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FUNDAÇÃO ARMANDO ÁLVARES PENTEADO

COMUNICAÇÃO E MARKETING

ANDRESSA MIRANDA - 42111090


ARTHUR LOBO - 42112747

N1- CRÍTICA DA COMUNICAÇÃO

Outubro, 2023
Nascido em 12 de dezembro de 1903 no Japão, Yasujirō Ozu consolidou-se

como um dos maiores nomes da cena cinematográfica mundial, pelo seu trabalho e

estilo, considerado por muitos, transcendental, que é relevante e aclamado até os

dias de hoje. Ozu inicia a sua vida como professor e alguns anos depois, é chamado

para servir na Segunda Guerra, e somente depois do seu retorno ao Japão que Ozu

entende-se como cineasta e dá início a suas produções.

Dentre toda sua filmografia, é possível separá-la em 3 fases. Na primeira, a

temática de seus filmes voltava-se para o olhar aos estudantes e suas rotinas em

família e na escola. Na segunda, Ozu busca retratar a vida dos trabalhadores, tanto

urbanos quanto rurais, através de questões sociais como exploração, opressão,

precarização e desemprego. Já em sua terceira e última fase, Ozu encontra um

tema que estará presente em todas as suas produções: relações familiares junto de

suas complexidades, abismos e afetos.

O cinema de Yasujiro Ozu é denominado por um termo que surge em 2003

pelo crítico francês Michel Ciment como “O cinema da lentidão”, um processo de

entendimento e sensação do cinema através da duração de planos e a sua relação

com a divagação e o deleite. Apesar de não se reconhecer como vanguarda, este

cinema da lentidão é um tema que tem sido estudado e analisado através da

contraproposta ao cinema ocidental tradicional, padronizado, consumista e acima de

tudo, de sua estética extremamente acelerada. Este estilo é uma forma de

resistência ao processo produtivista capitalista da indústria cinematográfica,

especialmente a hollywoodiana, que espetaculariza o cinema mainstream. É

através do desdobramento temporal que o slow cinema faz o espectador sentir o

tempo, pois, a consciência de lentidão e duração é uma experiência subjetiva.


Trazendo assim também, um contraponto com este cinema mainstream, que

segue uma linha de produção muito clara e uma padronização de gosto também.

Produzindo filmes gradativamente mais iguais, controlados por um estúdio que

segue uma lógica capitalista, portanto não se pode perder dinheiro, o que tira das

obras suas autoridades e essências. Diferente do cinema de Ozu, que traz uma

autoralidade muito maior, com um estilo próprio, tratando de temas relevantes para

a sociedade, que desinteressam a muitos nos dias de hoje, logo, para os grandes

estúdios, não vende. Portanto, observa-se poucos cineastas autorais que

utilizam-se de técnicas presentes no “Cinema da Lentidão”, e trabalham fora do

eixo estadunidense como: Lucrecia Martel, Pedro Costa, Lisandro Alonso,

Apichatpong Weerasethakul, Tsai Ming-Liang, Hou Hsiao-Hsien, entre outros.

É através do seu estilo que Ozu constrói os seus universos, o cinema do

vazio, que se utiliza de dramas e gestos rotineiros, a operação cuidadosa dos

objetos, da natureza e dos momentos de contemplação. O diretor é parte do cinema

clássico japonês e também foi eternizado como “o mais japonês entre os

japoneses” pois Ozu trabalha com histórias e técnicas que dialogam com os

costumes e tradições do seu país. Um exemplo disso, é a forma como o cineasta

trabalha com a lógica do estilo “Mono no aware”, que é um conceito japonês para a

triste beleza da impermanência das coisas.

Em sua cinematografia, o diretor se utiliza de dois aspectos, que são os mais

marcantes de seu cinema. O primeiro deles é o “Tatame Shot” , que é o tipo de

enquadramento utilizado por Ozu para posicionar a câmera postada ao chão, na

altura das pessoas que se sentam para conversar. Como uma forma de comunicar a

postura do japonês ao sentar-se, além de posicioná-la de maneira frontal, quase

como se os atores estivessem olhando para o espectador, para trazer uma


intimidade e realismo nas cenas e diálogos. Dessa forma, o espectador está sempre

inserido no que está sendo dito, uma tentativa do diretor de comunicar e inserir as

suas temáticas de um Japão clássico e de costumes para o seu público, sendo

assim, um convite ao cotidiano dessa sociedade.

O cineasta também se utiliza do “Pillow Shot”, que são planos de objetos

estáticos e de elementos da natureza, apenas com o intuito de registrar a passagem

do tempo na montagem de uma cena, sem registrar algo atrelado à narrativa. Nesta

transição de cenas, o diretor também se aproveita dos espaços vazios para

comunicar elementos de sua cultura de forma silenciosa e ao mesmo tempo

imponente.

Em “Era uma vez em Tóquio”, o casal de protagonistas vai para um spa

japonês e ao final da cena, o cineasta insere um plano longo apenas do chinelo dos

personagens que ficou de fora do quarto, mais uma vez, reforçando os aspectos

presentes no cotidiano dessa sociedade. Assim, o espectador é posto de frente com

um cinema que trabalha a situação ótica e sonora em sua forma pura e sua relação

com a imagem direta do tempo e o processo individual de mudança e passagem de

tempo.

Neste mesmo filme, acompanhamos um casal de idosos que sai do interior

para visitar os seus filhos em Tóquio, assim, observamos cuidadosamente a rotina

dessa família, seus trejeitos, costumes, tradições e a maneira que essas relações se

atravessam e conectam. Ozu retrata os espaços com muita cautela, deixando que

os personagens mantenham uma relação ativa e passiva com esses ambientes e

assim podemos ver como estes se afetam. Vemos a rotina nesses personagens

dentro das suas casas, a repetição dos movimentos, a câmera estática, o olhar

direcionado para os espaços. Há uma dualidade, um sabor contraditório, originado


de diversas tensões que moldam as principais dinâmicas dessas obras: entre a

labuta e a vida no lar; entre os sexos masculino e feminino; entre o indivíduo e a

sociedade; entre o ser humano e o ambiente natural; entre o efêmero e o duradouro;

entre o tradicional e o contemporâneo.

Na exploração do dia a dia e do que é rotineiro, mesmo diante de todos os

problemas, conflitos, embates que nos envolvem, nos sobrecarregam, nos

transformam e nos desafiam, é onde Ozu surgiu como um ponto de partida. Um

cotidiano “alternativo”, um senso comum que não apenas é marcado por

adversidades, mas sobretudo pelas oportunidades de encontro, simultaneamente

tangíveis, materiais e corporais.

Ozu, por outro lado, se renova nessa conexão que ele estabelece entre o

diretor e a literatura, criando verdadeiras crônicas cinematográficas em suas obras.

Estas crônicas desempenham um papel fundamental ao enquadrar a beleza e a

singularidade da vida cotidiana e das relações interpessoais, um tema recorrente

em suas produções, que abordam a dissolução familiar. Elas unem e, ao mesmo

tempo, distinguem seus filmes. Elas conferem uma unidade ao conjunto, agrupando

diversos filmes sob uma mesma taxonomia de estilo, abordagem e conteúdo,

enquanto também ressaltam suas diferenças, já que o cotidiano, mesmo na rotina,

nunca se repete.

“O cotidiano não se deixa apanhar, pertence à insignificância,

e o insignificante é sem verdade, sem realidade, sem segredo, mas

é talvez também o lugar de toda significação possível. O cotidiano

escapa. É nisso que ele é estranho, o familiar que se descobre (mas

já se dissipa) sob a espécie do extraordinário” (Blanchot, 2007: 237).


Apesar de terem sidos lançados nas décadas de 40, 50 e 60, tratam de

temas muito atuais como Pai e Filha, de 1949, que conta a história de um pai viúvo

e uma filha solteira e que enfrenta um dilema pois sofre uma pressão para sair de

casa e se casar, ao mesmo momento que a mesma quer continuar em casa

cuidando do pai, que é uma realidade presente em muitas famílias do mundo, até os

dias de hoje. Até mesmo em “Era uma vez em Tóquio”, retratando o abandono

parental, que um casal de idosos camponeses sofre por seu filhos ao irem visitá-los.

O que, novamente, acontece até os dias de hoje, vide o exemplo da criação de

asilos e lar de idosos.

Outro aspecto interessante deste mesmo filme é como Ozu retrata as

diferentes realidades, da cidade e do campo, e o encontro das duas, através do

casal de idosos. Principalmente por retratar Tóquio, como uma personagem, que

assim como os filhos, não acolhe o casal. Portanto, é uma unanimidade que Ozu

possui um estilo transcendental em sua forma, como Paul Schrader descreve e

aprofunda em seu livro “O Estilo Transcendental no Cinema - Ozu, Bresson,

Dreyer”. Entretanto, para além desta forma transcendental, seu cinema é atemporal,

ou temporalmente transcendental, principalmente acerca do conteúdo abordado nos

filmes.

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