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28 a 30 de junho de 2022

HISTÓRIA E FILOSOFIA DAS CIÊNCIAS DA NATUREZA: uma


reflexão no contexto da formação continuada
Ana Santana Moreira1
Erick Henrique Siqueira Paiva 2
Gustavo Fernandes Rodrigues3
Andreia Cristina B. Gomes4
Wárica Santos Souza5

Eixo 8: Relatos de Experiência: Relatos de experiência com discussão teórica.

Resumo: A escassez de discussões sobre história e epistemologia da ciência na formação inicial de


professores resulta em lacunas conceituais nas aulas de Biologia, Física e Química. Esse fato
contribui com a prevalência de percepções equivocadas e ultrapassadas sobre o conhecimento
científico, configurando-se como a-histórico, linear e com a presença de cientistas gênios, que
trabalham isoladamente. O objetivo deste estudo é relatar as percepções, reflexões e contribuições
propiciadas pela participação na disciplina de História e Epistemologia das Ciências da Natureza,
no processo formativo de mestrandos do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e
Matemática da Universidade Federal de Goiás. Em virtude da pandemia da COVID-19, a disciplina
foi ministrada de forma remota no segundo semestre de 2021. A experiência revela o potencial das
discussões na formação continuada de professores e pesquisadores, que ao se apropriarem da
abordagem histórico-epistemológica das ciências podem ressignificar os conteúdos e conceitos
científicos tornando-os mais significativos. Assim, defende-se a importância dessas discussões nos
cursos de licenciatura e na pós-graduação, a fim de contribuir com a superação de discursos
equivocados sobre o saber científico.

Palavras-Chave: História da Ciência; Epistemologia da Ciência; Formação de Professores; Relato


de Experiência.

INTRODUÇÃO
O estudo acerca da natureza do conhecimento científico e dos critérios de
cientificidade em cada uma das ciências é um aspecto necessário para a formação de
professores que se pretenda holística (NASCIMENTO JR; SOUZA; CARNEIRO, 2011).
No campo da formação continuada, a pertinência de disciplinas relacionadas à história e

1Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática, Universidade Federal de Goiás,


anasantana2@discente.ufg.br
2Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática, Universidade Federal de Goiás,
erick_henrique@discente.ufg.br
3Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática, Universidade Federal de Goiás,
gustavofr@discente.ufg.br
4Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática, Universidade Federal de Goiás,
andreiacristina.bg@discente.ufg.br
5 Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática, Universidade Federal de Goiás,
waricasouza@discente.ufg.br

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epistemologia das ciências justifica-se pela possibilidade de favorecer a superação das


lacunas conceituais advindas da formação inicial.
Nesse sentido, sua relevância assinala para o fato de que a “realidade é
historicamente construída, o conhecimento científico faz parte dessa construção” e não
pode ser “compreendido como meramente instrumental” (NASCIMENTO; SOUZA;
CARNEIRO, 2011, p. 225). Tal consideração sinaliza para a formação de professores a
importância de se proporcionar reflexões de cunho teórico-epistemológico, em especial no
que tange as singularidades características dos processos internos e externos que
possibilitaram a constituição das ciências de referência.
Com vista a fomentar esse debate, o presente estudo é um Relato de Experiência
(RE) que problematiza a disciplina História e Epistemologia das Ciências da Natureza no
contexto do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática da
Universidade Federal de Goiás (PPGECM/UFG). A disciplina foi ministrada por três
docentes, sendo um professor com formação em Física e duas outras professoras, com
formação em Biologia e Química respectivamente.
Essa multiplicidade de áreas trouxe um diferencial que enriqueceu as discussões,
haja vista a geração de possibilidades de compreensão das distinções epistemológicas que
transversalizam cada uma dessas ciências. Assim, o trabalho objetiva relatar e discutir as
percepções, reflexões e contribuições da disciplina para a formação continuada de
professores de Ciências da Natureza.

METODOLOGIA
Aproximando-se com os estudos descritivos, este relato descreve os fenômenos a
partir de possíveis estabelecimentos de relações da ação (GIL, 2008). De acordo com
Mussi, Flores e Almeida (2021), este tipo de produção científica deve conter descrições
informativas, referenciadas, dialogadas e críticas para se tornarem relevantes no meio
acadêmico tanto para discentes quanto docentes.
Nesse sentido, as leituras, debates e reflexões realizadas, por nós mestrandos, ao
longo da disciplina de História e Epistemologia das Ciências da Natureza do
PPGECM/UFG instigou na escrita das vivências e na exteriorização das percepções ao
longo deste curso de formação continuada. Assim, os docentes apresentaram o plano de
curso contendo o cronograma, o conteúdo programático, os objetivos, a metodologia, o

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processo avaliativo, as referências a serem utilizadas. Realizou-se um contrato pedagógico


entre discentes e os docentes estabelecendo acordos sobre pontualidade, assiduidade e
importância da participação.
O objetivo geral da disciplina centrava-se nas discussões dos aspectos sócio-
históricos, epistemológico e ontológico relacionados com a construção da Biologia,
Química e Física enquanto ciências, para compreender a origem, o desenvolvimento e a
organização do conhecimento ensinado.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A disciplina teve vinte e cinco discentes matriculados(as) com predomínio de
graduados nas áreas das Ciências da Natureza, além de alguns formados em Matemática e
Pedagogia. Este quantitativo mostra o interesse pela temática, todavia, aponta para a
dificuldade da efetiva participação de todos(as) nos debates e discussões prejudicando
aqueles com dificuldades de expressar-se oralmente. Em virtude do isolamento social
causado pela pandemia da COVID-19, as aulas foram ministradas em formato remoto, com
a mescla de atividades síncronas (durante o segundo semestre de 2021) e assíncronas. As
atividades síncronas aconteceram por meio de videoconferência usando a plataforma do
Google Meet e as assíncronas foram realizadas por fóruns e questionários, disponíveis na
Turma Virtual no Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas (SIGAA).
No que tange a ementa da disciplina, observa-se a presença de discussões
relacionadas ao conhecimento científico construído historicamente pela humanidade.
Ademais, está presente a perspectiva histórica e epistemológica sobre a natureza dos
objetos e conceitos científicos das Ciências da Natureza, sob o viés da Biologia, Física e
Química. Tratando-se de uma disciplina pertencente ao PPGECM, há o diálogo com as
discussões relacionadas à formação de professores e aos processos de ensino-
aprendizagem (PPGECM, 2019).
O enfoque temático dado à disciplina voltou-se para o contexto histórico e sua
influência na construção do conhecimento científico. Na busca da compreensão do que
caracteriza a atividade científica, é necessário entender sua circunscrição na história
humana. Para compreender seus signos, seus conceitos, seus métodos, sua sistematicidade
é preciso analisar sua construção ao longo de sua historicidade.
A ciência como atividade humana está em constante transformação, pois está

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intrinsecamente ligada ao contexto histórico em que está inserida. À medida que o


conhecimento avança, produz novos conhecimentos, pois expande suas fronteiras
(ANDERY et al., 2012). Desmistificar a ideia de uma ciência única, ingênua e a-histórica,
permite-nos entender não somente seu passado, mas seu presente e para onde caminha. O
fazer científico é carregado de dimensões e a forma como estas são apresentadas modifica
a forma como compreendemos os modos de fazer ciência na relação com os respectivos
objetos de estudo.
Em relação à dinâmica das aulas, no primeiro momento era apresentado pelos
professores o conteúdo e, em seguida, o debate era aberto. Neste contexto, o tempo era
insuficiente para todos fazerem seus apontamentos, além de ser monótono. A
diversificação nas estratégias de ensino ajuda a estimular a participação, interesse e
aprendizado do aluno. Até como forma de verificar se houve a prévia leitura do material
disponibilizado, os professores podem solicitar a construção de mapas mentais,
tempestades de ideias no início da aula, problematizações a serem enviadas antes da aula
permitindo, assim, a participação do aluno que é tímido e não consegue expressar-se
oralmente.
Uma proposta avaliativa baseou-se numa revisão bibliográfica na Biblioteca
Digital Brasileira de Teses e Dissertações, realizada por grupos de discentes. Objetivou-se
investigar sobre a História e Filosofia das Ciências da Natureza (Física, Biologia e
Química) em relação ao seu Ensino e a sua Formação de Professores. Nesse viés, é
necessário variar as formas avaliativas, considerando a diversidade da turma, podendo ser
contínua e explicitar os critérios avaliativos.
Destaca-se a assiduidade e pontualidade dos professores do início ao término das
aulas como qualidades importantes. Os diálogos nas aulas fomentaram a importância dos
“cursos de formação de professores, pensar constantemente como a natureza da ciência
está apresentada no ensino básico e exercitar a criação de novas formas de ensinar, que se
contraponham ao modelo de educação científica vigente” (SANTOS et al., 2020, p. 137).
As referências indicadas para leitura e discussão durante as aulas contemplam os
conteúdos propostos na ementa, transitando pelas ciências biológicas, física e química.
Partindo das leituras e discussões, propiciados pela disciplina, observa-se que a História da
Ciência é um complemento contextualizador e reflexivo (BELTRAN; SAITO;
TRINDADE, 2014), que pode auxiliar na compreensão das transformações conceituais,

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técnicas e da produção do conhecimento científico no decorrer da história. O uso dessa


abordagem no ensino dos conteúdos específicos de cada ciência (biologia, física, química)
tem um grande potencial formativo, pois permite a compreensão da essência dos conceitos
científicos, refletindo na materialização dos conteúdos e dos objetivos de ensino.
Apesar da importância proporcionada pela participação na disciplina, ainda há
obstáculos que dificultam a inserção da História e Epistemologia das Ciências da Natureza
na formação de professores. Silva (2006) aponta três barreiras que corroboram com o
exposto: a) a escassez de professores, que tenham uma formação adequada sobre a
abordagem; b) a ausência de materiais de estudo adequados e com qualidade; c) a redução
dessa abordagem em percepções equivocadas de gênios cientistas isolados, anedotas e a
linearidade do fazer ciência.

CONCLUSÃO
Ressalta-se a relevância da disciplina em nossa formação acadêmica, visto a
essencialidade dessa abordagem histórica, social e política para a compreensão dos fatos e
construção dos conhecimentos científicos. Percebe-se a reconstrução de conceitos e
significados ao compreender, discutir e pesquisar sobre a inserção da História e Filosofia
das Ciências na Educação Básica e na Formação de Professores. Posto que, durante a
graduação, havia predominância dos conteúdos específicos em detrimento dessa
abordagem contextualizada.
Como sugestões a serem avaliadas, elencamos algumas observações, como o
número expressivo de alunos em uma turma de pós-graduação, prejudicando a participação
efetiva de todos os alunos, essencialmente, aqueles com dificuldades em participar
oralmente. A importância em diversificar as estratégias de ensino e as avaliações, além de
explicitar os critérios que serão contemplados no processo formativo para respeitar a
heterogeneidade dos sujeitos.
Tais reflexões visam o feedback para os professores repensarem a estrutura e
reorganização da disciplina com intuito de uma melhoria na proposta de ensino na próxima
vez em que for ofertada. A importância maior deste relato é contribuir de forma
significativa com formação continuada dos futuros discentes e com o PPG.
Face ao exposto, a experiência revela o grande potencial das discussões na
formação de professores e pesquisadores, pois ao adquirir essa abordagem histórica-

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epistemológica da ciência específica (biologia, física, química) conseguimos ressignificar


os conteúdos e conceitos científicos tornando-os mais significativos. Portanto, fica nítida a
importância dessa formação nos cursos de licenciatura e na pós-graduação, a fim de evitar
discursos equivocados sobre o saber científico. Assim, criam-se as possibilidades de
fomentar planejamentos didático-pedagógicos contextualizados, críticos e que evidenciem
as transformações e dinâmicas dos conceitos científicos, dos modos de pensar e fazer
ciência.

REFERÊNCIAS

ANDERY, M. A. P. A. et al. (org). Para compreender a ciência: uma perspectiva


histórica. 4 ed. São Paulo: Garamond Universitária, 2012.

BELTRAN, M. H. R.; SAITO, F.; TRINDADE, L. dos S. P. História da Ciência para


Formação de Professores. São Paulo: Ed. Livraria da Física, 2014.

GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

MUSSI, R. F. de F.; FLORES, F. F.; ALMEIDA, C. B. de. Pressupostos para a elaboração


de relato de experiência como conhecimento científico. Práxis Educacional, [S. l.], v. 17,
n. 48, p. 60-77, 2021. DOI:10.22481/praxisedu.v17i48.9010. Disponível em:
https://periodicos2.uesb.br/index.php/praxis/article/view/9010 . Acesso em: 11 jan. 2022.

NASCIMENTO, A. F.; SOUZA, D. C.; CARNEIRO, M. C. O conhecimento biológico nos


documentos curriculares nacionais do Ensino Médio: uma análise histórico-filosófica a
partir dos estatutos da biologia. Investigações em Ensino de Ciências, v. 16, n. 2, p. 223-
232 (primeira parte), 2011.

SANTOS, B. C. dos; FARIA, G. P. de; PAIVA, E. H. S.; GUIMARÃES, S. S. M.; FARIA,


F. P. de. Na trilha da radiação: a produção de um jogo pedagógico a partir da prática como
componente curricular. Revista de Ensino de Ciências e Matemática, v. 11, n. 5, p. 132-
145, 8 ago. 2020. Disponível em:
https://revistapos.cruzeirodosul.edu.br/index.php/rencima/article/view/2695 Acesso em: 10
jan. 2022.

SILVA, C. C. (Org.). Estudos de História e Filosofia das Ciências: subsídios para a


aplicação no ensino. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2006.

PPGECM-UFG. Disciplinas: ementas e bibliografia. 2017. Disponível em:


https://ppgecm.prpg.ufg.br/p/1102-disciplinas-ementas-e-bibliografia. Acesso em: 12 jan.
2022.

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