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2º EnECI – Encontro de Ensino de Ciências por

Investigação
25 a 27 de maio de 2020
AULAS EXPERIMENTAIS EM TURMAS DIVIDIDAS: FACILITADORAS DO ENSINO
POR INVESTIGAÇÃO
Márcia Fernandes Pinheiro Hara1 , Érica Maria Nascimento Dias2, Fernanda Bassoli
Rosa3, Thamiris Dornelas de Araújo4
1 Colégio de Aplicação João XXIII da UFJF/Departamento de Ciências Naturais/marciapinheiro.hara@ufjf.br
2
Colégio de Aplicação João XXIII da UFJF/Departamento de Ciências Naturais/ericamjf@gmail.com
3
Colégio de Aplicação João XXIII da UFJF/Departamento de Ciências Naturais/ fernanda.bassoli@ufjf.edu.br
4
Colégio de Aplicação João XXIII da UFJF/Departamento de Ciências Naturais/ thamiris.dornelas@ufjf.edu.br

INTRODUÇÃO
As pesquisas em didática das ciências têm apontado para a necessidade de se superar o
reducionismo conceitual do ensino de ciências a partir de uma aproximação à investigação
científica em seus aspectos conceituais, procedimentais, axiológicos e epistemológicos
(CACHAPUZ et al., 2005). Entendemos como atividades experimentais as “tarefas
educativas que requerem do estudante a experiência direta com o material presente
fisicamente, com o fenômeno e/ou com dados brutos obtidos do mundo natural ou social”
(ANDRADE; MASSABNI, 2011, p. 840). Nessa perspectiva, defendemos que as atividades
práticas sejam planejadas de modo a propiciar diferentes formas de interatividade dos
estudantes com os objetos e fenômenos, bem como entre os próprios estudantes e seus
professores.

Dentre as diferentes “modalidades” de atividades práticas (aulas demonstrativas,


experimentos descritivos e aulas investigativas) (CAMPOS; NIGRO, 1999) as aulas com
caráter investigativo apresentam maior potencialidade em contribuir para o
desenvolvimento da cultura científica, uma vez que se caracterizam por envolver discussão
de ideias, elaboração de hipóteses explicativas e teste de hipóteses, exigindo grande
participação do aluno durante sua execução (CAMPOS; NIGRO, 1999).

Nessa direção, a Base Nacional Comum Curricular, BNCC (BRASIL, 2017), na área de
Ciências da Natureza, visa assegurar aos alunos do Ensino Fundamental o acesso à
diversidade de conhecimentos científicos produzidos ao longo da história, bem como a
aproximação gradativa aos processos, práticas e procedimentos da investigação científica.
Segundo este documento, é imprescindível que os alunos sejam progressivamente
estimulados no planejamento e na realização cooperativa de atividades investigativas.
Com esse intuito, mobilizamo-nos na busca por estratégias para promover maior inserção
de nossos alunos na cultura científica e apresentaremos neste trabalho uma das ações
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que estamos desenvolvendo no Colégio de Aplicação João XXIII da Universidade Federal
de Juiz de Fora (CAp) que consiste em um projeto de aulas experimentais com turmas
divididas.

METODOLOGIA

O projeto foi desenvolvido de forma colaborativa pelo grupo de professor@s de Ciências e


Biologia do CAp em 2018 e está voltado para o ensino de ciências no segundo segmento
do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano). Embora o CAp possua uma excelente infra-
estrutura com biblioteca, laboratórios de Química, Física e Biologia e infocentro,
percebemos que a presença de mais de trinta alunos simultaneamente no Laboratório,
tornava as aulas práticas pouco produtivas, não favorecendo a interação dos alunos entre
si, com @s professor@s e também com os experimentos e equipamentos,
comprometendo o engajamento intelectual e a construção de conceitos. Dessa forma, o
projeto foi desenvolvido pela equipe, com o intuito de melhorar a organização e
potencializar a aprendizagem de conceitos, procedimentos e atitudes, neste tipo de aula.
As turmas são divididas em dois grupos para a realização destas aulas, de modo que
enquanto um grupo faz as atividades práticas no laboratório com @ professor/a regente da
turma, o outro grupo desenvolve atividades paralelas em sala de aula, previamente
elaboradas pel@ professor/a regente e aplicadas por outr@ professor/a de ciências,
chamad@ de professor /a de apoio. Na semana seguinte, os grupos se invertem e @
professor/a regente leva a segunda metade da turma ao laboratório, enquanto @
professor/a de apoio desenvolve em sala as atividades preparadas pel@ regente.

A metodologia adotada pelo grupo é a pesquisa-ação colaborativa (IBIAPINA, 2008) que


associa duas dimensões da pesquisa em educação que consideramos fundamentais: a
produção de saberes e a formação continuada de professores, possibilitando a realização
de estudos e propostas de intervenção a partir de situações práticas, que aliam teoria,
prática, pesquisa, reflexão e ação a partir de um trabalho colaborativo entre os docentes
com o propósito de transformar as escolas em comunidades críticas de professores que
problematizam, pensam e reformulam práticas tendo em vista a emancipação profissional.
Segundo a autora, a pesquisa-ação colaborativa parte de três condições básicas: o estudo
é desencadeado a partir de determinada prática social suscetível de melhoria; é realizado
levando-se em conta a espiral de planejamento, ação, observação, reflexão, nova ação; é
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desenvolvido, preferencialmente, de forma colaborativa. Desta forma, apresentaremos a
seguir algumas reflexões sobre o desenvolvimento do projeto.

RELATO DE EXPERIÊNCIA

O projeto consiste na realização de aulas experimentais mensais com as turmas divididas


em dois grupos de cerca de quinze alunos, oferecendo aos alunos a oportunidade de
observar, experimentar, criar hipóteses e testá-las nas aulas de ciências, bem como de
discutir em pequenos grupos os resultados dos experimentos e atividades (BASSOLI et al.,
2020). Desse modo, o professor passa a ter maior controle sobre o manuseio do material,
de forma a garantir a segurança com relação ao desenvolvimento do procedimento
experimental e torna a relação professor-aluno mais próxima, facilitando a mediação das
discussões e estimulando a participação mais efetiva de cada aluno em todo o processo.
Segundo Pereira (2010), a ajuda pedagógica do professor é essencial para que haja
intervenções e proposições que contribuam para os processos interativos e dinâmicos que
caracterizam a prática experimental de ciências. O autor também defende que essa
mediação do professor deve extrapolar a observação empírica, problematizando,
tematizando e contextualizando o experimento.

Por meio do projeto foi possível estabelecer uma rotina de aulas no laboratório e,
principalmente, garantir aos alunos uma maior interação com os experimentos, com @s
professor@s e com os demais estudantes durante as atividades experimentais,
potencializando o processo de aprendizagem de conceitos, procedimentos e atitudes e
contribuindo para o letramento científico.

As aulas experimentais desenvolvidas no CAp João XXIII têm sido pautadas pelo estímulo
ao interesse e à curiosidade científica, no sentido em que possibilitam aos estudantes
definir problemas, levantar hipóteses, analisar e representar os resultados, comunicar
conclusões e propor intervenções. Desta forma, buscamos estimular a curiosidade dos
alunos, contribuindo para a sua alfabetização científica num aspecto amplo que envolva,
além da apreensão contextualizada de conceitos, o desenvolvimento de atitudes voltadas
para a colaboração e transformação social.

Outro aspecto importante, no que tange à organização e execução das atividades práticas,
está na preocupação em replicar os experimentos de forma que os alunos possam, eles
mesmos, manusear os equipamentos, o material e realizar o experimento em grupos. Esse
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procedimento estimula o trabalho em equipe e promove a construção coletiva do
conhecimento. Após discussão e registro das observações nos grupos, os alunos são
estimulados a expor oralmente seus questionamentos e hipóteses, o que favorece não só
o trabalho em equipe, mas também a colaboração entre equipes. Segundo Giordan (1999),
a formação de um espírito colaborativo de equipe pressupõe uma contextualização
socialmente significativa para a aprendizagem, tanto do ponto de vista da problematização
quanto da organização do conhecimento científico.

Os roteiros de aulas práticas elaborados pel@s professor@s de Ciências da Natureza do


CAp João XXIII inserem-se neste contexto, na medida em que abrem espaço para que os
estudantes registrem suas observações (por escrito ou por meio de ilustrações), após
discussão em grupo do que foi observado. A seguir, eles respondem a questionamentos
elaborados pel@ professor/a para desafiá-los, com reflexão e elaboração de hipóteses,
com foco na construção do conhecimento. O projeto tem gerado um acervo de aulas
experimentais, as quais estão sendo disponibilizados on line, por meio da por meio da
criação de um site (www.ufjf.br/ciensinar), em que estão sendo socializados também
vídeos sobre experimentação, jogos e relatos de experiência produzidos pelo grupo. Cabe
destacar que dois desses relatos estão sendo apresentados nesse evento com os
seguintes títulos: “Quem contaminou a minha sopa? Uma abordagem investigativa para a
compreensão do surgimento dos microrganismos” e “Do macro ao micro: Desafios na
construção de uma sequência didática sobre biologia celular e histologia por meio do
ensino por investigação.

Por fim, vale ressaltar a participação de estagiários dos cursos de licenciatura em Ciências
Biológicas e Química, bem como de bolsistas do Programa Institucional de Iniciação à
Docência (PIBID), os quais têm contribuído para qualificar ainda mais o projeto, como
também têm sido beneficiados com os conhecimentos construídos a partir do planejamento
de atividades e das interações estabelecidas com os estudantes e com @s professor@s.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diversos saberes vêm sendo construídos a partir do trabalho colaborativo d@s


professor@s envolvidos, visto que a necessidade de criar, refletir e adaptar a prática
pedagógica leva à incessante troca de experiências e saberes e motiva o grupo na busca
por novos conhecimentos, metodologias e recursos que viabilizem um trabalho mais
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coeso, no qual haja interlocução entre os saberes construídos em todas as séries finais do
ensino fundamental. Tais construções já são percebidas pelos alunos, que tem trazido
relatos e memórias de atividades investigativas realizadas através do projeto que
impactaram a construção de determinados conhecimentos, além de a experiência para
além das paredes da sala de aula e das metodologias convencionais ser lembrada pela
maioria deles como o destaque mais positivo das aulas de ciências nos últimos dois anos.

Pode-se destacar como frutos deste trabalho o fortalecimento e consolidação das


feiras de ciências e matemática realizada no colégio anualmente, na qual se observa o
crescente distanciamento dos alunos da apresentação de demonstrações prontas,
frequentemente limitadas a experiências descontextualizadas da realidade social, cultural e
dos interesses da comunidade escolar. A principal motivação para a escolha de temas de
trabalho específicos têm sido a necessidade de reflexão e/ou intervenção sobre desafios
reais, percebidas na comunidade em que os alunos residem, na própria escola ou, de
modo mais amplo, na sociedade. Dessa forma, os estudantes são estimulados a observar,
pesquisar, refletir e propor soluções viáveis para os problemas observados.

À medida que os alunos beneficiados pelo projeto progridem ao longo dos anos
finais do ensino fundamental, ou mesmo deixam-no, prosseguindo para o Ensino Médio,
será possível efetuar levantamentos de informações mais concisas sobre a maneira pela
qual os saberes elegidos como fundamentais, nas aulas investigativas, têm impactado a
construção de outros conhecimentos nestes ancorados. A partir da identificação dos
aspectos de maior sucesso na aprendizagem, ou mesmo da constatação da necessidade
de adaptação/implementação de outras práticas, agrupam-se elementos importantes que
deverão consolidar uma cultura de investigação no CAp, permeando todos os segmentos e
garantindo o oferecimento de um ensino de ciências da natureza sólido e conectado às
mudanças sociais, permitindo ao aluno a concreta propriedade de aplicação do
conhecimento científico, na compreensão e intervenção nas questões cotidianas.

Área Temática AT 1: Materiais e estratégias para o desenvolvimento de atividades


investigativas.
Palavras-chave: Ensino por Investigação. Atividades práticas. Cultura Científica.
Letramento Científico.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRADE, M. L. F. D.; MASSABNI, V. G. O desenvolvimento de atividades práticas na escola: um desafio
para os professores de ciências. Ciência & Educação (Bauru), v. 17, n. 4, p. 835-854, 2011. ISSN 1516-
7313. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ciedu/v17n4/a05v17n4.pdf Acesso em: 06 mar. 2020.
BASSOLI, F. et al. Desenvolvimento de um projeto de implementação de aulas experimentais no Colégio de
Aplicação João XXIII (UFJF): implicações para o ensino, a pesquisa e a extensão. Cadernos do Aplicação
(porto Alegre), v. 32, n. 1, p. 115-122, 2020.
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Brasília: MEC. 2017. Disponível em:
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf. Acesso em: 06
mar. 2020.
CACHAPUZ, A. et al. A necessária renovação do ensino das ciências: São Paulo: Cortez 2005.
CAMPOS, M. C. D. C.; NIGRO, R. G. Didática de ciências: o ensino-aprendizagem como investigação. São
Paulo: FTD, v. 199, 1999.
GIORDAN, M. O papel da experimentação no ensino de ciências. Química nova na escola, v. 10, n. 10, p.
43-49, 1999.
IBIAPINA, I. M. L. D. M. Pesquisa colaborativa: investigação, formação e produção de conhecimentos.
Brasília: Líber Livro Editora, v. 1, 2008.
PEREIRA, B. B. Experimentação no ensino de ciências e o papel do professor na construção do
conhecimento. Cadernos da FUCAMP, v. 9, n. 11, 2010. ISSN 2236-9929. Disponível em:
http://www.fucamp.edu.br/editora/index.php/cadernos/article/view/176. Acesso em: 06 mar. 2020.

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