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ISSN: 2594-911X
CARUARU
2017
CENTRO UNIVERSITÁRIO DO VALE DO IPOJUCA – UNIFAVIP
Reitor do UNIFAVIP/Devry
Ricardo Ciriaco
Comissão Organizadora
Fernando da Silva Cardoso
Grupo de Estudos e Pesquisa Interdisciplinares sobre Direitos Humanos
GEPIDH-UNIFAVIP
Comissão Científica
Aristóteles Veloso da Silva Muniz
Emerson Silva Santos
Fernando da Silva Cardoso
Filipe Antonio Ferreira da Silva
Flávia Roberta de Gusmão Oliveira
Glebson Weslley Bezerra da Silva
José Walter Lisboa Cavalcanti
Luísa Vanessa Carneiro da Costa
Paloma Raquel de Almeida
Pollyanna Queiroz e Silva
Roberta Rayza Silva de Mendonça
Vera Creusa de Gusmão do Nascimento
REALIZAÇÃO
GRUPOS DE TRABALHO
Crítica Política No Universo De Star Wars–A Busca Pela República E Pelo Fim Do
Império
Nadeje Pereira dos Santos, Hipólito de Moura Junior e Nayara Paulino de
Carvalho..........................................................................................................................61
“Apesar De Você Amanhã Há De Ser Outro Dia”: Reverberação Das Lutas Sociais
Na Música Brasileira
José Welligton de Oliveira..............................................................................................73
Equidade De Gênero Na Agenda 2030 Da ONU: (Há) A inserção dos homens (?)
Priscilla Viégas Barreto de Oliveira.............................................................................552
GT 03 - Direito, Movimentos Sociais e Cidadania
Desafios Para Atenção Integral À Saúde Mental: Uma Reflexão Sob A Ótica Da
Saúde Da População Negra E Sua Religiosidade
Pedro Henrique Melo Alves e Valquíria Farias Bezerra Barbosa...............................962
GT 08 - Trabalhos Artísticos
RESUMO
INTRODUÇÃO
A arte sempre foi uma das principais manifestações da cultura humana e esta, em
áudio-vídeo, pode transmitir e transformar muitos conceitos sobre debates e
questionamentos realizados diariamente por aqueles que desta arte utilizam. Pensando
em abordar a educação no meio rural e sua relação com a vida humana digna, viu-se no
1
Universidade de Pernambuco – Campus Arcoverde, Graduando em Direito e
netojustinoarruda@gmail.com.
2
Universidade de Pernambuco – Campus Arcoverde, Graduando em Direito e
danilo2010henrique@hotmail.com
documentário ―Vida-Maria‖ -que é repleto de cenas para análise da violação de
Direitos- a oportunidade de interagir o Direito à educação, a arte (meio) e o contexto
exposto por essa arte.
O curta de 2006 baseia-se na relação familiar e social entre vários personagens em
várias gerações, no cenário rural sertanejo, com enfoque nas mulheres e os conceitos
sociais pré-existentes acerca destas, que concluem em várias reflexões sobre a
educação, preconceito, gênero e Direitos Humanos.
A relevância dessa análise faz-se da necessidade de destacar a importância dos
instrumentos audiovisuais para a observação de questões que possam afetar (direta ou
indiretamente) direitos básicos do cidadão.
O Estado possui medidas políticas (governança) para a garantia do Direito à
educação, mas a indagação sobre a efetividade e alcance destas medidas sobrevieram
neste trabalho a partir da visualização pelos autores do Curta ―Vida-Maria‖ que possui
um enfoque na mesma indagação outrora citada. Assim, este trabalho guiou-se pelas
manifestações governamentais em matéria de educação e pelos escritos acadêmicos que
relatam a atual situação da educação brasileira (ou a falta desta).
Então, objetivando relacionar o direito à educação com a situação das sertanejas
no meio rural, pretende-se analisar a perspectiva da educação neste cenário com base no
que fora apresentado no Curta ―Vida-Maria‖. Partindo do método indutivo, com
pesquisa básica, bibliográfica e documental buscam-se elementos informativos da
educação e a necessidade de políticas públicas para efetivar o alcance destas no meio
rural.
Afirmando este enunciado, Silva e Tavares (2013) compreende que por meio da
educação, as pessoas podem tornar-se sujeitos de direitos, conhecedoras das conquistas,
avanços e recuos em relação à manutenção de seus direitos.
Os direitos humanos são nada mais do que direitos naturais, inatos ao ser humano,
que pertencem a cada um de nós, direitos baseados no respeito ao indivíduo e que
buscam salvaguardar a dignidade de todos, por isso são garantias universais a todos os
seres humanos.
Em 1979, Karel Vasak traçou a teoria intitulada ―teoria das gerações de direitos‖,
segundo o autor, os Direitos Humanos eram divididos em três categorias geracionais,
baseadas nos princípios advindos das revoluções francesa e americana.
Segundo Canotilho (1995), os direitos de primeira geração são os direitos ligados
a liberdade, a defesa, estabelecendo limitações ao Estado frente à seara particular dos
nacionais. Os direitos de segunda geração são aqueles associados à uma prestação
efetiva do Estado, como mantenedor de políticas para gestão social como a seguridade,
educação, trabalho, dentre outros. Os direitos de terceira geração estão relacionados as
garantias de toda a sociedade (comunal), como o direito ao desenvolvimento, direito à
paz, direito à autodeterminação e o direito ao meio ambiente equilibrado. (RAMOS,
2015)
Tanto como direito social, como direito de segunda geração, a educação é
reconhecida como direito humano básico, descrita no art. 26 da Declaração Universal
dos Direitos Humanos (1948) que dita:
1. Toda pessoa tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos
nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será
obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem
como a instrução superior, esta baseada no mérito.
2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da
personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos
e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a
tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e
coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.
3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que
será ministrada aos seus filhos. (UNESCO, 1998, p. 14)
Trata-se de uma animação que conta a história de uma mulher que vive na
região rural do Brasil. Ela aparece menina (chama-se Maria José) e gosta de
―desenhar as letras‖ num caderno. A mãe a repreende, dizendo que ela está
―perdendo tempo‖ e ordena que ela vá ajudá-la, varrendo o pátio ou levando
água para os bichos. Com pouquíssimos diálogos, a câmera vai mostrando a
vida de Maria que cresce trabalhando (sem estudar), casa-se e tem um filho
atrás do outro. Ao final, bastante amarga e envelhecida, ela repreende a filha,
que ―perde tempo desenhando o nome‖, repetindo um ciclo de analfabetismo
e falta de perspectiva, especialmente para as mulheres.
São apresentadas no filme imagens que mostram uma semelhança muito grande
com a realidade: traços bem parecidos com o real, suas cores pálidas e sombrias e os
formatos humanos foram bem selecionados que tornaram a atmosfera atraente para
reflexão sobre a vida interiorana das sertanejas/nordestinas/ruralistas.
Na perspectiva de José Leonardo Nascimento (2010, p. 1):
Vida Maria, de Márcio Ramos, é um curta que deveria ser visto por todos os
brasileiros. Duvido que haja um "sertanejo" que assista e que não "trema na
base". Utilizando-se de poucas palavras, todas elas facilmente encontradas no
vocabulário de quem nasceu sob o sol do nordeste – "bença, pai", "bença,
mãe" – nos é mostrada a história de Maria José, cuja mãe implicava com a
vontade que ela tinha de aprender a escrever. Não dá pra contar mais nada, só
que é preciso ser valente para não se perder no sol causticante, na poeira do
dia-a-dia.
A menina Maria do início do filme simboliza as muitas Marias que não têm
oportunidade de estudar, o que é bem representado, ao final, pelas tantas inscrições de
Marias no mesmo caderno. Nota-se que existe o prévio interesse em descobrir o ―algo
novo‖ quer seja, aprender, mas a necessidade de sobrevivência se sobrepõe aos anseios
particulares das jovens sertanejas.
Por fim, a educação geracional das ―Marias‖ mostrou-se como possível solução
para a mudança na perspectiva de vida, mas que sempre fora afastada por outra Maria
que não viu na educação a oportunidade de mudar.
Pelo visto nossa educação sempre esteve em crise e ela nunca foi objeto de
realização política e sim sempre ficou no discurso. Pois educação não soa bem aos
políticos (ARENDT, 2014). Por isso, é que com a dificuldade de se construir um
sistema de educação que der oportunidade aos seus habitantes, já que é um direito
tutelado pela Carta da República. O acesso por muito tempo foi negado às classes mais
pobres desse país, por isso a condição que ―as Marias‖ têm no vídeo é um determinismo
que acentua milhares e milhares de sertanejas, a ruptura do mesmo dar-se-á através de
mecanismos de inclusão e oportunidades.
Uma crise nos obriga a voltar às questões mesmas e exige respostas novas ou
velhas, mas de qualquer modo julgamentos diretos. Uma crise só se torna um
desastre quando respondemos a ela com juízos pré-formados, isto é, com
preconceitos. (ARENDT, 2014, p.223).
Pelos ensinamentos da autora, as crises são momentos de reflexão, mas o que
ocorre no nosso País é que a mesma demora em passar, caracterizando algo perene. O
momento de refletir se faz com rapidez, sendo que as soluções advindas, essas sim – há
uma ineficácia quanto a sua aplicação.
Por fim, não é só do governo que se faz uma educação – pois alguns movimentos
sociais e advindos da sociedade civil ganham corpo e são desenvolvidos no semiárido
nordestino, como exemplo: transforma sertão, voluntários do sertão, instituto livre ser,
amigos do bem, etc. Todos com um só objetivo: transformar e dar oportunidades as
tantas ―Marias‖ que tem nesse sertão, além de romper com esse determinismo histórico.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
ARENDT, Hannah. Entre o Passado e o Futuro: Crise na Educação. 7° Ed. São Paulo:
Perspectiva 2014, p. 221 – 247.
BATISTA, Jéssica Holanda de Medeiros; MUNIZ, Iranice Gonçalves; LUCENA, Mara
Ilka Holanda Medeiros de. Políticas públicas e educação em Direitos Humanos: O
PNEDH e o caso brasileiro.
BRASIL. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de
Educação em Direitos Humanos. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos;
Ministério da Educação, UNESCO, 2003.
_______. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de
Educação em Direitos Humanos. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos,
Ministério da Educação, Ministério da Justiça, UNESCO, 2007.
_______. Congresso Nacional. Constituição da República Federativa do Brasil de
1988. Promulgada em 05 de outubro de 1988.
______. Lei Federal n. 8069, de 13 de julho de 1990. ECA, Estatuto da Criança e do
Adolescente. DUO: 16 jul. 1990.
CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional. Coimbra: Almedina, 1995.
CÉSAR, Maria Rita de Assis; DUARTE, André. Hannah Arendt: pensar a crise da
educação no mundo contemporâneo. Educação e Pesquisa. São Paulo, v.36, n.3, p.
823-837, set/dez 2010.
CURY, Carlos Roberto Jamil. Direito à educação: Direito à igualdade, direito à
diferença. Cadernos de Pesquisa, n. 116, v. 2, julho, 2002.
DHESCA, Plataforma. Coleção Manual de Direitos Humanos. Vol. 07. Direito
Humano à Educação – 2ª edição – Atualizada e Revisada. Curtiba: SK editora. 2011.
RESUMO
INTRODUÇÃO
3
Graduando em Direito pela Universidade de Pernambuco. E-mail: danilo2010henrique@hotmail.com
4
Mestre e doutoranda em Ciências Criminais pela PUCRS. Professora de Direito Penal e Direito
Processual Penal da Universidade de Pernambuco (UPE). E-mail: denise.luz@upe.br
Este trabalho foi motivado em reflexões sobre a relevância da educação em
direitos humanos e para os direitos humanos. Embora notável a sua necessidade, a
indagação sobre a eficiência do ensino ―em sala de aula‖ na formação humanística
universitária se mostrou importante, tendo em vista que o Brasil possui um déficit
gigantesco na proteção desses direitos, seja em razão da fragilidade de suas instituições
jurídicas, seja em decorrência de políticas restritivas que perpetuam tradições
autoritárias, seja em razão da precariedade da educação superior sobre o tema.
Assim, em busca de uma solução adequada para reduzir os efeitos nefastos desta
problemática educacional, notou-se que as extensões universitárias têm grande potencial
para fechar algumas dessas lacunas quando promove participação cooperativa entre
docentes, discentes e comunidade em temáticas que envolvem violação e proteção de
direitos humanos. Nesse cenário, identificou-se o seguinte problema de pesquisa: os
direitos humanos podem ser aprendidos somente por atividades de ensino em ―sala de
aula‖ ou a vivência prática em ações de extensão é condição de possibilidade?
5
Confira a página do Projeto na rede social Facebook. Disponível em:
<https://www.facebook.com/Escrit%C3%B3rio-de-Defesa-da-Mulher-NPJUPE-
345985242420655/?hc_ref=SEARCH>. Acesso em: 1.ago.2017.
Decorrente de longo processo histórico, a Declaração Universal dos Direitos
Humanos, só vingou com o documento aprovado pela Assembleia Geral das Nações
Unidas, em 10 dezembro de 1948, a qual inicia pela afirmação de que ―o
reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus
direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no
mundo‖. Acima do status de cidadão de um Estado em particular está a condição de
Ser-humano, a quem se dispensa qualquer outra qualificação, seja de raça, gênero,
nacionalidade ou religião. ―Todo homem tem direito de ser, em todos os lugares,
reconhecido como pessoa perante a lei‖ (RAMOS, 2015, p. 5).
São de segunda geração os direitos humanos que clamam por uma intervenção do
Estado, uma prestação positiva, exigindo-lhes um papel ativo, não apenas um mero
fiscal. Esse papel ativo, de início, foi visto com tom de desconfiança, passando a ter
aporte favorável com a influência de doutrinas socialistas que os consideram direitos
necessários para fomentar a igualdade. Já os direitos de terceira geração são aqueles de
titularidade da comunidade, como o direito ao desenvolvimento, direito à paz, direito à
autodeterminação e, em especial, o direito ao meio ambiente equilibrado. (RAMOS,
2015).
Assim, o direito à educação é de segunda geração. Ele foi reconhecido no art. 26
da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) que dita:
1. Toda pessoa tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos
nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será
obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem
como a instrução superior, esta baseada no mérito.
2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da
personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos
e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a
tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e
coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.
3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que
será ministrada aos seus filhos. (UNESCO, 1998, p. 14).
Tratar a educação como um direito humano significa que sua efetivação não pode
depender das condições econômicas dos estudantes ou estar sujeita unicamente às regras
de mercado. Tampouco, tal direito humano social pode estar ligado a qualquer limitação
cultural, de gênero ou racial.
2005, p. 8).
O Direito não deve ser um ente distante e inatingível para a maioria das
pessoas. O Direito a ter direitos deve permear o dia-a-dia dos seres humanos,
ou seja, deve ser valorizado e estar presente no cotidiano dos homens. O
cotidiano é composto por segundos, minutos e cada dia na vida das pessoas.
Isso significa que o Direito deve estar presente o tempo todo e para todos, e
não apenas em momentos de conflitos, de extrema necessidade, de violência
exacerbada, de flagrantes injustiças; ou mostrar-se somente para uma
pequena parcela privilegiada da população. (COLAÇO, 2006, p. 6).
Para que haja a superação dessa crise, é necessário também que ocorra a
superação do ensino alienante que, ainda, na contemporaneidade, é em certa
medida uma marca, ficando a extensão nessa interface entre a pesquisa e o
ensino. Portanto, entende-se, que a superação em termos das atividades de
extensão, de modo a fortalecer o vínculo com a sociedade, implica na
universalização da extensão, envolvendo a totalidade dos alunos, o que
possibilitará maior presença, maior vínculo, maior interação com a
comunidade e a partir desse vínculo, dessa maior interação, ter os problemas
sociais, os problemas da comunidade como fonte, como parte da agenda de
pesquisa da universidade. (VILLAR, 2011, p. 88).
O EDM é composto por sete docentes do curso de Direito, quinze discentes, sendo
quatorze de graduação e um de pós-graduação, e um servidor administrativo. A equipe
presta assessoria jurídica para mulheres vítimas de violência de gênero. O trabalho é
feito pelos estudantes da UPE, sob a supervisão de professores.
CONCLUSÃO
Assim, conclui-se que a educação baseada apenas no ensino nos cursos de Direito
não é suficiente para a aprendizagem em (e para os) direitos humanos. Tal constatação
advém da verificação da predominância de aulas expositivas no modelo tradicional em
que o professor expõe o conteúdo e o estudante o recebe passivo. As atividades de
ensino jurídico no Brasil sustentam-se em dogmas teóricos criados e mantidos por uma
tradição bacharelista, baseada em teorias eurocêntricas, distantes da realidade local. A
rigidez característica do ensino jurídico não possibilita adaptá-lo e à plasticidade dos
direitos humanos, sempre necessária como instrumento de resistência a investidas
autoritárias em um mundo de frequentes e velozes mudanças.
Não há como educar em (e para os) direitos humanos sem contato direito da
universidade com a experiência concreta da violência, sempre renovável. A
universidade deve produzir saberes em colaboração com o meio social em um processo
de retroalimentação, o que não é realizável sem atividades de extensão. Assim, pode se
dizer que a vivência prática em ações de extensão é condição de possibilidade para a
educação em direitos humanos. Sem extensão, a educação em direitos humanos não é
viável.
REFERÊNCIAS
COSTA, Ana Maria Morais; SANTOS, Simone Cabral Marinho dos. A formação
cidadã e a educação em direitos humanos: perspectivas para a extensão universitária.
Rio de Janeiro: Interagir, n. 13, 2008, p 45-51.
LIMA, George Marmelstein. Críticas à teoria das gerações (ou mesmo dimensões)
dos direitos fundamentais. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4666/criticas-a-
teoria-das-geracoes-ou-mesmo-dimensoes-dos-direitos-fundamentais. Acessado em 14
jul. 2017.
MELO NETO, José Francisco de. Extensão universitária: bases ontológicas. In: José
Francisco de Melo Neto. (org.). Extensão universitária: diálogos populares. 1. ed.
João Pessoa -PB: Editora da Universidade Federal da Paraíba, 2002, v. 1, p. 13-33.
NUNES, Ana Lucia de Paula Ferreira; SILVA, Maria Batista da Cruz. A extensão
universitária no ensino superior e a sociedade. Mal-Estar e Sociedade. Barbacena ano
IV, n. 7, jul/dez 2011, p. 119-133.
INTRODUÇÃO
O consumo é algo natural do ser humano, significando um mecanismo de
sobrevivência desde os tempos mais remotos, como a utilização de água e alimentos
para suprir suas necessidades mais básicas, por exemplo. Porém, a revolução industrial
e os avanços tecnológicos no chamado mundo globalizado ocasionaram o crescimento
6
Graduanda de Direito pela Universidade de Pernambuco (UPE), membro do Grupo de Pesquisas
Transdisciplinares Sobre Meio Ambiente, Diversidade e Sociedade/GEPT-MDS, email:
ingridmoura@hotmail.com.
7
Graduando de Direito pela Universidade de Pernambuco (UPE), membro do Grupo de Pesquisas
Transdisciplinares Sobre Meio Ambiente, Diversidade e Sociedade/GEPT-MDS, email:
kleberamorim96@gmail.com.
exacerbado do consumismo, passando o mesmo a se tornar um problema com
repercussõesambientais. O modo de vida consumerista tornou-se algo comum no
sistema capitalista no qual estamos inseridos, uma vez que o consumo está diretamente
ligado à ideia de desenvolvimento econômico, justamente porque garante o movimento
e a estabilidade da economia. Não são poucas as vezes em que o hábito de consumir
está relacionado com o ideal de felicidade a ser perseguido, podendo isso ser constatado
através das propagandas nos diversos meios de comunicação com as quais o
consumidor depara-se diariamente, em especial, crianças e jovens.
Zygmunt Bauman, em sua obra "Vida para Consumo" alerta para a diferença
entre consumo e consumismo, o que será objeto de análise do presente trabalho (2007).
O consumismo acarreta diversos problemas ambientais, como por exemplo, a
exploração desmedida dos recursos naturais para satisfazer a crescente demanda da
produção em uma era descartável, na qual os produtos e serviços estão em constante
transformação. Além disso, a sociedade está sempre em busca daquilo que é mais atual,
gerando outro problema que é a alta produção de lixo tanto pelas indústrias como pelos
consumidores, já que é usual que os produtos que se tornam obsoletos sejam
descartados de forma incorreta na natureza devido à ausência de políticas de educação
ambiental. Além disso, falta, também, estímulos à produção com responsabilidade
ambiental, ao consumo consciente e sustentável, o que faz com que esse lixo acabe em
rios, esgotos e aterros sem nenhuma estrutura para tal, contribuindo para a degradação
do meio ambiente cada vez mais acelerada. Mais uma vez destaca-se a necessidade da
educação ambiental para a contenção da degradação do meio ambiente.
Nesse sentido, com o processo de globalização cada vez mais acelerado e o
reconhecimento de suas consequências, é relevantereconhecer a educação ambiental
como mecanismo de enfrentamento da degradação do meio ambiente, promovendo
políticas de educação, tanto nas escolas, como nas comunidades de uma forma geral,
capazes de enxergar a problemática interdisciplinar existente. Faz-se necessário que
haja um comportamento solidário em relação aos cuidados com o meio ambiente, de
forma que estes não sejam tratados como uma responsabilidade individual, mas sim de
todos (MARQUES, 2012). Quando fala-se em desenvolvimento sustentável, é possível
perceber que há uma ideia de natureza como um recurso ou uma matéria-prima, de
modo que sempre será explorada, porém de uma forma ―controlada‖. Partindo desse
ponto, é importante questionar a partir de que momento o meio ambiente deixou de ser
utilizado para a sobrevivência e passou a ser ―comercializado‖.
Com o avanço do capitalismo numa escala global, as pessoas passaram a se
importar cada vez menos com as consequências que suas ações podem acarretar, visto
que o consumismo exagerado parece ter-lhes cegado de tal forma, que não pensam mais
que as próprias podem sofrer com isso. Por isso é de suma importância que haja a
criação de políticas públicas que busquem conter a exploração exacerbada dos recursos
naturais, bem como um amplo debate e participação popular nas tomadas de decisões a
esse respeito. Através da divulgação de informações sobre um meio ambiente
equilibrado e sadio, é possível, inclusive, promover uma grande inclusão social, visto
que inúmeras comunidades (urbanas, rurais, indígenas, quilombolas, entre outras)
uniriam-se para tratar de um assunto comum e de interesse de todos.
A Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA – lei 9795/99) traz em seu
artigo 1º que a educação ambiental pode ser entendida como ―os processos por meio dos
quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos,
habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente,
bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade‖.
Dessa forma, é necessário que haja uma ampla discussão entre o governo do Estado e
seus membros para que se defina o que deve ser feito para a conservação da natureza,
bem como para a conscientização popular.
Nesse sentido, o presente trabalho pretende abordar as diversas transformações
sofridas pelo meio ambiente através da intensa exploração dos seus recursos e como
essas transformações afetam diretamente a vida dos seres humanos e dos demais seres
vivos. Vai buscar também uma análise a respeito da cultura do consumismo e tratar
sobre a forte influência dos meios de comunicação de massa para que isso ocorra. Por
último, comentaremos sobre a importância do consumo consciente e sustentável, além
da indispensabilidade de diversos princípios ambientais, como o da precaução e o da
solidariedade.
A problemática abordada é: como a era consumista influencia, de uma forma
interdisciplinar, a crescente degradação ambiental? O objetivo geral da pesquisa é
buscar compreender o papel do consumismo nas relações humanas, bem como o forte
impacto que este causa no meio ambiente. Os objetivos específicos são: analisar as
relações de consumo e de consumismo na atualidade e buscar compreender como isso
reflete nas interações entre os indivíduos. O artigo utiliza ainda uma metodologia
analítica e indutiva, bem como uma pesquisa bibliográfica e documental e uma
abordagem qualitativa e exploratória.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No mundo capitalista atual, somos educados a adquirir cada vez mais produtos e
a substituí-los em curtos espaços de tempo. Logo, faz-se necessário um processo de
reeducação da sociedade na qual o ideal de desenvolvimento esteja aliado a uma
preocupação ambiental prioritária e que isto não seja apenas uma teoria ou um discurso
falacioso, mas sim um objetivo a ser perseguido e efetivamente realizado na prática.
É possível perceber claramente como o meio ambiente está encontrando cada
vez mais dificuldades para conseguir repor os recursos dele retirados de forma exaustiva
e irresponsável, visto que a sociedade de consumo que se apresenta hoje está
acostumada à intensa exploração, fazendo com que não enxergue a escassez na qual
8
De acordo com Sachs, estes são os cinco pilares do ecodesenvolvimento e suas respectivas
características: a) Sustentabilidade Social: produção voltada ao atendimento das necessidades sociais e
redução das desigualdades; b) Sustentabilidade Econômica: manejo eficiente dos recursos e produção
aumentada da riqueza social; c) Sustentabilidade Ecológica: prudência no uso dos recursos naturais,
respeito aos ciclos ecológicos e preservação do meio ambiente para as futuras gerações; d)
Sustentabilidade Espacial ou Geográfica: relação equilibrada entre os meios urbanos e rurais e evitar o
excesso de aglomerações; e)Sustentabilidade Cultural: adaptação das soluções a cada ecossistema e
respeito às formações culturais locais para que se evitem conflitos (1993, apud Montibeller, 1993).
estamos adentrando. Dessa forma, é imprescindível se falar em uma educação ambiental
efetiva, que seja bem divulgada e também cobrada, de forma que as pessoas realmente
se deem conta do imenso prejuízo que estão causando à natureza.
Fala-se da forte contribuição do antropocentrismo para essa era consumista, pois
ao passo que o homem passa a se enxergar como centro, o meio ambiente começa a ser
apenas um meio de exploração de recursos, que está ali apenas para satisfazer as
necessidades humanas. Partindo dessa visão antropocêntrica em que vivemos na
contemporaneidade, fica cada vez mais indispensável se falar em um
ecodesenvolvimento, que seria capaz de gerar uma solidariedade entre as gerações
atuais, entre o homem e o meio ambiente e, inclusive, para com gerações futuras. É
preciso compreender que os recursos naturais são finitos, ao passo que as necessidades
humanas, não. Partindo desse raciocínio, deve-se pensar que o intenso desperdício e
descaso com a natureza afetará muito severamente indivíduos que nem tiveram a chance
de tentar mudar essa realidade, mas que já nascerão condenados.
O desenvolvimento sustentável é definido como ―desenvolvimento que responde
às necessidades do presente sem comprometer as possibilidades das gerações futuras de
satisfazer suas próprias necessidades‖. Em se tratando de um ecodesenvolvimento, deve
existir uma visão a longo prazo, uma preocupação com o bem-estar social, bem como
uma solidariedade com as futuras gerações. Pode-se perceber, então, que não é tão
recente a ideia de transgeracionalidade do meio ambiente. Há esse cuidado com
indivíduos que estão porvir, mas que antes não eram tutelados pelo Direito. O que torna
essa uma situação nova, com a qual os juristas não estão tão habituados. Por isso o
Direito Ambiental é bastante vasto e complexo, o que exige todo um cuidado específico.
Não se pode esquecer-se de mencionar que há certamente um impacto positivo
na sociedade de consumo quando é difundida uma educação ambiental de qualidade,
não só nas escolas, mas em qualquer meio em que haja o mínimo de interação humana,
incluindo pequenas comunidades. Essa educação é capaz de gerar um senso crítico e
responsável, bem como um forte sentimento de solidariedade entre as gerações. Pessoas
passam a se questionar se realmente necessitam consumir determinados produtos e isso
faz com que a era consumerista atual sofra uma desaceleração considerável.
Para isso, há que se falar também nos princípios que caminham ao lado dessa
educação ambiental e que contrubuem fortemente para que haja um desenvolvimento
sustentável e com uma máxima redução de gastos possível, visto que não se pode falar
em uma completa inação do homem no meio em que vive, o que também não significa
dizer que aquele tem o direito de consumir de forma exaustiva e desnecessária. Um
princípio de suma importância é o princípio da precaução, muito comumente
confundido com o princípio da prevenção, porém difere deste por não exigir um perigo
concreto para que seja aplicado. Neste último, o perigo já existe, é conhecido, mas são
tomadas medidas para minimizar o dano ambiental.
Um outro ponto bastante curioso e que deixa clara a extrema importância do
meio ambiente é o que diz respeito à responsabilidade objetiva daquele (pessoa física ou
jurídica, de direito público ou privado) que causa o dano. Isso quer dizer que, uma vez
causado o prejuízo, a pessoa deve responder por ele, independente de ter havido ou não
culpa. Isso importa falar também que essa preocupação com o meio ambiente não deve
se dar apenas dentro dos estados, de forma isolada. Por ser a natureza livre de fronteiras,
os danos a ela causados não se limitarão a permanecer no local onde foram gerados.
Dessa forma, é mister que haja um forte diálogo entre os diversos países para
que se façam acordos e se tomem medidas protecionistas em prol do meio ambiente,
como bem prega o princípio da precaução. É de extrema importância que se tenha essa
preocupação, pois, dependendo da gravidade e intensidade do dano, não se tem como
calcular a área que irá afetar, a quantidade de pessoas atingidas e, muito menos, o tempo
que irá durar.
Deve haver uma consciência de que o meio ambiente não existe apenas para
satisfazer as necessidades do ser humano, mas também é imprescindível para a própria
sobrevivência das espécies. Importante que se crie um pensamento responsável, crítico e
consciente acerca do consumo e também sobre as consequências que os danos
ambientais podem trazer para os seres vivos. Um desenvolvimento sustentável pode
reduzir as taxas de poluição, bem como de degradação ambiental, ao passo que fornece
mais tempo para que a natureza consiga se regenerar e consiguir repor os recursos dela
retirados. Sem falar também no grande benefício que trará às futuras gerações, as quais,
eventualmente, também passarão a ter deveres de perante o meio ambiente.
REFERÊNCIAS
BECK, Ulrich. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. São Paulo: Editora
34, 2010.
RESUMO
9
1 Graduanda em Direito pela DeVry|UNIFAVIP, Pesquisadora e extensionista no GEPIDH Mércia
Albuquerque; Extencionista DHiálogos . E-mail: nadejepsantos00@gmail.com
2 Graduando em Engenharia Mecânica pelo Instituto Federal de Pernambuco. E-mail:
sirjuniorhipolito@gmail.com
3 Graduanda em Direito pela DeVry|UNIFAVIP . E-mail: nayara.paulino@hotmail.com
INTRODUÇÃO
DESENVOLVIMENTO
E esse tipo de pensamento levou a população Italiana a viver dias temerosos, e o nexo
que a saga Star Wars faz com a realidade busca conduzir a sociedade a ter cuidado com
esse tipo de pensamento sobre regimes políticos instaurado em países.
Sob essa perspectiva, nota-se que os impactos sociais do regime são inevitáveis
tanto antes da instauração, como depois, porquanto a reorganização do Estado só é
possível diante da fragilidade socioeconômica de um país, tornando assim, os potenciais
movimentos revolucionários debilitados, e dessa maneira, a consolidação do fascismo
torna-se inabalável.
De acordo com Bernardo, (2015) Em cada país onde vigorou, o fascismo
procurou legitimar-se com o argumento de que era indispensável ao restabelecimento do
passado heróico nas ambicionadas dimensões (p.259) , e assim igualmente correspondia
às exigências modernas da sociedade, portanto para a cultura liberal ou conservadora
agregar a perspectiva do fascismo é um excelente pretexto para reerguer os ideais
totalitários, atribuindo por conseguinte ao fascismo um verniz de inocência e
modernidade.
Os líderes fascistas seguem esse sistema em todas as suas manifestações, e os
impactos sociais da opressão estão presente em todos os governos, haja vista que os
ideais norteadores do regime fascista são: Falta de um partido que consiga competir
com a burocracia civil, ou serviço civil em uma ditadura genérica; a radicalização do
movimento fascista e a existência de suporte de todas as classes (PAXTON, 2007).
Todos esses ideais são claramente representados na figura do império, em Star Wars,
fazendo assim uma provocação à reflexão sobre como o regime absolutista pode se
instaurar mascarado de democracia, mas na realidade, os parâmetros são de opressão
social e política.
O filme retrata no discurso do Supremo Chanceler Palpatine, o qual dirige o
golpe contra a república, a manobra de instauração do novo governo de forma
dissimulada: "É com uma grande relutância, que eu aceito este chamado. Eu amo a
democracia. Eu amo a República. Os poderes que me concederam, deixarão de ser
usados quando a crise for contornada. E como meu primeiro ato, com esta nova
autoridade, eu criarei um Grande Exército da nossa República, para conter as crescentes
ameaças dos Separatistas".
Tal discurso sucede uma onda de aplausos e aclamações a seu nome, e ao ser
concedido poderes emergenciais perante a crise da República diante da ameaça
separatista, Palpatine intensifica o desenvolvimento da atividade Bélica e Militar, assim
como dá início ao planejamento dos cursos de ação que submeteria a Galáxia aos
interesses próprios do governante, gerando consequentemente graves sequelas à
população.
Em paralelo com a realidade, assim ocorreu ao líder fascista Benito Mussolini
quando em seu discurso declarou: ―O meu programa é simples: quero governar‖
Mussolini (1883-1945), no entanto, ele definiu esse governo fascista de tal maneira: ―A
concepção fascista é voltada para o Estado, e é para o indivíduo, na medida em que ele
concorde com o Estado [...] O liberalismo negou ao Estado em nome do indivíduo, o
fascismo reafirma os direitos do Estado, como expressão da verdadeira realidade do
indivíduo‖ Mussolini (1883-1945), tornando os indivíduos vítimas do Estado.
Dessa maneira, Mussolini afirmou que os homens estavam cansados de liberdade e
em paralelo, no episódio três da saga Star Wars, quando o império claramente carregado
de características fascistas é instaurado, o povo aplaude e comemora fortemente tal
instauração, e nesse momento a ex-senadora Padmé Amidala diz ―Então é assim que a
liberdade morre - com um estrondoso aplauso.‖ A partir desse paralelo, percebe-se que
a falsa sensação de liberdade que os regimes totalitários trazem pode aparentar ser tão
verdadeira quanto a liberdade que a democracia possui.
3. Os pilares do fascismo
CONSIDERAÇÕES FINAIS
GIL, Antonio Carlos. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. 4. ed. São Paulo:
Atlas, 2009.
LIMA, Juliana Domingos de. O que há de política na saga Star Wars, 2016.
Disponível em:< https://www.nexojornal.com.br/expresso/2016/12/23/O-que-
h%C3%A1-de-pol%C3%ADtica-na-saga-Star-Wars>. Acesso em 10 de jul.
2017.
LUCAS, George. Star Wars, a trilogia: esp. ed. Rio de Janeiro: Darkside
Books, 2014.
INTRODUÇÃO
10
Centro Universitário do Vale do Ipojuca - UNIFAVIP/DeVry, graduando em psicologia,
wellingtonpsi83@gmail.com.
A música é uma das expressões artísticas mais antigas da humanidade, tendo no
corpo ponto de partida para a execução de ritmos e melodias, como é o caso dos rituais
indígenas na América do Sul, em que a percussão é marcada pela batida dos pés no chão
e onde a musicalidade assume caráter central no elo entre o terreno e o transcendental,
oferecendo uma rica cadeia de ritmos e cânticos direcionados as ações cotidianas e aos
eventos excepcionais (BASTOS, 2007).
A junção das culturas no processo de colonização brasileiro amplificou ainda
mais as manifestações artísticas de cunho musical, que passaram a apresentar novos
ritmos, cores, passos, versos e letras, além de oferecer a possibilidade de atores sociais
emergirem em meio aos acordes e batuques (BRANDÃO, 2009). Na capoeira, no
maracatu, no reisado, no cavalo-marinho, no pastoril, no bumba-meu-boi ou nas demais
manifestações populares nacionais observamos figuras que tem no ritmo uma das únicas
formas de expressão de sua subjetividade. Seja no agricultor da zona rural
pernambucana, que borda a gola de suas próprias vestimentas carnavalescas, ou no
negro suburbano que associa os passos de hip hop aos versos que ele mesmo cria,
vemos a imagem de populações marginalizadas, tomando voz e forma através da
música.
Para além das manifestações culturais populares, a música costuma apresentar
figuras que tomam o lugar de porta-voz de um grupo ou de uma realidade, transmitindo
suas reivindicações em forma de melodia. Surgem então nomes que dão voz ao que o
sistema opressor quer calar, que tomam significantes e sentidos, muitas vezes oriundos
dos movimentos sociais e lançam-nos através da arte, ora por via de denúncias ora de
pedidos de socorro.
Foi assim no período de ditadura militar quando nomes como Chico Buarque,
Geraldo Vandré, Caetano Veloso, Ellis Regina e Gilberto Gil, ecoaram contra a censura,
a tortura e a violência (NAPOLITANO, 2004); e é assim quando Elza Soares usa sua
voz a favor do feminismo e das pautas raciais e de classe (LOPES, 2010) ou quando
Linn da Quebrada denuncia a violência transfóbica no Brasil, através da música
(TAKARA, 2017).
O objetivo central deste trabalho é portanto, tomar como referência ícones da
música brasileira, buscando associar suas contribuições para os grupos minoritários
(enquanto representatividade) assim como, analisar de que forma as reverberações dos
movimentos sociais ecoam na maneira de compor e cantar destes artistas, identificando
os elos entre o que se vive e aquilo que é criado a partir daí.
Na tentativa de tornar as explanações mais didáticas, as discussões estarão
divididas em eixos que são propostos a partir de reflexões de recortes sociais. Abordar-
se-ão as contribuições musicais no período da ditadura militar brasileira, e do atual
governo assim como os recortes de classe, etnia, gênero e sexualidade, esboçados ao
longo da história, dando ênfase aos artistas que se encontram em destaque na atualidade.
Este trabalho, traz como justificativa central a necessidade de pensar os direitos
humanos a partir de outras vertentes que não apenas as atreladas ao campo científico. O
conhecimento artístico diz muito dos contextos históricos nos quais está inserido,
afastar a compreensão de direitos humanos, das manifestações artísticas é negligenciar
vivências e experiências ímpares que apontam para resistência e luta de um povo. A arte
é fluida e muitas vezes escapa aos mecanismos repressivos que regimentam outras
esferas do comportamento; nas manifestações subjetivas vemos emergir vozes e gritos
que em forma de versos, ritmos e sons oferecem saídas aos recortes populacionais de
exclusão.
A metodologia utilizada neste trabalho é de natureza qualitativa,
comparada por Denzin e Lincon (2006) como a prática de um tecelão de colchas, que
reúne em sua composição os retalhos de diversos espaços e discussões, compondo uma
figura multifacetada e diversa. Para composição deste trabalho foi utilizada uma
pesquisa bibliográfica na plataforma virtual Scielo, através de marcadores como: LGBT,
negro, mulheres, classe, ditadura e impeachment, atrelados a: música e cantores,
identificando assim trabalhos que dialogam sobre música como instrumento de
revolução social, além disso foi realizada uma pesquisa na discografia dos cantores
citados nas pesquisas, podendo pois, identificar composições que trazem em seu sentido
poético as reivindicações dos movimentos sociais.
“Eu não abro mão do que sonhamos juntos”: O atual governo do país
Em 1º de janeiro de 2011, o Brasil via, em transmissão midiática extensiva, a
primeira presidente mulher do país ser empossada. Aquele momento representava um
avanço significativo na história do país, que durante décadas negou os direitos políticos
das mulheres, sendo até hoje falho em representatividade política em todas as esferas. A
―política para todos‖ ainda faz parte de chavões e marketings dos partidos políticos, não
tendo efetividade prática, visto que o congresso nacional, por exemplo, é composto
majoritariamente por homens, brancos, de meia idade (MACHADO et. al., 2016).
A chegada de Dilma à presidência da república foi bastante controversa, tendo
sido alvo de várias críticas, muitas vezes justificadas em discursos machistas que
questionavam sua capacidade de governabilidade, baseada em estereótipos que a
inferiorizavam enquanto mulher. Apesar das controvérsias no ano de 2014, em
campanha acirradíssima a presidente foi reeleita em segundo turno, derrotando o
candidato ligado aos partidos alinhados aos ideais da direita. A partir de então vimos
emergir um novo cenário, onde a vitória foi inúmeras vezes questionada pelos seus
11
Canção escrita por João do Vale e José Cândido e interpretada por Maria Bethânia em 1995,
utilizando a analogia do carcará ao sistema ditatorial vigente.
opositores, que não satisfeitos com o resultado passaram a apoiar a retirada da
presidente democraticamente eleita.
Viu-se no ano de 2016 uma massiva movimentação, que com o apoio da mídia
apontada por Abramo (2016) como instrumento de manipulação a serviço do capital,
encabeçou um processo de impeachment, denunciado pelos movimentos sociais e pelos
partidos ligados diretamente as pautas destes movimentos, como golpe de estado. Na
culminância de um processo cheio de falhas, não por inconstitucionalidade, mas por
manipulação partidária e midiática, Dilma Vana Rousseff foi destituída de seu cargo em
agosto do mesmo ano, assumindo o até então vice-presidente Michel Temer, que já
havia assumido como presidente interino, durante o processo investigativo (RAMOS et.
al., 2016).
O novo governo, alinhado a outros ideais, passou a encabeçar reformas, usando
como justificativa a crise econômica existente no país. Reformas como a do ensino
médio, trabalhista, da previdência, dentre outras foram/são as pautas de maior
repercussão na Câmara dos Deputados e no Senado. Desalinhados com os movimentos
sociais, tais ações têm ocasionado repercussões cada vez mais amplas, mobilizando
intervenções e atos de resistência, principalmente das minorias políticas, que sentem-se
invisibilisadas diante do novo governo.
Como em todo período conturbado da história do país, a movimentação artística
passou a tomar um espaço de resistência. Vimos por exemplo, a forte repercussão da
extinção do Ministério da Cultura, que após a pressão popular, acalorada por artistas de
diversos segmentos foi repensada. Vimos, não nas letras, mas nos pronunciamentos
públicos de artistas como Chico Buarque, Caetano Veloso e Tico Santa Cruz a
insatisfação, que partia das ruas, nos atos contra o governo de Temer.
Os grandes atos de resistência foram abraçados por cantores como: Chico César,
Pitty, Emicida, Criolo, Maria Gadú e Tulipa Ruiz, além dos artistas locais de diversas
regiões do país, como é o exemplo de Gabi da Pele Preta, na cidade de Caruaru-PE. Em
meio à falas políticas, discursos dos movimentos sociais e de políticos aliados,
ecoavam-se músicas de resistência, algumas oriundas das lutas das mulheres, dos
negros, dos LGBT; outras da época da ditadura militar dialogavam com o momento
atual, ainda haviam as paródias que eram utilizadas como sátiras as figuras e discursos
proferidos pelas figuras apoiadoras do governo.
Outros artistas utilizaram/utilizam sua influência musical para promover
reflexões em meio aos seus shows particulares, como é o caso de Lenine, Baiana Sister,
Ney Matogrosso, além dos shows de artistas como Elba Ramalho 12, que apesar de não
compactuar com manifestações oriundas da plateia, e não esboçar opiniões sobre o atual
momento político, viu em alguns shows a repercussão do acalorado ―Fora Temer‖,
disseminado por todo país, chegando a recriminar a ação e causar repercussão, em
especial nas redes sociais.
Esse momento da história do país, ainda encontra-se longe de um desfecho,
sendo a pauta de discussão mais recente a votação do relatório que interrompe as
investigações por crime de corrupção passiva proferidas contra o atual presidente.13
Certamente veremos ecoar das ruas mais gritos de resiliência, mais versos de luta e
melodias de indignação, pois a arte tem se mostrado veículo de resistência em diversos
contextos sociais, principalmente naqueles em que a opressão ameaça se amplificar.
12
Reportagem disponível em: <http://www.parlamentopb.com.br/Noticias/?elba-ramalho-
repreende-fora-temer-e-discute-com-petista-durante-show-23.04.2017>
13
Reportagem disponível em: <http://g1.globo.com/politica/noticia/votacao-denuncia-temer-
camara.ghtml>
14
Trecho de canção de Chico César, refletindo sobre o contexto do processo de golpe vivido no
ano de 2016.
15
Projeção estimada pelo IBGE em 04 de agosto de 2017
http://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/
vida. Análise aprofundadas do cenário nacional nos últimos anos apontam uma queda
na disparidade da desigualdade, mas diante da discrepância essa redução é mínima.
Barros, Foguel e Ulisseia (2006) apontam que, mesmo com avanços entre os
anos de 2001 e 2005 o Brasil permanecia entre os países mais desiguais do mundo,
havendo concentração de boa parte da renda entre poucas famílias do país, enquanto a
maior parte da população concentrava uma pequena parcela, havendo casos em que as
condições ultrapassam a precariedade.
Souza (2004), reflete sobre a naturalização da desigualdade social, refletindo que
as práticas políticas nacionais criam sub cidadãos, não oferecendo a estes a
possibilidade de emergir e progredir economicamente, uma vez que são as classes
menos abastadas da população que recebem os piores serviços de educação, que não
tem acesso aos serviços de saúde de forma adequada e que consequentemente ocupam
no mercado de trabalho os espaços de menor status e remuneração.
Há muitas tentativas de incluir as pessoas menos favorecidas financeiramente
nas políticas públicas, oferecendo-lhes condições diferenciadas, presando pelo princípio
da equidade, mas em muitos momentos essa inclusão se dá numa perspectiva que
Sawaia (2002), chamaria de perversa, uma vez que oferecem-se oportunidades, como a
obrigatoriedade da matricula das crianças ou possibilidades de emprego para os jovens,
mas quando vislumbra-se a qualidade destes serviços, nos deparamos com o despreparo,
seja dos profissionais que não estão aptos ao trabalho frente a comunidades carentes, a
escassez de materiais ou as condições insalubres de residência e trabalho das populações
carentes.
O acesso aos grandes centros culturais acaba sendo utópico para maior parte da
população que em geral acaba tendo acesso apenas ao que é veiculado pelas grandes
mídias, conteúdos em muitos momentos dispares com a realidade local. Tais barreiras,
não impedem que os guetos, as favelas e os becos construam sua própria forma de
expressão, muito pelo contrário, em muitos momentos é a opressão, a marginalidade e
abjeção que serve de eixo motriz para resistência.
As músicas de Funck e Rap, são fortes exemplos de resistência em meio ao
caótico cenário de desigualdades. Zeni (2004) reflete que em muitos momentos as
músicas de Rap falam de uma realidade na qual os cantores encontram-se inseridos,
enquanto falam também de um processo de construção social que remonta o processo de
colonização onde se matava em nome do ouro e da prata.
Grupos com perfis similares aos Racionais MC‘s, em músicas como: Diário de
um Detento, Jesus Chorou e Negro Drama refletem sobre a realidade da vida nas
comunidades periféricas e suburbanas de nosso país, levantando a bandeira da crítica
social que aponta para os problemas oriundos da desigualdade de classe, mas que por
terem sido naturalizados acabam passando despercebidos frente as lentes dos olhares
dos gestores públicos, da mídia e muitas vezes da sociedade num geral.
O Funck é outro ritmo de grande reverberação das críticas sociais. Dos mais
antigos como Cidinho e Roca, com o famoso hit: Rap da felicidade, aos nomes atuais
como a MC Karol em letras como: Delação Premiada e Não foi Cabral, vemos a
insatisfação frente as desigualdades vividas nas favelas de todo país. Críticas a justiça
seletiva, que prende e mata negros e pobres, além de mensagens de otimismo e
esperança frente a uma realidade que parece não mudar, mas da qual não se desiste, são
algumas das temáticas abordadas pelos cantores e cantoras deste ritmo. A voz da favela
se faz ouvir dentro e fora de seu território, lançando os olhares cegos pela naturalização
para a realidade desigual de nosso país.
As desigualdades sociais brasileiras também já foram cantadas por inúmeros
outros ritmos. Algumas músicas de forró e baião falavam de uma realidade de exclusão
e necessidade de sua época, como foi o caso de canções como A triste Partida de Luiz
Gonzaga, retratando a necessidade de abandono das terras de inúmeras famílias
nordestinas do século passado e ainda vividas de formas reeditadas na atualidade. Ou na
música Cidadão do paraibano Zé Ramalho que nos leva a reflexão sobre a exploração
da mão de obra, muitas vezes em condições análogas à escravidão. Há ainda, canções
como Meu Guri, de Chico Buarque, interpretada também por Elza Soares que retratam
a vida de muitos garotos nos subúrbios brasileiros, que mesmo encontrando meios
alternativos de emergir economicamente, acabam calados pelas lápides ou grades de
uma prisão.
―É mais uma boca
Dentro do barraco
Mais um quilo de farinha
Do mesmo saco
Para alimentar
Um novo João Ninguém
A cidade cresce junto
Com neném‖16
16
Trecho da música Relampiano de Lenine, numa crítica a realidade de famílias atingidas
diretamente com os efeitos da desigualdade social.
miscigenação que passaram a surgir políticas públicas específicas para esta população,
como é o caso das cotas raciais em concursos e universidades.
Apesar dos avanços no que concerne a inserção da população negra nos entraves
das políticas públicas, o racismo mantém sua perpetuação, que vez ou outra se faz
evidente nos noticiários e jornais. Para além dos casos que ganham notória repercussão
há aqueles onde a vítima se quer entende o que está acontecendo, ou que não sabe o que
fazer com isso. O racismo está tão naturalizado, que a cor das favelas e do cárcere
parece ser entendida como mera coincidência.
É em meio ao preconceito diário que constrói sobre a figura negra estereótipos
de marginalidade e crime, e de uma sociedade que lança para esta população as
migalhas que caem das mesas dos brancos e afortunados, que vemos surgir gritos de
resistência, como a voz estridente de Elza Soares quando canta A carne. Elza carrega
consigo os estereótipos de ser mulher, negra, oriunda da classe pobre, vítima do
preconceito racial e do machismo, sentindo na pele o que é ser mulher negra, no ventre
o peso de sua descendência, que carregará marcas parecidas, e no sangue a pulsação que
exige luta Elza faz das cordas vocais amplificadores de sua dor, usando a metáfora do
açougue, para alertar sobre as injustiças vividas pela população negra que como retrata
trechos da música: ―Que vai de graça pro presídio/ E para debaixo do plástico/Que vai
de graça pro subemprego/E pros hospitais psiquiátricos.‖
Dentre as diversas manifestações de reivindicação contra o racismo, temos a voz
de Gabriel Pensador que denuncia as mazelas deste comportamento aversivo no Rap
Racismo é Burrice. A música fala aquilo que teorias, como a psicologia social, vem
discutindo desde sua concepção. Lança para sociedade reflexões que vão além das
justificativas racionais que apontam a não existência deste tipo de comportamento,
reflete sobre papeis sociais, identidade, representações grupais, dentre outras questões
pertinentes a compreensão do mecanismo do racismo em nosso país.
Recentemente vimos emergir, de diversos ritmos, expressões que dialogam com
a resistência negra de forma clara e evidente, é o caso da cantora Larissa Luz que em
seu álbum intitulado: Território Conquistado, realiza reflexões com base na
interseccionalidade das reverberações do machismo e do racismo. Músicas como:
Descolonizada, Bonecas Pretas e Letras Negras aponta para a experiência de ser
mulher negra na sociedade brasileira. Larissa evoca nomes como o de Carolina de Jesus
e faz parcerias com Elza Soares, lançando para as novas gerações a reflexão sobre a
importância da representatividade, nas vitrines, ruas e na música.
No Hip Hop não tem sido diferente, nomes como o da MC Soffia surgem para
lançar a reflexão sobre a não representatividade negra em nossa sociedade. Uma criança
que canta para outras crianças, passando mensagens de resistência, autoestima e
reconhecimento da cor e dos traços de sua etnia, como podemos ver nas músicas:
Menina Pretinha e Minha Rapunzel de Drad, é fruto das lutas de muitas negras e
negros que exigiram reconhecimento e o construíram e ainda constroem quando este lhe
é negado. Além destas podemos citar cantoras como Karol Conka, MC Karol, Juçara
Marçal e Ellen Oléria, que fazem de suas performances explanações sobre a realidade
negra do país.
―Sara, sara, sara cura
Dessa doença de branco
De querer cabelo liso
Já tendo cabelo louro
Cabelo duro é preciso
Que é para ser você, crioulo.‖17
“Mas sou minha, só minha e não de quem quiser”: A música cantada pelas
mulheres
17
Trecho da música Sarará Miolo de Gilberto Gil, realizando uma crítica aos padrões de beleza
baseados no modelo eurocêntrico.
Outro dado que aponta para as fragilidades do país para com as mulheres é o
índice de assassinatos. O Brasil ocupa o quinto lugar no ranking mundial de
feminicídio, tal fato culminou na elaboração da Lei Maria da Penha, que não deve ser
analisada como um ponto de partida das discussões de gênero, uma vez que esta é fruto
de outras reivindicações sociais, alinhadas aos movimentos sociais, mas também não
pode ser considerada um ponto de chegada, uma vez que passados anos da instituição da
Lei Maria da Penha, os índices de violência doméstica têm continuado alarmantes e
outras formas de preconceito de cunho sexista e machista continuam se apresentando
(CAMPOS, 2015).
As mulheres continuam sendo invisibilisadas na política, quando apesar de
serem maior parte da população ocupam uma porcentagem irrisória de mandatos; no
mercado de trabalho, uma vez que continuam recebendo menos que os homens que
realizam a mesma função, com o mesmo nível de especialização e também nas
produções acadêmicas hegemonicamente escritas por homens e muitas vezes
legitimando a disparidade entre os gêneros. Como aponta Haraway (1995) é preciso
produzir conhecimentos que busquem adequar-se à realidade social das mulheres, os
saberes precisam encontrar localização que parta das camadas oprimidas da sociedade e
não na lógica inversa, como grande parte das produções do último século.
Este artigo esteve perpassado pela evocação de nomes femininos que fizeram e
fazem a diferença na música brasileira. Seja no período ditatorial com nomes como o de
Ellis Regina e Nara Leão; na frente de resistência ao atual momento político do país,
como é o caso de Maria Gadú e Gabi da Pele Preta; na luta de classes onde ecoa a voz
de MC Karol ou na resistência negra onde se sobressaem nomes como Elza Soares,
Larissa Luz e MC Soffia. Necessitamos ainda rememorar as mulheres que fazem uso de
suas letras para reforçar o lugar feminino no mundo, negando a opressão e galgando
caminhos de uma sociedade mais justa e equânime.
Muitas das músicas produzidas e repercutidas em cenário nacional, seja no forró,
no sertanejo, no Funk ou MPB, apresentam em suas letras conteúdos de cunho machista
e sexista. Bergamini Júnior (2008) em análise das canções de Chico Buarque realiza um
levantamento e aponta que em muitas delas a mulher ocupa um lugar de inferioridade e
servidão; o mesmo ocorre com outros ritmos e com outros artistas que tornam em suas
letras a mulher num objeto, ou numa propriedade, lançando sobre seus corpos uma
sexualização exacerbada, que é usada como legitimadora de abusos dos mais diversos.
Na contramão destas canções vemos emergir cantoras que usam a voz para
mostrar que podem ser o que quiserem, independente das vontades da população
masculina. O Funk é um dos exemplos desta mudança de posicionamentos; em muitas
letras da década passada a mulher era apontada como objeto; na atualidade cantoras
como a Valesca Popozuda tem invertido esta ordem, mostrando com seus versos
satíricos e escrachados que o espaço da mulher se ampliou e que as normas e bons
costumes que tolhem seus desejos precisam ser ultrapassados. Músicas como Quero te
dar, Traz a Bebida que Pisca e Tá pra nascer homem que vai mandar em mim são
exemplos desta mudança, uma vez que expõem os desejos sexuais femininos e
dissociando-os da lógica sexista que perpassa estes pelo aval masculino.
O mais recente álbum de Elza Soares, A mulher do Fim do Mundo é outro
exemplo que dialoga com a luta feminina, as canções do seu 34º trabalho apontam para
a necessidade de realizar denúncias de violência doméstica e de se fazer mulher
independente dos limites impostos pela opressora sociedade machista. Aos 80 anos Elza
em canções como Mulher de Vila Matilde e Mulher do Fim do Mundo, além de seu
posicionamento público diretivo e contundente sinalizam que a luta por uma sociedade
mais equânime está ainda em processo, é preciso cantar até o fim, para que todas as
mulheres escutem e a partir de então se façam ouvidas.
Algumas bandas também têm apresentado postura crítica em suas canções é o
caso da música Triste, louca ou má da banda Francisco, el Hombre. A canção reflete
sobre os papeis sociais direcionados as mulheres, refletindo as possibilidades de
rompimento com a construção cultural vigente. Há ainda cantoras como Ellen Oléria
que fazem a intersecção do feminismo com a luta contra o racismo, refletindo nuances
de ambos os espaços de segregação, um exemplo claro é a música Antiga Poesia, na
qual há uma forte reflexão sobre as mulheres negras da América Latina e do Caribe.
Poderíamos ainda citar a música 1º de julho de Cássia Eller; Pagú eternizada por
Zélia Ducan e Rita Lee; 100% feminista, resultante da parceria de MC Karol
com Karol Conka, Desconstruindo Amélia, de Pitty, dentre outras.
―Ô moça, ontem eu tava caminhando
Perto daquela praça e um homem me parou
E me deixou marcas
Mas não eram de batom
Não eram de batom‖18
“Ninguém vai poder querer nos dizer como amar: Artistas LGBT‘s
18
Trecho da música Disk Denúncia de Nina Oliveira, refletindo sobre a responsabilização lançada
sobre as mulheres em caso de abusos machistas.
penitenciárias, serviços de assistência social e saúde, assim como a política num todo
ainda encontram-se despreparadas para dar conta das demandas da população LGBT.
Nos últimos anos, vimos emergir na música brasileira personalidades que
reivindicam direitos igualitários, assim como representatividade política e midiática.
Seja com letras que satirizam a realidade social de LGBT‘s, com críticas ao status quo
ou perpassando mensagens de tolerância e respeito o cenário musical vem se
modificando e as figuras, ditas estranhas têm alcançado notória visibilidade, mesmo que
atravessadas pelos mecanismos de opressão e repressão atuantes em diversas esferas.
Gonçalves (2016) realiza um apanhado histórico sobre a representatividade
musical LGBT no Brasil, para tal nos leva a refletir sobre quantos nomes e
personalidades que escreveram ou ecoaram canções que dialogam diretamente com o
movimento e que foram esquecidos, ou silenciadas. Uma destas artistas é Tuca que em
1974 já cantava sobre relações nada convencionais para sua época, como é o caso da
música Girl.
Canções famosas como Geni e o Zepelim, de Chico Buarque já traziam a
reflexão sobre o lugar das travestis na sociedade de sua época, não muito diferente dos
dias atuais. Caetano Veloso por sua vez trouxe em tons discretos eu líricos masculinos
realizando declarações a outros rapazes, como é o caso da canção Amor mais que
discreto. Outra figura de notoriedade é Ney Matogrosso que com suas performances,
rompia com os limites dos estereótipos de gênero, usando da música para expressar sua
liberdade, apesar de seu discurso muitas vezes interpretado como desserviço das causas
sociais.19 Além destes, temos no cenário musical figuras assumidas lésbicas ou
bissexuais, como Anna Carolina, Maria Bethânia, Adriana Calcanhoto, Maria Gadú,
Sandra de Sá, dentre outras,
Rompendo com os padrões até então expostos de forma muito sutil pela
musicalidade brasileira, vemos na última década surgir um grupo de novos cantores que
rompem com os estereótipos e barreiras de gênero e sexualidade, ora nas letras e clipes,
como é o caso de Johnny Hooker nas músicas Amor Marginal, Flutua e Volta; e de
19
Reportagem disponível em: <http://br.blastingnews.com/tv-famosos/2017/07/que-gay-o-caralho-
sou-ser-humano-desabafa-ney-matogrosso-001865331.html>
Silva nas músicas Beija Eu e Feliz e Pronto; ora no seu posicionamento político,
postura de palco e identidade desviante da norma estabelecida, como é o caso dos
cantores Liniker e Lineker.
Vemos ainda figuras como Pablo Vittar e os integrantes da Banda Uó, formada
por dois gays e uma mulher transexual, que tem ganhado visibilidade com suas músicas
dançantes, ou cômicas, tendo Pablo alcançado um espaço, outrora impensado para uma
Drag Queen no Brasil, além das produções mais reflexivas como a música
Indestrutível, que aponta para as dificuldades oriundas do processo de reconhecimento
de sexualidade ou identidade.
Outra característica interessante é que vimos surgir várias cantoras transexuais,
fazendo uso de sua voz para denunciar a violência transfóbica vivenciada no país.
Nomes como a Mulher Pepita, Lia Clarck, Candy Mel e Linn da Quebrada têm
representado as travestis e transexuais. Linn tem ousado em suas letras críticas como
Enviadecer, Mulher, Bixa Preta e Talento. Nelas Linn abusa da sátira, para
escancarar o universo de opressão vivenciados por travestis de todo país, em especial
aquelas oriundas dos subúrbios e de cor de pele escura. A cantora tem ido além das
críticas nas músicas tendo se posicionado em diversas entrevistas e programas,
apontando suas impressões sobre a diversidade de gênero e sexual, sendo apontada
como uma artista inovadora e fluída por autores como Takara (2017).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
20
Trecho da música Alguém segure esse homem do cantor Lineker, refletindo sobre a realidade
dos homens transexuais.
Atualmente vivenciamos um processo histórico delicado, onde os grupos sociais
menos favorecidos, não representados politicamente, temem por retrocessos. Ocupamos
os primeiros lugares nos rankings mundiais de assassinato de LGBT‘s e mulheres;
descansamos sob o mito da democracia racial, mas as denúncias de racismo não cessam
de aparecer e temos uma das piores distribuições de renda do mundo, mesmo assim
resistimos e conquistamos espaço, fazendo uso de recursos criativos que denunciam e
ajudam a vivenciar as nuances da desigualdade e do preconceito. Muitos artistas têm
feito de sua voz instrumento de resistência e certamente, continuarão a ecoar os gritos e
as melodias que anunciam que são as lutas sociais responsáveis pela garantia, conquista
e manutenção dos direitos humanos.
REFERÊNCIAS
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baixas da América do Sul: Estado da Arte. Mana, Rio de Janeiro, v. 13, p. 293-316,
2007.
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Buarque. 1990. 125 f. Dissertação (Mestrado). Mestrado em Letras na área de
Literaturas de Língua Inglesa, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 1990.
COTRIM, Gilberto. A instituição da república. In: COTRIM, Gilberto. História
Global: Brasil e Geral. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 405-413.
FREYRE, Gilberto. Casa-Grande & Senzala. 50. ed. São Paulo: Global Editora,
2005.
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mulher. (RE)cortes da mídia sobre a posse da primeira mulher presidente do Brasil.
Veredas. v. 9, p. 24-47, 2016.
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Grupo Gay da Bahia, 2017.
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dos serviços de vigilância política (1968-1981). Revista Brasileira de História. v. 24,
p. 103-126, 2004.
SILVA FILHO, José Carlos Moreira da. O anjo da História e a memória das
vítimas: O caso da ditadura militar no Brasil. Veritas, Porto Alegre, v.53, p. 150-178,
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TAKARA, Samilo. ―Que que é isso que essas bichas tão fazendo?‖ Micropolíticas
de resistência em enviadescer da MC Linn da Quebrada. In: IV Seminário
internacional de estudos culturais e educação. 2017.
ZENI, Bruno. O negro drama do rap: entre a lei do cão e a lei da selva. Estudos
Avançados, São Paulo, v. 18, p. 225-241, fev.2004.
NOVAS DIMENSÕES DO EUROCENTRISMO: PERCEPÇÕES DE
ALUNOS/AS DE DIREITO SOBRE DIREITOS HUMANOS E QUESTÕES
INDÍGENAS
RESUMO
1 INTRODUÇÃO
21
Escola Superior de Advocacia, pós-graduanda em Direito Processual Civil. Graduada em
Direito pelo Centro Universitário do Vale do Ipojuca. Advogada. deborahellenlima@hotmail.com.
22
Universidade Federal de Pernambuco, aluna especial no P.P.G.D.H (Programa de pós-graduação
em Direitos Humanos). Graduada em Direito pelo Centro Universitário do Vale do Ipojuca. Advogada. E-
mail: w.alana@live.com,
O presente trabalho aborda sobre o seguinte tema: ―Novas Dimensões do
Eurocentrismo: Percepções de Alunos/as de Direito Sobre Direitos Humanos e Questões
Indígenas‖.
Visamos realçar aspectos críticos sobre o tema apresentado, com intenções de
discutir a percepção dos estudantes do segundo e do décimo período do curso de direito
de uma Instituição de Ensino Superior do Agreste Pernambucano sobre a aplicação dos
direitos humanos na garantia de direitos indígenas, como também o trajeto histórico dos
direitos indígenas e a negação desses direitos ao longo da história.
Esses assuntos possuem relevância nos dias de hoje devido à omissão do Estado
brasileiro em implementar políticas públicas para a preservação do indígena, diante da
omissão é possível verificar uma elevada quantidade de violações aos direitos humanos,
e quando se trata de direitos indígenas a situação é ainda mais grave. A História mostra
que os interesses políticos e econômicos sempre se fizeram presentes na problemática
que envolve os direitos indígenas, repercutindo assim, sobre a proteção jurídica dada a
esses povos desde a colonização do Brasil até os dias atuais.
Assim, buscamos discutir a percepção dos alunos de uma universidade do
agreste pernambucano, a respeito dos direitos humanos como forma de garantia de
direitos, para que os povos indígenas posam sair de uma situação de invisibilidade e
negação de garantias, analisando a Declaração Universal de Direitos humanos e os
tratados internacionais em paralelo o Estatuto do Índio.
O problema estabelecido na pesquisa foi o seguinte: Qual a percepção dos
alunos/as de direito do segundo e décimo período do curso de direito sobre a aplicação
dos direitos humanos para povos indígenas?
Por sua vez, o objetivo geral do estudo foi instituído como: Compreender a
percepção dos alunos de direito do segundo e décimo período sobre a aplicação dos
direitos humanos para povos indígenas. E como forma de delineamento ao tema
abordado neste presente trabalho será apresentado o seguinte objetivo específico:
Analisar as principais abordagens históricas sobre direitos humanos como instrumento
para garantia de direitos indígenas.
Os principais autores que fundamentaram as discussões da presente pesquisa
foram os seguintes: Leitão (1993), Lidorio (2007), Ribeiro (2000), Piovezan (2012),
Sousa Filho (1998), Silva (2014) e Villa Bôas Filho (2003). Não podendo deixar de
citar os dados fornecidos pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI).
O trabalho apresentado consiste na perspectiva de compreender a percepção dos
estudantes sobre a aplicação de direitos humanos como formas de proteção aos direitos
indígenas, observando como eles entendem que os indígenas são sujeitos de direitos, e
tal devem ser respeitados. E que para aplicação será analisado as teorias universalistas,
relativistas, etnocêntrica e universalista de confluência; observando a que melhor se
encaixa para a afirmação de direitos indígenas.
Uma inquietação pessoal, fez com que houvesse a concretização deste trabalho.
Levando em consideração o desconhecimento da atual situação dos indígenas de
invisibilidade e negação de direitos, surgiu o interesse de entender qual a percepção dos
alunos sobre os direitos indígenas e se eles conseguiam considerar um índio como
portador de direitos e garantias.
Em seguida, surge à justificativa para este trabalho no tocante ao meio
acadêmico. Pois bem, o presente trabalho surge para despertar a curiosidade dos
acadêmicos para analisar e compreender (ou não) a percepção dos estudantes de direito
o quando o assunto é o tema em questão. O intuito do presente trabalho, é que este,
venha contribuir com discussões na sociedade como um todo, para que a realidade
apresentada possa ser rediscutida e repensada. Sempre visando o melhor pra todos.
Esse estudo se apresenta como um importante espaço de discussão acerca dos
aspectos que relacionam os povos indígenas e os direitos humanos.
Esse método se encaixa no presento trabalho, pois se faz necessário uma análise
da história dos direitos humanos dos povos indígenas, pois ao longo dos anos sua
aplicação vem sendo influenciada pelo contexto cultural de cada época. E, sendo
necessário uma observação ao passado para que se possa entender a atual situação
desses povos. Pode ser observado o uso desse método em pesquisas qualitativas.
A presente pesquisa baseia-se no levantamento de dados para compreender e
interpretar determinados comportamentos ou fenômenos. A abordagem usada será a
qualitativa, pois não será apresentado resultados em números, e sim, verificar a relação
da realidade com o objeto da pesquisa, analisando as respostas obtidas dos alunos dos
primeiros períodos e do último período do curso de direito a respeito dos direitos
humanos para povos indígenas brasileiros.
Sobre a abordagem qualitativa o autor Richardson ilustra:
O discurso dos direitos humanos não pode ser usado como uma arma de
imperialismo moral, oprimindo outras comunidades e modos de vida, do mesmo modo
que não deve servir de escudo para esconder práticas arbitrárias e violações de direitos.
4 Resultados
O presente trabalho é uma pequena parte de uma pesquisa científica realizada no
ano de 2016, que foi apresentada como Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção
do titulo de Bacharel em Direito. Para quantificar a percepção dos alunos dos períodos
inicias e do décimo período do curso de Direito de uma Instituição de Ensino Superior
do Agreste Pernambucano foi realizado um questionário de 25 (vinte e cinco) questões
que versavam sobre a aplicação dos direitos humanos para povos indígenas. Onde só
foram trazidos 6 (seis) questões para analise, sendo 3 dos períodos inicias e 3 dos
períodos finais.
A primeira questão trazida para analise foi feita aos alunos do curso de direito
que estão no segundo período, relativa aos direitos humanos que como é sabido à todos
os seres humanos, independente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou
qualquer outra condição. Diante da afirmativa acima, foi perguntado aos alunos sobre a
concordância ou não, destes, na aplicação dos direitos humanos ao povo indígena.
Segue as respostas:
GRÁFICO 1: Percepção de alunos/as de períodos iniciais sobre direitos
humanos ao povo indígena
12%
8%
4%
76%
A- Concordo, pois os direitos humanos são universais, também se aplicam aos indígenas
B- Concordo em partes, os direitos se aplicam aos indígenas mas em caráter excepcional quando a
violação do direito à cultura.
C- Não concordo, os direitos humanos não se aplicam aos povos indígenas, pois só são para homens
civilizados
D- Não consigo opinar sobre o assunto
0%
12% 4%
84%
A- Concordo, pois os direitos humanos são universais, também se aplicam aos indígenas
B- Concordo em partes, os direitos se aplicam aos indígenas mas em caráter excepcional quando a
violação do direito à cultura.
C- Não concordo, os direitos humanos não se aplicam aos povos indígenas, pois só são para homens
civilizados
D- Não consigo opinar sobre o assunto
Percebe-se que 84% dos alunos do décimo período concordaram que os direitos
humanos devem ser aplicados aos povos indígenas. Em minoria, 12% concordam
parcialmente, os direitos humanos só podem ser aplicados quando houver uma violação
de direito á cultura, no entanto o direito a cultura é garantido tanto pela Constituição
Federal de 1988 e pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, dois quem tem
uma força grande aplicação no país; violar o direito á cultura é violar um
direito/garantia constitucional. Um aluno discordou totalmente, os povos indígenas não
possuem direito a aplicação dos direitos humanos. Observou-se que todos os 25alunos
entrevistados expressaram uma opinião acerca da questão, e em sua maioria positiva e
garantidora de direitos.
Vale ressaltar que esses alunos já passaram pelas disciplinas de Direito
Constitucional, Direito Civil, Sociologia e Direitos Humanos; disciplinas que trazem no
seu contexto a discursão sobre a igualdades de povos, garantia de direitos e aplicação de
direitos para todos em solo nacional incluindo os indígenas.
A segunda pergunta trazida está relacionada ao direito à cultura dos povos
indígenas. Foi perguntado se os acadêmicos concordavam que tal direito deveria ser
preservado, mesmo que este violasse direitos humanos ou direitos fundamentais. Segue
as respostas:
16% 16%
36%
32%
B- Concordo em partes, a cultura deve ser preservada, desde que não viole direitos humanos ou
fundamentais
C- Não concordo, os direitos humanos são universais, e como tal devem ser respeitados.
4% 20%
36%
40%
B- Concordo em partes, a cultura deve ser preservada, desde que não viole direitos humanos ou
fundamentais
C- Não concordo, os direitos humanos são universais, e como tal devem ser respeitados.
12%
24%
16%
48%
A- Concordo, pois os índios devem analisar outras culturas com base na sua.
B- Concordo em partes, os indígenas devem analisar outras culturas com base na sua no entanto
devem está dispostos a dialogar
C- Não concordo, cada grupo cultural tem seu modo de definir os valores, por isso, os indígenas não
devem julgar outros povos
D- Não posso opinar sobre o assunto.
16%
28%
20%
36%
A- Concordo, pois os índios devem analisar outras culturas com base na sua.
B- Concordo em partes, os indígenas devem analisar outras culturas com base na sua no entanto devem está dispostos a
dialogar
C- Não concordo, cada grupo cultural tem seu modo de definir os valores, por isso, os indígenas não devem julgar outros
povos
D- Não posso opinar sobre o assunto.
Conclusão
O presente trabalho de pesquisa chega ao fim na busca por repostas ao seguinte
problema de pesquisa: Qual a percepção dos alunos de direito do segundo e décimo
período sobre a aplicação dos direitos humanos para povos indígenas?
Os resultados para que sejam reveladas as respostas do presente trabalho foram
alcançados por meio da análise de um questionário aplicado aos alunos do segundo e do
décimo período do curso de direito em uma Instituição de Ensino Superior do Agreste
Pernambucano. Ao desenvolver da pesquisa e dos demais estudos, constamos que os
estudantes de segundo período possuem uma percepção histórica satisfatória, já os
alunos do décimo período não corresponderam às expectativas. Percebeu-se que os
alunos de segundo período optaram por uma abordagem universalista para aplicação dos
direitos humanos; já os do décimo período optaram por uma abordagem relativista para
a aplicação dos direitos humanos.
No que se refere ao etnocentrismo, em sua maioria discordaram que os indígenas
adotem esse tipo de abordagem; mas a maioria concordou que a sociedade civil é
etnocêntrica e analisa o índio com base nos seus costumes, cultura e crenças. Essa
analise da cultura do outro com base na sua, gera preconceito o que consequentemente
pode vir a ser fruto de violações de direitos. Nesse ponto temos que observar o outro de
forma igual e reconhecer que existem aspectos que podem ser diferentes; mas nunca se
deve observar o outro de forma preconceituosa e com pré-conceitos.
Já, na garantia de direito, mais uma vez, em sua maioria, consideraram que os
indígenas possuem direitos a serem garantidos. Apesar dos estudantes do décimo
período alguns deles ainda afirmaram que esses povos não possuem direito. Os
estudantes de décimo período possuem uma base curricular bem mais ampla á cerca de
garantia de direitos, a própria disciplina de Direitos Humanos traz toda essa carga, o que
chega a ser inamissível que certos estudantes entendam que certos direitos não podem
ser aplicados á determinado povo em função da sua diferença ética ou por qualquer
outro motivo; os Direitos Humanos são universais, é aplicada a toda e qualquer pessoa
independente do lugar em que ela esteja. Precisa-se desconstruir esse conceito de que o
outro não possui direito; se esse outro é um ser humano ele possui direitos, sendo
indígena ou não.
Ao conceituar os direitos humanos e questionar sobre sua aplicação para povos
indígenas 76% dos estudantes do segundo período confirmam que os Direitos Humanos
são aplicados aos povos indígenas, apesar de serem estudantes que iniciaram o curso, a
percepção destes alunos é garantista, para eles as proteções de direitos se aplicam os
indígenas. Já 84% dos alunos do décimo período concordaram que os direitos humanos
devem ser aplicados aos povos indígenas.
Concluímos que há muito que se desenvolver sobre a aplicação dos direitos
humanos para povos indígenas; mas os estudantes possuem consciência de que os
direitos humanos são aplicados a povos indígenas.
REFERÊNCIAS
GIL. Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. - São Paulo:
Atlas, 2002.
____. Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6 ed. São Paulo.
Atlas, 2008
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 34. ed. São
Paulo: Malheiros, 2014.
Eu prefiro ser
Essa metamorfose ambulante
Do que ter aquela velha opinião formada sobre
tudo
(Raul Seixas).
RESUMO
Este artigo objetiva compreender as relações vivenciadas na Escola de Referências de
Panelas-PE, mediadas por uma proposta educativa que se manifeste no currículo, e as
práticas educativas da escola visando à formação ética na formação integral que
circunscreve as escolas de referências do estado de Pernambuco. Tal leitura assume
contribuições da filosofia deleuziana, que aponta para novas imagens do pensamento,
potencializando a criação e a invenção. Este estudo assume como percurso
metodológico o enfoque hermêutico, visando descortinar sentidos na relação singular –
múltipla que permeia o espaço educacional através de observações e entrevistas
reflexivas, Tal leitura se encaminha para o reconhecimento das possibilidades de uma
educação menor que resista às aspirações desenvolvidas na linearidade prevista pela
escola. Assim, a escola de Referência de Panelas-PE, desenvolve ações formativas que
revelam aspectos de uma educação moral, orientada pela cultura da trabalhabilidade e a
pretensão da inserção do jovem no ensino superior. Tal prática se constitui em meio ao
paradoxo da adequação à representação de uma educação dogmática, que prima pelas
imagens de pensamentos paralisados.
23
O trabalho resultou da pesquisa de Iniciação Cientifica (PIBIC – FACEPE/2013) realizada no
período de agosto/2013 a julho/2014, intitulada ―Transformações curriculares: o singular e o múltiplo na
formação ética do/a jovem da escola de Referência‖, vinculada ao Projeto de Pesquisa “O Dilema Ético
na formação de jovens no Ensino Médio: Um estudo da proposta de Educação Integral das Escolas
de Referência do Estado de Pernambuco”, coordenado pela Prof. Dra. Maria Betânia do Nascimento
Santiago. Esta ação recebeu financiamento da FACEPE – Fundação de Apoio à Ciência e Tecnologia do
Estado de Pernambuco, como Auxílio a Projetos de Pesquisa – APQ (Edital FACEPE 15/2012).
24
Graduada em Pedagogia pela UFPE-CAA - Universidade Federal de Pernambuco - Centro
Acadêmico do Agreste - ranuzianettinha@hotmail.com. Bolsista PIBIC-FACEPE no período de
agosto/2013 à julho/2014, com o projeto intitulado: Transformações curriculares: o singular e o múltiplo
na formação ética do/a jovem da escola de Referência, no qual este artigo é parte das conclusões.
Palavras-chave: Transformações curriculares. Formação Ética. Escola de Referência de
Panelas. Jovem. Perspectiva Deleuziana.
A educação do século XXI se constitui num contexto marcado por uma ampla crise, que
corresponde ao esgotamento da razão analítico instrumental, que perdura desde o iluminismo,
revelando sua inaptidão para cumprir o que propusera em relação à liberdade, igualdade e
fraternidade (COSTA, 2008, p.13). Nessa perspectiva, podemos perceber no que se refere ao
ser humano a relação regulada pelo medo, pela ansiedade, e o coletivismo. Experiências
marcadas pelo cinismo, pela competição, e que conduzem à perda da dignidade humana.
Nesse cenário, observa-se a fragmentações dos saberes, seguindo uma ótica
unidimensional. A ―educação passa a ser vista como algo utilitário, e a formação dos
sujeitos direcionada a finalidades econômicas‖ (MOURA; SANTIAGO, 2013, p. 3).
Contudo, essa mesma sociedade vivencia um paradoxo: por um lado, o ser humano em
sua totalidade está enfraquecido, devido às questões econômicas, sociais, políticas, e
culturais, e por outro se estabelece uma época de grandes oportunidades, enquanto
enfrentamento dessa crise que abarca as diferentes relações que o humano estabelece.
Nesse contexto de crise e de contraposição à lógica unidimensional, torna-se
uma exigência o debate e a busca de alternativas que se materializem em práticas
educativas direcionadas à formação humana. Diante disso, percebemos que a educação
integral em face de suas possibilidades indica outros direcionamentos, considerando que
a mesma parte do ―reconhecimento das dimensões do humano, à medida que essas se
tornam significativas no espaço educativo, sendo então perceptíveis e acolhidas‖
(MOURA, 2012, p .54).
Com efeito, a problemática da educação integral tem sido objeto de estudo de
diversos pesquisadores (SILVA; SILVA, 2012; ARROYO, 2012; MOLL, 2012). Tais
estudos expressam visões distintas e por vezes complementares no que se refere à
questão (LIMA NETTA, 2014, p. 17).
Assim, a Educação Integral desenvolvida pelo Programa de Educação Integral do
Estado de Pernambuco fundamenta-se nos pressupostos da educação interdimensional que se
propõe a integrar as diversas dimensões do humano (COSTA, 2008, p. 28). Dessa concepção
educativa, destacam-se elementos que se constituem em princípios formativos, são eles: a ideia
de protagonismo juvenil, de presença educativa, a defesa da educação para valores, os
quatro pilares da educação, e o empreendedorismo, relacionado à trabalhabilidade e o
compromisso com inserção dos/as jovens no Ensino Superior (LIMA NETTA, 2014, p. 18-19).
Essa relação entre a arte e a formação através de diferentes estratégias está relacionada
com a formação cultural – Bildung, tendo em vista a preparação do indivíduo, e relacionando as
normatizações universais e individuais que não se excluem como afirma Hermann (cf. 2008,
p.19). Dessa forma, os valores, os deveres, as normas, que continuam existindo historicamente,
e, presentes na sociedade são percebidos por uma crise atual, que:
Consiste no fato de não haver mais um padrão fixo e
(supostamente) universal, digno de ser aceito por todos como critério
de orientação e de juízo para os atos morais. A crise existe não porque
não haja mais valores, mas porque nos encontramos num momento de
passagem de um contexto de valores relativos às circunstâncias
materiais e culturais de tempo e lugar. (GOERGEN, 2010, p. 160).
Os valores que estão relacionados ao tempo, a cultura e ao lugar, por vezes direcionam a
ações totalizadoras, no que se refere aos casos singulares que são vivenciados na relação com o
todo. Dessa forma, os costumes, o raciocínio, desempenham papéis fundantes na construção do
indivíduo social e particular, moldando as subjetivações, direcionando as experimentações,
levando o humano ao uso da razão através da adaptação no mundo de valores decorrentes
historicamente. Como a Goergen (2010, p. 167), ―o contexto da mundialização totalizadora
envolve e viola veladamente o sujeito que assume formas de ser, de pensar, de julgar e de agir
contrárias aos mais elementares princípios do respeito, da tolerância e da justiça‖.
Essa relação totalizadora é a racionalidade instrumental, que permeia os processos
educativos, onde as construções singulares devem ser prescritas, devem condizer com a moral.
Mas, essas questões são limitadas diante do ethos construído atualmente, pois novos olhares
sociais são perceptíveis, novas construções, novos diálogos, novas interpretações. Assim, os
grupos sociais criam sua própria ética, sendo ―sua morada com normas e leis próprias, tendo em
vista que no mundo globalizado as chances de ter identidade e reconhecimento estão sendo
anuladas‖ (GORGEN, 2010, p.170).
Dessa forma, novas posturas emergem na contemporaneidade, com relações sociais,
políticas, religiosas, culturais que ―são seguramente sintomas de um novo universo de valores
éticos num mundo em transformação‖ (Ibid., p.165). Elas são expressão da busca do diálogo no
entendimento coletivo e, por conseguinte, de uma vida melhor para todos (cf., Ibid. p.165). Tal
entendimento nos faz pensar em novas relações éticas, como assinala Luciano Costa (2006, p.
2):
O ethos não é mais o a morada segura e imutável – talvez haja
mesmo a morada, uma ética como casa [...] que a casa só existe
mesmo para ser abandonada. A ética, portanto, comporta a própria
experimentação do abandono, daquilo que tenciona a fuga, fazendo da
filosofia uma pragmática de dispersão contínua.
Não sendo algo fixo e estático, na perspectiva deleuziana, a ética se expressa através da
relação com o ritornelo que ―se define pela estrita coexistência ou contemporaneidade de três
dinamismos implicados uns nos outros. Ele forma um sistema completo do desejo, uma lógica
da existência (―lógica extrema e sem racionalidade‖)‖ (ZOURABICHVILI, 2004, p. 50). Assim,
três componentes são expressão dessa experiência: o primeiro, está relacionado ao caos a busca
de um território, o segundo, a criação de territórios e o terceiro a saída do agenciamento do
território para outros agenciamentos, o que seria a desterritorialização (COSTA, 2006, p.3).
Expressam implicações éticas diferenciadas, a primeira diz respeito a ética da experimentação
(Mil Platôs), pensando em uma improvisação contínua, invenção. E a segunda seria a ética da
prudência necessária (O que é a filosofia?) está voltada às fugas, escapando dos regimes de
poder e saber através de novas possibilidades de vida (cf., Ibid., p.6). Assim, entre essas duas
éticas - surge a ética do improviso, como destaca o autor:
Nesta circularidade que envolve os ritornelos que nos
compõem, talvez a questão seja a de enxertar a fuga no passo, e que o
passo já seja ele mesmo um ―fugar‖ – não a saída de um lugar para um
outro, previamente, mas um partir suficientemente distraído - e
mesmo que se tenha a certeza do destinatário a ser alcançado, que o
momento do passo seja sempre o da grande improvisação (COSTA,
2006, p. 7).
Nessa perspectiva, podemos perceber que o que acontece na escola se torna singular na
medida que é múltipla, através das aulas diferenciadas para transformar ―uma suposta rotina‖
que se coloca na construção do conhecimento, na medida em que há a reprodução do saber, com
a intencionalidade de cumprir o que está delineado nos parâmetros curriculares e na proposta
curricular. O que faz da escola uma existência do fora e no fora. Por isso, essas aulas que são
descontraídas, perfazendo a metodologia construída pedagogicamente a priori, podem ser vistas
como ―experiências singulares acontecem no cotidiano da escola e produzem outras escolas e
outros processos educativos‖ (GALLO, 2013, p. 138). Desse modo:
Olhe: os professores, eles são muito amigos, eles, assim, tanto
ensina os conteúdos, como eles preparam a gente para vida lá fora.
Eles dizem: ―Oh! Aqui a gente se preocupa com vocês, mas é para
vocês se preocuparem com vocês também. Porque lá na faculdade não
é todo o professor que vai puxar vocês, entendeu? Aqui a gente se
preocupa para isso, pra vocês aprenderem a ter responsabilidade,
desde já‖. É isso que eles passam pra gente: que a gente tem que ter
responsabilidade com a gente mesmo, se a gente quer alguma coisa.
(A3, 2014).
Desse modo, compreendemos que as ações desenvolvidas pela escola, entre o que é
prescrito e vivido, apontam para o que é previsto nos documentos que regem a instituição, e
para a proposta de educação interdimensional que caracteriza a educação da escola de
Referência. Assim, as ações que percorrem vias de singularidades e experimentações, estão
atreladas a pedagogia da presença com intencionalidades formativas na relação entre o/a
docente e o/a discente (cf., COSTA, 2001, p.21) preparando para a cultura da trabalhabilidade, e
para a inserção dele/a no ensino superior.
Atentos a essas ações, observamos que existem ações educativas que instauram novas
verdades, através do pensar, do significar, de modo que, pensamos em uma certa subversão do
que é instituído, possibilitando novas construções, desestabilizando o território de certezas, e de
intencionalidades prescritas e normatizadas, resistindo às aspirações que são impositivas e que
instalam tempos caóticos no que se refere a formação do indivíduo, através de encontros com
coisas e pessoas. Assim, compreendemos que as ações educativas revelam certa autonomia, no
que diz respeito à flexibilidade curricular que há na escola de forma implícita, mesmo uma
autonomia condicionada a regras maiores – regulada, mas que, sendo assim, possibilita
experiências formativas que potencializam a diferença em sua real diferença, pelo
reconhecimento das peculiaridades que por vezes estão escondidas, encobertas e silenciadas.
Como nos diz CP (2014) ―a gente tem uma autonomia, mas ela é muito pequena, direcionada‖ e
continua explicitando:
Embora que a gente é assim, um ajuda o outro, mas aí já
melhorou muito, nesse sentido. Mas tem hora que tem divergência
sim, tem hora que não quer aceitar muito, professor que queria ter
mais autonomia, e eu também nisso aí, eu acho, eu também sou a
favor. Essa questão do currículo fechado, que você tem que vivenciar
aquele conteúdo e você está vendo que o aluno está necessitando de
outro, nessa autonomia do fazer pedagógico, que a gente aqui tenta
(CP, 2014).
Numa primeira leitura, podemos afirmar que o currículo apresenta-se fechado, mas é
flexibilizado através das posturas pedagógicas assumidas no cotidiano educacional, pois o
pensamento segue outras linhas. Nessa perspectiva, ele assume desdobramentos que difere da
imagem da árvore criticada por Deleuze (2011, p. 34), ao afirmar que muitas ―pessoas têm uma
árvore plantada na cabeça, mas o próprio cérebro é muito mais uma erva do que uma árvore‖.
Podemos entender o currículo dessa maneira: ele pode ser cristalizado de forma enraizada, sem
ramificações, mas as desconstruções que são pertencentes ao cérebro, que se materializam nas
ações pedagógicas desenvolvidas na escola, podem seguir linhas de uma pedagogia rizomática.
Pensando assim, ele se converte num currículo movente, uma educação que ―não empobrece a
racionalidade com narrativas da certeza, mas que potencializa a criação, a invenção, a diferença,
a variação, outras formas de viver através de um currículo movente‖ (RODRIGUES, 2013,
p.182). Assim, podemos pensar através de outros olhares essa experiência que constitui,
desconstitui e reconstitui a escola, nesse sentido, ―pensar é explicar, desenvolver, decifrar,
traduzir signos‖ (VASCONCELLOS, 2005, p. 1220).
Portanto, o currículo vivido legitima ações moralizantes, correlacionado a formação
do/a jovem da Escola de Referência, em consonância com o currículo prescritivo que é
normatizado pela proposta de Educação Integral. Assim, estabelece-se um paradoxo, de um lado
há a formação voltada para a educação interdimensional (Costa, 2008) e por outro, através das
linhas de fugas, ações que potencializam novas experimentações, no entanto, essas
―experimentações‖ estão atreladas as intencionalidades e objetivações da proposta. O que forja e
direciona a imagem do pensamento, assim, as experiências que possibilitam o pensar, e o criar,
estão em conexão com às conceituações que formam a filosofia da escola.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: Devir – singularidades e multiplicidades nos
labirintos formativos da Escola de Panelas-PE
Há labirintos que permeiam os espaços educativos que não são perceptíveis
visivelmente, e que carregam em si devires que são potências criativas e que destoam de
formações previstas e lineares – e pré-estabelecidas. Desse modo, as experiências, com
profundidades inimagináveis, expressam singularidades diante da multiplicidade na qual ela se
realiza. Constitui-se em significações novas e em relações desmedidas, fazendo daquele
território escolar, que é fechado, um desterritório, com formas diferenciadas de pensar e por
conseguinte agir.
Acreditamos que por vias desses labirintos, conseguimos descobrir relações singulares,
que se distanciam de rotulações, e de definições que se configuram nas ações educativas da
escola, pois, há a dicotomização entre estudantes que se sobressaem diante de valores e ações
moralizantes dos/as que lidam com a construção do conhecimento formal. Nesse sentido, a
experiência da formação segue a incerteza, a desconstrução, de forma implícita subvertendo a
ordem do saber que está instituído sob os moldes modernos do conhecimento, o que é visível e
compreendido na Escola de Panelas-PE. No entanto, as interfaces que são descortinadas nas
experiências formativas, seguem linhas de transformações, o que a nosso ver seriam
desconstruções.
Temos aí um paradoxo: de um lado, a imagem do pensamento universalizante, o que
seria a imagem dogmática do pensamento, através de ações e práticas que diz respeito à
racionalidade como sobreposição a outras formas de pensar, de criar e de aprender. Pois, como
assinala Deleuze (2006, p. 237): ―Os limites das faculdades se encaixam uns nos outros sob a
forma partida daquilo que traz e transmite a diferença. Não há metódo para encontrar tesouros
nem para aprender, mas um violento adestramento, uma cultura ou paidéia que percorre todo o
indivíduo‖. Nessa perspectiva, observa-se a possibilidade do novo através das práticas
formativas desveladas no horizonte escolar, através das diferentes atividades que buscam outros
caminhos formativos. Elas desencadeiam novo devires, através da experimentação, e da
interpretação das singularidades que compõe os indivíduos da escola diante do todo que se
configura como a multiplicidade com inúmeras conexões. Assim, através de filmes, da arte, das
brincadeiras, das conversas, descortinam-se novos sentidos de formação que permeia a
formação dentro e fora da escola.
São ações que nos levam a pensar diante do fechado, o aberto, diante da palavra, a
música, diante da foto, a cabeça erguida, seguindo desse modo possibilidades de libertação,
através de lutas em diversos ângulos e níveis (GALLO, 2008, p. 61). Ela ―deve dar-se no ângulo
do cotidiano da sala de aula‖ (GALLO, 2008, p. 61). Pois o tempo, o espaço, faz com que esses
labirintos sejam vividos nas relações entre estudantes e professores/as, entre estudantes e a
escola, entre estudantes e a gestão, entre estudantes e os/as funcionários/as daquele espaço
educativo. E assim, os territórios são revirados produzindo sentidos que são encontrados nas
frestas formativas que percorrem os devires educacionais, viabilizando encontros e conexões
gerando novas multiplicidades, que seriam essas novas intimidades, esses compartilhamentos
enquanto indivíduo, enquanto docente e discentes.
Nessa perspectiva, compreendemos a formação ética que é tensionada para a
moralização, para os valores, ao comportamento, também ganha novas conexões, novas
interpretações, (re) significando no lócus escolar a vivência dos sentidos previstos moralizantes,
mas também da invenção, e a permissão ao criar, através de novas posturas éticas, que se
proliferam no exercício do pensar.
Desse modo, as singularidades e as multiplicidades ganham visibilidades,
desenvolvendo movimentos que seguem vias desconhecidas produzindo a realidade social, e á
ética formativa da Escola, não se resume à experimentação, ou a prudência, mas ao improviso
enquanto ações criativas (COSTA, 2006), e assim o ―aprender não é reproduzir, mas inaugurar;
inventar o ainda não existente, e não se contentar em repetir um saber‖ (SCHÉRER, 2005, p.
1188).
A escola de Referência de Panelas-PE, em seus labirintos, revela aspectos, mesmo que
tênues da relação entre a potencialidade criativa, assim, a formação ética possibilita novas
construções sociais, através de vivências que emergem do dia a dia, e que potencializa novas
formas de pensar, estudar, e aprender, e, em consequência novas formações, novas
singularidades e novas multiplicidades, seguindo linhas de fugas, e, percebendo-se e formando-
se diante dos territórios provisórios, possibilitando outras entradas, e outras saídas, e assim,
outras formas de atuação na vida. Desvela-se nesse contexto que a educação que permeia esses
espaços educacionais baseados na proposta de educação integral, descortinam sentidos voltados
à formação do ser humano nas várias dimensões: a cognitiva, afetiva, espiritual, e a
corporeidade. Fazendo com que as ações educativas da escola, e os princípios formativos
estejam relacionados à construção social de um jovem autônomo, ético e moral, através das suas
escolhas, dos valores, das posturas, que são experienciadas e visibilizadas no cotidiano escolar.
Assim, compreendemos que a educação integral possibilita nuances acerca da
educação moral, da ética, da relação das dimensões do humano, constituindo-se
enquanto um desafio maior, o qual é transformar a ótica estrutural e organizacional que
a escola assume. Nessa proposição educacional fundamentada na concepção de
educação interdimensional, há elementos formativos direcionados ao protagonismo
juvenil, à educação para valores, à presença educativa, ao empreendedorismo, à
trabalhabilidade, e ao ingresso no ensino superior, buscando com isso, resultados
satisfatórios para alavancar o índice da escola. Nessa perspectiva, a proposta formativa
da escola se materializa em ações que se refere às relações entre pessoas, entre os
saberes. Destaca-se aí o aspecto da moralização como sentido da formação ética,
revelando aspectos constituídos na modernidade, marcados pelo paradigma da
racionalidade, expressão do modelo da recognição. Destacando dessa forma, os saberes,
as ações, as relações, potencializando as experiências sociais.
Com efeito, há relações que são disseminadas, e outras que são potencializadas
através do diálogo das áreas do conhecimento, permitindo assim, que os conteúdos, as
habilidades e competências, sejam (re) significados enquanto processo formativo que
descortinam outros sentidos, no que se refere ao pensamento, ao saber, ao convívio
educacional, ao fazer, ao conviver, de forma que se abrem ações educativas através de
conversas, de filmes, de atividades artísticas enquanto linhas de fugas que transformam
os olhares singulares e múltiplos e, por conseguinte a relação com a vida, com o saber e
consigo mesmo, o uno-múltiplo.
REFERÊNCIAS
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SP: Editora Canção Nova, 2008. – (Coleção valores).
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DELEUZE, Gilles. Kafka: por uma literature menor / Gilles Deleuze, Félix Guattari;
tradução Cíntia Vieira da Silva; revisão da tradução Luiz B. L. Orlandi. – Belo Horizonte:
Autêntica Editora, 2014. – (Filô/Margens, 4)
DELEUZE, Gilles; GUATARRI, F. O que é Filosofia. Tradução de Bento Prado Jr. e
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GALLO, Silvio, Deleuze & a Educação / Silvio Gallo. – 2 ed. – Belo Horizonte:
Autêntica, 2008.
LINS, Daniel, Mangue’s school ou por uma pedagogia rizomática, Educ. Soc.,
Campinas, vol. 26, n. 93, p. 1229-1256, Set./Dez. 2005.
PELLOSO, Rodrigo Gelamo. FERRAZ, Maria da Graça Chamma, Ética e moral como
modos de produção de subjetividade, tran/Form/Ação, São Paulo, 28(2): 117-128, 2005.
PRADO FILHO, Kleber. TETI, Marcela Montalvão. A cartografia como método para
as ciências humanas e sociais. Barbarói, Santa Cruz do Sul, n.38, p. <45-59>, jan./jun. 2013.
RABELO, Marta Klumb Oliveira, Educação Integral como política pública a sensível
arte de (re) significar os tempos e os espaços educativos. MOLL, Jaqueline (org). Caminhos
da Educação Integral no Brasil. Direitos e outros tempos e espaços educativos. Porto
Alegre: Penso, 2012.
SCHÉRER, René. Aprender com Deleuze. Educ. Soc., Campinas, vol. 26, n 93, p. 1183
– 1194, set./dez. 2005.
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DE PERNAMBUCO. Parâmetros para a Educação
Básica do Estado de Pernambuco, 2012.
RESUMO
INTRODUÇÃO
DESENVOLVIMENTO
Pensar na Lei da Anistia como uma “lei de mão dupla” nos leva a elaborar
questionamentos acerca da essência da própria lei e sobre os principais beneficiados
com sua vigência, questão que tratarei ainda neste trabalho.
Vários países da América Latina, tais como Brasil, Chile, Argentina e Uruguai,
que passaram por regimes totalitários, inauguraram nas últimas décadas um processo de
redemocratização, e é a partir desse processo que começam a ocorrer consideráveis
mudanças políticas e jurídicas através da implementação da Justiça de Transição.
Segundo Zyl (2011, p. 45) a Justiça de Transição é “o esforço para reconstrução
da paz sustentável após um período de conflito, violência em massa ou violação
sistemática dos direitos humanos.”
Nesse sentido, a Justiça de Transição envolve um conjunto de medidas que
permitem a superação de um regime autoritário para que se construa uma ordem
democrática e garantidora de direitos humanos. A Justiça de Transição é composta por
quatro elementos ou pilares, são eles: O direito à memória e à verdade; As reformas
institucionais; As reparações simbólicas e financeiras; A responsabilização por atos
praticados no período autoritário.
No presente trabalho, tratarei especificamente dos elementos acerca do direito à
memória e à verdade. Os quais, por sua vez, se constituem na busca pela reconstrução
da memória e da verdade histórica dos países que passaram por regimes autoritários.
Isso se faz necessário pois, é comum que regimes ditatoriais apresentem uma versão
oficial distorcida da história, que seja mais atrativa a seus interesses, trazendo à tona,
além de elogios a seu próprio governo, a ocultação das práticas autoritárias cometidas
no período.
Todavia, analisando o caso brasileiro em relação à aplicação da Justiça de
Transição, percebe-se que apenas duas medidas foram concretizadas: a reparação e o
resgate da memória com a promulgação da Lei nº 9.140/95, que foi conhecida como a
“Lei dos desaparecidos”, por meio da qual o Estado promove a indenização daqueles
que desapareceram por motivações políticas, isso, como uma forma de reparação pelos
danos causados.
Memória e verdade são os pontos de partida mais difíceis de concretizar quando
se fala de Justiça de Transição, uma vez que encontram diversas resistências por parte
do Estado para a efetivação, principalmente porque não basta apenas reconhecer e
reparar, mas existe a necessidade de se promover uma verdadeira mudança institucional.
No Brasil, a Justiça de Transição está muito aquém de ser efetivada. Prova disso
é a decisão do STF acerca da ADPF nº 153, que optou por manter os efeitos da Lei da
Anistia, no sentido de perdoar os carrascos ao deixar de aplicar-lhes punições penais
pelos crimes praticados.
Isso porque, a Lei da Anistia elaborada inicialmente como uma promessa de
transição à democracia, acabou se tornando um verdadeiro impedimento à efetivação da
Justiça de Transição.
As atrocidades cometidas durante a ditadura militar no Brasil jamais serão
esquecidas e, assim, devem ser. No entanto, a Lei criada com a expectativa de
reinaugurar o regime democrático no Brasil, deveria dispor, no mínimo, de mecanismos
para contemplar os verdadeiros acontecimentos ocorridos no período de ditadura e
possibilitar alguma investigação e punição daqueles que violaram diretamente os
direitos humanos de diversos cidadãos.
Na verdade, o que, infelizmente, se constata até o presente momento com este
trabalho, é que a Lei da Anistia acabou tornando um empecilho à efetivação da Justiça
Transicional e, tornou-se uma política de esquecimento, alavancada em prol daqueles
praticaram crimes contra a humanidade, absolvendo-os, por conseguinte, aprisionando
as vítimas do sistema ditatorial.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
RESK, Sucena Shkrada. Lei da anistia - 30 anos. São Paulo: Escala, 2009.
RESUMO
INTRODUÇÃO
1
Pós-Graduada em latus sensus em Histórias e Culturas dos Povos Indígenas pela UFPE/CAA. Graduada em
História pela FAFICA.
2
Pós-Graduado em latus sensus em História do Brasil pela FAFICA. Mestrando em Direitos Humanos pela
UFPE.
Problema de pesquisa: O movimento romântico na literatura brasileira, buscou
construir os valores do nacionalismo em nosso país, criando imagem para os diferentes
grupos étnicos que formou a nação, nessa perspectiva qual imagem dos indígenas
brasileiro no romantismo?
Objetivo Geral: Identificar a representação dos indígenas e da mulher indígena
durante o romantismo brasileiro.
Objetivos específicos: Contextualizar o romantismo brasileiro com as
características histórico-sociais do Brasil.
Analisar as obras ―Ubirajara‖, ―O Guarani‖ e ―Iracema‖ de José de Alencar, para
pensar sobre a idealização da mulher indígena neste texto.
Refletir como a idealização da mulher indígena na obra de José de Alencar,
representa também uma idealização da mulher brasileira.
A metodologia por nós utilizada foi a análise bibliográfica, tendo como referência
obras literárias do Brasil durante o século XIX, ligadas ao movimento romântico. Nossa
principal referência para escrever esse artigo será a obra de José de Alencar.
Nossa principal justificativa para esse artigo é Pensarmos ser importante a reflexão
sobre as imagens construídas na literatura brasileira no que diz respeito as mulheres
indígenas, inserindo em um debate acadêmico na área de gênero, onde seja possível
discutir aspectos ligados a idealização da figura feminina.
Os diálogos entre Clio e Calíope são marcados por diversas tensões, por momentos
de proximidade e também de distanciamento, numa relação de encontros e desencontros
desde a antiguidade. Para Aristóteles a história conta o que aconteceu e a poesia o que
deveria ter acontecido, ou seja, a história traz em sua elaboração e discurso um
compromisso com a verdade, com os fatos e os personagens que compõem o passado. Por
sua vez a poesia, ou literatura, traz no seu bojo diversas possibilidades, tendo por estrutura
a invenção consciente da realidade, a elaboração de um discurso que se deixa levar pela
imaginação, sem compromisso com os fatos e personagens tidos por verdadeiros.
O século XIX, marcado por cientificismo, terminou por construir um muro nas
fronteiras entre o campo historiográfico e o campo literário. O historiador no desejo de
legitimar seu conhecimento enquanto um saber científico, passou a refletir sobre o espaço
de sua disciplina tendo como foco as técnicas e processos das ciências naturais, junto com
uma preocupação por desvelar os fatos enquanto verdade, por extrair dos documentos o
testemunho real do acontecido. No modelo científico da história, Clio e Calíope findaram
por traçar diferentes caminhos, pois as indagações de Clio não encontravam respostas nas
palavras de Calíope.
A literatura torna-se fonte principal quando o caminho que buscamos trilhar tem
como objetivo atingir o imaginário de uma época. Cruzando com outras fontes e fazendo a
crítica aos documentos literários, podemos pintar na tela da história, imagens de um
período, maneiras pelas quais os indivíduos davam inteligibilidade e representavam o
mundo da vida enquanto atuavam sobre ele.
A literatura também torna-se uma fonte interessante quando tomamos por objeto de
estudo as mulheres, pois a produção científica à época era marcada por forte presença
masculina, já o campo literário sempre esteve mais próximo do feminino, mesmo não
sendo mulheres as autoras da maior parte das obras, mas as personagens femininas eram
protagonistas de muitos romances, e talvez mais importante do que isso, na maioria das
vezes eram as mulheres as principais consumidoras deste gênero. Portanto o discurso
literário com seus valores sobre o ideal feminino, era recepcionado diretamente por uma
parcela das mulheres na sociedade brasileira.
A literatura mesmo sem compromisso direto com a verdade, não é uma produção
totalmente fantasiosa, o texto literário surge da realidade, é no mundo da vida que o
escritor vai buscar inspiração para escrever, portanto o historiador ao pesquisar a partir da
literatura, tem o dito e o não dito como possibilidade de vestígios sobre um determinado
período.
Não nos debruçamos sobre a obra de José de Alencar com o intuito de extrair dela
uma verdade histórica, se isso não é possível no manejo de ―documentos oficiais‖, quiçá
seria possível através da literatura. Mas como dito antes, buscaremos vestígios de como
mulheres e homens no século XIX representavam o feminino a partir dos povos indígenas.
O romance nos diz pouco sobre o período ao qual ele se refere, mas muito sobre o
período no qual ele foi produzido. Os ideais nacionalistas da segunda metade do século
XIX no Brasil, da busca por construir uma nação, encontram eco na narrativa de José de
Alencar. O índio não corrompido por contato com os brancos, traz em si os valores da
pátria, os valores nativos do Brasil antes mesmo da chegada dos portugueses. Portanto o
que diz Alencar sobre a mulher indígena, mais do que um ideal de ser mulher indígena,
podemos ver um ideal de ser mulher, quais os valores que as mulheres brasileiras deveriam
ter, qual o tipo feminino tradicional da sociedade brasileira, que pode ser encontrado desde
os primeiros povos a habitar estas terras.
A produção historiográfica, apesar das suas vertentes teóricas, traz em si como toda
produção científica um ideal político e uma proposta de sociedade. Sendo assim, pensar a
mulher indígena a partir da literatura, é pensar não apenas sobre os índios do passado, mas
também do presente, pois mesmo a obra de José de Alencar sendo escrita no século XIX,
muitas das visões acerca dos povos indígenas e das mulheres indígenas existentes na obra,
são ainda hoje encontradas no imaginário da sociedade brasileira, assim como os próprios
ideais sobre o que é ser mulher, independente do grupo étnico ao qual faça parte.
A luta dos povos indígenas no Brasil de hoje é marcada por várias arenas de
combate, uma delas diz respeito ao imaginário social sobre o que é ser indígena, muitos
dos estereótipos sobre esses povos, presentes na sociedade brasileira, foram sendo gestados
ao longo do tempo, quando analisamos obras literárias tal qual a de José de Alencar,
podemos desnudar momentos da invenção do que é ser indígena no Brasil.
O debate dos direitos humanos no que diz respeito aos povos indígenas brasileiros,
além das questões materiais, como a luta pela posse das terras em que estão assentadas as
comunidades, também exige o direito a memória, o direito de cada povo construir sua
história a partir dos símbolos das suas culturas, rompendo quando achar necessário com
visões presentes na sociedade que não dizem respeito a realidade, e mais preocupante do
que isto, visões que deslegitimam a luta dos povos indígenas contemporâneos.
Portanto pretendemos inserir esse artigo no debate de lutas dos povos indígenas por
seus direitos, pensando as representações indígenas existentes na sociedade como produto
de uma determinada época, que por mais das vezes rotulou mulheres e homens indígenas,
relegando a eles papeis específicos na sociedade, seja o de exótico e perigoso à ―sociedade
branca‖, ou o bom selvagem que intocado por uma realidade externa que não a da
―floresta‖, guarda em si os valores ideais de convivência, tendo na sua organização o elo
perdido da humanidade com a natureza.
Tanto uma quanto outra visão termina por estereotipar os indígenas, criando rótulos
que limitam. Como dito antes; despertar para existência desses rótulos é criar
possibilidades para que os povos indígenas sejam o que são, sem que preocupem-se em ter
uma cultura que responda aos anseios dos não índios.
Origens do Romantismo
(BERLIM 2015)
É pois, esta vertente romântica que se instaurou no Brasil com a intenção política
por meio dos texto literário. O romantismo brasileiro em sua primeira geração teve como
base o ideal nacionalista, almejando construir no imaginário social a Identidade nacional e
ao mesmo tempo sentimento de amor à pátria.
3
Luiza Baldo (2016), apud Johann Gottfried Von Herder.
idealização das terras brasileiras como paraíso terrestre e os nativos como os novos
―Adões‖ paradisíacos. ―Montaigne, Rousseau e Chateaubriand, cada qual com sua visão
particular, forjaram o arquétipo do novo Adão paradisíaco, a saber, o índio americano; o
bom sauvage.” (SERRA, p.42)
Este projeto nacionalista foi bem aceito socialmente, sendo difundido pelas Artes,
nas obras literárias, no cotidiano brasileiro bem como nos principais documentos oficiais
como o IBGE.4 Tal ideação foi capaz de transcender por longos anos de história colonial
de duras e perversas perseguições, desrespeitos aos direitos individuais e humanos, assim
como massacres, escravização dos povos indígenas reais donos das terras, agora nação
brasileira.
4
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
5
Registrado na Enciclopedia Larrousse Cultural.
indispensável uso do discurso, dos textos literários que conseguem alcançar todas as
camadas sociais.
Desta maneira foi criado traços de uma ‗cultura‘ indígena. Para o perfil do índio
brasileiro, a força, a coragem, a virilidade, são características esperadas por um guerreiro
da nação. Estas são características que para o autor deveriam ser preservada e as mesmas,
corroboravam para seu projeto de nacionalização.
O projeto indianista reservou aos índios valores bem definidos e rígidos, para as
índias, não seria diferente, unindo os valores morais da sociedade europeizada, com
valores atribuídos aos indígenas, Alencar consolidou um perfil para as índias em seus
romances.
Iracema, escrito em 1865, um dos mais célebre romance que tem como
protagonista a índia brasileira, o autor destaca padrões de valores no que tange o universo
feminino para à época. Neste sentido, destaca o nascimento do brasileiro, filhos da nação
brasileira, o mestiço, filho da mãe pátria, esta representada, na figura da índia, junto ao
colonizador branco. A virgem dos lábios de mel revela a valorização da pureza feminina e
sua relação com a Natureza.
Iracema é descrita por Alencar como uma bela mulher, enfatizando sua virgindade,
é vista para alem da natureza humana, é considerada um ser divino, para a sua cultura ela
faz a ponte com o deus Tupã e guarda o segredo da Jurema.
Em Ubirajara, Alencar busca introduzir a imagem do indígena ‗puro‘, que não tem
contato com o colonizador, o autor neste romance buscou unir os traços da suposta cultura
indígena com os valores da colonização portuguesa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Brasil passar a ser nação, todavia não detinha características de tal. Os povos que
aqui viviam necessitavam de fazer germinar o sentimento patriótico. Construir a relação
orgânica entre o indivíduo e a terra. Deste modo, o romantismo nacionalista culmina com o
projeto nacionalista brasileiro. Ambos caminham para o mesmo fim. Se fez necessário
construir o Ethos brasileiro.
Neste sentido, temos então o projeto indianista, com o seu principal representante,
José de Alencar e sua tríade, O Guarani, Iracema e Ubirajara. Todos esses romances tem
ideais políticos. ―É literatura política, mesmo e justamente quando pretende ser apolítica‖.
(Apud, SERRA, 1992, p.46). Consagrando os povos indígenas como heróis nacionais,
consolidando no imaginário social o mito fundador, onde se busca a ideia que o povo
brasileiro surge com o encontro dos povos indígenas com os portugueses, e os filhos
gerados desse encontro, são desta forma o povo brasileiro, filhos do Brasil, da mãe pátria.
Alencar todavia, mitificou apenas os povos indígenas que ele julgou preservar a
verdadeira essência, a saber o índio selvagem, tendo este, grande influencia do perfil
indígena rousseniano, aquele que habitava apenas as florestas, que guardavam suas
tradições longe dos processos colonizadores, entretanto, o mesmo indígena disposto a
subserviência à elite dominadora branca.
O referido autor fecundou então, no senso comum, as supostas tradições dos povos
indígenas, aos índios, a força, a coragem, o heroísmo, a dedicação à guerra, o sacrifício
pela nação. As índias, a subserviência, os sentimentalismos, os ritos religiosos e atividades
domésticas, seus estereótipos de beleza e sua virgindade. Nota-se que os traços culturais
que foram associados aos povos indígenas eram na verdade, em sua grande maioria
pertencentes a sociedade colonizada em que Alencar se encontrava inserido. Os padrões
machistas, patriarcais, escravagistas europeizados, que as elites brasileira impuseram no
senso comum.
São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, língua, crenças e
tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam,
competindo à União demarcá-las, progeter e fazer respeitar todos os seus bens.
(Artigo 231, da Constituição Federal de 1988).6
Foi por meio desta, que os indígenas brasileiro passaram a ser reconhecidos pelo
Estado brasileiro com diferentes traços culturais, línguas, identidades e ritos. O ser
indígena foi reconhecido pelo Estado brasileiro. Todavia, não totalmente pela população
brasileira.
No Brasil, segundo o Censo do IBGE 2010, temos 896.917 indígenas. 240 Povos,
que habitam o território nacional. Destes, 324.834 indígenas vivem em áreas urbanas e
527.083 habitam áreas rurais. Percebemos deste modo o processo relevante de integração
6
Os direitos constitucionais dos índios estão expressos num capítulo específico da Carta de 1988
(título VIII, "Da Ordem Social", capítulo VIII, "Dos Índios").
social dos povos indígenas e juntamente as transformações impostas pela sociedade não
indígena em suas línguas, tradições, características físicas e demais traços culturais.
Podemos perceber, ao analisar dos dados oferecidos pelo IBGE, que a população
indígena apresenta uma crescente a partir dos anos 80, fato também oportunizado pela
compreensão ampla, de reconhecimento identitário, memória histórica do que é ser
indígena no Brasil.
RESUMO
INTRODUÇÃO
Na sociedade atual, inúmeros são os conflitos sociais que afrontam o bem estar
social. Tais conflitos aparecem e desaparecem ao longo da história, acompanhando a
evolução da sociedade. Tem crescido com velocidade os números da violência verbal,
psicológica, física e até mesmo de homicídios motivados pela discriminação, ódio e
intolerância, em face da orientação sexual ou identidade de gênero do sujeito, aos quais,
amplamente, se tem empregado o termo homofobia. Desta forma, tem o presente estudo a
pretensão de demonstrar, a partir de um referencial teórico e comparativo, a necessidade e
possibilidade da incidência da tutela penal na prática de crimes manifestamente
homofóbicos, como forma de evitar as reiteradas violações de direitos fundamentais e
7
Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco.
efetivamente promover a proteção desses sujeitos em situação de maior vulnerabilidade
social.
Esta alta vulnerabilidade esclarece a justificativa e relevância social deste estudo,
pois, diuturnamente, condutas determinantemente criminosas são consumadas perfazendo
novas vítimas, todas oriundas da larga difusão social do preconceito e discriminação.
No atual cenário legislativo nacional, não há nenhuma legislação nacional
específica que imponha maior rigor no tratamento e repressão dos crimes motivados pela
homofobia, e, por conseguinte, nenhuma disposição legal que vise evitar a prática de novas
ocorrências e efetivamente proteger o sujeito destinatário, intencionalmente selecionado,
desta violência. Desta maneira, ao longo do que será expendido, intentar-se-á responder a
questão central deste trabalho, condensada em: é possível uma maior repressão penal nos
crimes motivados pela homofobia? A partir desse questionamento serão dispostos aspectos
teóricos e comparativos relacionados à repressão dos crimes manifestamente homofóbicos,
por meio do sistema normativo penal. Assim, serão trazidas referências doutrinárias acerca
do conceito e finalidade do Direito Penal, dos bens jurídicos imprescindíveis para
preservação do indivíduo na sociedade, do poder do Estado de punir condutas que atentam
contra estes bens jurídicos, da teorização do Direito Penal mínimo e do garantismo penal, a
análise de dados da efetiva diminuição dos casos de violência com a edição da Lei Maria
da Penha, estabelecida como medida de proteção do gênero feminino, uma breve síntese do
tratamento legal conferido à homofobia nos Estados Internacionais, um breve histórico
legislativo brasileiro e, por fim, uma breve análise do Projeto de Lei n.º 7.582/2014, em
trâmite na Câmara dos Deputados, que tem como objetivo definir e prever sanções aos
crimes de ódio e intolerância, criando ainda mecanismos para coibi-los.
Para tanto, a metodologia empregada na construção deste estudo foi a apropriada
para as pesquisas no campo das ciências sociais, perfazendo-se em revisão bibliográfica de
livros; análise e interpretação da legislação nacional e internacional; análise e interpretação
de dados consubstanciados em relatórios e ainda o manejo de documentos hospedados na
rede mundial de computadores.
DESENVOLVIMENTO
Segundo o jornal The New York Times (2016), o Brasil é o país mais perigoso do
mundo para gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transgêneros e transexuais, em face da
larga violência perpetrada com cunho homofóbico. A conclusão do jornal considerou os
dados do Grupo Gay da Bahia8, que apenas acompanha as agressões com resultado morte
que guardam relação com a homofobia por meio de notícias veiculadas na mídia nacional,
posto que, inexiste meio oficial de contabilização das agressões diariamente sofridas por
esses sujeitos, ante suas orientações sexuais ou identidade de gênero. Aduzindo os dados
do Grupo Gay da Bahia, a publicação demonstra que em um período de quatro anos e
meio, anteriores ao lançamento da notícia, mais de 1.600 (uma mil e seiscentas) pessoas
foram assassinadas no Brasil por motivações homofóbicas, o que exprime a razão de
aproximadamente uma morte por dia, informação absolutamente devastadora. É de se
ressaltar ainda que, a reunião e exposição dos dados com base em notícias veiculadas,
evidencia o quão alarmante é a matéria tratada, pois, desconsidera as demais agressões que
não culminam em morte, bem como, provavelmente, não se aproxima dos dados reais da
violência sofrida, representando tão somente a ponta de um imenso derramamento de
sangue. Em que pese o amadorismo da reunião dos dados considerados, assim como, o
precário confronto com os dados de outros países, este é um tipo de notícia que não pode
passar sem ser notada, dando fomento a uma relevante discussão, exigindo que seja dada a
devida importância que a matéria carece.
Da mesma forma que os conflitos sociais se modificam na medida em que a
sociedade se desenvolve, com os bens a serem tutelados pelo Direito Penal coisa
semelhante ocorre. Bens que em um dado momento eram tidos como fundamentais e de
exacerbada importância à sociedade e, por conseguinte, mereciam a tutela protetiva do
Direito Penal, hoje, já não carecem de tal proteção. A exemplo disso, com a edição da Lei
8
Associação sem fins lucrativos de defesa dos direitos humanos dos homossexuais no Brasil, fundada em
1980. Membro da International lesbian, gay, bisexual, trans and intersex association – ILGA, The National
Latino/a Lesbian, Gay, Bisexual & Transgender Organization – LLEGO, comitê da Comissão Internacional
de Direitos Humanos de Gays e Lésbicas – IGLHRC, Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis –
ABGLT e Comissão Nacional de Aids do Ministério da Saúde do Brasil. (O QUE...)
n.º 11.106, de 28 de março de 20059, teve-se a revogação dos delitos de adultério10, ato
pelo qual o homem ou a mulher, legalmente casados violam a fé conjugal, imposta aos
esposos (PLÁCIDO E SILVA, 2012) e sedução11, que em se tratando de Direito Penal,
configurava o fato de se induzir a mulher a que consentisse em manter relações sexuais,
fora do casamento, mediante o emprego de meios ardilosos, ou bastante convincente para
influírem sobre à sua vontade (PLÁCIDO E SILVA, 2012), posto que, a mulher da década
de 1940, período de edição do Código Penal vigente no Brasil12, é completamente diferente
da mulher que participa ativamente da sociedade nos dias atuais.
É certo que o Direito Penal, através de sua estrutura punitiva, é apenas uma das
possíveis formas de resolução dos conflitos sociais e nesse sentido é que, considerando a
atual construção normativa brasileira e a parte majoritária da doutrinária acerca daquela,
que se pretende demonstrar a possibilidade de aplicação do Direito Penal como forma de
garantir maior repressão às condutas criminosas motivadas pela homofobia, conflito social
objeto deste estudo.
Direito Penal (legislação penal) é o conjunto de leis que traduzem normas que
pretende tutelar bens jurídicos, e que determinam o alcance de sua tutela, cuja
violação se chama ―delito‖, e aspira a que tenha como consequência uma coerção
jurídica particularmente grave, que procura evitar o cometimento de novos
delitos por parte do autor.
No Brasil, o Direito Penal está inserto no sistema normativo que constitui o Direito
Brasileiro, assentado como um dos ramos do direito público pátrio, o que enseja, portanto,
que os valores tutelados nessa esfera interessam a toda coletividade, distinguindo-se dos
9
Altera os arts. 148, 215, 216, 226, 227, 231 e acrescenta o art. 231-A ao Decreto-Lei no 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 – Código Penal e dá outras providências.
10
Art. 240 - Cometer adultério:
Pena: detenção, de quinze dias a seis meses. [...]
11
Art. 217 - Seduzir mulher virgem, menor de dezoito anos e maior de quatorze, e ter com ela conjunção
carnal, aproveitando-se de sua inexperiência ou justificável confiança:
Pena: reclusão, de dois a quatro anos.
12
Código Penal Brasileiro: Decreto-Lei n.º 2.848, de 7 de Dezembro de 1940.
demais ramos do direito público pela sua especificidade e consequência associada à
infração penal, qual seja: a imposição de uma pena. A pena, por sua vez, representa o meio
de coerção usado pelo Direito Penal para proteção de valores, bens e interesses
significativos para a sociedade. Nesse sentido, Zaffaroni e Pierangeli (2013, p. 85) acerca
da distinção do Direito Penal com os demais ramos do direito e da coerção oriunda do
Direito Penal explicam:
Os bens jurídicos
Posto que a finalidade do Direito Penal seja a proteção dos bens jurídicos
indispensáveis para a convivência social estável, oportuna é a noção doutrinária do bem
jurídico.
Por bens jurídicos, entende Roxin (s/d. apud PRADO, 2003, p. 47) que esses são
―pressupostos imprescindíveis para existência em comum, que se caracterizam numa série
de situações valiosas, como por exemplo, a vida, a integridade física, a liberdade de
atuação, ou a propriedade [...]‖. Assim, resta evidenciado que a finalidade protetiva do
Direito Penal quanto aos bens jurídicos imprescindíveis à conservação do indivíduo e da
sociedade é, sobretudo, norteada pelos princípios fundamentais presentes no texto
constitucional.
Considerando que a norma penal tenha o fito de promover a segurança comum e de
proteger os bens jurídicos de alta estima para a sociedade, requisitos indispensáveis para
que o ser humano desenvolva sua vida com dignidade, as condutas que violem direitos e
valores fundamentais, indubitavelmente, merecem a imposição deste sistema normativo
repressor, para prever e punir tais comportamentos, evitando, assim, toda forma de
inferiorização, humilhação e agressão. É, portanto, imperioso a repulsa das manifestações
homofóbicas no meio social através da tutela penal, com a finalidade de afastar às condutas
contrárias à boa vivência do indivíduo na sociedade e que potencialmente produzem lesões
aos bens que se espera proteger.
Jus puniendi: o poder do Estado de punir condutas que atentam contra os bens
jurídicos
Cada vez que um bem jurídico penalmente tutelado pelo Estado sofre uma violação
e uma norma é transgredida, o próprio Estado, como representante da sociedade, também é
violado. A violação desses bens jurídicos não lesa apenas a vítima, mas por serem bens
jurídicos públicos que carecem de proteção do Estado, alcançam todos os sujeitos no meio
social e visam uma pacífica convivência social, lesa também o próprio Estado. Nesse
sentido, Tourinho Filho (2013, v. 1, p. 28) destaca que:
13
Juiz italiano entre 1967 e 1975, professor de Filosofia do Direito e de teoria geral do Direito da Università
degli Studi Roma Tre (Roma, Itália) e Università degli Studi de Camerino (Camerino, Itália). (FERRAJOLI,
2004, tradução do autor)
14
Latim. Expressão freqüentemente empregada no Direito com significado de último recurso, razão final,
último argumento. (GUIMARÃES, 2007)
Resta evidente que, ainda que seja invocada a teoria minimalista como forma de
justificar a contenção de uma inflação de legislação penal e, por consequência, afastar a
proteção da lei penal de determinados grupos socialmente minoritários, tal argumento não
prospera, vez que a sólida doutrina acerca desta teoria indica que o Direito Penal deve
encontrar limites nos direitos fundamentais, agindo como instrumento de proteção destes,
como bem se vê na citação acima disposta. Os direitos fundamentais violados nas condutas
tipicamente homofóbicas, como, por exemplo, o da dignidade da pessoa humana, liberdade
e igualdade, são direitos fundamentais atribuídos a toda pessoa humana que não podem ser
negados, lesionados ou desamparados de proteção, pois, juntamente com os demais direitos
assegurados constitucionalmente, representam requisitos indispensáveis para que o ser
humano desenvolva sua vida com dignidade. Nesse sentido, Carvalho (2008, p. 93)
conclui: ―Os direitos fundamentais adquirem, portanto, o papel de objeto e limites do
direito (penal)‖.
Ante o exposto, chega-se à compreensão do que vem a ser o garantismo penal.
Observa Carvalho (2008, p. 82) que:
Com base na última edição do relatório A world survey of sexual orientation laws:
criminalisation, protection and recognition15 publicado pela ILGA - International lesbian,
gay, bisexual, trans and intersex association16 - no mês de Outubro de 2016, será exposto
neste tópico uma brevíssima síntese do tratamento legal conferido à homofobia nos
Estados Internacionais.
A ILGA é uma federação global com 1.200 organizações membros de 125 países
que fazem campanha por direitos lésbicos, gays, bissexuais, trans e intersexuais desde
1978. Publica anualmente o relatório que mapeia as leis que criminalizam a prática sexual
15
Tradução do autor: Uma pesquisa mundial de leis de orientação sexual: criminalização, proteção e
reconhecimento.
16
Tradução do autor: Associação internacional de lésbicas, gays, bissexuais, trans e intersexuais.
entre pessoas do mesmo sexo, leis que protegem o sujeito contra lesões e manifestações de
ódio em face de sua orientação sexual ou identidade de gênero e leis que reconhecem
direitos igualitários a estas minorias como união estável, casamento, adoção, pensão e
outras coisas.
Segundo este 11º relatório mundial (CARROLL, 2016), em sua maioria países do
continente Europeu: 14 países possuem disposições constitucionais que proíbem a
discriminação por orientação sexual (p. 47-48), 36 países possuem expressa proibição da
incitação ao ódio por orientação sexual (p. 52) e 40 países consideram a orientação sexual
da vítima como circunstancia agravante de delitos (p. 49-51). Noutro giro, é também de se
considerar que 73 países, em sua maioria dos continentes africano e asiático, criminalizam
o relacionamento entre pessoas do mesmo sexo (p. 38-39) e 13 desses países, em sua
totalidade dos continentes africano e asiático, possuem pena de morte para o
relacionamento entre pessoas do mesmo sexo (p. 39).
Voltando o olhar para a América do Sul17, depreende-se deste relatório ainda que,
dos doze países que a compõe, metade destes (Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia,
Equador e Uruguai) já editaram seus Códigos Penais para incluir desde a tipificação e
previsão de pena para a incitação da discriminação e discursos de ódio até agravantes da
pena no delito principal cometido com base na orientação sexual ou identidade de gênero
da vítima. A maior parte dessas edições ocorreu depois do ano de 2010, com exceção do
Uruguai, que segunda data das alterações legislativas, de forma pioneira na América do
Sul, ainda em 2003, editou seu Código Penal para incluir a orientação sexual ou identidade
de gênero nas tipificações de incitação e realização de atos de ódio, desprezo ou violência e
do Equador que as fez nos anos de 2005 e 2009. Nota-se, também, ainda em relação ao
Equador, que a edição de sua legislação foi a que mais estabeleceu proteção penal a
potencial discriminação do indivíduo.
Frise-se que, os demais países da América do Sul (Brasil, Guiana, Paraguai, Peru,
Suriname e Venezuela) não possuem legislação que preveja criminalização da incitação ou
17
São países da América do Sul: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai,
Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela.
realização de crimes de ódio e agravante de pena em face da orientação sexual ou
identidade de gênero do indivíduo.
Por fim, é de destaque ainda que, a Guiana possui previsão, em seu Código Penal
vigente, de condenação de prisão por 10 (dez) anos pela prática tentada de sodomia e
prisão perpétua para a prática da sodomia, da forma que segue:
Art. 354 – Sodomia. Quem cometer sodomia, seja com um ser humano ou
qualquer outro ser vivente, comete delito grave e será punido com prisão
perpétua.19 (Tradução do autor)
18
Texto original: Art. 353 - Attempt to commit unnatural offence. Everyone who:
a) attempts to commit buggery; or
b) assaults any person with intent to commit buggery; or
c) being a male, indecently assaults any other male person, shall be guilty of felony and liable to
imprisonment for ten years.
19
Texto original: Art. 354 - Buggery. Everyone who commits buggery, either with a human being or with
any other living creature, shall be guilty of felony and liable to imprisonment for life.
dos Deputados e submetido à análise do Senado Federal em 2006, onde o projeto passou a
ser denominado e numerado como Projeto de Lei da Câmara n.º 122 de 2006 (CÂMARA
DOS DEPUTADOS, 2006).
Dadas as alterações aprovadas na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei da
Câmara n.º 122 de 2006, tramitou no Senado Federal com o propósito de, segundo
disposição da ementa, alterar a Lei n.º 7.716, de 5 de janeiro de 1989, que define os crimes
resultantes de preconceito de raça ou de cor, o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de
1940 (Código Penal) e o Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 (Consolidação das
Leis do Trabalho – CLT) para definir os crimes resultantes de discriminação ou
preconceito de gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero, bem como
estabelecer as tipificações e delimitar as responsabilidades do ato e dos agentes. Em 2009,
o parecer dado pela Senadora Fátima Cleide (Partido dos Trabalhadores – Rondônia),
relatora responsável pelo projeto de lei na Comissão de Assuntos Sociais do Senado
Federal, fez modificações no projeto para incluir a criminalização do preconceito e
discriminação contra pessoas idosas e com deficiência, bem como para retirar alguns
artigos do projeto de projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados (CLEIDE, 2009).
Posteriormente, o projeto foi direcionado à Comissão de Direitos Humanos e Legislação
Participativa do Senado Federal, sob a relatoria do Senador Paulo Paim (Partido dos
Trabalhadores – Rio Grande do Sul) e, pendente de análise pela Comissão de Constituição
Justiça e Cidadania do Senado Federal (PAIM, 2013), foi arquivado ao final do ano de
2014 pelo término da 54ª Legislatura do Senado Federal, tudo conforme o art. 332 do
Regimento Interno e do Ato da Mesa n.º 2, de 201420, ambos do Senado Federal
(SENADO FEDERAL, 2015).
Também em 2014, novo Projeto de Lei com semelhante matéria, identificado sob o
n.º 7.582/2014 foi proposto pela Deputada Maria do Rosário (Partido dos Trabalhadores –
20
Art. 1º Este Ato regulamenta os procedimentos e condições a serem observados para a aplicação do art.
332 do Regimento Interno do Senado Federal (RISF), que trata do arquivamento de proposições ao final da
legislatura (BRASIL, 2014).
Rio Grande do Sul) na Câmara dos Deputados, tendo recebido pareceres favoráveis pela
aprovação em 2015, perante a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da
Câmara dos Deputados, sob a relatoria do Deputado Luiz Couto (Partido dos
Trabalhadores - Paraíba), e em maio de 2017 perante a Comissão de Direitos Humanos e
Minorias, da mesma casa legislativa, sob relatoria do Deputado Paulo Pimenta (Partido dos
Trabalhadores – Rio Grande do Sul), pendente, então, de apreciação e aprovação pelo
plenário da Câmara dos Deputados (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2015).
Segundo sua ementa, o projeto de lei define os crimes de ódio e intolerância e cria
mecanismos para coibi-los, não só em face da orientação sexual, identidade e expressão de
gênero do sujeito, mas também, em face da classe e origem social, condição de migrante,
refugiado ou deslocado interno, idade, religião, situação de rua e deficiência. A proposta,
além de definir todos esses grupos de vítimas frequentes de estigmatização social,
estabelece agravante de pena em um sexto até a metade para os crimes de ódio motivados
por preconceito e discriminação, pena de prisão de um a seis anos e multa para os crimes
de intolerância ou de incitação ao ódio, políticas públicas para coibir os crimes de ódio ou
intolerância e ainda assistências às vítimas desses crimes.
Para a Deputada autora do projeto, no tocante a criminalização da homofobia:
Se a lei contra o racismo pode ser usada, e deve ser, contra alguém que aja de
forma racista, precisamos também de uma lei que puna e criminalize a
homofobia e os crimes de ódio contra as pessoas, pela sua identidade de gênero e
orientação sexual (ROSÁRIO, 2016 apud SILVA, J., 2016).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Brasil vem garantindo a expansão de direitos e políticas antes não previstos à
lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transgêneros e transexuais, tais como a permissão para
adoção por casais homossexuais, bem como a averbação nos registros civis de ambos
adotantes como pais, a autorização para alteração de prenome e de sexo no assento de
nascimento no registro civil, o uso do nome social, a concessão da condição de
dependentes nos planos de saúde em que figure como titular pessoa do mesmo sexo e
titulação de pensões por dependência decorrente de vínculos homoafetivos estáveis,
reconhecimento e indenização de despedidas trabalhistas discriminatórias, reconhecimento
da união civil entre pessoas do mesmo sexo, dentre outros. Entretanto, nem tudo é avanço.
O crescente número e evidências assustadoras da violência cotidianamente vivenciada em
face da orientação sexual e identidade de gênero do sujeito, deixa claro que, alguns grupos,
especialmente os majoritários e socialmente dominantes, não estão caminhando no mesmo
sentido e ritmo das evoluções já vivenciadas.
Os impiedosos crimes marcados pelo ódio e intolerância são consumados
exclusivamente em virtude do preconceito e discriminação, sendo as vítimas
intencionalmente selecionadas. A resposta repressiva diante toda e qualquer forma de
discriminação e inferiorização no meio social serve de fortalecimento ao Estado
Democrático de Direito - qualidade própria da formação do Estado brasileiro, explícita já
nas primeiras disposições da nossa Lei maior -, especialmente, quando se trata de
estabelecer normas que se destinam a conceder proteção a todos àqueles que se encontram
em situação de maior vulnerabilidade social. Existem ausências legislativas que carecem
de resposta imediata para garantir legalmente a indistinta proteção dos indivíduos e, por
conseguinte, o tratamento mais severo de condutas que não se coadunam com o Estado
Democrático de Direito e repetidamente violam direitos fundamentais.
A orientação sexual e a identidade de gênero é, indubitavelmente, característica
pessoal, restrita a individualidade e privacidade do sujeito, tão somente por isso já
merecedora de tantos quantos forem os esforços para garantir sua inviolabilidade, e, com
base nos princípios jurídicos constitucionais brasileiros e na noção doutrinária de bens
jurídicos que se espera proteger, tais características não podem ser objeto de
reprovabilidade ou estigmatização social e ter afastada de si a tutela jurídica protetiva do
Estado. Ignorar a exteriorização dessas discriminações, marcadas em não poucas vezes
pelo sangue, só propicia seu crescimento e favorece a injustiça social.
Observando as legislações dos demais países sul-americanos, é possível perceber
que metade dos países editaram seus Códigos Penais para incluir a tipificação do crime de
incitação da discriminação e discursos de ódio, bem como para prever agravantes da pena
no delito principal cometido com base na orientação sexual ou identidade de gênero da
vítima, essas alterações legislativas tendem a demonstrar que uma sociedade fraterna e
democrática não pode, de modo algum, conviver com tamanha barbárie, indicando a
imprescindibilidade das legislações acompanharem as modificações sociais. Nesta esteira
de mudanças legislativas, o Brasil, por sua vez, tem em trâmite um projeto de lei com
objetivos semelhantes, afinal, não se espera outro posicionamento de um país que traz no
núcleo do seu sistema jurídico a preservação da dignidade da pessoa humana.
É de se considerar, portanto que, no Brasil, as manifestações homofóbicas ainda
carecem de tratamento jurídico apropriado. Essas manifestações são determinantemente
contrárias à preservação do bem estar social e em nada colabora para a vida em sociedade,
pelo contrário, estigmatiza pessoas determinadas que em nada difere das demais como
cidadãos produtivos e partícipes de uma sociedade que roga pelo respeito da diversidade
presente na orientação sexual e identidade de gênero, bem como, clama por justiça social.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei n.º 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm>. Acesso em: 06 jan.
2017.
______. Senado Federal. Ato de Mesa do Senado Federal n.º 2. Brasília, DF, 2014.
Disponível em:
<http://www.senado.gov.br/transparencia/SECRH/BASF/2014/11nov/Bap5625_2.pdf>.
Acesso em: 22 fev. 2017.
CÂMARA DOS DEPUTADOS. PL 5003/2001. Projetos de Lei e Outras Proposições,
Brasília, 07 dez. 2006. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=31842>.
Acesso em: 22 fev. 2017.
CARVALHO, Salo de. Pena e garantias. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris,
2008.
FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razón: teoria del garantismo penal. 6. ed. Madrid:
Editorial Trotta, 2004.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral. 17. ed. rev. e atual. Rio de
Janeiro: Impetus, 2015. 1 v.
SILVA, João Vitor. Projeto tipifica crimes de ódio. Câmara dos Deputados, Brasília, 27
set. 2016. Disponível em:
<http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/radio/materias/RADIOAGENCIA/516867-
PROJETO-TIPIFICA-CRIMES-DE-ODIO.html>. Acesso em: 22 fev. 2017.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 35. ed. rev. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2013. 1 v.
RESUMO
INTRODUÇÃO
21
Esta pesquisa é resultado dos estudos que atualmente vêm sendo desenvolvidos no âmbito do Grupo de
Estudos e Pesquisas Interdisciplinares sobre Direitos Humanos (GEPIDH-Mércia Albuquerque) do
UNIFAVIP, sob a coordenação e orientação do Prof.º Msc. Fernando da Silva Cardoso, do curso de Direito.
22
Mestranda em Direito – Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP. Pós-graduanda em Direitos
Humanos: Educação e Ressocialização – UCAM. Graduada em Direito – Centro Universitário do Vale do
Ipojuca - UNIFAVP, Pesquisadora Grupo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares sobre Direitos Humanos
Mércia Albuquerque - GEPIDH, Extensionista do Ciclo de Debates sobre Sociedade e Direitos Humanos -
DHiálogos. E-mail: luisavanessa1@hotmail.com
23
Centro Universitário do Vale do Ipojuca, Graduando em Direito, Pesquisador do Grupo de Estudos e
Pesquisas Interdisciplinares sobre Direitos Humanos (Mércia Albuquerque/UNIFAVIP), Pesquisador do
Projeto de Iniciação Científica: “Direitos humanos, violência e diversidade humana no período ditatorial, no
Agreste pernambucano”, Pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas Transdisciplinares sobre Meio
Ambiente, Diversidade e Sociedade (UPE/CNPq), Extensionista no Projeto de Extensão Universitária
DHiálogos: Ciclo de Debates sobre Sociedade e Direitos Humanos, E-mail: amagalhaesb@outlook.com
Assim, propõe-se analisar e discutir as seguintes problemáticas: Quais as
intersecções entre tráfico e as questões de gênero em relação a posição social das mulheres
presas? Qual a posição social das mulheres mulas do tráfico?
O objetivo geral da pesquisa consiste em compreender as intersecções entre gênero
e tráfico de drogas a partir da posição social ocupada pelas mulheres mulas.
Tem-se como objetivos específicos: discutir sobre a política antidroga no Direito
Brasileiro; refletir sobre tráfico de drogas e questões de gênero; e analisar as intersecções
entre tráfico e gênero sobre mulheres mulas.
De início nossa pesquisa se propõe a discutir sobre a política antidroga no Direito
Brasileiro e o lugar da mulher nesse contexto; em um segundo momento trataremos sobre o
encarceramento da mulher por tráfico de drogas; e, por fim analisaremos as intersecções
entre gênero e tráfico de drogas.
Esta pesquisa se justifica por ser de fundamental importância o estudo em questão,
tanto para a esfera acadêmica e social, quanto no âmbito pessoal, devido a desigualdade e
indiferença que existe com a mulher presa, frente às perspectivas humanistas
A metodologia utilizada em nossa pesquisa é de caráter bibliográfico-exploratório,
assim, proporcionando uma maior familiaridade com o tema.
É documental, pois utiliza-se de materiais já elaborados, especialmente da Lei de
Drogas Brasileiras e suas principais controvérsias.
Assim, entendemos que esse estudo é importante para compreender os aspectos de
vulnerabilidade feminina neste espaço, no qual o preconceito é aumentado devido ao
grande volume de preconceitos sociais.
2 DESENVOLVIMENTO
[...]
24
Retrocessos fáceis de serem notados com a leitura da Lei 11.343/06 são exemplos de resistência do Estado em relação a uma
política pública de drogas: a não efetividade de uma política de prevenção ao uso de drogas, de assistência e de reinserção social
do usuário; a não distinção entre usuário e traficante; um rigor extremamente punitivo contra quem comete delitos relacionados à
Lei de Drogas; obscuridade na configuração do rito procedimental, assim como um inequívoco intuito de que sejam apreendidos,
arrecadados e, porventura, leiloados os bens e vantagens que forem obtidos através do delito de drogas.
Deveria existir uma Política de Drogas sabedora das necessidades básicas de
usuários/as e/ou traficantes, de modo que todas/os pudessem ser alertadas/os dos efeitos
que as drogas causam.
Ainda, de acordo com o Relatório Sobre a Saúde Mental no mundo, da Organização
Pan-americana da Saúde/Organização Mundial de Saúde/ONU, em 2001, as mulheres têm
maior probabilidade do que os homens de receber prescrição de psicotrópicos. Com
relação à depressão, nos levantamentos epidemiológicos psiquiátricos, uma referência a
isso é encontrada em mulheres, perfazendo um total de 1,6 e 3,1 mulheres para cada
homem. (MORENO et al, 2004).
Contudo, toda a controvérsia direcionada a Lei de Drogas pode ter sido reflexo das
diferentes realidades socioeconômica e cultural de países da própria América Latina,
decorrente de uma estrutura traçada por padrões estereotipados.
No direito pátrio, o legislador acredita que a solução mais eficaz para repreender
alguém que comete ato delituoso é isolá-lo inteiramente do mundo social25, quando, na
verdade, apenas está colaborando para que haja um descaso com a dignidade da pessoa
humana, acarretando no caos encontrado hoje, no sistema carcerário. Há no cenário
mundial uma tendência de se enxergar o usuário dependente de drogas não como um
criminoso, mas sim uma vítima daquilo que se pode chamar de violência estrutural
(MANSUR JUNIOR, 2013).
Vários podem ser os fatores que levam uma pessoa a se envolver no mundo das
drogas. Por exemplo, as limitações pessoais, quer sejam de ordem física ou psicológica, ou
ainda, aquelas impostas pelo sistema em que se vive (MANSUR JUNIOR, 2013).
As drogas são podem ser consideradas como algo benéfico, de forma a serem
utilizadas por quase todas as culturas a partir de algumas necessidades médicas, religiosas,
por exemplo. Tornando-se parte indispensável dos ritos da sociabilidade, da cura, da
devoção, do consolo e do prazer. Dessa forma as drogas foram divinizadas em inúmeras
sociedades (CARNEIRO, 2002, p. 03).
25
Além disso, o legislador coloca em situação de vulnerabilidade social, aquela ou aquele que comete ato delituoso, de
forma a serem submetidos a práticas disciplinares do Estado, como por exemplo, o pagamento exorbitante de multa; ou
ainda instalando pessoas em lugares de inferioridade, de forma a serem alojadas ou alojados em estabelecimentos
insalubres.
Segundo Mansur Junior (2013), o consumo de drogas ilícitas, o tratamento e a
punição de usuários são temas recorrentes na sociedade brasileira e, na
contemporaneidade, ganham força várias tendências argumentativas que criticam a eficácia
da legislação nacional, a letargia do poder público e a inaptidão do Estado para lidar com a
questão.
No plano jurídico-normativo, há uma série de dispositivos que tratam da questão,
cabendo se certificar, qual seria a solução ou a busca de consensos para resolver os
problemas decorrentes de tal fenômeno social necessita de uma abordagem isenta a
respeito de como as instituições públicas e a sociedade devam se posicionar a respeito de
tão alarmante situação.
Há uma intensa controvérsia, ainda, quando se trata das penas aplicadas ao usuário
dependente. Observando se as políticas públicas adotadas pelo Estado por intermédio da
legislação atual têm obtido o êxito almejado em sua implementação, no que concerne ao
viciado reincidente, por exemplo.
A doutrina vem questionando a inconstitucionalidade do art. 28 da Lei n.
11.343/06.26 Defendendo que a Constituição Federal, no seu art. 5º, inciso X assegura o
direito à vida privada e à intimidade e que o art. 28 pune uma conduta que pertence, tão-
somente, à esfera particular do indivíduo, dizendo respeito exclusivamente a ele, enquanto
não lese direitos de terceiros, não sendo passível de qualquer intervenção pelo Estado.
Assim, faltaria ao art. 28 um bem jurídico a ser tutelado, o qual, em tese, seria a
saúde privada. Contudo, faltando ao Estado o poder para intervir nessa esfera particular,
restaria o disposto no art. 28 inconstitucional, o que esvaziaria o bem jurídico
constitucional-penal tutelado por esse dispositivo legal.
De modo que, nota-se a violação de princípios constitucionais e penais pela Lei nº
11.343/06, princípios estes basilares do Estado Democrático de Direito, por ferirem os
direitos fundamentais da pessoa humana.
Ainda, o art. 5º, inciso X da CRFB protege a liberdade e a privacidade individual,
ao dispor: que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
26
A respeito disso, já se tem o Recurso Extraordinário 635.659 - São Paulo, voto do Relator Gilmar Mendes.
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente da sua
violação (BRASIL, 1988).
De forma que, com uma política de drogas inteiramente proibicionista, e, por vezes,
contraditória, o consumo e o tráfico tendem a aumentar cada vez mais e a guerra às drogas
não colabora para sua diminuição, contribuindo tão somente para a ampliação do mercado
ilegal, cada vez mais lucrativo, vez que cresce também a condição do crime organizado.
Modelos extremamente repressivos, que ensejam legislações extremamente
rigorosas abandonando por completo a observância aos direitos fundamentais e violando
princípios como o da taxatividade, o da intervenção mínima, o da proporcionalidade, o da
humanidade, enfim, criando mecanismos que não só se apresentam inócuos a reduzir o
consumo de drogas e outros crimes decorrentes desse proibicionismo, como fomentam as
violações aos direitos fundamentais (MANSUR JÚNIOR, 2013).
A política de descriminalização tem objetivo de poupar gastos e trazer melhores
resultados para a sociedade. Com o mercado regularizado de alguns psicoativos poderia ser
reduzido o poder do crime organizado e melhorar a segurança dos cidadãos, pois esses são
os que mais sofrem com essa guerra desnecessária (SANTOS, 2011).
O atual sistema internacional de controle de drogas, do qual o Brasil faz parte, além
de não alcançar seus objetivos, gerou uma série de recordes negativos para o nosso país.
No Brasil, em junho de 2014 foram registradas pelos gestores de unidades
prisionais 37.380 mulheres no sistema prisional, conforme informação fornecida pelo
Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN).
Segundo relata Guimarães (2015), o documento aponta que 63% das mulheres
encarceradas respondem por crimes relacionados ao tráfico de drogas: 5.096 são acusadas
de tráfico, 421 por tráfico internacional e 832 mulheres, por associação com o tráfico.
No ano de 2005, antes da aprovação da Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006, 34%
da população carcerária feminina respondia por crimes ligados ao tráfico. Comprova-se
que em aproximadamente dez anos, essa proporção ultrapassa o dobro. Esta informação
acompanha um fenômeno internacional de aumento do encarceramento feminino pelo
crime de drogas: 50% da população feminina mundial responde por crimes de tal natureza,
informação (GUIMARÃES, 2015). É possível observar o quanto a política criminal de
drogas é tendenciosa ao aumento carcerário, de modo a torna-lo cada vez mais precário e
opressor.
No documento aprovado pela Assembleia Geral da ONU em 2010, conhecido como
―Regras de Bangkok‖, traçaram-se diretrizes para o tratamento de mulheres presas e de
medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras. Porém, verifica-se que
mesmo assim, as penalidades sofridas pelas mulheres são atribuídas em grau de
marginalização superior às masculinas devido ao patriarcalismo instaurado nas práticas do
Estado.
Diante dessa perspectiva, é comum observar que, devido ao proibicionismo, o
sistema carcerário foge do controle do Estado, de forma que o Estado não possui recursos
administrativos suficientes para construir estratégias que envolvam uma política judicial
eficaz.
Assim, poderia ser observada a realidade de cada detenta, como por exemplo, suas
condições físicas e psicológicas, de modo a implementar práticas utópicas e mais
acessíveis a uma realidade humana e justa.
A respeito disso, Salmasso (2004) dispõe que deve se observar, em primeiro plano,
em qual meio social essas mulheres estão inseridas (área de trabalho, ambiente doméstico e
etc) e, num segundo plano, revelar as condições biológicas e psicológicas que podem ou
não contribuir para a incidência e o grau dessa criminalidade.
Nos Estados Unidos, país com a maior população carcerária mundial, o aumento de
prisões de mulheres por tráfico aumentou em até 800% nos últimos trinta anos. Os dados
foram fornecidos da organização internacional de direitos humanos: The Witchcraft and
Human Rights Information Network (WHRIN), de acordo com entendimento de
Guimarães (2015).
O Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), ligado ao Ministério da Justiça,
constatou que a maioria das mulheres presas pela criminalização de drogas ocupa uma
posição coadjuvante nessa modalidade de crime, realizando serviços de transporte de
drogas em pequeno comércio, muitas são usuárias, sendo poucas as que exercem atividades
de gerência do tráfico.
De acordo com dados do Departamento Penitenciário Nacional (2014, p. 39), o
ritmo de crescimento da taxa de mulheres presas na população brasileira chama a atenção.
De 2005 a 2014 essa taxa cresceu numa média de 10,7% ao ano. Em termos absolutos, a
população feminina saltou de 12.925 presas em 2005 para 33.793 em 2014.
É importante observar que grande parte dessas mulheres que estão presas, são
rendas de suas próprias famílias, são as chefes de suas famílias, de forma que o
aprisionamento interfere na família inteira.
A retração no número de mulheres entre junho e dezembro do mesmo ano deve-se a
inconsistências nas informações prestadas pelos estados de São Paulo e Rio de Janeiro no
levantamento de junho. Nomeadamente, foi registrada no levantamento de junho a
presença de mulheres no Centro de Progressão Penitenciária Dr. Edgard Magalhães
Noronha, em São Paulo, e nos presídios Ary Franco e Evaristo de Moraes, no Rio de
Janeiro, quando nenhuma das unidades custodia mulheres (DEPEN, 2014, p. 39).
O tratamento e o comportamento dos homens, em relação às mulheres, ainda é
baseado no patriarcado, vivenciando, ainda um grau hierárquico distinto em vários
aspectos, dentre eles, na coação para a prática de delitos, sendo movidas através de atos
violentos.
2.3 Intersecções entre gênero e tráfico de drogas: posição social das mulheres mulas
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observa-se que as mulheres encarceradas são invisíveis para a sociedade e para o
Estado de modo a se tornarem cada vez mais vulneráveis incapazes de expressarem seus
desejos, vontades ou escolhas. O Estado apenas pensa em isolar o sujeito, de modo a alojar
mulheres como se fossem meros objetos do crime, afastando-as da sociedade.
É possível notar o quanto são apedrejadas por terem cometido um delito, como se o
crime apenas pudesse ser cometido por homens, embora a mulher que o faça, pode
permanecer em um lugar inadequado para atender suas condições de saúde básica, seja
física ou psicológica, não se observando, portanto, o que as levou a praticar determinado
ato.
Vale perceber o quanto o Estado é preservador de comportamentos opressores e
tradicionais, ao ponto de ser contraditório, em sua própria ação, quando se fala na
legalidade de antidepressivos, por exemplo, que grande parte das pessoas hoje em dia,
fazem uso desse tipo de medicação.
Retomando a questão das mulheres mulas, vale mencionar o quanto o machismo se
faz presente e supera qualquer mínima condição de que essas mulheres se sobressaiam
dessa situação. Assim, importante perceber o grau de invisibilidade sofrido por mulheres
mulas, inclusive nas prisões. Diante de práticas que só desfavorecem suas condições de
vida, notando-se, a partir disso, a ausência de humanização em relação às mulheres, de
forma tão drástica.
Nota-se, portanto, o quanto as mulheres são corriqueiramente iscas do
aprisionamento, tendo em vista as circunstâncias em que são presas e as quantidades de
drogas que levam consigo, ficando notória a hierarquia de gênero instalada no meio social
e carcerário que estamos submetidas.
Constata-se a necessidade da reforma da política de drogas, que prime pela redução de
danos e não pelo alojamento de mulheres diante do caótico sistema penitenciário de nosso
Estado. É preciso dialogar com as vivências de mulheres presas, considerando a posição
que elas ocupam, para pensar o enfrentamento desse cenário, a partir da Lei 11.343/2006.
A pesquisa retrata o quanto se faz necessária a implementação de uma nova política
de drogas que pense particularmente no(a) usuário(a) e no traficante, de modo que seja
dada prioridade a saúde do sujeito, assim como a responsabilidade condizente com a
conduta praticada, e, consequentemente, um acompanhamento processual mais célere, e,
portanto, uma melhor organização no sistema carcerário.
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atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para
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do Vale do Ipojuca, Pernambuco, Caruaru, 2011.
Simplesmente Homem – Relatos sobre a experiência cotidiana de homens trans
RESUMO
Este trabalho que tem como objetivo apresentar relatos variados de homens trans de
diferentes faixas etárias, segmentos profissionais, estágios no processo transexualizador e
orientações sexuais utilizando-se do formato “New Journalism” – mais conhecido como
jornalismo literário visando aproximar pessoas heterossexuais/cisgêneras (lésbicas, gays ou
bissexuais) da realidade deste segmento social para assim se criar uma ponte empática
dessa forma promovendo questionamentos do binário de gênero existente socialmente.
Como também mostrar como estes sujeitos buscam superar as adversidades impostas em
virtude de sua identidade de gênero nos mais diferentes espaços e convívios sociais.
INTRODUÇÃO
Ter uma em ―identidade‖ que lhe foi designada em conformidade a cromossomos e
a características corpóreas e, com isso, um nome, vestimentas, comportamentos, desejos
sexuais são atribuídos quase automaticamente. E quando, essa pessoa rompe com toda essa
estrutura social organizada, as oportunidades de emprego, estudo e afeto são negadas e a
sensação é similar à vivida por Gregor.
Kafka mostra três períodos da relação da família perante Gregor. No primeiro, ela
sente medo, num segundo, o aceita, mas o esconde do mundo, já no terceiro, odeia-o e o vê
como um peso que deve desaparecer.
Esses ciclos vividos pela personagem em Metamorfose são iguais àqueles vividos
por homens trans em que a família sente um estranhamento inicial, e posteriormente, uma
pseudoaceitação por aceitá-lo isolando-o e não mais convivendo com eles e, a fase final em
que todos o percebem com um fardo e desejavam intimamente a sua não existência naquele
seio familiar.
Ailton Santos27, professor e pesquisador da Universidade de São Paulo refuta a
ideia de migração de gênero, pois parece indicar que o sujeito nasceu em um gênero
especifico por conta de anatomia e genitália? E decidiu ir para outro gênero. As pessoas
transexuais com as quais ele conviveu e outras que são descritas por outros pesquisadores
reiteram em seus relatos, entre tantas diferenças, que sempre tiveram a sensação de estar no
―corpo errado‖. Neste caso, as modificações corporais são realizadas com o objetivo de
tornar o gênero vivido inteligível.
Pode-se perceber que a transmasculinidade apesar de não ser tão conhecida
socialmente é possível visualizá-la em muitos produtos audiovisuais como o filme Tomboy
(2011) dirigido pela cineasta francesa, Céline Sciamma, que relata a história de Laure
interpretada por Zoé Héran. Ela vive com os pais e a irmã caçula, Jeanne. A família tinha
se mudado há pouco, e, com isso, não conheciam os vizinhos. Um dia, Laure resolve ir à
27
Professor, militante e pesquisador da violência e vulnerabilidade na periferia e doutor em letras pela
Universidade de São Paulo.
rua e conhece Lisa que a confunde com um menino. Laure, que usa cabelo curto e gosta de
vestir roupas masculinas, aceita a confusão e diz chamar Michaël. A partir de então, ela
vive uma vida dupla, já que seus pais não imaginam que se apresenta como menino perante
a vizinhança e de sua nova amiga.
Durante a vivência social com os outros meninos, Laurie passa a sentir cada vez
mais com menino. Uma cena que ilustra isso é quando ela está vestindo uma sunga para
tomar banho em um rio com seus novos amigos e coloca um pano em um formato peniano
para se sentir melhor e também ninguém perceber que, na realidade, ela era uma garota.
No desenrolar do filme, a mãe questiona Laurie sobre os modos de vestir e de se comportar
da garota, como por exemplo, não usando roupas femininas e mantendo o cabelo curto. A
mãe a interroga sobre o porquê não deixa o cabelo crescer e se veste de modo mais
feminino. O pai logo interrompe dizendo que Laurie é apenas uma criança e tem de se
vestir como se sentir melhor.
Um dia, Lisa resolve ir até a casa de Michaël/Laure chamá-lo para brincar e sua
mãe atende a porta dizendo que não tinha ninguém com esse nome morando na casa. Ela
permanece escondida por um tempo até que a menina a vê e a sua mãe revela a Lisa o seu
verdadeiro nome. Ela fica em estado de choque vendo que perderá a sua vivência social
como menino, e ainda, não terá mais chances de ter algo romântico com Lisa, já que
tiveram um primeiro contato romântico por intermédio de um beijo.
A mãe desesperada e inconformada pela mentira decide revelar para todos da
vizinhança a verdadeira identidade da filha obrigando-a usar vestidos e andar dessa forma
para que todos possam vê-la e entender o que ela é na verdade.
Em Boys don´t cry – Garotos não choram – (1999) baseado na história real de
Teena Brandon, relata a vida de um jovem garoto que nasce com um corpo biologicamente
feminino, mas identifica-se com o gênero masculino. O filme retrata sua trajetória
enquanto homem trans e os embates que vive diante da sociedade.
Na cidade de Falls City, no estado de Nebraska. As mulheres o adoravam e quase
todos que conheciam esse recém-chegado carismático eram atraídos por sua inocência
encantadora. Porém, a personagem mais famosa e amiga fiel da cidade tinha um segredo:
ele não era quem as pessoas pensavam. Em Lincoln, sua terra natal, a apenas 120
quilômetros dali. Brandon Teena era uma pessoa diferente, envolvida numa crise pessoal
que a assombrou durante toda sua vida.
Cenas que são bem impactantes nessa película são: Quando Candace por estar
apaixonada por Brandon por vê-lo como figura paterna para sua filha e também um
companheiro sensível lhe empresta um cheque e, ao ir à loja, questiona a razão dele ter
sido devolvido. A vendedora lhe diz é do rapaz que está em sua casa. Sem entender nada,
Candace mexe nas coisas de Brandon e vê absorventes, cintas compressoras e a intimação
por multa de trânsito com o seu verdadeiro nome.
Dirigindo-se ao tribunal do município de Hunt, a atendente consulta o número do
RG contido na multa de trânsito e lá consta o número de RG de Charles Brayman, amigo
de Brandon/Teena levando um policial a intimá-lo e a prendê-lo por não ter comparecido a
uma audiência em Lincoln.
Em seguida, encontra Lana brincando com sua irmã e lhe conta sobre a prisão de
Brandon e chegando na prisão ele revela à sua maneira a sua condição dizendo que é
hermafrodita. Ela o aceita e logo o tira da prisão pagando multa e pedindo habeas corpus.
Confusa e frustrada, Candace em uma conversa com John e Tom conta sobre a real
condição de Brandon/Teena.
Algum tempo depois, eles mostram o jornal para a mãe de Lana sobre a prisão dele
contendo o nome verdadeiro. Ela se mostra chocada e indignada com aquela informação.
Minutos depois, Brandon/Teena entra na casa de Lana e é intimado diante da mãe e irmã
de Lana e Candace a revelar tudo. Lana propõe a John que fique a sós com Brandon para
dizer a todos se ele é ou não é homem. Tom John, e as demais pessoas não acreditam nela.
Por esta razão, Tom e John se trancam com ele no banheiro para verem com seus
próprios olhos e como Lana está batendo na porta e eles a chamam para dizer olha como o
seu namoradinho é de verdade.
Depois de um tempo, em que Brandon é exposto a um interrogatório vexatório
devido ao ocorrido na casa de Lana. O policial fica lhe questionando o tempo todo, eles
vendo que era é do sexo feminino, não lhe colocaram os dedinhos e não tentaram fazer
nada.
Ele diante de tanto constrangimento afirma que nada fizeram. E é dispensado e na
saída da sala de interrogatório. É abordado novamente por John e Tom que o levam para
um lugar deserto e ao chegarem nesse local o violentam sexualmente.
Após esse incidente, ele procura Lana propondo fuga, para assim, serem felizes em
outro local e ela aceita. Mas, de repente tudo, ela o atrai para uma armadilha em que Tom e
John acabam matando-o.
Na descrição desses fatos, pode- se ver a confusão feita pelas pessoas em relação à
identidade, expressão de gênero e orientação sexual. Pois, Tom e John ao ver o corpo de
Brandon passam a vê-lo como mulher e rapidamente esquece-se de toda a camaradagem
que existia entre eles por um corpo falar mais do que a afirmação de uma pessoa sobre o
que ela seja. E a mãe de Lana que lhe tinha comprado um presente a ele, diante da verdade
passa vê-lo como aberração e má influência para a sua filha, e a Candace por mais que
tenha tido um sentimento por ele se vê enciumada e inconformada por ele não ser
exatamente o que havia dito mesmo conhecendo o caráter violento de seus amigos lhes
revela tudo sem pestanejar.
Em nenhum momento, Brandon foi respeitado em sua identidade de gênero quando
as pessoas sabiam de toda a sua história. Por isso, teve de falsificar documentos e ter uma
vida errante para poder minimamente ser como é sem ninguém o julgar.
A exploração das contradições da identidade e juventude norte-americana através
da vida e da morte de Brandon Teena é mostrada em ―Garotos não choram‖. Em uma
narrativa cheia de caos e assassinato, surge a trajetória de um jovem à procura do amor, de
si mesmo e de um lugar para chamar de lar.
―Metamorfose‖ de Franz Kafka traz a seguinte narrativa: Gregor Samsa, um
caixeiro viajante que abandona suas vontades e desejos para sustentar a família e pagar a
dívida dos pais. E em certa manhã, Gregor acorda metamorfoseado em um inseto
monstruoso. Kafka descreve este inseto como algo parecido com uma barata gigante. Nos
primeiros momentos o livro descreve as dificuldades iniciais de Gregor em sua nova
forma. Uma ironia presente neste trecho do livro é que Gregor não se preocupa com sua
transformação, mas sim com o atraso para o trabalho.
No decorrer da história, Gregor antes visto como filho ideal e um bom empregado
passa a ser encarado com um intruso na própria casa, por seus pais, sua irmã, e pela
empregada. Todos se sentem incomodados por sua nova forma e não sabem lidar com algo
considerado asqueroso e fora dos padrões sociais.
―Ao despertar de um sonho inquieto, certa manhã, Gregor descobriu que se havia
transformado num gigantesco inseto.‖ (KAFKA, 1915, p.1) esta frase ecoa e faz com que
se entenda que a partir daquele momento toda a sua vida mudaria e os sentimentos das
outras pessoas em relação a ele também seriam modificados.
Durante parte da vida habitar em um corpo e uma vida que lhe foram designadas
em conformidade a cromossomos e a características corpóreas e, com isso, um nome,
vestimentas, comportamentos, desejos sexuais são atribuídos quase automaticamente. E
quando, essa pessoa rompe com toda essa estrutura social organizada, as oportunidades de
emprego, estudo e afeto acabam sendo negadas e a sensação é similar à vivida por Gregor.
Kafka mostra três períodos da relação da família perante Gregor. No primeiro, ela
sente medo, num segundo, o aceita, mas o esconde do mundo, já no terceiro, odeia-o e o vê
como um peso que deve desaparecer
Os estágios iniciais vividos pelo Gregor em Metamorfose são iguais àqueles
vividos por lésbicas, gays, bissexuais, travestis, mulheres transexuais e homens trans em
que a família sente um estranhamento inicial, e posteriormente, uma pseudoaceitação por
aceitá-lo trancando-o em casa e não mais convivendo socialmente com eles e, a fase final
em que todos o percebem com um fardo e desejavam intimamente a sua não existência
naquele seio familiar.
O preço que muitos homens trans pagam por apresentarem uma masculinidade
distinta a imposta pela heterocisnormatividade é a falta de oportunidades no mercado de
trabalho, a não possibilidade de continuarem seus estudos, situações de violência,
rompimento familiar, com amigos, impossibilidade de viver um amor e acesso à saúde.
O pesquisador carioca Guilherme Almeida diz que ao elaborar um conceito
fechado, mesmo que apenas didático, sobre os sujeitos que nascem com genitália e corpo
de mulher, mas vivem a sua existência social e de gênero no masculino ditados pelas
normas da sociedade.
Segundo Almeida, compilando as diferentes características dos grupos que ele
analisou, pode-se montar apenas para efeito de ilustração, um conceito ―fabricado‖, como
tantos outros, que definem homens trans como pessoas que nascem como genitália
feminina, mas assumem uma identidade de gênero masculina, adotam nomes masculinos e
remodelam seu corpo para dar inteligibilidade ao gênero, apesar de existir alguns sujeitos
que não fazem o caminho da remodelação corporal e se sentem homens do mesmo jeito.
Conforme a professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro especialista na
Teoria Queer, Eliane Borges Berutti (data), a comunidade transgênera americana utiliza o
termo Female to Male (FTM) para ―designar os transexuais masculinos-mulheres
biologicamente que optam por transformar seu corpo em masculino por meio de hormônios
ou cirurgia‖, diz a docente. A autora utiliza o termo ―opção‖ para identidade de gênero
transexual, propondo a reflexão a partir da ideia de que existem múltiplas identidades de
gênero e sexuais, e que a opção por uma ou mais delas implica na assunção dos encargos
sociais que todas elas trazem em seu bojo e no silenciamento de tantas outras identidades
sociais que se pode assumir no cotidiano.
Sandra Palma Saleiro doutora em Sociologia pelo Instituto Universitário de Lisboa
(ISCTE-IUL), conceitua os homens trans como pessoas a quem foi atribuído o sexo
feminino e se expressam permanentemente no masculino, sendo mais familiar a expressão
anglo-saxônica FTM. Para a autora, a transexualidade expressa um processo de migração
de gênero e não uma oscilação ou transgressão, como em outras expressões trans.
Por conta da sua forma de viver o gênero, que se contrapõe ás imposições
essencialistas sobre a relação sexo e gênero, os homens trans enfrentam, no cotidiano,
situações de violência voltadas à identidade de gênero masculina. Uma dessas situações é o
desrespeito ao nome social adotado e a possibilidade desses homens viverem a sua
masculinidade para além dos marcadores falocêntricos, característicos do universo
cismasculino.
Sobre esse processo, Almeida afirma que, nas narrativas dos homens trans:
Há frequentes experiências de discriminação compostas de marcos, como a
rejeição do lugar outorgado pelo binarismo de gênero, baseado na leitura inicial
de sua genitália, e por experiências sociais variadas de sexismo e transfobia em
decorrência dessa rejeição, ainda na infância e prolongando-se na vida adulta.
(ALMEIDA, 2012, p.517).
Almeida também comenta sobre a passibilidade poder favorecer uma vivência
menos estressante da identidade masculina e, ao mesmo tempo, torná-los invisíveis, o que,
em sua opinião, dificulta a produção de estudos sobre eles. Segundo o autor, uma das
restrições em relação aos estudos transidentitários:
É a sua rápida capacidade de passing, estreitamente vinculada ao
desconhecimento social da condição FTM, mas também relacionada á bem
elaborada construção de ‗corpos sociais masculinos‘, que se torna especialmente
eficaz após a realização da mastectomia e do uso prolongado de testosterona. Em
outras palavras, o uso da testosterona no caso dos homens trans, ao contrário do
que ocorre com as mulheres transexuais, torna-os bastante próximos fisicamente
ás expectativas sociais de como deve parecer um homem, o que contribui para
invisibilizá-los. Essa invisibilidade adquirida com frequência à duras penas
significa para a maior parte um agradável momento de trégua na estressante e
continua batalha por respeito à identidade/expressão de gênero. (ALMEIDA,
2012, p.519).
28
Homens cisgênero ou cis - são pessoas do gênero masculino que possuem concordância com o gênero
designado no seu nascimento. Isto é, configura uma concordância entre a identidade de gênero e o sexo
biológico de um indivíduo e o seu comportamento ou papel considerado socialmente aceito para esse gênero.
Disponível em: <http://www.significados.com.br/cisgenero/>, acesso em 26/05/2016.
O conceito de gênero é o que determina aquilo que culturalmente seriam
características do ser ‗masculino‘ e do ‗feminino‘: forma física, anatomia,
maneira de se vestir, falar, gesticular, enfim as atitudes, comportamentos, valores
e interesses de cada gênero (lembrando que essas características são designadas
pela cultura, pela sociedade dominante). Essas diferenças são estabelecidas
historicamente, de acordo com a sociedade influenciados pela cultura.
(BOMFIM, 10. jul. 2009, disponível no link:
http://educacaoesexualidadeprofclaudiabonfim.blogspot.com.br/2009/07/genero-
identidade-de-genero-e.html).
Homem trans29 é aquele que é homem. Porém nasce em num corpo feminino que
proporciona uma série de desconfortos por não refletir a sua real identidade de gênero. E
para amenizar o incômodo corpóreo muitos optam por hormonização, ou seja, aplicação de
testosterona e até cirurgias como mamoplastia masculina (remoção das mamas e/ou
reconstrução de um peitoral masculino), histerectomia (remoção dos órgãos internos
femininos), metoidioplastia (às vezes, informalmente chamada de meto, é uma alternativa à
faloplastia para homens trans. Com os efeitos do tratamento hormonal com testosterona, o
clitóris cresce com o tempo até atingir um tamanho médio de 4-5 cm. Em um
procedimento cirúrgico desses pelo fato do clitóris já ser grande é "solto" de sua posição
original e movido à frente para uma posição que lembra mais a de um pênis) e a faloplastia
(consiste na construção de um pênis de tamanho e aspecto ―normal‖ (igual/semelhante aos
de homens cisgêneros). Cria um órgão sexual funcional masculino com o qual se pode
urinar e ter relações sexuais com penetração.
Nem todos os homens trans realizam procedimentos de mudança corporal devido
aos problemas de saúde ou simplesmente por se sentirem homens sem necessitar de uma
aparência tida como masculina aos olhos sociais. Pois masculinidade e feminilidade nunca
serão definidas por vestimentas, comportamentos, orientação sexual ou papeis sexuais é
algo que está mais relacionado à percepção que o indivíduo possui socialmente acerca de si
mesmo.
A transmasculinidade é uma maneira distinta de se pensar masculinidade por
existirem pessoas que nascidas em uma identidade de gênero oposta ao seu nascimento
29
No primeiro encontro nacional de homens trans realizado na Universidade São Paulo, realizado em
fevereiro de 2015, o movimento social organizado deste segmento expos a sua identidade político social com
a nomenclatura homens trans pelo fato da maioria se reconhecer socialmente na identidade masculina
independente da sua transexualidade. Disponível em:
<http://encontronacionaldehomenstrans.blogspot.com.br/2014/12/o-ibrat-acredita-na-sua-forca.html>, acesso
em 26/05/2016.
reivindicam um tipo de masculinidade distinta ao padrão heteronormativo cisgênero que
atrela hombridade a genitálias e características corpóreas.
Ao longo da história há casos de personagens que vivenciaram o seu gênero de
forma distinta ao modelo social vigente, como, por exemplo, Joana D. Arc, uma mulher
que esteve à frente de batalhas na guerra dos cem anos na França. E, após a expulsão dos
britânicos, os nobres franceses, representados pelo rei Carlos VII, temerosos de uma forte
aliança popular entre Joana D‘Arc e a população camponesa, e também por representar a
possibilidade das mulheres liderarem exércitos saindo totalmente do papel social imposto a
elas de serem donas de casa, artesãs, serviçais ou trabalhadoras do sexo a entregaram para
os ingleses. Ela foi morta, queimada na fogueira, no ano de 1430, sob a acusação de
bruxaria.
A transmasculinidade existe desde que o homem habita a face da terra pelo fato de
masculinidade e feminilidade apesar de imposições sociais existentes não está relacionada
com características corpóreas, genitálias e, muito menos, a comportamentos e vestimentas.
É algo que invoca o sentimento mais profundo de pertencimento ao um determinado
gênero.
Isso é percebido na literatura através do personagem como Diadorim no livro
Grande Sertão Veredas de Guimarães Rosa em que uma pessoa nascida no gênero
feminino vivencia toda a sua vivencia toda a sua existência no gênero oposto por ansiar
uma liberdade só proporcionada aos homens naquele contexto social e, também, possuir
uma inquietação interna muito grande em relação ao não desejo de uma feminilidade em
seu ser e, o mais curioso dessa história, ele mesmo possuindo um forte sentimento de
masculinidade tem em seu ser aflorado um afeto por seu amigo Riobaldo e é
correspondido. Mas, em um mundo de cangaceiros, a vivência desse amor se torna
impossível e só no momento da morte a tal verdade é revelada, na verdade, era ela por
todos pelo fato de naquela conjuntura avaliarem através da corporeidade o que seja
feminino ou masculino.
Ao nascer uma criança, declara-se: ―É uma menina!‖ ou ―É um menino!‖. Nesse
momento, realizada uma espécie de ―viagem‖, ou melhor, é instalado um processo que,
supostamente deve seguir um rumo ou direção. Segundo a docente Louro, a afirmativa,
mais do que uma descrição, pode ser compreendida como definição ou decisão sobre um
corpo. ―E esse processo totalmente baseado em características físicas que são vistas como
diferenças, às quais se atribui significados culturais. Afirma-se e reitera-se uma sequência
de muitos modos já consagrada, a sequência sexo-gênero-sexualidade‖, diz Louro.
O objetivo do livro-reportagem é trazer informações sobre o universo
transmasculino. Tais informações referem-se às dificuldades, a exclusão social, religiosa,
afetivo, familiar, mercado de trabalho, saúde, entre outras. Pretende-se, ainda, divulgar e
refletir sobre os conceitos do gênero masculino & feminino que a sociedade estabelece e a
realidade.
Publicizar ao leitor os males sociais que uma masculinidade padronizada e
preconizada pela heteronormatividade cisgênera nos setores diversos como: igreja, escola,
família, relacionamentos, amizades, mercado de trabalho, universidade e outros afeta a
qualidade de vida dos homens trans – desde a inserção na sociedade até a saúde.
Divulgar relatos de homens trans que sofrem o preconceito social conhecido como
transfobia, e como o pensamento doutrinal das igrejas e grupos sociais, da sociedade como
um todo, a hipocrisia existente provoca um sofrimento grande nesse segmento.
Trazer ao receptor dados sobre o processo histórico da construção do conceito de
transmasculinidade e também como ele sofreu mudanças ao longo dos anos e também
mostrar como é a atuação de profissionais da saúde como psicólogo, psiquiatra,
endocrinologista e clinico geral que atuam no processo transexualizador ofertado pelo SUS
(Sistema Único de Saúde), plano de saúde ou consultórios particulares para saber como é
realizado o acompanhamento aos homens trans nos âmbitos físico e mental e também
como os hormônios impactam mentalmente e corporalmente nestas pessoas.
Informar que a transmasculinidade é vista em muitas correntes do feminismo como
uma tentativa de escape do machismo e da misoginia sofridas por mulheres heterossexuais,
bissexuais e lésbicas na sociedade e com isso, há uma isolamento social dos homens trans
em relação a amizades e até relacionamentos tidas anteriormente a sua transição assim
como noticiar os diferentes níveis de recepção em relação à transmasculinidade nos setores
religiosos existentes em nosso país para com isso trazer a tona como a religião encara as
questões de gênero e sexualidade
Por meio de levantamento de dados, pesquisa bibliográfica, e entrevistas de
entrevistas com psicólogo, psiquiatra, clínico geral, endocrinologista, , homens trans, e
sites que são referência na temática, decupagem de entrevistas dadas por homens trans em
programas de entrevista e depoimentos reais em documentários e filmes.
Explorar a trajetória de vida das personagens, trazer recortes históricos em que a
transmasculinidade não era conhecida dessa forma. Porém, era vivenciada por muitas
pessoas e também apresentar índices que mostram a vulnerabilidade sofrida pelo segmento
de homens trans.
Por não haver dados estatísticos sobre quantos homens trans existem no Brasil, tão
pouco os índices de violência, de desemprego, de situação escolar, familiar e sentimental,
psíquico-mental e de suicídio deste segmento buscar informações com o objetivo de trazer
ao leitor informações sobre o cotidiano destas pessoas para assim estabelecer uma empatia
e questionamento do porquê de tanto preconceito em relação à transmasculinidade.
Inicialmente serão feitas entrevistas com 20 homens trans e, no mínimo, um
profissional de cada especialidade como endocrinologia, ciências sociais, humanas,
jurídicas e teológicas como as principais vertentes religiosas existentes no Brasil:
candomblé e umbanda, evangélica, católica, islâmica e outras vertentes que se mostrassem
acessíveis a conversarem sobre o tema para o desenvolvimento estrutural de capítulos do
livro-reportagem e estruturação dos conceitos existentes no universo transmasculino.
O homem trans existe desde primórdios como descreveu o rei Hamurabi,
aproximadamente em 1772 a.C. No código de leis elaborado por ele, há a descrição de um
ser descrito como "Salzikrum", uma figura que se caracteriza como uma "mulher-homem"
que poderia ter uma ou várias esposas e direitos exclusivos da hereditariedade. A palavra
Salzikrum significa "filha-macho", como citado na introdução deste pré-projeto.
Em vista disso, falar de transmasculinidade é essencial para que o leitor possa
refletir e quebrar paradigmas acerca do conceito de masculinidade e também garantir a
visibilidade do segmento de homens trans para se garantir a elaboração de políticas
públicas nas áreas de saúde, educação e de trabalho para uma parcela da população que é
lida como lésbica masculinizada e, com isso, são desrespeitados desde não serem
chamados por seu nome social a invisibilização de suas especificidades em um
atendimento médico fazendo com que muitos desenvolvam doenças como câncer de mama
ocasionado a uso continuo de faixas compressoras (binders) para disfarçar as mamas e o
uso prolongado de hormônios sem acompanhamento médico especializado.
Como a pauta transexualidade está em evidencia na mídia, hoje, é necessário trazer
reflexões que refutam e questionam que a ideia de ser homem ou mulher é apenas algo
corporal, comportamental ou sexual. E, também, que não há um tipo de
transmasculinidade. Pois, mesmo que o homem trans não opte por todas as transformações
corpóreas e sua passabilidade seja tida como questionável ele é homem a partir do
momento que assim se identifique.
Trazer para o leitor diferentes modelos de masculinidade e de feminilidade, com
isso, fazer com o mesmo repense seus conceitos acerca do padrão vigente de virilidade e
dos papéis sociais impostos pelo binarismo de gênero imposto socialmente.
Ainda hoje, a transexualidade é apontada na Classificação Estatística Internacional
de Doenças e Problemas relacionados com a Saúde (CID), publicada na Organização
Mundial de Saúde (OMS), como um transtorno mental.
Quando um homem trans assume a condição de transexual passa a transgredir
todas as normas sociais vigentes ao reivindicar masculinidade em um corpo feminino. Nas
sociedades, a socialização do sujeito está ligada totalmente à corporeidade e, romper com
este ciclo heterornomativo cisgênero, é afirmar categoricamente que gênero é algo muito
mais ligado aos padrões sociais do que necessariamente um item biológico.
DESENVOLVIMENTO
REFERÊNCIAS
LOURO, Guacira Lopes. Um corpo Estranho – Ensaios sobre sexualidade e teoria queer.
Belo Horizonte: Autêntica, 2015.
MOTA, Griggory Thomas. Eu não tenho um pênis, mas sou homem! In: Simpósio -
Modos de visibilidade trans no ―espaço biográfico‖, Universidade Federal da Bahia, 4 a 7
de setembro de 2015.
SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do Trabalho Científico – 21. ed. ver e ampl.
– São Paulo: Cortez, 2000.
Transexualidade e travestilidade na saúde - Ministério da Saúde, Secretaria de Gestão
Estratégica e Participativa, Departamento de Apoio a Gestão Participativa – Brasília:
Ministério da Saúde, 2015.
RESUMO
A diversidade sexual é algo que sempre existiu, entretanto ao longo da história foram se
criando padrões de gênero, sexo e sexualidade que – devido a uma concepção binária e
heteronormativa – geraram um processo de subjugação dos indivíduos que não se
encaixam a tais normas, sendo os mesmos subalternizados e inseridos num sistema de
violência. O presente artigo possui como tema: Heteronormatividade e negação da
diversidade sexual: um paradigma cultural de discriminação contra a população LGBT+. O
objetivo geral deste trabalho é compreender como o estabelecimento da
heteronormatividade como regra de comportamento corrobora para a formação de um
sistema de discriminação contra as minorias sexuais. Não obstante, faz-se uso da
metodologia de pesquisa bibliográfica e exploratória, através de uma abordagem
qualitativa. Por fim, demonstra-se a necessidade de se romper com os ciclos de violência
diante das minorias sexuais por meio da adoção de um novo olhar sobre os sujeitos queer,
respeitando-os nas suas diferenças e valorizando-se a diversidade.
INTRODUÇÃO
Distintas foram as formas de se abordar a diversidade sexual, em especial a
homossexualidade, ao longo da história. A mesma já passou por um processo de
legitimação social na Grécia Antiga, posteriormente, tornou-se alvo de repulsa social na
cultura ocidental, principalmente em virtude da propagação do Cristianismo, assim como,
também foi considerada uma doença pela Organização Mundial da Saúde até o início da
30
Graduando de Direito pela Universidade de Pernambuco (UPE), membro do Grupo de Pesquisas
Transdisciplinares Sobre Meio Ambiente, Diversidade e Sociedade/GEPT-MDS, email:
kleberamorim96@gmail.com
31
Graduanda de Direito pela Universidade de Pernambuco (UPE), email: carolbezvp45@gmail.com
década de 90. Na contemporaneidade há um processo de transição, no qual se luta pela
visibilidade das minorias sexuais, que visa fortalecer e legitimar o respeito à diversidade.
No decorrer do tempo, foi se estabelecendo um padrão heteronormativo – baseado
no binarismo de gênero e numa espécie de heterossexualidade compulsória – como único
modo de comportamento correto a ser seguido, gerando como conseqüência a construção
de diversos estigmas acerca das demais expressões de gênero e sexualidade que não se
adequam a esta regra instituída, o que resulta na discriminação e subjugação das pessoas
que com estas se identificam.
Assim, o presente trabalho possui como objetivo geral compreender como o
estabelecimento da heteronormatividade como regra de comportamento corrobora para a
formação de um sistema de discriminação contra as minorias sexuais – direta ou
indiretamente – em razão da sua não adequação à normatização social dos corpos e das
expressões de sexualidade.
Já no que diz respeito aos objetivos específicos, busca-se analisar a forma com que
a heteronormatividade se instituiu na sociedade, e a maneira como ocorre a consolidação
deste processo através da reprodução de normas regulatórias que naturalizam um ideal
binário de sexo e gênero. Assim como, objetiva-se também descrever as múltiplas formas
de violências sofridas pela população LGBT+ e como isto é fortemente presente na
realidade brasileira, em razão da reprodução contínua dos discursos de intolerância diante
das minorias sexuais, como resultado justamente de uma herança cultural que reforça
reiteradamente estes padrões heteronormativos e cuja base se assenta no patriarcado, no
machismo e na influência de crenças religiosas que renegam a diversidade sexual.
Não obstante, o presente artigo tem como problema de pesquisa a seguinte
indagação: ―como o estabelecimento de padrões comportamentais fundados na
heteronormatividade resulta num paradigma de violência contra as minorias sexuais? ‖,
sendo utilizada para responder tal questionamento a metodologia de pesquisa bibliográfica
e exploratória, através de uma abordagem qualitativa, tendo como principal base teórica os
ensinamentos de Butler (1999), Miskolci (2009) e Louro (2004).
Por fim, será observado que mesmo com alguns progressos na conquista de direitos
pelas minorias sexuais, no que diz respeito à discriminação contra gays, lésbicas,
bissexuais, transsexuais, travestis, a situação ainda é muito preocupante. Na medida em
que se avança no sentido de lhes dar maior visibilidade e promover o respeito diante deste
grupo, a intolerância tem ganhado bastante espaço na sociedade, em especial no que diz
respeito à intensa propagação de discursos de ódio e à quantidade alarmante de homicídios
praticados contra a população LGBT+. Desta forma, fica evidenciada a importância e a
urgência em se discutir e se rever os padrões heteronormativos estabelecidos como
―normais‖, bem como de se refletir sobre a necessidade da adoção de uma nova
perspectiva em relação diversidade sexual baseada no respeito e na tolerância.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não se pode negar que já houve alguns avanços em relação à conquista de direitos
pela população LGBT+, mas o caminho a ser percorrido para que haja a consolidação de
fato da igualdade, da liberdade e da não discriminação é longo. Na medida em que se
avança no sentido de dar visibilidade às minorias sexuais, buscando-se propagar o respeito
à diversidade, também vem ressurgindo e se fortalecendo na contemporaneidade uma onda
de conservadorismo, cujas crenças e padrões de moralidade envolvem o silenciamento dos
que não se identificam como heterossexuais e cisgênero32, e contribuem para a manutenção
de um sistema preconceituoso que resulta na exclusão e marginalização dos mesmos.
Vários são os tipos de violências sofridas pela população LGBT+ unicamente em
razão da sua existência como ser humano. As experiências podem envolver abusos e
violência física e psicológica, e ocorrem dentro do próprio ambiente familiar, no meio
escolar, assim como, no convívio social em geral. A situação é alarmante também em
relação à quantidade de mortes em razão do ódio pela orientação sexual ou identidade de
32
Cisgênero é a pessoa que se reconhece como pertencendo ao gênero que foi compulsoriamente designado
quando nasceu – determinado de acordo com a sua genitália. Ou seja, há uma conformidade entre o ―sexo‖
que possui e o gênero com o qual o sujeito se identifica.
gênero do indivíduo, de modo que o Brasil o país em que mais se mata LGBTs no mundo,
como já exposto.
Este paradigma tem como fundamento o estabelecimento de uma
heteronormatização social – através da reprodução reiterada da construção binária de
corpos sexuados – que exige dos indivíduos a conformidade com os padrões de gênero e
sexualidade, consequentemente gerando um processo de marginalização e discriminação
perante os sujeitos dissidentes destas normas, resultando num ciclo de violência diante das
minorias sexuais, no intuito de transformá-las em seres ―normais‖ ou simplesmente como
forma de castigo por não se submeterem ao que lhes foi imposto como forma natural de se
viver.
Além da adoção da heteronormatividade como modelo de comportamento, este
processo de discriminação contra a população LGBT+ é legitimado também por um
sistema social de bases patriarcais, fundado em padrões culturais machistas e fortemente
influenciado por religiões cristãs que corroboram para o silenciamento da diversidade
sexual.
Daí a necessidade em se repensar as concepções hegemônicas sobre sujeitos, corpos
e sexualidade, as quais significam a reiteração de um padrão fundando na
heteronormatividade cuja reprodução resulta na marginalização de quem não se encaixa às
normas, bem como se torna indispensável a adoção de um novo olhar sobre estes sujeitos
queer, de forma a valorizá-los em suas diferenças e a buscar meios de se quebrar os ciclos
de violência diante dos mesmos, respeitando sua dignidade e seus direitos como cidadãos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BUTLER, Judith. Corpos que pesam: sobre os limites discursivos do „sexo‟. In: LOURO,
Guacira Lopes (Org.). In: O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte:
Autêntica, 1999. p. 151-172.
LIONÇO, Tatiana & DINIZ, Debora (2008). Homofobia, silêncio e naturalização: por uma
narrativa da diversidade sexual. Psicologia Política, 8(16), 307-324.
LOURO, Guacira. Lopes. Um corpo estranho: ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo
Horizonte: Autêntica, 2004.
MARTINS, F., & ROMÃO, L., & REIS, T. (Eds) (2010). Manual de Comunicação LGBT.
Revista Galileu (2012): ―Jovens homossexuais têm mais tendência ao suicídio, diz estudo”.
Disponível em: <http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,EMI226806-17770,00-
JOVENS+HOMOSSEXUAIS+TEM+MAIS+TENDENCIA+AO+SUICIDIO+DIZ+ESTUDO.html
> (Acesso em: 28/06/2017).
RESUMO
INTRODUÇÃO
33
Faculdade ASCES-UNITA, graduanda em direito. melorayanny@gmail.com
34
Mestre em Ciências Farmacêuticas. Doutor em Produtos Naturais e Sintéticos Bioativos, Professor da
ASCES/UNITA Arquimedesmelo@asces.edu.br
35
Mestra em Direitos Humanos, Professora da ASCES/UNITA. elbaravane@gmail.com
A violência obstétrica é um tipo de violência relacionada ao gênero, que se perfaz
com a violação de direitos no exercício da reprodução feminina, alçando o período
gravídico, parto, pós-parto ou abortamento.
2. METODOLOGIA
O objetivo do presente estudo possui o intuito de visibilizar a existência da
violência obstétrica no Brasil. Apontar as formas que caracterizam a violência obstétrica,
bem como, destacar a ausência de legislação específica. Almeja cooperar na diminuição
dos casos de violência contra a mulher. Desta forma, elucida também a importância de
implementação da assistência humanizada na prestação de serviço obstétrico, onde
propicie formas acolhedoras e dignas à parturiente.
O problema de pesquisa está atrelado a indicar a existência da violência obstétrica
no Brasil, além de explanar a falta de legislação especifica.
Para tanto, foi utilizado o método hipotético dedutivo, além de pesquisa
bibliográfica, legislação e documentos eletrônicos. Utilizamos também dados baseados no
Dossiê Parirás com Dor de 2012 e Cartilha do Ministério Público de Pernambuco sobre
Humanização no Parto de 2014.
A Justificativa para a formação deste trabalho se respalda, na relevância do
enfretamento à violência obstétrica, a fim de tolher a naturalização da violência obstetrícia,
tal como os casos de impunidades.
Vale ressaltar que o presente estudo faz parte das pesquisas para produção do
Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do grau de bacharela em Direito pela
ASCES UNITA, orientado por Arquimedes Fernandes Monteiro de Melo.
3. DISCUSSÃO E RESULTADOS:
Para garantir o acesso à saúde de forma universal no Brasil, foi criado o Sistema
Único de Saúde-SUS, um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo, que garante o
acesso integral, universal e gratuito como política de atendimento à saúde para toda
população do país. É regulado pelas leis Orgânicas da saúde, Leis n.º 8080/90 e nº
8.142/90 com propósito de diminuir a desigualdade na assistência à saúde populacional,
determinando obrigatório o atendimento público a qualquer cidadão, sendo vedada
cobrança pecuniária em relação à prestação do serviço.
Acontece que, o SUS disponibiliza acesso universal, no entanto a Organização
Mundial de Saúde reconhece que, a oferta de saúde a todas as pessoas que compõem a
totalidade populacional de um país não é possível, sendo assim, sempre será necessário
estabelecer prioridades na distribuição de recursos. Desse modo é necessário analisar as
localidades onde há mais demanda assistencial, ausência desta, tal como particularidades
de cada região, para que exista equidade na distribuição de recursos, destaca-se aqui, as
políticas voltadas à saúde da mulher já que no Brasil representam mais da metade da
população.
Neste contexto Zoboli e Fortes (2003, p.35), elucidam:
As escolhas de uma justa distribuição de recursos de saúde podem ser
fundadas em alternativas teóricas que procuram interpretar o princípio
ético de justiça distributiva. Essa reflexão remete a discutir qual a
responsabilidade do Estado na implementação de políticas públicas, quais
e quantos recursos devem ser dirigidos à assistência à saúde, quais as
prioridades para a distribuição de recursos entre programas, projetos, e
instituições de saúde.
3.4 Dos dispositivos legais vigentes no que concerne a assistência ao parto e uma
breve análise do Projeto-Lei 7633/14 e sua lacunosidade
Atualmente no Brasil não existe lei específica que verse sobre a violência
obstétrica, para prevenção e punição nos casos do tal ato infame e perverso no momento
mais vulnerável da vida gravídica da mulher no exercício do partejamento ou abortamento.
Há dispositivos legais soltos que podem ser aplicados para assegurar direitos da
parturiente, onde se encontram ressalvados nos Direitos Humanos, Constituição Federal de
1988, Código Civil, Código Penal, leis e portarias.
Dentre as Convenções mais relevantes podemos vislumbrar a ―Convenção sobre a
eliminação de todas as formas de Discriminação contra a mulher‖, recepcionada pela
Resolução 34/180 da Assembleia Geral das Nações Unidas em 18/12/1979, ratificada em
1° de fevereiro de 1984 pelo Brasil, e a‖ Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e
Erradicar a Violência Contra a Mulher‖, conhecida também como "Convenção de Belém
do Pará‖, na qual foi amparada pela Assembleia Geral da Organização dos Estados
Americano na data de 6 de junho de 1994, e ratificada pelo Brasil no ano de 1995 em 27
de novembro.
Esta estabeleceu o que pode ser considerada discriminação contra a mulher, seja
ela, toda forma de distinção que tenha como objetivo prejudicar a mulher, com base na
igualdade de gêneros, direitos humanos e liberdade fundamental na seara social, cultural,
econômica, e civil ou qualquer outra área.
A Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a
Mulher de 1979 em seu artigo 12 dispõe:
Artigo 12 - 1. Os Estados partes adotarão todas as medidas apropriadas
para eliminar a discriminação contra a mulher na esfera dos cuidados
médicos, a fim de assegurar, em condições de igualdade entre homens e
mulheres, o acesso a serviços médicos, inclusive referentes ao
planejamento familiar.
2. Sem prejuízo do disposto no parágrafo 1º, os Estados partes garantirão
à mulher assistência apropriada em relação à gravidez, ao parto e ao
período posterior ao parto, proporcionando assistência gratuita quando
assim for necessário, e lhe assegurarão uma nutrição adequada durante a
gravidez e a lactância.
CONCLUSÕES
REFERÊNCIAS
BERMEJO, Jose Carlos. Humanizar a saúde: cuidado, relações e valores. Traduzido por
Guilherme Laurito Summa. Petrópolis/Rio de Janeiro: Vozes, 2008.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 26. ed. São Paulo: Malheiros
editores LTDA, 2012.
FORTES, Paulo Antônio de Carvalho; ZABOLI, Elma Lourdes Campos Pavone Zoboli
(orgs.) Bioética e Saúde Pública. Centro Universitário São Camilo. São Paulo: Loyla,
2003, p. 167.
RIOS, Izabel Cristina. Caminhos da humanização na saúde: prática e reflexão. São Paulo:
Áurea, 2009.
VADE MECUM, Saraiva. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração
de Luiz Roberto Curia, Livia Céspedes e Juliana Nicoletti. 17.ed.atual , e ampl. São Paulo:
Saraiva ,2014.
DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E SEXUALIDADE: A CONSTRUÇÃO
DO DESEJO COMO ANORMALIDADE
Gabriel Carlos da Silva Carneiro Maranhão36
Marina Reis de Souza Guerra de Andrade Lima37
Tatiana Craveiro de Souza38
36
Mestrando em Direitos Humanos pela Universidade Federal de Pernambuco (PPGDH -UFPE), advogado e
jornalista, e-mail: gabrielcarlos_@hotmail.com
37
Mestranda em Direitos Humanos pela Universidade Federal de Pernambuco (PPGDH -UFPE), psicóloga,
e-mail: marina.rs@gmail.com
38
Mestranda em Direitos Humanos pela Universidade Federal de Pernambuco (PPGDH -UFPE), assistente
social; e-mail: tatianacraveiro@hotmail.com
39
Ao pesquisar na página online do Dicionário, os resultados para a palavra ―deficiência‖ foram os seguintes:
Imperfeição, falta, lacuna; 2 - Deformação física ou insuficiência de uma função física ou mental; 3 -
Imperfeição, falta, lacuna; 4 - Deformação física ou insuficiência de uma função física ou mental. Para mais
detalhes, ver o link: https://dicionariodoaurelio.com/deficiencia
algo‖ é responsável por impor a esses indivíduos uma aparência de dependentes, pessoas
que não são capazes de gerir sua própria vida.
Quando se enfoca a pessoa com deficiência, não raras vezes, há uma propensão a
conferir um tratamento indulgente, de pena. É como se houvesse uma tendência de encarar
esses cidadãos como sempre necessitado de cuidados, dependentes, inválidos. Em
contrapartida, na mente dos intitulados ―não-deficientes‖, parece passar despercebido que o
direito de almejar a felicidade e realização pessoal não deixa de ser legítimo em razão da
limitação física e/ou psíquica.
Entretanto, é preciso salientar que o termo deficiente não representa em si uma
categoria homogênea, indistinta. Como regra, os estudos científicos apontam quatro
diferentes naturezas da deficiência: 1) deficiência física: relacionada ao comprometimento
ou limitação de membro do corpo humano; 2) deficiência sensorial: relativa aos sentidos,
especialmente audição ou visão; 3) deficiência mental: que envolve transtornos
psiquiátricos e afetam a saúde mental; 4) deficiência intelectual: referente à atividade
cognitiva, intelectual do indivíduo.
A Convenção da ONU sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, ratificada pelo
Brasil em 2009, vai além ao trazer a deficiência como um conceito em evolução que
dialoga diretamente com a forma de interação entre os deficientes no seio da sociedade:
(...) a deficiência é um conceito em evolução e que a deficiência resulta da
interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao
ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na
sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas (BRASIL,
2009, p.2)
(...) Esse caso deveria ser visto como símbolo de um processo mais amplo: um
processo completamente interconectado, pelo qual a definição precisa das
―verdadeiras‖ características femininas e masculinas está aliada a um novo zelo
em definir, nos discursos judiciário, médico e político, o que é ―normal‖ ou
―anormal‖. De fato, ao definir o que é anormal (uma moça com evidências
corporais de masculinidade, neste caso), tornou-se plenamente possível tentar
definir o que é verdadeiramente normal (uma plena correspondência entre o
corpo e a identidade de gênero socialmente aceitável) (WEEKS, 2000, p.
44).
Para Foucault, a criação das perversões sexuais surge como instrumento para
ampliar as relações de poder pautadas pela sexualidade, salientando que:
40
O conteúdo das postagens foi extraído da reportagem publicada no site do jornal Diario de Pernambuco
em 27/03/2017. O texto original dos comentários na rede social Facebook foi excluído por Julia Salgueiro
devido à repercussão midiática do caso. Para acessar a matéria na integra, ver link
http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/vida-
urbana/2017/03/27/interna_vidaurbana,696094/blogueira-processada-por-injuria-se-diz-arrependida-de-
comentario-prec.shtml
De antemão, é importante salientar que, segundo o Estatuto da Pessoa com
Deficiência (Lei 13.146/2015), as publicações de Julia Salgueiro configuram crime
previsto no art. 88, já que o dispositivo legal pune quem ―praticar, induzir ou incitar
discriminação de pessoa em razão de sua deficiência‖ (BRASIL, 2015, p.1235). No caso
aqui analisado, o crime ainda teria a pena agravada por ter envolvido uma publicação,
como bem ressalta o parágrafo 2º do mesmo dispositivo:
Ao mencionar que por meio das relações sexuais entre indivíduos com síndrome de
Down ―vai ser um monte de filho toin toin‖, cabe destacar a preocupação com a
―reprodução saudável‖ da espécie humana e a reafirmação da função geracional do sexo.
Nas palavras de Foucault tal preocupação tem suas origens na relação entre sexo, biologia
e hereditariedade:
Seguindo essa lógica, por não servir a uma lógica reprodutiva, a sexualidade da
pessoa com deficiência torna-se objeto de controle que procura marginalizar o desejo que
não se enquadra na lógica heterossexual marital, cujo objetivo primordial é a procriação.
Nessa esteira, a ideia de indivíduos ―doentinhos‖ gerando filhos também ―doentinhos‖
surge como uma ameaça à sexualidade ―normal‖. Nesse sentido, Gay Rubin, no artigo
―Pensando o sexo: notas para uma teoria radical das políticas da sexualidade‖, ressalta que
―muitos dos discursos sobre o sexo sejam eles religiosos, psiquiátricos, populares ou
políticos, delimitam uma porção muita pequena da capacidade humana como consagrada,
segura, saudável (...)‖ (RUBIN, 2003, p. 15-16).
Na última parte da postagem, a menção a uma suposta natureza ―nojenta‖ do sexo
entre ―deficientes mentais‖ sugere uma possibilidade de estratificação das práticas sexuais.
Por assim dizer, segundo os estudos de Rubin, através da hierarquização sexual,
estabelece-se uma linha imaginária entre o bom e o mau sexo. Os atos que estão do lado
ruim da linha divisória são caracterizados como repulsivos e tidos como má-experiência,
―são entendidos como o trabalho do demônio, perigosos, psicopatológicos, infantis, ou
repreensíveis politicamente‖ (RUBIN, 2003, p. 16).
Na contramão da visão dualista sobre a sexualidade, a preocupação de Rubin com
uma análise progressista da sexualidade ainda se mostra extremamente atual e necessária.
Pelo menos em matéria de deficiência intelectual persiste a concepção de que qualquer
relação afetiva e sexual envolvendo duas pessoas deficientes é problemática e tal
entendimento só corrobora o argumento de que os atos sexuais são avaliados de acordo
com um sistema hierárquico de valores sexuais, no qual ―heterossexuais maritais e
reprodutivos estão sozinhos no topo da pirâmide erótica‖ (RUBIN, 2003, p. 13-14).
Partindo da premissa apontada por Rubin de que ―as formas institucionais concretas
da sexualidade em um determinado tempo e lugar são produto da atividade humana‖
(RUBIN, 2003, p. 1), uma revisão acerca dos paradigmas da heteronormatividade incluiria
também uma melhor compreensão da sexualidade das pessoas com deficiência.
Na tentativa de romper com a noção de uma sexualidade ideal, o desejo das pessoas
com deficiência cognitiva carece de uma maior reflexão dentro dos estudos sobre as
opressões sociais das minorias políticas. Mesmo quando as pesquisas procuram enfatizar a
deficiência, o resultado obtido ainda é uma construção dos deficientes baseada
exclusivamente na deficiência. Tal dificuldade já foi apontada por Virgínia L. Olense
quando analisa os estudos feministas:
Entretanto, por mais urgente que seja a produção das pesquisas acadêmicas pelo
viés da interseccionalidade, a própria Mattos salienta a existência de um ―déficit teórico
central‖, que resulta em pesquisas concentradas em apenas um dos níveis de investigação,
no máximo dois. Sendo assim, não é tão comum deparar-se com estudos que incluam uma
análise da sexualidade das pessoas com deficiência como foco central da pesquisa.
A percepção da deficiência como eixo de desigualdade, portanto, se revela
extremamente salutar para a desconstrução de uma sexualidade dissidente desses
indivíduos. Uma maior percepção dos pesquisadores e pesquisadoras sobre a construção do
desejo sexual dos deficientes intelectuais contribuiria para desconstruir uma ideia de
―anormalidade‖. Não se trata de investigar a deficiência pelos seus aspectos médico,
patológico, mas estimular, no campo das Ciências Sociais, o interesse por desmistificar
uma sexualidade anómala dos deficientes.
Como bem afirma Mattos, um olhar mais atento às categorias de diferenciação
―permite que se tornem visíveis as construções dos eixos das diferenças, que são
naturalizadas e hierarquizadas nas relações, práticas sociais e institucionais, gerando, das
mais variadas formas, exclusão social, dor e sofrimento‖ (MATTOS, 2011, p. 21). Ampliar
a construção de um conhecimento interseccional em prol das pessoas com deficiência é
salutar para perceber os meandros da discriminação voltada a esses indivíduos e como tal
segregação se relaciona com as categorias de raça, gênero, classe social e orientação
sexual.
É necessário o incentivo a pesquisas que procurem dar voz às pessoas com
deficiência, e que possam respeitar o ―lugar de fala‖ desses indivíduos para perceber quais
as dificuldades encontradas por eles para expressar a sua sexualidade. São indispensáveis
estudos acadêmicos que discutam a orientação sexual das pessoas deficientes não como
algo anormal ou patológico, mas como um campo de possibilidades que não pode ser
negligenciado pela existência de uma limitação intelectual.
Portanto, a desconstrução do discurso de anormalidade quanto à sexualidade das
pessoas com deficiência precisa ser reforçada através do entendimento de que ser
deficiente intelectual não exclui a busca pelo desejo e pelo prazer. É preciso perceber esses
indivíduos para além de suas limitações. Retomando as ideias do filósofo Sandro Sayão:
(...) se falamos aqui em sexualidade, nos seus interditos, nos discursos que são,
na verdade, dispositivos de poder, falo agora da necessidade de se estar junto e
observar como, no fundo, o que todos almejam é uma vida feliz e que para nos
aproximarmos da felicidade é preciso desagregar verdades, encontrar o outro e
desmistificar identidades. (SAYÃO, 2014, p. 155)
MAIA, Ana Cláudia Bortolozzi and RIBEIRO, Paulo Rennes Marçal. Desfazendo mitos
para minimizar o preconceito sobre a sexualidade de pessoas com deficiências. Rev.
bras. educ. espec.[online]. 2010, vol.16, n.2, pp.159-176. Disponível: <
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382010000200002. >
RUBIN, Gayle. Pensando o sexo: notas para uma Teoria Radical das Políticas da
Sexualidade. Tradução de Felipe Bruno Martins Fernandes. Revisão de Miriam Pillar
Grossi. Cadernos PAGU, n 21, 2003.
RESUMO
Entre os novos desafios da globalização, encontra-se, lidar com determinadas condutas difundidas
no ciberespaço, tal qual a violência de gênero na figura da pornografia de vingança Foram
estudadas as interfaces entre gênero e a pornografia de vingança, fundamentada a partir de
Beauvoir (1970), Neto e Gurgel (2014). Foi utilizado o método de pesquisa fenomenológico,
abordagem qualitativa, tipo de pesquisa descritiva e exploratória, coleta de dados bibliográfica e
exploração dos dados através da análise de conteúdo. Fora verificado que a globalização e a
consequente consolidação da sociedade da informação e evolução digital, pressionaram o direito
penal a evoluir para atender os anseios e necessidades do novo contexto social, no entanto, apesar
do desenvolvimento do Direito Penal em relação ao crime no ciberespaço, este ainda não é
suficiente no combate às dificuldades encontradas, como a incapacidade técnica de apuração dos
crimes virtuais, o surgimento de novas condutas criminosas, e principalmente, a garantia dos
direitos sociais de cada indivíduo.
41
Graduada em Direito no Centro Universitário do Vale do Ipojuca - DeVry|UNIFAVIP. Extensionista no
DHiálogos: ―Ciclo de Debates Sobre Sociedade e Direitos Humanos‖. Pesquisadora voluntária e
extensionista no GEPIDH Mércia Albuquerque. E-mail: jsuzanil@gmail.com
42
Maria Simone Gonzaga de Oliveira, aluna Especial do Mestrado em Direitos Humanos – UFPE. Graduada
em Direito pelo Centro Universitário do Vale do Ipojuca – UNIFAVIP|DeVry. MBA em Gestão Pública pelo
Centro Universitário do Vale do Ipojuca – UNIFAVIP|DeVry. Pesquisadora e extensionista no GEPIDH
Mércia Albuquerque. Extensionista no DHiálogos: ―Ciclo de Debates Sobre Sociedade e Direitos
Humanos‖.E-mail: Simone.gonzaga@outlook.com.br
43
Pós-Graduanda no curso Direito Processual Civil pela ESA/ OAB-PE. Graduada em Direito pelo Centro
Universitário do Vale do Ipojuca – DeVry|UNIFAVIP. Pesquisadora Voluntária no GEPIDH Mércia
Albuquerque. E-mail: lorennaverallyrds@gmail.com
INTRODUÇÃO
Para o pesquisador que aborda esse método em sua pesquisa, o que importa é
proporcionar uma descrição direta da experiência ―o modo como o conhecimento se dá‖
(GIL, 1999, p.33).
Será desenvolvida a pesquisa dentro da abordagem qualitativa, analisando o
problema através de uma investigação mais profunda, constando-se alta carga de
subjetividade.
A pesquisa será descritiva, uma vez que será pautada na técnica de coleta de dados
através da análise documental, observando, registrando e analisando o fenômeno
pesquisado, uma vez que ―as pesquisas descritivas têm como objetivo primordial a
descrição das características de determinada população ou fenômeno ou, então, o
estabelecimento de relações entre variáveis‖ (GIL, 2008, p.42).
Ainda de acordo com Gil (2008, p.42) a pesquisa exploratória busca ―proporcionar
maior familiaridade com o problema (explicitá-lo). Pode envolver levantamento
bibliográfico, entrevistas com pessoas experientes no problema pesquisado. Geralmente,
assume a forma de pesquisa bibliográfica e estudo de caso‖.
A técnica utilizada para análise de dados será a análise de conteúdo, visto ser
conduzida a pesquisa com descrição sistemática de dados para se chegar a uma
compreensão maior do objeto pesquisado.
O presente artigo tem como problemática compreender a abordagem do crime de
Pornografia de Vingança sob a ótica da violência contra a mulher.
Para concluir, resta evidenciado que quando exposto o material íntimo, não é
causado apenas prejuízo a moral da vítima, mas sim a todo o seu cotidiano, pois são
abaladas suas relações pessoais, profissionais e, principalmente, seu estado psicológico.
Trata-se de situação que pode causar prejuízo, na maioria das vezes, permanente.
DESENVOLVIMENTO
As Condutas Violadoras à Liberdade Sexual no espaço virtual
A falta de fronteiras do mundo virtual não permite a atuação eficaz, onde ―leis
materiais e processuais dos Estados, concebidas para atuarem dentro de limites territoriais,
perdem a efetividade‖ (BADDAUY, 2009, p. 1763).
Pode ser verificado que os meios virtuais são utilizados muitas vezes com a ideia
deturpada de propagar a liberdade de expressão, mas, no entanto, acabam violando o
direito à intimidade e a privacidade do outro. Os direitos da personalidade se encontram
desprotegidos e vulneráveis diante da difícil tarefa de limitar o que é privado e o que é
público no mundo virtual.
Com o desenvolvimento das mídias digitais, e em especial a internet, ―O Estado
perdeu o controle da informação, importante forma de conter as forças criminosas, o que
fragilizou a segurança internacional‖ (MARWELL, 2011, P. 04). A globalização
tecnológica deu margem ao surgimento de uma diversidade de crimes, onde qualquer
indivíduo pode se tornar vítima ou criminoso.
Pode ser afirmado que a violência de gênero, o controle do homem sobre a mulher e
essa relação desigual dominam qualquer espaço. Não diferente seria o espaço virtual,
sendo este utilizado como o novo mecanismo para se exercer essa dominação, praticando-
se a violência de gênero através do mundo virtual da mesma maneira que ocorre no mundo
real (TRINDADE apud PLOU, 2013).
Neste diapasão, percebe-se que a pornografia de vingança, na era da informação e
tecnologia, representa mais uma violação à intimidade da mulher ―como ato de violência
de gênero‖ (GUIMARÃES; DRESCH, 2014, p. 06).
No entanto, é preciso esclarecer que a pornografia de vingança não se trata de
conduta que fere apenas os direitos da mulher, apesar de na grande maioria dos casos esta
ser a vítima, os homens também podem se encontrarem no papel de vítima (TRINDADE,
2015).
Ainda de acordo com Trindade (2015), 90% das mulheres são vítimas da Revenge
Porn, isso segundo pesquisa requisitada pela campanha ―End Revenge Porn‖ 44.
Para Trindade (2015, p.01) ―O substantivo ―vingança‖ está no termo, pois,
inicialmente, a RP tratava-se da reação a um possível término de um relacionamento
duradouro‖. Ou seja, o termo vingança se encontra na nomenclatura, pois se entende que a
divulgação deste tipo de material é realizada como retaliação pelo término ao ex-parceiro,
com o qual teve uma relação longa. Contudo, deve ser destacado que esses
relacionamentos, nem sempre se tratam de relações duradouras, pois podem decorrer de
uma relação casual, muitas vezes de uma noite só.
44
A campanha é uma das ações do Ciber Civil Rights Initiative – instituição criada por um grupo de
profissionais norte-americanas (da área jurídica, da psicologia, entre outras) para auxiliar mulheres que são
alvo de Revenge Porn e de outras ações que ferem os direitos civis, sobretudo a privacidade na rede
(TRINDADE, 2015, p. 4).
No Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, foi analisada apelação criminal de réu
condenado pelos crimes de injuria e difamação por ter divulgado imagens intimas, de
conotação sexual, na internet de sua ex-namorada, como forma de retaliação por esta ter
acabado o relacionamento de aproximadamente 3 (três) anos. Vejamos:
Esse caso analisado pelo Tribunal teve como vítima uma jornalista conhecida na
cidade de Maringá, e os danos sofridos por esta foram muito além do constrangimento de
ter sua intimidade revelada, pois além de ter sua imagem vinculada como prostituta, esta
perdeu a guarda de seu filho mais novo e o emprego. Vale destacar que o ex-namorado da
vítima teve como cúmplice um assistente técnico que prestava serviços de manutenção dos
computadores da empresa do réu.
Visto todas as consequências extremamente graves, sofridas pela vítima, bem como
comprovada a materialidade e autoria da conduta por parte do réu, o então apelante, o
Tribunal de Justiça do Paraná manteve a pena estipulada na sentença condenatória,
culminada em 1 (um) ano, 11 (onze) meses e 20 (vinte) dias de detenção, mais 88 (oitenta
e oito) dias-multa, cumprido com regime inicial aberto, no entanto revertida a pena a
restritiva de direito, o réu pagará através de prestação de serviços a comunidade e também
com o pagamento mensal do valor de R$1.200,00 (um mil e duzentos reais) destinados a
vítima pelo período estipulado da pena.
Como observado, a pena estipulada ao réu foi ínfima diante dos danos ocasionados
a vítima, uma vez que está foi afetada em seu âmbito familiar, profissional e social, isso
demonstra a necessidade da devida tipificação da conduta, e com buscar meios mais
efetivos de coibir essa conduta, visto que a penalidade imposta não atua repressivamente e
mal cobre os prejuízos causados à vítima.
Verificar-se-á que na maioria das vezes a conduta não é punida no âmbito penal,
sendo tratado como mero caso de danos morais, como é verificado em decisão proferida
pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do sul. Vejamos:
A vítima dessa divulgação foi à autora embora tenha concorrido de forma bem
acentuada e preponderante. Ligou seu webcam, direcionou-a para suas partes
íntimas. Fez poses. Dialogou com o réu por algum tempo. Tinha consciência do
que fazia e do risco que corria (Voto do revisor Francisco Batista de Abreu. 16ª
Câmara Cível. Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Ap. Cív. 1.0701.09.250262-
7/001, Relator José Marcos Vieira, julgado em 11 de junho de 2014).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
RESUMO
INTRODUÇÃO
Dentre os ramos do Direito Civil, o que mais sofreu mudanças de função, natureza,
composição e concepção foi o direito de(as) família(s). Diz-se que, após o advento do
Estado social, especificamente ao longo do século XX, houve um claro interesse estatal
pelas relações familiares (LÔBO, 2011).
45
Universidade de Pernambuco – campus Arcoverde, graduanda em Direito, annegabrielebj@hotmail.com
46
Universidade de Pernambuco – campus Arcoverde, graduando em Direito, lopes.n8@gmail.com
47
Universidade de Pernambuco – campus Arcoverde, graduando em Direito, caiobrasilf@gmail.com
A família patriarcal entrou em crise a partir da promulgação da Constituição de
1988. Crise denota, portanto, uma transição de um paradigma para outro. Este novo
paradigma seria a afetividade (affectio), alçado à categoria de princípio jurídico balizador
dos vínculos conjugais e/ou parentais. Sob este mesmo fundamento e considerando ainda a
revolução copernicana ocasionada pela CF/88, infere-se que família é não somente
afetividade, mas também solidariedade. Por isso, uma relação familiar não advém apenas
do casamento ao serem reconhecidas outras entidades familiares constituídas.
Um ponto crucial e polêmico, porém visto igualmente como desdobramento da
conjuntura contemporânea deste ramo do direito, é que a família não deve ser tratada como
domínio da política, mas enquanto integrante da sociedade civil, bem mais ampla, sendo
merecedora da proteção do Estado.
Na prática social, as relações consanguíneas são menos importantes que as oriundas
de laços de afetividade e da convivência familiar, devendo prevalecer estas últimas quando
houver conflito com o dado biológico, salvo se o princípio do melhor interesse da criança
ou o princípio da dignidade da pessoa humana indicarem outra orientação (LÔBO, 2011).
A referida citação alude, em meio à discussão sobre biologização e afetividade, a
alguns princípios constitucionais aplicáveis ao direito de(as) família(s): dignidade da
pessoa humana e melhor interesse da criança. Este último, enquanto decorrência da própria
dignidade, núcleo existencial comum às pessoas humanas, norteará o escopo da pesquisa.
Assim sendo, busca-se analisar aqui como os responsáveis pela judicialização do
processo de adoção veem o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente e
ainda como este é relativizado de acordo com as características dos requerentes. Percebe-se
que ora o princípio assume um caráter de recomendação ética - portanto, não obrigatório -
ora de diretriz determinante, mostrando como modificamos, sem um mínimo de
cientificidade e segurança jurídica, suas hipóteses de incidência.
Ao conhecermos tais entraves na construção dos perfis familiares contemporâneos,
fica explícito que os princípios acabam não sendo realizados, sendo fulminado o ―critério
significativo na decisão e na aplicação da lei‖ de que se revestem, segundo a visão de
FACHIN (1996, p. 125).
A visão progressista sobre as múltiplas famílias, apesar de reconhecida
constitucionalmente e mais recentemente pelo Supremo Tribunal Federal, ainda carece de
uma reflexão cultural, dissociada de questões como a mera sexualidade.
Em suma, dizer que a família passa a ser espaço de realizações existenciais, cuja
unidade está na affectio e cujo perfil foi repersonalizado, a partir do Constituinte de 1988,
esbarra em dificuldades de cunho jurídico, contaminadas pela moral e religião do Poder
Judiciário e serventuários da justiça.
Tal constatação é formulada baseando-se nos trajetos metodológicos selecionados
para o presente trabalho. A abordagem mista, qualitativa e quantitativa, buscou, a partir da
coleta de dados, compreender os elementos mais relevantes sobre o objeto da pesquisa,
empírica e estatisticamente.
Os questionários de múltipla escolha foram realizados com juízes, analistas e
técnicos do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, nas cidades de Arcoverde e
Serra Talhada. Na primeira, as questões foram aplicadas na Vara Especializada da Infância
e Juventude. Já no segundo município, as mesmas questões foram respondidas pelas Varas
Cíveis.
As perguntas, fechadas, apresentavam uma série de possíveis respostas, sendo
respondidas por escrito e sem a presença dos entrevistadores, garantindo o anonimato dos
participantes. Entre os assuntos abordados estavam os direitos das crianças e adolescentes,
conhecimentos gerais sobre adoção, adoção homoparental e gênero.
Ao todo, foram 31 gráficos (tabelas também foram utilizadas) para cada uma das
cidades já mencionadas, sendo que para a pesquisa em comento, utilizaremos apenas 2
tabelas para Arcoverde e 1 gráfico e 1 tabela para Serra Talhada.
No antigo direito romano, a adoção servia para prover a falta de filhos e perpetuar o
culto dos deuses familiares (COULANGES, 1989). Gaio, por sua vez, falava em dois tipos
de adoção: a) ad rogatio (adotante interrogado se desejava que o adotando fosse seu filho
legítimo; consentimento do adotando; aprovação do populus); b) adoptio (adoção nos
moldes atuais).
As Ordenações Filipinas pouco trataram sobre adoção, tendo em vista a influência
do direito canônico, que ―desconheceu a adoção, em relação à qual a Igreja manifestava
importantes reservas.‖ (WALD, 2002, p. 219).
Com o Código Civil de 1916, este instituto passa a ser disciplinado
sistematicamente. Porém é somente com o Código Civil de 2002 que o sistema de adoção
plena é instituído. Nestas circunstâncias, ―tanto para os menores quanto para os maiores, a
adoção reveste-se das mesmas características, sujeitas à decisão judicial.‖ (LÔBO, 2011, p.
276).
A partir da CF/88, não há mais filho adotivo, o que existe é o processo de adoção.
Este último, concluído (sentença judicial e registro de nascimento), faz com que o adotado
se converta em filho integralmente. O artigo 227, §6º, do referido diploma é claro: ―os
filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e
qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação‖.
Significa dizer que as normas do CC/2002 e ECA deverão seguir a hermenêutica
constitucional da igualdade entre os filhos, independentemente da origem. O filho é
integrado à nova família totalmente, sendo sua condição de filho jamais questionada, seja
pelos pais que o adotaram, seja pelo próprio adotado.
Ao adotado é admitido conhecer sua origem biológica, pois o acesso ao processo
judicial de adoção é direito da personalidade. Isso não altera a natureza jurídica da adoção
de ato jurídico em sentido estrito, pois o estado de filiação é indisponível, não podendo ser
revogado.
É sempre importante ressaltar a função do instituto para além do direito das
famílias e lembrar que a adoção, diferente do que pensavam tratadistas do século XIX, não
constitui remédio consolatório para aqueles que não têm ou não podem ter filhos. Também
não concordamos com a ideia de que é uma medida excepcional como se a família
socioafetiva não fosse dotada de mesma dignidade que a família biológica.
Por isso, segundo LÔBO (2011, p. 277):
Condicionar a adoção ao interesse prévio de parentes pode impedir ou limitar a
criança de inserir-se em ambiente familiar completo, pois, em vez de contar com
pai e (ou) mãe adotivos, acolhido pelo desejo e pelo amor, será apenas um
parente acolhido por outro, sem constituir relação filial.
Por fim, sempre que possível e, assemelhando-se aos costumes romanos, o adotado
será ouvido. Inclusive, para os maiores de 12 anos, o consentimento é obrigatório.
48
Dados provenientes da pesquisa realizada pelos autores.
A importância da adoção no meio social no Judiciário em Arcoverde
Alternativas Para realizar o Para que os Visa o melhor Para que pais de Não há uma
sonho de orfanatos interesse da homossexuais importância
paternidade de fiquem vazios criança realizem o principal
pais que são sonho de ter
estéreis. netos
Repetição da 3 1 18 1
resposta
da repetição
da resposta
Em um primeiro momento foi questionado aos participantes sobre o que eles acham
do reconhecimento de famílias compostas por pais homossexuais. Os resultados, expostos
acima, apontaram que, ao entrar na seara do gênero, a perspectiva do melhor interesse foi
afastada do debate, pois as porcentagens no sentido de discordância à família homoparental
revelaram também que 67% dos participantes desconsideraram completamente a única
alternativa que citava o afeto e o bem estar da criança.
Faz-se então necessário relembrar a dura realidade dos menores que estão no
cadastro nacional de adoção (CNA). Estes, apesar de sua tenra idade foram expostos a
algum contexto de violência e/ou abandono, que os levaram até instituições de acolhimento
e ao cadastro de adoção. Marcas que infelizmente levarão consigo pelo resto de suas vidas.
Possibilitar uma família a estes traz não só a chance de um recomeço – além
daquele oferecido pelos abrigos - como também a garantia de uma proteção após a
maioridade, posto que esta é a idade limite, estabelecida em lei para o acolhimento.
Essa possibilidade, no entanto, se torna cada vez mais remota mediante a recusa de
alguns aos novos arranjos familiares. Que não só os desclassifica como também reduz a
oferta de possíveis adotantes. Deve-se ainda destacar que nas adoções homoparentais há
uma menor exigência quanto às características do adotando, o que traz consequências
muito positivas numa realidade em que se observa o desprezo por certos perfis, que não se
encaixam nas expectativas dos adotantes.
Não se pretende, todavia, defender a chamada teoria do ―mal menor‖, estabelecida
por Uziel (2012), causa de controvérsias doutrinárias, mas que se faz pertinente à
discussão. A autora irá estabelecer que nas adoções movidas por gays e lésbicas, a adoção
aparece como uma espécie de salvamento às crianças que não se adequam ao perfil de
adoção e que por isso permaneceriam nas instituições, nisto consistindo o chamado mal
menor.
Assim não se pretende aqui a propositura da adoção homoparental como uma forma
de escape ou de solução a um problema social e que somente certos perfis devem ser
―ofertados‖ a homossexuais, e sim a observação que estes têm despertado e se mobilizado
por uma realidade social patente e que fortalece a defesa das adoções homoparentais.
Alternativas Sim, as crianças Não, afinal a Sim, pois Sim, pois há Concordo, o
criadas por pais família, estas uma que deve
homossexuais independente da crianças probabilida - ser pensado
consequentemen orientação serão de maior de na família é
-te se tornarão sexual dos pais, frustradas crianças serem o afeto e o
é uma pelo exploradas bem estar
homossexuais. instituição preconceito sexualmente da criança.
legitimada a que irão por pais
educar, proteger sofrer da homosse-
e dar amor as sociedade. xuais.
crianças.
Repetição da 1 13 3 1
resposta
da repetição
da resposta
Outro ponto preocupante foi a opção dos participantes por alternativas no sentido
de que as crianças ou adolescentes criadas por homossexuais poderiam se tornar
homossexuais (5,88%), assertiva que não possuía qualquer grau de cientificidade e ainda
outros 5,88% que assinalaram que há uma probabilidade maior de crianças serem
exploradas sexualmente por pais homossexuais. A preocupação citada decorre do fato de
que além de possuírem uma ignorância no assunto, os profissionais que responderam as
questões atuam também produzindo pareceres relevantes nos processos - classificados
como ―conhecimentos peritos‖ por Coitinho Filho (2017) - que podem favorecer ou não a
adoção.
A opção por essas questões demonstra um imaginário social sobre a
homossexualidade, manifestado mediante a decisão de casais ou solteiros homossexuais
pela adoção. Neste sentido:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar dos esforços constitucionais em admitir outras entidades familiares
socialmente constituídas, é necessário um processo de assimilação cultural por parte dos
serventuários da justiça para que tais mandamentos sejam efetivamente contemplados.
Existem muitos estigmas que circundam as uniões homoafetivas, posicionando-as como
associadas à promiscuidade. Esta forma de pensar através de um senso comum, portanto,
desprovida de cientificidade, atinge as decisões dos processos de adoção.
O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, responsável por balizar
as relações familiares nacional e internacionalmente, acaba se tornando um ponto
problemático no que tange ao deferimento (ou não) do pedido de adoção quando os
requerentes são homossexuais. Não precisamos dizer que a relativização deste princípio é
realizada no próprio fazer jurisdicional, pelos magistrados e equipe técnica.
Acredita-se que não há nenhum óbice jurídico na adoção por pessoas do mesmo
sexo. O óbice é cultural, pautado na ideia de heterossexualidade enquanto norma padrão.
No Judiciário, há uma reprodução de preconceitos quanto à relação adotantes do mesmo
sexo/adotado. Por isso, técnicas argumentativas são utilizadas para encobrir o receio, entre
elas, o mal menor. Significa que, ao invés de afirmar os ganhos da inserção da criança em
uma família, os argumentos giram em torno da salvação das crianças de destinos que
seriam ainda piores (UZIEL, 2012). Ou seja, ser adotado por uma família homoparental é
ruim, mas livraria o adotado de um futuro ainda mais drástico.
Ao utilizar o contexto de duas cidades do sertão pernambucano, Arcoverde e Serra
Talhada, a partir do método qualitativo e questionários com perguntas fechadas, buscou-se
um entendimento geral sobre características da adoção e, principalmente, adoção
homoparental, como ela é vista, se é deferida, sua relação com o princípio do melhor
interesse.
Após o reconhecimento do conceito amplo de ―famílias‖, dado pelo STF, é
inconcebível que ainda se pense em ―periculosidade‖ da homoparentalidade como se
estivesse relacionada à pedofilia. Porém Arcoverde e Serra Talhada, em questões
específicas sobre tais temáticas, acabaram demonstrando que a hermenêutica utilizada para
decidir nem sempre é a do melhor interesse. O moralismo, o caráter ético e a não aplicação
dos princípios como diretrizes determinantes falam mais alto quando o assunto é
―sexualidade boa‖ ou ―sexualidade ruim.‖
Dizer que crianças criadas por pais do mesmo sexo terão um desenvolvimento
negativo é disseminar jargões desprovidos de cientificidade. Revela o quanto a sociedade
tem aversão às mudanças que versam sobre conjugalidade e parentalidade de gays e
lésbicas. O clima de suspeita, cunhado de ―pânico moral‖, foi evidenciado nos
questionários, mostrando que as duas cidades da pesquisa ainda não superaram as velhas
oposições binárias desiguais: a heterossexualidade ainda perfaz a ordem moral considerada
aceitável. O que se considera fora da norma (heterossexual) é relativizado e, o pior, de
maneira legitimada.
REFERÊNCIAS
______. Código Civil. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Brasília, DF, 2002.
COULANGES, Numa Denis Fustel de. A cidade antiga: estudos sobre o culto, o direito,
as instituições da Grécia e de Roma; tradução de Jonas Camargo Leite e Eduardo Fonseca.
- 8.ed. - Rio de Janeiro: Ediouro, 1989.
FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Função social da dogmática jurídica. 2. ed. São
Paulo: Atlas, 2015.
GAIO. Institutas. Trad. Alfredo di Pietro. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1997, p.114-
115.
LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
MISKOLCI, Richard. ―Pânicos morais e controle social: reflexões sobre o casamento gay‖.
Cadernos Pagu, Campinas, Núcleo de Estudos de Gênero Pagu UNICAMP, n. 28, p.101-
128, janeiro-junho, 2007.
RUBIN, Gayle. Pensando o sexo: notas para uma teoria radical da política da sexualidade.
Disponível em:<https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/
1582/gaylerubin.pdf?sequence=1miriamgrossi.cfh.prof.ufsc.br/pdf/gaylerubin.pdf>.
Acesso em: 1 ago. 2017.
RESUMO
INTRODUÇÃO
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
O Direito Penal dos Silvícolas, segundo alguns relatos de teóricos, não existia um
sistema de governo, nem mesmo instituições públicas estruturadas. Estes povos viviam sob
uma economia de subsistência, tendo métodos bastante rudimentares.
Pierangeli afirma:
Quando se deu o descobrimento do Brasil, os nossos indígenas não ostentavam
um grau de desenvolvimento cultural semelhante a outros povos que habitavam o
continente americano, como os incas, os astecas e os maias, cujo grau cultural
chegou a impressionar favoravelmente os conquistadores. (2004, p. 41)
Seu ordenamento jurídico era precário, visto que, na maior parte das vezes,
solucionavam seus conflitos penais através do direito costumeiro, não havendo um código
escrito.
Segundo relato de Gonzaga, os silvícolas:
A mãe que, esquecendo-se de o ser, matar de propósito o seu filho infante, não
por malignidade do coração, nem por outra paixão vil e baixa, mas com o fim
de encobrir o seu delito, e de salvar a sua fama e reputação, será para sempre
presa e reclusa na casa de correção. (2004, p.46)
O Código de Melo Freire serviu como base para a feitura do Código Criminal de
1830, o qual teve seu projeto apresentado por Bernardo Pereira de Vasconcelos. No
Brasil, este código foi pioneiro no abrandamento da pena de infanticídio, adotando o
critério honoris causa, privilegiando o infanticídio perpetrado pela mãe. Neste caso, a
pena variava entre 1 e 3 anos de prisão com trabalho. Ele foi sancionado após o advento
da independência, trazendo dois tipos de infanticídio.
No primeiro tipo, constava a seguinte redação, in verbis: ―Artigo 197. Matar
alguém recém-nascido. Penas – de prisão por três a doze anos, e de multa correspondente
à metade do tempo‖. Já no segundo tipo, estava expresso, in verbis: ―Artigo 198. Se a
própria mãe matar o filho recém-nascido para ocultar a desonra. Penas – de prisão com
trabalho por um a três ano‖.
Maggio faz uma crítica veemente a tais institutos:
Convém destacar que o Diploma penal de 1890 só foi revogado com a feitura da
Consolidação das Leis Penais. O desembargador Vicente Piragibe, inconformado com
sistematização penal da época, a qual englobava o Código Penal de 1890 e leis penais
especiais, resolveu agrupá-las de uma maneira mais organizada. Tal aglutinação dos
diplomas penais foi denominado de Consolidação das Leis Penais, também denominado
de Código Piragibe, sendo instituída pelo Decreto nº. 22.213, de 14 de dezembro de
1932.
Quanto ao crime de infanticídio, a Consolidação das Leis Penais não trouxe nada
diferente do que já estava previsto no Código Penal de 1890. Esta consolidação vigeu até
1940, visto que, neste ano, foi feita a redação do Código Penal de 1940, o qual está
vigente até hoje no ordenamento jurídico brasileiro.
Segundo Damásio de Jesus, existem 3 (três) critérios para conceituação legislativa
do infanticídio nos diferentes diplomas penais instituídos no Brasil, conforme a seguir
disposto:
Na cidade grega de Esparta, os meninos, desde os sete anos, eram preparados para
serem soldados e, por conta disso, quando uma criança nascia com alguma deformidade,
era jogada em um vale denominado Apotetas, o qual era situado no monte Taigeto. Tais
fatos ocorreram, sobretudo, em meados de 800 a.C.
Em Atenas, cidade grega considerada o berço da democracia, por conta de seu
ordenamento, impossibilitou o infanticídio de ser um crime punível. Isso se deu pelo fato
de a parte lesada ou seu representante legal ter que intentar o processo, visto que, naquela
época, não havia um ministério público ou outro órgão que possuísse suas prerrogativas.
Por conta disso, muitos crimes ficavam impunes, inclusive o infanticídio, pois, por
exemplo, se o pai matasse seu filho recém-nascido, não existiria ninguém que pudesse
levar o delito às autoridades competentes daquela época.
Em Roma, a Lex Duodecim Tabularum (Lei das XII Tábuas), a qual era uma antiga
legislação do direito romano, tendo sido o cerne da constituição da república romana,
assim como em Esparta, autorizava a morte dos recém-nascidos disformes. Além destes, se
o filho fosse motivo de desonra, os também estavam autorizados a mata-lo após o
nascimento.
Como leciona Ribeiro, em citação de Gustave Glotz: ―Em Roma, o filho estava
totalmente submisso à autoridade paterna, que podia vendê-lo e condená-lo à morte‖.
(2004, p. 20)
Tal fato ocorria em virtude do ius vitae et necis, ou seja, o direito de vida e morte
sobre as pessoas dependentes. Nesse contexto, o pater familiae era o magistrado no seio
familiar. Caso a mãe matasse o próprio filho, sua punição seria a pena de morte, pois, para
o direito romano antigo, ela, assim como os filhos, estaria submissa à vontade do pater
familiae.
Nesse momento histórico, a principal forma de cometimento do infanticídio era
abandonando os recém-nascidos. Normalmente, isto era feito pela manhã, pois, muitas
vezes, quem abandonava, tinha a esperança de que alguém visse a criança e a acolhesse.
No período conhecido como Intermediário, o qual teve seu início no século V e seu
final no século XVIII, foi de grande reação em favor dos recém-nascidos.
No direito romano deste período, não se conhecia a expressão infanticidium. A
expressão que tinha o significado mais próximo seria parricidium, a qual significava, de
forma ampla, qualquer tipo de homicídio.
À época de Justiniano, houve o desaparecimento do ius vitae et necis, tendo, as
Institutas, aplicado pena de morte a quem praticasse tal delito. Tal pena era chamada de
culeus ou ―pena do saco‖.
Jesus descreve como esta pena era feita:
Segundo Ribeiro, ―Na Idade Média não se fazia diferença entre homicídio e
infanticídio‖ (2004, p. 21), tendo, tal fato, ocorrido, também, à época de Justiniano.
Com a influência do Cristianismo, o infanticídio, além de se distinguir do
homicídio, tornou-se um delito mais grave. Nesse momento, a Igreja Católica estava em
grande ascensão, acarretando um maior seguimento, dos intelectuais da época, aos seus
ensinamentos. Tais pensadores pregavam uma doutrina de não supressão da vida de um ser
humano pelas mãos de outro.
Quanto aos recém-nascidos, esta doutrina era ainda mais repressiva, visto que estas
pessoas não poderiam sequer se defender, acarretando, ao infanticida, violentas
condenações.
Para Fragoso, ―a repressão rigorosa inspirava-se no fato de ser o infanticídio
violação da própria lei da natureza e do especial dever de proteção dos pais em relação aos
filhos; na premeditação que, geralmente, acompanha esses crimes; na debilidade da
vítima‖. (1988, p. 89)
Em países como a Inglaterra, era comum a utilização do overlaying para o
cometimento deste delito, o qual consistia na sufocação indireta do recém-nascido, pela
mãe, quando ambos estavam deitados no mesmo leito. A tais fatos, muitas vezes, não era
atribuído crime algum, pois as mães alegavam ter sido um acidente.
Na baixa Idade Média inglesa, diferente de muitos outros locais, havia uma
flexibilização nas punições de quem cometia o infanticídio, falando-se, sobretudo, em
penitência, pois a mulher, além de não ser presa, era considerada uma pecadora. As
penitências variavam entre um ano a pão e água, nos casos de sufocação do infante, até a
morte, quando o ―pecado‖ do infanticídio fosse mais grotesco, sendo cabível à Igreja o
julgamento de tais casos.
Segundo Maggio, em citação de Nelson Hungria, Carolina, a qual era a Ordenação
Penal de Carlos V, estatuía:
Para este crime, as leis francesa e inglesa não necessitavam de confissão, contudo, a
lei alemã, para que a mulher fosse acusada, precisa confessar o delito.
Ribeiro diz que:
A finalidade da punição seria impedir o réu de causar novos danos aos seus
concidadãos e demover os demais de fazer o mesmo. O meio adequado para
atingir esta meta é o que ele chama de ―a doçura das penas‖; não é necessário
que as penas sejam cruéis para serem dissuasórias, basta que sejam garantidas.
(2004, p.23)
Ribeiro ainda assevera que, para Beccaria, um outro argumento relevante é o de que
―a intimidação nasce não da intensidade da pena, mas de sua extensão‖. (2004, p. 23)
Neste contexto, o iluminista entende a perda total e definitiva da liberdade como
sendo um meio de intimidação mais eficaz do que a pena de morte.
Em virtude destes ideais liberais e individualistas, emergiram, no século XVIII,
protestos, feitos pelos filósofos do direito natural e pelos iluministas, buscando um
tratamento privilegiado para o infanticídio, tendo como embasamento, sobretudo, a
intenção, por parte da mãe, de ocultar a própria desonra.
É importante mencionar que o critério justificador deste privilégio concedido à
infanticida era de cunho psicológico.
Bruno, comentando tal critério, defende o princípio da defesa de honra da seguinte
forma:
Trata-se do homicídio cometido pela mãe contra seu filho, nascente ou recém-
nascido, sob a influência do estado puerperal. É uma hipótese de homicídio
privilegiado em que, por circunstâncias particulares e especiais, houve por bem
o legislador conferir tratamento mais brando à autora do delito, diminuindo a
faixa de fixação da pena (mínimo e máximo). Embora formalmente tenha o
legislador eleito a figura do infanticídio como crime autônomo, na essência
não passa de um homicídio privilegiado, como já observamos. (2013, p. 663-
664)
Esta espécie de homicídio foi devidamente tratada pelo legislador a fim de que não
fosse entendido este crime como um homicídio geral, e sim, específico e/ou privilegiado,
tendo em vista que existe um elemento normativo para que a conduta criminosa seja
entendida como tal, isto é, para que realmente seja configurado o crime de infanticídio.
Ainda quanto a conceituação, é importante observar as palavras de Capez:
Este entendimento do autor a pouco citado demonstra que enquanto alguns autores
defendem que o estado puerperal é bastante danoso e duradouro, há outros que discordam,
acreditando que embora ocorra o estado puerperal, este não é de tamanha proporção que
justifique a imputação de uma pena mais branda a genitora que cometeu o crime sob a
influência deste estado puerperal.
Tal posicionamento só enfatiza ainda mais que o infanticídio tem grande relação
com a cultura social, onde ao homem é permitido escolher, ou não, assumir suas
responsabilidades, enquanto que a mulher sofre com todos os medos, discriminações,
enfim, com o fruto que, embora gerado conjuntamente, passa a ser encargo seu.
Diante disto, vê-se que o infanticídio torna-se prática de mulheres que, em geral,
não possuem o apoio do genitor e são vistas com maus olhos pela sociedade, sociedade
esta que insiste em manter-se conservadora a costumes discriminatórios, os quais deveriam
ser urgentemente banidos.
É mais fácil criminalizar a mulher, a praticante do infanticídio, conforme menciona
Coelho Netto:
Vê-se que a mulher é, na verdade, uma vítima, pois o quadro social não lhe dá
muitas oportunidades de escolhas, sendo sua ação reflexo do contexto social no qual ela
está inserida.
O fato é que a prática do infanticídio pode ser tida como uma fraqueza (a mulher
não consegue lidar com tantas adversidades) ou como uma violência, fruto da infâmia
sofrida.
Em ambos os casos, o prejuízo recai exclusivamente sobre a mulher que, além de
ter que conviver com as críticas à sua pessoa e sua conduta, tem ainda um problema bem
maior, sentir-se eternamente culpada, mesmo que sua ação tenha origens totalmente
distintas de sua vontade, ou seja, há todo um histórico anterior que deram causa a execução
da conduta delituosa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
ARAÚJO, Marcos. Infanticídio: suas relevâncias. In: Site. Disponível em: <https://arauj
omaaff.jusbrasil.com.br/artigos/429720647/infanticidio>. Acesso em: 27.jul.2017.
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 2. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal. Parte especial 2: dos crimes
contra a pessoa. 14. Ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
BRASIL. Decreto-Lei nº. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. In: Site.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.ht
m>. Acesso em: 25.jul.2017.
FONSECA, João José Saraiva da. Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza: UEC,
2002.
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal. Parte Especial. Vol. 1. Rio de
Janeiro: Forense, 1988.
GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. Ed. São Paulo: Atlas,
1999.
HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. 6. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981.
JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal. 26. Ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica. 2. Ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
RESUMO
INTRODUÇÃO
DESENVOLVIMENTO
―Essa separação entre espaço público e privado tem como base a divisão sexual
do trabalho, que responsabiliza as mulheres pelo trabalho doméstico e os
cuidados com os filhos, privando-as de viver em pé de igualdade com os homens
a vida pública‖. (SILVA et al 2016, p.18).
De acordo com Saffioti, (1987) , sabe-se que a tal ―inferioridade‖ dar-se devido ao
fato da determinação do viés preconceituoso, imposta através de uma superioridade
masculina, por meio de um processo de exclusão, onde, para o patriarcado, as habilidade
femininas restringe-se aos afazeres domésticos e a família, sendo a capacidade para demais
habilidades impossível no meio feminino, restringindo, o conhecimento, o contato, a busca
pelo novo, apenas ao homem, através da sociabilidade nos mais diferentes espaços.
Em meio a impossibilidade de uma interação social de forma construtiva,
consciente e libertária, a mulher por submeter-se a uma vida regida pelos mais diferentes
tipos de violência, acaba sendo vítima das mais diferentes formas de violência. Ou seja,
além da ideologia embasada pelo viés do conservadorismo, do machismo e do patriarcado,
o homem ―sente a necessidade‖ de ir além, colocando em prática todo o seu desejo de
possuir tudo como propriedade sua, inclusive, a mulher, passando a fazer surgir um
quadro de violência.
Porém o papel da mulher, como gênero feminino, na sociedade, não foi apenas e
unicamente de suplício, perdas e exclusões, mas de vitórias e conquistas, ainda que por
meio de sofrimento e muita luta, até de fato ir reafirmando seu lugar na sociedade. A
mudança não só vinha a acontecer na esfera social, mas, também, no interior feminino. Na
fala de Besse (1999), ela argumenta que, após a Primeira Guerra Mundial, no Brasil, diante
de um processo industrial, regido por mudanças sociais, políticas e econômicas, as
mulheres começaram a transparecer-se em meio ao público, de forma exploratória, por
muitas vezes, sendo por um viés mercadológico, mas apareciam também seguindo um
direcionamento emancipatório, ainda que de modo encetado, pois, as mudanças durante
esse período eram constantes e as mulheres se faziam presente cada vez mais, sendo na
academia, nas ruas ou nas indústrias. O conceito de gênero estava em discussão mediante
perspectivas contraditórias na sociedade, porém, as mulheres em si, buscavam cada vez
mais fortalecerem-se através de práticas ativistas por intermédio de discussões e inserção
em diversas esferas sociais. O movimento feminista vai aos poucos ganhando espaço em
suas lutas e conquistas.
A voz da mulher em meio às suas atitudes
Souza E Cortêz (2008) falam que, no momento em que a mulher consegue atribuir
inúmeras conquistas, sendo as mais diferentes possíveis, nas diferentes esferas, realizando-
se internamente e externamente, ela ganha campo, e com isso uma indescritível e
intolerável aceitação do homem, uma vez que pode chegar, ou até passar da condição em
que encontra-se o homem, logo diante dessa realidade de conquistas femininas, o homem
sente a necessidade de impor sua masculinidade, para não perder o controle sob a mulher,
mostrando-se de forma violenta com a mesma.
Alguns autores vêm a apontar alguns entraves que contribuem para as possíveis
causas que podem vir a contribuir para a reprodução de algumas práticas machistas pelo
público feminino.
Oliveira e Santos (2010), fala sobre o poder de situação e de voz por parte da
classe masculina, por um perspectiva ―normal‖ e ―aceita‖ pela sociedade, fazendo assim
desfavorecer a mulher em sua posição social, colocando-a em situação de submissão e
vítima da redução de seus direitos, sendo essa posição de poder político do homem, uma
das características que compõem a organização estrutural, imbuída de seus determinantes
sociais junto às relações de gênero.
―a roupa suja deve ser lavada em casa‖; 89% dos entrevistados tenderam a
concordar[...]
―em briga de marido e mulher não se mete a colher‖.82%.
―casos de violência dentro de casa devem ser discutidos somente entre os membros
da família‖. [...]63% concordaram, total ou parcialmente[...]
―mulher que é agredida e continua com o parceiro gosta de apanhar‖: 65% dos/as
respondentes concordaram total ou parcialmente com a afirmação [...]
―se as mulheres soubessem se comportar haveria menos estupros‖ Quase três
quintos dos entrevistados, 58%, concordaram, total ou parcialmente[...]
―os homens devem ser a cabeça do lar‖ Quase 64% dos entrevistados e das
entrevistadas afirmaram concordar total ou parcialmente[...]
―toda mulher sonha em se casar‖( Mais da metade dos entrevistados concordou
totalmente com esta frase).
―uma mulher só se sente realizada quando tem filhos‖ Quase 60% dos respondentes
disseram concordar total ou parcialmente com essa afirmação[...]
―a mulher casada deve satisfazer o marido na cama, mesmo quando não tem
vontade‖ 14% dos entrevistados afirmaram concordar totalmente, e 27,2%
concordaram total ou parcialmente.
―tem mulher que é pra casar, tem mulher que é pra cama‖ Mais da metade dos
respondentes concordou total ou parcialmente com a afirmação[...]
―o que acontece com o casal em casa não interessa aos outros‖. Dos respondentes,
quase 82% concordam com a frase[...]
Discussões:
Ao falar do IPEA, os dados utilizados que vieram a compor esse artigo foram de
suma importância para sua estruturação. A pesquisa foi adquirida no site do IPEA, sendo
destinada ao Sistema de Indicadores de Percepção Social - Tolerância social à violência
contra as mulheres 04 de abril de 2014.
Entende-se que os números ainda são altos, onde acaba por gerar uma disparidade
na desigualdade e violência de gênero, porém, aos poucos notasse também, mudanças nas
percepções, com tudo, leva-se a crer que é essencial o desconstruir das praticas ideológicas
construídas unicamente pela ―sublimação‖ masculina, resultante da opressão feminina.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS:
BLAY,E.A.. Violência contra a mulher e políticas públicas. Estud. av. [online], São
Paulo Sept./Dec. . 2003, vol.17, n.49, pp.87-98. ISSN 0103-4014.
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crítica da categoria na história “feminização da profissão. – 2004- Pág. 99,131.
http://repositorio.ufpe.br/bitstream/handle/123456789/9916/arquivo9102_1.pdf?sequence=
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______ Já se mete a colher em briga de marido e mulher. São Paulo Perspec. [online].
1999, vol.13, n.4, pp.82-91. ISSN 0102-8839.
SANTOS, Silvana Mara de Morais dos and OLIVEIRA, Leidiane. Igualdade nas
relações de gênero na sociedade do capital: limites, contradições e avanços. Rev.
katálysis [online]. 2010, vol.13, n.1, pp.11-19. Pág. 13 ISSN 1982-0259.
VARELA, D.M.F.. A violência contra a mulher. Psicol. cienc. prof. [online]. 1988,
vol.8, n.2, pp.29-30. ISSN 1414-9893.
RESUMO
Aborda uma breve análise, não exaustiva, acerca da valoração probatória na Lei Maria da
Penha (LMP), como esse instituto vem sendo tratado nas doutrinas majoritárias e
minoritárias e seus respectivos entendimentos das Cortes Superiores, juntamente com as
jurisprudências atualizadas. O estudo foi desenvolvido a partir da necessidade sentida pela
autora em trazer à tona um tema ainda não muito difundido e não tão bem aceito pelas
Cortes Superiores, pela doutrina majoritária e, sobretudo, pela sociedade brasileira em
geral. Uma vez que, tal temática talvez traga consigo certo ranço de ―andar na contramão‖
do que vem sendo pregado pelos movimentos feministas de modo geral, destacando-se o
emponderamento feminino. Baseou-se em referenciais teóricos, com alguns dos principais
nomes da doutrina especializada no assunto. Pesquisa teórico-científica realizada através
de estudos bibliográficos, artigos científicos, sites especializados na área, dentre outros.
Palavras-chave: Direito Penal. Lei Maria da Penha. Valor Probatório. Processo Penal
Brasileiro.
INTRODUÇÃO
O presente estudo tem como finalidade desenvolver uma breve explanação acerca
da prova na Lei Maria da Penha (LMP), como esse instituto vem sendo abordado nas
doutrinas majoritárias e minoritárias e respectivos entendimentos das Cortes Superiores,
juntamente com as jurisprudências atualizadas.
No processo penal brasileiro a prova assumirá um papel crucial, uma vez que esta
terá valor preponderante no desencadear de uma ação penal, na qual não pode haver
dúvidas (precisa-se sempre respeitar o princípio do in dubio pro reo – na dúvida da autoria
do cometimento de ato ilícito, o réu será sempre beneficiado).
A imprescindibilidade da prova no processo penal é destacada pelo processualista
Fernando Capez da seguinte maneira:
Sem dúvida alguma, o tema referente à prova é o mais importante de toda a
ciência processual, já que as provas constituem os olhos do processo, o alicerce
sobre o qual se ergue toda a dialética processual. Sem provas idôneas e válidas,
de nada adianta desenvolverem-se aprofundados debates doutrinários e variadas
vertentes jurisprudenciais sobre temas jurídicos, pois a discussão não terá objeto.
(CAPEZ, 2011, p. 344).
Aqui, diferentemente do que ocorre num processo da esfera civil, o juiz não poderá
encerrar um processo sem prévia análise das provas, mesmo sendo o caso de réu confesso,
sempre priorizando e respeitando os princípios constitucionais do contraditório e da ampla
defesa. Uma vez que, a prova no âmbito criminal tem o condão de condenar ou absolver o
réu, de validar ou tornar nulo um ato ou um julgamento. A imputação do cometimento de
um crime pode trazer resultados irreversíveis e irreparáveis à vida de um cidadão, por isso,
faz-se necessário que a prova não deixe dúvidas quanto à autoria e materialidade ou não de
um ilícito penal.
O termo prova é proveniente do latim, cujo conceito pode ser estabelecido, sob a
óptica de Fernando Capez (2011, p. 344), da seguinte forma:
Do latim probatio, é o conjunto de atos praticados pelas partes, pelo juiz (CPP,
arts. 156, I e II, com a redação determinada pela Lei n. 11.690/2008) e por
terceiros [...], destinados a levar ao magistrado a convicção acerca da existência
ou inexistência de um fato, da falsidade ou veracidade de uma afirmação. Trata-
se, portanto, de todo e qualquer meio de percepção empregado pelo homem com
a finalidade de comprovar a verdade de uma alegação.
O objeto da prova é toda circunstância, fato ou alegação referente ao litígio sobre
os quais pesa incerteza, e que precisam ser demonstrados perante o juiz para o
deslinde da causa. São, portanto, fatos capazes de influir na decisão do processo,
na responsabilidade penal e na fixação da pena ou medida de segurança,
necessitando, por essa razão, de adequada comprovação em juízo.
A Lei de nº 11.340/2006, mais conhecida como a Lei Maria da Penha, recebe esse
nome em homenagem à farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, brasileira, que
passou vários anos de sua vida sofrendo graves agressões de seu próprio marido, um
professor universitário colombiano, o Sr. Marco Antonio Heredia Viveros.
Entretanto, só após quase onze anos desde a primeira ocorrência de homicídio
tentado, o caso veio ter maior repercussão quando Maria da Penha publicou, em 1994, seu
livro, intitulado: ―Sobrevivi...Posso Contar‖. A partir de então, o caso foi levado à
Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos
(OEA), o que culminou, no ano de 2001, na condenação internacional do Brasil por
negligência, omissão e tolerância em relação aos casos de violência doméstica contra a
mulher no País.
Neste estudo foi possível observar, de forma não exauriente, que a proposta deste
trabalho é apenas expor de maneira teórica algumas questões gerais acerca das provas no
processo penal e como estas incidem na aplicabilidade da LMP. Incluindo-se, neste
contexto, a fragilidade que há, em muitos casos práticos, no momento da utilização de
alguns dos meios de prova admitidos no ordenamento jurídico pátrio, tais como a palavra
da vítima e a prova testemunhal.
Faz-se mister destacar a prova testemunhal, pois, geralmente, a testemunha nem
sempre está no momento em que ocorreu o fato, valendo-se assim apenas de opiniões
particulares e deduções que são inerentes ao ser humano. Deduções estas que vêm
imbuídas de sentimentos de empatia e afinidade, além da carga de parcialidade presente.
Além do mais, a memória humana, com o tempo, vai perdendo um pouco o ―poder‖ de
guardar as informações de forma fidedignas e esmiuçadamente, com riqueza de detalhes, o
momento correto do acontecimento dos fatos, por exemplo. Muitas vezes, precisa-se de um
olhar mais ―clínico‖ e profissional para saber confrontar os fatos e as versões, pois vale a
conhecida máxima de que ―nem tudo é o que parece ser‖.
O que não pode ser esquecido, ou deixado à margem, é o fato de que o ser
humano em sua essência é passível de agir sendo impelido por sentimentos que trazem
em si determinado animus de prejudicar alguém. Salientando-se que a palavra da vítima
não poderá ser fator preponderante, sendo apenas ela de maneira isolada, para
consubstanciar embasamento suficiente a uma possível condenação penal. Faz-se latente a
seguinte indagação: ―Porém, até que ponto somente a palavra da suposta vítima deve ser
valorada como prova? Será que uma mulher rejeitada não poderia ter o mesmo desejo de
vingança que uma mulher traída?‖. (RANGEL, 2017, [p. 1]).
É importante mencionar que na grande maioria dos casos, a palavra da vítima vem
imbuída de sentimentos que podem ser tidos como ―nobres ou não tão nobres assim‖. Tais
sentimentos impulsionadores podem ser o ciúme, raiva, ódio, vingança, rejeição, a mera e
pífia necessidade de prejudicar o outro, dentre outros.
Não pode ser deixada à margem deste estudo a questão das excepcionalidades
(foram chamadas de ―vantagens gigantes‖, por Santos) contidas na LMP e que em
decorrência delas, nada mais plausível que ao menos serem questionadas tais ―vantagens‖,
pois, de acordo com Santos:
A Lei Maria da Penha já dá um arcabouço de vantagens gigantes às vítimas,
como às medidas protetivas, delegacias da mulher, casas ‗Maria da Penha‘
oferecidas às mulheres vítimas de violência doméstica, a impossibilidade da
suspensão condicional do processo, da transação penal, do termo circunstanciado
e da reparação civil de danos. Desse modo é minimamente viável questionar se
os entendimentos das Cortes Superiores estão corretos em considerar que apenas
a palavra da vítima basta para a condenação do réu.
Na atualidade, a maior parte da doutrina e jurisprudência considera a
possibilidade de uma condenação baseada na palavra da vítima. Determinados
autores afirmam que, em alguns tipos criminais, reputados como exceção, (casos
de violência doméstica, que vão contra liberdade sexual, os crimes patrimoniais,
etc.) a palavra da vítima tem valor fundamental para o esclarecimento dos fatos e
para efetivar uma condenação, principalmente quando não exista nenhuma prova
no processo que possa corroborar as versões ali apresentadas. (SANTOS, 2015,
[p. 32]).
A partir das palavras de Aranha, fica de fácil observação que a palavra da vítima
sempre virá com uma carga muito elevada de sentimento negativo em relação a seu
possível agressor, como afirma Santos:
[...] a palavra da vítima, por menor que seja, sempre conterá uma carga
emocional em si. Indaga-se nesse momento se a possibilidade de condenação na
mera palavra da vítima pode ser absoluta. Analisando tal parâmetro, inegável é a
constância de casos de pseudovítima ou de vítimas provocadoras no âmbito da
Lei 11.340, evidenciando dessa forma, para os autores que seguem a corrente
minoritária, a impossibilidade da condenação sustentada somente na palavra da
vítima [...]. (SANTOS, 2015, [p. 36]).
E, ainda:
Percebe-se que com o uso distorcido da Lei Maria da Penha o (suposto) agressor
na verdade é a grande vítima onde, mesmo que não lhe seja aplicada qualquer
punição ao final do processo, o mesmo terá que respondê-lo, sujeitando-se a uma
condição humilhante, angustiante e desnecessária pelos meses ou anos
subsequentes a denúncia. (LICER, 2017, [p. 4]).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo:
RT, 2003. p. 173.
BATISTA, Nilo Só Carolina não viu: violência doméstica e políticas criminais no Brasil.
In: MELLO, Adriana Ramos de (Org.). Comentários à lei de violência doméstica e
familiar contra a mulher. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 45.
______. Lei Maria da Penha. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Brasília: 2006.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm>. Acesso
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CAPEZ, Fernando. Prova. In: ______. Curso de processo penal. 18. ed. São Paulo:
Saraiva, 2011. p. 344 – 453.
HERMANN, Leda Maria. Maria da Penha com nome mulher: considerações à Lei nº
11.340/2006: contra violência doméstica e familiar, incluindo comentários artigo por
artigo. Campinas: Servanda, 2007. p. 108-109.
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único. 4. ed. rev., ampl.
e atual. Salvador: JusPodivm, 2016.
NUCCI, Guilherme de Souza. Provas. In: ______. Manual de processo penal e execução
penal. 8. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
______. Provas. In: ______. Manual de processo penal e execução penal. 11. ed. rev. e
atual. Rio de Janeiro: Forense, 2014. cap. 14. Em formato PDF.
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A pesquisa visa mostrar a mulher, levando em consideração o contexto social o qual essa
está inserida, como agente social do crime. Essa não mais ocupando o polo passivo da
criminalidade, mas como autora da violência. O estudo da mulher na esfera social do crime
ainda caminha a passos lentos e se mostra de uma maneira muito tímida. Partindo disso,
faz-se uma análise de quais são os determinantes para a entrada dessa mulher na
criminalidade. Nesse sentido, buscaremos analisar como a pobreza, as desigualdades de
gênero e o amor podem influir ou servir como justificativa para a delinquência feminina. A
partir da perspectiva de que ambas em conjunto intensificam a dominação do homem pela
mulher.
INTRODUÇÃO
1. A MULHER GENI
A pobreza é considerada uma forma violência e exclusão social, na medida em que,
a população pobre é a vítima preferencial da marginalização ficando alheio a qualquer
processo de desenvolvimento. Em outras palavras podemos dizer que a criminalização da
pobreza tornou-se um meio legitimador das políticas de exclusão e marginalização das
classes menos favorecidas. Nessa perspectiva, o distanciamento social e a alienação, a
discriminação e a estigmatização que recaem sobre a pobreza não ajudam a encontrar
soluções para o problema da pobreza e nem evitam que as desigualdades sociais
aumentem. (COSTA, 2005)
Duarte (2008) ressalta que a exclusão social e marginalização provocadas pela
pobreza resultam na a criminalização das minorias sociais. Estes excluídos são a parcela da
população marcada pela vagabundagem, mendicância e criminalidade. Os lugares
ocupados pelos pobres, geralmente, as margens da cidade são vistos como lugares
propícios ao desenvolvimento da criminalidade, visto que, o Estado não presta a devida
atenção, tornando precária a saúde, educação, saneamento e, principalmente, segurança.
Cria-se, em relação a essas minorias sociais, um sentimento de desconfiança e de
insegurança. Há uma relação entre o crescimento dessa população e o aumento da
criminalidade nos grandes centros urbanos que se evidencia tanto na mídia como nos
estudos de caráter científico. O perfil social dos criminosos também ajuda a reforçar essa
associação entre pobreza e criminalidade, os autores sociais dos crimes, sejam eles homens
ou mulheres são geralmente analfabetos, desempregados ou trabalhadores sem qualificação
e predominantemente de cor negra (COSTA, 2005)
Destarte, Eduardo Bittar (2015) analisa, a partir das contribuições do sociólogo
Amartya Sem, a definição de pobreza como privação de capacidades. Amartya Sem afirma
que:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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O MOVIMENTO ECOFEMINISTA BRASILEIRO: O DESENVOLVER DO
TRABALHO DE MARGARIDA MARIA ALVES E A CRESCENTE
NECESSIDADE DE UMA NOVA PERSCPECTIVA NO DIREITO AMBIENTAL
INTRODUÇÃO
Eu sentia que os direitos da gente /são iguais, ninguém é mais do que ninguém. E
se eu estava aqui era porque certamente tinha vontade de trabalhar. Porque tinha
coragem de lutar. Não tinha medo e achava que este negócio de homem e mulher é
besteira. A mulher pode ser até presidente de sindicato, pode ser (NOVAES apud
CARNEIRO, 1994, p. 12).
Assim, como principal desafio, tinha a luta pelas demandas da região paraibana
que habitava. Uma delas, a luta contra usineiros latifundiários que exploravam e
prejudicavam o desenvolvimento da agricultura familiar na região de Alagoa Grande e
municípios vizinhos. Covarde e brutalmente, foi assassinada na porta de sua casa
enquanto estava na companhia de sua mãe e seu esposo Severino Casemiro Alves e o filho
do casal, José de Arimatéia Alves. Os mandantes da barbárie eram ligados à usina da
região. Assim, Margarida foi assassinada por enfrentar o poder estabelecido na opressão e
exploração da classe camponesa, um poder assentado no monopólio territorial, lastreado
na violência econômica constitutivas das relações de produção que moviam as usinas de
açúcar do Brejo paraibano. Todavia, a paraibana deixou na justiça centenas de demandas
daqueles que defendia, todas ganhas. Sua morte repercutiu nacionalmente, chegando à
Comissão Interamericana de Direitos Humanos, todavia, mais de trinta anos depois,
nenhum dos mandantes foi condenado (LOURENÇO, 2015).
Margarida não se restringia a uma jornada de trabalho no campo; era esposa, mãe,
dona de casa e líder sindical. O início de suas atividades nas organizações de
trabalhadores rurais foi como tesoureira do sindicato rural, acabando por ser eleita
como presidente do sindicato tendo lá permanecido por 12 anos. Período em que
moveu mais de 600 ações trabalhistas contra usineiros e senhores de engenho da
região o que fez dela uma liderança política na região. (SANTANA, 2010.).
Assim, inspiradas em sua luta, desde o ano 2000, em agosto, sempre se reúnem
milhares de mulheres trabalhadoras rurais em Brasília. Intitulado como Marcha das
Margaridas, o movimento – organizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na
Agricultura (Contag) e Central Única dos Trabalhadores (CUT) – traz demandas a respeito
da garantia permanente a alimentos de qualidade e em quantidade suficiente, sem
comprometer outras necessidades essenciais; o acesso a terra e valorização da
agroecologia, uma educação que não discrimine as mulheres, o fim da violência
sexista, o acesso à saúde, a ser ou não ser mãe com segurança e respeito; autonomia
econômica, trabalho, renda, democracia e participação política (AGÊNCIA BRASIL,
2015).
Sendo mulher, negra, nordestina, trabalhadora rural, pobre; reunia em si
estereótipos calcados em uma sociedade patriarcal e preconceituosa. No entanto, não
permitiu ser vítima da opressão muito pelo contrário, dias antes de ser assassinada, em seu
discurso de comemoração de 1º de maio de 1983, na cidade de Sapé, Paraíba, Margarida
proferiu um dos lemas mais expressivos símbolos de sua luta e empoderamento:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Destarte, o ecofeminismo traz consigo um novo jeito de pensar o mundo. Não
trata unicamente da dialética ―homem-mulher‖, mas inova propondo uma verdadeira
revolução do agir e pensar da sociedade. Através da interdisciplinaridade, com ferramentas
analíticas e interpretativas, propõe uma leitura mais ampla. Baseando-se nos fundamentos
teóricos do feminismo e do ambientalismo, questiona a desigualdade de gênero, onde a
mulher é tratada como ser inferior. Torna-se, dessa forma, importante ferramenta de
renovação e construção de novos conhecimentos para as ciências.
Por sua vez, crescendo em conhecimento, vem adquirindo novos adeptos pelo
mundo que buscam reproduzir seus ideais a partir do aglomerado de suas diversas
correntes. Todavia, percebe-se a timidez de seu desenvolvimento em nosso país. Como
fruto de nossas primeiras conclusões, encontramos o desafio de superar as raízes
patriarcais que perduram nos valores da sociedade brasileira e, o modelo de
desenvolvimento socioeconômico que foi adotado. Assim, pudemos identificar nuances do
retrocesso impregnado nos patrimônios culturalmente preservados, bem como as visões de
desenvolvimento baseados unicamente em critérios como renda, produção e produtividade.
Felizmente, conseguimos identificar o crescimento, a pesar de tímido, do
movimento, já marcado desde a década de 1980, a partir do trabalho de Margarida Maria
Alves, das Quebradeiras de coco babaçu, entre outros. Assim, enquanto movimento social,
o ecofeminismo torna-se exemplo do verdadeiro progresso que está havendo nas
comunidades e, deve ser fortalecido pela academia, com sua contribuição intelectual, por
toda sociedade através da conscientização e preservação ambiental.
Finalmente, identificamos a maneira com que o papel do ecofeminismo encontra-
se, na atual conjuntura. Percebemos que tal modelo de feminismo se adéqua às
necessidades sentidas para o fortalecimento das lutas dos movimentos ecológicos e de
direitos humanos,bem como nas discussões das campesinas por espaço dentro da
propriedade e nas relações sociais. Porém, os ideais do ecofeminismo buscam mais do que
direitos para as mulheres, buscam transformações de relações que vão além das diferenças
de gênero, verdadeiras transformações políticas. Então, o que falta para que o
ecofeminismo atue em sua plenitude na nossa sociedade? Quais os paradigmas a serem
quebrados? A resposta percebemos na preservação dos próprios Direito Humanos.
Enquanto não nos desprendermos das amarras do preconceito social, da própria
consciência cultural marcada pela segregação de papéis dos indivíduos – homem e mulher
– e tendo menosprezado seus conhecimentos, não será possível superar nossas limitações
enquanto sociedade democrática e sustentável. Identificamos, assim, que o movimento
embora possua caráter inovador, assim como foi no movimento feminista em seu início,
deve reconhecer que é diversificado, possui traços particulares em cada país, em cada
região que estabelece. Portanto, carrega em si mesmo um grande dever de aprendizado:
superar seus próprios preconceitos culturais, e fortalecer-se para que suas diversas visões
ecofeministas caminhem rumo a uma democracia participativa e um mundo sustentável.
Com isso, as principais correntes ecofeministas estudadas, a espiritualista, a
construtivista e a clássica, veem a exploração ambiental como próprio fator de destruição
da humanidade. Nesse ponto, percebem que a mulher ao longo dos séculos foi silenciada
em suas ideias, suas ações, e participação. Defendem, assim, a inserção destas na seara
política, nas reuniões de suas comunidades ou, nos diversos movimentos sociais. Claro,
que em decorrência da própria diversidade humana, o ecofeminismo se aproxima da
comunidade tendo respaldo de alguns valores culturais, em países como a Índia, por
exemplo, interligado a uma grande crença religiosa, a corrente espiritualista abraça a ―mãe
terra‖ como uma divindade digna de proteção. Nos países ocidentais, a corrente
construtivista aproxima-se dos ideais um tanto céticos da sociedade, associando a
preservação ambiental e de combate a desigualdade de gênero como instrumentos de
garantir a própria sobrevivência da humanidade e o desenvolvimento sustentável, além de
se basear em direitos estabelecidos e conquistados, que devem ser exercidos. A corrente
clássica, embora tenha sido uma das primeiras correntes, recebendo críticas por estar
marcada por essencialismos, se constitui num esboço para o aperfeiçoamento de novas
questões.
No Brasil, percebemos grandes movimentos ecofeministas. Todavia, as discussões
estão em sua maioria concentradas no campo rural e do campesinato. Percebemos a
necessidade de participação dos movimentos feministas urbanos dialogarem com estes
novos movimentos, com a finalidade de levar para o meio ambiente artificial tais debates,
uma vez que os grandes centros industriais e, as grandes metrópoles são responsáveis por
boa parte da poluição ambiental. Além disso, no campo político brasileiro, vez que é nesse
ponto onde o poder de decisão se concretiza, percebemos uma tímida participação
feminina. De outro ponto, os debates ecológicos também se mostram insignificantes, tidos
como questões acessórias. Permanecem, então, os debates ecofeministas no campo dos
movimentos sociais e, timidamente, nas pesquisas e estudos da academia.
Em vista disso, é imperioso reforçar a educação social, voltada por um saber não
só ecológico, mas por direitos e por igualdade de participação e de oportunidades. Por isso,
a atual demanda é buscar um método que possibilite um novo modo de interagir com a
natureza, ao passo que nosso olhar para a sociedade seja de fraternidade e cooperação
mútua, vez que compartilhamos o mesmo ―lar‖. O Ecofeminismo, por conseguinte,
manifesta, uma libertação de ideias limitadas, de valores patriarcais. Convoca, dessa
maneira, a sociedade a lutar pela distinção de qualquer natureza ou, exploração do
ambiente, pois este ultimo é um bem comum a todos e, não somente, para aqueles que
usurpam o monopólio do poder.
Finalmente, tal como objetivamos a partir de Margarida, desabrochamos em
nossas observações vestibulares que a linha de pensamento ecofeminista é relevante
instrumento emancipatório das amarras sociais e como movimento defensor dos direitos
humanos que, somado à atual visão ecológica e sustentável que propõe a nova doutrina
ambiental e filosófica, permitirá a superação de mais um paradigma na luta por uma
verdadeira mudança estrutural e organizacional da sociedade, onde os tabus do capitalismo
patriarcal sejam substituídos pela frutificação de relações de parceria e solidariedade.
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AS IMPLICAÇÕES DO CONCEITO DE GÊNERO E SEXUALIDADE NA
CONSTITUIÇÃO DA DIMENSÃO SUBJETIVA
RESUMO
Esse artigo mostra que fatores culturais e históricos presentes em uma sociedade são e que
são influenciadores diretos no processo de construção do indivíduo. Assim o presente
estudo tem como objetivo reunir discussões acerca de Gênero, Sexualidade e Direitos
Humanos, articulando essas temáticas e buscando um maior conhecimento sobre as
mesmas. Portanto esse estudo traz um panorama sobre minorias sociais, políticas de
identidade, Direitos Humanos, direitos sexuais, performances, corporalidades, gênero,
interseccionalidades e tudo aquilo que esteja intimamente relacionado com a ideia central
onde se impulsione o caráter prioritário das dimensões subjetivas e suas especificidades.
INTRODUÇÃO
DESENVOLVIMENTO
Terceiro, a dimensão política que estrutura essas relações sociais, que inclui a
família, as relações de parentesco, a divisão sexual do trabalho, a educação e o sistema
político. Por fim, a identidade subjetiva, na qual interagem os elementos de ordem
subjetiva e as relações sociais. A segunda parte da proposição de Scott refere-se à
dimensão do poder, isto é, o gênero é o primeiro meio através do qual o poder é articulado.
Para Scott, ―estabelecidos como um conjunto de referências, os conceitos de gênero
estruturam a percepção e a organização simbólica de toda a vida social‖ e ―na medida em
que estas referências estabelecem distribuições de poder o gênero torna- -se envolvido na
concepção e na construção do poder em si mesmo‖ (SCOTT, 1990).
Corrêa (2006) tece uma análise crítica sobre o processo de consolidação da
associação do direito à sexualidade, tendo sido os direitos sexuais, nas conferências das
Nações Unidas que trataram do tema, restritos à consideração da condição das mulheres,
excluindo do debate os demais atores que têm seus Direitos Humanos violados em função
da sexualidade, tais como GLBT e profissionais do sexo.
Para Rios (2007), fundamental é que o debate avance segundo a direção apontada
pelas ciências sociais, ao desassociar a sexualidade necessariamente da noção de
reprodução, bem como problematizando a noção de ―saúde sexual‖, abrindo o campo para
a consideração de diferentes expressões e possibilidades do exercício da sexualidade para
além da naturalização da heterossexualidade.
Ainda para Rios (2007), o mesmo se propõe a formulação de um direito
democrático da sexualidade, enfatizando a necessidade da discussão sobre direito e
sexualidade a partir da perspectiva da universalidade dos Direitos Humanos. Para o autor,
três grandes eixos têm estruturado o debate atual sobre direitos sexuais: (1) a questão das
identidades, relativas às expressões da sexualidade, onde se insere notadamente a questão
das homossexualidades e das identidades de gênero; (2) as consequências e condições da
relação sexual, referentes, sobretudo, às práticas de prevenção ou planejamento da
concepção, bem como às abortivas; e (3) a busca pela fundamentação dos direitos sexuais,
que estaria historicamente referida à noção de ―saúde sexual‖.
Nessa perspectiva, Rios (2007) afirma que o desenvolvimento dos direitos GLBT
avançou e se consolidou na consideração de questões relativas ao acesso dos serviços de
saúde. Trata-se de uma peculiaridade da experiência latino-americana no processo
desconstrução de direitos sexuais que contemplem a população GLBT, e que diferencia a
lógica jurídica da região em relação aos processos análogos na América do Norte e na
Europa.
Joan Scott (1992) busca a atenção para a necessidade de se entender o gênero
enquanto a relação entre os sexos, de como é assegurado um significado para os conceitos
de homem e mulher e as práticas pelas quais os significados da diferença sexual são
definidos. Já para Amussen (1985), o gênero dá significado às distinções entre os sexos,
ele ―transforma seres biologicamente machos e fêmeas em homens e mulheres, seres
sociais‖.
[...] A concepção oficial e formal de Direitos Humanos compreende o conjunto de
direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, e é pautada nos princípios da
universalidade, indivisibilidade e interdependência. São princípios constitutivos da sua
dimensão filosófica, que amalgamam o discurso legal, mas provocam polêmicas no debate
político (ALMEIDA, 2005, p. 16).
Assim, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, demarcou e
reconheceu que o âmbito que compõe os Direitos Humanos são todas as dimensões
relacionadas à vida com dignidade, sendo uma unidade universal, indivisível,
interdependente e inter-relacionada (TRINDADE, 2002).
Portanto, Guimarães (2013), ressalta que construir possibilidade de realização dos
Direitos Humanos significa dar passos efetivos ao acirramento das condições históricas
que poderão ampliar as perspectivas de igualdade de gênero, sem perder de vista que
interior a esse debate há diferentes visões de mundo que expressam concepções variadas
sobre o ser social.
De acordo com Áran (2006) não é complicado compreender a rigidez das leis
estruturalistas, que consolida por meio da matriz heterossexual os posicionamentos
legítimos, toda a concepção diferenciada torna-se incompreensível e é contemplada como
um excesso que não deve ser inscrito ao âmbito simbólico, pois representa uma ameaça ao
sistema binário- hierárquico. Aquilo que é passível de simbolização estará comprometido
por uma operação de violência e exclusão e as consequências dessas ações são pertinentes
na flutuação de questionamentos acerca da construção do corpo sexuado, do ego corporal e
do estabelecimento de seus limites espaciais, contornos e fronteiras. Esses questionamentos
desembocam no patamar da ideia concebida a priori que contextualizam conceitos e
identificações sobre o que acaba por fixar ou restringir as manifestações das sexualidades.
A consideração das regulações de gênero compreende uma forma específica que
possui efeitos construtivos sobre a subjetividade. As regras que coordenam a identidade
são parcialmente consolidadas a partir da matriz de pensamento que hierarquiza a
heterossexualidade compulsória, dessa forma o gênero não é nem a nomeação de uma
essência endógena, nem ao menos um simples fator rudimentar de construção social. O
indivíduo gendrado seria primeiramente a resolução de repetidas construções que
determina noções substancializantes, afirmando a autora que o gênero por si próprio é uma
norma. (BUTLER, 2006).
Freire, (2011) afirma que a supressão emocional provoca a inibição do
comportamento expressivo, mas não a vivência negativa ao qual vem associada. Suprimir a
expressão das emoções conduz a menor experienciação das emoções positivas e maior de
emoções negativas levando a um afastamento social, a graduações mais ampliadas da
sintomatologia depressiva e níveis decaídos de satisfação com a vida, autoestima e
otimismo. De forma onde a autoestima parece se interligar-se a uma medida específica de
bem estar subjetivo, o que pode vir a estar discriminado com a definição e conceitualização
dos constructos. A avaliação do self, a satisfação com a vida e a análise da vida por uma
visão holística demonstram ter em comum um fator de valoração e emocional que seria
gostar de si e da vida que possui. Concluindo um enviese amplamente essencial no que se
concerne o estudo do gênero em um patamar subjetivo, principalmente aos que se
encontram á parte do modelo patriarcal e imposto pelas sociedades heteronormativas.
Moore, (2000) pontua a fatorialidade do contexto cultural em que o gênero está
inserido quando evidencia o envolver dos indivíduos nas posições oferecidas quando os
mesmos reproduzem o discurso cultural dominante, não obstante também edifica a
existência de muitas feminilidades e masculinidades, ou seja, diversificadas formas de ser
feminina ou masculina dentro de um mesmo contexto. O gênero não pode ser contemplado
isoladamente, mesmo que como uma forma de diferença. A mútua imbricação de
constituições distintas e pertinentes implica dizer que uma forma de diferença vem a
substituir a outra, sendo uma caracterização de processos e estruturação da vida humana
que permanece acessível a mudanças requerendo, portanto cautelosa especificação de
análise. Como uma solidificação do contexto apresentado Louro (2004) afirma:
Esse embate, como qualquer outro embate cultural, é complexo
exatamente porque está em contínua transformação. No terreno dos gêneros e da
sexualidade, o grande desafio, hoje, parece não ser apenas aceitar que as
posições se tenham multiplicado, então, que é impossível lidar com elas a partir
de esquemas binários (masculino/feminino, heterossexual/homossexual). O
desafio maior talvez seja admitir que as fronteiras sexuais e de gênero vem sendo
constantemente atravessadas e o que é ainda mais complicado admitir que o
lugar social no qual alguns sujeitos vivem é exatamente a fronteira. A posição de
ambiguidade entre as identidades de gênero e/ou sexuais é o lugar que alguns
escolheram para viver.
Compreende-se, portanto que a cultura determina os padrões sociais que incluem as
especificações de imposição de gênero e sexualidades e que os indivíduos abarcados por
esses fatores determinam essa cultura proveniente de acúmulos informacionais de gerações
antecessoras.
A categoria do gênero não detém o caráter de exclusão das outras categorias que
definem a subjetividade, mas é altamente necessária a amplificação de uma verbalização
específica para vislumbrar a diversidade das extensões construtivas das práticas individuais
e sociais. A extensão sexual obteve sua participação na incorporação histórica da
identidade pessoal e coletiva, principalmente no Brasil. (RAGO, 1998).
Ainda para Rago (1998) torna-se relevante pontuar que essa construção ao qual o
conceito de gênero se define é um fator atuante nas disparidades quanto às noções da
sociedade, onde uma das categorias se sobrepõe sobre as outras. Ainda na
contemporaneidade existem discursos que validam a inferioridade física e mental das
mulheres, provocando a divisão de mão de obra no trabalho, reunindo as classes em
empregos específicos que estão nivelados em um nível inferior na hierarquia das profissões
e estabelecendo salários abaixo de um patamar justo de subsistência e também que
corresponde a competência enquanto profissional.
Nessa perspectiva Belle (1993) aponta que a prioridade masculina no mercado de
trabalho atualmente é mal avaliada e que o direito ao emprego deve pertencer a todos os
sexos e gêneros referindo que houve uma queda no nível de segregação de gênero,
principalmente em empresas visionárias, todavia nem todas as organizações partilhas dessa
mesma ideologia, onde em muitos contextos essa segregação limita o acesso feminino a
múltiplos espaços.
O fenômeno do teto de vidro, estudado por Steil (1997), é uma das facetas da
generificação presente nas instituições empregatícias que impede a ascensão das mulheres
a níveis mais elevados em suas configurações profissionais. Para ultrapassar o teto de
vidro, as mulheres devem gerenciar uma nova identidade que envolva um inovador
mecanismo de adaptação às exigências organizacionais, contudo existem variáveis tetos de
vidro que se apresentam nas mais diversas organizações acreditando que as regras aos
quais se manifestam são relativas e atuam de acordo com as especificações do espaço.
Bourdieu (1999) assinala a permanência das posições relativas de desigualdades
entre homens e mulheres. Onde os homens têm articulado movimentos de resistência, pois
se sentem ameaçados, mesmo que de forma simbólica que se relaciona com sua imagem de
dominação e posição sócio- histórica de virilidade e poder. A identificação desses pontos
de resistência e elos onde as relações de poder são atribuídas vem a contribuir com a
dinâmica ao qual se estabelece os papéis sociais, portanto a manifestação do conceito de
gênero nas subjetividades.
Na visualização de Nicholson (2000) as identidades de gênero são estabelecidas
seguindo uma mesma lógica de apropriação em qualquer cultura:
Os sentidos, a atribuição de significados e valores dos corpos (e de partes dos
corpos) mudam através do tempo e das comunidades‖. Ainda que a maioria das
sociedades tenha estabelecido, ao longo dos séculos, a divisão
masculino/feminino como uma divisão fundamental e tenha compreendido tal
divisão como relacionada ao corpo, não se segue daí, necessariamente, a
conclusão de que as identidades de gênero e sexuais sejam tomadas da mesma
forma em qualquer cultura. ―Perceber uma diferença física ou mesmo atribuir a
ela uma significação moral e política não é o mesmo que usá-la para ‗explicar‘
divisões básicas na população humana.
REFERÊNCIAS
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NARDI, Peter M. & SCHNEIDER, Beth E (Eds.). Social perspectives in lesbian and gay
studies. London: Routledge, 1998.
SAFFIOTI, H. I. B. Primórdios do conceito de gênero. Cadernos Pagu. Campinas, n. 12,
p. 157-163, 1999.
SCOTT, J. W. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade, vol.
16, no 2, Porto Alegre, jul./dez. 1990, p.5.
SCOTT, J. História das mulheres. In: BURKE, Peter. (org.) A escrita da história: novas
perspectivas. São Paulo, UNESP, 1992, pp.64-65.
RESUMO
Este estudo apresenta uma pesquisa sobre crimes sexuais contra a criança e o adolescente
no âmbito intrafamiliar e as consequências que eles trazem para suas vítimas. Discute-se
acerca da violência sexual a partir de um estudo documental em um Centro de Referência
Especializado em Assistência Social - CREAS em uma cidade do Agreste de Pernambuco.
O objetivo assumido nesse trabalho foi o de estudar o cenário relacionado a crimes sexuais
contra crianças e adolescentes em uma cidade do Agreste de Pernambuco. Os principais
autores utilizados na pesquisa foram: Sanderson (2005), Brasil (1990), Ariès (1978), Frota
(2007) e Aberastury e Knobel (1981). Este estudo de cunho documental,
metodologicamente foi instrumentalizado a partir do método dialético, com uma
abordagem mista, quantitativa e qualitativa, e através de uma pesquisa exploratória,
descritiva e bibliográfica. As conclusões alcançadas com essa pesquisa permitem-nos
depreender que os crimes sexuais na cidade do Agreste de Pernambucano estão
intimamente relacionados a questões de gênero, pois, todos os agressores são do sexo
masculino, enquanto 87,5% das vítimas são do sexo feminino. Além disso, percebemos a
escassez de dados quanto aos agressores nos processos administrativos arquivados em um
CREAS, bem como a ausência de articulação e eficácia no trabalho da rede de atendimento
as crianças e adolescentes.
1 INTRODUÇÃO
Buscamos nesta pesquisa analisar a realidade dos crimes sexuais contra crianças e
adolescentes, no âmbito intrafamiliar, na cidade do Agreste de Pernambuco, com o intuito
que haja/houvesse maior visibilidade para esses sujeitos em desenvolvimento.
Desse modo, ao deparar-nos com um tipo de violência tão assustadora e que carrega
outras consigo, buscamos catalogar dados de um Centro de Referência Especializado em
Assistência Social - CREAS de modo que fosse possível responder o seguinte problema de
pesquisa: Qual o cenário relacionado a crimes sexuais no âmbito intrafamiliar contra
crianças e adolescentes em uma cidade do Agreste de Pernambuco?
De forma a responder esse questionamento a pesquisa direcionou-se a partir de um
objetivo geral, qual seja, ―estudar o cenário relacionado a crimes sexuais contra crianças e
adolescentes em uma cidade do Agreste de Pernambuco‖.
De modo a alcançá-lo, essa pesquisa se propôs, de início, a discutir as concepções
sobre crimes sexuais a partir da Lei nº 12.015/2009, bem como identificar as concepções
de infância e adolescência e os crimes sexuais e, por fim, analisar o cenário relacionado a
crimes sexuais contra crianças e adolescentes em uma cidade do Agreste de Pernambuco.
A metodologia utilizada em nossa pesquisa se fez a partir do método dialético
(LAKATOS, 2003), tendo em vista que esse instrumento possibilita uma melhor
apropriação da realidade. A abordagem desta pesquisa é mista, apresentando aspectos
quantitativos e, sobretudo, qualitativos, para que tenhamos uma visão do fenômeno
estudado a partir de estatísticas e da vivência no meio natural com os personagens, que de
alguma forma, estão envolvidos no fato.
Além disso, foram aplicadas três tipos de pesquisa: a exploratória, a descritiva e a
documental. Este último tipo de pesquisa foi utilizado para a coleta de dados no CREAS,
com o intuito de criar alguns indicadores a partir dos documentos, levando em
consideração o tema desse trabalho.
Assim, a análise documental foi realizada nos processos administrativos que ficam
no CREAS, e sobretudo pelos relatórios sociais ou psicossociais que é desenvolvido pelos
profissionais desse órgão, no período entre jan./2013 a out./2015.
Por fim, a técnica de análise de dados foi a análise de conteúdo (BURDIN, 2007),
de modo que pudemos interpretar os dados que foram coletados no CREAS.
Nossa pesquisa se justifica ao observarmos a complexidade e particularidade que a
violência sexual traz consigo. Dessa forma, através de um tema como esse, esperamos que
a sociedade se acostume a tratar sobre sexualidade, a quebrar tabus, a alertar os seus filhos,
as suas crianças e adolescentes sobre o sexo e o próprio corpo, antes que sejam vítimas
desse tipo de violência. Ademais, com essa pesquisa esperamos ter contribuído para que as
famílias, profissionais e a própria sociedade possa identificar e ajudar as vítimas desses
crimes sexuais.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 Diálogos sobre crimes sexuais contra crianças e adolescentes a partir da Lei nº
12.015/2009
A duração da infância era reduzida a seu período mais frágil, enquanto o filhote
do homem ainda não conseguia bastar-se; a criança então, mal adquiria algum
desembaraço físico, era logo misturada aos adultos, e partilhava de seus
trabalhos e jogos. De criancinha pequena, ela se transformava imediatamente em
homem jovem, sem passar pelas etapas da juventude, que talvez fossem
praticadas antes da Idade Média e que se tornaram aspectos essenciais das
sociedades evoluídas de hoje.
Desse modo, percebe-se que a concepção de infância varia de acordo com a época,
bem como a cultura de cada povo. Ou melhor, a existência ou não da concepção de
infância, varia de cada época e cada cultura.
Passamos do período chamado de Infância Negada (SILVA, 2005), que
compreendia os primeiros séculos, até a Infância de Direitos (final do século XIX e início
do XX) que é a que vigora atualmente. Neste último período começa a surgir um grupo
familiar preocupado com a sua prole, que se dedica a construção de afeto na família e
direcionado especificamente à criança (FROTA, 2007).
É importante destacar que essa nova visão que começou a surgir da criança foi
influenciada pelo Cristianismo. Tanto católicos quanto protestantes, pregavam sobre o
olhar de cuidado para com a criança, de maneira que pudesse conscientizar os pais a
cuidarem de seus filhos, bem como contribuir para que os governantes e a própria
sociedade começassem a combater as atrocidades cometidas contra as crianças. Nesse
contexto, Ferrari e Vecina (2002, p.46) contribui: ―Em alguns povos pagãos iniciou-se um
movimento de piedade pelas crianças, porém a verdadeira obra de redenção se deve ao
Cristianismo‖.
Entretanto, foi um longo caminho a ser percorrido para que a infância, como se tem
hoje, fosse reconhecida. A sociedade até começou a ter um olhar para a criança, mas em
um primeiro momento, e por muitas décadas, a criança foi vista como o ―menor‖. Leite
(2011, p. 20), assim comenta sobre o surgimento desse ―menor‖:
Observa-se que com a necessidade da saída dos pais para o trabalho, inclusive da
mulher, que era a cuidadora oficial das crianças, esses sujeitos em desenvolvimento
começam a ser enquadrados na categoria dos excluídos, os seres marginalizados da
sociedade. ―Abandonados, mendigos e infratores frequentemente foram confundidos sob o
nome de ‗menor‘, que nunca designa filhos de famílias das camadas médias e altas, e tem
conotações negativas desqualificantes‖ (LEITE, 2011, p.21).
Desse modo, essa estigmatização era designada às crianças que pertenciam as
famílias pobres, até porque eram esses grupos sociais que precisavam sair de suas casas
para trabalhar e garantir o sustento do lar.
Ainda nessa perspectiva, a educadora e psicóloga Frota (2007) acrescenta:
Nesse contexto, ainda no século XVIII, foi criado, no Brasil, a chamada ―roda dos
expostos‖ que era uma instituição que prestava assistência as crianças abandonadas,
ressaltando-se que essa instituição já existia desde o Medievo na Europa (MARCILIO,
2011). No entanto, o que tinha o papel de assistir a criança, era apenas mais um meio para
marginalizá-la, bem como foi um dos institutos que mais negligenciaram essas crianças:
É desumano saber que a roda dos expostos só deixou de existir na década de 50. Ou
seja, até meados do século passado essa era a realidade das nossas crianças abandonadas,
esse era o caminho percorrido por elas.
Marcilio (2011, p. 79) traz as transformações que ocorreram após a roda dos
expostos deixar de existir:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo chega a seu fim na busca por respostas a seguinte problemática:
Qual o cenário relacionado a crimes sexuais no âmbito intrafamiliar contra crianças e
adolescentes em uma cidade do Agreste de Pernambuco?
Os resultados encontrados a partir dos dados coletados levam-nos a fazer as
seguintes análises da realidade de uma cidade do Agreste de Pernambuco.
O maior número de denúncias ocorreu no ano de 2015, de modo que percebemos
que isso está totalmente atrelado aos seminários que vem sendo desenvolvido pelo CREAS
ao longo do ano. Para que uma cidade do Agreste de Pernambuco venha receber um
número mais expressivo de denúncias é essencial que sejam desenvolvidas mais ações com
o cunho educativo e esclarecedor sobre o tema, pois muitos familiares por não conhecerem
os sinais que as vítimas apresentam não conseguem identificar as violações aos direitos
sexuais daquelas crianças ou adolescentes.
Além disso, todos os agressores são homens. Essa constatação atraiu nossa atenção,
pois percebemos que a violência sexual tem suas raízes na violência de gênero.
Observamos que para que ocorra uma mudança nesse quadro, diminuindo essas violências,
é necessária uma conscientização coletiva, de forma que a luta contra o machismo seja
uma constante no meio social, especialmente em uma cidade do Agreste de Pernambuco
onde foi o nosso estudo.
Ademais, a idade dos agressores variou dos 10 aos 78 anos durante o período
analisado, de modo que não há um perfil estabelecido de quem pode ser esse agressor.
Qualquer pessoa é um agressor em potencial. Esse resultado mostra-nos a dificuldade
acentuada no combate a esse tipo de violência, por não ser possível identificar a idade, nem
mesmo outras características para traçar um perfil do agressor, sendo necessária assim uma
atenção especial para o comportamento desses sujeitos.
Outra constatação importante foi que em 79,16% dos casos os agressores eram
familiares. Como foi explicado acima, houve a coleta de dados de casos em que terceiros
aproximaram-se da família para aliciar as suas vítimas para depois praticarem os crimes.
No entanto, observamos que mesmo existindo essa outra ―classe‖ de agressores, a maioria
esmagadora são os familiares. Essa porcentagem é lastimável. Constatar que aqueles que
deveriam ser os garantidores do bem-estar da criança e do adolescente, são na verdade os
verdadeiros propagadores de um mal, uma sombra que vai afetar a vítima por toda a vida, é
totalmente alarmante.
Verificamos ainda que as vítimas em sua maioria são do sexo feminino (87,5%),
enquanto 12,5% são do sexo masculino. Observamos através dos casos que a violência
sexual além de estar atrelada a violência de gênero, também está ligada as relações de
poder entre o forte e o fraco, fisicamente e psicologicamente. Isso tem raízes históricas,
pois ao longo dos séculos as mulheres foram subordinadas aos homens legitimando essa
relação de poder ainda existente atualmente.
Nesse contexto percebemos que a faixa etária das vítimas variou de 2 a 17 anos de
idade, de modo que fica demonstrada que as crianças desde muito cedo já são vítimas de
crimes sexuais. Como observamos da pesquisa bibliográfica realizada, quanto mais nova
for uma vítima talvez ela não julgue se o que estar acontecendo com ela tem um cunho
certo ou errado, no entanto, quando o entendimento começa a surgir as consequências são
avassaladoras, podendo chegar a vontade de suicídio, como um dos casos apresentados
acima.
Constatamos ainda que o palco para a violência sexual são as casas dos agressores e
isso estar atrelado ao fato de ser um ambiente que não causa suspeita nas pessoas. Por
serem em sua maioria familiares, geralmente os que convivem com os agressores não
desconfiam e nem vão estar observando qualquer atividade suspeita.
Além disso, houve a predominância de dois crimes: o estupro de vulnerável e o
estupro, de modo que o que mudava para tipificação de cada um era apenas os requisitos,
como a idade da vítima ou se havia ou não deficiência mental.
E por fim, constatamos que a rede de atendimento, assim como já demonstrava
algumas pesquisas em outras localidades do país, também não funciona em uma cidade do
Agreste de Pernambuco. Como visto na análise de dados apenas 8,33% dos casos tiveram
um trabalho bem articulado com os órgãos públicos que compõem o Sistema de Garantia
de Direitos.
Portanto, a partir desses resultados, percebemos que a falta de conhecimento sobre
o tema é um dos primeiros problemas encontrados pela violência sexual, razão pela qual os
Poderes Públicos deveriam investir mais em campanhas educativas para conscientização e
conhecimento da sociedade, para que a própria população comece a ser instrumento de
combate a violência sexual. Ademais, é necessária uma luta contínua contra as relações de
poder, baseado no gênero, ainda tão viva na sociedade contemporânea.
REFERÊNCIAS
_______. Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009. Altera o Código Pena, a Lei dos Crimes
Hediondos e revoga a Lei n° 2.252, de 1° de julho de 1954, que trata de corrupção de
menores. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Congresso Nacional. Brasília,
DF, 2009.
BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa, Portugal; Edições 70, LDA, 2009.
FERRARI, Dalka C. A.; VECINA, Tereza C.C (orgs.). O fim do silêncio na violência
familiar: teoria e prática. São Paulo: Ágora, 2002.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial.10. ed. vol. 3. Rio de Janeiro:
Impetus, 2013.
HABIGZANG, Luísa F.; KOLLER, Silvia H.; ZEVEDO, Gabriela Azen; MACHADO,
Paula Xavier. Abuso sexual infantil e dinâmica familiar: aspectos observados em
processos jurídicos. Psic.: Teor. e Pesq., Brasília , v. 21, n. 3, p. 341-348, Dez. 2005.
RESUMO
INTRODUÇÃO
Durante muito tempo, fomos educados para ter um pensamento binário e com base
na biologia, onde o genital definiria o modo de agir de cada ser, porém com o passar dos
anos, surgiu a ideia de gênero. O conceito de gênero começou a ser (re)discutido de forma
mais rica e profunda, indo além dos moldes da ciência biológica; gênero seria um conjunto
de aspectos que vem a diferenciar o masculino do feminino, com isto, mostra-se então que
nem sempre o genital corresponderá a identidade de gênero.
A partir dessas ―descobertas‖ movimentos sociais, como o transfeminismo, surgem
para abranger/acolher essas pessoas, que antes eram totalmente marginalizadas e excluídas
da sociedade. Analisamos o transfeminismo, ou feminismo tans, como uma vertente do
feminismo (movimento político que luta pelo fim da dominação de um gênero sobre
outro), composta em sua grande maioria por travetis e mulheres transexuais ou
transgêneros, seu principal objetivo é lutar pelos direitos das pessoas trans.
Além disso, esse movimento vem com o intuito de salientar que a identidade das
pessoas é algo mais abrangente do que o órgão genital, acabando com o conceito
meramente político, uma vez que nos é atribuído direitos e deveres que, socialmente
falando, se enquadram a todo estereótipo social do que é entendido por gênero, como se
nos fosse imposto um manual de instruções, onde a partir dele teríamos condutas
determinadas, como um molde fixo em que tudo que se encontrasse às margens não se
enquadrasse.
Em decorrência disso, nos deparamos com outro problema, para o SUS (Sistema
Único de Saúde) se não for diagnosticado como doença, o mesmo não se diz como
responsável de/para fornecer tratamentos hormonais ou até mesmo a cirurgia de
transgenitalização. Não obstante há uma controvérsia nisso, uma vez que o mesmo já
declarou que ―todo cidadão tem direito ao atendimento humanizado, acolhedor e livre de
qualquer discriminação‖.
1. ÀS VEZES O MELHOR REMÉDIO É UM PALAVRÃO
Hoje podemos notar que o movimento cresceu e com ele suas vertentes foram
surgindo. O conceito de gênero que foi se aplicando no feminismo contribuiu com a
desconstrução de crença no que diz respeito ao modelo da mulher. Essa construção social
que advém dos paradigmas atribuídos ao gênero, acaba ―enfatizando a necessidade de
elaborar e exibir uma identidade coletiva autêntica, auto-afirmativa e autogerada, ele
coloca uma pressão moral nos indivíduos para que se conformem a uma dada cultua
grupal‖ (FRASER, 2000, p. 112). Contudo busca-se uma significação para o movimento
que vá além, que o considere ―tanto como uma filosofia quanto como uma práxis acerca
das identidades transgênero que visa a transformação dos feminismos‖ (JESUS &
HAILEY, 2010, p. 14).
Desse modo, por mais que haja brechas entre os dispositivos heterossexuais que
tenham dado espaço para a criação de novas performances, que ultrapassam do binarismo,
o que acaba se observando é que todo esse processo de formação do gênero ininteligível
consegue localizar dos discursos normalizadores e, posteriormente, a desnaturalizar as
identidades sexuais.
É um fardo que carregam essas pessoas, que precisam ter documentos com um
nome que não está de acordo com o seu gênero e, consequentemente, pode lhe causar
constrangimento público.
Com isto percebemos que esse padrão que nos é atribuído, vêm à ser uma
desvalorização cultural que tem por finalidade criar uma hierarquia de seres sociais, onde
alguns seriam chamados de normais e outros de anormais, essa segunda ‗classe‘ estaria
abaixo, ou seja, seria ignorada. Perante tais coisas, percebemos que olhando por esse
ângulo, a luta por reconhecimento busca a superação da subordinação.
Pessoas trans ainda são vistas como pessoas doentes, sendo considerado um
transtorno de identidade sexual pela Classificação Estatística Internacional de Doenças e
Problemas Relacionados à Saúde – CID 10 (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE).
De maneira geral, o movimento tem crescido aos poucos, no Brasil. Suas atividades
são, em sua maioria, pela internet, como grupos em redes sociais e em alguns sites, o que
deixa claro que as fontes a respeito ainda são bastante escassas e de um acesso mais
dificultoso.
2. DESPATOLOGIZAÇÃO
2.1.O GÊNERO NA CADEIRA DOS PACIENTES
John Money (1955) foi um dos primeiros a discutir sobre isso, o mesmo estudava a
―biologia do gênero‖ e tentou justamente diferenciar o sexo da identidade, em seus
estudos, mesmo com a escassez da época, ele conseguiu de certa forma mostrar isso,
porém para o mesmo a transexualidade seria uma ―disforia de gênero‖.
Com isto, o dilema que existe entre os ―normais‖ e ―anormais‖, não vem ao caso dentro
dessa perspectiva essa pessoa trans como doente
Não obstante, existe um medo que rodeiam as pessoas trans e as deixam com um pé
atrás quanto a despatologização, essa tensão se dá pelo fato do Estado já ser ausente e
ineficiente quando se é ligado a suprir as necessidades especificas desse grupo e caso não
seja mais diagnosticado como doença há a possibilidade do Estado não querer mais custear
as despesas com os processos de transformações corporais. Porém, caso isso viesse/vir a
acontecer estaria/estará havendo uma grande contradição, uma vez que os interesses do
Estado estarão sobrepondo os da população. Quando se fala em igualdades de direitos
devemos enxergar as minorias e suas especificidades, a definição de ―normais de gênero‖ e
portadores de direitos não devem vim somente da ideia que o Estado confirma, ou toma
por verdade (ou seja, o que a identidade corresponde ao órgão genital).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante tudo que foi discutido, vimos que a identidade de gênero não está ligada
diretamente a genitália, contudo é socialmente construída. A transexualidade é uma
questão identitária que vem a se opor aquilo que fomos acostumados a chamar de natural,
ou seja, para o meio, essas pessoas estariam burlando as regras instituídas culturalmente,
por isso as mesmas acabam sendo excluídas da sociedade e às vezes até da essência
humana, estando então sujeitos a violências físicas e psicológicas.
O transfeminismo tenta então, remar contra essa maré e proclamar que essa
marginalização, essa negação de direitos e de proteção igualitária, ou seja, todas as
injustiças de reconhecimento sejam de extintas. E para que possamos nos distanciar desse
pensamento heteronormativo sexista é preciso que haja essa transformação cultural, bem
como em suas expressões legais. Havendo então um reconhecimento positivo para esse
grupo que no momento é totalmente rebaixado.
REFERÊNCIAS
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transexual. Rio de Janeiro: Garamond, 2006.
DIAS, Diego Madi. Brincar de gênero, uma conversa com Berenice Bento. Cad. Pagu,
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http://dx.doi.org/10.1590/0104-8333201400430475.
MELO, Thalita Carla Lima et al. Despatologização das Identidades Trans: a saída para
uma sociedade mais igualitária. Caderno de Graduação. Ciências Humanas e Sociais.
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MONEY, John. Hermafroditismo, gênero e precocidade no hiperadrenocorticismo:
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PEREIRA, Pedro Paulo Gomes. A teoria queer e a Reinvenção do corpo. Cad. Pagu,
Campinas, n. 27, p. 469-477, Dec. 2006. Available from
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-
83332006000200020&lng=en&nrm=iso>. Access on 05 Aug. 2017.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-83332006000200020.
RESUMO
Falar em sexualidade ainda é uma tabu em nossa sociedade, as pessoas ainda estão
inseridas em modelos normativos sociais antigos em que o sexo é permitido apenas para
fins reprodutivos entre casais heterossexuais. Isso causa de certa forma uma repressão na
sexualidade de muitos indivíduos. O presente artigo tem como objetivo principal realizar
um estudo das práticas sexuais englobadas no BDSM (bondage e disciplina, dominação e
submissão, sadismo e masoquismo o sadomasoquismo) e como essas sexualidade são
desenvolvidas por seus praticantes, desde a infância quando o ser tem seus primeiros
contatos com a sexualidade até a vida adulta. Utilizaremos como método o bibliográfico e
descritivo para tentar melhor entender e explicar essas fases do individuo enquanto ser
sexual.
INTRODUÇÃO
METODOLOGIA
O método de pesquisa escolhido para este trabalho, foi embasado em análise
bibliográfica a partir de buscas na plataforma Scielo com análise de artigos, assim como
estudo de livros, se utilizando de escritos de alguns autores referenciados que se implicam
na discussão de temas relacionados a sexualidade, utilizando como critério a busca pela
temática BDSM. Como bem cita Gil (2009):
A pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado,
constituído principalmente de livros e artigos científicos. Embora em quase todos
os estudos seja exigido algum tipo de trabalho dessa natureza, há pesquisas
desenvolvidas exclusivamente a partir de fontes bibliográficas [...] (GIL, 2009, p.
44)
DESENVOLVIMENTO
A sigla BDSM é um acrônimo que engloba várias práticas sexuais do individuo,
sendo as mais principais: B e D para Bondage e Disciplina – onde esta primeira palavra
designa o ato de amarrar ou imobilizar o parceiro, através de cordas, algemas, ou qualquer
outro material que deixe a pessoa presa a algo – tal ato é feito para que esta pessoa está
imobilizada chegue ao prazer/gozo a partir do desconforto que lhe é causado, visto que as
amarrações são feitas em lugares estratégicos do corpo para garantir a segurança desta. Em
seguida temos a disciplina, ato de disciplinar o/a submisso/submissa a partir de várias
práticas que podem ser desde o bondage até outras como as relações D/s. Em segundo
momento temos o par D e S para Dominação e Submissão, para estes entendemos como
sendo as relações em que casais (ou não) vivem dentro do meio BDSM; é interessante
frisar aqui que os papeis de dominação ou submissão não estão ligados ao sexo biológico,
mas como a pessoa se sente no meio, podendo então um homem ser dominador ou
submisso e uma mulher ser dominadora ou submissa, outro ponto interessante aqui é que a
orientação sexual também não é um fator determinante nas práticas sadomasoquistas, visto
que podemos ver um homem hetero tendo uma relação D/s com outro homem, seja ele
hetero ou não – isso é possível porque no meio BDSM o prazer sexual se dá através de
várias formas e não apenas no ato de penetração dos órgãos sexuais. Por fim temos o par S
e M para Sadismo e Masoquismo ou Sadomasoquismo; para estes entendemos como as
práticas em que ambas as pessoas terão o prazer e gozo sexual a partir da dor, onde o
masoquista sente prazer em sentir dor e o sádico em infligir dor, ou também o
sadomasoquista que sente prazer em ambas as coisas.
É valido colocar também que há muitas outras práticas englobadas no BDSDM
que podem ser inseridas em uma dessas letras e que para que tais práticas seja possível de
se realizar é preciso ter consensualidade entre os praticantes. Vale salientar também que
nem sempre envolve dor ou muito menos penetração (FREITAS, 2010).
Para que haja essa consensualidade entre o dominador e o submisso, há também
um acordo de designação de uma palavra de segurança, a safeword, que indica o limite de
cada pessoa, que deve ser acionada quando o parceiro ou parceira realizar algo que o outro
não concorde, dessa maneira o outro não persistirá (ZILLI, 2007).
Através de algumas definições básicas o discurso BDSM busca esclarecer que
tipos de comportamentos estão em jogo quando se faz referência às atividades
que ele representa. Para isso constrói-se a ideia de um conjunto de práticas de
cunho sexual e consentidas entre os participantes. O consentimento é a noção
mais elementar do BDSM. Ele limita o universo de que se fala, de forma que
todas as considerações sobre modalidade de práticas e relacionamentos BDSM
subentendem que são atividades consentidas. Ou seja, que não há violação nem
abuso reais daqueles envolvidos. O consentimento separa o BDSM da
criminalidade (ZILLI, 2007, p. 62)
É a partir desta fala que conseguimos fazer uma diferenciação entre o sadismo
praticado no BDSM e o sadismo praticado nos romances do Marquês de Sade. Temos o
primeiro como a busca do prazer através da dor, dor esta que é proporcionada a partir de
práticas consensuais e aprovadas por ambas as partes, do outro lado temos os romances do
Marquês que tinham como principal objetivo o gozo a partir da dor e sofrimento do outro,
logo não se caracteriza como BDSM por não está englobado na consensualidade.
De certa maneira, a perversão definida pelo autor não enquadra nem patologiza
aos praticantes de sadismo e masoquismo, porém enfatiza que essas práticas se tomam
doentias quando o individuo força o outro, sem consensualidade alguma a realizar
determinada prática sem total consciência e desejo próprio.
Neste aspecto Facchini e Machado (2013), reforçam a ideia de consensualidade
diferenciando as práticas em que o sujeito é forçado a realizar, de práticas consensuais
sexuais, o SSC. Esta sigla significa São, Seguro e Consensual – podemos ver aqui que as
práticas sexuais englobadas no BDSM não partem apenas da consensualidade para ser
consumada, mas também da sanidade de ambas as partes, logo não é comum ver o
consumo de bebidas ou qualquer outra droga que altere a consciências dos praticantes, e
também a segurança – é preciso sabe o que está se fazendo e com quem vai fazer para que
ambas as partes aproveitem ao máximo.
Para melhor compreensão das relações BDSM, uma vez que elas tratem de
submissão, sadismo, dor, prazer na dor, entre outros elementos, faz-se importante
compreender, à luz da psicanalise, o processo de construção das representações da vida
sexual e o desenvolvimento sexual do sujeito. Freud (1905) destaca que, no período da
infância as fases libidinais infantis e suas zonas erógenas, enquanto fontes de prazer
sexual, de inicio tem a intenção de nutrição através do chucar na fase oral e posteriormente
a prática desse chucar torna-se inteiramente fonte de prazer, que no autoerotismo a criança
suga outras partes do próprio corpo, podendo se prolongar na vida adulta ao buscar repetir
a satisfação obtida na fase oral, através deum alvo sexual externo na vida adulta. Tal como
a zona dos lábios, a zona anal também possui papel importante e significante na formação
sexual infantil, de maneira que algumas crianças na fase anal retêm as fezes até que o
acumulo das mesmas provoca fortes contrações que ao passar pelo ânus, podem provocar
sensações prazerosas e ao mesmo tempo dolorosas.
Nos dizeres de Poli (2007), esses acontecimentos de fixação e regressão nas fases
oral e anal, ocupam uma posição de contribuição no desenvolvimento do individuo,
podendo resultar não somente na vida adulta, em comportamentos masoquistas ou até
mesmo sadistas, visto que a criança ao ―negar‖ presentear a mãe com as fezes, está de certa
maneira manipulando e dominando a situação, obtendo prazer desde o dominar até a dor e
o prazer de eliminar as fezes acumuladas.
Antes de mais nada precisamos entender o conceito de pulsão no sadismo e
masoquismo em que Birman (2016), por exemplo, define que é apenas no fim do sadismo
que o movimento pulsional apresentaria a pretensão de humilhar e dominar o outro, ou até
mesmo de punir o outro com dor, não sendo imperativo no sadismo originário. O que se
deseja é a afirmação da capacidade do ser, que mesmo se sucedendo em violência, não
estaria na procura de castigar o outro com dor ou não e sim uma passagem entre a posição
de masoquista, modificando a posição sádica inicial, pretendendo causar dor no outro
subsequentemente com dor e humilhação. A formação da potencia do ser, pulsão de vida,
seria marcada pela violência, não se pretendendo com isso o aniquilamento do outro, mas
assim a afirmação da potência. Isso vem a acontecer pelo fato de que a pulsão está em
busca unicamente de prazer, tentando dessa maneira diminuir o desprazer através da
afirmação da vida.
Dentre as questões relativas à submissão e masoquismo, Azevedo (2013) aponta
para uma diferença. Para essa autora a submissão difere do masoquismo, pois nem todos os
submissos sentem prazer em apontar e sim apenas em submeter-se ao outro. Ela defende
que, comumente o masoquista completamente submisso o é por, na infância, ter apanhado
muito, transformando, dessa maneira, a dor em prazer, cujas surras eram dadas
principalmente nas nádegas, tendo a formação psicológica formada por estimulo de adultos
repressores, logo culminado na vida adulta em papeis submissos. Evidentemente que a
posição de Azevedo (2013) é um dos elementos contributivos para obtenção de prazer e
para a condição de submissão. Porém não é a única.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos perceber a partir deste estudo que a sexualidade e o BDSM vem sendo
desenvolvido de forma lenta no país de forma a dificultar nosso olhar acerca do tema, além
disso, vemos também uma certa relutância entre os praticantes em ser mais abertos com
relação as práticas e compartilhamento de assuntos.
Chegamos a conclusão de que as práticas sexuais englobadas no BDSM que são
tão demonizadas, podem sim (e devem) ser consideradas normais como qualquer outra,
percebemos isto a partir do estudo da consensualidade entre os praticantes e simpatizantes,
onde nada é feito sem permissão de ambas as partes.
Além disso, pudemos perceber que esses desejos sexuais podem se dar inicio
durante a infância do individuo através de gestos simples que já podem ser um indicativo
do desejo pelas praticas dissidentes.
REFERÊNCIAS
FACCHINI, Regina; MACHADO, Sarah Rossetti. ―Praticamos SM, repudiamos
agressão‖: classificações, redes e organização comunitária em torno do BDSM no contexto
brasileiro. Sex, Salud Soc. (Rio J.), Rio de Janeiro, n. 14, p. 195-228, agosto de 2013.
FERREIRA, Glauco Batista. Produção de sujeitos, sexualidades e mercadorias no BDSM:
as técnicas e os circuitos do SM em San Francisco na etnografia de Margot Weiss. Ver.
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FREITAS, Fátima Regina Almeida de. Bondage, dominação/submissão e
sadomasoquismo: uma etnografia sobre práticas que envolvem prazer e poder em
contextos consensuais. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social), Universidade
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do BDSM na internet e seu diálogo com a psiquiatria. Disponível em
http://www.academia.edu/796864/A_pervers%C3%A3o_domesticada_Estudo_do_discurso_de_leg
itima%C3%A7%C3%A3o_do_BDSM_na_Internet_e_seu_di%C3%A1logo_com_a_psiquiatria._2
007 acesso em: 18 de março de 2017
MÃES DO CÁRCERE: interfaces entre cárcere, maternidade e condição
feminina
Este trabalho apresenta parte dos resultados da pesquisa intitulada ―Mães do Cárcere:
olhares sobre o feminino na Colônia Penal Feminina de Buíque/PE‖, realizada ao longo do
ano de 2015. Assim, o presente artigo tem por objetivo apresentar algumas intersecções
construídas sobre o sentido do universo feminino no cárcere, perfazendo o quadro acerca
das condições femininas com base do cotidiano investigado. De abordagem qualitativa,
esta pesquisa articula algumas categorias analíticas extraídas da investigação a partir da
técnica de Análise do Conteúdo (BARDIN, 2007). Os resultados apresentados neste estudo
indicam que o estabelecimento prisional estudado nega e/ou exclui a condição do ser
mulher‖ no cárcere por meio de processos que a despersonalizam e que subalternizam seus
direitos. Conclui-se que a mulher/mãe ao ser encarcerada não são observadas as
peculiaridades do universo feminino, especificamente o estado gestacional.
INTRODUÇÃO
Este artigo apresenta parte dos resultados da pesquisa desenvolvida ao longo do ano
de 2015 na Colônia Penal Feminina de Buíque/PE (CPFB), a qual teve como objetivo
investigar sobre a realidade e os desafios de ser mulher e exercer a maternidade no cárcere.
O presente artigo tem como problemática: Quais as experiências relacionadas com
a expectativa e a realidade do exercício da maternidade e a condição de ser mulher na
CPFB? Ainda tem como objetivo geral analisar o cenário em que é vivenciada a
maternidade e a condição de ser mulher na CPFB. Quanto aos objetivos específicos tem-se:
a) Demonstrar os desafios de vivenciar a maternidade no cárcere; b) Analisar as
intersecções entre maternidade e cárcere, sob a perspectiva de gênero; c) Identificar o
cenário de graves violações de direitos da mulher mãe em situação de cárcere.
Com relação à metodologia utilizada para nossa pesquisa determinamos os
seguintes métodos:
Tipo de pesquisa seguiu a perspectiva exploratória e explicativa. Exploratória por
se tratar de uma pesquisa bem especifica, podemos dizer que ela assume a forma de um
estudo de caso, sempre em consonância com outras fontes que darão base ao assunto
abordado. No entanto, é explicativa devida, esta aprofunda o conhecimento de uma
realidade.
Quanto à abordagem adotamos para esta pesquisa o método qualitativo. Com
relação à abordagem qualitativa, Richardson (1999, p. 80), expõe que:
Os estudos que empregam uma metodologia qualitativa podem descrever a
complexidade de determinado problema, analisar a interação de certas variáveis,
compreender e classificar processos dinâmicos vividos por grupos sociais.
Richardson (1999, p. 82) afirma ainda que ―[...] as pesquisas qualitativas de campo
exploram particularmente as técnicas de observação e entrevistas devido à propriedade
com que esses instrumentos penetram na complexidade de um problema‖
A análise das informações coletadas deu-se a partir da técnica da análise de
conteúdo. Por constituir-se em um estudo no campo qualitativo (GIL, 2008), a análise das
informações mapeadas orientou-se com base em descritores que surgiram ao longo das
reflexões e da coleta de informações. Estes descritores possibilitarão a organização dos
dados em categorias temáticas (BARDIN, 2007).
A Análise de Conteúdo permite compreender e evidenciar indicadores não
expressos explicitamente. Assim, a análise não se resumiu a descrição (enumeração das
características sobre algo) e nem da interpretação (a significação concedida a essas
particularidades), mas a um procedimento intermediário que permitiu a passagem, explícita
e organizada, em referenciais teóricos, da descrição à interpretação. Afinal, a análise de
conteúdo, quando trabalha com a palavra, permite produzir importantes inferências no
conteúdo (BARDIN, 2007).
A escolha do tema deu-se pelo interesse de entender como um ambiente frio,
solitário, que tem como função punir mulheres que cometeram crimes, mistura-se com o
sublime sentimento da maternidade.
A contribuição acadêmica dessa pesquisa, dar-se pelo fato de existirem poucas
publicações com o tema, cada vez mais o número de mulheres em presídios vem
aumentando, algumas Leis surgem com o intuito de melhorar a organização prisional, mas
na realidade estas Leis não têm eficácia.
Contudo, faz-se necessário um debate no meio acadêmico sobre o tema,
mostrando a realidade das mães e filhos que vivem em estabelecimentos prisionais,
fazendo com que os pesquisadores voltem seus olhos para essa realidade.
Ainda em análise sobre a justificativa do tema, observa-se que, para a sociedade, é
de fundamental importância o estudo em questão, pois o Brasil é um país de muitas Leis,
porém muitas delas pendentes de efetividades, considerando a ausência do cumprimento
das Leis, afeta a função social da pena.
Para a sociedade o Estado está cumprindo seu papel, ao retirar das ruas a mulher
que cometeu crime, entretanto, há de se dá uma resposta a sociedade no sentido de
demonstrar se, de fato, essas mulheres recebem do Estado a efetivação de seus direitos.
Nesse diapasão, conclui-se a pertinência do presente trabalho, diante da efetiva
demonstração de cabimento de sua análise, na sociedade atual.
DESENVOLVIMENTO
A relação mãe e filho começa ainda na gestação, podendo ter interferência pelo
ambiente em que a mãe se encontra. Pois, dentro da prisão a mãe não tem autonomia da
maternidade tem que aprender a como criar um filho dentro dos limites e regras
estabelecidas. Mães e filhos devem receber tratamento adequado e especial pois a mulher
no estado gestacional e de amamentação encontra-se em uma situação singular, ocupando
posição diferenciada das demais.
Stella (2006, p. 97) refere que: ―as acomodações para mães e bebês estão longe de
serem luxuosas.‖ A autora defende que o desenvolvimento da criança pode ser afetado pela
dificuldade de envolver criança e cuidadora em atividades, e quando há um ambiente
impróprio para uma criança, que não ofereça meios adequados de locomoção nem objetos
que possam ser usados em atividades espontâneas
Um ponto delicado que a Lei não expressa é o momento da separação, pois mesmo
existindo uma legislação no país não é explícito o momento que mãe e filho devem ser
separados, dependendo da legislação interna do presídio. Normalmente, passados os 6
meses iniciais mães e filhos são separados sem nenhum preparo, aquela mulher que antes
dedicava-se integralmente a maternidade, têm seu filho arrancado de forma cruel. Neste
sentido Kalus, Kennel e Klaus (2000), dispõem: ―o processo emocional que os pais
constroem com seu filho é formado pelas experiências do dia a dia, onde nasce o apego de
ambas as partes‖.
É importante que esse processo de separação decorra de forma gradativa, sempre
levando em consideração o melhor interesse da criança, para que mãe e filho não sofram de
forma brusca com a separação.
Ressalte-se, que o período de amamentação não é, apenas, o momento em que mãe
amamenta seu filho, mas, sim, equivale à todo o período em que a criança precisa de leite
materno. Nesse sentido, Silva:
[...]Mas a cláusula, por outro lado, é condicionada ao período de amamentação.
―Período‖ não no sentido de hora de amamentação, mas do tempo durante o qual
a criança depende do aleitamento, o tempo em que a criança necessita nutrir-se
do leite materno, total ou parcialmente. [...] Mas as autoridades públicas não
podem interferir nesse período [...].(2009, p. 152)
Neste tópico iremos debater de forma intercalada maternidade e cárcere sob uma
ótica de gênero, que nos levará a examinar questões relativas ao padrão esperado de uma
mulher pela sociedade, da dupla punição que ela sofre ao delinquir e como o Estado
recebe essas mulheres nos estabelecimentos prisionais. Dando ênfase, ao momento da
mulher gestante, e àquelas que se encontram com seus filhos nos estabelecimentos
prisionais.
As mulheres têm um histórico de lutas pelo reconhecimento como sujeitos de
direitos. Mesmo com todo o avanço do século XX alguns fatores sociais ainda impedem
que homens e mulheres sejam vistos de formas iguais. Mesmo sendo um princípio
expresso, a igualdade entre os sexos ainda não é enxergada, havendo discriminação,
muitas vezes disfarçada em relação a mulher. Delas se espera que sejam femininas, isto é,
sorridentes, simpáticas, atenciosas, submissas, discretas, contidas e até mesmo apagadas
(BOURDIEU, 2002).
Entretanto, sobre a mulher estão os olhos da moralidade, entre elas a questão de
gênero. A mulher é estigmatizada, marcada pela fragilidade, nasce para ser uma boa filha,
mãe, o exemplo do lar, enquanto o homem é designado o poder, ao ser que está acima da
mulher na sociedade.
A construção dos gêneros se dá através da dinâmica das relações sociais. Os seres
humanos só se constroem como tal em relação com os outros. Saffioti (1992, p. 210)
considera que:
Não se trata de perceber apenas corpos que entram em relação com outro. É a
totalidade formada pelo corpo, pelo intelecto, pela emoção, pelo caráter do EU,
que entra em relação com o outro. Cada ser humano é a história de suas relações
sociais, perpassadas por antagonismos e contradições de gênero, classe,
raça/etnia.
Mesmo com todos os avanços durante os tempos, delinquir tem seu preço, o
indivíduo é punido e paga pelo delito cometido. O que não mudou muito foi o local em
que se cumpre a pena, haja vista que o problema do Sistema Penitenciário Nacional, está
na superlotação e nas violações de direitos, cometidas diariamente dentro dos presídios.
Tratando-se do universo carcerário destaca-se:
O sistema carcerário não foi pensado para as mulheres até porque o sistema de
controle dirigido exclusivamente ao sexo feminino sempre se deu na esfera
privada sob o domínio patriarcal que via na violência contra a mulher a forma de
garantir o controle masculino (RAMOS, 2011, p. 12).
Tenho mais duas meninas e um menino, estão com minha mãe e irmã
(Entrevistada nº 06)
Tenho uma menina de um ano e quatro meses, mora com minha mãe (Entrevista
nº 03)
“Tenho seis filhos, não tenho paciência pra estudo, aqui eu também não
trabalho, aqui é muito difícil”. (Entrevistada nº 09)
“Tenho dois filhos, minha mãe veio na visita e a assistente social deu o papel
com meu nome pra ela ajeitar meu bolsa família e ficar recebendo meu bolsa
família” (Entrevistada nº 02)
Essas mulheres, geralmente não são viciadas em drogas, entram nesse tipo de vida
ligadas pelo elo emocional com algum parente ou até mesmo o companheiro. As mães
entrevistadas em sua grande maioria tinham como companheiros, homens que já viviam no
mundo das drogas, sejam como traficantes ou usuários.
Os delitos cometidos pelas mães entrevistadas dividem-se em, um homicídio: uma
receptação e os demais tráfico, com outro dado relevante, apenas duas mães das que foram
detidas por tráfico não estavam levando a droga para o companheiro no presídio.
“Não dei sorte, fui levar pra meu marido, mas na hora de passar pela revista eu
caí de lá já vim direto pra cá, hoje ta nós dois preso” (Entrevistada nº 02)
“Cheguei pra visitar meu marido grávida, passei pela revista a agente fez o
toque em mim e não encontrou nada, quando eu estava na cela com ele, eles
(agentes)chegaram falando que tinham recebido uma denúncia, e encontraram
maconha no bolso dele, fui tirada da cela e a agente disse que me revistou e fez
o toque e não achou nada, mas não teve jeito e eu desci pra cá” (Entrevistada nº
04)
A mulher quase nunca abandona seu companheiro quando este é preso, e sempre
vai à visita e nessas idas acaba cedendo e levando droga para seu companheiro o que
acarreta muitas vezes em sua prisão.
Vale salientar, que o papel da mulher no tráfico é subsidiário a elas é destinado um
papel inferior, tido como ―mula‖, a que leva a droga ao presídio ou aviãozinho aquela que
vende pequenas quantidades. Estando este fato muitas vezes ligado pelo afeto,
principalmente no que se refere aos companheiros dessas mulheres, e vêm suas vidas
transformadas maneira drástica.
A partir das indagações e respostas dos sujeitos entrevistados nesta categoria, fica
evidenciado que a condição econômica dessas mulheres é extremamente baixa, que a
educação escolar oferecida para elas dentro da CPFB, não tem nenhum atrativo.
Percebe-se que a entrevistada insere na sua fala o seguinte termo ―Como deixei ele
nesse mundo‖, confirmando o sentimento de culpa por não poder estar ao seu lado,
guiando e orientando, com essa fala a entrevista expõe a dor de saber que o filho encontra-
se também no mundo do tráfico.
Ao entrevistarmos a Chefia Executiva ela nos explicou como funciona e quais
critérios para a visita íntima, ocorre na CPFB, aos sábados das 08:00 às 12:00 a entrada e
às 16:00 a saída, hoje não há mais pernoite, acontece na própria cela, tendo a visita íntima
duração de duas horas, caso haja mais de uma mulher na mesma cela com visita íntima, o
horário será revezado entre elas.
Ressalta-se porém, que mulheres que estão no berçário, ou seja, as gestantes a partir
do sexto mês e as lactantes não têm direito à visita íntima, pois como os encontros são
realizados nas próprias celas e no berçário existem as crianças, elas mães não podem
manter visita íntima.
No entanto, para que possa ser autorizada a visita íntima, alguns aspectos devem ser
respeitados como, a presa deverá passar por exames e o seu companheiro fazer a
carteirinha de acompanhante.
Com relação a visita íntima nos chamou atenção o relato da entrevistada nº 05:
“Todo domingo meu marido traz minha mãe, mas ele espera ela fora da
Colônia, tenho muita vergonha desse lugar, isso aqui é um inferno, já fui muito
humilhada, não desejo isso aqui pra meu pior inimigo”.
“Meu maior desejo aqui é ir pra casa, aqui eu não tenho esse desejo, aqui eu
sou uma mulher morta”.
A fala da entrevistada é reveladora, uma vez que, para ela, o fato de estar presa é
como se ela não tivesse o direito a nada, muito menos de ter desejo, deve ser castigada
mesmo. Isso demonstra o quanto as mulheres se anulam, como não se reconhecem como
mulheres, e não devem sentir desejo.
O critério segundo a Chefia Executiva é o seguinte, quando inicia-se um
relacionamento, comunica-se ao setor psicossocial e passa a contar daquela data seis meses
para o primeiro encontro, caso as presas estejam na mesma cela, estas são separadas.
Durante esse tempo as mulheres passam por exames, após o resultado, precisam de
pareceres da saúde, segurança, psicossocial e por último da chefia executiva da CPFB, só
assim estarão aptas para o primeiro encontro conjugal, que ocorre no mesmo horário dos
demais encontros conjugais, aos sábados.
Esse prazo de seis meses é estabelecido segundo a Chefia Executiva, para que a
troca de parceiras, não seja uma constante na Colônia, pois como muitas nunca
mantiveram relacionamentos homoafetivos, a troca de parceiras as vezes é muito comum
entre as mulheres.
Entre as entrevistadas, precisamente a entrevistada nº 11, mantêm uma relação
homoafetiva e está prestes a ter seu primeiro encontro conjugal: “A gente já fez os exames
e nesses dias vai ser nosso primeiro encontro, é a primeira vez que tenho namoro com
mulher, tô muito bem com ela”
Com a distância da família, e a solidão do cárcere as mulheres desenvolvem o que
elas chama de homossexualidade de momento, na grande maioria estas mulheres quando
saem da prisão voltam a terem relacionamentos heterossexuais.
Contudo, o que percebe-se com os relados obtidos nesta categoria, é que a visita
não é uma constante na vida dessas mulheres privadas de liberdade, a visita familiar em
sua maioria não acontece com frequência devido alguns fatores, como distância da Colônia
e a falta de condições financeiras. Com relação a visita íntima as mães que estão no
berçário não podem manter encontros conjugais, devido ao local em que acontecem, pois
se trata de um berçário.
“Sim, tem respeito sim, fazer o que? Aqui é assim, falta tudo, principalmente pra
os bichinhos (filhos)” (Entrevistada nº04)
“Tem respeito sim, aqui é tudo certo com a gente, só é muito difícil, falta muito
as coisas” (Entrevistada nº02)
“É sim respeitada, mas é ruim demais aqui falta tudo” (Entrevistada nº 09)
O que percebe-se é que essas mulheres não fazem ideia do que é respeito e dos
direitos que elas possuem, acham que por terem ido contra as regras da sociedade, têm que
pagar sendo castigadas, como também associam muito o respeito as necessidades básicas
materiais, é o ―ter‖ para serem de fato respeitadas.
Conclui-se nesta categoria, o quanto as condições sub-humanas do espaço, não
atingem o que elas entendem como respeito, dignidade, o exercício da maternidade é feito
sob regras do estabelecimento prisional.
Momento da separação
Nesta categoria iremos analisar um aspecto imprescindível, sobre o tema que
estamos discutindo, o momento da separação entre mães e filhos que vivem em
estabelecimentos prisionais. Nesta categoria iremos relatar a omissão da Lei sobre o tempo
de permanência da criança junto à mãe, e a realidade aplicada na CPFB, sobre quais
aspectos se dá esta separação.
Durante conversa com a Chefia Executiva, na CPFB, ficou evidenciado que
crianças e mães dormem na mesma cama, por motivos sentimentais conforme relato
abaixo:
“Os berços foram abolidos, pois as mães não utilizavam, e é difícil obrigar,
acho que pelo pouco tempo que passam com os filhos preferem dormir
abraçadas a eles”.(Chefia Executiva)
Contudo, durante a entrevista com as mães elas relatam que não é confortável
dormir com seus filhos na mesma cama, como também dividir este espaço que já é
pequeno com outra mãe e outra criança, torna-se um incomodo, haja vista, que se um chora
acorda de imediato a outra criança. Ficando evidente o desconforto na fala abaixo:
É muito ruim dividir a cama, o colchão é muito fino eu tenho dor nas costas
nessa cama de cimento, imagina a bichinha, pequenininha nessa cama, eu fico
bem encolhida pra não bater nela, muito novinha, tenho medo de machucar”
(Entrevistada nº05)
A fala da entrevistada se opõe ao que é dito pela Chefia Executiva, uma vez que o
local onde funciona o berçário, ficaria difícil colocar berços, pois é muito pequeno, para
abrigar móveis e pessoas que se locomovem naquele ambiente.
Com relação ao critério de separação na CPFB, dar-se-á por volta dos seis meses de
vida do bebê, todas as mães entrevistadas sem exceção, falam que é melhor o filho fora da
prisão, mas ao mesmo tempo expressam muito sofrimento ao falarem do momento da
separação com seus filhos. Tanto as que já passaram por este momento como as que estão
perto de vivenciarem este terrível e doloroso dia.
Como expõe abraçada ao filho e chorando, a entrevistada de nº 02:
“Domingo mãe vem buscar ele, não gosto nem de falar, vou ficar muito tempo
sem ver ele, porque mãe não tem dinheiro pra vir me ver, passa seis mês para
vir, acho que ele nem vai mais me conhecer”.
Nesse sentido, podemos observar a dor dessa mulher, que vive a maternidade
integralmente por vinte quatro horas, e de uma hora para outra sem nenhum preparo,
rompe esse laço, a criança é retirada de forma ríspida, causando um sofrimento desmedido
para ambos.
Muito emocionada a entrevistada nº 09 descreve o dia que sua filha foi embora:
“Era dia trinta de dezembro, me agarrei com ela e gritava pra ela não ir, pedi
tanto que deixassem eu passar o ano novo com ela, mas não teve jeito. A menina
foi embora eu chorei tanto, foi uma dor tão grande que eu nunca senti uma coisa
daquela. Vim aqui falar com a senhora, mas não olhei pra o berçário, eu não
gosto de ficar vendo as outras mães com os filhos, eu lembro muito dela, quando
ela foi embora pedi na mesma hora pra subir pra o pavilhão”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Constata-se que condições em que vivem mães e filhos, contempla um universo
triste, uma realidade comovente, onde fica claro a negação da condição de ser mulher. O
problema percebido, é que o sistema carcerário ao negar as peculiaridades existentes no
mundo feminino comete violações e injustiças perante essas mulheres.
Partindo do princípio da dignidade da pessoa humana, percebe-se que este não faz
parte da rotina das mães e filhos que estão na CPFB. Contudo, mesmo com esforço por
parte da administração prisional da Colônia para adaptar o local para um universo
feminino, tendo em vista, que o prédio foi construído para ser uma cadeia pública
masculina, as condições são desumanas e apresenta situações que levam a entender como
distante está desse princípio ser aplicado.
Quanto ao período de permanência das crianças nos estabelecimentos prisionais, a
legislação trata apenas do período mínimo, que é o da amamentação, já o período máximo
de convivência a legislação é omissa, ficando o critério de separação com a diretoria dos
estabelecimentos prisionais, especificamente na CPFB, o prazo máximo é o de seis meses
de idade, devido à falta de estrutura em acomodar essa criança.
É inquestionável que a convivência entre mães e filhos é de fundamental
importância, principalmente no início da vida da criança, porém em condições dignas de
sobrevivência. Entretanto, mesmo em condições precárias do cárcere, as mães querem seus
filhos por perto, acreditam que eles estão melhor em suas companhias.
Desta forma, conclui-se que mesmo havendo leis que asseguram muitos direitos as
mães com pena privativa de liberdade que convivem com seus filhos no cárcere, elas ainda
estão pendentes de eficácia, como também os legisladores precisam enxergar as
necessidades do ser mulher, que ela tem que ter um tratamento diferenciado.
REFERÊNCIAS
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no 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal, para assegurar às mães presas e
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COSTA, Elaine Cristina Pimentel. Amor Bandido – As teias afetivas que envolvem a
mulher no tráfico de drogas. Maceió: EDUFAL, 2008.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008
RICHARDSON, Roberto Jarry. Pesquisa social: métodos e técnicas. 3 ed. São Paulo:
Atlas, 1999.
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construcción cultural de la diferencia sexual. México, Miguél Porruá, 2000.
O ESTIGMA DA LOUCURA: em interface com o campo de gênero
RESUMO
Diante da polarização política e social do nosso país, a qual colocou o Movimento
Feminista e a Luta Antimanicomial novamente em evidência, o artigo busca abordar dois
segmentos historicamente marginalizados trabalhando com as mulheres e com a loucura.
Tendo como proposta central a problematização da interseccionalidade das formas de
opressão pelo gênero, o machismo e pela patologia, a psicofobia. Através de um recorte
sócio-histórico pelos registros da loucura e das mulheres no Ocidente, um tema emergente
diante da tendência de estigmatização aos dois segmentos. Trabalhando ainda, o conceito
de Gaslighting, assim buscando contribuir com a compreensão da violência contra a
mulher para além da violência física. Bem como a promoção de políticas públicas que
levem em consideração a relação de biopoder exercido sobre as mulheres que apresentam
algum transtorno psiquiátrico. Tendo como objetivo problematizar o machismo estrutural e
fomentar o debate sobre a relação de opressão pelo gênero e pela condição psíquica no
campo dos Direitos Humanos.
INTRODUÇÃO
1. A LOUCURA HISTORICIZADA
2. AS MULHERES NA HISTÓRIA
Ainda segundo Zanello (2010), as mulheres representam setenta por cento dos que
utilizam de forma abusiva ou prolongada os benzodiazepínicos no país. Indícios de como a
saúde mental das mulheres brasileiras tem sido negligenciada. Compreendemos que se o
fator de gênero fosse levado em consideração na prevenção, na promoção e na atenção em
saúde mental, provavelmente o adoecimento entre mulheres seria minimizado.
O modelo de atenção à saúde, hegemônico, não abre espaço para a exploração de
novas possibilidades existenciais para as mulheres, na medida em que está
centrado no sintoma, na doença e na crença da neutralidade das técnicas e
intervenções, o qual funciona como dispositivo de normatização social, de
disciplinarização das atitudes e docilização das forças de ruptura. (CARVALHO;
DIMENSTEIN, 2004, apud ZANELLO, 2010, p.309).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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RESUMO
A referida pesquisa traz discussões interligadas entre os campos da Educação, Gênero, Literatura e
Teoria do Imaginário. Apresenta uma reflexão acerca das construções imagéticas de gênero
presente no pensamento literário-pedagógico de Cida Pedrosa. Assim, determinou-se como
objetivo geral neste estudo: Compreender quais as construções imagéticas de gênero presente no
pensamento literário-pedagógico de Cida Pedrosa. Os principais autores que referenciaram a
presente pesquisa foram: Durand (1994), Butler (1998), Pitta (2005) Freire (1998) e Mariano
(2005). A considerar a pesquisa bibliográfica, exploratória e descritiva, elementos indispensáveis a
essa construção. O estudo dessas obras configura a dicotomia: literatura e prática pedagógica, tendo
na pesquisa bibliográfica todo o apanhado que dará suporte a investigação de documentos
necessários à discussão proposta. A discussão relatada nesse estudo foi de que o gênero é uma
constituição social, a partir de concepções de imaginário constituidos socialmente, e que a arte
literária como expressão do sensível, possibilita uma resignificação aos modelos impostos pela
cultura, observados a partir da análise da obra literária de Cida Pedrosa.
INTRODUÇÃO
Dar sentido a vida e ao mundo são questões que a companha o homem e que
fizeram constituir suas relações filosóficas, políticas, religiosas e sociais. A perspectiva do
imaginário considera que nada para o ser humano é insignificante. E dar significado
implica entrar no plano do simbólico (PITTA, 2005 p. 13). O simbólico é aqui
compreendido como oportunidades de criação e libertação. Possíveis de criar uma conexão
do eu com o mundo. Butler (1998) considera que é nas práticas performativas de reiteração
que se dão através da dimensão simbólica da linguagem e da cultura, as relações, a partir
de então os corpos tornam-se passíveis de serem pensados.
Lidar a educação com filosofias redutoras é deixar de lado o diálogo, o debate com
o que é múltiplo, assim, questiona-se a representação, modelos que detêm o poder da
política social. A discussão de gênero compreende que a ausência da representatividade de
mulheres é um gerador de conflitos, pois está nessa prática uma relação de controle, nesse
sentido, é necessário realizar críticas às identidades, que naturalizam e imobilizam os
movimentos, para que o feminismo possa surgir fundado em pilares diferentes e se libertar
da construção de uma única identidade, um modelo de mulher que exclua as demais
(OLIVEIRA, 2016, p. 5)
desde criança
uma pergunta lhe ronda a língua
por que deus se preocupa tanto
com o que as mulheres carregam entre as pernas
a morada de vênus
foi cortada para o bem de toda a tribo
e a felicidade da fé
no lugar do amor
um espinho foi cravado
e no sangue de donzela
foram jogadas cinzas
excisão no corpo
de alma já infibulada
a fé de khady é a dor
e o rastro de deus é uma fístula
que de vez em quando parte em transumância
rumo ao ocidente
Kandhy com alma infibula carrega a dor que questiona. É perceptível aí, o que na
teoria do imaginário é tratado como função da imaginação simbólica, a qual tem uma
função transcendental, ou seja, ela permite que se vá além do mundo material objetivo
(PITTA, 2005, p. 38). Essa construção mítica calca-se na consideração que a poesia
é um estruturante da vida social. O trajeto antropológico apresentado por Durand é
compreendido como o percurso que fazemos e que nos constrói, nos mostra o papel que os
símbolos apresentam na construção do imaginário e as estruturas que os mesmos carregam.
Estruturas estas que dão resposta à questão fundamental do homem que é a sua
mortalidade (PITTA, 2005 P.23). Atrela-se a Kendy a estrutura noturna, compreendido
como regime que busca conhecimento, a construção de uma harmonia.
cargo maior
só o do dono-presidente e seu filho ronaldinho
A Teoria do Imaginário privilegia o simbólico, esse que foi tão negligenciado pelo
fazer científico ao longo da história, a possibilitar a elaboração de discursos outros.
Hermenêutica atrelada a diversos campos do saber constitui-se pelo princípio que a relação
entre natureza e cultura são estabelecidas através do imaginário.
REFERÊNCIAS
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ano II, janeiro/2009. Disponível em http://br.monografias.com/trabalhos915/educacao-
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DENZIN, Norman K. O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens.
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DURAND, Gilbert. L‟Imaginaire. Essai sur les sciences et la philosophie de l‟image.
Paris: Hatier, 1994.
RESUMO
Um dos traços característicos da contemporaneidade é o fato de que as formas como as
manifestações da sexualidade são encaradas possibilitou a alteração sobre a maneira de
experienciar as Performances Sexuais e as Sexualidades como um todo. Em decorrência do
crescente debate acerca da realização de cirurgias de Transgenitalização, bem como a
crescente procura por tratamentos hormonais, que lançaram um olhar diferenciado para o
fenômeno da Transexualidade. Este trabalho tem como proposta central investigar sobre a
realidade da população transexual nos países-membros da CPLP- Comunidade dos Países
de Língua Portuguesa. Visando a afirmação dos Direitos Humanos, esperamos,
evidentemente, contribuir com a compreensão do fenômeno da transexualidade, bem como
o fortalecimento das relações entre a Comunidade Lusófona. Além de problematizarmos a
necessidade de políticas públicas que possibilitem a diminuição da violência de gênero
dentro da Comunidade, especialmente, diante da problemática da Transexualidade.
Fomentando o diálogo e a pesquisa acerca da Transexualidade e da Lusofonia, ressaltando
o poder da diplomacia no campo dos Direitos Humanos.
INTRODUÇÃO
1. A CATEGORIZAÇÃO DA TRANSEXUALIDADE
A categorização da transexualidade é recente, data do início do século XX e foi
fortemente influenciada pelo discurso médico. O trabalho de três pesquisadores foi
fundamental para que isso ocorresse; Harry Benjamin endocrinologista alemão, radicado
nos Estados Unidos, Robert Stoller psiquiatra e psicanalista americano e John Money
psicólogo e professor do Hospital Universitário John Hopkins em Baltimore, EUA.
(ARÁN, 2005; ARÁN; MURTA, 2009).
Para adentrarmos a problematização da categorização em si, se faz necessário
discorrer um pouco sobre a história da transexualidade. Retomando assim alguns
conceitos, dentre eles a diferenciação entre sexo e gênero e, consequentemente, entre
orientação sexual e identidade de gênero para posteriormente enveredar nas especificidades
da categoria transexual.
A diferenciação entre sexo e gênero também é uma construção recente e apresenta
desdobramentos em vários campos do conhecimento, principalmente nas Ciências
Humanas. As primeiras elaborações sobre o tema datam da primeira metade do século XX
e apresentam gênero como um registro cultural e sexo como uma marca biológica.
(MEAD, 1988; BEAUVOIR; 1980).
O conceito de gênero de acordo com Spizzirrii et al. (2014) sofreu forte influência
do Movimento Feminista, desde sua origem já carrega um forte registro político ao
problematizar toda uma construção social e discursiva sobre as representações de gênero.
Destacam ainda o papel do psiquiatra americano Robert Stoller que popularizou o termo no
campo psiquiátrico ao lançar o livro Sexo e Gênero em 1968.
Outra contribuição significativa nessa diferenciação foi dada pela historiadora
americana Joan Scott, ela definiu gênero como: ―[...] um elemento constitutivo de relações
sociais baseado nas diferenças percebidas entre os sexos, e o gênero é uma forma primeira
de significar as relações de poder.‖ (SCOTT, 1990, p.21). A autora ainda ao analisar o
percurso da conceituação do termo gênero, reafirma a influência do Movimento Feminista
na sua definição contemporânea.
Gradativamente o modelo binário que estabelecia sexo/biológico e gênero/cultural,
proposto ainda na década de 50, passou a ser questionado. A principal expoente da crítica a
essa lógica é Judith Butler (2010). A filósofa pós-estruturalista propõe que não apenas o
gênero sofre influência da cultura, mas que o sexo também é uma construção cultural.
Rompe assim, com uma lógica identitária e estabelece o conceito de performance para
problematizar as possibilidades de experienciar às representações de gênero.
Para finalizarmos essa etapa de conceituação e diferenciação entre sexo e gênero,
tomamos as palavras de Bento (2012, p. 264):
(...) podemos analisar gênero como uma sofisticada tecnologia social
heteronormativa, operacionalizada pelas instituições médicas, linguísticas,
domésticas, escolares e que produzem constantemente corpos-homens e corpos-
mulheres. (...) O sexo é uma das normas pelas quais o ―alguém‖ se torna viável,
que qualifica um corpo para a vida no interior do domínio da inteligibilidade. Há
uma amarração, uma costura, ditada pelas normas, no sentido de que o corpo
reflete o sexo, e o gênero só pode ser entendido, só adquire vida, quando referido
a essa relação. As performatividades de gênero que se articulam fora dessa
amarração são postas às margens, pois são analisadas como identidades
―transtornadas‖ pelo saber médico.
O recorte de Stoller de acordo com Arán (2003 apud ARÁN, 2005) é fortemente
influenciado pelo viés da patologização, aspecto herdado da tradição psiquiátrica que
perdurou do século XIX até meados do século XX, mesmo assim sua descrição da
percepção subjetiva do transexual é detalhada e ainda válida.
Contemporaneamente a questão mais urgente no campo da transexualidade é a
despatologização. Nesse sentido Bento e Pelúdio (2012) tecem uma análise pela via do
empoderamento como movimento de mudança da via da patologização. As autoras
defendem o gênero politizado como uma alternativa de saída do paradigma diagnóstico,
nessa defesa elencam aspectos que vão além da despatologização formal.
Atualmente, são mais de 100 organizações e quatro redes internacionais na
África, na Ásia, na Europa e na América do Norte e do Sul que estão engajadas
na campanha pela retirada da transexualidade do DSM e do CID. As
mobilizações se organizam em torno de cinco pontos: 1) retirada do Transtorno
de Identidade de Gênero (TIG) do DSM-V e do CID-11; 2) retirada da menção
de sexo dos documentos oficiais; 3) abolição dos tratamentos de normalização
binária para pessoas intersexo; 4) livre acesso aos tratamentos hormonais e às
cirurgias (sem a tutela psiquiátrica); e 5) luta contra a transfobia, propiciando a
educação e a inserção social e laboral das pessoas transexuais. (BENTO;
PELÚCIO, 2012, p. 573).
Diante das proporções territoriais do antigo Império Colonial Português vi, iremos
nos ater ao processo sócio-histórico de ligação entre as nove nações que compõem a CPLP.
Respectivamente: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial,
Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste. A cultura lusófona tem sua
origem no Império Português, Portugal iniciou através das Grandes Navegações um
movimento expansionista e de colonização de povos em vários continentes, destacando sua
presença na América, África e Ásia. Tornando o pequeno reino um expoente econômico
entre os séculos XV e XIX, esse período de apogeu foi graças à dominação dos povos
oriundos dos territórios dominados e exploração dos recursos dessas colônias.
Muitos atribuem o êxito dessa expansão devido ao pioneirismo de Portugal como
Estado Moderno. Diante da expulsão dos mouros da Península Ibérica e a separação do
então Reino da Galícia, Portugal foi o primeiro Estado europeu a se consolidar e assegurar
uma unidade territorial e governamental. Perpetuando essa unidade praticamente de forma
inalterada desde a Idade Média, apesar de rupturas dinásticas e institucionais como o
período da União Ibérica, posteriormente o advento da Repúblicavi e a Ditadura de
Salazarvi. (MARTINS, 2014).
A unidade política e territorial, aliadas a posição geográfica privilegiada propiciou
um cenário fértil ao expansionismo. Não existe consenso sobre o marco inicial desse
período, alguns historiadores creditam a conquistavi das ilhas Canárias em 1336 e outros a
Ceuta em 1415 como o início do expansionismo português. (MARTINS, 2014). Dos países
ex-colônias que agora são membros da CPLP, o primeiro a ser conquistado foi Guiné-
Bissau. O navegador português Álvaro Fernandes chegou à Guiné em 1446.
Cabo Verde por sua vez, foi alcançado por Diogo Gomes em 1456. Diferentemente
da Guiné, Cabo Verde era um arquipélago desabitado. Sua povoação se deu de acordo com
Mourão (2009), devido à miscigenação entre os colonizadores portugueses e os africanos,
em sua maioria de origem guineense, que eram levados ao arquipélago para servir ao
tráfico negreiro. Ainda segundo a autora a povoação de Cabo Verde seria uma
consequência do período colonial.
As ilhas de São Tomé e Príncipe também estiveram desabitadas até 1470, quando
os navegadores portugueses João de Santarém e Pêro Escobar as conquistaram, passaram a
ser chamadas de Província Ultramarina de São Tomé e Príncipe. Também foram os
navegadores portugueses os primeiros europeus que exploraram o golfo da Guiné em 1471.
Fernão do Pó teria sido o responsável pela conquista do atual território da Guiné
Equatorial.
Posteriormente Portugal e Espanha firmaram dois tratados; o de Santo Ildefonso
assinado em 1777 e o de El Pardo assinado em 1778. Ambos tratavam do controle dos
países sobre colônias no Rio da Prata e do Golfo da Guiné. Portugal cedeu o território da
atual Guiné Equatorial e o controle da Colônia de Sacramento, atual Uruguai em troca da
posse de territórios nos pampas gaúcho e catarinense.
A conquista de Angola é atribuída ao explorador português Diogo Cão em 1482.
Mesmo esse território já sendo habitado por vários povos, dentre eles se destacavam os que
formavam o Reino de Ngola e o Reino de Matamba. A exploração portuguesa se deu
principalmente através do tráfico de escravos originários dos povos conquistados do atual
território angolano, na época conhecido como Estado da África Oriental para a exploração
no Brasil. (ANGOLA, 2017).
Ficou a cabo de Vasco da Gama o feito da conquista de Moçambique em 1497.
Resultante da rota de exploração de contorno do Cabo da Boa Esperança, atual território da
África do Sul, para acesso aos mercados orientais. Aos poucos outros exploradores
portugueses se estabeleceram no atual território moçambicano, dando origem à África
Oriental Portuguesa. O Brasil por sua vez, foi conquistado pelos portugueses em 1500 pela
esquadra de Pedro Álvares Cabral. Mesmo já sendo habitado por vários povos de origem
pré-colombiana, calcula-se que eram em torno de cinco milhões de indivíduos vivendo no
território na época da conquista portuguesa. (HAAG, 2010).
O Brasil logo se tornaria a colônia mais próspera do Império Português, as
atividades econômicas desenvolvidas pelos colonizadores passaram a demandar por mão
de obra, os povos indígenas foram inicialmente utilizados. Mas logo foram substituídos
pelos africanos escravizados, principalmente de origem angolana. Estabelecendo uma
relação de dependência do Brasil da mão de obra angolana, mas com o lucro final da
comercialização retido pelo poder central de Lisboa. O Padre Antônio Vieira ainda no
século XVII ilustrou bem essa relação, fazendo uma crítica às elites da colônia; ―Sem
pretos não há Pernambuco e sem Angola não há pretos. (...) O Brasil que vive e se alimenta
de Angola.‖ (VIEIRA, 1648 apud GOUVÊA, 2001, p. 285).
O último dos países-membros da CPLP conquistados por Portugal foi Timor-Leste,
que tem como primeiro registro uma carta de Rui de Brito Patalim ao rei Manuel I de
Portugal, datada de 6 de janeiro de 1514. Posteriormente a conquista documentada pela
carta de Rui de Brito Patalim, passou a ser explorado como colônia, sendo chamado de
Timor Português.
Antes de analisar os reflexos do longo período colonial no qual Portugal exerceu
domínio sobre os demais países da atual CPLP. Temos que refletir sobre o próprio conceito
de Lusofonia, que para muitos se restringe a comunidade de nações que partilham da
Língua Portuguesa. Mas se levarmos em consideração fatores macropolíticos, engloba uma
série de outros aspectos culturais, sociais e econômicos.
A independência das antigas colônias não limitou a expansão da Língua Portuguesa
e a influência da cultura Lusófona. Especialmente a Independência do Brasil que ocorreu
sete de setembro de 1822, sendo o primeiro dos atuais membros da CPLP a se libertar do
domínio português. A Independência do Brasil ocorreu ironicamente pelas mãos de um
português, coube a Dom Pedro I decretar a separação do Brasil de Portugal.
O Brasil devido às suas proporções continentais, atualmente conta com a área de
8.515.759,090 km2, (IBGE, 2017), além do dinamismo econômico, naturalmente exerce
uma liderança continental emergente desde o período do Segundo Império. É membro
fundador do MERCOSULvi, UNASULvi, CPLP e do BRICSvi. Exerce liderança econômica
e cultural sobre parte significativa das nações sul-americanas e lusófonas.
Fora o Brasil a independência dos demais territórios foi relevante para a atual
situação das relações na comunidade lusófona. A Independência de Guiné Equatorial,
território cedido por Portugal à Espanha desde 1778, ocorreu em 12 de outubro de 1968.
Sendo o primeiro país a se tornar independente entre as ex-colônias na África.
As colônias portuguesas na África teriam um caminho sangrento até conseguir a
independência. Em meados da década de 1960 começaram a ocorrer incidentes entre as
forças coloniais e grupos nacionalistas de resistência armada. O clima de revolta nas
colônias emergia como ilustra as palavras do líder revolucionário Amílcar Cabral:
Toda a educação portuguesa deprecia a cultura e a civilização do africano. As
línguas africanas estão proibidas nas escolas. O homem branco é sempre
apresentado como um ser superior e o africano como o inferior. As crianças
africanas adquirem um complexo de inferioridade ao entrarem na escola
primária. Aprendem a temer o homem branco e a terem vergonha de serem
africanos. A geografia, a história e a cultura de África não são mencionadas, ou
são adulteradas, e a criança é obrigada a estudar a geografia e a história
portuguesa. (CABRAL, 1978, p.64 apud CASSAMA, 2014, p. 27).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
BARBOSA, Bruno Cesar. ―Doidas e putas‖: usos das categorias travesti e transexual. In:
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FONSECA, José João Saraiva da. Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza: UEC,
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Porto Alegre: Faculdade de Educação/UFRGS, Vol.6,1990.
RESUMO
Ao falar de prostituição, surgem diversas problemáticas que poderão ser tratadas acerca de
um tema que é tão comum de se discorrer, buscando-se uma visão diferente daquela
tradicionais, machistas e conservadoras. O presente trabalho tem como foco principal a
discussão sobre a prostituição feminina, dessa forma, propõe-se analisar os caminhos
percorridos na constituição da prostituição até suas nuances mais contemporâneas no
Brasil. Desse modo, busca-se, também, discutir o histórico da prostituição no Brasil bem
como as formas como o legislador tem tratado dessa temática no ordenamento jurídico
brasileiro, mas pontualmente em nosso Código Penal, fazendo um paralelo com os
sistemas políticos e jurídicos adotados por outros países no mundo. Por fim, busca-se
expor a diversas visões sob as quais feminismo aborda e expõe os princípios sobre a
prostituição da mulher.
Palavras-chaves: Mulher. Prostituição. Feminismo. Brasil.
INTRODUÇÃO
Diversas formas de olhares podem ser direcionadas a prostituição, hoje toma várias
subdivisões e setores da sociedade que antes não era explorada ou até mesmo não se tinha
conhecimento dessas pratica.
Inicialmente o presente estudo será direcionado a origem da prostituição, expondo e
analisando cada período marcante na história até o século atual, desse modo que possamos
compreender de uma forma simples.
Em seguida, passaremos a analisar tanto as disposições políticas e jurídicas
pertencentes ao nosso ordenamento, quanto aos modelos que outros grandes países de
primeiro mundo adotam para fazer a sua tratativa acerca da prostituição.
Chegando ao fim, examina os posicionamentos do feminismo a respeito da
prostituição, visto que é um dos movimentos mais marcante quando se fala sobre mulher,
dessa forma expor e refletir sobre os seus posicionamentos.
Diante desses expostos, o presente trabalho busca responder o seguinte problema de
pesquisa: quais as principais origens que constituíram a prostituição e suas reverberações
no direito e no feminismo? Especificamente, nos voltaremos às questões da prostituição da
mulher e do que algumas correntes feministas podem ser, em tese, consideradas
ultrapassadas para um movimento que busca a igualdade e liberdade da mulher perante o
universo masculino.
Objetivando compreender quais as principais origens que constituíram a
prostituição, os referencias teóricos se organização com vista aos subsequentes objetivos
específicos: 1) relatar as principais origens que constituíram a prostituição feminina; 2)
analisar os aspectos e o ordenamento jurídico brasileiro tão como os sistemas adotados por
alguns países do globo ao tratar sobre a prostituição; 3) expor e analisar as correntes
feministas que versa sobre a prostituição.
E essa pesquisa é justificada uma vez que o debate sobre a prostituição,
principalmente a prostituição de mulheres deve ser instigada como uma conscientização de
que o julgamento ou a vitimação posta por uma sociedade nem sempre é correta, ainda que
a sociedade em sua maioria não considere uma profissão como outra qualquer, tão pouco
uma digna, buscar compreender os fatores que levaram a essa escolha, bem como os outros
objetivos pertinentes a essa temática.
Por outro lado, buscar o aprofundamento da temática, em pesquisas acadêmicas por
mais que seja um trema constantemente trabalhado em pesquisas na área do Direito. Ao
fim, e pessoalmente falando, desenvolver uma perspectiva diferente sobre a temática que é
constantemente abordada.
No que tange este estudo foi realizado com o método dialético, a partir de pesquisa
bibliográfica, considerando autores que abordam o tema, sobretudo, acerca da sua origem,
legislação e posicionamentos dos grupos de feministas.
Dessa forma, utilizando artigos, dissertações, teses, selecionada de uma forma
crítica que abordaram sobre a temática de várias perspectivas, para a construção de uma
base teórica.
Enquanto a análise documental nas legislações pertinentes, como a Constituição
Federal de 1988, Código Penal, e outros registros legais sobre o tema.
Após toda analises dos conteúdos bibliográficos e documentais, realizaremos a
produção dos resultados e das discussões acerca do tema em desenvolvimento, bem como a
conclusão.
2 DESENVOLVIMENTO
Partindo das ideias que podemos ouvir no nosso cotidiano de como à prostituição é
considerada a profissão mais antiga do mundo. Podemos então partir da mitologia, onde se
acredita que surgiu a prostituição, mais especificamente, na época das Deusas, aonde
mulheres eram tratadas como divindades e que tinham poder sobre a sexualidade. Nos
templos onde foram construídos para adoração a essas divindades ocorria o início da
prostituição. E esse status de entregar-se para diversos homens tinha grande valor na
sociedade. (WAGNER, SANTIN. 2014)
Na Grécia Antiga, foi onde se deu início às práticas sexuais com fins lucrativos, o
Estado então começa a criar lugares distintos para a prática da prostituição, pode se dizer
que então surgiu os famosos bordeis, com consequência disto, os homens, em que hoje
poderiam chamá-los de ―cafetões‖, passaram a enriquecer com a ―venda do sexo‖. O
Estado visando tais lucros da ―venda do sexo‖ começa a cobrar impostos, para as casas de
bordeis manterem-se funcionando, assim, a prostituição se torna uma forma de
enriquecimento para ambos os lados. No entanto, nota-se que esse negócio não era um
monopólio comandado apena por homens, mas também por as famosas meretrizes, ou seja,
mulheres que tinha suas próprias casas de prostituição. (WAGNER, SANTIN. 2014)
Já no Império Romano, por volta do século VIII a.C., e por volta dos primeiros cinco
séculos d.C., a prostituição era aceita e comum. Nesse período o Estado também cobrava
impostos sobre o trabalho das profissionais. Os Romanos, no entanto, foram quem se deu
inicio de um sistema de cadastro feito pelo estado para aquelas prostitutas de baixa classe
fosse obrigada a se cadastrar nesse sistema, uma vez que era uma imposição do Estado
autoritarista, mas, como em toda regra sempre as os que militam contra, vislumbrando seus
males que causaria, nem todas as cumpriam uma vez que tinha seus pontos negativos,
como: uma vez cadastrados jamais poderia ser removida deste cadastro. E seu nome posto
como prostituta, ou meretriz como na época era denominado, elas sofreriam várias perdas
de direitos. E por mais que as mulheres romanas tivessem uma liberdade social como: sair
sozinhas, visitar templos, assistir peças teatrais, etc. Com a imposição do Imperador
Augusto, quando incorporou leis que diferenciava as mulheres, entre as de alta sociedade,
onde essa lei designava que o casamento, o lar e a procriação da família, era algo exclusivo
para aquela em que não tinha uma vida desonrosa, fácil, que não era prostituta. Já as de
baixa classe, as cadastradas como prostitutas tinham como consequência a perda de sua
liberdade e seguir um regulamento imposto pelo Estado. (WAGNER, SANTIN, 2014)
Com a queda do Império Romano, houve o período de migração das mulheres de aldeia
a aldeia oferecendo os seus serviços. Contudo, logo após, o cristianismo passar a ser a
religião oficial do império, a prostituição se transformou, antes não importava mais as
tradições daquele estado, apenas a vontade do Imperador, que todos deveriam seguir sua
religião e seus dogmas, assim passou a ver como um mal para a sociedade, e devendo
então ser erradicada. (WAGNER, SANTIN, 2014)
Chegando ao período de colonização do Brasil, Portugal quis fazer uma diferença entre
as prostitutas e as não prostitutas, assim surgiu à expressão ―moça de família‖ para
diferenciar as mulheres que vinha para o Brasil como acompanhantes de diversos homens -
a prostituta- das suas filhas e esposas que no português de Portugal a expressão ―moça‖
também é dita como ―puta‖ e consequentemente ―puta‖ no nosso português é utilizada para
denegrir a imagem de mulheres que não vivem de acordo com os padrões impostos pela
família tradicional brasileira, as prostitutas.
Em pleno século XX, no agir da Primeira Guerra mundial, a autonomia dos militares
proporciona as grandes nações o poder de escolhas para solucionar o ―problema‖ da
prostituição. Contudo, na França e na Alemanha abria bordeis regulamentado a torto e a
direita, para poder satisfazer as necessidades sexuais e fortalecimento do ego das tropas.
No século XXI, a prostituição tomou-se várias formas do que antes era conhecido, hoje
podemos encontrar garotas e garotos de programas, e não se limita ao meio hétero, também
se expande ao cenário LGBT. Ou seja, a prostituição tornou-se algo mais diverso e
complexo do que vimos a séculos passados.
Mesmo com toda essa complexidade, há países em que ainda tem o mesmo
posicionamento ou semelhante ao do Império, quando o Cristianismo se tornou a sua
religião oficial, consideram um mal para a sociedade e devendo ser extinta. Com o advento
das legislações, chega-se a criminalização de tal prática. Um exemplo é legislação dos
Estados Unidos da América.
Atualmente, algumas nações do globo estão vislumbrando algo que já vimos com os
nossos antepassados, só que de uma forma bem mais avançada a regulamentam da
prostituição como qualquer outra profissão. É exemplo delas a Holanda, Alemanha, Nova
Zelândia, Austrália, entre outros.
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Bom, diante de todo o exposto, conclui-se que a prostituição é uma forma do homem
poder materializar suas fantasias e desejos ocultos, quando não consegue realizar com suas
companheiras, assim, partindo da ideia de que suas esposas no que tange ao sexo, serve
apenas para a reprodução de sua linhagem, não poderia ter uma relação sexual de prazer ao
mesmo tempo.
Assim, ao longo dos séculos a prostituição foi se adequando as necessidades do Estado,
seja para ter uma vantagem de lucros aos seus cofres ou para a imposição de uma ideologia
religiosa, sem opção de escolha da mulher, tão pouco um planejamento para reinserir essas
mulheres na sociedade de forma digna.
Dessa forma ao passar dos tempos foi surgindo diversos sistemas que legisla sobre a
prostituição, inicialmente o Estado foi adequando a suas necessitas quando se trata de
prostituição, tratando como um mal para a sociedade e criminalizando toda e qualquer
forma. Outros, visando à autonomia da mulher, optam pela legalização, legislando então
por criação de medidas que possam garantir direita tão como uma proteção jurídica para
quem atual nesse setor.
Concluindo essa reflexão, não poderia deixar de citar os grupos de movimentos sociais,
onde feministas traz pontos de vistas totalmente opostos sobre a temática, dessa forma, eu
como feminista, parto da um misto das ideias. A prostituição é um fator social e quem é
incapaz de ser extinto, que o Estado na figura de garantidor de direitos e de manter o bem
estar social deveria criar políticas públicas de conscientização da sociedade, que posso
começar mudar os pensamentos moralistas, sexistas e ultrapassado, que a mulher pode ter
seu direito de dispor da maneira que entender do seu corpo, tanto como a criação de
direitos que possam lhe trazer uma proteção jurídica, dessa forma, garantindo-lhe direitos
humanos, e para aquelas que buscam na prostituição como uma única saída, que o Estado
possa lhe garantir uma segunda opção de escolhas, e dignidade ao deixar a prostituição.
REFERÊNCIAS
RESUMO
A pesquisa realizada buscou fazer uma análise sobre a crise migratória do século XX.
Sabe-se que as pessoas que se encontram em situação migratória são verdadeiras marcas da
falta de respeito do Estado para com a comunidade internacional, violações que se
alternam os motivos. Este trabalho teve como principais autores: Rosas (1995), Santos
(2003), Bailey (1963), Povesan (2001) e Freitas (2016). Utilizamos de método indutivo e
de abordagem qualitativa, usamos os benefícios da pesquisa bibliográfica, descritiva,
exploratória e técnica de análise de dados a partir da análise de conteúdo. O imigrante sofre
com questões de xenofobia pelos nacionais de países de fronteira ou por pessoas de países
acolhedores, onde o refugiado é tido como um risco, um perigo ou problema. Conclui-se o
relatório ao final com a percepção de que as pessoas que se submetem à situação de
refúgio são verdadeiras vítimas marcadoras da falta de respeito humanitária do seu Estado
para com elas, bem como são vítimas de uma sociedade corruptora de direitos individuais e
coletivos que assegura uma qualidade de vida ―digna‖ e por vezes encontram mais
violações depois que conseguem o refúgio e as violações em suas vidas acabam se
tornando ciclos viciosos.
Palavras-chave: Preconceito. Xenofobia. Intolerância. Refugiados.
¹O presente trabalho é parte da pesquisa monográfica realizada aos anos de 2016 intitulada como:
―Percepções e (Des)venturas de aluno de um curso de direito sobre pessoas refugiadas‖.
² Pós-Graduanda no curso Direito Processual Civil pela ESA/ OAB-PE. Graduada em Direito pelo Centro
Universitário do Vale do Ipojuca – DeVry|UNIFAVIP. Pesquisadora Voluntária no GEPIDH Mércia
Albuquerque. E-mail: lorennaverallyrds@gmail.com.
3
Aluna Especial do Mestrado em Direitos Humanos – UFPE. Graduada em Direito pelo Centro Universitário
do Vale do Ipojuca – UNIFAVIP|DeVry. Pesquisadora e extensionista no GEPIDH Mércia Albuquerque.
Extensionista no DHiálogos: ―Ciclo de Debates Sobre Sociedade e Direitos Humanos‖.E-mail:
Simone.gonzaga@outlook.com.br
4
Graduada em Direito pelo Centro Universitário do Vale do Ipojuca – DeVry|UNIFAVIP.
E-mail:jsuzanil@gmail.com
INTRODUÇÃO
A universalidade dos direitos humanos nasce com o advento da Declaração
Universal de Direitos Humanos de 1948, baseado na razão de que o indivíduo por ser, ser
humano é dotado de direitos, deveres e garantias fundamentais.
Posteriormente ao processo de universalização dos direitos humanos nasce o
sistema internacional de proteção, tendo o mesmo como cunho principal o resguardo
mínimo de direitos, para esse feito, sempre analisasse o princípio da ponderação e
equivalência.
Por sua vez, em concomitância ao sistema global, surgem os sistemas regionais de
proteção aos direitos humanos, sendo estes, o da Europa, África e da América.
Todos esses sistemas são complementares, os regionais seguem as normativas do
sistema global e ambos unidos ao sistema nacional garantem e proporcionam uma melhor
efetivação dos direitos individuais e coletivos do ser humano, pois assim como a mundo o
ser humano está em constante variação de seu ponto de vista. O autor Allan Rosas (1995,
p. 243) a respeito da síntese de direitos humanos defende que: ―o conceito de direitos
humanos é sempre progressivo. […] O debate a respeito do que são os direitos humanos e
como devem ser definidos é parte e parcela de nossa história, de nosso passado e de nosso
presente‖
Para ele os direitos humanos é algo que está em constante modificação, pelo motivo
de que o mundo e por consequência o indivíduo está em constante modificação seja pela
globalização seja pela renovação de conceitos e paradigmas.
O surgimento do sistema global de proteção aos direitos humanos em relação às
pessoas que se encontram em situação de refúgio se deu com o fim da Segunda Guerra
Mundial, onde tomamos conhecimento histórico das inúmeras perseguições, torturas e
violações realizadas pelos Nazistas em face de uma determinada raça.
Pautou-se o problema no seguinte questionamento: De que forma acontecem As
políticas migratórias para a inserção humanitária das pessoas refugiadas?
O objetivo geral que orientou a pesquisa foi analisar o cenário das políticas
migratórias do Brasil e suas ramificações.
Em se tratando dos objetivos específicos foram: Identificar os delineamentos da
política migratória atual no Brasil, bem como outro objetivo foi observar as violações de
direitos humanos nas práticas preconceituosas de xenofobia.
Com o crescente quantitativo de pedidos de refúgio no Brasil, os órgãos
competentes visando realizar de maneira correta o refúgio e os direitos dessas pessoas
enquanto refugiados. O Brasil foi um país pioneiro na promulgação interna de uma lei
específica para tratar do assunto. O Decreto 50.215, de 28 de janeiro de 1961, em
consonância com a Convenção de 1951 foi criado para esta finalidade.
De acordo com o Comitê Nacional para os Refugiados, o número total de pedidos
de refúgio mais que triplicou durante tal período (de 566 em 2010 para 2.008 até dezembro
de 2012). E a maioria dos solicitantes de refúgio vem da África, América do Sul e Ásia.
As pessoas que se encontram em situação de refúgio são vítimas de perseguições
em seus países, que podem ser de diferentes aspectos, à exemplo de perseguições por raça,
religião, nacionalidade, grupo social, opiniões políticas ou até graves violações de direitos
humanos.
A perseguição e a violência são atrocidades que estão longe de deixar a vida dos
refugiados, o deferimento do refúgio que antes era a salvação e única alternativa dessas
pessoas mudarem de vida, hoje é mais um degrau de sofrimento.
O autor Santos (2003) nos acrescenta com a seguinte reflexão: ―[...] temos o direito
a ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito a ser diferentes
quando a nossa igualdade nos descaracteriza‖. Daí a necessidade de uma igualdade que
reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as
desigualdades.
Por isso a necessidade e a importância de estudos mais aprofundados sobre a
afirmação de direitos e a inserção do imigrante refugiado no nosso país, como também o
direcionamento do olhar da sociedade no que se refere às oportunidades que lhes são dadas
e aos direitos fundamentais que adquirem as pessoas refugiadas a partir do momento do
deferimento do refúgio.
Apresentaremos o percurso metodológico do trabalho, onde este se fez de
fundamental importância para a realização da pesquisa. Abordaremos os métodos e as
técnicas que foram exploradas para a preparação do trabalho em questão. Da mesma
forma, serão evidenciados quais os instrumentos eleitos a coleta de dados.
Para a realização do estudo, foi utilizado o método indutivo, o qual permite que
através da observação de um contexto específico, possa-se chegar a conclusões mais
amplas, quão seja a construção de hipóteses sobre um dado universo (GIL, 2009).
A abordagem qualitativa, nesta pesquisa, articula-se com algumas categorias
analíticas extraídas da investigação a partir da técnica de Análise do Conteúdo. Que
envolve a preparação dos dados para análise e posterior categorização. No pensamento de
Minayo (1995, p. 21-22):
No tocante ao procedimento de pesquisa descritiva, Vergara (2000) nos diz que esta
é uma pesquisa que proporciona a identificação de um determinado universo, pois esta
expõe as peculiaridades considerando as variáveis pertencentes à definição da natureza do
objeto. Pode-se dizer ainda que esta pesquisa tenha o intuito de esmiuçar as peculiaridades
de uma determinada população.
A pesquisa também é classificada como descritiva, pois se utilizou técnicas
padronizadas para a coleta de dados, como aplicação de questionários, buscando conhecer
as diversas situações e relações que ocorrem no universo pesquisado.
Em se tratando da pesquisa exploratória, o uso desta tem como propósito interpretar
e analisar fatos. Esse tipo de pesquisa requer um maior investimento de teorização e
reflexão sobre o objeto a ser estudado. Para Gil (2009), com a pesquisa exploratória visa-se
identificar os fatores que levam a ocorrência de determinado fenômeno, explicando a razão
Observa-se que a análise de conteúdo é uma técnica de análise de comunicações.
Como retrata Chizzotti (2006, p. 98): ―o objetivo da análise de conteúdo é compreender
criticamente o sentido das comunicações, seu conteúdo manifesto ou latente, as
significações explícitas ou ocultas‖.
A análise de dados na presente pesquisa deu-se por meio da técnica de análise de
Conteúdo. Como forma de explorar e aprofundar uma melhor compreensão sobre a
percepção de estudantes de direito a respeito de direitos de imigrantes refugiados.
A escolha do tema deu-se pelo interesse em saber de que forma aconteceu a crise
migratória no século XX.
A provável contribuição dessa discussão dá-se por buscar discutir violações dos
direitos das pessoas em situação migratória.
A contribuição acadêmica deste artigo dá-se pela falta de pesquisas e publicações
sobre o tema, o que torna escassa o debate sobre políticas públicas voltadas para a questão
dos migrantes.
Faz-se necessário um debate no meio acadêmico sobre o tema, mostrando a
realidade da sociedade que ―acolhe‖ pessoas migrantes e a visão da sociedade acadêmica,
fazendo com que os pesquisadores voltem seus olhos para essa realidade.
Ainda em análise sobre a justificativa do tema, observa-se que, para a sociedade, é
de fundamental importância o estudo em questão, pois, o tema é bastante atual tendo em
vista que, a questão dos migrantes refugiados a cada dia alarma o mundo, diante da crise
humanitária existente, e o Brasil é um país de muitas leis, porém, muitas delas pendentes
de efetividade, considerando também a participação da sociedade civil, esta, que possui
uma significativa colaboração quanto as políticas de inserção e envolvimento social para
com as pessoas em refúgio.
Nesse diapasão, conclui-se a pertinência do presente trabalho, diante da efetiva
demonstração de cabimento de sua análise, na sociedade atual.
DESENVOLVIMENTO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
CHIZZOTTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2006.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar Projetos de Pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas,
2009.
MILESI, Rosita; CARLET, Flavia. Refugiados e Políticas Públicas. In: SILVA, Cesar
Augusto S. da. (organizador.). Direitos humanos e refugiados. Dourados : Ed. UFGD,
2012. Cap. 04, p. 77-98.
ROSAS, Allan. Economic, Social and Cultural Rights. Dordrecht, Boston, Londres:
Martins Nijhoff Publisher
RESUMO
INTRODUÇÃO
A equidade de gênero, como indutora do exercício do Estado Democrático de
Direito no contexto brasileiro, vem sido pautada por Organizações Internacionais como
práticas que caracterizam as relações baseadas em mulheres, para mulheres e por mulheres.
O que Arilha¹ (apud MEDRADO e LYRA, 2012) problematiza como a instrumentalização
do homem.
Ou seja, a inserção dos homens nas agendas dos direitos sexuais e reprodutivos,
como por exemplo nos documentos das Organizações das Nações Unidas (ONU),
considera a perspectiva quase que exclusivamente da viabilização da saúde e direitos das
mulheres, e não necessariamente como direito ou necessidade masculina.
Nesse sentido, a análise feminista do sistema gênero / sexo traz à luz – e faz a
crítica - que a organização social baseada em desigualdade, injustiça e hierarquia política
de pessoas baseadas no gênero produz aspectos nocivos e opressores, refletindo-se como
objeto de disputas de interesses e subterfúgios políticos (LAGARDE, 1996; RUBIN,
2012).
1. a divisão sexual do trabalho, que mesmo admitida, não pode considerar as relações
humanas como determinadas por papéis-estanque, e que sempre há a interrrelação das
ações e reações entre homens e mulheres;
2. a existências de espaços políticos para além do ―privado‖, não reconhecidos como tal
[políticos], por não atingirem ―as estruturas capitalistas de sustentação da sociedade‖.
Especificamente no tocante à ONU, que fora a princípio criada para preservar a paz
e segurança internacionais, ao se relacionar as ações pela equidade de gênero, estas se
deram desde a criação da Comissão sobre a Condição da Mulher, em 1946, como também
através de Conferências e elaboração de plano de ação de combate a opressão,
marginilização e à discriminação aos quais as mulheres são submetidas cotidianamente
(VIEIRA, 2016).
Portanto, com base no que foi problematizado até aqui, esse artigo questiona, diante
da ênfase dada à igualdade de gênero nos ODS, qual – e se há – a inserção dos homens na
Agenda 2030 da ONU, principalmente no que se refere ao Objetivo do Desenvolvimento
Sustentável nº 5 (Igualdade de gênero: alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas
as mulheres e meninas), como necessária ao fomento à equidade de gênero.
DESENVOLVIMENTO
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e a equidade de gênero... E os homens?
Com relação aos Direitos das Mulheres, Vieira (2016, p. 18-19) pontua alguns
marcos importantes estabelecidos na Organização:
1) I Conferência Mundial sobre a Mulher, em 1975, ―na qual se
declarou este ano como o Ano Internacional da Mulher e a década de 1975-1985,
como a Década da Mulher”;
Nessa perspectiva, os ODS estabelecidos em 2015 como agenda até 2030 vêm
ampliar o conceito com o olhar para a sustentabilidade quando abordam a igualdade de
gênero e o empoderamento de mulheres e meninas.
Serão vistos os sub-itens desse objetivo para analisar a inserção – ou não – do homem
com vias a sua concretude:
O que coloca o homem no lugar de dominação do corpo feminino de tal forma, que se
naturalizam ações que se apropriam, invadem e mutilam corpos de mulheres e meninas
pelo mundo; e - por que não dizer - de homens e meninos, principalmente àqueles que não
seguem os ditos padrões esperados de ser, estar, no mundo de forma masculina.
Na abordagem trazida pelo documento, pode-se afirmar que a igualdade de gênero deve
abarcar o conceito de equidade, incluindo, nesse sentido, as pluralidades, especificidades e
contextos nos quais as mulheres estão inseridas.
Por isso, (há) a necessidade de ampliação das mulheres nos espaços públicos, que
envolvam tomadas de decisão, para que as mulheres possam interferir na elaboração e
implementação de propostas que vejam a igualdade entre homens e mulheres como
condição imprescindível ao desenvolvimento humano e sustentável.
A promoção da igualdade de gênero deve incluir mulheres e homens, uma vez que não
devem ser reflexo do fato de uma pessoa nascer do sexo feminino ou masculino. Por isso,
pode-se afirmar que implica em desevolvimento sustentável centrado nas pessoas, na ótica
dos direitos humanos.
Nessa perspectiva não se pretende afirmar que os homens devem isso às mulheres,
incorrendo no equívoco de que os homens precisam acessar esses espaços com objetivo
único de melhorar a vida das mulheres.
A melhoria na qualidade de vida das mulheres deve ser vista como um dos reflexos da
divisão do trabalho, ao nível público ou privado, de forma igualitária e equânime para
homens e mulheres. O que influenciará inclusive positivamente, com vias à eliminação do
preconceito e discriminação sofridos pelas mulheres nos diversos espaços, principalmente
naqueles relacionados à tomada de decisões e poder.
Sendo a inserção dos homens, nesse sentido, algo a ser problematizado e buscado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
BELO, Maria Luiza. Políticas públicas ―do cuidado‖ e as promessas dos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável para a igualdade de gênero no Brasil. 2012.
BORTOLUZZO, Adriana Bruscato; MATAVELLI, Ieda Rodrigues; MADALOZZO,
Regina. Determinantes da Distribuição da (Des)igualdade de Gênero entre os Estados
Brasileiros. Estud. Econ., São Paulo , v. 46, n. 1, p. 161-188, Mar. 2016. Disponível
em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
41612016000100161&lng=en&nrm=iso>. acesso em 24 Abr 2017.
CAMURÇA, Silvia. Sobre o problema das desigualdades do gênero no desenvolvimento e
para a democracia. BUARQUE, H., et al. Perspectivas de gênero: debates e questões
para as ONGS. Recife, p. 164-175, 2002.
CELLARD, A. A análise documental. In: POUPART, J. et al. A pesquisa qualitativa:
enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis, Vozes, 2008.
CONNELL, Robert W.; MESSERSCHMIDT, James W.; FERNANDES, Felipe Bruno
Martins. Masculinidade hegemônica: repensando o conceito. Estudos feministas, p. 241-
282, 2013.
GEBARA, Ivone. Vamos pensar de novo a DEMOCRACIA? In: ______. Vulnerabilidade,
Justiça e Feminismos: Antologia de Textos. São Bernardo do Campo: Nhanduti Editora,
2010, p.123 – 127.
______. Política feminina, política feminista ou simplesmente política. In: ______.
Vulnerabilidade, Justiça e Feminismos: Antologia de Textos. São Bernardo do Campo:
Nhanduti Editora, 2010a, p.133 – 142.
GOLDANI, Ana Maria. Famílias e gêneros: uma proposta para avaliar (des)
igualdades. Anais, p. 1-20, 2016.
LAGARDE, Marcela, ―El género‖, fragmento literal: ‗La perspectiva de género‘. In
Género y feminismo. Desarrollo humano y democracia, Ed. horas y HORAS, España,
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MARQUES, Stanley Souza. Ampliar a licença-paternidade para despatriarcalizar o estado
e a sociedade. Revista Gênero & Direito, v. 4, n. 1, 2015.
MEDRADO, Benedito; LYRA, Jorge. O gênero dos/nos homens: linhas de uma proto-
genealogia. Ciência & Saúde Coletiva, v. 17, n. 10, p. 2579-2581, 2012.
RAGO, Margareth. Descobrindo historicamente o gênero. In: Cadernos Pagu, p.89-98.
Campinas: Unicamp, 1998.
RUBIN, Gayle ―Pensando o Sexo: Notas para uma Teoria Radical das Políticas da
Sexualidade‖, Tradução de Felipe Bruno Martins Fernandes, Revisão de Miriam Pillar
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Acesso em: 04 abr. 2017.
SALLES, Fernanda Cimini. O Papel da ONU e do Banco Mundial na Consolidação do
Campo Internacional de Desenvolvimento. Contexto Internacional, v. 37, n. 2, p. 347,
2015.
SPINK, Mary Jane et al. A produção de informação na pesquisa social: compartilhando
ferramentas. 1.ed. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2014 (publicação
virtual).
VIEIRA, Leonardo de Araújo. He for she: uma análise hermenêutica do discurso de
lançamento do programa da ONU mulher pelo engajamento masculino na luta pela
igualdade de gênero. 2016. 50 f. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em
Comunicação Social)—Universidade de Brasília, Brasília, 2016.
VÍTIMAS DA INVISIBILIDADE: ausência de direitos sociais as pessoas em
situação de rua
RESUMO
INTRODUÇÃO
3
Centro Universitário do Vale do Ipojuca, UNIFAVIP/DEVRY, Graduanda do curso de Direito,
iolandadireito@hotmail.com.
da rua, fosse o culpado por estar nessa condição. São pessoas que além de deveres,
possuem direitos previstos constitucionalmente, como qualquer outro cidadão. Porém, o
fenômeno invisibilidade social mostra que são esquecidas pela sociedade civil e pelo
governo.
Diante disso, estabelecemos o seguinte problema de pesquisa: Até que
ponto os direitos sociais previstos constitucionalmente das pessoas em situação de rua são
(ou não) efetivados e se essas pessoas realmente vivenciam uma situação de invisibilidade
social?
Diante desse problema de pesquisa definimos o seguinte objetivo geral: dar
visibilidade a dura realidade das pessoas jovens adultas que vivem em situação de rua,
descrevendo as dificuldades que elas enfrentam para efetivação de seus direitos. Para
consecução do qual foram definidos os seguintes objetivos específicos: descrever sobre as
características e realidade das pessoas em situação de rua e os direitos sociais; conceituar
invisibilidade social; analisar as histórias de vida de pessoas em situação de rua na cidade
de Santa Cruz do Capibaribe-PE.
Tal pesquisa justifica-se socialmente pelo fato de que o Estado tem o dever
de garantir as pessoas em situação de rua assistência através da efetivação de direitos
sociais necessários para sua integração social.
Já academicamente a relevância da pesquisa consiste em uma mudança de olhar,
saindo do pensamento acadêmico tradicional, sobretudo entre os acadêmicos do curso de
direito os quais na maioria das vezes optam por pesquisas mais jurídicas e menos sociais.
De acordo com o que se pretende discutir no presente artigo acadêmico, a
abordagem qualitativa, pois tal tipo de pesquisa preocupa-se com a qualidade e não com a
quantidade, buscasse significados atribuídos aos fatos que se observa, o pesquisador
procura participar, compreender, interpretar as informações que se seleciona, que se
obtenha a partir da averiguação.
Quanto ao método de pesquisa optamos pelo fenomenológico que, é bastante
adequado para tratar de questões humanas. Quando a pesquisa se trata da experiência de
vida das pessoas, deve-se usar principalmente o método fenomenológico, pois este tem
como ponto central a experiência de vida vivenciada. Silveira et al (2010, p. 03),
esclarecem que: “o fenômeno inclui assim todas as formas de estar conscientes de algo,
aí incluídos os sentimentos, pensamentos, desejos e vontades”. É a experiência do ser
humano de forma realista, deixando de lado o que é estabelecido pelas ciências naturais.
Os pontos de vista ou opiniões são deixados de lado pelo pesquisador, este,
obtém depoimentos sobre aquilo que está diante dos seus olhos, tal como aparece. É a
forma como as pessoas vivenciam a realidade. Em total consonância com Lopes e Souza,
(1997, p. 06), “é um caminho significativo para o pesquisador que, a partir de suas
inquietações, busca o fenômeno através de quem vivencia uma determinada situação”.
Portanto, o método fenomenológico explica acontecimentos vividos no dia a dia.
Já quanto às técnicas de coletas de dados, utilizaremos a pesquisa
bibliográfica e a história de vida.
No que tange à pesquisa bibliográfica, é básica e obrigatória seja qual for à
modalidade de pesquisa, foram escolhidos artigos e livros que a partir de conteúdos que
versassem sobre o assunto em questão, a saber-se, historia, realidade, invisibilidade
pública, direitos sociais, todos relacionados a pessoas em situação de rua.
A história de vida consiste na análise do discurso dos sujeitos, as informações são
obtidas através da própria pessoa de acordo com suas trajetórias pessoais e de informes da
sua vida pessoal de um ou de diversos informantes. Conforme nos diz Closs e Antonello
(2012, p.109), “uma história de vida ou história pessoal é um registro escrito da vida de
uma pessoa baseada em conversas e entrevistas”. O indivíduo pesquisado pode falar de
forma livre sobre sua experiência particular em relação ao assunto pesquisado. De acordo
com Spindola e Santos (2003), na historia de vida não é possível que o pesquisador
confirme a veracidade dos fatos, pois a pessoa que vivenciou tal fato é quem irá contá-lo
de acordo com o seu ponto de vista, isto sendo o mais importante no método historia de
vida, ouvir a pessoa que passou por determinada situação, o pesquisador terá que ouvir o
sujeito participante do estudo para então obter a reflexão deste sobre sua própria vida, pois
os aspectos mais particulares é o que fará a grande diferença nessa metodologia. Optamos
por esse método porque iremos estudar a história de vida das pessoas em situação de rua
para termos uma noção geral da realidade dessas pessoas.
Ao todo foram 04 (quatro) relatos de história de vida analisados, a pesquisa fornece
um indicativo de não efetivação dos direitos sociais previstos no artigo 6° da Constituição
Federal de 1988, em se tratando de pessoas em situação de rua neste município e uma
condição de invisibilidade social, chamando atenção para urgência no planejamento de
formas de efetivação de direitos sociais, quais sejam: educação, saúde, alimentação,
trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância
e assistência aos desamparados. Prioritários para indivíduos que vivem em situação de rua.
Desde tempos remotos que existem pessoas vivendo em situação de rua, nas
mais variadas civilizações.
Na civilização grega e no Império Romano, por exemplo, geravam pessoas vivendo
nas ruas na Idade Média, fenômeno este, sempre relacionado ao sistema de produção e
consumo, porém, houve um crescimento quantitativo de pessoas em situação de rua com a
acumulação primitiva, mudança no modo de produção capitalista que consistiu na
desapropriação de terras rurais, segundo Marx apud Silva (2006, p. 72): “o processo
histórico que dissociou o trabalhador dos meios de produção foi denominado por Marx de
acumulação primitiva exatamente por constituir, em sua visão, a pré-história do capital e
do modo de produção capitalista”.
Encontramos um melhor entendimento a respeito do surgimento das pessoas
em situação de rua nas palavras de (MELO, 2011, p.13), que resume em sua obra um
trecho da Carta Aberta ao Presidente da República Federativa do Brasil escrito no Segundo
Encontro Nacional sobre População em Situação de Rua, em 20 de maio de 2009, segundo
esse autor “o fenômeno população em situação de rua é antigo. Sua história remonta ao
surgimento das sociedades pré-industriais da Europa, no processo de criação das condições
necessárias à produção capitalista”. É possível notar que a vivência nas ruas tem em suas
principais raízes o trabalho, o sistema de produção e consumo e os que nessa condição
estão ou estiveram, foram ou são excluídos de todo esse processo.
Diante de todo esse contexto histórico, surge o pauperismo, são pessoas que
podem e precisam trabalhar, mas não conseguem se inserir no mercado produtivo,
Também podemos ter uma compreensão clara nas palavras de Silva (2006, p. 75):
“Portanto, o fenômeno população em situação de rua surge no seio do pauperismo
generalizado vivenciado pela Europa ocidental, ao final do século XVIII, compondo as
condições históricas necessárias a produção capitalista”.
As pessoas em idade produtiva perderam suas terras, moradia e sustento,
migraram para a cidade onde acontecia a Revolução Industrial, por volta do final do século
XIX e início do século XX, em busca de melhorias de vida, esses trabalhadores expulsos
de suas terras, como afirma Silva (2006), iniciaram a venda da sua força de trabalho no
mercado, mas não havia oportunidade para todos e nem todos sabiam desenvolver as novas
atividades, logo, o mercado dispensava essa força de trabalho oferecida, na perspectiva de
Silva (2006), as pessoas passaram a ser fonte de reserva de trabalho, e como consequência
da não inserção nesse novo modo de se conseguir o sustento, a rua passou a ser local de
sobrevivência, pessoas que antes podiam prover seu sustento e de sua família passaram a
ser mendigos.
O novo mundo capitalista surgido nesse período caracterizou-se pelo
processo de troca, ou seja, produção e consumo daquilo que é produzido, mas essas
pessoas oriundas do êxodo rural estavam totalmente fora desse processo e não conseguiam,
por mais que se esforçassem se inserir nesse novo mundo, devido às transformações tão
radicais e totalmente fora daquilo que antes era sua realidade na vivência campestre,
deixando-as sem escolha e as obrigando a irem morar na rua.
A impossibilidade de se inserir nessas indústrias, por motivos variados,
obrigou aquelas pessoas que antes eram trabalhadoras, que podiam prover seu sustento e de
sua família com o que produziam no campo, a serem pessoas sem expectativa de melhores
condições de vida e viverem uma vida de mendicância. No saber de SILVA (2006, p. 72):
“eles só começaram a vender a sua força de trabalho no mercado depois que lhes foram
roubados todos os meios de produção e foram privados das garantias e seguranças que as
instituições feudais afiançavam à sua existência”, em consonância com a autora citada,
percebemos que essas pessoas foram para os centros urbanos vender o único bem que lhes
restava, sua força de trabalho.
A respeito deste tema é necessário também realizarmos uma discussão teórica sobre
a forma como essas pessoas são vistas pela sociedade, sendo tal visão contraposta com o
posicionamento deles ante a realidade social.
2.1 Os indesejáveis sociais: como são vistas as pessoas em situação de rua pela
sociedade
PARTICIP I SE NATURALIDADE:
ANTE: 02 DADE: XO: Surubim/PE; há 30 anos reside em
Pedro 3 Ma Santa Cruz do Capibaribe/PE
4 anos sculino
TEMPO APROXIMADO EM PARENTES RESIDINDO NA
SITUAÇÃO DE RUA: CIDADE:
03 anos 05 Irmãos
CONTATO COM MOTIVO DE IR FILHOS
FAMILIARES: MORAR NA RUA: :
Tem contatos com os Após a morte dos pais Tem 01
irmãos filho
PARTICIP I SE NATURALIDADE:
ANTE: 03 DADE: XO: Recife/PE
Miguel 3 Ma
4 anos sculino
TEMPO APROXIMADO EM PARENTES RESIDINDO NA
SITUAÇÃO DE RUA: CIDADE:
Não tem noção do tempo Não tem
aproximado
CONTATO COM MOTIVO DE IR MORAR FILHO
FAMILIARES: NA RUA: S:
Não tem contato Perca de laços familiares e Tem 04
envolvimento com álcool filhos
PARTICIP I SE NATURALIDADE:
ANTE: 04 DADE: XO: Vitoria de Santo Antão/PE
Gabriel 5 Ma
3 anos sculino
TEMPO APROXIMADO EM PARENTES RESIDINDO NA
SITUAÇÃO DE RUA: CIDADE:
01 ano Não tem
CONTATO COM MOTIVO DE IR FILHOS
FAMILIARES: MORAR NA RUA: :
Não tem Perca de laços familiares, Tem 03
morte de familiares. filhos
Nesse subtópico iremos fazer uma analise da história de vida das 04 (quatro) pessoas
em situação de rua participantes da pesquisa. Para tanto organizamos o presente estudo em
três categorias analíticas, a saber: (1) Desinteresse no cumprimento dos valores e regras
sociais e a ida para a rua; (2) a vivência nas ruas e a não efetivação dos direitos sociais; e,
(3) o desprezo e a invisibilidade como sinais de sua percepção frente à sociedade.
Em relação à primeira categoria, desinteresse no cumprimento dos valores e
regras sociais. Conforme o relato dos próprios participantes a ida deles para a rua não foi
por opção, o envolvimento com álcool, desavenças familiares e falta de trabalho, são os
problemas mais citados, ou seja, são coisas das quais não conseguiram ter um controle. “O
vicio do álcool me fez ir morar na rua, geralmente quando a pessoa se separa da mulher
se joga na bebida, mente fraca. Depois arranjei uma dona de casa, comecei trabalhar,
mas depois cai de novo no vício” (Miguel). Outro informante contou que foi parar na rua
após ter sido preso por matar um homem que havia desrespeitado a sua filha que na época
era uma criança, após sair da prisão não tinha para onde ir e estava sem o apoio dos
familiares. “O camarada pegou nas partes intimas da minha filha, eu vi com meus dois
olhos, eu não aguentei, estava com uma faca, dei uma facada na bexiga dele, ele se foi, ele
pegou na minha presença e falou que sabia que eu estava armado, mas que não tinha
medo não e ai fez um pai, eu não me controlei ao ver essa cena4” (Gabriel).
4
Buscando padronizar a exposição das falas dos participantes da pesquisa, utilizamos o texto em
itálico e entre aspas, mantendo a forma de falar deles, sem realizar correções de concordância, nem
gramaticais.
Regras como cumprimentos de horários em trabalhos ficam, completamente
comprometidas devido o forte envolvimento com álcool, que os impedem de trabalhar.
“Eu tenho um trabalho em uma estamparia, quando dá coragem eu vou, depois que
começo a beber está perdido, quando paro de beber eu trabalho, eu começo beber
qualquer hora, a hora que me acordo já estou bebendo, atualmente não estou
trabalhando” (Pedro).
Para Almeida e Nascimento, (2011, p. 2) “o indivíduo que não 'respeita estas regras'
– como se fosse o único responsável – consequentemente pagará um preço. Perderá a sua
condição de cidadão”.
Em outros momentos os valores irrisórios oferecidos pelo trabalho fazem eles se
sentirem desvalorizados e se negarem ao trabalho, “Me sinto desvalorizado, um serviço
que é pra eu ganhar 100 reais, querem me dar 10 reais, prefiro não ir, as pessoas só
querem explorar, pensam: - eu dou um litro de cana a ele” (Miguel).
As regras impostas fazem com que as pessoas em situação de rua, busquem outras
opções para atender suas precisões, mesmo possuindo parentes residindo na cidade e tendo
contato com eles, optam por morarem na rua a ter que se submeterem a humilhações,
regras ou perda da liberdade, pedem alimentos e usam lugares públicos com água para
tomar banho e lavar roupa por exemplo. “Tenho contato com meus irmãos e me dou bem
com eles, mas não da certo pra ir morar com eles, comida eles me dão, mas não vou
comer lá não, eu não gosto não, receber um bocado de comer e depois ficar falando, me
agrado não”. “fica humilhando a pessoa, prefiro morrer de fome no meio da rua”.
“Prefiro dormir na rua do que dormir na casa de alguém e levar sugesta” (João). São
rejeitados por não se encaixarem nas regras sociais, “Se eu parasse de beber meus irmãos
podiam aceitar eu morar com eles, mas eu não vou parar, prefiro continuar na rua, fazer o
que?” (Pedro). As regras para eles implicam uma mudança de comportamento, a qual eles
não estão dispostos a fazer.
Todos os participantes têm filhos, mas passam anos sem vê-los, sem os procurarem e
às vezes sem cumprirem com obrigações civis. “O dinheiro que consigo uso pra beber”.
“Não estou dando nada a minha filha, faz mais de ano que não vejo ela, não estou mais
nem pagando a pensão, ela tem 14 anos” (Pedro). “meus filhos não sabem onde estou,
não sabem nem onde moro, nem eles, nem ninguém da minha família sabe onde eu moro”
(Miguel). Almeida e Nascimento (2011), dizem que esses fatores dificultam a reintegração
desses indivíduos a regras e valores sociais.
A segunda categoria analisada foi à vivência nas ruas e a não efetivação dos
direitos sociais.
Conforme já destacado neste artigo, os direitos sociais básicos de qualquer pessoa,
dizem respeito à educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança,
previdência social, proteção à maternidade e infância e assistência aos desamparados, os
quais foram reconhecidos na Carta Magna a partir de 1988, como direitos fundamentais da
pessoa. No caso dos participantes da pesquisa verificamos através da fala deles uma total
ineficácia dos direitos sociais.
Apesar da baixa escolaridade, quase todos sabem ler e escrever; os que não sabem,
conseguem pelo menos assinar o próprio nome. O desejo de estudar foi citado por todos,
assim como a falta de oportunidade de se conseguir acesso à educação. “Nunca estudei, sei
fazer meu nome, mas não sei ler, nem escrever, tenho vontade de estudar.” (João). Bem,
sabemos que para pessoas que não tem nem onde morar, ou o que comer, estudar tornasse
algo praticamente impossível, a falta de estabilidade não permite que as pessoas em
situação de rua alcancem tal direito social. “Já estudei, parei na 8° serie, sei ler e escrever
gostaria de voltar a estudar, mas não tenho nem onde morar, como vou estudar?”
(Pedro).
Apesar de não terem sido relatados problemas relacionados à saúde, bem
sabemos que problemas como alimentação precária, exposição a todas as formas de
vulnerabilidade que a rua oferece, falta de perspectiva e perda de autoestima, podem
acarretar consequências na saúde das pessoas em situação de rua, em especial a saúde
mental, o sofrimento psíquico na fala desse participante reflete essa realidade, “Eu me vejo
como um bicho tem horas de me da vontade de me matar, não tenho vontade de comer,
não tenho vontade de nada” (João). O uso do álcool também causa um processo de
debilitação física e mental, onde a pessoa só consegue se enxergar de forma inferiorizada,
“Me vejo como pinguço, como cachaceiro, eu sou cachaceiro, é só o que sou” (Pedro).
Não é ofertado, por exemplo, tratamento para dependência alcoólica. “Eu bebo, mas quero
me libertar desse álcool, eu bebo porque estou na rua” (Gabriel). É valido salientar que o
acesso à saúde é um direito de toda a população brasileira, este não pode ser impedido por
qualquer barreias econômicas, sociais, culturais, políticas e etc.
A alimentação não é frequente, nem de qualidade, necessitando muitas vezes
de doações de particulares, sendo um dos problemas mais citados, não se tem a menor
segurança quanto à possibilidade de se fazer uma refeição todos os dias. “Nesse momento
difícil que estou passando eu peço, mas eu não quero essa vida, mendigando pão”
(Gabriel). “Não sei nem onde vou dormir hoje, comi agora e só vou comer segunda”. Em
outro momento da fala o mesmo participante diz “Faço apenas uma refeição ao dia, de
manhã” (Pedro). “A maior dificuldade de morar na rua é o frio, a muriçoca e a fome, a
barriga roncando de madrugada e sem ter o que comer da vontade de comer até terra”
(João).
É por meio do trabalho que a pessoa gera recursos para garantir a sua subsistência, é
essencial, a dificuldade de conseguir emprego, representa para eles um dos grandes
motivos pelo qual não conseguem sair da condição de rua, a fala de um dos participantes
representa bem essa situação, “passo de 03 a 04 meses morando na rua porque não tenho
emprego fixo, o principal motivo é esse” (Miguel). Sem emprego não há espaço para
projetos, planejamento a longo ou curto prazo, ou até esperança no futuro.
Ainda sobre emprego, outro participante da pesquisa disse que: “Trabalho um dia e
passo oito sem trabalhar, pago o aluguel de um mês, mas no outro não posso pagar, pagar
energia, não posso pagar, ai prefiro tá na rua mesmo” (João). O trabalho é o único bem
que essas pessoas podem oferecer para terem como sobreviver, se inserir no mercado
produtivo e não se tornarem uma sobra social, mas a dificuldade de conseguir trabalho seja
formal ou informal é evidente, “nunca trabalhei de carteira assinada, toda vida trabalhei
clandestino”. “Eu tenho procurado emprego, tenho dificuldade de conseguir” (Gabriel).
Almeida e Nascimento, (2011, p. 4) observam que “o fator econômico é determinante na
garantia de melhor educação, moradia, saúde, segurança e até entretenimento”.
Como já mencionado anteriormente prover um teto para seus cidadãos é uma
obrigação do estado à moradia é um direito básico previsto constitucionalmente, mas que
não alcança as pessoas em situação de rua. “Só queria um cantinho pra eu morar, pra eu
dormir, nem que eu tivesse que trabalhar de graça” (João). É um dos maiores desejos de
todos os participantes, “tenho vontade de parar de beber, de ter um canto pra morar”
(Pedro). E acreditam que a mudança de vida que tanto esperam venha apenas através da
concretização desse sonho, “quando sai do presídio fiquei na rua, eu não tenho uma
moradia”. “Eu quero verdadeiramente ver se eu consigo um quarto pra mim da uma volta
por cima, sair da rua” (Gabriel). Mas bem sabemos que acesso a moradia é um dos
problemas sociais mais latentes.
Em se tratando de segurança, o medo de que algo de mal lhes aconteça devido à
vulnerabilidade em que vivem é constante. “Sinto medo, medo de me deitar e chegar
alguma pessoa e me fazer o mal, a pessoa dormindo, tem gente que veio ao mundo para
fazer o mal, não é todo mundo, mas tem” (Gabriel). Reportagens noticiando graves
ataques físicos a essas pessoas são bem comuns, um dos participantes relatou ter sofrido
esse tipo de violência. “Já fui agredido fisicamente por um maloqueiro, levei um murro,
quebrou meus dentes” (João). O fato de que são alvo de violência é inegável, furto de
objetos pessoais são bem comuns. “Tinha um restaurante, um dia eu comecei tomar uma,
ai roubaram meu celular com chip e tudo, perdi tudo”. “Não tenho nada na minha vida,
só tenho a roupa que estou vestindo, minhas roupas levaram todas” (João). De acordo
com Costa (2005, p. 11), “a rua é vivida como um espaço de instabilidade, um mundo à
parte da sociedade formal, onde a presença do Estado como garantidor da ordem e da
segurança é relativa”.
A assistência aos desamparados deve servir como ponte para essas pessoas
alcançarem seus demais direitos, mas entre os informantes que participaram da pesquisa,
essa assistência não tem nenhuma efetividade, pois nenhum deles conseguiu se inserir, por
exemplo, em programas governamentais assistenciais, não possuem benéfico algum do
governo, como Bolsa Família, ou qualquer outro programa social. “Eu recebia o Bolsa
Família, mas foi cancelado”. “Fiz o Bolsa Família quando tinha um endereço fixo”. “Não
me sinto amparado pelos direitos sociais” (Miguel). Não há assistência nem para que
realizem as atividades essenciais de higiene pessoais mais básicas. “Já passei até dois, três
dias sem tomar banho, momento de procurar um canto pra tomar banho, chegar num
posto de gasolina às vezes tem até banheiro fechado, tem água pra tomar banho, mas está
fechado, quando encontra um açude, um canto, mas quando não encontra” (Gabriel). “A
maior dificuldade da rua e quando termina o dia e a pessoa não tem onde dormir, sem ter
um lugar pra tomar banho, minhas roupas não tenho onde lavar” (Pedro).
Costa (2005, p. 12) fala da ineficiência desse direito social quando afirma,
“faz parte do histórico da política assistencial no país a disponibilização de “serviços
podres, já que são destinados a pessoas pobres”. Tal tradição tem origem na crença, ainda
presente na cultura nacional, de que se trata de benevolência, de um favor prestado à
população, e não de direitos sociais a serem garantidos”.
Identificamos o direito social à previdência social, apenas na fala de um
participante mesmo assim de forma negativa, onde o mesmo fala: “Não alcanço mais
aposentadoria, alcanço mais nada, quando chegar lá estou morto já” (João).
Quanto ao direito social de proteção à maternidade e infância, não há que se falar
nessa presente categoria analítica, pois participaram da pesquisa apenas pessoas do sexo
masculino e adultas.
A falta de renda não possibilita que pessoas em situação de rua tenham lazer, “se
tivesse uma renda fixa nesses feriados iria visitar minha família” (Miguel). Para ele visitar
a família é um lazer, o qual por falta de recursos também lhes é privado.
Por fim, a última categoria foi o desprezo e a invisibilidade como sinais de sua
percepção frente à sociedade. A invisibilidade social torna as pessoas inexistentes no
meio das outras, são seres que não conseguem enxergar os seus iguais, sabem que eles
estão ali, mas procuram de alguma forma agir como se eles não tivessem. De acordo com
Costa (2008, p. 13) “há percepção, mas percepção, em alguma medida, rebaixada. E que
não fique dúvida: rebaixada a ponto de “chatear”, “reprimir” quem a sofre, necessitando o
sofredor evitá-la”.
Há um desinteresse do Estado e da sociedade pelas pessoas em situação de rua, é a
repressão, preconceito, indiferença e segregação, que essas pessoas vivenciam diariamente.
“Me sinto, desvalorizado por minha família, por as pessoas que não me conhecem, pelo
governo, tanta terra que tem no mundo e a pessoa viver desprezado no meio do mundo,
derrubam a casinha da gente. A minha família não me ver. Se eles conseguissem me
enxergar, o que falariam seria apenas João está desprezado” (João).
A sociedade já naturalizou a situação de rua, a presença dessas pessoas já não é mais
percebida, é bem mais cômodo se conformar, já que alguns consideram injustiça, outros
hostilizam, os consideram apenas bêbados safados e nojentos, mas a contribuição para a
mudança dessa realidade é inexistente. “Muitos conhecidos hoje não falam mais comigo,
me sinto desvalorizado, minha família não procura me ajudar. Eu sou a ovelha negra da
família” (Pedro). “O povo da rua nem pra mim não olha, finge que não me ver, passei por
meu irmão essa semana, ele virou a cabeça, nem pra mim olhou, me sinto invisível, ai é
que me sinto desgostoso da minha vida, as pessoas não procuram me ajudar” (João).
É uma grande desigualdade social que causa uma divisão entre as classes
mais favorecidas e as menos favorecidas. O julgamento pessoal e social torna ainda mais
difícil a possibilidade da pessoa superar a condição em que está. As pessoas os tratam
como se não existisse mais lugar para eles na sociedade. “Umas pessoas passam e viram a
cara para o outro lado, outros quando a pessoa chega se afastam”. “Às vezes a pessoa
bebe não é por que quer não, é porque falta algo na vida da pessoa, é desprezo que a
família dá”. “Me sinto desprezado e invisível diante das pessoas que tem mais condições
que eu” (Miguel). As pessoas que passam o tempo todo por ele andam pelas mesmas ruas,
mas parecem tão distantes e diferentes do que ele é. As palavras de Almeida e Nascimento,
(2011, p. 4) espelham a fala do participante, “tornaram-se invisíveis aos olhos dos
cidadãos, ora provocando estranheza como se não fossem seres humanos ora piedade”.
Sentimento de vergonha por estar em condição de rua e por ter que pedir
alimentos causa angustia nesses seres excluídos. “Eu me sinto angustiado por está na rua,
depois de 34 anos passando por isso, tenho vergonha de esta na rua, nunca pedi nada pra
ninguém, hoje eu peço, eu peço esmola, peço coisas para os outros, nunca tinha feito isso
e hoje estou fazendo, hoje vivo nessa vida” (Pedro).
A volta dos laços familiares e contato com a sociedade ajudaria bastante, pois o
sentimento de desprezo e invisibilidade por parte dos familiares e conhecidos causa grande
sofrimento psicológico nas pessoas em situação de rua. “Tenho vários irmãos morando
aqui, mas eles não ligam pra mim não”. “Eles sabem que estou nessa situação, todos tem
casa, mas não me abrigam” (João).
Diante da fala desses participantes em situação de rua, podemos perceber que são
homens marginalizados pelo sistema e considerados uma das grandes feridas sociais
contemporâneas, por aqueles que não se encontram nessa mesma situação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho procurou discutir a não efetivação dos direitos sociais previstos
constitucionalmente, em relação às pessoas em situação de rua e se essas mesmas pessoas
enfrentam invisibilidade social. Para tanto começamos o estudo fazendo uma análise
histórica de como surgiu à população em situação de rua, e os principais fatores que
levaram pessoas a chegarem nessa triste realidade. Percebemos através dessa análise que
um dos fatores principais foi uma exclusão da sociedade de produção capitalista, uma não
inserção no mercado de trabalho, fator esse que perdura até os dias atuais, podendo ser
percebido claramente na fala dos participantes da pesquisa.
Após esses aspectos históricos, nos ocupamos em fazer uma abordagem
acerca das características e realidade das pessoas em situação de rua, abordando também os
direitos sociais. Em se tratando de características e realidade de vida, a análise se ateve em
mostrar como as pessoas em situação de rua são vistas socialmente, percebemos que estão
inseridas em um contexto de discriminação e marginalização.
Outrossim, realizamos uma abordagem acerca dos direitos sociais previstos
constitucionalmente que deveriam servir como proteção para essa classe social. Ao longo
da pesquisa percebemos que as pessoas em situação de rua sofrem violação em todos os
seus direitos sociais e que os mesmos não trouxeram resultados efetivos na sua condição de
vida.
É fundamental que haja o reconhecimento das pessoas em situação de rua
como sujeitos que possuem direitos, os quais são variados e precisam sair da teoria para a
prática. Educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência
social, proteção à maternidade e a infância, assistência aos desamparados, são direitos
sociais que não tem efetivação quando se trata de moradores de rua, diante tudo quando foi
exposto ao longo do trabalho, não há dúvidas de que essa população carece de proteção
social em vários aspectos e que essa proteção é um direito legítimo deles que lhes é
privado. A pobreza possui um caráter coletivo, ou seja, possui um status de
responsabilidade social, por isso as pessoas em situação de rua têm o direito de serem
assistidas socialmente, como também devesse desenvolver políticas públicas voltadas para
essas minorias em situação de rua. Trata-se do reconhecimento e da legitimidade dos
moradores de rua enquanto sujeitos de direitos.
E por fim a invisibilidade das pessoas em situação de rua: um olhar a partir da
história de vida. A indiferença, o desinteresse, e a invisibilidade social marcam a
existência de quem vive nas ruas, a presença deles depõem contra a imagem da cidade,
portanto, deve ser encoberta.
É necessário mostrar que a exclusão não pode ser o destino dessas pessoas, que
a possibilidade delas saírem dessa condição e serem reinseridas socialmente, com a ajuda
de instituições de auxílio, de atendimento e serviço, de pessoas para trabalharem com esse
segmento social, aumento das formas de auxílio e serviços assistenciais específicos e
destinados á população em situação de rua, ou seja, é possível gerar um apelo para a
contribuição da sociedade em relação a essas pessoas.
Ressaltamos que não pretendemos esgotar as discussões sobre esta temática,
pelo contrário destacamos a necessidade de novos estudos que possam continuar debatendo
sobre as pessoas em situação de rua, em especial a efetivação de seus direitos e
invisibilidade social, para que possam ser propostas que transformem essa realidade, pois,
caso contrário, essas pessoas não terão oportunidade de se reintegrar socialmente
abandonando a situação de rua, mas, pelo contrário, continuarão a viver a margem da
sociedade.
REFERÊNCIAS
COSTA, Fernando Braga da, Moisés e Nilce: retratos biográficos de dois garis. Um
estudo de psicologia social a partir de observação participante e entrevistas. São Paulo,
2008.
SALES, Juliana Maria Araújo de; PACHÚ, Clésia Oliveira, Direitos sociais e as
políticas públicas como mecanismo de efetivação. In: PACHÚ, Clésia Oliveira, (Org.).
Direitos Sociais: O artigo 6° da Constituição Federal e sua efetividade, Ed. UEPB:
Campina Grande-PB, 2015.
RESUMO
1 INTRODUÇÃO
1
Centro Universitário do Vale do Ipojuca. Graduada em Direito pelo UNIFAVIP, advogada e
pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares sobre Direitos Humanos (Mércia
Albuquerque/UNIFAVIP). E-mail: mariane.izabel@hotmail.com.
Busca-se, nesta pesquisa, apresentar o cenário de violências sofridas por crianças e
adolescentes durante a ditadura militar do Brasil, com o intuito de dar maior visibilidade
sobre como esse grupo foi tratado nesse período, e, também, acerca das dimensões
jurídicas das normas nessa época. Dessa forma, buscamos catalogar dados bibliográficos
de modo a responder o seguinte problema de pesquisa: Qual o cenário das violências
sofridas pelas crianças na Ditadura Militar brasileira? E, enquanto questão secundária: A
formação jurídica acerca da infância e adolescência no Brasil, guarda relação com o
imaginário jurídico do civil-militarismo?
De forma a responder esse questionamento, a pesquisa direcionou-se a partir de um
objetivo geral, qual seja: apresentar o cenário das violências sofridas pelas crianças na
Ditadura Militar brasileira.
De modo a alcançá-lo, essa pesquisa se propôs, de início, a mapear e analisar as
legislações existentes sobre os direitos das crianças na época do militarismo no Brasil, bem
como identificar quais violências marcam o contexto de crianças e adolescentes nesse
período, e, por fim, apresentar o cenário de violências sofridas na Ditadura Militar
brasileira por crianças e adolescentes, a partir de narrativas de vida.
A metodologia utilizada em nossa pesquisa se fez a partir do método dialético
(LAKATOS, 2003), tendo em vista que esse instrumento possibilita uma melhor
apropriação da realidade. A abordagem desta pesquisa é qualitativa para que se tenha uma
visão do fenômeno estudado (a partir das histórias de crianças e adolescentes que viveram
naquele período) de forma a construir sentidos e significados sobre ele. Além disso, trata-
se de uma pesquisa bibliográfico-exploratória, que fez uso da técnica análise de conteúdo
(BARDIN, 2009), buscando interpretar as histórias de algumas crianças que viveram o
militarismo no Brasil, selecionadas a partir de pesquisa documental.
Assim, esta pesquisa se justifica por ser observada a invisibilidade que esse grupo
tem na formação democrática do país, assim como acerca das lacunas jurídicas presentes
na legislação nacional, as quais remontam o imaginário de repressão e violência vivido
naquele período. Dessa forma, espera-se que esse estudo contribua para que o “nunca
mais” se consolide, e que a verdade sobre a ditadura civil-militar seja conhecida.
2 DESENVOLVIMENTO
A ditadura militar é lembrada, na maioria das vezes, pelas violações e cassações aos
direitos das pessoas, até mesmo as mais vulneráveis. Dessa forma, é importante fazer uma
análise das normativas vigentes nesse período para que entendamos, de certo modo, qual o
lugar das normas instituídas na complacência a certas violações.
De todo modo, surge nas primeiras décadas do século XX a primeira legislação
internacional a tratar dos direitos da criança e do adolescente. Trata-se da Declaração de
1924, conhecida como Declaração de Genebra, na qual surge a expressão “direitos da
criança”, e que se começa a se referir, mesmo que implicitamente, sobre o tratamento com
absoluta prioridade que temos hoje, também assegurado na legislação brasileira.
Albuquerque (2001, p. 01) cita que:
2
A família medieval, na qual as mulheres e crianças eram consideradas propriedades do patriarca,
assim como um imóvel, por exemplo, não era baseada na afetividade, como ocorre atualmente, pelo
contrário, existia para produzir bens e propagar a honra daqueles patriarcas, do sobrenome da família.
Desse modo, percebe-se que a concepção de infância varia de acordo com a época,
bem como a cultura de cada povo, ou melhor, a existência ou não da concepção de infância
varia conforme as estruturas de poder e sociais que mantêm a hierarquização entre
determinados grupos. Do mesmo modo, para uma melhor compreensão do assunto, é
necessário ter em mente que a evolução histórica da criança, enquanto um ser em
desenvolvimento, está intimamente ligada a concepção e mudanças da família. Assim,
Ariès (1978) revela que nesse período (séculos X-XI) não havia noção de infância,
e consequentemente, nenhuma preocupação com o indivíduo enquanto ser em si mesmo.
Após a Revolução Francesa, começaram as maiores conquistas quanto a esses seres
em desenvolvimento, especialmente no que tange aos ideais iluministas e toda visão
pedagógica de Rousseau, que “[...] propôs uma educação infantil sem juízes, sem prisões e
sem exércitos” (NASCIMENTO; BRANCHER; OLIVEIRA, 2008, p. 53). Esse filósofo
vem romper com a ideia de sociedade adultocêntrica que foi construída até então, de forma
a destacar que a infância inicia com o nascimento e que deve ser tratada com afeto.
Já no final do século XIX e início do XX começa a era da Infância de Direitos, que
é a que vigora atualmente, de forma que a família é instrumento decisivo nessa conquista.
Surge um grupo familiar preocupado com a sua prole, que se dedica a construção de afeto
na família e direcionado especificamente à criança. Frota (2007, p.06) assim diz:
Entretanto, foi um longo caminho a ser percorrido para que a infância, como se tem
hoje, fosse reconhecida. Socialmente, até se começou a ter um olhar para a criança, mas,
em um primeiro momento, e, por muitas décadas, a criança e o adolescente foram vistos
como os “menores”. Leite (2011, p. 20), assim comenta sobre o surgimento dessa figura de
linguagem:
Observa-se que com a necessidade da saída dos pais para o trabalho, inclusive da
mulher, que era a cuidadora oficial das crianças, esses sujeitos em desenvolvimento
começam a ser enquadrados na categoria dos excluídos, os seres marginalizados da
sociedade. “Abandonados, mendigos e infratores frequentemente foram confundidos sob o
nome de „menor‟, que nunca designa filhos de famílias das camadas médias e altas, e tem
conotações negativas desqualificantes” (LEITE, 2011, p.21).
Desse modo, essa estigmatização era designada às crianças que pertenciam as
famílias pobres, até porque eram esses grupos sociais que precisavam sair de suas casas
para trabalhar e garantir o sustento do lar.
Ainda nessa perspectiva, Frota (2007, p. 12) acrescenta:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo chega a seu fim na busca por respostas a seguinte problemática:
Qual o cenário das violências sofridas pelas crianças na Ditadura Militar brasileira?
Resolveu-se buscar resultados a partir de duas histórias, a de Luis Carlos Max do
Nascimento e a de Carlos Eduardo Azevedo, de modo que podemos fazer as seguintes
análises e/ou apresentar os achados a seguir.
Crianças e adolescentes foram atingidas principalmente a partir das violências
direcionadas as suas famílias. A condição de nômades, e, por consequência, das crianças e
adolescentes, guardava relação com as práticas de resistência. A infância fora uma forma
de segregar aqueles/as que ousaram enfrentar o civil-militarismo.
Vê-se também que crianças e adolescentes cresceram com problemas de identidade
e ligados ao campo da saúde mental. A negação de suas subjetividades (utilização de
vários nomes ao longo de sua vida, e muitas vezes, nem sabiam os nomes verdadeiros de
seus pais), foram determinantes nas violações a esses sujeitos.
Ademais, a infância de muitos foi marcada pela separação familiar e o exílio, os
quais viveram, por muito tempo, com pessoas desconhecidas e em uma cultura totalmente
diferente, devido à perseguição política.
Por fim, percebe-se que a maioria dessas crianças conviveram com a invisibilidade,
a partir da negação de suas histórias. Vê-se ser preciso continuar a dar visibilidade a todas
essas crianças e adolescentes que foram vítimas de graves violações de direitos humanos,
como forma de se poder contribuir o “nunca mais” e a afirmação da democracia, hoje.
REFERÊNCIAS
RESUMO
4
Paulo Gonçalves de Andrade
Graduando em Direito – Centro Universitário do Vale do Ipojuca. Membro do Grupo de Estudo e
Pesquisas Interdisciplinares sobre Direitos Humanos (GEPIDH-UNIFAVIP). E-mail:
mrpaulogoncalves@gmail.com
²Camylla Galindo Cezar de Oliveira Silva
Graduanda em Direito – Centro Universitário do Vale do Ipojuca. Membro do Grupo de Estudo e
Pesquisas Interdisciplinares sobre Direitos Humanos (GEPIDH-UNIFAVIP); da Iniciação Científica
intitulada Justiça de Transição e Diversidade Humana em Períodos de Militarismo e do Projeto de Extensão
de Assessoria Jurídica - PROJURIS-UNIFAVIP. E-mail: camyllagc@gmail.com
³ Jessyca Iasmim de Souza Farias
Graduanda em Direito – Centro Universitário do Vale do Ipojuca. Membro do Grupo de Estudo e
Pesquisas Interdisciplinares sobre Direitos Humanos (GEPIDH-UNIFAVIP); da Iniciação Científica
intitulada Justiça de Transição e Diversidade Humana em Períodos de Militarismo e do Projeto de Extensão
de Assessoria Jurídica - PROJURIS-UNIFAVIP. E-mail: jessycaiasmim@hotmail.com
Palavras-chave: Violência. Desigualdade racial. Vulnerabilidade social.
Juventude.
1INTRODUÇÃO
2DESENVOLVIMENTO
Enquanto isso, a sociedade, que segue marcada pelo temor e pela ânsia
de vingança, parece clamar cada vez mais pela diminuição da idade de
imputabilidade penal, pela truculência policial e pelo encarceramento em massa,
que apenas dinamizam a criminalidade violenta, a um alto custo orçamentário,
econômico e social.
Desta forma, a economia tem uma relação direta com o envolvimento dos jovens à
violência, que tanto o baixo desenvolvimento econômico quanto o desenvolvimento
descontrolado, são agentes que interagem com a criminalidade.
Em síntese, o aumento desenfreado da taxa de mortalidade anual se dá em virtude
de vários fatores sociais, que não se esgota na presente pesquisa, sendo aqui apontado
apenas alguns fatores que corroboram com a perpetuação dos crimes com violência letal.
Esta situação, já demonstra que a realidade vivida pelos negros se afasta dos
não negros, em virtude da falta de uma educação de qualidade, para que se possa disputar
no mercado de trabalho em iguais condições com os brancos.
O racismo é enfrentado pelos negros até mesmo dentro da escola pública,
pois os professores não se sentem estimulados a desenvolver aqueles alunos por acreditar
que estão fadados ao fracasso. Este sentimento tem a ver com “a percepção que os
professores têm desse alunado, que são filhos de pais bêbados, pais desempregados, de
famílias incompletas, que os meninos vão sujos para a escola” (HASENBALG, 1987).
Não obstante, o mercado de trabalho por sua vez também é roupado com o
racismo onde prevalece a preferência por brancos em melhores cargos, sendo conferido
apenas as vagas de menor resposta financeira aos negros, o que é denominado por
Cerqueira e Coelho como segregação funcional, “esses setores ou postos de trabalho
podem funcionar como espécies de “clubes fechados”, reservados a pessoas que se
enquadram em certos requisitos sociais, em que a cor da pele é um deles”.
Afora esta seletividade na contratação, tem-se ainda a descriminação dentro
do ambiente de trabalho onde existe uma diferença salarial entre negros e brancos. Em
pesquisa realizada por Soares (2000) sobre divergência salarial, foi encontrada uma
disparidade de 46% e deste valor 17,9% se dá exclusivamente em virtude da descriminação
de raça
Na pesquisa realizada por este autor, o mesmo aponta que “os homens negros
também sofrem alguma discriminação na hora do contracheque – recebem algo em torno
de 5% a 20% menos que os homens brancos, sendo que esse diferencial cresce com a renda
do homem negro” (SOARES, 2000).
O autor SOARES (2000, p. 24) afirma ainda que:
GIL, Antonio Carlos. Método e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo:
Atlas, 2008.
RESUMO
No presente artigo buscamos fazer uma análise histórica do fenômeno religioso, pensando
mais especificamente o espaço da religião a partir dos valores da modernidade e da crise
desses valores. Refletiremos sobre o fenômeno religioso em suas diferentes vertentes, desde
uma perspectiva fundamentalista até uma progressista, pensando os possíveis diálogos entre o
fenômeno religioso e os Direitos Humanos. A religião enquanto uma forma de identificação
étnica, pode servir como elemento de luta para diversos povos, bem como transformar-se em
fruto de preconceito, quando se tem um olhar racista sobre determinados grupos, como os
negros brasileiros, onde suas práticas religiosas são adjetivadas negativamente como resultado
do preconceito racial. Assim construímos o diálogo entre racismo, religião e Direitos
Humanos.
INTRODUÇÃO
O fenômeno religioso faz parte de toda a sociedade, não podendo ser negligenciado
pelas ciências humanas, pois suas práticas reverberam em diferentes áreas. Esse fenômeno
religioso não é algo estanque ou homogêneo, mas sim algo que acompanha os movimentos da
sociedade, bem como interfere diretamente nesses. Podemos pensar a religião através de
diversas perspectivas, sejam conservadoras ou progressistas, influindo diretamente nas lutas
políticas de suas épocas.
1
Mestrando em Direitos Humanos(UFPE), Graduação em História e especialização em História do Brasil
(FAFICA) email alanhistoriadh@hotmail.com
2
Graduado em História pela faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru (FAFICA) e mestre em
ciências da Religião pela Universidade Católica de Pernambuco.
Sendo a religião um fenômeno histórico que relaciona-se com diversas aspectos
sociais, aparecendo muitas vezes como elemento central dos preconceitos raciais, ou da luta
de determinados grupos étnicos, como ocorre o diálogo entre o fenômeno religioso e os
Direitos Humanos?
Pretendemos refletir sobre os possíveis diálogos entre o fenômeno religioso e os
Direitos Humanos, Pensando sobre o papel da religião a partir dos valores da modernidade e
da crise desses valores. Identificando a partir de Boaventura de Souza Santos (2014) as
diferenças entre as teologias fundamentalistas e progressistas, compreendendo como as
diferentes perspectivas religiosas relacionam-se com determinados grupos étnicos.
Realizamos uma análise bibliográfica de textos que versam sobre o fenômeno
religioso, bem como textos que debatem sobre os Direitos Humanos, seguindo no que diz
respeito ao nosso olhar sobre os Direitos Humanos a perspectiva de Boaventura de Souza
Santos.
Acreditamos ser de extrema importância para a academia pensar o fenômeno religioso
e os Direitos humanos em uma perspectiva interdisciplinar, a partir da História, sociologia,
ciência da religião e Direitos Humanos.
Olhar para o fenômeno religioso e os Direitos Humanos, pode nos trazer uma
contribuição na agenda de luta de movimentos sociais que tem como referência o espaço do
sagrado, os Direitos Humanos ou ambos, buscando ver os pontos em que os encontros podem
ser fortalecimento das reivindicações de determinados grupos, ou então quando as práticas
religiosas tornam-se empecilho para uma vivencia pautada pelos direitos Humanos.
Pensar a modernidade como um elevado grau de estágio humano seria um passear nos
espaços mais obscuros. Um dilema que as ciências humanas vêm nos revelando. Entretanto,
não se pode ignorar que, a partir do século XIX é possível entender que o conceito científico
de evolução política, social e humanitária vem sendo nos últimos anos questionados, pois se
evoluímos, até onde? A saber, evolução, não passa apenas no campo da técnica, mas na
(re)produção de panoramas sócio igualitários de modo que cada um possa dialogar e conviver
onde as diferenças sociais se tornem algo minimizado.
Entretanto do mesmo modo que a modernidade é questionada enquanto evolução
sociopolítica devemos também buscar entender que o conceito de identidade ou sujeito na
modernidade também está forjado por interesses vetoriais distintos, destarte
Um tipo diferente de panorama estrutural está transformando as sociedades
modernas no final do século XX. Isso está fragmentando as paisagens culturais de
classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, que, no passado, nos tinham
fornecidos sólidas localizações como indivíduos sociais. (HALL, 2006, p. 9)
Acreditou-se que com a formulação dos preceitos básicos científicos e, sobretudo no
pós Iluminismo com os lemas de Liberdade, Igualdade e Fraternidade a humanidade atingiria
o ápice sóciohumanitário, mas o que veio a reboque? Com o século XIX a Era dos Impérios, o
século XX com duas grandes guerras, em suma, políticas imperialistas de nações que, a partir
da era Vitoriana vem se destacando em atacar os países mais pobres com o discurso de paz e
garantia da ordem humanitária e paradoxalmente ignoram completamente o ―outro‖.
Se levarmos a palavra ―hipocrisia‖ como um conceito particular das políticas
imperialistas em relação aos países considerados subdesenvolvidos não seria estranho, a Pax
Romana, Pax Britânica ou mais recentemente a Pax Americana são coirmãs, deste modo, o
que temos senão um discurso hipócrita de igualdade aos modelos evolutivos científicos de
sociedade pós século XIX?
E diante de tais premissas, qual o papel da religião nesse cenário tão caótico? Em
algum instante pode-se identificar a religião como uma baliza de coalizão e forças capaz de
unir os povos como uma constante de igualdade humanitária através de um deus onisciente e
onipresente.
Deste modo seria um tanto importante entender a religião e seus aspectos conceituais
antes mesmo de começarmos um debate histórico sobre.
Em primeiro lugar, segundo Hans – Jüngen Greschat
Cada uma das milhares de religiões que podem ser escolhidas e estudadas é
representada como uma totalidade passível de investigação de acordo com quatro
perspectivas: como comunidade, como sistemas de atos, como conjunto de doutrinas
ou como sedimentação de experiências. (GRESCHAT, 2005, p. 24/25)
Portanto de maneira muito clara percebemos que as religiões por mais primitivas que
sejam elas são dosadas por princípios básicos de regras que tem como meta conduzir um
grupo social a partir de ritos e ritualísticas que podem ou não inclusive repercutir na vida dos
que fazem parte de um grupo religioso. Logo poderíamos deduzir o papel das religiões como
elementos culturais capazes de unificar ou na pior das hipóteses aproximar a humanidade nas
suas diversas especificidades.
Deste modo, sem retirar o elemento do Sagrado,
pois as religiões possuem em seu bojo o campus do Sagrado que na visão de Rudolf
Otto, ―Ela [a esfera do Sagrado] apresenta um elemento ou ―momento‖ bem
específico, que foge ao acesso racional [...], sendo algo árreton [ ―impronunciável‖],
um ineffabile [―indizível‖] na medida em que foge totalmente à apreensão
conceitual.(OTTO, 2014, p. 37)
O papel da Igreja Medieval seria controle independente de uma sociedade que ela
dominava por meio de uma projeção teológica, entretanto com o advento do
cientificismo o discurso teológico demarca o sujeito para produzir um homem para
os novos princípios culturais de sociedade moderna. A produção do discurso
religioso de verdade vai produzindo entre os pares a significação de uma vivência
teológica educativa para a ―nova‖ sociedade que vai se formando, uma disciplina
que o ―outro‖ vai se adequando, ou pelo menos espera-se que ele se adéqüe, para a
firmação de uma doutrina teológica social. Essa educação religiosa a ser seguida é
do discurso intolerável. É preciso ser um pertencente a ―ordem discursiva‖ para se
encaixar na nova proposta teológica moderna. (TORRES, 2016, p. 43)
Contudo, seria simplória a extinção de uma cultura e uma mentalidade religiosa sob os
modelos civilizatórios e políticos de John Locke, Rousseau e tantos outros.
Pois as culturas levam um tempo em cristalizar os espaços no campo da mentalidade, e
isso ficou tão óbvio que os déspotas esclarecidos, mesmo que convivendo com os
movimentos pós Iluminismo, ainda se utilizaram do medo ao sagrado quando a lei do estado
civil de direito ficou tolhida pela Teoria do Direito Divino de Bousset, como, por exemplo, Os
Reis Taumaturgos, de Marc Bloch.
Portanto, tratando em específico das três maiores religiões ocidentais no século XXI é
possível percebermos que ainda não rompemos totalmente com a ligação do Estado de Direito
e a religião, sobretudo em países considerados subdesenvolvidos.
Assim sendo seria importante entendermos uma série de fatores históricos que
possivelmente levaram a tais condições atuais e que apesar de evoluções sociais estão muito
fortemente enraizada no imaginário social.
Desde a Baixa Idade Média, uma crise que rumou o destino da Europa e quiçar da
América, as religiões ocidentais aparecem em um cenário de horrores e pânico, a começar
com a maior organização religiosa até então, o cristianismo.
Segundo Toby Green,
Foi primeiramente na Espanha que o medo começou a afetar toda a sociedade. Ao
norte de Sevilha, onde a Inquisição tinha se originado, ficavam as planícies
escaldantes da Extremadura. Lá havia povoado de casa e pedras, lugares onde o
isolamento levava à raiva.‖ (GREEN, 2011, p. 135)
O medo ao qual fala Toby Green estaria focado em grupos que não fossem convertidos
ao cristianismo fazendo surgir grupos de neófitos, grupos esses que ou abririam mão de sua
crença, que outrora poderia ser o judaísmo, islamismo, etc., ou até mesmo que poderiam estar
agregados aos rituais de feitiçaria ou possessões do demônio, ou passariam pelo terror da
―Santa Inquisição‖.
A partir do Malleus Maleficarum a Europa já não era mais a mesma, mas o que nos
chama mais atenção é a Cruzada religiosa que seguiria nos anos vindouros, o medo do ―outro
religioso‖, o estranho, a prática religiosa católica já não mais seria a mesma, a Europa estava
então tomada do medo e do pânico, sobretudo em relação aqueles e aquelas declaradamente
considerados como não cristão católico.
Em seguida, desde a Reforma Protestante aos dias atuais percebemos uma onda de
pavor inquisitorial ou apocalíptico, para não distanciarmos, mas focando o debate a uma
História mais atual, se citarmos a Primeira Guerra Mundial e os conflitos que se seguiram
após 1914, grupos de protestantes procuraram elencar uma séria de elementos apocalípticos
que sucumbiram em práticas de violência ao comunismo, ao judaísmo e até mesmo ao
catolicismo. Tais contextos se deram com a Revolução Bolchevique em 1917, em seguida
com a criação da Declaração Balfour (1917) quando o governo britânico apoiou a criação do
Estado Judeu na Palestina e futuramente a criação da Liga das Nações. Todos esses contextos
históricos deram ao protestantismo norte-americano um motivo de acreditar ferrenhamente na
profecia de Apocalipse 16, 14, o anticristo revivido.
Segundo Karen Armstrong esse período foi uma
Sem dúvida a Jihad vai muito mais além do que hoje defende grupos ligados a
formação do Estado Islâmico, porém nos últimos anos, o Islã, vem sendo representado pela
mídia internacional como um novo bode expiatório, ―mal‖ humanitário que deve ser coibido.
Entretanto não sem deixar brechas e questões, grupos que se denominam muçulmanos, mas
que são praticantes de terrorismo vem espalhando pelo planeta o ―medo‖, o medo do
extremismo.
Mas, talvez para alguns, o que pode vir a ser de grande surpresa, é entender que
apenas bombas e estopins não se limitam a atos desumanos religiosos, até porque, os
discursos de líderes religiosos que vem causando uma ―nova cruzada‖ ao infiel vem sendo
destaque em discurso que reverberam no cotidiano religioso contra aqueles e aquelas que não
compactuam com tais atitudes sacralizadas.
Tais características chegam à modernidade como um dado expandido, pois a nova
forma de leitura religiosa vem a cada dia sendo um campo de difusão, sobretudo no Brasil
com a nova onda de grupos neopenteconstais fazendo emergir o discurso da valorização do
―verdadeiro‖ cristão.
Se olharmos de forma mais ampla tal prática não fica apenas no Brasil, estende-se para
a América do Norte e ao Oriente Médio, o século XXI anunciou não o fim das religiões como
apostou Freud e Young, na verdade, juntamente com as novas formas de interpretar a cultura
e projetar a segregação diante do mal do século freudiano grupos apostam nos espaços
sagrados, sobretudo em países onde o grau de escolarização é menor, acabando por serem
levados por líderes carismáticos ou de discursos de uma cruzada do século XXI ao caos
humanitários onde tudo e todos passas no espectro do inimigo.
Para Marty e Appleby in Armstrong, os sistemas fundamentalistas religiosos,
São formas de espiritualidade combativas, que surgiram como reação a alguma
crise. Enfrentam inimigos cujas políticas e crenças secularistas parecem contrárias à
religião. Os fundamentalistas não veem essa luta como uma batalha política
convencional, e sim uma guerra cósmica entre forças do bem e do mal. Temem a
aniquilação e procuram fortificar sua identidade sitiada através do resgate de certas
doutrinas e práticas do passado. Para evitar contaminação, geralmente se afastam da
sociedade e criam uma contracultura; não só, porém, sonhadores utopistas.
Absorvem o racionalismo pragmático da modernidade e, sob a orientação de seus
líderes carismáticos, refinam o ―fundamental‖ a fim de elaborar uma ideologia que
fornece aos fiéis um plano de ação. Acabam lutando e tentando ressacralizar um
mundo cada vez mais céptico. (ARMSTRONG, 2009, p.11)
Essas ondas de fundamentalistas no século XXI se destacam em espaços que vão além
do campo do sagrado, obedecem a uma lógica espiritualista e disso não abrem mão, e também
de território. São campos de atuação, espaços entre a pertença e a não pertença.
Nesse ponto há uma dupla ação social: o ―contrato de verdade instituído‖ e uma
―aceitação decodificada como cultura‖. Nesse ponto opera-se a dinâmica da
institucionalização de um saber ao passo que grupos introjetam ou compactuam e
sentem-se aptos a fazê-lo, isto é, se emolduram no esquadrinhamento de uma
verdade instituída. Nesse ponto temos o momento em que o discurso passa da
oralidade e atinge o escriturístico à materialização nos corpos sociais, o
aparelhamento discursivo chega, portanto, no seu objetivo, isto é, fomentou e
institucionalizou o seu saber como códigos de condutas a serem seguidos.
(TORRES, 2016, p. 38)
É um jogo da sedução entre o sagrado e o profano. Mas um jogo muito perigoso, pois
em épocas distintas das nossas, tais práticas extremistas emergiram numa (re)produção de
exercícios fascistas.
O fascismo não interessa apenas ao campo da política, mas também ao campo da ação
política religiosa, e talvez até mais ao religioso, pois este não se questiona, pois é deus quem
autoriza e uma vez entendendo as ações como atos políticos, aí vemos, nos discursos mais
habituais, uma lógica ―tradicional‖ que busca romper com a cultural dinâmica, e em ação, em
prol da salvação do fiel em meio a um mundo impuro.
Para Michel de Certeau, tais práticas escriturísticas sociais atuam como pontos bem
distintos e articulados sendo de tal modo que
Essa grande paixão mítica e reformadora funciona a partir de três termos que a
caracterizam: de uma parte, um modelo ou ―ficção‖, isto é, um texto; de outra parte,
os instrumentos de sua aplicação ou de sua escritura, isto é. Instrumentos; enfim, o
material que é ao mesmo tempo suporte e encarnação do modelo, isto é, uma
natureza, essencialmente uma carne que a escritura transforma em corpo. Por meio
de instrumentos, conformar um corpo àquilo que lhe define um discurso social, tal é
o movimento. Parte de uma ideia normativa veiculada por um código de
intercâmbios econômicos ou pelas variantes dela, apresentadas nos relatos do
legendário comum nas criações do saber. No começo, há uma ficção determinada
por um sistema ―simbólico‖ que tem a força da lei, portanto uma representação (um
teatro) ou uma fábula (ou um ―dito‖) do corpo. Isto é, um corpo colocado como o
significante (o termo) de um contrato. Essa imagem discursiva deve informar um
―real‖ desconhecido, outrora designado como ―carne‖. Da ficção ao desconhecido
que lhe dará corpo, a passagem se efetua por instrumentos que se multiplicam e
diversificam pelas resistências imprevisíveis do corpo a (con)formar. Torna-se
necessária uma fragmentação indefinida da aparelhagem para ajustar aplicar cada
um desses ditos e/ou saberes do corpo, modelo unificadores, à opaca realidade
carnal cuja complexa organização se revela no decorrer das intervenções resistindo-
lhe. Entre o instrumento e a carne, existe, portanto, um jogo que se traduz de um
lado por uma mudança na ficção (uma correção do saber) e, do outro, pelo grito, dor
inarticulável, impensado da diferença corporal (CERTEAU, 1990, p. 237).
Tanto uma teologia fundamentalista quanto progressista faz uma crítica a separação
entre o espaço público e privado no que diz respeito a religião, assim como uma crítica ao
estado contemporâneo, a forma como o poder é exercido no mundo atual. Porém se ambas
comungam de uma crítica direcionada a valores da modernidade, os fundamentalistas querem
apenas transformar uma estrutura de opressão por outra, idealizada em um estado pré-
moderno. Já os pluralistas querem contribuir na construção de uma sociedade onde essas
estruturas de opressão sejam extintas.
―A bancada da bíblia‖, como dito anteriormente tem em sua base uma teologia política
fundamentalista, conservadora, que em defesa dos valores cristãos tradicionais ver a revelação
divina como algo a ser imposto, sem nenhuma pretensão de libertar os pobres que sofrem
diante das relações econômico-sociais estabelecidas, pelo contrário, a prática desses senadores
e deputados acabam por favorecer o capital e os grupos dominantes.
Já as teologias progressistas como a teologia da libertação, ver no espaço público uma
possibilidade de transformação social através de uma prática religiosa, reivindicando uma
inserção da religião na esfera pública enquanto uma religião dos pobres, uma religião que está
ao lado dos oprimidos, pois enquanto houver essa circunscrição da religião apenas ao espaço
privado, com uma mística que separa o sagrado e os caminhos espirituais das lutas travadas
diariamente, o caráter libertador da religião estaria sendo reprimido em favor de uma sistema
econômico-social que beneficia apenas uma minoria e relega a maior parte da humanidade a
opressão e pobreza.
Se pensarmos os Direitos Humanos em uma perspectiva hegemônica, vemos que eles
podem relacionar-se com as políticas neoliberais sem que façam uma crítica ao modelo desse
sistema. Podem reproduzir uma visão do norteglobal que sirva aos anseios da globalização
neoliberal, bem como uma maior valorização do indivíduo com relação ao grupo social, do
mesmo modo as teologias fundamentalistas podem apresentar inúmeras afinidades com a
política econômica neoliberal.
O neoliberalismo se configura como um encolhimento do espaço público, através da
privatização de serviços fundamentais e de uma globalização hegemônica, já as teologias
fundamentalistas buscam nesse encolhimento do espaço público ocupar algo que foi perdido
com o advento da modernidade, buscam um momento de pós-secularização, onde a religião
volte a ter uma papel predominante na política e na organização social.
Pensar os Direitos Humanos em contato com essa realidade neoliberal e as teologias
políticas fundamentalistas, é pensar em ―novos Direitos Humanos‖, que não seja fruto de uma
visão de mundo fundada no capitalismo, colonialismo e patriarcado. Podemos citar como
exemplo de Direitos Humanos numa perspectiva hegemônica os casos de estupro contra
mulheres serem considerados apenas como crime sexual, quando também são fortemente
marcados por uma perspectiva patriarcal, onde deveriam ser vistos também como crimes
políticos.
As teologias políticas tradicionais colocam limites aos Direitos Humanos, por ver
nesses uma declaração secular, enquanto a única gramática de valores válidas é uma
gramática divina, essencialmente de caráter abraânico, seja do cristianismo, islamismo ou
judaísmo. Portanto outras formas de relacionar-se com o sagrado, são vistas por uma
perspectiva fundamentalista como não verdadeira, e assim tornam-se frutos de ataques.
Aqui nos interessa pensar as relações entre grupos étnicos e suas formas de
religiosidade. A religião é um ponto central de identificação entre determinadas comunidades
étnicas, não sendo possível falar em autonomia desses povos sem liberdade religiosa, mas os
limites impostos por uma teologia fundamentalista, coloca em risco todas as conquistas tidas
até então com relação aos Direitos Humanos e o respeito a liberdade religiosa e autonomia
dos povos.
Os povos indígenas brasileiros, tem nos seus aspectos culturais, incluindo as
manifestações com o sagrado, como um dos elementos de identificação étnica, o que ajuda a
estruturar as suas lutas por demarcação de terras, por acesso a serviços públicos como saúde e
por uma educação diferenciada, onde as suas práticas religiosas tornam-se um eixo central da
vivencia dos membros da comunidade dentro da escola.
Os Direitos Humanos para os povos indígenas não podem estruturar-se numa
perspectiva hegemônica, centrada nos valores da modernidade, pois como vimos, se uma
sociedade laica com espaços específicos para a religião na esfera privada, com uma escola
também laica, correspondem aos anseios de uma sociedade ocidental, a emancipação e agenda
de luta dos povos indígenas, passa necessariamente por uma escola não laica, por uma escola
que seja pública, mas ao mesmo tempo permeada por valores sagrados que fazem parte
daquela comunidade.
Ao contrário das teologias fundamentalistas que podem servir as políticas neoliberais,
bem como colocam desafios aos Direitos Humanos, as teologias progressistas podem servir
como uma possibilidade de diálogos para a construção de Direitos Humanos não
hegemônicos.
As teologias indígenas por exemplo, trazem uma possibilidade de novas formas de
interação entre mulheres e homens com a natureza, contrárias de uma perspectiva neoliberal
que ver a natureza unicamente como algo a ser explorado. As novas agendas dos Direitos
Humanos pautadas em movimentos ambientalistas, podem enriquecer-se a partir desse
diálogo com culturas não ocidentais.
As teologias feministas também trazem novos aspectos de valorização da mulher,
novas formas de lutas contra o patriarcado, que dentro de uma perspectiva não hegemônica
dos Direitos Humanos, contribui para desconstrução dos valores historicamente aceitos que
perpetuam diversas violências de gênero.
A continuação de preconceitos coloniais contra grupos étnicos vem a tona também
com teologias progressistas, como o discriminação contra membros de religiões
afrodescendente, a luta por liberdade religiosa no Brasil, pensada a partir das religiões de
origem africana, deve ser vista como uma luta contra o racismo, contra preconceitos
construídos no período colonial.
São muitos os exemplos de grupos étnicos que tem em teologias progressistas o centro
de suas lutas, podendo ser estabelecido um diálogo frutífero entre essas teologias e os Direitos
Humanos, além dos já citados povos indígenas e negros no Brasil, poderíamos também
destacar a luta do povo palestino contra a opressão que sofrem, a religião nesses casos termina
por ser um elemento de maior impulsão para as lutas do que especificamente os Direitos
Humanos.
O diálogo existente entre as teologias progressistas, que apesar das diferenças
consegue aproximar cristãos, islâmicos, judeus, etc. Também podem servir como modelo para
o diálogo dos Direitos Humanos com diferentes realidade do mundo, sem que haja uma
resposta pronta para todos os problemas, superando uma visão de Direitos Humanos do norte-
global.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
RESUMO
O presente trabalho problematiza a implantação da Lei nº 10.639/03 que estabelece a
obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira na educação básica. Além de
trabalhar a invisibilidade étnica no contexto da Educação e do percurso sócio-histórico da
população negra no Brasil. Retrata especialmente, algumas peculiaridades da interface da
história e das leis que influenciaram a vida da população afrodescendente no país. Ao
trabalharmos, inicialmente, os ranços históricos da colonização e da escravidão, realizamos
algumas reflexões acerca do racismo no país e seus reflexos na vida da população negra. Em
seguida nos debruçamos sobre os desafios e avanços representados pela Lei nº 10.639/03,
destacando a necessidade do respeito à diversidade étnica no campo da educação. Por fim,
discorremos sobre a necessidade de mudanças no sistema educacional, no sentido de
promover o debate étnico-racial e o respeito à diversidade religiosa. Esperamos que o nosso
trabalho amplie a discussão e o conhecimento sobre a questão étnico-racial na educação,
fomentando o empoderamento da população negra e a discussão sobre os Direitos Humanos
no viés étnico. Fornecendo assim, subsídios aos profissionais que lidam direta ou
indiretamente com esta temática.
INTRODUÇÃO
3
Psicóloga pela UNIFAVIP Devry. Emanuellelacerda.psi@hotmail.com
4
Aluna da Especialização em Gestão Pública do Instituto Federal de Pernambuco, Psicóloga Especialista em
Saúde Mental e Coletiva pela UNIFAVIP Devry. Claudenilima@gmail.com.
5
Psicóloga pela UNIFAVIP Devry, pedagoga pela UPE e especialista em Educação e igualdade racial pela
UFRPE. deboracardosopsi@gmail.com
Tendo em vista, o cenário de invisibilidade da cultura negra no currículo, tanto no
oculto quanto no formal na educação brasileira, mesmo o Brasil sendo um dos países com
maior diversidade étnica do Ocidente. Além do racismo estrutural que marca de maneira
transversal, não apenas a educação, mas toda a nossa sociedade. Ainda temos o mito da
democracia racial que ainda é vendido internamente e externamente a respeito das nossas
relações étnico-raciais.
Nesse contexto inquietou-nos pesquisar sobre a problemática: Qual o impacto da
implantação da Lei nº 10.639/03 no combate ao racismo no Brasil? Diante dessa problemática
temos como objetivo geral: Problematizar o impacto do ensino de história e cultura Afro-
brasileira no combate ao racismo no Brasil. Temos como objetivos específicos: descrever a
história da cultura afro-brasileira, identificar o racismo e a intolerância religiosa no contexto
da educação, analisar os desafios e avanços representados pela Lei nº 10.639/03, expor o mito
da democracia racial e seus impactos sociais e promover o debate sobre a importância da
questão étnica na promoção dos direitos humanos.
O trabalho justifica-se diante da situação de opressão a qual a população negra é
submetida e mediante o cenário político de retrocesso nas lutas progressistas de caráter
afirmativo. Diante da crescente onda de manifestações de cunho racista, praticado
principalmente através das redes sociais e muitas vezes por crianças e adolescentes. Além do
emergente crescimento dos casos de intolerância religiosa, praticados contra membros de
religiões afro-brasileiras. E academicamente para reafirmar os direitos humanos e a
importância da pesquisa sobre questões étnicas em um momento político e social de tamanha
intolerância.
A perspectiva metodológica abordada pelo trabalho segue os parâmetros da pesquisa
qualitativa, apresentada por Minayo (1994, p.21), como:
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa, nas
ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja,
ela trabalha com o universo dos significados, motivos, aspirações, crenças, valores e
atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos
e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.
O estudo qualitativo, portanto, mostrou-se mais adequado a essa pesquisa por se tratar
de uma questão de caráter social. O presente estudo caracteriza-se como uma pesquisa
bibliográfica que de acordo com Fonseca (2002), consiste em um levantamento de dados de
trabalhos já publicados, como artigos científicos, livros e revistas periódicas. Coletados
principalmente nos arquivos de instituições públicas, devido o levantamento histórico das
legislações que impactaram na vida da população negra entre os séculos XIX e XXI.
Coletamos essas informações, principalmente nos sites dos arquivos do Palácio do Planalto e
Senado. Caracterizando assim o principal instrumento de coleta de dados da pesquisa como
documental.
Para debater sobre os desafios do ensino de história afro no Brasil, teremos que
remontar a algumas das chagas estruturais do nosso país. A marca do período colonial, o
ranço do racismo e da intolerância religiosa. Nesse sentido subdividimos o trabalho em dois
capítulos, no primeiro iremos fazer um breve recorte histórico da cultura afro-brasileira.
Tomando como referencial os dados documentais coletados através dos sites oficiais de
órgãos da República Federativa do Brasil, especificamente Palácio do Planalto e Senado
Federal. No segundo capítulo problematizaremos os desafios e avanços representados pela Lei
nº 10.639/03, na construção de uma sociedade mais igualitária. Serão utilizados Gomes
(2008), Bairros (2017) e Caputo (2008) nessa construção.
6
Utilizamos o verbo conquistar ao invés de descobrir, tendo em vista que os países colonizados em sua maioria
já detinham população originária estabelecida.
7
Período compreendido entre meados do século XVI e início do século XVIII, no qual ocorreu o apogeu
econômico da Capitania de Pernambuco.
aqui chegavam já eram sobreviventes. Posteriormente, o sofrimento dos navios negreiros foi
ilustrado, através dos versos do poeta abolicionista Castro Alves.
(...) Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!
(ALVES, 1997, p. 185).
O Nordeste é a região das oligarquias, porque foi aí que elas conseguiram inventar
uma região, um nome da qual falam e reivindicam. Esta região conseguiu funcionar
com eficiência, como uma maquinaria imagético-discursiva destinada a evitar a
marginalização econômica e submissão política total destes grupos rurais e
tradicionais. (ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2011, p.147)
Apesar desse contexto de opressão, foi no Nordeste que surgiu o maior símbolo de
resistência à escravidão no Brasil, o Quilombo dos Palmares. O mesmo se localizava na atual
região da Serra da Barriga, área rural do município de União dos Palmares, atualmente estado
de Alagoas, mas na época território da Capitania de Pernambuco. Acredita-se que sua criação
ocorreu em meados de 1630, Palmares tornou-se o mais importante dos quilombos brasileiros.
(GELEDES, 2012).
O Quilombo dos Palmares teria sido fundado pela princesa do Congo Aqualtune, a
mesma havia sido capturada em conflitos entre o reino do Congo e forças portuguesas na
África. Teria sido vendida para colonos na Capitania de Pernambuco, especificamente para a
região do atual estado de Alagoas. Conseguiu escapar do cativeiro e junto com outros
africanos fundou o Quilombo dos Palmares. Seu filho Ganga Zumba tornou-se líder em
Palmares e posteriormente, seu neto Zumbi, foi o último e principal líder do Quilombo.
(LINS; REZENDE, 2014).
Inicialmente liderado por uma guerreira e posteriormente por seus descendentes,
também guerreiros, não há consenso se a forma de governo interna em Palmares pode ser
chamada de monárquica. Pelo menos, na visão eurocêntrica que alimentamos a respeito dos
regimes monárquicos. Mas o poder centralizado e os laços consanguíneos entre as lideranças
apontam para essa forma de governo.
Palmares representou quase um século de resistência negra à escravidão e ao poder da
Capitania de Pernambuco e do governo de Portugal. Resistindo a várias investidas das forças
militares brancas, porém, mesmo representando um marco de resistência, Palmares sucumbiu
à morte do seu líder Zumbi. Em 20 de novembro de 16958, Zumbi foi capturado,
posteriormente executado e teve sua cabeça exposta na Praça do Carmo em Recife.
(SILVEIRA, 2003).
Apesar do fim trágico, que só ilustra o grau de repressão aos negros no período
colonial, a memória de Zumbi iria atravessar os séculos como símbolo de resistência. Mas a
opressão aos negros ainda teria outros tristes capítulos. Mesmo com a Independência de
Portugal, ocorrida em 1822, o clima de tensão só se acentuou. E a resistência se reorganizou e
em 1835 estourou em Salvador a Revolta dos Malês. Segundo Reis (2008), o movimento
liderado por escravos africanos de origem muçulmana tinha como objetivo libertar outros de
mesma etnia e religião. Porém foi duramente e rapidamente reprimido pelas forças do Estado.
Como o receio de novas revoltas se espalhava pelas províncias, além da emergente
pressão internacional pelo fim da escravidão no Brasil, começaram a surgir leis que buscavam
regular a atividade e acalmar a opinião pública. A primeira delas foi a Lei nº 581/1850
(BRASIL, 1850), conhecida como Lei Eusébio de Queirós que proibiu o tráfico de escravos
no Brasil. Mas o ―avanço‖ foi ofuscado pela Lei complementar à Constituição de 1824,
promulgada em 1854 que decretou a proibição de negros frequentarem a escola.
Seguindo a máxima de pequenos gestos para amenizar o mal-estar social e político
sobre a Escravidão, em 1871 foi assinada pela princesa Isabel a Lei nº 2.040/1871 (BRASIL,
1871), conhecida como Lei do Ventre Livre. A mesma decretava que todos os filhos de
escravos que nascessem a partir daquela data estariam livres. Outra iniciativa com o intuito de
―flexibilizar‖ o sistema escravocrata foi a Lei nº 3.270/1885 (BRASIL, 1885), conhecida
8
Data escolhida para celebração do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.
como Lei do Sexagenário, tornava livres os escravos com mais de sessenta anos. Uma
verdadeira afronta à luta abolicionista, tendo em vista que a expectativa de vida dos escravos
não chegava a quarenta anos.
Por fim, as pressões internas e externas venceram e em 13 de maio de 1888 a princesa
Isabel, exercendo o cargo de regente assinou a Lei nº 3.353/1888 (BRASIL, 1888). Conhecida
como Lei Áurea, extinguiu a Escravidão no país. Mesmo depois da Abolição da Escravidão e
Proclamação da República, as opressões persistiram. Nenhuma iniciativa de afirmação,
indenização, assistência ou proteção da população negra foi tomada no período pós-abolição.
Muito pelo contrário, o governo republicano foi responsável pelo Decreto 528/1890
(BRASIL, 1890), que vedava a imigração de africanos no país. Também foi responsável pela
repressão em 1910 a Revolta da Chibata. Um motim de marinheiros que lutava pelo fim dos
castigos físicos na Marinha e tinha forte componente étnico. Os negros e mestiços, apesar de
maioria populacional no período republicano, não exerciam poder político.
Encontravam-se marginalizados politicamente, economicamente e até territorialmente,
sendo o grupo populacional mais afetado pela segregação urbana desde o século XIX. A
população negra se tornou a principal vítima do modelo urbanização adotado em várias
metrópoles brasileiras na virada do século XIX para o XX. Afinal o Brasil passava por um
processo de saída da população do campo, no período pós-abolição, o que ocasionou um
processo de urbanização desordenado, marcado pela segregação territorial, algo que persiste
até os nossos dias.
Até a literatura brasileira já refletiu o ranço escravocrata, tendo tido um período de
forte influência eugenista, a obsessão pelo branqueamento das personagens na busca de uma
estética europeia tinha sido a marca do século XIX e início do século XX. Monteiro Lobato 9
chegou a ser entusiasta do ideal eugenista, fazendo oposição a essa realidade, um autor negro
que expôs as mazelas sociais e de classe no país no início da República foi Lima Barreto10.
Mas só com o Modernismo é que o cenário de influências físicas eurocêntricas se
alteraria. O Movimento Modernista buscou a afirmação de uma estética nacional desde a
Semana de Arte Moderna de 1922. Na obra de Mário de Andrade, Macunaíma de 1928 a
personagem principal representaria essa síntese de influências étnicas e culturais. A busca por
uma estética nacional persistiria entre os modernistas, essa seria consagrada através das outras
gerações dos modernistas. Como por exemplo, através da obra de Jorge Amado que transita
entre a segunda e terceira geração do ciclo modernista, representa a máxima dessa estética
mestiça.
Contemporaneamente a esse momento passa a ganhar força o mito da democracia
racial. Pereira (2012, p. 112) defende que: ―A democracia racial, muito associada ao clássico
9
José Bento Renato Monteiro Lobato foi um escritor pré-moderno, ainda popular entre os brasileiros.
10
Afonso Henriques de Lima Barreto foi um jornalista e escritor pré-moderno, que infelizmente não goza de
muita popularidade entre os brasileiros.
livro de Gilberto Freyre publicado em 1933, Casa-grande & senzala, tornou-se o centro de
construção da própria identidade nacional na primeira metade do século XX.‖.
A ideia da democracia racial representada pela mestiçagem se apresenta como uma
forma de silenciar conflitos, não necessariamente solucioná-los. Uma saída à brasileira, tendo
em vista que historicamente o Brasil é um país que busca soluções ―menos conflituosas‖,
mais explicitamente que se omite para não lidar com questões relacionadas às desigualdades
estruturais. A romantização da questão étnica no Brasil demonstra uma tentativa superficial de
conciliação do povo brasileiro com a própria negritude e principalmente com séculos de
opressão aos negros.
No plano cultural, Jorge Amado tornou-se indiretamente porta-voz da ideia de
democracia racial, se não no plano político ou acadêmico, mas no plano simbólico. Fez da sua
obra uma bandeira desse caldeirão étnico, apesar de não minimizar as tensões raciais e
religiosas, mas romantizou o conceito de democracia racial no país.
(...) é mensurável dizer que Amado estava submerso nos objetos simbólicos e
ideológicos de seu tempo e respondia por eles: é o caso da democracia racial tão
exaltada em Tenda dos Milagres e que encontrava respaldo nas formulações
ideológicas de uma época, como em Casa Grande e Senzala de Gilberto Freyre:
―assim, se Freyre foi um dos ―pais da ideia‖ — ou ao menos aquele que a batizou —
, Jorge Amado foi seu grande artista e divulgador‖. (CHWARCZ, 2009 apud
ESTEVES, 2015, p. 129 aspas do autor).
11
Mesmo que essa secretaria tenha sido extinta pelo ―governo‖ Temer, o período que a mesma permaneceu
ativa, desempenhou um importante papel de empoderamento político e institucional da população negra
brasileira.
privilegiado. Principalmente, se olharmos a forma como concebíamos a escola, que sofreu
influência direta da família nuclear burguesa ao privilegiar a infância, a educação dos filhos e,
por sua vez, a reclusão da mulher na esfera privada, como defendido por Ariès (2006), esse
paradigma promoveu a ascensão do modelo escolar.
Nesse cenário, devemos levar em consideração que o racismo não nasce na escola,
mas dentro dela assume configurações próprias. O racismo institucional, a invisibilidade da
cultura afro-brasileira, o preconceito linguístico, o bullying racial e o racismo religioso são
configurações do racismo no contexto escolar. Podendo ocorrer entre pares, ou mediante uma
relação hierarquizada institucionalmente. Mas para além das práticas individuais o racismo
pode ser visto como um sistema ideológico que permeia às relações.
12
Deslocamento forçado dos africanos de seus territórios motivado pelo tráfico negreiro, explorado pelas
potências europeias no período colonial.
período longo, mas não foi o suficiente para promover equidade na educação de brancos e
negros.
Sobre as especificidades da Lei 10.639/03, Gomes (2008) destaca que mesmo depois
de anos de criação, a mesma ainda sofre com resistências em várias esferas. A autora atribui
ao mito da democracia racial como um dos fatores dessa resistência.
Muitas vezes, o caráter universal e abstrato do discurso em prol de uma democracia
para todos acaba uniformizando e homogeneizando trajetórias, culturas, valores e
povos. Por isso, os movimentos sociais cada vez mais buscam ampliar a noção de
democracia, a fim de que ela insira a diversidade e apresente alternativas para lidar
com as políticas de identidade. (GOMES, 2008, p.70).
13
Mãe de santo, sacerdotisa dentro das religiões de matriz africana.
14
Sacerdotisa, escritora e militante dos Direitos Humanos falecida em 27 de maio de 2017.
Eu só tenho o terceiro ano primário. Sempre quis estudar, mas meu pai achava que
mulher não podia aprender a escrever muito para não escrever cartas de amor. Saí da
escola, que na verdade, não era bem uma escola. Naquela época, no interior da
Bahia, as filhas dos coronéis iam para Salvador, faziam um curso por lá e voltavam
professoras. Elas eram a escola. Não tinha mais essas aulas, mas lia nos almanaques
que vinham no Biotônico Fontoura e lia tudo o que podia. Escrever também
escrevia. Com carvão, com pedra de cal, com varinha na areia. Acho que foi assim
que me tornei escritora. Mas isso eu me tornei. Predestinada mesmo estava era para
ser Ialorixá. Esse era meu Odu.
(CAPUTO; PASSOS, 2007, p. 94)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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2017.
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____ . Lei nº 3.353/1888. Lei Áurea. Rio de Janeiro, 1888. Disponível em:<
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CAPUTO, Stela Guedes. Ogan, adósu òjè, ègbónmi e ekedi - O candomblé também está na
escola. Mas como? In: CANDAU, Vera Maria (org.). Multiculturalismo: diferenças culturais
e práticas pedagógicas. 2. ed. - Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. p. (149- 181).
FONSECA, José João Saraiva da. Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza: UEC,
2002.
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https://www.geledes.org.br/historia-da-escravidao-negra-brasil/ > Acesso em 24 de julho
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GOMES, Nilma Lino. A questão racial na escola: desafios colocados pela implementação da
Lei 10.639/03. In: CANDAU, Vera Maria (org.). Multiculturalismo: diferenças culturais e
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LINS, Marcela; REZENDE, Beto. Zumbi, Ganga Zumba, Aqualtune e Manú: quatro
nomes, uma só serra. Fundação Joaquim Nabuco, 2014. Disponível em:<
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PEREIRA, Amilcar Araújo. ―Por uma autêntica democracia racial! ‖: os movimentos negros
nas escolas e nos currículos de história. Revista História Hoje, v. 1, n. 1, p. 111-128, 2017.
REIS, João José. A revolta dos Malês em 1835. Universidade Federal da Bahia, 2008.
SANTOS, Vilson Pereira dos. Técnicas da tortura: punições e castigos de escravos no brasil
escravista. In: Enciclopédia Biosfera. Goiânia, v.9, n.16, p. 2393- 2408, 2013.
RESUMO
Colonizado por portugueses de religião católico-cristã, o Brasil durante séculos reprimiu e
condenou as práticas de religiões africanas sobre o discurso de serem práticas satanistas e/ou
fetichistas, além de classificarem o homem negro como meras ―peças‖ de mercado cujo
objetivo era o trabalho braçal escravo. Pernambuco não fugiu do ciclo de escravidão nacional,
sendo uma das capitanias hereditárias que mais receberam negros traficados da África, seja
para o extrativismo primitivo, seja para o cultivo da terra. Caruaru, assim como outras tantas
cidades brasileiras possui uma dívida histórica com o povo negro, contudo ela traz em seu
próprio nome a carga simbólica da essência religiosa do povo negro escravizado, o ―caruru‖:
Oferenda feito a partir do kalu‘lu e dedicada aos orixás africanos. O presente artigo tem como
objetivo fazer uma tentativa de resgatar à história do povo negro desde sua chegada ao Brasil,
até a formação dos modernos terreiro, esse artigo é um tributo a historia negra de Caruaru.
Introdução.
1- Período Colônia.
15
Graduando em Comunicação social e jornalismo, pelo centro universitário vale do Ipojuca; Pesquisador de
Iniciação cientifica no projeto ―Dos calundus aos terreiros de candomblé de Caruaru‖.
Hugo.weslley2@gmail.com
Durante séculos o Brasil proibiu manifestações religiosas e culturais do povo negro,
graças a dogmas e práticas de origem católica-cristã que reprimia com severas penas as
praticas não cristãs em solo brasileiro. Com uma colonização de caráter exploratório-
aventureiro o Brasil em seus primórdios coloniais era visto com uma terra de oportunidades e
de recurso naturais ilimitados, porém, para extrair esses recursos e mesmo para o trato com a
terra, o trabalho braçal tornou-se necessário. Começou-se então o uso de mão de obra escrava
e tráfico humano no Brasil.
Tidos como animais sem alma, de cultura fetichista e demoníaca, os povos negros de
países africanos, como Nigéria, Moçambique e Angola, eram traficados para solo brasileiro a
fim de trabalharem na produção e manufatura de cana de açúcar, algodão e criação de gado,
bem como diversas outras atividades extrativistas em meados do século XVII. Isso posto, em
seu livro ―Candomblé e Umbanda, caminhos de devoção brasileira‖, Vagner Gonçalves da
Silva afirma que o processo de escravidão do povo negro não se dava apenas pelo tráfico
humano e o trabalho escravo, mais também pela transculturação do negro que tinha sua
família e estruturação social desfeita, além de ser obrigado a viver com pessoas de culturas
diferentes da sua, aprender novos hábitos, língua e religiosidade (seja ela branca ou negra):
Pessoas com relações de parentescos próprias, vivendo sob uma determinada
organização social, política e religiosa, fossem retiradas desses contextos para
tornar-se mão-de-obra escrava numa terra distante e numa sociedade diferente da sua
(SILVA, 1994, p. 29).
Vale-se chamar atenção para o fato de que não apenas o culto dos povos africanos
estava presente e sendo reprimido na colônia portuguesa, o culto ameríndio também era
proibido e perseguido. Graças a essas perseguições muito da cultura indígena se perdeu sendo
16
Para o sociólogo Frances, Pierre Bordieu, o Habitus é a manifestação inconsciente de todos os elementos que
compõe o individuo e sua sociedade, desde seus códigos éticos e morais até suas ações inconsciente.
sequer mencionada em relatos históricos. Comparando-as com as atuais práticas sincréticas se
é possível apontar que seu foco era o culto a natureza edificada, onde o pajé tinha acesso ao
mundo dos espíritos das florestas através de uma ritualística que envolve músicas e dança (o
Toré e a Jurema). Mas não é possível precisar o quanto desse ritual foi influenciado pela
cultura africana ou europeia.
A fim de manter a ordem social e tornar os negros escravizados adeptos ao sincretismo
cristão, a Coroa portuguesa e a Igreja católica fecharam um acordo onde o negro traficado ao
chegar em solo brasileiro era catequizado, batizado e tinha seu nome alterado para nomes
cristãos (como Maria, José, Sebastião, Madalena, etc). No entanto esse ato não era garantia de
melhores condições de vida, o negro continuava sendo visto como mão de obra e objeto de
uso, sendo-lhes negada qualquer regalia ou mesmo tratamento com ser humano.
Com tudo, dentro de suas propriedades eram os senhores de engenho quem ditavam as
regras que vigeriam dentro das senzalas. Para manter os ânimos calmos dentro de suas
propriedades os donos de escravos por vezes faziam vistas grossas aos rituais que aconteciam
dentro de suas fazendas. Sob a alegação de razões folclóricas, o culto aos santos católicos se
mesclava com a ritualística litúrgica negra de canto e dança. Portanto se fazia justificável o
uso de ―batuques‖ e cânticos em iorubá/português. Essas práticas eram tidas como formas
inofensivas e primitivas dos negros que cultuavam os santos cristãos a sua maneira. Essa
prática tinha também um cunho aristocrático-governamental, pois acreditava-se que ao
permitir que os negros se manifestassem folcloricamente, sua cultura acalmaria as rivalidades
internas dentro do grupo de escravos, ligaria os negros ao seu senhor (visto então como um
―bom senhor‖) e as rebeliões seriam mais difíceis de acontecer.
Deu-se então a união sincrética dos elementos africanos e lusos. Com os negros agora
catequizados e obrigados a frequentar as abadias e templos cristãos (em seus espaços
reservados, sem o contato com o homem branco). O culto sincrético a santos católicos passou
por uma ressignificação e apropriação de símbolos, códigos e signos. Santos católicos como
São Jorge, Santa Bárbara e São Lázaro tomaram-se então representações para os orixás de
ritualística africana, suas representações imagéticas e atribuições míticas foram atreladas aos
orixás Ogum, Oyá e Omolu, respectivamente; ―O que se verificou no universo religioso do
Brasil colonial é que as religiões que compunham romperam seus limites e se traduziram
mutuamente, dando origem às novas formas, mistas, afro-brasileiras‖ (SILVA, 1994, p. 42).
Só então o livre e o reprimido se uniram em uma dicotomia possível de ser realizada
nas senzalas. Ao se utilizarem dos nomes e imagens de santos católicos os negros podiam
cultuar seus orixás, valendo-se sempre da premissa que a dança e os cânticos eram uma forma
cultural de homenagear os santos católicos dentro da construção da cultura e tradição
africana.
Ao produto deste processo de reinvenção da cultura e religiosidade africana dentro das
senzalas foi atribuída a denominação Calundu (termo de origem Banto que significa batuque
ou batucajé). Em sua publicação ―Revisando o Calundu‖, Laura de Mello Souza, defende que
o Calundu (ou os Calundunzes, no plural), eram todas as práticas mágicas-religiosas que
envolviam o homem negro e o sincretismo afro-luso (por vezes afro-luso-ameríndio)
―frequentemente referidas a danças, batuques, ajuntamentos, mas, às vezes, denominando
hábitos e usos que não pertenciam ter qualquer articulação mais coerente, a ponto de
configurarem um rito‖ (SOUZA, 2001, p. 02).
Contudo, com a modernização da sociedade brasileira o modelo de escravidão foi
tornando-se insustentável, o homem negro uma vez liberto lutaria contra as praticas sociais
vigentes e buscaria melhores condições de vida para os seus.
Outro fator que contribuiu para o crescimento dos movimentos negros e a difusão dos
ideais religiosos afro-brasileiros foram à conquista de voz representativa da mulher negra no
espaço sócio cultural. No Brasil, conhecidas como Mãe-de-santo, ou Iyalorixá, elas são
mulheres que comandam os terreiros e barracões de candomblé, sendo elas as responsáveis
pelos seus filhos de santo, templo e todos os demais encargos à religião atribulada. Essas
mulheres são então líderes não só de sua religião, mas de sua comunidade, sua opinião é
respeitada e vista como a voz de liderança e sabedoria. Pode-se dizer que esse
empoderamento feminino fez parte de um traço cultural da mulher negra na cultura africana, e
por tanto acarretou mudanças sociais no modelo cultural brasileiro de enxergar a mulher
negra. Em seu artigo científico ―O candomblé e o poder feminino‖, Teresinha Bernardo
destaca que na cultura Iorubá cabe à mulher o papel da decisão econômica e estrutural em sua
sociedade: ―É importante sublinhar, a mulher não está trabalhando para o seu cônjuge. Ela
compra a colheita do marido, a revende na feira e fica com o lucro. Nessa perspectiva, pode-
se avaliar a autonomia da mulher iorubá‖ (BERNARDO, 2005, P.02).
Dado a maior participação feminina nas decisões políticas e estruturais, durante esse
período de primórdios para a reestruturação social e origem dos protestos e movimentos
sociais negros, a mulher negra brasileira era tida como uma líder comunitária e por vezes
porta vozes do movimento:
Naquela época, as mulheres negras não tinham apenas importância simbólica no
movimento negro. Segundo depoimento do antigo ativista Francisco Lucrécio, elas
―eram mais assíduas na luta em favor do negro, de forma que na Frente [Negra] a
maior parte eram mulheres. Era um contingente muito grande, eram elas que faziam
todo movimento‖. (DOMINGUES, 2006, p.106)
Nota-se então que essas práticas punitivas e discriminatórias partiam de classes sociais
de majoritário poder em uma estrutura espiralada de dominação e tomada de voz
representativa. Isso se dá pela construção social brasileira que por séculos privilegiou o
homem branco e desfavorece o homem negro. Esses levantes sociais representam, portanto,
uma retomada da consciência das classes dominadas, o que desperta nas classes dominantes a
vontade de reagir punitivamente.
3- Caruaru.
3.1- Origens do terreiros de religião de matriz africana e afro-brasileira.
Caruaru, assim como toda região nordeste fez parte do intenso ciclo escravocrata.
Durante o período colonial a cidade de caruaru não passava de um complexo de vales e
brejos, dominada por tribos indígenas. Em seu livro ―Caruaru: Nomes e cognomes‖, Nelson
Barbalho alega que foi seguindo os cursos de rios, dentre eles o rio Ipojuca, que se deu a
chegada dos primeiros habitantes luso-extratores as áreas do vale do Ipojuca, como era
chamada a região cortada pelos rios Capibaribe e Ipojuca, para a extração de recursos
naturais. Através desse avanço nas matas e florestas, capitania hereditária adentro, foram
feitos os primeiros escravos brasileiros: os índios.
Quando Duarte Coelho se apossou de sua capitania hereditária, a grande comitiva
que o acompanhou arregaçou as mangas deu combate feroz aos índios que ofereciam
resistência aos invasores, tratou de explorar as riquezas da terra, começando a fazê-
lo com a extração do pau-brasil e, também, com o plantio de cana-de-açúcar em alta
escala e a implantação de seus primeiros engenhos, para isso necessitando de muitos
braços para a lavoura e para o eito. Tratam de prear índio a torto e a direito, a fim de
escravizá-lo e obrigá-lo a trabalhar nos engenhos implantados. (BARBALHO, 1992,
p 30).
Se a cólera já era difícil de se tratar entre a população branca abastada, entre os negros
era quase impossível precisar o número de mortes. Foi quando em 1856, O jornal ―O Paiz”
divulgou um sistema de cura criado por ―Pai Manuel‖ (não há menções a sua alforria). A
―cura da cólera‖ foi amplamente difundida no agreste pernambucano, ela consistia em um
preparo de ervas, raízes e unções, maceradas. Após sua ―cura‖ ser publicada, houve uma
queda no número de mortes, barbalho discorre afirmando: ―violento ou não, o tratamento
aplicado aos negros salvava muita gente e espalhava-se rapidamente pelas senzalas
agrestino-pernambucana‖ (BARBALHO, 1980, p.156). O surto de cólera chegou ao fim em
meados de agosto de 1856.
Conclusão.
Bibliografia.
BARBALHO, Nelson. Caruaru, de vila a cidade. Recife. Editora universitária univ. fed. de
Pernambuco. 1980
BERNARDO, Teresinha. O Candomblé e o poder feminino. Revista de estudos da religião,
nº 02. 2005
BOURDIEU, Pierre. O poder Simbólico. Rio de Janeiro. Editora Bertrand Brasil LTDA.
1989.
CASTRO, Y. Pessoa de. Língua e nação do candomblé. África: revista do centro de estudos
Africanos da USP. Nº 04. 1981.
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar a importância dos Direitos Humanos na inclusão
das religiões afro-brasileiras, considerando o racismo por trás da descriminação religiosa . A
metodologia aqui sustentada parte de uma análise de conteúdo, onde foram buscadas
importantes informações sobre o tema em artigos, livros e pesquisa bibliográfica. O estudo a
respeito desse tema alimenta o conhecimento social e instiga a pesquisa acadêmica com o
objetivo de minimizar os impactos sobre as pessoas que aderem a essa prática religiosa, assim
como, influencia a inclusão religiosa na sociedade brasileira. Esse problema decorre de
práticas racistas oriundas do período da escravidão, onde existe a relação
negro/escravo/África, fazendo com que as religiões de matriz africana sejam consideradas
menos dignas de apreciação, e as pessoas que as proferem sejam tachadas como ―anticristos‖
ou nomes que sugiram que a religião não deve ser apreciada. Por isso, será analisada também
a origem dessa intolerância religiosa relacionada ao racismo.
INTRODUÇÃO
17
Graduanda do Curso de Direito da UPE – Campus Arcoverde, integrante do grupo de pesquisa ―Grupo de
Estudos e Pesquisas Transdisciplinares sobre Meio Ambiente, Diversidade e Sociedade‖ E-mail:
mariaiqueirozsantos@gmail.com
praticar seus cultos. Por isso, mostra-se necessário que entidades governamentais e não
governamentais atuem em favor desta minoria.
Foi a partir disso, que se resolveu problematizar a importância dos Direitos Humanos na
inclusão das religiões de matrizes africanas no Brasil, tendo como objetivos específicos
analisar a origem da intolerância exercida contra as religiões afro-brasileiras e explicitar a proteção das
instituições dos Direitos Humanos no combate à intolerância religiosa.
O presente artigo parte de uma pesquisa bibliográfica, envolvendo artigos e livros e adere
a uma metodologia fundada em uma pesquisa qualitativa, que visa analisar o conteúdo
coletado, a fim de influenciar de forma positiva na sociedade. Além disso, a pesquisa é
explicativa, pois se pretende explicitar a origem da intolerância religiosa explicando a relação
da escravidão, do negro e da segregação.
O trabalho possui relevância social, pois é de fato, imprescindível para uma sociedade
harmoniosa que as populações vivam em tempos de paz, sendo reprimida qualquer ideia que
induza a segregação racial e a intolerância religiosa. Do ponto de vista acadêmico, a
relevância do presente trabalho se atem ao fato de que a academia é responsável por formar
profissionais que atuem na área de proteção de diversas minorias, entre elas, os negros. Sendo
assim, é necessário que existam pesquisas que instiguem a inclusão social e religiosa de todas
as populações brasileiras, e que permitam a sociedade familiarizar-se com os temas e com os
acontecimentos que de fato, atingem a sociedade.
Primeiramente, será feita uma introdução à escravidão, de forma a relacionar como a vida
do negro foi diminuída e ligada a sua cultura de forma a serem excluídos em conjunto da
sociedade atual, após essa demonstração, será feito em um breve momento, uma análise sobre
o racismo e a intolerância religiosa, depois será demonstrada a proteção dos Direitos
Humanos a partir das entidades protetivas no combate a segregação religiosa no Brasil, e por
fim, relacionando os dois temas, será explicitado a origem dessa intolerância religiosa e as
descobertas feitas a partir do presente artigo.
1. A ESCRAVIDÃO E O NASCIMENTO DAS RELIGIÕES AFRO-
BRASILEIRAS
18
Lei Áurea de 13 de maio de 1888
19
A partir de 1988 foram apresentadas uma série de denúncias perante a Polícia Federal e o Conselho de Defesa
dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), sobre a prática de trabalho escravo e o desaparecimento de dois
jovens nessa fazenda.
20
As pessoas poderiam ser escravizadas por dívidas ou por serem desertores, por exemplo.
21
CIDH. Corte Interamericana de Direitos Humanos. Caso Fazenda Brasil Verde vs. Brasil, 2016.
Frente a ideia de escravidão, boa parte da cultura negra sofreu descriminação, como
por exemplo, crenças, objetos, armas, danças e adornos, como se afirma no livro Para uma
história do negro no Brasil (1988)22:
Como foi visto a religião africana ou qualquer religião que viesse para o Brasil de
origem negra, era desconsiderada sem o mínimo de atenção. Os negros eram batizados contra
a sua vontade e a religião católica era exclusiva no território brasileiro, sendo perseguido
qualquer um que não a aderisse.
No Brasil, o termo ―religião de matriz africana‖ não diz respeito somente às crenças
oriundas da África e de suas proximidades, mas trata principalmente das crenças religiosas
desenvolvidas por negros, no Brasil. Segundo Geraldo da Rocha (2011)23 ―quando se fala de
religiões de matrizes africanas, não está fazendo distinção entre os pertencimentos vinculados
as tradições sejam elas, ketu, jejê, nagô, nação ou angola‖. Ou seja, o termo ―africano‖ está
intimamente ligado à raça do ser humano, pertencente a qualquer lugar, neste caso, o negro
brasileiro.
Essas religiões tem origem na traumática passagem da escravidão pelo Brasil, abafada
pela forçada absorção do catolicismo, onde de uma forma ou de outra os católicos exerciam
sua ―superioridade‖ sobre os escravos, mesmo quando batizados, como se pode perceber,
segundo Alessandra Soares Nascimento (2010)24:
Aos ditos ―batuques‖ dos negros, os padres por vezes preferiam acreditar serem
homenagens aos santos católicos realizados na língua nativa dos africanos e
conforme as danças de sua terra, e os consideravam um ―folclore‖ inofensivo,
22
Para uma história do negro no Brasil. — Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1988
23
ROCHA, Geraldo. A intolerância religiosa e religiões de matriz africanas no Rio de Janeiro. Revista África e
Africanidades – Ano IV- n. 14/15. 2011.
24
NASCIMENTO, Alessandra Amaral Soares. Candomblé e Umbanda: Práticas religiosas da identidade negra
no Brasil. 2010.
julgando ser uma forma de manterem vivas suas tradições africanas e as rivalidades
entre os grupos de escravos provenientes de nações inimigas na África ao mesmo
tempo em que evitaria a organização de rebeliões ao não criarem, as etnias entre si,
laços de solidariedade contra os escravizadores. (SOARES NASCIMENTO. 2010)
Algumas religiões tornaram-se mais conhecidas que outras, fato esse que as tornou
mais vulneráveis frente às atrocidades cometidas pelas pessoas intolerantes a essas crenças.
Entre elas, devem-se observar duas principais religiões afro-brasileiras, quais sejam:
Candomblé e Umbanda.
O candomblé é uma religião monoteísta – cultua o Deus Olorum-, que possui diversos
nomes, variando de região para região, como por exemplo, Xangô no Recife ou Macumba no
Rio de Janeiro. No entanto, o termo utilizado no Rio de Janeiro pode possuir muitas vezes um
sentido pejorativo, de crítica, e por isso, adeptos dessa religião não se interessam pelo termo
ou procuram não utiliza-lo. Nesta religião, destaca-se o culto dos orixás, que segundo
Alessandra Soares Nascimento ―é qualquer objeto, animal ou planta que seja cultuado como
Deus ou equivalente por uma sociedade organizada em torno de um símbolo ou por uma
religião‖.
A Umbanda nasceu no Rio de Janeiro, e é uma religião que uni o catolicismo, o
espiritismo e as religiosidades africanas, indianas e indígenas. Também é uma religião
monoteísta, e o seu Deus é conhecido como Zambi. Essa religião se estrutura com três
fundamentos básicos, que são: fraternidade, caridade e respeito ao próximo. Como conceitua
Alessandra Soares Nascimento25:
A Umbanda é criada num contexto de valorização do ―ser brasileiro‖, patrocinou a
integração no plano mítico de todas as classes sociais, especialmente as excluídas,
apresentando uma nova visão distinta da prevalência dos valores dominantes da
classe média (catolicismo e posteriormente Kardecismo), com maior abertura as
formas populares afro-brasileiras, depurando-as a favor de uma mediação no plano
religioso, que representou a convivência de três raças brasileiras. (SOARES
NASCIMENTO. 2010)
É comum que as pessoas confundam essas duas religiões, exatamente por não
reconhecerem como dignas de atenção, e relacionam-nas ao simples fato de serem afro-
brasileiras. No entanto, existem diferenças básicas entre elas, como por exemplo, as entidades
25
NASCIMENTO, Alessandra Amaral Soares. Candomblé e Umbanda: Práticas religiosas da identidade negra
no Brasil. 2010
cultuadas, os rituais praticados em cada religião, os elementos culturais e objetos, assim como
as forças metafísicas cultuadas. Segundo Alessandra Soares Nascimento:
Como vimos, ao abordamos a religiosidade no Brasil, como parte fundamental de
sua formação cultural, percebemos que uma série de contextos norteou a presença e
manutenção das religiões de matrizes africanos em nosso cotidiano. No entanto esse
desenvolvimento cultural, de visualização, estudo e inserção do africano como
elemento formador da nação brasileira foi por longo período, minimizada ou até
mesmo inviabilizada por práticas preconceituosas e discriminatórias de uma
sociedade que traz consigo ―ranços‖ de um processo escravista de ―coisificação‖
humana. (SOARES NASCIMENTO, 2010)
Depois de 1988, com a chegada da nova Constituição Federal 26, aqueles que não
seguiam as religiões cristãs sentiram-se assegurados pelo disposto no art. 5º IV: ―É inviolável
a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos
religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias‖. Antes
disso, era mais comuns que os terreiros fossem incendiados ou destruídos das mais diversas
formas, e com alegações de que significavam cultos ao ―demônio‖ ou a espíritos malignos.
O terreiro constitui um espaço importante na realização desses cultos, pois caracteriza
―a casa‖ onde os fiéis sentem-se acolhidos para proferir sua fé. São nos terreiros que os cultos
acontecem, e que as divindades, são cultuadas. Atualmente, muitas pessoas mantém distância
dos terreiros devido ao estigma a que está inserido desde antigamente. Como afirma Geraldo
da Rocha (2011) ―a intolerância é generalizada, estendida a todos que professam a religião
dos Orixás, cujo rótulo ou estigma passou a ser naturalizado nas relações sociais como os
macumbeiros‖.
A intolerância vivida pelos fieis dessas religiões aumentou com a chegada do
neopentecostalismo27, que tenta eliminar a presença do ―demônio‖ no mundo. Em uma
sociedade onde são discriminados deuses como exu e pomba-gira o adepto ao
neopentecostalismo cresceu de forma significativa, unindo preconceitos na intenção de
destruir ou descriminar as religiões afro-brasileiras. Como afirma Vagner Gonçalves da Silva:
O neopentecostalismo, em consequência da crença de que é preciso eliminar a
presença e a ação do demônio no mundo, tem como característica classificar as
outras denominações religiosas como pouco engajadas nessa batalha, ou até mesmo
como espaços privilegiados da ação dos demônios, os quais se "disfarçariam" em
divindades cultuadas nesses sistemas. (SILVA, 2007)
26
BRASIL. Constituição (1988) Constituição Federal da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 1988.
27
É uma vertente do evangelicalismo, conglomerando igrejas do movimento de Renovação Cristã. Fora do
Brasil, essas igrejas são chamadas também de carismáticas, aqui esse termo é reservado a um movimento da
Igreja Católica. Essa vertente toma como base ideias do Pentecostalismo e Carismatismo americanos.
Portanto, deve-se salientar que na grande maioria das vezes, a descriminação sofrida
pelo Candomblé e pela Umbanda são vindas de outras religiões ou de pessoas que aderem a
outras religiões, dificilmente sofrem intolerância de ateus ou agnósticos.
A religião como sendo uma parte da cultura quase inseparável do ser humano, nasce
de acordo com a criação e aprendizado das crianças, na maioria das vezes influenciada pelos
pais ou professores. Com base nisso, foi criada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação 28,
incluindo o ensino religioso29 na sala de aula das escolas públicas. No entanto, embora o
Brasil seja um estado laico e tenha a muitos anos deixado de lado a ideia de religião oficial, o
que se pode perceber é que há nas escolas um ensino da religião católica.
É incomum que haja nas entidades públicas um ensino religioso voltado para as mais
diversas crenças religiosas. Na sala de aula são ensinadas preces e orações voltadas para o
cristianismo, e mesmo assim, quase nunca é ensinada alguma religião de cunho evangélico.
Esse ensinamento limita-se a religião católica. Segundo Iradj Roberto Eghrari30:
Portanto, o que se pode perceber é que embora o Estado seja laico, algumas religiões
são excluídas do meio social, seja pela população, seja pelas autoridades que não fiscalizam
esses ensinos em sala de aula. A falta de conhecimento das crianças a respeito de crenças
minoritárias faz com que outras crianças que aderem a essas religiões sejam excluídas ou
banalizadas no ambiente escolar, podendo ocorrer ataques ou xingamentos, que muitas vezes
incentivam as crianças descriminadas a não voltarem ao ambiente escolar.
28
Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
29
“O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui
disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade
cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.‖ (Art 33. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro
de 1996.)
30
EGHRARI, Iradj Roberto. Educação, Religião e Direitos Humanos: um espaço de Discussão. IV congresso
nacional de ensino religioso. 2015
2.1 Ataques ao Candomblé e a Umbanda
Como foi visto, a intolerância religiosa atinge os adeptos das religiões de matriz
africana de forma mais agressiva, por afirmarem que seus cultos incluem o demônio e que
suas divindades são espíritos malignos. Neste momento, irá se analisar até que ponto é capaz
de chegar à intolerância religiosa, atingindo fisicamente os fieis e seus locais sagrados, a
partir de casos reais.
A matéria intitulada ―Após sair de culto de Candomblé, menina de 11 anos leva
pedrada no Rio31‖ da Folha de São Paulo, relata a história da intolerância religiosa vivida por
um grupo de amigos que caminhavam para casa após um culto de Candomblé, no bairro de
Irajá, no Rio de Janeiro.
Um dos meninos que fazia parte do grupo, na época com 15 anos, descreveu o fato
como sendo traumatizante, e afirmou que dois homens se aproximaram portando a Bíblia e os
insultaram das mais diversas coisas, entre elas, ―grupo do diabo‖. Os agressores ainda
gritaram ―Jesus está voltando‖ como forma de diminuir a religião do grupo. Após os
xingamentos, um deles lançou uma pedra em direção ao grupo, que ricocheteou e atingiu uma
menina de 11 anos na cabeça, causando ferimentos leves. O caso foi registrado como lesão
corporal e classificado pelo artigo 20 da Lei 7.716 que versa sobre os crimes resultantes de
preconceito de raça ou de cor. Casos como esse, demonstram a real situação, crítica, em que
se encontra a intolerância religiosa no Brasil, chegando a agredir fisicamente os fieis,
inclusive crianças.
Outro caso que ganhou repercussão nacional aconteceu no nordeste, mais
precisamente na cidade de Maceió, em Alagoas. Após o carnaval do ano de 1912 uma noite
ficou conhecida como ―Quebra do Xangô32‖ onde uma massa de populares invadiu, queimou
e depredou os principais terreiros de Xangô na cidade, espancando líderes religiosos e pais de
santo dos cultos afro-brasileiros.
31
Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/06/1642819-apos-sair-de-culto-de-
candomble-menina-de-11-anos-leva-pedrada-no-rio.shtml. Acesso em: 28/08/2017
32
https://extra.globo.com/noticias/religiao-e-fe/comissao-de-combate-a-intolerancia-religiosa/quebra-de-
xango-100-anos-de-intolerancia-no-brasil-3807384.html Acesso em: 28/08/2017
A mídia noticiou o fato com palavras de cunho pejorativo, sem de fato, noticiar o real
perigo a que se encontravam os religiosos das mais diversas crenças. Utilizaram termos como
―bruxaria‖ e ―casas de feitiçaria barata‖ para descrever os cultos e os terreiros dessas
religiões.
Portanto, com tudo o que foi visto, desde a escravidão até a atualidade, das religiões
que nasceram no Brasil e se relacionaram involuntariamente com as raças dos fieis, pode-se
perceber que a intolerância está imersa num estágio de perigo, onde esses crentes não estão
protegidos e entidades necessitam de um olhar mais protetor sobre essa causa. Por isso, a
partir deste momento, irá se analisar, no presente trabalho, a participação da Constituição e
dos Direitos Humanos na inclusão das religiões brasileiras na sociedade.
Durante muitos anos, o império brasileiro limitou a crença religiosa quando entendia
como verdadeira apenas a religião católica. Durante anos perseguiu todos aqueles que não a
seguisse. Até então a Igreja Católica era a única aceita no Estado, e a religião oficial
brasileira. Anos depois, com a proclamação da república, o Estado tornou-se laico, apesar de a
religião oficial ainda ser a católica. Atualmente o povo brasileiro tem liberdade para participar
das reuniões religiosas que preferir, e aderir a qualquer crença, assim como não professar
nenhuma fé. Esse direito está garantido na Constituição Federal de 198833.
A liberdade de crença está relacionada diretamente a dignidade da pessoa humana,
quando aquela religião condiz com a ideologia e a realidade vivida por cada pessoa. Podem-se
perceber como nos casos das transfusões sanguíneas em Testemunhas de Jeová, quando,
baseados na dignidade da pessoa humana, os fieis recusam a transfusão sanguínea, mesmo
com risco de morte, afirmando suas bases religiosas. Em casos como esse percebe-se como é
importante para os fieis que sua religião seja seguida, e que os ensinamentos sejam reais.
Atualmente várias discussões surgem em torno da laicidade do Brasil. Símbolos
religiosos expostos em locais públicos, em fóruns, academias públicas e órgãos
33
“É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e
garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias‖ (Art. 5º, IV, CF/88)
governamentais. O que de fato acontece é que a religião católica é privilegiada. Pergunta-se,
por exemplo: Se em lugar de uma cruz (símbolo da igreja católica) fosse colocada em um
fórum uma imagem de Iemanjá, a sociedade manteria a pacificidade? A resposta é não, a
maioria católica do Estado limita o uso de símbolos e crenças de outras religiões.
A intenção com o comentário foi exemplificar o real situação de exclusão a que se
encontram as religiões minoritárias, inclusive as afro-brasileiras. Deve-se observar que com a
Constituição Federal de 1988 houve, de fato, uma melhoria na prática dos cultos, já que o
próprio governo não irá destruir ou proibir a construção de um terreiro, ou a divulgação das
preces e orações de outras religiões.
34
Assinada na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, San José, Costa Rica, em 22 de
novembro de 1969.
Art. 12
1. Toda pessoa tem direito à liberdade de consciência e de religião. Esse direito implica
a liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de
crenças, bem como a liberdade de professar e divulgar sua religião ou suas crenças,
individual ou coletivamente, tanto em público como em privado.
2. Ninguém pode ser objeto de medidas restritivas que possam limitar sua liberdade de
conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças.
3. A liberdade de manifestar a própria religião e as próprias crenças está sujeita
unicamente às limitações prescritas pela lei e que sejam necessárias para proteger a
segurança, a ordem, a saúde ou a moral públicas ou os direitos ou liberdades das demais
pessoas.
4. Os pais, e quando for o caso os tutores, têm direito a que seus filhos ou pupilos
recebam a educação religiosa e moral que esteja acorde com suas próprias convicções.
35
Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2016/01/21/n-de-denuncias-de-
intolerancia-religiosa-no-disque-100-e-maior-desde-2011.htm Acesso em: 28/08/2017
religiões de matrizes africanas. Ou seja, a grande maioria dos descriminados, são os fieis de
religiões afro-brasileiras.
Portanto, quando os problemas não são solucionados na própria sociedade, faz-se
necessário a participação de entidades governamentais e não governamentais. Os direitos
humanos agem de forma a resolver litígios e demonstrar os direitos das minorias, muitas
vezes escondidos.
Em relação à intolerância religiosa, os Direitos Humanos atuam de forma a minimizar
este tipo de acontecimento, conscientizando as pessoas, e aceitando as denúncias através de
suas plataformas para que as autoridades competentes punam na medida do possível os
culpados.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por tudo o que foi visto, pode-se perceber que a intolerância religiosa está diretamente
ligada descriminação racial. As pessoas que excluem esses fieis da sociedade demonstram
mais relação com o passado escravocrata do negro do que com o significado da sua crença
(nota-se que nem todos os que aderem ao Candomblé e a Umbanda são negros).
Pôde-se perceber durante o estudo, a preocupação em unir todas as sociedades a fim
de que vivam em harmonia. A diversidade cultural presente atualmente é incontável, por isso
pode-se imaginar que existam povos e culturas nunca antes vistos. Uma das soluções para a
minimização do problema da intolerância, e a ideal, seria que as pessoas se reconhecessem
como comunidade humana, evoluindo de forma igualitária e dependente uns dos outros,
desconsiderando assim, a ideia de uma só cultura ou uma só religião.
A origem da descriminação religiosa é a escravidão. É preciso um engajamento maior
para que as pessoas entendam o nível de igualdade ao qual se encontram as culturas no
mundo, para que se conscientizem da igualdade do Candomblé, da Umbanda, do Catolicismo,
do Islamismo, etc.
De forma geral, com essa problematização pode-se perceber que o Brasil necessita de
um avanço intelectual no debate sobre a intolerância religiosa e sobre igualdade. É uma
questão preocupante e que deve ser discutida abertamente na sociedade em geral, seja nas
casas, nas escolas, no Congresso ou nos Tribunais.
A proteção dos Direitos Humanos no processo de aceitação cultural é imprescindível.
Essa organização atua de forma internacional unindo comunidades em conflito e afirmando a
igualdade de raça, de gênero, de crença. Portanto, age diretamente no Brasil através de
programas que auxiliam na conscientização da sociedade em relação aos direitos das pessoas
e na aceitação pessoal daqueles que são descriminados.
Este trabalho buscou, de forma concentrada, apresentar o tema da intolerância
religiosa e demonstrar a origem escravocrata dessa descriminação, assim como analisar a
participação dos Direitos Humanos na busca da igualdade, como foi visto. Deve-se salientar
que importante seriam novas pesquisas na área, de forma a incluir o tema como problema no
meio acadêmico, onde são formados profissionais para atuarem nas áreas de minorias,
protegendo os direitos que eles desconhecem e buscando uma sociedade mais justa.
REFERÊNCIAS
OLIVEIRA, Felipe. Após sair de culto de candomblé, menina de 11 anos leva pedrada no
Rio. Eletrônico. Disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/06/1642819-apos-sair-de-culto-de
candomble-menina-de-11-anos-leva-pedrada-no-rio.shtml. Acesso em: 28/08/201.
Para uma história do negro no Brasil. — Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1988. 64 p.;
il. ; 20cm.
RODRIGUES, Rosiane. Quebra de Xangô: 100 anos de intolerância no Brasil. Eletrônico. 2012.
Disponível em: https://extra.globo.com/noticias/religiao-e-fe/comissao-de-combate-a-
intolerancia-religiosa/quebra-de-xango-100-anos-de-intolerancia-no-brasil-
3807384.html Acesso em: 28/08/2017.
SEGURANÇA PÚBLICA: o papel dos municípios na prevenção e combate a
violência e a criminalidade
RESUMO
INTRODUÇÃO
1
Pós-graduanda em Ciências Criminais pela Faculdade ASCES-UNITA, Advogada e Pedagoga, e-mail:
acaciadinizadv@gmail.com
2
Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/download/2/2017>
municípios na segurança pública, pois é comumente observar desde a Constituição
Federal de 1988, que em seu art. 144, destaca o papel dos estados e da união que,
através de seus órgãos de segurança devem, garantir a segurança de todos os cidadãos.
Logo, lendo o mencionado texto constitucional, temos a impressão de que a segurança
pública é assunto para a polícia, sob o manto dos estados e da união, apenas. Entretanto,
o município possui um importante papel na prevenção da violência. Caso inovador de se
destacar, por exemplo, é o município de Caruaru-PE, que através da prefeitura
municipal, protagoniza em 2017 a Secretaria de Ordem Pública e através desta
secretaria, cria-se o Plano Municipal de Segurança Pública - PMJPS, o Comitê
Permanente Municipal Juntos Pela Segurança - CPMJPS e os Conselhos de Segurança
Cidadã dos bairros e da zona rural – CONSEC, todos estes instrumentos serão
apresentados neste trabalho. Como metodologia de pesquisa, faremos uso da pesquisa
descritiva que: está interessada em descobrir e observar fenômenos, procurando
descrevê-los, classificá-los e interpretá-los.”3
1. SEGURANÇA PÚBLICA
3
OLIVEIRA, Maria Marly de. Como fazer pesquisa qualitativa. 7 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2016.
A segurança pública constitui, assim, um campo formado por diversas
organizações que atuam direta ou indiretamente na busca de soluções para
problemas relacionados à manutenção da ordem pública, controle da
criminalidade e prevenção de violências. Portanto, não se confunde com o
sistema de justiça criminal e nem se resume às organizações policiais. Por
mais que essas tenham papel central no debate público acerca da área.4
4
AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli de; LIMA, Renato Sérgio de; RATTON José Luiz. Crime, polícia e
justiça no Brasil. 1. ed., 1ª reimpressão. – São Paulo: Contexto, 2014.
5
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.
A partir destes dados, concluímos que o Brasil pouco investe ainda no sistema de justiça
criminal, deixando diversos crimes sem a devida investigação para apurar autores e a
motivação dos crimes, com isto, vários criminosos não são investigados, não respondem
a um processo judicial e tampouco cumprem pena pelo crime que cometeram, visto que
devido à ineficiência dos instrumentos de investigação das polícias, bem como o pouco
número de promotores de justiça e de defensores públicos, além do número ínfimo de
juízes para julgar os processos, todo o sistema de justiça criminal se encontra deficiente,
moroso e muito aquém de sua capacidade, fazendo com que a impunidade alcance
índices preocupantes.
Foi a partir de 2000, com a criação do Sistema Nacional de Segurança Pública –
SENASP, que as políticas de segurança pública no Brasil começaram a ganhar espaço,
trazendo para os órgãos públicos, principalmente para os municípios que se inseriram
no cenário nacional também como responsáveis pela segurança. A partir destas
mudanças houve a implantação de políticas preventivas e de combate à criminalidade, a
ressignificação de programas e a criação de outros, além de projetos de cunho
preventivo e de combate, também a nível estadual, como foram o caso do programa
Pacto pela Vida, desenvolvido em Pernambuco a partir de 2007.
O Programa Pacto pela Vida logrou bastante êxito entre os anos de 2007 a 2013,
com uma queda de 36% na taxa de homicídios em Pernambuco. Este programa possui
metas que pretendem trazer benefícios a curto, médio e a longo prazo. Trata-se de
medidas que buscam, através da parceria com a união e os municípios, diminuir o
crescimento da taxa de homicídios, bem como diminuir os índices de demais práticas
delituosas que geram a sensação de insegurança na população. Por ser uma ação
integrada, os municípios devem colaborar, contudo, no limite de sua competência.
6
SOARES, L. E. Segurança Pública: presente e futuro. São Paulo: Estudos avançados, 2006.
(http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142006000100008). Acesso em
16/07/2017.
crescimento para as áreas que estão destinadas a isto, temos uma grande mudança no
que concerne a zona rural do município, área formada por 4 (quatro) distritos e que são
maiores do que a própria urbana da cidade. Porém o cenário da zona rural tem sido
modificado não só pelo êxodo rural e pela seca que desestimula nos moradores o
investimento em produtos agrícolas e acaba gerando uma nova fonte de renda na zona
rural: a confecção de jeans. Como forma de manter o rendimento familiar, as famílias
têm se estruturado nesta fonte de renda, o que tem atraído a construção imobiliária para
essas áreas, investindo fortemente na expansão urbana de encontro com a área rural da
cidade, modificando o cenário e tonando a cidade com maiores problemas, pois o tipo
de solo, a localização e o aspecto urbanístico não estavam preparados para esta
mudança. Toda forma desordenada gera conflitos entre a comunidade e o poder público,
gera exclusão social, aglomeração de moradores sem respeitar áreas de recuo, sem
qualquer pagamento de taxas à prefeitura, sem respeitar o código de obras, espaços
importantes para a boa convivência social e problemas relacionados à saúde, segurança
e educação.
7
AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli de; LIMA, Renato Sérgio de; RATTON José Luiz. Crime, polícia e justiça
no Brasil. 1. ed., 1ª reimpressão. – São Paulo: Contexto, 2014.
13.022/2014, que dispõe sobre o Estatuto Geral das Guardas Municipais visualiza-se
que as Guardas Municipais, dentro da perspectiva do seu Estatuto, consolidam-se como
órgão de polícia administrativa stricto sensu, uma vez que a elas incumbe o
patrulhamento preventivo das vias municipais, de modo a impedir a ocorrência de
infrações penais, em especial, aquelas que atentem contra o patrimônio municipal. Na
Constituição da República, a segurança pública é tratada em capítulo exclusivo, que
conta apenas com o artigo 144, o qual traz, em seus incisos, os órgãos que exercem a
segurança pública em nosso país, mas também impondo-a como direito e
responsabilidade de todos, aí se incluindo todos os órgãos estatais, bem como a
sociedade civil. Daí se tratar de um rol não taxativo, quando analisamos os incisos do
art. 144 da CF/88. O Estatuto Geral das Guardas Municipais municia os cidadãos e o
poder público municipal com mais uma força de trabalho que pode atuar em diversos
espaços da cidade, além do que Estatuto reconhece a representatividade das guardas
municipais no Conselho Nacional de Segurança Pública, revelando, mais uma vez,
estarem elas inseridas entre os órgãos de segurança pública previstos na Constituição.
A polêmica sobre a Guarda poder andar armada, após o advento do novo
Estatuto, que no seu art. 16 ainda tem sido atitude pouco adotada pelos municípios no
Brasil, Caruaru, ainda é um dos municípios que não possui uma Guarda armada, e
reconhecemos que a discussão sobre este assunto requer um maior debate com a
população além de se analisar as questões de impacto socioeconômico que isso pode
gerar.
Em 2017, outra novidade, com a mudança de governo, após as eleições
municipais, há a criação de uma nova secretaria, a Secretaria de Ordem Pública, criada
através da atual gestão com o objetivo de implantar na cidade ações de ordem pública
que visem combater à violência e à criminalidade no município. Através desta secretaria
o município atualmente está elaborando o seu Plano Municipal de Segurança, que é um
plano de participação popular que pretende consolidar uma política pública voltada para
a definição do papel do município na contribuição da complexa tarefa da preservação da
ordem pública, além de procurar desenvolver a responsabilidade cidadã da comunidade,
bem como assumir compromissos com o envolvimento das outras instituições voltadas
para a segurança pública.
É a primeira vez que o município contará com a elaboração de um plano
municipal voltado para a sua segurança, além disto, também foi criado através de
Decreto ainda em 2017 o Comitê Permanente Municipal Juntos Pela Segurança -
CPMJPS, e o Conselho de Segurança Cidadã dos bairros e da zona rural - CONSEC.
Com a criação do Comitê os envolvidos na segurança pública terão um espaço
onde o poder público municipal vai receber as demandas da população, através dos
CONSEC‟s e, através disso, poder inter-relacionar com as secretarias e órgãos
competentes.
Então, essas demandas vão partir também dos CONSEC‟s e do Comitê com a
intenção de aprovar, planejar, executar, implementar e monitorar o Plano Municipal de
Segurança Pública, em consonância com as ações e atribuições constitucionais dos
diversos órgãos da esfera do poder público federal e estadual, que atuam na preservação
da ordem pública, trazendo, assim, resultados positivos na prevenção à violência em
Caruaru. É importante frisar que:
8
AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli de; LIMA, Renato Sérgio de; RATTON José Luiz. Crime, polícia e justiça
no Brasil. 1. ed., 1ª reimpressão. – São Paulo: Contexto, 2014.
Quando a prefeitura, em comum acordo com a comunidade, define uma agenda
local – o que requer focalização política -, mobilizando todos os seus órgãos e
recursos e envolvendo os meios de comunicação de massa no mutirão
organizado, tem chances de: a) infundir responsabilidade pelas iniciativas
conjuntas; difundir esperança no processo do empreendimento; c) valorizar
aquela área urbana e seus moradores; d) redefini-los ante a opinião pública da
cidade como protagonistas da mudança, sujeitos da transformação, construtores
da paz, promotores da ordem urbana cooperativa e solidária, exemplos para a
sociedade. Quando a prefeitura consegue alcançar esses resultados, e) logra
converter o estigma (residentes de área degradada, maculada pela violência)
em índice positivo (habitantes da área que se tornou paradigma da civilidade
urbana), fazendo que as expectativas se invertam, estabilizando-se na direção
positiva (...)9
9
SOARES, L. E. Segurança Pública: presente e futuro. São Paulo: Estudos avançados, 2006.
(http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142006000100008). Acesso em
16/07/2017.
sendo alvo dos aliciadores e traficantes, há em pauta, um plano estratégico para ser
realizado a fim de dar cumprimento à Lei estadual de nº 10.454/90 que trata sobre o
perímetro de segurança escolar, e que não vem sendo observado em sua completude, até
o momento. Vemos que através de ações como estas, estamos falando sobre prevenção
primária na sua essência, tão importante e eficaz quando o município se protagoniza a
cuidar e assumir os problemas que pertencem a sua esfera.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli de; LIMA, Renato Sérgio de; RATTON José Luiz.
Crime, polícia e justiça no Brasil. 1. ed., 1ª reimpressão. – São Paulo: Contexto, 2014.
OLIVEIRA, Maria Marly de. Como fazer pesquisa qualitativa. 7 ed. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2016
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo geral explanar a qualificação dos diversos
quadros de Transtorno de Personalidade Antissocial (TAP) existentes, bem como
compreender as relações entre as atividades antissociais de caráter criminoso e as
tipificações existentes no Direito Penal. Apresenta-se uma abordagem qualitativa, tendo
o tipo bibliográfico como método de pesquisa. A análise documental deste trabalho
norteou-se pelo estudo de Artigos Científicos e Monografias de base jurídica e
psicanalítica, bem como pela leitura do Manual Estatístico e Diagnóstico dos
Transtornos Mentais (DSM-V). O estudo identificou a fragilidade na identificação dos
quadros existentes e as lacunas legislativas que desamparam o judiciário brasileiro em
suas decisões e impedem a celeridade do devido processo legal, fazendo com que
precedentes fundados em entendimentos não pacificados pela psicanálise fomentem a
insegurança jurídica do Direito Penal em suas determinações, resultando no despreparo
estatal que vai desde o diagnóstico defasado dos sujeitos ao acolhimento precário dos
mesmos pós sentença.
INTRODUÇÃO
10
Graduanda em Direito pelo Centro Universitário do Vale do Ipojuca – DeVry|UNIFAVIP. Membro e
pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares em Direitos Humanos (GEPIDH –
Mércia Albuquerque). Extensionista no DHiálogos: Ciclo de debates sobre Sociedade e Direitos
Humanos. Pesquisadora na Iniciação Científica “Direitos Humanos, Violência e Diversidade humana no
período ditatorial no agreste pernambucano (1964-1985) ”. Pesquisadora do Grupo de Pesquisas
Transdisciplinares sobre Meio Ambiente, Diversidade e Sociedade (UPE/CNPq)
E-mail: alicia471998@gmail.com.
11
Bacharel em Psicologia pelo Centro Universitário do Vale do Ipojuca (2016). Psicóloga do CAEE -
Centro de Atendimento Especializado Especial de Jataúba/PE. Pós-graduanda em Neuropsicologia -
UNIFAVIP. Graduanda no Curso de Formação em Psicologia Avaliativa.
E-mail: stella.nmonteiro@gmail.com.
O transtorno de personalidade antissocial, está em uma posição de
vulnerabilidade jurídico-penal, onde os instrumentos jurídicos existentes mostram-se
insuficientes. A sociedade possui um entendimento deveras superficial quanto as
características e comportamentos dos comumente denominados “psicopatas”, pessoas
com transtorno de personalidade antissocial (TPA), o que deixa a sociedade menos
protegida das ações criminosas dessas pessoas. Por outro lado, a falta de aparato e a
fragilidade em se determinar um quadro de TPA põem em risco a dignidade do próprio
portador do transtorno de personalidade antissocial, que submetido às legislações
vigentes acaba não recebendo o tratamento adequado típico de um sujeito com
transtorno.
Faz-se necessário a prévia observação de que no decorrer do trabalho, devido à
falta de denominação oficial, o termo psicopata não será frequentemente utilizado. É
pacífico entre os doutrinadores e especialistas que o termo psicopatia se encontra
ultrapassado, sendo averiguado como Transtorno de Personalidade Antissocial, no
entanto a própria psicanálise não atribuiu uma denominação específica ao sujeito
portador do transtorno.
A pergunta de pesquisa que orientou o presente trabalho foi: Quais as definições
utilizadas pela psicanálise para designar a efetivação do TPA no sujeito e como o
ordenamento jurídico brasileiro utiliza essas definições para aplicação penal nos casos
existentes? No mesmo raciocínio, o objetivo geral da pesquisa busca compreender as
definições utilizadas pela psicanálise para designar a efetivação do TPA no sujeito e
como o ordenamento jurídico brasileiro utiliza essas definições para aplicação penal nos
casos existentes. A partir do questionamento anterior, os objetivos específicos
fomentados foram: 1 – Explanar a construção da personalidade com base na linha
psicanalítica; 2 – Apresentar uma base teórica que fundamente as definições
encontradas acerca do tema, preenchendo as lacunas do senso comum; 3 – Apontar as
faltas legislativas, os descasos com a efetivação das determinações e a insuficiência do
Estado.
As análises trazidas confirmam a complexidade de se definir uma concepção
estrita de TPA, por mostrar divergências entre as opiniões dos próprios estudiosos da
área. É importantíssimo que ideias defasadas e preconceituosas acerca da caracterização
das ações antissociais sejam esclarecidas, afastando as definições primárias da
psicanálise em que comportamentos minimamente fora dos padrões morais eram tidos
como sinais potenciais de psicopatia. A relevância acadêmica dá-se pelo fato de que a
perspectiva do Direito Penal quanto ao criminoso com transtorno de personalidade
antissocial não resguarda sua condição psicológica como esperado, seu diagnóstico na
maioria dos casos é tardio e apenas reconhecido nos casos de repercussão. Mostrando
assim uma falha na proteção da sociedade e para com o fim proposto pelo próprio
direito penal que seria o de ressocializar o criminoso, fim que desperta mais um
emblema mediante a semi-imputabilidade do sujeito com TPA, não podendo a ele ser
atribuída uma pena comum, tampouco abstê-lo da responsabilidade dos resultados de
suas ações. Para a elucidação das questões levantadas será utilizada uma metodologia
predominantemente dialética com abordagens analíticas dos relatórios utilizados na
pesquisa.
[...] acontecem no curso da fase oral: uma especial valorização do corpo (“o
ego, antes de tudo é corporal”); a identificação primária com a mãe; a
concepção de uma bissexualidade como uma qualidade primordial da herança
biológica; a vigência do princípio do prazer-desprazer, o predomínio do
processo primário do pensamento; a primitiva formação das representações-
coisa; as incipientes formas de linguagem e comunicação; dentre outros
conceitos mais.
Para o Direito Penal, não há o que se falar em conduta criminosa quando não
preenchidos os três requisitos levantados pela teoria tripartida: tipicidade,
antijuridicidade e culpabilidade. Numa breve explanação do que seria cada um dos
requisitos encontramos a tipicidade como sendo o enquadramento (subsunção) da
conduta do agente a norma prevista; a antijuridicidade como um fator consequente da
existência de conduta típica, pois representa a contrariedade da ação ou omissão
mediante a norma imposta; e a culpabilidade, indicador da responsabilidade de
exteriorização de um desejo subjetivo no mundo, figurando o juízo de reprovação da
conduta praticada mediante a sociedade e o ordenamento jurídico. Para um melhor
entendimento da diferenciação do criminoso com transtorno de personalidade social de
um criminoso comum, o último requisito será crucial.
Para que se fomente a concepção de Dolo e de Culpa, provenientes da
Culpabilidade, é necessário que haja a imputação do crime ao agente, ou seja, que sua
conduta possa ser atribuída ao mesmo, de acordo com o discernimento de que suas
ações culminaram no resultado/fato. Nessa situação de dependência entre a vontade
subjetiva e a capacidade mental do agente de discernir conforme a realidade normativa é
que se encontra a grande incógnita entre a psicanálise e o direito penal. O sujeito com
TPA possui o entendimento de que suas ações são ilícitas, tanto que um traço marcante
de sua condição é a facilidade com que mentem ou disfarçam situações, mas então o que
o difere de um criminoso comum?
2.1 – IMPUTABILIDADE
Art. 26. Parágrafo Único. A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o
agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento
mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
De acordo com a determinação judicial no caso concreto, o agente semi-imputável
que fora diagnosticado após laudo pericial com o transtorno de personalidade antissocial
deve ser sujeitado aos termos previstos nos Arts. 96 e 97, ambos do CPB, que trata das
Medidas de segurança adequadas ao grau de reprovação da conduta, bem como ao grau
de periculosidade do agente. Jurisprudências, no entanto, divergem:
Caracteriza-se como Medida de Segurança a sanção penal utilizada pelo Estado nos
casos de sentenças contra inimputáveis ou, excepcionalmente, semi-imputáveis.
A Reforma Penal de 1984 trouxe para o sistema penal brasileiro a alteração no sistema
duplo binário que previa a dupla aplicabilidade de penas, ou seja, a aplicação da pena
determinada com a medida de segurança. Situação que feria o princípio ne bis in idem,
por figurar uma dupla aplicação de pena sobre o mesmo fato cometido, ou seja, o
condenado cumpria a pena e posteriormente continuava sob a medida de segurança nas
mesmas condições e local de cumprimento da pena regular. As principais diferenças
entre a pena determinada e a medida de segurança são seu caráter retributivo-preventivo
presente na primeira, mas que na medida de segurança possui apenas uma natureza
preventiva que resulta da situação cognitiva e da necessidade curativa do agente.
A culpabilidade para a pena e a observância de sua periculosidade para a medida,
imprescindível na aplicação pois determinará se após o cumprimento do período inicial
de pena determinada o agente que receber um laudo médico que demonstre uma
evolução positiva do seu quadro, poderá significar o término da pena aplicada pelo juiz
da execução.
A temporalidade determinada da pena em oposição ao tempo indeterminado da medida,
que só findará com a cessação da periculosidade. Como supracitado, um dos
fundamentos da aplicabilidade da medida de segurança é a existência de periculosidade,
que significa a probabilidade estipulada de que o indivíduo virá a reincidir a partir dos
traços anômalos e antissociais que um laudo psíquico vier a diagnosticar. Essa
Periculosidade deve ser vista como um traço temporal do agente e não um quadro
constante e indeterminado, pois a aplicação da medida deve coincidir com um
tratamento adequado que vise a ressocialização do infrator, por isso se deve avaliar
periodicamente a evolução do infrator.
Quanto as circunstâncias pessoais dos infratores semi-imputáveis, a gravidade e
natureza do tipo em concomitância com o quadro psicológico do agente determinará se
haverá a aplicação da medida de segurança ou a diminuição da pena de acordo com o
Art. 26, parágrafo único, CPB. O fator determinante neste caso será a necessidade ou
não de tratamento curativo especial.
A determinação da aplicação das Medidas de Segurança segue as características
específicas de cada espécie de medida:
Medida de Segurança Detentiva – É a internação do infrator em Hospital de custódia e
tratamento, de forma que sua incapacidade cognitiva não lhe permita o cumprimento da
pena determinada restritiva de liberdade, mas que sua permanência na sociedade seja
temporariamente suspensa até que se constate que não há mais periculosidade eminente.
Medida de Segurança Restritiva – Como consta no Caput do Art. 97, CPB, quando o
crime for punível com pena de detenção, o juiz poderá submetê-lo a tratamento
ambulatorial. No entanto, há de se observar uma falha no dispositivo, pois ainda que o
crime não tenha o teor de gravidade similar ao da que se aplicaria a medida de
segurança detentiva, a situação psíquica do infrator não é observada pelo legislador
podendo aquele ter cometido uma infração não tão grave, mas possuir um quadro de
instabilidade cognitiva elevada e consequentemente possuindo um grau maior de
periculosidade.
A importância da colaboração entre juízes e médicos para uma aplicação correta da
medida de segurança é de suma importância para que efetive o ideal do Direito penal, o
sentimento de justiça adquirido pela sociedade, a recuperação do infrator com
problemas mentais e a ressocialização do mesmo num contexto sócio familiar.
Além disso, não há prisões “especiais” para psicopatas, eles cumprem a pena
em conjunto com outros criminosos, de todas as espécies. Como tem
profunda habilidade em manipulação, irão manipular outros presidiários a
fazer rebeliões, a carcerários para atingir seus objetivos, e serão rapidamente
liberados da cadeia, pois que serão presos exemplares. [...] Aplicar uma
Medida de Segurança em Hospitais de Tratamento e Custódia e tratamento
ambulatorial comum também não parece ser a medida mais efetiva.
Conforme já pudemos perceber, os psicopatas não são doentes mentais e não
padecem de sintomas similares àqueles esquizofrênicos ou dementes. Interná-
los nestes hospitais juntos com outros indivíduos que realmente tem
enfermidade mental não parece, de forma alguma, ser o tratamento efetivo.
Além disso, o simples tratamento ambulatorial também não indica ser o
melhor caminho para reabilitar tais indivíduos na sociedade. – OLIVEIRA,
Alexandra C. L.; Monografia/PUC-Rio (2012)
A falta de formação e conhecimento dos quadros psicológicos dos criminosos por parte
dos juízes também é um agravante na estrutura judiciária, o que impede que o juiz
reconheça a inexistência ou ignorância dos preceitos morais na figura do sujeito
“psicopata”, preceitos esses que norteiam as normas e que são ignorados pelos
portadores do TPA. Dessa forma, os juízes não possuem um entendimento unânime
sobre os quadros de TPA, justificado pelo uso das medidas de segurança pelos que
consideram os sujeitos criminosos semi-imputáveis, ou pelo uso da pena máxima do
tipo pelos que consideram que os sujeitos são plenamente imputáveis, no entanto,
ambos culminando na reclusão do sujeito. No primeiro caso por tempo indeterminado e
no segundo pelo período máximo de pena do tipo. Ainda mais omissa que o judiciário
se encontra a legislação brasileira, que sequer buscou possuir uma legislação específica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral. 20. ed. rev.,
ampl. E atual. – São Paulo: Saraiva, 2014
BRASIL. Constituição (1988) Constituição Federal da República Federativa do Brasil.
Brasília, DF, 1988.
RESUMO
INTRODUÇÃO
12
Graduando em Direito – Centro Universitário do Vale do Ipojuca – UNIFAVIP | DeVry. Pesquisador
do Grupo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares em Direitos Humanos – Mércia Albuquerque,
Extensionista no DHiálogos - Ciclo de Debate sobre Sociedade e Direitos Humanos e Extensionista e
Pesquisador no grupo de extensão e pesquisa Associa – Existir e Educar. E-mail: cmg824@hotmail.com.
13
Graduando em Direito– Centro Universitário do Vale do Ipojuca – UNIFAVIP | DeVry, Pesquisador do
Grupo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares em Direitos Humanos – Mércia Albuquerque e
Extensionista no DHiálogos - Ciclo de Debate sobre Sociedade e Direitos Humanos.
forma de gerar filhos, conforme a pregação religiosa a homossexualidade virou algo
antinatural, passando-se a coibir qualquer ato considerado homo afetivo, e até mesmo
com o passar dos anos tentando-se associar a tal a problemas genéticos elevando-a ao
patamar de doença psicológica.
Nestes termos a população LGBTQI passou a sofrer represália pela sexualidade
manifestada em si, configurando uma minoria sociocultural que é massacrada por
grupos majoritários donos do controle social e econômico, quando estes estabelecem
padrões usando da influência surgida desse poder, padrões estes atribuídos ainda na
infância, visto o caráter hetero dominante persistente por toda a história, que é imputado
às crianças (ARIÉS apud ULANOWICZ, 2015), assim os homossexuais por sentirem
atração pelo mesmo sexo, os bissexuais por se identificarem sexualmente com ambos os
sexos, sendo muitas vezes considerados promíscuos, bem como ao surgir os transexuais
com a modernidade, os tais sendo consideradas aberrações, por seu sentimento de
incompatibilidade com seu corpo de nascença, vez que buscam alterá-lo, e por fim os
queers, indivíduos que não são heterossexuais ou se identificam com o binarismo dos
sexos, e os intersexuais que configuram pessoas que nascem com uma anatomia sexual
que não se encaixa na definição típica de sexo feminino ou masculino, como, por
exemplo, os hermafroditas, ou seres humanos que possuem genitálias com formação
incomum, como um clitóris avantajado sem abertura vaginal ou um pênis envolto por
lábios vaginais, ou ainda nascerem com anatomias femininas e genitais masculinas e
vice-versa. Todas essas características trazem a quem as possui aversão social, estes
sofrendo agressões, ou a morte por modos majoritariamente cruéis e sádicos, impondo
medo.
No período República explodem os movimentos em prol dos direitos dos
homossexuais, lésbicas e transexuais, abrindo precedentes para a evolução jurídica,
marcada pelo surgimento de novas definições de indivíduos e da forma de auto
reconhecimento, como o estouro das Drag Queens em 1950. Chegando ao período
Contemporâneo, os meios de comunicação avançados, em especial a internet deu um
poder de informação fortificante aos grupos minoritários, havendo um contraste ainda
maior entre a propagação sociocultural dos membros da comunidade LGBTQI e a
violência empregada a estes, nos fazendo olhar para dentro de si mesmo e pensar como
esses indivíduos estão sendo protegidos pelo Estado.
Nesse questionamento viramos nossos olhos para o direito penal, vertente estatal
responsável por manter a ordem na sociedade em face de atos violentos, e entende-se
que não existem dispositivos específicos no ordenamento jurídico que garantam a
proteção de tal grupo, logo questões relativas à como proceder para criação do citado
dispositivo e que elementos sócio construtores fazem deduzir sua necessidade surgem.
Com a finalidade de respondê-los, neste trabalho objetiva-se propor uma punição
específica para aqueles que cometerem atos violentos contra indivíduos membros da
população LGBTQI. Também é objetivo do presente trabalho analisar os elementos
psicológicos e sociais que fazem com que a grande maioria da população heterossexual
tenha aversão ao grupo em questão, analisando suas formações sociológicas. Objetiva-
se aqui propor meios para a prevenção da violência e evolução da sociedade como um
todo quando o assunto é gênero.
Para a consecução deste trabalho no que se trata dos objetivos utilizar-se-á de
pesquisa exploratória e descritiva, com vistas a construir hipóteses, pretendendo
descrever e desvendar os fatos e fenômenos de determinada realidade (SILVEIRA e
GERHARDT, 2009). No que diz respeito aos procedimentos será utilizada a pesquisa
documental, na qual serão usadas pesquisas estatísticas relacionadas a população
LGBTQI, sempre atentando para a validade e a fidedignidade das informações
(LAKATOS, 2003). Outro tipo de pesquisa neste mesmo viés que também será
utilizada é a bibliográfica, na qual, através de doutrinadores específicos, busca-se
mesclar definições e corroborar teorias, de modo a possibilitar produção teórica
multifacetada e progressiva, permitindo o pleno entendimento do que se pretende
defender. (LAKATOS, 2003). As pesquisas discutidas acima serão catalisadas por meio
de uma abordagem qualitativa, que tem como intuito o levantamento de dados sobre as
motivações dos indivíduos agressores e encaixando traços do direito penal na situação a
ser tratada, produzindo informações aprofundadas (SILVEIRA e GERHARDT, 2009).
Verifica-se a necessidade de abordar essa temática no meio acadêmico visto a
pouca atenção dada pelos doutrinadores em discutir um assunto tão importante que vem
acompanhado de uma enxurrada de novos direitos, que certamente merecem mais
atenção, para que haja seu desenvolvimento e disseminação dentro da formação teórica
do próprio direito, ajudando assim a criar juristas com uma visão ampla e
constantemente inovadora. No âmbito social, o desenvolvimento deste assunto se
mostra necessário visto sua importância para a ordem pública e a conscientização da
população sobre “ser humano”, e as punições possíveis quando há crueldade para com
este, já em relação ao poder legislativo é mister cada vez mais a elevação do trazido
tema, para que este posicione-se em relação ao tema, cumprindo seu papel de regular a
sociedade por meio de penas na medida de suas paixões e anseios.
DESENVOLVIMENTO
Porcentagem Perfil
1% Bissexuais
3% Lésbicas
4% T-lovers
50% Homossexuais
Matança da população LGBT foi recorde em 2016, com 343 mortes. O relatório
é feito com base em notícias e informações que chegam ao conhecimento do grupo, e a
população de travestis e transexuais correspondeu a 42% das mortes, num total de 144
vítimas. De acordo com a organização, as pessoas trans são as mais vitimizadas, sendo
que o risco de elas serem assassinadas é 14 vezes maior em relação a gays. Dessas
mortes, 50% foram de gays, correspondendo a 173 pessoas, além disso 4% equivale a
12 pessoas T-lovers (amantes de transexuais), 3% corresponde a 10 lésbicas e 1% a 4
bissexuais.
É mister ressaltar que a criminalização não deve ser encarada como um medida
violenta que busca um resultado sanguinário por meio de ataques a quem pratique as
condutas previstas pelo dispositivo a ser criado, sua função é de ultima ratio, sempre
visando para sua extinção, visto que se busca reprimir tais atos de modo que no futuro
esta repressão não seja mais necessária, logo a seguir explana-se a base princípio- lógica
que faz acreditar na necessidade de se inserir uma punição para a LGBTQIfobia, de que
forma esta será inserida e como será aplicada de acordo com o modelo penal atual.
3.1 Princípios ensejadores
Os princípios surgem para facilitar a interpretação da norma bruta dentro da
seara jurídica, ajudando a regular a sociedade de forma a ter muitas vezes força de
regra, e ser usados para embasar decisões jurídicas, legislativas e executivas, revelando
assim ser de grande importância para a manutenção do direito (ALEXY, 2008). Estes,
porém, não possuem apenas essas funções, pois como adquire força de norma, influem
o suficiente para ensejar a criação de novos dispositivos por que nascem justamente dos
usos do direito, neste caso, o penal, sendo muitos deles provenientes de parâmetros
constitucionais tendo cunho supremo na ordem social, sendo fonte normativa primária.
Desta forma adentrando o meio criminal, percebe-se um apanhado
principiologica que faz entender ser preciso o surgimento de uma pena específica para
os indivíduos que praticam atos homofóbicos que denigra o outro, física ou
psicologicamente, apanhado este que será exposto e coligado nas seguintes linhas.
Começa-se pelo princípio da Legalidade ou da reserva legal que diz que, não há
crime sem lei que o defina, nem pena sem prévia cominação legal, tendo por base o
artigo 5º da Constituição da República de 1988, XXXIX e Código Penal art. 1º. Tal
princípio deve ser entendido como a vedação da aplicação de penalidade quando esta
não tiver previsão legal (BITTENCOURT, 2011). Com a tipificação dos atos
LGBTQIfóbicos, condutas praticadas contra essa comunidade, terão as suas devidas
penas aplicadas aos infratores.
Após este é relevante o princípio da ofensividade que dispõe que não basta que a
conduta seja imoral ou pecaminosa, ela deve ofender um bem jurídico provocando uma
lesão efetiva ou um perigo concreto ao bem (BITTENCOURT, 2011). Tal princípio é
importante, pois, é fundamental que as condutas ora tipificadas devem ser além de
imorais e pecaminosas, devem ofender um bem jurídico, uma lesão efetiva ou um
perigo concreto, desse modo a criminalização da LBTQIfobia é pertinente pois além de
conduta típica, matar, mata-se por preconceito, ou a conduta típica, agredir, agride-se
por preconceito.
Por fim analisa-se o princípio da fragmentariedade em favor do atingido pelas
ações de cunho LGBTQIfóbico vez que o direito penal não deve englobar todos os bens
jurídicos, mas, apenas os indispensáveis para que haja ordem social (BITTENCOURT,
2011), assim a vida e a integridade de indivíduos LGBTQI configuram tais bens e
devem ser protegidos devidamente e sem excessos, analisando o caso concreto através
de uma visão garantíssima penal.
3.1.1 Internacionalmente: Princípios de Yogiakarta
Os princípios de Yogiakarta configuram uma carta de nível internacional que
traz princípios relacionados à aplicação dos Direitos Humanos e leis globais no que é
concernente a sexualidade e identidade de gênero. Os cinco primeiros princípios
expostos em tal documento dão premissa para a criminalização de que trata este
trabalho nos termos que serão trazidos a seguir.
O Estado tem a obrigação de que todos possam desfrutar dos Direitos Humanos
sem impedimentos não importa a sexualidade destes, caracterizando o princípio do
direito ao gozo universal dos direitos humanos. Em seguida, vem o princípio da
igualdade e não discriminação que nos diz que qualquer distinção, exclusão, restrição ou
preferência baseada na sexualidade prejudique a igualdade perante a lei ou o exercício,
de todos os direitos humanos e das liberdades fundamentais igualmente deve ser
regulada pela lei do país de modo não acontecer.
O princípio do reconhecimento perante a lei se mostra muito relevante, pois,
para que a lei penal aqui discutida tenha eficiência, o Estado deve reconhecer os Gays e
Lésbicas, os Bissexuais, os Transexuais, os Travestis, os Queers e os Intersexuais como
indivíduos sujeitos de proteção legislativa na sua forma mais perfeita, que é objetivo de
tal princípio. Para concluir têm-se dois princípios basilares dos Direitos Humanos e
trazidos no documento de Yogikarta com uma visão voltada para a sexualidade, são
eles, o direito à vida e segurança pessoal que, em suma, reforçam que ninguém deverá
ser privado do bem da vida por causa de sua identidade de gênero ou sexualidade e
todos deve receber segurança estatal por igual, não sendo segregados pelos mesmos
motivos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
IHERING, Rudolf Von. A luta pelo Direito. 1. ed. São Paulo: Editora Martin Claret,
2009. (LIVRO)
BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 17. ed. São Paulo: Editora
Saraiva, 2011.
ROXIN, Claus. Tem futuro o Direito Penal?. 1. ed. Minas Gerais: EDITORA
VOZES, 2001. (ARTIGO)
BICUDO, Tatiane Viggiani. Por que punir? Teoria Geral da Pena. 1. ed. São Paulo:
Editora Saraiva, 2010. (LIVRO)
BRASIL. Código Penal. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1940.
RESUMO
O presente artigo propõe uma interseção entre Estado Penal, criminologia crítica e
direitos humanos como esses fatores interferem na sociedade e quais a suas
importâncias para a mesma. Portanto o objetivo desse estudo é realizar análises da
intersecção de políticas com a questão social e as políticas sociais reparatórias.
Buscando assim, alternativas ao encarceramento, reflexões sobre direitos humanos. É de
fundamental importância considerar os processos de subjetivação da violência urbana,
suas representações, aspectos sobre socialização, e cultura do medo; conflitos, sociais e
criminalização da pobreza.
INTRODUÇÃO
O Estado Penal pode ser caracterizado pelo aumento da repressão estatal sobre
as camadas excluídas, como uma forma de conter os efeitos da redução das políticas
sociais. Conforme Wacquant (2001, p. 10), o Estado Penal constitui uma resposta “às
desordens pela desregulamentação da economia, pela dessocialização do trabalho
assalariado e pela pauperização relativa e absoluta de amplos contingentes do
proletariado urbano, aumentando os meios [...] do aparelho policial [...].”
Baratta (1993), afirma que a teoria do direito penal mínimo representa uma
proposta de política criminal alternativa na perspectiva da criminologia crítica. Trata-se,
sobretudo, de um programa de contenção da violência punitiva através do direito,
baseado na mais rigorosa afirmação das garantias jurídicas próprias do Estado de
Direito e dos direitos humanos de todos os cidadãos, em particular das vítimas,
processadas e condenadas pelo sistema de justiça penal. Seu programa consiste numa
ampla e rigorosa política de descriminalização e, numa perspectiva final, na superação
do atual sistema de justiça penal e sua substituição por formas mais adequadas,
diferenciadas e justas de defesa dos direitos humanos frente à violência.
Segundo afirma Tanques (2006), a violência e a criminalidade correspondem a
aspectos ocasionados pela falta de assistência social, pelo desemprego, pela falta de
oportunidades iguais para todos, pela miséria e desigualdade social. Ou seja, os desvios
de conduta dos sujeitos ocorrem devido ao sofrimento com alguns destes problemas de
ordem não apenas social, mas de caráter econômico, eis que envolve a opressão do
capital, bem como as mudanças ocorridas no mundo do trabalho com a introdução de
novas tecnologias e formas de acumulação de lucro.
As políticas públicas de segurança, justiça e penitenciárias tendem a
desenvolver estratégias mais preventivas, pois é crescente o numero dos crimes,
das violações dos direitos humanos e da violência em geral
(ADORNO, 2002). A despeito das pressões sociais e pelos investimentos
promovidos pelos governos estaduais e federais, é estimulado em
recursos financeiros, materiais e humanos para o controle da ordem pública, no quesito
direito a segurança.
Ainda para Tanques (2006), quando os indivíduos partem para a criminalidade,
apossando-se ou tentando garantir-lhes o que foi negado, o caminho que se visualiza é a
prisão, já que o Estado passou de “Estado de bem-estar social” para Estado Penal, ou
seja, opressor, que pune. Por último, analisa-se o fenômeno da banalização da
sociedade, abordando a maneira pela qual a sociedade comporta-se no que concerne às
expressões da questão social, como é o caso da violência e da criminalidade.
DESENVOLVIMENTO
REFERÊNCIAS
ADORNO, Sérgio. Conflitualidade e violência. Reflexões sobre anomia na
contemporaneidade. Revista TEMPO SOCIAL, 10 (1): 19-47, maio de 1998.
LEVI, Margaret. Trust and governance.Nova York, Russell Sage Foundation, 1998.
MACHADO, Ednéia Maria. Questão Social: objeto do Serviço Social? Serviço Social
em Revista. V. 2, n° 1, Jul/Dez, 1999. Disponível em:<
http://www.ssrevista.uel.br/cv2n1quest.htm>. Acesso em: 267 jun. 2007.
PINHEIRO, Paulo Sérgio. Polícia e Crise Política: o caso das polícias militares. in ID
PUTNAM, Robert D. Comunidade e democracia. A experiência da Itália moderna.
Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas. EM, A violência Brasileira. São Paulo:
Brasiliense, 1996
SANTOS, José Vicente Tavares dos. “Por uma sociologia da conflitualidade no tempo
da globalização” in Violências no tempo da globalização. São Paulo: Hucitec, 1999.
VELHO, Gilberto & ALVITO, Marcos (org) Cidadania e violência. Rio de Janeiro:
FGV Editora, 1996.
WACQUANT, Loïc. As prisões da miséria. Trad. André Telles. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 2001.
RESUMO
Este artigo aborda como o discurso eficientista do sistema penal tem sido
fundamental para a expansão desse modelo de Estado que vem proporcionando o
fenômeno penal mais alarmante do último século, o “encarceramento em massa”. O
ponto central no debate aqui proposto é a discussão de como o Estado Penal tem se
expandido e de como o cárcere - principal instrumento do sistema penal - atua na
desconstrução identitária dos sujeitos encarcerados, tornando-os estranhos a si próprios.
Busco demonstrar, portanto, como o eficientismo penal colabora para a expansão do
Estado Penal e a relação que há entre o fenômeno do encarceramento em massa e esse
movimento do direito penal, analisando, por último, como o cárcere, figura central nessa
discussão, tem sido um instrumento atuante na despersonalização dos sujeitos
encarcerados. Assim, esse estudo visa promover o princípio da dignidade humana para
os sujeitos encarcerados, pois embora em condição carcerária, esses indivíduos são
portadores de uma dignidade que de maneira alguma pode ser violada.
INTRODUÇÃO
14
Érick Florêncio Lagos é graduando no curso de bacharelado em Direito da Universidade Católica de
Pernambuco. Email para contato: erickflorencio7@gmail.com.
É comum a todos que, na atualidade, há um imenso crescimento da população
carcerária em vários países do mundo. Apesar desse crescimento estar fortemente
concentrado em alguns países, o fenômeno do encarceramento em massa não se limita a
um local, mas se alastra por todo mundo, paralelo à construção social de um sentimento
de insegurança social (PAVARINI 2010).
Visto então que se tem expandido tanto o Estado Penal, quanto o número de
pessoas detidas por esse sistema, faz-se mister a discussão de como o cárcere, principal
instrumento punitivo do Estado, tem influenciado na construção de identidade de um
grupo social, que vive em uma realidade de total descaso em meio a uma superlotação
prisional.
Assim, a primeira parte deste artigo, visa analisar como o discurso eficientista
tem contribuído, não para a eficácia do sistema penal, mas para a sua expansão. Esta
visa, portanto, mostrar como esse movimento criminal do Law and Order, tem
contribuído, não para a eficácia das funções declaradas do sistema penal, mas para a
relegitimação desse sistema altamente punitivo e destrutivo.
A segunda parte aspira apresentar como essa expansão do Estado Penal, tem
desembocado em um fenômeno de encarceramento em massa demonstrando o salto que
houve na população prisional nas últimas décadas através do inchaço do sistema penal
que se dá ao redor do mundo devido a um sentimento global de insegurança social.
Por fim, a terceira parte busca analisar as transformações performáticas as
quais os sujeitos encarcerados são submetidos e o estigma que eles passam a portar em
razão da condição de preso. A proposta é discutir como o cárcere serve como
instrumento do Estado para permanecer no controle social, de maneira que possui uma
subjetividade coercitiva, a qual será analisada através dos estudos de Silva (2015).
Acerca dos procedimentos metodológicos utilizados nessa pesquisa, baseamos
esta pesquisa fundamentada nas lições trazidas pelo Método Indutivo onde se partirá da
observação dos fenômenos e das descobertas de relação entre eles, tanto entre o
eficientismo penal e o encarceramento em massa, quanto os marcadores sociais que
possibilitam a performance identitária e a despersonalização dos sujeitos encarcerados.
Sendo utilizada no trajeto da pesquisa a pesquisa bibliográfico-exploratória, uma vez
que se fez necessário uma maior familiaridade com o tema.
O presente artigo utiliza como referencial teórico ideias e conceitos
desenvolvidos por Andrade (2006), Pavarini (2010), Zaffaroni (2015), Silva (2015),
entre outros, que através de suas pesquisas possibilitaram-nos traçar um paralelo de
como o movimento eficientista tem trabalhado na expansão do Estado Penal, que
através da disseminação de um sentimento de insegurança social fez emergir em vários
lugares do mundo o fenômeno denominado encarceramento em massa e como o cárcere
tem atuado de maneira performática nas identidades dos sujeitos encarcerados.
Por sistema penal entende-se, portanto, [...] a totalidade das instituições que
operacionalizam o controle penal (Parlamento, Polícia, Ministério Público,
Justiça, Prisão) a totalidade das Leis, teorias e categorias cognitivas (direitos+
ciências e políticas criminais) que programam e legitimam, ideologicamente,
a sua atuação e seus vínculos com a mecânica de controle social global
(mídia, escola, universidade), na construção e reprodução da cultura e do
senso comum punitivo que se enraíza, muito fortalecidamente, dentro de cada
um de nós, na forma de microssistemas penais.
O que torna o sistema penal legítimo, da forma como está organizado hoje, é o
cumprimento de suas atribuições, ou seja, a realização na prática daquilo que declara ser
a sua função.
Entretanto, com o decorrer dos anos, a experiência histórica tem nos mostrado
que o sistema penal não tem cumprido com aquilo que declara ser a sua função. Isso
implica que na necessidade de se fazer uma distinção, para se demonstrar o que é
declarado difere muito daquilo que é praticado.
Portanto, a função não declarada, é por consequência a real função do sistema
penal. A saber, se espera que o sistema penal deva trabalhar na prevenção e combate à
criminalidade, na proteção bens jurídicos e na garantia de segurança, não somente
pública à sociedade, mas também jurídica aos acusados, entretanto, não é isso que se vê.
O sistema penal tem se mostrado “estruturalmente incapaz de cumprir as
funções que legitimam sua existência” (ANDRADE, 2006 p. 171) e de fato o sistema
penal “não pode porque sua função real é construir seletivamente a criminalidade e a
função real da prisão (violência institucional) é „fabricar os criminosos‟” (ANDRADE,
2006 p. 171).
Em suma, ao observar a realidade, é claramente perceptível que o sistema penal
não consegue cumprir com aquilo que declara ser sua função e se a sua legitimidade
depende desse cumprimento, segue-se por consequência lógica sua ilegitimidade.
Essa reflexão mostra-nos a necessidade que o sistema penal tem de sempre se
reformular para que então possa manter garantida sua legitimidade, mesmo que de
maneira simbólica. E a decorrência dessas práticas de reformulação é que esse mesmo
sistema tem tomado uma proporção gigantesca, no último século, em especial nos
últimos anos, para cumprir alcançar esse objetivo.
O eficientismo penal, mais conhecido como o movimento da “Lei e Ordem”
tem sido o principal fator de expansão do Estado Penal nas últimas décadas.
Tradicionalmente, o direito penal é conhecido pelos operadores do direito e
classificado na cultura jurídica como a ultima ratio, e isso significa que esse ramo
jurídico, deve ser sempre a última alternativa estatal para conter os conflitos que
venham emergir no seio da sociedade, visto que existem outros mecanismos que operam
como ferramentas para conter esses possíveis conflitos sociais.
Todavia, o discurso da “Lei e Ordem”, polariza com essa visão tradicional, ao
afirmar que se o sistema penal não funciona de modo a não obter eficácia nas tentativas
de conter a criminalidade, é pelo fato de não ser repressivo o suficiente, tanto na
prevenção quanto na punição dos crimes, de modo que o seu nível de eficácia está
diretamente ligado ao seu nível de repressão.
Desse modo, o movimento da “Lei e Ordem” defende a necessidade de que
cada vez mais haja a expansão do Estado Penal e a fomentação de uma cultura
punitivista, recrudescendo as leis existentes, criando-se novas leis mais rígidas e
suprimindo cada vez mais as garantias penais, para que então possa haver eficácia no
sistema penal. Andrade (2006 p. 178) nos ensina que:
O sistema penal tem tomado uma grande proporção nas últimas décadas, de
modo que a expansão do número de pessoas encarceradas é fruto direto da
contraposição do Estado Penal ao modelo de Estado de Bem-Estar Social; quanto mais
se diminui esse, mais aquele se superdimensiona em todas as suas esferas.
Em vários cantos do globo houve uma elevação do número de pessoas presas e
o termo que se encontrou e se cunhou para se fazer referência direta a esse fenômeno
jurídico-penal foi chamá-lo de encarceramento em massa.
O crescimento da população carcerária não tem outra implicação para os
sujeitos encarcerados que não seja mais indiferença do sistema penal para com eles.
Consequentemente, essa indiferença acarreta diretamente no abandono do ideal de
ressocialização desses sujeitos. Ideal este que tanto declaram em discursos como a
função do sistema penal, a fim de que ele seja reconhecido como legitimo.
O número de pessoas presas tem aumentado e para simplificar a comparação
entre a média de pessoas presas em cada país e a média mundial, utiliza-se o percentual
de detentos para cada 100 mil habitantes.
De acordo com dados do Centro Internacional de Estudos Penitenciários
(ICPS), ligado à Universidade Birkbeck de Londres, a média mundial de pessoas
encarceradas é de 144 presos para cada 100 mil habitantes. Isso significa que cerca de
10,3 milhões de pessoas estão encarceradas em todo o mundo. Só os Estados Unidos,
apresentam um índice de 666 detentos para cada 100 mil pessoas, além de apresentar a
maior população prisional de todo o mundo que equivale a aproximadamente 2 milhões
145 mil presos.
Esses números chocam quando são analisados a partir da alteração que
sofreram, em especial na década de 80, com a implantação da política criminal da Law
and Order nos Estados Unidos no início da década de 70. Wacquant (1999, p. 40) trata
que:
3.1 A Identidade
As lições mais básicas sobre filosofia nos ensinam quer certa vez Rousseau
veio a afirma em uma célebre frase que o homem nasce bom e a sociedade o corrompe.
O processo de formação da identidade do homem é, assim como enxergava Rousseau,
um processo não só individual, mas também social, e precisamos estar atentos para
como a sociedade participa nesse processo de constituição das identidades. Sobre isso,
Silva (2015, p. 21) nos ensina muito bem que:
[...] o sujeito delituoso que até então andava livre pelas ruas, passa a ser
enclausurado em uma penitenciária, onde será regulado dia após dia,
provocando assim um choque de realidade que produz no indivíduo a perda
de sua liberdade física e psíquica. O sujeito encarcerado perde sua
autonomia, criando uma tensão entre o mundo exterior e interior.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. {Sem Local}: Ridendo Castigat Mores,
2001.
CIAMPA, A. C. Identidade. In: W. Codo & S.T. M Lane, Psicologia Social: o homem
em movimento. p 58-75, São Paulo: Brasiliense, 1984.
DIAS, Gabriel Bulhões Nóbrega. Encarceramento em massa: Produto das relações entre
as políticas carcerária e proibicionista. Revista Transgressões: Ciências Criminais em
Debate, v. 1, n° 1, 2013.
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Editora
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MORE: Mecanismo online para referências, versão 2.0. Florianópolis: UFSC Rexlab,
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ZAFFARONI, Eugenio Raúl. O inimigo no direito penal. Rio de Janeiro: Revan, 2007.
RESUMO
INTRODUÇÃO
15
UNIFAVIP- DeVry, graduanda em Psicologia, hannah.damaris@gmail.com
elaboração dos fenômenos de violência (WIERVIORKA, 1997). Neste trabalho são
destacadas as formas de violência coletivas conhecidas como „linchamento‟, em virtude
de sua amplitude social e em decorrência de sua repercussão nos últimos anos.
De acordo com teóricos naturalistas como Darwin (2000) e Lorenz (1995) todas
as espécies animais possuem em seu código genético informações que compelem à
agressividade, sendo esta considera como intrínseca à natureza humana. No entanto,
cabe aqui diferenciar a agressividade de violência, estando a primeira ligada à „potência
para‟ e a segunda à ação impulsiva. Conceitua-se agressividade segundo Cegalla (2008)
como “Disposição para agredir; dinamismo; energia” ao passo que a violência é
entendida como “Ímpeto; Arrebamento [...] Ataque” (CEGALLA, 2008).
A imagem midiática
Semiótica
De acordo com Chandler o estudo e uso da semiótica permite que “nos tornemos
mais atentos ao papel mediador dos signos, e dos papéis que todos exercemos para a
construção da realidade social” (2002). A semiótica é, segundo Peirce, o estudo dos
signos, e “um signo é (...) algo que representa algo para alguém, sob algum prisma”
(PIERCE, 1974). Falando das bases da ciência semiótica Peirce traz a consideração de
que “os símbolos são o fio e a trama de toda investigação e de todo pensamento”
(1974). A semiótica é, portanto uma ciência capaz de estudar as outras ciências
entendendo todas as coisas como signos perceptivos e, portanto, objetos.
A semiótica teve suas bases através dos trabalhos de Saussure e Peirce na década
de 1900. Mais tarde as ideias de Saussure, que denominava a ciência em questão como
semiologia, serviram de base para pensadores como Levi Strauss, Lacan e Foucault. A
ciência da semiótica no início estava a serviço do reconhecimento de informações
escondidas „dentro da informação‟. O grande objetivo inicial de Peirce e Saussure era
compreender o que está por trás do que é mostrado e o quê mais tal pode significar
(1974).
A teoria semiótica de Pierce contribuiu grandemente para o estudo da
informação, dos símbolos, signos e significações. Posteriormente a teoria foi
incorporada por Santella (1983) que agregou métodos de análise semiótica, aplicando-a
ao design e à publicidade. Este trabalho, agrega ainda a semiótica social de Kress e Van
Leeuwen (2000); os quais utilizam a técnica para análise de imagens incluindo
fotografias, como é o caso deste trabalho.
Pierce propõe relações triádicas ou tricotomias, compreende o signo como sendo
composto a partir de uma tríade (JOLY, 1996), contendo pelo menos um Significante,
um Significado e um Referente (Representamen, Interpretante e Objeto). Sendo estes
três respectivamente: A forma que o signo apresenta, ou seja, o que é perceptível; o
sentido que ele tem, o significado que é criado na mente de quem observa o signo;
aquilo a que se refere, a coisa propriamente dita. De acordo com as tricotomias
propostas por Pierce (Signo-Objeto; Signo-Signo; Signo-Interpretante) o signo pode ser
em relação ao seu objeto: Ícone, Índice, ou Símbolo (nesta pesquisa foi analisada a
relação tricotômica Signo-Objeto).
No caso da fotografia, a imagem apresenta seu significante preso a seu objeto,
isto é, trata-se de uma captura exata de um momento específico. O signo fotográfico é
ao obrigatoriamente ícone da realidade que ele representa e índice da mesma. Para
Kress os meios produzem sentidos e estes por sua vez interferem no meio; este autor
salienta ainda os signos não linguísticos incluindo gestos, ações e imagens visuais; a
partir disso propõe os sistemas de significações como sendo fluídos e dinâmicos no
meio social (KRESS; LEITE-GARCÍA; VAN LEEUWEN, 2000). Neste trabalho
entende-se a fotografia como Representamen do Linchamento ocorrido, assim temos:
Figura 1.
Imagem 1
A partir do aspecto da calçada, do tipo de lixo (folhas secas e jornal limpo) pode
ser interpretado que a cena se passa em um bairro de classe média, o ambiente
iluminado por luz artificial transmite a ideia de horário noturno e deixa impreciso
quanto tempo teria decorrido desde o incidente até o momento da foto. O Jovem negro
ao centro, parece consciente das violações cometidas contra ele, ele segura a trava de
bicicleta que tem no pescoço mostrando-a. O ângulo defronte da vítima no qual a foto
foi tirada parece intencionalmente revelar a violação de direitos cometida. A posição do
corpo do jovem: pernas retraídas e com joelhos juntos, parece não só demonstrar
vergonha da nudez e exposição, como também posição de autodefesa. Os braços
afastados mostrando seu estado transmite a ideia de consciência do lugar de vítima. O
ato de despir a vítima manifesta intencional propósito de humilhar, tornar vulnerável. O
acorrentamento do jovem pelo pescoço pode sinalizar intenções de rebaixar a
humanidade do sujeito, impondo-lhe tratamento que remete ao distanciamento da figura
do agressor e da pessoa linchada destituindo sua humanidade em paralelo a afirmação
de „bom humano‟ do agressor „mantenedor da ordem‟.
Imagem 2
Imagem 3
Imagem 4
A quarta imagem (Figura 5) tem seu cenário constituído a partir de uma calçada,
ao fundo pode-se ver um portão que aparenta ser de metal e uma parede de cerâmica,
manchados e respingados de sangue. Na calçada um poste de energia elétrica com
sangue em sua extensão. O chão da calçada também contém sangue e pedaços de roupas
ensanguentados. Na porção direita da foto onde se localiza o poste pode-se ver um
indivíduo do sexo masculino, negro, nu, coberto de sangue e amarrado com uma corda
ao poste. Observa-se que a corda o prende pelo pescoço e tórax. Aparenta haver um
pedaço de tecido ensanguentado cobrindo os genitais da vítima. O corpo está sentado no
chão, e pende para frente, sendo sustentado pela corda presa ao poste, as pernas estão
dobradas e voltadas ambas para a mesma direção (lado esquerdo do corpo). Os braços
estendidos para baixo, e a cabeça pendente para baixo com o rosto voltado para o lado
direito do corpo. O corpo apresenta cortes, escoriações, hematomas, lacerações e está
coberto de sangue.
Resultados
Durante a pesquisa foi observado que ao passo que a imagem da vítima traduz o
distanciamento da figura humana confortável e propõe certo grau de desconforto, a
mesma também pontua e assinalada características que podem ser reencontradas em
padrões de identificação de possíveis „suspeitos‟ ou „culpados‟. Assim a imagem dos
linchados expressa pontos extremos da natureza humana permeando desde o
desconforto, estranhamento e afastamento da figura humana; e traça um perfil/esboço
do sujeito passível de linchamento.
Percebeu-se também que em três dos casos o linchamento levou a óbito a vítima.
O que confere um caráter de intencional eliminação do mal representado pelo
transgressor dos contratos sociais. O caso que não levou à morte a vítima pode-se
configurado como tendo caráter „pedagógico‟, isto é, a punição tem a função não de
eliminar o sujeito, mas de reprovar o comportamento de modo a evitar sua repetição.
Durante o processo de análise foi observado que duas das fotografias analisadas
são capturas da vítima no momento da ação do linchamento e duas são da vítima pós-
linchamento. Nestas últimas a vítima aparece presa a um poste, e em todas a vítima está
ao chão, sendo que nas imagens em que o linchamento está acontecendo a vítima
também se localiza ao centro do grupo agressor, o que pode trazer a ideia de conotação
à inferioridade em relação às pessoas ao redor e simbolicamente às pessoas que
consomem a imagem. Bem como denota o caráter de espetacularização pela localização
ao centro.
Pode-se verificar por meio das imagens que os atos de violência coletiva
ocorrem com maior frequência em período diurno. E a composição dos grupos
agressores é em sua maioria composta de homens. Estes dados também foram
observados por José de Souza Martins (1995). A composição do grupo agressor além do
supracitado é ainda formada de modo espontâneo e impulsivo, diante da afetação pode-
se entender nuances do instintivo senso de pertença por identificação, onde entende-se
que o crime que se quer punir atenta contra o todo social e assim contra cada um.
Como descrito por Marcus Brandão (2004) a potência para a agressão embora
inerente ao humano, não determina a violência. O alvo da violência é aprendido por
meio de familiarização, assim, a produção de significações a cerca desta temática por
meio da mídia cria/reforça perfis no imaginário social, o que dialoga com os
pressupostos de Kress (2001) acerca do dinamismo dos sistemas de significações.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
DARWIN, Charles. A expressão das emoções no homem e nos animais. São Paulo:
Companhia das Letras, 2000.
HALLIDAY, Michael A.; HASAN, Ruqaiya. Language, context, and text: Aspects of
language in a social-semiotic perspective. 1989.
LENT, Roberto. 100 bilhões de neurônios. Rio de Janeiro: Editora Atheneu, 2010.
Rodrigo Mariz16
Benick Santana17
RESUMO
O estudo pretende demonstrar a contradição do discurso acerca do caráter
ressocializador, amplamente divulgado que, em tese, teria a pena. Busca-se evidenciar,
através da discussão acerca da Criminologia Crítica, estudado por Alessandro Baratta e
Lourival Trindade, a qual traz à tona a questão econômica para o âmbito penal
revolucionando os conceitos existentes, visto que os autores da Criminologia
Positivista, como Césare Lombroso, aduziam ser a criminalidade transmitida de maneira
atávica; e o processo de Prisionização que, em verdade, o sistema prisional não
consegue ressocializar o indivíduo, mas o contrário, cria e reproduz criminalidade de
maneira cíclica, selecionando condutas, indivíduos e fomentando indiretamente a
perpetuação do processo criminológico. A pesquisa é fundamentada, ainda, nas ideias
críticas de Eugenio Zaffaroni, Paulo Busato e Lourival Trindade. A abordagem utilizada
foi a qualitativa, pois realizou-se uma pesquisa bibliográfica com análise de conteúdo,
baseada na leitura de artigos, livros e revistas acerca do tema. Além disso, a
metodologia usada foi a dialética, tendo em vista que analisamos os fatos e os contextos
sociais em que estão inseridos. Não conseguimos esgotar o assunto, e muito menos
achar uma solução para a reintegração dos apenados, mas sim aspectos que minimizam
os efeitos degradantes inerentes à pena.
Palavras chave: Criminologia Crítica. Ressocialização. Prisionização.
INTRODUÇÃO
16
Graduando em Direito pela Universidade de Pernambuco. Email: rodrigolfm98@gmail.com
17
Graduando em Direito pela Universidade de Pernambuco. Email: benickts97@gmail.com
encarcerado, o indivíduo irá ser reeducado e voltará ao harmônico convívio em
sociedade. É bem verdade que tal discurso tem perdido força ultimamente devido a
constatações empíricas que nos evidenciam que a prisão não reeduca o apenado.
É sabido que o Direito Penal se apresenta como a ultima ratio para resolução
dos problemas sociais. A privação de liberdade constitui a pena mais grave e mais
degradante em nosso ordenamento jurídico e, por sê-lo, é necessário que a mesma
proporcione uma resposta social satisfatória, que justifique a sua aplicação. Entretanto,
no Brasil os índices de reincidência são incertos (porém considerados altos) devido aos
inúmeros métodos com que a reincidência é aplicada nas pesquisas, vezes considerando
reincidência a prisão definitiva e vezes considerando também a prisão provisória (IPEA,
2015), fazendo com que a tese acerca da eficácia do isolamento de indivíduos
“desviantes” na prisão como forma de solução de conflitos não fique incólume. Nesse
cenário, buscou-se reunir dados/informações com o propósito de responder o seguinte
problema de pesquisa: Quais os pontos que evidenciam a falha da função
ressocializadora da pena?
Existe uma diferença entre a função declarada da pena, a qual seria o ideal de
como a pena deveria incidir no comportamento do apenado, promovendo a função
educativa e o combate à criminalidade; e a função real da pena, que é como esta se
comporta na prática. Tem-se a ideia de que a prisão como um método de controle social
e execução de seus diversos objetivos é um “fracasso”, entretanto, analisando de forma
mais profunda, é possível perceber que a função real da prisão está sendo cumprida,
qual seja a de proporcionar uma reiteração criminal (ANDRADE, 1997, p. 291 apud
TRINDADE, 2002, p. 18).
Para que o assunto possa ser entendido de maneira satisfatória, é salutar uma
digressão histórica ao período em que surgiram as discussões sobre a figura do Estado,
no século XVI. Os homens transferiram parte de sua liberdade ao poder estatal como
forma de defesa dos seus bens jurídicos dos ataques de outros homens, e é na questão do
contrato social que foi incorporada a ideia de justificação do direito de punir, ou seja, o
poder estatal como elemento de coação mediante a aplicação e execução das penas.
Configura-se elemento indispensável para a compreensão do assunto a ressalva feita por
Beccaria: “o conjunto de todas essas pequenas porções de liberdade é o fundamento do
direito de punir. Todo exercício do poder que se afastar dessa base é abuso e não justiça;
é um poder de fato e não de direito; é uma usurpação e não mais um poder legítimo”
(BECCARIA, 2015, p.24).
Sabendo que o direito de punir surge com base na necessidade de o homem viver
em conjunto com certa segurança proporcionada pelo Estado, dentro das ciências
criminais Franz Von Liszt percebe o discurso jurídico-penal atuando como forma de
defesa dos interesses individuais (bem jurídicos) dos cidadãos, de modo que a pena se
revela o meio precípuo de instrumentalização destes. Esta ideia foi apresentada no
Programa de Marburgo, em 1882, surgindo, dessa forma, o caráter finalista da pena.
Quem nos explica isso bem é Baratta (1999, p.25). Segundo o autor, o processo
de seletividade penal perpassa por duas fases essenciais. A primeira, relacionada com o
direito material, diz respeito ao processo de eleição dos bens jurídicos a serem tutelados,
bem como a previsão das condutas penalmente reprováveis. Essa eleição leva em
consideração os interesses das elites, num processo denominado como hierarquia de
interesses (TRINDADE, 2002). Assim, quando se tem condutas relacionadas às ações
típicas das classes marginalizadas e economicamente inferiores, o grau de intensidade
da ação penal se eleva; ao passo que, quando falamos em condutas típicas das elites,
como crimes econômicos ou ambientais, essa intensidade é exponencialmente menor,
sendo, no mais das vezes, subestimadas ou ignoradas pelo sistema, independentemente
do grau de ofensividade da conduta.
Tal processo se divide em duas etapas, de acordo com Baratta (1999, p.184-
185), sejam elas a “desaculturação” e a “aculturação”. Na primeira, tem-se que o total
isolamento do cárcere à sociedade faz com que o indivíduo se desadapte as condições
básicas de vida em liberdade, gerando a perda de autodeterminação social e econômica,
além da paulatina criação de uma ilusão sobre o ambiente externo, diminuindo,
sobremaneira, seu senso de realidade. Em outras palavras, quando o agente
criminalizado é separado abruptamente do convívio social, além de perder totalmente a
função que exercia na comunidade, ele se afasta, também, dos modelos de
comportamento vigentes externamente. Além disso, passa a ser classificado, sob um
prisma maniqueísta, como um indivíduo patológico, incompatível com os outros ditos
como “cidadãos de bem”, o afastando ainda mais da relação com o meio social e
fomentando a ideia de ruptura com a vida extramuros. Cite-se ainda a propensão a
situações demasiadamente degradantes, ferindo a estima do apenado de diversas formas,
que destoam totalmente com parâmetros de conduta que o agente tinha em sua vida fora
à prisão, forçando essa quebra com as nuances da vida em liberdade.
2.2 A busca por uma minimização dos fatores negativos através Intervenção
mínima
É a partir dos estudos sobre a Intervenção mínima, presente nas doutrinas mais
influentes do Ocidente, que conseguiremos reduzir a quantidade de apenados nos
presídios, “recuperar” os que lá estão e evitar que novas pessoas entrem,
consequentemente reduzindo a intensidade do fenômeno da prisionização e
estigmatização.
Adotar o Direito penal mínimo é, portanto, “o primeiro passo a ser dado dentro
da busca por soluções menos estigmatizantes” (RIBEIRO, 2016, p. 470). Outro aspecto
que nos parece relevante é o estudo por métodos alternativos de resolução de conflitos,
como é a mediação comunitária e a justiça restaurativa. Esta vem angariando muitos
adeptos na América Latina e “se trata de uma fórmula alternativa ao Direito Penal para
resolver conflitos com o empoderamento da própria comunidade que vivenciou o
conflito, como também a vítima” (RIBEIRO, 2016, P. 471).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
RESUMO
INTRODUÇÃO
A Constituição Federal de 1988 dispõe que todos devem ser tratados igualmente
sem distinção de qualquer natureza, inclusive, de cor e raça. Todavia, desde o
descobrimento do Brasil, vivemos por processos racistas onde certos grupos são
discriminados, sobretudo, os negros.
18
Universidade de Pernambuco, Graduando em Bacharelado em Direito,
silvioramosfilho1@hotmail.com.
19
Doutora e Mestra em Filosofia pela Universidade Federal da Paraíba. Coordenadora do Grupo
Observatório de Cidadania na Universidade de Pernambuco – Campus Arcoverde. Professora Adjunta da
Universidade de Pernambuco. E-mail: rita.tabosa@bol.com.br
Infelizmente, o racismo acaba sendo tão danoso para a vida das pessoas que
chega a ser fator determinante para o crescimento de números que dizem respeito à
violência. O Mapa da Violência, especialmente o de 2014 e o de 2016, evidenciam ser
os negros as maiores vítimas de homicídios no país. Para tanto, o presente artigo
científico tem como problemática: quais as razões para a maior parte das vítimas de
homicídios, segundo o Mapa da Violência, serem negras?
Logo, o objetivo geral desta pesquisa consiste em entender quais as razões para a
maior parte das vítimas de homicídios serem negras.
O método constitui uma das partes importantes de um trabalho científico.
Lakatos e Marconi (2010) destacam que o método é o conjunto das atividades
sistemáticas e racionais que, com maior segurança e economia, permite alcançar o
objetivo, traçando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as decisões do
cientista.
Assim, pode-se concluir, que a escolha correta e consciente do procedimento a
ser utilizado em um trabalho científico, além de ser essencial para o andamento da
pesquisa, pode ser fator determinante para o sucesso nos futuros resultados a serem
encontrados.
O presente trabalho utiliza o método dialético como parâmetro de pesquisa. A
utilização do referido se dá pelo fato de existir uma necessidade na apuração de dados
vertentes existentes de um fenômeno, nesta pesquisa, qual seja, os dados do Mapa da
Violência que apontam os negros como maior parte das vítimas de homicídios no
Brasil.
O presente trabalho utiliza, principalmente, três tipos de pesquisa, quais sejam a
pesquisa bibliográfica, descritiva e exploratória. Vale ressaltar que a bibliográfica
constitui técnica de pesquisa de documentação indireta. Lakatos e Marconi (2010)
definem a documentação indireta como a fase da pesquisa realizada com intuito de
recolher informações prévias sobre o campo de interesse. Além disso, o presente artigo
também vai utilizar-se da pesquisa descritiva, que, nas palavras de Prodanov e Freitas
(2013) é aquela que visa a descrever as características de determinada população ou
fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis.
De forma a entender e encontrar uma solução para a problemática aqui proposta
passa-se a analisar sobre o racismo no Brasil, como ele está enraizado na população e
como se dá a intersecção dele com os dados do Mapa da Violência referentes aos
homicídios por arma de fogo.
Os africanos, que são, em sua extrema maioria, negros, acabaram por serem
explorados por séculos. Apenas no segundo império, algumas legislações abolicionistas
surgem, tais como a Lei dos Sexagenários, a qual garantia liberdade aos escravos com
60 anos de idade ou mais, cabendo aos proprietários de escravos indenização, e a Lei do
Ventre Livre, que considerava livre todos os filhos de mulher escravas nascidos a partir
da data da lei.
Como bem lembra Reis
Este processo de abolição foi influenciado por processos externos. Havia uma
forte pressão britânica pelo fim da escravidão. Essas pressões não eram
motivadas somente por razões humanitárias, mas também econômicas, uma
vez que os escravos não recebiam salários e por isso não consumiam. O
sistema capitalista internacional, em expansão após a revolução industrial,
precisava encontrar mais mercados e mais consumidores (2012, p 19).
Tais marcas racistas persistem até hoje na sociedade brasileira, de forma que
podemos encontrar uma espécie de racismo que está enraizado na nossa população,
como veremos a seguir.
Os negros, assim como qualquer outra pessoa de qualquer raça que seja,
precisam ter sua dignidade humana preservada. Tal dignidade é inerente a qualquer ser
humano. O ser humano é digno justamente pelo simples fato de existir.
Aliada à falta de dignidade e do direito à vida, temos ainda a desvalorização das
vidas perdidas, que pode ser percebida na falta de investigação, solução e punição dos
casos de violência.
Com o reforço do discurso discriminatório, parte da população, inclusive,
pessoas mais esclarecidas, acabam por apoiar certos desrespeitos a dignidade da pessoa
humana, aos direitos humanos e ao próprio Estado.
A sensação de impotência e a indignação marcam a vida de famílias (SILVA, et.
al., 2009). Não é incomum que a vida perdida de uma pessoa negra não seja tão
valorizada quanto a de uma não negra, o que configura, também, uma grave violação
aos direitos humanos.
O Brasil é signatário de todas as Convenções, Acordos e Tratados internacionais
que objetivam erradicar o racismo e a discriminação à mulher, bem como qualquer tipo
de discriminação (BERTULIO, 2001). Isso é um fato positivo no que se refere ao nosso
Estado, todavia, o Brasil ainda carece de maior efetividade nas políticas de forma a
erradicar o racismo ou quaisquer outras formas de discriminação.
Embora não existam dados confiáveis e/ou corretos sobre a quantidade de armas
de fogos no Brasil, sabe-se que esse número é muito alto.
De acordo com o Mapa da Violência 2016 – Mortes por armas de fogo no Brasil,
de 1980 até 2014 morreram no Brasil 967.851 vítimas de disparo de arma de fogo,
sendo 830.420 dessas mortes, isto é, 85,8% do total, foram resultantes de agressão com
intenção de matar: foram homicídios (WAISELFISZ, 2016).
Dessa forma, por dia, no Brasil, morrem mais pessoas que em atentados
terroristas ou conflitos armados em países em estado de Guerra Civil (declarada).
Ainda como lembra o Mapa da Violência 2016
Característica marcante dos HAF é a elevada masculinidade de suas vítimas:
94,4% das vítimas, em 2014, foram homens; além de ceifar a vida, de forma
preferencial, da juventude: em 2014, os jovens de 15 a 29 anos
representavam, aproximadamente, 26% da população do país, mas essa faixa
é responsável por 60% das vítimas dos HAF acontecidos nesse ano
(WAISELFISZ, 2016, p. 71).
Os homens são os que mais morrem em virtude de homicídio por arma de fogo e
os jovens são a grande maioria, como já visto aqui.
Mas o dado mais alarmante é a seletividade racial dos homicídios por arma de
fogo tendo os negros estado do outro lado do cano da arma bem mais vezes que pessoas
não negras.
Entre 2003 e 2014, as taxas de HAF de brancos caem 27,1%, de 14,5, em 2003,
para 10,6, em 2014; enquanto a taxa de homicídios de negros aumenta 9,9%: de 24,9
para 27,4 (WAISELFISZ, 2016). Infelizmente, possivelmente a tendência é que nos
futuros levantamentos esse número venha a aumentar.
Como bem lembra Waiselfisz (2016), além da herança do passado colonial e
escravocrata, outros fatores podem ser mencionados na tentativa de explicar essa
crescente seletividade racial da violência homicida. A segurança pública não chega a
todos os locais da mesma forma e o aparelhamento de segurança também tem passado
por um processo de privatização, onde as populações menos favorecidas não têm
condições de utilizar desse serviço estando, dessa forma, mais vulneráveis.
Vale ressaltar que as famílias negras possuem uma renda fixa mensal menor que
as famílias brancas, o que demonstra mais uma vertente do racismo no Brasil.
Ainda, vale lembrar que geralmente as populações negras vivem em regiões com
menos alcance do Estado seja no que diz respeito à saúde, à Educação, ao Esporte e etc.,
o que acaba por impulsionar o aumento das desigualdades, que é outro fator
determinante para seletividade racial da violência homicida.
Vale lembrar que ambientes como a escola precisam ser utilizados para o
combate a discriminação, sobretudo, racial. Como lembra Reis
A Escola tem um papel fundamental a cumprir para combater preconceitos e
superar as desigualdades. O Brasil é um país conhecido por ser católico e
conservador especialmente no campo sexual, ao mesmo tempo em que se diz
“acolhedor” e “liberal”. Há um grande contraste desse lado “liberal” e os
ataques contra homossexuais e a discriminação contra as mulheres e aos
negros (2012, p. 24).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como observado, o racismo é uma grave violação aos direitos humanos ainda
presente de forma latente e viva na nossa sociedade. Embora muitas vezes esse racismo
se dê de forma velada e/ou por meio de atitudes aparentemente normais, como se dá no
institucional, ele acaba por ser um fator determinante no aumento das taxas de
segurança pública.
O Brasil é um dos países do mundo onde mais se cometem homicídios
diariamente, semanalmente, mensalmente e anualmente. Os números chegam a ser
assustadores por mostrar como a vida humana acaba por ter nenhum valor. Sendo as
maiores vítimas as pessoas negras e pobres, esse valor acaba sendo mínimo, visto que a
discriminação e a desigualdade perante estas são enormes.
Fato ainda mais preocupante é que a população jovem do país é a maior vítima
dos homicídios, sendo sua grande maioria, de negros. Embora o investimento em
políticas para inclusão da população menos favorecida e/ou discriminada seja maior que
nas décadas passadas, precisamos ter uma maior atenção para isso, visto que, a
educação é a porta e a possível solução para diminuição de taxas, que não são ruins
apenas para o Estado, bem como são verdadeiras violações a dignidade da pessoa
humana e, consequentemente, os direitos humanos.
A mudança na sociedade como um todo, partindo do indivíduo em si, até as mais
altas instâncias de órgãos públicos, deve ser imediata, pois enquanto isso, a carne mais
barata do mercado continua sendo a carne negra.
REFERÊNCIAS
REIS, Deyse Almeida dos. Uma reflexão sobre o racismo no âmbito escolar.
Universidade Federal de Ouro Preto. Especialização em Gestão de Políticas Públicas em
Gênero e Raça. Trabalho de Conclusão de Curso. Ouro Preto, 2012.
SANTOS, Ivair Augusto Alves dos. Direitos humanos e as práticas de racismo / Ivair
Augusto Alves dos Santos [recurso eletrônico]. – Brasília: Câmara dos Deputados,
Edições Câmara, 2013.
SILVA, Rodnei J. da, CARNEIRO, Suelaine. Violência racial: uma leitura sobre os
dados de homicídios no Brasil / Rodnei Jericó da Silva e Suelaine Carneiro. – São
Paulo: Geledés Instituto da Mulher Negra; Global Rights Partners for Justice, 2009.
RESUMO
Este estudo apresenta uma pesquisa com o seguinte tema: O perfil do criminoso: Um
estudo comparativo dos marcadores sociais do preso da cidade de Caruaru-PE. Discutir-
se-á acerca do estudo realizado no ano de 2015 analisando os marcadores sociais do
criminoso traçando assim um perfil do agente encarcerado, desta feita será comparado
com uma pesquisa realizada no ano de 2017.1). Desta feita o objetivo assumido foi o de
analisar qual o perfil do criminoso que se encontra em situação de cárcere na cidade de
Caruaru-PE. Ademais será tratado de forma específica: Verificar se os marcadores
sociais do agente delituoso do ano de 2015 são os mesmo do ano de 2017.1 bem como,
compreender a relação dos crimes praticados com os marcadores sociais de pessoas em
situação de cárcere. As conclusões alcançadas com a pesquisa realizada, nos permitem
esclarecer que o perfil do criminoso não mudou muito comparando as pesquisas de
2015 e 2017.1, podendo-se concluir que o perfil é de jovens masculinos, de cor
predominantemente parda, com escolaridade de ensino fundamental e fundamental
incompleto, com profissão variadas e com renda até um salário e com crime cometidos
em sua maioria contra o patrimônio.
1 INTRODUÇÃO
20
Universidade Federal de Pernambuco, aluna especial no P.P.G.D.H (Programa de pós-graduação em
Direitos Humanos). Graduada em Direito pelo Centro Universitário do Vale do Ipojuca. Advogada. E-
mail: w.alana@live.com,
² Escola Superior de Advocacia, pós-graduanda em Direito Processual Civil. Graduada em Direito pelo
Centro Universitário do Vale do Ipojuca. Advogada. deborahellenlima@hotmail.com.
O presente trabalho aborda sobre o seguinte tema: “O perfil do criminoso: Um
estudo comparativo dos marcadores sociais do preso da cidade de Caruaru-PE”.
Visa-se destacar aspectos críticos sobre o tema apresentado, com intenções de
discutir sobre o perfil do criminoso que se encontra em situação de cárcere na cidade de
Caruaru-Pe.
Tal pesquisa teve o auxílio o Núcleo de Prática Jurídica (NPJ) do
UNIFAVIP/DeVry que é a garantidora do acesso à justiça de 99% dos processos
analisados, nos quais não tem dinheiro para pagar um advogado particular nem
conseguem vagas com a defensoria pública. O NPJ presta assistência jurídica gratuita
garantindo-lhes o que a Constituição prevê.
Será realizado um estudo comparativo de duas pesquisas, uma referente ao ano
de 2015 e outra referente ao ano de 2017.1 (pesquisa realizada até o primeiro semestre
do corrente ano). Tal pesquisa se da de cunho comparativo com o intuito de verificar se
o perfil do agente delituoso continua o mesmo, levando em consideração os marcadores
sociais do criminoso, isto é sexo, cor, escolaridade, profissão e renda, bem como se
analisará o crime cometido.
No tocante a justificativa, pode-se concluir que o presente trabalho tem grande
relevância social no que diz repeito ao conhecimento da sociedade, conhecimento este
acerca do perfil da pessoa que está em situação de cárcere, saber quais seus marcadores
sociais e os estigmas que esteS carregam.
Haja vista a justificativa acadêmica preza-se também pelo incentivo a novos
artigos e pesquisa na área, fomentando assim a curiosidade e possível solução para o
cenário atual.
O problema estabelecido na pesquisa foi o seguinte: Qual o perfil do criminoso
que se encontra em situação de cárcere na cidade de Caruaru-PE?
Por sua vez, o objetivo geral do estudo foi instituído como: analisar qual o perfil
do criminoso que se encontra em situação de cárcere na cidade de Caruaru-PE.
Outrossim, será tratado de forma específica: Verificar se os marcadores sociais
do agente delituoso do ano de 2015 são os mesmos do ano de 2017.1, bem como:
Compreender a relação dos crimes praticados com os marcadores sociais de pessoas em
situação de cárcere.
3 DESENVOLVIMENTO
3.1 Marcadores sociais do criminoso
A presente pesquisa foi realizada nos moldes comparativo, isto é, em 2015 foi
realiza uma pesquisa que tinha com base processos dos anos 2011/2013/2014 e 2015,
que tramitam no Fórum da cidade de Caruaru, especificadamente na 1º Vara Criminal,
foi traçado um perfil do criminoso bem como analisado questões processuais inerentes a
prisão provisória. Em 2017 (primeiro semestre), foi realizada outra pesquisa, pesquisa
essa que se analisaram os mesmos requisitos da pesquisa anterior, tomando como base
os anos de 2016 e 2017 de processos que tramitam no Fórum da cidade de Caruaru,
especificadamente na 1ª e 3ª Vara Criminal, contando nas duas pesquisas com o auxílio
ímpar do Núcleo de Práticas Jurídicas (NPJ) do Unifavip-Devry sendo assegurado ao
criminoso o acesso a justiça, como bem estabelece a Constituição Federal.
Na pesquisa realizada em 2015 foram analisados processos referentes aos anos
de 2011, 2013, 2014 e 2015, constitui-se análise de 30 (trinta) processos com 37 (trinta
e sete) envolvidos. Far-se-á a discussão baseada nos anos dos processos analisados, são
estes.
Os marcadores sociais do criminoso, serão observados e levados em
consideração o sexo, a idade, escolaridade, profissão, cor e renda do agente delituoso,
traçando assim o seu perfil.
Desta feita, dos processos referentes à pesquisa de 2015 analisou-se 30
processos, obtendo uma média do sexo do criminoso.
Dos 37 envolvidos nos processos, (pesquisa de 2015) apenas 05 são mulheres e
32 homens.
Ao analisar os dados coletados constatou-se que só 01 é referente ao ano de
2011. Diante disso, relata-se que dos processos analisados o que faz menção ao ano de
2011 é:
Diante dessa análise referente ao ano de 2011, tem-se o seguinte perfil: jovem,
com ensino fundamental incompleto, com profissão, com renda não superior a um
salário mínimo e de cor parda.
No tocante o ano de 2013, contatou-se que dos 30 processos analisados que dizem
respeito a 37 criminosos, apenas 02 representam o ano de 2013.
Tabela 02- Casos analisados em 2013
Não tem como não falar na tipificação penal sem fazer menção aos marcadores
sociais do indivíduo delituoso. Quando tratamos deste tema no tópico anterior, falou-se
muito que o perfil do crimino consiste basicamente em homens jovens com um grau de
escolaridade baixo, pardos e com renda não superior a um salário mínimo, no entanto
não se fez menção qual o crime mais praticado entre os 37 envolvidos.
Caso 01 Latrocínio
Caso 01 Roubo
Caso 02 Roubo
Caso 01 Roubo
Caso 02 Roubo
Caso 03 Roubo
Caso 04 Tráfico
Caso 05 Porte ilegal de arma
Pode-se concluir que, dos processos analisados nos anos acima referidos o crime
que predomina é o roubo, isto é crime contra o patrimônio com 05 envolvidos. Tráfico
com apenas 01 envolvido, seguido de porte ilegal de arma, com a mesma quantidade.
Latrocínio com apenas 01 envolvido também.
Pode-se então falar que o perfil do criminoso está ligado a práticas de crime
contra o patrimônio.
Analisar-se-á agora os crimes cometidos no ano de 2015. No ano de 2015 a
tipificação penal que está no topo é o tráfico de drogas, visto que dos 10 processos
referente a tráfico de drogas, 04 diz respeito à prática desse crime cometido por
mulheres as quais foram presas dentro da unidade prisional, quando levavam drogas
para alguém já se encontrava custodiado. A última mulher que está na lista dos 37
processos analisados, praticou crime de furto. Totalizando assim 05 mulheres
criminosas dentre os 37 processos estudados.
Na sequência de crime mais praticado, vem o roubo com 06 indivíduos
envolvidos, seguido de furto com 04 indivíduos. Latrocínio e crime contra a mulher
seguem com 03 envolvidos cada, finalizando vem o porte ilegal de arma com 02
envolvidos e violação aos direitos autorais 01 envolvido.
É chegado o momento em que será ponderado o perfil do criminoso da pesquisa
realizada com processos dos anos 2016 e 2017.1 (primeiro semestre). Ao final será feito
um comparativo para ver se o perfil do criminoso mudou ou permanece o mesmo.
Na pesquisa realizada em 2017.1, isto é o presente trabalho abarcou somente
processos de 2016 até o primeiro semestre de 2017. Constitui-se análise de 25 (vinte e
cinco) processos com 30 (trinta) envolvidos. Far-se-á a discussão baseada nos anos dos
processos supracitados.
Os marcadores sociais do criminoso, serão observados e levados em
consideração o sexo, a idade, escolaridade, profissão, cor e renda do agente delituoso,
traçando assim o seu perfil.
Com base nos dados da pesquisa realizada em 2017.1, onde analisou-se 25
processos com 30 envolvidos, chegou-se ao quantitativo referente ao sexo dos
criminosos. 26 (Vinte e seis) são homens e apenas 04 mulheres.
Do referido quantitativo acima, obteve-se do ano de 2016, a prática criminosa de
17 indivíduos, 14 homens e 03 mulheres.
Veja-se o perfil do criminoso do ano 2016, senão, veja-se:
Tabela 05- Casos analisados em 2016
Com base no quadro acima, pode-se relatar que no que concerne a idade do
agente delituoso tem-se 10 indivíduos entre a faixa etária de 18 à 25 anos, 03 indivíduos
estão na faixa etária entre 26 à 35 anos e 03 pessoas entre 36 à 49 anos. Apenas 01
pessoa não informou a idade.
No que se refere a escolaridade dos indivíduos envolvidos na pesquisa, tem-se
02 pessoas com ensino médio, 04 com o ensino fundamental, 09 indivíduos com o
ensino fundamental incompleto, apenas 01 analfabeto e 01 pessoa não informal seu
nível de escolaridade.
A respeito da profissão dos envolvidos da pesquisa, obteve-se os seguintes
resultados: 06 serventes de pedreiro, 03 agricultores, 03 estudantes, seguido de
autônomo, vendedora, moto-táxi, costureiro todos com apenas 01 indivíduo cada e por
fim apenas 01 indivíduo não informou a profissão.
No tocante a cor dos analisados computou-se: 08 indivíduos se declaram pardos,
03 brancos, 02 parda escura, 01 amarela e 03 não informaram a sua cor.
Por fim, compreende-se os dados referentes a renda dos criminosos, obteve-se:
06 diz ter até 01 salário, 04 indivíduo diz ter até 02 salários e 07 não informaram a
renda que recebem.
Diante da análise supracitada tem-se o perfil do criminoso referente ao ano de
2016. A predominância de jovens está no topo, com a idade na faixa etária entre 18 à
25 anos Jovens em sua grande maioria do sexo masculino, com a escolaridade de ensino
fundamental não havendo registro de graduação, com cor predominantemente parda,
servente de pedreiro é a profissão que prevalece tendo assim uma renda que prepondera
de até 01 salário.
No tocante ao ano de 2017.1, tem-se o seguinte perfil
Caso 01 Roubo
Caso 02 Roubo
Caso 03 Roubo
Caso 05 Furto
Caso 06 Furto
Caso 07 Furto
Caso 08 Furto
Caso 09 Roubo
Caso 10 Roubo
Caso 11 Roubo
Caso 14 Furto
Caso 15 Furto
Caso 17 Receptação
Caso 01 Furto
Caso 02 Roubo
Caso 03 Roubo
Caso 06 Roubo
Caso 12 Roubo
Caso 13 Roubo
Pode-se concluir que, dos processos analisados nos anos acima referidos o crime
que predomina é o roubo, com 13 envolvidos na prática desse crime que é contra o
patrimônio, seguido de 06 crimes de furto, 06 portes ilegais de armas, 04 tráficos de
droga (crime contra a sociedade), houve ainda 01 registro de crime de violação de
direitos autorais. Uma „novidade‟ nessa pesquisa foi o crime de receptação que não
havia nenhum registro, crime de trânsito e estupro tentado. Não havendo registro de
latrocínio como foi elencado no ano de 2015.
Pode-se então falar que o perfil do criminoso está ligado a práticas de crime
contra o patrimônio, perfil que não alterou em comparação aos anos de 2014, mas,
diferente do ano de 2015, pois neste ano a tipificação penal que está no topo é o tráfico
de drogas, visto que dos 10 processos referente a tráfico de drogas, 04 diz respeito à
prática desse crime cometido por mulheres as quais foram presas dentro da unidade
prisional, quando levavam drogas para alguém já se encontrava custodiado. No ano de
2016 e 2017 a predominância dos crimes cometidos por mulheres foi o furto (03) e 01
mulher cometeu crime de porte ilegal de arma.
Na sequência de crime mais praticado no ano de 2015 vem o roubo com 06
indivíduos envolvidos, seguido de furto com 04 indivíduos. Latrocínio e crime contra a
mulher seguem com 03 envolvidos cada, finalizando vem o porte ilegal de arma com 02
envolvidos e violação aos direitos autorais 01 envolvido.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho de pesquisa chega ao fim na busca por repostas ao seguinte
problema de pesquisa: Qual o perfil do criminoso que se encontra em situação de crime
na cidade de Caruaru-PE?
Os resultados para que sejam reveladas as respostas do presente trabalho foram
alcançados por meio da análise a processos que tramitam na 1ª e 3ª Vara Criminal da
comarca de Caruaru. Como já relatado ao longo do trabalho em questão, este se deu
com base em pesquisas realizadas no ano de 2015 e 2017. Fazendo assim uma
comparação para analisar se o perfil do criminoso de 2015 é o mesmo perfil do
criminoso do ano 2017.
De acordo com os dados coletados da pesquisa, os marcadores sociais dos
criminosos são: jovens entre 18 e 25 anos, homens, de cor predominantemente parda,
com renda entre 01 (um) até 02(dois) salários mínimos, sem escolaridade necessária
para conseguir um emprego, pois a maioria só possuem o ensino fundamental
incompleto, mostrando dessa forma que, a falta de conhecimento reforça assim a
conduta criminosa, em relação a profissão a grande maioria diz ter.
Outrossim, pode-se concluir que o perfil do criminoso não mudou.
Com relação os crimes praticados, constatou-se que a grande maioria trata-se de crimes
contra a o patrimônio e contra a sociedade, ou seja, roubo , furto e tráfico.
REFERÊNCIAS
BARDIN, L. Análise de conteúdo . Lisboa: Edições 70, 1977
GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5.ed. São Paulo: Atlas, 1999.
LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Fundamentos metodologia científica. 4.ed. São
Paulo: Atlas, 2003.
MALHOTRA, N. Pesquisa de marketing . 3.ed. Porto Alegre: Bookman, 2001
ATUAÇÃO DE EQUIPE TÉCNICA DE CREAS MEDIADA PELA JUSTIÇA
RESTAURATIVA: um relato de experiência
Resumo
INTRODUÇÃO
22
Graduação em Psicologia pela Faculdade do Vale do Ipojuca – FAVIP; Discente do Programa de Pós-
Graduação em Educação Contemporânea – PPGEduC, do Centro Acadêmico do Agreste – CAA, da
Universidade Federal de Pernambuco – UFPE; Trabalhador do Sistema Único de Assistência Social –
SUAS.
como o corpo, as relações com os pais e com os pares, as exigências sociais, entre
outras coisas. Ganhos, pois as novas experiências oferecem um conhecimento bem mais
aprofundado e elaborado das relações sociais e pessoais. Todo esse universo de
experiências pode ser gerador de questionamentos sobre si e sobre o mundo, bem como
a vivência de uma série de conflitos que podem percorrer, desde o descobrimento de um
novo corpo, até às reações oriundas de sentimentos e relações, antes nunca vivenciados.
As representações e papéis sociais, além das exigências endereçadas as/aos
adolescentes, neste período de suas vidas, expõe a adolescência a uma miríade de
possibilidades de ser no mundo, geralmente influenciadas pela cultura de consumo e
pela mídia. Ao mesmo tempo em que a/o adolescente é bombardeada/o pela mídia e
pela cultura do consumo, que defendem que ser é sinônimo de ter, e que o status social
vale mais que a pessoa, emerge a necessidade da reflexão sobre uma sociedade que
exclui e impõe o valor do indivíduo como se ele fosse uma mercadoria que vale mais ou
que vale menos. Esta relação de maior ou menor valia, não obstante, pode gerar
conflitos tão perturbadores que levem adolescentes a cometerem atos infracionais em
razão das exigências de um pertencimento social baseado naquilo que se tem e não,
naquilo que se é.
O que se propõe aprofundar justifica-se, pois é reconhecível em diversos espaços
a (inter)relação entre ser e ter. O cotidiano social, as relações, os espaços de
pertencimento e tantas outras coisas que poderíamos destacar confirmam a valorização
do ter em relação ao ser na adolescência, principalmente, porque esta condição
representa poder.
O poder é algo extremamente representativo na adolescência, as transformações
que dela são originadas interpelam as/os adolescentes, de modo a gerar resistências à
ordem e a disciplina estabelecidas. Estas situações, não raro, são percebidas pela quebra
do decoro infantil, e pelo enfrentamento às instâncias disciplinares, como a família, a
sociedade, a escola, entre outras.
Quando falamos na escola, por exemplo, é fácil perceber a necessidade do
enfrentamento, da autonomia e da singularidade exigida pelas/os adolescentes, pois na
prática diária parece existir um enfraquecimento do papel escolar, tanto desgastado por
exigências que não são suas, como pelas condições desfavoráveis que possuem.
Na medida em que na escola, além da tentativa de exercer a sua autonomia e a
sua singularidade, a/o adolescente se vê no impasse causado por essa
possibilidade/impossibilidade, e, onde é crescente a presença de temas como
“indisciplina, descrédito na escola, enfraquecimento da autoridade dos professores,
violência” (COUTINHO, 2011, p.3), etc., o que perpassa a questão dos conteúdos
escolares e sua significação é a subjetividade da/o aluna/o e seu processo de
ressignificação.
A inclusão e a permanência da/o adolescente nesse contexto, geralmente
denotam recorrentes embates, e, o estabelecimento de relações saudáveis entre escola e
aluna/o é algo que gera resistências e desconhecimento de práticas efetivas que
garantam que os processos de conflito sejam tratados de forma positiva.
Para proporcionar um ambiente escolar e comunitário acolhedor e encorajador é
necessário compreender que a cultura de paz deve ser um elo que faz o conceito de
justiça ser um valor social alcançável em todos os âmbitos da sociedade como prática
restaurativa e cooperativa, que responsabiliza e dá suporte para que todas/os as/os
envolvidas/os na tessitura social sejam reconhecidas/os como pessoas.
Compreendemos que a “constituição da subjetividade é mediada por
experiências propiciadas pela cultura. [...] a linguagem e os conceitos que através dela
internalizamos da cultura tornam-se instrumentos fundamentais para a humanização”
(COUTINHO, 2011, p. 4). Por isso, a necessidade de trabalhar no ambiente escolar com
a construção de uma cultura de paz, que embasada no diálogo e na alteridade, promova
uma mudança intencional resgatando o reequilíbrio entre os sujeitos como indivíduos
reconhecidos e coletivos organizados.
Diante do exposto e, considerando a importância de aprofundar as questões que
podem levar adolescentes a cometerem atos infracionais, nossa questão principal é se há
a possibilidade de a sociedade, a família e, principalmente, a escola, ser capaz de atuar
de maneira restaurativa?
O objetivo deste trabalho é analisar os processos de relações estabelecidos entre
um adolescente que cometeu ato infracional, a sua família, a comunidade e a escola,
pelo viés da justiça restaurativa.
As atividades que foram desenvolvidas pela equipe técnica do Centro da
Referência Especializado de Assistência Social – CREAS, de um município do interior
de Pernambuco, que contava, à época, com equipe formada por profissionais de
Psicologia, de Serviço Social e de Direito, consubstanciaram o presente trabalho, na
tentativa de maior aproximação entre o arcabouço teórico da Justiça Restaurativa e as
possibilidade de utilização de práticas restaurativas, no contexto da atuação de equipe
técnica de serviço da área de Assistência Social.
Para que possamos aprofundar a temática utilizaremos a metodologia de Estudo
de Caso e Relato de Experiência, tendo como aporte a situação de um adolescente, do
interior de Pernambuco, encaminhado pelo Poder Judiciário, para ser acompanhado pela
equipe técnica do CREAS, de modo a subsidiar sentença de Medida Socioeducativa –
MSE.
DESENVOLVIMENTO
23
Direitos deliberados pela V Conferência Nacional de Assistência Social, realizada em Brasíla – DF, no
ano de 2005, criados de modo a fortalecer às metas para a implementação da Política Nacional de
Assistência Social no Brasil.
violação de direito, encaminhamentos para a rede, entre outras estratégias,
possibilitando o restabelecimento de vínculos familiares e/ou sociais, articulação com a
rede de serviços socioassistenciais e setoriais, etc.
No que se refere ao adolescente, tratava-se de pessoa com dezesseis anos de
idade, estudante, filho de pais separados, e que residia na área rural de município
pernambucano, junto com a sua genitora, seu irmão, sua cunhada e seu sobrinho.
Segundo a mãe do adolescente, o pai dele é alcoólatra, reside na área urbana do
município e já faziam alguns anos que estava separada dele.
O acompanhamento e as estratégias de intervenção solicitadas à equipe técnica
do CREAS, pelo judiciário, objetivavam oferecer maiores subsídios para a decisão,
quanto a Medida Socioeducativa – MSE que seria mais adequado ao adolescente, tendo
em vista que o mesmo havia cometido ato infracional. Desse modo, o CREAS atuou
nesta situação, em parceria com o judiciário, na tentativa de encontrar possibilidades
para o cumprimento da medida, sem que a liberdade do adolescente fosse privada.
Para fins didáticos e de esclarecimentos a divisão legal entre infância e
adolescência, conforme estabelecida pelo Estatuto da Criança e adolescente – ECA (Lei
8.069/90), é descrita considerando crianças: as pessoas com idade até doze anos
incompletos, enquanto que a adolescência: é atribuída a pessoas entre doze e dezoito
anos de idade.
As etapas desenvolvidas
Art. 13. As medidas sócios disciplinares que por ventura sejam tomadas pela
escola ou pelos professores, devem observar o que segue:
Resultados
Enquanto resultado das contribuições que foram realizadas nesta situação, sob a
ótica da Justiça Restaurativa, destacamos a confecção de relatório produzido pela equipe
técnica do CREAS, com a finalidade de poder subsidiar à sentença judicial a ser
tomada, objetivando que a MSE adotada, levasse em consideração as potencialidades do
adolescente e o suporte que o mesmo e a sua família deveria receber da rede
socioassistencial e setorial. De modo que o adolescente não tivesse à sua liberdade
privada, pois o ato infracional cometido poderia ter estreita relação com a falta e/ou
precariedade de oportunidades e de acesso aos serviços públicos, e, que esta situação,
aliada a exigências sociais higienizadoras, bem como a invisibilidade sofrida pelas
condições de vida, econômicas, sociais, geográficas, etc., poderiam ter contribuído para
o comportamento infracional do adolescente.
Cabe destacar que a conduta do adolescente foi grave e danosa para a ordem
social estabelecida, e, para as relações entre as pessoas. Mas, das avaliações e análises
que realizamos, consideramos que medidas que reforçassem as restrições que este
adolescente já vivenciava, poderiam desencadear o desenvolvimento de um self
(conceito de si) fragilizado, o que poderia possibilitar que, dependendo do
acompanhamento que ele viesse a receber, ou deixasse de acessar, se tornasse uma
pessoa com poucas expectativas e os propósitos de vida se fragilizem mais e mais.
Infelizmente, a então, equipe técnica do CREAS não obteve mais informações
sobre o caso do adolescente, mesmo após o envio do relatório pela equipe, em 31 de
outubro de 2016. Pois, por ocasião das eleições municipais ocorridas naquele ano,
alguns profissionais que compunham aquela equipe, deixaram de trabalhar no serviço,
impossibilitando o conhecimento, quanto à sentença que tenha sido adotada em relação
ao processo do adolescente.
Entretanto, consideramos satisfatória a nossa participação no estudo deste caso,
pois acreditamos que as nossas observações e intervenções possibilitaram uma reflexão
mais ampliada sobre as possibilidades que as práticas restaurativas podem oferecer para
o atendimento de adolescentes em conflito com a lei.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
RESUMO
1
Bacharela em Direito. Graduada pela Faculdade de Direito de Garanhuns (AESGA/FDG). E-mail:
julliacalado@hotmail.com.
2
Bacharelando em Direito pela Faculdade de Direito de Garanhuns (AESGA/FDG). E-mail:
lucasaa@bol.com.br.
3
Bacharela em Direito, Especialista em Direito Processual Civil, Direito do Trabalho, Direito Ambiental e
Ciências Políticas, Mestre em Direitos Humanos e Doutora em Direito do Trabalho. Conselheira da OAB,
subseção de Garanhuns – PE. Profa. Dra. da Faculdade de Direito de Garanhuns (AESGA/FDG) e da
UNIFAVIP- DeVry. E-mail: brunamariaj@gmail.com.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Assim, pode-se dizer que o lema da Revolução Francesa, qual seja “Igualdade,
Liberdade e Fraternidade”, só se aplicou aos homens, reforçando a ideologia de hierarquia
entre os gêneros e o papel doméstico da mulher, deixando-as, mais uma vez, afastadas do
ideal de cidadania.
Já a Revolução Industrial representou um marco para a inserção definitiva da
mulher no mercado de trabalho formal, pois modificou o setor produtivo – substituindo a
mão de obra física pelo maquinário – e originou a classe operária, sendo o capitalismo e a
produção as principais preocupações dos empregadores.
Dessa forma, qualquer um que pudesse operar uma máquina estaria em condições
de ser contratado. Nas palavras de Barros (2016, p. 51):
À vista disso, nota-se que a questão da divisão sexual do trabalho é vista não só no
que se refere à distribuição de cargos e funções no exercício de atividade remunerada,
como também nas atividades domésticas, resultado do patriarcalismo e da atribuição do
tripé “mãe/esposa/dona-de-casa” como exemplo de mulher ideal.
Registrada a inserção da mulher no mercado de trabalho, abordando diferentes
contextos históricos e culturais, cumpre reunir as primeiras normas de proteção ao trabalho
da mulher no Brasil, tema a ser abordado no próximo tópico.
Nota-se, assim, que a sociedade familiar era liderada por uma figura que detinha,
sozinha, o poder de decidir o destino dos demais, inclusive, o da esposa, caracterizada
como relativamente incapaz, que dependia da autorização do cônjuge para exercer
atividade laboral.
As primeiras regulamentações acerca do trabalho da mulher ocorreram por
intermédio do Decreto 21.417-A, de 1932, intitulado “Trabalho da mulher: na indústria e
no comércio”. O decreto em questão inovou em vários aspectos.
Tal decreto regulamentou as condições do trabalho da mulher, conferindo igualdade
salarial, proibiu o trabalho à gestante quatro semanas antes do parto e depois do parto;
determinou que os estabelecimentos com pelo menos 30 (trinta) empregadas com mais de
dezesseis anos deveriam ter local apropriado para guarda e vigilância dos filhos em
período de amamentação; e proibiu a dispensa das gestantes única e exclusivamente pela
gravidez (LUZ; FUCHINA, 2009).
Verificou-se uma evolução na legislação brasileira que, por sua vez, passou a
legitimar efetivamente o trabalho da mulher, garantindo as condições mínimas para o seu
exercício justo e digno, estabelecendo a igualdade salarial e a viabilização de condições
específicas para a empregada gestante e lactante.
Entretanto, tal decreto não foi suficiente, pois, ainda que reconhecesse a mulher
como trabalhadora, conforme o seu próprio título aponta, trata-se de um diploma
separatista, que reconhece o lugar da mulher na indústria e no comércio, mas a exclui dos
demais setores, reforçando o conceito histórico de divisão sexual do trabalho.
Apresentadas considerações acerca das primeiras normas de proteção ao trabalho da
mulher no Brasil, cumpre trazer maiores esclarecimentos acerca da proteção à maternidade
conferida pela CLT, principalmente no que tange ao exercício de atividades insalubres.
O Projeto de Lei nº 6.787-B de 2016, também conhecido como o texto que institui a
Reforma Trabalhista, traz mais de 100 alterações à atual disciplina da CLT.
Dentre tais modificações, merece destaque a nova redação do art. 394-A, in verbis
(2016, p. 1):
CONSIDERAÇÕES FINAIS
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 10. ed. atual. São Paulo:
LTr, 2016.
BARROS, Alice Monteiro de. Cidadania, relações de gênero e relações de trabalho. In:
Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, 2008. Disponível em:
<https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/1939/72686/2008_rev_trt03_v47_n077.pdf?s
equence=1&isAllowed=>. Acessado em 19 jul. 2017.
DELGADO. Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 15 ed. São Paulo: LTR,
2016.
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Internacional Interdisciplinar Inthertesis. vol. 4. n.1, 2007. Disponível em:
<https://periodicos.ufsc.br/index.php/interthesis/article/view/911/10852>. Acessado em 19
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LUZ, Alex Faverzani da; FUCHINA, Rosimeri. A evolução histórica dos direitos da
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Ciências Políticas da UFRGS, 2009. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/%0D/cpa/n26/30398.pdf>. Acessado em: 24 jul. 2017.
MARQUES, Tereza Cristina de Novaes; Melo, Hildete Pereira de. Os direitos civis das
mulheres casadas no Brasil entre 1916 e 1962. Ou como são feitas as leis. In: Revista
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<https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/issue/view/1125>. Acessado em 20 de jul de
2017.
NOGUEIRA, Claudia Mazzei. As relações sociais de gênero no trabalho e na reprodução.
In: Aurora Revista dos Discentes da Pós-Graduação em Ciências Sociais da
Unesp/Marília-SP, 2010. Disponível em:
<http://www2.marilia.unesp.br/revistas/index.php/aurora/issue/view/123>. Acessado em
19 de jul. 2017.
RESUMO
O presente artigo lança-se na discussão das relações de gênero, analisadas a partir das
práticas pedagógicas do/a professor/a em sala de aula, apontando a coeducação, como
prática de emancipação dos sujeitos e de horizontalização do poder. Fazemos uma
intersecção entre as teorias feministas e educação, apontando a educação como dispositivo
importante no enfrentamento as desigualdades de gênero. Para darmos conta dessa
discussão temos como objetivo geral: Analisar o uso é feito das relações de gênero nas
práticas docentes dos/as professores/as, se e quando se aproximam da coeducação. Quanto
ao método epistemológico, optamos pela pesquisa qualitativa do tipo etnográfico na
perspectiva de André (2011) e para análise dos dados, utilizamos a Análise de Conteúdo na
proposta de Bardin (1977). Nos resultados retomaremos os objetivos específicos ao
realizarmos esclarecimentos acerca de cada um deles, aproximando teoria e campo. Por
fim, os resultados apontam para a existência na escola de práticas educativas ainda
excludentes. No entanto, foi verificada a existência de práticas coeducativas isoladas ou de
momentos coeducativos.
INTRODUÇÃO
4
Graduando em Pedagogia pela UFPE – CAA. E-mail: psirubemviana@gmail.com
puderam frequentar o espaço escolar, ou tiveram uma educação diferente da destinada aos
meninos, pensada para a esfera privada da vida social, por serem consideradas o “segundo
sexo”, o sexo que devia ser educado para a família, que deveria assegurar através do
casamento filhos a sociedade. O exercício do pensamento crítico e o ensino para a
profissionalização era destinada aos meninos (ALMEIDA, 2007a, 2007b, 2015).
Desta forma, a escola é historicamente marcada pelas desigualdades de gênero, que
ainda estão presentes em muitas práticas pedagógicas dos espaços escolares
contemporâneos como nos traz Louro (1997). Desigualdades que segregam e excluem
sujeitos, considerados diferentes ou desviantes da norma padrão, a mulher, o negro, o
homossexual, o transexual entre outros. No entanto, alguns esforços têm sido tomados para
diminuir as desigualdades de gênero na escola, a partir de olhares que vêm
problematizando as práticas pedagógicas, como é o caso da coeducação defendida por
Daniela Auad (2006). Esses novos olhares para as políticas escolares e para as práticas
pedagógicas voltados para as relações de gênero surgiram com o movimento feminista do
final século XIX, através de reivindicações das mulheres ao sufrágio e por igualdade
educacional para meninos e meninas por meio de uma educação indiferenciada para ambos
os sexos, dando surgimento as escolas mistas.
No entanto, a escola mista que hoje temos no Brasil, se revela falha, no que se refere
à educação para a igualdade de gênero, pois a simples mistura entre meninos e meninas
não é suficiente para diminuir as desigualdades de gênero, pois essas, são fruto de uma
estrutura social complexa e histórica, que influenciam as relações e práticas pedagógicas,
como nos mostra Auad (2006). Assim, a escola ainda hoje “fabrica” corpos desiguais como
afirma Louro (1997), essa autora, contribui a essa discussão ao afirmar e problematizar que
os espaços escolares são marcados pelas relações de gênero, relações essas que são
desiguais, e que implicam em relações históricas de poder, desta forma, a partir dessa
assertiva é possível apontarmos que a escola contemporânea ainda é sexista e excludente.
Não obstante, ainda com todas essas dificuldades, a escola é um espaço no interior
do qual podem ser construídos novos padrões de aprendizado, convivência, produção e
transmissão de conhecimento, sobretudo se ali valores, crenças, representações e práticas
associadas a preconceitos discriminações e violências de ordem racista, sexista, misógina e
homofóbica forem levados à discussão crítica e política conforme a realidade de cada
espaço escolar.
É diante deste contexto escolar, que aponta para a necessidade de novas práticas
emancipadoras e democráticas que lançamos a seguinte questão provocadora: Qual uso é
feito das relações de gênero nas práticas pedagógicas dos/as docentes, se e quando se
aproximam da coeducação? Para podermos refletir sobre como é tratada as relações de
gênero na educação básica a partir das práticas pedagógicas, por acreditarmos que a
educação é um dispositivo importante no enfrentamento as desigualdades de gênero,
mesmo sabendo que o caminho de melhoramento das desigualdades que existem na escola
é um processo que deve envolver leis e medidas que articulem todas as esferas da
sociedade, da administração pública aos docentes em sala de aula. Assim, lançamos aqui
mais um olhar sobre as relações de gênero que se estabelecem nas práticas pedagógicas
escolares, apontando a coeducação como possibilidade de prática pedagógica
emancipadora, com o intuito de levantar reflexões e propor alternativas as práticas
pedagógicas tradicionais vigentes.
Utilizamos como objetivo geral: Analisar o uso feito das relações de gênero nas
práticas pedagógicas dos/as docentes, se e quando se aproximam da coeducação. E como
objetivos específicos: 1) Identificar e analisar a existência da coeducação nas práticas
pedagógicas mediada pelo/a professor/a em sala de aula; e 2) Conhecer e caracterizar as
principais questões referentes às relações de gênero que perpassam as práticas
pedagógicas.
Nossa pesquisa foi construída numa perspectiva qualitativa, por acreditarmos que,
desta forma, a riqueza sociológica e pedagógica dos fenômenos teria seu conteúdo
preservado. Nosso campo/tema é a coeducação enquanto prática pedagógica, desta forma,
nosso estudo está delimitado enquanto campo a uma escola pública municipal da cidade de
Caruaru no Agreste Pernambucano. Os sujeitos da pesquisa foram dois professores que
dividiam as disciplinas do quinto ano do ensino fundamental, na escola escolhida, um
professor que daremos o nome de P1, e uma professora, que daremos o nome de P2, por
motivos éticos a fim de preservar suas identidades na discussão dos dados, a turma de
quinto ano escolhida para pesquisa possuía 40 alunos, sendo 17 meninas e 23 meninos, a
pesquisa foi realizado no segundo semestre do ano de 2016.
No que tange ao método epistemológico, nossa pesquisa é do tipo etnográfico na
perspectiva de André (2011). Acreditamos que a partir desse método é possível levantar e
categorizar os fenômenos que perpassam o dia a dia da realidade escolar com
fidedignidade e isso atende a nosso objetivos. Na fase de tratamento dos dados
utilizaremos a Análise de Conteúdo na perspectiva de Bardin (1977), por acreditar que essa
técnica metodológica, traduz melhor os significados dos fenômenos obtidos na pesquisa do
tipo etnográfico.
RECORTE TEÓRICO
Gênero: categoria útil para análise das desigualdades entre meninos e meninas na
escola
A partir da “segunda onda” do movimento feminista em meados de 1960 surge a
teorização da problemática do conceito gênero no movimento, que agora se volta para o
campo acadêmico, propondo a discussão das questões relativas ao sujeito mulher na
sociedade, levando para o campo da academia a militância política e social, que surgiu no
século XIX com o sufragismo, movimento que propunha a legalidade do direito da mulher
ao voto. As estudiosas feministas passam a denunciar o ocultamento da mulher na esfera
pública e acadêmica, com estudos que tinha por objetivo tornar visível o sujeito mulher
que historicamente esteve restrito à esfera privada, estes estudos, então, dão voz aquelas
que eram sumariamente silenciadas pela norma masculina (LOURO, 1997).
Estes estudos questionavam principalmente o determinismo biológico que sustentava
a tese de que por serem sexualmente diferentes homens e mulheres teriam posições sociais
diferentes, utilizada por séculos para justificar a desigualdade social entre homens e
mulheres. No entanto, os estudos vêm demostrar que não são as características sexuais,
mas o que se fala ou se pensa sobre elas, que vai construir o que é masculino ou feminino
em uma sociedade em um tempo histórico. O debate vai se construir sobre uma nova
análise onde gênero passa a ser o conceito central da discussão, conceito esse que passa a
incluir também as questões do homem, e das masculinidades (LOURO, 1997).
Gênero passa a ser diferenciado de sexo, se afastando do determinismo biológico que
tem o termo sexo, no entanto, como afirma Louro (1997, p.22): “não é negada a biologia,
mas enfatizada, deliberadamente, a construção social e histórica produzida sobre as
características biológicas”. Scott (1995) contribui a essa discussão ao problematizar que,
enquanto saberes constituídos, a distinção entre gênero e sexo é complexa, o que significa
dizer que, embora o pênis e a vagina possuam existência material eles só ganham sentido, a
partir de um olhar que é cultural, por meio de um discurso que é construído. Assim,
concepções políticas sobre masculino e feminino marcam e orientam a constituição desses
saberes.
Para Louro (2001), a inscrição do gênero se dá sempre no contexto de uma
determinada cultura, nesse sentido, os corpos ganham sentido socialmente. Assim as
diversas formas de expressar e viver os desejos e prazeres, também trazem uma
codificação estabelecida socialmente. As identidades de gênero e sexuais são, portanto,
definidas a partir das relações sociais, moldadas pelas redes de poder de uma sociedade. É
no âmbito da cultura e da história que se definem as identidades sociais.
Dentre as múltiplas marcas que a cultura impõe sobre os corpos, Butler (1990, p.
197), destaca o gênero como a inscrição primeira, inauguradora do processo de
subjetivação.
[...] as leis naturais tinham estabelecido o lugar da mulher no lar e o dos homens
na vida pública. Juntar dois seres tão diversos e com destinação tão diferente se
constituía uma inobservância das leis divinas e da natureza. Subverter essa
ordem seria desobedecer a Deus. [...]
Desta forma para a igreja católica brasileira do final do século XIX o ensino na
coeducação significaria uma ameaça à sociedade, a moral e aos bons costumes e poderia
desvirtuar as mulheres de sua função social preestabelecida pela igreja, calcada sob
princípios biológicos e fundamentalmente religiosos.
Segundo Almeida (2007a, 2007b, 2015), as ideias de escolas coeducativas entram no
Brasil através dos missionários protestantes Norte Americanos por volta de 1870, que
possuíam ideias democráticas de liberdade, que movidos por interesses econômicos
compactuavam com as ideias feministas de igualdade educacionais sem distinção de
gênero. No entanto, as escolas mistas se proliferaram no Brasil, muito mais pelas
condições socioeconômicas em que o país se encontrava, já que custavam menos aos
cofres públicos, do que, por uma ideologia de igualdade. Auad (2006) destaca sobre essa
discussão que o projeto inicial de coeducação no Brasil falhou, pois o que de fato foi
implantado no país, foi um modelo de escolas mistas, o projeto de coeducação feminista de
equidade de gênero foi suprimido pelo sistema.
É a partir da intersecção entre a luta feminista acadêmica e política das relações de
gênero que surgem os conceitos contemporâneos de coeducação. Almeida (2007a)
conceitua pedagogicamente coeducação como sendo:
Auad (2006), faz uma diferenciação entre escolas mistas e coeducação, pois, para a
autora, além dos meninos e meninas, estarem “misturados” realizando as mesmas
atividades de forma que as diferenças sejam respeitadas, é necessário que as oposições
históricas sobre o lugar da mulher e do feminino e do homem e do masculino na sociedade,
e as relações de gênero que também compreendem, relações de poder, sejam questionados
na escola e que as práticas pedagógicas tenham um sentido definido.
Louro (1997), entre outros autores, afirmam que a escola por ser um espaço de
reprodução da sociedade que a constitui, é um espaço marcado pelas relações de gênero
que implicam em relações de poder por serem relações hierarquizadas criando e
reproduzindo diferenças e desigualdades. Assim, para a autora, tanto os dispositivos
curriculares que pressupõem normas e procedimentos de educação, quanto os sentidos
subjetivos do que é ensinado, e como é ensinado, devem ser questionados quando se
pretende diminuir as desigualdades de gênero na escola.
De acordo com Auad (2006), na escola contemporânea os próprios alunos\as
questionam o lugar que é dado às feminilidades e masculinidades nas práticas educativas
tradicionais, assim, por estarem inseridos em uma sociedade que vem sofrendo grandes
transformações do pensamento, e que constantemente questiona os lugares sociais e
subjetivos dos sujeitos, seria de grande estranhamento se esses questionamentos não
surgissem em sala de aula por parte dos próprios alunos\as. Por conta disso, o professor
deve estar atento aos sentidos e significados que são construídos na sala de aula, a esse
respeito.
Desta forma, para Louro (1997), se admitirmos que a escola não só transmite
conhecimentos como também “fabrica” sujeitos, produzindo identidades sociais, temos que
reconhecer que essas identidades são formadas a partir de relações de desigualdade. Assim,
ao perceber esse contexto social e histórico o qual a escola está inserida, encontramos
justificativas para poder intervir na descontinuidade dessas desigualdades.
A pedagogia feminista, que é uma das pedagogias que vem a influenciar a
coeducação, pode ser pensada como um novo modelo que possa vir a contribuir com o
enfrentamento as desigualdades de gênero na escola, nas palavras de Louro (1997, p 113),
a pedagogia feminista:
Quadro 1 –
Disposição dos alunos/as na sala
A esse respeito Louro (1997), nos alerta para os processos de naturalização em que
as relações que são constituídas no espaço escolar, assim como, a forma como esse espaço
é utilizado de maneira diferenciada por meninas e meninos, não só o espaço físico, mas
também o espaço sonoro. Pois, “por um aprendizado eficaz, continuado e sutil, um ritmo,
uma cadência, uma disposição física, uma postura parece penetrar nos sujeitos” (p. 61) e
produzir, o que a autora chama de corpo escolarizado.
Na nossa observação verificamos que o uso dos gêneros nas práticas de mistura e
separação é feito tanto pelo professor P1, quanto pela professora P2 no entanto, essas
práticas são feitas na maioria das vezes com a intenção de conter a indisciplina e não como
uma prática coeducativa de respeito as diferenças, são práticas que ao contrário reforçam
as divisões e desigualdades de forma normalmente imposta, não obstante, nas entrevistas
tanto o professor P1, quando a professora P2, afirmam que as misturas feitas são por
motivos de integração e que as separações feitas por eles são por motivos de indisciplina.
Entretanto, as observações das aulas nos revelaram que tanto as práticas de misturas,
quanto as de separação, ocorrem na maioria das vezes em momentos de indisciplina e não
há uma problematização do motivo da troca ou mistura dos alunos e quando são feitos
solicitações de grupos ou de duplas, estas, são feitas, quase sempre, com o intuito de
diminuir a indisciplina e assim facilitar o andamento da aula, seja grupos ou duplas, de
separação ou de mistura, vejamos as falas do professor P1 a respeito dessa questão:
[...] não sei se vocês já observaram, mais geralmente menino, menina, menino,
menina, menino, menino, é uma das formas que eu utilizo para separar os
alunos nas bancas, não só para evitar conversas uns com os outros, mas para
possibilitar também e quebrar um pouco o gelo, a ideia que eles têm de que
meninas só fica do lado de meninas e meninos do lado de meninos, e que não
pode se misturar. Então, as vezes meio que forçadamente eu proponho a mistura,
para que eles interajam, dialoguem entre eles, mas também proponho grupos e
atividades de modo que haja separação, no caso, não mistura entre eles, mas
uma separação, às vezes quando formo um grupo, às vezes em hora da saída,
mando as meninas na frente, depois os meninos, ou meninos e meninas.
Propositalmente também, às vezes eu separo, ou formo grupos, só grupos de
meninos ou só grupos de meninas também para diferenciá-los. (Entrevista
com P1, 7 de novembro de 2016).
Quadro 2-
Disposição dos alunos na sala
[...] não acho que tem que ter isso de menino com menino e menina com menina
não. Até porque, assim, quando eu faço duplas na sala eu nem olho quem tá
do lado do outro, eu vou juntando quem está próximo, se for menino vai
com menino ou menina. Eu deixo eles ficarem juntos, portanto que eles façam o
trabalho (Entrevista com P2, 7 de novembro de 2016).
Na fala dela, assim como nas falas de P1 é possível perceber que eles de alguma
forma compreendem que as separações de gênero podem corresponder a concepções
arcaicas de sujeitos, no entanto, na prática, isso não se personifica enquanto atividade de
mistura coeducativa, fica apenas no campo teórico, na fala.
Com relação às práticas de mistura que é condição indispensável para que exista a
coeducação Auad (2006) vem nos alertar para o fato de que se essas práticas não tiverem
uma função pedagógica pensada para integração e respeito às diferenças, essas, não
corresponderão a práticas coeducativas completas, pois a mistura entre meninos e meninas
sem uma reflexão que vise uma igual valorização de gênero pode cristalizar o aprendizado
da separação reproduzindo hierarquias.
A esse respeito Louro (1997), coloca que sobre formas reeditadas e utilizando novas
formas e regras a escola continua imprimindo nos sujeitos sua marca distintiva,
fomentando desigualdade através de múltiplos e diversos mecanismos escolariza-se os
corpos e mentes. Ainda sobre a linguagem no processo de diferenciação e desigualdade a
autora nos alerta para o fato de a linguagem não apenas expressa relações de poder, como
também ela produz e se propõe a fixar desigualdades e diferenças nos sujeitos, no entanto,
a autora ressalta que isso não e recebido de forma totalmente passiva por parte dos alunos e
alunas, pois eles se envolvem nesse processo de aprendizagem, reagindo respondendo,
recusando ou assumindo integralmente.
Não obstante, foram verificadas características ou práticas dos docentes que se forem
aperfeiçoadas e feitas de forma consciente, enquanto seus objetivos e finalidades, podem
ser utilizadas a fim de enfrentar as desigualdades de gênero na escola, ancoramos essas
observações e pontuações na compreensão de Auad (2004, 2006) e Almeida (2007a,
2007b, 2015), sobre coeducação, ressaltando que não são práticas completas de
coeducação, são práticas que na nossa compreensão, tem em alguns momentos
características coeducativas isoladas, ou características importantes para a implantação da
coeducação, para além das misturas.
A primeira característica observada é a de que, os professores tiveram algum
contanto com as teorias de gênero, essa assertiva foi apontada por eles, e aparece nas falas
durante as entrevistas, mesmo sendo de forma não aprofundada, e por vezes confusa, e não
aparecendo da forma que é colocado nas entrevistas nas práticas, ficando no campo
teórico, no entanto, o que queremos destacar, é o fato de que, tanto o professor P1, quanto
a professora P2 tiveram de alguma forma nas suas formações contato com a problemática
de gênero. Desta forma, P1 e P2 parecem compreender mesmo de forma limitada, já que
eles têm uma compreensão confusa sobre a diferença entre gênero e sexualidade, que, o
uso das relações de gênero na escola precisa mudar e não ser tão engessadas com são,
como podemos perceber na seguinte fala:
Não tem esse negócio não, só porque antigamente a gente via muito isso né? E
até tem pais que são assim: “ah! Não quero que minha menina faça né, se
junte com um menino”. Mas não pode ser assim, a vida não é assim. Desde
cedo, na escola a gente tem que trabalhar isso com eles. (Entrevista com P2, 7
de novembro de 2016).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As práticas dos professores/as relativas às questões de gênero e sexualidade
analisados neste artigo, apontam de um modo geral para um reprodução de práticas
tradicionais, revestidas por vezes de estereótipos e de posicionamentos próprios do senso
comum, pensamos que isso pode dificultar a possibilidade da existência de práticas que de
fato tenham um compromisso coeducativo, assim como também, agravar ainda mais as
desigualdades de gênero existentes na escola. No entanto, a partir dos dados obtidos
pensamos que as temáticas críticas feministas das relações de gênero começam a entrar no
espaço escolar.
Ao tentar responder nosso primeiro objetivo específico encontramos a partir das
práticas pedagógicas analisadas, práticas de separação e de mistura de meninos e meninas,
ou seja, foi verificado o uso das relações de gênero nas práticas pedagógicas, no entanto, o
uso das relações de gênero era feito, na maioria das vezes para conter a indisciplina dos
alunos/as e assim facilitar a aula. Desta forma não verificamos práticas completas de
coeducação, apenas momento coeducativos em atividades isoladas.
Nas análises referentes ao segundo objetivo específico os dados obtidos revelaram
práticas na relação professor/a-aluno/a que podem fomentar desigualdades, são práticas
que remontam papéis de gênero bastante delimitados, cristalizados e patriarcais, não
obstante, foi verificado também, práticas na relação professor/a-aluno/a que podem
contribuir para o enfrentamento das desigualdades de gênero na escola, são práticas não
totalmente politizadas e não totalmente conscientes em relação a suas finalidades, no
enteando, podem ser favoráveis se aperfeiçoadas e articuladas a outras práticas
emancipadoras e a políticas públicas, podendo vir a ser coeducativas, na perspectiva
proposta pelas autoras feministas discutidas aqui.
Não obstante, de um modo geral, mesmo em meio a práticas já obsoletas em relação
ao uso dos gêneros em sala de aula, verificamos algumas contribuições significativas rumo
ao enfrentamento das desigualdades de gênero, isso no nosso entendimento tem acontecido
pelo aumento da problematização da temática de gênero que pesquisadores/as e
professores/as ousados/as têm levantado nos cursos de formação de professores, assim
como os dados obtidos apontam, no entanto, sabemos a partir da realidade de desigualdade
na qual a escola ainda está emersa, que o que tem sido feito precisa ser ampliado, precisa
estar nos currículos de formação docente, e nos currículos escolares, assim como também
precisam se tornar políticas públicas. Por fim, conforme analisado e discutido aqui
acreditamos que a coeducação enquanto prática pedagógica parece ser uma alternativa
viável se aliada a uma rede democrática de enfrentamento as desigualdades e promoção de
cidadania.
REFERÊCIAS
ANDRÉ, Marli Eliza Dalmazo Afonso de. Etnografia da prática escolar. Campinas. São
Paulo. Editora Patirus. 18 ª edição. 2011.
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ALMEIDA, Jane Soares de. A co-educação dos sexos: apontamentos para uma
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10 de outubro de 2016.
AUAD, Daniela. Educar meninas e meninos: relações de gênero na escola. São Paulo:
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SCOTT, Joan W. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade,
Porto Alegre, n.º 16, p. 5-22, 1995.
A MULHER E SEUS DIREITOS: Encontros e desencontros em documentos oficiais
de Direitos Humanos
1. INTRODUÇÃO
5
Mestranda em Direitos Humanos pelo PPGDH da UFPB. Email: oliveiramelonatalia@hotmail.com
Sejam em ambientes escolares, em empresas, em sindicatos, em movimentos
sociais ou em tantos outros muitos espaços, a pesquisa em gênero carrega significados. A
pesquisa nessa área não acaba em si mesma, pelo contrário, tem se tornado a ponte para
outras novas pesquisas, outros novos estudos e mais ainda, outras novas ações
emancipatórias feministas, propagando assim a luta. Não há sentido, pois, em uma
pesquisa em gênero que não almeje lutar contra essa marginalização e violência contra as
mulheres, pois pesquisar em gênero é antes de mais nada, um ato político, ultrapassando as
fronteiras dos livros e dos marcos teóricos e alcançando os mais diversos espaços sociais
nessa busca contínua de emancipação da mulher.
Nesse sentido, um primeiro caminho cabível para a luta feminista se dá pela luta
dos direitos. A busca pelos direitos, a luta pela sua conquista é um elemento norteador para
a mulher. Perceber e estudar como os direitos das mulheres estão presentes em alguns
textos oficiais relevantes, é uma inquietação atual que vem emergindo.
Sendo assim estabeleceu-se como problema de pesquisa: Como os direitos das
mulheres se relacionam em documentos oficiais? E então como objetivo geral:
Compreender como os direitos das mulheres se relacionam em documentos oficiais. E
como objetivos específicos: apontar a ausência ou presença das mulheres e seus direitos em
documentos oficiais e relatar a importância da inclusão dos direitos das mulheres em
documentos oficiais.
O caminho para a igualdade de gênero é longo e árduo, a luta é constante. É preciso
buscar, das mais diversas formas por uma sociedade mais igualitária, mais justa, que
assegure todo e qualquer direito do ser humano, protegendo assim sua dignidade. E é nesse
sentido que o presente estudo se encaminha, uma busca por essa sociedade que viva os
Direitos Humanos, no que diz respeito a mulher e seus direitos frente a uma sociedade que
marginaliza a mulher em vários aspectos.
A presente pesquisa, visando o seu melhor desenvolvimento, acredita e se insere
nos estudos desenvolvidos pelas Ciências Sociais, pois esses estudos vêm contribuindo
para a melhor compreensão dos fatos sociais, que são dotados de provisoriedade,
dinamismo e especificidade, como nos diz Minayo (2009). Os fatos sociais, e seus
fenômenos tem como essencialidade a subjetividade, esse fator que vai aquém de números,
expectativas ou estatísticas, pois a subjetividade é que faz do ser humano ser único.
Buscando uma metodologia que melhor se inserisse nessa pesquisa a fim de
alcançar nossa inquietação, a mesma se fundamenta numa pesquisa de abordagem
qualitativa, partido da concepção de pesquisa qualitativa segundo Chizzotti (2006) quando
este nos diz que na pesquisa qualitativa têm-se o princípio que o mundo real e o sujeito
estão numa relação dinâmica, que há uma relação de mutualidade entre sujeito e objeto,
um “vínculo indissociável” entre o mundo do objeto e a subjetividade do sujeito.
Se configura como uma pesquisa também bibliográfica (GIL, 2008) a partir do
momento em que basearemo-nos em materiais já elaborados, em documentos, fundando
nossos estudos também a partir de fontes documentais. É ainda um estudo exploratório
(GIL, 2008), pois tem a finalidade inicial de levantar um conjunto de informações sobre a
mulher e os seus direitos em documentos oficiais de grande importância.
Como instrumento, se faz necessário utilizar aquele que Severino (2007) nomeia de
documentação, percebendo a importância desse material em forma de documento, na
medida que nos mostrará como os direitos das mulheres aparece nos documentos oficiais
selecionados, que são: a DUDH, o PNDH-3 e um documento oficial da Organização
Internacional do Trabalho intitulado: “Mulheres no Trabalho - Tendências 2016
[Sumário].
A análise das informações coletadas dar-se-á a partir da técnica de análise de
conteúdo (BARDIN, 1977), nas dimensões da codificação e categorização, buscando
entender se os direitos das mulheres têm aparecido nos documentos oficiais mencionados,
e se aparecem, como aparecem.
2. DESENVOLVIMENTO
Para que os direitos das mulheres sejam atendidos pelos documentos que discutem
os Direitos Humanos é preciso compreender a situação a qual a mulher se encontra,
situação muitas vezes de marginalização, de vulnerabilidade, e também de violência.
Dessa forma, esses documentos vêm como instrumento para proporcionar uma vida mais
digna às mulheres, como Silva (2016) nos apresenta em seu texto. Por isso destaca-se a
importância desses textos elegeram as questões dos direitos das mulheres em suas
redações, se tornando mais um aliado na luta pela dignidade do universo feminino.
Como é possível perceber não há menção direta no que diz respeito ao uso da
palavra mulher, e sim a questão do gênero. Nesse texto há a intenção de igualdade de
gênero, que se constitui sim como uma conquista para as mulheres, porém ainda não se
configura como uma afirmação dos direitos das mulheres. Aqui é assegurado que homens e
mulheres têm o direito de invocar suas liberdades. No entanto, não é possível compreender
que nesse artigo há uma afirmação dos direitos das mulheres porque não há uma atenção e
um direcionamento do artigo para a situação da mulher especificamente.
Há sim um elemento de grande importância, a igualdade de gênero, que agrega e
muito à luta do movimento feminista na medida em que, como Prá e Epping (2012) dizem,
evidencia o olhar dos dirigentes em busca de políticas públicas de igualdade de gênero, e
“[…] isso permite dimensionar a capacidade de mobilização de grupos e organizações de
mulheres (capital social) e o seu potencial de inserção política” (PRÁ; EPPING, 2012,
p.47). Aqui, o espaço da mulher sendo conquistado na medida em que a questão dos
direitos iguais a ambos os sexos são assegurados. O caminho para a garantia dos direitos
das mulheres começa a ser trilhado, e é nessa direção que a análise a segunda menção à
figura feminina feita na DUDH.
Encontra-se a segunda referência à figura feminina no 16º artigo, no inciso 1 do
referido documento, onde há uma menção direta à mulher, com o uso da própria palavra
mulher, segundo a ONU:
6
A partir deste momento usa-se a sigla OIT para se referir à Organização Internacional do Trabalho.
7
Brasil. OIT. Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/content/apresenta%C3%A7%C3%A3o>. Acesso
em: 2 abr. 2016.
8
Ver em: <http://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---dgreports/---dcomm/---publ/documents/publication/
wcms_457096.pdf>. Acesso em: 17 de jun. de 2016.
orientados à prevenção, à afirmação dos direitos humanos” (2009, p.67). Tal publicação
por parte da OIT se configura como processo fundamental na luta pela afirmação do direito
da mulher, pois tal documento norteia-se pela prevenção e afirmação dos direitos humanos,
na medida que percebe a marginalização da mulher em relação ao trabalho, e através desta
referida publicação busca meio de combater essa situação e assim garantir os direitos das
mulheres no trabalho.
O texto esquematiza-se da seguinte maneira: são abordados alguns temas de
conflitos da mulher em relação ao trabalho e são apresentadas estatísticas através de dados
que solidificam o texto. Por se tratar de um documento oficial e atual, alguns elementos
mostram o quanto ainda temos que avançar enquanto sociedade para se afirmar os direitos
das mulheres e assim vivenciar de fato uma sociedade democrática. Segundo o próprio
texto OIT: “[…] as disparidades de gênero na população ativa e nas taxas de emprego
diminuíram apenas marginalmente (2016, p.3).
Mesmo no século XXI nos deparamos com dados de documentos oficiais que
relevam a marginalização da mulher em relação ao espaço do trabalho. Por isso se faz
importante debater sobre o trabalho feminino, e tais discussões devem-se guiar por formas
de combater “[…] a conduta desigual nas relações de gênero e as mudanças nessa
construção social. (SILVA, 2016. p.51). Tal documento emerge como instrumento de
combate à essas estruturas sociais que ainda colocam a mulher em situação desfavorável
em relação ao homem, pois como é possível perceber no próprio texto da OIT, as
diferenças de gênero diminuíram pouco.
Situar essa diferença de gênero no trabalho faz do documento oficial em questão
um instrumento político. Trata-se não só de um texto no qual se discute a mulher e o
trabalho, mas sim uma ferramenta de luta feminista que emerge na perspectiva de: “[…]
uma transformação social, econômica, política e ideológica da sociedade” (TELES, 1999.
p.10). Tal documento vem como fortalecedor da luta pela afirmação dos direitos das
mulheres no âmbito do trabalho.
Em sua continuidade o texto aborda a questão da situação do trabalho feminino
atual, direcionando pra um elemento importante do século XXI: a informalidade no
trabalho. Tal informalidade neoliberal no trabalho que atinge o século presente respinga na
mulher de forma mais forte, e o documento nos mostra esse fator no momento em que
aborda tal temática, como observa-se no texto da OIT: “[…] a qualidade do emprego das
mulheres continua a ser um desafio: A situação no emprego e o emprego informal” (2016,
p.4).
Discutir a questão do trabalho informal feminino no século XXI mostra que a OIT
está atenta as condições que vulnerabilidade que a mulher, no que diz respeito ao trabalho,
se encontra. Como Benevides bem coloca, qualquer situação que vá de encontro ao direito
fundamental que a mulher tem no trabalho, atinge para além de sua integridade física,
“[…]atinge a sua dignidade enquanto pessoa humana” (1997, p.8). É então, na perspectiva
de promoção e igualdade dos direitos humanos no trabalho que o documento se guia,
norteando-se na busca pela defesa dos direitos da mulher no trabalho.
Buscar por afirmação dos direitos no espaço do trabalho é parte integrante da luta
feminista. Pois tal movimento se configura, como nos diz Teles, na direção de “[…] buscar
a libertação das mulheres” (1999, p.11). Libertar a mulher do trabalho informal e assim
garantir uma qualidade de emprego feminino equiparado ao trabalho masculino é
importante no processo de luta feminista, e mais uma vez tal documento é importante
nesse processo.
O documento se encaminha também na perspectiva de soluções cabíveis e possíveis
para as situações de vulnerabilidade do trabalho na qual a mulher se encontra. Como trata-
se de um documento oficial da OIT a mesma se direciona na perspectiva de fomentar ações
que combatam as situação de desigualdades sofridas pelas mulheres no espaço do trabalho.
Como é possível perceber, o próprio texto, mediante os dados recolhidos percebe que: “[…]
com as tendências atuais, serão necessários 70 anos para eliminar as disparidades salariais
de gênero” (OIT, 2016, p.9).
Diante de tais dados apresentados pela OIT se faz necessário ações que deem conta
de eliminar as diferenças entre homens e mulheres no espaço do trabalho, diferenças dentre
as quais o texto elenca a questão salarial. É preciso reconstruir os significados e as relações
no espaço do trabalho, de tal modo que após esses 70 anos previstos pela OIT as mulheres
tenham seus direitos afirmados também no trabalho. Assim, segundo Barros e Duarte
quando as mesmas trazem que: “[…] Assim, da mesma forma que a cultura nos diferenciou
em todas as partes do mundo, a mesma cultura pode nos conduzir na construção de
relações sociais horizontalizadas de gênero” (2014, p.57). O texto nos traz essa noção de
possibilidade, essa ideia de que a igualdade entre homens e mulheres pode e deve-se fazer
real, logo é necessário se direcionar por culturas, perspectivas, ações que corroborem com
esse processo.
Tais construções devem ser desenvolvidas por toda a sociedade democrática. O
texto em questão discorre sobre a situação da mulher no trabalho, porém, não o direciona
apenas às mulheres. Seu público alvo é a sociedade em geral. Desta feita, a luta pela
afirmação dos direitos das mulheres é uma luta que toda a sociedade deve estar engajada,
pois, “[…]a luta pela libertação da mulher não deveria em nenhum momento ser
desvinculada da busca de soluções dos problemas mais gerais da sociedade” (TELES,
1999. p.63). Lutar pela afirmação dos direitos das mulheres é luta por a humanidade, logo,
todos que a compõe são parte integrante e importantes desse processo.
O documento em questão também se direciona por promulgar ações de combate à
situação de marginalização da mulher no trabalho. Se encaminhando para o seu término o
texto elabora algumas medidas a serem tomadas para que a situação da mulher no trabalho
seja reconfigurada. O documento da OIT traz: “[…] O diferencial salarial entre homens e
mulheres deve ser eliminado” (2016, p.11).
A questão salarial é um elemento vigente no texto em questão. O texto transcende a
questão de descrever a situação de desigualdade e apontar os dados, e emerge para ações
imprescindíveis para erradicar tais disparidades, como a questão salarial. No espaço do
trabalho feminino a questão salarial é importante, pois é uma luta real pela qual as
mulheres passam, e seguindo na perspectiva de Silva (2016) que fala que o trabalho
feminino é um caminho para a autonomia da mulher, abordar a questão da desigualdade
salarial se faz necessário.
Na medida em que o documento em questão afirma que é preciso eliminar a
diferença salarial entre homens e mulheres, este se encaminha no processo de
desconstrução das relações que marginalizam a mulher. O texto mostra a importância de se
combater tais desigualdades no espaço do trabalho, nos mostrando que é preciso trilhar:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
BARROS, Ana Maria de; DUARTE, Ana Maria Tavares. Pesquisa em Gênero e
Educação no Agreste de Pernambuco: o Lugar do Estudo de Gênero na Educação
Municipal. In.: BARROS, Ana Maria de; et. Al. Org(s). Gênero em debate: dialogando
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2014. 471p. v.l : il. p.53-70
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio da pesquisa social. In: MINAYO, Maria
Cecília de Souza; GOMES, Suely Ferreira Deslandes Romeu (orgs.).Pesquisa social:
teoria, método e criatividade. 27ª ed. Petrópolis: Vozes, 2009, p.9-29.
TELES, Maria Amélia de Almeida. Breve história do feminismo no Brasil. São Paulo:
Brasiliense, 1999.
O EMPODERAMENTO COMO PROCESSO DENTRO DAS PROPOSTAS DE
ASSISTÊNCIA AO USUÁRIO DE SAÚDE MENTAL NA REDE DE ATENÇÃO
PSICOSSOCIAL
Sílvio A. Damasceno de Oliveira
RESUMO
INTRODUÇÃO
MÉTODO
Com base nos critérios de Noronha e Pires (2000, p. 193-195), nos propomos a
realizar uma revisão analítica do tema abordado. E para tanto realizamos uma pesquisa
na base de dados Scielo e Scholar Google sobre o objeto de estudo. Os artigos
consultados compreendiam o período de 1996 a 2015 e foram utilizados os seguintes
descritores: empoderamento, empoderamento no Brasil, psicossocial.
RESULTADOS
Com tudo isso e com as ações políticas brasileiras muito frágeis a consolidação
de uma atuação coerente dentro desta prática com este cenário se torna alvo fácil de
conduções equivocadas do ambiente de cuidado. Abrindo margem para novas
configurações de tutela do usuário e confinamento da pessoa em sofrimento psíquico.
As ações “técnicas” dentro das instituições de saúde mental passam a ter um caráter de
poder, limitando ou cessando as atitudes autônomas ou espontâneas dos indivíduos que
acessam o serviço de saúde. O lugar de parceiro do cuidado e mediador de conflitos,
características do profissional desta área de conhecimento, passa a se apresentar como
um “gestor de vidas” que atua “na direção da desarticulação e do enfraquecimento desse
coletivo”(Figueiró & Dimenstein, 2010).
DISCUSSÃO
Se faz importante analisar como a tutela sobre a vida do usuário ainda opera
nos serviços de saúde mental. Compreender como essa construção de subjetividade
opressora é retroalimentada em uma cadeia de significados criados e refeitos dentro da
sociedade e do território. Tendo dentro do Caps como mais um reprodutor dos ideais de
instituições e do capitalismo em si. Para então pensarmos em elementos de
empoderamento junto as práticas de cuidado as pessoas em sofrimento psíquico. Tais
elementos necessitam deste olhar aberto e receptivo do sujeito que não se evidencia em
relações de poder estabelecidas. Pois como questiona Dimenstein e Alverga (2006) “(...)
a ideia de reabilitação traz em si concepções ligadas à institucionalização da loucura, à
norma, à razão, ao sujeito autônomo, à identidade e cidadania, enfim, promessas
lançadas na constituição das sociedades modernas que destoam do
desinstitucionalizar?”, deste modo, ao ingressar no serviço de saúde, as práticas lá
estabelecidas já estariam estigmatizando o sujeito a uma prática de poder, limitando-o a
uma aceitação e corroboração dos supostos cuidados.
Ainda segundo Dimenstein e Alverga (2006) deve-se ter uma postura que
possibilite o encontro, aspecto antagônicos da tutela:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
RESUMO
Este trabalho tem como finalidade promover uma reflexão sobre a aprendizagem do
estudante surdo e a influência que o profissional tradutor e intérprete de língua de sinais
exerce sobre esse processo de aprendizagem, tendo em vista os direitos que foram
conquistados pela pessoa surda. Abordamos sobre osdireitos inerentes a todos os seres
humanos, e também sobre os direitos específicos da pessoa surda que proporcionam um
melhor acesso à educação, considerações acerca da aprendizagem e do profissional
tradutor e intérprete de Libras. A metodologia escolhida pode ser classificada
comoqualitativa,e os procedimentos metodológicos utilizadosfoi análise documental e a
coleta de dados foi feita através de questionários aplicados aos sujeitos envolvidos no
processo que a se refere o presente trabalho. Concluímos através da pesquisa realizada,
que o tradutor e intérprete da língua brasileira de sinais, no contexto educacional, pode
influenciar positiva ou negativamente na aprendizagem do discente surdo por diversos
motivos.
Palavras-chave: Direitos humanos.Aprendizagem. Surdo. Intérprete.
INTRODUÇÃO
1
Tradutora e Intérprete de Libras da Universidade Federal de Pernambuco – Centro Acadêmico
do Agreste – UFPE/CAA, Pedagoga pela FUNESO, Integrante do Núcleo Setorial de Acessibilidade –
NACE – UFPE/CAA, rayyssa.felix@gmail.com
A pesquisa sobre os intérpretes da língua brasileira de sinais é recente, este
profissional teve sua profissão regulamentada ao ser sancionada a Lei nº
12.319/10.Constâncio e Dias (2012, p. 2), afirma que “apesar do atual reconhecimento
do intérprete de Libras, são poucas as pesquisas sobre esse novoagente social, condição
que define a importância de se investigar como está ocorrendo a atuação desse
profissional”. Portanto, esta pesquisa poderá contribuir com informações relevantes para
auxiliar instituições de ensino que necessitem do trabalho do tradutor e intérprete de
Libras, pois aprofunda os conhecimentos sobre este tema, ainda pouco pesquisado, e
que se encontra num campo que está em constante crescimento. Sendo assim, as escolas
poderão ter conhecimento do que avaliar num intérprete, como acompanhá-lo, e o
estudante surdo terá seu direito garantido, por meio da atuação de um profissional bem
qualificado.
Diante dessas considerações, nossa investigação tem como objetivo geral
discutir como ocorre a influência que o profissional tradutor e intérprete de Libras
exerce sobre a aprendizagem do estudante surdo, tendo em vista os direitos
conquistados pela pessoa surda. Assim, traz como objetivos específicos identificar a
conquista de direitos das pessoas surdas, que as auxiliam na participação ativa em seu
processo de aprendizagem; identificar as características e habilidades necessárias a um
intérprete, bem como suas limitações,e investigar o papel deste profissional no ambiente
educacional.
O termo “todo ser humano” inclui também pessoas que apresentam necessidades
específicas para realizarem algo. Há pessoas que apresentam dificuldades em enxergar
objetos ou seres que estejam a certa distância, e precisam de óculos ou lentes que o
ajude a superar esta limitação. Outras limitações ocorrem por um período determinado
de tempo, como é o caso de gestantes, idosos, ou um indivíduo qualquer que tenha se
acidentado e que apresente dificuldades de locomoção ou para subir escadas.Ou seja,
todos nós estamos sujeitos a, em algum momento, apresentar uma necessidade
específica, seja de locomoção, visão, audição, ou qualquer outra.
No caso do educando com deficiência, este tem direito de acesso às mesmas
oportunidades de aprendizagem que os demais estudantes. Porém, nesse processo de
ensino e aprendizagem, o discente com deficiência possui suas
especificidades.Deixando de lado as necessidades relacionadas à acessibilidade física,
que diz respeito à estrutura dos prédios e ambientes da escola, discutiremos
exclusivamente sobre as necessidades que o discente surdo apresenta para incluir-se, de
fato, no processo de ensino e aprendizagem.
APRENDIZAGEM
Para que a aprendizagem seja uma realidade nas salas de aulas, e sobretudo na
vida dos estudantes, é necessário cuidado para que o objeto de conhecimento não seja
armazenado à estrutura cognitiva do educando de forma literal, arbitrária e sem
significado, o que segundo Ausubel (2003), configura uma aprendizagem mecânica.
Em contrapartida, ao tratar da aprendizagem significativa, Rogers (1988), a
entende como uma aprendizagem que é mais do que um ajuntamento de fatos e que
deve provocar uma modificação, seja no comportamento, nas atitudes, na personalidade
do sujeito, ou na orientação futura que este escolherá. Uma aprendizagem penetrante,
que não se limita ao acúmulo de conhecimentos, mas que penetra profundamente em
todas as partes da sua existência.
Assim, faz-se necessário promover um ensino que leve os educandos a participar
ativamente de seu processo de aprendizagem, refletindo e designando um sentido
pessoal ao novo conhecimento. De acordo com Santos (2008), aprendizagem
significativa é aquela que ocorre ao surgir um sentido pessoal por parte de quem
aprende, o que desencadeia uma atitude pró-ativa que tenta desvendar o novo e
(re)construir conceitos que ampliam cada vez mais a habilidade de aprender.
METODOLOGIA
Para contemplar nosso objetivo geral que é discutir como ocorre a influência que
o profissional tradutor e intérprete de Libras exerce sobre a aprendizagem do estudante
surdo, tendo em vista os direitos conquistados pela pessoa surda, utilizamos a pesquisa
qualitativa.Segundo Minayo (1995, p. 21-22):
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se
preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser
quantificado, ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos,
aspirações, crenças, valores e atitudes. O que corresponde a um espaço mais
profundo das relações dos processos e dos fenômenos que não podem ser
reduzidos à operacionalização de variáveis. (MINAYO, 1995, p. 21-22)
Quanto aos procedimentos metodológicos,foram utilizados para o presente
trabalho, análise documental, e questionáriosaplicados a estudantes surdos, intérpretes
de Libras e professores de discente surdoe professor surdo.
Na pesquisa qualitativa, a análise documental constitui uma técnica importante,
seja complementando informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos
novos de um tema ou problema (LUDKE; ANDRÉ, 1986).
O questionário pode ser definido, segundo Gil (2008, p. 121), como:
(...) a técnica de investigação composta por um conjunto de questões que são
submetidas a pessoas com o propósito de obter informações sobre
conhecimentos, crenças, sentimentos, valores, interesses, expectativas,
aspirações, temores, comportamento presente ou passado etc.
RESULTADOS E ANÁLISES
Para compreender a influência do TILS (tradutor e intérprete de língua de
sinais)na aprendizagem do discente surdo é preciso avaliar como ele é visto pelos
professores que atuam juntamente com ele, bem como pelos discentes surdos e extrair
algumas informações dos próprios intérpretes.
Tabela 4 – Ainda quando questionados se o papel do TILS está bem definido e compreendido pelos
professores.
INTÉRPRETES RESPOSTAS
Acúmulo de funções
Na pesquisa realizada, intérpretes ressaltaram que outras atribuições lhes são
propostas a serem executadas e um intérprete destacou 11 (onze) dessas atribuições
conferidas ao intérprete que está inserido neste contexto confuso.
Tabela 5 – Quando solicitados a comentar se o papel do TILS está bem definido e compreendido pelos
professores.
INTÉRPRETES RESPOSTAS
Intérprete 1 (...) Muitas atribuições são dadas a este profissional, como por
exemplo: Primeiro deles é o de ensinar ao surdo a língua portuguesa
como segunda língua. Em segundo, o ensino da própria língua de
sinais (...). E em terceiro, ensinar a língua de sinais aos ouvintes (...).
Em quarto, constatou que o intérprete também é responsável pela
adequação curricular (...). Em quinto, participar do planejamento das
aulas e como sexto papel, procurar a integração junto com o professor
regente (...). Em sétimo lugar o intérprete deve orientar habilidades de
estudo dos alunos surdos (...). Oitavo papel o de estimular a
autonomia deste aluno. Em nono, (...) estimular e interpretar a
comunicação entre colegas surdos e ouvintes. Em décimo, o intérprete
deve utilizar a comunicação multimodal, ou seja, usar diversos canais
de comunicação para garantir a compreensão de significados. Por
último, em décimo primeiro, o intérprete deve promover a tutoria,
orientando o surdo na organização de suas atividades.
Intérprete 2 Quase sempre as pessoas que coordenam, e educadores por não
entender o papel dele (do intérprete) acabam querendo atribuir outras
atividades a este profissional.
Fonte: o autor, 2014.
Tabela 8 –Quando questionados sobre como deve ser a relação entre professores e intérpretes e se essa
relação ideal está de acordo com o que realmente acontece.
INTÉRPRETES RESPOSTAS
Tabela 9 –Quando questionados se consideram relevante a interação entre docentes e intérpretes para
discutirem sobre conteúdos e métodos.
PROFESSORES RESPOSTAS
Professor 1 Sim. Pois as dificuldades dos surdos devem ser levados em conta na
preparação das aulas como por exemplo, colocar legendas nos vídeos.
Professor 2 Sim.
Professor 3 Ainda não fizemos isso. Acho que seria relevante ter essa conversa,
uma vez que ficaria mais claro para nós, ouvintes, com trabalhar
melhor com esses alunos.
Fonte: o autor, 2014. (Grifo nosso)
Referente à essa interação para discutir atividades e métodos, de acordo com os
professores e intérpretes entrevistados, Dias, Silva e Braun (2007, p. 107apud
ALMEIDA, 2012, p. 41) afirma:
Também é apontada a necessidade de maior colaboração entre professores e
especialistas (quando houver) que participam do cotidiano escolar, para a
organização de atividades que apresentem ações e propostas eficazes às
necessidades de todos os alunos. (DIAS, SILVA e BRAUN 2007, p. 107
apud ALMEIDA, 2012, p. 41)
Professor 1 Sim. Tive que falar mais devagar, para a aluna ler meus lábios e ficar
mais atento a seus questionamentos através do intérprete.
Professor 2 Não.
Professor 3 Sim. Precisei me preocupar em colocar legendas nos filmes. Preciso
garantir que ela esteja atenta e procuro minuciar a intérprete de todas
as informações necessárias, num contexto de prova, para que a
intérprete possa ajudar a minha aluna surda.
Fonte: o autor, 2014.
Vale salientar que o professor 2 citado nesta tabela é o que a menos (e pouco)
tempo trabalha com discente surdo. Os demais professores citaram pequenas, mas
significativas mudanças em sua metodologia e forma de agir em sala, que se fizeram
necessárias devido à presença do discente surdo.
Observa-se que há inúmeras dificuldades na interpretação como a falta de
referencial do intérprete no tocante a conhecer ou não significados ou mesmo sinais dos
conteúdos, em não está compreendido seu papel e assim ele ter que assumir outras
atribuições. E que tudo isso resulta em uma interpretação com alteração ou percas.
Desta forma, o aluno não recebe exatamente a mensagem transmitida pelo professor.
Ficando assim, lacunas na interpretação.
Neste trecho, o intérprete cita um novo motivo para essa falta de propriedade da
Libras por parte do TILS: Não ter contato com surdos antes de se tornar intérprete. Este
mesmo motivo encontra-se em respostas de outro profissional que participou desta
pesquisa: o professor surdo – um surdo, que já passou pela experiência de estudante e
atualmente é professor.
Tabela 13 –Quando questionado sobre qual a maneira de resolver o problema da (má) influência.
PROFESSOR RESPOSTA
Professor surdo Aprofundar mais o conhecimento e a prática de intérprete, formar
vários cursos, o meu opinião que o melhor para aprender é a
convivência de comunidade surda durante anos.
Fonte: o autor, 2014. (Grifo nosso)
PROFESSOR RESPOSTA
Professor surdo A maioria de interprete estão a procura de emprego pelo salário e não a
vontade de influência (positivamente) ao surdo.
Fonte: o autor, 2014. (Grifo nosso)
Tabela 15 – Quando questionado se sua aprendizagem já foi influenciada de forma positiva por um
intérprete, ou se já teve dificuldade em aprender por causa de um intérprete.
PROFESSOR RESPOSTA
Professor surdo Tive 4 interpretes diferentes devido o salário durante 2 anos, que a
maioria de interprete aprendeu o Libras na igreja, não me influenciou
(de forma positiva) devido falta de fluência e adaptação.
Fonte: o autor, 2014. (Grifo nosso)
Professor surdo A maioria de interprete pensa que já é suficiente para interpretar após
aprender os sinais de algum tempo, está enganado, precisa aprender
durante muito tempo, também convivência de comunidade surda,
aprender com 5 parâmetros, o principalmente expressão facial.
Fonte: o autor, 2014. (Grifo nosso)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
_______ Declaração Universal dos Direitos Humanos. Assembleia Geral das Nações
Unidas. 10 dez. 1948. Disponível em: <http://www.onu.org.br/img/2014/09/DUDH.pdf
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GIL, A C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. - São Paulo: Atlas, 2008.
GLAT, Rosana (org.). Educação Inclusiva: cultura e cotidiano escolar. Rio de Janeiro:
7Letras, 2007. In: ALMEIDA, J. J. F. Libras na Formação de Professores: Percepções
de Alunos e da Professora. 150 f. 2012. Dissertação (Mestrado em Educação) –
Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2012.
RESUMO
Esta pesquisa parte dos princípios de um estudo feito sobre a política nacional de
educação inclusiva em uma escola municipal de rede regular de ensino, e procura
conhecer a partir do objetivo como se dar a articulação da Política Nacional de
Educação Inclusiva numa Instituição Municipal de Belo Jardim/PE. O percurso
compreensivo assume como ponto de partida os conceitos das políticas públicas e
políticas educacionais direcionadas à Politica Nacional de Educação Inclusiva. Tal
perspectiva sugeriu uma forma de pesquisa do tipo qualitativa, na qual destaques foram
dados à análise questionários e entrevistas, para obter os resultados relevantes à análise.
A análise tem permitido inferir na articulação e na implantação de itens referente a
Política Nacional de Educação Inclusiva no âmbito educacional público que inscreve-se
o dever de assegurar o direito à educação regular às pessoas com deficiência.
Palavras-chave: Política Nacional de Educação Inclusiva, Inclusão, Gestão, Política
pública, Estado.
INTRODUÇÃO
2
UFPE/CAA, Estudante de Pegagogia, genelice.c@gmail.com
3
UFPE/CAA, Estudante de Pegagogia, ingrid.cabj5c@hotmail.com
4
UFPE/CAA, Estudante de Pegagogia thaylinne.f@gmail.com
uma política pública social, uma política pública de corte social, de
responsabilidade do Estado – mas não pensada somente por seus organismos.
O tema abordado foi escolhido pela relevância das questões que envolvem as
politicas públicas educacionais na perspectiva inclusiva como fator importante que
contribui de forma efetiva no processo de desenvolvimento e aprendizagem do principal
sujeito da esfera educacional, ou seja, o aluno. A educação inclusiva possui caráter
político, cultural, social e pedagógico ambos em defesa de todos os alunos estarem
juntos, sem nenhum tipo de segregação, tendo em vista que existe uma alta demanda de
educandos portadores de necessidades especiais a serem inclusos na rede regular de
ensino.
Visto que o Art. 1º da União prestará apoio técnico e financeiro aos sistemas
públicos de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, na forma deste
Decreto, com a finalidade de ampliar a oferta do atendimento educacional especializado
aos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades
ou superdotação, matriculados na rede pública de ensino regular, é considerável se
questionar: Como se dá a articulação da Politica Nacional de Educação Inclusiva numa
Instituição Municipal de Belo Jardim?
Temos a compreensão que há uma indispensabilidade da aplicação do Plano
Político Nacional de educação, para que haja acompanhamento especifico aos alunos
portadores de necessidades especiais, visto que não é apenas o aspecto físico da escola
que contribui para o melhor desenvolvimento cognitivo destes alunos, mas também um
profissional adequado, com formação em Educação Especial para fornecer atendimento
típico à especialidade da deficiência do educando.
Tendo em vista que a preocupação com a educação inclusiva está cada vez mais
presente nas realidades das escolas, nos desperta o interesse em conhecer uma
instituição publica de Belo Jardim e questionar: Como se dar a articulação da Política
Nacional de Educação Inclusiva numa Instituição Municipal de Belo Jardim, como
também, analisar se a escola conhece a politica nacional da inclusão e levantar quais os
itens da politica nacional da inclusão que a escola consegue contemplar.
DESENVOLVIMENTO
Metodologia
Analise de dados
Em entrevistas orais (informais) foi nos dito por uma professora da Instituição
que “falta material específico para ajudar no desenvolvimento dos alunos”,
lamentavelmente sem a sala de recursos os professores sentem-se inseguros quanto a
metodologia que pode ser desenvolvida com os alunos especiais. Ressaltamos que, no
Art. 3 §1 “º As salas de recursos multifuncionais são ambientes dotados de
equipamentos, mobiliários e materiais didáticos e pedagógicos para a oferta do
atendimento educacional especializado.”, o mesmo deveria ser oferecido e implantado
pela União.
Outro ponto que podemos destacar é que a escola abre portas para alunos com
deficiência e transtornos de desenvolvimento, caracterizando uma gestão democrática –
“[...]tem na busca de uma educação de qualidade, ao mesmo tempo, a principal razão de
ser o principal alvo.” (AZEVEDO, 2013, p. 48) - promovendo uma educação para
todos. E a gestão da escola campo de pesquisa evidencia isto em sua fala:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
AZEVEDO, Janete M. Lins de. A educação como Política Pública. São Paulo: Xamã
Campinas, SP: Autores Associados, 1997.
GIL, A, C. Métodos e técnicas em pesquisa social. 5.ed. São Paulo: Atlas, 1999.
HOFLING, Eloisa de Mattos. Estado e Políticas (Públicas) sociais. Vol.2. Cad. CEDES,
2001.
GT 07 - P
RESUMO
O presente artigo aponta como, ao longo da história, a deficiência foi percebida como
coisa sobrenatural e tratada como ameaça social, tendo as pessoas deficientes sido
excluídas da sociedade, a exemplo do que ocorria com os loucos, leprosos ou aqueles
considerados delinquentes. A pessoa com deficiência fora segregada da sociedade
capitalista por não fazer parte de um modelo de produção, estando, portanto, na mira de
uma sociedade disciplinar. Para Foucault as sociedades disciplinares, seriam um
desdobramento de uma necessidade do modelo capitalista de produção; o pensador
francês desvela um sistema de segregação dos ditos incorrigíveis em nome e pela defesa
da sociedade. O trabalho analisa a mudança de paradigma na atenção e respeito à pessoa
com deficiência, que passou de objeto de estudo num modelo médico para ser
compreendida enquanto protagonista de um contexto social de exclusão. A experiência
da deficiência não é resultado de uma lesão, dado isento de valor, e sim, de um
ambiente hostil à diversidade, sendo, portanto, o resultado da interação de corpo em
uma sociedade planejada para segregar os desvios da norma. Eis a necessidade de
analisar a exclusão social das pessoas com deficiência nas Cidades a partir de uma
investigação interdisciplinar.
5
Mestre em Historicidade dos Direitos Fundamentais pela Faculdade Damas da Instrução Cristã –
FADIC, Especialista em Direitos Humanos pela Universidade Católica de Pernambuco - UNICAP,
Advogado, contato: dirceulemos.adv@gmail.com
6
Pós-Doutorado realizado na The New School of Social Research-NY (Bolsista CAPES), Doutora em
Direito pela UFPE (Estágio de Doutorado realizado na Universidade de Paris - Bolsista CAPES),
Professora do PPGD da Faculdade Damas ARIC/PE, da Universidade de Pernambuco-UPE e da
FACIPE/NUFA, Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas Transdicisplinares sobre Meio
Ambiente, Diversidade e Sociedade - GEPT/UPE, Advogada ambiental, contato:
marquesc@newschool.edu
Necessário se faz um novo marco metodológico para a História, em especial,
para História do Direito, disciplina que caiu no descrédito, na medida em que a
historiografia de matriz liberal-burguesa passou a ser mera disciplina de justificação da
ordem legal vigente e da acumulação de conhecimentos para a chamada “cultura
superior”, restando assim, sem fins úteis para com a realidade (WOLKMER, 2004, p.
17). Submersa numa crise de eficácia, marcos teórico-metodológicos devem ser
redefinidos no intuito de alcançar novo paradigma para pesquisa e investigação
histórica, como lembra Wolkmer (2004, p. 17), “não mais uma historicidade linear,
elitista e acumulativa, mas problematizante, desmistificadora e transformadora”. Assim,
acreditar e fazer com que a História não sirva apenas para formulação de uma
historicidade oficial e homogeneizadora, mas, como expressão da sociedade, ou seja, da
experiência humana, deve se prestar a uma historiografia crítica, de muitos e para
muitos sujeitos.
Nesse sentido, convém destacar que o processo de urbanização experimentado
na maioria das cidades deu-se de forma abrupta, negando a natureza e construindo
cidades que representam verdadeiros templos de desigualdade e exclusão; um espaço
fragmentado e propenso a conflitos que segrega aquele que não tem como pagar pela
porção de cidade que almeja viver e, então, é condicionado, conduzido ou melhor,
disciplinado a aceitar o que lhe é imposto como normal.
É nos aglomerados urbanos que as barreiras físicas, atitudinais e sociais
apresentam-se como uma forma contundente de desrespeito ao direito fundamental à
cidade acessível. Nesse sentido, questiona-se: a não efetivação do direito fundamental à
cidade acessível representaria óbice a uma vida plena, digna e autônoma por parte das
pessoas com deficiência, dificultando, assim, o exercício da cidadania?
Ao longo da história, a deficiência foi percebida como coisa sobrenatural e
tratada como ameaça social e as pessoas deficientes foram excluídas da sociedade, a
exemplo do que ocorria com os loucos, leprosos ou aqueles considerados delinquentes.
Observa-se que a pessoa com deficiência fora segregada de uma sociedade capitalista
por não fazer parte de um modelo de produção, estando, portanto, na mira de uma
sociedade disciplinar. Nesse sentido, a experiência da deficiência não é resultado
unicamente de uma lesão, mas do ambiente social hostil à diversidade física. A lesão é
um dado isento de valor, ao passo que a deficiência é o resultado da interação de um
corpo com lesão em uma sociedade discriminatória, planejada para segregar os
“desvios” da norma. O presente trabalho objetiva analisar a mudança de paradigma na
atenção e respeito à pessoa com deficiência, que passou de objeto de estudo num
modelo médico para ser compreendida enquanto protagonista de um contexto social de
verdadeira exclusão, em especial no ambiente das cidades. Nesse sentido, o advento da
Estatuto da Pessoa com Deficiência é marco na legislação pátria de uma mudança
juspositiva no respeito à dignidade da pessoa deficiente, alterando o Código Civil de
2002 e descontruindo a teoria das (in)capacidades. Desta forma, foi utilizada uma
metodologia majoritariamente analítica, aliada a uma abordagem exploratória que
resgatou a perspectiva histórica da deficiência, sem contudo esquecer a crítica em nome
de uma história não-linear, como base explicativa para o cenário identificado no texto
como um desafio interdisciplinar.
7
Redação anterior do artigo do CC: Art. 3o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos
da vida civil:
I - os menores de dezesseis anos;
II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática
desses atos;
III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.
Redação atual: São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de
16 (dezesseis) anos. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
I - (Revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
II - (Revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
III - (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
Redação anterior do artigo no CC: Art. 4o São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os
exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento
reduzido;
Assim, no Direito Brasileiro, com a entrada em vigor da Lei nº 13.146/2015 –
Estatuto da Pessoa com Deficiência, o único critério para incapacidade absoluta passa a
ser o etário (menores de 16 anos), não havendo mais qualquer fundamento legal que
autorize o reconhecimento da incapacidade absoluta por qualquer deficiência. Todas as
pessoas com deficiência, das quais tratava o comando anterior, passam a ser, em regra,
plenamente capazes para o Direito Civil, o que visa a sua plena inclusão social, em prol
de sua dignidade. Já o artigo 4º do Código Civil, ao fixar as hipóteses de incapacidade
relativa, retira a previsão de incapacidade pelo discernimento reduzido, proveniente de
deficiência mental ou desenvolvimento mental incompleto. Por outro lado, a hipótese de
impossibilidade de exprimir a vontade, por causa transitória ou não, é incluída no rol de
incapacidades relativas8.
O inciso II do supracitado dispositivo foi modificado de forma considerável não
fazendo mais referência às pessoas com discernimento reduzido, que não são mais
consideradas relativamente incapazes, como antes estava disposto. Estando mantidas no
diploma as menções aos ébrios habituais (entendidos como os alcoólatras) e aos
viciados em tóxicos, que continuam dependendo de um processo de interdição relativa,
com sentença judicial, para que sua incapacidade seja reconhecida.
Também foi alterado o inciso III do art. 4º do Código Civil, sem mencionar mais
os excepcionais sem desenvolvimento completo. A nova redação dessa norma passa a
enunciar as pessoas que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir
vontade, o que antes estava previsto no inciso III do art. 3º como situação típica de
incapacidade absoluta. Agora a hipótese é de incapacidade relativa. Isto posto, com a
9
António Manuel Hespanha esclarece a ideia que a história pode servir para provar a linearidade do
progresso, como querem alguns. Para tanto, o autor destaca que, partindo-se de um modelo histórico
evolucionista, ou seja, um modelo que conceba a história como acumulação progressiva de conhecimento,
o direito também poderia ser visto como algo em evolução, passando de uma fase juvenil, rude, para a
fase atual, de “apogeu”, o que se daria através do progresso da sabedoria humana e das descobertas de
eméritos juristas (HESPANHA, 2012, p. 19).
10
A temporalidade linear representa um tempo vazio e homogêneo, onde só existe lugar para a soma
(encadeada) de fatos como se o tempo fosse um receptáculo com forma e tamanho bem definidos. Há
uma exclusão de todas as virtualidades históricas e todas as experiências passadas que não foram
registradas ou que foram frustradas, e somente há espaço, em tal historiografia, para os sucessos
históricos (FONSECA, 2012, p. 155).
humana. Nesse sentido, passa-se a repensar a historicidade sob nova ótica: quais
acontecimentos foram narrados e quais foram esquecidos, quais vozes foram ouvidas e
quais foram silenciadas, quais fontes históricas foram aclamadas e quais foram
renegadas.
Daí acreditar-se que a cidade, enquanto objeto da “ciência da cidade”, não pode
ser a cidade histórica, pelo menos não nessa pesquisa. Em que pese a representatividade
e influência dos clássicos, esses textos afastam a cidade enquanto objeto da ciência, por
perfazerem uma cidade histórica remontada a partir de fragmentos, ganhando ares de
documento, de exposição ou peça de museu (LEFEBVRE, 2001, p. 106). “A cidade
historicamente formada não vive mais”, isso é o que se observa da obra de Lefebvre. O
autor esclarece que a cidade histórica não passa de um objeto de consumo cultural para
os turistas e para o “estetismo”. No entanto, destaca que “o urbano” persiste
(LEFEBVRE, 2001, p. 106).
Em mais um salto histórico, convém destacar que as crises de superacumulação
voltam a assolar o capitalismo, aqui nos referimos aos anos 90 do século XX e início
desse século. A urbanização mais uma vez apresenta-se como saída e causa da crise, em
especial quando recordamos o boom do mercado imobiliário e suas consequências para
urbanização e o modo de vida urbano. A explosão imobiliária fora testemunhada por
quase todas as cidades, essa globalização se deu de forma parecida, sendo os ricos
favorecidos em detrimento de milhares de miseráveis, que se viam obrigados a migrar,
“a medida que o campesinato rural era desapropriado pela industrialização e
comercialização da agricultura” (HARVEY, 2014, p. 42/43).
O processo atual de urbanização, como nas fases já mencionadas, mas agora em
caráter global11, trouxe consigo inúmeras transformações no estilo e qualidade de vida
da urbanidade. O acesso ao espaço é de quem por ele possa pagar12, essa é a premissa
do espaço moderno, configurado por elites econômicas que escolheram o isolamento e
11
A respeito da globalização, com lucidez, nos fala Zygmunt Bauman: “O significado mais profundo
transmitido pela idéia da globalização é o do caráter indeterminado, indisciplinado e de autopropulsão dos
assuntos mundiais; a ausência de um centro, de um painel de controle, de uma comissão diretora, de um
gabinete administrativo. A globalização é a “nova desordem mundial” de Jowitt com um outro nome”
(BAUMAN, 1999, p. 58).
12
Para Ermínia Maricato (2013, p. 33): “A cidade constitui um grande patrimônio construído histórico e
socialmente, mas sua apropriação é desigual e o nome do negócio é renda imobiliária ou localização, pois
ela tem um preço devido aos seus atributos”.
assim pagam por ele de bom grado (BAUMAN, 1999, p. 24). O resultado dessa
crescente polarização na distribuição de renda e de poder é evidenciado nas formas
espaciais de nossas cidades; esse desenvolvimento incoerente só evidencia e enfatiza
que cada vez mais vivemos em cidades divididas, fragmentadas e propensas a conflitos
(HARVEY, 2014, p.47/48).
É sobre esse espaço conflitual que alerta Lefebvre:
Através de um imenso processo, o capitalismo apoderou-se da cidade
histórica, fê-la explodir, gerou um espaço social que ocupou, continuando a
sua base material a ser a fábrica e a divisão técnica do trabalho no seio da
empresa (1973, p. 19/20).
O conhecimento desse espaço, do que nele se faz, do que nele se passa e do que
dele se serve, retoma a dialética, que detecta e revela as contradições e a relação
conflituosa de um espaço fragmentado, ou seja, o centro e a periferia (LEFEBVRE,
1973, p. 17/18). Se todos possuem direito à cidade, mas a segregação no espaço urbano
destitui a população de direitos, então essa mesma cidade representa a negação de
direitos no plano factual. Pensando o direito à cidade como corolário da cidadania, a
negação desse direito implica a negação de todos os demais, situação agravada quando
em análise a promoção da autonomia das pessoas com deficiência.
Esse contraponto metodológico, aponta as variáveis nuances do direito à cidade
enquanto ciência. Lefebvre (2001, p. 106) assinalava que, mesmo ainda em esboço, uma
ciência analítica da cidade era necessária, e que conceitos e teorias só podem avançar
com a realidade urbana em formação, “com a práxis (prática social) da sociedade
urbana. Portanto, na busca por uma nova história valendo-se de uma historiografia não-
linear, apresenta-se a cidade a partir do urbano e não remontando-se a cidade antiga.
Isto é, na direção de uma prática social, do homem da sociedade urbana, dos conflitos e
conquistas que serviram de lastro para reivindicação por um direito à cidade.
As cidades como objeto de estudo possuem relevância, posto ser nos
aglomerados urbanos que as barreiras físicas, atitudinais e sociais apresentam-se como
forma mais contundente de desrespeito ao direito fundamental à cidade acessível. Daí, o
problema apresentado na Introdução do presente trabalho: a não efetivação do direito
fundamental à cidade acessível representaria óbice a uma vida plena, digna e autônoma
por parte das pessoas com deficiência, dificultando o exercício da cidadania? A análise
do tema exige uma pesquisa interdisciplinar, apoiada para além do Direito, na Filosofia,
na Sociologia, na História, bem como, na Geografia, disciplinas que discutem e
fundamentam o Direito à Cidade. Todavia, ressalta-se que o presente trabalho propõe-se
a apresentar um problema, não havendo espaço para o enfrentamento do desafio
interdisciplinar apontado.
É necessário delinear sobre qual ideia de cidade a pesquisa recairia. Para tanto,
as ponderações historiográficas são de grande importância, por, metodologicamente,
definirem dentro de uma nova perspectiva histórica, sobre qual cidade a pesquisa iria se
debruçar. Eis a razão pela qual, a partir de uma historiografia não-linear (aquela que
rompe com a temporalidade linear da história tradicional), a reflexão voltar-se-ia para a
cidade a partir do “urbano” e não remontando à “cidade histórica”. É nessa segunda
natureza, ou seja, no ambiente artificialmente construído sobre a natureza, que de forma
abrupta fora apropriada, que o desafio é iniciado. Para a trajetória por um direito à
cidade, é necessário rememorar, mesmo que por vezes de forma descritiva, as lutas
proletárias que reivindicaram o direito à cidade. Para tanto, Henri Lefebvre (1973;
2001) é uma fonte fundamental; a visão neomarxista do autor, desvela as implicações do
modelo capitalista de urbanização, a leitura do tema é, ao mesmo tempo, oxigenado pela
visão atual de David Harvey e sua filosofia das cidades (2014).
Do ajuntamento de tais marcos teóricos, cristalina se fez a compreensão de que
as cidades surgiram da concentração geográfica e social de um excedente de produção.
O processo de urbanização experimentado pela maioria das cidades serviu ao
capitalismo como saída para crises cíclicas de superacumulação inerentes a esse modelo
econômico. A produção capitalista do espaço trouxe consigo o surgimento de um
espaço fragmentado e propenso a conflitos. Nesse ambiente fragmentado, produzido
pelo modelo de urbanização capitalista, surgem as primeiras insurreições por “O Direito
à Cidade”. Desejar uma cidade melhor, e melhor para todos emerge das lutas
proletárias, sejam elas fabris ou urbanas, mas que buscam uma alternativa ao modelo
cotidiano de urbanidade, o qual, impossibilita que todos possam usufruir em igualdade
de condições do espaço urbano.
Com Michel Foucault e sua genealogia das instituições (2014), enquanto redes
de poder, é possível investigar a construção do espaço, aquele urbanizado por e para as
elites capitalistas, planejado para excluir os desvios da “norma”. Percebe-se, que a
pessoa com deficiência fora segregada do ambiente urbano, como ocorrido com os
loucos, leprosos, delinquentes por não ser de interesse do modo de produção capitalista,
estando na mira de sociedades disciplinares. Importante notar, que o confinamento do
louco em instituições asilares como observado por Foucault, não diz respeito ao
confinamento como doentes e sim, como incapazes de integrar à sociedade, por isso
mesmo não foi apenas o “louco” como “doente mental” que fora excluído, e sim todos
aqueles que apresentavam sinais de desregramento. O objetivo não era a cura dos
doentes e sim, ao mantê-los longe do convívio social, restaurar a ordem moral através
do adestramento acarretado pelas disciplinas, e assim, defender a sociedade da
“anormalidade”.
O outro, o diferente, os ditos “anormais” que tiveram seus corpos disciplinados,
bem como, toda a população, que, enquanto objeto da biopolítica passou a ser regulada,
ou seja, uma massa dos irredutíveis à norma foi então enquadrada num modelo de
cidade perfeita, que segrega e exclui a diversidade. Compreende-se, assim, que da
disciplina do anormal à regulação da população, os mecanismos do poder disciplinar,
bem como, os mecanismos do biopoder, definiram através da compartimentação o lugar
cabível a cada indivíduo no espaço urbano.
Ora encarcerados nas instituições disciplinares, sofrendo com os mecanismos
disciplinares na busca por um “corpo” mais eficaz ao trabalho, ora nas periferias das
cidades, depostas de qualquer urbanização que vise eliminar as barreiras que impedem a
vivência da cidade, o “anormal” em Foucault, ainda é o outro, o diferente na atualidade;
e a ele foi dado o não-lugar nesse ideal de cidade perfeita que privilegia o consumismo,
a competitividade, idolatra a segurança e impõe, para fora dos seus muros, uma massa
de indesejáveis.
Poderíamos pensar que as cidades não foram pensadas levando em conta o outro
(a pessoa com deficiência), mas, observa-se, na verdade, que a urbanização considerou a
diferença, a parcela da população que não se amolda à norma, contudo, para excluí-la,
para segregar “o outro” através da imobilidade no ambiente urbano. Ocorre que, esse
outro, exemplaridade da diversidade que compõe o urbano, é a voz ativa da história, foi
quem não se conformou com a disciplinação do corpo, foi quem não se tornou dócil e,
assim, mais eficaz. Essa massa reivindica seu direito à cidade, o direito não só de acesso
ou retorno às cidades tradicionais como nos alertou Lefebvre (2011, p. 117/118), mas de
mudar e reivindicar a cidade a partir dos nossos mais profundos desejos, como assinala
Harvey (2014, p. 63).
Ao reconhecer as diferenças, deseja-se o respeito à diversidade, para além da
tolerância, do respeito ao outro, ao meu semelhante, a minha coletividade, imperativo
pensar, idealizar e efetuar um modelo de urbanização prospectivo, que enfrente a
realidade presente através de medidas de requalificação do ambiente urbano, mas que
também apresente um projeto de cidade mais humano para as futuras gerações. Pensar a
cidade para todos é pensar além do outro, é articular políticas públicas que respeitem a
diversidade e ultrapassem a “retórica da tolerância”, com o desejo de reivindicar a
cidade para si, para o outro e para aqueles que ainda não existem, o que só possível
através da solidariedade para a autonomia.
Acredita-se, portanto, que a efetivação da acessibilidade enquanto direito
fundamental à condição humana é condição de possibilidade para o exercício da cidade
por parte da pessoa com deficiência, que poderá, a partir da eliminação das barreiras,
sejam elas, arquitetônicas, sociais ou mesmo, atitudinais, participar de forma autônoma,
independente e digna dos espaços comuns do ambiente das cidades. Espaços estes,
concebidos como espaços de participação social, necessários a construção e ao exercício
da cidadania. Propõe-se como estratégia para cidades acessíveis, uma gestão mais
democrática das cidades. Isto torna-se viável a partir dos instrumentos legais de
participação social, na medida em que a participação efetiva de diferentes parcelas que
compõe a diversidade das cidades na elaboração de políticas públicas para o
planejamento urbano, reflete uma maior representatividade e exercício da cidadania por
aqueles que estão reivindicando seu “direito à cidade”.
CONCLUSÃO
A pessoa com deficiência, que ao longo da história fora vista como algo
“anormal”, passa a ser vista sobre nova ótica. O corpo que fora através das disciplinas,
docilizado, adestrado, passa então de uma perspectiva médica para um modelo social de
deficiência, através de tal mudança paradigmática atesta-se que a experiência da
deficiência é uma consequência de um ambiente pensando, ou melhor, urbanizado para
excluir, e não fruto de uma lesão, que é um dado isento de valor. Essa perspectiva
humanitária ganha destaque com a Convenção Internacional sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e no nosso ordenamento com a Lei Brasileira de Inclusão da
Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), o que corrobora com a fundamentalidade
dos direitos que tutelam a pessoa com deficiência.
A dissociação entre capacidade e deficiência já aponta como o reconhecimento
dos direitos de personalidade devidos a todas as pessoas. Observa-se que a tutela de
direitos voltada para a pessoa com deficiência no ordenamento pátrio é exemplo do
fenômeno da jusfundamentalidade, ou seja, atrair a uma situação jurídica existencial o
caráter de fundamentalidade. A pessoa com deficiência passa a ter atenção especial do
Estado e seus direitos situam-se como posições jurídicas jusfundamentais.
A noção de fundamentalidade constitui uma categoria ligada à atribuição de uma
especial dignidade na proteção de um direito, o objeto de estudo do presente trabalho é
exemplo desse fenômeno. A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência, ao integrar o ordenamento com status de norma constitucional, passa a
ser indiscutivelmente direito fundamental mesmo estando fora do catálogo, como dispõe
do art. 5º, § 2º da Constituição Federal. A fundamentalidade desse direito resta
configurada para além do âmbito formal, sendo materialmente fundamental, pelo escopo
de proteção a dignidade e autonomia da pessoa com deficiência. No entanto, a mudança
de paradigma não pode ser apenas legal, mas sim, deve ser moral, sendo necessário um
giro na organização social e ambiental que prime pelo respeito às diferenças e promoção
do exercício da cidadania.
Percebe-se assim, que o modelo capitalista de urbanização desenvolvido ao
longo dos séculos foi excludente, produziu cidades caracterizadas pela fragmentação do
espaço e pela exclusão social e territorial. O desordenamento do crescimento periférico
associado à profunda desigualdade entre áreas pobres, desprovidas de toda a
urbanidade, e áreas ricas, nas quais os equipamentos urbanos e infraestruturas se
concentram, reflete a realidade de conflitos sociais no interior da cidade, o que reforça a
injustiça social e inviabiliza uma cidade para todos.
REFERÊNCIAS
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil Volume 1. São Paulo. Editora Saraiva, 2003
SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de
Janeiro: WVA, 1997.
WOLKMER, Antonio Carlos. História do Direito no Brasil. Rio de Janeiro: Forense,
DIREITOS E CONQUISTAS NA INCLUSÃO DE PESSOAS DEFICIÊNTES
NAS ESCOLAS DE ENSINO REGULAR: REFLEXÃO ACERCA DO
ESTATUDO DA PESSOA COM EFICIÊNCIA.
Resumo
A temática inclusão social e escolar de pessoas deficientes está presentes nos
congressos, seminários, colóquios e debatida, principalmente entre o meio acadêmico.
Diante de tal realidade surgiu a seguinte inquietação: as instituições escolares estão
preparadas para receber as pessoas deficientes ou as adaptações necessárias serão
realizadas após a presença dos mesmos nas escolas? Com o intuito de responder nossa
inquietação, elencamos como objetivo geral: Compreender como se efetiva as
conquistas que o estatuto da pessoa com deficiência concede as pessoas deficientes em
relação a inclusão escolar. Como objetivos específicos: Conhecer as principais barreiras
que contribui para que ocorra a exclusão ou segregação das pessoas deficientes nas
instituições de ensino; Identificar as necessidades fundamentais para que seja efetivada
a inclusão escolar de deficientes nas Instituições de ensino regular. Com o intuito de
contemplar nossos objetivos esta pesquisa é qualitativa e para coleta de dados
utilizamos a entrevista semiestruturada, na qual utilizamos análise de conteúdo segundo.
Assim, concluiu-se que mesmo com muitas conquistas e avanços a inclusão escolar para
pessoas com deficiências ainda não está efetivado como o estatuto da pessoa com
deficiência assegura.
Palavras-chave: Direito Humanos. Inclusão escolar. Deficiência. Barreiras.
Introdução
13
Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática (PPGECM), Universidade
Federal de Pernambuco - Centro Acadêmico do Agreste – UFPE/CAA. Integrante do Grupo de Pesquisa – CNPq
– UFPE – Educação, Inclusão Social e Direitos Humanos. Pedagoga pela UFPE/CAA. Caruaru/PE.
risoneteprof@gmail.com
14
Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela ESA-PE. Bacharel em Direito – FAVIP - E-MAIL:
samuel.junior89@outlook.com.
15
Professora Adjunta, Universidade Federal de Pernambuco- Centro Acadêmico do Agreste-UFPE/CAA.
Coordenadora do Grupo de Pesquisa – CNPq – UFPE – Educação, Inclusão Social e Direitos Humanos.
Pedagoga pela UFPE/CAA
A questão da pessoa com deficiência é um tema que está sendo abordado
constantemente, através de congressos, simpósios, palestras entre outros. A ênfase no
tema começou após a declaração de Salamanca em 1994, na Espanha. O evento reuniu
94 representantes de governos e organizações não governamentais (Ongs). Assim, a
educação inclusiva é cada vez mais debatida e torna-se objeto de estudo e pesquisa nos
meios acadêmicos.
Porém, desde 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos já trazia
princípios de igualdade, liberdade de locomoção, segurança, integridade física e à
segurança pessoal e o direito a instrução independente da pessoa ser deficiente ou não.
Pois, de acordo com o art. 1 da Declaração dos Direitos Humanos “todos os seres
humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”. Ainda, no Artigo 7, diz que:
Todos são iguais perante a lei e tem direito, sem qualquer distinção, a igual
proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer
discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento
a tal discriminação. (UNIC / Rio / 005 - Agosto 2009).
Essa preocupação com a pessoa com deficiência foi resultado das duas grandes
guerras que assolaram o mundo no Século XX. Como resultado dos conflitos houveram
muitos soldados, e mesmo civis, que perderam membros do corpo, além de terem
desenvolvido problemas na audição, psicológicos, entre outros. Por outro lado, essas
vítimas da guerra eram “heróis de guerra”, e como tal não poderiam ser, simplesmente
desprezados pela sociedade, visto que a tradição bélica dos governos era o
reconhecimento público pelos serviços prestados pelos ex-combatentes.
A partir disso, mudou a visão da sociedade e dos governos com relação a
pessoa com deficiência. Vale destacar a criação dos jogos paraolímpicos, buscando dar
alguma “utilidade” aos deficientes. Com o passar do tempo, passou-se a olhar também
para os outros deficientes.
Nesta mesma direção, o Estatuto da Pessoa com Deficiência é destinado a
assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das
liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e
cidadania. Rege o art. 3o que, para fins de aplicação da Lei, devem ser considerados
acessibilidade, tecnologia assistiva, barreiras entre outras.
Diante dos direitos conquistados pelas pessoas deficientes surge a seguinte
inquietação: as instituições escolares estão preparadas para receber as pessoas
deficientes ou as adaptações necessárias serão realizadas após a presença dos mesmos
nas escolas? Visto que, no Brasil, não é raro presenciar o desrespeito e a vulnerabilidade
em que vive grande parte das pessoas deficientes.
Observando esta inquietação, elencamos como objetivo geral compreender
como se efetiva as conquistas que o estatuto da pessoa com deficiência concede às
pessoas deficientes em relação à inclusão escolar. E como objetivos específicos
conhecer as principais barreiras que contribuem para a exclusão ou segregação das
pessoas deficientes nas instituições de ensino; identificar as necessidades fundamentais
para que seja efetivada a inclusão escolar de deficientes nas Instituições de ensino
regular.
De acordo com a declaração dos Direitos Humanos em seu artigo 26 “todo ser
humano tem direito à instrução, que será gratuita e obrigatória, pelo menos nos graus
elementares e fundamentais.” Diante deste artigo e das leis e decretos, que respaldam a
inclusão de pessoas deficientes no ensino regular, nos debruçaremos com o intuito de
contemplar nossos objetivos.
Com a finalidade de compreender como se efetivam as conquistas que o estatuto
da pessoa com deficiência concede às pessoas deficientes em relação à inclusão escolar,
utilizamos a pesquisa qualitativa. Que segundo Minayo (2013.p. 63) “a interação entre o
pesquisador e os sujeitos pesquisados é essencial”. Tal interação contribuiu para a coleta
de dados que iniciou com uma conversar entre os interlocutores, realizada por iniciativa
do pesquisador. Desta forma, realizamos uma entrevista semiestruturada que segundo
Minayo (2013, p. 64) “combina perguntas fechadas e abertas, em que o entrevistado tem
a possibilidade de discorrer sobre o tema em questão sem se perder à indagação
formulada”.
A inclusão escolar vai além de leis e regras e normas, mesmo sabendo que elas
são fundamentais e que a partir das mesmas é que nossos direitos e deveres são
garantidos. Para que de fato a inclusão escolar seja efetivada, a comunidade escolar
deve estar preparada para transformações pedagógicas e pessoais. Segundo Raiça,
Prioste e Machado (2006, p.51-52) quando se propõe uma educação inclusiva se faz
necessária uma mudança na concepção e na prática pedagógica do sistema educacional
como um todo. Pois, a prática inclusiva entra na aprendizagem e não no ensino, buscando
uma prática que atenda o desenvolvimento da pessoa.
Todos os dias, as pessoas deficientes têm que superar obstáculos para realizar
suas atividades diárias, muitas dessas barreiras interferem diretamente na sua
locomoção, mesmo que a Constituição Brasileira assegure o direito de todo cidadão de
“ir e vir” livremente.
Diante da diversidade de obstáculos existente, o Estatuto da Pessoa com
Deficiência no Art. 3º, paragrafo IV – denomina como Barreiras:
Cidadão Vejo muitas, mas não com ele a professora tem medo do meu filho e não
sabe como agir. Ela não passa nenhuma atividade escolar para ele.
Caruaruense Não, aqui não tem intérprete de Libras e não tem outros deficientes.
Pernambucano Aqui na escola muitas coisas foram cumpridas por que eu falei. Como
colocar porta e tranca nos banheiros e retirar uma caquera 16 que estava na
frente da rampa de acesso as salas de aula.
Brasileiro Se eu vejo? (risos) há muitas conquistas sendo efetivadas sim, mas ainda não
chegaram aqui. A burocracia atrapalha bastante, aqui não há material em
braile.
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Vaso grande com planta.
Os professores alegam (com toda razão) que em seus cursos de formação não
tiveram a oportunidade de estudar a respeito, nem de estagiar com alunos da
educação especial. Muitos resistem, negando-se a trabalhar com esse alunado
enquanto outros os aceitam, para não criarem áreas de atrito com a direção
das escolas. (CARVALHO, 2006, p. 27).
Pesquisadora Pergunta: Você se sinta realmente incluído nesta escola ou precisa ter algo
mais para que ocorra a inclusão?
Entrevistados Respostas
Cidadão Claro que não me sinto, aqui ainda precisa de muitas coisas principalmente
que fosse um espaço maior.
Caruaruense Não, o que eu queria mesmo era sair daqui e ir para uma escola onde só
tenha surdos.
Caruaruense A falta de comunicação. Preciso esta fazendo gestos e mimicas para ser
entendido pelos meus colegas como pelos professores e as outras pessoas das
escolas.
Pernambucano A barreira urbana, a cidade não esta preparada para o cadeirante, as paradas
de ônibus não têm rampas as rampas dos ônibus em cada 4 ônibus 3 estar
com a rampa quebrada.
Nordestino A pior barreira para mim que sou cadeirante é a falta de transporte, calçadas
e rampas.
Brasileiro A barreira atitudinal sem dúvida é a pior. Através desta barreira surgem as
demais que oprime, ignora e desrespeita todos os nossos direitos já
adquiridos.
A terceira pergunta que elencamos para essa análise foi: O Estatuto da Pessoa
com Deficiência cita algumas barreiras, qual delas você acha mais difícil de ser
superada? Dentre os entrevistados a resposta de Brasileira, resume todas as outras falas
quando ele diz: “A barreira atitudinal sem dúvida é a pior. Através desta barreira
surgem as demais que oprime, ignora e desrespeita todos os nossos direitos já
adquiridos”.
Uma barreira atitudinal, infelizmente muito comum, na cidade onde serviu de
campo para esta pesquisa, são os carros estacionados em cima da calçada ou
estacionados nas vagas reservadas para pessoas com deficiência ou mobilidade
reduzida. Para muitas pessoas ditas “normais” essa atitude é comum, não causa
problema algum. Porém, para um cadeirante, por exemplo, esta atitude está impedindo
o acesso a algum local, quer isso aconteça de modo intencional ou não.
As barreiras atitudinais, porém, nem sempre são intencionais ou percebidas. O
problema das barreiras atitudinais é que quando são percebidas muitas vezes nos
omitimos e não as removermos.
Considerações finais
Referências
CARVALHO, Rosita Edler. Educação Inclusiva: os pingos nos “is”. – Porto Alegre:
Mediação, 2006.
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS - Adotada e proclamada
pela resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro
de 1948 (UNIC / Rio / 005 - Agosto 2009).
FREIRE, Paulo. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Olho
d‟água, 1997.
RAIÇA, Darcy; PRIOSTE, Cláudia; MACHADO, Maria Luiza Gomes. Dez questões
sobre a educação inclusiva da pessoa com deficiência mental.- São Paulo:
Avercamp, 2006.
RESUMO
1. INTRODUÇÃO
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Graduanda do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Pernambuco/UFPE-CAA,
vandasilva.a@outlook.com
18
Graduanda do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Pernambuco/UFPE-CAA,
ciceramirelle@bol.com.br
autista. Esta turma possui atendimento interdisciplinar e conta com a participação da
família dos alunos, um psicólogo da escola, a professora e a professora auxiliar e a
equipe de apoio de educação inclusiva da Secretaria de Educação de Caruaru.
Inicialmente apresentamos uma perspectiva histórica do autismo para então
dialogarmos acerca da Inclusão escolar de crianças autistas. O termo autismo foi
utilizado pela primeira vez no ano de 1943 pelo médico Austríaco Dr. Leo Kanner, este
por sua vez escreveu um artigo intitulado “Distúrbios Autísticos do Contato Afetivo”,
escrito em inglês, nesta produção acadêmica o médico relata e descreve 11 casos de
autismo que chegaram até ele para tratamento relatando ainda que o primeiro de
Autismo que este atendeu, foi o caso de Donald T., que data do ano de 1938.
No ano de 1944, outro importante médico, Hans Asperger , também austríaco,
formou-se na mesma universidade onde estudou Leo Kanner, Universidade de Viena.
Hans Asperger escreveu em alemão o artigo intitulado “Psicopatologia Autística da
Infância”, neste artigo o médico descreveu as condições do autismo de diversas crianças
que se assemelhavam as descrições que foram feitas por Kanner.
Esses dois médicos foram os percursores em elaborar e escrever as primeiras
produções acadêmicas que tratam sobre o autismo embora tenham utilizado linguagens
e modos diferentes de caracterizar este distúrbio.
O Autismo apesar de estar sendo estudado por cientistas acerca de sete décadas,
ainda pairam sobre este distúrbio do desenvolvimento humano, várias dúvidas e
questionamentos. A aparência física das crianças com autismo não possui nenhuma
diferença em relação a aparência das demais crianças, porém as características que as
diferenciam é o atraso da fala, isolamento , dificuldade de aprendizagem, dificuldade de
socialização, dificuldade de comunicação, movimentos repetitivos, ecolalia tardia,
dificuldade em se utilizar da imaginação, hiperatividade e em alguns raros casos uma
agressividade desmedida e sem causa .
Ressaltamos que apesar de terem sido realizadas e divulgadas diversas pesquisas
sobre as possíveis causas do autismo, nunca se chegou a uma real conclusão sobre a sua
real causa. Destacamos que não se pode considerar o autismo como um retardo mental,
pois no retardo mental a criança demonstra um desenvolvimento totalmente defasado,
enquanto que a criança que tem autismo o desenvolvimento é absolutamente irregular,
ou seja, em alguns casos a criança pode ter um atraso na fala, mas ter o
desenvolvimento motor normal ou acelerado, não existe uma previsão correta de como a
criança autista irá se desenvolver durante sua infância, pois este desenvolvimento irá
depender do grau de autismo que esta possui, por conseguinte é deveras de muita
importância o apoio de uma equipe multidisciplinar de saúde para orientar a família
neste processo.
Atualmente compreendemos que a efetivação da educação inclusiva é
desafiadora para o professor, visto que este profissional deve além de refletir sobre suas
práticas cotidianas estabelecer parcerias e um diálogo aberto com a família do aluno,
para que haja uma parceria que contribua para o desenvolvimento do ensino-
aprendizagem das crianças autistas.
Nesse viés delimitamos nosso problema de pesquisa: Como ocorre a
consolidação, o atendimento multidisciplinar e a concretização da educação inclusiva de
alunos autistas em uma classe regular? Para adentrarmos nessa investigação, elencamos
como objetivo geral: Compreender a consolidação, o atendimento multidisciplinar e a
concretização da educação inclusiva de alunos autistas em uma classe regular, e como
objetivos específicos são: Identificar quais são as leis que garantem o direito à
escolarização de crianças autistas,
Analisar se as leis de amparo são efetivadas no contexto da escola pública regular e
Levantar dados e informações acerca do atendimento multidisciplinar de apoio que a
escola analisada fornece para os dois alunos que tem autismo.
2. HISTÓRICO DO AUTISMO
3. PROCEDIMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
Essa investigação foi realizada a partir do requisito avaliativo do componente
curricular Estágio Supervisionado I cursado na graduação de Pedagogia da
Universidade Federal de Pernambuco/ UFPE-CAA.
Como já dito anteriormente, nosso campo empírico refere-se à uma escola
municipal da rede regular de ensino localizada na cidade de Caruaru-PE e nossos
sujeitos de pesquisa serão duas crianças autistas e as práticas da professora frente à
esses alunos.
Para analisar os dados coletados optamos pela perspectiva de análise de
conteúdo que de acordo com Bardin (2010) refere-se à:
Um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando obter,
por meio de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do
conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que
permitam a inferência de conhecimentos relativos ás condições de
produção\recepção (variáveis inferidas) destas mensagens” (BARDIN,
2010, P. 42.)
Seguimos essa proposta de construção de pesquisa apontada por Bardin (2010)
pois nos indica a possibilidade de analisar, descrever e realizar interferências
necessárias aos pontos relevantes da investigação.
Para compreender a consolidação, o atendimento multidisciplinar e a
concretização da educação inclusiva de alunos autistas em uma classe regular, optou-se
pela realização de entrevistas semiestruturadas.
Entendemos que na realização da entrevista semiestruturada o entrevistador tem
total liberdade para desenvolver diversas situações, direcionando cada situação para
qualquer direção que este considere como sendo deveras a mais adequada. Segundo
Marcani e Lakatos (2006) “Geralmente as perguntas deste tipo de entrevista são abertas,
e desta forma estas podem ser de fato respondidas dentro de uma conversação
totalmente informal”.
Para realizar o Levantamento de dados e informações acerca do atendimento
multidisciplinar de apoio que a escola analisada fornece para os dois alunos que tem
autismo utilizamos a observação e o registro no diário de campo.
Esclarecemos que nossas observações ocorreram no período matutino, pois é
neste horário que aconteciam as aulas para a turma de educação infantil II, a observação
participante ocorria de forma espontânea no decorrer da aula, e as entrevistas
aconteciam sempre no horário do intervalo, pois neste momento a professora da turma
juntamente com a professora auxiliar sempre estava disponível para nos atender de
forma mais atenciosa.
Para identificar quais são as leis que garantem o direito à escolarização de
crianças autistas e analisar se as leis de amparo são efetivadas no contexto da escola
pública regular realizamos diversos estudos e consultas bibliográficas e documentais em
livros, artigos e aparato legal que tratam sobre Inclusão escolar e autismo.
4. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Atualmente entendemos que a efetivação da inclusão na escola regular é um
desafio para o professor já que este além de refletir sobre suas práticas cotidianas deve
desenvolver ações em prol da Educação inclusiva.
São várias as leis que garantem o acesso de crianças com autismo na escola
regular, entre elas podemos destacar: A Lei Federal nº 12.764\2012 Berenice Piana que
se enquadra no quadro de leis educacionais e além de garantir o acesso a rede regular de
ensino público destaca que a unidade escolar também deve fornecer um apoio
psicopedagógico especializado e o atendimento de uma equipe multidisciplinar para
estes alunos.
Ressaltamos ainda, que a aprovação da lei federal nº 12.764\2012 Berenice
Piana só foi possível graças ao empenho e lutas de pais de autistas e movimentos sociais
, que em conjunto, uniram forças para ir em busca do direito à educação de seus filhos.
Destacamos que esta lei federal também garante outros direitos para as crianças
que possuem o espectro autista, como por exemplo direito a ter acesso a medicamentos
gratuitos que devem ser fornecidos pela rede pública de saúde bem como a terem o
diagnóstico precoce , e a obter um tratamento especializado e multiprofissional que
garanta para estes uma melhor qualidade de vida.
As crianças autistas também devem ter acesso garantido à educação básica e
profissionalizante, oportunidade de ingressar no mercado de trabalho, bem como ter
acesso à previdência social e também à assistência social.
O autor Costa (2013) destaca que a lei federal Berenice Piana foi promulgada e
aprovada após muita luta que contabilizaram exatos treze anos. Salientamos que Costa
possui um filho que tem autismo, e lutou muito durante treze anos juntamente com a
senhora Berenice Piana ( mais tarde o nome desta senhora foi escolhido para intitular a
lei federal que garantiria todos os direitos fundamentais dos autistas) , para que as
famílias mais humildes tivessem total amparo por parte dos governos.
Costa ( 2013) relata que foi em parceria com a senhora Berenice Piana que este
organizou a Audiência na Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, e que foi
graças a esta que se originou o Projeto de Lei 168\11 que foi o pontapé inicial do que
mais tarde iria originar a Lei Federal 12.764\2012 Berenice Piana, pois somente desta
forma as crianças autistas iriam ter seus direitos fundamentais a cidadania devidamente
garantidos por lei.
Portanto segundo Costa (2013, P.130) ficou definido nesta Lei Federal, no que
tange ao direito a educação o seguinte: “Parágrafo único. Em casos de comprovada
necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de
ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 2 , terá direito a acompanhante
especializado”.
Ainda segundo Costa ( 2013) o gestor escolar jamais poderá recusar a matrícula
de um aluno autista, pois esta recusa poderá acarretar punições para este , como também
a família deste aluno pode abrir processo contra este seguindo os preceitos desta lei,
sobre isto Costa ( 2013, P.131) nos traz um trecho deste artigo da Lei Federal
12.764\2012: “Art. 7 O Gestor escolar, ou autoridade competente, que recusar a
matrícula de um aluno com transtorno do espectro autista, ou qualquer outro tipo de
deficiência, será punido com multa de 3 (três) a 20 ( vinte) salários mínimos.” E ainda
havendo caso de reincidência, poderá ser aberto um processo administrativo, neste
ficará assegurado para o gestor escolar, o direito a demonstrar contraditório e a ampla
defesa, como consequência e ficando realmente provado o descumprimento desta Lei
Federal haverá perda do cargo.
Portanto podemos considerar que a esta Lei Federal trouxe importantes
benefícios para as crianças autistas oriundas de famílias pobres que precisam ter o seu
direito de acesso a escola garantidos, para que desta forma estas possam avançar e
desenvolver-se também nas instituições escolares.
Destacamos também a importância do professor que possui em sua turma regular
alunos que possuem o espectro autista ter uma formação específica que auxilie na
superação dos desafios provenientes do cotidiano da sala de aula.
Salientamos que é exigido por lei que haja um professor de apoio para auxiliar e
dar um apoio pedagógico diferenciado para o aluno com autismo de forma que
possibilite uma educação inclusiva e transformadora.
Sobre este desafio Silveira (2015) nos diz que:
“É preciso uma mudança de postura do professor em relação ás
crianças que estão sendo incluídas, trabalhar de uma maneira
diferenciada com elas, mas não tratando-as como “diferentes” ,
estigmatizando-as ou rotulando-as, tratando com indulgência e
subestimando-as. E também é preciso buscar uma interação constante
com os pais e responsáveis pelo aluno”. (SILVEIRA, 2015, P.55)
Desta forma o professor precisa refletir e avaliar a sua própria prática educativa
a fim de utilizar em seu planejamento atividades e momentos lúdicos ao mesmo tempo
que deve propiciar significativos momentos de aprendizagem.
A autora ainda afirma a relevância e a importante contribuição que a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional- LDB (Lei 9394\96, cap. V) ao destacar que o
Estado também possui o dever fundamental de garantir o acesso, permanência e prover
e fornecer apoio pedagógico, e outros suportes para que estes alunos especiais possam
ter uma educação inclusiva e de qualidade, desde a educação infantil.
Na sua opinião o suporte pedagógico que a escola fornece para apoiar a sua prática
educativa ,é suficiente para a demanda da educação especial ?
Não totalmente, a professora auxiliar me ajuda bastante com os dois alunos
autistas dentro da sala de aula, porém a equipe da escola nas formações continuadas e
nas reuniões não me orientam e não me fornecem material pedagógico específico , para
lidar com estas crianças especiais, sempre tenho que fazer pesquisas por conta própria. (
Professora titular)
Portanto, a criança não deve ser tratada com indiferença ou como sendo um ser
vulnerável, esta deve ser tratada como um ser social portadora de direito, desta forma é
que a relação entre ensino e aprendizagem poderá ser uma relação qualitativa, e como
consequência disto a pré-escola e seus processos de ensino terá muito mais significado
para a criança.
Ademais a pré-escola tem como missão fundamental oferecer um ensino de
qualidade, pois somente desta forma a criança irá desenvolver-se de forma satisfatória, e
sobre o desenvolvimento escolar e a educação infantil de qualidade Oliveira (2002) nos
diz:
As crianças pequenas que se beneficiam de um serviço de qualidade
tendem a desenvolver mais o raciocínio e a capacidade de solução de
problemas, a ser mais cooperativas e atentas aos outros e a adquirir
maior confiança em si. Grande parte desses efeitos positivos persistem
e contribuem para suscitar-lhes uma atitude positiva com relação á
aprendizagem escolar e favorecê-las com o sucesso em seus estudos
posteriores. (OLIVEIRA, 2002, P.85)
Realmente notamos que a escola oferece sim uma educação de qualidade para os
alunos, ao passo que foi possível notar que várias crianças da turma do pré - II já sabem
ler e escrever. Constatamos também, que a relação que as crianças mantêm com a
professora e com a professora auxiliar é uma relação harmoniosa e respeitosa, ao passo
que não notamos indisciplina por parte dos alunos.
Com relação à educação inclusiva notamos que os dois alunos que têm Autismo
mantêm uma relação de ternura e respeito com a professora e com a professora auxiliar,
e estes têm feito muitos avanços no que tange ao aprendizado, notamos que este sucesso
se deve a boa relação e comunicação direta que a professora mantém com as famílias
dos alunos, este é um ponto positivo e muito apropriado de acontecer, pois a educação
inclusiva exige que a família mantenha comunicação direta com o professor, e sobre
esta comunicação direta Belisário e Cunha (2010) nos diz:
Para que haja sucesso na interlocução e parceria entre a escola e a
família, os profissionais da escola devem sistematicamente dar retorno
á família sobre todo e qualquer progresso apresentado pela criança no
ambiente escolar, evitando-se relatarem apenas as dificuldades vividas
com a criança. Os professores devem ter em mente que a família
encontra-se muitas vezes fragilizada por toda a vivência desde a
descoberta do transtorno e que será parceira quanto mais conseguir
entender o processo pedagógico do filho e perceber os pequenos
avanços. O que chamamos de pequenos avanços. O que chamamos de
pequenos avanços são extremamente significativos para a família. (
BELISÁRIO e CUNHA, 2010, P. 25)
Nesse sentido, a escola deve oferecer uma educação inclusiva para as crianças
para que estas consigam ter um desenvolvimento cognitivo, afetivos e pessoais
satisfatórios. O contato com cada aluno é muito gratificante, poder ver de perto os
alunos se desenvolvendo, conhecer um pouco mais de todas as crianças que faziam
parte daquela turma de Educação Infantil observando o desenvolvimento dos dois
alunos que tinham autismo é de suma importância para o nosso processo de formação
como pedagogas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O ingresso de uma criança autista em escola regular é um direito garantido por
lei, como aponta o capítulo V da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB), que trata sobre a Educação Especial. A redação diz que ela deve visar a efetiva
integração do estudante à vida em sociedade. Além da LDB, a Constituição Federal, a
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, Estatuto da Criança e do
Adolescente e o Plano Viver sem Limites (Decreto 7.612/11) também asseguram o
acesso à escola regular.
A professora do nosso campo empírico nos mostra o quanto é necessário um
plano de ensino que respeite a capacidade de cada aluno e que proponha atividades
diversificadas para todos e considere o conhecimento que cada aluno traz para a escola.
No caso do autista, o que está em jogo são as habilidades. “É nelas que se deve investir”
para, assim, desenvolver as inabilidades.
Percebemos que as crianças autistas apresentam hiperatividade, dentro do
distúrbio autista, Em outras palavras, a característica principal é a falta de concentração.
A memória deles costuma ser muito boa, o que de fato os prejudica é a hiperatividade e
a falta de concentração, porque enquanto eles estão fazendo um movimento repetitivo,
não focam no que está sendo ensinado ao seu redor, portanto, não conseguem captar o
aprendizado, justamente por conta da falta de concentração.
Quando atraídos, eles conseguem prestar mais atenção e realmente aprender.
Nosso primeiro passo foi criar um vínculo, como fazemos com qualquer criança.
Quando eles começam a confiar no professor, a relação de ensino-aprendizado funciona
melhor.
O autismo é considerado como um transtorno em detrimento ao mesmo englobar
a síndrome de Asperger e abarcar diversas dificuldades do desenvolvimento humano,
recebendo assim o termo TEA – Transtorno do Espectro Autista.
Nos dias atuais, vive-se uma época em que todos os ambientes devem trabalhar
com a inclusão, principalmente no ambiente escolar, pois é neste ambiente, que o
indivíduo é preparado para viver em sociedade. A inclusão é muito mais que o inserir, é
mais do que o simples fato de matricular na escola. A inclusão para realmente fazer jus
à palavra dita, precisa acompanhar uma preparação tanto do próprio professor quanto da
escola, que é de grande importância para o desenvolvimento da criança, pois não é o
indivíduo autista que deve adaptar-se ao ambiente, mas sim o ambiente que deve ser
adaptado e receber a educação inclusiva, pois já há leis que determinam esta afirmação.
A importância do tema abordado deu-se por razão do entendimento do processo
da inclusão do aluno autista na escola regular da rede pública e suas contribuições, pois,
o ensino inclusivo é um direito conquistado e é dever de toda sociedade aceitar e
respeitar as diferenças.
A inclusão dos autistas nas escolas públicas é necessária, pois deste modo é
despertado nos educandos atitudes de solidariedade e respeito às diferenças, concepções
essas fundamentais para a inclusão e a valorização da diversidade no âmbito educativo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARBOSA, Maria Carmen Silveira: Horn, Maria da Graça Souza, A organização dos
espaços na educação infantil, Porto Alegre: Artmed, 2004.
GIL, Marta, Educação Inclusiva: O Que o Professor Tem a Ver Com Isso ? ,
Coordenação; Texto de Apresentação do Prof. Hubert Alquéres. São Paulo: Imprensa
Oficial do Estado de São Paulo: Ashoka Brasil, 2005.
MELLO, Ana Maria S. Rose de. Autismo: Guia Prático. Colaboração: Maria Alice de
Castro Vatavuk.6. ed._São Paulo: AMA; Brasília: CORDE, 2007
MENDONÇA, M. Gêneros: por onde anda o letramento ? . IN: Santos, C.F.;
Mendonça, M. Alfabetização e Letramento: Conceito e Relações. Belo Horizonte:
autêntica, 2005.
RESUMO
O presente artigo objetiva realizar uma análise teórico-reflexiva acerca do cuidado
integral em saúde mental, contemplando a população negra e suas religiosidades no
Brasil. No âmbito nacional o processo de desinstitucioanlização tem sido de grande
relevância na construção de políticas públicas inclusivas em saúde mental, porém nos
artigos publicados a nível nacional e internacional percebe-se ainda uma incipiência do
reconhecimento das múltiplas facetas do racismo enquanto evento estressor no processo
de adoecimento mental e a negligência no âmbito assistencial frente às crenças
espirituais desta minoria social. Estes múltiplos fatores de vulnerabilidade exercem uma
grande influência na garantia da atenção integral à saúde, devido ao racismo
institucional. Como processo de enfrentamento dessa problemática no âmbito da saúde,
tem ações afirmativas de saúde para população negra, com o objetivo de tanto combater
das iniquidades sócias existentes no contexto do Sistema Único de Saúde oriundas do
racismo, como de fortalecer o processo de promoção à saúde mental da população
negra.
19
Instituto Federal de Pernambuco, discente do curso Bacharelado em Enfermagem,
alvespedro113@gmail.com.
2
Instituto Federal de Pernambuco, Doutora em Ciências Humanas pela Universidade Federal de Santa
Catarina, valquiria@pesqueira.ifpe.edu.br
INTRODUÇÃO
Ocorrida no ano de 2001, a III CNSM teve como título, “Cuidar sim, excluir
não” nesse contexto é implementado as problematizações a cerca do termo “cuidar”,
onde o usuário deve ser visto além de sua doença mental, pois a cultura medicocentrada
existente no contexto da saúde, faz com que o profissional negligencie o contexto que o
mesmo está inserido na sociedade, nessa perspectiva não há um cumprimento integral
da atenção à saúde (BRASIL, 2001 apud, BARBOSA, 2014). Na defesa do projeto de
desistitucionlização proposta pelo movimento da reforma psiquiátrica, na III CNSM, foi
problematizado também o processo de territorizalização, levando a reflexão sobre o
território que o usuário está inserido, nesta perspectiva da territorialidade, no ano de
2002 tem-se a implementação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS),
regulamentada pela portaria 336/02, constituindo-se de um serviço diário de atenção
ambulatorial, com o objetivo de atuar no processo não só de acompanhamento e
manutenção da saúde no território, mas do processo de reinserção social e resgate dos
direitos humanos dos usuários (BRASIL, 2002).
A IV CNSM ocorreu no ano de 2010, teve com o tema: “Saúde Mental, direito
e compromisso de todos: consolidar avanços e enfrentar desafios” onde o debate girou
em torno tanto do processo de práticas inovadoras como a intersetorialidade do cuidado,
fortalecendo o processo de descentralização defendido pela reforma sanitária,
corroborando também ao processo de ressocialização do usuário no seu território
(BRASIL, 2010 apud BARBOSA, 2014), nesta perspectiva, no ano de 2011 é
implementada a portaria 3.088/11, que regulamenta a Rede de Atenção Psicossocial
(RAPS), com o objetivo de promover e fortalecer o princípio da integralidade do
cuidado, numa perspectiva interdisciplinar em rede, ou seja, um cuidado descentralizado
(BRASIL, 2011).
No Brasil o risco de uma criança preta ou parda morrer antes dos cincos anos
por causas infecciosas e parasitárias é 60% maior em relação a uma criança branca.
Também o risco de morte por desnutrição apresenta cerca de 90% maior entre crianças
pretas e pardas que entre brancas. O risco de uma pessoa negra morrer por causa
externa é 56% maior que o de uma pessoa branca, levando em consideração um homem
negro, o risco é 70% maior que o de um homem branco. No geral, o risco de morte por
homicídios foi maior nas populações preta e parda, independentemente do gênero. Já as
mulheres negras grávidas morrem mais de causas evitáveis, a exemplo das síndromes
hipertensivas da gestação (BRASIL, 2007).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os avanços frente às políticas institucionais de saúde mental, através do
movimento da reforma psiquiátrica, estão em constantes transformações, pois a reforma
psiquiátrica vem acontecendo como o passar dos tempos, apresentando seus avanços e
retrocessos como toda política pública. Dentre os avanços encontra-se a efetivação da
RAPS e seus benefícios para os usuários que passaram muito tempo internos nas
unidades psiquiátricas e através de uma política de ressocialização, viabilizam um
processo emancipatório frente a suas escolhas e sua vida, e como essa estruturação da
rede tem contribuído para o processo de fechamento de algumas instituições
psiquiátricas, tendo um cumprimento da proposta de desinstitucionalização em saúde
mental.
Porém uma das problematizações que ainda está incipiente no processo de
construção da proposta da reforma psiquiátrica é o debate frente às questões raciais,
uma vez que no ano de 2009, no mês de novembro, foi publicada a PNSIPN e
reconhecendo principalmente o racismo como um determinante de saúde, nesta
perspectiva torna-se de grande relevância a transversalização das políticas de saúde
mental e de saúde da população negra, correspondendo desta forma ao princípio da
integralidade do SUS.
Para esse processo de transversalização das políticas, faz-se necessário construir
em todos os níveis de atenção, propostas de ações afirmativas é trabalhar, tanto no
âmbito assistencialista: com profissionais (rompendo o racismo institucional,
proporcionado uma visão crítica e reflexiva) e usuários (trabalho em grupos sobre
empoderamento, autoestima, auto percepção, resiliência e dentre outros assuntos que
promova a saúde mental da população negra, principalmente os indivíduos com
transtorno mental) como também a gestão, implementando políticas de educação
permanente com os profissionais atuantes em todos os serviços da rede sobre a
importância de levar em consideração o racismo institucional como determinante de
saúde.
É necessário verificar quais os dispositivos alternativos, para além dos ambientes
institucionais de saúde que podem ser utilizados frente ao processo de promoção a
saúde, dentre os dispositivos alternativos presente na Rede de Atenção á Saúde,(RAS)
tem-se os espaços religiosos que podem ser utilizados, conforme a vontade do usuário,
em sua linha de cuidado, com o intuito de atender as suas demandas psicoespirituais.
Nesta perspectiva a gestão pode promover debates sobre religiosidade e saúde com
ênfase na intolerância religiosa frente ao povo de terreiro que cultuam a umbanda e o
candomblé, com o intuito de romper os pré-conceitos existentes a cerca destas
manifestações religiosas.
Ocupar os espaços de formação de todos os profissionais que trabalham de foma
direta no processo de promoção à saúde, é de grande relevância, pois rompendo os
estigmas sociais envolvendo as pessoas negras, com transtorno mental que cultuam as
religiões de matriz-africana, proporciona o fortalecimento do SUS, garantindo de forma
plena, uma atenção integral a saúde.
REFERÊNCIAS
HOLDEN, Kisha; et. al. Toward Culturally Centered Integrative Care for Addressing
Mental Health Disparities among Ethnic Minorities. Psychol Serv. U.S.; V. 11 N. 4 pp:
357–368. Nov. 2014.
HOLDEN, Kisha B; et. Al. Prevalence and Correlates of Depressive Symptoms and
Resiliency among African American Women in a Community-Based Primary Health
Care Center. J Health Care Poor Underserved. U.S. V. 24. N. 4 0 pp: 79–93. Nov –
2013.
SILVA, Naiara Gajo et al. O quesito raça/cor nos estudos caracterização de usuários de
Centro de Atenção Psicssocial. Saúde Sociedade, São Paulo, v. 2, n. 1, p.100-114, maio
2017.
TRIMER, Roger (org.). Saúde Coletiva. 1 ed. São Paulo: Person Education Brasil.
2014.
AS PÉTALAS QUE ELA CONTINHA
Era tarde de quinta-feira e Elena corria com seus cadernos e suas muitas pastas em
seus braços, destas últimas, algumas folhas ameaçavam se desprender devido à forte
ventania que também bagunçava seus cabelos. Acreditava que se atrasaria para a sua
primeira aula àquele dia, porém alcançou a parada de ônibus segundos antes de tomar o
transporte.
A segunda aula daquele dia era também a que Elena mais temia: a aula de educação
física. Ela se sentia envergonhada por ser a mais alta dentre todas, algo que fazia com que
se curvasse; por conta dos pelos em suas pernas, responsáveis por fazer com que preferisse
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Graduando em Psicologia pela DeVry | UNIFAVIP, E-mail: mateus.103962@homail.com
usar calças em vez de shorts; e pela sua desenvoltura, que imprimia nela a sensação de não
pertencimento àquelas atividades.
Para não participar dessas atividades em aulas passadas, havia simulado situações
inusitadas. Em uma delas, fingiu estar enjoada. Em outro momento, fingiu ter torcido o
tornozelo; enquanto que em um terceiro, fingiu ter torcicolo. A grande maioria das vezes
em que se utilizou de atuação com esse propósito, teve êxito, mesmo que os olhos de sua
professora indicassem que conhecia a verdade.
Era pouco possível, porém, que simulasse um problema diferente a cada nova
quinta-feira e fosse sempre convincente. — Eu posso fingir ter torcido o pé novamente. —
Pensou, entretanto desistiu logo em seguida. Naquele dia ela se submeteria aos mais longos
cinquenta minutos de aula da semana. Ao primeiro momento, teve que correr em torno da
quadra junto aos demais. O comando a fez sentir calafrios, mas logo iniciou o trajeto.
Sentiu que todos os olhares estavam sob ela enquanto o fazia; que estavam à espera
de um tropeço ou qualquer movimento brusco que pudesse ser usado para que a
perseguissem outra vez. Para seu alívio, nada daquilo chegou a acontecer, mas o alívio não
durou muito, pois foram organizados pela professora em times de futebol de salão. Aquilo
a desconcertou.
Elena era conhecida pela pouca habilidade com esportes, então, apesar de ter sido
escalada para um time, fora escalada na posição de reserva. Ela permaneceu no banco à
espera do fim da partida, ininterruptamente constrangida e imaginando todo tipo de
julgamento que se passava na mente de seus colegas. Era uma cena verdadeiramente triste.
Ao fim da aula, preferiu se trocar longe dos demais olhares, pois não queria ser
vista por ninguém. Sentia-se exposta. Elena se sentia daquela forma mesmo trajando peças
de frio, o que era comum, apesar de serem quase sempre inapropriadas. Nem mesmo as
altas temperaturas a faziam abrir mãos das mangas compridas e calças largas. Além disso,
ao menor sinal de neblina, a menina incluía um capuz à sua vestimenta.
Ela não tinha irmãs ou irmãos, vivia com seus pais em uma casa simples à zona sul
de sua cidade e não tinha animais de estimação, apesar de desejá-los. Seus hobbies eram o
desenho e a pintura, entretanto poucas pessoas além dela própria tinham conhecimento
daquilo. Sua mãe era uma dessas pessoas e a doutora Aline, sua psicóloga, era a outra.
Sua mãe os havia encontrado alguns meses antes. — Que traços lindos! — Pensou
e, de início, acreditou pertencerem à outra pessoa, alguém que os tivesse esquecido ali sob
sua cômoda. Porém se deteve ao fato de que sua filha não tinha muitos amigos; nenhum, na
verdade, então considerou que tivessem sido produzidos por ela própria.
Seus desenhos retratavam rosas com poucas pétalas e muitos espinhos. Brotos de
rosa aprisionados em carvão ou tinta, sem que pudessem jamais exibir as pétalas que
continham. Alguns desenhos traziam ainda solos secos, aparentemente inférteis,
novamente com brotos de rosas presentes.
Apesar de surpresa pelo talento da filha e admirada com a beleza das imagens, sua
mãe se viu preocupada com o significado por trás deles, então buscou a filha para que
conversassem sobre aquilo. Àquela noite Elena a contou que desenhava sua própria
percepção diante do mundo, algo que não ficou claro para ela.
Foi aí que decidiu encaminha-la para uma profissional. Não a psicóloga de sua
escola, devido às possíveis perseguições que viria a sofrer caso fosse percebida visitando-a
com frequência, mas outra que pudesse acolher suas dores. O passar das sessões não trouxe
mudanças perceptíveis em seu comportamento, mas a menina comunicou o avanço por
meio dos traços.
Manteve a essência de suas pinturas, que àquela altura estavam cada vez mais
elaboradas, mas adicionou cores. Em pinturas de campo, por exemplo, passou a ser
possível que se enxergassem flores vermelhas e azuis ao fundo, enquanto que antes não
havia nada. Essas pareciam expressar esperança. Era um desabrocho de angústias
acumuladas com o tempo.
À noite daquela mesma quinta-feira, Elena se viu só. Não apenas pelo fato de que
seus pais não estavam em casa, mas por se sentir sozinha no universo. Sentiu que era tão
única que era incapaz de ser admirada ou compreendida em sua vastidão. Ela esperava
encontrar a si própria para que pudesse lhe fazer companhia.
Em sua casa, espelhos estavam por todos os lados, exceto em seu quarto. Neste,
apenas um pequeno espelho ocupava discretamente um local ao lado de seu guarda-roupa.
Nele ela se limitava a pentear seus cabelos, mas não se demorava. Elena os evitava por não
se sentir feliz com a imagem que encontrava diante de si sempre que, por acidente, era
capturada por seu próprio reflexo.
Foi em busca de algo no guarda-roupa de sua mãe que a coubesse. Olhou algumas
blusas, sentiu seus tecidos e as pôs contra o próprio corpo diante do espelho. Era a primeira
vez em muito tempo que olhava para si própria sentindo interesse e até mesmo fascínio.
Encontrou sapatos que achou serem lindos e que desejava calçá-los, mas eram muito
pequenos, então se deteve a avaliar as maquiagens.
E foi buscando elas que se deparou com algumas lâminas de barbear, instrumentos
comumente presentes em seu próprio guarda-roupa, mas que cercados por objetos como
aqueles, ganhava um significado diferente. Ela as tomou em suas mãos e foi em direção ao
banheiro, onde pela primeira vez raspou os pelos que tanto a incomodavam.
Os dias que se seguiram não foram muito diferentes do que costumavam ser, exceto
pelo fato de que Elena se sentia mais encorajada. Na segunda-feira ela não baixou os olhos
ao entrar no ônibus. Na terça-feira ela se sentou em uma cadeira ao meio dele e não foi a
última a descer. Na quarta-feira, se permitiu sair de casa sem o moletom.
Mas foi na quinta-feira, novamente durante a aula de educação física, que sua
coragem seria posta à mostra. No vestiário, local em que usualmente ela trocaria seus jeans
por calças de tecido, Elena vestiu um short. A vergonha a abateu assim que o vestiu e o
sentimento a fez hesitar quanto a sair do box vestindo aquela peça, porém respirou fundo e
foi à quadra.
O olhar no horizonte logo foi substituído por um que insistia em buscar refúgio no
piso polido abaixo da garota novamente amedrontada. Ouviu piadas, assovios e risos. — A
menina raspou as perninhas. — Diziam. — Olha o shortinho dela. Que curtinho. —
Continuavam. Foi quando as lágrimas tomaram conta de seu rosto e ela tentou voltar para o
vestiário.
— Marcos. Deixe-o em paz! — Interviu sua professora. — Eric você está bem?
Mas Elena não foi à enfermaria, caminhou pelo pátio de sua escola e encontrou
aconchego sob a grama que ali se encontrava. Observou as flores de pétalas escuras e
ressecadas, se perguntando quanto tempo leva para que percam suas pétalas após chegarem
ao fim da vida. — Talvez eu mesma já tenha perdido as minhas. — Pensou, pois se sentiu
tão sem vida quanto à morte ao seu redor.
Elena não podia ser Elena e ela não conseguia elencar uma razão específica pela
qual, tampouco alguém, pois algo maior violava sua existência. Algo a ameaçava de tomar
as oportunidades que para ela surgiriam caso exercesse sua identidade. Delimitava que era
absolutamente mais importante ser alguém ao mesmo tempo em que determinava que ela
não era; e com isso a tornava indigna.
E se a garota não tinha forças para ser ela mesma, conteria seu desabrocho. Seria
Eric enquanto fosse preciso ser, mas não Eric, o esquisito, apenas Eric. Assumiria a
identidade masculina a qual fora designada e, de modo geral, sua puberdade. Assumiria ser
o garoto que seus genitais diziam que ela era e que seus documentos atestavam, e teria
êxito daquela forma.
Mesmo que não completamente, seria aceita. Cursaria o ensino superior alguns
anos depois e se formaria, trabalhando como produtora de moda. Sonhava em cursar
pedagogia, era verdade, porém entendia que caso desse adeus a Eric em algum momento
de sua vida, deveria ocupar um espaço que a coubesse e esse não seria o educacional, onde
sua presença seria temida.
Pais e mães não confiariam suas crianças a uma figura tão perversa quanto à dela.
Gestores tomariam sua natureza como perigosa. Ela mesma não tinha certeza se seria
adequado que estivesse em uma sala de aula caso chegasse lá algum dia. Seria mais seguro,
então, que não seguisse por aquele caminho. Que acolhesse as limitações a ela impostas e
que as percebesse enquanto privilégios.
Elena daria adeus a ela própria por conta da insegurança que seu eu mais profundo
exprimia sob seu futuro. O medo da rejeição, do desemprego, do desafeto, do homem. E
cada passo contido seria um instante a mais em uma posição que não era a sua. Se Elena
seria para sempre uma rosa, Eric seria por muito tempo o broto que a conteria.
MÃOZINHAS NA AREIA, PERIGO À VISTA.
Maria da Conceição Carneiro de Barros1
MT 01: Contos e Crônicas
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Graduada em Serviço Social. Formada pela UNINASSAU. E-mail: caletito@hotmail.com
criança e provavelmente ainda continua sendo de outras crianças. A casa imaginária, mas
precisamente a cozinha, era o reduto. Meu Deus, quanta inocência!
Mas, quantas vezes terá sido? Não sabe-se ao certo, em sua infância talvez duas ou
três vezes, na sua adolescência, uma vez, com toda certeza . Dói! Dói a lembrança que
ainda é bastante forte, apesar dos tempos terem passado, mas a lembrança é bastante viva
em sua mente. Gostava tanto dele, o tinha como um segundo pai. Incrível como nunca
imaginou que algo dessa natureza existiria e que pudesse acontecer com crianças, pois
seria de uma monstruosidade indescritível. Se era manhã, tarde, não se sabe, é como que o
que aconteceu viesse a apagar algumas coisas de sua memória. Mas a lembrança de ser
subtraída da brincadeira, para sentar no colo e ser abusada, é inesquecível. Em vez do
afago, que era para vir em forma de um toque em sua face, de um cheiro em sua cabeça,
ou um beijo em sua testa, vinha o tocar do pênis em seu corpo enquanto sentada em seu
colo, para talvez conseguir uma penetração, ou algo próximo mesmo. Plantava assim em
sua cabecinha, o sentimento de dúvida, de vergonha, de medo e ao mesmo tempo de culpa.
Respostas queria, mas não tinha. Ninguém sabia, e assim o seu mundinho, já não estava
mais tão colorido, algo tinha acontecido e fez com que ele perdesse um pouco do seu
brilho. Pois agora, estava no ar, o porquê dele ter feito isso.
Mas o tempo passou e tudo permanecia do mesmo jeito, afinal de contas foram
umas duas ou três vezes. Os pais não sabiam, a família não sabia, ninguém sabia, e o
encanto da essência infantil ajudou a ir esquecendo aos poucos esse trauma em sua vida.
Pelo menos era o que ela acreditava.
---Meu coração tá pedindo para você não ir. Coração de mãe não se engana!
Assim dizia a mãe, ao clamar à filha para não ir à casa da tia.
Era uma linda tarde e não tinha aula, poderia ter ficado em casa com sua mãe,
estudando ou fazendo alguma outra coisa, mas ninguém vai saber o que lhe espera mais na
frente. Seus pais não toleravam faltas na escola e sempre lhe falavam da importância dos
estudos, apesar de não terem tido o privilégio de os completarem, chegando apenas até
segunda ou terceira série do primário, tendo que trabalhar logo cedo para se sustentar.
Tinha a mãe como uma guerreira e um exemplo de mulher a ser seguido, por sua
determinação e persistência nas barreiras impostas pela vida. Seu pai trazia para ela a
segurança, pois sabia que ao lado dele estaria segura em qualquer lugar. Sem contar com o
amor e carinho, que sempre passava para ela. Ou seja, amor nunca faltou em sua vida.
Mas a casa da tia a esperava. Se ela soubesse o que iria acontecer com certeza não
iria. A tarde estava ótima, calma e tranquila. Como um raio, bêbado, surge ele,
cambaleando, querendo algo para comer, para servir de acompanhamento à cachaça.
Mocinha, bem prendada, já ia ao fogão. Foi o “fim da picada!”. Mais uma vez vinha a
acontecer tudo o que aconteceu enquanto sua fase de criança. Enquanto tirava algo para
ele comer, a mando da tia, ele mexia no corpo dela como uma propriedade sua,
percorrendo suas mãos por todo ele, pressionando-a contra o fogão e depois contra a
parede, tentando explorar dele o máximo possível. Sua tia nem imaginava o que estava
acontecendo. A força e a voz pareciam ter sumido da sua natureza. Algo inexplicável! Mas
de repente, já não se encontrava ali uma criança, e sim uma quase mulher, que em seu eu,
ainda que transtornado e tomado pelas dúvidas da adolescência, criou força para gritar,
afastar e chorar de forma descompensada, clamando por uma grito de socorro. A tia chega
e o coloca para fora aos gritos, logo, quase todos ficam sabendo, mas o silêncio pairou no
ar, definitivamente, a história passou a não existir. Penetração? Não, não existiu, não deu
tempo, na verdade. Se chegaria a esse estágio, não se sabe. Mas a marca ficou em seu eu,
para sempre. Casos assim em família, não se fala, se cala, para sempre. Você de imediato
começa a pensar que as pessoas naturalizam esses tipos de acontecimentos.
Para a mãe foi o maior desgosto, pois não contou para o pai, que provavelmente
poderia matá-lo, ou morrer, de tanta raiva que iria sentir. Em sua persistência, em sua
forma de ver a vida, procurando viver ao máximo os momentos ofertados por ela, a
menina, hoje, mulher, busca forças sabe-se lá como, para dar continuidade a sua vida
fazendo o possível, pelo menos por alguns instantes para não lembrar das cenas que sua
mente lhe faz questão de recordar, ao escutar ou saber de noticias desse tipo. Sua pessoa
foi fragilizada, sua personalidade também, mas nunca entregou-se definitivamente às
tristes lembranças, sempre se reergueu. Uma luta constante com seu eu, com sua
consciência. Mas enxergou, que por ser mulher, sofre por inúmeras atitudes machistas e
preconceituosas, simplesmente pelo fato de ser mulher. Mas que tal situação precisa mudar
é importante a desconstrução dessa forma de pensar e agir relacionada ao gênero feminino.
Optou por ser mais uma do time daquelas que podem fazer a diferença na vida de muitas
outras mulheres, levando consigo a ferramenta do empoderamento feminino, através do
fortalecimento da luta pelos seus direitos, buscando sempre por um lugar de direito e de
respeito na sociedade.
A luta é contínua e constante, porque não árdua também. Mas a cada conquista,
seja ela individual ou coletiva, é necessário uma comemoração. É essencial que
proliferem-se as buscas por novas retomadas, pelos seus objetivos, pelo seu espaço, seja
em qualquer esfera, pela emancipação feminina, pelo não à violência, pelo
reconhecimento do verdadeiro lugar da mulher, que é onde ela quiser.
O LOBO EM PELE DE CORDEIRO
Essas foram frases vindas de uma conversa eventual, que fez por trazer a necessidade de
escrever, ou melhor, de compartilhar e ao mesmo tempo de chamar a atenção para a
importância da luta pela busca de um lugar na sociedade, independente da “bandeira” a
qual defende. Sendo extremamente de suma importância que as políticas publicas sociais
referidas aos diversos grupos sejam consolidadas, que a construção social referente a
determinados posicionamentos, de forma falaciosa e preconceituosa, seja desconstruída,
para que assim possa-se coviver minimamente em uma esfera social, igualitária e
pacífica.
Designa-se o homem como o lobo, por ter em meio a conversa, se apresentado de forma
sutil e atenciosa, porém, até então, com sua pele de cordeiro, fazendo apresentar-se no
fluir da conversa, sua inflexibilidade, referente ao assunto mulher e homossexualidade,
enfatizando assim toda sua intolerância.
---- Você não sabe o quanto o pai dele está decepcionado! Exclamou o lobo.
---- Deus que me livre desse mal!(homossexualidade) Preferiria ter um filho estuprador ou
ladrão! Exclamou o lobo.
---- Queria eu chegar em casa e ter minha mulher com mais duas na cama esperando por
mim!
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Graduada em Serviço Social. Formada pela UNINASSAU. E-mail: caletito@hotmail.com
---- Mas na verdade sabe de quem é a culpa? Da mãe!
---- Sabe por que eles ficam assim (homossexual)? Porque coloca desde cedo para lavar
prato, varrer casa, varrer banheiro, quando cresce vira isso!
Dói em escutar essas barbaridades, não tem como não constranger-se diante de tanta frieza
e naturalidade. Então você para pra observar e chega à conclusão de que o caminho é
longo, a luta é intensa, cheia de contradições e decepções, mas que a palavra desistir deve
ser excluída da sua vida, porque não vai ser fácil não.
O lobo em pele de cordeiro, é atencioso, educado, sorridente, que nem parece que em sua
essência existe tanto preconceito. Difícil demais aceitar esse posicionamento, onde
reproduz as atitudes machistas e intolerantes, que de forma desrespeitosa vem a coisificar
as pessoas, minimizando-as e subjugando-as. Tais comentários, só nos faz ter a certeza do
quanto incitasse a cultura do estupro, junto à cultura homofóbica, ambas ainda tão presente
em nossos dias, sendo esses dois grupos, vítimas, constantemente de um sistema patriarcal,
machista e estigmatizante, que vem a ditar normas conforme seus interesses.
Quantas Marias e Severinas que fazem e refazem suas lutas diariamente, quantas Dandaras
e Fridas tiveram e têm um posicionamento guerreiro e desafiador, quantas morreram e
foram abusadas, violentadas, vítimas de um capricho ou de um sentimento misógino.
Conforme seu posicionamento, percebe-se, como já foi dito, que não apenas a mulher
serviu de referência para o desrespeito, inserindo-se nesse quadro, também, a
homossexualidade. Em meio a esse dilema direcionado por um viés avassalador, sabe-se o
quanto é custoso para a vítima ter que conviver com as mais diferentes formas de
tratamento, forma essas embasadas pela intolerância. Imagina-se o quanto incomoda a
orientação sexual de uma pessoa, para alguns, quando se foge do “padrão estabelecido
socialmente”. Negando e repudiando a existência de pessoas que optam por se relacionar
com pessoas do mesmo sexo. Imagina-se o quanto está arraigado na sociedade a rejeição,
chegando por muitas vezes a um estado de ódio, expressando através da violência, a sua
raiva, o seu medo e seu desprezo, contribuindo para a materialização de práticas
homofóbicas e perpetuando dessa forma a violência de gênero.
Lembrando que, ninguém é preciso aceitar, só apenas, respeitar. Com isso, é bom passar a
refletir para se desconstruir essa forma de enxergar e tratar a pessoa, como que fosse um
ser de outro mundo. Vale ressaltar que a batalha da homossexualidade começa em casa,
com sua própria família, e logo após os muros que a cercam, por isso é bastante árdua.
Ninguém pode dizer que é digno de respeito quando se repudia uma classe e violenta,
ainda que seja verbalmente outra classe, mas, infelizmente, é frequente esse tipo de
transição de pensamento pelas pessoas que acham que o que é certo, é apenas o que lhe
convém dentro de seu padrão referencial, da sua ordem estabelecida, do seu “modinho” de
ver e viver a vida, mostrando-se resistente e intolerável ao que ele acha que vem a “servir
de ameaça” ao seu mundinho.
Fazendo mais um recorte relacionado à mulher, são pequenas atitudes machistas que
acabam fortalecendo a cultura do estupro, fazendo-se presente e bastante viva em nossas
vidas, enfatizando o desejo de posse, de propriedade de um ser (homem) sobre o outro
(mulher), ao mesmo tempo em que objetifica a mulher violentamente, descartando-a
conforme suas necessidades e desejos.
Diante disso, o bom senso, o amor ao próximo, o respeito pela pessoa, é fundamental. A
liberdade à orientação sexual se faz necessária e essencial, para uma convivência pacífica e
humana. Com isso o empoderamento passa a ser uma ferramenta de extrema importância,
para os mais diferentes grupos. Grupos esses oprimidos por um sistema construído
exclusivamente para o domínio masculino. Sistema esse, excludente e cruel, que faz criar
diante das mais sujas realidades, a luta contra um paradigma estabelecido, de maneira
errônea. De forma gritante, é perceptível a necessidade de uma luta direcionada, mais de
que nunca, pela igualdade e pelo repeito, seguindo em direção, sempre à emancipação
humana.
DE SANGUE, SUOR E LÁGRIMAS
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E-mail: rachfarias@gmail.com, Centro Universitário do Vale do Ipojuca - UNIFAVIP,
Graduanda em Direito. Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares sobre
Direitos Humanos e aluna pesquisadora da Iniciação científica “Direitos humanos, violência e
diversidade humana no período ditatorial, no Agreste de Pernambuco (1964-1985) ”, ambos
realizados no UNIFAVIP.
Não existia nada que desejasse mais do que replicar aqueles movimentos e calar multidões
com a beleza exalada pelos movimentos de seu corpo.
Os espelhos em torno de si refletiam seu olhar perdido em devaneio, revelando a
simplicidade presente no desejo cru que corroía seus pensamentos. Dançar não era apenas
algo transitório, ou capricho... Era seu eu cruelmente revelado através da delicadeza dos
movimentos arduamente ensaiados.
O 'click' do apagar das luzes fez com que o menino finalmente levantasse a cabeça,
revelando seu rosto perfeitamente angulado e seus olhos esverdeados, repletos de
esperança e sonhos, componentes conflitantes de um ser repleto de sonhos, cuja realidade
os corroía tão sutilmente que não eram percebidos.
- Parabéns – Proferiu diante do espelho sentindo um sorriso se espalhar pelas
feições sérias e concentradas. Infelizmente não existia ninguém ali para torcer por ele, no
fundo, isso já não importava, havia aprendido a se auto preencher tão completamente que
sua palavra era a única capaz de lhe atingir, tanto positivamente, quanto negativamente.
- Belo trabalho, continue se esforçando e talvez um dia consiga sair daqui –
Continuou o diálogo jogando a bolsa em suas costas, dando uma última olhada no próprio
rosto: Infantil e repleto de sonhos, exatamente como deveria ser.
[...]
Seus passos ecoavam pelos becos vazios, fazendo-o sapatear com delicadeza,
transformando a solidão em uma música tão suave quanto o seu ser. A bolsa começava a
pesar em suas costas e o suor escorrer pelo canto de sua testa, sua casa ainda se encontrava
alguns quilômetros de distância e o collant começava a aderir sua pele ao nível de
transformar-se em uma segunda pele.
- Halley - O chamado distante, mas bastante conhecido, fez com que o menino
acelerasse os passos, substituindo a leveza e paixão por pressa e confusão. - Tá fugindo,
gatinha? - Mais uma vez seus passos foram apressados, tornando-se tão urgentes quanto
um samba bem entoado.
-E essa roupinha - A voz dessa vez foi acompanhada por um empurrão que fez
com que o pequeno fosse parar alguns centímetros a frente, virando-se na direção de seu
agressor. - Se chama collant, vende em qualquer loja de ballet, caso esteja interessado -
Respondeu arrumando a bolsa em suas costas, preparando-se para mais comentários
idiotas. Eles não vieram. Mas um soco atingiu a face bem delineada antes mesmo que
Liam tivesse a chance de desviar.
-Acha que sou como você? - A voz voltou a atingi-lo, assim como um novo soco,
seguido de outro e mais outro e outro... A dor agora não atingia apenas seu rosto, fazendo-
o cair de joelhos sob o asfalto áspero, ornamentado com o sangue brilhante que escorria
de seu nariz.
-Esquisito, bicha - As palavras fizeram com que o pequeno olhasse para cima
tentando entender o que se passava, embora já tivesse sido chamado daquela palavra
anteriormente, não fazia ideia de seu significado. Forçou o pé contra o asfalto tentando
voltar a se levantar, sendo impedido por um chute que fez com que todo o seu corpo fosse
ao chão, inclusive a face já machucada.
Xingamentos e palavras desconexas continuavam a ser pronunciadas, mas Liam
já não conseguia entendê-las. A dor agora tomava conta de todo o seu corpo, fazendo-o
se encolher em posição de defesa. Chutes e socos continuaram a atingi-lo, fazendo-o
deslocar a mente daquele momento, prendendo-o em memórias cada vez mais dolorosas.
-Para - Pediu sentindo a voz falhar enquanto tentava engatinhar para longe do
rapaz, cujo tamanho e violência sempre acabavam por impedi-lo de dar qualquer passo. -
Por favor - Tentou implorar, mas foi calado por um soco que fez com que seu nariz fosse
deslocado, assim como suas costelas e todas as partes de seu corpo, ou pelo menos assim
lhe parecia.
Dor e escuridão eram as únicas coisas que o pequeno conseguia perceber. Já não
sabia quem lhe batia, o motivo, ou a quanto tempo se encontrava imerso naqueles
sentimentos, apenas se deixava ir; conduzindo seus pensamentos para momentos de
esperança, onde seu irmão apareceria e lhe abraçaria fazendo a dor parar.
No fim, até mesmo a esperança lhe havia sido tirada, até mesmo a dor parecia ter
sumido, apenas a escuridão lhe restava. Não resistia mais, nem era tão ruim, se ele fosse
ser sincero, era apenas uma presença contínua e irresistível.
II
***
- Okay... Já pode sair – Implorou fingindo uma irritação autoritária que ambos, ele
e o seu interlocutor, sabiam não existir, acabando por despertar risadas histéricas que
acabaram por inundar o pequeno quarto da felicidade latente que os envolvia.
- Maddie – Voltou a chamar assim que as risadas foram abafadas, sendo
substituídas pelo silêncio curioso que vinha preenchendo o local desde que o outro havia
se trancado no banheiro, duas horas atrás, sob o argumento de precisar lhe mostrar algo
importante.
A curiosidade não era a forma mais eficaz de ganhar sua atenção, contudo, até
mesmo ele já se encontrava impaciente com a demora, afinal duas horas era um tempo
um pouco longo demais e sua mente já havia formulado todos os tipos de explicações
loucas possíveis.
Sua mente encontrava-se pronta para emergir em mais uma teoria infundada
quando a porta finalmente se abriu...
A imagem lhe atingiu antes mesmo que seu cérebro encontrasse palavras para
definir algo. O seu queixo, ele tinha certeza, encontrava-se literalmente no chão. Em sua
frente, onde supostamente deveria estar seu namorado, encontrava-se uma mulher loira
de traços angelicais e beleza singular.
- O que achou? – A voz soou trêmula, carregada por uma insegurança tão palpável
quanto a tristeza que as acompanhava. O rapaz voltou a encarar – a agora namorada –
deixando que seus olhos percorressem cada pequeno pedaço de seu visual, absorvendo
cada detalhe como se encontrasse-se diante da Monalisa.
- You look sexy as hell – Foi a única coisa que conseguiu pronunciar antes de
puxar Maddie para si, evolvendo-lhe a cintura delicadamente. – Eu te amo – Sussurrou
deslizando os lábios de uma bochecha para outra. – Eu sempre vou amar – Reafirmou
finalmente capturando seus lábios.
***
- Olha só é o menino menina – O comentário, ainda que distante, fez com que o
rapaz se virasse de uma única vez sentindo uma veia pulsar em seu pescoço tamanha a
raiva que passou a lhe dominar. Não era fácil entender todas as situações que envolviam
gênero e sexualidade, ele mesmo havia sentido alguma dificuldade em compreender
Maddie, mas se havia algo que simplesmente não admitia era desrespeito.
O sorriso leve que antes adornava seus lábios sumiu rapidamente. A mão que antes
envolvia a cintura da menina, agora vagava ao seu lado enquanto seus passos ecoavam
pela rua, aproximando-o do comentarista ousado ao mesmo tempo que impunha a
distância entre ele e a loira.
- Liam, não – A voz suave e hipnotizante fez com que parasse exatamente no meio,
entre o ‘agressor’ e sua namorada. – Existe alguma dúvida que precise ser esclarecida? –
Inquiriu esvaziando o pulmão, deixando que parte de sua raiva fosse eliminada no
processo.
Em geral, ele não era violento, mas sabia muito bem onde comentários como
aquele poderiam levar. As cicatrizes em seu corpo e, principalmente, em sua alma, o
impediam de não sentir seu corpo estremecer ao menor sinal de violência, ainda que
simbólica. Acima de tudo, comentários direcionados a si, ele era capaz de aguentar, mas
jamais permitiria que nada acontecesse com Maddie.
- Olha só ela é nervosinha – O novo comentário fez com que Liam fechasse os
punhos como força, fechando os olhos por um milésimo de segundo, apenas o suficiente
para lembrar-se de que o ataque nunca era uma boa abordagem, ainda que quisesse muito.
- Nervoso – Corrigiu o outro, dando mais um passo em sua direção. – Caso não
tenha percebido, não me identifico como mulher. – Explicou voltando a liberar uma boa
carga de ar de seus pulmões.
- Então é bicha – O novo comentário atingiu-o tão profundamente que o cegou
por alguns segundos. Uma nova respiração profunda. Fechou e abriu os punhos algumas
vezes. – Na verdade, eu sou bissexual, como pode perceber, estou acompanhado de uma
mulher, isso não é motivo de vergonha, ou rebaixamento, ao contrário de seu
comportamento. O que lhe incomoda mais: o fato de eu estar acompanhado de uma
mulher linda, talentosa e bem-sucedida, ou o fato de você estar sozinho? – As palavras
voaram de seus lábios ao mesmo tempo que suas mãos finalmente voltavam a ser
espalmadas, revelando a ausência de tensão e raiva que antes o dominava.
- Ambos, eu diria. Então, vou te dar uma dica – Continuou sentindo o sorriso voltar
a alegrar suas feições bem desenhadas, afinal, aquele ser desprezível poderia até passar a
noite lhe xingando, mas isso não o impediria de voltar para casa e beijar o seu amor até
que estivessem tão cansados que adormecessem. – Pessoas gostam de ser respeitadas e
bem tratadas, não importa se são homens ou mulheres, todos precisam de amor.
- LIAM – O grito desesperado de Maddie atingiu seu tímpano no momento em
que seus olhos captaram o movimento conhecido do pulso do ‘agressor’. Lembranças
obscuras brincaram em sua mente ao mesmo tempo em que movimentava seu corpo,
desviando-se do murro certeiro que deveria atingir sua face.
- Sério? É assim que você quer resolver isso? – Inquiriu, liberando, agora, toda a
frustração que antes o dominava. – Eu vou te dar uma nova dica – As palavras foram
cuspidas de forma quase animalesca, exatamente como ele se sentia naquele momento.
Detestava qualquer tipo de violência, ainda mais as físicas, mas, depois de tudo o que lhe
aconteceu, isso não significava que não conseguisse se defender.
- Destreza e precisão não servem apenas para passos de dança e se você não quer
ver para o que mais elas servem, acho melhor aceitar minhas palavras e seguir seu
caminho. – Completou, agora, sentindo a mão de Maddie entrelaçar-se a sua, deixando
claro, ainda que sem palavras, que se encontrava ali e isso era mais do que poderia pedir.
Observou, um pouco incrédulo, quando o ‘agressor’ deu as costas. – Ele foi
mesmo? – Perguntou, ainda completamente céptico, recebendo os lábios da loira como
resposta para sua pergunta.
O mundo girou com intensidade, seu coração acelerou, tudo se tornou líquido e
dispensável, tornando aquele momento o melhor de sua vida. Liam voltou a apertar a
menina contra o seu peito, deixando que seus batimentos cardíacos se confundissem,
trambaleando no mesmo ritmo indecifrável e apaixonado de sempre.