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RUDÉ, Georges.

A Multidão na História: estudos de movimentos populares na França


e na Inglaterra 1730-1848. Rio de Janeiro: Campus, 1991.

Capítulo Um – O Motim Rural francês no século XVIII p.19-32

p.19 – França – século XVII – rebeliões de camponeses descontentes: 1620, 1630 e


1640.
– Período de Richelieu1 – choques com coletores de impostos e
recrutadores.
– Agitações no período de Luís XIV (1643-1715).
– Insurreições na década de 1670 – contra o imposto do sal (gabela).
– Guerras, Fome e Perseguição – último quarto do século XVII –
insurreição francesa do Languedoc2.
p. 19-20 – Resquícios do feudalismo – contra as obrigações senhoriais camponeses se
recusam a pagar impostos ao rei, dízimos a Igreja ou realizar trabalhos
forçados manuais servis (corveia3).
– Final do reinado de Luís XIV – desastrosa colheita e escassez de 1709.

– Século XVIII – marcada por menos perturbações que o período


anterior.
– Reivindicações dos camponeses permaneciam insatisfeitos – tributos
reais mais pesados – gabela e a talha4 continuam a ser recolhidos.
– Obrigações feudais continuaram a ser impostas pelos senhores aos
arrendatários.
– Número maior de camponeses adquiriu terras como proprietários
arrendatários durante esse período.
– Período de prosperidade agrária – reinado de Luís XV (1715-1774).

1
Cardeal de Richelieu foi primeiro-ministro do rei Luís XIII de 1628 a 1642, sendo considerado arquiteto
do absolutismo francês e da liderança da França na Europa.
2
Região do sudeste da Occitânia no sul da França.
3
Obrigação presente no modo de produção feudal e correspondia ao pagamento através de serviços
prestados nas terras ou instalações do senhor feudal ou feudo vassal ou estado. De 2 a 4 dias por semana,
o servo era obrigado a cumprir diversos trabalhos, como por exemplo, fazer a manutenção do castelo,
construir um muro, limpar o fosso do castelo, limpar o moinho, etc. Podia realizar também trabalhos de
plantio e colheita no manso senhorial.
4
Imposto francês direto, um dos mais importantes entre o período do século XV e a Revolução Francesa.
A arrecadação da talha era utilizada na manutenção do exército e sua cobrança era anual.
2

– Fome generalizada desaparece como “fenômeno frequente no campo


francês”.
– Preços agrícolas continuam a cair – baixam até 1730 – dificuldades.
– Alguns princípios de agitações camponesa na década de 1720.

p.21 – E. Labrousse – período: 1733-1778 – constante aumento de preços para


proprietários e arrendatários – mercado para vinhos e cereais
encontrado.
– 1778-1788 – tendências de quedas nos preços – França se envolve na
Guerra de Independência Americana (em 1778).
– 1787 – série de más colheitas e calamidades – onde de rebeliões –
papel vital na crise revolucionária de 1789.
– 1789 – dificuldades econômicas fazem emergir reinvindicações básicas
dos camponeses até então submersas.

Motins de 1755 – importante evento.


p.23 – Turgot – nomeado por Luís XVI – controlador Geral das Finanças5 – 1774.
– Fisiocrata – defensor do livre comércio.
– Decide estabelecer a liberdade de comércio de cereais e farinha no
mercado interno – modificação não era em si impopular – funcionaria
se a colheita fosse boa.
p.24 – 1774 – colheita muito pior que a anterior.
– 1775 – estoques esgotados.
– Ação de açambarcadores e as grandes compras feitas pelos
consumidores abastados eleva o preço de maneira alarmante.
– Turgot se recursa a intervir.
– Pobres reagem, originando um protesto prolongado que se assemelha
ao dos anos 1720.
– Seu início se deu em Beaumont-sur-Oise, comuna situada 30 km ao
norte de Paris – padeiros se recusam a fazer mais pão, alegando o
preço alto do trigo exigido pelos comerciantes. Magistrado se recusa a
intervir.

5
Ministro-geral das Finanças do rei Luís XVI de França entre 1774 e 1776.
3

– População invade o mercado e obriga os comerciantes a vender o trigo


pelo preço justo.

p.25 – Motins seguintes seguiriam a esse padrão.


– Imposição do “preço justo” se espalha ao longo das cidades, mercados,
aldeias e fazendas – exigir que comerciantes, agricultores, moleiros e
padeiros seguissem o exemplo.
– Origem da desconfiança em relação aos camponeses
– Avaliação à época de que esses motins se originavam de um suposto
complô para criar o caos na capital e derrubar o governo.
– Inimigos de Turgot na Corte – jesuítas e o partido da Igreja.

p.26 – Mapa com os Motins Franceses dos Cereais, 1775 – na Região de Paris.

p.27 – Suspeitas generalizadas – encampadas pelos biógrafos de Turgot.


– Guerra das Farinhas – motivadas pelo “Medo da Fome” e não pela
conspiração.
– Autor comprova através do estudo do padrão e momentos dos motins
que não havia uma indicação que comprovasse a tese da conspiração –
se divide em quatro correntes.
p.28 – Governador de Versalhes mandou em nome do rei vender o pão a um preço
menor – Turgot desfez a decisão.
– Efeito: população se convenceu que o Rei aprovava os motins e
atividades deles.
– 3 de maio de 1774 – reação da população dos subúrbios de Paris contra
o preço elevado do pão que os mercados estavam cobrando.
* invadiram postos aduaneiros até chegarem aos mercados centrais de
farinha e cereais – saquearam e compraram trigo, cevada e farinha
a preços reduzidos.
* trabalhadores assalariados e pobres de Paris esvaziaram as barracas
dos padeiros nos mercados e sitiaram todas as padarias da área
central.
p.29 – Faziam isto dizendo que era “Por ordem do Rei”.
4

– Reação de Turgot foi demorada – envio de soldados para os mercados –


movimento se espalha para outras áreas da cidade – centenas de
prisões, duas execuções públicas na capital (demora mais de uma
semana para debelar o movimento).
– Motins da Fome não parecem ter um centro único de irradiação.
– Magistrados locais – atendiam em alguns casos – cidade-mercados –
as exigências dos amotinados, geralmente parcialmente – medo do
desastre ou por solidariedade a sorte dos pobres.
p.30 – Decisões dos magistrados ajudaram a difundir as agitações –
aparência de “sanção oficial”, mesmo quando efetivamente não
tivessem tomado essa decisão, que era usada pela força do boato.
– Agitações como “expressão genuína” e espontânea do “alarme popular
com o crescente aumento do preço dos alimentos”.
Perfil dos agitadores
– Quem eram os agitadores (presos): vinicultores, horticultores,
trabalhadores do campo, carregadores e artesãos da região de Paris e
de cidades-mercados e aldeias – gente conhecida dos agricultores e
comerciantes. p.30-1
– Possível elo entre os motins de cereais de 1775 e os da Revolução
Francesa.

– Movimentos pós-1789 – semelhança com os distúrbios contra as


taxações (1789, 1792-3 e 1795).
– Hostilidade estimulada pela revolução da população da cidade e do
campo contra a nova doutrina de que “artigos necessários à vida”
deviam ser regulados pela “oferta e procura e não por uma
preocupação tradicional com a “justiça”. p.31
– Movimentos semelhantes antes da Revolução fracassaram –
amotinados isolados em seu movimento – enfrentam o exército, a
burguesia urbana, a igreja, o governo e os proprietários rurais.
– Força das ideias de liberdade, soberania popular e os Direitos do
Homem que alinham classes médias e baixa na luta contra o “inimigo
comum” mais tarde, ainda não haviam começado a circular entre os
pobres urbanos e rurais.
5

– Hostilidade tradicional dos camponeses às obrigações feudais não se


inscreveram no curso dessas perturbações.
– Alvo dos motins camponeses é o agricultor, o camponês próspero, o
comerciante de grãos, o moleiro ou o padeiro.
– Não se falava em derrubar o Rei ou a ordem feudal (Antigo Regime).
– Não se vislumbra ainda uma mudança ou reparação pela via política.
p.32
.*.*.*.
p.33 – Capítulo 2 – O Motim Inglês no Campo no Século XVIII p.33-48

– Impacto do comércio, da guerra civil, das vendas de terras, do


fechamento (cercamento) das terras e da invasão dos artesanatos
domésticos na “velha aldeia medieval” – eliminação dos resquícios
feudais – senhores e camponeses não existiam mais.
– Rebeliões camponesas como as que voltam a explodir na França não
ocorrem na Inglaterra desde o reinado de Elizabeth I (1553-1603).
– Proprietário local – governa a aldeia e participa do tribunal do condado
– arrendava terras aos camponeses arrendatários e empregava o
trabalho assalariado de mão de obra rural.
– Constitui-se um proletariado rural que se dedica à fiação e tecelagem
de uma manufatura industrial nascente.
– Patrão é o manufatureiro e comerciante – arrenda teares e leva o
produto acabado ao mercado.
p.33-4 – Comerciante – tem terras na aldeia e participa do Parlamento
junto com os proprietários – aprovam a Lei do Cercamento de Terras,
subsídios, Lei dos Cereais; promovem taxas e barreiras fiscais;
aprovam a Leis das Milícias e medidas contra o contrabando,
apoiando a Lei dos Pobres (Poor Laws em 1601), espécie de ajuda
social aos pobres.
p.34 – Questões que afligiam pequenos proprietários e arrendatários,
tecelões, mineiros, artesãos e os pobres da aldeia – preocupação e
ausência de representação política – recorrem ao motim tradicional.
6

– Século XVIII – eram frequentes, mas, não assumiam forma política –


alguns poucos casos, mais nas cidades, quando poderia
ocasionalmente evoluir para causa política.
p.35 – Historiadores tenderam a tratar esses motins populares como algo
sem muita importância, chegando a considerar que não houvesse
“descontentamento social” significativo.
– Motins aconteciam com frequência – constituíam um tipo de
protesto social – relacionados questões de subsistência, mas,
poderiam assumir outras formas (motins “religiosos”); disputas
trabalhistas (ataques aos irlandeses); contra as Leis das Milícias
ou as barreiras fiscais, havendo forte oposição popular.
– Hostilidade em relação ao “fechamento de terras” – mais prolongadas –
ao longo de todo o século XVIII – mais intensa depois de 1760.
– Motins mais numerosos ocasionados por escassez ou súbito aumento de
preços de alimentos.
p.36 – 1736-1800 – 275 perturbações identificadas pelo autor – 2 em
cada 3 tem essa motivação – considerável ser improvável que as
proporções sejam diferentes para outros anos do século XVIII.
p.37 – Medo da Fome – mais do que na França, a população inglesa de
pequenos consumidores “dependentes do pão barato e abundante,
da carne, da manteiga e do queijo em momentos de colheita ruim
e de guerra que esgotavam os estoques, tendo de exportar o trigo
em época de escassez, os preços subiam, e o temor da fome
acendia as agitações.
– Preço médio do trigo: 1713-1764 – baixos; 1709, 1727-8, 1740 e 1756-
7 – “maus períodos”.
 Consideráveis perturbações coincidem com esses anos (como na
França).
1709 – inverno rigoroso e verão chuvoso.
1727-8 – verão chuvoso;
1740 – colheita ruim;
1756-7 – Guerra dos Sete Anos.
– Medo da “turba”, de explodir revoltas ou motins.
7

– 1765-1800 – período de preços elevados dos alimentos – fracassos


nas colheitas: 1766-7, 1770-4, 1782, 1789, 1794 e 1799-1800.
– Entrada da Inglaterra na guerra e más colheitas de 1793 em diante
pioram o cenário.
p.38 – Anos mais críticos coincidem com a deflagração de “motins da
fome”.
– 1766 – mais generalizados – 60 incidentes.

* Observações Gerais quanto a todos motins da fome do século XVIII:


1) Grande número de trabalhadores industriais participa dessas
manifestações – revela, portanto, que como ocorre na França, a
“forma típica de protesto social na época, mesmo entre
trabalhadores assalariados, era o motim da fome, e não a greve”.
2) Motins eram mais frequente no norte e no oeste – área de
exportação de cereais pelos portos (no sul e no leste ficavam as
áreas produtoras de trigo).

– Formas assumidas pelos motins eram variadas: saques de depósitos,


ataques às casas dos comerciantes, obstrução à barcos estrangeiros que
iam para o exterior, ou podiam tomar forma de “imposição de um teto
de preços” como na França – aliás tornou-se um fenômeno mais
frequente ultrapassando o século XVIII – ocorriam geralmente em
período críticos dos motins da fome.
p.39 – Examinando uma série específica de motins:
– 1766 – Possível paralelo com a Guerra das Farinhas francesa (1775) –
perturbações relacionadas com a escassez e o custo crescente de
cerais.
– Não há evidência de motivação por parte da facção política interessada.
– Causa mais evidente: colheita ruim em 1765 seguidas de outras –
súbito aumento no preço do trigo.
p.41 – Variações nos preços parece explicar melhor a reação de
consumidores em pânico que correram aos mercados por reparação.
p.42 – Descrição dos episódios de motins e sua difusão pelo interior da
Inglaterra.
8

– Forçando os comerciantes e produtores a rebaixarem seus preços.


p.44 – Descrição de manifestação ocorrida em Norwich que assumiu
grande proporção.
– Verão de 1768 – preços começam a recuar, temporariamente – refluxo
dos motins – efeito de ações tardias do governo – iniciativa privada
reage a esses motins: rebaixando os preços ou comprando fora para
vender na Inglaterra e obter lucros.
p.44-5 – Repressão – uso das milícias dos condados e de militares; casos
em que agricultores em cidades e aldeias pegaram em armas para
conter os amotinados.
– Número elevado de prisões.

* Reação rápida aos aumentos de preços na França e na Inglaterra.


* Principal eixo foi o Mercado – centro principal de difusão e
recepção de notícias e rumores no distrito.
– Alvo de hostilidade: negociante de cereais ou o agricultor – na
Inglaterra o primeiro era mais do que o segundo.

– Característica Geral – redução pela força do preço dos alimentos,


pelo motim.
– França – trigo, farinha e pão; Inglaterra – frequentemente do queijo,
da manteiga, da carne e do toucinho.
– taxation populaire:
– França – forma de imposição a agricultor, padeiros e comerciantes
para reduzir preços;
– Inglaterra – quase sempre a multidão fazia a venda.
– Voltar ao preço dos anos de boas colheitas e de abundância normal.
p.45 – Memória popular da “velha prática de intervenção oficial para
proteger os pobres contra os preços da fome” abandonada
recentemente.
– Autoridades em alguns casos defendias os “velhos métodos”. p.45-6

– Diferenças entre os dois movimentos. p.46


9

A) Motins na França em 1775 – “movimento único” – difunde-se


numa série de “erupções” de um mercado para o outro.
B) Inglaterra – “erupções separadas” com origem e propósito
comum – três bolsões.
– Composição de amotinados não é a mesma (1775 e 1766).
– França – principalmente camponeses (vinicultores,
trabalhadores do campo e artesãos).
– Inglaterra – tecelões, funileiros, mineiros de carvão, barqueiros,
ou simplesmente “pobres” (não se manifesta a “mesma confiança
convocadora no papel do protetor do monarca” como no caso
francês, pois, o rei constitucional opera com o consentimento do
Parlamento – situação inglesa pode ser considerada mais
evoluído, e reflete uma fase do desenvolvimento social atingida
pelo campo).

– Movimentos que pertencem a uma “tradição popular semelhante” – típica forma de


protesto social – sobrevive na Inglaterra até 1847, e na França até 1848.

.*.*.*.

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