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MOVIMENTO ESTUDANTIL POPULAR REVOLUCIONÁRIO. Estudantes a serviço da libertação


dos camponeses pobres, 2003. Disponível em: http://www.estudantesdopovo.hpg.ig.com.br/
(acessado em 01/02/03).

Estudantes a serviço da libertação dos camponeses pobres

Elogio do Aprendizado
Bertolt Brecht
Adquira conhecimento, você que sente
Aprenda o mais simples!
frio!
Para aqueles cuja hora chegou
Você que tem fome, agarre o livro: é
Nunca é tarde demais!
uma arma.
Aprenda o ABC; não basta, mas
És chamado a ser um dirigente!
Aprenda! Não desanime!
Não se envergonhe de perguntar,
Comece! É preciso saber tudo!
camarada!
És chamado a ser um dirigente!
Não se deixei convencer.
Aprenda, homem no asilo!
Veja com seus olhos!
Aprenda, homem na prisão!
O que não sabe por conta própria
Aprenda, mulher na cozinha!
Não sabe.
Aprenda, ancião!
Verifique a conta
És chamado a ser um dirigente!
É você quem vai pagar.
Freqüente a escola, você que não
Ponha o dedo sobre cada item
tem casa!
Pergunte: O que é isso?

“Uma nova escola.” “Um novo ensino.” “Métodos revolucionários para o “aprendizado.”Esses termos citados ao acaso nas universidades
não causariam tamanho impacto se fossem abordadas conceitualmente folheados ao acaso nos velhos manuais de letras mortas da
distante e gelada universidade brasileira. Mas no Norte de Minas Gerais, região do semi-árido brasileiro, onde o latifúndio semeia
massacres e suas cabeças de gado pastam onde milhares de famílias poderiam tirar seu sustento, a história tem sido contada de uma
nova forma.

O camponês, esquecido pelos projetos e “reformas” do governo, pela primeira vez, tem a possibilidade de aprender a ler e escrever,
somar e subtrair, aprender sobre o Iraque e Palestina, aprender sobre seu próprio país. Ensinam a lutar, a arrancar frutos da terra seca,
compartilham da sua rica e secular experiência e sabedoria, semeiam um mundo novo.

Montes Claros, 300 mil habitantes. “A capital do Norte de Minas”, carrega em seu sangue do forte traço de sua origem camponesa. O
povo amistoso e hospitaleiro e o ambiente típico de cidade interiorana contrastam com o movimento do centro da cidade, mas não é raro
presenciar ônibus e carroças dividindo a mesma pista. E apesar do crescimento populacional e surgimento da industria, preserva as
atrasadas relações do latifúndio.

Centenas de famílias, que há anos partiram de suas roças de mala e cuia para a cidade, carregando tudo o que tinham em busca de
emprego, escolas para os filhos, atendimento hospitalar, enfim, como tantos brasileiros em busca de uma vida melhor, encontram a fome
e o pesadelo do desemprego. Não podendo mais retornar ao campo, permanecem na cidade, na esperança de um dia poder voltar para a
roça e refazer a vida.

Foi essa esperança que uniu as dezenas de famílias, que organizadas pela Liga dos Camponeses Pobres do Norte de Minas, decidiram
tomar as terras do latifúndio da “Guiné”, situado nos arredores de Montes Claros, onde desde muito nada produzia e encontrava-se
abandonado pelo “proprietário” que tem negócios fora da região. A área agora é conhecida como “Bandeira Vermelha”, uma homenagem
à luta das famílias da Vila Bandeira Vermelha em Betim, região metropolitana de Belo Horizonte.

Tomaram e dividiram as terras entre as famílias, organizaram-se e resistiram às investidas do latifúndio com farsas de reintegração de
posse e ameaças. Resistiram à seca e organizaram um grupo de produção para plantar a roça. Elegeram uma coordenação e comissões
de trabalho, dentre elas, a Comissão para criação da Escola Popular.

A Escola Popular já é uma realidade nas áreas do trabalho da Liga. Mas no “Bandeira Vermelha” o grande desafio é a sua construção,
não apenas material mas política.

O primeiro passo já foi dado. A idéia partiu de uma reunião com os estudantes do Núcleo de Ciências Agrárias da UFMG (NCA): elaborar
um questionário para as famílias da área, para fazer o levantamento das pessoas dispostas a participarem das atividades da Escola
Popular, e um mapa de tudo o que é produzido pelos camponeses para auxílio técnico.
O questionário foi elaborado e a diretoria do NCA cedeu o ônibus para que o grupo de estudantes pudesse visitar a área e fazer as
entrevistas.

Todos os preparativos cumpridos, a expectativa era enorme entre os camponeses. Todos queriam ver e conhecer os estudantes. Quando
o ônibus despontou na curva, foi calorosamente recebido com uma salva de foguetes. Após abraços e cumprimentos, todos ao trabalho
com os questionários em mãos passaram o dia inteiro conversando com os camponeses O entrosamento foi tamanho que no horário do
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almoço as crianças já haviam elegido os “tios” favoritos e brincavam em seus colos. Na despedida, já surgiam planos para o futuro.
A expectativa era grande e muito trabalho estava pela frente, quando se iniciou o trabalho da Escola Popular no “Bandeira Vermelha”. Seis
meses depois, já surgem os primeiros resultados.

Na Unimontes, as reuniões são para esclarecer sobre a proposta da Escola Popular. Construir uma nova escola que sirva para despertar
o povo para lutar pelos seus direitos, que leve aos seus filhos o conhecimento sobre a realidade em que vivem fornecendo com isto a
chave para compreender e derrotar a miséria, a ignorância, a fome.

São organizadas palestras: no NCA, sobre a luta dos camponeses contra o latifúndio e a luta pela produção. A necessidade do apoio
dos estudantes de Agronomia a luta camponesa, e de ligar o aprendizado à realidade do povo da região servindo a sua luta. Os
professores interessados , se oferecem para apoiar projetos e desenvolver trabalhos voltados para as famílias do “Bandeira Vermelha”.

Como fruto dessas discussões, a diretoria do NCA ofereceu às famílias, cursos gratuitos na “Semana do Produtor Rural” – atividade
desenvolvida pelo Núcleo voltada para os pequenos produtores do Norte de Minas.

Na Unimontes, uma aula foi ministrada por uma professora da Escola Popular. Com o tema “Questão agrária: a violência do latifúndio e a
resistência dos camponeses”, envolveu estudantes e professores de vários cursos. Foi debatida a situação da luta pela terra no norte de
Minas e a luta dos camponeses pela produção.

Essas iniciativas atraíram novos apoiadores para a causa da Escola Popular. No último período, os estudantes de Educação Física da
Unimontes organizaram uma atividade de lazer no “Bandeira Vermelha”, demonstrando que o trabalho da Escola Popular envolve não só
a alfabetização e a produção, mas deve atuar em todos os aspectos da vida do povo: cultura, esporte, saúde, lazer, trabalho.

O próximo passo projetado, é a construção material do espaço para as aulas, já que professores não faltam. São organizados bingos e
sorteios para levantamento de fundos. Mas isso não basta. Em breve, será lançada uma campanha para conseguir apoio junto às
universidades e escolas para arrecadar material didático, carteiras e cadeiras, lousas, giz, papel.

A construção das Escolas Populares é uma necessidade para as massas de camponeses em luta. Projetos como “Amigos da Escola” e
“Analfabetismo Zero” que são pintados com todas as cores pelo governo e a imprensa reacionária, no campo assumem sua verdadeira
cor. A cor da demagogia, da fome, da miséria e da violência e das filas intermináveis nas portas das escolas a espera de uma vaga no
começo do ano. O preço que o Estado reacionário cobra das massas camponesas, é sugar todo seu suor e sangue para saldar as dívidas
de banqueiros e servir ao imperialismo, enquanto crianças abandonam a escola por falta de transporte e para trabalhar. O governo faz
demagogia atacando o trabalho infantil mas não toca no problema do latifúndio que assassina centenas de camponeses dia após dia. A
cada ano surgem novos cursinhos e faculdades particulares, mas nenhuma escola, nenhuma vaga é aberta para o povo pobre.

A culpa da miséria no campo reside no latifúndio, na grande burguesia e no


imperialismo. A saída para essa vida de miséria e fome é a derrubada das três
montanhas que há séculos pesam sobre as costas do nosso povo.
A Escola Popular não é a solução definitiva para esses problemas, pois é falsa
a tese de que a solução dos problemas do povo está na educação. Se falta
educação para o povo é porque esse sistema podre, assassino, arcaico serve
aos ricos, à burguesia e ao latifúndio. Não podemos conceber a luta por uma
nova educação separada da luta por um novo Brasil, por um novo mundo. A
luta por uma nova Escola faz parte da luta por derrubar as três montanhas de
opressão sobre nosso povo.
Em sua intervenção na III Assembléia Nacional dos Estudantes do Povo, uma
representante da Escola Popular dirigiu um convite a todos os estudantes
brasileiros que se disponham a trancar a sua matrícula durante um semestre
ou mesmo que seja por um curto espaço de tempo, para que possam
conhecer e participar da construção das Escolas Populares no campo.
Reproduzimos esse convite a todos os companheiros leitores do Jornal
Estudantes do Povo.

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