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Transportes

e Destinos Turísticos:
Planejamento
e Gestão
Guilherme Lohmann
Carla Fraga
Rafael Castro
Transportes
e Destinos Turísticos:
Planejamento
e Gestão
Guilherme Lohmann
Carla Fraga
Rafael Castro
© 2013, Elsevier Editora Ltda.

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L824t

Lohmann, Guilherme
   Transportes e destinos turísticos: planejamento e gestão / Guilherme Lohmann; coordenação Eduardo
Sanovicz. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.
  256 p.; 23 cm

  ISBN 978-85-352-6086-81

   1. Transportes - Planejamento. 2. Turismo. I. Fraga, Carla. II. Castro, Rafael. III. Sanovicz, Eduardo. IV. Título.

13-01159            CDD: 338.441
                CDU: 656.11
17/05/2013  17/05/2013
Autores

Guilherme Lohmann
Professor da School of Tourism and Hospitality Management (STHM) da Southern
Cross University (SCU), campus Gold Coast, Austrália. Sua experiência acadêmica
internacional também inclui o ensino e a pesquisa em universidades no Brasil (USP e
UESC), Estados Unidos (University of Hawaii at Manoa) e Nova Zelândia (University of
Waikato e Victoria University of Wellington). Foi consultor para trabalhos do Ministério
do Turismo do Brasil, Organização Mundial do Turismo (OMT), UNEP (Programa das
Nações Unidas para o Meio Ambiente) e Queensland Airport Ltd (Austrália), além de ter
dado treinamento para funcionários da Abu Dhabi Tourism Authority (Emirados Árabes
Unidos). Tem experiência na orientação de doutorado em pesquisas tanto em transporte
quanto em turismo, incluindo alguns alunos brasileiros. É membro-fundador e atual
diretor executivo da ABRATUR, Academia Internacional para o Desenvolvimento da
Pesquisa em Turismo no Brasil (www.abratur.org). Seus temas de interesse e de pesquisa
incluem transportes turísticos, aviação, cruzeiros marítimos, geografia dos transportes,
aspectos teóricos e metodológicos do turismo e administração de destinos turísticos.
Email: gui.lohmann@me.com / Site: www.guilohmann.com

Carla Fraga
Professora do curso de Turismo da Escola de Turismologia da Universidade Federal
do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), atua como bolsista da Coordenação de Aperfei-
çoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)/Universidade Aberta do Brasil (UAB)
para a coordenação da disciplina Transportes do curso de Licenciatura em Turismo
(EAD) - Fundação CECIERJ/Consórcio CEDERJ. É professora dos cursos de graduação e
pós-graduação de Turismo e Eventos da Universidade Estácio de Sá. Atuou com trens e
turismo na Associação Brasileira das Operadoras de Trens Turísticos e Culturais (ABOTTC)
e foi membro do Núcleo de Turismo Cultural Ferroviário do Movimento de Preservação
Ferroviária (MPF). Desde 2009 lidera o Grupo de Pesquisa Transportes e o Turismo (GPTT).
Seus temas de interesse e pesquisa incluem transporte e turismo, com ênfase em trens
turísticos, educação em turismo, turismo e meio ambiente.
E-mail: carlota.fraga@gmail.com
Rafael Castro
Mestre e Doutorando em Engenharia de Transportes pelo PET/COPPE/UFRJ com
período sanduíche na School of Tourism and Hospitality Management (STHM) da Southern
Cross University (SCU), campus Gold Coast, Austrália. Bacharel em Turismo pela Univer-
sidade Positivo (UP). É professor dos cursos de graduação em Turismo e Gastronomia do
Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM), no Rio de Janeiro. Os principais temas de
interesse incluem transporte aéreo e turismo, branding de aeroportos e desenvolvimento
de destinos turísticos, além de hospitalidade e acessibilidade nos transportes turísticos.
E-mail: contato@profrafaelcastro.com / Site: www.profrafaelcastro.com
Apresentação

Turismo: ampliar conhecimento para crescer com o Brasil

Atuar no setor do Turismo gera inúmeras oportunidades para as pessoas que estão
procurando inserir-se no promissor cenário econômico brasileiro, marcado pela inclusão
de milhões de novos consumidores no mercado.
Gerador de expressivos resultados para as comunidades, nas quais se torna parte do
ambiente econômico, o turismo recupera a autoestima, contribui para a preservação
do meio ambiente, estimula a produção cultural e incentiva centenas de atividades nos
mais variados portes.
Trabalhar em Turismo, nos seus vários segmentos e atividades correlatas, pode pare-
cer complicado, mas é uma sequência muito objetiva de atos – trata-se de equacionar
corretamente a articulação entre quatro verbos – comer, dormir, comprar e visitar. Estes
são os verbos que um passageiro conjuga ao chegar a seu destino, na medida em que
se utiliza da oferta gastronômica (ele come fora de casa); da oferta hoteleira (ele dorme
fora de casa); da oferta comercial (ele faz compras) e da oferta lúdico-cultural ou natural
(ele vai visitar e conhecer o lugar). O que muda é a razão pela qual ele os conjuga: férias
e lazer, negócios e eventos, visita a parentes, provar de um prato ou bebida especial,
praticar esportes, além de dezenas de outras razões que podemos imaginar.
Como profissional de turismo, venho atuando há vários anos tanto no setor público
como no setor privado, especialmente no mercado internacional. Neste sentido, há muito
tempo me chama a atenção o crescimento da produção intelectual do turismo brasileiro.
Vários colegas vêm escrevendo e refletindo sobre o desenvolvimento do turismo ao longo
dos últimos anos, com muita competência. Nossa produção bibliográfica inclusive tem
a qualidade de estar distribuída ao longo de praticamente todo o país, incorporando,
portanto, contribuições intelectuais que espelham a diversidade e o pluralismo cultural
sobre os quais o Brasil está se construindo.
No entanto, quando iniciei minhas atividades docentes na Universidade de São Paulo,
em 2008, uma questão de outra qualidade começou a me chamar a atenção: se por um
lado é fato que o Brasil construiu uma imagem internacional completamente nova, que
o país hoje se coloca como um dos agentes econômica e politicamente destacados no
cenário mundial, e que este fato vem se refletindo no turismo brasileiro, por outro, nossa
produção intelectual, assim como a reflexão acadêmica de nossos colegas, ainda não se
encontrou com a produção estrangeira para um diálogo de qualidade.
Ou seja, encontros como é prática antiga e corrente em diversos setores da produção
cultural brasileira – música, teatro ou arquitetura, por exemplo – nos quais a realização de
trabalhos construídos em parceria entre autores estrangeiros e brasileiros vem produzindo
resultados memoráveis e marcantes, ainda não se verificam no turismo. Apesar do cres-
cimento gerado pela inserção do Brasil no mercado turístico internacional – em volume
de passageiros, em volume de conexões aéreas internacionais, em volume expressivo de
crescimento no ingresso de dólares na economia brasileira, nossa produção literária em
turismo ainda não viveu uma experiência desta qualidade.
Esta foi a ideia inicial desta coleção – partindo de textos instigantes e inovadores de
autores estrangeiros, cujos temas são de interesse dos brasileiros, construir uma relação
com autores nacionais de uma forma que lhes desse toda a liberdade para reconstituir
os textos originais, adaptando-os à realidade latino-americana. A coragem da Editora
Elsevier em oferecer seu portfólio a este projeto, confiando no resultado e na capacidade
dos autores brasileiros em trazer textos estrangeiros para o ambiente cultural e técnico
regional, adaptando relatos e conceitos, deve ser registrada e enaltecida.
Este diálogo tem início agora, também por acompanhar o ciclo de maturação do
turismo enquanto atividade econômica no país, em relação ao cenário internacional. Se
retornarmos no tempo, é possível traçar uma linha lógica de acontecimentos – a criação
do Ministério do Turismo e o redirecionamento da Embratur para atuação internacional,
a inserção do tema Eventos na agenda de promoção do país (2003), a criação dos Es-
critórios Brasileiros de Turismo (2004), o Plano Aquarela e a criação da Marca Brasil (2005)
e finalmente a presença do Brasil no Top 10 do Ranking ICCA – International Congress
& Convention Association em volume de realização de eventos internacionais (2006); e
acompanhar a repercussão destes fatos na mídia internacional, que reage, em paralelo à
implantação de cada uma das situações descritas, em grande parte pelo peso econômico
que o país vai assumindo enquanto mercado consumidor, como resultado das políticas
de inclusão social. O turismo beneficia-se deste cenário, pois a imagem do país vai se
reconstituindo no imaginário tanto de consumidores como de decision-makers ao redor
do mundo, e o noticiário referindo-se ao Brasil de forma positiva começou a despontar
já ao final da década passada.
Pois bem, um processo de crescimento pode ter como paralelo a adolescência:
nosso corpo e nossa alma ficam um pouco contraditórios, a voz muda, os desejos são
alternados entre antigos interesses infantis e os novos olhares para a futura vida adulta.
Pois é exatamente neste ponto em que nos encontramos hoje, enquanto país, em relação
a vários itens da agenda nacional relacionados a turismo. A cada nova etapa vencida ao
longo dos últimos anos, surge um novo desafio a enfrentar – legislação, infraestrutura e
capacitação, os mais comentados, são a parte visível deste adolescer do turismo brasileiro,
rumo a um novo papel no cenário internacional.
Do ponto de vista da produção intelectual brasileira a criação do curso de Lazer e
Turismo da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da Universidade de São
Paulo, em 2005, representou a possibilidade de inserir no universo acadêmico uma
nova geração de professores e formuladores, cuja formação, por abranger um conjunto
amplo de áreas de conhecimento, e destacadamente por trazer a reflexão mais ampla
sobre o lazer em suas diversas possibilidades. Ao completar seu sexto ano, tendo já
graduado várias turmas e iniciado um ciclo gerador de titulação de seus professores
na carreira acadêmica, o curso tem uma contribuição a fazer ao pensamento turístico
brasileiro.
Daí o que representa esta coleção. A contribuição de um grupo de profissionais, todos
relacionados à academia, todos ligados direta ou indiretamente ao curso de Lazer e Turis-
mo da EACH/USP ou à produção teórica que dialoga com seus postulados, procurando
dar corpo ao diálogo entre o turismo no Brasil e suas possibilidades, e a produção in-
telectual publicada ao redor do mundo, no que ela tem de contribuições a nos ofertar.
No país que conquistou o direito de realizar a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos,
a tarefa à qual se propõe esta coleção inovadora é trazer aos leitores, sejam estes profis-
sionais interessados em ingressar no setor ou já atuantes; sejam empreendedores ou
trabalhadores; sejam estudantes de nível técnico, superior ou graduados na área, as
seguintes contribuições:
– atualização: pois reúne alguns dos melhores e mais consagrados autores estrangei-
ros, traduzidos e adaptados por autores brasileiros especializados nos segmentos
sobre os quais escreveram;
– inovação: pois, a partir dos textos originais, acrescenta conceitos e experiências
da literatura turística brasileira profundamente calcados na realidade nacional e na
expertise e vivência profissionais e acadêmicas de cada um dos autores;
– apoio: pois tem a capacidade de orientar objetivamente aqueles que pretendem
ingressar no setor ou rever as práticas que hoje adotam em sua ação cotidiana; e
– reflexão: pois é a primeira coleção produzida após as profundas alterações ins-
titucionais pelas quais passou o turismo brasileiro com a criação de um Ministério
próprio em 2003. Esta coleção vai refletir os resultados obtidos com o novo patamar
alcançado pelas atividades ligadas ao turismo, assim como sua inserção na agenda
econômica do país.
Convido todos a desfrutarem da coleção completa : A primeira fase, reunindo autores
estrangeiros e brasileiros e a segunda, que se abre agora com autores nacionais. Profes-
sores e alunos, profissionais iniciantes e experientes vão encontrar na diversidade de temas
que abordamos um processo de reflexão a altura dos desafios do Brasil contemporâneo.
Vão encontrar em cada um dos livros, temas que nos desafiam cotidianamente. Nosso
objetivo declarado aliás, ao eleger temas e autores, era exatamente o de ampliar o universo
de leitores das publicações especializadas em turismo, por meio da abordagem de temas
cujo equacionamento é vital para que o Brasil esteja a altura de seu novo patamar.
Esta é a tarefa à qual nos propusemos e agora submetemos a julgamento dos leitores.
Se por um lado é fato que esta nova década assiste a consolidação de um país melhor
em termos de qualidade de vida sob todos os aspectos, por outro, esta situação nos cria
novos desafios em termos de geração de infraestrutura e qualidade de produtos e serviços
para atender este novo patamar de demandas internas e externas.

São Paulo, julho de 2011


Eduardo Sanovicz
Apresentação da obra
e dos autores

Todo livro tem uma história. A deste remonta há mais de uma década.
Desde o ano de 2002, quando terminei de escrever o livro Transportes Turísticos, muita
coisa aconteceu tanto do ponto de vista mercadológico quanto acadêmico nesta área.
O livro em si foi excepcionalmente bem aceito entre professores e alunos de Turismo,
foi reimpresso e reeditado e, durante alguns anos, foi o livro mais vendido da Coleção
Turismo da editora Aleph. Das quase 300 citações que minhas publicações receberam até
o ano de 2012, um-terço se deve a este livro. Há alguns anos, vários colegas professores
pediam-me que uma versão atualizada da obra fosse lançada, principalmente em função
das enormes transformações ocorridas no Brasil desde então. No início dos anos 2000, a
Gol era uma promessa, e Varig e TAM dominavam o setor aéreo. Quem iria imaginar que
em poucos anos a Gol se tornaria uma big player e que viesse a comprar a própria Varig?
Outras empresas de baixo custo se instalaram, a demanda expandiu vertiginosamente,
mas a crise aérea dos anos 2006/7 mostrou o lado sombrio de um sistema que ainda
precisava modernizar a sua gestão, notadamente no que diz respeito ao tráfego aéreo e
às operações aeroportuárias. Hoje o transporte aéreo é muito mais acessível e não apenas
um privilégio de poucos. Em outro modo de transporte, o setor de cruzeiros marítimos
explodiu no país, chegando a quase 800 mil passageiros na temporada 2010/11.
Escrever um livro deste porte é uma “loucura acadêmica”. Requer-se meses de trabalho
a fio, ganha-se muito pouco de direitos autorais, e as universidades de ponta preferem
muito mais que seus pesquisadores se dediquem a produzir artigos científicos do que a
escrever livros. Com a minha mudança de volta ao exterior, em 2008, as universidades fora
do Brasil simplesmente não valorizam nada que não seja publicado em inglês. Quando o
Prof. Eduardo Sanovicz, meu ex-colega da Universidade de São Paulo, me convidou em
2011 para escrever um livro sobre transportes para a coleção da Campus/Elsevier que
leva o seu nome, minha decisão inicial seria agradecer com um “thanks, but no thanks”...
Há sempre um tempo para se refletir... e se colocar as situações em perspectiva.
Poucas semanas depois do convite do Sanovicz, fui convidado pelo Prof. Marcio
Peixoto de Sequeira Santos (PET/COPPE/UFRJ) para ir ao Brasil participar da banca
de doutorado da Carla Fraga. O Marcio eu já conhecia desde a minha graduação em
Engenharia de Transportes na UFRJ e ele foi meu orientador no mestrado da COPPE. Já
a Carla, eu a conheci assim que o livro Transportes Turísticos foi publicado. Ainda como
aluna de graduação na UFJF, ela me escreveu entusiasmada sobre o lançamento do livro
e a contribuição que ele daria para o seu Trabalho de Conclusão de Curso. Nesses anos
todos, nos encontramos algumas poucas vezes no Rio e mantínhamos um certo contato.
Da minha parte, eu acompanhava com interesse a trajetória dessa turismóloga apaixonada
por transporte ferroviário que bravamente se aventurou a fazer mestrado e doutorado em
Engenharia de Transportes na COPPE/UFRJ.
Alguns dias antes da defesa da Carla, em dezembro de 2011, ela me convidou para
fazer uma apresentação sobre Transportes e Megaeventos na UniRio e lá encontrei
com o Rafael Castro, turismólogo, também apaixonado pelos transportes turísticos, que
seguia os passos da Carla na sua formação acadêmica na COPPE/UFRJ. O Rafael e eu já
havíamos trocado alguns emails em função do seu tema de doutorado sobre transporte
aéreo e turismo. No evento da UniRio “caiu a ficha”. Por que não aceitar o convite do
Sanovicz, incluindo a Carla e o Rafael neste projeto? Para mim seria a oportunidade
perfeita para trabalhar com uma nova geração de acadêmicos interessados na pesquisa
sobre transporte e turismo, ao mesmo tempo em que juntos poderíamos oferecer uma
abordagem mais atualizada do tema. Além disso, uma cena me fez colocar tudo em
perspectiva. Um aluno de graduação de educação a distância (depois descobri o nome
dele, João Alípio) carregava um exemplar do livro Transportes Turísticos. Se contribuir
com a futura geração de profissionais do meu país não era importante para a minha
universidade, para mim é! Um novo livro seria escrito... Com o convite feito e aceito
pelos dois, me encontrei com o Sanovicz no café da livraria Cultura, em São Paulo, e
acertamos os detalhes da obra.
Tanto para mim quanto para o Sanovicz estava claro que precisava haver alguns pontos
de inovação nesta nova obra. Ele queria que retratássemos as transformações ocorridas
nos anos 2000. Fazia totalmente sentido. Eu queria uma maior interligação entre trans-
portes não só com o turismo, mas principalmente com os destinos turísticos. Era uma
decisão arriscada, já que não há ainda um corpo teórico, mesmo na literatura internacio-
nal, que pudesse embasar um livro acadêmico sobre transportes e destinos turísticos. De
qualquer forma, gradualmente, o foco do ensino e da pesquisa acadêmica em turismo
está convergindo cada vez mais para a complexa dinâmica do turismo nos destinos
turísticos, a profissionalização da sua gestão, a relevância do marketing de destinos em
justaposição ao marketing de empreendimentos turísticos individuais e o entendimento de
que a experiência turística é representada pelo somatório das experiências vividas durante
toda uma viagem. Não há mais como se desvencilhar os sucessos e desafios dos setores
e empreendimentos individuais sem entender a dinâmica que ocorre dentro dos des-
tinos e entre eles e como são percebidos através das imagens que projetam. Por tudo
isso, neste projeto resolvemos focar em aspectos de planejamento e gestão dos diversos
modos de transportes turísticos que influenciam os destinos turísticos. Procuramos dar
exemplos e apresentamos casos tanto no Brasil, quanto no exterior, incluindo Austrália,
Estados Unidos, Emirados Árabes Unidos, França, Nova Zelândia, dentre outros. Além
disso contamos com uma gama de colaboradores convidados que enriqueceram a obra
com suas experiências de pesquisa.
A presente obra está estruturada em oito capítulos, cada qual encerrado por um
número de exercícios propostos. O primeiro provê uma introdução sobre transporte e
destinos turísticos enfocando a relação transporte-turismo e descrevendo a importância
da evolução tecnológica dos transportes para o turismo (LOHMANN e DUVAL, 2011).
Um mapeamento das redes de transportes é realizado, e as diferentes funções nodais
analisadas a partir das oportunidades que o sistema de transporte oferece para portões
de entrada, hubs e destinos turísticos (LOHMANN e PEARCE, 2010; 2012). Uma análise
sobre Cingapura e Dubai é realizada a partir dos estudos de LOHMANN, ALBERS et al.
(2009). O capítulo também trata da escolha do meio de transporte para o turismo domés-
tico no Brasil, a partir de dados da pesquisa de “Caracterização e Dimensionamento do
Turismo Doméstico” realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE).
Esse último item foi elaborado por Glauber Santos e Thiago Allis.
O Capítulo 2 contribui para o entendimento teórico-conceitual sobre a relação entre
transporte, turismo e destinos turísticos, estando estruturado em duas partes principais. A
primeira propõe uma análise global sobre o papel do transporte identificado em modelos e
sistemas turísticos consagrados na literatura nacional e internacional. De forma específica,
examinam-se aspectos do deslocamento e dos destinos turísticos nos quatro grupos de
modelos apontados por Pearce (2003): “viagem turística”, “origem-destino”, “estruturais”
e “evolucionários”. A segunda parte do capítulo apresenta o estado da arte da pesquisa
em transportes turísticos publicada em periódicos brasileiros de turismo, a qual foi escrita
por Glauber Santos e Thiago Allis.
Os dois capítulos seguintes focam em aspectos de planejamento e gestão. O Capítulo 3
analisa os modelos de planejamento dos transportes em interface com o turismo. Ele é
divido em três partes essenciais sendo que na primeira são abordados temas relativos ao
planejamento dos transportes e destinos turísticos com ênfase nos modelos sequenciais,
também conhecido como Modelo Quatro Etapas. Daniela Caruza Gonçalves Ferreira
faz uma análise das políticas públicas de transportes e de turismo em âmbito nacional,
com enfoque especial para aos últimos 12 anos. A sustentabilidade é parte intrínseca ao
planejamento dos transportes e do turismo e tema principal da segunda parte do capítulo,
que termina com a análise das especificidades e dos impactos dos transportes para
megaeventos, assunto bastante peculiar para a realidade vivida pelo Brasil atualmente. Já
o Capítulo 4 considera, a partir dos princípios básicos do marketing, aspectos de gestão
em transporte e turismo que estejam integrados em termos de produto, preço, promoção
e distribuição. Com quatro seções dedicadas a cada um desses aspectos do marketing,
o capítulo oferece exemplos práticos, do Brasil e do exterior, de gestão em transportes
turísticos para vários modos de transportes. O capítulo contou com a participação do
Flávio Valente.
Os Capítulos 5, 6 e 7 estão dedicados a modos específicos de transportes turísticos.
O Capítulo 5 apresenta características do modo aéreo com ênfase para o desenvolvi-
mento dos destinos turísticos. De relevância importância são tratados temas como os
modelos de negócios das empresas aéreas (LOHMANN e KOO, 2013) e como empresas
aéreas de baixo custo e empresas de modelos tradicionais impactam nos destinos turís-
ticos e na demanda atraída. O capítulo analisa também os principais fatos ocorridos na
(des)regulamentação do transporte aéreo no Brasil e a crise aérea dos anos 2006 e 2007,
com uma descrição dos impactos para o turismo doméstico. Um estudo de caso sobre
aeroportos e turismo residencial na região do Algarve, em Portugal, escrito pela Cláudia
Almeida encerra o capítulo.
O Capítulo 6 aborda dois meios de transportes aquaviários notadamente associados
com o turismo: cruzeiros e ferries. Em relação aos cruzeiros marítimos, em função da
sua atuação em escala internacional, apresentam-se os principais destinos de cruzeiros
marítimos do mundo, como é elaborado o processo de planejamento de itinerários de
cruzeiros, além de analisar os impactos ambientais e econômicos provocados nos des-
tinos turísticos. O capítulo também oferece uma visão sobre o crescimento do setor no
Brasil nos anos 2000. Os ferries são abordados através da tecnologia de catamarãs de alta
velocidade e os exemplos malsucedidos de operação dessa tecnologia na Nova Zelândia
e no Havaí, Estados Unidos (LOHMANN e NGUYEN, 2011; LOHMANN e TRISCHLER,
2012a).
O Capítulo 7 examina os transportes rodoviários e ferroviários separadamente, a
fim de se evidenciar como características particulares de cada modo influenciam no
desenvolvimento de destinos turísticos. No modo ferroviário é debatido como diversas
tecnologias ferroviárias podem influenciar no desenvolvimento de destinos turísticos, em
especial os trens de alta velocidade, as conexões aeroferroviárias e os trens exclusivos para
fins turísticos. Já no modo rodoviário, além da importância dos automóveis e de ônibus
regulares e fretados para o turismo, outros temas ganham destaque, como o mercado de
locação de veículos e o desenvolvimento de destinos turísticos. Por fim, tendo como foco
o período compreendido entre os anos 2000 e início de 2013, é realizada uma análise
conjunta entre os modos de transportes terrestres (rodoviário e ferroviário) e o turismo no
Brasil. Nesta parte do livro dá-se enfoque nos diversos projetos ferroviários de passageiros
que se pretende implantar no Brasil nos próximos anos. Discute-se também sobre trans-
porte rodoviário, sustentabilidade e destinos turísticos que dialoga especialmente com o
Capítulo 3. Três pesquisadores convidados oferecem reflexões valiosas sobre a relação
entre transportes terrestres e desenvolvimento de destinos turísticos, sendo eles: Prof.
José Augusto Sá Fortes e Elisangela Aparecida Machado da Silva que fazem uma análise
sobre a relação entre o transporte rodoviário e o desenvolvimento do turismo na Região
Trinacional do Iguaçu no Sul do Brasil. O Prof. Thiago Allis faz uma análise dos ônibus
de fretamento na cidade de São Paulo.
O último capítulo, intitulado “Tendências para os transportes e destinos turísticos”,
faz discussões sobre pesquisa, mercado e ensino. Na parte sobre pesquisa, o capítulo
conta com a participação de Márcio Peixoto de Sequeira Santos e Sergio Ribeiro. A partir
da análise dos transportes terrestres e o desenvolvimento do turismo rural na Região
do Vale do Café no Rio de Janeiro, os pesquisadores fornecem pistas preciosas para a
elaboração de pesquisas científicas sobre a relação entre ferrovia, rodovia, sustentabili-
dade e desenvolvimento de destinos turísticos dessa região. Na parte sobre mercado são
abordados temas relevantes, tais como: fusões e aquisições, segmentação do mercado de
transportes e turismo, entre outros. Na parte sobre educação, Guilherme Lohmann narra
sua experiência com viagens e visitas técnicas envolvendo o ensino da relação entre os
transportes e o turismo. Carla Fraga analisa sua experiência com o ensino e aprendizagem
dos transportes na educação à distância em turismo.
Um livro nunca se escreve sozinho, muito menos quando feito a seis mãos.
Nesta obra tivemos o privilégio de enriquecer o nosso trabalho com a experiência de
nove outros colegas. A obra apresenta colaboração de pesquisadores do Distrito Federal,
Rio de Janeiro, São Paulo, além de Portugal e Austrália, totalizando oito diferentes ins-
tituições acadêmicas. Nosso muito obrigado a Cláudia Almeida (Universidade do Algarve),
Elisangela Machado (UnB), Daniela Caruza (UERJ), Flávio Valente (Southern Cross Univer-
sity), Glauber Santos (IFSP), José Augusto Fortes (UnB), Marcio Santos (PET/COPPE/UFRJ),
Sergio Ribeiro (FACHA e FAETEC-RJ) e Thiago Allis (UFSCar) por terem escrito alguns dos
casos ou partes dos capítulos que enriqueceram sobremaneira esse livro. Com quase todos
os colaboradores possuindo grau de doutor ou em estágio de doutoramento, fica evidente
que a área de transportes turísticos se consolida academicamente tanto no Brasil quanto
no exterior. Além disso, boa parte dos coautores e colaboradores apresentam uma his-
tória acadêmica conjunta, quer do ponto de vista de publicações, quanto de orientação
(por exemplo, Carla, Sergio e eu fomos orientandos do Márcio, Elisangela está sendo
orientada pelo José Augusto e por mim, e eu co-oriento o Flávio no seu doutoramento).
Agradeço também a confiança e o convite do Prof. Eduardo Sanovicz, assim como
ao André Wolff, da Campus/Elsevier, pelo interesse e suporte fornecidos ao longo do
nosso trabalho. Por fim, essa obra não teria chegado ao fim sem o incansável esforço,
dedicação e competência da Carla Fraga e do Rafael Castro. Muito obrigado aos dois
pelo companheirismo e comprometimento.
Os coautores desta obra, Carla Fraga e Rafael Castro, gostariam de endossar esses
agradecimentos e destacam a seguir agradecimentos pessoais:
Carla Fraga agradece particularmente: “Ao Prof. Márcio Santos, por possibilitar o
reencontro com o Guiherme Lohmann. Ao Prof. Eduardo Sanovicz e toda equipe da
Campus/Elsevier por aceitarem a sugestão de meu nome para a coautoria desta obra.
Ao Guilherme Lohmann, por me mostrar com suas ações como transformar este grande
sonho em realidade! Ao Rafael Castro, pela parceria nesta desafiadora empreitada! Ao
ex-aluno João Pedro Villela, por ser um leitor atento do rascunho e oferecer feedback
sobre a relevância dos temas abordados para os alunos de turismo. Aos meus colegas de
trabalho na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio) e na Universidade
Estácio de Sá, demais amigos e familiares por me incentivarem na realização deste projeto;
em especial a Mari Torós por sempre estar disposta a contribuir com a realização de meus
sonhos, me impulsionando a ir em busca de tudo aquilo que me faz feliz!”.
O Rafael agradece particularmente: “ao Guilherme Lohmann, pelo convite para
fazer parte deste projeto ambicioso e pela paciência com os percausos encontrados
no meio do caminho. À Carla Fraga pelo companheirismo de sempre e por ter pos-
sibilitado finalmente meu encontro pessoal com o Guilherme durante a sua banca
de doutorado no PET/COPPE/UFRJ! Igualmente agradeço ao Prof. Eduardo Sanovicz
e à equipe da editora Campus/Elsevier por acreditarem no projeto e possibilitarem
que ele acontecesse. Por fim, agradeço aos meus amigos e aos meus familiares pelo
incentivo de sempre e novamente ao Guilherme por ajudar a tornar mais um dos
meus objetivos em realidade. Dreams do come true”.
Mais um sonho está sendo realizado. Melhor do que realizar os próprios sonhos é realizar
os sonhos de outras pessoas. Bons sonhos, bons estudos e boas realizações. Cheers!

Prof. Guilherme Lohmann, PhD


School of Tourism and Hospitality Management
Southern Cross University
Gold Coast (Austrália)
30 de março de 2013

LOHMANN, G.; ALBERS, S. et al. From hub to tourist destination - An explorative study of
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Research, v.17, n.1, p. 14-29. 2012.
LOHMANN, G.; TRISCHLER, J. The Failure of Fast Ferry Catamaran Operations in New
Zealand and Hawaii. Journal of Transportation Technologies, v.2, n.2, p. 102-112. 2012.
PEARCE, D. G. Geografia do Turismo: fluxos e regiões no mercado de viagens. São Paulo:
Aleph. 2003.
Prefácio

Com o Brasil vivenciando desafios de nível mundial que impactam o setor de turis-
mo, como a realização de eventos esportivos (Copa das Confederações de Futebol em
2013, Copa do Mundo de Futebol em 2014, Olimpíadas de 2016, no Rio de Janeiro) e
religiosos (Jornada Mundial da Juventude), este livro traz à tona a importância de discutir
o planejamento e a gestão na relação entre Transportes e Destinos Turísticos.
Nos últimos anos, constata-se que a movimentação de passageiros em viagens de
natureza turística vem crescendo acentuadamente. Segundo a Fundação Instituto de
Pesquisas Econômicas (FIPE), da Universidade de São Paulo, cerca de 20,8% das viagens
aéreas são realizadas por motivo de lazer; no transporte rodoviários, segundo a Associação
Brasileira de Transporte Terrestre de Passageiros (Abrati), 31,7% das viagens interestaduais
são de natureza turística.
Esses índices passaram a ser considerados com relevância no planejamento de trans-
portes federal. Estima-se uma taxa anual de 5,1% para o crescimento do turismo interno,
espelhado nos instrumentos de planejamento em transportes e nos programas de governo
para expansão e modernização da infraestrutura.
Grandes projetos de infraestrutura de norte a sul do país fomentam a cadeia turís-
tica no Brasil e também a relação com os países vizinhos. Exemplos a destacar são as
duplicações da BR-101 Nordeste, ligando em pista dupla o Rio Grande do Norte à Bahia
pelo litoral; e da BR-101 Sul, ligando Palhoça/SC a Osório/RS, que está em fase final de
construção e que melhora o corredor rodoviário de acesso ao Mercosul. A interconexão
física do Brasil com os vizinhos sul-americanos tem, por exemplos, a pavimentação da
BR-156/AP e a conclusão da ponte internacional com a Guiana Francesa; além da cons-
trução da BR-317/AC e da ponte internacional em Assis Brasil/AC, com Iñapari no Peru,
viabilizando acesso rodoviário do Brasil a Cuzco e Lima.
O olhar científico proposto pelos autores é bem-vindo neste momento em que se
consolida um mercado praticamente unificado no setor de transporte de passageiros. Se
anteriormente era possível dizer que, para viagens de média e longa distância, havia um
segmento da população que viajava de avião e outro segmento que viajava de ônibus, o
surgimento das companhias aéreas de baixo custo e, sobretudo, a elevação dos níveis de
renda da população, fizeram com que esses públicos se fundissem. Hoje a concorrência
entre o transporte rodoviário e o transporte aéreo de passageiros se dá basicamente em
termos de preço.
Embora o Brasil não tenha uma tradição no transporte ferroviário de passageiros, algu-
mas iniciativas com foco no turismo e na mobilidade regional estão em curso. Funcionam
no país linhas regulares de passageiros e trens turísticos, além de trens comemorativos
autorizados esporadicamente. O Ministério dos Transportes desenvolve estudos para
implantação de Trens Regionais de Passageiros, reativando um projeto desenvolvido pelo
BNDES, nos anos 1990. Estão em estudo trechos ferroviários, que poderão viabilizar o
transporte entre cidades e também servir a finalidades de deslocamento turístico, em
especial nos fins de semana.
Em futuro próximo, o Brasil passará a contar com trens de alta velocidade, trazendo
novos conceitos de tempo de viagem, nível de serviço, conforto e segurança. O primeiro
trecho integrará Rio de Janeiro - São Paulo – Campinas, com notável potencial para atração
de viagens de lazer no principal eixo econômico do país.
É nessa perspectiva que o livro Transportes e Destinos Turísticos: planejamento e
gestão possibilita pensar criticamente o papel dos diversos atores públicos e privados
para o desenvolvimento desta atividade produtiva. O turismo depende de uma rede de
transportes eficiente para garantir o alcance de seus objetivos sociais e econômicos, que,
em primeira instância, vêm contribuir para a realização das expectativas de progresso e
desenvolvimento da sociedade brasileira.

Paulo Sérgio Passos


Ministro dos Transportes
Brasília, março de 2013.
CAPÍTULO 1
Transporte e
Desenvolvimento
de Destinos Turísticos

Guilherme Lohmann e Rafael Castro

CONCEITOS APRESENTADOS NESTE CAPÍTULO


O objetivo geral deste capítulo inicial é apresentar a estreita relação entre os transportes
e o turismo, enfatizando a sua importância para o desenvolvimento de destinos turísticos.
A introdução traz conceitos importantes dessa interface a fim de estabelecer aspectos
teóricos e práticos da influência dos transportes no sistema turístico. Para tal são apresen-
tadas as evoluções tecnológicas dos transportes e seus impactos no turismo, as redes de
transportes e o desenvolvimento de funções nodais (origem, destino, hubs e portões
de entrada) que permitem um aprimoramento da função turística; a intermodalidade e a
mobilidade intradestinos como fatores de desenvolvimento do turismo.

1.1. INTRODUÇÃO – TRANSPORTE NO TURISMO


A relação entre as atividades de transporte e turismo é simbiótica, tendo o desloca-
mento humano como ponto comum que as une. Afinal, todo viajante, quer a lazer ou a
negócios, utiliza algum meio de transporte para chegar ao seu destino. Por consequência,
essa intensa inter-relação entre o transporte e o turismo faz com que, muitas vezes, o
desenvolvimento de destinos turísticos seja alavancado, ou não, em função da existência
ou ausência de eficientes sistemas de transporte.
No Brasil, durante a década de 2000, alguns exemplos merecem ser citados a fim de
ilustrar a relação entre transporte e turismo. Os dois acidentes aéreos fatais envolvendo
1
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

separadamente as empresas Gol (2006) e TAM (2007) deflagraram uma crise no sistema
de transporte aéreo, gerando um caos sem precedentes com impactos danosos não só
para o setor aéreo, mas também para vários destinos turísticos. Dentre os resultados
dessa crise, pode-se citar: por vários meses houve congestionamentos tanto no lado-terra
quanto no lado-ar dos principais aeroportos do país, com muitas ocorrências de atrasos
e cancelamentos nos voos; viajantes optando pelo uso do transporte rodoviário e se
possível para destinos mais próximos, com resultados preocupantes para vários destinos
turísticos tradicionais do Nordeste, tais como Fortaleza, Natal, Recife e Salvador, que são
altamente dependentes de acesso aéreo dos turistas do Sul e Sudeste; além de aumento da
demanda por cruzeiros marítimos a partir dos portos de Santos e Rio de Janeiro (COSTA,
LOHMANN et al., 2010).
Por outro lado, no turismo receptivo internacional, muitos destinos turísticos do Nor-
deste se beneficiaram da melhoria das suas infraestruturas aeroportuárias, bem como do
estabelecimento de acordos bilaterais entre o Brasil e a Europa, permitindo voos diretos
para o Nordeste. Previamente turistas europeus tinham de fazer conexões no Rio de
Janeiro ou em São Paulo. Esses voos podem ser tanto regulares (aqueles com horários
regulares a serem cumpridos em frequências previamente estabelecidas), a partir de des-
tinos europeus como Madri, Milão, Roma, Londres, Paris, Amsterdã e Lisboa, assim como
fretados (sem um padrão regular de frequência e que podem ser cancelados em função
da falta de demanda) de países como Suécia, Finlândia, Hungria e Polônia.
No contexto de outros países, Prideaux (2000) identificou na Austrália, em Cairns
de forma mais específica, os benefícios da melhoria da infraestrutura de transportes
e o incremento de turistas internacionais em função da diminuição do tempo total de
viagem para a região Norte do estado de Queensland. Outros destinos internacionais
têm emergido graças à criação de empresas aéreas com elevado padrão de serviço e
aeroportos eficientes e confortáveis que atraem passageiros intercontinentais para seus
hubs. Exemplos de crescimento exponencial nas décadas de 1990 e 2000 incluem as
cidades de Dubai e Abu Dhabi (ver Figura 1.1), nos Emirados Árabes, e Cingapura, na Ásia.
Lohmann et al. (2009) apresentam, através da óptica das funções nodais e das estratégias
de transporte aéreo, as semelhanças empregadas por Dubai e Cingapura para atingirem
o padrão de desenvolvimento atual de seus destinos a partir de hubs de transportes (ver
estudo de caso apresentado neste capítulo).
Se, por um lado, os exemplos anteriores ajudam a ilustrar a relação transporte e desen-
volvimento de destinos turísticos, há uma série de conceitos e aspectos teóricos que foram
brevemente mencionados que precisam ser melhor compreendidos. Eles, juntamente
com outros aspectos do planejamento e da gestão do transporte e do turismo, formam
a base teórico-conceitual empregada nesta obra. Apesar do enfoque no planejamento
e na gestão, a relação entre transportes, deslocamento de pessoas e destinos turísticos
é fundamentalmente de ordem geográfica. De forma objetiva, Leiper (1990) apresenta
um sistema turístico a partir de um enfoque geográfico, contendo: a região de origem
dos viajantes (onde vivem); as regiões de trânsito que interligam a origem aos destinos;
2
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

Figura 1.1 — Construção simultânea de quatro arranha-céus nos arredores do hotel


Emirates Palace, Abu Dhabi, em março de 2010 (Foto cortesia: Guilherme Lohmann)

3
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

e as regiões de destino turístico. Os outros dois elementos do sistema são: os turistas e


as indústrias de turismo e viagens (ex: meios de hospedagem e centros de informações
turísticas). Conforme ilustrado na Figura 1.2, cada um dos elementos interage com o sis-
tema não apenas para contribuir com a existência do produto turístico, mas também é
impactado pelo mesmo.

Figura 1.2 — Modelo de Leiper para um sistema turístico. (Fonte: LOHMANN e ­PANOSSO
NETTO, 2012)

Além de os transportes facilitarem o deslocamento dos turistas entre sua origem e seus
destinos, o sistema de transporte intradestinos provê a movimentação entre os terminais de
transportes, equipamentos e atrativos turísticos a fim de maximizar a experiência turística
(PAGE, 2009). Conforme ilustrado brevemente nos exemplos anteriores, o transporte pode,
muitas vezes, ser o fator mais importante na viabilização de um destino turístico (LOHMANN
e DUVAL, 2011). Em outros casos, o transporte em si torna-se o grande atrativo turístico, tal
como acontece nos serviços ferroviários cênicos do Canadá ou nos cruzeiros marítimos de
curta duração, nos quais a maioria dos passageiros tende a preferir permanecer dentro dos
navios do que a explorarem os portos visitados. No futuro, outro exemplo serão os voos
suborbitais tais como os oferecidos pela Virgin Galactic, permitindo que turistas espaciais
experimentem a gravidade zero, além de visualizarem a curvatura azul da superfície terrestre.
No contexto da mobilidade local dos destinos turísticos, podem ser encontradas
algumas situações conflituosas que geram desafios teóricos e práticos envolvendo o
planejamento e a gestão dos transportes. Em primeiro lugar, em muitos casos, os turistas
são apenas um dos muitos tipos de passageiros que buscam mobilidade. Assim sendo,
empresas de transportes urbanos podem estar mais focadas na prestação de serviços de
transporte para a população local do que necessariamente para os turistas. Em segundo
lugar, o deslocamento de turistas pode envolver várias escalas geográficas, desde viagens
4
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

intercontinentais até deslocamentos curtos dentro de um mesmo destino. Raramente as


organizações de turismo e transporte e os formuladores de políticas públicas têm o con-
trole do planejamento e gestão de todas as regiões visitadas em uma viagem turística,
gerando desafios na implementação e aplicação de políticas de transporte que sejam
consistentes e integradas durante toda a viagem. Em terceiro lugar, as diferenças na
morfologia geográfica do destino turístico, a concentração de atrações, a sazonalidade
dos visitantes e a natureza do ambiente podem influenciar a escolha dos modos de trans-
porte e sua viabilidade (LOHMANN e NGUYEN, 2011).
A fim de melhor esclarecer alguns dos conceitos-chave apresentados neste livro, faz-se
necessário definir “destino turístico” e os diversos aspectos do sistema de “transporte turístico”.
¥ Definição de destinos turísticos
É inevitável, dada a falta de precisão prevalente na pesquisa em turismo, que haja
desafios ao se tentar definir os destinos turísticos. No contexto desta obra, o conceito de
destino turístico é empregado para descrever áreas geográficas espaciais onde o turismo
é uma atividade importante (se não a mais importante), em que se encontram um número
de infraestruturas e serviços providos com o objetivo de atender às necessidades de lazer
e negócios dos viajantes e que podem variar em escala desde um vilarejo até uma nação,
incluindo diferentes morfologias geográficas, tais como destinos urbanos e rurais, zonas
costeiras, montanhas e ilhas (PRIDEAUX, 2009).
¥ Definição de transporte turístico
É a atividade-meio compreendida por uma série de atributos (ver Quadro 1.1) que in-
terliga a origem de uma viagem turística a um determinado destino (e vice-versa),
que interliga vários destinos turísticos entre si (primário ou secundários) ou que faz
com que os visitantes se desloquem dentro de um mesmo destino primário ou secundário.
A Figura 1.3 apresenta um esquema espacial dessa definição.
Os atributos de transportes apresentados no Quadro 1.1 são relevantes para todos
os stakeholders envolvidos desde a origem da viagem, incluindo viajantes, as empresas
que oferecem serviços de transporte, o poder público, dentre outros. Um destino turís-
tico pode se destacar dos demais por oferecer variedade e qualidade nesses atributos.
O destino que pode ser acessado por vários modos de transporte terá a vantagem
competitiva de possuir o modo de transporte mais conveniente para diferentes tipos de
turistas, incluindo seus segmentos e mercados. No entanto, só variedade não é suficiente,
pois atributos relacionados à qualidade do serviço de transporte, tais como segurança e
conforto, são partes fundamentais de uma experiência turística satisfatória e podem cons-
tituir em diferencial para o grau de satisfação com um destino turístico (THOMPSON e
SCHOFIELD, 2007). Preço e velocidade dos transportes (que estão também relacionados
à tecnologia e à força motriz) são outros atributos que podem determinar a escolha de
um destino turístico em detrimento de outro, pois tempo de deslocamento e o valor
despendido na passagem constituem critérios prioritários para grande parte dos turistas.
Obviamente fatores geográficos contribuem para a eventual existência ou não de parte
5
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Quadro 1.1 — Atributos e características do sistema de transportes turísticos

ATRIBUTO CARACTERÍSTICAS
Conforto Medido de muitas maneiras diferentes, incluindo o espaço entre as
­poltronas, nível de ruído no interior do veículo, qualidade da área
de espera etc.
Confiabilidade Capacidade de cumprir o contrato de transporte, incluindo, por exemplo,
a pontualidade.
Doméstico ou Quando envolve ou não o transporte entre mais de um país. Na maioria
Internacional dos casos, as viagens internacionais exigem arranjos mais complexos para
se conformarem com os procedimentos de mais de um país, incluindo
imigração, alfândega, regulamentos sanitários, regulamentações
econômicas e de segurança dos transportes.
Elementos do trans- Força Motriz: define o modo (ver item a seguir) de transporte e a
porte velocidade da viagem.
Terminal: lugar de troca de um modo de transporte para outro, ou
conexões entre veículos de um mesmo modo.
Veículo: unidade de transporte onde os passageiros e bagagens serão
acomodados.
Via: dividido em natural (água ou ar) e artificial (rodovias e estradas de
ferro).
Modo Aéreo: é o mais rápido modo de transporte, ligando a maior parte do
mundo.
Ferroviário: com via dedicada, é uma opção confiável e segura de
transporte, usualmente com alto nível de conforto. Requer altíssimo
investimento em infraestrutura. Trens de alta velocidade tornaram-se
competitivos com os aviões, particularmente para rotas de curta e média
distância (menos de mil quilômetros).
Rodoviário: oferece transporte terrestre de forma conveniente e
porta-a-porta.
Aquaviário: apesar de ser o mais lento modo de transporte, permite
alto padrão de conforto e amenidades a bordo, podendo transportar um
grande número de passageiros (cruzeiros marítimos) e eventualmente
veículos (ferries).
Tarifa (preço) O preço do transporte pode ser básico para qualquer assento disponível ou
pode seguir uma estratégia complexa de tarifação na qual, por exemplo,
passageiros voando o mesmo voo e na mesma classe pagam preços com-
pletamente diferentes dependendo do quanto antes fizeram suas reservas
e das restrições da tarifa escolhida (tempo de cancelamento, duração da
estada no destino, pontuação em programas de milhagens).
Regular ou fretado Regular segue uma frequência determinada de horários preestabelecidos
a despeito do número de passageiros a bordo. Fretados são usualmente
organizados por um cliente particular, não tendo um horário fixo e regular
a ser cumprido, podendo ser cancelado por falta de demanda
Segurança Número de acidentes ou de fatalidades, roubos etc.
Velocidade O quão rápido uma determinada tecnologia viaja (v. o item “Força Motriz”
anteriormente).
Fonte: adaptado a partir de LOHMANN e DUVAL (2011)

6
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

Figura 1.3 — Esquema de transporte aplicado ao turismo

desses atributos, uma vez que, por exemplo, transportes aquaviários estão disponíveis
somente nos destinos costeiros ou próximos a rios e lagos.
Em muitas circunstâncias, o transporte determina a decisão de viajar, prevalecendo
sobre o próprio destino turístico, influindo até mesmo na escolha do local a ser visitado.
Isso é comumente observado quando, por exemplo, empresas aéreas lançam tarifas
superpromocionais, barateando-as a tal ponto que turistas potenciais priorizam a opor-
tunidade de viajar independentemente do destino de sua preferência. Esse fato reforça
a importância do transporte para os destinos turísticos que são servidos principalmente
por empresas aéreas de baixo custo. Promoções especiais por parte dessas empresas
podem representar uma enorme diferença no fluxo de turistas. A questão é que, tanto
os destinos turísticos como as empresas de transporte muitas vezes fazem um grande
esforço de marketing promocional junto a turistas potenciais, mas, por outro lado, têm
uma atitude muito passiva para criar parcerias conjuntas de marketing que facilitem a
atração de turistas potenciais. Um exemplo positivo nesse aspecto vem da Austrália, onde
é comum organizações turísticas governamentais terem um especialista em transporte
aéreo a fim de interagir com empresas aéreas e aeroportos na captação de novos voos.
Outros conceitos vitais para os destinos turísticos são a “acessibilidade” e a “conecti-
vidade”, que, além de influenciarem a relação transporte-turismo, evidenciam os papéis
de atuação dos setores público e privado em provê-las. Acessibilidade é simplesmente
uma medida geográfica comparativa de vários pontos dentro de uma rede e das conexões
que são possíveis devido a provisão de transporte existente. Conectividade é uma medida
semelhante, mas examina as restrições práticas, tecnológicas e as oportunidades para
maior acessibilidade, incluindo menor tempo de viagens ou modos de transportes mais
eficientes (LOHMANN e DUVAL, 2011).

1.1.1. Transportes sustentáveis


Após vinte anos da realização da Eco-92 e do enorme interesse e atenção sobre a
temática do desenvolvimento sustentável, evidencia-se ainda uma falta de consenso não
apenas em termos de como se definir turismo sustentável, mas também em aspectos
teóricos que possam de forma prática viabilizar a implementação de políticas públicas
com efetivos mecanismos de planejamento (SHARPLEY, 2010). No caso específico dos
7
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

transportes, uma adaptação da definição estabelecida pela Comissão Brundtland para a


sustentabilidade do planeta seria a habilidade de se alcançarem as necessidades atuais
de transporte sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas
necessidades de transporte (adaptado de RICHARDSON, 2005) – ver Seção 3.4.
As publicações acadêmicas sobre transporte sustentável têm provido tanto uma
abordagem teórica (GIVONI, 2007; BANISTER, 2008), quanto tentativas práticas de se
alcançarem meios de transporte que sejam mais eficientes, o que tem sido interpretado
na literatura como sendo “sustentável” (DALLEN, 2007; GRONAU e KAGERMEIER, 2007;
BARR, SHAW et al., 2010; HARES, DICKINSON et al., 2010). Alguns indicadores quan-
tificáveis em termos de políticas de sustentabilidade de transporte incluem segurança,
diminuição de congestionamentos, o consumo eficiente de combustível, redução das
emissões dos veículos e melhoria do acesso. Em geral, esses indicadores são consequên-
cias das políticas destinadas a reduzir e substituir a necessidade de viagem, incentivar a
transferência modal para o transporte público ou o uso de tecnologias menos intensivas
de emissão de carbono, diminuição das distâncias percorridas ou a geração de inovação
tecnológica com melhor eficiência energética (BOSCHMANN e KWAN, 2008; AFTA-
BUZZAMAN e MAZLOUMI, 2011). No entanto, como Dickinson e Dickinson (2006)
apontam com relação ao número de soluções que almejam resolver o problema do
transporte sustentável, ainda não está claro exatamente o que funciona, onde e por quê.
Algumas iniciativas de transporte mais sustentáveis de turistas começam a ser debatidas
e implementadas em determinados destinos turísticos. No entanto, as lições aprendidas
com essas experiências não foram ainda integradas em uma única estrutura, tendo em
consideração as diferentes escalas geográficas, os diferentes tipos de destinos (costeiro,
urbano, rural, montanhoso e insular) e outros fatores como comportamento do turista,
comercialização, transferência entre modos de transportes, inovação tecnológica, políticas
de turismo e transporte, dentre outros (LOHMANN e STANFORD, 2012).
Entretanto, considerando a concentração da população e a tendência atual de cres-
cimento das cidades, medidas de transporte urbano sustentáveis tornaram-se extrema-
mente relevantes, com algumas iniciativas e políticas atualmente implementadas em
megalópoles em todo o mundo, incluindo Londres, Cingapura e São Paulo. Essas iniciativas
incluem: a promoção da utilização dos transportes públicos; alocação de rotas para ci-
clistas e caminhantes; rejuvenescimento da área central; mudanças no uso do solo a fim
de proporcionar maior proximidade entre áreas residenciais e pólos geradores de viagens;
restrição de acesso de transporte individual aos centros empresariais e financeiros por
meio de rodízio de veículos, pedágios urbanos ou mesmo sua proibição completa. Tais
medidas podem aumentar a atratividade dos destinos turísticos promovendo ambientes
menos poluídos, além da redução do congestionamento tanto para a população local
quanto para turistas (LOHMANN e STANFORD, 2012).
Destinos montanhosos e rurais têm seus próprios problemas com o transporte sus-
tentável, em função do desafio de que o transporte pode representar impactos no meio
ambiente, na maioria das vezes o grande atrativo para o tipo de turistas e visitantes que
8
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

são atraídos para esses destinos. A grande dispersão de atrações e atividades turísticas, sa-
zonalidade e a falta de adequado e eficiente sistema de transporte público são alguns dos
desafios apresentados para destinos montanhosos. Algumas das bem-sucedidas iniciativas
de transporte sustentáveis têm como alvo os moradores locais, em vez dos turistas, uma
vez que aqueles estão mais propensos a se envolver no planejamento e reserva das suas
viagens, estar ciente das informações sobre o compartilhamento do uso de automóveis
e da existência de informações em tempo real de transporte público.
Por fim, pequenas ilhas em economias emergentes são muito dependentes de viagens
aéreas e tendem a ter uma economia menos diversificada, sendo em grande parte depen-
dente do turismo. Em muitos casos, não há alternativas de transporte que não o transporte
aéreo. Além disso, o acesso de viajantes por meio de ferries pode ter implicações em
termos da gestão do tráfego local, com a falta de planejamento e acessibilidade apresen-
tando aspectos negativos, como engarrafamentos, quando, além dos veículos trazidos
pelo ferry, se somam a um segmento de locação de veículos barato e fácil, tal como no
caso de Malta (ROBBINS, 1996). No Havaí, alta acessibilidade por transporte aéreo e, em
menor grau por cruzeiros marítimos, diminuem o isolamento de um dos mais remotos
arquipélagos do mundo. No entanto, como apresentado por Lohmann e Nguyen (2011),
há vários desafios em se prover transporte sustentável no Havaí, em função do alto grau
de desenvolvimento econômico, batalhas políticas e judiciais inerentes à organização do
estado (ver Estudo de caso no Capítulo 6).
Iniciativas futuras de desenvolvimento tecnológico dos serviços de transportes terão
necessariamente de incorporar materiais, energia e eficiência que garantam um avanço
sustentável da mobilidade de turistas. Mas para entender o futuro, é preciso também se
conhecer o passado da evolução tecnológica dos transportes e o desenvolvimento de
destinos turísticos, o que é feito na seção a seguir.
1.2. EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA DOS TRANSPORTES
E O DESENVOLVIMENTO DO TURISMO
O turismo, no padrão que atualmente é conhecido no mundo inteiro, só pôde ser
alcançado graças ao desenvolvimento tecnológico dos meios de transportes. Até meados
do século XIX, atravessar o Atlântico demandava algumas semanas de viagem, enquanto
hoje os jatos tradicionais (subsônicos) percorrem a travessia em poucas horas, fazendo
com que as embarcações dessa época e sua tecnologia fossem um empecilho para
o fenômeno social e econômico que é o turismo atualmente. Por outro lado, a excessiva
mobilidade gerada por tecnologias que empregam combustíveis fósseis e que tornaram
o deslocamento turístico acessível para uma grande parte da população mundial ameaça
vários destinos turísticos, através da geração de poluição atmosférica e sonora, além da
eliminação do meio ambiente para a implantação desses sistemas de transportes.
Dentre essas tecnologias, pode-se creditar principalmente ao automóvel e ao avião a
intensificação e a frequência do turismo de massa que hoje existe em âmbito mundial.
Os automóveis passaram a fazer parte da vida de centenas de milhões de pessoas em
9
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

todo o mundo, permitindo uma grande mobilidade no dia a dia e o surgimento do turis-
mo de curta e média distância. Por sua vez, os aviões foram responsáveis por facilitar
o acesso rápido e seguro aos mais variados e remotos destinos turísticos do mundo,
principalmente em função de eliminar barreiras geográficas ao utilizar o ar como via
de transporte.
Embora desenvolvidos ainda no final do século XIX, somente após o término da
Segunda Guerra Mundial, em 1945, os automóveis foram fabricados em escala industrial e
tornaram-se um bem acessível para uma parcela da população mundial. Com a expansão
de seu uso e a construção de estradas rodoviárias, o turismo também ganhou impulso,
o que possibilitou à indústria hoteleira e demais serviços turísticos desenvolverem-se
nesses novos destinos turísticos. Os automóveis, em função da grande acessibilidade
(porta a porta), compreendem boa parte da rede de transporte de uma região e também
servem como meio de interligação entre os outros modos de transporte. Para os des-
tinos turísticos, os automóveis permitem que um maior número de viagens a lazer sejam
realizadas e com cada vez mais frequência, tornando-se, em alguns países como Austrália
e Estados Unidos, a primeira forma de transporte turístico.
Com a introdução dos aviões a jato, que mais do que dobraram a velocidade de
cruzeiro das aeronaves – de 400 km/h para 950 km/h –, e da introdução dos wide-bodies
na década de 1970, aviões como o Boeing 747 capazes de transportar mais de 400 pas-
sageiros, o modo de transporte aéreo suplantou as viagens marítimas intercontinentais.
Com o aumento de capacidade das aeronaves, o custo por assento-quilômetro disponível
(CASK, em inglês Cost Available Seat-Kilometer) diminuiu significativamente, permitindo
tarifas mais acessíveis. Como exemplo, apesar da inflação existente entre as décadas de
1930 e 2010, a tarifa de um voo da Hawaiian Airlines entre as ilhas Havaianas continuam
a valer os mesmos US$40. Outro exemplo atual das vantagens da economia de escala
no transporte aéreo ocorreu com a introdução do Airbus A380 em 2007. O double-deck
tornou-se o maior avião comercial do mundo em operação, com capacidade para trans-
portar 525 passageiros numa configuração de três classes (econômica, executiva e primeira
classe), e até 853 passageiros em uma configuração de classe única (AIRBUS, 2012).
Apesar do desenvolvimento tecnológico individual de cada modo de transporte, um
bom sistema de transportes compreende terminais intermodais, interligando tecnologias
que sejam complementares, ao invés de competitivas.

1.2.1. Intermodalidade
Cada modo de transporte apresenta vantagens e desvantagens, por isso a intermoda-
lidade permite que viajantes utilizem, ao longo de toda viagem, o modo de transporte
mais eficiente possível (v. Quadro 1.1). O rodoviário, por exemplo, oferece flexibilidade
porta-a-porta que permite que o turista se desloque entre os diversos terminais de trans-
porte e seus destinos finais. No ferroviário, carros adicionais podem ser adicionados (leito,
panorâmico etc.), permitindo flexibilidade em relação à sazonalidade, mas necessita
de integração, pois em raros casos é porta a porta. O modo aéreo favorece o turismo de
10
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

média e longa distância devido a velocidade e alcance mundial, porém, em função do


alto consumo de combustível e excessiva regulamentação, é muito suscetível a fatores
políticos e econômicos externos. O modo aquaviário apresenta grande capacidade de
carga e conforto, porém baixa velocidade, além de demandar grandes estruturas para
atracação em portos.
Desde o surgimento das tecnologias de transporte após a Revolução Industrial e até
boa parte do século XX, tradicionalmente, sempre houve uma integração muito grande
entre os transportes marítimos e ferroviários. Enquanto os navios eram responsáveis pela
cabotagem ao longo de vastas regiões costeiras e também através dos oceanos, os trens
faziam a interligação dos portos com o interior. De certa forma, o transporte de pas-
sageiros e a integração aquo-ferroviária foi resultado do intenso transporte de carga que
existia entre esses dois modos de transportes. Com o surgimento do transporte aéreo,
os aeroportos foram construídos afastados dos grandes centros e geralmente sem a in-
terligação com o sistema ferroviário. Assim, as rodovias foram a maneira encontrada para
interligar os aeroportos com os grandes centros urbanos (STUBBS e JEGEDE, 1998). O
primeiro esquema da Figura 1.4 representa a visão tradicional de integração e competição
entre os sistemas de transportes.
Durante os anos 1990, uma outra visão se consolidou em diversos sistemas de trans-
portes no mundo. Ainda que nessa visão contemporânea a competitividade e a integração
da visão tradicional continuem a existir, novas formas de integração se fizeram presentes,
incluindo a ligação metroferroviária com os aeroportos e o desenvolvimento de novas tec-
nologias de ferries catamarãs com navegação mais rápida favorecendo turistas a transpor-
tarem seus veículos nessas embarcações (Figura 1.5). A viabilidade econômico-financeira
e os potenciais impactos ambientais dessa nova tecnologia têm demonstrado ser um
desafio para a sustentabilidade de suas operações, já que exemplos do Havaí (Estados
Unidos) e da Nova Zelândia descrevem o fracasso dos catamarãs de alta velocidade
(LOHMANN e TRISCHLER, 2012). Se nesse último caso foi o desenvolvimento de uma
nova tecnologia que favoreceu a integração aquo-rodoviária, no caso dos aeroportos o
transporte ferroviário foi a solução encontrada para o transporte público de massa com
confiabilidade e segurança. O metrô e o trem colaboram para diminuir o tempo total
de viagem dos passageiros aéreos em função dos constantes engarrafamentos existentes
nos longos percursos urbanos para acesso aos principais aeroportos do mundo. A parte
inferior da Figura 1.4 esquematiza a visão contemporânea.
O Brasil apresenta fundamentalmente uma visão ainda tradicional de integração modal,
pois há uma supremacia dos transportes rodoviários (automóveis e ônibus) no que diz
respeito à integração com os aeroportos. Poucos aeroportos brasileiros são integrados
com o transporte metroferroviário (ex: Porto Alegre e Recife), apesar do trânsito caótico
das principais cidades brasileiras, mesmo aquelas que contam com uma rede de metrô
e trem. Além disso, apesar de sua vasta região costeira e a existência de grandes cen-
tros urbanos costeiros, o transporte aquaviário de passageiros é insignificante, com raras
exceções, como é o caso de Belém e Manaus.
11
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Figura 1.4 — Visão tradicional e contemporânea de intermodalidade. (Adaptado a


partir de LOHMANN e DUVAL, 2011)

1.3. REDES DE TRANSPORTES E SURGIMENTO DE FUNÇÕES NODAIS


Outro aspecto relevante para o desenvolvimento dos destinos turísticos são as redes de
transporte e as diversas funções nodais apresentadas por uma localidade. Alguns destinos
turísticos, principalmente os grandes centros urbanos, são, naturalmente, onde as redes de
transportes se concentram e dispersam. Redes de transporte bem conectadas implicam
destinos turísticos mais acessíveis e interligados, e, portanto, indutores do desenvolvimento
regional e do turismo. Os nós das redes de transportes podem desempenhar várias funções
nodais, incluindo origem, destino, hub, portão de entrada, escala e funções múltiplas
12
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

Figura 1.5 — Tecnologia roll-on/roll-off de catamarãs de alta velocidade, Wellington,


Nova Zelândia, em abril de 2002 (Foto cortesia: Guilherme Lohmann)

(LOHMANN e PEARCE, 2010). As funções origem e destinos foram apresentadas neste


capítulo (ver Figuras 1.2 e 1.3 e definições). Devido às suas posições e conexões em uma
rede de transportes, hubs e portões de entrada têm características especiais que podem
ser extremamente relevantes para o turismo. Os itens a seguir apresentam de forma
conceitual e prática as redes de transportes e as diversas funções nodais mencionadas.

1.3.1. Rede de transportes


Redes de transportes são o conjunto de ligações dos diversos modos de transportes e
seus terminais de integração. A existência de uma rede de transportes está condicionada
a diversos fatores de acordo com os atributos de cada modo. Por exemplo, uma rede
aquaviária limita-se à existência ou não de corpos d’água navegáveis; redes terrestres, quer
rodoviárias ou ferroviárias, podem ser mais abrangentes geograficamente, mas dependem
da topografia, construção de pontes e túneis podem encarecer ou até mesmo inviabilizar
um projeto de transportes; uma rede aeroviária apresenta maior flexibilidade por utilizar
o “ar”, e novos sistemas de navegação aérea, como o NextGen, permitem a redução da
distância total das rotas aéreas, diminuindo o número de congestionamentos aéreos e o
consumo de combustível.

1.3.2. Funções Nodais


Funções nodais e as oportunidades de geração de visitantes que elas produzem podem
gerar benefícios favoráveis para o turismo. Conceitos teóricos e os desafios práticos da
13
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

inter-relação entre as diversas funções nodais e destinos turísticos foram apresentados


para o sistema de ferry que interliga as Ilhas do Norte e Sul da Nova Zelândia, tanto
do ponto de vista da demanda turística (LOHMANN e PEARCE, 2010), quanto dos
fornecedores de transporte e turismo (LOHMANN e PEARCE, 2012). O que esses autores
identificaram foi que lugares como Picton, uma pequena localidade na Ilha do Sul, ex-
tremamente dependente da existência dos ferries para a sua sobrevivência econômica,
têm menores chances de atrair passageiros de ferries para estenderem suas permanências
no destino, em comparação com Wellington, a capital do país. Por outro lado, a própria
infraestrutura portuária que permite o recebimento de visitantes em trânsito e contribui
para o setor de restaurantes, postos de gasolina, dentre outros, é um fator a degradar o
meio ambiente bucólico que Picton apresenta e que poderia induzir o desenvolvimento
do turismo se os ferries não estivessem presente.

1.3.3. Hub
Hubs são tradicionalmente designados num sentido bastante amplo para se referir a
um local que funciona como uma encruzilhada ou de base operacional de um grande
aeroporto ou companhia aérea. O conceito de hub assumiu um significado mais técnico
a partir de alterações nas práticas das empresas aéreas e refere-se às funções de trans-
ferência dentro de uma rede de transporte mais ampla (DENNIS, 1994). A ideia-chave
é que o fluxo entre um conjunto de cidades origem-destino passe por um ou mais hubs
em rota para o destino turístico final. O sistema de hubs-and-spokes foi popularizado nos
Estados Unidos após a desregulamentação do transporte aéreo em 1978, com as empresas
aéreas norte-americanas implementando-os com o objetivo de atenderem vários destinos
com um menor número de aeronaves.
A função nodal hub é muito mais utilizada no modo aéreo, uma vez que é muito fácil
implantar ou deslocar um hub já que o transporte aéreo não possui vias aéreas cons-
truídas. Para as empresas aéreas a estratégia de hub traz enormes vantagens em termos
econômicos (ganho em escala). Para os passageiros, se as economias de escala e escopo
geram tarifas menores, por outro como os voos tendem a passar pelo hub em vez de irem
direto para seus destinos finais, o tempo total de viagem aumenta. Pode-se dizer que o
hub, por sua qualidade espacial de centralidade e intermediação, aumenta a eficiência
do tráfego dentro do sistema de transportes (HOYLE e KNOWLES, 1998).

1.1 ATIVIDADE DE FIXAÇÃO:


IDENTIFICAÇÃO DE HUBS DAS EMPRESAS AÉREAS BRASILEIRAS

No Brasil, os hubs aéreos podem ser visualizados na concentração de rotas das


empresas aéreas domésticas em operação no território brasileiro. Na década de 2000,
observou-se, por exemplo, que TAM e Gol utilizavam, predominantemente, os aeroportos
de Brasília e São Paulo como hubs, sendo estes inclusive palcos da crise aérea de 2006
e 2007. Já a empresa aérea Azul inaugurou suas atividades utilizando o aeroporto de
14
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

Campinas (SP), evitando o congestionamento tipicamente presente nos grandes aeroportos


de São Paulo.
Visite os sites das principais empresas aéreas brasileiras e aponte seus principais
hubs. Você encontrou também hubs secundários espalhados em outras regiões do país?
Considere uma hipotética viagem entre a Austrália e o Brasil. Enumere empresas aéreas
que oferecem voos entre os dois países com a necessidade de apenas uma escala. Anote
o nome desses hubs e compare-os em sala com outros colegas.

1.3.4. Portões de Entrada


São vistos de um modo geral como pontos principais de entrada/saída dentro ou fora
de um sistema de transporte nacional ou regional. Portões de entrada não apenas ligam
os outros nós dentro de uma rede nacional ou regional, mas também servem para ligar
duas ou mais redes de transportes. Os portões de entrada podem ser comparados a
um funil pelo qual os viajantes convergem de diferentes rotas para ter acesso por meio
de um certo ponto, e a partir de onde podem dispersar ou não, dependendo da função
nodal existente no outro nodo (BURGHARDT, 1971; PEARCE, 2001).
Os portões de entrada e os hubs possuem funções nodais privilegiadas na rede de
transportes pois obtêm um intenso fluxo de viajantes que passam por eles a fim de chegar
a outros nodos. Isso possibilita a esses locais o privilégio de capturarem tais viajantes
e transformá-los em turistas. Por essa razão, os portões de entrada reúnem maior capaci-
dade de atraírem, por exemplo, diversos tipos de eventos, tais como reuniões, convenções
e exibições (MISTILIS e DWYER, 1999). Lohmann e Pearce (2010; 2012) produziram es-
tudos evidenciando os desafios enfrentados por portões de entrada em diferentes escalas
(urbana e rural) e estágios de desenvolvimento turístico para atrair passageiros de ferry a
se tornarem turistas na Nova Zelândia.

1.3.5. Escalas
O conceito de escalas está menos desenvolvido que as demais funções e deriva de
análises de turnês ou viagens em forma de circuitos. Como o nome sugere, referem-se a
“paradas” ou escalas em lugares que servem como pontos de apoio no caminho entre
destinos ou funcionam como destinos turísticos secundários ou em circuitos mais longos.

1.3.6. Múltiplas funções


As funções previamente descritas raramente ocorrem de forma isolada. Caves e Gosling
(1999), por exemplo, usam o termo “gateway hubs” para se referirem a portões de entrada
na periferia da Europa. Em seu modelo de espaços turísticos urbanos, Pearce (1981) ex-
plicitamente incorpora a ideia de que grandes centros urbanos, em particular, podem
ter múltiplas funções nodais devido ao tamanho, à infraestrutura e ao lugar que ocupam
na hierarquia urbana. Mais tarde, ele desenvolveu as implicações práticas de múltiplas
funções nodais no que diz respeito ao planejamento do turismo (PEARCE, 1995). De forma
prática, pode-se tomar o exemplo da cidade de São Paulo, que funciona como ponto
15
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

de origem de milhões de viagens turísticas anuais, ao mesmo tempo em que é um dos


principais destinos turísticos do país e o grande hub aéreo do Brasil.

1.4. EXEMPLO DE FIXAÇÃO: CINGAPURA E EAU


Dois países que exemplificam com sucesso as diferentes funções nodais previamente
apresentadas e que têm gerado grande fluxo de passageiros aéreos que se tornam turistas
são Cingapura e Emirados Árabes Unidos (EAU). Ambos os destinos usaram muito bem um
mix de estratégias de gestão integrada entre companhias aéreas, aeroportos, governos e
respectivos organismos de turismo. A partir dessas bem elaboradas estratégias integradas,
Cingapura e EAU, particularmente Dubai, conseguiram atrair um significativo número de
passageiros que fazem paradas nesses hubs nas rotas de longa distância entre a Europa,
Ásia e Sudoeste do Pacífico (LOHMANN, ALBERS et al., 2009).
Cingapura e EAU têm uma localização geográfica central e privilegiada em relação a
principais mercados emissores de turismo (Europa, Ásia e Oceania), conferindo a essas
localidades uma vantagem competitiva. Mas somente uma localização geográfica por si
só não é suficiente para ter sucesso, uma vez que outros competidores em suas respectivas
regiões não obtiveram o mesmo grau de desenvolvimento. Os governos dos dois destinos
desenvolveram estratégias coerentes em que a importância e o papel do sistema de trans-
porte aéreo foram claramente articulados através de investimento público e boa governança.
Exemplo prático disso foi transformar as companhias aéreas (Singapore Airlines e ­Emirates
Airline) e seus respectivos aeroportos (Changi e o aeroporto internacional de Dubai) em
serviços de classe mundial. Isso foi alcançado por meio de estratégias de liderança, custo
e qualidade, implementadas simultaneamente. Houve também uma continuidade de am-
bos os governos para que ocorressem investimentos consistentes e de longo prazo. Em
ambos os casos, existiu uma relação sinérgica entre as diretorias das companhias aéreas e
outras instituições, permitindo, assim, um controle importante das atividades de produção
em seus aeroportos. Muitas empresas que operam em Changi e no aeroporto de Dubai
são subsidiárias de suas respectivas companhias aéreas. Além disso, as empresas aéreas
investem e colaboram com as organizações de turismo e o trade turístico como um todo.
Exemplo disso se dá com a Emirates, que possui participações em hotéis, agências de viagens
de aventura e até mesmo em atrações turísticas.
Singapore Airlines e Emirates investiram consideravelmente nos serviços de bordo até
obterem excelente reconhecimento internacional, o que passou a cativar cada vez mais
novos e antigos clientes. Os serviços de bordo das empresas aéreas foram cuidadosamente
elaborados para que tivessem uma grande reputação de serviço para atrair particularmente
passageiros com elevado padrão de renda. Posteriormente esse atendimento de alto nível
foi copiado por outras empresas aéreas, como é o caso de Etihad, também baseada nos
EAU, mas servindo à capital Abu Dhabi.
Paralelamente, as duas localidades começaram a criar vários incentivos para a per-
manência dos passageiros em suas cidades, incluindo o turismo de compras com reduzida
16
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

carga tributária, tarifas aéreas promocionais, oportunidades de marketing combinando


a compra de passagens aéreas e descontos na rede hoteleira local, além de toda uma
gama de serviços e infraestrutura diferenciada nos aeroportos (LOHMANN, ALBERS
et al., 2009). No aeroporto de Changi, por exemplo, passageiros aguardando por mais de
cinco horas entre dois voos em conexão podem fazer um tour gratuito de duas horas pela
cidade-nação. Há a opção também de um banho na piscina do aeroporto (ver Figura 1.6),
uso de academia de ginástica, jogos de computadores, sala de descanso, dentre outros.

Figura 1.6 — Piscina do aeroporto de Changi, em Cingapura, em janeiro de 2003 (Foto


cortesia: Guilherme Lohmann)

Dessa maneira, EAU e Cingapura transformaram seus hubs em sofisticados destinos


turísticos pela interação estratégicas dos setores de atrações, transportes e alojamento,
gerando verdadeiros “paraísos” para atrair turistas e aumentar o tempo de permanência
nos mesmos. O Quadro 1.2 resume as principais relações entre características e ações
que permitiram Cingapura e Dubai consolidarem suas funções nodais, especialmente de
hub e destino turístico (LOHMANN, ALBERS et al., 2009).
Apesar da importância de se conhecerem exemplos de excelência em outras partes do
mundo, faz-se necessário também ter uma visão ampla do uso de transportes turísticos
no Brasil. A seção a seguir, elaborado pelos pesquisadores Glauber Santos e Thiago Allis,
analisa a escolha modal das viagens domésticas no Brasil a partir de estudos da Fundação
Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) para o ano-base de 2007.
17
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Quadro 1.2 — Tipos de função nodal e sua representação em Cingapura e Dubai

CARACTERÍSTICAS ESTRATÉGIA EMPREGADA


Localização Geográfica Central e privilegiada.
Governo Continuidade, capacidade de articulação, inves-
timentos e boa governança.
Aeroportos Criação de serviços e infraestruturas diferen-
ciados.
Empresas aéreas Investimento em serviço de bordo; tarifas
aéreas reduzidas; integração com outras em-
presas tais como aeroportos, hotéis, agências
de viagens e atrações turísticas.
Atrações turísticas Além de todas as atrações naturais e artificiais,
incentivo a eventos e turismo de compras.
Hotelaria Redução de diárias quando adquiridas em
conjunto com voos para outros destinos.
Fonte: adaptado de Lohmann, Albers et al. (2009).

1.5. ESCOLHA DO MEIO DE TRANSPORTE PARA VIAGENS


TURÍSTICAS DOMÉSTICAS
Glauber Santos1, e Thiago Allis2
A escolha do meio de transporte para a realização de um determinado deslocamento
turístico é um processo bastante complexo, resultado de inúmeras variáveis relativas
aos indivíduos e às alternativas disponíveis. Dentre elas, algumas das mais importantes
são renda do consumidor, gasto monetário e distância. A influência desses fatores será
analisada nesta seção a partir de dados da pesquisa de Caracterização e Dimensionamento
do Turismo Doméstico realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE)
para o Ministério do Turismo. Como recorte, foram consideradas apenas as viagens de
lazer feitas por turistas domésticos independentes (sem a aquisição de pacote turístico
completo). Os dados são relativos a 2007.
O meio de transporte mais utilizado pelos turistas domésticos no Brasil é o automóvel
particular, escolhido por 54% dos viajantes, conforme apresentado na Tabela 1.1. Os
turistas da faixa de renda3 mais alta também preferem esse meio de transporte (67%), ao
passo que aqueles na faixa de renda mais baixa utilizam tanto o automóvel particular
quanto o coletivo regular (42% e 43%, respectivamente). A frequência de uso do coletivo
regular na classe baixa é substancialmente superior à média geral (29%), indicando uma

1
Professor Doutor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP).
2
Professor Doutor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR).
3
As faixas de renda alta, média e baixa aqui utilizadas foram definidas com fins exclusivamente operacionais
pela pesquisa utilizada como fonte de dados neste trabalho.
18
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

Tabela 1.1 — Meios de transporte selecionados segundo a faixa de renda

MEIO DE TRANS- FAIXA DE RENDA (EM SALÁRIOS MÍNIMOS)


PORTE ATÉ 4 DE 4 A 15 MAIS DE 15 TOTAL
Automóvel 42% 63% 67% 54%
privado
Avião 4% 9% 21% 8%
Coletivo fretado 9% 6% 2% 7%
Coletivo regular 43% 21% 8% 29%
Outros 2% 1% 2% 2%
Total 100% 100% 100% 100%
Fonte: FIPE (2007)

associação fortemente negativa entre renda e a escolha desse meio de transporte. Além
disso, a taxa média de seleção do avião como meio de transporte é de 8%, sendo essa
incidência maior entre os turistas da faixa de renda alta (21%) do que entre aqueles da
faixa de renda mais baixa (4%).
Portanto, nota-se que, em 2007, a expansão do transporte aéreo ainda não havia sido
suficiente para inverter o quadro tradicional brasileiro de preponderância do transporte
rodoviário. Além disso, pelos dados dessa pesquisa, pode-se dizer que as tentativas de popu-
larização das viagens de avião não tinham conseguido, até o ano de 2007, efetivamente incluir
nesse mercado os turistas de renda mais baixa. Provavelmente pesquisas futuras tenderão
a evidenciar uma maior participação no transporte aéreo das classes de renda mais baixa.
Na Tabela 1.2, percebe-se que o gasto total médio com transporte em uma viagem
doméstica dos turistas da classe alta, em 2007, era de R$575,16, quase o dobro dos
gastos da classe de renda mais baixa (R$241,94). Essa discrepância é bastante menor
quando considerado apenas o transporte aéreo: o gasto médio para a classe alta era de
R$1.292,28, ao passo que, para a classe baixa, era de R$953,15 – uma diferença de 36%.

Tabela 1.2 — Gasto médio com transporte por meio de transporte e faixa de renda
(em R$)

MEIO DE TRANS- FAIXA DE RENDA (EM SALÁRIOS MÍNIMOS)


PORTE ATÉ 4 DE 4 A 15 MAIS DE 15 TOTAL
Automóvel 207,16 286,81 407,73 276,26
privado
Avião 953,15 1.069,34 1.292,28 1.100,23
Coletivo fretado 187,80 273,27 375,65 226,32
Coletivo regular 214,32 264,21 314,83 233,65
Outros 285,80 242,02 504,02 294,28
Total 241,94 348,79 575,16 325,85
Fonte: FIPE (2007)

19
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Essa diferença pode ser explicada pela menor flexibilidade do avião, já que os serviços
usualmente não apresentam grandes variações. Por exemplo, não são comuns diferentes
classes de serviços em aeronaves em voos domésticos. Além disso, a distância média das
viagens não varia muito para essas duas classes (1.312 km e 1.259 km, respectivamente).
A mesma relação entre variação do gasto e flexibilidade do meio de transporte pode ser
observada com respeito ao coletivo regular: para os turistas da faixa de renda mais alta
o gasto médio era de R$314,83, enquanto para os turistas de renda baixa esse valor era
de R$214,32, uma diferença de cerca de 50%. Por outro lado, o automóvel privado –
que permite maior flexibilidade nas viagens e, portanto, maior variação no programa da
viagem (locais, rotas, permanências) e despesas – ilustra o outro extremo dessa relação.
Nesse caso, os gastos médios variam substancialmente em função da renda dos turistas.
Os gastos da classe alta (faixa de renda acima de 15 salários mínimos) com transporte em
automóvel foram de apenas R$407,73, ao passo que na classe baixa (até quatro salários
mínimos) esse valor foi de R$207,16, uma diferença de 97%.
O transporte responde por 31% do gasto total das viagens de turistas domésticos no
Brasil, conforme apresentado na Tabela 1.3. Esse percentual é menor para aqueles que
viajam em automóvel privado, e maior para aqueles que utilizam outros meios de trans-
porte. Além disso, a parcela do gasto total da viagem destinada aos custos de transporte
é decrescente em relação à renda. Em outras palavras, turistas com maior nível de renda
tendem a empregar parcelas menores de seus gastos totais no custeio do transporte.
Essa realidade, que é confirmada pelos dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares
(IBGE, 2012), está associada ao fato de que os custos de transporte são menos flexíveis
que os demais, como alojamento e alimentação. Assim, os turistas podem buscar ajustar
seus níveis de gasto às suas rendas a partir da seleção do padrão de qualidade dos serviços
de alojamento e alimentação, mas pouco podem fazer para ajustar seus gastos a partir
da seleção de diferentes alternativas de um mesmo meio de transporte.
As distâncias percorridas pelos turistas domésticos no Brasil podem ser consideradas
relativamente pequenas, especialmente se comparadas à ampla extensão territorial do

Tabela 1.3 — Parcela do gasto total empregada no pagamento dos custos de trans-
porte por meio de transporte e faixa de renda

MEIO DE TRANS- FAIXA DE RENDA (EM SALÁRIOS MÍNIMOS)


PORTE ATÉ 4 DE 4 A 15 MAIS DE 15 TOTAL
Automóvel 34% 26% 21% 26%
privado
Avião 46% 37% 35% 38%
Coletivo fretado 38% 33% 28% 34%
Coletivo regular 41% 30% 23% 36%
Outros 41% 27% 29% 33%
Total 39% 29% 25% 31%
Fonte: FIPE (2007)

20
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

país. A distância média origem-destino-origem percorrida é de apenas 436 km, o que,


considerando que a maior parte das viagens tem um único destino, aponta para visitação
de destinos localizados a pouco mais de 200 km do local de residência dos turistas. Esses
dados indicam a importância que as políticas regionais de turismo devem desempenhar
no Brasil, de maneira que se possam aproveitar e dinamizar os fluxos regionais, levando-se
em conta no planejamento da atividade as formas de deslocamento.
Pelos dados da Tabela 1.4, pode-se perceber que os turistas de baixa renda, quando
optam pelo automóvel particular, acabam por realizar viagens mais curtas (cerca de 300 km,
contra quase 400 km por parte dos turistas da classe alta), o que permite reduzir o custo total
da viagem. Com efeito, as maiores discrepâncias na distância viajada entre faixas de renda
são referentes justamente ao uso do transporte privado (33% entre as classes alta e baixa).

Tabela 1.4 — Distância média origem-destino-origem, em km, por meio de transporte


e faixa de renda

MEIO DE TRANS- FAIXA DE RENDA (EM SALÁRIOS MÍNIMOS)


PORTE ATÉ 4 DE 4 A 15 MAIS DE 15 TOTAL
Automóvel 301 317 399 322
privado
Avião 1.312 1.311 1.259 1.297
Coletivo fretado 387 384 436 388
Coletivo regular 411 443 467 423
Outros 368 417 475 401
Total 401 436 585 436
Fonte: FIPE (2007)

Novamente, vale registrar o contraste entre as grandes distâncias no território nacional


e as pequenas médias de deslocamento – especialmente para os turistas de baixa renda
(300 km), mesmo quando o automóvel converte-se em produto acessível a parcelas cada
vez maiores da população. Para uma melhor compreensão das razões que levam a esse
cenário, é necessário considerar outras variáveis além da renda, tais como a qualidade da
infraestrutura das rodovias e a falta de hábito das famílias para longas viagens rodoviárias –
algo que poderia estar associado à escassez ou à baixa qualidade de estruturas de apoio
ou mesmo aos níveis de segurança nas rotas rodoviárias.
Se excluídas as viagens de avião (meio de transporte utilizado por parcelas muito
pequenas de qualquer faixa de renda), depreende-se que o coletivo regular ainda é o
meio de transporte que permite maiores deslocamentos para as faixas de renda baixa e
média (cerca de 410 km e cerca de 443 km, respectivamente), corroborando seu peso
no cenário turístico doméstico, inclusive do ponto de vista econômico. Ainda assim,
as distâncias são bem restritas (menor do que 500 km da média geral), o que reforça a
importância do turismo regional no contexto doméstico.
Pode-se concluir que a renda é uma variável essencial para a compreensão dos fluxos
turísticos em território nacional. Com renda baixa e pouca capacidade de consumo do modo
21
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

aéreo, grandes contingentes de turistas circulam por espaços turísticos relativamente res-
tritos. A maior parte dos viajantes depende dos meios de transporte terrestres – que, no caso
brasileiro, praticamente não inclui o transporte ferroviário de passageiros de média e longa
distâncias. Nos últimos anos, o mercado aéreo brasileiro vem passando por importantes ex-
pansões, de maneira que, em pouco tempo, a matriz de uso dos transportes turísticos deverá
ganhar novas nuances, sobretudo com a inclusão das classes de renda mais baixa. Pelos dados
estudados, pode-se afirmar que ainda persiste uma concentração no transporte rodoviário.
Um dos fatores limitantes para a dinamização turística do Brasil poderia decorrer do
fato que as estruturas rodoviárias brasileiras apresentam níveis de conforto e segurança
discrepantes entre as várias regiões do país – com as melhores rodovias concentradas no
Sudeste do país. Portanto, os estados com melhor infraestrutura rodoviária têm, em prin-
cípio, perspectivas significativamente melhores no que diz respeito ao desenvolvimento
do turismo na escala regional.

1.6. MOBILIDADE INTRADESTINOS


O conceito de transportes turísticos apresentado anteriormente evidencia que o mesmo
compreende não somente o deslocamento dos turistas até o local de destino primário,
mas inclusive suas movimentações entre destinos turísticos primários e secundários, assim
como também no âmbito dos próprios trajetos.
A fim de conhecer os atrativos turísticos de um destino, deslocar-se entre terminais
de transporte, locais de acomodação e atrações turísticas, turistas requerem mobilidade
dentro dos destinos. Para isso, utilizam-se tanto de serviços de transporte público quanto
serviços específicos para o turismo, como ônibus de city tour.
A utilização dos serviços de transporte público deve ser planejada a fim de que não haja
a sobrecarga desses sistemas, prejudicando, assim, a utilização por parte da comunidade
local e dos turistas. Manente (2000) explica que a relação do turismo com os sistemas de
transportes pode ser sintetizada da seguinte maneira: (a) inicialmente, os turistas precisam de
transporte rápido e eficiente para chegar aos destinos, enfatizando a acessibilidade dos mes-
mos; (b) em um segundo momento, há a necessidade de sistemas de transporte integrados
e flexíveis para o seu deslocamento intradestinos, garantindo boa mobilidade urbana.
Minghetti e Celotto (2000) realizaram uma pesquisa a fim de identificar os principais
problemas e impactos em função dos padrões de mobilidade intradestinos dos turistas. As
dez cidades analisadas foram: Amsterdã, na Holanda; Barcelona, na Espanha; Canterbury
e Glasgow, no Reino Unido; Jerusalém, em Israel; Paris, na França; Roma e Rimini, na
Itália, além da Região Alpina de Tyrol-Salzburg, na Áustria. O Quadro 1.3 apresenta um
resumo dos principais problemas encontrados pelos autores que foram classificados de
acordo com o seu grau de importância: problemas de grande importância, grande/média
importância e de baixa importância.
Ao analisar o Quadro 1.3 percebe-se que grande parte dos problemas de mobili-
dade intradestinos encontrados nas cidades pesquisadas são de graus de alta e média
22
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

Quadro 1.3 — Problemas encontrados nos padrões de mobilidade intradestino em


algumas cidades do mundo

PROBLEMAS DE GRANDE IMPORTÂNCIA


1. Problemas novos/recentes - Falta de um padrão de sistemas de informação para
coletar, elaborar e disseminar os dados relativos aos trans-
portes e ao turismo que possam ser utilizados para prever,
informar e administrar tráfegos de turistas.
2. Problemas estruturais - Picos sistemáticos de mobilidade;
- Engarrafamentos causados por carros particulares;
- Impactos do excursionismo (visitantes que não pernoitam);
- Poluição/ruídos;
- C oncentração de fluxos turísticos para poucos atrativos
­turísticos;
- Rotas superlotadas.

PROBLEMAS DE GRANDE / MÉDIA IMPORTÂNCIA


1. Problemas com soluções já - Estruturas de estacionamento inadequadas;
adotadas ou planejadas - Integração insuficiente da oferta de transportes (serviços,
bilhetagem e tarifas);
- Variação sazonal significante no fluxo de turistas.
2. Problemas de “segundo nível” - Dificuldade na troca de modos de transporte;
(há outros mais importantes) - Impactos negativos da infraestrutura de transportes no
ambiente urbano;
- Impactos de eventos, exibições e reuniões importantes no
destino.
3. Problemas relativos às tomadas - Fraco desempenho da Câmara Municipal no planejamento
de decisões (suas soluções dos transportes e do turismo;
dependem do comportamento - Desequilíbrio entre os setores público e privado;
dos atores) - Muitos atores com baixa coordenação das suas próprias ações.

PROBLEMAS DE BAIXA IMPORTÂNCIA


1. Problemas específicos (ou - Congestionamentos causados por veículos particulares
seja, encontrados somente em (fluxos de trânsito);
algumas cidades) - Congestionamentos causados por fluxos de pedestres.
2. Problemas já resolvidos por - Dificuldade de acessibilidade de longo curso (conexões
alguns dos destinos estudados aéreas e rodoviárias inadequadas);
pelos autores - Concentração de locais de acomodação e instalações
­turísticas nas mesmas áreas;
- Sistema de transporte público ineficiente (ex: baixa
­frequência dos serviços);
- Congestionamento causados por ônibus de turismo.
Fonte: Minghetti e Celotto (2000).

i­mportância. A falta de informação nos transportes que sirvam de apoio tanto para o
turista quanto para moradores é um dos grandes entraves para o desenvolvimento do
turismo nas localidades, o que foi comprovado na pesquisa. Alguns destinos turísticos
já consolidados se destacam nesse sentido, como é o caso de Londres, no Reino Unido.
23
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Suas paradas de ônibus possuem mapas da cidade, indicando as rotas das linhas que
passam por determinado local, destacando os principais atrativos turísticos, além de um
painel indicando em quanto tempo o próximo ônibus chegará naquele ponto. Moradores
e turistas têm ainda acesso à página da Transport for London na internet, além de apli-
cativos disponíveis para smartphones, que oferecem serviço de previsão de saídas dos
ônibus em tempo real, facilitando o deslocamento das pessoas sem perda de tempo. O
metrô de Londres segue o mesmo padrão nas estações das suas treze linhas que cobrem
praticamente toda a cidade (TRANSPORT FOR LONDON, 2012).
A fim de diminuir o impacto dos padrões de mobilidade intradestino dos turistas nos
sistemas de transportes das cidades estudadas, Minghetti e Celotto (2000) sugerem es-
tratégias que podem ser implantadas em cidades genéricas desde que haja uma adaptação
para a realidade local. Cada estratégia pode ser desenvolvida por meio de uma série de
conjuntos de ações que levam em conta as especificidades de cada caso. Sendo assim,
as seis principais estratégias são:
1. Cidades livres de carros: estratégia que busca lidar com a invasão de veículos par-
ticulares nas cidades, afetando a qualidade de vida, a atratividade do destino e,
consequentemente, a experiência turística.
2. Gestão dos fluxos de veículos de turismo: estratégia focada na gestão de ônibus ou
demais veículos que prestam serviços regulares ou irregulares de turismo que causam
grandes problemas aos sistemas de transporte, sobretudo nos horários de pico e em
altas temporadas.
3. Melhorias na acessibilidade de longa distância: diz respeito à necessidade de propor-
cionar ligações internacionais eficientes a fim de incluir o destino no mercado turístico
internacional.
4. Serviços de transporte urbano flexíveis: estratégias centralizadas em serviços de trans-
porte inovadores e de baixo impacto, moldados de acordo com as necessidades dos
usuários, como os sistemas de aluguéis de bicicletas.
5. Gestão da demanda turística: desenvolvimento de políticas de turismo que possam
complementar e ser integradas ao planejamento dos transportes. Exemplos dessas
iniciativas incluem a realização de eventos em baixa temporada; implantação de rotas
alternativas e complementares e novos atrativos. Pode-se ainda propor ações que
combinem os horários de abertura dos atrativos mais populares com os horários das
linhas de transporte público. Essas estratégias representam a abordagem mais recente
na chamada reengenharia dos destinos turísticos.
6. Aplicações da tecnologia da informação: coleta de dados efetivos sobre transportes
e turismo, elaboração e disseminação de informações e gerenciamento eletrônico de
informações e comunicações.
A utilização de estratégias que garantam a mobilidade intradestinos é extremamente
importante para o desenvolvimento turístico. Assegurar que turistas e residentes consigam
24
 Capítulo 1 [Transporte e Desenvolvimento de Destinos Turísticos]

deslocar-se de acordo com as necessidades peculiares de cada um é uma forma de


amenizar os impactos negativos causados pela atividade turística, bem como maximizar
seus benefícios.

1.7. CONCLUSÕES
Este capítulo abordou uma série de aspectos introdutórios da relação transporte e turis-
mo. De forma geral, pode-se perceber que os temas aqui apresentados se inter-relacionam
e colaboram para um entendimento introdutório sobre a temática abordada nesta obra.
Por exemplo, enfatizou-se que, historicamente, o desenvolvimento de novas tecnologias
de transporte têm um papel decisivo para o surgimento do padrão de turismo que se
alcançou nos dias atuais. Ademais, novas tecnologias também permitiram uma evolução
de novas formas de competição e integração entre os diversos modos de transportes, com
implicações para as redes de transportes implantadas que por sua vez contribuem para o
surgimento ou alteração das funções nodais que cada localidade possui. Como ficou ilus-
trado nos exemplos sobre Cingapura e Dubai aqui citados, o turismo é altamente influen-
ciado pelo estabelecimento dessas funções e hoje são considerados destinos de padrão
internacional graças à contribuição do transporte aéreo. O capítulo também evidenciou
a predominância do turismo regional por meio do uso do transporte rodoviário no Brasil.
Muitos dos termos aqui apresentados serão retomados em momentos diversos nos
próximos capítulos. Assim, a compreensão dos conceitos tratados neste capítulo inicial é
fundamental para um bom entendimento dos conhecimentos relativos à relação dos trans-
portes com os destinos turísticos. Os demais capítulos desta obra estão assim estruturados.
O Capítulo 2 trata dos modelos e sistemas de desenvolvimento de destinos turísticos, e
parte da discussão teórica iniciada aqui será retomada, particularmente considerando os
diversos modelos de desenvolvimento turístico e a contribuição dos transportes. Uma
revisão do estado da arte das publicações acadêmicas sobre transporte e turismo também
será efetuada no Capítulo 2 com o propósito de se alcançar uma visão ampla e geral do
tema, antes que temas e modos específicos de transportes sejam abordados, incluindo:
planejamento e gestão dos destinos turísticos conectado com os transportes (Capítulo 3),
aplicações dos princípios do marketing aos transportes turísticos (Capítulo 4); organização
dos diversos modos de transportes (Capítulos 5, 6 e 7); as tendências e o desenvolvimento
de pesquisa sobre transportes e destinos turísticos (Capítulo 8).

QUESTÕES
1. O Sistema Turístico de Leiper traz uma representação da atividade turística sob o ponto
de vista geográfico. Analise-o e explique de que forma a relação transporte e turismo
está elucidada neste sistema.
2. De que forma a evolução tecnológica dos transportes colaborou para o desenvolvimen-
to do turismo como um fenômeno social e econômico atual? Dê exemplos concretos
além dos que foram apresentados neste capítulo.
25
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

3. O que é a mobilidade intradestinos? Dê exemplos de problemas causados pela


utilização dos sistemas públicos de transporte pelos turistas.
4. Considere a sua cidade ou um destino turístico em particular: selecione os principais
atrativos turísticos, hotéis e os terminais de transportes (rodoviários, aéreos, aquaviários
e ferroviários). A partir daí, esboce um minirroteiro desde a chegada do turista no
destino, check-in no hotel e visita a dois atrativos turísticos. Por fim, observando este
minirroteiro, escreva sobre o padrão de mobilidade intradestinos deste turista.
5. Explique as diferenças entre as visões tradicional e contemporânea de integração e
competição entre os modos de transporte e seus impactos para o desenvolvimento
dos destinos turísticos. Quais novas possibilidades de integração você identifica no
presente momento e no futuro, quer em escala mundial ou local?
6. Explique a afirmação: “Em muitas circunstâncias o transporte determina a decisão de
viajar, prevalecendo sobre o próprio destino turístico, influindo na escolha do local a
ser visitado”.
7. O que é a intermodalidade? Use exemplos de outros países em sua resposta.
8. (Em inglês): Assista ao debate realizado na University of Central Lancashire (UCLan)
com o tema “Can Sustainable Tourism Include Flying?”. Ao assistir o debate, anote
argumentos favoráveis e contrários e no final argumente a sua opinião sobre o tema.
Disponível em: www.icrtourism.org/can-sustainable-tourism-include-flying/

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Acessado em 17/09/2012.

29
CAPÍTULO 2
Destinos turísticos e
transportes: aspectos
teóricos e estado da arte

Carla Fraga, Guilherme Lohmann, Glauber Santos e Thiago Allis

CONCEITOS APRESENTADOS NESTE CAPÍTULO


Neste capítulo são apresentados aspectos teóricos-conceituais sobre a relação entre
transportes, turismo e destinos turísticos. De forma específica, examinam-se aspectos
do deslocamento e dos destinos turísticos nos quatro grupos de modelos apontados por
Pearce (2003): “viagem turística”, “origem-destino”, “estruturais” e “evolucionários”. Ao
final é apresentado um estudo a respeito da produção científica sobre transportes turís-
ticos em periódicos nacionais.

2.1. INTRODUÇÃO
Ao longo das últimas décadas, os estudos e as pesquisas sobre transportes turísticos
têm se ampliado de forma significativa. Isso ocorre não somente em relação ao número
de livros e artigos publicados no Brasil e no exterior, mas também através do aprimora-
mento dos debates propostos pelos pesquisadores da área. Contudo, torna-se necessário
consolidar esses estudos “de forma a criar um conjunto de conceitos e conhecimento
que permita um mapeamento do que já foi aprendido até o momento e o que ainda
precisa ser mais bem compreendido” (PALHARES, 2005, p.641). Visando contribuir para a
consolidação dos aspectos teóricos de parte desses estudos, no Capítulo 1 identificou-se
de que forma o transporte é abordado no turismo. No presente capítulo busca-se explicar
qual o papel do transporte nos sistemas e modelos sobre turismo.
31
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Considerando alguns dos principais estudos desenvolvidos no período 1965-2005,


foram selecionados nesta seção sistemas e modelos teóricos sobre turismo a fim de
evidenciar a participação e a influência do transporte nos mesmos, notadamente na
relação do transporte com os destinos turísticos. Os sistemas e modelos de turismo consi-
derados neste capítulo estão listados no Quadro 2.1, antes de se centrar a discussão nos
grupos de modelos espaciais propostos por Pearce (2003) - ver as Seções 2.2.1 a 2.2.4.
A consolidação do conhecimento sobre transporte e turismo também é efetuada a partir
de uma análise das pesquisas publicadas sobre o tema. Na segunda parte do capítulo

Quadro 2.1 — Multiplicidade de representações sobre transportes em sistemas e


modelos de turismo

AUTOR (ano) TRANSPORTE


Cuervo (1967) Turismo é um grande conjunto, composto por diversos subconjuntos, cuja
função é a comunicação por meio do elemento viagem. O transporte é um
dos subconjuntos que, por sua vez, forma outros subconjuntos de acordo
com dois critérios: (a) o modo de transporte; e (b) a sua abrangência geo-
gráfica e política (nacional ou internacional). Na medida em que a comunica-
ção é uma função do turismo, os transportes são o elemento que possibilita
que esta ocorra de forma hábil entre origem e destino.
Leiper (1990) Para o autor, cinco elementos fazem parte do sistema turístico (Figura 1.2).
Três são de ordem geográfica: (1) a região de origem, (2) a região de trân-
sito e (3) a região de destino turístico. Os dois elementos restantes são: (4)
o turista e (5) a indústria de turismo e viagem. Pode-se dizer que houve um
avanço no estudo da relação entre transporte e destinos turísticos a partir
desse modelo. Por exemplo, o estudo de redes de transportes turísticos só
é possível ao se considerarem regiões geradoras de fluxo, ou seja, regiões
de origem e de destinos turísticos. Ao se considerar a localização geográfica
dos prestadores de serviços de transportes dentro do sistema turístico,
pode-se organizar parcerias estratégicas entre empresas de um mesmo
setor (ex: duas companhias aéreas – integração horizontal); empresas de
setores diversos (ex: companhia aérea e hotel – integração vertical); ou ain-
da integração diagonal (ex: empresas de cartões de crédito que oferecem
seguros viagem e pacotes turísticos aos clientes). Esses tipos de parcerias
foram apresentados por Palhares (2002). Todas essas possibilidades são es-
senciais para o planejamento e a gestão dos transportes em sinergia com os
destinos turísticos (tema do Capítulo 3).
Molina (1997) O sistema turístico é definido pelo conjunto das seguintes partes: (a) superes-
trutura, (b) demanda turística, (c) infraestrutura, (d) atrativos, (e) equipa-
mentos e instalações, e (f) comunidade receptora. O transporte pode estar
contido ao mesmo tempo nas partes de equipamentos e instalações, infra-
estrutura e atrativos. Contudo, o modelo não demonstra de forma objetiva
as relações entre as partes, o que pode levar a um questionamento se de
fato este é um sistema baseado na Teoria Geral dos Sistemas (ver Martínez,
2005 citado por Lohmann e Panosso Netto, 2008). Logo, por mais que haja re-
presentação dos elementos que compõem os transportes, esse sistema-mo-
delo pode não ser ideal na análise de possíveis relações do transporte com os
atrativos, com os demais equipamentos e com os destinos turísticos.

32
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

Quadro 2.1 — Multiplicidade de representações sobre transportes em sistemas e


modelos de turismo (cont.)
AUTOR (ano) TRANSPORTE
Krippendorf (2000) Este modelo representa a relação entre o “cotidiano” e a busca pelo “anti-
cotidiano” em um momento histórico de crescimento do turismo (início da
década de 1980). O elemento transporte é um ponto que pode ser analisado
a partir dos 23 conselhos propostos como “teses para a humanização da via-
gem”. Especificamente na parte “filosofia das estratégias” o autor aconselha
“desafogar e distribuir melhor os fluxos de turistas”. Isso só pode ocorrer a
partir do planejamento e do gerenciamento do transporte no turismo.
Beni (2001) Este modelo é amplamente utilizado no Brasil, e tem-se caracterizado como
o mais importante proposto por um autor brasileiro. Ligações importantes
entre transporte e turismo podem ser evidenciadas através da associação
entre os conjuntos descritos no SISTUR – Modelo Referencial. São três
conjuntos: (1) “Conjunto da organização estrutural (OE)” composto por dois
subsistemas – infraestrutura e superestrutura. Sendo que, a rede viária, faz
parte da infraestrutura, que é a base para a ocorrência do deslocamento
turístico. A superestrutura congrega organizações relacionadas ao turis-
mo – pública, privada e o terceiro sector – e coopera para as estratégias de
desenvolvimento do turismo no país. A definição de uma política pública
conjunta de transporte e turismo e a promoção de ações intersetoriais de
planejamento estratégico podem ser elaboradas e analisadas sob a pers-
pectiva desse último subsistema; (2) “Conjunto das ações operacionais
(AO)”, o transporte pode ser representado em todos os subsistemas desse
conjunto, pois é produzido, ofertado, demandando, distribuído e consumido
no mercado turístico; (3) “Conjunto das relações ambientais (RA)” é re-
presentado pelos subsistemas ecológico, cultural, social e econômico. Este
influencia os outros dois conjuntos. Por exemplo, na parte econômica das
relações ambientais (RA), as variações cambiais de moedas entre países
emissores e receptores de turistas podem facilitar ou inibir a compra de
passagens aéreas para um determinado destino turístico. Por sua vez, isso
pode influenciar diretamente a parte de infraestrutura (com a necessidade
de ampliação ou redução de infraestrutura de transportes não só aéreo,
mas de integração entre os aeroportos e o restante do destino turístico) e
superestrutura (com necessidade de organização sinérgica entre o setores
público, privado e terceiro setor além da definição de políticas públicas
específicas) (OE); bem como o “Conjunto das ações operacionais (AO)” com
ações definidas no mercado para a produção, distribuição e consumo desses
serviços de acordo com o tipo de desenvolvimento que se espera para os
destinos turísticos envolvidos com a variação cambial. A atração de um
grande número de turistas num determinado momento, pelo preço atraente
de bilhetes aéreos favorecido por diferenças cambiais momentâneas, pode
gerar variados impactos que devem ser controlados através do planeja-
mento e da gestão integrados do turismo e dos transportes (ver Capítulo 3).
É fundamental perceber que tudo está interligado, e que uma variação
em âmbito econômico pode promover impactos negativos e positivos nos
demais subsistemas e conjuntos influenciando o desenvolvimento dos des-
tinos turísticos envolvidos.

(Continua)
33
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Quadro 2.1 — Multiplicidade de representações sobre transportes em sistemas e


modelos de turismo (cont.)
AUTOR (ano) TRANSPORTE
Tribe (1997) Este modelo visa analisar a criação do conhecimento sobre turismo. O turis-
mo é considerado como campo de estudo (objeto de estudo) das ciências
e está divido em duas partes: “aspectos comerciais” e “aspectos não
comerciais”. Os novos conhecimentos podem ser produzidos na denominada
“banda K” (K de knowledge – conhecimento, em inglês) em que ocorre a
interligação dos campos do turismo com as disciplinas (Economia, Filosofia,
Direito, etc). Nesse sentido, este modelo é muito útil na produção de novos
conhecimentos sobre a relação entre transporte e turismo. Um diferencial
é que ele permite que o problema relacionado ao tema seja analisado a
partir da óptica acadêmica/científica (campo não comercial) ou a partir do
mercado (campo comercial).
Jafari (2005) O autor considera que deve haver um “Centro de Estudos de Turismo”
formado por disciplinas oriundas de outros departamentos. O conjunto
dessas disciplinas concebem o curso de Turismo. A relação entre transporte
e turismo é vista no curso de Turismo como “Fundamentos do Transporte”,
que está ligada ao Departamento ou Disciplinas denominado Transporte.
Neste modelo a relação interdisciplinar (entre disciplinas) sobre transporte
e turismo é bem representada. Logo, métodos de investigação oriundos dos
transportes podem ser aplicados ao turismo.
Fonte: elaborado pelos autores a partir de alguns dos modelos analisados por Lohmann e Panosso Netto
(2008).

(Seção 2.3), Glauber Santos e Thiago Allis fazem uma revisão bibliográfica da temática
“transportes turísticos” em revistas científicas brasileiras de turismo. A partir dessa análise
desenvolvida exclusivamente para este livro, é possível identificar o que foi produzido
no Brasil sobre o tema durante o período 1990-2011.

2.2. ASPECTOS TEÓRICOS


Sistemas e modelos são amplamente empregados nos estudos sobre transportes
turísticos, uma vez que possibilitam tanto uma visão geral a respeito das complexidades
dessa relação, quanto uma visão específica das partes. A aceitação de um modelo está
diretamente associada à sua aderência com os fatos e as ideias que se pretende explicar.
Nas últimas décadas, o turismo foi vastamente analisado pela visão sistêmica, cujos
fundamentos se originam na Teoria Geral dos Sistemas (TGS). Existe uma concordância de
que esta tenha como um de seus principais criadores e divulgadores o biólogo Ludwig von
Bertalanffy (ver LOHMANN e PANOSSO NETTO, 2008). Panosso Netto (2005) identificou
a visão sistêmica como paradigmática. Essa abordagem se tornou padrão ao se explicar
o fenômeno turístico. Dessa forma, analisar o papel do transporte e a relação entre este
e os destinos turísticos em sistemas e modelos de turismo exige que se encare o fato de
que grande parte da produção científica sobre essa interface é fundamentada pela visão

34
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

sistêmica sobre o turismo. No entanto, como existe uma série de modelos sobre turismo,
é importante deixar claro também que mesmo que dois ou mais modelos tenham como
finalidade a análise dos transportes turísticos, o resultado dessas representações podem
ser diferentes, já que a construção de sistemas e modelos é influenciada pelos contextos
do autor e da obra. Daí vale a pena uma análise comparativa entre os mesmos.
Outro processo que é influenciado pelos contextos do autor e da obra é a classificação
de modelos em grupos distintos. Por exemplo, Getz (1986) identificou a existência de
mais de 150 modelos sobre turismo em seu estudo realizado na década de 1980, sendo
que esse número é ainda maior nos dias atuais. Em seu estudo, Getz classificou os
modelos como: (a) teóricos; (b) de processos de planejamento e gerenciamento; e (c) de
previsão. De acordo com essa classificação, nesta parte do capítulo serão tratados os
modelos teóricos, e no Capítulo 3 serão abordados modelos relacionados a processos
de planejamento e gerenciamento e de previsão.
Em comum, a grande maioria dos modelos sobre turismo ilustra a questão do des-
locamento e por isso cita-se o transporte de forma direta ou indireta. Todavia, não são
todos os modelos que representam de forma explícita a relação de indução ou limitação
ao desenvolvimento que pode ocorrer entre transporte e destinos turísticos. Para compor
o Quadro 2.1, sobre a multiplicidade de representação dos transportes em sistemas e
modelos de turismo, foram selecionados alguns dos modelos amplamente divulgados na
literatura nacional e internacional.
A partir do exposto, é possível concluir que sistemas e modelos dependem de uma
base teórica sólida para serem desenvolvidos e testados. Sendo assim, a proposta de se es-
tabelecer um conjunto de princípios sobre transportes e turismo é um ponto de referência
importante na literatura. Kaul (1985) desenvolveu nove postulados que são largamente
utilizados em estudos científicos e mercadológicos. Um exemplo da aplicação desses
princípios é a pesquisa de Prideaux (2000a) sobre o papel do sistema de transporte no
desenvolvimento de destinos. A seguir são destacados os postulados de Kaul (1985),
citados por Prideaux (2000a):
I. A evolução do turismo é muito influenciada pelos transportes e é uma função do
desenvolvimento destes.
II. O turismo é tanto um fenômeno de massa, quanto uma atividade individual, ambos
necessitam de diferentes tipos de transportes e infraestruturas.
III. As infraestruturas de transportes são uma necessidade inicial e integral para o
turismo e operam como um fator de expansão e limitação para o fluxo de viagens;
a qualidade dos serviços de transportes oferecidos também influencia o tipo de
fluxo turístico.
IV. O desenvolvimento de forma planejada, a manutenção e a operação da infra-
estrutura de transportes sob uma política de transportes bem idealizada – a fim
de atender a tecnologia e as exigências de demanda presentes e futuras – são

35
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

fundamentais para o sucesso do sistema de transportes, contribuindo para o cres-


cimento do turismo.
V. O preço dos transportes influencia a elasticidade da demanda por viagens e a diver-
sificação na estrutura de preço. A competição tem encorajado a redução nos valores
e melhorias qualitativas entre os modos de transportes para o benefício do turismo.
VI. A integração e a coordenação entre sistemas de transportes locais, regionais,
nacionais e internacionais contribuem para facilitar o fluxo de turistas e o cres-
cimento do turismo doméstico e internacional.
VII. O desenvolvimento tecnológico dos transportes influencia nos meios e padrões de
transportes em sociedades desenvolvidas e em desenvolvimento, resultando num
sistema de transportes mais rápido, eficiente e seguro, benéfico para o crescimento
e expansão do turismo.
VIII. Acomodação é um dos fatores essenciais para o desenvolvimento e sucesso do
turismo, devendo manter um crescimento real para atender às crescentes e diversas
demandas do turismo e da expansão dos transportes.
IX. O desenvolvimento satisfatório, os equipamentos nos terminais de transportes e
a implantação de rotas de transportes, a melhoria sistemática na infraestrutura, a
absorção e a adoção de novas tecnologias e a apropriação de técnicas de marketing
de massa nos transportes têm um impacto penetrante no crescimento continuado
do futuro do turismo mundial.
Em linhas gerais, pode-se concluir que esses postulados: (a) destacam o papel de
indução ao desenvolvimento que os setores de transporte e turismo podem produzir
entre si e no ambiente (todos os postulados exemplificam a indução); (b) evidenciam
que essa interface envolve uma série de articulações espaciais e socioeconômicas que
são difíceis de serem representadas por um único modelo (exs.: postulados II, III, IV e
VI); (c) demonstram que a evolução de sistemas e modelos – que servem para explicar
essa relação – é condicionada pelo avanço do conhecimento sistematizado sobre fatos
e ideias (exs.: postulados VII e IX).
Todo modelo admite críticas e nem sempre são aceitos de forma universal. Para ilustrar
de maneira prática como sistemas e modelos estão passíveis de serem revistos e com-
plementados, recorre-se à afirmação de Prideaux (2000a) sobre o Modelo de Leiper (ver
Capítulo 1). Prideaux (2000a, p.55) explica que no Modelo de Leiper falta a representação
“da influência do transporte no comportamento dos viajantes”. De um lado, entende-se
que essa falta seja justificada, pois o principal objetivo do modelo é explicar o turismo
em formato abrangente. Por outro lado, essa lacuna é uma oportunidade para o aprimo-
ramento desse modelo, ou ainda para a criação de uma nova forma de se representar a
influência dos transportes no comportamento dos viajantes.
A identificação sobre “o que” os sistemas e modelos representam (ver Quadro 2.1) deve
ser feita acompanhada da análise de “como” esses modelos e sistemas são elaborados,
36
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

classificados e organizados. Dessa forma, Pearce (2003) inova ao agregar modelos turís-
ticos espaciais em quatro grupos distintos (ver Quadro 2.2). A visualização desses grupos
possibilita o diálogo entre modelos com abordagem até então individualizadas, dispersos
na literatura sobre geografia, transportes e turismo. A contraposição desses modelos e

Quadro 2.2 — Modelos Espaciais de Turismo

GRUPOS DE MODELOS DESCRIÇÃO DOS GRUPOS


Viagem turística Realçam o componente “ligação”, denominado
“transporte”, representando essencialmente as
viagens através das noções de rotas, direções
do tráfego turístico, volumes de tráfego e
natureza de viagem. Portanto, esse grupo de
modelo é útil para a análise preliminar das
relações espaciais e de fluxos turísticos exis-
tentes.
Origem-destino Esses modelos são amplamente utilizados nos
estudos de planejamento de transportes, uma
vez que o estabelecimento de zonas de atração
(destinos) e produção (origem) de transporte
é um dos primeiros passos para se planejar os
transportes (ver Capítulo 3). Nesse sentido, a
abordagem multidisciplinar envolvendo trans-
porte, turismo e geografia pode ser útil para a
elaboração de novos métodos que visam men-
surar a indução ao desenvolvimento que pode
ocorrer entre transporte e destinos turísticos.
Estruturais O objetivo é explicar de que forma as relações
espaciais ocorrem num determinado ambiente
e tempo histórico. Por exemplo, o modelo
proposto por Britton (1980) é uma referência
nominal a isto. Denominado “enclave turístico
em uma economia periférica”, neste modelo há
a possibilidade do estudo específico sobre como
ocorrem as relações espaciais (e de fluxos turís-
ticos) entre mercado de metrópole e produto
de nação periférica num dado tempo histórico,
marcado por condicionantes políticos, culturais,
econômicos e sociais.
Evolucionários O grupo de modelos “evolucionários” demons-
tra as mudanças que podem ocorrer ao longo
de um determinado tempo caracterizando es-
tágios e tipos de turismo, e por isso são essen-
ciais para a compreensão da possível relação
de indução/limitação ao desenvolvimento entre
transporte e turismo.
Fonte: elaborado a partir de Pearce (2003).

37
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

teorias forma parte de uma base consistente para que se evolua na discussão a respeito
da relação entre transportes e destinos turísticos.
As próximas seções (2.2.1 a 2.2.4) propõem discussões mais aprofundadas sobre trans-
porte e desenvolvimento de destinos turísticos a partir de cada um dos quatro grupos
apresentados no Quadro 2.2.

2.2.1. Modelos de Viagem Turística


Nos estudos sobre os transportes, o termo “viagem” se relaciona com o percurso a
ser atravessado durante um deslocamento. Portanto, esta seção apresenta como foco o
entendimento dos padrões de deslocamento percorridos por viajantes entre origem e
destino(s) turístico(s). Com base em Pearce (2003), foram selecionados três modelos es-
paciais para a análise da relação entre transporte e o turismo (ver Quadro 2.3): Campbell
(1967), Mariot (1969) e Miossec (1976).
Posterior ao estudo realizado por Pearce (2003), Palhares (2005) abordou de forma
extensa sistemas e modelos relacionados aos transportes turísticos. O autor inovou ao
combinar o modelo de viagem turística proposto por Mariot (1969, ver Figura 2.1), com

Quadro 2.3 — Modelos de Viagem Turística

AUTORES (ANO) RELAÇÃO ENTRE TRANSPORTE E TURISMO


Campbell (1967) A partir da noção de centro urbano, são estabelecidas viagens recreativas,
viagens de férias e viagens excursionistas recreativas de acordo com o tipo
de deslocamento e de estada. Intuitivamente percebe-se que estas exigem
meios e modos de transportes diferenciados. Assim, o nível de desenvolvi-
mento de destinos turísticos pode ser influenciado pela rota de transporte,
pelo volume do fluxo turístico e pelo tempo de estada estabelecidos pelos
viajantes (categorizados como excursionistas ou turistas a partir desses três
tipos de viagem).
Mariot (1969) Além de determinar lugar de residência (origem), centro turístico (destino),
rota de acesso e de retorno; outra importante contribuição deste modelo é a
definição da rota recreativa, que traz para o elemento transporte a possibili-
dade de atratividade turística, já que a rota pode ser escolhida como a parte
principal da viagem (ver Figura 2.1). De acordo com Pearce (2003), a rota
recreativa também pode ser entendida como a possibilidade de se visitarem
vários destinos em uma viagem, ilustrando assim o conceito de excursão.
Miossec (1976) Este modelo considera quatro cinturões a partir do núcleo (origem da viagem),
e que mudam de acordo com as zonas, os motivos, os meios e os custos da
viagem. Pearce (2003) explica que no mundo real essas zonas regulares
podem ser alargadas ou retraídas em função de diversos fatores, a citar a
política e o clima. Logo, percebe-se que tanto o transporte como os destinos
turísticos são influenciados por diferentes questões. Portanto, a compreensão
desta representação espacial é importante para o planejamento e a gestão
dos transportes em função da movimentação (transporte) dos fluxos turísticos.
Fonte: elaborado com base em Pearce (2003).

38
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

Figura 2.1 — Modelo de Mariot do fluxo de turista (Fonte: PEARCE, 2003)

a­ lguns elementos do Sistema de Leiper. Para Palhares (2005), o Modelo de Leiper, com dois
destinos turísticos (ver Figura 2.2) é similar ao de Mariot, já que ambos evidenciam o
deslocamento ao detalhar as rotas de viagem.

Figura 2.2 — Elemento geográfico de Leiper num sistema de turismo com dois ­destinos
(Fonte: LEIPER, 1990, apud PALHARES, 2005)

O Modelo Completo de Sistema de Transporte Turístico, proposto por Palhares (2005),


também contribui significativamente para o avanço do conhecimento sobre a questão da
viagem (ver Figura 2.3). Enquanto Leiper apresenta uma “Região Geradora de Viajantes -
(RGV)” e duas “Regiões de Destino Turístico – (RDT)” interligadas por “Rotas de Trânsito
(RT)”, o modelo completo apresenta uma série de padrões de fluxos entre origem e des-
tino de uma viagem turística, que estão explicados a seguir:
¥ Fluxo Origem-Destino(s):
1. A partir da origem, através da rota direta, o viajante alcança o primeiro destino
primário (DP1).
2. A partir da origem, pela rota indireta, o viajante alcança o(s) destino(s) secundário(s)
(DSy, sendo y = 1, 2, etc.), antes de alcançar o destino primário (DP1).
39
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Figura 2.3 — Modelo Completo de Sistema de Transportes Turísticos (Fonte:


PALHARES, 2005)

¥ Fluxo Destino(s)-Origem:
1. A partir de DP1 - destino primário 1, o viajante retorna em rota direta para a sua
origem.
2. A partir de DP1, o viajante, pela rota intermediária ou indireta, acessa outros des-
tinos primários (DPz, sendo z = 2, 3, etc.) e destinos secundários (DSy, sendo y = 1,
2, etc.) antes de retornar para a sua origem. É possível fazer uma viagem circular
entre destinos primários (DPz) e secundários (DSy).

2.2.2. Modelos Origem-Destino


Como está implícito no nome desse grupo de modelos, o foco se dá nos pontos da
rede de transportes estabelecidos como origem e destino. A partir do estudo realizado
por Pearce (2003), são destacados os modelos de Thurot (1980), Lundgren (1982) e Pearce
(1981), conforme apresentado no Quadro 2.4.

2.2.3. Modelos Estruturais


Estes modelos estão focados nos mecanismos que suportam a existência do turismo
em um determinado tempo e espaço, por isso recebem o nome de estruturais. Dos
modelos estruturais analisados por Pearce (2003) destaca-se o de Britton (1980) sobre
“enclave turístico em economia periférica”. Esse modelo deve ser contextualizado com
o período histórico em que foi desenvolvido (início da década de 1980). Assim, as
40
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

Quadro 2.4 — Modelos Origem-Destino

AUTORES (ANO) RELAÇÃO ENTRE O TRANSPORTE E O TURISMO


Thurot (1980) A partir das noções sobre oferta e demanda, esse modelo aponta para a
existência de diferentes níveis de fluxos turísticos (doméstico e internacional)
entre países. De acordo com o postulado (VI) de Kaul, é possível compreender
a importância de se coordenar de forma integrada sistemas de transportes
em diversos níveis (locais, regionais, nacionais e internacionais). Essa
coordenação deve levar em consideração que nem sempre instalações e
serviços turísticos, como exemplo os terminais aeroportuários e serviços de
fretamento rodoviário entre terminais e centros urbanos, são compartilhados
pelos variados níveis de fluxos turísticos nacional e internacional. Logo, as
ações de planejamento e gestão dos transportes, em sinergia com destinos
turísticos (ver Capítulo 3), devem considerar as variações da demanda em
cada país para adequar a oferta. Para tanto, a partir do Modelo de Thurot, é
essencial a realização de pesquisa junto aos turistas nos principais portões
de entrada/saída dos países. Ao se detectar a existência de grupos com
predileções e necessidades específicas pode-se adotar estratégias mais
pontuais de atuação conjunta entre destino e transportes. Um exemplo de
atendimento às necessidades de grupos é o city tour ofertado no aeroporto
de Schiphol em Amsterdã, na Holanda. Os viajantes em trânsito que possuem
uma média de aproximadamente cinco horas no destino podem fazer um tour
privativo de três horas, percorrendo o centro histórico da cidade, e se o cliente
preferir, o tour pode ser personalizado. Essa estratégia que integra destino e
aeroporto (Schiphol é considerado o maior aeroporto internacional dos Países
Baixos e um dos mais movimentados do mundo) para um determinado público,
é um convite para que o passageiro em trânsito faça planos para realizar uma
nova visita à cidade e ao país. Programa similar existe no aeroporto Changi,
em Cingapura (ver Capítulo 1).
Lundgren (1982) Em geral, classifica os destinos como metropolitanos, periféricos urbanos,
periféricos rurais e destinos de ambiente natural. Logo, é possível constatar
que o tipo de estrutura de transporte utilizado em cada caso pode ser distinto,
uma vez que estes são influenciados pelas distâncias, motivações e custos
de viagem diferenciados em função das especificidades do local visitado.
Este modelo pode auxiliar na compreensão sobre o papel da segmentação
de mercado no equilíbrio entre oferta e demanda de transportes para um
determinado destino turístico (ver postulado II de Kaul).
Pearce (1981) Este modelo atenta para os tipos específicos de fluxos que uma cidade (em
geral grandes metrópoles) pode atrair ou gerar, estabelecendo zonas variadas
como: de férias, de turismo de final de semana e segunda residência, de
viagem de um dia. A partir das lógicas espaciais estabelecidas é possível
perceber como o transporte influencia o destino e vice-versa. Essa influência
ocorre principalmente em função dos diferentes papéis (destino primário,
portão de entrada, cidade de origem, etc.) que o destino pode ter para
moradores e visitantes (nacionais e internacionais). O tamanho do destino, sua
função e nível de desenvolvimento, bem como aqueles dos destinos vizinhos,
devem ser amplamente estudados. Este modelo auxilia sobremaneira no
planejamento e gestão de circuitos turísticos.
Fonte: elaborado com base em Pearce (2003).

41
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

relações ­ilustradas entre mercado da metrópole e produto de nação periférica puderam


ser alteradas significativamente pelas mudanças de hegemonias políticas e econômicas,
locais e mundiais, que ocorreram nessa época.
Com base em Pearce (2003), para aplicações gerais, pode-se extrair desse modelo
uma reflexão sobre a distribuição do fluxo turístico na origem e no destino turístico, res-
peitando a ascendência local, regional, nacional, para posterior transferência internacional.
Essa ilustração do modelo é bastante útil para se planejar e gerir transportes em sinergia
com destinos turísticos. Um exemplo clássico ocorre no Brasil, que é país de dimensões
continentais e apresenta uma concentração de aeroportos internacionais em grandes
regiões metropolitanas.
Dessa forma, passageiros residentes no interior do país, que tenham como objetivo
se deslocar por via aérea para outros continentes (transferência internacional), precisa-
rão se locomover de seu local de residência (esfera local) para regiões metropolitanas em
seus estados de origem (esfera regional), ou para diferentes estados (esfera nacional), antes
de alcançar o deslocamento internacional. O mesmo movimento pode ocorrer no destino
visitado, caso este não seja o destino primário de chegada do visitante (ver Figura 2.3).
Nesse sentido, as parcerias estratégicas, por exemplo entre os setores aéreo e rodoviá-
rio intermunicipal e interestadual, podem ser estabelecidas em prol do desenvolvimento
do turismo. Uma ação específica é a disponibilidade de ônibus na cidade de origem em
horários que favoreçam aos viajantes alcançarem os terminais aeroportuários no tempo
ideal para o processo de check-in e embarque para suas viagens internacionais.

2.2.4. Modelos Evolucionários


A compreensão sobre os processos de mudança na relação entre turismo e trans-
portes é essencial para a produção de previsões que auxiliem no planejamento e gestão
de forma integrada (ver Capítulo 3). Os modelos evolucionários são extremamente úteis,
pois consistem em estudos que evidenciam as mudanças “em termos da evolução dos
movimentos turísticos internacionais ou do desenvolvimento de estruturas de turismo”
(PEARCE, 2003, p.43). No Quadro 2.5 são analisadas as relações entre transporte e des-
tinos turísticos, a partir de alguns modelos abordados por Pearce (2003).
É mister afirmar que nos grupos de modelos espaciais existem alguns mais focados nos
destinos turísticos e outros na figura do turista. Por exemplo, para Lohmann e Panosso
Netto (2008), o modelo evolucionário de Butler (1980) tem foco no destino turístico, e
o de Plog (1991) no turista. Essa outra forma de segmentar os modelos (por área geo-
gráfica – destino turístico/por ator social – tipo de turista) auxilia na adição de diferentes
representações de sistemas que não foram tratados especificamente pela óptica espacial.
Ao se considerarem os vários grupos de modelos, é importante lembrar que a maioria
foi concebida antes do século XXI. Com as transformações ocorridas no turismo ao longo
do tempo e o surgimento de novas abordagens teóricas, esses modelos podem se tornar
menos aderentes à realidade atual, portanto, precisam ser constantemente revistos. Uma
42
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

Quadro 2.5 — Modelos Evolucionários

AUTORES (ANO) RELAÇÃO ENTRE O TRANSPORTE E O TURISMO


Miossec (1976, 1977) Demonstra evolução de resorts no tempo e espaço. Sendo que as fases de
evolução de resort (0 a 4) são relativizadas pelo transporte, comportamento
do turista e das atitudes de indivíduos com poder de decisão e da população
da região receptora. A análise dos transportes destaca-se como um dos
elementos classificadores da relação de desenvolvimento estrutural de resorts.
Plog (1991) Este modelo foi desenvolvido a partir de uma consultoria realizada por Plog
na década de 1970 para empresas aéreas norte-americanas. Ele relaciona
a característica do destino visitado com tipos psicográficos de viajantes
(psicocêntricos, quase psicocêntricos, meio-cêntricos, quase alocêntricos
e alocêntricos). Exemplificando, os psicocêntricos são pouco afeitos a
aventuras, escolhem o que é familiar, preferencialmente em viagens de carro.
Já os alocêntricos são afeitos a aventuras, preferem áreas não turísticas,
bem como o uso do avião em suas viagens. Este modelo é bastante útil para
a análise da relação entre transporte e o destino turístico, pois é possível
se relacionarem algumas características psicográficas com a predileção
de um modo de transporte em particular e das distâncias visitadas. Logo,
em linhas gerais, viagens mais longas relacionam-se aos alocêntricos e as
mais curtas aos psicocêntricos. No entanto, o modelo gerou uma série de
questionamentos teóricos sobre a sua validade. Lohmann e Panosso Netto
(2008) sintetizam de forma objetiva as principais críticas realizadas por
outros pesquisadores e observam de que forma Plog as rebateu.
Butler (1980) Amplamente testado, debatido e utilizado, o Ciclo de Vida de Destinos
Turísticos apresenta uma tentativa de previsão do estágio de vida de um
destino a partir do número de turistas ao longo do tempo. Os estágios
resultantes podem ser exploração, envolvimento, desenvolvimento,
consolidação, estagnação, podendo ocorrer: rejuvenescimento, crescimento
reduzido, estabilização, declínio ou declínio imediato. A relação entre
transporte e os estágios previamente citados é indiretamente considerada,
uma vez que supõe-se que o transporte é o responsável pela acessibilidade
do fluxo turístico (número de turistas) ao longo do tempo, fator
preponderante para o eventual crescimento da demanda turística. Embora
seja um dos modelos mais clássicos da literatura acadêmica em turismo,
o transporte não é apresentado de forma clara e objetiva, o que foi feito
posteriormente por Prideaux (ver Quadro 2.6).
Gormsen (1981) O foco é no desenvolvimento espaço-temporal do turismo internacional à
beira-mar. O modelo destaca-se por abranger um período histórico amplo,
envolvendo mudanças sociais e econômicas de longo prazo. A partir deste
modelo é possível analisar: (a) o aumento da participação regional através
de iniciativas locais e externas; (b) a questão das diferentes classes sociais
no usufruto do turismo à beira-mar; (c) a variação na oferta de tipo de
acomodação. O planejamento e a projeção de produtos e serviços de
transportes que atendam às demandas específicas do turismo de massa
e segmentado, concomitante ao atendimento das necessidades dos
residentes, exigem o conhecimento sobre o desenvolvimento do espaço ao
longo do tempo. Portanto, Gormsen traz uma grande contribuição para que
se entenda de que forma isso acontece no turismo internacional à beira-mar.

(Continua)

43
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Quadro 2.5 — Modelos Evolucionários (cont.)


AUTORES (ANO) RELAÇÃO ENTRE O TRANSPORTE E O TURISMO
Oppermann (1993) Em geral a concorrência entre os mercados formal e informal no turismo é
um dos fatores que merece atenção dos interessados no desenvolvimento
sustentável de destinos turísticos. A oferta de serviços de transportes
é uma das atividades que se inserem neste cenário de concorrência.
Exemplos são serviços de vans ofertados em aeroportos, atrações
turísticas; serviços de barqueiros para travessias fluviais (ver PRIDEAUX e
LOHMANN, 2009) e marítimas sem que haja registro e autorização para a
prestação desses serviços pelos órgãos concedentes. Como o Modelo de
Oppermann se ocupa em fazer uma análise espacial dos setores formais
e informais do turismo, este torna-se uma ferramenta essencial para se
diagnosticar o estágio de desenvolvimento do turismo nos destinos. Uma
vez diagnosticada a realidade, é pertinente a elaboração de estratégia
de planejamento, o desenvolvimento de políticas públicas e a criação de
legislações específicas sobre transportes turísticos.
Fonte: elaborado com base em Pearce (2003); Lohmann e Panosso Netto (2008).

visão crítica sobre sistemas e modelos auxilia na criação e no aperfeiçoamento do que foi
proposto por outros estudiosos. Por exemplo, críticas atribuídas aos modelos sugeridos
por Butler (1980) e Plog (1991) oferecem possibilidade de se repensarem estratégias para
avançar no conhecimento sobre turismo. Nesse sentido, estudos subsequentes aos mode-
los referidos anteriormente tornaram-se importantes para a construção do conhecimento
sobre a relação entre transporte e destinos turísticos.
A análise do que é proposto por Prideaux (2000b, 2004) ilustra como os embates
teóricos e a identificação de limitações nos modelos contribuem para a produção do
conhecimento científico sobre a relação entre transporte e destino turístico. De acordo
com o autor, apesar de ser amplamente empregado, o modelo de Butler (ver Quadro 2.5)
é unidimensional e pode ser controverso ao ser aplicado no contexto atual, já que é
mais orientado para representações do turismo de massa. Prideaux (2000b) propõe um
modelo multidimensional denominado “Espectro de Desenvolvimento de Resort”, no qual
a relação de desenvolvimento considerando tipo de turista e de transporte empregado
está demonstrada no Quadro 2.6.
Prideaux (2004) elaborou um estudo de caso sobre a Gold Coast, no qual é considera-
da uma quinta fase adicional às quatro fases apresentadas no Quadro 2.6 (anos 2000 em
diante). Localizada em Queensland, na Austrália, a Gold Coast passou de estância cos-
teira sem grande expressão para um destino reconhecido nacional e internacionalmente.
O tempo de duração de cada fase não pode ser apontado, pois existem zonas de
transição entre uma fase e outra que podem levar vários anos e até mesmo décadas.
Contudo, alguns avanços sobre os transportes destacados por Prideaux (2004) são
potenciais influenciadores dessa transformação, como por exemplo: (a) a introdução de
serviços aéreos de passageiros regulares no ano de 1947; e (b) a implantação de voos
diretos de Sidney (principal cidade da Austrália) para a Gold Coast no ano de 1956. A
44
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

Quadro 2.6 — Relação de desenvolvimento entre resort, tipo de turista e transportes

FASES DE DESENVOLVIMENTO TIPO DE TURISTA TRANSPORTE


DE RESORT
Primeira fase (turismo local) Moradores locais e de localida- Abrangência muito limitada,
des vizinhas sendo o rodoviário o principal
modo utlizado. Se o resort es-
tiver localizado perto de uma
ferrovia, parte do tráfego pode
ser realizado por esse modo.
Segunda fase (turismo Os mesmos tipos da fase O transporte rodoviário é
regional) anterior acrescidos de turistas significativamente aumentado,
que viajam dentro do estado e outros modos podem ser im-
ou região. Tráfego turístico plantados a partir do desen-
possivelmente limitado ao volvimento de infraestruturas.
fluxo interestadual, sendo que Serviços aéreos regulares (se
turistas podem estar de pas- houver) realizados por compa-
sagem pela região em busca nhias aéreas locais.
de um resort maior.
Terceira fase (turismo nacional) Os da fase anterior mais os O acesso pelas rodovias
turistas que viajam longas continua a ser desenvolvido,
distâncias de todas as partes por exemplo, autoestradas.
do país. As capitais dos es- O transporte aéreo regular
tados tornam-se os principais começa a ser operado por
mercados emissores. companhias aéreas nacionais
ou afiliadas. Outros modos
podem ser significativamente
remodelados, ou seja, ter-
minais marítimos e serviços
ferroviários.
Quarta fase (turismo interna- Os da fase anterior, somado ao Início dos serviços aéreos
cional) fluxo turístico internacional. internacionais. Outros modos
continuam sendo desenvolvi-
dos. Dependendo da distância
entre o resort e os mercados
emissores de turistas, o modo
aéreo pode se tornar predomi-
nante.
Fonte: elaborado com base em Prideaux (2004).

posterior redução real do preço das passagens aéreas potencializou a atração de demanda
nacional para o local (ver Prideaux, 2004). O reconhecimento internacional da Gold Coast
pode ser associado, em parte, à implantação de voos charter internacionais iniciados na
década de 1990. Em 2012, o aeroporto da Gold Coast operava voos regulares diretos
para a Nova Zelândia, Cingapura, Japão e Malásia.
Prideaux ainda identificou, por meio do estudo de outros pesquisadores, que a oferta
de serviços e produtos turísticos especializados (de nicho de mercado, ou seja, que visam
45
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

a­ tender aos interesses específicos da demanda, tais como mochileiros, turismo de estudos
e o segmento gay) caracterizam o “pós-turismo de massa”. Nesse sentido, o estudo de
Prideaux (2004) se diferencia do estudo de Butler (1980), pois os estágios – declínio, es-
tagnação ou rejuvenescimento – são estabelecidos com base nos segmentos de mercado
atendidos e não no número total de visitantes ao longo do tempo. Prideaux (2004) ressalta
que esses estágios podem ocorrer em apenas um dos setores do mercado, logo generali-
zações sobre o estágio de desenvolvimento do destino como um todo podem incorrer em
erros de planejamento e gestão do turismo. Nesse sentido, para se compreender a melhor
maneira de se implementarem estratégias integradas de planejamento entre transportes
e turismo (ver Capítulo 3) é preciso considerar: de um lado, a elaboração de serviços
de transportes especializados para atender as predileções de cada segmento e nicho de
visitantes; e, de outro, serviços de transportes que possam atender às necessidades do
turismo de massa. Para Prideaux (2004), a procura do destino dependerá de três fatores:
(1) nível de interesse individual dos turistas; (2) reputação do resort nos mercados local,
nacional e internacional; e (3) a singularidade do resort. Logo, é preciso que se façam
estudos aprofundados sobre a relação entre transportes e destinos turísticos com base
nesses fatores.
A partir do conjunto de aspectos teóricos expostos, pode-se concluir que a forma
de se representar e interpretar a relação entre transporte e destino turístico depende da
evolução do entendimento sobre o turismo, por meio do tempo e das diversas correntes
teóricas que buscam explicá-lo. Por isso, os postulados de Kaul (1985), o Modelo Com-
pleto de Transportes de Palhares (2005), o Modelo de Espectro de Resort de Prideaux
(2000b, 2004), somados à análise sobre os variados sistemas e modelos turísticos exa-
minados nesta parte do capítulo, se tornam um ponto inicial para estimular a reflexão
teórica entre transportes e destinos turísticos. Eventualmente também poderão servir de
base para novos estudos que colaborem para o avanço do conhecimento científico sobre
o tema, que é apresentado na seção a seguir.

2.3. PRODUÇÃO CIENTÍFICA SOBRE TRANSPORTES


EM PERIÓDICOS DE TURISMO
Glauber Santos1 e Thiago Allis2
Revistas científicas são o principal veículo de divulgação de pesquisas acadêmi-
cas que contribuem para o desenvolvimento de um campo do saber. No Brasil, há
diversas revistas científicas das áreas de turismo e de transportes, no entanto, ainda
inexistem publicações especializadas na intersecção entre esses dois temas. Portanto,

Professor Doutor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP).
1

Professor Doutor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR).


2

46
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

a veiculação de pesquisas acadêmicas situadas na confluência entre turismo e trans-


portes acaba dividida entre as publicações especializadas em cada uma dessas duas
áreas. Nesta seção, é apresentada uma revisão parcial dessa literatura, analisando-se
os artigos sobre transporte e turismo publicados em periódicos brasileiros de turismo.
Dessa forma, busca-se enfocar a perspectiva dos pesquisadores brasileiros de turismo
sobre essa temática.

Quadro 2.7 — Artigos sobre transporte publicados em periódicos brasileiros de turismo

AUTOR ANO TÍTULO PERIÓDICO MODO PALAVRAS-CHAVE


Pelizzer e 1990 Relacionamento entre Turismo em Aéreo agências de turismo;
Scrivano agência de turismo Análise agências de viagens;
e fornecedores de transporte aéreo;
serviços turísticos: relações comerciais;
agência de turismo e sistema de operação;
transportador aéreo relações comerciais
Almeida 1992 Transportes e planifi- Turismo em transporte; hotelaria;
cação do turismo Análise planificação
Zancudo e 1997 El negocio de líneas Turismo em Aquaviário indústria de turismo;
Álvarez de cruceros y el mo- Análise linhas de cruzeiros;
delo de estratégias competitividade; mo-
competitivas delo de estratégias
de Porter; Carnival
Graciose 1999 Turismo e metrô: Turismo em Ferroviário turismo receptivo;
parceria viável Análise turismo cultural; me-
trô; São Paulo
Allis 2002 Ferrovia e turismo Turismo em Ferroviário interpretação pa-
cultural - alternativa Análise trimonial; turismo
para o futuro da Vila sustentável; turismo
de Paranapiacaba cultural; turismo
(SP) ferroviário; Parana-
piacaba (SP)
Feitosa 2002 Estratégias e políticas Turismo em Aéreo mercado aéreo;
de preços no mercado Análise companhias aéreas;
de aviação: caso da políticas de preços;
Gol Transportes Aéreos Gol (low-cost/low-fare)
Valente e 2004 Transporte aéreo e a Turismo Visão Aéreo turismo; transporte
Cury integração logística e Ação aéreo; integração
com as atividades logística
turísticas
Saab e 2004 Breve panorama Caderno Aquaviário -
Ribeiro sobre o mercado de Virtual de
cruzeiros marítimos Turismo

(Continua)

47
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Quadro 2.7 — Artigos sobre transporte publicados em periódicos brasileiros de turis-


mo (cont.)
AUTOR ANO TÍTULO PERIÓDICO MODO PALAVRAS-CHAVE
Pinto 2005 Os bondes de Santos Patrimônio: Ferroviário -
Lazer e Turis-
mo
Valente e 2005 Turismo como fator Turismo em Aéreo empresas aéreas
Lohmann de decisão no plane- Análise regionais; turismo;
jamento de empresas planejamento de
aéreas regionais linhas aéreas
brasileiras
Moraes 2006 Alternativas para ame- Caderno Rodoviário alternativas; fluxo
nizar o fluxo de ônibus Virtual de turístico
turísticos na praia Turismo
central de Balneário
Camboriú, SC
Maia e 2006 Turismo em Cabo Caderno Aéreo Cabo Verde; turismo;
Borges Verde: perspectivas Virtual de aeroportos;
de crescimento com o Turismo
aeroporto internacio-
nal da Praia, Ilha de
Santiago
Souza 2006 Turismo de cruzei- Patrimônio: Aquaviário -
ros: considerações Lazer e Turis-
sobre o receptivo da mo
Prefeitura de Ilhéus,
Bahia no verão de
2005-2006
Souza, 2006 Reflexões sobre os Caderno Aquaviário cruzeiros; economia;
Ramos, benefícios econômi- Virtual de Ilhéus; Bahia
Nogueira e cos da temporada de Turismo
Silva transatlânticos no
verão 2005/06 em
Ilhéus, BA
Brasil 2006 O impacto dos canais Turismo Visão Aéreo comportamento do
de distribuição no e Ação consumidor; compa-
comportamento de nhias aéreas; valor;
compra no turismo: lealdade
uma análise das
relações entre
satisfação, valor e
lealdade na aquisi-
ção de passagens
aéreas através de
canais interpessoais
e canais baseados em
tecnologia

48
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

Quadro 2.7 — Artigos sobre transporte publicados em periódicos brasileiros de turis-


mo (cont.)
AUTOR ANO TÍTULO PERIÓDICO MODO PALAVRAS-CHAVE
Mamede, 2008 Trens turísticos e Caderno Ferroviário patrimônio cultural;
Vieira e patrimônio cultural: Virtual de preservação; trem
Santos como o turismo Turismo turístico; turismo
ferroviário tem res- ferroviário
gatado, preservado e
valorizado o patrimô-
nio cultural
Lohmann e 2008 Transporte ferroviário Turismo em Ferroviário transporte ferroviá-
Oliveira de passageiros turís- Análise rio; estado da arte
ticos: o estado da
arte
Cyrillo 2008 Políticas de plane- Turismo e Aquaviário espaço turístico;
jamento turístico e Sociedade cruzeiros marítimos;
ordenamento de terri- planejamento turís-
tório - a influência dos tico; ordenamento
cruzeiros marítimos territorial
no espaço turístico de
Porto Belo - SC
Bandeira, 2008 Análise da qualidade Turismo Visão Rodoviário qualidade; trans-
Ariotti e de um serviço de e Ação porte turístico; linha
Marins transporte turístico: turismo
estudo empírico da
linha turismo de Porto
Alegre
Ferraz e 2008 A estratégia de Turismo em Aéreo overbooking; geren-
Oliveira overbooking e sua Análise ciamento de receitas;
aplicação no mercado reservas; transporte
de transporte aéreo aéreo
brasileiro
Zanirato 2008 A mobilidade nas Revista Rodoviário cidades históricas;
cidades históricas e a Eletrônica mobilidade; conser-
proteção do patrimô- de Turismo vação
nio cultural Cultural
Brito e 2008 Corpo, lazer e natu- Turismo em Aquaviário cruzeiros marítimos;
Bruhns reza: uma reflexão Análise turismo; lazer;
sobre os cruzeiros lazer em cruzeiros
marítimos marítimos
Debenetti 2008 Passeio de trem Cultur - Revis- Ferroviário passeio de trem;
maria-fumaça: um ta de Cultura animações culturais e
exemplo de turismo e Turismo lúdicas; produto turís-
cultural e de lazer: es- tico; turismo cultural
tudo das percepções e de lazer
dos turistas

(Continua)

49
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Quadro 2.7 — Artigos sobre transporte publicados em periódicos brasileiros de turis-


mo (cont.)
AUTOR ANO TÍTULO PERIÓDICO MODO PALAVRAS-CHAVE
Brasil 2008 Canais de distribuição Turismo em Aéreo comportamento
no turismo: uma análise Análise do consumidor em
das variáveis deter- serviços; sistemas de
minantes do uso de entrega de serviços;
canais interpessoais e canais de entrega;
da internet na compra distribuição
de passagens aéreas
Ribeiro 2009 Demanda para trens Itinerarium Ferroviário turismo; transporte;
de passageiros no trem de alta veloci-
eixo Rio de Janeiro – dade
São Paulo
Alves e 2009 Turismo ferroviário Revista Turis- Ferroviário turismo ferroviário;
Ferreira e valorização do mo & Desen- patrimônio; interpre-
patrimônio histórico volvimento tação patrimonial
ferroviário em Minas
Gerais
Corrêa 2010 TAM Linhas Aéreas Revista Aéreo transportes e
no Twitter: canal de Brasileira de turismo; TAM Linhas
comunicação ou rede Pesquisa em Aéreas; comunicação;
social? Turismo social; Twitter
Barbosa, 2010 Implantação da es- Observatório Rodoviário estrada-parque; con-
Pereira, trada-parque e suas de Inovação flito; planejamento
Pacheco, perspectivas para o do Turismo participativo; meio
Gonçalves campo do ecoturismo ambiente
e Salomão na região de Visconde
de Mauá - RJ
Siqueira e 2010 Imaginário e re- Revista Rosa Ferroviário turismo; transporte
Delage presentações sociais dos Ventos ferroviário de pas-
a bordo do trem de sageiros; representa-
passageiros Vitória ções sociais; Estrada
Minas de Ferro Vitória Minas
Maia e 2010 Recovery of rail Patrimônio: Ferroviário patrimônio ferroviá-
Dias industrial heritage and Lazer e Turis- rio; interpretação do
perceptions of the com- mo patrimônio cultural;
munity: a study about trem da Vale
trem da Vale - Ouro
Preto and Mariana (MG)
Gastal 2010 Correio aéreo e avia- Turismo e Aéreo turismo; aviação
ção civil: os primeiros Sociedade brasileira; correio
passos da Varig aéreo; Varig
Resende e 2011 Cicloturistas na Turismo em turismo; segmen-
Vieira Filho Estrada Real: perfil, Análise tação; cicloturismo;
forma de viagem e planejamento;
implicações para o Estrada Real
segmento

50
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

Quadro 2.7 — Artigos sobre transporte publicados em periódicos brasileiros de turis-


mo (cont.)
AUTOR ANO TÍTULO PERIÓDICO MODO PALAVRAS-CHAVE
Ribeiro 2011 Os navios de cru- Licere Aquaviário atividades de lazer;
zeiros marítimos turismo; navios
enquanto campo de
atuação profissional
no lazer
Rodrigues 2011 Transporte fluvial e Turismo e Aquaviário transporte fluvial;
e Castro turismo: uma análise Sociedade turismo; sustentabi-
das potencialidades lidade
dos cânions do rio
São Francisco e do
atracadouro da Terra
Caída em Sergipe
(Brasil)

Entre 1990 e 2011, foram publicados 34 artigos (ver Quadro 2.7) relacionados ao tema
transportes em 13 revistas científicas brasileiras da área de turismo, predominantemente
na revista Turismo em Análise (doze artigos), no Caderno Virtual de Turismo (cinco artigos),
revista Turismo Visão e Ação (três artigos) e na revista Turismo e Sociedade (três artigos).
A maioria dos artigos aqui apresentados podem ser encontrados gratuitamente nos sites
das respectivas revistas, ou através de buscas no endereço www.publicacoesdeturismo.
com.br.
A primeira publicação é do início da década de 1990, momento em que os cursos
superiores de turismo se ampliavam no Brasil e os periódicos da área iniciavam suas
atividades – caso da revista Turismo em Análise que teve o seu primeiro número publicado
em 1990. No entanto, é a partir dos anos 2000, principalmente a partir de 2006, que
se observa uma intensificação das publicações sobre a temática, conforme apresentado
no Gráfico 2.1, portanto, ainda que pontualmente, os transportes vêm sendo objeto de

Gráfico 2.1 — Evolução do número de artigos sobre transportes e turismo publicados


nas revistas científicas no Brasil (n = 34)

51
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

e­ studos desde os primeiros momentos em que se organizam as pesquisas e os periódicos


da área. Contudo, infelizmente isso foi feito sem seguir uma linha de tendência muito
clara no que se refere às especificações temáticas.
Uma análise desses artigos revela ao mesmo tempo uma diversidade de abordagens e
um certo grau de concentração em temas específicos. A intersecção entre transportes
e turismo é ampla e fértil, de maneira que classificar e sintetizar esse corpus é uma tarefa
complexa e cujo desenvolvimento não pode ter a pretensão de ser definitiva. No entanto,
essa leitura geral e abrangente pode ser de grande auxílio para uma apreensão preliminar
do conhecimento em desenvolvimento, que poderá subsidiar novos trabalhos e lastrear
reflexões mais aprofundadas. A diversidade de abordagens e objetivos dos diferentes
artigos publicados faz com que a análise desse conjunto de trabalhos não possa seguir
uma única lógica de categorização. Dessa forma, a análise feita a seguir está organizada
de acordo com a temática central dos artigos, dividindo-se em categorias definidas por
diferentes critérios, respeitando-se a perspectiva dos autores.
Dos artigos destacados, observam-se análises sobre diferentes meios de transporte.
Estudos sobre os modos de transporte aéreo, ferroviário e aquaviário ocorrem com
frequências relativamente parecidas, enquanto os trabalhos sobre o transporte rodoviário
são um pouco mais escassos, conforme apresentado na Gráfico 2.2:

Gráfico 2.2 — Distribuição dos artigos por modo de transporte (n = 32)

O foco específico dos estudos publicados segundo o modo de transporte inclina-se


em direção aos interesses específicos dos estudiosos de turismo. A maior parte dos es-
tudos sobre transporte aéreo trata das empresas do setor, sendo que a temática específica
dos aeroportos – a despeito de sua evidente importância para a realidade brasileira – é
menos frequente. No transporte ferroviário, destacam-se os trens turísticos, elemento
carregado de significado e nostalgia em um país carente de ferrovias de transporte regular
de passageiros. No entanto, alguns estudos isolados tratam também de metrôs e bondes.
Os cruzeiros marítimos predominam no conjunto de estudos sobre o transporte aquaviário,
52
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

ainda que exista um artigo sobre transporte fluvial. Por fim, no campo dos transportes
rodoviários distribuem-se estudos sobre carros, ônibus, estradas e rodovias, incluindo
análises deste modo de transporte no âmbito dos destinos turísticos.
Uma das abordagens dos meios de transporte no âmbito do turismo implica na análise
dos elementos de atratividade e motivação turística. Talvez o caso mais emblemático do
meio de transporte como motivador das viagens turísticas seja o dos cruzeiros marítimos,
opção de turismo que reúne serviços de transporte, hospedagem e lazer de forma peculiar
e atraente para grande parte dos turistas. A grande importância dos cruzeiros marítimos é
refletida no destaque da pesquisa acadêmica sobre o tema. Sete dos oito artigos sobre o
transporte aquaviário abordam esse assunto. No entanto, é importante notar que a maior
parte dos estudos sobre cruzeiros marítimos não se concentra sobre aspectos relacionados
à atratividade, enfocando prioritariamente elementos da gestão pública e privada relativos
a esse meio de transporte. Uma notável exceção é o trabalho de Brito e Bruhns (2008),
que trata do lazer a bordo dos navios sob a perspectiva do consumidor.
O transporte ferroviário também tem ocupado lugar de destaque na análise dos trans-
portes enquanto elemento de atratividade turística. Em particular, esse meio de transporte
tem sido amplamente associado à questão do patrimônio histórico e cultural. Esse direcio-
namento está relacionado ao fato de que o transporte ferroviário regular de passageiros no
Brasil é quase inexistente. Consequentemente, ganha destaque relativo o debate sobre a
contribuição do turismo ferroviário para o processo de valorização e preservação do pa-
trimônio (tema de seis dos 10 artigos que tratam do modo ferroviário), como em Mamede,
Vieira e Santos (2008), de maneira mais abrangente, e em Alves e Ferreira (2009), que
adotam uma abordagem mais direcionada, enfocando as diferentes formas de valorização
do patrimônio histórico ferroviário do turismo em três ferrovias de Minas Gerais. De
forma semelhante, o processo de requalificação do patrimônio histórico ferroviário de
Ouro Preto, incluindo a adequação deste ao uso turístico, foi debatido por Maia e Dias
(2010), e as perspectivas de aproveitamento do patrimônio histórico ferroviário da Vila
de Paranapiacaba (SP) também foram discutidas por Allis (2002). A utilização turística de
um trem a vapor (maria-fumaça) que circula entre Bento Gonçalves, Garibaldi e Carlos
Barbosa (RS) foi estudada por Debenetti (2008). Em um estudo sobre o histórico dos bondes
de Santos (SP), ressalta-se a associação destes com a atratividade turística (PINTO, 2005).
Por fim, Lohmann e Oliveira (2008) fizeram uma revisão da literatura internacional sobre
transporte ferroviário e turismo a partir de trabalhos publicados em periódicos estrangeiros.
A questão da atratividade turística da via de transporte é um enfoque presente em
diferentes artigos. O estudo de Rodrigues e Castro (2011) trata da atratividade turística
de passeios em barco no Rio São Francisco, sugerindo um amplo campo de pesquisa
no Brasil, dada a amplitude da rede hidrográfica nacional e as potencialidades turísticas
associadas. A atratividade turística de estradas também tem sido analisada, ainda que de
forma incipiente e com enfoques bastante divergentes. No período analisado, foram publi-
cados apenas quatro artigos sobre essa temática. Enquanto Barbosa et al. (2010) ­discutem
a atratividade de forma geral de uma possível estrada-parque na região de Visconde de
53
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Mauá (RJ), Resende e Vieira Filho (2011) estudam a atratividade da Estrada Real para
cicloturistas, dando destaque para um meio de transporte pouco discutido nos estudos
sobre transportes, mas que guarda importante relação com o desenvolvimento turístico
na escala regional. Já Moraes (2006) e Bandeira, Ariotti e Marins (2008) abordam, res-
pectivamente, esse modo de transporte em função do impactos dos ônibus em Balneário
Camboriú (SC) e a partir da análise da Linha de Turismo de Porto Alegre (RS), indicando
um campo de estudo associado às relações entre transportes e destinos turísticos.
Outros trabalhos debatem os impactos da infraestrutura e operação de transportes
sobre a sociedade, economia ou mercado turístico das localidades. Almeida (1992) propõe
um arcabouço teórico para analisar o impacto econômico de projetos de infraestrutura
de transportes frente à demanda turística, enquanto outros autores analisam casos es-
pecíficos de impactos provocados por estradas (BARBOSA et al., 2010), aeroportos (MAIA
e BORGES, 2006) e, sobretudo, por cruzeiros marítimos (CYRILLO, 2008; SOUZA, 2006;
SOUZA et al., 2006). Muitos desses estudos incluem apenas algumas propostas para a gestão
dos impactos negativos e positivos, ao passo que outros são essencialmente propositivos.
Dois estudos tratam especificamente da gestão de veículos automotores em cidades turísticas
(MORAES, 2006; ZANIRATO, 2008). Um terceiro estudo propositivo é aquele desenvolvido
por Graciose (1999) sobre um roteiro turístico na cidade de São Paulo utilizando o metrô
como meio de transporte – cidade que não é a única a ter esse tipo de transporte no Brasil.
O trabalho de Zanirato (2008) é o único que, de maneira direta, aborda a temática dos
transportes pelo viés da mobilidade, abordando o assunto em face dos possíveis conflitos
de sobreuso dos espaços de cidades históricas pelos veículos automotores. Isso expõe
certa omissão dos estudos em transportes turísticos no que se refere a aspectos amplos
de movimentação de fluxos de turistas dentro dos destinos turísticos, especialmente na
interação do pedestre com os espaços de circulação.
Análises de mercado e da gestão de empresas privadas também constituem uma abor-
dagem relevante dos transportes na área do turismo. No entanto, os assuntos específicos
tratados pelos estudos nessa área se mostram pouco integrados, formando um conjunto de
elementos dispersos em um vasto campo de possibilidades. Os temas variam de análises
abrangentes do mercado de um modo de transporte (SAAB e RIBEIRO, 2004; ZANCUDO
e ÁLVAREZ, 1997) ao estudo de práticas específicas, como o overbooking (FERRAZ e
OLIVEIRA, 2008), a precificação (FEITOSA, 2002) e o uso de ferramentas on-line para a co-
municação empresarial (CORRÊA, 2010). A maior concentração de estudos sobre um mesmo
tema se dá com respeito à distribuição de serviços de transporte aéreo (BRASIL, 2006, 2008;
PELIZZER e SCRIVANO, 1990; VALENTE e CURY, 2004). A demanda por serviços de trans-
porte de diferentes modos (RIBEIRO, 2009; VALENTE e LOHMANN, 2005) e a satisfação
dos consumidores desses serviços (BANDEIRA et al., 2008; DEBENETTI, 2008) completam
o quadro de temas relacionados ao mercado e à gestão de empresas de transportes.
Pode-se ainda destacar a existência de uma série de estudos isolados sobre temáticas
específicas dos transportes. Gastal (2010) traz uma abordagem histórica do transporte
aéreo no Brasil, ressaltando as relações entre correios e passageiros no caso da Varig,
54
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

um estudo sobre o transporte aéreo que acaba por contribuir, de maneira ampla, para o
entendimento da história do turismo contemporâneo brasileiro. Siqueira e Delage (2010)
abordam o universo simbólico dos passageiros da ferrovia Vitória Minas, trazendo à
discussão aspectos de natureza psicológica quando do momento da viagem. Resende e
Vieira Filho (2011) estudam o perfil dos cicloturistas que percorrem a Estrada Real.
Diante desse cenário, percebe-se que a perspectiva dos estudiosos do turismo sobre a
temática dos transportes é marcante no conjunto de estudos analisados, em que se des-
tacam alguns direcionamentos específicos no bojo da intersecção das temáticas turismo e
transportes. As questões relacionadas à gestão pública e privada predominam (ainda que
estudos aplicados às empresas de transporte ainda estejam concentrados no setor aéreo),
mas análises do comportamento do turista, dos efeitos do sistema de transportes sobre a
atividade turística e debates sobre a questão do patrimônio cultural, particularmente na
interface com o transporte ferroviário, também têm recebido alguma atenção.
Da análise dos artigos disponíveis, não é possível extrair leituras lineares no que diz res-
peito ao tipo de enfoque: por modos de transporte, por elemento do sistema (via, veículo,
força motriz ou terminal) ou por grandes temas (mormente conectados a assuntos do
turismo). Tampouco a intermodalidade – tema pungente nos estudos de turismo atuais que
emerge como categoria de análise, a despeito de qual seja o enfoque – com uma possível
exceção de Almeida (1992), cujo artigo trata dos transportes de maneira genérica, em que
pese sua relação com o planejamento turístico. Pode-se perceber, com efeito, uma leve
tendência em se aproximar o estudo dos transportes do planejamento turístico, algo que
indica um papel de maior destaque para o tema da mobilidade – extrapolando, portanto,
uma visão técnica e comercial dos sistemas de transporte, que, apesar de ser uma de suas
facetas, não resume sua importância para o turismo.
Ainda que sob ressalvas, pode-se dizer que tem havido um aumento na complexidade
dos estudos desta área no Brasil. Esse campo de pesquisa tem conquistado autonomia
com relação aos estudos de agenciamento e distribuição turísticos, passando a contar
com uma literatura de referência cada vez mais ampla e consistente. No entanto, ainda
existe um amplo espaço para o desenvolvimento de novos estudos que contribuam tanto
no sentido de aprofundar os conhecimentos já existentes, quanto de diversificar o escopo
das pesquisas realizadas. Ademais, pode ser conveniente reconhecer que, provavelmente,
existe uma série de estudos e pesquisas relacionados ao tema que, até o momento, ainda
não atingiram os periódicos científicos, sugerindo uma maior atenção aos pesquisadores
brasileiros (e eventualmente às próprias revistas) para as questões de transporte e turismo.
Isso sem mencionar os estudos sobre transporte e turismo que tenham sido publicados
em periódicos científicos em outros campos do conhecimento que não apenas o turismo.

2.4. CONCLUSÕES
Este capítulo tratou das representações dos transportes em alguns dos principais
modelos de turismo apresentados pela literatura acadêmica, destacando a importância
da abordagem sistêmica para se trabalhar de forma integrada os transportes e o turis-
55
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

mo. Por outro lado, o foco na análise dos transportes, com base nos modelos espaciais
propostos por Pearce (2003) – Viagem, Origem/Destino, Estruturais e Evolucionários –
forneceu pistas relevantes para que se compreenda de que maneira a organização
espacial de redes de transportes pode contribuir para o aprofundamento de questões
inerentes ao planejamento e a gestão dos transportes turísticos, tema que será abordado
no Capítulo 3. Outro ponto relevante deste capítulo foi a identificação do estado da arte
sobre transportes e turismo em revistas científicas nacionais. Os pesquisadores Thiago
Allis e Glauber Santos verificaram a existência de uma nova complexidade dos estudos
sobre a temática no Brasil.
Para concluir este capítulo são destacadas duas questões que merecem atenção
por parte dos estudiosos dessa temática. A primeira questão é que ficou evidente neste
capítulo que a partir de métodos consistentes e aplicados de forma sistemática é pos-
sível conhecer o padrão de desenvolvimento dos destinos em relação aos transportes e
vice-versa (ver estudos de Prideaux, 2000b e 2004). Assim, é fundamental que, de um
lado, se estimule o uso de abordagem sistemática em novas propostas de pesquisa sobre
a temática; e que por outro haja a integração entre a academia e o mercado, propician-
do que estudos teóricos aprofundados subsidiem o planejamento e a gestão e que os
resultados dessas ações retroalimentem os estudos teóricos sobre transportes e turismo.
Uma segunda questão é que o avanço do conhecimento científico dependerá não só do
incentivo para o desenvolvimento de pesquisas sobre transportes e destinos turísticos,
mas que os resultados dessas pesquisas sejam compartilhados através de publicações em
periódicos científicos nacionais e internacionais.

QUESTÕES
1. Todo modelo admite críticas e nem sempre são aceitas de forma universal. Para ilus-
trar de maneira prática como sistemas e modelos estão passíveis de serem revistos e
complementados, reúna-se com alguns colegas e crie um debate sobre as diversas
formas de representação dos transportes nos modelos consagrados de turismo. Ao
final faça um quadro com as principais ideias que surgirem nesse debate.
2. Com base em todos os modelos apresentados neste capítulo, faça a proposição de
um esquema gráfico (desenho) para representar a complexidade da relação entre
transportes e destinos turísticos. Justifique sua resposta.
3. Em dupla com um colega, selecionem um dos artigos identificados no estudo sobre
estado da arte (Quadro 2.7) e analisem, individualmente, o seguinte: de que forma
a pesquisa realizada neste artigo contribuiu para se conhecer mais sobre a relação
entre transporte e turismo. Depois de realizar a análise, comparem as suas respostas
e avaliem as convergências e divergências sobre o que foi percebido por você e por
seu colega. Caso haja várias duplas em sala de aula, a comparação pode ser feita com
relação a outros artigos analisados. A maioria dos artigos do Quadro 2.7 está disponível

56
 Capítulo 2 [Destinos turísticos e transportes: aspectos teóricos e estado da arte]

gratuitamente nos sites dos respectivos periódicos ou podem ser obtidos também por
meio de buscas no endereço <http://www.publicacoesdeturismo.com.br>
4. Em sala de aula: com base numa viagem de férias que você tenha realizado ou que
gostaria de realizar, escolha um modelo espacial tratado neste capítulo que possa
servir de base para ilustrar o uso dos transportes nesta viagem. Justifique sua resposta
e apresente o resultado aos seus colegas.
5. Com base nos artigos identificados no estudo sobre o estado da arte (ver Quadro 2.7),
escolha um modo de transporte em particular e faça o levantamento de todos os
artigos. Após a leitura desses artigos, responda a seguinte questão: quais problemas
teóricos-conceituais devem ser abordados em novas pesquisas sobre a relação entre
o modo de transporte escolhido e o turismo?

LISTA DE REFERÊNCIAS

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61
CAPÍTULO 3
Planejamento e gestão
dos transportes
e destinos turísticos

Rafael Castro, Carla Fraga e Guilherme Lohmann

CONCEITOS APRESENTADOS NESTE CAPÍTULO


O objetivo geral deste capítulo é analisar algumas conexões possíveis sobre o planeja-
mento e a gestão de transportes e de destinos turísticos. São abordados alguns princípios
teóricos e metodológicos que dão suporte para se planejar e gerir os transportes no
turismo.

3.1. INTRODUÇÃO
A visão integrada sobre planejamento dos transportes e do turismo pode auxiliar
sobremaneira na gestão pública e privada dessas atividades, e no desenvolvimento de
mecanismos e políticas públicas específicas. Apesar dos avanços teóricos-conceituais
(ver Capítulo 2), é necessário admitir que o processo de planejamento dos transportes é
um tema pouco explorado na literatura sobre turismo.
Inicialmente o foco do capítulo incide na análise da metodologia de planejamento do
turismo e suas referências ao planejamento dos transportes em destinos turísticos. A fim de
subsidiar o processo de planejamento integrado entre transportes e turismo, é interessante
analisar de que forma alguns modelos espaciais de turismo (ver Capítulo 2) podem se rela-
cionar com as fases do ciclo de transportes. As etapas do processo de planejamento de cada
atividade serão detalhadas, cujo intuito é encontrar o melhor modo de complementação
entre elas. A partir da apresentação do modelo de quatro etapas, também conhecido como
Modelo Sequencial de Demanda, faz-se uma reflexão sobre a importância desse modelo
enquanto ferramenta para o planejamento do turismo (ver Quadro 3.2).
63
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Tópicos atuais das políticas públicas de transportes e de turismo no Brasil também são
abordados neste capítulo com análise realizada por Daniela Caruza Gonçalves Ferreira
abordando as principais políticas de desenvolvimento do turismo em interface com os trans-
portes. O desenvolvimento sustentável está diretamente relacionado ao planejamento dos
transportes e do turismo, uma vez que as atividades devem ser planejadas garantindo não
somente a sua utilização pelas gerações presentes, mas também pelas que virão no futuro.
O capítulo apresenta ainda questões importantes sobre o planejamento dos transportes
em momentos nos quais os destinos passam por um grande aumento em sua demanda por
serviços de transporte e turismo, devendo, assim, adequar a sua oferta: os megaeventos.
Eventos como a Copa do Mundo de Futebol, os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de Verão
ou Inverno, dentre outros, atraem um número excessivo de espectadores e visitantes aos
destinos turísticos, fazendo com que a sua infraestrutura de transportes (aeroportos, portos,
terminais rodoviários e transporte público) e de turismo (hotéis, serviços de receptivo,
alimentos e bebidas) sejam remodeladas e ampliadas conforme as necessidades de cada
evento. Por fim, o capítulo é encerrado com a apresentação de um estudo de caso que
trata do desenvolvimento da cidade de Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, es-
pecialmente no que diz respeito ao planejamento do turismo e do setor de transportes.

3.2. PLANEJAMENTO DOS TRANSPORTES EM DESTINOS


TURÍSTICOS
Na literatura sobre planejamento de destinos turísticos, os transportes são raramente
abordados de maneira direta. Por exemplo, ao mencionar o grupo de modelos denomi-
nado “Planejamento como um sistema conceitual”, Getz (1986) recorre ao seu trabalho
realizado em 1983, o qual aborda a capacidade de absorção do turismo e o processo de
planejamento turístico. Nesse estudo o autor propõe um modelo que visa o incentivo à
constante adaptação do processo de planejamento através de avaliação de impactos. O
sistema de transporte não é um elemento destacado de forma objetiva na estrutura de
planejamento do turismo proposto por Getz (1983), no entanto, fica óbvio que a relação
entre capacidade de absorção e desenvolvimento do turismo está diretamente relacionada
à implantação ou à melhora dos transportes. Vale destacar que as etapas do processo
de planejamento são estabelecidas da seguinte forma pelo autor: (1) modelagem e co-
nhecimento do sistema e seu ambiente; (2) previsão: escolha de alternativas futuras; (3)
avaliação do desenvolvimento planejado; (4) prioridade para metas e objetivos; (5) seleção
de estratégias; (6) desenvolvimento incremental; (7) revisão e avaliação; (8) decisão.
As etapas do processo de planejamento do turismo, propostas por Getz, não são
a única forma de se planejar o turismo. Além de se pensar tais etapas de uma forma
diferente, observa-se que algumas podem se convergir. Isso foi pesquisado por Lohmann
e Panosso Netto (2008), que a partir de uma extensa revisão bibliográfica, apontaram
seis etapas para a compreensão do planejamento do turismo. O Quadro 3.1 analisa
de que forma os transportes estão relacionados às etapas de planejamento de turismo
identificadas pelos autores.
64
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

Quadro 3.1 — Análise dos transportes no processo de planejamento do turismo

ETAPAS DO PLANEJAMENTO
TRANSPORTES
DO TURISMO
Análise do ambiente Partindo-se do princípio de que essa é a etapa na qual se tem uma
(externo e interno) visão geral da área que se pretende planejar, é importante que seja
realizado um histórico detalhado da relação entre a evolução tecno-
lógica dos transportes e o desenvolvimento do turismo. Na análise
interna do ambiente é preciso se identificar quais são os pontos
fortes e fracos dos transportes em relação ao turismo. Na análise
externa é preciso identificar quais são as ameaças e oportunidades
relacionadas aos transportes turísticos. Assim, é preciso identificar
inclusive quais são os potenciais visitantes para esse destino e que
tipo de transporte utilizarão para terem acesso e circularem no local.
Diagnóstico É a etapa na qual se levantam os dados necessários sobre o local
que será planejado. O objetivo do planejamento deve ser claro e o papel
dos diversos atores sociais e das organizações bem definidos. Portanto,
neste momento é essencial que se faça um levantamento específico
sobre de que forma a oferta de transportes atende aos residentes e aos
visitantes no presente. Deve-se considerar a quantidade e qualidade de
oferta por modos, a localização dos terminais e o nível da prestação de
serviços ofertados nestes; a existência de intermodalidade; tipos e níveis
de serviços ofertados pelas empresas de transportes; a existência de
parceria entre empresas de transportes e de turismo; o perfil dos clientes
das empresas de transportes que servem diretamente e indiretamente
ao turismo, envolvendo pesquisas junto aos moradores e aos visitantes.
Prognóstico Esta etapa é a previsão do curso de desenvolvimento do turismo. Nela
são considerados dados estatísticos das etapas anteriores, política gover-
namental e tendências. Portanto, neste momento, é essencial que se faça
um levantamento específico sobre: (a) de que forma a oferta de trans-
portes atenderá aos residentes e aos visitantes no futuro, tendo em vista
curto, médio e longo prazos; (b) legislação aplicada aos setores de trans-
portes e turismo; (c) as tendências da relação entre transportes e turis-
mo, como, por exemplo, o desenvolvimento de segmentos de mercado
turístico que exijam oferta de transporte com características específicas.
Estratégia Nesta etapa deve ficar evidente de que forma será realizada a im-
plantação ou reposicionamento da atividade turística para que os ob-
jetivos do planejamento sejam alcançados. Portanto, é essencial
que se tenha alternativas de ação de acordo com os recursos finan-
ceiros previstos. Nesta etapa é preciso ter a clareza do que é priori-
tário. Por exemplo, estrategicamente é mais importante a construção
de infraestrutura de transportes específica para o desenvolvimento
do turismo (pontes e aeroportos, por exemplo), ou criar mais canais
de distribuição dos serviços de transportes junto aos clientes.
Portanto, definir o conjunto de estratégias a ser adotado é um grande
desafio para planejadores e gestores dos transportes em sinergia
com os destinos turísticos. De uma maneira geral, a compreensão
sobre os modelos teóricos trabalhados no Capítulo 2 podem ser
um suporte precioso para a definição de estratégias.

(Continua)
65
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Quadro 3.1 — Análise dos transportes no processo de planejamento do turismo (cont.)

ETAPAS DO PLANEJAMENTO
TRANSPORTES
DO TURISMO
Implantação É o momento no qual o documento torna-se realidade. Nesta etapa
existe a captação de recursos, as oficinas de conscientização/sensi-
bilização e mobilização para residentes, o desenvolvimento de pro-
gramas de marketing. Portanto, nesta fase tudo que foi pensado
de maneira estratégica para o desenvolvimento sinérgico entre
transportes e turismo deve ser posto em prática. Em cidades que são
sedes de megaeventos esportivos, o desenvolvimento de infraestru-
tura de transportes geralmente se torna um legado que pode auxiliar
no reposicionamento do destino turístico frente aos mercados
nacionais e internacionais (ver Seção 3.5). Nesse sentido, a captação
de recursos para o desenvolvimento turístico pode estar associada
a órgãos e empresas de variados setores, como, por exemplo, em-
presas do ramo de comunicação que têm interesse na transmissão
dos jogos. As oficinas de conscientização para residentes também
podem envolver questões relacionadas ao uso dos transportes. No
estudo de caso sobre o uso de bicicleta em Paris (ver Seção 3.4),
fica bastante evidente de que maneira o papel da população local é
fundamental no processo de planejamento do transporte urbano em
sinergia com o desenvolvimento do turismo.
Avaliação O planejamento exige a avaliação contínua dos resultados, a fim
de corrigir eventuais falhas e gerar novas estratégias para atualizar
o próprio processo de planejamento. Dessa forma, é essencial que se
criem mecanismos para a avaliação sobre as relações de incentivo ou
limitação ao desenvolvimento que podem ocorrer entre transportes e
destinos turísticos. Em outras palavras, ao se analisar a sinergia entre
esses dois setores (transportes e turismo), a partir de métodos consis-
tentes e aplicados de forma sistemática, é possível construir séries his-
tóricas de dados que são bastante úteis para se conhecer o padrão de
desenvolvimento dos destinos em relação aos transportes e vice-versa
(ver estudos de Prideaux, 2000b e 2004 analisados no Capítulo 2).
Fonte: adaptado de Lohmann e Panosso Netto (2008).

O Quadro 3.1 evidencia o processo passo a passo de planejamento do turismo que


pode envolver, em maior ou menor grau, o planejamento das atividades de transportes.
Apesar dos avanços teóricos-conceituais sobre transportes e turismo identificados na
literatura (ver Capítulo 2), é necessário reafirmar que o processo de planejamento dos
transportes é um tema pouco explorado na produção científica sobre planejamento de
destinos turísticos. Sendo assim, o objetivo aqui é destacar de que maneira aspectos teóri-
cos e metodológicos, sobre planejamento de transportes, podem prover, cientificamente e
tecnicamente, o processo de planejamento integrado entre transportes e destinos turísticos.
Ao longo dos últimos anos, o planejamento dos transportes tem sido tratado por
diversos autores na literatura acadêmica nacional e internacional (ver Bruton, 1979
e 1985; Sheffi, 1985; Oppenheim, 1995; Andrade, 2007; Campos, s.d, entre outros).
66
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

Bruton (1979; 1985) foi um dos pesquisadores que mais contribuiu para o detalhamento
metodológico do processo de planejamento de transportes. Passadas algumas décadas,
sua obra notadamente ainda coopera para a elaboração de diversos planos, programas
e projetos de transportes. No Brasil, pode-se destacar a utilização do embasamento
científico de Bruton (1985) nos aspectos metodológicos norteadores do Plano Nacional
de Transporte e Logística (PNLT). Esse Plano foi elaborado, na segunda metade dos anos
2000, pelo Ministério dos Transportes, Ministério da Defesa e através do Centro de
Excelência em Engenharia de Transportes (CETRAN). Compreendendo o universo es-
tratégico entre os anos de 2008 e 2023, o PNLT é considerado um marco da retomada
do planejamento de médio e longo prazo dos transportes no país (BRASIL, 2009). O
PNLT será melhor explicado quando forem abordadas as políticas públicas sobre trans-
porte e turismo no Brasil (Seção 3.3).
Em linhas gerais, o estudo do planejamento de transportes visa “adequar as neces-
sidades de transportes de uma região ao seu desenvolvimento de acordo com suas
características estruturais. Isso significa implantar novos sistemas ou melhorar os exis-
tentes” (CAMPOS, s.d, p.2). Daí a importância de se discutir a relação entre os trans-
portes e o desenvolvimento de áreas geográficas que cumprem algum tipo de função
nodal específica no turismo, tais como aquelas destacadas por Lohmann e Pearce (2010):
origem, destino, hub, portão de entradas, escala e múltiplas funções (ver Capítulo 1).
A definição da área de estudo para o planejamento de transportes nem sempre corres-
ponde aos limites geográficos, políticos e administrativos de um único destino turístico
ou região turística. Nesse sentido, é válido destacar que, tecnicamente no planejamento
dos transportes, em especial o urbano, existe a possibilidade de se definirem linhas
imaginárias que auxiliam na delimitação da área de estudo e no estabelecimento de
zonas de tráfego. Desenhar essas linhas auxilia também na definição de pontos para a
coleta de dados, que posteriormente servirão para a construção de modelos e tomadas de
decisão relacionadas à implantação ou à melhoria dos sistemas de transportes. A seguir
são detalhadas informações sobre duas linhas - cordon line e screen line:
¥ Cordon Line: envolve os principais movimentos da região; as áreas que serão desen-
volvidas no futuro; e ainda deve cruzar as principais vias e corredores de transportes.
No planejamento de transportes a área de estudo ainda é subdivida em zonas de
tráfego, isto é, unidades básicas para se estabelecer a quantidade de fluxo gerados
(ver CAMPOS, s.d). É válido destacar que na literatura de planejamento de transportes
existe ainda uma série de estudos que podem contribuir para se definir o tamanho
da zona de tráfego e a inter-relação entre elas (ver BRUTON, 1985; KHISTY, 1990;
ORTÚZAR e WILLUMSEN, 1994; OPPENHEIM, 1995; CAMPOS, s.d).
¥ Screen line: esta linha corta a área de estudo que foi determinada pela cordon line e
muitas vezes coincide com um obstáculo natural, como um rio, ou construído, como
uma ferrovia (ver CARDOSO, 1999; CAMPOS, s.d.).
Em destinos turísticos, a definição dos pontos de coleta de dados podem coincidir
com os Polos Geradores de Viagens (PGV) de natureza turística. Os PGVs são “locais ou
67
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

instalações de distintas naturezas que têm em comum o desenvolvimento de atividades


em um porte e escala capazes de exercer grande atratividade sobre a população (...)”
(REDE PGV, 2010). Portanto, o planejamento das atividades de turismo deve considerar
os impactos que os PGVs de natureza turística (por exemplo, atrativos turísticos, terminais
de transportes e hotéis) podem gerar na infraestrutura viária e na oferta de transportes.
Somente assim será possível tratar os impactos sociais, culturais, ambientais e econômicos
decorrentes da implantação e da gestão destes PGVs (CASTRO, 2011).
Ainda sobre a questão dos impactos relacionados ao desenvolvimento de PGVs de
natureza turística, é válido destacar que dois conceitos amplamente trabalhados na
literatura de planejamento do turismo se tornam úteis ao determinarem-se projeções ou
remodelações de sistemas de transportes relacionados ao atendimento de atrações turís-
ticas, parques hoteleiros, dentre outros. O primeiro é sobre “zoneamento turístico” e o
segundo sobre “capacidade de carga”:
¥ Zoneamento turístico: é aquele que “procura estipular finalidades específicas para o
uso do solo, a fim de separar atividades que são incompatíveis ou de permitir que
usos compatíveis coexistam” (COOPER, 2000 traduzido por LOHMANN e PANOSSO
NETTO, 2008, p.441).
¥ Capacidade de carga: pode ser entendida como “capacidade que um determinado
meio ou ambiente possui para suportar o afluxo de visitantes e turistas sem perder as
características de sua originalidade ou ter ameaçada a sua integridade” (PIRES, 2005,
p.7 apud LOHMANN e PANOSSO NETTO, 2008).
Assim, ao se iniciar o planejamento de transportes em parceria com o desenvolvimento
sustentável de destinos turísticos, é mister identificar de que forma estão estipuladas as
finalidades para o uso do solo da área que se almeja planejar, e se essas finalidades serão
respeitadas a partir da implantação ou remodelação dos sistemas de transportes. Da mesma
forma, deve-se definir nos estudos de previsão de demanda de transportes (ver Quadro 3.2)
os limites de recebimento de visitantes (capacidade de carga) relacionados aos PGVs de
natureza turística. De nada adianta a criação de maior acessibilidade, a partir da implantação
ou remodelação dos sistemas de transportes, se os resultados dessas ações ameaçarem a
integridade ou contribuírem para a perda de originalidade do destino turístico.
O processo de planejamento de transportes com a identificação de alternativas de
transportes ocorre não só pela identificação dos problemas nas áreas de estudo e da coleta
de dados prévios, mas também pela aplicação de modelos sequenciais de demanda, mais
conhecido como Modelo Quatro Etapas. Esse conceito é pouco explorado na literatura
sobre o turismo e está detalhado no Quadro 3.2.
Um estudo que evidencia as relações entre as dinâmicas de uso do solo, os trans-
portes e a mudança da função nodal no turismo foi empreendido por Hsueh (2012). Esse
pesquisador identificou as transformações da área de Puli, em Taiwan na Ásia, a partir
da análise da revolução nos transportes (conexão rodoviária entre as Estradas Nacionais
1 e 6). A nova conexão entre as estradas, promoveu mais acessibilidade e menor tempo
68
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

Quadro 3.2 — Planejamento integrado entre os transportes e os destinos turísticos

POR QUE A APLICAÇÃO DESSE MODELO


MODELOS O QUE SIGNIFICA ESSE É UMA FERRAMENTA PARA O PLANEJA-
SEQUENCIAIS MODELO? MENTO INTEGRADO ENTRE TRANSPORTES
E TURISMO?
Geração de Viagens “Determinam a quantidade Ao se determinarem os PGVs de natureza
de viagens geradas (produzi- turística, através da elaboração de in-
das e atraídas) em cada zona ventário da oferta turística e de pesquisa
de tráfego” (CAMPOS, s.d, de mercados turísticos reais e potenciais, é
p.21). possível mensurar a quantidade de viagens
produzidas e atraídas em uma determinada
zona de tráfego em função de aspectos co-
mo a sazonalidade (alta e baixa temporada).
Distribuição “Determinam, a partir do Identificar a matriz Origem/Destino (O/D)
de Viagens total de viagens geradas na rede de transportes turísticos intrades-
em cada zona, a distribuição tino e interdestinos primários e secundários,
das mesmas entre as demais considerando a sazonalidade identificada
zonas de tráfego, chegando a partir do Modelo de Geração de Viagens
a uma matriz de origem pode auxiliar no processo de zoneamento tu-
e destino das viagens” rístico. Ou seja, nas definições de uso do solo
(CAMPOS, s.d, p.21). para a estruturação ou a criação de zonas de
interesse turístico ou de lazer (v. Capítulo 1).
Divisão Modal “Definem a distribuição Uma vez definida a matriz origem-destino
das viagens nos vários modos (O/D) a partir dos PGVs de natureza turís-
de transporte”(CAMPOS, s.d, tica é possível se pensar na distribuição
p.21). de viagens por modos de transportes
em função da experiência turística a ser
proporcionada por esses modos (ver a
distinção proposta por Lumsdon e Page
(2004) e citada por Page 2008, p.47 sobre:
“transporte para o turismo” e “transporte
como turismo”). Dependendo do objetivo
do deslocamento turístico, que foi mapeado
na primeira etapa, Geração de Viagem,
é possível fazer a distribuição do fluxo
turístico por modos, visando satisfazer
os variados tipos de demanda turística (ver
modelo com foco no turista abordado no
Capítulo 2). Para tal, o uso de ferramentas
de segmentação de mercado é igualmente
essencial (ver Capítulo 4). É válido observar
que, em muitos casos, o uso do transporte
pode ser compartilhado entre visitantes
de origens variadas e residentes dos des-
tinos turísticos. Logo, os múltiplos perfis
podem apresentar necessidades igualmente
variadas que precisam ser atendidas
de maneira satisfatória.

(Continua)

69
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Quadro 3.2 — Planejamento integrado entre os transportes e os destinos turísticos


(cont.)

POR QUE A APLICAÇÃO DESSE MODELO


MODELOS O QUE SIGNIFICA ESSE É UMA FERRAMENTA PARA O PLANEJA-
SEQUENCIAIS MODELO? MENTO INTEGRADO ENTRE TRANSPORTES
E TURISMO?
Alocação de fluxo “Fazem a distribuição do Uma vez estabelecida a divisão modal,
fluxo de viagens na rede de alocam-se os fluxos de transportes na
transporte” (CAMPOS, s.d, rede. A partir disso, é possível perceber
p.21). de que forma o objetivo dos deslocamentos
para fins turísticos influenciam na neces-
sidade de redimensionar ou criar novos
sistemas de transportes que comportem
a demanda real, do presente, e as neces-
sidades futuras de forma sustentável.
Fonte: elaborado pelos autores a partir de Campos (s.d); Lumsdon e Page (2004) apud Page (2008).

de viagem para se chegar aos dois destinos turísticos internacionais populares: Sun
Moon Lake e Quing-Jing Farm. Dessa forma, as mudanças acarretaram um aumento
considerável da quantidade de viajantes nos destinos próximos a Puli, transformando
destinos secundários em primários, pois viajantes apresentaram mais tempo disponível
para visitar a área de Puli (HSUEH, 2012).
A pesquisa examinou e analisou o itinerário individual de 300 viajantes independentes
e 40 turistas de massa (ver Plog, 1991 no Capítulo 2), levantando as funções nodais – “nós
de viagem” primários (1); e os secundários (2), antes e após a evolução de transportes. O
número crescente de viajantes na área de Puli após a evolução nos transportes demons-
trou que isso foi um fator relevante para reforçar a competitividade desse destino turís-
tico em sua região. O vine effect (efeito videira, em alusão ao formato de uma trepadeira
ramificada) representa a nova configuração espacial alcançada.
O estudo de Hsueh (2012) reforça que um dos maiores desafios para o planejamento
integrado entre transportes e destinos turísticos é tratar as complexidades envolvidas
na relação entre as dinâmicas de uso do solo, os transportes e o desenvolvimento sus-
tentável de destinos turísticos. Na literatura sobre planejamento de transportes existe a
proposição de um Ciclo de Transportes (ver Figura 3.1), que é raramente abordado nos
estudos turísticos. Esta é uma apropriada ferramenta para se analisar as relações entre as
“dinâmicas de uso do solo” (mudanças no uso e ocupação do solo, alteração no valor
da terra) e os “transportes” (geração de movimentos, oferta e demanda por transportes,
aumento da acessibilidade) com o desenvolvimento de destinos turísticos.

3.2.1. Geração de movimentos, demanda e oferta de transportes


No processo de planejamento dos transportes os estudos de previsão da demanda são
essenciais para se definir a oferta de transportes (ver Quadro 3.2), uma vez que propiciam
70
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

Figura 3.1 — Ciclo de transportes. (Fonte: redesenhada a partir de CAMPOS, s.d)

a estruturação dessa oferta em função das necessidades específicas da demanda. Logo,


se, de um lado, os estudos de previsão de demanda de transportes considerarem, na parte
de coleta de dados, a inclusão dos PGVs de natureza turística (hotéis, atrações turísticas,
terminais de transportes etc.) distribuídos pelas linhas imaginárias cordon line e screen
line; e de outro, os dados coletados forem tratados a partir do embasamento teórico que
compõe os modelos evolucionários com foco no turista (ver Plog, 1991, e Capítulo 2),
será possível identificar subsídios relevantes para as tomadas de decisão referentes ao
atendimento das necessidades e desejos dos múltiplos perfis de usuários de transportes.
Esse exercício de sobreposição pode promover, de um lado, técnicas mais apuradas no
ato de planejar e gerir os transportes no turismo, e, de outro, levar ao desenvolvimento de
políticas públicas e mecanismos específicos para transportes e turismo, que colaborem
para resultados mais duradouros e sustentáveis (ver Seção 3.3). Na parte mercadológica,
as empresas de transporte poderão se programar, reformulando suas estratégias para
atender de maneira personalizada aos diversos públicos. Isso fortalece o marketing entre
transportes e destinos turísticos (ver Capítulo 4).

3.2.2. Aumento da acessibilidade, alteração no valor da terra


e mudança no uso e da ocupação do solo
O “aumento da acessibilidade” em função da “demanda por transporte” pode gerar
o crescimento do número de visitantes nos destinos turísticos, contudo o aumento de
71
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

visitantes nem sempre significa desenvolvimento (ver Prideaux, 2000b e 2004, abordado
no Capítulo 2). Nesse sentido, é fundamental que se empreendam estudos de capacidade
de carga e de zoneamento turístico. Estes ajudarão a determinar o ponto de equilíbrio entre
aumentar a acessibilidade e as mudanças no uso e ocupação do solo a fim da promoção
do desenvolvimento sustentável dos destinos turísticos envolvidos na área de estudo.

3.2.3. Mudanças tecnológicas


É válido ressaltar que outros estudos sobre planejamento de transportes consideraram
no Ciclo de Transportes (ver Figura 3.1) a inserção de uma variável intermediária entre
a “oferta de transportes” e o “aumento da acessibilidade”, denominada “mudanças
tecnológicas” (CNT, 2002; ANDRADE, 2007). Dentre as inúmeras mudanças tecno-
lógicas que podem tornar os destinos mais acessíveis e mais competitivos, vale des-
tacar aquelas que podem contribuir com o desenvolvimento dos destinos de maneira
sustentada. A busca pelo uso de fontes alternativas de energia, como os denominados
combustíveis “verdes” ou “limpos”, é uma delas. Nesse sentido, foi desenvolvido através
da parceria entre a Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do
Rio de Janeiro (FETRANSPOR) e a Secretaria do Estado de Transportes o projeto “B20
– Biodiesel experimental, o Rio de Janeiro anda na frente”. Lançado em setembro de
2009, com foco nos Jogos Olímpicos de 2016, esse projeto envolveu a circulação de 14
ônibus utilizando combustível B20 (mistura de 20% do biodiesel adicionado ao diesel
comum) durante 12 meses nessa cidade. Além dos aspectos ambientais, sob o ponto
de vista social, foi criado pelo governo federal o Selo Combustível Social relacionado à
distribuição de renda envolvendo agricultores familiares. Para ter direito a esse selo, as
usinas produtoras desse combustível têm de adquirir matéria-prima junto aos agricultores
familiares em concordância com um percentual mínimo - o percentual pode variar de
acordo com o Estado - (FETRANSPOR, 2011). Essa proposta de mudança de tecnologia
relacionada à força motriz dos veículos chama a atenção sobre a estreita relação entre
transportes, qualidade de vida e o meio ambiente.
Antes de avançar para a análise das políticas públicas de transportes e turismo no
Brasil, organizou-se um roteiro com base nas discussões teóricas realizadas nesta parte do
capítulo. Este serve como suporte aos estudos preliminares para o planejamento integrado
entre transportes e destinos turísticos (ver Quadro 3.3).

3.3. POLÍTICAS PÚBLICAS DE TRANSPORTES E TURISMO NO BRASIL


Daniela Caruza Gonçalves Ferreira1
O planejamento pode ser entendido como um tipo de tomada de decisão e elaboração
de políticas públicas – não decisões individuais, mas interdependentes e sistematicamente
relacionadas. Esse processo envolve aspectos como negociação, compromisso e valores.

Tutora à distância da disciplina Transportes do curso de Licenciatura em Turismo do Consórcio CEDERJ/Fundação


1

CECIERJ.
72
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

Quadro 3.3 — Roteiro para suporte teórico para planejamento integrado entre trans-
portes e destinos turísticos

SUPORTE PARA ESTUDOS PRELIMINARES RELACIONADOS À IDENTIFICAÇÃO DE PROBLEMAS


DE TRANSPORTES E A DELIMITAÇÃO DE ÁREA DE ESTUDO E DE PLANEJAMENTO
1. Analisar e aplicar os postulados sobre transportes e turismo (v. KAUL, 1985; PRIDEAUX, 2000a
e o Capítulo 2).
2. Identificar como é desenvolvido o zoneamento turístico (v. COOPER, 2000; LOHMANN
e PANOSSO NETTO, 2008).
3. Identificar o perfil da demanda turística e a escolha de modo(s) de transportes
(ver PLOG,1991; PRIDEAUX, 2000b e 2004; LOHMANN e PANOSSO NETTO, 2008 e o Capítulo 2).
4. Analisar a evolução dos transportes (ver BLASCO, 2001; PALHARES, 2002).
5. Identificar as funções nodais relacionadas ao turismo dispostas nas redes de transportes
(ver PALHARES, 2003; LOHMANN e PEARCE, 2010 e o Capítulo 1).
6. Identificar a localização e as características dos Polos Geradores de Viagem e sua natureza
turística (ver Capítulo 2, CAMPOS, s.d; CASTRO, 2011; REDE PGV, 2010).
7. Estudar a capacidade de carga relacionadas aos PGVs de natureza turística (ver PIRES, 2005;
LOHMANN e PANOSSO NETTO, 2008).
8. Identificar o estágio de desenvolvimento do(s) destino(s) turístico(s) (ver BUTLER, 1980;
PRIDEAUX, 2000b e 2004; LOHMANN e PANOSSO NETTO, 2008 e o Capítulo 2).
9. Compreender como o estágio de desenvolvimento de destinos turísticos se relaciona com
o Ciclo de Transportes (ver Capítulo 2 e Figura 3.1).
10. Fazer estudos relacionados aos modelos sequenciais (ver Quadro 3.2).

Hall (2004, p.24) afirma que “planejar é, portanto, apenas uma parte de um processo
global de ‘planejamento-decisão-ação’”.
Lohmann e Panosso Netto (2008, p.121) definem políticas públicas de turismo como
“o direcionamento dado pelos governos federal, estadual, municipal ou regional para o
desenvolvimento da atividade turística, após ter consultado os representantes do setor
turístico e da sociedade”. Para o BRASIL (2009), o papel do Estado Nacional é funda-
mental para o desenvolvimento do turismo, uma vez que ele é o principal responsável
por oferecer as condições necessárias para que o turismo aconteça: infraestrutura básica,
como esgoto, rede de comunicação, água e estradas; e uma superestrutura organizada,
com legislação, normas, regulamentos relativos ao turismo, dentre outros. Dessa forma,
é necessário que as políticas direcionadas ao planejamento e desenvolvimento do turis-
mo estejam articuladas com outras políticas, ligadas diretamente ao turismo ou a ele
relacionadas, tais como transporte, meio ambiente, saneamento básico, saúde, educação,
segurança, fomento de atividades produtivas, e assim por diante.
O desenvolvimento de um destino turístico, bem como a definição de seus principais
polos emissores de turista, está diretamente ligado, entre outros fatores, à existência de
vias de acesso e à sua condição de tráfego. Como imaginar o turismo sem a efetiva pos-
sibilidade de deslocamento? As políticas públicas de transportes, portanto, influenciam
e podem, inclusive, determinar a evolução dos destinos turísticos de um país. Como
73
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

abordado anteriormente na Seção 3.2, o aumento ou a melhoria das vias de acesso podem
se configurar até mesmo como uma ameaça ao destino em questão. Nessa mesma seção,
no caso analisado por Hsueh (2012), a conexão entre duas estradas nacionais em Taiwan
alterou a dinâmica de desenvolvimento turístico de uma região específica.
Ações fundamentais das políticas públicas de transporte, a construção e a manutenção
de vias de acesso e de seus equipamentos de apoio são o que permite a interligação
entre determinados pontos do território nacional, estimulando o desenvolvimento de
determinados lugares em detrimento de outros. O planejamento dessas ações pode
seguir critérios empíricos (vias utilizadas anteriormente ao processo de planejamento por
necessidade dos habitantes ou do comércio local), políticos e ideológicos (como o de
manutenção de fronteiras, ocupação do território nacional ou de ligação entre as capitais
das unidades da federação), ou estratégicos e comerciais (interligação de polos comerciais
ou necessidade de escoamento da produção).
Uma característica histórica da política de transportes no Brasil foi o progressivo in-
centivo às rodovias, cuja construção se intensificou em meados do século XX. Um fator
importante desse processo é que, em vez de estimular a integração intermodal, estabele-
cendo conexões entre rodovias, ferrovias e hidrovias já existentes (o que poderia melhorar
o acesso e dinamizar o sistema nacional de transportes), a construção das rodovias foi
feita basicamente com traçados paralelos aos ferroviários, acirrando a competição entre os
modos em termos de investimentos e intervenções governamentais (DNIT, s/d). Posterior-
mente, como resultado do processo das privatizações iniciado nos anos 1980 e continuado
especialmente na década seguinte, o desenvolvimento da infraestrutura brasileira foi, em
geral, reduzido, e os investimentos na manutenção e melhoramento das redes de transporte
rodoviário e ferroviário minguaram, fazendo com que fossem afetados tanto os custos do
transporte quanto sua confiabilidade (LOHMANN e DREDGE, 2012). Nos anos 2000, o
transporte aéreo foi favorecido pela flexibilização da legislação tributária, possibilitando
a queda das tarifas e gerando uma competição acirrada das companhias aéreas entre si,
o que fez com que o transporte por ônibus se tornasse menos atraente aos passageiros,
sobretudo nas ligações entre centros maiores. A adoção do modelo low cost-low fare, por
algumas companhias aéreas, também foi um fator de ampliação da demanda pelo trans-
porte aéreo, que crescia a taxas superiores a 10% ao ano (BRASIL, 2009).
É possível dizer que as políticas públicas e os programas de desenvolvimento do turismo
são desenhados, em grande medida, tomando como base as políticas públicas de trans-
porte ou seus resultados: em alguns casos são pensados conforme a infraestrutura de
transportes já existente e a possibilidade de utilizá-la para o turismo; em outros, parte dos
recursos destinados aos programas de desenvolvimento turístico são alocados para cons-
trução ou manutenção de vias de acesso e seus equipamentos, quando essa infraestrutura
é inexistente ou precária. Dois exemplos importantes desse delineamento marcado pela
infraestrutura de transporte disponível são o Programa de Desenvolvimento do Turismo
no Nordeste – PRODETUR NE e a escolha dos 65 destinos indutores no Programa de
Regionalização do Turismo – PRT.
74
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

O PRODETUR NE I concentrou investimentos na construção ou melhoramento desse


tipo de infraestrutura. Concebido nos anos 1990 como um programa de captação de
recursos internos e externos para o desenvolvimento do turismo, tinha o objetivo de con-
tribuir para o desenvolvimento socioeconômico do Nordeste do Brasil por meio do
desenvolvimento da atividade turística. Assim, o programa foi desenhado para, entre
outras coisas, facilitar os deslocamentos para essa região, por meio de investimentos na
melhoria dos aeroportos, sistemas de vias urbanas e rodovias secundárias e de acesso,
complementados pelo fortalecimento dos órgãos estaduais de transportes em termos
de sua capacidade operacional e de manutenção (BANCO DO NORDESTE, 2005).
Para citar alguns exemplos, no Piauí, o montante destinado ao componente Transporte
chegou a 75% dos recursos disponibilizados, tendo sido utilizado mais especificamente
para a pavimentação de trechos rodoviários de acesso ao Polo Costa do Delta. No Ceará,
o projeto do aeroporto de Fortaleza recebeu 47,7% do valor total dos investimentos
(RUSCHMANN CONSULTORES, s/d).
O PRT, por sua vez, se constitui como uma das políticas que parte de uma infraestrutura
de transporte minimamente consolidada. Em 2007, três anos após seu lançamento, foram
selecionados 65 destinos indutores para receber investimentos técnicos e financeiros do
Ministério do Turismo e ser foco de articulações e busca de parcerias com outros minis-
térios e instituições. Esses destinos indutores deveriam se tornar responsáveis por propagar
o desenvolvimento nos roteiros dos quais fazem parte e, consequentemente, nas regiões
turísticas que perpassam. Os destinos selecionados, portanto, foram aqueles que já pos-
suíam infraestrutura básica e turística e atrativos qualificados, e que se caracterizavam
como núcleo receptor e/ou distribuidor de fluxos turísticos, isto é, aqueles capazes de
atrair e/ou distribuir significativo número de turistas para seu entorno e dinamizar a
economia do território em que se inserem. Na análise foram considerados os seguintes
critérios em relação ao acesso: transporte aéreo, acesso rodoviário, outros tipos de aces-
so (aquaviário e ferroviário), sistema de transporte no destino e proximidade de grandes
centros emissivos de turistas (BRASIL, 2008).
A logística de transportes continua sendo considerada tão importante para a política
nacional de turismo que se configura como um eixo temático específico do atual Plano
Nacional de Turismo – PNT. Para o período vigente, esse eixo foi destacado como um
dos macroprogramas do Plano, com três frentes de atuação: o Programa de Ampliação
da Malha Aérea Internacional, que tem o objetivo de promover a integração do Brasil
com os demais países do mundo; o Programa de Integração da América do Sul, que
também privilegia o modo aéreo; e o Programa de Integração Modal nas Regiões Turís-
ticas, que consiste na avaliação da infraestrutura relacionada à acessibilidade marítima,
terrestre, aérea e fluvial, propondo ações de melhoria da qualidade dessa infraestrutura
e dos equipamentos de apoio a elas relacionados: postos de combustíveis, serviços de
alimentação e hospedagem, e informações turísticas (BRASIL, 2007).
Da mesma forma, o turismo passou a ser levado em consideração no planejamento
da atual Política Nacional de Transporte, o que pode ser visto como um reflexo de sua
75
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

inserção como um dos setores expoentes de desenvolvimento nacional.2 O mais recente


instrumento de planejamento no âmbito do setor de transportes, o Plano Nacional
de Logística e Transportes – PNLT, considera, por exemplo, a necessidade de avaliar
o impacto do crescimento da demanda de serviços de transporte associada ao turismo
interno como um dos pontos principais que diferenciam as características da gestão
do planejamento de transportes, nesse início do século XXI, daquelas observadas em
períodos anteriores. O planejamento do sistema de transportes é visto como meio para
alavancar o potencial turístico das cinco regiões brasileiras e a política de transporte como
via para alcançar o desenvolvimento de áreas do país que se encontram economica-
mente “deprimidas” (BRASIL, 2009). Ao Ministério dos Transportes cabe a formulação,
a coordenação e a supervisão das políticas nacionais e o planejamento estratégico de
programas de investimento; vinculados a ele estão: o Conselho Nacional de Integração de
Políticas de Transporte, que tem a atribuição de propor políticas nacionais de integração
dos diferentes modos de transporte de pessoas e bens; a Agência Nacional de Transportes
Terrestres (ANTT) e a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), que têm as
funções de implantar as políticas formuladas e de regular ou supervisionar, em suas res-
pectivas esferas e atribuições, as atividades de prestação de serviços e de exploração da
infraestrutura de transportes exercidas por terceiros; além do Departamento Nacional
de Infraestrutura de Transportes (DNIT), que é responsável por implementar, em sua es-
fera de atuação, a política formulada para a administração da infraestrutura do Sistema
Federal de Viação, compreendendo operação, manutenção, restauração ou reposição,
adequação de capacidade e ampliação, mediante construção de novas vias e terminais.
A regulação do transporte aéreo é feita pela Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC,
e a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária – INFRAERO é responsável pela
gestão e pela operação da infraestrutura aeroportuária.
Ações de flexibilização da legislação, aberturas comerciais e outros tipos de decisão
governamental, empreendidos por fatores políticos, estratégicos e econômicos, refletem
e impactam tanto nas políticas de transportes quanto de turismo. Um exemplo foi a libe-
ração da navegação de cabotagem na década de 1990. Isso permitiu o desenvolvimento
do mercado de cruzeiros no Brasil como o conhecemos na atualidade (ver Capítulo 6).
O advento da liberdade tarifária e da liberdade de oferta previsto na lei de criação da
ANAC3 resultou na queda gradual nas tarifas aéreas, que até então deveriam obedecer a
um preço mínimo (ANAC, 2009).
A seguir são apresentados alguns marcos do desenvolvimento dos transportes e do
turismo no Brasil, do ponto de vista das políticas públicas, com ênfase nas últimas décadas.

2
De acordo com a Lei Geral do Turismo (Lei 11.771 de 17/09/08), que define as atribuições do Governo
Federal no planejamento, desenvolvimento e estímulo ao setor turístico, “O poder público atuará, mediante
apoio técnico, logístico e financeiro, na consolidação do turismo como importante fator de desenvolvimento
sustentável, de distribuição de renda, de geração de emprego e da conservação do patrimônio natural, cultural
e turístico brasileiro” (art. 3°, parágrafo único).
Lei n° 11.182, de 27 de setembro de 2005.
3

76
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

O histórico de intervenções governamentais específicas em turismo é relativamente


recente – os programas e planos institucionais de desenvolvimento do turismo datam
de meados dos anos 1980. A criação do Ministério do Turismo em 2003 foi um importante
marco no setor. Antes disso, o turismo era tratado em conjunto com outras áreas como
cultura, comércio ou esportes.
¥ Criação do Ministério do Turismo: no lado do turismo, os anos 2000 foram marcados pela
criação do Ministério do Turismo em 2003, a elaboração de um Plano Nacional de Turismo
(2003/2007) e (2007/2010). Através da política de regionalização do turismo foi possível
a formação de estruturação de segmentos de mercados e criação de roteiros turísticos
comercializáveis. Como já destacado, no Plano Nacional de Turismo (2007/2010) existiu
uma preocupação muito clara com a integração de transportes nas regiões turísticas.
¥ Plano Nacional de Logística de Transportes (PNLT): oriundo da parceria entre Minis-
tério dos Transportes e Ministério da Defesa, é um marco significativo na retomada
do processo de planejamento de transportes em médio e longo prazo. O objetivo do
PNLT é subsidiar os Planos Plurianuais (PPAs), tendo assim como universo o ano de
2023. Apresenta foco no desenvolvimento regional e no planejamento participativo.
¥ PAC: o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, criado pelo Decreto 6.025
de 22 de janeiro de 2007, é um programa do Governo Federal que investe em um
conjunto de políticas e ações específicas, com o objetivo de acelerar o crescimento
econômico do Brasil. Tem como prioridade o investimento em infraestrutura, sa-
neamento, habitação, transporte, energia e recursos hídricos. No Plano Nacional
de Turismo, estão destacados os investimentos do Programa Infraestrutura Logística,
as medidas de incentivo ao investimento privado, além de recursos diretos para a
promoção, interna e externa, e para a construção de infraestrutura turística. De acordo
com dados do site oficial do Ministério dos Transportes, sua primeira fase destinou
R$40 bilhões para 1.500 ações – obras, manutenções e projetos relacionadas ao setor
de transportes.
¥ Lei Geral do Turismo: um destaque para os avanços da Política Nacional de Turismo
foi a criação da Lei 11.771 de 17 de setembro de 2008, mais conhecida como Lei Geral
do Turismo. Ela dispõe, entre outros assuntos, sobre a Política Nacional de Turismo,
definindo atribuições do Governo Federal no planejamento, no desenvolvimento e
no estímulo ao setor turístico. A prestação de serviços por transportadoras turísticas
é abordada nesse documento.
¥ Ações interministeriais: algumas ações interministeriais, envolvendo diretamente
os Ministérios dos Transportes e do Turismo merecem destaque, como é o caso da
formação do Grupo de Trabalho sobre Turismo Ferroviário em 2010. Esse grupo propôs
uma cartilha que orienta a implantação de novos trens turísticos e culturais no Brasil
baseado nos princípios da regionalização do turismo (FRAGA, 2011).
Atualmente, existe uma série de planos, programas e projetos de transportes, em fase de
estruturação ou implantação, que se ligam em maior ou menor grau ao desenvolvimento
77
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

do turismo. A cidade do Rio de Janeiro, que será sede da Copa do Mundo de Futebol
(2014) e dos Jogos Olímpicos (2016), reúne grande parte destes incluindo a implantação
dos Bus Rapid Transit (BRTs, que são corredores projetados exclusivamente para a circu-
lação de ônibus) e a revitalização do espaço urbano da região portuária, mais conhecido
como Porto Maravilha.
Analisar o processo de planejamento e a elaboração de políticas públicas pode ser uma
via para alcançar a compreensão das causas e das consequências das decisões políticas e
melhorar o conhecimento sobre a sociedade. Hall (2004) destaca que o planejamento é um
processo político, não só por envolver a elaboração de políticas públicas, mas, principalmen-
te, porque envolve objetivos sociais e sua relação com aspirações, muitas vezes conflitantes,
de grupos distintos. Esses grupos – o autor cita como exemplos associações ligadas ao turis-
mo, grupos conservacionistas, grupos comunitários, indivíduos representativos (membros
do governo local, líderes empresariais), membros de entidades burocráticas (funcionários de
organizações de turismo ou órgãos de desenvolvimento), além de acadêmicos e consultores –
influenciam as políticas públicas de maneira significativa e, em geral, também divergem
marcantemente na forma como as percebem. Como Hall (2004) observa, as questões que
podem ser colocadas, nesse sentido, e que tentamos explorar – mesmo que superficialmente
– neste capítulo, dizem respeito às características socioeconômicas e do sistema político que
atuam para moldar o conteúdo da política, e aos impactos que as políticas públicas exercem
na sociedade, no ambiente e no próprio sistema político. Parafraseando o autor, a análise
das políticas públicas é, finalmente, uma forma de compreender causas e consequências,
uma possibilidade de buscar soluções para problemas práticos referentes ao turismo e de
introduzir esses conhecimentos no processo de planejamento.

3.4. TRANSPORTE E TURISMO NA PERSPECTIVA


DA SUSTENTABILIDADE
O conceito de desenvolvimento sustentável começou a ser discutido internacional-
mente na década de 1970 justamente quando os países começaram a se preocupar de
fato com os riscos da degradação ao meio ambiente. Diversos eventos aconteceram em
diferentes lugares do mundo a partir dessa época a fim de discutir o tema, que passou a
ser mais aceito pela sociedade somente em 1987 quando a Comissão Mundial da ONU
sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED) apresentou o Relatório Brundtland
(também conhecido como Nosso Futuro Comum) que trazia a seguinte definição para
sustentabilidade: “é desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem com-
prometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem suas próprias necessidades”
(RELATÓRIO BRUNDTLAND, 1988).
Muito se ouve falar nos dias de hoje sobre o termo “sustentabilidade”, porém sempre
relacionado à preocupação com a preservação e conservação do meio ambiente es-
sencial para a manutenção da vida no planeta. Entretanto, é importante que se tenha um
entendimento mais amplo a respeito do conceito de desenvolvimento sustentável que

78
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

vem sendo usado de forma aleatória. Quando se analisa o desenvolvimento do turismo


de forma sustentável, percebe-se que este tange a uma série de dimensões chamadas
por diversos autores da área como “dimensões da sustentabilidade” – social, econômica,
ambiental e cultural (Quadro 3.4) – deixando claro que o aspecto ambiental é somente
uma das dimensões que devem ser analisadas.

Quadro 3.4 — As dimensões do turismo sustentável e suas variáveis

DIMENSÃO VARIÁVEIS
Social Dimensão marcada pelo envolvimento ou não das comunida-
des receptoras dos locais de destino com a atividade turística.
Identificação da relação entre turista e comunidade local.
Econômica Valorização das iniciativas locais. Contribuição para ampliação
da empregabilidade. Ampliação das receitas e apoio do poder
público no combate à sonegação fiscal. Prática do preço justo,
formação de cadeias produtivas locais, geração de emprego
e renda para a comunidade local.
Ambiental Ações que possam proporcionar melhorias na conservação
e preservação da fauna, flora, patrimônios naturais e na ade-
quação e uso de recursos naturais.
Cultural Valorização dos bens materiais (museus, igrejas, locomotivas
centenárias, etc.) e imateriais referentes à cultura (memória
oral, festas folclóricas, etc.). Preservação e/ou conservação
dos bens e implantação da educação patrimonial tanto
para turistas quanto para moradores.

A compreensão da sustentabilidade para cada um dos modos de transportes turísticos


demanda entender que, em uma visão sistêmica, estes são formados por quatro elementos
já abordados no Capítulo 1: via, veículo, força motriz e terminal. Assim, não basta que
somente o veículo seja “sustentável”, mas todos os demais elementos dos transportes
turísticos devem atender aos parâmetros e às dimensões da sustentabilidade.

CRUZEIROS MARÍTIMOS
Os cruzeiros marítimos são ótimos exemplos de aplicabilidade das dimensões da sus-
tentabilidade (FRAGA e FERNANDES, 2011). No aspecto ambiental, pode-se pensar na
coleta de lixo seletiva, uma vez que não é tudo que pode ser jogado pelos navios em
alto-mar além de nem todos os portos estarem habilitados a receber todo e qualquer tipo
de lixo. Sendo assim, é importante que os navios façam um trabalho de coleta seletiva. Na
dimensão cultural, ressalta-se o intercâmbio cultural e o respeito à pluralidade cultural, já
que os navios de cruzeiros empregam pessoas de diversos países que estão à disposição
para servir passageiros também de origens variadas. Há ainda o contato entre os cruzeiris-
tas (aqueles que viajam de cruzeiros) e a comunidade local no momento em que o navio
atraca em determinado porto.

79
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Na dimensão econômica da sustentabilidade em cruzeiros marítimos, não se pode


deixar de citar a geração de emprego e renda para a comunidade local. As comunidades
nas quais os navios aportam e os passageiros podem desembarcar estão envolvidas com
a prestação de serviços e venda de produtos direta e indiretamente relacionados a essa
cadeia produtiva. Por fim, o aspecto social revela o envolvimento das comunidades locais
dos destinos com a empresa operadora e os próprios cruzeiristas.
A sustentabilidade dos transportes está ainda diretamente relacionada à prática do
turismo sustentável em destinos planejados para beneficiar não somente a comunidade
local e os turistas de hoje, mas também os que virão no futuro. Destinos turísticos consa-
grados como Paris, na França, sabem trabalhar o turismo sustentável de forma bastante
inteligente conforme apresentado no estudo de caso a seguir:

VÉLIBS E AUTOLIBS DE PARIS


Acompanhando a tendência mundial da substituição do automóvel particular pelas
bicicletas em trajetos de curtas e médias distâncias, a Prefeitura de Paris criou em julho
de 2007 o serviço de aluguel de bicicletas chamado Vélib (Figura 3.2). Atualmente (2012)
são 1800 estações – distantes cerca de 300 metros umas das outras – distribuídas por
toda a cidade de Paris, com mais de 20.000 bicicletas disponíveis durante 24 horas e
7 dias da semana. Os trinta primeiros minutos de utilização são gratuitos, e após esse
período é cobrada uma taxa que varia de acordo com o tempo de utilização. Há ainda
pacotes promocionais anuais como o Vélib’ Classique em que o usuário paga 29 euros
e tem direito a uma série de trajetos ilimitados. Para os turistas há opções como passes
diários – 1,70 euro – ou semanais – 8 euros (VÉLIB, 2012).
Analisando em termos de sustentabilidade, esta ação da Prefeitura de Paris atendeu
a todas as dimensões propostas anteriormente. O aspecto mais fácil de ser identificado
é o ambiental, já que os usuários (moradores e turistas) deixam de utilizar os veículos
motorizados e com isso diminuem a quantidade de emissão de gases na atmosfera. Na
dimensão econômica pode-se citar a redução no orçamento das famílias e turistas, que
antes tinham gastos com combustível e estacionamento e que agora gastam bem menos
com o aluguel das bicicletas (sobretudo com os passes diários, semanais ou anuais).
Os congestionamentos nas grandes cidades têm causado inúmeros problemas para as
comunidades e turistas, ganhando até mesmo um determinado cunho social, uma vez
que provocam instabilidade emocional, acidentes e diversos outros transtornos. Sendo
assim, no aspecto social da sustentabilidade, a diminuição dos congestionamentos deve
ser ressaltada. Há outros benefícios de saúde para a população, como a possibilidade
de se exercitarem ao fazer uso desse serviço. O uso do Vélib já se tornou uma questão
cultural para os parisienses e também para os turistas do mundo inteiro que visitam
a cidade e agora preferem conhecê-la a bordo das bicicletas que permitem maior
mobilidade para todos.
Mais recentemente, em dezembro de 2011, a Prefeitura de Paris lançou mais um serviço
inovador: o Autolib. Trata-se do aluguel de veículos elétricos (com capacidade para até qua-
tro pessoas) espalhados em cerca de 1.100 estações que podem ser carregados em quase
80
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

5.000 postos de carregamento (AUTOLIB, 2012). Os dados informam que até junho de
2012, aproximadamente 1.740 carros estavam disponíveis para parisienses e turistas, mas esse
número poderá chegar aos 3.000 carros em breve. O serviço é muito simples e funciona da
seguinte forma: (1) a pessoa preenche um cadastro que pode ser feito online ou nos quiosques
do Autolib em diversos locais da cidade, apresentando a carteira de habilitação válida e um
cartão de crédito; (2) o cliente recebe um cartão que dá acesso ao serviço; (3) chegando à
estação, basta encostar o seu cartão no sensor para desbloquear um dos veículos disponíveis;
(4) basta entrar no carro e acioná-lo com a chave que já estará na ignição. Assim como no
Vélib, também há diversos planos tarifários para a utilização do Autolib. O Autolib 1 Jour, por
exemplo, serve para pessoas com necessidades imediatas e que precisam do veículo por um
dia. Nesse plano paga-se 10 euros por dia somados a 7 euros a cada meia hora de uso do
carro (Figura 3.3).

Figura 3.2 — Estação de Vélib em Paris, janeiro de 2013 (Foto cortesia: Carla Fraga)

81
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Figura 3.3 — Estação de Autolib em Paris, janeiro de 2013 (Foto cortesia: Carla Fraga).

Ficou claro que o desenvolvimento de destinos turísticos sustentáveis depende, em


partes, da implantação de serviços de transportes também sustentáveis em todas as
suas dimensões, uma vez que o transporte é condição sine qua non para a realização
de atividades turísticas. Os megaeventos, tais como Jogos Olímpicos e Copa do
Mundo de Futebol, têm atraído número significativo de turistas para as cidades-sede
colaborando para a diminuição da sazonalidade do turismo. Entretanto, seus sistemas
de transportes devem ser planejados, de forma sustentável, para receber esse aumento
de demanda.

3.5. TRANSPORTES E MEGAEVENTOS


Megaeventos esportivos têm impactos de longo prazo sobre seus destinos, uma
vez que exigem altos investimentos em infraestrutura que se transformam em legados
para o futuro da região (ESSEX e CHALKLEY, 1998). Assim, além da construção e
reforma de estádios, os Jogos Olímpicos, por exemplo, cada vez estimulam a melhoria

82
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

dos sistemas rodoviários, ampliação dos transportes públicos e terminais aéreos,


renovação da área urbana e implantação de modernos sistemas de informações turís-
ticas e culturais.
A existência de um adequado sistema de transporte tem sido evidenciada como crítica
para o sucesso de megaeventos (ESSEX e CHALKLEY, 1998; HENSHER e BREWER, 2002;
ROBBINS et al., 2007), principalmente pelas melhorias tangíveis e duradouras que po-
dem proporcionar (GOLD e GOLD, 2008). Investimentos em transporte público para as
Olimpíadas de Londres, em 2012, representaram melhorias significativas em termos de
acesso para a região Leste de Londres com relação ao restante da cidade, principalmente
para passageiros com necessidades especiais. Da mesma forma, em Barcelona (1992)
e Sidney (2000), os Jogos Olímpicos contribuíram para a melhoria da infraestrutura de
transporte público em geral, aumentando a sua confiabilidade, mesmo durante horários
de pico, reduzindo a dependência dos moradores em relação ao uso de veículos parti-
culares (CHALKLEY e ESSEX, 1999). Em Sidney, em particular, o plano de transportes era
de que nenhum espectador chegasse aos estádios por transporte privado, fazendo uso
exclusivamente de transporte público (ZAGORIANAKOS, 2004). Por outro lado, os Jogos
Olímpicos de 1996, em Atlanta, sofreu críticas pela falta de investimentos em infraestrutura
de transporte, acarretando em congestionamentos e atrasos durante os Jogos (GOLD e
GOLD, 2008).
Os desafios apresentados em termos de se prover mobilidade urbana durante
megaeventos são resultados da necessidade de se proverem serviços de transportes
em níveis de serviços diferenciados para um amplo público, incluindo a “família
olímpica”, espectadores dos jogos e a população local. Em geral, um órgão especí-
fico é criado para gerenciar o sistema de transporte de um evento esportivo com o
propósito de prover serviços de transportes para vários públicos, incluindo VIPs (T1,
T2 e T3), atletas e membros das comissões esportivas (T4), imprensa (T4), árbitros
(T4), funcionários e voluntários (T5), além de espectadores (T5). Para o público T4
são estabelecidas rotas especiais de ônibus fretados com horários preestabelecidos.
Os passageiros T5 fazem uso da rede de transporte público, eventualmente com-
plementada por uma rede de ônibus especiais. Os passageiros VIPs são servidos por
uma frota especial de limusines e/ou táxis. Os VIPs consistem em membros do Comitê
Olímpico Internacional (COI) (T1), chefes das Federações Esportivas Internacionais (IFs,
em inglês), chefes dos Comitês Olímpicos Nacionais (CON) (T1 ou T2, dependendo
do tamanho do Comitê), assim como patrocinadores, convidados do COI, IFs, CON
e do país-sede (T3). Transportes para T1 e T2 são efetuados em carros exclusivos com
motorista dedicado para um (T1) ou dois (T2) passageiro(s) (MINIS, ANGELOPOULOS
et al., 2009).
Do ponto de vista de infraestrutura, “faixas especiais” exclusivas são geralmente
empregadas para o deslocamento da família olímpica. Em Londres, por exemplo, cem

83
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

quilômetros de faixas especiais foram introduzidas. Apesar de não restringirem o trans-


porte público, elas têm impacto no deslocamento da população durante a fase de prepa-
ração para os eventos em que grandes obras são realizadas. O uso das “faixas especiais”
é feito a partir de serviços de táxi e limusine estabelecidos para a conveniência da família
olímpica. Em Atenas (2004), uma frota com mais de 600 veículos proviam um serviço
de transporte durante 24 horas durante um período de 15 dias para cerca de 3.500 VIPs
(MINIS et al., 2009).
A fim de se beneficiar dos legados de transportes provenientes desses megaeventos,
muitos destinos passam longos períodos anteriores aos jogos tendo de conviver com
o fechamento de ruas e estações com o objetivo de que obras sejam conduzidas. Em
Sidney, por exemplo, a população local teve sua rotina sistematicamente interrompida
por causa da construção de infraestrutura de transporte dentro da cidade. Ademais,
nos dias precedentes aos jogos, os horários dos transportes públicos foram alterados
e o acesso a determinadas vias, interditado. No entanto, os benefícios providos
representaram uma reviravolta significativa e duradoura nos serviços de transporte
de Sidney. Antes das Olimpíadas, o sistema de transporte público era conhecido por
ser pouco confiável, com constantes atrasos e alto grau de insegurança. Durante os
jogos, no entanto, o sistema de transporte funcionou melhor do que nunca, uma vez
que comportou bem a movimentação de passageiros, mesmo nos horários de pico,
já que se incentivou a utilização de trens e ônibus entre o aeroporto e a cidade, bem
como entre as instalações desportivas (HENSHER e BREWER, 2002). Além disso, os
tempos de viagem foram significativamente diminuídos em função da diminuição do
uso de automóveis particulares durante os jogos. Essa diminuição do uso de carros
particulares também foi evidenciada em Atlanta 1996 (FRIMAN et al., 2001), Atenas
2004 e Pequim 2008.
Semelhante a Sidney, Pequim usou os Jogos Olímpicos como uma oportunidade
para investir na infraestrutura de transporte público que era relativamente precária. Em
preparação para os Jogos Olímpicos de 2008, Pequim investiu na melhoria dos sistemas
de metrô, ferrovias e infraestrutura aeroportuária. Os investimentos de transporte público
de Pequim, no entanto, não se restringiram apenas às necessidades dos jogos, já que a
cidade sofre com constantes pressões em termos de crescimento populacional. Da mes-
ma forma, Atenas atualizou e ampliou seu sistema de transporte público, investindo em
programas de modernização, bem como no desenvolvimento de uma ligação ferroviária
entre o aeroporto e o centro da cidade. No entanto, apesar de sua rede de transportes
moderna, o caos apresentado no trânsito na capital grega retornou aos níveis anteriores
às Olimpíadas alguns meses após a conclusão do evento. Assim, ainda que incentivos ou
restrições possam mudar o hábito de viagem da população durante o período dos Jogos,
isso não significa que tais mudanças serão duradouras. Os exemplos de Pequim e Atenas
sugerem que os investimentos em infraestrutura de transportes requerem uma abordagem
mais integrada com a política de longo prazo de renovação urbana e de planejamento,
a fim de justificar os enormes investimentos efetuados.
84
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

3.6. INTERCONECTANDO A GESTÃO DE TRANSPORTE E TURISMO:


CASO ABU DHABI
Na década de 1950, Abu Dhabi era habitada por nômades, pescadores e mergu-
lhadores em busca de pérolas. Quando as primeiras reservas de petróleo foram des-
cobertas, no início dos anos 1960, um número crescente de trabalhadores expatriados
de Bahrein e Kuwait se mudaram para lá (BUTT, 2001). Junto com a sua independência
conquistada do Reino Unido, em 1971, a produção de petróleo foi o ponto de partida
para o aumento da população e da riqueza em Abu Dhabi (KAZIM, 2007). Atualmente,
Abu Dhabi produz cerca de 3,5 milhões de barris de petróleo por dia e exportações no
valor de mais de 260 bilhões de dólares por ano (DAVIDSON, 2009). Como tal, a capital
dos Emirados Árabes Unidos (EAU) produz cerca de 90% da produção total de petróleo
do país e possui 7,4% dos recursos mundiais comprovados de petróleo (LUOMI, 2009).
Mesmo com uma alta taxa de produção de petróleo, essas reservas estão estimadas para
durar pelo menos mais 90 anos (DAVIDSON, 2009).
Outro pilar da economia de Abu Dhabi são os investimentos internacionais. Por
mais de 40 anos, parte das receitas do petróleo tem sido injetada em investimentos in-
ternacionais de longo prazo pelas empresas estatais. A maior organização, a Abu Dhabi
Investments Authority (ADIA), atingiu cerca de US$360 bilhões em ativos no exterior,
em 2005, e quase US$900 bilhões, em 2008 (DAVIDSON, 2009; RAWI, 2009). A Abu
Dhabi National Oil Company (ADNOC), que detém uma participação de controle nas
diversas concessões da indústria do petróleo, juntamente com a ADIA são os principais
investidores da economia de Abu Dhabi, responsáveis por inúmeros novos projetos de
desenvolvimento (ANDELSON, 2000).
Semelhante a Dubai, na década de 1990, Abu Dhabi prioriza cada vez mais a diver-
sificação de sua economia para além do setor petrolífero, incluindo indústrias de alta
tecnologia e programas de energia renovável, projetos imobiliários e a introdução do
turismo cultural (SHARPLEY, 2002; LUOMI, 2009). Essa estratégia consta entre os objetivos
do Plano Abu Dhabi 2030, que foi publicado em setembro de 2007. O Plano Abu Dhabi
2030 é um plano de estruturação urbana que identifica todas as ideias, temas e orienta-
ções a fim de prover uma visão objetiva para o desenvolvimento cultural e ambiental de
Abu Dhabi. Como tal, esse plano inclui seis direções fundamentais: a sustentabilidade,
meio ambiente único, uma cultura em estado de evolução, identidade e oportunidades,
excelência em moradia e conectividade (ABU DHABI PLANNING COUNCIL, 2007).
Do ponto de vista do desenvolvimento do turismo, o Plano Abu Dhabi 2030 foca no
desenvolvimento sustentável de nichos turísticos, em vez de uma rápida diversificação
que se mostrou problemática como no caso de Dubai (ABU DHABI PLANNING COUN-
CIL, 2007; DAVIDSON, 2007). Assim, o Escritório da Marca Abu Dhabi (OBAD), como
parte da Autoridade Turística de Abu Dhabi (ADTA), em conjunto com a Empresa de Inves-
timento em Desenvolvimento Turístico (TDIC) coloca particular ênfase no turismo cultural
de alto luxo como alternativa ao turismo de sol e de compras, além da promoção de
85
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

eventos, sobretudo os de caráter esportivo. Em particular, prioriza-se o desenvolvimento


de um destino turístico de classe mundial, oferecendo-se uma ampla gama de produtos
turísticos (ADTA, 2011). Dentre algumas das atrações turísticas e eventos encontram-se o
parque temático da Ferrari e a corrida de Fórmula 1, a Grande Mesquita Sheik Zayed (ver
Figura 3.4), filiais dos museus Louvre e Guggeinheim, o museu marítimo, dentre outros.

Figura 3.4 — Exterior e átrio da Grande Mesquita Sheik Zayed, Abu Dhabi, março de
2010 (Foto cortesia: Guilherme Lohmann)

Além do crescimento sustentável do turismo, o Plano Abu Dhabi 2030 põe grande
ênfase no desenvolvimento da infraestrutura de transporte e na redução da emissão de
carbono (LUOMI, 2009; REICHE, 2010). Esses objetivos de longo prazo são essenciais
e têm implicações significativas na infraestrutura de transporte existente e naquela que
precisa ser desenvolvida no futuro (MEZHER, TABBARA et al., 2010).
O transporte aéreo
Usando o aeroporto internacional de Abu Dhabi como hub, a companhia aérea
nacional dos Emirados Árabes Unidos, a Etihad Airways, é, desde 2003, por ocasião
da sua criação, a companhia aérea que mais cresce na história da aviação comercial
(ETIHAD AIRWAYS, 2011). Em 2010, Etihad Airways ligava Abu Dhabi a 66 destinos
internacionais, com uma frota de 57 aeronaves, operando cerca de mil voos por semana
(ETIHAD AIRWAYS, 2011). Embora seja a segunda maior transportadora dos Emirados
Árabes Unidos, atrás da Emirates Airline, a Etihad Airways colocou a maior encomenda
86
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

individual da história da aviação civil no Salão de Farnborough International Air em 2008,


com um total de mais de 200 novas aeronaves e um investimento de US$43 bilhões em
dez anos (DAVIDSON, 2009).
A necessidade crescente de acomodar aeronaves e voos requer investimentos maciços
na infraestrutura do lado-ar, incluindo dois terminais adicionais no aeroporto de Abu
Dhabi (ABU DHABI AIRPORTS COMPANY, 2011; ETIHAD AIRWAYS, 2011). Com cerca
de sete milhões de passageiros em 2008, os números subiram para quase 11 milhões de
passageiros anuais em 2010 e estima-se que alcance 40 milhões em 2015 (ABU DHABI
AIRPORTS COMPANY, 2011). O segundo aeroporto internacional de Abu Dhabi é o Al
Ain, que está localizado 18 km a noroeste da cidade de mesmo nome. Em 2010, sete
companhias aéreas estavam em operação, servindo até mil passageiros por hora. Além
disso, o aeroporto de Al Ain comportará um cluster aeronáutico que tem como objetivo
ser um centro de excelência em tecnologia e inovação. Finalmente, o aeroporto executivo
Al Bateen, uma antiga base aérea militar, foi reconstruído para acomodar até 50 jatos
particulares (ABU DHABI AIRPORTS COMPANY, 2011).
Turismo de cruzeiros
Com a crescente demanda internacional pelo turismo de cruzeiros, a ADTA iden-
tificou esse segmento como um dos setores-chave da sua estratégia de turismo (AD-
TA, 2009; 2010). Até 2013, um novo terminal de cruzeiros está previsto para ser inau-
gurado no porto Mina Zayed (ASHCROFT, 2011; GHOSH, 2011). Com mais de 175.000
visitantes de cruzeiro na temporada 2009/10, a ADTA estimou em mais de 235.000
o número de visitantes na temporada 2010/11 devido à cooperação com a empresa
italiana de cruzeiros MSC, que é a primeira a utilizar Abu Dhabi como homeport (MSC
CRUISES, 2010; ASHCROFT, 2011).
Mobilidade rodoviária em Abu Dhabi e com o restante dos Emirados Árabes Unidos
Com o crescente número de moradores e turistas nas três grandes cidades dos Emira-
dos Árabes Unidos (Dubai, Abu Dhabi e Sharjah), a mobilidade urbana e regional é uma
preocupação crescente, principalmente pela carência de sistemas de transportes públicos
e a alta dependência do uso de carros no país (FENTON, 2009). Assim, congestionamentos
de tráfego, bem como a elevada poluição sonora e do ar em Dubai e Abu Dhabi são
comuns (DAVIDSON, 2009). Autoestradas modernas resultam do rápido desenvolvimento
da infraestrutura, que inclui conexões especialmente a partir de Abu Dhabi para Dubai
e para Al Ain (SHARPLEY, 2002).
Após o lançamento do Plano Abu Dhabi 2030 e do Plano Diretor de Transporte de
Superfície (SMTP), uma rede de bondes será agregada ao sistema de transportes públicos
de Abu Dhabi até 2015, seguido por um sistema de metrô e serviço de trem regional a
ser desenvolvido até 2020 (ABU DHABI PLANNING COUNCIL, 2007; DEPARTMENT
OF TRANSPORT, 2008). Os objetivos específicos do plano diretor também incluem a
melhoria das estradas, ampliação do acesso ao porto e ao aeroporto, ônibus adicionais
e paradas de ônibus com ar-condicionado, além de restrições de táxis nas áreas centrais
87
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

(FENTON, 2009; WRIGHT, 2011). Por questões de segurança e barreira linguística, a


maioria dos turistas faz uso principalmente de táxis ou serviços de limusine.
Além do desenvolvimento de infraestrutura do sistema de transporte, uma estratégia
adicional é aumentar a participação de emiratenses que trabalham no setor de serviço.
Atualmente, Abu Dhabi experimenta grandes lacunas no desenvolvimento de recursos
humanos, com o setor de serviços sendo prestado predominantemente por funcionários
com baixa instrução e treinamento, muitos dos quais imigrantes de países em desenvol-
vimento (PARSA, KEIVANI et al., 2002; LUOMI, 2009; PECH, 2009). Em 2005, o quadro
era de 9,3% de emiratenses e 90,7% de trabalhadores expatriados (PECH, 2009). Parti-
cularmente na indústria do turismo de Abu Dhabi, a participação atual de emiratenses na
mão de obra é de apenas 1% e deve ser aumentada para 5% até 2012 (ADTA, 2011). O
aumento da participação da mão de obra local, notadamente nos serviços de táxi, visa
melhorar o nível de prestação de serviços, bem como a fluência no inglês e no árabe.

3.7. CONCLUSÕES
O cruzamento de aspectos teóricos das áreas de planejamento de transportes e de tu-
rismo realizado no início deste capítulo possibilitou a criação de um suporte metodológico
(ver Quadro 3.3) para realizar uma reflexão sobre a condução integrada do processo de
planejamento e gestão dos transportes e dos destinos turísticos. As políticas públicas são o
fio condutor para o planejamento e para a gestão. Nesse sentido, a pesquisadora Daniela
Caruza Gonçalves Ferreira fez uma contribuição para que estudantes, planejadores e
gestores de turismo e transportes busquem soluções para os variados problemas práticos
e teóricos sobre o temática no país.
A partir dos temas discutidos nas Seções 3.2 e 3.3 deste capítulo ficou evidente que
planejar e gerir os transportes turísticos exige esforços para garantir a sustentabilidade. Assim,
a análise realizada sobre o papel do aluguel de bicicletas (Vélib) e carros (Autolib) para o
desenvolvimento sustentável de destinos turísticos consagrados, como em Paris, é uma forma
de demonstrar como ações práticas estão sendo desenvolvidas ao redor do mundo (Seção
3.4). Os navios de cruzeiros, tema também abordado na Seção 3.4, destacou a importância
de se atuar de maneira equilibrada com as dimensões da sustentabilidade (ambiental, social,
cultural, econômica). Dessa forma, ficou evidente que a parceria entre as operadoras de
navios de cruzeiros, com os diversos atores dos destinos turísticos visitados, pode ajudar na
divisão de bônus e ônus, equilibrando a balança do desenvolvimento sustentável.
Um tema emergente se relaciona a como prover transportes para estruturas temporá-
rias, como por exemplo os megaeventos. Planejar e gerir eventos que envolvam o acesso
e a circulação de um número grande de pessoas ao mesmo tempo é um desafio que
também exige a aplicação dos princípios da sustentabilidade. Tanto o mapeamento do tipo
de público (T1, T2, T3, T4 e T5, ver Seção 3.5) que circulará durante a realização do
megaevento, quanto a identificação entre os pontos de “origem” e “destino” dos des-
locamentos, são elementos-chave para se planejar e gerir com sucesso as relações entre
88
 Capítulo 3 [Planejamento e gestão dos transportes e destinos turísticos]

transportes e destinos turísticos que sediarão megaeventos. Nesse sentido, quanto mais in-
tegrada estiver a visão sobre sustentabilidade entre os destinos turísticos com as empresas
de transportes, mais fácil será alcançar o sucesso. Com o objetivo de ilustrar como isso
pode ocorrer na prática, na Seção 3.6 foi analisada a busca pela sustentabilidade a partir
da análise sobre a evolução do turismo e o investimento em transportes em Abu Dhabi.
O próximo capítulo complementa o que foi apresentado aqui abordando as noções
de marketing aplicadas aos transportes e destinos turísticos. Se bem planejado e gerido, o
marketing pode se tornar uma ferramenta poderosa para manutenção da sustentabilidade
dos destinos turísticos e das empresas de transportes.

QUESTÕES
1. Elabore um resumo comparativo entre os processos de planejamento de transportes
e do turismo.
2. A partir de um exemplo prático entre transportes e destinos turísticos, responda: qual
é a etapa do Ciclo de Transportes do atual estágio de desenvolvimento da relação
entre transportes e turismo? Justifique sua resposta.
3. Pense na sua cidade e faça uma análise sobre os principais Polos Geradores de Viagens
(PGVs) de natureza turística e seus impactos na rede de transportes.
4. De que maneira os transportes devem ser planejados para o atendimento da demanda
exacerbada durante os megaeventos?
5. Elabore um texto dissertativo contendo os seguintes conceitos: “transportes”; “des-
tinos turísticos” e “sustentabilidade”. Argumente sobre os aspectos teóricos e dê um
exemplo prático da convergência desses três elementos.
6. Comente algum aspecto das políticas públicas abordados neste capítulo que seja es-
sencial para o planejamento e a gestão integrados de transportes e destinos turísticos
no Brasil.

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95
CAPÍTULO 4
Marketing dos Transportes
e Destinos Turísticos

Guilherme Lohmann, Rafael Castro e Flávio Valente1

CONCEITOS APRESENTADOS NESTE CAPÍTULO


Este capítulo discute o marketing dos transportes do ponto de vista das quatro carac-
terísticas inerentes aos serviços – intangibilidade, inseparabilidade, variabilidade e
perecibilidade – em relação aos quatro componentes principais e tradicionais do mix
de marketing – produto, preço, promoção e praça. Além disso, tal discussão se faz
tendo em vista a influência mútua existente entre empresas de transportes e os destinos
turísticos, com apresentação de alguns exemplos práticos onde isso ocorre.

4.1. INTRODUÇÃO
A sinergia existente entre destinos turísticos e empresas de transportes é enorme, uma
vez que ambos dependem da persuasão de potenciais consumidores para que viagens
sejam efetivamente realizadas. Dessa forma, estratégias bem-sucedidas de marketing,
incluindo produtos, promoção, distribuição e preço, produzem benefícios mútuos, quer
para destinos turísticos, quer para os operadores de transportes. Um exemplo são as
empresas de cruzeiros promovendo um roteiro de Réveillon pelo Nordeste brasileiro,
o que indiretamente beneficia os destinos turísticos incluídos em seus roteiros. Outro
exemplo são empresas aéreas oferecendo descontos promocionais em baixa temporada
para determinadas localidades, divulgando esses destinos quer em seus próprios sites,
quer na mídia ou junto a outros canais de distribuição. Da mesma forma, campanhas de
marketing realizadas pela Embratur na Europa resultarão em benefícios para empresas
de transportes operando entre o Brasil e o “Velho Continente”.

Doutorando na School of Tourism and Hospitality Management (STHM), Southern Cross University (SCU),
1

Austrália.
97
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

A existência (ou não) de estratégias de marketing, tanto por parte das empresas de
transportes quanto das organizações de turismo, tem sido fator fundamental para o sucesso
(ou fracasso) de muitos destinos turísticos em diversas partes do mundo. Os exemplos
de Cingapura e Dubai citados no Capítulo 1 evidenciam isso. Daí, um indesejável des-
compasso entre as necessidades dos viajantes e a adequada oferta de serviços de trans-
portes pode afetar os destinos turísticos de forma considerável. Isso ficou evidenciado no
exemplo da crise aérea brasileira entre 2006-7 previamente abordado nesta obra. Por essa
razão, este capítulo não pretende fazer uma análise isolada do marketing dos transportes,
visando tão somente o desempenho das empresas transportadoras; mas sim discutindo o
marketing dos transportes no contexto mais amplo de sua influência na atividade turística,
especialmente, nos destinos turísticos.
Para tal, a abordagem empregada neste capítulo está balizada sob dois enfoques.
Em primeiro lugar, o transporte de turistas é posicionado dentro do setor de serviços,
examinando algumas características inerentes a estes, tais como: intangibilidade, insepa­
rabilidade, variabilidade e perecibilidade. Num segundo momento, explora-se de forma
prática como essas características são influenciadas pelos componentes do mix de
margeting: produto, preço, promoção e praça.

4.2. MARKETING DE SERVIÇOS E TRANSPORTES


Assim como as demais empresas do setor de turismo, as empresas de transportes
trabalham, predominantemente, com a prestação de serviços. Diferenciar produto de
serviço não é uma tarefa fácil, já que os transportes e o turismo requerem produtos físicos
a partir dos quais são oferecidos seus serviços. No entanto, define-se aqui neste capítulo
serviço como sendo a atividade (ação, processo ou atuação), essencialmente intangível,
que uma empresa oferece a um consumidor e que não resulte na propriedade/posse
de nenhum bem (LOVELOCK, 2001; GRONROS, 2003; KOTLER, BOWEN et al., 2003;
KOTLER e KELER, 2006).
Page (2001) esclarece que esse processo de prestação de serviços de transportes é
composto por algumas etapas que devem ser cumpridas até que se chegue ao serviço final.
O processo se inicia pelo entendimento das necessidades dos consumidores, principalmente
em relação aos benefícios do serviço que lhes são oferecidos. É uma etapa na qual a deman-
da pelos serviços de transportes turísticos é conhecida em detalhes por meio de informações
que são coletadas por pesquisas de marketing. De posse das informações sobre o cliente,
o prestador de serviço analisa as necessidades e exigências dos consumidores, o segmento
específico a ser atingido pelo seu serviço e a imagem que está associada a ele. O item
sobre planejamento de itinerários de cruzeiros marítimos no Capítulo 6 exemplifica isso.
Caracterizar os transportes turísticos como parte integrante do marketing de servi-
ços implica no entendimento de particularidades em sua gestão, tais como as quatro
características inerentes aos serviços e dos seus respectivos desafios e oportunidades
que representam, descritos a seguir.

98
 Capítulo 4 [Marketing dos Transportes e Destinos Turísticos]

4.2.1. Intangibilidade
Os serviços são intangíveis porque, geralmente, não podem ser efetivamente testados
antes de serem adquiridos. Nos serviços de transportes, o viajante, por exemplo, só poderá
comprovar que chegou com segurança e no horário previsto após a realização de uma
viagem, independentemente do número de viagens semelhantes que já tenha feito previa-
mente. Adicionalmente, quando o turista adquire uma passagem de trem, avião ou ônibus
ele está, basicamente, adquirindo um direito de uso temporário de uma poltrona ou
cabine, durante certo percurso, nas condições preestabelecidas; e só irá gozar desse direito
transitório durante a prestação do serviço. Apesar disso, há obviamente aspectos com os
quais viajantes frequentes podem estar familiarizados, tais como o serviço de bordo de
uma companhia aérea, o tipo de entretenimento oferecido e o conforto das poltronas.
Devido a intangibilidade dos serviços, os operadores de transportes e as organizações
de destinos turísticos podem oferecer alguns elementos para “tangibilizar” seus serviços.
Para tal fazem uso de folders e mídias impressas ou digitais a fim de ilustrar os padrões de
serviços a serem ofertados. Em alguns casos, empresas de transportes oferecem produtos
tangíveis como parte do seu serviço, incluindo, por exemplo, os famosos pijamas da
Qantas na classe executiva e na primeira classe, ou o oferecimento, por parte da Virgin
Australia, de tablets para o entretenimento a bordo. Em alguns casos, uma importância
desproporcional é dada a essas amenidades, como o caso de um casal em Los Angeles
que, viajando para Melbourne na primeira classe, se retirou do avião e não viajou quando
foram informados que a empresa aérea não tinha mais pijamas. Tais amenidades, visam:
1. Dar ao viajante uma “sensação de posse” e tangibilidade do serviço de transporte.
2. Oferecer “surpresas agradáveis”, excedendo expectativas dos passageiros.
3. Reforçar a marca da empresa, pois o passageiro poderá levar consigo algumas dessas
amenidades e, ao se deparar posteriormente com as mesmas, lembra da experiência
do serviço da empresa.
Dessa forma, percebe-se que, apesar de aspectos da intangibilidade dos serviços de
transportes, uma série de produtos tangíveis fazem parte da experiência de viajar, ou
melhor, da própria experiência turística como um todo.

4.2.2. Inseparabilidade
A inseparabilidade dos serviços se refere ao fato de eles serem consumidos e produ-
zidos ao mesmo tempo. Os serviços de transporte e de turismo dependem da presença
física do viajante e são prestados simultaneamente à sua experimentação. Por isso, pode-se
afirmar que a produção e o consumo do transporte e do turismo são inseparáveis.
A inseparabilidade representa desafios para os operadores de transportes e para os
destinos turísticos, pois não é tarefa simples manter alta qualidade da experiência turística
durante todo o processo de prestação do serviço, ainda mais num setor que envolve uma

99
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

série de empresas e organizações de turismo e que depende largamente de mão de obra


nem sempre altamente qualificada. Falta de treinamento, stress e outras situações externas
podem gerar improviso que é geralmente percebível e, na maioria das vezes, inaceitável.
Na inter-relação entre transportes e destinos turísticos, serviços de táxi são um exemplo
em que podem ocorrer inúmeras situações indesejáveis. Em muitos casos, sobretudo em
aeroportos, o contato com taxistas é o primeiro que o turista tem com um novo destino
turístico e diferenças de idiomas, moedas ou mesmo o cansaço e a falta de conhecimento
do destino podem fazer o turista internacional ter uma primeira impressão negativa
do local a ser visitado. Por conta disso, destinos como Londres e Cingapura efetuam
treinamento com seus taxistas a fim de que estes possam oferecer alto nível de serviço
(veja quadro a seguir). No Brasil, o programa Taxista Nota 10 focou na qualificação e na
certificação desse serviço com vistas à Copa do Mundo de Futebol de 2014 (ver também
seção sobre megaeventos, no Capítulo 3).

TREINAMENTO DE TAXISTAS EM LONDRES


Londres exige de seus taxistas um dos mais rigorosos e criteriosos sistemas de trei-
namento em todo o mundo. Antes mesmo de se inscreverem nos cursos preparatórios,
que têm duração mínima de dois anos, os futuros candidatos devem atender a alguns
pré-requisitos, tais como idade mínima de 21 anos, não possuir antecedentes criminais
e ter boa saúde física e mental. As provas de conhecimento são efetuadas quando o
candidato encontra-se preparado para responder às provas escritas, cujo conhecimento
prévio consiste em mais de 400 rotas da cidade, incluindo seus pontos de interesse,
tais como hotéis, restaurantes, museus, parques, discotecas, cinemas, teatros, estátuas,
monumentos, terminais de transportes, órgãos governamentais, hospitais, delegacias
de polícia, cemitérios, etc. Elas compreendem aproximadamente 25 mil ruas diferentes,
fazendo com que muitos considerem o conhecimento adquirido nesses estudos iguais
aos de um curso de graduação. Sem ter conhecimento do “The Knowledge”, a licença
não é concedida, mesmo em tempos em que praticamente todos os táxis disponham de
dispositivos de GPS. Após ser aprovado na prova escrita, o candidato é submetido a uma
entrevista. A terceira etapa inclui o conhecimento de outras cem rotas pertencentes aos
subúrbios de Londres, além de um teste prático de direção. Neste, o candidato é avaliado
tanto por sua habilidade em conduzir o veículo de forma segura, quanto em sua atitude
em situações como ajudar um deficiente físico a entrar e sair do automóvel.
Thompson e Schofield (2007) discutem a importante relação entre a performance dos
serviços de transportes e a satisfação do turista com o destino visitado. Eles analisaram a
percepção do transporte público de Manchester, Inglaterra, com a satisfação desse des-
tino entre turistas internacionais. Em seu estudo, esses autores puderam correlacionar
três fatores de transportes com a satisfação do destino: facilidade de uso dos transportes
públicos (incluindo obtenção de informações, facilidade de compra de bilhetes e se os
funcionários são prestativos), eficiência e segurança (incluindo rapidez, pontualidade e
segurança) e estacionamento (segurança e disponibilidade de vagas).
100
 Capítulo 4 [Marketing dos Transportes e Destinos Turísticos]

4.2.3. Variabilidade
Este conceito é altamente relacionado ao anterior, uma vez que, como visto, a
qualidade do serviço de transporte e turismo pode variar significativamente em função
do grau de treinamento dos funcionários que prestam o serviço, bem como de fatores
intrínsecos (ex. personalidade) e extrínsecos (ex. clima/temperatura). Os serviços variam
na qualidade ou no modo como são prestados, pois dependem muito de quem os pres-
tam e das percepções de quem recebe o serviço nas condições em que são prestados.
Ademais, o turismo é caracterizado por alta rotação de pessoal, o que gera inconsis-
tências no nível de prestação dos serviços. Diferentemente de produtos que podem
passar por criteriosos controles de qualidade, o mesmo não acontece na prestação de
serviços.
A fim de minimizar os efeitos da variabilidade, a que todo prestador de serviço está
sujeito, além das técnicas mencionadas na inseparabilidade, são necessárias, por exem-
plo, técnicas de planejamento detalhado para cada etapa da execução dos serviços
por meio da criação de procedimentos padrões mínimos, que incluam ações corretivas
(pré-elaboradas) para as possíveis falhas (gaps) e/ou imprevistos. Tais procedimentos,
por sua vez, servem de suporte para treinamentos constantes e, ao mesmo tempo, de
critérios para medir o desempenho dos prestadores de serviço, principalmente, daqueles
diretamente envolvidos no contato imediato com os viajantes. Exemplo prático disso
é empregado pela empresa de cruzeiros Carnival, que incentiva seus funcionários a
cumprimentarem os hóspedes com um sorriso. Para tal, ao entrarem nas áreas públicas
dos seus navios, há um espelho com os dizeres “share a smile”. Obviamente que um
funcionário que não tenha um perfil “de hospitalidade” achará isso muito difícil e não
deveria nem estar trabalhando com turismo.

A HORA DA VERDADE: CLÁSSICO SOBRE LIDERANÇA ESCRITO


POR JAN CARLZON
Lançado originalmente nos anos 1980, “A Hora da Verdade” é um clássico da adminis-
tração e um dos mais importantes livros de negócios de todos os tempos. Ele apresenta
o relato da extraordinária experiência de Jan Carlzon, então presidente executivo da
companhia de aviação escandinava SAS, que criou um modelo inédito de administração,
mudando os rumos da gestão empresarial e revolucionando o conceito de liderança.
Carlzon inverteu a tradicional pirâmide hierárquica e delegou poder a todas as pessoas
na linha de frente do atendimento. Assim, conseguiu superar uma das maiores crises da
história da SAS, conquistando o prêmio Empresa Aérea do Ano, em 1983.
O que o autor chamou de “a hora da verdade” é o momento em que o cliente entra
em contato com o pessoal da linha de frente: é nessas ocasiões que ele forma sua imagem
da empresa e é essa experiência que o faz voltar ou não a procurar seus serviços.
Com seu estilo acessível e contando boas histórias, Carlzon apresenta em detalhes
sua ousada abordagem, posteriormente copiada por inúmeras empresas, para prosperar
101
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

numa economia voltada aos clientes: como definir uma estratégia, como estruturar uma
organização para que as necessidades dos clientes tenham prioridade, como motivar e
se comunicar com a equipe da linha de frente.

4.2.4. Perecibilidade
Os serviços de transporte e a maioria dos serviços oferecidos pelos destinos turísticos
não podem ser estocados e aproveitados para consumo posterior. O serviço é altamente
perecível, e um assento ou cabine não ocupados por um passageiro naquela determinada
viagem jamais poderá ser vendido novamente. Por essa razão, os lugares vazios representam
uma preocupação constante para as empresas de transportes e muitos prestadores de serviço
nos destinos turísticos (acomodações, atrações turísticas e restaurantes). Esse problema
pode ser minimizado se forem utilizadas algumas ferramentas de marketing, tais como,
promoções ou o Yield Management (Gerenciamento de Receitas), que será detalhado na
Seção 4.3.2. Isso é particularmente evidente em localidades onde há grande sazonalidade.
Na capital da Nova Zelândia, Wellington, assim como em alguns destinos urbanos
onde predomina a viagem a negócios, o fluxo de visitantes é mais intenso durante os dias
da semana, com os hotéis e voos apresentando menores taxas de ocupação nos finais
de semana. Dessa forma, o departamento municipal de turismo lançou, em 1996, uma
campanha intitulada Send Yourself to Wellington. Nesse época a principal atração turística
da cidade, o museu Te Papa, estava prestes a ser inaugurado e havia grande interesse que
este recebesse um número grande de turistas a lazer. Para tal, hotéis, a Air New Zealand,
eventos e atrações turísticas se organizaram para oferecer pacotes com tarifas mais aces-
síveis, exclusivas para os finais de semana, que eram comprados via internet ou telefone,
fora das agências de viagem para manter um custo mais baixo. Como resultado, a taxa
de ocupação dos hotéis nos finais de semana subiram de 59,6%, em 1996, para 66,2%,
em 2000 (POSITIVELY WELLINGTON TOURISM, 2013).
Do ponto de vista das empresas aéreas, outra forma de minimizar os impactos da
perecibilidade é através do uso de overbooking, que é uma prática mundial entre as em-
presas aéreas e considerada por muitos como um “mal” necessário. Como há sempre um
risco de os passageiros cancelarem suas reservas ou mesmo de não aparecerem para em-
barcar (no-show), é importante que as empresas conheçam o histórico de cancelamentos
e no-shows, para que possam acomodar mais clientes no seu sistema de reservas do que
a capacidade oferecida. Dessa forma, as empresas tentam diminuir os impactos da pere-
cibilidade de seus serviços. Embora muitas vezes criticado, já que em algumas situações
haverá passageiros que não poderão embarcar, o overbooking permite que potenciais
passageiros não sejam tão facilmente descartados, possibilitando, assim, benefício tanto
para a empresa de transportes quanto para os passageiros. Entretanto, quando a média
histórica de cancelamento e desistências não se confirmam, as empresas devem oferecer
compensações aos passageiros prejudicados, como, por exemplo, pagamento em dinheiro
para que passageiros voluntariamente desistam da viagem, além das multas previstas pela
legislação em alguns países como no Brasil.
102
 Capítulo 4 [Marketing dos Transportes e Destinos Turísticos]

4.3. MIX DE MARKETING


O mix de marketing representa o grupo de variáveis controláveis de marketing que a
empresa de transportes e destinos turísticos utilizam para produzir a resposta desejada
no mercado (para mais detalhes, ver Seção 5.4). O desafio do marketing é se valer das
quatro características inerentes aos serviços (intangibilidade, inseparabilidade, variabili-
dade e perecibilidade), descritas anteriormente, e, em função dessas características, criar
diferenciações competitivas por intermédio dos quatro elementos tradicionais do mix de
marketing: produto, preço, promoção e canais de distribuição (praça).

4.3.1. Produto
Produto é o conjunto de serviços de transportes ofertados que sofrerá as ações do mar-
keting. Nos transportes pode-se considerar como elementos constituintes deste conjunto
de serviços (ver a discussão sobre serviços e produtos de transportes na Seção 4.2.1): os
variados tipos de veículos com seus respectivos atributos, características e benefícios (força
motriz, modernidade, velocidade, conforto, tecnologia e segurança); as vias de transporte
(natural ou artificial); os terminais (facilidade de acesso, conforto e interligação modal);
além de frequência/horários (convenientes e pontuais) e também garantias e serviços
especiais oferecidos a bordo. A variedade e complexidade nas quais esses elementos
podem ser arranjados fazem com que o trabalho de marketing do produto das empresas
transportadoras seja bastante desafiador.
Em termos de controle do produto, ainda que alguns elementos sejam de total res-
ponsabilidade das empresas de transportes, como por exemplo a frota que utiliza,
em muitos outros não há como garantir um controle do produto, como é o caso das
vias utilizadas no deslocamento ou nos terminais de transportes. Uma forma de suprir
carências de serviços nos terminais de transportes e estender a qualidade dos serviços
de transportes nos terminais é a existência das salas VIPs, que se fazem presente tanto
nos aeroportos, mas também em algumas rodoviárias das grandes cidades brasileiras.
Nelas serviços complementares, como poltronas especiais, revistas e jornais, refeições e
bebidas, podem ser oferecidos.

4.3.2. Preço
Precificar significa a agregação de um valor monetário ao serviço de transporte que
está sendo posto à venda no mercado. Nos transportes esse valor monetário a ser co-
brado é representado pelas tarifas praticadas, taxas, impostos, regras tarifárias, descontos,
concessões, prazo, condições de financiamento, reembolsos e forma de pagamento
das passagens e de eventuais serviços complementares (seguros, acesso a salas VIPs
e bagagens adicionais). A definição de um valor monetário a ser cobrado pelo serviço de
transporte constitui tarefa complexa para uma empresa de transporte e está relacionada
a múltiplos fatores controláveis e incontroláveis pela empresa de transporte. Dentre os
fatores incontroláveis estão relacionados a seguir:
103
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

a. Á demanda: nível socioeconômico e hábitos de viagem.


b. Ao ambiente econômico: câmbio, juros, legislaçãoe custo do combustível.
c. À infraestrutura: das vias, dos terminais e dos destinos.
d. À concorrência direta: outras empresas e a sazonalidade.
A fim de lidar com as oscilações entre demanda e oferta, as empresas de transportes,
e muitas outras do setor de serviços, fazem uso do yield management (YM), ou geren-
ciamento de receitas, para controlarem os preços tarifários que praticam. Inicialmente
empregado em larga escala pelas empresas aéreas, o YM pode ser definido como uma
técnica de maximização de receitas, com o objetivo de aumentar o lucro líquido, por meio
da alocação prévia da capacidade disponível para os diversos segmentos de mercado, a
um preço ótimo (ver exemplos nos Capítulos 5 e 6). Em outras palavras: “vender o produto
certo, para o consumidor certo, no tempo certo e ao preço certo”.
Uma melhor distribuição da demanda é benéfica tanto para a economia dos passageiros
quanto para um melhor planejamento das empresas de transportes e dos destinos turísticos.
Assim, o YM leva em consideração diversos detalhes de sazonalidade, como, por exemplo, o
momento em que a venda é efetuada de modo a oferecer descontos iniciais a viajantes que
estejam preparados para adquirir passagens: a) com muita ou pouca antecedência; b) entre os
diferentes dias da semana; c) entre os dias da semana e os finais de semana e d) em horários
diferentes, dias e horários de pico podem ser desestimulados por meio de tarifas mais altas,
enquanto dias e horários mais ociosos podem ser estimulados com tarifas atraentes.
Na alta temporada o objetivo é maximizar as receitas por unidade vendida, enquanto
na baixa estação a meta é maximizar o porcentual de ocupação com preços mais
baixos, a fim de se obter alguma receita. Turistas mais frequentes sabem que programar
as viagens de férias, com antecedência e para os períodos de baixa estação, apresenta
grandes oportunidades de descontos. Mas devido à política homogênea de férias es-
colares durante os meses de verão, os efeitos da sazonalidade são ainda um problema
para empresas de transportes e destinos turísticos que devem trabalhar em conjunto no
sentido de maximizar ofertas atraentes aos passageiros em baixa estação.
Entretanto, a fim de que todas essas informações concorram para o sucesso de uma
política de YM, as empresas de transporte precisam fazer uso correto das informações
disponíveis de maneira integrada. Para tanto, é necessário aliar estrategicamente todas as
tecnologias de informação, tais como os sistemas computadorizados de reservas (CRS),
sistema global de distribuição (GDS) e gerenciamento de relacionamento com clientes
(CRM) – ver Figura 4.1.
Conhecer o histórico da demanda, bem como o padrão das reservas efetuadas, faz com
que a empresa de transportes esteja mais bem preparada para propor ou não um determina-
do desconto. Sem um bom conhecimento dessas informações, corre-se o risco de oferecer
um desconto para um passageiro que estaria propenso a pagar mais pelo mesmo serviço,
ou, ao contrário, de não oferecê-lo a um cliente que não pode pagar um preço mais caro, o
104
 Capítulo 4 [Marketing dos Transportes e Destinos Turísticos]

Figura 4.1 — Mapa dos canais de distribuição e as tecnologias utilizadas no transporte


aéreo. (Fonte: VENTURI e LOHMANN, 2006).

que terminaria por não atraí-lo e, em consequência, ter uma menor taxa de ocupação. Por
isso, o investimento em integração estratégica de informações é altamente necessário para
uma empresa de transportes. Hoje em dia, já existem softwares no mercado com custo mais
acessível e que podem ser usados inclusive por pequenas e médias empresas de transportes.

4.3.3. Promoção
A promoção é o conjunto de ações que visa estimular a divulgação e a comercialização
do serviço de transportes no mercado, que incluem as ações de publicidade, propaganda,
promoção de vendas, força de vendas, merchandising, relações públicas, entre outras.
Sabe-se que a concorrência existente nos diversos setores da economia é intensa.
Dentro do setor de transportes essa realidade não é muito diferente, sobretudo tendo em
vista as transformações ocorridas em termos do comportamento do cliente nas últimas
décadas, que vem se tornando cada vez mais exigente e conhecedor dos serviços e
dos seus direitos. As empresas prestadoras de serviços de transportes devem buscar es-
tratégias de promoção a fim de diferenciar sua oferta no mercado para atrair um número
maior de passageiros, diferenciação essa definida por Kotler (2000, p.254) como “o ato de
desenvolver um conjunto de diferenças significativas para distinguir a oferta da empresa
das ofertas de seus concorrentes”. Vale ressaltar que destinos turísticos e empresas de
transportes devem trabalhar de forma sinérgica a fim de criar políticas que incentivem a
atração de visitantes de acordo com a capacidade do local. Há casos em que um número
maior de clientes de transportes pode impactar negativamente o destino que não tenha
infraestrutura adequada para recebê-los.
Ao analisar os esforços de propaganda de empresas de transporte tradicionais até
meados dos anos 1980, o que se percebe claramente é que o foco era vender os destinos
105
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

turísticos. Certamente para que o turista chegasse até lá seria necessário a utilização de
serviços de transportes e, aí sim, a empresa era citada. Não é muito difícil encontrar
diversos exemplos desse fato. Em 1965, a Philippine Airlines lançou a seguinte campanha:
We’re islands specialists, ou “Somos especialistas em ilhas”, em menção aos seus voos
para as ilhas de Hong Kong, Manila, Cingapura, dentre outras. Ainda na década de 1960,
a norte-americana Pan Am iniciou suas operações para o Brasil e colocou em circulação
a campanha intitulada South America: Where cities are CITIES ou “América do Sul: onde
cidades são CIDADES”. A propaganda era em torno da Praia de Copacabana, no Rio
de Janeiro, acompanhado de um texto sobre os principais atrativos turísticos da cidade.
O mesmo acontecia com os outros modos de transportes. A empresa norte-americana de
transporte rodoviário Greyhound trabalhava nos anos 1950 em sua propaganda o seguinte
texto: Only Greyhound reaches all America's choice vacation spots with top convenience
at lowest cost ou “Somente a Greyhound chega a todos os pontos turísticos da América
com mais conveniência e menor custo”.
Após o período de desregulamentação do transporte aéreo e do aumento da concor-
rência entre as empresas, por volta dos anos 1990, o foco das propagandas passou a ser
o produto transporte em si, buscando a diferenciação a partir de argumentos relacionados
ao conforto a bordo, à frota mais moderna, dentre outros atributos. Atualmente há uma
grande concorrência entre as empresas aéreas em relação à idade da sua frota. A brasileira
Gol Linhas Aéreas durante muito tempo utilizou o slogan “A frota mais nova do Brasil”. A
campanha foi interrompida com o início das operações da Azul Linhas Aéreas Brasileiras
com aeronaves 100% novas. As diferentes classes de serviço oferecidas também são alvo
das propagandas atuais, em que as empresas têm se desdobrado para oferecer serviços
cada vez mais únicos e personalizados em suas classes business e first. A Emirates Airlines
inovou quando incluiu em seus Airbus A380 chuveiros que podem ser utilizados pelos
passageiros da primeira classe e utilizou essa comodidade para atrair mais clientes.
Entretanto, há ainda empresas de países pequenos como a própria Emirates, dos
Emirados Árabes, e a Singapore Airlines, da Cingapura, que ainda hoje oferecem grande
identificação com seu destino (ver Capítulo 1). A Hawaiian Airlines, com base no Havaí,
Estados Unidos, é outro caso típico que faz questão de deixar claro as suas origens
havaianas. Um exemplo foi a utilização do slogan Hawaii isn’t just where we’re from.
It's who we are, ou “O Havaí não é somente de onde nós somos. É quem nós somos”,
enfatizando que a tradição da hospitalidade nascida na ilha é evidente desde o conforto
das suas aeronaves ao acolhimento dos serviços a bordo.
Uma das estratégias utilizadas para a promoção de empresas de transportes é o Branding
ou Gestão de Marcas: os terminais aeroportuários, por exemplo, costumavam ser tratados pe-
los seus gestores tão e somente como utilidades públicas caracterizadas por oferecer serviços
de embarque e desembarque de passageiros e cargas, realizando a transferência de outros
modos de transporte para o modo aéreo. O fato é que atualmente os aeroportos oferecem
grandes oportunidades de negócios (CASTRO et al., 2011). As autoridades aeroportuárias
em todo o mundo estão demonstrando uma maior preocupação no desenvolvimento de
106
 Capítulo 4 [Marketing dos Transportes e Destinos Turísticos]

estratégias de investimento em suas operações a fim de melhorar suas performances. O que


se percebe é que os aeroportos estão se tornando cada vez mais dependentes das chamadas
receitas não aeronáuticas. Estas são provenientes de vendas de espaços de propaganda nos
terminais, aluguéis de lojas, estacionamento, vendas em geral, dentre outros. Graham (2009)
afirma que a evolução dos aeroportos como entidades públicas para uma indústria comercial
ou até mesmo privatizada ofereceu mais liberdade para que os seus potenciais comerciais
pudessem ser explorados. Nos aeroportos da América do Norte, por exemplo, essas receitas já
representavam, em 2007, cerca de 52,6% do total de receitas (GRAHAM, 2009). Aproveitando
essa tendência de comercialização, muitos aeroportos têm investido no estabelecimento e na
gestão de marcas fortes e representativas a fim de diferenciá-los em relação à concorrência.

EXEMPLO:
BRANDING DE AEROPORTOS

Para se criarem experiências positivas, estabelecer sua imagem e uma marca única que
traga posicionamento de mercado para qualquer tipo de ambiente de transportes para o
turismo é necessária a realização de pesquisas de mercado com clientes, além dos princi-
pais tomadores de decisão, parceiros de negócios e funcionários. É preciso entender os seus
desejos, suas percepções e o seu nível de satisfação em relação aos serviços oferecidos.
Uma grande oportunidade está na diferenciação por meio do desenvolvimento de marcas
que evoquem características locais e/ou regionais. A Future Brand (2008), uma empresa in-
ternacional especializada na implantação de marcas, garante que enquanto alguns terminais
se preocupam em determinar o seu design construtivo, seus recursos e demais caracterís-
ticas, o papel e a relação entre o terminal e a identidade regional dificilmente é considerada.
Exemplos incluem a oferta não somente de culinária internacional, mas também da
gastronomia típica local; selecionar estabelecimentos comerciais que possam vender
souvenirs; adoção de estratégias que mantenham os preços o mais próximo possível da-
queles praticados nas regiões centrais dos destinos turísticos; desenvolver constantemente
exposições de arte local/regional; a arquitetura do terminal com aspectos particulares
que façam com que o consumidor se sinta no local visitado desde o momento do seu
desembarque; dentre muitas outras estratégias que beneficiarão tanto a administração
do terminal quanto os seus clientes, o destino turístico e demais empresas envolvidas.
Outra estratégia de promoção muito utilizada pelas empresas de transportes para o
turismo atualmente são as mídias sociais. Esse fenômeno já é uma realidade mundial,
e o número de pessoas associadas a esses espaços virtuais de interação social cresce a
cada dia. As empresas atentas às tendências comportamentais do mercado consumidor
passaram a utilizar as redes sociais para se relacionarem com seus clientes oferecendo
um conteúdo planejado periodicamente.
As principais mídias sociais que impactam diretamente no turismo são o Facebook, o
Twitter e o Foursquare. Segundo dados do blog Funsherpa (2012), cerca de 70% das pes-
soas atualizam o status do seu Facebook enquanto estão viajando e 46% fazem questão
107
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

de informar a sua localização por meio dos conhecidos check-ins que podem ser feitos
pelo próprio Facebook ou, mais comumente, pelo Foursquare (aplicativo voltado es-
pecificamente para informações sobre a localização dos usuários).
Atualmente diversas agências de marketing ou de relações públicas oferecem serviços
de atualização e monitoramento dos perfis das empresas nas redes sociais. Algumas das
estratégias utilizadas são:
¥ Ações promocionais em mídias sociais: caso a empresa tenha um novo produto
e deseja promovê-lo diretamente ao seu público-alvo. Nesse caso serão utilizados
mecanismos que gerem atenção e interatividade entre empresas e seus clientes por
meio de projetos de marketing e publicidade em mídias sociais.
¥ Setor de atendimento ao cliente (SAC) via mídias sociais: a nova geração de con-
sumidores está cada vez mais acostumada a adquirir produtos e serviços em multi-
plataformas, ou seja, por vários meios de comunicação e não estão mais dispostos a
serem atendidos somente pelo telefone. As mídias sociais são importantes alternativas
para esses casos. Nos transportes, grande parte dos serviços são adquiridos pela
internet, e é interessante que o cliente possa ter contato com a empresa também de
forma online.
¥ Gestão de crise em mídias sociais: sistema de monitoramento das opiniões dos clientes
sobre as empresas nas redes sociais. É preciso fazer o reconhecimento do cenário e
elaborar uma estratégia para explicar, atender e argumentar com os clientes formadores
de opinião a fim de gerir uma possível crise. Isso permite que situações possam ser
revertidas e/ou amenizadas para clientes e empresas.
¥ Planejamento em mídias sociais: estratégias de marketing tradicionais precisam ser
revistas para que as empresas se adequem às mudanças de comportamento do consu-
midor atual em fases de pré-venda, venda e pós-venda. O planejamento é necessário
para desenvolver estratégias no sentido de alcançar os objetivos de relacionamento
com clientes, formadores de opinião e outros via mídias sociais.
¥ Gestão de conteúdo e layout em mídias sociais: projeto que tem como meta gerar
interatividade para atingir um nicho ou rede de clientes com a criação de conteúdos
e layouts personalizados. Deve ser feito planejamento mensal para o conteúdo que
será publicado via mídias sociais levando em consideração as metas e os objetivos
que deverão ser alcançados naquele período. Há ainda que se observar o comporta-
mento do público-alvo nessa determinada rede social. Há estudos (FUNSHERPA, 2012)
que apontam que os horários mais movimentados no Facebook durante a semana são
entre 10h e 11h e das 21h às 22h.
Muitas empresas de transportes turísticos já adotaram as redes sociais como gran-
des promotoras dos seus produtos e serviços. No modo rodoviário pode-se citar a
europeia Busabout, uma empresa especializada em viajantes independentes e com
orçamento reduzido. A Busabout utiliza o Facebook para interagir com seus clientes,

108
 Capítulo 4 [Marketing dos Transportes e Destinos Turísticos]

fazer promoções, oferecer opções de roteiros rodoviários, tirar dúvidas e gerenciar crises,
dentre outros. Já no modo aéreo diversos aeroportos e muitas companhias aéreas podem
ser citados: American Airlines, Iberia, Qatar Airways, Emirates etc.; além dos aeroportos
de Londres, Hong Kong, Sidney, Joanesburgo, Cingapura, dentre muitos outros. As em-
presas de cruzeiros marítimos também estão presentes nas redes sociais. É o caso da
MSC Cruzeiros, da Royal Caribbean, da Costa Cruzeiros, da Íbero Cruzeiros, etc. Já no
modo ferroviário pode-se destacar a presença da SNCF (Societé Nationale des Chemins
de Fers Français ou Sociedade Nacional dos Caminhos de Ferro Franceses) e da Eurostar,
famosa pela importante ligação ferroviária entre Paris e Londres.
O que se percebe em termos da promoção dos transportes para o turismo é uma
grande modernização das plataformas utilizadas e o constante acompanhamento das
tendências comportamentais dos consumidores. Em um cenário como o atual no qual
a concorrência é cada vez mais acirrada é de grande importância que as empresas es-
tejam atentas e abertas às novas formas de promoção que possuem ligação direta com
os canais de distribuição, abordados no próximo tópico.

EXEMPLO DE FIXAÇÃO:
SOUTHWEST AIRLINES

Uma empresa do setor de transportes aéreos que soube trabalhar a imagem que gos-
taria de desenvolver a respeito dos seus serviços foi a Southwest Airlines. A empresa aérea
norte-americana, reconhecida internacionalmente pelo seu sucesso no mercado de baixo
custo/baixa tarifa, foi criada em 1971 e tinha como base o Aeroporto Love Field (Campo
do Amor) em Dallas, Texas. Em certo momento, por mais que as suas tarifas fossem ex-
tremamente atrativas para o consumidor, a Southwest passava por uma situação na qual
suas aeronaves não decolavam completamente lotadas. Estrategicamente, a companhia
resolveu adotar a imagem e o posicionamento de companhia do amor, colocando um
coração em sua logomarca. A partir desse momento, suas aeronaves passaram a ser
chamadas de “pássaros do amor”, as bebidas servidas a bordo eram as “poções do amor”,
os famosos amendoins chamados de “bocados do amor”, os bilhetes eram emitidos pela
“máquina do amor” e as comissárias de bordo eram as love hostesses, ou “aeromoças
do amor”. Este posicionamento fez com que a Southwest se sobressaísse em relação à
concorrência que adotava um estilo muito mais sério e menos descontraído, fazendo com
que ela ganhasse mercado na aviação norte-americana.

4.3.4. Canais de Distribuição


A chamada “economia física”, aquela baseada em propriedades e bens está enco-
lhendo, resultando em uma crescente valorização de formas intangíveis de bens que
incluem informações, ativos intelectuais e serviços, nos quais se incluem os transportes
e o turismo (RIFIKIN, 2001). Por esta razão, a importância da função de distribuição,
dentro do mix de marketing, fica ainda mais ressaltada como elemento-chave de sucesso

109
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

de qualquer negócio, especialmente para as empresas de transportes e para os destinos


turísticos que lidam com tais formas intangíveis de serviço.
Canais de distribuição (ou praça) definem o local onde as ações de transportes são
desenvolvidas, assim como os meios pelos quais os serviços de transportes serão distribuídos
(comercializados). No caso dos transportes, os locais são os destinos envolvidos, assim como
os vários canais de vendas – os diretos: site da própria transportadora na internet, call center
próprio e as lojas físicas próprias; e os canais indiretos: agências de viagens, operadoras de
turismo, sites de agências virtuais, etc.), conforme esquematizado na Figura 4.1.
Utilizar canais diretos ou indiretos para distribuição dos serviços de transportes consis-
te numa decisão entre estratégia de marketing de custo ou de cobertura (vide exemplo
inicial neste capítulo sobre Wellington, na Nova Zelândia). A estratégia de custo utiliza,
predominantemente, a distribuição direta visando diminuir custos; já a estratégia de
marketing de cobertura utiliza, predominantemente, a distribuição indireta dos serviços,
objetivando alcançar ampla cobertura de mercado e, consequentemente, maior volume
de vendas. A escolha da estratégia de marketing de venda direta ou por intermediários,
recai sobre quatro fatores que a empresa de transporte deve considerar:
a. Grau de controle sobre a venda dos serviços que a empresa deseja ter.

b. A economia que representará cada opção em termos de: fazer chegar o serviço ao
passageiro, custos de atendimento, divulgação, manutenção e riscos financeiros.

c. Capacidade de adaptação dos serviços a diferentes realidades e contextos locais e


regionais, inclusive, adaptação dos serviços aos hábitos de compras dos consumidores,
pois, muitas vezes, o intermediário está mais próximo.

d. Conhecer melhor as necessidades e os desejos dos viajantes.


É possível a empresa de transportes escolher uma combinação das duas estratégias,
optando, ao mesmo tempo, por distribuição direta e indireta com o objetivo de atingir,
ao mesmo tempo, diferentes segmentos de mercado. Além do mais, existem vantagens e
desvantagens em se utilizar vendas diretas ou indiretas. Por exemplo, é vantajoso utilizar
venda direta quando a venda de transporte envolve viajantes individuais que desejam uma
viagem considerada simples ou “ponto a ponto” bem definida. Um exemplo hipotético
seria uma passagem aérea ligando Salvador a Paris, ida e volta, numa mesma empresa
aérea, em voos sem conexões, numa base tarifária única. Para este caso, as tecnologias
de informação via internet (venda direta) são amplamente favorecidas pois envolve uma
menor complexidade de regras, tarifas, horários para que a transação de compra flua em
direção a uma compreensão clara por parte dos passageiros. Quando, porém, a viagem
é mais complexa, envolvendo paradas e/ou conexões, diversas empresas de transportes
e bases tarifarias diferentes, como por exemplo um pacote aéreo com cruzeiro marítimo e
hospedagem em diversos destinos, a venda intermediada (venda indireta) passa a ser rele-
vante tanto para o passageiro quanto para a transportadora. Isso porque um intermediador,
como um agente de viagem, pode esclarecer dúvidas de vários produtos e destinos, ao
110
 Capítulo 4 [Marketing dos Transportes e Destinos Turísticos]

mesmo tempo em que tem acesso a várias plataformas de distribuição, incluindo os GDS.
A mesma complexidade acontece quando a viagem envolve grupo de passageiros/turistas
que entram e saem da reserva em momentos diferentes antes da viagem.
Com o surgimento de empresas de transportes de baixo custo e crescimento de
tecnologias de informação, tem se dado muita ênfase na desintermediação (venda direta)
dos serviços de transportes. Porém a estratégia de cortar custos funciona bem até certo
ponto, como visto nos parágrafos anteriores, onde a qualidade ou personalização do
serviço não são comprometidos, pois o serviço é voltado para a massa. Ao mesmo tempo,
a maioria dos estudos de distribuição em transportes e turismo tem sido concentrados
nos setores de transporte aéreo e no setor da hotelaria, talvez pelo tamanho econômico
que representam. Kwortnit (2006) discute a experiência bem-sucedida de Carnival em
lidar com o processo de desintermediação e como a empresa de cruzeiros lida com
seus canais de distribuição que no caso dos cruzeiros marítimos ainda apresenta alta
participação de vendas por parte dos agentes de viagens. Dentre outros motivos, a em-
presa de cruzeiros Renaissance faliu em 2001 em função da sua inabilidade em lidar com
o processo de desintermediação da distribuição dos seus produtos.
Pearce e Sahli (2007) apresentam um interessante estudo sobre canais de distribuição
voltado exclusivamente para as empresas de transportes na Nova Zelândia (empresas de
ônibus, locadoras de veículos e motor homes, trens e ferries). Este estudo apresentou alguns
resultados interessantes, evidenciando que existe uma considerável diversidade de canais
de distribuição entre os transportes na Nova Zelândia. Quase todas as empresas de trans-
portes desse país utilizam vendas diretas com exceção do mercado internacional. Para este
público específico, a tendência tem sido a utilização de vários níveis de intermediários
(até três níveis). Estes diferentes níveis de intermediários facilitam todos os arranjos neces-
sários – alojamento, alimentação e diferentes tipos de transportes - e reduzem os custos
para os grupos baseados na economia de escala. As empresas de ônibus, quando lidam
diretamente com grupos organizados (clubes e esportes), o fazem diretamente utilizando
o telefone. No entanto, as linhas regulares utilizam canais diretos por meio de rede de
lojas próprias. Outra constatação foi que o relativo baixo preço envolvido nas transações
de transportes de superfície suporta geralmente uma intermediação de apenas um nível.
Isto ocorre principalmente com o transporte ferroviário, de ferries e ônibus regulares,
onde a intermediação desta forma (um nível) ainda é vital por conta das características
da demanda que são predominantemente segmentos de baixa renda que não utilizam
cartão de crédito (PEARCE e SAHLI 2007).
Em conclusão, este estudo apontou que, no caso da Nova Zelândia, um único tipo de
distribuição não é suficiente para atender às necessidades dos passageiros de transportes.
Em mercados em desenvolvimento é necessário a utilização de um mix entre distribuição
direta e indireta e também de diferentes tipos de canais nestas duas categorias. Principal-
mente, quando existe competição entre diferentes empresas oferecendo o mesmo tipo de
transporte. Atenção especial deve ser dada na distribuição quando ela ocorre na rota e no
destino, porque os serviços de transportes de superfície são vendidos geralmente quando os
111
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

passageiros chegam aos destinos. Por fim, estes autores afirmam que as empresas de trans-
portes devem tratar seus intermediários como clientes assim como tratam seus passageiros.
Em outra abordagem, Chris Anderson, autor do livro A cauda longa, defende
o crescimento dos chamados nichos de mercado em todos os setores da economia
(ANDERSON, 2012). Para ele, com o avanço das tecnologias e a consequente diminuição
no custo de distribuição, a segmentação de produtos e serviços deve avançar. Para este
autor, numa economia sem gargalos de distribuição os produtos e serviços segmentados
podem ser economicamente tão atrativos quanto aos produtos de massa. Desta maneira
as empresas devem se valer da oportunidade para criar cada vez mais quantidades maiores
de serviços de nichos, formando a chamada “cauda longa” de serviços. Este conceito
poderia ser melhor explorado, por parte das empresas de transportes e destinos turísticos,
mesmo na atração de viagens de curta duração. Isto se daria a partir da utilização de uma
gama maior de opções de transportes turísticos, como por exemplo, o aluguel de motos,
patinetes e skates elétricos, bicicletas ou triciclos elétricos (ou convencionais); passeios em
balões, asa-delta, paraglider e helicópteros. Assim, desta maneira, o barateamento de uma
ferramenta de marketing, que é a distribuição, pode se transformar em oportunidade para
explorar outra ferramenta, que é a segmentação baseado em diferenciação de produtos
e serviços. Este conceito também se aplica, numa escala maior, na empresa de nicho de
mercado a Virgin Galactic, já mencionada no Capítulo 1.

4.4. CONCLUSÕES
Esse capítulo elaborou uma discussão teórica sobre aspectos básicos relacionados
às características dos serviços de transportes (que em muitos casos são idênticos na
maioria de prestadores de serviços turísticos) tais como intangibilidade, inseparabilidade,
variabilidade e perecibilidade. Além disso, empregando-se a estrutura clássica do mix de
marketing, avançou-se a discussão sobre como aspectos elementares do marketing de
transportes se relacionam com o turismo. Alguns exemplos de várias partes do mundo
foram empregados para pontuar essa questão.
As possibilidades de iniciativas de marketing em termos de transportes e destinos
turísticos são inúmeras. Além dos exemplos apresentados até aqui, pode-se ainda levar
em conta alguns outros apresentados pela literatura a fim de ilustrar as oportunidades de
marketing existentes entre transportes e destinos turísticos.
Inicialmente empregados como ferramenta para cativar a fidelização de viajantes por
meio de uma pontuação que gerasse viagens ou upgrades gratuitos, os programas de mi-
lhagem, sobretudo aqueles relacionados a empresas aéreas, evoluíram para se tornarem
grandes ferramentas de marketing que extrapolaram o setor de transportes, incluindo uma
série de outros ramos de turismo e viagem (ex: hotéis, locadoras de veículos), bem como
bancos, supermercados e postos de gasolina. Do ponto de vista do marketing de destinos
turísticos, estratégias implementadas nos programas de milhagem podem induzir viagens para
determinados destinos, quer por meio de acordos financeiros pagos por organizações de

112
 Capítulo 4 [Marketing dos Transportes e Destinos Turísticos]

turismo, quer por meio de iniciativa das próprias empresas aéreas. No caso de destinos, uma
estratégia de promoção pode ser desenvolvida pagando às empresas aéreas para reduzirem
as milhagens necessárias para que os passageiros frequentes possam voar para o seu des-
tino. Esse investimento que poderia ser efetuado em campanhas publicitárias cujo retorno é
incerto, pode eventualmente ser melhor aplicado ao se (1) encorajar que os participantes dos
programas de milhagem gastem seus pontos visitando um determinado destino; (2) divulgar
o destino por meio da própria campanha de marketing direto realizada pela operadora do
programa de viagem junto aos milhões de membros que normalmente estão associados a
esses programas. LIU, WALL et al. (2000) apresentam várias oportunidades de marketing re-
lacionados ao uso de programas de milhagens, focando no caso específico da China Airlines.
Com este capítulo encerra-se uma parte deste livro que esteve mais focada em prover
uma abordagem ampla da relação entre transporte e destinos turísticos, quer por meio
de suas características gerais, quer por meio de enfoques e áreas do conhecimento como
a geografia (Capítulo 2), o planejamento (Capítulo 3) e o marketing (Capítulo 4). Nos
próximos três capítulos deste livro o foco se dá em abordar aspectos específicos dos
diversos modos de transportes que são tratados de forma individual: aéreo (Capítulo 5),
aquaviário (Capítulo 6) e terrestre (Capítulo 7). O conhecimento apresentado até aqui
será útil para analisar de forma individual esses modos de transporte.

QUESTÕES
1. Escolha uma empresa aérea ou de cruzeiros marítimos de grande porte e elabore
uma análise na qual você considere quais são os principais desafios que essa empresa
possui em termos de intangibilidade, inseparabilidade e perecibilidade.
2. Considerando a mesma empresa da Questão 1, descreva e analise o produto, o preço,
a promoção e a distribuição.
3. Analise como a segmentação em termos de preço (ex. viajantes de primeira classe ou
de segmento premium em cruzeiros marítimos) influencia as estratégicas de produto,
promoção e distribuição.
4. Faça uma análise das propagandas de viagem vinculadas aos domingos no principal
jornal do seu Estado. Discuta os aspectos existentes entre transportes e turismo nesse
material de propaganda.
5. Faça uma análise das estratégias do mix de marketing das principais empresas rodo-
viárias do seu Estado. Discuta os motivos para os resultados encontrados.
6. Refaça o exercício anterior considerando as principais empresas aéreas e de cruzeiros
marítimos que operam no país.

LISTA DE REFERÊNCIAS

ANDERSON, C. Entrevista com Chris Anderson. Revista Época. São Paulo: Editora Globo 2012.

113
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

CASTRO, R. T.; BALASSIANO, R.; ESPÍRITO SANTO, JR, R. A. Aeroportos como atrativos
turísticos culturais: uma análise preliminar. Anais do IX Rio de Transportes. Rio de Janeiro:
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Acesso em 31/12/2012.

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KOTLER, P. Administração de Marketing: a edição do novo milênio. 10 Ed. São Paulo:


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PEARCE, D. G.; SAHLI, M. Surface transport distribution channels in New Zealand: A


comparative analysis. Journal of Travel & Tourism Marketing, v.22, n.2, p. 73-87. 2007.

POSITIVELY WELLINGTON TOURISM. Send Yourself to Wellington. Wellington, 2013.


Disponível em: <www.wellingtonnz.com/about_us/send_yourself_to_wellington>. Acesso
em: 04/01/2013.

RIFIKIN, J. A era do acesso. São Paulo: MakronBooks. 2001.

THOMPSON, K.; SCHOFIELD, P. An investigation of the relationship between public


transport performance and destination satisfaction. Journal of Transport Geography, v.15,
p. 136-144. 2007.

VENTURI, M. J.; LOHMANN, G. Mapeando os canais e as tecnologias de distribuição


de uma empresa aérea brasileira. In: EPUSP, V SITRAER Simpósio de Transporte Aéreo,
Brasília, p. 85-93. 2006.

114
CAPÍTULO 5
Transporte Aéreo e Turismo

Rafael Castro e Guilherme Lohmann

CONCEITOS APRESENTADOS NESTE CAPÍTULO


Este capítulo apresenta alguns dos principais conceitos relacionados ao transporte aéreo,
incluindo o conceito de liberdades do ar caracterizados nos acordos bilaterais ou multi-
laterais entre os países. Os dois principais modelos de negócios de empresas aéreas (de
baixo custo – low-cost e tradicional) também são analisados de forma a evidenciar as
interações com os destinos turísticos.

5.1. INTRODUÇÃO
Nenhuma outra tecnologia de transportes foi tão fundamental para o desenvolvimento
do turismo em escala mundial quanto o transporte aéreo. Interligando os quatro cantos do
mundo, o avião provê acesso seguro e mais rápido e a um menor custo para destinos
turísticos captarem grande parte de seus mercados potenciais.
Embora o sistema de transporte aéreo seja uma estrutura complexa que envolve um
número enorme de fornecedores com atuação global, incluindo fabricantes de aerona-
ves, empresas aéreas, terminais aeroportuários, sistemas de navegação aérea, empresas
de manutenção, comunicação e catering, não é o propósito desta obra cobrir todos
esses setores. Este capítulo foca notadamente em análises mais objetivas que tenham
influência direta para o desenvolvimento de destinos turísticos, incluindo uma visão
introdutória de aspectos regulatórios e dos modelos de negócios de empresas aéreas.
As transformações do setor aéreo nos anos 2000 também são retratadas, principalmente
em função das mudanças regulatórias, competitivas e de governança do setor. A crise
aérea dos anos 2006 e 2007 também é analisada antes de se oferecer uma análise dos
dados estatísticos do mercado aéreo, bem como dos aeroportos brasileiros. O capítulo
115
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

termina com um estudo de caso sobre aeroportos e turismo residencial para a região do
Algarve, em Portugal, escrito pela Profa. Cláudia Almeida, da Universidade do Algarve.

5.2. REGULAMENTAÇÃO DO TRANSPORTE AÉREO


E SUAS IMPLICAÇÕES PARA OS DESTINOS TURÍSTICOS
O setor de transporte aéreo exige um ambiente que seja muito bem estruturado e
controlado pelos governos, uma vez que está diretamente relacionado à segurança e à
soberania nacional dos países e pelo seu importante caráter desenvolvedor da economia
e da sociedade.
Em escala mundial, a IATA (International Air Transport Association) e a OACI/ICAO
(Organização de Aviação Civil Internacional/International Civil Aviation Organization)
são os órgãos responsáveis pelo fomento da aviação. A primeira representa cerca de
240 empresas aéreas em 118 países, concentrando aproximadamente 93% do fluxo aéreo
regular no mundo, tendo como objetivos, em linhas gerais (IATA, 2012):
1. Estimular as empresas a oferecerem serviço de transporte seguro, econômico e regular
para o bem-estar de todos os povos.
2. Fomentar o transporte aéreo e estudar seus problemas a fim de fornecer subsídios
para a colaboração entre as empresas que estão direta ou indiretamente relacionadas
a este tipo de serviço.
3. Cooperar com a OACI, dentre outros organismos internacionais.
4. Representar, liderar e servir a toda a indústria do transporte aéreo.
A fim de atender aos seus objetivos a IATA desenvolve uma série de atividades traba-
lhando em prol da criação de padrões internacionais das condições de transporte, das
condições contratuais, além dos padrões de indenizações cobradas no caso de irregula-
ridades no serviço de transporte aéreo de pessoas.
A OACI é uma entidade pública vinculada diretamente às Organizações das Nações
Unidas (ONU), com sede em Montreal, Canadá. Suas atribuições são relacionadas ao
transporte aéreo internacional e seus objetivos estão descritos na Convenção de Chicago
de 1944. De uma maneira geral, compete à organização o desenvolvimento de técnicas
e princípios de navegação aérea internacional e o estímulo ao estabelecimento e ao
progresso do transporte aéreo internacional.
A famosa Convenção de Chicago reuniu mais de cinquenta países de todo o mundo
para discutir assuntos relacionados ao transporte aéreo de pessoas e cargas e ao tráfego
aéreo de aeronaves. Além de criar a OACI, a Convenção serviu para a elaboração do es-
boço das chamadas “liberdades do ar”, que nada mais seriam do que acordos multilaterais
assinados entre os países que permitissem que as empresas aéreas voassem livremente
sobre os seus territórios. Para uma melhor organização desses acordos, cinco liberdades do
ar foram então descritas (PALHARES, 2002), cujos exemplos são ilustrados na Figura 5.1:
116
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

Figura 5.1 — Exemplos ilustrativos das cinco primeiras liberdades do ar.

1a Liberdade do Ar: direito a sobrevoar o espaço aéreo de um terceiro país quando


a aeronave estiver interligando outros dois países.
2a Liberdade do Ar: direito a fazer escala técnica num determinado país, apenas
para reabastecimento da aeronave, sem embarque ou desembarque de passageiros,
quando uma aeronave estiver voando entre outros dois países.
3a Liberdade do Ar: direito de uma companhia aérea levar os passageiros do país
ao qual pertença para outro país.
117
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

4a Liberdade do Ar: direito de uma empresa aérea trazer passageiros de um outro


país para o país ao qual pertença.
5a Liberdade do Ar: direito de fazer escala num determinado país, com embarque
ou desembarque de passageiros, quando uma aeronave estiver voando entre dois
outros países.
Na época da Convenção de Chicago muitos países ainda sofriam com os efeitos e os
prejuízos causados pela Segunda Guerra Mundial e acabaram optando por estratégias
mais protecionistas das suas fronteiras, fazendo com que as cinco liberdades do ar
propostas pelos Estados Unidos não fossem aceitas por todos. O acordo multilateral entre
os países presentes envolveu as primeira e segunda liberdades do ar. Para se ter acesso
às demais permissões foram necessários acordos bilaterais firmados entre os governos
das nações interessadas. Com o passar do tempo, o mercado da aviação passou a ter
diferentes necessidades, e as liberdades do ar foram revistas, surgindo mais quatro opções
descritas a seguir e ilustradas na Figura 5.2:

Figura 5.2 — Exemplos ilustrativos da sexta, sétima, oitava e nona liberdades do ar

118
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

Figura 5.2 — Exemplos ilustrativos da sexta, sétima, oitava e nona liberdades do ar (Cont.)

6a Liberdade do Ar: direito de transportar passageiros e cargas sobre o território


do país de nacionalidade da aeronave, entre o território de um segundo país e o
território do país de destino (as chamadas conexões).
7a Liberdade do Ar: direito de transportar passageiros e cargas entre o território
de um país para outro país, sem continuar o serviço aéreo para o país de nacio-
nalidade da aeronave.
8a Liberdade do Ar: transporte de passageiros e cargas do país de nacionalidade
da aeronave para um segundo país com pouso permitido em mais de uma cidade
nesse mesmo país com desembarque e embarque de passageiros.
9a Liberdade do Ar: transporte aéreo de passageiros e cargas entre destinos domés-
ticos localizados em outro país que não o de nacionalidade da aeronave, também
chamado de cabotagem pura.
Percebe-se que essas regulamentações tratam somente de permissões de sobrevoo, pou-
so de aeronaves e embarque e desembarque de passageiros e cargas nos países, portanto,
são do tipo não econômicas. Há ainda uma série de determinações do tipo econômicas
quando os governos federais influenciam diretamente no controle das tarifas praticadas
pelas empresas aéreas, das taxas, da concorrência entre elas, dentre outros aspectos.
O Brasil, por exemplo, teve um período marcado pela chamada “Regulação Estrita”,
em que barreiras legais à entrada e à regulação dos preços foram impostas pelo governo.
Segundo o IPEA (2010):
O elevado grau de intervenção governamental na aviação
civil brasileira esteve ligado, por um longo período, às
necessidades estratégicas de indução do desenvolvimento
nacional e da ocupação territorial, por ser considerada
atividade pioneira. A grande proliferação de empresas
aéreas nas décadas de 1950 e 1960 gerou um ambiente de
competição predatória, cujas graves consequências foram
penosamente corrigidas à custa de um grau ainda maior
de intervencionismo. Estas tendências cristalizaram, nas
autoridades aeronáuticas brasileiras, um compreensível receio
pela liberdade mais ampla de mercado. (IPEA, 2010, p. 15)
119
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Durante esse período o governo controlou firmemente os preços e as frequências de


voos, além de limitar a entrada de novas companhias aéreas no mercado, a fim de con-
trolar a chamada competição predatória.
Do ponto de vista do mercado turístico, as regulamentações do tipo econômicas são ex-
tremamente negativas, uma vez que impedem a concorrência entre as companhias aéreas
e a prática de tarifas competitivas. Dessa forma, o transporte aéreo se mantém elitizado,
o que não favorece o desenvolvimento de destinos turísticos ainda não consolidados.
Com o passar dos anos, as empresas aéreas, os órgãos reguladores e pesquisadores do trans-
porte aéreo passaram a perceber que em locais onde este mercado era menos regulamentado
havia maior competição entre as empresas, o que gerava tarifas menores e um grande aumento
na demanda pelos serviços de transporte aéreo de passageiros e cargas. Essa análise deu início
ao processo de desregulamentação do transporte aéreo em diversos países, como Estados
Unidos, Austrália, Nova Zelândia e muitos outros. Segundo Palhares (2002), a desregulamen-
tação envolve o desenvolvimento de políticas com maior liberdade operacional e comercial
para que as empresas aéreas possam estipular suas próprias tarifas, rotas e frequências de voos
desejadas, sem que para isso seja necessária autorização prévia do governo.
A desregulamentação do setor aéreo nos Estados Unidos foi pioneira e serviu de
modelo para diversos outros países. Até o ano de 1978 as ligações aéreas interestaduais
no país eram reguladas pelo CAB (Civil Aeronautics Board), e as ligações intraestaduais –
dentro do mesmo estado – não eram regulamentadas. Em meados de 1977, os especialis-
tas perceberam que nas ligações intraestaduais havia uma grande concorrência entre as
empresas aéreas e as tarifas eram mais baixas. No ano seguinte, o então presidente Carter
assinou o decreto de desregulamentação do transporte aéreo, conhecido como Airline
Deregulation Act, que causou as seguintes mudanças no setor:
¥ Consolidação das redes hub-and-spoke: as empresas perceberam que era mais
vantajoso concentrar a oferta em determinadas rotas mais lucrativas por meio da
concentração das mesmas em um centro de distribuição, o que consolidou as cidades
de Atlanta, Chicago, Dallas e Denver como grandes hubs nos Estados Unidos. Tal
processo foi posteriormente identificado em vários outros países, inclusive no Brasil
(KOO e LOHMANN, 2013).
¥ Entrada de novas empresas no mercado: no ano de 1978 havia 43 empresas operando voos
regulares nos Estados Unidos (PALHARES, 2002). Aproximadamente dois anos, depois esse
número já havia dobrado e as empresas do modelo baixo custo/baixa tarifa começaram
a surgir uma vez que estavam livres para praticar as tarifas que bem entendessem.
¥ Aumento da concorrência: a desregulamentação provocou o surgimento de novos
modelos de negócios (como o low cost/low fare), mas também serviu para fortalecer
os já existentes. Um maior número de empresas passou a operar nas mesmas rotas,
gerando maior concorrência e tarifas diferenciadas para os passageiros. Do ponto
de vista dos destinos essa mudança foi extremamente interessante, já que ajudou a
aumentar a demanda e a desenvolver o turismo.
120
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

¥ Tarifas com desconto: a partir desse momento, as tarifas do transporte aéreo começaram
a concorrer até mesmo com os modos ferroviário e rodoviário, com redução de cerca
de 35%.
¥ Crescimento do setor: o setor apresentou altas taxas de crescimento após a des-
regulamentação.
¥ Surgimento dos programas de milhagem: a partir da desregulamentação as empresas
aéreas passaram a retribuir os viajantes cativos com pontuação em termos das milhas
viajadas que poderiam ser trocadas posteriormente por passagens gratuitas ou pela
oportunidade de voar em uma classe de serviço mais confortável.
¥ Sistemas de reservas por computador e alianças estratégicas: a desregulamentação
colaborou para o surgimento dos sistemas de reservas por computador, possibilitando
que as empresas colocassem seus serviços à disposição dos passageiros onde estes
estivessem. As alianças entre as empresas aéreas também surgem com a utilização
do code-share, quando uma aeronave de uma empresa pode operar um voo dessa
empresa e, ao mesmo tempo, o voo de outra empresa com disponibilização recíproca
de assentos (PAGE, 2008).
Até então foram relatados os efeitos positivos da desregulamentação. Entretanto, alguns
especialistas da área apontam que ela também foi responsável por aspectos negativos.
Page (2008), por exemplo, relata um declínio na qualidade dos serviços, uma vez que
comunidades menores que não estavam diretamente ligadas às rotas-tronco (aquelas
interligadas aos aeroportos hub) sofreram com o aumento das tarifas e com a diminuição
na frequência dos voos. O sistema aeroportuário também sofreu efeitos negativos, pois os
terminais de passageiros não estavam preparados para o grande fluxo de pessoas gerado
pela desregulamentação. Sendo assim, os clientes encontravam problemas em relação à
restituição de bagagens, cancelamentos e atrasos de voos, serviços de bordo precários,
dentre outros.
Para o desenvolvimento do turismo, não se pode deixar de ressaltar que a desregu-
lamentação também teve efeitos positivos e negativos. O incentivo à concorrência
possibilitou que um maior número de pessoas pudesse viajar a turismo, pagando tarifas
menores. Os destinos turísticos passaram a receber maior número de turistas e tiveram
de planejar sua infraestrutura para tal, seja por meio da ampliação da sua rede hoteleira,
dos serviços de transporte local, do setor de alimentação e até mesmo com a melhoria
de serviços básicos como água, esgoto e geração de energia elétrica.

5.3. IDENTIDADE E TRANSFORMAÇÃO DE NOVOS DESTINOS


EM FUNÇÃO DO TRANSPORTE AÉREO
A interdependência do desenvolvimento de destinos em função do transporte aéreo
foi mencionado no Capítulo 1, a partir do momento em que novas tecnologias foram
introduzidas e destinos de todas as partes do mundo passaram a ter acessibilidade para
121
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

receber turistas dos principais mercados emissores. O Capítulo 2 também enfatizou,


através dos modelos apresentados, o desenvolvimento e o amadurecimento dos des-
tinos em função da introdução do transporte aéreo. Por fim, no Capítulo 3, o exemplo
apresentado sobre Abu Dhabi, onde o transporte aéreo teve importante participação
para a transformação dessa capital em destino global, também evidencia isso, o que não
é muito diferente de outros destinos como Dubai e Cingapura (LOHMANN, ALBERS et
al., 2009). Esta seção visa avançar nessa temática discutindo outros exemplos e explorando
de forma mais detalhada como o transporte aéreo pode contribuir para a transformação
de destinos turísticos, particularmente no que diz respeito aos diferentes modelos de
negócios de empresas aéreas (LOHMANN e KOO, 2013).
No modelo de Espectro do Desenvolvimento de Resort, Prideaux (2000a; 2004)
efetua uma análise nos destinos costeiros do estado de Queensland, na Austrália, em
que identifica que nos estágios de desenvolvimento mais avançado desses destinos o
transporte aéreo nacional e, posteriormente, internacional se faz presente (para maiores
detalhes, v. LOHMANN e PANOSSO NETTO, 2012). No caso específico de Cairns,
destino que serve como portão de entrada para turistas visitando a Grande Barreira de
Corais, Prideaux (2000b) identifica as transformações ocorridas a partir do momento em
que voos diretos internacionais passaram a servir o aeroporto local, não requerendo mais
a conexão em outros portões de entrada convencionais da Austrália. Efeito similar pode
ser notado no Brasil, com a modernização dos terminais aeroportuários do Nordeste que
possibilitaram a ligação direta com voos para a Europa. Isso permitiu uma diminuição
considerável do tempo total de viagem, uma vez que anteriormente grande parte dos
turistas precisavam fazer uma conexão no Rio de Janeiro ou em São Paulo. O aumento
da acessibilidade contribuiu, tanto no caso australiano, quanto no brasileiro, para um
incremento da competitividade dos destinos destacados.
Dentre os fatores preponderantes para a importância do transporte aéreo na trans-
formação dos destinos turísticos está a redução dos custos reais de transporte aéreo, do
aumento da capacidade e da velocidade, bem como o alto grau de segurança apresentado
(SYPHER:MUELLER INTERNATIONAL INC, 1990; LOHMANN e DUVAL, 2011). Além disso,
a contribuição contínua das companhias aéreas para expansão do turismo vai muito além
do fornecimento da acessibilidade. A partir dos anos 1970 e 1980, e de certa forma até os
dias atuais, a integração vertical com outras empresas de turismo e os pacotes oferecidos
com acomodações, operadores turísticos e locadoras de veículos ampliam as oportunidades
de vendas nos destinos turísticos (PYLE, 1985; LAFFERTY e FOSSEN, 2001). Um exemplo
atual é a Emirates Airlines, que é parte de um grande grupo empresarial que engloba várias
atividades de turismo, incluindo uma empresa de gestão de viagens, hotéis e resorts, uma
operadora de turismo e atrações turísticas (LOHMANN, ALBERS et al., 2009). Tais parcerias
puderam projetar Dubai como um destino global, em função das sinergias criadas e do
padrão de qualidade consistente entre os vários produtos turísticos oferecidos no destino.
No passado, as companhias aéreas também contribuíram ativamente para a promoção
dos destinos. Pode-se identificar isso claramente assistindo anúncios de TV, muitos dos
122
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

quais disponíveis no YouTube, produzidos pelas companhias aéreas na década de 1980


(ver Seção 4.3.3). Nesse sentido, as companhias aéreas e os organismos de destino turís-
tico têm metas e objetivos semelhantes, com ambos exercendo alguma influência sobre
as atividades do outro. Companhias aéreas, por exemplo, podem exercer pressão sobre
organismos de destino turístico para aumentar os esforços de marketing em um mercado
em particular a fim de fazer crescer o tráfego numa rota específica. Organismos de destino
turístico, por sua vez, podem tentar exercer pressão sobre as companhias aéreas a au-
mentar a frequência do serviço a partir de um determinado mercado, em reconhecimento
da demanda latente que não está sendo atendida. Ainda que a decisão de se introduzir
ou manter uma determinada rota aérea em particular seja quase totalmente baseada em
aspectos financeiros, não é incomum que pressões políticas sejam exercidas para fazer
uma companhia aérea abrir uma nova rota, especialmente quando esse esforço está ali-
nhado com o desejo do governo nacional ou estadual de expandir relações comerciais.
Um dos muitos exemplos foi a decisão da Etihad em estabelecer um voo entre Abu Dhabi
(Emirados Árabes Unidos) e Astana, a capital do Cazaquistão.
É crítico salientar que frequentemente a experiência turística de um destino em
particular começa ao se embarcar no avião. Um exemplo disso é o conceito criado pela
Singapore Airlines, em 1970, onde as aeromoças, também conhecidas como Singapore
Girls, oferecem uma autêntica hospitalidade asiática a bordo de suas aeronaves. A Ha-
waiian Airlines também efetua esforços de marketing com esse propósito, oferecendo uma
hospitalidade havaiana já em suas aeronaves, criando nítida e forte ligação com o destino
turístico que servem (ver Capítulo 4). Essas duas empresas, que apresentam modelos de
negócios bem distintos, oferecem oportunidades para se explorar a relação entre empresas
aéreas de baixo custo (LCC, low-cost carrier) e as empresas aéreas tradicionais (FSNC,
full service network carrier), conforme apresentado no item anterior.

5.3.1. Empresas aéreas de baixo custo (LCC)


e o desenvolvimento de destinos turísticos
As mudanças legislativas e de comportamento do consumidor no uso de férias, passan-
do do tradicional um mês corrido para vários intervalos menores, beneficiou amplamente
o crescimento do turismo de curta distância. Em muitos mercados esse padrão de viagem
foi ampliado pela introdução de serviços de empresas de baixo custo, oferecendo um
incentivo para que se façam mais viagens. Várias dessas empresas são conhecidas pela
geração de tráfego adicional que beneficiam imensamente os destinos turísticos. Daí, não
é de se estranhar que empresas como Southwest Airlines (SWA), Ryanair e EasyJet tenham
um forte poder de negociação com novos destinos e aeroportos com baixo tráfego. Por
quase 40 anos, a SWA tem voado exclusivamente no mercado interno dos Estados Unidos,
decidindo de forma meticulosa em quais aeroportos opera. Em dezembro de 2009, a SWA
servia apenas 68 cidades (em comparação com mais de 200 da American Airlines) em 35
diferentes estados norte-americanos. Por nenhum parâmetro a SWA pode ser considerada
uma companhia aérea de pequeno porte, pois tem a maior frota de Boeings 737 em todo
123
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

o mundo (mais de 530!). Além disso, é a segunda maior companhia aérea do mundo em
termos de passageiros/quilômetro voado (118,27 bilhões). Uma característica da SWA é
que se, por um lado, serve menos destinos do que a maioria das principais companhias
aéreas dos Estados Unidos, por outro lado, quando abre uma nova rota há uma tendência
de se oferecer um grande número de frequências. Além disso, como algumas pessoas
costumam dizer: “Aonde quer que a Southwest Airlines vá, tarifas aéreas mais baixas
seguem”, já que os concorrentes são obrigados a reduzir suas tarifas. Isso traz vantagens
enormes para os destinos turísticos. Por isso, a SWA é uma companhia aérea desejada
por muitos aeroportos e destinos turísticos nos Estados Unidos. O texto a seguir, extraído
do site do aeroporto de Mobile (Alabama) reflete parte dessa dimensão e dos esforços
para atrair a SWA (LOHMANN e DUVAL, 2011):
Existe algo que Mobile possa fazer para convencer a Southwest Airlines para servir
Mobile?
A Southwest Airlines toma decisões cautelosas baseadas em suas estratégias e há
pouco que uma comunidade possa fazer para atrair a SWA além de manter uma eco-
nomia expansiva e crescente. [...] A abertura de novas rotas requer um potencial de
aproximadamente 750.000 passageiros. O potencial de Mobile é de 600.000 passageiros.
No entanto, temos trabalhado em estreita colaboração com a Southwest há dez anos e,
espera-se, um dia, que eles mudem seu modelo de negócio para se ajustarem ao tamanho
de cidades como Mobile.
Finalmente, é também importante mencionar que para muitos viajantes as tarifas mais
baixas oferecidas pelas LCCs proporcionam-lhes uma oportunidade de saírem de suas
rotinas e fazerem turismo. Quando empresas aéreas como a Ryanair oferece passagens
aéreas a £ 5 (aproximadamente R$15) em seu site, o destino é muitas vezes o que menos
importa. A maioria dos consumidores só quer viajar, de preferência para um local de
clima mais quente. Nesse sentido, o preço influencia a demanda e os destinos servidos
por LCCs se beneficiam imensamente dessa acessibilidade.

5.3.2. Empresas aéreas tradicionais (FSNC) e desenvolvimento


de destinos turísticos
Apesar do grande sucesso de algumas empresas operando no modelo de baixo
custo, empresas aéreas tradicionais ainda apresentam grandes oportunidades para des-
tinos turísticos. Operações de longo curso provêm claramente a maneira mais rápida e
eficiente para um destino atrair um mercado potencial distante. Dois exemplos disso,
e previamente mencionados nesta obra, são Cingapura e Dubai. Eles combinam uma
iniciativa bem orquestrada envolvendo companhias aéreas, aeroportos, marketing, turismo
e ações governamentais para converter passageiros em trânsito em turistas. A rede de
transportes criada tanto pela Singapore Airlines (SQ) quanto pela Emirates (EK) fez com
que tanto Changi como o aeroporto de Dubai se transformassem, respectivamente, em
centros comerciais, financeiros e turísticos importantes entre o Ocidente e o Oriente.
Com um pequeno mercado local de onde pode atrair passageiros, Cingapura, com
124
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

aproximadamente 4,5 milhões de habitantes, e Dubai, com 1,4 milhões de pessoas, es-
sas duas companhias aéreas só sobreviveram pela geração de tráfego a partir de outros
mercados externos.
A Singapore Airlines oferece um serviço de alto padrão aos passageiros de longo curso,
servindo cerca de 100 destinos em todo o mundo. Ela opera mais de um terço de todos os
voos no aeroporto de Changi, dos quais detém monopólio em várias rotas a partir do país
insular. Changi é um aeroporto de classe mundial fornecendo uma ampla gama de serviços
aos passageiros (zonas de lazer especiais, incluindo jardins temáticos e uma piscina, lojas
duty free e passeios turísticos gratuitos para passageiros com pelo menos uma conexão de
sobreposição de cinco horas) e companhias aéreas (hangares de manutenção e serviço
de catering). Cingapura como destino oferece muitas atrações ao ar livre, como o Jardim
Botânico, o Zoo que oferece grande interatividade com os animais, a Ilha Sentosa e a Ilha
da Tranquilidade. Ele também é um dos principais destinos para reuniões, convenções e
exposições não só da Ásia, mas em todo o mundo. Outra característica desenvolvida para
atrair turistas é a promoção de Cingapura como um paraíso de baixo custo para compras,
particularmente produtos de alta tecnologia, joias e relógios.
A Emirates é uma das poucas companhias aéreas do mundo a voar para todos os
continentes, aproveitando a excelente localização de Dubai entre a Europa e a Ásia, com
cerca de 3,5 bilhões de pessoas residindo dentro de um raio de 8 horas de voo a partir de
Dubai. A Emirates tem uma forte presença na Austrália e na Nova Zelândia, na Europa,
na Ásia e na África. Mais recentemente também abriu rotas para América do Norte e do
Sul. A Emirates faz uso de várias estratégias bem-sucedidas operacionais e gerenciais,
incluindo (LOHMANN, ALBERS et al., 2009):
¥ Menores custos de trabalho, devido à utilização de trabalhadores expatriados de países
de baixos salários.
¥ Terceirização de atividades de contabilidade e tecnologia de informação para a Índia
e para o Paquistão.
¥ Grandes encomendas de aeronaves junto a Airbus e Boeing para conseguir descontos
por volume.
¥ Entrada em um novo mercado oferecendo pelo menos um voo diário, e por meio de
aumento da demanda, aumentando o tamanho das aeronaves servindo esses destinos
e expandindo o número de frequências.
Parece que a estratégia definida pela Singapore Airlines para desenvolver o seu destino,
fazendo uso de uma rede de transportes eficientemente estabelecida, foi bem imitada pela
Emirates. É possível argumentar que a integração e a governança das companhias aéreas,
aeroportos e organizações de turismo só foi possível nesses dois casos, devido a seus gover-
nos e a decisão de um investimento consistente de longo prazo orientado para uma estratégia
de desenvolvimento (HENDERSON, 2006). Muitas empresas que operam em Changi ou no
aeroporto de Dubai são subsidiárias de grupos empresariais que incluem suas respectivas
companhias aéreas. Esse é um exemplo de integração vertical ao nível operacional.
125
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

5.4. O TRANSPORTE AÉREO NO BRASIL NOS ANOS 2000


O transporte aéreo começou a ser organizado e regulamentado no Brasil em 1920
quando o governo criou a chamada Inspetoria Federal de Viação Marítima e Fluvial
com atribuições relacionadas tanto à navegação quanto à indústria aeronáutica. Em
1932, foi criado o Departamento de Aviação Civil (DAC), uma vez que se entendeu
que a aviação tinha particularidades que deveriam ser tratadas de forma exclusiva.
Em 1941, o departamento foi incorporado ao Ministério da Aeronáutica, um órgão
militar. As responsabilidades do DAC envolviam o planejamento, o gerenciamento
e o controle das atividades relacionadas à aviação civil no país. Durante toda a sua
existência, o DAC foi alvo de inúmeras críticas, uma vez que muitos segmentos da
sociedade defendiam a hipótese de que o Comando da Aeronáutica deveria responder
tão somente pela defesa do espaço aéreo e da soberania nacional e não pelo controle
da aviação civil brasileira.
Em meados dos anos 1990, desenvolveu-se a chamada Política de Flexibilização do
Transporte Aéreo: um conjunto de ações governamentais com o objetivo de remover de
forma gradativa os controles sobre o setor aéreo (OLIVEIRA e SALGADO, 2006). Era o
momento no qual o governo se encontrava influenciado pelos ideais do neoliberalismo
e pelas percepções em relação aos efeitos causados à dinâmica do mercado por meio
das restrições e da política de regulamentação da época. Sendo assim, uma série de
portarias foi expedida pelo DAC entre os anos 1990 e 2001 (com ênfase nos anos 1992,
1998 e 2001), enfatizando o caráter gradativo do processo de desregulamentação. As
ações envolviam redução de tarifas, a possibilidade de entrada de novas empresas no
mercado, a centralização da malha aérea em aeroportos hubs, dentre outras.
Foi somente no ano de 2005 que o DAC foi substituído pela Agência Nacional da
Aviação Civil (ANAC), caracterizada por ser uma agência reguladora civil subordinada
ao Ministério da Defesa, marcando o período de “desmilitarização” do transporte aé-
reo no Brasil. A ANAC é uma “autarquia especial, com independência administrativa,
personalidade jurídica própria, patrimônio e receitas próprias para executar atividades
típicas da Administração Pública, que requerem, para seu melhor funcionamento, gestão
administrativa e financeira descentralizada” (ANAC, 2012).
Pelas observações de Oliveira e Salgado (2006), é possível esclarecer que a des-
regulamentação do transporte aéreo no Brasil foi extremamente útil para a redução
das tarifas, aumento da eficiência operacional das empresas aéreas operadoras e da
competitividade entre elas. Porém, como os aeroportos e o controle do tráfego aéreo não
foram desregulamentados ou privatizados, tais atividades seguiram sob administração do
governo. A combinação de todos esses fatores culminou na construção de uma rede bas-
tante peculiar com a concentração do tráfego aéreo regular de passageiros nas cidades
de São Paulo (aeroportos de Congonhas e Guarulhos) e Brasília, contribuindo, em 2006
e 2007, para a ocorrência dos dois principais acidentes aéreos registrados na história do
Brasil (COSTA et al, 2010).
126
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

5.4.1. A crise aérea no Brasil (2006-2007) e suas repercussões


no turismo
O primeiro grande acidente aéreo da década de 2000 aconteceu em setembro de
2006, quando um Boeing 737, da Gol Linhas Aéreas, que voava de Manaus para Brasília
(voo 1907) colidiu em pleno ar com um jato executivo Embraer Legacy 600 que voava
para os Estados Unidos. O acidente aconteceu quando as aeronaves sobrevoavam uma
região entre o norte do Mato Grosso e o sul do Pará. O jato executivo conseguiu pousar
avariado na Serra do Cachimbo, porém todas os 154 passageiros e a tripulação a bordo
do Boeing da Gol morreram.
No momento da catástrofe, as duas aeronaves estavam sendo controladas pelo centro
de controle de tráfego aéreo de Brasília, o que gerou, posteriormente, uma enorme dis-
cussão em relação à eficiência dos órgãos de controle no país. Em outubro do mesmo
ano, uma pane no sistema de radares do Cindacta 2 (Centro Integrado de Defesa Aérea
e Controle de Tráfego Aéreo), localizado em Curitiba, causou atrasos em pelo menos
146 voos comerciais. Com a investigação do acidente do voo 1907 em andamento, os
controladores de voo do Cindacta 1, em Brasília, se sentiam cada vez mais pressionados,
levando-os a fazer uma greve em novembro de 2006. Vale ressaltar que o Cindacta 1
era responsável pelo controle de cerca de 75% do tráfego aéreo brasileiro. O caos es-
tava assim instalado, com voos constantemente atrasados por todo o país e passageiros
estressados e revoltados nos principais aeroportos. Todos esses fatos resultaram no
seguinte quadro: em dezembro de 2006, cerca de 55% dos voos sofreram atrasos ou
cancelamentos e por muitos meses o transporte aéreo no Brasil não era mais considerado
confiável pelos passageiros (COSTA et al., 2010).
Em 2007 a história não mudou muito: greves dos controladores, atrasos e cance-
lamentos de voos e uma enorme discussão na sociedade acerca da segurança e da
qualidade dos serviços aéreos prestados pelas empresas aéreas brasileiras e aeroportos.
Foi no meio desse cenário que, em julho de 2007, outro acidente ocorreu, dessa vez
com um Airbus A320 da TAM Linhas Aéreas voando de Porto Alegre para São Paulo –
Congonhas. A aeronave aproximou-se normalmente do aeroporto, porém no momento
do pouso não foi possível pará-la, fazendo com que ela saísse da pista, atravessasse
uma avenida movimentada da maior metrópole do Brasil e atingisse um prédio da
própria TAM. Uma série de fatores contribuiu para o acidente, inclusive a chuva e o
recapeamento da pista que não tinha sido completamente concluído. No total, 200
pessoas morreram.
Os acidentes evidenciaram as deficiências do transporte aéreo brasileiro. O principal
deles diz respeito à falta de investimento na infraestrutura aeroportuária e de controle
de tráfego aéreo, apesar do enorme crescimento que o setor sofreu. Costa et al. (2010)
apontam que o sistema estava claramente afetado por problemas operacionais, pela falta
de transparência e questões administrativas da gestão militar dos sistemas de controle de
tráfego aéreo e pela concentração em apenas alguns aeroportos hubs.

127
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

É certo que todos esses problemas refletiram em diversas áreas da economia e,


sobretudo, no turismo, que depende em grande parte do transporte aéreo. Muitos turis-
tas em potencial acabaram cancelando suas viagens para não passarem por estresse
nos aeroportos, e outros trocaram de modo de transporte, deixando de utilizar aviões
e viajando de ônibus ou carros particulares. Outros ainda optaram pelas férias em
cruzeiros marítimos, por acreditarem que estes eram mais seguros. Trigo (2008) regis-
trou que a temporada 2007-2008 de cruzeiros marítimos foi a melhor já registrada até
então. Segundo pesquisa realizada pelo Sindicato das Empresas de Turismo no Estado de
São Paulo (Sindetur-SP), publicada pelo G1 (2006), cerca de 41% dos turistas admitiam
trocar o transporte aéreo pelos ônibus, principalmente em roteiros com menos de 300
quilômetros. As operadoras de turismo também sofreram com o chamado “caos aéreo”
com a venda de pacotes turísticos reduzido em 50% nesse período.
Os resorts localizados na região Nordeste foram severamente impactados pela crise,
principalmente nas cidades de Fortaleza, Natal, Recife e Salvador, por serem cidades distantes
cerca de duas a três horas de voo dos principais mercados emissores de turistas domésticos:
São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. A demanda de turistas para o Nordeste caiu cerca
de 35%, e mais de 15.000 funcionários foram despedidos em 2006 (COSTA et al., 2010).

5.4.2. O mercado aéreo brasileiro atual (2000 - 2012)


Os anos 2000 foram caracterizados pela desregulamentação e descentralização do
controle do mercado das empresas aéreas, sobretudo pela desmilitarização do setor com
o surgimento da ANAC, em 2005. Foram anos marcados pelo aumento da demanda
por transporte aéreo, pela falência de algumas empresas e pelo surgimento de outras.
O Gráfico 5.1 mostra o crescimento exponencial da demanda por transporte aéreo no
Brasil entre os anos 2004 e 2011:

Gráfico 5.1 — Movimentação de passageiros (embarques e desembarques), em mi-


lhões, de 2004 a 2011 nos aeroportos brasileiros (Fonte: INFRAERO, 2012)

128
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

Até 2001 o mercado aéreo de transporte regular de passageiros era dominado por
quatro grandes empresas: Varig, VASP, TAM e Transbrasil. Ainda em 2001 entrou em
operação a primeira empresa adepta ao modelo LCC da América Latina, a Gol Linhas
Aéreas Inteligentes. A união de todos os fatores citados anteriormente somados à grande
competitividade do mercado acabaram levando à falência duas empresas tradicionais: a
Transbrasil (2001) e a VASP (2002). A Varig, empresa sinônimo de requinte, sofisticação e
glamour nos ares, resistiu até 2007, quando foi comprada pela Gol, ironicamente famosa
pelas barrinhas de cereais e amendoins servidos a bordo. Vale ressaltar que a Gol foi a
principal responsável pela popularização do transporte aéreo no Brasil. Milhares de pes-
soas puderam voar pela primeira vez com a Gol, por conta das tarifas praticadas no início
das suas operações e das promoções surpreendentes. Sendo assim, o mercado passou a
ser dominado pelo duopólio Gol e TAM.
Acompanhando a tendência mundial da operação de empresas LCCs e pelo suces-
so que a Gol vinha desempenhando no Brasil, o empresário brasileiro e naturalizado
norte-americano David Neeleman (fundador e CEO da aérea JetBlue nos Estados Unidos)
anunciou em março de 2008 a criação de uma nova companhia aérea brasileira. Antes
mesmo do início das suas operações a empresa inovou ao lançar a promoção Você es-
colhe para que o público pudesse sugerir nomes para a própria empresa. Decidiu-se que
ela se chamaria Azul Linhas Aéreas Brasileiras, iniciando suas operações em dezembro
de 2008, até então, somente com aeronaves brasileiras, os jatos Embraer modelos 190
e 195. Em 2012 a Azul respondia por cerca de 9% do mercado doméstico brasileiro,
ocupando o terceiro lugar no ranking (INFRAERO, 2012). Lohmann e Lipovich (2013)
explicam que a quantidade de aeroportos subutilizados no Brasil e em toda a América
Latina é enorme, o que é extremamente favorável para o surgimento de LCCs nessa
região. O Gráfico 5.2 apresenta a participação das empresas no mercado de transporte
aéreo regular doméstico de passageiros em 2011:

Gráfico 5.2 — Market-share das rotas domésticas das empresas aéreas brasileiras em
2011 (Fonte: INFRAERO, 2012)

129
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Já o mercado internacional é dominado pela participação de inúmeras empresas


estrangeiras que atuam nos aeroportos brasileiros. Alguns exemplos são: American
Airlines, United Airlines, Delta Airlines, U.S. Airways e Continental (todas dos Estados
Unidos); Emirates Airlines (Emirados Árabes); Air France (França); Ibéria (Espanha);
British Airways (Reino Unido); dentre muitas outras. As nacionais TAM e Gol estão
expandindo suas rotas internacionais gradativamente, e suas operações já são bastante
significativas.
A Gol apresenta 16% do tráfego internacional (Gráfico 5.3) por conta dos seus voos
para a América Latina como Argentina, Chile, Paraguai, dentre outros. Em dezembro
de 2012, a Gol começou a operar voos regulares para as cidades de Miami e Orlando,
ambas na Flórida, nos Estados Unidos, com escala em Santo Domingo, na República
Dominicana, ampliando seu mercado (PANROTAS, 2012). Uma desvantagem dos voos
internacionais da Gol é o equipamento utilizado – Boeings 737-800 – com assentos um
tanto quanto apertados e desconfortáveis para voos de longa distância.

Gráfico 5.3 — Market-share das rotas internacionais partindo e chegando ao Brasil


em 2011 (Fonte: INFRAERO, 2012)

A TAM (responsável por 25% do tráfego internacional) oferece não somente serviços para
a América Latina, mas também voos diretos e diários partindo do Brasil para destinos na
Europa, tais como Londres, Paris, Frankfurt, Madri e Lisboa, e nos Estados Unidos como Nova
York e Miami, com aeronaves de maior porte, como nos modelos Airbus A330 e Boeing 777.
As fusões têm surgido como uma tendência do mercado aéreo com diversos casos
ao redor do mundo, e no Brasil não é muito diferente. Em junho de 2012, as companhias
aéreas TAM e LAN anunciaram o sucesso do processo de fusão das duas empresas que
deu origem à LATAM Airlines Group S.A., a maior companhia aérea da América Latina.
Segundo o G1 (2012), apesar da fusão, ambas continuarão utilizando os nomes TAM e
LAN separadamente e funcionarão normalmente em seus países, mantendo inclusive os
seus centros de operação em São Paulo e Santiago, respectivamente.
130
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

5.4.3. Os aeroportos brasileiros


Os aeroportos sempre foram locais que geraram muita curiosidade seja por pes-
quisadores, entusiastas da aviação, passageiros, empresários do mercado aéreo e até
mesmo pelos filósofos. O filósofo suíço Alain de Botton, famoso no meio acadêmico do
turismo pelo seu livro A arte de viajar, foi convidado em 2009 para passar uma semana
no Terminal 5 do Aeroporto Internacional de Heathrow, em Londres, a fim de desenvolver
uma obra que mostrasse o aeroporto em suas qualidades e deficiências sob o olhar dos
passageiros e funcionários. Um dos trechos que mais chama atenção é o seguinte:

Se alguém tivesse de levar um marciano para visitar um


único lugar que captasse perfeitamente a gama de temas que
atravessam a nossa civilização – da nossa fé em tecnologia
à nossa destruição da natureza, da nossa interconexão
ao nosso romantismo ao viajar -, então deveria ser para
os terminais de chegadas e partidas que ele deveria ir
(DE BOTTON, 2009, p. 13 – traduzido pelos autores).

Conceitualmente, o Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) estabelece uma diferença


entre os termos aeródromo e aeroporto (BRASIL, 1986). Sendo assim, um aeródromo
é entendido como toda e qualquer área de pouso, decolagem e movimentação de
aeronaves, podendo ser civis ou militares, públicos ou privados. Já um aeroporto é
um aeródromo do tipo público dotado de instalações e facilidades para apoio de
operações de aeronaves e embarque e desembarque de passageiros e cargas. Pode-se
dizer, portanto, que todo aeroporto é um aeródromo, mas nem todo aeródromo é um
aeroporto. Graham (2003) enfatiza que os aeroportos são parte essencial de um sistema
de transporte aéreo, sendo então fornecedores da infraestrutura necessária para que
ambos, passageiros e cargas, sejam transferidos de qualquer outro modo de transporte
para o aéreo.
Jarach (2001) explica que há cinco diferentes posicionamentos de mercado que podem
ser adotados pelos aeroportos:
¥ Hub primário: o aeroporto funciona como hub para uma ou mais companhias aéreas.
Geralmente construído em grandes centros econômicos que possam por si só gerar
movimentação de passageiros, seja a negócios ou a lazer. Alguns exemplos são Paris
Charles de Gaulle, Amsterdã Schiphol, Londres Heathrow, Madri Barajas e São Paulo
Guarulhos.
¥ Hub secundário: por conta de uma parceria entre a autoridade aeroportuária e uma
empresa aérea regional, o aeroporto se torna hub de uma rede de baixa densidade,
com rotas de alta frequência de negócios. Podem ainda ser desenvolvidos por uma
companhia aérea de bandeira que tenha outro hub principal, com foco em operações
de curta distância. Exemplos: Barcelona, Seattle e Montpellier.
131
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

¥ Aeroporto regional: o principal foco destes aeroportos são os voos ponto a ponto,
especialmente em segmentos que atendam ao passageiro de negócios como o táxi
aéreo. Exemplos: Milão Orio, London City, Stuttgart, Valência e Chicago Midway.
¥ Aeroporto low-cost: o aeroporto tem por objetivo atrair as LCCs e possui um terminal
e uma engenharia de operações que minimize ao máximo os custos e as tarifas às
empresas aéreas. Exemplos: London Stansted, London Luton e Dallas Love Field.
¥ Aeroporto de carga: aeroportos com foco no transporte de cargas. Por isso oferecem
uma gama de especificações técnicas para o atendimento às empresas aéreas deste
tipo. Exemplos: Campinas, Memphis, Louisville e Paris Charles de Gaulle.
Independentemente do posicionamento adotado por um aeroporto, a sua infraestrutura
é sempre dividida em duas partes: o lado-ar e o lado-terra. O lado-ar inclui todas as pistas
e vias de movimentação de aeronaves. São incluídos ainda os pátios de estacionamento
das aeronaves, as áreas de manobra, instalações e serviços de aproximação e de controle
de tráfego aéreo. O lado-terra é formado pelos terminais de passageiros e cargas. É a parte
onde o público tem livre acesso e inclui também os setores de despacho de passageiros
(check-in), de distribuição de bagagens nas esteiras de restituição, além das instalações
referentes à administração do aeroporto e das empresas aéreas. É ainda no lado-terra
onde se encontram os serviços disponíveis aos turistas e aos visitantes, tais como praças
de alimentação, banheiros, lojas e hotéis.
Uma infraestrutura aeroportuária de qualidade possibilita a gestão eficiente dos proces-
sos logísticos que envolvem a decolagem/aterrisagem de uma aeronave e o embarque/
desembarque de passageiros e cargas. Porém, como todo negócio, os aeroportos também
devem gerar lucro aos seus investidores, sendo as suas receitas classificadas em aero-
náuticas e não aeronáuticas. A taxa de embarque cobrada aos passageiros, por exemplo,
é uma receita aeronáutica, pois tem como objetivo a remuneração de prestadores de
serviço relacionados ao conforto e à segurança, bem como as instalações presentes nos
terminais de embarque e desembarque. Há ainda diversas tarifas cobradas diretamente
às empresas aéreas, tais como (FONSECA, 2004): tarifa de pouso (objetiva remunerar
a utilização das áreas e dos serviços relacionados ao taxiamento e estacionamento das
aeronaves); tarifa de permanência (cobrada para aeronaves que ficam estacionadas no
terminal por mais de três horas); tarifa de armazenagem (armazenamento de cargas
nos galpões do aeroporto); e por fim a tarifa de uso das comunicações (serviços de
informações aeronáuticas, meteorologia, tráfego aéreo, dentre outros). Basicamente,
pode-se dizer que as receitas aeronáuticas são provenientes de atividades relacionadas
ao lado-ar dos aeroportos.
Já as receitas não aeronáuticas são aquelas advindas de cobranças pelo direito de
as empresas funcionarem nas dependências dos terminais, do aluguel das lojas e dos
espaços disponíveis no aeroporto e demais atividades coordenadas pela própria adminis-
tração do aeroporto. Para Palhares (2002), os aeroportos que investem na geração de
receitas não aeronáuticas possuem uma administração “comercial”, diferentemente
132
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

daqueles administrados tradicionalmente voltados somente para a prestação de serviços


aeronáuticos.
Tais estratégias comerciais iniciaram prioritariamente com a privatização dos aero-
portos no Reino Unido e em outros países. Algumas ações incluem: instalação de lojas
de grandes marcas nacionais e estrangeiras, formando um grande shopping com preços
competitivos aos praticados nos centros das cidades; ampla variedade de estabelecimentos
de alimentação; realização de eventos como shows e exposições; opções de entreteni-
mento no interior do aeroporto como cinemas, video games, museus, centros interativos
de artesanato local, dentre outros.
O Aeroporto Internacional de Changi, em Cingapura, é um excelente exemplo de
terminal que atrai não somente passageiros, mas também outros públicos como as
companhias aéreas, funcionários do aeroporto, tripulação das empresas aéreas, pessoas
que vão ao encontro dos passageiros que chegam, visitantes do aeroporto, entusiastas da
aviação, residentes locais e o público de negócios. A chamada Changi Airport Shopping
City possui mais de 230 lojas e mais de 100 estabelecimentos de alimentos e bebidas
que variam do fast food até restaurantes que proporcionam a experiência da gastronomia
local. Além das diversas opções de entretenimento dentro do próprio terminal, o aeroporto
está ainda integrado com o destino turístico, conforme já mencionado anteriormente.
No Brasil alguns esforços têm sido feitos em relação à maximização das receitas não
aeronáuticas. A INFRAERO lançou o projeto Aeroshopping com o objetivo de fortalecer
o varejo aeroportuário em relação à identidade visual, capacitação de recursos humanos,
aprimoramento do mix comercial e da comunicação mercadológica (INFRAERO, 2012).
Entretanto, o que se encontra ainda são estabelecimentos comerciais cobrando preços
altamente abusivos e a prática de uma estratégia desconexa em relação ao destino turístico.
A Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeronáutica (INFRAERO) foi criada em 12 de
dezembro de 1972 pelo Ministério da Aeronáutica com a finalidade de administrar os
aeroportos mais importantes do país. Sendo assim, atualmente a INFRAERO é responsável
pela gestão e pela operação de 66 aeroportos em todo o país. Seus terminais reunidos
concentram aproximadamente 97% do movimento de transporte aéreo regular no país
(INFRAERO, 2012).
A estrutura administrativa dessa empresa ligada diretamente ao governo federal é
centralizada em sua sede na cidade de Brasília, com superintendências regionais que são
localizadas estrategicamente nas principais cidades do país. Esse modelo de administração
centralizada vem sendo alvo de muitas críticas pelos principais tomadores de decisões e
especialistas sob diversos aspectos correlacionados.
A primeira delas diz respeito à existência de uma única gestão de recursos que leva
a uma espécie de subsídio cruzado no qual os aeroportos superavitários acabam com-
pensando os deficitários. Sendo assim, os terminais lucrativos não veem os investimentos
sendo proporcionalmente voltados para melhorias em suas infraestruturas no repasse
de verbas. Já os aeroportos deficitários permanecem definitivamente dependentes dos
133
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

recursos provenientes das atividades dos demais. Esse modelo não estimula a concorrência
entre os aeroportos e nem desafia os aeroportos de pequeno porte a buscarem novas
estratégias a fim de diversificar o potencial do seu negócio.
No Gráfico 5.4 é possível identificar os aeroportos mais movimentados da rede
INFRAERO, e o que se percebe claramente é ainda uma centralização muito grande da
malha aérea nacional na região Sudeste (São Paulo – Congonhas e Guarulhos; Rio de
Janeiro – Galeão e Santos Dumont; Belo Horizonte – Confins), além da capital Brasília,
que se encontra entre os seis aeroportos mais movimentados do país. Este último é
uma importante ligação entre as regiões Sul/Sudeste e Norte/Nordeste por conta da sua
localização central. Muitos voos oriundos do Sul ou do Sudeste com destino ao Norte
ou ao Nordeste fazem escala ou conexão nesse aeroporto.

Gráfico 5.4 — Participação dos aeroportos em termos do número de passageiros


embarcados e desembarcados em 2011. (Fonte: INFRAERO, 2012)

Os aeroportos do Rio de Janeiro (Santos Dumont) e São Paulo (Congonhas) são os


únicos entre os dez mais movimentados do país que não são internacionais. Esse grande
fluxo de passageiros e aeronaves se deve à ponte aérea Rio – São Paulo, que transporta
diariamente milhares de passageiros. Vale ressaltar que as duas cidades são importantes
134
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

polos econômicos, de negócios e de turismo, gerando um fluxo bastante intenso entre


as duas cidades, além de passageiros advindos de outras regiões do país.
Outro ponto importante é a centralização dos voos internacionais nos aeroportos
de Guarulhos e do Galeão, em São Paulo e Rio de Janeiro, respectivamente. Esse é um
grande problema para passageiros das demais regiões do país que, obrigatoriamente,
devem realizar conexões nesses aeroportos para seguir viagem ao exterior. Sendo
assim, passageiros de Fortaleza, por exemplo, que desejassem voar para Paris, na
França, deveriam ir até o Rio de Janeiro ou São Paulo para aí sim embarcar em um voo
internacional. Além das horas de voo, o passageiro perderia ainda todo o tempo gasto
com os trâmites de embarque e desembarque no aeroporto de conexão. Essa realidade
vem mudando gradativamente, e muitas empresas aéreas estão atentas ao potencial das
demais cidades do país na demanda por voos internacionais. A American Airlines, por
exemplo, já opera voos diretos entre as cidades de Belo Horizonte, Brasília, Salvador
e Recife para Miami. A portuguesa TAP também expandiu seus negócios, com rotas
partindo de Belo Horizonte, Brasília, Salvador, Recife, Natal e Fortaleza para Lisboa
ou Porto, dependendo da rota.
Já foi apresentado anteriormente o crescimento do transporte aéreo no Brasil. Porém, é
mister afirmar que apesar de todo esse desenvolvimento o investimento na infraestrutura
aeroportuária, seja no lado-ar ou no lado-terra, não é compatível à realidade das neces-
sidades do mercado.
O que se encontra hoje são aeroportos com problemas sérios de infraestrutura que
causam transtornos não somente aos passageiros, mas também às próprias empresas
aéreas. A privatização dos aeroportos é um assunto muito debatido como forma de
melhoria e modernização dos terminais brasileiros, e alguns esforços já estão sendo
feitos nesse sentido. É importante entender que há duas formas de ceder os aeroportos
à iniciativa privada: privatização ou concessão. No primeiro caso, o aeroporto seria
totalmente vendido à uma empresa privada. Seria uma operação definitiva na qual o
poder público deixa de exercer qualquer tipo de controle sobre os próprios aeroportos.
Já na concessão o aeroporto, ou parte dele, seria cedido à iniciativa privada durante um
prazo estabelecido em um contrato. Após o fim do contrato, este pode ser renovado ou
não. Caso não haja renovação, o aeroporto volta para administração do poder público.
Tendo em vista o crescimento do transporte aéreo no país e a organização dos
megaeventos que ocorrerão nos próximos anos (Copa do Mundo de Futebol, em
2014; Jogos Olímpicos e Paraolímpicos, em 2016), decisões como essa são de grande
urgência. No início de 2012 os aeroportos de Guarulhos, em São Paulo, Viracopos,
em Campinas, e o de Brasília foram leiloados e concedidos por 20 anos à iniciativa
privada. Além disso, no dia 20 de dezembro de 2012, a presidente Dilma Roussef
anunciou que os aeroportos do Galeão (Rio de Janeiro) e Confins (Belo Horizonte)
também serão concedidos à iniciativa privada. A esperança é que os aeroportos
melhorem sua infraestrutura e adotem um modelo de competição saudável entre si,
estimulando inclusive o turismo doméstico.
135
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Sabe-se que os destinos turísticos, os aeroportos e as empresas aéreas sofrem com


a sazonalidade, ou seja, períodos do ano com maior ou menor demanda. A região do
Algarve, em Portugal, desenvolveu uma estratégia interessante por meio do segmento
do turismo residencial que poderia ser utilizada em determinadas regiões do Brasil, as-
sunto do próximo tópico.

5.5. TRANSPORTE AÉREO E TURISMO RESIDENCIAL:


O CASO DO ALGARVE
Cláudia Almeida1
O conceito de aeroporto tem evoluído ao longo das últimas décadas, motivado pela
adaptação às novas necessidades do mercado e a uma abordagem proativa resultante de
um novo posicionamento dessa infraestrutura. No contexto aeroportuário, os aeroportos
de índole turística apresentam desafios na sua gestão que advêm do fato da sua opera-
ção ser afetada pela sazonalidade associada ao destino turístico em que está inserido
(ALMEIDA, 2009 e 2010).
O conhecimento é hoje uma ferramenta chave para que os gestores aeroportuários
conheçam com detalhe as características associadas aos vários segmentos de procura
turística (GRAHAM, 2003). Além disso, possibilitam conhecer o perfil dos passageiros
e, acima de tudo, possuem informações importantes que lhes permitam uma melhor
delineação de estratégias e análise de alterações necessárias nos seus processos internos.
Por outro lado, é imprescindível para a estruturação de propostas de negociação de rotas
com as companhias aéreas (ALMEIDA, 2009 e 2010).
Um dos segmentos que tem demandado especial atenção em Portugal é o turis-
mo residencial, ou seja, aquele associado ao viajante que possui um imóvel (segunda
habitação) no destino, onde fica alojado durante a sua estada. Esse segmento assume
uma importância maior em épocas de menor procura dos destinos turísticos, uma vez
que os proprietários viajam para o destino várias vezes ao longo do ano, com especial
incidência nas épocas de menor procura turística, como salienta Almeida (2011) no seu
estudo relativo ao Algarve (Portugal). Nesse destino os proprietários estrangeiros de uma
segunda habitação visitam-no em média 4,4 vezes por ano, normalmente em períodos
de menor procura turística, reduzindo a sua sazonalidade. Esses dados já haviam sido
evidenciados por Mazón (1987) no seu estudo sobre a Playa de San Juan (Alicante) e por
King et al. (2000) que estudaram de forma comparativa a Toscana (Itália), Malta, Costa
do Sol (Espanha) e o Algarve.
Segundo Almeida (2010), esse é um segmento de mercado que se caracteriza es-
sencialmente pela procura de destinos já consolidados, seguros, onde exista um clima
ameno e boas acessibilidades terrestre e aérea. Além disso, encontramos ainda como

1
Doutora em Turismo pela Universidade de Aveiro. Professora Adjunta na Universidade do Algarve (ESGHT),
Portugal.
136
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

principais motivos de compra a existência de campos de golfe, serviços de saúde in-


tegrados e complexos de animação.
O desenvolvimento desse segmento está associado a algumas das principais tendências
globais, em concreto o envelhecimento da população e a maior mobilidade das popula-
ções, nomeadamente por via aérea, sustentada pelo desenvolvimento das companhias
aéreas de baixo custo e da sua oferta diversificada de rotas aéreas (ALMEIDA, 2009).
Associado a essas tendências tem-se também uma maior facilitação no acesso ao crédito
bancário para aquisição de uma segunda residência.
Verifica-se uma maior tendência na procura de novos destinos, novas culturas e novas
formas de viver o dia a dia, com uma escolha por destinos com clima ameno e maior
número de horas de sol por ano, favorável para pessoas que vivem habitualmente em
destinos mais frios e chuvosos, como por exemplo o Reino Unido.
A acessibilidade, principalmente aérea no caso dos mercados internacionais, é fun-
damental para esse segmento da procura turística, motivo pelo qual se torna necessário
a criação de elos de ligação entre os diferentes stakeholders, nomeadamente entidades
públicas e privadas que operam no destino, companhias aéreas e aeroportos, pois só
assim se podem adequar estratégias individuais e em parceria entre todos os interes-
sados, com o objetivo de captar clientes e até mesmo novos investimentos para a região
(ALMEIDA, 2009).
De modo a aferir as características dos passageiros que viajavam a partir do Aeroporto
de Faro (Algarve-Portugal), Almeida (2011) realizou um questionário a 3134 passageiros
que viajavam em rotas aéreas do Reino Unido, Alemanha, Irlanda e Holanda, mercados
com maior percentagem de passageiros com processamento no Aeroporto de Faro (cerca
de 80% em 2010). Desses cerca de 7% eram proprietários de um imóvel na região algarve,
cujas características resumimos no Quadro 5.1.
Almeida (2011) salienta que a média de idade dos inquiridos proprietários de um
imóvel no Algarve se situa nos 51 anos, viajando estes em grupos de, em média, 2,1 pes-
soas, em que só, em média, 0,5 apresentam uma idade inferior a 16 anos. Relativamente
ao nível escolar, 34,6% tem estudos secundários, enquanto 33,6% apresentam estudos
universitários. Dos inquiridos, 56,7% está empregado, embora se verifique que 19,4% se
encontre em processo de transição para a aposentadoria (19,4%) ou já estejam aposenta-
dos (18,4%). Sobre a sua profissão, 17,6% referiram ter a sua própria empresa, enquanto
9,3% trabalham no ensino ou em serviços financeiros.
Relativamente ao deslocamento para o Algarve, cerca de 94% dos inquiridos referiu
ter viajado numa companhia aérea de baixo custo, o que vem demonstrar a crescente
importância dessas companhias aéreas em destinos como o Algarve e para proprietários
de uma segunda habitação.
Os dados recolhidos permitem evidenciar as principais características do segmento
de procura do turismo residencial e enaltecer a importância que o mesmo assume para
uma infraestrutura aeroportuária, nomeadamente pelo fato de esses proprietários viajarem
137
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Quadro 5.1 — Estudo sobre turismo residencial no Algarve (fonte: ALMEIDA, 2011)

para o destino onde possuem o imóvel mais de quatro vezes por ano e na sua grande
maioria acompanhados, o que origina um número considerável de viagens aéreas e uma
sustentação das rotas aéreas.

5.6. CONCLUSÕES
Este capítulo se propôs a promover uma discussão sobre os principais assuntos
que dizem respeito ao transporte aéreo e aos destinos turísticos. Sabe-se que o as-
sunto é muito amplo, porém os tópicos mais importantes foram abordados. A (des)
regulamentação do transporte aéreo em diversas partes do mundo foi o primeiro item
estudado, e percebeu-se que esta teve um impacto enorme em diversas esferas. Para
as empresas aéreas os ganhos incluíram o aumento da demanda pelo transporte aéreo
de passageiros e a possibilidade da entrada de novas empresas no mercado, inclusive
138
 Capítulo 5 [Transporte Aéreo e Turismo]

para as LCCs. Do ponto de vista dos aeroportos, é importante salientar que as suas infra-
estruturas tiveram de ser adaptadas para receber um número de passageiros até então
desconhecido para as administrações aeroportuárias. Entretanto, com mais empresas
aéreas operando e mais passageiros, os aeroportos também acabaram lucrando com
a desregulamentação. Para os passageiros as mudanças foram praticamente tangíveis:
tarifas muito mais baixas, empresas aéreas operando rotas que ainda não eram operadas,
aeroportos se estruturando. Há ainda os impactos causados aos destinos turísticos, tanto
positivos quanto negativos: o aumento da demanda gera, assim como nos aeroportos,
a necessidade de adaptação das infraestruturas básica e turística e a profissionalização
dos profissionais da área.
O capítulo prosseguiu abordando a questão da identidade e da transformação de
destinos turísticos pelo transporte aéreo. Foi percebido o quanto as LCCs foram, e
continuam sendo, importantes para o desenvolvimento de novos destinos e/ou para a
consolidação de destinos já conhecidos. Observou-se ainda que as FNSCs também são
grandes oportunidades para destinos turísticos. Os exemplos de Changi, em Cingapura,
e Dubai, nos Emirados Árabes, foram fundamentais para o perfeito entendimento dessa
realidade.
Em seguida, uma longa discussão sobre o transporte aéreo no Brasil nos anos 2000 foi
desenvolvida. Inicialmente o “caos aéreo”, estabelecido após os acidentes aéreos de 2006
e 2007, foi abordado enfatizando os impactos diretos causados à indústria do turismo.
Foi importante perceber ainda que o mercado de empresas aéreas atual é basicamente
dominado por duas grandes empresas, a Gol e a TAM, e que empresas como a Azul vêm
traçando estratégias de mercado interessantes para conquistar público cada vez maior.
Os aeroportos brasileiros passam por grande dificuldade de adaptar sua infraestrutura à
atual demanda, e a preocupação é ainda maior em relação aos megaeventos de 2014 e
2016 que ocorrerão no Brasil. Em relação a esse ponto, a privatização vem sido muito es-
tudada e comentada no país, tendo alguns aeroportos já sido cedidos à iniciativa privada
como é o caso do Aeroporto de Viracopos, em Campinas.
Este capítulo encerra a discussão da relação entre o transporte aéreo e os destinos
turísticos. No próximo capítulo, o foco será o transporte aquaviário.

QUESTÕES
1. Descreva a importância da desregulamentação do transporte aéreo para o desenvol-
vimento de destinos turísticos.
2. Faça uma busca de tarifas nos sites das principais empresas aéreas para um voo da
ponte aérea Rio de Janeiro (Santos Dumont) – São Paulo (Congonhas) em uma data
qualquer e elabore um texto discutindo o resultado obtido em sua pesquisa.
3. Promova uma discussão em sua sala de aula ressaltando os impactos do caos aéreo
de 2006-2007 para o turismo. Que motivos causadores da crise continuam a existir
no país?
139
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

4. Pesquise sobre a infraestrutura dos principais aeroportos brasileiros e faça uma cor-
relação com as necessidades dos megaeventos esportivos de 2014 e 2016.
5. Pense sobre os aeroportos do futuro. Como serão? Faça uma análise levando em conta
aspectos da gestão dos aeroportos, das formas de receita e da infraestrutura disponível.
6. “Todo aeródromo é um aeroporto, mas nem todo aeroporto é um aeródromo”. Essa
frase está correta ou não? Justifique sua resposta e comente por que os aeroportos
são parte vital da experiência de viagem do turista.

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142
CAPÍTULO 6
Transportes Aquaviários
e Turismo

Guilherme Lohmann e Rafael Castro

CONCEITOS APRESENTADOS NESTE CAPÍTULO


Este capítulo discute as características do transporte aquaviário de longo curso com foco
principal nos cruzeiros marítimos. O crescimento do mercado em diversas regiões do
planeta é amplamente discutido neste capítulo, que traz ainda conceitos importantes tais
como sazonalidade e o planejamento de itinerários para cruzeiros.

6.1. INTRODUÇÃO
Com a evolução tecnológica do modo aéreo, especialmente com o desenvolvimento
do avião a jato na década de 1960, as empresas de transportes aquaviárias, que trans-
portavam passageiros de longo curso entre os continentes do mundo, desapareceram.
Isso ocorreu porque era difícil concorrer com o transporte aéreo regular de passageiros,
que apresenta maior velocidade, menor preço e maior capacidade de interligação entre
destinos, inclusive os não costeiros. Devido a essa concorrência, o transporte marítimo
de passageiros entrou em crise e se transformou, encontrando no segmento de cruzeiros
marítimos um nicho promissor. Foi no final da década de 1960 e no início dos anos 1970
que surgiram algumas das atuais empresas de cruzeiros, tais como a Norwegian Cruise
Line (NCL) e a Carnival Cruise.
Como produto turístico, os cruzeiros marítimos oferecem inúmeras conveniências
que resultam na sua enorme popularização. Em geral, os passageiros se beneficiam da
conveniência de conhecerem vários destinos permanecendo na mesma cabine durante
toda a viagem. Os cruzeiros oferecem refeições sofisticadas e entretenimento incluídos na
tarifa, com inúmeras opções adicionais de atrativos que podem ser adquiridos a bordo,
incluindo casinos, spas, duty free shopping, bares, fotografias ou mesmo refeições em
143
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

restaurantes privativos. Beneficiando-se das vantagens da flag of convenience (bandeira de


conveniência), em que navios podem ser registrados em países que não cobram impostos
e nem exigem salário-mínimo ou horários máximos de trabalhos a bordo, os preços dos
cruzeiros se tornam bastante competitivos para o viajante. A Mongólia, país não costeiro,
tem uma série de navios registrados.
Com essa fórmula, o setor de cruzeiros marítimos tem sido o segmento turístico que mais
cresce em todo o mundo (MARTI, 2004). A taxa de crescimento média anual do número de
passageiros de cruzeiros em todo o mundo, para o período 1990-2007, foi de 7,4%, sendo
bem maior que a taxa média de crescimento do turismo como um todo (WOOD, 2004).
Apenas entre os anos 2000 e 2011, foram construídos cerca de 143 novos grandes navios
de cruzeiros, e somente para o ano de 2012 eram esperados mais 13 novas embarcações,
totalizando mais 18.000 leitos. Em 2010, cerca de 14,8 milhões de pessoas ao redor do
mundo fizeram um cruzeiro de férias, e a estimativa para o ano de 2011 era que esse
número atingisse a marca de 16,3 milhões (CLIA, 2012). O Gráfico 6.1 mostra o crescimento
do número de passageiros de cruzeiros entre o período de 1980 e 2011.

Gráfico 6.1 — Crescimento de passageiros em cruzeiros marítimos no período


1980-2011. (Fonte: CLIA, 2012)

Além dos cruzeiros marítimos, outro modo de transporte aquaviário que se despontou
nas últimas décadas foram os fast ferries, catamarãs. Desde a sua criação, na Noruega,
durante a década de 1970, resultante das dificuldades de transporte terrestre devido à
topografia específica da costa Oeste do país (GEE, 1999), fast ferries evoluíram em formas
e tamanhos diferentes e são atualmente utilizados para inúmeros fins, incluindo transporte
urbano de curta distância, viagens de médio curso que transportam uma combinação de
144
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

passageiros e de transporte de carga, operações militares, de patrulhamento, resgate de


incêndio, controle de poluição e transporte exclusivo de carga.
Embora este capítulo tenha por objetivo apresentar os transportes aquaviários de lon-
go curso, o foco principal se dá nos cruzeiros marítimos, em função da sua importância
para a indústria turística e para as centenas de destinos turísticos no mundo. Em especial
será apresentado o desenvolvimento desse setor, os principais destinos visitados, o pla-
nejamento de itinerários de cruzeiros e seus impactos nos destinos visitados. No Brasil,
de forma particular, houve um expressivo avanço do número de navios de cruzeiros que
atualmente visitam as nossas costas, e uma análise será também efetuada. O capítulo
termina apresentando os ferries catamarãs, que, embora ainda não estejam presentes
no Brasil, são dignos de serem considerados em função do potencial que apresentam.
Apesar disso, duas experiências malsucedidas de implantação, quer no Havaí, quer na
Nova Zelândia, serão abordadas com o propósito de se tirarem lições de como novas
tecnologias de transportes apresentam desafios a serem vencidos, principalmente no
que diz respeito às regulamentações que lhes são impostas na atualidade.

6.2. DESENVOLVIMENTO DO SETOR DE CRUZEIROS MARÍTIMOS


Embora a indústria de cruzeiros marítimos só tenha se expandido amplamente nas
últimas décadas do século XX, o conceito de viagens a lazer em navios, com o propósito
de visitar vários destinos litorâneos, surgiu em meados do século XIX, no Reino Unido.
Segundo Cartwright e Baird (1999), na década de 1890 a Orient Lines operava cruzeiros
regulares no Caribe, no Mediterrâneo e na Escandinávia. No início do século XX, em-
presas como a White Star Line (a mesma que operou o Titanic), P&O (Peninsular and
Oriental Steam Navigation Company), dentre outras, também passaram a operar cruzeiros
regulares.
A Lei Seca, que vigorou nos Estados Unidos entre 1920 e 1933, proibia o consumo
de bebidas alcoólicas no país, inclusive nos navios de bandeira norte-americana. Entre-
tanto, tal sanção não se aplicava aos navios de bandeiras estrangeiras. Com isso, muitos
navios estadunidenses passaram a navegar com a bandeira do Panamá e a oferecer aos
norte-americanos a oportunidade de consumirem bebidas alcoólicas em suas viagens.
Assim, os cruzeiros marítimos passaram a significar uma ocasião para celebrações
anuais, com direito a consumo de álcool. Posteriormente empresas de cruzeiros também
se beneficiaram das liberdades oferecidas ao navegarem em águas internacionais para
oferecerem atividades ilícitas em alguns países, como é o caso de casinos. Alguns dos
chamados cruise to nowhere nada mais são do que viagens de cruzeiros, geralmente de
curta duração, sem visitar um destino em particular, apenas com o propósito de se per-
manecer em águas internacionais.
Na década de 1930, surgiram os navios luxuosos, alguns no estilo art déco, com
infraestruturas mais confortáveis, inclusive com cabines com vista para o mar. Em 1938,
o Normandie, até hoje considerado por muitos o mais belo navio já construído, efetuou
145
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

um cruzeiro de 22 dias entre Nova York–Rio de Janeiro–Nova York, mas o seu acesso,
diferente dos tempos atuais, era restrito à elite econômica da época. Suas passagens cus-
tavam entre US$ 395 e US$ 8.600 (valores da época!).
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, o transporte de passageiros foi amplamente
reativado, não só no deslocamento das tropas de volta ao lar, mas nas ligações a partir
do Reino Unido para a Índia e a Austrália. O Reino Unido, com sua decisão, na década
de 1960, de só permitir que seus cidadãos comprassem 50 £ em moeda estrangeira para
viajar ao exterior, terminaram por incentivar o crescimento dos cruzeiros marítimos, uma
vez que os navios de bandeira inglesa permitiam aos passageiros gastarem a bordo suas
libras, deixando a cota em moeda estrangeira para ser utilizada apenas nos destinos turís-
ticos internacionais a serem visitados.
Tudo mudou quando, em 1958, a Pan Am inaugurou o primeiro voo do Boeing 707.
As linhas marítimas regulares pouco a pouco desapareceram, processo este agravado
ainda mais com o surgimento do Boeing 747 em dezembro de 1969, capaz de trans-
portar mais do que o dobro de passageiros do que o Boeing 707. Embora as empresas
marítimas de passageiros tenham procurado outros mercados para explorar, aquelas
que operavam apenas com linhas regulares encontraram grandes dificuldades para se
adaptarem ao mercado de cruzeiros marítimos, principalmente em função de:
¥ Empregarem tripulação dos seus próprios países, cuja mão de obra era muito mais
cara. A solução foi registrar os navios em países que não impunham restrição quanto
à nacionalidade dos tripulantes (bandeira de conveniência).
¥ Haver relutância por parte das empresas de navegação em transferir o registro de seus
navios para a situação de “bandeira de conveniência”.
¥ Existir escassez de recursos para converter os navios de transporte regular, que ge-
ralmente tinham dois ou três tipos de classes de passageiros, para apenas uma única
classe, como é o caso dos navios de cruzeiros.
¥ Não entenderem que os passageiros de cruzeiros têm expectativas diferentes daqueles
das linhas regulares, principalmente no que diz respeito a infraestruturas, serviços e
atrações existentes a bordo.
Com uma greve promovida pelos trabalhadores marítimos em 1966, a crise do pe-
tróleo no início da década de 1970, responsável pelo aumento de até dez vezes o preço
do barril, e com a liberação das restrições de compra de moeda estrangeira para viajar
ao exterior, o setor de cruzeiros marítimos britânicos entrou em crise, principalmente
porque muitos turistas foram atraídos pelos pacotes com voos charter para cruzeiros na
região do Mediterrâneo. Do outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos, começaram
a surgir empresas como a Carnival Cruises e Royal Caribbean, que passaram a lançar
cada vez mais navios, operando principalmente no Caribe a partir do porto de Miami.
Foram essas novas empresas que passaram a ditar o ritmo e a tendência do mercado
durante os anos 1970.

146
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

A demanda por cruzeiros marítimos, após o crescimento do início da década de 1970, foi
novamente aquecida a partir do ano de 1988, em parte devido à recuperação do mercado
no Reino Unido. Nesse ano, foi entregue o primeiro meganavio, o Sovereign of the Seas,
com 73 mil GRT (ver explicação a seguir), seguido por vários outros, tais como o Ecstasy
(1991), da Carnival, e o Crown Princess, da P&O/Princess (em 1990 com 69.845 GRT).
Esse exponencial crescimento do setor de cruzeiros pode ser atribuído a vários fato-
res. O primeiro, e talvez mais contundente, é o fato de os navios de cruzeiros terem se
transformado em verdadeiros “destinos turísticos flutuantes” que proporcionam, numa
só viagem, uma experiência altamente satisfatória de hospedagem, gastronomia, lazer,
compras e entretenimento. As empresas de transportes marítimos passaram a priorizar
não só mais os seus itinerários, com seus respectivos destinos turísticos (portos), mas
também incorporaram inúmeros atrativos, equipamentos e atividades a bordo para trans-
formar o navio de cruzeiro, por si só, no maior e principal destino. Um sinal evidente
dessa diferenciação no produto “navio” pode ser exemplificada pela atual divisão da
tripulação dos próprios navios. Tripulantes estão agora claramente divididos em áreas
distintas de operação: técnico e navegação de um lado, hotelaria e entretenimento do
outro (LOIS, WANG et al., 2004). Adicionalmente, em face da grande segmentação de
mercado que tais embarcações já apresentam, é possível encontrar cruzeiros específicos
para uma ampla gama de público, incluindo certos nichos de mercado, que vão desde
famílias com crianças, casais em lua de mel, solteiros, amantes dos esportes, apreciadores
da boa musica, até aqueles cruzeiros destinados exclusivamente a realização de eventos
empresariais, científicos, religiosos, entre outros.
Outro fator responsável pelo rápido crescimento do setor de cruzeiros está relacio-
nado ao alto índice de satisfação dos passageiros. Mais de 80% dos usuários se dizem
“extremamente satisfeitos” ou “muito satisfeitos” em ter participado de um cruzeiro.
Além disso, de cada dez passageiros de primeira viagem, sete afirmam que a experiência
de um cruzeiro excedeu suas expectativas. A cada ano, a participação de viajantes que
realizam um cruzeiro pela primeira vez é da ordem de 40%. Não é surpresa alguma
encontrar num cruzeiro vários cruzeiristas que já estiveram em mais de dez cruzeiros,
enquanto alguns podem já ter participado de até 25 cruzeiros!
Mais um fator de sucesso dos cruzeiros é que os navios construídos são cada vez
maiores, criando assim um produto de massa personalizado e permitindo que as empresas
de transportes obtenham economia de escala e possam praticar tarifas altamente atraentes
em comparação com seus concorrentes em “terra firme” (WEAVER, 2005). Em grande
parte o crescimento da indústria de cruzeiros marítimos se deve ao fato de os preços das
viagens terem diminuído consideravelmente pelo ganho das economias de escala e de
escopo. Muitas viagens de cruzeiros podem chegar a custar quase a metade da estada
em um hotel de mesmo padrão (5 estrelas).
Esse aumento no tamanho e consequentemente na tonelagem dos cruzeiros pode
ser observada na Tabela 6.1. Percebe-se que o volume dos navios quase triplicou, entre

147
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Tabela 6.1 — Evolução do volume (GRT), capacidade e custo de construção de navios


de cruzeiros

ANO NAVIO GRT LEITOS CUSTO (MILHÕES US$)


Carnival Cruises
1972 Mardi Gras 27.300 1.024 nd
1982 Tropicale 36.674 1.022 100
1990 Fantasy 70.367 2.056 225
1996 Destiny 101.353 2.642 350
2003 Pinnacle Class 150.000 2.620 450
Royal Caribbean Cruises
1970 Norway 18.000 724 13.5
1988 America 23.000 1.004 140
1990 Sovereign 73.192 2.278 150
1999 Voyager 137.276 3.144 500
2006 Fredom 154.407 3.634 750
Fonte: Klein (2005) e CLIA (2012).

a década de 1970 para década de 1990. É importante frisar que a unidade de medida
do volume interno de um navio é conhecida como GRT, em inglês Gross Registered
Tonnage. Muitos confundem o termo como sendo o peso do navio, mas esse não
é o caso. Muito menos o GRT representa o volume de água deslocada pelo navio.
Uma unidade de GRT representa cem pés cúbicos, volume equivalente a 2,83m3. Em
relação à capacidade de um navio em número de leitos, o seu cálculo é efetuado
multiplicando-se por dois o número de cabines existentes, considerando-se uma média
de duas pessoas por cabine. Entretanto, como às vezes as empresas acomodam até três
ou quatro passageiros numa mesma cabine, o fator de ocupação de um navio (load
factor) pode tornar-se superior a 100%. A Carnival, por exemplo, teve um load factor
médio, em 2000, de 105,4%, enquanto, em 1999, este foi de 104,3% (CARNIVAL
CORPORATION, 2001).
Outro fator que contribui para o sucesso dos cruzeiros é o fato de os mesmos fornece-
rem uma variedade de opções relativas à duração e itinerários de viagens. Os passageiros
podem escolher cruzeiros a partir de dois dias de duração para lugares próximos, até
cruzeiros de circum-navegação do globo terrestre (MARTI, 2004). Um cruzeiro ao redor
do mundo geralmente dura entre 80 e 110 dias e tem tarifas diárias que podem variar
de US$100 a mais de US$3.000 (MARTI, 2004). Mesmo os cruzeiros de longa duração
podem ser divididos em vários cruzeiros menores. Isso pode ser vantajoso tanto para
os passageiros, que podem viajar mais vezes para vários destinos em navios diferentes,
assim como para as empresas de cruzeiros, que podem otimizar a ocupação do navio
negociando mais facilmente os cruzeiros menores devido ao menor custo.
Devido à ampla segmentação dos navios de cruzeiros, estes passaram a receber
diferentes classificações. Desde o sistema de classificação por estrelas, passando pela
148
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

classificação de tamanho, volume e capacidade, até a classificação pelo luxo das


embarcações. Como exemplo, pela classificação de cruzeiros do Guia Berlitz, Ocean
Cruising & Cruise Ships 2005, os cruzeiros marítimos em todo o mundo são classificados
em dez categorias diferentes, de uma estrela simples a 5 estrelas plus (BARRON e
GREENWOOD, 2006). Já de acordo com a classificação de Ward (2005), por exemplo,
o foco é na quantidade de passageiros que o navio pode transportar: o navio Boutique
pode acomodar de 50 a 200 passageiros; o navio pequeno pode acomodar entre 200
e 500 passageiros; o navio médio pode acomodar de 500 a 1.200 passageiros e o
navio grande acomoda mais de 1.200 passageiros. O mesmo autor também classifica
os navios por segmento de mercado em que se posicionam em função do nível de
qualidade das refeições, serviços e instalações. Assim, Ward classifica os cruzeiros
como sendo standard, premium luxo, ou totalmente exclusivo (WARD, 2005). Além
disso, às vezes as próprias empresas de cruzeiros adotam uma autoclassificação. Como
exemplo, a empresa Carnival, que se classifica como sendo de baixo custo, enquanto
a empresa Cunard se classifica como sendo uma empresa de navios de luxo (BRIDA
e ZAPATA, 2010).
Pode-se afirmar, no entanto, que o mercado mundial de cruzeiros é ainda bastante
concentrado, tanto pela oferta como pela demanda. O mercado fornecedor é controlado
por poucas grandes corporações americanas e europeias. Apenas três corporações, a
Carnival Corporation, a Royal Caribbean Cruises e a Star Cruises, no ano de 2002, con-
trolavam 79,7% do mercado mundial. A Carnival controla sozinha 12 marcas: Carnival
Cruise Lines, Princess Cruises, Holland America Lines, Seabourn Cruiseline, Windstar
Cruises, Costa Cruises, a P&O Cruises, Cunard Line, Swan Hellenic, Ocean Village, Aida
e P&O Cruises Australia (BUTT, 2007). O mercado está concentrado também em termos
dos destinos operados, com o Caribe recebendo 43% do total de cruzeiros (BUTT, 2007).
Pelo lado da demanda, ele está concentrado no mercado norte-americano (Estados Unidos
e Canadá), que representava, no ano de 2009, aproximadamente 70% do mercado, de
acordo com a Cruise Lines International Association (CLIA).
A CLIA é a principal associação que congrega essas e outras empresas de cruzeiros.
Em 2006, fundiu-se com a International Council of Cruise Lines (ICCL), uma entidade irmã
criada em 1990 que se dedicava ao processo de regulamentação e desenvolvimento de
políticas da indústria de cruzeiros. Assim, após a fusão de ambas organizações, a CLIA
mudou-se para Fort Lauderdale, na Flórida, em janeiro de 2007, porém mantém uma
filial em Washington, DC (CLIA, 2012). Trata-se de uma associação bem organizada e
que exerce bastante influência no mercado de cruzeiros. Nos Estados Unidos, os gastos
do setor de cruzeiros, principalmente por meio da CLIA, com lobby junto ao Congresso
norte-americano, durante 1997 a 2007, chegou a quantia de mais de US$10 milhões de
dólares (BRIDA e ZAPATA, 2010).
O perfil médio do passageiro norte-americano, em geral, é o seguinte: mais de 48
anos de idade, um rendimento anual acima de US$97.000 dólares, diploma universitário
e casado (BARRON e GREENWOOD, 2006; CLIA, 2012). O sistema de distribuição e
149
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

venda dos cruzeiros marítimos continua sendo, predominantemente, “concentrado” nos


agentes de viagens, que realizam cerca de 90% das reservas no mercado norte-ame-
ricano. Em comparação a outros produtos turísticos, os cruzeiros marítimos são muito
mais complexos, pois envolvem uma vasta opção de itinerários, navios e destinos,
favorecendo o uso de um agente de viagens para auxiliar no processo de decisão e
compra. Apenas nos Estados Unidos, um bilhão de dólares foram pagos de comissão
para agentes de viagens no ano de 1998 (CLIA, 2012).
Se, por um lado, o transporte aéreo foi o principal indutor do fim do transporte maríti-
mo de linhas regulares, atualmente ele é um dos principais responsáveis pelo fenômeno
dos cruzeiros marítimos. Pelos pacotes air/sea, as empresas de cruzeiro oferecem pas-
sagens aéreas de ida e volta para o porto de saída dos navios a preços promocionais.
Outra opção também é a de o passageiro viajar de navio para um determinado destino,
e voltar para o porto de origem de avião. O Reino Unido, um dos principais mercados
de cruzeiros marítimos e com importantes portos, como Southampton, teve 69% dos
cruzeiros vendidos em conjunto com passagens aéreas (fly-cruise) no ano de 1994
(PEISLEY, 1995).
Embora ainda distante da realidade norte-americana ou europeia, o Brasil caminha
a passos firmes na expansão de mercado de cruzeiros. O mercado de cruzeiros no
Brasil tem apresentado um crescimento substancial anual desde 2004 e é atualmente
considerado um mercado atraente para as empresas de cruzeiros (ABREMAR/FGV, 2011)
(ver Seção 6.5).

6.3. PRINCIPAIS DESTINOS DE CRUZEIROS MARÍTIMOS


Os principais destinos de cruzeiros marítimos são aqueles que possuem maior apelo
turístico, águas propícias para a navegação durante boa parte do ano, investimento
em infraestrutura portuária, dentre outros aspectos. Charlier e McCalla (2006) apontam
que existem três principais macroáreas geográficas nas quais os cruzeiros acontecem
e elas se complementam de acordo com as temporadas. São elas: América do Norte e
América Central, Europa e os demais países. É interessante observar que os autores ainda
esclarecem que, segundo análise feita em 2004, no primeiro trimestre de cada ano, por
exemplo, cerca de 63% da oferta de cruzeiros está concentrada nas Américas Central e do
Norte, com maior destaque para a primeira, onde o clima está mais ameno nessa época.
No segundo trimestre, há uma redução na oferta norte-americana, que cai para 54%, e
um grande aumento na oferta europeia, que chega a 31% e tem o seu auge no terceiro
trimestre com 38,6% da oferta, conforme a Tabela 6.2. Portanto, percebe-se claramente
como a distribuição da oferta em cada região do planeta de acordo com a sazonalidade
faz com que o mercado esteja sempre em movimento.
A Tabela 6.3 mostra a atratividade de alguns destinos de cruzeiros apontados junto ao
mercado norte-americano, com o Caribe liderando esse ranking. Essa região, formada por
diversas ilhas e famosa pelo mar azul cristalino, sempre foi um dos principais destinos de
150
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

Tabela 6.2 — Estrutura geral do mercado de cruzeiros marítimos em 2004 de acordo


com as regiões e os trimestres

REGIÃO 1° TRIMESTRE 2° TRIMESTRE 3° TRIMESTRE 4° TRIMESTRE


América Central 63,3% 54,3% 52,03% 59,5%
e do Norte
Europa (incl. 5,8% 31,8% 38,6% 18,4%
transatlânticos)
Demais países 25,3% 12,08% 8,8% 18,8%
Embarcações 5,6% 1,7% 0,5% 3,2%
ociosas
Fonte: Charlier e McCalla (2006).

Tabela 6.3 — Destinos com maior apelo para cruzeiros marítimos

REGIÃO %
Caribe 45%
Alasca 24%
Bahamas 23%
Havaí 15%
Bermuda 15%
Mediterrâneo/Ilhas Gregas/Turquia 14%
Restante da Europa 13%
Canal do Panamá 8%
Costa Oeste do México 8%
Fonte: adaptado pelos autores de Florida-Caribbean Cruise Association (2010).

cruzeiros marítimos. Desde a década de 1980, o mercado nessa região vem apresentando
consecutivos aumentos expressivos passando rapidamente de 1,4 milhão de passageiros
em 1980 para 8,5 milhões em 1997 (WOOD, 2000) a partir de uma estratégia que tinha
por objetivo popularizar os cruzeiros marítimos no Caribe.
A Tabela 6.4 mostra, por exemplo, o substancial aumento de cruzeiristas em Belize,
país banhado pelo mar do Caribe, entre o ano de 2001 e 2007, um aumento da ordem de
1140% em poucos anos. Esse crescimento de visitantes de cruzeiros em Belize pode ser
atribuído também à abertura em 2002 de um porto na cidade especialmente construído
para atender cruzeiros (DIEDRICH, 2010).
É importante perceber que há uma variação metodológica nos estudos estatísticos
que por vezes incluem as Bahamas como parte do Caribe (Tabela 6.4), enquanto outros
apresentam seus dados separadamente, por conta da expressão desse destino para o
mercado de cruzeiros (Tabela 6.3). A maioria dos roteiros que incluem o Caribe partem
dos Estados Unidos, sobretudo do estado da Flórida, com as cidade de Miami, Fort
Lauderdale e Port Canaveral como os principais portos de embarque/desembarque,
151
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Tabela 6.4 — Visitantes de cruzeiros nos principais destinos do Caribe

PAÍS 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007


Belize 48.166 319.690 575.196 851.436 800.331 655.931 624.128
Bahamas 2.551.673 2.802.112 2.970.174 3.360.012 3.078.709 3.076.397 2.970.659
Ilhas 1.214.757 1.574.750 1.818.979 1.310.960 1.798.999 1.930.136 1.715.666
Cayman
Cozumel 1.595.362 2.343.135 2.708.913 2.862.036 2.519.179 n/d n/d
Ilhas 1.891.389 1.738.710 1.773.948 1.963.609 1.912.539 1.901.275 1.917.878
Virgens
Porto Rico 1.350.317 1.203.911 1.234.922 1.065.215 1.315.079 1.338.019 1.437.239
Fonte: adaptado de Diedrich (2010).

porém já existem roteiros mais longos partindo também de Nova York. Uma das es-
tratégias da região é aliar os cruzeiros com a visita aos parques temáticos da cidade de
Orlando. A Disney Cruise Line, por exemplo, oferece serviço de traslado entre os portos
e os parques e resorts de Walt Disney World.
O segundo destino de cruzeiros mais importante é o Alasca, nos Estados Unidos.
Entre os anos 1997 e 2008, o número de visitantes provenientes de cruzeiros no Alas-
ca dobrou, passando de 500 mil a 1 milhão de pessoas (ALASKA CRUISE ASSOCIA-
TION, 2012). Os itinerários no Alasca acontecem, basicamente, de duas formas: com
embarque em Seattle (Estados Unidos) ou Vancouver (Canadá) passando pelo Sudeste
do Alasca, ou cruzeiros pelo golfo do Alasca embarcando ou desembarcando em An-
chorage, passando por Seward e Whittier, todas cidades no próprio Alasca. A duração
média dos roteiros é de sete dias, e a temporada acontece entre os meses de maio a
setembro de cada ano. O perfil do cruzeirista que viaja ao Alasca é representado pelo
turista que, ao escolher um cruzeiro, o faz com base prioritária no destino, e não na
experiência a bordo das embarcações. Sendo assim, nota-se que a participação dos
passageiros nas excursões aos destinos visitados pelos navios é muito maior do que nos
demais destinos de cruzeiros, tendo uma estimativa de que cerca de 80% a 90% do
total de passageiros compra pelo menos uma excursão ao longo da viagem (ALASKA
CRUISE ASSOCIATION, 2012).
Há de se chamar atenção para mercados de cruzeiros marítimos ainda emergentes. A
Austrália é um desses casos e tem apresentado crescimento extremamente significativo
nos últimos anos, conforme o Gráfico 6.2. Um estudo realizado pela ICCA (International
Cruise Council Australasia) mostrou que cada vez mais o turista australiano que opta
por passar suas férias em um cruzeiro prefere permanecer: ou no próprio território aus-
traliano (aumento de 33% entre 2010 e 2011) ou em viagens para a vizinha Nova Zelândia
(aumento de 80% no mesmo período) ou em roteiros que incluam o Pacífico Sul - Taiti,
Fiji e viagens transpacíficas (aumento de 34%) (ICCA, 2011).
Assim como a Austrália, o Brasil também vem despontando como um excelente destino
de cruzeiros marítimos (ver Seção 6.6). Um dos fatores decisivos para o sucesso ou não
152
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

Gráfico 6.2 — Crescimento do número total de passageiros de cruzeiros na Austrália


2002-2011. (Fonte: DELOITTE ACCESS ECONOMICS, 2012)

desse mercado é o planejamento correto dos itinerários dos cruzeiros a fim de atender à
demanda e otimizar as operações das empresas armadoras.

6.4. PLANEJAMENTO DE ITINERÁRIOS DE CRUZEIROS MARÍTIMOS


O itinerário de um navio de cruzeiro, incluindo o porto de partida/chegada (port of
embarkation/disembarkation) e os portos visitados ao longo da viagem (port of calls)
durante um certo número de dias, constitui o segundo fator mais importante no processo
de escolha dos cruzeiristas. Só perde para o custo (MARTI, 1991). Dessa forma, o
processo de planejamento de um itinerário é meticulosamente estudado pelas empresas
de cruzeiros a fim de atender os mercados e segmentos que espera atrair. Grandes es-
forços de marketing são feitos tanto pelos destinos turísticos quanto pelos operadores
portuários com o propósito de captar e manter os itinerários de cruzeiros. A SeaTrade,
também conhecida como Cruise Shipping Miami, é a principal convenção do setor, e
acontece anualmente na segunda maior cidade da Flórida.
Os itinerários de cruzeiros podem ser classificados de diferentes formas, e cada
um apresentará características próprias que influenciarão em aspectos específicos da
viagem como um todo. Os termos geralmente são utilizados em inglês e ilustrados a
seguir com exemplos:
¥ “Close jaws”: são itinerários que começam e terminam num mesmo porto, ou seja,
nesse caso o porto de embarque e desembarque é o mesmo.
¥ “Open jaws”: são itinerários que começam e terminam em diferentes portos. Esse
tipo de itinerário inclui as viagens de reposicionamento de navios, por exemplo,
quando eles são trazidos do hemisfério Norte para passar a temporada de verão no
Brasil ou podem fazer parte de um itinerário maior, como um navio fazendo a volta
ao mundo, mas que a empresa de cruzeiro também vende trechos individuais. Na
153
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Austrália é muito comum os cruzeiros que fazem um itinerário costa a costa serem
desse tipo, como por exemplo as viagens de Sidney até Perth. Há implicações desse
tipo de cruzeiro, uma vez que ele irá requerer o deslocamento de volta para os locais
de origem dos cruzeiristas (vide discussão anterior sobre: fly-cruise).
¥ “Cruise to nowhere”: são cruzeiros de poucos dias cujo objetivo principal é levar o
navio para águas internacionais, sem necessariamente visitar nenhum destino turís-
tico. O propósito geralmente está ligado a exercer atividades que são ilegais em
determinados destinos, como a operação do casino ou a venda de bebidas alcoólicas.
São muito populares na Ásia.
¥ “Round the world cruise”: cruzeiros de longa duração, com duração de mais de
100 dias, geralmente ofertado por empresas que atraem o segmento de luxo, com o
propósito de circum-navegar o globo terrestre. Tais itinerários podem ser ofertados não
só a passageiros fazendo todo o percurso, mas também individualmente em trechos
opened jaws de aproximadamente duas semanas.
Além das empresas de cruzeiros e das organizações de turismo, vários outros sta-
keholders se fazem interessados no planejamento dos itinerários de cruzeiros, incluin-
do operadores portuários, imigração e alfândega e operadores de turismo receptivo.
Operadores de turismo receptivo, em particular, são peça-chave na montagem de um
itinerário, uma vez que são os responsáveis por intermediar junto aos operadores locais
as opções de tours a serem oferecidos no destino (ver Figura 6.1). Em muitos casos,
esses operadores trabalham junto com atrações turísticas locais, restaurantes e outros
estabelecimentos para montarem vários pacotes receptivos. Por se tratarem, em muitos
casos, de operadores de pequeno porte, a oportunidade de oferecer seus produtos para
uma empresa de cruzeiros impõe uma série de desafios. Dentre eles consta a neces-
sidade de oferecerem produtos de alto padrão e estarem sujeitos a cancelamento caso,
por exemplo, o navio não possa usar tenders, embarcações de menores dimensões, em
função de mau tempo. Para a empresa de cruzeiro, a experiência que os cruzeiristas
terão no destino é crucial para o sucesso do cruzeiro como um todo. Daí, em alguns
casos, empresas como a Disney Cruise Line manterem ilhas particulares no Caribe,
a fim de poderem oferecer o mesmo padrão de qualidade dos serviços prestados a
bordo, ao mesmo tempo em que retêm para si as despesas que os cruzeiristas fizerem
em terra firme.
Uma série de fatores influencia a escolha e a montagem de um itinerário de cruzeiros,
que em muitos casos pode ocorrer com até três anos de antecipação. Henry (2012)
enumera os seguintes:
1. Duração do cruzeiro: em geral cruzeiros de curta duração, como por exemplo
duas ou três noites, terão passageiros mais interessados em ficar no navio do que
desembarcar. Nesse grupo incluem-se os chamados cruise to nowhere apresentados
anteriormente. Cruzeiros com maior duração tenderão a visitar um número maior de
destinos, embora haja exceções como as viagens transatlânticas, em que o interesse

154
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

Figura 6.1 — Sinalização em Ilha Bela (SP) informando em cores a localização dos di-
versos tipos de tours/operadores/transportes disponíveis para cruzeiristas, fevereiro
de 2008 (Fonte: foto cortesia de Guilherme Lohmann)

dos passageiros se dá na viagem em si e no navio. De forma geral, a duração do


cruzeiro leva em conta aspectos do mercado a ser atraído e sua disponibilidade de
férias, bem como o número de destinos a serem cobertos numa região. Um cruzeiro
de duas semanas a partir da Costa Oeste dos Estados Unidos para o Estado do

155
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Havaí provavelmente passará mais tempo viajando pelo Pacífico do que visitando o
arquipélago havaiano.
2. Destinos turísticos: vários aspectos de um destino turístico são levados em consi-
deração na sua escolha como parte de um cruzeiro marítimo. A distância entre os
destinos bem como em relação ao mercado de origem dos passageiros devem ser
considerados. Operando com velocidade média de aproximadamente 33km/h, os
destinos geralmente são encaixados de forma a minimizar muitos dias em alto-mar,
ao mesmo tempo em que permite ao navio viajar à noite e ficar atracado no destino
durante o dia. Tipicamente os passageiros terão o horário entre 8h00 e 18h00 para
desembarcarem e visitarem o destino. Obviamente que a atratividade dos destinos
escolhidos é fundamental para o apelo do itinerário como um todo. As atrações
disponíveis e as excursões oferecidas têm papel fundamental para atrair não só
cruzeiristas que estejam fazendo o itinerário pela primeira vez, bem como aqueles
que desejem visitá-lo em outras ocasiões.
3. Acessibilidade portuária: este aspecto está diretamente relacionado ao item a seguir
(tamanho do navio) já que do ponto de vista operacional o porto precisa oferecer
condições para que o navio ancore ou opere com tenders. Portos recebendo vários
navios podem sofrer congestionamentos tanto na atracação dos navios quando nas
vias que dão acesso ao terminal portuário.
4. Tamanho do navio: está relacionado ao segmento e ao número de passageiros que
serão transportados. Um navio “boutique” é aquele que pode acomodar entre 50 e
200 passageiros; um navio de pequeno porte entre 200 e 500 passageiros; um navio
de médio porte acomoda entre 500 e 1200 passageiros; e um “navio resort” tem ca-
pacidade para mais de 1200 passageiros. No entanto, essa classificação é considerada
incompleta se não levar em conta a segmentação dos passageiros transportados, que
podem ser classificados em padrão, premium/luxo ou totalmente exclusivo (BARRON
e GREENWOOD, 2006). Como visto no Capítulo 2, há forte ligação entre o tipo de
turista e o estágio de desenvolvimento dos destinos que estes planejam visitar.
Assim como em vários outros aspectos da experiência de um cruzeiro, as empresas
levam muito em consideração a avaliação feita pelos passageiros. Decepção com as
excursões oferecidas ou com a experiência do destino como um todo podem fazer as
empresas reverem seus itinerários e oferecem novos destinos/itinerários. Esse é um as-
pecto de grande competitividade entre destinos que oferecem apenas “ports of call”.
O estado de Queensland, na Austrália, identificando o potencial de crescimento
para a oferta de cruzeiros marítimos em sua costa, preparou os seus principais destinos
costeiros como Brisbane, Whitsundays, Cairns e Port Douglas, com várias iniciativas.
Um manual detalhado e em linguagem simples foi produzido com o propósito de ex-
plicar aos operadores turísticos locais o potencial desse segmento turístico, bem como
de que forma ele funciona e quais segmentos e mercados atrai (TOURISM QUEENS-
LAND, 2006). Anos depois do lançamento desse manual, uma série de medidas foram

156
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

implementadas, incluindo a participação por anos seguidos na SeaTrade a fim de


fazerem os tomadores de decisão terem conhecimento da atratividade do estado e de
seus destinos, elaboração de estudos junto da demanda de cruzeiristas, disseminação
dessas informações e de outras oportunidades por meio de de simpósios realizados
nos destinos envolvidos. Além disso, investimentos em sinalização e infraestrutura
dos terminais foram efetuados, bem como o estabelecimento de um programa para
recepcionar todos os navios com uma banda musical composta por voluntários. Os
resultados desses esforços foram constatados pelo crescimento da demanda em 34%
entre as temporadas 2010/2011 e 2011/2012, bem como um aumento do núme-
ro de cruzeiros visitando os portos do estado de 193 para 282 no mesmo período
(O’BRIEN, 2012).

6.5. OS IMPACTOS ECONÔMICOS E AMBIENTAIS DOS NAVIOS


DE CRUZEIROS
O crescimento da indústria de cruzeiros em todo o mundo tem sido vertiginoso.
Isso leva, naturalmente, a uma maior preocupação com os impactos econômicos e
ambientais causados e que tem crescentemente interessado às comunidades locais,
regionais, nacionais e até mesmo internacional. Esta seção tem por objetivo quantificar
e discutir, por meio de alguns estudos, a importância econômica e ambiental do setor
de cruzeiros.
Devido à concentração da oferta de cruzeiros, boa parte dos benefícios econômicos
do setor termina por se transferir para os países que sediam as empresas de cruzeiros,
notadamente os Estados Unidos e o Reino Unido. No entanto, um porcentual des-
ses impactos econômicos também termina por ficar nos destinos visitados. Entre esses
impactos, destacam-se os gastos derivados dos turistas, tripulantes e os gastos das em-
presas de navegação (armadoras) nos destinos. No caso dos gastos efetuados pelos
armadores estes incluem tarifas portuárias, impostos, compras de suprimentos,
combustível, água, entre outros. Já os turistas e tripulantes contratam agências de
viagens receptivas locais, transporte de táxi e transfers, compram alimentos, roupas,
bebidas e presentes em geral, entre outros (veja Gráfico 6.3). Muitas cidades portuárias
também se beneficiam pelo fato de os passageiros chegarem alguns dias antes ou
saírem alguns dias depois do término do cruzeiro, gerando benefícios para o setor
hoteleiro e toda a cadeia de suprimento do turismo. Nas cidades de origem dos turistas,
também se movimentam alguns setores, como por exemplo o das agências de viagens
que vendem o cruzeiro (comissão dos agentes de viagens), o de transporte até o porto
de partida, dentre outros.
Para muitos destinos turísticos, especialmente para pequenas ilhas do Caribe,
os impactos econômicos são substanciais. Para esses destinos, os cruzeiros cons-
tituem mais de 50% do total de chegadas de turistas, gerando receitas importantes
através dos serviços prestados por seus portos e pelos gastos gerados por passageiros
157
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Gráfico 6.3 — Gastos diretos realizados por passageiros e tripulação de cruzeiros,


em milhões de dólares americanos (Fonte: BRIDA e ZAPATA, 2010)

e tripulantes (BRIDA e ZAPATA, 2010). Em uma entrevista que o Prof. Guilherme


Lohmann realizou com o então secretário municipal de turismo de Ilha Bela, este
informou, na época (2008), que para alguns comerciantes as vendas realizadas
durante um dia em que passageiros de cruzeiros passavam na ilha equivalia a todo
um mês na baixa estação.
Em 2010, a indústria de cruzeiros representou para a economia dos Estados Unidos
em compras diretas, por parte das empresas de cruzeiro e seus passageiros, um total de
US$18 bilhões. Essa despesa resultou em US$37,9 bilhões em impacto econômico total.
Cerca de 330.000 empregos foram gerados e, em consequência, US$15,2 bilhões em
salários para os trabalhadores norte-americanos (CLIA, 2012).
O Brasil, embora não conte com empresas de cruzeiros marítimos de porte inter-
nacional, passou a captar parte dessas receitas econômicas principalmente a partir da
liberação da cabotagem de navios de bandeira estrangeira a partir do ano de 1995.
Vários portos do litoral brasileiro, a cada temporada de cruzeiros, têm visto o número
de transatlânticos aumentar (veja seção a seguir). Um estudo do perfil e dos impactos
econômicos dos cruzeiros no Brasil, realizado pela Associação Brasileira de Cruzeiros
Marítimos (Abremar), em conjunto com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), demonstrou
que, na temporada 2010/2011, os impactos econômicos totais diretos e indiretos dos
armadores e dos cruzeiristas no Brasil foram de R$1,4 bilhão, sendo R$893,5 milhões
gerados pelos gastos dos armadores com compras de suprimentos, custos portuários
e combustíveis e R$522,5 milhões gerados pelos gastos dos cruzeiristas nos portos de
embarque/desembarque e de trânsito (ABREMAR/FGV, 2011). Dentre os quase 800 mil
passageiros estavam os cruzeiristas internacionais – que somavam quase 100 mil e que
apresentaram um gasto médio 184% superior aos cruzeiristas nacionais. Quanto à geração
de empregos nesse mesmo período, o estudo apontou uma geração de 20.638 postos de
trabalho (ABREMAR/FGV, 2011).
Num estudo semelhante, porém numa outra região do planeta, Dwyer e Forsyth (1998)
estimaram, para o ano de 1996, os impactos socioeconômicos decorrentes dos cruzeiros
158
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

marítimos na Austrália. Tomaram, para isso, um cruzeiro típico de seis dias com um navio
com 900 passageiros a bordo. Os gastos efetuados pelos passageiros e pela tripulação
representaram, para a região de origem dos turistas e para os portos visitados, um total de
617 mil dólares australianos para os cruzeiros costeiros, e de 172 mil dólares australianos
para os cruzeiros internacionais, principalmente aqueles pelas ilhas do Pacífico Sul. Os
gastos do operador do cruzeiro com taxas portuárias, serviços de capatazia, combus-
tível, impostos, dentre outros, foram estimados em 239 mil dólares australianos para os
cruzeiros costeiros, e de 195 mil dólares australianos para os cruzeiros internacionais. De
forma geral, um cruzeiro costeiro contribuía com receitas de 756 mil dólares australianos,
dos quais 80% referentes a gastos dos passageiros e da tripulação (uma média de 825
dólares australianos por pessoa). No caso dos cruzeiros internacionais, esse valor era
de 367 mil dólares australianos, ou o equivalente a 401 dólares australianos por pessoa.
Esses dados evidenciam os benefícios que os cruzeiros costeiros provêm na economia
do país, em comparação aos cruzeiros internacionais. Dados globais e mais recentes do
setor na Austrália indicam não só um crescimento das receitas diretas em função do cres-
cimento da demanda, mas também um aumento nas médias dos valores das despesas
individuais de cruzeiristas para as temporadas 2007-08 (568 milhões dólares australianos),
2008-09 (662,7 milhões dólares australianos), 2009-10 (790 milhões dólares australianos)
e 2010-11 (830 milhões dólares australianos) (DELOITTE ACCESS ECONOMICS, 2012).
No entanto, apesar do amplo reconhecimento dos impactos econômicos positivos,
existem também algumas críticas sobre alguns desses impactos. Uma dessas críticas seria
que a participação econômica do setor de cruzeiros no turismo global não é tão grande
assim. No inicio da década de 2000, a participação do setor de cruzeiros no turismo
internacional corresponderia a 1,6% do total dos turistas e 1,9% do número total de
noites, e a receita de empresas de cruzeiros representava apenas 3% das receitas totais
de turismo internacionais (KESTER, 2002). Outra crítica é que a maioria dos navios de
cruzeiro são registrados em países que oferecem uma “bandeira de conveniência”, como
Bahamas, Panamá ou a Libéria. Com isso, as empresas de cruzeiros estariam evitando
tributação e, ao mesmo tempo, buscando uma legislação trabalhista mais frágil para,
por exemplo, restringir os direitos dos trabalhadores e permitir pagamentos de baixos
salários (BRIDA e ZAPATA, 2010). Há também a crítica da concorrência que os cruzeiros
exercem aos hotéis resorts em terra, que, em tese, participariam com um maior impacto
econômico no destino turístico. Por fim, não obstante uma fração da renda gerada pelas
atividades de cruzeiro permanecer nos portos dos destinos turísticos, estes também
precisariam arcar com os custos e problemas ambientais e sociais associados com as
chegadas dos navios, dos passageiros e das tripulações, como será visto no próximo
item (BRIDA e ZAPATA, 2010).

Os impactos ambientais dos navios de cruzeiros


Uma dificuldade fundamental no que diz respeito aos impactos ambientais é o de
como quantificá-los em relação aos benefícios econômicos (JOHNSON, 2002). Um

159
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

estudo sobre como os navios de cruzeiros afetam o meio ambiente, o The Ocean
Conservancy de 2002, afirma que, da frota mundial de navios mercantes de aproxima-
damente 46222, estima-se que os cruzeiros são responsáveis por um quarto de todos os
resíduos que são gerados, apesar de representarem menos de 1% de toda essa frota. Isso
se deve, obviamente, ao enorme número de passageiros que são transportados, muito
superior aos navios cargueiros. Estima-se que um navio de cruzeiro gera um mínimo
de um quilo de resíduo sólido, além de duas garrafas e duas latas por passageiro por
dia (BUTT, 2007).
Desde o ano de 1990, todas as embarcações navegando em qualquer parte do mundo
passaram a ter de atender aos padrões da MARPOL (Marine Pollution) e do International
Safety Management Code (ISM), ambos sob os auspícios da International Maritime
Organization (IMO), a agência da Organização das Nações Unidas (ONU) responsável
pela segurança do transporte marítimo e da prevenção de poluição pelas embarcações.
O Anexo V da MARPOL define a disposição dos resíduos, lixos e material poluente
lançados pelos navios nos mares. Basicamente, o que essa legislação faz é dividir as
águas em quatro zonas marítimas, de acordo com a proximidade do navio em relação
à costa. Assim, por exemplo, é proibido jogar ao mar qualquer resíduo sólido a menos
de três milhas náuticas da costa (1.852m). Entre três e doze milhas náuticas, é vedado
o lançamento de papel, vidro e mesmo de alimento, exceto se este tiver menos do que
uma polegada de diâmetro. As outras duas áreas são aquelas compreendidas entre 12 e
25 milhas náuticas e distâncias superiores a 25 milhas náuticas, nas quais, basicamente,
fica restrito o lançamento de material plástico.
Um dos impedimentos para a implementação da Convenção MARPOL surge a
partir da existência de “bandeiras de conveniências” e a dificuldade de muitos destinos
portuários em executar inspeções para verificar o cumprimento ou não das normas
internacionais. Na maioria das vezes, eles não têm uma infraestrutura adequada para
tal. No estado norte-americano do Havaí, as autoridades locais assinaram um acordo
com as empresas de cruzeiros segundo o qual estas assumem a responsabilidade de
informar qualquer infração cometida em relação ao meio ambiente. Obviamente
que esse é um procedimento inviável para o devido monitoramento de eventuais
infrações cometidas.
O The Ocean Conservancy, em 2002, reafirmou a necessidade do aumento na
regulação das atividades dos cruzeiros, incluindo a redução e a regulação das descargas
para diminuir o impacto causado pelos vários tipos de resíduo produzidos a bordo.
Além disso apontaram para a necessidade de melhorar a monitoração, a inspeção e,
principalmente, o fortalecimento de mecanismos de execução destas leis, incluindo
programas de treinamento.
Um exemplo de recente avanço na gestão dos resíduos dos navios é o Plasma Arc
Waste Destruction Systems (PAWDS), que utiliza energia de plasma para destruir os
resíduos combustíveis. Esse sistema foi testado em um navio de cruzeiro da Carnival, o

160
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

M.S. Fantasy, e é capaz de tratar papel, papelão, plásticos, têxteis, madeira e alimentos.
Como com qualquer nova tecnologia, o custo de instalação em todos os atuais navios
de cruzeiro poderia ser proibitivo, mas poderia ser uma opção viável para a gestão de
resíduos nas novas construções (BUTT, 2007).
Os navios da Holland America, individualmente, produzem oito toneladas de lixo a
cada sete dias de cruzeiro, possuindo vários equipamentos para separar e processar esse
material, não só com o objetivo de melhor acondicioná-lo a bordo, mas também para
prepará-lo para o processo de reciclagem que ocorrerá após a atracação do navio no
próximo porto. O vidro é quebrado em pequenos fragmentos e o papel é queimado ou
empacotado, os restos de comida podem ser incinerados ou jogados ao mar, dependendo
do local em que se encontra o navio.
A Princess, por sua vez, implantou o programa Planet Princess, que prevê, para suas
embarcações, um futuro no qual não serão lançados quaisquer tipos de materiais no
mar. O primeiro navio da empresa a operar nesse sistema é o Sun Princess. Entretanto, os
equipamentos necessários para tratar e armazenar o lixo e o esgoto produzidos a bordo
podem custar até dez milhões de dólares e possuírem uma altura equivalente a três deques
da embarcação, o que representa uma grande perda de área útil.
Mais do que propriamente encontrar soluções para os rejeitos produzidos durante uma
viagem de cruzeiro, o que muitas empresas têm feito é tentar eliminar o maior número
possível de geração de material plástico a bordo, dando preferência sempre pelo uso de
papel ou mesmo por outros materiais reutilizáveis e recicláveis. Além disso, a própria
conscientização junto aos passageiros também é efetuada, notadamente para que estes
cooperem com a reciclagem do lixo, mediante o uso de compartimentos diferenciados
para os materiais plásticos, de metal, de vidro e de papel.
Há ainda outros tipos de impactos indesejáveis decorrentes dos navios de cruzeiros,
incluindo congestionamentos nos principais portos quando os navios atracam. A in-
fraestrutura portuária e os locais visitados pelos turistas muitas vezes ficam lotados,
principalmente porque não estão preparados para receber grandes fluxos de turistas.
O ecossistema pode ser perturbado com o número de visitantes e com as frequências
de saída e chegada de embarcações. Além disso, há ameaça constante de vazamento de
óleo. As dragagens necessárias para que os navios atraquem nos portos também podem
impactar nos corais e outros organismos marinhos.
Contudo, muitos dos efeitos negativos para o ambiente diretamente associados aos
navios de cruzeiro podem ser superados se houver determinação e cooperação entre as
partes interessadas. A grande quantidade de resíduos gerados pelos navios de cruzeiro
necessita do emprego efetivo de melhorias tecnológicas na seleção, no armazenamento e
reciclagem. Os portos e seus contratados devem assegurar instalações adequadas para lidar
com todas as formas de resíduos recuperados e recicláveis e ser encorajados a utilizar as
instalações locais sempre que possível para evitar o transporte por terra. Enfim, há neces-
sidade de uma abordagem responsável e sustentável para a gestão de impactos ambientais

161
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Quadro 6.1 — Estratégias de sustentabilidade ambiental para cruzeiros

ESTRATÉGIA INICIATIVA DE GESTÃO


Física – Variar o itinerário.
– Limitar número de passageiros.
– Reabilitação do destino.
– Projetos de conservação.
Regulatória – Política corporativa ambiental reguladora.
– Sistemas de gestão ambiental.
– Promoção de práticas ambientais.
Econômica – Contabilizar custo econômico total do meio ambiente.
– Investimento em tecnologias “limpas”.
– “Recompensas” pela consciência ambiental.
– Uso positivo de receitas turísticas.
Educacional – Parcerias educacionais com os destinos.
– Relatórios corporativos ambientais.
– Códigos de boas práticas.
– Divulgação de boas práticas ambientais.
Fonte: adaptado de Johnson (2002).

dos navios de cruzeiros (BUTT, 2007). Do ponto de vista das empresas de cruzeiros e dos
destinos turísticos, diferentes estratégias e iniciativas de gestão podem ser empregadas
para que juntos cumpram suas obrigações de desenvolvimento sustentável. Johnson (2002)
apresenta um resumido quadro de estratégias de sustentabilidade ambiental e várias
iniciativas de gestão disponíveis que cruzeiros e destinos podem adotar (ver Quadro 6.1).

6.6. CRUZEIROS MARÍTIMOS NO BRASIL DURANTE OS ANOS 2000


Os navios da Companhia Nacional de Navegação Costeira chegaram ao Brasil no
verão de 1962, dando início ao turismo de cruzeiro no país. Os quatro transatlânticos,
chamados de Cisnes Brancos – Anna Nery, Princesa Leopoldina, Princesa Isabel e Rosa
da Fonseca – foram comprados da Iugoslávia e da Espanha (PALLADINO, 2010). Os
navios operavam em rotas consideradas longas para a época como de Porto Alegre (RS)
a Aracaju (SE) ou até o estado do Pará, por exemplo, com saídas semanais.
Durante os anos 1970 e 1980, o mercado de transporte marítimo de passageiros e
cargas caminhava muito bem, até que em 1988, com a divulgação da nova Constituição
Federal, a navegação de cabotagem para navios de bandeira estrangeira foi proibida. A
navegação de cabotagem é aquela que tem origem e destino dentro dos limites do país.
Durante alguns anos, as poucas viagens permitidas vinham da Argentina ou do Caribe,
com escala em portos nacionais. A desregulamentação da atividade e a revogação
da lei da cabotagem veio somente em 1996 quando os cruzeiros marítimos no Brasil
começaram a realmente fazer a diferença no mercado turístico brasileiro, se tornando
um dos grandes produtos nas prateleiras das agências e operadoras de viagens.

162
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

O Brasil é um país de dimensões continentais, com praias de grande apelo turístico e


litoral que propicia condições muito favoráveis à navegação durante praticamente todo o
ano, especialmente na região Nordeste. Todos esses fatores aliados aos demais aspectos
determinantes da oferta de cruzeiros – roteiros com portos de paradas que abrangem
geralmente mais de uma cidade turística, a diversificação e a segmentação dos cruzeiros e
a relação custo-benefício do produto – constituem elementos-chave para a determinação
do sucesso dos cruzeiros no país. A exploração e o desenvolvimento das operações de
cruzeiros no Brasil se dão de duas formas distintas:
¥ Cruzeiros Domésticos: conjugam três requisitos básicos – embarque, visitação e
desembarque de passageiros exclusivamente em portos localizados no território
brasileiro. Exemplo de roteiro: Rio de Janeiro (RJ) – Búzios (RJ) – Ilha Bela (SP) – Rio
de Janeiro (RJ).
¥ Cruzeiros Internacionais: todos aqueles que não se incluem na categoria anterior. São
cruzeiros que podem ter embarque, visitação ou desembarque de passageiros em
territórios internacionais. Exemplo de roteiro: Rio de Janeiro (RJ) – Santos (SP) – Buenos
Aires (Argentina) – Punta del Este (Uruguai) – Santos (SP) – Rio de Janeiro (RJ).
Para que os cruzeiros marítimos possam ocorrer é preciso que uma série de ações,
regulamentações e controles sejam providenciados tanto pelos armadores quanto
pelas diferentes entidades e órgãos controladores da atividade no país. A Abremar/
FGV (2011) esclarece que a existência de inúmeros agentes envolvidos na operação,
juntamente com suas respectivas competências e atribuições, torna o processo mais
lento, custoso e burocrático. A Figura 6.2 ilustra todos os órgãos envolvidos e suas
respectivas atribuições.
Apesar de toda a burocracia dos processos necessários para que as empresas
armadoras possam operar seus navios de cruzeiros na costa brasileira, o mercado
se encontra em plena expansão. Na Tabela 6.5 é possível perceber que o número
de navios no Brasil aumentou quase 200%, e o número de passageiros em mais de
500% na temporada 2010/2011 em relação à temporada 2004/2005, ou seja, em um
intervalo de seis anos.

Tabela 6.5 — Número de navios e passageiros de cruzeiros no Brasil

TEMPORADA NÚMERO DE NAVIOS NÚMERO DE PASSAGEIROS


2010/2011 20 792.752
2009/2010 18 720.621
2008/2009 16 521.983
2007/2008 14 396.119
2006/2007 11 300.017
2005/2006 09 225.178
2004/2005 06 139.430
Fonte: adaptado de Abremar/FGV (2011).

163
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Figura 6.2 — Agentes envolvidos na operação de cruzeiros no Brasil (Fonte:


ABREMAR/FGV, 2011)

A temporada de cruzeiros no Brasil tem início geralmente no mês de outubro de


cada ano e termina em abril do ano seguinte, quando os navios fazem os cruzeiros
de volta. A Tabela 6.6 mostra os portos mais visitados pelos cruzeiros na temporada
2010/2011. As cidades do Rio de Janeiro e de Santos são os principais portos de
embarque e desembarque do Brasil, por isso recebem o maior número de escalas.
Sabe-se que os cruzeiros marítimos beneficiam os destinos em diferentes aspectos,
seja movimentando a economia, aumentando o fluxo de turistas na cidade, gerando
empregos, estimulando a entrada de divisas e promovendo o destino em âmbitos
nacional e internacional. Entretanto, tais benefícios dependem de alguns aspectos
(ABREMAR/FGV, 2011): (1) tipo de porto de referência (porto de embarque/desem-
barque ou escala); (2) período da viagem (início, meio ou fim); (3) quantidade de
escalas prevista na rota e; (4) a infraestrutura existente para atender às demandas do
navio e dos passageiros.
Já na Tabela 6.7 é possível entender algumas características do mercado de cruzeiros
marítimos no Brasil, com a listagem das principais empresas operadoras, os navios que
estas trouxeram ao Brasil para a temporada 2012/2013 e suas respectivas capacidades
de passageiros. Os navios da Pullmantur foram fretados pela operadora de turismo CVC
durante muitas temporadas e com isso ganharam importante representatividade no
mercado brasileiro. Apesar de o contrato de fretamento ter sido encerrado, a armadora es-
164
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

Tabela 6.6 — Número de escalas recebidas por portos brasileiros na temporada


2010/2011

PORTOS NÚMERO DE ESCALAS RECEBIDAS


Rio de Janeiro e Santos Mais de 200
Salvador, Búzios e Ilha Bela Entre 101 a 200
Recife, Maceió e Ilhéus Entre 51 e 100
Fortaleza, Fernando de Noronha, Natal, Vitória, Entre 1 a 50
Cabo Frio, Ilha Grande, Ubatuba, Paraty, Angra
dos Reis, São Francisco do Sul, Itajaí, Porto Belo
e Rio Grande
Fonte: Abremar/FGV (2011).

Tabela 6.7 — Empresas operadoras e navios da temporada 2012/2013

CAPACIDADE
OPERADORAS ESCALAS NO BRASIL NAVIOS DE PASSAGEIROS
Pullmantur 259 Empress 2.020
Zenith 1.800
Sovereign 2.882
MSC Cruzeiros 240 MSC Magnífica 2.518
MSC Poesia 2.550
MSC Musica 2.550
Costa Cruzeiros 209 Costa Fascinosa 3.800
Costa Favolosa 3.800
Costa Fortuna 3.470
Costa Serena 3.780
Íbero 148 Grand Celebration 1.896
Grand Holiday 1.860
Grand Mistral 1.700
Royal Caribbean 84 Azamara Quest 764
Splendour of the Seas 2.076
Aida Cruises 71 Aida Cara 1.180
Aida Vita 1.200
Oceania Cruises 39 Regatta 684
Marina 1.250
Fonte: elaborado pelos autores com base em Brasil Cruise (2013).

panhola fez questão de manter uma importante característica da época dos seus cruzeiros
com a CVC: o sistema all inclusive ou “tudo incluído”, em que o passageiro tem direito
a comidas e bebidas à vontade, diferentemente dos navios das demais operadoras, que
oferecem somente as refeições inclusas em suas tarifas.
165
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Ao analisar a capacidade de passageiros dos navios das principais armadoras operan-


do no Brasil e relacionar com a classificação em termos do tamanho das embarcações,
é possível afirmar que a grande maioria deles é considerada navios resorts, por aco-
modarem mais de 1200 passageiros. Raras exceções são os navios de médio porte,
como o Azamara Quest, o Aida Cara e o Regatta. Há ainda o Grand Amazon, um
navio de pequeno porte com capacidade para 150 passageiros que não aparece na
tabela anterior. Esse navio, operado pela Iberostar, faz cruzeiros fluviais no Amazonas
em roteiros de quatro, cinco ou oito dias em itinerários que partem e voltam sempre
para Manaus, passando pelos rios Negro e Solimões. O principal público-alvo desses
roteiros são os turistas internacionais que desejam conhecer um pouco mais do interior
do Brasil navegando em alguns dos principais rios da Amazônia brasileira.
Os maiores navios operando no Brasil na temporada 2012/2013 foram os italianos
Costa Fascinosa e Costa Favolosa com capacidade para até 3800 passageiros e mais de
1100 tripulantes. Chamados de navios “gêmeos”, essas luxuosas máquinas em alto-mar
oferecem aos hóspedes uma gama de oportunidades de lazer e entretenimento: spa,
cinco restaurantes, quatro piscinas, cinco jacuzzis, cafés, lojas, áreas para crianças,
cassino, percurso de jogging, campo desportivo, teatro, além de muitas outras. O
primeiro operava, em sua maioria, roteiros internacionais de nove noites que incluíam
destinos como Rio de Janeiro, Santos, Punta del Este e Buenos Aires. Já o segundo
contou com minicruzeiros de três ou quatro noites entre os estados do Rio de Janeiro
e São Paulo e cruzeiros de sete noites para o Nordeste (COSTA CRUZEIROS, 2012).
Apesar de todo o potencial e da expansão do mercado de cruzeiros marítimos no
Brasil nos últimos anos, há certos entraves que dificultam o seu crescimento. Uma das
principais questões é o fato de este ser um mercado relativamente novo, haja vista que
a navegação de cabotagem foi permitida somente a partir de 1995. Isso faz com que
o mercado ainda não tenha grandes conhecimentos sobre a sua realidade e dos seus
consumidores potenciais. Pesquisas vêm sendo realizadas ao longo das temporadas a
fim de descrever o perfil dos cruzeiristas brasileiros. Durante a temporada 2005/2006,
uma pesquisa realizada pela FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) em
parceria com o IPETURIS (Instituto de Pesquisas, Estudos e Capacitação em Turismo)
revelou que o viajante de cruzeiro no Brasil possui em sua maioria entre 31 a 65 anos,
tem nível de instrução superior completo e renda entre R$5.000,00 e R$10.000,00
por mês, mostrando então ser um turista já bem estabelecido profissionalmente e,
com certeza, bastante exigente (BUSINESS TRAVEL MAGAZINE, 2012).
Há ainda outros entraves no desenvolvimento do setor. Arantes (2009) aponta que a
falta de segurança no país e a sua imagem no exterior, além da concentração do fluxo
em determinados destinos domésticos, a sazonalidade e a concorrência equivocada com
os resorts também interferem no processo de crescimento do mercado. Para Paolilo e
Rejowski (2002), os principais problemas são a deficiência da infraestrutura portuária e
poucos portos com terminais de passageiros; as altas taxas portuárias, que elevam as tarifas
para os passageiros e a baixa qualidade do serviço de receptivo turístico nos destinos.
166
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

As perspectivas para o mercado em termos da infraestrutura portuárias são


positivas. Na cidade do Rio de Janeiro, o projeto Porto Maravilha tem o objetivo
de revitalizar toda a zona portuária da cidade, transformando-a em um verdadeiro
polo turístico (espaços geográficos claramente definidos com vocação para o
turismo). Somente em sua primeira fase, o projeto já demanda um investimento
de R$350 milhões e envolve melhorias no entorno do porto, iluminação pública,
recuperação de patrimônios culturais e pavimentação. O Píer Mauá é área destinada
ao embarque e desembarque de cruzeiros no porto do Rio de Janeiro e também
sofrerá modificações em sua estrutura que abrigará ainda o Museu do Amanhã, um
espaço dedicado à sustentabilidade (PORTO MARAVILHA, 2012). Em Santos (SP),
o terminal portuário é considerado o maior da América Latina. Sua infraestrutura
para passageiros conta com salão de espera, seis salões para embarque e desem-
barque, um salão exclusivo para recepção de bagagens, sistema de comunicação
audiovisual e 32 televisores para informações sobre chegadas e partidas dos navios
(CONCAIS, 2012). Muito há que ser melhorado na infraestrutura portuária, porém
com excelentes expectativas de crescimento do mercado a tendência é que os
investimentos comecem a aparecer.

6.7. FERRIES E TURISMO: EXEMPLOS DO PACÍFICO


Historicamente, o crescimento do turismo tem sido intimamente associado com os
avanços na tecnologia de transporte que têm, progressivamente, facilitado o acesso entre
mercados e destinos em todo o mundo. Os ferries constituem exemplo prático de um tipo
de transporte aquaviário que tem sido ao mesmo tempo vital e motivo de controvérsia
para alguns destinos (LOHMANN e PEARCE, 2011).
Durante a década de 1980, o crescimento do transporte por meio de ferries foi bastante
acentuado na Europa, principalmente por conta do enorme porcentual de proprietários
de automóveis, tais como no caso dos britânicos, que preferem fazer turismo pelo
continente europeu de forma mais independente (HOLLOWAY e ROBINSON, 1995). A
maioria dos ferries possui ótima infraestrutura para os passageiros, tais como restaurantes,
cinemas, bares, espetáculos de dança e música, casa de câmbio, lojas comerciais, sala
de jogos, televisão ou mesmo poltronas confortáveis para leitura e descanso, além de
lojas de duty-free.
O tamanho dos ferries podem variar significativamente. No caso das rotas em que
efetuam o transporte de veículos, muitas vezes opera-se com grandes embarcações num
sistema conhecido como roll-on roll-off, ou simplesmente Ro-Ro. O termo deriva do
inglês para caracterizar que os veículos entram e saem por seus próprios meios, como
nas ligações do Canal da Mancha, entre as ilhas do Norte e do Sul da Nova Zelândia
ou nos países escandinavos. Quanto à velocidade, podem variar entre dez (18,5km/h)
e vinte (37km/h) nós nas embarcações tradicionais, até a velocidade de cinquenta nós
(92,6km/h) nos catamarãs de alta velocidade. Os catamarãs de alta velocidade estão
167
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

atualmente em operação em várias partes do mundo, incluindo rotas entre o Reino


Unido e o continente europeu, Grécia, países escandinavos, Califórnia, Costa Leste dos
Estados Unidos, entre Argentina e Uruguai, entre Macau e o aeroporto internacional de
Hong Kong e no Japão (LOHMANN e TRISCHLER, 2012b).
Embora a utilização desse tipo de catamarã tenha se propagado ao longo do tempo
e para diferentes partes do mundo, em alguns locais este tipo de ferries não alcançou o
sucesso esperado. No Pacífico, e mais especificamente na Nova Zelândia e no Havaí,
onde os serviços de ferries são fundamentais, por suas características geográficas
de arquipélagos, foram realizadas recentes pesquisas e há controvérsias quanto à
utilização dos catamarãs de alta velocidade. Alguns dos problemas estão associados
a questões ambientais, de segurança, dos altos custos de aquisição e operação e da
forte concorrência, que levou alguns operadores à falência ou os forçaram a cessar
suas operações (LOHMANN e TRISCHLER, 2012b). Esses dois exemplos são detalhados
a seguir.

O SUPERFERRY, NO HAVAÍ (EUA), E A EXPERIÊNCIA NO ESTREITO


DE COOK (NOVA ZELÂNDIA)
Arquipélagos como o Havaí, o mais isolado do mundo, dependem sobremaneira
dos transportes aéreo e marítimo para a movimentação de viajantes dentro do estado.
Sem ter contato com uma opção de transporte marítimo intraestadual por muito tempo,
a implantação de um serviço de ferry catamarã de alta velocidade ocorreu em 2007
(LOHMANN e NGUYEN, 2011). A viagem inaugural em agosto de 2007 partiu de
Honolulu para Kahului Harbor, em Maui. Com sede em Honolulu Harbor, o Superferry
foi planejado também para incluir as rotas para Kahului Harbor, Nawiliwili em Kauai,
e Kawaihae, na ilha do Havaí, também conhecida como a ‘Big Island’. No entanto, a
única rota que efetivamente existiu foi a de Honolulu e Kahului (ver Figura 6.3).
Para operar essas rotas, o Superferry contratou a Austal USA, que construiu o Alakai
e, mais tarde, o Huakai, por US$80 milhões por ferry. Esses navios são de alumínio de
casco catamarãs capazes de transportar até 866 passageiros e 282 carros. A tarifa inicial
foi de US$39 por passageiro e US$57 por veículo (PACIFIC BUSINESS NEWS, 2009).
Para acomodar as operações do Superferry, o estado do Havaí investiu US$46 milhões
em infraestrutura portuária. Em sua primeira viagem para Kauai, o Alakai foi recebido
com grandes protestos no porto de Nuwiliwili, onde os manifestantes expressaram uma
série de preocupações que podem ser divididas em: social, trânsito, meio ambiente e
questões legais.
Os possíveis impactos sociais giravam em torno do potencial de drogas a serem levadas
de O’ahu para as demais ilhas, bem como a comunidade mendicante da ilha migrar
para outras partes do estado. Comunidades do restante do arquipélago também expres-
saram preocupação que este novo modo de transporte pudesse aumentar o número de
turistas, impactando na capacidade de carga que afeta o ecossistema local. A inclusão
de veículos nos ferries causou alarme já que estes poderiam impactar negativamente no
tráfego nas ilhas vizinhas. Em agosto de 2007, um juiz ordenou que o Departamento
168
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

Figura 6.3 — As rotas existentes e planejadas para o Superferry no Havaí (Fonte:


LOHMANN e TRISCHLER, 2012a)

Estadual de Transportes do Havaí implementasse medidas de mitigação de trânsito em


Kahului Harbor (Maui) a fim de acomodar o tráfego esperado na chegada do ferry. Após
a realização de um estudo de impacto de tráfego, o Departamento argumentou que o
ferry só iria adicionar um aumento de tráfego marginal nas ruas adjacentes ao terminar
(WILSON, 2007).
A lista de questões ambientais era abundante. Ao permitir a inclusão de veículos no
ferry, havia preocupações sobre o potencial de transporte de espécies invasoras, como rãs
coqui e formigas de fogo para as ilhas exteriores. Embora os veículos fossem inspecionados
e lavados antes do embarque, os moradores questionaram a eficácia destes métodos de
prevenção. O processo de viajar entre as ilhas também representavam riscos ambientais
como a descarrega de água de lastro no oceano, potencialmente liberando muitos tipos
de bactérias, plantas e outras formas de vida que poderiam ser prejudiciais ao ecossistema
local. Além disso, muitas das rotas propostas iriam atravessar áreas contendo habitats
de baleia corcunda - daí a utilização de duas vias diferentes, tal como apresentado na
Figura 6.4 (NOAA, 2009). Havia também a preocupação de que os ferries navegando
em altas velocidades com seus cascos afiados poderiam também ameaçar as baleias,
semelhantes ao incidente nas Ilhas Canárias, onde uma balsa em movimento rápido matou
uma baleia cachalote (JOHNSON, 2005).
Essas preocupações ambientais levaram a uma série de questões jurídicas que ator-
mentaram as operações do Superferry. Em agosto de 2007, o Supremo Tribunal do Havaí
afirmou que uma avaliação de impacto ambiental seria necessária para quaisquer obras
efetuadas nos portos, derrubando a decisão de um juiz de Maui em 2005. Apesar disso,

169
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

o ferry foi em frente e viajou para Nawiliwili antes do previsto. Contínuos protestos em
Kauai levaram à suspensão do serviço para Nawiliwili. Em outubro de 2007, o tribunal de
Maui exigiu que o Superferry aguardasse uma avaliação de impacto ambiental ser con-
cluída, antes de retomar o serviço. No entanto, após uma reunião entre a Governadora
e o Senado do Estado do Havaí, o Superferry foi autorizado a retomar o serviço até a
conclusão dos estudos de impactos ambientais (Pacific Business News, 2007). Em março
de 2009, o Supremo Tribunal do Havaí considerou as operações do Superferry antes da
conclusão da avaliação de impacto ambiental como sendo inconstitucional (BLAIR, 2009).
Na sequência deste anúncio, a empresa demitiu os funcionários e decretou falência em
maio de 2009.
A Nova Zelândia, com as suas duas principais ilhas (Norte e Sul), é separada
pelo Estreito de Cook. Desde agosto de 1962, o transporte de ferries convencionais
Ro-Ro tem sido a única outra alternativa além do transporte aéreo no deslocamento
de passageiros de uma ilha para a outra. Isso mudou no final de 1994, quando a
tecnologia de catamarãs de alta velocidade foi introduzida, com um número de
concorrentes desafiando a empresa incumbente, a Interisland Line, na ligação entre
a capital Wellington e Picton (Figura 6.4). Enquanto as embarcações faziam a traves-
sia em três horas, a nova tecnologia permitia fazer o mesmo trajeto em uma hora e
quarenta e cinco minutos.

Figura 6.4 — Transporte de ferries entre Wellington e Picton (Fonte: LOHMANN


e PEARCE, 2012)

Com uma população de 164.000 (e o dobro disso regionalmente), Wellington atrai


um grande número de turistas domésticos. Em 2004, 4,5 milhões de visitantes pas-

170
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

saram 8,3 milhões noites na cidade (PEARCE e SAHLI, 2007). Wellington também é o
mais importante hub aéreo doméstico da Nova Zelândia. Picton, por sua vez, é uma
pequena cidade de 4000 habitantes localizada na extremidade de Queen Charlotte
Sound, um destino popular de verão, principalmente para atividades aquáticas, cami-
nhadas e mountain bike. Estima-se que os visitantes de Picton podem atingir um pico
diário de 20000 visitantes no auge do verão. Picton tem um aeroporto muito pequeno,
com voos para a capital Wellington operados por aviões a hélice de 12 lugares, portanto
depende quase que totalmente dos serviços de ferries existentes. Na análise realizada
por Lohmann e Pearce (2010) nesses dois lugares, ficou evidenciado que existe uma
íntima relação entre o desenvolvimento do turismo, especialmente para Picton, devido
ao transporte de ferry.
Além da operação dos ferries convencionais que existiam por décadas, a empresa
incumbente introduziu em 1994 o serviço Lynx, que, ao longo de sua vida útil de cerca
de dez anos, fez uso de diferentes tipos de embarcações ferry catamarãs de alta veloci-
dade (Condor 10, Condor Vitesse, Incat 057 e Incat 046). No mesmo período em que
o Lynx foi introduzido, uma outra empresa concorrente também iniciou operações com
tecnologia semelhante. A experiência da concorrente foi um fracasso, notadamente pela
inabilidade de manter a concorrência com uma empresa que já tinha amplo conhecimento
do transporte de carga e passageiros no Estreito de Cook. Posteriormente outros dois
operadores tentaram concorrer com o The Lynx operando ferries menores exclusivamente
para o transportes de passageiros. Estes enfrentam problemas em lidar com este tipo
de embarcação que é menor e também devido a susceptibilidade a cancelamentos
durante mares bravios. Outro tipo de problema enfrentado na Nova Zelândia foram as
agências reguladoras que demoraram seis anos até definir as restrições de velocidade
de operação dos catamarãs de alta velocidade. Quando velocidades bem inferiores ao
padrão de operações dos ferries de alta velocidade foram impostas, o tempo de viagem
aumentou em trinta minutos, inviabilizando a competitividade que o Lynx oferecia. O
fator competição também desempenhou um papel importante, já que nitidamente não
havia demanda suficiente que justificasse dois operadores de ferries de alta velocidade
operando concomitantemente, além do serviço tradicional de ferries. Interessantemente, o
único concorrente que sobreviveu, Bluebridge, nunca fez uso da tecnologia de catamarãs
de alta velocidade.
O que as experiências malsucedidas de implantação de tecnologias de ferries de
alta velocidade demonstram é que tanto no caso do Havaí quanto da Nova Zelândia,
as implicações foram grandes para o turismo. Na Nova Zelândia, quando os ferries
de alta velocidade estavam em operação, sem quaisquer restrições de marcas de
velocidade, os passeios excursionistas, de apenas um dia, a partir de Wellington
constituíram um importante mercado, particularmente quando os pacotes turís-
ticos ofereciam o ferry em conjunto com transporte e almoço nas regiões vinícolas
de Marlborough. No Havaí, o Superferry proporcionou uma diferente experiência
para os turistas, dando a oportunidade de os mesmos velejarem e passearem nas
ilhas, o que normalmente não é possível com os voos interinsulares (LOHMANN e
TRISCHLER, 2012b).

171
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

6.8. CONCLUSÕES
Este capítulo teve como objetivo apresentar as principais características dos trans-
portes aquaviários com foco especial nos cruzeiros marítimos e suas interações com os
destinos turísticos. Ao abordar os cruzeiros, em sua história e enquanto produtos turísticos
“expostos nas vitrines” das agências de viagens e operadoras, ficou claro o seu grande
potencial, provado por dados estatísticos de crescimento do mercado em diversas regiões
do mundo, inclusive no Brasil.
Apesar de todo o crescimento, apontou-se ainda que algumas regiões são mais
privilegiadas nesse setor, e a oferta e a demanda ainda são desiguais. É o caso do Caribe
e do Alasca, por exemplo, duas das principais regiões receptoras de navios de cruzeiros
do mundo. Por outro lado, países como a Austrália e o Brasil ainda são considerados
emergentes, mas vêm caminhando a passos largos investindo em infraestrutura portuária
e na adequação dos destinos turísticos.
Verificou-se que as empresas armadoras também possuem grande responsabilidade,
uma vez que devem oferecer serviços de qualidade que atendam às expectativas dos
clientes cada vez mais exigentes. Isso inclui um perfeito planejamento dos itinerários
de cada temporada dos navios, fator de suma importância na escolha dos cruzeiros
pelos turistas.
Em relação aos destinos, é imprescindível observar que além de todos os impactos
positivos trazidos pelo incremento da oferta turística por meio dos cruzeiros marítimos, há
também impactos positivos, sobretudo no que diz respeito ao meio ambiente. Entretanto,
diversos avanços têm sido realizados no sentido de minimizá-los, e muitos deles foram
descritos neste capítulo. Por fim, foi apresentada a realidade dos ferries e sua relação
com o turismo, motivo de discórdias em destinos turísticos sobretudo em relação à sua
segurança e aos seus impactos.
Conclui-se que ainda existe um caminho a ser percorrido para que o mercado de
cruzeiros marítimos possa beneficiar igualmente destinos no mundo todo. Entretanto,
ficou evidente que passos de grande relevância já foram dados e que os avanços são
significativos com o passar dos anos.

QUESTÕES
1. Descreva, com base em sua leitura do capítulo, de que forma se deu o crescimento
e a consolidação do mercado de cruzeiros marítimos no mundo.
2. Utilize a internet para buscar nos sites das principais empresas operadoras de cru-
zeiros marítimos no Brasil e elabore um texto descrevendo os principais portos de
embarque/desembarque e de escalas na temporada brasileira.
3. Discuta em sala de aula sobre o planejamento de itinerários de cruzeiros no Brasil.
Tenha como base a pesquisa utilizada na questão anterior.
172
 Capítulo 6 [Transportes Aquaviários e Turismo]

4. Quais são os principais entraves para o desenvolvimento do mercado de cruzeiros


no Brasil?
5. Pesquise sobre as empresas que operam cruzeiros no Caribe e faça uma dissertação
apresentando suas principais características.

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176
CAPÍTULO 7
Transporte Terrestre
e Destinos Turísticos

Carla Fraga

CONCEITOS APRESENTADOS NESTE CAPÍTULO


Este capítulo examina os transportes rodoviários e ferroviários separadamente, a fim de
se evidenciar como características particulares de cada modo e seus elementos (via,
veículo, força motriz e terminal) influenciam no desenvolvimento de destinos turísticos.
No lado ferroviário, são abordados as tecnologias de alta velocidade, os trens exclusivos
para turismo e os trens de aeroportos. No lado rodoviário, além dos automóveis e ônibus
(regulares e fretados) são discutidos o mercado de locação de veículos e a relação entre
rodovias e turismo. Ao final é realizado um estudo sobre o transporte terrestre no Brasil.

7.1. INTRODUÇÃO
Uma série de estudos anteriores à Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra no
século XVIII, contribui para o surgimento ou aperfeiçoamento das tecnologias de trans-
portes influenciando numa nova configuração dos padrões de deslocamentos de cargas
e de passageiros. A invenção do motor a vapor, por James Watt, foi determinante para o
nascimento do modo ferroviário. Segundo Blasco (2001), foi a união entre a locomotiva
a vapor e a estrada de ferro, usada na mineração, a grande combinação para a criação
do sistema ferroviário.
Em 1830, o transporte ferroviário de passageiros foi iniciado em larga escala entre as
cidades inglesas de Liverpool e Manchester na Inglaterra. Simmons (1984) explica que a
relação entre esse modo, o turismo e a hotelaria já era notada desde o início. Na década de
1840, Thomas Cook organizou e promoveu a primeira viagem turística de grupo no padrão
que conhecemos na atualidade. Para tal utilizou-se do transporte ferroviário de passageiros
tendo como destino de viagem Loughborough também na Inglaterra (PALHARES, 2002).
177
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

A ampliação de rede ferroviária em vários países do mundo, incluindo o Brasil, cuja pri-
meira ferrovia foi operada a partir de 1854, foi um incentivo ao uso crescente desse modo
de transporte. Naturalmente, com o avanço da ferrovia houve exigência por mais conforto,
e novos avanços tecnológicos foram alcançados. Assim, surgiram invenções como os
carros-dormitório, restaurante, salão etc (SCHOPPA, s.d). Essas melhorias propiciaram
mais comodidades no uso dos transportes ferroviários, o que influiu no desenvolvimento
do turismo. Alguns desses avanços geram implicações até os dias atuais, por exemplo, a
partir do conceito de trem-hotel, algumas empresas ferroviárias, com trajetos noturnos
longos, oferecem serviços leitos em cabines, nos carros-dormitórios aos passageiros que
tenham interesse em se deslocar com maior conforto (PALHARES, 2002).
A ferrovia, por carregar a ideia de progresso associada a um mundo novo, trans-
portando carga e passageiros com mais segurança e conforto, tornou-se o símbolo do
desenvolvimento capitalista, principalmente até 1930, ou seja, antes da popularização
do automóvel (ARRUDA, 2000).
A evolução tecnológica e os direcionamentos políticos e econômicos fizeram com
que a distribuição modal apresentasse alterações ao longo do tempo. Em muitos países,
a dependência do modo rodoviário no contexto turístico é notável, uma vez que este
oferece algumas vantagens competitivas como o serviço porta a porta entre origem e
destino (PALHARES, 2002).
Ao longo da história, fica nítido que avanços tecnológicos de um determinado modo de
transporte podem influenciar no declínio ou ascensão de outros modos, que, por sua vez,
podem afetar o desenvolvimento de destinos turísticas de maneira diferenciada. Por exem-
plo, a colaboração entre os modos de transportes e os destinos turísticos para amenizar
o declínio de um determinado modo de transportes pode ser notada através de alguns
estudos, como o realizado por Prideaux (1999) sobre transporte ferroviário e o turismo na
Austrália. Esse autor destaca que a partir da elevada aquisição de automóveis particulares
e da oferta de transporte aéreo, houve um declínio nos serviços ferroviários de pas-
sageiros de longa distância operados pela Queensland Rail. As estratégias adotadas para
se manterem os serviços ferroviários de passageiros se relacionaram com o turismo. Por
exemplo, a partir da nostalgia pela viagem de trem tem-se um interesse além do des-
locamento, sendo o uso do trem a própria experiência turística (PRIDEAUX, 1999).
Embora apresentem a via terrestre como elemento comum, é evidente que os modos
ferroviário e rodoviário são tecnologias diferente entre si. Dessa forma, o planejamento
e a gestão integrada destes com os destinos turísticos (ver Capítulo 3), o posicionamento
de marketing envolvendo as diversas empresas de transportes e os destinos turísticos (ver
Capítulo 4) exigem a análise dos modos ferroviário e rodoviário de maneira individuali-
zada. Um ponto de partida para se compreender de que forma cada modo pode induzir
ou limitar o desenvolvimento de destinos turísticos é por meio da análise de caracterís-
ticas básicas sobre os elementos (via, veículo, força motriz e terminal – ver Capítulo 1)
que compõem os transportes (PALHARES, 2002). Nas Seções 7.2 (modo ferroviário) e 7.3

178
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

(modo rodoviário) é preciso fazer duas observações: (a) a impossibilidade de se abordar,


de maneira aprofundada, todos os meios de transportes e suas implicâncias para o de-
senvolvimento de destinos turísticos. Contudo, isso não significa que os meios aqui não
considerados sejam menos importantes. Por exemplo, os veículos de baixa capacidade
e não motorizados, como as bicicletas, são transportes que podem contribuir para o
desenvolvimento de destinos turísticos e de nichos de mercado, com o desenvolvimento
de uma forma de turismo conhecida como cicloturismo; (2) alguns dos meios de trans-
portes que fazem parte dos modos terrestres já foram tratados em outras partes deste
livro (ex: táxis na Seção 4.2.2). Ao final deste capítulo será realizada uma discussão sobre
os transportes terrestres e o turismo no Brasil (ver Seção 7.4), considerando-se o período
entre o ano de 2000 e o início do ano de 2013.

7.2. MODO FERROVIÁRIO E O DESENVOLVIMENTO DE DESTINOS


TURÍSTICOS
Diferentemente de todos os outros modos de transportes, o deslocamento ferroviário
é feito por meio de guias (trilhos) segregadas. Isso permite mais fluidez no acesso aos des-
tinos turísticos, pois dificilmente há engarrafamentos no sistema. A infraestrutura e o tráfego
ferroviário são detalhados por Palhares (2002). Um importante fator para o planejamento e
a gestão integrados (ver Capítulo 3) entre ferrovia e turismo é se compreender o impacto
que a diferença de bitola, isto é, a largura interna constante entre os dois trilhos, tem na
integração do sistema ferroviário de um país ou região. Por exemplo, no estudo realizado
por Cury (2011) sobre a escolha de bitola para a linha 4 do metrô do Rio de Janeiro, esse
autor explica que a bitola larga medindo 1,6 m (larga) é a oficial no Brasil, contudo as
linhas ferroviárias que fazem parte da malha ferroviária brasileira se subdividem em 19,3%
bitola larga (1,6 m); 78,3% bitola métrica (1 m), 1,7% em bitola mista; 0,7% bitola standard
(1,435m). É válido destacar que a padronização tem se mostrado como uma forma de tornar
os trens mais rápidos e assim mais competitivos com os demais modos de transportes.
Os transportes ferroviários podem ser divididos em: (1) carga e (2) passageiro. O
transporte ferroviário de passageiro pode ser subdividido ainda em urbano, de médio ou
de longo percurso. Já os transportes ferroviários exclusivamente turísticos independem
da distância e se subdividem em cênicos e nostálgicos (PALHARES, 2002). Considerando
a guia segregada (trilhos) como elemento central da ferrovia, Fraga e Castro (2012) fazem
uma discussão ampla a respeito dos veículos que compõem os diversos sistemas de
transportes sobre trilhos. A partir desse estudo é possível concluir que a gama de veículos
ferroviários existentes (ex: trens e bondes) obedecem a princípios construtivos com caracte-
rísticas próprias, assim, se diferenciam entre si, e, consequentemente, podem influenciar o
desenvolvimento de destinos turísticos de diversas maneiras. É válido lembrar que algumas
tecnologias requerem vias especialmente construídas para determinados tipos de veículos.
Por exemplo, por suas especificidades técnicas, os Trens de Alta Velocidade – TAV não
compartilham a via com trens convencionais, sem que haja pelo menos uma adaptação.

179
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

A força motriz também é bastante variada, podendo existir veículos tracionados a


vapor, eletrificados, de alta velocidade, bateria etc. A quebra de recordes de velocidades
relacionando diversas tecnologias ferroviárias (vapor, elétricos, TAV e Maglev) entre
os anos de 1890 e 1999 é detalhada por Palhares (2002). Por exemplo, os 144 km/h
alcançados pela tecnologia a vapor em 1890 na França e superado pelos Estados Unidos
com 165 km/h no início dos anos 1900 é pelo menos três vezes menor que a velocidade
do Maglev (trem de levitação magnética) no Japão, com 552 km/h (PALHARES, 2002).
Os terminais ferroviários (estações ferroviárias) podem oferecer mais serviços que
as plataformas de embarque/desembarque para a troca entre modos de transportes
(FRAGA e CASTRO, 2012). A sua localização numa rede de transportes intermodal é
fundamental para se compreenderem as funções nodais no turismo em diversas escalas
geográficas (ver Capítulo 1).
A partir do exposto é evidente que, dependendo dos objetivos do projeto ferroviário,
estes terão uma finalidade relacionada ao desenvolvimento de destinos turísticos. Essa
finalidade muitas vezes está expressa no nome atribuído a um determinado veículo ou
sistema. Um exemplo são os trens de aeroportos, que servem para interligar centros ur-
banos e aeroportos; aeroportos e aeroportos; e terminais dentro de um mesmo aeroporto.
Portanto, é natural haver designações como trens de aeroporto, trens de subúrbio (quando
trem interliga o centro de uma cidade ao subúrbio que faz parte de uma mesma região
metropolitana), trens regionais de passageiros (quando o objetivo é promover ligações
entre locais dentro de uma mesma região) (v. FRAGA e CASTRO, 2012). Longe de esgotar
o assunto, nesta parte do capítulo optou-se por se abordar alguns subtemas emergentes
no tratamento desta relação, a saber: trens de alta velocidade (Seção 7.2.1); trens de
aeroporto (Seção 7.2.2); transportes ferroviários exclusivos para fins turísticos (Seção 7.2.3).

7.2.1. Trens de alta velocidade


Os trens de alta velocidade revolucionaram a relação entre tempo e espaço. Por exem-
plo, nas distâncias entre 200 km e 800 km, o transporte ferroviário de alta velocidade é
mais competitivo que as aeronaves e até mesmo que o transporte rodoviário (LEVY, 2001
apud MARQUEZ, 2006). Palhares (2002), com base nos dados da Union Internationale
des Chemins de Fer/União Internacional das Ferrovias (UIC, 2000), demonstrou a
divisão modal entre os transportes aéreo e ferroviário de alta velocidade envolvendo
distâncias entre 300 km e 600 km. O autor concluiu que nas viagens até 500 km de
distância os trens de alta velocidade conseguem ser mais competitivos que os aviões
(PALHARES,2002).*
A Figura 7.1 ilustra o Eurostar, que promove a travessia ferroviária submarina mais fa-
mosa do mundo, utilizando-se do Eurotúnel no Canal da Mancha interligando a Inglaterra

*Essas velocidades foram alcançadas em condições específicas e controladas, o que pode ser diferente da
velocidade real de operação.
180
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

Figura 7.1 — Eurostar na Gare du Nord em Paris, fevereiro de 2013 (Foto cortesia:
Carla Fraga)

à França. Uma curiosidade é que o Eurostar e o Eurotunnel são empresas diferentes, e o


Eurostar é o maior cliente do Eurotunnel. Esse serviço iniciou-se em 1994, e atualmente
interliga St Pancras International, Ebbsfleet International, Ashford International em Lon-
dres, Paris, Bruxelas, Lille, Calais, Disneyland Resort Paris, Avignon e os Alpes franceses.
De acordo com o site Eurostar, a frota de 28 trens já transportou mais de 115 milhões de
passageiros entre Londres e o continente.
Palhares (2002) fez um estudo muito interessante sobre os sucessos e fracassos do
Eurostar no início dos anos 2000. Uma década depois, de acordo com dados do site
oficial do Eurostar, pode-se destacar o papel dessa empresa para a realização dos Jogos
Olímpicos e Jogos Paraolímpicos em Londres ocorridos no ano de 2012. O Eurostar foi
um dos principais patrocinadores desses megaeventos esportivos e cumpriu uma função
nobre que foi transportar centenas de milhares de fãs, as delegações e os outros interes-
sados na realização dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos. Diante desse contexto, o
número de passageiros subiu 4% em comparação com o mesmo período do ano anterior
(EUROSTAR, 2012).
Um dos objetivos das novas estratégias mercadológicas é que viagens de curta
duração realizadas na Europa tenham como predileção o TAV e não o modo aéreo.
181
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Assim, com a implantação do TAV pode haver uma modificação na distribuição modal
(PALHARES, 2002). Nesse sentido, alguns estudos sobre a relação entre ferrovia de
alta velocidade e desenvolvimento de destinos turísticos demonstram que esse meio
de transportes pode reduzir custos de transportes e ser uma importante alternativa
para o desenvolvimento de destinos turísticos, pois permitem a melhoria da aces-
sibilidade.
Masson e Petiot (2009) estudaram a ligação ferroviária de alta velocidade entre
Barcelona (na Espanha) e Perpignan (na França) e explicam que também pode ocorrer
uma concorrência espacial entre destinos turísticos. Nesse sentido, é fundamental com-
preender de que forma a alteração no custo de transportes pode influenciar na formação
de arranjos turísticos espaciais, como os aglomerados em torno de um determinado
destino, forçando outros destinos a se diferenciarem para competirem (MASSON e
PETIOT, 2009).
Palhares (2002) fez um verdadeiro inventário das linhas ferroviárias de alta velocidade
disponíveis em diversos países até o início dos anos 2000. Contudo, na última década
outros sistemas ferroviários de alta velocidade foram implantados, como: Korea Train
Express (KTX) ou Trem Bala Coreano, que foi inaugurado em 2004; em Taiwan as opera-
ções do TAV começaram em janeiro de 2007. Esse último projeto apresenta 345 km de
extensão entre Taipei (10 milhões de habitantes) e Kaohsiung (2,7 milhões de habitantes)
(LACERDA, 2008).
Como o objetivo deste capítulo é a análise sobre a influência dos transportes terres-
tres e os destinos turísticos, no Quadro 7.1 é possível observar como trens de alta
velocidade influenciam no desenvolvimento de destinos turísticos em alguns dos países
pioneiros nos estudos e implantação desses sistemas de transportes, como Japão, França
e Alemanha.
Uma tecnologia que merece atenção quando se trata do desenvolvimento integrado
entre transportes ferroviários e destinos turísticos é aquela propulsionada pela levitação
magnética. A tecnologia dos trens de levitação magnética apresenta o nome de HSST
(High Speed Surface Transport) no Japão e Transrapid na Alemanha. Popularmente, o
Maglev é conhecido como o “trem que voa”, pois os veículos não tocam os trilhos, assim
há uma enorme redução da força de atrito, o que favorece o aumento da velocidade.
É mister destacar que a propulsão ocorre pela “atração entre polaridades contrárias, e
pela repulsão entre as polaridades semelhantes que são geradas alternativamente entre
os dispositivos eletromagnéticos” (PALHARES, 2002).
Na prática, uma linha comercial, o Maglev iniciou a operação em 2004 em Xangai
na China. O trem dá acesso ao Aeroporto Internacional de Pudong numa velocidade
operacional de até 430 km/h (LACERDA, 2008). A seguir será mais bem detalhada de que
forma a integração modal entre trens e aeroportos pode possibilitar o desenvolvimento
de destinos turísticos.

182
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

Quadro 7.1 — A relação entre os Trens de Alta Velocidade e o desenvolvimento


de destinos turísticos

SISTEMAS DE RELAÇÃO ENTRE O TAV E O DESENVOLVIMENTO DE DESTINOS


PAÍS
ALTA VELOCIDADE TURÍSTICOS
Japão Sistema Shinkan- Foi a primeira linha de alta velocidade desenvolvida no mundo e
sen lançada em 1964 entre Tóquio e Osaka, sendo que o sistema ainda
está em expansão. Embora com uma certa inconsistência, a estru-
tura regional e urbana japonesa foram afetadas pela implantação
deste sistema ferroviário. Logo, surgiram políticas de planejamento
objetivando dispersar atividades para fora dos núcleos urbanos,
especialmente em Tóquio-Nagoya e Osaka. (SANDS, 1993).
França TGV Por exemplo, na ligação entre Paris e Lyon (TGV Southeast), o
turismo passou por duas mudanças contraditórias: (1) menos
tempo de permanência e novos pacotes de viagem, o que
ocasionou o aumento no número de viagens de ida e volta no
mesmo dia; (2) maior promoção por zonas, ao longo da linha,
sendo que o turismo de inverno, aparentemente, não foi afetado
pelo TGV (SANDS, 1993). É válido ressaltar que foi feito um estudo
por Bonnafous (1987) sobre o impacto regional da linha ferroviária
de alta velocidade TGV entre Paris e Lyon. O interessante é que as
pesquisas ocorreram antes e depois da implantação desta.
Alemanha ICE Como parte de um esforço para livrar rodovias de conges-
tionamento, este sistema começou a operar em 1991. Há uma
escassez de estudos formais sobre a questão do desenvolvimen-
to nacional e os níveis locais de desenvolvimento. Na estação
Kassei-Wilhelmshöhe a implantação do ICE foi percebida como
uma grande oportunidade econômica para a cidade, integran-
do-a com o resto da Alemanha e da Europa (SANDS, 1993).
Fonte: elaborado pela autora com base em Bonnafous (1987); Sands (1993).

7.2.2. Trens de aeroportos


A importância dos trens que interligam aeroportos a outros aeroportos, terminais
dentro de um mesmo aeroporto ou aeroportos e centros urbanos é enorme. Através
de levantamento apresentado por Bandeira (2004), ficou evidente que mais de 20%
da demanda de usuários de aeroportos ingleses como Gatwick (45 km até o centro de
Londres) e Heathrow (23 km até o Centro de Londres) utilizam o meio ferroviário para
acesso a esses terminais aeroportuários. Marquez (2006) evidencia que os benefícios da
intermodalidade entre os modos aéreo e ferroviário não são somente para os passageiros,
mas também para as empresas aéreas e ferroviárias, o aeroporto, as áreas próximas ao
aeroporto.
Existem diversas tecnologias sobre trilhos que podem ser empregadas nos projetos
de trens de aeroportos, inclusive aquelas de alta velocidade (ver Seção 7.2.1). Nesse
sentido, os métodos construtivos também são variados, como exemplos vias construídas

183
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

em superfície, em túneis e em elevados (BANDEIRA, 2004). É válido destacar que uma


parte significativa de sistemas utilizados são automáticos, do tipo driverless, isto é, sis-
temas automáticos que não precisam de condutores.
Para se projetarem sistemas ferroviários que atendam aos aeroportos deve-se
analisar, num primeiro momento, a infraestrutura de transportes preexistentes, bem
como as propostas para a implantação de novas infraestruturas. Jesus (2004) ilustra
como foi implantada uma ligação ferroviária no aeroporto em Estolcomo na Suécia
em 1999, a extensão da linha apresenta 42 km, o processo de implantação levou
quatro anos, a velocidade pode chegar a 200 km/h, isto é, alta velocidade. Essas
ligações favorecem o desenvolvimento do turismo nos destinos, pois em geral tornam
mais fácil o acesso entre o aeroporto e os meios de hospedagem, atrações turísticas,
outros terminais de transportes, principalmente para aqueles que não conhecem o
destino turístico.
Como visto, a interligação entre trens e aeroportos pode auxiliar no desenvolvimento
de destinos turísticos de maneira variada. Por fim, Givoni e Banister (2006) explicam que
a competição entre os modos de transportes é um tema mais abordado do que a coo-
peração entre estes. Esses autores sugerem um modelo no qual as companhias aéreas
utilizam serviços de transporte ferroviário de alta velocidade como raios adicionais em
sua rede de serviços a partir de um aeroporto hub. Os ganhos sociais e econômicos
dessa ação são: a melhoria dos serviços de transportes integrados e o menor custo
ambiental (GIVONI e BANISTER, 2006).

7.2.3. Transportes ferroviários exclusivos para o turismo


A definição de trem turístico é algo controverso, e um ponto chave para se conceitua-
rem esses serviços é a discussão sobre o que torna a experiência de transportes de fato
uma experiência turística. Assim, o cruzamento de características da oferta e da demanda
(ver Capítulo 3) podem auxiliar na definição e no planejamento do transporte ferroviário
exclusivo para o turismo.
Na Seção 7.2 foi evidenciado que Palhares (2002) considera os atributos nostálgicos
e cênicos para definir os transportes ferroviários exclusivos para fins turísticos. Fraga
(2011) aponta que os trens turísticos podem apresentar outros atributos relacionados a
experiência turística, além da nostalgia e dos valores cênicos. Para justificar isso, Fraga
(2011) recorre à pesquisa de campo que realizou em 2003 sobre o trem turístico que
interliga o bairro do Cosme Velho no Rio de Janeiro ao Alto do Corcovado, onde se
encontra o Monumento Cristo Redentor. É válido destacar que esse monumento foi
eleito uma das sete maravilhas do mundo moderno e que o Trem do Corcovado é um
dos líderes do setor ferroviário turístico nacional, transportando mais de 600 mil pas-
sageiros por ano (ver Seção 7.4 e a matéria sobre “História” do site oficial do Trem do
Corcovado).

184
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

Por meio da aplicação de 400 questionários junto aos usuários do Trem do Corcovado,
nos meses de setembro e outubro de 2003, foi identificado que 89% destes consideram
a experiência de uso do trem a própria experiência turística e que os três principais
conjuntos de motivos relacionados a isso são: (1) a cultura, a história e a nostalgia, as-
sociadas ao fato da Estrada de Ferro Corcovado ser centenária, já que foi inaugurada
em 1884; (2) a ecologia, provavelmente por conta do percurso ferroviário está contido
dentro de uma área de Mata Atlântica, sendo possível vislumbrar a biodiversidade local;
(3) cênico, em função de o trem apresentar janelas largas, propícias para se avistar a
paisagem em seu trajeto (FRAGA, 2004).
Blasco (2001, p.101) explica que “trens turísticos são cruzeiros sobre trilhos (...) é
um produto pouco conhecido, se comparado com os cruzeiros ou os pacotes turísticos
realizados de ônibus” (tradução própria), a partir disso o autor analisa algumas iniciativas
como: o Oriente Express, que inaugurou as operações em 1883, sendo o mais antigo e
luxuoso do mundo; o Transiberiano, que interliga vários pontos do maior país do mundo,
a Rússia, que apesar de não envolver luxo, apresenta valores paisagísticos e culturais para
a composição da experiência de viagem.
Os bondes também podem influenciar no desenvolvimento de destinos turísticos.
Por exemplo, Halsall (2001) se ocupou de analisar o bonde Stoomtram Hoorn-Medem-
blik que está localizado numa área rural da Holanda e constatou que este faz parte da
paisagem turística local. Pearce (2001) examinou o papel do governo local e do proces-
so de formulação políticas públicas sobre turismo urbano por meio de uma análise do
desenvolvimento do bonde turístico Christchurch.
O desenvolvimento do turismo ferroviário se faz a partir do somatório de uma série
de fatores que exigem planejamento e gestão coordenadas entre ferrovia e turismo. É vá-
lido destacar que em alguns casos não é o uso do transporte ferroviário que desencadeia
a experiência turística relacionada a ferrovia. Por exemplo, é possível que se desenvolva
o turismo ferroviário a partir de atrações como uma vila ferroviária desativada, museus
ferroviários e ferrovia desativada. No Capítulo 2, a partir da pesquisa de Allis (2002)
sobre a Vila de Paranapiacaba, é possível identificar a importância do patrimônio his-
tórico relacionado à ferrovia para o desenvolvimento do turismo ferroviário.

7.3. MODO RODOVIÁRIO E O DESENVOLVIMENTO DE DESTINOS


TURÍSTICOS
A relação entre o modo rodoviário e o desenvolvimento de destinos turísticos envolve
variadas situações que merecem atenção dos pesquisadores e tomadores de decisão.
Longe de esgotar o tema, optou-se nesta parte do capítulo por se abordar alguns subtemas
relevantes no tratamento dessa relação, a saber: os automóveis e o turismo; o mercado de
locação de automóveis; os ônibus regulares e fretados; as rodovias e o desenvolvimento
de destinos turísticos.

185
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

7.3.1. Automóveis e o turismo


Ainda que tenham sido idealizados no final do século XIX, a fabricação em escala
industrial do automóvel, levando à popularização deste, só foi iniciada após a Segunda
Guerra Mundial. Todavia, as vantagens do uso de automóveis para o turismo foram logo
percebidas e estes passaram a ser um dos principais meios para os deslocamentos turís-
ticos em vários países. Isso influenciou a construção de infraestrutura viária como estradas
e sinalização, atraindo empresários que implantaram hotéis ao redor das vias, contribuindo
para o desenvolvimento de novos destinos turísticos (BLASCO, 2001; PALHARES, 2002;
PAOLILLO e REJOWSKI, 2002; CASTRO, 2012).
Dentre as vantagens do uso do automóvel para o desenvolvimento de destinos turís-
ticos, destacam-se:
a. A possibilidade de acesso direto entre origem e destinos turísticos (serviço porta a porta)
quando o deslocamento não envolve travessias aéreas e marítimas; sendo que no caso
das travessias marítimas é possível se transportarem automóveis (por um sistema de
roll-on e roll-off, conforme visto no Capítulo 1) através de outros modos de transportes.
b. Flexibilidade de definição de rotas pelos viajantes. Taplin e Qiu (1997) fizeram um estudo
sobre a atração de viagem de carro e escolha de rotas na Austrália. Os resultados indicaram
uma elevada propensão de turistas que utilizam o carro para viagens de longa distância em
retornarem por uma rota alternativa daquela utilizada na ida. Isso invoca aspectos turísticos
com o propósito de se conhecerem outros destinos e paisagens durante uma viagem.
c. A flexibilidade de horário, o que difere do transporte público regular que tem horários
predefinidos. Zillinger (2007) fez um estudo sobre uma perspectiva temporal e geo-
gráfica a respeito dos percursos de carro em rotas turísticas. Nas conclusões do estudo,
o autor explica que a mobilidade constitui uma parte importante do sistema de turismo,
e que os turistas que usam carros viajam de acordo com um ritmo de viagem individual,
isto é, com rotas e horários flexíveis. No entanto, é possível observar padrões.
d. Maior privacidade para os passageiros, as viagens de automóveis geralmente são feitas
em pequenos grupos, justamente pela baixa capacidade dos veículos.
Contudo, o uso dos automóveis e o desenvolvimento de destinos turísticos apresen-
tam algumas limitações, como por exemplo: (1) apesar da privacidade, o tamanho dos
automóveis dificilmente permite mais de cinco passageiros; (2) a velocidade operacional
não deve ultrapassar os 110 km/h, portanto, é mais utilizado em deslocamentos de curto
e médio percursos (ver PALHARES, 2002).

7.3.2. Mercado de locação de veículos e o desenvolvimento


de destinos turísticos
Há uma notável dependência do setor de locação de veículos rodoviários, em especial
os automóveis, com o turismo. Essa dependência pode ser percebida por meio de parcerias

186
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

entre agências locadoras de automóveis e a rede hoteleira, atrações turísticas, outros


modos de transportes, principalmente o modo aéreo (PALHARES, 2002; CASTRO, 2012).
Apesar de a influência do mercado de locação de automóveis no desenvolvimento de
destinos turísticos ser um tema de grande relevância para os estudos sobre os transportes
turísticos, são escassas as pesquisas sobre essa temática. Nesse sentido, é mister destacar
o estudo de Lohmann e Zahra (2011) sobre os custos de realocação da frota de veículos
para locação. Esse estudo traz à tona um problema estrutural da indústria de turismo da
Nova Zelândia: a falta de alinhamento entre o marketing de destinos e o gerenciamento
de destinos. No estudo, Lohmann e Zahra (2011) demonstram a utilidade de modelos
teóricos para a compreensão de padrões de viagem, que envolvem o aluguel de veículos
na Nova Zelândia. Foi utilizado como base os cinco padrões de movimentos do modelo de
alternativas espaciais de viagem de férias proposto por Lue et al. (1993) e do modelo de
Oppermann (1995). Sendo que este último foi desenvolvido em duas partes: (a) sobre um
único destino e (b) sobre múltiplos destinos.
A partir da noção sobre a geografia insular da Nova Zelândia, composta por duas ilhas,
a Ilha do Norte e a Ilha do Sul, separadas pelo Estreito de Cook, a maioria das locadoras de
automóveis mantém frotas separadas em cada uma das ilhas, para que dessa forma evitem ter
de deslocar os carros através de travessia marítima. Os movimentos de reposicionamento das
frotas mais evidentes são: de Wellington para Auckland (Ilha do Norte); de Christchurch para
Picton (Ilha do Sul) e de Queenstown para Christchurch (Ilha do Sul). Nesse sentido, as empre-
sas trabalham com a noção de sazonalidade, como por exemplo, a oferta de descontos para
o deslocamento na direção norte a fim de que turistas viajando no antifluxo contribuam para o
reposicionamento da frota. Esses descontos acabam por provocar concorrência entre os meios
de transportes, já que as tarifas de locação de veículos podem se tornar economicamente
mais atraentes do que o uso do ônibus em alguns trajetos. (LOHMANN e ZAHRA, 2011).
Dentre os resultados do estudo, é possível destacar que a promoção da Nova Zelândia
como um país multidestinos levou Auckland a ser percebido como a principal porta
de entrada internacional (pela capacidade de seu aeroporto, o tamanho de sua popu-
lação e por ser reconhecida como uma importante cidade de negócios). Além disso,
recentemente, Christchurch também se tornou um importante portão de entrada, já que
companhias aéreas internacionais começaram a oferecer voos para Austrália, Japão,
Singapura e Ilhas do Pacífico. Contudo, para o desenvolvimento do mercado de locação
de automóveis é fundamental que haja um esforço coordenado de marketing entre as
empresas de transportes e os destinos turísticos neozelandeses para, por exemplo, se
incentivar o desenvolvimento do turismo através da locação de veículos.
No Quadro 7.2 são apresentadas as características básicas do mercado de locação de
veículos. Estrategicamente existem locadoras de veículos (na maioria dos casos multina-
cionais) localizadas em terminais aeroportuários, e isso acontece porque os aeroportos
são importantes portões de entrada de turistas. No turismo, a oferta de pacotes fly and
drive, ou seja, a aquisição conjunta de passagem aérea e locação de veículos é facilitada

187
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Quadro 7.2 — Características da locação de veículos

Idade mínima Varia de acordo com a legislação do local em que o veículo


for locado. Por exemplo, no Brasil, as locadoras geralmente
adotam 18 anos, pois coincidem com a idade mínima
para se ter a carteira de habilitação. Nos Estados Unidos
a idade mínima é de 21 anos. Sendo que para locatários
pertencentes a faixa etária de 21 a 24 anos é cobrada uma
taxa extra por diária.
Habilitação As locadoras exigem de seus clientes carteira
de habilitação de acordo com a categoria do veículo que
será locado.
Diária Corresponde a 24 horas. A contagem inicia com a retirada
do veículo da loja. Cobrança de horas extras e novas diárias
pode ocorrer.
Pagamento Em geral, feito através do cartão de crédito, que também
serve de garantia caso haja multas ou a não devolução do
veículo nas condições estabelecidas no contrato de locação.
Taxas e outros serviços Incidem por exemplo sobre a devolução do veículo numa
loja diferente daquela que o veículo foi retirado (taxa
de retorno); taxa relacionada à idade do motorista; taxa
relacionada a serviço de motorista particular, horas
excedidas ao contrato de locação, etc. As empresas
locadoras de veículos podem oferecer outros serviços
extras associados a locação do veículo (ex: equipamentos
de GPS).
Seguros O seguro geralmente é opcional e existe uma variedade,
exemplos: exoneração de danos e/ou avarias (PDW);
proteção total do veículo (LDW); proteção contra terceiros
(ALI); proteção de acidentes pessoais (PAI).
Quilometragem O cliente pode optar por quilometragem livre
(geralmente mais cara) ou veículos com limite estipulado
de quilometragem, a partir do qual incidem pagamentos
por quilômetro utilizado.
Devolução do veículo Em geral, o veículo pode ser devolvido na mesma loja
que foi locado ou em outra loja da rede, mesmo que
a loja esteja localizada em outra cidade. Nestes casos,
geralmente é cobrada uma taxa de retorno.
Fonte: elaborado pela autora com base em Palhares (2002); Castro (2012).

pela localização das locadoras de automóveis nos aeroportos. Sobre esse tema, Castro
(2012) fez um levantamento sobre as quatro organizações empresariais mais expressivas
no mercado norte-americano. Com base nos dados da Business Travel News de 2010,
ficou evidente a participação em números e porcentagens das locadoras de automóveis
em aeroportos nos Estados Unidos, como demostrado no Quadro 7.3.
Além da localização, algumas vantagens percebidas pelo turista se relacionam com a
oferta de milhagem por programas de fidelização que envolvem, por exemplo, o trans-
188
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

Quadro 7.3 — Estados Unidos - Locação de veículos nos aeroportos

NÚMERO TOTAL PORCENTAGEM


DE LOJAS NÚMERO DE LO- DE LOJAS
GRUPOS BREVE DESCRIÇÃO (DENTRO E FORA JAS DENTRO DOS DENTRO DOS
DOS AEROPORTOS AEROPORTOS
AEROPORTOS) POR GRUPOS (%)*
Enterprise Desde 2007 o grupo 6.113 624 10,2%
Holdings é formado por
Enterprise Rent a Car,
Alamo Rent a Car e a
National Car Rental.
Avis Budget Budget foi comprada 2.115 617 29,1%
pela Avis em 1987.
Hertz Foi fundada em 1918. 2.116 516 24,3%
Dollar Rent As empresas 467 249 53,3%
a Car e Dollar Rent a Car e
Thrifty Car Thrifty Car Rental
Rental individualmente
foram adquiridas
pela Chrysler
formando o Grupo
Dollar Thrifty na
década de 1990.
* Porcentagem referente a relação entre o número total de locadoras e o número de lojas dentro dos aeroportos.
Fonte: elaborado pela autora com base em Castro (2012); Business Travel News (2010).

porte aéreo e a locação de veículos. O negócio de locação de automóveis é bastante


variado, envolvendo empresas multinacionais e aquelas que atuam localmente. Pearce
e Sahli (2007) demonstram as diferenças entre as companhias multinacionais e aquelas
que são locais, através da por meio dos pontos de venda dos serviços, do gerenciamento
de frotas, do perfil dos clientes e dos canais de distribuição. Por exemplo, enquanto 75%
das receitas das empresas multinacionais é intermediada por agentes de viagens e outros,
80% das empresas locais são de vendas diretas junto ao consumidor.
Nos Estados Unidos existem poucas companhias que dominam o mercado com
grandes frotas. Em geral, essas corporações são multinacionais e congregam várias em-
presas. No Gráfico 7.1 fica evidente que o número de pontos de vendas dos três maiores
conglomerados (11.402 lojas) supera o número de pontos de vendas de todas as outras
grandes companhias (1.491 lojas) e aquelas consideradas como independentes (5400
lojas), que somados totalizam 6.891 lojas. No Brasil, ocorre o inverso, de acordo com
a Associação Brasileira das Locadoras de Automóvel (ABLA), empresas de pequeno e
médio porte respondem por aproximadamente 70% do mercado nacional.
Na Europa, existe uma dificuldade de se quantificar o mercado de locação de
veículos já que além das grandes corporações multinacionais e empresas nacionais,
existe uma série de empresas pequenas com atuação local nos diversos países. De
189
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Gráfico 7.1 — Número de lojas das empresas locadoras de veículos nos Estados Unidos
em 2012 (Fonte: AUTO RENTAL NEWS, 2012)

acordo com a Avis Europe, em 2010, o mercado ficou subdivido da seguinte forma:
25,8% Europcar; 17,2% Avis Europe; 14,2% Hertz, 9,4% Sixt e as demais totalizavam
33,4% (CASTRO, 2012).

7.3.3. Ônibus e o turismo


A história do ônibus antecede o processo de motorização dos veículos, uma vez que
o francês Blaise Pascal desenvolveu, no ano de 1662, um veículo de transporte coletivo
movido a tração animal com rotas e horários fixos na cidade de Paris. O auto-ônibus,
ou seja, com motorização própria, foi desenvolvido no final do século XIX por Karl
Benz. Na primeira metade do século XX, os ônibus já alcançavam a velocidade de 70
km/h e isso facilitou sobremaneira o acesso aos destinos turísticos (PALHARES, 2002).
Antes de abordarmos os serviços de ônibus regulares e fretados, torna-se importante
compreender que existem várias categorias de ônibus e que estas apresentam caracterís-
ticas diferentes entre si. Castro (2012) explica que pode-se encontrar no mercado os
seguintes tipos de ônibus: convencional, executivo, leito, semileito e panorâmico duplo
deck (DD) (ver Quadro 7.4).
Além disso, Castro (2012), a partir de Paolillo e Rejowski (2002), detalha as categorias
dos ônibus utilizados para fins turísticos, conforme apresentado no Quadro 7.5.
190
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

Quadro 7.4 — Tipos de ônibus rodoviários

CATEGORIAS CARACTERÍSTICAS
Convencional Capacidade entre 40 e 50 passageiros, com acabamento
simples. Equipados com sanitários, não apresentam ar-
condicionado, poltronas pouco reclináveis. Indicado para
percursos curtos e médios.
Executivo Capacidade entre 30 a 40 passageiros, acabamento mais
refinado, apresenta sanitários, ar-condicionado, poltronas
reclináveis, serviço self service de água e café.
Leito Capacidade para 25 e 35 passageiros, o acabamento
é considerado luxuoso. Equipados com sanitários,
ar-condicionado, serviço self service incluindo kit lanche
além da água e do café. As poltronas são totalmente
reclináveis (tipo cama) e ainda apresenta descanso para os
pés. Geralmente não há a exibição de filmes, e é utilizado
em longos percursos.
Semileito Apresentam as mesmas características dos ônibus leito,
a diferença é que não se pode reclinar totalmente as
poltronas. Geralmente há a projeção de filmes.
Panorâmico (duplo deck) Por oferecer dois andares, oferecem dois tipos de serviços
diferentes, sendo que no primeiro piso há o serviço leito e
no piso superior o serviço é tipo semileito.
Fonte: elaborado pela autora com base em Castro (2012).

Quadro 7.5 — Características dos ônibus utilizados para fins turísticos por categoria

CATEGORIAS CARACTERÍSTICAS
Standard Veículos equipados com poltronas individuais, reclináveis,
descanso para os pés, sanitário, microfone, equipamento
de som e assento para o guia de turismo. Além disso, há
caixa de primeiros socorros.
Luxo Além das características do standard, há geladeira, ar-
condicionado e travesseiros.
Super luxo Além das características da categoria luxo, oferece
poltronas totalmente reclináveis, o acabamento é de
couro ou tecido. Há oferta de mantas, aparelhos de DVD,
micro-ondas, geladeira elétrica, calefação e esterilizador
de ar.
Fonte: elaborado a partir de Castro (2012) com base em Paolilo e Rejowski (2002).

Tanto os serviços regulares, quanto fretados são fundamentais para o desenvolvimento


do turismo. As características de cada tipo de serviço são descritas a seguir a partir de
Palhares (2002), Paolilo e Rejowski (2002), Castro (2012).
1. Ônibus regular : as linhas e horários são predeterminados, e o serviço é ofertado
independentemente do número de passageiros.
191
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

2. Ônibus para fretamento : existem dois tipos de fretamento- aberto e fechado. O aberto
faz parte da oferta de turismo rodoviário de pacotes das operadoras de turismo. Nesse
caso, os passageiros não precisam se conhecerem previamente. O fechado envolve a
locação do ônibus junto a empresa rodoviária, em geral, os membros do grupo que
irá viajar apresentam afinidades entre si e pretendem ir a eventos (esportivos, religiosos
e de negócios etc.).
A seguir é analisada a importância do city tour para o desenvolvimento de destinos
turísticos:

SERVIÇOS DE CITY TOUR E O DESENVOLVIMENTO DE DESTINOS


TURÍSTICOS
A oferta de serviços de city tour ou sightseeing contribui bastante para o desenvol-
vimento de destinos turísticos. Os serviços de sightseeing são geralmente ofertados em
ônibus de dois andares, que apresentam a parte superior aberta. Estes realizam visitas às
principais atrações turísticas de um determinado local, e para tal contam com o auxílio
de guias ou material informativo sobre as atrações a serem visitadas. Dependendo do
tipo de turista e destino (ver modelo de Plog 1991, citado no Capítulo 2) esses serviços
podem ser mais ou menos utilizados. Logo, é essencial que exista um planejamento com
base em pesquisas de mercado para a implantação deste tipo de serviço nos destinos
turísticos (ver Capítulo 3).
A empresa City Sightseeing Worldwide, iniciada na década de 1990, atualmente
opera em vários continentes, e é uma das mais expressivas do mercado. O sistema uti-
lizado é do tipo hop-on/hop-off. Esse sistema permite que o passageiro entre (hop-on)
e saia (hop-off) dos ônibus (desde que haja capacidade para o embarque), quantas
vezes forem necessárias, nos pontos da rota e no tempo estabelecido pela aquisição
do bilhete. Em geral, os bilhetes apresentam durações específicas, e são cobrados
valores diferenciados de acordo com o tempo de uso. O sucesso desse sistema reside
na flexibilidade que o usuário tem para compor a sua experiência turística no destino
visitado. A partir do tempo disponível, é possível hierarquizar de que forma os atrativos
turísticos serão visitados. Sendo assim, as empresas podem trabalhar com variados
segmentos e nichos de mercado dependendo da elaboração de sua rota. Contudo,
nem todos os city tours funcionam no sistema hop-on/hop-off, alguns são passeios que
apresentam começo/fim com horários predeterminados (v. TAVARES, 2002).
Ainda é válido destacar que existe uma gama de tours que são mais focados em de-
terminados segmentos ou nichos de mercado. Por exemplo, em Liverpool, na Inglaterra,
onde o grupo musical The Beatles se formou, existe um tour de ônibus muito curioso, o
Magical Mystery Tour (“Uma turnê misteriosa” e é a trilha sonora de um filme homônimo
protagonizado pelos jovens na década de 1960). O ônibus é tematizado com motivos
relacionados à banda, e o trajeto envolve pontos que apresentam algum tipo de conexão
com o quarteto musical de Liverpool. O roteiro engloba desde o caminho que eles
faziam para ir à escola quando crianças, até locais mais reconhecidos pelos fãs, como o
famoso Cavern Club, onde eles se apresentavam na cidade (v. VISIT LIVERPOOL, 2013).
192
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

7.3.4. Rodovias e o desenvolvimento de destinos turísticos


A relação entre rodovias e turismo é bastante estreita, sendo que os atributos históricos,
arquitetônicos e cênicos da via podem ser elementos chave para a construção do produto
e da experiência turística relacionados ao modo rodoviário. Prideaux e Carson (2011) reali-
zaram um estudo sobre as tendências e os mercados emergentes envolvendo o turismo em
rodovias, e definiram um modelo que apresenta o turista e a experiência rodoviária turística
como elementos centrais. No modelo supracitado, de um lado encontram-se os fatores da
oferta da demanda que influenciam o tipo de suprimento fornecido, (carro para famílias,
aluguel de carro, veículo 4×4, veículo recreacional, caravan) e de outro os fatores push-pull
isto é, aqueles que têm a capacidade de atrair ou repelir a demanda turística (marketing, po-
liciamento, atrações, acomodações, redes rodoviárias, clubes de carros, seguro e satisfação).
As tendências futuras compreendidas no modelo de Prideaux e Carson (2011) são in-
fluenciadas por mudanças climáticas, pico do petróleo, comércio de emissões de crédito
carbono até as novas tecnologias. Logo, percebe-se que um dos desafios para o avanço
do turismo rodoviário é a cooperação intersetorial entre transportes e turismo. A con-
tribuição para um turismo rodoviário win-win, ou seja, de ganho para ambos os setores,
é observada por Olsen (2003) no estudo sobre as rotas turísticas temáticas na Austrália.
Os corredores rodoviários são vistos não só como produtos turísticos para o consumo
por meio do uso de carros, mas também como elementos para a eficiência rodoviária e
para a melhoria da segurança rodoviária. (OLSEN, 2003).
Apesar de o modo rodoviário ser amplamente utilizado no Brasil, ainda são escassos
os produtos turísticos construídos a partir da relação entre rodovias e destinos turísticos.
De acordo com Palhares (2002), o turismo no Brasil é prejudicado, pois grande parte das
rodovias não apresenta sinalização e conservação adequadas. Ademais, uma parte não é
sequer pavimentada. O autor apresentou a classificação e nomenclatura do sistema rodoviário
brasileiro e destacou algumas rodovias que contribuem para o turismo interno, como: (a)
BR 101 que interliga importantes destinos turísticos brasileiros, já que faz a ligação entre as
extremidades norte-sul do país, ou seja, entre os estados do Rio Grande do Sul e Rio Grande
do Norte; (b) o Sistema Anchieta (SP-150) Imigrantes (SP-160) forma as Ecovias, composto
por uma série de outras rodovias (SP-041, SP-059, SP-248 e SP -055), possibilitando o des-
locamento entre a capital e o litoral do estado de São Paulo; (c) Região dos Lagos, que, a
partir da cidade do Rio de Janeiro, pode ser acessada pela Via Lagos (RJ-124) ou pela RJ-106.
A Sociedade das Florestas do Brasil (2010) está tentando implantar uma metodologia para
o reconhecimento de rodovias cênicas no país, o que já acontece nos Estados Unidos e na
Europa. Os procedimentos utilizados são baseados no National Scenic Byways Program im-
plementado nos Estados Unidos. O primeiro passo é a rodovia ser transferida para a iniciativa
privada. Logo após, é preciso seguir outras etapas para que esta seja considerada rodovia
cênica pela Sociedade das Florestas do Brasil (CASTRO, 2012). Ainda sobre rodovias e turis-
mo, na Seção 7.4 é destacado o projeto BR-163, que por aliar rodovia e munícipios em prol
do desenvolvimento sustentável regional, pode ter o turismo como uma excelente ferramenta.

193
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

7.4. O TRANSPORTE TERRESTRE E O TURISMO NO BRASIL NOS


ANOS 2000
No Capítulo 3, especificamente na Seção 3.3, sobre políticas públicas, ficou evidente
que: do lado dos transportes, houve uma retomada do processo de planejamento de
longo prazo para esse setor no Brasil e que o lançamento do Plano Nacional de Logística
e Transportes (PNLT) contribuiu sobremaneira para isso; do lado do turismo, houve a
criação do Ministério do Turismo em 2003, a elaboração e execução do Plano Nacional
de Turismo referentes aos períodos (2003/2007) e (2007/2010), a instituição da Lei Geral
do Turismo (Lei 11.771 de 17 de setembro de 2008). O foco desta parte do capítulo será
a análise dos modos de transportes terrestres no Brasil entre os anos 2000 e início do
ano 2013.

7.4.1. Modo ferroviário e o desenvolvimento de destinos


turísticos no Brasil
Como visto na Seção 7.2, a primeira ferrovia construída no Brasil data de 1854 e
interligava os fundos da Baía de Guanabara a Raiz da Serra no Estado do Rio de Janeiro
sendo que no primeiro momento foram construídos 14,5 km até a Parada do Fragoso
(SCHOPPA, s.d). No Quadro 7.6 é possível identificar tanto a expansão quanto a retração
ferroviária por períodos históricos (ver Quadro 7.6):

Quadro 7.6 — Expansão e retração da malha ferroviária no Brasil

ANO REFERÊNCIA/PERÍODO EXTENSÃO (KM)


1854 Início (E.F. Mauá) 14,50
1854/1889 Império 9.356,00
1889/1930 1º República 32.478,00
1930/1945 2º República 35.250,00
1945/1957 Pré-RFFSA* 37.250,00
1958 RFFSA 37.967,00
(Extensão máxima)
1996 Privatização 30.450,00
2011 Situação atual 29.961,00
* RFFSA - Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima.
Fonte: Rodriguez (2012).

É possível identificar no Quadro 7.6 que houve uma expansão da malha ferroviária
significativa até 1930, e que os demais períodos não apresentaram consideráveis aumentos
(ver número acumulados – km no Quadro 7.6), inclusive nos anos posteriores ao que o
autor nomeia de privatização até a situação atual em 2011 existem retrações com relação
ao período imediatamente anterior.

194
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

Pode-se observar que, além da diminuição da malha, as concessionárias ferroviárias


apresentam maior interesse no transporte de carga do que no de passageiros. De acordo
com esse cenário, atualmente no Brasil há uma escassez de oferta de transportes ferroviários
de passageiros de longa distância em operação (FRAGA, 2011).
A compreensão sobre a divisão dos transportes ferroviários no Brasil é uma impor-
tante ferramenta para se perceber como cada projeto ferroviário pode influenciar no
desenvolvimento de destinos turísticos. Nesse sentido, no Relatório Anual da ANTT 2011
(ANTT, 2012a) o transporte ferroviário de passageiro se divide da seguinte forma: (1) regu-
lar-opera sob regime de concessão e tem de manter a regularidade; (2) não regular-neces-
sita de autorização da ANTT para operar. Os transportes ferroviários não regulares se
subdividem em: (a) turístico, para a promoção do turismo e valorização do patrimônio
cultural e histórico; (b) comemorativo, operado em eventos específicos e isolados.
O governo federal tem apresentado propostas para investimento no setor ferroviário
no país. De acordo com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT, 2012b), está
previsto o investimento de 200 bilhões de reais na malha ferroviária brasileira nos próximos
anos. A seguir isso será discutido com base nos debates sobre propostas ferroviárias e
o desenvolvimento de destinos turísticos, para tanto serão levadas em consideração
proposições de investimento em: (a) trens regionais de passageiros; (b) trens turísticos;
(c) trem de aeroporto; (d) trem de alta velocidade.
a. Trens regionais de passageiros
No inicio dos anos 2000, foi publicado um estudo que identificou os trechos potenciais
para a implantação de trens regionais de passageiros no Brasil, e um dos vetores de desenvol-
vimento considerado foi o turismo (BNDES/ COPPE – UFRJ 2002). Fraga (2011) fez uma pes-
quisa cruzando os trechos elencados pelo estudo realizado em 2002 e os destinos indutores
do turismo propostos pelo estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas/Ministério do
Turismo (ver Relatório Brasil, 2010). a partir do qual se conclui que há um grande potencial
de desenvolvimento entre turismo, ferrovia e destinos turísticos na região Nordeste do país.
Em 2012 foi realizado um evento sobre o tema: “Trens de passageiros uma necessidade
que se impõe”, cujo objetivo foi debater sobre propostas, projetos e financiamentos.
Apesar de o turismo não ter sido um item-chave da pauta, é fundamental observar a
relação entre ferrovia e sustentabilidade que se estabelece ao se explicar a importância
de se investir nos trens regionais de passageiros no Brasil. Nesse sentido, o site oficial
da ANTT explica que o investimento nos trens regionais de passageiros dialoga com o
menor custo, a maior segurança e a necessidade de diminuir a sobrecarga das rodovias,
traduzindo-se em uma preocupação com o meio ambiente (ANTT, 2012b).
b. Trens turísticos
Como visto na Seção 7.2 existe uma controvérsia para a conceituação de trens turís-
ticos, e nada impede que um trem regional de passageiro se torne propulsor da ex-
periência turística para um determinado grupo de usuários, mesmo que não tenha sido

195
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

planejado exclusivamente para isso. As análises desta parte do capítulo serão baseadas
na conceituação proposta pela ANTT em âmbito nacional.
A existência de alguma ociosidade no uso da malha ferroviária brasileira torna-se uma
oportunidade para implantação de trens regionais de passageiros e também para os trens
turísticos e comemorativos. Nesse sentido, existe no Brasil um número crescente de oferta
ferroviária turística. A Associação Brasileira das Operadoras de Trens Turísticos e Culturais
(ABOTTC) é uma entidade fundada em 2000 que reúne operadores de trens turísticos e
culturais nacionais. Uma curiosidade é que bondes com fins turísticos também podem
ser associados. Com base nos dados da ABOTTC e da ANTT é possível identificar que no
Brasil existem uma série de passeios ferroviários turísticos em operação. O Ministério do
Turismo noticiou que são 32 roteiros envolvendo 11 estados brasileiros (BRASIL, 2012). É
válido destacar que Tomelin (2009) apresentou alguns desses passeios ferroviários turísticos
e examinou a sua contribuição para o desenvolvimento do turismo ferroviário no Brasil.
Coelho (2011) fez uma análise sobre as tarifas praticadas nos passeios ferroviários
brasileiros e encontrou como menor valor praticado R$0,60 (sessenta centavos de real)
e o maior valor R$270 (duzentos e sessenta reais), sendo que na época que a pesquisa foi
realizada ficou identificada uma concentração de tarifas cobradas na faixa dos cinquenta
reais. Contudo, a precificação dos passeios ferroviários é um grande desafio para o planeja-
mento e gestão nesse mercado, já que tanto os serviços oferecidos (bordo, guiamento etc);
durações das viagens (número de horas), distâncias percorridas (km), quanto as caracterís-
ticas relacionadas aos atrativos (nostalgia, cultura e história) são bastante diferentes entre si.
Existe uma série de projetos para implantação de novos trens turísticos expressivos,
o que ocasionou em 2010 a criação de uma Cartilha para a proposição de novos trens
de interesse turístico e cultural. Nesse documento se considera nas diretrizes gerais se
os municípios envolvidos com a implantação do trem turístico fazem parte do Mapa de
Regionalização do Turismo (2009), do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) das
Cidades Históricas etc. (BRASIL, 2010). Logo, fica evidente a necessidade da articulação
política, envolvendo diversos atores e organizações, para o avanço do turismo ferroviário
no Brasil (ver Seção 3.3 do Capítulo 3 sobre políticas públicas de turismo e transportes).
c. Trem de alta velocidade no Brasil
No Brasil entre 2007 e 2009 ocorreram estudos de traçado, demanda, operação e custos
para a implantação de trechos ferroviários de alta velocidade. De acordo com dados do site
do Ministério dos Transportes foram feitas consultas públicas sobre modelagem financeira
e traçados, com o lançamento de um edital de concorrência internacional. Segundo dados
sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC-2), disponíveis no site do Minis-
tério do Planejamento relacionado às ferrovias, existe uma possibilidade de se investir nos
trechos envolvendo os seguintes destinos: (1) Rio de Janeiro-São Paulo e Campinas; (2) São
Paulo e Curitiba; (3) Campinas e Triângulo Mineiro; (4) Campinas e Belo Horizonte. Assim,
percebe-se que as cidades de São Paulo e Campinas são importantes nós da rede ferroviária
de alta velocidade que está sendo proposta. Ao se considerar que São Paulo e Rio de Janeiro
196
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

apresentam aeroportos que são os principais portões de entrada para os turistas internacio-
nais, é possível concluir a importância do TAV para o desenvolvimento turístico brasileiro.
Além dos sistemas de alta velocidade, é importante perceber o planejamento ferroviário
como um todo. Por exemplo, ao se delimitar o traçado de uma proposta de Expresso
Ferroviário de Aeroporto na cidade de Campinas, é importante considerar os pontos de
conexão com outros projetos, como exemplos: o Trem de Alta Velocidade (interligando
Rio de Janeiro, São Paulo e Campinas) e o Trem Turístico (interligando Campinas e Poços
de Caldas). Assim, fica evidente que a implantação coordenada de projetos ferroviários po-
deria de fato otimizar o desenvolvimento dos destinos turísticos envolvidos (SILVA, 2004).
Por fim, além da integração com outros sistemas ferroviários (de aeroporto, regionais
de passageiros etc.), é preciso garantir a acessibilidade financeira ao uso do trem de alta
velocidade. Assim, Lacerda (2008) fez um estudo sobre os trens de alta velocidade em
várias partes do mundo, evidenciando o alto custo de implantação dessas tecnologias,
bem como das tarifas praticadas. A acessibilidade física promovida entre origem e des-
tinos turísticos tem de ser seguida da acessibilidade financeira para o uso desse sistema.
A tecnologia de levitação magnética para ferroviais de alta velocidade também tem sido
um tema abordado no Brasil. O Laboratório de Aplicações de Supercondutores (LASUP)
da Universidade Federal do Rio de Janeiro desenvolveu um projeto denominado Maglev
Cobra. Um das vantagens desse projeto é a possível adaptação para o uso do veículo em
vias existentes, através da instalação de vias levitação magnética sobre a via permanente.
d. Trens de aeroporto no Brasil
Os trens de aeroporto podem utilizar a alta velocidade (ver Seção 7.2.1). Seguindo a
tendência mundial, no Brasil há uma tendência ao investimento na intermodalidade entre fer-
roviais e aeroportos. Com isso, estudos acadêmicos e mercadológicos têm sido desenvolvidos.
Marquez (2006) fez um estudo sobre a aplicação do modelo de intermodalidade
aeroferroviária existente no Aeroporto de Frankfurt (na Alemanha) e a realidade do
Aeroporto de Guarulhos (no Brasil), que é considerado um hub sul-americano. A partir
do Projeto Expresso Aeroporto desenvolvido pelo Governo do Estado de São Paulo, a
Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e a Infraero, o objetivo é interligar
tal aeroporto à cidade de São Paulo.

7.4.2. Modo rodoviário e o desenvolvimento de destinos


turísticos no Brasil
A expansão dos transportes terrestres é fundamental para a criação de novas cidades,
a atração de investimentos e o desenvolvimento de atividades comerciais, dentre elas o
turismo. O Brasil apresenta um histórico que envolve investimentos massivos no transporte
rodoviário, ocorrido, entre outros fatores, por conta da expansão da indústria automobilís-
tica. Assim, é perceptível que muitos destinos turísticos se tornaram parcialmente ou
totalmente dependentes desse modo de transportes ao longo das últimas décadas.
197
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

A sinergia entre transporte rodoviário e turismo pode ser sentida no mercado de locadoras
de automóveis nacional. A partir do Anuário 2009, a ABLA destacou que no Brasil 45% das
locações de automóveis são destinadas ao turismo, o que totalizam 6,7 milhões turistas.
Ainda, de acordo com dados do Ministério do Turismo, em 2009 o mercado de locação
de automóveis no Brasil apresentou faturamento anual de 4,37 bilhões de reais, a frota foi
estimada em 363456 veículos, o número de usuários 16,8 milhões, com uma geração de em-
pregos (direto e indiretos) de 240.644 postos de trabalho e 1.443 milhões de reais em impostos
gerados. No Gráfico 7.2 é possível analisar a participação expressiva do turismo no perfil de
negócios das locadoras de automóveis brasileiras, considerando os anos de 2003 e 2008.

Gráfico 7.2 — Perfil do mercado de locação de automóveis no Brasil (Fonte: Elaborado


pelos autores com base no Anuário da ABLA, 2009)

A malha rodoviária brasileira é organizada de acordo com as esferas administrativas (fe-


deral, estadual e municipal). Apresenta aproximadamente 1,7 milhões de quilômetros, dos
quais 186 mil quilômetros de rodovias federais e estaduais são asfaltados. Os serviços de
transportes rodoviários interestadual e internacional de passageiros no Brasil respondem
por um número superior a 140 milhões de usuários (serviços regulares e serviços fretados)
(ANTT, 2009).Isso influencia decisivamente no desenvolvimento de destinos turísticos
nacionais. Assim, torna-se relevante conhecer a divisão dos transportes rodoviários interes-
tadual e internacional de passageiros proposta pela ANTT: (1) regular-se subdividem em
aqueles que trafegam mais que 75 quilômetros e os semiurbanos; (2) por fretamento-even-
tual ou contínuo (ANTT, 2012a). Cada tipo de transporte terá uma forma de influência no
estímulo ou inibição do desenvolvimento sustentável de destinos turísticos. A expansão
da malha rodoviária nacional, bem como os processos de concessão e privatização, já
foram amplamente explorados por outros autores, como Palhares (2002).
Nesta parte do capítulo, o objetivo será fazer discussões sobre um tema emergente:
a sustentabilidade relacionadas aos transportes rodoviários e o desenvolvimento de des-
tinos turísticos no Brasil.
198
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

A busca pelo desenvolvimento sustentável de destinos turísticos atrelados ao uso de


automóveis tem gerado procura por uma série de soluções, tais como: sistemas de com-
partilhamento de carros (como o Autolib em Paris, abordado no Capítulo 3), redução de
emissões de poluentes ao meio ambiente. Sobre esse último item, no Brasil observa-se que
no licenciamento total de automóveis e comerciais leves por combustível (considerando-se
o mês de janeiro dos anos de 2012 e 2013 como referências) há um nítido crescimento de:
veículos elétricos; veículos movidos a Fuel Flex (sistema que permite utilizar de maneira
alternada dois combustíveis, tais como álcool e gasolina) e veículos movidos a diesel.
Em contraposição há uma sensível diminuição do número de veículos licenciados que
apresentam apenas a gasolina como combustível (ver Gráfico 7.3):

Gráfico 7.3 — Licenciamento total de automóveis e comerciais leves por combustível


(Fonte: elaborada pelos autores com base na Carta da ANFAVEA fevereiro de 2013)

Fica evidente que as decisões de compra e venda de automóveis no Brasil estão sendo
influenciadas por aspectos relacionados à conservação do meio ambiente e à sustentabili-
dade como, por exemplo, a relação entre o tipo de combustível/força motriz e a emissão
de poluentes na atmosfera. Esse cenário demonstra que há uma mudança paradigmática
em curso, relacionando o uso de automóveis e a sustentabilidade dos destinos turísticos.
Não só os veículos e a força motriz são focos dos desafios da sustentabilidade, mas o
planejamento integrado envolvendo a via e os destinos turísticos também são necessários.
Por exemplo, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente, em 2006, houve a criação
do Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável para a Área de Influência da Rodovia
BR-163 envolvendo 79 municípios nos Estados do Pará, Mato Grosso e Amazonas. Em 2009,
para dar suporte ao Plano foi criado o Projeto BR-163 Sustentável, que objetiva influenciar
desde o manejo das florestas públicas e o apoio a iniciativas de produção sustentável, até
199
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

o fortalecimento da sociedade civil e dos movimentos sociais. Buscando discutir mais este
tema sob a perspectiva científica, no Capítulo 8 são propostas algumas indagações a respeito
da relação entre sustentabilidade, transportes terrestres e o desenvolvimento do turismo rural.
No fechamento deste capítulo são apresentadas duas discussões realizadas por pes-
quisadores convidados sobre o desenvolvimento do turismo rodoviário no Brasil. O
primeiro foi elaborado por Thiago Allis e versa sobre a relação entre os ônibus fretados e
o turismo na cidade de São Paulo. O segundo foi realizado por uma dupla de pesquisa-
dores, Elisangela Aparecida Machado da Silva e José Augusto Sá Fortes, sobre o turismo
rodoviário e o desenvolvimento do destino turístico Foz do Iguaçu. Ambos contribuem
para a reflexão sobre a importância do planejamento e gestão integrados entre transportes
terrestres e destinos turísticos como fator crítico de sucesso para o posicionamento do
Brasil frente a demanda doméstica e internacional.

OS ÔNIBUS FRETADOS E O TURISMO NA CIDADE SÃO PAULO


THIAGO ALLIS1

A cidade de São Paulo é o núcleo da principal aglomeração urbana da América do


Sul, acumulando, isoladamente, 12% do PIB nacional e quase 20 milhões de pessoas
na sua região metropolitana. Atualmente, a capital paulista recebe cerca de 11 milhões
de visitantes, principalmente a negócios (45%) e eventos (24,4%) e, cada vez mais, em
atividades de lazer (12,2%), estudos (6,7%) e saúde (3%). Nos próximos anos, deverá
atrair ainda mais fluxos turísticos, consoante à sua visibilidade no plano internacional e
particularmente aos grandes eventos esportivos.
Nesse contexto, as práticas turísticas, distribuídas nos espaços e no cotidiano da cidade,
oferecem a riqueza de uma urbe multifacetada, mas também impõem dificuldades de
ordem prática, dadas a natureza e a intensidade do seu processo de formação urbana.
A acessibilidade aos pontos de interesse (terminais de transporte, meios de hospedagem,
estabelecimentos de alimentação e atrativos turísticos) é um assunto que poderia ser
considerado um entrave para perfeita fruição da cidade. Deslocamentos de até duas
horas não são raros, pois as distâncias são grandes e os congestionamentos fazem parte
da rotina da cidade.
Ainda que a situação dos transportes públicos em São Paulo tenha algumas vantagens
(sistema de metrô limpo, seguro e em expansão, frota de ônibus em ligeira melhora e uma
frota de mais de 30 mil táxis), os deslocamentos turísticos nem sempre acontecem de maneira
segura, eficiente e confortável. Portanto, a discussão sobre a convivência entre os transportes
turísticos e o trânsito geral da cidade é um assunto emergente, pois, ao mesmo tempo em que
o turismo aumenta de importância na cidade, as condições de trânsito continuam difíceis.
Nesse sentido, as agências de receptivo têm um importante papel ao oferecer serviços
de transporte orientado aos locais de visita, poupando o visitante das deficiências do

Professor Doutor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), campus Sorocaba.


1

200
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

transporte público (os aeroportos de São Paulo não são servidos por metrô ou trem)
e conferindo diferenciais durante os deslocamentos (informações turísticas e acompa-
nhamento de guias de turismo durante os trajetos).
Recentemente, novas regras de circulação para ônibus fretados – um tipo de trans-
porte amplamente utilizado no receptivo turístico – vêm causando muitas dúvidas,
principalmente por conta da dificuldade de compreensão das especificidades do trans-
porte turístico por parte dos legisladores e agentes fiscalizadores. Além disso, as discussões
mais avançadas nos planos estadual e federal acabam por não dar a devida atenção ao
ambiente intraurbano, focando-se nas questões que envolvem o transporte intermunicipal
e interestadual de passageiros.
Desde 2009, a Lei Municipal 14.971 (e as Portarias 67/2009, 18/2011 e 127/2012)
definem parâmetros para a circulação de ônibus fretados na Capital (Zona Máxima de
Restrição de Fretamento - ZMRF), como medida para controlar congestionamentos em
certas áreas da cidade, principalmente nos horários de pico da manhã e da tarde. Assim,
as empresas de fretamento devem solicitar Autorização Especial de Trânsito (AET) em
função das rotas e dias de operação, para que possam circular na ZMRF entre as 5h00 e
as 21h00. Fora desses horários ou fora da ZMRF, a circulação de veículos fretados é livre,
respeitadas as regulamentações gerais de trânsito.
A medida não tem relação direta com o turismo, já que os principais usuários são
trabalhadores de várias partes da cidade, da região metropolitana e de municípios de
outras regiões do estado, que usam ônibus fretados para acessar seus locais de traba-
lho. Contudo, a legislação aponta uma distinção entre “transporte rotineiro” e “trans-
porte não rotineiro”, como maneira de se buscar harmonizar as várias situações previstas
nos fretamentos urbanos. O transporte não rotineiro, segundo essa lei, está voltado às
seguintes finalidades: “turismo, seminários, religião, hospedagem, cultura, esporte, lazer,
cinema, audiovisual, assembleias e reuniões de trabalhadores, estudantes e entidades
populares, entre outros” (Lei 14.971, art. 9°). Porém, ainda persistem tensões entre es-
pecificações da lei, empresas do setor (agências de receptivo e empresas de veículos
fretados) e agentes públicos a cargo da execução e fiscalização da Lei.
Dentre os principais problemas, o principal deles refere-se às particularidades do trans-
porte turístico em grandes cidades. Para se solicitar a AET – que, apesar de ser feita online,
depende de avaliação e aprovação do órgão local – é necessário que a empresa trans-
portadora apresente, dentre outras documentações, a lista de nomes dos passageiros com
antecedência, bem como os itinerários (Plano de Operação). Para cada evento, deve-se gerar
uma AET específica, o que impõe mais burocracia à operação do receptivo. Isso, por vezes,
acaba por gerar dificuldades, uma vez que são comuns atrasos de voos ou cancelamentos
de viagens (que causa alteração no grupo de passageiros). Outra dificuldade é a exigência de
informações precisas sobre local, hora e data específicos de embarque, desembarque e es-
tacionamento (que a AET não viabiliza), o que, não raro, precisa ser revisto – diferentemente
do transporte rotineiro. Não se pode desconsiderar também que as atividades de city-tour
às vezes sofrem pequenos ajustes no roteiro em função de condições climáticas ou mesmo
por entendimento entre os turistas e o guia de turismo, o que pode levar a penalidades numa
situação de fiscalização, já que a AET foi emitida em função de um Plano de Operação.

201
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

A São Paulo Turismo S/A (SPTuris), órgão oficial de turismo da cidade, vem intermediando
essas discussões desde a aprovação da lei, de maneira a buscar uma harmonização de regras e
práticas. Contudo, ao que tudo indica, ainda serão necessários ajustes na aplicação das regras,
especialmente no que diz respeito a um maior entendimento por parte dos legisladores e da
Secretaria Municipal de Transportes sobre as particularidades do transporte turístico. Ademais
do tema dos fretamentos, há ainda tensões relacionadas à regulamentação e à operação de
transportes especiais e os serviços de táxi, que incorporam outra categoria (taxistas).
Ainda que minoritário nas receitas municipais, o turismo vem se fazendo sentir de maneira
mais intensa em São Paulo, o que exige operações de transportes ajustadas ao novo cenário
(especialmente porque os deslocamentos autônomos, quando viáveis, não encontram um
cenário tão bem estruturado quanto nas metrópoles européias, por exemplo). Por outro lado,
as questões gerais do trânsito são, de fato, contundentes, já os seus ônus fazem parte da
vida de milhões de paulistanos, premissa que tende a continuar nortear as decisões técnicas
dos órgãos gestores do transporte local. Convém, portanto, a partir de agora, avançar no
entendimento sobre os rumos do turismo na cidade, entendendo-o de maneira articulada
à realidade urbana presente e futura, inclusive no que tange aos transportes turísticos.

O TURISMO RODOVIÁRIO E O DESENVOLVIMENTO DO DESTINO


TURÍSTICO FOZ DO IGUAÇU NA REGIÃO TRINACIONAL DO IGUAÇU
ELISANGELA APARECIDA MACHADO DA SILVA2
JOSÉ AUGUSTO SÁ FORTES3

Foz do Iguaçu, cidade localizada no oeste do Estado do Paraná, é fortemente influen-


ciada pela atividade turística, geração de energia hidrelétrica e comércio fronteiriço com
Argentina e Paraguai, pois faz parte da Região Trinacional do Iguaçu. A cidade apresenta
atrativos turísticos, como as belezas naturais do Parque Nacional do Iguaçu, tombado como
Patrimônio Natural da Humanidade, onde estão localizadas as Cataratas do Iguaçu com
diversas atrações e serviços para seus visitantes. Conta também com o Parque das Aves,
uma área ambiental temática onde é possível observar aves tropicais raras e multicoloridas,
com mais de 900 tipos de aves de 150 espécies. No lado paraguaio da Região Trinacional
do Iguaçu, Ciudad del Leste é responsável por metade do Produto Interno Bruto (PIB) desse
país, e é a terceira maior zona franca de comércio do mundo, após Miami e Hong Kong.
No lado argentino, Puerto Iguazú destaca-se pela variedade de seus estabelecimentos de
gastronomia e de hotelaria, além da possibilidade de jogos nos seus cassinos.
É válido destacar que o fluxo turístico em Foz do Iguaçu, principal portão de entrada
regional, apresentou crescimento médio anual de 15,8% no período de 1999/2010. Em
2010 o número de turistas foi 5,4 vezes maior daquele verificado em 1999, chegando
2
Mestre e doutoranda em Transportes pelo Programa de Pós-Graduação em Transportes (PPTG) da Univer-
sidade de Brasília (UNB).
3
Professor Doutor do Programa do Programa de Pós-Graduação em Transportes (PPGT) da Universidade de
Brasília (UNB).

202
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

a aproximadamente 2,24 milhões (NOGUEIRA et al, 2011). Nesse cenário, a demanda


por prestação de serviços aumenta significativamente, gerando mais trabalho e renda
aos destinos envolvidos e, consequentemente, aumento do PIB total e turístico, e torna
evidente a importância dos transportes terrestres para a operacionalização dos roteiros
turísticos no país.
Em consonância com a Política Pública Nacional o estado do Paraná orienta-se, dentre
outros princípios, pela promoção de uma atuação pública mobilizadora de planejamento
e coordenação para o desenvolvimento turístico regional, de forma articulada e comparti-
lhada entre os municípios que integram as regiões turísticas do Estado, tendo em vista
ações de negociação, consenso e organização social. Para tanto consolida a proposta no
Plano de Ação (2011-2014) de planejar e organizar o turismo estadual para o fortalecimento
da regionalização, roteirização e segmentação do turismo, com destinos e produtos turísticos
ofertados de forma mais estruturada, ampliada, diversificada e qualificada. Nesse contexto,
a formatação de produtos focados no turismo rodoviário é fortalecedor do turismo regional
e pressupõe o associativismo entre os municípios que se consorciam para somar atrativos,
equipamentos, serviços turísticos e meios de transportes. Com objetivo de enriquecer a oferta
turística, ampliar as opções de visita e a satisfação do turista, fortalecer a cadeia produtiva do
setor, com consequente aumento do fluxo e permanência dos visitantes na área geográfica,
ou seja, a composição de circuitos turísticos compostos por um conjunto de municípios
preparados para acolher turistas, e oferta de deslocamento aos pontos de visitação.
A formatação de produtos focados no turismo rodoviário é um importante fortalecedor
do turismo regional, gerador de oportunidades na exploração das potencialidades e vetor
de qualificação do produto turístico nacional frente ao mercado internacional de viagens.
A escassez da oferta de pacotes turísticos terrestres, a inexistência de infraestrutura rodo-
viária para embarque e desembarque de passageiros nas principais cidades emissoras e
receptoras de turistas dificulta a operacionalização e a comercialização de pacotes dessa
natureza, mesmo que os acessos iniciais sejam feitos por via aérea, o acesso e percurso
aos roteiros turísticos somente é possível com o uso de meios de transportes terrestres,
em especial os rodoviários.
Isso mostra um potencial a ser melhor explorado ao impulsionar o setor turístico de Foz
do Iguaçu, dado que a competitividade de uma cadeia de negócios é maior quanto mais
fortalecido for cada um de seus elos constitutivos. Contudo, poucos pacotes e serviços são
ofertados tendo como base o deslocamento rodoviário. E é com esse teor que se propõe
implantar o Projeto Iguaçu Sobre Rodas na região da tríplice fronteira, via o deslocamento
por ônibus comerciais, ônibus turísticos, veículos particulares e automóveis alugados.
O destino visa formatar produtos competitivos e volta sua atenção para o turismo
rodoviário, uma vez que este representa a maioria do público que visita a região. O
projeto Iguaçu Sobre Rodas tem por objetivo promover ações estratégicas com foco no
aumento do fluxo rodoviário, atraindo turistas num raio de 800 km em território brasileiro,
paraguaio e argentino nos períodos considerados de baixa temporada, cabendo às
agências elaborar pacotes organizados com preços convidativos a estudantes, famílias,
terceira idade e em especial ao público da classe C e D, os novos consumidores de
turismo no Brasil (INSTITUTO POLO INTERNACIONAL IGUASSU, 2012).

203
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

O Iguaçu Sobre Rodas está em fase inicial de implantação pelos representantes do


setor turístico, com a caracterização da oferta e demanda realizada, envolvimento dos
representantes do trade local, regional, estadual e nacional efetivados, constituindo-se
em um projeto efetivo de integração entre transportes e turismo para o desenvolvimento
regional. Contudo, é preciso reconhecer as deficiências da infraestrutura rodoviária e
colocá-las como um dos principais empecilhos para o incentivo às viagens rodoviárias
regionais, bem como criar um marco regulatório no Brasil para facilitar a circulação de
veículos comerciais entre os municípios dos roteiros turísticos.

7.5. CONCLUSÕES
Este capítulo abordou como uma série de aspectos relacionados aos modos ferroviário e
rodoviário podem influenciar no desenvolvimento de destinos turísticos. Num primeiro mo-
mento, foi possível perceber, através de dados históricos, a importância da Revolução Industrial
para os avanços tecnológicos dos transportes que influenciaram o desenvolvimento do turismo.
Particularmente, a popularização do automóvel e o uso do ônibus em larga escala im-
plicaram no declínio do modo ferroviário em alguns países, inclusive no Brasil. Do lado dos
transportes rodoviários, a importância do mercado de locação de veículos para o desenvol-
vimento de destinos turísticos foi analisada a partir da realidade nacional e internacional.
No estudo específico sobre a realocação de frotas na Nova Zelândia ficou evidente como
os destinos turísticos dependem da locação de veículos para o seu desenvolvimento. No
tratamento do modo ferroviário evidenciou-se que existe uma série de particularidades ao
se decidir sobre o melhor tipo de projeto ferroviário (trem de aeroporto, trem regional de
passageiro e trem turístico) a ser implementado envolvendo destinos turísticos.
Este capítulo finaliza trazendo contribuições sobre a realidade brasileira na última
década e explora as tendências para os modos terrestres (rodoviário e ferroviário) na
retomada ao planejamento estratégico de longo prazo abordadas na Seção 3.3 deste livro.

EXERCÍCIOS
1. Cite duas características de cada um dos modos de transportes terrestres (ferroviário)
e (rodoviário) e explique como esses modos influenciam no desenvolvimento de des-
tinos turísticos.
2. O que é serviço porta a porta? Explique sua importância para o desenvolvimento
de destinos turísticos.
3. Qual a importância dos trens de alta velocidade para o desenvolvimento de destinos
turísticos?
4. Elabore um texto dissertativo relacionando os seguintes conceitos: “locação de veícu-
los”, “trem de aeroporto”, “destinos turísticos” e “Brasil”.
5. Qual a importância do desenvolvimento de intermodalidade aeroferroviária para
o desenvolvimento de destinos turísticos?

204
 Capítulo 7 [Transporte Terrestre e Destinos Turísticos]

6. De que forma a escolha da força motriz pode influenciar no impacto do turismo


em destinos turísticos?
7. Faça uma pesquisa sobre os trens turísticos existentes no Brasil e apresente uma tabela
para seus colegas explicando quais atributos os tornam verdadeiras atrações turísticas.
8. Identifique uma carência de infraestrutura de transportes terrestres em um destino
turístico que você já tenha visitado e ofereça algum tipo de solução envolvendo
a preocupação com a sustentabilidade. Na sua resposta, explique de que forma
esse destino poderia se desenvolver turisticamente a partir da solução proposta
por você.

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211
CAPÍTULO 8
Tendências
para os transportes
e destinos turísticos

Carla Fraga e Rafael Castro

CONCEITOS APRESENTADOS NESTE CAPÍTULO


Este capítulo discute as tendências dos transportes para o turismo sob a perspectiva da
pesquisa, do mercado e do processo de ensino aprendizagem. Um dos principais desafios
apresentados diz respeito à construção de perguntas para o desenvolvimento de pesquisas
que envolvam transportes e turismo. Na parte mercadológica, destaca-se a importância
da competitividade entre os modos de transportes para o desenvolvimento de destinos
turísticos, bem como do uso de novas tecnologias de reservas e relacionamento com os
clientes, além da diferenciação entre os termos fusão e aquisição. Na área educacional
trata-se de temas como o ensino experiencial através do uso de simuladores de trans­
porte aéreo e de visitas e viagens de campo para o ensino de transportes e da experiência
com a educação a distância.

8.1. INTRODUÇÃO
Após a exposição de grande parte das interações e inquietações que envolvem tratar
da relação entre transportes e turismo, é essencial pensar nas perspectivas futuras. Sendo
assim, nada melhor do que concluir esta obra abordando as tendências dos transportes para
o turismo. Este capítulo foi dividido de forma a abranger as tendências de acordo com três
óticas distintas: a pesquisa científica, o mercado e a educação em transportes e turismo.
Inicialmente faz-se uma análise sobre os desafios e as tendências da pesquisa científica
em transportes e turismo, em que é possível perceber que até os dias de hoje ainda
há muito o que avançar em termos científicos sobre essa interface. Grande parte dos
213
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

pesquisadores em turismo acaba se concentrando em objetos de estudo relacionados a


outras áreas, e os engenheiros e planejadores de transportes muitas vezes não se interes-
sam em tratar de aspectos teóricos do turismo. Sobre esse tópico, apresentam-se ainda
perguntas acerca do papel dos transportes terrestres para o desenvolvimento turístico
do Vale do Café, no estado do Rio de Janeiro. Nele, tenta-se conduzir a construção de
perguntas ou problemas a serem investigados em pesquisas que envolvem transportes e
destinos turísticos.
Num segundo momento, apresentam-se as tendências mercadológicas dos transportes
para o turismo. Os assuntos abordados são subdivididos em quatro blocos principais: (1)
trata-se das fusões e aquisições entre empresas de transportes mostrando o quão comum
essa prática tem se tornado no setor, não somente no transporte aéreo, mas também nos
demais modos de transportes; (2) a segmentação do mercado que vem fazendo com que
as empresas tenham de adaptar seus serviços cada vez mais às diferentes necessidades
de cada grupo de clientes; (3) a revolução nas tarifas de transportes, sobretudo com o
surgimento das empresas aéreas do modelo low cost/low fare e, consequentemente, a
atual concorrência entre os modos de transporte como fato essencial para o desenvol-
vimento dos destinos turísticos e; (4) as novas tecnologias de reservas e as novas formas
de relacionamento com os clientes com ênfase para as redes sociais na internet.
Por fim, abordam-se as tendências educacionais, quando são apresentados dois estudos
que revelam experiências vividas pelos autores desta obra enquanto docentes em cursos
de turismo. O primeiro estudo, elaborado por Guilherme Lohmann, relata a importância
da inovação do ensino por meio da simulação e das visitas e viagens de campo para as
disciplinas de transportes e turismo. Já o segundo estudo, desenvolvido por Carla Fraga, e
com participação do Rafael Castro, trata do ensino de transportes para cursos de turismo
a distância.

8.2. TENDÊNCIAS NA ÁREA CIENTÍFICA


Ambos, transportes e turismo são práticas que antecedem a teoria. Assim, muitas
vezes esses termos “turismo” e “transportes” são utilizados no cotidiano, independente
da produção científica que abranja a conceituação, classificação e categorização desses.
A ideia de movimento, isto é, da necessidade da “viagem” está imbricada tanto nos trans-
portes, quanto no turismo. Contudo, o próprio significado de “viagem” pode ser um para
os estudos de transportes e outro para os estudos de turismo (ver Capítulo 2). O termo
“destino turístico”, também se tornou bastante popular no tratamento da organização de
viagens a lazer e é tido intuitivamente como o “local de estadia” para a realização das
práticas turísticas. Como visto nos capítulos iniciais, no destino turístico também ocorrem
deslocamentos por transportes que precisam ser analisados conceitualmente.
Uma convergência sobre os estudos científicos entre transportes e turismo é que estes
são essencialmente multidisciplinares. Portanto, um determinado problema de pesquisa
pode ser tratado a partir de teorias, métodos e técnicas oriundos de várias abordagens,

214
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

tais como: Geografia, Administração e Economia. Assim, a indagação sobre qual é a


formação acadêmica e profissional do pesquisador que atua com transportes e destinos
turísticos é um elemento para a reflexão sobre tendências e desafios.
Page (2008) fez uma análise interessante sobre como diversos profissionais podem
atuar com os desafios da interface transporte e turismo, dentre esses, destacam-se o
geógrafo, o administrador, o economista e o profissional de marketing. A partir disso
algumas perguntas podem ser formuladas: qual é a contribuição do turismólogo para
o enfrentamento de questões relacionadas aos transportes e destinos turísticos? E do
engenheiro ou planejador de transportes? A fim de oferecer pistas para respostas a essas
perguntas, no Capítulo 3 ficou evidente como o planejamento e a gestão integrados dos
transportes e destinos turísticos exigem a criação de um suporte multidisciplinar (abarcan-
do teorias, métodos e técnicas de diversas áreas do conhecimento) para o tratamento dos
problemas e delimitações de áreas de estudos que envolvam planejamento de transportes
e o planejamento de destinos turísticos.
Para se elaborar esse suporte teórico foi fundamental uma revisão da literatura abran-
gendo tanto a área de planejamento de transportes, quanto a de planejamento de turis-
mo. Sendo assim, o empreendimento da revisão da literatura, com consulta a livros e
periódicos, é bastante útil para que se compreendam os diálogos estabelecidos entre os
autores (com formações variadas) e as teorias, métodos e técnicas empregados oriundos
de diversas disciplinas que compõem o mosaico de produção do conhecimento científico
sobre transportes e destinos turísticos. Nesta parte do capítulo optou-se por fazer um
recorte e apresentar as tendências que estão ocorrendo nas pesquisas sobre transportes
turísticos que foram elencadas por Palhares (2003). Em síntese, tem-se que:
a. A maioria das pesquisas tem sido conduzidas através da perspectiva de uma única
disciplina em particular (ex: geografia ou economia), sem geralmente envolver uma
abordagem multidisciplinar.
b. Os estudos se concentram usualmente em um único modo de transportes, especial-
mente o aéreo. Temas como a intermodalidade são pouco abordados.
c. Parcerias (marketing e alianças estratégicas, por exemplo) os estudos não consideram
variados tipos. Há um foco grande em parcerias entre companhias aéreas e hotéis.
d. São poucos os estudos que focam na questão dos hubs, em especial o papel dos
portões de entrada como função nodal para o desenvolvimento de destinos turísticos.
Resultante a essas tendências, existe uma escassez de modelos teóricos (ver Capítulo 2),
bem como de modelos de planejamento, previsão e gestão (ver Capítulo 3) que atendam
as especificidades do binômio transportes e destinos turísticos. Dessa forma, são percep-
tíveis algumas lacunas importantes que precisam ser preenchidas com o desenvolvimento
de novos estudos científicos, tais como: a elaboração de modelos que abranjam todos
os modos de transportes, a aplicação de princípios multidisciplinares na condução de
pesquisas científicas, etc. Resgatando outro ponto tratado neste livro pelos pesquisadores
215
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Glauber Santos e Thiago Allis, a partir da identificação do estado da arte dos transportes
turísticos nas revistas científicas nacionais (ver Capítulo 2), ficou nítido que a maioria dos
estudos publicados sobre a temática nas duas últimas décadas no Brasil ainda seguem as
tendências explicadas por Palhares (2003).
Especialmente sobre o Brasil, o estágio de desenvolvimento de pesquisas científicas
sobre a temática pode estar associado a outros elementos, como por exemplo a escassez
de programas de pós-graduação strictu senso (mestrados e doutorados) que apresentem
interesse e produção científica focada na interface entre transporte e turismo. Assim,
se o objetivo é o aprofundamento das pesquisas científicas iniciadas na graduação, ao
término desta, pode existir uma incógnita sobre qual caminho seguir na pós-graduação.
Por outro lado, um bom exemplo sobre o fortalecimento das discussões e produção
científica a respeito dos transportes e o turismo em âmbito nacional é a criação de Grupos
de Pesquisa sobre o tema registrados nos Diretórios de Grupos de Pesquisa (DGP) do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Por exemplo,
em 2009, foi registrado o Grupo de Pesquisa Transportes e o Turismo (GPTT), certificado
pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). No início de 2013, havia
quatorze integrantes, incluindo nove pesquisadores e cinco estudantes. Já o Grupo de Pes-
quisa Transportes, Turismo e Desenvolvimento Econômico, certificado pela Universidade
de Brasília (UnB), foi criado em 2010. De acordo com dados do Diretório de Pesquisas do
CNPq, esse grupo representa a abertura de uma linha de pesquisa envolvendo o Centro
de Excelência em Turismo (CET) e o Programa de Pós-graduação em Transportes (PPGT)
da UnB.
Com objetivo de ilustrar os debates realizados por pesquisadores, a seguir é apresen-
tado o início de uma discussão teórica realizada por três pesquisadores que fazem parte
do GPTT, sendo um deles coautora deste livro.

8.2.1. Construindo perguntas sobre o papel dos transportes


terrestres para o desenvolvimento sustentável
do turismo rural no Vale do Café
Sergio de Castro Ribeiro1
Marcio Peixoto de Sequeira Santos2
Carla Fraga
As perguntas norteadoras para a elaboração de pesquisas científicas podem partir de
vários pontos, sendo um importante exercício inicial para os pesquisadores. Por exemplo,
pode-se observar experiências reais e, a partir delas, surgirem questões a serem tratadas
Professor Mestre da Escola Técnica Estadual Juscelino Kubitschek (FAETEC) e das Faculdades Intgradas
1

Hélio Alonso (FACHA).


2
Professor Doutor do Programa de Engenharia de Transportes (PET) do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós
-Graduação e Pesquisa de Engenharia (COPPE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

216
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

através do emprego do método científico; ou pode-se identificar marcos teóricos e con-


traposições teóricas que mereçam ser investigadas cientificamente. As reflexões iniciais
sobre transportes terrestres (rodoviário e ferroviário), sustentabilidade e turismo, com foco
no Vale do Café no Rio de Janeiro, surgiram a partir da curiosidade dos pesquisadores
sobre o comportamento da realidade do local frente a esses temas. Nesse sentido é válido
destacar algumas características do Vale do Café para a compreensão sobre o motivo
que levaram os autores a discutir sobre este assunto:
O Vale do Café, localizado no estado do Rio de Janeiro, é referência para a prática do
turismo rural e está composto por um conjunto de municípios, a saber: Conservatória,
Barra do Piraí, Mendes, Engenheiro Paulo de Frontin, Miguel Pereira, Paty do Alferes,
Piraí, Valença, Rio das Flores e Vassouras.
O apogeu econômico dessa região é associado ao Ciclo do Café (séculos XVIII ao
inicio do século XX). Sendo que os entroncamentos ferroviários desenvolvidos para escoar
a produção do café permitiram a interligação da região, bem como o acesso a outros
estados brasileiros, em especial aqueles que apresentavam portos para o embarque da
produção agrícola a ser vendida no mercado internacional. Sendo assim, o transporte
ferroviário apresenta um papel fundamental para identidade cultural dessa região, com
potencial para se tornar um ícone para o turismo no imaginário de viagem.
O fim do Ciclo do Café deixou um rastro de esvaziamento e prejuízos econômicos
incalculáveis. Contudo, ainda existem nessa região propriedades (fazendas, casarões e
senzalas) de inestimáveis valores históricos, culturais e arquitetônicos. No final dos anos
1990, grande parte dos proprietários desses bens arquitetônicos, remanescentes desse
glorioso período histórico brasileiro, encontraram no uso turístico uma significativa fonte
de receita através do desenvolvimento do turismo rural. Muitas propriedades foram
transformadas em fazenda-hotéis, outras passaram a ofertar gastronomia típica da região.
A partir do foco no Vale do Café, as discussões travadas entre os três pesquisadores
seguiram dois eixos, que estão resumidos a seguir:
Eixo 1 – Sentido de Turismo Rural
Em um primeiro momento, procurou-se compreender o sentido de turismo rural
no contexto nacional mais amplo, através da busca de definições emitida por órgãos
oficiais e o levantamento de dados históricos sobre o desenvolvimento do turismo
rural no país. Por exemplo, se identificou que, o Ministério do Turismo convencionou
denominar o turismo rural como o segmento turístico praticado no meio rural, envol-
vendo práticas agropecuárias, que podem servir como uma importante ferramenta
para oferecer outras oportunidades econômicas e sociais no espaço rural (BRASIL,
2010).
Identificou-se também que no Brasil o turismo rural é algo recente, sem haver dados
estatísticos consolidados através de longas séries históricas sobre sua prática. Estima-se que
o turismo rural tenha suas raízes em meados dos anos 1980, no município de Lages (SC),

217
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

onde fazendas locais passaram a acolher os viajantes para passar um dia no campo, ofere-
cendo-lhes pernoites e atividades relacionadas ao cotidiano no meio rural (SALLES, 2003).
Por fim, observou-se que, em 1990, o número de trabalhadores ocupados em atividades
não agrícolas nos campos cresceu 2,5% ao ano, enquanto a população economicamente
ativa relacionada às atividades agrícolas caiu 2,2% (GRAZZIANO, 1997). Assim, foi pos-
sível compreender a complexidade do turismo rural frente a área de estudo: Vale do Café.
Eixo 2 – Transportes, turismo, desenvolvimento e sustentabilidade
Devido a escassez de pesquisas realizadas no Brasil sobre a interface (ver Capítulo 2),
foi possível descobrir alguns estudos internacionais (HOYER, 2000; DICKINSON e DIC-
KINSON, 2006; MING SU e WALL, 2009; LOHMANN e STANFORD, 2012) que podem
servir de base teórica para a construção de perguntas norteadoras para a elaboração de
futuras pesquisas sobre os transportes terrestres e o desenvolvimento do turismo rural de
maneira sustentável no Vale do Café. Por exemplo, Lohmann e Stanford (2012) analisam
uma série de experiências reais em diferentes escalas e morfologias de destinos turísticos.
A análise sobre regiões montanhosas e rurais traz uma série de subsídios para se construir
perguntas sobre o papel dos transportes terrestres para o desenvolvimento sustentável do
turismo rural no Vale do Café. Com base nesses estudos voltou-se o olhar para o Vale do
Café e iniciaram-se as discussões que são narradas a seguir.
A construção de perguntas norteadoras
A partir dos debates teóricos iniciais (ver eixos 1 e 2), se focou na questão específica dos
transportes, para se discutir turismo e sustentabilidade no Vale do Café. Assim, num primeiro
momento, foi identificado o seguinte: atualmente, o acesso ao Vale do Café por via terrestre
pode ser realizado de duas maneiras: (1) por meio da rodovia RJ-127, normalmente a mais
utilizada por turistas da capital, BR-116 e RJ-145; (2) através de trens urbanos (operado pela
empresa Supervia) que atendem à Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ) através
do ramal Central do Brasil-Japeri que se interliga com o ramal Japeri-Paracambi.
A partir desse cenário de oferta de transportes terrestres (ver Capítulo 7) ao Vale do
Café e, com base em Lohmann e Stanford (2012), se observa que existem alguns fatores
específicos que influenciam na escolha do modo de transporte a ser utilizado para o
deslocamento turístico até áreas montanhosas e rurais: (a) geralmente o público-alvo do
turismo em ambientes rurais é interessado em atividades recreativas, o que pode exigir
o transporte de objetos volumosos e equipamentos de camping, pesca e montanhismo,
sendo necessário que os transportes estejam adaptados para isso; (b) grande parte dos
destinos em ambientes rurais são isolados das rotas de transportes público (vide o aces-
so ferroviário descrito anteriormente), o que pode forçar o uso do carro particular; (c)
a propensão à sazonalidade nos destinos turísticos em áreas rurais pode levar na alta
temporada a dificuldade de se controlar a poluição (ar, visual e auditiva) provocada por
veículos automotores; podem ocorrer atrasos nos serviços regulares de ônibus, prejudi-
cando os deslocamentos a serem realizados pela população local; pode ocorrer a falta
de estacionamento, gerando uma desordem espacial. Todas essas questões merecem
218
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

ser cuidadosamente analisadas no Vale do Café. A seguir são detalhados como outros
estudos servem de base para que se desenvolvam perguntas iniciais sobre esta complexa
realidade que é a relação entre turismo em ambiente rural, transportes e sustentabilidade.
Dickinson e Dickinson (2006) fizeram um estudo com foco em destinos turísticos do
Reino Unido que pode ser útil para se analisarem algumas dimensões do Vale do Café.
Utilizando-se do aporte teórico sobre representação social, eles analisaram como as re-
presentações de transportes e turismo são criadas e como isso afeta o desenvolvimento sus-
tentável entre transportes e destinos turísticos em áreas rurais. Voltando o olhar para o Vale
do Café, um dos elementos turísticos, que faz parte do imaginário de viagens, é o transporte
ferroviário, em especial a maria-fumaça e a nostalgia dos tempos áureos do café. Então, com
base em Dickinson e Dickinson (2006), pode-se ponderar: “Qual tipo de projeto ferroviário
(trens turísticos/trens regionais de passageiros) poderia contribuir para o desenvolvimento
sustentável dos destinos turísticos no Vale do Café?” (ver Capítulo 7, em especial a Seção 7.4
sobre transportes terrestres no Brasil entre os anos 2000 e início de 2013).
Outra análise foi a respeito do estudo desenvolvido por Ming Su e Wall (2009) sobre
como o turismo no Tibet, impulsionado pela abertura da ferrovia Qinghai-Tibet. A inau-
guração dessa ferrovia proporcionou maior acessibilidade a esse destino turístico. Esses
autores analisaram a importância relativa da viagem de trem, em comparação com a
experiência global da viagem. Foram aplicados 187 questionários junto aos viajantes, dos
quais 82 no período pré-viagem e 105 no período pós-viagem. Assim, se fez a seguinte
pergunta sobre o Vale do Café: “A implantação de um trem turístico poderia tornar a
experiência individual nos destinos turísticos do Vale do Café mais integradas entre si?”
Foi identificado também que na literatura sobre transportes, turismo e sustentabilidade
existem alguns impasses sobre planejamento e gestão dos transportes relacionado ao
desenvolvimento sustentável. Hoyer (2000) destaca que o turismo sustentável deve ser
ligado a um conceito de mobilidade sustentável. Essa mobilidade implica não só uma
mudança nos meios de transporte, mas também um nível reduzido de mobilidade. A partir
disso, foi elaborado a seguinte pergunta: “Qual é o impacto ambiental que o provimento
de maior acessibilidade pode gerar no Vale do Café?”.
Longe de responder as questões levantadas, o objetivo dos autores aqui é suscitar
o debate entre os pesquisadores a fim de contribuir para a construção de perguntas
norteadoras, e como que essas indagações podem colaborar para que novas pesquisas
científicas sejam iniciadas.

8.3. TENDÊNCIAS NA ÁREA MERCADOLÓGICA


O mercado de transportes vem passando por inúmeras mudanças nas últimas décadas,
motivadas pela globalização, o desenvolvimento de novas tecnologias e o surgimento
de novas necessidades do mercado consumidor. É mister informar que nem todas as
tendências mercadológicas do setor serão abordadas neste capítulo, pois isso demandaria
um trabalho muito mais extenso, porém alguns dos tópicos principais e de maior impacto
ao mercado turístico serão explorados separadamente a seguir.
219
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

8.3.1. Fusões e aquisições entre empresas de transportes


Muito se fala sobre as fusões e aquisições de empresas nos diversos setores da econo-
mia. Entretanto, é importante entender que os dois termos possuem significados diferentes.
Sob a ótica financeira, a fusão é uma operação basicamente societária que envolve duas ou
mais empresas que juntam seus patrimônios a fim de formar uma nova sociedade comer-
cial. No processo de aquisição, o patrimônio total de uma empresa de menor porte passa
a ser controlado por uma de maior porte, e somente uma delas mantém a identidade.
Camargos e Minadeo (2007) garantem que os processos de fusões e aquisições de empresa
se constituem como uma das atividades de maior destaque atual e que têm reconfigurado
de maneira significativa a dinâmica das relações empresariais, principalmente nas três
últimas décadas (1980 – 2010) quando a atividade ganhou dimensões globais.
No mercado de transportes a realidade não é muito diferente. É fácil observar os
inúmeros casos de fusões e aquisições acontecendo entre empresas dos diversos modos
de transportes. Em 2011, as companhias aéreas British Airways, da Inglaterra, e Iberia, da
Espanha, se juntaram em um processo de fusão e se consolidaram como a terceira maior
empresa aérea europeia. Para o passageiro não há grandes consequências práticas, haja
vista que cada empresa continuou com seus programas de milhagem e voando com suas
próprias aeronaves e em rotas já existentes. Como já colocado anteriormente, a fusão é
simplesmente uma ação societária e financeira. Mais recentemente, no início de 2013,
as americanas American Airlines e US Airways anunciaram uma fusão que resultará na
maior empresa aérea americana, com valor de US$11 bilhões, segundo o Jornal O Globo
(2013). Vale ressaltar que a American Airlines já estava em processo de recuperação
judicial desde novembro de 2011, o que mostra que a fusão é uma tentativa de permitir
que as empresas se recuperem com o passar dos anos.
Na América Latina, pode-se citar o caso da fusão entre a brasileira TAM Linhas Aéreas e
a chilena Lan, consolidada em 2012 formando a LATAM, a maior empresa aérea da Amé-
rica Latina. Cada empresa do grupo continuou com seus respectivos centros de operação
em São Paulo e em Santiago, no Chile, e operando com suas marcas de forma individual.
Mas há ainda no Brasil um caso clássico de aquisição de empresa aérea: a aquisição
da Varig pela Gol. Em 2007, a Gol firmou um acordo de compra da Varig que já tinha
suas operações nacionais praticamente eliminadas por conta da concorrência acirrada,
sobretudo pela entrada da própria Gol. Desde 2004, a Varig já havia inclusive feito a
abertura de capital na Bovespa e na Bolsa de Nova York em uma tentativa de se reerguer
financeiramente. Durante algum tempo a marca Varig continuou existindo, mas após a
conclusão do processo de aquisição todas as aeronaves foram pintadas e incorporadas
à frota da nova Gol/Varig.
As fusões e aquisições não acontecem somente entre empresas aéreas. O Grupo
JCA é um exemplo dos modos rodoviário e aquaviário. Em 1968, o empresário Jelson
da Costa Antunes comprou a Auto Viação 1001, e a essa empresa foram incorporadas
suas outras organizações, como a Auto Viação São José, a Expresso Rio Bonito, dentre
220
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

outras. Em 1991 o empresário visionário decide reestruturar a empresa e criar um grupo:


o Grupo JCA. Desde então, várias empresas foram adquiridas pelo grupo que hoje é
composto da seguinte forma: Auto Viação Catarinense; Auto Viação 1001; Expresso
do Sul; Rápido Macaense; Viação Cometa; Opção Turismo (empresa de fretamento
de ônibus); Rápido Ribeirão Preto; SIT (Sistema Integrado de Transporte – Macaé, Rio de
Janeiro); Metar Logística (gestão de transporte de cargas das empresas do grupo) e, por
fim, a operadora das barcas que circulam entre o Rio de Janeiro e Niterói, a Barcas S/A.

8.3.2. Segmentação do mercado de transportes e turismo


A segmentação, prática advinda a partir dos estudos de marketing, foi fundamental para
o desenvolvimento das empresas de transportes. A grande oportunidade da segmentação
é possibilitar que as empresas atinjam diversas demandas com pouca variação na sua
oferta. Pesquisas são realizadas para conhecer os mais diversos públicos e agrupá-los em
categorias que as unam de acordo com alguma similaridade. Há diversas variáveis para se
categorizarem os grupos, seja pelo potencial econômico de cada um, seja pela idade, pelo
motivo da viagem e muitas outras. A partir desse reagrupamento da demanda é possível ajus-
tar a oferta a fim de oferecer exatamente aquilo que aquela categoria de cliente necessita.
As empresas aéreas começaram a fazer isso há muitos anos atrás, quando perceberam
que o público que utilizava seus serviços não era sempre o mesmo e que havia pessoas
com espectativas, motivações e necessidades diferentes. Foi assim que elas passaram
a oferecer dentro de uma mesma aeronave diferentes classes de serviço: econômica,
executiva e primeira classe. Atualmente já existem outras variações das classes como
a premium economy da Virgin Australia, um serviço que fica entre a econômica e a
executiva. As fabricantes de aeronaves as preparam conforme as especificações das
empresas aéreas. Sendo assim, existem aeronaves que possuem somente uma classe,
outras que possuem duas ou até mesmo as três classes. A Singapore Airlines opera um
voo entre Cingapura e Nova York (conhecido como o maior voo non-stop do mundo,
quase 19 horas de voo) com um Airbus A340-500 totalmente em classe executiva com
capacidade para 100 passageiros. É um dos únicos all business class flights do mundo.
Certamente essa estratégia da Singapore se deveu a resultados obtidos em pesquisas que
identificaram a necessidade de atender essa demanda potencial.
No Brasil, infelizmente, as companhias aéreas operam seus voos domésticos somente
com uma classe, a econômica. Entretanto, percebendo essa lacuna, as empresas de
transporte rodoviário aproveitaram a oportunidade para inovar em seus serviços. O
surgimento dos ônibus double-deck foi fundamental para que a operação dos novos
serviços acontecessem (ver Figura 8.1). Com ele as empresas puderam dividir o veículo em
duas classes: executivo, no piso superior, e leito, no piso inferior. A partir daí as empresas
passaram a operar esse tipo de serviço até mesmo em carros que possuem somente um
andar no qual as classes são ligeiramente separadas dentro do ônibus. A Útil possui o
serviço mix: veículo com duas classes de serviço, com seis poltronas do tipo cama na
parte dianteira e 24 padrão executivo na parte traseira ou ainda 12 poltronas semileito
221
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Figura 8.1 — Ônibus double-deck oferecendo serviço executivo (piso superior) e leito
(piso inferior) (Fonte: foto cortesia de Rafael Castro)

na frente e 24 convencionais na parte de trás. O sanitário fica no meio do veículo, sendo


de fácil acesso para todos os passageiros (UTIL, 2013).
Nos trens a prática é bastante parecida com os ônibus, oferecendo serviços em classes
diferenciadas. A Eurostar, famosa pela rota Londres – Paris em seus trens de alta velocida-
de, oferece três classes distintas para os passageiros: standard, standard premier e business
premier. Ainda na França, foi lançado, em 2004, o serviço de transporte ferroviário de
alto velocidade low cost chamado iDTGV. Testado primeiramente na rota Paris–Marseille,
atualmente a oferta já atende a mais de 30 destinos em toda a França. As vendas são
100% realizadas via internet com tarifas bem reduzidas para reservas antecipadas e, o
mais inovador, o passageiro pode escolher entre dois ambientes no momento da reserva:
o iDzen ou o iDzap. Os vagões iDzen são para os clientes que desejam ter uma viagem
tranquila e são aconselhados a: (1) falar discretamente para não atrapalhar o silêncio; (2)
desligar seus telefones celulares; (3) não utilizar aparelhos que tenham qualquer tipo de
emissão sonora a não ser com fones de ouvido e; (4) não viajar na companhia de animais.
Já os vagões iDzap são ideais para famílias viajando com crianças em um ambiente
amigável onde podem atender suas chamadas de telefone tranquilamente ou ainda alugar
um tablet por € 10 onde terá acesso ao serviço de entretenimento com filmes, rádios e
222
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

jogos. A segmentação está presente até mesmo no slogan do iDTGV: choisissez avec qui
vous voyagez ou “escolha com quem você viaja”.
Nos cruzeiros marítimos a segmentação também acontece quando as empresas arma-
doras oferecem dentro de um mesmo navio inúmeros tipos de cabines: internas, externas,
externas com varanda e suítes presidenciais. A faixa etária é um elemento importante
na segmentação dos navios. Alguns, por exemplo, não recebem passageiros menores de
18 anos. Já outros, como os navios da Disney Cruise Line, são totalmente voltados para
as famílias e oferecem atividades tanto para as crianças quanto para os adultos. Outra
opção bastante comum de segmentação no modo aquaviário são os cruzeiros temáticos
que procuram agrupar grupos de hóspedes com comportamentos e gostos semelhantes
atingindo então públicos bastante específicos. Alguns exemplos são os cruzeiros GLBT
(gays, lésbicas, bissexuais e transexuais), os cruzeiros para solteiros, cruzeiros sobre vinhos,
de música eletrônica, dentre muitos outros.

8.3.3. Tarifas dos serviços de transportes e competitividade


entre os modos
É impossível tratar de tendências mercadológicas dos transportes sem abordar a
revolução que vem acontecendo há alguns anos em relação às tarifas dos serviços de
transportes. No modo aéreo é fácil afirmar que o surgimento das empresas que adotaram
o sistema low cost/low fare foi o principal aliado para que as mudanças começassem a
acontecer. O transporte aéreo hoje é, sem dúvida alguma, muito mais popular do que
antigamente. No Brasil, inúmeras pessoas tiveram a chance de voar pela primeira vez
quando a Gol entrou no mercado com tarifas imensamente mais baixas do que as suas
concorrentes principais da época TAM e Varig.
Ao redor do planeta essa competitividade também não é novidade e, de fato, as
tarifas são infinitamente menores. Na Europa dois exemplos clássicos são a Ryanair e a
easyJet. Na Austrália, pode-se citar a Tiger Airways e a Jetstar, esta última subsidiária da
Qantas. Na Tabela 8.1 são apresentadas algumas das tarifas cobradas por essas empresas
em 2013 para voos somente de ida ou volta, excluindo as taxas.

Tabela 8.1 — Exemplos de tarifas cobradas por empresas aéreas low cost/low fare
em 2013

EMPRESA ROTA TEMPO DE VOO TARIFA MÉDIA


Ryanair Dublin – Edimburgo 1h10min € 22
Ryanair Londres – Dublin 1h10min £ 25
EasyJet Paris – Londres 1h15min € 40
EasyJet Barcelona – Milão 1h40min € 35
Tiger Airways Brisbane – Sidney 1h40min A$50
Jetstar Sydney – Melbourne 1h35min A$35
Fonte: sites das respectivas empresas aéreas.

223
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Tendo em vista tamanha diminuição das tarifas do transporte aéreo, o mesmo passou a
competir com os modos rodoviário e ferroviário em determinadas ligações que tiveram de
passar por momentos de reflexão sobre as suas tarifas e serviços prestados aos passageiros.
É o caso do trecho Rio de Janeiro–São Paulo, por exemplo. Com as companhias aéreas
fazendo constantes promoções, as empresas de transporte rodoviário que operam o mesmo
trecho tiveram de se adaptar para convencer o cliente a passar 6 horas dentro do ônibus em
vez de 50 minutos dentro do avião. Sendo assim, atualmente elas fazem promoções para os
seus clientes com opções de financiamento e têm investido constantemente na renovação da
sua frota e na implantação de diferenciais bastante competitivos. Os ônibus hoje são muito
mais confortáveis e oferecem até mesmo serviço de entretenimento. Na Expresso Brasileiro,
o passageiro que opta pela primeira classe tem à sua disposição sistema de vídeo individual
e fones de ouvido, canais de filmes, shows e músicas, como nas aeronaves.
Sabe-se que o transporte ferroviário não apresenta grande expressividade no panorama
brasileiro, mas são imprescindíveis para o deslocamento de pessoas entre cidades e
países em outros lugares, como na Europa (ver Capítulo 7). Com o desenvolvimento da
tecnologia dos trens de alta velocidade, o modo ferroviário passou a concorrer fortemente
com o aéreo, uma vez que o tempo de viagem diminuiu consideravelmente. Uma das
grandes vantagens dos trens é o embarque e desembarque em estações localizadas em
áreas centrais das cidades, ao contrário dos aeroportos, que usualmente estão mais afas-
tados. Por isso, os trens acabam sendo a preferência de muitos passageiros, ainda mais
para aqueles que sofrem do pânico de voar. A Tabela 8.2 traz um comparativo entre os
modos aéreo e rodoviário no trecho Paris – Londres.

Tabela 8.2 — Comparativo entre os modos aéreo e rodoviário no trecho Paris – Londres
com dados de 2013
MODO AÉREO
Origem Distância Destino Distância Tempo de Voo Tarifa Média
do Centro do centro
de Paris de Londres
Paris – Charles 28 km Londres – 55 km 1 h15 min 40 euros
de Gaulle Luton (EasyJet)

MODO FERROVIÁRIO
Origem Distância Destino Distância Tempo Tarifa Média
do Centro do centro de Viagem
de Paris de Londres
Paris – Gare 3,5 km Londres – 3,7 km 2h25min 70 euros
du Nord St. Pancras (Eurostar)
Fonte: EasyJet (2013); Eurostar (2013)

Ao analisar a Tabela 8.2 tendo em vista as tarifas praticadas, aparentemente o modo


aéreo parece mais atraente. Entretanto, é preciso considerar dois pontos: (1) a distância
dos locais de embarque e desembarque em relação às áreas centrais das cidades e; (2)
224
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

o fato de que para voos internacionais o passageiro deve chegar ao aeroporto com no
mínimo 2 horas de antecedência para embarcar e nos trens basta chegar 1 hora antes
da partida. Essa análise pode obter resultados diferentes de acordo com o público pes-
quisado, entretanto é essencial perceber que a competitividade de fato existe.
Para o desenvolvimento e a consolidação dos destinos turísticos essa concorrência
entre os modos é essencial. O destino atendido por vários modos de transportes oferece
aos turistas maiores possibilidades de escolha que poderão levar em conta inúmeras
variáveis como a tarifa, o conforto, o tempo de viagem, etc., aumentando ainda a sua
acessibilidade.

8.3.4. Tecnologias de reservas e relacionamento com o cliente


Outra importante tendência no mercado de transportes são as inovações em relação
às tecnologias de reservas e de relacionamento com o cliente. A internet colaborou
imensamente com esse desenvolvimento desde o surgimento dos Sistemas Globais de
Distribuição (GDS) na década de 1960 e vem revolucionando o mercado desde então.
Atualmente os clientes podem efetuar reservas diretamente com as empresas fornecedoras
dos serviços de transportes por diversos canais, por agentes de viagens, operadoras ou
ainda por sites especializados.
Os sites especializados em reservas de viagens e turismo começaram a surgir por volta
dos anos 2000 e passaram a ganhar importância cada vez maior, se tornando excelentes
canais de distribuição para as empresas de transportes. O Expedia é um exemplo de sucesso
que, apesar de estar baseado nos Estados Unidos, possui páginas exclusivas para cerca de
outros 20 países. No Brasil um dos grandes fenômenos é a agência virtual Decolar.com que
vende pacotes de viagens, passagens aéreas, reservas de hotéis, carros e cruzeiros marítimos.
A tendência de modernização da tecnologia de reservas vai ainda mais longe. Os
smartphones (telefones celulares com acesso à internet via rede 3G) estão cada vez mais
presentes nas vidas das pessoas, e o mercado está atento a essas mudanças. Atualmente é
possível encontrar uma infinidade de aplicativos que podem ser instalados nos smartphones
com a temática transportes e turismo. Esses aplicativos têm facilitado imensamente a vida
dos turistas durante as suas viagens oferecendo mapas dos destinos, informações turísticas
gerais e demais funcionalidades. Há ainda aplicativos que possibilitam efetuar reservas
de serviços de transportes. Diversas companhias aéreas já disponibilizam hoje para o
cliente seus aplicativos, os quais, por meio de alguns toques na tela do celular, ele consegue
verificar disponibilidade, efetuar a reserva, pagar e receber a confirmação do seu voo (ver
Figura 8.2). Em muitos casos, o turista utiliza o próprio aplicativo para fazer o check-in,
sendo gerado um código de barras que dá acesso ao portão de embarque e à aeronave.
O relacionamento entre clientes e empresas de transportes também passa por ino-
vações que contam com a colaboração dos especialistas em marketing. A influência
das redes sociais no marketing de relacionamento das empresas de transportes já foi
abordada anteriormente nesta obra (ver Capítulo 4), porém é mister ressaltar a sua
225
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Figura 8.2 — Telas do aplicativo Flightspecials da Virgin Australia. Pesquisa simulando


voos com origem em Gold Coast e destino Melbourne, na Austrália (à esquerda);
resultados da pesquisa com as respectivas tarifas e voos disponíveis (no centro); tela
para check-in utilizando o aplicativo (à direita) © Virgin Australia, 2013

relevância enquanto tendência de mercado. A JetBlue simplesmente ofereceu wi-fi grátis


no Terminal 5 do Aeroporto JFK em Nova Iorque e agradou os passageiros. O Aeroporto
de Auckland, na Nova Zelândia, aproveita o cadastro realizado pelos passageiros que
utilizam a sua rede wifi para em seguida enviar via e-mail uma pesquisa de avaliação
dos serviços do terminal. Em 2012, a KLM lançou o serviço “Meet and Seat” no qual
os passageiros podem integrar sua reserva de viagem com seus perfis no Facebook ou
LinkedIn e assim identificar quem mais estará presente no mesmo voo, podendo gerar
até mesmo novas oportunidades de negócios. A British Airways, por sua vez, criou o
“Flying Start”, um programa de doações para a instituição “Comic Relief” que visa ajudar
crianças em situações de risco e pobreza no Reino Unido no qual qualquer pessoa pode
efetuar doações pelo Facebook. Diversas companhias aéreas já disponibilizam em seus
perfis links que oferecem acesso direto aos seus sites (Air France, Copa Airlines etc.),
porém acredita-se que em muito pouco tempo, além do papel já realizado de divulgação
e relacionamento com o cliente, as redes sociais poderão também servir como canais
de distribuição por onde os clientes poderão efetivamente efetuar suas reservas sem que
para isso tenham de acessar o site da companhia.

8.4. TENDÊNCIAS NA ÁREA EDUCACIONAL


Muito tem se discutido sobre o ensino universitário de turismo, entretanto, são
raros os estudos que focam nas problemáticas envolvidas no ensino e aprendizagem
dos transportes no turismo. Como visto na Seção 8.1, tanto transportes, como turismo
são essencialmente multidisciplinares, sendo assim é natural que teorias, métodos e

226
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

técnicas de diversas áreas sejam empregados na construção do conhecimento sobre


o tema. Nas Seções 8.4.1 e 8.4.2 são exploradas experiências didático-pedagógicas
dos autores nos processos ensino-aprendizagem sobre a relação entre os transportes
e o turismo.

8.4.1. Estudo de Caso: ensino experiencial em transporte


e turismo
*Elaborado por Guilherme Lohmann
Durante as décadas de 1980-2010, boa parte do ensino no campo do turismo,
hospitalidade e eventos (a partir daqui denotado apenas por “turismo”), nos países
ocidentais de língua inglesa passou por transformações profundas. Nessas três décadas,
percebeu-se uma explosão da oferta de cursos de turismo, na maioria das vezes com
uma grade curricular fundada em disciplinas básicas das Escolas de Administração e
Negócios. Países como Austrália, Estados Unidos, Nova Zelândia e Reino Unido se des-
tacam nesse contexto. Enquanto nos Estados Unidos houve uma ênfase predominante
na hospitalidade, os outros três países focaram no turismo, ainda que existam cursos
de hospitalidade e eventos sendo oferecidos com grande sucesso. Na Austrália, em
particular, os cursos de graduação em eventos são bastante populares em função do
imenso número de eventos locais sediados no país e do espírito aventureiro e outdoor
do australiano.
Com relação ao ensino da disciplina de transportes em cursos de turismo nesses
países, este é de certa forma ainda muito tímido, se comparado, por exemplo, com a
realidade brasileira, já que muitos currículos não oferecem essa disciplina, apesar de
sua notória importância para a formação dos profissionais em turismo. Provavelmente a
School of Travel Industry Management (TIM) da University of Hawaii at Manoa (UHM)
é a que tem a maior tradição nessa área, já que oferece disciplinas de transportes desde
os anos 1970, sendo transportes uma das ênfases oferecidas (as outras duas são turismo
e hospitalidade). Mais recentemente, outros programas passaram a oferecer disciplinas
em transportes, dentre eles a School of Tourism and Hospitality Management (STHM) na
Southern Cross University (SCU), Austrália. O relato apresentado nesta seção é fruto da
experiência de docência do Prof. Guilherme Lohmann tanto na TIM/UHM (2008-2009),
mas principalmente na STHM/SCU (ver Figura 8.3), a partir de 2010.
Um número crescente de acadêmicos, dentre eles Tribe (2002) e Dredge et al. (2012),
têm refletido sobre a necessidade de se balancear a grade curricular e o conteúdo das
disciplinas dos cursos de turismo a fim de se contemplar ao mesmo tempo o conheci-
mento técnico de aspectos operacionais e de gerenciamento, sem abrir mão da análise
crítica necessária para formar futuros profissionais preparados para entender e atuar
com as complexidades do turismo. Nesse sentido, no caso do turismo, o aprendizado
experiencial apresenta grandes vantagens em relação ao aprendizado cognitivo, pois
permite que (ROGERS e FREIBERG, 1994): o aluno participe completamente do processo

227
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Figura 8.3 — O Prof. Guilherme Lohmann, no centro, juntamente com alunos da TIM/UHM
(foto acima) e da STHM/SCU (foto abaixo) (Fonte: fotos cortesia de Guilherme
Lohmann)

228
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

de aprendizagem e tenha controle sobre sua natureza e direção; e seja principalmente


focado em problemas práticos. Rogers e Freiber (1994) também enfatizam nesse método
pedagógico a importância de aprender a aprender e uma abertura à mudança.
Nos subitens a seguir são apresentados dois exemplos de ensino experiencial em
duas disciplinas distintas de transporte: a primeira envolvendo o uso de simulação digital
em transporte aéreo, com especial enfoque na capacidade crítica e de adaptabilidade
de tomadas de decisão estratégicas; a segunda fazendo uso de visitas de campo na dis-
ciplina de cruzeiros marítimos. Ambos os exemplos estão estruturados de forma a prover
uma revisão bibliográfica desses dois tipos de ensino experiencial utilizado, a descrição
da experiência de ensino e aprendizado e as avaliações efetuadas pelos próprios alunos
sobre as disciplinas cursadas e a percepção deles com relação aos benefícios pedagógicos
identificados.
Simulação digital em transporte aéreo
Simulações são exercícios educativos destinados a imitar situações da vida real.
De um modo geral, as simulações podem incluir jogos, ser baseadas em cenários de
aprendizagem, estudos de caso focados na aprendizagem, manequim (no caso, por
exemplo, da área médica) e simuladores tecnológicos. Simulações normalmente exigem
que os alunos exerçam atividades que simulem a vida real, e enquanto as atividades
simuladas podem ser reais, modificações podem ocorrer para fins de aprendizagem
(HERTEL e MILLIS, 2002). Como consequência, as simulações apresentam diferentes
níveis de realismo ou fidelidade (WELLINGTON e FARIA, 2006). Quando uma situação
de aprendizagem espelha uma situação real, é mais provável que o aluno se sinta
seguro e confortável em um ambiente em que lhe parece familiar (ANDRESEN, BOUD
et al., 2000).
O uso de simulações em turismo tem um apelo imediato para os educadores. O
ambiente dinâmico das organizações do setor exige que os gestores analisem informações
de diversas fontes, tomem decisões e implementem um plano de ação para oferecer ex-
periências satisfatórias aos viajantes. Na economia do conhecimento e integrada em rede,
os formandos em nível universitário precisam interpretar e apresentar o conhecimento de
forma criativa, principalmente através do uso de tecnologias de informação, que estão
em crescente demanda na hotelaria e no turismo. Enquanto estágios são tradicionalmente
usados para aumentar a empregabilidade dos graduandos, estes tendem a concentrar-se
no desenvolvimento de competências profissionais e operacionais. Em contraste, as
simulações proporcionam uma oportunidade para os alunos praticarem e desenvolverem
a tomada de decisão estratégica e habilidades para resolver problemas. Simulações
desafiam os alunos a compreender as inter-relações entre uma gama de funções de
negócios, incluindo vendas e marketing, design de serviços, finanças, operações, recursos
humanos e estratégia.
Enquanto alunos de hospitalidade fazem uso de simulações digitais como o HOTS
(http://simulations.etosc.com), no transporte aéreo o Simulate!/ AIRLINE Online

229
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

tem se mostrado bastante popular (www.simulate.aero). Simulate!/AIRLINE Online


é utilizado por empresas aéreas e universidades em várias partes do mundo, tanto
como ferramenta de planejamento estratégico, treinamento de funcionários e apren-
dizado de alunos. AIRLINE Online é um simulador web no qual os participantes
assumem a gestão de uma empresa aérea em um ambiente realista e competitivo.
A simulação se baseia em um banco de dados extenso que inclui informações
financeiras e operacionais reais de empresas aéreas e mercados de várias partes
do mundo. Em uma das minhas conversas com os proprietários da empresa, eles
me informaram que aproximadamente 85% do ambiente do AIRLINE Online reflete
dados reais do setor. Os participantes têm total controle de sua empresa aérea, e
o trabalho realizado em grupos permite que cada membro da equipe assuma um
papel específico de gestão (marketing, financeiro, planejamento de rotas, RH e
assim por diante). Cada grupo representando uma companhia aérea compete con-
tra outros indivíduos ou grupos concorrentes no mesmo mercado (ambiente). Na
minha disciplina eu também fazia os alunos competirem com uma empresa aérea
que eu administrava, além de outras três que eram gerenciadas pelo simulador
através de inteligência artificial (ver Figura 8.4). Isso tornava a simulação ainda
mais competitiva. Uma das vantagens do AIRLINE Online é a sua capacidade
de ser personalizado para atender às necessidades individuais de treinamento e
educação. O escopo de cada simulação pode ser largo ou estreito, definindo-se
regiões/mercados específicos para as empresas operarem, além de se configurarem
áreas de gestão específicas dentre as listadas previamente. No caso da minha dis-
ciplina na STHM/SCU, desabilitei aspectos de publicidade e marketing, bem como
de manutenção de aeronaves, uma vez que os grupos eram pequenos, compostos
por no máximo três alunos, com cada membro já exercendo um grande número
de atribuições. Ademais, achei que essas atribuições iam além dos pressupostos
em termos do conhecimento almejado na disciplina.
No primeiro semestre de 2012, a disciplina contou com 24 alunos, dos quais nove
estavam matriculados no ensino à distância (EAD). Além das vantagens descritas anterior-
mente, imaginei que o uso da simulação digital seria uma oportunidade para que alunos
presenciais e do EAD pudessem trabalhar em grupos independentemente do modo como
estavam matriculados na disciplina (presencial ou EAD). Isso poderia ser feito através de
ferramentas de comunicação como o Skype, o que seria uma forma de prepará-los para
o ambiente corporativo, em que essa prática de comunicação é muito usual. As aulas pre-
senciais e os tutoriais eram gravados com o software Camtasia e ficavam disponibilizadas
para todos os alunos através do site Blackboard. O AIRLINE Online foi introduzido na
terceira semana do semestre letivo, e os grupos tinham três semanas para se familiarizarem
com o ambiente de simulação. No final da quinta semana o ambiente era reiniciado, e
a competição entre os grupos começava, com cada empresa aérea recebendo US$500
milhões como investimento inicial. A cada semana um batch era rodado, representando
um trimestre do ano financeiro da empresa. Geralmente eu introduzia alguma mudança no

230
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

Figura 8.4 — Exemplos de telas do AIRLINE Online (Fonte: fotos cortesia de Guilherme
Lohmann)

231
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

ambiente da simulação a cada nova semana, como por exemplo o aumento da querosene
de aviação ou o fechamento/diminuição da demanda de um aeroporto em particular.
Com a simulação funcionando por seis semanas do semestre letivo, as empresas têm a
chance de operar no que seria o equivalente a um ano e meio. Cinco avaliações estavam
relacionadas com a simulação: (1) apresentação em PowerPoint do plano de negócios da
empresa aérea; (2) relatório anual no final da simulação; (3) elaboração de uma resenha
individual de 200 palavras a cada semana descrevendo as principais tomadas de decisão;
(4) avaliação individual de cada aluno sobre o grupo e sobre a sua própria participação;
e (5) o lucro operacional final da empresa.
Em relação ao feedback dos alunos com relação ao uso da simulação, os seguintes
testemunhos foram obtidos em uma pesquisa junto aos alunos. Na sequência faço alguns
comentários:

“Eu realmente gostei da simulação - foi uma maneira fantástica


de se envolver com os outros [alunos], aprender, colocar a
teoria em prática e experimentar algo similar à realidade
da operação de uma empresa aérea. [A simulação] me
proporcionou uma maior compreensão de algo que eu não
teria obtido a partir de um livro-texto ou a partir de qualquer
leitura.”
“Gostei muito dessa matéria. A simulação foi muito
desafiadora, mas me permitiu um entendimento diferente
das empresas aéreas e da competitividade existente”.
“Aprendi muito nessa matéria, especialmente utilizando
o sistema de simulação, que é muito interessante. Também
gostei da forma de trabalhar em grupo nessa disciplina.”
“Eu gostei muito dessa disciplina. As avaliações, a partir
do uso da simulação, foram as melhores que já tive em todo o
meu curso”.

Se, por um lado, os alunos parecem concordar com o que foi descrito pela literatura
sobre o uso de simulação, é indubitável que eles tiveram de dedicar à simulação muito
mais horas por semana do que estavam acostumados a fazer em outras disciplinas. Outros
alunos tiveram dificuldade em compreender o funcionamento da simulação, notadamente
aqueles de origem asiática que estão mais acostumados com formas tradicionais de
avaliação. Para minha surpresa, três alunos trancaram a disciplina logo no começo do
semestre por não quererem se expor a um tipo de avaliação fora do que estavam acos-
tumados. Outra surpresa que tive, considerando que quase todos os alunos eram jovens
e que cresceram com acesso a internet, foi a dificuldade que tiveram de trabalhar em
equipe de forma à distância.

232
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

Visitas de campo em cruzeiros marítimos


Inúmeras experiências de visitas de campo têm sido utilizadas com alunos de turis-
mo, uma vez que nem sempre é possível simular um cenário ou experiência, como
apresentado na seção anterior. Ademais, a própria oportunidade de viajar provê ao aluno
de turismo a chance de experimentar o que é ser um viajante e como este interage com
diversos produtos e profissionais de turismo. Wong e Wong (2009) identificaram um
número de vantagens nas visitas de campo, incluindo a chance de melhor conhecer os
demais alunos e os professores, no desenvolvimento de trabalhos ou provas relacionados
com a visita e a oportunidade de estabelecer contato com a cultura e a população da
área visitada, despertando ainda mais o interesse na disciplina.
Tive a oportunidade de organizar visitas de campo na disciplina de cruzeiros marítimos
em duas instituições de ensino. Na University of Hawaii at Manoa, foi possível realizar
duas visitas de algumas horas nos navios Pride of America, da NCL, e Golden Princess,
da Princess Cruise Line. Essas visitas consistiram em um tour pelos navios enquanto estes
estavam atracados no porto de Honolulu, com a vantagem de termos tido a oportunidade
de visitar não somente as áreas comuns dos navios, mas também uma variedade de
cabines, incluindo uma grand suite, e a ponte de comando. Em ambos os casos, o tour
terminou com um almoço a bordo. As empresas ofereceram essas visitas sem nenhum
custo para os alunos ou para a UHM.
No caso da STHM/SCU, a universidade apresentava a oportunidade de se efetuarem
visitas de campo nas quais os alunos pudessem pagar à parte para participar de um
cruzeiro marítimo. Além disso, em geral, o nível socioeconômico dos alunos permitia
que se oferecesse uma opção de se efetivamente viajar a bordo de um cruzeiro, enquanto
tivessem aulas da disciplina de cruzeiros, visitas guiadas e palestras por profissionais da
empresa de cruzeiro. A disciplina ‘MNG10291, The Cruise Business’ foi oferecida pela
primeira vez durante o semestre de verão em 2012-2013. A disciplina era eletiva para
todos os alunos, notadamente aqueles matriculados nos três cursos oferecidos pela STHM/
SCU: eventos, hospitalidade e turismo. Os cursos de verão da STHM/SCU são oferecidos
apenas no módulo de EAD. Nesse período houve um total de 40 alunos matriculados,
dos quais 24 participaram da visita de campo (ver Figuras 8.5 e 8.6). A visita de campo
aconteceu na quinta semana de aulas (10-17 de novembro de 2012), consistindo em um
cruzeiro doméstico de sete dias a bordo do Pacific Dawn, da P&O Australia, saindo de
Brisbane e visitando outros destinos do Estado de Queensland, indo até a Grande Barreira
de Corais (Cairns e Port Douglas) e retornando. Os alunos que participaram do cruzeiro
tiveram as aulas restantes da disciplina de forma consolidada, incluindo um total de vinte
horas, cobrindo seis tópicos restantes da disciplina. Os alunos que participaram da visita
de campo tiveram uma das suas avaliações adaptadas a fim de cobrir a experiência que
tiveram em termos de aprendizado, analisando suas experiências como hóspedes da em-
presa de cruzeiros e como futuros profissionais de modo a discutir aspectos relacionados
à demanda por cruzeiros, itinerários e impactos, além de recursos humanos.

233
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

Figura 8.5 — Alunos da SCU com a Sra. Martina Lamonte, gerente de receitas da P&O
após uma das palestras (foto acima); visita à cozinha do navio guiada pelo chef Marc
Dumas (foto abaixo), novembro de 2012 (Fonte: fotos cortesia de Guilherme Lohmann)

234
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

No que diz respeito à avaliação dos alunos em relação à visita de campo, obtivemos
os seguintes testemunhos. Na sequencia faço alguns comentários.

“Nós chegamos como quatro grupos distintos e diferentes


de pessoas, algumas não conhecendo ninguém, e na última noite no
cruzeiro parecia que havia apenas um grupo. Como aluna do EAD,
esta foi a minha primeira experiência de assistir a aulas presenciais
e eu adorei conhecer outros estudantes [...] e as amizades que
fizemos agora são de valor inestimável e vão certamente vir a
calhar para os meus estudos futuros.”
“A visita de campo foi excelente para mim. A oportunidade de
ouvir [a experiência de] funcionários de todos os departamentos
foi interessante e me deu uma boa visão sobre o negócio de
cruzeiros. A oportunidade de interagir com os alunos do EAD
e estudantes de outros campi e fora da sala de aula foi uma
experiência incrível e conhecer as experiências desses alunos
coloca a minha própria em perspectiva.”
“[Foi] uma experiência fantástica, que vai permanecer comigo
por muito tempo. A chance de conhecer os profissionais do
setor e explorar o seu local de trabalho foi muito além do que
eu esperava!”
“Eu senti que a viagem de campo ofereceu uma visão valiosa
sobre o funcionamento de um navio de cruzeiro. A magnitude
da operação não pode ser totalmente apreciada a partir da
leitura de um livro. Ganhei compreensão crítica dos requisitos
logísticos necessários para processar milhares de passageiros
em todos os estágios de sua jornada.”
“ E m ge ra l, e sta foi u ma e xp e riê n cia ma ravil h o s a
e eu absolutamente aproveitei cada minuto. Como aluno
externo, foi uma excelente oportunidade para conhecer
outros alunos dos demais campi e do EAD [...] e ouvir as suas
experiências e desafios. Essa disciplina foi muito interessante
e me deu a chance de conhecer aspectos de uma indústria
em expansão que eu acho fascinante e não teria sido capaz
de aprender de outra forma.”
“Eu tive uma experiência incrível e eu fico feliz em dizer que
foi a melhor semana da minha vida!!”

A minha reflexão sobre a visita de campo foi que ela obteve vários resultados, confir-
mando alguns obtidos por pesquisas efetuadas com alunos de turismo que participaram
de visitas de campo (WONG e WONG, 2009):

235
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

1. Imersão dos alunos numa experiência realmente autêntica de turismo e hospitalidade:


isso foi comprovado pelos inúmeros testemunhos dos alunos, bem como por meio
das reflexões escritas.
2. Expôs os alunos a oportunidades de carreira que eles não haviam considerado ante-
riormente: no final do cruzeiro um percentual alto de alunos manifestou interesse em
fazer estágios e procurar oportunidades de emprego nas empresas de cruzeiro. Caso
eles resolvam trabalhar a bordo, terão de procurar empregos no exterior, uma vez que,
por questões trabalhistas e vantagens salariais, as empresas de cruzeiros operando na
Austrália não oferecem oportunidades para os australianos.
3. Interação com profissionais de turismo e hospitalidade: isso também foi enfatizado nos
testemunhos providos pelos alunos, principalmente pela oportunidade que tiveram
de efetuar visitas guiadas, terem palestras com funcionários da P&O e por terem tido
uma lista de perguntas e curiosidades respondida pelos mesmos.
4. Proveu a oportunidade de estudantes dos diversos cursos da STHM e dos vários campi
da SCU, incluindo alunos do EAD, de se encontrarem, socializarem e aprenderem
juntos: a SCU possui uma das maiores escolas de hospitalidade e turismo da Aus-
trália, com campi em Coffs Harbour, Gold Coast, Lismore e Sidney, oferecendo cursos
em hospitalidade, turismo e eventos. A visita de campo permitiu uma das poucas
oportunidades existentes na STHM/SCU dos diversos alunos se conhecerem e terem
aulas presenciais num ambiente que também permitiu um algo grau de socialização
(ver Figura 8.6). Como evidenciado num dos testemunhos anteriores, isso poderá lhes
trazer oportunidades futuras de amizades e network profissional.

8.4.2. Educação a distância: ensino e aprendizagem


dos transportes no turismo4
Elaborado por Carla Fraga
O conceito de educação a distância envolve a separação espacial e/ou temporal entre
professor e aluno, sendo que o processo de ensino-aprendizagem é mediado pelo uso de
variadas tecnologias (PEÑA, 2010). Moran (2002) explica que existem várias modalidades
de educação, como exemplos: educação presencial (geralmente ocorre em sala de aula,
com a presença do professor), semipresencial (parte presencial/parte virtual ou a distância)
e educação à distância (ou virtual).
Fazer um apanhado histórico sobre a educação a distância (EAD) é algo complexo, pois
as informações são espaçadas. Contudo, alguns pesquisadores acreditam que o embrião
da EAD é a Coleção de Cartas de Platão. Um dos marcos históricos para o surgimen-
to da educação à distância está associado à invenção da impressa por tipos móveis de
Gutenberg, ocorrido na Alemanha no século XV. Esse invento fez com que os livros, antes

Agradecimentos especiais à Camila Moraes (Coordenadora Curso Licenciatura em Turismo – Fundação


4

CECIERJ/Consórcio CEDERJ/UNIRIO).
236
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

Figura 8.6 — Alunos da SCU no píer da piscina participando de uma das festas a bordo
do Pacific Dawn (foto acima); grupo de alunos do campus Coffs Harbour (foto abaixo),
novembro de 2012 (Fonte: fotos cortesia de Guilherme Lohmann)

237
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

escritos à mão, e por isso caríssimos, se tornassem mais acessíveis e populares. Assim era
possível ler o conteúdo da aula em casa (ver ALVES, 1994).
Existe um consenso entre os pesquisadores de EAD que as fases históricas desta se
relacionam não só com as demandas educativas da sociedade, mas também com os
recursos técnológicos disponíveis. Por exemplo, o uso de textos escritos enviados por
correios; o posterior uso de recursos como rádio e televisão (décadas de 1960/1970)
antecedem o uso e a popularização do computador e marcam fases importantes do
desenvolvimento da EAD. Assim, é possível afirmar que a popularização do computador
e da rede mundial de computadores, através da Internet, foi um avanço significativo para
a educação a distância. A seguir, Peña (2010) demostra as mídias e suportes que são
incorporados à EAD (Tabela 8.3):

Tabela 8.3 — Mídias e suportes a EAD

MÍDIAS SUPORTES
impressa telefone
e-learning professor presencial
CD-room professor on line
vídeo e-mail
TV fax
rádio carta
outros reunião presencial ou virtual
Fonte: elaborado pela autora com base em Peña (2010).

A realização de reuniões virtuais, o professor online e a troca de e-mails dependem


da construção de um universo virtual. Assim, a virtualidade dá origem ao nascimento do
Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), no qual é possível promover várias formas de
interações entre professor e aluno recorrendo-se as mídias e aos suportes da EAD, sempre
que necessário (ver Tabela 8.3).
Franco et al. (2003) fazem uma discussão sobre a criação do AVA numa importante
universidade pública brasileira. Nesse sentido, os autores demonstram dois meios para o
desenvolvimento da EAD através de treinamentos, e concluem que não só discentes, mas
também docentes, precisam de formação para atuar com os AVAs. Franco et al. (2003) des-
tacam que existem variadas plataformas que possibilitam o desenvolvimento da EAD, e ex-
plicam que são as tecnologias de informação e comunicação (TICs) disponíveis nos AVAs que
contribuem para se diminuir a distância. No entanto, estas precisam ser utilizadas de maneira
adequada para se tornarem mediadoras do processo educativo (FRANCO et al., 2003).
Nesta parte do capítulo será analisada especificamente a questão do ensino dos trans-
portes no turismo através de EAD no Brasil. Matias (2012) fez um levantamento sobre
EAD no país envolvendo cursos de turismo e áreas afins ao turismo (hotelaria e serviço
aeronáutico). No Gráfico 8.1 é possível identificar que o número total de oferta de vagas
nesses cursos é superior a 5 mil, e que os cursos focados especificamente no turismo
238
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

Gráfico 8.1 — Número de vagas ofertadas em cursos de turismo e áreas afins ao turismo
(a distância) no ano de 2009

(Fonte: elaborado pela autora a partir de MATIAS (2012), com base na Sinopse Estatística
e Microdados do Censo da Educação Superior/MEC/INEP/DEED/IF CEFET de 1995 a 2009.

(ver Cursos de Gestão do Turismo e de Turismo) são os mais expressivos, representando


aproximadamente 93% da oferta de vagas.
No Estado do Rio de Janeiro, a Fundação CECIERJ (Centro de Ciências e Educação
Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro) apresenta o Consórcio CEDERJ (Centro
de Educação a Distância do Estado do Rio de Janeiro), que é formado por sete instituições
públicas de ensino superior, a saber: CEFET, UENF, UERJ, UFF, UFRJ, UFRRJ, e UNIRIO
e tem como objetivo disseminar a educação superior gratuita e de qualidade em todo o
Estado do Rio de Janeiro (Fundação CECIERJ/Consórcio CEDERJ).
O Curso de Licenciatura em Turismo iniciou em 2009. A partir da experiência que
tenho como coordenadora e conteudista da disciplina de Transportes, examino aqui três
pilares para o desenvolvimento da EAD: (a) material didático; (b) tutoria e (c) plataforma.
Ao final é feita uma discussão sobre o processo de avaliação.
Construção do Material Didático: Este desafio envolveu a seleção de uma equipe
altamente qualificada de conteudistas. Todos possuíam formação com pós-graduação
strictu sensu (mestrado e doutorado em andamento ou concluído) nas áreas de Ciências
Sociais Aplicadas e Engenharias, sendo que três possuíam Bacharelado em Turismo e
Mestrado em Engenharia de Transportes. Foram construídas 25 aulas por quatro es-
pecialistas seguindo o roteiro: Introdução sobre transportes e turismo (aulas 1 a 4);
Planejamento e gestão dos transportes no turismo (aulas 5 e 6); Modo hidroviário e o
turismo (aulas 7 a 10); Modo rodoviário e o turismo (aulas 11 a 14); Modo ferroviário e
o turismo (aulas 15 a 18); Modo aéreo (aulas 19 a 22). Por fim, três aulas (23, 24 a 25) foram
desenvolvidas com focos específicos: tendências mercadológicas, oportunidades de
239
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

trabalho e pesquisa científica sobre transportes e turismo. Nesses materiais didáticos foi
possível criar uma estrutura repleta de ligações com outros materiais, como por exemplo
indicação de livro, artigo científico, outra aula dessa disciplina ou de outras disciplinas
do Curso, vídeos disponíveis na internet etc. Outro destaque é que as atividades propos-
tas e as respostas comentadas levam o aluno a se colocar frente a frente com desafios
teóricos e práticos de maneira divertida. Nessas atividades são sugeridas simulações,
como: “Vamos considerar uma situação hipotética, mas com base em dados reais para
resolução do desafio proposto: Você foi convidado para ministrar uma aula (...)/para atuar
como consultor (...) etc. envolvendo os temas relacionados aos transportes turísticos”.
Tutoria: O professor tutor é um educador que deve estar imerso no processo de
acompanhamento, avaliação das relações de ensino-aprendizagem e gestão educacional.
Assim, ele é um elo fundamental entre os alunos e a instituição. A capacidade para atuar
como mediador utilizando as mídias e suportes da EAD (ver Tabela 8.3) é fundamental.
Assim, o primeiro tutor à distância, também coautor deste livro, Rafael Castro, buscou
empreender uma série de atividades que facilitou a quebra das barreiras temporais e es-
paciais junto aos alunos. Dentre elas, destacam-se:
(a) A criação de um ambiente virtual de aprendizagem agradável e didático, no qual
o tutor à distância criou uma série de teasers (do verbo “provocar” em inglês) para atrair
a atenção dos alunos sobre a importância da leitura do material didático. Por exemplo,
foram disponibilizados links com vídeos sobre assuntos relacionados aos transportes e
turismo que remetiam a temas abordados nas aulas, instigando, assim, o aluno a procurar
o que estava sendo dito no vídeo na aula e vice-versa.
(b) A visitação aos variados polos para conhecer os alunos e a realidade destes foi
um grande diferencial para o avanço do processo de tutoria, pois foi possível discutir
como os transportes influenciavam o turismo a partir de exemplos cotidianos dos alunos.
Nessas ocasiões foram coletados dados sobre o que de fato estava dando certo e o que
deveria ser melhorado, o que foi essencial para o aperfeiçoamento do trabalho de tutoria
e coordenação da disciplina.
Plataforma: O ambiente virtual de aprendizagem depende muito do tipo de plataforma
utilizada. Assim, algumas tecnologias da informação e comunicação (TICs) podem ser
exploradas em maior ou menor grau. Um grande destaque da plataforma utilizada nessa
experiência é a possibilidade de diálogo constante entre tutor, coordenador e os alunos.
Assim, dentre todas as ferramentas disponíveis, uma apresenta grande destaque: os fóruns
de discussão. O avanço na interatividade e na produção de conhecimento de maneira
coletiva dependem decisivamente da abordagem que é feita no fórum pelo tutor e o
coordenador. Sendo assim, buscou-se criar fóruns dialogados com o material didático
e com a sala de aula virtual. Os teasers propostos pelo tutor ora eram colocados na sala
de aula virtual e ora nos fóruns. Logo, o acompanhamento diário da plataforma se mostrou
essencial para se alcançarem os resultados desejados, ou seja, o ensino-aprendizagem
de alta performance.

240
 Capítulo 8 [Tendências para os transportes e destinos turísticos]

Por fim, destaca-se a construção de avaliações à distância e presenciais. Estas também


seguiram a lógica das atividades propostas no material didático e nos fóruns de discussão.
Assim, podemos ressaltar que nas avaliações buscou-se explorar de maneira criativa os
conteúdos estudados sobre a conexão entre transportes e turismo, integrando o processo de
ensino-aprendizagem de forma harmônica. Por exemplo, uma atividade sugeria que o aluno
assistisse ao filme “O Terminal” e após fizesse uma resenha crítica abordando a relação entre
transporte, hospitalidade e turismo (tema das aulas introdutórias do curso – 1 a 6). Buscou-se
a integração entre ensino, pesquisa e extensão sugerindo ao aluno que fizesse uma propos-
ta de pesquisa sobre um tema relacionado aos transportes turísticos e foi estimulado que
participassem de eventos sobre o tema. Essas práticas trouxeram resultados muito positivos,
pois alguns alunos ficaram interessados em participar de Grupos de Pesquisa (ver Seção 8.2)
e de projetos de iniciação científica, gerando uma maior curiosidade sobre vários aspectos da
vivência universitária. Atualmente é possível notar um grande interesse pelo desenvolvimento
de trabalhos de conclusão de curso (TCCs) sobre a relação entre transportes e turismo.
Compartilhar as experiências práticas sobre ensino e aprendizagem dos transportes e
turismo na EAD é um convite para novas reflexões sobre as complexidades da educação
em turismo no século XXI, especialmente considerando o cenário brasileiro.

8.5. CONCLUSÕES
Este capítulo final se propôs a fazer uma abordagem relacionada às tendências dos
transportes para o turismo no que diz respeito a pesquisa, mercado e educação. Ficou
claro que todo o conteúdo abordado nos demais capítulos deste livro é essencial para a
formação de futuros pesquisadores que tenham interesse em tratar problemas de pesquisa
que envolvem essa fascinante relação entre transportes e turismo.
Do ponto de vista mercadológico, verificou-se a importância de as empresas de trans-
portes estarem sempre atentas às mudanças que ocorrem na sociedade por conta de
diversos fatores que acabam alterando o comportamento do consumidor, mas, sobretudo,
devem se preocupar com as transformações do sujeito enquanto turista e do mercado
turístico em si. A empresa que investir em constantes pesquisas a fim de conhecer os
mercados consumidores real e potencial e entender as suas necessidades terá grandes
vantagens competitivas frente às demais.
É interessante observar que até alguns anos atrás a disciplina “Transportes” não existia na
grade curricular dos cursos de graduação em Turismo no Brasil, e seu conteúdo era ministrado
dentro da ementa de outras disciplinas como “Agenciamento”, por exemplo. Grandes avanços
já ocorreram nesse sentido, pois hoje praticamente a totalidade dos cursos possuem pelo
menos uma disciplina exclusiva de transportes com carga horária de de pelo menos 40 horas
em seu currículo. Portanto, na questão do ensino e aprendizagem em transportes e turismo,
o que se quis mostrar é que a mesma é imprescindível para a formação do profissional em
turismo. Além disso, mostrou-se que a tecnologia também se faz presente no ambiente es-
colar e deve ser utilizada de forma a maximizar o processo de aprendizagem dos alunos.

241
[Transportes e Destinos Turísticos: Planejamento e Gestão]

QUESTÕES
1. Desenvolva um roteiro de pesquisa sobre um tema relacionado a transportes e turismo
traçando o problema de pesquisa, os objetivos geral e específico e a metodologia de
trabalho.
2. Caso você tenha um perfil no Facebook ou em outra rede social na internet, faça
uma busca por páginas de empresas de transportes e desenvolva uma análise sobre
os serviços oferecidos por elas na rede social.
3. Faça uma busca na internet sobre os cruzeiros temáticos oferecidos na última temporada de
cruzeiros no Brasil e faça uma dissertação abordando o tema da segmentação de mercado.
4. Vamos considerar uma situação hipotética, na qual você precisa utilizar dados reais
para propor soluções ao desafio apresentado: Você foi convidado para ministrar uma
mini-palestra sobre as tendências dos transportes no turismo para guias de turismo e
hoteleiros em sua cidade. O tempo de duração de sua mini-palestra é de aproximada-
mente 30 minutos e você deverá organizar os slides de apresentação utilizando o seguinte
roteiro: apresentação do tema, objetivos da palestra, tendências da educação sobre trans-
portes e turismo, curiosidades, conclusões. Apresente a proposição da palestra em sala
de aula e discuta com seus colegas o que poderia ser melhorado na sua proposta.
5. A relação entre transportes e destinos turísticos está no cotidiano, inclusive na hora
do lazer. Selecione um filme que aborde um tema qualquer sobre transportes e des-
tinos turísticos. Depois faça uma releitura da parte desse livro que mais tenha ligação
com o filme e escreva uma breve redação (20 linhas) associando cenas do filme e
os aspectos teóricos observados. Peça a um colega que faça a mesma coisa, depois
troquem as suas impressões individuais sobre a redação criada por vocês.

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