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O que é procrastinação?

Atrasar uma tarefa, em muitos dos casos, pode ser uma


estratégia previamente planejada, sendo uma decisão sensata a
ser tomada. Diante de uma grande dificuldade ou de um
problema complexo, adiar uma ação nos dá a oportunidade de
buscar maiores informações, entrar em contato com outras
pessoas as quais, poderiam nos ajudar na resolução do problema
em questão, ou até mesmo ganhamos mais tempo para pensar e
refletir sobre tal dificuldade. Sendo assim, adiar uma tarefa ou
tomada de decisão pode ser uma sábia estratégia para que
possamos angariar novos e maiores recursos frente a um problema complexo. Todavia, não é
sempre que o adiamento de uma tarefa se mostra como uma estratégia sensata e funcional.

Muitas das vezes esse atraso é desnecessário, acompanhado de sentimentos


desagradáveis como: culpa, ansiedade, vergonha, inadequação e arrependimento. Nesses
casos poderemos falar de procrastinação, podendo ser inicialmente definida como um atraso
voluntário e desnecessário de uma tarefa que se pretendia realizar, apesar de estar consciente
das consequências desagradáveis desse atraso, resultando em um significativo sofrimento
subjetivo. Ou seja, a procrastinação não é um simples atraso de um afazer, mas um atraso
contrário a uma intenção inicial do indivíduo, mesmo sabendo de seus custos e da pouca, ou
nenhuma, funcionalidade desse atraso.

A palavra procrastinação vem do latim, procrastinatus’. pro - à frente - e crastinus -


amanhã. Por definição, procrastinação é a evitação ou o adiamento de uma ação a tal ponto
que isto gere prejuízos em alguma área da vida da pessoa. Para a pessoa que procrastina, isso
resulta em um aumento do nível de estresse, com acúmulo de tarefas, menor produtividade,
sensação de fracasso por não cumprir com a suas responsabilidades e compromissos.

Embora a procrastinação em um grau moderado seja considerada algo comum, torna-


se um problema quando impede o funcionamento normal das ações. A procrastinação crônica
pode ser um sinal de problemas psicológicos e/ou fisiológicos. Para alguns indivíduos, a
procrastinação se torna um mau hábito, causando inúmeros prejuízos ao longo da vida,
podendo afetar a saúde, o desempenho e/ou suas relações sociais.

No momento você pode estar se perguntando, “então por que algumas pessoas ainda
insistem em procrastinar?”. Já entendemos que a procrastinação está relacionada ao atraso e
ao adiamento de uma tarefa ou tomada de decisão. Entretanto, apesar do atraso ser um fator
fundamental na procrastinação, apenas esse elemento não explica o fenômeno por completo.
Precisamos entender os principais motivos que levam uma pessoa a procrastinar.

A partir de uma maior compreensão acerca deste comportamento disfuncional, passa


a ficar mais evidente um dos aspectos centrais por trás da procrastinação: uma falha
autorregulatória. E o que isso significa? A autorregulação é nossa habilidade em regular
processos relacionados aos nossos pensamentos, às nossas emoções e também aos nossos
comportamentos. Uma pessoa que procrastina apresenta dificuldade em regular alguns desses
processos. Por exemplo, ao experimentarmos uma emoção de ansiedade ou medo frente a
realização de uma tarefa, podemos não conseguir manejar aquela situação de forma
adequada, focando excessivamente no desconforto sofrido no momento, fazendo com que
evitemos ou fujamos essa tarefa a fim de nos sentir mais calmos outra vez. Veremos mais para
frente como esse problema implica na manutenção do comportamento procrastinatório.

Diante de situações desagradáveis, as pessoas que procrastinam tendem, inicialmente,


a sofrer menos desconforto quando comparados àqueles que não utilizam tantos
comportamentos procrastinatórios. No entanto, ao se aproximar do prazo da entrega de um
trabalho ou de um projeto qualquer, as pessoas que procrastinam não apenas vivem
consideravelmente maior elevação do nível de estresse, como também apresentam um
desempenho inferior se comparado aos demais. Aqui fica mais claro o papel da procrastinação
como um alívio momentâneo, porém um causador de maiores prejuízos em longo prazo.

Como os meus pensamentos influenciam na procrastinação?


Normalmente acreditamos que uma situação ou evento específico são inteiramente
responsáveis pelo modo como reagimos em tal momento. Mas na verdade não é assim. Pense
rapidamente em uma situação na qual você se sentia muito apreensivo, realizando um
trabalho, por exemplo. O que estava passando na sua cabeça naquele momento? Será que
todas as outras pessoas vivenciavam o mesmo sentimento que você, ou cada um enfrentava a
situação de um jeito diferente?

A maneira como interpretamos determinadas situações tem um enorme poder de


provocar reações emocionais e comportamentais. Nossa interpretação influencia diretamente
nos nossos sentimentos, nas nossas ações e nas nossas reações corporais. Entretanto, essas
nossas avaliações sobre diferentes situações, sobre nós mesmos, sobre os outros ou sobre
nosso futuro, muitas vezes podem ser equivocadas, e mesmo assim lidamos com elas como se
fossem verdades.

A procrastinação é um comportamento e, como acabamos de compreender, um dos


principais fatores que contribui para nossa resposta comportamental é a maneira como
interpretamos certas situações. Sendo assim, o comportamento procrastinatório é uma
estratégia para regular, em curto prazo, emoções negativas que acompanham a avaliação de
uma tarefa.

A procrastinação está geralmente associada a fatores cognitivos e emocionais, sendo


eles o desconforto da tarefa e medo do fracasso. O primeiro diz respeito à maneira como
interpretamos certas tarefas. O maior ou menor grau de desconforto percebido sobre a tarefa
(p. ex.: difícil, tediosa, cansativa) vai mediar a possibilidade de se engajar em um
comportamento procrastinatório.
Muitas pessoas que costumam procrastinar não acreditam serem boas o suficiente.
Podem muitas vezes apresentar um pensamento de que são uma fraude. Sendo assim, a
procrastinação ligada ao segundo fator (medo do fracasso) pode ser entendida como uma
estratégia de proteção à autoestima quando se entra em contato com uma tarefa aversiva, a
qual pode revelar a própria “incapacidade” do indivíduo.

Desta forma, adia-se com frequência atividades percebidas como desagradáveis a fim
de prevenir avaliações negativas sobre seu próprio desempenho. Esse comportamento
procrastinatório está muito ligado a um tipo de perfeccionismo social, ou seja, à ideia de que
os outros esperam o melhor do indivíduo e que, se ele não corresponder a essas expectativas
(irreais), não provará ser bom o suficiente.

O indivíduo pode ruminar pensamentos sabotadores, como: “hoje não haverá tempo
suficiente”, “estou cansado, amanhã terei mais energia para tentar fazer isso”, “pode ser que
ele desista de cobrar isso”, “preciso de mais informações, conversar com mais pessoas para
saber como vou começar”, “eu já passei por muitas dificuldades essa semana, mereço fazer
algo relaxante agora”.

A Figura 23.3 ilustra como um pensamento distorcido pode ser “ruminado” e conduzir
a reações emocionais e comportamentais disfuncionais numa “reação em cadeia”. Para se ter
maior clareza e entendimento de como a procrastinação acontece e pode afetar a vida de uma
pessoa, veja o exemplo.

Roberta tem 26 anos e está terminando sua graduação em medicina. Neste momento,
Roberta está passando por muita dificuldade por conta da sua monografia. Assim que
começou o projeto, ela havia feito um planejamento, diante do qual se sentia muito confiante
em conduzi-lo com início, meio e fim. Com o passar dos dias, Roberta preferia se engajar em
outras atividades mais prazerosas, pois sempre que sentava para fazer o trabalho, não
conseguia dar continuidade. Ora sentia tédio, ora se sentia incapaz, ora via outras tarefas
como prioridade. Para compensar, ela alterava o seu cronograma, acumulando obviamente
mais etapas em menos tempo, e prometia para si mesma que escreveria algo no dia seguinte.
No entanto, o dia seguinte virou uma semana, um mês e, quando se deu conta, já estava se
aproximando o prazo de entrega. Roberta subestimou o tempo necessário para completar a
tarefa e superestimou o tempo disponível para sua realização. Experimentava muitas emoções
negativas, como ansiedade, culpa, tristeza, medo, inadequação e arrependimento. Sabia que
deveria falar com seu orientador, mas tinha receio de que ele fosse achá-la incompetente.
Quando já não sabia mais o quefazer, pensou em mentir, talvez inventar uma doença na
família, entretanto seus valores morais a impediam de ter tal conduta. Por fim, resolveu de
fato conversar com o orientador. Contradizendo a avaliação inicial que fazia Roberta
procrastinar o contato, ele a ouviu atentamente, mostrou-se compreensivo e a orientou no que
precisava.
Como o meu problema pode estar sendo mantido?
Antes de qualquer coisa, precisamos entender como aumentamos a frequência de um
comportamento qualquer, seja ele adequado ou não. Após um comportamento podemos
então receber algo satisfatório ou nos livrar de algo insatisfatório. Sempre que uma dessas
consequências é apresentada após um comportamento qualquer, isso tenderá a aumentar a
frequência do mesmo.

Por exemplo, podemos trabalhar com entusiasmo, chegando no horário correto e


mostrando maior produtividade (comportamentos) porque iremos receber uma bonificação,
uma promoção ou mesmo um elogio do chefe (ganhamos algo satisfatório); ou podemos
trabalhar arduamente porque queremos nos livrar da bronca do chefe “chato”, porque
seremos severamente punidos ou mesmo por haver risco de demissão (nos livramos
momentaneamente de algo insatisfatório).

Assim, podemos entender o porquê dos comportamentos procrastinatórios serem tão


frequentes na vida de algumas pessoas. A procrastinação, em muitos momentos, parece
funcionar (apesar dos danos), então não é à toa que acaba se transformando em um mau
hábito. Tente relembrar: entre todas as vezes que você procrastinou, quando de fato você não
conseguiu concluir a sua tarefa? Muitas vezes, houve atrasos ou não se atingiu a qualidade de
que se gostaria, mas a verdade é que, na maioria das vezes, aquela tarefa que foi tão protelada
acabou sendo cumprida.

Quando procrastinamos, nos vemos com menos tempo e maior pressão para realizar
uma tarefa conforme o prazo de entrega se aproxima. Neste momento, nós ativamos um
estado de alerta, liberamos mais adrenalina e aumentamos nossa capacidade de atenção e,
consequentemente, tendemos a ficar mais produtivos. Por fim, frequentemente conseguimos
realizar a tarefa (nos livramos de algo insatisfatório - a pressão) e podemos sentir uma grande
satisfação, especialmente quando recebemos uma boa avaliação (ganhamos algo satisfatório -
boa nota e elogio, por exemplo) (Leahy et ah, 2013).

Apesar de funcionar de forma imediata, não é adequado manter este modo de


enfrentamento dos problemas, visto que podemos, em alguns casos, não conseguir finalizar o
afazer ou, mesmo conseguindo concluir, podemos apresentar um quadro de exaustão logo
após a finalização da tarefa.

Outro motivo pelo qual a procrastinação parece “funcionar” é porque ela pode trazer
um alívio momentâneo de seu estado de desconforto emocional. Ao sentirmos medo,
ansiedade ou tristeza por ter que realizar uma tarefa específica, o adiamento da mesma quase
que imediatamente reduz todo esse sofrimento. O risco de lidar desse modo com as exigências
do dia a dia, é que podemos desenvolver o hábito de sempre nos livrarmos de desconfortos
emocionais, o que pode nos manter nesse ciclo, aumentando o comportamento
procrastinatório.

Pessoas que procrastinam podem apresentar uma certa dificuldade relacionada ao


controle dos impulsos. Desta forma, costumam priorizar prazeres imediatos. Para se atingir
resultados em longo prazo, é necessário, em muitos casos, abrir mão de prazeres, ou enfrentar
desconfortos momentâneos para que se tenha uma satisfação maior no futuro. Em geral, há
uma preferência em se engajar em atividades que envolvam recompensas mais imediatas em
relação às atividades (geralmente enfadonhas) que somente apresentam recompensas em
médio ou longo prazo (Sirois, 2007).

Como lidar com a procrastinação?


Até então esclarecemos o que de fato é a procrastinação e o que está por trás dela.
Isso já é um grande passo, afinal, para combatermos o “inimigo”, precisamos conhecê-lo ao
máximo. Sendo assim, não deixe de esclarecer qualquer questão com o seu terapeuta ou
buscar mais informações em fontes confiáveis.

Além disso, durante o tratamento psicoterápico pela abordagem cognitivo-


comportamental, você irá aprender estratégias que o ajudarão no manejo do comportamento
procrastinatório.

O autoconhecimento e a psicoeducação: entender sua história de vida e o porquê de


agir da maneira como age é essencial para se estabelecer como você irá mais facilmente
enfrentar e vencer o problema. Há pessoas que são mais receosas que o normal, “ruminam”
preocupações improdutivas; outras se cobram em excesso, são muito perfeccionistas; outras
podem ser tímidas e temer uma má avaliação; outras, por sua vez, podem ser desorganizadas;
outras, ainda, podem ter dificuldade para controlar os próprios impulsos e se entregar aos
prazeres imediatos. Como vimos, há muitos motivos que podem levar uma pessoa a
procrastinar.

Identificar e questionar os pensamentos sabotadores: Lembre-se que os seus


pensamentos possuem um papel fundamental em suas respostas emocionais e
comportamentais. Poderá ativamente identificá-los, questioná-los e até mesmo mudá-los, caso
sejam pensamentos distorcidos (não realistas, pouco úteis, não pragmáticos). No decorrer do
tratamento, você aprenderá a reestruturar esses pensamentos disfuncionais, respondendo de
maneira mais adaptativa quando confrontado com essas situações.

Ativação comportamental: Muitas pessoas tendem a esperar surgir uma certa vontade
para então darem início a algum comportamento, porém a verdade é que nos motivamos à
medida que agimos. Quantas vezes você procrastinou por achar uma tarefa difícil e sem graça,
mas, depois que começou a fazer, percebeu que, na realidade, não era aquele “bicho de sete
cabeças” e até teve algum prazer enquanto fazia? Pois é, ao longo do tratamento você
também irá aprender a como se engajar nessas tarefas e por onde começar.

Regular suas emoções: Como vimos, a falta de habilidade em lidar com as próprias
emoções é um dos principais fatores que envolvem a procrastinação. Ao contrário de tentar
evitá-las (esquiva emocional através de alienação ou compulsões), temos que aprender com
elas, entendê-las e aceitá-las. Não é uma tarefa fácil, mas o seu terapeuta poderá ajudá-lo a
desenvolver essa habilidade. Lembrando que o enfrentamento de situações que geram
sentimentos desconfortáveis acontecerá de uma forma preparada e gradual.

Será que vou conseguir?


Mesmo sendo um problema muito frequente, ainda há pouco entendimento acerca
da procrastinação, muitas vezes sendo vista de forma trivial ou com “maus olhos”. Não é raro
que as pessoas que tendem a procrastinar sejam recorrentemente chamadas de preguiçosas,
desinteressadas ou irresponsáveis. Na realidade, esses rótulos só aumentam ainda mais a
pressão por resultados, pois, como vimos anteriormente, muito do comportamento
procrastinatório está associado a pensamentos negativos sobre si e sobre os outros.

Também vimos que mesmo possa parecer difícil lidar com a procrastinação, há
alternativas viáveis para se enfrentar e vencer o problema. Muitos indivíduos conseguem
superar seus obstáculos. Como vimos durante este texto, é preciso “nadar contra a maré”. Não
procrastine a busca por ajuda, a busca por mais informações, a busca por tratamento!

Você pode estar achando que será difícil parar de procrastinar, mas pense
rapidamente em todas as dificuldades que você conseguiu superar ao longo de sua vida,
apesar da sua recorrente procrastinação. Todos os projetos que conseguiu conduzir, apesar
das dificuldades, com início, meio e fim.

Além do mais, se você está lendo esse texto é porque já está engajado, de certa forma,
na mudança. Lembre-se também de que a procrastinação é um hábito e, como qualquer
hábito, pode ser mudado! Não será uma tarefa fácil, pois haverá desconforto. Um hábito que
nos acompanha ao longo de uma vida não se muda de um dia para outro, mas você pode
procurar procrastinar menos hoje do que ontem e fazer isso a cada dia. Assim, colherá
inevitavelmente os frutos de seu esforço.

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