Você está na página 1de 2

Sou muito e sou nada, sou incoerente e consciente da incoerência que me habita, da dualidade

que me atravessa, das dúvidas e das questões que são fermento de nova humanidade em
mim.

A vida trouxe-me dificuldades e, no meio dessas dificuldades, existiu a provocação de defeitos,


qualidades, mas, essencialmente, caraterísticas que hoje fazem parte de mim, portanto, não as
vejo com maus olhos, por outro lado, com visão de caminho constante e de salvaguarda do
que de bom existe.

Senti que o convite que me era feito seguia uma linha de solidão, não apenas estar só. E hoje
preciso e gosto do silêncio, da verdadeira solidão, aquela que é amarga, mas que é
provocadora de confronto e assumível da verdade que há em mim. Não tenho um gosto
especial pelo sofrimento interior, mas percebi que tendo consciência de mim próprio e
querendo ter ao longo da vida, ele não me abandonará, será construtor de paz. Tenho a minha
forma de sofrer, é minha, alheia-me do mundo, entro no meu e lá fico até poder saltar.

Como é claro, esta necessidade de solidão e de “sofrimento” anseiam um equilíbrio, pois não
me posso afastar das pessoas e rejeitá-las apenas porque preciso do meu tempo e do meu
espaço. Para mim são duas coisas intocáveis, onde poucas pessoas entram. Isto porque cada
um acarreta em si um mistério singular, uma forma de amar distinta de todos os outros e
poucos são os que conseguem assumi-lo, compreendê-lo e amá-lo. Talvez por isso, existem
muitos colegas, pessoas de grande estima e, depois, os amigos. São poucos! Poderá parecer
estranho, mas orgulho-me disso. Como sabemos isso poderá trazer exageros, pois poderá
fazer com que afetivamente fique dependente de alguém ou de alguns. Tenho uma certa
dependência por alguém, mas passados alguns meses de acompanhamento essa dependência
tem vindo a transformar essa amizade numa linha de equilíbrio. Melhorou substancialmente,
no respeito pelo espaço do outro e da sua disponibilidade para estar. Não me proibi a estar,
impus-me a respeitar. Temos sempre de caminhar e lutar para que as amizades aconteçam de
forma saudável, tenho lutado, não me afastando, pois isso estaria a formar uma bomba para o
confronto posterior. Estou a aprender a estar em verdade e amor, já caminhei bastante!

Como são poucas as pessoas que entram verdadeiramente em mim, reconheço que não gosto
que alguém estranho a essa dimensão ouse entrar e, portanto, nessas alturas tenho
dificuldade de tolerar, tornando-me impulsivo, respondendo de uma forma pouco simpática.

Neste caminho para o equilíbrio criei outras amizades que são verdadeiros tesouros…

As dificuldades em casa às vezes também me afetam bastante!

Refletindo sobre estas dificuldades, tenho impressão de não saber amar, por vezes. E,
consequentemente, não me sei perdoar quando tomo consciência dos meus erros para com as
pessoas. Isso afeta-me bastante, provavelmente é o que me afeta mais, pois mergulho nessa
culpa e tudo o resto não existe. A disponibilidade para estudar, por vezes, torna-se pouca, pois
emocionalmente não estou disponível. Afeta, portanto, a produtividade e o gosto académico,
chego até a tornar-me desorganizado.

O grupo do Propedêutico é um grupo unido, mas o facto de estarmos constantemente juntos,


de ainda não termos conseguido o silêncio, a organização e o respeito verdadeiro uns pelos
outros, faz-me ter uma necessidade de sair, de certa forma para poder existir uma sã
convivência.
Neste emaranhar de dificuldades o processo de discernimento vocacional fica afetado, mas
muito pela positiva, pois coloca as questões mais pertinentes no momento mais pertinente, o
Propedêutico. Sinto que a apesar de tudo o rio de Deus conduz-me, no sofrimento e na dúvida,
à mesma foz, o Seminário e a vocação sacerdotal. Chorar, descobri que é bom, mas a maior
descoberta foi perceber que Deus me tem vindo a evaporar as lágrimas.

Algo que também me tem ajudado neste caminho é a escrita, o facto de colocar por escrito os
meus sentimentos, numa perspetiva de purificação dos mesmos.

Você também pode gostar