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Pontifícia Universidade Católica de Goiás

Escola de Formação de Professores e Humanidades


Curso de Licenciatura em História

Disciplina: HIS1001. Antiguidade Clássica


Prof. Me. Ivan Vieira Neto (Turma A01 / 2023-1)

APOSTILA DE CURSO
ANTIGUIDADE CLÁSSICA
Texto 01

As Civilizações Egeias entre os Séculos XX e XII (AEC).

Referência

PETIT, P. O Mundo Antigo. Lisboa: Edições Ática, 1976. pp. 39-


47.
PAUL PETIT
Professor da Facuidade de Letras
e Ciências Humanas de Grenoble

O MUNDO
ANTIGO

EDIÇÕES ÁTICA
LISBOA
Capítulo V

AS CIVILIZAÇOES EGEIAS
ENTRE OS SÉCULOS XX E XII

BIBLIOGRAFIA: HALPHEN-SAGNAC, Les premiéres civilisat., págs. 238-277.


Hist. Univers., Pléiade, págs. 501-551. G. GLOTZ, La civilisat. égéenne, col. H. Berr
(nova ed., por Ch. PICARD), 1952. AYMARD-AUBOYER, O Oriente e a Grécia
antiga. J. BÉRARD, L'expansion et la colonisation grecques, 1960, págs. 19-34. A. SÉ­
VERYNS, Gréce et Orient avant Homére, 1960.

As civilizações do Egipto e do Oriente são, antes de tudo, continentais,


territoriais, agrícolas; se a formação de grandes conjuntos mais ou menos
duradouros desenvolveu importantes relações comerciais, estas fazem-se por
terra ou por rios e o papel da navegação costeira, do delta do Nilo até aos
portos sim-fenícios, em nada modifica estas características fundamentais. Na
mesma época, entretanto, o Mar Egeu apresentava outras formas de ci­
vilização, marcadas pela preponderância da actividade marítima e comercial,
pelo fraccionamento dos Estados, por uma liberdade maior dos indivíduos,
por uma arte menos grandiosa, porém mais variada.
Embora o Mar Egeu tenha desempenhado importante papel no alvorecer
da civilização grega, o facto é que conhecemos bem mal, e somente desde há
pouco tempo (1875 quanto a Micenas, 1900 para Creta), as civilizações
anteriores, porque a sua escrita está ainda insuficientemente decifrada: Creta
conheceu três sistemas de escrita, a hieroglífica e as lineares A e B; a partir
de 193 5, os esforços dos ingleses Ventris e Chadwick permitiram verificar-se
que a linear B, a mais recente, conhecida pelas tabuletas de Cnossos e de Pilos
(costa ocidental do Peloponeso), transcrevia uma língua miceniana que já era
o grego, que começamos a ler, sem podermos chegar, ainda, a conclusões
precisas. Ignoram-se completamente as duas outras escritas. A arqueologia
permanece como fonte única, ao lado de alguns textos clássicos, dos quais uns
simplificam ao extremo (Tucídides), ao passo que outros transmitem-nos
quase que exclusivamente lendas (Homero, Platão). Nenhuma síntese é
possível, sendo necessário reserva quanto às reconstruções brilhantes, mas
arbitrárias.

A CIVIIJZAÇÃO CRETENSE

É ela extremamente original e sedutora, pela sua arte e por uma espécie de
alegria de viver bem mediterrânica, mas precisamos admitir conhecermos
somente fragmentos, nem sequer o nome de um rei (Minos corresponde a um
título, ou ao nome de uma dinastia), nenhum nome de pessoa; impossível
delinearmos o regime político, a sociedade, as crenças religiosas. Trata-se de
um "livro de figuras sem legendas" (Ch. Picard).
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O QUADRO CRONOLÓGICO E HISTóRICO

A civilização desenvolveu-se tardiamente em Creta e, antes do II milénio, o período


chamado do minóico antigo nos deixou vestígios arqueológicos na parte oriental da ilha e na
planície da Messara (Palecastro, Vassilice, Modos), com restos de cerâmica subneolítica,
vasos de pedra e objectos de metal que atestam uma bem natural influência asiática. É no
início do II milénio (Minóico médio) que distinguimos o período dos ''Primeiros
Palácios", entre 1700 e 1500, os de Cnossos, Faistos e Malia: tratar-se-ia aqui de centros
pouco fortificados de principados feudais onde as relações marítimas já activas introduziram
grande riqueza; a baixela do Minóico médio encontra-se em todo o Mar Egeu, na Argólia
(Asine), nas Cíclades (Delos), na Fenícia (Ras-Chamra-Ugarit, Biblos), no Egipto, enfim.
Ao lado dos palácios há restos de choupanas e, nas cidades, de casas com terraços; as
tumbas são variadas, com múltiplas câmaras, e se o fresco ainda está pouco representado, já
as artes menores, joalheria, glíptica e principalmente a cerâmica estão em pleno flores­
cimento, com um barro muito fino, em "casca de ovo" (o que supõe a invenção de um
tomo rápido), ou do estilo "de Camares", cujo brilho das cores e valor decorativo (mo­
tivos geométricos e naturalistas pouco estilizados) justificam uma ampla difusão. Por volta
de 1700, os palácios foram todos eles incendiados, o que se explicaria mais por uma in­
cursão dos primeiros aqueus chegados ao Peloponeso (Chapouthier), do que por levantes de
origem social (J. Pirenne).

Pouco depois, reconstroem-se os palácios, segundo um plano mais vasto,


e a partir de então não há qualquer dúvida relativa à supremacia de Cnossos, o
que atestaria o surto de uma monarquia centralizadora, a dos "Minos",
certamente, entre 1700 e 1450. Luxuosas moradas surgem cá e lá, na própria
Cnossos, em Tilisso, em Haguia-Tríada especialmente. Finalmente, es­
cavações americanas- e depois francesas - permitiram distinguirem-se em �km

Gurnia uma verdadeira cidade de artesãos, com tortuosas vielas. Os dados


arqueológicos de Cnossos, e especialmente o e'studo dos frescos, então em seu Mapa m. - O mundo egeu na época ereto-micénica
pleno brilho, autorizam algumas hipóteses quanto ao estado político e social: derasa marinha. Se as relações parecem declinar com o Egipto, então em plena força (os
um soberano ("o príncipe dos lírios") reina num complicado palácio (o La­ Keftiu, que são talvez cretenses, levam presentes a Tutmés ill), e com a Síria-Palestina,
birinto, segundo o nome oriental da dupla acha-de-armas, ou fabris, sem elas aumentam, em compensação, com as Cíclades (notadamente Meios, rica em obsi­
dúvida emblema menos político do que religioso, frequentemente repro­ diana), a Argólia e na direcção do Ocidente até a Sicília, se é que o nome histórico de
duzido no palácio), toma o seu lugar num trono ainda visível, distribui a Minoa, dado a certas cidades costeiras, corresponde realmente à fundação de feitorias cre­
tenses.
justiça e governa através de uma espécie de chancelaria, cujos actos trans­ Por volta de 1450 abate-se nova catástrofe sobre Creta, cujos palácios e ricas moradas
crevem-se, não mais em hieróglifos, como na época precedente, mas em são incendiados e pilhados. Levando-se em conta o posterior aparecimento de traços de
linear A, antes de 1450, e depois em linear B, mais simples. Entre os sinais contribuição dos aqueus em Creta (linear B, por exemplo), e, na Grécia, a possibilidade de
desta escrita notam-se o cavalo, o carro, espadas, índice de nova contribuição observarmos um brusco enriquecimento dos príncipes locais e o sinal directo do trabalho de
civilizadora, a dos aqueus. As tabuletas de Cnossos e de Pilos (mais tardias, artistas cretenses, parece lógico concluirmos ter a Creta independente surumbido sob os
golpes dos aqueus. A partir daí, a sua civilização rastejará sem originalidade, sob influência
no Peloponeso), parecem transcrever contas, listas, talvez listas de impostos, aquéia, depois dória, até á época clássica.
com menções de trigo, carneiros e cifras frente a nomes de pessoas. A
presença, no palácio de Cnossos, de extensos armazéns prova também o
desenvolvimento de uma economia bem organizada. A CIVILIZAÇÃO, A RELIGIÃO E AS ARTES

A ilha vive então o seu apogeu, sob um poder forte e centralizador; tratar-se-ia, entre Os resultados da arqueologia, embora incompletos e de difícil datação,
1500 e 1450, da época da "talassocracia" cretense, em relação à qual não estamos em pertencem, aqui, a categoria superior. Não podemos determinar a origem da
condições de dizer se foi exclusivamente comercial ou, ao menos por vezes, mesclada de raça, que nos contentamos de baptizar como "mediterrânica", pois não é
verdadeiro imperialismo: o tributo dos moços e moças, oferecido pelos atenienses ao
Minotauro, anteriormente o mítico Teseu, pode ser a reminiscência de uma brutal semítica, nem indo-europeia ; os indivíduos são pequenos, glabros, de
dominação; é verdade que somente as relações comerciais são atestadas, apoiadas numa po- finíssima cintura e de grande agilidade, que os predispõe aos desportos. As
42 O MUNDO ANTIGO AS CIVILIZAÇÕES EGEIAS 43

mulheres, cujas vestes complicadas e de linhas modernas, corpete decotado, mente, de uma arte decorativa e de coloristas, frequentemente negligen­
saia com pregas, adelgaçam ainda mais a cintura, são coquetes e cobrem-se de ciando o desenho sem por isso ignorá-lo, omitindo o pormenor não decorativo
jóias; o desnudamente do busto surge apenas em estátuas votivas, devendo (a Parisiense não tem orelhas), e incapaz de reproduzir a perspectiva ou a pro­
ter tido um significado religioso. Estamos melhor informados a respeito dos fundidade.
príncipes e dos ricos do que acerca dos humildes, se bem que vasos e canecos, Mas as cores são deslumbrantes, pouco numerosas, o vermelho, o azul, o
como os de Váfio (na Lacónia, mas de origem cretense), representem cenas amarelo e, naturalmente, o preto e o branco: a representação das flores, lírio,
da vida rural. Os palácios, e mesmo as moradas ' 'burguesas' ', revelam uma rosa, hera, reproduzidas num plano, como num herbário, é luzente, de
espantosa busca do conforto, no que se refere à limpeza, às águas e às ins­ extremo gosto e sempre decorativa. A seguir surge a estilização e uma
talações; mas nos palácios complicadíssimos, onde, à volta do pátio central, tendência a preferir a espiral antes de tudo, curvas harmoniosas e flexíveis; o
sentimos dificuldade em dispor em certa ordem as múltiplas salas de aparato animal transforma-se também em decoração, faisões, macacos num ambiente
(sala do trono, de Cnossos, com trono de alabastro, banquetas, bacia de água florido, com plantas e rochedos e de coloração fantasista (macaco azul).
lustral, muros decorados com frescos representando grifos e teto apoiado em A reprodução do movimento é o triunfo do artista cretense, que de boa
pilastras, de ciprestes na forma original e que curiosamente se dilatam para o mente interrompe a monotonia dos desfiles e procissões, neles introduzindo
alto), o problema da iluminação é mal resolvido por poços de luz, espécie de tipos individuais e a desordem, fugindo à simetria e à estabilidade e
estreitos patiozinhos que apenas deixam uma luz parcimoniosa às salas in­ procu rando sempre, pelas linhas curvas, as atitudes contornadas, a malea­
feriores. bilidade de todas as coisas (plantas, tentáculos de polvos, anéis de cabelos,
linhas do corpo humano), a representação do turbilhonar, do girar e do rodar.
Ignoramos totalmente o pensamento cretense, e muitas manifestações colectivas,
conhecidas por frescos ou estatuetas, podem ter tido um significado religioso: cortejos ou
procissões, passeios em carro puxado por mulas ou cavalos, jogos tauromáquicos, sem le­ A CIVILIZAÇÃO AQUEIA (OU MICÉNICA)
var à morte, nos quais figuram inclusive mulheres acrobatas. Apesar da importância do
touro nos frescos e nos entalhes e a abundância dos ' 'cornos de consagração'' (?), a religião
é dominada por um princípio feminino, de fecundidade, o que denotaria influências Adquiriu-se o hábito, por razões de comodidade, de tratar da civilização
orientais; a divindade suprema é uma Grande-Mãe, servida por sacerdotisas de amplos aqueia imediatamente após a cretense, mas isto não impede que jamais de­
seios, que manipulam serpentes, símbolos ctónicos que os gregos depois adoptarão. Os ri­ vamos perder de vista terem elas coexistido, com uma espécie de desajuste
tos agrários são frequentes, os sacrifícios, raramente sangrentos, consistem em oferendas que não parece ultrapassar dois séculos: conhece-se uma autêntica civilização
de produtos dos campos. A ausência de símbolos masculinos. surpreende-nos, bem como a aqueia a partir de ao menos 1600 (os segundos palácios cretenses começam
de signos astrais e celestes, mas a presença de animais fantásticos, grifos e monstros di­
versos, denota influência mesopotâmica. Acerca da religião funerária, não sabemos o que por volta de 1700), e ela prosseguiu até a queda de Micenas, no começo do
pensar: o sarcófago pintado de Haguia-Tríada seria de extrema importância, se século XII, segundo trabalhos recentes, ou seja, cerca de dois séculos após a
conseguíssemos chegar a um acordo quanto ao seu significado; parece que o morto era tido de Cnossos. Se se revela inferior à cretense pelo espírito e pela arte, a ci­
como temporariamente reconduzido à vida, mediante oferendas conduzidas por um cortejo vilização dos aqueus nem por isso deixa de ter grande alcance histórico, pois
a um edifício que deve ser o seu ''templo-tumba''. Em parte alguma foi distinguido algum estendeu-se mais amplamente no espaço e situou-se directamente na origem
sinal seguro de templo: o culto realizava-se nas elevações, grutas (Camares), à volta de
árvores sagradas e no Palácio, onde se encontram bacias (de água lustral) e mesas de da civilização grega, como bem podemos verificar pelos poemas homéricos.
oferendas. A documentação literária clássica é paupérrima, mas a decifração dos
textos aqueus em tabuletas escritas em linear B, como as de Pilas da
Messénia, pode dar-nos vastas esperanças: a arqueologia, enfim, desde as
Mais fácil é falarmos da arte cretense, a cujo encanto não podemos ficar célebres escavações de Schliemann em 1874-1876 em Micenas, e as outras
insensíveis. Diante do desaparecimento da arquitectura, restituída de maneira mais científicas, de Doerpfeld, a partir de 188 5, colabora com importante
verossímil pelos esforços de Evans, restam-nos sobretudo os frescos, os rele­ contribuição, enriquecendo-se dia a dia.
vos pintados, frequentemente bastante restaurados, as estatuetas de metal,
pedra mole (esteatita) ou marfim, as placas de faiança colorida, os vasos
O QUADRO HISTóRICO
(rhyta) de metal decorados de relevos e de cerâmica. Salvo certos frescos,
cujas personagens ultrapassam o tamanho natural (o Prtncipe dos !trios tem A Grécia continental não evoluiu tão rapidamente quanto Creta, e até 1900 a. C. mais
cerca de 2 , 1O m de altura) as obras são de pequena dimensão e, por vezes, ou menos,_ a p�r�e norte, Tes�ália e Macedónia, continua na Idade da Pedra, enquanto que
tanto mais sedutoras quanto são minúsculas como as pedras gravadas. Ao o sul, mais proxtmo do mar, Já conhece o bronze. A partir de 1900, invasores, procedendo
contrário do Egipto e da Asia, a arte cretense repudia o grandioso e, di­ lentamente, ou por simples infiltrações, mas de origem indo:europeia (a primeira vaga de
h�)enos, chamada dos jónios?) contribuem com elementos novos: o conjunto forma a ci­
ferentemente da artª grega que, no total, mal apresenta uma ou outra relação vilização "miniana", cuja cerâmica cor de cinza é conhecida na Grécia Central e em
com ela, ignora a estatuária de dimensões normais. Trata-se, preliminar- Tróia.
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Por volta de 1600, surge já constituída a civilização da Argólida, região favorecida, um considerável incêndio que corresponderia à destruição da cidade de Príamo, o que se si­
tanto pela fertilidade de suas planícies como pelas suas relaç�s. m'.1fítimas com Cr�ta e � tua, seja por volta de 1184, segundo a cronologia tradicional do alexandrino Eratóstenes,
ilhas do Egeu: Micena, Tirinta, Midéia são então os seus pnncipais centros e con�uarao seja ainda mais longe, segundo certos autores modernos, pelos inícios do século XIII, em
povoadas durante o Heládico recente !-II-III, desde 1600 a 1200. O que caractenza esta 1270 aproximadamente.
segunda civilização é a presença de novo elemento indo-europeu, a �aber! os aqu_e1;1�: tra­ Um século mais tarde, por volta de 1190, Micenas e as cidades aqueias da Grécia são,
ta-se de gregos, filhos de Danao, segundo a lenda, bruscamente eru:iquecidos e civilizados por sua vez, destruídas irremediavelmente: tratar-se-ia a�ora do resultado da chegada dos
pelo bom êxito da incursão sobre Cnossos, por volta de 1700; dommam eles uma pop�la­ _
dórios, facto contemporâneo de vastos movimentos de diversos povos, que provocaram a
ção primitiva autóctone(?) e inspiram-se nitidamente nas realizações cretei:ises, conhe':1das queda dos hititas, a ruína de Ugarit e as lutas desesperadas dos faraós Meneftá e Ramsés III,
graças às relações comerciais e à presença, no Peloponeso, de comerciantes e artistas que afastam do Egipto os Povos do Mar, por volta de 1230 e, depois, em 1191. No mundo
minóicos. inteiro, desde o Mediterrâneo até ao Oriente, abre-se então uma nova época.

A partir de 1500, estes aqueus, em pleno desenvolvimento, superam os


cretenses, ocupam Cnossos por volta de 1450 (e lá introduzem sua linear B), A CIVILIZAÇÃO AQUEIA
e acabam por destruí-la (ou deixá-la destruir?), nas imediações do ano 1430.
Durante dois séculos evolui e difunde-se no mundo mediterrânico a ci­ Com os jónio-minianos, os aqueus são os primeiros gregos da história,
vilização propriamente aqueia, que não se limita à Argólida: encontram-se mas não se justifica qualquer referência a um''milagre''. Foi Creta que os ci­
cerâmica e construções ' 'micénicas' ' na Tessália, em lolco, não longe dos sí­ vilizou, ·não deixando de apresentar interesse a combinação das influências
tios heládicos antigos de Sesclo e Dimini; na Beócia, na Cadmeia de Tebas, mediterrânicas e nórdicas.
em Orcômeno e na ilha de Glá (região nordeste do Lago Capais); na Atica,
em Atenas (Acrópole, Areópago), em Torico, em Elêusis; no Peloponeso
Ocidental, em Cacovato e em Pilas da Messénia, na Lacónia, enfim, em A organização política mal pode ser definida, constatando-se, entretanto, a inexis­
tência de qualquer palácio digno do de Cnossos e estabelecendo a sua supremacia no
Amicleia e Váfio. continente, e a riqueza dos restos arqueológicos em fortificações: resulta, daí, que os
Fora da Grécia continental é poderosíssima a expansão aqueia: coloni­ aqueus se haviam organizado em principados feudais, o que confirma o Catálogo dos Na­
zação, sem dúvida armada, em Rodes (!aliso, Lindo) e em Chipre, mau grado vios da Ilida; com Micenas e Tirinta na Argólida, os principais castelos são os de Pilos na
a resistência de elementos orientais (Encomi-Alásia); feitorias comerciais, Messénia(Nestor?), de Amicléia perto de Esparta (Menelau?), da Cadméia de Tebas( o rei
entrepostos, colónias de mercadores na costa siro-fenícia, perto do Orontes mítico Cadmos?) e da Acrópole de Atenas. Estes chefes amavam as armas, a guerra e as
jóias, e sua actividade parece mais voltada para a pilhagem e pirataria no mar do que para a
em AI-Mina, mais ao sul em Ugarit-Ras-Chamra, em Biblos e mesmo em economia pacífica. Além disso, nada sabemos a respeito das laboriosas populações por eles
Jericó. Na Anatólia, os aqueus igualmente tomaram pé, chocando-se contra dominadas, antigos habitantes reduzidos à servidão, mas também hábeis artesãos e
os hititas, tanto a oeste, perto de Sipilo e de Carabel, quanto principalmente comerciantes aventurosos, como nos obriga a admitir a difusão de objectos e cerâmica:
na costa sul, onde a região de Arzava (Panfília) parece ter sido um principado neste caso, trata-se da única época da história em que uma sociedade feudal guerreira tenha
aqueu, cujo nome aparece, sob a forma Ahiava, nas tabuletas de Bogaz-Keui. favorecido o comércio e as artes da paz. Nenhuma informação sobre o poder político, salvo
as indicações homéricas relativas ao papel da Assembleia dos Guerreiros e à relativa li­
Mais tarde, a persistência de um dialeto ''arcádio-cipriota' ' em Chipre e na berdade de palavra deixada aos conselheiros dos reis; mas será que isto diz respeito à época
Panfília atestaria a profundidade desta colonização antiga. micénica? Enfim, as tabuletas de Pilos restituem-nos, segundo parece, listas de impostos,
contas de gado etc., e mostram que estes senhores tinham sabido organizar uma estrita
exploração de seus recursos, um regime agrário complexo (propriedade real, feudal, sagra­
Enfim, no Mediterrâneo ocidental, os modernos estão actualmente inclinados a dar aos da, tenências de diversos tipos), e ao menos o embrião de uma burocracia, o que é ainda
aqueus um lugar já importante, principalmente na Sicília e nas ilhas Lípari, pois as lendas surpreendente. As muralhas fortificadas, de resto, são bem mais vastas que os palácios e
antigas relativas a uma primeira colonização "no tempo dos heróis" homéricos, fre­ castelos, e parecem previstas para recolher os habitantes em caso de perigo.
quentemente rejeitadas como sendo fantasistas, são corroboradas pelos trabalhos de J.
Bérard e Bernabó Bréa: é difícil, segundo Bérard, exp1icar de outra forma os precisos
conhecimentos de Homero e as exactas descrições de sítios hoje em dia reencontrados pela Comparada com Creta, a vida quotidiana parece mais dura e austera; os
arqueologia, tais sejam, por exemplo, a gruta de Calipso, a região de Circe, Caribde e Cila,
e a "praia das ossadas" das Sereias; além disso, encontraram-se objectos micénicos nas castelos não apresentam as facilidades e ornamentos dos palácios cretenses e a
ilhas Lípari. É neste contexto de relações comerciais, de imigração armada e de busca de mulher, neste ambiente guerreiro, não mais dispõe da mesma influência,
escoadouros económicos que deveríamos localizar, num período antigo, a expedição dos nem da mesma liberdade, embora conservando o gosto pelos enfeites e jóias.
Argonautas, vindos da Tessália, sob o comando de Jasão, e dirigindo-se para o Mar Negro, A religião, pouco conhecida, é verdade, passa por ser muito próxima da
até a Cólquida, e a guerra de Tróia, cuja realidade histórica, quando não os verdadeiros dos cretenses, mas o culto dos heróis, sem dúvida de origem nórdica, é bem
objectivos (expedição de pilhagem, ânsia de forçar a rota económica do Euxino?), não é
mais contestável; a sua data, é verdade, não foi ainda indiscutivelmente determinada. As mais desenvolvido. O dos mortos também, como nos dão testemunho os tra­
escavações de Tróia, no sítio de Hissarlic, revelam uma cidade importante, contemporânea ços de sacrifício perto das tumbas micénicas. Surgem grandes deuses nç>Vos,
de Micenas, Tróia VI, e a camada imediatamente superior, a de Tróia VII, é marcada por já gregos, como Atena, Zeus, Hera, Posseidon e Deméter, da qual o mais
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antigo telestérion ( sala de iniciação), em Elêusis, remonta à época micénica; causa da qualidade média de produtos destinados a grande difusão. Os motivos são
é possível que tenham sido edificados templos, pela primeira vez, mas inicialmente cretenses, mas logo depois estilizados, como o polvo característico dos vasos
somente no fim do período. micénicos, ou cada vez mais geométricos, com o emprego de cruzados, losangos, cha­
A rigor, é a arquitectura que melhor nos revela a civilização aqueia. As veirões ou espirais, dispostos em faixas horizontais.
construções de Micenas e de Tirinta, as mais célebres, são impressionantes
pela sua força: trata-se de cidadelas, cercadas por diversas muralhas, de uma A civilização aqueia, em suma, é mais interessante pelo seu papel his­
espessura que atinge 10 metros, cujos enormes blocos, por vezes talhados e tórico do que pelo encanto que dela possa emanar. Mais brutal e sumária, sem
enquadrejados com a serra de bronze, colocados uns sobre os outros, consti­ dúvida porque mais militar, que a cretense, é ela, entretanto, a primeira ci­
tuem o aparelho ''ciclópico'' ; as portas são fortificadas, defendidas por vilização grega, tendo-lhe cabido o mérito de recolher e transmitir, para além
muralhas astuciosamente desenhadas, providas de padieiras esmagadoras, do turbilhão dos dórios, as tradições de Creta. Graças aos poemas homéricos,
como a da ''Porta das leoas'' em Micenas, cujo motivo é de origem cretense esta "idade dos heróis", embelezada e deformada por lendas das quais
ou oriental; paternas, casamatas cavadas nas muralhas, por vezes canalização nenhuma, ao que parece, é totalmente desprovida de fundamento histórico
de água subterrânea, reforçam a defesa. O palácio propriamente dito, no (cf. os trabalhos de J. Bérard), agiu profundamente sobre o pensamento
cume de terraços ligados por escadas, está mal conservado, mas não apresenta grego.
o esquema do palácio cretense: é mais simples, sem pátio central, mas
comporta uma ou duas salas rectangulares, chamadas megaron, no centro das
quais se encontra um braseiro, cercado de quatro colunas que sustentam o TEXTOS E DOCUMENTOS: F. MATZ, Le monde égéen (texto curto, numerosas
dispositivo de escapamento da fumaça. Esta sala é ladrilhada, ornada de es­ pranchas). Ch. ZERVOS, L 'art de la Grete (o mais rico conjunto documentário).
MASSON, La Grete antique. CONTENAU-CHAPOT, Hist. de l'art antique, págs.
tuques ou de frescos; não se sabe se o braseiro fixo indica uma influência 134-155. O. REVERDIN-R. HOEGLER, La Grete, berceau de la civilisation européenne,
nórdica ( clima mais frio), ou se corresponde a finalidades de ordem religiosa; Lucerna, 1960: numerosas ilustrações a cores.
alguns distinguem no megaron a primeira forma do templo grego, mas isto é
discutido. De cada lado abrem-se corredores, de traçado irregular, que
conduzem a salas numerosas mas de incerta destinação. Arquitecturas do
mesmo tipo existem também em Mideia, Atenas, Orcômeno, Tebas, Pilos.
A única cidade micénia conhecida estaria situada na elevação rochosa de Glá,
nas margens do Lago Capais, na Beócia.
Os túmulos são a segunda forma característica da arquitectura micénica:
tumbas de poços antigamente, dispostas de maneira circular (dois ''círculos''
de tumbas em Micenas), depois com câmaras, precedidas de um corredor -
ou dromos - e finalmente as célebres
ª
tumbas de cúpula, das quais a mais no­
tável é o "Tesouro de Atreu" composto de um corredor, em seguida de
uma sala abobadada em saliências, decorada de motivos em bronze, dos quais
subsistem apenas os furos de fixação, mas que se encontram um pouco em to­
da parte, em Orcómeno, sobretudo no Peloponeso, em Rodes e até em Cólo­
fon, na Asia Menor. Trata-se dos túmulos das grandes famílias, onde o morto
é colocado directamente ou num esquife, revestido de máscara de ouro,
munido de abundante e rico mobiliário e de numerosas armas, pelas quais os
micénios, parecem ter paixão ; alguns punhais decorados com incrustações
são verdadeiras obras-primas.

As outras obras de arte são mais directamente inspiradas em modelos cretenses: no­
tadamente o fresco e a pintura em estuque, nos quais os motivos animais e vegetais são cre­
tenses, enquanto as damas, vestindo ricos mantos bordados ou saias com babados de tipo
minóico, que figuram nos frescos de Tirinta, já têm um perfil grego. Um vaso de Micenas,
chamado Vaso dos Gue"eiros, representa tipos que anunciam a arte da Grécia arcaica. A
cerâmica aqueia é difundidíssirna no mundo mediterrânico, mas não tem nem a riqueza
colorida, nem a variedade da cerâmica cretense, seja pela inferioridade dos artistas, seja por

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