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Bibliografia:
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De Cícero temos uma autobiografia no final do seu diálogo Brutus. Marco Túlio Cícero (Arpinum, 106
- Gaeta, 7. 12. 43 a. C.), embora de origem plebeia, nasceu no seio de uma família abastada
que lhe pôde proporcionar uma excelente educação. Em Roma, na companhia do seu irmão
Quinto, pôde ouvir os melhores mestres: estuda direito com os Cévolas, retórica com
Apolónio Mólon, um grego de Rodes, filosofia com Fedro, filósofo epicurista, Fílon,
filósofo académico que o leva a rejeitar o epicurismo, e ainda com Diódoto, filósofo estóico.
Domina perfeitamente o grego, traduz além de trechos de Homero e dos trágicos os
Phaenomena de Arato; aperfeiçoa os seus conhecimentos retóricos frequentando o forum,
onde escutava os oradores mais eminentes do tempo. Em 84 a. C. inicia a sua actividade de
advogado, de 81 a. C. é o primeiro discurso judicial que chegou a té nós, o Pro Quinctio,
iniciando uma carreira de orador que tornará o seu nome sinónimo da própria eloquência
(Quintiliano, IO 10.1.112). Dos 58 discursos remanescentes, alguns são justamente
considerados obras-primas da prosa latina, Pro Archia, Pro Murena, Pro Milone, Pro
Sestio, Pro Caelio, Pro Marcello, as In Verrem, In Catilinam. Ler Romana, ‘A eloquência
de Cícero’ (Catulo 49.1-7).
No entanto, não vamos estudar nem a sua oratória, nem as suas tentativas poéticas (De consulatu suo),
nem a epistolografia que tanto impressionou os humanistas do Renascimento (as mais de
setecentas cartas que constituem as 4 colectâneas Ad Familiares, Ad Quintum fratrem, Ad
Atticum, Ad M. Brutum).
Interessa-nos sobretudo o tratadista de filosofia e retórica por forma a conhecermos ainda que
parcelarmente essas duas dimensões da cultura antiga, que no ideal ciceroniano configuram
a própria sabedoria. De 21 tratados filosóficos compostos por Cícero, temos apenas 12:
Tusculanae disputationes, Academicae quaestiones, Paradoxa stoicorum, De finibus, De
natura deorum, De fato, De diuinatione, De officiis, De re publica, De legibus, De amicitia,
De senectute. Sobre retórica Cícero escreveu tratados técnicos como o De inuentione,
Partitiones oratoriae, Topica, e tratados teóricos como De oratore, Orator, Brutus ou ainda
o prefácio De optimo genere oratorum.
Repercussão de Cícero na Antiguidade, na Idade Média (o sábio, versões de Alonso de Cartagena e do
Infante D. Pedro), no Renascimento (o Tullianus stilus, o ciceronianismo), modelo da prosa
latina até ao séc. XIX, a hipercrítica (escola de Mommsen), caricatura de Cícero, reduzido
a transmissor e divulgador da filosofia grega, de muitos filósofos gregos apenas possuímos
citações feitas por Cícero.
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mas foram ambos expulsos, a difusão do epicurismo em Roma será feita no séc. I a. C. por
um poeta latino Lucrécio com o seu poema De rerum natura.
No entanto a divulgação sistemática das correntes da filosofia grega será glória de Cícero.
A posição filosófica de Cícero, Romana, p. 59 (De officiis 2.2.8).
Cícero sente-se autorizado a adoptar uma posição ecléctica e sincretista: rejeita o epicurismo que
receitava a abstenção da vida política, prefere o estoicismo que ao invés defendia a acção,
a virtude activa, combinando-o com as doutrinas eclécticas do academismo, aceita o
probabilismo no que toca à teoria do conhecimento, mas recusa o cepticismo quado podia
por em causa o Estado ou a religião romana, nestes domínios, da política e da religião
mantém-se fiel ao estoicismo. Em suma procura conciliar a sabedoria grega com o espírito
romano, é nesta perspectiva helenizante, universalista, mas referado pelo particularismo
romano que Cícero formula o projecto de criação de uma literatura filosófica em latim.
Bibliografia
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VALENTE, M. , L'éthique stoicienne chez Cicéron, Paris, 1956.
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De oratore 2.15.62-63, Estudos, p. 140: a história é tarefa do orador; preceitos a observar pelo
historiador, não dizer falsidade alguma, ousar dizer toda a verdade, evitar qualquer suspeita
de favor ou aversão; depois a rerum ratio obriga à ordinem temporum e à regionem
descriptionem, deve o historiador atender à ordem cronológica dos acontecimentos,
descrever os lugares, apresentar as causas com rigor, giografar as principais figuras, dar a
conhcer as suas acções e carácter. Esta tem sido a interpretação tradicional deste trecho do
De oratore (P. G. WALSH, M. H. ROCHA PEREIRA, A. P. KELLEY, P. A. BRUNT).
Mas, como observa A. J. WOODMAN), é necessário situar este passo do De oratore no
seu contexto, António regressa à pergunta com a qual iniciara a sua exposição, se é ou não
a história tarefa do orador, por isso distingue numa perspectiva retórica pensamentos e
palavras, conteúdo e forma, a matéria, os dados de que se ocupa o historiador, a res, da
forma de expressão, os uerba, distingueos monumenta dos ornamenta, situa a história no
âmbito da oratória judicial, o historiador deve pois ser um bom advogado, imparcial,
verosímil, deve ser credível para poder persuadir os seus ouvintes/leitores, verdade é pois
indissociável da fides. Ora os preceitos enunciados, nota WOODMAN, não são mais do
que as regras da narratio, prescritas nas artes retóricas. A título de exemplo, Cícero já no
De inuentione (1.29) considerara indispensável à narratio o respeito pela ordem
cronológica, a temporum ordo. Portanto este ideal de ueritas defendido por Cícero não
corresponde também ao que hoje entendemos por verdade histórica, embora sempre
afectada pelas circunstâncias, pelas mentalidades, condicionada ideologicamente. A
verdade histórica no De oratore é pois antes verosimilhança, exigida pela eficácia
argumentativa, os dados da história transformam-se em argumentos, logo é necessário que
sejam credíveis, plausíveis, a fides.
Romana, ‘História e oratória’, De oratore 2.9.36 e 2.14.59; confere-se à história valor paradigmático,
trata-se de uma concepção moralista, história exemplar, a história com finalidade
pedagógica quando não mesmo didáctica, a história magistra uitae, deve instruir e, mais
ainda, fornecer modelos de conduta, ainda aqui o trabalho do historiador, o otium, deve
estar ao serviço do bem comum da Respublica.
Tendo em conta a perspectiva em que esta teoria da história é formulada, não devemos deixar de
reconhecer que é em Cícero que se encontra a mais completa reflexão sobre estas questões
na Antiguidade, evidente já no apreço com que se refere à história:
Orator, 34.120: Nescire autem quid ante quam natus sis acciderit, id est semper esse
puerum, 'não saber aquilo que aconteceu antes de se ter nascido é ser sempre criança'.
E logo depois conclui: Commemoratio autem antiquitatis exemplorumque prolatio summa
cum delectatione et auctoritatem orationi affert et fidem, 'ora a lembrança da antiguidade/do
passado e a alusão aos precedentes da história, além do maior prazer/ encanto/
traz/comunica ao discurso a um tempo autoridade e credibilidade/ crédito.
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Bibliografia:
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do λόγος, da arte dos seus rivais, ao criar a palavra ῥητορική limitava e depreciava o campo
de interesses dos sofistas; por outro lado, o Górgias, composto após a condenação à morte
de Sócrates, resulta também da profunda desilusão do autor com a vida pública ateniense,
ῥητορική surgia pois como acusação ao ensino de Isócrates que produzia tais ῤήτορες, os
políticos dos tribunais e assembleias.
ῥητορική foi transliterada para latim sob as formas rhetorice ou rhetorica, por vezes substituída pela
expressão ars dicendi ou simplesmente por eloquentia. A mais antiga ocorrência da palavra
rhetorica encontra-se num fragmento de Énio da primeira metade do séc. II a. C.. Rhetor
designava em Roma o mestre de retórica que, sucededendo ao grammaticus, ministrava por
assim dizer o ensino superior.
discursos e praticar nobres feitos» (Fénix na Ilíada, 9.443), as duas vertentes da ἀρετή. Nos
Poemas figuram já algumas das questões mais conspícuas da história da retórica: a questão
da autoridade e credibilidade do orador (Telémaco), da necessidade de adequar o estilo ao
ethos de cada um (o discurso de Menelau é breve, claro, simples/ o de Ulisses abundante,
complexo, torrencial). A própria classificação dos géneros se encontra já aí prefigurada,
discursos 'judiciais' na Ilíada (I, XVIII), Odisseia (II), oratória epidíctica (Ilíada, XXIV,
elogios fúnebres de Heitor). E o canto IX da Ilíada, a cena da embaixada, com os discursos
de Ulisses, Fénix e Ájax, desde muito cedo foi entendido pelos Antigos como uma espécie
de retórica implícita. Como a Ilíada e a Odisseia se tornaram livro de texto nas escolas
gregas e latinas, a atitude homérica em relação à oratória acabou por interferir
poderosamente na concepção de orador da cultura greco-latina: pervive na imagem heróica
do orador que pela palavra impõe aos outros a sua vontade. A persuasão revela-se como o
principal meio de comunicação entre os deuses e os homens, como instrumento ao serviço
dos deuses e dos homens sábios, condutores de homens. A palavra é dom divino, em
Homero são divinos os arautos, os reis, os médicos, todos os que curam com o sortilégio da
palavra, o poeta, o profeta, o adivinho, o médico.
proposições uma tem mais probabilidade de estar certa do que a outra; nas mãos dos
sofistas esta teoria permitirá desligar a argumentação retórica do critério da verdade, há
factos que acontecem contra toda a probabilidade, logo factos contra a probabilidade são
prováveis, o improvável torna-se provável. A tradição que faz da Sicília o berço da retórica
e de Córax e Tísias os seus inventores apresenta um fundo de verdade: tanto Empédocles
como Górgias, um dos sofistas que mais concorreu para a difusão da arte em Atenas, eram
originários da Sicília, a retórica ganha importância com estabelecimento da democracia.
Embora nenhuma das obras de Tísias e Córax tenha chegado até nós pode-se presumir que
ambos terão contribuído para a sistematização dos preceitos retóricos, com efeito
Quintiliano reserva para os dois sicilianos o título de artium scriptores antiquissimi. (IO,
3.1.8).
Bibliografia:
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Voltando ao Bruto, Cícero começa por referir, como primeiros mestres de oratória, os sofistas gregos
Górgias, Trasímaco, Protágoras, Pródico e Hípias, que ensivam o método de tornar a causa
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mais débil a causa mais forte. Alude à resposta da ética de Sócrates e da eloquência de
Isócrates, aponta Péricles como o primeiro orador intruído nos preceitos da filosofia.
Como primeiro orador romano indica Marco Cornélio Cetego, mas acrescenta que, anterior ao fim da
2ª guerra púnica, já só conheceu o discurso de Ápio Cláudio Cego, proferido no Senado,
em 288 a. C., quando Pirro, rei do Epiro, propôs a paz a Roma. Ápio levou o Senado a
rejeitá-la; provavelmente foi escrito por algum ouvinte e depois conservado na família
como oração fúnebre.
- a laudatio funebris era justamente a forma mais comum da oratória epidíctica em Roma, género
especificamente latino que remonta ao elogio do primeiro cônsul, Bruto, embora se trate
por certo de um texto apócrifo; estes discursos laudatórios pronunciados dos rostra no
forum recorriam a fórmulas fixas, por isso Cícero fala com algum desdém destas orationes.
- da restante oratória arcaica temos escassas informações: Névio, o poeta satírico, usou a invectiva e o
ataque político contra os Metelos e Cipião o Africano, a prática oratória grega tal como ela
se reflectia na Comédia Nova Ateniense, encontra eco no teatro plautino, não podemos
todavia das falas mais retóricas das personagens de Plauto, inferir o estado da eloquência
latina coeva, visto que se torna muito difícil discernir o que é plautino/romano daquilo que
pertenceria aos modelos gregos.
- o primeiro grande orador latino, do qual se pode traçar com alguma nitidez o seu retrato é Marco Pórcio
Catão, Catão-o-Antigo, ou Catão-o-Censor (234-149 a. C.); ao que parece era muito
respeitado pela sua competência no campo do direito e da história, aliança frequente nos
oradores romanos até ao séc. I a. C.; ficou célebre a frase com que terminava os discursos,
et delenda Carthago, sinal da sua visão estratégica e da sua influência política; há notícia
de mais de 180 discursos pronunciados por Catão, conhecem-se citações de alguns dos seus
discursos em textos de autores gregos e latinos, e um trecho relativamente extenso da oração
intitulada Defesa dos Ródios proferida em 167 a. C. Cícero no Bruto procura reabilitar a
oratória de Catão, aponta como características do seu estilo o uso da anáfora e do assíndeto,
figuras desconhecidas do latim, e ainda da interrogação retórica, Cícero e mais tarde Aulo
Gélio lamentam no entanto a falta de ritmo na sua prosa, a ausência das cláusulas métricas;
os modernos a este propósito mostram-se divididos, Alan ASTIN afirma que Catão
desconhecia a teoria grega, E. FRAENKEL analisou o discurso dos Ródios e encontrou
nesses excertos inúmeras cláusulas, G. KENNEDY na esteira de Fraenkel recorda o
interesse de Catão pelas letras gregas, os seus contactos na Magna Grécia e na pp Grécia, a
contratação de um grego como tutor do seu filho.
O Círculo dos Cipiões, por meados do séc. II, desenvolve o interesse romano pelo teatro, pela história,
pela filosofia, mas parece alhear-se da retórica, no entanto Cícero no Bruto, 258, considera
Cipião, Lélio e Fílon bons oradores, acrescentando que cultivavam um estilo caracterizado
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pela brevidade, pela subtileza, concisão e lógica, nos antípodas portanto da pompa e da
amplificação do asianismo.
Sobre os grandes oradores da geração seguinte, dos finais do séc. II, temos muita informação no Bruto
e indirectamente também no De oratore; com efeito, neste diálogo além de um
representante do grupo dos Cipiões, o jurista Quinto Múcio Cévola, encontramos como
personagens principais os oradores Marco António e Licínio Crasso.
Marco António, avô do triúnviro homónimo, foi cônsul em 99 e censor em 97, veio a ser condenado à
morte nas proscrições de Mário; enquanto orador é louvado no Bruto, 207, por Cícero pela
sua inuentio, dispositio, memoria e pronuntiatio, porém não merece aprovação a sua
elocutio, Cícero julga-o melhor na oratória judicial do que na deliberativa, notando ainda o
conhecimento superficial quer do direito quer da literatura grega, como Catão terá
composto um tratado retórico.
Licínio Crasso, cônsul em 95 e censor em 92, foi igualmente orador reputado, no Bruto, 143, Cícero
atribuí-lhe duas qualidades que faltavam a António, domínio do direito e estilo elegante, no
De oratore contrasta com António pelo seu saber enciclopédico, como no Bruto Cícero
considera-o precursor da sua própria latinitas e modelo do seu orador ideal.
Bibliografia:
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Cícero, como Platão, ocupou-se tanto da ciência política (De Republica - República) como da arte do
discurso (De oratore - Górgias, Fedro).
Os tratados técnicos (De inuentione, Partitiones, Topica).
O De inuentione, composto por 84 a. C., pese embora o menor apreço com que Cícero mais tarde se lhe
refere, rudes commentariola juvenis, contém já algumas das ideias primordiais do
pensamento retórico do autor latino, defendidas depois no Do orador: sem eloquência
pouco adianta a cultura, é a oratória o fundamento da civilização humana, é a oratio que
distingue os homens dos animais, é a capacidade de o homem se exprimir a medida da sua
humanitas. Com efeito logo no início do De inuentione Cícero afirma com solenidade que
a sabedoria sem a eloquência pouco aproveita (parum prodesse) ao Estado, e que
eloquência sem sabedoria jamais é proveitosa e não raro prejudicial (nimium obesse
plerumque, prodesse numquam); no livro II Cícero expõe a doutrina da stasis. Lia-se como
manual para juízes e advogados, o De inuentione, Rhetorica Vetus, com a Ad Herennium,
Rhetorica Nova, foi a principal fonte da retórica clássica durante a Idade Média, D. Duarte
encarregou D. Afonso de Cartagena da sua versão para vernáculo.
As Partitiones, diálogo publicado por finais de 46 a. C., apresentam-se como conjunto de respostas
dirigidas ao filho Marco, a concisão é pois uma das suas principais características, trata-se,
todavia, de um excelente resumo das teorias retóricas ciceronianas. Discutem as cinco
tarefas do orador, as partes e divisões do discurso.
O De optimo genere oratorum (44) não é mais do que o prefácio de Cícero à sua versão dos discursos
forenses pronunciados por Demóstenes e Ésquines a respeito da coroa que Ctesifonte
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Bibliografia:
B. F. PEREIRA, Retórica e eloquência em Portugal na época do Renascimento, Lisboa, INCM, 2012, pp. 42-59 e 87-127.
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