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Escola de Comunicações e Artes - Universidade de São Paulo - 23 a 26 de agosto de 2011

Eixo Temático
Quadrinhos e História

O REFLEXO DE IDÉIAS NOS QUADRINHOS: RECRUTA-ZERO E A


GUERRA DA CORÉIA

Iberê Moreno Rosário e Barros1

Graduando, PUC-SP, São Paulo, São Paulo

Resumo

O artigo se propõe a analisar as mudanças no pensamento político e na sociedade estadunidense


durante a Guerra da Coréia, a partir do estudo dos quadrinhos do Recruta Zero (originalmente Beetle
Bailey), publicados por Mort Walker, durante o mesmo período. Tem por objetivo demonstrar como a
produção de quadrinhos reflete o pensamento de setores da sociedade daquele país, tomando como
principal argumento as mudanças que ocorreram no decorrer do tempo, dentro do escopo da história
em quadrinhos e no próprio personagem. A metodologia utilizada no estudo combina uma breve
revisão bibliográfica, com a comparação de relatos históricos e políticos do período, além da análise
das próprias tiras, tendo como reforço argumentativo os relatos produzidos por Mort Walker. Busca-
se entender os quadrinhos não apenas como uma produção estética e artística, mas também como
uma representação histórica e cultural da sociedade na qual está inserida. Pode-se tirar como
conclusão a idéia de que os quadrinhos, e em especial as tiras publicadas em jornais, além de serem
uma manifestação artístico-cultural, são expressões que refletem a opinião e o posicionamento de
grupos sociais e neles se refletem.

Palavras-Chave

Recruta Zero; EUA; Quadrinhos; Guerra da Coréia; Mort Walker; Cultura

Abstract

The article intent to analyze the changes on political thinking and in American society during the
Korean War, based on the study of the comic of Beetle Bailey, published by Mort Walker during the
same period. Aims to demonstrate how the comics production reflects the ideas of some groups from
the society in the USA, taking as main argument the changes that occurred during the time, inside the
scope and in the character itself. The methodology utilized in the study mash a brief review, with the
comparison of historical and political accounts from the period, together with the analyses of the strips
itself, having as an argument reinforcement the texts written by Mort Walker. As a conclusion is
possible to get the idea that the comics, and in special the daily strips, more than an artistc or cultural,

1
Instituição de Origem: PUC-SP. Endereço: Rua Monte Alegre, 984, São Paulo, SP, Brasil.
iberemoreno@gmail.com
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they are expressions that reflects the opnion and the position of social groups and that reflects on
them.

Keywords

Beetle Bailey; USA; Comics; Strips; Korean War; Mort Walker; Culture

Introdução

Os quadrinhos, ou como Will Eisner nomeia, a arte sequencial, diferentemente de


outros recursos midiáticos, fazem uso de uma linguagem híbrida única. Advindas de
influências da literatura e do cinema, as histórias em quadrinhos usam recursos de
conteúdos originários de livros, como a linguagem textual verbal, somada às imagens e ao
ritmo do cinema.

Ao ler as histórias em quadrinhos, o que é reproduzido internamente é uma


seqüência de representações de cenas, falas e sons, da mesma maneira que ocorre ao ler
um livro; ao mesmo tempo em que existe a referência gráfica do movimento e das cores nas
imagens, assim como ocorre ao se assistir a um filme. Isso, portanto, sugere a idéia delas
serem uma mistura de duas mídias diferentes, criando como que uma terceira linguagem,
com características e formatos próprios.

Essa capacidade expressiva, que mescla o verbal e o iconográfico, possibilita que


maior quantidade de informações seja passada, num formato de fácil compreensão e
assimilação, tornando os quadrinhos uma via ideal para a cultura de massa e para a
apresentação do ideário de um grupo. Além de proporcionar ao campo da história e das
ciências sociais uma fonte de pesquisa única, temporizada e marcada pela ideologia do
autor, a arte seqüencial nos permite analisar como a própria sociedade se entende.

Conforme apontam Dorfman e Mattelart, em sua obra “Para ler o Pato Donald”, o
pensamento de um determinado grupo, ao qual o autor por conseqüência faz parte, acaba
sendo transportada através desse recurso. Entende-se, portanto, que as histórias em
quadrinhos não devem ser analisadas apenas como arte, mas sim como um método
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histórico-político, tanto para a compreensão de uma dada situação como uma ferramenta
para a doutrinação de um determinado grupo.

É dentro deste campo no qual o presente artigo se insere. Pretende-se apresentar


como ocorre a relação entre os fatos históricos e a produção dos quadrinhos, tomando como
fonte deste argumento a Guerra da Coréia e a produção das tirinhas do Recruta Zero, ou
como será chamado pelo seu nome original neste artigo, Beetle Bailey, de Mort Walker. O
período compreendido para esta análise se situa, aproximadamente, entre 1950 e 1953.
Representando, assim, a interlocução da arte com a vivência do autor e da sociedade,
integrando-a nos objetos de compreensão da história.

Esse estudo justifica-se como estudo de caso da aplicação dos princípios da Nova
História Cultural. Exemplificando, portanto, o uso dos quadrinhos como uma via para a
compreensão da sociedade e de sua construção histórica da própria imagem do indivíduo e
da sociedade. A idéia dos quadrinhos como espelho da sociedade, portanto, corrobora essa
compreensão, de maneira a reafirmar a necessidade de estudos de caso como este. Assim
como aponta Peter Burke, ao citar o método de trabalho de Burckhardt, a idéia era buscar e
salientar os elementos recorrentes, constantes e típicos num determinado corpo artístico de
maneira a, baseado nisso, apresentar generalizações sobre a cultura, as quais definiem-a
ajudam a compreender a sociedade e não apenas os fatos.

Para poder então discutir essa questão como um todo vale ressaltar o que se
entende como cultura. O conceito tem passado por diversas evoluções no decorrer da
história, transformando-se em uma complexidade de paradigmas e não apenas em um
conceito estanque. Nesse desenvolvimento, inicialmente predomina uma idéia elitista e de
perfeição, como apresentado pelo inglês Matthew Arnold no século XIX. No entanto, a
concepção de cultura como sinônimo de erudição, com o passar do tempo e o
desenvolvimento do campo, perde espaço para uma concepção mais aberta, que entende
que toda ação do ser humano no natura é cultura. Logo o estudo de uma produção de
tamanha complexidade, é também uma análise da sociedade na qual a produção está
inserida.

Visa-se, portanto, aplicar esse conjunto de idéias, apresentando possibilidades de


estudo e como o recurso dos quadrinhos pode ser usado como fonte de análises de
segmentos e secções da sociedade. O objetivo central pode ser compreendido como a
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busca por mostrar um caminho para conhecer a cultura de um grupo societário, de maneira
não a estigmatizá-lo ou determiná-lo, mas sim exemplificá-lo.

Revisão de Literatura

Como referências bibliográficas principais, optou-se focar em dois pontos distintos. O


primeiro, definir o que é entendido como cultura, de forma a reafirmar o estudo dos
quadrinhos como ferramenta para áreas como a História. O segundo, um breve panorama
dos acontecimentos da guerra da Coréia para que se tenha um referencial dos processos
que são pano de fundo para a análise.

O conceito de cultura é amplo e complexo, não existindo um axioma único. Raymond


Williams, buscando balizar o debate e redefinir os rumos dos estudos nesse campo,
apresenta os três principais tipos de definição de cultura:

(1) Idealizado, em que a cultura é compreendida como um estado ou


processo da perfeição humana, com base em valores absolutos e
universais; (2) documental, relacionado à produção de obras que
envolvem a imaginação e o intelecto, e que são produzidos para a
posteridade, da mesma forma que o pensamento e a experiência
humana – são os “tesouros” da cultura e (3) social (antropológico e
sociológico), que relaciona a cultura a um modo de vida global dentro
do qual percebe-se um “sistema de significações” essencialmente
envolvido em todas as formas de atividade social. 2

Cada um dos tipos se refere a uma maneira de compreender a sociedade e o que


define esse grupo, seja através da elitização, da produção ou da significação das tradições.
Na primeira definição a cultura é entendida como um objetivo e não um processo de um
grupo societário; ou seja, a cultura seria criada e modificada apenas pelos mais “evoluídos”.
Na segunda, a cultura ainda tem uma carga de exclusividade, mas não mais na pessoa em
si, mas sim no objeto, uma vez que é entendido como objeto apenas a arte, produzida,
principalmente, sob um intuito estético e de perpetuação. Já a terceira definição entende a
cultura como a significação de todo ato de uma sociedade ou grupo social, seja ele de um

2 WILLIAMS, Raymond. The Long Revolution. London: Chatto & Windis, 1961. p. 41-43 In:
CUNHA, Magali do Nascimento. Vinho novo em odres velhos. Tese de Doutorado.
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indivíduo ou de um grupo, de uma elite, de segmentos populares, ou de um grande


contingente variado e disperso de pessoas, como ocorre na cultura de massa.

A linha escolhida para este estudo é, portanto, a terceira, pois se entende que toda
ação, como a produção de tirinhas, é cultura, e a cultura é uma representação direta da
sociedade. O que, portanto, revela a existência concomitante da cultura e da sociedade,
sendo uma sempre paralela e complementar à outra, além de criar um senso de
exclusividade mútuo.

Nesta segunda parte da revisão de literatura, o tópico a ser tratado é a Guerra da


Coréia em si. Conforme indicam diversos autores, como por exemplo Eric Hobsbawn, esse
foi o primeiro ponto de atrito entre as duas potências dominantes do pós-segunda guerra,
porém sem que ambas estivessem no campo de batalha stricto sensu. Foi um momento de
transição do período diretamente pós guerra, no qual se buscava uma paz relativa, para
uma disputa tácita de território, usando como escudo as ideologias, mas sempre sendo os
atores países secundários ou a imagem das forças de paz da ONU.

A frase “Guerra improvável, paz impossível”, cunhada pelo pensador francês


Raymond Aron, resume muito claramente a situação vivida na época da Guerra Fria. A
própria construção da ordem internacional, com um destaque, neste artigo, para a situação
coreana, demonstra essa disputa.

Ao final da Segunda Guerra Mundial, as tropas americanas e soviéticas se


instalaram estrategicamente em diversos territórios ocupados durante as batalhas, conforme
acordado na conferência de Potsdam, em 1946. No caso da Coréia, o tratado determinava
que a linha de divisão seria o “Paralelo 38”, conforme a rede geográfica, de tal maneira que
os EUA ocupariam todo o espaço ao sul desta marca, enquanto os soviéticos seriam
responsáveis pelo norte.

O processo foi pacífico, chegando ao ponto de que as tropas, tanto americanas como
soviéticas, terem sido desmobilizadas em 1949. Porém, em função de alterações políticas
na Coréia do Norte, principiando-se com derrota de Chinag Kai-shek para a Revolução
Popular de Mao Tsé-tung, em 24 de junho de 1950 o exército norte-coreano cruzou em
massa o paralelo 38, iniciando-se, assim, a primeira etapa da “Guerra da Coréia”.
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O conflito pode ser dividido em três fases distintas, ou conforme denominado na


bibliografia de Dean Acheson, secretário de estado entre 1949 e 1953, escrita por Robert
Beisner, as três guerras da Coréia:

The first Korean War, which began with North Korean tanks rolling
over the parallel, caused basic changes in U.S. cold war policies. In
the second Korean War, U.S. forces threw back the invaders and
headed north, above the 38th parallel. The third, which started with
Chinese forces smashing the U.S. army and marines above the
parallel, plunged the administration into crisis, stirred noxious new
effusions of McCarthyism…(BEISNER, 2006, p.323)3

A razão deste ser considerado um ponto de virada é intimamente ligada ao


McCartismo, pois, como conseqüência da demissão do General MacArthur, o Senador
Joseph MacCarthy voltou a ganhar força com seu discurso de caça aos comunistas,
conforme apontado no trecho supracitado. Em função disso, qualquer argumento que
questionasse toda e qualquer ação americana era censurado.

Tendo estes conceitos em mente, pode-se entrar na discussão em si de como a


produção das tirinhas está inserida dentro de um contexto claro de representação cultural,
podendo ser compreendido como via de entendimento de uma parcela da sociedade
americana do início da década de 1950.

Não se busca indicar, neste trabalho, que esta é a única opinião da época ou que as
conclusões aqui apresentadas sejam exclusivas. Durante a pesquisa, foram procurados
outros trabalhos que lidassem com estes mesmos objetos, porém, não foram encontrados
estudos que se utilizaram dessa mesma metodologia de análise, que se baseia na Nova
História Cultural.

Materiais e Métodos

3
Tradução Livre: “A primeira Guerra da Coréia, que começou com os tanques norte-coreanos
atravessando o paralelo, causou mudanças básicas nas políticas estadunidenses para a Guerra Fria. Na
segunda Guerra da Coréia, forças estadunidenses empurraram de volta os invasores e se encaminharam
para o norte, acima do paralelo 38. A terceira, que começou com as forças chinesas esmagando o
exército americano e os Marines que estavam acima do paralelo, mergulhou a administração em uma
crise, levando a novas efusões nocivas do McCartismo.”
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O material utilizado, de maneira a focar em fontes apontadas por Mort Walker, foram
os dois volumes publicados no Brasil da edição americana entitulada de “O melhor do
Recruta Zero”, originalmente entitulada “The Best of Beetle Bailey”. Somado a isso, foi
utilizado material divulgado no site oficial do autor e no site oficial do personagem.

O método, diferentemente de outras pesquisas, não contou com um trabalho


estatístico ou qualitativo, mas sim comparativo. Pode-se indicar, portanto, como material e
uma das bases principais do método, o livro de Peter Burke entitulado “O que é a História
Cultural?”, no qual são apresentados os métodos de análise e pesquisa da escola da Nova
História Cultural, que consiste em uma utilização de manifestações artístico-culturais como
indicativos do pensamento, no qual essas foram produzidas.

Além disso, a pesquisa contou com uma literatura básica para estudos dos
quadrinhos, como modo de compreender o objeto a ser utilizado na análise histórica, alguns
exemplos são: “Quadrinhos e Arte Seqüencial” de Will Eisner e “A História da História em
Quadrinhos” de Álvaro de Moya.

Resultados Finais

Dois pontos de evolução do objeto estudado são extremamente importantes para a


análise proposta: o primeiro é o alistamento de Beetle Bailey no exército; e o segundo é o
banimento da tirinha do jornal “Stars and Stripes”. Ambos cronologicamente localizados,
respectivamente, no início e no fim da Guerra da Coréia, representando em um primeiro
momento o ufanismo vivido pelos anos dourados e, posteriormente, um descontentamento,
conseqüência do aumento no número de mortes causados pela Guerra. Essas alterações no
universo do personagem são conseqüências das alterações do universo no qual o autor está
inserido.

Beetle Bailey não foi apresentado desde o início como um militar. Sua estréia foi
como um estudante universitário desinteressado nas questões acadêmicas, mas focado nas
demais vivências do ambiente no qual estava inserido. BB entende que o fato de estar em
uma universidade irá, por si só, abrir portas e permitir que ele alcance cargos e posições de
destaque, como representado na tira abaixo. O personagem pode ser entendido como uma
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representação do comodismo, um americano no conforto gerado pelo status quo do início


dos anos dourados, conseqüência da resolução das grandes guerras.

Ilustração 1: Beetle Bailey como Estudante Universitário4

Porém, como aponta o próprio Mort Walker no seu livro “O melhor do Recruta Zero”,
com o aumento do alistamento, essa figura que representava o universitário vai se tornando
cada vez mais escassa, dando lugar a uma juventude militarizada. Sendo a tira uma alegoria
da situação vivida pelo autor e pela sociedade americana como um todo, os impactos da
guerra da Coréia e dos alistamentos não poderiam passar despercebidos pela tira.

Dados da época, fornecidos pelo departamento de alistamento do governo


americano, levando em consideração os números de recrutamentos totais por ano,
compreendidos entre 1917 à 1973, demonstram esse boom no alistamento. É interessante
notar que o número total de alistamentos de 1951, 551.806 homens, só foi menor do que os
dos períodos da primeira e segunda guerra mundial, sendo a maior marca a de 1943,
totalizando 3.323.970 alistados em um único ano.

Vale ressaltar que o crescimento ocorrido durante a Guerra da Coréia, não se repetiu
nenhuma outra vez, quando analisados os resultados comparativamente. Em 3 anos foram
1,529,539 homens recrutados, a guerra do Vietnã, que durou 9 anos, teve apenas 327.765
alistamentos a mais.

Pode-se notar também que há ainda certo resquício da lógica da Segunda Guerra
Mundial na qual o jovem ao ir para a guerra é entendido como um herói que defende a

4
Fonte: O melhor do recruta zero 1. Tradução: Marco Aurélio Poli. Porto Alegre:
L&PM, 2006
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democracia. Somado a isso há a imagem de que os EUA seriam os defensores da


liberdade, demonstrados pelo Plano Marshall e pelo ideário de Kennan.

Esse conjunto, como denominado pelo próprio diplomata, George Kennan, era uma
política externa de contenção, ou seja, buscar ferramentas que contivessem qualquer
possibilidade de avanço soviético, e uma vez que o ataque da Primeira Guerra da Coréia
pode ser entendido como uma tentativa de expansão soviética, os EUA deviam reagir,
criando uma simbiose da opinião pública do redscare, o medo do avanço comunista sob o
mundo, com a política externa de contenção.

Como o personagem não tinha grandes ambições na universidade, a transição para


o universo da caserna foi simples e sem grandes questionamentos. Porém, essa alteração
no universo da história contada, representou, também, a naturalidade com a qual os jovens
deixaram seu conforto para integrarem as forças armadas, demonstrando assim como os
quadrinhos são um reflexo da sociedade na qual a sua produção está inserida. Abaixo duas
tiras representando o momento da transição.

5 6

Ilustração 2: Representação de como seria a noticia do alistamento de Beetle


Ilustração 3: Beetle se imaginando como Soldado

5
Fonte: Idem
6
Fonte: Ibidem
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O segundo ponto a ser trabalhado no artigo é o momento do pós Guerra da Coréia,


no qual a tira foi banida da edição Japonesa do jornal militar americano “Stars and stripes”.
Como afirma o próprio Mort Walker, essa exclusão teve um resultado positivo nas vendas,
além de ter sido embasado no fato de a tira não ser construtiva para o treinamento dos
soldados. Segue abaixo declaração feita em uma entrevista para a revista “The Comics
journal” de número 297, publicada em abril de 2009:

“TCJ: Quando o Beetle foi para o exército, houve um crescimento no


interesse pela tira e isso aumentou a sua circulação, mas não tamanho
até a Pacific Stars and Stripes banir a tira em Janeiro de 1954 quando
ela realmente explodiu, se me recordo

MW: Bem, isso me deu um monte de publicidade. Foi estúpido deles


fazer isso.

(…)

Até o Pentágono sentiu que eu não estava ajudando na disciplina ou na


eficiencia do Exército criticando-o; Eu apenas mostrava como os
garotos poderiam se divertir, sem se importar onde estavam [risadas].
Então, finalmente eu fui ao Pentágo pois eles haviam feito um livro
chamado Como não fazer as coisas, e eles haviam usado as minhas
tiras nele.”7

Como se pode perceber na declaração, Walker em nenhum momento havia um


intuito de divulgar qualquer valor, seja de esquerda ou de direita; ele visava apenas retratar
uma situação de maneira o mais jocosa possível, o que acabou levando a uma má
interpretação. Somado a isso, existe o fato de que a Guerra da Coréia já havia se encerrado
há seis meses, tendo como marco o mês de Julho de 1953, porém os soldados ainda
permaneciam na região, de maneira que qualquer desincentivo ou atitude não pró ufanista,
era vista com maus olhos.

Posteriormente a tira voltou a circular, porém o fato marcou por dois motivos: o
primeiro é a demonstração de que há uma integração entre a cultura, o pensamento político
e a população, mesmo que não seja claro, mas sempre em vias de mão dupla, ou seja, ao
mesmo tempo que a publicação é influenciada, ela pode sofrer reações por supostas
influências que cause; o segundo é o fato de o autor posteriormente ter incentivado que as

7
(tradução nossa)
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famílias enviassem as tiras para os soldados, em uma atitude, comedida, de “desobediência


civil”, apresentando novamente a conexão entre a realidade e a tirinha.

8
Segue abaixo imagem traduzida do original que mostra uma propaganda realizada
pelo autor para incentivar a ação “desobediência civil moderada”. Além de um extrato de
uma notícia comentando sobre o fato.

Ilustração 4: Incentivo
Ilustração 5: Notícia
Considerações Finais

Nota-se na publicação, e em especial nos trechos ressaltados, que a história,


a política e a cultura, estão intimamente ligadas. Essa ponte é expressa em situações como
os quadrinhos que, desde seu surgimento, ganham progressivamente peso e
representatividade. O caso estudado, apesar de sua importância, ainda está longe de ser o
mais expressivo de todos, mas é um momento muito claro dessa simbiose.

Uma vez que este gênero de literatura já passou dos seus 80 anos, considerando o
seu formato tradicional, a estruturação como objeto de pesquisa, apesar de ainda não
suficientemente explorada, é uma realidade, sendo necessária a sua expansão para os
campos das Ciências Sociais, dentre elas a História e as Ciências Políticas. Além de sua
pertinente e reconhecida abordagem no campo da Comunicação.

8
Fonte: Ibidem
9
Fonte: Ibidem
Escola de Comunicações e Artes - Universidade de São Paulo - 23 a 26 de agosto de 2011

Como representação direta da interconexão entre a realidade e a tira, demonstrando


como esta é um espelho das idéias do autor e muitas vezes a do senso comum, segue
abaixo uma tira originalmente publicada em 7 de fevereiro de 1954, que ironiza sobre a
própria existência da tira, sendo ela a única parte do jornal que os soldados lêem.

Ilustração 6: Ilustração da argumentação do artigo10


Referências

Sites Consultados

http://beetle.king-online.com/ - Acesso em 19 de Junho de 2011

http://www.mortwalker.com/ - Acesso em 19 de Junho de 2011

http://www.sss.gov/induct.htm - Acesso em 19 de Junho de 2011

10
Fonte: Ibidem
Escola de Comunicações e Artes - Universidade de São Paulo - 23 a 26 de agosto de 2011

http://www.toonopedia.com/beetle.htm - Acesso em 19 de Junho de 2011

Referências Bibliográficas

BEISNER, Robert. Dean Acheson: A life in Cold War. Nova Yorque: Oxford Press, 2006.

BURKE, Peter. What Is Cultural History?. Cambridge: Polity Press, 2004

DORFMAN, Ariel e MATTELART, Armand. Para Ler o Pato Donald – Comunicação de


massa e colonialismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2010.

EISNER, Will. Quadrinhos e arte Seqüencial. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

HOBSBAWM, Eric. A Era dos Extremos. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

Harvey,R.C. The Mort Walker Interview (Excerpt from TCJ #297). 2009. Disponível em:
<http://archives.tcj.com/index.php?option=com_content&task=view&id=1021&Itemid=
48> Acesso em 19 de Junho de 2011

JUNQUEIRA, Mary A.. Estados Unidos - A Consolidação da Nação. São Paulo: Contexto,
2001.

MOYA, Álvaro de. Historia da historia em quadrinhos. São Paulo: Brasiliense, 1996.

TOTA, Antonio Pedro. Os americanos. São Paulo: Contexto, 2009

WALKER, Mort. O melhor do recruta zero 1. Tradução: Marco Aurélio Poli. Porto Alegre:
L&PM, 2006

____________. O melhor do recruta zero 2. Tradução: Marco Aurélio Poli. Porto Alegre:
L&PM, 2006

WILLIAMS, Raymond. The Long Revolution. London: Chatto & Windis, 1961.

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