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18 Modelo numérico de terreno

18.1 introdução
A possibilidade de descrever e representar o relevo de um terreno por meio de uma modelagem matemática foi um avanço
inestimável da Cartografia e, por conseguinte, da Geomática, que modificou substancialmente a maneira de se elaborar proje-
tos nas mais diversas áreas da Engenharia. Desde a sua criação na década de 1950, nos Estados Unidos, para servir de apoio à
automatização de projetos de vias de transporte, ela tem sido empregada nos mais variados ramos da Engenharia que necessi-
tam de informações altimétricas sobre o relevo do terreno. A lista de produtos derivados de tais modelos é extensa, incluindo:
traçado de curvas de nível, traçado de perfis e seções do terreno, cálculo de volumes, terraplenagem, projeto geométrico de
vias de transporte, linhas de transmissão de energia, mapas de declividades, vistas em perspectiva, apoio à retificação de ima-
gens fotogramétricas para geração de ortofotos, dentre muitas outras.
Modelar matematicamente a superfície de um terreno significa descrevê-la por meio da aplicação de uma ou mais funções
matemáticas, que descrevam a forma geométrica espacial dessa superfície, de acordo com métodos específicos de interpola-
ção, baseados em dados contínuos ou discretos da variável a ser modelada. As funções matemáticas empregadas são deno-
minadas funções de interpolação; a superfície representada é denominada superfície modelada e ao conjunto formado pelas
variáveis a serem modeladas, mais as funções de interpolação e mais os recursos de uso prático da superfície modelada, dá-se
o nome genérico de Sistema de Modelagem Matemática de Elevação.
Em função dos diferentes termos utilizados para os modelos matemáticos de elevação e para situar o leitor no assunto
específico a ser tratado neste capítulo é importante esclarecer as diferentes denominações utilizadas no meio cartográ-
fico para esses modelos. Tomando como referência a Norma da Especificação Técnica para Produtos de Conjuntos de
Dados Geoespaciais (ET-PCDG), primeiramente deve-se considerar a forma com a qual os dados de elevação estão
disponíveis. Se eles estiverem disponíveis na forma de uma imagem,1 ou seja, de forma contínua, a função matemática
a ser aplicada levará em consideração essa continuidade e o modelo gerado é denominado modelo digital de elevação.
Por outro lado, se os dados estiverem disponíveis na forma de pontos discretos, o modelo gerado é denominado modelo
numérico de elevação.
Considerando que para as aplicações correntes da Engenharia, na maioria dos casos, os dados de elevação a serem mode-
lados correspondem a pontos discretos da superfície de um terreno, neste capítulo serão tratados apenas os conceitos relativos
ao Modelo Numérico de Terreno (MNT).
O uso de um MNT se faz sempre por intermédio de um programa aplicativo de computador desenvolvido para tal
fim. Um programa desse tipo deve conter módulos para a captura dos dados, para a modelagem da superfície e para a
geração de produtos derivados. Além disso, para que possa ser considerado um MNT, ele deve ser capaz de considerar
os acidentes geográficos do relevo, tais como talvegues, espigões, divisores de água, taludes, muros de arrimo, zonas cons-
truídas e outros, os quais, em modelagem numérica de terreno, são denominados linhas notáveis ou linhas de quebra
(breaklines) do relevo. Caso contrário, trata-se apenas de um programa aplicativo de computador para a modelagem de
elevações. Outro aspecto que deve ser destacado sobre a modelagem numérica de terreno é o mau uso frequente que se
1 Também denominada formato raster.
e-2 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

faz do termo MNT. É comum encontrar referências ao termo para a descrição de conjuntos de pontos, principalmente
nos casos em que eles são gerados por escâneres laser. Nesses casos, se diz, erroneamente, que a nuvem de pontos é um
MNT, quando, na realidade, ela representa apenas um conjunto de pontos com coordenadas espaciais (X, Y, H) conheci-
das. Outro engano frequente é relacionar uma vista em perspectiva de um terreno como um MNT. Logicamente, não é!
Uma vista em perspectiva pode ter sido gerada por meio da superfície modelada e, nesse caso, ela representa uma vista
em perspectiva do modelo, mas não é o modelo. Outro engano comum é dizer que um MNT é um programa aplicativo
para o traçado de curvas de nível. Sim! Parcialmente, ele é; mas é muito mais do que isso. Traçar curvas de nível é apenas
um dos produtos gerados por meio de um MNT e nem é o mais importante.
De acordo com o exposto, o leitor deve notar que, ao se falar de um MNT, como o próprio termo indica, se está falando
da modelagem matemática do relevo do terreno, sem considerar os elementos geográficos e construtivos que se sobressaem
sobre ele, como vegetação, construções e outros da mesma natureza. Ao modelo que considera esses elementos dá-se o nome
de Modelo Numérico de Superfície (MNS), conforme ilustrados na Figura 18.1.
Da mesma forma, são utilizados os termos Modelo Digital de Terreno (MDT) e Modelo Digital de Superfície (MDS)2 para os
casos de os dados da superfície do terreno estarem disponíveis no formato raster.

Figura 18.1 • Modelo Numérico de Superfície e Modelo Numérico de Terreno.

Quando a superfície é modelada por meio de pontos ge-


rados automaticamente por escâneres laser aéreos ou por
técnicas de correlação de imagens fotogramétricas, em geral,
se tem um MNS. Para se obter o MNT, aplicam-se técnicas de
filtragem, por meio das quais todos os elementos não perten-
centes ao relevo são filtrados, conforme mostram as vistas em
perspectiva da Figura 18.2.
Conforme ilustrado na Figura 18.3, o esquema geral para a
produção de um modelo numérico de terreno envolve diver-
sas etapas antes de se obter um produto final para o seu uso
em Engenharia. Por esta razão, ele deve ser interpretado como
muito mais que um simples programa aplicativo, uma vez que
a qualidade final do produto gerado dependerá da qualidade de Figura 18.2 • Vistas em perspectiva de um MNS (à esquerda) e
cada uma das etapas. de um MNT (à direita, após filtragem).

2 Na literatura em inglês, em geral, utilizam-se os termos Digital Terrain Modeling (DTM) e Digital Surface Modeling (DSM).
Modelo numérico de terreno e-3

Assim, de acordo com a Figura 18.3, o estudo da modelagem nu-


mérica de terreno compreende as seguintes etapas inter-relacionadas e
indicadas no sentido ascendente na figura:
• coleta dos dados de campo;
• estruturação dos dados tendo em vista a modelagem;
• modelagem matemática por meio do emprego de funções de in-
terpolação;
• visualização e interpretações do modelo;
• geração de produtos derivados – Aplicações.
Discutem-se, na sequência, os detalhes técnicos de cada etapa.

Figura 18.3 • Tópicos a serem considerados na criação


de um MNT.
Fonte: adaptada de Hutchinson e Gallant (2000).

18.2 Coleta dos dados de campo


A coleta dos dados de campo consiste, basicamente, na determinação das coordenadas espaciais (3D) representativas da su-
perfície do terreno e da localização de seus acidentes geográficos. Pode ser considerada a etapa fundamental do processo de
geração de um MNT, a qual se baseia no uso dos diferentes métodos de determinação de coordenadas tratados ao longo dos
capítulos deste livro, conforme indicados a seguir:
• nivelamento geométrico ou trigonométrico;
• nivelamento com uso da tecnologia GNSS;
• escaneamento terrestre, aéreo ou RADAR;
• correlação de imagens fotogramétricas;
• digitalização de documentos cartográficos.
Após a determinação das coordenadas espaciais é
necessário localizar os acidentes geográficos do terreno
a ser modelado e dos elementos artificiais que o com-
põem. Estas informações devem estar incluídas como
vetores associados à malha (ou à nuvem) de pontos ge-
rados pelo levantamento topográfico. A inclusão desses
vetores se dá pela indicação das coordenadas espaciais
(3D) de seus vértices e pelas indicações das semirretas
que os unem, conforme ilustrado na Figura 18.4. Ob-
têm-se, assim, as linhas notáveis do terreno compostas
por breaklines, bordas do modelo e zonas mortas.
Na figura, os vértices dos triângulos representam
os pontos com coordenadas espaciais conhecidas.
Todas as técnicas apresentadas produzem como
resultado um grupo ou uma nuvem de pontos indivi-
duais com coordenadas (X, Y, H) conhecidas. Algumas
delas, como o escaneamento laser (aéreo e terrestre) e a
Figura 18.4 • Linhas notáveis do modelo.
correlação de imagens fotogramétricas, produzem nu-
vens de pontos extremamente densas, enquanto as demais produzem pontos esparsamente distribuídos sobre o terreno. É claro
que, independentemente da técnica empregada, a qualidade posicional desses pontos é um dos fatores decisivos na qualidade do
modelo numérico gerado. Outro fator importante a ser considerado, nesta etapa, é a distribuição dos pontos sobre o terreno. Ela
deve representar, o mais fielmente possível, todas as irregularidades do relevo. Pelo fato de a modelagem numérica basear-se em
funções de interpolação, as irregularidades não representadas serão desconsideradas no modelo.
e-4 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Dependendo da técnica de medição aplicada para a coleta de dados, obtém-se uma distribuição geométrica específica dos
dados. Em geral, os dados são distribuídos de duas maneiras, que são:
• distribuição regular de pontos (quadrada ou retangular);
• distribuição irregular de pontos.

Conforme ilustrado na Figura


18.5, a coleta de dados por meio de
uma distribuição regular de pon-
tos gera um conjunto de pontos
no espaço cartesiano regularmen-
te espaçados e com coordenadas
(X,Y,H) conhecidas. Esse tipo de
coleta de dados exige cuidados es-
peciais para a definição coerente
dos pontos no terreno.
A escolha do método de levan-
tamento a ser utilizado e o espaça-
mento entre os pontos, neste caso, Figura 18.5 • Coletada de pontos com distribuição regular. Exemplo de medição com estação total.
dependerão das dimensões da área
de projeto e da precisão almejada. É
consensual que quanto menor o es-
paçamento, maior a precisão. Notar
que, pelo fato de os pontos estarem
regularmente espaçados, poderá
haver oclusão de acidentes geográ-
ficos importantes, os quais devem
ser tratados separadamente para a
formação do modelo.
No caso da coleta de dados por
meio de uma distribuição irregular
de pontos, conforme ilustrado na Figura 18.6 • Coletada de pontos com distribuição irregular. Exemplo de medição com estação total.
Figura 18.6, as suas posições podem
ser escolhidas em campo, segundo critérios do operador de forma a representar fielmente as ondulações do terreno, ou au-
tomaticamente, no caso de nuvens de pontos geradas por meio de varredura laser ou correlação de imagens fotogramétricas.
Além dos pressupostos aqui indicados, o leitor deve notar que algumas técnicas de determinação de coordenadas espaciais
citadas produzem valores relativos ao relevo e outros relativos à superfície elevada do terreno (relevo + elementos naturais e
artificiais).

18.3 Estruturação dos dados


A estruturação dos dados coletados em campo consiste na geração de uma malha unindo os pontos com o objetivo de torná-los
adequados para a modelagem matemática, ou seja, para a aplicação das funções de interpolação para a criação do modelo.
É nesta etapa que se deve avaliar: (1) a exatidão com que os dados representam a rugosidade da superfície, (2) se todos os
elementos geográficos estão consistentemente representados e (3) se há consistência geométrica na malha gerada. Em suma, é
nesta etapa que se deve avaliar a qualidade posicional e a qualidade da distribuição dos dados coletados no terreno. O termo
malha, neste contexto, deve ser entendido como o conjunto de pontos com coordenadas (X, Y, H) conhecidas e distribuídos
no formato regular ou irregular sobre a área a ser modelada.

18.3.1 Estruturação dos dados em uma malha regular


A estruturação dos dados em uma malha regular pode resultar diretamente da distribuição geométrica dos dados coletados
em campo, ou seja, eles já estão distribuídos em um formato regular, conforme indicado na seção precedente ou, no caso de os
dados coletados estarem distribuídos irregularmente, por meio de um método de interpolação em função dos pontos vizinhos
aos vértices da malha a ser gerada, conforme indicado na Figura 18.7. Nesse caso, os valores das altitudes (HP) dos vértices da
malha são interpolados em função da posição (Xi, Yi) e do valor de (Hi) dos pontos vizinhos. O resultado final deste tipo de
estrutura de dados é a obtenção de uma malha regular com vértices de coordenadas (X, Y, H) conhecidas.
Modelo nuMérico de terreno e-5

Figura 18.7 • Dados estruturados segundo uma malha regular.

A estruturação dos dados em malha regular tem como deficiência nem sempre se adequar à complexidade do relevo do
terreno, necessitando de refinamentos da malha para melhorar a acurácia do modelo final.

18.3.2 Estruturação dos dados em uma malha irregular


Outra alternativa para a estruturação dos dados coletados em campo é utilizar uma malha de triângulos no lugar de uma ma-
lha regular. Nesse caso, os dados coletados em campo são unidos 3 a 3 de maneira a formarem uma rede de triângulos unindo
todos os pontos disponíveis para o modelo, conforme indicado na Figura 18.8b. Ao processo de formação dos triângulos dá-se
o nome de triangulação ou TIN (Triangular Irregular Network), conforme conhecido popularmente.
Para que a formação dos triângulos seja consistente para a geração de um MNT, existem três condições que devem ser
consideradas:
• para cada conjunto de pontos, o TIN gerado dever ser único;
• a forma geométrica dos triângulos deve ser otimizada para que cada triângulo seja o mais equilátero possível;
• cada triângulo é formado pelos vizinhos mais próximos, ou seja, a soma dos três lados deve ser a mínima possível.
Existem vários algoritmos disponíveis para a geração do TIN. Entre eles, o único que satisfaz essas três condições é o al-
goritmo de Triangulação de Delaunay, apresentado resumidamente na sequência. Os triângulos de Delaunay formam figuras
interligadas, onde os vértices são os pontos amostrais. Os triângulos são formados de maneira que sejam o mais equilátero
possível, e para um conjunto de dados só há uma triangulação otimizada possível. Para mais detalhes sobre esse algoritmo de
triangulação, o leitor deve consultar literatura especializada.
O algoritmo de Triangulação de Delaunay inicia-se com a escolha do ponto de partida (também denominado ponto de
rotação). Embora qualquer ponto possa ser escolhido, a sugestão é partir de um ponto situado no centro geométrico do
conjunto de dados. Após a escolha do primeiro ponto, o próximo passo consiste em encontrar o ponto mais próximo para
formar a base do primeiro triângulo. Em seguida, cria-se um círculo com diâmetro igual à distância entre os dois pontos
e verifica-se quantos pontos estão inseridos no círculo. Se houver somente um vizinho, ele é escolhido como o terceiro
vértice do triângulo. Se houver mais de um, escolhe-se aquele que formar o maior ângulo entre o vértice e a base preesta-
belecida. Caso não seja encontrado nenhum ponto no interior do círculo, o seu diâmetro é progressivamente aumentado
até que se encontre um ou mais pontos da vizinhança. A Figura 18.8 apesenta a sequência de passos para a formação da
Triangulação de Delaunay.

Figura 18.8 • Sequência de aplicação do algoritmo de Delaunay.


e-6 toPoGrAFiA PArA enGenHAriA

Passos:
1. Encontrar o vizinho mais próximo do ponto 1.
2. Criar um círculo com diâmetro igual à distância entre os pontos 1 e 2.
3. Expandir o círculo.
4. Verificar pontos que se encontrem no interior do círculo (3 e 4) e escolher aquele que forme o maior ângulo com a base (3).
5. Criar um círculo passando pelos pontos 1 e 3.
Repetir o processo para o ponto
2, e assim sucessivamente.
A Figura 18.9 exibe uma vista
em planta e em perspectiva com-
pleta da rede irregular (TIN) gerada
a partir do conjunto de pontos com
coordenadas (X, Y, H) conhecidas.
Cada vértice da malha corresponde
a um ponto medido sobre o terreno.
Após o estabelecimento da rede
de triângulos (TIN), ela deve ser ve-
rificada para possíveis edições e rea-
Figura 18.9 • Dados estruturados segundo uma malha irregular (TIN).
mostragem. Incluem-se, nesta etapa,
a inserção e/ou edição das linhas no-
táveis do modelo (breaklines, zonas mortas e bordas da malha) e a filtragem de valores considerados “suspeitos” para a represen-
tação da superfície. A inserção das linhas notáveis é feita indicando quais pontos pertencem a elas. Alguns programas de geração
da malha permitem que essa indicação seja feita durante a coleta de dados em campo, incluindo a indicação de “pertencente a
uma linha notável” como um atributo do ponto. Outros exigem que essa indicação seja manual. Seja qual for a maneira utilizada,
o resultado é a geração de uma malha irregular cujas linhas notáveis são incluídas como um lado da rede de triângulos, ou seja,
nenhum lado de triângulo deve cortá-la.
A Figura 18.10 ilustra um exemplo de edição de uma breakline a ser inserida na malha e a Figura 18.11 uma vista 3D de um
modelo numérico de terreno com suas breaklines.

Figura 18.10 • Exemplo de inclusão de uma breakline na Triangulação de Delaunay.

Figura 18.11 • Vista em perspectiva de um mode-


lo numérico de terreno com suas breaklines.
Modelo numérico de terreno e-7

A estruturação em malha triangular irregular (TIN) é mais complexa quando se opta pela inclusão de linhas notáveis.
Porém, quanto maior a quantidade dessas linhas, mais acurado será o modelo, pelo fato de ele representar melhor as irregu-
laridades do relevo.

18.4 Modelagem da superfície – funções de interpolação


Uma função de interpolação é, por definição, uma função contínua que descreve, aproximadamente, o comportamento mate-
mático de um fenômeno para o qual se conhecem apenas valores discretos. Para o caso de uma superfície tridimensional, ela
consiste em determinar a superfície que descreve aproximadamente o comportamento de um conjunto de pontos discretos
definidos por suas três coordenadas (X, Y, H). Supõe-se, geralmente, que as coordenadas (X, Y) são as variáveis independentes
e (H) a variável dependente, de forma que:
H  f  X ,Y  (18.1)
Ou seja, o valor da variável (H) pode ser calculado para quaisquer valores de (X, Y) pertencentes ao domínio da função.
Para o caso de um MNT, as funções de interpolação são usadas para determinar a altitude (HP) de um ponto (P) qualquer,
a partir dos valores conhecidos das altitudes (Hi) de seus vizinhos. Além disso, deve-se também considerar que a superfície de
um terreno possui algumas características peculiares, que impõem algumas condições de contorno para o modelo matemático
de interpolação, quais sejam:
• a superfície do terreno é contínua e suave;
• existe sempre uma correlação elevada entre os pontos vizinhos.
Nestes termos, os métodos de interpolação para a geração de um modelo numérico de terreno podem ser classificados em:
• pontuais;
• regionais.
Um método de interpolação é dito pontual quando o valor da variável (H) é calculado individualmente, em função dos
valores de (X, Y, H) de seus vizinhos.
Um método de interpolação é dito regional quando o valor da variável (H) é calculado em função de uma superfície de
interpolação ajustada em função dos valores de (X, Y, H) de um conjunto de pontos. Se a superfície de interpolação for gerada
em função de todos os pontos do conjunto, ela é denominada interpolação tridimensional global. Se o domínio do conjunto
de pontos for dividido em subdomínios, de forma a determinarem superfícies elementares de interpolação, definidas pelos
pontos de referência contidos em cada uma delas, ela é denominada interpolação tridimensional local.

18.4.1 Métodos de interpolação tridimensional pontual


Encontram-se disponíveis na literatura vários métodos de interpolação tridimensional pontual. Em geral, todos muito simples
de aplicar e com capacidade para produzirem bons resultados para os casos de conjuntos densos e bem distribuídos de pontos.
Apresentam-se a seguir alguns dos métodos de interpolação tridimensional pontual disponíveis na literatura e de interesse
para os propósitos deste livro.

18.4.1.1 Método de interpolação tridimensional pela média móvel


O método de interpolação pela média móvel consiste em calcular o valor a interpolar (HP), em função da média dos valores
(Hi) conhecidos de (n) pontos da vizinhança do ponto (P), conforme indicado na equação (18.2):
1 n
HP   Hi
n i 1
(18.2)

Trata-se de um método simples de aplicar, porém, com a desvantagem de ser empírico e exigir a definição de uma vizi-
nhança para a interpolação.

18.4.1.2 Método de interpolação tridimensional pela média móvel ponderada


O método de interpolação pela média móvel ponderada baseia-se também nos valores (Hi) conhecidos de (n) pontos da vizi-
nhança de (P). A diferença reside no fato de que, neste caso, se aplica um peso a cada vizinho, de acordo com a sua influência
no cálculo de (HP). Assim, tem-se:
n
H P   wi * H i (18.3)
i 1

sendo w1 o peso dado para a altitude (i).


e-8 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Na maioria dos casos, utiliza-se a distância entre o ponto (i) e o ponto (P) como indicador do peso, ou seja, menor distân-
cia, maior peso. Assim, tem-se:
1
dx
wi  n i (18.4)
1
i 1 di
x

em que:
di = distância entre o ponto (i) e o ponto (P);
x = coeficiente de ajuste dos pesos.

Exemplo aplicativo 18.1


Considerando as coordenadas cartesianas espaciais dos pontos indicados na Tabela 18.1, calcular a altitude do ponto (P) apli-
cando o método de interpolação tridimensional pelo princípio da média móvel ponderada, com coeficiente de ajuste de peso
igual a 2, em função das altitudes de seus vizinhos (A, ..., E).

ƒƒ Solução:
Para a solução deste exemplo é necessário estabelecer os pesos a serem dados às altitudes dos vizinhos do ponto (P), os quais
são determinados em função das distâncias entre o ponto (P) e cada um deles. O resultado dos cálculos efetuados está indicado
na Tabela 18.2.

Tabela 18.1 • Coordenadas conhecidas Tabela 18.2 • Valores parciais para a determinação dos pesos
Ponto X [m] Y [m] H [m] Distância H 1
Alinhamento wi wi * H i
P 11.556,118 15.468,963 – [m] [m] d2
A 11.588,256 15.511,332 815,325 PA 53,179 815,325 0,0004 0,185 150,917
B 11.599,247 15.450,458 817,269 PB 46,931 817,269 0,0005 0,238 194,238
C 11.520,053 15.436,214 816,567 PC 48,716 816,567 0,0004 0,221 180,110
D 11.527,000 15.510,000 817,864 PD 50,318 817,864 0,0004 0,207 169,092
E 11.560,000 15.410,000 815,943 PE 59,091 815,943 0,0003 0,150 122,322

1
d 2
 0, 0019

A partir dos resultados parciais apresentados na Tabela 18.2 e aplicando a equação (18.3), obtém-se a altitude do ponto (P)
conforme apresentado a seguir:
H P  150, 917  194, 238  180,110  169, 092  122, 322  816,679 m

18.4.2 Métodos de interpolação tridimensional regional


O método de interpolação tridimensional regional mais simples para ser aplicado na modelagem de uma superfície é o méto-
do de interpolação tridimensional global, que consiste em adotar um polinômio de grau elevado para descrever o comporta-
mento da superfície como um todo. Tem-se, assim,
n
H (x , y )  a
i , j 0
i, j xi y j (18.5)

em que:
ai, j = coeficientes do polinômio;
x, y = variáveis do polinômio;
n = grau do polinômio.
O problema na aplicação deste método de interpolação é que, à medida que o grau do polinômio aumenta, a superfície
interpolada torna-se rapidamente irreal, inviabilizando o uso do método para a modelagem numérica de terreno. Para evitar
tal ocorrência, sugere-se utilizar métodos de interpolação tridimensional regional local. Nesses casos, divide-se o domínio de
definição do modelo em vários subdomínios para, em seguida, descrever o comportamento de cada um deles, por meio
Modelo numérico de terreno e-9

de uma função de interpolação simplificada. Dessa forma, conforme apresentado na sequência, existem diferentes funções de
interpolação que podem ser aplicadas, dependendo da estruturação dos dados e da continuidade geométrica desejada para os
subdomínios. Apresentam-se na sequência as de uso comum em modelagem numérica de terreno.

18.4.2.1 Interpolação linear – rede de triângulos


Para os casos em que os dados foram estruturados segundo uma malha
irregular de triângulos, conforme descrito na Seção 18.3.2 – Estruturação
dos dados em uma malha irregular, a interpolação linear tridimensional
consiste em determinar um plano que contenha os três vértices de cada
triângulo, conforme exibido na Figura 18.12. Matematicamente, tem-se:

H  a0  a1 x  a2 y (18.6)

com:
ai = coeficientes do polinômio;
x, y, H = coordenadas dos vértices do triângulo.

Os valores dos três coeficientes (ai) do polinômio são calculados em


função das coordenadas (X, Y, H) conhecidas para cada vértice do triân-
gulo, ou seja, P1(x1, y1, H1), P2(x2, y2, H2) e P3(x3, y3, H3). Assim, têm-se:
H1  a0  a1 x1  a2 y1
Figura 18.12 • Interpolação linear triangular.
H 2  a0  a1 x2  a2 y2 (18.7)
H 3  a0  a1 x3  a2 y3
ou na forma de matriz:

 H1  1 x1 y1  a0 
    
 H 2   1 x2 y2   a1  (18.8)
 H 3  1 x3 y3  a2 
  
H = X * A (18.9)

e, assim,
A = X -1 H (18.10)
Obtêm-se, então, os valores dos coeficientes (a0, a1, a2) e, por conseguinte, o valor (HP) de qualquer ponto (P) de coorde-
nadas (XP , YP) conhecidas e situado no interior do triângulo, bastando, para isso, substituir as suas coordenadas (XP , YP) na
equação (18.6).

18.4.2.2 Interpolação bilinear – malha regular


Para o caso de os dados estarem estruturados segundo uma malha regular, conforme descrito na Seção 18.3.1 – Estruturação
dos dados em uma malha regular, a interpolação pode ser feita por intermédio de uma função polinomial bilinear de acordo
com a equação (18.11).
H  a0  a1 x  a2 y  a3 xy (18.11)
em que:
ai = coeficientes do polinômio;
x, y, H = coordenadas dos vértices do elemento da malha regular.

Os valores dos quatro coeficientes (ai) do polinômio são calculados em função das coordenadas (X, Y, H) conhecidas para
cada vértice do elemento da malha, ou seja, P1 (x1, y1, H1), P2 (x2, y2, H2), P3 (x3, y3, H3) e P4 (x4, y4, H4). Assim, tem-se:
1
a0  1 x1 y1 x1 y1   H1 
     
 a1   1 x2 y2 x2 y2  H2 
a2  1 x3 y3 x3 y3  H3  (18.12)
     
a3  1 x4 y4 x 4 y 4   H 4 
e-10 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Obtêm-se, então, os valores dos coeficientes (a0, a1, a2, a3) e, por conseguinte, o valor (HP) de qualquer ponto (P) de coor-
denadas (XP ,YP) conhecidas e situado no interior do elemento da malha, bastando para isso substituir as suas coordenadas
(XP ,YP) na equação (18.11).
A aplicação de funções de interpolação linear ou bilinear,
conforme descrito anteriormente, apresenta, contudo, um pro-
blema de continuidade entre as superfícies dos subdomínios. Por
serem facetas planas elas não são contínuas, conforme indicado
na Figura 18.13. Para solucionar este problema, é necessário uti-
lizar polinômios de maior grau, por exemplo, polinômios com 8,
12 e até 16 termos, conforme indicado na sequência.
Para o caso da utilização de um polinômio de 8 termos, ado-
ta-se o polinômio de interpolação biquadrático, conforme des-
crito pela equação (18.13).

H  a0  a1 x  a2 y  a3 xy  a4 x 2  a5 y 2  a6 x 2 y  a7 xy 2 (18.13)
Figura 18.13 • Descontinuidade das facetas planas de uma
Os termos (x3) e (y3) foram abandonados por conveniência rede triangular.
de cálculo.
Têm-se, assim, 8 coeficientes para serem calculados. A solução é utilizar uma malha regular com 8 pontos de referência,
ou seja, adicionando-se 4 novos pontos nos lados de cada elemento da malha, por meio, por exemplo, de uma interpolação
bidimensional cúbica.
Para a malha regular, pode-se também considerar o uso de um polinômio bicúbico com 16 termos, conforme indicado na
equação (18.14).

H  a0  a1 x  a2 y  a3 xy  a4 x 2  a5 y 2  a6 x 2 y  a7 xy 2  a8 x 2 y 2 
(18.14)
a9 x 3  a10 y 3  a11 x 3 y  a12 xy 3  a13 x 2 y 3  a14 x 3 y 2  a15 x 3 y 3

Têm-se assim 16 coeficientes para serem calculados. A solução proposta para este caso é utilizar a primeira e a segunda
derivadas parciais da função como condições de continuidade para os subdomínios. Para os casos de malhas regulares, as
primeiras derivadas em (X) e em (Y) são consideradas iguais às tangentes das junções entre dois subdomínios adjacentes em
ambas as direções e a segunda derivada é igualada às tangentes diagonais.
A solução para o cálculo dos 16 coeficientes é alcançada considerando que quatro equações são formadas pelos valores de
(Hi) de cada vértice do elemento quadrangular e as 12 equações remanescente são formadas pelas 3 derivadas em cada vértice.
Obtêm-se, então, os valores dos coeficientes (ai) e, por conseguinte, o valor (HP) de qualquer ponto (P) de coordenadas (XP ,YP)
conhecidas e situado no interior do elemento da malha, bastando para isso substituir as suas coordenadas (XP ,YP) na equação (18.14).
Para os casos de redes triangulares, existem também soluções propostas com o uso de polinômios bicúbicos. A metodo-
logia aplicada, entretanto, exige cálculos matemáticos um pouco mais sofisticados do que os precedentes. Por esta razão, eles
não foram incluídos neste texto. O leitor interessado deverá consultar literatura especializada.
Além dos modelos de interpolação citados, o leitor poderá encontrar vários outros que podem ser aplicados para a modelagem
numérica de terreno. Entre eles, se destaca o Método de Interpolação Krigagem ou Krigeagem. Esse método parte do princípio
de que a superfície a ser gerada é baseada em uma estrutura de correlação espacial. Essa superfície apresenta três componentes:
um estrutural, associado a um valor médio constante ou a uma tendência (função determinística); um termo estocástico, que
varia localmente e depende espacialmente do componente estrutural; e um ruído aleatório não correlacionado, normalmente
distribuído. Vale ressaltar que essa interpolação só pode ser implementada caso os componentes supracitados sejam detectados.
Tal detecção é efetuada por meio de um gráfico, chamado variograma, obtido a partir dos pontos medidos. Embora disponível
em muitos programas aplicativos de modelagem numérica de terreno, este método não será discutido neste livro.

18.5 Visualização do modelo


Para que o modelo numérico de terreno possa ser exibido graficamente, é necessário lançar mão de algum método de repre-
sentação gráfica da modelagem matemática. Utiliza-se, neste caso, uma das seguintes formas tradicionais de representação
gráfica de superfícies:
• representação por meio de curvas de nível;
• representação por meio de sombreamentos;
• representação por meio de vistas em perspectiva.
Apresentam-se na sequência as principais características geométricas de cada uma delas.
Modelo numérico de terreno e-11

18.5.1 Representação por meio de curvas de nível


Conforme já descrito no Capítulo 13 – Representação do relevo, a técnica de representação do relevo por meio de curvas de
nível é a mais utilizada mundialmente em projetos de Engenharia. Razão pela qual, na maioria das vezes, ela constitui a forma
preferida de visualização de modelos numéricos de terreno pelos projetistas.

18.5.2 Representação por relevo sombreado


A representação, neste caso, é plana e realizada por meio de
uma iluminação hipotética da superfície do terreno a par-
tir de determinado azimute e uma altitude do Sol. A Figura
18.14 ilustra um exemplo clássico desse tipo de representação
gráfica do relevo. Trata-se de uma forma de representação
conveniente para a inspeção cartográfica do modelo, embora
ela possa facilmente ocluir pequenas áreas do relevo.

Figura 18.14 • Representação de um MNT por relevo sombreado.

18.5.3 Representação por meio de vistas em perspectiva


A forma de representação do MNT por meio de vistas em
perspectiva, conforme ilustrado na Figura 18.15, é uma ma-
neira de representação de fácil entendimento pelos usuários
não profissionais. Embora ela não permita que se tenha uma
vista completa de todas as partes do terreno, ela possibilita
que áreas de destaque sejam visualizadas como uma proje-
ção 3D da superfície, eliminando, assim, qualquer possibili-
dade de oclusão de áreas do terreno. A possibilidade de girar
a vista do terreno em qualquer direção no espaço é a sua
maior qualidade.

Figura 18.15 • Representação de um MNT por meio de vistas em perspectiva.


Fonte: DamienGeso | iStockPhoto.

18.6 Interpretação dos resultados


A interpretação dos resultados da modelagem numérica de um terreno consiste em explorar o modelo com o objetivo de
confirmar a sua adequabilidade à superfície real modelada e refinar as hipóteses adotadas. Para tanto, a visualização por meio
de vistas em perspectiva é uma maneira de interpretar os resultados obtidos com a modelagem numérica que pode ser desta-
cada. A interpretação, neste caso, consiste em uma verificação criteriosa da conformidade do modelo com as rugosidades do
relevo, por meio de observações detalhadas de áreas de interesse do modelo. A interpretação da conformidade dos acidentes
geográficos é a principal delas. Outra maneira de interpretar os resultados é pela geração das curvas de nível do modelo. A
conformação das curvas de nível pode ser um indicador de adequação do modelo ao relevo representado. Busca-se, neste caso,
a existência de picos ou zonas planas muito extensas. Em ambos os casos, a interpretação dos resultados é realizada de forma
visual e manual.

18.7 Aplicações de um MNT – produtos derivados


A lista de produtos derivados de um MNT, para os propósitos da Engenharia, é extensa. Não é necessário ser um especialista
para imaginar as vantagens de se ter em mãos um modelo que descreva o comportamento geométrico da superfície de um
terreno. Por esta razão, foi desenvolvida uma infinidade de programas aplicativos para a modelagem numérica de terrenos,
para as mais diversas aplicações da Engenharia. A escolha do melhor programa dependerá do uso que se fará dele e dos resul-
tados esperados. Em geral, para os propósitos da Engenharia Civil, um MNT deve ser capaz de gerar, no mínimo, os seguintes
produtos derivados:
e-12 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

• representação do relevo em curvas de nível;


• determinação de perfis longitudinais e seções transversais de alinhamentos traçados sobre o modelo;
• determinação de altitudes de pontos;
• cálculo de volumes;
• representação 3D do relevo modelado.
Além dos produtos básicos citados, dependendo da aplicação desejada, o Engenheiro pode adicionar outros aplicativos à
lista, por exemplo:
• geração de mapas de declividades e de recursos hídricos;
• determinação do fluxo hidráulico;
• determinação de redes de drenagem;
• determinação de linhas de visadas.
Por meio dos produtos que podem ser gerados mediante o uso de um MNT, existem programas aplicativos que se utilizam
deles para auxiliarem no desenvolvimento de projetos de engenharia, por exemplo:
• projetos de vias de transporte;
• projetos para a implantação de dutos;
• projetos para redes elétricas de alta-tensão;
• projetos para implantação de torres de telefonia celular;
• projetos de terraplenagem e de barragens;
• projetos urbanísticos (loteamentos e outros);
• geração de ortofoto;
• projetos de hidrologia;
• projetos de redes de drenagem de águas pluviais;
• projetos de redes de distribuição de água potável;
• projetos de redes de coleta de esgoto;
• automatização de máquinas de terraplenagem;
• agricultura de precisão;
• simulação de voo.
Para cada aplicativo existem métodos e técnicas de extração de informações específicas do MNT. O leitor interessado em
conhecer tais métodos e técnicas deve consultar outras referências especializadas. Nesta seção, discute-se uma das técnicas
usadas para o traçado de curvas de nível, o traçado de perfis de terrenos por meio de MNT e os principais elementos que
devem ser avaliados para o uso de um MNT em projetos de vias de transporte. A técnica para o cálculo de volumes por meio
de um MNT está descrita na Seção 17.6 – Cálculo de volume por meio de modelos numéricos de terreno.

18.7.1 Traçado de curvas de nível por meio de um MNT


O primeiro conceito a ser considerado nesta seção é o entendimento de que as curvas de nível geradas por meio de um MNT
são apenas isolinhas para a visualização do relevo. A superfície modelada é a referência para qualquer dado gerado a partir do
modelo. Dessa forma, não faz muito sentido preocupar-se com detalhes da representação das curvas como se fossem curvas
desenhadas manualmente a partir de métodos tradicionais de traçado de curvas de nível.
A técnica usada para o traçado de curvas de nível por meio de MNT, geradas por meio de malhas regulares ou por meio de
um TIN, é praticamente a mesma, a qual inclui:
• escolher o ponto inicial para o traçado;
• interpolar as coordenadas dos pontos de interseção de cada curva com os lados dos elementos da malha ou do TIN;
• traçar as curvas;
• suavizar o traçado das curvas, se necessário, por meio de funções de interpolação.
Apresentam-se a seguir os detalhes algébricos de cada uma das etapas citadas.

18.7.1.1 Escolha do ponto inicial para o traçado das curvas de nível


O primeiro passo para escolher o ponto inicial para o traçado das curvas de nível é conhecer os valores da altitude máxima e mínima
do terreno para determinar qual é a curva de nível de maior valor e a curva de nível de menor valor a serem traçadas. Têm-se assim,
H mín
hmín int 1 * h (18.15)
h
H máx
hmáx int *h (18.16)
h
Modelo numérico de terreno e-13

em que:

hmín = menor valor da altitude da curva de nível;


hmáx = maior valor da altitude da curva de nível;
Hmín = valor da menor altitude do terreno;
Hmáx = valor da maior altitude do terreno;
Dh = intervalo das curvas de nível.
O próximo passo consiste em escolher a curva de nível a ser traçada e buscar todas as bordas interceptadas por ela. Para
saber se uma borda contém uma ou mais curvas de nível, pode-se usar as equações apresentadas a seguir:

Se H P1  h  H P2 ou H P1  h  H P2 → a curva passa pela borda P1P2

=
Se H P1 h=
ou H P2 h → a curva passa pelo vértice (P1) ou (P2)

Caso contrário, a curva não passa pela borda considerada.


Com:
P1, P2 = vértices da borda considerada;
h = altitude da curva de nível considerada;
HPi = altitude do vértice (Pi) da borda.

18.7.1.2 Interpolação do ponto de interseção da curva de nível


A determinação do ponto de interseção da curva de nível com a borda do
elemento da malha regular ou do TIN é feita por meio de uma interpolação
linear entre os valores dos vértices da borda. Assim, têm-se:
 h  H A  
X h  X A    *  X B  X A  (18.17)
 H B  H A  
 h  H A  
Yh  YA    * YB  YA   (18.18)
 H B  H A  

Conhecendo o ponto de entrada da curva no elemento da malha regular


ou do TIN, o próximo passo é determinar o ponto de saída do elemento, e
assim por diante, conforme exibido na Figura 18.16.

Figura 18.16 • Desenho da curva de nível sobre


uma malha de elementos triangulares.

18.7.1.3 Desenho da curva de nível


O desenho da curva de nível é feito baseando-se nos pontos de entrada e de saída de cada curva de nível. No caso de
uma malha regular, pode haver ambiguidade de resultados. Neste caso, deve-se verificar a interpolação nas diagonais
do elemento. O traçado de uma curva termina quando ela atinge a borda do modelo ou quando ela se fecha no seu
ponto inicial.

18.7.1.4 Suavização do traçado da curva de nível


As curvas desenhadas de acordo com o procedi-
mento indicado são segmentos de retas. Para que
elas possam ter um aspecto mais suave existem
dois procedimentos que podem ser aplicados,
conforme indicado a seguir:
• subdividir o elemento do subdomínio em
elementos menores, conforme exibido na
Figura 18.17;
Figura 18.17 • Suavização de uma curva de nível pela subdivisão de domínios.
e-14 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

• aplicar uma técnica de suavização de curvas por meio


do uso de um polinômio de grau superior como uma
spline cúbica, por exemplo.
A Figura 18.18 apresenta um exemplo de uma rede de ele-
mentos triangulares (TIN) com as respectivas curvas de nível
suavizadas sobrepostas.

Figura 18.18 • Exemplo de um TIN com curvas de nível sobrepostas.

18.7.2 Traçado de perfis de alinhamentos a partir de um MNT


O traçado do perfil de um alinhamento por meio de um MNT é um processo simples de interpolação de altitudes em função das
coordenadas (X, Y) conhecidas de pontos predeterminados do alinhamento. Os passos para o traçado do perfil são os seguintes:
• determinação do MNT da superfície do terreno considerado;
• traçado do alinhamento sobre o desenho plano da superfície modelada (ver Capítulo 23 – Curvas horizontais e verticais,
para mais detalhes sobre o traçado de alinhamentos de vias de transporte);
• especificar as configurações para o desenho do perfil, tais como, estaqueamento,3 escalas e outros;
• interpolação dos valores das altitudes dos pontos característicos do alinhamento;
• desenho do perfil.

A Figura 18.19 mostra um exemplo do traçado de um perfil do alinhamento (greide) AB definido sobre um MNT.

Figura 18.19 • Exemplo do traçado de um perfil de terreno por meio de um MNT.

3 Ver Capítulo 23 – Curvas horizontais e verticais para mais detalhes sobre estaqueamento.
Modelo numérico de terreno e-15

18.7.3 MNT como auxílio para o projeto de vias de transporte


O uso de um MNT como apoio para a elaboração de um projeto geométrico de uma via de transporte é assunto conhecido desde
os primórdios da aplicação desta técnica. A sua importância em projetos geométricos é tão grande que praticamente não existem,
atualmente, vias de transporte terrestre que não sejam projetadas sem o auxílio de um MNT. Neste contexto, apresentam-se, a
seguir, os principais aspectos a serem considerados no projeto de uma via de transporte por meio de um MNT.
A escolha do traçado de uma rodovia ou de uma ferrovia, por exemplo, geralmente, é realizada sobre uma carta topográfi-
ca, em escala apropriada. Em seguida, procede-se ao levantamento do relevo e dos detalhes do terreno no entorno do traçado
proposto, por meio de um método de levantamento topográfico e de nivelamento adequados. A partir dessa etapa inicia-se a
aplicação do MNT, cujo primeiro passo é a geração do modelo matemático a partir dos dados levantados em campo. Em se-
guida, com a modelagem terminada e verificada, inicia-se o lançamento do projeto geométrico da via sobre o modelo gerado,
etapa em que, geralmente, são também traçadas as curvas de nível representativas da superfície do terreno, para serem usadas
como apoio visual para o lançamento das diretrizes do projeto.
Após o lançamento das diretrizes geométricas do projeto, definem-se as posições das tangentes e das curvas horizontais
da via sobre a representação gráfica plana do modelo numérico. O resultado deste posicionamento é a obtenção do perfil
longitudinal do terreno por onde o eixo da via irá passar. O perfil do terreno assim definido é usado, posteriormente, para a
definição do traçado vertical da via, composto por rampas e curvas verticais.
A próxima etapa do projeto é a definição do estaqueamento para o lançamento das seções transversais da via. Por meio do
estaqueamento e da definição da seção transversal, considerando todos os elementos transversais do projeto, tais como leito
da via, acostamentos, drenagens e taludes, têm-se os elementos de projeto prontos para serem lançados sobre o MNT.
O projeto é definido por meio da escolha do melhor traçado em planta e em perfil considerando as diretrizes do projeto,
as condições de visibilidade da via e os volumes de corte e aterro gerados.
A automatização do projeto se dá pelo
fato de as interpolações dos eixos verti-
cal e horizontal ocorrerem praticamente
em tempo real. Cada vez que o projetis-
ta altera o traçado, o programa aplicati-
vo interpola o novo traçado horizontal e
vertical e considera todas as variantes da
seção transversal da via, produzindo um
novo modelo numérico da mesma, que,
ao ser sobreposto ao MNT, gera os dados
de terraplenagem, os desenhos do proje-
to, vistas 3D e, inclusive, um simulador de
movimento sobre a via, dependendo do
desempenho do programa aplicativo uti-
lizado. A Figura 18.20 mostra uma vista Figura 18.20 • Vista em perspectiva de uma rodovia projetada com base em um MNT.
em perspectiva de uma rodovia projetada
com o auxílio de um MNT.

18.8 Acurácia de um MNT


A indicação da acurácia da modelagem numérica de terreno é ainda um tema controverso. Embora as pesquisas nessa área
tenham se iniciado em 1950, ainda existe pouco consenso com relação a essa questão. A acurácia do modelo aplicado depende
da morfologia do terreno, da densidade dos pontos, da precisão do levantamento e do método de interpolação utilizado. O
leitor encontrará na literatura vários modelos que permitem determinar valores de acurácia, porém, todos eles exigem análises
estatísticas elaboradas. O método mais simples ainda é a verificação por meio de pontos de checagem, ou seja, por meio de
alguns pontos de coordenadas (X, Y, H) conhecidas estrategicamente selecionados e que podem ser tomados como valores de
referência. Assim, considerando que os erros grosseiros e os erros sistemáticos foram eliminados do modelo, considera-se a
raiz quadrada do erro quadrático médio como indicador de qualidade do modelo. A decisão de aceitar ou não a modelagem
realizada dependerá do propósito para o qual o MNT está sendo elaborado.
19 Projeção cartográfica

19.1 introdução
Conforme destacado anteriormente neste livro, as cartas, os mapas e as plantas topográficas são representações planas da
superfície curva terrestre. Eles são obtidos por meio da aplicação de modelos matemáticos diversos, que variam em função
das dimensões da superfície terrestre a ser representada, como já discutido em capítulos precedentes. Entre os modelos dis-
poníveis, se destacam as projeções cartográficas, que tratam fundamentalmente do estabelecimento de relações matemáticas
e gráficas que permitem representar a superfície de referência elipsoidal terrestre global, ou parte dela, sobre uma superfície
plana com as menores deformações possíveis. A superfície de referência elipsoidal, neste caso, é representada por um sistema
de coordenadas geodésicas (φg, λg), enquanto a superfície plana é definida por um sistema de coordenadas plano específico,
que varia em função da projeção cartográfica adotada. Para a Engenharia, em geral, se prefere aquelas definidas sobre um
sistema de coordenadas planorretangular (X, Y), de forma que:

 
X  f1  g , g
Y  f2  ,  
g g
(19.1)

As funções de mapeamento (f1) e (f2) podem possuir infinitas formas. O desafio é escolhê-las de maneira a minimizar
as deformações geométricas no modelo de representação plana. Sempre haverá deformações e elas crescem à medida que a
superfície representada aumenta. Porém, é possível preservar algumas características geométricas dos dados espaciais repre-
sentados, por exemplo, os ângulos, as áreas ou as distâncias. A escolha de qual característica será preservada dependerá da
finalidade para a qual o modelo da representação plana está sendo criado.
Existe na literatura uma infinidade de sistemas de projeções cartográficas e muitos livros dedicados exclusivamente ao
tema. Entre os sistemas de destaque, o Sistema de Projeção UTM, por ser o mais simples de usar e aquele que se adapta melhor
às necessidades da Engenharia, é o mais utilizado mundialmente e o recomendado para os mapeamentos no território brasi-
leiro. Por esta razão, este capítulo trata exclusivamente desse sistema, apresentando ao leitor os seus fundamentos matemáticos
e como utilizá-los convenientemente em seus projetos.

19.2 Classificação das projeções cartográficas


As projeções cartográficas são classificadas por diferentes maneiras, que variam em função de critérios específicos relaciona-
dos às características geométricas e gráficas de sua construção. Apresentam-se, na sequência, as principais classificações para
os propósitos da Geomática aplicada à Engenharia.

19.2.1 Classificação em função da grandeza geométrica preservada


As grandezas geométricas que podem ser medidas em uma representação topográfica (planta, mapa ou carta) são as distân-
cias, as áreas e os ângulos (forma). No caso de uma representação por meio de uma projeção cartográfica, a representação
ideal seria aquela que mantivesse inalteradas todas essas grandezas simultaneamente. Porém, nenhuma delas possui essa
Projeção cartográfica e-17

qualidade. As grandezas preservadas são excludentes. Assim, em função da grandeza geométrica preservada, as projeções
cartográficas podem ser classificadas como indicado a seguir:
• Projeção conforme,1 aquela que conserva os ângulos e, por conseguinte, a forma das figuras geométricas representadas. Este
é o tipo de projeção adotada para os projetos de Engenharia, uma vez que ela permite estabelecer uma relação direta entre
os ângulos medidos no terreno (superfície topográfica) e os seus valores na superfície plana (projeção cartográfica);
• Projeção equivalente, aquela que conserva as áreas, ou seja, uma área determinada sobre a projeção cartográfica é igual,
em escala, a sua correspondente no terreno. Este é o tipo de projeção usado para o estabelecimento de cartas em escalas
reduzidas como para um atlas geográfico, por exemplo;
• Projeção equidistante, aquela que conserva as distâncias, ou seja, uma distância determinada sobre a projeção cartográ-
fica é igual, em escala, a sua correspondente no terreno.
Além das projeções citadas existem outras, que fogem do escopo deste livro. Os leitores interessados deverão consultar
literatura especializada.

19.2.2 Classificação em função da posição do centro de projeção


O centro de projeção em uma projeção cartográfica corresponde, graficamente, ao ponto nodal a partir do qual partem os
raios imaginários que cortam a superfície do elipsoide e interceptam a superfície do mapa. Dependendo da posição desse
centro, tem-se uma classe diferente de projeção cartográfica:
• Projeção gnomônica, aquela
em que o centro de proje-
ção é o centro da Terra;
• Projeção estereográfica, aque-
la em que o centro de pro-
jeção é o polo oposto ao
ponto de tangência da su-
perfície de projeção;
• Projeção ortográfica, aquela
em que o centro de proje-
ção está no infinito.
A Figura 19.1 ilustra as três
classes de projeções cartográfi-
Figura 19.1 • Classes de projeções cartográficas em função da posição do centro de projeção.
cas citadas.

19.2.3 Classificação em função do tipo de superfície de projeção


Em função do tipo de superfície de projeção, as projeções cartográficas podem ser classificadas conforme indicado a seguir:

• Projeção cilíndrica, aquela em que a modela-


gem matemática considera que a superfície do
elipsoide de referência é projetada sobre um ci-
lindro tangente ou secante a ela, o qual é pos-
teriormente desenvolvido para se obter a repre-
sentação cartográfica plana, conforme indicado
na Figura 19.2.

FIGURA 19.2 • Desenvolvimento da projeção cilíndrica.

1 A Projeção Conforme foi desenvolvida pelo matemático e geodesista alemão Carl Friedrich Gauss (1777-1855). Ela passou a ser utilizada em
Geodésia a partir do desenvolvimento matemático de J. H. L. Krüger (1857-1923). Em homenagem a eles, a Projeção Conforme de Gauss e
suas coordenadas foram batizadas, na década de 1920, de Projeção e Coordenadas de Gauss-Krüger, na Alemanha e, mais tarde, nos demais
países da Europa.
e-18 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

• Projeção cônica, aquela em que a


modelagem matemática conside-
ra que a superfície do elipsoide de
referência é projetada sobre um
cone tangente ou secante a ela, o
qual é posteriormente desenvolvi-
do para se obter a representação
cartográfica plana, conforme in-
dicado na Figura 19.3.

Figura 19.3 • Desenvolvimento da projeção cônica.

• Projeção azimutal, aquela em que a


modelagem matemática considera que
a superfície do elipsoide de referência
é projetada sobre um plano tangente
ou secante a ela, conforme ilustrado
na Figura 19.4.

Figura 19.4 • Desenvolvimento da projeção azimutal.

19.2.4 Classificação em função da orientação da superfície de projeção


Em função da orientação da superfície de projeção, as projeções cartográficas podem ser classificadas conforme indicado a
seguir para as projeções cilíndricas:
• Projeção cilíndrica normal: o eixo do
cilindro coincide com o eixo de ro-
tação da Terra;
• Projeção cilíndrica transversa: o eixo
do cilindro coincide com o plano do
equador;
• Projeção cilíndrica oblíqua: o eixo do
cilindro é oblíquo com relação ao
eixo de rotação da Terra.
A Figura 19.5 ilustra as três classes de
projeções cartográficas citadas.

Figura 19.5 • Classes de projeções cartográficas em função da orientação da superfície


de projeção.
Projeção cartográfica e-19

19.2.5 Classificação em função da posição relativa da superfície de projeção


Em função da posição relativa da superfície de projeção, as projeções cartográficas podem ser classificadas conforme in-
dicado a seguir:

• Tangente, aquela em que a modelagem matemática


considera que a superfície de projeção é tangente ao
elipsoide de referência, conforme ilustrado na Figu-
ra 19.6. O fator de escala, neste caso, é igual a 1 na
linha de tangência e aumenta à medida que a área
de interesse se afasta dela. O leitor pouco habituado
com a definição de fator de escala em projeções car-
tográficas deverá consultar a Seção 19.7 – Fator de
escala da Projeção UTM.

Figura 19.6 • Superfície de projeção tangente à superfície de referência.

• Secante, aquela em que a modelagem matemática considera que a


superfície de projeção é secante ao elipsoide de referência, confor-
me ilustrado na Figura 19.7. O fator de escala, neste caso, é menor
que 1 no centro da projeção, aumenta até chegar a 1 nas proximi-
dades das linhas de secância e torna-se superior a 1 à medida que
a área de interesse se afasta delas.

Figura 19.7 • Superfície de projeção secante à superfí-


cie de referência.

19.3 Sistema de Projeção UTM (Universal Transversa de Mercator)


O Sistema de Projeção UTM baseia-se na projeção conforme de Gauss-Krüger modificada. Considera-se que ele tenha sido utili-
zado em grande escala durante a Segunda Guerra Mundial e aprimorado pelo Serviço de Cartografia do Exército Norte-america-
no (US Army Map Service – AMS), após a guerra. A sua principal vantagem é que ele permite representar grandes áreas da super-
fície terrestre, sobre um plano, com poucas deformações e com apenas um grupo de equações para realizar as transformações de
coordenadas. Ele utiliza um sistema de coordenadas planorretangular, o que facilita o seu uso para as aplicações em Engenharia.
A União Internacional de Geofísica e Geodésia (IUGG), na sua assembleia geral realizada em Bruxelas, em 1951, reco-
mendou o uso das coordenadas planas do tipo Gauss-Krüger, na versão da Projeção UTM, para os cálculos geodésicos e
na construção de cartas e mapas. Com essa resolução, o Sistema de Projeção UTM tornou-se o sistema de projeção mais
utilizado mundialmente.

19.3.1 Características da Projeção UTM


A Projeção UTM é uma projeção cilíndrica, conforme,2 transversa e secante, definida por um grupo de equações, com o obje-
tivo de converter pares de coordenadas geodésicas (φg, λg) em pares de coordenadas planorretangulares (N, E). Graficamente,
ela pode ser representada conforme ilustrado na Figura 19.8. Por ser uma projeção cilíndrica secante, existem duas linhas de
interseção entre o cilindro e a superfície de referência, que são as linhas AB e CD da Figura 19.8.

2 A Projeção UTM mantém os ângulos e a forma das figuras para pequenas áreas, como aquelas utilizadas em projetos de Engenharia.
e-20 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Figura 19.8 • Representação gráfica da Projeção UTM.

Existem assim três regiões de projeção: duas projetadas com fator de escala maior que 1 e uma com fator de escala menor
que 1. Os pontos situados sobre as linhas AB e CD são projetados sem deformações. Ao fator de escala da Projeção UTM
denomina-se, neste livro, de (kUTM).
Para que as deformações sejam controladas, a área de projeção da superfície elipsoidal sobre o cilindro é restrita a 6° de
amplitude, determinando várias parcelas de projeção sobre ele, denominadas fusos, que variam de posição em longitude, à
medida que o cilindro é girado horizontalmente. Cada fuso é representado por um número que o identifica ou pela longitude
do seu meridiano central,3 conforme indicado na Figura 19.9.

Figura 19.9 • Fusos da Projeção UTM.

Conforme já destacado, a representação gráfica do Sistema de Projeção UTM é feita sobre um sistema de coordenadas planor-
retangular, denominado Sistema de Coordenadas UTM. Para identificá-lo, o eixo das abcissas é denominado Este e representado
pela letra (E) e o eixo das ordenadas é denominado Norte e representado pela letra (N). Simplificadamente, são denominadas
coordenadas UTM (N, E). A malha retangular desse sistema de coordenadas recobre cada fuso com as linhas das ordenadas pa-
ralelas ao meridiano central do fuso e as abscissas paralelas à linha do Equador, conforme ilustrado na Figura 19.10.
3 Dá-se o nome de meridiano central ao meridiano terrestre localizado no centro da área de uma projeção cartográfica. No caso da Projeção UTM,
ele corresponde ao meridiano situado no centro do fuso correspondente.
Projeção cartográfica e-21

Figura 19.10 • Representação da malha retangular do Sistema de Projeção UTM.

Por se tratar de um sistema de projeção cartográfica universal, o Sistema de Projeção UTM possui uma série de carac-
terísticas geométricas que o define. São elas:
• Amplitude dos fusos: 6° com 3° para cada lado do meridiano central (MC).
• Numeração dos fusos: 1 a 60, a partir do antemeridiano de Greenwich, para o leste. Assim, o fuso 1 possui meridiano
central (MC) igual a 177° W e o fuso 60 possui meridiano central (MC) igual a 177° E (ver Fig. 19.10).
• Para restringir as deformações nos polos, a Projeção UTM está limitada entre as latitudes 84°N e 80°S.
• A linha do Equador e a linha do meridiano central de cada fuso são representadas por linhas retas na projeção. Os de-
mais meridianos são representados por linhas côncavas com relação ao meridiano central e os paralelos são representa-
dos por linhas côncavas com relação ao polo mais próximo (ver Fig. 19.9b).
• Os meridianos e os paralelos se interceptam em ângulos retos na projeção.
• O espaçamento entre os meridianos, na representação gráfica, aumenta à medida que eles se afastam do meridiano
central. Para manter a proporcionalidade da projeção conforme, a escala na direção Norte-Sul também é deformada,
acarretando, assim, a existência de uma escala diferente para cada ponto situado sobre o mesmo lado do meridiano.
• O cilindro de projeção secante à superfície de referência é disposto sobre ela de forma que as linhas de secância estejam
localizadas a 180 km do meridiano central. Tem-se, assim, um fator de escala no meridiano central (k0) igual a 0,9996.
Este é, portanto, o menor fator
de escala do Sistema de Proje-
ção UTM.
• O fator de escala máximo ocorre
na borda do fuso e para o elipsoi-
de GRS80 é igual a 1,000981060.
• A malha de coordenadas re-
tangulares está disposta sobre
o fuso de forma que o ponto
de cruzamento do meridiano
central com a linha do Equa-
dor possui coordenadas (N =
10.000.000 m, E = 500.000 m)
para o hemisfério sul e (N =
0,000 m, E = 500.000,000 m)
para o hemisfério norte.
A Figura 19.11 ilustra os princi-
pais detalhes geométricos do Siste- Figura 19.11 • Detalhes geométricos do Sistema de Projeção UTM.
ma de Projeção UTM. Fonte: adaptada de LETEC (2019).
e-22 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

19.3.2 Determinação do valor do meridiano central do fuso do Sistema de Projeção UTM


O valor do meridiano central (MC) do Sistema de Projeção UTM é determinado considerando que a sua variação ocorre de 6°
em 6°. Os meridianos centrais orientais possuem valores iguais a: 3°, 9°, 15°, 21°, e assim por diante até 177o. Para conhecer o
valor da longitude do meridiano central do fuso em que se localiza determinado ponto de longitude conhecida, basta analisar
em qual intervalo de longitudes de 6° o ponto se insere. A relação Fuso/MC, considerando o sinal algébrico do valor do meri-
diano central,4 é dada pelas equações (19.2) e (19.3).

MC 6 * Fuso 183° (19.2)


MC 183°
Fuso abs (19.3)
6
sendo Fuso o número do fuso.
O valor do meridiano central pode também ser calculado por meio da equação (19.4), conhecendo a longitude (λg) de um
ponto na área do projeto. O valor de (λg) deve incluir o sinal algébrico. Assim, tem-se:
 g 
MC  6 * arred    3o (19.4)
 6 
Somar 3º para pontos a oeste do meridiano de Greenwich e subtrair para pontos a leste do meridiano de Greenwich.

Exemplo aplicativo 19.1


Sabendo que o ponto (E010) possui longitude igual a –47851937,233699, calcular os valores do meridiano central e do número
do fuso em que ele se encontra.

ƒƒ Solução:
Aplicando a equação (19.4), obtém-se o valor do meridiano central com o seu respectivo sinal algébrico.
  47 o 51 37, 2336  o o
MC  6 * arred    3   45
 6
 
O valor do número do fuso é obtido por meio da equação (19.3).

 
   45o  183o 
Fuso  abs    23
 6 
 
Conhecendo o valor do fuso, pode-se também calcular o valor do meridiano central aplicando a equação (19.2).
MC  6 * 23  183o   45o

19.4 Transformações de coordenadas do Sistema de Projeção UTM


Para o uso efetivo das projeções cartográficas em projetos de Engenharia é fundamental que o engenheiro tenha conheci-
mentos adequados para realizar as respectivas transformações de coordenadas entre as superfícies de referências envolvidas.
É com base nos valores das coordenadas dos pontos representados na projeção cartográfica que se elabora a maioria dos
projetos de Engenharia de grande porte. Apresentam-se, portanto, na sequência, os modelos matemáticos utilizados para as
transformações de coordenadas geodésicas (φg, λg) para coordenadas no Sistema de Projeção UTM (N, E) e vice-versa.
Na literatura existe uma série de equações relacionadas com essas transformações. O leitor deve, contudo, ser criterioso no
seu uso, principalmente quando as aplicar por intermédio de programas de computador de qualidade não comprovada. Para
os propósitos deste livro, apresentam-se a seguir as equações consideradas rigorosas e recomendas pelo IBGE.

19.4.1 Transformação de coordenadas geodésicas (φg, λg) para coordenadas UTM (N, E)
Pelo fato de na maioria das vezes os projetos de Engenharia se basearem em sistemas de coordenadas planorretangulares, a
transformação de coordenadas geodésicas para planorretangulares UTM é a mais comumente utilizada em Geomática. O mo-
delo matemático rigoroso comumente utilizado para essa transformação baseia-se nas equações indicadas na sequência, as quais
devem ser utilizadas com os sinais algébricos da latitude e da longitude, em função da posição do ponto no globo terrestre.

4 Negativo para longitudes a oeste do meridiano de Greenwich.


Projeção cartográfica e-23

N    I    II  * p2   III  * p 4   A6  * p6 (19.5)
E    IV  * p  V  * p3   B5  * p5 (19.6)

em que:
ordenada N = N9 (para o hemisfério norte);
ordenada N = 10.000.000 + N9(para o hemisfério sul);
abscissa E = 500.000 + E9.
 I   k0 * S (19.7)
 B C D E F 
     
S  a * 1  e 2 *  A *  g  sen 2 g  sen 4 g  sen 6 g  sen 8 g  sen 10 g 
 2 4 6 8 10 
      (19.8)

3 45 175 6 11.025 8 43.659 10 (19.9)


A  1  e2  e 4  e  e  e
4 64 256 16.384 65.536

3 2 15 4 525 6 2.205 8 72.765 10


B e  e  e  e  e (19.10)
4 16 512 2.048 65.536
15 4 105 6 2.205 8 10.395 10
C e  e  e  e (19.11)
64 256 4.096 16.384
35 6 315 8 31.185 10 (19.12)
D e  e  e
512 2.048 131.072

315 8 3.465 10 (19.13)


E e  e
16.384 65.536
639 10
F= e (19.14)
131.072

 
N * sen  g * cos  g * 108 k0  
 II   (19.15)
2 " 2

N * sen * cos3
III
g g
* 5 tg
2
9e2 * cos2 4e4 * cos 4 * 1016 k0 (19.16)
4 g g g
24

 
N * cos  g * 104 k0
 IV   (19.17)
"
N * cos 3 g
V 3 * 1 tg
2
g e 2 * cos 2 g * 1012 k0 (19.18)
6 "

p 0, 0001 *  (19.19)

 g MC (19.20)

N * sen g * cos5 g
61 58tg 2 g tg 4 g
A6 6
* * 1024 k0 (19.21)
720 " 2
270e * cos 2
g
2
330e * sen 2
g

N * cos5 g 5 18tg 2 g tg 4 g 14e 2 * cos 2 g 58e2 * sen2 g


B5 5
* * 1020 k0 (19.22)
120 "
em que:
ρ99 = 206.264,806299 (fator de conversão de radiano para segundo de arco);
φg = latitude geodésica do ponto, com seu sinal algébrico;
λg = longitude geodésica do ponto, com seu sinal algébrico;
λMC = longitude do meridiano central, com seu sinal algébrico;
e-24 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Dλ = λg – λMC = diferença entre a longitude do ponto e a longitude do meridiano central, considerando os sinais algébricos;
k0 = 0,9996;
N = raio de curvatura do primeiro vertical, conforme equação (3.8);
e, e9 = primeira e segunda excentricidades, conforme equações (3.3) e (3.5).

Para auxiliar o leitor em seus cálculos, apresentam-se na Tabela 19.1 os valores dos parâmetros fixos utilizados para a trans-
formação de coordenadas geodésicas para coordenadas UTM, considerando o elipsoide GRS80.

Tabela 19.1 • Parâmetros fixos para a transformação de coordenadas geodésicas para coordenadas UTM, considerando o elipsoide GRS80
a e e9 A B
6.378.137,000 m 0,081819191 0,082094438 1,005052502 0,005063109
C D E F
1,062759026*10–5 2,082037857*10–8 3,932371371*10–11 6,554547943*10–14

Exemplo aplicativo 19.2 Tabela 19.2 • Coordenadas geodésicas conhecidas – SIRGAS2000


Altura elipsoidal5
Considerando as coordenadas geodésicas do ponto (E010) Ponto Latitude Longitude
(h) [m]
apresentadas na Tabela 19.2, calcular as suas respectivas
E010 –22°01952,522999 –47°51937,233699 866,868
coordenadas planas UTM.5

ƒƒ Solução:
Considerando os parâmetros indicados na Tabela 19.1 e sabendo que o ponto (E010) se encontra no hemisférico sul e a oeste do
meridiano de Greenwich, obtêm-se os valores parciais indicados na Tabela 19.3.
Tabela 19.3 • Valores parciais calculados para o ponto (E010)6
N = 6.381.143,1030 m Δλ = –10.297,233699 p = –1,02972336099 S = –2.437.261,5097 m (I) = –2.436.286,6051 m
(II) = –2.606,6090 m (III) = –2,1447 m (IV) = 286.661,6936 m (V) = 81,2534 m (A6) = –0,0016 m
(B5) = 0,0205 m N9 = –2.439.052,8844 m E9 = –295.270,9823 m

Em função dos valores parciais indicados na Tabela 19.3 obtêm-se as coordena- Tabela 19.4 • Coordenadas UTM calculadas
das UTM calculadas do ponto (E010) indicadas na Tabela 19.4. Ponto E [m] N [m]
Nota: os valores calculados na Tabela 19.4 serão utilizados no restante do capítulo
E010 204.729,0177 7.560.947,1156
com o arredondamento nas quatro casas decimais indicadas.

19.4.2 Transformação de coordenadas UTM (N, E) para coordenadas geodésicas (φg, λg)
A transformação de coordenadas UTM para geodésicas tem pouca aplicação em Engenharia. Mesmo assim, é importante que
o engenheiro tenha conhecimentos suficientes para realizá-la quando necessário. Dessa forma, apresentam-se na sequência as
equações matemáticas que podem ser aplicadas para esse fim.

19.4.2.1 Cálculo da latitude (φg)


O cálculo da latitude (φg) é um processo iterativo. Assim, tem-se:
N* o
0  (19.23)
 * k0
com:
  A * a * 1  e 2  (19.24)

em que:
φ0 = latitude inicial, em grau decimal;

5 O valor da altura elipsoidal está apresentado nesta tabela pelo fato de ele ser utilizado em cálculos posteriores ao longo do capítulo. Ele não
interfere nos cálculos da transformação de coordenadas geodésicas para UTM.
6 Notar os valores negativos das distâncias indicadas na tabela, que ocorrem pelo fato de se considerar os sinais algébricos das coordenadas geodésicas.

Alguns autores desconsideram esses sinais para que as distâncias sejam positivas, impactando no sinal algébrico dos cálculos das coordenadas (N, E).
Projeção cartográfica e-25

a = semieixo maior do elipsoide de referência;


A = parâmetro calculado pela equação (19.9);
N9 = parâmetro calculado pela equação (19.5);
k0 = 0,9996;
ρ° = 57,295779513° (fator de conversão de radiano para graus decimais).
Com a latitude inicial (φ0) calculada determinam-se os valores das latitudes (φi+1) subsequentes por meio da equação (19.25).
o N 
i 1  *    * sen  2i    * sen  4i    * sen  6i    * sen  8i    * sen 10i  (19.25)
  k0
Sendo:
B * a * 1  e2


  (19.26)
2
C * a * 1  e2


  (19.27)
4
D * a * 1  e2


  (19.28)
6
E * a * 1  e2


  (19.29)
8


F * a * 1  e2

  (19.30)
10
em que B, C, D, E, F são os parâmetros Tabela 19.5 • Parâmetros fixos para a transformação de coordenadas UTM para coordenadas geodésicas,
definidos na seção anterior. considerando o elipsoide GRS80
Para auxiliar o leitor em seus cál- a b g δ ε ζ
culos, apresentam-se na Tabela 19.5 os
6.367.449,1458 m 16.038,5087 m 16,8326 m 0,0220 m 3,1142*10 m 4,1526*10–8 m–5
valores dos parâmetros fixos utilizados
para a transformação de coordenadas
UTM para coordenadas geodésicas, considerando o elipsoide GRS80.
Para fins de projetos de Engenharia, a iteração da equação (19.25) deve ocorrer até que seja verificado a condição
φn = φi+1 – φi # 0,000199. Geralmente, esta condição é atendida após a quinta iteração.
Calculado o valor de (φn), dá-se prosseguimento aos cálculos para a obtenção da latitude final (φg) conforme indicado a seguir:

 g  n  VII  * q 2  VIII  * q 4   D6  * q 6  (19.31)


Notar que o segundo termo da equação (19.31) está em segundos de arco.
q = 0,000001E9 (19.32)

tg(n )* 1  e 2 * cos 2 n   *1012  "


VII   (19.33)
2N 2 *k02

tg(n ) 5  3tg n   6e  * cos n   6e  * sen n    1024  


2 2 2 2 2

VIII   *  * (19.34)
24 N 4 3e 4 * cos 4 n   9e 4 * cos2 n  * sen2 n   k04

tg(n ) 61  90tg 2 n   45tg 4 n   107e 2 * cos 2 n    1036  
 D6   * * (19.35)
720N 6 162e  * sen n   45e  * tg n  * sen n   k06
2 2 2 2 2

sendo (N) o raio de curvatura do primeiro vertical calculado para o valor (φn), conforme equação (3.8).

19.4.2.2 Cálculo da longitude (λg)


Para o cálculo da longitude (λg) pode-se utilizar as equações apresentadas a seguir:
g  MC   IX  * q   X  * q 3   E5  * q 5  (19.36)
e-26 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Notar que o segundo termo da equação (19.36) está em segundos de arco.


sec(n ) * 106  
 IX   (19.37)
N * k0

sec(n ) 1018  
X  * 1  2 tg 2
( )  e 2
* cos 2
( )  * (19.38)
6N 3 
n n 
k03
sec(n ) 1030  
 E5   *  5  28 tg 2
( )  24 tg 4
( )  6e 2
* cos 2
( )  8e 2
* sen 2
( )  * (19.39)
120N 5  
n n n n
k05
em que:
N = raio do primeiro vertical calculado para o valor (φn), conforme equação (3.8);
e92 = segunda excentricidade quadrática, conforme equação (3.6);
ρ99 = 206.264,806299 (fator de conversão de radiano para segundo de arco).

Exemplo aplicativo 19.3


Considerando os valores apresentados na Tabela 19.4, transformar de coordenadas UTM do ponto (E010) para coordenadas
geodésicas no sistema de referência SIRGAS2000.

ƒƒ Solução: Tabela 19.6 • Parâmetros para o cálculo da latitude do ponto (E010)


Para o cálculo da latitude, deve-se apli- φ0 = –21,955944120° φn = –22,056248366°
q = –0,295270982 m
car a sequência de equações (19.23) a Valor inicial da latitude 5a iteração
(19.35), obtendo-se os valores dos parâ- N = 6.381.149,5913 m (VII) * q2 = –90,05941207299 (VIII) * q4 = –0,08828334399
metros apresentados na Tabela 19.6. (D96) * q6 = –8,845032568 * 10–599 φ = –22,031256361° φ = –22°01952,522999

Tabela 19.7 • Parâmetros para o cálculo da longitude do ponto (E010)


Para o cálculo da longitude, deve-se aplicar a sequência de
(IX) * q = –10.302,138299 (X) * q = –4,908699 (E95) * q5 = –0,004199
equações (19.36) a (19.39), obtendo-se os valores dos parâme-
tros apresentados na Tabela 19.7. 10.297, 2336
g  45o   45o  2, 860342668o  47 o51 37, 2336
3.600

19.5 Convergência meridiana na Projeção UTM (γ)


No sistema de coordenadas UTM, o eixo das
ordenadas é a direção tomada como referência
para os cálculos topométricos. Para diferen-
ciá-lo da direção de referência geodésica, dada
pelos meridianos terrestres, ele é denomina-
do Norte da Quadrícula (NQ), em referência à
quadrícula do sistema de coordenadas UTM.
Os meridianos terrestres, por usa vez, re-
presentam a direção verdadeira do norte geo-
désico, estabelecendo o que se denomina Nor-
te Verdadeiro ou Norte Geodésico (NG). Como
já visto, quando projetados sobre o plano da
Projeção UTM eles são representados por uma
linha côncava com relação ao meridiano cen-
tral e denominados meridianos projetados.
Tomando um ponto qualquer no plano de
projeção UTM, o Norte da Quadrícula (NQ) é
dado pela direção do eixo das ordenadas que
passa pelo ponto e o Norte Verdadeiro (NG)
é dado pela tangente ao meridiano que passa Figura 19.12 • Convergência meridiana.
pelo mesmo ponto. Assim, conforme ilustrado
na Figura 19.12, existe uma diferença angular
entre eles. A este ângulo dá-se o nome de Con-
vergência Meridiana (γ).
Projeção cartográfica e-27

No hemisfério sul, o valor de (γ) é positivo para os pontos situados a Oeste do meridiano central e negativo para os pontos
situados a Leste. Como se verá na sequência, as equações matemáticas utilizadas para o cálculo desse valor já produzem resul-
tados com os seus respectivos sinais.
Existem na literatura várias equações disponíveis para o cálculo do valor da convergência meridiana (γ). Apresentam-se
na sequência duas delas baseadas nas coordenadas geodésicas do ponto de interesse. Existem também outras equações
baseadas nas coordenadas UTM, porém, elas utilizam o valor da latitude (φg) do ponto que precisa ser calculado por um
método de transformação de coordenadas UTM para coordenadas geodésicas, o que adiciona pouca vantagem com rela-
ção ao modelo de cálculo da convergência meridiana baseada nas coordenadas geodésicas. Por esta razão, elas não foram
incluídas neste texto.
O interesse em se conhecer o valor da convergência meridiana para aplicações em Engenharia se dá pelo fato de, em
alguns casos, os levantamentos topográficos ou geodésicos terem o Norte Verdadeiro (NG) como única referência, por
exemplo, nos trabalhos subterrâneos, em que são usados giroteodolitos (teodolitos acoplados a um giroscópio). Pode-se
também citar o caso de instalações de painéis solares, em que se busca a direção do Norte Verdadeiro para maximizar a
eficiência da instalação.

19.5.1 Cálculo aproximado da convergência meridiana em função das coordenadas geodésicas


O valor aproximado para a convergência meridiana em função das coordenadas geodésicas pode ser obtido por meio da
equação (19.40).

 
  g  MC * sen  g   (19.40)

em que:
γ = convergência meridiana;
λg = longitude do ponto considerado;
λMC = longitude do meridiano central;
φg = latitude geodésica do ponto considerado.

19.5.2 Cálculo rigoroso da convergência meridiana em função das coordenadas geodésicas


O cálculo rigoroso da convergência meridiana em função das coordenadas geodésicas é dado pela equação (19.41).
   XII  * p   XIII  * p3   C5  * p5 (19.41)

 XII   104 sen(g ) (19.42)

sen g * cos 2 g 2 2
XIII * 1 3e * cos g 2e 4 * cos 4 g *1012 (19.43)
3 "2
 
sen  g * cos 4  g   * 2  tg
 C5  
15  " 4 
2
  * 10
g
20
(19.44)

em que:
γ = convergência meridiana, em segundos;
φg = latitude geodésica do ponto considerado;
ρ99 = 206.264,806299 (fator de conversão de radiano para segundo de arco);
p = dado pela equação (19.19);
e92 = segunda excentricidade quadrática, conforme equação (3.6).

Exemplo aplicativo 19.4


Considerando as coordenadas geodésicas do ponto (E010) apresentadas na Tabela 19.1, calcular a convergência meridiana
para aquele local aplicando a equação aproximada e a equação rigorosa em função das coordenadas geodésicas.

ƒƒ Solução:
Cálculo aproximado da convergência meridiana em função das coordenadas geodésicas:
Aplicando a equação (19.40), tem-se:
   
   47 o 51 37, 2336  45o  * sen 22o 01 52, 5229  1o 0422, 6194
e-28 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Cálculo rigoroso da convergência meridiana em função das coordenadas geodésicas:


Aplicando as equações (19.41) a (19.44), têm-se os valores dos parâmetros de cálculo indicados na Tabela 19.8.

Tabela 19.8 • Parâmetros para o cálculo da convergência meridiana do ponto (E010) em função das coordenadas geodésicas
  3.865, 4270
p = –1,0297233699 (XII) * p = 3.862,619499 (XIII) * p3 = 2,805499 (C5) * p5 = 0,002299
  1o0425, 4270

19.6 Redução à corda (δ)


A menor distância entre dois pontos (A) e (B) na superfície de um elipsoi-
de é dada por uma curva (s) denominada linha geodésica ou, simplesmente,
geodésica. Esta curva quando projetada sobre o plano da projeção UTM é
representada, neste plano, por um arco com concavidade voltada para o me-
ridiano central, conforme ilustrado na Figura 19.13.
Na Projeção UTM, quando se conhecem as coordenadas dos pontos
(A) e (B), a distância (dUTM) entre eles é calculada pela equação (19.45) e
o azimute da quadrícula (AzQAB) é calculado pela equação (19.46). Ambas
derivadas das equações (10.2) e (10.4).

 EB  EA    N B  N A 
2 2
dUTM  (19.45)

 E  EA  o
AzQ AB  arctg  B   180 (19.46)
 NB  NA 
Pelo fato de a geodésica ser representada por uma curva na Projeção
UTM e o alinhamento entre os pontos (A) e (B) ser considerado uma reta
Figura 19.13 • Ilustração da redução à corda.
(linha pontilhada da figura), existe uma diferença angular entre a reta e a
tangente a essa curva, denominada ângulo de redução à corda7 (δ), cujo valor
pode ser calculado por meio da equação (19.47) ou (19.48).

 2E   E  
 AB   A 2 B  *  N B  N A  *   (19.47)
 6R0 

 E   2E  
 BA   A 2 B  *  N A  N B  *   (19.48)
 6R0 

em que:
δi, j = ângulo de redução à corda, em segundos;
Ei9 = E –500.000;
Ni, Nj = ordenadas UTM dos pontos extremos da semirreta (i, j);
R0 = raio médio local da Terra;
ρ99 = 206.264,806299 (fator de conversão de radiano para segundo de arco).
Geralmente, para as distâncias medidas nos trabalhos topográficos, a curvatura da geodésica é muito pequena e, por isso,
ela é desconsiderada, aceitando-se a corda que une os dois extremos da semirreta como a referência angular. Para uma dis-
tância de 2 km, por exemplo, o ângulo de redução à corda é da ordem de um segundo, ou seja, da ordem da precisão angular
de uma estação total de alta precisão.

7 Muitos autores preferem adotar a simbologia (t-T) para indicação do ângulo de redução à corda.
Projeção cartográfica e-29

Nos casos em que o ângulo de redução não pode ser desprezado, ele afetará os valores das direções medidas em campo,
alterando os valores dos ângulos determinados entre essas direções, conforme ilustrado na Figura 19.14.
A conversão angular entre o ângulo da tangente (at) e o ângulo da corda (ac), nestes casos, é dada pela equação (19.49),
onde o sinal positivo ou negativo deve ser empregado em função dos quadrantes das localizações dos alinhamentos.
 t   c   AB   AC (19.49)

Figura 19.14 • Situações das ocorrências das posições da redução à corda.

Exemplo aplicativo 19.5


Tabela 19.9 • Coordenadas UTM conhecidas
Considerando as coordenadas geodésicas do ponto (E010) indicadas na Tabela
19.1 e as coordenadas UTM dos pontos (E010) e (E014) no sistema geodésico Ponto E [m] N [m]
SIRGAS2000 indicadas na Tabela 19.9, calcular o valor do ângulo de redução à E010 204.729,0177 7.560.947,1156
corda no ponto (E010). E014 203.551,8201 7.560.860,4734

ƒƒ Solução:
Para a solução deste exercício deve-se, primeiramente, calcular o raio médio local da Terra e os valores de (E9E010) e (E9E014). Assim,
tomando o ponto (E010) como referência, têm-se:
N E 010 6.381.143,103 m
M E010 6.344.401, 487 m R0 E 010 6.362.746 m
EE 010 204.729, 0177 500.000 295.270, 9823 m
EE 014 203.551, 8201 500.000 296.448,1799 m

Em seguida, obtém-se o valor do ângulo de redução à corda para o ponto (E010) aplicando a equação (19.47). Assim, tem-se:
2 *  295.270, 9823    296.448,1799   *  7.560.860, 4734  7.560.947,1156  * 206.264, 8062
 E010    0, 0653
6 * 6.362.7462

19.7 Fator de escala da Projeção UTM


Conforme já discutido em seções anteriores, em razão de suas características geométricas, as distâncias indicadas ou cal-
culadas sobre uma Projeção UTM são afetadas por um fator de escala, que varia em função de suas localizações no fuso da
projeção. A esse fator de escala dá-se o nome de fator de escala da projeção (k) ou fator de escala UTM (kUTM). Pelo fato de já
se utilizar o símbolo (k) para outras grandezas, neste livro se optou por utilizar a segunda denominação.
O fator de escala UTM permite relacionar as distâncias indicadas no plano de projeção UTM, (dUTM), com as suas respec-
tivas sobre a superfície elipsoidal (d0), conforme ilustrado esquematicamente na Figura 19.15.
Recordar que a distância elipsoidal (d0) está relacionada com a distância topográfica em função do fator de escala altimé-
trico (kalt), conforme apresentado na Seção 6.2 – Tipos de distâncias.
e-30 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

De forma semelhante ao cálculo da convergência meridiana, existe na literatura várias equações disponíveis para o cálculo
do valor do fator de escala UTM (kUTM). Apresenta-se na sequência o cálculo aproximado em função das coordenadas UTM
e o cálculo rigoroso em função das coordenadas geodésicas.

Figura 19.15 • Relações geométricas para cálculo da distância plana UTM.

19.7.1 Cálculo aproximado do fator de escala em função das coordenadas UTM


O valor aproximado para o fator de escala em função das coordenadas UTM pode ser obtido por meio da equação (19.50).
 2 4 
kUTM  k 0 *  1  E 2  E 4  (19.50)
 2R 0 24 R 0 
com:
k0 = 0,9996 (fator de escala no MC);
E9 = E –500.000;
R0 = raio médio local da Terra.

19.7.2 Cálculo rigoroso do fator de escala em função das coordenadas geodésicas


O valor rigoroso para o fator de escala em função das coordenadas geodésicas pode ser obtido por meio da equação (19.51).

k UTM k0 * 1 C2 * L2 * 1 C4 * L2 (19.51)

Sendo:

L    g   MC  * cos  g   em radianos 
� (19.52)

e 2 * cos2  g 
2  (19.53)
1  e2
1  2 (19.54)
C2 
2
5  4 * tg 2  g    2 * 9  24 * tg 2  g  
C4  (19.55)
12
e2 = primeira excentricidade quadrática, conforme equação (3.4).

Conforme ilustrado na Figura 19.16, o valor do fator de escala UTM no meridiano central é igual a k 0 = 0,9996.
A partir daí, ele cresce tanto para Oeste quanto para Leste até atingir o valor kUTM = 1,000, nas vizinhanças dos valores
de E = 320.000 metros e E = 680.000 metros, continuando a crescer até o valor kUTM = 1,000981060, nas bordas dos fusos
(para o elipsoide GRS80).
Projeção cartográfica e-31

Figura 19.16 • Ilustração da variação do fator de escala no fuso da projeção UTM.

Pelo fato de o fator de escala UTM ser pontual, ele varia em função da localização do ponto na superfície de projeção. Por
esta razão, para aplicá-lo a uma distância entre dois pontos, alguns profissionais consideram adequado adotar o fator de escala
de qualquer um dos pontos extremos da semirreta para distâncias inferiores a 1 km; utilizar o fator de escala médio calculado
em função dos fatores de escala extremos para distâncias entre 1 e 4 km e, para distâncias maiores que 4 km, utilizar o fator
de escala calculado por uma média ponderada adotando o valor do fator de escala do ponto médio da semirreta com um peso
igual a 4 com relação aos pontos extremos. Assim, têm-se:
Para distâncias inferiores a 1 km:

kUTM  kUTMi ou kUTM j (19.56)

Para distâncias entre 1 e 4 km:


k UTM i k UTM j
k UTM m (19.57)
2
Para distâncias maiores que 4 km:
k UTM i 4k UTM ij k UTM j
k UTM m (19.58)
6
em que:
k UTM i , k UTM j  fator de escala UTM dos pontos extremos da semirreta ij;
k UTM m  fator de escala UTM médio;
k UTM ij  fator de escala UTM do ponto médio da semirreta ij.

As estratégias de ponderação do valor do fator de escala UTM indicadas são apenas sugestões. O leitor deverá avaliar o seu
uso segundo as características geométricas e da precisão exigida pelo seu projeto.
Notar que para áreas pequenas pode-se ainda adotar um fator de escala médio único para toda a área. O tamanho da área,
neste caso, deve ser avaliado em função da precisão das medições de distâncias considerada adequada para o projeto.
Com o valor do fator de escala UTM (kUTM) calculado, pode-se adotar duas estratégias de cálculo da distância plana UTM
(dUTM). A primeira delas consiste em calcular a distância elipsoidal (d0), multiplicando a distância horizontal topográfica (d)
e-32 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

pelo fator de escala altimétrico (kalt) e, em seguida, calcular a distância plana UTM (dUTM), multiplicando a distância elipsoidal
(d0) pelo fator de escala UTM. Assim, têm-se:

d0  kalt * d (19.59)

d UTM  k UTM * d0 (19.60)

Para não realizar o cálculo em duas etapas, recomenda-se utilizar o fator de escala combinado (FC) ou fator de escala total
(kT), conforme indicado na equação (19.61).

FC kT kalt * k UTM (19.61)

Neste caso, multiplicando o fator de escala total (kT) pela distância horizontal topográfica (d), obtém-se diretamente a
distância plana (dUTM). Dividindo a distância plana (dUTM) pelo fator de escala total (kT), obtém-se a distância horizontal
topográfica (d). Assim, tem-se:

d UTM (19.62)
d UTM = kT * d ou d
kT

A influência do fator de escala altimétrico (kalt) no cálculo da distância plana ou a sua inversa é um elemento de cálculo
que deve ser observado com cuidado. Adotando o mesmo princípio de cálculo da variação do valor da distância elipsoidal em
função do raio médio local da Terra e da altitude, apresentado na Seção 6.2.5 – Distância elipsoidal, mostra-se que uma varia-
ção de 6 metros na altitude causa uma variação de 1 ppm na distância UTM (2 ppm para 12 metros e 3 ppm para 18 metros).
Estes valores podem indicar quando se deve ou não considerar a ondulação geoidal e/ou a variação de altitude do terreno para
o cálculo do valor do fator de escala altimétrico e, por conseguinte, do fator de escala total (kT).

Exemplo aplicativo 19.6


Mediu-se sobre o terreno a distância inclinada entre os pontos (E010) e (E014), conforme indicado na Tabela 19.10. De
acordo com as medições de campo e os valores das coordenadas conhecidas indicadas nas Tabelas 19.9 e 19.11, calcular
os fatores de escala e as distâncias UTM entre os pontos (E010) e (E014), para cada um dos critérios de cálculo indicados
na seção anterior.

Tabela 19.10 • Valores medidos em campo Tabela 19.11 • Coordenadas conhecidas


Ponto Distância Ângulo vertical Ponto φg λg H [m]
Estação
visado inclinada [m] zenital E010 –22°01952,522999 –47°51937,233699 866,868
E010 E014 1.179,788 90°3095599 E014 –22°01954,619299 –47°52918,304599 856,791

ƒƒ Solução:
Para a solução deste exercício, inicialmente, deve-se calcular a distância horizontal (dE010) no nível de (E010), de acordo com a
equação (6.1). Assim, tem-se:

 
dE010  1.179, 788 * sen 90o 3055  1.179, 740 m

Notar que foi desconsiderado o efeito da curvatura da Terra e da refração atmosférica vertical.
Como a distância entre os pontos é da ordem de 1,2 km, neste exercício, para o cálculo do fator de escala altimétrico, serão
considerados a altitude média entre os dois pontos e o raio médio local da Terra na latitude do ponto (E010). Assim, têm-se:

866, 868  856, 791


H médio   861, 830 m
2

R 0 E 010 = 6.362.746 m (conforme calculado no Exemplo aplicativo 19.6)

6.362.746, 000
kalt m 0, 999864569
6.362.746, 000 861, 830
Projeção cartográfica e-33

Os valores dos fatores de escala e das distâncias UTM calculados para cada critério estão indicados na Tabela 19.12.

Tabela 19.12 • Fatores de escala e distâncias UTM obtidas para os diferentes critérios de cálculo
Critério de cálculo Ponto kUTM kUTMmédio kTmédio dUTM[m]
E010 1,000676531
Método simplificado por coordenadas UTM 1,000680832 1,000545309 1.180,384
E014 1,000685134
E010 1,000677393
Método rigoroso por coordenadas geodésicas 1,000681697 1,000546174 1.180,385
E040 1,000686002

Exemplo aplicativo 19.7


Com os dados da Tabela 19.9, calcular a distância horizontal topográfica entre os pontos (E010) e (E014), considerando os
valores de (kUTM) calculados e indicados na Tabela 19.12.

ƒƒ Solução:
Para a solução deste exercício, inicialmente, deve-se calcular a distância UTM entre os pontos (E010) e (E014) em função de suas
coordenadas indicadas na Tabela 19.9. Assim, tem-se:

2 2
d UTM 204.729, 0177 203.551, 8201 7.560.947,1156 7.560.860, 4734 1.180,3817 m

De acordo com os resultados do Exemplo aplicativo 19.6, aplicando os valores dos fatores de escala total calculados,
obtêm-se os valores da distância horizontal topográfica para cada critério de cálculo indicada na seção anterior, conforme
indicado a seguir:

1.180, 3817
Método simplificado por coordenadas
= UTM: d = 1.179,7384m
1, 000545309

1.180, 3817
Método rigoroso por coordenadas geodésicas:
= d = 1.179,7374m
1, 000546174

19.8 Azimutes a serem considerados no Sistema de Projeção UTM


Pelo fato de se considerar o Norte da Quadrícula e o Norte Verdadeiro na Projeção UTM, quando se trabalha com coordena-
das UTM, haverá dois tipos de azimutes a serem considerados. São eles:
• azimute plano ou azimute da quadrícula;
• azimute geodésico ou azimute verdadeiro.
O azimute plano ou azimute da quadrícula (AzQ) é o ângulo horário, na projeção, entre o Norte da quadrícula UTM e a
corda do alinhamento considerado. Ele é calculado em função das coordenadas UTM (N, E) dos pontos extremos do alinha-
mento, de acordo com a equação (19.63), derivada da equação (10.4).

 E  o
AzQ  arctg    180 (19.63)
 N 

O azimute geodésico ou azimute verdadeiro (Azg) é o ângulo horário, na projeção, entre a tangente ao meridiano projetado
que passa pelo ponto inicial do alinhamento considerado e a tangente ao arco da projeção do alinhamento considerado, con-
forme ilustrado na Figura 19.17.
De acordo com a geometria da Figura 19.17, o azimute geodésico (Azg(AB)) e o azimute da quadrícula (AzQ(AB)) estão rela-
cionados entre si em função da convergência meridiana (γA) e do ângulo de redução à corda (δAB). A equação para relacionar
os dois azimutes depende do quadrante em que se encontra o alinhamento. Assim, para o hemisfério sul e considerando os
sinais algébricos de (γ) e (δ), tem-se:

Az g  AzQ     (19.64)
e-34 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Figura 19.17 • Azimutes na Projeção UTM em função da convergência meridiana e do ângulo de redução à corda.

Exemplo aplicativo 19.8


Considerando os pontos (E010) e (E014) do Exemplo aplicativo 19.5, calcular o azimute geodésico (Azg) do alinhamento
E010-E014 e do alinhamento E014-E010.

ƒƒ Solução:
Para a solução deste exercício é necessário conhecer os azimutes da quadrícula nas direções E010-E014 e E014-E010, as conver-
gências meridianas e os ângulos de redução à corda nos pontos (E010) e (E014).
Os azimutes da quadrícula são calculados de acordo com a equação (19.63). Assim, têm-se:

 203.551, 8201  204.729, 0177 


  180  265 4726,1537
o o
AzQ E 010  E 014  arctg 
 7 . 560 . 860, 4734  7 . 560 . 947 ,1156 
AzQ E 014  E 010  265o 4726,1537  180o  85o 4726,1537

No Exemplo aplicativo 19.4, foi apresentada a solução para o cálculo da convergência meridiana para o ponto (E010). Apli-
cando a mesma sequência de cálculo, determina-se a convergência meridiana para o ponto (E014).

 E 010  1o 0425, 4270  E 014  1o 0440, 9644

No Exemplo aplicativo 19.5, foi apresentada a solução para o cálculo da redução à corda para o alinhamento E010-E014.
Aplicando a mesma sequência de cálculo, determina-se a redução à corda para o alinhamento E014-E010.

 E 010  0, 0653  E 014   0, 0653

Considerando que os alinhamentos se encontram no hemisfério sul, aplicando a equação (19.64), têm-se os seguintes valores
para os azimutes geodésicos:
Azg E 010  E 014  265o 4726,1537  1o 0425, 4270  0o 0000, 0653  266o 51 51, 6460
 
Az g  E 014  E 010  85o 4726,1537  1o 0440, 9644  0o 0000, 0653  86o 527, 0528

19.9 Sistema de Projeção Transverso de Mercator (TM)


Embora o Sistema de Projeção UTM seja o mais utilizado globalmente, em projetos de Engenharia específicos, pode ser mais
conveniente adotar um Sistema de Projeção Transverso de Mercator (TM), com características locais ou regionais, que se
adapte melhor às condições geométricas do projeto. A solução, neste caso, consiste, basicamente, em diminuir o tamanho do
fuso e aumentar o valor do fator de escala no meridiano central (k0), de forma a diminuir os efeitos das deformações geomé-
tricas dos objetos representados no plano de projeção.
Projeção cartográfica e-35

Entre os infinitos sistemas de pro-


jeção TM que se podem elaborar,
um deles se destaca pelo seu uso
frequente em situações especiais de
projetos de Engenharia. Trata-se do
sistema de projeção denominado, no
Brasil, Sistema de Projeção Trans-
verso de Mercator Local (LTM) ou
Local Transverso de Mercator, cujas
características geométricas estão apre-
sentadas na sequência e detalhadas
na Figura 19.18:
• projeção cilíndrica, conforme,
transversa e secante;
• amplitude dos fusos: 1°;
• meridianos centrais nas longi-
tudes de 309;
• limites de latitude: 45°N e 45°S;
• fator de escala no meridiano
central (k0) igual a 0,999995;
• o fator de escala máximo ocor-
re nas bordas do fuso e para
o elipsoide GRS80 é igual a
1,000033335;
• coordenadas do ponto de cru-
zamento do meridiano central
com a linha do Equador iguais
a (N = 5.000.000; E = 200.000)
Figura 19.18 • Detalhes do fuso de projeção no sistema LTM.
para o hemisfério sul e (N = 0,000;
E = 200.000) para o hemisfério
norte.
As designações para os eixos de coordenadas devem ser (X, Y) para diferenciá-las da Projeção UTM.

Para as transformações de coordenadas e para as determinações dos valores dos elementos geométricos do Sistema de Pro-
jeção LTM, referir-se às equações utilizadas para o Sistema de Projeção UTM apresentadas nas seções anteriores, alterando,
evidentemente, o valor de (k0).

Exemplo aplicativo 19.9


Considerando as coordenadas geodésicas dos pontos (E010) e (E014) apresentadas na Tabela 19.11, calcular as suas coorde-
nadas planas LTM no sistema de referência SIRGAS2000.

ƒƒ Solução:
Para a solução deste exercício, deve-se considerar os parâmetros indicados na Tabela 19.1 e os parâmetros do elipsoide GRS80.
Assim, considerando a Projeção LTM com meridiano central igual a –47°3090099 e fator de escala k0 = 0,999995, têm-se:

Tabela 19.13 • Parâmetros para o cálculo das coordenadas LTM dos pontos (E010) e (E014)
E010 S = –2.437.261,5097 m Δλ = –1.297,233699 p = –0,129723360 (I) = –2.437.249,3234 m
(II) = –2.607,6390 m (III) = –2,1455 m (IV) = 286.774,9703 m (V) = 81,2855 m
A6 = –0,0016 m B5 = 0,0205 m N´ = –2.437.293,2057 m E´= –37.201,5902 m
E014 S = –2.437.325,9888 m Δλ = –1.338,304599 p = –0,133830450 (I) = –2.437.313,8022 m
(II) = –2.607,6938 m (III) = –2,1455 m (IV) = 286.773,7976 m (V) = 81,2835 m
A6 = –0,0016 m B5 = 0,0205 m N9 = –2.437.360,5082 m E9= –38.379,2612 m
e-36 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

As coordenadas LTM calculadas para os pontos (E010) e (E014) estão apresen- Tabela 19.14 • Coordenadas calculadas LTM
tadas na Tabela 19.14. Ponto X [m] Y [m]
E010 162.798,410 2.562.706,794
E014 161.620,739 2.562.639,492

19.10 Utilização de coordenadas UTM em projetos de Engenharia


Por se tratar de uma representação plana deformada da superfície terrestre, o Sistema de Projeção UTM exige conhecimentos
técnicos para o seu uso em projetos de Engenharia, tanto na etapa de determinação dos pontos de apoio como nas etapas de
elaboração e de implantação do projeto. Discutem-se, na sequência, os detalhes técnicos mais importantes do seu uso em cada
uma dessas etapas.

19.10.1 Determinação de coordenadas dos pontos de apoio em coordenadas UTM


Conforme visto em seções anteriores, a determinação das coordenadas de pontos de apoio em um projeto de Engenharia pode
ser realizada por diversos métodos de levantamentos topográficos e/ou geodésicos e os valores das coordenadas determinadas
podem estar em um Sistema Topográfico Local, em um Sistema Geodésico Local ou no Sistema de Projeção UTM (ou TM,
se for o caso), além de outros. No caso do Sistema de Projeção UTM, existem algumas prerrogativas técnicas que devem ser
observadas para que os valores determinados sejam coerentes com a modelagem matemática adotada. Os procedimentos de
cálculo a serem adotados são praticamente os mesmos para todos os métodos de levantamento, razão pela qual apresentam-se,
na sequência, os relativos ao método de levantamento topográfico por poligonação, por considerar-se que ele seja o mais uti-
lizado para a determinação de pontos de apoio em projetos de Engenharia.
Seja então considerado o caso de uma poligonal apoiada baseando-se em quatro pontos (A), (B), (M) e (N) de coor-
denadas UTM conhecidas, entre os quais foram medidos direções horizontais, ângulos zenitais e distâncias inclinadas
de um caminhamento de forma semelhante ao ilustrado na Figura 11.3. Pelo fato de os pontos extremos da poligonal
estarem em coordenadas UTM e as distâncias medidas em campo durante o caminhamento serem distâncias topográ-
ficas reduzidas ao plano do instrumento, é necessário transformá-las em distâncias planas UTM antes de realizar o ba-
lanceamento (ou o ajustamento) da poligonal. Sem esse recurso, dependendo da localização da poligonal, o fechamento
linear da mesma será irrealista.
Para solucionar este problema, recomenda-se adotar os passos aqui indicados:
1. Com base nas coordenadas UTM dos pontos (A), (B), início do caminhamento, calcular o azimute inicial UTM (AzQAB).
2. Com base no azimute UTM inicial calculado e considerando as direções medidas em campo, calcular todos os azimu-
tes UTM provisórios (Az9qij) até o ponto de apoio (M) da poligonal.
3. Conhecendo os azimutes provisórios (Az9qij) e as distâncias topográficas horizontais (dij), reduzidas ao plano do ins-
trumento, calculadas em função das distâncias inclinadas e dos ângulos verticais zenitais medidos em campo para cada
lado da poligonal, calcular as coordenadas UTM e as altitudes ortométricas provisórias de cada vértice do caminha-
mento. Notar que até esta etapa nenhum tipo de correção está sendo compensado.
4. Uma vez calculadas as altitudes ortométricas aproximadas e conhecendo a altitude de pelo menos um dos pontos de
referência da poligonal, pode-se calcular os valores dos fatores de escala altimétricos (kalt) para cada lado da poligonal,
ou, se for o caso, um fator de escala altimétrico médio para toda a área da poligonal. A estratégia a ser tomada depen-
derá das variações das altitudes entre os vértices da poligonal.
5. Caso seja necessário, as distâncias reduzidas para a superfície elipsoidal devem ser calculadas considerando a curvatu-
ra da Terra e a refração atmosférica, conforme apresentado no Capítulo 6 – Distâncias.
6. Em função das coordenadas UTM provisórias (N´, E´) calculadas para os vértices da poligonal, calcular os fatores de
escala UTM médio (kUTMm) de acordo com a estratégia de ponderação adotada para a área de projeto.
7. Calcular e aplicar a correção do ângulo de redução à corda (δij) para cada lado da poligonal, se considerar necessário.
8. Com os valores dos fatores de escala altimétrico médios e dos fatores de escala UTM médios conhecidos, calcular
os fatores de escala total médio (kTm) para cada lado da poligonal. Em seguida, reduzir as distâncias topográficas
horizontais calculadas para o plano do Sistema de projeção UTM, multiplicando-as pelos fatores de escala total (kT)
correspondentes. Obtêm-se, assim, as distâncias planas UTM aproximadas para cada lado medido da poligonal.
9. Com base nos valores das distâncias planas UTM aproximadas, realizar o balanceamento (ou o ajustamento) da poli-
gonal por meio de um dos métodos de balanceamento de poligonal indicados na Seção 11.2.3 – Erros de fechamento e
balanceamento de poligonais.
10. Finalmente, calcular os valores das coordenadas totais (finais) de cada vértice da poligonal.
Projeção cartográfica e-37

Exemplo aplicativo 19.10


Considerando os valores medidos em campo e apre- Tabela 19.15 • Coordenadas UTM conhecidas
sentados na Tabela 19.17, calcular as coordenadas
Pontos E [m] N [m] Altitude (H) [m]
finais UTM (totais) de cada vértice da poligonal
apoiada pelos pontos de coordenadas UTM conhe- P 217.377,303 7.557.453,190 852,036
cidas (P), (Q), (R) e (S), conforme ilustração da Fi- Q 216.463,837 7.558.135,327 856,791
gura 19.19. Sabe-se que a latitude do ponto (P) é igual R 221.801,561 7.557.717,180 866,842
a –22°03953,566099. Realizar os cálculos geodésicos S 222.968,157 7.557.431,186 869,790
tomando o ponto (P) como referência. As coorde-
nadas conhecidas estão indicadas na Tabela 19.15.

ƒƒ Solução:
O primeiro passo na solução deste exercício é calcular
o valor do raio médio da Terra para o local. Assim,
considerando as coordenadas geodésicas do ponto (P)
e aplicando as equações (3.7) a (3.9), têm-se os valo-
res indicados na Tabela 19.16.
Na sequência, deve-se calcular as coordenadas
provisórias dos vértices da poligonal, em função dos
valores medidos em campo, sem aplicar nenhuma
correção. Com as coordenadas provisórias pode-se
calcular os fatores de escala que permitirão converter
as distâncias horizontais topográficas em distâncias Figura 19.19 • Ilustração da poligonal levantada em campo.
UTM. Para tanto, foi considerada a altitude média
de todos os pontos da poligonal levantada. Todos os
valores calculados até esta etapa estão indicados nas Tabela 19.16 • Cálculo do raio médio local da Terra no ponto (P)
Tabelas 19.17 a 19.19. φP = –22°03953,566099 N = 6.381.151,833 m
Após as etapas indicadas, têm-se os dados neces- P
M = 6.344.427,527 m R0 ≅ 6.362.763 m
sários para proceder com o balanceamento da poligo-
nal, conforme a sequência de cálculo apresentada na
Seção 11.2.3.6 – Balanceamento de poligonal apoiada pelo Método de Similitude. Os valores intermediários dos cálculos não
estão indicados no texto.
Para auxiliar o leitor na conferência de seus cálculos, apresentam-se na Tabela 19.20 os erros de fechamento angular e linear
da poligonal, a precisão linear relativa e as coordenadas UTM finais dos vértices da poligonal.

Tabela 19.17 • Valores medidos em campo e calculados


Ângulo Ângulo Hz. Azimute não Distância horizontal
Ponto Direção Distância
Estação vertical provisório corrigido topográfica [m]
visado horizontal inclinada [m]
zenital Eq. (5.1) Eq. (10.10) Eq. (11.5)
Q 66°5393299 – –
P 134°0592699
A 200°5895899 1.034,623 89°3090099 80°50928,839299
1.034,587
P 299°2891799 1.034,630 90°3090799
A 196°1295799
B 135°4191499 1.165,483 89°5295599 97°03925,839299
1.165,477
A 227°3494599 1.165,475 90°0791099
B 168°2995599
C 36°0494099 1.136,016 89°4894499 85°33920,839299
1.136,004
B 148°2992299 1.136,005 90°1192399
C 176°3391899
R 325°0294099 1.122,301 89°5194699 82°06938,839299
1.122,302
C 282°4892399 1.122,310 90°0892099
R 201°4091299
S 124°2893599 103°46950,839299
e-38 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Tabela 19.18 • Coordenadas parciais e fatores de escala


Ponto X provisório [m] Y provisório [m] E9 kUTM
Estação
visado Eq. (11.15) Eq. (11.16) Eq.(19.6) Eq. (19.50)
Q
P 217.377,303 7.557.453,190 –282.622,697
A 1,000586257
P 1,000579140
A 218.398,700 7.557.617,864 –281.601,300
B 1,000579140
A 1,000571112
B 219.555,347 7.557.474,674 –280.444,653
C 1,000571112
B 1,000563283
C 220.687,936 7.557.562,701 –279.312,064
R 1,000563283
C 1,000555629
R 221.799,616 7.557.716,746 –278.200,384
S

Tabela 19.19 • Fatores de escala e distância UTM


kUTM kalt kT médio Distância UTM [m]
Estação Ponto visado kUTM médio
Eq. (19.50) Eq. (6.11) Eq. (19.61) Eq. (19.62)
Q
P
A 1,000586257
1,000582699 0,999864642 1,000447262 1035,050
P 1,000579140
A
B 1,000579140
1,000575126 0,999864642 1,000439691 1165,989
A 1,000571112
B
C 1,000571112
1,000567198 0,999864642 1,000431763 1136,495
B 1,000563283
C
R 1,000563283
1,000559456 0,999864642 1,000424023 1122,778
C 1,000555629
R
S

Tabela 19.20 • Erros de fechamento, precisão e coordenadas UTM


Coordenadas UTM
Erros de fechamento e precisão
X [m] Y [m] Vértice
Angular 22,4799 217.377,303 7.557.453,190 P
Linear em X [m] –0,0357 218.399,163 7.557.617,979 1
Linear em Y [m] –0,0764 219.556,333 7.557.474,795 2
Precisão linear relativa 1/52.899 220.689,414 7.557.562,954 3

Vale a pena destacar que se não fossem realizadas as conversões de distâncias topográficas para distâncias UTM, a precisão
do levantamento seria igual a 1/2.237.

19.10.2 Transposição de fusos UTM


Em levantamentos de campo, dependendo do local onde se está realizando o trabalho, pode ocorrer a situação em que seja ne-
cessária a transposição de coordenadas de um fuso para outro. Este tipo de problema pode, por exemplo, ocorrer na implanta-
ção de projetos de rodovias, ferrovias, linhas de transmissão de energia e outros projetos de Engenharia de cunho linear. Para
resolver esse tipo de problema, existem várias soluções indicadas em bibliografias especializadas. Neste livro será apresentada
a solução baseada no uso das coordenadas UTM de dois pontos em cada lado dos fusos adjacentes e no prolongamento das
dimensões dos fusos, conforme descrito na sequência.
Projeção cartográfica e-39

Considere-se a situação em que se têm dois pontos (P) e (Q) de coordenadas planas UTM conhecidas no fuso (A). A partir
deles e por meio de medições de ângulos e distância reduzidos ao plano UTM pode-se lançar um novo ponto (R) de forma
que ele se situe sobre o fuso adjacente (fuso B). Tem-se, assim, o ponto (R) com coordenadas UTM conhecidas relativas ao
fuso (A), porém, localizado no fuso (B). A partir do ponto (R) pode-se lançar um novo ponto (S) também com coordenadas
relativas ao fuso (A) e situado sobre o fuso (B). Em seguida, as coordenadas UTM dos quatro pontos deverão ser transforma-
das em coordenadas geodésicas estendendo ambos os fusos para compreender os pontos do fuso anterior e posterior. Com
as coordenadas geodésicas conhecidas, calculam-se as coordenadas UTM de cada ponto em seu respectivo fuso e no fuso
adjacente. Agindo assim ter-se-ão os quatro pontos com coordenadas UTM conhecidas nos dois fusos, o que permitirá dar
prosseguimento ao caminhamento.
O leitor deve notar que essa transposição de fuso pode também ser realizada por meio do uso da tecnologia GNSS,
obtendo-se diretamente as coordenadas geodésicas dos pontos medidos. As demais transformações de coordenadas se
mantêm inalteradas.

Exemplo aplicativo 19.11


Considere-se as coordenadas UTM conhecidas dos pontos (P005) e (P006) no fuso 22. A partir deles foram realizadas medi-
ções de campo de forma a determinarem as coordenadas dos pontos (P007) e (P008), conforme apresentado na Tabela 19.21.
Ver ilustração na Figura 19.20. Notar que os pontos (P007) e (P008) se situam no fuso 23, mas estão com coordenadas com
relação ao fuso 22.
Considerando os valores indicados, calcular as coordenadas UTM de todos os pontos no fuso 23.

Tabela 19.21 • Coordenadas UTM conhecidas no


fuso 22 no sistema de referência SIRGAS2000
Pontos E [m] N [m]
P005 809.829,641 7.572.038,287
P006 809.863,375 7.572.152,411
P007 810.166,878 7.571.928,123
P008 810.146,779 7.572.224,971

Figura 19.20 • Ilustração da localização dos pontos (P005), (P006), (P007) e (P008) nos
fusos 22 e 23.

ƒƒ Solução:
1. Realizando os cálculos das coordenadas geodésicas dos pontos (P005), (P006), (P007) e (P008), em função de suas coordenadas
UTM no fuso 22, obtêm-se os valores de coordenadas geodésicas indicados a seguir:

P 005  21o 5543, 2035 P 006  21o 5539, 4753


P 005  48o 0003,1458 P 006  48o 0002, 0492
P 007  21o 5546, 5672 P 008  21o 5536, 9384
P 007   47 o 5951, 3310 P 008   47 o 5952, 2331

2. Com os valores das coordenadas geodésicas conhecidos, pode-se calcular as coordenadas UTM de cada ponto no fuso 23
estendido. Assim, têm-se:

=
EP 005 189 .989, 694 m N P 005 7.572.034,7511 m
=
EP 006 190 .018, 937 m N P 006 7.572.150,108 m
=
EP 007 190 .330,984 m N P 007 7.571.937, 867 m
=
EP 008 190 .299,285 m N P 008 7.572.233,700 m
e-40 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

19.10.3 Elaboração de um projeto de Engenharia em coordenadas planas UTM


A elaboração de um projeto de Engenharia baseado em pontos de apoio com coordenadas UTM, ou seja, sobre o plano da
Projeção UTM, é uma operação que exige conhecimentos científicos e cuidados técnicos por parte do projetista. Ele deve
estar ciente de que os valores das distâncias horizontais envolvidas no projeto estão afetados pelo valor do fator de escala
total (kT), em cada alinhamento. Dessa forma, para poder realizar o seu projeto convenientemente, ele precisa estabelecer
uma estratégia de trabalho adequada, sobre a qual todos os profissionais envolvidos no projeto estejam cientes para as
devidas adequações das distâncias.
A estratégia mais simples de ser aplicada consiste em desconsiderar as coordenas UTM da área de projeto e elaborar o
projeto com as coordenadas determinadas diretamente sobre o Plano de Projeção Local (PTL), implantar a obra, e somente
no final do projeto transformá-las para o Sistema de Projeção UTM.
Uma segunda estratégia que pode ser aplicada consiste em transformar as coordenadas UTM da área de projeto para
coordenadas planorretangulares no PTL ou no Sistema Geodésico Local (SGL) e elaborar o projeto em um desses sistemas. A
elaboração do projeto, nesse caso, é feita sem nenhuma alteração de escala nos valores das distâncias horizontais dos elemen-
tos projetados. As equações para a realização dessas transformações de coordenadas estão apresentadas na Seção 19.11 – Com-
patibilização entre o sistema de coordenadas UTM e os sistemas de referências locais. Notar que estes tipos de transformações
de coordenadas são adequados apenas para projetos de pequenas dimensões. As deformações podem se tornar importantes à
medida em que as distâncias aumentam.
A terceira solução consiste em elaborar o projeto diretamente sobre o Plano de Projeção UTM, ou seja, em coordenadas
UTM. Essa estratégia somente é válida para projetos pequenos, nos quais as deformações das distâncias podem ser despreza-
das ou se pode adotar um fator de escala total (kT) único para todo o projeto.
A escolha da melhor estratégia deve ser discutida e esclarecida entre todos os profissionais envolvidos no projeto. Além dis-
so, recomenda-se realizar o controle das dimensões geométricas apresentadas no projeto em todos os sistemas de coordenadas
utilizados, aplicando as transformações de coordenadas envolvidas no processo.

19.10.4 Implantação de um projeto de Engenharia elaborado em coordenadas UTM


No caso de o projeto ter sido elaborado ou transformado para o Plano de Projeção UTM, ou seja, todas as coordenadas envol-
vidas no projeto são coordenadas UTM, para a sua implantação, é necessário considerar o tipo de instrumento topográfico/
geodésico a ser utilizado. No caso da implantação com instrumentos da tecnologia GNSS-RTK, as operações de campo são
simplificadas pelo fato de esses instrumentos serem capazes de operar diretamente com coordenadas UTM, desde que devi-
damente configurados. O operador, nesse caso, trabalha com as coordenadas UTM, porém, as distâncias topográficas hori-
zontais de implantação são calculadas pelo coletor de dados do instrumento GNSS e os pontos são implantados diretamente
no plano de referência local.
Caso a implantação seja realizada com uma estação total, as distâncias UTM precisam ser corrigidas pelo respectivo fator
de escala total (kT). Isso significa que cada distância calculada no plano de projeção (distância UTM) deve ser dividida pelo
seu respectivo fator de escala total para se obter a respectiva distância horizontal topográfica no terreno. É importante salien-
tar que algumas estações totais possuem recursos para operar diretamente com coordenadas UTM, ou seja, o instrumento
pode ser configurado com os parâmetros da projeção, simplificando as operações de campo. A implantação, neste caso, é
semelhante àquela realizada com instrumentos GNSS-RTK, uma vez que o instrumento realizará os cálculos necessários para
as reduções das distâncias para o plano de referência local.
Como se pode notar, o parâmetro decisivo para a implantação de pontos com coordenadas UTM é o fator de escala total
(kT). Por esta razão, caso se trabalhe com instrumentos da tecnologia GNSS-RTK ou com estações totais com capacidade
para operarem com coordenadas UTM, deve-se avaliar qual o método de cálculo que esses instrumentos utilizam para a
determinação do fator de escala total (kT). O uso de um fator de escala total único para toda a área é sempre desejável, desde
que aceitável. Neste caso, é interessante que o valor considerado para a implantação seja o mesmo adotado para o cálculo do
levantamento, o qual deve fazer parte dos metadados do levantamento. Uma condição importante para que se possa adotar
um valor único para o fator de escala total em todo o projeto é que não existam grandes variações de altitudes na área onde
será implantado o projeto.

19.11 Compatibilização entre o sistema de coordenadas UTM e os sistemas de


referências locais
Embora as vantagens de se trabalhar com o sistema de coordenadas UTM sejam evidentes, em muitos casos, o engenheiro
pode preferir trabalhar com coordenadas planorretangulares referenciadas a um plano de referência topográfico ou geodésico
local, ou seja, sobre um sistema de coordenadas localizado no nível da superfície topográfica, conforme ilustrado na Figura
4.9. Como já enfatizado em outros capítulos, a elaboração de um projeto de Engenharia nesse sistema é facilitada, uma vez que
o projetista não necessita se preocupar com as deformações das figuras geométricas representadas.
Projeção cartográfica e-41

Por estas razões, existem modelos de transformações de coordenadas que permitem compatibilizar as coordenadas de am-
bos os sistemas, ou seja, permitem converter as coordenadas do plano UTM para um sistema de referência local e vice-versa.
Os modelos disponibilizados na literatura são diversos, sendo os mais expressivos apresentados a seguir:
• transformação de coordenadas UTM (N, E) para coordenadas no Plano Topográfico Local (PTL) (XL, YL) por meio da
aplicação da transformação de Helmert 2D;
• transformação de coordenadas espaciais geocêntricas (X, Y, Z) para coordenadas no PGL (XL, YL), segundo as equações
de transformação de coordenadas cartesianas geocêntricas para coordenadas cartesianas topocêntricas;
• transformação de coordenadas geodésicas para coordenadas planorretangulares no Sistema Geodésico Local (SGL),
segundo as equações disponibilizadas na NBR no 14166/1998;
• aplicação da Projeção TM de Baixa Distorção (PBD);
• transformação de coordenadas (UTM) para coordenadas no PTL (XL, YL) por meio de reduções cartográficas.
Na sequência, discutem-se as aplicações práticas de cada uma delas.

19.11.1 Transformação de coordenadas UTM (N, E) para coordenadas no PTL (XL, YL) por meio da
aplicação da transformação de Helmert 2D
Este tipo de transformação baseia-se exatamente no modelo de transformação ortogonal com redundância de pontos homólo-
gos descrito na Seção 4.9.1.2 – Transformação entre sistemas de coordenadas cartesianos planos. Conforme apresentado naque-
la seção, o modelo de transformação baseia-se na existência de pelo menos dois pontos homólogos no sistema de coordenadas
UTM e no sistema de coordenadas topográfico local. Obviamente, na prática, se utiliza muito mais de dois pontos e o cálculo
dos parâmetros de transformação pode ser realizado aplicando a sequência de equações indicadas na Seção 4.9.1.2.2 – Trans-
formação ortogonal com excesso de pontos homólogos ou por meio da aplicação de um método de ajustamento de observações
pelo Método dos Mínimos Quadrados.
Esse tipo de transformação é utilizado com frequência nas implantações de obras, cujo projeto esteja no plano topográ-
fico local e se deseja implantar pontos do projeto com instrumentos GNSS-RTK. Nesse caso, como os instrumentos GNSS
podem disponibilizar coordenadas UTM (ou TM), há a necessidade de se realizar uma transformação de coordenadas. Para
isso, o engenheiro deverá ter uma rede de pontos de apoio com coordenadas conhecidas no Plano Topográfico Local (PTL),
as quais serão selecionadas para rastreamento GNSS, formando, assim, o conjunto de pontos homólogos, com coordenadas
conhecidas em ambos os sistemas (UTM e Local). Com o conjunto de pontos assim definido, determinam-se os parâmetros
de transformação, os quais, depois de inseridos no coletor de dados do instrumento GNSS, permitirão trabalhar com ambos
os sistemas de coordenadas. É importante salientar que os pontos homólogos deverão estar uniformemente distribuídos na
área de projeto. A qualidade dos resultados dependerá da qualidade das coordenadas dos pontos de apoio determinadas em
ambos os sistemas.
Pelo fato de se tratar de uma transformação de coordenadas entre sistemas cartesianos planos, a prática tem mostrado que
as deformações geométricas, geradas pelo modelo, podem se tornar inaceitáveis para áreas maiores que 10 × 10 km, depen-
dendo se o projeto tem extensão predominante no sentido Norte-Sul ou Leste-Oeste. Se no sentido Leste-Oeste, as deforma-
ções são mais expressivas. Para áreas pequenas, no entanto, o método se mostra extremamente confiável, gerando resultados
melhores quando comparado com os demais para uma mesma área. Experiências realizadas por Morais (2019) em uma área
de 3,7 km × 12 km no sentido N-S produziram resultados médios da ordem de ±5 cm nos extremos da área.

19.11.2 Transformação de coordenadas cartesianas geocêntricas (X, Y, Z) para coordenadas cartesianas


topocêntricas no PGL (XL, YL)
Este método de transformação de coordenadas também está apresentado em detalhes na Seção 4.9.2.6 – Transformação das
coordenadas geodésicas para coordenadas planorretangulares no sistema geodésico local (SGL) segundo as equações disponibili-
zadas na (NBR no 14166/1998) e vice-versa. Por esta razão, ele não será discutido aqui. Conforme apresentado naquela seção,
por meio deste método de transformação de coordenadas, pode-se transformar tanto coordenadas cartesianas espaciais geo-
cêntricas como coordenadas geodésicas para o PGL e vice-versa. A transformação utiliza apenas um ponto como origem, o
qual pode ser conhecido no plano geodésico local ou adotado.
A extensão de aplicação deste modelo de transformação de coordenadas é limitada a áreas da ordem de 10 × 10 km.
A mesma experiência citada anteriormente produziu resultados médios da ordem de ±9 cm para este modelo de transformação.

19.11.3 Transformação de coordenadas geodésicas para coordenadas planorretangulares no Sistema


Geodésico Local (SGL), segundo as equações disponibilizadas na NBR no 14166/1998
Este método de transformação de coordenadas também está apresentado em detalhes na Seção 4.9.2.6 – Transformação das
coordenadas geodésicas para coordenadas planorretangulares no sistema geodésico local (SGL) segundo as equações disponibilizadas
e-42 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

na (NBR no 14166/1998) e vice-versa. Por esta razão, ele não será discutido aqui. Conforme apresentado naquela seção, por meio
deste método de transformação de coordenadas pode-se transformar coordenadas geodésicas de uma série de pontos conhecidos
para coordenadas planorretangulares no SGL e vice-versa. Da mesma forma que a seção precedente, esse tipo de transformação
utiliza apenas um ponto como origem, o qual pode ser conhecido no plano geodésico local ou adotado.
A Norma Brasileira (NBR no 14166/1998) indica que a extensão para a aplicação deste método de transformação de coor-
denadas pode ser da ordem de 100 × 100 km. Os autores consideram que essa afirmação deve ser vista com resguardo.
Os resultados podem variar sensivelmente dependendo do relevo do terreno. A mesma experiência citada anteriormente
também produziu resultados médios da ordem de ±9 cm para este modelo de transformação.

19.11.4 Projeção TM de Baixa Distorção (PBD)


Outro tipo de solução que pode ser utilizada para a obtenção de coordenadas com distorções compatíveis com as de um plano
geodésico local é o uso de um sistema TM com fator de escala no meridiano central (k0) calculado em função da média das
altitudes da área de projeto, conforme descrito na sequência.
Considera-se, neste caso, que se conhecem as coordenadas geodésicas de todos os pontos envolvidos no projeto. Em seguida,
deve-se definir o meridiano central e a latitude de origem do sistema local. Define-se, assim, um ponto de origem, o qual pode
ser o centro aproximado da área de interesse, um local físico específico, um ponto pertencente à Rede de Controle Geodésica já
existente ou outros. A esse ponto atribui-se um par de valores de coordenadas planas, de maneira que, ao longo de toda a extensão
da área, não se trabalhe com números negativos nem se confunda com os valores das coordenadas UTM dos mesmos pontos.
Em seguida, define-se a altura elipsoidal (h0) a ser adotada para o ponto de origem, a qual deve ser definida em função da
média das alturas elipsoidais do terreno da área de projeto. Com esse valor conhecido, se estabelece uma projeção TM, cuja
superfície de projeção seja tangente ao elipsoide de referência na altura elipsoidal de (h0). Nestas circunstâncias, o valor do
fator de escala (k0) tangente a ser adotado para o meridiano central deve ser calculado pela equação (19.65).
h0
k0  1  (19.65)
R0
Assim, com o fator de escala (k0) calculado, pode-
se determinar as coordenadas TM aplicando as equa-
ções apresentadas na Seção 19.4.1 – Transformação
de coordenadas geodésicas (φg, λg) para coordenadas
UTM (N, E).
A Projeção TM de baixa distorção, conforme des-
crito, é uma projeção tangente na altitude elipsoidal
média (h0) da área de projeto (ver Fig. 19.21). Ela
pode, contudo, ser abaixada levemente de maneira a
tornar-se secante. Esse rebaixamento pode ser realiza-
do aplicando um fator adicional (kr), aumentando, as-
sim, a extensão da zona utilizável, conforme ilustrado
na Figura 19.22.
O fator adicional (kr) pode ser calculado aplicando a
equação (19.66). Figura 19.21 • Projeção TM de baixa distorção considerando a tangente à
superfície de projeção.
  l 
kr  cos arcsen   (19.66)
  2R 0  
O novo fator de escala para o meridiano central para
a projeção secante passa então a ser denominado (k0s) e
pode ser determinado aplicando a equação (19.67).

k0 s = k0 * kr (19.67)

em que:
kr = fator de redução de escala adicional;
l = extensão do projeto (maior dimensão);
R0 = raio médio local da Terra.

Em seguida, caso se deseje, pode-se verificar a defor-


mação (δi) para um conjunto de pontos distribuídos por Figura 19.22 • Projeção TM de baixa distorção considerando a secante à
toda a área de projeto, de acordo com a equação (19.68). superfície de projeção.
Projeção cartográfica e-43

R0
 i  ksi * 1 (19.68)
R0  hi
em que:
R0
 i  ksi =* fator deescala
1 da projeção no ponto (i), conforme equação (19.50) ou (19.51);
R0  hi
hi = altura elipsoidal do ponto considerado.

Multiplicando o coeficiente (δi) pela distância entre os pontos, obtém-se a deformação na unidade de distância utilizada.
Notar que, multiplicando o coeficiente por 1.000.000, obtém-se a deformação em ppm.
Pelo fato de o processo de definição de uma PBD ser um problema de otimização, é necessário realizar avaliações repetidas.
O valor final é aquele considerado adequado para o projeto em questão.
A PBD aproxima a projeção LTM à superfície terrestre, tornando possível que o engenheiro elabore seus projetos e realize a
sua implantação em campo sem se preocupar com fatores de escala. Além disso, ele pode mesclar medições GNSS e medições
com estações totais sem se preocupar com a aplicação de um fator de escala combinado para cada ponto. Porém, é importante
salientar que se deve documentar e manter os parâmetros definidores da PBD como metadados do projeto, pois apesar das
vantagens apresentadas, ela somente poderá se relacionar como outros sistemas por meio de suas coordenadas geodésicas.
A mesma experiência citada anteriormente produziu resultados médios da ordem de ±10,5 cm para este modelo de trans-
formação no modo tangente.

19.11.5 Transformação de coordenadas planas (UTM) para coordenadas planas locais (XL, YL) por meio
de reduções cartográficas
Para alguns casos específicos em que não se necessita de uma precisão elevada, pode-se realizar a transformação das coor-
denadas planas UTM (N, E) para coordenadas planas locais (XL, YL) aplicando uma rotação, em função da convergência me-
ridiana e a adequação da distância topográfica, em função do valor do fator de escala total, calculado em função da altitude
média do local e das coordenadas UTM de um ponto tomado como referência.
Para a aplicação deste método, inicialmente, deve-se definir um ponto como sendo o ponto de origem (P0) com coordena-
das adotadas, vinculadas ao plano local. A sequência de cálculo, neste caso, é a seguinte:
1. Escolher um ponto da área de trabalho para origem do sistema local (P0).
2. Calcular a convergência meridiana e o fator de escala total (kT) nesse ponto.
3. Calcular os azimutes da quadrícula (AzQ) dos alinhamentos PoPi e corrigi-los com o valor da convergência meridiana
e a redução à corda.
4. Calcular as projeções (DXPoPi) e (DYPoPi) de cada alinhamento considerando o fator de escala total (kT).
5. Calcular as coordenadas transformadas para cada ponto (Pi).
As equações a serem aplicadas são as seguintes:
E
AzQ arctg 180 conforme equação (19.63)
N
    XII  * p   XIII  * p3   C5  * p5 conforme equação (19.41)

 2E   E  
   A 2 B
 AB  *  N B  N A  *   conforme equação (19.47)
 6R0 

Az g  AzQ     conforme equação (19.64)

dUTM P0 Pi
X P0 Pi * sen Az g P0 Pi (19.69)
kT
dUTM P0 Pi
YP0 Pi * cos Az g P0 Pi (19.70)
kT

XL Pi XL P0 X P0 Pi (19.71)

YL Pi YL P0 YP0 Pi (19.72)
e-44 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

A aplicação deste método deve ser realizada com resguardo, uma vez que se trata de um método aproximado sem con-
sistência algébrica com o modelo de projeção cartográfica adotado. Ele pode, entretanto, ser útil para casos em que a área de
projeto é pequena e possui muito pouca variação altimétrica.
A mesma experiência citada anteriormente produziu resultados médios da ordem de ±9,5 cm para esse modelo de trans-
formação.
Para auxiliar o leitor no entendimento da aplicação dos métodos de transformações de coordenadas apresentadas nas se-
ções precedentes, apresentam-se no Exemplo aplicativo 19.12 os cálculos referentes às transformações de coordenadas de uma
série de pontos de coordenadas conhecidas em diferentes sistemas de coordenadas.

Exemplo aplicativo 19.12


Considerando os valores das coordenadas planas UTM, topográficas locais e geodésicas dos pontos indicados nas Tabelas
19.22 e 19.23, calcular as suas coordenadas no PTL ou no PGL aplicando os cinco modelos de transformação de coordenadas
apresentados nas seções anteriores. Comparar os resultados.

Tabela 19.22 • Coordenadas conhecidas


Coordenadas UTM Coord. Geodésicas SIRGAS 2000 Coordenadas PTL
Altitude
Pontos XL YL
E [m] N [m] Latitude Longitude [m]
[m] [m]
E007 204.031,2178 7.560.476,9482 –22°02907,370299 –47°52901,853199 151.889,9871 253.644,0658 867,029
E010 204.729,0177 7.560.947,1156 –22°01952,522999 –47°51937,233699 152.596,0920 254.100,8250 866,868
E020 204.584,4814 7.559.967,1848 –22°02924,266599 –47°51942,909799 152.433,3026 253.124,3034 877,881
E031 203.446,7804 7.560.309,7056 –22°02912,445799 –47°52922,325499 151.302,8407 253.487,8928 867,787
E011 204.543,5922 7.560.971,5163 –22°01951,617499 –47°51943,678099 ? ? –
E014 203.551,8201 7.560.860,4734 –22°01954,619299 –47°52918,304599 ? ? –

Tabela 19.23 • Coordenadas cartesianas geocêntricas conhecidas


Pontos X [m] Y [m] Z [m]
E007 3.968.636,9733 –4.387.123,2687 –2.378.370,1722
E010 3.969.275,4490 –4.386.776,4898 –2.377.946,7276
E011 3.969.145,4939 –4.386.908,3527 –2.377.920,9607
E014 3.968.379,3952 –4.387.541,8844 –2.378.002,7274
E020 3.968.915,7713 –4.386.621,6076 –2.378.856,0469
E031 3.968.162,6977 –4.387.474,2173 –2.378.515,1891

ƒƒ Solução:
Para aplicação dos modelos matemáticos apresentados anteriormente, todos os cálculos serão realizados tomando o ponto (E010)
como referência. Assim, têm-se:
1. Os cálculos relativos à aplicação da transformação de Helmert 2D estão apresentados no Exemplo aplicativo 4.5. Para a de-
terminação dos parâmetros de transformação foram tomados como referência os pontos (E007), (E010), (E020) e (E031).
A partir deles foram obtidas as coordenadas dos pontos (E011) e (E014), cujos resultados estão transcritos na Tabela 19.27.
2. Os cálculos relativos à aplicação da transformação de coordenadas geocêntricas (X, Y, Z) para coordenadas topocêntri-
cas (XL, YL) estão apresentados no Exemplo aplicativo 4.13. Para os referidos cálculos tomou-se como referência o ponto
(E010), a partir do qual foram obtidas as coordenadas dos pontos (E011) e (E014), cujos resultados estão transcritos na
Tabela 19.27.
3. Os cálculos relativos à aplicação da transformação de coordenadas geodésicas para coordenadas planorretangulares no
Sistema Geodésico Local (SGL), segundo as equações disponibilizadas na (NBR no 14166/1998), estão apresentados no
Exemplo aplicativo 4.16. Para os referidos cálculos tomou-se como referência o ponto (E010), a partir do qual foram obti-
das as coordenadas dos pontos (E011) e (E014), cujos resultados estão transcritos na Tabela 19.27.
4. Os cálculos das coordenadas LTM aplicando o princípio da Projeção TM de Baixa Distorção (PBD) estão apresentados na
sequência. Para os referidos cálculos tomou-se como referência o ponto (E010), a partir do qual foram obtidas as coorde-
nadas dos pontos (E011) e (E014), cujos resultados estão apresentados na Tabela 19.27.
Projeção cartográfica e-45

O primeiro passo para a aplicação desta transformação de coordenadas é o cálculo da altitude média do local, que, se-
gundo a Tabela 19.23, é igual a 869,891 m. Aqui desconsiderou-se a ondulação geoidal para se manter em acordo com os
resultados dos exemplos anteriores. O raio médio local da Terra, calculado anteriormente para o local, é igual a 6.362.746 m.
O passo seguinte é calcular o fator de escala no meridiano central da LTM, aplicando as equações (19.65), (19.66) e
(19.67). Assim, considerando que a largura máxima do projeto é igual a 1.500 metros, têm-se:

869, 891   1.500  


k0  1   1, 000136716 kr  cos arcsen    0, 999999993
6.362.746   2*6.362.746  
k 0 s  1, 000136716 * 0, 999999993  1, 000136709

Com a fator de escala calculado e adotando o ponto (E010) como ponto central da projeção cartográfica, pode-se
determinar as coordenadas dos pontos (E011) e (E014) aplicando as equações (19.5) a (19.22). Assim, considerando
que o meridiano central é o meridiano que passa no ponto (E010) e o valor do fator de escala no meridiano central é
igual ao valor calculado para (k0s), obtêm-se os valores indicados na Tabela 19.24. Para que seja possível comparar os
resultados das transformações de coordenadas apresentadas na Tabela 19.27, deve-se transladar a origem do sistema
de coordenadas da PBD para o ponto (E010). Este procedimento pode ser realizado calculando as coordenadas PBD do
ponto (E010) e utilizando o valor calculado como valor da translação no eixo (Y). Têm-se, assim, os valores indicados
na Tabela 19.25 para os parâmetros da transformação de coordenadas geodésicas para coordenadas no PBD dos pontos
(E010), (E011) e (E014). As coordenadas transformadas estão indicadas na Tabela 19.27.

Tabela 19.24 • Parâmetros para o cálculo das coordenadas PBD dos pontos (E010), (E011) e (E014)
E010 S = –2.437.261,5097 m Δλ = 099 p=0 (I) = –2.437.594,7062 m
(II) = –2.608,0085 m (III) = –2,1458 m (IV) = 286.815,6092 m (V) = 81,2970 m
A6 = –0,0016 m B5 = 0,0205 m N´ = –2.437.594,7062 m E9 = 0,0 m
E011 S = –2.437.233,6579 m Δλ = –6,444499 p = –0,000644440 (I) =–2.437.566,8506 m
(II) = –2.607,9848 m (III) = –2,1458 m (IV) = 286.815.816,1157 m (V) = 81,2978 m
A6 = –0,0016 m B5 = 0,0205 m N9 = –2.437.566,8516 m E9 = –184,8358 m
E014 S = –2.437.325,9888 m Δλ = –41,070999 p = –0,004107090 (I) = –2.437.659,1941 m
(II) = –2.608,0634 m (III) = –2,1458 m (IV) = 286.814,4364 m (V) = 81,2951 m
A6 = –0,0016 m B5 = 0,0205 m N9 = –2.437.659,2381 m E9 = –1.177,9727 m

5. Os cálculos da transformação de coordenadas UTM para coordenadas no Plano Topográfico Local (XL, YL) por meio de re-
duções cartográficas estão apresentados na sequência. Para os referidos cálculos tomou-se como referência o ponto (E010),
a partir do qual foram obtidas as coordenadas dos pontos (E011) e (E014).
Os resultados dos cálculos parciais para a transformação de coordenadas estão indicados nas Tabelas 19.25 e 19.26. Notar
que alguns valores relacionados aos pontos (E010) e (E014) são conhecidos de exemplos aplicativos anteriores. Os relacio-
nados com o ponto (E011) foram calculados para este exemplo. Os cálculos não estão indicados neste texto.
Para o cálculo do fator de escala altimétrico médio considerou-se a altitude média do local como igual a 869,891 m e o raio
médio da Terra no local como sendo igual a 6.362.746 m.

Tabela 19.25 • Convergência meridiana e fatores de escala


Conv. Meridiana Redução à kUTM
Lado kUTM kUTM médio kalt kT
E010 corda E010
E010-E011 0,01835777199 1,000678746 1,000678070 1,000541279
1,073729724 1,000677393 0,999863302
E010-E014 0,06525788799 1,000686002 1,000681697 1,000544906

Tabela 19.26 • Distâncias, azimutes e coordenadas transformadas


Dist. UTM Dist. topo
Lado AzUTM Azg ΔX [m] ΔY [m] XL [m] YL [m]
[m] [m]
E010-E011 187,024 186,923 277°29947,939199 278°34913,347899 –184,8357 27,8560 152.411,256 254.128,681
E010-E014 1.180,382 1.179,739 265°47926,153799 266°51951,646099 –1.177,9726 –64,5319 151.418,119 254.036,293
e-46 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Apresenta-se na Tabela 19.27 um resumo comparativo das coordenadas topográficas calculadas para cada modelo de
transformação.

Tabela 19.27 • Coordenadas topográficas calculadas para os pontos (E011) e (E014)


E011 E014
Modelo de transformação
XL [m] YL [m] XL [m] YL [m]
Transformação Helmert 2D 152.411,258 254.128,680 151.418,120 254.036,295
Plano topográfico local 152.411,257 254.128,681 151.418,124 254.036,292
NBR no 14166/1998 152.411,256 254.128,680 151.418,120 254.036,293
Baixa distorção (PBD) 152.411,256 254.128,680 151.418,119 254.036,293
Plano topográfico local, por meio de reduções cartográficas 152.411,256 254.128,681 151.418,119 254.036,293
20 Sistemas de navegação
global (GNSS)

20.1 introdução
Conforme apresentado nos diversos capítulos deste livro, as determinações das coordenadas de um ponto no espaço, também
referido como posicionamentos,1 em geral, se baseiam em medições de direções horizontais, ângulos verticais e distâncias rea-
lizadas por meio de instrumentos topográficos instalados sobre a superfície terrestre e orientados sobre uma rede de pontos de
apoio provenientes de um sistema de referência geodésico ou topográfico local predeterminado. As exceções a estas prerroga-
tivas são as determinações de coordenadas por meio de técnicas aerofotogramétricas (Capítulo 22 – Aerofotogrametria), por
meio de escâneres aéreos (Capítulo 21 – Tecnologia de varredura laser) e as obtidas mediante rastreamentos de sinais emitidos
por satélites artificiais, conforme discutido neste capítulo.
Como o leitor terá oportunidade de verificar ao longo deste texto, o surgimento do posicionamento por meio de satélites
artificiais revolucionou inúmeras atividades do cotidiano humano, como as redes sociais, o deslocamento de pessoas e cargas,
a agricultura, a Engenharia e muitos outras. Embora desenvolvido, inicialmente, com objetivos militares, rapidamente ele se
tornou disponível para a comunidade civil e diversos sistemas de posicionamento baseados nele foram desenvolvidos por
diferentes países, estabelecendo o que se denomina Sistemas de Navegação Global por Satélite, cuja sigla em inglês é GNSS
(Global Navigation Satellite System). Tem-se assim, atualmente, um conjunto de sistemas de posicionamento espacial que
provê informações de posição e tempo 24 horas por dia, em qualquer lugar da Terra e sob quaisquer condições atmosféricas.
A discussão sobre os detalhes desses sistemas, os métodos de determinação de coordenadas (posicionamento) e os levanta-
mentos topográficos e geodésicos por meio dessa tecnologia, para fins de Engenharia, é o objetivo deste capítulo.

20.2 Estrutura dos sistemas GNSS


As determinações de coordenadas de pontos no espaço por meio do rastreamento2 de sinais emitidos por satélites artificiais,
ou, simplesmente, posicionamento por satélites, tiveram início imediatamente após o lançamento dos primeiros satélites na
década de 1960. Baseando-se na suposição de que seria possível conhecer as coordenadas de uma estação rastreadora de sa-
télites, posicionada no solo, por meio do conhecimento das órbitas dos satélites rastreados e de suas posições com relação a
um sistema de referência terrestre, a marinha norte-americana declarou operacional, em 1964, o sistema de posicionamento
espacial denominado Navy Navigational Satellite System (NNSS), também conhecido como Sistema TRANSIT, o qual oferecia
uma precisão da ordem de 400 metros.
Os resultados animadores desse primeiro sistema levaram a Força Aérea América a propor, em 1973, o desenvolvimento
de um novo sistema, o qual foi denominado Sistema de Posicionamento Global NAVSTAR (NAVigation Satellite Timing And
Ranging), também conhecido como Sistema GPS ou, simplesmente, GPS. A adoção desse sistema pelas comunidades civis e
militares foi imediata, tornando-o sinônimo de posicionamento por meio de rastreamento de sinais de satélites.

1 Posicionamento: o mesmo que determinar a posição com relação a um sistema de coordenadas. No caso dos sistemas GNSS, usualmente, o
sistema cartesiano geocêntrico.
2 Rastrear um sinal de satélite significa receber contínua e remotamente, por meio de uma antena receptora de sinais, informações emitidas por

um satélite artificial.
e-48 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Paralelamente ao desenvolvimento do sistema GPS, em 1982, a ex-União Soviética iniciou testes com um novo siste-
ma de posicionamento por satélites, semelhante ao GPS, denominado Globalnaya Navigatsionnaya Sputnikovaya Systema
(GLONASS). O seu uso foi, inicialmente, restrito ao seu território e seus aliados, para fins militares e estratégicos, mas se
tornou também um sistema disponível para a comunidade civil mundial a partir dos anos 2000.
Em razão do sucesso desses sistemas e para diminuir a dependência com relação a eles, a Comunidade Europeia decidiu
também desenvolver um sistema de posicionamento global para os países integrantes daquela comunidade, denominado
Sistema GALILEO, que se tornou efetivo a partir de 2016 e está contando com uma constelação de 22 satélites ativos em maio
de 2022 (https://www.gsc-europa.eu/system-service-status/constellation-information, acesso em: 31 maio 2022).
Existem vários outros sistemas disponíveis para diferentes comunidades, entre os quais se destacam o sistema BeiDou,
desenvolvido pela China e disponibilizado para a comunidade civil mundial; o sistema japonês Quasi-Zenith Satellite System
(QZSS), disponibilizado para as regiões do Japão e da Oceania; o sistema IRNSS, em desenvolvimento pela Índia; e os sistemas
SLR e o DORIS, já citados no Capítulo 3 – Referências geodésicas e topográficas.
O termo GNSS engloba, portanto, uma gama de tecnologias de posicionamento espacial que permite determinar a posição
geográfica, distâncias, direções, velocidades e a hora local de uma antena receptora localizada em qualquer ponto da superfície
terrestre ou próximo a ela.
Conforme ilustrado na Figura 20.1, para que um sistema GNSS possa gerar dados geoespaciais condizentes com as necessi-
dades das Geociências, ele é composto por três segmentos, que, em conjunto, garantem a qualidade dos dados gerados. São eles:
Segmento espacial: composto pela cons-
telação de satélites artificiais que orbitam
em torno da Terra, segundo planos orbitais
predefinidos e com altitudes variadas, por
meio dos quais são determinadas as coorde-
nadas espaciais de cada satélite ao longo de
sua trajetória, com relação a um sistema de
referência específico, e que são disseminadas
pelas efemérides do satélite. Os satélites são
munidos de processadores de tempo, emisso-
res de ondas eletromagnéticas e de geradores
de códigos, entre outros sinais GNSS, que são
transmitidos por suas antenas para as ante-
nas receptoras do seguimento do usuário.
Segmento de controle: composto por esta-
ções terrestres (antenas de controle e estações
monitoras) que controlam continuamente a
qualidade dos sinais GNSS emitidos e as po- Figura 20.1 • Segmentos dos sistemas GNSS.
sições dos satélites ao longo de suas trajetó-
rias orbitais. Os dados coletados de cada satélite são enviados para uma Estação Master, a qual calcula as posições e as correções
dos parâmetros gerados para os satélites e as retransmitem por meio dos próprios satélites para o segmento do usuário.
Segmento do usuário: composto por qualquer usuário que seja capaz de captar, por meio de uma antena e de um processa-
dor de sinais, denominado receptor, os sinais emitidos pelos satélites GNSS e os utilize para aplicações diversas. Em princípio,
as antenas/receptores utilizados pelos usuários são entidades passivas que apenas recebem sinais emitidos pelos satélites. Eles
nunca transmitem sinais para os satélites. Existem situações, contudo, que os sinais recebidos podem ser retransmitidos para
outras antenas receptoras, como nos levantamentos com o método de posicionamento diferencial no modo RTK3 e nos casos
das estações ativas, por exemplo, as estações de referência de operação contínua (CORS, do inglês Continuously Operating
Reference Station), que são estações fixas de rastreamento de satélites e que disponibilizam os dados rastreados de forma con-
tínua para usuários autorizados.

20.3 Composição dos sistemas GNSS


Para orientação geral ao leitor sobre as características dos principais sistemas de posicionamento que compõem os sistemas GNSS,
apresentam-se, na sequência, os detalhes técnicos mais expressivos de cada um deles, considerando o seu uso em Geomática.

20.3.1 Sistema GPS


O sistema GPS foi projetado para oferecer uma constelação mínima de 24 satélites. Porém, nos últimos anos, este número tem
sido sempre superior. Os satélites são alocados em planos inclinados descrevendo órbitas elípticas, com período orbital de

3 Ver Seção 20.6.3 – Método de posicionamento diferencial.


Sistemas de navegação global (GNSS) e-49

11h57958,39 (tempo solar), a uma altitude aproximada de 20.200 km acima da superfície terrestre, divididos em seis planos
orbitais com inclinação igual a 55° com relação ao plano do Equador e cobrindo as latitudes entre 80°N e 80°S, conforme ilus-
trado na Figura 20.2. Essa configuração garante, a qualquer instante, a existência mínima de quatro satélites acima da linha do
horizonte de uma antena receptora localizada sobre a superfície terrestre.

Figura 20.2 • Constelação de satélites GPS.


Fonte: adaptada de Segantine (2005).

Os sinais emitidos pelos satélites da constelação GPS incluem códigos pseudoaleatórios e informações sobre as efemérides trans-
mitidas (broadcast ephemeris) que contêm os elementos keplerianos que permitem calcular as posições dos satélites no momento da
emissão do sinal, os coeficientes de correções ionosféricas, os coeficientes de correções dos relógios do satélite e a condição de “saú-
de” do satélite, entre outros. Após a passagem do satélite, é possível ainda conhecer as suas coordenadas precisas em instantes predeter-
minados por meio do que se denomina efemérides precisas,4 que são disponibilizadas por instituições que compõem a rede do IGS
(International GNSS Service),
ou junto a agências autorizadas,
algumas horas ou dias após o
rastreamento dos satélites.
Uma característica impor-
tante do sistema GPS é que to-
dos os satélites da constelação
emitem sinais com a mesma
frequência e com as mesmas
informações básicas relativas
ao momento em que o sinal é
emitido pela antena do satélite.
A frequência fundamental
gerada pelos satélites do sis-
tema GPS se baseia em uma
onda eletromagnética deno-
minada Band L, com valor
igual a 10,23 MHz. Baseado
nessa frequência, um oscila-
dor gera outros componentes
dos sinais, conforme indica-
do na Figura 20.3, os quais
são utilizados para as medi-
ções de posicionamento com
o sistema GPS. Figura 20.3 • Estrutura básica dos sinais do sistema GPS.
4 Como o próprio nome sugere, as efemérides precisas são de melhor qualidade que as efemérides transmitidas pelos satélites no momento das
observações. Existem três tipos de efemérides precisas: (1) IGU – ultrarrápidas – são disponibilizadas com latência de 3 a 4 horas por dia pelo
IGS; (2) IGR – rápidas – são disponibilizadas com latência de 17 a 42 horas pelo IGS; (3) IGS – precisas – são disponibilizadas com latência de 12
a 18 dias pelo IGS. Elas podem ser obtidas, por exemplo, em https://cddis.nasa.gov/Data_and_Derived_Products/GNSS/orbit_products.html.
e-50 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

A primeira onda portadora de sinal é de-


nominada (L1). Ela é modulada5 com qua-
tro tipos de códigos falsamente aleatórios,
sendo: dois com frequência de 1,023 MHz,
denominados código-C/A e código-L1C; um
com frequência de 5,115 MHz, denominado
código-M (militar); e o quarto com frequên-
cia de 10,23 MHz, denominado código-P.
Para que o leitor entenda melhor o signi-
ficado de modulação da onda, apresenta-se
graficamente na Figura 20.4 o efeito da mo- Figura 20.4 • Efeito da modulação com o código-P.
dulação da onda portadora com o código-P.
O código-C/A e o código L1C estão disponíveis para a comunidade civil enquanto o código-M e o código-P são reservados
apenas para uso das forças armadas norte-americanas e para usuários autorizados. Todos são códigos binários, ou seja, pos-
suem somente valores 1 ou –1.
O sistema disponibiliza, ainda, um segundo código civil, denominado código-L2C, modulado na portadora (L2), o qual garante
maior robustez de sinal diminuindo os efeitos das interferências externas e maior precisão nas medições em condições adversas.
O código-P, por requisito militar, é deliberadamente criptografado para derivar o código-Y, que só pode ser lido por recep-
tores autorizados pelo governo norte-americano. Este procedimento criptográfico do código-P para o código-Y é denominado
efeito AS (anti-spoofing).
Além das duas ondas portadoras principais, o sistema possui ainda uma terceira, denominada (L5), com frequência igual a
1.176,45 MHz e cujo objetivo é prover maior apoio à navegação.
Para a comunidade civil, os serviços disponíveis pelo sistema GPS são denominados Standard Positioning Service (SPS),
enquanto os serviços com autorização restrita são denominados Precise Positioning Service (PPS).
O sistema geodésico de referência utilizado pelo sistema GPS é o Sistema Geodésico WGS84, conforme descrito na Seção
3.4.1.2 – Sistema geodésico WGS84.

20.3.2 Sistema GLONASS


O sistema GLONASS foi projetado para oferecer uma constelação mínima de 21 satélites para transmitirem continuamente
os sinais em duas bandas de frequências, possibilitando a aplicação dos mesmos princípios de medição do sistema GPS. Os
satélites estão distribuídos em três planos orbitais com um ângulo de 64,8° com o plano equatorial e orbitam a uma altitude
da ordem de 19.100 km com um período aproximado de 11h1594499 (tempo solar).
A maior diferença entre os sistemas GLONASS e GPS é que cada satélite GLONASS transmite ondas portadoras com fre-
quências próprias. Assim, considerando (k) o canal atribuído a determinado satélite (variando de 1 a 24), têm-se as bandas de
frequência indicadas pelas equações (20.1) e (20.2).
9
Banda de frequência L1 → f1  k   1.602  k MHz (20.1)
16

7
Banda de frequência L2 → f 2  k   1.246  k MHz (20.2)
16
As frequências transmitidas pelos satélites GPS e GLONASS são muito próximas e, por esta razão, é possível usar uma
antena combinada e um amplificador comum no mesmo equipamento, o que permite que o usuário possa utilizar um único
receptor para captar sinais de ambos os sistemas.
Igualmente ao sistema GPS, o código-C/A está disponível para os usuários civis, enquanto o código-P está disponível para
os usuários autorizados. Ambos os códigos são modulados na portadora (L1) e na portadora (L2) somente com o código-P. A
frequência fundamental emitida pelo sistema é igual a 0,511 MHz para o código-C/A e 5,11 MHz para o código-P.
O GLONASS oferece dois níveis de precisão: um sinal de alta precisão – o Channel of High Accuracy (CHA) – e um sinal
de precisão padrão – o Channel of Standard Accuracy (CSA). Tal como o GPS, o sinal de alta precisão (CHA) é prerrogativa
dos usuários militares, ao passo que o sinal padrão (CSA) é liberado para os usuários civis. Diferentemente do sistema GPS, o
sistema GLONASS nunca teve a degradação seletiva dos sinais.
O sistema de coordenadas das órbitas dos satélites GLONASS é ba- Tabela 20.1 • Parâmetros definidores do elipsoide PZ90
seado no Sistema Geodésico SGS85/SGS90, o qual utiliza como refe- Elipsoide Semieixo maior [m] Achatamento
rência geodésica o elipsoide PZ90 (ver Tab. 20.1).
PZ90 6.378.136 1/298,257
Para mais informações sobre o sistema GLONASS, o leitor pode
consultar o website https://www.glonass-iac.ru/en.
5A modulação, neste caso, significa sobrepor os códigos na onda portadora e transmiti-los juntamente com ela.
Sistemas de navegação global (GNSS) e-51

20.3.3 Sistema GALILEO


O Sistema GALILEO é totalmente compatível com os sistemas GPS e GLONASS, porém, se encontra ainda em fase de com-
plementação da constelação. Quando o projeto estiver totalmente instalado, prevê-se a disponibilidade de 27 satélites opera-
cionais e três de reservas, localizados em três planos orbitais com um ângulo de 56° com o plano equatorial e com altitudes
de 23.257 km e 23.222 km. O período orbital é de 14h494599 e há repetição de passagem por um mesmo ponto terrestre apro-
ximadamente a cada 10 dias. Esta configuração garante uma boa
cobertura para todos os países da Comunidade Europeia, norte da Tabela 20.2 • Portadoras do sistema GALILEO
África e até regiões de 75° de latitude. O sistema oferecerá cinco ní-
Relação com a frequência
veis de serviços para os usuários: (1) serviço de acesso aberto (OS); Portadora fundamental de 10,23 MHz
Frequência
(2) serviço de acesso comercial (CS); (3) serviço com segurança de média [MHz]
do sistema GPS
vida (SoL); (4) serviço público regulado (PRS); e (5) serviço de bus-
E5A 115 1.176,45
ca e resgate (SAR).
O Sistema GALILEO transmitirá em três bandas de frequências: E 5B 117,5 1.207,14
(E5), (E6) e (E1). Para tanto, são utilizadas quatro portadoras: (E5A), E6 125 1.278,75
(E5B), (E6) e (E1), conforme indicado na Tabela 20.2. Notar que as E1 154 1.575,42
portadoras (E5A) e (E1) têm as mesmas frequências das portadoras
(L1) e (L5) do sistema GPS.
O sistema de referência geodésico utilizado pelo sistema GALILEO é o GALILEO Terrestrial Reference Frame (GTRF), re-
lacionado com o International Terrestrial Reference Frame (ITRF). Mais detalhes podem ser obtidos na Seção 3.4.1.1 – Sistema
geodésico ITRS e em literaturas especializadas no assunto.

20.3.4 Sistema BeiDou


O BeiDou é um sistema de posicionamento global em operação par- Tabela 20.3 • Portadoras do sistema BeiDou
cial e que oferece informações de posicionamento compatíveis com
Relação com a frequência
os sistemas GPS, GLONASS e GALILEO. Quando totalmente opera- Frequência
Portadora fundamental de 10,23 MHz
cional, os satélites dessa constelação terão satélites geoestacionários média [MHz]
do sistema GPS
(GEO – a uma altitude de 35,786 km) e satélites orbitais (MEO, ope-
B1 152,6 1.561,098
rando a uma altitude de 21,528 km, e IGSO, operando a uma altitude
de 35,786 km), ambos com uma inclinação de 55° com relação ao B2 118,0 1.207,140
plano equatorial. Este sistema utiliza três faixas de frequências, B 3 124,0 1.268,520
conforme indicado na Tabela 20.3. Em maio de 2022, o sistema
contava com 55 satélites operacionais ativos (http://www.csno-tarc.cn/en/system/constellation, acesso em: 31 maio 2022).
O sistema geodésico de referência utilizado é o China Geodetic Coordinate System 2000 (CGCS2000), o qual está relacio-
nado com o ITRS.

20.3.5 Sistema QZSS


O QZSS (Japanese Quase Zenith Satellite System) é um sistema de Tabela 20.4 • Portadoras do sistema QZSS
posicionamento regional disponibilizado pelo Japão desde 2010. Relação com a frequência
Frequência
Ele consiste em uma constelação de quatro satélites quase-zenital Portadora fundamental de 10,23 MHz
média [MHz]
que orbitam a uma altitude da ordem de 32.000 km e a uma ele- do sistema GPS
vação acima de 70°, permitindo a sua posição acima do horizonte L1 C/A 154 1.575,42
por mais de 12 h/dia. A Tabela 20.4 apresenta as portadoras e suas L1C 154 1.575,42
frequências emitidas pelo sistema. O QZSS está apoiado no sistema
L1-SAIF 154 1.575,42
geodésico japonês, o qual utiliza o elipsoide GRS80 como referência.
As portadoras (L1C/A), (L1C), (L2C) e (L5) são compatíveis com os L2C 120 1.227,60
receptores GNSS, o que torna o sistema QZSS útil para a região do LEX 125 1.278,75
Japão e países vizinhos. Mais informações sobre este sistema podem L5 115 1.176,45
ser obtidas em literaturas especializadas no assunto.

20.3.6 Sistema IRNSS


O sistema IRNSS (Indian Regional Navigation Satellite System) foi disponibilizado em 2006 pelo governo da Índia para
atender as necessidades daquela região. A constelação está composta por sete satélites, sendo três geoestacionários locali-
zados nas longitudes 32,5°, 83° e 131,5°; quatro satélites descrevem órbitas predefinidas, sendo dois com plano orbital de
55° de inclinação e dois satélites com plano orbital de 111,75° com relação ao equador. Este sistema oferece dois tipos de
serviços: posicionamento padrão (SPS) e posicionamento restrito (RS), ambos baseados nas portadoras (L5) e (E5A), com-
patíveis com os sistemas GPS e GALILEO.
e-52 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

20.3.7 Sistemas SBAS


Os sistemas SBAS (Space-Based Augmentation Systems) são compostos por satélites geoestacionários implantados com o ob-
jetivo de melhorar o desempenho dos serviços prestados pelos sistemas GNSS. Eles se baseiam em uma rede de estações de
referência CORS, conectadas a um centro de processamento, que permite a coleta de dados e a transmissão de informações
aos usuários dos sistemas GNSS, por telecomunicação.
A rede CORS registra as observações GNSS continuamente e por meio de suas medições determina parâmetros de corre-
ções que são enviados aos satélites geoestacionários e deles para os receptores dos usuários. Como se verá nas próximas seções
deste capítulo, com essas correções é possível alcançar precisões de posicionamento GNSS da ordem do metro, o que, para
muitas aplicações de posicionamento terrestre, é de grande valia
Vários países implementaram seus próprios sistemas SBAS, conforme apresentado a seguir:
• Comunidade Europeia: sistema EGNOS (European Geostationary Navigation Overlay Service).
• Estados Unidos: sistema WAAS (Wide Area Augmentation System), LASS (Local Area GPS Enhancement), GBAS (Groud-
based Augmentation System), WAGE (Wide Area GPS Enhancement).
• Canadá: sistema CDGPS (Canada-Wide Differential GPS).
• Japão: sistema MSAS (Japan’s Space-Based Augmentation System).
• Índia: sistema GAGAN (Indian GPS Aided Geo Augmented Navigation).
• China: sistema SNAS (Satellite Navigation Augmentation System).
• Coreia do Sul: sistema KASS (Korean Augmentation satellite System GPS).
• Rússia: sistema SDCM (System for Differential Corrections and Monitoring).

20.4 Vantagens dos sistemas GNSS para a Geomática


Em face de sua facilidade de uso e da qualidade dos resultados, a tecnologia de determinação de coordenadas espaciais por
meio do rastreamento de sinais de satélites artificiais tornou-se rapidamente uma das principais ferramentas para a coleta de
dados geoespaciais para projetos de Engenharia. Esta aceitação pelos profissionais da área de Geomática se deve às vantagens
que ela oferece quando comparada com as demais tecnologias disponíveis, como apresentado a seguir:
• as estações de medição (antenas receptoras dos sinais GNSS) não precisam ser intervisíveis;
• as medições podem ser realizadas sob quaisquer condições climáticas durante 24 horas por dia;
• as antenas receptoras dos sinais dos satélites coletam os dados de forma independente, ou seja, uma antena não precisa
saber da existência de outras antenas coletando dados no mesmo instante;
• o sistema garante cobertura global para toda superfície terrestre ou próxima a ela;
• permite alcançar alta precisão posicional, de velocidade, de direção e de tempo;
• permite determinar posições em tempo real, o que facilita o seu uso para a automação de procedimentos de posiciona-
mento em Engenharia, como automação de máquinas, agricultura de precisão e outros;
• os equipamentos de recepção de sinais utilizados pelos usuários são pequenos, leves e fáceis de usar. Além disso, permi-
tem conexões e inserções em sistemas eletrônicos de terceiros.
Embora os sistemas tenham todas as vantagens citadas, há também algumas dificuldades de utilização que precisam ser
destacadas. São elas:
• não funcionam adequadamente quando as antenas receptoras são instaladas no interior de edifícios, em locais subterrâ-
neos; embaixo de árvores com folhagens densas; próximas de locais que têm transmissores de rádio potentes; em locais
de áreas densamente construídas, como os denominados “cânions urbanos” e outros;
• dependem da qualidade das antenas e dos receptores;
• dependem de métodos de posicionamento adequados.
Além disso, é importante destacar que para o uso efetivo da tecnologia é necessário que o usuário tenha conhecimentos
básicos de Cartografia, Geodésia e sobre os funcionamentos dos sistemas de posicionamento.

20.5 Princípios do posicionamento de pontos por meio da tecnologia GNSS


A determinação da posição geográfica de um ponto, por meio da recepção de sinais emitidos por satélites artificiais, é realiza-
da aplicando o princípio da multilateração espacial,6 tomando as coordenadas dos satélites como pontos de referência.
As coordenadas dos satélites são determinadas, inicialmente, sobre um sistema de coordenadas cartesiano espacial relacio-
nado com suas órbitas no espaço, denominado Sistema Celeste. As posições dos satélites no espaço são em seguida transfor-
madas para um sistema de coordenadas cartesiano geocêntrico com relação a um sistema geodésico de referência específico,
conforme descrito no Capítulo 3 – Referências geodésicas e topográficas.
6 Para mais detalhes, ver Seção 10.13 – Multilateração.
Sistemas de navegação global (GNSS) e-53

Para a determinação das coordenadas car-


tesianas tridimensionais de uma antena recep-
tora (r), instalada na superfície terrestre, con-
siderem-se as distâncias, (d1), (d2) e (d3), entre
os satélites “Sat1”, “Sat2”, “Sat3” e a antena re-
ceptora instalada sobre o ponto (P), conforme
ilustrado na Figura 20.5. As distâncias (d1),
(d2) e (d3) representam as “linhas de visadas”
(desobstruídas) entre as antenas dos satélites
e a antena receptora. Assim, conhecendo as
coordenadas cartesianas geocêntricas (Xs, Ys,
Zs) dos satélites “Sat1”, “Sat2” e “Sat3” e as dis-
tâncias (d1), (d2) e (d3), em princípio, é possível
determinar as coordenadas cartesianas geo-
cêntricas (Xr, Yr, Zr) da antena receptora por
meio da trilateração espacial, conforme indi-
cado na Figura 20.5.
Como se pode verificar na figura citada,
uma vez conhecidas as posições dos satéli-
Figura 20.5 • Trilateração espacial usada no posicionamento de pontos pela tecno-
tes, o fator crucial para a determinação das
logia GNSS.
coordenadas cartesianas tridimensionais da
antena receptora instalada sobre o ponto (P) são as medições precisas das distâncias (d1), (d2) e (d3), as quais são realizadas
por meio de métodos de medição eletrônica de distância, semelhantes àqueles utilizados para os distanciômetros eletrônicos,
indicados na Seção 7.3.2 – Medições eletrônicas de distâncias.
Existem, contudo, algumas diferenças importantes entre a medição eletrônica de distância com um EDM (Electronic Dis-
tance Measurement) e a medição eletrônica de distância com a tecnologia GNSS. Primeiramente, além da medição da dife-
rença de fase da onda portadora, a medição com a tecnologia GNSS utiliza também a correlação de códigos. Outra diferença
importante decorre do fato de não ser possível emitir uma onda a partir do satélite ou do receptor e recebê-la de volta refle-
tida pela antena receptora ou pelo satélite. A solução, nesse caso, consiste em considerar apenas o percurso de ida da onda
eletromagnética emitida pelo satélite. Para que isso seja possível é necessário replicar a onda eletromagnética e seus códigos
internamente na estação receptora. Têm-se, assim, um sinal emitido pelo satélite e outro gerado no receptor.
As ondas eletromagnéticas emitidas pelos satélites são denominadas ondas portadoras. Para o seu uso no cálculo da distân-
cia entre o satélite e a antena receptora, elas são moduladas com informações referentes ao satélite e com alguns códigos, que
variam para cada sistema de posicionamento GNSS, conforme apresentado na Seção 20.3 – Composição dos sistemas GNSS.
De forma semelhante às medições com EDM, as distâncias são medidas pelo tempo de propagação da onda eletromagné-
tica ou pela diferença de fase, sendo que, agora, pelo fato de os sinais serem gerados em dispositivos diferentes, se utilizam
códigos e há a necessidade de os satélites e os receptores possuírem relógios sincronizados em uma escala de tempo comum,
denominado “tempo GNSS”.
Os relógios dos satélites são baseados
em padrões atômicos e os dos receptores
são, em geral, de quartzo. Eles não pos-
suem, portanto, qualidade para sincro-
nização efetiva, o que torna necessário
considerar, na maioria das vezes, a variável
tempo no sistema de equações para a de-
terminação das coordenadas cartesianas
geocêntricas (Xr, Yr, Zr) da antena recepto-
ra. Tem-se, assim, um sistema de equações
com quatro incógnitas, correspondentes
às coordenadas cartesianas geocêntricas
(Xr, Yr, Zr) da antena receptora e a compo-
nente (∆t) correspondente ao erro entre o
tempo GNSS e o registrado pelo relógio do
receptor. Dessa forma, a posição da antena
receptora somente pode ser determinada
por meio do rastreamento simultâneo dos
sinais de no mínimo quatro satélites, con- Figura 20.6 • Configuração mínima para a determinação das coordenadas cartesianas
forme ilustrado na Figura 20.6. geocêntricas da antena receptora.
e-54 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Após a solução do sistema de equações, obtêm-se as coordenadas da antena receptora referenciadas ao mesmo sistema de
coordenadas do sistema geodésico adotado como referência para o sistema GNSS utilizado.
Os detalhes sobre a determinação dessas coordenadas estão apresentados nas próximas seções.

20.5.1 Cálculo das distâncias entre a antena receptora e os satélites


Como citado, os cálculos das distâncias entre a antena receptora e os satélites são realizados a partir do tempo de propa-
gação da onda eletromagnética ou pela diferença de fase da portadora. Quando a distância é determinada pelo tempo de
propagação da onda, diz-se que se tem uma pseudodistância, e quando determinada pela fase da portadora, diz-se que se
tem uma distância pela fase da portadora.
Os detalhes técnicos de cada método de medição de distância estão apresentados na sequência.

20.5.1.1 Pseudodistância (código)


Dá-se o nome de pseudodistância à distância geométrica entre a antena do satélite e a antena receptora, medida por meio da
diferença de tempo entre os pulsos dos códigos (C/A) e (P), gerados no satélite, e suas réplicas geradas no receptor. Para que
o leitor compreenda bem o procedimento de medição, imagine que o relógio do satélite e o relógio do receptor estejam per-
feitamente sincronizados e que, em um dado instante, ambos emitam um bip. O observador na posição da antena receptora
irá ouvir o bip do relógio do receptor imediatamente após ser emitido, mas irá ouvir o bip do satélite com uma decalagem
de tempo em razão de o sinal ter viajado cerca de 20.000 km. Essa diferença de tempo pode ser medida e, como se conhece a
velocidade de deslocamento do som,7 pode-se calcular a distância entre o satélite e a antena receptora. Este mesmo princípio é
aplicado pelos sistemas GNSS com a diferença de que o sinal emitido pelo satélite é uma onda de rádio modulada com códigos
pseudoaleatórios e os relógios não estão perfeitamente sincronizados.
Com o satélite emitindo e o receptor
replicando os mesmos sinais no mesmo
instante, a medição do tempo (∆t) de
percurso da onda eletromagnética da
antena do satélite até a antena do recep-
tor é realizada por meio de uma corre-
lação do código, conforme ilustrado na
Figura 20.7. Em seguida, multiplicando
o valor de (∆t) pela velocidade da luz no
vácuo, obtém-se a distância. Pelo fato Figura 20.7 • Correlação do código C/A para a determinação da pseudodistância.
de ela estar “contaminada” pelo erro da
diferença de sincronização dos relógios,
ela é considerada “pseudodistância”, ou seja, uma “falsa distância”.
Assim, de acordo com a Figura 20.7, tem-se:

c * t (20.3)

em que:
ρ = pseudodistância entre a antena do satélite e a antena do receptor, no tempo do sistema GNSS;
c = velocidade da luz;
Dt = intervalo de tempo decorrido entre a emissão da onda eletromagnética pela antena do satélite e a recepção pela antena
receptora, no tempo do sistema GNSS.

Tanto o relógio do satélite como do receptor possuem uma diferença de tempo com relação ao tempo GNSS (tGNSS). Os
satélites têm quatro relógios atômicos, com uma diferença de tempo (∆ts) de apenas alguns nanossegundos por dia. Essa dife-
rença de tempo, também denominada erro de relógio do satélite, é determinada a cada passagem do satélite sobre uma estação
de controle terrestre, e é retransmitida para o receptor, no solo, juntamente com as mensagens de navegação, cada vez que eles
se conectam. Dessa forma, se conhece com precisão o tempo (ts) em que houve a transmissão do sinal pelo satélite, na escala
de tempo do satélite (tGNSS). Assim, conhecendo o tempo (tr) de chegada do sinal no receptor, no tempo do receptor, e o erro
(∆tr) do relógio do receptor com relação ao tempo do satélite (tGNSS), têm-se:

(20.4)
s s
t  t GNSS  t (20.5)

7 No caso do bip.
Sistemas de navegação global (GNSS) e-55

De onde se deduz que o intervalo de tempo de propagação do sinal (Dtsr), no tempo GNSS, é dado pela equação (20.6).

t rs tr t s tr t s (20.6)

A equação da pseudodistância (20.3) torna-se assim:


s
r c t rs c t s c  tr (20.7)

Pelo fato de o sinal emitido pelo satélite se deslocar no espaço é necessário considerar também outros fatores no cálculo da
pseudodistância, como a influência da refração atmosférica (ionosfera e troposfera), o multicaminhamento,8 os erros orbitais,
os erros de ruído no receptor, os erros de ruído nos satélites e outros. Assim, considerando as coordenadas cartesianas geo-
cêntricas (Xs, Ys, Zs) dos satélites no instante (i) e as coordenadas cartesianas geocêntricas (Xr, Yr, Zr) da antena receptora, que
se deseja calcular, tem-se a equação final da pseudodistância indicada a seguir:
2 2 2
s
r i Xis Xr Yi s Yr Zis Zr c  t s  tr I rs Trs mrs s
r r
s (20.8)

em que:
(r rs)i = pseudodistância medida no instante (i);
s
Ir = atraso em função da ionosfera;
s
T r = atraso em função da troposfera;
s
mr = efeito do multicaminhamento nas proximidades da antena do receptor;
s
er, er, es = erros orbitais e erros de ruídos nos satélites e nos receptores.

Os detalhes científicos e os efeitos dos atrasos e erros citados, embora importantes para a determinação das coordenadas
da antena receptora, não serão discutidos neste livro. Na etapa atual de desenvolvimento da tecnologia GNSS, os seus efeitos
são bem conhecidos e, portanto, corrigidos durante as medições e no processamento dos dados GNSS.
Considerando que os valores de (ts), (tr), (∆ts), o atraso da ionosfera, o atraso da troposfera, os ruídos do satélite e do re-
ceptor são conhecidos e que o multicaminhamento pode ser evitado, as incógnitas da equação (20.8) são as coordenadas (Xr,Yr, Zr)
da antena receptora e a correção do erro do relógio do receptor (∆tr) com relação ao tempo GNSS. Estas incógnitas podem
ser calculadas pela observação simultânea de pelo menos quatro satélites. As coordenadas cartesianas espaciais determinadas
são, em seguida, transformadas para coordenadas geodésicas (latitude, longitude e altura elipsoidal) e, se necessário, para
coordenadas no plano de projeção, conforme apresentado no Capítulo 19 – Projeção cartográfica.

20.5.1.2 Fase da portadora


Como já citado, a medição da distância GNSS por in-
termédio da fase da portadora é realizado de forma
muito semelhante ao da medição da distância pela
fase da portadora de um medidor de distância ele-
trônica de uma estação total. A principal diferença é
que, na estação total, o EDM emite duas ondas: uma
de referência e outra de medição, e no sistema GNSS a
onda de medição é gerada no satélite e a de referência
no receptor.
s
A medição da distância (d r), neste caso, se baseia na
medição da diferença de fase entre a onda eletromagné-
tica, emitida pelo satélite (s), e a onda de referência re-
plicada ininterruptamente no receptor (r), e pelo cálculo
s
da quantidade (N r) de ondas inteiras existentes entre a
antena do satélite e a antena receptora. A essa quantidade
de onda inteira, da mesma forma que nas medições com
EDM, é denominada ambiguidade do sistema. Somando
as duas variáveis, tem-se a distância medida, conforme
ilustrado na Figura 20.8. Figura 20.8 • Elementos da medição de distância com a onda portadora.

8 Dá-se o nome de multicaminhamento GNSS ao efeito causado pela recepção de sinais GNSS na antena receptora que não advêm diretamente dos
satélites, ou seja, foram refletidos ou refratados por objetos da vizinhança da antena.
e-56 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

As ondas utilizadas para essa medição são as ondas portadoras citadas nas seções anteriores, que, no caso do sistema GPS,
são as ondas (L1), (L2) e (L5) ou uma combinação entre elas.
De acordo com a Figura 20.8, a distância entre a antena do satélite e a antena receptora é dada pela equação (20.9).
d 
s
r i  
 N rs *   rs * 
i
(20.9)
em que:
s
(d r)i = distância entre o satélite (s) e a antena GNSS (r), no instante (i);
s
N r = ambiguidade entre o receptor (r) e o satélite (s);
s
(φr)i = diferença de fase medida entre a onda emitida pelo satélite (s) e a onda gerada internamente no receptor (r), no instante (i);
λ = comprimento da onda.
A equação (20.9) somente é verdadeira para o caso ideal da propagação da onda no vácuo e com os relógios do satélite e
do receptor perfeitamente sincronizados. Quando isso não ocorre, da mesma forma que a pseudodistância, haverá os atrasos
ionosférico e troposférico e os demais erros do sistema. Assim, o valor da diferença de fase medida no instante (i) é dada (de
forma resumida) conforme indicado a seguir:
1 2 2 2 c
s
r i
* Xis Xr Yi s Yr Zis Zr N rs *  t s  tr I rs Trs ruídos (20.10)

sendo as variáveis envolvidas na equação as mesmas indicadas na equação (20.8). Notar a consideração do atraso do sinal na
troposfera e a aceleração na ionosfera.
s
Notar que a equação (20.10) possui quatro incógnitas que são as coordenadas (Xr, Yr, Zr) e a ambiguidade (N r). A diferença
s
de fase (φr)i é medida e as demais são conhecidas, conforme citado na seção anterior.
s
O cálculo da ambiguidade, ou seja, do valor de (N r), é realizado por estratégias de cálculos específicos, que consideram o
tipo de receptor e restrições dos satélites. Por se tratar de um valor ambíguo, ele pode ser tratado como um valor inteiro na
primeira medição, Em seguida, se forem contados os ciclos inteiros entre as demais medições sucessivas, as diferenças de fase
entre as épocas não são ambíguas. Isso significa que a medição da fase não é uma medição de distância, como na pseudodis-
tância, mas uma medição da variação de distância em função do tempo.
s
Na realidade, o valor de (N r) não é um número inteiro e no seu cálculo ele deve ser considerado como um número real. O seu
valor é calculado por meio de ajustamentos sucessivos levando em conta a equação (20.10). Simplificadamente, apenas para que o
leitor possa entender o princípio do cálculo, ele pode ser entendido como se, no primeiro ajustamento, se obtivesse um valor real
s
para (N r) mais um desvio-padrão (σ). Dessa forma, definindo um intervalo de confiança para ele, por exemplo, (N rs  3 , N rs  3 ), se
s
o intervalo contiver um valor inteiro, adota-se esse valor como valor de (N r), ou seja, fixou-se a ambiguidade (resolveu a ambiguidade).
No cálculo do ajustamento citado, pode ocorrer de o intervalo de confiança não conter um valor inteiro ou conter vários.
Tem-se, neste caso, uma solução não fixa, denominada solução float. O resultado, neste caso, para tempos de observação rá-
pidas (dezenas de minutos) não é considerado adequado e deve ser evitado. Já para observações longas (horas), os resultados
com solução da ambiguidade ou float são praticamente iguais.
s
Na prática, os algoritmos utilizados para o cálculo do valor de (N r) são muito mais complicados do que o citado. Ao longo dos
anos foram desenvolvidos vários métodos e estratégias para calcular o valor da ambiguidade. Alguns amplamente conhecidos
pela comunidade científica e outros de propriedade reservada (patenteados) por produtores de equipamentos GNSS. Não cabe
no escopo deste livro discuti-los em detalhes e os leitores interessados são incentivados a consultarem literaturas especializadas.
Embora pouco relevante para os objetivos desta obra, é interessante citar que a medição da diferença de fase no receptor
não é realizada diretamente sobre as ondas portadoras. Como já mencionado, os satélites emitem os seus sinais por meio das
frequências das portadoras (L1) e (L2), as quais, quando recebidas no receptor, em razão do efeito Doppler, são ligeiramente
diferentes das portadoras nominais geradas no receptor. A combinação desses dois sinais produz uma nova onda, denomina-
da onda de batimento. É sobre essa onda que se mede a diferença de fase no receptor. Esta é a razão pela qual muitos autores
preferem utilizar o termo diferença de fase da onda de batimento para referir a medição da diferença de fase.

20.6 Métodos de posicionamento com a tecnologia GNSS


Considerando os métodos de medição das distâncias entre os satélites e a antena receptora apresentados na seção anterior,
foram desenvolvidos três métodos de posicionamento da antena receptora, quais sejam:
• método de posicionamento absoluto;9
• método de posicionamento relativo;
• método de posicionamento diferencial.
Apresentam-se a seguir os detalhes técnicos mais importantes de cada um deles.
9 Alguns autores preferem o termo posicionamento pontual, entretanto, de acordo com os conceitos propostos neste livro, o termo pontual se
refere aos métodos de medição topográfica em que os pontos são medidos individualmente, conforme apresentado na Seção 8.1 – Introdução.
Sistemas de navegação global (GNSS) e-57

20.6.1 Método de posicionamento absoluto


Diz-se que o posicionamento da antena receptora é absoluto quando as suas coordenadas são determinadas diretamente pela
multilateração espacial e por meio de apenas um receptor GNSS, conforme ilustrado na Figura 20.9. As coordenadas são deter-
minadas com relação à origem do sistema geodésico geocêntrico adotado pelo sistema GNSS.
O posicionamento absoluto pode ser realizado no modo estático ou no modo cinemático (navegação). Diz-se que ele é
estático quando a antena receptora de sinais permanece estática durante todo o período de medição e cinemático, quando
ela se move. Apresentam-se na sequência os detalhes técnicos de cada um deles.

Figura 20.9 • Posicionamento absoluto.

20.6.1.1 Posicionamento absoluto no modo cinemático


No posicionamento absoluto cinemático, o operador necessita apenas de um conjunto antena/receptor com capacidade para
medir diretamente as pseudodistâncias entre a antena receptora e, pelo menos, quatro satélites simultaneamente. As medições
são realizadas com a antena em movimento e os valores das coordenadas determinadas são exibidos, em tempo real, na tela
do instrumento de medição.
A precisão obtida pelo posicionamento GNSS absoluto no modo cinemático é da ordem de 3 a 15 metros, não sendo, por-
tanto, adequada para levantamentos topográficos e geodésicos que exijam acurácia.
Os instrumentos de medição para este tipo de posicionamento são de pequeno formato, possuem preços baixos e podem
ser operados por usuários sem nenhum conhecimento sobre posicionamento GNSS. São exemplos clássicos deste tipo de
posicionamento GNSS a navegação por meio de aplicativos de telefonia celular e o posicionamento de veículos automotores,
podendo, em alguns casos, ser utilizado em trabalhos preliminares de Engenharia ou em coleta de dados para sistemas de
informação geográfica de baixa precisão.

20.6.1.2 Posicionamento absoluto no modo estático


No modo absoluto estático, o operador também utiliza apenas um conjunto antena/receptor rastreando informações do có-
digo-C/A e/ou das portadoras (L1/L2) e se mantém estático sobre o ponto rastreado durante um período de tempo que pode
variar de algumas dezenas de minutos a horas. A este método de posicionamento denomina-se posicionamento por ponto
preciso (precise point positioning – PPP).
Por se tratar de um método de posicionamento estático, ele permite melhorar a acurácia das coordenadas determinadas,
tornando-as adequadas para vários trabalhos de Geomática. Além disso, a determinação das coordenadas se baseia nas in-
formações das efemérides precisas, por meio das quais, dependendo do tempo de rastreio e da configuração da constelação
de satélites, possibilita alcançar acurácias da ordem de 5 a 10 cm com receptores de uma frequência (L1) e de 1 a 5 cm com
receptores de dupla frequência (L1/L2). Trata-se, porém, de um método de posicionamento que exige o pós-processamento
dos dados e a disponibilidade de informações das efemérides precisas que serão utilizadas no pós-processamento.
Embora preciso, o método de posicionamento PPP necessita de um tempo longo de observações para alcançar a conver-
gência dos resultados. Para solucionar este problema, está sendo desenvolvido um novo conceito de posicionamento, denomi-
nado PPP-RTK, o qual estende o conceito PPP por meio da disponibilização de correções dos erros atmosféricos, calculados
e-58 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

por uma rede de estações CORS, semelhante ao posicionamento NRTK, descrito na Seção 20.9.2.4 – Levantamentos de campo
por meio de estações de referência virtual (VRS). Por se tratar de um método de posicionamento ainda em fase experimental,
ele não será tratado neste livro. O leitor interessado deverá consultar bibliografias especializadas.

20.6.2 Método de posicionamento relativo


Diz-se que o posicionamento da ante-
na receptora é relativo10 quando as suas
coordenadas são determinadas com o
uso de dois ou mais receptores rastrean-
do, simultaneamente, dados do código-
C/A e das fases das portadoras de todos
os satélites localizados acima de uma
máscara de elevação definida pelo usuá-
rio por determinado período de tempo.
O princípio de posicionamento por
este método consiste em utilizar um
ponto de coordenadas conhecidas, so-
bre o qual é instalado o conjunto ante-
na/receptor, denominado receptor base
ou estação de referência, e proceder à
determinação das coordenadas dos
pontos remotos, por meio da instala-
ção de outro conjunto antena/receptor
sobre eles. Determina-se, assim, o vetor
espacial entre os pontos observados, Figura 20.10 • Posicionamento relativo.
denominado vetor da linha de base ou,
simplesmente, linha de base, conforme
indicado na Figura 20.10.
Matematicamente, pode-se expressar esta situação da seguinte forma:
XQ XP  X PQ (20.11)
YQ  YP  YPQ (20.12)
ZQ  Z P  Z PQ (20.13)
em que:
XP, YP, ZP = coordenadas cartesianas geocêntricas conhecidas da estação de referência;
XQ, YQ, ZQ = coordenadas cartesianas geocêntricas da estação remota;
ΔXPQ, ΔYPQ, ΔZPQ = componentes do vetor da linha de base entre os pontos (P) e (Q).

A vantagem do posicionamento relativo é que ele permite aumentar sensivelmente a precisão das coordenadas determinadas.
Este aumento de qualidade é obtido realizando o processamento das observações por meio de combinações lineares entre
os valores coletados pelas diferentes antenas receptoras envolvidas no processo de medição, de forma a eliminar certos erros
comuns a elas nas medições das distâncias entre os receptores e os satélites pela diferença de fase da portadora.
As combinações lineares utilizadas são denominadas simples diferença de fase, dupla diferença de fase, tripla diferença de
fase e combinações lineares entre as portadoras (L1) e (L2).
Apresentam-se a seguir os detalhes analíticos de cada uma delas.

20.6.2.1 Simples diferença de fase


A simples diferença de fase é uma combinação linear entre as observações obtidas entre dois receptores e um satélite, confor-
me ilustrado na Figura 20.11. Para entendimento do procedimento, considere-se a equação (20.10) da diferença de fase da
portadora para dois receptores (P) e (Q) e o satélite (s1), no instante (i), dada a seguir:

       
s1
PQ i
s1
P i
s1
Q i (20.14)

10 Notar que a maioria dos métodos de posicionamento utilizado em Geomática é relativo, uma vez que se utiliza sempre uma estação base e um
ponto de referência, como apresentado nos capítulos anteriores deste livro.
Sistemas de navegação global (GNSS) e-59

De forma simplificada e individual para os recepto-


res posicionados sobre os pontos (P) e (Q), têm-se:
1 c
 
s1
P i 

*  RPs1   N Ps1  *  trP  t s1    I Ps1   TPs1 
i  i i i

(20.15)
1 c
 
s1
Q i 

  i  i

* RQs1  N Qs1  * trQ  t s1  I Qs1  TQs1
i
     i

(20.16)

em que:

R  X   Y   Z 
2 2 2
s s s s
r i  i  Xr i  Yr i  Zr (20.17)

Substituindo as equações (20.15) e (20.16) na equa-


ção (20.14), tem-se como resultado:

 
s1
PQ i 
1

*  RPQ
s1
i  N PQs1  c *  trPQ i   I PQs1 i  TPQs1 i Figura 20.11 • Técnica da diferenciação da simples diferença de fase no
posicionamento relativo.
(20.18)

Pela equação (20.18), nota-se que a simples diferença de fase elimina os erros dos relógios dos satélites e reduz os erros
das órbitas e de propagação da onda eletromagnética.

20.6.2.2 Dupla diferença de fase


Como ilustrado na Figura 20.12, se após a simples
diferença de fase for realizada uma dupla diferen-
ça de fase, ou seja, combinações lineares entre as
observações das duas antenas receptoras (P) e (Q)
e dois satélites (s1) e (s2), no instante (i), haverá
ainda a eliminação dos erros dos relógios dos re-
ceptores. Assim, considerando a equação da dupla
diferença, tem-se:

         
s1s 2
PQ i
s1
PQ i
s2
PQ i (20.19)

Substituindo a equação (20.18) em (20.19), ob-


tém-se como resultado final:
1
  s1s 2
PQ i 

s1s 2
* RPQ
i
 s1s 2
 N PQ s1
 I PQ    T 
i
s1
PQ i

(20.20)

Pela equação (20.20), nota-se que os termos re- Figura 20.12 • Técnica da diferenciação da dupla diferença de fase no posicio-
lativos aos erros dos relógios dos receptores foram namento relativo.
também eliminados. Assim, como os erros pro-
venientes da ionosfera e troposfera podem ser estimados por meio de modelos matemáticos, os valores das ambiguidades
podem ser fixados em valores inteiros por meio de um ajustamento pelo Método dos Mínimos Quadrados, o que permite
obter valores dos componentes da linha de base com alta precisão. Por esta e outras razões, este é o procedimento comumente
aplicado nos programas aplicativos de processamento de dados GNSS comerciais.

20.6.2.3 Tripla diferença de fase


Seguindo o mesmo raciocínio dos procedimentos anteriores, se as duplas diferenças forem realizadas entre os mesmos recep-
tores e os mesmos satélites, em épocas diferentes (i e j), tem-se o que se denomina tripla diferença de fase, conforme ilustrado
na Figura 20.13.
e-60 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Neste caso, tem-se um conjunto de equações de du-


plas diferenças, conforme indicado a seguir:

         
s1s 2
PQ i
s1
PQ i
s2
PQ i (20.21)

       
s1s 2
PQ j
s1
PQ j
s2
PQ j
(20.22)

Resolvendo as duplas diferenças, obtém-se como


resultado final a equação (20.23).
1 s1s 2
 
s1s 2
PQ i , j  
R
 PQ

i, j
(20.23)

Neste caso, as ambiguidades foram eliminadas, o


que simplifica consideravelmente o tratamento das
observações. Por este motivo, pelo fato de a quan-
tidade de incógnitas estar fortemente reduzida e as
ambiguidades, que são as incógnitas mais difíceis de
serem determinadas, terem sido eliminadas, a solução
é atingida rapidamente. Ela é, portanto, a solução ado-
tada para o cálculo das coordenadas iniciais do ajus- Figura 20.13 • Técnica da diferenciação da tripla diferença de fase no po-
tamento; além de ela permitir a detecção de perdas de sicionamento relativo.
sintonias momentâneas entre o satélite e o receptor,
conhecidas como perdas de ciclo.
Por outro lado, a eliminação da incógnita relativa à ambiguidade torna impossível fixá-la com um valor inteiro, o que dimi-
nui a qualidade dos resultados, tornando-a pouco utilizada nos processamentos definitivos das observações GNSS.

20.6.2.4 Combinações lineares entre as portadoras (L1) e (L2)


As combinações lineares entre as portadoras (L1) e (L2) são utilizadas para eliminar o efeito da refração da ionosfera ou para
facilitar a resolução da ambiguidade no caso de bases longas (maiores que 50 km). Os resultados, contudo, são inferiores aos
da dupla diferença de fase.
A combinação linear mais utilizada entre as portadoras (L1) e (L2) é a combinação denominada (L3). Trata-se de uma
combinação linear livre das influências da ionosfera e utilizada, em geral, em posicionamentos GNSS com linhas de base de
algumas dezenas de quilômetros. Tem-se, assim:
f12 f 22
 L3   * L1  *L2 (20.24)
f12  f 22 f12  f 22
sendo (fi) a frequência da onda (Li).
Além da combinação linear (L3) existem outras que não serão tratadas neste livro.
Com base nas combinações lineares apresentadas, o posicionamento relativo pode ser realizado no modo relativo estático
ou no modo relativo cinemático. Em ambos os casos, os resultados do posicionamento somente são obtidos após o pós-pro-
cessamento dos dados por programas aplicativos específicos, geralmente, disponibilizados pelos fabricantes dos instrumentos
de medição GNSS.

20.6.2.5 Posicionamento no modo relativo estático


No posicionamento no modo relativo estático se exige que as antenas receptoras se mantenham estáticas e rastreando os
mesmos satélites durante todo o período de posicionamento, com um intervalo de registro das observações11 que garanta
a simultaneidade dos dados coletados (em geral, alguns segundos). As determinações das coordenadas dos pontos ras-
treados podem ser realizadas por meio das medições das pseudodistâncias, das diferenças de fase da portadora (L1) ou
das portadoras (L1/L2). A acurácia obtida por este método de posicionamento depende da distância entre o receptor de
referência e o receptor remoto. Em boas condições de medição, os fabricantes de instrumento GNSS indicam precisões
da ordem 1 a 5 metros para os posicionamentos por meio das pseudodistâncias e de 20 a 80 cm, se for aplicado o artifício
de utilizar a fase da onda portadora para suavizar as medidas das pseudodistâncias, ou seja, aproveitar o baixo ruído das
medidas de fase, de poucos milímetros, para reduzir os resíduos das medidas do código. No caso de se utilizar as ondas
portadoras (L1/L2), a precisão pode chegar a ±3 mm + 0,1 ppm, na horizontal, e a ±3,5 mm + 0,4 ppm, na vertical, com
um nível de confiança de 95 %.

11 Alguns profissionais utilizam o termo taxa de coleta de dados.


Sistemas de navegação global (GNSS) e-61

20.6.2.6 Posicionamento no modo relativo cinemático


No posicionamento no modo relativo cinemático,
a antena receptora da estação base é mantida está-
tica sobre um ponto de coordenadas conhecidas,
enquanto uma ou mais antenas remotas podem ser
deslocadas sobre outros pontos de interesse duran-
te o rastreamento dos sinais dos satélites, confor-
me indicado esquematicamente na Figura 20.14.
Trata-se de um método de posicionamento GNSS
altamente produtivo, porém, sujeito a certas con-
dições operacionais, conforme descrito na Seção
20.9 – Levantamento topográfico ou geodésico com
a tecnologia GNSS.
Por se tratar de um método de posicionamen-
to relativo, todas as antenas receptoras precisam
rastrear, simultaneamente, os sinais dos mesmos
satélites que estão sendo rastreados pela antena re-
ceptora da estação de referência e durante todo o
período de tempo da medição.
As medições das distâncias para o posiciona-
mento podem ser realizadas por meio das pseudo- Figura 20.14 • Método de posicionamento cinemático.
distâncias ou da fase da portadora. Quando reali-
zadas por meio das pseudodistâncias, a antena remota pode iniciar o seu deslocamento imediatamente após o receptor iniciar
o rastreamento dos satélites. O nível de precisão deste método de posicionamento é também da ordem de 1 a 5 metros nas
medições sem suavização do código e de 20 a 80 cm, em caso contrário.
Quando as medições são realizadas por meio da fase da portadora existem duas possibilidades de posicionamento: o po-
sicionamento relativo cinemático com inicialização e o posicionamento relativo cinemático sem inicialização ou PPK, conforme
descrito na sequência.

20.6.2.6.1 Posicionamento relativo cinemático com inicialização12


Neste modo de posicionamento, a antena remota deverá permanecer estática durante um período de tempo, denominado
tempo de inicialização estática para a resolução da ambiguidade inicial (ver Fig. 20.14). Os receptores, neste caso, podem ser
de uma frequência (L1) ou de dupla frequências (L1/L2). O tempo de permanência estática da antena remota e a distância entre
a antena de referência e a remota variam para diferentes fabricantes de instrumentos. Mais detalhes sobre esses valores estão
apresentados na Seção 20.9.2.2 – Levantamentos de campo por meio de posicionamentos cinemáticos. A precisão alcançada por
este tipo de posicionamento é da ordem de ±5 mm + 0,5 ppm, em planimetria, e da ordem de ±10 mm + 0,5 ppm em altimetria
para receptores de dupla frequência.

20.6.2.6.2 Posicionamento relativo cinemático sem inicialização (PPK)


Neste modo de posicionamento, a antena receptora pode se mover durante o período de inicialização para a resolução da
ambiguidade, ou seja, a resolução da ambiguidade é realizada durante a movimentação da antena. Alguns autores denomi-
nam esse tipo de posicionamento como relativo no modo cinemático “on the fly” e outros como relativo no modo cinemático
pós-processado (post-processing kinematic – PPK). Os receptores, neste caso, devem ser, preferencialmente, de dupla frequên-
cias (L1/L2) e a distância que se deve manter entre a antena de referência e a antena remota é indicada pelo fabricante.13 Notar
que durante o tempo de inicialização para resolução da ambiguidade os valores das coordenadas determinadas com a antena
remota em movimento são de baixa qualidade. A qualidade indicada pelo fabricante somente é atingida após a resolução da
ambiguidade. No caso do uso de receptores de uma frequência (L1), o tempo para a resolução da ambiguidade é maior que o
de dupla frequência e a distância entre a estação base e o receptor remoto deve ser menor.
A acurácia indicada pelos fabricantes para este método de posicionamento, após a resolução da ambiguidade, é também da or-
dem de ±5 mm + 0,5 ppm, em planimetria, e da ordem de ±10 mm + 0,5 ppm em altimetria para receptores de dupla frequência.
Para ambos os posicionamentos, é necessário que todas as antenas envolvidas mantenham continuidade de rastreamento
de pelo menos quatro satélites durante todo o período de medição. Caso ocorra a interrupção dos sinais, a operação de me-
dição deverá ser reinicializada.
12 Pelo fato de haver necessidade de manter a antena estática durante um período de tempo, alguns autores preferem o termo semicinemático para
este método de posicionamento.
13 Em geral, não mais de 15 a 20 km.
e-62 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

20.6.3 Método de posicionamento diferencial


Este método de posicionamento
é semelhante ao método de po-
sicionamento relativo, uma vez
que são utilizadas duas ou mais
antenas receptoras captando si-
multaneamente dados emitidos
pelos satélites, mantendo uma
delas sobre um ponto de coor-
denadas conhecidas. A diferença
entre eles é que, nesse caso, as
correções diferenciais determi-
nadas pelo receptor da estação
base são transmitidas por tele-
metria, em tempo real, para os
demais receptores, os quais as
utilizam para gerarem as suas
posições em tempo real, confor-
me ilustrado na Figura 20.15.
A grande vantagem deste mé-
todo de posicionamento é que
o operador, situado no ponto Figura 20.15 • Posicionamento diferencial.
remoto, recebe informações em
tempo real sobre os valores das
coordenadas do ponto, ou seja, não é necessário realizar nenhum pós-processamento dos dados coletados. O processamento
é realizado em tempo real no receptor remoto.
O inconveniente, neste caso, é que requer um sistema de comunicação entre o receptor da estação base e o receptor remoto,
que, em alguns casos, restringe o tamanho da área de medição.
O posicionamento diferencial pode ser efetivado no modo diferencial DGPS ou no modo diferencial RTK, conforme des-
crito na sequência.

20.6.3.1 Posicionamento no modo diferencial DGPS


Diz-se que o posicionamento diferencial está no modo diferencial DGPS quando as correções diferenciais são realizadas nas
pseudodistâncias ou nas coordenadas determinadas por elas.
Por ser um método de levantamento baseado no método de posicionamento diferencial e nas pseudodistâncias, as coorde-
nadas dos pontos rastreados são exibidas em tempo real e imediatamente após o receptor iniciar o rastreamento dos satélites.
Neste caso, o receptor da estação de referência, por estar localizado sobre um ponto de coordenadas conhecidas, pode calcular,
entre outros, os erros das pseudodistâncias medidas e transmiti-las para os receptores remotos, os quais os utilizam para de-
terminar as coordenadas dos pontos remotos rastreados. As correções são transmitidas segundo os protocolos de intercâmbio
de dados GNSS, conforme apresentados na próxima seção.
Quando apenas as correções das pseudodistâncias são calculadas, o método de posicionamento diferencial DGPS
permite alcançar precisões da ordem de 1 a 5 metros nas medições sem suavização do código e de 20 a 80 cm, em caso
contrário.

20.6.3.2 Posicionamento no modo diferencial RTK


Diz-se que o posicionamento diferencial está sendo realizado no modo diferencial RTK quando as correções diferenciais
incluírem os valores das medições das fases das portadoras (L1/L2). No entanto, por se basear nas medições das fases das
portadoras, ele exige que sejam garantidas as mesmas prerrogativas indicadas para o posicionamento relativo no modo
cinemático pós-processado (PPK), ou seja, é necessário haver um tempo de inicialização do sistema de medição. A grande
vantagem, neste caso, é que, pelo fato de as correções diferenciais serem transmitidas do receptor da estação base para
o receptor remoto, o próprio receptor remoto indica quando a resolução da ambiguidade foi atingida e qual a precisão
dos valores calculados para as coordenadas do ponto rastreado, indicadas na tela do coletor de dados do instrumento.
Também, neste caso, as correções são transmitidas segundo os protocolos de intercâmbio de dados GNSS, conforme
apresentados na próxima seção.
De acordo com os fabricantes de instrumentos GNSS, a precisão das linhas de base determinadas com o posicionamento
GNSS no modo diferencial RTK é da ordem de ±5 mm + 0,5 ppm na horizontal e ±10 mm + 0,5 ppm na vertical.
Sistemas de navegação global (GNSS) e-63

20.7 Formatos de intercâmbio de dados GNSS


Além da transmissão de dados pelos satélites das constelações dos sistemas GNSS, existem também transmissões de
dados pelos próprios receptores GNSS para outros receptores ou para outros dispositivos de medição. Os protocolos de
transmissão de dados pelos satélites foram muito bem estabelecidos desde a implantação dos primeiros sistemas GNSS.
A transmissão entre os receptores, contudo, não está uniformizada, existindo formatos diversos, conforme apresentado
na sequência.

20.7.1 Formato NMEA 0183


O protocolo de transmissão de dados NMEA 0183 foi desenvolvido pela Marinha norte-americana e é considerado um forma-
to de transmissão de informações GPS universal. Ele é comumente usado para a transmissão de informações entre o receptor
GNSS e um computador ou para outros dispositivos de navegação. Os dados são transmitidos em formato ASCII e incluem
informações sobre posição, tempo, velocidade, efemérides e muitos outros. Para facilidade de transmissão foram formulados
vários protocolos padronizados com diferentes tipos de informações, com denominações como: GCA, GLL, GSA, GSV, RMC,
VTG, ZDA,14 entre outras.
O formato NMEA 0183 é o protocolo de transmissão de dados utilizado pela maioria dos sistemas de navegação baseados
em informações GNSS.

20.7.2 Formato RINEX


O formato RINEX (Receiver INdependent EXchange format) foi desenvolvido pelo Instituto Astronômico da Universidade de
Berna com o objetivo de facilitar o intercâmbio dos dados brutos coletados por receptores de diferentes marcas. Assim, como
todos os fabricantes de instrumentos GNSS disponibilizam os dados de seus receptores no formato RINEX, torna-se possível
pós-processá-los combinando dados de diferentes receptores em um mesmo processamento.
No momento atual, a versão do formato RINEX é a 3.04, a qual consiste em três arquivos no formato ASCII:
1. arquivo com dados de observação;
2. arquivo com mensagens de navegação;
3. arquivo com dados meteorológicos.
Cada arquivo consiste em uma seção de cabeçalho e uma seção de dados. A seção de cabeçalho contém informações sobre
todo o arquivo e se localiza no início do texto. Para informações sobre o formato e a ordem das informações contidas na seção
de cabeçalho, recomenda-se que o leitor interessado consulte literatura especializada.
Os arquivos de dados de observações e meteorológicos contêm, basicamente, os dados de determinada localização e de
uma sessão de observações. O arquivo com as mensagens de navegação pode conter mensagens de apenas um satélite ou dos
vários rastreados por diferentes receptores. Na versão 3, todos os arquivos passaram a conter mensagens dos satélites dos sis-
temas GPS, GLONASS, GALILEO, QZSS, BeiDou, IRNSS e SBAS.
Os tipos e os formatos dos dados de observação, meteorológicos e de navegação disponibilizados variam entre os diferentes
sistemas e são apresentados em tabelas de definição de formatos e de exemplos de dados disponibilizados em documentos
oficiais sobre o formato RINEX. Não cabe no escopo deste livro discuti-los. O leitor interessado nessas informações poderá,
por exemplo, consultar as tabelas do documento disponibilizado em: http://acc.igs.org/misc/rinex304.pdf.

20.7.3 Protocolo RTCM SC104


O protocolo de transmissão de dados RTCM SC104 foi desenvolvido pelo Comitê 104 da Radio Technical Commission for
Maritime Services, dos Estados Unidos, com o objetivo de prover um serviço de transmissão de correções diferenciais para
as operações GPS nos modos DGPS e RTK. Atualmente, ele possui a versão 2.3 (RTCM 10402.3), a qual é utilizada para a
transmissão de correções diferenciais de código (DGPS) para as aplicações com o uso das constelações de satélites dos siste-
mas GPS e GLONASS; e a versão 3.3 (RTCM 10403.3, Diferencial GNSS Services – abril 2020) para transmissão de correções
diferenciais de código e fase para posicionamentos de alta precisão nos modos RTK, NRTK e PPP-RTK, para operações com
as constelações de satélites dos sistemas GPS, GLONASS, GALILEO, QZSS e BeiDou, incluindo observações SBAS.
As mensagens são codificadas em diferentes grupos contendo diferentes informações baseadas em valores numéricos atin-
gindo 63 tipos de mensagens, que incluem informações sobre a estabilidade e os parâmetros da estação de referência, a es-
tabilidade da constelação de satélites, as correções diferenciais e outras. Para a compreensão total das mensagens RTCM, os
usuários devem consultar manuais específicos sobre esse protocolo.
14 As informações contidas em cada um desses protocolos estão descritas em detalhes nos documentos de descrição do formato NMEA.
e-64 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

20.7.4 Protocolo NTRIP


Com o avanço das possibilidades de transmissão de dados em geral, por exemplo, via telefonia celular e Internet, desenvolveu-
se um novo protocolo de transmissão de dados, denominado Networked Transport of RTCM via Internet Protocol (NTRIP),
que se trata, como o próprio nome indica, de um protocolo de transmissão de dados via Internet, inclusive wireless. Esse pro-
tocolo permite, portanto, as operações DGPS e RTK via Internet.
O protocolo NTRIP tem as seguintes características:
• permite acesso via http (Hipertext Transfer Protocol);
• disponibiliza continuamente qualquer tipo de dado GNSS;
• permite acesso de vários usuários ao mesmo tempo;
• o acesso aos dados é realizado de forma segura sem a necessidade de o usuário estar em contato direto com as estações
de referência;
• está habilitado a fornecer o fluxo de dados por meio de qualquer rede móvel TCP/IP (Transfer Control Protocol/Internet Protocol);
• a largura de banda necessária para disseminar as correções GNSS é relativamente pequena.
O NTRIP é, basicamente,
composto por quatro com-
ponentes; o NTRIP Source, o
NTRIP Server, o NTRIP Cas-
ter e o NTRIP Client, confor-
me ilustração da Figura 20.16.
O NTRIP Source tem a fun-
ção de disponibilizar o fluxo
de dados GNSS continuamen-
te, sendo, em geral, represen-
tado por uma estação CORS,
por exemplo, as estações de
referência da Rede Brasileira
de Monitoramento Contínuo
(RBMC) do IBGE.
O NTRIP Server constitui a
parte do sistema que possibilita a
transferência de dados do recep-
tor GNSS para o NTRIP Caster.
O NTRIP Caster é cons-
Figura 20.16 • Componentes do protocolo NTRIP.
tituído por um servidor http
que organiza e verifica a qua-
lidade dos dados recebidos e distribui as correções diferenciais para o NTRIP Client.
O NTRIP Client é um aplicativo instalado no receptor remoto que permite o acesso ao fluxo de dados disponibilizados na
rede Internet.

20.8 Composição de um instrumento GNSS


Os principais componentes e acessórios de um instrumento GNSS estão ilustrados na Figura 20.17. As características e as
funções de cada um deles estão descritas a seguir.

Figura 20.17 • Principais componentes de um instrumento GNSS.


Sistemas de navegação global (GNSS) e-65

• Antena e pré-amplificador: a função da antena é detectar as ondas eletromagnéticas transmitidas pelos satélites, conver-
tê-las em corrente elétrica, amplificar o sinal e enviá-lo para o receptor. Entre as diferentes características que as antenas
GNSS devem ter, se destacam a sensibilidade para receber os sinais, a estabilidade do seu centro de fase e a proteção
contra multicaminhamentos. Há vários tipos de antenas GNSS, sendo a mais utilizada em instrumentos de medições
topográficas ou geodésicas as denominadas microstrip, por serem as mais robustas e mais fáceis de fabricar.
• Processador do sinal: a função deste componente é transformar os sinais recebidos para uma frequência mais baixa de
modo que o sinal possa ser processado por outros componentes do receptor.
• Oscilador: tem a função de gerar uma frequência padrão que será utilizada para sincronizar todos os circuitos essenciais
responsáveis pela decodificação dos sinais.
• Microprocessador: a função deste componente é controlar as operações do receptor (captar e processar o sinal e decodifi-
car a mensagem de navegação), calcular em tempo real a posição e a velocidade da antena com relação a uma antena de
referência, controlar a entrada e saída dos dados e controlar as correções diferenciais, entre outras.
• Memória: a função deste componente é armazenar os dados coletados. Trata-se de um dispositivo que pode ser interno
ou externo ao receptor, por exemplo, cartões de memória e pendrives. Os dados armazenados são posteriormente des-
carregados para um computador para visualização e pós-processamento.
• Suprimento de energia: a função deste componente é suprir energia para os demais componentes do instrumento. Em
geral, ele é composto por baterias de lítio-íon e, para casos específicos, são também utilizados conversores de tensão para
um nível apropriado para o dispositivo.
• Unidades de comando (ou interface de comunicação humana), cabos e display: as unidades de comando (controladoras)
são, geralmente, componentes externos que permitem aos usuários realizar as comunicações com o receptor por meio
de um teclado alfanumérico e tela VGA. As comunicações podem também ser realizadas por meio de computadores, no
escritório ou no campo, de modo que os receptores possam ser operados, em campo, sem a intervenção do operador.
A interligação entre a antena e o receptor e entre a unidade de comando e o receptor, em geral, é realizada por cabos de
diferentes tipos, podendo também ser realizada via conexões wireless.
A Figura 20.18 apresenta a configuração geral de um instrumento GNSS para instalação em tripé ou em um pilar de concreto
com dispositivo de centragem forçada. Esse tipo de configuração é utilizado para as estações de referência ou para as estações
remotas quando operando em modo relativo estático. No caso de operações em modo relativo cinemático ou diferencial DGPS/
RTK, em geral, os instrumentos são montados sobre um bastão, conforme ilustrado na Figura 20.19. Outras instalações comu-
mente utilizadas são as realizadas em tetos de veículos terrestres, máquinas de construção civil, veículos aéreos, entre outras.
O receptor e a antena do conjunto de instrumentos de medição GNSS podem estar separados, conforme ilustrado na Fi-
gura 20.18, ou estar combinados em um único dispositivo, como ilustrado na Figura 20.19. Em ambos os casos, eles podem
ser operados com ou sem a unidade de comando externa (controladora). Cada fabricante de instrumentos GNSS propõe a
solução de composição que considera mais adequada para as suas soluções de medições.

Figura 20.18 • Instalação de um instrumento GNSS em um tripé. Figura 20.19 • Instalação de um instrumento GNSS em um bastão.
Fonte: adaptada de Leica Geosystems. Fonte: adaptada de Leica Geosystems.
e-66 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

É importante salientar que, na maioria das aplicações da Geomática, o que se busca não é exatamente a posição da antena,
mas sim a posição do ponto sobre o qual ela está instalada ou referenciada, em geral, por meio de um tripé ou de um bastão.
Por esta razão é que se necessita sempre conhecer o off-set entre o centro de fase da antena e o ponto considerado, ao que se
denomina medir a altura da antena. Para esta finalidade, as antenas receptoras utilizadas em medições topográficas ou geodé-
sicas são instaladas no interior de um recipiente protetor, sobre o qual está indicada a referência geométrica, denominada ARP
(antena reference point), que permitirá determinar a sua altura com relação ao ponto de medição.15 Quando instaladas sobre
um tripé, elas se acoplam a ele por meio de uma base nivelante e um adaptador de acoplagem, conforme ilustrado na Figura
20.18, e a medição da sua altura é realizada por meio de uma trena. Quando instaladas sobre um bastão, o procedimento de
instalação e medição da altura é exatamente igual ao de um prisma refletor, conforme apresentado na Figura 20.19. Para essa
finalidade, as antenas contam com um sistema de acoplagem ao bastão ou ao adaptador da base nivelante semelhante ao de
um prisma refletor.

20.9 Levantamento topográfico ou geodésico com a tecnologia GNSS


Realizar um levantamento topográfico ou geodésico com a tecnologia GNSS significa determinar coordenadas de pontos
sobre a superfície terrestre por meio de métodos de posicionamentos dessa tecnologia. No caso de levantamentos geodésicos,
em geral, eles são realizados para a determinação de pontos de apoio ou para o estabelecimento de redes geodésicas. No caso
de levantamentos topográficos, eles são realizados para inúmeros propósitos de aplicações de Geomática, que variam desde
o estabelecimento de pontos de controle para obras de construção civil a levantamentos cadastrais de agrimensura e outros.
Seja qual for o objetivo do levantamento, existem algumas prerrogativas que devem ser observadas para que o trabalho seja
bem-sucedido. Entre elas, se destacam:
• planejamento do levantamento;
• escolha do método de posicionamento a ser aplicado;
• escolha do tipo de instrumento adequado;
• planejamento das operações de campo;
• estratégia de processamento de dados.
Apresentam-se a seguir os detalhes técnicos mais relevantes de cada uma delas para os propósitos da Geomática.

20.9.1 Planejamento do levantamento


O resultado final de um levantamento GNSS depende de alguns cuidados que os usuários devem ter mesmo antes de iniciar os
trabalhos de campo para a aquisição dos dados. A determinação e a localização dos pontos que serão utilizados como estações
de referências constituem as principais preocupações que se deve ter antes de iniciar as operações de campo. Os pontos a se-
rem utilizados são disponibilizados por órgãos federais e estaduais, por exemplo, o IBGE, no caso brasileiro, que disponibiliza
as suas informações no Banco de Dados Geodésicos (BDG) por meio de um Relatório de Estação Geodésica, onde, além das
coordenadas e localização do marco geodésico, estão indicadas todas as demais informações pertinentes à estação disponibi-
lizada. Recomenda-se, também, que seja feita uma visita prévia aos locais de operação para verificar a existência de possíveis
interferências para os sinais GNSS e para escolher os melhores locais para a implantação dos novos marcos topográficos ou
geodésicos (se for o caso). Além disso, recomenda-se visitar os marcos geodésicos que serão utilizados como pontos de refe-
rência para verificar as suas condições de uso.
Os programas de processamento dos dados GNSS, que acompanham o sistema de medição, possibilitam verificar a dis-
ponibilidade e as condições geométricas dos satélites, permitindo, assim, que se escolha os melhores locais e os melhores
horários para o levantamento.
Atenção especial deve ser dada quanto à disponibilidade de estações de monitoramento contínuo. Muito países têm redes
de pontos de monitoramento contínuo mantidas pelo governo, de acesso gratuito, e/ou redes privadas com acesso pago em
função do tempo de utilização. No Brasil, o IBGE disponibiliza a rede de monitoramento contínuo, denominada RBMC, cujas
informações podem ser acessadas pelo website https://ibge.gov.br/. Notar que o uso deste tipo de estação de referência fica
condicionado à disponibilização dos dados pelo órgão mantenedor. Dessa forma, para levantamentos críticos, o usuário deve
precaver-se quanto a problemas de disponibilização dos dados.
Os locais definidos para os levantamentos devem garantir facilidade de acesso e visibilidade do horizonte em todas as dire-
ções a partir de um ângulo de corte (cut-off angle) mínimo de 10° acima do horizonte da antena receptora para garantir não só a
qualidade dos sinais rastreados, como também o mínimo da influência do multicaminhamento, que degradam as precisões das
coordenadas determinadas. Outro fator importante é a escolha da taxa de coleta de dados a serem armazenados no receptor. Para
levantamentos no modo relativo estático, em geral, são utilizadas taxas que variam de 5 a 15 segundos; no modo relativo cine-
mático, taxas que variam de 1 a 5 segundos e no modo relativo diferencial, quase sempre taxas iguais ou inferiores a 1 segundo.

15 Notar que o ARP é o indicador geométrico por meio do qual o fabricante reduz as observáveis para o centro de fase calibrado da antena e, em
seguida, para o ponto sobre o qual foi medida a altura da antena.
Sistemas de navegação global (GNSS) e-67

20.9.2 Método de posicionamento, instrumentação e operações para o levantamento de campo


A escolha do método de posicionamento e as operações de campo são realizadas em função dos propósitos para o qual o
levantamento está sendo realizado, do nível de exatidão desejada/exigida no projeto, dos equipamentos disponíveis, do ta-
manho da área a ser levantada, das condições de infraestrutura para realizar o levantamento e da habilidade dos operadores
de campo. No caso de um levantamento geodésico, o método de posicionamento se restringe ao método de posicionamento
relativo estático e, no caso dos levantamentos topográficos, eles podem ser estáticos, cinemáticos e diferenciais. As operações
de campo para cada um deles e os instrumentos a serem utilizados são apresentados na próxima seção.

20.9.2.1 Levantamentos de campo por meio de posicionamentos estáticos


Os levantamentos de campo por meio de posicionamentos estáticos são realizados para os trabalhos geodésicos ou topográ-
ficos em que se deseja determinar as coordenadas de pontos individuais bem estabelecidos sobre o terreno, como marcos
geodésicos, marcos de apoio topográfico e pontos cadastrais.
Em geral, nesse tipo de levantamento aplica-se o método de posicionamento relativo estático. Dependendo da precisão
exigida e das condições operacionais do levantamento, por exemplo, em regiões remotas em que não se dispõe de pontos de
referência, pode-se aplicar o método de posicionamento absoluto estático. Os detalhes operacionais de cada um deles estão
descritos na sequência do texto.

20.9.2.1.1 Levantamento de campo por meio de posicionamento relativo estático


Por muito tempo este tipo de levantamento de campo foi o mais utilizado para as medições topográficas com a tecnologia
GNSS, sobretudo por aplicar diretamente os conceitos básicos da tecnologia. Além disso, é o tipo de levantamento GNSS que
garante a maior acurácia das coordenadas determinadas, principalmente se forem utilizados receptores de dupla frequência e
com capacidade para rastrear sinais GPS e GLONASS.
Neste tipo de levantamento é necessário que se tenha, pelo menos, um ponto de coordenadas geodésicas conhecidas,
sobre o qual seja possível instalar a antena receptora para definir a estação de referência ou que se tenha uma estação de
monitoramento contínuo GNSS, em ambos os casos, posicionados a uma distância relativamente próxima dos pontos a
serem levantados (pontos remotos). No caso de se utilizar apenas um ponto de referência, o usuário deve ter, pelo me-
nos, um conjunto de dois receptores/antenas para que um deles seja instalado sobre o ponto de referência e o outro sobre
o ponto remoto. Ao iniciar o levantamento, os receptores devem ser configurados de acordo com as especificações do
fabricante e precisam coletar dados brutos GNSS, simultaneamente, durante um período de tempo que varia em função
da distância entre eles.
No caso de se utilizar os dados de uma estação GNSS de monitoramento contínuo, o operador deverá também se certi-
ficar de que o receptor GNSS remoto está configurado para coletar dados com uma taxa igual ou múltipla da taxa da coleta
de dados da estação de monitoramento contínuo. A Figura 20.20 ilustra esquematicamente a situação de um levantamento
hipotético com uma estação de monitoramento contínuo (CORS) e com uma base de referência.
Dependendo da quantidade de receptores disponíveis para a execução do levantamento, ele pode ser realizado por meio
de uma linha de base ou de múltiplas linhas de base, estabelecendo uma rede de linhas de base GNSS, conforme ilustrado na
Figura 20.21.
Por meio da repetição das linhas de base se estabelece o que se denomina rede de linhas de base GNSS. Notar que, neste
caso, os pontos são ocupados mais de uma vez, razão pela qual os levantamentos em rede são utilizados exclusivamente no
modo relativo estático.
Em geral, os levantamentos de campo
são realizados com apenas uma linha de
base. Esse procedimento, contudo, por não
ter redundância de dados, pode acarretar
a obtenção de valores equivocados em si-
tuações de distúrbios não detectados nos
componentes do sistema GNSS, mesmo
em situações em que o resultado indicou
resolução da ambiguidade.
O procedimento de campo mais indica-
do é sempre realizar o levantamento com
pelo menos duas linhas de base partindo de
estações de referências distintas. Além disso,
como as medições GNSS são altamente cor-
relacionadas, recomenda-se que as linhas de
base sejam medidas em épocas diferentes. Figura 20.20 • Ilustração de levantamento relativo estático GNSS.
e-68 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Os resultados, neste caso, terão maior


confiabilidade, permitindo análises es-
tatísticas mais robustas.
Os levantamentos podem ser realiza-
dos com receptores de uma frequência
(L1) ou de dupla frequência (L1/L2). Os
resultados são obtidos por meio de pós-
processamento dos dados coletados em
ambos os receptores e por intermédio de
processamento da diferença de fase.
A distância entre a estação de refe-
rência e o ponto remoto pode variar
de alguns metros a algumas centenas de
quilômetros. Com a tecnologia atual,
considera-se que para distâncias de
até 50 km,16 as técnicas de resolução
da ambiguidade disponíveis são capa- Figura 20.21 • Linhas bases independentes e trivial.
zes de obter uma solução fixa com um
tempo de rastreamento da ordem de 15 a 20 minutos para receptores de dupla frequência (L1/L2). Para receptores de uma
frequência (L1), recomenda-se seguir as recomendações do fabricante. Tem-se, neste caso, o que se denomina levantamento
relativo estático rápido. Para distâncias maiores, em que, na maioria das vezes, se tem uma solução float, o tempo de coleta de
dados deve ser da ordem de horas, podendo chegar a três horas em casos de bases longas (200 a 300 km). Tem-se, neste caso,
o que se denomina levantamento relativo estático.
Sobre os instrumentos GNSS a serem utilizados nesse tipo de levantamento, normalmente, eles são compostos de uma antena
e um receptor acoplados ou conectados por cabos. No caso de se usar uma estação de referência própria, em geral, tanto a antena
da base como do ponto remoto é instalada sobre tripé, conforme ilustrado na Figura 20.18. Como o levantamento se restringe
a coleta de dados brutos em modo estático, todas as configurações para a coleta são realizadas em escritório, e o operador em
campo necessita apenas estacionar a antena e ligar o receptor, caso ele não tenha recursos para ligar e desligar automaticamente.

20.9.2.1.2 Levantamento de campo por meio de posicionamento absoluto estático (PPP)


Conforme já citado, esse tipo de levantamento de campo é realizado em ocasiões em que se deseja determinar as coordenadas
de pontos situados em localizações remotas, em que não se tem uma estação de referência próxima ou adequada para a reali-
zação de um posicionamento relativo.
O procedimento de campo, neste caso, consiste em estacionar a antena receptora GNSS sobre o ponto desejado, e coletar
dados GNSS por um período de tempo que varia em função do tipo de receptor utilizado (somente L1 ou L1/L2) e da precisão
desejada. Com receptores (L1/L2) e tempo de rastreio entre três e quatro horas, tem-se alcançado precisões de ordem centimé-
trica. Por se tratar de um levantamento no modo estático, a montagem da antena, neste caso, pode ser realizada por qualquer
um dos procedimentos de instalação estática indicados nas seções precedentes.
Nesse tipo de levantamento, os dados coletados precisam ser pós-processados com o uso das efemérides precisas e todas
as demais correções envolvidas no posicionamento GNSS. Além disso, pelo fato de se usar as efemérides precisas, o processa-
mento somente pode ser realizado alguns dias após a coleta dos dados, em face do tempo necessário para a disponibilização
das efemérides. Em geral, o processamento é realizado por agências especializadas, que oferecem o serviço gratuito, por exem-
plo, a Universidade de New Brunswick, Canadá, por meio do website http://www2.unb.ca/gge/Resources/PPP/OnlinePPPs.
html, o National Geodetic Service (NGS), Estados Unidos, que oferece o serviço on-line denominado OPUS (Online Positio-
ning User Service – https://www.ngs.noaa.gov/OPUS/). No Brasil, este tipo de serviço é prestado pelo IBGE, que já disponibi-
liza os resultados no sistema de referência utilizado no Brasil (SIRGAS 2000,4).

20.9.2.2 Levantamentos de campo por meio de posicionamentos cinemáticos


Conforme já citado, em várias aplicações da Geomática se deseja determinar as coordenadas de pontos sequenciais em um
caminhamento. Tem-se, assim, o que se denomina levantamento relativo cinemático.
São exemplos típicos da aplicação deste tipo de levantamento os trabalhos realizados para a determinação de grupos de
pontos e aqueles para o posicionamento de sensores de medição topográfica em movimento (aéreos e terrestres), como já
descritos em capítulos anteriores.
16 Alguns fabricantes de instrumentos GNSS indicam distâncias de até 70 km.
Sistemas de navegação global (GNSS) e-69

A Figura 20.22 ilustra, esquematica-


mente, a situação de um levantamento rela-
tivo cinemático composto por uma estação
de referência, uma antena remota sobre
veículo e uma antena remota em mochila.
De forma semelhante ao levantamen-
to estático, o usuário pode utilizar uma
estação de monitoramento contínuo ou
pode estabelecer a sua própria base de re-
ferência com o uso de um segundo equi-
pamento. A medição, neste caso, pode ser
realizada no modo relativo cinemático
por código, relativo cinemático por códi-
go e fase com inicialização ou no modo Figura 20.22 • Ilustração de levantamento relativo cinemático GNSS.
relativo cinemático PPK.
Os levantamentos relativos cinemáticos baseados na medição da pseudodistância (levantamentos por código) são pouco
utilizados em Geomática em virtude de sua baixa precisão. Mesmo assim, trata-se de um tipo de levantamento que pode ser
adequado para a coleta de dados para sistemas de informação geográfica ou para aplicações na agricultura que não necessitem
de alta precisão. A despeito de sua baixa qualidade posicional, ele possui a vantagem de não necessitar de um tempo de inicia-
lização do sistema no início do levantamento ou quando houver interrupção do sinal.
Nos casos de levantamentos por meio de posicionamento relativo cinemático com código e fase com inicialização, a coleta
de dados não pode ser interrompida durante a trajetória da antena. Caso isso ocorra, o levantamento deve ser reinicializado a
partir do ponto em que houve a perda do sinal.
Nos casos de levantamentos por meio de posicionamento relativo cinemático PPK, caso haja interrupção dos sinais, a
antena remota pode seguir em movimento. Porém, conforme já citado, durante o intervalo de tempo com solução float, as
coordenadas determinadas são de baixa precisão.
As interrupções de sinais ocorrem sempre que os sinais recebidos pela antena remota forem bloqueados, por exemplo, em
situações em que ela atravessar regiões arborizadas e com folhagens densas, viadutos ou sofrer sombreamento do sinal por
edifícios ou outros obstáculos. Os receptores, em geral, emitem um sinal de aviso quando a quantidade de satélites rastreados
está abaixo de um limiar predeterminado.
A quantidade de pontos determinados neste tipo de levantamento dependerá do intervalo de registro dos dados e da
velocidade de deslocamento. Em geral, eles variam de 1 a 5 segundos, podendo chegar a décimos de segundos em caso de
levantamentos aéreos.
Por se tratar de um levantamento por meio de posicionamento relativo, de forma semelhante aos anteriores, eles precisam
ser pós-processados para que se obtenham as coordenadas finais do levantamento.

20.9.2.3 Levantamentos de campo por meio de posicionamentos diferenciais


A possibilidade de se conhecer em tempo real os valores das coordenadas determinadas com a tecnologia GNSS, me-
diante a aplicação de posicionamentos diferenciais, determinou uma nova era para os levantamentos GNSS. Atualmente,
a grande maioria dos levantamentos é realizada por meio desse tipo de posicionamento. Eles são aplicados em todos os
tipos de trabalhos em que se necessita conhecer as coordenadas dos pontos medidos em tempo real, por exemplo, na
implantação de obras, no posicionamento de sistemas de automação de máquinas de construção civil, na agricultura de
precisão e muitos outros.
De forma semelhante aos levantamentos de campo citados nas seções anteriores, o usuário também necessita de um con-
junto de dois receptores/antenas operando como antena de referência e antena remota. A diferença, neste tipo de levantamen-
to, é que os receptores deverão estar munidos de um sistema de transmissão de dados que permita a comunicação entre o
receptor de referência e o receptor remoto. O sistema de comunicação utilizado pode ser rádios UHF, comunicação Bluetooth,
comunicação celular GSM, comunicação via Internet, comunicação via satélite geoestacionário, entre outros. Os protocolos
de intercâmbio de dados são os apresentados na Seção 20.7 – Formatos de intercâmbio de dados GNSS.
As operações de campo consistem em instalar a antena de referência sobre um ponto de coordenadas conhecidas, as quais
devem ser inseridas no receptor, e pelo envio das correções diferenciais do receptor de referência para os receptores remotos.
Assim que o receptor remoto recebe as correções, ele inicia a determinação das coordenadas do ponto remoto e as exibe na
tela do coletor de dados do receptor com indicação da qualidade das coordenadas determinadas. Um exemplo típico de le-
vantamento de campo por meio de posicionamento diferencial é o realizado a partir de uma antena receptora instalada sobre
um bastão de medição, conforme ilustrado na Figura 19.19. O operador, neste caso, posiciona o bastão com a antena sobre o
ponto desejado, verifica a qualidade da posição indicada no coletor de dados do sistema de medição e grava as coordenadas
na memória do instrumento.
e-70 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

No caso em que o posicionamento está sendo realizado no modo diferencial DGPS, os valores indicados pelo receptor po-
dem ser utilizados imediatamente após a exibição. O exemplo mais expressivo deste tipo de levantamento GNSS é o realizado
por meio dos sistemas SBAS, citados na Seção 20.3.7 – Sistemas SBAS. O usuário, neste caso, necessita de apenas um receptor/
antena com capacidade para receber as correções do sistema SBAS.
No caso de posicionamentos pelo método diferencial RTK, conforme já descrito, o operador deverá respeitar um tempo
de espera (estático ou em movimento) até que o sistema resolva a ambiguidade. Em geral, neste tipo de levantamento, são
utilizados receptores de dupla frequência (L1/L2) com capacidade para rastrear sinais GPS e GLONASS. Além disso, o usuário
deve ater-se ao tempo de latência da solução, principalmente para as medições cinemáticas.
Por se tratar de um levantamento baseado em posicionamento relativo diferencial, não há necessidade de pós-processa-
mento e as coordenadas são disponibilizadas na tela do coletor de dados e/ou gravadas na memória interna do sistema de
medição, em tempo real.

20.9.2.4 Levantamentos de campo por meio de estações de referência virtual (VRS)


O estabelecimento de uma estação de
referência virtual (VRS), simplificada-
mente, se baseia no conceito de arma-
zenar as correções diferenciais de uma
rede de estações de referência de moni-
toramento contínuo (CORS) para, por
meio de um método de interpolação de
correções diferenciais, utilizá-las para
o processamento de linhas de base de
pontos remotos medidos no interior
da área de cobertura da rede. Em ge-
ral, as estações CORS são posicionadas
com distâncias da ordem de 50 a 60 km
entre elas de forma a cobrirem a maior
extensão possível da área de interesse.
Isso equivale a estabelecer uma VRS
próxima à posição do ponto remoto, a
qual, virtualmente, possui as mesmas
correções da posição do ponto remo-
to, permitindo, assim, a determinação
Figura 20.23 • Conceito de estação de referência virtual.
de suas coordenadas em tempo real ou
pós-processadas, conforme ilustrado
na Figura 20.23.
Operacionalmente, na determinação de uma VRS, inicialmente, as informações das pseudodistâncias e das fases das porta-
doras coletadas, continuamente, pelas antenas de cada um dos receptores da rede de estações são processadas em um centro
de controle. Assim que se obtém uma solução fixa para a ambiguidade da rede, tem início a fase de modelagem das correções
diferenciais. A partir daí, o centro de controle é capaz de interpolar valores para pontos específicos no interior da rede e gerar
dados de observações e/ou correções GNSS como se eles estivessem sido coletados por uma antena receptora hipotética de
uma estação de referência estacionada naquela posição.
No caso de levantamentos por meio de posicionamentos diferenciais RTK, que, neste caso, passa a ser denominado
NRTK (Network Real Time Kinematic), existem duas soluções preferencialmente empregadas para os levantamentos pelo
método diferencial: a primeira delas, baseada diretamente no conceito VRS, requer que o receptor remoto tenha capa-
cidade de receber e enviar comunicações de/para o centro de controle, em geral, via telefonia celular ou Internet. Nesse
caso, o receptor remoto envia a posição de navegação para a central de controle, a qual realiza os primeiros cálculos e
os transmite para o receptor remoto via protocolo NMEA. O processo de posicionamento é iterativo até que se obtenha
uma posição definitiva. A partir daí as correções diferenciais são transmitidas continuamente por meio do protocolo
RTCM (ver Fig. 20.23).
O segundo tipo de solução é denominado Master-Auxiliary Concept (MAC) e se baseia no conceito de se estabelecer uma
área de dados de ambiguidades para serem utilizados como correções diferenciais, as quais são disponibilizadas para todos os
receptores remotos operando na área de ação da rede CORS, via RTCM, sem a necessidade de dupla comunicação. Para que
o sistema seja operacional, a rede de estações é dividida em áreas formadas por grupos (clusters) e células (cells), por meio das
quais se alcança um nível de ambiguidade comum a ser disponibilizada para os usuários.
Estudos realizados têm mostrado que ambas as tecnologias produzem o mesmo nível de acurácia, com valores variando
entre 1 e 2 cm na componente horizontal e 1,5 e 3,5 cm, na componente vertical com um nível de confiança de 67 %.
Sistemas de navegação global (GNSS) e-71

No caso de levantamentos por meio de posicionamentos relativos estáticos ou cinemáticos, a solução se baseia no conceito
de se produzir um arquivo RINEX virtual (VR), com informações interpoladas dos dados brutos de cada estação da rede
CORS, para uma posição hipotética de um ponto no interior da área de cobertura da rede. Os dados são iguais aos de um
arquivo RINEX convencional, com a vantagem de se referir a uma estação localizada próxima ao ponto remoto. O usuário
utiliza, então, as informações desse arquivo RINEX para o pós-processamento dos dados.
As vantagens de se usar este tipo de solução são enormes e, por esta razão, ele tem sido implementado em vários países e
regiões de grandes atividades de medições GNSS. No Brasil, conforme já citado, o IBGE/INCRA possui uma rede CORS com
algumas possibilidades de implantação de VRS, e no estado de São Paulo existe uma rede CORS privada que disponibiliza
informações para operações em modo NRTK, mediante pagamento por tempo de uso da rede. Mais informações sobre este
tipo de operação GNSS são facilmente obtidas em portais da Internet especializados.

20.9.3 Processamento dos dados coletados em campo


Processar os dados GNSS coletados em campo significa utilizar um programa computacional desenvolvido para tal fim. Por
meio do processamento dos dados é que se obtém as coordenadas dos pontos rastreados, além de todas as informações rela-
cionadas ao levantamento.
O primeiro passo para a realização do processamento é a transferência dos dados coletados em campo, do receptor para um
computador. Quando o levantamento foi realizado em modo diferencial, as coordenadas já foram determinadas em campo e
o programa apenas as exibe juntamente com as demais informações relacionadas ao levantamento. No caso de levantamentos
nos modos relativos estático e cinemático, as coordenadas são obtidas após relacionar os dados de todas as linhas de base
envolvidas no levantamento, o que se denomina pós-processar os dados.
De acordo com os tipos de levantamentos apresentados anteriormente, o pós-processamento dos dados pode ser autôno-
mo, vetorial ou em rede.
O pós-processamento autônomo segue exatamente as prerrogativas citadas na Seção 20.9.2.1.2 – Levantamento de campo
por meio de posicionamento absoluto estático (PPP).
O pós-processamento vetorial pode ser realizado para cada linha de base independente ou por seções. No pós-processa-
mento por seções, como o próprio nome sugere, o processamento das bases independentes é realizado simultaneamente para
todas as seções de levantamento.
Os pós-processamento pode também ser realizado em rede, desde que, evidentemente, os dados tenham sido coletados de
forma a formarem as linhas de base correspondentes às redes desejadas. Conforme já citado, este é o procedimento de cam-
po mais recomendado. É importante, contudo, notar que o pós-processamento em rede deve ser realizado por profissionais
experientes, uma vez que a análise dos resultados exige conhecimentos avançados de ajustamentos de redes geodésicas.
Independentemente do tipo de pós-processamento utilizado, o engenheiro responsável pelo projeto deve buscar sempre a
melhor solução para as coordenadas processadas. Para tanto, ele deve avaliar se a solução do processamento atendeu a todos
os testes estatísticos, se as ambiguidades possíveis foram resolvidas e se as precisões obtidas atendem os objetivos do projeto.
Em geral, os programas de pós-processamento exibem os resultados dos processamentos, permitindo acesso dos usuários
aos seus arquivos de erros residuais e das matrizes de covariâncias, em caso de processamentos em redes. Alguns permitem
ainda desabilitar satélites considerados indesejáveis para o levantamento realizado. Os usuários mais experientes devem sem-
pre consultar esses arquivos ao fim de cada processamento.
Por fim, ressalta-se que as coordenadas primárias obtidas pelo pós-processamento dos dados GNSS são as coordenadas
cartesianas espaciais (X, Y, Z) do ponto medido com relação ao Sistema Geodésico WGS84. Conforme apresentado no Capítulo 3
– Referências geodésicas e topográficas, para o seu uso em projetos de Engenharia elas devem ser transformadas para coordenadas
geodésicas (latitude, longitude e altura elipsoidal) e, posteriormente, para o Sistema de Projeção Cartográfica desejado.

20.9.4 Relatório final do trabalho


Assim como todo projeto de Engenharia, após a realização de todos os procedimentos de campo e de escritório, faz-se ne-
cessário a elaboração de um relatório final do trabalho para fins de documentação das operações realizadas e para eventuais
análises futuras. O relatório deve conter, no mínimo, os seguintes apontamentos:
• descrição detalhada do local onde foi realizado o levantamento, se possível com uma imagem da localização do ponto
que pode ser facilmente obtida por meio de imagens geradas pelo aplicativo Google Earth;
• relatar os objetivos do trabalho realizado, bem como as precisões desejadas e alcançadas;
• descrição dos marcos geodésicos implantados com fotos e detalhamento de suas posições para facilitar eventuais visitas
futuras;
• descrição detalhada do software utilizado na etapa de processamento e ajustamento dos dados, incluindo nome e núme-
ro da versão;
• descrição detalhada de todas as etapas de levantamento de campo com os itinerários realizados nos deslocamentos entre
os pontos e os nomes dos técnicos que efetuaram o levantamento;
e-72 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

• descrição de todo e qualquer acontecimento durante a sessão de observação julgados importantes para as análises dos
processamentos e ajustamentos dos dados;
• todos os arquivos gerados pela coleta de dados, processamento e ajustamento devem ser convenientemente armazena-
dos em mídias seguras para garantirem a integridade e a segurança dos dados;
• relatório final impresso para apresentação ao cliente.

20.10 Qualidade dos levantamentos topográficos e geodésicos com a tecnologia GNSS


Da mesma forma que os demais tipos de levantamentos topográficos citados ao longo deste livro, os realizados com a tecno-
logia GNSS também variam em função dos erros instrumentais, dos erros atmosféricos e dos erros operacionais, conforme
apresentados a seguir.

20.10.1 Erros instrumentais


Os principais erros instrumentais e seus efeitos nas medições GNSS estão descritos em detalhes nas seções precedentes rela-
tivas aos métodos de posicionamentos. Além deles, existem outros que podem afetar a qualidade do levantamento, os quais
estão apresentados a seguir.
Erros entre os canais do receptor: os receptores atuais oferecem modelos com capacidade de vários canais para recepção dos
sinais para os diversos sistemas de posicionamento. Em virtude desse fato, podem ocorrer erros instrumentais uma vez que
cada sinal de cada satélite de cada sistema percorrerá um caminho eletrônico diferente. Estes erros podem ser eliminados na
diferenciação das observações quando se utilizam instrumentos de mesma marca e modelos na execução do levantamento.
Erros de ruídos do receptor: os receptores são equipamentos eletrônicos e, assim, estão sujeitos a “ruídos” gerados por
seus circuitos eletrônicos. Estes “ruídos” devem atender a valores de tolerâncias estipulados pelo fabricante, os quais não
devem ser ultrapassados de modo a garantir a qualidade do levantamento. Estes erros não são previsíveis e, por isso, são
considerados erros acidentais do sistema. Em função disso, periodicamente, os receptores devem ser calibrados para ve-
rificação dos ruídos eletrônicos gerados e se estes ruídos se encontram dentro dos valores especificados pelos fabricantes.
Erros de fase da antena: o centro de fase elétrico da antena é o ponto virtual onde as medições dos sinais são referenciadas
e, em geral, ele não coincide com o centro geométrico da antena (ARP). Por esta razão, para trabalhos de alta qualidade,
recomenda-se que as antenas sejam calibradas para se conhecer os valores das variações do centro de fase. De forma sim-
plificada, essa calibração é realizada girando a antena em torno de um eixo de forma a determinar a direção em que se
tem a menor variação da fase. Este tipo de erro pode ser minimizado com a utilização de antenas de mesmo tipo/modelo
do mesmo fabricante e pela orientação com relação ao Norte Verdadeiro para que os parâmetros de calibração possam ser
utilizados corretamente pelo programa de processamento.

20.10.2 Erros atmosféricos


Os principais erros relacionados com as condições atmosféricas e que afetam os levantamentos GNSS são os seguintes:

Erros durante a propagação dos sinais: os sinais, ao serem emitidos pelos satélites e antes de atingirem a antena recepto-
ra, atravessam a atmosfera terrestre e, portanto, sofrem efeitos de “refração atmosférica”. A refração ocorre em todas as
camadas da atmosfera, sendo os efeitos mais relevantes os que ocorrem na troposfera e na ionosfera. No caso de uso de
receptores de múltiplas frequências, os efeitos da refração ionosférica podem ser removidos por modelos matemáticos,
enquanto no uso de receptores de uma frequência eles devem ser devidamente modelados. Estes erros não podem ser
ignorados em levantamentos que envolvam grandes distâncias entre os pontos, pois a atmosfera é variável entre eles. No
caso de levantamentos em pequenas distâncias, os erros de refração são removidos por diferenciação no processamento.
Geralmente, os programas de processamentos disponibilizados pelos fabricantes de instrumentos GNSS disponibilizam
modelos matemáticos para a troposfera e a ionosfera. O engenheiro responsável pelo processamento de dados deverá de-
finir qual o melhor modelo a ser utilizado para a região em que é realizado o levantamento.
Erros resultantes de explosões solares: as ocorrências de explosões solares são danosas aos sinais que transitam no espaço
antes de atingirem as antenas receptoras. Portanto, o engenheiro, sempre que possível, deve consultar portais da Internet
relativos ao assunto para verificar a ocorrência de explosões solares durante a etapa de elaboração do projeto de levanta-
mento e, assim, evitar executar o levantamento durante esses períodos.
Erros decorrentes do multicaminhamento: este tipo de erro ocorre em face da reflexão dos sinais em superfícies refletivas
antes de alcançarem as antenas receptoras. Dependendo das condições locais, os efeitos do multicaminhamento podem se
tornar tão grandes e provocar a perda dos sinais pelo receptor e, em função desse fato, reduzir a precisão da coordenada
do ponto medido. Alguns fabricantes oferecem tipos especiais de antenas que possuem capacidade de filtragem de sinais
refletidos, mas isso não garante a total eliminação do efeito. A melhor forma para diminuí-lo é escolher locais que não
apresentem superfícies refletoras próximas da antena receptora.
Sistemas de navegação global (GNSS) e-73

Erros em função da perda de ciclos: este tipo de erro é detectado quando, por alguma razão, ocorre a interrupção do rece-
bimento do sinal de um ou mais satélites pela antena receptora. Assim, a perda de sinal acarreta a perda de contagem do
número inteiro de ciclos medidos no receptor, causando, assim, a “perda da ambiguidade”. Se a perda de ciclos for pequena
(poucas épocas de observação), estes erros podem ser corrigidos pelos programas de processamento por técnicas conheci-
das por cycle slip fixing (correção das perdas de ciclos). Se a perda de ciclos for grande (muitas épocas de observação), isto
pode comprometer a precisão final das coordenadas processadas, podendo até ser objeto de cancelamento do trabalho e
exigir o retorno ao campo para realizar novas observações para refazer o trabalho.
Erros em razão da relatividade: são erros que surgem como consequência do movimento de rotação dos satélites em torno
da Terra, o qual faz com que os relógios atômicos dos satélites sofram um “atraso” de acordo com a teoria da relatividade,
uma vez que os relógios dos receptores e dos satélites se encontram em campos gravitacionais diferentes e se deslocam com
velocidades diferentes. Essas correções são calculadas pela estação master17 e aplicadas nos relógios dos satélites.
Além dos erros citados, existem outros de menor influência, que não fazem parte do escopo deste livro. Os leitores interes-
sados em mais detalhes deverão consultar literaturas especializadas.

20.10.3 Erros operacionais


Os erros operacionais a serem considerados em um levantamento GNSS são os seguintes:
Erro de centragem da antena receptora: este erro ocorre de forma semelhante aos erros de centragem dos instrumentos
topográficos citados na Seção 9.2.2.1 – Erro de centragem do instrumento e do prisma refletor.
Erro na medição da altura da antena: o usuário deve estar atento na medição precisa da altura vertical da antena (vertical
ou inclinada), pois esta medida é importante para a qualidade da determinação da altura geométrica do ponto medido.
Erros de configuração dos receptores: os usuários devem certificar-se de que ambos os receptores (base e remoto) sejam
configurados com os mesmos parâmetros, como taxas de coleta de dados, ângulos de corte, método de posicionamento,
sistemas de coordenadas e outros, de forma a evitarem perda de dados medidos.
Além dos erros citados, deve-se também considerar as precisões de outros elementos envolvidos no levantamento de cam-
po, que são:
• precisão das coordenadas (X, Y, Z) da estação de referência, as quais, em geral, são disponibilizadas juntamente com os
valores das coordenadas;
• precisão do nível de bolha do bastão da antena remota, em caso de medição com antena sobre bastão;
• estabilidade do tripé (ISO 12858-2:1999);
• precisão dos modelos matemáticos aplicados para transformação de coordenadas e para a ondulação geoidal, quando for o caso.
Embora não seja um erro operacional propriamente dito, outro fator que influencia a precisão da medição com a tecno-
logia GNSS é a disposição dos satélites no espaço sobre a área de medição. Para considerar esse efeito, definiu-se um fator
de qualidade, denominado Dilution Of Precision (DOP), que relaciona a geometria dos satélites no espaço com a precisão da
posição do ponto medido. Existem para este propósito dois valores DOP a serem prioritariamente considerados nas medições
com a tecnologia GNSS: o PDOP e o GDOP.18 O valor PDOP (Dilution of Precision) expressa a diluição da precisão das coor-
denadas no momento da observação e o valor GDOP (Geometric Dilution of Precision) expressa a influência da geometria dos
satélites e da medição do tempo na qualidade das observações. Em geral, recomenda-se que as observações sejam realizadas
em momentos em que o PDOP e GDOP sejam inferiores a 3 e 6, respectivamente. Estas informações os usuários podem obter
nos programas de planejamento de missões que fazem parte do programa de processamento de dados, que acompanham os
instrumentos, ou por meio de aplicativos disponibilizados em portais da Internet.
Com o intuito de esclarecer um pouco mais os valores dos coeficientes DOP e sem entrar em detalhes algébricos excessivos
para os propósitos deste livro, aos leitores com conhecimentos avançados em ajustamento de observações, os autores esclare-
cem que os coeficientes DOP são determinados em função dos elementos da diagonal da matriz de cofatores (Q XX ) obtida no
ajustamento das observações GNSS realizado para o posicionamento dos pontos rastreados. Assim, têm-se:

GDOP  q XX  qYY  qZZ  qt t (20.25)

PDOP  q XX  qYY  qZZ (20.26)

Esses valores são calculados a priori, em função das coordenadas aproximadas da zona de observações e da previsão da
passagem dos satélites dada pelos almanaques dos satélites.

17 Ver Seção 20.2 – Estrutura dos sistemas GNSS.


18 Além do PDOP e do GDOP, são também disponibilizados o VDOP, o HDOP, o TDOP e o HTDOP.
e-74 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Os valores das coordenadas obtidas em um levantamento GNSS são, evidentemente, resultantes da composição de todos
os erros citados. Notar que os valores das precisões indicadas em catálogos de fabricantes consideram apenas os erros
instrumentais e em boas condições atmosféricas para levantamentos GNSS. Além disso, eles indicam a precisão da linha
de base e não a precisão absoluta do ponto medido. Razão pela qual, se recomenda que os resultados obtidos sejam sempre
avaliados quanto a sua confiabilidade. O leitor deve lembrar que o processamento GNSS se baseia em avaliações estatísticas,
podendo, portanto, gerar resultados diferentes em condições diferentes.
Os resultados mais confiáveis são sempre aqueles obtidos por levantamentos em rede, que, em virtude da redundância de
dados, permitem determinar as precisões absolutas e as relativas, em função de um intervalo de confiança.
No caso de resultados obtidos por meio de apenas uma linha de base, a única indicação da qualidade obtida é a indica-
ção da precisão interna do processamento, a qual é sempre muito otimista tendo em vista a alta correlação entre os valores
medidos. Em geral, as precisões obtidas são de ordem milimétrica, o que, evidentemente, não condizem com os valores das
exatidões para os pontos medidos. Como não é possível determinar a exatidão do ponto medido, uma regra empírica utilizada
pelos usuários da tecnologia GNSS é considerar a exatidão como 10 vezes o valor da precisão obtida no processamento.
Notar que se o pós-processamento puder incluir as efemérides precisas, os resultados das coordenadas processadas podem
ser de melhor qualidade.
Como resumo dos valores de qualidade de um levantamento GNSS, apresentam-se no Quadro 20.1 os valores típicos dos
intervalos das acurácias obtidas em um levantamento GNSS em função do método de posicionamento empregado.

Quadro 20.1 • Precisão de um levantamento GNSS em função do método de posicionamento empregado.


21 Tecnologia de
varredura laser

21.1 introdução
A tecnologia de varredura1 laser tornou-se, em um curto espaço de tempo,2 uma das principais inovações da área de Geomá-
tica para coleta de dados geoespaciais. Baseando-se na tecnologia LiDAR (Ligth Detection and Ranging), que permite medir a
distância precisa entre um sensor e um objeto de medição, por meio de varredura espacial e a uma velocidade de medição de
milhares de pontos por segundo, ela estabeleceu um novo procedimento de coleta de dados geoespaciais baseado na vetoriza-
ção ou na modelagem espacial de um conjunto de pontos com coordenadas espaciais (X, Y, Z).
Diferentemente de uma estação total, que mede pontos bem
determinados no espaço, os instrumentos de varredura laser de-
terminam coordenadas 3D de pontos regularmente distribuídos
no espaço, ao que se denomina nuvem de pontos (ver Fig. 21.1).
Pela sua característica de varredura espacial da cena, os instru-
mentos de varredura laser são também denominados escâneres
laser ou laser scanner.
Pelo fato de os pontos medidos com esta tecnologia estarem
distribuídos no espaço, para o seu uso em Geomática, eles pre-
cisam ser tratados geometricamente para definirem um dado
geoespacial, ou seja, de forma semelhante à Fotogrametria, a
varredura laser deve ser vista como um sistema composto por
hardware, para a coleta da nuvem de pontos, e software, para o
tratamento dos dados. A diferença é que a fotogrametria, por ser
um sistema passivo de aquisição de dados, gera imagens com os Figura 21.1 • Nuvem de pontos coletada por varredura laser.
atributos da cena, as quais precisam ser tratadas algebricamente
para gerarem a nuvem de pontos e a varredura laser, por ser um sistema ativo de aquisição de dados, gera diretamente uma
nuvem de pontos com coordenadas (X, Y, Z) determinadas com relação a um sistema de coordenadas cartesiano espacial pre-
definido. Notar que o terno (X, Y, Z), nesse caso, refere-se a um sistema de coordenadas cartesiano espacial genérico.
Para o seu estudo, as tecnologias de medição por varredura laser são classificadas em função da tecnologia de medição
utilizada ou em função da plataforma sobre a qual o instrumento está instalado. Com relação a esta última, elas podem ser:
• varredura laser aérea (Airborne LiDAR);
• varredura laser terrestre (TLS, do inglês terrestrial laser scanning).
Diz-se que a tecnologia de varredura laser é aérea quando a plataforma sobre a qual o instrumento de medição está ins-
talado é uma aeronave (tripulada ou não). Diz-se que ela é terrestre quando o instrumento de medição se localiza sobre a
superfície terrestre. As terrestres podem ainda ser classificadas em estáticas e dinâmicas, sendo dinâmicas aquelas em que o
instrumento é transportado durante o processo de medição. A Figura 21.2 exibe um quadro resumo das classificações citadas.
1 Emprega-se também o termo varrimento.
2 As primeiras experiências com o uso da tecnologia de varredura laser iniciaram-se em meados dos anos 1990.
e-76 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Figura 21.2 • Plataformas de instalação dos instrumentos de varredura laser.

Dependendo da tecnologia de medição e do tipo de instrumento utilizado, as distâncias de medição podem variar de al-
guns metros a quilômetros, tornando possível aplicar a tecnologia de varredura laser em áreas tão diversas como a modelagem
3D de peças industriais e monumentos históricos como as modelagens numéricas de terrenos e superfícies. Para a Engenharia
Civil, ela tem sido empregada, prioritariamente, nas seguintes aplicações:
Aéreo: modelagem numérica de terrenos, modelagem numérica de superfícies, mapeamento de corredores (gasodutos,
oleodutos, vias de transportes etc.), mapeamentos geotécnicos e geológicos, gestão ambiental e outros.
Terrestre estático: modelagem 3D de edificações, modelagem 3D industriais, modelagem 3D de superfícies topográficas
restritas, as-built, documentação histórica de monumentos, arqueologia, monitoramento geodésico de estruturas, cálculo
de volumes, investigações forenses e outros.
Terrestre dinâmico veicular: mapeamentos de rodovias, ferrovias, túneis e áreas urbanas, entre outros.
Terrestre dinâmico portátil: mapeamentos de pequenas áreas de difícil acesso, em áreas internas de edificações, cânions
urbanos e outros.
Em face da extensão do assunto e do escopo deste livro, este capítulo trata apenas dos aspectos mais relevantes da tecno-
logia de varredura laser terrestre estático. O objetivo do capítulo é apresentar a tecnologia e orientar o leitor nas tomadas de
decisões com relação ao seu uso racional.

21.2 Componentes de um instrumento de varredura laser terrestre


Um escâner laser é um instrumento de medição de distância sem prisma, consistindo, basicamente, em um emissor de energia
eletromagnética, de um receptor e de um detector. A onda portadora é um laser, que contém as informações de modulações neces-
sárias para detectar o tempo de propagação do sinal entre o emissor e o receptor. Os lasers possuem diferentes potências e diferentes
comprimentos de onda, sendo a potência máxima limitada aos graus de segurança para a vista humana, conforme apresentado na
Seção 7.3.2.6 – Medições de distâncias eletrônicas sem prisma. O detector é formado por uma rede de fotodiodos de alta sensibilidade
que, além da assinatura do sinal, é capaz de detectar a sua intensidade, definindo, assim, uma quarta dimensão ao dado medido.
Tecnologia de varredura laser e-77

Figura 21.3 • Componentes de um instrumento de varredura laser terrestre estático.

Conforme ilustrado na Figura 21.3a, os componentes de um instrumento de varredura laser terrestre são similares aos de
uma estação total, com a diferença da não existência da luneta. A medição da distância, portanto, é realizada por um espelho
refletor, que se move por meio de um motor acoplado a ele, e que deflete a onda eletromagnética para diferentes direções no
espaço, conforme ilustrado na Figura 21.3b. Em alguns instrumentos, o espelho realiza um giro vertical de 360°, em outros ele
apenas oscila verticalmente. O giro horizontal é realizado pelo movimento rotatório horizontal do instrumento, que completa a
varredura espacial.
Assim como uma estação total robótica, o escâner laser é composto, basicamente, pela alidade (corpo), no interior da qual
estão localizados os componentes eletrônicos de operação do instrumento; pelos três eixos; pelos dispositivos de leitura angular;
e pelos dispositivos de medição de distância.
A estabilidade do instrumento durante a medição é pre-
ponderante para que se determinem as posições dos pontos
medidos, com acurácia. Por esta razão, muitos dos escâne-
res disponíveis no mercado são equipados com compensa-
dores eletrônicos, que armazenam informações da direção
da gravidade antes de cada medição e ajustam os valores
medidos pelo escâner em função das inclinações indicadas
pelos compensadores.
As características dos compensadores utilizados nos di-
ferentes instrumentos variam de acordo com o fabricante.
O leitor interessado em mais detalhes deverá consultar as
informações técnicas dos instrumentos.
Para a sua operação em campo, os instrumentos de var-
redura laser terrestre estáticos são posicionados sobre um
tripé e operados a partir de um computador externo ou por
meio de uma tela VGA acoplada ao instrumento, conforme
ilustrado na Figura 21.4. Figura 21.4 • Instrumento de varredura laser terrestre estático em
Apresentam-se a seguir os detalhes técnicos dos prin- operação.
cipais componentes de um instrumento de varredura laser Fonte: Disponível em: https://www.professionistiuniti.it/i-laser-scanner/.
Acesso em: 20 jan. 2021.
terrestre estático.

21.2.1 Medição da distância


O princípio da medição da distância por varredura laser é o mesmo apresentado na Seção 7.3.2 – Medições eletrônicas de dis-
tâncias. Alguns instrumentos utilizam o método de medição por pulso (time-of-flight), outros o método de diferença de fase
e, os mais recentes, o método baseado na tecnologia WFD. Ambos, por intermédio de uma modulação por feixe laser com
capacidade para medições de distâncias sem prisma. Evidentemente, a distância medida é a distância inclinada entre o ins-
trumento e o objeto. O alcance das distâncias de medição varia de alguns metros a alguns quilômetros. Em geral, os de curta
distância empregam o método de diferença de fase (alta acurácia) e os de média e longa distância, o método de medição por
pulso (acurácia reduzida) ou o método WFD (alta acurácia) (ver Tab. 21.1).
e-78 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Pelo fato de os instrumentos de varredura laser operarem por meio de feixes laser, existem alguns parâmetros relacionados
com os pontos laser e com as superfícies de incidência que devem ser considerados na caracterização da qualidade da medi-
ção, conforme descrito a seguir.

21.2.1.1 Divergência do feixe laser


A forma geométrica do feixe laser emitido por um instrumento de varredura laser pode ser visualizada, simplificadamente, como
esferas concêntricas, cujo diâmetro vai aumentando à medida que o feixe se distancia do instrumento. A esse aumento de diâmetro
dá-se o nome de divergência do feixe laser. Como resultado, tem-se um ponto laser com diferentes dimensões, em função da distân-
cia do objeto medido. Notar que, em função da inclinação da superfície iluminada pelo feixe laser, o ponto laser poderá ter formato
circular ou elíptico. As especificações para os métodos de medição do diâmetro, do ângulo de divergência e das taxas de propagação
do feixe laser estão apresentadas na Norma ISO/TR 11146-3:2004 – Lasers and laser-related equipment – Test methods for laser beam
widths, divergence angles and beam propagation ratios. Part 3: Intrinsic and geometrical laser beam classification, propagation and de-
tails of test methods. Por se tratar de uma onda eletromagnética que se propaga no espaço, ela sofre ainda todos os efeitos da refração
atmosférica e da dispersão da onda, que não podem ser desprezados para evitar erros sistemáticos nos valores medidos.
A Figura 21.5 ilustra o efeito da divergência do feixe laser no tamanho do ponto laser em diferentes distâncias. Evidentemente,
quanto menor o ponto laser, maior a acurácia da distância medida, uma vez que o sinal de retorno será sempre a média das refle-
xões ocorridas no interior da área circular (ou elíptica) iluminada pelo feixe laser incidente (ver Fig. 21.6 e Tab. 21.1).

Figura 21.5 • Divergência do feixe laser. Figura 21.6 • Efeito do tamanho do feixe laser.
Imagem adaptada do Manual do Usuário Leica TPS1100 Professional Series.
Fonte: Leica Geosystems: Manual do usuário Leica TPS1100 Professional Series.

21.2.1.2 Espaçamento dos pontos laser


O segundo parâmetro importante da medição da distância com um escâner laser é o espaçamento entre os pontos laser, ou
seja, a resolução da varredura (ver Fig. 21.7). Esse parâmetro é função da taxa de emissão do feixe laser, da distância ao objeto
e do incremento de rotação do espelho refletor. Distâncias maiores podem exigir menor incremento de rotação e vice-versa.

Figura 21.7 • Resolução da varredura laser em função da distância do instrumento ao objeto.


Tecnologia de varredura laser e-79

No caso do método de medição por pulso, por exemplo, o sistema de medição precisa esperar o retorno do sinal antes de en-
viar outro sinal. Assim, quanto maior a distância, maior o tempo de espera e menor a taxa de varredura. No caso do método de
medição por diferença de fase, o sistema não precisa esperar o retorno do sinal para enviar o próximo, o que permite alcançar
taxas de varredura maiores (ver Tab. 21.1).

21.2.1.3 Refletividade da superfície


A refletividade da superfície de incidência do feixe laser é outro fator importante a ser considerado na medição da distância
com um instrumento de varredura laser. Quanto maior a refletividade da superfície do objeto, maior a potência do sinal de
retorno e, consequentemente, maior o alcance do feixe laser e maior a capacidade do instrumento em medir a distância cor-
retamente. Os valores de refletividade, porém, variam em função do tipo de radiação laser utilizada, do tipo de superfície e do
ângulo de incidência do feixe laser, o que os tornam difíceis de serem avaliados corretamente. Em casos extremos, a distância
nem pode ser medida. As únicas fontes de informações, neste caso, são os testes feitos pelos fabricantes, que indicam os valores
de refletividade nas especificações técnicas de seus instrumentos.
Além da refletividade da superfície do objeto é importante também considerar o efeito da atmosfera existente no espaço
de deslocamento do feixe laser. A existência de partículas de poeira no ar e ambientes úmidos deterioram a qualidade do
sinal de retorno.

21.2.2 Medição angular


A orientação do feixe laser em um escâner terrestre estático é medida por meio de codificadores angulares horizontais e ver-
ticais (círculos de medição angular), semelhantes àqueles utilizados em estações totais e teodolitos eletrônicos (ver Capítulo
8 – Instrumentos topográficos). Nos instrumentos de baixa resolução, são mais frequentes os sensores angulares baseados no
método absoluto de medição angular, enquanto nos de alta resolução se exige o uso de sensores incrementais.

21.2.3 Sistema de deflexão do feixe laser


Conforme já citado, para que uma cena seja varrida por um escâner laser, é necessário que haja um sistema de deflexão do
feixe laser nas direções horizontal e vertical. Esse sistema é composto, basicamente, por um jogo de espelhos que deflete
o feixe laser emitido pelo instrumento na dire-
ção da cena e que varre o objeto de medição por
meio de servomotores (rotores) acoplados aos
codificadores angulares.
Em função dos incrementos angulares cons-
tantes e iguais, tem-se uma malha de pontos me-
didos sobre a cena, definindo, assim, a nuvem
de pontos. Além disso, em função da intensida-
de da onda eletromagnética de retorno recebida
pelo instrumento, é possível determinar os dife-
rentes valores de refletância de cada ponto me-
dido e atribuir-lhe uma cor, dando um aspecto
de imagem à nuvem de pontos da cena varrida,
conforme ilustrado na Figura 21.8. Figura 21.8 • Ilustração de uma nuvem de pontos com diferentes tons de refletividade.
Os sistemas de deflexão variam para as dife-
rentes tecnologias de varredura laser (terrestre e aérea). A Figura 21.9 ilustra os diferentes tipos de defletores utilizados nas
diferentes classes. Os instrumentos de varredura laser terrestre estático, em geral, utilizam o método de deflexão por meio de
espelho oscilante ou rotativo (ver Tab. 21.1).
Conforme ilustrado na Figura 21.10, em função do tipo de deflexão do espelho e do campo de visão, os instrumentos de
varredura laser são classificados em perfiladores (ou linear), panorâmicos, câmeras e híbridos. Os perfiladores são utilizados,
primordialmente, em varreduras cinemáticas, por exemplo, na varredura terrestre veicular ou portátil. O escâner perfila a área
2D e o movimento do sensor completa a terceira dimensão. Os escâneres panorâmicos realizam a varredura quase hemisférica
da cena, limitado apenas pela região da base do instrumento, fazendo com que a região varrida verticalmente esteja limitada
a aproximadamente 310°. Os instrumentos do tipo câmera possuem o campo de visão limitado pela janela de movimentação
do espelho e pelo movimento de rotação horizontal do instrumento, restritos em uma janela da ordem de 40° × 40°. Os instru-
mentos do tipo híbridos são aqueles que possuem rotações irrestritas em uma das direções, geralmente, a horizontal, porém,
possuem restrições de giro na direção vertical, variando entre 50° e 60°.
e-80 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Figura 21.9 • Sistemas de deflexão do feixe laser.

Figura 21.10 • Classificação dos instrumentos de varredura laser segundo o tipo de deflexão e o campo de visão.

21.2.4 Câmera digital interna


Alguns instrumentos possuem também uma câmera fotográfica digital interna instalada de forma coaxial com o eixo de co-
limação do instrumento. Ela possui capacidade para fotografar a cena de medição, de modo que as imagens obtidas possam,
posteriormente, ser dispostas em forma de um mosaico a ser incorporado sobre a nuvem de pontos, adicionando a informa-
ção RGB do pixel ao ponto correspondente, reforçando assim o aspecto de imagem da cena mapeada. Além da câmera interna,
alguns instrumentos são também munidos de uma câmera externa.

21.3 Georreferenciamento – determinação das coordenadas 3D


Em um escâner laser, a combinação entre as posições dos rotores e a distância inclinada medida permite determinar posições
de pontos no espaço por meio das coordenadas polares espaciais (Azi, zi, d9i ) definidas pelo sensor (ver Seção 4.9.2.1 – Trans-
formação de coordenadas retangulares espaciais para coordenadas polares espaciais e vice-versa). Tem-se, assim, uma nuvem de
pontos com coordenadas referenciadas ao sistema de coordenadas interno do escâner, as quais estão relacionadas unicamente
com a posição do instrumento no momento da medição.
As coordenadas polares assim determinadas podem ainda ser transformadas em coordenadas cartesianas espaciais ado-
tando-se um sistema de coordenadas cartesiano espacial local do instrumento, conforme ilustrado na Figura 21.11. Nesse
caso, a origem do sistema de coordenadas cartesianas espaciais é o centro eletro-óptico do instrumento; o eixo (z) coincide
com o eixo vertical do instrumento; o eixo (x) coincide com o eixo óptico do feixe laser (eixo de varredura), orientado arbi-
trariamente; e o eixo (y) é ortogonal a ambos. Notar que diferentes fabricantes de instrumentos laser podem adotar diferentes
orientações para os eixos do seu sistema de coordenadas.
TECNOLOGIA DE VARREDURA LASER e-81

De acordo com as relações matemáticas apre-


sentadas no Capítulo 4 – Sistemas de coordena-
das, as relações entre as coordenadas polares
espaciais medidas pelo escâner e as coordenadas
cartesianas espaciais locais do ponto medido são
estabelecidas pelas equações (21.1) e (21.2), as
quais são oriundas das equações (4.97) a (4.102).
Assim, têm-se:

 x  d  * sen  z  * sen  Az  
   
 y   d  * sen  z  * cos  Az   (21.1)
z  
   d  * cos  Az  


arctg  x 
Az y
z arccos z (21.2)
d Figura 21.11 • georreferenciamento de pontos levantados por varredura laser.
d 2 2 2
x y z

A nuvem de pontos com coordenadas cartesianas espaciais definidas pelo usuário em função de uma única posição do ins-
trumento, conforme descrito, somente é adequada para o uso em aplicações especiais em que a referência da nuvem de pontos
não altera os atributos do produto gerado. Nos demais casos é necessário que se tenha um sistema de coordenadas cartesiano
espacial predefinido, sobre o qual se fará o georreferenciamento da nuvem de pontos. Existem, para tanto, dois métodos de
georreferenciamento que podem ser aplicados. São eles:
• georreferenciamento direto;
• georreferenciamento indireto.
Apresentam-se na sequência os detalhes geométricos relevantes de cada um deles.

21.3.1 georreferenciamento direto


Diz-se que o georreferenciamento da
nuvem de pontos gerada por meio
de medições com um instrumento
de varredura laser é direto quando
o instrumento pode ser instalado e
orientado sobre um ponto de esta-
ção e um ponto de orientação, com
coordenadas conhecidas com relação
a um sistema de coordenadas carte-
siano espacial predefinido, conforme
ilustrado na Figura 21.12.
O georreferenciamento, nesse caso,
é similar ao realizado para as ope-
rações com uma estação total, con-
forme apresentado no Capítulo 10
– Cálculos topométricos. O ponto de
orientação (ponto de ré), nesse caso,
é um alvo especial que acompanha o
instrumento e que determina a posi-
ção do ponto de orientação ao ser es-
caneado pelo instrumento, conforme
indicado na Figura 21.17. Figura 21.12 • georreferenciamento direto.
De forma semelhante aos levan-
tamentos com estação total, toda vez que o objeto a ser medido (escaneado) exigir o posicionamento do instrumento de
medição em diferentes localidades, deverá haver uma rede de pontos de apoio implantada sobre elas. A Figura 21.13 ilustra
e-82 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

um exemplo de uma rede de pontos


de apoio implantada para o levanta-
mento por varredura laser de uma
basílica, na Itália. Notar a necessi-
dade de se estabelecer pontos de
apoio no interior do edifício para a
varredura laser de seu interior.
A rede de pontos de apoio é,
em geral, implantada por meio de
medições com estação total ou ins-
trumentos da tecnologia GNSS. Al-
guns instrumentos de varredura
laser, contudo, já possuem recursos Figura 21.13 • Rede de pontos de apoio implantada para o levantamento por varredura laser da
para estabelecer a própria rede de Basilica di San Pietro al Monte, Itália.
pontos de apoio por meio de poli- Fonte: adaptada de Alba et al. (2007).
gonais ou para determinar a posição e orientação do instrumento por meio da técnica de estação livre. Para mais detalhes, o
leitor deve consultar o Manual Técnico do instrumento de seu interesse.
A nuvem de pontos assim gerada possui as suas coordenadas 3D diretamente referenciadas ao sistema de coordenadas
espaciais da rede de pontos de apoio. É preciso considerar, contudo, que, para a aplicação desse tipo de georreferenciamento,
o instrumento de medição deve possuir recursos adequados para a sua operação semelhante a uma estação total, quais sejam:
instalação sobre marcos no terreno, orientação sobre alvos instalados no terreno e compensador eletrônico.

21.3.2 Georreferenciamento indireto


Diz-se que o georreferenciamento da nuvem de pontos gera-
dos a partir de medições com um instrumento de varredura
laser é indireto quando as medições realizadas em diferentes
posições do escâner são, primeiramente, combinadas em
uma única nuvem de pontos e, posteriormente, transfor-
madas para o sistema de coordenadas do objeto escaneado.
Têm-se, assim, as relações cartesianas entre o espaço instru-
mento e o espaço objeto, conforme ilustrado na Figura 21.14.
À combinação entre as diferentes nuvens de pontos para a
formação de uma única base de dados denomina-se registro
ou corregistro das cenas.
De acordo com a Figura 21.14, as coordenadas polares
espaciais (Azij, zij, díj) do ponto (i), determinadas com re-
lação à varredura (j), são, inicialmente, transformadas
em coordenadas cartesianas espaciais (xij, y ij, zij) do es-
paço instrumento. Em seguida, diferentes varreduras (j)
podem ser corregistradas e georreferenciadas ao espaço
objeto por intermédio de uma transformação de coorde-
nadas espaciais, conforme apresentado na Seção 4.9.2.2 –
Transformação entre sistemas de coordenadas cartesianos
espaciais. Assim, tem-se: Figura 21.14 • Relações cartesianas entre o espaço instrumento e o
espaço objeto.
 Xi   xij   Xcj 
     
 Yi   R *  yij    Ycj  (21.3)
 Zi  z  Z 
   ij   cj 
em que:
R = matriz de rotação entre o espaço objeto e o espaço instrumento (j); ver equação (4.21);
(Xi,Yi,Zi) = coordenadas do ponto (i) no espaço objeto;
(Xcj,Ycj,Zcj) = coordenadas da posição (j) do escâner no espaço objeto.
Conforme discutido no Capítulo 4 – Sistemas de coordenadas, os parâmetros de transformação entre dois sistemas de
coordenadas espaciais quaisquer podem ser determinados desde que se tenham pelo menos três pontos conjugados com
coordenadas conhecidas em ambos os sistemas.
TECNOLOGIA DE VARREDURA LASER e-83

A Figura 21.15 ilustra a geometria


do corregistro de duas cenas medidas
em duas posições diferentes do escâner.
Nesse caso, o registro da nuvem de pon-
tos da segunda varredura (TLS2) com
relação à primeira (TLS1) é realizado co-
nhecendo-se os valores das três trans-
lações (∆X, ∆Y, ∆Z) e das três rotações
(ω, φ, κ). Trata-se de uma transformação
de corpos rígidos, uma vez que se des-
considera o fator de escala, ou seja, é
uma transformação de Helmert 3D sem
fator de escala.
Na prática, as múltiplas medições
são corregistradas tomando uma delas
como referência. As junções das dife-
rentes varreduras são realizadas por
meio de diferentes algoritmos de corre- Figura 21.15 • geometria do corregistro de duas cenas medidas em duas posições diferen-
lação geométrica até se obter o registro tes do instrumento.
total de todas as cenas, formando uma
nuvem de pontos única referenciada
ao sistema de coordenadas espaciais do
instrumento.
Os algoritmos de correlação geomé-
trica disponíveis atualmente são diver-
sos. Alguns deles se baseiam nas próprias
nuvens de pontos, por meio das quais se
realiza uma correlação de superfícies;
outros em alvos artificiais distribuídos
nas diferentes cenas; outros em objetos
geométricos comuns entre as cenas, tais
como vértices, planos, cilindros etc.,
ou ainda na correlação de imagens.
Atenção especial deve ser dada ao re-
cobrimento das múltiplas cenas, que
devem conter porções significativas de
recobrimento e a existência de detalhes
Figura 21.16 • Pontos de controle para o georreferenciamento indireto.
geométricos ou pontos de controle em
diferentes profundidades, que permi-
tam correlacioná-las corretamente.
O leitor deve notar que, neste caso, não se realiza uma simples correlação
de imagens 2D, e sim uma correlação geométrica espacial (3D). Ainda se re-
ferenciando ao caso da aerofotogrametria, o corregistro pode ser interpretado
como a determinação de pontos de ligação (tie-points) citados na Seção 22.11
– Aerotriangulação.
O georreferenciamento final com relação ao sistema de coordenadas do ob-
jeto é realizado por meio de pontos de controle semelhantes àqueles descritos
no Capítulo 22 – Aerofotogrametria, ou seja, podem ser tanto pré-sinalizados
como naturais, determinados por levantamentos topográficos convencionais
(ver Figs. 21.16 e 21.17). Figura 21.17 • Exemplos de alvos utilizados
A distribuição dos pontos de controle deve ser criteriosa para garantir o como pontos de referência nas medições por var-
melhor georreferenciamento possível da nuvem de pontos. Cuidados especiais redura laser.
devem ser tomados nas varreduras de cenas alongadas, em que os erros de
corregistro são facilmente acumulados. Igualmente à fotogrametria, a verifi-
cação final do georreferenciamento deve ser realizada por meio de pontos de
verificação predeterminados.
e-84 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Os alvos utilizados para a determinação dos pontos de controle ou dos pontos de ligação pré-sinalizados, em geral, são pla-
cas planas ou alvos esféricos, conforme ilustrado na Figura 21.17. Na maioria dos casos, se prefere os esféricos pela facilidade
de se determinar o centro do alvo em qualquer ângulo de varredura, o que pode ser um problema nos casos de placas planas.
O leitor deve notar que o centro do alvo é determinado pelo centroide da varredura dele, uma vez que o feixe laser não
pode ser dirigido diretamente para ele.

21.3.3 Comparação entre métodos de georreferenciamento


Ambos os métodos de georreferenciamento possuem suas vantagens e desvantagens, conforme indicado a seguir:

Georreferenciamento direto – vantagens


• Não é necessário realizar escaneamentos extras quando existem pontos de controle. Se for utilizado escaneamento com
suporte da tecnologia GNSS, o escaneamento e as medições GNSS podem ser realizadas simultaneamente;
• não é necessário o recobrimento dos escaneamentos;
• os dados são georreferenciados no campo e não precisam ser pós-processados no escritório;
• a quantidade e a qualidade dos dados podem ser verificadas no campo, reduzindo, assim, o tempo do levantamento e a
necessidade de repetir o escaneamento;
• procedimento bem conhecido, o que facilita o seu entendimento e a sua integração com os levantamentos clássicos.

Georreferenciamento direto – desvantagens


• Menor precisão comparado ao método indireto;
• quando são utilizados alvos de ré, a qualidade dos resultados do georreferenciamento é afetada pela refletância e pelo
método utilizado para calcular o centroide do alvo.

Georreferenciamento indireto – vantagens


• Alta precisão do georreferenciamento, desde que seja realizada uma configuração com alvos estáveis;
• o escaneamento pode ser realizado a partir de estações arbitrárias;
• não é necessário centralizar, nivelar e medir a altura do instrumento.

Georreferenciamento indireto – desvantagens


• Necessidade de se estabelecer pontos de controle e, consequentemente, a necessidade de levar ao campo mais instrumen-
tos, por exemplo, uma estação total;
• necessidade de um cuidadoso planejamento para garantir uma boa configuração dos alvos;
• necessidade de recobrimento entre os escaneamentos;
• dificuldade no estabelecimento de boa configuração dos alvos em determinados casos, por exemplo, em obras longitu-
dinais (rodovias, túneis, oleodutos etc.);
• dificuldades na implantação de alvos em locais de difícil acesso, tais como: barragens, edifícios muito altos, torres etc.;
• necessidade de uma boa geometria 3D dos recobrimentos nos casos de registros por correlação de superfícies;
• necessidade de pós-processamento no escritório;
• os resultados dos registros e do georreferenciamento dependem da refletância e dos métodos usados nos cálculos dos
centroides dos alvos.

21.4 Vetorização e modelagem espacial


Os produtos gerados por meio de uma medição por varredura laser são, basicamente, a nuvem de pontos, mapas de vetores
da cena e/ou modelos espaciais dos objetos ou de toda a cena escaneada. A nuvem de pontos, conforme explicitado nas seções
anteriores, é o produto primário de uma medição por varredura laser. É por meio dela que os demais produtos são gerados.
Para tanto, na maioria das vezes, ela é pré-processada para filtrar pontos indesejados, para agrupar pontos homogêneos e,
algumas vezes, segmentada para facilitar a modelagem. Em seguida, ela deve ser formatada e importada para um programa
aplicativo de vetorização ou de modelagem espacial dos dados.
Em algumas aplicações especiais, se deseja apenas derivar valores particulares entre pontos da nuvem, tais como distância
entre eles, valores de coordenadas e outros. Nesses casos, eles podem ser obtidos diretamente em um aplicativo CAD sem
nenhuma modelagem prévia (ver Fig. 21.18).
A vetorização da nuvem de pontos consiste na elaboração de um mapa de linhas dos elementos geométricos detectados
na nuvem de pontos. É um processo manual que se baseia na interligação dos pontos referentes a um mesmo elemento geo-
métrico até se obter o mapa final desejado. Esse processamento é geralmente realizado por meio de um aplicativo CAD com
capacidade para operar com nuvem de pontos (ver Fig. 21.19).
Tecnologia de varredura laser e-85

Figura 21.18 • Exemplo de obtenção de valores geométricos de elementos da nuvem de


pontos de um escaneamento laser.

Figura 21.19 • Ilustração de uma imagem vetorizada a partir de uma nuvem de pontos.

A modelagem 3D da nuvem de pontos consiste na determinação matemática da forma espacial dos objetos escaneados, os
quais podem ser elementos geométricos tridimensionais individuais ou toda a geometria da cena. Modelar, nesse caso, deve
ser entendido como o processo de desenvolvimento de uma representação matemática georreferenciada de superfícies em três
dimensões, por meio de um programa aplicativo desenvolvido para esse fim. Por se tratar de uma representação matemática,
o modelo espacial gerado pode ser visualizado, editado, modificado, plotado e girado no espaço por intermédio de recursos
computacionais adequados.
Existem duas maneiras de se realizar a modelagem matemática da nuvem de pontos oriunda de uma mediação por varredura
laser. A primeira delas é a aplicação de um algoritmo de modelagem numérica de superfícies (MNS), conforme descrito no Capí-
tulo 18 – Modelo numérico de terreno. Os passos a serem seguidos, nesse caso, são exatamente aqueles descritos no referido capí-
tulo. O modelo assim gerado é visualmente composto por elementos triangulares que formam a figura da superfície modelada, a
qual pode ser tratada por recursos da computação gráfica para diferentes propósitos gráficos. A Figura 21.20 ilustra um exemplo
da modelagem espacial de uma nuvem de pontos por meio de recursos da modelagem numérica de superfícies.

Figura 21.20 • Modelagem espacial de superfícies por meio de MNS.


e-86 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

A segunda maneira consiste em utilizar progra-


mas aplicativos especiais de modelagem estrutural
de elementos geométricos específicos da nuvem
de pontos, tais como retângulos, cilindros, perfis
estruturais e muitos outros, de modo a gerar for-
mas geométricas espaciais de estruturas complexas,
conforme ilustrado na Figura 21.21.
O leitor deve notar a mudança de paradigma da
representação gráfica e dos recursos para a elabo-
ração de projetos de Engenharia em curso, em fun-
ção da possibilidade de se trabalhar com nuvens de
pontos e modelos 3D de objetos e superfícies. Aten-
ção especial deve ser dispensada à especialização
nesses tipos de recursos de projeto.
Figura 21.21 • Modelagem estrutural de uma nuvem de pontos.

21.5 Qualidade das medições por varredura laser


Conforme explicitado nas seções anteriores, o resultado primordial de uma medição por varredura laser é a indicação da
posição espacial (X, Y, Z) de cada ponto escaneado pelo instrumento. A acurácia e a precisão do posicionamento dos pontos
dependem de inúmeros fatores, tais como a qualidade física e a orientação do feixe laser, a distância da medição, as proprie-
dades físicas do objeto escaneado, as características do meio ambiente, a qualidade do georreferenciamento e a estabilidade
dos componentes internos do instrumento, entre outros. Além disso, o tamanho do ponto laser sobre o objeto medido é muito
maior que a sua imagem retratada na nuvem de pontos
e a densidade da malha de pontos (resolução) é tão alta
que os elipsoides de confiança dos pontos se recobrem,
dificultando a análise da qualidade posicional dos pontos.
Todos esses fatores tornam a quantificação da qualidade
de uma medição por varredura laser uma tarefa difícil de
ser realizada, principalmente, pela inexistência de nor-
mas específicas para esse fim.
O fato decorrente dessas circunstâncias é que a quali-
dade dos instrumentos de varredura laser é determinada
pelo próprio fabricante e indicada em suas especificações
técnicas. Além disso, o comportamento dos componentes
internos do instrumento às variações de temperatura e às
vibrações durante as medições exigem testes repetitivos
em câmaras de calibração especiais, somente disponí- Figura 21.22 • Exemplo de câmara de calibração de instrumentos de
veis em laboratórios especializados, razões pelas quais as varredura laser terrestre.
calibrações e os respectivos ajustes somente podem ser Disponível em: https://leica-geosystems.com/pt-br/services-and-support/product-
realizados pelo próprio fabricante. Ver exemplo de uma services/calibration-services. Acesso em: 20 jan. 2021.
câmara de calibração apresentada na Figura 21.22.
Para a avaliação da precisão (repetibilidade) de um instrumento de varredura laser recomenda-se utilizar a Norma ISO
17123-9:2018 (E) – Field procedures for testing geodetic and surveying instruments – Part 9: Terrestrial laser scanners, a qual
indica procedimentos para testes de verificação da adequabilidade de determinado instrumento para a tarefa pretendida. Para
mais detalhes sobre a aplicação da norma, o leitor deverá consultar os respectivos documentos. Alguns fabricantes indicam
também procedimentos de campo que podem ser efetuados pelo próprio operador para a verificação da qualidade de seus
instrumentos para garantir que eles estão operando dentro das especificações indicadas. Para tanto, o leitor deverá consultar
o Manual de Operações de seu instrumento para mais detalhes.

21.6 Fontes de erros nas medições por varredura laser


Por se tratar, fundamentalmente, de um instrumento de medição angular e linear, os escâneres laser estão sujeitos aos mesmos
tipos de erros de uma estação total com algumas características próprias relacionadas com as suas propriedades, as proprieda-
des da superfície refletora, o meio ambiente e o georreferenciamento, conforme descritos na sequência.
Tecnologia de varredura laser e-87

21.6.1 Erros instrumentais sistemáticos


Os erros instrumentais sistemáticos de um escâner laser estão relacionados com os componentes por meio dos quais se reali-
zam as medições angulares e lineares. Têm-se assim:
• erros angulares relacionados com os círculos de medição angular;
• erros angulares relacionados com o sistema de deflexão do feixe laser;
• erros angulares relacionados com os erros de eixos do instrumento;
• erros lineares relacionados com o sistema de medição da distância entre o escâner e o objeto.
Apresentam-se na sequência as principais características físicas de cada um deles.

21.6.1.1 Erros angulares relacionados com os círculos de medição angular


Os círculos de medição angular horizontal e vertical de um instrumento de varredura laser são praticamente os mesmos
utilizados em uma estação total e se comportam, portanto, da mesma maneira com relação aos erros instrumentais sistemáti-
cos de círculo, conforme apresentado na Seção 9.2.1.1 – Erros de círculo. Por esta razão, eles não serão tratados neste capítulo.

21.6.1.2 Erros angulares relacionados com o sistema de deflexão do feixe laser


O sistema de deflexão do feixe laser, conforme já descrito, é responsável pelo direcionamento da onda eletromagnética em
direção ao objeto a ser medido. Em conjunto com os círculos de medição angular e a perpendicularidade dos eixos do instru-
mento, ele define a posição do ponto laser no espaço, interferindo, portanto, na qualidade dos valores angulares medidos com
o instrumento. O erro angular específico do sistema de deflexão ocorre em função das irregularidades de seus componentes
físicos e ópticos, tais como efeitos do desalinhamento dos sensores de emissão e recepção do feixe laser com relação ao eixo
vertical do instrumento, desvio de perpendicularidade da incidência do feixe laser no espelho refletor, irregularidades da su-
perfície do espelho e outras. Todos eles dependem, exclusivamente, da qualidade da construção do instrumento, não havendo
nenhuma possibilidade de interferência do operador.

21.6.1.3 Erros angulares relacionados com os erros de eixos de rotação do instrumento


Os eixos de rotação de um escâner laser, conforme ilustrado na Figura 21.3, são os mesmos de uma estação total, quais sejam:
• eixo vertical: também denominado eixo de rotação do instrumento, em torno do qual o instrumento gira horizontalmente;
• eixo horizontal: também denominado eixo de rotação do espelho refletor, em torno do qual o feixe laser realiza a varre-
dura vertical;
• eixo de colimação: definido pela linha de visada, que coincide com o alinhamento central do feixe laser defletido pelo
espelho refletor.
As relações geométricas entre os três eixos e os efeitos dos erros em face da não ortogonalidade entre eles, nas medições an-
gulares, são exatamente os mesmos indicados na Seção 9.2.1.2 – Erros de eixos, incluindo, nesse caso, a calibração do compen-
sador eletrônico. Dessa forma, as equações para as correções desses erros são as mesmas indicadas nos textos correspondentes.
Os valores dos erros de eixo são determinados durante a calibração do instrumento e inseridos na memória do instrumento
para as correções angulares devidas, conforme descrito na Seção 9.2.1.2.
Nos instrumentos com câmera digital interna é necessário também calibrar o possível desalinhamento entre o centro da
rede de sensores CCD (ou CMOS) e o eixo de colimação do feixe laser para garantir a perfeita coincidência entre o ponto
medido e o sensor óptico da câmera.

21.6.1.4 Erros lineares relacionados com o sistema de medição da distância entre o escâner e o objeto
Novamente, os erros relacionados com a medição da distância entre o instrumento e o objeto de medição em um instrumento
de varredura laser são, basicamente, os mesmos descritos para os erros de EDM apresentados na Seção 9.2.3 – Erros sistemá-
ticos de medição de distâncias. Existem, contudo, algumas peculiaridades dos escâneres que devem ser ressaltadas, como os
erros nas medições de distâncias em decorrência da divergência do feixe laser e do ângulo de incidência na superfície refletora,
conforme descritos nas seções anteriores.

21.6.2 Erros resultantes das propriedades da superfície refletora


O grupo de erros associados ao objeto de medição estão relacionados, principalmente, com o índice de refletividade da super-
fície refletora, conforme discutido brevemente na Seção 21.2.1.3 – Refletividade da superfície. A variação do índice de refletivi-
dade da superfície causa, primordialmente, um erro na medição da distância. Superfícies altamente refletoras permitem obter
medições mais precisas que as menos refletoras, pelo fato de as primeiras refletirem uma maior quantidade de energia de volta
e-88 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

para o sensor. Notar que o excesso de refletividade pode também afetar a qualidade da medição ou até mesmo impedi-la.
Os efeitos, contudo, variam para diferentes instrumentos com diferentes comprimentos de onda do feixe laser.
Além da refletividade, a energia do feixe laser pode também penetrar em alguns tipos de materiais, como madeira, isopor,
mármore e outros. O sinal, neste caso, é refratado e refletido no próprio material, introduzindo uma nova constante de adição
na distância medida.
As características físicas da superfície refletora que geralmente induzem a erros nas medições de distâncias com um instru-
mento de varredura laser são as seguintes:
• cor;
• rugosidade;
• temperatura da superfície;
• umidade da superfície;
• composição física do material.

21.6.3 Erros decorrentes de fatores ambientais


Fatores ambientais, tais como temperatura e pressão, umidade relativa do ar, iluminação, vibração e outros, são também fontes
de erros importantes para as medições com instrumentos de varredura laser. Eles causam distorções na forma do feixe laser
refletido, atenuam a intensidade do sinal e modificam a sua velocidade de propagação, conforme descrito na Seção 7.3.2.4 –
Correções das distâncias medidas com um distanciômetro eletrônico. Outro efeito importante a ser considerado é o falso retorno
do sinal em função de múltiplos sinais de retorno causados por partículas de chuva ou de poeira no ar.

21.6.4 Erros de georreferenciamento


Os erros relacionados com o georreferenciamento do instrumento de medição são os mesmos relacionados com o georrefe-
renciamento de uma estação total, quais sejam:
• precisão das coordenadas da estação e do ponto de orientação, no caso de georreferenciamento direto, e das coordenadas
dos pontos de apoio, no caso do georreferenciamento indireto;
• erros de nivelamento do instrumento, nos casos de inexistência de compensador eletrônico;
• erros de centragem do instrumento;
• erros de determinação do centro dos alvos de orientação do instrumento ou dos pontos de controle.
Trata-se de erros acidentais, cujas determinações e efeitos podem ser avaliados conforme apresentados no Capítulo 9 – Erros
instrumentais e operacionais.

21.7 Exemplos de instrumentos de varredura laser


Para esclarecimento aos leitores sobre os níveis de qualidade e recursos dos instrumentos de varredura laser, apresenta-se na
Tabela 21.1 uma lista das principais características técnicas de alguns instrumentos disponíveis no mercado.

Tabela 21.1 • Principais características de instrumento de varredura laser


Divergência Taxa de
Passo Precisão Alcance Medidor de Espelho Campo de
Marca Modelo feixe laser varredura
angular linear [m] distância refletor visão
[mrad] [pt/s]
899 Hz 1,2 mm 360º Hz
Leica P50 1.000 WFD 0,23 1 milhão Oscilante
899V +10 ppm 290º V
699 Hz 5 mm 360º Hz
Optech Polaris 2.000 Pulso 0,30 500 mil Oscilante
399V +7 ppm 120º V
360º Hz
Trimble X7 – 2 mm 80 Pulso – 500 mil Rotativo
282º V
3299 Hz 360º Hz
Faro Focus – 150 Pulso 0,30 – Rotativo
300º V
3299 V

Z+F 0,799Hz 1 mm 360º Hz


Z+F 187 Fase 0,30 1 milhão Rotativo
5010X 1,599V +10 ppm 320º V

599Hz Polígono de 360º Hz


Riegl VZ-2000i 3 mm 2.500 WFD 0,27 1,2 milhão
2,599V rotação 100º V
22 Aerofotogrametria

22.1 Introdução
As medições topográficas para a determinação dos valores de um dado geoespacial, como visto nos capítulos precedentes,
são realizadas, na maioria das vezes, por meio de instrumentos topográficos e em contato direto com o objeto de medição.
Dependendo das dimensões e da quantidade de objetos a serem medidos, esse tipo de medição, contudo, pode ser laborioso
e custoso e, em alguns casos, até inviável com a tecnologia disponível atualmente. Incluem-se nesta situação, por exemplo,
os levantamentos cadastrais de grandes áreas, os mapeamentos cartográficos, os mapeamentos de corredores para projetos
lineares de Engenharia, o mapeamento de áreas de difícil acesso, a coleta de dados para a geração de modelos numéricos de
terreno de grandes superfícies e muitos outros.
Em face da dificuldade em se aplicar técnicas convencionais de medições topográficas na coleta de dados para esses tipos
de projetos, empregam-se técnicas de medições remotas e com capacidade de gerar grandes quantidades de dados, como
as técnicas de medições por meio de escâneres laser aéreos e terrestres, apresentadas no capítulo anterior, e as técnicas de
medições por meio da fotogrametria, discutidas neste capítulo.
Para os leitores menos habituados com o termo fotogrametria, ele deve ser entendido como a denominação genérica dada
à metodologia de modelagem matemática do espaço 3D por intermédio de imagens 2D geradas por sensores de captura de
imagem. Para a Geomática, isso envolve, predominantemente, informações geométricas (dimensões e formas), semânticas
(interpretativas) e físicas (propriedades da energia eletromagnética) dos elementos do espaço modelado.1
Para atender aos objetivos citados, no âmbito da Geomática, a fotogrametria é considerada uma ciência, uma técnica, que,
além de seus conceitos próprios, abrange conceitos de diferentes disciplinas, entre as quais se destacam a Geodésia, a Geome-
tria, o tratamento de imagens e a visão computacional, entre outras.
Neste contexto, o objetivo deste capítulo é discutir os conceitos básicos do que se denomina fotogrametria digital. Priori-
za-se aqui o estudo dos conceitos técnicos relacionados com a coleta de informações geométricas de dados geoespaciais por
meio de sensores aerotransportados, ou seja, por meio da aerofotogrametria. Não serão tratados os aspectos interpretativos
das imagens – ao que se denomina fotointerpretação e tampouco os conceitos relacionados com a fotogrametria terrestre. Por
se tratar de um capítulo de livro, serão discutidos apenas os aspectos relevantes da aerofotogrametria digital com o objetivo de
instruir os profissionais de Engenharia, no uso racional dessa tecnologia.

22.2 Definição de fotogrametria digital


Dá-se o nome de fotogrametria digital ao sistema de coleta de dados geoespaciais baseado em equipamentos eletrônicos e
programas computacionais, que permitem definir a posição, a forma, a dimensão, a orientação e informações semânticas de
objetos no espaço, por meio de imagens armazenadas em meio digital e nas equações matemáticas que regem as relações geo-
métricas entre o objeto espacial e sua imagem plana. Os equipamentos de coleta das imagens digitais são denominados sen-
sores fotogramétricos ou câmeras fotogramétricas digitais. Os equipamentos utilizados para a extração dos dados geoespaciais
1 Outros profissionais podem estar interessados em outros aspectos da modelagem 3D, como é o caso, por exemplo, daqueles envolvidos com a
computação gráfica ou a visão computacional.
e-90 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

são denominados, genericamente, restituidores fotogramétricos digitais ou, ainda, sistemas fotogramétricos digitais, os quais
operam por meio de programas ou bibliotecas de aplicativos específicas destinadas a solucionar os diversos problemas foto-
gramétricos. As empresas que atuam nessa categoria profissional são denominadas empresas de aerofotogrametria e os profis-
sionais que nela trabalham, fotogrametristas.
Para a racionalização do estudo da fotogrametria digital aplicada à Engenharia, ela pode ser categorizada segundo a loca-
lização da plataforma de aquisição de dados, conforme apresentado a seguir:

• fotogrametria terrestre: aquela em que a plataforma de aquisição de dados está localizada na superfície da Terra;
• aerofotogrametria ou fotogrametria aérea: aquela em que a plataforma de aquisição de dados é uma aeronave. No caso
de uma aeronave tripulada, ela é denominada aerofotogrametria convencional e, no caso de uma aeronave não tripulada,
fotogrametria por meio de VANT (ou RPA).

As aplicações em Engenharia variam entre as categorias. Para o caso específico da aerofotogrametria convencional, desta-
cam-se, entre outras, as seguintes:

• extração de informações tridimensionais para a atualização de bases de dados espaciais em formatos numéricos, alfanu-
méricos, gráficos e digitais (imagem);
• obtenção de informações geométricas e semânticas tridimensionais para aplicações em mapeamentos, Engenharia Civil,
Engenharia Mecânica, Engenharia Aeronáutica, Engenharia Ambiental, Engenharia Florestal, Arquitetura e Urbanismo,
cadastro rural e urbano, registro de patrimônio histórico-cultural, análise forense, relatórios de perícias técnicas, robó-
tica, sistemas de assistência à navegação veicular, aplicações médicas e outros;
• geração de modelos tridimensionais para o estudo em diferentes fases do ciclo de vida de um projeto de Engenharia,
como aplicações da tecnologia BIM, estudos do meio ambiente, geotecnia, modelagem hidrológicas, monitoramento de
estruturas e realidade virtual;
• mapeamentos e controles da produção na agricultura;
• mapeamentos para planejamento regional e urbano;
• controle de tráfego e acidentes em rodovias urbanas e rurais;
• inteligência militar.

As aplicações relacionadas com a fotogrametria por meio de VANT estão descritas na Seção 22.16 – Coleta de dados por
meio de sistemas VANT.

22.3 Imagem digital


A principal fonte de informação usada em fotogrametria digital é a imagem fotográfica, ou seja, a foto. Para o seu uso em fotogra-
metria, ela é obtida por sensores eletro-ópticos (ou fotodiodos) e disponibilizada em meios digitais, na forma de uma matriz com
valores correspondentes à quantidade de radiação eletromagnética do espectro luminoso, captada pelo conjunto de fotodiodos
com dimensões micrométricas. A quantidade de radiação captada é, em seguida, convertida em tons de cinza (ou valores de nível
digital – ND), ou ainda em cores, para que possam ser visualizadas. A imagem assim gerada é formada por elementos de imagem,
denominados pixel (contração de picture element, em inglês), que são também representados numericamente por valores que va-
riam de acordo com a resolução radiométrica da imagem. O tamanho da imagem, em número de pixels, depende da quantidade
de fotodiodos do sensor, ou seja, do tamanho da matriz de sensores, que pode ser quadrada ou retangular. A Figura 22.1 mostra
o exemplo de uma porção de uma imagem digital representada em tons de cinza e por meio de valores numéricos de 8 bits.

Figura 22.1 • Ilustração de uma imagem digital com sua matriz numérica de tons de cinza.

Além do atributo relacionado com o tom de cinza ou os canais de cores do objeto imageado, cada pixel possui uma dimen-
são (∆r, ∆c) e uma posição na imagem, correspondente a linha (r) e a coluna (c) em que ele se encontra na matriz de sensores.2

2r – row e c – column, em inglês.


Aerofotogrametria e-91

Essa relação geométrica entre o tamanho do pixel e sua posição na imagem permite estabelecer um sistema de coordenadas
bidimensional,3 denominado coordenadas pixel (r, c),4 expresso em pixels. Trata-se de um sistema de coordenadas levogiro
com origem no centro do pixel localizado no canto superior esquerdo da imagem, conforme indicado na Figura 22.2.
As equações matemáticas da fotogrametria, por outro lado, estão baseadas em um sistema de coordenadas cartesiano plano (x, y)
dextrogiro, com origem no centro da imagem, cuja localização, em geral, coincide com o centro da matriz de sensores, denominado
sistema de coordenadas imagem. A relação geométrica entre os dois sistemas de coordenadas está ilustrada na Figura 22.2.

Figura 22.2 • Representação do sistema de coordenadas pixel (r, c) e do sistema de coordenadas imagem (x, y).
Fonte: adaptada de EESC/USP.

Para o imageamento, os fotodiodos são fixados sobre um substrato cerâmico formando uma matriz de sensores, sendo
os mais comuns os baseados na tecnologia CCD e CMOS, já descritos em capítulos anteriores. Para as aplicações fotogra-
métricas, eles possuem dimensões variadas, alcançando, atualmente, resoluções da ordem de 450 megapixels,5 com pixels de
dimensões da ordem de 4,0 µm.
Os valores gravados na imagem digital correspondem à quantidade de fótons6 capturados em cada fotodiodo em determi-
nado intervalo de tempo, denominados intensidade do pixel. Geralmente, eles estão relacionados com a média das energias
geradas pela área coberta pelo pixel. Em meio digital, os valores de intensidade são gravados na forma binária, ou seja, com
valores 0 ou 1. Mais comumente, no formato de 8 bits (equivalente a 1 byte), que corresponde a valores inteiros compreendi-
dos entre 0 e 255, que estão bem acima da capacidade humana de distinguir tons de cinza. Os arranjos de bits são variados,
existindo imagens de 8, 11, 14, 16 bits e outros. A quantidade de bits de uma imagem é denominada resolução radiométrica
da imagem. As imagens coloridas, geralmente, são formadas por três matrizes de valores de intensidades (ou valores de
ND) de 8 bits, correspondentes às regiões do R (vermelho), G (verde) e B (azul) do espectro eletromagnético. As imagens são
assim classificadas em multiespectrais, quando consistem em apenas algumas bandas espectrais, em geral, entre 4 e 20; supe-
respectrais, quando possuem 36 bandas; e hiperespectrais, quando possuem 100 ou mais bandas espectrais.
A aquisição da imagem se dá por meio do uso de uma câmera fotográfica digital, também denominada simplesmente câme-
ra digital ou sensor digital, no qual o anteparo de formação da imagem é a matriz de sensores CCD (ou CMOS). A Figura 22.3
mostra a geometria da formação da imagem, que depende tanto de aspectos geométricos da câmera quanto da altura de voo.
Os principais elementos geométricos da câmera digital a serem considerados para a fotogrametria são: a distância focal (f),
o tamanho do pixel e a quantidade de pixels. Assim, simplificadamente, pode-se considerar que, por semelhança de triângulos,
existe uma relação linear entre o tamanho do pixel (pixel), a distância focal (f) da câmera e a altura do voo (hv). Um dos elementos
físicos de destaque, neste caso, é o centro da objetiva, também denominado centro óptico ou centro perspectivo (ver Fig. 22.3).
3 Notar que, no caso de imagens com múltiplas bandas, como as imagens coloridas, ele passa a ser definido como um sistema multidimensional.
4 Alguns autores preferem o termo coordenadas imagem. Neste texto, o termo coordenadas imagem será usado para o sistema de coordenadas
relacionado com o centro da matriz de sensores.
5 A área de desenvolvimento de sensores CCD e CMOS é extremamente dinâmica. O valor indicado é apenas informativo para a época atual.

Sempre que necessitar de informações a este respeito, o leitor deve consultar materiais especializados e atualizados.
6 Partículas elementares que constituem a luz, correspondente à quantidade de energia do respectivo espectro luminoso.
e-92 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Em função dos elementos de forma-


ção da imagem indicados, define-se re-
solução espacial (ou geométrica) da ima-
gem como a área recoberta por um pixel
sobre o objeto imageado (terreno), cal-
culada em função da dimensão da aresta
do pixel (quadrado) no terreno, denomi-
nado GSD (Ground Sample Distance).
A equação (22.1) relaciona o valor do
GSD com os parâmetros internos da câ-
mera digital.
hv * pixel
=
GSD = k * pixel (22.1)
f
hv
k= (22.2)
f
em que:
Figura 22.3 • Ilustração da formação de uma imagem digital aérea.
hv = altura do voo;
pixel = tamanho do pixel;
f = distância focal da câmera.7

O tamanho do pixel pode ser calculado em função das dimensões da matriz de sensores CCD (ou CMOS) utilizado na
obtenção das imagens. Assim, tem-se:
dimensão do sensor
pixel = (22.3)
número de fotodiodos
A resolução radiométrica indica a menor variação de intensidade que pode ser detectada em uma imagem e a resolução
espacial indica a menor área do terreno que pode ser representada na imagem.
Notar que, quanto menor o valor do GSD, maior a resolução da imagem e melhor a identificação dos objetos no terreno.
Deve-se, contudo, considerar que a capacidade de detecção, reconhecimento e identificação de um objeto em uma imagem
digital pelo cérebro humano depende da quantidade de pixels que a representa e de seu entorno. Essa quantidade não é con-
sistentemente definida. Em geral, se aceita que a detecção ocorre quando se tem pelo menos 2 pixels representando o objeto;
o reconhecimento quando se tem entre 4 e 6 pixels; e a identificação quando se tem entre 8 e 12 pixels.8 Isso significa que com
um GSD de 4 cm só será possível identificar objetos de 32 a 48 cm, aproximadamente. Esses valores dependem do formato
do objeto e do contraste com os objetos vizinhos. Um exemplo típico da relação entre o GSD e o tamanho do objeto pode ser
verificado na ilustração da Figura 22.4.

Figura 22.4 • Relação entre GSD e tamanho do objeto.


Fonte: adaptada de EESC/USP.

7 Utiliza-se a letra (f) para a distância focal como um termo genérico. Para os casos em que a distância focal é um valor calibrado, em geral, se adota
a letra (c).
8 De acordo com Sandau, R. (ed.) et al. Digital Airborne Camera – introduction and technology. Heidelberg, Germany: Springer Verlag, 2010.
Aerofotogrametria e-93

Figura 22.5 • Deformações da imagem fotográfica aérea em função do relevo e da inclinação da câmera.

Outro aspecto importante a ser considerado em


uma imagem fotográfica é o fato de ela ser uma pro-
jeção perspectiva, ou seja, ela não possui uma escala
uniforme, já que os objetos mais próximos da objeti-
va estão representados com escala maior que os mais
distantes. Diz-se, assim, que existe uma deformação
radial da imagem aérea relacionada com o relevo do
terreno, conforme ilustrado nas representações dos
edifícios da Figura 22.5a. Da mesma forma, caso a
imagem tenha sido adquirida por meio de uma câ-
mera aérea inclinada com relação à vertical, haverá
ainda uma deformação da mesma relacionada com
essa inclinação, conforme ilustrado na Figura 22.5b.
Em virtude das deformações indicadas, uma
foto não pode, evidentemente, ser considerada
geometricamente equivalente a um mapa, exceto
em raríssimas exceções.
Conforme indicado na Figura 22.6, um mapa é Figura 22.6 • Diferença de projeção geométrica entre uma foto e um mapa.
uma projeção ortogonal, ou seja, todos os objetos es-
tão representados com a mesma escala, que é a escala do mapa. Isso significa que em uma foto aérea, dependendo do ponto de vista,
algumas fachadas de edifícios, por exemplo, podem ser visíveis, o que não ocorre em um mapa, que mostra a projeção ortogonal.

Exemplo aplicativo 22.1


Considerando uma câmera digital com distância focal igual a 3,4 cm, composta por uma matriz de sensores CMOS com
6.000 × 4.000 fotodiodos quadrangulares e dimensões 23,5 × 15,6 mm, respectivamente, calcular a dimensão do pixel na ima-
gem e o GSD para um voo fotogramétrico com altura igual a 250 m.

ƒƒ Solução:
Aplicando as equações (22.3) e (22.1), têm-se:
23, 5 15, 6
pixel 0,0039 mm = 3,9m
6.000 4.000
250 * 3 * 10 6
GSD 0,029 m = 2,9 cm
0, 034
Notar que o pixel, neste caso, possui formato quadrangular. Esse não é sempre o caso. Ele pode também possuir um formato
retangular.
e-94 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

22.4 Aquisição de imagens digitais aéreas


A aquisição das imagens para a fotogrametria digital, em princípio, pode ser realizada por qualquer câmera digital. Porém,
para que elas possuem a qualidade necessária para os propósitos da fotogrametria, elas precisam ter algumas características
físicas importantes que garantam a geometria e a estabilidade interna de seus componentes, de forma que as imagens sejam
reproduzíveis quando sujeitas às mesmas condições operacionais. Incluem-se, neste caso, a estabilidade da distância focal
(preferencialmente, mantida fixa), a estabilidade radiométrica e o controle das distorções das lentes. Diz-se, neste caso, que se
tem uma câmera métrica, em contraposição às câmeras não métricas.
As câmeras métricas digitais utilizadas em fotogrametria são categorizadas como de pequeno formato, de médio formato e
de grande formato. Os limites entre elas não são claros, mas como indicador genérico pode-se considerar as câmeras digitais
de pequeno formato como aquelas com resolução inferior a 50 megapixels, as de médio formato aquelas com resolução entre
50 e 100 megapixels e as de grande formato, aquelas com resolução acima de 100 megapixels.9
Existem, atualmente, dois tipos de arranjos de sensores utilizados nas câmeras aéreas para a coleta de imagens digitais
de grande formato. São eles: os denominados sensores de quadro (frame) e os denominados sensores de varredura linear
(pushbroom). Descreve-se a seguir os principais conceitos de cada um deles.

22.4.1 Sensores de quadro (frame)


As câmeras aéreas do tipo sensores de quadro são compostas por uma única rede de fotodiodos CCD (ou CMOS) com cente-
nas de megapixels com dimensões variando entre 3,8 e 12 µm,10 resolução radiométrica de 14 bits (R, G, B, NIR)11 e distâncias
focais variando entre 80 e 210 mm, o que possibilita a geração de imagens com GSD da ordem 5 cm para alturas de voo de
aproximadamente 1.000 m. A composição dos quadros gerados com este tipo de câmera está ilustrada na Figura 22.7. A geo-
metria da imagem gerada por um sensor deste tipo está ilustrada na Figura 22.8.

Figura 22.7 • Ilustração da formação de uma imagem digital com Figura 22.8 • Ilustração da geometria das imagens geradas com sen-
sensor de quadros. Cortesia de Leica Geosystems. sor de quadros. Cortesia de Leica Geosystems.

A maioria das câmeras baseadas em sensores de quadro atuais possui formato retangular, com a maior dimensão transver-
sal à linha de voo para minimizar a quantidade de faixas de voo. A resolução da matriz de sensores é definida em quantidade
de pixels na imagem, por exemplo, 26.460 × 17.004 pixels. Assim, conhecendo o tamanho de cada fotodiodo, pode-se deter-
minar a dimensão do quadro.

22.4.2 Sensores de varredura linear (pushbroom)


As câmeras aéreas do tipo pushbroom baseiam-se no princípio da varredura espacial realizado por um ou vários arranjos lineares
de fotodiodos. No caso das câmeras aéreas fabricadas, atualmente, pela empresa Leica Geosystems, por exemplo, as redes lineares
de fotodiodos estão dispostas em três posições perpendiculares ao eixo da câmera, que são: anterior, nadir e posterior, conforme
ilustrado na Figura 22.9. Neste tipo de câmera, para cada posição de imageamento (anterior, nadir, posterior) são posicionadas
várias linhas de fotodiodos para a captura de intensidades luminosas das bandas R, G, B, NIR, obtendo-se assim, pelo menos 12
imagens superpostas, com 20.000 pixels lineares (pixel ~ 5,0 µm), resolução radiométrica de 14 bits e distâncias focais de 62,5 e
140 mm. Notar que este é apenas um exemplo de configuração de linhas de sensores. Ela varia para diferentes fabricantes.
9 Classificação meramente contextual proposta pelos autores.
10 Os avanços tecnológicos nesta área são surpreendentes e inviabilizam, por isso, discussões temporais e indicação de valores atuais sobre esta
tecnologia.
11 NIR, do inglês near infrared ou infravermelho próximo.
AerofotogrAmetriA e-95

As imagens geradas com este tipo de sensor são disponibilizadas em faixas contínuas (ver Fig. 22.10), que podem ser re-
cortadas segundo as necessidades dos usuários. Os diferentes posicionamentos das faixas conferem o efeito da estereoscopia
necessário para a restituição fotogramétrica, conforme apresentado na Seção 22.6 – Estereoscopia.

FIgura 22.10 • Ilustração da geometria das imagens


FIgura 22.9 • Ilustração da formação de uma imagem digital com sensor geradas com sensor de varredura linear. Cortesia de Leica
de varredura linear. Cortesia de Leica Geosystems. Geosystems.

Além dos sensores de imagem, os sistemas de captura de imagens digitais aéreas possuem vários outros componentes necessá-
rios para a geração de imagens com qualidade espacial adequada para a fotogrametria. Entre os mais importantes, pode-se citar:
• berço giro estabilizado (Gimbal): consiste em um suporte do sensor, cuja finalidade é minimizar os seus movimentos
com relação aos movimentos da aeronave;
• dispositivo para compensação do deslocamento da aeronave (TDI, do inglês time delay integrator): tem a função de evi-
tar o efeito do arrastre da imagem, compensando o efeito do deslocamento do terreno, na imagem, durante o tempo de
abertura do obturador. O resultado desta correção é a obtenção de uma imagem com nitidez superior àquela obtida sem
uso do TDI. É importante ressaltar que muitas câmeras aéreas digitais modernas (CMOS) possuem tempo de gravação
da imagem suficientemente baixo (1:1.000 a 1:2.500) para dispensar o uso deste dispositivo;
• sistemas de posicionamento (GNSS) e inercial (IMU): auxiliam na determinação da posição e das rotações do sensor no
espaço, conforme apresentado na Seção 22.10.2 – Determinação direta dos parâmetros de orientação por meio de georre-
ferenciamento GNSS e sistema inercial (IMU);
• dispositivos de controle do voo e de captura das imagens: aqueles relacionados com o controle da trajetória da aeronave
e o controle do funcionamento do sistema de captura das imagens.
As Figuras 22.11 e 22.12 apresentam exemplos de câmeras aéreas atualmente disponíveis no mercado instaladas sobre ber-
ço giro estabilizado. Na Figura 22.12, o conjunto câmera/berço é mostrado no interior da aeronave.

FIgura 22.11 • Câmera aérea digital sobre berço FIgura 22.12 • Câmera aérea digital instalada no interior de uma aeronave.
giro estabilizado. Cortesia de PHaSEONE Industrial. Cortesia de Vexcel Imaging.
e-96 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

22.5 Voo fotogramétrico


A aquisição das imagens, conforme descrito na
seção anterior, é realizada por intermédio de um
voo fotogramétrico, cuja finalidade é capturar um
conjunto de imagens que recubra toda a área de
interesse para implantação de um projeto. Para os
fins aerofotogramétricos, entretanto, as imagens
capturadas devem recobrir-se atendendo a uma
superposição mínima, ao longo da linha de voo
(longitudinal) e transversal a ela (lateral), confor-
me ilustrado na Figura 22.13.
Para obter o efeito desejado dos recobrimen-
tos longitudinal e lateral das imagens, o voo fo-
togramétrico é realizado em faixas e com alturas
de voo predeterminadas a partir de um planeja-
mento de voo. Para compensar o efeito dos mo-
vimentos da aeronave, o recobrimento longitu-
dinal de cada imagem não deve ser inferior a 60 Figura 22.13 • Esquema de voo fotogramétrico mostrando duas linhas de voo pa-
ralelas entre si e em direções contrárias.
% e o lateral deve estar entre 10 e 30 %.12 Fonte: adaptada de Google Earth.
Atenção especial deve ser dada à altura do
voo, uma vez que é ela quem determina o GSD do levantamento e garante os recobrimentos necessários, em função da varia-
ção das altitudes do relevo. O par de imagens recobertas longitudinalmente entre si é denominado par de imagens conjugadas,
estereopar ou par estereoscópico. A Figura 22.14 mostra um exemplo de um par de imagens com recobrimento longitudinal
formando um par estereoscópico.

Figura 22.14 • Exemplo de um par estereoscópico formado pela sobreposição das imagens durante o voo
fotogramétrico.

12 Estes valores variam em função do relevo do terreno e do objetivo do levantamento. Notar, entretanto, que quanto maior o recobrimento, maior
a quantidade de imagens.
Aerofotogrametria e-97

A quantidade de faixas e, por conseguinte, de imagens,


depende do tamanho do fotodiodo do sensor, da altura do
voo, do GSD desejado, dos recobrimentos longitudinal e la-
teral especificados no planejamento de voo e do tamanho da
área a ser recoberta. Existem para isto equações conhecidas
que permitem calcular as quantidades de faixas e de imagens.
Por restrições de conteúdo, elas não serão apresentadas neste
texto. O leitor interessado poderá encontrá-las facilmente em
referências bibliográficas específicas ligadas à fotogrametria.
Para o estudo do modelo fotogramétrico (ver Seção 22.8
– Modelo fotogramétrico), ele é dividido em dois espaços geo-
métricos: o espaço imagem e o espaço objeto, cada qual com
um sistema de coordenadas próprio. O espaço objeto referen-
ciado ao sistema de coordenadas do terreno e o espaço ima-
gem ao sistema de coordenadas da imagem (ver Fig. 22.21). A
representação geométrica espacial desse modelo é realizada
conforme ilustrado na Figura 22.15.
Conforme ilustrado na figura, para facilidade de com- Figura 22.15 • Espaço imagem e espaço objeto do modelo
preensão da representação gráfica, o espaço imagem pode fotogramétrico.
estar disposto na posição negativa ou positiva com relação ao
centro perspectivo. Em geral, se prefere a posição positiva, ou
seja, com o plano da imagem rebatido para abaixo do centro
perspectivo.

Exemplo aplicativo 22.2


Considere-se a situação de quatro voos fotogramétricos com o uso de
quatro câmeras aéreas digitais com sensor de quadros, com fotodiodo
quadrado de dimensão 4 × 4 µm, e imagem de 26.460 × 17.004 pixels,
transversal e longitudinal na linha de voo, respectivamente. Sabendo
que elas possuem distâncias focais iguais a 210, 120, 100 e 80 mm, cal-
cular as alturas de voo para que as arestas dos retângulos recobertos no
terreno tenham todas as dimensões iguais a 2.646 × 1.700 m, conforme
ilustrado na Figura 22.16.

ƒƒ Solução:
Para que as áreas sejam as mesmas, as dimensões do GSD em cada voo
devem ser as mesmas, ou seja:
264.600 170.000
GSD    10 cm
26.460 17.004
Assim, aplicando a equação (22.1), têm-se:

210 * 100 Figura 22.16 • Ilustração da situação geométrica do voo.


=
hv f 210 = 5.250 m
0, 004
120 * 100
=
hv f 120 = 3.000 m
0, 004
100 * 100
=
hv f 100 = 2.500 m
0, 004
80 * 100
hv f 80 = = 2.000 m
0, 004

Exemplo aplicativo 22.3


Utilizando a mesma câmera aérea do exemplo aplicativo anterior, na sua configuração com distância focal igual 100 mm,
calcular a área do terreno coberta por um par de imagens com recobrimento longitudinal igual a 60 % e altura de voo igual a
1.500 metros.
e-98 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

ƒƒ Solução:
Com os dados do problema e aplicando a equação (22.1), têm-se:
1.500 * 26.460 * 4 * 10 6
Lado 1 do retângulo 1,59 km
0,1
1.500 * 17.004 * 4 * 10 6
Lado 2 do retângulo 1,02 km
0,1
Tem-se, assim, a área do terreno recoberta por uma foto dada por:
áreafoto 1, 59 * 1, 02 1,62 km 2
Considerando um recobrimento longitudinal de 60 %, a área coberta por um par estereoscópico é dada por:
áreapar  0, 6 * 1, 59 * 1, 02  0,97 km 2

22.6 Estereoscopia
Dá-se o nome de estereoscopia ao efeito visual que permite ao ser humano reconstruir virtualmente, em seu cérebro, o espaço
3D de uma cena por intermédio de vistas bidimensionais de um par de imagens conjugadas do mesmo objeto obtidas a partir
de pontos de vista diferentes. Diz-se, neste caso, que se tem um modelo estereoscópico. O princípio físico da ocorrência do efei-
to da estereoscopia se baseia, entre outros, na capacidade do ser humano em detectar alterações nos ângulos paraláticos de sua
visão e, assim, determinar diferenças de profundidade em uma cena, conforme ilustrado esquematicamente na Figura 22.17.
No caso de duas imagens planas conjugadas da mesma cena, tomadas de pontos de vista diferentes, o observador somente
reconstruirá o espaço 3D virtual (modelo estereoscópico), se cada olho visualizar as imagens respectivas simultaneamente,
como indicado na Figura 22.18. Para que isto seja possível, existem diversos dispositivos construídos especificamente para
este fim, conforme indicado na sequência do texto.

Figura 22.17 • Ângulo paralático. Figura 22.18 • Ilustração do efeito da estereoscopia.

Tipos de dispositivos separadores de imagem:


a) Separação de imagens por meio de lentes divergentes, por exemplo, em estereoscópios de lentes ou estereoscópios de
espelhos.
b) Método anaglifo, que se baseia no efeito da visualização das imagens por meio de lentes oculares munidas de filtros
coloridos, por exemplo, vermelho para a lente esquerda e azul para a direita. As imagens, neste caso, são projetadas ou
impressas nas cores compatíveis com os filtros das lentes.
c) Método da luz polarizada, que se baseia no efeito da luz polarizada em dois planos perpendiculares da imagem. Uti-
lizam-se, neste caso, óculos com filtros polarizadores, com planos de polarização coincidentes com os das imagens
projetadas por algum tipo de dispositivo de projeção de imagens.
Como apresentado na Seção 22.10 – Determinação dos parâmetros de orientação exterior do modelo fotogramétrico, em fotogra-
metria, todo processo de captura manual de informações geométricas sobre os dados geoespaciais representados em um par de
imagens digitais é realizado por intermédio da estereoscopia, ou seja, mediante um modelo virtual 3D (modelo estereoscópico).
Aerofotogrametria e-99

22.7 Marca flutuante e paralaxe


A geometria simplificada da
produção de duas imagens aé-
reas conjugadas está ilustrada
na Figura 22.19. Nesse caso,
os pontos (A) e (B) do terreno,
denominados pontos objeto, ge-
raram dois pontos imagem em
cada foto, que são os pontos
(a9, b9) na foto da esquerda, e os
pontos (a99, b99) na foto da direi-
ta. Os pontos imagem (a9) e (a99)
representam a imagem do pon-
to (A) em cada uma das ima-
gens e, por isso, são chamados
pontos homólogos. De modo Figura 22.19 • Paralaxe.
semelhante, os pontos (b9) e
(b99) são pontos homólogos. Tomando am-
bas as imagens como referência, pode-se
considerar que cada um deles sofreu um
deslocamento aparente no plano das ima-
gens, com um valor variável, em função da
altitude em que eles se encontram no ter-
reno. A esse deslocamento aparente dá-se o
nome de paralaxe.
Considerando o efeito do relevo sobre
a separação das duas imagens do mesmo
ponto objeto sobre as duas fotos, confor-
me ilustrado na Figura 22.19, nota-se que,
quanto mais próximo ele estiver da foto,
menor é a distância entre as suas imagens
nas duas fotos, ou seja, menor a paralaxe.
Notar, por exemplo, na Figura 22.20, que
o ponto objeto (P1) está mais baixo (mais
afastado da foto) do que o ponto objeto
(P2). Por isto, a distância horizontal entre
Figura 22.20 • Marca flutuante.
os pontos homólogos (p29) e (p299) é me-
nor que distância horizontal entre os pontos homólogos (p19) e (p199).
De acordo com a Figura 22.20, o ponto objeto (P2) não faz parte do terreno. Ele aparecerá no espaço do modelo estereoscó-
pico se, por exemplo, duas marcas artificiais idênticas forem colocadas sobre as fotos na interseção de duas retas que partem dos
centros ópticos (O1) e (O2). Nesta situação, o ponto (P2) aparecerá flutuando sobre o terreno, no modelo estereoscópico, e, por ser
uma marca virtual, recebe o nome de marca flutuante.
O leitor deve notar que, movimentando as duas marcas sobre as fotos ao mesmo tempo, mantendo-as na interseção dos
raios homólogos e alterando o valor da paralaxe, é possível posicionar a marca flutuante virtual sobre qualquer objeto do
espaço virtual 3D e, assim, utilizar as marcas nas fotos como referências para a coleta de dados espaciais. Em termos práticos,
isso significa determinar os valores das coordenadas imagem (x, y) de cada marca em suas respectivas fotos.
Se os raios homólogos não se interceptarem no espaço, o observador terá a impressão da existência de duas imagens do
ponto (Pi) flutuando no espaço. Diz-se, nesse caso, que ele possui uma paralaxe, a qual precisará ser eliminada para que se
possa medir as coordenadas imagem (homólogas) do ponto (Pi) adequadamente.

22.8 Modelo fotogramétrico


A ideia genial da fotogrametria é o conceito de se recriar a situação geométrica espacial da tomada das imagens por meio de
um modelo matemático, que represente a relação geométrica entre o espaço imagem e o espaço objeto, e que permita a sua
exploração mediante um modelo estereoscópico (virtual 3D). Fisicamente, isso significa estabelecer as condições para que se
tenha um modelo reduzido da cena imageada, sobre o qual se possa coletar informações geométricas e semânticas de dados
espaciais nele representados. A esse modelo dá-se o nome de modelo fotogramétrico.
e-100 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

O desenvolvimento de um modelo fotogramétrico se baseia no estabelecimento das condições ópticas e geométricas para
que se possa recriar as projeções das imagens no espaço, orientá-las adequadamente umas com relação às outras para que se
obtenha um modelo estereoscópico fiel do espaço objeto e, finalmente, georreferenciar o modelo estereoscópico com relação
a um sistema de coordenadas predefinido. A esse processo de formação do modelo dá-se o nome de orientação fotogramétrica.
A etapa de formação das imagens é denominada orientação interior. A etapa de formação do modelo estereoscópico e o seu
georreferenciamento com relação ao sistema de coordenadas do espaço objeto é denominado orientação exterior. Em visão
computacional, os parâmetros da orientação interior são denominados intrínsecos e os relacionados com a orientação exterior,
extrínsecos. Apresenta-se a seguir uma breve discussão sobre cada uma dessas etapas.

22.8.1 Orientação interior – parâmetros intrínsecos


Dá-se o nome de orientação interior à etapa de formação do modelo fotogramétrico em que se define a geometria interna do
sensor da forma mais próxima possível do estado em que ele se encontrava no momento de captura da imagem. Ela pode
ser compreendida como a etapa em que se realiza o referenciamento do plano da imagem com relação ao eixo óptico da câ-
mera para que ela possa ser projetada no espaço de maneira semelhante à configuração em que ela foi criada. Isso significa
determinar a geometria da imagem, ou seja, as dimensões do sensor CCD (ou CMOS), o tamanho do pixel, a distância focal
calibrada (c), a posição do ponto central da imagem e as distorções da lente. A estes parâmetros dá-se o nome de parâmetros
de orientação interior ou parâmetros intrínsecos. Eles são disponibilizados por meio de certificados de calibração da câmera
e considerados fixos para o modelo fotogramétrico correspondente. Notar que a distância focal calibrada (c) corresponde ao
valor de (f) após calibração da câmera.
Além da determinação dos parâmetros da orientação interior citados, nesta etapa, se estabelece também o sistema de
coordenadas cartesiano plano (x, y) com origem no centro da imagem, conforme descrito na Seção 22.3 – Imagem digital. Isso
significa realizar uma transformação de coordenadas para adequar o sistema de coordenadas pixel ao sistema de coordenadas
imagem. Essa transformação é dada pela equação matricial (22.4).

x r 0 r rc (22.4)
*
y 0 c c cc
em que:
x, y = coordenadas de um ponto com relação ao referencial com origem no centro da imagem (espaço imagem);
∆r, ∆c = tamanho do pixel;
r, c = coordenadas (linha, coluna) do pixel;
rc , cc = coordenada (linha, coluna) do centro da imagem.
Considerando que o número de linhas e colunas da imagem sejam H e W, respectivamente, as coordenadas (rc, cc) serão
dadas por:

rc   H  1 2 (22.5)

cc  W  1 2 (22.6)

22.8.2 Refinamento dos valores das coordenadas medidas nas imagens


Como se verá nas próximas seções, a determinação dos valores de dados geoespaciais, do espaço objeto, em fotogrametria,
se baseia nas medições das coordenadas imagem dos pontos homólogos que os representam. Por esta razão, são realizados
refinamentos dos valores dessas coordenadas para considerarem as distorções da imagem em razão da composição do sistema
óptico do sensor, da refração atmosférica e da curvatura da Terra. Foge ao escopo deste livro discuti-los todos. Discute-se, na
sequência, apenas os efeitos das distorções do sistema óptico. O leitor interessado poderá encontrar informações mais deta-
lhadas sobre as demais distorções em literatura especializada.

22.8.2.1 Distorção das lentes


As câmeras métricas atuais possuem excelentes qualidades ópticas e físicas. Mesmo assim, o usuário deve se ater aos proble-
mas ópticos que podem ocorrer nas imagens geradas por uma câmera digital, que são: distorções das lentes, aberrações das
lentes, profundidade de campo, profundidade de foco, difração e arrastre. Estas distorções fazem, por exemplo, que retas do
espaço físico não sejam retas na imagem, ou seja, distorcem a imagem. Esses problemas se tornam ainda mais relevantes em
câmeras não métricas, cuja qualidade do sistema óptico pode ser inferior à das câmeras métricas. Em geral, se consideram
apenas as distorções das lentes, caracterizadas pela distorção radial simétrica e pela distorção descentrada. A distorção radial si-
métrica é a mais comumente encontrada e varia radialmente com relação ao ponto principal. Os componentes em (x, y) dessa
distorção são dados pelos três primeiros termos do polinômio representado pelas equações indicadas a seguir.
Aerofotogrametria e-101

 xr x x0 * k1 * r 2 k2 * r 4 k3 * r 6 (22.7)
yr y y0 * k1 * r 2 k2 * r 4 k3 * r 6 (22.8)
2
r 2   x  x0 2   y  y0  (22.9)

em que:
Dxr, Dyr = componente da distorção radial simétrica em (x, y);
x, y = coordenadas imagem com relação ao referencial com origem no centro da imagem;
x0, y0 = coordenadas do ponto principal (explicado na Seção 22.9 – Equações fundamentais da fotogrametria digital);
ki = parâmetros da distorção radial simétrica;
r = distância radial com relação ao ponto principal.
A distorção descentrada ocorre em virtude da não centragem dos elementos das lentes ao longo do eixo óptico da câmera,
que causa distorções radiais (não simétricas) e tangenciais. Ela é modelada de acordo com as equações (22.10) e (22.11).
2
 xd p1 * r 2 2 x xo 2 p2 * x xo * y yo (22.10)
2
yd p2 * r 2 2 y y0 2 p1 * x x0 * y y0 (22.11)
em que:
Dxd , Dyd = componente da distorção descentrada em (x, y);
x, y = coordenadas imagem com relação ao referencial com origem no centro da imagem;
x0, y0 = coordenadas do ponto principal;
pi = parâmetros da distorção descentrada;
r = distância radial com relação ao ponto principal.
Em geral, a distorção descentrada pouco influencia o resultado das coordenadas medidas sobre as imagens quando compa-
rada com a distorção radial simétrica. Por esta razão, em alguns casos, ela é desprezada nos modelos fotogramétricos.

22.8.3 Orientação exterior – parâmetros extrínsecos


A etapa de orientação exterior do modelo fotogramétrica significa estabelecer, matematicamente, a inter-relação entre o es-
paço imagem e o espaço objeto, ou seja, determinar as equações matemáticas que relacionam os sistemas de coordenadas de
ambos os espaços. Diz-se, neste caso, que se realiza o georreferenciamento do sensor com relação ao sistema de coordenadas
do espaço objeto. Essa inter-relação é expressa pela determinação dos seis parâmetros de orientação da câmera aérea com re-
lação ao sistema de coordenadas objeto, conforme descrito pelas equações fundamentais da fotogrametria digital apresentadas
na próxima seção. A determinação desses parâmetros é pré-requisito para que se possa realizar qualquer coleta de dados em
um modelo fotogramétrico.

22.9 Equações fundamentais da fotogrametria digital


As equações fundamentais da fotogrametria digital para a realização da
orientação exterior de um modelo fotogramétrico são baseadas nos princí-
pios da geometria descritiva, considerando alguns pressupostos, conforme
descritos a seguir:
• objeto invariável durante a geração das imagens;
• objeto composto por um conjunto de pontos no espaço;
• imagem formada por um conjunto de feixes luminosos considerados
como linhas retas que ligam o ponto imagem ao ponto objeto passando
por um centro perspectivo (O);
• modelo matemático baseado em condições geométricas da perspectiva
central;
• objeto reproduzido em duas ou mais imagens;
• imagem considerada plana.
Com base nestes pressupostos, têm-se dois sistemas de coordenadas carte-
sianos envolvidos na geometria espacial do modelo fotogramétrico, conforme
indicado na Figura 22.21. As coordenadas (X, Y, Z) do espaço objeto estão re-
lacionadas com o sistema de coordenadas adotado para os pontos do terreno. Figura 22.21 • Geometria espacial do modelo
Notar que, neste caso, elas são coordenadas genéricas, que podem estar tanto fotogramétrico.
e-102 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

relacionadas com o sistema de coordenadas cartesiano espacial quanto com um sistema de projeção cartográfica ou plano lo-
cal, mais a altitude ortométrica. As coordenadas (x, y, z) do espaço imagem referem-se ao sistema de coordenadas cartesiano
3D com origem no centro óptico (O) da objetiva da câmera. Os ângulos (κ, ϕ, ω) são os ângulos de rotação da câmera aérea no
espaço, conforme detalhado na Seção 22.10 – Determinação dos parâmetros de orientação exterior do modelo fotogramétrico.
Notar que as coordenadas imagem (x, y) do plano da imagem estão relacionadas com as coordenadas (x, y ,z) do espaço
imagem estendendo o eixo (z), que é perpendicular ao plano da imagem, mantendo a orientação dextrogiro do sistema.
O ponto (O) possui coordenadas (X0, Y0, Z0). O parâmetro (c) corresponde ao valor da distância focal e é dado pelo cer-
tificado de calibração da câmera. O ponto (P) é o ponto objeto no terreno e possui coordenadas (XP , YP , ZP). O ponto (p9) é
o ponto imagem com coordenadas imagem (xP ,yP). O ponto (N9) é o ponto de interseção da vertical do lugar, que passa pelo
centro óptico da objetiva, com o plano da imagem. O ponto (PP), denominado ponto principal, representa a localização do
ponto de interseção da linha vertical entre o centro óptico (O) e o plano da imagem. Por construção da câmera, ele não coinci-
de necessariamente com o pixel central da imagem, possuindo as coordenadas (x0, y0) com relação a esse centro, denominadas
coordenadas do ponto principal. Esses valores também são determinados durante a calibração da câmera.
A relação geométrica entre os parâmetros citados é dada por intermédio de um modelo matemático baseado em um con-
junto de equações denominadas equações projetivas, conforme apresentado a seguir.

22.9.1 Equações projetivas (equações de colinearidade)


O modelo matemático utilizado para representar o modelo físico ilustrado na Figura 22.21 baseia-se no modelo de equações
projetivas, por meio das quais se obtêm as equações de colinearidade, que são as equações fundamentais da fotogrametria di-
gital. Por intermédio dessas equações é possível determinar os valores das coordenadas cartesianas espaciais (X, Y, Z), de um
ponto objeto no terreno por meio das coordenadas planorretangulares (x, y) da imagem desse objeto. Em suma, as equações
de colinearidade relacionam as coordenadas tridimensionais de um ponto da superfície espacial com as de seus homólogos na
imagem plana, conforme ilustrado na Figura 22.21.
Os parâmetros das equações são determinados aplicando uma transformação de coordenadas cartesianas espaciais com
sete parâmetros, entre o sistema de coordenadas terrestre (X, Y, Z) e o sistema de coordenadas do espaço imagem (x, y, z).
Nestas condições, o centro perspectivo (O) possui as coordenadas indicadas na sequência.
Com relação ao sistema de coordenadas do objeto:
 X   X0 
   
Y    Y0  (22.12)
 Z   Z0 
   
Com relação ao sistema de coordenadas com referência no centro da imagem:
x x0
y y0 (22.13)
z c

Para a determinação das equações de colinearidade é preciso, primeiramente, tornar o sistema (x,y,z), do espaço imagem,
paralelo ao sistema (X, Y, Z), do objeto. Para tanto, basta aplicar, inicialmente, as rotações (κ, ϕ, ω) ao sistema (X, Y, Z) para
torná-lo paralelo ao sistema (x, y, z). Assim, tem-se:
x  X
   
 y   R  , ,   * Y 
z  Z  (22.14)
   
Para fazer com que o sistema (X, Y, Z) coincida com o sistema (x, y, z) com referência no centro da imagem é necessário
ainda transladá-lo com as distâncias (X0, Y0, Z0) e aplicar um fator de escala (k). Assim, tem-se:

 x  x0   X  X0 
 
 y  y 0  k * R   ,  ,    Y  Y0 
* (22.15)
 c   Z  Z0 
   
Considerando a matriz de rotação dada pela equação (4.104), obtém-se,
 x  x0   r11 r12 r13   X  X0 
     
 y  y0   k * r21 r22 r23  *  Y  Y0 
(22.16)
 c  r31 r32 r33   Z  Z0 
  
Aerofotogrametria e-103

Desenvolvendo a equação matricial (22.16), obtém-se o sistema de equações indicado a seguir:

x  x0  k * r11  X  X0   r12 Y  Y0   r13  Z  Z0   (22.17)

y  y0  k * r21  X  X0   r22 Y  Y0   r23  Z  Z0   (22.18)

c  k * r31  X  X0   r32 Y  Y0   r33  Z  Z0   (22.19)

Em seguida, dividindo as duas primeiras equações pela terceira equação e adicionando os fatores de correção (∆x e ∆y)
dos valores das coordenadas imagem relacionados com suas deformações, obtêm-se as clássicas Equações de Colinearidade
indicadas na sequência. Notar que o fator de escala desaparece no sistema de equações assim gerado.

r11 X X0 r12 Y Y0 r13 Z Z0


x x0 c * x (22.20)
r31 X X0 r32 Y Y0 r333 Z Z0

r21 X X0 r22 Y Y0 r23 Z Z0


y y0 c * y (22.21)
r31 X X0 r32 Y Y0 r333 Z Z0

Assumindo que os parâmetros de orientação interior (ou intrínsecos) sejam conhecidos, o sistema de equações anterior
possui seis parâmetros de transformação, que são os três ângulos de rotação (κ, ϕ, ω) e as três coordenadas (X0, Y0, Z0) do cen-
tro perspectivo. São necessários, portanto, três pontos homólogos para a determinação destes parâmetros, uma vez que cada
ponto possibilita escrever duas equações [correspondentes às equações (22.20) e (22.21)]. Essas equações permitem calcular
as coordenadas do ponto imagem em função das coordenadas do ponto objeto. Para calcular as coordenadas do ponto objeto
em função das coordenadas do ponto imagem, deve-se considerar que a matriz de rotação é uma matriz ortogonal, a partir
do que se sabe que:

 X  X0   x  x0 
 
 Y  Y0   k * RT
  ,  ,    y  y 0 
* (22.22)
 Z  Z0   c 
   
o que permite obter as equações indicadas a seguir,

r11  x  x0   r21  y  y0   r31 *c


X  X0   Z  Z0  * (22.23)
r13  x  x0   r23  y  y0   r33 *c

r12  x  x0   r22  y  y0   r32 *c


Y  Y0   Z  Z0  * (22.24)
r13  x  x0   r23  y  y0   r33 *c

Considerando as equações (22.23) e (22.24),


é possível calcular as coordenadas (X, Y) de
um ponto objeto conhecendo os seis parâme-
tros da transformação e a coordenada (Z) do
ponto objeto. Notar que a solução não é úni-
ca, já que para cada coordenada (Z) haverá um
par de coordenadas (X, Y) diferente. A solução
unívoca é alcançada se for conhecido o valor de
(Z) ou se houver duas imagens do mesmo ob-
jeto, conforme ilustrado na Figura 22.22. Nesse
caso, têm-se 12 parâmetros de transformação
(seis para cada imagem). Considerando que
os três pontos homólogos aparecem nas duas
imagens, haverá duas equações do tipo (22.23)
e duas do tipo (22.24) para cada ponto homó-
logo, totalizando 12 equações. A solução desse
sistema de equações permite obter os valores
dos 12 parâmetros de transformação. Figura 22.22 • Relações geométricas de um par de imagens fotogramétricas orientadas.
e-104 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Com os parâmetros de transformação conhecidos, basta igualar as duas equações da coordenada (X) para calcular a
coordenada (Z), a qual pode, em seguida, ser substituída nas equações da coordenada (Y). Obtêm-se, assim, os valores
das coordenadas (X, Y, Z) de cada ponto objeto, cujas coordenadas (x, y) foram medidas nas imagens.
Quando se tem mais de três pontos homólogos de coordenadas conhecidas, o que ocorre com frequência, a solução
do sistema de equações se dá por intermédio do uso de um ajustamento de observações pelo Método dos Mínimos
Quadrados.

Exemplo aplicativo 22.4


Considerando os valores de orientação da câmera aérea nas posições (1) e (2) para determinado voo aerofotogramétrico, con-
forme indicados na Tabela 22.1, calcular os valores das coordenadas terrestre do ponto (P), cujas coordenadas imagem estão
indicadas na Tabela 22.2.
Tabela 22.1 • Parâmetros de orientação da câmera nas posições (1) e (2) Tabela 22.2 • Coordenadas imagem do ponto (P)
Coordenadas do Distância focal Ponto Imagem 1 Imagem 2
Valor [m] Rotação
centro perspectivo da câmera [mm] xp´ [mm] yp´ [mm] xp” [mm] yp” [mm]
X01 201.961,524 p
w1 = –0,013197159 rad 97,722 –37,373 14,082 –37,044
Y01 7.564.499,471 φ1 = 0,023878410 rad
Z01 2.038,068 κ1 = –1,592169455 rad
c = 153,5
X02 201.948,101 w2 = –0,002147713 rad
Y02 7.563.826,864 φ2 = 0,030440581 rad
Z02 2.036,582 κ2 = –1,573313763 rad

ƒƒ Solução:
Para a imagem (1), considerando a equação (4.104), tem-se a matriz de rotação indicada a seguir:

0, 021365409 0, 999677808 0, 013703986 r11 r12 r13


R , , 0, 999486593 0, 021684656 0, 023586574 r21 r12 r23
0, 023876141 0, 013193014 0, 999627868 r31 r32 r33
Para a imagem (2), considerando a equação (4.104), tem-se a matriz de rotação indicada a seguir:

0, 002516267 0, 999994360 0, 002224325 r11 r12 r13


R , , 0, 999533554 0, 002582795 0, 030430307 r21 r12 r23
0, 030435880 0, 002146716 0, 999534416 r31 r32 r33
Para a solução do problema serão consideradas as seguintes igualdades para fins de simplificar a aplicação dos valores nas
equações (22.23) e (22.24).

97, 7220 37, 373 153, 5


0, 021365409 * 0 0, 999486593 * 0 0, 023876141 *
1.000 1.000 1.000
kX1 0, 285055182
97, 7220 37, 373 153, 5
0, 013703986 * 0 0, 023586574 * 0 0, 999627868 *
1 . 000 1.000 1.000
14, 082 37, 044 153, 5
0, 002516267 * 0 0, 999533554 * 0 0, 030435880 *
1.000 1.000 1.000
kX2 0, 274079441
14, 082 37, 044 153, 5
0, 002224325 * 0 0, 030430307 * 0 0, 999534416 *
1 000 1 000 1.000
97, 7220 37, 373 153, 5
0, 999677808 * 0 0, 021684656 * 0 0, 013193014 *
1 000 1 000 1.000
kY1 0, 654039053
97, 7220 37, 373 153, 5
0, 013703986 * 0 0, 023586574 * 0 0, 999627868 *
1.000 1 000 1 000
97, 7220 37, 373 153, 5
0, 999994360 * 0 0, 002582795 * 0 0, 002146716 *
1.000 1.000 1.000
kY2 0, 094015691
97, 7220 37, 373 153, 5
0, 002224325 * 0 0, 030430307 * 0 0, 999534416 *
1.000 1.000 1.000
Aerofotogrametria e-105

Neste ponto da solução do problema é necessário igualar as duas equações da coordenada (X) ou (Y) para se obter a coorde-
nada (Z), de onde se obtém:

201.948,101  201.961, 524  2.038, 068 * 0, 285055182  2.036, 582 * 0, 274079441


Z  852,206 m
0, 285055182  0, 274079441

Em seguida, aplicando as equações (22.23) e (22.24), obtêm-se:

X  201.961, 524   852, 206  2.038, 068  * 0, 285055182  201.623, 488 m


Y  7.564.499, 471   852, 206  2.038, 068  * 0, 654039053  7.563.723,871 m

Ressalta-se que a melhor solução para este tipo de problema é utilizar mais de três pontos homólogos e, para tanto, será neces-
sário a aplicação de conceitos de ajustamento das observações pelo Método dos Mínimos Quadrados. O leitor interessado neste
tipo de solução deverá consultar literatura específica sobre o assunto.

22.10 Determinação dos parâmetros de orientação exterior do modelo fotogramétrico


Conforme descrito na seção anterior, as equações de colinearidade relacionam as coordenadas (X, Y, Z) do espaço objeto com
as coordenadas (x, y, z) do espaço imagem. Assim, desde que se conheçam os parâmetros de orientação espacial (κ, ϕ, ω, X0,
Y0, Z0) de cada imagem, bem como os parâmetros de orientação interior (c, x0, y0, ...), é possível determinar o valor das coorde-
nadas de qualquer ponto no terreno (espaço objeto) por intermédio das medições de suas coordenadas imagem representadas
sobre o estereopar.
Quando se conhecem os valores dos parâmetros de orientação espacial (κ, ϕ, ω, X0, Y0, Z0) de um par de imagens consecu-
tivas se tem, imediatamente, a formação de um par estereoscópico, ou seja, é possível visualizar o modelo virtual 3D (modelo
estereoscópico) por meio do posicionamento das imagens na tela do computador e pelo uso de um dispositivo de separação
de imagens, conforme descrito na Seção 22.6 – Estereoscopia.
A medição das coordenadas de um ponto sobre uma imagem significa localizar o ponto sobre a imagem e determinar a
posição do pixel que o representa. Isto pode ser feito tanto monoscopicamente como estereoscopicamente. No primeiro caso, a
localização da representação do ponto em cada imagem é realizada pelo seu reconhecimento visual sobre as imagens. Medem-
se, assim, os pares de coordenadas (x, y), separadamente, em cada imagem. No segundo caso, a localização do ponto sobre as
imagens é realizada por intermédio da marca flutuante indicada na Seção 22.7 – Marca flutuante e paralaxe. Assim, quando
o operador considera visualmente que a marca flutuante está localizada sobre a representação do ponto no modelo estereos-
cópico, ele confirma a posição e o sistema mede diretamente os valores dos pares de coordenadas (x, y) nas duas imagens.
Todo o processo fotogramétrico se baseia, portanto, no conhecimento dos parâmetros de orientação (κ, ϕ, ω, X0, Y0, Z0)
das imagens. Esses parâmetros podem ser determinados de forma indireta ou de forma direta. De forma indireta, conforme
descrito na Seção 22.9 – Equações fundamentais da fotogrametria digital, eles são determinados por meio de pontos com coor-
denadas conhecidas no espaço objeto, cujas imagens apareçam em pelo menos duas fotos consecutivas e pela medição de suas
coordenadas (x, y) em cada uma delas. Aos pontos de coordenadas (X, Y, Z) conhecidas no espaço objeto, dá-se o nome de
ponto de controle.
De forma direta, os parâmetros de orientação são determinados, diretamente, por meio do georreferenciamento do centro
perspectivo da câmera aérea com o uso de instrumentos da tecnologia GNSS, e a orientação espacial do sensor, por meio de
um sistema de navegação inercial, genericamente denominados IMU (Inertial Measurement Unit).
Apresenta-se a seguir uma breve discussão sobre cada um dos métodos de determinação dos parâmetros de orientação do
modelo fotogramétrico citados.

22.10.1 Determinação indireta dos parâmetros de orientação por meio de pontos de controle
Um ponto de controle para a Aerofotogrametria é um ponto sinalizado sobre o terreno, cujas coordenadas são conhecidas
com relação a um sistema de coordenadas do espaço objeto previamente escolhido. Isso significa que elas foram determinadas
por meio de medições com a tecnologia GNSS ou por meio de estações totais. Conforme já citado, elas podem ser coordena-
das cartesianas geocêntricas, planas UTM ou topográficas locais com altitudes ortométricas. Em geral, um ponto de controle
é simplificadamente denominado por sua sigla em inglês GCP (Ground Control Point).
Um ponto de controle pode ser planimétrico, altimétrico ou planialtimétrico. Para a determinação dos parâmetros de
orientação das imagens conjugadas de um par estereoscópico é necessário ter, pelo menos, dois pontos com coordenadas
(X, Y, Z) conhecidas e um ponto com coordenada (Z). Obviamente, para que se tenha maior acurácia, e para que se possa
conhecer os valores das precisões dos valores calculados, recomenda-se sempre utilizar mais de três pontos de controle.
Existem dois tipos de pontos de controle utilizados em aerofotogrametria. São eles:
e-106 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

22.10.1.1 Ponto de controle natural


Um ponto de controle natural é aquele escolhido visualmente sobre as imagens após o voo fotogramétrico. A sua identificação
depende do GSD da imagem. Em geral, são escolhidas figuras geométricas que possam ser bem identificadas no terreno e na
imagem, como vértices de esquinas de quadras, vértices de faixas de pedestre, cantos de muros, cercas etc. Uma vez o ponto
escolhido sobre a imagem, ele deve ser identificado e medido no terreno. A Figura 22.23 ilustra o exemplo de um ponto de
controle natural que pode ser utilizado em aerofotogrametria.

22.10.1.2 Ponto de controle pré-sinalizado


Um ponto de controle pré-sinalizado é aquele construído sobre a superfície do terreno antes da realização do voo. A forma,
o tipo e o tamanho desse tipo de ponto variam em função da altura do voo e da resolução geométrica da imagem. Os pontos
assim sinalizados podem ser medidos, no campo, antes ou após o voo. A sua implantação é mais laboriosa que a de um ponto
natural, porém, o seu uso e a qualidade dos resultados podem ser sensivelmente melhores, uma vez que a sua identificação
digital é facilitada pelo uso de ferramentas automáticas de identificação existentes nos programas de fotogrametria. A Figura
22.24 mostra um exemplo de um ponto de controle pré-sinalizado utilizado em aerofotogrametria.

Figura 22.23 • Ponto de controle natural em Figura 22.24 • Ponto de controle pré-
uma faixa de pedestres. sinalizado.

22.10.2 Determinação direta dos parâmetros de orientação por meio de georreferenciamento GNSS e
sistema inercial (IMU)
O uso da tecnologia GNSS e de um sis-
tema inercial acoplados à câmera foto-
gramétrica, conforme ilustrado na Figura
22.25, permitem determinar os valores
das coordenadas (X0,Y0, Z0) do centro
perspectivo e os valores das rotações (ω,
ϕ, κ) do sensor, em cada posição de to-
mada da foto. Diz-se, nesse caso, que se
realiza um georreferenciamento direto do
modelo fotogramétrico.
O posicionamento GNSS é obtido apli-
cando diferentes técnicas de levantamento,
que variam em função da qualidade deseja-
da. Em geral, tem-se utilizado o método de
levantamento no modo relativo cinemático
(PPK) e no modo diferencial RTK, confor-
me apresentado no Capítulo 20 – Sistemas
de navegação global (GNSS). Figura 22.25 • Voo aerofotogramétrico com suporte GNSS e IMU.
Aerofotogrametria e-107

A unidade de medição inercial (IMU) utilizada em aerofotogrametria é composta por três giroscópios, três acelerômetros,
uma plataforma de montagem desses sensores (estabilizada ou não) e uma placa de computador com um algoritmo apropriado
para transformar as medições inerciais em informações de navegação. Os dados dos acelerômetros e dos giroscópios estão
relacionados com os incrementos de velocidade e as variações angulares, disponibilizadas a uma frequência da ordem de 200
Hz. Essa montagem, contudo, não garante a estabilidade do sistema e, dependendo da qualidade dos sensores inerciais, ocor-
rem desvios de posição e de atitude que variam ao longo do tempo.
Um sistema inercial de qualidade média, por exemplo, pode variar a sua posição entre 3 e 10 cm por segundo de tempo. Já
a atitude pode variar entre 0,1 e 0,2 segundo de arco por segundo de tempo. É importante, contudo, considerar que, em função
dos avanços tecnológicos que ocorrem nesta área, não vale a pena deter-se a dados específicos. Sempre que necessário, o leitor
interessado deverá consultar referências especializadas recentes e catálogos de fabricantes.
Para solucionar o problema da insta-
bilidade dos sistemas inerciais, se realiza
uma integração dos dados inerciais com
os dados GNSS. Em resumo, isso significa
corrigir o desvio da trajetória determinada
pela unidade de medida inercial por meio
da integração com o posicionamento GNSS.
Considerando que os sistemas inerciais pro-
duzem valores de posições relativas e de ati-
tudes precisos a uma frequência da ordem
de 200 Hz, se for aplicada, por exemplo,
uma correção GNSS a cada segundo, se ob-
tém a orientação da aeronave no espaço em Figura 22.26 • Ilustração da correção da trajetória pela integração GNSS-IMU.
distâncias adequadas para a aerofotograme-
tria, conforme ilustrado na Figura 22.26.
O sistema inercial é rigidamente conectado ao corpo da câmera de forma que os sistemas de coordenadas de ambos este-
jam aproximadamente alinhados. Ao desvio angular existente entre os dois sistemas dá-se o nome de ângulos de boresigth.
A antena do sistema GNSS, por sua vez, é rigidamente montada no corpo da aeronave de modo que se possam conhecer os
valores dos off-sets entre o centro da antena e o centro perspectivo da câmera. Os valores desses desvios são, muitas vezes,
indicados pelos fabricantes das câmeras ou medidos com o uso de instrumentos topográficos. Mesmo assim, eles precisam ser
determinados por calibrações de campo.
Outro aspecto importante a ser considerado na integração dos sistemas GNSS-IMU no posicionamento da câmera aérea
é a escolha do sistema de coordenadas do projeto. Em geral, se utiliza um sistema de projeção cartográfica relacionado
com o sistema de referência geodésico nacional, como a projeção UTM e altitude ortométrica, por exemplo (ver Capítulo
19 – Projeção cartográfica). O modelo fotogramétrico, contudo, se baseia no sistema de coordenadas cartesiano espacial.
Torna-se necessário, portanto, realizar transformações de coordenadas para que se possa combinar os dois sistemas.
Além disso, é preciso também considerar o fato de que as altitudes utilizadas nos projetos de Engenharia são as altitudes
ortométricas ou as altitudes normais, conforme descrito na Seção 3.5.1 – Ondulação geoidal, e as geradas pelo sistema
GNSS são as elipsoidais, o que torna imprescindível considerar a ondulação geoidal e o desvio da vertical no produto
final de mapeamento.

22.11 Aerotriangulação
Conforme descrito na Seção 22.9.1 – Equações projetivas (equações de colinearidade), a determinação indireta dos parâme-
tros de orientação das imagens de um par estereoscópico exige a existência de pelo menos três pontos de controle distribuí-
dos na área de superposição das duas imagens do modelo estereoscópico. Dessa forma, considerando que um levantamento
aerofotogramétrico, em praticamente todos os casos, recobre áreas extensas do terreno gerando um grande número de
pares estereoscópicos, o uso de três pontos de controle por par de imagens torna-se impraticável. Para solucionar esse pro-
blema adota-se a prática de processar simultaneamente a geometria de todo o bloco de imagens, baseando-se em pontos de
ligação13 (tie points) entre as imagens adjacentes, o que reduz sensivelmente a quantidade de pontos de controle necessária
para a determinação dos parâmetros de orientação das imagens do bloco. A esse processo de orientação conjunta do bloco
de imagens dá-se o nome genérico de fototriangulação, ou no caso aéreo, Aerotriangulação.

13 Também denominados pontos de passagem.


e-108 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

A Figura 22.27 ilustra o exemplo clássico da for-


mação do bloco de imagens (ou bloco aerofotogra-
métrico) em um levantamento aerofotogramétrico.
As marcas circulares representam os pontos de
ligação entre os modelos e as marcas triangulares
representam os pontos de controle.
Existem, portanto, três tipos de pontos que de-
vem ser considerados no processamento de uma
aerotriangulação. São eles:
Ponto de controle: já descrito na Seção 22.10.1 –
Determinação indireta dos parâmetros de orientação
por meio de pontos de controle.
Ponto de ligação: aqueles medidos sobre as áreas
de recobrimento das imagens adjacentes do bloco
aerofotogramétrico, cuja função é garantir a co-
nexão longitudinal e lateral entre os modelos. Eles
são escolhidos sobre a imagem e não precisam ser Figura 22.27 • Ilustração da formação do bloco de imagens em um levanta-
identificados no terreno, ou seja, não precisam ter mento aerofotogramétrico.
as suas coordenadas do espaço objeto (X, Y, Z) co-
nhecidas. Não existe uma regra fixa para indicar qual tipo de objeto utilizar como ponto de ligação. Em geral, exige-se apenas
que eles sejam facilmente identificados nas imagens adjacentes, não podendo ser, evidentemente, pontos medidos sobre ob-
jetos móveis, como veículos em movimento, animais etc. Também devem ser evitados pontos em locais com sombra, prin-
cipalmente entre faixas diferentes, em função da mudança da posição do sol (ver exemplo na Fig. 22.28). Os programas de
fotogrametria, em geral, possuem algoritmos para a determinação automáticas desses pontos e geram centenas deles em cada
par estereoscópico.

Figura 22.28 • Exemplo de ponto de ligação.


Fonte: adaptada de EESC/USP.

Ponto de verificação:14 aquele utilizado para verificar a qualidade do ajustamento da aerotriangulação. Trata-se, na realida-
de, de um ponto de controle não utilizado no ajustamento do bloco aerofotogramétrico. O seu uso se dá pela comparação de
suas coordenadas, conhecidas no terreno, com aquelas geradas pelos modelos fotogramétricos ajustados. As diferenças entre
as duas permitem determinar a acurácia do ajustamento realizado.
Existem na literatura diversos métodos de fototriangulação que foram desenvolvidos ao longo do tempo. O mais flexível
e acurado entre eles e que se encontra disponível em praticamente todos os programas aplicativos de fotogrametria utiliza
o método denominado ajustamento por feixes perspectivos (bundle block adjustment), que pode ser entendido como um
modelo matemático que relaciona de uma só vez as coordenadas do espaço imagem de todo o bloco com os parâmetros
do sensor e as coordenadas do espaço objeto. Em suma, significa a aplicação simultânea das equações de colinearidades
para todos os modelos do bloco de imagens. Os valores dos parâmetros de orientação, neste caso, são determinados por
intermédio da aplicação de um ajustamento de observações pelo Método dos Mínimos Quadrados, conforme ilustrado no
exemplo apresentado na sequência.
Considere-se como exemplo o bloco composto por duas faixas de voo com quatro imagens cada, conforme ilustrado na
Figura 22.29.

14 No jargão popular na área de fotogrametria se utiliza também a denominação “ponto de checagem”.


Aerofotogrametria e-109

Figura 22.29 • Bloco de imagens com seus respectivos pontos de ligação e de controle.

Pela Figura 22.29, nota-se que o bloco de imagens possui as seguintes características:

• 20 pontos de ligação (1 a 20);


• 5 pontos de controle (A, B, C, D, E);
• total de 25 pontos para serem medidos sobre as imagens;
• imagens 1 e 5 possuem 7 pontos cada;
• imagens 4 e 8 possuem 8 pontos cada;
• imagens 2, 3, 6 e 7 possuem 11 pontos cada;
• total de medições igual a 2*7+2*8+4*11 = 74 pontos imagem.

O número de incógnitas do sistema é igual às coordenadas (X, Y, Z) de cada ponto, mais os parâmetros (ω, ϕ, κ, X0, Y0, Z0)
de cada foto, ou seja, 3*25+8*6 = 123 incógnitas.
A quantidade de equações de colinearidade é igual a 2*74 = 148 por serem duas equações para cada ponto imagem.
Como se tem 148 equações e 123 incógnitas, a solução pode ser obtida a partir do ajustamento de observações pelo
Método dos Mínimos Quadrados. Como resultado ter-se-á os parâmetros de orientação (ω, ϕ, κ, X0, Y0, Z0) de cada foto
mais as três coordenadas (X, Y, Z) ajustadas para cada ponto medido. Os detalhes sobre o emprego de um ajustamento
desse tipo excedem os objetivos deste livro. O leitor interessado deverá consultar bibliografias especializadas. Deve-se
ressaltar que, dependendo do tamanho do bloco de imagens, a quantidade de equações é grande, exigindo modelos de
processamento aprimorados.
Com relação à quantidade de pontos de controle, alguns autores recomendam o uso de pelo menos um ponto a cada 4 ou 6
pares de imagens, distribuindo-os nos cantos e nas áreas de recobrimento longitudinal e lateral dos modelos. Adicionalmente,
pode-se também incluir pontos de controle verticais (pontos de altitude conhecidas) nas áreas de recobrimento lateral a cada
4 modelos.
Com relação aos pontos de ligação, a quantidade indicada varia entre 9 e 15 pontos por imagem, nos procedimentos ma-
nuais. Nos casos da determinação automática dos pontos de ligação, recomenda-se utilizar uma quantidade da ordem de 100
pontos por imagem. Esse valor, obviamente, não é fixo e pode variar caso a caso.
A precisão do resultado do ajustamento é realizada pelo exame da matriz de variância-covariância dos parâmetros do ajus-
tamento, que indica o valor do desvio-padrão com que cada parâmetro foi determinado. A acurácia, por sua, vez, é determina-
da por intermédio dos pontos de verificação. A raiz quadrada da soma das diferenças, ao quadrado e dividido pelo número de
observações, entre os valores das coordenadas medidos no modelo aerofotogramétrico ajustado e os valores das coordenadas
conhecidas dos pontos de verificação, indica a acurácia do ajustamento, ou seja, quanto o bloco de imagens assim estabelecido
se ajusta ao modelo físico. É importante ressaltar que os pontos de controle que já foram utilizados no ajustamento do bloco
aerofotogramétrico não podem ser utilizados como pontos de verificação.
Sobre o valor da acurácia esperada na verificação do bloco aerofotogramétrico ajustado existem poucas indicações
na literatura. Alguns autores indicam que, para o caso de um ajustamento com pontos de controle pré-sinalizados, assu-
mindo que não existam erros grosseiros, pode-se esperar valores da ordem de 0,5 a 1 pixel, em planimetria, e da ordem
de 1,0 a 2 pixels em altimetria.15 Estes valores devem ser vistos com resguardo e tomados apenas como indicadores com-
parativos, uma vez que a aceitação ou não do levantamento aerofotogramétrico ajustado dependerá do objetivo para o
qual ele foi realizado.
15 Estes valores são baseados em discussões técnicas dos autores com fabricantes, pesquisadores e empresas de aerofotogrametria.
e-110 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

22.12 Correlação de imagens


A busca dos pontos homólogos em fotogrametria foi sempre uma operação fastidiosa, principalmente quando se necessita
localizar grandes quantidades em um bloco aerofotogramétrico. Conforme já citado, essa busca é realizada com o objetivo de
determinar as coordenadas dos pontos homólogos nas imagens conjugadas (par estereoscópico). Em face da morosidade des-
se processo, desde o início da fotogrametria digital, se procurou soluções que pudessem automatizar os processos de busca. Às
técnicas desenvolvidas para essa automatização denominou-se correlação de imagens (image correlation ou image matching).
O princípio básico da correlação de imagens é a determinação da correspondência entre duas porções de imagens de uma
mesma região física, representadas sobre um estereopar (imagens conjugadas), por intermédio da análise de alguns atributos16
inerentes a elas. O problema a ser solucionado, neste caso, é como identificá-las nas imagens conjugadas de forma automática.
A este respeito, existe uma série de técnicas que foram desenvolvidas ao longo do tempo e que se encontram muito bem des-
critas em bibliografias especializadas. Entre elas, se destacam as técnicas de correlação de imagens baseadas nas diferenças dos
tons de cinza de uma porção das imagens conjugadas e as baseadas em feições dessas imagens.17
A correlação de imagens baseada nos tons de cinza das imagens conjugadas se baseia na suposição de que os tons de cinza
da vizinhança de um determinado pixel nas duas imagens são semelhantes. Assim, em vez de se procurar a localização do pixel
homólogo, se procura a localização de um conjunto de pixels determinado por um gabarito predefinido de pixels (template).
O gabarito de pixels, neste caso, consiste em uma matriz de valores de tons de cinza de pixels com dimensões que variam entre
5×5 pixels a 11×11 pixels (de preferência, ímpar). O pixel central desse gabarito é o pixel homólogo.
A correspondência é realizada posicionando o gabarito de pixels sobre um local predefinido e fixo da primeira imagem, denomina-
do gabarito de referência. Uma vez selecionado o gabarito de referência em uma das imagens, deve-se selecionar uma região de busca
na outra imagem do par e posicionar o mesmo gabarito de
pixels sobre ela (agora denominado gabarito de busca).
Em seguida, o gabarito de busca deve ser deslocado
sobre a região de busca de forma a realizar todas as com-
binações possíveis do gabarito de referência, com as dife-
rentes posições do gabarito de busca, com o propósito de
determinar a posição com maior semelhança (ou corres-
pondência) com o gabarito de referência. As localizações
dos pixels centrais de ambos os gabaritos, selecionados,
definem as coordenadas dos pontos homólogos, confor- Figura 22.30 • Exemplo de gabarito de pixels e janela de busca em um
me ilustrado na Figura 22.30. processo de correlação de imagens.

22.12.1 Algoritmos de correlação de imagens


A maioria dos algoritmos de correlação de imagens se baseia em algum tipo de tratamento digital de imagens. No caso dos
algoritmos baseados nos tons de cinza, existem duas técnicas de correlação que são aplicadas com maior frequência. São elas:
• correlação de imagens pelo método do coeficiente de correlação cruzado;
• correlação de imagens pelo Método dos Mínimos Quadrados.

22.12.1.1 Correlação de imagens pelo método do coeficiente de correlação cruzada


Esta técnica de correlação de imagens se baseia na maximização do coeficiente de correlação (ρ) entre os tons de cinza dos
dois gabaritos da correlação, conforme indicado a seguir:
1
   
F T G  eT F eT G
n

 (22.25)
 T 1 T 2  T 1 T 2


F 
F 
n
  
e F *
 
 
G G 
n
e  
G 


sendo:
 f1   g1 
   
f2 g2
F   G  eT  1 1  1
  
   
 fn   g n 

16 Alguns autores preferem o termo “primitivas”.


17 Além destas duas, existem outras mais elaboradas baseadas nas entidades geométricas e suas relações estruturais. O leitor interessado deverá
consultar literatura especializada.
Aerofotogrametria e-111

f1 = valor do tom de cinza do pixel (i) do gabarito (f) –


convenientemente posicionado sobre a imagem de
referência;
g = valor do tom de cinza do pixel (i) do gabarito (g)
– convenientemente posicionado sobre a região de
busca da imagem conjugada;
n = quantidade de pixels do gabarito.

O valor de (ρ) varia entre –1 e +1. Assim, quanto mais


próximo de +1, maior a correlação entre os tons de cinza
do gabarito escolhido. Um valor igual a +1 indicaria duas
imagens idênticas nos dois gabaritos. A Figura 22.31 ilus-
tra um exemplo da distribuição dos coeficientes de corre-
lação em uma região de busca. O pico do gráfico indica a Figura 22.31 • Distribuição dos coeficientes de correlação em uma
posição do gabarito com maior correlação. região de busca.

22.12.1.2 Definição da área de busca para correlação de imagens


Antes de iniciar o processo de busca dos pontos homólogos por qualquer método de correlação, é necessário definir o lugar
geométrico mais provável da localização dos pontos a serem correlacionados, ou seja, a região da imagem global onde será reali-
zada essa busca. A definição correta dessa região é de primordial importância para se evitar custo computacional elevado e para
diminuir as possibilidades de ambiguidades nos resultados das correlações. A este respeito existem algumas técnicas de restrição
do espaço de busca que são aplicadas em praticamente todos os algoritmos de correlação, conforme indicado a seguir:
Geometria epipolar: se baseia na suposição de que, se
um objeto aparece sobre uma das imagens, ele poderá ou
não aparecer na outra, porém, se aparecer, certamente ele
estará sobre uma linha de paralaxe nula, denominada li-
nha epipolar.
Processo hierárquico: consiste em utilizar uma pirâ-
mide de imagens do estereopar, conforme ilustrado na
Figura 22.32. A pirâmide de imagens, neste caso, é for-
mada por um conjunto de imagens com diferentes reso-
luções geométricas, reduzidas por um fator 2, no qual o
nível mais alto corresponde à imagem de menor resolu-
ção e o nível mais baixo à de maior resolução, em geral,
a imagem original.
O processo de correlação de imagens ao longo da
pirâmide se inicia na parte superior da mesma, ou seja,
nas imagens de menor resolução. Os resultados obtidos
em cada nível superior são projetados na imagem infe-
rior até se alcançar a imagem original.
Sobre as técnicas de correlação de imagens, é impor-
tante salientar que se trata de uma área do tratamento de
imagens extremamente explorada pelos pesquisadores das
mais diversas áreas relacionadas com a visão computacio-
nal e implementadas com ótimos resultados em programas Figura 22.32 • Ilustração do processo hierárquico na formação da
e sistemas específicos voltados para o processamento de pirâmide de imagens.
dados fotogramétricos. Nesta seção do livro o objetivo foi Fonte: adaptada de EESC/USP.
apenas introduzir o assunto aos leitores com a finalidade de ajudá-los a compreender os fundamentos dos métodos de correlação
aplicados em fotogrametria para poder avaliar convenientemente os resultados obtidos em seus trabalhos práticos.

22.13 Calibração de câmeras fotogramétricas


Uma câmera fotogramétrica, em última instância, é um instrumento de medição. E como tal, ela precisa ser calibrada. A calibra-
ção, neste caso, é realizada com o objetivo de determinar os valores dos parâmetros geométricos internos da câmera (c, x0, y0), os
valores radiométricos da matriz de sensores CCD (ou CMOS) e os parâmetros de distorção da lente (k1, k2, k3, P1, P2). No caso
de câmeras com recursos para orientação direta dos parâmetros de orientação, ou seja, integrada com sensores GNSS/IMU, a
calibração inclui também informações associadas à geometria dessa integração, que estão relacionadas com os off-sets da antena
e-112 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

GNSS e do sistema inercial (IMU), com relação ao centro perspectivo da câmera, e os ângulos de desalinhamento entre os siste-
mas de referência do IMU e da câmera, conforme descritos na Seção 22.10.2 – Determinação direta dos parâmetros de orientação
por meio de georreferenciamento GNSS e sistema inercial (IMU).
Os valores dos parâmetros calibrados e suas precisões devem ser apresentados em um certificado de calibração com indi-
cações tabulares e gráficas dos resultados obtidos. Os parâmetros a serem calibrados e o formato do certificado de calibração
variam em função do tipo de câmera, principalmente para as de pequeno formato. A frequência com que se deve realizar a
calibração depende do tipo de câmera e de regulamentações de órgãos governamentais. Em geral, para as câmeras de grande
e médio formato, recomenda-se calibrá-las ao menos uma vez cada dois anos.
Os procedimentos para a calibração de uma câmera fotogramétrica fundamentam-se em três técnicas clássicas de calibra-
ção, que são: laboratorial, calibração terrestre (in situ) e autocalibração. Apresenta-se a seguir uma breve descrição sobre cada
uma delas e a calibração do ângulo de boresight e dos off-sets da antena GNSS e do sensor IMU (lever arms).

22.13.1 Calibração em laboratório


Esta técnica de calibração consiste, basicamente, em relacionar fisicamente a geometria da matriz de sensores com um feixe
de raios ópticos controlados, gerado por meio de um conjunto de colimadores montados em um arranjo angular conhecido.
Em seguida, cada colimador projeta uma imagem individual de uma marca em cruz (ou a imagem de uma placa codificada)
sobre a matriz de sensores CCD (ou CMOS). As coordenadas dos cruzamentos são determinadas posteriormente e, assim, são
calculados os valores dos parâmetros geométricos da orientação interior.
Outro parâmetro determinado nesta etapa de calibração é a resposta espectral da câmera, ou seja, a calibração radiomé-
trica, que determina a relação funcional entre a radiação de entrada e o valor digital indicado pelo instrumento. Um exemplo
de calibração desse tipo é o uso de um espectrômetro de alta qualidade, que gera uma fonte de luz isotrópica e homogênea,
tomada como padrão, e que ilumina o sistema de lentes da câmera e determina a resposta espectral da matriz de sensores.
Além dos parâmetros citados, vários outros são calibrados em laboratório. Não faz parte do escopo deste livro tratá-los
todos. O leitor interessado poderá encontrar informações a esse respeito em literatura especializada ou em manuais de instru-
ção de fabricantes de câmeras aéreas.

22.13.2 Calibração terrestre (in situ)


Esta técnica de calibração consiste em relacionar as coordenadas cartesianas 3D locais, conhecidas de uma rede de pontos de
uma área de teste, com os valores das coordenadas imagem desses mesmos pontos, medidas sobre um conjunto de imagens
dessa rede. Uma rede clássica de pontos de calibração é composta por uma malha de alvos com coordenadas espaciais conhe-
cidas pintada sobre um anteparo estável, em geral, determinados por meio de instrumentos topográficos. A determinação dos
parâmetros de calibração é realizada mediante o uso das equações de colinearidade expandida com parâmetros adicionais,
que são: a distância focal calibrada (c), as coordenadas do ponto principal (x0, y0), os três coeficientes da distorção radial
simétrica e os dois coeficientes da distorção descentrada da lente. Estes são os parâmetros mais comuns. Existem outros que
não são tratados neste livro.
A solução é obtida por meio de um ajustamento pelo Método dos Mínimos Quadrados, de onde se obtém também os parâ-
metros da orientação externa da câmera. Este tipo de calibração é realizado, geralmente, com o uso de programas específicos
para essa finalidade.

22.13.3 Autocalibração
Esta técnica de calibração é semelhante à anterior, com a diferença de que as observações são realizadas sobre os pontos de con-
trole de um campo de prova, conforme descrito na Seção 22.11 – Aerotriangulação. Para garantia da qualidade dos resultados, na
maioria das vezes, se utilizam pontos de controle pré-sinalizados, embora se possa utilizar também pontos de controle naturais.
Após a calibração, se considera que os parâmetros intrínsecos da câmera se manterão estáveis por um período de tempo.
Na realidade, nenhuma câmera é estável. Por isso, nos casos do uso de câmeras não métricas, se recomenda verificar os parâ-
metros de calibração antes e depois do projeto para estar seguro de que não houve mudanças significativas durante a aquisição
das imagens.
Os parâmetros geométricos da câmera são mais bem determinados quando realizados por meio de calibrações em labo-
ratório, onde todas as medições são efetuadas em condições ambientais controladas. Esse procedimento requer, contudo,
que a câmera seja enviada para um laboratório certificado, de acordo com as exigências do fabricante. A calibração in situ é
utilizada quase que exclusivamente para câmeras de pequeno formato, métricas ou não métricas, e a autocalibração é utilizada
para todos os tipos de câmeras. Em alguns casos, mesmo as câmeras calibradas em laboratório, são autocalibradas durante os
projetos aerofotogramétricos para verificar a estabilidade dos parâmetros. Os programas fotogramétricos, em geral, possuem
ferramentas para a determinação dos parâmetros de calibração das câmeras aéreas.
Aerofotogrametria e-113

22.13.4 Calibração do ângulo de boresight e dos off-sets da antena GNSS e do sensor IMU (lever arms)
A calibração dos ângulos de boresight e dos off-sets da antena GNSS e do sensor IMU é semelhante à autocalibração, apre-
sentada anteriormente. Nesse caso, se realiza um voo aerofotogramétrico sobre um terreno plano com pontos de controle
bem distribuídos e determinados com alta precisão. Em seguida, se realiza um processo de aerotriangulação e se determina
a posição do centro óptico da câmera e a respectiva matriz de rotação do modelo com relação a um sistema de coordenadas
predefinido. Por intermédio da antena GNSS e do processador do sistema IMU, se obtém a posição medida do centro óptico e
a matriz de rotação para cada posição do IMU. Comparando as duas posições e as matrizes de rotação, se obtêm os valores dos
off-sets e os ângulos de boresight. Finalmente, calculando a média para todo o bloco de imagens, se obtém os valores ajustados
e a matriz de variância-covariância relacionada. O processo é mais bem controlado e os resultados mais confiáveis se já houver
informações a priori desses parâmetros, que, em geral, são indicados pelos fabricantes.
O modelo matemático utilizado para esta calibração consiste em adicionar os parâmetros de calibração diretamente nas
equações de colinearidade e realizar o ajustamento por blocos de imagens, conforme já citado.

22.14 Estação fotogramétrica digital


Dá-se o nome de estação fotogramétrica digital (DPW, do inglês digital photogrammetric workstation) ao conjunto de equi-
pamentos e programas aplicativos de computador projetados com o objetivo de gerar produtos cartográficos por meio de
conceitos da fotogrametria digital. Os equipamentos, neste caso, incluem um computador com pelo menos dois monitores,
um mouse especial (também denominado 3D-mouse), um dispositivo de separação de imagens para visualização 3D, óculos
para visão estereoscópica e acessórios gerais para manipulação do computador.
A Figura 22.33 apresenta um exemplo de uma estação fotogramétrica digital completa com seus equipamentos e acessó-
rios. A Figura 22.34 ilustra o princípio de separação de imagens da estação fotogramétrica exibida na Figura 22.33. A Figura
22.35 ilustra exemplos de 3D-mouse.

Figura 22.33 • Estação fotogramétrica digital.


Cortesia de 3D Pluralview. Figura 22.34 • Princípio de separação de imagens para visão 3D.

O dispositivo para separação das imagens apre-


sentado na Figura 22.34 é um exemplo de dispositi-
vo baseado no método da luz polarizada, conforme
apresentado na Seção 22.6 – Estereoscopia. O seu
princípio de funcionamento é autoexplicativo pelas
indicações da figura. O leitor interessado em outros
exemplos poderá encontrar vários deles disponíveis
em portais da Internet.
O 3D-mouse é o acessório da estação fotogramé-
trica que possui a função de mover o cursor da tela
do computador nas direções (X, Y, Z) do modelo
estereoscópico. Os deslocamentos em (X, Y) são re-
alizados movendo-se o 3D-mouse sobre a mesa de
trabalho, nas respectivas direções. A movimentação
em (Z) é realizada por meio de uma esfera inserida
no corpo do 3D-mouse, conforme ilustrado na Figura Figura 22.35 • Exemplos de 3D-mouse.
22.35. Girando essa esfera, o operador separa ou junta
e-114 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

as marcas flutuantes, o que significa movê-la para cima e para baixo no modelo estereoscópico, permitindo colocá-la sobre o
terreno. Para facilidade de uso, o 3D-mouse possui botões configuráveis, que permitem realizar funções como eliminação da
paralaxe, aplicação de zoom nas imagens, constituição de figuras geométricas em ambiente CAD, entre outros.
Os equipamentos da estação fotogramétrica são gerenciados por um programa de computador denominado, genericamen-
te, programa fotogramétrico. É por meio dele que a estação fotogramétrica se comunica com o operador. Fundamentalmente, a
sua função é aplicar todas as rotinas de captura de imagem, armazenamento das imagens, edição e armazenamento de pontos
de controle, realização dos procedimentos de orientação interior da câmera e exterior do bloco de imagens, gestão e exibição
dos modelos estereoscópicos e geração de produtos cartográficos por meio da coleta dos dados espaciais de interesse, repre-
sentados nas imagens. A coleta dos dados, neste caso, é realizada por meio da medição das coordenadas dos pontos homólo-
gos que representam os objetos a serem medidos. O programa fotogramétrico mede as coordenadas dos pontos homólogos
indicados pelo operador, as transforma em coordenadas objeto, conforme citado nas seções anteriores, e apresenta o ponto na
tela do monitor gráfico por meio de um programa CAD integrado na estação fotogramétrica. A geração do produto cartográ-
fico ocorre, em seguida, pela combinação gráfica dos pontos medidos. Para tanto, o programa fotogramétrico possui módulos
dedicados para a geração de produtos diversos, os quais estão descritos em mais detalhes nas próximas seções.

22.15 Produtos gerados pela fotogrametria digital


Os produtos que podem ser gerados pela fotogrametria digital são variados. Para a Engenharia existem, basicamente, três
produtos de interesse, que são:
• restituição fotogramétrica (mapa de linhas);
• criação de malha de pontos para a geração de modelos digitais de terreno ou de superfícies;
• a ortofoto (e o mosaico de ortofotos).
Todos eles se baseiam no princípio fundamental da medição das coordenadas de pontos homólogos por meio do modelo
estereoscópico, ou seja, por meio do uso da marca flutuante, descrita na Seção 22.7 – Marca flutuante e paralaxe. Apresentam-se
a seguir os detalhes técnicos de cada um deles.

22.15.1 Restituição fotogramétrica – mapa de linhas


Dá-se o nome de restituição fotogramétrica, em fotogra-
metria, ao processo de elaboração de mapas de linhas,
em planimetria, por intermédio da vetorização de ele-
mentos geográficos de interesse, representados em um
modelo estereoscópico fotogramétrico. O resultado
desse processo é um mapa vetorial com representação
planimétrica ou planialtimétrica dos dados geoespa-
ciais, conforme ilustrado na Figura 22.36. A Figura
22.36a exibe a imagem aérea digital do local e a imagem
22.36b exibe o mapa de linhas gerado pela vetorização
dos elementos geográficos representados na imagem.
Como vetorização, o leitor deve entender como o pro-
cesso de transformação de um objeto representado em
uma imagem no formato raster (imagem digital) para um
objeto representado no formato vetor, formados por pon-
tos, linhas e curvas no espaço.
O tipo de dado geoespacial a ser extraído depende do
objetivo para o qual o mapa de linhas está sendo gera-
do. O que se obtém, em qualquer caso, é um mapa com
elementos geométricos, em escala, representados em
diversas camadas (layers), que podem ser manipuladas
pelo usuário. Além disso, por ser um modelo vetorial,
não há escala fixa, podendo ser aumentado ou reduzido
em escala, segundo as necessidades do usuário.
A restituição fotogramétrica é um processo manual,
que exige experiência do operador. Fundamentalmen- Figura 22.36 • Exemplo de um mapa vetorial obtido por meio da resti-
te, se trata de um trabalho de posicionamento da marca tuição fotogramétrica.
flutuante sobre cada vértice de cada objeto a ser veto-
rizado, no modelo estereoscópico, conectando-os por
Aerofotogrametria e-115

meio de linhas, polilinhas e outros. Para que isso seja possível, os programas fotogramétricos dispõem de um aplicativo CAD
integrado, que permite realizar as funções de vetorização desejadas. O elemento geométrico primário plotado no espaço do
desenho CAD é o ponto com coordenadas (X, Y, Z) definidas pela marca flutuante. O desenho das figuras geométricas é rea-
lizado pelas funções CAD disponíveis no aplicativo.
Outro tipo de restituição fotogramétrica de destaque em fotogrametria é a geração de curvas de nível por meio do modelo es-
tereoscópico. Embora cada vez mais esse processo seja realizado por meio de modelos numéricos de terreno, o desenho delas di-
retamente sobre o modelo estereoscópico ainda tem
sido usado com certa regularidade nos projetos de
mapeamentos digital. O procedimento de geração
das curvas de nível, neste caso, se baseia no posicio-
namento da marca flutuante na altitude desejada,
700 metros, por exemplo, e no deslocamento dessa
marca sobre a superfície do terreno, representada
no modelo estereoscópico, mantendo a altitude da
marca fixa durante o deslocamento. Conforme o
operador desloca a marca flutuante sobre o modelo,
o programa fotogramétrico cria pontos em interva-
los predeterminados e o aplicativo CAD desenha Figura 22.37 • Exemplo de curvas de nível desenhadas manualmente sobre o
uma polilinha conectando-os de modo a gerar uma modelo estereoscópico.
curva de nível, conforme ilustrado na Figura 22.37.

22.15.2 Criação de malha de pontos


A criação de malha de pontos é uma aplicação da fotogrametria que ganhou destaque com o avanço dos métodos de correla-
ção de imagens. O objetivo, nesse caso, é definir uma nuvem de pontos 3D distribuídos sobre o terreno e sobre os objetos arti-
ficiais representados no modelo estereoscópico, com coordenadas (X, Y, Z) determinadas por meio de métodos de correlação
de imagens. O espaçamento dos pontos da malha é determinado pelo operador e, dependendo desse espaçamento, ela pode
conter milhões de pontos de coordenadas conhecidas. A malha assim criada é usada, na maioria dos casos, como dados de en-
trada para a geração de modelos numéricos
de terreno ou de superfície, conforme apre-
sentado no Capítulo 18 – Modelo numérico
de terreno. O uso do modelo numérico de-
pende da aplicação para o qual ele foi confi-
gurado. Neste contexto, o desenvolvimento
de modelos numéricos de superfície, ou re-
sumidamente modelos 3D, vem ganhando
destaque pela quantidade de aplicativos de
computador que estão sendo desenvolvidos
para o uso desses modelos em diversas áreas
da Engenharia.
A Figura 22.38 ilustra um exemplo de
modelo 3D gerado por meio de correlação
de imagens. Notar que se trata de uma ima-
gem híbrida, em que se visualiza uma parte
da imagem original e uma parte da malha
com pontos triangulados para facilidade de Figura 22.38 • Ilustração de modelos 3D gerado por meio da malha de pontos de cor-
visualização. Cada vértice dos triângulos relação de imagens.
corresponde a um ponto da malha, deter- Disponível em: https://news.cision.com/saab/i/3d-model-and-polygon-mesh,c86571.
minado por correlação de imagens. Acesso em: 20 jan. 2021.

22.15.3 Ortofoto
Uma ortofoto é uma imagem digital representada em projeção ortogonal, semelhante a um mapa convencional, ou seja,
ela possui as características geométricas de um mapa e as qualidades gráficas de uma foto. Isso significa que em uma
ortofoto as distâncias, áreas e ângulos medidos correspondem aos seus valores no terreno, corrigidos pela escala e pelas
distorções relativas a projeção cartográfica, se for o caso. Para que isso seja possível, ela deve passar por um processamento
e-116 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

fotogramétrico, denominado ortorretificação, por intermédio


do qual são removidas as distorções das imagens em conse-
quência de variações do relevo do terreno e da inclinação da
tomada de imagens, entre outros associadas à aquisição de
uma imagem fotográfica.
Os deslocamentos em razão da orientação da câmera aérea
e os associados à aquisição da imagem são removidos durante
o processo de aerotriangulação e pela calibração do sensor. Os
deslocamentos resultantes da variação do relevo do terreno são
removidos pelo uso de um modelo numérico de terreno no
processo de ortorretificação.
Existem diversos modelos matemáticos que podem ser
usados para a ortorretificação. Entre eles, pode-se citar aque-
les baseados em transformações polinomiais, em elementos
finitos e nas equações de colinearidade. Os especialistas con-
sideram que o modelo matemático baseado nas equações de
colinearidade é o que produz melhores resultados. O proces-
so de ortorretificação, neste caso, é realizado segundo o fluxo Figura 22.39 • Fluxo operacional para a geração de uma ortofoto.
operacional ilustrado na Figura 22.39. Para tanto, é necessá-
rio ter disponíveis uma imagem orientada e um modelo nu-
mérico do terreno da região a ser ortorretificada, ambos no
mesmo sistema de coordenadas.
O fluxo operacional consiste em atribuir o valor do tom de cinza da imagem orientada ao pixel correspondente do modelo
numérico do terreno para, em seguida, constituir uma nova imagem retificada.
O procedimento detalhado é o seguinte:
• define-se, inicialmente, o tamanho do pixel desejado para a imagem ortorretificada;
• define-se a região do espaço objeto que será ortorretificada, área esta que deve ser comum à imagem que será ortorreti-
ficada e o modelo numérico do terreno disponível;
• com base nas coordenadas (X, Y, Z) do primeiro pixel, obtidas por meio do modelo numérico do terreno, se determinam
as coordenadas (x, y) do ponto correspondente na imagem, por meio das equações de colinearidade [ver Seção 22.9.1 –
Equações projetivas (equações de colinearidade)];
• na maioria dos casos, as coordenadas (x, y), determinadas sobre a imagem, não correspondem exatamente à posição de
um pixel da imagem. Assim, é preciso interpolar os valores dos tons de cinza de seus vizinhos para determinar o valor do
tom de cinza a ser atribuído ao pixel da imagem ortorretificada. Essa interpolação é realizada por meio de um processo
de tratamento de imagem digital, denominado reamostragem. Existem vários métodos de reamostragem que podem ser
usados para a geração de ortofotos. Entre eles, se destacam: vizinho mais próximo, interpolação bilinear e convolução
cúbica. Não faz parte do escopo deste livro discutir estes métodos de reamostragem. Recomenda-se aos leitores interes-
sados consultarem literatura especializada;
• uma vez determinado o valor do tom de cinza a ser atri-
buído ao pixel da imagem retificada, ele é inserido na po-
sição (X, Y) do referido pixel.
Pelo fato de as ortofotos serem geradas, geralmente, com o
uso de um modelo numérico de terreno, os objetos que não fa-
zem parte do terreno, como edifícios, viadutos e outros, não são
ortorretificados e aparecem inclinados na imagem, como ilus-
trado na Figura 22.40. Notar a presença das laterais dos edifícios
na ortofoto da figura. Isso significa que os objetos são represen-
tados na imagem com as suas partes superiores deslocadas com
relação às inferiores, o que torna impraticável a sobreposição dos
vetores restituídos do modelo estereoscópico (mapa digital) so-
bre a ortofoto. A chave para a solução deste problema é o uso de
um modelo numérico de superfície (MNS) no lugar do mo-
delo numérico do terreno (MNT) na geração da ortofoto. Assim, Figura 22.40 • Ortofoto convencional.
como se têm também as coordenadas (X, Y, Z) dos objetos da Fonte: Nframes.
Aerofotogrametria e-117

imagem, eles podem ser ortorretificados de forma a minimiza-


rem os efeitos dos seus deslocamentos verticais. Tem-se, assim,
uma imagem ortorretificada, denominada ortofoto verdadeira
(true orthophoto). A Figura 22.41 mostra a ortofoto verdadeira
da mesma cena ilustrada na Figura 22.40.
O uso de ortofotos verdadeiras soluciona o problema da
inclinação dos objetos, porém, traz o problema do preenchi-
mento com imagem das áreas oclusas da imagem original. Es-
sas áreas correspondem àquelas que estavam recobertas pela
parcela inclinada dos objetos, as quais se tornam visíveis com a
ortorretificação do objeto. Este problema é solucionado desde
que se tenham outras imagens que mostrem vistas das áreas
oclusas. Ver exemplo de ortofoto verdadeira na Figura 22.42.
Outra ocorrência importante a ser considerada é o fato de
a modelagem numérica de superfície raríssimas vezes mode-
lar exatamente as arestas dos objetos, o que faz com que as
suas imagens ortorretificadas apareçam distorcidas ou com Figura 22.41 • Ortofoto verdadeira.
pouca nitidez. Fonte: Nframes.

Figura 22.42 • Exemplo de ortofoto verdadeira com reconstituição da área recoberta pela imagem do edifício inclinado
da imagem original (à esquerda). Fonte: Fugro Earthdata.

Com relação às aplicações das ortofotos em Engenharia, deve-se considerar que, pelo fato de elas poderem ser consideradas
geometricamente equivalentes a um mapa, elas podem ser utilizadas para as mesmas finalidades, com a vantagem de serem
mais detalhadas. Além disso, se necessário, elas podem ser complementadas com sobreposição dos elementos geométricos da
restituição fotogramétrica, conforme ilustrado na Figura 22.43.

Figura 22.43 • Exemplo de ortofoto com sobreposição de mapa digital.


e-118 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Por fim, uma ortofoto é mais barata de ser produzida, é mais fácil de ser atualizada do que um mapa digital e pode ser
utilizada por usuários não técnicos.
Em casos de grandes áreas de projeto, as ortofotos individuais consecutivas são conectas entre si formando um bloco de
imagens ortorretificadas, ao que se denomina mosaico de ortofotos.

22.16 Coleta de dados por meio de sistemas VANT


Como visto ao longo deste capítulo, os recursos da fotogrametria digital simplificaram enormemente o processamento de
dados digitais, reduzindo os custos e abrindo um horizonte infinito de aplicações para a fotogrametria. Novos usuários foram
cooptados pelo simples poder da era digital e da facilidade de gerar geoinformações usando recursos computacionais auto-
matizados de processamento de imagens. Ao mesmo tempo, com o aparecimento dos veículos aéreos não tripulados (VANT),
com possibilidades de acoplamento de sensores miniaturizados, abriu-se um novo horizonte para a fotogrametria, facilitando
a coleta de dados geoespaciais em locais antes inatingíveis pela aerofotogrametria convencional, ampliando, assim, o emprego
da fotogrametria para os projetos de Engenharia de pequeno porte.
O uso de aeronaves não tripuladas possui uma longa história em aplicações militares e vêm sendo utilizadas nessa área,
com sucesso, há várias décadas. O seu uso civil, contudo, é recente, principalmente na área de mapeamentos topográficos, que
teve o seu início mais intenso a partir dos anos 2000 e se expandiu rapidamente em virtude da interferência de profissionais
das áreas da visão computacional e do tratamento digital de imagens. A inclusão de tais profissionais ampliou o nível de au-
tomatização dos processos fotogramétricos e facilitou o seu uso por profissionais que até então desconheciam ou não tinham
acesso às técnicas fotogramétricas.
Como se verá nas próximas seções, a inclusão de novos profissionais no desenvolvimento de recursos fotogramétricos
por meio da plataforma de aquisição de dados por meio de VANT estabeleceu uma tecnologia de hardware e um fluxo
operacional de coleta e tratamento de dados fotogramétricos, que determinaram uma subdivisão da aerofotogrametria em
aerofotogrametria convencional e aerofotogrametria por meio de VANT. A plataforma de coleta de dados, neste caso, é
composta de vários aparelhos e sensores, que incluem a aeronave não tripulada e seus elementos de controle de voo e de
coleta de dados fotogramétricos. A esse conjunto de aparelhos e sensores, se denominará, neste livro, Sistema VANT. É
importante que o leitor entenda que o uso de aeronaves não tripulada como plataforma de coleta de dados fotogramétricos
não constitui uma nova fotogrametria. As bases teóricas e os conceitos matemáticos e operacionais básicos da fotograme-
tria continuam os mesmos.
Existem, contudo, algumas especificidades técnicas inerentes à fotogrametria por meio de VANT, que facilitam o seu uso
em aplicações muitas vezes dificultosas para a fotogrametria convencional, tais como:
• mapeamento e coleta de dados geográficos seletivos em corredores (rodovias, ferrovias, gasodutos, canais, linhas de
transmissão e outros elementos de infraestrutura) de pequeno porte;
• mapeamentos de áreas para geração de energia, como inspeção de plantas geradoras de energia elétrica, energia eólica,
painéis solares e outros;
• agricultura de precisão;
• estudos ambientais localizados;
• monitoramento de desastres naturais;
• inspeção e monitoramento de obras;
• apoio na exploração de minérios e cálculo de volumes;
• mapeamento topográfico e cadastral de pequenas áreas;
• coleta de dados para atualização de Sistemas de Informação Geográfica;
• fotogrametria forense;
• fotogrametria arquitetural e arqueológica.
Nesse sentido, as próximas seções têm como objetivo descrever, brevemente, os principais componentes de uma plataforma
de aquisição de dados fotogramétricos por meio de VANT e discutir as questões relevantes da aquisição e do processamento
de dados, que interferem na qualidade dos produtos fotogramétricos gerados por essa tecnologia tendo em vista a sua aplica-
ção em Geomática.

22.16.1 Definição de sistema VANT


Para os propósitos deste livro, define-se Sistema VANT como o conjunto de dispositivos mecânicos e eletrônicos conectados
com o objetivo de realizar voos e coletar dados por meio de veículos aéreos não tripulados com capacidade para transportar
diferentes tipos de carga, que variam em função do tipo, funcionalidade, características operacionais e objetivo da missão.
Por se tratar de um sistema, ele é composto por vários subsistemas, em que a aeronave é apenas um deles. Assim, para não
confundir a aeronave com o sistema, têm-se empregado, internacionalmente, as seguintes denominações:
Aerofotogrametria e-119

• UAV (Unmanned Aerial Vehicles) – veículo;


• UAS (Unmanned Aircraft Systems) – sistema;
• RPA (Remotely Piloted Aircraft) – veículo;
• RPAS (Remotely Piloted Aircraft Systems) – sistema.
É também de uso corrente o termo drone em substituição ao termo veículo aéreo não tripulado (VANT). Alguns autores,
contudo, consideram drone como um termo genérico para indicar um veículo aéreo não tripulado de recreação, enquanto
VANT seria um veículo aéreo não tripulado com inteligência embarcada para realizar missões programadas. A Agência Na-
cional de Aviação Civil (ANAC), assim como outros organismos internacionais, tem utilizado os termos RPA e RPAS.
A Figura 22.44 ilustra a composição operacional de um sistema VANT para uso em Geomática. Conforme ilustrado na
figura, os principais componentes desse sistema para uso em Geomática são: o veículo aéreo, os dispositivos embarcados para
navegação e os dispositivos para o georreferenciamento da aeronave, as estações GNSS para a correção diferencial, os sensores
de coleta de dados fotogramétricos, os sistemas de comunicação e o dispositivo terrestre para o controle do voo, também
denominado estação de controle terrestre (GCS, do inglês ground control station).
Apresentam-se a seguir os detalhes técnicos mais importantes de cada um dos componentes do sistema VANT citados.

Figura 22.44 • Composição operacional de um sistema VANT.

22.16.2 Classificação dos veículos aéreos não tripulados


Os veículos aéreos não tripulados podem ser clas-
sificados segundo diferentes aspectos relaciona-
dos com seus componentes físicos, alturas de voo,
peso máximo de decolagem e outros. Pelo fato de
não haver ainda uma classificação oficial aceita
por todos os órgãos internacionais, neste livro,
propõe-se categorizá-los segundo o tipo de asa, a
altura de voo e o peso máximo de decolagem, con-
forme apresentado a seguir.

22.16.2.1 Tipo de asa


Com relação ao tipo de asa, as aeronaves dos sis-
temas VANT podem ser classificadas conforme
apresentado na Figura 22.45.
De modo geral, a maioria dos VANT utilizados
em Geomática possuem características aerodinâ-
micas tanto de asa fixa como de asa rotativa. Eles
são construídos com materiais leves, como o po-
lipropileno expandido (EPP) para os de asa fixa, e Figura 22.45 • Classificação dos sistemas VANT em função do tipo de asa da
em fibra de carbono para os de asa rotatória. aeronave.
e-120 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

22.16.2.2 Altura de voo


Tabela 22.3 • Classificação de VANT em função da altura de voo e do peso
Em função da altura de voo, as aeronaves dos sistemas VANT
máximo de decolagem segundo a ANAC
podem ser classificadas como de baixa altitude e de grande al-
titude. Os de baixa altitude são aqueles autorizados a voarem Classe Altura de voo Peso máximo de decolagem
abaixo do tráfego aéreo, em alturas que variam entre 150 a 200 1 Acima de 250 m Maior que 150 kg
metros acima do solo e, em geral, apenas sob condições visuais 2 Entre 150 e 250 m Entre 25 e 150 kg
do operador (ver Tab. 22.3). Para aplicações em Geomática, em
3 Abaixo de 150 m Até 25 kg
geral, se utilizam altura de voo inferiores a 200 metros.

22.16.2.3 Classificação em função do peso máximo de decolagem


A classificação em função do peso máximo de decolagem da aeronave é uma métrica importante para classificar os sistemas
VANT pelo fato de ela impactar a quantidade de energia cinemática necessária para a aeronave levantar voo, que pode ser con-
siderado um fator primário de segurança aérea. No caso brasileiro, a ANAC em seu regulamento RBA-C no 94 (ANAC, 2017)
classifica os VANT em três categorias, segundo o peso máximo de decolagem. Na classe 1, estão incluídos os veículos com
peso máximo de decolagem maior que 150 kg; na Classe 2, os veículos com peso máximo de decolagem que varia de
25 a 150 kg; e na Classe 3, aqueles com peso máximo de decolagem menor ou igual a 25 kg. Para as aplicações em Geomática,
em geral, se utilizam aeronaves classificadas como Classe 3 (ver Tab. 22.3).
Alguns órgãos de regulamentação também classificam os VANT com relação à autonomia de voo. Para os propósitos da
Geomática, entretanto, essa classificação é de pouco interesse e não será tratada neste livro.

22.16.3 Dispositivos para orientação do voo e posicionamento da aeronave


Para que a aeronave possa se orientar e indicar para a estação de controle a sua posição, ela precisa de um sistema de nave-
gação que, ademais de outros sensores, combina um módulo GNSS e um sistema inercial. Para a navegação, esses elemen-
tos não precisam ser de alta performance e são perfeitamente adequados para os casos de orientação indireta dos modelos
fotogramétricos por meio de pontos de controle. Já para a orientação direta por meio de georreferenciamento GNSS e
sistema inercial (IMU), se utilizam módulos GNSS e IMU com qualidade de georreferenciamento da ordem do centímetro,
o que somente pode ser obtido por meio de dispositivos de alto rendimento. Nesses casos, dependendo da qualidade dese-
jada para o levantamento, o georreferenciamento GNSS deve ser realizado em modo diferencial RTK ou PPK e o módulo
IMU deve garantir alta taxa de processamento dos sinais (da ordem de 200 Hz) e qualidade de deriva inferior a 6°/hora.
Notar que, embora sejam compostos basicamente dos mesmos tipos de componentes, o sistema de navegação e o sistema
de georreferenciamento são independentes.

22.16.4 Estação GNSS


Para o posicionamento da aeronave no modo diferencial RTK ou PPK, é necessário haver pelo menos uma estação de refe-
rência emitindo as correções diferenciais ou armazenando dados brutos de rastreamento. Elas podem ser estações terrestres
instaladas pelo usuário ou pertencentes a uma rede de estações SBAS,18 e outros. Nos casos de posicionamento RTK ou SBAS,
elas necessitam de um sistema de comunicação embarcado que permita receber as correções diferenciais.

22.16.5 Dispositivos de coleta de dados


Para as aplicações em Geomática, os dispositivos de coleta de dados fotogramétricos comumente utilizados em um sistema
VANT são as câmeras digitais, o módulo GNSS, o sensor inercial (IMU) e os sensores de varredura laser de pequeno formato,
conforme descritos na sequência.

22.16.5.1 Câmera fotográfica digital


As câmeras fotográficas digitais utilizadas, atualmente, em um sistema VANT
para aplicações em Geomática são de pequeno formato, podendo ser métricas ou
não métricas, pesam menos de 500 gramas, possuem resolução geométrica que
podem chegar a 40 MP (pixel 4 µm e GSD variando de 1 cm a 10 cm em função
da altitude do voo) e resolução radiométrica nas bandas espectrais RGB, multies-
pectrais e termais.
Embora a tecnologia de produção de câmeras fotográficas digitais para sistemas
VANT avance rapidamente, apresenta-se na Figura 22.46 um exemplo de câmera
fotográfica digital disponível no mercado atualmente. Figura 22.46 • Câmera fotográfica digital
RGB para sistema VANT.
18 Consultar o Capítulo 20 – Sistemas de navegação global (GNSS). Cortesia de PHASEONE Industrial.
Aerofotogrametria e-121

22.16.5.2 Módulo GNSS e sistema inercial (IMU)


Os chips dos receptores da tecnologia GNSS utilizados nos sistemas VANT são mó-
dulos de processamento GNSS miniaturizados. Eles podem ser de uma frequência
(L1) ou de dupla frequência (L1/L2). Além disso, podem coletar dados para opera-
ções em modo cinemático pós-processado ou em modo diferencial RTK.
Os sistemas inerciais (IMU) utilizados nos sistemas VANT são munidos de ace-
lerômetros, giroscópios, magnetômetros e barômetros. Eles são construídos ba-
seando-se na tecnologia dos sistemas micro eletromecânicos (MEMS), o que os
tornam leves e adequados para uso nos sistemas VANT. A Figura 22.47 mostra um
exemplo de uma placa eletrônica com módulo GNSS e módulo IMU instalados. Em
geral, eles são acoplados diretamente no corpo da câmera fotográfica digital ou no Figura 22.47 • Placa eletrônica com mó-
corpo do sensor de varredura laser, de forma a facilitar a sua calibração. dulo GNSS e sensores IMU. Fonte: Trimble.

22.16.5.3 Sensores de varredura laser


Os sensores de varredura laser aéreo passaram, nos últimos anos, por
um processo tecnológico que reduziu suas dimensões e peso, possibi-
litando seu uso em plataformas VANT. As características dos sensores
desse tipo variam sensivelmente entre os fabricantes e os avanços tec-
nológicos são enormes, tornando difícil uma categorização atualizada.
Assim, para situar o leitor no estado da arte, como exemplo apresen-
tam-se a seguir algumas características importantes do sensor apresen-
tado na Figura 22.48.
• Peso: 1,9 kg; dimensão: 25 × 13,1 × 10,2 cm.
Figura 22.48 • Sensor de varredura laser para sistemas
• Taxa de emissão de pulsos:19 1.200.000 pontos/s.
VANT. Fonte: 3D-Scanfly.
• Alcance: 200 m; precisão posicional: 4 cm.

22.16.5.4 Componentes diversos


Além dos sensores e módulos apresentados, os sistemas
VANT podem também conter vários outros componentes
embarcados, como servomotores, sensor de velocidade, pa-
raquedas (como dispositivo de segurança) e outros.
A Figura 22.49 mostra um exemplo de um VANT com
todos os dispositivos de coleta de dados fotogramétricos
acoplados. Notar em destaque o sensor de varredura laser e
a câmera fotográfica digital.

Figura 22.49 • Exemplo de VANT com dispositivos de coleta de dados


fotogramétricos acoplados.
22.16.6 Sistema de comunicação
O sistema de comunicação e o monitoramento do voo de um VANT são do tipo semiautônomo. Eles são realizados por inter-
médio de um link de rádio entre a estação terrestre e o piloto automático do veículo, geralmente na faixa do UHF, micro-ondas
(5 GHz) ou wi-fi de longo alcance. A estação terrestre, composta de um rádio controle, monitora o veículo por telemetria e
permite a intervenção do operador a qualquer momento. A unidade de piloto automático é formada por um processador
conectado a todos os dispositivos e componentes do VANT, com a função de executar o plano de voo e monitorar o estado da
aeronave. Alguns pilotos automáticos possibilitam o retorno da aeronave ao ponto de decolagem, automaticamente, no caso
de pane com o sistema de controle.
O rádio controle deve usar faixa de frequência própria, regulamentada pela Agência Nacional de Telecomunicações
(Anatel). O link de rádio permite que as informações, como velocidade com relação ao solo, velocidade estimada do vento,
direção e altitude do voo e nível de carga de bateria, sejam transmitidas em tempo real para a estação terrestre. Com essas
informações, o piloto controla a aeronave e interrompe o voo, sempre que necessário.
19 Alguns autores utilizam o termo taxa de varredura.
e-122 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

22.16.7 Estação de controle terrestre


A estação de controle terrestre (GCS) de um sistema VANT se localiza, na maioria das vezes, em solo,20 próxima à área de voo.
Para os propósitos da Geomática, ela pode ser simplesmente um centro de controle local baseado em um computador do tipo
notebook, por meio do qual a missão de voo é programada e executada. A sua função é controlar o status do voo e enviar e
receber comandos da aeronave para garantir que a missão seja realizada conforme planejada. Para outros tipos de aplicações
e missões especiais diferentes daquelas realizadas para a coleta de dados geoespaciais topográficos, as estações de controle
terrestre podem ser mais elaboradas e possuir recursos mais avançados, os quais estão além dos objetivos deste livro. É impor-
tante ressaltar o crescente desenvolvimento de softwares para aplicativos do tipo mobile e sistemas operacionais próprios, que
evitam o uso de notebooks em campo.

22.17 Classificação dos sistemas VANT segundo a aplicação em Geomática


Para os propósitos da Geomática, os sistemas VANT podem ser classificados de acordo com o tipo de aplicação, conforme
indicado a seguir:
• inspeção aérea da infraestrutura;
• sensoriamento remoto;
• fotogrametria.
Apresenta-se a seguir uma breve descrição de cada uma delas.

22.17.1 Sistema VANT para inspeção aérea da infraestrutura


Os sistemas VANT para reconhecimento e inspeção aérea são aqueles utilizados, primordialmente, para a captura de
imagens (ou vídeos) com a finalidade de verificação remota de algum evento relacionado com a manutenção da infraes-
trutura de obras de Engenharia. Eles são empregados, na maioria das vezes, para as operações de inspeção em locais de
difícil acesso, nos quais o uso de um VANT é vantajoso. Os exemplos deste tipo de aplicação são inúmeros, destacan-
do-se as inspeções em pontes e viadutos, torres de alta tensão e eólicas, oleodutos, gasodutos, áreas de mineração a céu
aberto, barragens e outros.

22.17.2 Sistema VANT para sensoriamento remoto


Os sistemas VANT para sensoriamento remoto são aqueles utilizados, primordialmente, para a captura de imagens com o
objetivo de estudos relacionados com a semântica e as condições físicas dos objetos imageados. São exemplos clássicos desta
aplicação o uso de sistemas VANT para áreas tão diversas, como a arqueológica, a agricultura, a Engenharia Florestal, o tráfego
rodoviário e muitos outros.

22.17.3 Sistema VANT para fotogrametria


Os sistemas VANT para uso em fotogrametria são aqueles utilizados para a coleta de parâmetros e imagens fotogramé-
tricas ou nuvens de pontos de varredura laser para a geração de produtos fotogramétricos, conforme descritos na Seção
22.15 – Produtos gerados pela fotogrametria digital e na Seção 21.4 – Vetorização e modelagem espacial. Os tipos e as ca-
racterísticas dos produtos fotogramétricos e da nuvem de pontos são os mesmos da aerofotogrametria convencional e da
varredura laser aérea. O que as diferem, na maioria das vezes, são as dimensões, o nível de detalhamento e as condições
do levantamento.

22.18 Processamento de dados com a tecnologia VANT


Conforme já citado, o processamento dos dados coletados com os veículos VANT compreende etapas similares a de um proje-
to aerofotogramétrico convencional, quais sejam: licenças para voar, planejamento do voo, implantação de pontos de controle,
captura das imagens, importação das imagens, processamento do bloco aerofotogramétrico, análise de qualidade e geração de
produtos. A Figura 22.50 ilustra o fluxo operacional dessas etapas.
É importante ressaltar que, pelo fato de vários programas de processamento específicos da tecnologia VANT serem de-
senvolvidos por profissionais de áreas diferentes da fotogrametria convencional, alguns termos utilizados nesses programas
podem diferir dos comumente utilizados pelos fotogrametristas.

20 O solo, neste caso, deve ser entendido como o terreno ou qualquer outro tipo de plataforma controlável próxima a ele.
Aerofotogrametria e-123

Apresentam-se a seguir alguns detalhes relevantes de cada uma das etapas do fluxo operacional indicadas na Figura 22.50.

Figura 22.50 • Fluxo operacional para a coleta e o processamento de dados com a tecnologia VANT.

22.18.1 Requerimentos legais e de segurança


Para realizar uma missão de voo com um VANT é necessário seguir procedimentos legais e de segurança, determinados por
órgão governamentais de cada país. Os procedimentos são variados e vêm sendo adaptados para garantirem o uso seguro
da tecnologia. No Brasil, as instruções legais que definem as diversas condições para as autorizações de voos e sua execução,
incluindo a visibilidade do veículo pelo operador e as condições de telemetria entre veículo e o operador, estão definidas por
DECEA (2015) e pela ANAC (2017). É importante ressaltar que toda aeronave VANT e seu piloto devem estar cadastrados
no DECEA e cada missão de voo precisa ser registrada por meio do sistema SARPAS daquele órgão para fins de obtenção da
licença de voo para a realização dos trabalhos de campo.

22.18.2 Planejamento do voo


Os programas de planejamento de voo fotogramétricos utilizados nos sistemas VANT são, em geral, fornecidos juntamente
com a aeronave adquirida, uma vez que devem ser totalmente compatíveis com as características do veículo e dos sensores
embarcados. Em geral, o plano de voo pode ser feito sobre a base de dados disponibilizada pelo Google Earth®, sobre a qual
é definido a trajetória da aeronave por meio de waypoints, faixas de voo, velocidade, alturas de voo, sobreposições entre as
imagens e dimensão do GSD dentre outros parâmetros de voo.
Na etapa de planejamento do voo fotogramétrico é importante observar questões de logística, condições do tempo e fina-
lidade do levantamento. No mínimo, é necessário definir os seguintes pontos:

• prever redundância, com altas taxas de sobreposição entre as imagens, por exemplo, longitudinal de 80 % e entre faixas
de 60 a 70 %, e voos cruzados;
• para terrenos planos pode-se realizar voos com padrão regular (80 % longitudinal e 60 % lateral) com apenas uma altura
de voo, desde que se tenha pontos de controle, sistema de controle de voo de boa qualidade e câmera com parâmetros de
orientação interna conhecidos;
• para terrenos acidentados ou áreas urbanas, recomenda-se realizar voos cruzados em diferentes altitudes. Atenção espe-
cial deve ser dada para garantir a uniformidade do GSD. Alguns programas de planejamento de voo permitem utilizar
modelos numéricos de superfície para auxílio de voo;
• para voos em corredores, recomenda-se realizar, no mínimo, três a quatro faixas de voo ao longo do corredor, com pon-
tos de controle distribuídos ao longo das faixas para evitar deformações elevadas do modelo e garantir qualidade nos
casos de autocalibração da câmera;
• para o desenvolvimento de modelos 3D, o voo com ângulo oblíquo de até 45° em padrão cruzado ajuda a superar os
efeitos de sombreamento;
• no caso de modelos 3D com fachadas, recomenda-se adicionar imagens perpendiculares ao objeto;
e-124 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

• em todos os casos, a velocidade do vento deve ser inferior a 12 m/s. Como diretriz geral, para ventos com velocidade
inferior a 6 m/s, pode-se voar tanto na direção do vento como transversal a ela. Para ventos com velocidade entre 7 e
12 m/s, recomenda-se voar na direção perpendicular ao vento;
• definir adequadamente as áreas de pouso e decolagem;
• em geral, se trabalha com GSD variando entre 1 e 30 cm e altura de voo entre 50 e 800 metros. Para voos acima de 120
metros, em geral, se exige autorizações especiais dos órgãos reguladores;
• voos baixos sobre áreas com árvores ou prédios altos, ou com grande variação de altura, são difíceis de processar. Uma
regra da aerofotogrametria convencional que pode ser aplicada é que as alturas dos objetos tenham no máximo 20 % da
altura do voo;
• garantir duração do voo conforme autonomia do veículo. Com a tecnologia atual, entre 20 e 50 minutos.

22.18.3 Pontos de controle


Dependendo do tipo de georreferenciamento do voo, pode haver a necessidade da implantação de pontos de controle, con-
forme apresentado na Seção 22.10.1 – Determinação indireta dos parâmetros de orientação por meio de pontos de controle. Os
tipos de pontos de controle, a quantidade, os métodos de medição e a sua distribuição devem seguir as mesmas prerrogativas
indicadas para os pontos de controle da fotogrametria convencional. No caso dos sistemas VANT, contudo, pode haver situa-
ções em que os pontos de controle devem ser implantados de maneira totalmente não convencional para atender a propósitos
específicos do levantamento aerofotogramétrico. O leitor deve tomar cuidados especiais a este tema, uma vez que a qualidade
do ponto de controle, na maioria das vezes, determinará a qualidade dos resultados obtidos com o voo fotogramétrico.

22.18.4 Aquisição das imagens


Conforme já descrito, as imagens nos sistemas VANT são obtidas com câmeras fotográficas digitais de pequeno formato, as
quais, em muitos casos, podem ser não métricas. Por esta razão, as imagens adquiridas podem conter distorções, estar borra-
das pelo efeito do arrastro e pela aberração cromática das lentes e pela baixa qualidade do registro radiométrico. Recomenda-
se, por isto, muita atenção ao tipo de câmera adquirida e realizar calibrações regulares antes da execução de cada voo.
A resolução geométrica mínima deve ser igual a 6 MP, sendo recomendado 10 a 20 MP, com pixel com dimensões da ordem
de 5 µm. A distância focal (f) da câmera deve, preferencialmente, ser fixa, variando entre 18 e 80 mm. Notar que quanto maior
o valor de (f), maior a quantidade de imagens para cobrir uma mesma área.
A maioria dos programas opera com imagens no formato JPEG, outros recomendam usar imagens RAW (porque tem
maior intervalo dinâmico de contraste) e convertê-las para TIF. Lembrar que há sempre o perigo de perda de qualidade nos
processos de compactação de imagens
Para o caso específico de mapeamento topográfico, recomenda-se que as imagens sejam verticais ou quase verticais, pos-
suam todas as mesmas dimensões, por exemplo, 4.000 × 3.000 pixels, e que o voo seja realizado em faixas semelhantes às da
aerofotogrametria convencional, ou seja, em linhas paralelas e em sequência.
A grande diferença na captura das imagens com os sistemas VANT, com relação aos voos realizados para a captura de
imagens aéreas para a aerofotogrametria convencional, é que, no caso convencional, as imagens são obtidas em um ambien-
te comportado com imagens perpendiculares aos
objetos, com recobrimentos longitudinais e laterais
mínimos, blocos mais regulares e tratadas em es-
tações fotogramétricas de alto rendimento, desen-
volvidas por profissionais da área de fotogrametria.
As imagens obtidas por sistemas VANT podem
ser oblíquas e coletadas em diferentes alturas, con-
forme ilustrado na Figura 22.51. Além disso, elas
podem estar distribuídas irregularmente no espa-
ço, desde que garantam as sobreposições necessá-
rias. O tratamento das imagens, em geral, é realiza-
do em programas desenvolvidos por profissionais
da visão computacional e com pouca experiência Figura 22.51 • Captura de imagens oblíquas com sistemas VANT.
em mapeamento fotogramétrico.

22.18.5 Importação das imagens


Esta etapa consiste na importação para o computador de todas a imagens adquiridas durante o voo aerofotogramétrico para
fins de processamento por meio de programas de computador específicos. Cuidados especiais devem ser tomados com a ma-
nipulação dos arquivos importados para garantir o processamento adequado das imagens, uma vez que qualquer modificação
em sua estrutura pode gerar dificuldades no processamento.
Aerofotogrametria e-125

22.18.6 Processamento das imagens


Os blocos aerofotogramétricos gerados com os sistemas
VANT são semelhantes àqueles gerados pela aerofoto-
grametria convencional, conforme apresentado na Seção
22.11 – Aerotriangulação. A principal diferença, conforme
já citado, é que, em muitos casos, as imagens estão dis-
tribuídas espacialmente na posição oblíqua com relação
ao terreno ou aos objetos de medição. Tem-se, assim, um
bloco de imagens semelhante ao da fotogrametria conven-
cional, porém, distintamente distribuído no espaço, con-
forme ilustrado na Figura 22.52.
O seu processamento é realizado, na maioria dos ca-
sos, por modelos matemáticos baseados nas equações de
colinearidade, porém, modificadas para atender às espe-
cificidades da qualidade, da quantidade de imagens e da
geometria da coleta de dados. Os algoritmos matemáticos
adaptados a essa situação passaram a ser denominados al- Figura 22.52 • Bloco aerofotogramétrico típico de um levantamento
goritmos de Structure from Motion (SfM), desenvolvidos fotogramétrico com um sistema VANT.
na década de 1970. De forma semelhante aos modelos ma-
temáticos baseados diretamente nas equações de colinearidade da fotogrametria convencional, eles permitem determinar os
parâmetros internos da câmera (intrínsecos) por meio de uma autocalibração, e os parâmetros externos (extrínsecos) por um
ajustamento em bloco.
Embora semelhantes em seus princípios geométricos e analíticos, a diferença básica entre a técnica SfM e a fotogrametria
convencional é que a SfM realiza inicialmente a orientação relativa das câmeras para gerar o modelo 3D, filtra as irregulari-
dades do modelo para, em seguida, realizar o georreferenciamento do modelo por meio de pontos de controle e ajustamento
em bloco.
Os algoritmos de SfM possuem a qualidade de permitir que não especialistas sejam capazes de gerar nuvens de pontos de
coordenadas 3D por meio de imagens digitais, de maneira relativamente barata e com o uso de câmeras digitais não métricas.
Algumas das características importantes desses algoritmos são:
• podem ser usados com qualquer tipo de câmera digital comercial;
• estão implementados em programas aplicativos de baixo custo, alguns de acesso livre e altamente automatizados;
• exigem, contudo, alto grau de recobrimento entre as imagens;
• são fáceis de serem operados por usuários com pouco conhecimento em fotogrametria;
• porém, em geral, são implementados em forma de caixas-pretas e podem gerar soluções com baixa acurácia e repetibilidade;
• estão sujeitos a soluções duvidosas disponibilizadas em blogs e portais genéricos da Internet.

A autocalibração e o ajustamento do bloco de imagens dos algoritmos de SfM são realizados por meio do uso dos pontos
de controle e pela geração automática, por meio de algoritmos de correlação de imagens, dos pontos de ligação (tie points),
os quais são denominados nos programas de processamento da tecnologia VANT como keypoints. É importante considerar
que os métodos de correlação de imagens utilizados nos programas de processamento fotogramétrico por meio de VANT se
baseiam na existência de um recobrimento alto entre as imagens. Razão pela qual os resultados podem ser desastrosos se essa
condição não for atendida.
A quantidade de keypoints é determinada pelo programa aplicativo exigindo pouca interação do usuário. Mesmo assim,
recomenda-se verificar se a distribuição está coerente com as faixas de voo realizadas.
A quantidade de pontos de controle necessários para a aerotriangulação depende de vários fatores, entre os quais se
destacam:
• a configuração da área de voo: retangular, corredor ou objeto 3D;
• a qualidade da câmera: métrica ou não métrica;
• o tipo de relevo do terreno: plano, montanhoso, construído, outros;
• a textura da superfície: facilidade para a correlação de imagens.
De forma semelhante ao processamento da aerofotogrametria convencional, quando o projeto exigir a inclusão de pontos
de apoio (GCP), eles devem ser posicionados na zona de ligação entre as faixas e de modo que apareçam em pelo menos três
imagens. A configuração mínima é de quatro pontos nos cantos do bloco. Algumas empresas de produção de programas fotogra-
métricos, contudo, recomendam o mínimo de 10 pontos. De qualquer forma, os GCP devem garantir a acurácia em planimetria
e altimetria em todo o bloco e devem ser usados pontos de verificação para conferir se a acurácia desejada foi alcançada.
e-126 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Os sistemas VANT de alta qualidade são munidos de módulos GNSS e IMU com capacidade para realizarem o georreferen-
ciamento direto das imagens, conforme descrito na Seção 22.10.2 – Determinação direta dos parâmetros de orientação por meio
de georreferenciamento GNSS e sistema inercial (IMU). Nesse caso, da mesma forma que os módulos empregados nos sistemas
de georreferenciamento das câmeras de grande porte, eles precisam ser calibrados com relação aos off-sets da antena GNSS e
do IMU e com relação aos ângulos de boresight.

22.18.7 Qualidade posicional


A avaliação da qualidade posicional dos produtos gerados por meio de processos fotogramétricos por meio de VANT é difícil de
ser realizada em função dos múltiplos componentes do sistema. Igualmente ao caso da aerofotogrametria convencional, ela varia
em função do tipo de aeronave, da qualidade dos sensores embarcados (imagem, GNSS, IMU), da qualidade da autocalibração
da câmera, da qualidade posicional dos pontos de controle e dos keypoints, que são os pontos de ligação da fotogrametria conven-
cional. No estado atual da arte, as pesquisas indicam que a qualidade posicional alcançada pela fotogrametria por meio de VANT
para coleta de dados em Geomática é da ordem de 0,5 GSD, em planimetria, e 1,5 GSD em altimetria, em condições favoráveis,
uma vez que esses valores dependem da qualidade dos dispositivos embarcados. Estes valores, contudo, não devem ser tomados
como regra, uma vez que as tecnologias de coleta de dados e de processamento são variadas e têm avançado rapidamente. Notar
que estes níveis de precisão são relatados para a qualidade posicional dos pontos do modelo fotogramétrico e não são aplicáveis
para os produtos fotogramétricos gerados em função deles, que vão depender de outros fatores, como a qualidade da correlação
de imagens, a qualidade do método de interpolação utilizado na geração do modelo numérico de superfície, entre outros. As
pesquisas, neste caso, indicam precisões variando entre 0,5 e 2,5 GSD, em planimetria, e entre 2,5 e 4,0 GSD, em altimetria. Para
o caso de varredura laser, nos sistemas mais sofisticados têm-se alcançado precisões variando entre alguns centímetros e decíme-
tros, dependendo da qualidade dos sensores embarcados e da altura de voo.
É importante também enfatizar que, em face do alto grau de automatização do fluxo operacional, os usuários menos avi-
sados podem ser induzidos a acreditar que os resultados sempre serão positivos. Contudo, é observado na prática que o não
conhecimento sobre fotogrametria, ou a não obediência aos seus procedimentos básicos, tem levado a resultados incompatí-
veis com o uso adequado da tecnologia.

22.18.8 Geração de produtos


Os principais produtos gerados pelos programas aplicativos de fotogrametria por meio de VANT são os mesmos da foto-
grametria convencional, quais sejam, os parâmetros de orientação dos modelos fotogramétricos e a malha de pontos com
coordenadas 3D conhecidas. A malha de pontos é, em seguida, utilizada para a geração de modelos numéricos de superfície.
Alguns programas possuem algoritmos para a filtragem de elementos artificiais do terreno para a obtenção do modelo numé-
rico do terreno, conforme apresentado no Capítulo 18 – Modelo numérico de terreno. Os produtos que podem ser gerados em
função dos modelos numéricos de superfícies e de terreno são diversos e dependem dos aplicativos incluídos no programa de
processamento. Entre eles, pode-se citar a geração de modelos tridimensionais de objetos, traçado de curvas de nível, geração
de mapas de declividade, cálculos de volumes, perfilamentos do terreno, entre outros.
Em geral, os programas fotogramétricos da fotogrametria por meio de VANT não possuem funções de restituição foto-
gramétrica, mas podem fazer a exportação das informações das orientações dos modelos nos formatos dos programas mais
conhecidos de aerofotogrametria convencional, de modo que possam ser usadas nas estações fotogramétricas convencionais
para a extração de feições tridimensionais.
Outros produtos importantes gerados pela fotogrametria por meio de VANT são as ortofotos e os ortomosaicos. Nesses
casos, é importante avaliar corretamente o valor do GSD, que varia em função da resolução da imagem, da distância focal
da câmera e da altura do voo. A definição desse valor tem implicações nos detalhes que podem ser identificados na imagem
e depois no mapa final que será reproduzido em escala gráfica específica. No caso da geração de ortofotos, a American
Society of Photogrammetry and Remote Sensing (ASPRS) recomenda que o GSD da imagem bruta não exceda 95 % do GSD
final da ortoimagem. Isso significa que se pode ter um GSD bruto de 5 cm e gerar uma ortofoto com GSD de 10 cm, mas
não o oposto, evidentemente.
23 Curvas horizontais e verticais

23.1 introdução
Em Engenharia, muitos projetos são elabo-
rados tendo como base geométrica o deli-
neamento de linhas sobre o terreno, como
nos casos de projetos de vias de transpor-
te, arruamentos, túneis, canais, traçados de
gasodutos, oleodutos, linhas de alta tensão
e vários outros. As linhas, nestes casos,
com exceção das linhas de alta tensão, são
compostas por segmentos de retas e curvas
dispostas no espaço de forma a se acomo-
darem à superfície do terreno, conforme
ilustrado na Figura 23.1. Os elementos li-
neares encadeados, conforme indicado na Figura 23.1 • Exemplo da composição espacial de um projeto de Engenharia de con-
figura, determinam o traçado geométrico formação linear.
do projeto e, por consequência, a diretriz do
projeto, o qual é composto por trechos re-
tos, denominados tangentes e rampas, e por
trechos curvos, compostos por curvas hori-
zontais e curvas verticais.
Pelo fato de serem estruturas espaciais,
os projetos e as representações gráficas das
tangentes e das curvas horizontais são reali-
zados em planta, e das rampas e das curvas
verticais são realizados em perfil, conforme
ilustrado na Figura 23.2. Razão pela qual,
neste capítulo, o estudo das curvas utiliza-
das em Engenharia está dividido em curvas
horizontais e curvas verticais, como se verá
na sequência deste capítulo.
Ressalta-se, ainda, que este capítulo não
tem como objetivo discutir as aplicações
das curvas nos projetos de Engenharia.
Trata-se apenas do estudo de seus detalhes Figura 23.2 • Composição em planta e em perfil de um projeto com alinhamento
analíticos e geométricos com vistas às suas geométrico espacial.
e-128 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

aplicações em tais projetos. O leitor interessado em mais detalhes sobre a utilização das curvas em projetos de Engenharia
deverá consultar literatura especializada.
Dessa forma, apresentam-se, neste capítulo, os detalhes geométricos e as equações fundamentais dos três tipos de curvas
utilizados em projetos de Engenharia, que são:
• curvas horizontais circulares;
• curvas horizontais com transição;
• curvas verticais.

23.2 Curvas horizontais circulares


Uma curva horizontal, para a Engenharia, deve ser entendida como arcos de circunferência situados no plano horizontal do
projeto, conectados entre si, formando uma curva horizontal circular, geralmente, compreendida entre duas tangentes per-
tencentes a esse plano.
Para os propósitos da Engenharia, consideram-se três tipos de curvas horizontais circulares:
• curva horizontal circular simples;
• curva horizontal circular composta;
• curva horizontal circular reversa.
Apresentam-se a seguir os detalhes geométricos de cada uma delas.

23.2.1 Curva horizontal circular simples


Uma curva horizontal circular simples é aquela que possui um raio de curvatura (R) constante, conforme indicado na Figura
23.3. Trata-se de uma curva geometricamente bem definida e fácil de ser projetada e implantada, razão pela qual ela é o tipo
de curva mais utilizado em projetos de Engenharia. Ela conecta duas tangentes de forma a garantir a continuidade do alinha-
mento sem a ocorrência de vértices, o que significa que ela inicia e termina nos dois pontos de tangência com as tangentes.

Figura 23.3 • Elementos geométricos da curva horizontal circular simples.

De acordo com a Figura 23.3, a curva horizontal circular simples possui os seguintes elementos geométricos:
PI = ponto de interseção das tangentes (T1) e (T2);
PC = ponto de curvatura = ponto de início da curva;
PT = ponto de tangência = ponto final da curva;
PM = ponto médio da curva;
c = corda da curva;
M = ordenada média;
S = ponto médio da corda;
P = ponto qualquer da curva;
E = distância externa à curva ou afastamento;
AC = deflexão entre as tangentes (T1) e (T2) = ângulo central da curva;
gP = ângulo central do ponto (P);
R = raio da curva;
Curvas horizontais e verticais e-129

T = comprimento da tangente da curva;


D = desenvolvimento da curva ao longo do arco PC-PT = comprimento da curva;
O = centro da curva.
As relações algébricas entre os elementos citados são definidas pela geometria euclidiana, conforme indicado a seguir:
Comprimento da tangente (T): distância entre os pontos (PC) e (PI), que é também igual à distância entre os pontos (PT) e
(PI), dada pela equação (23.1).
 AC 
T  R * tg   (23.1)
 2 
Afastamento (E): distância entre os pontos (PI) e (PM), dada pela equação (23.2) ou (23.3).
 
 AC  R 1
cos   → E  R  1

 2  RE
 
 cos AC
2

 (23.2)

 AC 
E  T * tg   (23.3)
 4 
Ordenada média (M): distância entre os pontos (PM) e (S), dada pela equação (23.4) ou (23.5).
AC RRM
 AC M  AC
 AC
cos
cos  RR → M RR ** 11co
M coss  (23.4)
 22    22 

 AC 
M  E * cos   (23.5)
 2 
Corda (c): segmento de reta entre os pontos (PC) e (PT), cujo comprimento é dado pela equação (23.6) ou (23.7).
 AC   c c
 AC  AC  
 AC
 2   2R
sensen → c c 2R2*Rsen
* sen
 2   (23.6)
  2  2R   2 

 AC 
c  2T * cos   (23.7)
 2 

Desenvolvimento (comprimento) da curva (D): dado pelo comprimento do arco de círculo entre os pontos (PC) e (PT), cujo
valor pode ser calculado pelas equações (23.9), (23.10) ou (23.11). Assim, sabendo que:
D AC
 (23.8)
2 R 360o
Têm-se:
 * R * AC o
D para AC em graus (23.9)
180o
D = AC * R para AC em radianos (23.10)

 * R * AC para AC em grados (23.11)


D
200 g
Grau da curva ou Grau de curvatura (G): para o caso rodoviário, ele é o ângulo central que corresponde a um arco de 20
metros e, para o caso ferroviário, ele é o ângulo central que corresponde a uma corda de 20 metros. Ele é calculado de acordo
com as equações (23.12) e (23.13), para o caso rodoviário e ferroviário, respectivamente.

Para o caso rodoviário, tem-se: G 360o 1.145, 916o (23.12)


  G
20 2 R R

 G  10  10 
Para o caso ferroviário, tem-se: sen     G  2arcsen   (23.13)
2 R R
23.2.2 Curva horizontal circular composta
Uma curva horizontal circular composta é aquela formada por duas ou mais curvas horizontais circulares simples consecuti-
vas com raios de curvatura diferentes, conforme indicado na Figura 23.4.
e-130 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Em geral, esse tipo de curva é pouco utilizado nos projetos de Engenharia.


O seu uso é recomendado apenas para casos especiais em que se necessita
evitar obstáculos do terreno, os quais não podem ser evitados com o uso de
curvas horizontais circulares simples de raio maior.
No exemplo da Figura 23.4, a reta AB é a tangente comum às duas curvas
no ponto (TC) e as retas (T1) e (T2) são as tangentes às duas curvas. Dessa
forma, por serem curvas diferentes, elas geram dois ângulos de deflexão
(a e b), de forma que AC = a + b. Os demais elementos são os mesmos da
curva horizontal simples.

Figura 23.4 • Curva horizontal circular composta.

23.2.3 Curva horizontal circular reversa


Uma curva horizontal circular reversa é aquela formada por duas curvas ho-
rizontais circulares simples consecutivas, geralmente, com raios de curvatu-
ra iguais, porém, com centros de curvatura opostos, conforme indicado na
Figura 23.5. O tratamento geométrico desse tipo de curva horizontal é, ge-
ralmente, realizado considerando-as como duas curvas horizontais simples
independentes.
Na Figura 23.5, as retas (T1) e (T2) são as tangentes às duas curvas. Os demais
elementos são os mesmos da curva horizontal simples.

Figura 23.5 • Curva horizontal circular reversa.

23.2.4 Estaqueamento do alinhamento


Após a definição do alinhamento com suas tangentes concordadas por curvas horizontais, ele é discretizado em pontos equi-
distantes, denominados estacas. Tem-se, assim, um caso típico de aplicação de um Sistema de Referência Linear, conforme
descrito no Capítulo 4 – Sistemas de coordenadas. A equidistância varia de acordo com o tipo de projeto. Para uma rodovia,
por exemplo, no Brasil, a equidistância entre as estacas é igual a 20 metros. O estaqueamento inicia-se em um ponto deter-
minado pelo projetista e prossegue em função da equidistância adotada, gerando estacas numeradas de acordo com a sua
posição na sequência do estaqueamento. Quando se pretende discretizar um ponto não correspondente a uma estaca inteira,
sua posição é definida pelo número da estaca inteira precedente mais a distância, em metros, entre a estaca e ele. Por conven-
ção, a indicação do estaqueamento é dada por um par de valores entre colchetes do tipo [A+B]. Assim, por exemplo, para um
estaqueamento de 20 m, um ponto posicionado a 1.272,135 metros do ponto inicial do estaqueamento será identificado pela
estaca [63+12,135].
Entre os vários pontos de destaque do traçado de uma via, as posições das estacas dos pontos (PI), (PC) e (PT) são sempre
calculadas e indicadas nas representações gráficas dos projetos. Os cálculos dessas posições são realizados aplicando as equa-
ções indicadas a seguir:
Estaca do (PI): por se situar sobre a tangente, ela é calculada diretamente em função do comprimento da tangente, não exigin-
do nenhuma equação particular.
Estaca do (PC): calculada a partir da posição da estaca do (PI) e pelo comprimento da tangente (T). Assim tem-se:
estaca do PC = estaca do PI – T (23.14)
Curvas horizontais e verticais e-131

Estaca do (PT): calculada a partir da posição da estaca do (PC) e pelo comprimento da curva (D). Assim, tem-se:

estaca do PT = estaca do PC + D (23.15)

Exemplo aplicativo 23.1


Em um trecho da Rodovia SP-107 será executado uma alteração de projeto geométrico de uma curva circular simples. Neste
novo projeto a curva deverá atender às seguintes características técnicas:
Raio de curva = 800 metros Estaqueamento a cada 20 metros
Estaca do PI = [65 + 12,498] Ângulo central = 32°1092299
Considerando as informações indicadas, calcular os elementos geométricos da nova curva.

ƒƒ Solução:
Aplicando as equações indicadas nas seções anteriores, têm-se:

1
E 800 * o
1 2 ou *
cos 32 10 22
2
o
800 * 1 co 32 10 22 31 324 ou 32 600 * cos 31, 324 m
2
o o
c 2 * 800 * sen 32 10 22 443, 338 m ou c 2 * 230, 702 * cos 32 10 22 443, 338 m
2 2
* 800 * 32o10 22
D 449, 217 m
180o
20 * 360o
G 1o 25 56, 6
2 * * 800
estaca do PC 65 12, 498 11 10, 702 54 1, 796
estaca do PT 54 1, 796 22 9, 217 76 11, 012

23.3 Curvas horizontais com transição


Para alguns projetos específicos, como os projetos de rodovias e ferrovias, deve-se considerar a inconveniência da desconti-
nuidade da curvatura no ponto (PC) de passagem da tangente para a curva e no ponto (PT) de passagem da curva para a tan-
gente. A quebra abrupta da continuidade da aceleração centrípeta ao longo do alinhamento causa instabilidade no veículo que
trafega pela via e desconforto para os seus ocupantes. Para evitar tais impactos, as vias são projetadas de modo a terem uma
curvatura variável entre a tangente e a curva circular. A esse trecho de curvatura variável dá-se o nome de curva de transição.
Existem na literatura vários tipos de curvas de transição. De certa forma, qualquer curva cujo raio varie do infinito até o valor
do raio da curva circular pode ser usada como curva de transição. No contexto deste livro serão discutidos apenas os detalhes
geométricos fundamentais da clotoide.
Uma curva de transição se diferencia de uma curva circular pelo fato de o valor do seu raio mudar continuamente passando
de um valor infinito a um valor finito (R). Assim, para a clotoide, tem-se:

R * L = K (23.16)

em que:
R = raio da curva em um ponto qualquer (P) da clotoide;
L = comprimento percorrido até o ponto (P);
K = constante relacionada ao comprimento da transição e ao raio do trecho circular. Este parâmetro é também denominado
parâmetro da clotoide. Diferentes valores de (K) implicam diferentes tipos de clotoide.
e-132 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

23.3.1 Coordenadas de um ponto em uma clotoide


A melhor maneira de localizar um ponto sobre uma clo-
toide é por meio do estabelecimento de um sistema de
coordenadas planorretangular local, em que o eixo X é
coincidente com a direção da tangente e o eixo Y é per-
pendicular a ele, conforme ilustrado na Figura 23.6. As-
sim, tomando o ponto de início da clotoide (TS) como
origem do sistema de coordenadas, têm-se os seguintes
elementos geométricos a serem considerados para o es-
tudo da clotoide:

R = raio de curvatura de um ponto (P) qualquer da clo-


toide;
Rc = raio da curva circular;
L = comprimento percorrido até o ponto (P);
Ls = comprimento total da clotoide;
TS = ponto de início da clotoide;
SC = ponto final da clotoide;
θP = ângulo entre a tangente a espiral no ponto (P) e o
eixo das abscissas;
x, y = eixos do sistema de coordenadas planorretangular.

O ponto (P9), infinitésimo de (P), está localizado a


uma distância (L + δL) de (TS). Dessa forma, tem-se: Figura 23.6 • Parâmetros geométricos da clotoide.

R *    L (23.17)

Substituindo a equação (23.16) em (23.17), obtém-se a equação diferencial da clotoide.

L * L (23.18)
 
K
Integrando a equação (23.18), tem-se:

L2 L
  rad  (23.19)
2K 2R  

Da mesma forma, dx = δL * cos(θ) (23.20)

dy   L * sen   (23.21)

Assim, desenvolvendo as funções seno e cosseno em série e integrando, têm-se:


2 4 6 8
x L* 1  (23.22)
10 216 9.360 685.440

3 5 7
y L*  (23.23)
3 42 1.320 75.600
Curvas horizontais e vertiCais e-133

Em sua conformação geométrica total,


os elementos geométricos considerados
para o estudo da clotoide estão indicados
na Figura 23.7.

AC = deflexão da curva
TT = tangente total
TL = tangente longa
TC = tangente curta
p = afastamento
E = distância externa
δc = ângulo central circular
Dc = desenvolvimento circular
θs = ângulo central da espiral
θP = ângulo até o ponto genérico (P)
SC = ponto de passagem da clotoide
para o trecho circular
CS = ponto de passagem do trecho
circular para a clotoide
TS = ponto de passagem da primeira
tangente para a clotoide Figura 23.7 • Parâmetros de uma curva horizontal com transição.
ST = ponto final da clotoide do segun
do trecho
xs = abscissa do (SC) e do (CS)
ys = ordenada do (SC) e do (CS)
Q = abscissa do centro (O9)
O9 = centro da circunferência deslocada
Rc = raio da curva circular
x, y = coordenadas de um ponto genérico (P)

Considerando que no ponto (SC) as relações geométricas R = Rc e L = LS são válidas para a clotoide e para a curva horizontal
simples, de acordo com a equação (23.19), tem-se:
LS
S  rad  (23.24)
2Rc  
Os demais parâmetros geométricos da Figura 23.7 são calculados de acordo com as equações indicadas a seguir:

 2 4 6  S8 
x S  LS *  1  S  S  S   (23.25)
 10 216 9.360 685.440 
 3 5  S7 
y S  LS *  S  S  S    (23.26)
 3 42 1.320 75.600 

Q  x S  Rc * sen  S  (23.27)

p  y S  Rc * 1  cos  S   (23.28)

 AC 
TT  Q   Rc  p  * tg   (23.29)
 2 
Dc   AC  2 S  * Rc (23.30)

 
 R  p 
E c   Rc (23.31)
  Ac  
 cos  2  
  
e-134 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

TL  x S  y S * cotg  S  (23.32)
yS
TC  (23.33)
sen  S 
2
L 
 P   P  *  S rad 
 LS  (23.34)

 2 4 6  P8 
x P  LP *  1  P  P  P     (23.35)
 10 216 9.360 685.440 

 3 5  P7 
y P  LP *  P  P  P     (23.36)
 3 42 1.320 75.600 
2
L   y 
 P   P  * S  arctg  P  (23.37)
 LS  3  xP 

O valor de (TT) posiciona os pontos (TS) e (ST) com relação ao (PI). O valor de (Q), abscissa do centro, posiciona o centro
(O9) com relação ao TS ou ST. O valor de (p) mede o afastamento da curva circular com relação às tangentes.

Exemplo aplicativo 23.2


Deseja-se projetar uma curva horizontal com transição considerando os seguintes elementos geométricos: AC = 35°1894299,
LS = 90 m, RC = 500 m, estaqueamento de 20 metros e estaca PI = [228 + 3,674]. A partir desses dados, calcular os elementos
geométricos da curva correspondente.

ƒƒ Solução:
Os cálculos dos elementos geométricos da clotoide podem ser calculados aplicando as equações (23.24) a (23.33). Assim, têm-se:

90 0, 09002 0, 0900 4 0, 09006


S 0, 0900 rad 5o 09 23, 8 xS 90 * 1 89, 927 m
2 * 500 10 216 9.360
0, 0900 0, 09003 0, 09005
yS 90 * 2,698m Q 89, 927 500 * sen 5o 09 23, 8 44, 988 m
3 42 1.320
35o18 42
p 2, 698 500 1 cos 5o 09 23, 8 0, 675m TT 44, 988 500 0, 675 * tg 204, 348 m
2

500 0, 675
Dc 0, 616304848 2 * 0, 0900 * 500 218,152m E 500 25,425 m
35o18 42
cos
2
2, 698
TL 89, 927 2, 698 * cotg 5o 09 23,8 60, 025 m TC o
30, 023 m
sen 5 09 23, 8326

23.4 Curvas verticais


Após a definição do alinhamento no plano horizontal, é necessário concordar o traçado projetado no plano horizontal com as
variações do relevo. Para que isto seja possível é necessário conhecer o perfil do terreno ao longo do traçado projetado. Este tra-
balho é realizado por meio de nivelamentos topográficos, conforme apresentado na Seção 13.2 – Representação do relevo por meio
de perfis e seções transversais do terreno.
Com o perfil do terreno levantado, o projetista elabora o projeto das rampas e das curvas verticais, de forma que elas
concordem com as condições do relevo, atendam as especificações de segurança do projeto e gerem o melhor custo/benefício
para a obra.
Curvas horizontais e verticais e-135

O primeiro passo para o projeto das curvas


verticais é a definição das rampas. Em seguida,
definem-se as curvas verticais de forma a con-
cordarem os dois segmentos de retas no plano
vertical, conforme ilustrado na Figura 23.8.
Em geral, as curvas verticais utilizadas para
a concordância das rampas, em projetos de
Engenharia, são as circunferências e as parábo-
las. No caso da circunferência, a concordância
segue as mesmas regras apresentadas para o
caso de curvas horizontais circulares simples.
Discutem-se, portanto, nesta seção, os detalhes
geométricos e analíticos das curvas verticais
Figura 23.8 • Geometria da curva vertical parabólica.
parabólicas simples do 2o grau. Assim, consi-
derando a geometria indicada na Figura 23.8,
têm-se os elementos geométricos para a pará-
bola de concordância entre as rampas 1 (i1) e 2 (i2):
PIV = ponto de interseção das rampas;
PCV = ponto de curvatura vertical – início da curva vertical;
PTV = ponto de tangente vertical – fim da curva vertical;
LV = comprimento da curva na sua projeção horizontal;
i1 = cinclinação da rampa 1, em porcentagem (positivo ascendente, negativo descendente);
i2 = inclinação da rampa 2, em porcentagem (positivo ascendente, negativo descendente);
δi = diferença algébrica de inclinação (δi = i2 – i1).
A parábola é geometricamente próxima da circunferência e, por isto, para efeito de cálculos, é comum referir-se a ela como
tendo um raio de curvatura vertical (RV) como o raio da circunferência equivalente à parábola. Dessa forma, o comprimento
mínimo de curva vertical pode ser calculado pela equação (23.38).
LV  RV *  i (23.38)
Em projetos viários, é comum definir um valor para o raio vertical e a partir dele calcular o valor do comprimento da
curva vertical.
Apresentam-se a seguir as formulações algébricas utilizadas para o estudo da parábola.

23.4.1 Equação da parábola


A equação da parábola, em função dos eixos (x) e
(y), conforme indicado na Figura 23.9, é dada pela
equação (23.39).

y  ax 2  bx  c (23.39)

Notar que o sistema (x, y), nesse caso, determina


um sistema local de coordenadas, onde o eixo (y) se
situa no plano vertical.
Considerando que a origem da parábola coincide
com o ponto de concordância entre a rampa e a pa-
rábola (PCV), o termo (c) é igual a zero.
Impondo a condição de que a parábola concorde
com as rampas nos pontos (PCV) e (PTV), tem-se: Figura 23.9 • Termos da equação da parábola.
y
 i1  2ax  b (23.40)
x
Como x = 0, neste ponto, tem-se b = i1.
No ponto final da parábola (PTV), sabe-se que x = LV. Assim,
y i2  i1 
 i  2a * LV  b  a  i (23.41)
x 2 2LV 2LV
e-136 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

e, portanto,
i
y * x 2  i1 * x (23.42)
2LV

23.4.2 Altitudes e posições das estacas do (PCV ) e (PTV )


A equação (23.42) fornece o valor da ordenada (y) em qualquer ponto (P) da curva em função da abscissa (x), que representa
a distância entre o (PCV) e o ponto (P). A ordenada (y), neste caso, representa a diferença de altitude ou de cota entre o (PCV)
e o ponto (P), por meio da qual se pode determinar as altitudes ou cotas dos pontos verticais da curva, conforme apresentado
a seguir:
i1 * LV
altitude do (PCV) = altitude do (PIV) − (23.43)
2

i2 * LV
altitude do (PTV) = altitude do (PIV) + (23.44)
2
LV
estaca do (PCV) = estaca do (PIV) − (23.45)
2

LV
estaca do (PTV) = estaca do (PIV) + (23.46)
2

23.4.3 Pontos de máximo e de mínimo da curva vertical


Os pontos de máximo e de mínimo de uma curva vertical são dois elementos geométrico importantes para o projeto da
curva, os quais podem ser definidos derivando a equação da parábola com relação a (x) e igualando a derivada a zero.
Assim, têm-se:

y  i  i * L0 i1 * LV
 * x  i1  0   i1  0  L0   (23.47)
x LV LV i

De onde se deduz que a ordenada do ponto de máximo ou de mínimo é dada por pela equação (23.48).
i12 * LV
y0   (23.48)
2 i

23.4.4 Cálculo das altitudes e flechas da parábola simples


A Figura 23.10 apresenta os pon-
tos singulares de uma curva verti-
cal convexa parabólica. Conforme
indicado na figura, têm-se:
f = flecha da parábola;
F = flecha máxima da parábola;
M = ponto médio da curva
vertical;
V = ponto máximo da curva
vertical.
Demonstra-se que o valor da
flecha (f) para qualquer ponto
da curva pode ser calculado pela
equação (23.49).

i
f  * x2 (23.49) Figura 23.10 • Pontos singulares de uma curva vertical convexa parabólica.
2LV
Curvas horizontais e verticais e-137

LV
No ponto (PIV), em que x = , tem-se:
2
i
F * LV (23.50)
8
As coordenadas dos demais pontos singulares da vertical podem ser calculadas de acordo com as equações indicadas na
Tabela 23.1.
De forma análoga à Figura 23.10, a Figura 23.11 ilustra o posicionamento dos elementos geométricos a serem considerados
para as curvas verticais côncavas.

Tabela 23.1 • Coordenadas dos pontos singulares


da curva vertical
Pontos x y
PCV 0 0
PTV LV (i1 + i2) * LV/2
PIV LV/2 i1 * LV/2
M LV/2 δi * LV/8 + i1 * LV/2
V –i1 * LV/δi i12 * LV/2δi

Figura 23.11 • Pontos singulares de uma curva vertical côncava parabólica.

Exemplo aplicativo 23.3


Considerando os valores dos elementos geométri-
cos do perfil do alinhamento vertical indicado na
Figura 23.12, calcular os elementos geométricos
da parábola simples de concordância entre as duas
rampas, admitindo que ela terá um raio (RV) igual
a 3.000,000 metros. Indicar também a altitude do
ponto (P) da estaca [32+3,475].

ƒƒ Solução:
A partir dos valores indicados na Figura 23.12, têm-se:

 i  i2  i1   0, 03  0, 04  0, 07 Figura 23.12 • Situação geométrica do projeto.


LV  3.000 * 0, 07  210, 000 m
 0, 04 * 210 
altitude PCV  815, 236     811, 036 m
 2 
 210 
estaca PCV  32  14, 873     27  9, 873
 2 
 0, 03 * 210 
altitude PTV  815, 236     812, 086 m
 2 
  210  
estaca PTV  32  14, 873      37  19, 873
  2 
 0, 04 * 210 
L0      120, 000 m
 0, 07 
 0, 042 * 210 
y0      2, 400 m
 2 *  0, 07  

F
 0, 03  0, 04  * 210  1, 838 m
8
e-138 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

A Tabela 23.2 apresenta um resumo dos valores calculados para Tabela 23.2 • Coordenadas locais dos pontos singulares da curva vertical
os elementos singulares da curva. Coordenadas locais
Os cálculos das coordenadas locais do ponto (P) estão indicados Pontos
x [m] y [m] H [m]
na sequência.
PCV 0,000 0,000 811,036
xP [32 3, 475] [27 9, 873] 643, 475 549, 873 93, 602 m PIV 105,000 4,200 815,236
0, 07 PTV 210,000 1,050 812,086
yP * 93, 6022 0, 04 * 93, 602 2, 284 m
2 * 210 M 105,000 2,363 813,399
V 120,000 1,350 813,436
P 93,602 2,284 813,320

23.5 Implantação dos elementos geométricos do traçado de uma via


Implantar os elementos geométricos do traça-
do de uma via significa posicionar pontos ao
longo do alinhamento por onde ela será cons-
truída, por meio de estacas que indiquem as
referências lineares e altimétricas para a sua
construção. Diz-se, neste caso, que se realiza o
estaqueamento da via.
As distâncias entre as estacas variam em fun-
ção do tipo de obra e do tipo de elemento geo-
métrico que se está implantando. Em uma estra-
da, por exemplo, as estacas são posicionadas e
niveladas, em geral, a cada 20 metros, podendo
também ser a cada 10, 50 e 100 metros. Em caso
de locações de vias urbanas, o estaqueamento Figura 23.13 • Estaqueamento do eixo, das bordas e dos pontos de taludes de uma via.
pode ser a cada 1, 2 ou 5 metros.
Nos casos em que o projeto possui uma pla-
taforma, conforme ilustrado na Figura 23.13, além do eixo principal da via, a implantação inclui também o estaqueamento das
bordas da plataforma e dos pontos em que os taludes de corte e aterro interceptam o terreno (pontos de off-set).
Após o posicionamento das estacas, que definem o traçado no plano horizontal, realiza-se o nivelamento do traçado
no plano vertical para determinar as alturas de corte e de aterro, que serão os indicadores para os trabalhos posteriores de
terraplenagem.
O estaqueamento das tangentes não apresenta grandes dificuldades. Por esse motivo, discutem-se na sequência os deta-
lhes geométricos e técnicos do estaqueamento de curvas horizontais e verticais, com ênfase no traçado geométrico de vias de
transporte rodoviário.

23.5.1 Implantação da rede de pontos de apoio


Como em qualquer projeto de Engenharia de grande
porte, o primeiro trabalho a ser realizado em cam-
po é a implantação da rede de pontos de apoio. Essa
operação pode ser realizada por meio de qualquer
um dos métodos de determinação de pontos de
apoio apresentados nos capítulos precedentes. Em
geral, são utilizados os métodos de poligonação e os
métodos de levantamentos por meio da tecnologia
GNSS. Seja qual for o método empregado, o resulta-
do deve ser a implantação de marcos com coordena-
das conhecidas ao longo do trecho de projeto.
Por se tratar de pontos de referência que devem
subsistir por todo o tempo de construção da obra
e, em muitas situações, mesmo após, os marcos da
rede de pontos de apoio devem ser construídos em
concreto, cravados no terreno, claramente identifi-
cados e protegidos de choques, conforme ilustrado
na Figura 23.14. Figura 23.14 • Marco da rede de pontos de apoio.
Curvas horizontais e verticais e-139

Dependendo do tipo de projeto, pode também ser necessário implantar uma rede de pontos de RN ao longo do trecho, a qual
será utilizada para o nivelamento dos elementos geométricos do projeto. Com frequência, a rede de nivelamento é muito mais
densa que a rede de pontos de apoio horizontal, os quais, em geral, são também incluídos como vértices da rede de nivelamento.
Em alguns tipos de obras, as altitudes dos pontos podem ser determinadas por nivelamento trigonométrico ou por nivela-
mento com a tecnologia GNSS; em outros, se exige a aplicação de nivelamentos geométricos. A escolha do método de nivela-
mento mais adequado é feita em função do nível de precisão exigido para o posicionamento vertical dos elementos da obra.
Atenção especial deve ser dada ao sistema de referência e ao datum vertical adotados para o projeto e para a implantação
da obra. As medições de campo para o levantamento topográfico de detalhes e para a implantação da obra dependerão
dessa escolha.

23.5.2 Implantação de curvas horizontais circulares simples


Exceto para casos especiais, os raios das curvas horizontais utilizadas em projetos de Engenharia são muito grandes para per-
mitirem que elas sejam implantadas a partir do seu centro. Existem, por isto, alguns procedimentos de campo recomendados
para esse fim, os quais são apresentados na sequência. Todos eles consideram que as tangentes já foram previamente esta-
queadas e que as estacas dos (PC), (PI) e (PT) das curvas são conhecidas. Notar que as estacas dos (PI) servem apenas como
referências suplementares, não sendo, portanto, de implantação obrigatória, além do que, em alguns casos, elas podem estar
posicionadas em locais de difícil acesso.
Entre os vários métodos de implantação de curvas horizontais disponíveis na literatura, discutem-se neste capítulo os
seguintes métodos:
• Método das coordenadas totais, que se baseia no posicionamento de pontos ao longo da curva em função de suas coor-
denadas planorretangulares conhecidas no projeto e das coordenadas dos pontos de apoio previamente implantados;
• Método das deflexões e comprimento da corda, que consiste em demarcar a curva por meio do ângulo de deflexão entre
as tangentes e do comprimento da corda;
• Método das abscissas e ordenadas, que consiste em utilizar um sistema de coordenadas planorretangulares local da curva,
definido com relação a direção da tangente ou das cordas.

23.5.2.1 Método das coordenadas totais


Com a popularização do uso de estações totais e dos instrumentos da tecnologia GNSS operando em modo RTK, o método de
implantação de curvas horizontais mais empregados na atualidade é o método das coordenadas totais. Trata-se de um método
simples de ser aplicado, principalmente se forem utilizados instrumentos GNSS. Ele exige apenas que se tenham pontos de
apoio ao longo do trecho do alinhamento e que se conheçam as coordenadas dos pontos a serem implantados, com relação a
essa rede de pontos de apoio. Como ele se baseia em coordenadas conhecidas, ele não exige, necessariamente, que as estacas
dos pontos (PC), (PT) e (PI) das curvas estejam previamente implantados.
No caso do uso de estações totais, a implantação é realizada conforme apresentado na Seção 15.3.1 – Implantação com
estações totais. A Figura 23.15 ilustra a aplicação do método. Neste caso, o ponto (PA) pertence à rede de pontos de apoio e os
pontos (Pi) pertencem à curva. Evidentemente, dependendo do tamanho da curva, os pontos podem ser implantados a partir
de mais de um ponto de apoio. No caso do uso de instrumentos GNSS em modo RTK, a implantação é realizada conforme
apresentado na Seção 20.9.2.3 – Levantamentos de campo por meio de posicionamentos diferenciais.

Figura 23.15 • Implantação de uma curva horizontal circular simples pelo método das coordenadas totais.
e-140 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Em geral, as coordenadas dos pontos a serem implantados


são obtidas por meio de suas localizações nas representações
gráficas em ambiente CAD. Para os casos em que se deseja cal-
cular algebricamente esses valores, pode-se aplicar um dos mé-
todos apresentados na sequência. Assim, considerando a Figura
23.16, têm-se:

Dados:

Ponto (PC): (XPC, YPC)


Ponto (PI): (XPI, YPI)
Ponto (PT): (XPT, YPT)
Raio: Rc

Comprimentos dos arcos (D1) e (D2)


Calcular: Figura 23.16 • Situação geométrica para o cálculo de coordena-
Ponto (P1): (XP1, YP1) das totais sobre uma curva.
Ponto (P2): (XP2, YP2)

Cálculo pelas deflexões:


1. Uma vez que se conhecem as coordenadas dos pontos (PC) e (PI) pode-se determinar o valor do azimute (AzPCPI)
aplicando a equação (10.4).
2. Em seguida, a partir do ponto (PC), calcular o valor do ângulo de deflexão (α1/2) em função do valor do comprimento
do arco (D1) e do raio (R). Assim, tem-se:
1 D1 1 90o * D1
 rad  ou  graus  (23.51)
2 2R   2  *R 
3. Calcular o azimute (AzPCP1) do alinhamento PCP1 somando o azimute (AzPCPI) ao valor da metade da deflexão (α1/2),
levando em consideração o sentido da curva com relação ao ponto (PC). Assim, tem-se:

Az PCP1  Az PCPI  1 (23.52)
2
4. Calcular o comprimento da corda PCP1 aplicando a equação (23.6). Assim, tem-se:
 1  (23.53)
cPCP1  2R * sen  
 2 
5. Finalmente as coordenadas do ponto (P1) podem ser calculadas aplicando as equações (10.5) e (10.6). Assim, têm-se:


XP1  X PC  cPCP1 *sen Az PCP1  conforme equação (10.5)

YP1 Y PC cPCP1 * cos Az PCP1 conforme equação (10.6)

Cálculo pelas coordenadas do centro da curva (O):

1. Este cálculo também se baseia no conhecimento do azimute (AzPCPI) do alinhamento PCPI, calculado em função das
coordenadas dos pontos (PC) e (PI), conforme indicado no caso anterior.
2. Com o azimute (AzPCPI) conhecido e sabendo que o centro (O) da curva se encontra no alinhamento perpendicular a
tangente PCPI pode-se calcular o azimute do alinhamento PC-O, conforme indicado a seguir, considerando o sentido da
curva com relação ao ponto (PC).
Az PC O  Az PC  PI  90o (23.54)
3. Têm-se, assim, os valores das coordenadas do centro da curva aplicando as equações (10.5) e (10.6), conforme indicado
a seguir:

XO  X PC  R * sen  Az PC O  conforme equação (10.5)

YO  YPC  R * cos  Az PC O  conforme equação (10.6)


Curvas horizontais e verticais e-141

Notar que, muitas vezes, os valores das coordenadas do centro da curva já são conhecidos, não havendo, portanto,
necessidade de aplicar o passo 3.
4. Em seguida, calcular o valor do ângulo central do trecho da curva correspondente, em função do valor do comprimento
do arco (D1) e do raio (R), conforme a equação (23.51).
D1  180o 
1  rad  ou 1    * D1 graus  conforme equação (23.51)
R  *R 
5. Calcular o azimute (AzO-P1) do alinhamento O-P1 somando o azimute (Az PC O 180o ) ao valor calculado do ângulo central,
considerando o sentido da curva com relação ao ponto (PC). Assim, tem-se:

AzO  P1  Az PC O  1  180o (23.55)

6. Finalmente as coordenadas do ponto (P1) podem ser calculada aplicando as equações (10.5) e (10.6). Assim, têm-se:


X P1  XO  R * sen AzO  P1  conforme equação (10.5)


YP1  YO  R * cos AzO  P1  conforme equação (10.6)

O mesmo raciocínio pode ser aplicado para o cálculo das coordenadas do ponto (P2) e demais pontos da curva.

Exemplo aplicativo 23.4


Considerando os valores de coordenadas indicados na Tabela 23.3 e sabendo que se trata Tabela 23.3 • Coordenadas conhecidas
de uma curva horizontal circular simples à direita, com raio (R) igual a 500 m, calcular as Ponto X [m] Y [m]
coordenadas totais do ponto (P1) situado a 50 metros do (PC) ao longo da curva. Aplicar
PC 5.172,023 10.520,960
os dois métodos de cálculos indicados anteriormente.
PI 5.248,357 10.598,369
ƒƒ Solução:
As coordenadas totais do ponto (P1), por meio das deflexões, são obtidas aplicando a sequência de cálculos apresentada a seguir:
 5.248, 357  5.172, 023 
  44 3557, 8
o
Az PCPI  atan 
 10.598, 369  10.598, 369 
1  90o 
 * 50  2 51 53, 2
o

2   * 500 
Az PCP1  44 o 3557, 8  2o 51 53, 2  47 o 2751, 0
 
cPCP1  2 * 500  sen 2o 51 53, 2  49, 979 m
X P1  5.172, 023  49, 979 * sen  47 2751, 0   5.208, 850 m
o

YP1  10.520, 96  49, 979 * cos  47 2751, 0   10.554, 748 m


o

As coordenadas totais do ponto (P1), por meio das coordenadas do centro da curva, são obtidas aplicando a sequência de
cálculos apresentada a seguir:

Az PC O  44 o 3557, 8  90o  134 o 3557, 8


 
XO  5.172, 023  500 * sen 134 o 3557, 8  5.528, 040 m
YO  10.520, 960  500 * cos 134 3557, 8   10.169, 887 m
o

50
1   0,100 rad  5o 4346, 5
500
Az OP1  134 o 3557, 8  5o 4346, 5  180o  320o1944, 3
 
X P1  5.528, 040  500 * sen 320o1944, 3  5.208, 850 m
YP1  10.169, 887  500 * cos  320 1944, 3   10.554, 748m
o
e-142 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

23.5.2.2 Implantação de curva horizontal circular simples pelo método das deflexões e comprimento da corda
Conforme visto no método precedente, os valores dos
ângulos de deflexão e das cordas são elementos impor-
tantes para se implantar uma curva horizontal, haven-
do por isto um método de implantação baseado neles e
na posição das tangentes, conforme ilustrado na Figura
23.17. A sua aplicação, geralmente, é realizada com o uso
de uma estação total, embora possa também ser realizada
com o uso de um teodolito e uma trena.
Na aplicação desse método de implantação de curvas
horizontais, de acordo com a Figura 23.17, o estaqueamen-
to se inicia pelo primeiro ponto de estaca com valor inteiro
depois do (PC), que, no caso desta figura, é o ponto (P1), lo-
calizado a uma distância (D1) a partir do (PC) sobre a curva.
Considerando a tangente que passa pelo ponto (PC)
como referência, a posição do ponto (P1) pode ser esta-
queada por meio de um ângulo de deflexão e do compri-
mento de sua corda. Assim, de acordo com as relações geo- Figura 23.17 • Implantação de uma curva simples pelo método das de-
métricas ilustradas em detalhes na Figura 23.17, têm-se: flexões.
1 D1  90o * D1
 rad  ou 1  graus  conforme equação (23.51)
2 2R 2  *R 
 
c1  2R * sen  1  conforme equação (23.53)
 2 
Após a implantação da primeira estaca com valor inteiro, todas as demais serão também estacas com valores inteiros, que
no caso da Figura 23.17 são as estacas (P2) e (P3).
Por serem estacas com valores inteiros, todas elas possuem o mesmo ângulo de deflexão com relação à direção da corda
anterior. Assim, se todas as estacas de implantação da curva forem visíveis a partir do ponto (PC), a implantação segue de
forma regular até a estaca anterior ao ponto (PT), a partir da qual verifica-se a posição do ponto (PT) com o ângulo (aPT/2) e
a corda (cPT) (ver Fig. 23.17). Essa verificação é um indicador da qualidade da implantação realizada. Assim, para as estacas
inteiras sucessivas, tem-se o seguinte valor para a deflexão em um estaqueamento de 20 m:
 i G 20 * 180o
  (23.56)
2 2 2 * R
A corda acumulada para cada ponto da curva é calculada por meio da soma das deflexões acumuladas até o ponto de in-
teresse, aplicando a seguinte equação:
 
c1  2R * sen  1  conforme equação (23.53)
 2 
Para o caso de a implantação ser realizada com o uso de uma estação total, as operações de campo podem seguir os passos
indicados a seguir:
1. Verificar em campo se a implantação de todas as estacas da curva pode ser realizada a partir da estaca do (PC).
2. Preparar uma tabela de valores de ângulos e distâncias para a implantação. Algumas estações totais possuem aplicativos
que permitem inserir essa tabela na memória do instrumento e utilizá-la durante a implantação.
3. Instalar a estação total sobre o ponto (PC).
4. Orientar o instrumento em uma das estacas de ré ou de vante da tangente. Zerar o instrumento nessa direção.
5. Iniciar a implantação com as indicações dos ângulos e dos comprimentos das cordas para cada novo ponto.
6. Na última estaca, verificar a posição da estaca do (PT).

Exemplo aplicativo 23.5


Seja o caso da implantação de uma curva simples horizontal de um ar- Tabela 23.4 • Valores conhecidos para os elementos da curva
ruamento de loteamento, cujos elementos geométricos conhecidos estão Elemento Valor
indicados na Tabela 23.4. Considerando os valores indicados e que a curva Estaca do (PC) [340+3,000]
seja à direita, preparar a tabela de implantação para esta curva, a partir do
Tangente (T) 128,512 m
ponto (PC). As estacas devem ser implantadas a cada 20 metros.
Ângulo central da curva (AC) 81°1093499
Curvas horizontais e verticais e-143

ƒƒ Solução:
Para a preparação da tabela de locação é necessário, inicialmente, calcular os elementos da curva indicados a seguir:
128, 512
R  150, 001m

tg 81o1034 2  Tabela 23.5 • Planilha de locação de uma curva circular simples pelo método
o
20 * 180 das deflexões e das cordas
G  7 o 3821, 8
 * 150, 001 Arco Corda Deflexão
Estaca acumulada
 * 150, 001 * 81o1034 [m] [m]
D  212, 520m
180o PC = [340 + 3,000] 0,000 0,000 00°0090099
Estaca PT  340  3, 000  212, 520 [341] 17,000 16,991 3°1494899
 350  15, 520 [342] 20,000+17,000 36,906 7°0395999
 est 341
90 * 17, 000 oo [343] 57 56,658 10°5391099
  3 1448, 3
2  * 150, 001 [344] 77 76,157 14°4292199
 PT 90o * 15, 520 o [345] 97 95,319 18°3193299
  2 5750, 5
2  * 150, 001 [346] 117 114,057 22°2094399
[347] 137 132,288 26°0995499
Os valores para a locação da curva a partir do (PC) estão indi-
cados na Tabela 23.5. [348] 157 149,931 29°5990599
Notar que para a tabela de locação os valores angulares das [349] 177 166,908 33°4891699
deflexões acumuladas foram arredondados para o segundo. [350] 197 183,144 37°3792799
Para auxiliar o leitor em seus cálculos, apresentam-se a seguir
PT = [350 + 15,520] 212,520 195,186 40°3591799
os cálculos realizados para a estaca [341] e [342].

 est 341 90o * 17, 000


Deflexão acumulada na estaca [341] =   3o1448, 3
2  * 150, 001
 est 342 7 o 3821, 8
Deflexão acumulada na estaca [342] =  3o1448, 3   7 o 0359, 2
2 2
 est PT 
Deflexão acumulada na estaca PT = [350+15,520] =  37 o 3726, 5  2o 5750, 5  40o 3517, 0
2
Muitas vezes, dependendo do comprimento da cur-
va, não é possível visualizar todos os pontos a serem
implantados de uma mesma estação, exigindo que o
instrumento topográfico seja instalado várias vezes ao
longo da curva.
Considere-se o caso da Figura 23.18, em que a es-
tação total precisou ser instalada no ponto (P2) com
orientação no ponto (PC). Nestas condições, para a im-
plantação do ponto (P3), o ângulo de implantação será
 o 2 G 
igual a  180    , observando cuidadosamente o
 2 2
sentido da curva, se à direita ou à esquerda. Assim, para
todos os demais pontos a serem implantado a partir
do ponto (P2) com orientação no (PC) basta somar a
metade do ângulo central correspondente. Se a estação
total for novamente transferida para outro ponto na Figura 23.18 • Implantação de novos pontos a partir de um ponto qual-
curva, o processo se repete. quer da curva.

Exemplo aplicativo 23.6


Considerando os dados do Exemplo aplicativo anterior, a curva simples horizontal deverá ser locada a partir do ponto (PC)
até a estaca [345 + 0,000]. Após a locação deste ponto, a estação total deverá ser deslocada para ele para que seja realizada a
locação dos demais pontos da curva. Elaborar a planilha de locação desta curva.
e-144 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

ƒƒ Solução:
Apresentam-se na Tabela 23.6 os valores de locação Tabela 23.6 • Planilha de locação de uma curva circular simples pelo método das
considerando que a estação total foi instalada na deflexões e das cordas a partir da estaca [345]
estaca [345] e orientada no (PC) da curva. A mes- Arco Corda Deflexão
ma tabela repete os valores já calculados no exem- Estaca acumulada
[m] [m]
plo aplicativo anterior até a estaca [345], a partir do PC = [340 + 3,000] 0 0 00°0090099
(PC) da curva.
[341] 17 16,991 3°1494899
Para auxiliar o leitor em seus cálculos, apresentam-se
a seguir os cálculos realizados para a estaca [346]. [342] 37 36,906 7°0395999
[343] 57 56,658 10°5391099
Deflexão acumulada 180o 18o 31 31, 9 3o 49 10, 9 [344] 77 76,157 14°4292199
202o 20 42, 8 [345] 97 95,319 18°3193299
Notar que para a tabela de locação os valores an- [346] 20 19,985 202°2094399
gulares das deflexões acumuladas foram arredondados [347] 40 39,882 206°0995499
para o segundo. [348] 60 59,601 209°5990599
[349] 80 79,055 213°4891699
[350] 100 98,158 217°3792799
PT = [350 + 15,520] 115,520 112,686 220°3591799

23.5.2.3 Método das abscissas e ordenadas


Para os casos em que a curva é pequena e não se possui uma esta-
ção total disponível, pode-se realizar a sua implantação por meio
das abscissas e ordenadas com relação a tangente, conforme ilus-
trado na Figura 23.19.
A locação dos pontos da curva é realizada por meio da mar-
cação, sob a tangente, da abscissa (x). Em seguida, desloca-se até
esse ponto e implanta-se o ponto da curva por meio do valor da
ordenada (y) perpendicular ao eixo das abscissas.
As equações para os cálculos das ordenadas e abscissas, consi-
derando o valor da corda, são as seguintes:

  (23.57)
x Pi  ci * cos  i 
 2 

Figura 23.19 • Implantação de uma curva simples por abscis-


 
y Pi   ci * sen  i  (23.58) sas e ordenadas.
 2 

As ordenadas e abscissas podem também ser calculadas considerando o valor do raio (R), conforme apresentado a seguir:

x Pi  R * sen  i  (23.59)

y Pi  R * 1  cos  i   (23.60)

Exemplo aplicativo 23.7


Para a mesma curva do Exemplo aplicativo 23.5, calcular os elementos de implantação da curva pelo método das abscissas
e ordenadas considerando as equações apresentadas na seção precedente.
Curvas horizontais e verticais e-145

ƒƒ Solução:
Apresenta-se na Tabela 23.7 a planilha de lo- Tabela 23.7 • Planilha de locação da curva circular simples pelo método das abscissas e ordenadas,
cação da curva aplicando as equações (23.57) considerando o valor da corda
e (23.58). Corda Deflexão
Estaca Arco [m] x [m] y [m]
Apresenta-se a seguir o exemplo de cálculo [m] acumulada
para a estaca [341]. PC = [340 + 3,000] 0,000 0,000 00°0090099
[341] 17,000 16,991 3°1494899 16,964 –0,962
 3o1448, 3 
xest 341  16, 991 * cos    16, 964 m [342] 20,000+17,000 36,906 7°0395999 36,626 –4,540
 2 
[343] 57 56,658 10°5391099 55,638 –10,700
 3 1448, 3 
o
yest 341  16, 991 * sen     0, 962 m [344] 77 76,157 14°4292199 73,663 –19,333
 2  [345] 97 95,319 18°3193299 90,379 –30,285
[346] 117 114,057 22°2094399 105,492 –43,363
Os mesmos resultados podem ser obti-
dos se forem aplicadas as equações (23.59) [347] 137 132,288 26°0995499 118,732 –58,333
e (23.60). Segue exemplo de cálculo para a [348] 157 149,931 29°5990599 129,864 –74,931
estaca [341]. [349] 177 166,908 33°4891699 138,691 –92,861


x Pi  150 * sen 6 2936, 6  16, 964 m
o
 [350] 197 183,144 37°3792799 145,056 –111,805
PT = [350 + 15,520] 212,520 195,186 40°3591799 148,226 –126,991
 
y Pi  150 * 1  cos 6o 2936, 6   0, 962 m

23.5.3 Implantação de uma curva de transição


A Figura 23.20 ilustra a situação geométrica da
posição de um ponto sobre o primeiro trecho de
transição de uma curva horizontal com transi-
ção. A sua implantação pode ser realizada apli-
cando qualquer um dos métodos de implanta-
ção de curvas horizontais indicados nas seções
precedentes. Assim, têm-se:
a) Implantação pelo método das abscissas e or-
denadas sobre a tangente: neste caso, deve-se
utilizar as equações apresentadas na Seção
23.3 – Curvas horizontais com transição.
Referindo-se à Figura 23.20 e às equações
(23.34), (23.22) e (23.23), têm-se:
2
L 
 P   P  *  S rad  conforme equação
 LS  (23.34) Figura 23.20 • Implantação de uma curva circular horizontal com transição.

    2

4 6 8
x P  LP *  1     P
...  conforme equação (23.22)
P P P

 10 216 9.360 685.440 


 3 5  P7 
y P  LP *  P  P  P  ...  conforme equação (23.23)
 3 42 1.320 75.600 

b) Implantação pelo método das deflexões e comprimento da corda: neste caso, o valor do ângulo de deflexão é dado pela equa-
ção (23.37) e a corda pela equação (23.61).
2
L   y 
 P   P  * S  arctg  P  conforme equação (23.37)
L
 S 3  xP 

corda P  x P2  y P2 (23.61)

c) Implantação pelo método das coordenadas totais: neste caso, deve-se proceder da mesma maneira indicada para a implan-
tação de uma curva horizontal circular simples.
e-146 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

Exemplo aplicativo 23.8


Considerando os dados geométricos da curva horizontal com tran- Tabela 23.8 • Dados da geometria da curva horizontal com transição
sição apresentados na Tabela 23.8, calcular os elementos de implan- Estaca do PI [92 +12,560]
tação do primeiro trecho espiral da curva aplicando os três méto-
Comprimento do trecho espiral (LS) 80 m
dos de implantação indicados nas seções precedentes. Considerar
estaqueamento a cada 20 metros. Raio da curva circular (Rc) 500 m
Deflexão da curva (AC) 35°1294799
ƒƒ Solução: Azimute do alinhamento TS-PI 23°4591899
Apresenta-se a seguir a sequência de cálculos necessários para a solução X = 5.791,164 m
do exercício. Coordenadas totais do ponto (TS)
Y = 11.404,340 m
80
S   0, 080 rad
2 * 500
 0, 0802 0, 080 4 0, 086 0, 0808 
x S  80 *  1     ...   79, 949 m
 10 216 9.360 685.440 
 0, 080 0, 0803 0, 0805 0, 0807 
y S  80 *     ...   2,132 m
 3 42 1.320 75.600 
 
Q  79, 949  500 * sen 4 o 3501, 2  39, 991m

 
p  2,132  500 * 1  cos 4 o 3501, 2   0, 533 m
 35o1247 
TT  39, 991   500  0, 533  * tg    198, 833 m
 2 

Estaca do TS = [92 +12,560] – 198,833 = [82 +13,727] Tabela 23.9 • Elementos de implantação da curva horizontal com transição
pelo método das abscissas e ordenadas sobre a tangente
Apresenta-se na Tabela 23.9 a planilha de locação das es- Estacas L [m] θ[rad] x [m] y [m]
tacas da primeira espiral, ou seja, do ponto (TS) ao (SC), pelo TS = 82 + 13,727 0,000 0,00000000 0,000 0,000
método das abscissas e ordenadas sobre a tangente. Para auxi-
83 6,273 0,00049184 6,273 0,001
liar o leitor em seus cálculos, apresentam-se a seguir os cálculos
realizados para as estacas [83]. 84 26,273 0,00862820 26,273 0,076
85 46,273 0,02676456 46,269 0,413
Lest 83  20  13, 727  6, 273 m 86 66,273 0,05490092 66,253 1,213
2
 6, 273  SC = 86 + 13,727 80,000 0,07999945 79,949 2,132
est 83    * 0, 080  0, 00049184 rad
 80 
 0, 0004918822 0, 000491882 4 0, 0004918826 0, 0004918828 
xest 83  6, 273 *  1       6, 273m
 10 216 9.360 685.440 
 0, 000491882 0, 0004918823 0, 0004918825 0, 0004918827 
yest 83  6, 273 *       0, 001m
 3 42 1.320 75.600 

A Tabela 23.10 apresenta a planilha de locação das estacas da primei- Tabela 23.10 • Elementos de implantação da curva horizontal com
ra espiral, ou seja, do ponto (TS) ao (SC), pelo método das deflexões e do transição pelo método das deflexões e do comprimento da corda
comprimento das cordas usando as equações (23.35) a (23.37). Corda
Para auxiliar o leitor em seus cálculos, apresentam-se a seguir os Estacas x [m] y [m] Deflexões
[m]
cálculos realizados para a estaca [83].
TS = 82 + 13,727 0,000 0,000 0°0090099 0,000
Deflexão da estaca [83]:
83 6,273 0,001 0°0093499 6,273
0, 001 o 84 26,273 0,076 0°0995399 26,273
est 83
arctg 0, 000163946 rad 0 00 34
6, 273 85 46,269 0,413 0°3094099 46,271
Corda da estaca [83]: 86 66,253 1,213 1°0295599 66,264
SC = 86 + 13,727 79,949 2,132 1°3194099 79,977
Lest 83  6, 2732  0, 0012  6, 273m
Curvas horizontais e verticais e-147

A Tabela 23.11 apresenta a planilha de Tabela 23.11 • Elementos de implantação da curva horizontal com transição pelo método das
locação das estacas da primeira espiral, ou deflexões e do comprimento da corda
seja, do ponto (TS) ao (SC), pelo método Estacas Deflexões Azimutes Corda [m] X [m] Y [m]
das coordenadas totais. A aplicação des- TS = 82 + 13,727 0°0090099 23°4591899 0,000 5.791,164 11.404,340
te método exige que sejam calculados os
83 0°0093499 23°4595299 6,273 5.793,692 11.410,081
azimutes das direções dos pontos a serem
implantados bem como os valores das cor- 84 0°0995399 23°5591199 26,273 5.801,816 11.428,356
das de cada ponto. 85 0°3094099 24°1595899 46,271 5.810,180 11.446,523
Para auxiliar o leitor em seus cálculos, 86 1°0295599 24°4891399 66,264 5.818,962 11.464,491
apresentam-se a seguir os cálculos realizados
SC = 86 + 13,727 1°3194099 25°1695899 79,977 5.825,321 11.476,656
para a estaca [83].

 
Xest 83  5.791,164  6, 273 * sen 23o 4552   5.793, 692 m

 
Yest 83  11.404, 340  6, 273 * cos 23o 4552   11.410, 081 m

23.5.4 Implantação de curvas verticais


Uma vez o alinhamento horizontal implantado, procede-se a implantação das rampas, das curvas verticais e dos off-sets dos
taludes de corte e aterro. Também, neste caso, em razão da facilidade de se implantar por meio de coordenadas, todos esses
elementos podem ser implantados com o uso de estações totais ou receptores GNSS. Em casos em que seja exigida alta preci-
são, lança-se mão de um nivelamento geométrico.
O procedimento de campo consiste em indicar sobre cada estaca implantada os valores de corte ou aterro que ocorrerá
naquela estaca, ou seja, quanto o maquinista deverá cortar ou aterrar naquele ponto para se atingir o nível exigido pelo projeto
da plataforma. Ao mesmo tempo se implanta as estacas dos pontos de off-sets por meio de suas coordenadas (X, Y) indicadas
pelo projetista.
De forma semelhante à implantação de curvas horizontais, os valores das altitudes das estacas de uma curva vertical são
calculados e indicados no terreno considerando os espaçamentos entre as estacas horizontais já implantadas e, em alguns
casos, em frações delas, conforme ilustrado na Figura 23.21.

Figura 23.21 • Indicação dos valores de altitudes e estacas de uma curva vertical.

As altitudes dos pontos da curva são calculadas por meio da equação (23.42), tomando a altitude da estaca do (PCV) como
referência.
Em seguida, é necessário calcular a altitude em que se encontra cada estaca, por meio de um nivelamento topográfico, e
indicar o valor da altitude de projeto e a diferença com a altitude da estaca no terreno.
Para facilitar o trabalho do maquinista, é comum colocar uma marca (pintada ou com algum outro tipo de destaque) sobre
a própria estaca, ou sobre uma estaca auxiliar,1 indicando o nível do ponto nivelado da curva vertical.
Os valores a serem nivelados são calculados em escritório e entregues aos operadores de campo como uma planilha de
“Ordem de serviço”. Nela estão indicados todos os valores a serem implantados em um determinado trecho da via.

1 No Brasil, em geral, se utiliza uma vara de bambu como estaca auxiliar fixada ao lado da estaca da curva horizontal.
e-148 TOPOGRAFIA PARA ENGENHARIA

A Tabela 23.12 apresenta os valores de corte e aterro a se- Tabela 23.12 • Valores de altitudes para implantação de uma curva vertical
rem empregados na locação da curva vertical da Figura 23.21. Diferenças de pontos
É importante salientar que os trabalhos de implanta- Hterreno Hprojeto nivelados (ΔH)
Estacas
ção tanto dos alinhamentos horizontais como dos verticais [m] [m]
Corte [m] Aterro [m]
exigem o acompanhamento de profissionais experientes e
PCV = [76] 542,325 546,480 4,155
de uma equipe de campo bem treinada. Em face das cons-
77 542,489 546,780 4,291
tantes movimentações de pessoas e máquinas no local e a
constante movimentação de terra, as estacas, muitas vezes, 78 543,014 546,880 3,866
precisam ser reimplantadas reiteradamente, devendo, por 79 543,873 546,780 2,907
isso, haver uma sintonia constante entre os operadores das PIV = [80] 544,118 546,480 2,362
máquinas e o engenheiro responsável pelas implantações. 81 544,981 545,980 0,999
Outro fator importante a ser considerado na implanta-
82 546,257 545,280 0,977
ção de obras viárias é o crescente uso de sistemas de con-
trole de máquinas, aos quais os profissionais de Geomática 83 547,148 544,380 2,768
devem estar atentos. PTV = [84] 548,053 543,280 4,773

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