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A economia moral da multidão inglesa no século XVIII

Edward Thompson

O autor trata dos motins de fome ocorridos ao longo do século XVIII na Inglaterra, principalmente
por conta dos grãos de trigo e as relações econômicas, culturais e morais daquele período. Motins
que muitas vezes pareciam greves organizadas e com fins estabelecidos, muito mais do que uma
rebelião simplesmente.

Essa simples palavra de cinco letras é capaz de encobrir o que pode ser descrito como uma visão
espasmódica da história popular. Segundo essa visão, dificilmente se pode tomar a gente comum
como agente histórico antes da Revolução Francesa. (…) Essas intromissões são antes compulsivas
que conscientes ou auto-ativadas: não passam e reações aos estímulos econômicos. 150

^^ Thompson questiona os antigos historiadores que trabalharam o tema acima, porque eles
acreditavam nesse visão espasmódica, em que os trabalhadores eram movidos por razões
compulsivas: os outros que pensavam por eles, e os trabalhadores foram a esses motins por
vagabundagem, pela fome, mas não como sujeitos históricos conscientes de seu papel como
transformadores da sociedade.

Rostow: o autor questiona este. Embora concordando que a fome produz rebeliões, ele não vê essa
situação apenas como econômica (aumento de preço, formação de estoques, ganância de
comerciantes, intermediários) ou reações causadas pelas necessidades fisiológicas dos habitantes,
mas eles também estavam defendendo direitos e costumes quanto ao uso do trigo. Os mesmos se
organizaram e tinham objetivos em comum, não sendo apenas um motim em reação.

Os anos que levaram a agricltura inglesa a um ovo grau de excelência foram marcados pelos motins
(…) de 1709, 1740, 1756-7, 1773, 1782 e, sohretudo, 1795 e 1800-1.153

^^ a fortuna dos capitalistas (principalmente do sul e leste) dependia da venda de lã, carne e cereais,
entre os quais o trigo para se fazer pão. É verdade que não se alimentavam apenas de pão e que o
mesmo não era inteiramente feito de trigo, feito também com cevada, centeio e outros grãos.
Embora ligado a questões financeiras, tinham regiões da Inglaterra que o trigo não amadurecia, o
que impedia o consumo em grande escala.

* padeiros promoviam a venda do pão escuro, que muitos acusavam de conter nocivos aditivos,
enquanto que o pão branco (farinha pura) era feito em menor quantidade, pois a legislação proibia
o lucro deles frente aos pobres. Em épocas de escassez, havia os que não se sujeitavam a comer o
pão misturado, principalmente no final do século, em que o trigo prevalece.

1800: lei proibia os moleiros a fazerem qualquer farinha que não fosse de trigo integral = mulheres
atacaram moleiros que ofereceram a elas farinha escura.

Modelo paternalista: os agricultores trazem os cereais. Não poderiam reter o produto nem vendê-lo
enquanto estivesse no campo. Na compra, quem deveria adquirir primeiro eram os pobres. Somente
depois deles, os comerciantes licenciados poderiam comprar pra revender, porém eram atingidos
por medidas protecionistas. Por conta dessas restrições, fazendeiros negociavam com intermediários
ao invés de se regularem ao mercado, isso quando não regulam o preço entre eles, escondem
produções pra aumentar o preço, exportam para outros locais mesmo em crises de abastecimento.
** ricos moleiros também comerciavam em algumas localidades. Padeiros se utilizavam também da
mistura de farinha barata com estragada para aumentar as vendas, e de pesagens erradas.
*** mesmo com revogações de certas leis protecionistas, as compras antecipadas de grãos eram
consideradas penalidades no direito consuetudinário
O modelo paternalista era ideal, mas tinha falhas. Nos anos de boas colheitas, as autoridades pouco
se importavam com os mecanismos para favorecer os comerciantes, agricultores, moleiros, porém
com o encarecimento e os pobres se revoltavam, o Estado tinha que intervir de forma a produzir
pelo menos um efeito simbólico. Há de levar em consideração que os estudos a respeito da
autorregulação do mercado e do funcionamento da economia estavam começando, tais como
críticas a intervenção do Estado.

Em 1796, Arthur Young calculava que o deficit total de grãos de trigo era menos de 25%; mas o
aumento dos preços era de 81%: o que dava (pelos seus cálculos) um lucro de 20 milhões e libras
para a comunidade agrícola num ano normal.163

*** as pessoas viam os responsáveis pela produção e comercialização de grãos como extorsionistas,
não raro que se revoltasse e rompessem com a moral paternalista e consuetudinária, partindo para o
saque e agressão. Alguns até que não eram monopolistas também pagaram o pato. Ao mesmo
tempo, o trabalhador em geral não podia custear um saco da farinha.

Uma operação combinada de soldados e povo forçou o prefeito de Chichester a concordar em fixar
o preço do pão. 180

^^ próprios prefeitos também utilizavam do poder bélico policial para abrir fogo ou violar direitos.

Se a praça do mercado era uma arena da guerra de classes, tanto quanto a fábrica e a mina vieram a
ser na Revolução Industrial, a ameaça de motins causaria impacto sobre toda a situação de
mercado.187

No curto prazo, os motins talvez fossem contraproducentes, embora isso ainda não esteja provado.
Porém, uma vez mais, os distúrbios eram uma calamidade social, que devia ser evitada mesmo a um
custo alto. 192

entre 1795 e 1801, os motins não se subscreviam apenas como ações entre os paternalistas e a
multidão, mas a repressão foi levada a cabo por mais magistrados e nobres. Esse paternalismo era
incoerente com o liberalismo.

Temos dificuldade de conceber possível a existência de uma época, numa comunidade menor e
mais integrada, quando não parecia “natural” que um homem lucrasse com as necessidades dos
outros, e quando se admitia que, em tempos de escassez, os preços dos “artigos de primeira
necessidade” deviam continuar no seu nível habitual.198

^^ ao mesmo tempo em que era local de exploração, o mercado era ponto de encontro dos
consumidores no âmbito da industrialização, em que criavam conexões econômicas, sociais,
culturais.

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