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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS


DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
MESTRADO EM PSICOLOGIA

TATIANA DRIELY VASCONCELOS MACHADO

SENTIDOS EM DISPUTA SOBRE O HOSPITAL NA ATENÇÃO EM SAÚDE


MENTAL POR ESTUDANTES DE PSICOLOGIA EM RECIFE

Recife

2022
TATIANA DRIELY VASCONCELOS MACHADO

SENTIDOS EM DISPUTA SOBRE O HOSPITAL NA ATENÇÃO EM SAÚDE


MENTAL POR ESTUDANTES DE PSICOLOGIA EM RECIFE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Psicologia da Universidade
Federal de Pernambuco, como requisito parcial
para a obtenção do título de Mestre em
Psicologia. Área de concentração:
Psicologia.

Orientadora: Profª. Drª. Wedna Cristina Marinho Galindo.

Recife

2022
Catalogação na Fonte
Bibliotecário: Rodriggo Leopoldino Cavalcanti I, CRB4-1855

M149s Machado, Tatiana Driely Vasconcelos.


Sentidos em disputa sobre o hospital na atenção em saúde mental
por estudantes de psicologia em Recife / Tatiana Driely Vasconcelos
Machado. – 2022.
67 f. : il. ; tab. ; 30 cm.

Orientadora : Wedna Cristina Marinho Galindo.


Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Pernambuco,
CFCH. Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Recife, 2022.

Inclui referências, apêndice e anexo.

1. Serviços de saúde mental. 2. Pessoal da saúde mental. 3.


Hospitais gerais. 4. Hospitais psiquiátricos. I. Galindo, Wedna Cristina
Marinho (Orientadora). II. Título.

150 CDD (22.ed.) UFPE (CFCH2023-056)


TATIANA DRIELY VASCONCELOS MACHADO

SENTIDOS EM DISPUTA SOBRE O HOSPITAL NA ATENÇÃO EM SAÚDE


MENTAL POR ESTUDANTES DE PSICOLOGIA EM RECIFE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Psicologia da Universidade
Federal de Pernambuco, como requisito parcial
para a obtenção do título de Mestre em
Psicologia. Área de concentração:
Psicologia.

Aprovada em: 30 / 08 / 2022.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________
Profª Drª. Wedna Cristina Marinho Galindo (Orientadora)
Universidade Federal de Pernambuco

____________________________________________
Profª Drª. Juliana Monteiro Costa (Examinador Externo)
Faculdade Pernambucana de Saúde

____________________________________________
Profª Drª. Klaylian Marcela Santos Lima Monteiro (Examinador Interno)
Universidade Federal de Pernambuco
AGRADECIMENTOS

No processo do mestrado e no curso de uma pesquisa, sabemos que podem existir


momentos de dúvidas, incertezas e um pouco de angústia. Quando entrei no curso não
imaginava que passaríamos por uma pandemia no meio do caminho e esses sentimentos
seriam exponenciados. Mas durante a caminhada tive suporte e apoio de pessoas que me
auxiliaram para que a caminhada fosse possível.

Primeiramente, agradeço a minha família, especialmente aos meus pais, marido e


irmão, por me incentivarem e sempre acreditarem no meu potencial.
Às minhas amigas, sempre dispostas a ouvir minhas incertezas e questionamentos e
ajudar no que fosse preciso.
À Wedna, minha orientadora desde a graduação, por todo conhecimento, paciência e
compreensão nas reviravoltas que a vida deu no percurso do mestrado.
À Universidade Federal de Pernambuco e ao Departamento de Psicologia, pelo
acolhimento e possibilidade de sempre aprofundar meu conhecimento na área da psicologia.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo
suporte financeiro possibilitando a realização da pesquisa.
RESUMO
A instituição hospitalar ocupa um importante lugar na assistência em saúde mental.
Historicamente esteve presente de formas diferentes (hospital psiquiátrico/ hospital geral) e
com participações diversas nos serviços ofertados na rede de saúde mental. Tais
características propiciaram um espaço para que sentidos fossem construídos e consolidados
em relação ao seu papel na assistência. Essa pesquisa teve como objetivo analisar os sentidos
da atenção hospitalar na assistência à saúde mental para estudantes de graduação em
psicologia, partindo do princípio que é pertinente a compreensão de como esses sujeitos
percebem a temática, pois em breve estarão no mercado de trabalho como profissionais.
Participaram da pesquisa cinquenta e um estudantes regularmente matriculados em cursos de
graduação em Psicologia no município de Recife/PE, respondendo questionário on-line sobre
o assunto. O conceito de dispositivo preconizado por Foucault e o entendimento do discurso
como prática, entrelaçado às relações de poder e sociais, nortearam a discussão do material
reunido, cujo tratamento e análise foram apoiados na Análise de Conteúdo proposta por
Bardin. Foi identificado que a instituição hospitalar se encontra em disputa no campo
discursivo, com referências a aspectos associados à luta antimanicomial e indicações de
conteúdos que podem ser associados ao paradigma manicomial. Entendemos que a
Contrarreforma Psiquiátrica em curso no Brasil pode estar sustentando esse campo em
disputa. A participação da psicologia na assistência em saúde mental desde o hospital também
aparece em tensão. Ora este núcleo de saber é apresentado como guardião de processos
humanizados junto à população, como acolher, escutar. Ora a atuação de psicólogas/os parece
reduzida ao clássico setting terapêutico da psicologia clínica A formação em psicologia tem
diante de si a tarefa de buscar afastar-se do ensino alinhado ao paradigma manicomial, para
que as transformações preconizadas pelo Movimento de Reforma Psiquiátrica possam
capacitar os profissionais em formação para atuação na rede de atenção em saúde mental.
Recomenda-se que pesquisas futuras aprofundem conhecimentos sobre as práticas
profissionais em torno da saúde mental no ambiente hospitalar. Investigações sobre
concepções de sujeito usuário do hospital junto a profissionais de saúde também serão bem-
vindas.

Palavras-chave: serviços de saúde mental; pessoal da saúde mental; hospitais gerais; hospitais
psiquiátricos.
ABSTRACT
The hospital institution exercises an important place in mental health care. Historically, it was
present in different ways (psychiatric hospital/general hospital) and with different
participation in the services offered in the mental health network. These characteristics
provided a space for meanings to be constructed and consolidated in relation to their role in
care. This research aimed to analyze the meanings of hospital care in mental health care for
undergraduate psychology students, assuming that it is pertinent to understand how these
individuals realize the subject as they will soon be in the job market as professionals. Fifty-
one students regularly enrolled in undergraduate courses in Psychology in the city of
Recife/PE participated in the research, answering an online questionnaire about the subject.
The concept of device transmitted by Foucault and the understanding of discourse as a
practice interlaced with power and social relations guided the discussion of the material,
which the treatment and analysis were supported by the Content Analysis proposed by Bardin.
It was identified that the institution is associated with a dispute with anti-asylum disciplines
and that it cannot be a paradigm. It was identified that the hospital is in dispute in the
discursive field, with references to aspects associated with the anti-asylum struggle and
indications of content that can be associated with the asylum paradigm. We understand that
the Psychiatric Counter-Reform, in progress in Brazil, may be supporting this disputed field.
The participation of psychology in mental health care from the hospital also appears in
tension. Sometimes this knowledge is presented as a guardian of humanized processes with
the population, as welcoming or listening. Sometimes the role of psychologists seems reduced
to the classic therapeutic setting of clinical psychology. The teaching in psychology has the
task of seeking to move away from teaching aligned with the asylum paradigm, so that the
transformations designated by the Psychiatric Reform Movement can capacitate professionals
in developing to work in the mental health care network. It is recommended that future
research deepens knowledge about professional practices around mental health in the hospital
environment. Investigations about hospital patients conceptions with health professionals will
also be welcome.

Keywords: mental health services; mental health personnel; hospital, general; psychiatric
hospitals.
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Faixa etária/Quantidade de participantes 41


Tabela 2 Gênero/Quantidade de participantes 41
Tabela 3 Anos de Reconhecimento do Curso de graduação/Quantidade
de participantes 42
LISTA DE SIGLAS

CAPS Centro de Atenção Psicossocial

CFP Conselho Federal de Psicologia

CNS Conselho Nacional de Saúde

CT Comunidade Terapêutica

DCN Diretriz Curricular Nacional

IES Instituições de Ensino Superior

MEC Ministério da Educação e Cultura

ONU Organização das Nações Unidas

OPAS Organização Pan-Americana da Saúde

RAPS Rede de Atenção Psicossocial

RAS Redes de Atenção à Saúde

RP Reforma Psiquiátrica

SUS Sistema Único de Saúde

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido


SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................... 11

2 O OBJETO DE PESQUISA ...................................................................................... 13

2.1 O PERCUSO DO HOSPITAL NA ASSISTÊNCIA À SAÚDE MENTAL ............................ 13

2.1.1 O movimento das Reformas .......................................................................................... 16

2.1.2 A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) ...................................................................... 19

2.1.3 A Contrarreforma .......................................................................................................... 20

2.2 NOTAS SOBRE A FORMAÇÃO EM SAÚDE MENTAL .................................................... 22

3 FUNDAMENTOS DE PESQUISA ........................................................................... 27

3.1 O DISPOSITIVO HOSPITALAR ............................................................................................ 27

3.2 O DISCURSO COMO PRÁTICA ........................................................................................... 33

4 PROCEDIMENTOS DA INVESTIGAÇÃO ........................................................... 36

4.1 TIPO DE PESQUISA ............................................................................................................... 36

4.2 ASPECTOS ÉTICOS ............................................................................................................... 36

4.3 SUJEITOS ................................................................................................................................ 36

4.4 INSTRUMENTOS ................................................................................................................... 37

4.5 TRATAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS ......................................................................... 38

5 RESULTADOS ........................................................................................................... 41

5.1 CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES ..................................................................... 41

5.2 TEMÁTICAS EM TORNO DO HOSPITAL .......................................................................... 42

5.2.1 O hospital ..................................................................................................................... 42

5.2.2 A atenção em saúde mental no hospital ....................................................................... 44

5.2.3 A rede de saúde mental ................................................................................................ 46

6 DISCUSSÃO ............................................................................................................... 50

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 55

REFERÊNCIAS .......................................................................................................... 57

APÊNDICE A - MODELO DO QUESTIONÁRIO ON-LINE ............................... 62


ANEXO A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO ........... 65
11

1 INTRODUÇÃO
O hospital ocupa um lugar importante na assistência à saúde mental. No Brasil,
entendemos que é uma instituição protagonista neste campo por estar presente na assistência
ao longo dos anos, mesmo que de formas diferentes e após modificações nas políticas
públicas.
O percurso da assistência à saúde mental no Brasil tem marcas históricas com
propostas antagônicas: o modelo manicomial e o psicossocial. O primeiro segue a direção de
um tratamento asilar, em que o hospital psiquiátrico é central e de maior importância. São
associadas a esse modelo referências terapêuticas como isolamento e tratamento
prioritariamente medicamentoso.

Seguindo por outro caminho, aberto após o movimento da Reforma Psiquiátrica, está o
modelo psicossocial que tem outro entendimento acerca da forma de se fazer assistência em
saúde mental, se voltando para a construção de uma rede de serviços para a saúde mental, nos
diversos níveis da saúde e tendo uma perspectiva biopsicossocial dos sujeitos em adoecimento
psíquico. O hospital está presente aqui como forma de suporte em nível terciário da atenção à
saúde, ou seja, como sendo um dos serviços de saúde dessa rede construída para assistência.

No entanto, no decorrer do processo da Reforma Psiquiátrica e início da construção


para o estabelecimento de uma rede de atenção psicossocial sólida e estruturada, assistimos a
uma Contrarreforma. Ou seja, mesmo após a abertura do caminho para uma atenção
psicossocial, o modelo manicomial volta a ser considerado como uma possibilidade de
referência para o tratamento. De forma que existe um campo de intensa disputa no âmbito da
saúde mental, por vagar em campos com parâmetros de tratamento e terapêutica bem diversas
na assistência.

Sendo assim, a instituição hospitalar coexiste nos modelos de assistência ao longo da


história, porém com objetivos e formas de atuação diferentes. De forma que é salutar buscar
compreender quais referências simbólicas estão atreladas a ela quando se discute sobre saúde
mental.

O objetivo desse estudo foi de analisar os sentidos da atenção hospitalar na assistência


à saúde mental para estudantes de graduação em psicologia, pois se entende que esses
profissionais em formação que, em breve irão ingressar no mercado de trabalho como
12

psicólogas/os, colocarão em prática o conhecimento adquirido perpassado pelas suas


vivências e compreensões individuais.
Além disso, buscou-se caracterizar o hospital diante dos outros dispositivos da
assistência à saúde mental, identificar terapêuticas associadas à atenção hospitalar na saúde
mental e que situações, no que se refere à saúde mental, são atendidas na atenção hospitalar.

Para isso foram estruturados seis capítulos nesta pesquisa. No primeiro é apresentado
o objeto de pesquisa sendo realizado um breve histórico do percurso do Hospital na
assistência em saúde mental, além de aspectos referentes à temática de saúde mental na
formação em psicologia nos curso de graduação. O capitulo seguinte aborda os fundamentos
da pesquisa, pondo em diálogo a perspectiva do hospital como dispositivo, apresentando a
conceituação do termo e como se entende o tema na pesquisa. Além disso, é posto e discutido
a perspectiva do discurso como prática.

A metodologia é apresentada no capítulo seguinte, detalhando qual o caminho


metodológico percorrido durante a realização da pesquisa. Instrumentos utilizados,
procedimentos de coleta, tratamento e análise dos dados são explanados nesta seção. Os
aspectos éticos também compõe o capítulo.

No capítulo subsequente é feita a apresentação dos resultados a partir de categorias e


subcategorias que emergiram durante o processo de análise dos dados. Cada categoria tem
uma síntese e, posteriormente, é feita a apresentação detalhada dos dados coletados que
compõe cada uma. Neste capítulo também é feita a caracterização sociodemográfica dos
estudantes que participaram da pesquisa. A discussão e as considerações finais compõem os
capítulos seguintes. As referências utilizadas encontram-se ao fim do texto.
13

2 O OBJETO DE PESQUISA

2.1 O PERCUSO DO HOSPITAL NA ASSISTÊNCIA À SAÚDE MENTAL

As funções e objetivos ligados à instituição hospitalar na assistência à saúde mental


estão relacionados, entre outros fatores, principalmente ao modo como a doença mental é
concebida, de acordo com o contexto sócio-político, pela sociedade.

A assistência por meio de leitos em hospitais não são recursos recentes, há registros
desde a Idade Média da existência desses leitos reservados para o tratamento de loucos, apesar
de serem diferenciados em comparação as demais patologias (eram leitos fechados, como
jaulas). No entanto, o acesso a eles era restrito apenas às loucuras consideradas curáveis,
como melancolia e episódios de violência, ficando os demais tipos de loucuras sem nenhum
tipo de assistência (FOUCAULT, 1975).

Seguindo o percurso histórico, no Renascimento também haviam práticas localizadas


de cuidado e assistência à loucura, inclusive com a abertura de instituições com esse intuito.
Apesar disso, à época, a loucura era tida
circula, faz parte do cenário e da linguagem comuns, é para cada um uma experiência
cotidiana que se

Posteriormente, há uma mudança dessa concepção, a loucura é deslocada do lugar de


admiração para o de exclusão. Por volta do século XVII, são criadas casas de internamento,
também conhecidas como Hospitais Gerais, que trata não só daqueles considerados loucos,
mas também aqueles que estão à margem da sociedade (enfermidades diversas e prostitutas,
por exemplo) (FOUCAULT, 1998; 1975). É importante salientar a posição de poder ligada
aos Hospitais Gerais n
médico. É antes uma estrutura semijurídica, uma espécie de entidade administrativa que, ao

1978, p. 54).

Para além dos Hospitais Gerais, Foucault (1998) faz alusão a outro tipo de instituição
hospitalar anterior ao século XVIII, a qual estava ligada a um caráter assistencialista aos
pobres enfermos, tendo em vista que esses indivíduos precisavam de assistência e, estando
doentes, poderiam representar um risco de contágio para a população em geral, caso não
fossem tratados. Dessa forma, essas instituições tinham um intuito caridoso, mas também
14

propiciavam a exclusão e segregação desses sujeitos que eram acolhidos. Tal instituição não
era médica e não objetivava a cura dos indivíduos, era comandada em sua maioria por
religiosos e possuía intuitos ligados a isso também.

O personagem ideal do hospital, até o século XVIII, não é o doente que é


preciso curar, mas o pobre que está morrendo. E alguém que deve ser
assistido material e espiritualmente, alguém a quem se deve dar os últimos
cuidados e o último sacramento [...] e, portanto, a salvação da
alma do pobre no momento da morte e a salvação do pessoal hospitalar que
cuidava (FOUCAULT, 1998, p. 101-102)

A medicalização dos hospitais ocorre no final do século XVII, a intervenção e


presença dos médicos passam a ser cada vez mais regulares, os indivíduos passam a ir à
instituição em busca da cura (AMARANTE, 2015). Esse processo do hospital se tornar um
lugar médico tem origem tanto no deslocamento do modelo de intervenção médica, como na
disciplinarização do espaço hospitalar de modo que é possível vigiar os sujeitos, controlar o
ambiente e o que acontece dentro dele, sendo o médico o principal detentor de poder da
instituição (FOUCAULT, 1998).

Philippe Pinel, médico que ficou conhecido como o fundador da psiquiatria, foi
responsável pela medicalização do Hospital de Bicêtre em Paris (AMARANTE, 2007). Nessa

(concretas)
considerados por Pinel os dois pilares do tratamento que o médico chamou de alienismo
(FOUCAULT, 1975; AMARANTE, 2015).

O tratamento moral pineliano, como ficou popularmente conhecido, trouxe aos loucos
um cuidado psiquiátrico sistemático, porém baseado na disciplina, controle e que buscava ter
uma função corretiva para com os pacientes. Entendia-se que era necessária a retirada do
sujeito do seu local de convivência habitual, e a partir do seu isolamento ter controle sob suas
condições de vida, sendo o hospital psiquiátrico o local em que isso seria realizado.

Com esse tipo de instituição e tratamento se s indivíduos e


reconduzir suas ideias e pensamentos (QUEIROZ, 2001). O ambiente que era proporcionado
aos internos era o de um encadeamento moral e de um constante julgamento, o louco era
frequentemente vigiado, questionado e sofria sanções imediatas a erros ou desvios da conduta
considerada normal (FOUCAULT, 1975).
15

As sanções e punições, em caso de não seguimento das regras, era uma prática
entendida como parte do tratamento. Os castigos podiam envolver desde a privação de visitas
até a diminuição dos alimentos, colete de força e reclusão em solitária, por exemplo (ENGEL,
2001).

Nos hospitais psiquiátricos (ou manicômios) para além da assistência e terapêutica que
eram ofertadas aos pacientes, é importante ressaltar que a arquitetura, a dinâmica e as relações
eram consideradas os instrumentos para cura (FOUCAULT, 1998). De acordo com Amarante
(2015, p. 76) o ambiente do asilo
chegam à percepção dos loucos, seja

Contudo, esse modelo de hospital psiquiátrico foi sendo alvo de diversas críticas dos
estudiosos contemporâneos de Pinel e da sociedade como um todo no que diz respeito ao
autoritarismo, a superlotação, além disso:

enorme dificuldade em estabelecer limites entre a loucura e a sanidade; as


evidentes funções sociais (ainda) cumpridas pelos hospícios na segregação
de segmentos marginalizados da população; as constantes denúncias de
violência contra os pacientes internados, fizeram com que a credibilidade do
hospital psiquiátrico e, em última instância, da própria psiquiatria, logo
chegasse aos mais baixos níveis. (AMARANTE, 2007, p. 38)

Nesse período surgiu como alternativa a colônia de alienados, esse modelo de


tratamento associava ao tratamento o trabalho, vendo-o como um recurso terapêutico que
auxiliaria a obtenção da cura. O trabalho proporcionaria vontade, energia e seria também um
meio dos sujeitos voltarem para sociedade ao fim do tratamento (QUEIROZ, 2001).

Entretanto, as colônias de alienados em pouco tempo passaram a mostrar problemas


semelhantes aos hospitais psiquiátricos tradicionais, tornando-se também instituições asilares
(AMARANTE, 2007).

No Brasil, o Hospital D. Pedro II foi o primeiro hospital psiquiátrico criado em 1852.


Posteriormente, em 1912, foi promulgada a primeira Lei Federal de Assistência aos Alienados
que aumentava o número de instituições para doentes mentais (FIGUEIREDO, DELEVATI e
TAVARES, 2014). A segunda Lei Federal de Assistência aos Doentes Mentais foi
promulgada em 1934 que determinava, entre outras coisas, o hospital como única alternativa
de tratamento no âmbito da psiquiatria (RAMMINGER, 2002). Enfatizava assim, o
protagonismo que a instituição hospitalar tinha no âmbito da assistência em saúde mental.
16

A quantidade de manicômios e de pessoas internas nessas instituições foi aumentando


com o passar do tempo no país. Segundo Cerqueira (1984) entre as décadas de 50 e 70 houve
um aumento de 213% no número de pessoas internadas em hospitais psiquiátricos.

O Hospital Colônia de Barbacena foi o maior manicômio brasileiro. Localizado no


estado de Minas Gerais iniciou suas atividades no ano de 1903, recebendo pessoas de várias
partes do país, muitas das quais não sabiam o motivo pelo qual estavam sendo mandadas para
a instituição (PERON, 2013; ARBEX, 2013).

Daniela Arbex (2013) narra


ao assassinato em massa ocorrido na Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial, a história
desse hospício em que ocorreram cerca de 60 mil mortes e 70% das pessoas internadas não
possuíam diagnóstico de doença mental. A instituição era superlotada e com condições
insalubres para os pacientes:

Os pacientes do Colônia morriam de frio, de fome, de doença.


Morriam também de choque. Em alguns dias, os eletrochoques eram
tantos e tão fortes, que a sobrecarga derrubava a rede do município.
Nos períodos de maior lotação, dezesseis pessoas morriam a cada dia.
Morriam de tudo e também de invisibilidade (ARBEX, 2013, p.13)

2.1.1 O movimento das Reformas

Diante das experiências mal sucedidas com os modelos manicomiais e hospitais

Impulsionada pelas questões que surgiram após a Segunda Guerra Mundial,


perceberam-se as condições desumanas as quais os indivíduos eram submetidos nos
manicômios e que muito se assemelhavam aos campos de concentração das guerras. Ao abrir
espaço para essas reflexões cria- ições de possibilidade histórica para outro período

diversas em diferentes
países, mas que tinham em comum a busca por uma nova forma de assistência à saúde mental.
Algumas dessas reformas propunham, mesmo que de maneiras diferentes, que o modo como
a instituição hospitalar figurava na atenção à saúde mental deveria ser modificado para que se
pudesse proporcionar uma melhor assistência e cuidado aos sujeitos.
17

Amarante (2007) caracteriza as reformas em grupos de acordo com as mudanças


principais que eram preconizadas por cada uma delas. A Comunidade Terapêutica e a
Psicoterapia Institucional formavam um desses grupos e tinham como premissa que as
dificuldades encontradas nos modelos manicomiais estavam relacionadas à gestão do próprio
hospital e que deveriam ser inseridas mudanças na instituição de forma que o hospital pudesse
se tornar um local efetivamente terapêutico.

Para o segundo grupo, formado pela Psiquiatria de Setor e a Psiquiatria Preventiva, a


instituição do hospital psiquiátrico, em si, era o motivo dos fracassos do modelo manicomial.
Tais reformas propunham a descentralização do hospital a partir da criação de serviços
alternativos que seriam responsáveis pelo cuidado terapêutico aos pacientes. Essa ideia
proposta é semelhante ao modelo proposto no Brasil posteriormente, o psicossocial.

Os movimentos de Reforma Psiquiátrica tiveram início no continente europeu, países


como Inglaterra, França e Itália foram locais que sediaram algumas das experiências citadas
acima. Na Itália, Franco Basaglia foi um nome de grande importância pelas mudanças
realizadas no hospital psiquiátrico de Gorizia e, depois, em Trieste. Basaglia propôs a
desativação dos manicômios, tendo os serviços comunitários de saúde como alternativa, o que
também possibilitava a reinserção dos pacientes na sociedade (JUNQUEIRA & CARNIEL,
2012).

A desinstitucionalização proposta ia além do fechamento da estrutura hospitalar em si,


estava relacionada à prática da assistência em saúde mental e ruptura com um modelo de
trabalho que segregava os pacientes. A desinstitucionalização é:

a construção de uma nova política de saúde mental; a centralização do


trabalho terapêutico no objetivo de enriquecer a existência global; a
construção de estruturas externas totalmente substitutivas à internação no
manicômio; a não-fixação dos serviços em um modelo estável, mas
dinâmico e em transformação; a transformação das relações de poder entre a
instituição e os sujeitos; o investimento menor dos recursos em aparatos e
maior nas pessoas (HIRDES, 2009 , p. 300)

Basaglia visitou o Brasil em duas ocasiões, realizou conferências e visitou


manicômios, além disso, concedeu entrevistas à imprensa denunciando a situação precária dos
manicômios (SERAPIONI, 2019). Suas ideias e reflexões sobre a assistência em saúde mental
tiveram grande impacto nessa área no Brasil. Desse modo, o movimento da Reforma
18

Psiquiátrica (RP) começou a ganhar força tardiamente no país em relação ao continente


europeu, no fim da década de 70 e início da década de 80 (AMARANTE, 1995).

Vale salientar o contexto em que a RP aconteceu no país: pós-ditadura e de


redemocratização do país, concomitante ao surgimento do Sistema Único de Saúde (SUS) que
trazia uma nova visão para as políticas de saúde (KINOSHITA, 2009; AMARANTE, 2018).
m movimento político,
impregnado ética e ideologicamente e o processo de sua construção não pode ser

Sendo assim, a partir da década de 1970 inicia-se um movimento mobilizado pela


Reforma Psiquiátrica brasileira de crítica ao processo e dinâmica vigente relacionado à
institucionalização da loucura e a situação dos hospitais psiquiátricos. Na década seguinte
novas práticas começam a ser pensadas como alternativa ao modelo manicomial
(AMARANTE, 2018).

Em 1989, foi realizada em Santos uma intervenção pelo poder público municipal na
Casa de Saúde Anchieta, hospital privado que prestava serviços ao Estado, em razão da
violação de direitos, atrocidades e maus tratos que aconteciam aos pacientes que lá estavam
internados (YASUI, 2006; KINOSHITA, 2009). Esse momento é entendido como um marco

anteriormente quando se procurava melhorias para os asilos, a intervenção em Santos


extinguiu a Casa de Saúde e deu início ao que se denominou de rede substitutiva, ou seja,
outros serviços de saúde mental possibilitando a descentralização do hospital (AMARANTE,
2018; YASUI, 2006). De acordo com Hirdes (2009) esse acontecimento é:

um marco na história da psiquiatria brasileira, por se tratar de uma


experiência inovadora, em que ocorreu uma intervenção médico-legal num
asilo, esta pode ser considerada a primeira experiência concreta de
desconstrução do aparato manicomial no Brasil, e de construção de

No âmbito mundial as buscas por melhorias no cuidado aos sujeitos em sofrimento


psíquico também continuavam. Em 1991, a Organização das Nações Unidas (ONU) lançou a
Resolução 46/119 que trata acerca da assistência em saúde mental e a proteção de pessoas

portante salientar que tal resolução


19

tornava a internação como não obrigatória, além de estabelecer que o acesso aos
estabelecimentos de saúde mental deve ser livre, podendo o paciente sair da instituição sem
restrições (BERTOLOTE, 1995)

Já em 2001, foi orientada pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) a


assistência em nível primário de saúde, inserida na comunidade e com a participação destes
(GUIMARÃES E ROSA, 2019). Percebendo-se, dessa forma, que o movimento de
descentralização do dispositivo hospitalar estava cada vez mais forte, carregando princípios
que busca entender os usuários dos serviços como singulares, além de promover sua
cidadania.

Corroborando com esses ideais, no Brasil é aprovada a lei 10.216/01, conhecida como
a Lei da Reforma Psiquiátrica, que dispõe sobre os direitos das pessoas portadoras de
transtorno mentais e redireciona o modelo assistencial. Com relação aos internamentos e
tratamentos ligados a lógica do isolamento, a lei
suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem

Por meio dessa lei também ocorreu uma mudança gradativa do direcionamento dos
recursos financeiros, migrando do serviço hospitalar para os extra-hospitalares (Centro de
Atenção Psicossocial [CAPS] e centros de convivência, por exemplo), o que possibilitou o
investimento para construção e aprimoramento dos serviços substitutivos ao hospital
psiquiátrico (GARCIA, 2011).

2.1.2 A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)

A legislação brasileira e as políticas públicas vão acompanhando as transformações


trazidas pela Reforma Psiquiátrica e a luta antimanicomial. Com a Rede de Atenção
Psicossocial (RAPS), instituída pela Portaria n. 3088/2011, os serviços de saúde mental
das Redes de Atenção à Saúde (RAS) - sistema
integrado que opera de forma contínua, proativa e voltado para as condições agudas e crônicas
(LIMA & GUIMARÃES, 2019, p. 884).

A instituição da RAPS na assistência a saúde mental foi um marco, pois criou uma
rede de serviços substitutivos ao hospital, descentralizando a instituição como local de
cuidado ao sofrimento psíquico. Afirmando, dessa forma,
20

mudar
2018, p. 81).

Na RAPS, o hospital figura por meio de enfermarias especializadas e serviço


hospitalar de referência em Hospital Geral, bem como um ponto de atenção à urgência e
emergência. O hospital psiquiátrico aparece como possibilidade de apoio em regiões em que a
RAPS ainda não foi inteiramente implementada, sendo frisado no texto da Portaria que se
deve priorizar a expansão da rede e seus serviços.

A assistência prestada ocorre


relacionados aos transtornos mentais e ao uso de álcool, crack e outras drogas, em especial de

2011). Outra questão importante de frisar em relação à portaria 3.088/2011 é o


estabelecimento da substituição progressiva dos leitos em hospitais psiquiátrico por serviços
substitutivos inseridos na comunidade (SOUZA E JORGE, 2019).

2.1.3 A Contrarreforma

A assistência a saúde mental no Brasil, por meio da RAPS, passou a atuar numa
perspectiva antimanicomial de forma a se adequar aos preceitos do movimento da Reforma
Psiquiátrica. Entretanto, nos anos recentes alguns aspectos do modelo asilar voltaram a ser
possibilitados em razão de influências conservadoras e neoliberais nas políticas públicas. por
meio de legislações (GUIMARÃES & ROSA, 2019).

As Comunidades Terapêuticas (CTs) foram inseridas na como um componente


substitutivo na RAPS (BRASIL, 2012), contudo essas instituições não se enquadram no
na
perspectiva manicomial, com cunho religioso e sem uma equipe técnica para compor a rede
de saúde mental. GUIMARÃES & ROSA, 2019, p. 121).

Posteriormente, em 2016 (Portaria SAS/MS nº 1.482 de 25/10/2016), tal serviço é


reiterado como um serviço de saúde da assistência em saúde mental, possibilitando que receba
recursos advindos do Sistema Único de Saúde (SUS).

As influências conservadoras vão evidenciando a fragilidade da perspectiva


antimanicomial e do modelo psicossocial na assistência à saúde mental perante o conturbado
contexto político-social brasileiro. No ano de 2016, ocorre o impeachment da então presidenta
21

Dilma Rousseff, o que agrava a instabilidade em todos os âmbitos do país. Vale salientar que
todo o processo do impeachment, desde a instauração, foi questionado, de forma que
(NOGUEIRA,
2016, p. 249)

No ano seguinte, no governo do presidente Michel Temer que assumiu após a


destituição de Dilma, ocorrem significativas mudanças na gestão e na Política da Saúde
Mental no Brasil. A Portaria 3588/2017, que dispõe sobre algumas alterações na RAPS,
culminou os retrocessos no que se refere a desinstitucionalização e reabilitação psicossocial
que estavam ocorrendo no âmbito da saúde mental.

É observada a remanicomialização da saúde mental, por meio da referida Portaria. Um


dos pontos das alterações é o aumento do valor das diárias para os hospitais psiquiátricos, não
ocorrendo nenhum reajuste na verba destinada aos CAPS, o que precariza o principal serviço

hospital psiquiátrico, que na lógica da Reforma sofreu uma amortização gradativa, sendo

É previsto ainda, pela portaria, um incentivo às enfermarias psiquiátricas em Hospital


Geral, por meio do aumento dos recursos financeiros aos hospitais com maior número de
leitos (BRASIL, 2017). Vale salientar que as análises que embasaram essas mudanças foram
de caráter quantitativo, sem considerar determinantes sociais, além dos avanços alcançados
pela assistência antimanicomial.

Ainda no que diz respeito às novas legislações que trouxeram transformações na


assistência em saúde mental, a nota técnica nº 11/2019 apresenta-se com esclarecimentos
sobre as mudanças na Política Nacional de Saúde Mental e nas Diretrizes da Política Nacional
sobre drogas e tem como foco principal a reinclusão do Hospital Psiquiátrico na Rede de
Atenção Psicossocial, partindo da premissa de que não se deve falar em rede substitutiva,
tendo em vista que nenhum serviço substitui outro (em referência ao que era proposto
inicialmente na RAPS, dos CAPS serem serviços substitutivos aos leitos psiquiátricos)
(LIMA, 2019).

Nessa nova organização da rede, o dispositivo hospitalar figura por meio do hospital
psiquiátrico e das enfermarias especializadas em hospital geral, não sendo mais incentivado o
22

fechamento dos leitos (BRASIL, 2019). Ainda que diferente dos moldes pré-Reforma
Psiquiátrica (em relação as condições das instituições e suporte terapêutico, por exemplo) há,
assim, a concretização do retorno de uma perspectiva asilar no âmbito da saúde mental e
consequente perca de muitos dos avanços conquistados ao longo das décadas.

A divulgação da nota técnica provocou uma reação de movimentos sociais,


trabalhadores e conselhos profissionais em razão das mudanças que propunha, amplamente
contrárias ao que vinha sendo construído. O Conselho Federal de Psicologia (CFP)
manifestou repúdio por meio de nota, afirmando que a nova legislação apresenta questões que
desconstroem a política de saúde mental (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2019).

Percebe-se, dessa forma, a busca pelo retorno da instituição hospitalar psiquiátrica no


tratamento em saúde mental, salientando a volta da perspectiva de um tratamento asilar não só
pela figura do hospital psiquiátrico, como também das comunidades terapêuticas. O retrocesso
dessas mudanças da legislação da saúde mental está atrelado ao contexto social e político do
país atualmente, de forma que o retorno do hospital psiquiátrico/modelo asilar traz
consequências práticas e imediatas ao tratamento dos pacientes, mas também está relacionado
ao poder e controle que é exercido pela instituição hospitalar.

2.2 NOTAS SOBRE A FORMAÇÃO EM SAÚDE MENTAL


A preocupação com a formação em psicologia existe desde o início da história do curso.
Inicialmente, se propunha uma psicologia com uma posição mais positivista voltada para a
teoria e filosofia, perspectiva que foi sendo modificada ao longo das décadas de
desenvolvimento da profissão.

O currículo dos cursos de graduação em psicologia era baseado de acordo com o


Curriculum Mínimo. O documento, oficializado em 1962 pelo Conselho Federal de Educação,
detalhava o tempo e as matérias necessárias para o curso de Psicologia que podia ser
bacharelado, licenciatura e formação de psicólogos. A formação durava quatro anos para o
bacharelado e licenciatura, já para formação de psicólogo era acrescentado um ano a mais no
qual aconteciam os estágios supervisionados (COSTA et al., 2012). Em relação à parte prática
da formação (os estágios supervisionados), o Curriculum Mínimo preconizava que deveriam
ser ofertados em três áreas de atuação do psicólogo: clínica, educação e trabalho (CURY &
NETO, 2014).
23

No Curriculum Mínimo estamos diante a


transmissão de conhecimentos se dá por meio do parcelamento de disciplinas, o estudo é
isolado dos problemas e dos processos concretos do contexto social em que se dão, e, por fim,
a aprendizagem é realizada por RDES, 2012, p.
218).

Em 2004 é publicado pelo Conselho Nacional de Educação por meio da Resolução nº


08/2004 as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para os cursos de graduação em
Psicologia (COSTA et al., 2012), em substituição ao modelo de formação do Curriculum
Mínimo. As DCNs são norteadoras para construção e implementação dos currículos dos
cursos de graduação em Psicologia.

É a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996, que atualiza as estratégias de

orientações sobre princípios, fundamentos, condições de oferecimento e procedimentos para o


RDES, 2012, p.
218). De acordo com a lei, as competências e habilidades são definidas por cada curso
superior tendo por base o que estava preconizado nas diretrizes.

No âmbito do processo histórico da formação em psicologia, o desenvolvimento das


Diretrizes Curriculares foi um importante marco ocorrendo por meio de uma construção
coletiva, debates e discussões ativas entre os atores/instituições envolvidas. As DCNs
trouxeram mudanças e inovações, uma delas foi a existência, dentro do currículo, de um
núcleo comum (relacionado com a formação básica do aluno) e de um núcleo voltado para
ênfases curriculares (relacionado com o aprofundamento em domínios da psicologia). Além
disso, houve a ampliação da necessidade de estágio, antes o estágio ocorria apenas na fase
final da formação, com as DCNs deve ocorrer desde a formação básica (núcleo comum) e no
núcleo voltado para as ênfases (COSTA et al., 2012).

De modo mais amplo, em substituição à formação baseada na transmissão dos


conteúdos e conhecimentos disciplinares tradicionais preconizados pelo Curriculum Mínimo,
as DCNs possibilitaram uma formação adaptável às transformações da sociedade e às
necessidades relacionadas a esses processos de mudanças (COSTA et al., 2012; CURY &
NETO, 2014).
24

As Diretrizes Curriculares Nacionais foram, inegavelmente, um grande avanço na


forma como se pensa e se constrói a formação em psicologia. Mas, conforme diagnóstico de
Cury & Neto (2014):

no aspecto geral as DCN não enfrentaram diretamente o centralismo


verbalista da sala de aula na tradição conteudista da formação em Psicologia,
nem problematizaram a contento qual a relação dessa forte tradição com as
demais atividades práticas desenvolvidas nos cursos. (p. 508).

É preciso, portanto, equilibrar os aspectos relacionados à teoria e à prática. Cury e


Neto (2014) fazem essa reflexão ao levar em consideração os diferentes contextos de
formação em Psicologia, em alguns cenários em que vários docentes se formaram no modelo
do Curriculum Mínimo pode existir uma maior predominância da teoria. Discutem que em
algumas instituições particulares de ensino é comum haver uma maior predominância da
prática, pelo pouco investimento em pesquisa. Sendo assim, percebe-se que para além das

sinergia do encontro entre essas duas dimensões da prática acadêmica na direção do

Poppe & Batista (2012) realizaram um estudo com o objetivo de analisar as


contribuições da inserção das práticas em saúde na graduação em Psicologia em razão das
DCNs. A pesquisa foi realizada com alunos, professores, supervisores e coordenadores em
duas universidades do estado de São Paulo, sendo uma pública e uma privada. A investigação
indicou que as mudanças promovidas pelas diretrizes curriculares impactaram positivamente a
graduação em Psicologia, mas é indispensável atentar para uma formação prática voltada para
os princípios do SUS. A inserção da prática desde o início do curso é um dos aspectos mais
positivos das mudanças de acordo com docentes participantes do estudo. Contudo, estes
demonstraram preocupação em como construir essa formação integrada sendo necessário
repensá-la de modo a assegurar a consolidação das competências estabelecidas. Os estudantes
que contribuíram a investigação em questão formularam reflexões frágeis no que diz respeito
à articulação entre Psicologia e Saúde o que sugere que pela inserção da psicologia na saúde
ser recente, principalmente no setor público, afeta a forma como é compreendida pelos
alunos.

Historicamente, a formação profissional em psicologia era voltada mais para a atuação


clínica e percepção das questões e fenômenos psicológicos individuais. Mesmo que
existissem estudos que considerassem a perspectiva macrossocial, coletiva e contextualizada
25

dos aspectos psicológicos o que era mais difundido era uma concepção individualista. De
acordo com Bernardes (2010) antes mesmo da regulamentação da profissão já se tinha uma
formação que resultava em profissionais liberais, autônomos e que atuariam em consultórios
privados. Ferreira Neto (2010) refere que a tradição da formação clínica perdurou por muito
tempo, sendo prevalente até a década de 1990, e suas consequências prosseguem até hoje.
Quanto a um dos principais argumentos que sustentam as DCNs, Bernardes (2012) comenta

modus operandi centrada no indivíduo e (2) localizada na atuação


clínica.
Aos poucos, a formação voltou-se, em menor grau, também para a área escolar e do
trabalho/indústria. Mesmo representando certo avanço, vale salientar que no campo da prática
a atuação psicológica continuou voltada para a atuação com características de atendimento
clínico individual. Conforme Dimenstein (2001) discute há uma tendência dos profissionais a
permanecer nessas atividades que consolidam o modelo clássico de atuação, ainda que tenham
outro vínculo de trabalho.
Percebe-se que há a necessidade de uma profunda reorientação da formação para as
necessidades reais da sociedade, uma formação contextualizada com a atualidade das
demandas dos serviços em saúde e da população. Bernardes (2010) há 11 anos já indicava que
essa nova realidade se mostra distante dos currículos e formações existentes, de modo que

Psicologia e as características político-


Após o surgimento do Sistema Único de Saúde (SUS) e a inserção do profissional de
psicologia para atuação na saúde pública, se torna evidente a necessidade de (re)
planejamento dos métodos e competências da formação. Silva & Carvalhaes (2016) e Ferreira
e Facci (2020) apontam em seus estudos para a importância de abordar, durante a formação,
temáticas referentes à pobreza, problematizações sobre intervenções e análises históricas e
políticas da atuação em psicologia de forma a diminuir ações padronizadas e automáticas dos
futuros profissionais.

As DCNs já inserem uma perspectiva que se contrapõe ao modelo assistencial


individual, propondo que o psicólogo tenha uma atuação em equipe multiprofissional com
uma perspectiva para a transformação social. No entanto, ainda é necessária uma estruturação
das estratégias de ensino que propiciem essas possibilidades para os cursos de Psicologia.
26

A formação de profissionais de saúde em consonância com as diretrizes e princípios


do SUS é um desafio para todas as profissões de saúde, inclusive para os psicólogos (POPPE
& BATISTA, 2012). Na psicologia há o incremento de que a inserção prática profissional na
saúde pública se iniciou quase que simultaneamente ao momento de mudanças alcançadas
pela Reforma Psiquiátrica, intercorrendo na necessidade de reflexão de diversas mudanças na
forma do fazer psicologia e, consequentemente, na forma do ensinar.

Sabe-se atualmente que a formação abrange, para além de conhecimento técnico-


científico, aspectos de produção de subjetividade, produção de habilidades técnicas e de
pensamento e o conhecimento do SUS. De forma que, pensar a formação a partir do cenário
de prática e suas problemáticas é uma possibilidade frente às necessidades e lacunas do
processo de ensino-aprendizagem. De acordo com Ceccim & Feuerwerker (2004) a formação
estruturar-se a partir da problematização do processo de trabalho e sua capacidade de
dar acolhimento e cuidado às várias dimensões e necessidades de saúde das pessoas, dos
coletivos e das populações .

Concordando com a formulação de Ceccim & Feuerwerker (2004) e tendo em vista os


aspectos que destacamos da formação em psicologia no Brasil, salientamos que a discussão
sobre formação e currículo de profissionais de psicologia deve superar a simplicidade de uma
grade de disciplina ou da descrição de conteúdo. É imprescindível compreender a importância
-lo como efetivamente

(BERNARDES, 2012, P. 219). Na presente pesquisa, as notas sobre formação de psicólogos


compõem o contexto que consideramos da participação de discentes respondentes ao nosso
questionário. A análise do material, portanto, conta com tal contextualização.
27

3 FUNDAMENTOS DE PESQUISA
Neste capítulo serão abordados dois tópicos que embasam teoricamente o estudo. A
noção de dispositivo apresentada por Foucault é o primeiro deles e norteia o entendimento
acerca da instituição hospitalar nesse estudo. Na sequência são expostas, tendo como base
teórica o mesmo autor, considerações sobre a perspectiva do discurso como prática,
ponderando-o como manifestação que influencia e é influenciada pelo contexto político e
socioeconômico.

3.1 O DISPOSITIVO HOSPITALAR

O conceito de dispositivo tratado por Foucault norteará o entendimento da instituição


hospitalar neste estudo. A definição dada pelo autor é que o dispositivo é:

um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições,


organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas
administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais,
filantrópicas. Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo
(FOUCAULT, 1998, p.244)

De modo a situar o uso do termo dispositivo nas obras de Foucault, é importante


salientar que em suas publicações podem ser distinguidos dois momentos: o arqueológico e o
genealógico. Seus estudos iniciai
compõe o período arqueológico, já os estudos do projeto genealógico começam

a partir da década de 1970, principalmente com a publicação de Vigiar e


Punir e da História da Sexualidade I: A Vontade de Saber, além de uma série
de conferências, palestras e aulas através das quais Foucault trouxe suas
concepções da gênese do saber, a partir do entendimento do poder.
(MORAIS, 2017, p.184).

O conceito de dispositivo passa a ser discutido por Foucault em sua obra no momento
de transição do período arqueológico para o da genealogia (MALAMUT, MODENA,
PASSOS, 2011).

A episteme era
conjunto de relações que liga tipos de discursos e que corresponde a uma dada época
episteme estava restrito a ordem do
discurso de forma que o próprio Foucault passa a sentir falta em seu trabalho da análise de
28

poder, da integração do discursivo e do não-discursivo (CASTRO, 2009). Surge, então, o


conceito do dispositivo, mais amplo e englobando aspectos para além do discursivo:

Com efeito, a episteme é um dispositivo especificamente discursivo,


enquanto o dispositivo, no sentido que Foucault explorará dez anos mais
-

O dispositivo é a rede que se estabelece entre elementos, podendo estar presentes em


uma relação, em um fenômeno social, por exemplo. Podendo ser constituído por uma
infinidade de aspectos discursivos e não discursivos (KLEIN, 2007).

Foucault (1998) ressalta ainda dois aspectos em relação ao conceito de dispositivo. O


primeiro é que na relação que é estabelecida entre esses elementos heterogêneos, sejam eles
discursivos ou não, existe uma espécie de jogo em que ocorrem mudanças de posição e
modificadores de funções. Sendo assim o discurso pode surgir como parte de um programa
ao contrário, como elemento que permite justificar e mascarar
uma prática que permanece muda (Ibidem, p. 244).

O outro aspecto levantado pelo autor com relação ao dispositivo diz respeito à sua
função de responder a determinada urgência de acordo com o momento histórico em que
surge. Isso evidencia a dinamicidade que é atrelada ao dispositivo para que este possa se
modificar e tornar-se responsivo a uma urgência ou demanda que surja no momento histórico.
O dispositivo tem uma função estratégica dominante, pois é atravessado por relações de
poder, sustenta saberes, possibilita desenvolver ou inibir determinadas forças, bem como
organizar e influenciar os sujeitos que estão em seu contexto.

Agambem (2009) discute outro aspecto no que diz respeito aos dispositivos de que
estes sempre implicam um processo de subjetivação. De forma que devem produzir além dos
discursos, o seu sujeito, tendo em vista que realizam uma atividade de governo que não tem
nenhum fundamento no ser (MALAMUT, MODENA, PASSOS, 2011). É necessário, então,

um processo de subjetivação, sem o qual o dispositivo não pode funcionar


como dispositivo de governo, mas se reduz a um mero exercício de
violência. O dispositivo é, na realidade, antes de tudo, uma máquina que
produz subjetivações, e só enquanto tal é uma máquina de governo.
(AGAMBEM, 2005, p. 14-15)

Foucault ainda compreende que o dispositivo formado por três dimensões: o saber, o
poder e os modos de subjetivação, estas não possuem contornos definitivos, são variáveis e se
29

culturais em que o poder e o saber se cruzam, e em que nossa compreensão de individuo, de

As regras de funcionamento, dinâmica, estrutura são incluem aspectos discursivos e


não discursivos que compõe o que é entendido como dispositivo hospitalar. Inferindo do
histórico de surgimento do hospital, como forma de exclusão tanto do doentes como dos
marginalizados para proteção do resto da sociedade, percebe-se uma das formas de controle
que se pretende com a existência da instituição, é no hospital que se desvela de forma mais
concisa o controle do "corpo socia corpo individua (anátomo-
patológico)

A instituição hospitalar médica pode ser entendida, então, como um local de produção
das técnicas de intervenção médicas e da prática disciplinar. Aspectos como a classificação
dos doentes, a posição das salas, as rotinas estabelecidas e a constante observação dos sujeitos
contribuem para essa forma de entendimento da instituição frente à sociedade. Ademais, a
figura do médico é de protagonismo, responsável por definir toda a dinâmica e hierarquia da
instituição.

Nos hospitais psiquiátricos, todo o delineamento na forma como o tratamento e


terapêutica era posto aos pacientes tornava a função médica primordial, como um
. O médico era aquele que tinha o poder de explicitar o que estava escondido nos
sujeitos e depois dominar e harmonizar aquilo que foi tornado visível. Dessa forma:

A terapêutica da loucura é a arte de subjugar e de dominar, por assim dizer,


ao alienado, pondo-o em estreita dependência de um homem que, por suas
qualidades físicas e morais, está apto para exercer sobre ele um domínio
irresistível e é capaz de trocar a cadeia viciosa de suas ideias. (CAPONI,
2009, p. 100)

Com efeito, a doença mental era assistida por meio de um delimitado conjunto de
estratégias de poder, visto que os manicômios também respondiam às demandas sociais para
garantir a ordem social com promessas de cura, em razão da suposta eficiência terapêutica que
o isolamento proporcionava.

No entanto, prover um ambiente livre de influências exteriores, conseguir lidar com as


resistências pessoais, submeter a um regime médico e impor novos hábitos aos loucos eram
alguns dos principais motivos para isolá-los em hospitais psiquiátricos, além, claro, da já
30

citada segurança da sociedade e da família. Percebendo-


trata de uma questão de poder, medir o poder do louco, neutralizar os poderes exteriores,
(Ibidem, p. 100)

Semelhante às três dimensões propostas por Foucault que compõem o dispositivo,


Deleuze entende esse conceito como formado por três eixos: a produção do saber, o poder e a
produção de sujeitos. O autor também define dispositivo como um conceito operatório
multilinear, ou seja, formado por linhas, curvas e regimes; tais curvas e regimes são
transitórios, sofrem variações diversas e são tensionadas por enunciações, objetos,
movimentos e forças que são produzidas pelo próprio dispositivo (MARCELLO, 2003). De
forma que, o dispositivo:

É composto por linhas de natureza diferente e essas linhas do dispositivo não


abarcam nem delimitam sistemas homogêneos por sua própria conta (o
objeto, o sujeito, a linguagem), mas seguem direções diferentes, formam
processos sempre em desequilíbrio, e essas linhas tanto se aproximam como
se afastam uma das outras. (DELEUZE, 1990, p. 155)

Deleuze (1990) indica que Foucault destaca primeiramente as curvas de visibilidade e


de enunciação como as duas primeiras dimensões de um dispositivo, ambas ligadas
fortemente à historicidade destes. As curvas de visibilidade formam as figuras variáveis e
inseparáveis que constituem o dispositivo, não é uma luz geral, mas um regime de luz que
intercambia entre o visível e o invisível, o que deve aparecer e o que deve ser encoberto.

É importante salientar o status dos sujeitos, entendido como passivo frente a essas
anteriores à vontade individual de um
sujeito que, aqui, é considerado como o objeto, como uma variável da própria visibilidade,

As curvas de enunciação distribuem as posições diferenciais dos elementos que


compõe o dispositivo, definindo seus aspectos de acordo com as variáveis e estando
diretamente relacionado com a verdade que está em evidência e guiando a sociedade. A
compreensão aprofundada acerca da enunciação e visibilidade dos dispositivos é importante

(Ibidem, p.81)

A terceira dimensão dos dispositivos são as linhas de força envolvem trajetos das
curvas anteriores, agem como setas, cruzam-nas, vão e vem; e, dessa forma, passam por todos
31

os locais do dispositivo, penetram nas coisas e palavras (DELEUZE, 1990). Essas linhas
dizem respeito à dimensão do Poder que ligado a aspectos do Saber condicionam o
conhecimento e a verdade, evidenciando que o dispositivo sustenta saberes, mas também é
sustentado pelas mesmas ideias que propõe. (DREYFUS E RABINOW, 1995; FOUCAULT,
1998).

Estão ainda, presentes nos dispositivos as linhas de objetivação, pois Foucault


entendia que os dispositivos não podem existir de maneira fechada e intransponível, sem que
outros vetores o passem por cima ou por baixo. De forma que emergem as linhas de
subjetividade, linhas de fratura e as linhas de fuga.

As linhas de subjetividade estão ligadas a constante inovação do saber e do poder,


possibilitando novas formas dessa dimensão do dispositivo. Tais linhas predispõem as linhas
de fratura, estando no limite do dispositivo, por indicar a descontinuidade e de ruptura do
próprio dispositivo. Já as linhas de fuga, assim como as demais curvas e regimes são
históricas, e por meio da fuga e resistência promovem novas formas de objetivação, novas
formas de produção de sujeitos e podem suscitar e antecipar um dispositivo futuro.

Os dispositivos, então, são então compostos por diferentes curvas, linhas e regimes
que se encontram, cruzam, perpassam e tencionam de forma que é preciso desbravá-lo para
conhecer e compreendê-lo em profundidade. Para Deleuze:

Desemaranhar as linhas de um dispositivo é, em cada caso, traçar um mapa,


cartografar, percorrer terras desconhecidas, é o que Foucault chama de
-nos sobre as próprias linhas, que
não se contentam apenas em compor um dispositivo, mas atravessam-no,
arrastam-no, de norte a sul, de leste a oeste ou em diagonal. (DELEUZE,
1990, p.155)

Pode-se, então, inferir que o modo como a legislação é posta ao longo da história: as
leis, normas, o protagonismo do hospital ou a construção de uma rede de atenção a saúde
mental são os regimes de visibili
são nem sujeitos nem objetos, mas regimes que é necessário definir em função do visível e do
enunciável, com suas derivações, suas transformações, suas mutações. Ibidem, p.156).

Podemos relacionar ainda aspectos das linhas de força, perpassada pelos regimes de
enunciação e visibilidade, com as formas de tratamento e terapêutica associadas ao dispositivo
hospitalar. Compreende-se essa linha ligada às produções discursivas e a aspectos da
32

objetivação dos dispositivos, de forma que a ponta do serviço e como este é feito, sugere
locais por onde as linhas de força estão presentes.

Portanto, o dispositivo hospitalar inserido no âmbito da assistência à saúde mental está


ligado a um referencial de poder que define, entre outros aspectos, desde como os tratamentos
serão possibilitados à sociedade até a forma que o sujeito/paciente e suas demandas são
entendidos pelos profissionais e unidades de saúde.

No Brasil, historicamente, no momento em que havia a predominância do modelo


manicomial se tinha uma perspectiva de tratamento focado no isolamento, no controle e na
obtenção da cura, já no modelo psicossocial se busca a compreensão do sujeito em sua
singularidade, inserido na comunidade em que vive, além de um tratamento mais amplo e
integrado. Com a volta da relevância do hospital, trazendo à tona o modelo manicomial, tem-
se novamente essa mudança de perspectivas e saberes predominantes ligadas ao dispositivo
hospitalar.

Relacionado a essa predominância de determinados entendimentos, Silva (2008)


argumenta sobre a legitimação do conhecimento sobre doença e saúde mental fundamentados
na ciência psicológica e psiquiátrica. A receptividade e efetivação de tais entendimentos estão
atrelados às demandas e discursos predominantes. A autora discute a vulnerabilidade atribuída
a a loucura e seu tratamento ao citar o entendimento de Foucault de que
legitima
esse conceito. Dito de outro modo, a legitimação de uma intervenção em saúde mental

2008, p. 142).

De forma que, a mudança do que é partilhado em sociedade, em razão do discurso de


poder modela as concepções vigentes acerca da saúde mental. Assim, as noções acerca do
dispositivo hospitalar, inseridos no contexto da saúde mental e regido pelo poder desses
discursos (exercido de variadas formas), influenciam marcantemente a predominância do
entendimento acerca do hospital.

A tentativa de impulsionar o retorno a um modelo de assistência em saúde mental que


já existiu (o manicomial) ressalta a transitoriedade do dispositivo hospitalar e como as curvas,
regimes e linhas são passíveis de mudanças e estão em constante movimento. As recentes
33

mudanças vêm atreladas a diversas transformações em diversos outros âmbitos da sociedade


brasileira, devido ao atual contexto sócio-político-econômico. Modificações nas leis e normas
vigentes que impactam diretamente a prática e o cotidiano das unidades de saúde são formas
de, por meio das peculiaridades que constituem o dispositivo, governar e ter poder sobre a
verdade e o sentido vigente.

Dessa forma, entende-se na presente pesquisa o hospital como um dispositivo,


integrando os elementos que constituem tal conceito. Sendo, o dispositivo hospitalar, utilizado
como uma instituição de poder ao longo da história, servindo a diferentes interesses e funções.
Entendemos o hospital como dispositivo na assistência à saúde mental, pois compreendemos a
importância da esfera hospitalar quando se trata de respostas no campo da saúde mental.
Entendemos que essa instituição está em disputa e é detentora de poder frente à assistência a
saúde mental de maneira geral.

3.2 O DISCURSO COMO PRÁTICA


Neste estudo trabalhamos com referências de Foucault sobre o discurso. O autor
entende o conceito como uma estrutura complexa e que não existe de forma isolada, não
sendo uma simples sequência de palavras ou signos linguísticos que formam frases e textos. O
discurso é:

um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo


e no espaço, que definiram, em uma dada época e para uma determinada área
social, econômica, geográfica ou linguística, as condições de exercício da
função enunciativa (FOUCAULT apud AZEVEDO, 2013, p. 156).

O discurso deve ser entendido a partir das relações com os acontecimentos que
ocorrem contemporaneamente a ele, fenômenos políticos, econômicos e/ou sociais. Além
disso, é dinâmico e fluído sendo necessário compreendê-lo a partir de uma ótica de

apud MORAIS, 2017, p. 25).

Para Foucault, o discurso é uma rede de enunciados e carrega consigo a percepção de


percurso e movimento (AZEVEDO, 2013). O autor concebe o discurso como uma reprodução
de uma verdade que nasce para o sujeito de acordo com o contexto histórico sócio temporal
em que emerge. Assim, o discurso sempre estará relacionado e refletirá o momento em que
acontece e se modificará com o passar do tempo (SILVA & JÚNIOR, 2014).
34

Além disso, o discurso é prática. De modo que as práticas discursivas articuladas às


outras práticas (sociais, profissionais e politicas, por exemplo) mantém o discurso em
funcionamento, por meio de enunciados e relações. Para Foucault:

O discurso (...) não é uma consciência que vem alojar seu projeto na forma
externa da linguagem; não é uma língua, com um sujeito para falá-la. É uma
prática que tem suas formas próprias de encadeamento e de sucessão
(Foucault, 2010, p. 193).

, o que existe são relações com outras práticas


e/ou com situações históricas e sociais que sobressaem por meio dele. O discurso não é
é uma prática social que é constituída por um jogo de
regras ou relações sociais de caráter discursivo e não discursivo. (MORAIS, 2017, p.189).

É importante, quando se fala em discurso atentar-se a algumas características, que


devem ser pensadas em conjunto (CARVALHO, 2001). A primeira trata-se de definir os
objetos do discurso no que diz respeito às regras que possibilitam a sua formação, inseridos
em um contexto histórico. Também existem diversas formas as quais os discursos e
enunciados serão ditos e transmitidos, não existindo uma unidade enunciativa. O enunciável
é aquilo que se pode ver e dizer, de diferentes maneiras, em função de uma época e de um
lugar, em associação com o registro de verdade , p. 65).

Devem-se considerar também as regras de formação que estiveram na base da


formação e transformação do discurso, de modo a compreender os conceitos que permearam
podemos
pensá-los em sua historicidade, em seu caráter produtivo, escapando à armadilha da
ou da descoberta 2001, p.66).

O discurso está intimamente ligado a dois pontos importantes de serem ressaltados: o


social e o poder. Para Ernesto Laclau, conforme indica Fischer (2001)
carrega um significado e,
consequentemente está ligado a um discurso que une aspectos linguísticos e não-linguísticos.

A emergência do discurso cumpre as funções e interesses das instâncias de poder que


propiciam a sua produção (SILVA & JÚNIOR, 2014). A materialização desse poder é
perceptível pelas práticas sociais e pelas ações e relações dos sujeitos imersos nelas.
35

Tudo está imerso em relações de poder e saber, que se implicam


mutuamente, ou seja, enunciados e visibilidades, textos e instituições, falar e
ver constituem práticas sociais por definição permanentemente presas,
amarradas às relações de poder, que as supõem e as atualizam (FISCHER,
2001, p.200)

Dessa forma, sujeitos, objetos e discursos são envoltos por relações de poder. Para
Foucault, os discursos são criados por meio de uma série de procedimentos para que seja
possível controlar sua produção (SILVA & JÚNIOR, 2014). Ao controlar a produção
discursiva alcança-se também os sujeitos, pois não há um sujeito preestabelecido que emana
os sujeitos são construídos e/ou produzidos pelos discursos que
Ibidem, p.12). Compreender as relações de poder diz

necessária para esse entendimento. Para uma análise aprofundada dessa questão é salutar
perceber aquilo que é passado a longo da história, muitas vezes de maneira despercebida.

O poder opera por meio do discurso, que muitas vezes se torna um dispositivo
estratégico das relações que ele engendra. Este discurso forma o saber e define de que forma o
sujeito estará inserido, que posições e funções ele ocupará diante dele. Apesar dessas regras
de apropriação e utilização do discurso, Foucault refere que mais importante de quem
pronunciou é a materialidade do discurso, ou seja, o que foi dito em determinado período:

Por exemplo, o problema da loucura, do discurso sobre a loucura, e de tudo o


que foi dito em certas épocas sobre a loucura. Não creio que o problema seja
o de saber quem relatou esse discurso, que maneira de pensar ou mesmo de
perceber a loucura penetrou na consciência das pessoas em uma época dada,
mas, antes, acho que o problema é o de examinar o discurso sobre a loucura,
as instituições que dela se encarregam, a lei e o sistema jurídico que a
regulamentaram, a maneira como os indivíduos se viram excluídos por não
terem emprego ou por serem homossexuais. Todos esses elementos
pertencem a um sistema de poder, no qual o discurso não é senão um
componente religado a outros componentes. A análise consiste em descrever
as ligações e relações recíprocas entre todos esses elementos (FOUCAULT,
2010, p.254)

Infere-se, dessa forma, a ampla dimensão dos discursos por meio das práticas
discursivas, da possibilidade de perpetuação de saberes e poderes o que impacta os
indivíduos, a sociedade e seus contextos sociais, econômicos e políticos. Sendo assim, por
meio do discurso podemos, nesta pesquisa, buscar a compreensão de como o dispositivo
hospitalar é entendido pelos estudantes na área da saúde mental, tangendo um relevante grupo
de pessoas para a temática visto que serão futuros profissionais da psicologia.
36

4 PROCEDIMENTOS DA INVESTIGAÇÃO

4.1 TIPO DE PESQUISA


O estudo é de natureza exploratória e se utiliza de uma abordagem qualitativa, a qual
busca compreender aspectos da realidade, o sujeito, as relações e o contexto social e histórico,
buscando perceber o universo de significados, crenças, valores e atitudes, que envolvem as
relações, processos e fenômenos. A pesquisa qualitativa baseia-se nas experiências e
vivências expressas pelo sujeito que o orientam nas suas ações (MINAYO, 2002;
GERHARDT E SILVEIRA, 2009).

4.2 ASPECTOS ÉTICOS


Essa pesquisa seguiu as orientações da resolução 466/12 e 510/16 (BRASIL, 2012b;
2016) do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa
em Seres Humanos da UFPE, tendo sido iniciada após a aprovação pelo referido comitê de
acordo com parecer favorável CAAE nº 29908720.0.0000.5208.
No Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foram apresentadas
informações sobre a pesquisa, riscos e benefícios relacionados à sua participação na mesma,
bem como garantido seu anonimato em relação às informações que seriam tratadas. O TCLE
estava acessível no início do Questionário.
Ressalta-se que dados da pesquisa ficarão armazenados em computador e pastas de
arquivo sob cuidados da pesquisadora pelo período de cinco anos após a conclusão da
pesquisa.

4.3 SUJEITOS
Participaram da pesquisa cinquenta e um estudantes de graduação de psicologia de
instituições de ensino localizadas no município de Recife. Os critérios de inclusão para
participação na pesquisa foram ser estudante de psicologia matriculado em Instituições de
Ensino Superior (IES) públicas ou privadas do município de Recife, em Pernambuco. Além
disso, ser maior de 18 anos e concordar com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE) foram outros critérios para ser incluído na pesquisa.
Optou-se por não delimitar outras variáveis como período que está sendo cursado,
realização ou não de estágios, idade e gênero, por exemplo. Contudo, é válido salientar que
tais marcadores foram considerados durante a análise do material em razão de elementos que
pudesse emergir em sua razão.
37

4.4 INSTRUMENTOS
A prospecção de participantes da pesquisa foi realizada por meio de contato com
professores e coordenadores de instituições de ensino de graduação de psicologia em Recife.
Docentes de dez IES que contam com curso de graduação de Psicologia, foram contatados.
Buscou-se contato com coordenadoras/es dos cursos, mas tal comunicação não foi efetivada
com sucesso, entende-se que o contexto da pandemia do novo corona vírus esteja na base das
dificuldades, tendo em vista o momento de isolamento social em que muitas das instituições
não estavam com funcionamento presencial.
A comunicação com docentes foi feita via e-mail e aplicativo de mensagem por
celular, sendo feita uma breve apresentação da pesquisa e repassada uma mensagem pré-
elaborada (com o link de acesso para o questionário) para que pudesse ser repassada para os
alunos, também de forma on-line. A divulgação da pesquisa foi feita também, pelos mesmos
meios, por parte da orientadora da pesquisa, em seus contatos de docentes.
A coleta realizada por meio de um questionário on-line por meio da plataforma
que ficou disponível para receber respostas pelo período de um mês.
Para que o participante pudesse responder ao questionário era necessário a leitura e a
concordância com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), incluído no
questionário. O e-mail do participante foi considerado como a assinatura do TCLE e também
como forma de limitar a resposta do questionário a uma única vez por sujeito.
O questionário foi dividido em etapas , incluindo aspectos sociodemográficos e
questões discursivas. Após a apresentação da pesquisa e o TCLE, iniciava-se a seção
que focava nos dados sociodemográficos e relacionados ao curso de graduação em
psicologia, de forma a se conhecer melhor os participantes.
Na seção seguinte, foram apresentadas

obrigatória para avançar o questionário e a ordem em que foram apresentadas foi igual para
todos os participantes. Por fim, na etapa seguinte, havia um espaço para que o participante
pudesse fazer observações que julgasse pertinente, o preenchimento desse espaço era opcional
(para visão detalhada do questionário, consultar Apêndice A).
Foi estabelecido o prazo de um mês para recepção das respostas e ao final desse
período, os dados foram sistematizados (pela plataforma) em uma planilha cujas perguntas
38

estavam em colunas e cada linha correspondia a um participante. Foram utilizados números


para identificação de participantes e assim garantir o anonimato.

4.5 TRATAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS


Para realização do tratamento e análise de dados o questionário foi dividido em duas
partes: a primeira concentra os dados sociodemográficos e de caracterização dos participantes
e a segunda diz respeito às respostas dadas as perguntas discursivas.
Os aspectos relacionados à primeira parte são apresentados em um tópico do capítulo
de Resultados de forma que se possa tomar conhecimento acerca da população de estudantes
que participou dessa pesquisa.
Já para a segunda parte dos dados, de modo a analisa-los em consonância com os
objetivos da pesquisa, ou seja, para compreender os sentidos da atenção hospitalar na
assistência à saúde mental para os estudantes da graduação em psicologia, optamos por
utilizar a Análise de Conteúdo de Bardin (1977).
De acordo com essa técnica a organização da análise se dá em três pólos cronológicos:
(1) pré-análise, (2) exploração do material e (3) tratamento dos dados, inferência e
interpretação (BARDIN, 1977). A primeira etapa é a fase de organização em que são
realizadas atividades como leitura flutuante, formulação de hipóteses e objetivos e preparação
do material, por exemplo.
O tratamento dos dados iniciou-se com a leitura flutuante do material das respostas
discursivas
2002, p.
76). Como produto deste momento identificamos categorias temáticas e subcategorias.
A segunda etapa do tratamento do material envolveu a categorização do material.
Foram utilizados recursos de copiar e colar de editores de textos para facilitar a manipulação e
sistematização dos trechos nas categorias criadas (GALINDO, FRANCISCO, RIOS, 2015).
A categorização foi feita considerando as unidades de registro e de contexto que são
material e face aos

significação e se refere ao conteúdo que deve ser considerado como unidade base, já a
unidade de contexto são trechos maiores do que a unidade registro e que auxiliam na
compreensão desta.
39

Os trechos categorizados das respostas do questionário foram ordenados em tabela em


uma planilha do Excel de acordo com o código do participante (p.1, p.2 p.3...), categoria,
subcategoria, unidade de registro e unidade de contexto.
Três categorias foram definidas na análise do material, cuja identificação recebeu
letras (A, B, C) e suas respectivas subcategorias foram identificadas com número após a letra,
conforme descrito a seguir:
(A) O hospital
o (A1) Função: Apresenta reflexões gerais acerca da função do hospital como
instituição, de que forma essa instituição se posiciona e atua como serviço de
saúde mental.
o (A2) Profissionais: Aborda aspectos relacionados aos profissionais que atuam
no hospital, de que forma esses profissionais devem atuar, o trabalho em
equipe e dificuldades relacionadas a essa questão.
(B) A atenção em saúde mental no hospital
o (B1) Fenômenos/situações: Relata situações e fenômenos em saúde mental que
são atendidas nas instituições hospitalares.
o (B2) Procedimentos: Aborda de que forma as situações e fenômenos em saúde
mental que chegam aos hospitais podem ser assistidas; quais tipos de
intervenções podem ser realizadas pelos profissionais que atuam no hospital.
(C) A rede de saúde mental
o (C1) O hospital na rede: aborda semelhanças e diferenças gerais em relação à
instituição hospitalar e as outras unidades de saúde na atenção à saúde mental,
além de possibilidades de assistência e intervenção que podem ser realizadas
exclusivamente pelo hospital e as que são compartilhadas com outros
dispositivos da rede de saúde mental.
o (C2) Dinâmica da rede: Aspectos que dizem respeito aos encaminhamentos e
fluxos das demandas que chegam aos serviços de saúde mental.
o (C3) Contemporaneidade da rede: apresenta reflexões e pontuações dos
estudantes acerca da rede de atenção à saúde mental atualmente.
O Quadro 1 esquematiza as categorias e subcategorias para melhor visualização:
40

Quadro 1 - Categorias e subcategorias de análise


CATEGORIAS SUBCATEGORIAS
A1 Função
A O hospital
A2 Profissionais
B A atenção em saúde mental no B1 Fenômenos/Situações
hospital B2 Procedimentos
C1 O hospital na rede
C A rede de saúde mental C2 Dinâmica na rede
C3 Contemporaneidade da rede
Fonte: Elaborado pela autora.
A categorização possibilitou a sistematização dos resultados e, por conseguinte, a
discussão foi realizada a partir das inferências e interpretações do material obtido.
41

5 RESULTADOS

5.1 CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES


O questionário da pesquisa foi acessado por 52 estudantes, um deles não aceitou
participar após leitura do TCLE. De forma que o estudo contou com a participação de 51
estudantes de graduação em psicologia.
Os participantes tinham idade entre 18 e 68 anos. Catorze deles estavam na faixa etária
menor ou igual a 25 anos. Com idade entre 26 e 35 anos, responderam ao questionário treze
estudantes. A mesma quantidade de estudantes indicou faixa etária entre 36 e 45 anos. Nove
estudantes da faixa etária entre 46 e 55 anos e dois estudantes acima de 55 anos participaram
do estudo.
Tabela 1 - Faixa etária/Quantidade de participantes
Faixa etária Número de participantes
Menor ou igual a 25 anos 14
Entre 26 e 35 13
Entre 36 e 45 13
Entre 46 e 55 9
Acima de 55 anos 2
Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados da pesquisa
Já no que se refere à categorização do gênero (Tabela 2) 43 participantes se
identificaram como sendo do gênero feminino. Seis se identificaram como do gênero
masculino. Dois estudantes se identificaram por outras nomenclaturas:
e [P5]1.
Tabela 2 Gênero/Quantidade de participantes

Gênero Número de participantes


Feminino 43
Masculino 6
Outro 2
Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados da pesquisa

A maioria dos participantes (47) declarou frequentar instituições privadas, enquanto


uma menor parte (4) realiza o curso de graduação em psicologia em instituições públicas.
Quando identificamos o tempo de existências das IES, considerando o ano de reconhecimento
do curso de graduação em Psicologia pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), a maior

1
As respostas dos participantes serão apresentadas no corpo ). A
identificação entre colchetes refere-se ao número de identificação dos participantes ([P/nº do
participante])
42

parte dos participantes (32) estudam em IES cujo curso de graduação em psicologia tem mais
de 40 anos (tabela 3). Das instituições com menos de cinco anos de reconhecimento do curso
de graduação participaram 13 estudantes. A menor participação foi entre estudantes (6) de
instituições de 8 a 13 anos de reconhecimento.

Tabela 3 - Anos de Reconhecimento do curso de graduação/Quantidade de participantes

Categoria Número de
participantes
Até cinco anos de reconhecimento 13
De oito a treze anos de reconhecimento 6
Mais de quarenta anos de reconhecimento 32
Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados da pesquisa
A maioria dos participantes da pesquisa (23), estava cursando o 3º ou 4º ano do
curso; 9 estudantes informaram estar no último ano do curso. No que diz respeito ao campo de
estágio a maior parte dos alunos referiu a clínica, (21) e 11 alunos ainda não estavam
realizando estágios.

5.2 TEMÁTICAS EM TORNO DO HOSPITAL


A exposição dos resultados está orientada pela sistematização do material reunido nos
questionários a partir das categorias temáticas já indicadas: a instituição hospitalar, a atenção
em saúde mental no hospital e a rede de saúde mental.

5.2.1 O hospital
As referências ao hospital destacam vários de seus aspectos informando sobre suas
funções e funcionamento. Ao hospital é referida a função de vigilância diante de necessidades
da população, no campo da saúde mental. O hospital também é considerado como um dos
principais serviços quando há a necessidade de cuidado em saúde, é visto como a instituição

relação à demanda com que se chega nele.

[Instituição] de apoio, de prontidão. [P46]


É um atendimento mais emergencial. [P20]
Estabelecer um vínculo a curto prazo com o paciente para que possa
se sentir acolhido e amparado [P3]
43

A centralidade na doença é outro aspecto que emerge quando se trata da instituição


hospitalar, há um entendimento de que o foco é o tratamento de doenças, o hospital a
preocupaç [P35]. Há um protagonismo de aspectos médicos,
atendimento médico especializado. [P38], além da busca da cura para o adoecimento do
paciente em detrimento da perspectiva do trabalho de prevenção.
A oferta de assistência diante do adoecimento psíquico também deve acontecer nos
hospitais. Dessa forma, se configura como um serviço que lida na assistência à saúde em
situações de crise e demais fenômenos ligados ao sofrimento psíquico.

Ser dispositivo de cuidado para portadores de transtornos mentais


que necessitem de atendimento e serviços especializados. [P1]
Hospitais poderiam ser ótimos aliados para saúde mental se
conseguissem abrir espaço para atendimentos emergenciais,
principalmente em situações de crise, atuando de maneira que
fornecesse o atendimento ao indivíduo logo no começo do possível
desenvolvimento de transtornos ou afins. [P2]

Quando vinculado ao cuidado em saúde mental o hospital é associado ao cuidado


global da saúde dos seus usuários (incluindo a saúde física). Prestar toda a assistência
necessária à saúde para o paciente e ou usuário, que englobe não só saúde mental, mas
também na observância de sintomas clínicos [P17].

Observa-se que a doença está sempre em evidência no que diz respeito à instituição
hospitalar, tanto no que se refere ao físico quanto ao psicológico. No percurso de um
adoecimento é inevitável se passar por um hospital, para que seja possível oferecer cuidado
físico e psíquico no atravessamento da experiência do adoecimento. [P49].
Questões e reflexões relacionadas à finitude da vida são outros aspectos que emergem
quando se trata dessa temática tendo em vista ser uma possível consequência das internações
e adoecimentos com os quais se tem contato nesses locais.

Além da perspectiva curativa do hospital, referências são dirigidas à prevenção,


ofertando saúde de outras formas, ou seja, ntervir também de forma preventiva, não apenas
atuar naquele momento. [P6].
Com relação à forma como ocorre a assistência ao paciente, identificamos no material
a indicação de que ela deve ir além de um atendimento pontual e emergencial. O hospital é
entendido como um local em que se deve proporcionar o acolhimento e o cuidado aos
44

pacientes de modo integral, ou seja, tanto no que se refere aos cuidados físicos como aos
cuidados psíquicos. Ressalta-se que mesmo sendo percebido como um local em que a
permanência ocorre por um curto período de tempo, os aspectos voltados ao apoio,
acolhimento e empatia são evidenciados.

Acolher o paciente que precisa de atenção e cuidado. [P47]


Acolhimento e cuidados integrais. [P28]
Buscar sempre a melhor forma de como ajudar o paciente [P25]

Embora seja um local vinculado aos aspectos médicos, o mesmo hospital é entendido
como um serviço de saúde amplo, multidisciplinar, que Seria um espaço de tratamento
multidisciplinar visando o bem-estar das pessoas atendidas [P22]. É referido como uma
instituição composta por equipe multidisciplinar assistentes sociais,
terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, médicos de outras especialidades, nutricionistas e
demais profissionais que possam contribuir nas diversas linhas de tratamento . [P22].
Contrapondo-se a um modelo de assistência voltado ao protagonismo médico, tal equipe
multiprofissional é de suma importância para a oferta de uma assistência global ao paciente,
de modo que possibilitaria um cuidado de forma inclusiva, o que traria mais conforto e apoio
ao paciente.
O psicólogo no hospital, atuante na equipe multidisciplinar, tem como função
possibilitar o acolhimento no que se refere aos sentimentos e emoções tendo em vista que os
pacientes estão vivenciando uma situação de adoecimento que tem influência nessas questões.
Além disso, ao profissional de saúde mental (não necessariamente ao psicólogo) na instituição
hospitalar, é atribuída a responsabilidade de realizar intervenções psicossociais.
No entanto, a falta de profissionais da área de saúde mental para responderem à
demanda [P51] e a forma como algumas equipes profissionais atuam nas instituições
hospitalares. Falta de empatia por parte de alguns profissionais que não são da área de
[P3], são alguns dos
obstáculos dessa assistência.

5.2.2 A atenção em saúde mental no hospital


A instituição hospitalar deve estar apta para atender e acolher a população em suas
demandas de saúde mental. Se for no hospital especializado [psiquiátrico], acredito que
45

todos os casos de distúrbios mentais [devem ser atendidos]. [P6]. Como condição para o
atendimento eficiente também identificamos a necessidade de adequada estrutura (física, de
equipe e equipamentos).

Ao serviço de saúde hospitalar chegam, no que se refere à saúde mental, situações


emergenciais em que não há possibilidade de espera. São exemplos dessas situações crises
psicológicas [P48], descontrole emocional que merece cuidados específicos da equipe de
saúde [P30], 44] e em situações que
sco a sua vida e a de outros [P45]. Também é realizada a
assistência a situações mais graves, aqueles fenômenos que se entende que não é da
competência de atuação dos demais serviços da rede de saúde como
graves, em casos extremos e que não possam ser acompanhadas via centro de atenção
psicossocial ou terapias privadas [P24].
, , , , surtos
p , , crise de depressã , ,
transtorno de estresse pós-traumático e [expressões citadas por diversos
respondentes da pesquisa] são fenômenos psicológicos que motivam a busca de atendimento
nas instituições hospitalares. Consumo de drogas também podem levar à busca do hospital,
diante de crise decorrente de transtorno mental em usuários de álcool e outras drogas
[P51] e surtos psíquicos derivados ou não do uso de substâncias psicotrópicas P17].
Intervenções medicamentosas também é parte das ações de cuidado realizadas nos
medicação, se necessário [P42] Medicação guiada por critérios clínicos
visando diminuir o sofrimento causado por transtorno mental [P51]. O serviço, no entanto,
por vezes, é compreendido como aquele que apenas realiza esse tipo de atuação:
que só [realiza] intervenção medicamentosa. [P10].

Além das demandas de atendimentos emergenciais, estabilização da crise e assistência


ao paciente e seus familiares, o espaço da instituição hospitalar é, conforme material, um
lugar de potencial realização ações educativas, em que podem ser promovidas campanhas de
conscientização e rodas de conversas como forma de colocar essa atenção em saúde mental
em prática dentro dos hospitais.

Campanhas de conscientização sobre saúde mental. [P12]


Intervenção psicoeducativa [P31]
Rodas de conversa, Oficina de artes. [P41]
46

A estadia do usuário no hospital, quando for o caso, vai depender do contexto, da


demanda exposta. [P32]. O internamento dos pacientes é uma ação entendida como
necessária em algumas situações, mas com duração breve,
termo porque ele abre um vasto leque, inclusive a ideia de manicômio, e não é isso que
penso, mas às vezes pode ser necessário passar dois dias, por exemplo. [P42].

As ações de assistência disponibilizadas pelo hospital são referidas na perspectiva de


estabilização do sujeito que sofre. acredito que seria o ambiente para
estabilização [P49], para onter e estabilizar um estado de crise P9]. E, após a
estabilização, realizar a reinserção do mesmo de volta à sociedade através de
acompanhamento fora da instituição hospitalar . [P39]. O atendimento hospitalar pode
ocorrer ainda por meio de encaminhamento para um serviço mais adequado sendo feita uma
transição para outro equipamento [P9].

No que se refere à atuação de profissionais de psicologia no hospital, são referidas


como técnicas a scuta e [o] acolhimento, principalmente. [P26]. O acolhimento pode
ocorrer tanto aos pacientes, acolher o paciente que chega com a demanda e amenizar seu
sofrimento através da escuta. [P35], como aos seus familiares O acolhimento da demanda
do paciente e seus familiares, a escuta efetiva e o aparato psicológico. [P32]. Acontecendo
de forma breve e pontual e delimitado, no tempo e nas demandas, apenas às situações
referentes ao período da assistência hospitalar sendo
superficial momentâneo sem um acompanhamento. [P19].

5.2.3 A rede de saúde mental


Conforme referem participantes da pesquisa, os serviços de saúde integrantes da Rede
não possuem uma boa comunicação além de terem pouca interação entre si, essa relação pode
ter como consequência uma influência negativa no tratamento e acompanhamento dos
pacientes que podem ser encaminhados para o serviço inadequado ou sem muitos detalhes
acerca da sua situação.
Identifico relações distantes, de encaminhamentos sem muitos
detalhes para além de um prontuário e histórico do paciente. [P8]
Tem que se manter conectadas, essa conexão é de suma importância
para melhor atender qual será a maior necessidade do paciente. [P25]
47

Existem aproximações na rede de atenção à saúde mental quando há


plena comunicação entre os diversos dispositivos de cuidado e o
paciente e usuário é acolhido no local mais adequado para sua
demanda emergencial ou ambulatorial. O contrário ocorre quando
falhas nessa comunicação não permitem o acolhimento adequado do
sujeito. [P1]

Os demais serviços de saúde que compõe a rede são vistos como aqueles que ofertam
um tratamento e acompanhamento em saúde mais humanitário do que o que é ofertado nas
instituições hospitalares.

O hospital muitas vezes vê o indivíduo como mais um paciente


doente, enquanto em outras unidades é comum a humanização. [P48]
De distanciamento, a pessoa é vista como doença [no hospital].
[P46]
Tenho a impressão de um distanciamento entre hospital e o Centro de
Atenção Psicossocial (CAPS), os menores parecem oferecer um
serviço mais humanitário. [P6]

A instituição hospitalar inserida na rede de saúde mental exerce uma função de


intermédio com os demais serviços de saúde, pois é um local em que as pessoas ficam por
pouco tempo e seguem para outros serviços da rede para dar continuidade no
acompanhamento em saúde. uros tratamentos ao
paciente . [P12]. Vale salientar que também há concepções de que os hospitais,
diferentemente dos outros serviços, não se dedicam efetivamente à saúde mental:

Acho que são instituições distintas [os serviços de saúde mental],


com atividades específicas, e sem nenhuma intenção por parte do
hospital se dedicar a saúde mental como paralelo. Embora alguns
profissionais de outras especialidades não se omitem em adentrar na
área da saúde mental como uma ferramenta que vem a ajudar o
tratamento ao paciente. [P19]
48

O hospital possui relhos adequados e equipe profissional


mais ampla. [P30] podendo ofertar um cuidado mais abrangente em casos mais delicados e
de urgência em saúde mental.
Um afastamento mais profundo do hospital em relação aos serviços de saúde que
fazem parte da rede de saúde mental (que vai além das demandas, encaminhamento e
necessidades diárias) é atribuído à situação em que se encontra a saúde pública no país
[P23]. A precarização e o quase colapso da assistência em saúde de um modo geral e, em
específico, com relação à saúde mental, que eria aos olhos
[P28].
A atuação técnica do profissional psicólogo e a forma como essa prática acontece nos
diferentes espaços (as adaptações que precisam ser feitas em comparação à prática clínica, por
exemplo) são pontos de aproximação que existem entre a instituição hospitalar e os demais
serviços da rede de saúde mental.

A principal aproximação que enxergo entre as instituições [de saúde]


é a escuta realizada pelo profissional de psicologia, sua
disponibilidade e criatividade. [P49]
Em relação ao setting terapêutico, esse não existe no hospital em
stricto sensu e também não existe em outras instituições, como os
Centros de Referência em Assistência Social (CRAS), Centro de
Referência Especializado em Assistência Social (CREAS), Núcleo de
Apoio a Saúde da Família (NASF) e, às vezes, até no Centro de
Atenção Psicossocial (CAPS). [P49]

No que se refere à formação desses profissionais de psicologia os participantes


indicam a necessidade de aprimoramento do conteúdo em relação à saúde mental durante a
graduação. Acredito que para nós, estudantes da graduação, falta ter o contato direto com a
realidade, pois acho que acontece muito tardiamente o contato com a realidade da saúde
[P39].
A dificuldade no acesso da população aos serviços da rede de saúde mental, seja pela
falta de disponibilidade ou pelo preconceito na por busca cuidados relacionados à prevenção e
à promoção em saúde mental é um importante aspecto levantado, tendo em vista que
49

culmina muitas vezes na busca quando os quadros estão em estado avançados e, muitas
vezes, a única referência é uma emergência psiquiátrica 24].
Participantes da pesquisa sugeriram estratégias de fortalecimento da rede de saúde
mental, como investimento em emergências psiquiátricas e leitos psiquiátricos em hospital
[P07] e o investimento nos centros de atenção psicossocial para o acompanhamento
dos casos mais leves e das fases menos críticas dos casos graves [P07]. Há muito a se fazer
ainda pela saúde mental dentro das políticas públicas de saúde. Demos grandes passos, mas
é necessário insistir no aprimoramento e consequente desenvolvimento destas políticas
[P51].
As mudanças podem possibilitar melhorias no cenário da assistência em saúde para
além das questões práticas
[na
atualidade] de substituição por um modelo baseado em comunidades
terapêuticas desvinculadas do sistema de saúde, que na prática seria
um retorno às práticas manicomiais do século passado, com o
abandono de todo o avanço ético e científico dos internamentos para
tratame 7]
Além disso, é importante ampliar a atenção à saúde em qualquer âmbito da
saúde, mesmo em entidades em que os atendimentos não sejam voltados
[P3]. Concomitante, possibilitar cada vez mais da
psicologia, com práticas éticas e baseadas nos avanços técnico científicos
[P7].
50

6 DISCUSSÃO

O hospital é referido a partir de uma pluralidade de características e funções. Muitas


delas conflitivas entre si. Identificamos a centralidade da doença, protagonismo médico e
busca de cura, conteúdos que poderiam ser associados ao modelo manicomial. A oferta de
assistência integral diante do adoecimento psicológico, acolhendo o sofrimento psicológico, a
crise e cuidando também do físico (corpo), sugerem uma atenção psicossocial como
norteadora das tarefas do hospital em saúde mental. Na mesma direção plural, foram
registradas a possibilidade de prevenção e a atuação emergencial e pontual em situações de
crise.

Compreendemos que o sentido para hospital como equipamento que acolhe situações que
envolvem saúde mental está em disputa no campo discursivo. A contrarreforma
(GUIMARÃES & ROSA, 2019), que sugestiona uma remanicomialização do cuidado em
saúde, é um dos aspectos que sustenta essa disputa tendo em vista que há o incentivo da
retomada dos hospitais como equipamento de destaque na assistência em saúde mental.

Ao considerarmos a volta do protagonismo do hospital tem-se, atrelado a esse aspecto,


o ressurgimento de entendimentos relacionados a uma ótica manicomial como a posição de
vigilância e controle dos corpos relacionados à instituição (FOUCAULT, 1975). Junto ao
movimento da contrarreforma caminha a herança discursiva que a instituição hospitalar
carrega, vinculada ao poder e domínio que se busca exercer aos sujeitos que necessitam de
sua assistência.

Além disso, é importante ressaltar que antes do movimento da contrarreforma o


paradigma manicomial ainda estava presente na sociedade , ainda guiando tomadas de
decisão, discursos cotidianos (CARNEIRO, 2020) e, por conseguinte, presente na formação
dos futuros profissionais. A Reforma Psiquiátrica caracteriza-se por ser um movimento que
deve acontecer no âmbito macrossocial, conectado também à transformação da sociedade
(YASUI, 2006), processo que requer tempo e investimento eficientes para que ocorra. Sendo
assim, os ideais psicossociais e manicomiais coexistiam.

Destarte, a formação dos profissionais em psicologia sofre influência desses aspectos,


pois é composta por docentes que, muitas vezes, precisavam de reorientação relacionada à
formação no âmbito da saúde mental considerando as novas diretrizes preconizadas para
atuação (BERNARDES, 2010). A participação dos estudantes neste estudo é importante pois
51

fornece um panorama de como essa percepção é repassada aos alunos pelos processo de
ensino-aprendizagem, seja em sala de aula ou em estágios, além de como esses estudantes
vem captando a composição e atuação da rede de saúde mental após as diversas e constantes
mudanças que vem ocorrendo.

Ao compreendermos o hospital como um dispositivo, consequentemente o colocamos


como uma instituição envolta por poder, além de estar ligado a transformações, políticas
públicas e o discurso perpassado ao longo do tempo. Entende-se que a compreensão dos
estudantes sobre a temática está em construção, inclusive alguns referiram não ter muito
contato com o assunto durante a graduação, o que pode sinalizar o entendimento mais
relacionado ao senso comum do que embasado frente a uma perspectiva teórico-prática da
psicologia.

Quanto à assistência em saúde mental ofertada nas instituições hospitalares e as


medidas terapêuticas utilizadas pode-se depreender que buscam a um objetivo principal: a
contenção. Não necessariamente uma contenção física, mas na forma de estabilização da
crise/surto que fez com que o usuário procurasse o serviço para que haja uma normalização
de seu estado mental.

O uso de medicamentos, muito ligado aos hospitais, e a escuta são terapêuticas


utilizadas com esse fim para controle da saúde mental. De acordo com a pesquisa de Salles &

pessoa com transtorno mental, oferecendo suporte e contenção temporários, até que a pessoa
-se que a intenção de
ofertar esse tipo de assistência nos hospitais pode estar ligada a continuar promovendo certo
tipo de controle ao usuário que necessita da atenção em saúde mental.

Nos tratamentos oferecidos aos doentes mentais sempre se buscou o controle e a


contenção em busca de uma normalização e/ou estabilização de seus sintomas. Haviam
repr
com a popularização dos manicômios em que os sujeitos eram refreados pelo isolamento e
regras institucionais (FOUCAULT, 1975; AMARANTE, 2015; QUEIROZ, 2001), ou seja,
52

Sendo assim, percebe-se que há referências de manutenção desse propósito dentro da


assistência em saúde mental inferidas pelos sentidos dados pelos participantes desse estudo.
Observa-se que existe uma mudança nas ferramentas pelas quais é feito essa vigilância e
estabilização, mas que impera o sentido de fazer com que o indivíduo retorne a um caminho
comum a todos, no qual estaria a normalidade. Identifica-se aqui o referido por Ferla, Oliveira

(anátomo-patológico).

Atenta-se aqui para a força que o paradigma manicomial possui na atenção em saúde
mental e ainda está presente nos discursos dos estudantes participantes da pesquisa. Aspectos
percebidos do paradigma manicomial podem ser discutidos a partir da ótica das quatro
dimensões do processo da Reforma Psiquiátrica proposta por Amarante (AMARANTE, 2007;
YASUI, 2006). A dimensão epistemológica é importante na desconstrução dos saberes postos,
principalmente aqueles que alicerçam a psiquiatria, de forma que se possa tecer novas linhas
de articulação para que seja possível a construção de um novo paradigma em saúde mental.

Observou-se nos resultados da pesquisa que há uma cobrança para que sejam
promulgadas leis e portarias que regulamentem práticas que estejam de acordo com um
paradigma psicossocial de atenção em saúde mental e que, além disso, consolidem e
fortaleçam com mais investimentos financeiros desse modelo dentro da assistência (abrindo
mais leitos psiquiátricos em hospitais gerais e incentivos aos centros de atenção psicossociais,
por exemplo) principalmente levando em consideração o desmonte que vem ocorrendo nos
últimos anos na área da saúde mental. Aqui se percebe um movimento associado ao que está
na alçada na dimensão jurídico-política, voltada para a busca da construção de um alicerce
que sustente as premissas da Reforma Psiquiátrica.

Destarte, há uma demanda pela modificação na forma como os serviços são ofertados
aos usuários que procuram as instituições, de forma que sejam oferecidas terapêuticas e
práticas alinhadas com o novo paradigma em saúde mental. Relacionando com a dimensão
técnico-assistencial identificamos uma ponte entre a prática e a teoria, ou seja, materializar
nos serviços aquilo que é proposto pela teoria. Intenciona-se o detrimento da perspectiva
manicomial e o avanço do entendimento dos hospitais como lugares de acolhimento ao
sofrimento psíquico, às famílias dos usuários e articulação de uma rede que possibilitem
novas formas de cuidado e aproximação do serviço de saúde/usuário.
53

Entretanto, notou-se que, apesar de requisitarem mudanças e entenderem que os


hospitais devem ser instituições de cuidado e de acesso a variadas terapêuticas no cuidado em
saúde mental, os participantes compartilham do sentido das instituições hospitalares serem
locais de breve atendimento, atenção emergencial e, majoritariamente, terapia
medicamentosa. Ou seja, os sentidos relacionados aos hospitais diferem do cenário ideal
(proposto pelas normativas e pressupostos da Reforma Psiquiátrica). Contrasta-se essa análise
com a última dimensão, a sociocultural, que se refere justamente ao imaginário social e
representações compartilhadas socialmente sobre temáticas da saúde mental. Mesmo
ocorrendo avanços nas leis, nos entendimentos científicos e nas formas como se concebe o
modelo de assistência, se não houver uma modificação nas referências compartilhadas
socialmente sobre a saúde mental, o paradigma manicomial seguirá presente.

A partir da análise, a psicologia nas instituições hospitalares revela-se de forma


enfraquecida quando ponderada a necessidade e importância da contribuição que a área possui
no contexto da assistência à saúde mental. Não há um entendimento de que existe uma
psicologia especializada e que dê conta das demandas existentes na atuação hospitalar, mas o
sentido compartilhado é de adaptação das terapêuticas da psicologia clínica transpostas para
a prática hospitalar em saúde mental.

O uso da criatividade para a adaptação de um setting terapêutico (como ocorre na


clínica) para o ambiente hospitalar, a compreensão da equipe multiprofissional de que ao
profissional de psicologia deve ser atribuído a função de escuta dos usuários são exemplos de
situações compartilhadas pelos participantes da pesquisa. Tais referências reiteram que a
psicologia na assistência em saúde mental supostamente é reduzida ao trabalho conforme
modelo clínico privado. A formação em psicologia, durante a graduação, ainda muito pautada
em preceitos da tradição clínica (FERREIRA NETO, 2010) e os desafios para uma formação
alinhada às diretrizes do SUS (POPPE & BATISTA, 2012) contribuíram para esse
entendimento. Além disso, é comum que psicólogos acumulem a atuação na clínica com outro
vínculo empregatício (DIMENSTEIN, 2001) favorecendo que façam essa intermediação de
práticas entre os campos de atuação.

O sujeito em sofrimento psíquico, aquele que procura a unidade hospitalar e que é


atendido pelos profissionais de saúde, pela via a qual a pesquisa se encaminhou foi ofuscado

mentais. Sugere-se a realização de outros estudos para que o conhecimento sobre o sujeito
54

atendido nas instituições hospitalares seja aprofundado, investigando as subjetividades e o


sentido desse recorte pouco explorado nesta pesquisa.
55

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo buscou compreender quais sentidos os estudantes de graduação possuíam
sobre a atenção hospitalar no contexto da assistência em saúde mental. Foi identificado que o
hospital é um estratégico e importante equipamento que compõe a rede de saúde mental sendo
protagonista na dicotomia paradigma manicomial/paradigma psicossocial.
Foi percebido que o paradigma manicomial não só continua presente, como vem sendo
reforçado, possivelmente pela força do movimento da Contrarreforma. Nesse sentido, o
dispositivo hospitalar segue transmitindo ao longo dos anos referências associadas ao controle
dos sujeitos, estabilização dos sintomas e busca pela normalidade.
A formação dos profissionais que atuam e que atuarão no contexto da saúde mental é
de fundamental importância para que ocorra uma quebra nesse ciclo e haja a consolidação dos
preceitos do paradigma psicossocial. Mesmo com avanços legislativos, nas políticas públicas
e até de conhecimentos técnicos na área, é salutar que o profissional de saúde esteja alinhado
com as novas políticas e despido dos entendimentos prévios, em sua maioria, relacionados ao
paradigma manicomial. Dessa forma, entende-se que um olhar atento para as metodologias e
conteúdos dos cursos de graduação em psicologia contribuirão para um progresso nesse
âmbito.
Apesar de possibilitar a ampliação do quantitativo/diversidade de sujeitos e de ter sido
utilizado em virtude da pandemia Covid-19, cabe a autocrítica para o uso do questionário on-
line como forma de coleta de dados. A expectativa inicial era acessar uma quantidade
significativa de respondentes e ter um panorama amplo do que discentes teriam a dizer sobre
o hospital na saúde mental. Inclusive projetou-se trabalhar com um software para tratamento e
análise de dados textuais. Mas, o volume obtido de respostas não permitiu o uso do software.
Sugere-se que novas pesquisas sejam realizadas com outros instrumentos para aprofundar
compreensões sobre aspectos indicados pela presente pesquisa.
Bem como, sugere-se novos estudos para detalhamentos de aspectos relacionados às
práticas profissionais em saúde mental, principalmente na área da psicologia, na qual foi
identificado que não existe uma prática psicológica especializada, mas sim um conhecimento
transposto da psicologia clínica.
Ouvir outros atores envolvidos na instituição hospitalar no que se refere à saúde
mental, como profissionais de saúde, usuários, familiares, gestores apresenta-se como uma
importante estratégia de investigação. Resultados de pesquisas assim contribuirão com a
56

criação de estratégias para superar os desafios presentes tanto na formação de profissionais


quanto na atuação em hospital no campo da saúde mental.
57

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62

APÊNDICE A - MODELO DO QUESTIONÁRIO ON-LINE

Sobre a pesquisa

Esta pesquisa intitulada

saúde mental. A Pesquisa está organizada para reunir o que estudantes têm a dizer sobre o
assunto.

Para participar dessa pesquisa é necessário que você seja maior de 18 anos e esteja cursando a
graduação em Psicologia em universidades/faculdades da cidade do Recife-PE.

O questionário é composto por quatro seções:

1 - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE), na qual você lerá


o Termo que possui informações detalhadas da pesquisa podendo consentir ou não com sua
participação na pesquisa. Em caso afirmativo, você assinala "aceito" segue para inserção do e-
mail (confirmação para participar) e continua o questionário. Em caso negativo, você assinala
a opção "não aceito" e o questionário se encerra.

2 - SOBRE VOCÊ, composto por questões sociodemográficas e sobre sua formação.

3- SOBRE O HOSPITAL NA ATENÇÃO À SAÚDE MENTAL, nela você poderá escrever o


que pensa sobre os temas abordados nas questões.

4- OBSERVAÇÕES, em que você poderá fazer demais considerações sobre o tema e sobre a
própria pesquisa, se julgar necessário

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)

Vide anexo

Sobre você

Responda às perguntas que nos ajudarão a conhecer sobre você

Idade (registre sua idade em anos e meses, considerando o seguinte formato: 20a05m (= 20
anos e cinco meses). Considere a data de resposta ao questionário como referência para o
cálculo. ___________
63

Gênero (escreva o gênero que representa você): ______________

Instituição em que estuda em Psicologia:____________________

Ano de ingresso no Curso de Graduação em Psicologia: _______________

Ano de previsão para conclusão do Curso de Graduação em Psicologia: _______________

Campo de Estágio Específico (Selecione o local que corresponde ao seu estágio, caso esteja
concluindo o curso):

( ) Assistência Social

( ) Clínica

( ) Comunitária

( ) Educação

( ) Jurídica

( ) Organizacional

( ) Saúde

( ) Social

( ) Outros

Sobre o hospital na atenção à saúde mental

Queremos conhecer o que você pensa sobre a temática da atenção hospitalar na atenção à
saúde mental

Quais serviços de saúde mental você conhece (ouviu falar, visitou, leu sobre...)?

Na sua opinião, qual a função do Hospital na atenção à saúde mental?

Para quais situações sobre saúde mental a população pode ter atendida no Hospital?

Quais intervenções em saúde mental podem ocorrer no Hospital?


64

Quais intervenções em saúde mental que ocorrem em Hospital podem ocorrer em outras
unidades de saúde?

Que relações (de aproximação, distanciamento) você identifica entre o Hospital e outras
unidades de saúde no que se refere à atenção em saúde mental?

Observações

Use esse espaço para fazer comentários que queira em relação ao assunto abordado, caso
julgue necessário.

Você concorda em ser contatada/o por e-mail para possível entrevista


aprofundada sobre o assunto?

( ) Não
( ) Sim

Obrigada por ter participado da pesquisa!

Pedimos que você compartilhe este Formulário com colegas que possam nos ajudar. Temos
projetada que cada pessoa possa compartilhar com, pelo menos, três colegas.
65

ANEXO A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

MESTRADO EM PSICOLOGIA

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

(PARA MAIORES DE 18 ANOS OU EMANCIPADOS)

Convidamos o (a) Sr. (a) para participar como voluntário (a) da pesqu

pesquisador (a) Tatiana Driely Vasconcelos Machado, endereço: Av. Acadêmico Hélio
Ramos, s/n Cidade Universitária Recife PE - CEP 50670-901 (7º andar do CFCH
Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFPE) telefone: (81) 995213920, e-mail:
tati_driely@hotmail.com. Está sob a orientação de: Prof. Dr. Wedna Cristina Marinho
Galindo Telefone: (81) 99720312, e-mail wedna.galindo@gmail.com.

Todas as suas dúvidas podem ser esclarecidas com o responsável por esta pesquisa.
Apenas quando todos os esclarecimentos forem dados e você concorde com a realização do
estudo, pedimos assinale o campo que concorda em participar desta pesquisa. Uma via lhe
será enviada por email.

Você estará livre para decidir participar ou recusar-se. Caso não aceite participar, não
haverá nenhum problema, desistir é um direito seu, bem como será possível retirar o
consentimento em qualquer fase da pesquisa, também sem nenhuma penalidade.

INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA:


66

- Descrição da pesquisa: A pesquisa objetiva analisar os sentidos sobre atenção hospitalar na


assistência a saúde mental, bem, como caracterizar o hospital diante dos outros dispositivos de
assistência a saúde mental, identificando terapêuticas e situações relacionadas a atenção
hospitalar. Os dados serão coletados por meio de questionário on-line e entrevista narrativa
com estudantes de graduação em Psicologia do município de Recife-PE. A etapa da entrevista
narrativa será realizada com apenas cinco estudantes que responderam o questionário on-line
e concordaram em participar dessa etapa de aprofundamento dos dados. A pesquisadora estará
disponível para contato para dúvidas ou qualquer informação relacionada a pesquisa por meio
do e-mail disponibilizado neste TCLE.

- O período de participação do voluntário na pesquisa se iniciará após sua autorização por


meio desse termo e se encerrará após a conclusão das respostas do questionário de pesquisa.

- RISCOS: O participante pode ser exposto por participar dessa pesquisa se referem a
questões como desconforto em decorrência do caráter subjetivo e temática, bem como
cansaço visual, físico e mental em virtude da participação por dispositivo eletrônico via
questionário on-line. De forma que é orientado ao participante estar em um local confortável e
ajustar o brilho do dispositivo eletrônico de modo conveniente ao início do questionário. A
sua na pesquisa pode ser encerrada a qualquer momento, além disso a pesquisadora estará a
disposição para minimizar possíveis inconvenientes ou para quaisquer dúvidas, podendo ser
contactada via e-mail.

- BENEFÍCIOS: proporcionar um espaço de discussão e reflexão acerca de assuntos


diretamente ligados a área de formação e atuação dos estudantes/estagiários. Assim como
pode nortear e ampliar conhecimentos dos profissionais atuantes na área da saúde mental.

Todas as informações desta pesquisa serão confidenciais e serão divulgadas apenas em


eventos ou publicações científicas, não havendo identificação dos voluntários, a não ser entre
os responsáveis pelo estudo, sendo assegurado o sigilo sobre a sua participação. Os dados
coletados nesta pesquisa serão feitos por planilhas geradas pelo Formulário Google, ficarão
armazenados em computador pessoal, sob a responsabilidade do pesquisador, no endereço
acima informado, pelo período de mínimo 5 anos.

Nada lhe será pago e nem será cobrado para participar desta pesquisa, pois a aceitação
é voluntária, mas fica também garantida a indenização em casos de danos, comprovadamente
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decorrentes da participação na pesquisa, conforme decisão judicial ou extra-judicial. Se


houver necessidade, as despesas para a sua participação serão assumidas pelos pesquisadores
(ressarcimento de transporte e alimentação).

Em caso de dúvidas relacionadas aos aspectos éticos deste estudo, você poderá
consultar o Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da UFPE no endereço:
Avenida da Engenharia s/n 1º Andar, sala 4 - Cidade Universitária, Recife-PE, CEP: 50740-
600, Tel.: (81) 2126.8588 e-mail: cepccs@ufpe.br

____________________________________________

(assinatura da pesquisadora)

Tendo em vista os itens acima apresentados, eu, de forma livre e esclarecida, manifesto meu
consentimento em participar da pesquisa.

Obs.: Não marque a opção "aceito" deste termo se ainda tiver dúvida a respeito.

* o Aceito

o Não aceito

CONSENTIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DA PESSOA COMO VOLUNTÁRIO (A)

*Obrigatório

Endereço de e-mail *

Seu e-mail: ____________________________

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