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DÉRBI | 12 nov, 23:00

Benfica-Sporting, 2-1 (crónica)

Ter na alma a chama imensa

David Marques Jornalista. @Dmarques1988

Estádio da Luz, Lisboa

O dérbi eterno foi aquilo que faz dele, há mais de 100 anos, um jogo apaixonante. Teve
alternâncias de ascendente, alta tensão, muita luta, uma expulsão e um final
absolutamente caótico, quando o Sporting parecia a caminho de sair da Luz com a
liderança reforçada, o estatuto fortalecido de melhor equipa desta Liga e acabou
derrotado com dois golos já em tempo de compensação.

O dérbi começou por ser o jogo de desencaixes que Ruben Amorim previu. Porque o
Benfica desfez o 3x4x3 do desastroso jogo a meio da semana para a Champions e
recuperou o 4x4x2 ao, qual, apesar de todas as carências que ele tem, está mais
habituado.
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Os encarnados foram melhores durante mais tempo na primeira parte. Mais agressivos
nos duelos e objetivos com bola. Durante os 20 minutos iniciais, as equipas pareciam a
antítese do que os sinais prévios ao dérbi pareciam anteviam. O Benfica uma equipa
governada e hiperconfiante; o Sporting a duvidar de si próprio.

João Neves e Florentino superiorizaram-se no meio-campo a Hjulmand e ao regressado


Morita, Rafa, a partir da esquerda, mas sempre em busca do espaço, encontrou-o e
esteve perto de marcar aos 9 e aos 12 minutos.

Gradualmente, o Sporting estabilizou. Começou a ter mais bola e a ser mais eficaz na
pressão, impedindo que o Benfica de chegar com a mesma facilidade ao ataque. Depois,
duas ocasiões de Diomande e de Pote – ambas negadas por Trubin – mostraram que os
leões queriam tanto ganhar o jogo como as águias e agarrar o «seis» que Amorim não se
cansara de repetir na conferência da véspera.

E do dérbi começava a sobressair uma evidência. A de que o Benfica deixara de


condicionar com a mesma eficácia o Sporting e que havia muito campo aberto para os
visitantes no meio-campo ofensivo. Nas subidas a solo de Matheus Reis pela esquerda;
nas vezes em que Gyökeres conseguia desencaixar dos defesas e virar-se de frente para
a baliza de Trubin; mas, sobretudo, quando Edwards recebia a bola e ultrapassava
adversários e servia os companheiros.
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Foi dele o soberbo passe que deixou Pote na cara do guarda-redes do Benfica e seria
dele, após deixar o lateral-esquerdo Morato para trás de forma brilhante, o lançamento
para o golo de Gyökeres na última jogada da primeira parte de um dérbi nervoso e
intenso.

O dérbi dos desencaixes mudou aos 51 minutos, quando Gonçalo Inácio foi expulso por
acumulação de amarelos após falta sobre Rafa. A partir daí, a bola foi do Benfica e o
jogou-se sobretudo nas imediações da área de Antonio Adán.

Mas quase nunca suficientemente perto do guarda-redes espanhol. Amorim ajustou


rapidamente, retirando Edwards e colocando St. Juste, e o dérbi passou a ser, com o leão
reduzido a dez, um jogo de encaixes. O que dizia muito sobre o governo de uma equipa,
mesmo com dez, e o desgoverno de outra.

As substituições de Schmidt, quase todas incompreendidas pelos adeptos, não


melhoraram a equipa. Tornaram-na, até, mais facilmente anulável e, até, permeável a
contra-ataques.
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Até aos derradeiros instantes, altura em que o dérbi ganhou uma dimensão que
transcende a lógica que o Futebol insiste em fintar, o melhor que o Benfica tinha feito
após ter estado em superioridade foram remates perigosos de João Mário e de Di María,
mas os dois de fora da área.

No quarto de seis minutos de compensação dados por Artur Soares Dias, as clareiras
que começavam a ver-se nas bancadas da Luz denunciavam a desistência dos adeptos de
uma equipa.

Só que a equipa, mesmo com todos os seus (muitos) defeitos, não desistiu. Trubin subiu
à área leonina em duas bolas paradas seguidas e, na segunda, o melhor do Benfica na
noite elevou-se também à categoria de melhor em campo, repetindo Alvalade na época
passada: João Neves.

Aí, acendeu-se a luz da esperança. Acendeu-se também a Luz para segundos finais de
absoluta loucura.

E o Benfica frágil tornou-se no Benfica campeão nacional que é. Numa equipa com
alma e chama imensa.

No último fôlego do dérbi eterno, os mais de 60 mil adeptos nas bancadas assistiram a
um plot-twist digno das melhores produções de ficção de Hollywood. Aursnes, o lateral-
direito adaptado, a cruzar para que Tengstedt, o último dos avançados na hierarquia do
plantel, fosse herói improvável e decidisse, com o selo do VAR, um dérbi que será
lembrado por muito tempo e que terminou com um novo líder do campeonato.
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