Você está na página 1de 18

1. As origens de Roma.

As origens de Roma: a localização da cidade; o mito de Rómulo e Remo, a tradição literária tardia
(Énio, Anais; Cícero, A República; Tito Lívio, Desde a Fundação da cidade; Dionísio de Halicarnasso,
Antiguidades Romanas; Plutarco, Rómulo). A problemática dos 'primordia romana': da credulidade de
antigos e medievais ao cepticismo dos modernos; a filologia humanista e a crítica histórica de
Beaufort e Niebuhr, o positivismo de Mommsen e a hipercrítica de Ettore Pais; a arqueologia e a
superação do impasse filológico. Fundação romuliana ou formação da cidade? ktísis e sinecismo ou
expansão de um núcleo original? O contributo das recentes descobertas feitas no Palatino. Os
primordia romana na tradição literária. Leitura e comentário de Énio, Anais, I, 45-62; Cícero, A
República, 2.3-4.19; Plutarco, Vida de Rómulo, 1.1-1.14.

Bibliografia (as obras destacadas são de leitura obrigatória):


TITO LÍVIO, História de Roma, Livro I, Lisboa, Inquérito, 1993, pp. 7-67.
PLUTARCO, Teseu e Rómulo, Coimbra, CECH, 2008, pp. 97-173.
PEREIRA, M. H. Rocha, Romana, Lisboa, Guimarães Edit., 2010 (6ª ed.).
CARANDINI, A., La nascita di Roma, Torino, Einaudi, 2003.
CARANDINI, A., Roma, Milano, Electa, 2000. CARANDINI, A., Roma. Il primo giorno, Bari,
Laterza, 2009.
CITRONI, M. et alii, Literatura da Roma Antiga, Lisboa, Gulbenkian, 2006.
CORNELL, T. J., The Beginnings of Rome, London, Routledge, 1995.
FORSYTHE, G., A Critical History of Early Rome, Berkeley (CA), 2005, c. 1-4.
GALINSKY, K., Augustan Culture, Princeton (NJ), Princeton University Press, 1996.
GRANDAZZI, A. La fondation de Rome, Paris, Les Belles Lettres, 2004.
PEREIRA, M. H. Rocha, Est. de Hist. da Cult Cláss., II vol., Lisboa, Gulbenkian, 2009.
RODRIGUES, N. S., Mitos e Lendas: Roma Antiga, Lisboa, Livros e Livros, 2005.

Localização da cidade – resguardada de ataques de piratas (segundo a tradição só o quarto rei Anco
Márcio veio a fundar o porto de Óstia), mas com uma importante estrada fluvial, no
último ponto onde o rio ainda se podia passar a vau, graças à Isola Tiberina, lugar
estratégico para o comércio, do sal, por exemplo, entre o norte e o sul e o leste e o oeste,
fácil de defender dos altos das sete colinas (ver mapa);
Relatos das origens – narrativas do mito fundacional, único mito entre as lendas primitivas: Énio,
Anais (o mais antigo dos que nos chegaram), Tito Lívio, Desde a Fundação da cidade,
Dionísio de Halicarnasso, Antiguidades Romanas, Plutarco, Rómulo, entre outras;
problemática dos Primordia Romana: à credulidade dos antigos, aos hábitos medievais
de misturar história bíblica com história romana (o patriarca Noé a desembarcar nas
margens do Tibre) opõe-se o cepticismo dos modernos sobretudo a partir do séc. XVII;
os humanistas do Renascimento começam a submeter os textos à crítica filológica e
histórica, movimento que se acentua de Beaufort a Niebuhr (dinamarquês que inaugura
com a sua História de Roma a Altertumswissenschaft) e do positivismo de Mommsen
(esquece as épocas das quais não se conhecem ‘factos’ nem ‘acontecimentos’) à
hipercrítica de Ettore Pais, discípulo do grande historiador alemão que chega ao ponto de
tudo reduzir a especulação literária tardia ou mesmo falsificação deliberada; por que
surgem estas dúvidas? primeiro por razões ideológicas (pôr em dúvida a historicidade de
Rómulo era outra maneira de questionar a veracidade da tradição bíblica), depois pela
grande distância, 500 anos, que separa os testemunhos mais antigos da fundação, 753 a.
C., data tradicional calculada por Varrão; o incêndio de Roma provocado pelos gauleses
de Breno em 390 que segundo os antigos destruiu de grande parte dos documentos
anteriores. A arqueologia veio no séc. XX resolver o impasse a que conduzira a crítica
filológica.
Na verdade, no séc. IV a. C. o relato de Rómulo e Remo já era oficial, os gémeos figuram em moedas
de prata desta altura e mais antiga ainda, do séc. V, será a famosa estátua da loba
capitolina que está exposta no Museu do Palazzo dei Conservatori, geralmente tida como
exemplo de arte etrusca (os meninos não faziam parte do grupo, foram acrescentados no
séc. XV por Pollaiuolo).
A arqueologia veio de facto mostrar que o Palatino foi habitado pelo menos desde o ano 1000 a. C., do
séc. VIII datam algumas cabanas e restos do que terá sido uma muralha; à mesma época
pertencem os achados arqueológicos de Alba Longa e Lavínio; portanto, estes dados são
perfeitamente conciliáveis com os relatos literários que falam de uma cerimónia
fundacional no Palatino e da instituição de um lugar de asilo no Capitólio; o pomoerium,
os limites da Roma quadrata, incluiria ou não o Capitólio, mas excluía com certeza o
Aventino onde Remo teria sido enterrado; a disposição orográfica tenderia a impelir as
populações das sete colinas para um processo de sinecismo que como na Grécia
conduziria à ‘coabitação/unificação’ numa cidade-estado; no entanto, a ideia corrente
durante muito tempo de que tal se deveria à drenagem do Forum no séc. VII hoje está
posta de lado (Gjertadt chegou a considerar o forum ‘o berço de Roma’); na verdade o
forum terá algo a ver com estar às portas, fores.
Fundação ou formação da cidade? Igualdadade entre povoações autónomas ou primazia de um núcleo
original? Fusão ou difusão? A tese da ktisis como resultado de um processo de sinecismo,
de unificação de populações do Septimontium, de junção de populações até então
separadas, foi refutada pelo arqueólogo alemão Müller-Karpe; a esta tese contrapõe-se a
hipótese da expansão progressiva, do desenvolvimento ao longo do tempo de um núcleo
original, o reconhecimento da supremacia do Palatino juntamente com a recusa de
qualquer forma de sinecismo conduz a uma depreciação do elemento sabino nos
Primordia Vrbis, . Durante muito tempo não se atribuiu qualquer credibilidade, mesmo
passada a fase hipercrítica do séc. XIX, à tradição literária da fundação romuliana, o
pomerium palatino não passaria de invenção dos autores da época augustana, o
nascimento de uma verdadeira cidade só teria ocorrido no séc. VI sob acção dos etruscos.
Mas tudo mudou nas últimas décadas:
As sondagens arqueológicas efectuadas desde 1985 no declive do Palatino, sobranceiro ao Forum,
numa área ainda inexplorada, do Arco de Tito à Casa das Vestais, vieram revelar dados
surpreendentes: aí foram detectadas quatro grandes construções, com atrium e jardim, do
séc. VI a. C. erigidas sobre três muros defensivos dos sécs. VI e VII. Mas a descoberta
mas sensacional surge por baixo destes muros, uma muralha com o mesmo traçado que
datará de 730 a. C., linha defensiva reforçada por uma paliçada: é impossível não deixar
de pensar na demarcação do pomerium romuliano. A ideia de definição de um espaço
urbano, de limite, era muito importante em toda a Itália central, cipos de tufo atestam
essas marcações. Não por acaso os limites da colina do Palatino se apresentam protegidos
por Aius Locutius, Angerona, Tacita Muta, Acca Larentia, divindades do silêncio, dos
mortos, da além. O estabelecimento de uma linha pomerial por volta de 730 a. C. atesta a
existência de uma comunidade que tem já consciência da sua força para querer marcar
um limite claramente perceptível. Não podem deixar de ter significado factos como a
localização do património nacional no Palatino (a gruta do Lupercal, a figueira Ruminal,
a casa/ aedes Romuli, Roma quadrata) ou a volta que davam à colina os Lupercos com a
sua procissão e os generais vencedores antes de subirem ao Capitólio. Roma terá
resultado não de sinecismo nem de um processo de formação, mas da combinação de
ambos os acontecimentos e processos. O nascimento de Roma supõe uma formação já em
curso, a fundação romuliana supõe a supremacia do Palatino mas também e sobretudo a
eliminação física, ou meramente política, de comunidades vizinhas rivais (assim se
compreenderá o fratricídio ritual, a luta entre os gémeos representa a relação de
identidade e alteridade, de aliança e oposição).
Estas questões, das origens da cidade, bem como o chamado ‘problema etrusco’ – durante muito
tempo considerou-se que o próprio nome da cidade era etrusco, quando parece ser uma
antiga palavra itálica que se ligará a ruma, ou rumen, o figo, a mama de um animal, da
loba que amamentou os gémeos à sombra da figueira Ruminal, ou ainda as colinas que
têm esse formato - foram dilucidadas por T. J. Cornell em The Beginnings of Rome; de
facto ao tratarmos das origens e da primeira expansão romana referimo-nos ao período
monárquico, 753 – 509: aos quatro primeiros reis, Rómulo, Numa Pompílio, Tulo
Hostílio e Anco Márcio, juntam-se os reis etruscos Tarquínio Prisco, Sérvio Túlio e
Tarquínio o Soberbo, sete reis como sete colinas que excluem alguém, neste caso o
oitavo rei Tito Tácio, rei dos Sabinos que nalgumas versões governa com Rómulo ou
depois deste, ver lenda do rapto das Sabinas.
Ver mapas 1-4; o pomoerium, a colonização grega e Magna Grécia, a Itália primitiva, O poder romano
em 264 a. C.;
Ler Énio, «Fundação de Roma», Anais, 1.45-62; Énio de Rúdias, da Messápia na Calábria, é um autor
do séc. III-II a. C. que se apresenta já muito helenizado, invoca as Musas à maneira grega
«Musas que pisais aos pés o Magno Olimpo», em vez do verso satúrnio usa o haxâmetro
dactílico, considera-se uma reencarnação do próprio Homero; verdade se diga que Ovídio
chamará hirsutos aos seus versos, mas nos Anais já encontramos alguns dos processos
literários típicos da epopeia grega, epítietos, símiles, fórmulas para descrever o anoitecer
e o raiar da aurora.
Ler Tito Lívio, Ab urbe condita, prefácio e 1.4.1–1.7.4, 1.8.4 – 1.10.7; interpretar as versões do mito
fundacional, etiologia de costumes e instituições, racionalização dos relatos míticos,
alegorização de valores romanos, constituição de um património nacional.

Bibliografia:
TITO LÍVIO, História de Roma, Livro I, introd., trad. e notas de Paulo Farmhouse Alberto, Lisboa,
Inquérito, 1993, pp. 7-67.
PEREIRA, M. H. Rocha, Romana. Antologia da Cultura Latina, Porto, Asa, 2005 (5ª ed.).
ALBRECHT, Michael von, Historia de la Literatura Romana, 2 vols. Barcelona, Herder, 1999.
CITRONI, M. et alii, Literatura da Roma Antiga, Lisboa, Gulbenkian, 2006.
BORDET, M., Síntese de História Romana, Porto, Asa, 1995.
CARANDINI, Andrea, La nascita di Roma: Dèi, Lari, eroi e uomini all'alba di una civiltà, Torino,
Einaudi, 2003.
CORNELL, T. J., The Beginnings of Rome, London, Routledge, 1995.
FORSYTHE, G., A Critical History of Early Rome, Berkeley (CA), University of California Press,
2055, caps. 1-4.
GRANDAZZI, A. La fondation de Rome, Paris, Les Belles Lettres, 2004.
PARATORE, E., História da Literatura Latina, Lisboa, Gulbenkian, 1987.
PEREIRA, M. H. Rocha, Estudos de História da Cultura Clássica, II vol., Lisboa, Gulbenkian, 2002
(3ª ed.).
RODRIGUES, Nuno Simões, Mitos e Lendas: Roma Antiga, Lisboa, Livros e Livros, 2005.
BRIQUEL Dominique, À propos de Tite-Live, I : L'apport de la comparaison indo-européenne et ses
limites, Folia Electronica Classica 5 (2003):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
BRIQUEL Dominique, Religion étrusque et religion chrétienne : un aspect peu étudié de la « réaction
païenne», Folia Electronica Classica 14 (2007):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html

BRIQUEL Dominique, Tullus Hostilius et le thème indo-européen des trois péchés du guerrier,
Folia Electronica Classica 5 (2003):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
LABEYE, Thomas, Les degrés de cohésion de la tradition construite autour du règne de Numa
Pompilius, Folia Electronica Classica 5 (2003):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
LIOU-GILLE, Bernadette, «Un héros "romain"?: Marcius Coriolan. Un exemple d'intégration à la
ciuitas Romana d'un citoyen latin en 493 a.C. ?», Folia Electronica Classica 14 (2007):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
MEURANT, Alain, Histoire mythique et mythe historique: le cas des rois romains, Folia
Electronica Classica 11 (2006):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
MEURANT, Alain, Le parcours initiatique de Romulus et Rémus, enfants albains et premiers
Romains, Folia Electronica Classica 6 (2003):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
MEURANT, Alain, «Quelques facettes de la gémellité dans les légendes de l'Italie primitive», Folia
Electronica Classica 1 (2001):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
POUCET, Jacques, Le roi Romulus, ou les silences de l'Histoire, Folia Electronica Classica 12 (2006):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
POUCET, Jacques, Les rois dits étrusques, ou la lente émergence de l'Histoire, Folia Electronica
Classica 12 (2006):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
POUCET, Jacques, Les Rois de Rome. Autopsie d'un récit historico-légendaire, Folia Electronica
Classica 1 (2001):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
POUCET, Jacques, Les Troyens aux origines des peuples d'Occident, ou les fantasmes de l'Histoire,
Folia Electronica Classica 12 (2006):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
POUCET, Jacques, Romulus : fondateur et premier roi de Rome, Folia Electronica Classica 2 (2001):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
POUCET, Jacques, Romulus et Rémus, les jumeaux fondateurs de Rome, Folia Electronica Classica
12 (2006):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
WANKENNE, Ludovic, «L'enlèvement des Sabines (Tite-Live I, 13): Analyse philologique et
linguistique», Folia Electronica Classica 12 (2006):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html

O mito fundacional e as lendas primitivas romanas


Noção de mito: mythos, epos e logos; mito, lenda e conto popular. A fundação de Roma segundo Énio
(Anais, 1.45-62) e Cícero, A República, 2.3-4.19. Etiologia e racionalização do mito fundacional na
narrativa de Tito Lívio; leitura e comentário de Ab urbe condita 1.9-10.

Bibliografia (as obras destacadas são de leitura, digamos, obrigatória):

J. L. BRANDÃO, História da Roma antiga, vol. I. Coimbra, IUC, 2015, caps. 2, 3 e 4. Descarregar
aqui:
https://estudogeral.uc.pt/bitstream/10316/35212/1/Histo%CC%81ria%20de%20Roma%20Vol.%20I.p
df
BURKERT, W., Mito e Mitologia, Lisboa, Edições 70, 1991.
POWELL, B. Classical Myth, New York, Longman, 2014 (8ª ed.), cap. 22.
TITO LÍVIO, História de Roma, I, introd., trad. e notas de Paulo Farmhouse Alberto, Lisboa,
Inquérito, 1993, pp. 7-67.
PEREIRA, M. H. Rocha, Romana, Lisboa, Guimarães, 2010 (6ª ed.).
PEREIRA, M. H. Rocha, Estudos, II vol., Lisboa, Gulbenkian, 2009 (4ª ed.), pp. 15-38.
RODRIGUES, Nuno Simões, Mitos e Lendas: Roma Antiga, Lisboa, Livros e Livros, 2005, pp. 113-
125 e 311-316.
POUCET, Jacques, Le roi Romulus, ou les silences de l'Histoire, Folia Electronica Classica 12 (2006):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
POUCET, Jacques, Les rois dits étrusques, ou la lente émergence de l'Histoire, Folia Electronica
Classica 12 (2006): http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
POUCET, Jacques, Les Rois de Rome. Autopsie d'un récit historico-légendaire, Folia Electronica
Classica 1 (2001): http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
POUCET, Jacques, Les Troyens aux origines des peuples d'Occident, ou les fantasmes de l'Histoire,
Folia Electronica Classica 12 (2006):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html

2. A expansão romana e a helenização da cultura.


A expansão romana, da monarquia arcaica às guerras macedónicas e anexação da Grécia; organização
militar e cidadania, consequências das vitórias sobre Latinos, Etruscos e Samnitas; as guerras contra
Pirro e a conquista de Tarento (272); o processo de assimilação da cultura grega.

Bibliografia:
J. L. BRANDÃO, História da Roma antiga, vol. I. Coimbra, IUC, 2015, caps. 5, 6 e7. Descarregar
aqui:
https://estudogeral.uc.pt/bitstream/10316/35212/1/Histo%CC%81ria%20de%20Roma%20Vol.%20I.p
df
O. Wattel, Petit Atlas historique de l'Antiquité romaine, Paris, Colin, 2000 (ver trad. esp. enviada por
e-mail dinâmico).
M. H. ROCHA PEREIRA, Estudos, II vol., 2009 (4ª ed.), pp. 41-71.
M. H. ROCHA PEREIRA, Romana, Porto, Asa, 2005 (5ª ed.).
W. HARRIS, War in Republican Rome, Oxford, Clarendon Press, 1979.
N. ROSENSTEIN, A Companion to the Roman Republic, Oxford, Blackwell, 2006.
F. WALBANK (ed.), The Cambridge Ancient History, VII.2, Cambridge, CUP, 1989.
P. GRIMAL, Le siècle des Scipions, Paris, Aubier, 1975.
A. COSTA RAMALHO, «Énio»; «Névio», Enciclopédia Verbo, s. v..
M. CITRONI, Literatura da Roma antiga, Lx, Gulbenkian, 2006, p. 61-100, 149-159.
E. PARATORE, História da Literatura Latina, Lisboa, Gulbenkian, 1987, pp. 91-144.

Reis Lendários de Roma:


1. Rómulo (os primeiros reis e a trifuncionalidade de Dumézil)
2. Numa Pompílio (rex sacrorum)
3. Túlio Hostílio (destruição de Alba Longa)
4. Anco Márcio (domínio do litoral, fundação de Óstia)
5. Tarquínio Prisco (drenagem do Fórum)
6. Sérvio Túlio (aliança latina)
7. Tarquínio Soberbo (templo capitolino)

O elemento grego (história de Demarato; o alfabeto latino e o alfabeto grego)


A questão etrusca: Roma uma cidade etrusca?
A tradição lendária sobre o fim da monarquia; revolta contra a tirania ou contra o domínio
estrangeiro?

509 a. C. a República Romana


- o conflito externo: guerras com os Etruscos (quem era Lars Porsena?); a Liga Latina e o foedus
Cassianum, guerras com Sabinos, Équos e Volscos; a conquista de Veios (todo o séc. V a. C.) e a
constituição do ager publicus)
- o conflito interno, da ‘constituição serviana’ às instituições republicanas (funções dos cônsules, o
poder dos optimates, dos patrícios, e o Senado; a assembleia popular, os comitia e os tribunos da
plebe);
494 a. C. a Secessão do Monte Sacro

A expansão romana e a helenização da cultura.


A conquista da Magna Grécia (tomada de Tarento, 272) e o processo de assimilação da cultura grega;
mudanças provocadas pelo segunda guerra contra Cartago. Consequências das guerras púnicas.

Bibliografia (as obras destacadas são de leitura, digamos, obrigatória):


J. L. BRANDÃO, História da Roma antiga, vol. I. Coimbra, IUC, 2015, caps. 5-7.
https://estudogeral.uc.pt/bitstream/10316/35212/1/Histo%CC%81ria%20de%20Roma%20Vol.%20I.p
df
M. H. ROCHA PEREIRA, Estudos, II vol., 2009 (4ª ed.), pp. 41-71.
M. H. ROCHA PEREIRA, Romana, Porto, Asa, 2005 (5ª ed.).
W. HARRIS, War in Republican Rome, Oxford, Clarendon Press, 1979.
N. ROSENSTEIN, A Companion to the Roman Republic, Oxford, Blackwell, 2006.
F. WALBANK (ed.), The Cambridge Ancient History, VII.2, Cambridge, CUP, 1989.
P. GRIMAL, Le siècle des Scipions, Paris, Aubier, 1975.
A. COSTA RAMALHO, «Énio»; «Névio», Enciclopédia Verbo, s. v..
M. CITRONI, Literatura da Roma antiga, Lx, Gulbenkian, 2006, p 61-100, 149-159.
E. PARATORE, História da Literatura Latina, Lisboa, Gulbenkian, 1987, pp. 91-144.

Factos históricos condicionantes


- contactos entre Gregos e Romanos já no séc. XIII a. C.
- dificuldade em destrinçar o que é especificamente romano do que é resultado de um
longo processo de assimilação, vd. Horácio, Graecia capta, p. 194-5.
pode-se distinguir três épocas neste lento mas cada vez mais profundo processo de helenização:
- dos primórdios da Urbe até à tomada de Tarento (272 a. C.)
- de 272 a. C. até à submissão da Macedónia
- de 168 a. C. a 81 a. C. (Pro Quinctio)
relações comerciais ascendem ao período micénico, pré-urbano
contactos directos:
depois da fundação da cidade, relações regulares: vasos gregos datáveis de 530-500; taças
do séc. VI em Lavínio, Gravisca e Roma; dedicatória dos Dioscuros em grego descoberta
em Planúvio.
contactos indirectos:
pela Etrúria a Norte
pela Magna Grécia a Sul; vd. alfabeto de Cumas a Roma pela via etrusca; os mais antigos
documentos em Latim (Fíbula de Preneste ?, Lapis Niger, Vaso de Duenos, caracteres
gregos)
séc. IV a. C. Guerras Samnitas, avanço para Sul; c. 340 anexação da Campânia (Cícero, Pro Rabirio,
patrícios trocam a toga pela clâmide quando em Nápoles), p. 10, Énio, 'A resistência
romana', p. 214 Tito Lívio, Ab Vrbe condita, 'Cincinato'.
tal a consideração pela cultura grega que os jovens patrícios e os senadores em Nápoles
vestiam-se à Grega; segundo Estrabão (I a. C./ I d. C.), Nápoles, Régio e Tarento
continuaram gregas (Tarento é a última das colónias gregas a ser conquistada em 272).
272 a. C., conquista de Tarento, um jovem grego adoptado pela gens Liuia vem para Roma, Lívio
Andronico, o primeiro nome da História da Literatura Latina; por ordem do Senado,
traduz para latim uma peça grega para ser apresentado nos Ludi Romani de 240 em
comemoração da final da primeira guerra púnica; versão latina da Odisseia, ainda texto
escolar no tempo de Horácio
264-241 a. C. Primeira Guerra Púnica
242 a. C. conquista da Sicília; consequências culturais: contacto directo com a extraordinária riqueza
artística da ilha (cf. De signis das orações In Verrem de Cícero, Verres foi propretor na
ilha entre 73-71 a. C.); os romanos quando não obtêm os originais mandam fazer cópias,
muitas das quais chegaram até nós, p. 194-5, Graecia capta.

218-201 a. C. Segunda Guerra Púnica


a expedição de Aníbal, da Península Ibérica à Gália cisalpina e à Itália (o poder do Barcas
equivale na política cartaginesa ao poder dos Cipiões em Roma); razias e devastação da
Itália pelas tropas de Aníbal, a derrota de Roma em Canas; desembarque de Cipião no
norte de África, vitória romana em Zama;
consequências políticas, sociais e culturais: desaparecimento do minifúndio na Itália
destruída pelos cartagineses; tempos de carestia; os Cipiões, família filelénica, passam a
dominar a política romana, pelo menos a facção helenizante; surge o teatro literário em
Roma como ‘tradução’ e contaminatio de peças gregas; Plauto e Terêncio;
168 a. C. submissão da Macedónia, Paulo Emílio vence Perseu em Pidna, dos despojos do palácio real
reserva para si apenas a biblioteca, para educação dos seus filhos; são levados como
reféns para Roma vários gregos, entre os quais, Políbio, futuro mestre de Cipião
Emiliano, um jovem romano pede a um cativo grego que o eduque «pois só assim se
consideraria digno da sua família e dos seus antepassados» (Políbio, Histórias, admirador
dos Romanos acompanha o seu discípulo nas suas campanhas até à destruição de Cartago
146, p. 257.).
149-146 a. C. Terceira Guerra Púnica
Catão o Censor e a política romana para o Mediterrâneo ocidental, et delenda Carthago.
146 a. C. destruição de Cartago, a Grécia passa a província romana sob o nome de Acaia, Tito
Flamínio, um fileleno, derrota Filipe V da Macedónia, arrasa Corinto, e proclama a
'liberdade' da Grécia.
133 a. C. Átalo III, rei de Pérgamo, deixa em testamento aos Romanos a sua coroa, um dos maiores
centros culturais do mundo helenístico (bilbioteca, pergaminho, estudos linguísticos
realizados por uma corrente do estoicismo); conquista da Hispânia
momentos de encontro com a cultura grega, em que se destacam figuras proeminentes como a família
dos Cipiões, no entanto todo este movimento de aclimatação da cultura helénica não se
fez sem resistência, vd. Catão o Censor.
1.2. A Lei das Doze Tábuas

Lex XII Tabularum, o Direito é uma das principais contribuições dos Romanos para a Civilização
Ocidental, pp. 26-27, Cícero, De oratore I. 44. 195-197. No tempo de Cícero era ainda
aprendida de cor, consciência da superioridade romana neste campo.
F. WIEACKER, o maior especialista em Direito Romano, chama-lhe «a carta de fundação do DIreito
Civil»; que tem a ver com a helenização?
Duas incógnitas:
- não chegou até nós o livrinho das 12 tábuas, temos apenas tentativas de reconstituição
feitas a partir das citações dos gramáticos, jurisconsultos, lexicógrafos e teóricos da
ciência política.
- não conhecemos igualmente o possível modelo grego, designadamente as leis de Sólon.
Há várias versões quanto aos condiconalismos que rodearam a redacção da lei das XII Tábuas, fala-se
de uma ida a Atenas, noutros testemunhos de uma missão à Magna Grécia, teriam sido
elaboradas por volta de 450 a. C., a principal fonte, como é habitual para esta época, é
Tito Lívio que apresenta a instituição destas leis como consequência das lutas entre
patrícios e plebeus, que teriam terminado com a concessão dos tribunos da plebe e
repartição das principais magistraturas
Tito Lívio, Desde a Fundação da Cidade III. 31-33, fala da necessidade de «leis que fossem úteis a
ambos, patrícios e plebeus, e capazes de criar a igualdade e a liberdade», para tal ter-se-ia
constituído uma comissão que teria ido a Atenas «para copiar as ínclitas leis de Sólon e
tomar conhecimento das instituições, costumes e leis de outras cidades gregas». O reto da
narrativa é muito mais confuso, mas Lívio termina declarando que «ainda hoje são a fonte
de todo o direito público e privado» (repare-se na concordância com Cícero, Lívio vive
entre 59 a. C. -17 d. C.). Lívio, possivelmente inspirado no De republica de Cícero (II.
37.63), aponta também para uma fonte grega; Dionísio de Halicarnasso (grego que viveu
em Roma no séc. I a. C.) fala de duas embaixadas uma a Atenas, outra à Magna Grécia;
Plínio o Velho e Estrabão referem a presença em Roma de um tal Hermodoro de Éfeso
que terá colaborado na redação da Lei das XII Tábuas, estas e outras fontes falam sempre
de uma fonte grega.
Actualmente a crítica tende a fixar quase unanimemente o ano de 451/450 a. C. como data da
eleboração das leis; a aceitar o papel desempenhado pelos decênviros (que segundo Lívio
terão tomado parte no colégio que administrava a justiça e terá gravado um código em 10
tábuas para o povo o discutir); a reconhecer a natureza arcaica do vocabulário utilizado.
WIEACKER sublinha que era fácil ir à Grécia, mas que a inspiração ateniense é
duvidosa, que não é nítida a influência das leis de Sólon; no entanto seria grega — e não
itálica ou etrusca — a ideia de integrar a pólis no meio de uma legislação completa. É que
anteriormente os Romanos tinham apenas leis isoladas, casuísticas, que tomavam o nome
do proponente (ainda no tempo de Cícero, cf. Lex Manilia e homónimo discurso de
Cícero sobre a atribuição a Pompeu de plenos poderes no Oriente, Lex Tulia que o próprio
Cícero fizera aprovar em 63), leis pontuais que acorriam a necessidades imediatas:
legislar em abstracto é a grande novidade da Lei das XII Tábuas; é grego na lei a
codificação e a sua afixação (Michèle DUCOS),
notar que se trata de direito profano e não de proibições cultuais, novidade já corrente entre os gregos;
marco fundamental no processo de laicização do direito; as leis das XII Tábuas tratam da
família e da propriedade (não aceitam ainda o casamento entre patrícios e plebeus); dizem
respeito à acção humana livre e à reacção do Estado a essa acção, isto é, no dizer de
WIEACKER, «influenciarão e ordenarão prospectivamente esse comportamento humano
e suas consequências sociais, segundo um plano racional».

Bibliografia:
PEREIRA, M. H. Rocha, Estudos de História da Cultura Clássica. II volume: Cultura Romana,
Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 42009, pp. 53-57; além da bibliografia aí
indicada:
M. BERTONE, História do Direito Romano, Lisboa, Estampa, 1990, caps. II-III.
M. DUCOS, «Les fondements sacrés du droit et la tradition cicéronienne», BAGB (1990), pp. 262-
274.
GODEFRIDI, D., «Roma aeterna?: Controverse sur la filiation de la propriété napoléonienne», Folia
Electronica Classica 12 (2006):
http://bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/FEC-TM.html
JUSTO, A. Santos, Direito Privado Romano I, Coimbra, Coimbra Editora, 2000.
IGLESIAS, Juan, Derecho Romano, Barcelona, Editorial Ariel, 2001.
CRUZ, Sebastião, Direito Romano (Ius Romanum), I, Introdução. Fontes, Coimbra, 1984.
AA. VV. Estudos de Direito Romano, AAFDL, Lisboa, 1989, 2 volumes.
Franz WIEACKER, «The Importance of Roman Law for Western Civilization and Western Legal
Thought, 4 B.C. Int'l & Comp. L. Rev. 257 (1981),
http://lawdigitalcommons.bc.edu/iclr/vol4/iss2/2
1.3. O Círculo dos Cipiões

Família com uma longa tradição ao serviço da cidade que se vai notabilizar pelas armas e pelas letras
ao longo dos sécs. III-II a. C.
ler epitáfios dos Cipiões, pp. 13-14
1. 'O ideal de kalokagathía': os epitáfios mais antigos apresentam o nome completo,
outros como este fazem uma curta biografia que terá sido acrescentada provavelmente por
meados do séc. II a. C.; note-se a referêncai ao cursus honorum; o epíteto fortis uir
sapiensque repercute o ideal grego da beleza física e moral, o louvor habitual para o
guerreiro e varão latino era antes fortis ac strenuus.
2. 'Epitáfio de Gneu Cornélio Cipião Hispano'; agnomen tirado do nome do país que tinha
vencido, dois dísticos elegíacos, duas ideias romanas: mos maiorum, honor.
Vd. árvore genealógica da família dos Cipiões no fim do livro de P. GRIMAL.
Cipião-o-Africano Maior (mais velho), vencedor de Aníbal, um dos seus filhos, Públio
Cornélio Cipião, escreveu história em grego, e a irmã deste, a mãe dos Gracos, Cornélia,
escolheu mestres gregos para os seus filhos (nas classes mais altas, a cultura romana era já
bilingue na primeira metade do séc. II, Plauto fazia rir o público dizendo que traduzira as
suas comédias para bárbaro, uortit barbare, em vez do esperado uortit Latine), Públio
Cornélio Cipião adoptou o filho de Paulo Emílio, o conquistador da Macedónia, que
reservara para si dos despojos do paácio real de Pela apenas a biblioteca. Tomou o nome
de Públio Cornélio Cipião Emiliano, o Africanus Minor, depois de ter destruído Cartago.
Cipião Emiliano confia a sua educação a um grego, Políbio; segundo Tácito (Ann. 2.59.2)
vestia à grega quando estava na Sicília e Plutarco, na vida de Catão o Censor (3.6)
acrescenta que ele era um frequentador de palestras e teatros. Estes antecedentes
familiares e estes costumes pessoais indiciam desde já o filelenismo de Cipião Emiliano,
mas a sua relevância na difusão da cultura grega decorre sobretudo do papel que
desempenha como polo aglutinador de intelectuais unidos pelo amor à cultura grega
Círculo dos Cipiões, Cipião Emiliano reúne à sua volta gregos como o historiador Políbio e o filósofo
Panécio (que havia de divulgar em Roma o estoicismo) e poetas latinos de pendor
helenizante como
Lucílio, poeta que cultivava a sátira narrativa ou pessoal, geralmente crítica e moralista, e
que não hesitava em inserir no meio das suas sátiras latinas palavras gregas e versos
inteiros em grego; no entanto era de um patriotismo inatacável, ideia da persistência do
povo romano:
Vt Romanus populus uictus ui et superatus proeliis
Saepe est multis, bello uero numquam, in quo
Sunt omnia (…)
«Sim o povo romano foi vencido muitas vezes pela força e dominado em muitos
combates, mas nunca numa guerra, aí é que está tudo»
Terêncio, apesar de originário do Norte de África tornou-se um estilista da língua latina, a
maioria das suas peças, eplo processo da contaminatio, são imitadas de Menandro; as más
línguas diziam que Cipião Emiliano é que era o verdadeiro autor das peças, cf. Lusíadas
5.96.4-8:
«Vai César sojugando toda a França
E as armas não lhe impedem a ciência;
Mas, numa mão a pena e noutra a lança,
Igualava de Cícero a eloquência.
O que de Cipião se sabe e alcança
É nas comédias grande experiência.
Lia Alexandro a Homero de maneira
Que sempre se lhe sabe à cabeceira»
Cipião Emiliano tinha por livro de cabeceira a Ciropedia de Xenofonte (Cícero, Ad Quintum, p. 67, 'A
Grécia mestra de Roma'), espelho de príncipes da Antiguidade, vd. p. 29, De oratore
'Apreço dos antigos Romanos pela filosofia grega'
Cícero situa a acção de alguns dos seus diálogos filosóficos em volta de Cipião Emiliano, De
Republica, De amicitia, De senectute.
Discute-se se será legítimo chamar círculo literário a este convívio entre os frequentadores da casa de
Cipião; para ASTIN e STRASBURGER essa designação é inapropriada e pouco rigorosa,
segundo este último autor deve-se a Cícero essa visão idealizada das relações que
mantinham esses estadistas e intelectuais do séc. II a. C.. Será legítimo falarmos de
círculo literário se lhe dermos o significado de grupo de pessoas que se conheciam e que
partilhavam o mesmo gosto pela cultura grega.

PEREIRA, M. H. Rocha, Estudos de História da Cultura Clássica. II volume: Cultura Romana,


Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 42009, pp. 58-62 e bibliografia aí indicada,
maxime:
P. GRIMAL, Le siècle des Scipions, Paris, Aubier, 21975.
3. A helenização da cultura e a resistência ao helenismo.
3.1. A helenização no domínio literário

3.1.1. A epopeia
Não se sabe ao certo se a epopeia foi ou não o 1º género literário a ser importado da Grécia
Nos Ludi Romani de 240 a. C., para comemorar o fim da Primeira Guerra Púnica, foi
apresentada uma peça vertida, por ordem do Senado, do grego para latim por Lívio
Andronico; talvez uma tragédia, momento que marca o nascimento oficial da literatura
latina, sob o signo da tradução.
Lívio Andronico, esse grego de Tarento, além de tragédias e comédias, traduziu ainda a Odisseia para
versos satúrnios latinos dos quais chegararm até nós cerca de 40, considerados a mais
antiga tradução literária conhecida; mas temos apenas 3 versos seguidos, muitos desses
fragmentos são constituídos por um único verso quando não por um verso incompleto.
Cícero nas Tusculunas I. 1.3 considera-o no entanto o mais antigo autor latino

Névio, Campânia, séc. III, Guerra Púnica, tema recente.


Énio, de Rúdias na Calábria (embora a sua origem fosse da Messápia), leitura de «Fundação de
Roma», Anais, I, 45-62 (Romana, p. 8).

A acção do Círculo dos Cipiões


3.1.2. O teatro.
3.1.3. A poesia lírica.

3.2. A divulgação da filosofia grega.


Cepticismo, na Nova Academia de Carnéades
Epicurismo, da expulsão de Alkios e Philiskos em 154 a. C. ao De rerum natura de Lucrécio (c. 54
a.C.)
Estoicismo, de Panécio e Posidónio

PEREIRA, M. H. Rocha, Estudos de História da Cultura Clássica. II volume: Cultura Romana,


Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 42009, pp. 103-124 e bibliografia aí indicada.
3.3. Resistência ao helenismo: a figura de Catão o Censor.
Sumário: Acontecimentos marcantes da resistência ao helenismo no séc. II a. C.. A figura e a acção de
Catão-o-Censor, o cursus honorum de um homo nouus, uma estratégia moral e política de
oposição aos Cipiões, características da prosa catoniana, o ideal do uir bonus dicendi
peritus. Tradição romana e civilização universal: a problemática da imitação dos gregos…
Bibliografia:
PLUTARCO, Catão o Antigo (Plutarque, Vies, Paris, Les Belles Lettres, 1964).
M. H. ROCHA PEREIRA, Estudos, II vol., 2009 (4ª ed.), pp. 188-195.

Graecia capta… ler Epist. 2.1, p. 194: Horácio exprime poeticamente uma verdade que o vinha send
desde há muito tempo: vencidos, os Gregos tinham acabado por se tornar culturalmente
vencedores. A difusão do helenismo é muito antiga, mas nem sempre foi pacífica. Nem
mesmo, ou sobretudo, quando por acção do Círculo dos Cipiões mais se acentuou essa
assimilação dos modelos gregos.
- o culto de Dioniso, que atraía as classes baixas e já na Grécia tinha suscitado muitas reservas,
é em 186 proibido ou severamente restringido pelo Senatus consultum de Bacanalibus;
- o luxo e a ostentação são drasticamente perseguidos em 161;
- no mesmo ano o Senado autoriza o pretor Marco Pompónio a excluir da cidade filósofos e
retores gregos;
- em 155 é ordenada a expulsão dos filósofos que compunham a embaixada ateniense, ler
Plutarco, Catão o Antigo, 22, 1-4, Romana, p. 259 (271); Catão levou o Senado a expulsar os
filósofos atenienses, apesar do enorme sucesso que obtêm entre a juventude romana, ou
precisamente por causa disso, Carnéades, filósofo académico, Diógenes, estóico, e noutras
versões também Critolau, peripatético (nenhuma fonte refere a presença de epicuristas);
- no entanto talvez no ano seguinte, em 154, o Senado expulsa da cidade Alkios e Philiskos,
dois epicuristas;
- em 151 o Senado manda demolir o teatro de pedra que então se começara a construir (o
primeiro edifício permanente só será erigido em 55 por iniciativa de Pompeu);
- em 92 é encerrada a primeira escola latina de retórica; no entanto foi no âmbito do rhetor
Lúcio Plócio Galo que se compôs a Rhetorica ad Herennium; vd. Edicto dos censores
Aenobarbo e Crasso – o orador que Cícero fará rotagonista do seu De Orator – e a sua
invocação do mos maiorum contra as novidades:
Edictum adversus Latinos rhetores
1. Cn. Domitius Ahenobarbus L. Licinius Crassus censores ita edixerunt:
Renuntiatum est nobis esse homines, qui novum genus disciplinae instituerunt, ad quos
iuventus in ludum conveniat; eos sibi nomen imposuisse Latinos rhetoras; ibi homines
adulescentulos dies totos desidere.
2. Maiores nostri, quae liberos suos discere et quos in ludos itare vellent, instituerunt.
haec nova, quae praeter consuetudinem ac morem maiorum fiunt, neque placent neque
recta videntur.
3. Quapropter et iis, qui eos ludos habent, et iis, qui eo venire consuerunt, videtur
faciundum, ut ostenderemus nostram sententiam, nobis non placere.
- com efeito, no séc. I, já profundamente helenizado, ainda será prudente alardear um certo
descaso pela cultura grega. Cícero nos prefácios dos seus tratados cuida sempre de justificar o
tempo que dedica aos estudos; nas Verrinas desculpar-se-á perante o tribunal por conhecer
bem a escultura grega e fingirá uma certa incerteza na atribuição de uma estátua de Hércules
ao famoso escultor grego Míron (vd. De Signis II-III).
Nos acontecimentos da primeira metade do séc. II encontramos sempre Catão.
Na verdade, neles toma sempre parte o primeiro grande orador latino, Marco Pórcio Catão, Catão-o-
Antigo, ou Catão-o-Censor (234-149 a. C.); ao que parece era muito respeitado pela sua
competência no campo do direito e da história, aliança frequente nos oradores romanos
até ao séc. I a. C.; ficou célebre a frase com que terminava os discursos, et delenda
Carthago, sinal da sua visão estratégica e da sua influência política (queria a romanização
do Ocidente, o estabelecimento do domínio da administração, e no Oriente apenas a
segurança e a justiça). Catão era um homo nouus que se impôs pelo seu valor moral e
militar, participou como tribuno militar na II Guerra Púnica concluída por Cipião
Africano Maior (218-201) e faleceu quando começou a III Guerra Púnica (149-146);
desempenhou os cargos de questor na Sicília em 204, foi edil plebeu em 199, pretor na
Sardenha em 198, cônsul em 195. No entanto foi no cargo de Censor que veio a encarnar
a figura de opositor ao helenismo, competia a este magistratura de influência fiscalizar as
obras públicas e lançar impostos sobre o luxo).
Catão foi o primeiro grande prosador latino; escreveu o Da Agricultura, um tratado técnico sobre
religião e cultivo dos campos, as Origens, uma história pragmática, e dos mais de 150
discursos que pronunciou, conhecem-se fragmentos de oitenta orationes citadas em textos
de autores gregos e latinos, além de um trecho relativamente extenso do Discurso de
defesa dos Ródios, oração proferida em 167 a. C.. Cícero no Bruto procura reabilitar a
oratória de Catão, aponta como características do seu estilo o uso da anáfora e do
assíndeto, figuras desconhecidas do latim, e ainda da interrogação retórica, Cícero e mais
tarde Aulo Gélio lamentam no entanto a falta de ritmo na sua prosa, a ausência das
cláusulas métricas; os modernos a este propósito, como em geral quanto à influência
grega na sua obra, mostram-se divididos, Alan ASTIN afirma que Catão desconhecia a
teoria grega, E. FRAENKEL analisou o discurso em defesa dos Ródios e encontrou
nesses excertos inúmeras cláusulas, G. KENNEDY na esteira de Fraenkel recorda o
interesse de Catão pelas letras gregas, os seus contactos na Magna Grécia e na pp Grécia,
a contratação de um grego como tutor do seu filho.
Mas se é verdade que remonta a Catão (e a Aristóteles) a definição de orador que se encontra em
Quintiliano, uir bonus dicendi peritus, ‘o homem de bem capaz de falar em público’ (IO
12.1.1), a retórica é a arte que convém ao bonus uir, o estadista cuja prudentia o habilita
para a acção política, ‘bondade’ que para os estóicos significava participação na vida
pública, também não se pode esquecer um passo catoniano transcrito por Plínio o Velho
em que o Censor aconselha o filho a ‘olhar para a literatura grega, mas sem a aprender a
fundo’, illorum litteras inspicere, non perdiscere, pois se algum dia esse povo nos der os
seus escritos corromperá tudo’. Mais: interdita-lhe o uso da medicina grega. Por tudo isto
Catão ficou como o representante acabado da resistência à cultura grega.
Trata-se no entanto de uma figura complexa e desconcertante, pelo menos a julgar pelos factos e pelos
testemunhos antigos. A Basílica Pórcia, tribunal construído em Roma sob o seu patrocinio
em 184, tinha como base o modelo arquitectónico helenístico. Segundo Cícero e Plutarco
fora um aprendiz tardio da cultura grega, de acordo com Plutarco embora soubesse falar
grego, dirigia-se em Latim às cidades gregas que visitava.
Que significado atribuir às atitudes de Catão? Terá sido um feroz opositor do helenismo ou um
moderado? Ou alguém que adoptava posições diversas segundo as circunstâncias? Teria,
como mais tarde o próprio Cícero na sua hostilidade aos poetae noui, uma atitude para
com os gregos contemporâneos e outra para com os gregos do período clássico? Convirá
suspender o juízo: conhecemos apenas uma ínfima parte da sua obra.

Você também pode gostar