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Bonardel c professora na
Universidade de Sorbonne.
Conhecida por seus trabalhos
sobre a alquimia (Philosophie
de ralchimiey 1993, e La
Voie Heruiéti(]uey 2002),
ela dá continuidade a uma
obra original ao explorar
as “margens” da filosofia
(esoterismo, mística, poesia)
sem deixar de buscar as
condições de um possível
diálogo entre tradições
espirituais e pós-modernas.
Nesta obra, ela explica que
os próprios alquimistas se
definiam como “Filósofos
pelo Fogo”, em virtude de
certa sabedoria (entre obra de
sabedoria e elemento ígneo),
que se tornou bem estranha
para espíritos como os
nossos, que agora obtêm suas
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Filosofar
pelo Fogo
Antologia de textos alquímkos
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Françoise Bonardel
Filosofar
pelo Fogo
Antologia de textos alquímicos
Tradução:
1 daiina Lopes
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Publicado originalmente em francês sob o título Philosopher par le Feu: Anthologie de
Textes Alchimiques, por Éditions Almora.
© 2009, Éditions Almora.
Direitos de edição e tradução para os países de língua portugesa.
Tradução autorizada do francês.
©2012, Madras Editora Ltda.
Editor:
Wagner Veneziani Costa
Produção e Capa:
Equipe Técnica Madras
Tradução:
Idalina Lopes
Revisão da tradução:
Jefferson Rosado
Revisão:
Silvia Massimini Felix
Maria Cristina Scomparini
Jerônimo Feitosa
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ainda o uso da internet, sem a permissão expressa da Madras Editora, na pessoa de seu
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Índice
Introdução.......................................................... 9
Origens de uma palavra e de uma prática 14
O espírito da alquimia............................... 24
Uma metafísica no imperativo................. 36
Pseudo-história de uma “louca sabedoria” 44
Nota............................................................ .52
Prefácio à Segunda Edição................................ 55
A Alquimia Descrita por Ela Mesma............... 63
1. Prólogo entre o Céu e a Terra: a Revelação
de Hermes Trismegisto...................................... 65
Tábua de Esmeralda.................................. 66
Pirofilia...................................................... 78
Eudoxe....................................................... 78
2. A Argamassa Mística Egípcia...................... 82
Os mistérios do Egito: arte sagrada
e transmissão iniciática........................................................ 83
Alguns patronos míticos....................................................... 89
3. A Arte de Hermes................................................................... 101
4. O Espírito do Mundo: Alquimia, Cosmologia e Astrologia.. 125
5. Grande Obra, Génese e Embriologia...................................... 147
A embriologia metálica e mineral..................................... 148
Do caos ao cosmos: génese de um mundo........................ 159
6. Diálogo da Artista e da Natureza............................................ 171
7. A Deontologia Operativa (Ora et Labora)..............................192
Ver segundo a natureza: uma oração visionária................ 193
-5-
6 Filosofar pelo Fogo
K
Willian Blake.1 Relatada por Aristóteles e de *
pois comentada por Martin Heidegger,2 uma
anedota nos mostra de fato o mais obscuro dos
pensadores e “teólogos” (theologoi) anteriores
a Sócrates se aquecendo um dia junto ao pé de
um modesto forno de padeiro, e justificando sua JÍERACLITV5
presença insólita naquele lugar por meio de uma Philofonkús .
palavra tão límpida que quase se torna enigmá Heráclito. filósofo: O Fogo é
tica: “Aqui também os deuses estão presentes”. o principio de todas
Sem dúvida eles não estavam menos, nem de for as coisas.
ma tão diferente, próximos desses fornos em que
as “pessoas do crisol [cadinho]”, dizendo-se Filhos de Hermes, também
começaram desde a Antiguidade, mas por meio de práticas estrangeiras ao
3. Marccllin Berthelot, Collection des anciens alchimistes grees (1888), t. III, p. 235; pro
pósitos muito próximos em OHmpiodoro, ibid., p. 90.
4. La Psychanalyse du Feu, Paris, Gallimard (Idées), 1949; Fragments d'une poétique du
feu, Paris, PUF, 1988.
5. Cf. Eugène Canseliet, Alchimie, Paris, J. J. Pauvert, 1964, p. 20-55, em que Arthur Rim
baud é consagrado “Filho de Hermes” segundo a tradição própria à Arte alquímica.
INTRODUÇAO 11
6. Martinho Lutero, Propos de table, trad. fr. Paris, Ed. Montaigne, 1932, p. 411 (41).
7. De la Signature des Choses, reedição Sebastiani, 1975, p. 87.
8. Opus Paramirum (IX, 41-42), citado in Lucien Braun, Paracelse, Presses Universitaires
de Strasbourg, 1981, p. 136.
12 Filosofar pelo Fogo
mas negligenciando sua família faminta. Ora, se o amor pela sutil idade
serviu incontestavelmente de escapatória a alguns dos mais ilustres “de
cadentes” (Baudelaire, Huysmans, Villiers de l'lsle Adam) desejosos
de fugir da trivialidade de um século já materialista e emburguesado,
a busca por tais equilíbrios, de fato tão frágeis quanto teias de aranhas
(sub-tela), visava principalmentc a arrancar a “matéria” filosofal dessa
dupla decadência que é, para o espírito alquímico, uma espiritualidade
desprovida de corporeidadc ou uma corporeidade que não teria sido
espiritualizada, como ensina muito claramente Hermes nos escritos que
lhe são atribuídos,13 e como gosta de repetir um conhecido de Eugcnc
Canseliet (1899-1982), o poeta Robert Marteau: “Porque não há nada
de material que não seja ao mesmo tempo espiritual, o filósofo do fogo
opera ao mesmo tempo que especula, não aceitando a ilusão do espelho
a não ser confrontada à lógica da matéria”.14 Nem que fosse essa a espe
rança de que se quis portadora a buscafilosofal, cuja singularidade - em
relação à abstração filosófica e à revelação religiosa - não exclui a uni
versalidade. De onde quer que venham e seja qual for a identidade que
nesse mundo tenham adotado (filósofos, alquimistas, poetas, sábios),
todos os “operativos” são convocados, mais dia, menos dia, a fazer a
mesma constatação: “Nossa prática é de fato um caminho nas areias,
onde devemos nos conduzir pela Estrela do Norte, mais do que pelos
vestígios que ali vemos impressos”.15
Longe de constituir um fenômeno cultural isolado próprio ao Oci
dente pagão e depois cristão, o pensamento e a prática alquímicos de
fato declinaram a mesma aspiração nas línguas e sob formas culturais
diversas. A erudição letrada confirma atualmente a existência desses
alquimistas — mesopotâmica, árabe, chinesa, indiana -,16 e a presença
dessas práticas em espaços culturais tão disseminados, inexplicável por
razões estritamente históricas, tende por isso mesmo a reabilitar o que
por sua vez afirmavam de sua Arte os Adeptos que solitariamente tra
balhavam em suas regiões: que a universalidade verídica da alquimia
depende menos de sua difusão planetária que da retidão e do fervor
que levam cada um dos Filhos de Hermes à busca de uma Unidade,
intemporal mas encarnada, tendo por si só valor de panaceia (remédio
25. cf a obra clássica de Jack Lindsay, Les origines de l’alchimie dans 1’Égipte gréco-
romaine, trad. fr. Monaco, Le Rocher, 1986.
Introdução 17
do mundo inteiro” (Asclépius, 24), o Egito parece então ter sido rcalmente
a “argamassa mística” (Zózimo) onde se uniram os destinos da alquimia
ocidental e do hermetismo greco-alcxandrino, gnose neoplatònica no en
tanto bastante compósita.26 E sob os traços do deus egípcio Thoth que o
Hermes-Mercúrio greco-latino teria, portanto, pela primeira vez ma
nifestado aos homens seus poderes ocultos. Autenticando essa origem
egípcia em sua famosa obra Symbola aurece mensce duodecim nationum
(1617), Michael Maier (1566-1622) acabou realizando obra de herme-
tista ao evidenciar que analogias unem símbolos cristãos e pagãos. Mas
outras hipóteses não devem ser negligenciadas: as teurgias do fogo pra
ticadas pelos cabires na ilha de Samotrácia, por exemplo, como sugere
René Alleau em Aspectos da alquimia tradicional (1953), cm que a
hipótese de um estreito parentesco entre as alquimias ocidental e chi
nesa (taoista) é igualmente desenvolvida; sendo ambas tão preocupadas
com o aperfeiçoamento dos metais quanto pela prolongação da vida em
“corpo” de imortalidade.
Mesmo que a maioria dos tratados canónicos ocidentais invoque
uma inspiração emanada dirctamente de Hermes Trismegisto,27 as eti
mologias mais correntemente propostas da palavra alquimia se referem
principalmente à própria prática dessa arte cujos diversos aspectos fo
ram sucessivamente considerados como muitas de suas origens possí
veis: a arte de fundir e de escorrer os metais, %1XHÇ a de derramar e
de misturar os líquidos, %ECD ou ainda de extrair determinado Sal que
também corresponde, segundo outra terminologia demasiado marcada
pela dinâmica dos quatros Elementos, à noção de Quinta-Essência: “A
Alquimia é uma arte derivada de OtÁÇ e de X^fLOÇ, Sal e suco, por
que ela ensina a extrair o Sal, os humores, sucos e licores de qualquer
misto”, observa Nicolas de Locques.28 Essencialmente voltadas para a
tecnologia própria a essa prática, essas considerações etimológicas dei
xam, em contrapartida, de lado a denominação de Arte Sagrada (Hiera
technè) ou de Ciência Divina frequentemente empregada pelos alqui
mistas gregos preocupados com a fabricação da Água divina, também
chamada “Água de enxofre”, “Água aérea” ou “Água do abismo”, e já
26. cf. Françoisc Bonardel, L'Herniétisme, Paris, PUF, Que sais-je? NB 2247, 1985. Reedi
ção revista e ampliada sob o título La Koie hermêtique. Paris, Dervy, 2002.
27. Três vezes grande: “Ele é chamado Trismegisto. sendo considerado segundo a tríade o
que é feito e o que se faz”, dizia sobre essa denominação Zózimo (Marcelin Bcrthelot, op.
cit. p. 136).
28. Les Rudiments de la Philosophie naturelle (1665), p. 199. Mesmos propósitos em Le
Tonibeau de la Pauvretè (1672) pelo Filósofo desconhecido: “Parece que o verdadeiro nome
de Alquimia demonstra que essa ciência consiste na facção de um Sal fusível, pois em gre
go, significa Sal e Chymie, fusão”.
18 Filosofar pelo Fogo
33. Cf. o texto de David de Planis Campy citado p. 116-118. em que são indicados a eti
mologia da palavra Spagyrie e o uso por assim dizer ,lnobre” que dela fizeram Paracelso e
sua escola.
20 Filosofar pelo Fogo
34. L Alchimie au Moyen Àge, trad. fr. Paris, Aubier-Montaigne, 1936 e Verviers (Bélgica).
Marabout, 1974, p. 1Ó5.
INTRODUÇÂO 21
0 espírito da alquimia
Sob o nome de alquimia de fato se encontraram ao longo dos sé
culos uma oração visionária e uma prática (Ora et Labora), sem dúvi
da nenhuma oriundas dos antigos segredos de ofício, mas que a partir do
século XIII conheceu no Ocidente um desenvolvimento sem precedentes,
43. Um adágio alquímico célebre recomenda de fato: “Ora, lege, relege, et inverties occul-
tuni lapidem” (Nicolas Flamel).
44. Chiara Cristiani/Claude Gagnon, Alchimie et Philosophie au Moyen Âge, Montreal, Ed.
Univers, 1980, p. 80.
45. Marcelin Berthclot, Collections des anciens alchimistes grecs, op. cit. p. 429.
Introdução 25
46. Além das obras dc Jean de Rupescissa citadas nessa antologia, cf. por exemplo: Hicrony-
mus Brunschwig, Liber de arte distillandi (1500). Jérome Cardan, De subtilitate (1559).
47. Seyycd Hossein Nasr, “La tradition alchimique”, Sciences et savoir en isIam. trad. fr.
Paris, Sindbad, 1990, p. 267.
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26 Filosofar pf.lo Fogo
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a extração das forças latentes, mas vivas da Natureza, até que um sal
to qualitativo transmute o crescimento natural em “novo nascimento”,
enobrecendo a matéria até então leprosa e vil. A Arte alquímica era,
portanto, obrigada, para atingir esse objetivo, a entrar com a Natureza
em um diálogo feito, durante séculos, de atenção quase religiosa e de
respeito, pelo menos até que o “prometeísmo” agora triunfante faça
prevalecer a única vontade de dominação (exploração sem freio das ri
quezas naturais) e de revelação sem limites: o “grande esclarecimento”
prometido pela maior parte dos tratados no século XVIII! Por isso o
desaparecimento da alquimia foi programado tanto pela evolução das
ideias para um materialismo mecanicista, inelutável, desde o final do
século XVII, quanto pelo declínio do estado de espírito em que residiu
também o gênio “mercurial” da alquimia. Tal Hermes, conduzindo para
INTRODUÇAO 27
48. cf. Cari Gustav Jung, Der Geist Mercurius, in Essais sur ia symbolique de l 'Esprit, trad.
fr. Paris. Albin Michel. 1991. p. 15-84.
49. Oswald Crollius, Traité des Signatures (1618); Jacob Boehmc, De la Signature des
Choses (De Signatura Rerum, 1621).
28 Filosofar pelo Fogo
50. Mauricc Aniane. “Notes sur 1’Alchimie ‘yoga’ cosmologique de la chrétienté médié-
vale”, in Yo%a, Science de THomme intégral, Ed. Des Cahiers du Sud, 1953, p. 244.
51. Monge inglês (360? - 422?) propagador de um ascetismo estrito, julgado, no entanto,
herético, por Santo Agostinho em particular, pois valorizava a liberdade humana em detri
mento, como se teme, da única graça divina.
52. Angclus Silesius, Pèlerin chérubinique, trad. fr. Paris, Aubier-Montaigne, 1943, p. 77
(1, 102). cf. Também 1, 244 : “O amor é a pedra filosofal”: ela separa o ouro da lama, ela
faz do vazio alguma coisa, e me transforma em Deus”. Simone Weil escreve o mesmo em
seus Cahiers: “A santidade é uma transmutação como a eucaristia”, La connaissance
surnalurelle, Paris, Gallimard, 1950, p. 41.
Introdução 29
53. Santideva, La Marche à la Lumière, trad. fr. Paris, Les Deux Océans, 1987, p. 37.
54. Cari Gustav Jung, Psychologie et alchimie, trad. fr. Paris, Buchet-Chastel, 1970, p. 33.
55. Frans von Baader, Fermenta cognitionis, trad. fr. Paris, Albin Michel, 1985, p. 57-58.
30 Filosofar pelo Fogo
uma química espiritualista, porque nos permite entrever Deus por meio
das trevas da substância”, dizia Fulcanelli.59 Por isso, quando os alqui
mistas falam de sua Matéria como de seu Fogo ou de sua Água, existe
aí muito mais do que um fechamento sobre um segredo difícil de desco
brir e que tudo convida a guardar de forma zelosa. É bem de um gesto
s de apropriação que se trata, porém mais próximo de
’z uma imitação - a do gesto criador divino na maior
parte do tempo - do que de uma mimesis dominada
pela irreflexão ou pelo pragmatismo; a lógica parado-
à I xal da “posta em Obra” desejando de fato que se torne
“nossa” qualquer matéria cujo trabalho de natureza
alquímica conseguiu suspender e atenuar a materiali
FpLato Chymi, dade por demais pesada, sem deixar de paralelamente
|cis. reduzir nosso sentido por demais afiado da proprieda
Platão, Químico: de. Indício de um repatriamento, essa palavra (nosso)
Antes, o ovo apodre também se torna de uma alienação de si que dá à Opus
ce, depois, o pintinho Chemicum sua coloração mística e soteriológica. Por
é engendrado, outra isso inúmeros alquimistas mostraram, nos próprios
vez do ovo corrompi títulos dados a seus tratados, essa vontade de ir ao
do nasce o animal. coração das coisas para delas extrair uma “essência”
benéfica: A Flor das flores (Fios florum), O Caminho dos caminhos
(Semita semitce), O Segredo dos segredos (Secretum secretorum).
Que os alquimistas se tenham reconhecido como autênticos filóso
fos não depende portanto de um mal-entendido, mas de outra concepção
do “filosófico” mais precisamente dado pelo epíteto filosofal, de empre
go tardio: “Amante de sabedoria, que é instruído das operações secretas
da Natureza, e que imita seus procedimentos para conseguir produzir
coisas mais perfeitas do que as da própria Natureza”, resumia Dom
Pernéty em seu célebre Dicionário mito-hermético (1758). Um desses
“filósofos” até mesmo se aventurou a apostrofar Platão nos seguintes
termos: “Eu vos lamento, senhor Platão. Realmente gostaria que vós
tivésseis possuído o que eu possuo, pois vós teríeis uma bela disposição
para vos tornar um segundo Hermes”.60 Concebemos o que semelhante
programa pode ter de chocante para os espíritos modernos, bastante dis
tanciados, desde Descartes, de tal visão da Natureza e que não veem
mais qual senso “crítico” pode bem, por meio de tais operações,
ainda se exercer; o mimetismo evocado lhes parecendo antes remeter
64. Le Char trioniphal de 1'Anfinioine (1604). Reedição Paris, Retz, 1977, p. 124-125. No
livro II de Les douze Clefs de la Philosophie (1* Ed. 1599). Basile Valentin escreve igual
mente : “As abelhas também produzem mel das melhores partículas, c com ervas e flores;
e assim de todas as coisas, das quais a chave e as principais causas estão na putrefação de
onde provêm todas essas espécies de separações e transmutações”, (p. 144).
65. Carta a Witold von Hulewicz. (Euvres, t. III, Correspondance, trad. fr. Paris, Éd. du
Seuil. 1976, p. 590.
66. cf. a esse respeito: Françoise Bonardel. Philosophie de 1’alchiniie - Grand (Euvre et
ntodernité (Paris, PUF. 1993). no qual se demonstra que “o espírito de alquimia” continua
inspirando muitos pensadores e artistas modernos e contemporâneos; a lógica paradoxal e
a simbólica da Arte de Hermes também representando um papel mediador entre religião
e filosofia.
Introdução 35
70. Yves Bonnefoy, Le Nuage rouge, Paris, Mercure de France, 1977, p. 265.
71. Les origines de / alchimie (1885), reimpresso Osnabruck, Otto Zeller, 1966, p. 2.
72. André-Jean Festugière, La Révélation d'Hermes Trismégiste, Paris, Gabalda, 1944-
1954,1.I, p. 239.
INTRODUÇAO 37
75. Nouvelle Lumière chyniique (1639), reedição Paris, Retz, 1971, p. 34.
76. Les Textes alchimiques. op. cil. p. 63.
INTRODUÇAO 39
81. Collection cies anciens alchimisíesgrecs, op. cit., t. III, p. 52 {“Questions naturelles et
mysteneuses " do Pseudo-Deniócrito).
82. cf Les Alchimisíes grecs, t. 1, texto estabelecido e traduzido por Robert Halleux. Paris.
Lcs Befles Lettres. 1981.
83. Corps spirituel et Terre céleste, Paris. Buchet-Chastel, 1961. p. 26.
84. Collection cies anciens alchimisíesgrecs. op. cit., t. III, p. 116.
1
Introdução 43 i
I
por sua vez Rilke: “Sê entusiasta, ah! Da chama pela qual uma coisa
te deixa, cm glória de metamorfose”.85 Assim o corpus alquímico não
teria sido senão uma imensa e redundante “receita”, cuja palavra de
ordem tanto quanto o resultado esperado teria sido transmutação ou
um dos seus equivalentes mais próximos: amadurecimento, maturação,
aperfeiçoamento, quando c prioritariamente designado o processo na
tural de que a Grande Obra é apenas a imitação realizada; ou ainda per
muta, quando é principalmente evidenciada a rotação dos Elementos,
cuja incessante circulação produz pouco a pouco a transmutação à qual
o espírito da escolástica cristã muitas vezes preferiu a noção de tran-
substanciação, frequentemente utilizada toda vez que é considerada a
similitude entre corpo da Pedra e corpo
do Cristo (Lapis-Christus).
Mas é preciso ressaltar que essa
mesma injunção assim proferida tam
bém responde ao chamado de sofri
mento oculto e disseminado em toda
parte na Natureza, e do qual o opera » <41
dor vigilante e misericordioso recolhe
o eco em seu matraz [balão de desti
lação] hermeticamente fechado. Por
isso, a ordem lançada não é imperiosa,
coercitiva apenas para alguém que não
percebe quanto ainda mais imperativo é
o chamado à transformação latente em
fere
toda matéria, e sobre o qual “filosofia”
alquímica desejou que Deus tivesse ■ ''í1
85. Sonnets à Orphée, 2a parte, soneto 12, in (Etivres, trad. fr., Paris. Éd. Du Seuil. 1972,
p. 160.
44 Filosofar pulo Fogo
86. cf Antoinc Faivre, Toison d’Or et Alchimie. Milão. Archè, 1990, em que algumas páginas
(48-55) sào consagradas ao tratado de Salomon Trismonin La Toison d'Or. Inúmeras outras
“fábulas” ou mitos foram evocados cm apoio a essa analogia: o de Cadmus (cf texto citado p.
239), mas também a Odisseia homérica e, em um contexto cristão, a Busca do Graal.
87. Sobre essa questão, cf por exemplo: Houang-Po, Entretiens. Paris, Éd. du Seuil, 1993;
Entretiens de Lin-TsL Paris, Fayard. 1972; Tch'an, Paris, Les Deux Océans, 1985.
I NTRODUÇAO 45
89. Questão determinante com efeito, uma vez que dela depende a possibilidade mesma da
“transmutação”. Ora. se os alquimistas foram bastante conscientes dessa dificuldade, eles
em geral decidiram em favor não de uma passagem entre as diversas espécies, mas de um
aperfeiçoamento (quantitativo e qualitativo) próprio a cada uma delas, e conforme ao desejo
secreto da Natureza.
90. LAlchiniiste, de Gérard de Nerval e Alexandre Dumas pai (1839), La Recherche de
1'Absolu, de Honoré de Balzac (1834).
91. Gregor Reisch, Margarita Philosophica (1496).
1NTRODUÇAO 47
por sua vez sua própria visão de uma vida sábia c agradável, pois razoá
vel, tão capaz de resistir às seduções da intemperança e a seu cortejo
de insanidades quanto às solicitações ilusórias ou mentirosas de um
“espírito” desprovido de qualquer racionalidade. No que poderia então
contribuir, sobre essa grave questão, a alquimia? Tomando como divi
sa o famoso solve et coagula (dissolve e coagula) a fim de extrair do
veneno o remédio adequado, essa
arte c entre todos reconhecível, na
medida cm que ela coloca a serviço
de uma serena e solar “Sabedoria
do Meio-dia” - “que domina to
das as coisas, que penetra à direi
ta até o Oriente, e à esquerda até o
Ocidente, e abraça a terra inteira”92
-alguma sombria melancolia, justi
ficando que Saturno, com lentidões
extenuantes e impurezas inquietan-
tes, tenha sido o inevitável “crivo
dos Sábios”, em que se reconheceu
como modelo a Obra de alquimia.
Louca esperança com efeito aquela O Rei doente: 'Aqui o Pai está coberto
de todos esses “Reis doentes” que por um forte suor de onde escorre a
perseguem com sua languidez e sua verdadeira Tintura ”, Lambsprinck, De
palidez os textos canónicos,93 e se Lapide philosophico, séc. XVI.
oferecem como vítimas expiatórias
de um “erro” que o otimista escatológico próprio à alquimia situa me
nos em uma anterioridade suja, que deveria ser resgatada, do que na
impotência, para quebrar o círculo encantado de um presente indefini
damente reiterado, e no seio do qual o melancólico se contenta em dese
jar, sem ele próprio conseguir. Obrar, uma Realeza todos os dias adiada.
E também por isso que os alquimistas se mostravam particularmente
atentos ao fato de que a putrefação de sua matéria e a mortificação que
se segue não anulam para sempre suas chances de sobrevida.
A explicação proposta por Lenglet-Dufresnoy quanto à ausência
de verdadeira História da alquimia parece, portanto, a contrario escla
recedora: preocupados demais com o sucesso de suas operações, os al
quimistas teriam se desinteressado de sua própria história e da História
92. Michael Maier, Atalante fugitive (1618), reedição Paris, Librairie de Médicis, 1969,
p. 213.
93. cf. textos citados p. 216 55.
48 Filosofar pelo Fogo
Borel (1646) e que é, como aliás seu título indica,95 apenas um catálogo
dos tratados publicados antes de 1643; ou ainda o Conspectus Scriptorum
Chemicorum Illustriorum, realizado por Olaus Borrichius (1697) e que
traz uma espécie de resumo da doutrina dos principais escritores em
uma ciência menos marcada, no entanto, pela diversidade do que pela
unidade e a continuidade.96 Quanto aos diversos compêndios consti
tuídos desde o final do século XVI,97 os mais conhecidos foram em
seguida o Musceum Hermeticum Reformatum et Amplificatum (1625,
depois 1678) e as notáveis coleções reunidas por Lazarus Zctzner
(Theatrum Chemicum, 1613, 1622, 1661), depois por Jcan-Jacqucs
Manget (Bibliotheca Chemica Curiosa, 1702) e William Salmon
(Biblioteca dos Filósofos Químicos, 1740-1754), aos quais inúmeros
empréstimos necessariamente foram feitos para a realização desta
antologia; a escolha dos textos sendo então guiada tanto por sua fi
delidade à continuidade tradicional quanto pelo estilo próprio com o
qual cada autor se apropriou, inovando na ocasião em uma arte que
nem por isso tem deixado de pertencer à história das ideias.
Sem dúvida tratou-se, para os autores dessas coleções de tratados,
de também salvar do esquecimento obras até então consideradas pelos
Filhos de Hermes como canónicas, mas cada vez mais ameaçadas pela
evolução das ideias em favor do materialismo mecanicista.98 Mas não
é sobretudo que esse modo de coletânea - theatrum não tem na ori
gem outra significação - responde estritamente à lógica que foi a dos
alquimistas, usando da invocação e da enumeração quando se trata de
relembrar que prestigiosos precursores emprestaram antes dele a via
real traçada pela proclamação de Hermes em sua Tábua de Esmerai-
da? Usando também da evocação dos dizeres destes ou daqueles que
pertencem a essa fabulosa linhagem, quando eles julgam necessário
pontuar sua exposição com uma “prova” então qualificada de argu
mentação, ali onde muitas vezes seríamos levados a ver apenas o banal
recurso ao argumento de autoridade: "Hinc dicit Philosophus” (daí o
Filósofo diz), ou ainda “Ideo Philosophi dicunC (é porque os Filósofos
dizem). Mas ao filósofo que constata de maneira muito legítima que os
alquimistas não se preocuparam verdadeiramente em argumentar, seria
preciso relembrar que a própria existência da Natureza não tinha aos
seus olhos nenhuma necessidade de ser demonstrada, mas exigia antes
95. Bibliotheca Chemica seu Catalogas librorum philosophicorum hermeticorum.
96. cf Texto de Dom Peméty citado p. 98-99.
97. Aurijèríe Artis quam Chemian vocant (1572). Alchemice, quam vocant artisque metallicce
doctrina (Guglielmo Gratarolo, 1572).
98. cf. Texto de Bruno de Lansac citado p. 94-95.
50 Filosofar pelo Fogo
99. Essa analogia estrutura e anima todo O Théâtre et son Double, de Antonin Artaud (pu
blicado em 1938), e não apenas o texto que tem por título “Le Théâtre et 1’alchimie” : cf.
Françoise Bonardel, Philosophie de Talchimie - Grand (Euvre et modernité. Paris, PUF,
1993. p. 559-576.
100. Questão sobre a qual René Alleau insiste de forma bem particular em seu notável
artigo “Alchimie”, publicado na Enciclopcedia Universalis.
InTROPUÇ/\O 51
101. Le Monde comme volonté et comme représentation, trad. fr. Paris, 1966, p. 1222.
52 Filosofar pelo Fogo
Nota
As principais coletâneas de textos alquímicos em língua latina utili
zadas para a constituição desta antologia são: Alchemice. Quam vocant ar
risque metallicce doctrina (A doutrina de Alquimia e da Arte metálica), ed.
de 1572, 2 vol., reunidos por Guglielmo Gratarolo; Auriferce Artis quam
Chemiam vocant (Da arte defazer ouro, chamada Alquimia), ed. de 1572,2
vol.; Theatrum Chemicum (Teatro Químico), de Lazarus Zetzner, na ed. em
6 vol., de 1661; Museum Hermeticum Reformatum etAmplificatum (Museu
Hermético Corrigido e Amplificado), 1678; Bibliotheca Chemica Curiosa
(Biblioteca Química Completa) de Jean-Jacques Manget (2 vol., 1702), da
qual existe uma reedição em dois volumes (Arnaldo Forni Editore, 1976).
Todos os textos extraídos dessas coleções - ou de obras isoladas citadas em
sua edição original latina - estão aqui presentes em uma tradução inédita.
Um determinado número de traduções antigas foi, no entanto, con
servado, ou em razão de sua qualidade poética, ou porque elas são autori
dade ao longo dos séculos. Assim a Biblioteca dos Filósofos Alquímicos, de
Willíam Salmon (1672-1673), aumentada por Jean Maugin de Richebourg
(1740-1754), foi continuamente usada pelos hermetistas modernos
(Julius Evola, Eugène Canseliet, René Alleau, Claude d’Ygé), a despei
to das críticas formuladas pelos eruditos que, com razão, deploravam
a imprecisão de suas transcrições e traduções. Essa obra foi objeto de
102. cf René Alleau. “Le synibolisme alchimique de la mort”, Cahiers internationaux du
Symbolisme (n° 37-39), p. 79.
Introdução 53
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* - ■■
-55-
56 Filosof/Xb Pelo Fogo
103. Marcellin Bcrthclot, Collection des anciens alchimistes grecs. op. cit., p. 192.
104. “Não existe remédio contra o veneno, se não for o próprio veneno”: L’heure du crime
et le temps de Toeuvre d’art, trad. fr. Paris, Hachette, 2004, p. 343.
Prefacio z\ Segunda EdiçAo 57
107. Pierrc Thuillier, “L’alchimic hier et aujourd’hui”, Les savoirs ventriloques, Paris, Le
Seuil, 1983, p. 30.
108. Apresentação de Alchimie (Tratados alemães do século XVI), Paris, Fayard, 1980, p. 17.
Prefácio à Segund/\ Ediçáo 59
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Apoio e um alquimista: desenho deAlbrecht Diirer, 1494-1496 (Albertina, Viena).
109. Raimon Panikkar, Èloge du simple, trad. fr. Paris, Albin Michel, 1995. p. 92 e 109.
60 Filosofar Pelo Fogo
110. Título de uma obra de Jean Biès, autor, entre outros, de Les alchimistes, Paris, Éd. du
Félin, 2000.
111. Dom Albert Belin, Apologie du Grand (Euvre ou Elixir des Philosophes (1659), p. 235.
Prefácio A Segunda Ediçáo 61
Unia jovem atiçando o fogo com uma asa de pássaro: desenho de Martin
Schongauer (1469) que pode simbolizar a arte e o espírito da alquimia.
A Alquimia Descrita
por Ela Mesma
-63-
64 Filosof/\r pelo Fogo
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Tábua de Esmeralda
1. É verdade, sem qualquer mentira e muito verídica.
2. Que o que está embaixo é como o que está em cima, e o que está em
cima é como o que está embaixo, para que se realize o milagre de uma
única coisa.
3. E assim como todas as coisas procederam do Um
c" JI
somente pela mediação do Único: da mesma forma
elas nasceram por adaptação dessa coisa única.
4. Seu Pai é o Sol, e a Lua, sua mãe; o vento a carregou
em seu ventre e sua ama de leite é a terra.
5. E o pai de todos os milagres do mundo.
____ 6. íntegra é sua potência, se for convertida em terra.
HERMES TRLSMfj
| fftos, /tffrtdts. j 7. Tu separarás a terra do fogo, o sutil do espesso, sua
vemente e com grande habilidade.
Hermes Trismegisto, 8. Ela se ergue da terra em direção ao céu e então re
o Egípcio: O que torna à terra e recebe a energia das realidades superio
está no alto é como
res e inferiores; assim, tu ganharás a glória do mundo
o que está embaixo.
todo, e toda escuridão se afastará de ti.
9. Esta é em toda a sua força a potência suprema, que dominará qual
quer realidade sutil e penetrará todo corpo sólido.
10. Assim o mundo foi criado.
11. Suas aplicações serão desde então maravilhosas, segundo as seguin
tes modalidades.
12. É por isso que eu, Hermes, detendo as três partes da filosofia do
mundo todo, sou com razão chamado Tris-megisto.*
13. E assim está realizado o que eu disse quanto à operação do Sol.
Tábua de Esmeralda (Tabula Smaragdina, scc. IX),
iti Jcan-Jacques Mangcr,
Bibliotbeca Chetnica Curiosa, t. I, p. 381.
113. Goethe, Second Faust, trad. fr. Paris, Garnier, 1969, p. 37.
Prólogo entre o Céu e a Terra: a Revelação de Hera\es Trismegisto 67
*
* *
*
* *
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l: í
JL aça com que o que está em cima venha para baixo, o que é visível se
torne invisível e o que é palpável, impalpável; e, novamente, faça com
que o que está embaixo se eleve para o alto, torne o invisível visível
e o impalpável, palpável: essa é a totalidade completamente perfeita,
sem nenhuma falta nem diminuição, em que residem a morte e a vida,
a destruição e a ressurreição. E uma esfera perfeitamente redonda com
a qual a deusa da Fortuna avança sua carruagem, e concede aos homens
de Deus o dom da sabedoria. Nenhum nome mais apropriado poderia
lhe ser dado pela inteligência das realidades temporais do que aquele
de todas as coisas em todas as coisas: acima das próprias realidades
eternas se mantém esse árbitro e juiz supremo.
Se agora alguém desejar o que é todas as coisas em todas as coi
sas, confeccione asas enormes para um animal
selvagem; que o empurre até o extremo para que
ele alce seu voo e percorra os ares, eleve-se até
a mais alta região do céu, e então lhe queime as
asas com um fogo muito forte a fim de que a terra
seja a primeira a cair de cabeça em um mar ver-
K i melho e ali comece a sufocar; e pelo fogo e pelo
ar corte a água para que uma terra seja então no
vamente feita: você terá então, eu lhe digo, todas
Basilivs Vaixn,.
’ tmus Mcma,: as coisas em todas as coisas.
Se você não puder alcançar isso, procure em
Basile Valentin, monge:
si mesmo, e em todos os lados você observará um
O Ouro é o pai da
Tintura;, a Prata-viva,
círculo em torno de todas as coisas que é possí
sua mãe; Mercúrio, seu vel descobrir através do mundo: você obterá então
avô; a Agua mercurial; todas as coisas em todas as coisas que é a virtu
sua avó. de atrativa de todas as coisas metálicas e vegetais
oriundas do Enxofre e do Mercúrio, e uma segun
da vez nascidas do Mercúrio: mais do que isso não caberá a mim dizer o
que são todas as coisas em todas as coisas, uma vez que todas as coisas
foram compreendidas em todas as coisas.
Basile Valentin, Da Grande Pedra dos Antigos Sábios
(De Magno Lapide Antuptoruni Sapientmn, séc. XV?),
in Jean-Jacqucs Manget,
Bibliotheea Chenitca Curiosa, c. II, p. 411.
*
* *
Prólogo entre o Céu e a Terra: a RevelaçAo de Hermes Trismegisto 75
lE/ ssas palavras, ao que parece, não proclamam nada além do que o
próprio Moisés ensina quanto ao início da Génese física, e que Hermes
diria da seguinte maneira: a Arte espagírica é ensinada por meio de uma
meditação sobre a criação do mundo, na qual vemos que foram cria
das tanto as águas inferiores quanto as águas superiores, e que foram
criadas as águas superiores como certamente foram criadas as águas
inferiores; e isso foi feito para que sejam realizadas as obras maravi
lhosas de uma única coisa. E, assim como todas as coisas procedem por
concepção mental de um Deus criador único, e em primeiro lugar apenas
de um mundo único, assim também todas as coisas foram cm seguida
criadas, graças a um arranjo, essencialmente a partir desse único mundo.
Por essa comparação que mostra alguma similitude com a criação do
mundo, ele ensina até hoje que sua Arte espagírica teve um primeiro iní
cio. Depois disso, indo da teoria para a prática, ele diz: O Pai dessa coisa
que desejo lhes ensinar, ou seja, a medicina universal, é o Sol terrestre,
ou melhor, ainda ígneo, e a Lua aquosa. O ar carregou essa medicina
ígnea em seu ventre, e a Terra a alimentou. Sua perfeição será conhecida
quando ele acolher no final da obra a forma concentrada da terra.
Veja, agora você tem todo o resumo da preparação, que pode até
certo limite ser adaptada pela imitação à totalidade do mundo, de que
você obterá até mesmo a origem da prática. Você separará as águas
inferiores de suas trevas já liberadas e, se repetir isso com frequência,
das águas superiores e mais sutis, e isso por meio de um fogo suave e de
uma grande dedicação. Que seja assim feito, para que dessa maneira a
gestação espagírica terrestre revista por ascensão sua natureza celeste,
e receba em seguida de maneira manifesta, por sua descida, a natureza
do centro terrestre; a natureza celeste não sendo menos retida no centro
oculto da terra, que ela tinha adquirido pela ascensão. Se de alguma ma
neira a glória temporária advém a partir do mundo todo, você aprenderá
nessa arte como expulsar de si certa escuridão, tanto corporal quanto
mental, para que se comporte bem.
Nesse remédio residem também vigor e valentia, para além de
qualquer modo de cura, uma vez que ele vence o mal sutil e espiritual
no espírito humano, e que penetra e coloca em movimento toda a vida
do corpo, tanto interna quanto externa, bem como em sua integral idade;
espera-se que esse remédio tenha sido confeccionado da mesma ma
neira pela qual o mundo foi criado. Que seja então por essa maravilha
efetuado o tratamento das doenças, de que você detém aqui o meio e
76 Filosof/Xr pelo Fogo
‘*5’
Pirofilia
Eudoxe
116. O texto em latim é o seguinte: Quodest inferius, est sicut quodestsuperius, et quodest
superius, est sicut quod est inferius, ad perpetanda miracula rei unius.
Prólogo entre o Céu e a Terra-, a RevelaçAo oe Hermes Trismegisto 79
eus tirou a Natureza do vazio pela virtude de seu Verbo, o qual ele
havia engendrado há muito tempo. Ele quis, e o Verbo engendrou um
vapor, um nevoeiro ou uma fumaça imensa, e ali imprimiu sua virtude,
isto é, um espírito pleno de força e potência. Esse vapor se condensou
em uma água que os Filósofos nomearam universal e caótica, ou sim
plesmente o caos, é dessa água que o Universo foi formado: é ela que
foi, como ainda é e será sempre, a matéria-prima de todas as coisas
naturais [...]
Enfim, entre o céu e a terra nós só vemos vapores, fumaça e água,
que, levadas pelo calor central da terra, se sublimaram e subiram de
nossa esfera composta de terra e de água para a região do ar; c se pu
déssemos perceber as sutis emanações ou os vapores sutis dos céus, ve
ríamos suas influências, que descem de cima para baixo, se misturarem
e se unirem com os vapores terrestres que se sublimam no alto; mas,
se não podemos vê-los por causa da fraqueza de nossa visão, devemos
concebê-los por meio de nosso espírito, em seguida torná-los palpáveis
pela prática da Alquimia, e sentir que tudo o que acontece no microcos
mo também acontece no macrocosmo, e que o que está em cima é como
o que está embaixo [...].
Não podemos ir de uma extremidade á outra sem passar pelo meio.
Esse axioma dos Filósofos é e sempre será verdadeiro, e os Artistas de
vem realmente aprendê-lo; pois existe uma infinidade deles que erram,
por não observar e não considerar esse ponto essencial o suficiente. De
fato o céu só poderia se reduzir em terra por meio da água e do ar, e
a terra não pode jamais se tornar céu, sem a água e o ar, como coisas
médias entre o céu e a terra, assim como o céu muito dificilmente se
reduzirá em água, sem o ar, e a terra só se tornará ar por meio da água.
O céu é sutil, puro, claro e muito volátil, a terra, ao contrário, é gros
seira, espessa, tenebrosa e muito fixa, e se alguém empreendesse unir
e fixar o céu, que é muito volátil, à terra, que é muito fixa, ele jamais
conseguiria; mas o muito volátil voaria ao mínimo calor, e retornaria ao
seu caos, abandonando o fixo.
Que um Artista tenha, portanto, sempre esse ponto diante dos
olhos, isto é, saber que nunca, em qualquer tipo de coisa, o muito sutil
e o muito fixo se deixam ligar e unir, sem seu meio conveniente; de
outra forma ele perderá sua matéria, seu tempo e seus gastos. Assim,
quem quer que deseje reduzir o céu ou o fogo em terra, deve uni-los
antes com seu meio, e então eles se unirão no mesmo instante; ao passo
que, sem isso, seria necessário, por assim dizer, quase uma eternidade
para uni-los. Faça descer o céu no ar, como seu meio, eles se unirão sem
80 Filosofar pelo Fogo
combate, porque ambos são de uma natureza sutil: assim que estiverem
unidos, dê-lhes água, como um meio entre o ar e a terra, eles se unirão
no mesmo instante; em seguida dê-lhes a terra, dessa maneira a união
se fará por graus intermediários convenientes, descendo de um grau
muito sutil a um sutil, de um sutil a um mais espesso, deste a um muito
espesso, e não imediatamente de um muito sutil para um muito espesso.
Ao contrário, reduza a terra em ar pela água ou por meio da água, a
água em ar pelo ar, e este em céu pelo céu, pois todos são uma mesma
coisa, quanto à sua matéria e à sua origem, por isso um deve ser a ajuda
e o condutor do outro, e devemos preparar um por meio do outro [...].
Observando todas essas coisas é que conheceremos o superior e o
inferior de Hermes, a corrente* de ouro de Homero, o anel de Platão, e
que seremos convencidos de que uma coisa se transmuta em outra e se
torna, pela vicissitude das coisas, a mesma ou semelhante àquela que
ela foi anteriormente.
A Natureza revelada ou a Teoria da Natureza (1772).
Tradução da Aurea Catena Hotneri, dc
Anton Joseph Kirchweger (1723),
1.1, p. 2, 5-6, 15-17 c 35.
A Argamassa
Mística Egípcia
Mercúrio foi chamado Hermes* três vezes o grande
Por causa de sua força de alma e de seus poderes.
Ele tratou por escrito de muitas maravilhas.
Expôs prudentemente a obra da alquimia.
Daniel Stolcius,
Virtdaríum chymicum (1624)
Uma tradição bem estabelecida quer que o Egito tenha sido o berço
do hermetismo, assim como da alquimia, essa “arte divina ” cujo se
gredo teria sido revelado pelo anjo Amnãel a Isis, por quem ele estava
encantado; a qual por sua vez teria transmitido a seu filho Hórus o
ensinamento de Hermes, cuja alma possuía “o vínculo de simpatia com
os mistérios do céu ” (Corpus Hermeticum). A morte e a ressurreição
solar de Osíris pareciam, por outro lado, anunciar as de Cristo e sim
bolizar o destino da “matéria “posta em Obra pelos alquimistas. Ainda
que o Egito permaneça realmente o coração, o lar da revelação atribuí
da a Hermes Trismegisto, muitos alquimistas ocidentais ampliaram sua
expansão para toda a bacia mediterrânea e o Oriente médio (Caldeia,
Mesopotâmia, Pérsia, Palestina).
Uma espécie de tradição primordial e oriental assim surgiu, cuja
anterioridade venerável parece atestar a superioridade sobre o mun
do grego. Às vezes colocados entre os “fazedores de ouro ”, os filóso
fos gregos são então reconhecidos por não terem ainda traído, como
o farão seus sucessores, a verdadeira filosofia revelada por Hermes
Trismegisto, três vezes “grande ”, na medida em que ele teria sido ao
mesmo tempo Filósofo, Sacerdote e Rei (Michael Maier). Ainda que
se relacione a origem à tríade egípcia (Osíris, ísis, Hórus) ou a uma
-82-
A Argamassa Mística Egípicia 83
*
* *
7
Z-/
ózimo a Teosébio, salve!
Todo o reino do Egito, ó Mulher, depende dessas duas artes, a das [tin
turas] convenientes e a dos minerais. A arte chamada divina, seja em
suas partes dogmáticas e filosóficas, seja na maioria das questões de
menor alcance, foi confiada a seus guardiões por sua substância. Isso
acontece não apenas com essa arte, mas ainda com as quatro artes cha
madas liberais e com as artes manuais. Sua potência criativa pertence
aos reis. Se eles o permitem, aquele a expõe de viva voz, ou a interpre
ta a partir das estrelas, que recebeu seu conhecimento como herança
de seus antepassados. Mas aquele que possuía o conhecimento dessas
coisas não fabricava [para si mesmo], pois ele teria sido punido; assim
como os artesãos que sabem cunhar a moeda real não têm o direito de
cunhá-la para eles mesmos, sob pena de castigo. Assim como também,
sob os reis egípcios, os artesãos da arte do cozimento e os que possuíam
o conhecimento dos procedimentos não operavam para si mesmos, mas
para os reis do Egito, e trabalhavam em prol de seus tesouros. Eles ti
nham chefes particulares colocados acima deles, e grande era a tirania
exercida na arte do cozimento, não apenas em si mesma, mas também
em relação às minas de ouro. Pois em relação à escavação, era uma re
gra entre os egípcios a necessidade de uma autorização escrita.
Zózimo, O Primeiro Livro do Cálculo Final
in Marcellin Berthelot,
Coleção dos antigos alquimistas gregos (1888),
t. III, p. 231.
*
* *
A Argamassa Mística Egípicia 85
dadeira raiz dessa palavra CHEMIE que me foi ensinada por um dos
ilustres dessa época [...]. Ele me respondeu que CHEMIA ou ALCHE-
MIA significava A CIÊNCIA do Egito, e que tínhamos ignorado até
agora que a maneira de falar CHEMIE vinha de chemi, antiga maneira
de falar dos coptas; tirada de Cham [Cam], filho de Noé, que o Egito
tinha recebido como um dom natural, e que nessa língua copta, que é a
antiga do Egito, também chamada faraónica, Chemi significava o Egito;
de onde se derivou a palavra CHEMIA ou ALCHEMIA para explicar a
Ciência dos egípcios, de onde os Filósofos garantem que se originou o
primeiro conhecimento [...].
Ora, voltando à nossa ciência Alquimia, vários filósofos se an
gustiaram para encontrar quem foi seu primeiro inventor e operador.
Alguns disseram que foi um Filósofo chamado Alchimus. de quem veio
o nome de Alquimia. Outros dizem, com uma evidente razão, que foi
Adão, o primeiro homem criado por Deus no sexto e último dia de sua
operação, e à sua imagem e semelhança: ao qual Deus o criador deu a
partir de então verdadeiro e perfeito conhecimento de todas as coisas
do mundo que ele criara nos cinco dias precedentes: com pleno po
der e senhoria sobre elas, para usá-las na conservação de seu ser c de
sua posteridade. Eles dizem também que, depois do dilúvio universal,
Noé encontrou essa ciência entre as outras artes liberais, que os Antigos
mais sábios do primeiro século teriam gravado em dois pilares, um de
madeira, o outro de pedra; eles foram colocados no Vale de Hebron,
para servir aos do século futuro, que é esse em que vivemos ainda pela
graça de Deus.
Quanto à minha opinião, considerando bem mais superior a ori
gem dessa nobre Ciência: creio que esse mesmo grande Deus criador
do Universo foi o primeiro e o mais excelente Alquimista que existiu
e jamais existirá. Pois assim que lemos os livros da Sagrada Escritura,
não tendo criado desde o início senão uma matéria confusa, a que cha
mamos caos, dela ele extraiu os quatro Elementos, e estes foram sepa
rados um do outro e colocados cada um em seu próprio vaso por meio
de sua divina Alquimia.
Breve discurso das admiráveis virtudes do Ouro potável
Composto pelo Senhor da Tourrete
(1575), p. 4-5 e 38-39.
*
* *
86 Filosofar pelo Fogo
•)3§ RTi-ND
s caldeus, os persas e os egípcios obtiveram
à? ,,< dos segredos da natureza um conhecimento idênti
j£ co e uma mesma religião. Os caldeus e os persas,
contentando-se em modificar os nomes, nomeiam
sua doutrina “Sophia” (sabedoria) e “Magia”.
*4!ué i>
11 Quanto aos egípcios, eles dão à sua sabedoria o
nome de sacerdócio r
------------------------- - causa de seu destino sa-
por
? 515 criticai. A Magia dos persas e a Teologia dos egíp-
cios eram outrora simultaneamente ensinadas nas
escolas, e foram muitas na Arábia, na África e na
Grécia as escolas e os homens sábios como Albu-
mazar, Abenzagel, Geber, Rasis e Avicena, entre os
árabes; Machaon, Podalire, Pitágoras, Anaxágo-
Hermes Trísmegisto sob os ras, Demócrito, Platão, Aristóteles e Rodianus,
traços do rabino Abraão entre os gregos; no entanto, dissensões exis
Eleazar. Uraltes chymisches tiram entre eles, cujas concepções variaram
Werk, Erfurt. 1735. para tudo o que diz respeito à sabedoria dos
egípcios. Esta é a razão pela qual Pitágoras re
cusou ser chamado Sábio: porque ele não tinha recebido um ensino
suficientemente completo do sacerdócio e da sabedoria da forma como
eram praticados pelos egípcios. E ainda que ele tenha extraído dessa sa
bedoria inúmeros e profundos mistérios, Anaxágoras, no entanto, divergiu
dos egípcios em muitos pontos, como aparece manifestadamente nas inú
meras controvérsias que ele manteve sobre o Sol e sua Pedra, e que deixou
após sua morte. Péla mesma razão os discípulos de Hermes não quiseram
ser chamados nem de Sábios nem de Magos, mas, e nisso imitando Pi
tágoras, adotaram o título de Filósofo, e isso ainda que tenham retido da
Magia dos persas e dos egípcios apenas algumas centelhas comparáveis
no máximo às sombras. É que na verdade Moisés, Abraão, Salomão, Elias
e os Magos vindos do Oriente para venerar o Cristo foram os verdadeiros
Magos e Sábios divinos, e os autênticos cabalistas.* Ora, dessa arte e des
sa sabedoria os gregos só tiveram uma experiência mínima, e até mesmo
inexistente. É por isso que nós nos desinteressamos da sabedoria filosófi
ca grega, como de uma pura especulação distante e separada demais, sob
qualquer ângulo que a consideremos, das outras artes verídicas.
Gérard Dorn, A Aurora ou o Tesouro dos Filóso/os
(Aurora seu Tbesaurus Philosophorum, IS??'),
p. 12-13.
*
* *
A Argamassa Mística Egípicia
T* . ,
_L/ u nao me deterei para explicarem primei
ro lugar o nome de Chimie nem para procurar
sua etimologia, mas como nós conhecemos
e só falamos das coisas pelos seus nomes,
e que por isso é preciso ter o conhecimento
dos nomes antes de conhecer as coisas, direi
apenas, de passagem, que mais parece que
essa palavra Chimie vem da de Chemia, que •
é o nome que os antigos sacerdotes davam Hermes representado como Mago
ao Egito na língua sagrada e misteriosa de sua oriental com a tríplice coroa:
religião, na narrativa de Plutarco, que da pa Salamonis Clavículas. 1657.
lavra %í)ev que quer dizer fundir, nem na de
%úatq, que significa suco ou licor, porque a Arte de Alquimia [Chimie]
ensinou a fundir os metais e a extrair e destilar os licores dos corpos
mistos, e é por isso que algumas vezes a chamamos Arte destilatóriay
e os alquimistas destiladores. Ainda que essa palavra Chénúey ou, para
falar como o vulgar, Chimie ou Alchimie, acrescentando a ela o artigo
árabe Al, signifique propriamente a Arte ou a Ciência do Egito, onde
muito provavelmente ela começou, uma vez que Hermes, reconhecido
pelos Filósofos como sendo seu autor, e que por essa razão eles o cha
mam de Pai, era seu Rei, no relato de Cícero, Grande Sacerdote e além
do mais Profeta ou Filósofo. Por essa razão ele foi chamado xvjiòç,
Trismegisto,* isto é, três vezes grande, ou porque tinha as três maiores e
mais excelentes qualidades que os homens possam possuir, pois, como
está dito em sua Tábua Esmeralda > ele tinha o conhecimento de todas
as coisas da Natureza, isto é, dos minerais, dos vegetais e dos animais.
E é por isso que os Filósofos muitas vezes chamam a Alquimia a Arte
ou a Ciência hermética, e a maneira com a qual eles selam seu vaso, o
selo* de Hermes.
William Salmon, Biblioteca dos Filósofos ALjuttnicos
(1741). Prefácio, p. VIII-IX.
*
* ★
-/V^Loisés foi formado em todas as ciências dos egípcios, dentre as
quais a mais secreta, e ao mesmo tempo uma das mais essenciais, era a
da transmutação dos metais: portanto, não devemos nos surpreender ao
vê-lo fundir, calcinar e transformar em pó essa massa enorme do Bezer
ro de Ouro, do qual em sua ausência o povo de Israel se tinha feito uma
88 Filosofar pelo Fogo
*
* *
primeiro inventor dessa Arte [...] foi Hermes, o Triplo, pois ele co
nheceu toda a tripla Filosofia natural, ou seja, mineral, vegetal e animal.
E como ele foi o inventor da Arte, nós o chamamos Pai, assim como em
todos os livros da Turbe sobre Hermes, antes de Pitágoras, está dito que
qualquer um que tiver essa Ciência será chamado de seu Filho. Sobre
esse Hermes está escrito na Bíblia que após o Dilúvio ele entrou no Vale
de Hebron, e ali encontrou sete Tábuas de pedra de mármore, e em cada
uma delas estava gravada uma das sete Artes liberais em Princípios, e
essas Tábuas foram gravadas antes do Dilúvio pelos Sábios que então
90 Filosoi-ar pelo Fogo
existiam. Pois eles sabiam que o Dilúvio viria sobre toda a Terra, e que
tudo pereceria; e para que as Artes nào perecessem, eles as esculpiram
nessas pedras de mármore. Apenas Hermes encontrou essas Tábuas, as
quais sào o fundamento de todas as Artes e Ciências.
E esse mesmo Hermes esteve diante da lei antiga. Mas
houve muita gente naqueles tempos que conheceram
7, essa Ciência; e Aros diz no livro que escreveu ao rei
de Meffohe que no tempo da doação da Lei antiga
no Deserto, perto da montanha de Sinai, essa Ciência
foi dada e revelada a cada um dos filhos de Israel,
para decorar e realizar a obra do Templo, e a Arca do
antigo Testamento, como está escrito em Ezequiel, o
| BfRNHARDyS CoJ Profeta, e em Daniel, e no Livro de Josefo.
| ?nz5 TrtíafániLS . I E assim a obra foi dada de Deus a alguns, como
Bernard. conde dc Trévise: eú disse. Os outros a encontraram de forma natural,
Uma solução permanente sem revelações nem quaisquer livros nem experiên
com semente macho e cia, como Fitomé, Rebeca, Salomão, Ambadagesir e
fêmea engendra uma Felipe, o Macedônio. Mas Hermes, após o Dilúvio,
nova espécie. foi o primeiro inventor e provador dessa Ciência de
Filosofia e encontrou essas Tábuas no Vale de He-
bron, ali onde Adão foi colocado, depois de ter sido expulso do Paraíso
terrestre. E, após Hermes, ela chegou por meio dele a muitos outros.
Bernard le Trévisan (séc. XV),
O Livro da Filosofia Natural dos Metais (1567),
in Wtlliam Salmon, Biblioteca dos Filósofos Alquíniicos
c. II, p. 330-332.
*
* *
igo que nossa Ciência é tão divina e tão sobrenatural [...] que é,
sempre foi e será no futuro, impossível a todos os homens conhecê-la,
e descobri-la por si mesmos, ainda que eles fossem os
maiores e experientes Filósofos que jamais existiram
neste mundo. Pois a esse respeito todas as razões e ex -íò ■
periências naturais nos enfraquecem. De forma que foi
escrito justamente pelos autores antigos, Que é o segre
do, o qual nosso bom Deus reservou e deu aos que o
__
1
temem e o honram, como diz nosso grande Profeta Her
mes: Eu não obtenho essa Ciência, diz ele, a não ser da DiONYÓIV^Z^ÇH í
inspiração de Deus [...]. ruis PkiLfòphuj .
Mas quanto ao fato de ela ser natural, isto é, na Dcnys Zachaire, Filó
medida em que em suas primeiras operações ela se sofo: Essa Arte, retida
gue a Natureza, existem diversas opiniões para saber pela potência de Deus,
quem foi seu primeiro inventor. Uns dizem que foi éfunesta ao comum.
92 Filosofar pelo Fogo
*
* *
lEf stou aqui. Senhor, pois assim o quisestes, colocado na categoria
química, e como marca da minha obediência eu vos envio a tradução
que tanto desejastes. Na verdade, não espero dela um grande fruto, co
nhecendo o gosto do século como eu faço, e estou bem certo que gos
tariam muito mais de tratados de filosofia segundo Descartes do que
segundo Hermes. O primeiro está na moda e tem todas as benesses da
novidade, ao passo que o último é tão velho e tão usado que seu nome é
pouco conhecido no mundo; um só propõe coisas fáceis de demonstrar,
mantendo-se apenas na superfície dos corpos; o outro, mais abstrato,
só se apega à essência interior das coisas; enfim, um se fecha na mecâ
nica, não dá às coisas senão uma virtude de máquina, e pretende que o
movimento, por si só indiferente, somente produza coisas diversas em
razão das diversas configurações dos corpos que ele move, ao passo que
o outro, todo intelectual, admite uma alma universal do mundo, agente,
inteligente e informante. Falai, eu vos rogo, a um cartesiano sobre o
centro, o fogo de natureza, a virtude seminal, sobre um espírito diretor
e arquitetônico em cada misto,* sobre as qualidades elementares etc., e
ele não deixará de tratar vosso discurso de galimatias e vós, de visioná
rio, e por menos que vós o pressionais, por meio de vossa autoridade,
ele logo vos colocará no manicômio. Mas, me direis, não é para eles que
escrevemos, é para aqueles que estão em nossos mesmos princípios,
eu o desejo, mas se vós retirais os químicos vulgares que, consultando
apenas sua avidez, amam muito mais um monte de falsas receitas do
que os melhores livros do mundo, vós vereis que restarão muito poucos
daqueles que sonham mais com se tornar filósofos do que com se tornar
possuidores da Pedra filosofal; mas vós me direis ainda que não é pre
ciso se deter em tudo isso, que é preciso escrever pela honra da ciência
A Argamassa Mística Egípicia 95
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funções desse deus se espalhavam pelo céu, sobre a terra e nos in
fernos. No céu onde ele sempre estava atento para receber as ordens dos
deuses e executá-las [...]. Da terra aos infernos, ele deve assistir os ago
nizantes, para diluir as almas de seus corpos e conduzi-los aos infernos
após sua separação pela morte, fazer reviver as almas que cumpriram seu
tempo nos Campos Elíseos, fazendo-as entrar em novos corpos, após lhes
ter feito beber a água do rio Lete, que tem a propriedade de fazer esquecer
o passado. Enfim, só ele tem o direito de abrir as portas do Céu* químico,
as portas duplas do templo de Jano, e de assistir a todas as produções novas
da natureza.
Ele é o primeiro a ter feito alianças, inventado as belas-letras, os nú
meros, os pesos e as medidas [...].
Ele é essa quintessência extraída da terra com a ajuda do fogo, de
Júpiter, como primeiro princípio e distribuidor do fogo divino, que espalha
no seio de Maia, na terra que ele toma muito luminosa e brilhante, que é o
que significa o nome de Maia, de acordo com o hebreu, illuminata.
Hermes Trismegisto* diz que ele é um dos três deuses, que tem a sa
bedoria em todo o seu esplendor, Caelus, Saturno e Mercúrio.
Os gregos o representavam como tendo o rosto de um jovem rapaz
sorridente, e os egípcios como tendo o lado direito branco e brilhante, e o
lado esquerdo de cor negra e plúmbea, a cabeça coberta com um pequeno
chapéu à moda arcadiana, sobre o qual há duas pequenas asas lado a lado
das têmporas, asas em seus pés, e em sua mão um bastão, em tomo do qual
foram presas duas serpentes que ele encontrou em seu caminho, quando
elas se erguiam uma contra a outra, e tendo-o colocado entre as duas, elas
se reconciliaram de tal forma que desde então não mais se separaram. Seu
caduceu* é o símbolo da paz e da concórdia. Seu nascimento sobre o monte
Cilene, na Arcádia, revela que essa criança, que descende de Júpiter e de
Maia, foi de certa forma arrancada do centro da terra [...].
A representação do rosto desse deus, que é branco do lado direito e
negro do lado esquerdo, anuncia dois dos primeiros movimentos da na
tureza, feitos do frio e do seco, convertidos em úmido. Seu chapéu alado
marca sua nobreza; e as asas em seus calcanhares, a rapidez em executar as
ordens dos deuses. Seu caduceu, a potência do destino. O bastão de ouro
que ele segura em sua mão direita com duas serpentes entrelaçadas marca a
harmonia dos elementos celestes e terrestres, da terra e da água, reduzidas
à simplicidade pelos celestes, o ar e o fogo, após terem sido despojadas de
tudo o que existia de defeituoso na terra e na água: ou seja, da obscuridade,
da espessura e do repouso da terra, e da obscuridade e da espessura da água.
98 Filosofar pelo Fogo
*
* *
Qs Filósofos herméticos diferem absolutamente dos filósofos ou físi
cos ordinários. Estes últimos não têm nenhum sistema garantido. Eles o
inventam todos os dias, e o último parece não ser imaginado a não ser para
contradizer e destruir aqueles que o precederam. Enfim, se um se eleva e se
estabelece, é apenas sobre as minas de seu predecessor, e ele só subsiste até
que um novo venha derrubá-lo e tomar seu lugar.
Os Filósofos herméticos, ao contrário, estão todos de acordo entre
si: nenhum contradiz os princípios do outro. Aquele que escrevia há 30
anos fala como aquele que vivia há 2 mil anos. O que existe até mesmo
de singular é que eles não se cansam de repetir este axioma adotado pela
Igreja como a marca mais infalível da verdade a que ela nos propõe a crer:
Quodubique, quod ab omnibus, et quod semper creditum est, idfirmissime
credentum puta.no Vejam, dizem eles, leiam, meditem sobre as coisas que
foram ensinadas em todos os tempos, e por todos os Filósofos; a verdade
está encerrada nos lugares em que todos estão de acordo.
Que engano, de fato, que pessoas que viveram em séculos tão dis
tantes, e em países tão diferentes pela língua, e ouso dizer, pela maneira
de pensar, tenham, no entanto, concordado em um mesmo ponto. Que
egípcios, árabes, chineses, gregos, judeus, italianos, alemães, america
nos, franceses, ingleses, etc., todos tenham, portanto, decidido sem se
conhecer, sem se ouvir e sem ter comunicado particularmente suas ideias
entre si, falar e escrever conforme uma quimera, um ser de razão? [...]
Essa conformidade de ideias e de princípios ao menos não forma uma
presunção, que aquilo que eles ensinam tem algo de real e de verdade?
120. É preciso considerar que aquilo que foi acreditado em toda parte, por todos e em todos
os tempos, deve ainda ser objeto de fé (Vincent de Lérins).
A Argamassa Mística Egípicia 99
ste k\\ ,
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----------------------- ----------------------------------------------------.:=—ÍZ2Ú-! J
Hermes Trismegisto. mediador entre macrocostno e microcosmo: Michael Maier,
Symbola aurece mensa:. Frankfurt, 1517.
3
A Arte de Hermes
E isto, a alquimia: conduzir a seu termo o que ainda não
conseguiu; realizar a natureza do chumbo a partir de seu
mineral grosseiro, trabalhá-lo, tornã-Io próprio a alguma
utilidade [...].
Aprende então a reconhecer o que é a alquimia:
essa arte que. por intermédio do Fogo.
transforma o que é impuro até torná-lo puro.
121. Prefácio ao Mystère des Cathédrales, de Fulcanelli, Paris, J. J. Pauvert, 1964. p. 30.
- 101 -
102 Filosofar pelo Fogo
Icemos nas Histórias dos divinos Antigos que existiram três Filósofos
♦ N.T.: O aço dos Sábios nào é o metal com o qual são feitas as ferramentas, ele é um es
pirito puro, um fogo infernal e secreto, muito volátil e receptáculo das virtudes superiores
e inferiores.
A Arte de Hermes 105
*
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* *
123. cf. textos citados p. 394 ss. Quanto à significação desse termo.
110 Filosofar pelo Fogo
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\
tu chegaste, e examina em seguida o que tu buscas
' ) te. E Alexandre diz: existem nessa arte duas ordens,
/ Z I a saber, o aspecto visível ao olhar, e o outro por meio
do intelecto. E essa pedra está dissimulada, e é com
razão chamada Dom de Deus, sobre o qual Arisleus
diz em sua visão,124o dom de nosso magistério é se
PETRVS BONVJ*
TerTarú-njis . creto e não aparente. Eis a pedra divina oculta, e sem a
mistura dessa pedra poderosa a Alquimia não é nada,
Petrus Bonus de Ferrare: pois dessa pedra divina é constituída a Alquimia ou o
Da alma vem o inicio e trabalho se perde no mesmo instante; e essa pedra di
o primeiro movimento vina procurada pelos Filósofos é o coração e a tintura
e até mesmo tudo o (pie do ouro sobre a qual Hermes diz: é preciso que no fim
acontece, do corpo
do Mundo o Céu e a Terra se encontrem e se unam;
vem a execução.
semelhante palavra é filosófica. E sobre isso Rasis diz
em A Luz das Luzes'. A natureza da pedra secreta e sua dissolução devem
ser integraImente conhecidas, e quando ela o tiver sido até poder ser re
produzida, eu advirto que deveremos cessar de operar. E Pitágoras em A
Assembleia (Turba) dos Filósofos: Foi isso o que o deus Apoio dissimulou
para que o mundo não fosse destruído. Segundo esse modo, a Alquimia
supera a natureza e é divina. E é nessa pedra que reside toda a dificuldade
da Arte à qual não pode ser atribuída uma razão suficientemente natural;
pois, se isso fosse possível, também não poderíamos compreendê-la com o
intelecto, nem com isso nos satisfazer. Portanto, é preciso acreditar, assim
como cremos em milagres divinos, tão verdadeiro quanto o fundamento da
fé cristã, que se sustenta para além da natureza, e não é de forma alguma
julgado verídico pelos não crentes, porque seu fim é milagroso e se realiza
para além da natureza. Por isso, apenas Deus é operador, e o artífice natural
permanece em repouso.
Perrus Bonus, A Preciosa Pérola Nova
(Pretiosa Margarita tiovella, 1330),
in Jean-Jacques Manget, Bibliotheca Chetnica Curiosa,
t. II, p. 29.
*
* *
*
* *
p
JL/ xiste certa arte nobre, chamada Alquimia,
Que não busca nem o inconstante nem o sonhador.
E clérigo muito industrioso que ela requer,
Raramente leigo na verdade, senão com uma suprema habilidade.
Deixai ali as matérias corruptíveis: sais e tintas
E tantas outras que os pilões corrompem.
No Mercúrio está oculta uma tintura fortificante
Permanecendo no fogo, e brilhando como o Sol ou a Lua:
Não divulgada, no entanto, mas crescendo como a erva.
Por isso é preciso refletir sobre estas palavras dos Sábios:
A alma é extraída por meio do espírito,
E será purificada pela ação do fogo.
Estão lá árvores e folhas lunares.
Dotadas de nomes variados, marcando aflições efémeras.
E quando ela é sublimada, clara e pura,
Dela é destilada, permanente como a onda,
E por isso mesmo que uma parcela de nosso ar é tingida,
E de vil preço aquilo em que o Todo está oculto.
Muitos são ignorantes sobre o que dos Filósofos é conhecido.
Trina e una é a Pedra, espírito, corpo e alma.
Também é um bem feito divino conhecer bem seus nomes.
Verídica é a comparação com a Trindade,
Sem nenhuma violação ao respeito da unidade.
Autor desconhecido,
in Theatrum Chemicum,
t. III, pp. 736-737.
*
* *
*
* *
c aiba antes, caro amigo, que nossa arte consiste em imitar a natureza,
e, assim como a natureza produz por si mesma árvores e plantas, que
em seguida o jardineiro multiplica ao semear suas sementes ou ao tirar
delas enxertos, da mesma forma a natureza engendra na terra e nas
profundezas das profundas montanhas metais como o ouro e a prata,
que o artista multiplica ao semeá-las em uma terra apropriada, ou ao
enxertá-las em um ramo adequado.
Você deve então saber antes de mais
nada quais são as sementes do ouro e
da prata, quais são os ramos e qual é
a terra. Nós dizemos, portanto, que o
Sol e a Lua têm em si suas sementes,
e que Saturno, Júpiter, Marte, Vé
nus são os ramos. A terra de todos
eles é na verdade o Mercúrio, e isso
é considerado como fundamento es
tável, para o qual você deve dirigir A arte do enxerto: Goossen Vdn
toda a sua atenção, harmonizando a Vreeswijk. De Goude Son,
similitude de um com a natureza e Amsterdã, 1675.
114 Filosofar pelo Fogo
*
* *
q emeai vosso ouro na terra branca folhada.
À terra miserável os camponeses confiam seus grãos
Quando, com seus ancinhos, eles araram o terreno.
Assim os Filósofos ensinaram como espalhar o ouro
Nesses campos nevados e, como ele, finamente arados.
Se tu queres fazer isso, observe então: como o ouro
Chega a germinar, em resposta o fermento o dirá.
A Alquimia revela em primeiro lugar as operações da agricultura
por causa de seus fins e de seus modos de operar secretos. Os agricul
tores possuem uma terra, que semeiam com seus grãos, assim como
os Alquimistas têm um esterco, graças ao qual fertilizam seus cam
pos. Sem esse campo que eles possuem nada também seria feito, e al
guns não esperariam nem frutos. Eles têm sementes, das quais desejam
multiplicação. Se os Alquimistas não as possuíssem, eles imitariam um
116 Filosofar pelo Fogo
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&A\U^úè^aSn^rís^<
"Semeai vosso ouro na terra branca arada": Michael Maier, Atalanta íugicns,
Oppenheim, 1618, emblema VI.
Ou então, a Alquimia é uma ciência pela qual aprendemos a conhecer a
primeira matéria de todos os corpos do mundo, sejam animais, vegetais
ou minerais, e como a Natureza procedeu ao procriá-los e aperfeiçoá-
los até sua última matéria, e também como é preciso que procedamos
para desfazê-los, retrocedendo a ordem dessa Natureza, se desejarmos
ver ocularmente sua primeira matéria. E ao fazer isso achamos verda
deiramente que se trata de três coisas, nem mais nem menos, ou seja,
Enxofre, Sal e Mercúrio, visíveis e palpáveis, cada um em sua essência
incorporada, depois que são separados do composto pela via e meio
dessa ciência.
Em quarto lugar, podemos definir a Alquimia como uma parte da
verdadeira Medicina que ensina a conhecer, eleger e perfeitamente pre
parar e separar o puro do impuro, pela Arte espagírica, dos medicamen
tos tanto internos quanto externos, tanto simples quanto compostos,
para com mais certeza usá-los no corpo humano [...].
i 18 Filosofar pelo Fogo
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O Espírito do Mundo:
Alquimia, Cosmologia
e Astrologia
todos eles. E novamente está bastante oculto, pois assim como o Céu se
mostra de maneira bastante ampla com seu Corpo na superfície do mun
do, da mesma forma ele se oculta bem profundamente no centro da terra
com seu Espírito. Ele também é a criatura mais preciosa, pois fora dele,
nele e por ele são, vegetam e crescem todas as coisas, tudo está repleto
de sua virtude e nada está vazio de sua essência; no entanto, início c fim de
qualquer criatura, ele conserva e destrói, é bom e malicioso, triplo c uno,
é composto de Sal, Enxofre e água mineral pura, coagulado c dissolvido,
compacto e separado, regado e seco, mas para excitar todo esse poder em
ação que ainda só tem em poder é preciso torná-lo espiritual.
Hcnri dc Linthau,
A /h<rora (scc. XVI), ms. n. P-
*
* *
*
* *
está unida e misturada com o Céu, é por isso que eu lhe dou esse belo
nome, o Céu* terrestre.
Vinceslas Lavintus de Moravia,
Tratado do Cru terrestre (1612). ín William Salmon.
Biblioteca dos Filósofos ALjuituicos. t. IV. p. 566-567.
das formas que não podem ser feitas sem o vital movimento; se é que
ainda vemos essa mesma Natureza, assim'como uma Mãe muito fecun
da e cuidadosa, envolver e alimentar esse mundo, distribuindo a cada
um de seus membros uma porção de vida suficiente. De forma que não
há nada em todo o Universo a que ela não se dedique a tornar animada;
é por isso que ela não pode ser inativa, mas permanece sempre tensa e
atenta à sua ação, que é a de vivificar. Ora, esse grande corpo é agitado
e provido de um movimento sem repouso, e esse movimento não pode
acontecer sem o espírito vital, pois o que é sem vida é necessariamente
imóvel, não de um lugar a outro, por movimento violento e forçado,
mas de privação da forma, ou, para dizer mais claramente, da imperfei
ção à perfeição. Da vegetação com plantas, e da concreção com pedras,
avançam com movimento, que se faz pela infusão dessa alma que agita
essa grande massa por meio de certo Espírito radical e alimentador; a
fonte e Mina que está estabelecida no centro da Terra, bisavó de todas as
coisas, para que daí provenham e se estendam por todo o corpo (como
do coração) todas as funções vitais.
Ora, essa raiz e mina estão encerradas no antigo seio do velho
Demogorgon,* progenitor universal, que os poetas, inquisidores muito
diligentes dos segredos naturais, engenhosamente descreveram como
revestido com uma capa verde, envolvida por uma ferrugem, coberta
por obscuras trevas, e alimentando toda espécie de animais, no ven
tre do qual as virtudes dos globos celestes incessantemente decorrem,
penetrando os flancos da terra que elas engravidam com todas as espé
cies multiformes. Ali aonde de forma semelhante as qualidades e forças
elementares vêm servir esse velho Pai, como produtor e especificador
de todas as coisas, perpetuamente ocupado na repartição das formas
específicas por meio de seu lliastre,127 e com a excitação do calor vital
por seu Arqueu.128 lliastre e Arqueu são como as duas ferramentas da
formação, da conservação e do aumento das coisas [...].
O corpo do mundo é familiarmente conhecido pelos sentidos, mas
nele se encontra um espírito oculto, e nesse espírito uma alma, que não
pode ser acoplada ao corpo senão pelo meio deste, pois o corpo é gros
seiro, e a alma bastante sutil, muito distante das qualidades corpóreas. Por
isso, para esse acoplamento, é preciso um terço que participe da Natureza
dos dois, e que seja espírito-corpo, porque as extremidades não podem ser
reunidas senão pela ligação de algum mediador que tem tal afinidade com
ambas, que cada uma delas possa ali reencontrar sua própria natureza.
Assim como o grande mundo, ele tem seu polo e seu ímã, isto
é, essa virtude atrativa daquilo que é próprio a cada uma das partes em
geral, e em particular.
Conhecer a virtude atrativa do ar para o pulmão; do sangue ou do
suco para o fígado; das ferocidades para os rins; dos espíritos vitais para
o coração; dos espíritos animais para o cérebro; dos alimentos para o
estômago; e assim para o restante das partes.
E como a terra no grande mundo é o ímã, a atração de todas as
influências celestes, e o Céu é o polo, no qual tudo o que ela engendra
tende ao lugar de sua origem; da mesma forma o Sal, que é essa terra
virginal, no centro de todas as coisas, é o Imã de tudo o que pode man
ter a vida do microcosmo.
E faz, por sua frieza e sua secura, o que o polo boreal e seten
trional faz pelos mesmos, porque o próprio da frieza é constranger, e o
da secura é atrair e absorver seu úmido. Ora, como o sal está cm toda
parte, podemos dizer que esse ímã também está, e o todo em toda coisa,
sem o que a vida não pode ser conservada, acerca do que falaremos no
tempo conveniente.
Mas porque a virtude atrativa é mais forte e mais fraca em uma
das partes do ímã do que em outra, como ele não pode ser igualmente
atraído por todas as partes; é preciso admitir duas espécies de virtudes,
uma pela dilatação com o calor, e outra pela contração, que se faz pela
frieza: tanqua media habilia)29 E por isso que o ímã do corpo animal
vivente deve ser mais forte do que o ímã do sangue do animal morto:
pois assim como um deve servir de polo ao outro, o outro deve servir
de forma semelhante de ímã [...].
Ainda mais que a virtude dos Imãs é agir mais por sua forma do
que pelas qualidades sensíveis de frieza, de calor, de úmido e de secura,
ita ut non fit lux neque Stella quae non profunde penetrei ornneni mundi
partem usque ad centram.™ Da mesma forma, a natureza do espírito
magnético do sangue é penetrar por sua sutileza, e por sua agilidade,
sendo espiritual, vital e radiante, até a ínfima de todas as partes do cor
po humano, para se unir, mesclar-se e se encontrar com o espírito e com
a Múmia131 de nossos corpos, como seu semelhante.
*
* *
Por que certa substância permanente, celeste, divina, muito estranha
RM
(por Avicena e os Platónicos),
orvalho da noite, água rarefeita
do dia, espírito invisível coagu-
, lado, semente de todas as coisas,
espírito vivente de todas as cria
turas, vida celeste, espírito uni
versal incluído nas coisas cozidas
e engravidadas pelo ar, semente
universal da Natureza, espírito
salino-sulfúroso-mercurial, subs
í
a tância una afetada de uma tripla
virtude, princípio mais próximo
de todas as coisas. Athanase
Kircher, livro 12, capitulo 5 do
) Mundo Subterrâneo; Luz, bál-
■ samo da vida, múmia* vital, ca
■ • J
— lor natural, Úmido nascido com
ai
força e vigor da natureza uni
Do concurso dos sete planetas depende a versal, princípio do movimento,
realização da Grande Obra: Figurarum enteléquia, esperma do mundo,
/Egyptiorum Secretarum, séc. XVIII. Água do grande Oceano, Água
O Espírito do Mundo: Alquimia, Cosmologia e Astrologia 139
*
* *
CZ-ada um sabe verdadeiramente, e não deixará de dizer que é o Espí
rito auxiliado pela água, que faz crescer; sim, certamcnte é o Espírito,
mas, sendo apenas um espírito volátil, ele não fará grande efeito nas
coisas sublunares. É preciso necessariamente, para que ele possa lhes
ser útil, que tenha e que tome em si mesmo um corpo sensível, palpável
e visível, pois o que deve fazer frutificar as coisas corpóreas e terrestres
deve da mesma forma ser ou se tomar corpóreo e terrestre com elas.
É por isso que, como a semente vegetal, animal e mineral é pal
pável e visível, também é preciso que esse Espírito seja semelhante ou
se torne.
Muitas pessoas frequentemente tocam com suas mãos esse espíri
to corporificado, e podemos recolhê-lo em quantidade, mas, apesar de
tudo isso, são poucas as que conhecem essa semente corpórea quanto à
sua origem; a razão é que ela usa outro nome além daquele que deveria
ter; pois, segundo sua verdadeira origem e raiz, deveríamos chamá-la
a Semente do macrocosmo, o Espírito universal, o Caos regenerado,
visível, corpóreo e palpável. Esse é o título que lhe convém, uma vez
que ela é a semente concentrada, coagulada, condensada, corpórea e o
Espírito do mundo em um corpo diáfano e visível como um cristal; uma
água que é uma água seca, que não molha de forma alguma as mãos;
140 Filosofar pelo Fogo
uma terra que é uma terra aquosa e cheia de fogo, que também contém o
frio como o gelo; um céu coagulado, um ar coagulado, uma coisa mais
excelente e mais preciosa do que os tesouros do mundo.
A Natureza revelada ou Teoria da Natureza (1772),
Tradução da Aurra Catnia Honwri, dc Ancon Joscph
Kirchwcgcr (1723), c.1, p. 84-86.
*
* *
j/\ntes é preciso saber que essa ciência divina faz uso de termos
*
* *
F,s a tábua dos planetas de onde você poderá, se
*
**
O Espírito do Mundo: Alquimia, Cosmologia e Astrologia 143
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pelo poeta Rainer Maria Rilke: “O metal langue. E quer deixar as moe
das, as engrenagens que lhe ensinam uma pequena vida. E das fábricas
e das caixas ele entrará nas nervuras das montanhas entreabertas que
se encerram sobre ele 133
133. Rainer Maria Rilke, Le Livre du pèlerinage, Das Buch von der Pligerschaft (1901),
in SãmtiicheWerke. Insel Verlag. 1955, t. 1, p. 329: « Das Erz hat Heimweh. Und verlassen
/ will es die Munzen und die Ràder, / die es ein kleines leben lehren. / Und aus Fabriken
und aus Kassen / wird es ztíruck in das Geàder / der aufgetanen Berge kehren, / die sich
verschiessen hinter him.
Grande Obra, Génese e Embriologia 149
Retomando por sua conta a teoria das exalações exposta por Aristóteles nes
sa obra, os alquimistas reterão a lição em relação à geração dos metais nas
entranhas da terra, mas não a conclusão relativa ao ouro, ou melhor, "seu ”
Ouro que escapa à geração como à corrupção. Por isso essa teoria em alqui
mia é indissociável da dos Elementos e Princípios (cf. capitulo 11).
á
substâncias fortes, sendo algumas dúcteis e ou
tras não. Mas quaisquer que sejam as causas de
<9/5
sua geração, a mesma coisa aparece tão clara
mente que, portanto, não é a ocasião de expor 2;
novamente.
RlCHARDVS AN(í
Os corpos minerais são igualmente classi Hais Pkiloíãvhus.
ficados em duas categorias principais, a saber:
uma metálica, que reagrupa os metais que tiram Richard, filósofo inglês:
sua origem do Mercúrio, tais como o ouro, a pra O estudo da Ciência
suprime a ignorância e
ta, o cobre, o estanho, o chumbo e o ferro, e são
conduz a inteligência ao
nomeados minerais maiores. E uma categoria verdadeiro conhecimento.
150 Filosofar Pelo Fogo
mineral, onde organizar aqueles que não têm sua origem do Mercúrio,
tais como os sais, as tintas, os alumínios, o vitriol,* o arsénico,* orpimen-
ta (ouro-pigmento),* enxofre e outros semelhantes, e que são chamados
minerais menores. Contudo, existem corpos não metálicos que, sendo ma
nifestamente dos minerais maiores (isto é, corpos metálicos), têm sua ori
gem no enxofre e na prata-viva em sequência mais ou menos depurados.
Richard 1’AngIais, A Correção dos insensatos
(CorredioJatuorum, scc. XII), in Thealrutn Chetnicwn,
t. II, p. 387-388.
*
* *
Para que em todas as coisas o fim corresponda a seu princípio, deve
I
s Vkiiv/òvhus .
ma substancial poderia ser introduzida ali onde proprie
dades ativas não podem ser adquiridas artificialmente
por meio das propriedades passivas. Mas a forma subs
tancial do Sol não é obtida a partir do calor do sol ou de
I «Michaet Scot> um fogo semelhante àquele de que se servem os artis
tas: ela o é, portanto, antes a partir do calor do Sol, etc.
Quanto a essa questão, devemos saber que nada mais é
Michel Scot. filósofo:
O que era oferecido
buscado exceto saber se de determinado mineral - o Sol
às nossas mãos está limpo ou a Lua - pode ser artificialmente procriada certa
perdido por causa virtude seminal que, imediatamente, fortalece o Mercú
dos pecados dos rio até que ele tenha obtido a dureza do Sol [...].
homens ímpios. A esse respeito, é preciso saber antes que seme
lhante virtude seminal pode ser encontrada de maneira
mais adequada a partir do ouro. O que é aprovado pelo bem-aventurado
Agostinho em seu comentário sobre a Génese,134 onde ele diz: estão
de fato presentes nas coisas corpóreas todos os elementos do mundo, e
certas razões seminais ocultas que, quando lhes for oferecida a oportu
nidade temporal e causal, se precipitarão nas causas debitadoras. e nas
espécies segundo seus modos e finalidades próprias; e da mesma forma
que não são chamados anjos aqueles que fazem criaturas animais, tam
bém não são nomeados criadores de corpos vegetais os cultivadores
de quaisquer tipos de cereais na terra, ainda que tenham descoberto o
meio de revelar oportunidades bem comparáveis, e as causas requisita
das para que elas se manifestem. Somente o Deus único c verdadeiro
é criador, que plantou as próprias causas e as razões seminais nas coi
sas. Isso mesmo está até dito em A Cidade de Deus e por metalepse
no capítulo 31, questão 5. Portanto, não é surpreendente que os filóso
fos mostrem esses argumentos de maneira variada e segundo diversos
modos. Uns chamam de virtudes celestes, como está dito no segundo
capítulo do De Generatione’.^ as formas de todas as coisas estão nos
corpos celestes, etc.; outras virtudes igualmente elementares, porque
se precipitam subitamente na ação, como o fogo ou qualquer outro ele
mento. Outros as nomeiam com razão virtudes minerais, porque são
produzidas a partir dos metais apropriados quanto a seu ser. Outros di
zem que essas virtudes são as raízes do sol, pois, assim como o grão
alimenta pelo intermédio da raiz, o mesmo acontece com o ouro por
intermédio dessas virtudes, como será exposto posteriormente. Quanto
a nós, chamamo-las espíritos fermentados, porque eles corrompem os
espíritos purificados para que toda a massa seja fermentada; mas esta c
a obra de todas as coisas muito naturais: tornar a outra semelhante a si
mesma; e, para que as coisas sejam perfeitas, não há nada a ser encon
trado na obra a não ser por que esses espíritos fermentam e tingem. Se,
portanto, foi atingido aquilo de que falam os filósofos no sentido figu
rado, nós afirmamos que essa questão responde à sua intenção essen
cial. Da mesma forma aparece claramente em todos os filósofos o que
nós queremos dizer: que a virtude seminal anteriormente citada é de
natureza universal, não certamente que o Mercúrio esteja presente em
sua própria natureza, nem na totalidade de sua substância, mas em pelo
menos uma parte desta. Para isso irá trabalhar, com efeito, o elemento
sublimador, a fim de livrar o Mercúrio de sua umidade fleumática e de
sua substância feculenta, e para que ele possa ser mortificado; pois, sem
ter sido morto nem fixado, ele não poderia aperfeiçoar a obra: e para
isso trabalhará transpirando o agente acelerador com um fogo de uma
*
* *
136. cf. também texto de Roger Bacon citado p. 321-222, relativo ao forno e ao vaso, com
paráveis à montanha e à mina onde são procriados os metais.
Grande Obra, Genese f. Embriologia
153
*
* *
2Was, para retornar ao nosso objetivo (pois não pretendemos falar
aqui somente da Pedra), tratemos da matéria dos metais. Disse um
pouco antes que todas as coisas são produzidas de um ar líquido, isto
é, de um vapor que os Elementos destilam nas entranhas da Terra por
154 Filosofar Pelo Fogo
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Deus criando o inundo: Simeon Ben Cantara, Cabala mineral is, séc. XVII.
*
* *
CZ) ue o Filho dos Filósofos ouça os Sábios, unânimes em concluir que
essa obra deve ser assimilada à Criação do Universo. No início, portanto,
Deus criou o Céu e a Terra, e a Terra era inútil e vazia, e as trevas reco
briam o abismo, e o espírito de Deus era levado sobre a superfície das
águas, e Deus disse: “Que se faça a Luz!’’ e a Luz se fez. Essas palavras
bastarão aos filhos da Arte. E preciso de fato que o Céu seja parceiro da
Terra no leito da amizade e do amor. Assim ela reinará com honra sobre
toda a vida universal. A Terra é um corpo pesado, a matriz dos minerais
que, conservando-os secretamente dentro de si, tem todo o tempo de levar
para a luz as árvores e os animais. O Céu é o espaço em que dois grandes
astros executam suas revoluções em companhia dos outros astros, e ele
comunica através do ar suas energias às coisas inferiores; mas no início
todas as coisas reunidas formam o Caos. Pronto, eu lhes revelei a verdade
com sinceridade e piedade: nosso Caos é de fato uma Terra, mineral em
relação à sua própria coagulação; mas existe, no entanto, um ar volátil no
centro do qual se encontra o Céu* dos Filósofos; esse centro é verdadei
ramente astral, irradiando de seu brilho para a Terra até sua superfície.
E qual é o Mago suficientemente sábio que, da reunião de todos os Ele
mentos, concluirá que um novo Rei nasceu, superando todas as coisas e
prestes a recuperar seus irmãos da Queda original; destinado a morrer e
a ser exaltado a fim de dar sua carne e seu sangue para a vida do mundo?
Deus pleno de bondade, como tuas obras são admiráveis! Pois tu fizeste
isso, e esse milagre surge aos nossos olhos: eu te dou graças, Pai, Senhor
do Céu e da Terra, de ter ocultado isso dos sábios e dos prudentes para
revelá-lo aos simples e às crianças.
Eyrcncc Philalèthc, A Entrada aberta do PalácioJechado do rei
(Introitus apertus ad occlusum Regis Palatium, 1645),
in Jcan-Jacques Mangct,
Bibliotheca Chemica Curiosa, t. II, p. 663.
*
★ *
Grande Orra, Génese e Embriologia
163
137. Os quais eram totalmente inimigos em um grau de tensào muito alto, mas amigos
quando ela se soltou.
Filosofar Pelo Fogo
*
* *
Podemos dizer mais detalhadamente que esse Espírito Santo fez surgir
primeiramente nesse grande todo as duas contrariedades, que são: uma, o
calor e o frio; a outra, o seco e o úmido.
Que dessas duas contrariedades agindo juntas se fixam os quatro Ele
mentos, que são o fogo, o ar, a água e a terra. Que destes saíram os três
Princípios, que são o Enxofre, o Mercúrio e o Sal. E que daí, enfim, todos
os mistos* ou compostos extraem sua origem, tantos os celestes quanto os
terrestres, os puros e os impuros, os sutis quanto os grosseiros, e geralmente
todos os mistos que existem no mundo.
A ideia que toda essa Filosofia nos dá de Deus é que Ele é único e
fecundo, e que é apenas perfeição, luz, pureza. Sobre essa ideia, parece que
a Criatura, pela qual poderemos nos elevar melhor ao conhecimento desse
Criador, é o Sol: e, com efeito, a Sagrada Escritura diz que Deus colocou
seu tabernáculo no Sol, que Deus é um fogo, que Deus habita uma luz ina
cessível. Mas se o Sol é a imagem do grande Deus, ele está bem distante dos
homens para lhes servir de degrau, pelo qual eles possam subir até esse Ser
supremo. E preciso buscar na Terra alguma outra criatura que seja tão pura,
tão luminosa, tão fecunda e, em uma palavra tão perfeita, se for possível,
para que nós possamos ir por meio de seu conhecimento ao conhecimento
dos outros seres, e ao de seu Criador.
Ora, depois de ter feito uma busca bastante exata com os mais hábeis
dos Sábios, encontramos, como eles, que não há em toda a Terra onde se
encontram melhor todas as qualidades que acabamos de citar do que a Pedra
dos Filósofos; uma vez que ela é composta de raios concentrados do próprio
Sol, que ela é de uma fecundidade quase infinita, que não sofre de nenhuma
impureza perto dela e que transforma tudo o que existe no que há de mais
puro. Nada é tão semelhante ao Sol do Céu, e é o Sol da Terra.
Barent Cocnders van Helpen,
bitrodnção à Filosofia dos Antigos (1689), p. 33-36.
_L/ m relação à nossa matéria: o que ela pode realmente ser e onde deve
ria ser procurada; o que ela conserva uma vez tornada Pedra ao branco, é
preciso observar o que alguns dizem: Que o Criador Todo-Poderoso, cuja
sabedoria é tão infinita quanto o ser, criou no início, quando nada além
d’Ele existia, duas coisas, certamente celestes, e todas as que estão conti
das sob os céus. As coisas celestes são os próprios céus e seus habitantes,
de que deveremos falar ou filosofar de maneira mais sutil e fecunda. Mas
as coisas que existem sob o céu e criadas a partir dos quatro Elementos
são em número de três e comumente distribuídas pelos homens em três
gêneros, entre as quais as que vivem, sentem e ocupam o primeiro lugar e
Grande Obra, Génese e Embriologia 167
sabor [...]. Meu Deus, em quantas espécies se dividem todas essas pro
duções? Em inúmeras, digo eu, que a cada dia também se tornam mais
nobres e mais raras graças ao cuidado diligente, a tal ponto que chega
mos até mesmo a pensar que flores tão cheirosas e tão elegantes nunca
tinham existido antes. Mas quanto aos metais de que ela é uma matéria
comum: a Prata-viva, certamente, digerida e coagulada pela força do
Enxofre, o que eu diria? [...]. É por isso que vemos cotidianamente
de que maneira a própria natureza é continuamente solicitada quanto
à mortificação e purificação dos metais, até que eles sejam finalizados
em ouro que é a intenção final da natureza. Portanto, todos os metais
mostram que neles a natureza não foi trabalhada senão com o propósito
de orientar qualquer coisa para uma perfeição posterior. Por isso, não
poderíamos encontrar um metal cuja perfeição seja a tal ponto diminuí
da que não contenha um grão de ouro ou de prata. E claro, assim como
tal preparação foi feita para que a natureza se dê muito proximamente
o trabalho de engendrar o ouro a partir da Prata-viva que contém em si
seu Enxofre: o que é com efeito possível a menos que algum impedi
mento exterior intervenha sob forma de um enxofre certamente imun
do, fedendo e adustível* - assim vemos em vários lugares o ouro puro,
limpo e obrizon* cozido na misturas dos outros metais. Porque isso
também acontece nas minas de Prata-viva quando um enxofre, vindo
principalmente do exterior, lhe é misturado, e isso entrava a perfeição; e
segundo a variedade desse Enxofre as diferentes espécies de metais são
igualmente engendradas.
Tratado de Ouro (Tractatus Aureus, 1692),
in Musaan Henneticum, p. 13-15.
Grande Obra, Génese e Embriologia
169
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“Que a natureza seja teu guia, que tua arte a siga passo a passo
Michael Maier, Atalanta fugiens, Oppenheim, 1618, emblema XLII.
6
Diálogo da Artista
e da Natureza
"Para o artesão, todo trabalho que enobrece a matéria, tal qual extrair
o copo transparente de uma pasta opaca, é um sacrifício em que a subs
tância física é consagrada, pela integração a um modelo espiritual".™
139. Seyyed Hossein Nasr, “A tradição alquímica”, Sciences et savoir en Islam, Paris
Sindbad, 1990, p. 273.
DiAlogo da Artista e da Natureza
173
Stéphanus de Alexandria,
Primeira Leitura (séc. VII), in Demócrito de rXbdèrc,
Da Grande Arte (1573), p. 23-25.
*
* *
oculta essa primeira matéria do vidro, a arte teria podido, a partir de
las, produzir qualquer vidro que fosse, ou nào o teria aperfeiçoado sem
natureza preexistente. Sendo assim, você se dá conta de que não pode
mos extrair nada daquilo que não existe: é por isso que toda espécie no
seio de sua espécie, todo gênero em seu gênero e toda natureza em sua
própria natureza procura espontaneamente obter um aumento de vir
tude, e dá fruto na proximidade de sua natureza, e não naquilo que lhe
é estrangeiro; e uma vez que toda coisa fecundada corresponde à sua
semente, nós dizemos isso até a geração. Nada é engendrado a partir de
um homem se não for um homem, nem nada de comparável que não
o seja igualmente por seu semelhante; e até que a natureza tenha sido
imitada pela arte, toda coisa que trabalha graças ao ministério da arte
só o faz pela constituição dessa natureza: que uma natureza estranha
seja introduzida, e imediatamente a arte não imita mais simplesmente a
natureza, mas esses elementos estranhos e de menor qualidade a pene
tram e nada daquilo que esperávamos pode mais ser realizado a partir
deles; pois toda coisa pior se esforça em destruir o melhor ali onde ela
trabalha; e toda coisa melhor se esforça, ao contrário, em fazer progre
dir o pior. Por isso é necessário não imitar a natureza, senão por um
único artifício, e conhecer por que meios sua arte imita a natureza da
coisa, sem o que age estupidamente aquele mesmo que é reconhecido
por aperfeiçoar a natureza pela arte.
Ríchard 1'Anglais, A Correção dos insensatos
(Corrediofatuorum, séc. XII),
in Theatrum Chetnicutn,
r. II, p. 387-388.
*
* *
Portanto, você não tem outra coisa para fazer
senão preparar como se deve a Matéria, exte
riormente, porque ela mesma faz interiormente
tudo o que é necessário para se tornar perfeita.
Pois ela tem em si um princípio e um mo
vimento que lhe está intimamente unido, e que a
Artephius, filósofo faz agir de uma maneira segura sem se enganar,
árabe: A sabedoria do e por ordem infalível que é incomparavelmen
mundo se ocupa de três te melhor do que qualquer outra coisa que os
coisas: a alma, o corpo homens poderiam inventar e imaginar. Assim,
e o espírito. prepare e disponha apenas sua Matéria, e a
Dialogo D/\ Artista e da Natureza 177
Natureza fará todo o resto. Pois, contanto que a Natureza não seja de forma
alguma impedida nem forçada a tomar um rumo oposto ao seu desejo, ela
seguirá seu movimento e sua maneira de agir, que ela regulou muito bem,
e muito certa, tanto para conceber quanto para engendrar. É por isso que,
depois de ter preparado sua Matéria, você deve prestar atenção apenas em
duas coisas: primeiro, a não inflamar o Banho,* fazendo um fogo demasia
do forte; em segundo lugar, a não deixar exalar o Espírito, pois, se ele sair
do Vaso,* sua operação será inteiramente destruída, e você não terá senão
dor e despeito. O que acabo de dizer evidentemente revela a verdade do
axioma que diz que, segundo o curso e a maneira de agir da Natureza, é
necessário que este não conheça a composição dos metais, que não saiba
como devemos destruí-los. Portanto, é preciso unir e juntar os Pais que são
do mesmo sangue, porque as Naturezas reencontram as Naturezas que são
suas semelhantes e, ao apodrecerem, elas se mesclam inteiramente.
O Livro de Artépio (scc. XII?)
in Willtam Salmon,
Biblioteca dos Filósofos ALpiíniteos
t. II. P. 156-157.
*
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*
* *
c ão duas as causas que agem nesse refugio curvo do mundo: a Arte e
a natureza. A natureza produz e engendra cotidianamente coisas novas;
a Arte, na realidade, imprimindo em si pelo pensamento as semelhanças
formais dessas coisas, acompanha por um procedimento maravilhoso os
vestígios e os traços da natureza. De forma que, se lhe acontece de não
ser assistida em algumas operações pela invenção do homem, a natureza
entregue a ela mesma é abertamente reconhecida por ter falhado em sua
obra. E de fato a Arte ajudada pela natureza algumas vezes corrige, com
pleta e de certa forma (principalmente nesse magnífico discurso das coisas
naturais) parece suplantar a natureza. O que há muito tempo foi conservado
na memória por esses primeiros e ilustres filósofos que pertencem a duas
categorias: os que, como os médicos, escrutam por si mesmos a natureza,
transmitiram por meio de escritos monumentais a virtude e a potência que
as coisas sublimares têm, ora a partir das qualidades elementares, ora a
partir do céu e das estrelas; e ainda os que descreveram as naturezas dos se
res vivos, das árvores, das ervas, dos metais e pedras preciosas. Os outros,
de longe os mais prestigiosos, penetrando com uma grande sagacidade e
uma viva acuidade não apenas a natureza, mas seu próprio arcano* e seus
santuários mais profundos, atribuíram-se em virtude de uma denomina
ção mais verídica o nome de Filósofos. Mas por que a natureza produz
todos os metais a partir de dois, Enxofre e Mercúrio, e que ela nos terá
deixado os corpos superiores gerados a partir deles bem como os inferiores,
é claro que é possível aos homens diligentes fabricar essas coisas a partir
dessas três operações, e conduzir os corpos inferiores à natureza e perfeição
dos corpos superiores [...]. Nós já dissemos que a natureza é uma deter
minada força implantada nas coisas e procriando os semelhantes a partir
dos semelhantes. A natureza com efeito engendra, faz crescer as coisas,
porque ela carrega o nome de todas as coisas. O animal é pela natureza, a
Dialogo da Artista e Dz\ Natureza
179
*
* *
•3
ÍT Assim, o alquimista é semelhante ao padei
ro que assa o pão, ao vinhateiro que faz o vinho,
ao tecelão que confecciona um tecido. E con
sequentemente é alquimista qualquer um que
leve ao termo desejado pela Natureza o que nela
cresce para o proveito do homem. Saibam que a
PH ILIPPV5 THEíX; respeito dessa arte deve ser feita aqui uma dis
vhrafíus ParOíéyuS. tinção notável: se alguém tomasse uma pele de
Philippe Théophraste carneiro e, deixando-a em estado bruto, a usasse
Paracclso: Esta é a como pclica ou casaco, seria o maior exemplo
medicina, assim também de grosseria e inabilidade em comparação com
se torna o ouro. a arte do peleteiro e do fabricante de tecido. Tão
grosseiro e inábil é aquele que, recebendo algum
dom da Natureza, não o usa. Sim, mais grosseiro e inábil até mesmo,
pois aqui estão em jogo a saúde, o corpo e a vida, em relação aos quais
devemos redobrar a atenção e a dedicação. Mas hoje todos os ofícios
manuais escrutaram a Natureza e adquiriram a experiência de suas pro
priedades, de forma que eles sabem, em todas as operações que são as
suas, seguir suas vias e extrair o que nela existe de mais elevado. Ora,
hoje isso não é mais posto em prática em medicina - onde, no entanto,
isso seria o mais necessário - e que, no estado em que ela se encontra
hoje, é a mais grosseira e inábil das artes [...]. Ora, a própria Natureza
o avisa, por meio das coisas, ao que você deve se dedicar a fim de ofe
recer à sua medicina toda a sua eficácia. O que o verão efetua com as
peras e as uvas também deve ser introduzido e realizado na medicina.
E, quando sua medicina seguir tais preceitos, você também estará em
condição de obter bons resultados. Por isso é necessário agora mais
uma vez relembrar que sua medicina deve dar frutos como o verão o faz
com os seus. Saiba que o verão age assim com a ajuda do Astro,* e não
sem ele. Quando o Astro exerce no tempo desejado sua influência, saiba
mais uma vez que sua preparação médica deve lhe ser rigorosamente
ordenada e submetida; pois é ele que realiza a obra da arte.
Paracclso, I.ibcr Paragranum,
VIII. 181 (1528), in Samtlicht Wrkc, 1.1.
p. 381-382.
*
* *
Diálogo da Artista e D/\ Natureza
183
JWas existe coisa mais tola e iníqua do que odiar o que ignoramos?
Considere que a coisa deve ser odiada; existe, no entanto, algo de mais
abjeto e de mais vil do que condenar uma ciência sobre a qual nós ape
nas compreendemos uma ínfima parcela, nem conhecemos a Natureza e
seu poder, ainda menos as propriedades ocultas dos metais? Mas como
compreenderiam o que está fora deles, que não sentem nem sabem o
que em menos de 24 horas a Natureza opera neles mesmos, transmutan-
do ervas, plantas e todos os frutos e animais comestíveis em seu sangue,
e substância total? De resto, que aqueles que negam que a Alquimia seja
uma ciência verdadeira, leiam A Defesa da Alquimia de Libavius,141 a
qual eu recomendo. E para concluir esta parte, vejamos como a arte
pode fazer o Ouro. É preciso conhecer antes de mais nada que existem
três causas efetivas, que são o início, o meio e o fim de todas as coisas,
que elas as conservam encerradas em si mesmas, e são Deus, Natureza
e a Arte. Triângulo divino cujo Deus diz, a Natureza faz e a Arte imita.
Assim, a Natureza comandada pela causa primeira produz todos os dias
coisas novas, cuja arte, que por meio da concepção imprime em si a
similitude dessas coisas, continua de uma maneira admirável o traço e
as linhas da Natureza: de forma que, se o entendimento do homem não
fosse algumas vezes obstruído, vocês diriam que a Natureza é falha
em suas operações. Pois a Arte, com o auxílio da natureza, corrige-a,
suplanta-a e a apoia quando ela falta, principalmente nessa sagrada
Filosofia natural e operativa, assemelhando-se por isso à Medicina, que
não nos pode mostrar a verdade daquilo que ela ensina, a não ser pela
experiência.
Henri de Linthaut,
Comentário sobre o Tesouro
dos tesouros de Christojle de Gamou
(1610), p. 68-69.
*
* *
você precisa saber que a Pedra filosofal deve ser necessária e inteira
mente feita tal qual a própria Natureza.
Una, o que significa que você não se convence de que a Pedra
filosofal possa ser feita de diversas maneiras, mais do que de uma só:
tudo o que é conduzido a termo, como convém, é aperfeiçoado por um
modo único.
Verdadeira, o que quer dizer que você não busca na coisa o que
não está nela: não se faz qualquer coisa a partir de qualquer coisa, mas
algo de determinado a partir do que já existe ali.
Continua, ou seja, que você não comece agora para em seguida
interromper, mas que antes adquiriu a matéria verdadeira, e o verda
deiro modo operatório, de forma que suas ações sejam contínuas e não
interrompidas.
Isenta de confusão significa que, assim como a Natureza conduz
as coisas da potência ao ato de acordo com uma ordem, você deve agir
em todas as coisas da mesma forma e sem confusão, segundo a ordem
mais justa. Ou ainda: porque a Natureza não pensa nem efetua nada sem
ordem, da mesma forma nada deve ser feito nessa arte confusamente,
mas sempre de tal forma que uma tarefa decorra necessariamente da
outra.
Paciente, pois toda digestão para ser efetiva requer um tempo su
ficiente.
Constante, o que significa dizer não passar de um reino da natu
reza ao outro, e assim de uma matéria à outra, mas ao menos concentra
seu espírito na unidade da matéria.
Simples, pois é verdade que você não desejará imaginar coisas
sutis sobre as quais a Natureza nada sabe, mas permanecer na via real,
fácil e simples, que a Natureza prescreve a partir dos exemplos de suas
operações. Por isso, tudo o que é tentado fora dessa luz da Natureza é
vão, e não chegamos a nada a não ser a uma perda de tempo e à ruína
dos trabalhos empreendidos.
Micbatl Pvtier, A Filosofia Pura
(Philosophia Pura, 1619), p. 83-88.
*
* *
osso grande Deus colocou tais limites à Natureza, que ela tem
bastante poder, que ela pode aperfeiçoar o Enxofre, o Mercúrio e o Sal
espirituais, não apenas em enxofre, em Mercúrio e em sal corpóreos,
e em corpos que são compostos desses Princípios nos reinos vegetal,
186 Filosofar pelo Fogo
rÉI
188 Filosofar pelo Fogo
■p
JL/u protesto diante de Deus, e na salvação eterna de minha alma, com
um coração sincero, tocado de compaixão por aqueles que desde sem
pre estão na grande busca; eu certifico a todos vocês, que acalentam
essa maravilhosa Arte, que nossa grande obra nasce de uma só coisa,
e que nessa coisa a obra encontra sua perfeição, necessitando apenas
ser dissolvida e coagulada, e isso ela deve fazer por ela mesma, sem o
auxílio de nenhuma coisa estranha.
Quando colocamos gelo em um vaso posto sobre o fogo, observa
mos que o calor o reduz a água; devemos usá-lo da mesma maneira com
nossa Pedra, que não precisa senão do auxílio do Artista, da operação
de suas mãos e da ação do fogo natural, pois ele jamais derreterá por si
mesmo se permanecer eternamente sobre a terra: é por isso que deve
mos ajudá-lo, de tal forma todavia que não lhe acrescentemos nada que
lhe seja estranho e contrário.
Assim como Deus produz o fermento nos campos, e que em segui
da cabe a nós colocá-lo na farinha, amassá-lo e com ele fazer o pão; da
mesma maneira nossa Arte requer que façamos a mesma coisa. Deus nos
criou esse mineral para que sozinhos o tomássemos, que decompusés
semos seu corpo grosseiro e espesso; que separássemos e tomássemos
para nós o que ele encerra de bom em seu interior; que rejeitássemos o
que há de supérfluo; e que de um veneno mortal aprendêssemos a fazer
uma Medicina soberana.
Alcxandre-Toussaint Limojon dc Saint-Didier,
Entrevista da Pedra dos Filósofos com o Ouro e o Mercúrio,
O Triunfo Hermético (1699), in William Salmon,
Biblioteca dos Filósofos Alqutmicos, t. III, p. 181-183.
. ./í
A Deontologia
Operativa
( Ora et Labora)
Portanto, aquele que deseja ser introduzido nessa
sabedoria oculta que possuímos deve fugir
do vício da arrogância, ser piedoso, ser homem de bem,
de um profundo raciocínio,
c guardar os segredos que lhe foram revelados.
142. cf. a esse respeito Raimon Panikkar, Éloge du simple, trad. fr. Paris, Albin Michel,
1995, em que o parentesco entre vida monacal e transmutação alquímica é esboçado.
-192-
A Deontologia Operativa (Ora et Larorà)
193
definidos pela alta contemplação, e pela vida santa, tanto ele não conhece
apenas as entranhas da natureza, mas também ele deve saber transmutar
as coisas transmutáveis. Essa coisa é conhecida por poucas pessoas. Cla
ro. existem aqueles que comumente se ocupam com essa ciência, sem
ter dela nenhum conhecimento; esses seguem ordinariamente as ficções
e sofisticações, e por essa razão se tornam falsificadores de moedas e
servos dos prelados e dos príncipes, sendo vagabundos, enganadores e de
vida incorreta, sem religião [...]. Quanto às outras obras maravilhosas
da Filosofia, elas dependem daquelas que já citei, e eu as aprendi por
meio das altíssimas iluminações e inspirações celestes, eu as revelarei
a vocês enquanto me for possível, homens evangelizados (se agradar a
Deus) aos quais eu escrevo amplamente.
Jcan dc Rupcscissa,
A Virtude e Propriedade da Quinta essência de todas as coisas
(scc. XIV, rrad. fr. 1549), p. 110-112.
*
* *
lE/ u ordeno a todos os exploradores dessa arte que em primeiro lugar
em que, ainda que seja sal e por mais criado que seja, Deus inscreveu
no entanto - e de forma maravilhosa - imagens vivas de si mesmo para
que não possamos encontrar ninguém, ou no máximo alguém de jul
gamento fraco, que não seja levado a ignorá-los e que ao contrário não
os entenda, clamando de todas as partes e cantando em alta voz: Deus
fez todas essas maravilhas, e suporta além do mais todas as coisas pela
força de seu Verbo. Com efeito, d’Ele e de semelhante força elas se
manifestam de ter sido criadas e de ser conservadas. Vimos de fato que
a natureza não é capaz por ela mesma de se criar; e, se lhe é permitido
ser por si mesma contemplada, não lhe é possível se conservar a partir
de si mesma. Portanto, resta que ela foi criada por outro e que nós nos
dedicamos além do mais a conservá-la, e a reconhecer esse Deus único e
sozinho: pois criar, que significa tirar alguma coisa para fora do vazio,
e isso unicamente pela potência de seu Verbo, depois conservar o que
foi criado, pressupõe uma virtude infinita, eterna e todo-poderosa; e
essa virtude infinita, eterna e todo-poderosa é o próprio Deus.
É por isso que, com a cabeça livre de qualquer suspeita, podemos
alegremente concluir que todas as coisas, de qualquer qualidade que
sejam na série daquelas que existem e que vivem, são e vivem graças a
Deus, que é o ser dos seres e a verdadeira vida dos viventes, e que só o
bem, o repouso e a felicidade supremos podem ser atendidos. Assim a
Alquimia, escrutando as coisas naturais pelo gênio do fogo, que é o ob
servador de todas as realidades ocultas, recolhe de certa maneira os so
brenaturais e leva a conhecer e revela Deus: não no estado em que ele se
encontra em relação a si mesmo, mas tal como ele aparece na natureza;
e, no entanto, apresentando-lhe e iluminando tudo, a luz natural e o fogo
são sob outros pontos de vista obscuros e mais de uma vez inteiramente
Cimérios; isso para que seja contemplada essa luz superinacessível e
superincomunicável, que não pode se igualar a nenhuma outra luz, caso
essa não seja a única verdadeiramente autêntica, descendo do céu para
iluminar todo homem que vem ao mundo e que os homens até agora
não reconheceram [...].
Eis o que revela a Alquimia interior da natureza criada, contem
plando à medida de suas capacidades mentais os mistérios na natureza
incriada, que nem as hierarquias estabelecidas pelos homens, nem todas
as ordens angélicas conjugadas podem penetrar. Somente o podem o
Pai, só o Filho, só o Espírito Santo, só essa Trindade: o Deus Uno que
conheceu esses mistérios e os comunicou a nós por sua graça; não para
lhes dar uma existência verídica, mas para que nós possamos percebê-los
A Deontologia Operativa (Ora et Labora)
201
de maneira inteligível, tanto que o espírito humano seja capaz, por meio
das barras de sua luz, de atravessar seu próprio espelho.
Pierrc-Jcan Fabre,
O Alquimista Cnstào
(Alchymista christianus, 1632), p. 6-13.
*
* *
ó lhes resta orar a Deus para que Ele realmente deseje fazê-los che
gar à posse de uma joia, que é de um preço inestimável. Afiem então
a ponta de seus espíritos; leiam os escritos dos Sábios com prudência;
trabalhem com diligência e não ajam com precipitação em uma obra tão
preciosa. Ela tem seu tempo ordenado pela Natureza, assim como os
frutos que estão nas árvores e os cachos de uvas que a vinha* carrega.
Tenham a retidão no coração e proponham, em seu trabalho, um objeti
vo honesto; senão Deus não lhes dará nada: pois ele não comunica um
tão grande Dom senão àqueles que querem fazer bom uso dele; e Ele
priva aqueles que desejam dele se servir para cometer o mal. Rogo a
Deus que Ele lhes dê sua santa bênção. Assim seja.
Alcxandre-Toussainc Limojon de Saint-Didicr,
O Triunfo hermético (1699). in William Salmon,
Biblioteca dos Filósofos Alquímtcos, t. III, p. 202-203.
K1^^
desejaram tornar as coisas obscuras para o homem
inteligente, para que os demónios hesitassem em
conceber o ciúme, pois sem dúvida eles teriam ten
tado aqueles que teriam se distinguidos nessa obra.
Pertence aos Sábios Deus, em sua clemência, quis que eles pudessem
procurar as mais altas supor que isso não existiria na realidade. Talvez
coisas eternas ao os demónios tivessem tentado, fazendo-lhe entre
elevar seu espirito e ver grandes despesas e o perigo de ser arruinado,
seus olhos. como outros já haviam tentado antes dele, desviar
A Deontologia Operativa (Ora tr Labora)
203
o homem da busca desse favor divino e generoso, pois ele deve conduzir
aqueles que são seu objeto às delícias da vida futura: a obra é uma grande
marca do favor que Deus faz a seus adoradores. Eu os engajo, portanto,
a se apoiarem em minhas recomendações: não se desanimem na leitura
dos livros nem na prática das operações. Tenham paciência, esperem que a
tintura esteja terminada, e peçam a Deus (que seu nome seja glorificado!),
peçam-lhe por meios de suas preces e súplicas que ele os faça chegar ao
objetivo. Desconfiem do fogo no momento da operação, sendo o fogo o
inimigo da água, enquanto não houver acordo entre eles, assim como disse
aos filósofos Nosso Senhor, o Messias,144 quando estes vieram colocar cm
prova sua ciência com a ajuda de seus conhecimentos: “Estou surpreso, ó
filósofos, diz-lhes, de ver como podeis harmonizar a água com o fogo. A
obra não pode ter sucesso senão a esse preço, com a permissão de Deus.
Agi portanto e não vos desencorajai, não desanimai. Tende paciência; lede
assiduamente os livros e tentai compreende-los; pedi a Deus que Ele vos
coloque no bom caminho e Ele vos conduzirá”.
O Livro de El-Habíb, in Marcelin Berthelot,
A Química na Idade Média, t. I, p. 99-100.
*
* *
V ocês não podem alcançar seu objetivo sem Iluminação e sem pa
ciência, e sem ter coragem de atingir; pois quem não tiver paciência
não entrará nessa Arte. Como acreditam entender nossa Matéria desde
a primeira vez, nem da segunda, nem da terceira? Leiam tudo todas as
vezes que duvidarem e tenham esse Livro como uma luz diante de seus
olhos, e tenham paciência de esperar. Vi em meu tempo um grande Fi
lósofo, que sabia tanto quanto eu, e que não era um de nós; mas por sua
impaciência e pressa, e desmedida ambição, pela justiça de Deus, como
eu creio, pela força do fogo, perdeu tudo, e não pôde ver o que deseja
va. E por isso, nosso Mestre Pitágoras diz que quem ler nos Livros, e a
eles se dedicar, não terá vãos pensamentos na cabeça, e rezará a Deus,
ele comandará pelo mundo. Pois vocês buscam um grande segredo, por
que então não desejam ter trabalho? Não veem que um Homem mata
o outro, e também se mata por dinheiro? O que então vocês deveriam
fazer, e que esforço ter a fim de chegar a essa alta Ciência, que é de tão
grande proveito? Quando plantam e semeiam, não esperam o fruto até o
144. Nota de Mareei in Berthelot: “Essa passagem é singular, estando intercalada em uma
obra muçulmana. Parece que é realmente uma citação de Maria, personagem gnóstico”.
(Origines de l 'alchimie, p. 64).
r
tempo de sua maturidade? Como então desejam ter o fruto dessa Arte em
tào pouco tempo? Eu lhes digo, para que depois não me amaldiçoem, que
toda precipitação nessa Arte vem do Diabo, que se dedica a desviar os ho
mens de seus bons propósitos. Sejam firmes e creiam em seu Mestre, como
acreditamos no nosso. Por nele ter crido e ter sabido, nós tivemos proveito:
da mesma forma se vocês acreditarem, terão proveito.
A Assembleia dos Filósofos
(Turba Philosophorum, scc. XII), in William Salmon,
Biblioteca dos Filósofos Alqtttmicos, t. II, p. 22-24.
*
* *
kw gfjj
Dedique-se agora a considerar e a examinar esse
Mestre, e esteja certo de que o saberá e o com-
preenderá facilmente. Mas lembre-se sempre,
sobretudo, de estudar bem o começo e o fim.
3ÍORIENV5ROMAN.
Phifofõphus. Pois, por esse meio, com a ajuda de Deus, des
Morienus, filósofo cobrirá mais facilmente tudo o que é necessário
romano: E no esterco de para fazê-lo. Ora, eu o advirto que esse Magis
nossa putrefação que se tério, que você tanto busca, não se descobre
encontra o começo e a nem com violência nem com ameaças, que não
causa sine qua non. é se irritando que chegamos ao objetivo; e que
somente aqueles que são pacientes e humildes,
e que amam a Deus sincera e perfeitamente, po
dem pretender adquiri-lo. Pois Deus só revela
XF5 essa divina e pura Ciência aos seus fiéis servi
dores, e somente àqueles a quem de toda eterni
i dade ele resolveu, por sua divina providência,
revelar um tào grande mistério. Assim, aqueles
__ _ íJJ a quem ele concedeu uma graça tão singular
CaÊtD R£X AGIPT devem considerar muito bem a quem podem
fraanj.Mprvm confiar um tão grande segredo, antes de dizê-lo
e de descobri-lo; porque só devemos considerá-
Calid, rei sarraceno do
Egito, discípulo de lo como um Dom de Deus, que ele concede de
Morienus: Aquele que acordo com sua vontade, e a quem lhe agrada
vem em terceiro depois dentre os escolhidos entre seus fiéis Servidores.
do Pai e da Mae é o E eles devem continuamente se prostrar e se
mestre do Fogo. humilhar diante de Deus; reconhecer com uma
A Deontologi/\ Operativa (Ora et Labora) 205
completa submissão que só d’Ele eles têm esse bem tão grande, e usá-lo
apenas segundo as ordens de Sua santa vontade [...]. E é apenas Deus
quem escolhe, entre seus servidores, aqueles que lhe agradam, e que
Ele destina a buscar essa Ciência divina, que é desconhecida e oculta
dos homens, e para guardá-la e mantê-la em segredo em seus corações,
quando enfim a tiverem descoberto. Por isso é uma Ciência admirável
que destaca e retira aquele que a possui da miséria deste mundo, e que
o conduz e o eleva ao conhecimento dos bens da vida eterna. É por isso
que os antigos Filósofos eram tão ciumentos dela, que ao morrerem
deixavam essa Filosofia uns aos outros, por tradição, como uma herança
que só a eles pertencia. Em seguida veio um tempo cm que essa Ciência
foi quase destruída, sendo desprezada por todos. E ainda que dentre
todo esse desprezo que dela se fazia existiram vários livros dos antigos
filósofos, que foram conservados, nos quais essa Ciência se encontrava
completa e sem nenhuma mentira.
Entrevista do Rn Calid e do Filósofo Morien,
in William Salmon, Biblioteca dos Jilósofos
aLjuítnicos, t. II, p. 64-67.
*
* *
MATÉRIA: assim não se zangue, uma vez que conheço sua boa
vontade e que você quer me fazer um favor, eu o conduzirei pelo reto
caminho, c você chegará à realização de seu desejo, mas note bem mi
nhas palavras porque elas são divinas e de grande efeito, e, para o pri
meiro ponto, eu sou aquele que você busca, tão monstruoso e selvagem,
todavia grande virtude c riqueza extraem de mim.
Eis como você fará: é preciso que entenda que desci das regiões
celestes, e caí aqui nessas côncavas cavernas da terra, aqui me alimentei
durante um espaço de tempo e desejo apenas retornar, e o meio para
isso é que você me mate, e depois me ressuscite, e com o instrumento
com o qual me matará você me ressuscitará, pois, como diz a pomba
branca, aquele que me mata me fará viver, e eis o meio como você deve
me matar: é preciso que me pegue puro e limpo assim como cu sou, pois
nunca estive em má companhia, e não me sujei com nenhuma mácula,
e para isso mantenha em mim minha pureza depois você mc cortará cm
fatias bem pequenas e cortará dentro de mim minha água, que é minha
bem-amada, tão suavemente quanto possível, e mc mesclará dc tal for
ma que não se reconheça nada de mim e que haja duas matérias diferen
tes, ainda que elas sejam de uma raiz, todavia, é apenas uma natureza,
ainda que uma se chame macho e a outra, femea.
E depois que tiver sabiamente feito, você me colocará em uma
câmara redonda e clara, para que veja em torno de mim, e que ela seja
justamente fechada, e que nada ali possa entrar nem causar prejuízo.
Além do mais, você construirá duas outras câmaras e as colocará uma
dentro da outra, e tomará aquela onde estou, e a colocará no meio das
duas, e que nada possa prejudicar. E quando estiver assim acomodado,
você me aquecerá sem qualquer violência, com um calor próprio para
me fazer morrer, pois só isso pode me fazer morrer; é preciso que isso
seja uma morte langorosa e não súbita, pois ela seria prejudicial.
Eu também o advirto sobre um ponto, ou seja, que você seja pacien
te, ainda mais que é preciso que o calor seja vaporoso e úmido, contínuo
até o tempo que eu esteja morto e ressuscitado, e é preciso evitar esse
dardo e fogo de Vulcano, e não seja preguiçoso, pois estaríamos arruina
dos e destruídos, ou seja, você, e a natureza, e eu sem jamais me levantar.
Até aqui é a metade do tempo da obra e não é preciso mexer nem
mudar nada no primeiro tempo. Falaremos agora da profundidade da
ciência de ponto em ponto, e das operações secretas da Natureza, e para
esse fim que você não ignore nenhuma coisa.
208 Filosofar pelo Fogo
é também aos Sábios que eles falam, não à tropa ignorante, ouçam,
escutem como chegamos ao conhecimento dessa ciência tão desejada.
Existem quatro vias:
Pela ciência infusa, isto é, que Deus em seu nascimento os preor-
denou a isso, ou depois lhes comunica por sua potência essa Ciência,
dom particular e raramente visto neste século, senão pelo senhor Bom-
bast.145
Por revelação, isso também é Deus, dom gratuito, essas duas vias
são difíceis ao homem carnal.
Ser marcado por um bom espirito, São Pedro e Tobias estão mor
tos, quis vult sumere oracula, vel dona divina, oportet sanate caste que
viveref6 ou são os outros que o são, Nigro que similis signo,147 vejam
lacrimistas pecadores de que lado vocês estão.
A quarta via mais fácil, ser assinalado por um homem que tenha
feito essa perfeita transmutação, mas quem a conhecer não dirá nada
sobre ela, ou quem entende os Antigos.
Fora dessas quatro vias não chegaremos jamais, conheçam um, e
lhes faltará o outro, um ponto rompe o centro, a perfeição dessa ciência.
O espelho dos Alquimistas
pelo Cavaleiro imperial (1609).
p. 12-13.
*
* *
*
* *
A Deontologia Operativa (Ora et Labora)
213
sobre isso que Haly fala de maneira figurada, quando diz que as raízes
de seus minerais se encontram no ar e nas extremidades na terra, e que,
quando elas são arrancadas de seus lugares de origem, um som terrível
se faz ouvir, gerando um terror imenso. É por isso que você precisa
caminhar rapidamente, pois elas logo se esvanecem.
Em segundo lugar, para que os homens maus não se apropriem
indevidamente dessa ciência para seu próprio proveito. Por isso está
escrito no Livro de Saturno’, nossa Pedra bendita é conhecida de todos,
ela c lançada nas ruas e podemos encontrá-la em qualquer lugar. É por
isso que os Filósofos antigos dissimularam tanto essa Pedra quanto a
conduta de seu magistério. Não se surpreenda, portanto, se os Filósofos
omitiram o início e o fim do magistério, conservando apenas seu meio;
pois, se a totalidade tivesse sido abertamente exposta, alguns ímpios a
usurpariam de maneira indigna. Assim como diz outro Filósofo: não
deixarei de encorajá-lo para que a ninguém mais além de você, meu
caro, sejam abertos os tesouros de nossos segredos, e que as cabras mal
cheirosas e repugnantes não esmaguem as rosas brancas e vermelhas de
nosso jardim. É por isso que devemos semelhantemente dissimular,
e não informar nenhum de nossos amigos, para não excitar contra
nós o furor divino.
Laurcnt Ventura. Do meio de confeccionar a Pedra JilosoJal
(De ratione confieiendi Lapidis philosophiei, séc. XVI?),
in Thealntm Cheinicum, t. II, p. 226-7.
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Enigmas, Fábulas
e Parábolas
uma história edificante pela qual o leitor se sente por sua vez concernido:
não é sua própria história, aquela de seu desejo mais oculto que lhe ê con
tada e que, de seu próprio imaginário, ressurge assim exaltada? Nenhuma
resposta, nenhuma tradução em linguagem clara é, todavia, espetada de
quem responde, por sua única transformação, à narração cuja injunção ele
ouviu. Em contrapartida, a “fabulação ” começa quando a narrativa só é
mais pretexto a uma laboriosa decifração em vista de uma total elucidação.
*
* *
Enigmas
1. Eis o mistério: a serpente Ourobo-
ros [que morde sua cauda] é a composição
que em seu conjunto é devorada e fundida,
dissolvida e transformada pela fermenta
ção. Ela se torna de um verde-escuro, e a
cor de ouro deriva dela. E dela que deriva
o vermelho chamado cor de cinábrio: é o
cinábrio* dos filósofos.
2. Seu ventre e seu dorso são cor de
açafrão, sua cabeça é de um verde escuro,
seus quatro pés constituem a tetrasomia,*
suas três orelhas são os três vapores subli
mados.
3. Um fornece ao Outro seu sangue, e o
Um engendra o Outro. A natureza regozija a
natureza, a natureza encanta a natureza, a na
tureza triunfa da natureza, e a natureza domi Serpente devorando sua própria
na a natureza; e isso não por essa [natureza] cauda (Ouroboros): Abrahani
Eléazar, Uraltes chymisches
oposta a tal outra, mas por uma única e mes
Werk, Erfurt, 1735.
ma natureza [procedente] dela mesma pelo
processo [químico], com dor e muito esforço.
4. Ora, meu caro amigo, aplique sua inteligência nessas matérias e
não cairá em erro, mas trabalhe seriamente e sem negligência até que tenha
visto o fim [de sua busca].
5. Uma serpente está estendida, guardando esse templo [e] aquele
que a domou; comece por sacrificá-la, depois tirar sua pele e, depois
de ter tomado sua carne até os ossos, faça um caminho na entrada do
templo, suba até ele e lá encontrará o objeto buscado. Pois o sacerdote,
primeiro homem de cobre, mudou de cor e de natureza, ele se tornou
r
ser reparado: e os olhos untados com esse licor podem facilmente ver e
compreender os arcanos* filosóficos.
Enigma da Pedra in A Assembleia dos Filósofos
(Turba Philosophorum, séc. XII), in Jean-Jacqucs Mangct,
Bibliotbeea Chemiea Curiosa, t. I. p. 496.
*
* *
B u sou um Dragão* venenoso, de preço vil e presente em todos os
lugares. A coisa sobre a qual repouso, e que se repousa sobre mim, se
encontra em mim, buscando cuidadosamente minha Água e meu Fogo,
que compõe, que destrói e que restabelece. Você extrairá de meu corpo
o Leão verde e vermelho. Se você não me conhece exatamente, tome os
cinco sentidos de meu fogo. De minhas narinas sai um veneno que logo
amadurece, e que trouxe prejuízos a muitos. Separe então com artifício
o sutil do espesso, a menos que a pobreza o agrade. Eu lhe aumento as
forças dos machos e das fêmeas, bem como as do Céu e da Terra. Os
mistérios de minha Arte devem ser tratados com coragem e magnani
midade. Se você deseja que eu vença a força do Fogo, saiba que nisso
muitos perderam seu tempo, seus bens e seus esforços. Eu sou o ovo
da Natureza, conhecido somente dos Sábios, que, sendo piedosos e
modestos, engendram de mim o pequeno Mundo que Deus, muito bom
e muito grande, preparou para os homens; mas ainda que muitas pessoas
*
* *
JE/u moro nas montanhas e nas planícies; sou o
... : M
y engendrando-me sem ter necessidade de alimento.
Sou Hermafrodita* e tenho duas naturezas; sou
li 4 vitorioso sobre todos os fortes, e sou vencido pelos
I
' OM ui'- mais fracos e menores; não se encontra no céu nada
de tão belo nem que tenha uma figura tão perfeita.
Nasce de mim um Pássaro admirável, que de
seus ossos, que são meus ossos, se faz um peque
no ninho, onde, voando sem asas, ele se revivifica
ao morrer, e a Arte ultrapassa as leis da Natureza,
ele no final se transformou em um Rei, que supera
em virtude os outros seis. Eis o verdadeiro Mila
Andrógino hermético: Liber gre do Céu* terrestre, pela Arte do Sábio.
der heiligen Dreifaltigkeit,
1488. Vinccslas Lavinius dc Moravia,
Tratado do Céu Terrestre (1612), in William Saltnon,
Biblioteca dos Filósofos Alquímicos, t. IV, p. 569.
*
* *
ENIGMAS, Fábulas e PARÁBOLAS
223
Parábolas
A Alegoria Filosófica o rei, é aquela que eu amo mais do que tudo e com a
de Merlim: Saturno é qual fui eleito diante de todos os outros. Esclarecido
o planeta da Morte, por essas palavras, o soldado logo se foi e a trouxe.
veja, aqui ele usa unia Assim que a recebeu, o Rei bebeu e bebeu mais ainda,
túnica preta. até que todos os seus membros dela estivessem pre
enchidos e suas veias inchadas. Vendo-o então muito
pálido, seus soldados lhe disseram: Senhor, eis o cavalo; montai, por
favor. Ele lhes respondeu: Saibam que não posso montar. Por que não
o podeis?, disseram os soldados. Porque me sinto pesado, respondeu-
lhes, a cabeça me dói, e me parece que todos os meus membros se des
tacam um a um de mim. Eu lhes ordeno, portanto, que me coloquem em
um quarto claro, que colocarão em um lugar quente, mantido dia e noite
em um calor temperado: assim poderei transpirar e a água que bebi se
secará em mim, e estarei livre. Os soldados então fizeram assim como o
rei lhes havia ordenado. No final do tempo estabelecido, eles abriram a
porta do quarto e o encontraram quase morto. Os parentes logo se pre
cipitaram em direção dos médicos egípcios e alexandrinos, que convém
honrar mais do que todos os outros e, contando-lhes imediatamente o
que tinha acontecido, levaram-nos para perto do rei. Tendo-o visto, eles
disseram que sem dúvida era possível livrá-lo. E os parentes pergunta
ram: Quem de vós se encarregará? Nós, responderam os alexandrinos,
se isso vos convier. Isso não nos convém, disseram os egípcios: nós, ao
contrário, queremos assumir essa tarefa, pois somos mais antigos que
vós, ainda que parecendo mais jovens. Os alexandrinos consentiram, e
os médicos escolhidos tomaram o rei, cortaram-no em pequenos peda
ços e os trituraram, misturaram-nos pouco a pouco com suas medicinas
emolientes. Tendo assim o preparado, eles o depositaram em seu quarto,
em um lugar onde reinava como antes, de dia como de noite, um calor
temperado. Isso feito, eles o retiraram quase morto, e conservando ape
nas um sopro de vida. Vendo-o nesse estado, os parentes exclamaram:
Infelizmente, o rei está morto! Ele não está morto, replicaram os médi
cos. Não gritem, pois ele dorme, e seu sono está quase terminando. Então
Enigmas, Fábulas e Parábolas 227
eles retomaram o Rei e o lavaram com uma água suave até que o odor
das medicinas tivesse desaparecido: e lhe administraram novamente a
mesma estranha medicina, e o colocaram no mesmo lugar que antes. E
quando o retiraram, ainda o encontraram experienciando a morte [em
perigo de morte?]. Então os parentes gritaram muito alto: Infelizmen-
te! O Rei está morto. Os médicos, respondendo-lhes, disseram: Nós
o matamos para que ele reapareça neste mundo, melhor e mais forte
depois de sua ressurreição, no dia do Julgamento, do que ele era antes.
Ouvindo isso, os parentes do Rei os tomaram como impostores e, assim
que lhes confiscaram suas medicinas, expulsaram-nos do reino. Depois
disso eles deliberaram entre si, examinando o que deveriam fazer com
esse corpo envenenado e morto. Decidiram enterrá-lo com medo de que
o mau cheiro de sua putrefação espalhasse a pestilência. Ouvindo isso,
os médicos alexandrinos vieram até eles e disseram: Não o enterrem,
pois, se vós desejardes, nós o restituiremos ainda mais são, mais belo
e mais poderoso do que no passado. Então os parentes sorriram, dizen
do: Vós quereis zombar de nós, como os outros? Sabei que, se vós não
mantiverdes vossas promessas, não saireis vivos de nossas mãos. Assim
considerados como responsáveis, os médicos tomaram o Rei morto c
como os outros o colocaram e o esfregaram, depois o lavaram até que
não restasse nada das medicinas dos outros, enfim o secaram. Em se
guida tomaram uma parte de sal* amoníaco e duas partes de nitro* ale
xandrino que misturaram com o pó do morto, depois fizeram uma pasta
com um pouco de óleo de linho e a colocaram em uma câmara cm for
ma de cruz aberta em sua parte inferior; sob a abertura eles colocaram
outro vaso limpo (mundum) igualmente em forma de cruz e o deixaram
lá por uma hora. Em seguida eles o envolveram com fogo, soprando até
que ele se liquefizesse completamente e descesse até a outra cruz aberta
embaixo. Então, retornando assim da morte à vida, o Rei gritou com
uma voz forte e disse: Onde estão meus inimigos? Que eles saibam que
eu os matarei se não vierem sem demora se submeter a mim. Ouvindo
isso, todos se apresentaram e disseram: Senhor, estamos aqui prontos a
obedecer. E por isso que desde esse momento todos os Reis e poderosos
de outras regiões o honraram e o temeram como antes.
E quando eles desejavam ver algumas de suas maravilhas, coloca
vam em um vaso em forma de cruz uma onça de mercúrio bem lavado
e projetavam sobre ele quase a grossura de um grão de trigo das unhas,
dos cabelos ou do sangue do Rei; e soprando sobre os carvões, não
os deixavam senão quando se tornassem frios, e encontrassem a pe
dra que eu sei. Dessa pedra, eles projetavam um pouco sobre Saturno
22S Filosofar pelo Fogo
purificado. cuja forma era logo transformada como eu sei. Então, eles
em seguida colocavam uma parte de dez de Vénus, e tudo se tornava
de uma única cor e excelência. Da mesma forma. Eles tomavam então
essa terceira pedra, misturavam-na com sal e Sol, depois a liquefaziam
e projetavam os ditos sais sobre o leite de cabra. Assim se realizava a
melhor obra de todas.
Irmão, conserva esse tratado e exerce tua vigilância, pois a me
lhor coisa é impostura entre os insensatos, mas não entre os sábios.
Essa é. com efeito, a via das três jornadas reais, emprestada por aqueles
que. pelo preço de um pouco de trabalho, desejam obter um grande
benefício. Dirijamos nossos louvores ao Criador supremo que inspi
rou graciosamente seus fiéis a transmutar os acidentes [de matéria] em
substâncias para que aquilo que dormia em potência nas coisas possa
ser conduzido ao ato e reinar sabiamente.
Alegoria de Merlim (Merlini Allegoria), in Jcan-Jacques Mangct,
Bibliotheea Chemiea Curiosa c. II. p. 191-192.
*
* *
1E/ u entrei em uma morada subterrânea e, depois que Elsaham e eu
*
* *
1E/ ntenda, Filho, entenda a doutrina do Pai dos Filósofos, Aristóteles,
tào bem provida do alto da cabeça até as coxas, e infectada das coxas
até as plantas dos pés.
Mãe Alquimia lhe respondeu: Nào se surpreenda que eu tenha um
dia sido assim gratificada pelo Sol até o peito e pela Lua até as coxas,
mas a partir das coxas até os pés infectada e hidrópica; por essa razão
meu corpo está até agora incompleto e imperfeito. Eu o mandei inquirir,
Mestre e pai sobre todas as ervas, para que cuide de mim e que reconfor
te meus membros tào paralíticos quanto hidrópicos. E caso consiga cui
dar de mim e me devolver a saúde, eu me comprometo a recompensá-lo
generosamente. Apresente-me então agora suas medicinas e mostre-me
as virtudes de suas ervas para que eu possa novamente andar. Saiba en
tão que eu o tornarei rico: não apenas você, mas o mundo inteiro.
Mestre Macer lhe disse: Minha cara Alquimia, tudo o que desejar
de mim você obterá e, claro, poderá usar as virtudes de minhas ervas;
espero com efeito que todos os seus membros debilitados sejam assim
devolvidos à saúde. Isso eu o quero e o desejo, pois a vejo em estado de
extrema indigência. Veja então agora, e escolha entre essas ervas muito
nobres a que mais agrada e convém melhor para a fraqueza de sua natu
reza. E Alquimia, lançando logo seus olhares sobre a erva mais cheirosa
e notável por sua cor, designou-a dizendo: Ó Mestre, percebo certa erva
cheirosa e extremamente resplandecente que me agrada muito, diga-me
qual é sua virtude e onde a encontraste.
E Macer: Ó minha cara Alquimia, eu lhe responderei que recen
temente, assim que você me enviou suas mensagens e esperou a minha
ajuda, eu prontamente me apresentei aos seus enviados, levantei-me e
subi então à grande montanha de Mambré, onde colhi todas essas er
vas; e, subindo em um monte mais elevado, vi plantada ali essa erva
que lhe é tão agradável e a extraí com suas raízes por amor a ti, para
conseguir cuidá-la graças a ela. Saiba, com efeito, que essa erva é de
grande virtude, pois é capaz de cuidar indistintamente, ao penetrá-los,
seus membros paralíticos e hidrópicos, e ela é chamada por alguns de
Almíscar aromático.
Como resposta Mãe Alquimia lhe disse: Eis o que é bom para
mim, e eu lhe agradeço, meu verdadeiro e caro Mestre Macer, de ter vin
do e de ter me trazido essa erva muito nobre e para meu corpo caridosa
e curativa. Explica-me se ela foi batizada por alguém com outro nome.
E Macer: Ela é igualmente nomeada raiz de Mambré, por ter sido
encontrada no Monte Mambré, onde cresce.
A nobre Alquimia disse então com alegria: Ó Mestre de vasta ex
periência, eu lhe faço desde já o pedido: não demore mais, e envolva
logo energicamente meus membros enfermos com as raízes de Mambré
234 Filosofar pelo Fogo
*
* *
ao melhor, todavia ela deixou alguns na sua imperfeição, sendo sua causa
a impureza das matrizes, não a matéria, pois ela é a mesma. Ora, esse cor
po deseja duas ervas para curá-lo. E preciso observar que é uma similitu
de, tomada pela conveniência das circunstâncias da Matéria dos Filósofos
com a dos planetas; pois assim como os planetas têm a faculdade de ve
getar, assim também essa Pedra tem a potência de crescer e de aumentar
até o infinito (maneira de dizer) caso ela seja ajudada. Aliás, assim como
com as plantas nós preparamos remédios que curam as doenças do corpo
humano, da mesma maneira essa Pedra cura as doenças dos metais. Ora,
quanto ao fato de existirem duas ervas, é preciso compreender a Matéria
que, sendo de duas substâncias, tem apenas uma mesma raiz considerada
como o Espírito universal, que alguns chamaram Montanha de Satur
no, e outros, seu Enxofre perfeito, que participando da natureza do Fogo
ocupa o lugar mais alto e mais eminente de todos os seus companheiros,
assim como as montanhas em relação aos vales. Além do mais, podemos
dizer o que essas duas ervas significam: uma, a obra ao branco; a outra,
ao vermelho; a Montanha, que é dupla, o lugar de onde são retiradas, ou
seja, os metais e os fornos. Que observemos sobre esse assunto os Filó
sofos que em sua maioria consideram os metais e os fornos* como suas
montanhas: quanto aos primeiros, ainda mais que a fermentação de nossa
massa é retirada deles, pois a Natureza se regozija em sua Natureza e ao
se regozijarem [eles] se conjugam, ao se conjugarem [eles] se colorem e
se perfazem, etc. Quanto aos segundos, é neles e com eles que essa rara
operação se perfaz, com a qual os corpos dos metais acima citados sc
curam, e deixam ricos para sempre aquele que os possui [...]. A glória seja
dada ao Trino-um, para sempre, Amém.
David dc Planis Campy, L'Ouverture de 1’Escolle de
Philosophie transmutatoire tnétallique (1633),
tn (Euvres (1646), p. 679-680.
*
* *
Fábulas e alegorias
_/Weu Filho, compreendendo esse pequeno resumo, você poderá fa
cilmente conciliar os Filósofos, que, com efeito, possuíram a mesma
Sabedoria; só há uma verdade, mas suas vestimentas são diversas: se
um filósofo pomposamente a apresenta paramentada de finas pedrarias
e do mais puro Ouro; o outro, também verídico, cobre-a com o lodo e o
Filosofar pelo Fogo
o ua. .
Do sangue do Dragão nasce o Mercúrio dos Filósofos: Ripley Scrowle, 1588.
Geometria divina e visionária: William Blake, Europa, 1794.
9
Sonhos e Visões
Um homem está ali, transparente, no calmo da noite.
Seu corpo está vestido de verde. Suas partes mais ocultas
aparecem aos meus olhos. Sua cabeça altaneira está coberta
por uma preciosa coroa. Uma estrela a sobrepuja, ela reluz
nas trevas. Enquanto cu o interrogo, ele me ordena a
segui-lo.
Daniel Stolcius, ViriJahurn cbymicutn (1624).
-245-
246 Filosofar pelo Fogo
Visões
itágoras diz: Nós já escrevemos tudo sobre como essa preciosa ár
vore deve ser plantada, com medo que ela morra, e como o fruto, após as
Sonhos e Visões
wTwl o Rei os ouviu falar, veio até nós e disse: Quem vos
trouxe a nós? E lhe respondemos: Nosso Mestre,
a cabeça dos Sábios e o fundamento dos Profetas,
i. P1TÁGORAS, que ele nos enviou para vos oferecer
AuxgoriaAris. um dom muito grande. E o Rei perguntou: Onde está
\io . esse dom? E eu disse: A oferta e o dom estão ocultos,
Parábola alegórica de e não descobertos. E ele diz: Dê-os para mim agora,
Arisleus: A concepção senão eu vos matarei. Eu respondi: Nosso Mestre por
e o noivado sefazem nosso intermédio vos envia a Arte de engendrar e de
na decadência e a plantar uma árvore, e aquele que comer do seu fruto
geração das gerações não terá fome. E o Rei me respondeu: Vosso mestre
no ar. me envia um grande dom, se é assim como dizeis. E
eu digo: Nosso Mestre jamais o enviaria nem nós o
revelaríamos por nada, caso nesse país já soubessem algo sobre essa
árvore; pois, se já tivesse sido mencionada, jamais o teríamos feito.
Mas, para que a Ciência não perecesse, e que fosse conhecida em todo
o país e terras, nosso Mestre, que é o Mestre dos Sábios e dos Filósofos
a quem Deus fez mais dons do que a qualquer outro homem depois de
Adão, aqui nos enviou para que a comunicássemos a cada um em um
país. E o rei disse: Diga-me o que é. E eu disse: Senhor Rei, ainda que
sejais Rei, e vosso país bem fértil, todavia vós usais de um mau regime
nesse país, pois vós reunis os machos com os machos, e sabeis que os
machos não engendram: pois toda geração é feita de homem e de mu
lher. E quando os machos se reúnem com as fêmeas, então Natureza se
regozija em sua natureza. Como então, quando reunis indevidamente as
naturezas com as estranhas naturezas, esperai engendrar algum fruto? E
o Rei disse: O que é conveniente reunir? E eu lhe disse: Traga-me vosso
filho Gabertin e sua irmã Béya. E o Rei me disse: Como tu sabes que o
nome de sua irmã é Béya? Eu creio que tu és mágico. E eu lhe disse: A
Ciência e a Arte de engendrar nos ensinaram que o nome de sua irmã é
Béya. E ainda que ela seja mulher, ela o corrige; pois ela está nele. E o
Rei disse: Por que tu queres tê-la? E eu lhe disse: Pois não se pode fazer
uma verdadeira geração sem ela, e nenhuma árvore pode multiplicar.
Então ele nos enviou a dita irmã, e ela era bela e branca, suave e delica
da. E eu disse: Eu reunirei Gabertin e Béya. E ele respondeu: O irmão
leva sua irmã, não o marido sua mulher. E eu disse: Assim fez Adão;
é por isso que somos vários filhos, pois Eva era da mesma matéria de
Gabertin, o belo e resplandecente. Mas ele é homem perfeito, e ela é
Sonhos e Visões
251
■p
JL/ sta visão, que aqui descrevo, apareceu à minha vista cansada durante
certa noite em que eu estava ocupado com meus livros.
Vi um Sapo vermelho beber o suco de uvas com tanta avidez e energia
até ficar saturado e então morrer. E do seu corpo envenenado ele lançou um
veneno mortal; a dor que sentiu fez com que todas as partes de seu corpo
começassem a inchar. Ele se aproximou de sua caverna secreta, gotejando
um suor infecto e, com os vapores fedorentos e fumcgantes de seu hálito,
envenenou toda a sua toca.
Desses vapores se formou, após algum tempo e no mesmo lugar,
um humor dourado; humor que escorria do alto da abóbada, manchava a
terra com um orvalho de cor vermelha. Quando seu corpo começou
a perder as forças, o hálito vital lhe faltou. E esse Sapo moribundo
tornou-se então semelhante ao carvão (por causa de sua cor negra); e
permaneceu assim submerso no dilúvio envenenado de suas próprias
veias, e durante o espaço de 80 dias ficou cozinhando.
Quis tentar expulsar esse veneno, e para isso coloquei sua carcaça
sobre um fogo lento, o que produziu uma coisa surpreendente de se
ver, e mais ainda de se contar. Esse Sapo estava penetrado em todas as
partes por cores raras, e quando toda essa diversidade de cores passou,
o branco apareceu. Em seguida se tingiu da cor vermelha, e permaneceu
para sempre nesse estado.
Em seguida fiz uma Medicina com esse veneno assim preparado; des
se veneno, eu digo, que mata e que cura aquele que se atreve a tomá-lo.
Glória àquele que oferece seus segredos, honra e louvores eternos,
com ações de graças. Assim seja.
Gcorge Riplcy, tn Filosofia natural dc
três antigos Filósofios (1682), n. p.
*
* *
JPrimeiramente, o Sol e a Lua surgiam com todo o firmamento, depois
se imobilizavam: certamente eles tinham uma cor, mas estavam privados
de qualquer brilho. Acima deles tomavam-se igualmente visíveis um globo
da cor da terra. Em seu centro se encontrava uma pequena esfera, mui
to branca e cintilante como a neve. Enquanto eu contemplava tudo isso,
produziu-se um terrível trovão acompanhado de uma grande rachadura e
de um brilho de fogo, que me fez sentir um imenso terror. Ali também
se encontrava uma enorme nuvem e, quando esta se dissipou, tomava-se
visível acima do Sol, da Lua e de todo o firmamento uma estrela cujo bri
lho tinha uma claridade tal que nela não conseguiria fixar meu olhar, tan
to seu vermelho superava o do Sol. Assim que essa estrela surgiu, todo o
r
I
Sonhos e Visões
253
Sonhos
trancados durante nove meses, e durante esse tempo fazem todos esses
belos móveis que me mostraram. Ao final desse prazo, os dois saem
unidos em um mesmo corpo; e, tendo apenas uma alma, são apenas
um, cuja potência é muito grande sobre a Terra. O Hagacestaur serve-se
deles então para converter todos os maus, que estão cm seus sete reinos.
Bcrnard IcTrévisan. O Sonho verde (scc. XV).
in William Salmon. Biblioteca dos Filósofos Al.jutmtcos,
t. II. p. 437-446.
*
* *
d^erta vez, navegando do Polo Ártico ao Polo Antártico, fui lançado,
nome próprio é a Agua de nosso mar, a Agua de vida que não molha as
mãos. Perguntei-lhe ainda: Outras pessoas além dos Filósofos a usam
para outra coisa? Toda criatura (ele diz) a usa, mas invisivelmente. Nasce
alguma coisa nessa água?, eu lhe disse. Dela se fazem todas as coisas que
vivem nela, disse-me, mas não há nada propriamente nela, a não ser
que é uma coisa que se mistura com todas as coisas do mundo. Pcrgun-
tei-lhc: Ela é útil no fruto dessa árvore? Ele me diz: Sem esse fruto ela
nào c útil para essa obra: pois ela só se aperfeiçoa com esse único fruto
dessa Árvore solar.
E então eu comecei a pedir: Senhor, por favor, nomeie-a para mim
tão clara e abertamente que eu não possa duvidar. Mas ele, aumentando
sua voz, gritou tão forte que me despertou: e por essa razão nào pude
lhe perguntar nada mais e que ele não desejou mais responder, nem eu
também não posso lhe dizer mais. Contente-se com o que lhe disse, e
creia que não é possível falar mais claramente. Pois, se você não com
preende o que declarei, jamais entenderá os livros dos outros Filósofos.
O Cosmopolita. Nova I.uz ALjuíniúa
(Novutti Lumen chymicutn, 1609), in Jean-Jacqties Manget,
Bibliothaa Chanica Curiosa c. II, p. 474-475.
*
* *
^.L^endo adormecido de um profundo sono, por volta da meia-noite
me pareceu ver o Senhor que tinha descido do céu envolto por uma
chama mil vezes mais pura do que aquela que vemos sair das coisas que
queimamos. Nove anjos o acompanhavam e estavam de joelhos diante
dele, rogando para que quisesse aperfeiçoar e realizar o número, assim
como ele tinha tido a misericórdia de querer lhes fazer esperar. O Se
nhor lhes respondeu: “Vós pedis uma coisa que vos causará dor”; e eles
responderam: “Não importa, Senhor, vossa glória será ainda maior”, e
se prosternaram diante do Senhor, de cujo interior saiu um vapor diluí
do que se condensou em uma água muito tenebrosa sobre a qual lançou
seu olhar, e no mesmo instante saiu dessa água uma grande luz que se
dividiu e tomou a forma de quatro homens carregando cada um uma co
roa; eles se olharam por um momento e se abraçaram com tanta força,
que, mesmo tendo apenas como armas seus membros, se entremataram
e permaneceram mortos no local, mantendo-se tão estreitamente liga
dos após sua morte que não desuniram mais. Então Deus lançou sobre
eles um pouco de fogo e de água e deles saíram três novos homens
armados, mais fortes e mais robustos do que os primeiros, que, assim
262 Filosofar pelo Fogo
*
•k *
á dois dias, ao dormir, pensei ter visto Vénus nos braços de Mar
te. Vulcano, infelizmente para eles, surpreendeu-os , no exato instante
em que estavam no auge de suas carícias; e para se vingar dessa afronta
atravessou o peito dos dois com um forte golpe de punhal. Logo o san
gue escorreu de suas veias e foi dar no mar, que acabou tingido com
sua cor. Netuno, surpreso com tão abrupta mudança, e para saber sua
causa, partiu naquele mesmo instante; e como ele percorria a margem,
lançou seu olhar para o lugar onde Vénus e Marte tinham permaneci
do, e os viu estendidos mortos sobre a areia ainda ensanguentada. Esse
triste espetáculo o tocou sensivelmente, mas, vendo-se na impotência
para poder remediar a situação, ele bruscamente lançou com cólera seu
Tridente ao mar, na própria presença de Vulcano. Esse golpe, assim
lançado com tanta precipitação e força, remexeu tanto com as ondas do
mar que este espumou por todos os lados; e para marcar ainda mais sua
perturbação, ele encheu o ar com vapores malignos que o infectaram
Sonhos e Visões
263
com seu mau odor, e que em seguida formaram uma nuvem espessa
tão desagradável que Júpiter ficou indignado. Vulcano apercebeu-se
disso e, com medo de que Júpiter não o acusasse de ter causado essa
desordem, retirou-se sutilmente para junto de Mercúrio e lhe pediu, se
fosse possível, acalmar logo essa tempestade. Solícito, Mercúrio logo
se levantou sem hesitação no ar e, passando através dessa nuvem, co
meçou pouco a pouco a dissipá-la: o mar logo se tornou mais calmo, e,
de sanguinolento que estava, surgiu sob um belo véu branco tão claro
quanto a mais bela e a mais pura água de rocha. Então Saturno, que
acabara de chegar, logo se dirigiu a Mercúrio e lhe disse admiravelmente
que na verdade ele fizera muito em ter assim purificado o ar, mas que lhe
suplicava de querer em seu favor desviar de cima do mar esse belo véu
branco que o ocultava, para que assim todos que ali estavam reunidos
pudessem vê-lo sem impedimento e até mesmo se banharem se assim
lhes parecesse adequado. Mercúrio assim o fez com toda diligência e o
bom sucesso que Saturno esperava. Todavia Ceres, que se amedrontara
de não ver mais frutos sobre a terra, não demonstrou estar de acordo; é
por isso que Mercúrio tentou consolá-la e, para consegui-lo, mostrou-
lhe no mar uma infinidade de flores que um suave Zcfir ali tinha seme
ado e lhe garantiu que, não obstante isso, ainda restava o suficiente nas
árvores para que elas carregassem frutos em abundância. Ainda que
Ceres estivesse bastante persuadida da boa amizade de Mercúrio, tanto
quanto de sua sinceridade, no entanto não acreditou muito em suas pa
lavras e porque ela conhecia o prazer que ele tinha em fazer mensagens,
suplicou-lhe que no momento oportuno, e para acabar com a dor que
a atormentava, ele mesmo fosse então colher os mais belos e melhores
frutos, para ser apresentados em um festim que ela decidira fazer aos
deuses e às deusas. Mercúrio logo tomou o bastão de Caduceu* e se
pôs a caminho; mas sua viagem, ainda que longa, não teria tido todo
o sucesso que Ceres esperava dela se Apoio não o tivesse ajudado em
sua empreitada. Em seu retorno, Ceres pegou o fruto e, começando por
Diana, apresentou-o a todos os deuses e deusas, e colocou-o enfim na
boca de Marte e de Vénus, que no mesmo instante ressuscitaram. Fiquei
surpreso ao despertar em sobressalto e, com medo de esquecer um so
nho tào misterioso, logo me levantei para escrever e partilhar com os
curiosos.
“Sonho filosófico”,
in O Túmulo da pobreza
pelo Filósofo desconhecido (1672), n. p.
264 Filosofar pelo Fogo
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Eleaaentos e Princípios
Efetua primeiro a rotação de teus Elementos, c converte
antes todas as coisas da Terra cm Água; extrai cm seguida
o Ar de tua Água, pela levigação,* c reduz teu Ar cm Fogo,
tu serás entào mestre de todo o nosso Magistério.
* *
Bela diz: Você aconselhou bem os discípulos. Mas eu lhe digo que
Deus criou o mundo de quatro Elementos, e o Sol é seu Mestre c Se
nhor; mas vemos apenas dois: a Terra e a Água. E existe um Ar preso
na Água, e outro na Terra, e o Ar é tirado do Fogo, que mantém a Terra
no Ar, e a Terra mantém a Água e o Fogo acima do Ár. A Terra e o Fogo
são amigos; o Ar e a Água são amigos; o Fogo é amigo da Água pelo
Ar. e o Ar é amigo da Terra pela Água; e a Água mantém o Ar acima c
abaixo, e a Terra mantém o Ar, e o Ar também mantém a Terra. O Fogo
é mantido na Terra, e o Ar o abre e o prende na Água; e a Água o abre
para o Ar, e o coloca no Ar, que está preso na Terra, pelo Fogo que ali
também está preso. O Ar abre, e o Fogo fecha a Água no Ar, e o Ar abre
o Fogo na Terra. Bendito seja aquele que ouve minhas palavras; pois
jamais homem falou mais claramente.
A Assembleia dos l ilósofos
(Turba Philosopborum, séc. XII), in William Salmon.
Bibhoteea dos Filósofos Al<]uitnieos, t. I, p. 24.
*
* *
\/eja, mestre, o que você faz, você senhor e tirano de minha alma,
ao me distanciar da grandeza da filosofia e me dire
cionar para a arte que no fogo e nos fornos consis
te, ao me engajar, para permutar as matérias e para
transformar as naturezas das coisas? Pois ainda que
tudo isso convide a considerar que essa ciência tende
principalmente para a filosofia natural, a maior parte
a considerara mística e oculta e nào estava disposta
a colocá-la entre as ciências racionais. Na realidade, | AUchael Psellvs
eu mesmo sou há muito tempo admirador dessa ope
ração; e como ela não reteve meu espírito pelo uso Michel Psellus,
das palavras, em consequência eu a julguei extraor filósofo: Alma e Na
dinária, tendo a bem dizer me engajado nessa tarefa tureza fazem descer
na companhia de certo Euristeus, a fim de transferir, Deus dos céus.
graças ao movimento giratório das coisas, dos ouros
de má qualidade ou o chumbo em ouro ou em estanho, ou em qualquer
outra das coisas naturais comumente realizadas nessa obra. Por isso me
empenhei antes em descrever a função dessa arte, buscando as causas
das coisas que por meio dela são feitas, para que se encontrasse um mo
tivo conforme a razão dos fatos que a partir daí se produzem, para que
270 Filosoi-ar pelo Fogo
*
* *
(Saiba então que nossa Ciência consiste no conhecimento dos quatro
espécies de metais não podem se transmutar, a não ser que sejam reduzidos
em sua primeira Matéria; redução de que falaremos em seguida.
A multiplicação dos metais é fácil, mas não sua transmutação, pois
toda coisa que nasce na Terra, e ali cresce, se multiplica; o que pode ser
visto nas plantas, nas árvores e nos animais; pois de um grão outros mil são
engendrados; de uma árvore procedem mil ramos, ou melhor dizendo, uma
infinidade de outras árvores; e de um único homem se faz a procriação de
todo o gênero humano.
Portanto, todas as coisas aumentam e se multiplicam por meio de sua
espécie, da mesma forma o metal pode aumentar e se multiplicar, e isso
sem nenhuma diferença. Aristótelcs pergunta se esse aumento e multiplica
ção acontecem nas minas naturais ou artificiais. Ora, já está bem estabeleci
do que todos os metais nascem c crescem na Terra. Portanto, é possível que
neles aconteça um aumento e uma multiplicação infinita. Mas isso só pode
acontecer pelo que é aperfeiçoado na Lua, ou ordem dos metais, cm cuja
geração e aperfeiçoamento o Elixir dos Filósofos é a perfeita Medicina, c
que só se pode conseguir fazer por um meio próprio ou coisa interposta,
porque não existe nenhum movimento de uma extremidade à outra senão
por um meio que lhes é próprio. Eu conheci a natureza desse meio, ou coisa
mediante, que contém as extremidades, que são o Enxofre e o Mercúrio. De
um e de outro se faz e se realiza o Elixir pela coisa mediante, que natural
mente deve ser mais purificada, mais cozida, mais bem digerida, melhor,
mas perfeita, e consequentemente mais próxima.
Assim, meu caro Leitor, cuide para não errar e faltar, pois o homem
recolherá apenas o semelhante do que ele semeou. Então, agora você
vê o que é a Pedra dos Filósofos e conhece os meios pelos quais é pos
sível fazê-la. Lembre-se sempre de que nada de estrangeiro é colocado
nem acrescentado em sua composição e, ao contrário, as coisas imperfeitas
devem ser retiradas: e que nada convém ao nosso segredo, senão o que
é próximo e de sua natureza. Venho portanto explicar-lhe as sentenças c
os ditos dos Antigos, com suas palavras obscuras e ocultas sob enigmas e
parábolas. E o faço para que você julgue que bem compreendi a doutrina
dos Filósofos, e que compreenda que tudo o que eles escreveram é verdade.
Nicolas Flamel, O Desejo desejado (Scc. XIV),
in Wtlliam Salmon. Biblioteca dos Filósofos ALjuhnicos,
t. II, p. 286-289.
*
* *
274 Filosofar pelo Fogo
ueles que, por menos que tenham ouvido falar das coisas naturais,
sabem bem que no início do mundo Deus todo-poderoso separou teus
Elementos do caos informe; que ele colocou a Terra no fundamento ou
centro; que sobre tua terra ele colocou a água; sobre a água, o ar, e sobre
o ar, o fogo. De tal forma que cada um tem sua sede e seu receptáculo,
de onde não sai sem a ordem de Deus. Ora, nós achamos que existe tal
comunicação entre eles, que um não é nada sem o outro; e se existe
um que predomina em alguma parte, os outros estão ocultos nele, daí
podem ser retirados pela engenhosidade. Assim, da terra nós tiramos
a água, o ar e o fogo; da água, a terra, o ar e o fogo; e do fogo, o ar,
a água e a terra. Assim os Elementos se convertem e passam de uma
espécie à outra, e cada um deles recebe e dá a vida a seu companheiro
reciprocamente. O fogo não poderia queimar sem o ar; o fogo age sobre
a água, e dela faz o ar; a água repousa na terra, à qual dá a umidade; o
fogo engrossa o ar; o ar escorre sua semente na terra, a terra alimenta
Elementos e Princípios 279
*
* *
J^^ão podemos ignorar que são Três os Princípios de todas as coisas,
presentes em toda composição. De fato, é evidente que aqueles, em que
estão dissolvidos os corpos naturais, bem como as partes a partir das
quais eles continuam, existiam desde o início de sua composição; de
forma que nenhum corpo composto pela operação da Natureza pode
ser artificialmente dissolvido e dividido em mais ou menos do que Três.
Mercúrio, ou licor, Enxofre, ou óleo, e o SaT, pois nesses três não im
porta qual coisa criada é engendrada e conservada. Ao proferir seu tri
plo verbo Fiat, a Santa Trindade dotou, com efeito, todas as coisas de
triplicidade, assim como testemunha a análise espagírica:* por seu ver
bo Fiat, Deus produziu a matéria-prima, tripla antes em razão dos três
Princípios constitutivos, e isso mesmo depois que essas três espécies
tenham sido separadas em quatro corpos diversos ou Elementos, como
se um artesão experiente preparasse o mínio a partir do chumbo, a ce-
rusa, o vidro e o Espírito de Saturno. Da mesma forma o mundo não é,
junto com os corpos criados, nada mais do que uma fumaça coagulada
a partir dessas três substâncias: essas três (Enxofre, Sal e Mercúrio) são
de fato a matéria de que todos os corpos foram criados, o que podem
mostrar e provar os Espagíricos por meio de uma experiência visível e de
uma demonstração irrefutável; pois na madeira verde residem igualmen
te três espécies de umidade: a primeira, aquosa, corresponde ao Mercúrio
fugitivo que preserva a madeira da combustão; a outra, absolutamente
Elementos e Princípios 281
•fc
* *
C-)ue os amantes dessa Santa Ciência saibam, portanto, que exis
para que a vontade do Altíssimo (da qual depende toda a Natureza) fos
se realizada, ela ordenou que cada um desses quatro Elementos tivesse
de agir incessantemente no outro. O Fogo começou então a agir no Ar,
e isso produziu o Enxofre; o Ar semelhantemente começou a agir na
Água, e essa ação produziu o Mercúrio. A Água também começou a
agir na Terra, e isso produziu o Sal. Quanto à Terra, não encontrando ne
nhum Elemento no qual agir, ela não produziu nada, mas reteve em seu
seio o que os outros três Elementos tinham produzido: Esta é a razão
pela qual só surgiram três Princípios, e por que a Terra foi considerada
como a matriz e a alimentadora dos outros Elementos. Três Princípios,
assim como nós dissemos, foram produzidos, e que os antigos Filósofos
não consideraram de forma tão estrita, eles que descreveram apenas
duas ações dos Elementos (e se ignoraram isso, quem os julgará então
quando dedicarem seus escritos aos seus filhos?) e afirmaram, e isso
nos basta, que o Enxofre é junto com o Mercúrio a matéria dos metais,
ou melhor, da Pedra dos Filósofos.
O Cosmopolita (Michacl Scndivogius dit),
Tratado do Enxofre (Tractatus dr Sulpbure, 1609),
in Jean-Jacques Manget, Bibliotheca Chnnica Curiosa,
t. II, p. 480 c 485.
*
* *
JE/ stá claro em segundo lugar que todos os compostos desses quatro
Elementos se reduzem em três Princípios, a saber, em Enxofre, Sal e
Mercúrio, que segundo suas diversas misturas compõem todas as coisas
sublunares, ainda que infinitas em número, proporções e virtudes. É um
belo assunto de meditação, e digno motivo para admirar o Autor da Na
tureza, observar essa grande variedade de flores e de frutos, de pedras
e de metais; essa diversidade de espécies entre os animais não provém
senão da mistura das três coisas. Essa variedade parece muito evidente,
uma vez que na resolução de todos os compostos vemos essas três coi
sas, e nada mais: vemos uma parte terrestre, uma aquosa e uma sulfu
rada; vemos uma alma, um corpo e um espírito; e nesse ternário vemos
também o quaternário das quatro qualidades e Elementos. O corpo é
composto de terra e de água, e o chamamos Sal; o espírito é composto
de água e de ar, e o chamamos Mercúrio; a alma é composta de ar e de
fogo, e a chamamos Enxofre. O Sal é a matéria, o Enxofre é a forma e
o Mercúrio é o meio que une. Pois como o corpo e a alma participam
das qualidades demasiado distantes e opostas, o Mercúrio que participa das
Elementos e Princípios
283
*
* *
163. Sem dúvida, trata-se de Christian Adolphe Balduinus, autor da obra Aureum superíus
et inferius, publicada em 1679.
164. Força de inclinação, de motivação, aqui relacionada ao deus Marte (Ares), associada
pelos alquimistas ao ferro.
286 Filosofar pelo Fogo
jje pela arte uma coisa qualquer é reduzida a cinzas, ela entrega por si
mesma seu sal: pois, se você consegue, na análise desse corpo, conser
var separadamente o Enxofre e o Mercúrio, e depois restituí-los ao seu
sal segundo a exigência da arte, então, a partir daí, com a ajuda do fogo
poderá novamente ser feito o que já existia antes da destruição ou aná
lise desse corpo: e isso é o que os prudentes deste mundo denominam
besteira e consideram como vaidade, nomeando-a uma nova criação
que não é permitida ao pecador por Deus; mas estes não compreen
dem que o que parece ter sido criado já existira antes, e que o artista
demonstra sua maestria graças à semente da natureza e ao aumento que
ele pode lhe oferecer.
Por isso, um artista que não guarda a cinza também não pode con-
feccionar o sal a partir de nossa arte, pois sem o sal nossa obra corpórea
não pode ser realizada: somente o sal opera, com efeito, a coagulação
de todas as coisas.
♦ N.T.: Termo de alquimia. Sabào dos filósofos, o mercúrio.
288 Filosofar pelo Fogo
* *
! ■ ■ * •*. y.
*?
í
£
'14 mina de nosso Mercúrio é nosso salitre, não o do vulgar Siméon Ben Cantara,
Cabala mineralis, séc. XVII.
Elementos e Princípios 293
- 294 -
z\ Obra do LeAo Verde 295
Metamorfose da prata-viva
c(Jobre o Mercúrio maravilhoso. Seus primeiros nomes, em grego, são
os seguintes: enxofre, arsénico, sandáraca.
Apesar da diversidade desses nomes, é a mesma matéria. De fato,
quando a natureza recebe alguma coisa contrária e a ela se assimila, for
tifica-se: essa coisa não é expulsa, porque ela toma e é tomada. É dessa
forma que escondemos o nome do Mercúrio e que o tornamos obscuro.
Da mesma forma o ziouqa (nome siríaco do Mercúrio) varia
de nome, de acordo com as diversas tradições; às vezes ele é chamado de
zioug e às vezes de ziouq, e prata líquida, água de prata, matéria que
branqueia o cobre, nuvem branca, corpo que foge do fogo, enxofre,
arsénico, sandáraca, e água de todos esses, água de enxofre clarificado,
mistério revelado, água de cobre e água de fogo, água de vidro, selcni-
ta (acppoÉXrvuoD), espuma de mar, espuma de rio, espuma de todas as
espécies e de todos os animais, principalmente do cão raivoso, água do
rio e do orvalho, mel ático - aquele que é intermediário de todas as
coisas e de todos os méis -, água de Saturno, isto é, provada pelo chum
bo (Saturno), crisócalo; água que serve para a ferrugem e as escritas.
Ele ainda é chamado o fiel de todos os animais, o fermento, e leite
de todos os animais, leite de resina de todas as árvores e todas as plan
tas, por causa de sua formação e de suas relações com o leite. Dizem
que também é chamado de urina do filho dos tetos (demónio lunático);
e ainda,o que se dissolve e escorre; transparência (ôíoyiç) e nuvem, e
todos os vapores do enxofre suspenso.
É com razão que o chamamos enxofre suspenso, porque, quando é
aquecido, encontramo-lo suspenso na tampa do vaso.
Essa substância não carrega um nome único, mas seus nomes são
inúmeros, porque ela não é de uma única espécie e representa inúmeras
espécies, de que cada uma é diferente das outras.
296 Filosofar pelo Fogo
*
* *
IE/ m um distante país do Ocidente, ali onde se encontra o estanho, exis
te uma fonte que sai da terra e faz surgir o mercúrio como água. Quando
os moradores desse lugar veem que ele está no ponto de se espalhar para
fora da fonte, escolhem uma jovem notável por sua beleza e a colocam
diante dele toda nua para que ele se encante com a beleza da jovem.
Ele se atira sobre ela de um salto, buscando aprisioná-la, mas a jovem
escapa com um passo rápido, enquanto os jovens se mantêm perto dela
carregando machados em suas mãos. Assim que o veem se aproximar
da jovem, eles o atingem, cortam-no, e então ele vem e por sua própria
conta entra no buraco preparado e por si mesmo se fixa e endurece.
Fcrnand de Mcly, A Alquimia entre os chineses e a alquimia grega,
in Os lapidarias da Antiguidade e da Idade Média, 1895, t. 2, p. 24.
*
* *
_j/\jguns, e até mesmo bem numerosos, querem então trazer a con
tradição, e particularmente aqueles que não compreendem nada dessa
Arte e não conhecem as naturezas dos metais, ignorando o que lhes é
intrínseco ou extrínseco, e muito pouco instruídos sobre suas dimen
sões e profundezas. A esses portanto, objetando, segundo Aristóteles,
sua certeza de que os artifícios da Alquimia não podem permutar as
espécies das coisas, é preciso responder o que disseram aqueles que
têm fé nessa operação e querem por isso transubstanciar os metais cor
rompidos: que isso é sem dúvida possível, mas com dificuldade. Que
então eles compreendam os seguintes propósitos de Aristóteles: que a
experiência destrói a forma das espécies, e particularmente nos metais.
Pois é verdade que, quando um metal é calcinado, se torna assim cinza
e cal, que é terrificada, lavada e queimada com uma água ácida até que
se torne branca e viva: assim, pelas calcinações e medicinas diversas
rejeitam a umidade corrompida e adustiva* e adquirem uma umidade
aérea que vivifica os próprios corpos; e a cal purificada é reduzida em
A Obra no LeAo Verde 297
uma massa sólida que pode receber a tintura branca e vermelha. Desse
fato, Hermes diz que os corpos nào podem penetrar os espíritos caso
não tenham sido purgados, e só os penetram com uma água doce. E
Aristóteles diz: Não creio que os metais possam ser transubstanciados
se não são reduzidos em sua primeira matéria, isto é, purificados de sua
corrupção pela adustão* do fogo. Mas quero de maneira mais convin
cente ainda objetar aos contraditores e incrédulos, pois aquilo sobre o
que falamos nós o vemos, e o que vemos, testemunhamos.
Vemos, com efeito, as diferentes espécies receberem em diversos
tempos formas diversas: assim como pelo Arsénico,* que é vermelho, e
por uma decocção constante se tornará negro, e pela sublimação o bran
co, e sempre da mesma maneira. Ora, alguém francamente afirmava que
tais espécies podem ser facilmente transmutadas de uma cor em outra,
mas que essa operação é irrealizável nos metais. Para esses eu respondo
a partir de uma razão manifesta e por diversas provas e evidencias, que
destroem totalmente seu erro: Vemos, com efeito, que o azul é engen
drado da prata que é chamada transmarina; e ainda que seja perfeita
de natureza e isenta de corrupção, ela aparece mais facilmente, c isso
consiste em destruir acidentalmente mais que cssencialmcnte.
Vemos também o cobre receber a cor citrino de uma pedra
calaminada;166 a qual adquire assim uma perfeita neutralidade e não se
torna nem cobre nem pedra calaminada, pois nas duas o fogo age. Ve
mos o estanho se tornar litargírio, e ser mudado na cor do ouro por uma
forte decocção, ainda que também tenha sido bem possível converte-lo
na espécie da prata que é da mesma natureza dele. Vemos o ferro con
vertido em Prata-viva, o que é considerado por alguns como impossível;
e eu disse anteriormente a razão pela qual isso é factível. Mas a partir
daí, como a Prata-viva é a origem de todos os metais, é igualmente pos
sível reduzir o ferro em Prata-viva. Seria graças ao vaso* que contém
a água em estado líquido e que durante o inverno não se endurece pela
excessiva frieza e se torna gelo? Será que o gelo não se dissolve pelo
calor do sol até se tornar água como antes? Isso é o que acontece com
a Prata-viva em toda parte onde ela reside na terra; e se lá também se
encontra o enxofre, então esses dois são reunidos e endurecidos durante
um tempo bastante longo por uma decocção muito temperada, e assim
será confeccionada a pedra mineral de onde se extrai o metal. Vemos
também que do chumbo é feita a cerusa; da cerusa, o mínio; e do mínio,
o chumbo. Eis, portanto, provado de forma bastante clara que as espé
cies podem ser permutadas de cor em cor até a terceira ou quarta forma.
Sendo assim, é bem plausível que os metais corrompidos possam ser
166. Transformada cm carvão pela combustão.
298 Filosofar pelo Fogo
*
* *
forma, para que ele faça obra viril. Pois até que a criança, isto é, nossa
Pedra, esteja em forma e fermentada com seu semelhante, a saber, com
o sangue verde do Dragão verde, e com o sangue vermelho do Dragão
vermelho - que a Pedra seja branca, ou que ela seja vermelha ele
jamais poderá fazer uma obra perfeita. Compreenda então, filho, que a
primeira água é essa água e esse leite que Deus formou a partir da natu
reza, e que é a causa da geração, como disse anteriormente. Na verdade,
naquele momento, após a conjunção que se faz desse casamento, eles
engendram a água da vida e o leite dos Filósofos, com o qual ou com os
quais você aumentará e alimentará indefinidamente sua Pedra.
Gcorge Riplcy, Livro do Mercúrio c da Pedra dos Filósofos
(Liber de Mercúrio et Lapide Philosophoruin,
in Opera omnia chemica (1649), p. I09-I 10.
Cf também Theatrum Chcimcum, t. III, p. 824.
*
* *
>
304 Filosofar pelo Fogo
enegrecer e por branquear. Mas, então, existe alguém que ignore o que
é o paramento branco dos anjos? E as crianças, que têm pouco uso da
razão, conhecem-nos bem quando os veem pintados com asas. Se eles
têm asas, então esses Espíritos são voláteis.
Vocês podem se retirar agora, vocês que buscam com extrema de
dicação suas diversas cores em seus vasos* de vidro. Vocês que me
cansam os ouvidos com seu Corvo negro, vocês são tão loucos quanto
aquele homem da Antiguidade que costumava aplaudir no teatro, ainda
que estivesse sozinho, porque sempre imaginava ter diante dos olhos
algum espetáculo novo. Vocês fazem o mesmo quando, derramando lá
grimas de alegria, imaginam ver em seus vasos sua Pomba branca, sua
Aguia* amarela e seu Faisão vermelho: vão, eu lhes digo, e retirem-se
para longe de mim, se buscam a Pedra filosofal em uma coisa fixa; pois
assim como ela não faria do corpo de um homem do mundo as mura
lhas mais sólidas, também não penetrará os corpos metálicos.
JacqucsTol, O Caminho do Cni iiLjuúnuv
(Sfanuductio ad Ccrlum Cbemicum),
trad. fr. 1688. p. 22-26.
*
* *
J^epitamos para concluir que o Enxofre e o Mercúrio são a mina de
nossa Prata-viva quando estão conjugados, porque a Prata-viva tem o
poder de dissolver, matar e vivificar os metais; poder que recebe do En
xofre, ácido por natureza. Mas, para que você possa compreender me
lhor, entenda que diferença existe entre nossa Prata-viva e o Mercúrio
vulgar. O Mercúrio vulgar não dissolve o Ouro nem a Prata, de forma
que ele não se separa deles; nossa Prata-viva dissolve verdadeiramente
o ouro e a prata e deles não é jamais separada, não mais que a água
misturada com a água. O Mercúrio vulgar tem em si um Enxofre com
bustível ruim que o escurece; nossa Prata-viva contém um Enxofre
incombustível, fixo, bom, muito branco e vermelho. O Mercúrio vulgar
é frio e úmido; o nosso é quente e úmido. O Mercúrio vulgar escurece e
corrompe os corpos; nossa Prata-viva os branqueia até lhes dar a trans
parência do cristal. E, precipitando o Mercúrio vulgar, nós o converte
mos em um pó cor de limão e em um mau Enxofre, ao passo que nossa
Prata-viva é convertida pelo calor em um Enxofre muito branco, bom,
fixo e fusível. O Mercúrio vulgar torna-se tanto mais fundível quanto
mais é cozido, mas quanto mais nossa Prata-viva é cozida, mais ela
engrossa. Assim você poderá então concluir sobre essas considerações
306 Filosofar pelo Fogo
*
* *
1SJ osso Mercúrio, creio que já o dissemos, é esse peregrino, esse
168. Viatorium: Hoc est de Montibus Planetarum septem seu metallorum, 1651.
308 Filosofar pelo Fogo
*
* *
*
* *
Ty preciso ter o agente, que é o Leão verde, e o paciente, que é seu irmão
uterino, chamado nigrum nigrius nigro,'10 retire dele seu espírito ou a
parte superior da alma pela dissolução, é o Mercúrio dos Filósofos; depois
tire sua alma, que é o óleo, fogo ou enxofre secreto e oculto vermelho e
sangue desse Leão verde; depois retire seu corpo e depois da purificação
reúna-os pela embebição, trituração, dessecação, seja ao branco ou ao ver
melho, desde que ele esteja próprio para fazer a projeção.
Jacqucs Ic Tcsson,
A Obra do Leão Verde (séc. XVI),
ms. n. p.
★
|Saiba então que o Enxofre filosófico não é outra coisa além do fogo
muito puro da natureza, disperso nos elementos, e preso por essa mesma
natureza em nosso sujeito,* e nos vários
outros em que já recebeu alguma cocção, £
pela qual ele é cm parte congelado e fi
xado; todavia, sua fixidez é ainda apenas
potência, porque ele está envolvido por
muitos vapores voláteis, que são causas
que evaporam facilmente e desaparecem
nos ares.
Pois, quando em um sujeito a parte
volátil suplanta a fixa, as duas se tornam
voláteis, e isso acontece segundo as regras
e a possibilidade da natureza. Portanto,
essa luz não se encontra de forma algu
ma, atualmente, fixa sobre a terra, sem
ser suplantada pelas qualidades contrá
rias, fora no Ouro; o que faz com que o
Ouro seja o único de todos os corpos em
que os elementos estão em uma proporção Leão verde brandindo a Terra dos
igual, e consequentemente fixo e constan Sábios: Hermaphroditisches Sonn
te ao fogo. Mas, quando essa virtude fixa und Mondskind. 1572.
é suplantada por uma maior parte volátil
da mesma natureza que ela, e que ela se encontra unida a excremen
tos vaporosos, então perde essa fixidez por um tempo, ainda que esteja
sempre em potência.
Nosso Enxofre, que é requisitado pela Obra, é o esplendor do Sol
e da Lua, da natureza dos corpos celestes, e revestido de um corpo se
melhante. Assim, é preciso que você procure cuidadosamente em que
sujeito esse esplendor pode estar e se ali pode conservar, e saiba
que ali onde está esse esplendor, ali está a Pedra tão procurada. É da
natureza da luz não poder aparecer aos nossos olhos sem estar revestida
de algum corpo, e é preciso que esse corpo também seja adequado para
recebera luz. Ali, portanto, onde está a luz, ali necessariamente também
deve estar o veículo dessa luz.
Eis o meio mais fácil para não errar. Procure então, com a luz de
seu espírito, a luz que está envolvida pelas trevas, e aprenda então que o
sujeito mais vil de todos, segundo os ignorantes, é o mais nobre segun
do os sábios, uma vez que somente nele a luz repousa, e que é por meio
316 Filosofar pelo Fogo
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-319-
320 Filosofar pelo Fogo
artista deve fazer seu forno de acordo com o grau de fogo que ele
quer dar. Assim, se quiser fazer um fogo forte e violento, deve fazer seu
forno espesso, com grandes registros, e suficientemente largo para ter
um grande espaço entre seu vaso sublimatório e os lados do forno. E, se
ele quiser que seu fogo seja medíocre ou fraco, deve dar a todas essas
coisas uma extensão mais medíocre e menor [...].
Se então você quiser fazer uma grande sublimação, deve ter um
aludel tão grande que toda a matéria que você colocará no fundo de
seu vaso só tenha um palmo* de altura. Em seguida você colocará esse
aludel em um forno tão largo que, uma vez o vaso colocado no meio,
ele tenha pelo menos dois polegares de distância entre ele e os lados do
forno, no qual será necessário fazer buracos ou registros que também
sejam espaçados, para que o calor também se comunique em toda par
te. Depois, você colocará uma barra de ferro espessa de um polegar no
meio do forno, apoiando-se firmemente nos dois lados e elevada acima
do fundo do forno de um bom palmo, sobre a qual você colocará seu
aludel, que será reunido a cada espaço ao forno, para que esteja mais
firme. Então, faça um fogo e tome cuidado para que a fumaça saia bem,
e para que a chama se espalhe livremente por todo o forno c envolva o
aludel. Pois, se assim acontece, isso será uma marca de que a proporção
está sendo bem observada [...].
Em relação à espessura do forno, ela depende do fogo que se queira
fazer. Pois, se ele deve ser alto, é preciso que o forno tenha mais espessura
e esta deve ser sempre de um bom palmo. Se for médio, um forno com a
espessura da largura da mão será suficiente. E, se o fogo for baixo, bastará
que o forno tenha duas polegadas de espessura. Essa mesma proporção
deverá ser usada para a madeira de que o artista se serve. Pois a madeira
sólida e estreita faz um fogo forte, e que dura muito tempo. Aquela que
é esponjosa e leve faz um fogo fraco e que não dura muito. A madeira
seca faz um fogo alto, mas de pouca duração. A madeira verde, ao con
trário, faz um fogo fraco e que dura muito tempo [...].
Para ter um bom aludel, ou vaso sublimatório, é preciso que ele
seja de vidro e muito espesso. Pois não seria bom de outra maneira,
uma vez que só o vidro é capaz de reter os espíritos, impedir que se exa
lem e que sejam consumidos pelo fogo, porque o vidro não tem poros,
ao contrário, como os outros materiais são porosos, os espíritos saem
e partem pouco a pouco através deles. Os próprios metais não valem
nada para fazer essas espécies de vasos, pois, como os espíritos têm
uma grande afinidade com eles, penetram-nos, ligam-se a eles e passam
consequentemente com facilidade através, como se pode inferir daquilo
que dissemos antes, e como a experiência o demonstra. Logo, não há
outra matéria além do vidro de que possamos utilmente nos servir para
fazer vasos sublimatórios.
É preciso então fazer uma cucúrbita de vidro, que seja redonda,
cujo fundo não seja muito arredondado, mas quase plano, no meio da
324 Filosofar pelo Fogo
*
* *
JR.esolvemos falar, agora, de nosso vaso. Vocês, filhos da doutrina,
prestem bem atenção, para compreender nosso sentimento e nosso espí
rito. Ainda que tenhamos descoberto vários gêneros de vasos, descritos
enigmaticamente em nossos livros, todavia, nossa opinião é a de não se
servir de diversos vasos, mas de apenas um único, que será aqui exibi
do com demonstrações visíveis e sensíveis; nele nossa obra é realizada
desde o início até o fim de todo o Magistério. De toda forma, nosso
vaso é composto da seguinte maneira: existem dois vasos ligados a seus
alambiques, de mesmo tamanho, quantidade e forma em altura, em que
o bico de um entra no ventre do outro, para que, pela ação do calor, o
que está tanto em uma quanto na outra parte suba até a cabeça do vaso e
depois, pela ação do frio, desça até o ventre. Ó filhos da doutrina, vocês
têm o conhecimento de nosso vaso e não são pessoas de cabeça dura.
Falaremos agora de nosso forno, mas nos será muito desagradável
relatar aqui o segredo de nosso forno, que os antigos filósofos tanto
ocultaram, pois descrevemos em nossos livros vários fornos. Contudo,
Fechamento do Vaso e Cores do Tempo
325
forno.
Explicação dessa Figura, com a maneira do Fogo.
Esse vaso de terra com essa forma é chamado
pelos Filósofos de triplo vaso, pois no meio ele tem
um nível sobre o qual existe um prato cheio de cin
zas mornas, nas quais é colocado o Ovo filosófico,
que é um matraz de vidro que você vê pintado em
forma de Escrivaninha, e que está repleto das formu
lações da Arte, isto é, da espuma do Mar vermelho
e da gordura do vento Mercurial. Ora, esse vaso de
terra se abre por cima, para que se coloque dentro o
prato e o matraz, sob os quais, por essa abertura, se Selo de Nicolas Flamel:
coloque o Fogo filosófico, como você sabe. Assim, O Livro das Figuras
você tem três vasos, e o vaso triplo. Os invejosos o hieroglíficas, séc. XIV.
326 Filosofar pelo Fogo
*
* *
1E/ m relação ao primeiro forno, ele pode ser construído grande ou pe
orifícios dos recipientes, para que assim se possa dar uma suficiente e
justa proporção de ar ao fogo; porém, se o diâmetro é de mais de um pé,
é preciso também que haja dois ou três canos (que, considerados juntos,
também devem ter a largura correspondente à largura da terça parte do
forno; pois é necessário que ele tenha tanto de largura, tanto de ar, para
que o fogo queime facilmente e faça seu trabalho) aos quais é preciso
aplicar vasos da mesma proporção, para que o fogo não se apague.
Jcan Rodolphc Glaubcr,
A descrição dos novosfornosfdosófcos
(1658, trad. do latim cm 1659), p. 5-8.
* *
se unam de tal forma que se tornem um único ser e uma única Pedra, e
é também o que se chama selar a criança no ventre de sua mãe, isto c
dissolver e encerrar o ouro no mais profundo das entranhas do mercúrio
que o produziu.
Crosset dc la Haumcric
(pseudónimo dc François-Maric-Pompcc Colonna),
Os Segredos ntais ocultos da Filosofia dos Antigos
(1722). p. 301-303.
171. Jogo de palavras próprio à Cabala fonética (cf esta palavra no Glossário), mas intra
duzível, uma vez que enxofre se diz em grego Oeiov.
Fech/VMENTO do Vaso f. Cores do Tempo
333
o Rei e sua esposa. Cozinhai-os até que eles se tornem negros, depois
brancos, enfim vermelhos: deles no final será preparado o veneno tingi
do. Da mesma forma é confeccionada a Pedra ao branco pela combus
tão, e pela umidade ou liquefação. Dizem, com efeito, que a água traz a
mortificação que aparece no negror que a precedeu, e na qual o espírito
e o corpo são unidos graças à mortificação: significa dizer que eles são
ressecados, pois, se os corpos não são desmantelados, não aparecem as
cores da alma que são chamadas negror e nuvem. Da mesma forma a
magnésia,* quando foi branqueada, não permite ao espírito que fuja, ele
que pela natureza contém a natureza. A umidade, portanto, que curava
o negror no cozimento, manifesta-se no estado ressecado no momento
em que a cor branca começa a surgir. De fato, eu vi na transmutação do
negror, antes que ele se tornasse perfeitamente branco, uma brancura
sombria que é vulgarmente chamada castanha; ora, dessa sombra casta
nha se realiza em seguida a verdadeira brancura. Durante a cor castanha,
aconteceu que meu mestre quebrou o vaso e a pedra e, examinando-o
tanto no interior como no exterior, descobriu o castanho no exterior
enquanto o negror se encontrava, no entanto, também no interior. Ele
me afirmou que a causa desse fenômeno era certamente que as partes
da matéria que aderiram às paredes do vaso tinham se ressentido mais
do calor que lhes era próximo do que a matéria que estava no meio, e
que por isso elas tinham logo começado a ser transmutadas no calor. E
ele me disse por que essa cor castanha se elevava: porque a brancura
era extraída desse negror, como está dito em A Assembleia', quando de
fato você observar essa ocorrência, saiba que a brancura estava oculta
no próprio ventre do negror que tinha se manifestado antes. Convém
então que você extraia esse negror, e isso pelo negror mais sutil que lhe
pertença: não se espante então se a partir daí eu chamar essa matéria de
pedra. Saiba, com efeito, que pelo tempo que durar a brancura, e mesmo
quando o vermelho for obtido, ela permanece por muito tempo dura e
persiste sob o aspecto de uma massa sólida, até que começa a ser des
truída e muito pouco elevada pela continuação do cozimento.
Arnaud de Villencuvc, Nova Luz
(Novum Lumen, scc. XIII-XIV),
in Jean-Jacques Manger,
Bibliotheca Chemica Curiosa, t. I, p. 678.
*
* *
Fechamento do Vaso e Cores do Tempo
335
*
* *
^JTodos esses movimentos fazem surgir em 40 dias o que os sábios
palácio ornado, depois dos quais ela, assim como tinha surgido, pouco
a pouco desaparece e dá lugar a seu irmào Febo, que vem devagar e só
mostra sua face depois que tiver manifestado os ornamentos de seus men
sageiros, que são violeta envelhecido e escuro, azul, citrino e vermelho, e
só então ele revela seu rosto mais resplandecente que o Sol, seu pai; então,
tudo é feito para que essa operação finalizada, como acabo de dizer, o Trc-
visam a nomeie a fonte onde o rei se banha, e toda essa operação acontece
por si mesma, sem que jamais as mãos a toquem: a natureza, ajudada pela
arte, faz tudo sozinha e sem outra ajuda além dessa que eu lhe digo, e essa
arte ajudando não é outra coisa senão um fogo externo, doce e mais próxi
mo do natural, o qual excita esse fogo natural que está encerrado em nosso
Mercúrio para fazer tudo o que venho de dizer.
CartasJilosóJiais (scc. XVII), ms. n. p.
0 tempo da obra
./Worien: Tome a fumaça branca, e o Leão verde, e o Almagra* ver
melho, e a imundície. Dissolva todas essas coisas, e as sublime, e depois
as una, de tal forma que em cada parte do Leão verde haja três partes
da imundície da morte. Da mesma forma, faça uma parte da fumaça
branca, e duas da Almagra, que você colocará no Vaso* verde, e ali as
cozinhe, e feche bem a abertura do vaso, assim como foi dito antes.
Em seguida, coloque-o ao Sol, para que seque, e, quando estiver seco,
acrescente o Elixir; e por fim despeje por cima a Agua do sangue até
que ela flutue; e após três dias e três noites, será necessário regar com a
Agua fétida ou malcheirosa, prestando atenção para não deixar passar
o dia e para que o fogo não se apague, que não aumente ao se inflamar,
e também não diminua, para que seu cozimento se faça corretamente.
Depois de 17 noites, abra seu vaso e retire a Agua que encontrar dentro,
e ali coloque pela segunda vez outra Agua fétida, o que é preciso fazer
durante três noites, sem retirar o vaso do forno;* e será necessário colo
car Agua fétida uma vez a cada três noites; e na 21a noite, você retirará
o vaso do forno e secará o Elixir que estará no interior. Depois disso
você tomará o corpo branco, no qual fixou o branco, e o colocará em
um vaso bem pequeno, de acordo com o tamanho do forno filosófico,
depois que o tiver construído. Em seguida, coloque corretamente o vaso
no forno, com cuidado para que a chama não o queime nem o toque.
Você também deve colocar nele o Elixir, de que falamos anteriormente,
de acordo com a seguinte proporção: se colocar em cima uma parte do
corpo branco, ali você colocará 11 partes do Elixir. E, depois que os
Fechamento do Vaso e Cores do Tempo 339
*
* *
odos os bens chegaram até mim ao mesmo tempo que ela, essa Sa
bedoria do Sul que sai para pregar fora, faz ouvir sua voz nas praças pú
blicas, grita nos ouvidos das multidões, expõe-se na entrada das portas
da cidade, dizendo: “Vinde a mim e sede iluminados, e vossas opera
ções nào virarão confusão; todos vós que me desejais sereis agraciados
com minhas riquezas. Vinde então, filhos, e eu vos ensinarei a ciência
de Deus”. Que sábio, no entanto, a compreende, sobre quem Alphidius
diz que os homens e as crianças passam ao lado dela nos caminhos e nas
ruas, e que ela é cotidianamente esmagada com os pés no excremento
pelos rebanhos e pelos animais de carga? [...].
O Levantar da aurora (Aurora consurgens), esse é o título batismal
que demos a esse tratado, e isso por quatro razões: primeira, a aurora
(aurora) é por assim dizer uma hora de ouro (aurea hora); por isso essa
ciência comporta uma hora cujo fim é de ouro para aqueles que operam
corretamente. Em segundo lugar, a aurora ocupa o meio entre a noite e
o dia, brilhando de uma dupla cor: vermelho e amarelo. Da mesma for
ma, essa ciência é pródiga em cores vermelha e amarela, intermediárias
entre o preto e o branco. Em terceiro lugar, porque na aurora os doentes
enfim descansam aliviados de todas as enfermidades noturnas; assim,
na aurora dessa ciência todos os odores e vapores ruins que atacam o
espírito do operador se distanciam e desaparecem, como diz o Salmo:
à noite permanecerão presos os choros, e na manhã a alegria. Em quar
to, e em último lugar, a aurora é chamada fim da noite e início do dia,
ou ainda mãe do Sol: assim também nossa aurora põe fim na extrema
vermelhidão a toda tenebrosidade e põe em fuga a noite, esse longo
período invernal onde tropeçará o caminhante que não prestar atenção.
De fato a esse respeito já foi escrito: e a noite designa a ciência à noite,
o dia profere a palavra ao dia, e a noite se ilumina tanto quanto o dia no
seio de suas próprias delícias.
A Sabedoria não grita nas praças, e a prudência não faz ouvir sua
voz nos livros dos sábios, dizendo: “Ó Homens, eu grito para vós e
minha voz se dirige aos filhos da inteligência: compreendei, insensa
tos, percebei a parábola e a interpretação, as palavras dos sábios e seus
enigmas, pois os sábios se serviram de diversas expressões quando
estabeleceram que similitudes uniam todas as coisas sobre essa terra;
e [vivendo] sob o globo da Lua, eles multiplicaram as parábolas em
relação a essa ciência”. Ao ouvir, o sábio também se tornará mais sá
bio e compreenderá; ao compreendê-la, ele possuirá essa Sabedoria: a
Rainha do Sul vinda, como dizem, do Oriente, como a Aurora em seu
Fechamento do Vaso e Cores do Tempo
34!
A Matéria com
Mil Nomes
Dupla c a matéria-prima, ao mesmo tempo próxima
c distante: próxima ela c Prata-viva; distante
c água, pois a Prata-viva antes foi água,
c cm seguida Prata-viva.
-347-
348 Filosofar pelo Fogo
iãll
TVkhaPhiidsoJ
ihorum acJãpientunv . |
tinto de sangue. E saiba que tudo o que possui um espí
rito tem igualmente um sangue: lembrem-se, portanto,
sempre desse arcano”.
A Assembleia dos Filósofos
(Turba Philosophorum, scc. XI I\
tn Jcan-Jacques Manget.
A Assembleia dos Filó Bibltolheea Chemiea Curiosa, r. 1. p. 451.
sofos e dos Sábios:
0 primeiro agenciamen *
to ê o coito; o segundo, * *
a concepção; o terceiro, ]E/ ssa Água dissolve igualmcntc tudo o que pode ser fun
a gravidez; o quarto, o
nascimento; o quinto, a dido e liquefeito. É uma Água pesada, viscosa ou pegajosa,
nutrição. preciosa, e que merece ser honrada; ela dissolve todos os
corpos, que são crus, em sua primeira Matéria, isto c, cm
uma terra e pó viscosos, ou, para falar mais claramente, cm Enxofre e cm
Prata-viva. Portanto, se você colocar nessa Agua qualquer tipo de metal,
em limalha ou em lâminas trituradas, e deixar durante algum tempo cm um
calor suave, o metal se dissolverá todo e será inteiramente transformado
em uma Água viscosa, ou Óleo branco, como acabei de dizer. E assim essa
Água amolece o corpo e o prepara para a fusão e a liquefação; e ela toma
até mesmo fundíveis todas as coisas, tanto as pedras quanto os metais, e cm
seguida lhes comunica o Espírito e a Vida. E, dessa maneira, ela dissolve
todas as coisas com uma Dissolução admirável e converte o corpo perfeito
em uma Medicina fusível, fundível e penetrante, que é mais fixa do que não
é o próprio corpo, e aumenta seu peso e sua cor.
Trabalhe então com essa Água e você terá o que deseja dela. Pois
ela é o Espírito e a Alma do Sol e da Lua; o Óleo e a Água dissolvente,
a Fonte, o Banho-Maria,* o Fogo contra natureza, o Fogo úmido, o Fogo
secreto, oculto e invisível. É o Vinagre muito ácido, sobre o qual um
antigo Filósofo disse: Pedi a Deus, e ele me mostrou uma Agua nítida,
que eu vi que era um puro Vinagre, alterando, penetrando e digerindo
Essa Água é, portanto, a única maneira ou meio próprio c natural
pelo qual devemos dissolver os corpos perfeitos do Sol e da Lua, por
uma dissolução admirável e particular, conservando-os sempre em seu
mesmo espaço, e sem que esses corpos sejam de forma alguma destruí
dos, que para receber uma forma e uma geração nova, mais nobre e
350 Filosoi-ar pf.i.o Fogo
mais excelente do que a que eles tinham antes: uma vez que é por te
rem sido mudados na Pedra perfeita dos Filósofos; o que é seu segredo
admirável.
O Livro de Artépio (scc. XII?),
in William Salmon,
Biblioteca dos Filósofos Alquíinicos, t. II, p. 119-122.
*
* *
JWorien: Considere o que disse o Sábio: Que o Magistério foi acos
tumado a ser feito de uma única coisa. Guarde então isso muito bem em
seu espírito, e pense a respeito, e o examine de tal forma que não so
fra mais nenhuma contradição [...]. O mesmo filósofo diz: Quem, para
fazer o Magistério, buscar alguma outra coisa além dessa Pedra, será
como um homem que quis subir em uma escada sem,degraus e, como
não pode fazê-lo, cai com a cabeça para baixo.
Calid: O senhor está falando de uma coisa rara, ou a encontramos
com facilidade?
Morien: Sobre isso o Sábio disse: é para o rico e para o pobre, para
o pródigo e para o avaro, para aquele que anda e para quem está senta
do. Pois é uma coisa que jogamos nas ruas, e andamos sobre os estercos
onde ela está. O que foi a causa para que muitos esquadrinhassem nos
estercos acreditando ali encontrá-la, e se enganaram. Mas os Sábios
conheceram o que era, e muitas vezes experimentaram e recomendaram
essa coisa única, que contém em si os quatro Elementos, e que tem do
mínio sobre eles.
Calid: Em que lugar e em que mina devemos procurar essa coisa
para encontrá-la?
Nesse momento Morien se calou e, abaixando a cabeça, pensou
por muito tempo no que deveria responder ao Rei; e, enfim, levantando-
se, ele disse:
O Rei, eu vos confesso a verdade, que Deus, segundo seu desejo,
criou em vós essa coisa tão notável, e não importa onde estejais, ela está
em vós, e não poderia ser separada, e tudo o que Deus criou não poderia
subsistir sem ela, de forma que, se a separarmos de alguma criatura, ela
logo morre.
Calid: Não entendi nada do que vós acabastes de me dizer, se não
me explicais.
Morien respondeu: Os discípulos de Hermes lhe disseram: Nos
so bom Mestre, os Sábios, nossos predecessores, compuseram livros
/\ Matéria com Mil Nomes
351
sobre esse Magistério, que deixaram para seus filhos e seus discípulos;
portanto, rogamo-vos de não nos ocultar a explicação, mas de querer,
por favor, sem mais demora, declarar-nos o que os Antigos deixaram
um pouco obscuro em seus escritos. E ele lhes disse: Ó Filhos da Sabe
doria! Sabei que Deus, o altíssimo e bendito Criador, criou o mundo dos
quatro Elementos, que são todos dessemelhantes entre si, e colocou o
homem entre esses Elementos, como sendo o maior ornamento.
Calid: Eu vos rogo, explicai-me mais uma vez o que dissestes.
Moricn: Qual a necessidade de tantos discursos, ó Rei, é de vós que
se extrai essa coisa; sois vós a mina, pois ela se encontra em vós, e, para
confessar sinceramente a verdade, nós a tomamos e a recebemos de vós.
E, quando a tiverdes experimentado, o amor que tendes por ela aumentará
em vós. Estai certo de que o que eu digo aqui é verdadeiro c indubitável.
Entrevista do Rei Calid e do Filósofo Morim, m William Salmon.
Biblioteca dos Filósofos AL]niiniios, t. 11. p. 84-87.
* *
*
* *
O elemento da água é,
portanto, a mãe, a semente e a
raiz de todos os minerais, e nela
é o Arqueu* que dispõe as coi
sas singulares em determina
da ordem, para que uma coisa,
qualquer que seja ela, se torne
segundo sua última matéria na
tural, que, contudo, o homem
recebe segundo sua primeira
matéria artificial, ou seja: Onde
se detém a Natureza, ali mesmo Figuração simbólica da Matéria-prima:
começa a Arte do homem, pois Goossen Van Vreeswijk, De Groene Leeuw.
a matéria última da arte é para o Amsterdã, 1674.
homem a primeira. Em contra
partida, a corrupção da natureza graças à arte é para o homem a matéria
última. Por uma obra tão digna de admiração Deus criou a água como pri
meira matéria da natureza, substância a tal ponto mole e frágil de onde pro
vêm no entanto um fruto metálico muito sólido, pedras, etc., assim como
do muito mole o muito duro, e que da água nasça o fogo acima do alcance
do intelecto humano, mas não, contudo, acima da natureza. Deus criou o
feto admirável a partir de sua mãe, como é visível nos homens, se eles tam
bém se fazem ver em sua mãe, cada um em particular é reconhecido por
sua engenhosidade e sua propriedade, não segundo seu corpo, mas por sua
fundação (preparação, criação) de temperamento.
Gérard Dorn. Ccngmcs PanuAsisa Chentit
df Transmutationibus mftallorum (1581),
in Jean-Jacqucs Manger, Btbhothtca Chemira Curwta,
( II. p. 455.
*
* *
*
* *
JE/ssa primeira matéria é, portanto, um sal. O que significa dizer que
o Sal é o primeiro corpo, pelo qual ela se torna palpável c visível; desse
sal, Raymond Lullc pretende falar em seu Testamento, quando diz: An-
teriormente, declaramos que no centro da Terra existe uma terra virgem,
e um verdadeiro elemento: e que é a obra da Natureza. Essa Natureza
está situada no centro de cada coisa. Assim, o sal é essa terra virgem
que ainda nada produziu; na qual o espírito do mundo se converteu
primeiramente, por vitrificação, isto é, por extenuação de humor. É ele
quem dá forma a todas as coisas, e nada pode aparecer ao sentido da
vista nem do tato a não ser pelo sal. Nada se coagula, a não ser o sal.
Nada além do sal se congela. É ele quem dá a dureza ao ouro, a todos
os metais; ao diamante, e a todas as pedras tanto preciosas quanto as
outras, por uma potente e muito secreta virtude vitrificante. Além do
mais, observa-se que todas as coisas compostas dos quatro Elementos
retornam ao sal. Pois, caso um corpo apodreça, o que restará dele senão
um pó de cinzas que guarda um sal precioso? E se o corpo for destruído
por queimada, calcinação ou incineração, o que tiraremos dele em últi
ma instância a não ser o sal?
Clovis Hestcau de Nuisctncnt,
Tratado do verdadeiro Sal dos Filósofos e
do Espínto geral do Mundo (1621),
p. 87-89.
*
* *
358 Filosofar pelo Fogo
p
JL/ u lhes confesso sinceramente que a Prática de nossa Arte é a coisa
mais difícil do mundo, não em relação às suas operações, mas em rela
ção às dificuldades que existem em aprendê-la distintamente nos livros
dos Filósofos. Pois se, de um lado, ela é com razão chamada um Jogo dc
crianças; do outro, ela requer daqueles que buscam sua verdade por seu
trabalho e seu estudo um conhecimento profundo dos Princípios e das
operações da Natureza nos três gêneros; mas particularmente no gênero
mineral e metálico. É um grande ponto encontrar a verdadeira Matéria,
que é o Sujeito* de nossa obra: é preciso atravessar para isso mil véus
escuros, com os quais ela foi envolvida; é preciso distingui-la por seu
próprio nome, entre um milhão de nomes extraordinários, com os quais
os Filósofos diversamente a expressaram; é preciso compreender todas
as suas propriedades, e julgar todos os graus de perfeição, que a Arte é
capaz de lhe dar; é preciso conhecer o Fogo secreto dos Sábios, que é o
único Agente, que pode abrir, sublimar, purificar e dispor da Matéria a
ser reduzida em Água; é preciso para isso penetrar até a Fonte divina da
Água celeste, que opera a solução, a animação e a purificação da Pedra; é
preciso saber converter nossa Água metálica em Óleo incombustível por
meio da completa solução do corpo, de onde ela extrai sua origem; e para
isso é preciso fazer a conversão dos Elementos, a separação e a reunião
dos três Princípios; é preciso aprender como se deve fazer seu Mercúrio
branco, e um Mercúrio citrino; é preciso fixar esse Mercúrio, alimentá-
lo com seu próprio Sangue,175 para que se converta em Enxofre fixo dos
Filósofos. Eis quais são os pontos fundamentais de nossa Arte; o resto da
obra se encontra muito claramente ensinado nos livros dos Filósofos, para
não ter necessidade de uma explicação mais ampla.
Alexandrc-Toussaint Limonjon dc Saint-Didicr,
O Triunfo hermético (1699), in William Salmon,
Biblioteca dos Filósofos Alíjtdinicos
r. III, p. 294-296.
*
* *
176. Em As Instituições divinas (liv. II. VIII. 8). Lactâncio defende de fato a criação ex
nihilo contra aqueles que pretendem tirar uma coisa da organização do caos: “Não se deve
ouvir os poetas, que contam que no inicio havia o caos, isto é, a confusão dos objetos e dos
elementos, e que. mais tarde. Deus tinha feito uma triagem em toda essa massa, extraído
dessa confusão todas as coisas uma a uma, e as tinha colocado em seu lugar e tinha simul
taneamente organizado e ornado o mundo”.
360 Filosofar pelo Fogo
p
JL/ também considerando que todas as coisas se engendram de duas
substâncias, uma quente e seca, a outra fria e úmida, representadas pelo
Sol e pela Lua, os Filósofos também nomeiam Enxofre e Mercúrio, di
zendo que é preciso que a irmã tire seu irmão e o irmão, sua irmã, assim
como se vê na dissolução.
Todavia, antes de continuar, saiba que os Filósofos chamam a maté
ria: agente e paciente, irmã e irmão, para declarar que é preciso que eles
sejam de uma mesma espécie e apenas diferentes no sexo; portanto, os
que trabalham em vão são os que reúnem seu fermento masculino com
uma água estranha e de outra natureza que não é extraída deles, mas em
pregada pela natureza em sua geração, na qual eles não podem dissolver
pois ela é estrangeira e de outro sangue e que ela não é sua irmã, como
o mercúrio o é do enxofre; essa consaguinidade denota muito mais que
a semente feminina de nossa obra se assemelha muito à semente mas
culina, e pouco falta para que elas não sejam uma mesma coisa; essa
diferença não depende senão do calor de uma e da frieza da outra, para
que vejamos abertamente que o mercúrio vulgar, considerando-o em suas
qualidades sem se adequar à nossa obra, está tão distante do parentesco
do Sol, que, se não se aproximou dele por uma nova Aliança, ele não pode
ser a matéria feminina do Elixir, mas, ao macerá-la primeiramente com
um espírito da natureza do fermento filosofal e que seja seu próprio ir
mão, nós os colocamos tão perto um do outro, que por esse meio ele rece
be a consaguinidade do fermento, o que se faz animando-o e cozinhando
como já dissemos, e então ele é tão bem-proporcionado à natureza do Sol
que pode verdadeiramente ser nomeado sua irmã.
Henri dc Linthaut,
A Aurora (séc. XVII), ms. n. p.
*
c
•k *
segundo a disposição que seu fogo lhe dê. Pois o antimônio contem
todas as cores, como o mercúrio. Coisa com a qual não é preciso se
surpreender, porque a Natureza tem dois recursos admiráveis, os quais
não podemos aprender nem hoje nem depois [...].
Portanto, você saberá que antimônio é apenas uma fumaça ou en
tão um vapor excitado pelos astros nas entranhas da terra c, por meio
dos Elementos, reduzido a uma coagulação formal. E as mesmas cons
telações que produzem o mercúrio também produzem o antimônio,
comunicando-lhe sua essência, suas virtudes, suas operações e suas
qualidades do início; e não há nenhuma outra influência cm seus princí
pios dc geração, a não ser que o antimônio é mais duro c mais coagula
do do que o mercúrio - ou prata-viva - em seu começo [...].
O antimônio não passa de um mineral feito por um vapor elevado
c dissolvido em um licor. Esse vapor é o verdadeiro astro do antimônio.
E esse licor, atraído do elemento da terra pelos astros celestes e sendo
ressecado pelo elemento do fogo que está no ar, se reduz pela coagu
lação em uma forma e essência palpável, c nessa forma o enxofre, em
seguida o mercúrio; e a mínima parte dos três princípios é o sal. do qual
contudo existe o suficiente para lhe dar uma forma sólida. As qualida
des primeiras e elementares do antimônio são secas e quentes e não
participam na frieza e umidade, a não ser cm um grau bem mais baixo;
assim como o mercúrio, ou prata-viva comum, e o ouro corpóreo têm
mais calor do que frieza [...].
Digo-lhes imediatamente que no antimônio encontramos um mer
cúrio, um enxofre e um sal que são os soberanos medicamentos da saú
de dos homens. O mercúrio do antimônio consiste em seu regula.* o
enxofre em sua vermelhidão; e seu sal permanece na terra negra que
deixamos. E quando se sabe separar bem essas três coisas uma da outra,
e uni-las imediatamente segundo as regras da arte e que delas se pos
sa fazer uma fixação sem veneno, quem o fez pode se vangloriar com
honra de que encontrou a pedra de fogo que se faz do antimônio para a
saúde dos homens.
Basilc Valcntin, A Carruagem triunfal do Antimônio (séc. XV?),
reedição da tradução francesa de 1646.
Paris, Rerz. p. 97-99. 107-108. 144. 148. 156.
*
* *
Podemos com razão conjeturar que essa base, essa raiz dos mistos.*
que seguiu à sua destruição, é uma parte da primeira matéria, a porção
364 Filosofar pelo Fogo
*
* *
177. Fulcanelli observa, com efeito: “Esses vómitos do enxofre sào os melhores indícios
de sua dissolução e mortificação. Quando chega a essa fase, a Obra adquire, na superfície,
um aspecto de “caldo gordo e salpicado de pimenta”, brodium saginatum piperatum, como
dizem os textos. A partir de então, o mercúrio enegrece cada dia mais e sua consistência se
torna viscosa e pastosa” (op. cit., p. 446).
178. Do Mestre Amaud de Villeneuve, em seu Rosário dos Filósofos.
A Matéria com Mil Nomes
e busca atingir outros lugares, como um corpo de ouro. Por outro lado,
guarde-o com cuidado, para que ele nào desapareça em fumaça.”
Este é realmente nosso adubo, foi aprovado pelo Mestre, nosso
adubo que os Filósofos designaram pelas expressões de enxofre negro,
enxofre de natureza, prisão do ouro, túmulo do Rei. ou pelos nomes
de latão, bronze, corvo, Saturno, Vénus, cobre, estanho, etc., e ao qual
atribuíram as mais raras e maiores virtudes. Eles consideraram, com
todo direito, como um real presente do Criador, e nos afirmam que, sem
uma inspiração do Céu, não poderíamos jamais reconhecer, nesse mag
ma deserdado, repulsivo de aspecto, o Dom de Deus, que transforma o
simples alquimista em sábio e o Filósofo em Adepto experimentado.
Eugènc Canseliet,
Prefácio de As McraJas jibscfais,
de Fulcanelli (1964), t. I. p. 33-34.
366 Filosofar pelo Fogo
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A Matéria-prima da Pedra dos Filósofos, ms, século XVIII.
A Matéria coa\ Mn. Nomes 367
I
14
Chaves do Magistério
Eu só vos peço para cozinhar: cozinhai no início,
cozinhai no meio, cozinhai no fim,
e não façais outra coisa,
pois muito a Natureza se aperfeiçoará.
A Assembleia dos Filósofos (séc. X),
in William Salmon,
Biblioteca dos Filósofos Alqiiímicos, t. II, p. II.
nào sai do campo, nào poderá tirar proveito dele. Sào os seis irmãos que
envolvem o Claudianos* e seus congéneres. Ora, só existem dois úteis;
a brancura radiante nào serve para nada. O campo encerra uma serpente
cujo sopro resseca esse lugar, e [os irmãos] ali se tornam lânguidos. Eu
a vejo, com suas escamas de cor variada. O nascimento de sua cauda é
branco como leite; seu ventre e suas costas são da cor do açafrão; sua
370 Filosofar pelo Fogo
179. Ou alambique de Sinésio (séc. IV) deve seu nome à garganta (ou ranhura circular) que
permite aos líquidos, condensados no vaso cm forma de mama, ajustado sobre o matraz
inferior, que escorram pela tubulação e que sejam recolhidos.
Chaves do Magistério 371
udo o que foi tratado neste Livro, nós demonstramos sua vera
cidade, pois vimos com nossos próprios olhos, tocamos com nossas
próprias mãos; nós mesmos operamos e o realizamos. Por isso vamos
recapitular em uma breve conclusão desprovida de qualquer alegoria a
totalidade de nosso Magistério.
Portanto, pegamos e trituramos a pedra de que falamos, a fim de
enfraquecê-la com a ajuda e habilidade da natureza e da arte, e de redu
zi-la em Prata-viva, à qual acrescentamos o corpo branco que é de uma
natureza semelhante, e que se cozinha até conseguir transformá-la cm
uma verdadeira mina, que em seguida se multiplicará à sua vontade.
Faça de modo que essa matéria seja mais uma vez reduzida a Prata-
viva, que você dissolverá em nosso mênstruo* até que a Pedra se torne
volátil e separada de todos os seus elementos. Enfim, purgue-a até a
última perfeição, tanto do corpo quanto da alma, para que, graças a
um calor natural temperado, possa ser realizada a íntima conjunção do
corpo e do espírito. Assim a pedra se tornará mina, e o fogo será manti
do constante até que ela seja reduzida a um pó branco, que nomeamos
180. Thutie: termo que provavelmente designa aqui a Cádmio (cf. esta palavra no Glossá
rio), mas às vezes também certo lugar conhecido dos alquimistas gregos por seus santuários.
372 Filosofar pelo Fogo
alid: Como e de que maneira se pode fazer com que nesse Magis
tério só haja uma Raiz, uma Substância e uma Matéria, uma vez que nos
escritos dos Filósofos encontramos vários nomes dessa raiz, e todos são
diferentes? [...].
Morien: Hércules diz a alguns de seus
discípulos: O núcleo da tâmara é produzido e
alimentado pela palma e a palma o é pelo seu nú
cleo. E da raiz da palma surgem vários pequenos
brotos, que se multiplicam e produzem várias
outras palmeiras em torno dela. E Hermes disse:
Olhe o vermelho realizado, e o vermelho dimi
Existem duas nuído em sua vermelhidão; considere também o
Matérias: uma para alaranjado perfeito, e o alaranjado diminuído de
queimar, a outra para sua cor laranja, e toda a cor laranja. E olhe ainda
endurecer. o negro realizado, e o negro diminuído de seu
negror, e todo o negror. Assim também a espiga
vem de um grão, e de uma árvore saem vários ramos, ainda que árvore
venha apenas de sua semente. Outro Sábio, que renunciara ao mundo
por amor a Deus, oferece-nos um exemplo semelhante. Pois ele diz:
A semente é a primeira formação do homem; e de um grão de trigo
surgem cem, e de uma pequena semente surge uma grande Árvore, e
de um homem é tirada uma mulher semelhante a ele; e desse homem
e dessa mulher nascem muitas vezes vários filhos e filhas, que têm a
tez, os traços e o rosto diferentes. O mesmo Sábio ainda diz: Veja o
trabalhador: de um mesmo tecido faz uma camisa, e todo tipo de ves
timenta, e cada parte tem um nome particular e diferente das outras.
E, contudo, ao considerar essas partes naturalmente, isto é, segundo
sua matéria, pensaremos que todas são feitas de um mesmo tecido, e
que um único tecido, que é a principal matéria com a qual foram feitas
todas as roupas. Pois, ainda que o corpo, as mangas e caudas tenham
nomes diferentes, como partes da roupa o tecido é, no entanto, sua
principal matéria. Pois podemos desfazer a roupa, e separar suas partes
retirando o fio com o qual estão cosidas e mantidas juntas, sem que o
tecido deixe de ser ele mesmo, e sem que ele tenha necessidade de ou
tro tecido para isso. Assim, nosso Magistério é uma coisa que subsiste
por si mesma, sem ter necessidade de qualquer outra coisa. Ora esse
Magistério está oculto nos livros dos Filósofos, e todos os que falaram
dele lhe deram mil nomes diferentes. Ele está até mesmo selado, e só
se abre para os sábios. Pois os sábios o buscam com zelo e o encontram
depois de tê-lo procurado; e assim que o encontraram, eles o amam e o
honram: mas os Loucos não prestam atenção, e o estimam bem pouco,
Chaves po Magistério
375
ou, para dizer a verdade, eles não o estimam de forma alguma, porque
não sabem o que é.
Eis alguns desses nomes dados ao seu Magistério em seus escritos
pelos Sábios. Eles o chamaram Semente, que quando se transforma se
torna sangue na matriz, e enfim se coalha e se torna uma espécie de pe
daço de carne composta. E isso acontece dessa maneira até que a criatura
receba outra forma, ou seja, a do homem, que sucede a essa primeira for
ma de carne, e então é preciso necessariamente que se faça um homem.
Outro desses nomes é que ele se assemelha à palmeira pela cor de seus
frutos, e por que têm suas sementes, antes de chegar à sua perfeição.
Entrevista do Rei Calid e do Filósofo Monen,
m William Salmon, Biblioteca dosfilósofos
alqiiítnicos, t. 11, p. 72-76.
*
* *
* *
^_l/ábua da Ciência maior.
182. Duenech: é o negro muito negro, de outra forma chamado o Latào, que é preciso em
branquecer pela açào de um fogo continuo.
378 Filosoear pelo Fogo
*
* *
d^uero colocar em suas mãos seis Chaves, com as quais você poderá
ele deve observar que nessa substância homogénea, que aparece sob a
forma da Água, existem três substâncias diferentes, e três Princípios na
turais de todos os corpos. Sal, Enxofre e Mercúrio, que são o Espírito, a
Alma c o Corpo; e ainda que pareçam puros e perfeitamente unidos, ain
da falta muito para que o sejam; pois, quando pela Destilação retiramos
a Água, que é a Alma e o Espírito, o corpo permanece no fundo do Vaso,
como uma Terra morta, negra e feculenta, que no entanto não deve ser
desprezada; pois em nosso Sujeito* não há nada que não seja bom [...].
Você sabe que nada é mais contrário que o Fogo e a Água; é preciso no
entanto, que o sábio Artista faça a paz entre os inimigos, que no fundo
se amam ardentemente [...]. Com efeito, essas duas substâncias, que são
de uma mesma natureza, mas de dois sexos diferentes, abraçam-sc com o
mesmo amor, com a mesma satisfação, que o macho e a femea, e se elevam
insensivelmente juntos, deixando apenas um pouco de fezes* no fundo do
vaso, de forma que a Alma, o Espírito e o corpo, após uma exata depuração,
parecem enfim inseparavelmente unidos, mas sob uma forma mais nobre
e mais perfeita do que antes, e tão diferente da primeira forma líquida
quanto o Álcool do vinho, exatamente retificado, e acuado em seu sal, c
diferente da substância do Vinho do qual foi extraído [...].
A quarta Chave da Arte é a entrada da segunda obra; é ela que
reduz nossa Água em Terra; existe somente essa Água no mundo que,
por um simples cozimento, possa ser convertida em Terra; pois o Mer
cúrio dos Sábios traz em seu centro seu próprio Enxofre, que o coagula.
A terrificação do Espírito é a única operação dessa obra [...]. Cultive,
portanto cuidadosamente essa preciosa Terra: regue-a com frequência
com sua umidade; seque-a muitas vezes, e você não aumentará menos
suas virtudes que seu peso e sua fecundidade.
A quinta Chave de nossa obra é a fermentação da Pedra com o
Corpo perfeito, para fazer dela a Medicina da terceira ordem. Nào direi
nada de especial sobre a operação da terceira obra; senão que o corpo
perfeito é um fermento necessário para nossa massa; que o Espírito
deve fazer a união da massa com o fermento, assim como a Água ume-
dece a farinha, e dissolve o fermento, para compor uma massa fermen
tada, própria para fazer o pão [...]. Em relação à fermentação, o Filósofo
repete aqui toda a obra e mostra que, assim como a massa da pasta
se torna fermento, pela ação do fermento que lhe foi acrescentado, da
mesma maneira qualquer confecção filosófica se torna por essa ope
ração um fermento, próprio para fermentar uma nova Matéria, e para
multiplicá-la até o infinito [...].
384 Filosofar pelo Fogo
ora falta falar dos erros que se produzem na obra, e por isso são
responsáveis pelo distanciamento de muitos do caminho correto. Por
tanto, é preciso advertir que o primeiro ERRO está na descontinuidade
e na oposição dos fogos nessa obra, segundo o próprio grego. De fato,
não é apenas o calor, mas a qualidade do calor que se deve vigiar; pois
o fogo quente e úmido, como em um banho, e seco como na [palavra
que falta], têm efeitos diferentes: um, assim como o ventre do cavalo,
contribui com efeito para a perfeição da dissolução; enquanto que o ou
tro produz igualmente uma dissolução, mas de outra ordem, e provoca
a alteração da Matéria. Por isso os verdadeiros Filósofos dizem que Um
único Fogo, Um único Regime,* e Um único Vaso* são requisitados
para que a obra seja perfeita, e assim reinarão em todas as coisas a pa
ridade da obra e a harmonia do todo. Segundo o grau da operação, esse
fogo deve ser conduzido com moderação, de forma que sempre seja
lento até a obtenção da brancura, como o calor natural do homem ou o
do ovo enquanto é chocado no ninho pela mãe: daí sairá a matéria da
Pedra correspondente à quarta digestão do homem, composta a partir
das quatro naturezas.
Durante a primeira obra e a putrefação, sua verdadeira essência é
abstrata em sua Quinta Essência, que é o princípio de nossa obra ter
minada e do Magistério: o início da corrupção do Um corresponde à
geração do outro, em vista de outra natureza e de outro efeito. Por isso,
essa matéria deve ser dissolvida em um calor Contínuo, que terá em si
este TRÊS: a umidade, um calor sem secura, e a raridade de sua matéria
tornada homogénea. E se um desses elementos viesse a faltar, não se
poderia contar com nenhum efeito benéfico, a menos que a obra seja
conduzida de maneira mais sutil e mais segura.
O segundo ERRO diz respeito à matéria de onde a Pedra é re
conduzida à origem ou ao ato. Com efeito, a Pedra a ser retida deve
ser descoberta por jovens de idade média, alertas, felizes e saudáveis,
Chaves no Magistério
385
Tentar entrar sem a chave no Roseiral dos Filósofos é o mesmo que andar sem os
pés: Michael Maier, Atalanta fugiens, Oppenheim, 1618, emblema XXVII.
388 Filosofar pelo Fogo
-389-
390 Filosofar pelo Fogo
mia; e provarei meus dizeres, não calarei nem dissimularei nada, ex
ceto o que não convém nem dizer nem mostrar. De fato, dizemos que
os quatro magistérios constituem esse artifício maior ou, como dizem
os Sábios: dissolver, coagular, branquear e avermelhar. E essas quatro
quantidades também são parceiras ativas, das quais duas são talvez en
tre si partícipes, e as duas outras da mesma forma entre si. E cada uma
dessas duas quantidades duplas tem outra quantidade partícipe, para
ela dominante, depois dessas duas. Isto é, a propósito dessas quantida
des, em que não entra nem diminuição nem adição na quantidade das
naturezas e no peso das medicinas que são dissolvidas e coaguladas
segundo a ordem. Mas essas duas, a saber, a solução e a coagulação,
serão efetuadas em uma única operação e produzirão um único efeito,
e isso antes da composição; pois, depois de sua composição, a obra
será diferente. Mas essa solução e essa congelação já nomeadas são a
solução do corpo e a congelação do espírito que, caso sejam duas, não
têm todavia senão uma única operação, pois o espírito só é congelado
pela solução do corpo; e da mesma forma o corpo só é dissolvido pela
congelação do espírito. E quando o corpo e a alma estão reunidos, cada
um deles provoca em seu companheiro um fato semelhante em si mes
mo, a exemplo da terra e da água: quando a água está unida à terra, ela
de fato se esforça em dissolvê-la com suas próprias virtudes: a umidade
e a virtude; ela a toma mais sutil do que era antes, e semelhante a si
mesma, caso a água fosse de fato mais sutil do que a terra. E a alma age
de forma semelhante no corpo, e dessa maneira a água é espessada com
a terra, e se torna em densidade inteiramente semelhante à terra, pois
esta é mais espessa do que a água. E saiba que entre a solução do corpo
e a congelação do espírito não há nenhum intervalo de tempo, nem uma
obra diferente, de forma que um possa ser sem o outro; também não há
entre a água e a terra, no momento de sua união, uma porção diferente
de tempo suscetível de ser conhecida, ou que um possa ser distinguido do
outro durante suas operações; mas delas duas só há um único termo e um
Os Dois Pilares pa Arte (5o4vf et Coagula)
391
*
* *
Passemos agora, com a bênção de Deus, à segunda preparação,‘que
é o branqueamento (dealbaçào)* da terra pura. Pegue então duas par
tes da terra anteriormente fixada, chamada cabeça de corvo: triturc-a
tado sua sede. Depois de tê-las triturado, misture-as bem para que essa
massa caótica por meio da união do corpo, da alma e da água se tome
perfeita e íntima; e isso até que eles se interpenetrem na própria pro
fundeza do corpo. Isso feito, recoloque a mistura em sua cucúrbita*
hermeticamente fechada para que não se evapore, e coloque-a cm seu
pequeno leito bem preparado, temperado, mantido no calor constante,
para que no espaço de oito dias ela sue e se livre de toda a água absor
vida cm suas vísceras, para que a terra seja perfeitamente branqueada.
Em seguida, pegue novamente essa pedra c a quebre e a embeba de leite
virginal como já tinha feito antes, graças à mistura, para que ela satis
faça mais uma vez sua sede; e coloque-a mais uma vez cm sua âmbula,
c então sobre seu pequeno leito suavemente temperado para que ela se
resseque ao suar como antes. Repita quatro vezes a operação de acordo
com esta ordem: embebição da terra pela água ate a obtenção dc uma
união estável, dessecação e calcinação, dessa maneira você cozinhou o
suficiente a terra da preciosa pedra e, por meio dessas etapas: cozimento,
trituração, embebição contínua pela água, secamcnto c calcinação, você
limpou perfeitamente a cabeça do corvo, a terra negra malcheirosa, c a
conduziu à brancura pela força do fogo e do calor, e a do branqueamento
da água. Recolha então com cuidado essa terra branca e coloque-a dc
lado, pois ela é o tesouro procurado: a terra branca folhada, o enxofre
branco, a magnésia* branca, etc. E é nesse ponto que o Filósofo Morien
designa dizendo: Essa terra se putrifica com sua água e, se ela está limpa,
o Magistério está totalmente terminado, com a ajuda dc Deus. Hermes
também diz que o Azoto* lava o Latão* e distancia dele toda impureza.
Da mesma forma, nessa composição e operação foi realizada a verda
deira conjunção dos Elementos, pois ali se efetuou a união de um elemento
água com o elemento terra, e do ar com o fogo. Da mesma maneira, ali foi
consumada a união do homem e da mulher, do macho e da têmea, do ouro
e da prata, do enxofre e da água celeste impura, assim como realizada a
revivificação dos corpos mortos. E por isso que o Filósofo diz:
Que aqueles que não sabem mortificar e revivificar não operem
essa arte.
Alberto, o Grande, O Composto dos compostos
(Ccmpcsitum dc compositis, séc. XIII),
in Thtatrum Chenucum, t. IV, p. 837.
*
* *
394 Filosofar pelo Fogo
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JL-/ u declaro, portanto, que toda Obra só consiste em pegar a Pedra
(isto é, a Matéria da Pedra), que deve ser bem conhecida por todas as
coisas já ditas nos capítulos deste tratado; e, por um trabalho assíduo
e contínuo, dar-lhe o primeiro grau da sublimação, a fim de lhe retirar
toda impureza que a corrompe; a perfeição que a sublimação deve dar a
essa matéria consiste em apenas fazê-la tornar-se tão sutil que ela seja
elevada à última pureza e sutileza, que ela se torne enfim completamcn-
te espiritual e volátil. Depois disso, é preciso torná-la tão fixa, pelas
maneiras de fixações que já descrevi, que ela possa resistir ao fogo, por
mais violento que ele seja, e ali permanecer sem escapar nem evaporar;
e esse é o final do segundo grau da preparação que essa Matéria deve
receber. Pelo terceiro grau, sua preparação se encerra. O que acontece
pela sublimação dessa Pedra (ou dessa Matéria) é que, assim, de fixa
ela se torne então volátil, e de volátil fazendo-a fixa uma segunda vez,
dissolvendo-a depois de tê-la fixado; e, estando dissolvida tornando-a
ainda volátil, e a refixando mesmo assim, enquanto ela for fundível e
transmutar os imperfeitos e lhes der a verdadeira perfeição de Sol e de
Lua a qualquer prova. Assim, ao refazer as operações desse terceiro
grau, aumenta-se a perfeição da Pedra e multiplica-se a virtude que
ela tem de transmutar os corpos imperfeitos. De forma que é somente
ao refazer continuamente as mesmas operações da Obra, que damos a
multiplicação à Pedra, pela qual a tornamos tão perfeita que uma de
suas partes poderá converter, em verdadeiro Sol e em verdadeira Lua,
cem partes de metal imperfeito, depois mil e assim por diante, aumen
tando sempre até o infinito. Depois disso, só nos resta passar pelas pro
vas o metal que terá sido transmutado, para conhecer se o Magistério,
que terá feito sua transmutação, é verdadeiro e perfeito.
Pscudo-Gcbcr, Súmula da perfeição do magistério
(Summa perfectionis Magisterii, scc. XIV),
in William Salmon, Biblioteca dos Filósofos Alquimias,
1.1, p. 380-382.
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(S^aiba, meu caro, que nossa sublimação não está no fato de se ele
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JL ortanto, eu digo que todo trabalho da pedra não é senão uma per
pétua sublimação filosofal e não química, pois a química é apenas uma
elevação da matéria ao cume do vaso,* mas a filosofal é uma melhoria
e elevação a um grau mais alto de perfeição a que levamos a matéria, o
que sempre acontece até que a pedra tenha adquirido sua última perfei
ção, por meio da arte e da natureza que estão sempre juntas.
Ora, a sublimação pressupõe sempre a dissolução do corpo, e todo
corpo é dissolvido pelo espírito com o qual ele está misturado, e por
meio dele é feito espiritual; e, quando o corpo é dissolvido, o espírito se
coagula pela mesma operação, que é divina, sobrenatural e incompreen
sível: daí é preciso inferir que o que dissolve e o que é dissolvido são
de mesma natureza e que, se houvesse alguma natureza estrangeira,
não aconteceria uma verdadeira e física dissolução do corpo e con
gelação do espírito.
A primeira operação se chama a extração da semente do ouro, que
é a primeira sublimação ou preparação do mercúrio filosofal; por meio
da arte, o ouro nessa semente adquire a potência de se multiplicar, e as
sume então o sujeito* da matéria que o Artista deve escolher para fazer
sua obra, e de onde ele pode extrair a forma da semente da pedra [...].
Essa primeira sublimação também é nomeada destilação, pois, ao
destilar, a água vai para o alto do vaso* filosofal em espécie ou em for
ma de fumaça; é por isso que Hermes diz: O vento o leva em seu ventre.
Pela sublimação perfeita, a destruição, a contrição e a pulverização da
matéria acontecem, isto é, colocar na cal por meio de um fogo forte o
corpo que permaneceu no fundo do vaso: o que se faz para que o elo
e a consolidação das partes terrestres e combustíveis sejam rompidos e
que as substâncias sejam separadas, e que a alma sutil, que é a parte que
tinge, seja mais facilmente extraída [...].
A sublimação dos Filósofos contém várias operações, a saber, a
purificação, a fim de ter uma substância pura e nítida; a dissolução, para
reduzir toda a massa da matéria em uma água; a terceira, a putrefação
ou corrupção, ainda mais que nada se acontece sem que primeiramente
a corrupção preceda, seguindo o axioma dos Filósofos, corruptio unius
est generatio alterius.1** A ablução, a limpeza, branqueamento e ensa-
boamento vêm depois, porque toda coisa sórdida deve ser limpa de toda
impureza corrompedora; essa ablução também se nomeia inceração e
mundificação.* A outra é a coagulação, pois é preciso que essa água tão
preciosa da qual falamos seja ressecada e retorne em forma de pó do
185. A corrupção de um é a geração do outro.
Os Dois Pilares da Arte (Solve et Coagula)
407
substância, quando ela está livre desses óleos que a viciam, é uma coisa
que tinge e, se não fosse assim, as operações não poderiam lhe dar essa
virtude. Que Deus, o Altíssimo, o ajude nisso!
Djâber. O Livro da Realeza. tn Marcelin Bcrthclot,
A Química na Idade Média, t. I. p. 130-132.
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Para que servem todos essas diversas misturas? Uma vez que nossa
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Hans Baldung Grien, Saturno, 1516.
16
186. Contrariamentc a seu título, o romance de Marguerite Yourcenar coloca em cena antes
a história de um sábio na matéria antiga que de um alquimista.
-415-
416 flLOSOFAR PELO l;OGO
pois, todas as vezes que uma nova porta de entrada é aberta ao Fogo,
uma nova forma ou gênero de vestimentas é a partir de então concedi
da, todas as vezes a título de privilégio, até que a Pedra, em si mesma
desprovida, adquira as riquezas e não tenha mais necessidade de manter
com as outras uma troca mútua.
Basilc Valentin, As 12 Chaves Ja Filosofia
(Claves X.1L Philosopha. séc. XV?; Ia edição 1599).
in Jcan-Jacqucs Mangct. Btbliolheca Cheinica Curiosa. t. 11. p. 419.
*
* *
Desejo agora começar por Saturno, sem nenhuma palavra de duplo
sentido, nem obscuridade nem enigma, assim como já fiz em relação
aos metais precedentes, pois nos próximos também encontraremos a
verdade.
Ora, é algo muito provável e demonstrável que Saturno é não ape
nas conhecido pela invenção astronómica - por ser o principal regente
e governante dos céus -, mas também que a pedra, que é o bálsamo de
todos os nobres filósofos e desse vale de miséria, como também dessa
vida caduca, extrai seu princípio e sua coagulação apenas da cor negra
do planeta de Saturno, que todos os outros seguem e imitam em tudo
o que eles produzem de bom e de melhor, pois o esplendor do planeta
Saturno, que é incorruptível e imortal, esclarece e ilumina todo o fir
mamento do céu.
Mas, ainda que pareça que eu deveria dizer algo sobre o nasci
mento de Saturno e de como ele extrai sua origem e seu princípio tanto
do macrocosmo como de sua própria terra, todavia, uma vez que já
mencionei muitas vezes e já discorri de várias maneiras em meus outros
livros, não achei adequado falar ainda mais sobre ele aqui, ainda mais
que isso não traria nenhum avanço ao desejo de meus discípulos e que
este meu livro se tornaria muito longo se desejasse descrever tudo o
que poderia ser dito sobre Saturno - de que me abstenho no momento
-, não tendo outra intenção senão a de declarar e iluminar com verdade
e sinceridade as coisas que outrora foram obscuras e desconhecidas, por
não ter conhecido essa minha declaração ou instrução.
Portanto, vocês devem saber que de modo algum se deve rejeitar e
desprezar Saturno por causa de sua aparência externa. Mas ele recom
pensará suficientemente os trabalhos e os sofrimentos daquele que é in
quiridor e amante da ciência, se este operar filosoficamente com aquele
por meio de um verdadeiro procedimento ou prática. É por isso que
418 Filosofar pelo Fogo
*
* *
ratem de conhecer o rio filosófico que sai de uma montanha, cujo cume
se perde nas nuvens; uma chuva meridional lhes indicará essa montanha, se
quiserem ser um pouco atentos: pois, ainda que esteja continuamente cober
ta de neve, ela encerra, no entanto, um fogo devorante, que exala um vapor
absolutamente necessário à operação hermética. Excitem esse fogo para
aumentar o vapor. Cavem a terra ao pé da montanha e sairá o verdadeiro
mercúrio com seu caduceu* que opera maravilhas.
Eis o Mercúrio filosófico, assim como o vaso* e o fogo, mas não se
enganem nem tomem do mercúrio vulgar pelo Mercúrio filosófico. Eu lhes
aconselhei a cavar a terra ao pé da montanha, mas não posso deixá-los ig
norar que terão muito trabalho para executar esse serviço, pois encontrarão
pedras bem duras.
Em seguida, peguem a erva de Saturno que é encontrada nos lugares
saturninos. Os ramos dessa planta lhe parecerão mortos, mas que isso não
os esmoreça; sua raiz é plena de suco, arranquem-na e joguem-na no buraco
que fizeram ao pé da montanha. Em seguida, façam intervir Vulcano, e no
mesmo instante todos os poros da montanha estarão repletos de vapor sa
turnino, que será impregnado do espírito ígneo, filosófico, ou espírito
de Saturno, cuja propriedade é de branquear. Eis o mercúrio filosófico e a
Nigrum Nigrius Nigro (Obra ao Negro) 423
não revelar nem divulgar; é aquele que diz respeito à espécie divina e à
ação divina. Com efeito, é divino o que, pela união da divindade, torna
as substâncias divinas; é o meio pelo qual o espírito toma um corpo, os
seres mortais adquirem uma alma e, recebendo o espírito que sai das
substâncias, são dominados e se dominam entre si. O espírito tenebro
so, cheio de vaidade e de preguiça, quando domina os corpos, impede-
os de ser branqueados e de receber a beleza e a cor que o Criador lhes
faz revestir. Assim, os corpos, o espírito e a alma são enfraquecidos, por
causa da sombra estendida sobre eles.
Mas quando o espírito tenebroso e fétido é rejeitado, a ponto de não
deixar nem odor nem cor sombria, então o corpo se toma luminoso e a
Nigrum Nigrius Nigro (Obra ao Negro) 425
tei o que lhe disse e lhe retirei sua clareza por um circuito de palavras,
e disse que o que está unido estava desunido, e o que está muito próxi
mo estava distante. Asse, portanto, essas
Matérias, e em seguida cozinhe-as pelo
espaço de sete dias, de 14 e de 21, na
quilo que vem do ventre dos cavalos.
Então o Dragão* se faz, o que come
suas asas e mortifica a si mesmo. Depois
disso, coloque-o em um pedaço de teci
do e no fogo do forno, e vigie cuidado
samente para que ele não saia do vaso.*
E saiba que os tempos da Terra es
tão na Água, e que a Água sempre se faz,
Mortificação do composto:
até que você coloque a Terra sobre ela.
Johann Daniel Mylius,
Philosophia reformata, 1622.
426 Filosofar pi:lo Fogo
<í
[ Cavut Caput Corin
Putrc - a la c
Plulo - IcMíi
*
* *
*
* *
Juntos, essa sombra e o Sol fazem o dia e a noite, o que o Sol não
poderia realizar sozinho, ele, cuja tarefa é iluminar todos os lugares e cor
pos que lhe estão opostos, e nào apenas fazer sombra, se não for por aci
dente em sua ausência. Da mesma forma, o Sol filosófico faz o dia com
432 FlI.OSOFAR PELO FOGO
e você trabalhou com o Sol e a Lua para neles procurar nosso Enxofre,
examine atentamente se sua matéria é semelhante à da massa inchada, à
água fervente, ou melhor, à seiva derretida; pois nosso Sol, assim como
nosso Mercúrio, tem na obra do sol vulgar uma imagem emblemática jun
to com nosso Mercúrio. Seu forno* está aceso com o fogo alto, coloque
durante 20 dias sua esperança no calor fervente, durante esse tempo você
observará diversas cores e, lá pelo fim da quarta semana e com a condição
de que o calor tenha sido contínuo, você verá um verdor agradável que
não desaparecerá durante dez dias ou quase. Alegre-se, então, pois logo
certamente você verá tudo negro como carvão, e todos os membros do
seu composto serão reduzidos a átomos. Essa operação, com efeito, não é
Nigrum Nigrius Nigro (Obra ao Negro)
435
nada mais do que a resolução do fixo no não fixo, para que ambos unidos
não façam senão uma matéria, em parte espiritual e em parte corpórea. É
por isso que o Filósofo diz: “Pegue um cão de Khorassan e uma cadela
da Arménia, cruze-os, e eles engendrarão um filhote da cor do céu”. Pois
essas naturezas são transformadas por uma breve decocção em uma sopa
semelhante à espuma do mar, em que uma névoa espessa tinge dc uma
cor lívida [...]. Por isso, quando tiver visto em seu copo as naturezas se
misturarem simultaneamente como sangue coagulado ou queimado, esteja
certo de que a fêmea sofreu o abraço do macho. Espere então dez dias, a
partir da primeira desidratação dc sua matéria, para que as duas naturezas
sejam transformadas em uma mistura gorda; elas então circularão juntas
como se fossem uma nuvem espessa ou a espuma do mar, como já foi
dito, cuja cor será das mais escuras. Considere então garantido que a pro
genitura real foi concebida, pois você perceberá a partir desse momento
no fogo e nas paredes do vaso* vapores verdes, amarelos, negros e azuis.
Estes são ventos frequentes durante a formação dc nosso Embrião, c que é
preciso guardar com cuidado para que não escapem e para que a obra não
seja destruída. Preste também atenção para que o odor não se exale por
alguma fissura, pois a força da Pedra sofreria um prejuízo considerável.
Essa é a razão pela qual o Filósofo ordena conservar cuidadosamente o
vaso com sua ligadura, e seja cuidadoso para não operar de forma alguma
de maneira descontínua, de não deslocar nem abrir o vaso, ou interromper
em nenhum momento o cozimento, e continuar a cozinhar até que assista
ao desaparecimento do humor, o que é realizado durante 30 dias. Alegre-
se então, e esteja certo de estar engajado na via justa. Vele então sobre
sua obra, pois talvez verá, duas semanas após esse momento, toda a terra
se tomar seca e extremamente negra. Foi porque aconteceu a morte do
composto: os ventos cessaram, e todas as coisas se entregaram ao repouso.
Aí está o grande eclipse do Sol e da Lua, durante o qual nenhum dos dois
astros brilhará sobre a terra, e o mar desaparecerá. Então, o Caos terminou
e surgirão, ao comando de Deus e na ordem que lhe é própria, todos os
milagres do mundo.
Eyrénée Philalèthc,
A Entrada aberta ao palácio fechado do Rct
(Introitus apcrtus ad occlusum Regis Palatiutn, 1645),
in Jcan-Jacques Mangct, Bibltothcca Cbeniica Curiosa,
t. II. p. 672.
*
* *
436 Filosofar pelo Fogo
e ensaboado, pois está muito branco, é por isso que os Mestres da Arte
lhe deram os nomes de lavações, purgações, purificações, ensaboamen-
tos e abluções. No início a água aparecia, pois O Mercúrio é água, mas
quando essa água é espessa e que o negro se revela, é então a terra negra
que se revela.
Constata-se então que, por essa putrefação, acontece a separação
do puro e do impuro. O que a Natureza não pôde fazer, mas é ao Artista
que esse poder é devolvido, o que, sendo bem feito, a matéria não pode
mais permanecer em sua espécie nem em sua forma, mas bem dentro de
seu gênero, e assim a matéria está disposta a receber a forma de todos
os metais, e é uma operação, a única que a dispõe à separação de todas
as partes que a compõem, não sendo de forma alguma permitido ao
Artista, nem mesmo aos Anjos, destruir o gênero sem uma particular
permissão de Deus,, que assim o quis desde o início e desde a criação
de todos os seres.
Hcinrich von Bastdorff,
O Fto AriaJnc (1965), p. 96-99.
ir
* *
H ntão qual é a condição primordial, essencial, para que uma geração
Quando os
Opostos Se Unem
A Pedra branca começa a aparecer acima da superfície das
«águas ao pôr do sol, escondendo-se até a meia-noite, para
depois cair na profundeza. A vermelha opera na verdade
de maneira oposta, já que ela começa a se elevar acima das
águas ao nascer do sol até o meio-dia e em seguida cai na
profundeza.
Consilium Conjuga (1566), in Jcan-Jacqucs Manget,
Bibhotbcca Chenuca Curiosa, t. II, p. 237.
189. Cari Gustav Jung, Mysterium conjunctionis, trad. fr. Paris, Albin Michel, 1980 e 1982,
2 vol.
-440-
Quando os Opostos Se Unem
441
das qualidades, supondo, para ser (operativo, que tanto um quanto outro
dos parceiros tenham renunciado ao seu “si ” vulgar. Se Rei
„ j e Rainha,
Sol e Lua são as representações mais espetaculares do enfrentamento
terrestre e celeste entre Enxofre e Mercúrio, de outros corpos a cor
pos não menos mortíferos (Aguia/Leão, Lobo/cão), representam com
a mesma força o estado efervescente e sacrificial de uma Matéria cuja
transformação engaja o destino de toda a Criação: Queimar pela água
e lavar pelo fogo, matar o vivo e ressuscitar o morto, como ensina O
Rosário dos filósofos (séc. XIV), é apenas uma maneira de dizer, desta
vez operativa, que “o que está em cima é como o que está embaixo ”
(Tabula Smaragdina).
Mercurio/enxofre
C^ombates, cobre; combates, mercúrio; unem o macho à fcmea; este
*(N.T.:) No original está chalerant. palavra inexistente atualmente, o autor sugere caloroso.
Quando os Opostos Se Unem
443
e ainda que uma não possa aparecer aos nossos olhos sem a outra, e a
outra subsistir na natureza sem ela, mesmo assim é uma coisa.
Eis por que os Filósofos chamaram a matéria de sua bendita Pe
dra Rebis, que é uma palavra latina composta de Res e de Ris, que
significa dizer uma coisa dois, querendo-nos induzir a buscar duas
coisas, que não são duas, mas uma única que eles nomearam Enxofre
e Mercúrio.
Por isso é preciso concluir que eles desejaram que pegássemos um
Enxofre não estrangeiro, mas da natureza do nosso Mercúrio, senão ele
não poderia lhe dar sua forma; e também que o Mercúrio que pegamos
seja da natureza do Enxofre, do qual ele deseja a perfeição e a forma,
senão isso seria esforço e despesa perdidos. Ora, para retornar à verda-
Quando os Opostos Se Unem
445
*
* * ^-ítÍLX.^
Oriente/Ocidente
* *
exandre da Pérsia escreve livremente
Que o Lobo e o Cão se encontram no vale.
No entanto o Sábio nos mostra
Que cada um dos dois tem sua própria origem,
Pois c do Oriente que vem o Lobo
E do Ocidente sai o Cão.
Os dois tém ciúmes mútuos,
Furiosos, enraivecidos, ferozes até a demência.
Um priva o outro de sua vida
E de seu combate é produzido o grande Veneno.
Mas se, novamente, eles retomam à vida,
Então, verdadeiramente, de sua ressurreição
Faz-sc a mais alta Medicina e a melhor Teríaca190
Que possa ser encontrada na terra.
Por isso ela alegra todos os Sábios
E eles agradeceram a Deus,
Dando-lhe honra c louvor.
Lambsprínck, Tratado da Pedra filosofal
(Tractatulus de Lapide philosophico, 1599),
in Museuni Hermeticum, p. 350.
Águia/leão
Lobo/cõo
q e você desejar trabalhar com nossos corpos, torne um ávido lobo
cinzento que, submisso ao belicoso Marte em razão de seu nome, tam
bém é filho do velho Saturno, por sua raça de nascimento, e que é en
contrado em todas as montanhas e vales do mundo, assaltado por uma
fome atroz: lance-lhe o corpo do Rei, para que com ele faça o seu pasto
e, quando o tiver devorado, faça uma grande fogueira e lance o lobo para
que seja inteiramente consumido: então o rei será novamente libertado;
e quando tiver reiterado isso três vezes, o Leão terá vencido o Lobo, e
nele você não encontrará mais nada a ser consumido, dessa maneira, no
início de nossa obra nosso corpo está adequadamente preparado.
E saiba que essa é a única via correta e legítima para a purgação
de nossos corpos, pois o Leão se purifica a si mesmo com o sangue
do lobo, e a tintura do Leão se regozija prodigiosamente com a tintura
desse sangue, estando claro que o sangue de ambos se uniu mutuamen-
te em virtude de certa afinidade de vizinhança; e, quando o Leão está
enfim satisfeito, seu espírito tornou-se mais forte do que era antes, e
Veneno/teríaca
*
* *
1E/ m verdade, eis a grande maravilha e astúcia alada
Que em um Dragão* venenoso reside a Medicina suprema.
0 Mercúrio correta e quimicamente precipitado e sublimado,
Em sua própria Água reduzido e uma vez mais coagulado.
Um Dragão terrível mora na floresta,
Terrivelmente venenoso e a quem nada escapa:
Quando do Sol ele vê os raios e do fogo, o brilho,
Espalha então seu veneno e alça um voo tão prodigioso
Que nenhum animal permanece vivo para onde ele vai,
Que até mesmo o Basilisco* não pode lhe ser comparado.
Que sabiamente saberia matá-lo,
Escaparia de todos os perigos.
Sua morte acentua todas as suas veias, e suas cores,
E de seu veneno é confeccionada a Medicina suprema:
Pois seu veneno subitamente ele absorve,
Devorando, com efeito, sua própria cauda venenosa.
Aperfeiçoar em si todas as coisas ele mesmo se obrigou.
Dele escorre um bálsamo renomado,
E todos os Sábios enfim contemplam suas virtudes
Das quais eles se regozijam no mais alto grau.
Lambsprinck. Tratado da Pedrafilosofal
(Traetatulus de Lapide phtlosophúo, 1599),
in Museum Hemieticum, p. 352-353.
*
* *
452 Filosofar pelo Fogo
Sol/Lua
O Sol, como diz Algazel, é o < " ,
olho do mundo, o brilho do firma-
mento, a beleza do céu, o viajante das esferas celestes, a fonte de todo
calor, o guia dos planetas, o distribuidor das horas, a
graça e a honra de Deus. Ele também diz que a Lua
é a púrpura do céu, a acompanhante do Sol, a conso
lação dos navegantes, a generosa ama do orvalho, a
anunciadora da tempestade, a senhora da humanida
de. Dizem que o Sol ilumina quase todas as coisas,
e que a Lua espalha sua luz sobre as coisas contrá
rias: supondo que se possa falar dessa forma, uma
vez que ela não brilha por si mesma, mas empresta
Eis o irmão e eis a
lodo o seu brilho do Sol. Hermes diz: O Sol também
irnià. eis o marido e a
é o mestre dos corpos e das pedras, e é mais nobre do mulher, ofilho e a mãe.
que eles, pois é seu rei e a fonte de sua abundância,
pois nem a terra nem a água não o corrompem, nem o fogo, que não
o diminui, mas, ao contrário, retifica-o e o umedece; e também não o
consomem os enxofres corrompidos, porque sua natureza é igual, clara
e corretamente temperada. Por essa razão os Sábios o honraram e glori
ficaram, e nele colocaram a composição do Elixir da nobre Pedra, pois
ele é uma substância igual e permanente, fixada para sempre. Esse Eli
xir certamente tem a mesma constituição da substância do ouro, porque
é quente e úmido, e se mantém nos corpos como o Sol entre as estrelas,
das quais ele é o rei e a luz; e por meio dele são finalizadas as coisas
!
456 Filosofar pelo Fogo
*
* *
]E/ u sou a Lua, crescente úmida e fria, e tu
í- '
u-
kw
fe B''
5?—-
Saturno/Sol
T?
JL oi com palavras veladas e com sutileza que certamente os sábios
Filósofos se expressaram em seus livros, quando descobriram o co
nhecimento, a ciência e a experiência relativos à transformação de
dois metais muito enfermos e muito vis em dois outros muito nobres
e muito sutis, e isso principalmente quanto ao metal mais débil: tra
ta-se com certeza de Saturno, que é transubstanciado e transmutado
em outro muito nobre, pois certamente ele é o mais fraco e o mais
grosseiro entre o conjunto dos planetas de todo o céu; e até mesmo
entre os metais da terra, um mais vil pode ser transubstanciado em
puro Sol, uma vez que nele [os sábios] acolhem Júpiter, que sucede a
Saturno segundo o movimento do céu; e graças a essa possibilidade
assim descoberta, os Filósofos revelaram e expuseram essa arte a to
dos a quem Deus desejou conceder essa ciência, pois é bem verdade
que Saturno é um Sol em sua mais profunda natureza oculta, e que o
Sol é Saturno em sua natureza exterior manifestada; nesse ponto to
dos os Filósofos concordam, a respeito do qual só lhes resta inverter
o que está manifesto e o que está oculto, ou colocar no exterior o que
é obscuro no interior do corpo e, ao inverso, desviar para longe de
sua origem o que, de nosso ponto de vista, lhe é exterior, pois para o
interior sem nenhuma dúvida existe um puro e bom Sol em todas as
coisas reconhecidas; e dessa maneira é realizada a transmutação de
Júpiter em Lua, e assim nós vemos a verdade, pois a transmutação
nesses dois corpos, a saber em Sol e em Lua, pode ser efetuada sem
grandes despesas de duas maneiras.
Uma, que é admirável, é realizada graças à absorção de uma
medicina de um gênero único; a outra só é efetuada com a ajuda do
Sol celeste, sem adjunção de qualquer outra medicina que existe no
mundo, a não ser com um módico fermento solar e outro da Lua, que
juntos devem ser misturados e unidos, pois devem repousar em um
vaso* longe dos raios do Sol e da Lua, e isso certamente durante dois
dias e duas noites: o Sol e a Lua serão então estabilizados em forma
de pequenas pedras, e em seguida devem ser expostos a um vento
fraco, de tal forma que uma água seja novamente feita e com a qual
será confeccionada a pedra, sem fogo e sem calor algum: a matéria
é então preparada, e louvado seja Deus Jesus Todo-Poderoso. Com
toda certeza nós devemos louvá-lo, pois Ele nos deu a ciência de
Quando os Opostos Se Unem 459
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O Fogo Secreto
dos Sábios
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f ogo que se inflama espontaneamente. - ele é
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valo aumenta o óleo por causa
da umidade, e também fixa a
pedra nào pedra por seu calor.
Fora desses dois, existe outro
fogo que é quente e seco no
segundo grau, como o fogo do V
forno, depois que se retira o
pào: este opera uma fusão len ■ J
ta e nào carboniza, pois nele
nào existe nem chama nem
excesso de calor, este diminui
progressivamente até desapa O fogo subterrâneo: Athanase Kircher,
recer; mas, se permanecesse, Mundus subterraneus, Amsterdà, 1682.
ele fixaria o espírito no corpo ou no exterior do corpo. O fogo de cavalo
também não funde nem consome, mas domina e aumenta a umidade. O
forno de fixação comporta igualmente um fogo: este funde e fixa, mas
também nào consome, pois não tem chama e só difere do anterior por
que um tem um calor extremo e o outro não. O quinto, quente e seco no
terceiro grau, é chamado fogo de chama, ele calcina muito e nào opera
466 Filosofar pelo Fogo
*
* *
a verdade, temos três fogos, sem os quais a Arte não pode ser per
feita; e quem trabalhar sem esses fogos, trabalhará inutilmente. O primei
ro, o fogo da lamparina, é um fogo contínuo, úmido, vaporoso, aéreo. E
é preciso astúcia para encontrá-lo, pois a lamparina deve ser proporcional
aos lugares onde ela está confinada; e, para fazer bem e conduzir correta
mente esse fogo, é preciso ser muito judicioso, o que um Artista aturdido
jamais poderá fazer, porque, se o fogo da lamparina não é proporcional
geometricamente, e como se deve, uma dessas duas coisas acontecerá:
ou, sendo o calor muito fraco, os sinais, que os Filósofos disseram que
deveriam acontecer em um tempo determinado, não aparecerão de forma
alguma, e um atraso muito longo tomará sua esperança vã, não aconte
cendo nada do que você pretendia; ou, sendo o calor demasiado forte, as
flores do Ouro se queimarão, e você se arrependerá de lamentavelmente
ter dispensado esforço e trabalho. O segundo fogo é o fogo de cinzas,
sobre as quais se coloca e se encerra o Vaso* selado hermeticamente, ou,
melhor dizendo, esse fogo tem um calor bem suave, que vem do vapor
temperado da lamparina, e que também envolve o Vaso. Esse fogo só é
violento se for demasiado excitado. Ele digere, altera e é tomado de um
corpo diferente da matéria [do fogo]. E único e é até mesmo úmido, e
não é natural, e também tem as outras propriedades que acabo de citar.
O terceiro fogo é o Fogo natural de nossa Agua que também se chama
O Fogo Secreto dos Sábios 467
Fogo contra natureza, porque é uma Agua, e, no entanto, esse Fogo faz do
Ouro um Espírito, o que o fogo comum não poderia fazer. Ele é mineral,
é igual, participa do Enxofre, destrói tudo, congela, dissolve e calcina. É
penetrante, sutil e não queima de forma alguma. E a Fonte de Agua viva,
na qual o Rei e a Rainha se banham. Necessitamos desse Fogo em toda a
obra, no início, no meio e no fim, mas nem sempre precisamos dos outros
fogos, sendo necessário apenas por algum tempo. Quando você ler os
livros dos Filósofos, tenha sempre presente em sua memória esses três
tipos de fogo e os aplique às palavras deles, e com certeza compreenderá
facilmente tudo o que eles dirão sobre o fogo.
O Livro de Artépio (séc. XII?),
in William Salnion, Biblioleea dos Filósofos ALpiimicos
t. II, p. I49-I5I.
*
* *
O que podemos reter dessas palavras, a não ser que uma boa parte
de nosso segredo reside no fogo? Mas esse fogo varia de inúmeras ma
neiras: um é de fato natural, o outro, inatural; um é elementar e o outro
é contra a natureza. O fogo natural é aquele que provém da influência do
Sol, da Lua e das estrelas, por meio dos quais são engendrados os espí
ritos das águas ardentes, os vapores essenciais (e os outros potenciais)
dos minerais, e também as virtudes naturais dos seres vivos. O inatural
é um fogo ocasional, como o do calor durante as febres, e é chamado
fogo úmido feito artificialmente pelos Filósofos. Ele é igualmente no
meado fogo de primeiro grau que, em virtude de uma mesma proporção
de calor, é chamado de Banhos,* fogo de estufa ou de esterco; nesse
fogo é realizada a putrefação de nossa pedra. O fogo elementar é aquele
que fixa, calcina e consome, e que as coisas combustíveis alimentam.
0 fogo contra a natureza dissolve por sua potência, deteriora, aniquila c
destrói a potência dirigente da forma da pedra, pois ele dissolve a pedra
na água de chuva com a destruição da forma (e da figura) específica. Por
outro lado, ele é chamado fogo contra a natureza porque sua operação
é oposta a todas as operações naturais, como afirma Raymond [Lullc].
Com efeito, todas as operações que a natureza compõe, esse fogo as
destrói e as conduz à corrupção, se um fogo de natureza não lhe é acres
centado. É por isso que, como afirma Raymond, nele residem operações
contrárias. Pois, assim corno o fogo contra a natureza dissolve o espirito
do corpo fixo na água de chuva e comprime o corpo espiritual volátil
na terra congelada e cristalina, assim também, ao contrário, o fogo de
natureza congela o espírito liquefeito do corpo fixo em terra gloriosa.
468 Filosofar pelo Fogo
sua Pedra os Filósofos não queimam os dedos, e por que eles se servem
de um fogo diferente do fogo ordinário, agora mostrarei a diferença,
comparando-os um com o outro.
1. O fogo dos Químicos é conhecido por todos por ser vulgar, ao
passo que nosso Fogo é obtido pela arte e é difícil de descobrir.
2. Seu fogo é elementar; o nosso na realidade é natural e ao mesmo
tempo vivificante e celeste.
3. Seu fogo é ativo-quente e seco, porque eles o preparam a partir
da madeira, do óleo ou dos carvões; o nosso em verdade é quente-seco
e úmido, e mais espiritual do que matéria.
O Fogo Secreto dos Sábios 473
4. Seu fogo não efetua nada caso não tenha ar; o nosso, na verdade,
nào realiza nenhuma operação se, ao contrário, não estiver fechado em
um vaso* particular que é importante fechar para que apenas um míni
mo de ar ali possa ser introduzido.
5. O fogo dos Químicos não poder ser suficientemente bem dirigi
do e, se a matéria combustível faltar, ele enfraquece e apaga; o nosso,
na verdade, exerce continuamente sua operação perpétua pela qual, e
ainda que a mão não o socorra, ele é de fato alimentado e, graças a
um vapor espiritual, nossa matéria é por ele irradiada e circularmente
agitada.
6. O fogo dos Químicos é ativo-operativo-quente e seco. Sua pri
meira qualidade é consumir e destruir todas as coisas nas quais ele age.
Por isso, parece também verdadeiro que, se seu fogo for muito suave —
Banho-Maria* no qual os ovos podem ser cozidos destrói o germe de
qualquer coisa, seus outros fogos muito mais potentes podem mantê-lo
de uma forma mais rápida e forte. Mas, por mais importante que seja
essa contribuição ao nosso fogo, aquele aquece lenta e progressivamen
te nossa matéria e, por uma irradiação contínua, cozinha-a, conserva,
congela e umedece, alimenta e aumenta em virtude. Em resumo, o fogo
Filosófico difere absolutamente do fogo dos Químicos.
7. O fogo dos Químicos é violento e corrosivo, ali onde o nosso é
suave e generoso, natural, fechado-aéreo-vaporoso, dotado de um movi
mento circular que envolve a matéria, contínuo, temperado, ao mesmo
tempo nutritivo e vivificante e também celeste. Por isso é muito admi
rável que esse fogo Filosófico seja semelhante à matéria de sua Pedra,
uma vez que ele foi escolhido pela arte do raro segredo em relação com
a puríssima substância das entranhas da matéria. Esse fogo é, portan
to, o verdadeiro Banho-Maria, cujo segredo, saber de que maneira ele
deve ser preparado, é tão oculto quanto a própria matéria da Pedra filo
sofal, uma vez que a ciência de um compreende a inteligência do outro.
Ensinamento relativo à Árvore solar
(Instrwtio de Arbore solari),
in Theatrum Cheniicutn, t. VI, p. 190-191.
*
* *
Pássaro, tão caro aos Sábios, que verso ele poderia dignamente
cantar? Se de cem bocas minha língua proferisse sons, eles não basta
riam para elogiar esse pássaro cujas cinzas encontram uma vida mais
perfeita e um novo vigor no próprio seio da morte.
É nos confins de Syenes, que em um tempo muito remoto voou
pela primeira vez esse Pássaro, essa magnífica e benéfica Fénix,* cujo
pescoço emplumado de púrpura está envolvido por um colar, e cuja
cabeça é protegida por um esplêndido penacho, coroado por Rubis. O
calor em sua plumagem se mostra extremo, pois em suas profundezas,
476 Filosofar pelo Fogo
Natureza usa o Fogo - e nisso foi logo imitada pela Arte - como
se fosse um instrumento e um martelo no cozimento de sua obra: nas
operações que ambas efetuam, o fogo é, portanto, mestre e magistrado.
É por isso que o conhecimento dos fogos é altamente necessário ao Fi
lósofo, sem o que ele giraria em vão a roda da natureza, como um novo
íxion, preso a um infrutuoso trabalho.
478 Filosofar pelo Fogo
nome de fogo contra a natureza, uma vez que de alguma forma ele é con
forme à natureza, já que corrompe de tal maneira a matéria, sem deixar
de preservar a forma específica, que o dispõe para a geração.
Todavia, é mais crível que o fogo corruptor, que chamamos contra
a natureza, não seja outro que o fogo enxertado, mas em seu primeiro
grau: a ordem da Natureza exige, com efeito, que a corrupção preceda
a geração. É por isso que o fogo enxertado, que satisfaz a lei da na
tureza, executa uma e outra, colocando sucessivamente em ação dois
movimentos na matéria: o primeiro, e mais lento, é um movimento de
corrupção suscitado por um calor fraco, a fim de amolecer e preparar os
corpos; o outro, mais vigoroso, é o da geração, excitado por um calor
mais violento, a fim de animar e perfeitamente informar o corpo ele
mentar já disposto pelo primeiro. Esse duplo movimento é, portanto,
produzido pelo duplo grau de calor desse mesmo fogo, e não se
deve considerar que existam ali duas espécies de fogo; o nome de
fogo contra a natureza devendo ser dado com muito mais razão a um fogo
violento e destruidor [...].
Já que toda a obra consiste na separação e na perfeita preparação
dos quatro Elementos da pedra, consequentemente ela requer tantos
graus de fogos quanto existem nela de elementos, cada um deles sendo
extraído de acordo com o grau de fogo que lhe é apropriado. Esses qua
tro graus de fogo são chamados fogo de banho, fogo de cinzas, fogo de
carvões e fogo de chamas, o qual é igualmente nomeado fogo de rever
beração.* Cada um desses graus também possui seus próprios pontos:
ao menos dois e algumas vezes três. Que seja aumentado ou diminuído,
o fogo deve, com efeito, ser conduzido pouco a pouco através desses
pontos, para que a matéria chegue pouco a pouco no interior da Natu
reza e, por seu próprio movimento, à sua informação e à sua realização,
nada sendo, com efeito, tão estranho à Natureza quanto o que é violen
I to. Que o Filósofo se proponha então a considerar com que lentidão se
aproxima e se distancia o Sol, que dispensa sua chama e suas lampari
nas às coisas do Mundo em função das estações, e seu calor segundo a
lei do Universo, a quem ele comunica seu temperamento.
Jean TEspagncc, /Irfano da Filostfa hermética
(Arcanum Hermética’ ^hiilosofiar, 1623), in Jcan-Jacqucs
Manget, Bibliothcca Chcmica Curiosa, t. II. p. 658.
*
* *
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480 Filosofar pelo Fogo
chover; úmido, mas que resseca. Uma água que apaga, uma água que
lava os corpos, mas que não molha as mãos.
Eu não me espanto se muitos, e quase todos, erraram por não co
nhecerem o fogo, pois é como se a eles faltassem os instrumentos ne
cessários para sua arte; é certo que eles jamais chegariam ao objetivo a
que se propõem, e só fariam algo disforme e imperfeito. Para que então
suas obras sejam perfeitas, ó filhos da arte, sirvam-se desse fogo instru
mental. pelo qual somente todas as coisas se fazem perfeitas. Esse fogo
está espalhado por toda a natureza, pois sem ele ela nào poderia agir,
e em toda parte onde a virtude vegetativa está conservada, ali também
esse fogo está oculto. Esse fogo sempre se encontra junto ao úmido* ra
dical das coisas e acompanha continuamente o esperma cru dos corpos.
Mas, ainda que ele esteja assim espalhado em toda a natureza inferior,
e disperso nos elementos, ele nào deixa de ser desconhecido ao mundo, e
suas ações não são o suficientemente consideradas.
É esse fogo que causa a corrupção das coisas, pois é um espírito
muito grosseiro, inimigo do repouso, que só deseja a guerra e a destrui
ção. Uma coisa que deveria ser muito admirada na natureza é que tudo o
que se encontra exposto ao ar, tudo o que está na água ou sob a terra, se
reduz a nada e retorna em seu primeiro caos. As mais sólidas pedras, as
mais fortes torres, os mais soberbos edifícios, os mais duros mármores,
e todos os metais enfim, com exceção do ouro, reduzem-se a pó depois
de um longo tempo.
0 vulgar ignorante costuma atribuir uma coisa tão surpreendente
ao tempo que devora tudo, e isso vem do fato de que ele ignora o que
está oculto nos elementos, e sobretudo no ar. E uma chama invisível c
insensível que imperceptivelmente consome tudo, e o envolve sob um
profundo silêncio. Esse fogo de que falamos está difuso no ar, porque
sua natureza é toda aérea. Por causa de seu espírito grosseiro ele decom
põe os mistos* e, ao destruir as obras da natureza, reduz todas as coisas
ao seu primeiro ser por meio da corrupção. É por ele que as coberturas
de chumbo de algumas construções são depois de um longo período
convertidas em uma ferrugem branca, que se assemelha à cerusa arti
ficial e que, sendo lavada pela água das chuvas, com ela se confunde e
se perde. Mesmo o ferro, pouco a pouco se transforma em escória, uma
parte depois da outra. Os cadáveres dos animais, suas ossadas, os tron
cos das árvores bem como suas raízes, os mármores, as pedras, os me
tais, enfim, tudo o que existe na natureza cai pela sucessão do tempo e
é reduzido ao nada, unicamente por essa causa, e por esse fogo secreto.
482 Filosofar pelo Fogo
193. Ladrões, nào toquem no depósito sagrado de Plutão. / Ignorantes que são daquilo que o
vaso dissimula / Em que um duro trabalho encerrou os elementos divididos. / Em poder des
se modesto poeta jaz Maximus Olybius. / Com sua trompa fecunda, a abundância recom
pensará seus guardiões. / Para que de semelhante profundeza o bem não seja dispersado.
O Fogo Secreto dos Sábios 483
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O Céu Alquímico
Busquei, encontrei e limpei mais ainda;
Misturei, deixei amadurecer e descobri a Tintura de Ouro
Que já pode ser nomeada centro do mundo.
Origem de tantas opiniões, escritos c figuras variadas.
Hcnricus Madathanus, in Thtsaurus et
Armatnentartum medico-cbymicuni (1631), p. 475.
195. Planta herbácea com flores amarelas. Cor azul extraída do pastel-dos-tintureiros e
empregada na tinturaria.
488 Filosofar pelo Fogo
*
* *
CZ-ompreenda então o que diz Ostanes: “Coloque sua mão no interior
da pedra e lhe tire o coração, porque sua alma está em seu coração".
Assim então, por semelhante declínio, essa pedra rejeita tudo o que está
no interior, e o fundo do coração é rejeitado, assim como o espírito, que
é o ios* amarelo, estabelece em princípio como a cor de ouro, pois essas
coisas estão em relação com o que tambcm Demócrito diz: “Trate a pi
rita até que ela esteja amarela como a cor do ouro e verifique se o metal
se torna sem sombra. Se ele não se tornar sem sombra, não recrimine
o cobre, mas a você mesmo: pois não operou direito. Tratc-a então até
que o cobre, que se tornou amarelo e sem sombra, tinja todo o corpo de
ouro e se torne como a cor do ouro".
É preciso a partir de então considerar e observar se ele se torna
amarelo sem sombra, como a cor do ouro; se não se tornar sem sombra,
não pode tingir de amarelo como a cor do ouro. Com efeito, ele não
é ouro [ou dourado] quanto à sua qualidade, uma vez que são certas
qualidades que o tornam amarelo, pois a palavra qualidade tem como
etimologia a palavra fabricar. O amarelo produz uma tintura, cm razão
de sua qualidade dourada, pois é evidente que as ações exercidas pelas
qualidades são de certa forma incorpóreas. Disso decorre a ação de
dourar, uma vez que, se a cor não possui a qualidade amarela em sua
própria substância, ela não pode nem fazer o ouro nem tingir de ouro.
Mas nosso ouro, que possui a qualidade desejada, pode fazer o ouro e tin
gir de ouro. Este é o grande mistério [a saber] que a qualidade se torna
ouro e então faz o ouro.
Eis por que a Coroa dos filósofos diz que a qualidade, pela trans
mutação, realiza o que buscamos. Ele nos persuade e nos convida a
interrogá-lo, dizendo: “Qual é essa qualidade?”. Ele responde. “A qua
lidade do pó de projeção reside nas qualidades douradas. Se adquire a
qualidade dourada e não se torna ouro, possuindo a cor perfeita, ele não
490 Filosofar pelo Fogo
pode fazer o ouro.” Assim então, como ele diz, verifique se o amarelo se
tornou sem sombra, isto é, [um ser] incorpóreo, um ios* amarelo como
a cor do ouro. O que se deve verificar é se o amarelo se tornou sem
sombra e se parece com a cor do ouro.
Zózimo, “Sobre a virtude c a interpretação”,
in Marcelin Bcrthclot,
Coleção dos antigos alquimistasgregos, t. III, p. 133-134.
*
* *
B Por isso Que Ungir é apenas transformar ao tingir a coisa tingida
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*
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JL-/ u vi escorrer o Aço como se fosse uma onda viva
Enquanto brilhando pelo excessivo calor
à bola de enxofre ele estava oposto:
Vi dessa mescla um açafrão composto,
De que um peso colocado na água se dilata de tal forma,
Que tinge mil pesos na cor escarlate:
Cor que da água clara não se vê desunir
E nem com o tempo menos vermelho se tornar.
Se o Enxofre e o Marte da imperfeita tintura
Une-se tão forte à água que não é de sua natureza,
Seria coisa impossível ao nosso ouro exaltado,
E feito mais que perfeito quase em infinitude,
Espalhar sua cor nos corpos metálicos
Para torná-los para sempre templos de suas relíquias,
Uma vez que o paciente é semelhante à prata?
Em seu corpo de boa vontade a alma se aloja [...]
O fim universal da verdadeira Alquimia
E retirar dos metais uma impura cadmia,*
Que, ao infectá-la, sua pura substância impede
De chegar ao topo onde a natureza tende:
Depois acrescentar ao socorrer sua natureza aflita
Ao Enxofre muito perfeito sua semente purgada:
Pois o mais precioso é para o mais vil metal,
Em semente primeira e em nascimento igual [...].
Vemos esse milagre em outro vulgar
Que o simples rústico costuma fazer;
Quando industrioso em um balde de leite mistura
Alguns grãos de coalho, ou de um queijo velho,
Que o calor reúne, e faz tudo dispersar
Nesse leite, que logo em queijo vai se tornar:
O Céu Alquímico 493
*
* *
||La. ‘1
tí!
O
A multiplicação: Johann Daniel Mylius, Philosophia
reformata, Frankfurt, 1522.
Céu/quintessência
1E/ is a preparação dessa água divina: pegue os ovos da serpente do car
valho, que no mês de agosto mora nas montanhas do Olimpo, do Líbano
ou de Taurus. Pegue esses ovos frescos, coloque uma libra deles em um
L
500 Filosofar pelo Fogo
vaso de vidro. Adicione a água divina bem quente, faça subir quatro
vezes até a região celeste, até que o óleo destilado se torne de cor púr
pura. Pegue: 13 onças de amianto, nove onças de
sangue de conchinhas [de púrpura], cinco onças
de ovos de falcão com asas de ouro. Esses ovos
são encontrados perto dos cedros do Líbano, na
montanha. Esmague tudo em um pilão de pedra,
*
* *
c aiba então, meu caro Filho, que o ignorante não pode penetrar
no segredo da Arte, porque não tem o conhecimento do verdadeiro
corpo. Conheça então, meu Filho, as naturezas, o puro e o impuro,
pois nenhuma coisa pode dar o que ela não tem. E como as coisas se
fazem e não podem se fazer senão de acordo com sua natureza, sirva-
se então do mais perfeito e do mais próximo membro que encontrar,
e isso lhe bastará; deixe, portanto, o misto* e tome seu simples, pois
ele é sua Quintessência. Considere que nós temos dois corpos de uma
grande perfeição, cheios de Prata-viva. Retire então deles sua Prata-
viva e obterá a Medicina, que chamamos Quintessência, que tem uma
O Céu Alquímico
501
esse sangue repousar, retire a água e deixe-o secar. Depois moa com
a décima parte de sal comum, preparado pelos Médicos dos homens,
coloque tudo em um frasco de vidro e feche e sele diligentemente.
Depois o coloque no ventre de um cavalo preparado como explicado
anteriormente, e mexa o excremento uma ou duas vezes durante a
semana, para que o fogo seja mais forte, e dcixe-o apodrecer até que
tenha se convertido inteiramente em água. Essa água aparecerá em 30
ou 40 dias, algumas vezes mais, outras vezes menos. Coloque então
essa água em um alambique e ponha para destilar em bom fogo, deixe
subir tudo o que puder subir. E jogue o que subiu várias vezes sobre
as fezes* terrestres, misture sobre o mármore, e depois o destile e
refaça essa operação várias vezes. E quando tiver a nobre água desse
sangue bem reiterada e ratificada, e quiser atrair sua Quinta-essência,
coloque-a em um vaso* circular, e a faça passar por várias destila
ções, até que esteja reduzida, tenha o odor e o aroma da Agua ardente
citada antes. E essa é a Quinta-essência divina e mais milagrosa do
que se pode imaginar. •
Jean dc Rupcscissa, A Virtude e Propriedade da
Quinta-Essência de todas as coisas
(séc. XIV, trad. fr. 1549), p. 34-36.
*
* *
P egue um vinho que não seja muito caro, nem muito gordo, nem
*
* *
não é visível nenhuma distinção das partes, e que encerrou sob a tutela
de um vínculo mútuo a unidade das coisas inferiores com as superiores:
as quais, todavia, são apenas a única natureza. Dupla é, portanto, a sepa
ração, a saber: uma que concerne aos Elementos, para que os mais puros
sejam separados dos mais grosseiros; sendo a outra as qualidades ele
mentares: separação acontecendo depois aos olhos do vulgar, mas que
na realidade é primeiramente metafísica.
A natureza opera, contudo, apenas pela mistura que comporta duas
operações: a alteração e a animação. Das coisas particulares falaremos
mais amplamente em seguida; agora falaremos da separação do puro e
do impuro. Isso se efetua por si mesmo em alguns corpos, como o vi
nho, e em outros por um intermediário, como nos grãos e nas sementes.
Ainda que em todos os corpos produzidos peia natureza esteja oculta
uma quinta-essência, todavia em nenhum deles ela pode ser obtida
em uma quantidade tão abundante quanto no vinho, nem de nenhuma
outra coisa tão facilmente separada. É por isso que os Filósofos lhe dão
preferência, em razão da facilidade com a qual ela pode ser isolada
pela separação, e não porque essa quintessência seria cm si melhor ou
*
* *
■?= J J,
À V?
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e perfeita. Por isso, ela revela que, com essas perfeições e paramentos
corporais, devem ser necessariamente dadas as graças venusianas das
formas de onde devem por sua vez jorrar em abundância e de todas as
partes, de maneira realmente justa e boa, as ações honestas.
É igualmente verdade que a Alquimia ensina a conhecer a natureza
universal e mostra o caminho das virtudes e energias próprias às coisas
O Céu Alquímico 511
*
* *
Terra e Céu em perfeito equilíbrio: Marx Ernst, Depois dc mim o sono, 1958.
O Céu Alquíaaico 515
-516-
r
* *
35 m sua altura, o ouro é quente e úmido: é um ouro aéreo, sanguíneo,
clara, suas partes adquirem pouco a pouco uma coesão, até que ele se
torne sólido e pesado, e por isso não se putrifica na terra nem é facil
mente consumido pelo fogo.
Pscudo-Aristótelcs, Do Magistério perfeito
(De perfeeto Magistério), in Jcan-Jncqucs Manget,
Bibliotheea Chemica Curiosa, t. 1, p. 642.
*
* *
por causa da forte ligação do Mercúrio e do enxofre em sua cal. ele não
é tão úmido e untuoso ao tato quanto os outros corpos, por isso ele
não deixa marcas negras como os outros metais quando c usado em um
pergaminho. Mas, se lhe acrescentamos a prata ou outro metal, então
ele deixará marcas negras, porque a untuosidade do corpo que lhe foi
adicionado tende para a superfície c o faz branquear c se uinidificar: c
porque algumas de suas partes se espalham cm abundância em direção
ao centro e, por ser mais pesado, por causa de sua Prata-viva.
Pscudo-Aviccna, Pe.jitenc Tratade $d>re a
(‘íracMultis de Alrhfmia), m |can-|acqucs M.ingct.
Bibliotheea Chettuea Curicsa, /. I. p. 627.
*
* *
epois que tiver visto que sua matéria suportará a análise de fusão
e que desejar separar de seu metal, caso exista ali ainda alguma imun-
Uma Realeza Metálica: o Ouro Filosofal 521
sempre tendem para o alto nas pedreiras dos minerais e ali escorrem
generosamente com fertilidade.
“Eu elevo em grau, e sozinho enobreço a prata. Sou eu que, com
toda justiça, dou luz e claridade à Lua. Todos esses magos naturalistas
e sábios escritores falam de minha virtude e propriedade vermelha,
eles discorrem sobre isso em toda parte, desde o Oriente até o Poente.
E eu sou Senhor de todas as roupagens e cores celestes clarificadas. Sou eu
quem orna o firmamento, que dá o temperamento do ar, e o arco-íris é
revestido por mim segundo a vontade de Deus, meu Senhor. Eu dou e ele
vo todas as nobres pedrarias ou pedras preciosas em toda a terra, tudo
o que nela cresce, todas as criaturas e enfim todas as coisas. E tudo o
que não posso atravessar, transpassar ou penetrar interiormente em meu
movimento, eu o reparto e separo para realizá-lo na pedra luminosa da
natureza por meio de minha amiga e amante, a Lua.”
Basile Valentin, O Último Testamento (séc. XV’?).
reedição da tradução francesa de 1645.
Paris, Éditions Retz. 1977, p. 201-202.
*
* *
P rimeiramente, calcine o Sol, à maneira dos ourives por meio do
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“O fogo gosta de se inflamar, o ouro [gosta] de transformar em
ouro”: Michael Maier, Atalanta fugiens, Oppenheim, 1618.
casca oferece um núcleo de ordem medicinal, sem o qual toda sua con
figuração é quase totalmente ineficaz. Em 12ô, que devem ser enviados
a Anticira200 até que ali sejam purgados pela essência de Heléboro que
é ali extraída (assim como alguns relatam) aqueles que, movidos por
uma ignorância própria da alma, reneguem as virtudes medicinais do
Ouro ou, seduzidos pelo dinheiro de qualquer outro mal informado,
não louvem ou deem graças a Deus por todas essas maravilhas (que ele
quis fazer prevalecer no mundo por causa de sua providência singular),
e por outros educados e tornados sábios, espalhem para seu proveito a
animosidade e para sua notoriedade a mentira.
Johann Daniel Mvlins, Anatomia do Ouro
(Anatomia Auri, 1628). Epístola dedicatória, n. p.
*
* *
200. A cidade grega de Anticira era célebre na Antiguidade pela extração de Heléboro,
que ali era praticada. A raiz dessa planta, no entanto tóxica, deveria curar da loucura ou ser
utilizada como depurativo (cf. artigo Antídoto do Glossário).
528 Filosofar pelo Fogo
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C^uem quer que deseje conquistar esse Velo de Ouro,201 deve saber
que nosso pó aurífico, que nomeamos nossa Pedra, é apenas o Ouro co
zido e digerido até o grau supremo de pureza e de fixidez sutil ao qual
podem conduzi-lo a Natureza e a habilidade do ano; é por isso que o
Ouro assim tornado essência - e que chamamos nosso Ouro, uma vez
que ele nào é mais o do vulgar - é a última perfeição atingida pela Natu
reza e pelo ano. A esse respeito, eu poderia citar todos os Filósofos, mas
não preciso de testemunhas, sendo eu mesmo um Adepto e escrevendo
de modo mais claro que qualquer outro antes [...]. O Ouro é, portanto, o
verdadeiro, o único princípio cuja purificação deve ser operada. Nosso
Ouro, e do qual fazemos a experiência por causa de nossa obra, é, no
entanto, duplo. Um, alçado à maturidade, é o Latão* amarelo fixo, cujo
coração ou centro é de fogo puro. É por isso que seu corpo se defende
no Fogo, onde ele acolhe sua depuração, de forma que não cede em
nada à tirania deste último ou não sofre com ela. Esse Ouro representa
em nossa obra o papel de macho, por isso ele é unido ao nosso ouro
branco mais cru, desempenhando o papel de semente feminina, na qual
ele deposita seu esperma, um contraindo com o outro uma aliança in
dissolúvel, da qual é concebido nosso Hermafrodita,* tendo a potência
de um e do outro sexo. O ouro corpóreo está, portanto, morto, antes de
se ter unido à sua noiva, com a qual o Enxofre coagulante, que no ouro
é extrovertido, torna-se introvertido. Assim, a altura está oculta e a pro
fundidade, manifestada. Assim, o fixo acontece por um tempo volátil, a
fim de possuir em seguida um estado mais nobre que aquele que tinha
herdado, e no qual ele obterá uma potente fixidez. Parece claramente,
portanto, que todo o segredo consiste no Mercúrio, do qual o Filósofo
diz: No Mercúrio se encontra tudo o que os Sábios buscam. E Gebcr diz
a esse respeito: Louvado seja o Altíssimo, que criou nosso Mercúrio e
lhe deu uma natureza que supera todas as coisas. Dc fato, se ele não o
fosse, os alquimistas se enalteceriam como bem entendessem, mas sua
obra seria vã. Por isso, é evidente que esse Mercúrio não é o do vulgar,
mas aquele dos Sábios; porque todo Mercúrio vulgar é macho, isto é,
corpóreo, especificado e mortal, ao passo que nosso é espiritual, femi
nino, vivente e vivificante.
Eyrcnéc Philalcthc, A Entrada aberta ao Palácio fechado do Rei
(Introitus apertus ad occlusum Regis Palatmm, 1645),
in Jean-Jacques Manget, Bibliotheca cheinica
curiosa, t. II, p. 661-662.
*
* *
^Jeria outro Mercúrio, e outro Ouro, dos quais Hermes ouviu falar;
um Mercúrio úmido e quente, e sempre constante no fogo. Um Ouro
que é todo fogo e todo vida. Tal diferença não seria capaz de fazer
facilmente distinguir estes daqueles do vulgar, que são corpos mortos
privados de espirito, ao passo que os nossos são espíritos corpóreos
sempre vivos?
Ouvimos falar entre os Filósofos apenas do Ouro vivo, do Ouro
filosófico; mas, longe de querer nos explicar o que é, parece que eles
assumem a tarefa de escondê-lo e de envolvê-lo em sombras. Contudo,
como é nisso principalmente que consiste o verdadeiro fundamento da
530 Filosofar pelo Fogo
-534-
Uma Soberania Benéfica: a Pedra dos Sábios 535
vulgar pela palavra, mas eles o revelaram apenas aos iniciados. Eles o
chamaram a pedra encéfalo em seus escritos simbólicos, a pedra não
pedra, a coisa desconhecida que é conhecida de todos, a coisa despreza
da que é muito preciosa, a coisa dada e não dada de Deus. Para mim, eu
* N.T.: Mercúrio dos alquimistas.
** N.T.: Vitriol verde.
202. Dom Antoine-Joseph Pernéty esclarece a esse respeito: “Mas todos esses nomes nâo
lhe foram dados pela mesma razão; os autores nessas diferentes denominações só levaram
em conta a maneira de considerá-la, ora em relação à sua cor, ora às suas qualidades.’’: As
Fábulas egípcias e gregas reveladas e reduzidas ao mesmo principio (1758), t. 1, p. 189.
Uma Soberania BenEfica: /\ Pedra nos Sábios 537
a saudarei com o nome dc [pedra] não dada c dada por Deus: é a única,
em nossa obra, que domina a matéria. Esta é a preparação que possui a
potência, o mistério mitríaco.
O espírito do fogo se une com a pedra e se torna um espírito dc
gênero único. Ora, eu lhes explicarei as obras da pedra. Misturada com
o comaris,* ela produz as pérolas, e é nesse momento que a chamamos
crisólita. O espírito opera todas as coisas pela potência do pó seco. E
vou explicar a palavra comaris, coisa que ninguém ousou divulgar, mas
aqueles [os antigos] a transmitiram às pessoas inteligentes. Ela detém
a potência feminina, aquela que se deve preferir, pois o branqueamento
tornou-se objeto de veneração para todo profeta [...].
Stéphanus diz: Pegue [o metal composto] dos quatro Elementos,
adicione o arsénico* mais elevado e o mais baixo, o rugoso e o ruivo,
o macho e a fêmea, em peso igual, a fim de uni-los entre si. Pois, assim
como o pássaro choca seus ovos e os conduz a termo no calor, da mes
ma maneira você chocará e levará a termo sua obra, depois dc tê-la leva
do para fora, regado com as águas divinas, exposto ao sol c nos lugares
quentes; depois de fazê-la cozinhar em um fogo lento, e depositando-a
em um leite virginal. Preste atenção à fumaça. Mergulhe o produto no
Hades,* mexa com cuidado, até que a preparação tenha adquirido con
sistência e não possa escapar do fogo. Então, pegue [uma parte] e, quan
do a alma e o espírito se unificarem [com o corpo] e formarem apenas
um único ser, projete sobre o corpo metálico da prata e você terá o ouro,
que nem os tesouros dos reis continham.
Eis o mistério dos filósofos, aquele que nossos pais juraram não
revelar nem publicar.
Zózimo. “Sobre a cal”, in Mareei in Berthelot,
Coleção dos antigos alquimistas gregos, r. III. p. 122-123.
*
* *
Pedra dos Filósofos não é nada mais do que o Ouro muito perfeito,
isto é, conduzido a tal grau de perfeição que ele possa aperfeiçoar todos
os corpos imperfeitos. O Ouro é, portanto, essa Pedra, mas não o vulgar,
pois ele está morto, e o nosso está vivo. É aquele que é preciso pegar,
mas saiba qual é esse Ouro vivo. Quando os frutos estão maduros, eles
carregam a semente, pela qual podem ser multiplicados até o infinito;
assim, o Ouro é um fruto que nunca adquiriu essa maturidade nas minas
e, consequentemente, é chamado morto, pois sua semente é a coisa que
pode fazê-lo viver e vegetar como os dois outros reinos. Mas podemos
imaginá-lo como essa semente que nele já existe potencialmente, pois
ele é criado para multiplicar, assim como esses dois irmãos; do contrá
rio, ele poderia ser chamado o impotente da natureza. Ele realmente
tem essa semente imaginada, que a Natureza tratou por todos os meios
de lhe fazer efetuar, mas suas forças não foram suficientemente grandes
e exigem o auxílio do Artista. É por isso que está dito: Ajude-me e eu
542 Filosofar pf.lo Fogo
*
* *
JEf ssa pedra, da qual é feita essa obra, tem em si três cores. Ela é com
efeito branca e vermelha, de um vermelho muito vermelho; e citrino,
do mais belo citrino: celeste, vigoroso, denso. Nessa pedra estão quatro
Elementos: aquoso, aéreo, ígneo e terrestre. No oculto dessa pedra es
tão calor e secura e, em seu manifesto, frieza e umidade; convém então
ocultar o manifesto, e fazer o que está oculto se manifestar, pois o que
está no oculto, a saber, calor e secura, é um óleo, e esse óleo é seco; essa
Ua\a Soberania Benéfica: a Pedra dos Sarios 543
secura, e somente ela, tinge, porque nada alem do álcali tinge. O que
está no manifesto frio e úmido é uma fumaça aquosa altcrante; convém,
portanto, que essa umidade e frieza sejam a esposa do calor e secura,
para que ela não fuja sob o efeito do fogo, pois no seio dessa frieza c
umidade está uma partícula quente e seca; convém, portanto, que o frio
e o úmido recebam o quente e o seco que estavam no oculto, c que eles
façam uma única substância. Essa frieza e umidade é, com efeito, uma
fumaça corruptora e aquosa, a propósito da qual se diz que a umidade,
aquosa e adustível,* corrompe os corpos e tinge em negror. Convém,
portanto, destruir essas enfermidades no fogo e por meio dos graus do
fogo. Esse é o Livro das Três palavras, livro da preciosa Pedra, que é
o corpo aéreo e volátil, frio e úmido, aquoso e adustível, em que cstào
calor, secura, frieza e umidade: uma virtude está no oculto, outra está
no manifesto. Isso para que o que está no oculto se torne manifesto, e o
que está manifesto se torne oculto pela potência de Deus, tanto o calor
quanto a secura. Os Filósofos persas dizem, com efeito, que a frieza e a
umidade aquosa e adustíveis não gostam do calor e da secura, pois o ca
lor e a secura destroem o frio e o úmido aquoso e adustível pela virtude
divina. E então, esse espírito é transformado em um corpo muito nobre,
e não foge do fogo, e escorre como um óleo que é tintura viva e multi
plicativa, que pondera, colore, ilumina, fortifica, muito bela, penetrante,
protetora e perpétua, e por isso é um Sol precioso.
Livro das três Palavras (Líber trium lerborunt),
in Aurífera Artis tjuam Chaniani wcant, t. I. p. 377-378.
*
* *
I^m um campo violeta escuro, um homem vermelho de púrpura, se
Por isso, agora ela leva o homem para fora desse vale de misérias,
isto é, para longe dos incómodos da pobreza e da enfermidade e, com
suas asas, levanta-o gloriosamente para fora das estagnadas águas do
Egito (que são os pensamentos ordinários dos Mortais) e, fazendo-o
desprezar a vida e a riqueza presentes, faz com que ele medite noite e
dia em Deus e em seus Santos, deseje o Céu* Agravado, e beba as doces
nascentes das fontes da esperança eterna.
Louvado seja Deus eternamente, que nos deu a graça de ver essa
bela e toda perfeita cor de púrpura, essa bela cor da papoula campestre
do rochedo, essa cor de Tiro, cintilante e flamejante, que é incapaz de
mudança e de alteração sobre a qual o próprio Céu, e seu zodíaco, não
pode mais ter domínio nem potência, cujo brilho flamejante e ofuscante
parece de alguma forma comunicar ao homem algo de supraceleste,
Uma Soberania Benéfica: a Pedra dos SAbios 545
sse capítulo contém a arte inteira e a revela aos Sábios que co
nhecem o Leão químico. Com efeito, uma vez que se sabe o que é o
corpo de nosso Leão, ou Pedra dos Filósofos, todo o resto não passa
de assunto de mulheres e brincadeira de criança: precisamos cozinhar
pelo tempo necessário e ter a paciência e o tempo, até que a obra tão
desejada esteja terminada. Se a Pedra é a quintessência do Céu e de
todos os Elementos, ela não pode ter outro corpo, nem colocar outra
vestimenta, senão o corpo e a vestimenta do sal. Com efeito, enquan
to ele se cozinha no centro da Terra, esse espírito não pode endossar
por esse cozimento nenhuma outra vestimenta além do sal. Nesse sal
contemplamos, com efeito, todos os Elementos: nós vemos o fogo, por
causa de seu calor e do brilho que ele manifesta; vemos o ar, por causa de
sua porosidade e de sua brancura; vemos a água, por causa de sua diafa-
neidade e de sua umidade; vemos a terra, por causa de sua corporeidade
e de sua massa compacta; vemos o Céu, por causa das características e
propriedades notáveis do Sol, da Lua e de todas as estrelas, de forma
que todas as causas que produzem o próprio Sal estão encerradas e nele
percebidas. O que mais desejaríamos em um sujeito tão excepcional,
que chamamos Pedra dos Filósofos, e que, no entanto, não é uma pedra
e não tem a natureza da pedra?
Picrrc-Jean Fabrc, Manuscrito dirigido a Frederico
(Manuscriptuni ad Fredericutn, 1690), in Jcan-Jacqucs Manget,
Bibhotheca Cheniica Curiosa, 1.1, p. 293.
*
* *
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onde a Natureza emprega mil anos, o Artista pode empregar apenas mil
dias, e ainda menos.
A Natureza revelada ou Teoria da Natureza (1772),
tradução do Aurea Catena Honieri, dc Anton Joscph
Kirchwcgcr (1723), 1.1, p. 364-365.
*
* *
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*
* *
J^etomemos agora o terceiro funda mento,204 sobre o qual repousa a arte
médica, a saber, a alquimia. Se o médico a ela não se aplica com dedicação
e não adquire uma grande experiência, então toda a sua arte permanece vã.
A natureza é de fato tão sutil e tão penetrante em suas operações que não
se pode, sem uma grande habilidade, dela tirar proveito. Pois ela não revela
nada que esteja perfeitamente finalizado, e cabe ao homem finalizar seus
desejos; essa realização leva o nome de alquimia [...].
Por isso, um médico que deseja se instruir deve saber o que é a
calcinação e o que é a sublimação. E para isso ele não deve se contentar
com uma abordagem superficial, mas aprender também a conhecer em
profundidade as transformações interiores das coisas; o que é muito mais
importante, pois da arte e da maneira de preparar essas coisas depende
que se obtenha o amadurecimento que a Natureza não lhes deu. O médico
deve praticar sua arte, a fim de se substituir ao tempo, pois aqui ele é ao
mesmo tempo o verão, o outono e o Astro* no qual ele deve tudo realizar.
O fogo é a terra, o homem é o organizador, as coisas dormem no seio das
sementes. E, ainda que consideremos todas as coisas no mundo como se
fossem simples ou se tivessem tornado, elas são, no entanto, muito diver
sas quanto ao seu objetivo. Diferentes igualmente em sua função última,
ainda que, mediante esse processo (alquímico), todos os arcanos nasçam
no fogo; e que além do fogo seja sua terra e também seu sol, e que a terra
e o firmamento não sejam senão uma única coisa nessa segunda criação.
Os arcanos ali fermentam, ali se transformam [...].
Vocês acham que eu encontro indevidamente um apoio na arte da
alquimia, que me traz a prova de que a verdade lhes é e lhes era desco
nhecida, como me ensina a experiência? Seria necessário que essa arte
não fosse boa, capaz de colocar todas as coisas à prova e revelá-las?
Será necessário que seja injusto esse fundamento da arte médica que
prova, mostra e confirma o saber do médico? Vocês acreditam que possa
*
* *
-/\^Ledicina dada por Deus para proteger a Vida dos homens em
condição de viver por muito tempo, para resistir à lepra, tendo em si
uma infinidade de maravilhosas virtudes ocultas. Pegue três dracmas205
de sol puro reduzido em pó sutil, uma dracma do melhor Bálsamo, da
melhor mirra, aloé hepática, duas dracmas de incenso e de láudano
não falsificado, cinco dracmas de cânfora; amasse tudo com óleo de
maçãs de mandrágora e Bálsamo misturados. Tome uma dracma, ou
dracma e meia dessa medicina todos os meses, beba depois um copo cheio
de vinho ardente misturado com água de buglossa e flores de rosmarino:
misture e destile em um alambique. Essa medicina é real e magnífica, so-
bre a qual os louvores são infinitos e que não devem ser de forma alguma
comunicadas aos indignos. Ela é comparável ao ouro potável, e também
muito mais preciosa do que o ouro potável, se o ouro fosse reduzido em
água sem corrosivos e misturado com as coisas citadas: se alguém desejar
conservar sua juventude por muito tempo e não pode ter essa medicina,
que use todos os dias mirobálanos206 caramelizados com sua calda.
Jcan Liebaut, Quatro Livros dos Segredos de
Medicina e da Filosojia alquimica (1628), p. 290.
*
* *
Preparação do Unicórnio mineral
*
* *
c empre achei que a medicina ordinária, da forma como é cotidiana-
mente exercida, não era a verdadeira; e que ela, visto sua inutilidade
e o pouco de efeito que faz surgir de suas promessas, não era senão a
sombra daquela em que um abismo infinito de razões abunda em um
maravilhoso Tesouro de milagrosas experiências. Esse pensamento,
ainda que limitado à medicina, estende-se, no entanto, para além dela,
pois é certo que, tomando-a pelo devido viés, poderíamos especificá-la
em todas as outras ciências, as quais estão contidas na medicina. E por
isso que o Sábio, ao falar da Medicina, fala da Enciclopédia perfeita.
Quem não teólogo, e astrólogo, pode ser Médico e Mago; e todos os
que se dizem médicos sem esse conhecimento se fazem conhecer por
suas obras de falsos médicos; os quais impondo à Natureza, oferecem
apenas a levedura da Morte àqueles que recebem de suas mãos o vene
no, em vez da Medicina [...].
Essa verdadeira Medicina, portanto, é aquela de cujo conheci
mento esses grandes e inimitáveis Médicos e Filósofos antigos, como
r
Uma Caridade Prolífica: a Medicin/k Universal 567
207. Nào há nenhuma doença contra a qual nào tenha sido inventado um remédio (uma
“medicina”).
208. A Medicina é uma graça dada por Deus, cujos livros sábios nào sào o fundamento, mas
essa misericórdia invisível e esse dom de Deus.
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que os jovens, tendo muito úmido e calor, têm também muita vida, c
que os idosos, por serem muito resfriados, c muito ressecados morrem
incontinênti.
Faz parte de nossa vida, assim como de uma lamparina que se apa
ga logo que o fogo ou o óleo lhe faltem, mas que também se mantém,
na medida em que reparamos aquilo que se dissipa. E como a lamparma
nào pode queimar senão à medida que lhe fornecemos o que ela conMi
me, da mesma maneira não podemos viver se não nos restabelecemos
pelos alimentos e pela atração que fazemos do Ar (...].
Ora, uma vez que os Médicos estão de acordo conosco, que o calor
natural e o úmido radical são os princípios da vida, é preciso então que
confessem que, para prolongar nossos dias, é absolutamente necessário
restabelecer nosso princípio de vida. E eles não ignoram que ixav;
princípio de vida não pode ser conservado nem restabelecido por coisas
grosseiras e dessemelhantes ao nosso temperamento, mas sim por puras
substâncias que lhe são absolutamente conformes, c por alimentos de
semelhante natureza, rejeitando para sua alimentação, e para sua con
servação, tudo o que lhe é estrangeiro.
É por isso que aquele que certamente quer conservar a vida, uma
longa sequência de anos com uma vigorosa saúde, não pode encontrar
meio mais garantido do que conservar bem seus Princípios. Mas é pre
ciso saber que os Princípios da vida só se podem conservar e restabe
lecer pelas mesmas causas com que são produzidos; isto é. por puras
substâncias espirituais e formais que lhes são absolutamente conformes
e de semelhante natureza [...]. Essa pura substância vital é conhecida
pelos verdadeiros Filósofos como o único alimento Celeste, e a natural
carne do Princípio de vida, essa substância vital, ou humor de vida,
os Sábios sabem (pela indústria secreta de sua arte divina) conjugar e
unir fisicamente à pura substância material do corpo Astral do ouro. E
dessas duas puras substâncias formais e materiais incorruptíveis, eles
compõem filosoficamente o grande Ouro potável [...].
Portanto, que aquele que pretender adquirir a secreta ciência da
oculta composição do grande Ouro potável dos Sábios trabalhe para
descobrir o segredo escondido do engenhoso artifício dos Filósofos,
de que eles se servem para fazer a misteriosa conjunção das formas
e das matérias, sem a qual é praticamente impossível poder chegar à
perfeição desse grande Ouro potável. Mas por ela realizamos em sua
mais alta perfeição esse soberano remédio que é o chef-d oeuvre [obra-
prima] da arte, e da natureza. E por essa filosófica conjunção das subs
tâncias FORMAIS com as MATERIAIS que se faz o grande e sagrado
570 Filosofar pelo Fogo
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576 Filosofar pelo Fogo
O corpo não se alimenta pelo corpo, mas pela vida comum que é
o fogo vital e Espírito universal, como de um alimento. E por isso que o
homem não é alimentado pelo beber nem pelo comer, mas sim por esse
fogo vital, que nele está oculto e que se une facilmente ao natural, por
causa da homogeneidade que ele tem com o fogo vital do fogo, uma vez
que não são senão uma mesma coisa.
O Cavaleiro desconhecido, A natureza a descoberto (1669),
in Eugène Canselict, Três Antigos Tratados da Alquimia,
Paris, J. J. Pauvert, 1975, p. 22-25.
*
* *
IE/ ssa medicina tem outras virtudes ainda mais inacreditáveis. Quan
do está no Elixir branco, ela tem tanto de simpatia com as Damas, sobre
a qual você falava há pouco, que ela pode renovar e tornar seus corpos
tão robustos e vigorosos como eram em sua juventude. De forma que
elas não pareçam ter mais do que 19 anos e tenham um rosto cheio
como a lua aos seus 14.
Para isso, prepara-se antes um banho com várias ervas odoríficas, com
as quais elas devem se esfregar bem para retirar a sujeira. Em seguida, elas
entram em um segundo banho sem ervas, mas no qual foram dissolvidos
três grãos de Elixir branco com um quartilho de espírito de vinho. Elas per
manecem um quarto de hora nesse banho, depois disso, sem se enxugar,
prepara-se uma grande fogueira para secar esse precioso licor. Então elas se
sentem interiormente tão fortes e seus corpos se tomaram tão brancos que
elas não poderiam se imaginar sem ter experimentado isso.
Nosso bom pai Hermes continua concordando com essa operação,
mas ele também deseja que, ao mesmo tempo, se tome durante sete dias
consecutivos, interiormente, esse Elixir, e acrescenta a isso que, se uma
Dama faz a mesma coisa todos os anos, ela viverá isenta de todas as
doenças às quais estão sujeitas as outras mulheres.
O Parnaso sitiado ou a guerra declarada entre
os Filósofos antigos e modernos,
Atribuído ao Senhor F. A. D. M.
(1697), p. 28-29.
*
* *
Uma Caridade Prolífica: a Medicin/k Universal 577
juventude, ainda que fosse idoso, pelo uso de um licor, ou elixir extraí
do de um cervo inteiro. Também sabemos que o cervo pode viver vários
séculos e que, consequentemente, podemos extrair dele princípios de
vida de uma duração mais longa.
Para isso, cortamos inteiramente o corpo de um cervo; depois de
ter separado os excrementos, quebramos os ossos: tudo foi colocado em
digestão, depois destilado em banho-maria* em um alambique de pro
porção a poder contê-lo; o licor sendo destilado, separamos o muco e os
espíritos salinos, por meio das digestões e das coobações* reiteradas; a
matéria restante, que passou pelo alambique por meio de vários tubos,
dá um óleo amarelo e outro negro, que no final é bem malcheiroso. A
cabeça morta,210 que permaneceu, foi calcinada: dela se extrai um sal
volátil e um fixo; dela separamos uma terra, que foi purificada e serviu
para depurar os óleos e para eliminar seu mau cheiro; muitas elabora
ções foram feitas com cada uma dessas substâncias, até que elas fossem
reduzidas ao estado elementar, sem nenhuma mistura de matérias ex-
cremenciais; nesse momento, fazemos a junção de todos os princípios;
e disso resulta um elixir ou licor muito suave, muito penetrante, e dc
uma virtude singular para prolongar a vida.
Eis, em resumo, a descrição da Medicina universal do reino animal.
Revelações cabalísticas de uma Medicina universal
extraída do Vinho, pelo Senhor Gosset
(1735). p. 19-21.
*
* *
Jean Duvet, Alegoria aos monstros (“Veneno e contra-veneno'), gravura séc. XV.
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582 Filosofar pelo Fogo
Glossário
Principais dicionários especializados consultados: Martin Ruland,
Lexicon Alchemice (1612); William Salmon, Dictionnaire hermétique
(1695); Guglielmo Johnson, Lexicon Chymicum (in Jean-Jacques Man-
get, Bibliotheca Chemica Curiosa, 1702); Dom Antoine-Joseph Per-
néty, Dictionnaire mytho-hermétique (1758). Também foram utlizadas
as obras de Marcelin Berthelot: Les Origines de l’Alchimie (1885),
Collection des anciens alchimistes grecs (1888, 3 voL), Introduction à
1’étude de la Chimie des Anciens et du Moyen Âge (1889), La Chimie au
Moyen Âge (1893), bem como Psychologie et Alchimie, de Cari Gustav
Jung (trad. francesa de 1970).
As palavras objeto de um artigo do glossário estão assinaladas por
um asterisco no texto da obra.
Adustão: Do latim adustio, ação de queimar. Podemos nos surpreender
que nenhum dos autores de dicionários herméticos tenha levantado esse
termo, no entanto muito presente nos tratados e geralmente relacionado
à ação do Enxofre, que no estado impuro é chamado “escaldante”, em
oposição ao Enxofre puro e “vivo” (ou ainda vermelho), que transmite
sem consumação seu calor e sua luz regeneradores.
Águia: Por esse pássaro consagrado a Júpiter, cujo reino vem depois do
de Saturno (Obra ao Negro) no desenrolamento da obra filosófica, os
alquimistas designam em geral o estado de extrema volatilidade de sua
matéria depois de sua sublimação: “Por águias se entende a substância
volátil”, está dito em O Livro de Sénior. Mas, quando a Águia consegue
devorar o Leão, trata-se então do poder dissolvente do volátil sobre o
fixo: o que simboliza aos olhos dos Adeptos a fábula de Prometeu preso
ao seu rochedo, o fígado devorado por uma águia.
-583-
584 Filosofar pelo Fogo
lhe tirado toda a sua escuridão” (Dom Pernéty). A essa operação são
associados os símbolos da brancura (Albedo)’. Lua, Virgem, Cisne, leite,
terra branca folhada, rosa branca...
Demogorgon: Considerado pelos Antigos como o Gênio da Terra, esse
personagem aparece ocasionalmente nos tratados para designar o Fogo
ou o Espírito adormecido nas profundezas de uma “terra” destinada a
se tornar, graças à intervenção da Arte, a dos Sábios: “Essa raiz e mina
está encerrada no antigo seio do velho Demogorgon, progenitor uni
versal, que os antigos Poetas engenhosamente pintaram vestido de uma
capa verde, envolto em uma ferrugem, coberta de obscuras trevas, e ali
mentando qualquer espécie de animais” (Clovis .Hesteau de Nuisement,
Tratado do verdadeiro Sal secreto dos Filósofos, 1612).
Dragão: Representação simbólica e proteiforme do Mercúrio sob seu
aspecto devorador, o Dragão está, como a serpente, intimamente asso
ciado às diversas fases da operação alquímica: em forma de Ouroboros,
mordendo sua própria cauda, é “a imagem do mundo” (Olimpiodoro,
séc. V) e simboliza a unidade da matéria, ao mesmo tempo em que a
circularidade do processo de transmutação. Provido de asas, ele se torna
a expressão da volatilidade mercurial e, privado de asas, da fixidez do
Enxofre: “O Dragão é o Enxofre, que é extraído dos corpos pelo Ma
gistério” (Seala Philosophorum). Às vezes guardião de um tesouro aná
logo ao das Hespérides (pomo de ouro), ele então vela cuidadosamente
sobre o segredo de sua preservação e destrói com seu sopro pestilento
quem quer que se aproxime imprudentemente.
Espagíria: Etimologicamente, a espagíria (de spao, dividir, dilacerar)
é a ciência “que ensina a dividir os corpos, a reduzi-los e a separar
seus princípios [...]. Seu objeto é, portanto, a alteração, a purificação e
até mesmo a perfeição dos corpos, isto é, sua geração e sua medicina
(Dom Pernéty). Assim compreendida, a espagíria não é nada diferente
da alquimia. Todavia, os alquimistas insistiram em distinguir sua Arte
daquela dos espagiristas (sopradores, lacrimistas) que, usando meios
violentos e contra a natureza, produziam uma imitação da verdadeira
Filosofia, e mereciam assim, bem como seus homólogos antigos, des
prezados por Platão, o nome de sofistas.
Etiópia: Enquanto que a “Terra negra” do Egito é reconhecida como a
origem — simbólica mais que geográfica - da Arte alquímica, a escuri
dão da terra da Etiópia é em geral associada ao Nigredo, como no Velo
de Ouro de Salomon Trismonin (1612), em que vemos “um homem
Glossário 591
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Cf
1
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Michael Maier, Symbola aureee mensa? duodecim nationum, Frankiurt. 1517 frontispíciot.
1
Índice Onomástico
B
Baader, Franz von, 29, 30
Bachelard, Gaston, 10, 23, 462
Bacon, Roger, 108, 152, 153, 275, 322, 398, 516
-600-
Índice Onomástico 601
Demócrito (Pseudo-), 19, 21, 42, 86. 89, 172. 173, 175, 197, 266. 285, 296. 432,
489, 567, 597
Dorn, Gérard, 30, 42, 58, 63, 76, 86, 355, 510, 535. 549
Dumas, Alexandre (Pai), 46
602 Filosofar pelo Fogo
E
Eckarthauscn, Karl von, 29
Egito, egípcios, 5, 14, 16, 17, 20, 82, 83, 84, 85, 87, 88, 89, 92, 95, 102, 135, 137,
173, 204, 267, 369, 476, 538, 544, 590
Eliade, Mircea, 13, 35
Empédocles, 19
Eneias, 240
Espagnet, Jean d’, 77, 162, 211,219, 242, 434, 447, 479
Etiópia, etíopes, 267, 433, 590, 591
Evola, Julius, 35, 52
F
Fabre, Pierre-Jean, 12, 120, 192, 201, 291, 314, 422, 512,550
Faivre, Antoine, 44
Faustus, Johann Michaelis, 445, 513
Ferguson, John, 38
Festugière, André-Jean, 36, 41
Ficino, Marcílio, 547
Flamel, Nicolas, 24, 40, 219, 273, 325, 326, 423, 544, 545, 586, 593
Fulcanelli, 12,32,40, 89, 101,308, 332, 364, 365,438, 535, 553,587,588, 592, 593
G
Gagnon, Claude, 24
Ganzenmúller, Wilhem, 20
Garcia Font, Juan, 15
Geber (Pseudo-), 30, 86,92, 114, 120, 197, 205,206,213,217,310,313, 322, 324,
342, 394, 396, 430, 468, 474, 529, 567, 586
Glauber, Johann Rudolf, 279, 330, 572, 584, 586
Gohory, Jacques, 592
Gorceix, Bernard, 33, 58, 486
Gosset (Sieur), 242, 577
Graecus, Marcus, 464
Grasseus, Johannès, 253
Gratarolo, Guglielmo, 7, 49, 52, 535
Greverus, Jodocus, 115
Grosparmy, Nicolas, 31, 111, 333
Guénon, René, 23, 35
I
ísis, 16, 18, 82, 83, 84, 95,441
J
Jâbir Ibn Hayyân, 18
Jâmblico, 42
Jasào, 44, 240, 241,516, 528, 592
Jesus Cristo, 135, 136, 195, 202, 398
Johnson, Ben, 12, 583
Jung, Cari Gustav, 22, 23, 27, 29, 30, 35, 39, 55, 58. 245. 246. 440. 535, 583. 593
Júpiter, 97, 113, 140, 142, 145, 164, 242,263, 298. 302. 371,442, 447, 458. 513.
546, 558, 583, 587
K
Khunrath, Heinrich, 21, 550, 589
Kirchweger, Anton Joseph (Áurea Catena Honieri), 80, 140, 552. 587
L
Lacinius, Janus, 213
Lactâncio, 359
Lambsprinck, 47, 224, 225, 258, 446. 448. 450. 451.472, 551, 595
Lansac, Bruno de, 49, 95, 165, 316, 412, 482, 530
Lavoisier, Laurent de. 22, 23
Le Breton, Jean-Baptiste, 483, 498
Lenglet-Dufresnoy, Nicolas, 45, 46, 47, 88, 121
Le Pelletier, Jean, 307
Libavius, 184
604 Filosofar pelo Fogo
Libois, Éticnne. 98
Licbaut, Jean. 526. 565
Limojon dc Saint-Didier, 13, 146, 188, 201,384, 462
Lindsay, Jack, 16
Linthau, Henri dc, 131
Lin-Tsi. 44
Lullc (Pseudo-). Raymond, 92, 109, 116, 290. 325, 357, 360, 372, 429, 449, 467,
567
M
Madathanus, Henricus, 486
Maier. Michael, 8, 17, 43, 47, 53, 72, 82, 92, 100, 116, 117, 143, 170, 219, 260,
277, 307, 311, 335, 339, 365, 387, 388, 392, 408, 432, 433. 434, 447, 451,
452, 469, 471,476, 527. 533, 587. 599
Manget, Jcan-Jacques, 15, 18. 49, 52, 66. 67, 71, 74, 76, 77, 108, 109, 110, 133,
153, 155,162, 183, 195, 211, 212,220,221,228, 230,253,261,266,
268, 276, 282, 287, 288, 300, 302,306, 322, 334, 336, 343, 347, 349,
355, 357,359, 372, 397, 403, 405, 415, 417, 428, 431, 434, 435, 440,
446. 447,449, 456, 457, 459. 470, 479, 516, 518, 519, 529, 534, 541,
547, 550, 560, 583
Maria (a Judia, a Profetisa), 4, 30, 34, 89, 148, 203, 254, 307, 335, 336, 349, 443,
473, 488. 587, 596, 598
Marte, 113, 140, 142, 262, 263, 285, 298, 371,448, 492, 513, 558, 592
Marteau. Robert. 13
Medeia. 242, 592
Merlim, alegoria de, 226, 228
Michclspacher. Stefan, 588
Montanor, Guido de, 336, 560
Morienus (ou Morien), (cf. Calid) 14, 103, 204, 213, 326
Mui ler. Philippe, 389
Mylius, Johann Daniel. 14, 61, 76, 249, 271, 378. 389, 398, 399, 402, 425, 427,
439, 496.515. 527, 554, 564
Mynsicht, Adrianus, 566
N
Nasr. Seyyed Hossein, 25, 172
Nerval, Gérard de, 46
Netuno, 208, 2\8, 257, 258, 259, 262
Norton, Samuel, 443, 493, 494, 556, 584
Norton, Thomas, 18, 53, 212, 276, 470
Nuisement, Clovis Hesteau de, 77, 135, 187, 210, 357, 419, 493, 524, 590
Índice Onomástico 605
O
Olimpiodoro, 10, 18, 44, 89, 137, 147, 424, 590
Osíris, 16, 81,82. 116, 137, 415, 424. 587
Ostancs. 67, 89, 488, 489, 500. 539, 567
Ouroboros, serpente, 44, 135, 219. 584, 590, 592, 597
p
Pandora, 242, 243, 395, 445, 485, 513, 563
Panikkar, Raiinon, 59, 192
Pantheus, Giovanni Agostino, 159
Paracelso, Théophraste de Hohenheim, dito. 11, 19, 30, 39, 101, 118, 182. 209.
217, 280, 285, 306, 344, 493, 556, 561, 567, 584. 585, 586. 587
Paulo, Sào, 4, 88, 178, 196, 209, 219, 235, 275, 281,308, 341,369. 391,432,447,
501,543,561
Pelágio, Monge, 89, 489
Pcrnéty, Antoine-Joseph (Dom), 32, 83, 123, 309, 364, 536, 583, 584, 585, 587,
590, 591,594, 596, 597
Philalèthe, Eyrénée, 94, 162, 302, 327, 343, 381,415, 435, 529
Philothaume, 12, 96, 483
Pitágoras, 86, 89, 92, 110, 111, 197, 203, 248, 249, 285, 326, 426, 567
Planis Campy, David de, 19, 50, 118, 239, 316, 361,401, 556. 567, 587
Platão, 11, 19, 20, 25, 32, 38, 80, 86, 89, 92, 110, 135, 197, 266, 285, 300. 342,
567, 584, 586, 590
Plínio, 561,589
Plutarco, 16, 87
Poisson, Albert, 285
Pontanus, Jean, 474, 475
Potier, Michael, 185
Prometeu, 242, 462, 583
Reisch, Gregor, 46
Rhazès (ou Razi), 15
Rhenanus. Johannes, 563
Richard 1’Anglais, 150, 176
Rilke, Rainer Maria, 34, 43, 148
606 Filosofar pf.lo Fogo
Riplcy. Gcorgc, 141, 142, 144, 238. 243, 252, 266, 302, 311, 312, 352, 368, 382,
405,431,433,468, 567
Rouillac, Philippe, 445
Ruland. Martin, 557, 562, 583, 584. 585. 588, 591, 598
Rupcscissa, Jean de, 25, 193, 194, 287, 502, 506, 507, 586
s
Salmon. William, 13, 49, 52, 53, 70, 73, 78, 87, 90, 92, 128, 133, 144, 165, 177,
188, 192. 195, 201,204, 205, 206, 212, 222, 241,251, 257, 266, 269, 273,
299, 310, 316, 319, 324, 325, 326, 335, 336, 339, 350, 351,353, 354, 358,
368, 373, 375, 384, 394, 396, 409, 412, 426, 430, 445, 462, 467, 482, 501,
520. 545, 583. 586, 587, 589. 591, 595, 596
Salomão, Rei, 86. 90, 93, 181, 187, 211,318, 341,413, 433, 567, 570, 592
Santideva, 28, 29
Saturno, deus e planeta, 6, 18,47,97, 113, 127, 140, 141, 145, 154, 213, 214, 218,
226, 227, 239, 259. 263, 278. 280, 294, 295, 298, 302, 328, 335, 336, 337,
365, 371,414, 416, 417, 418. 419, 420, 421,422, 423, 448, 457, 458, 459,
477. 483, 506, 513, 532, 546, 549, 558, 567, 583, 596
Schippergcs, Heinrich. 21
Schmieder, Karl Christoph, 37
Schopenhauer, Arthur, 51
Scot, Michael, 10, 150, 152
Scott. Waltcr, 13
Siebmacher, Johann Ambrosius, 16, 357
Silento, Petrus de, 445
Silcsius, Angelus, 28
Sinésio. 70, 89, 294. 347, 370, 389, 501
Sloterdijk, Peter, 56
Steiner, Rudolf, 556
Stéphanus de Alexandria, 175, 370, 441
Stolcius, Daniel. 61, 82, 99, 245, 534
Stuart de Chevalier, Sabine, 125, 202, 284, 423, 496
Swedenborg. Emmanuel, 33
u
Ulstadc. Philipp, 505, 589
Valentin. Basile. 31, 34. 37. 53. 74. 132. 144. 145, 217. 219. 221, 222, 293. 301,
347, 353. 354, 363, 364, 408, 417, 418, 429, 446, 449, 453. 525. 530, 585
Valois, Nicolas, 122, 126, 542
Ventura, Laurent. 214
Vénus, deusa e planeta, 113, 141, 142, 154, 228, 240, 262, 263, 298. 302, 310,
312, 332, 354, 365, 371, 513, 558, 565, 591
Vigcnère, Blaise de, 277, 290
Villeneuve, Arnaud de, 92, 300, 334, 364, 377, 395, 459, 567, 586
Villiers de 1’Isle Adam, 13
Vulcano, 53, 92, 159, 207, 208, 240, 262, 263, 265, 353, 422, 454, 470
w
Waite, Arthur Edward, 37
Weil, Simone, 22, 28, 57
Welling, Georg Von, 21
Ygé, 52
Yourcenar, 55, 415
z
Zachaire, Denis, 91, 92, 195, 499
Zadith, Sénior, 15, 229, 230
Zetzner, Lazarus, 49, 52
Zohar, 277
Zózimo, 10, 12, 17, 22, 56, 58, 69, 84, 89, 245, 247, 309, 321, 348, 465, 489,
490, 537, 591,597
i
i
de claridade.
“Os textos aqui aprescntaclos
mostrarão bem qual
importância os alquimistas
conferiam à apreciação
dos fogos em função do
estado da matéria em via de
transformação e, mais ainda,
à descoberta do famoso Fogo
Secreto dos Sábios, sobre o
qual tudo leva a pensar que
não era outra coisa além
da não menos misteriosa
Matéria, tão integralmente
livre de suas impurezas e tão
perfeitamente em harmonia
com o Fogo”, ressalta.
"Uma coletânea de textos
acompanhados de comentários
aguçados que permitem ao
leigo penetrar os arcanos da
sabedoria". (Natalhie Clerc,
Science etAvenir)
"■;í'
MADRAF ir
Alquiinia/Filosofia
Filosofar
pelo Fogo
O que é a alquimia, objeto de tantas especulações e fantasias? Uma
arte do fogo que, unindo céu e terra, corpo e espírito, por meio de uma
sucessão de dissoluções c de coagulações (solve et coagulei), realiza o desejo
secreto da natureza, guia infalível na via que conduz à realização da
Grande Obra. Caminhando durante séculos ao lado do cristianismo,
cujos símbolos ela muitas vezes integrou ao seu próprio imaginário, a
Arte de Hermes acabou se singularizando pela atenção dada ao mistério
da vida e por sua vontade de traçar uma via “média” entre religião e
filosofia.
Nada poderia então substituir uma confrontação direta com os textos,
já traduzidos ou ainda inéditos, para tirar da sombra onde foi relegada
pela ciência moderna uma tradição velha de dois milénios e que merece
ser redescoberta, tanto em razão da importância de seu corpus quanto
de suas riquezas simbólica e espiritual. Dos alquimistas gregos aos
pintores e poetas surrealistas, o persistente interesse dedicado à alquimia
tradicional depõe a favor dessa busca de imortalidade inscrita no mais
profundo do coração e do espírito humanos.
Sendo a característica de uma tradição transmitir fielmente tanto O
conteúdo quanto o espírito de um saber ancestral, esta antologia
reúne-o essencial dos textos canónicos, apresentados em uma ordem
cronológica - algumas dezenas de tratados segundo Eugène Canseliet
-, acompanhados de uma iconografia em que se mesclam imagens
^tradicionais e criações modernas ou contemporâneas, livremente
inspiradas pela alquimia.
ISBN 978-85-370-0757-0
MADRAS*
|IU|MI|