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Norberg-Schulz, Christian. “A Arquitetura Romana”. In: O Significado na Arquitetura Ocidental.

Buenos Aires: Summa, 1973.

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Introdução

Ainda que por muito tempo não se tenha estabelecido uma clara distinção entre a arte romana
e arte grega, o esplendor da arquitetura romana foi durante séculos objeto de admiração. No
entanto, a partir de Winckelmann (1717-1768), ao se aprofundar o estudo da contribuição
grega, surgiu a tendência de considerar arquitetura romana como uma “degeneração” da
arquitetura grega clássica. Assim, a verdadeira compreensão do valor original do aporte
Romano é de data bastante recente. Mesmo que ainda haja muito por fazer neste campo, já
estamos hoje em condições de levar a cabo uma análise estrutural da arquitetura romana e
dos significados que representa.

A arquitetura romana não pode ser associada com determinado tipo de edifício dominante,
como ocorre no caso do templo grego. Há, ao contrário, uma multiplicidade de temas edilícios
até agora quase desconhecidos como, por exemplo, as grandiosas construções das termas, das
basílicas, dos anfiteatros e dos circos. Essa multiplicidade indica funções e estruturas sociais
mais complexas, e também uma margem mais ampla de significados existenciais; no entanto,
apesar de diferenças funcionais, os edifícios e as plantas romanas têm características
fundamentais em comum, sobretudo estão em geral organizados sobre uma base axial rígida.

Podemos considerar o eixo como uma das propriedades distintivas da arquitetura romana. Já
encontramos o eixo na arquitetura egípcia mas, lá, ele era de importância secundária em
relação a o espaço ortogonal mais geral. Em Roma, os elementos ortogonais e rotatórios se
unem para formar totalidades complexas organizadas axialmente. Devemos destacar também
que, em geral, o eixo Romano aparece relacionado com um centro, que frequentemente se
define como um cruzamento de eixos. O significado do eixo Romano é, pois, totalmente
distinto do significado simbólico do percurso egípcio.

Uma segunda propriedade distintiva da arquitetura romana é sua utilização frequente e


variada tanto do espaço interior como do espaço exterior “ativo”. De fato, se fala da
arquitetura romana como de uma arquitetura “espacial” em contraste com o caráter “plástico”
da Grécia clássica. Na arquitetura romana aparecem, pela primeira, vez vastos espaços
interiores isolados ou em grupos complexos. Estes espaços mostram uma grande variedade de
formas e estão cobertos às vezes por cúpulas, elementos que até então só haviam
desempenhado um papel secundário na construção. Em geral, os romanos trataram o espaço
como uma substância moldável e articulável, “ativado” desse modo, já não é um “inter-meio”
secundário em relação com os corpos plásticos circundantes, mas adquire importância
primordial e é definido pelos muros, entendidos como superfícies contínuas mais que como
massas volumosas. Para tornar possível tais superfícies, os romanos desenvolveram uma nova
técnica de construção. Ao invés dos sistemas trilíticos dos egípcios e dos gregos, utilizaram
uma espécie de cimento que se conformava de modo tal que criava muros contínuos,
abóbadas e cúpulas (“opus caementicium”). Como, pois, foi possível confundir arquitetura
romana com a grega ou estimar que a primeira era uma “degeneração” da segunda? É verdade
que os romanos adotaram as ordens clássicas, mas as empregaram de modo basicamente
inovador. O que antes havia sido o elemento estrutural foi reduzido a “decoração” superficial.
Mas seria injusto julgar arquitetura romana conforme cânones gregos. É indubitável que os
membros clássicos perderam grande parte de sua força plástica e de sua Independência na
arquitetura romana mas, em troca, conferem caráter a um novo tipo de entorno integrado
espacialmente. Contudo, o caráter já não é o de lugares individuais: espaço e articulações se
convertem em fusões de tipos muito codificados que podem ser empregados sem mudança
fundamental em qualquer lugar. Portanto, a arquitetura romana pode ser caracterizada como
um “estilo Internacional” independente da situação geográfica particular.

Paisagem e Assentamento

Enquanto o mundo grego consistia de uma multiplicidade de lugares individuais, o mundo


Romano esteve sempre centrado na capital. Roma era o “caput mundi”; os caminhos do
Império levavam desde a coluna do “Miliarium Aureum” até o pé do Capitólio. Se traçássemos
um mapa simbólico do mundo Romano sua característica mais evidente seria uma rede
centralizada de caminhos. Não podemos, pois, falar da paisagem romana nos mesmos termos
em que falamos da paisagem egípcia ou da paisagem grega. Os romanos dominaram a
natureza, técnica e espacialmente, isso é, o sistema organizado de caminhos e aquedutos
manifesta esse feito. É muito significativo, a esse respeito, a figura de Jano, divindade romana
que não tem equivalente em nenhuma outra mitologia. Jano era o Deus de todos os acessos e
portas públicas pelas quais passavam os caminhos. Suas 2 caras lhe permitiam observar
simultaneamente o exterior e o interior de um edifício. Assim como era o Deus das portas,
também era o Deus da partida e do regresso. Reconhecemos aqui um novo fato existencial: o
desejo humano de conquistar o universo a partir de um centro conhecido e significativo. A
rede de caminhos representa, assim, a propriedade básica do espaço existencial Romano.
Numa rede assim constituída, os nós são particularmente importantes e os romanos os
destacaram com portas e arcos triunfais.

Isso não significa que os romanos careceram do sentimento da natureza. Também no mundo
Romano alguns lugares foram escolhidos ou consagrados em razão de seu caráter particular.
“Genius Loci” é, sobretudo, um conceito latino. Mas, ao invés de limitar-se a interpretar o
caráter natural, os romanos quase sempre introduziram uma ordem organizadora diferente.
Quando se consagrava um “sítio” o “augur” se sentava no centro e com sua vara, o “lituus”,
determinava 2 eixos principais através do centro, dividindo, assim, o espaço em 4 áreas:
esquerda e direita, adiante e atrás. Esta divisão não era arbitrária, mas representava os pontos
cardeais e se ajustava também às formas da paisagem circundante. O espaço assim definido,
dentro do limite do horizonte, era chamado o “templum”. Os romanos tomavam, pois, uma
imagem espacial geral como ponto de partida de suas planificações, em vez de recorrer a um
caráter específico simbolizado em formas plásticas. Todo lugar Romano é uma manifestação
dessa ordem basicamente cósmica.

Também o “castrum” e a cidade se baseavam no mesmo esquema: a superfície quadrada ou


retangular dividida em 4 partes mediante 2 ruas principais que se cortavam em ângulo reto. A
principal, “cardo”; a secundária “decumanus”. O “cardo”, com um percurso de norte a sul,
representava o eixo do mundo; e o “decumanus”, o percurso do Sol de Oriente a ocidente. As
ruas principais levavam às 4 portas abertas no muro da cidade. Essa estrutura simbólica é
também a de Roma. O primeiro assentamento, no Palatino, recebeu o nome de “Roma
quadrata”, nome que se refere não a uma forma quadrada, mas à uma de visão em 4 partes. O
centro estava representado por um poço que se chamava “mundus”. O “mundus” simbolizava,
evidentemente, a relação imediata com as forças terrestres, cujos favores o homem devia
obter, como na caverna situada debaixo da pedra onfalos em Delfos. Mais tarde, quando sob
Sérvio Túlio Roma se converteu em grande cidade, a divisão em 4 partes se manteve, e se criou
um novo “mundus” no fórum Romano, perto do qual se levantou depois, no tempo de
Augusto, o “Miliarium Aureum”. Em outras cidades romanas, o fórum se converteu, quase
sempre, num espaço retangular organizado axialmente, próximo ao centro simbólico.

É evidente que a paisagem e os assentamentos romanos tinham uma estrutura análoga: eram
concebidos como áreas centralizadas, divididas em 4 zonas por 2 “percursos” de distinto valor
que se cortavam num centro em ângulo reto. Esta organização geralmente concretizava uma
imagem cosmológica e a cidade era concebida como um “microcosmos”, tal como o
demonstra a estreita afinidade entre as palavras “orbs” (mundo) e “urbs” (cidade). A relação
com o Egito é evidente mas, ao fazer de um centro a origem da ordem ortogonal e axial, os
romanos transformaram a imagem estática eterna dos egípcios num mundo dinâmico onde as
possibilidades de partida e de regresso, isso é, de conquistar o entorno, se converteram num
significado existencial primordial. Mas essa conquista se dava como manifestação de uma
ordem cósmica pré-estabelecida “de acordo com os deuses”.

O Edifício

O interesse Romano pelo espaço como meio ativo de expressão arquitetônica levou à
valorização dos interiores e à integração do edifício no marco urbano. Isto é evidente até no
tipo mais conservador de edifício Romano, ou seja, no templo. Desde o começo mesmo, o
templo Romano foi concebido de maneira basicamente diferente do templo grego. Por
exemplo, o templo de Júpiter Capitolino (509 a.C.) apresentava colunas muito espaçadas e
relativamente esbeltas. O intercolúnio central era mais largo a fim de acentuar o eixo
longitudinal iniciado na escada frontal, que conduzia ao alto pódio. A cela dedicada à tríade
capitolina (Júpiter, Juno e Minerva) apresentava no fundo um muro cego que se estendia para
abraçar as fileiras laterais de colunas. O edifício não pode ser lido como um corpo plástico em
vulto, visto que está orientado frontalmente.

À medida que se desenvolvia, o templo Romano assimilou elementos procedentes da


arquitetura grega, mas conservou, e até acentuou, suas características originais. O “bosque de
colunas” do templo capitolino se converteu num profundo pórtico, e a cela se converteu num
espaço unitário que abarcava toda a extensão do pódio. Em geral, o templo Romano não está
isolado, e sua parte posterior se conecta com o muro que rodeava um espaço organizado
axialmente, o qual ele domina. Assim, a primazia do espaço fica evidente e, como
consequência lógica, a cela de templos tardios, como o templo de Vênus e Roma (135 d.C.),
estava coberta com uma abóbada que completa o simbolismo cósmico da imagem espacial.

Em outros tipos de edifícios menos tradicionais, o interesse Romano no espaço fica ainda mais
evidente. Um bom exemplo é constituído pela “basílica” que, em diversos aspectos, tinha uma
função análoga à stoa grega, formando em geral, um dos limites do fórum, oposto ao templo.
O eixo do templo pode, assim, unir-se com o eixo transversal da basílica. Este eixo está
atravessado em ângulo reto por outro eixo longitudinal. A planta biaxial da basílica repete o
esquema básico do espaço Romano: sua secção, com uma nave central mais alta flanqueada
por Naves laterais, não apenas permite a entrada da luz na parte central do espaço, mas
contribui fundamentalmente para a majestosidade do interior. Na basílica de Maxêncio, em
Roma (307-312 d.C.), este efeito é sublinhado pela introdução de 3 grandes abóbadas de
arestas sobre a nave central. Os empuxos destas abóbadas são neutralizados por 3 abóbadas
de canhão em cada lado.

Também a casa romana com átrio ilustra o conceito Romano de espaço. O átrio, de origem
etrusca, é um espaço centralizado iluminado zenitalmente, penetrado por um eixo longitudinal
que, a partir da entrada, percorre o jardim desde o peristilo até o extremo oposto. Em certos
aspectos, a casa com o átrio tem uma afinidade com a casa grega com pátio mas, enquanto a
casa grega se caracterizava por seu isolamento, graças a sua disposição axial a casa romana
forma parte de um sistema espacial complexo. Devido a isso, pode ser considerada como uma
síntese ideal de funções privadas e públicas, ao mesmo tempo fechada e aberta à relação com
o ambiente. O eixo longitudinal terminava numa exedra: a sala de receber do “pater famílias”.
Em consequência, o eixo pode ser interpretado como um símbolo de autoridade, assim como
eixo organizador do templo Romano.

Por último, o teatro exemplifica de forma exemplar as intenções fundamentais dos romanos.
Enquanto o teatro grego podia ser definido como um espaço relativamente “passivo”, que
servia de fundo para as figuras plásticas e ativas dos atores, o teatro Romano é um verdadeiro
espaço “ativo”. Suas fileiras de assentos, colocadas em forte pendente, e a “scena frons”
elevada, criam uma poderosa a sensação de espaço interior. Dentro do espaço, os atores não
atuavam livremente, mas estavam limitados a um estreito proscênio na frente dos
espectadores: apareciam, pois, como um relevo. Junto com os espectadores, formavam parte
de um espaço dominante que se revela axial quando examinado atentamente. No centro da
“scena frons”, sobre a porta principal, se elevava a estátua de uma autoridade e, na frente
dela, atrás dos espectadores, havia geralmente um pequeno templo. Deste modo, a atuação
dos atores se integrava a um sistema existencial compreensivo, e o edifício exemplificava a
busca tipicamente romana da diferenciação funcional como expressão da multiplicidade de
ações que constituem um sistema.

Articulação

Novos problemas de articulação formal se desenvolveram naturalmente a partir da crescente


importância dos espaços “ativos” interiores e exteriores. Enquanto que as ordens clássicas
haviam sido desenvolvidas para caracterizar pequenas unidades arquitetônicas relativamente
independentes, a existência de superfícies ininterruptas dos edifícios romanos maiores
exigiram um novo tipo de subdivisão e de tratamento. Ainda que os egípcios tivessem
desenvolvido alguns dos meios mais importantes de articulação arquitetônica, podemos dizer
que o problema “moderno” do muro como “encontro de forças exteriores e interiores, de
função e espaço” foi introduzido pelos romanos.

Em geral a articulação do muro Romano não corresponde à estrutura técnica do edifício. Ainda
que apareçam elementos técnicos, como o arco, o tratamento formal do muro, mais do que
explicar, oculta a construção. Os edifícios romanos de concreto constavam de um sistema
contínuo de abóbadas, arcos, muros e pilastras, quase sem elementos horizontais. A aparência
dos muros está normalmente condicionada pela aplicação dos membros horizontais e verticais
das ordens clássicas. Só em edifícios utilitários de importância secundária fica à vista a
construção, fato que indica porque se introduziram as ordens em relação com as obras
públicas mais importantes. Os romanos queriam, obviamente, criar uma nova forma simbólica.
É evidente que não se limitaram à mera imitação da arquitetura grega, que o uso Romano das
ordens difere fundamentalmente do uso grego. Assim, os membros clássicos, mais do que
expressar um determinado caráter ideal, formam uma totalidade dinâmica e complexa de
partes em interação.

O exemplo mais conhecido do uso Romano das ordens é a chamada “superposição”, na qual se
colocam umas sobre as outras colunas dóricas, jônicas e coríntias, semicolunas ou pilastras. A
masculina e robusta coluna dórica sustenta a jônica, mais graciosa, que, por sua vez, sustenta a
coríntia, mais esbelta. O jogo de forças relativamente simples expresso deste modo representa
um novo tipo de relação entre os elementos de um edifício. Atuam em conjunto, não como
indivíduos, mas como partes de um sistema. A ideia organizadora de sistema determina a
eleição de cada parte. Diferente da arquitetura grega, na qual cada elemento continha o
caráter imanente do conjunto, aqui cada parte por si só não nos diz nada sobre o edifício como
totalidade. Um exemplo mais complexo de tais sistemas são dados pelos muros em que as
ordens clássicas se combinam com o almofadado; e devemos ter em conta que, ainda no
século XVI, este artifício era interpretado por Serlio como expressão de uma interação entre a
capacidade organizadora do homem e as forças da natureza. Então, se os romanos queriam
caracterizar o edifício como um sistema dinâmico, por que não usaram o sistema de
construção diretamente para tal fim? Evidentemente porque o jogo de forças numa
construção contínua seria muito complexo e não harmonizaria com a estrita ordem espacial
das plantas e dos edifícios romanos. Os grandes “baldaquinos” das abóbadas de aresta
representam, no entanto, um passo importante para a utilização de estruturas técnicas reais
como meios de organização espacial. Em geral, a articulação romana responde ao problema de
como dar ao espaço continuidade e ritmo, ou seja, ordem dinâmica. Sua intenção básica era
caracterizar o espaço como o cenário da ação humana inspirada pela divindade. O espaço se
converte no cenário variado e dinâmico, mas ordenado, no qual se desenrola a história. As
pinturas murais pompeanas apoiam essa interpretação. Mediante a ilusão da perspectiva,
fazem com que as paredes se dissolvam e o cômodo passa a ser parte de uma totalidade
espacial compreensiva e as ações que ali têm lugar se encontram dentro do plano histórico e
divino simbolizado pelos motivos pictóricos. O espaço Romano corporifica, assim, a dimensão
do tempo, não como uma ordem estática e eterna, tal como ocorria com os espaços
ortogonais dos egípcios, mas como dimensão da ação.

Palestrina

Em Palestina, perto de Roma, se encontram os restos da antiga Praeneste, onde se erguia um


dos santuários mais importantes da antiguidade romana. Era consagrado à Fortuna Primigênia,
a “primogênita” de Júpiter (ainda que, ao mesmo tempo, se afirme que foi a ama-de-leite de
Júpiter e de Juno!). Estamos diante de uma devoção muito diferente das que vimos na Grécia.
Um Deus antropomorfo é substituído por um vago conceito de “força do destino”, isso é, o
princípio que move as coisas e produz os fatos. O santuário da Fortuna é do período
republicano (aproximadamente 80 a.C.) mas o culto à deusa neste sítio era, sem dúvida, muito
mais antigo. Desde o começo da evolução romana, o destino se apresenta como uma nova
dimensão da existência humana.

Dois antigos lugares sagrados que já existiam na íngreme ladeira se tornaram o ponto de
partida para o grande projeto de Sila: o templo circular da Fortuna Primigênia, que data do
século III a.C. e, aproximadamente uns 100 m mais abaixo, a estátua da Fortuna com Júpiter e
Juno em seu regaço. Estes dois elementos se incorporaram a um vasto plano de terraços
distribuídos axialmente. Ao templo antigo se adicionou um pórtico semicircular que abraçava
um “teatro” desde o qual se podia dominar toda a campina. Será difícil encontrar outro lugar
onde se evidencie a tal ponto como os romanos utilizavam a paisagem. De um e de outro lado
o espaço está delimitado por colinas, enquanto o cardo dirige a nossa visão até o mar ao
longe. Um vale que corre de leste a oeste atravessa este eixo abaixo do santuário, como um
decumanus. O santuário domina este âmbito ordenado, e o “teatro” surge num sítio a partir
do qual essas associações cósmicas podem ser percebidas e compreendidas (o altar da Fortuna
possivelmente estava situado dentro do “teatro”, no lugar do cenário). A série de terraços que
estão mais abaixo prepara o visitante para esta significativa experiência final. “Preparar”
significa, neste caso, um movimento contínuo dentro de um espaço organizado. Entra-se no
santuário por ambos os lados mediante escadas dispostas simetricamente que levam a uma
espécie de propileus com pórticos com colunas e fontes. Aqui se iniciam as largas rampas de
acesso que se elevam em ângulo reto na direção do eixo principal da planta. As rampas
estavam flanqueadas por muros e não permitiam contato algum com a paisagem antes que o
visitante chegasse à plataforma central, onde uma magnífica vista da planície que se estende
mais abaixo revelava a significação e o poder do eixo principal. As escadarias dão acesso a um
largo terraço flanqueado por colunas dóricas. No centro de cada metade do terraço estão
inseridas exedras jônicas: a ocidental para abrigar um altar, a outra para a estátua da Fortuna
com Júpiter e Juno em seu regaço. Uma escadaria central leva a outro terraço, cujo muro
posterior está articulado por semi-colunas jônicas. Seguindo ao largo do eixo principal,
chegamos a uma ampla plataforma rodeada por 3 lados de colunas coríntias. Daqui se vê o
templo da Fortuna, que aparece por cima do teatro e de seu pórtico semicircular com colunas.

O santuário de Palestrina não está integrado por corpos plásticos individuais como o templo de
Delfos, mas é constituído de terraços, colunatas, rampas e escadarias unificadas para formar
um todo integrado. A continuidade é uma de suas fundamentais propriedades formais. A
continuidade espacial e plástica geral se combina com uma distribuição axial dominante.
Observamos uma série de elementos significativos ao nos dirigirmos à meta final: o grande
muro poligonal sob o primeiro terraço, e as ordens dórica, jônica e coríntia nos níveis
principais. Cada elemento se torna parte dependente de um todo dinâmico que parece
concretizar uma ação significativa. Desde o momento em que o visitante ingressa no santuário,
o traçado o captura, como uma força espacial que o conduz até a meta. Desse modo, o templo
da Fortuna estende sua influência além de suas dimensões e se converte em agente de uma
ordem cósmica que abarca toda a paisagem. É evidente que o santuário pode ser lido a partir
do templo e que o percurso Romano se estende a partir de um centro. O regresso egípcio foi
substituído pela partida e pela conquista romanas.

o Panteão

Enquanto o santuário de Palestrina é o primeiro grande exemplo de um espaço exterior ativo,


o Panteão Romano representa a introdução do espaço interior como expressão de uma nova
dimensão existencial. O edifício que se ergue atualmente foi dirigido por Adriano (118-128
d.C.) que o dedicou a “todos os deuses”. Novamente nos deparamos com um princípio geral e
não com uma força individual e específica. Na verdade, o Panteão sempre impressionou aos
visitantes por seu caráter “cósmico”. “Parece o céu”, declarou Dion Casio. Estudos recentes
corroboram esta similaridade.

O Panteão é formado por 2 elementos principais: uma vasta rotunda com cúpula, e um
extenso pórtico com colunas. O pórtico se assemelha ao de um templo Romano normal, e
originalmente esteve precedido por uma escadaria, já que o nível do solo era
consideravelmente mais baixo. Estava flanqueado por pórticos mais baixos com colunas que se
estendiam para frente em ambos os lados. O efeito geral do exterior não diferia do de outros
tempos romanos. O Panteão constituía o elemento dominante de um espaço exterior ativo. A
rotunda não foi concebida como um corpo plástico, mas como envoltório que continha a
grande cela, que parece expressar uma nova imagem do universo humano. Ambas entidades
não formam, aparentemente, uma totalidade integrada. O pórtico tradicional e a
revolucionária rotunda parecem somados sem uma íntima necessidade. No entanto, um
exame mais detido revela características formais que contradizem essa interpretação (por
outra parte, bastante comum). Um volume retangular foi introduzido entre o pórtico e a
rotunda, o qual atua como transição natural. Os entablamentos dos dois volumes principais
não coincidem, mas ambos se prolongam mediante o elemento de transição, produzindo uma
interpenetração de formas que só podem ser percebidas numa concepção total do edifício.
Além disso, foi introduzido um eixo longitudinal que, partindo do pórtico, percorre o volume
de transição e, depois de atravessar a rotunda, termina numa abside. Esta abside está
flanqueada por colunas que, através de rupturas no entablamento, se conectam visualmente
com um arco que penetra no tambor da cúpula. Uma vez no interior, no entanto, o eixo é
menos evidente que o efeito centralizador do espaço circular e da cúpula hemisférica. Tem-se
assinalado, constantemente, que uma esfera com um diâmetro de 43,20 m poderia ser inscrita
dentro do espaço. Mas é importante destacar que os caixotões da cúpula não estão
relacionados com o centro desta esfera, mas com o centro do pavimento, ou seja, com o
espectador que ali se detém. Deste modo, se define um eixo vertical que se eleva livremente
até o céu, através da ampla abertura até o zênite. O Panteão integra, assim, a dimensão
sagrada da vertical na organização do espaço interior.

Unifica, assim, uma cúpula celestial e um prolongado eixo longitudinal num todo significativo.
Unifica a ordem cósmica e a história viva, e faz com que o homem experimente a si mesmo
como um explorador e um conquistador de inspiração divina, como um criador da história
conforme o plano divino. Isso também se evidencia na divisão horizontal do espaço. O tambor
da cúpula consta de duas zonas articuladas mediante membros clássicos: abaixo, grandes
pilastras e colunas coríntias e, acima, pilastras menores. Estes membros, seus delicados
entablamentos, e os caixotões da cúpula ocultam a complexa construção abobadada e dão ao
interior a sossegada ordem cósmica que se perseguia. A zona inferior tem uma rica articulação
plástica com nichos profundos e colunas independentes que representam, por assim dizer, a
ação no espaço. A zona superior apresenta uma ordem simples, de membros antropomorfos, e
a cúpula transmite a harmonia celestial da perfeição geométrica. Deste modo, o espaço
arquitetônico se converte em símbolo significativo da existência do homem no espaço.

As Termas de Caracalla

As termas representam, sem dúvida, a manifestação mais grandiosa do interesse dos romanos
pelo espaço interior concreto. Nas grandes termas imperiais não só existe uma rica variedade
de interiores abobadados e com cúpulas mas também uma nova intenção de reunir estes
espaços a fim de constituir grupos complexos. Ainda que isto se deva a um programa funcional
diferenciado não se pode explicar apenas por razões funcionais. Enquanto as termas de
Pompéia mostram ainda uma distribuição irregular de espaços, as de Tito (80 d.C.) tinham um
traçado estritamente simétrico em relação ao eixo norte-sul. Nas termas de Trajano (109 d.C.)
encontramos também um eixo leste-oeste plenamente desenvolvido. Este esquema, com sua
afinidade com o cardo e o decumanus dos assentamentos romanos, se repete nas termas de
Caracalla (212-216 d.C.) e nas de Diocleciano (298-306 d.C.).

Nas termas de Caracalla foram exploradas todas as possibilidades da construção de concreto e


as ruínas ainda testemunham um traçado imponente. O edifício termal é um retângulo que
mede 214m x 110m e se levanta dentro de uma superfície amuralhada de 450x450 metros,
com a qual têm em comum o eixo principal norte-sul. O recinto exterior está formado por
construções de volume considerável. A ala setentrional continha oficinas e habitações e, no
centro, a entrada principal. Na ala meridional havia cisternas para água flanqueadas por filas
de assentos para contemplar os jogos que se desenrolavam na frente do edifício das termas. O
eixo do campo de esportes está indicado por grandes exedras situadas a leste e a oeste. O
edifício termal tem uma distribuição espacial complexa mas rigidamente organizada. A
interseção de seus eixos principais determina o lugar que deve considerar-se núcleo do
edifício: uma sala de grande altura coberta com três abóbadas de aresta. Nos ângulos, quatro
espaços menores que se uniam com a sala continham banhos frios de imersão. A sala era o
“frigidarium”, ou banho frio das termas. Paralelo ao eixo principal, a norte, está a piscina de
natação ou “natatio” e, ao sul, o “tepidarium” circular, ou banho quente. Este último estava
franqueado de ambos os lados por filas idênticas de cômodos aquecidos menores. O resto do
retângulo era ocupado por palestras possivelmente cobertas, rodeadas por uma fila de
vestiários (“apodyteria”). Depois de trocarem-se, os visitantes entravam possivelmente nos
ambientes aquecidos, dos quais passavam ao “caldarium”. Deste, seguindo o eixo principal,
penetravam no “tepidarium” e, logo, no “frigidarium” e, por último, nas piscinas. Vemos, pois,
que os eixos principais que se cortam só em parte correspondem a uma pauta funcional.

Como o traçado das termas romanas não pode ser explicado de todo em termos funcionais,
podemos deduzir que também têm um significado simbólico. Ou melhor, que o uso
compreendia funções que iam além dos atos físicos do banho e da ginástica. As termas davam
ao visitante a oportunidade de cultivar o espírito mediante a conversação, a leitura e outras
atividades intelectuais e, durante a época imperial, foram verdadeiros centros cívicos onde se
adotavam importantes decisões políticas. Em consequência, deviam ter uma organização
espacial e uma articulação distinta das estruturas puramente utilitárias. Por tratar-se de um
dos mais importantes proscênio da vida romana, as termas tinha que possuir naturalmente a
estrutura espacial que já encontramos ao nos referirmos à paisagem, ao assentamento, e aos
principais tipos de construção romanos. Não é, portanto, mera coincidência que a organização
das termas se assemelhe a da cidade. Mas seria demasiado superficial explicar essa afinidade
como consequência de funções similares. Melhor dito, ambas manifestam a mesma ordem
básica, fato que prova que os romanos aplicavam o mesmo modelo espacial a todos os níveis.

Spalato

Quando se retirou, depois de sua abdicação no ano 305 d.C., Diocleciano fez construir um
importante Palácio na costa dálmata. É difícil estabelecer se se trata de um Palácio ou de uma
pequena “cidade ideal”. De fato, a planta se parece muito com a de um “castrum” romano,
com suas ruas principais que se cortam em ângulo reto e o “praetorium” situado no extremo
do eixo norte-sul. De fato, o Palácio abrigava uma guarnição e estava fortificado como uma
Fortaleza militar permanente. Mas também incluía elementos próprios da arquitetura de vilas
e palácios, como a “loggia” contínua ao largo da fachada meridional.

A planta se inscreve dentro de um retângulo que mede 216m x 180 m. O Palácio estava
rodeado por altos muros com torres quadradas salientes, entradas monumentais flanqueadas
por torres octogonais no meio dos muros setentrional, oriental e ocidental. As portas estão
ligadas por ruas com colunatas que se cortam no centro geométrico da planta, determinando,
assim, o esquema Romano básico do “cardo” e do “decumanus”. As ruas dividem a zona
urbana em 4 partes iguais, duas das quais estavam reservadas para a guarnição e as outras
duas, ao sul para o Palácio propriamente dito e dois espaçosos recintos. A parte oriental
contém o mausoléu do Imperador, e a ocidental um templo consagrado à Júpiter e duas
pequenas rotundas. O eixo principal norte-sul levava a uma grande sala de audiências circular
e a outra vasta sala retangular, também de audiências, que comunicava diretamente com a
loggia meridional que dava para o mar. De modo que o eixo não se detinha mas indicava a
integração do Palácio com um espaço natural mais vasto. De especial interesse é a sequência
espacial formada pela porta áurea, no muro setentrional, o cardo e o peristilo localizado além
da interseção principal, o vestíbulo com cúpula, a “aula” e a abertura central da “loggia”. A
porta estava coroada por uma arcada que continha estátuas do Imperador e dos deuses em
seus nichos. Dentro havia um vestíbulo quadrado coberto por uma cúpula celestial. O percurso
processional levava desde a porta, passando pelo peristilo com arcadas, até o vestíbulo com
cúpula que servia como “salutatorium” do Imperador. Entre o peristilo e o vestíbulo se
levantava um frontão glorificatório no qual o entablamento horizontal estava interrompido no
centro por um arco. Mais que como um edifício, o Palácio foi concebido como uma sucessão
significativa de espaços adaptada à dignidade do Imperador divino.

Dentro desta totalidade dinâmica integrada, o mausoléu e o templo formam uma composição
simbólica complementar. Enquanto o templo está orientado para o sol nascente, o mausoléu
está orientado para oeste. Assim, juntos representam o princípio e o fim, e seu eixo comum
tem um caráter verdadeiramente metafísico. Qualquer um que chegue ao vestíbulo imperial
deve experimentar esta apelação do mistério e os limites da existência humana. Muito
apropriadamente, ambos os edifícios ficam ocultos atrás das arcadas laterais do percurso
principal.

Em geral, o Palácio de Spalato se caracteriza pela ordem estrita e a regularidade. Mas esta
ordem representa algo muito mais profundo que a organização militar da sua sociedade
contemporânea. Ao repetir a ordem do “templum” Romano, o Palácio se torna um autêntico
“palatium sacrum”. Assim, Diocleciano construiu para si um Palácio em forma de “castrum”
não tanto para a sua proteção física, mas porque a planta simbolizava uma ordem divina
universal. Como “cosmocrator”, o Imperador era o supremo poder que regia este mundo, e
seu Palácio era uma manifestação de sua posição dominante. “O “palatium” era, pois, um
conceito e não um edifício específico. Um conceito que implicava um poder universal e divino
que emanava dos deuses e que se manifestava na pessoa do soberano”.

A concepção do espaço e sua evolução histórica

Os exemplos mostraram que, antes da função do edifício e do nível ambiental, os romanos


empregavam a mesma imagem espacial fundamental. Vimos que esta imagem representava
uma ordem universal abstraída a partir de determinados fenômenos naturais, como os pontos
cardeais, e símbolos antiquíssimos como a vertical “espiritual”, a horizontal “profana” e os
conceitos de centro e de percurso. Diferente do pluralismo da arquitetura grega, a arquitetura
romana se caracteriza pela uniformidade. Isso não apenas se deve ao emprego da mesma
imagem básica, mas também é um desejo de fazer desta imagem um princípio organizador
que determine a eleição e a articulação dos detalhes. A arquitetura romana é autenticamente
sistemática e ao mesmo tempo funcional. Os romanos eram, sem dúvida, um povo prático
bem organizado e exigiam de seus edifícios um resultado eficaz. Dentro do esquema
organizativo geral, encontramos uma rica variedade de formas e dimensões espaciais, assim
como engenhosas soluções técnicas, entre as quais se encontra a calefação de hipocausto.

Como no caso da arquitetura egípcia, as intenções romanas básicas já estavam presentes


desde o começo mesmo e, até certo ponto, procedem de fontes itálicas mais antigas. Mas não
é difícil reconhecer uma evolução histórica que consiste tanto no desenvolvimento gradual das
intenções básicas como em sua interação com as circunstâncias próprias do momento. Esta
última componente histórica falta quase por completo na arquitetura egípcia. Em geral,
podemos distinguir 3 períodos principais: o período Republicano, o Imperial, e o do baixo
Império. Na arquitetura republicana o espaço exterior ativos se desenvolve como uma
expressão do papel geral dos romanos no mundo. Ao mesmo tempo, a articulação exemplifica
a integração das características antropomórficas gregas a uma nova totalidade sistemática. A
arquitetura dos primeiros imperadores se caracteriza ainda pela variedade e pela vida
“orgânica” de membros e detalhes. Depois do pacífico “classicismo” de Augusto, surgem os
experimentos “maneiristas” do período Claudiano. Uma mudança decisiva está representada
pela reconstrução de Roma sob Nero, depois do grande incêndio do ano 64, com a utilização
generalizada do tijolo e do concreto e a elaboração de novas formas espaciais. A primeira
grande manifestação de espaço interior se encontra na “Domus Aurea” de Nero, onde uma
sala octogonal coberta por uma cúpula iluminada zenitalmente apresenta uma nova
interpretação divina do papel do Imperador. Durante os reinados de Trajano e de Adriano o
domínio do espaço alcançou seu clímax em criações como o fórum de Trajano e a Vila de
Adriano. O “teatro marítimo” desta última tem uma planta centralizada de riqueza e
complexidade insuperadas, interpenetrada pelos eixos fundamentais cortados em ângulo reto.
O período do baixo Império se caracteriza por uma sistematização e uma rigidez crescentes,
assim como por uma falta quase ascética da articulação e dos detalhes tradicionais. Na
arquitetura romana as noções básicas de centro, percurso e zona se unificam constituindo um
sistema hierárquico. No plano mais amplo, a própria Roma era o centro, o “caput Mundi” de
um sistema de percursos e zonas. As cidades se interpretavam como um microcosmos de
estrutura análoga, e o edifício individual repetia o mesmo modelo. Cada edifício representava,
assim, a totalidade, e cada sítio recordava ao cidadão romano a ordem universal a que
pertencia. Isto não significa, no entanto, que o espaço Romano fosse “aberto” e continuo.
Consistia, melhor dizendo, na soma de unidades claramente definidas e estruturadas, tal como
fica evidente quando consideramos a composição dos fóruns imperiais ou a planta geral da
Vila de Adriano. O espaço Romano fornecia um máximo de segurança sem confinar o homem,
seja física ou psicologicamente, num lugar específico.

Significado e Arquitetura

Mesmo que os romanos tenham herdado as ordens da arquitetura grega clássica, sua intenção
não era primordialmente simbolizar uma multiplicidade de arquétipos ideais. O novo conceito
de sistema implica, melhor dizendo, que as partes estão condicionadas por uma imagem
compreensiva geral. Os elementos individuais dos gregos foram, assim, substituídos pelo
conceito de interação sistemática. Os filósofos estóicos insistiram na natureza essencial
comum de todos os homens e, consequentemente, sustentaram que havia uma só lei e uma
sua Pátria. Posidônio (135-51 a.C.) considerava que a natureza era um grande sistema e que
todos os seus detalhes estavam ordenados pela Divina Providência. Esta atitude ainda está
presente na filosofia de Marco Aurélio, Imperador de 161 a 180 d.C., que declarou: “Oh
mundo, eu concordo com cada nota de tua divina harmonia”. De modo que, ao invés de
perseguir a perfeição ideal, os romanos sentiam que deviam viver em conformidade com o
plano divino, participando ativamente da história. Para os romanos, a vida terrestre não era
mera reprodução imperfeita de arquétipos ideais, mas uma manifestação direta e significativa
da vontade divina. Assim, podemos compreender que a contradição entre a ordem cósmica e a
ação prática seja apenas aparente. Na realidade, ordem e ação eram interpretados como
aspectos de um mesmo processo histórico.

O reconhecimento da história como dimensão básica da existência humana implicava


naturalmente uma nova interpretação dos deuses. Os deuses romanos não eram, em sua
origem, abstrações da experiência de forças naturais e de caracteres antropomórficos, mas
eram concebidos como os agentes do processo histórico e como simbolizações de seus
diferentes aspectos. Já mencionamos Jan,t o Deus de todos os começos, e podemos recordar
outro Deus tipicamente Romano: Marte, Deus da guerra. De suprema importância era Júpiter,
grande protetor da cidade e do Estado. Todos os deuses romanos eram concebidos como
forças mais que como personagens. Não pertenciam a lugares específicos nem a uma
mitologia original. No curso da época imperial, o Imperador foi assumindo cada vez mais as
funções dos deuses. Sua pessoa estava investida de autoridade divina e ele mesmo estava
rodeado por um pseudo-cosmos. Suas ações eram manifestações da vontade divina e, em
consequência, se perpetuavam mediante monumentos, tais como colunas, arcos e edifícios.
Enquanto ignoramos a data de construção dos principais edifícios gregos, todos os
monumentos romanos representavam importantes acontecimentos históricos. O ambiente
arquitetônico se converteu, assim, na concretização do estado cósmico Romano e sua história.
O Imperador e seu “palatium sacrum” atuavam como seu centro significativo. Herodiano
escreveu: “onde o Imperador está, ali está Roma”. É, pois, um erro considerar os romanos
apenas como engenheiros práticos de vigoroso talento organizativo. A organização romana se
fundava numa disposição religiosa, e a “práxis” era a manifestação histórica da ordem divina.
Os romanos não buscaram afirmar-se no campo da especulação filosófica absoluta e
consideraram o tempo como uma dimensão existencial fundamental. Não buscavam a
essência das coisas, mas sua forma de manifestar-se. A filosofia histórica considera as “formas”
da conduta humana, e o comportamento ético significa viver conforme o plano divino, ser o
instrumento do curso da história. Em consequência disto, arte romana se caracteriza por um
novo realismo: o desejo de representar um momento histórico para marcar sua sucessão. Isto
é particularmente evidente nas representações históricas, como os relevos das colunas de
Trajano e de Marco Aurélio, mas também nos bustos dos imperadores romanos. Na arte do
baixo Império, a história viva é substituída por um sistema abstrato como tal. A arquitetura de
Diocleciano se caracteriza por um desejo quase egípcio de forma eterna. É como se a liberdade
de ação resultante da imagem romana do mundo se houvesse perdido. O homem já não
encontrava a segurança na ação e na conquista, e devia retornar às suas origens. Assim a
história humana repete o curso de um processo natural.

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