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Renan M. Mezabarba1
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1 Sugestões,
correções ou reclamações são bem vindas. Tem alguma(s)? Se sim, peço que as
envie para o endereço eletrônico: rmmezabarba@gmail.com.
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Prefácio
O presente texto foi elaborado a fim de servir como suporte adicional para a disciplina
Álgebra II (MAT06564), ministrada no primeiro semestre de 2020, para o curso de Ma-
temática da UFES (campus de Goiabeiras). Embora as referências oficiais [2] e [3] cubram
todos os tópicos abordados na disciplina, elas o fazem numa ordem diferente, o que pode
dificultar o estudo dos leitores 1 da Geração Z. Assim, em último caso, aquele 2 que preferir
os clássicos nacionais supracitados pode considerar o presente texto como um guia para
selecionar quais tópicos estudar.
1
Nas frequentes ocasiões em que eu me refiro à pessoa que lê, eu escrevo “leitor”. Embora, a rigor,
tal termo pressuponha o gênero masculino (o leitor ), eu o escrevo pensando em the reader, que não
tem gênero em inglês. Tal grafia está de acordo com as regras do Português para o tratamento neutro
(são regras machistas? Possivelmente sim! O que não é?!) e, infelizmente, ainda sou escravo da estética
imposta pela gramática oficial. Por isso, peço sinceras desculpas para a pessoa que, ao ler tais termos, se
sentir ofendida.
2
Veja a nota-de-rodapé anterior.
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Also known as, i.e., também conhecido como.
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Sumário
Prefácio 5
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1.2.3 A caracterı́stica dos anéis e o Teorema dos Restos
1.3 Anéis de polinômios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
1.3.1 A dolorosa construção de A[x] (± opcional) . . .
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1.3.2 O anel de polinômios para leitores pragmáticos . . . . . . . . . . . 36
1.4 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
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2 Tecnicalidades polinomiais 49
2.1 Polinômios sobre domı́nios e corpos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
2.1.1 O algoritmo da divisão revisitado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51
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3 Yoga algébrica 87
3.1 Algebricidade e transcendência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88
3.1.1 Finitude = algebricidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
3.1.2 Opcional: o fecho algébrico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 94
3.2 Extensões finitas dos racionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 98
3.2.1 O Teorema do Elemento Primitivo (versão baby) . . . . . . . . . . . 98
3.2.2 O Teorema do Elemento Primitivo (incompleto, leitura não reco-
mendada) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100
3.2.3 Construções com régua e compasso . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
3.3 Exercı́cios da seção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
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8 SUMÁRIO
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Capı́tulo 1
Neste capı́tulo seremos apresentados aos protagonistas do curso: anéis e seus morfismos.
No texto de Adilson Gonçalves [3], tais tópicos são tratados nos Capı́tulos 3 e 4 (embora
alguns exemplos particulares sejam abordados secretamente em capı́tulos anteriores), en-
quanto o Capı́tulo 1 do material de Garcia e Lequain [2] cobre, a menos de ordem, quase
tudo o que veremos.
sabemos que existem duas operações, a adição (ou soma, indicada por +) e a multiplicação
(ou produto, indicado por ·) definidas em X, que se comportam de maneira relativamente
bem, no seguinte sentido:
• a adição é comutativa, i.e., x + y = y + x para quaisquer x, y ∈ X;
• a adição é associativa, i.e., x + (y + z) = (x + y) + z para quaisquer x, y, z ∈ X;
• a adição tem um elemento neutro, i.e., existe 0 ∈ X tal que 0 + x = x + 0 = x
para todo x ∈ X;
• todo elemento de x ∈ X admite um inverso aditivo1 , i.e., existe y ∈ X tal que
x + y = y + x = 0;
• a multiplicação é associativa, comutativa e tem elemento neutro denotado por 1;
• adição e multiplicação são compatı́veis entre si, i.e., ocorre
x · (y + z) = (x · y) + (x · z) e (x + y) · z = (x · z) + (y · z)
para quaisquer x, y, z ∈ X, o que costuma ser abreviado dizendo que adição e mul-
tiplicação satisfazem a distributividade.
1
Ou simétrico.
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10 CAPÍTULO 1. A CATEGORIA DOS ANÉIS
Exemplo 1.1.1 (Matrizes). Para X como um dos conjuntos numéricos com os quais
iniciamos esta seção, consideremos as matrizes de ordem n e coeficientes em X, com
n ∈ N e n > 0, e chamemos por Mn (X) a coleção de todas elas. Intuitivamente, uma
matriz A ∈ Mn (X) consiste de uma tabela de n linhas e n colunas, tal que para cada
i, j ∈ {1, . . . , n} corresponde um elemento αij ∈ X na célula localizada na i-ésima linha
da j-ésima coluna, de modo que escrevemos A ..= (αij ) – ou, em contextos mais pedantes,
A ..= (αij )1≤i,j≤n .
Por exemplo, para n ..= 3 e X ..= Z, a matriz
0 2 −1
A ..= −7 8 4
0 1 9
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matrizes (αij ), (βij ) ∈ Mn (X), denotaremos a soma de tais matrizes por (αij ) ⊕M (βij ),
que naturalmente é definida como
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(αij ) ⊕M (βij ) ..= (αij + βij ),
o que abrevia a receita de que a célula da i-ésima linha da j-ésima coluna tem coordenada
αij + βij . Por sua vez, o produto entre as matrizes (αij ) e (βij ) será denotado (por
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enquanto) como (αij ) M (βij ), cuja definição, um pouco mais enfadonha, ainda é a mesma
de sempre: !
n
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X
(αij ) M (βij ) ..= αik βkj
k=1
Um exercı́cio tı́pico de Álgebra Linear consiste em verificar que a maioria das pro-
priedades listadas antes de começarmos este exemplo se verifica para as operações ⊕M e
M . Em particular, a matriz nula (0ij ) (em que todas as células assumem valor 0) e a
matriz identidade Idn ..= (δij ) (onde δij ..= 1 se i = j e δij = 0 caso contrário)4 são,
respectivamente, os elementos neutros da adição e da multiplicação de matrizes. O leitor
não deve ter dificuldades em notar que isso foi uma sugestão implı́cita de exercı́cio5 . •
2
Pode ser interessante pesquisar sobre as contendas entre o formalismo e o platonismo, duas correntes
de pensamento da Filosofia Matemática.
3
Ou, equivalentemente (para efeitos de memória), no Ensino Médio.
4
Talvez uma das contribuições mais conhecidas de Kronecker.
5
Por exemplo, a multiplicação é associativa pois, para (αij ), (βij ), (γij ) ∈ Mn (X), temos
n n
! n n
! !
X X X X
(αij ) M ((βij ) M (γij )) = αil βlk γkj = αil βlk γkj = ((αij ) M (βij )) M (γij ).
l=1 k=1 k=1 l=1
Tome quanto tempo for necessário para refletir sobre as igualdades acima.
1.1. O ADVENTO DOS ANÉIS 11
O leitor atento pode ter a impressão de que a descrição acima generaliza o que fizemos
no exemplo anterior. Isso não está completamente errado: ao tomarmos o conjunto
S ..= {1, . . . , n} × {1, . . . , n}, podemos pensar numa função f : S → X como sendo a
matriz (f (i, j))ij . Com tal identificação, a operação de soma em F(S, X) é, em certo
sentido, idêntica à soma de Mn (X). Porém, o mesmo não ocorre com a multiplicação7 .
Ainda assim, as operações que definimos em F(S, X) apresentam todas as propriedades
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listadas no começo desta seção. Como ilustração, note que para f, g, h ∈ F(S, X), para
s ∈ S qualquer temos
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((f ⊕F g) F h)(s) = (f ⊕F g)(s) · h(s) = (f (s) + g(s))h(s) = (f (s)h(s)) + (g(s)h(s)) =
= ((f F h) ⊕F (g F h))(s),
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Exemplo 1.1.3 (Conjuntos). Vamos considerar um caso que não é oriundo do contexto
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numérico. Fixado um conjunto S de sua preferência, vamos denotar por ℘(S) a coleção de
todos os subconjuntos de S, i.e., ℘(S) ..= {A : A ⊆ S}, o qual frequentemente é xingado
de conjunto das partes. Embora, a princı́pio, ℘(S) não tenha qualquer relação com
números, podemos usar as operações de interseção (∩) e reunião (∪) para mimetizar um
comportamento algébrico sobre ℘(S).
A operação de interseção em ℘(S) nos dá uma imitação da multiplicação. De fato,
para A, B e C subconjuntos quaisquer de S, se verifica:
X A ∩ B = B ∩ A,
X A ∩ (B ∩ C) = (A ∩ B) ∩ C,
X A ∩ S = S ∩ A = A,
6
As notações para este animal costumam variar de acordo com o contexto. Por exemplo: XS , S X e
Set(S, X) são algumas alternativas que o leitor pode ter o desprazer de encontrar.
7
Isso ficará claro futuramente. Mas veja que enquanto a multiplicação em F(S, X) é feita coordenada-
à-coordenada, o mesmo não ocorre com Mn (X).
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Quando duas funções são iguais? A menos de contextos muito especı́ficos, é seguro dizer que F e G
são iguais se, e somente se, ambas têm o mesmo domı́nio D e F (x) = G(x) ocorre para todo x ∈ D.
12 CAPÍTULO 1. A CATEGORIA DOS ANÉIS
afirmações que devem ser verificadas pelo leitor que não as considerar evidentes 9 . En-
quanto as duas primeiras dizem que ∩ é comutativa e associativa, respectivamente, a
última diz que S é um elemento neutro da interseção.
Para deixar as coisas nos mesmos moldes que temos visto, precisamos de uma operação
em ℘(S) que cumpra o papel de adição. É bem provável que a ansiedade da vida moderna
leve o leitor afoito a conjecturar que a operação de reunião ∪ realize tal missão, já que,
para A, B, C ⊆ S quaisquer se tem
X A ∪ B = B ∪ A,
X A ∪ (B ∪ C) = (A ∪ B) ∪ C, e
X A ∪ ∅ = ∅ ∪ A = A;
A ∩ (B ∪ C) = (A ∩ B) ∪ (A ∩ C). (1.1)
Ainda assim, uma adição que se preze precisa garantir um inverso aditivo. Em outras
palavras, para cada subconjunto A ⊆ S, deveria existir algum B ⊆ S tal que A∪B = ∅. A
fim de remediar a situação, introduzimos a chamada diferença simétrica: para A, B ⊆ S,
a diferença simétrica entre A e B é o subconjunto 20
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A ∆ B ..= (A \ B) ∪ (B \ A) (1.2)
Todos os exemplos acima sugerem que existe muita coisa tipicamente algébrica es-
condida em ambientes aparentemente especı́ficos. Naturalmente, alguém muito focado
pode achar mais interessante estudar um objeto particular... no entanto, a depender do
objetivo do estudo, podemos optar por avaliar as consequências das propriedades que
listamos. O benefı́cio dessa abordagem? Simples: objetos com as mesmas propriedades
devem necessariamente partilhar das mesmas consequências11 , dado que elas decorrem
das propriedades e não dos objetos em si.
a ⊕ b = b ⊕ a = 0A .
a (b ⊕ c) = (a b) ⊕ (a c) e (a ⊕ b) c = (a c) ⊕ (b c),
para quaisquer a, b, c ∈ A.
Acima, não exigimos que a multiplicação do anel A seja comutativa pois, even-
tualmente, isso não acontece. Nas felizes ocasiões em que a multiplicação do anel A é
comutativa, dizemos que o anel A é (surprise, suprise! ) comutativo.
Também não exigimos que a existência de elemento neutro para a multiplicação pois,
eventualmente, ele não existe. Nas felizes ocasiões em que o anel A tem um elemento
neutro multiplicativo, dizemos que A é um anel com unidade.
Apesar de eventualmente podermos esbarrar com anéis não-comutativos ou sem uni-
dade, o nosso objetivo ao longo deste curso é desenvolver minimamente o estudo dos
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anéis comutativos e com unidade. Embora os demais tipos de estrutura sejam indiscuti-
velmente interessantes, a falta de hipóteses torna o seu tratamento bem mais delicado, o
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que costuma exigir um público mais devoto.e masoquista
Exemplo 1.1.4. O leitor não deve ter dificuldade em aceitar que Z, Q, R e C são todos
anéis comutativos e com unidade quando considerados com suas operações usuais. O
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mesmo vale para os conjuntos F(S, X) e ℘(S) dos Exemplos 1.1.2 e 1.1.3, munidos com
as operações lá definidas. Em particular, se trocarmos X por um anel comutativo e com
unidade A, então F(S, A) ainda é uma anel comutativo e com unidade. •
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Exemplo 1.1.5. O conjunto Mn (X) das matrizes de ordem n (Exemplo 1.1.1), dotado
das operações de soma e produto, é um anel com unidade, não-comutativo se n ≥ 2. O
mesmo continua valendo se trocarmos X por qualquer anel comutativo e com unidade A
razoável : Mn (A), o anel das matrizes de ordem n com coeficientes em A, é um anel e
com unidade – não-comutativo se n ≥ 2. Como deve ser um anel A capaz de assegurar a
comutatividade de M2 (A)? •
Exemplo 1.1.6 (Patológico). Considere 2Z ..= {2z : z ∈ Z} o conjunto dos múltiplos
inteiros de 2. Note que para 2x, 2y ∈ 2Z temos 2x + 2x, 2x · 2y ∈ 2Z. Podemos então
definir operações de soma e produto em 2Z fazendo
Por Z já ser um anel comutativo de fábrica, não é difı́cil se convencer de que as
operações ⊕ e acima tornam 2Z um anel comutativo. No entanto, 2Z não tem elemento
neutro multiplicativo: de fato, supondo que 2e ∈ 2Z seja elemento neutro, deveria ocorrer
2e 2x = 2x para todo x ∈ Z; porém, para x ..= 1, terı́amos
2e (2 · 1) = 2 · 1 ⇒ 2e · 2 = 2 ⇒ 4e = 2,
1
o que, neste caso, só é possı́vel para e = , que não pertence a Z. •
2
14 CAPÍTULO 1. A CATEGORIA DOS ANÉIS
Observação 1.1.7. Apesar do exemplo acima, em nosso contexto será MUITO MAIS
NATURAL tratar 2Z como um ideal de Z do que como um subanel. Por isso vale frisar
novamente: tratou-se apenas de um exemplo patológico. 4
Exemplo 1.1.8 (Menos patológico). Seja L0 o conjunto das funções da forma f : R → R
satisfazendo
lim f (x) = lim f (x) = 0.
x→+∞ x→−∞
apenas “ab” para indicar “a · b”, costume já difundido desde tempos imemoriais).
Proposição 1.1.10. Se X é um conjunto e ∗ é uma operação em X, então existe no
máximo um elemento e ∈ X tal que
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∀x ∈ X x ∗ e = e ∗ x = x.
então tal b é o único a fazer isso. Em tal caso, denotaremos b por a−1 ou , o qual será
a
chamado de inverso multiplicativo de a. Num claro exemplo de irresponsabilidade, é
muito comum chamar de unidades os elementos do anel que admitem inversos multiplica-
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∀α, β, γ ∈ Z γ 6= 0 e γα = γβ ⇒ α = β. (1.4)
Como diria Jack, O Estripador...
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ab = 0A ⇒ a = 0A ou b = 0A .
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equipado de fábrica com os elementos 0A e 1A , também conhecidos como o zero e o um
do anel. É irresistı́vel então nos indagarmos se também podemos definir 2A , 3A , 4A . . .
Naturalmente, isso pode ser feito recursivamente:
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• já temos 0A e 1A definidos;
(n + 1)A ..= nA + 1A .
UF
nA ..= 1A + . . . + 1A .
| {z }
n vezes
Uma vez feito isso, ficamos a apenas um passo de definir zA para z ∈ Z: para n ≥ 0,
definimos nA como acima e, de maneira similar, fazemos
• ϕ(−m) = −ϕ(m) para qualquer m ∈ Z: pois ϕ(−m) ..= (−m)A = −mA = −ϕ(m).
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Lema da Academia (Tengan, E.).
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Será por pouco tempo, não se preocupe!
18 CAPÍTULO 1. A CATEGORIA DOS ANÉIS
ϕ(2) = ϕ(1) ∆ X = X ∆ X = ∅.
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ϕ(3) = ϕ(2) ∆ X = ∅ ∆ X = X.
Observação 1.1.19. Explicitamente, o último exemplo nos mostrou que existem anéis
nos quais 1A + 1A = 0A . Isso não seria novidade no anel trivial com um elemento só, mas
num primeiro contato pode ser uma revelação chocante. Agora descanse um pouco. 4
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Dica: faça primeiro para m, n ≥ 0, argumentando por indução, depois analise os outros casos levando
em consideração a definição de zA para z ≥ 0 e z < 0.
1.1. O ADVENTO DOS ANÉIS 19
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para uma carteirada desleal: Bourbaki26 , ao tratar de anéis com unidade, também exige
que um morfismo de anéis f : A → B verifique f (1A ) = 1B . 4
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Exemplo 1.1.22. Independentemente do anel A (com unidade!) que consideremos, não
existem muitas opções de morfismo da forma f : Z → A. Primeiro, é claro que a função
ϕ : Z → A definida logo no começo desta subseção é um morfismo de anéis. Por sua
vez, se f : Z → A for outro morfismo, então devemos ter f (1) = 1A , pois esta é uma
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das exigências para ser um morfismo de anéis. Daı́, aplicações sucessivas da condição
f (x + y) = f (x) + f (y) nos levam à conclusão de que f (z) = ϕ(z) para todo z ∈ Z, i.e.,
f = ϕ.
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Teorema 1.1.23 (Propriedade universal de Z). Se A é um anel com unidade, então existe
um único morfismo de anéis ϕ : Z → A.
Esse tipo de afirmação ocorrerá com certa frequência ao longo do curso27 , mas ainda
é cedo para explorarmos isso com mais profundidade. Ainda assim, vale destacar que,
por ser único, o morfismo ϕ : Z → A está apto a receber uma notação especial: vamos
denotar ϕ por µA . •
De modo geral, se A e B são anéis com unidade28 tais que A ⊆ B, dizemos que A
é subanel de B precisamente quando a inclusão i : A ,→ B for um morfismo de anéis.
Equivalentemente, isto significa dizer que
• A 6= ∅ e 1A = 1B ,
• a − a0 ∈ A sempre que a, a0 ∈ A, e
pois, de tal forma, segue que a restrição das operações de B sobre o conjunto A faz dele
um anel com unidade e tal que a inclusão é um morfismo de anéis29 .
Um caso tı́pico de subanel ocorre ao tomarmos um morfismo de anéis f : A → B: a
imagem de f , i.e., o subconjunto
é um subanel de B (por quê?). Embora soe abstrato, isso sintetiza diversos exercı́cios
clássicos de Álgebra – principalmente depois que introduzirmos polinômios. Por exemplo,
1. Z[i] ..= {a + bi : a, b ∈ Z} ⊆ C,
√ √
2. Z 2 ..= a + b 2 : a, b ∈ Z ⊆ R, e
√
20
20
√
3. Q 3 ..= a + b 3 : a, b ∈ Q ⊆ R
são casos de subanéis (de C e R, respectivamente) que podem ser descritos como a imagem
de um morfismo de anéis – o que ainda não vimos, porém, é como descrever apropria-
ES
damente o domı́nio de tais morfismos30 . Apesar disso, nossas atuais limitações técnicas
não devem impedir o leitor de duvidar das afirmações acima e verificar, no braço, que
√ os
animais supracitados são subanéis dos anéis indicados – em particular, note que Q 3
UF
g ◦ f : A → C,
que faz g ◦ f (a) ..= g(f (a)) para todo a ∈ A, é um morfismo de anéis (por quê?).
Retomemos então a analogia estrutural sobre morfismos. Por pensarmos nos morfismos
como meios de comunicação entre anéis, é natural que, eventualmente, tenha-se uma via
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de mão dupla. Mais precisamente, dados anéis A e B, pode ser que existam morfismos
de anéis ϕ : A → B e ψ : B → A: o primeiro nos diz como B interpreta o que A diz,
enquanto o segundo nos diz como A interpreta o que B diz. Daı́, a ocasional ocorrência
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das identidades
ϕ ◦ ψ = IdB e ψ ◦ ϕ = IdA ,
significa, em certo sentido, que A e B afirmam exatamente as mesmas coisas do ponto de
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Em particular, fixado um conjunto S ..= {1, . . . , n}, existe uma bijeção natural en-
tre F(S, A) e o conjunto An das n-uplas (a1 , . . . , an ), onde ai ∈ A para cada i ∈ S:
fazemos cada f ∈ F(S, A) corresponder à n-upla (f (1), . . . , f (n)). A estrutura de anel
em An oriunda desse processo de osmose é aquela que o leitor já deve suspeitar: para
(a1 , . . . , an ), (b1 , . . . , bn ) ∈ An , temos
De tal isomorfismo, passa a fazer sentido confundir os anéis F(S, A) e An sempre que
|S| = n, onde |S| denota a cardinalidade do conjunto S. •
Exemplo 1.1.30. Os anéis M2 (Z) e Z4 não são isomorfos, embora a correspondência
α β
7 (α, β, γ, δ)
→
γ δ
seja uma bijeção. De fato, enquanto o segundo é comutativo, o primeiro não é. •
Exemplo 1.1.31 (Propriedades universais e isomorfismos). Provamos anteriormente que
se A é um anel com unidade, então existe um único morfismo de anéis µA : Z → A. Ao
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afirmamos que tal propriedade de Z o caracteriza a menos de isomorfismo, queremos dizer
o seguinte: se R for um anel com unidade tal que para todo anel com unidade A existe um
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único morfismo de anéis σA : R → A, então R e Z são isomorfos. Esse tipo de propriedade
costuma ser xingada de propriedade universal32 . Mas por que R deve ser isomorfo a
Z?
Pois bem, como para qualquer anel A existe um único morfismo de anéis Z → A,
ES
IdZ = ψ ◦ ϕ e IdR = ϕ ◦ ψ,
x = qn + r e y = q 0 n + r0 ,
com 0 ≤ r, r0 < n, então r = r0 se, e somente se, x − qn = y − q 0 n, o que por sua vez
equivale a dizer que x − y é divisı́vel por n.
24 CAPÍTULO 1. A CATEGORIA DOS ANÉIS
Neste estágio da vida, convém verificar que a relação de equivalência módulo n é,
realmente, uma relação de equivalência. Escrevendo x ≡n y para indicar que x e y são
equivalentes módulo n, temos:
X x ≡n x, pois x − x = 0 · n;
Exemplo 1.2.3. Para n ∈ N com n > 0 fixado, a discussão realizada no último exemplo
mostrou que para m ∈ Z, existem únicos q ∈ Z e r ∈ N tais que m = qn + r e 0 ≤ r < n.
Logo, existem precisamente n classes possı́veis de restos para a relação ≡n de equivalência
módulo n. Em particular, neste contexto, costuma-se denotar a classe de equivalência de
m ∈ Z por m, de modo que temos Z/ ≡n = {0, 1, . . . , n − 1}. Discutimos alguns exemplos
particulares na Seção de Exercı́cios. •
x y := x + y e x y := x · y (1.6)
Dizer que I é fechado por combinações A-lineares significa, precisamente, afirmar que
a ∈ I sempre que a for uma combinação A-linear de elementos de I. Temos então o
seguinte
Teorema 1.2.4. Nas notações acima, se I é fechado por combinações A-lineares, então
∼ é uma relação de equivalência sobre A. Além disso, as operações e estão bem
definidas e dão a A/I uma estrutura de anel, comutativo e com unidade.
X a ∼ a pois a − a = 0A ∈ I;
As operações sobre A/I estão bem definidas pois I é fechado por combinações A-
lineares: por exemplo, se x ∼ x0 e y ∼ y 0 , então (x + y) − (x0 + y 0 ) = (x − x0 ) + (y − y 0 ) ∈ I,
ES
Observação 1.2.5. Dizer que uma função está bem definida é um abuso de lingua-
gem. Na verdade, o que se costuma fazer é mostrar que uma relação binária satisfaz as
exigências para ser chamada de função. Um modo mais preciso de escrever (1.6) e que
ajuda a evidenciar a necessidade de verificar a boa definição é o seguinte: para α, β ∈ A/I,
vamos fazer α β ..= x + y, onde x e y são tais que x ∈ α e y ∈ β. Como a definição da
operação depende da escolha de representantes, poderia ser o caso de que um mesmo par
tivesse imagens distintas a depender do representante escolhido. Felizmente, vimos que
isso não ocorre. 4
Exemplo 1.2.6. Note que para n ∈ N, o subconjunto nZ ..= {nz : z ∈ Z} é fechado por
combinações Z-lineares. Observe que para n = 0, x ∼ y ocorre se, e somente se, x = y,
enquanto que para n > 0, x ∼ y ocorre se, e somente se, x ≡n y. Logo, a princı́pio temos
Z/0Z = {z : z ∈ Z} e Z/nZ = {0, . . . , n − 1} para n > 0. •
26 CAPÍTULO 1. A CATEGORIA DOS ANÉIS
Como ocorre na vida, a reunião de ideais não resulta necessariamente num ideal,
embora eles possam ser somados e multiplicados: se I, J ⊆ A são ideais de A, então
I + J := hI ∪ Ji, e IJ := h{ab : a ∈ I, b ∈ J}i. Convido o leitor interessado a descrever
explicitamente os habitantes de I + J e IJ.
Aprendemos ao longo da História da Civilização que existem muitos tipos diferentes de
ideais. Naturalmente, o mesmo ocorre na álgebra: para I ⊆ A um ideal próprio (I 6= A),
dizemos que
1. I é um ideal primo se uma das duas condições (equivalentes!) a seguir é satisfeita:
20
(b) para J, J 0 ⊆ A ideais de A, JJ 0 ⊆ I implica J ⊆ I ou J 0 ⊆ I;
mente inócua
Proposição 1.2.7. Seja I ⊆ A um ideal.
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a · b = ab = 0A ⇔ ab ∈ I,
a · b = 1A ⇔ ab − 1A ∈ I.
(i) n é primo;
20
(iii) Z/nZ é domı́nio;
20
(ii) hni é primo; (iv) Z/nZ é corpo.
De fato, é bom lembrar que um número inteiro p ∈ Z \ {1} é primo se seus únicos
ES
de (ii) ⇔ (iii), resta tratarmos do item (iv): claramente (iv) ⇒ (iii); agora, se Z/nZ é
domı́nio com n > 0, então Z/nZ é necessariamente finito, o que implica (iv) em virtude
do próximo
não pode ser infinita, donde segue que existe n ∈ N com hdn+1 i = hdn i, acarretando
dn = αdn+1 para algum α e, consequentemente, dn (1A − αd) = 0A . Enfim, por D ser
domı́nio, temos dn 6= 0A e, por falta de opção, αd = 1A , como querı́amos.
Costuma ser pedagogicamente edificante observar Z/nZ para n composto (i.e., não-
primo): note que para n ..= 6 e 2, 3 ∈ Z/6Z, temos 2, 3 6= 0, mas 2 · 3 = 6 = 0, mostrando
que Z/6Z tem divisores não-triviais de zero. •
35
Você pode provar no braço, o que não é difı́cil, ou esperar o Teorema do Isomorfismo, que veremos
já já.
36
A notação ±α é apenas um modo preguiçoso de escrever α ou −α. Podem me julgar.
28 CAPÍTULO 1. A CATEGORIA DOS ANÉIS
Demonstração. Existência: basta definir f : A/I → B fazendo f (a) = f (a), que está bem
definido pois I ⊆ ker f , e claramente satisfaz as condições para ser morfismo de anéis.
Unicidade: se ρ : A/I → B também satisfaz ρ ◦ π = f , então ρ ◦ π(a) = f (a), ou seja,
ρ(a) = ρ(π(a)) = f (a) = f (a).
20
Corolário 1.2.12 (Teorema do Isomorfismo, para anéis). Se f : A → B é um morfismo
de anéis, então A/ ker f ' im (f ).
20
Demonstração. Fazendo I = ker f na proposição anterior, obtemos o único morfismo
ker f → B satisfazendo f ◦ π = f . Basta então notar que f é injetor com
f : A/
im f = im (f ).
ES
na última seção do capı́tulo, sobre polinômios, vamos apresentar duas aplicações simples
de quocientes.
A coisa começa a ficar mais interessante depois de notarmos que ker µA é um ideal
principal. Longe de ser uma propriedade exclusiva de ker µA , isso se verifica para todos
os ideais de Z, como indica a próxima proposição (cuja prova fica a cargo do leitor).
Desse modo, existe um único n ≥ 0 tal que ker µA = nZ. Por isso, podemos xingar n
de modo especial: a caracterı́stica do anel A é o único n ∈ N tal que ker µA = nZ, que
denotamos por char (A).
O que a caracterı́stica de um anel diz sobre ele? Algumas coisas, mas não muitas.
Basicamente, temos dois casos:
n = min{m ∈ N : mA = 0A }, (1.7)
1A + . . . + 1A = 0A .
| {z }
n vezes
Consequentemente, se A e B são anéis tais que char (B) não divide char (A), então
não existe morfismo de anéis da forma A → B. 4
30 CAPÍTULO 1. A CATEGORIA DOS ANÉIS
Exemplo 1.2.18. Se o anel A tem caracterı́stica n > 0, então A contém uma cópia de
Z/nZ. Isto é uma consequência direta do Teorema do Isomorfismo, já que o subanel
im (µA ) ⊆ A é isomorfo ao quociente Z/ ker µA = Z/nZ. •
Exemplo 1.2.19. Anéis de caracterı́stica positiva não precisam ser finitos. Qualquer que
seja o conjunto X 6= ∅, não é difı́cil se convencer de que char (℘(X)) = 2. Um modo de
verificar isso consiste em lembrar que para qualquer A ∈ ℘(X) temos
A + A ..= A ∆ A ..= (A \ A) ∪ (A \ A) = ∅ ..= 0,
o que em particular vale para X ..= 1℘(X) . Para o leitor que prefere não se lembrar disso,
a discussão feita no exemplo anterior dá conta do recado, pois ℘(X) é isomorfo ao anel
F(X, Z/2Z), e este contém uma cópia do anel Z/2Z, cuja caracterı́stica é 2. •
Exemplo 1.2.20. Se char (A) = 1, então A = {0A }, a menos de isomorfismo. •
y ∈ x ⇔ y − x ∈ I ⇔ ∃z ∈ I y = x + z ⇔ y ∈ x + I ..= {x + z : z ∈ I}.
Assim, também faz sentido denotar os elementos de A/I como sendo expressões da
forma x + I, de modo que as operações em A/I passam a ser descritas pelas regras
(a + I) + (b + I) ..= (a + b) + I e (a + I)(b + I) ..= ab + I.
Embora tal mudança de terminologia seja irrelevante ao tratarmos de um único quo-
ciente, isso vai nos ajudar a não forçar a barra ao discutirmos o fato de que o resultado
mencionado no começo da subseção é equivalente a dizer que a função
Z Z Z
ϕ: −→ × ... ×
hmi hm1 i hmr i
x + hmi 7−→ (x + hm1 i, . . . , x + hmr i)
é um isomorfismo: note que dizer que x é o único, modulo m, a satisfazer x ≡mi ai para
todo i, equivale a dizer que ϕ(x + hmi) = (a1 + hm1 i, . . . , ar + hmr i).
Exemplo 1.2.22. Dado que 3 e 5 são números primos, uma consequência do Teorema
Chinês dos Restos é o isomorfismo entre os anéis Z/15Z e Z/3Z × Z/5Z dado pela regra
ϕ que associa x + h15i ao par de classes (x + h3i, x + h5i). Para não dizerem que não faço
contas, notem que ϕ(13 + h15i) = (1 + h3i, 3 + h5i). •
1.3. ANÉIS DE POLINÔMIOS 31
20
(a + I1 , a + I2 ) = (0A + I1 , 0A + I2 )
se, e somente se, a ∈ I1 ∩I2 . Logo, o Teorema do Isomorfismo nos diz que a correspondência
20
a + I 7→ (a + I1 , a + I2 ) estabelece um isomorfismo entre A/I e a imagem de ψ, de modo
que nos resta apenas verificar a sobrejetividade de ψ a fim de concluir a demonstração.
Contudo, sem querer nós já fizemos isso: dados (a + I1 , b + I2 ) ∈ A/I1 × A/I2 , note que
ES
Começamos esta seção com um exercı́cio de regressão astral, cujo destino remete à fase
escolar37 . Mais precisamente, convido o leitor a se lembrar dos longı́nquos tempos nos
quais ele aprendeu o conceito de equação. O exercı́cio é verdadeiramente simples, e consiste
em responder à seguinte pergunta:
Certamente, precisamos distinguir os dois tipos de equação que podem surgir nessa
discussão. Observe, por exemplo, as seguintes identidades, tipicamente encontradas no
caderno de Matemática de qualquer estudante do Ensino Básico:
14 + 1 = 15; (1.8)
2 · x + 1 = 15. (1.9)
A força do hábito faz com que seja mais comum chamar de equação igualdades como
(1.9), que expressam uma identidade entre números conhecidos e termos que representam
20
números desconhecidos, i.e., as incógnitas ou variáveis. No entanto, tal distinção só faz
sentido num caráter informal, já que (1.8) se reduz a uma expressão semelhante à (1.9)
20
ao fazermos 14 + 1 = 15 + 0x.
A pergunta que se coloca agora pode soar peculiar, mas é importante: como po-
derı́amos dar algum rigor para as noções intuitivas discutidas acima?
Uma vez que a letra “x” em (1.9) é pensada como um número, damos a “x” o direito
ES
2 · x = 2 · x + 1 − 1 = 15 − 1 = 14,
O importante aqui não é encrencar com o raciocı́nio acima, mas observar a ideia
subjacente no processo: ao tratarmos x como um objeto dotado dos mesmos direitos
algébricos que os elementos de Z, implicitamente estendemos Z a um anel maior, xingado
Z[x], no qual x é um habitante legı́timo. Daı́, somas finitas de elementos da forma mxn
– chamados de monômios –, com m ∈ Z e n ∈ N, devem pertencer a Z[x].
Isso pode ser feito – e não apenas para Z. De fato, o anel de polinômios A[x] pode ser
construı́do para qualquer anel A comutativo e com unidade, como discutimos a seguir.
Melhor ainda, ele é descrito por uma propriedade universal que, uma vez entendida, nos
isentará de pensar em sua construção para o resto da vida. A coisa toda lembra um pouco
a construção de um espaço vetorial, só que com um anel de escalares em vez de um corpo.
1.3. ANÉIS DE POLINÔMIOS 33
Sobre S, definimos a soma usual oriunda de F(N, A), a saber: para funções f, g ∈ S,
f ⊕ g : N → A é a função que faz (f ⊕ g)(n) ..= f (n) + g(n) para todo n ∈ N. Como
20
supp (f ⊕ g) ⊆ supp (f ) ∪ supp (g) ,
segue que f ⊕ g ∈ S para quaisquer f, g ∈ S. Nesta altura do campeonato, não deve ser
20
difı́cil se convencer de que
X ⊕ é associativa;
ES
X ⊕ é comutativa;
em seguida.
Demonstração. Seja N ..= min{n ∈ N : f (m) = 0A para todo m > n} e, para cada i ≤ N ,
defina ai ..= f (i). Note que isso faz sentido pois f ∈ S (logo, existe algum n tal que
f (m) = 0A para todo m > n) e, pela boa ordenação de N, temos o direito de escolher o
menor – a hipótese de que f 6= 0A nos garante que aN 6= 0A . Observe que para n > N
temos
(a0 x0 ⊕ a1 x1 ⊕ . . . ⊕ aN xN )(n) ..= a0 x0 (n) + a1 x1 (n) + . . . + aN xN (n) = 0A ,
enquanto que para j ≤ N , o mesmo raciocı́nio mostra que
(a0 x0 ⊕ a1 x1 ⊕ . . . ⊕ aN xN )(j) = aj xj (j) = aj = f (j),
donde a igualdade desejada segue.
Agora, suponha que M ∈ N e b0 , . . . , bM ∈ A, com bM 6= 0A , satisfaçam
f = b0 x0 ⊕ . . . ⊕ bM xM . (1.10)
Com os mesmos procedimentos acima, mostra-se que f (n) = 0A para todo n > M , o
que nos dá N ≤ M devido à minimalidade de N . Contudo, a expressão (1.10) implica
em f (M ) = bM xM (M ) = bM , de modo que se ocorresse N < M terı́amos bM = 0A . Logo,
N = M . De maneira análoga mostra-se que bj = f (j) para cada j ≤ N , garantindo a
unicidade desejada.
20
O lema acima nos permite escrever cada f ∈ S \ {0A } como uma combinação
20
f = f0 x0 ⊕ . . . ⊕ fNf xNf ,
onde fi = f (i) para cada i ≤ PNf , com fNf 6= 0A . Por simplicidade, vamos denotar tal
expressão simplesmente como i≤Nf fi xi .
ES
X X
f g ..= fi gj xi+j . (1.11)
i≤Nf j≤Ng
Primeiramente: a expressão acima faz sentido! De fato, ela é apenas uma versão
compacta da quilométrica identidade
f g ..= f0 g0 x0 ⊕ . . . ⊕ f0 gNg xNg ⊕ . . . ⊕ fNf g0 xNf ⊕ . . . ⊕ fNf gNg xNf +Ng ,
que está bem definida pois cada termo entre parênteses pertence a S. Explicitamente,
f g é a função N → A que faz
n
X X
(f g)(n) ..= f (i)g(n − i) = f (i)g(j)
i=0 i+j=n
e de maneira similar,
X
(f (g h))(n) = f (k)g(l)h(j);
k+l+j=n
X as operações
X
xi xj (n) = xi (k)xj (l),
k+l=n
que só assume valor 1A para n ..= i + j, sendo 0A em todos os demais casos.
Finalmente, temos em mãos, e de maneira (quase) honesta, o anel S, que será denotado
por A[x], o anel dos polinômios na indeterminada x com coeficientes em A (e
voltamos a usar o bom e velho “x” em vez do “x”). Como a correspondência i : A → A[x]
que faz i(a) ..= a é um morfismo injetor de anéis, não há riscos em assumir A como um
subanel de A[x], o que nos permite omitir o sublinhado e escrever a ∈ A[x]. Além disso, ao
escrevermos + em vez de ⊕ e suprimirmos (como de costume) as menções à multiplicação,
um elemento tı́pico de A[x] \ {0A } passa a ser denotado como
n
X
aj x j = a0 + a1 x + . . . + an x n .
j=0
α0 + α1 x + . . . + αn xn ,
e isso poderia ser repetido em qualquer anel B que contém A e x. O que distingue A[x]
diante de outros anéis é a unicidade com que isso pode ser feito, o que foi expresso de
maneira um tanto nebulosa no Lema 1.3.2. Refraseando tal lema para o nosso atual
contexto, temos a seguinte
α0 + α1 x + . . . + αn xn = β0 + β1 x + . . . + βm xm
• se αi = βj = 0A para todo i, j;
• se m = n e αi = βi para todo i ≤ n. 20
20
Demonstração. Se α0 + . . . + αn xn 6= 0A , então o Lema 1.3.2 nos diz que os coeficientes
αi são únicos. Se α0 + . . . + αn xn = 0A , então o mesmo deve ocorrer com os coeficientes
βj , embora possa ocorrer m 6= n. A recı́proca é clara.
ES
0A = 0A + 0A x = 0A + 0A x + 0A x2 = . . . = 0A + . . . + 0A xn = . . .
ao passo que um polinômio não-nulo admite apenas uma única expressão enquanto soma
formal de termos αxn . Em particular, se p ∈ A[x] é um polinômio não-nulo – que também
pode ser denotado por p(x) a depender do gosto do freguês –, definimos o grau de p como
o maior n ∈ N tal que
p = α 0 + α 1 x + . . . + α n xn
com αn 6= 0A , e chamamos αn de coeficiente lı́der de p. Em momentos de muita pressa,
o grau de p será denotado por deg p. Seguindo a postura de Rotman [8], não definimos o
grau do polinômio nulo. Finalmente, os elementos de A quando vistos como polinômios
em A[x] serão chamados de polinômios constantes.
Embora passar pelo processo de construir A[x] seja traumático39 , a propriedade uni-
versal que caracteriza A[x] tem um apelo bastante intuitivo.
Demonstração. Fazemos F (0A ) ..= 0B e, para um elemento não-nulo tı́pico de A[x], diga-
mos p ..= α0 + . . . + αn xn , definimos
20
e, finalmente, F (1A ) = f (1A ) = 1B . Por construção, temos F (a) = f (a) para todo a ∈ A.
20
Agora, se G : A[x] → B é outro morfismo de anéis com G(x) = b e G(a) = f (a) para
todo a ∈ A, então temos G(xn ) = (G(x)n ) = bn = F (xn ) para todo n ∈ N, donde é
fácil se convencer de que G(p) = F (p) ocorre para todo p ∈ A[x], garantindo a unicidade
desejada.
ES
Séculos atrás, quando iniciamos esta seção, nos propusemos (implicitamente) a motivar
a definição dos polinômios como uma maneira de dar rigor algébrico às equações do dia-
UF
a-dia. Acabamos de fazer a parte mais chata: agora, a expressão “2x + 1 = 15” faz
sentido, por exemplo, em Z[x], e indica uma relação de igualdade entre o polinômio 2x + 1
e o polinômio constante 15. Contudo, dentro do ambiente que construı́mos, ela é uma
sentença absolutamente falsa, pois os polinômios 2x + 1 e 15 não são iguais em Z[x]!
Vejamos então o que significa “encontrar o valor de x”.
Fixados um anel A e uma indeterminada x, sejam B uma extensão de A, i.e., um
anel que contém A como subanel, e β ∈ B um elemento qualquer. Pela propriedade
universal de A[x], existe um único morfismo de anéis
tal que evβ (a) = a para todo a ∈ A e evβ (x) = β, chamado morfismo de avaliação em
β. Explicitamente, se p = p0 + p1 x + . . . + pn xn ∈ A[x], então
X
evβ (p) = pn β n .
j≤n
Exemplo 1.3.5. Para A ..= B ..= Z, p ..= 2x + 1 e γ ..= 15, um certo β ∈ Z satisfaz
evβ (2x + 1) = 15 sse 2β + 1 = 15, o que por sua vez ocorre somente para β = 7. •
Observação 1.3.6. O exemplo acima mostra que toda essa embromação algébrica ren-
deu frutos: formalizamos, em algum sentido, a ideia intuitiva de que a letra “x” numa
expressão do tipo “2x + 1 = 15” representa um número indeterminado (x pode ser qual-
quer coisa!), mas que é passı́vel de determinação (encontre o x tal que blablabla). Por
sorte, esta não é a única aplicação que faremos de todo esse ferramental algébrico! 4
Uma função f : B → B para a qual exista um polinômio p ∈ A[x] satisfazendo f = evp
é chamada de função polinomial em B com coeficientes em A – caso tenha-se A = B,
dizemos simplesmente que f é uma função polinomial. Classicamente, para denotar a
imagem pela função evp de algum b ∈ B especı́fico, escreve-se p(b) em vez de evb (p). Por
outro lado, também é comum escrever p(x) para denotar o polinômio p ∈ A[x]. Daı́, como
a letra “x” é a escolha universal para representar elementos arbitrários, tradicionalmente
confundimos o polinômio p com a função polinomial evp . Mas há perigo nisso.
Já sabemos que o conjunto F(B, B) de todas as funções da forma B → B é um anel,
de modo que a função
ev : A[x] → F(B, B)
p 7→ evp
20
é um morfismo de anéis, cuja imagem é precisamente o subanel das funções polinomiais
20
com coeficientes em A. O perigo alertado acima decorre do fato de que ev pode não ser
injetora!
Considere, por exemplo, A ..= B ..= Z/2Z o corpo de dois elementos, e o polinômio
p .= x2 + x ∈ A[x], que não é o polinômio nulo, posto que seus coeficientes são não-nulos.
.
ES
Dado que x2 + x = x(x + 1), é fácil ver que evb (p) = 0 em A para todo b ∈ A. Em outras
palavras, um polinômio não-nulo de A[x] induziu a função nula em F(B, B), mostrando
que o núcleo de ev não é trivial40 .
UF
Ainda assim, a moral dos autores que definem polinômios como sendo funções poli-
nomiais41 pode ser parcialmente salva pois, nos casos em que B é um domı́nio infinito, o
morfismo ev é realmente injetor. Vamos nos dedicar a provar isso, e começamos com um
lema inocente sobre o grau de polinômios, cuja prova fica a cargo do leitor.
Lema 1.3.7. Se A é um anel e f, g ∈ A[x] são polinômios não-nulos, então
deg (f · g) ≤ deg f + deg g.
Em particular, se o coeficiente lı́der de f ou de g não for divisor de zero42 , então vale a
igualdade.
Proposição 1.3.8 (Algoritmo da divisão, para polinômios). Sejam R um anel e po-
linômios não-nulos f, g ∈ R[x]. Se o coeficiente lı́der de g for invertı́vel em R, então
existem únicos polinômios q, r ∈ R[x] satisfazendo
f = q · g + r, (1.13)
com r = 0A ou deg r < deg g.
40
Um morfismo de anéis f : R → T é injetor se, e somente se, ker f = {0R }. Provar tal afirmação é o
Exercı́cio 1.55.
41
Sim, querido leitor, há quem faça isso.
42
Por termos visto a definição disso en passant, relembramos: um elemento não-nulo b ∈ A é um divisor
de zero se existir c ∈ A não-nulo com bc = 0A .
1.3. ANÉIS DE POLINÔMIOS 39
f1 = f − an+1 b−1
m x
n+1−m
·g
Agora, como B é uma extensão de A, podemos assumir que B[x] é uma extensão de
A[x], pois o morfismo A[x] → B[x] que faz x 7→ x, dado pela propriedade universal, é
injetor. Isso ajuda a dar sentido ao próximo lema.
mostrando que r = 0B .
É chegada a hora da tão sonhada redenção.
Teorema 1.3.10. Seja R um anel infinito. Então R é um domı́nio se, e somente se, todo
polinômio não-nulo de R[x] tem apenas finitas raı́zes.
40 CAPÍTULO 1. A CATEGORIA DOS ANÉIS
dado que R é um domı́nio. Como deg q = n, a hipótese de indução nos garante que
q tem finitas raı́zes e, por conseguinte, p tem finitas raı́zes.
Anéis de polinômios são uma poderosa ferramenta algébrica para a criação de anéis.
Costuma-se pensar na indeterminada x como um elemento novo, por meio do qual po-
demos estabelecer, via quociente, relações que a princı́pio não eram verdadeiras no anel
original.
Exemplo 1.3.14. R[x]/hx2 + 1i e C são isomorfos. De fato, ao considerarmos o elemento
i ∈ C, o morfismo de avaliação em i, evi : R[x] → C, que faz p 7→ p(i), tem o ideal hx2 + 1i
como núcleo. Com efeito, se p ∈ hx2 + 1i, então existe q ∈ R[x] tal que p = q · (x2 + 1),
donde segue que p(i) = 0. Por outro lado, se p(i) = 0, então ao efetuarmos a divisão de
p por x2 + 1 obtemos únicos polinômios q, r ∈ R[x], com r = 0 ou deg r < 2, tais que
p = (x2 + 1) · q + r. Por termos r(i) = 0, não pode ser o caso de que r tenha grau 1 (por
quê?), donde segue que r é uma constante e, por conseguinte, r = 0. Agora basta aplicar
o Teorema do Isomorfismo, valendo-se do fato de que evi é sobrejetor. •
1.4 Exercı́cios
Generalidades iniciais (alongamento)
Nos próximos exercı́cios, A denota um anel comutativo e com unidade 1A .
20
Exercı́cio 1.1. Convença-se de que Mn (A) é um anel com unidade. Mostre que se A 6= 0,
então Mn (A) é necessariamente não-comutativo para n > 1.
20
Exercı́cio 1.2. Mostre que Mn (A) é um anel comutativo e com unidade se, e somente
se, n ≤ 1.
ES
Exercı́cio 1.5. Para um conjunto S fixado, convença-se de que ℘(S) é um anel comutativo
e com unidade. Mostre que se |S| = 1, então ℘(S) é um corpo com dois elementos.
Exercı́cio 1.6. Dados a, b ∈ A, mostre que a(−b) = (−a)b = −ab e (−a)(−b) = ab.
Tente fazer isso sem usar a unidade do anel ou a comutatividade do produto.
Exercı́cio 1.7. Por que N não é um anel com as operações usuais?
Exercı́cio 1.8. Dê exemplos de conjuntos com operações binárias que NÃO satisfaçam
os critérios para serem considerados anéis.
Exercı́cio 1.9. Mostre que Q×Q admite uma estrutura de anel comutativo e com unidade
ao definirmos (a, b) ∗ (c, d) ..= (a ∗ c, b ∗ d), para ∗ ∈ {+, ·}.
Exercı́cio 1.10. Quais são os elementos invertı́veis de Q × Q? Q × Q é um corpo? Q × Q
é um domı́nio?
Exercı́cio 1.11. Generalize a construção do 1.9 para dotar
An ..= A
| × .{z
. . × A}
n vezes
Prove que ax+y = ax ay e (ax )y = axy para quaisquer x, y ∈ N. Se A for um corpo, defina
a−n ..= (an )−1 e prove que as identidades anteriores valem para x, y ∈ Z.
Exercı́cio 1.14. (Sobre nilpotentes) Prove que se D é um domı́nio e d ∈ D satisfaz
dn = 0D para algum n ∈ N, então d = 0D .
Exercı́cio 1.15. (Sobre idempotentes) Prove que se D é um domı́nio e d ∈ D satisfaz
d2 = d, então d = 1D ou d = 0D .
Exercı́cio 1.16. Sejam + e · as operações originais de A, e denote por 0A e 1A seus
elementos neutros. Vamos definir novas operações ⊕ e em A, por meio das seguintes
regras:
a ⊕ b ..= a + b + 1A e a b ..= ab + a + b.
20
Mostre que tais operações também fazem do conjunto A um anel. Qual o elemento neutro
da operação ⊕? A operação admite um elemento neutro?
20
Morfismos e subanéis (aquecimento)
Os próximos dez exercı́cios não dependem da comutatividade do anel A que fixamos.
ES
Exercı́cio 1.17. Para i ∈ {0, 1}, mostre que a projeção πi : A × A → A dada por
πi
(a0 , a1 ) 7−→ ai é um morfismo de anéis.
UF
• 1B ∈ A,
• a − a0 ∈ A sempre que a, a0 ∈ A, e
• a, a0 ∈ A sempre que a, a0 ∈ A.
Nesse sentido, o que o enunciado propõe é perguntar: por que não basta exigir a + a0 ∈
A sempre que a, a0 ∈ A no segundo item? 4
Dica. Não se desespere caso você obter o sinal trocado, i.e., ab = −ba, pois (x + x)2 =
4x e (x + x)2 = 2x, donde segue que 2x = 0 e, consequentemente, x = −x para todo
x ∈ A.
Daqui em diante, A passa a indicar um anel comutativo e com unidade.
2
Exercı́cio 1.27. Mostre que An e Mn (A) não são anéis isomorfos sempre que A 6= 0 e
n > 1.
20
Exercı́cio 1.28. Suponha que A seja um corpo. A correspondência pA : Z → A, dada
20
por pA (z) ..= az , é um morfismo de anéis?
Exercı́cio 1.29. Mostre que o anel A pode ser visto como subanel de F(X, A), qualquer
que seja o conjunto X 6= ∅.
ES
T
Exercı́cio 1.44. Seja S ..= {STi : i ∈ I} uma famı́lia de ideais de A. Mostre que i∈I Si é
um ideal de A. Observação: i∈I Si é a coleção de todos os x tais que x ∈ Si para todo
i ∈ I.
UF
Provocação. Também é verdade que a interseção de subanéis é subanel. Pode ser in-
teressante provar isso também se quiser praticar um pouco mais argumentações do tipo
anterior.
Exercı́cio 1.45. Dado um subconjunto X ⊆ A, prove que existe um ideal J ⊆ A tal que
para todo ideal I ⊆ A,
X ⊆ I ⇒ J ⊆ I.
Dizemos que J é o ideal gerado por X, o qual denotaremos por hXi.
Exercı́cio 1.46. Quem é h∅i? Por quê?
Exercı́cio 1.47. Para X ⊆ A com X 6= ∅, descreva os elementos de hXi.
Exercı́cio 1.48. Mostre que se I, J ⊆ A são ideais do anel A, então vale a identidade
I + J = {a + b : a ∈ I, b ∈ J}. Além disso, IJ ⊆ I ∩ J. Observação: lembre-se de que no
texto, I + J foi definido como o menor ideal de A que contém I ∪ J.
S
Exercı́cio 1.49. Dada uma famı́lia J de ideais de A, denote por J∈J J a coleção P de
todos os x ∈ A para os quais S existe algum J ∈ J com P x ∈ J. Chame por J∈J J o
menor ideal de A a conter J∈J J. Mostre que x ∈ J∈J J se, e somente se, existem
J0 , . . . , Jn ∈ J para algum n ∈ N e ji ∈ Ji para cada i ≤ n tais que x = j0 + . . . + jn .
1.4. EXERCÍCIOS 45
Exercı́cio 1.52. Mostre que m, n ∈ Z são coprimos (mdc entre m e n é 1) se, e somente
se, hm, ni = Z.
Exercı́cio 1.55. Mostre que um morfismo entre anéis é injetor se, e somente se, o seu
núcleo é o ideal nulo.
20
Exercı́cio 1.58. Mostre que todo ideal maximal é primo.
Exercı́cio 1.59. Mostre que A é corpo se, e somente se, h0A i é ideal maximal de A.
20
Exercı́cio 1.60. Mostre que A é domı́nio se, e somente se, h0A i é ideal primo de A.
Exercı́cio 1.61. Mostre que todo ideal de Z é principal. Mais precisamente: prove que
ES
Exercı́cio 1.62. Quem é Z[i]/h2 + ii? Dica: note que 2 + i = 0 em Z[i]/h2 + ii.
UF
Exercı́cio 1.63. O anel A tem caracterı́stica n ∈ N se, e somente se, contém uma cópia
do anel Z/nZ. Verdadeiro ou falso? Observação: não responda sim, por gentileza.
Exercı́cio 1.64. Mostre que se D é um domı́nio, então char (D) = 0 ou char (D) > 0 é
um número primo. Vale a recı́proca?
Exercı́cio 1.65. Sejam m, n ∈ N tais que m não divide n. Mostre que não existe morfismo
de anéis da forma Z/nZ → Z/mZ.
Exercı́cio 1.69. Mostre que o anel Z[i] é imagem de um morfismo da forma Z[x] → C.
√
Exercı́cio 1.70. Mostre que o anel Q[ 3] é imagem de um morfismo da forma Q[x] → R.
Exercı́cio 1.72. Mostre que D é um domı́nio se, e somente se, D[x] é um domı́nio.
Exercı́cio 1.77. Seja F2 um corpo com dois elementos e X um conjunto. Mostre que
F(X, F2 ) e ℘(X) são anéis isomorfos. 20
Exercı́cio 1.78. Dizemos que um elemento a ∈ A é idempotente se satisfaz a2 = a.
20
Mostre que se X é um conjunto infinito, então o anel F(X, R) tem infinitos elementos
idempotentes. Vale a volta?
ES
Exercı́cio 1.79. Mostre que f ∈ F(X, R) é invertı́vel (no sentido de admitir inverso
multiplicativo) se, e somente se, f (x) 6= 0 para todo x ∈ X. Vale o mesmo resultado para
f ∈ F(X, Z)?
UF
J ⊆ K ⇔ π[J] ⊆ π[K].
Exercı́cio 1.82. Seja p ∈ Z um número primo. Mostre que hx, pi ⊆ Z[x] é um ideal
maximal. Dica: Z/pZ é um corpo.
Exercı́cio 1.85. Uma relação binária sobre um conjunto X é chamada de ordem total
se for reflexiva (x ≤ x), antissimétrica (x ≤ y e y ≤ x ⇒ x = y), transitiva (x ≤ y e
y ≤ z ⇒ x ≤ z) e, para quaisquer x, y ∈ A ocorrer x ≤ y, x = y ou y ≤ x. Dados um
anel A e uma ordem total ≤ sobre A, dizemos que A é um anel (totalmente) ordenado
por ≤ se tivermos
a · v ..= σ(a)(v).
UF
• 1A · v = v; • (a ⊕A b) · v = (a · v) ⊕V (b · v);
• a · (b · v) = (a A b) · v; • a · (u ⊕V v) = (a · u) ⊕V (a · v).
45
É mais fácil do que parece, embora não seja trivial. De qualquer forma, só faça esse se estiver com
tempo :p
UF
ES
20
20
Capı́tulo 2
Tecnicalidades polinomiais
Nesta segunda parte do curso, abordaremos com mais calma as particularidades algébricas
dos anéis de polinômios. No meio do caminho, vamos esbarrar com classes especiais de
domı́nios nas quais frequentemente se encontram os anéis de polinômio. Daqui em diante,
todos os nossos anéis são comutativos e com unidade. Além disso, vamos nos esquecer
do subı́ndice “A ” ao indicarmos o elemento neutro aditivo (a.k.a. 0) e o elemento neutro
multiplicativo (a.k.a. 1) de um anel A.
divisão sobre K[x] quando K é um corpo: dados polinômios f, g ∈ K[x], basta que g não
seja o polinômio nulo para que existam únicos q, r ∈ K[x] tais que f = qg + r com r = 0
ou deg r < deg g (compare com o enunciado da Proposição 1.3.8).
UF
Exemplo 2.1.1. Não é possı́vel realizar a divisão do polinômio x2 +6x+8 pelo polinômio
2x + 4 em Z[x]. Porém, quando vistos como polinômios de Q[x], a divisão é possı́vel. Em
particular, note que 2 não é invertı́vel em Z, mas é invertı́vel em Q. •
Outra manifestação de como o anel base influencia o anel de polinômios foi enunciado
como exercı́cio no capı́tulo anterior, a saber:
Proposição 2.1.2. Um anel D é domı́nio se, e somente se, D[x] é domı́nio.
Demonstração. Como D é subanel de D[x], é claro que se D[x] for um domı́nio, então
D também será. Agora, se D é domı́nio e p, q ∈ D[x] são polinômios não nulos de D[x],
então pq 6= 0:
• se p e q têm ambos grau 0, então pq ∈ D \ {0};
• se algum deles tem grau positivo, então a igualdade deg pq = deg p + deg q garante
que pq não é o polinômio nulo.
Tal resultado nos leva a uma pergunta bastante natural: será que K[x] é um corpo
se K for um corpo? A resposta é não e, na verdade, independe do fato de K ser corpo.
De fato, pelo item 2 da Proposição 1.2.7 e por A[x]/h0i ser isomorfo a A[x], segue que
A[x] é corpo se, e somente se, h0i é ideal maximal de A[x], o que nunca ocorre, posto que
h0i ( hxi =6 A[x]. Isto não significa que K[x] não seja especial.
49
50 CAPÍTULO 2. TECNICALIDADES POLINOMIAIS
T ..= {n ∈ N : n ∈ I}
m = qt + r,
Exemplo 2.1.5. A fim de praticarmos um pouco, vejamos que, de fato, hx, yi não é um
ideal principal em K[x, y]. Há pelo menos três maneiras de fazer isso:
1. supondo que p ∈ K[x, y] satisfaz hpi = hx, yi, chegar a uma contradição por meio
da análise dos graus dos monômios que compõem p;
3. analisando o comportamento dos ideais primos principais com relação aos demais
ideais principais.
2.1. POLINÔMIOS SOBRE DOMÍNIOS E CORPOS 51
O jeito (1) ficará a cargo do leitor masoquista. O jeito (2) é praticamente imediato:
como hyi + hxi = hx, yi é principal se, e somente se, y é invertı́vel em K[y], resulta que
hx, yi não é principal, já que y não é invertı́vel em K[y]. Finalmente, o jeito (3) consiste
em mostrar a seguinte
Demonstração. Basta mostrarmos que se a inclusão for própria, então b é invertı́vel. Ora,
como a ∈ hbi, existe c ∈ D satisfazendo a = bc e, consequentemente, bc ∈ hai. Daı́, por
hai ser primo, resulta que c ∈ hai e, portanto, existe d ∈ D com c = ad. Logo, a = adb,
acarretando a(1 − db) = 0 e, portanto, db = 1, como querı́amos.
Agora, por termos hxi ( hx, yi ( K[x, y], segue que hx, yi não poderia ser um ideal
principal, pois isso contradiria a conclusão da proposição anterior. •
Observação 2.1.7. Um modo alternativo e bem mais eficiente de verificar que K[x, y]
não é um d.i.p. é notar que K[x] não é um corpo. Percebe o porquê? 4
Ainda assim, uma condição mais fraca do que ser d.i.p., mas muito útil, é preservada
ao considerarmos anéis de polinômios. A saber, um anel R é chamado de noetheriano1 se
20
todo ideal de R for finitamente gerado. É possı́vel provar que se R é um anel noetheriano,
então R[x] também é noetheriano. Logo, embora K[x, y] não seja um d.i.p., ele é um anel
20
domı́nio noetheriano.
Em nossos dois exemplos de d.i.p. vistos acima (Z e K[x] para um corpo K), a pos-
sibilidade de realizar divisões de maneira sistemática foi essencial. Isto sugere que a
propriedade de ter um algoritmo de divisão euclidiana possa ser algo que mereça algum
UF
Exemplo 2.1.10. Dado um corpo K, a função deg : K[x]\{0} → N que a cada polinômio
associa o seu grau é, como a gramática sugere, uma função grau que faz de K[x] um
domı́nio euclidiano. •
Exemplo 2.1.11 (Inteiros de Gauss). O anel Z[i], formado por todas as expressões da
forma a + bi, com a, b ∈ Z e i ∈ C, é um domı́nio euclidiano ao considerarmos a função
grau ∂ : Z[i] \ {0} → N dada pela regra ∂(a + bi) ..= a2 + b2 .
Primeiro, Z[i] é, de fato, um domı́nio, por ser a imagem do morfismo de anéis Z[x] → C
dado pela correspondência p 7→ p(i). Agora, a função ∂ satisfaz (EDii ). De fato, para
qualquer β ∈ Z[i] \ {0} deve ocorrer 1 ≤ ∂(β) pois, se β = a + bi 6= 0, então a2 + b2 ≥ 1,
donde segue que
∂(α) ≤ ∂(α)∂(β) = ∂(αβ),
onde a última igualdade segue, secretamente, do Exemplo 1.1.25 (por quê?!). A verificação
de que ∂ satisfaz (EDi ) é só um pouco mais chata.
Dados α, β ∈ Z[i] com β 6= 0, buscamos λ, µ ∈ Z[i] tais que α = βλ + µ com
∂(µ) < ∂(β) ou µ = 0. Primeiro, note que podemos considerar α/β ∈ C e expressar tal
número como uma soma x + yi, com x, y ∈ Q: de fato, temos
α α β αβ
= · = ,
β β β
20
∂(β)
Logo, α = β(a + bi) + β(u + vi), e afirmamos que λ ..= a + bi e µ ..= β(u + vi) satisfazem
nossas exigências. Primeiro, é claro que λ ∈ Z[i], enquanto µ ∈ Z[i] segue pois µ = α−βλ.
Se, por ventura, µ = 0, acabou. Se não, devemos mostrar que vale ∂(µ) < ∂(β). Isso de
fato ocorre, pois
∂(µ) = ∂(β(u + vi)) = ∂(β)∂(u + vi),
enquanto
1 1 1
∂(u + vi) ..= u2 + v 2 ≤ + = < 1,
4 4 2
o que acarreta a desigualdade desejada.
Independentemente da importância que o domı́nio Z[i] possa ter para a Teoria dos
Números e outras áreas relacionadas, nossa discussão neste momento tem objetivos bem
mais modestos: observar que os elementos λ e µ que satisfazem o algoritmo de divisão
(EDi ) não são necessariamente únicos!
2.1. POLINÔMIOS SOBRE DOMÍNIOS E CORPOS 53
Note que se a, b ∈ A são tais que existe um elemento invertı́vel c ∈ A tal que a = bc,
então b = ac−1 , com c−1 também invertı́vel (certo?!). Em tal situação, dizemos que a e
b são associados. No caso mais especı́fico de domı́nios, tipo de anel protagonista deste
capı́tulo, dois elementos a e b são associados se, e somente se, hai = hbi (Exercı́cio 2.1).
Desse modo, o fato relevante escondido no Teorema Fundamental da Aritmética está
na afirmação de que elementos não-invertı́veis (os elementos não-nulos diferentes de 1 ou
−1) admitem uma única fatoração com todos os fatores primos, a menos de permutação e
multiplicação por um invertı́vel, afinal de contas, 1 e −1 são os únicos elementos invertı́veis
de Z. A relevância de tal informação está justamente no fato de que tais fatorações não
são triviais, nos sentidos expressos acima.
Em geral, um elemento p ∈ A não-invertı́vel é chamado de elemento primo se o
ideal hpi ⊆ A é primo em A. Equivalentemente, p ∈ A é primo se não for invertı́vel e p
dividir a ou b sempre que p dividir o produto ab ∈ A. Secretamente, elementos primos
satisfazem ainda outra condição referente à não-trivialidade de fatorações, pelo menos no
reino dos domı́nios:
contrário p seria um produto de invertı́veis, logo invertı́vel. Neste caso, resulta que b
também é elemento primo, associado ao primo p. 4
Para D ..= Z, a propriedade destacada na última proposição extrai uma velha carac-
UF
terização para os números primos: p é primo se seus únicos divisores são ±1 e ±p. No
entanto, como ficará claro ao longo desta subseção, tal condição não equivale à prima-
lidade, razão pela qual ela recebe um nome próprio. Dizemos que um elemento π ∈ A
não-invertı́vel é irredutı́vel se ele só admite divisores triviais, i.e., se para quaisquer
a, b ∈ A, valer que
π = ab ⇒ a é invertı́vel ou b é invertı́vel.
Num primeiro momento, os domı́nios de fatoração única, que introduzimos a seguir,
são os domı́nios nos quais o Teorema Fundamental da Aritmética é satisfeito ao trocarmos
a expressão “primo” por “irredutı́vel”. Mais precisamente, dizemos que D é domı́nio de
fatoração única (ou d.f.u.) se qualquer elemento não-nulo e não-invertı́vel d ∈ D
se escreve de forma única como produto de elementos irredutı́veis de D, a menos de
permutação ou multiplicação por um elemento invertı́vel, i.e.,
A proposição acima mostra que domı́nios de ideais principais têm parte do que é
preciso para serem xingados de d.f.u. – explicitamente, a parte referente à unicidade de
fatorações. A existência de fatorações será provada usando o fato de que todo ideal num
d.i.p. é finitamente gerado. Tal informação inócua será extremamente importante em
nossa demonstração do Teorema 2.1.22, em vista do próximo
Lema 2.1.21 (Domı́nios de ideais principais são noetherianos). Em qualquer anel A as
seguintes afirmações são equivalentes:
(NCi ) todo ideal de A é finitamente gerado;
(NCii ) toda cadeia ascendente de ideais estaciona, i.e., se {In }n∈N é uma famı́lia de
ideais de A tal que In ⊆ In+1 para todo n ∈ N (isto é ser uma cadeia ascendente de
ideais), então existe N ∈ N tal que In = IN para todo n ≥ N (isto é dizer que a
cadeia estaciona).
π = π0 ϑ0 , o que provaremos por absurdo, supondo o contrário. Neste caso, o próprio π não
pode ser irredutı́vel, o que nos dá elementos não-invertı́veis ρ0 , σ0 ∈ D tais que π0 = ρ0 σ0
– note que hπ0 i ( hρ0 i (veja o Exercı́cio 2.2). Novamente, a suposição garante que ρ0
não é irredutı́vel, o que nos dá elementos não-invertı́veis ρ1 , σ1 ∈ D tais que ρ0 = ρ1 σ1 ,
donde resulta, em particular, que hρ0 i ( hρ1 i. Procedendo indutivamente, obterı́amos
uma cadeia ascendente e não-estacionária de ideais
contrariando mais uma vez o lema anterior. Portanto, uma decomposição nas condições
desejadas deve existir, como querı́amos.
Observação 2.1.23. Note que por Z ser um d.i.p., reobtemos como corolário o Teorema
Fundamental da Aritmética. 4
Em sı́ntese, até agora vimos que
• corpos são exemplos triviais de domı́nios euclidianos, enquanto
• domı́nios euclidianos são casos particulares dos domı́nios de ideais principais e,
• por sua vez, domı́nios de ideais principais satisfazem as condições para serem xin-
gados de domı́nios de fatoração única.
1Todas√as implicações
acima são estritas: Z é um domı́nio euclidiano que não é corpo;
Z 2 (1 + −19) é um d.i.p. que não é domı́nio euclidiano e, pelo que veremos nas
próximas subseções, K[x, y] é um d.f.u. que é não d.i.p. sempre que K é um corpo. Por
fim, convém destacarmos que existem domı́nios que não são d.f.u..
√
Exemplo 2.1.24. O anel A ..= Z[ −5], subanel de C, é um domı́nio √ que não é d.f.u..
Explicitamente, os elementos de A são expressões da forma a + b −5, donde não é difı́cil
se convencer de que
√ os únicos √ elementos invertı́veis√ de A são√ 1 e −1. Daı́, por termos
20
6 = 3 · 2 = (1 + −5)(1 − −5), com 2, 3, 1 + −5 e 1 − −5 elementos irredutı́veis
não-associados, resulta que a decomposição em A não satisfaz o critério de unicidade. •
20
Observação 2.1.25. A lista de generalizações não acaba aqui: existem ainda os chamados
domı́nios de Bézout, domı́nios de MDC6 , domı́nios de Schreier, domı́nios integralmente
fechados, etc. Contudo, tais assuntos são mais profundos e exigem um pouco mais de
ES
O próximo objetivo que se coloca adiante é a demonstração de que D[x] é um d.f.u. sempre
que D for um d.f.u.. Para tanto, precisamos nos convencer de que todo domı́nio pode ser
visto como subanel de um corpo especial, digamos K, o corpo de frações de D. Feito isso,
o fato de K ser um corpo nos dirá que K[x] é um d.i.p. e, consequentemente, um d.f.u.,
o que nos permitirá obter as decomposições dos elementos de D[x].
Em certo sentido, o corpo de frações visa corrigir os problemas que possivelmente
impeçam que um certo domı́nio D de ser xingado de corpo. Nesse sentido, a ideia é
“mergulhar” D num corpo no qual todos os seus elementos sejam invertı́veis. Nesse
ponto, vamos nos afastar das referências principais da disciplina, que constroem o corpo
de frações “no braço”, e faremos uma análise mais qualitativa do problema, seguindo [8].
Para motivar as ideias, vamos supor que estejamos em busca de um anel Q que contém
Z, no qual o elemento 2 admita um inverso multiplicativo. Em certo sentido, um modo
de obter Q consiste em acrescentar um elemento x ao domı́nio Z e, posteriormente, forçar
que a relação 2x = 1 seja satisfeita. Ora, sabemos como acrescentar um elemento a Z
de modo preciso: o anel de polinômios Z[x] é exatamente isso! Quanto a forçar a relação
2x = 1, isto é o mesmo que pedir 2x − 1 = 0. Por isso, nosso candidato natural é anel
Z[x]
Q ..= .
h2x − 1i
6
Ou GCD-domains nas referências estrangeiras.
58 CAPÍTULO 2. TECNICALIDADES POLINOMIAIS
Note que Z pode ser visto “dentro” de Q por meio da composição λ ..= π ◦ i : Z → Q,
onde i : Z ,→ Z[x] é a inclusão (injetora!) e π : Z[x] Q é a projeção natural do quociente.
Além de λ ser (claramente) um morfismo de anéis, temos λ injetor: se λ(z) = 0 em Q,
então em virtude da natureza de Q segue que existe um polinômio f ∈ Z[x] satisfazendo
z = f · (2x − 1), o que só é possı́vel para f = 0 e, consequentemente, z = 0. Por fim, a
imagem de 2 em Q, que denotamos por 2, é tal que 2 · x = 1, mostrando que x é o inverso
multiplicativo de 2 em Q.
Desse modo, se abandonarmos a barra “ — ” sobre a imagem dos elementos de Z em
Q, podemos pensar em x como o inverso multiplicativo de 2. Mais geralmente, qualquer
potência de 2 é invertı́vel em Q, já que 2n xn = (2x)n = 1. De tal observação, resulta que
os elementos de Q se comportam precisamente como aquilo que costumamos chamar de
frações – com a restrição de que seus denominadores são potências de 2.
De fato, um habitante tı́pico de Q, digamos ψ, é da forma ψ ..= α0 + α1 x + . . . + αn xn ,
1
para certos α0 , . . . , αn ∈ Z. Se escrevermos n em vez de xn , resulta
2
1 1
ψ = α0 + α1 + . . . + αn n ,
2 2
donde obtemos 2n ψ = α0 2n + α1 2n−1 + . . . + αn e, consequentemente,
20 1
ψ = α0 2n + α1 2n−1 + . . . + αn · n ,
2
20
1
mostrando que ψ = α · n para certos α ∈ Z e n ∈ N, que abreviamos, como de costume,
2
α
escrevendo n .
2
ES
α β α2n + β2m
+ = ,
2m 2n 2m+n
α β
basta notarmos que e são maneiras psicologicamente (mais) agradáveis de denotar
2m 2n
os elementos λ(α)λ(2m )−1 e λ(β)λ(2n )−1 , respectivamente, donde segue que
α β
m
+ n ..= λ(α)λ(2m )−1 + λ(β)λ(2n )−1 =
2 2
= λ(α)λ(2n )λ(2n )−1 λ(2m )−1 + λ(β)λ(2m )λ(2m )−1 λ(2n )−1 =
α2n + β2m
= λ(α2n )λ(2m+n )−1 + λ(β2m )λ(2m+n )−1 = λ(α2n + β2m )λ(2m+n ) ..= ,
2m+n
α β αβ
como afirmamos. A verificação de que m · n = m+n fica a cargo do leitor.
2 2 2
Para finalizar este primeiro passo, observamos que uma igualdade do tipo
α β
m
= n
2 2
em Q ocorre se, e somente se, λ(α)λ(2m )−1 = λ(β)λ(2n )−1 , o que por sua vez é equivalente
à igualdade α2n = β2m , posto que λ é injetora. Em particular, disso segue que Q não é
apenas um anel que contém Z, mas sim um domı́nio! Pense um pouco sobre isso.
2.1. POLINÔMIOS SOBRE DOMÍNIOS E CORPOS 59
A construção acima pode ser generalizada a fim de obter anéis nos quais elementos
arbitrários de um anel dado sejam invertı́veis. Em tal situação, costuma-se dizer que
o anel obtido é a localização do primeiro por algum subconjunto do anel original cujos
elementos buscamos inverter. Em nosso caso, vamos tratar apenas do caso em que D é um
domı́nio e buscamos um corpo K tal que moralmente se tenha D ⊆ K, com D subanel,
de modo que todo elemento de K seja da forma ab−1 , com a, b ∈ D e b 6= 0, elemento que
a
será representado pela notação de fração tı́pica, i.e., escreveremos em vez de ab−1 .
b
O modus operandi será essencialmente o mesmo:
onde entendemos A[F ] ..= A[x0 , . . . , xn ] se tivermos F ..= {x0 , . . . , xn }, A[∅] ..= A. Por
exemplo, para A ..= Z e X ..= {xn : n ∈ N}, espera-se que tanto expressões da forma
2x30 x87 + 4x32 quanto 42x19
34 + 7 sejam polinômios de Z[X].
Porém, como já sabemos que um anel não é apenas um conjunto, devemos nos preo-
cupar em determinar as operações de A[X], o que não é um problema muito grave. De
fato, por construção dados f, g ∈ A[X], existem subconjuntos finitos F, G ⊆ X tais que
f ∈ A[F ] e g ∈ A[G], donde segue que f, g ∈ A[F ∪ G], o que nos permite definir tanto
f + g quanto f · g em A[F ∪ G] ⊆ A[X]. Por exemplo, para A ..= Z, X ..= {w, x, y, z},
f ..= 2w + x2 e g ..= 3y + x3 , temos a princı́pio f ∈ Z[x, w] e g ∈ Z[x, y], mas para ambos
temos f, g ∈ Z[w, x, y], o que nos permite efetivamente calcular f · g e f + g em Z[w, x, y],
que está contido em Z[w, x, y, z].
60 CAPÍTULO 2. TECNICALIDADES POLINOMIAIS
Naturalmente, para que tal construção faça sentido, nos valemos da suposição de que
se F ⊆ G, então A[F ] ⊆ A[G], o que segue por indução da suposição que nos acompanha
desde o final do primeiro capı́tulo, de que o anel de coeficientes A é subanel do anel de
polinômios A[x]. Em particular, isto garante a boa definição das operações de soma e
produto acima, donde segue que A[X] é, de fato, um anel comutativo e com unidade, que
contém A como subanel e X ∪ A como subconjunto gerador.
Embora existam outros modos de construir tal animal, eles são desnecessariamente
complicados para o presente momento de nossas vidas. Além disso, o método de cons-
trução é irrelevante em vista do
Demonstração. Antes de provar o caso geral, devemos nos convencer de sua validade
quando X é um conjunto finito de indeterminadas. Para X ..= ∅ é trivial, posto que
A[∅] ..= A e, para X ..= {x}, o enunciado se reduz à propriedade universal de A[x]
(Teorema 1.3.4). Agora, supondo o resultado verdadeiro para conjuntos de indeterminadas
com n > 1 elementos, provaremos sua validade para X com |X| ..= n + 1.
20
Ora, fixado x0 ∈ X, o conjunto Y ..= X \ {x0 } tem n elementos, donde segue pela
hipótese de indução que existe um único morfismo de anéis FY : A[Y ] → B satisfazendo
20
FY (y) = c(y) e FY (a) = f (a) para quaisquer y ∈ Y e a ∈ A. Daı́, pela propriedade
universal do anel (A[Y ]) [x0 ], existe um único morfismo F : (A[Y ]) [x0 ] → B tal que
F (x0 ) = h(x0 ) e F (α) = FY (α) para todo α ∈ A[Y ]. Por termos A[X] = (A[Y ]) [x0 ],
resulta que F (x) = c(x) e F (a) = FY (a) = f (a) para quaisquer x ∈ X e a ∈ A, mostrando
ES
assim a existência. Note que se existisse outro morfismo de anéis ϕ : A[X] → B com
ϕ(x) = c(x) e ϕ(a) = f (a) para quaisquer x ∈ X e a ∈ A, a restrição de ϕ ao subanel
A[Y ], digamos ψ, nos daria ψ = FY (pela unicidade de FY neste caso), acarretando ϕ = F .
UF
o que só é possı́vel se cada fj for nulo (por quê?)7 e, consequentemente, u = 0. Por fim,
a imagem de d 6= 0 em K, que denotamos por d, é tal que d · xd = 1, mostrando que xd é
o inverso multiplicativo de d em K.
Desse modo, se abandonarmos a barra “ — ” sobre a imagem dos elementos de D em
K, podemos pensar em xd como o inverso multiplicativo de d. Mais geralmente, qualquer
produto de elementos não-nulos de D é invertı́vel em K, já que d0 ·. . .·dn xd0 ·. . .·xdn = 1. De
tal observação, resulta que os elementos de K se comportam precisamente como aquilo
que costumamos chamar de frações – com a restrição de que seus denominadores são
elementos não-nulos de D.
De fato, um habitante tı́pico de K, digamos ψ, é da forma
X
ψ ..= αj xd0 m0,j xd1 m1,j . . . xdn mn,j ,
j≤N
1
escrevermos l em vez de xi l , resulta
20
para certos n, mi,j , N ∈ N, αj ∈ D e d0 , . . . , dn ∈ D \ {0}, com i ≤ n e j ≤ N . Se
20
di
X 1
ψ= αj m m m .
j≤n
d0 0,j d1 1,j . . . dn n,j
ES
Escrevemos da forma acima apenas para tornar o próximo passo irresistı́vel: tomar
d ..= d0 · . . . dn 6= 0 e M > 0 suficientemente grande8 , para multiplicarmos a identidade
UF
1
mostrando que ψ = α · para certos α, β ∈ D com β 6= 0, que abreviamos, como de
β
α α
costume, escrevendo . Em particular, frações oriundas de D são da forma , razão pela
β 1
qual omitimos o denominador.
α γ
Agora, é fácil se convencer de que para , ∈ K devemos ter
β δ
α γ αδ + βγ α γ αγ
+ = e · = , (2.1)
β δ βδ β δ βδ
as regras usuais de soma e multiplicação de frações. Em particular,
α γ
= ⇔ αδ = βγ, (2.2)
β δ
7
Está longe de ser trivial. Convença-se disso analisando casos particulares simples ou se aventure no
Exercı́cio 2.54.
8
Maior do que todos os mi,j , por exemplo.
62 CAPÍTULO 2. TECNICALIDADES POLINOMIAIS
tem a vantagem de ser uma receita de bolo. No final das contas, ocorre que o método
escolhido para construir Frac (D) é irrelevante pois, como provaremos a seguir, tal corpo
é caracterizado por uma propriedade universal.
UF
tı́pica de Frac (D). Em outras palavras, se F existir, ela deve ser dada pela expressão
acima. Portanto, nosso trabalho se resume a mostrar que tal correspondência determina,
de fato, um morfismo de anéis com as propriedades desejadas.
α γ
Precisamos nos convencer, primeiramente, de que se , ∈ Frac (D) são frações
β δ
iguais, então f (α)f (β)−1 = f (γ)f (δ)−1 . Este é o caso de fato, pois a igualdade entre
tais frações ocorre se, e somente se, αδ = βγ, acarretando f (α)f (δ) = f (β)f (γ), donde
a igualdade desejada segue automática. Fica para o leitor o trabalho de se convencer de
que tal correspondência é um morfismo de anéis.
9
O que também ocorre nos contextos mais gerais da localização de anéis, que não se comporta tão
bem como no caso de domı́nios.
2.1. POLINÔMIOS SOBRE DOMÍNIOS E CORPOS 63
Observação 2.1.29. No caso em que K é um corpo que contém D como subanel, i.e., tal
que a inclusão i : D ,→ K é um morfismo de anéis, a propriedade universal de Frac (D)
garante um único morfismo de corpos j : Frac (D) → K tal que j(d) = d para todo d ∈ D.
Como morfismos entre corpos sempre são injetores, isso nos dá o direito de enxergar
Frac (D) “dentro” de K: de fato, im (j) ⊆ K é uma cópia isomorfa de Frac (D) que
contém D. Por tal razão, também é comum encontrar textos que caracterizam o corpo
de frações de D como o “menor corpo que contém D”, posto que qualquer corpo que
contenha D deve, necessariamente, conter uma cópia de Frac (D). 4
Observação 2.1.30. É possı́vel demonstrar a propriedade universal do corpo de frações
e, mais geralmente, da localização, sem apelar para a estrutura fracionária dos elementos
de Frac (D). Embora tal argumentação alternativa seja um pouco mais abstrata, ela tem a
vantagem de funcionar, inclusive, em casos não-comutativos mais gerais. O leitor curioso
pode consultar o Exercı́cio 2.53. 4
segundo item consiste em tomar f ∈ D[x] irredutı́vel, mostrar que este deve ser irredutı́vel
em K[x], onde K ..= Frac (D) e, finalmente, usar o fato de K[x] ser um d.f.u. para concluir
que f é primo em K[x] e, a fortiori, primo em D[x]. Por isso mesmo, começamos por
ela – ou quase: precisamos revisitar a velha noção de máximo divisor comum dos nossos
tempos escolares.
Exemplo 2.1.33 (Sobre a não-unicidade do m. d. c.). Vejamos duas situações onde efeti-
vamente podemos calcular um m. d. c. entre dois elementos de anéis particulares. Vamos
começar com A ..= Z, a ..= 30 e b ..= 42: afirmamos que 6 e −6 são m. d. c. de {30, 42}. Um
modo simples de se convencer disso, embora computacionalmente impraticável em outros
casos, é observar as decomposições de 30 e 42 em fatores irredutı́veis/primos: temos, por
exemplo 30 = 2 · 3 · 5 e 42 = 2 · 3 · 7 e, como os únicos elementos invertı́veis de Z são 1 e
−1, podemos trocar cada fator p nas últimas identidades por seus associados (−1)(−p),
além de alterarmos a ordem.
20
Logo, a menos de multiplicar por −1, os números 2, 3 e 5 são todos os divisores de 30,
enquanto 2, 3 e 7 são todos os divisores de 42. Consequentemente, 2 · 3 = 6 divide tanto
20
30 quanto 42, mostrando que 6 é um divisor comum. Por outro lado, se c ∈ Z divide
30 e 42, então os elementos irredutı́veis que aparecem em uma decomposição de c devem
estar presentes tanto numa decomposição de 30 quanto numa decomposição de 42, donde
ES
é fácil ver que c ∈ {−6, 6} e, portanto, c divide 6, mostrando que 6 é, de fato, um m. d. c.
de {30, 42}. Analogamente, mostra-se que −6 também é m. d. c. de {30, 42}.
Agora, se A ..= Q[x], a ..= 2x2 − 2 e b ..= x2 − 3x + 3, então d ..= x − 1 é um
m. d. c. de {a, b}: como acima, isto segue de observarmos decomposições de a e b em
UF
onde ti ..= min{mi , ni } para cada i ≤ l. Os detalhes restantes serão deixados para o
leitor.
então existe m. d. c. F .
Obviamente a proposição acima seria inútil se sua tese fosse verdadeira em qualquer
anel. De fato, há domı́nios em que dois elementos irredutı́veis não admitem um m. d. c. – e,
UF
consequentemente, tais animais não podem ser d.f.u.. Na seção de exercı́cios deste capı́tulo
apresentamos um desses exemplos e também discutimos duas generalizações importantes
dos domı́nios aqui tratados: os domı́nios de m. d. c. e os domı́nios de Bézout. Por ora,
temos uma agenda a cumprir: demonstrar o Teorema de Gauss!
Os lemas de Gauss
Em vista da última
P proposição, se D é um domı́nio de fatoração única, então para cada
i
polinômio f = i≤n αi x ∈ D[x], podemos considerar a coleção Cf ..= {α0 , . . . , αn } dos
.
.
coeficientes de f , de modo que faz sentido definir
c(f ) ..= m. d. c. Cf
Finalmente, como p divide c(f g) por hipótese, segue que f g ∈ pD[x] e, pela discussão
acima, devemos ter ϕ(f g) = ϕ(f )ϕ(g) = 0, donde segue que ϕ(f ) = 0 ou ϕ(g) = 0 e, por
conseguinte, p divide c(f ) ou p divide c(g).
UF
Num linguajar mais próximo da nossa realidade escolar de outrora, o último corolário
garante que se os coeficientes dos polinômios f e g são coprimos, então os coeficientes
de f g também são. Veja que para f ..= 2 + 3x e g ..= 7x2 − 11 em Z[x], por exemplo,
temos f g = 21x3 + 14x2 − 33x − 22, com m. d. c. {21, 14, −33, −22} = 1. Esse tipo de
tradução pode ajudar o leitor a digerir com mais facilidade os dois próximos resultados,
que encerram a demonstração da delicada (e aguardada!) afirmação (Gii ).
temos f0 ..= βf ∈ D[x]. Daı́, fazendo α ..= c(f0 ), i.e., o m. d. c. dos coeficientes de f0 ,
20
α 1 β
resulta que c ..= e f ∗ ..= f0 = f nos dão a decomposição desejada. De fato, é
β α α
claro que c ∈ K e f ∗ ∈ D[x]. Para nos convencermos da primitividade de f ∗ , apelamos
ES
20
Teorema 2.1.44 (Gauss). Seja D um d.f.u.. Então um polinômio não-constante f ∈ D[x]
é irredutı́vel em D[x] se, e somente se, f é irredutı́vel em K[x] e primitivo em D[x].
20
Nossa última discussão encerrou o embate sobre a afirmação (Gii ). Vejamos, final-
mente, como aniquilar (Gi ).
ES
donde o resultado segue por D ser d.f.u.. Agora, se o resultado é válido para polinômios
com grau menor do que ou igual a n > 0 e deg f = n + 1, podemos escrever f = c(f )f ∗ ,
com f ∗ primitivo: basta proceder como no teorema anterior16 . Pelo caso base da indução,
c(f ) é invertı́vel ou um produto de irredutı́veis de D, de modo que se f ∗ for irredutı́vel
nossa demonstração acabou: a fatoração desejada está aı́. Por outro lado, se f ∗ não é
irredutı́vel, então f ∗ = gh, onde ambos g e h são polinômios não-nulos e não-invertı́veis
com grau menor do que ou igual n, posto que deg f = deg f ∗ (use o Exercı́cio 2.7).
Logo, pela hipótese de indução, ambos admitem fatorações por elementos irredutı́veis e,
consequentemente, f também admite.
Demonstração. Indução.
Consequentemente, se K é um corpo, então K[x0 , . . . , xn ] é um d.f.u. para qualquer
n ∈ N, mas só é d.i.p. para n ..= 0, i.e., quando se tem K[x0 ]. Consequentemente, se f e g
são polinômios em finitas indeterminadas e coeficientes em K, então existe um polinômio
que faz o papel de m. d. c. {f, g}, posto que máximos divisores comuns sempre existem
em d.f.u..
16
Na prática, estamos deixando o fator c(f ), comum a todos os coefientes de f , em evidência.
2.1. POLINÔMIOS SOBRE DOMÍNIOS E CORPOS 69
Critérios de irredutibilidade
Embora tenhamos discutido aspectos gerais do comportamento dos elementos irredutı́veis
em anéis de polinômios, não abordamos o problema real que consiste em determinar se
um dado elemento é irredutı́vel ou não.
Se, por um lado, isto se resuma na simples checagem das condições de irredutibilidade,
por outro, não há razões para pensar que tal tarefa seja trivial na prática: por exemplo,
o número 123534571 é um primo de Z? Por isso, não surpreende que seja complicado
determinar, em geral, quando um polinômio é irredutı́vel. Naturalmente há casos triviais:
fechado.
20
no próximo capı́tulo veremos que todo corpo é subanel de algum corpo algebricamente
•
20
Quando K é o corpo de frações de um domı́nio de fatoração única D, podemos reciclar
as ideias utilizadas no Teorema de Gauss a fim de obter critérios que nos permitam garantir
que um dado polinômio é irredutı́vel18 . De fato, se f ∈ K[x] é um polinômio não-nulo,
ES
vantagem teórica já que, em certo sentido, D[x] tem menos elementos para testarmos a
irredutibilidade de f ∗ .
• se p tivesse um fator de grau 3, então também teria um fator de grau 1, o que já
vimos não ser possı́vel;
Logo, p deve ser irredutı́vel é Z[x] e, portanto, em Q[x]. Note que em todas as
argumentações acima, foi imprescindı́vel o fato de que os únicos elementos invertı́veis de
Z são −1 e 1. Isso mostra que as mesmas conclusões não seriam válidas se feitas com
relação à Q, e ajuda a ilustrar a vantagem de trabalharmos em D[x] em vez de K[x] a
fim de determinar a irredutibilidade de um polinômio. •
O exemplo acima também sugere algo que o leitor realista certamente suspeitava: o
processo de determinar irredutibilidade de um polinômio é, essencialmente, artesanal.
Apesar disso, há certos padrões que nos permitem garantir, sem grandes artifı́cios, a
irredutibilidade de polinômios. Um dos mais famosos se dá no próximo
Teorema 2.1.50 (Critério de Eisenstein). Sejam D um domı́nio e f ..= a0 + a1 x + . . . +
an xn ∈ D[x] um polinômio com grau n ≥ 1. Se existir um elemento primo p ∈ D tal que
• p não divide an ,
• p2 não divide a0 ,
então f não é produto de dois polinômios não-constantes em D[x]. Em particular, f é
irredutı́vel em K[x].
20
Demonstração. Procedemos por absurdo. Se existirem g, h ∈ D[x] não constantes, com
20
f = gh, podemos escrever
g ..= α0 + α1 x + . . . + αs xs , (2.4)
h ..= β0 + β1 x + . . . + βt xt , (2.5)
ES
dividisse ambos, então p2 dividiriam a0 . Logo, temos apenas um dos casos abaixo.
p | α0 e p - β0 ou p - α0 e p | β0 .
Vamos supor que ocorra o primeiro caso. Agora, note que por termos an = αs βt e
p - an , segue que p não divide tanto αs quanto βt . Em particular, isso mostra que o
conjunto {j ∈ N : p não divide αj } é não-vazio e, portanto, tem um menor elemento,
digamos u, o qual é necessariamente menor do que ou igual a s. Observe que por termos
au = αu β0 + αu−1 β1 + αu−1 β2 + . . . + α0 βu ,
| {z }
(∗)
a minimalidade de u garante que p divide cada um dos αi ’s em (∗). Ora, como p divide au
por hipótese, resultaria que p divide αu , contrariando a nossa escolha anterior de ı́ndice.
Portanto, o primeiro caso deve ser falso. Como o segundo caso também leva a uma
contradição do mesmo tipo, resulta que a decomposição assumida não pode existir, como
querı́amos.
Em particular, como os elementos não-invertı́veis de K[x] são polinômios não cons-
tantes, a conclusão acima mostra que f deve ser irredutı́vel em K[x].
Exemplo 2.1.51. O polinômio f ..= 10x11 + 6x3 + 6 é irredutı́vel em Q[x]. De fato, como
p ..= 3 é primo em D ..= Z e
2.2. ASSUNTOS IMPORTANTES (PARA ALGUÉM) 71
• 32 = 9 não divide 6,
Outro truque eventualmente útil consiste em tomar um anel quociente adequado. Mais
precisamente, se A é um anel de I ⊆ A é um ideal, então podemos considerar o anel de
polinômios (A/I) [x], cujos elementos são polinômios na indeterminada x e coeficientes no
anel quociente A/I. Em particular, dado um polinômio f ..= a0 + . . . + an xn ∈ A[x], faz
sentido considerar o polinômio f ..= a0 + . . . + αn xn ∈ (A/I) [x], em diversas referências
chamado de polinômio reduzido de f . E daı́?
Observação 2.1.54. Note que a exigência por f ser mônico nos argumentos acima se
ES
faz por dois motivos: primeiro, o polinômio reduzido de um polinômio mônico é mônico
e, segundo, se um polinômio de grau 3 é redutı́vel, então a princı́pio sabemos apenas que
ele se fatora por um polinômio de grau 1, o qual poderia não ter raiz sem a monicidade 19 .
UF
Em último caso, podemos ainda apelar para a força bruta. Note que se f ..= x3 −
a2 x2 + a1 x + a0 é um polinômio em Z[x], então f é redutı́vel em Z[x] se, e somente se, f
tem uma raiz em Z. Ocorre que se γ ∈ Z é tal raiz, então deve ocorrer
γ 3 + a2 γ 2 + a1 γ = −a0 ,
α0 + α1 a + . . . + αn an = 0A .
Demonstração. É claro que (1) ⇒ (2). Para a recı́proca, supondo (2), devemos mostrar
que (x − a)n+1 não divide f . Ora, se dividisse, existiria p ∈ A[x] com f = (x − a)n+1 p.
ES
variavelmente 1, resulta que não existem raı́zes com multiplicidade infinita21 , mesmo em
anéis que não são domı́nios (Exercı́cio 2.27). 4
f = (x − α0 )m0 · . . . · (x − αn )mn h,
Derivadas em Álgebra??!
Pois é... Dado um polinômio f ..= j≤n αj xj ∈ A[x], definimos sua derivada como sendo
P
o polinômio22 X
f 0 ..= jαj xj−1 = α1 + 2α2 x + . . . + nαn xn−1 ,
j≤n
onde um termo da forma jαj ∈ A deve ser interpretado como no Exercı́cio 1.31.
Devido à simplicidade das duas primeiras, provemos aqui apenas a última24 . Ora, se
f ..= i≤n ai xi e g ..= j≤m bj xj , então por um lado temos
P P
m+n
!0 m+n
20 ! m+n
!
20
X X X X X X
(f g)0 = ( ai bj )xl = l ai b j xl−1 = l ai b j xl−1 (2.6)
l=0 i+j=l l=0 i+j=l l=1 i+j=l
0 0
X X X X X X X X
0 0 i j i i−1 j i j−1
f g + fg = ai x bj x + ai x b j xj = iai x bj x + ai x jbj x =
UF
20
2. f (j) (d) = 0 para todo j < n e f (n) (d) 6= 0, onde f (j) é a j-ésima derivada28 de f .
Demonstração. Vamos proceder por indução em n ∈ N \ {0}, de modo que o caso base
20
é precisamente o lema anterior. Agora, assumindo a equivalência verdadeira para n > 1,
mostraremos sua validade para n + 1.
Se d é raiz de f com multiplicidade n + 1, então existe um polinômio h ∈ D[x] com
f = (x − d)n+1 h e h(d) 6= 0. Logo,
ES
Agora, por termos f 0 (d) = . . . = (f 0 )n−1 (d) = 0 e (f 0 )(n) (d) 6= 0, a hipótese de indução
nos permite afirmar que d é raiz de f 0 com multiplicidade n. Note que se mostrarmos que
d também é raiz de h com multiplicidade n, a prova estará terminada.
26
Comutativo e com unidade, por favor, né...
27
Isto é, tem multiplicidade maior do que 1.
0
28
Mais precisamente: f (0) ..= f e, se f (j) estiver definido, então f (j+1) ..= f j .
2.2. ASSUNTOS IMPORTANTES (PARA ALGUÉM) 75
Por um lado a identidade (2.7) nos diz que (f 0 )(m) = (m + 1)h(m) + (x − d)h(m+1) para
qualquer m ∈ N. Por outro lado, a observação acerca de f 0 e d feita acima nos dá
para j < n e 0 6= (n+1)h(n) (d)+(d−d)h(n+1) (d) = (n+1)h(n) (d). Logo, as hipóteses sobre
D nos permitem concluir que d é raiz de h com multiplicidade n, como querı́amos.
20
(i) a propriedade universal do anel de polinômios A[x] nos dá um único morfismo de
anéis ϕ : A[x] → A[x] tal que ϕ(x) = x − α, bem como um único morfismo de anéis
20
ψ : A[x] → A[x] tal que ψ(x) = x + α;
(iii) como IdA[x] : A[x] → A[x] deve ser o único morfismo de anéis que leva x em x,
resulta que ψ = ϕ−1 ,
(iv) em particular, por ϕ ser sobrejetora, existe g ..= j≤n γj xj tal que ϕ(g) = f ,
P
UF
i.e.,
f = γ0 + γ1 (x − α) + . . . + γn (x − α)n . (2.8)
Apesar disso, geralmente é uma tarefa não-trivial determinar, na prática, quem são os
coeficientes γj . No caso em que o anel é, na verdade, um corpo K com char (K) = 0, as
derivadas nos dão um algoritmo alternativo.
Avaliando f em α, segue de (2.8) que γ0 = f (α). Daı́, ao derivarmos as duas expressões
em (2.8), resulta que
f 00 (α)
acarretando f 00 (α) = 2γ2 e, por K ser corpo, γ2 = . Ao procedermos dessa maneira
2
f (j) (α) X f (j) (α)
indutivamente, obteremos γj = e daı́ f = (x − α)j , chamada de ex-
j! j≤n
j!
pansão de Taylor do polinômio f em α. Note que sem impor char (K) = 0, poderı́amos
ter j! = 0 em K para algum j, o que não nos permitiria determinar γj . •
76 CAPÍTULO 2. TECNICALIDADES POLINOMIAIS
Observação 2.2.10 (Derivadas nulas). Já que esta subseção se tornou um puxadinho
de Cálculo, pode ser interessante rever um fenômeno curioso das derivadas com épsilons
e deltas sob a luz da Álgebra. Lembremo-nos de que no Cálculo, a derivada de funções
constantes é nula, com a conveniente “recı́proca” de que uma função com derivada nula
num intervalo é constante no intervalo.
O mesmo fenômeno se verifica com a derivada de polinômios se a caracterı́stica do
domı́nio de coeficientes for 0, i.e., se char (D)
P = 0 e fj−1 ∈ D[x] satisfaz f 0 = 0, então f ∈ D.
De fato, se f = j≤n ai x , então f = j≤n jaj x , de modo que se ocorrer f 0 = 0,
i 0
P
então jaj = 0 para cada j ≤ n, donde a suposição sobre a caracterı́stica de D nos dá
j ∈ D \ {0} para cada j ∈ {1, . . . , n}, e a hipótese sobre D ser domı́nio acarreta aj = 0.
Logo, o único coeficiente possivelmente não-nulo de f é a0 e, portanto, f ∈ D.
Por outro lado, se char (D) 6= 0 é um número primo29 maior do que 0, digamos p ∈ N,
e f ∈ D[x] satisfaz f 0 = 0, então existe g ∈ D[x] tal que f = g(xp ). Mais precisamente,
n ∈ D tais que f = a0 +
existem a0 , . . . , aP a1 xp + a2 x2p + . . . + an xnp . A demonstração é
análoga: se f ..= j≤m bj xj , então f 0 = j≤m jbj xj−1 , donde a identidade f 0 = 0 aliada
P
às hipóteses sobre D nos permitem concluir apenas que os coeficientes bj com p 6 | j são
nulos. 4
Uma análise mais cuidadosa sobre a multiplicidade de raı́zes em polinômios com coefi-
cientes num corpo será feita em nosso breve estudo das extensões separáveis, no próximo
20
capı́tulo. Por ora, vamos nos demorar um pouco mais com os números complexos.
20
2.2.2 O corpo dos complexos e as raı́zes da unidade
Recordemo-nos de que o corpo dos números complexos C é composto pelos números
da forma a + bi, com a, b ∈ R e onde i é tal que i2 = −1. Formalmente, podemos pensar
ES
No sentido do que aponta a observação anterior, números complexos podem ser reali-
zados como pontos do plano R2 , por meio da correspondência óbvia
(a, b) 7→ a + bi.
Embora isso defina uma bijeção entre R2 e C, não devemos nos apressar e achar que
isso chega perto de ser um isomorfismo de anéis: embora a soma de um par (a, b) + (c, d)
em R2 seja levada no número complexo (a + c) + (b + d)i, a multiplicação não é respeitada,
posto que (0, 1) · (0, 1) = (0, 1) em R2 , enquanto i · i = −1. Isso já era esperado, uma vez
que C é um corpo e R2 não chega nem mesmo a ser um domı́nio.
Porém, dada a natureza amigável e intuitiva do plano cartesiano R2 , isso abre espaço
para a pergunta de como poderı́amos interpretar a multiplicação de números complexos
como algum tipo de operação entre vetores do R2 . Isso é feito brilhantemente pela repre-
sentação polar de um número complexo, que por sua vez é tremendamente simplificada
pela notação de Euler.
20
20
Figura 2.2: Diferentes formas de interpretar 1 + i.
ES
b a
então devem valer as identidades sen ϑ = , cos ϑ = e, consequentemente
|z| |z|
z = |z| · (cos ϑ + i · sen ϑ) , (2.11)
chamada de representação polar do número complexo z. Na expressão acima, o número
não-negativo |z| será chamado de norma de z, enquanto o ângulo ϑ é um argumento32
de z. O leitor não deve ter dificuldades para se convencer de que o número real |z| ≥ 0
que torna a identidade (2.11) é o único a fazer isso.
Agora, note que se z = |z| · (cos ϑ + i sen ϑ) e z 0 = |z|0 · (cos ρ + i sen ρ), então
z · z 0 = (|z| · (cos ϑ + i sen ϑ)) · (|z|0 · (cos ρ + i sen ρ)) =
= |z| · |z 0 | · (cos ϑ cos ρ − sen ϑ sen ρ + i(cos ϑ sen ρ + cos ρ sen ϑ)) = (2.12)
= |zz 0 | · (cos (ϑ + ρ) + i sen (ϑ + ρ)) ,
onde a última igualdade se deve ao fato de termos33 |z| · |z 0 | = |zz 0 | aliada às fórmulas
para o cosseno e seno da soma de ângulos quaisquer.
32
Como as funções cosseno e seno têm perı́odo 2π, é claro que se ϑ é um argumento de z, então ϑ + 2π
ainda é um argumento de z.
33
Não é difı́cil se convencer de que a identidade |z|2 = zz vale para qualquer z ∈ C, onde z denota
2
o conjugado de z. Logo, (|z||z 0 |) = zzz 0 z 0 = zz 0 zz 0 = |zz 0 |2 , donde segue |z||z 0 | = |zz 0 |. Lembre-se: a
conjugação de números complexos determina um isomorfismo de anéis C → C.
78 CAPÍTULO 2. TECNICALIDADES POLINOMIAIS
20
z n = rn · (cos nϑ + i sen nϑ), (2.13)
20
para qualquer34 n ∈ N. A fórmula (2.13) costuma ser chamada de fórmula de de
Moivre, em referência ao matemático francês Abraham de Moivre35 . No Exercı́cio 2.36,
o leitor é convidado a demonstrar sua validade para qualquer n ∈ Z. 4
ES
soma de outros em R, coisa que a exponenciação já faz na multiplicação de números reais:
ax ay = ax+y para quaisquer a > 0 e x, y ∈ R. Mais precisamente, para cada x ∈ R vamos
escrever
eix ..= cos x + i sen x, (2.14)
chamada de fórmula de Euler, onde e é o número de Euler que aprendemos a amar
nos cursos de Cálculo.
Observação 2.2.14 (Como se livrar da circularidade). Apesar de ser inofensivo ado-
tar (2.14) como uma definição36 neste curso, convém destacar algumas peculiaridades da
notação.
1. Formalmente, até agora sabemos apenas calcular ex para x ∈ R, de modo que a
expressão em (2.14) escapa de tal cenário, uma vez que ix ∈ C \ R para todo x 6= 0.
3. Uma vez convencidos de que faz sentido escrever ez para z ∈ C, podemos nos
perguntar sobre o que é eix para x ∈ R. Ora, por ser um número complexo legı́timo,
existem r ≥ 0 e ϑ ∈ R tais que eix = r · (cos ϑ + i sen ϑ). Note que como x ∈ R e
tanto r quanto ϑ dependem de x, faz sentido pensar em r e ϑ como funções reais
de x. Daı́, ao apelarmos mais uma vez para Análise Complexa, mostra-se que
dr dϑ
i · eix = (cos ϑ + i sen ϑ) + r · (− sen ϑ + i cos ϑ)
dx dx
e, ao substituirmos a expressão para eix acima e compararmos as partes reais e
dr dϑ
imaginárias, resulta que = 0 e = 1. Logo, r deve ser uma constante,
dx dx
enquanto ϑ é da forma x + C. Finalmente, como ei0 = 1, obtemos r = 0 e C = 0,
acarretando a identidade
eix = cos x + i sen x.
com rs ≥ 0, o que por sua vez é apenas a identidade obtida em (2.12) reescrita com a
notação de Euler. Todo esse malabarismo tem consequências surpreendentes no estudo
dos polinômios da forma xn − 1 ∈ C[x], para n ∈ N com n > 0.
UF
resulta que reix é raiz da unidade se, e somente se, r = 1, cos nx = 1 e sen nx = 0.
Finalmente, como as condições cos ϑ = 1 e sen ϑ = 0 só são satisfeitas para ϑ = k · 2π
com k ∈ Z, provamos a maior parte da seguinte
Demonstração. A argumentação acima já deve ter nos convencido quanto à forma das
2kπ
raı́zes n-ésimas da unidade: todas elas são da forma e n i para algum k ∈ Z e, reciproca-
mente, todo número complexo dessa forma é uma raiz n-ésima da unidade. Vamos tratar
então da quantidade de raı́zes.
2π
Note que ω ..= e n i é uma raiz n-ésima da unidade tal que ω não é raiz de xm − 1 para
qualquer m < n: se ω fosse raiz de xm − 1, resultaria que m é múltiplo de n e, portanto,
m ≥ n. Agora, é claro que qualquer potência de ω também é raiz n-ésima da unidade. Em
particular, ω 0 = 1, ω, ω 2 , . . . , ω n−1 são raı́zes n-ésimas da unidade, que devem ser todas
distintas entre si: se ω j = ω k para 1 ≤ j < k < n, terı́amos ω k−j = 1, com 0 < k − j < n,
contrariando a minimalidade de n aferida acima. Daı́, como xn − 1 tem no máximo n
raı́zes, o resultado está provado.
2π 2(n−1)π
Geometricamente, as n raı́zes n-ésimas da unidade, a saber 1, e n i , . . . , e n i , cor-
respondem aos n vértices de um polı́gono regular inscrito na circunferência de raio 1,
centro na origem e um vértice no eixo horizontal, interpretação que inclusive ajuda a
2kπ
entender o comportamento cı́clico das raı́zes da forma e n i para k ≥ n. Em geral, dado
k ∈ Z, existem únicos q, r ∈ Z com 0 ≤ r < n tais que k = qn + r, donde segue que
2kπ 2qnπ 2rπ 2rπ 2rπ
i i i
e n =e n e n = (e2πi )q e n
i
=e n
i
,
Suponha que sejam dados um polinômio p ..= a0 +a1 x+. . .+an xn ∈ Q[x] e um matemático
do século XVIII ou anterior. Se ambos forem deixados simultaneamente na mesma sala,
então um deles tentará resolver o outro. Resolver, no caso do matemático, significa
encontrar um método ou fórmula que permita determinar as raı́zes do polinômio por
meio de seus coeficientes. Já para o polinômio, resolver o matemático significa assisti-lo
falhar quando n ≥ 5. Como assim?
Para n ≤ 2, a famigerada fórmula de Bhaskara 38 , terror dos alunos do Ensino Médio e
paixão dos concurseiros, determina que as raı́zes (possivelmente complexas) de ax2 +bx+c
são da forma √ √
−b + b2 − 4ac −b − b2 − 4ac
e ,
2a 2a
que admitem diversas deduções ao longo da história, algumas bastante recentes39 .
38
This represents Brazil more than soccer and samba: a expressão “fórmula de Bhaskara”, ou
“Bháskara”, parece ser algo difundido apenas no Brasil, o que é curioso, já que Bhaskara nada teve
a ver com a descoberta/invenção dessa fórmula. Por que esse hábito se difundiu no Brasil? Não sei, e
pretendo continuar assim.
39
Um modo bastante intuitivo foi desenvolvido em 2019, pelo matemático Po-Shen Loh. O artigo,
A Simple Proof of the Quadratic Formula, está disponı́vel no arXiv: https://arxiv.org/pdf/1910.
06709.pdf.
2.3. EXERCÍCIOS 81
2.3 Exercı́cios
Irredutibilidade, invertibilidade e afins
A menos de menções explı́citas em contrário, A, D e K denotam, respectivamente, um
anel, um domı́nio e um corpo.
Exercı́cio 2.1. Sejam D um domı́nio e a, b ∈ D elementos quaisquer. Mostre que a e b
são associados se, e somente se, hai = hbi.
Exercı́cio 2.2. Sejam D um domı́nio e π, ρ ∈ D elementos quaisquer, com π 6= 0. Mostre
que se existe σ ∈ D tal que π = ρσ e hρi ⊆ hπi, então σ é invertı́vel.
Exercı́cio 2.3. Sejam D um domı́nio e r ∈ D com r 6= 0. Mostre que hri + hxi é um
ideal principal em D[x] se, e somente se, r é invertı́vel em D.
20
Dica. Se r for invertı́vel então é claro que hri + hxi é principal em D[x], pois hri = h1i.
Para a recı́proca, supondo p ∈ D[x] com hri + hxi = hpi, conclua que p ∈ D é invertı́vel
20
e, com isso, obtenha α ∈ D com αr = 1.
Exercı́cio 2.4. Mostre que se D é um domı́nio, então f ∈ D[x] é invertı́vel se, e somente
se, f ∈ D com f invertı́vel em D. É importante que D seja um domı́nio? Por quê?
ES
Exercı́cio 2.7. Dado um corpo K, mostre que f ∈ K[x] é irredutı́vel se, e somente se,
deg f ≥ 1 e não existem polinômios g, h ∈ K[x] com 0 < deg g, deg h < deg f tais que
f = gh. Dica: procure primeiro pelos invertı́veis de K[x].
Exercı́cio 2.8. Sejam K um corpo e f ∈ K[x] um polinômio irredutı́vel. Por que o anel
quociente K[x]/hf i é um corpo?
Exercı́cio 2.9. Vale a recı́proca no exercı́cio anterior?
Exercı́cio 2.10. Mostre que se K é um corpo e f ∈ k[x] é um polinômio com grau 2 ou
3, então f é irredutı́vel se, e somente se, f não admite raı́zes em k. O que ocorre para
deg f 6∈ {2, 3}?
Exercı́cio 2.11. Mostre que x1023914123 − 27x2 + 1 ∈ R[x] é redutı́vel. Dica: use Cálculo.
Exercı́cio 2.12. Pense rápido: se f ∈ K[x] \ K é um polinômio redutı́vel, então f tem
raiz em K?
Exercı́cio 2.13. Use os resultados provados no capı́tulo para demonstrar que as seguintes
afirmações, sobre um número p ∈ Z \ {0, 1} qualquer, são equivalentes:
40
https://drive.google.com/file/d/1ZEqV2eUdFa8kqcHerZkYO8AeQA8Sk2kn/view?usp=sharing
82 CAPÍTULO 2. TECNICALIDADES POLINOMIAIS
• se a = 0, então m. d. c. {a, b} = b.
Exercı́cio 2.16. O objetivo deste exercı́cio fútil é mostrar que f ..= x2 + y 2 − 1 ∈ K[x, y]
é irredutı́vel, qualquer que seja o corpo K com char (K) 6= 2.
a) Chamando Z ..= K[y], observe que Q ..= Frac (Z) é o anel cujos elementos são
p
frações da forma , com p, q ∈ Z ..= K[y] e q 6= 0. Isso nos permite trabalhar com
q
o polinômio f no anel Q[x]. Reflita sobre isso pelo tempo que precisar.
+ y 2 − 1 = 0,
q
de que 2 6∈ Q nos permite concluir que tal identidade não pode ser satisfeita.
Divisão em domı́nios
Exercı́cio 2.17. Sejam D um domı́nio euclidiano com grau ∂ e a, b ∈ D \ {0}.
Exercı́cio 2.20. Mostre que para a, b ∈ Z quaisquer existe um único d ≥ 0 tal que
d = m. d. c. {a, b}. Observe que existem inteiros x, y ∈ Z tais que d = xa + yb.
2.3. EXERCÍCIOS 83
20
Observação 2.3.1. A identidade m. d. c. {a, b} = xa + yb é frequentemente chamada de
identidade de Bézout, daı́ o nome dado aos domı́nios nos quais ela é satisfeita. 4
20
Exercı́cio 2.23. Mostre que se D é um domı́nio noetheriano42 em que todo elemento
irredutı́vel é primo, então D é d.f.u.. Dica: já fizemos isso.
Exercı́cio 2.24. Sejam K um corpo e f0 , f1 ∈ K[x] polinômios coprimos, i.e., tais que
ES
m. d. c.{f0 , f1 } = 1. Mostre que para todo f ∈ K[x] existem polinômios g0 , g1 ∈ K[x] tais
que f = g0 f0 + g1 f1 .
UF
onde a última identidade é tomada em K(x), o corpo de frações de K[x]. Dica: use o
exercı́cio anterior e indução em t.
i) K = Q;
√
ii) K = Q[ 2];
iii) K = R.
41
Lembre-se que um polinômio é mônico se seu coeficiente lı́der é 1.
42
Relembre a definição na página 51.
43
Eu sou escravo da Constituição Federal e da Ementa da disciplina.
84 CAPÍTULO 2. TECNICALIDADES POLINOMIAIS
Raı́zes e multiplicidade
Exercı́cio 2.27. Sejam um anel A 6= 0 e um polinômio f ∈ A[x] \ A. Mostre que se a é
uma raiz de f , então existe n ∈ N com n > 0 tal que (x − a)n divide f mas (x − a)n+1
não divide f .
Exercı́cio 2.31. Pense rápido: a função ∂ : A[x] → A[x] que faz ∂(f ) ..= f 0 para todo
f ∈ A[x], é um morfismo de anéis?
Exercı́cio 2.32. Dado um anel A e um elemento a ∈ A, mostre que para todo n ∈ N\{0}
deve valer ((x − a)n )0 = n · (x − a)n−1 .
20
Exercı́cio 2.33. Sejam D um domı́nio, f ∈ D[x] um polinômio não-constante, d ∈ D
um elemento e n ∈ N \ {0} um número natural. Mostre que se char (D) > n, então são
equivalentes:
20
• d é raiz de f com multiplicidade n;
Sortidos
Exercı́cio 2.40. Dados um anel A e um ideal I ⊆ A, mostre que (A/I) [x] é isomorfo ao
anel A[x]/I[x], onde I[x] é o ideal em A[x] gerado por I.
Exercı́cio 2.41. Reflita: por que a notação I[x], empregada acima, faz sentido?
Exercı́cio 2.42. Use o fato de Z ser um d.f.u. para obter um algoritmo capaz de deter-
minar se duas palavras quaisquer são anagramas44 .
Exercı́cio 2.43. Determine as raı́zes do polinômio x5 + 3x3 + x2 + 2x ∈ (Z/h5i) [x].
Exercı́cio 2.44. Dizemos que um corpo K é algebricamente fechado se todo polinômio
não-constante f ∈ K[x] admite pelo menos uma raiz em K.
i) Mostre que R não é algebricamente fechado.
ii) Mostre que se K é um corpo finito, então K não é algebricamente fechado.
Exercı́cio 2.45. Qual deveria ser a definição de anel algebricamente fechado? Mostre
que se A 6= 0 for um anel algebricamente fechado, então A é um corpo.
Exercı́cio 2.46. Se K é um corpo e a ∈ K \ {0}, mostre que o morfismo ψ : K[x] → K[x]
dado por ψ(p) ..= p(ax) é um isomorfismo de anéis. O que acontece se K for apenas um
domı́nio? 20
Exercı́cio 2.47. Sejam K um corpo e p ∈ K[x] \ K um polinômio irredutı́vel.
20
i) Mostre que se f ∈ K[x] é um polinômio não-nulo que divide p, então f ∈ K ou
p = α · f para algum α ∈ K.
ES
ii) Mostre que se f, g ∈ K[x] são tais que p divide f · g, então p divide f ou p divide g.
Você percebeu alguma relação dos itens anteriores com o fato de K[x] ser um d.f.u.?
Quais?
UF
Localização e injetividade
Exercı́cio 2.52. Prove a propriedade universal do corpo de frações sem usar a caracte-
rização dos elementos do corpo de frações. Dica: use a propriedade universal do anel de
polinômios e do quociente.
Exercı́cio 2.53. [soon]
Exercı́cio 2.54. [soon]
44
Como bolo e lobo, por exemplo.
UF
ES
20
20
Capı́tulo 3
Yoga algébrica
Como o nome do capı́tulo sugere, nesta parte final do curso trataremos das extensões
de corpos. Embora, em certo sentido, a definição seja a mesma do contexto de anéis, a
aparentemente inócua existência de inversos multiplicativos facilita sobremaneira o estudo
das extensões de corpos em comparação com o que se faz no cenário de anéis.
Explicitamente, dados corpos K e L, dizemos que L é um extensão de K, o que
denotaremos daqui em diante por K/L, se K for um subcorpo de L. Em outras palavras,
20
K deve ser um subconjunto de L de tal forma que a inclusão i : K ,→ L seja um morfismo
de anéis. Já esbarramos com situações desse tipo ao longo do texto:
20
• as inclusões Q ( R ( C nos dão as extensões C/R, R/Q e C/Q;
87
88 CAPÍTULO 3. YOGA ALGÉBRICA
Q[x]
iv) finalmente, a maximalidade obtida acima garante que 2 é corpo e, por
√ hx − 2i
conseguinte, Q[ 2] também deve ser.
√
A parte mais curiosa, porém, vem agora: ao tratarmos Q[ 2] como um Q-espaço veto-
rial, a descrição de seus elementos deixa evidente que ele deve ter dimensão 2, exatamente
o grau do polinômio √ x2 − 2. Será mesmo uma coincidência? √
Se tomarmos 3 2 ∈ R, então a função ψ : Q[x] → R que faz ψ(f ) ..= f ( 3 2) para cada
f ∈ Q[x] é um morfismo de anéis cujo núcleo é hx3 − 2i, novamente um ideal maximal
de Q[x], o que garante que im (ψ) é um subcorpo de R. Em particular, note que se
β ∈ im (ψ), então existem números racionais a, b, c ∈ Q tais que
√3
√
3 2
β =a+b 2+c 2 ,
n √ √ 2o
sugerindo que, talvez, 1, 3 2, 3 2 pode ser uma base para im (ψ) como Q-espaço veto-
rial2 . Veja como o número 3 foi recorrente neste parágrafo...
Por outro lado, se tomarmos um elemento γ ∈ R que não é raiz de qualquer polinômio
em Q[x], então o morfismo de anéis ϕ : Q[x] → R que faz ϕ(f ) ..= f (γ) para
√ cada f ∈ Q[x]
deve ter núcleo trivial, mostrando que o subanel im (ϕ), o análogo do Q[ 2] no primeiro
20
caso, não é subcorpo de R: se fosse, então h0i seria um ideal maximal de Q[x], coisa que
não ocorre. Coincidentemente, a dimensão de im (ϕ) como Q-espaço vetorial é infinita.
Os fenômenos acima não são frutos do acaso: o estudo das extensões de corpos que
20
faremos neste capı́tulo permitirá perceber como as questões tipicamente algébricas se
relacionam com as noções de caráter mais geométrico difundidas na Álgebra Linear.
Como bônus, ganham-se ferramentas adicionais para resolver problemas de várias na-
ES
Exemplo 3.1.1. Numa extensão de corpos L/K, todo elemento de K é algébrico sobre
K. De fato, se k ∈ K, então k é raiz do polinômio x − k ∈ K[x]. •
√ √
Exemplo 3.1.2. Os números 2 e 3 2, ambos pertencentes a R, são algébricos sobre Q,
pois são raı́zes dos polinômios x2 − 2 e x3 − 2, respectivamente. Note que embora sejam
algébricos sobre Q, tais números são irracionais. •
2
Também pode ser interessante rever o Exercı́cio 1.35.
3.1. ALGEBRICIDADE E TRANSCENDÊNCIA 89
X
e(f ) ..= γj αj ∈ B,
j≤n
Nessa altura do campeonato, o leitor não deve ter grandes dificuldades para se con-
f (α)
vencer de que, explicitamente, os elementos de K(α) são frações em L da forma ,
g(α)
onde f, g ∈ K[x] e g(α) 6= 0. Nesse contexto, uma pergunta pertinente que talvez torture
a consciência do leitor atento é a seguinte: é possı́vel que ocorra K[α] = K(α)? A res-
posta para essa pergunta também revela a relação entre a discussão acima e as noções de
algebricidade e transcendência que definimos anteriormente.
1. α é algébrico sobre K;
por K[x] ser d.i.p., existe um polinômio p ∈ ker e satisfazendo ker e = hpi. No caso
em que α é algébrico sobre K, resulta que p é um polinômio não-constante (por quê?!),
digamos p ..= a0 + . . . + an xn com an 6= 0. Logo, q ..= a−1
n p é um polinômio não-constante,
mônico, irredutı́vel e tal que q(α) = 0. Por ser único (Exercı́cio 3.2), o polinômio q
costuma receber um xingamento especial: q é o polinômio minimal de α sobre K,
explicitamente o polinômio mônico de menor grau que tem α como raiz. Vamos denotá-lo
simplesmente por mα quando não houver risco de confusão. 4
Tais objetos costumam ser os protagonistas dos cursos de Álgebra Linear7 , geralmente
para K = R ou K = C. Para este curso, precisamos nos lembrar da noção de base.
Primeiro, dizemos que S ⊆ V é um subespaço vetorial se a restrição das operações
de V fazem de S um K-espaço vetorial tal que 0V ∈ S. Como no caso de ideais, a
interseção de subespaços vetoriais é um subespaço vetorial e, de modo análogo, podemos
definir o subespaço gerado por um subconjunto G ⊆ V , que denotamos por hGi, como
a interseção de todos os subespaços de V que contêm G. Quando G 6= ∅, resulta que hGi
é a coleção de todas as combinações K-lineares de elementos de G.
Agora, um subconjunto B ⊆ V é uma base para V se
• B for um gerador para V , i.e., hBi = V e, 20
• B for linearmente independente, abreviado como l.i., o que por sua vez significa
20
que para qualquer número finito de elementos de B, digamos b0 , . . . , bn ∈ B, uma
combinação linear do tipo α0 b0 + . . . + αn bn = 0V só por possı́vel para α0 = α1 =
. . . = αn = 0.
ES
Até aqui, tudo isso poderia ser definido se K, em vez de corpo, fosse simplesmente um
anel, situação em que a expressão “espaço vetorial” costuma ser substituı́da por módulo:
moralmente, um A-módulo8 é um espaço vetorial sobre o anel A. Mesmo neste cenário
UF
Dada uma extensão de corpos L/K, o corpo “maior” L pode ser visto como um K-
espaço vetorial de modo muito natural: para k ∈ K e v ∈ L, a multiplicação do “escalar”
k pelo “vetor” v é simplesmente o resultado da multiplicação k · v quando ambos são
vistos como elementos de L. Não é tão complicado quanto parece: por exemplo, o corpo
dos números reais R é um subcorpo dos números complexos C, e podemos tratar C como
R-espaço vetorial ao declararmos
Logo, em virtude do que discutimos na última observação, existe o cardinal dimK K[α],
ES
K[x]
de α, digamos f ..= xn + j<n αj xj , é irredutı́vel e K[α] '
P
. Daı́, basta notar que
hf i
K[x]
{1, x, . . . , xn−1 } é uma base para . Os Exercı́cios 3.4 e 3.5 tratam dos detalhes11 .
hf i
Finalmente, resta apenas nos convencermos de que (3) ⇒ (1). Um modo inusitado de
fazer isso depende do seguinte lema, cuja prova é o conteúdo do Exercı́cio 3.3.
Demonstração de que (3) ⇒ (1). Como (1) e (2) são equivalentes, basta mostrarmos que
(3) ⇒ (2). Como isso é imediato em vista do lema anterior, a demonstração está encer-
rada.
10
Há quem escreva “dimK V = ∞” para indicar que a dimensão do espaço não é finita. Contudo, isso
não é muito adequado, posto que o sı́mbolo “∞” costuma estar atrelado à noção de “ilimitação”, mais
comum aos contextos em que existe uma noção de medida contı́nua. Existem notações próprias para as
infindáveis cardinalidades infinitas. De qualquer forma, o leitor é livre para abusar das notações como
todo bom algebrista.
11
Alternativamente, ou nem tanto: use o algoritmo da divisão de polinômios para mostrar que
{1, α, . . . , αn−1 } é uma base para K[α] sem apelar para quocientes.
3.1. ALGEBRICIDADE E TRANSCENDÊNCIA 93
Corolário 3.1.12. Seja L/K uma extensão de corpos. Se a dimensão de L com oK-
espaço vetorial for finita, então L/K é uma extensão algébrica.
Demonstração. De fato, como K[α] é subespaço vetorial de L e o último tem dimensão
finita, segue que K[α] tem dimensão finita e, portanto, α é algébrico sobre K.
Exemplo 3.1.13. A extensão C/R é finita, pois {1, i} é uma base para C como R-espaço
vetorial. Consequentemente, todo número complexo é raiz de algum polinômio real. •
Em geral, escrevemos [L : K] para indicar a dimensão do corpo L como K-espaço
vetorial e, nesse contexto, chamamos o cardinal [L : K] de grau da extensão. Quando
[L : K] é um cardinal finito, dizemos que a extensão L/K é finita. Logo, como subespaços
vetoriais de espaços com dimensão finita têm dimensão finita, o último teorema nos dá o
Corolário 3.1.14. Toda extensão de corpos finita é algébrica.
Observação 3.1.15. Há um modo mais direto de se convencer da validade do último
corolário. Sejam L/K um extensão finita, α ∈ L qualquer e B ⊆ L uma base de L como
K-espaço vetorial, cuja cardinalidade é um número natural n > 0. Se α ∈ K não há o que
provar. Se α 6∈ K, então podemos assumir que {1, α, . . . , αn } tem cardinalidade n + 1:
se αj = αj+i para i > 0, então αj (αi − 1) = 0 e, por conseguinte, α é raiz do polinômio
xi − 1 ∈ K[x], como querı́amos. Agora, se 1, α, . . . , αn são dois a dois distintos, então
20
necessariamente eles formam um conjunto linearmente dependente Pn em L,j donde segue que
existem constantes γ0 , . . . , γn ∈ K não todas nulas tais que j=0 γj α = 0, mostrando
20
que α é raiz do polinômio nj=0 γj xj . Reflita: esse argumento funcionaria no contexto de
P
anéis? 4
A recı́proca do último corolário é falsa, i.e., existem extensões algébricas L/K tais que
ES
dimK L > n para qualquer n ∈ N. Porém, para trabalhar com elas ou mesmo exibi-las,
os ferramentais necessários costumam ser bem mais delicados. Uma das razões para essa
dificuldade está escondida no próximo teorema, cuja prova depende da
UF
já que √
Q[ 3] também
√ é√uma extensão
√
20
Exemplo√3.1.18. Já sabemos que Q[ 2] é uma extensão de Q com grau 2. Analoga-
mente, √ de Q com grau 2. As duas extensões são distintas,
2 6∈ Q[ 3]√e 3 6∈ Q[ 2]: se a primeira pertinência √ ocorresse, por exemplo,
20
2 2
terı́amos 2 = a + b√3 para certos a, b ∈ Q, e daı́ √ 2= √ a + 2ab 3 + 3b , o que acarretaria
na racionalidade
√ √ de 3. Por outro lado, como 2 e 3 são algébricos sobre Q, segue que
.
L = Q[ 2, 3] é um subcorpo de R que contém Q.
.
ES
Embora o fenômeno acima não seja válido para toda extensão finita, ela vale para
uma classe de extensões que engloba as extensões finitas dos racionais, tópico abordado
na próxima seção deste capı́tulo. Porém, antes disso convém abordar rapidamente (e em
caráter opcional) a existência dos chamados fechos algébricos, o que fazemos na próxima
subseção.
Ao nos depararmos com um certo corpo K, pode ser o caso de que exista um polinômio
p ∈ K[x] \ K sem raı́zes em K. Por exemplo, o polinômio x(x + 1) + 1 ∈ F2 [x] não admite
raı́zes em F2 : basta verificar com os únicos elementos de F2 , que são 0 e 1. Esse tipo de
situação sugere que busquemos uma extensão L/K na qual o polinômio p ∈ K[x] ⊆ L[x]
admita uma raiz. Mas poderia ser o caso de que nessa nova extensão, existisse um
polinômio q ∈ L[x] \ L sem raı́zes, de modo que o problema se repetiria.
Dizemos que L é um corpo algebricamente fechado se todo polinômio não-constante
p ∈ L[x] admite pelo menos uma raiz em L. Naturalmente, por meio do algoritmo da
divisão de polinômios, é fácil ver que L é algebricamente fechado se, e somente se, todo
polinômio não-constante tem todas as raı́zes possı́veis 15 em L. Agora, podemos nos
perguntar com mais precisão: dado um corpo K, existe uma extensão L/K com L alge-
bricamente fechado?
A resposta é um sonoro SIM e, como se não bastasse, a argumentação segue um roteiro
natural:
i. prova-se que existe uma extensão K 0 de K tal que todo polinômio f ∈ K[x] \ K tem
(pelo menos) uma raiz em K 0 ;
e, por conseguinte, em L.
O leitor atento deve ter notado que, a menos do primeiro passo, o roteiro acima é
quase trivial. O único problema para executá-lo se encontra, precisamente, no passo
UF
15
No sentido de que tem tantas raı́zes quanto o seu grau permite. Isso não exclui a possibilidade de
que existam raı́zes repetidas.
16
Pode-se provar que dois corpos isomorfos têm fechos algébricos isomorfos. No entanto, o isomorfismo
entre os fechos algébricos não é necessariamente único ou natural: de fato, em sua construção emprega-se
o Lema de Zorn.
96 CAPÍTULO 3. YOGA ALGÉBRICA
Como λ0 ∈ L e L/K é algébrica, resulta que dimK K[λ0 ] é um cardinal finito. Agora,
sabemos que λ1 ∈ L é algébrico sobre K, mas por termos K ⊆ K[λ0 ], inferimos que λ1
é algébrico sobre K[λ0 ] e, consequentemente, K[λ0 ][λ1 ] ..= K[λ0 , λ1 ] tem dimensão finita
como K[λ0 ]-espaço vetorial. Por valer a identidade
dimK K[λ0 , λ1 ] = dimK[λ0 ] K[λ0 , λ1 ] · dimK K[λ0 ],
temos necessariamente dimK K[λ0 , λ1 ] finita, de modo que procedendo indutivamente,
concluı́mos que M ..= K[λ0 , . . . , λn ] é um K-espaço vetorial cuja dimensão é finita. Fi-
nalmente, como α ∈ L é algébrico sobre M , devemos ter dimM M [α] finita, donde nova-
mente usamos a proposição anterior para concluir que M [α]/K é um extensão finita e,
consequentemente, α é algébrico sobre K.
Corolário 3.1.21. Sejam K um corpo e L/K uma extensão com L algebricamente fe-
chado. Então existe uma extensão algébrica K/K com K algebricamente fechado.
Demonstração. Já descrevemos K na página anterior, resta apenas ver que ele cumpre o
que promete. Primeiro, a fim de mostrarmos que K é um corpo, é suficiente tomarmos
α, β ∈ K e verificar que K[α, β] é um corpo contido em K. Ora, por α ser algébrico
sobre K temos dimK K[α] finita e, por β ser algébrico sobre K, logo sobre K[α], temos
dimK[α] K[α, β] finita. Como na proposição anterior, a última desigualdade nos permite
20
concluir que dimK K[α, β] é finita, donde segue que todo elemento do corpo K[α, β] é
algébrico sobre K, i.e., K[α, β] ⊆ K, como querı́amos17 .
20
Agora, como todo elemento de K é algébrico sobre K, resulta que K é, verdadeira-
mente, uma extensão de K, algébrica por construção. Finalmente, vamos nos convencer
de que K é algebricamente fechado. Um polinômio f ∈ K[x] \ K certamente admite uma
raiz α ∈ L. Como na proposição anterior, se λ0 , . . . , λn ∈ K são os coeficientes de f ,
ES
então M ..= K[λ0 , . . . , λn ] é uma extensão finita de K. Daı́, por α ser algébrico sobre M ,
temos M [α]/M e M/K algébricas, resultando M [α]/K algébrica e, consequentemente,
α ∈ M [α] ⊆ K.
UF
Agora, vamos nos dedicar a mostrar que existe um corpo K 0 que contém K tal que
todo polinômio f ∈ K[x] \ K tem pelo menos uma raiz em K 0 .
Lema 3.1.22. Sejam K um corpo e F ( K[x] \ K um subconjunto finito de polinômios
não constantes. Então existe uma extensão finita L/K na qual todo polinômio p ∈ F
admite uma raiz em L.
Demonstração. A prova se faz por indução. Se F ..= {p}, então podemos tomar um
polinômio g ∈ K[x] \ K irredutı́vel que divide p: se p não for irredutı́vel, tomamos
duas testemunhas disso e nos perguntamos se alguma delas é irredutı́vel, e procedemos
recursivamente até nos depararmos com algum fator irredutı́vel18 . Agora, com tal g
irredutı́vel em K[x], resulta que L ..= K[x]/hgi é um corpo que estende K: L é corpo pois
hgi é maximal, enquanto o morfismo de corpos óbvio
i π
K ,→ K[x] L
é injetor, o que nos permite supor K ⊆ L. Por fim, x ∈ L é raiz de g, donde o resultado
segue.
17
A inclusão K[α, β] ⊆ K nos diz, numa tacada só, que α + β ∈ K, αβ ∈ K e, se α 6= 0, então o seu
inverso multiplicativo, que a princı́pio mora em K[α] ⊆ K[α, β], também mora em K.
18
Alternativamente, podemos usar o fato de que todo d.i.p. é um d.f.u..
3.1. ALGEBRICIDADE E TRANSCENDÊNCIA 97
onde a última igualdade se deve à suposição de que K é subcorpo de L, que nos permitiu
fazer αi = αi . No entanto, o mesmo argumento valeria se, em vez de g, tivéssemos
quocientado por hpi. Implicitamente, a irredutibilidade de g foi usada para garantir a
maximalidade do ideal hgi e, consequentemente, que o anel L resultante fosse um corpo.
Na prática, o que fizemos foi mostrar que dado um ideal I de K[x], existe um ideal
maximal M ( K[x] com I ⊆ M . Tal resultado, para o bem (ou para o mal) vale bem
mais geralmente.
20
Teorema 3.1.23 (Krull). Sejam A 6= 0 um anel e J ( A um ideal. Então J está contido
num ideal maximal de A.
20
Demonstração. Consideramos a famı́lia P ..= {I ⊆ A : I é ideal de A com J ⊆ I} =
6 ∅,
parcialmente ordenada pelaSinclusão. Como qualquer ideal C pertencente a uma cadeia
C ⊆ P está contido no ideal C ∈ P, segue pelo Lema de Zorn que existe M ∈ P maximal
com respeito à inclusão, donde o resultado segue.
ES
O teorema acima garante que corpos, antes tratados como estruturas rarı́ssimas, são
tão abundantes quanto anéis – em algum sentido. Conforme havia sido prometido, uma
UF
Agora, devido ao último lema, existe uma extensão de corpos L/K na qual cada um
dos polinômios fi admite uma raiz αi ∈ L. Finalmente, aplicamos na expressão acima o
morfismo de avaliação20 ev : K[X ] → L que faz corresponder Xfi 7→ αi para cada i ≤ n
e Xq 7→ 0 para os demais Xq ∈ X . Como a única indeterminada de fi (Xfi ) é Xfi , segue
que ev(fi (Xfi )) = f (αi ) = 0 e, portanto,
!
X X
1 = ev(1) = ev gi fi (Xfi ) = ev(gi )fi (αi ) = 0,
i≤n i≤n
uma contradição.
20
αj + cβk 6= α1 + cβ1
20
para quaisquer j ≤ r e k ≤ s com k 6= 1. Nosso trabalho a partir daqui consiste em
mostrar que γ ..= α + cβ tem a propriedade desejada.
Como γ ∈ K[α, β], temos de graça a inclusão K[γ] ⊆ K[α, β]. A fim de nos con-
vencermos da outra inclusão, vamos mostrar que α, β ∈ K[γ]. Por simplicidade, vamos
ES
já que α é raiz de f . Agora, como F [x] é um d.f.u. e g ∈ K[x] ⊆ F [x], existe em F [x] o
m. d. c. de g e h, o qual mostraremos ser x − β:
• note que se um polinômio d ∈ F [x] divide g, então as raı́zes de d estão contidas na
coleção das raı́zes de g;
Observação 3.2.4 (O caso racional). Como todo corpo de caracterı́stica zero deve ser
infinito e conter uma cópia isomorfa dos racionais (por quê?!), o teorema anterior nos diz
precisamente que toda extensão finita dos racionais é simples.
Em particular, ao fazermos K ..= Q, as raı́zes tomadas no fecho algébrico de K podem
ser pensadas essencialmente como números complexos, já que o fecho algébrico de Q
está contido em C, a menos de isomorfismo. Um modo de se convencer sobre a última
afirmação faz uso do famoso
r i
q(x)|f (x) em L[x] ⊂ K[x]. Escrevendo q(x) = x + i<r ai x , com ai ∈ L ⊂ K, mos-
traremos que L = F [a0 , . . . , ar−1 ], donde seguirá que L é determinado pelos coeficientes
de q(x). Como f (x) tem somente finitos divisores mônicos em K[x], isso nos permitirá
concluir que K/F tem somente finitos corpos intermediários.
Escrevemos L0 = F [a0 , . . . , ar−1 ]. Novamente, note que L0 ⊂ L e K = L0 [α]. Como
q(x) ∈ L0 [x], segue que se q0 (x) ∈ L0 [x] é o polinômio minimal de α sobre L0 , então
q0 (x)|q(x). Então
⇒ [K : L0 ] = [K : L][L : L0 ].
Logo [L : L0 ] = 1, ou seja, L = L0 , como querı́amos.
Provemos a recı́proca. Se F é finito, então K é finito e K = F [α], onde α ∈ K é
tal que hαi = K × . Assim, podemos assumir |F | ≥ ℵ0 . Agora, se K/F é finito, então
existem α1 , . . . , αn ∈ K tais que K = F [α1 , . . . , αn ], o que nos permite prosseguir com a
demonstração por indução sobre n.
Se F [α1 , . . . , αn−1 ] = F [β], então K = F [β, αn ]. Note que o conjunto
A = {F [β + cαn ] : c ∈ F }
24
As demonstrações conhecidas desse resultado, apesar do nome, usam ferramentas não-algébricas.
3.3. EXERCÍCIOS DA SEÇÃO 101
que se dimK D é finita, então D é um corpo. Dica: dado d ∈ D \ {0}, mostre que a
multiplicação por D é uma transformação linear sobrejetiva.
Exercı́cio 3.4. Sejam L/K e L0 /K extensões de corpos. Mostre que se L e L0 são
isomorfos enquanto anéis, então L e L0 são isomorfos como K-espaços vetoriais.
K[x]
Exercı́cio 3.5. Mostre que {1, x, . . . , xn−1 } é uma base para , onde f ∈ K[x] é um
hf i
polinômio não-nulo de grau n ∈ N \ {0}.
Off topic
4.1 Categorias
4.2 O Axioma da Escolha é seu amigo
Observação 4.2.1. Texto adaptado de [7]. 4
20
Nesta seção farei comentários muito breves sobre o Lema de Zorn, ignorando o máximo
possı́vel questões sobre Fundamentos de Matemática e Teoria de Conjuntos, que permeiam
por definição qualquer discussão honesta sobre o assunto.
20
Começamos nos lembrando de que uma ordem parcial num conjunto P é uma
relação binária em P que é: reflexiva (x x), antissimétrica (x y e y x ⇒ x = y)
e transitiva (x y e y z ⇒ x z). Em tal situação, também dizemos que (P, )
ES
é uma ordem parcial ou que P é parcialmente ordenado (pela relação ). Caso,
adicionalmente, quaisquer dois elementos em P forem comparáveis (x y ou y x ou
x = y), dizemos que P é totalmente ordenado.
UF
103
104 CAPÍTULO 4. OFF TOPIC
Como o nome sugere, essa é uma afirmação que assumimos como verdadeira. O
contexto em que fazemos tal suposição é o da teoria (axiomática) dos conjuntos. Daı́,
como teoria dos conjuntos é o modelo usual utilizado para o desenvolvimento formal
de várias teorias matemáticas, segue que por transitividade as outras áreas acabam por
assumir (tacitamente) os mesmos axiomas da teoria dos conjuntos. Curiosamente, prova-
se que o Lema de Zorn e o Axioma da Escolha são equivalentes, no sentido de que um
implica o outro, vice-versa.
Entretanto, tais questões existenciais não nos interessam aqui. Precisamos apenas
saber como o Lema de Zorn funciona. O leitor interessado em discussões mais honestas
sobre o Axioma da Escolha deve consultar por livros de Teoria Axiomática dos Conjuntos,
como [4] (mais elementar) ou [5] (bı́blico) – ou se aventurar na Subseção A.3.2 do inaca-
bado [6], disponı́vel no endereço https://drive.google.com/file/d/1SgLc-kdOTi6n_
qz7w-5QHOwns8HHZyWI/view.
20
20
4.3 Módulos
ES
UF
Lista de sı́mbolos e siglas
(αij )
Idn
20
matriz com entradas αij para cada i, j, 10
X \Y diferença entre X e Y , 12
0A zero do anel A, 14
1A a unidade do anel A, 14
im (f ) imagem de f , 20
105
106 Lista de sı́mbolos
A[X] 20
anel de polinômios com coeficientes em A e indeterminadas
em X, 59
20
Frac (D) corpo de frações do domı́nio D, 62
m|n m divide n, 64
L/K K é subcorpo de L, 87
[4] K. Hrbacek and T. Jech. Introduction to set theory. Monographs and Textbooks in
Pure and Applied Mathematics 220. M. Dekker, New York, 3 edition, 1999.
20
[6] R. Mezabarba. Fundamentos de Topologia Geral. Redação em andamento, 2020.
[7] B. Mirzaii. Notas de aula – Álgebra 2017, 2017. Notas de aula do curso de Álgebra,
20
ministrado em 2017 no ICMC-USP.
107
UF
ES
20
20
Índice Remissivo
transncendente, 88
base, 91 espaço
vetorial, 90
UF
109
110 ÍNDICE REMISSIVO
coprimo, 31 minimal, 90
maximal, 26 nulo, 36
primo, 26 primitivo, 65
principal, 26 reduzido, 71
identidade separável, 98
de Bézout, 83 pré-ordem, 63
inverso projeção
aditivo, 9 canônica, 24
multiplicativo, 15 propriedade
isomorfismo universal, 22
de anéis, 21 propriedade universal
do anel de polinômios, 36
Lema do anel de polinômios sobre X, 60
de Gauss, 68 do quociente, 28
limitante superior, 103 dos inteiros, 19
propriedae universal
máximo divisor comum, 63
do corpo de frações, 62
módulo, 91
matriz raiz
de ordem n, 10
identidade, 10
nula, 10
20n-ésima da unidade, 79
de polinômio, 39
relação
20
morfismo de equivalência, 23
de anéis, 19
de avaliação, 37 simétrico
ver inverso aditivo, 9
ES
multiplicidade
da raiz, 72 subanel, 20
subconjunto
núcleo, 28 linearmente independente, 91
UF
número subespaço
complexo, 76 gerado, 91
norma vetorial, 91
do número complexo, 77
Teorema
operação, 12 Chinês dos Restos, 31
ordem de Gauss, 63
parcial, 103 do Isomorfismo para anéis, 28
polinômio, 36 zero
constante, 36 de polinômio, 39