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O VISUAL DO INVISÍVEL:
A COMPLEXIDADE DAS CATEGORIAS ENTRE A MÚSICA E A CEGUEIRA
MANAUS
2019
RENATO ANTÔNIO BRANDÃO MEDEIROS PINTO
O VISUAL DO INVISÍVEL:
A COMPLEXIDADE DAS CATEGORIAS ENTRE A MÚSICA E A CEGUEIRA
MANAUS
2019
FICHA CATALOGRÁFICA
RENATO ANTÔNIO BRANDÃO MEDEIROS PINTO
O VISUAL DO INVISÍVEL:
A COMPLEXIDADE DAS CATEGORIAS ENTRE A MÚSICA E A CEGUEIRA
Comissão Examinadora
_____________________________________
Profa. Dra. Rosemara Staub de Barros (presidente)
Universidade Federal do Amazonas/UFAM
__________________________________
Profa. Dra Regina Finck Schambeck (membro)
Universidade Estadual de Santa Catarina/UDESC
___________________________________________
Profa. Dra. Maria Almerinda de Souza Matos (membro)
Universidade Federal do Amazonas/UFAM
____________________________________
Prof. Dr. Odenei de Souza Ribeiro (membro)
Universidade Federal do Amazonas/UFAM
_______________________________________
Profa. Dra. Thais Helena Chaves de Castro (Membro)
Universidade Federal do Amazonas/UFAM
___________________________________
Prof. Dr. Glaucio Campos (Suplente)
Universidade Federal do Amazonas/UFAM
________________________________________
Prof. Dr. Jackson Colares da Silva (Suplente)
Universidade Federal do Amazonas/UFAM
MANAUS
2019
DEDICATÓRIA
Esta tese é dedicada a um conjunto de pessoas que viabilizam uma forma diferente e
tão pouco especial de apreciar o mundo que vivem. Vai ao encontro de todos aqueles que por
um ou mais motivos se questionaram como seria uma vida sem a visão, ou mesmo, tentaram
nas suas horas mais sozinhas, experimentar uma realidade por achar que também enxergam
o mundo de um jeito muito seu e difícil de explicar para todos.
AGRADECIMENTOS
A presente tese se ocupa de dar voz a uma questão muito particular sobre as condições
elementares de uma vida que una a deficiência visual e a música, suas potencialidades e
limites ilustrados em métodos que nos trazem pela ciência os mitos e verdades de todo esse
processo sócio criativo da problematização deste estudo. É dividida em quatro partes, iniciada
no levantamento das ideias de investigação publicadas nos últimos cinco anos por conta do
que expõe a ABEM como colaboradora do tema mais aproximado que aqui nos referimos. Em
outro momento, trouxemos aspectos metodológicos da vida rotineira de quem possui baixa
visão e atua como músico profissional, momentos importantes que abrem para novas
reflexões sobre, a partir de então, que tragam relatos próprios de pessoas que vivem a
deficiência e narram suas dificuldades e conquistas para o meio acadêmico. Em terceiro
plano, podemos considerar, diante do lido autobiográfico do autor desta tese, como a vida de
três grandes nomes da música mundial podem, em associação com os parâmetros pedagógicos
verificados no primeiro capítulo, ordenar propostas reflexivas com as histórias de Ray
Charles, Hermeto Pascoal e Andrea Bocelli, realidades distintas e de resoluções parecidas pela
existência de seus nomes alinhavados com a arte, Por fim e sem melhor juízo, trazemos um
conjunto de proposituras para benefício somativo de tudo alcançado nestes anos de
Declaração Universal dos Direitos Humanos, sobretudo, das pessoas em situação de
deficiência. Entendemos por este, a arte, no caso a música, é potencial para o potencial
humano, revela eficiências mesmo nos contextos deficientes, ainda há muito mais para ser
feito em relação de um mundo inclusivo satisfatoriamente, todas as ações e escritos sobre a
inclusão pela diversidade causada pela baixa visão é e será fator preponderante para o
evoluído até então, porém é hora das afirmações daqueles beneficiados por anos de apoio
educativo e paciente para que o lema “Nada sobre nós sem nós” viesse com toda a força que
percebemos por registrar esse estudo.
The present thesis deals with giving a very particular question about heel ementary conditions
of a life that unites visual deficiency and music, its potential it yes and limits illustrated in
methods that bring us by science them y this and truths of this whole process partner problem
of this study. It is divided in four parts, started in the survey of research ideas published in the
last five years because of what ABEM exposes as collaborating with the most close lyre lated
the methat we are referring to here. At another time, we brought methodological aspects oft
her outine life of those who have low vision and act as a professional musician, important
moments that open to new reflections on, from the non, bring accounts of people who live the
disability and narrate their difficulties and achiev ements for the academic world. On the
third plane, we can consider, in view of the author's autobiographical reading of this thesis,
how the life oft here great world musiccan, in association with he pedagogical parameters al
ready verified in the first chapter, order reflective propos als with the stories of Ray Charles,
Hermeto Pascoal and Andrea Bocelli, different realities and similar resolutions for the
existence of the irnamesa ligned with art. Finally and with out better judgment, webring a set
of propositions for the be nefit of the sum achieved in all these year sof the Unicist
Declaration of Human Rights, especially of people with disabilities. We under standby this, in
this case, music, it is potential for human potential, it detect seffi ciencies even in poor
contexts, there is still much more to be done in relation to a satisfactorily inclusive world, all
actions and writing son inclusion for diversity caused by the low vision is and will be a
preponderant factor for the evolution until then, but it is time for
theaffirmationsofthosebenefitedbyyearsofeducationalandpatientsupportsothatthemotto
"Nothing about us without us" came with all the force that we perceive for registering this
study.
LISTA DE IMAGENS
Figura 1 - Lupa virtual ancorada. ----------------------------------------------------- 29
Figura 2 - Leitura com o Bloco de Notas -------------------------------------------- 29
Figura 3 - Interface Programa DSPEECH ------------------------------------------ 31
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................... 11
1. DAS TEORIAS AOS CAMINHOS PARA O VISÍVEL DO INVISÍVEL.................................................. 17
1.1 Uma voz pela diversidade: a abordagem auto(biográfica) na pesquisa acadêmica.......17
1.2. Superação não é adaptação: reflexões sobre o aspecto da baixa visão .......................... 23
1.3. Lentes físicas e lentes virtuais ....................................................................................... 26
1.4. Material didático ampliado ............................................................................................ 27
1.5. Citando equipamentos de auxílio para leitura por pessoas com baixa visão ................. 37
2 – MOVIMENTOS PARA UMA EDUCAÇÃO MAIS INCLUSIVA ........................................................... 41
2.1. Associação Brasileira de Educação Musical/ABEM ................................................................ 41
2.2 Levantamento Internacional ........................................................................................... 50
2.3 Resumos dos trabalhos nacionais levantados ................................................................. 51
PERFIL A.................................................................................................................................... 129
Perfil B ........................................................................................................................................ 137
PERFIL C .................................................................................................................................... 143
PERFIL D.................................................................................................................................... 145
2.4 Análise dos sistemas de relações e estratégias do aprendizado musical por alunos com
baixa visão. ........................................................................................................................... 51
3 - TOCAR PARA SER FELIZ: RELAÇÕES INTERPESSOAIS NOS ESTILOS POPULARES E
ERUDITO ............................................................................................................................................................ 56
Ray Charles Robinson: “A música é o meu primeiro amor” ................................................ 59
3.2 sonoro Hermeto Pascoal: visualmente ............................................................................ 62
3.3 Andrea Bocelli: A música do silêncio ............................................................................ 65
3.4 Eu, eles e nós todos: nossas biografias em debate .......................................................... 68
4 - PROPOSITURAS PARA A VIDA, A EDUCAÇÃO E A AFIRMAÇÃO DO CONTEXTO ENTRE A
MÚSICA E A BAIXA VISÃO ............................................................................................................................ 73
4.1 Evidência ........................................................................................................................ 74
4.1.1 Os estados físicos da cegueira ..................................................................................... 76
4.2 - Percepção musical: sinais e símbolos........................................................................... 79
4.3 - Tecnologias e processos de construção da abordagem produtiva da música e a baixa
visão ...................................................................................................................................... 85
4.4 Interpretação das proposituras ........................................................................................ 91
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................................. 94
REFERÊNCIAS .................................................................................................................................................. 98
APÊNDICE...............................................................................................................................
11
INTRODUÇÃO
Entre 1985 a 1986, passava na televisão brasileira a 34ª novela da Rede Globo, Roque
Santeiro, uma trama idealizada por Dias Gomes e Aguinaldo Silva, cuja história contava com
a participação de uma figura social, que à época, estando eu com nove anos, me chamava
atenção. Curiosamente a quem me refiro é o músico cego, Jeremias, personificado pelo ator
Arnald Rodrigues. Lembro-me de que ali, ao ver aquela figura socialmente ilustre, questionei-
me sobre como seria a vida dentro da cegueira, além de ter ainda vivo na memória uma
convicção, ele só poderia mesmo ser um músico para driblar a deficiência e viver com certa
dignidade na cidade. Desde então, os autores brincavam com o fato de que ele, o cego, via
tudo e todos, revelando em fofocas casos íntimos de toda a trama (Machado et al, 1997).
De maneira que somente um cego pode conduzir as verdade verificadas na forma que
“vê” o mundo, existe aqui o esforço como apelo para que mais nada sobre nós seja dito sem
nós. As incontáveis modalidades comunicativas já desenvolvidas pela humanidade podem
somar mais essa narrativa como meio de ampliar o horizonte de quem vê o que não vê. Por
isso, objetivamos nesse empenho literário, trabalhar no timbre da voz do deficiente visual as
realidades de um mundo simplesmente comum, dificultoso e possível em suas determinadas
condições de tempo e espaço para suas eficiências se apresentarem.
A figura do indivíduo cego carrega consigo certos ares folclóricos, muito pelo mistério
que se envolve e também pelos temores contidos em cada um de nós sobre a possibilidade de
ficar cego. Como vivemos em um mundo que privilegia como maior valor o conhecimento, é
óbvio que todas as ações que alcancem tal riqueza serão valorizadas. Perder a visão é, em
potencial, distanciar-se dessa possibilidade de possuir mais conhecimento. Por isso, a visão,
dentro de um contexto de culturas visuais como é a nossa, é o sentido mais importante.
Vejamos que quando eu cito acima minha primeira experiência sobre o contato, ainda
que na TV, com uma pessoa cega, lembrando do que era a televisão no auge dos anos de 1980,
verifico e vivencio o medo de perder a visão. Neste período que tenho de 9 para 10 anos,
minha síndrome não havia se manifestado. Bem, esse empenho se objetiva a dar voz e forma,
não somente a esse “medo”, mas tende a verificar, por meio das narrativas e interpretações de
conceitos e teorias, outras maneiras de expressão o visível do invisível. Todavia, eu e minha
orientadora, em sintonia e sensibilidade, procuramos construir lentes auxiliares sob a leitura
do pensamento complexo e semiótico novidades para um novo discurso objetivo das
subjetividades verificadas nessa jornada investigativa.
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Por outro lado, como é impossível desassociar, entre um e outro apontamento, quer ser cego e
o estar com baixa visão são os mesmos, mas, com isso não queremos os igualar, pelo
contrário, o resultado considera ao final desta tese, de que temos uma necessidade de separar
as condições para a diminuição dos impactos em relação aos tratamentos proferidos nas
escolas e sociedade. Nessa esteira, por vezes falaremos do cego em geral, pois dada as
seguintes ocasiões, uma denominação é servente para todas.
Antes que nos perguntam mais uma vez como é o sonho de um cego, podemos dizer, é
o que ele vê. Tratamos do verbo “ver” para um norte de evidência. Vemos o que nos convém,
pois o órgão responsável é o olho, porém é no cérebro que tudo se processa e quando este não
quer ver, cria pela praticidade. No caso da baixa visão, o que podemos ver, e por mais obvio
que seja, é justamente assim como segue nossa discussão. Temos olhos para ver, mas é no
cérebro que tudo se faz presente, um sonho cego é lotado do que o emocional irriga ao neural
e sonhamos como qualquer um, pois sonhos são sonhos. A partir desse prisma, por todo o
cordão de palavras é possível ligar outras formas de explicar os detalhamentos do visível do
invisível, uma tese que tem na arte musical sua forma condutora para a integração sensorial e
eficiência.
Nesse ponto, temos como considerar a ABEM como a maior propagadora de debate
sobre a música e as deficiências. No estado do conhecimento, adquiridos dados revelam como
é crescente a preocupação científica para a área, no entanto, ainda há pontos sem suporte,
esclarecidos pela jovialidade de tantas fontes e realidades do desenvolvimento científico de
nosso país. Como resultado, de um modo ou de outro, ficamos mais perto de uma
comunicação elementar sobre o invisível aos olhos e visível a alma por conta da música. Tais
processos passam por relatos de experiência, pesquisas de campo, inovações e revisões
publicadas no Brasil. Da mesma maneira, vimos na ANPPOM, em menor proporção, essa
temática ganhando espaço nos eventos e publicações. Por fim, sem menor valor, também
acusamos a presença do Congresso Brasileiro de Educação Especial (CBEE) com
colaborações importantes, tendo como plano sob os resultados alcançados em nossa tese,
demonstrando como a música é um ótimo veículo para as ideias de inclusão nas variações dos
quadros de deficiência, transtornos globais do desenvolvimento humano e superdotação.
Nosso método passa pela abordagem de análise de narrativas biográficas coletadas em
filmes, entrevistas, matérias de jornais, sites da internet e itens acadêmicos, para o ideal
imaginário de uma vida sem visão. Participam Ray Charles, Hermeto Pascoal e Andrea
Bocceli, cada um com sua confluência com a deficiência visual, tratada por nós a partir dos
elementos coletados para a identificação de processos sóciocriativos do modo como
15
Para esta tese iremos utilizar recursos para uma pesquisa narrativa contento biografias,
relato orais, histórias de vida, memórias, autobiografia e depoimentos, contribuindo para o
nosso planejamento metodológico, através deste modelo que ganha força nos últimos vinte
anos.
validação dos termos apresentados pela qualidade do envolvimento de quem narra os fatos.
Do mesmo modo. Bueno (2002), prefere dar clareza ao momento vivido dentro das academias
para uma suposta aceitação de abordagens autobiográficas nos textos produzidos nas
universidades e institutos de pesquisa no Brasil. Para tal, Bolívar (2002), adiciona sobre os
riscos, estes sempre presentes, pela interpretação e modelo de aquisição que acompanham as
composições destes discursos.
Como vemos, anunciamos para esta tese uma proposta de investigação que busque
determinações válidas pelo viés de quem vive a deficiência visual, ao mesmo tempo, longe de
nossa tentativa para um confronto, trazemos com cuidado os paradigmas preponderantes do
programa ao qual este estudo se vincula. Delory-Mombergue sustenta em apoio a nossa
apropriação, uma narração é tão sociológica quanto uma teoria defendida há mais de 20 anos.
Assim, viabilizamos o que há de dinâmico, damos valor ao já verificado como natural sobre a
movimentação dos agentes e cenários de cada cultura e sociedade.
Bueno, publica, “iniciou-se na Alemanha no século XIX, como alternativa para as
ciências humanas e sociais. Em 1920, os americanos utilizaram o método biográfico de forma
sistemática na escola de Chicago, caindo em desuso nas décadas seguintes.” (2002, p.13).
Entramos, com os telefones celulares, na era da instantaneidade, não são mais os telejornais
que revelam fatos, mas sim uma rede de pessoas comuns que colaboram, mesmo sem saber às
vezes do impacto, com as notícias do mundo. Claramente, todos os autores que colaboram
para este tópico são unânimes, a condução dos dados precisa ser constantemente verificada,
nomeada e datada, ao contrário, o aumento de narrativas sociais dispersas de maneira errada,
podem e deverão conduzir a um conjunto de prejuízos jamais vistos.
No caminho do aprofundamento dos dados, quando precisamos falar de algo mais
presente, contínuo e particular, se fazemos exercício de lembrar quando éramos crianças,
somente nós, sob um falso aspecto egoísta, dizíamos o que queríamos. É fato, como propçoe
Bolívar (2002), por nós, falamos sobre nós. O autor, buscando dar credibilidade, atravessa
pelo latim com sua ideia, dizendo em frase, “de nobis ipsis loquemur”, sendo entendido para
um contexto já citado, “nada sobre nós, sem nós!”. O momento, conclui em conforto, pois
com a chegada de pessoas com deficiência em posições de liderança e condições competitivas
de expressão, joga concretamente esse ideal para novos debates, revalida, ainda como
possibilidade, corpus autobiográficos para apreciação social e de crivos científicos mais
reflexivos. Por este, há conclusões mais aproximadas de abordagens definitivas conforme as
cabeças pensantes e os ambientes atuantes, mas como prevê Bueno (2002), as necessidades
criaram as normas.
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Sendo os dados coletados, como por exemplo, as entrevistas, materiais da análise, cabe
comentar, como diz Delory-Mombergue (2012), estaremos sempre sujeitos a interpretação da
qualidade da luz que auxilia a leitura, uma vez que no globo terrestre existem, por conta do
eixo, variações na qualidade ótica em se ver os fatos. Neste caso, os fundamentos de uma
abordagem autobiográfica nos traduzem pelo confronto de outras realidades, o patamar social
de uma Amazônia em exploração, pois valoriza o sujeito narrador partindo da arte que vive
em sua pele, e se entendermos bem, se apresenta sob a coragem das críticas assumindo o ato
de auto interpretar e compartilhar suas emoções para o bem comum científico.
Temos clara a condição do autor como pessoa com baixa visão e músico, atuante na
área da educação e militante de processos socioculturais pelo desenvolvimento da Amazônia.
pequeno, piscava muito e isso me rendia apelidos bem diretos. Apesar de uma aproximação
exagerada ao aparelho de TV, vivia normalmente, vendo bem inclusive. A Síndrome de
Stargardt (SS), como também é conhecida a anomalia, é progressiva, pelo que sei e sinto, com
a idade os sintomas parecem acelerar, mas não há nada comprovado em relação a isso. Andrea
Bocelli, no filme diz para sua mãe, tentando explicar como vê o mundo, “eu vejo tudo e não
vejo nada”, uma frase codificada e entendida só por quem tem a deficiência.
Nossa tese tem como característica um texto predominantemente referenciado por
citações indiretas, aqui aberto à crítica de quem lê e por consequência avalia, afirmo que “vi”
os escritos mesmo sem vê-los. Durante o doutorado fui convidado a ler a Amazônia, preparei
uma quantidade enorme de livros para que pudessem ser lidos pelo celular ou computador,
inventei cada parte das leituras pelo mais aproximado de um currículo de imagens que possuo.
Em outras palavras, vemos muito e sabemos o que vemos, até mesmo quando inventamos as
imagens como o rosto das pessoas. Com isso, tais narrativas, associadas a outros exemplos da
mesma condição de vida farão parte da defesa dessa ideia de tese.
Qualquer pessoa vive sua parcela de exclusão. Seria aqui um espaço muito pequeno
para os exemplos que ilustrariam essa afirmação. Não dominamos todos os assuntos e uma
simples roda de conversa é capaz de demonstrar o quanto temos a aprender e tentar se incluir.
Desse modo, vemos aqui uma boa oportunidade de conduzir uma pesquisa que dê a chance do
observado ser observador. A soma dos ideais investigados, sem juízo de valor, é com cobaias e
proposituras para uma realidade distinta. Os anos de luta por uma educação para todos, nos
projeta agora para recebermos as opiniões e posicionamentos daqueles que foram e vem sendo
atendidos.
Bezerra (2016) aponta para uma urgência dos saberes contidos nas perspectivas de
Deficientes Visuais, doravante DV, ou seja, os relatos ou pesquisas dessa categoria precisam
dividir com a comunidade uma cultura mais honesta da realidade do mundo com baixa visão.
Eu tenho baixa visão, ainda desempenho certas atividades que o resíduo visual me
proporciona capacidade. No entanto, do momento do início desta tese até a presente data,
perdi importâncias do meu potencial de enxergar e ao mesmo tempo, passei a identificar
mecanismos muito rápido de adaptação. Dessa feita, uso a autobiografia no sentido mais
restrito a colaboração do conhecimento humano, sem, em hipótese alguma, querer sensibilizar
para longe de meu potencial de pesquisa que almejo ter.
Com base nos dados deferidos, a importância dada por inúmeros pesquisadores sobre a
curiosidade que move a ciência a respeito das relações entre a música e a deficiência visual,
tange uma coisa mais profunda, uma necessidade latente sobre como é a temida vida sem a
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luz. Da mesma forma que os ditos populares se questionam sobre qual idioma pensa um
surdo, trazemos na mesma proporção, como seria o sonho de um cego. Nas situações que
conheço uma pessoa e tenho que explicar como vejo o mundo, sinto o silêncio habitual de
quem me observa, estático e cascavilhando palavras para o momento do meu silêncio quando
término de explicar. Por estes, vejo como muito normal e imprecisa a noção sobre as
possibilidades de vida que existem.
Aprendi a ler música ainda com uma boa acuidade visual, porém dava indícios com
meus erros frequentes. Dona Ignês Braga, minha primeira professora de música, era uma
autoridade social, tinha lecionado para bons músicos e filhos da sociedade Manauara por
muitos anos antes de minha aparição em sua classe, na verdade, sala de sua casa. Hoje, com o
AEE, vejo como nós, eu e minha professora, estávamos distantes de qualquer proposta de
atendimento especializado sobre minha baixa visão. Tive todos os motivos para odiar estudar
música, ler bolinhas pretas entre linhas e espaços impressos tão pequenos era uma tortura.
Sempre, quando tinha uma chance, enquanto a professora ia ver o feijão que aprontava na
cozinha, levava as pautas aos olhos e bem pertinho, decorava os trechos com muita facilidade,
além de entender muito rápido, mesmo antes de ter noção das estruturas formais da música
como, motivos, frases e movimentos.
Em casa via que meu pai se debruçava para ouvir minhas poucas notas em uma apneia
enorme, pois a flauta doce, meu primeiro instrumento, tinha um defeito, toda vez comentado
pela Dona Ignez e eu, com pena do esforço do meu pai por comprar aquela maravilha alemã,
escondia que a mesma não servia. Nessa altura, é fácil perceber que meu maior problema não
era ter pouca visão, mas driblar todas as considerações da metodologia mais que rígida da
professora. Nessa época e nem agora me vejo com potenciais extraordinários para a música.
Na verdade, tudo é tão difícil quanto antes, as horas de dedicação são fundamentais.
Não sei como, mesmo que isso pareça totalmente contraditório dentro do corpo desta
ou qualquer tese, aprendi a tocar. Talvez esses processos ocultos sejam motivos encorajadores
para outras pesquisas. Fui uma acomodação paulatina de tarefas auto adaptativas como propõe
Schafer (1991) quando aborda nossa primeira percepção do mundo sonoro. Aprendi a tocar
violão com os amigos, e interpretava as harmonias dentro de suas cadências, com uma força
para um batismo de cada grau ouvido, ou seja, queria dar nome para cada acorde por entender
a força tonal exercida dentro da música.
Na faculdade, nas aulas de harmonia, vim finalmente saber sobre tônicas, mediantes,
subdominantes, sensíveis e outras, nomes dados para as harmonias, me causando um enorme
conforto, pois achava que o requerido batismo de antes era uma pequena loucura de minha
22
cabeça.
Música na minha cabeça e de meus pais, principalmente de meu pai, um músico em
potencial, era a própria partitura. Mesmo que alguma força me levasse para uma atuação mais
livre, autoral e improvisada, tive muita atenção ao que existia escrito no pentagrama. É
impossível dizer quantas vezes reforcei as notas com uma caneta de ponta porosa ou mesmo
esferográfica para poder ler. Passei a sentir os tons, nunca fui de dizer que tom, em outras
palavras, quando entro em uma música para tocar, percebo o tom e minha mão esquerda busca
o acorde no violão pelo o que sinto, não me vem a cabeça uma nota como G ou F, vem a
sensação e ai, muito rapidamente, vem a técnica e identificação do tom pela letra da cifra.
Tudo isso acontece muitíssimo rápido, mais como a definição de Schafer (1992) sobre o
ouvido absoluto, não se tratando de dar nomes às notas, mas, dar vazão ao sentimento por
eles.
Se dentro das classes de aula de música eu nunca vivi um atendimento específico,
imaginemos juntos como era nas formações orquestrais que trabalhei em minha cidade. Sou
de uma época em que não existiam celulares e nem mesmo a internet. Hoje, facilmente
andamos com um afinador, metrônomo, dicionário de acordes, cifras, partituras, tablaturas e
muito mais, dentro dos smartphones.
Naquele tempo, ou sabíamos ou não sabíamos, tocávamos em uma formação popular e
sem contabilizar, sempre me via em apuros para tocar uma música nova, harmonias
elaboradas e sem apoio de ninguém, somente um tom dito quase sempre pelo baixista e tudo
se acertava. Em contato com outros músicos na academia, vi que a minha escola popular não
era simples e comum como imaginava. Percebi como certas coisas na música eram bem
difíceis quanto a qualidade das oportunidades da prática. Para melhor dizer, fui o músico não
pela minha deficiência, mesmo porque meus pares nem sabiam ao certo o que eu tinha de
fato, me chamavam de Cego, ou Galo Cego, mas nenhum tratamento diferenciado eu pude
obter por eles.
Com o tempo, fui perdendo o medo de tocar somente com o ouvido, sabia o caminho
exato de cada movimento harmônico e afinava meu instrumento pelo som guardado de cada
corda com muita precisão. Não existiam mais acordes elaborados, mas sensações do encontro
dos intervalos de 9ª, 4ª e outras mais. A música clássica, como conteúdo dentro da academia,
me trouxe acomodação das ideias, porém a liberdade expressiva, o tudo pode, está no
distanciamento de uma leitura formal e felizmente, no meu caso, é assim que me sinto musical
e pleno. Todavia, não seria justo desassociar uma coisa da outra, elas se complementam e nem
cabe dizer quem veio primeiro.
23
Atualmente, não tenho mais leituras de tipos gráficos impressos em tinta, ainda que
muito ampliados, os vejo, mas não os entendo. Continuo me preocupando em fazer música,
não penso sobre a deficiência. No entanto, a cada evolução do processo de perda do meu
potencial visual, passo a me sugerir novas formas de apreciar e tocar o meu instrumento.
Partindo do que colabora Sá et. Al. (2008), sabemos que há uma base de procedimentos para o
atendimento de pessoa com baixa visão, doravante PBV, sendo cada caso, especificamente
analisado para emprego dessas adaptações. Eu sempre fiz minhas próprias adaptações,
descobri caminhos para a leitura e não paro de encontrar processos de criação dos meios
facilitadores para o meu desempenho e lazer.
Apreciando os escritos levantados para esta pesquisa pode-se verificar como ler
música em Braille ou em pautas ampliadas é sem dúvida um caminho, mas a arte é livre e de
um modo mais evidente que os casos regulares de ensino, não são os únicos meios para fazer
e ser musicalizado. Os meios computacionais são ferramentas poderosas para a deflagração de
qualquer processo, Keenan&Finck (2016) associam a ideia do aumento da oferta de vagas no
ensino superior por parte da qualidade dos meios de comunicação mais inclusivos. Em Fantini
(2016), vemos como dentro dos grupos de trabalho dedicados a educação musical especial, a
tecnologia é fundamental e cada vez mais presente.
Como recurso, trouxe minha realidade e parte de minha história relacionada ao
emprego da música na trajetória que vim seguindo. Faço aqui, para dar claridade ao que
teremos como exemplo de vida verossímil sob outras narrativas no próximo capítulo, saber
que meu, ou melhor, nosso contexto, sendo uma abordagem de origem amazonense, tem a
mesma relevância e pertencimento para a criação de momentâneos paradigmas para a
educação e a vida profissional de músicos cegos no decorrer de nossa história. Assim, peço
licença aos apreciadores desta proposta para minha entrada como agente participativo, pois
muito se perde pela ausência de testemunhos sobre as mentes privadas de um dos sentidos, e
sendo ciência, cabe entender como tudo tem um sentido e valor nas mãos corretas e
interessadas.
uma tarefa fácil de entender. Com isso, vivia perdido entre os que viam normalmente e os que
não viam nada, quem eu era? Silva et, al. (2019, p.04) diz que “[...]os variados tipos de
desenvolvimento atípico são marcadores sociais, e não algo meramente biológico”.
Muito do que prescrevo faz sentido nos apontamentos de Vigotski (1997, p.99), ainda
pela interpretação das potencialidades indicadas no campo sociocultural. As relações de
convivência são preponderantes, tanto em saber conviver, quanto em saber ser a partir das
observações locais, neste em um grupo focal de cegos. Para ele, “não se pode resumir a
deficiência a uma falta de visão (o defeito de um órgão singular), mas deve compreender a
existência de uma reestruturação muito profunda de todas as forças do organismo e da
personalidade”.
No estudo de Oliveira (2014) sobre relatos de músicos cegos, podemos identificar
momentos de aceitação e entendimento nos sujeitos da pesquisa, porém o autor faz sua
verificação com DVs consagrados, ou seja, pessoas que se reconhecem como tal. Por isso, é
importante que algumas afirmações sobre a deficiência visual venham acompanhadas da
condição e momento da aquisição da cegueira. Em resumo, podemos nascer cegos ou com
baixa visão, ou adquirir ao longo da vida. Pré e pós-linguísticos respectivamente.
leitura de partituras e outros itens, que voltando aos valores acima citados, refletem desejos
que não combinam com superação. Por outro lado, ainda que estes mesmos itens não surjam,
vamos ter que viver e queremos ainda estar vivos e para isso, a saída é se adaptar.
O foco de Fantini et, al, (2016) quando aponta o estado do conhecimento em relação a
artigos dedicados a associação da música com a deficiência, nada se vê considerando a
adaptação partindo da pessoa com deficiência, ainda pensamos só nas competências de
professores e escolas. No entanto, o deficiente, como valoriza Vigotski (1997), traz, na sua
proporção e de igual valor colaborativo, capacidades e essas, precisam aflorar. Com isso, é
vista uma realidade de insuficiência estrutural, aspectos mais deficientes que o próprio
indivíduo que é atendido e decorre nessas falsas interpretações de “superação”.
Em relação às lentes, eu usei por anos uma lupa de apoio 1, igual a de joalheiros,
pendurada no pescoço. Essa mesma lente, na minha rotina de atividades diárias, ajudava a ler
qualquer coisa como bulas de remédio, preços de produtos, documentos do estudo, entre
outros, ou seja, qualquer leitura rápida. A lente de ampliação de 60x me auxiliava em tarefas
comuns.
Vale comentar que tal recurso não se aplicava a leitura de um livro, por exemplo. Ler
1
Lupa normalmente pequena e grossa, seu uso é direto nos olhos, por isso se chama de “apoio”, ela não serve
para observações a distância, pois tudo fica melhor lido quando o texto, lente e olhos estão bem próximos um do
outro. Em outras palavras, para ler com essa lupa, é preciso levar a lente junto do olho, papel junto do nariz e
focar com resíduo visual.
27
textos extensos requer muito esforço e a lente, no caso dessa explanação, era grudada ao olho
e só permitia rápidas incursões por me deixar tonto se demorasse muito tempo usando-a. Com
uso dos smartphones, esse tipo de leitura está garantida e afasta a necessidade do
acompanhamento diário da pequena e pesada lente de joalheiro.
Em modo de adaptação, temos as próprias lentes das câmeras dos aparelhos servindo
da mesma forma para ampliação imediata como se faz com a lupa. Em casos mais específicos
e de mesma ordem, tiramos uma foto do documento e ampliamos a imagem para a leitura do
conteúdo textual ou gráfico em cada caso.
Além da lupa de apoio, temos a telelupa, esta tem servido para ver a distância.
Funciona identicamente a uma pequena luneta e nos acompanha guardada na bolsa. É
recomendada para ver o itinerário de ônibus, numeração de casa, placas, assistir a uma peça
de teatro e qualquer outra tarefa de acuidade distante. É de prescrição médica, pois existe em
diferentes potências, 2x, 4x e 8x, por exemplo. Posso dizer, assistir a uma televisão ou a um
espetáculo teatral com a telelupa, era um bom avanço, por outro lado, cansava muito rápido,
somente um olho era usado e por isso, sentia ânsia de vômito. Com tablets e smartphones,
essa tarefa ficou muito mais simples e confortável. Ainda que tenhamos muito a amadurecer,
pois donos de estabelecimentos de espetáculos não permitem o uso de dispositivos luminosos
ligados nas plateias, quando isso é possível, temos os dois olhos abertos observando, por meio
da magnificação da lente dos dispositivos, qualquer apresentação.
Com isso, atualmente a leitura de partituras é feita exclusivamente por foto. Obtenho
com o celular todas as imagens das páginas, organizo com recorte e aparas, amplio cada
trecho e toco. Obviamente que a leitura à primeira vista, nesse caso, é algo totalmente próprio
de uma situação clara, lemos, porém paramos compasso a compasso para mudar a imagem de
posição. Ainda não conheço uma aplicação computacional que faça essa tarefa, ampliar um
compasso de cada vez, mudar na hora em que vamos executando e parar na hora desejada,
além, é claro, de voltar imediatamente aos compassos anteriores como é feito em qualquer
estudo. Sonhar, se me permitem dizer assim, não custa nada. Seria ótimo ter algo nesse
sentido.
Como diz Sá et. Al.(2008), para PBV podemos oferecer textos ampliados com fonte
clara do tipo Tahoma, Verdana e preferencialmente, Arial. O tamanho varia entre 18 e 24
pontos, gerando respectivamente textos volumosos fisicamente. Eu, durante a graduação não
28
carteira adaptada, com a mesa inclinada para que o aluno possa realizar as atividades
com conforto visual e estabilidade da coluna vertebral. Acessórios: lápis 4B ou 6B,
canetas de ponta porosa, suporte para livros, cadernos com pautas pretas espaçadas,
tiposcópios (guia de leitura), gravadores. Softwares com magnificadores de tela e
Programas com síntese de voz. Chapéus e bonés: ajudam a diminuir o reflexo da luz
em sala de aula ou em ambientes externos.
Com todas as indicações previstas pelas autoras, podemos verificar que as soluções
propostas como inclusivas de uma inclinação do texto em relação a postura do aluno,
intensidade de luz no material lido, ampliação de fontes e tipos gráficos, síntese de voz e uso
de letras em negrito e pautas ampliadas, se resumem ou estão contidas, confortavelmente,
dentro de um PC, smartphone ou tablete.
Veremos isso nos processos descritos abaixo a partir das imagens oferecidas:
teses, e dissertações e livros, feitas por escuta em deslocamento, tempos livres e horas
dedicadas a redação do trabalho. Existem pontos positivos e negativos, respectivamente,
citamos a agilidade e usabilidade de leitura enquanto nos deslocamos de ônibus, por exemplo.
Como negativo, uma leitura de livro, temos que ter bastante atenção, procurar decorar em qual
página está sendo feita a leitura, caso apareça uma boa referência, sumários sem
conformidade com o número da páginas real, atrapalham e deixam lenta e estressante a
audição do texto, imagens mal legendadas confundem e se forem preponderantes, nos fazem
perder todo o contexto interpretativo, entre outras.
Portanto, quando preciso ler algo muito extenso, uso o DSpeech (fig. 03) gratuito e
dou preferência por vozes masculinas, estas encontradas para dowloundna internet, modelos
privados ou livres. Os passos são simples, cola-se todo o conteúdo literário dentro da caixa
maior da interface do software, aperta-se “speak” e imediatamente se ouve o texto colado em
voz.
FIGURA 03:Interface Programa DSPEECH
Desse modo, o processo de leitura fica mais ágil, transparente e acessível. Com as
novidades das Tecnologias da Informação e Comunicação(TIC), esperar por uma adaptação
de um texto em fonte ampliada, ou ainda pior, em Braille, virou coisa do passado, pois como
sugere Finck (2016), o professor deve saber de sua competência em aproximar os recursos de
acordo com a realidade de seus alunos, neste caso, entender que existe leitura mais rápida e
eficaz sem ser o Braille, e, se tudo for disponibilizado a tempo, as cobranças avaliativas se
tornam únicas e mais inclusivas.
Observando desejos de ser e vir a ser dos sujeitos para esta pesquisa, temos como
preponderância de suporte, os relatos coletados em proposta direta. Porém, uma vez
interpretada pela orientação deste estudo, não devemos confiar em uma boa interpretação sem
relacionar formação educativa e o aprendizado solitário dos atores investigados por este
projeto. Em outras palavras, muito se espera através do viés que parte da observação e da auto
32
aceitação de quem participará do estudo. Desse modo, faz-se presente uma verificação de
currículos pedagógicos da formação de professores de música para o ensino inclusivo e
especializado.
Para as bases, o modelo investigativo se adequa ao que inconscientemente os sujeitos
deixam escapar em suas palavras por meio de conversas e depoimentos. Em acordo com essa
feita metodológica temos a participação confirmada dos músicos cegos Claudionor Batista e
David Assayag, ambos relacionados com o Festival Folclórico de Parintins, além de
biografias espalhadas pela internet de casos clássicos de DVs em condições semelhantes aos
sujeitos mencionados acima.
consistência o singular de cada auto compreensão de ser e querer ser um músico ainda em
condições específicas de cegueira. Com isso, muito se revelará ao mundo como processos de
enfrentamento, não somente dos dados objetivados que dispomos neste, mas de outras
possibilidades de aplicação dos princípios ou mesmo mecanismos para soluções emergentes
para as dificuldades que impõe cada deficiência.
Na abordagem sob a perspectiva da narração, teremos como função predominante a
visão do mundo ou percepção subjetiva deste. Em reflexão sobre ver mesmo no invisível,
tendo como linguagem a música para dimensionamento dos valores existenciais dos sujeitos
investigados, poderemos dar garantia do visual transcrito de ambientes percebidos por
sentidos remanescentes e logicamente pouco habituais. Trazendo como exemplo as imagens
olfativas de determinadas paisagens que comumente são mais válidas pelo sentido visual.
Biografias coletadas para o debate, nas suas devidas proporções, deverão trazer
consigo processos de percepção desenvolvidos como mecanismos de comunicação e
integração com o meio. Cada condição histórica a que se pretende envolver, fatalmente
colabora com realidades ainda recobertas por brumas do distanciamento e pouco
envolvimento das práticas pedagógicas nas escolas de hoje. A relação entre a música e a
deficiência visual concorre como um enquadramento sócio cultural inventado na cabeça de
muitos. A música em si, valiosa pela beleza e admiração dos seus e a cegueira ligada
justamente pela escuridão tradicionalmente cultivada em nossa consciência coletiva.
questões mais recentes do desenvolvimento desta tese, dando valor às memórias e voz de
quem se apresenta a colaborar. Diante disso, onde se aproximam as práticas perceptivas
musicais entre pessoas com ou sem deficiência? Existem mesmo potencialidades mais
evidentes para a música pelos cegos? Como o mundo vem vendo tudo isso e onde residem as
verdades do senso comum?
Para levantamento dos dados e relatos, privilegiamos essa primeira parte da pesquisa.
Muitos atores contactados confirmaram suas participações e todos de acesso rápido e
facilitado. As biografias preferidas estão contidas na internet em títulos publicados como
memórias e narrações não-autorizadas, além de filmes e documentários.
O uso de recursos tecnológicos se inicia na composição deste projeto, são
Reconhecedores de Caracteres Óticos(OCR), editores de partitura com ampliadores das
pautas, conversores da escrita convencional da música em musicografia Braille, leitores de
tela, editores de áudio por comandos alternativos, verificação de currículos de formação de
professores de música que privilegiem horas de educação inclusiva, entre outros, “Assim
pode-se afirmar que a importância deste tipo de pesquisa está justamente nesse olhar que se
volta para si mesmo e auxilia o sujeito a compreender seus processos de formação e a
influência do contexto e do outro em sua própria constituição” (BOLDARINE, 2010, p.39).
Pensamos que no caso da educação/música/cegueira, mesmo que pareçam estar
dissociadas, nossa pesquisa ganha justamente pelo valor de uma proposta de conjunção desses
saberes. Do ponto de vista pedagógico o debate pretende a partir das categorizações do
sujeito, redimensioná-lo, abrir os portões de acesso a sua luz interior, dando dessa feita, mais
um modelo de visualização de suas potencialidades. Em segundo lugar, a música é
infinitamente emotiva para se resumir em linhas e colcheias convencionais, pois se tratamos a
mesma como imagem sonora de nosso sentimento, revalido que todos, sem exceção sentem,
tendo ou não condição de ver o mundo com os olhos, dando ver ao que o coração deseja
escrever. E por fim, visão eficiente do invisível, cada vez mais colorida que escura, dando cor
inclusive ao preto, sendo sensorial pela quantidade de possibilidades ainda desconhecidas que
habitam o que teremos revelado pelos relatos de quem tem mais voz que visão.
Desse modo, nós, orientando e orientadora, partiremos para uma viagem que me
convoca pela primeira vez a dizer quem sou e ao mesmo tempo quem quero ser. É uma
jornada de letreiros que acusam os mais diferentes desafios, onde serão puxadas as pontas do
emaranhado de fios das perguntas que nos movem, além do desejo de contribuir para uma
aproximação entre o mundo de todos para o mundo realmente feito para todos. De fato, o que
queremos é a inclusão.
36
Portanto, nossa tese versa sobre as relações dos processos de acessibilidade por parte
do ensino, relações interpessoais e prática musical com pessoas com deficiência visual. Ao
mesmo tempo, como possui narrativas autobiográficas sob o viés da baixa visão, trata do
levantamento dos últimos e mais conceituados papers aproximados da arte musical e a
situação de impedimentos causada pelas barreiras da rotina de vida diária de cada um. Ferreira
(2002) indica que contabilizamos mais de 20 anos de pesquisas dedicadas ao desafio de
mapear produções acadêmicas sendo teses, dissertações, artigos em periódicos e anais, como
fundamentais para a aquisição dos parâmetros do desenvolvimento intelectual de futuras
investidas em qualquer área (Silva, 2016).
Conhecida como “Estado do Conhecimento”, esta se ocupa de realizar “[...]uma
metodologia de caráter inventariante e descritivo da produção acadêmica e científica sobre o
tema que busca investigar[...]”. Nesse momento, nos invade uma necessidade de saber como
os materiais defendidos no Brasil se comportam de acordo com o que projetamos a investigar.
Ao longo do surgimento e fortificação dos programas de pós-graduação, tais investidas são
facilmente aceitas pela quantidade de tempo e possibilidades quantitativas de objetos para
entrada em nosso catálogo. Sendo assim, faremos buscas nos mais importantes repositórios
nacionais que contenham dados como teses, dissertações, capítulos de livros e artigos,
completos e de acordo com as devidas formas de referenciação nominal.
Em outro momento da história, tal esforço seria provavelmente impossível de ser
exercido em tamanho espaço de tempo. Hoje, com a internet, o caminho percorrido para
alcance dos dados é mais fácil. Por outro lado, como pudemos perceber durante esse levante,
ainda temos muito a evoluir, nem sempre os começos de busca são eficazes, interfaces de
pouco contraste de cores cansam os olhos, sites sem padrões específicos dificultam a
agilidade de observação e por consequência, a qualidade da busca, lentidão de acesso, entre
outros. De acordo com Keenan Junior &Finck (2017), certas preocupações devem ser
tomadas quando pensamos na acessibilidade, principalmente da leitura em níveis de ensino
superior para pessoas com baixa visão. A quantidade de itens apreciados, sumários e letras de
diferentes fontes e tamanhos, dependendo do tipo de deficiência visual, causam cansaço
excessivo e precoce.
Desse modo, o auxílio de plataformas de busca mais compromissadas, não somente
com os sujeitos citados acima, mas também pensando no conforto global, encorajaria outros
estados de conhecimento para o enriquecimento da comunidade acadêmica.
Podemos destacar uma linha de avanços ao acesso dos estudos para a mapeamento do
Estado da Arte, inicialmente, as universidades ofereciam catálogos impressos em formulários
37
contínuos, mais tarde, os dados eram distribuídos em CD-ROMs, cumprindo um ciclo quase
efetivo de ampla divulgação, e por fim e ainda em desenvolvimento, a criação de espaços
dentro dos portais de instituições para avaliação total, dispostos em Documentos de Formato
Portátil (pdf), seguros e leves para transferência entre conexões via internet. Para Ferreira
(2002, p.03), isso é um reflexo das exigências de “[...]uma sociedade que vê a universidade
como prestadora de serviços e que, por isso, deve ser avaliada”.
Com o surgimento das agências de fomento, os recursos sendo públicos para a
produção do conhecimento, as universidades, como o faziam, tomaram conta de se
modernizar, porém como toda transição de condutas, estamos vivenciando, a duras condições
de espera, por mais qualidade no acesso da informação. Desse modo, a
1.5. Citando equipamentos de auxílio para leitura por pessoas com baixa visão
levantamento dos dados. Usamos um computador do tipo PC, monitor de 16”, teclado comum
sem adaptação de ampliação e contraste de cores nas teclas, software browser Google
Chrome, Lupa Ancorada do Windows em 1350% de magnitude, Leitor de Tela NVDA para os
casos de leitura mais complicados, com fontes de difícil interpretação, Iphone X com Voice
Over ativado para leitura dos textos, Whatsapp para reposicionamento dos textos, iPad Air 8
com os mesmo benefícios do iPhone X, leitor de textos DSPEECH, um scanner de 1200dpi e
uma impressora Laser Jet para impressão de textos ampliados .
Tenho minha própria postura em relação a composição dos materiais a serem lidos e
contraídos para as pesquisas que faço. Koepsel&Baier (2019), sob suas preocupações acerca
da preparação de material de estudo para pessoas com baixa visão revelam que cada sujeito
tem seu tempo. Por mais obvio que isso pareça, essa relação de tempo assume determinadas
particularidades entendidas, às vezes, quando há uma boa convivência com o aluno. No caso
de um estudo para a pós-graduação, essa rotina é quase inexistente. Por outro lado, neste nível
de ensino, alguns recursos e condutas devem ter sido criados pela pessoa com deficiência,
caso diferente de demais níveis mais iniciais. Dessa feita, irei descrever abaixo procedimentos
de aprimoramento dos conteúdos para conclusão desta tese.
Acredito que o relato a que venho adicionar, colabore para futuras leituras, abra portas
para uma melhor compreensão dos esforços enfrentados para obtenção dos resultados. De
início, temos que entender o que é um texto passivo de leitura pelo computador. Após este,
vamos aos processos de inserção na máquina, qualidade e agilidade do uso e, por fim, leitura
ou escuta do material.
a) Um texto passivo de leitura pelo computador é aquele que em suas unidades de
caracteres há uma singularidade de reconhecimento óptico, ou seja, arquivos editados
em blocos de nota têm seus caracteres inseridos individualmente, editáveis e
selecionáveis. Nessa categoria podemos verificar as seguintes extensões: .doc; .txt;
.pdf original. Em particular, arquivos protegidos no formato PDF fazem que seus
caracteres não sejam copiados, e em outros casos, são criados arquivos desta mesma
extensão a partir de fotos, nesse caso, o computador não lê unidade de caracter, mas a
unidade da página inteira por seu uma imagem completa. Durante a pesquisa, no
Banco de Teses e Dissertações da CAPES, a maioria dos arquivos estão protegidos,
isso gera um esforço adicional para a conclusão das leituras, os textos precisam ser
modificados em programas e sites especializados e sem garantia de sucesso imediato
da tarefa de reconhecimento óptico dos caracteres.
39
b) Usei três processos de leitura com os textos nas máquinas. O primeiro acontece ao
computador, usando um programa gratuito chamado Dspeech, todo o conteúdo escrito
dos caracteres é copiado e colado no interior da interface do software, com isso
pronto, adicionamos uma voz de leitura em português brasileiro sintetizada e
acionamos a leitura. No outro caso, por preferência, uso o leitor de tela do iPhone,
sistema operacional iOS12, Voice Over. Os arquivos que desejo ler são enviados via
WhatsApp para o celular e por conta do compartilhamento entre aplicativos, abro o
texto científico no próprio WhatsApp, ou se o volume for muito grande, acima de 20
páginas, compartilho com outro aplicativo, o iBooks, ao comando de dois dedos
simultaneamente passados de cima para baixo no monitor do aparelho, inicia-se a
leitura. Em ambos os casos, Dspeech e Voice Over, há o controle de velocidade de
leitura. Contam como motivos a minha preferência pela leitura via WhatsApp pela
liberdade e facilidade de ter acesso enquanto ando, uso ônibus e UBER, além de poder
parar onde quero e voltar de onde pausei, isso não acontece com o PC, pois se
deixamos uma leitura para o outro dia, ao desligar a máquina, perdemos as marcações,
com o celular, não. Por fim, fiz uso de textos copiados para dentro do Bloco de Notas
do Windows. Nesse processo, toda a informação literária excluindo gráficos, é copiada
para o interior da interface do programa configurado para fonte 140, na preferência do
tipo Arial por ser menos poluída com detalhes. Dessa maneira, o texto fica enorme e
com as setase o teclado, acima e abaixo, posso navegar com a leitura ampliada e na
posição de plano inclinado nos mesmos moldes do monitor do PC.
c) Mesmo com toda a prática que possuo, o processo ainda é muito lento, barreiras como
textos envelhecidos, rabiscados, fotocopiados, protegidos, faltando páginas,
modificados irresponsavelmente, contaminados com vírus, liberados somente se
oferecermos um e-mail, com títulos numéricos ao invés de palavras, título de um,
conteúdo de outro, entre outros, são fatos comuns e bem frequentes. Ao mesmo tempo,
essa possibilidade tem dado a nós, pessoas com deficiência visual, um ganho de tempo
em relação a preparação de livros em Braille, no mesmo sentido, não dependemos por
mais vezes de outras pessoas para alcançar obras na internet.
d) Hoje, com o amadurecimento da internet as possibilidades de acesso a livros e
textos tem se ampliado drasticamente. Por outro lado, alguns títulos não estão prontos e
disponíveis na rede.
Dessa forma, principalmente na formação superior e stricto sensu, a demanda por
novos e velhos materiais é constante, faz da tarefa de varredura dos livros impressos uma ação
40
que contabiliza tempo e poderia vir descrita no cronograma dos projetos sem pestanejar. Nesta
tese, com auxílio de alunos bolsistas do Núcleo de Acessibilidade da UFAM, preparamos mais
de 30 unidades de livros para usufruto de pessoas cegas, me incluindo também.
41
Fantini et. al. (2016), aponta que em um recorte de tempo entre 2001-2013, a ABEM
conseguiu registrar em seus anais de eventos, 67 textos relacionados a EME2. Ainda as
autoras confirmam, dentro de outro recorte, 1992-2014, uma única publicação na Revista da
ABEM com os mesmos critérios.
Em relação a outros repositórios verificados nesta e na pesquisa de Fantini et.
Al.(2016), como a Biblioteca Digital de Teses e Dissertações(BDTD), Banco de Teses e
Dissertações Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior(CAPES), anais
da ANPPOM, Simpósio de Cognição de Artes Musicais(SIMCAM), Revista de Educação
Especial(REE), Revista Brasileira de Educação Especial(RBEE) e pelos melhores motivos,
buscamos os aglomerados derivados do Programa de Pós-Graduação em Educação Especial
(PPGEEs) da Universidade Federal de São Carlos(UFSCar), a ABEM se coloca como o mais
importante veículo preocupado e de acordo com os seus objetivos, principalmente com a
inclusão nos diferentes modelos apresentados.
Estabelecemos em uma tabela as novas verificações da defasagem do Estado da Arte
de Fantini et. al. (2016), o qual este, verifica textos até o ano de 2014 para os congressos,
2013, para os encontros regionais, 2015, para as publicações da Revista da ABEM,
2
Sigla que vamos usar constantemente durante a redação do texto. Educação Musical Especial. Ainda que os
termos existam de modo singular, Educação Musical e Educação Especial (Inclusiva), ao mesmo tempo, abre-se
uma possibilidade de unificação, tanto em um, quanto no outro, o atendimento é fundamentado em modelos,
paradigmas da prática especializada para o acesso e aprendizado dos conteúdos. Quando o professor possui em
sua classe alunos inclusos pela diversidade de um quadro de deficiência ou altas habilidades, da mesma maneira
que ocorre em outros quadros mais convencionais, o atendimento se especializa e as teorias pedagógicas da
música em aprendizado se adequam ao novo modelo de interseção.
43
TABELA 2 – Indicador quantitativo das produções nos canais mantidos pela ABEM em um recorte de
tem entre 2015-2018
Locais de Busca Período da busca Número de estudos
selecionados
Revista da ABEM 2015-2018 07
Anais de congressos e 2015-2018 34
encontros da ABEM
Total 41
O levante para a Tabela 02 acima teve como critérios básicos e norteadores a presença
dos seguintes léxicos: inclusão, especial, inclusiva, deficiência, deficiente, baixa visão, cego,
cegueira, transtorno, espectro, autismo, autista, síndrome, surdo, surdez, auditivo,
superdotados, altas-habilidades, acessibilidade, acessível, Braille, LIBRAS e visual, criando
um filtro mais apurado em relação ao corte das outras autoras que verificaram também todos
esses aspectos.
Cabe comentar que nem sempre a presença das palavras de busca nos títulos dos
elementos publicados inicialmente verificados indicava textos de EME, desse modo, foram
feitas leituras de todos os resumos ou introduções para refinamento da pesquisa.
Além de enriquecer a pesquisa, empregamos esforços para que um caminho ao qual
aumenta a preocupação com o tema sendo defendido nos debates da ABEM. Eu, como uma
pessoa com deficiência, somo minha curiosidade em perceber como o público alvo citado no
Decreto nº 7.611/11 é atendido em relação ao aprendizado e apreciação da arte musical como
conteúdo formador. Em 30 anos, como aponta Fantini et. al. (2016), 68 formas de texto foram
contabilizadas enquanto neste nosso levante, em apenas 4 anos, 41 novos estudos foram
dedicados a EME. Com isso, é afirmativa a apresentação das contribuições sociais da ABEM
para a comunidade e os interesses para benefício de todos.
Inserido nos Congressos e Encontros da ABEM temos o Grupo de Trabalho (GT)3.3,
“Educação Musical e Inclusão Social”, presente e impulsionador para as ideias
compartilhadas. Veremos abaixo na Tabela 03, a pluralidade dos temas abordados dentro deste
GT. Como resultado, o empenho em trazer para a tese a importância da associação é de
declarar que temos hoje, respeitosamente falando, um local de ampla discussão, democrático e
científico, realmente grande em relação aos outros repositórios relevantes para este estudo, em
44
1
1 3
2
TEA Deficiência Visual
Formação Estado da Arte
é líder até a publicação do relacionado das autoras, porém, como consta, estudos direcionados
ao TEA vem adquirindo destaque em relação aos demais. Por outro lado, é constante a
observação para a educação musical com pessoas com deficiência visual. Em um dos casos, a
presença do tema interligado ao ensino superior, clara percepção sobre os efeitos dos esforços
de antes para que haja mais inclusão, não somente em classes do ensino básico, mas, como
desejamos sempre, nas mais altas e diferenciadas camadas do ensino facultativo.
Por fim, é um belo material escrito em espanhol dos autores Giesteira et. Al .(2015),
tratando das necessidades de uma inclusão musical para alunos cegos com uso da
musicografia Braille. Estudo destacado por conta da oportunidade de dar voz a quem de fato
usa o Braille depende dele para tocar.
Os congressos da ABEM são bienais, tendo a última versão sediada em Manaus pela
UFAM. Tendo percorrido em todas as regiões do Brasil, a associação presta um serviço de
integração com seus membros durante os eventos nacionais. Nestes mesmos, junto aos
encontros regionais é que temos o maior contingente de publicações e são gerados anais de
muito valor para a comunidade pedagógica musical, além das discussões sobre concursos
públicos e público alvo do aprendizado musical.
Desse modo, o congresso oferece também a oportunidade de práticas e trocas de
experiências, contando, de maneira agradável, com a difusão das culturas de nosso imenso
país por meio de performances musicais e números locais por onde ocorre.
Dentro do recorte de tempo entre 2015-2017, os dois congressos puderam ofertar
publicações relacionadas ao tema EME, sendo ainda na maioria, a deficiência visual o mais
presente dentre os demais. Um destaque está para 02 estudos dedicados à educação musical
para surdos, mesmo sendo um tabu para alguns. Meu convívio com amigos e colegas
deficientes auditivos confirma essa abertura para o encontro dos dois universos de linguagem,
nem sempre a música é ouvida, mas sim, sentida. Em outro caminho, dos 14 trabalhos
publicados, 07 classificamos como dedicados à formação, no entanto cabe uma crítica séria
quanto a falta de delimitação das categorias de público alvo tratado nos textos.
Está disposto no Decreto nº 7.611/11, acima citado, que há distinção entre as
deficiências físicas, e um trabalho verossímil aos anseios sob nossa observação, hoje, não
comporta mais amplas delimitações. Além destes, temos uma representação de esforço para
um estudo de levantamento do Estado do Conhecimento de artigos científicos voltados à
inclusão social.
O site da associação disponibiliza os anais de 10 edições do congresso, sendo
verificadas especificamente as duas últimas para o Estado da Arte desta tese. A exemplo de
46
outros repositórios, que a ABEM é o mais importante espaço contendo a soma das abordagens
músico/inclusivo em classes regulares de ensino, especializadas, professores e alunos em
constante formação. Contudo, nossas estratégias de formação seguem as hipóteses levantadas
pelo projeto desta pesquisa, o mito relacionado à união evidente entre deficientes visuais e a
música vem sendo contabilizada na comparação da maioria absoluta de estudos desde a
fundação da ABEM no Brasil.
Gráfico 02 – Demonstrativo gráfico das publicações nos congressos da ABEM por área (2015-
2017)
1
2 4
7
Deficiência visual Formação Deficiência auditiva Estado da Arte
Gráfico 03 – Demonstrativo gráfico das temáticas abordadas nos Encontros Regionais da ABEM
(2016-2018)
1
3
6
3
2
3 Def. visual Def. Intelectual
Def. auditiva TEA
Formação Superdotação
Ainda que para esta pesquisa tenhamos coletado dados como, trabalhos de teses e
dissertações em todo o repositório reconhecido pela CAPES, a ABEM quando mantém o
GT3.3 de inclusão social, colabora para um amadurecimento e visibilidade da acessibilidade
no campo da música. Neste caso, nos preocupamos em destacar para o corpo de discursão,
estudos que tivessem relação, sobretudo em seus títulos, com a deficiência visual e a música.
Por outro lado, percebemos que o autismo vem sendo trabalhado com mais frequência
para os dados tabulados. Como resultado, a crescente verificação de assuntos mais
diversificados, percorrem na totalidade o público alvo do AEE, vimos cada assunto sendo
registrado dando início ao fortalecimento do GT nos debates da ABEM.
Sob análise, os resumos verificados desenham como o nosso país, mesmo gigantesco,
possui problemáticas muito aproximadas.
Em outras palavras, certas inquietações são semelhantes mesmo com diferentes
realidades. Contudo, é possível perceber que o número de autores se divide entre pessoas que
tem um envolvimento direto por possuírem parentes próximos com deficiência ou
superdotação, e outros, cuidadosamente dedicados por amarem a causa.
Charlton (1998), após retumbantes debates sobre as pessoas com deficiência na
Europa Central, defendeu a posição dentro dos grupos associados com a propagação do
slogan “No thing about us withouus”, sendo amplamente deferido no Brasil com a tradução,
“Nada sobre nós, sem nós”. Com isso, a análise dos textos coloca o sujeito em observação na
maioria dos casos, visto aqui criticamente como uma abordagem a ser modificada de hoje
para diante.
A Associação é a primeira a dedicar um Grupo de Trabalho especialmente inclinado
48
TABELA 06: Dados organizacionais dos títulos levantados para o Estado da Arte da pesquisa no
repositório da ANPPOM. Neste temos informação do título levantado no Congresso Nacional da Associação.
ANPPOM
Autor(s) Tipo Titulo Ano
Renato Brandão Artigo A cor do som: processos de reconhecimento da 2016
imagem do som por meio da
Rosemara Staub completo
semiótica nas relações entre deficientes visuais e a
de Barros música
TABELA 07: Dados organizacionais dos títulos levantados para o Estado da Arte da pesquisa no
repositório de teses e dissertações da CAPES. Neste temos informações de todos os bancos de programas
cadastrados no país.
CAPES
Autor(s) Tipo Titulo Ano
Dissertação Música e deficiência visual: 2016
Edibergon Varela Bezerra os processos de aprendizagem musical no
projeto esperança viva
Layara Feifer Calixto Seco Dissertação Mediações motivacional e inclusão para 2017
musicistas cegos
JOYCE SIQUEIRA Dissertação Brailleécran: uma abordagem 2017
para entrada de texto em braille para
smartphones
OZANI PEREIRA DE Dissertação Musicografia Braille: estratégias e recursos 2017
OLIVEIRA MALHEIROS para a formação musical da pessoa
normovisual, cega e/ou com deficiência visual
pesquisadores iluminem quadros mais diversos relacionados com os impactos da arte para a
inclusão ou mesmo o inverso disso.
Além destes itens literários, outros títulos também foram consagrados pela
aproximação temática que no decorrer do estudo serão apresentados e inseridos no debate de
nosso trabalho. A arte, como um todo, nas mais diferentes linguagens, vem, associada
pudemos observar, sendo progressivamente cultivada como um agente importante no processo
de assimilação, desenvolvimento, instrumentalização, análise, metodologia e objeto crítico,
quando temos ações pedagógicas com o público alvo de AEE. Como resultado, após a
verificação dos itens levantados neste Estado de Conhecimento, veremos por meio de suportes
teóricos atualizados, um diálogo entre jovens autores que compartilham suas experiências na
educação especial e na arte para auxílio de nossas considerações finais.
Em uma primeira abordagem dos conteúdos apresentados para este Estado do
Conhecimento, algumas particularidades identificadas nos forçam, por motivos de
organização, a dividir os perfis em quatro modelos aproximados entre si. As camadas
representadas pelas letras estão identificadas no Gráfico 04.
a) Processos Socio Culturais – são trabalhos que versam sobre história, movimento de
recursos tecnológicos para a vida diária, condição humana e variedades da rotina de
um indivíduo, não necessariamente aluno, com deficiência visual.
b) Processos de aprendizagem – são trabalhos diretamente ligados ao ensino de música
para cegos ou pessoas com baixa visão.
c) Musicográficos – destes temos resultados do uso do Braille sendo ou não sendo uma
alternativa de codificação da linguagem convencional musical para o universo da
leitura a partir de sinais em alto relevo.
d) Processos de aprendizagem no ensino superior – nestes casos, é identificado como
uma corrente inovadora de pesquisa para a chegada de alunos público alvo do AEE
nas camadas superiores do ensino do Brasil.
GRÁFICO 04: Distribuição dos perfis dos trabalhos até aqui levantados.
2
5
4
7
A B
50
12
10
10
8 7
2 1 1
0
2015 2016 2017 2018
Além dos repositórios mais importantes no Brasil, fizemos uma busca pelos canais
estrangeiros dando ênfase a publicações na Europa e Estados Unidos da América. Entendemos
assim pela proximidade e domínio dos idiomas verificados e realidades distintas, essa
variedade de produções em países desenvolvidos. Para tanto, fizemos uma busca com
palavras na língua inglesa em equivalência às mesmas deferidas nas buscas nacionais. Mesmo
em repositórios europeus, foi viabilizada a busca com base nas publicações dos abstracts
habituais.
Para a pesquisa fomos nos seguintes repositórios:
TESEO – é um sistema de teses e dissertações internacional que viabiliza buscas a
partir de ano, autor e, instituições e palavras chave. Disponível em: <
https://www.educacion.gob.es/teseo/irGestionarConsulta.do;jsessionid=053836327DB
F8A7ACB053EB6995B2F9E>
DIALNET - é uma das maiores bases de dados contendo itens científicos de perfil
Ibero-americanos. Apresenta uma interface descomplicada e modo de busca avançado
por ano, autores e instituições. Disponível em: < https://dialnet.unirioja.es/tesis>
51
2.4 Análise dos sistemas de relações e estratégias do aprendizado musical por alunos com
baixa visão.
plano educacional hoje. Na primeira LDB não se lê nem as palavras inclusão, diversidade e
deficiência. Em 1971, com a LDB 5.692, começamos a verificar, contido no “Art. 8º [...] a
inclusão de opções que atendam às diferenças individuais dos alunos[...]” e uma mesma
preocupação creditada ao atendimento do Conselho Nacional de Educação da época que diz,
também no I Capítulo, “Art. 9º Os alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os
que se encontrem em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os
superdotados deverão receber tratamento especial”.
Eu nasci em 1976, entrei na graduação em 1996, e como foi dito neste resumo, durante
meus anos de estudo básico e superior, pouco ou quase nada tive de atendimento
especializado formal. Ao contrário destes, o auxílio que tive, veio da solidariedade de muitos,
também encarado como uma ação inclusiva inconsciente e válida. Entendo a inclusão na
perspectiva da educação especial como uma onda que hoje, com força e caudal, arrebenta nos
recifes do nível da pós-graduação, se a lei se aplica a todos os níveis, ainda é pobre a visão de
determinados programas que não viabilizam as mesmas diretrizes que completam 20 anos de
aplicação na educação básica.
Em 1996, após nossa última constituição em 1988, ao enriquecer pela mentalidade
coletiva, o disposto na Lei nº 9.394 deste mesmo ano, no 3º Título legal, “III - atendimento
educacional especializado gratuito aos educandos com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, transversal a todos os níveis, etapas e
modalidades, preferencialmente na rede regular de ensino;” , tal como “§ 3º A oferta de
educação especial, nos termos do caput deste artigo, tem início na educação infantil e
estende-se ao longo da vida[...]”.
Em nossa maior carta legal, a Constituição de 1988, no Capítulo VII, da família, da
criança, do adolescente, do jovem e do idoso, dispomos da criação de programas que auxiliem
a coletividade ainda que existam obstáculos sociais, arquitetônicos e sendo específico, na
música. Desta iniciativa, nascem as primeiras investidas de “contaminação” das boas ideias
para uma melhor inclusão. Fantini et al (2016) demonstra que os artigos em EME são
significativos pela propriedade latente de trazer para o meio todas as possibilidades e sujeitos
para o desenvolvimento humano. Nestes 30 anos desde a Constituição, passamos a ter mais
espaço destro dos eixos de produção científica e um olhar mais esclarecido por parte de pares
e lideranças em geral.
Raul Seixas (1945-1989) revela em uma de suas canções que nascemos há 10.000
anos atrás, ou seja, trazemos conosco o acúmulo de todas as conquistas provindas dos erros e
acertos humanos, e hoje, diante do que temos aqui defendido, vale considerar a Declaração
53
Universal dos Direitos Humanos(DUDH), Nações Unidas, 1948, como a base para usufruto
do posicionamento das mentalidades atuais. Não há transição sem impactos, dor e reflexões.
Quando digo que não tive auxílio formal para minha educação, é uma verdade, mas, longe de
uma sensibilização penosa, defendo aqui que se notem como foram positivas as mudanças em
nosso planeta para o desafio da inclusão. Para tanto, em 2006, a DUDH é orientação para a
Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência para o Brasil.
Para Mendes e Oliveira (2017), o aprendizado musical se prevalece do sugerido como
“1 - Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos
nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião,
opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou
qualquer outra condição.” Em Matias (2016); Bezerra (2016) e Rodrigues (2018), textos
propostos relacionados à criação de programas e diminuição dos impactos sociais por meio da
música, são bons exemplos que relacionamos na consolidação do alcance dos direitos
humanos nos dias de hoje.
Diante dos fatos, nossa intensão, não é debruçar pela intimidade dos dispositivos e
documentos legais como depósito dos mesmos aqui. Na verdade, objetivamos por meio da
autobiografia apresentada, colher sob as leituras dos dados, como a música vem se
aproximando deste contexto de promoção da inclusão pela educação especial. Dados estes,
que inclusive geram o termo de Educação Musical Especial e com isso, iluminar os processos
sociocriativos da arte associada à possibilidade sem diferença das humanidades e liberdade de
expressão.
Considerando Fantini et. Al. (2016), passamos a apreciar o desenvolvimento da
temática da ENE nas derivações dos esforços surgidos, pelo menos, nos últimos 30 anos.
Nasci durante um período que manifestava suas considerações sociais em relação às pessoas
com deficiência de modo muito peculiar, lembro dos momentos, uma moça que trabalhava na
casa de meus pais, e por consequência, cuidava de mim e minha irmã, dizendo, quando íamos
brincar na praça de perto de nossa casa, no fim da tarde, crianças correndo e no meio delas,
um garoto, hoje meu conhecido, que usava cadeiras de roda, vítima da tão temida Paralisia
Infantil Nossa babá, dentro do que lhe constituía, nos falava, aqui imaginando sua fala, “estão
vendo aquele menino aleijado?”, e nós, com os olhos arregalados, acenávamos balançando a
cabeça em afirmativo, daí ela resolvia, “ele é assim por conta de um castigo de Deus,
desobedeceu sua mãe e Deus o castigou”. Nesse contexto, podemos verificar, não
diferentemente de qualquer localização no Brasil, as mentalidades vêm se transformando, em
minha opinião e como vemos no texto das autoras, para melhor.
54
Com base nas minhas experiências de vida tendo os dois lados bem preservados, vidência e
baixa visão, posso compreender que o processo de transformação das ideias tem seu ritmo de
acordo com a melhoria do acesso a educação.
Tanto Fantini et. Al.(2016), quanto Finck (2017), demonstram o quanto a instrução é
libertadora em qualquer aspecto. O surgimento de novos cursos de Educação Artística e
depois da individualização das linguagens nas IES brasileiras é o mais fácil demonstrativo
dessa condição. Nosso país, em contraste com os demais centros de formação na Europa e
América do Norte, ainda é jovem, possui programas de pós-graduação recentes e mais
particular, em nossa região norte e nordeste, tudo é muito infantil se podemos dizer assim.
Como resultado, os 126 itens levantados por Fantini et. Al. de 1991-2014 e os nossos 19
artigos dentro do recorte de 2015-2018, contabilizam, 145 propostas de intervenção, análises,
projetos, observações e relatos sobre o tema.
Em uma ordem crescente, temos a maioria dos escritos verificados como artigos
contidos em anais de eventos acadêmicos, dissertações, artigos em periódicos especializados e
teses de doutorado. Como recurso técnico, todos os elementos de estudo adquiridos para este
Estado da Arte foram transformados, quando necessário, para ao formato de PDF original, ou
seja, passivos de seleção e cópia de seus conteúdos escritos. Dessa forma, para melhor
diagnosticar, associado ao nosso interesse, a quantidade de vezes que os léxicos cegueira,
cego, visual e baixa visão, são utilizados nos estudos. Para os textos em língua estrangeira,
fizemos a busca pela palavra equivalente na língua original para os mesmos fins de
conhecimento. Abaixo veremos na tabela os resultados.
TABELA 09 – Demonstrativo da quantidade citada, pelo menos uma vez, dos léxicos de interesse na
pesquisa:
Léxico Utilização por texto
Cegueira 16
Cego 16
Deficiência Visual 23
Baixa Visão 08
somos mais de 80%, inseridos na comunidade global de deficientes visuais, como pessoas
com baixa visão, o quantitativo de cegos é muito baixo em relação ao que é inventado na
cabeça do sensu comum.(OMS, 2018) Em outras palavras, pudemos identificar que certos
autores tratam00, algumas vezes, três categorias, cego, baixa visão e deficiente visual, isso
não se aplica. Finck (2016 e 2017), Giesteira (2015), Brandão (2016 e 2017), são exemplos de
uma boa preocupação com a referenciação correta dos termos empregados.
Ainda em relação à Tabela 09, existem distorções sobre patologias de sintomas
correspondentes a baixa visão sendo deferidos como cegueira. Nos casos apresentados, os
autores precisam da comprovação dada pelo sujeito de como se considera, mesmo possuindo,
por exemplo, síndromes degenerativas que causam baixa visão, esses podem ter percepções
cegas do mundo. Esse tipo de preocupação dentro das investigações é séria, quase na
totalidade dos estudos verificados, temos ações pedagógicas voltadas ao AEE em EME, um
erro hoje, impede o crescimento que estamos tendo ao longo de toda evolução conquistada
desde os documentos internacionais sobre os Direito Humanos.
Acompanhando a estrutura de Fantini et. Al.(2016), vimos as seguintes inclinações de
estudos: “conhecimento sobre alunos atendidos; Conhecimentos sobre/dos professores e
formação de professores; Processos de ensino/aprendizagem; Recursos na educação musical
especial; Processos inclusivos; Programas de ensino/projetos; Métodos de ensino/teorias;
Instrumentos de avaliação musical; e Revisão/resenhas”, sendo este último, a única deferência
não contemplada.
Após cuidadosa leitura de todos os itens levantados, verificação quali-quantitativa,
reflexão por minhas próprias considerações por ser uma pessoa com baixa visão, vejo que há
um hiato em relação ao posicionamento do sujeito, sempre investigado e raras vezes escutado,
sobre o que podemos fazer em relação a nossa própria condição humana.
Em outras palavras, nossa tese se fundamenta em dar além de voz, mas, profundidade
ao potencial criativo, guardando as devidas proporções, de como as pessoas com deficiência
podem ir ao encontro de seus sistema de formação, não somente recebendo ações, mas
também promovendo ações de inclusão para si, dando dimensão a sua luz como pessoa antes
mesmo de sua deficiência.
Desse modo, sem quaisquer críticas danosas ao tamanho esforço dedicado pelos
colegas autores, mas é hora de termos uma proposição sobre o papel colaborativo, neste caso,
do DV com baixa visão, na atuação com sua autonomia tendo como viés de propagação a arte
e a educação.
56
Lembro-me de quando tinha meus 12 anos, disse ao meu pai, “Quero ser músico”.
Com medo de sua resposta ao interpretar minha decisão, até então convicta, imediatamente
lhe disse, “Músico de verdade, pai”. Ele, diante de um desejo incontido, engenheiro de
estradas, dono de um assovio afinadíssimo, me disse, “Seja o que quiser ser, tenho certeza que
irás ter essa condição, eu amo música e fico feliz com isso”. É claro que as palavras aqui são
suposições de uma lembrança presente e fraca de detalhes, por outro lado, senti que o
caminho estava aberto para uma fluidez de quem eu era supostamente. Desse modo, as
relações interpessoais são fundamentais para qualquer processo. Brandão (2016) se refere a
confiança estabelecida entre professor e aluno, uma vez conquistada, o docente cria as
imagens que precisar na cabeça do estudante pela forma com que tais relações ficam claras.
De fato, me tornei um músico, profissional e atuando nos melhores e piores palco da
cidade. Desde quando eu havia reconhecido uma clave de sol de forma diferente de um “S”
estilizado, a música escrita passava a ter um valor ou sentido próprio. Como contexto, Manaus
era uma cidade reconhecida no Brasil pela Amazônia, sua Zona Franca e corredores de lojas
dos artigos importados com os melhores preços do país. Por outro lado, ainda nos
deparávamos com certas insuficiências e uma delas era a ausência de modelos escolares
específicos para o aprendizado musical. Isso, passado no fim da década de 1980, fazia de nós,
amantes da música, meros perseguidores de revistas e fitas VHS que continham alguma
novidade e ler música, era o apogeu de uma condição destacável.
Em 1989, eu apresentava indícios de estava perdendo a visão, ao mesmo tempo,
estudava música por meios tradicionais, lia partituras e meus erros, durante as leituras, me
induziam a procurar modos de enfrentar os ralhos da professora, na sua condição, como me
refiro a nossa capital da época, nada sabia sobre inclusão. Hoje, como podemos ver em
Fantini et. Al.(2016), dada a quantidade de títulos publicados, e Finck (2015), chamando
atenção para a nova formação de educadores musicais, ser um agente promotor da inclusão é
algo mais presente e rotineiro do que 30 anos atrás. Porém, em defesa de minha professora, ali
eu determinava mecanismos de adaptação a uma nova condição gradativa de perda da visão,
principalmente na música, pois eu queria ter o status de leitor intérprete.
Cardozo e Silva (2014) abordam questões sobre a relação entre o sujeito e seu meio de
interesse. Para melhor dizer, vejamos o que é se relacionar pessoalmente no fio descrito e ao
57
mesmo tempo em um grupo de caridade da igreja. Não que seja uma regra se socializar bem
na igreja e se digladiar na arena de valores, mesmo porque tal fato pode estar diretamente
inverso em situações reais. Por outro lado, as autoras buscam o amadurecimento da ideia para
a produtividade. As boas relações provêm de caminhos que nos devolvem ao profissionalismo
e bem estar. Uma vez que eu houvesse dito ao meu pai, “Vou ser um músico de verdade”,
interpretamos que os meus interesses culminavam ao mesmo tempo por dois caminhos.
Keenan Jr e Finck (2017) quando descrevem a chegada de alunos DVs no ensino
superior de música, logicamente não podem adicionar todas as histórias de vida para o
decorrer do processo. Vejamos aqui que faço uma análise autobiográfica de uma realidade
distinta em muitos casos e em outras, trazemos parâmetros mais globais do enredo. No jargão
musical é comum brincarmos sobre a verdadeira função social do músico, ainda vemos como
poucos enxergam a música como forma de vida, mentalidade criada por mais fórmulas
discursivas sobre ganhar dinheiro. Eu venci justamente por conta da música. Por conta de
meus interesses em relação a ser “músico de verdade”(p.12).
Ainda Keenan Jr e Finck(2017) abordam os recursos atualmente disponíveis em IES
brasileiras para acolhida de alunos DVs, sobretudo, em cursos de formação musical. Nos
núcleos de acessibilidade (Brasil, 2011), materiais didáticos adaptados, internet banda larga,
tablets, smartphones, PCs e o advento de políticas públicas afirmativas, são elementos bem-
vindos e consolidados para a efetivação da qualidade do ensino e aprendizados musical na
graduação. Ao contrário disso, longe de tentar sensibilizar pelas palavras, não usufrui de
qualquer recurso descrito, sou filho de um tempo em transformação e auto aceitação. De outra
forma, passava horas criando mecanismos de adaptação para o tamanho de meu interesse em
aprender. Desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, Paris, que
somatórias de investidas têm sido tomadas para benefício da inclusão de todos para todos.
Logicamente, nestes 71 anos de proclamação, vejo de forma muito otimista e positiva que
sofremos avanços importantes.
Manaus, não diferentemente de outras cidades no mundo, teve, por conta da qualidade
comunicativa mundial, seu tempo para de fato entrar em um contexto de pertencimento dos
valores do globo. Por consequência, meu diagnóstico de baixa visão em 1992, só ocorre
quando consigo sair da capital para Porto Alegre, sendo um centro mais avançado. Tal
propósito ilustra como Cardozo e Silva (2014, p01) dispõem, em uma relação em
desenvolvimento, certas coisas antecedem o “[...]autoconhecimento, empatia, autoestima,
cordialidade, ética”, é a qualidade do modo como se comunicam as pessoas.
É muito comum verificarmos em breves visitas a centros universitários de formação
58
musical a diferença entre músicos eruditos e populares. Em casos mais extremos, essas
divisões são prediais. Para Camelo (2017), Giesteira (2015), Koepsel&Baier (2019), Matias
(2016), é importante ter acesso ao que leva um aluno DV a estudar ou dar preferência em
estudar música. Os artigos mais recentes pouco valorizam essa matéria. Digo que quando
decidi ser músico, ainda tendo um curso unificado de Educação Artística, não pensava em
relações formadas por e pela música erudita ou popular. Vi pela primeira vez uma orquestra
filarmônica em 1998, durante um ensaio que fui convidado para tocar no Bumbódromo em
Parintins, ilha do Rio Amazonas onde ocorre todo ano a festa de Boi Bumbá.
Mesmo diante daquilo, daquele poder sonoro e acústico, não vi diferença, tudo era
música e nada mais. Desse modo, cresce como crítica a essa convenção de que música vem
depois de partituras, ao contrário, a música que fez com essas fossem criadas. Bouabid (2015,
p07) observa que “D’après nos enquêtes de terrain, les musiciens aveugles et malvoyants se
révèlentêtre de plus en plus nombreux à s’orienternatur ellementvers le jazz et la musique
populairedont l’exécution ne necessite pas lere cours à une partition musicale”. Nossa
tradução: A partir das pesquisas realizadas em campo com DVs, o autor pode perceber que há
uma movimentação de interesse por estes para o Jazz e estilos populares, práticas que não se
apoiam em leituras de partituras convencionais.
Hoje, toco para ser feliz, porém, minha formação docente por várias vezes induziu a
condicionar alunos regulares a leituras sistemáticas de partituras e confesso que todos os
projetos de maior aceitação e produtividade fugiram desse viés. Ainda que o debate seja
amplo, não faço aqui um juízo de valores sobre usar ou não a leitura convencional, mas me
refiro a como ensinava mais feliz quando estava dentro de meu campo de ação, não lendo e
ensinando aos pequenos música por meus meios, éramos muito mais felizes (Cardozo &
Silva, 2014). Buscamos epistemologias menos soberanas, somos mais próximos, alunos e
professores, do que antes, assim vem caminhando nossa humanidade e a convivência entre
popular e erudito somada, logicamente, aos exemplos fabulosos, passamos a conhecer
melhores valores dessa união, ou melhor dizendo, dessa única coisa que jamais foi diferente
entre si.
Reilly destaca com ênfase a figura tanto rural como urbana do músico cego. Com isso,
a autora adiciona uma triste consideração sobre o país que vivemos. Somos uma nação em
desenvolvimento e por consequência, é inevitável a associação entre deficiência e
miserabilidade. Nesse sentido, a “[...] fragilidade do lugar social ocupado pelo cego músico,
que carrega historicamente a bagagem do assistencialismo, da marginalidade e da miséria, por
um lado, e do mito da superação do infortúnio e da compensação da perda visual pela
59
(Carterjackieee, 2016).
Charles, segundo Clarck (2017), valoriza a figura de um professor de piano por sua
didática. Ainda criança, mas cego, escutava impacientemente WyliePitman tocando, queria de
qualquer modo interferir na performance do artista. Pitman, para Charles, foi o maior
responsável por sua inicialização musical. Relata que mesmo sem autorização, sentava-se ao
lado do pianista e tocava as teclas com todos os dedos da mão. Ao contrário de uma reação
muito comum, Wylie acreditou no potencial de Ray e passou a lhe ensinar a pianística de
forma correta e inclusiva.
Para Bouabid (2015), quando cita Ray Charles, os processos de cognição são formados
independentemente da condição visual. Por outro lado, o fator de manutenção da memória,
neste caso, aflora juntamente com a percepção dos intervalos e alturas de notas no piano.
Ainda o autor diz, o piano, por ser temperado, ou seja, ter notas distintas em um único local
do instrumento, é facilitador em relação a outros instrumentos, como exemplo, o violino.
Clarckescreve, “When Mr. Pitman started playing, whatever I was doing I'd stop to go in and
sit on that little stool chair he had there” (2017, p. 02).
Ray Charles comenta que após uma tragédia em sua vida, a perda do irmão mais novo,
afogado enquanto brincavam em uma banheira, passou a perder a visão. Lembra-se das
tentativas de estagnação por parte dos médicos e da mãe. A única recomendação era o
afastamento de luz intensa. Em Carterjackieee (2016), ele mesmo diz que ao mesmo tempo
em que lembra como são as estrelas, lua e sua mãe, a música lhe traz essas convicções, daí a
inspiração de suas canções.
Após a constatação de cegueira, sua família o matricula na Escola de Surdos e Cegos
St. Agostin, em St. Agostinho. Mesmo com pouca instrução, sua mãe, completando somente
até a 4ª série, segundo Charles, foi a maior responsável pela sua adaptação para o mundo sem
luz. Infelizmente, quando Taylor Hackford dirige o filme biográfico, pouco se vê da relação
de perda visual, mãe e vida musical, pois o que há é uma cena em que o pequeno Robinson,
aos 07 anos, se depara com a cegueira e os sons da fazenda onde morava. Sua mãe, nesse
sentido, só o observa e chora por perceber no filho um potencial de fato.
Na escola de atendimento específico, Charles tenta iniciar-se ao piano, mas as turmas
sempre estão lotadas, dai, por influência de um professor, seu primeiro instrumento
musicalizador é o clarinete. Para Clark, Ray, mesmo em classes inclusivas, relata do
desconforto de ler 3 compassos com os dedos e depois ir tocar. “I'd read three or four bars of
music with my fingers, and then play it. You can't just sit there and play as you're reading the
music.” (2017, p.03). Giesteira (2015) comenta justamente esse fator como determinante para
61
músicos cegos partirem para estilos mais populares. Na Bouabid (2015) confirma que o Jazz e
o POP, são os preferidos para este contexto.
No caso de Ray, suas realidades populares em música vinham das rádios, tocando,
sobretudo, Blues, Gospel, Jazz e R&B, mas tarde, esse último, por própria influência de
Charles, transformando-se em Soul Music norte-americana. Na escola da StAgostin o
conteúdo musical era exclusivamente de teor clássico. Quando Charles diz, “Even in my other
classes, I always felt that it was important to know what you were supposed to do and have
your lessons down, or at least have a working relationship with the music”. Em outras
palavras e nossa tradução, basicamente o aluno mostra como era importante saber sua posição
no “jogo”, ou seja, na metodologia aplicada na escola. Estamos avaliando uma realidade
americana da década de 1940, anos antes inclusive da Declaração Universal dos Direitos
Humanos.
A música clássica para Ray Charles era o caminho para o fim, “classical music to me
was a me anstoan end”. O que queria tocar era Jazz e Blues, porém, na concepção da época,
não tinha outra saída para organizar seu pensamento musical, teria de fato que aprender teoria
musical. Existia uma pequena confusão na cabeça dos filhos dos Robinson, a música ao
mesmo tempo em que era a mesma coisa, sendo clássica ou popular, fazia-se diferente em sua
mente. Isso acontecia, diz Bezerra (2016), precisamos dar proximidade ao que o aluno se
interessa tocar, a música é uma só, mas as culturas não são as mesmas.
Como estudante, Charles sempre estava tocando coisas que os outros escreviam para
ele. De certo modo, como ele mesmo diz, isso foi impulsionador para sua primeira e grande
satisfação na vida, escrever algo para os outros tocarem. Mesmo que as possibilidades no
StAgostin sugerissem a formação de grupos pequenos, no máximo 09 músicos, Ray se lembra
da sensação de imposição de sua liberdade, ouvir o que havia escrito por outros músicos era
muito excitante (Clark, 2017). Bezzera (2016) em sua avaliação das ações de educação
musical em ONGs acompanha os dizeres do músico cego norte-americano, é preciso dar
oportunidade para a criação, valorizar o íntimo e por consequência, a arte livre.
Com a perda da mãe, Ray, agora com 15 anos, passou a viver a vida pelas penas do
sofrimento da perda. Sua formação musical herdada da Escola St. Agostin foi sozinho para
Orlando e por lá iniciou, de fato, sua vida profissional de músico. Vivendo isolado de seus
familiares, conduzia em seu caminho os ensinamentos dados pela mãe. Ray Charles ainda
como um simples músico de bandas aleatórias, diz que o fato de ser cego sempre o favoreceu,
principalmente quando passou fome. As pessoas o acolhiam e lhe davam o que comer.
Pairava sobre Ray Charles uma “aura” de genialidade, algo bem percebido durante
62
suas apresentações ao vivo. Porém, nas leituras feitas sobre sua história, o mais evidente é a
sua automotivação e condição determinada de assumir sua posição como músico. Traz uma
vez ou outra, momentos que a deficiência foi favorável, por outro lado, ilustrando isso, o
momento que ele conhece Quincy Jones, um dos maiores produtores musicais do mundo,
percebe-se que sua formação em tempos de pouco atendimento educacional especializado,
foram determinantes para sua configuração mais como atendedor do que como atendido.
Assim, a partir das análises no Estado da Arte desta tese, precisamos criar movimentos que
promovam o encontro dos sistemas sendo o atendedor com o atendido, que haja equilíbrio e
força comum.
O músico morreu aos 74 anos em Los Angeles, rico e com 12 filhos. Ao que envolve
Ray Charles com este estudo, fazemos referência à boa vontade de muitos e inclusive a sua. A
educação musical especial que queremos hoje tem, sem dúvidas, suas origens nessas histórias
de sucesso e mesmo em contextos sociais diferentes, uma comparação é clara, nem a música e
nem a vida com deficiência são fáceis, porém não são impossíveis.
reconhecidos como importantes indicadores para uma constante reformulação das práticas
educativas, principalmente nas regiões norte e nordeste. Nesse sentido, vamos imaginar o que
seria a vida no interior, no sertão alagoano da década de 1930. Os níveis de ignorância eram
altíssimos e nesse contexto nasce Hermeto Pascoal.
Segundo Lima Neto (2009, p.23), o pequeno Hermeto “[...]foi alfabetizado pela
professora Zélia Gaia, homenageada na música nº 317: 339. Recusado pelos professores de
teoria de Caruaru devido à deficiência visual causada pelo albinismo,[...]” passou a aprender
teoria musical sozinho como podemos ver nos seus manuscritos das neumas3 do “Calendário
do Som”, livro que comporta 365 composições feitas uma a uma a cada dia do ano. Nascido
em uma família de sanfoneiros, coisa distinta e respeitosa no interior do nordeste brasileiro,
teve contato com a música inicialmente com os refugos de metais da oficina de seu avô,
ferreiro famoso na localidade. Desde muito pequeno, destacado por sua característica albina,
tendo baixa visão, diz não se sentir vigiado, ao mesmo tempo em que via tudo e nunca a
deficiência foi uma coisa triste, ao contrário, encontrava sempre uma forma de se beneficiar
de sua condição. Em Liang (2018, p.01), Pascoal diz, “nunca usei óculos quando pequeno,
mas aprendi a usar a vista assim mesmo. Quando era criança e andava a cavalo ou se o sol
estava muito quente, eu usava chapéu”. É muito comum pessoas albinas terem
hipersensibilidade a luz, principalmente do sol.
A vida nas condições socioculturais e econômicas da década de 1930 e 1940, pela
leitura que temos hoje, devia ser precária no sentido de dar cuidados específicos para qualquer
modalidade educativa. Quando o músico relata,“para enxergar bem, tinha que fechar um dos
olhos, mas aprendi a aproveitar aquilo que eu poderia achar que me atrapalhasse”(2013, p.03),
verificamos como a realidade que o excluía, ao mesmo tempo, lhe favorecia uma autonomia
gradual de acordo com seus interesses. Desse modo, lembro quando assessorava crianças com
nistagmo na rede municipal de ensino em Manaus, a maior parte dos problemas apresentados
era a incompreensão social e a falta de respeito ao tempo de cada aluno. Devemos dar mais
valor ao acréscimo de conhecimento da realidade patológica de nossos estudantes atendidos.
Por força de um contexto cultural do momento, Hermeto aprende a ler e escrever
partituras e indica suas dificuldades quando diz, “tenho deslocamento e fraqueza do nervo
óptico, então eu não fixo o olhar. Às vezes eu estou lendo partitura e me perco. Não consigo
parar para olhar, só se eu me preparar para balançar os dois olhos. Mas eu vejo tudo - até além
3
Antes da invenção da escrita musical em pautas de cinco linhas, o pentagrama, o registro musical era feito com
símbolos neumáticos, elementos gráficos que davam noção das propriedades do som para a musica, ou seja,
uma escrita não unificada e primitiva da intenção musical.
64
da conta!” (p.03). Para Cardozo & Silva, o pequeno músico foi atribuído, dentro de suas
relações de família e musicalidade com seus parentes, dos fatores básicos que “são o respeito,
a amizade, a cordialidade nas relações, a cooperação e o entrosamento dentro e fora da
organização” (2014, p.30).
Uma vez, eu estava na casa do Miles Davis e ele me convidou para lutar boxe. Ele
tinha tablado, luva, tudo. Aí o que aconteceu? No meu tempo de menino, eu também
brincava de boxe e as crianças sempre se confundiam para onde eu olhava. Eu me
aproveitava disso. Foi a mesma coisa com o Davis: quando eu comecei a brincar
com ele, o olho direito rodou para um lado, eu já estava com o esquerdo sabendo o
que queria e aí taquei a mão nele. Eu uso muito isso. Se não tivesse treinado os
olhos, veria muito menos (LIANG, 2018, p.01).
Ainda pequeno, com mais ou menos 08 anos, não tinha a concepção da deficiência
visual por motivos óbvios da natureza simples de sua criação, por outro lado, por não ver
como os demais, tinha a liberdade de construir um mundo só seu e a música foi a melhor saída
para essa tarefa. De acordo com entrevista fornecida para Liang (2018), “mas eu não sinto
falta de ver nada. Uso muito a inteligência, tenho um reflexo danado”. No mesmo sentido, em
Bial (2018), revela que seu primeiro instrumento foi a natureza, canos de mamona furados
como proto-pífanos lhe respondiam às imagens de uma paisagem rural sertanista.
Nos vídeos e textos revisados para esta tese, não vimos qualquer menção de Hermeto
em relação a sua deficiência visual, por outro lado, ele diz para Bial (2018), “fui vetado por
que era feio” quando se refere aos anos que conheceu e trabalhou junto com Sivuca nas rádios
de Pernambuco. Na verdade, Pascoal é um ótimo exemplo de relação entre a vida e a
deficiência, pois ao contrário de ser “feio”, ele ainda acrescenta, “eu sou mais bonito em me
amar”. Como resultado, não temos dados relacionados diretamente a processos educacionais
da formação musical deste instrumentista, porém, com base nos estudos, há o esforço pela
vontade de criar e por consequência, usufruir de recursos visuais como a partitura para esse
efeito. No entanto, suas partituras não são simplificadas, ao contrário, configuram exemplos
bem reais da forma com o que vê o que para muitos é invisível, o som, neste caso, são traços e
formas na “visão hermetiana”.
Costa et al. traz, “a palavra cego vem do latim caecue quer dizer privado da vista;
alucinado; que impede a reflexão, o raciocínio; que perturba o julgamento; oblitera a razão.
Cegueira quer dizer: estado de cego; estado de quem tem a razão obscurecida, o
discernimento ou o raciocínio perturbado; afeição extrema; falta de lucidez ou de
inteligência” (2011, p.1470). Um confronto direto a isso é a biografia de Pascoal, dito por si,
“[...]sou o reflexo de minha inteligência”.
No cinema ela também lê as legendas baixinho pra mim. Às vezes eu digo para ela
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"Deixa eu pensar numa história sozinho, sem entender o que eles estão dizendo e só
com o que eu estou enxergando". Sabe que às vezes fica quase igual? Quando o
filme é ruim, peço para ela parar de ler as legendas mais cedo (LIANG, 2018, p.01).
Com isso, a claridade de Hermeto não está somente em sua pele, cabelos e olhos.
Costa et al. (2011, p.1468) entende, “têm-se outros exemplos de como a luz, o claro, a ideia
de ver tem relação direta com o conhecer”, pois pelo tanto que conhece Pascoal, visto no
Brasil e no mundo, podemos afirmar que a luz por vezes está em nós e, no caso dele, em sua
musicalidade e destreza para lidar com um mundo. Com 82 anos, ainda hoje revela sua
musicalidade pelo mundo e condiz com o que sempre pregou, “eu sinto a música, é o
suficiente, depois eu esqueço”.
Em 1985, na Itália rural da região da Toscana, nascia Andrea Bocelli. Sendo um dos
tenores mais conhecidos do mundo, popularizou nos anos de 1990, o canto lírico com arranjos
populares e um carisma inigualável, aproximando assim, a ópera do povo. Possuidor de
glaucoma congênito, acuidade visual baixa, com resíduo de luminosidade e formas. Nos seus
27 anos de carreira, é um dos maiores vendedores de discos do gênero com mais de 80
milhões de cópias. Sua vida artística e social está contida na recomendada história publicada
primeiramente em um livro autobiográfico e depois em um filme (2017), “A música do
Silêncio”.
De modo muito semelhante com o levantamento feito com os outros dois nomes desta
tese, Bocelli é um referencial farto pela proximidade temporal da carreira com as inovações
tecnológicas. No entanto, como buscamos aqui revelações sobre a interligação da música e a
cegueira, além de textos acadêmicos, temos como aporte, o filme e livro da autobiografia do
cantor. Nestes dois últimos, podemos verificar, quando o autor narra um romance íntimo de
sua vida pela ficção, dando nome a um personagem paralelo a si, Amós, dados curiosos do
aprendizado musical, do atendimento específico educacional e do apoio ideológico solidário
de muitos dentro de sua história. Como resultado, ao longo deste tópico, faremos cruzamento
com outras referências dando criticidade ao que nos reúne nesta tese.
Costa et. al., quando se referem a acuidade visual, dizem, “[...] a capacidade funcional
não está relacionada apenas aos fatores visuais, mas também às reações da pessoa à perda
visual e aos fatores ambientais que interferem no seu desempenho” (2011, p.1469). Andrea
Bocelli é abastado quando nasce, seus pais são donos de uma bem-sucedida vinícola. O
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diagnóstico de glaucoma, acordando com o nível de instrução dos pais, que sofrem, mostra,
dentro de um contexto europeu da década de 1950, a realidade de ter um filho com problemas
visuais. No filme, dirigido por Michael Redford, traz em 2017, para consagrar a carreira
vitoriosa do tenor, cenas ilustrativas de uma adaptação social e compreensiva da cegueira de
Andrea.
Em 2008, com a publicação da Lei nº5.761, primeiro texto do Atendimento
Educacional Especializado, temos a eliminação das escolas de atendimento específico. Em
Manaus, temos como destaque a Escola Estadual Joana Rodrigues Vieira, no Bairro da Glória,
exclusiva na educação de cegos. De acordo com a biografia de Bocelli, uma escola, ao qual o
menino é matriculado para compor seus estudos básicos, é preponderante no curso de sua
atuação como cidadão e músico. Bocelli (2012), conta com uma impaciência que era um
reflexo dos momentos de maturação da condição física indesejada. Na cena que Amós divide
seu cavalo com o irmão, é tudo muito claro como a cegueira é temida por todos.
Sua alfabetização é em Braille e bem cedo tem contato com o canto dentro de sua
primeira escola. Dessa maneira, estudando junto com outros DVs, até mesmo tendo uma
professora com as mesmas condições físicas. A formação de Andrea uma qualificação
bastante positiva em relação ao universo de todas as habilidades desenvolvidas, inclusive a
música. Decorrendo assim, uma ausência de falsas noções do ser cego, a citação a seguir é um
apelo contrário segundo o próximo autor.
Acerca da deficiência visual, o entendimento da sociedade pode coadunar com a
antiga noção de que ser cego é um estigma que está associado às pessoas de péssimo
caráter, a um castigo divino; o indivíduo com deficiência passa ao largo do
pertencimento e do reconhecimento de uma comunidade, fato que o torna vulnerável
a desenvolver sentimentos de baixa autoestima, ter maior suscetibilidade ao
isolamento social, não ter acessibilidade a serviços oferecidos e ao trabalho, e,
assim, apresentam maior facilidade para tornar-se vítimas de violência, nas suas
mais diversas formas (COSTA et al. 2011, p.1470).
por Perez et al. pareçam ingênuos, muito há de colaborativo para a formação dos alunos DVs.
Tanto na direção de Redford (2017) e nos escritos da ficção de Bocelli (2012), podemos
claramente identificar que havia um compromisso sério, não com a deficiência em si, mas na
qualidade do cidadão que queriam formar naquele momento. Em específico, podemos ver
outras considerações importantes.
- Para poder seguir el ritmo de las clases nuestro alumno necesitat em er
conocimientos del lenguaje Braille. Conel consiguiente gasto de material y profesor
para él
- Necesitala máquina de escribir Perkins o un teclado enel ordenador conel sistema
Braille.
- Así como la necesidad de utilización del material especializado al centro por
lafundación ONCE enlos casos de niños ciegos em el aula ordinaria.
- Utilización de material adaptado dentro de las aulas como bolas del mundo
conrelieve y anotaciones en Braille. (PEREZ et al. 2016, p.10)
O Braille, como podemos ver, foi fundamental para Andrea e seus colegas pela
qualidade do acesso à leitura. Em Redford (2017) quando a mãe pergunta ao filho se está tudo
escuro, pelo enredo, sabemos que a educação e a música são as melhores saídas para o
inexplicável. Bocelli diz, “eu não vejo a escuridão mamãe. Eu não consigo explicar. O que eu
vejo é tudo e nada”. Nesse sentido, há uma comum concordância com o geral das
possibilidades de cegueira, vemos o que queremos ver. Ele explica à mão sem entender nada
da situação do filho, “eu vejo o que quero ver, a cama, o armário e você”.
Pode parecer curioso ou intrigante, mas temos um mundo desenhado em nossa cabeça.
Sendo meu testemunho, da mesma forma que o tenor, inventamos faces de acordo com a voz
que ouvimos, inventamos formas do alimento ligado ao cheiro que sentimos e assim temos
uma saída, em adaptação cognata de um mundo nosso e ao mesmo tempo pouco exclusivo.
Pessoas novas na minha vida possuem um rosto muito meu. Nessa ludicidade, se posso
colocar assim, brinco com a possibilidade de acerto quando essa mesma face em algum
momento for revelada. Seja por uma foto ampliada no computador ou mesmo na hora de um
cumprimento mais íntimo de beijos no rosto.
Para Ponzo, Andrea diz que, “ciò cheè più essenzial e nell avitaè invisibile agliocchi”
(2018, p.22), ou seja, o que é mais essencial na vida é invisível para os olhos. As constantes
irritações e reflexões em contraponto, principalmente em relação as posições socio
ideológicas de sua mãe, foram na verdade, segundo Bocelli (2012), a base para formação de
um caráter mais audacioso. Costa et al. quando reflete sobre as determinações sociais da
pessoa cega na afirmação em seu meio, destaca que, “[...] na percepção social acerca da
deficiência visual a organização em torno dos três elementos nucleares: de quem foi a culpa
(dos pais, castigo divino?); da limitação imposta pelo “não ver”; e, por fim, a ideia de que o
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cego é um ser puro, bom” (2011, p.1470). Em Ponzo, o tenor revela que, ser cego é uma
enorme desvantagem, mas todos têm desvantagens na vida, a minha é apenas mais evidente
que muitas outras” (2018, p22, nossa tradução).
Você tem diante de si um texto Braille e deixa que sua mão aberta passeie ao acaso
pelo papel. Uma sensação de aspereza estimula sua pele e nada mais. Aí você
experimenta olhar para o texto e a princípio não vê senão um emaranhado de pontos,
que ora podem assemelhar-se a um labirinto, ora lembram um bordado abstrato, ora
uma pauta musical, ora parecem sugerir flores ou pequenos peixes (BELARMINO,
2016, p.06).
O Sistema Braille tem um sentido, faz valer como um alfabeto e isso, por várias vezes,
percebido durante as inúmeras palestras que coordeno, gera questões embebidas em um
enorme mistério e admiração. O mesmo, na minha opinião, acontece quando leigos observam
sozinhos a uma partitura musical. Sendo que no caso da pauta, a relação entre o observador e
as notas escritas é mais verossímil, lembrando que o mundo é visual.
Imaginemos como deve ter sido o movimento cultural da metade do século XIX com a
aparição do código Braille. Tais modificações acontecem hoje, este em só mais um item
textual feito de horas de codificação de escritos em linguagens facilitadoras de acesso aos
conteúdos apropriados para a defesa desta tese. No nosso caso, a dinâmica da produção é
infinitamente maior e ágil em relação aos duzentos anos passados. Porém, em se tratando de
nossas humanidades, os desejos são os mesmos.
Queremos aqui obter um título, entendem?
Os signos são considerados desde a antiguidade e naquela época, tratados como
verbais e não-verbais. Um caminho anunciado neste capítulo capta significados entre o que
esperamos da arte, deficiência e expectativas não somente táteis, mais ultra sensoriais
(Cavalcante, 2012). A escassez de investigações que privilegiem a comunicação tátil dentro
do campo das ciências ligadas a formação de licenciados não interfere de modo errado nas
tomadas de decisão do mercado, ou seja, nas tendências que outras áreas se dedicam a muito
tempo. Podemos trazer o exemplo da garrafa de Coca-Cola, mudando de formato durante os
últimos 20 anos, oferece não somente aos cegos, mas a todos, a sensação comunicativa tátil
sobre sua identidade, seus projetistas vislumbram não somente as cores vermelho e branco,
mas o formato e a sensação de estar com uma garrafa deste refrigerante entre os dedos.
Desse modo, apresentamos aqui uma inovadora e audaciosa manifestação de dar não
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somente voz, mas texturas ao que sentimos na dimensão da cegueira e na função musical. A
arte, sendo um código em associação com a música e as percepções táteis, comunicam,
integram e precisam ser mais vistas pela educação que se consolida mais presente e aberta aos
novos tempos de um mundo feito para todos.
Quando nasci, a Declaração Universal dos Direitos Humanos completava 28 anos.
Com a ONU, muito se modificou em relação a paz mundial. No entanto, a mudança da
mentalidade e com isso, da cultura de cada povo, caminha a passos lentos ou ágeis igual a
necessidade. Ainda vivemos a escravidão e ao mesmo tempo, temos uma nave não tripulada
em direção de além do nosso sistema solar. Desse modo, este tópico, me permitirá apresentar
as interposições das pluralidades de vida, mundo e arte,
Tanto para Charles, Pascoal e Bocelli, a realidade cultural para as afirmações de
pessoas com deficiência foram apresentadas, contando a diferença de tempo e espaço, muito
semelhantes a minha. Imaginemos um casal projetando uma nova vida, em último caso,
normalmente, se pensam nas deficiências. Ao longo da gestação, com cautela o assunto pouco
aparece, por medo e o casal torce para que venha com saúde. No jargão médico nos
acostumamos a ouvir, “nasceu perfeito, é um menino!”. No nosso caso, somos filhos de antes
das ultrassonografias, ainda assim, a cegueira só se identifica após o nascimento.
Nos casos apresentados temos a cegueira adquirida. Posso dizer com clareza que o
momento da perda da visão ou avanço desta, fica guardado como um grande evento de nossa
vida. Bocelli perde totalmente a visão por conta de uma bolada forte na cabeça. No filme, esse
momento é bem discutido e apresentado pelo diretor, mostra os conflitos iniciais e acima de
tudo, uma certeza de mudança compulsória na rotina diária. Todos nós conhecemos a música
por sua escrita convencional, isso foi determinante nos 4 quadros e acredito que mesmo antes
de aprendermos a música impressa em tinta, temos uma imagem muito aproximada do código
escrito no pentagrama.
Para mim, Charles e Pascoal, poder escrever para outros músicos videntes é a
consagração de toda nossa potencialidade. Bouabid (2015) comenta, DVs ou normovisuais
são músicos idênticos, porém a imagem da música para DVs se associa a uma capacidade
extraordinária de conduzir a memória para fins da prática musical. Nesse sentido, enquanto,
um aluno, além da prática de seu instrumento precisa desenvolver o acesso ao armazenamento
das melodias, o aluno DV entra no processo epistêmico com essa etapa quase ou toda
definida.
Entre as relações pessoais dos agentes dos quatro processos, mais especificamente dos
educadores e alunos de música, vemos, indicado por Cardozo & Silva (2014), ser dada uma
71
importância mais que normal para elementos consagrados durante as atividades de ofício ou
estudo. Em outras palavras, ao mesmo tempo que nós, músicos DVs, sabíamos de nossas
limitações, vendo tudo acontecer em função da partitura musical, passamos a desejar,
priorizar a pauta como único caminho para o ato de tocar. Assim, dizendo pela própria
experiência, tocar nunca foi algo fácil, mesmo com os potenciais acima descritos, somos
ainda músicos iguais, aprendizes e nossa saída é o caminho popular, menos disciplinado do
ponto de vista dos escritos impressos em tinta (Bouabid, 2015).
Fica claro em cada biografia analisada que há singularidade nos sistemas de
aprendizagem, eu, Charles e Pascoal, desenvolvemos processos criativos de aquisição dos
modelos convencionais do ensino musical por meios próprios. Bocelli, por estudar em uma
escola de atendimento específico, tendo inclusive uma professora cega, é apresentado a uma
metodologia mais direta, sem rodeios ou adaptações, diferente de nós outros. Hermeto,
consolidando Sá et. al. (2008), ouvia mais que escrevia, morava no sertão nordestino e sua
educação musical dependia da oralidade e paciência. Uma verdade que aprendi tempos após
saber tocar, não é preciso ver o instrumento para tocá-lo.
Diante dos casos, dada a minha idade e colocação, é distinta a minha formação,
aprendi a ler partituras aos 12 anos e aos 15, começava a perder acuidade visual muito
rapidamente. Nesse sentido, com as leituras de Fantini (2016) e Keennan Junior &Finck
(2017), hoje contamos com um número crescente de alunos DVs em cursos de formação de
professores de música. No meu caso, ainda cursando Educação Artística, habilitação em
música, à época, não tive nenhum apoio dentro da academia, éramos, professores e alunos,
inexperientes no tema. Hoje, com a ABEM, vejo como muito progredimos, somos mais
capazes de entender com clareza o que não sabemos. Ainda que seja um absurdo, porém um
todo da verdade, não pensávamos na possibilidade de ampliar uma partitura para que pudesse
ter acesso às peças musicais enquanto estudava na graduação.
A figura do músico cego, segundo Reily (2008), quebra estereótipos por conta das
atitudes reveladas pelo potencial musical. Neste caso, trazemos histórias consagradas, que
antes tentamos verificar nos processos de construção da pessoa musical e cega. Ainda como
diz a autora, carregamos conosco uma falsa impressão das verdadeiras condições da ausência
de visão. Na idade média, os ícones ilustrativos da igreja só apresentavam figuras humanas
cegas em situação de abandono, mutilação e funções subalternas. Hoje, como venho frisando,
somos donos de propostas inclusivas que aos poucos vão afastando essa impressão. Com o
AEE e outras políticas afirmativas, eu e muitos outros deficientes passam a ter mais espaço e
voz. Dessa maneira, a arte e o esporte, contabilizam uma grande parte de oportunidades em
72
relação a presença de potenciais, por outro lado, precisamos dessa mesma qualidade de
expressão em ramos diferentes das funções sociais.
Uma das coisas mais comuns e intrigantes da vida entre a música e a cegueira é o
ouvido absoluto. FERREIRA define como, “[...] a capacidade de perceber e dar nome a cada
uma das notas que chega ao seu ouvido” (2008, p.01). Por outro lado, Schafer (1991), traz sua
definição de ouvido absoluto como algo mais profundo, pois dar nome às notas, de certo
modo, com muito treino, é fácil. No caso do autor, ouvir absolutamente é dar vez ao conjunto
de informações sonoras musicais de nosso redor. Neste caso, precisamos treinar para uma
devolução de nossa condição humana que perdemos ao longo da vida adulta. Quando
crianças, somos essa máxima apreciação das paisagens sonoras e quando nos tornamos
músicos, as práticas nos conduzem a determinadas identificações de alturas das ondas de som.
E não estamos falando só de música: também vale sons vindos de buzina, chiados da
natureza, vozes de animais, barulhos de máquinas… A explicação para esse dom não
está no aparelho auditivo, mas na cabeça. Quem tem ouvido absoluto possui mais
capacidade de receber e interpretar estímulos do lado esquerdo do cérebro, onde os
sons são processados (FERREIRA, 2008, p.01).
As notas não tem nomes enquanto tocamos, elas fazem parte de nossa estrutura
cognitiva, acionadas pelo instrumento em questão, sendo mais sensações que propriamente
números ou notas. Quando eu toco, principalmente em grupo, não penso nas notas, me dedico
a sucessão de sensações que cada harmonia representa na música. É claro que músicas nunca
ouvidas não fazem qualquer sentido, o músico, DV ou não, não é mágico, é mais habilidade e
sentimento. Também é válido comentar que conhecer de harmonia, campos harmônicos e
formação de acordes, faz muita diferença e soma preponderantemente para a melhoria de
minha performance ao tocar. Isso é visto na história dos demais que aqui lemos, todos
procuraram técnica para suas ações, não cabe negligenciar o acúmulo de boas informações
desenvolvidas pela sociedade, principalmente sobre os caminhos de uma boa prática musical.
Como diz Reilly (2008), as sociedades infelizmente prestigiam a conveniência de uma
arte praticada por elites. Cegos eram confinados a uma insignificância social, doando parte de
suas maldições físicas aos instrumentos que os acompanhavam. Será saudável sustentar nesta
tese que os caminhos para o encontro de ideias mais reveladoras sobre a cegueira e a música
só dependem de mais conhecimento. Neste sentido, ainda persistem falsas noções do mundo
mitológico de seres com ouvidos hiperdesenvolvidos e ações mágicas ao tocar um
instrumento. Como disse Bocelli, o som começa mesmo é na qualidade do silêncio.
73
às vezes sofremos pelo rigor exercido e não usufruímos da liberdade de conhecer mais, por
experimentar formatações mais simples de alcançar nossas incertezas. Para Morin (2003),
essa maneira breve de se relacionar com nossos questionamentos, passa por operações
cognitivas que ao longo desse levantamento vamos revelar.
Dentre tantas competências do ser humano, uma se faz necessária ser comentada aqui:
a linguagem, que, desenvolvida no curso de nossa evolução, além de nos diferenciar dos
demais seres vivos, foi capaz de abrigar em si nossa maneira de pensar. Significados e
significantes caminham juntos, são elementos determinantes culturais e exemplos dinâmicos
de nossa capacidade comunicativa. O pensamento complexo se apoia nos princípios
etimológicos da palavra, unidades escritas ou faladas que contém uma história e peso, do
global ao individual, sendo tudo cultura e ciência de cada povo (Lopes, 2015).
De acordo com Lopes (2015, p.14), “Linguagem é todo sistema organizado de sinais
que serve como meio de comunicação entre os indivíduos.” A situação de deficiência visual,
em muitos dos casos, se apresenta como a mais temida das mutilações de nosso organismo. A
partir desse entendimento, fica claro que somos seres de necessidades emergentes de
comunicação. O viés do visível e da imagem é responsável por mais de 80% das relações da
linguagem e leitura do mundo. Por outro lado, perder a capacidade de ver o mundo com
qualidade é uma condição impeditiva certamente, no entanto, nosso organismo se estabelece
de modo especial a redirecionar nossas percepções do mundo externo ao nosso corpo.
O que há de distinto na percepção visual de quem não enxerga, só cabe a si. Em outras
palavras, somente um cego é capaz de determinar, a seu modo, o quanto e como percebe o
mundo. Todavia, no contexto educacional, algumas informações mais íntimas da percepção
visual seriam de grande importância, para exemplificar: um professor dotado das
potencialidades e da compreensão do que é uma imagem para o invisível de um cego, é capaz
de desenvolver melhores e concretos recursos adaptados para o ensino dessa pessoa.
Contudo, vamos aqui despertar o encontro de duas áreas do conhecimento para
redimensionar, por meio da complexidade, algo a mais no universo do visível do invisível, ou
seja, abordar a cegueira sob uma nova perspectiva e por outro caminho, romper paradigmas e
se distanciar do determinismo. Veremos que o mundo pode ser lido de muitos outros ângulos
e luzes, é só acreditar.
4.1 Evidência
Uma breve busca pelas origens das palavras de nossa língua; nos reserva
satisfatoriamente horas de uma maravilhosa jornada investigativa. Comumente nos deparamos
com conclusões óbvias, palavras que sempre nos disseram o que são e que por conta da
rapidez empregada ao falá-las, não vivenciamos a sua essência. Nosso vocabulário tem sua
origem em línguas bem estruturadas e amadurecidas. Para uma melhor entrada no universo da
deficiência visual vamos nos ater aos princípios formativos de algumas palavras relacionadas
com o tema.
Faremos uso da palavra EVIDÊNCIA, promovendo o confronto do significado com a
relação e uso por pessoas com deficiência visual. Para Henrique (2011, p.58), “ela vem do
Latim EVIDENTIA, “prova”, originalmente “clareza, distinção”, de EVIDENS, “claro, óbvio,
perceptível”, de EX-, “fora”, mais VIDENS, de VIDERE, “ver, enxergar”.
Por mais que nos falte a luz no conjunto dos sentidos, o mundo não se resume a isso.
Curiosamente somos condicionados pelos pais e professores a fragmentar o todo do que
queremos aprender, sem mesmo ter condições de acessar a essência de sua totalidade. Uma
criança cega aprende em uma só aula, tudo que confere a uma galinha, sabe que é uma ave e
que pões ovos, ou seja, consegue esgotar o assunto a partir dos fragmentos dispostos na classe
pelo professor. Isso tudo ocorre no plano das palavras. No dia seguinte a essa aula, ao ser
questionada, a mesma aluna responde com toda a propriedade o que tem aprendido sobre o
assunto galinha. No entanto, quando sua professora lhe oferece uma massa de modelagem,
pede-lhe que forme ali uma galinha, a criança, por estar inserida em um outro plano
dimensional, não apresenta o conteúdo galinha.
Dar evidência, significa dar condições de esclarecimento do todo as suas possíveis
fragmentações. O correto no caso acima citado, seria que o ensino do conteúdo galinha teria
seu fim, quando de fato a menina tocasse em uma miniatura de galinha ou melhor, se fosse a
uma fazenda e escutasse, cheirasse, tocasse e degustasse a famosa galinha. Nossa educação
apresenta conteúdos isolado e não os evidencia na totalidade do mundo que pertencem.
Uma educação comprometida com a verdade é resultado da qualidade com a qual as
evidências são dispostas na rotina de todo educador. Sendo evidências como sinônimo de
provas, alunos cegos ou não, dependem de como a construção de suas imagens internas ou
evidências são criadas para que alcancem o sucesso de suas propostas epistemológicas. Desse
76
modo, podemos dizer que mesmo alunos cegos podem ter vidência ou provas concretas sem
qualquer prejuízo impeditivo da falta de visão.
Operar, dessa forma, a palavra EVIDÊNCIA nos possibilita revelar que a sua origem
favorece as aplicações mais profundas e urgentes para uma educação de todos e para todos.
Morin(2001, p.211) propõe que os operadores cognitivos da recursividade, do holográfico e
do dialético são estruturantes do visto como temos significado aos significantes da linguagem.
Desse modo, dar “evidência” é algo que ultrapassa a simplicidade do termo, concorre na
verdade ao conjunto de informações sensoriais que caminham para uma “prova” do que
queremos aprender ou estamos sendo ensinados.
Nesse sentido, pelo que construímos aqui, podemos determinar evidências mesmo
dentro do invisível. Ainda pensando na aluna cega, depois de suas aulas no plano das
palavras, esta fosse a uma fazenda, teria ali as evidências pelo toque, audição, tato e paladar,
do que até então era invisível. A holografia da razão cognitiva dessa aluna teve por fim
conclusões óbvias e evidentes do assunto galinha.
Podemos concluir que, dar vidência por meio das evidências constitui uma ação
pertinente a qualquer situação de percepção visual. Mesmo ao invisível dos olhos, as provas
de uma leitura do mundo se tornam visíveis, todas as vezes que nos preocupamos em
redimensionar o acesso, em outras palavras, ainda que tenhamos aprendido que nossos
sentidos trabalham de maneira distinta, é salutar verificar que somos perceptivos do mundo,
através das associações evidentes percebidas no conjunto ou sistema de sentidos de nosso
corpo. Dar vez à essa forma de pensar, promove a clareza nas condutas pedagógicas entre
alunos e professores.
Uma breve consideração sobre a situação de cegueira nos obriga a compreender que
existem dois casos clássicos de deficiência visual. O primeiro se destina a considerar pessoa
cega aquela que não possui qualquer resíduo visual satisfatório e mesmo com correções de
lentes possa perceber formas, cores e luzes do mundo. O segundo, mais frequente, é o estado
permanente de pessoa com baixa visão, onde nestes casos, diferentes formas de resíduo visual
77
responsável por estabelecer as mudanças mais importantes. Além disso, temos os materiais de
apoio e os recursos tecnológicos, sobretudo os computacionais que nos levam a uma inclusão
mais verdadeira, ou mesmo, segura quando utilizadas com responsabilidade e objetividade.
Constatamos que trazer o assunto das condições emocionais e comportamentais de
deficientes visuais por meio do discurso interdisciplinar, nesse caso entrelaçando a Física, a
Psicologia e as Ciências Sociais, inicia uma nova reflexão sobre diferentes formas de pensar e
dá voz às situações de eficiência quando nos relacionamos com pessoas com deficiência. A
melhoria da qualidade de visibilidade entre as pessoas, com ou sem deficiência, depende por
muitas vezes desse tipo de mudança de ângulos de observação. O conjunto de caminhos
abertos pela iniciativa do pensamento complexo é feita por quem o caminha e diz como o vê
em cada contexto determinado por cada vez.
problemas. A busca por chaves que nos abram as ideias é reflexo de uma sociedade que busca
suas respostas por meios responsáveis e confiáveis como se tudo ainda possa ser resolvido.
Todo problema merece um tratamento, ele se expressa através de perguntas, onde estas,
dependendo de como são feitas, determinam o caminho do tratamento, ou seja, da técnica
aplicada ao assunto.
No caso do que aqui iremos discutir, a arte, mais especificamente a música, favorece
em valores nossa consciência, ou seja, o elemento musical com toda a sua simbologia revela
nossa condição na materialização ou percepção do sentimento nela contido. De acordo com
Langer a obra de "arte é a criação das formas simbólicas do sentimento humano" (1942,
p.224). Na prática, somos convocados por estímulos a perceber e transcriar o mundo. A arte,
sem necessidade alguma de existir para que a humanidade sobreviva, é robusta em se
sustentar exclusivamente por ser sentimento e propor emoções.
Langer (1942) classifica a música destacada das demais formas artísticas. Para ela a
música assume uma condição inefável, em outras palavras, indizível e diferente das relações
de fato/ficção e modelo/copia, ações presentes na dramaturgia, plástica e literatura. Na
tentativa de aproximarmos mais este conceito, podemos entender a música dentre as demais
categorias de arte como algo que não se toca e, no entanto, só se percebe. Dessa feita, uma
busca mais detalhada no interior de cada pessoa é capaz de justificar como a música nos
alcança pela soma de sentimentos envolvidos e redistribuídos semelhante à mesma melodia é
escutada no decorrer da vida (Oliveira, 2016).
A música é capaz de expressar com inefabilidade o que qualquer outra linguagem é
incapaz de transmitir como mensagem. Logicamente que todas as prerrogativas que ponderam
a situação que se encontra o ouvinte como condição emocional do momento, devem ser
respeitadas. Por outro lado, nossas subjetividades em qualquer aspecto ocorrem quando por
meio das associações harmônicas se apresentam instigando as mais diferentes emoções.
Segundo Oliveira (2016, p. 01), "[...] uma composição musical, na maioria das vezes, não
estabelece vínculos com possíveis referências extramusicais".
A músicas e as outras artes dizem ao mundo tudo o que não pode ser dito, ou seja, o
indizível filosófico não se aplica quando a linguagem se apropria da arte diante de suas
necessidades de propagação dos autos comunicativos. Pensar assim nos conduz a uma análise
mais dirigida à compreensão do esforço e uso dos símbolos contidos na arte que estão sempre
aproximados das formas e modelos mais naturais que conhecemos ou mesmo crescemos
aprendendo a reconhecer. A essência de nossa percepção surge exatamente desta premissa,
pois tudo o que não nos é familiar, como a natureza que convivemos por todo o tempo, não
81
nos alcança os sentidos. Langer (1942) propõe que o esforço a ser deferido atinja uma vontade
de perceber como a arte, a matemática e a biologia são ao mesmo tempo distribuídos por
todos.
Langer, em outra "key", ou seja, "chave" de leitura comenta que entre o passado e o
futuro, nossa imaginação se permite perceber, e o que é percebido, somente a arte é capaz de
conceber como linguagem. A música, não referencial, ainda assim é aberta a interpretação do
conjunto de sentidos atribuídos a isso e trabalhando em harmonia diante das dimensões e
contextos. Um exemplo disso se dá quando escutamos uma música do passado e nos
lembramos exatamente das interseções sensoriais de outrora, relações olfativas e táteis que
quando revistas, nos conferem as emoções mais presentes da época em questão.
A razão de inefabilidade da música não é uma abordagem perceptiva exclusiva de
Langer; Schopenhauer, Nietzsche, Adorno e Jankélévitch, também consideravam a arte
musical nestes termos. Porém Langer, dado ao que se investiga, acrescenta e demonstra que a
problemática da arte e seus dilemas, se difundem melhor quando são reveladas distante das
recursividades da palavra escrita e o símbolo real, ou seja, quando usa caminho próprios da
linguagem dita no que não é dito.
A arte não cabe dentro de "molduras" do logos demonstrativo. As ideias a serem
representadas quando temos o sentimento e sua forma passam por atribuições próximas ao
que compreendemos como estado de consciência elevado, espiritual ou qualquer coisa neste
mesmo contexto. Contudo, seria uma fraca constatação identificar que toda experiência
humana seria capaz de ser traduzida pela linguagem verbal. Talvez por isso, quando
perguntamos ao mais experiente dos enamorados o que é o amor, haja um silêncio que
anteceda sua resposta e por vezes nem resposta há por meio da linguagem verbal.
Ele, incumbido de tal questão, responderia dizendo, o amor é o sol de uma tarde na
beira do rio Tarauacá, a brisa que bate por lá e o cheiro de macaxeiras desembarcadas pelos
índios Kulinas no meio de julho quando este rio está seco. Nem mesmo todas as palavras do
mundo são capazes de definir o amor no que há descrito acima. Essa inefabilidade a música
resume em si. Ele, ainda tentando conceituar tal sentimento, sabe que quando ouvir uma
canção ligada à época, dirá consigo, o amor é pra mim tudo aquilo quando o rio está seco no
meio de julho, mas o que prevalece como conceito é a sua emoção. Dessa feita, o verbo é
82
olhos do músicos participantes. Ao contrário, sabemos que uma orquestra, diante de uma
ordem tonal, inicialmente oferecida por um dos músicos, é capaz de tocar em improvisação
por infinitas horas sem qualquer símbolo escrito à sua frente.
Pensando assim, o caso da pessoa cega que se inicie nas práticas musicais, também
pode, dada a condição perceptiva, amadurecida ou não, se deferir em relação ao som, tocando
em conjunto ou não, longe dos símbolos gráficos. Nosso problema é, mesmo assim,
indiferente aos símbolos musicais, qualquer aluno de música, na mesma proporção dos
grandes instrumentistas, quer sempre mais do mais que seus estudos lhe oferecem. Na
verdade, nossos símbolos não são limitados a condição do que é escrito, são simbologias
perceptivas, uma espera dentro do discurso musical por notas e cadências que determinam,
mesmo sem as ver, quais caminhos tomamos quando tocamos ou estudamos as passagens
sonoras ou peças musicais.
Langer (1980), defende que existem dos aspectos perceptivos: o lógico, criado e
mantido pelo acesso à informação técnica, e o psicológico, absorvendo as raízes simbólicas do
fazer musical pela tomada dos sentidos e interpretação emocional que fazemos por todas as
vezes. Como exemplo temos, um músico quando convocado a se exibir em uma cadência,
dele se espera a técnica da lógica, notas bem deferidas e sustentação de um bom som, e por
outro caminho, também se espera a técnica psicológica, como ele irá nos emocionar ou
mesmo surpreender com as linhas de intervalo menos convencionais.
Determinada época na música do sul dos Estados Unidos da América, mais
especificamente no estilo musical das lavouras negras, o blues, muitos músicos cegos eram
considerados ótimos representantes do estilo musical. Até mesmo músicos sem a cegueira,
colocavam atrelados ao seu nome artístico a palavra blind, cego em português, para que dessa
forma, além do atributo técnico lógico aguardado pelo ouvinte, a palavra blind lhe atribuía a
técnica psicológica. No entanto, não queremos afirmar que somente cegos possuem tal
qualidade de emprego sensível à arte. Nossa questão ainda reside na problemática que
defende o símbolo escrito como caminho exclusivo para as melhores técnicas da prática
musical. Pois lembremos, a academia deve privilegiar o acesso de todos (Espinola, 2016).
Sendo assim, a razão entre a lógica e a psicologia da percepção musical, sofre
alterações corriqueiras, caminha por diferentes espaços e ao mesmo tempo que parecem ser
diferentes, são complemento direto e necessário para como queremos ter nossos avanços
musicais. Reconhecer que nossas ideias pertencem ao amadurecimento das técnicas
provenientes dessas duas premissas condicionais, é a chave que abre para a resolução de
muitos problemas que não são pessoais, mas da situação social que se impões em relação ao
84
fazer artístico.
De modo muito evidente, a música sempre é comentada como a representação
organizada dos sons que a natureza possui, ainda nesse sentido, a música é algo que gostamos,
sentimos e vivenciamos. Ilustram essa perspectiva os sons de trovões e do vento, que traziam
consigo informações sonoras e um contexto analógico do que de fato é o som. Desse ponto de
partida, podemos encontrar hoje propriedades facilmente compreendidas no universo musical
em relação a qualidade do som. Temos a altura, o timbre, a duração e a intensidade.
“Música é alguma coisa de que se gosta; música é som organizado com ritmo e
melodia; música é som agradável aos ouvidos; música é arte ou música é uma atividade
cultural relativa ao som” (SCHAFER, 1996, p.25).
Pitágoras (570a.C. - 490a.C.) percebendo o mundo e suas sonoridades, muito antes de
toda a analogia moderna do áudio, deferiu ao mundo estudos que nos possibilitam
esquematizar comprimentos de ondas e frequências de sinal sonoro hoje em dia. O
conhecimento produzido pelo filósofo grego perdura por mais de 2000 anos até sofrer análises
comprobatórias pela física tradicional do século IX e XX. Na verdade, músicos e físicos
acústicos, trabalham com a mesma matéria prima, os primeiros sentem o som, enquanto que
os segundos, quantificam o que para eles são frequências eventuais presas a numerações entre
o tempo e o local do fenômeno acústico.
Uma retomada ao assunto dirigido às propriedades do som acima citadas, temos como
contexto, a vida e técnica de músicos amadurecidos que compreendem o som por meio de
suas práticas. Para o leigo, altura do som é correspondente ao quanto forte esse mesmo som
chega aos seus ouvidos, por outro lado, sendo mais preciso, altura de som, nos termos
técnicos, equivale a numeração da frequência ao qual ele se apresenta, por exemplo, sons
graves possuem numerações mais baixas que sons agudos. Sendo assim, a altura sonora é
relativa e percebida nas diferentes notas que antes Pitágoras descrevia.
Da mesma forma que o físico Rutheford (1871-1937) descreve o esquema gráfico da
figura de um átomo em 1917, algo que nesse aspecto nunca e jamais alguém virá a ver, as
ondas sonoras também são defendidas por um modelo gráfico, didático que pela apropriação
das rotinas e frequências do balanço marinho, são chamadas assim, de ondas para uma melhor
compreensão dos fenômenos acústicos. Os estudos de Hertz (1857-1894) em 1904,
colaboraram para a percepção visual da música que temos atualmente com as imagens de
ondas sensoriais dentro dos espectros dos computadores e seus programas de edição do áudio,
nesse caso digital. Tal feito que hoje somos capazes de observar, comprova o que Pitágoras
dizia sobre o movimento dos intervalos que agora chamamos de notas musicais e para os
85
sobretudo, em meios computacionais como smartphones, tablets e PCs. Sá et al. (2008, p.16),
divide os recursos didáticos em dois níveis, “ópticos” e “não-ópticos”, aos quais faremos
algumas considerações: “recursos ou auxílios ópticos são lentes de uso especial ou dispositivo
formado por um conjunto de lentes, geralmente de alto poder, com o objetivo de magnificar a
imagem da retina. Esses recursos são utilizados mediante prescrição e orientação
oftalmológica”.
No caso de recursos Não-ópticos, ela diz, “tipos ampliados: ampliação de fontes, de
sinais e símbolos gráficos em livros, apostilas, textos avulsos, jogos, agendas, entre outros”
(2008, p.19-20). Na época da difusão dos descobrimentos das autoras, ainda não se tinham
tantos dispositivos do tipo smart celulares como hoje. Desse modo, tendo vivido toda essa
significativa mudança, vamos discorrer sobre a associação dos recursos descritos com as
possibilidades de alcance atuais.
Ao longo da formação do aluno DV em música/licenciatura, as solicitações de
construção do plano de aula são levadas de modo muito sério diretamente pelo o que diz
Finck (2017, p.37). Para a autora, “neste panorama encontramos também as necessidades
ligadas à acessibilidade, tanto por parte de alunos quanto de professores com algum tipo de
deficiência que apresentam limitações de acesso[...]”. O avanço dos meios computacionais
trouxe a possibilidade de aquisição de novas fontes de conteúdo e visibilidade inovadoras de
outras realidades pelo mundo. Por este motivo a “[...]internet, repositórios digitais
desenvolvidos com base no desenho universal, leitores de tela e materiais didáticos
pedagógico-musicais acessíveis, nos quais, as dificuldades de produção se potencializam
consideravelmente”.
“A resposta humana para o discurso musical é raramente indiferente” (GALVÃO,
2006, p.12). Sendo assim, podemos verificar em Fantini (2016) um enorme conjunto de
títulos que narram, sobretudo, a “importância” da música em nossas vidas. As relações
existem, porém com cuidado, como diz Souza (2016), nem sempre a música faz bem.
Na verdade, no contexto de uma cognição por parte do universo individual humano, a
música é geradora de uma movimentação sensorial causadora do desenvolvimento de uma
memória duradoura (Galvão, 2006); (Bouabid, 2016). Desse modo, Finck diz que, “isso
traduz a experiência musical como uma experiência emocional socialmente compartilhada em
festas, funerais, salas de concerto, cinemas, carros e em muitos momentos da vida cotidiana”
(2019, p.13).
O debate dos autores acima propõe uma reflexão sobre nossa cognição por algo que
ela própria foi capaz de criar, no caso, a música. Na dimensão que se assume com a criação de
87
fóruns e eventos de discursão sobre as condições de vida dentro e fora da escola por DVs,
vemos a música como um agente pertinente para vazão das ideias e proposições afirmativas
de cada ou qualquer pessoa. Por outro lado, ainda nos vemos diante de uma necessidade viva,
precisamos formar mais e melhores professores, integrar relações pessoais e viabilizar por
meios da formação acadêmica, a visibilidade de novas fronteiras de enfrentamento para o
desafio da inclusão. Pensar em uma música pode ser entretenimento para muitos, mas para
arte educadores, é necessário ir mais além (Finck, 2017).
Os anos passam, as leis brasileiras vêm aprimorando seu alcance, temos no ECA um
grande avanço, foram defendidos valores óbvios e que por pura condição de
subdesenvolvimento, temos que garantir pela palavra escrita e punições abomináveis
comportamentos sociais. Encontram-se propostas em Finck (2015, 2016, 2017); Reisa et al.
(2018); Malheiros (2017) ressaltando a figura do DV para mais dignidade ao acesso a
condutas de atendimento especializado. Para este fim, vamos organizar as principais propostas
previstas por Galvão (2006) pelo o que aponta como caminho para uma abordagem para os
efeitos da música na nossa vida e principalmente na formação cognitiva.
Usamos como método a interpretação das publicações eleitas com as mais pertinentes
proposituras obtidas durante o levantamento do Estado da Arte. Faremos uso de uma citação
indireta a cada obra com comentários transversais quando necessário por outros autores. Ao
final, queremos tornar claro como se movimentam as ideias de apoio a inclusão com ligação
ao fazer musical e após.
Propor um modelo para reflexão do que previmos nesta tese. A escolha do material
apresentado não sofre ondem de valor pela data de publicação e nem tema defendido.
Veremos que os autores trazem questões muito distintas entre si, modelos semelhantes foram
encontrados, demos preferência para os nomes mais frequentes como colaboradores nos
canais de eventos e revistas no meio teórico do caso.
Com este, é possível propor com clareza a urgência em preparação das instituições de
ensino e demais centros profissionais para a chegada desse tipo de colaboração. Damos como
exemplo a ineficiência nos exames de seleção para programas de pós-graduação da maioria
das IES: provas mal formuladas, tempo insuficiente, confusão entre o Braille e a Libras, entre
outros. Em outro caminho, podemos ver propostas mais avançadas, situações em que
prevalecem a solidariedade e o envolvimento, pois proficiência em língua estrangeira não
pode ter um único modelo avaliativo, deve favorecer a quantidade de tempo e formato menos
90
cansativo de leitura de alguns textos, só para ilustrar. Com isso, os autores conseguem dar
uma noção dos rumos que vamos tomar para o futuro, diante das decisões tomadas e reveladas
para o esforço de todos.
Mestre Ozani Malheiros podemos observar uma tendência ao qual cabe como
proposta entre as proposituras deste capítulo. Malheiros trabalha com educação de cegos e
PBV no nordeste brasileiro, especialista em canto coral, vem dedicando suas ações para além
dos serviços prestados a igreja, atendendo de modo especializado as demandas para educação
musical com uso da musicografia Braille. Ao contrário do que muitos pensam, relata o autor, a
pessoa cega precisa de um bom acompanhamento para desenvolver uma leitura satisfatória
por meio dos dedos, ou seja, pela percepção tátil.
Nessa esteira, há um novo velho caminho. Louis Braille, na França, iniciou o sucesso
da propagação do código Braille com apresentações musicais de seus alunos. A musicografia
Braille é eficiente, porém, como diz Malheiros, o tempo dedicado a produção de peças em
Braille é enorme e isso afasta possíveis envolvimentos de professores de música em quadros
especializados. Ainda assim, é muito tímida a atuação musicográfica no Brasil. Contamos
com o Centro Cultural da Av. Vergueiros em São Paulo capital com uma boa coleção de peças
em Braille para diferentes estilos e instrumentos. Todavia, o Braille é muito perecível, se
apaga pela quantidade de vezes que se leem com os dedos, caro e cada vez mais escasso
quando existe.
Traçar propostas para uma melhor produção de conteúdo é a mais antiga
reinvindicação da comunidade de cegos que tocam. O autor comenta que a maioria da
comunidade por ele assistida não deseja ser um profissional da música. Nos casos, Malheiros
dirige a atenção para o aluno que quer simplesmente tocar uma melodia do momento, de sua
igreja e não peças consagradas e enormes de algum clássico erudito. Com isso, é preciso
canalizar os olhares para o que vem sendo produzido em canais de compartilhamento
aleatório de comunicação, nas redes sociais como Youtube, pois lá, na medida do tempo de
qualquer um, as aulas ou simples explicações fazem a diferença sem importar a distância ou
momento do aprendizado.
O Braille não deve acabar, porém na urgência de quem precisa de informação, ter em
um vídeo suas preferências musicais alcançadas, vem valendo mais do que a espera pela
91
preparação de materiais em Braille para que PBV pudessem tocar. Nesse contexto, a proposta
é para uma melhor identificação dos itens dispostos na rede de computadores, barateamento
da conexão à internet de banda larga, repositórios dedicados a mùsicas editadas em programas
como Encore, Musescore,Finalle e Sibelius, preferencialmente. Com isso, unificaremos os
artigos utilizados em um só arquivo digital, sendo útil para quem desejar, passivo de alteração
e adaptação de tonalidades e recados individuais para caso ou demanda do atendimento
especializado.
Podemos encarar nas proposituras acima perfis destacados em três níveis de atuação.
De acordo com o aspecto autobiográfico deste estudo e os levantamentos registrados, tais
considerações podem conter nos parâmetros mencionados em três perspectivas, muito do que
esperamos para uma nova proporção de ações nos próximos anos. Desse modo classificamos
assim:
Relações Interpessoais: ainda temos muito a caminhar para compor uma
sociedade menos preconceituosa e medíocre em relação a seu compromisso com a
acessibilidade. Ainda parece que o dever maior de promoção de atendimento específico fica
somente com o setor pedagógico, todos esperam ações afirmativas de dentro para fora da
escola, no entanto, é verdade que na escola vamos ter a base formadora de boas ações, porém,
principalmente no ensino superior, cursos abrem mão de receber em seus quadros docentes,
professores com um mínimo de formação didática, fundamentados no fazer pedagógico e
retomando suas humanidades. Para exemplificar, temos bons engenheiros lecionando, mas são
devedores de boas didáticas e pelo contexto, obviamente não conhecem quase nada do que
existe em relação ao atendimento preferencial e condutas para pessoas com deficiência. Como
resultado, ainda teremos gerações de bons construtores desumanizados em variadas frentes de
atividade. Nas universidades, sem qualquer esforço investigativo, percebemos como é fraca a
discursão sobre o tema de acessibilidade fora das licenciaturas e pedagogias. Ainda vivemos
na condição de ter atenção a estes quadros de atendimento somente quando alguém próximo
da família passa a depender severamente de políticas afirmativas e ou mesmo quando se
aposentam e descobrem o quanto trabalharam mal para seu conforto social no futuro de
descanso laboral. Para isso, se faz necessário uma reformulação dos projetos de formação
acadêmica, unificação das práticas e uma maior exigência do mercado para profissionais mais
humanizados e sensíveis nesse aspecto.
92
pelo mundo e em menos de poucos segundo, trazer coisas novas para a composição do
repertório de grupos nos mais diferentes moldes de orquestração. No viés das fronteiras do
universo digital, deficientes passam a ter mais vez, participam melhor e constituem-se
amplamente pela oportunidade de acesso eminente. Infelizmente alguns setores são bem
taxativos e duros em relação a essa conquista. Ainda não podemos assistir espetáculos com os
celulares ampliando a imagem focada por suspeita de gravação indevida, ainda não nos
permitem fazer provas ao computador por medo de cola, ainda não nos permitem apresentar
escritos em língua de sinais por não verem cientificidade na ação e outras mais. Contudo, o
que somamos aqui pode ser considerado promissor, vivemos as informações em tempo real e
pela qualidade do acesso, quase nunca estamos excluídos das questões mais presentes.
No contexto da criação do Estatuto da Pessoa com Deficiência em 2015, vemos o
quanto há de alteração nas prerrogativas para a maneira como a sociedade vê a questão da
inclusão. No disposto acima em três partes, podemos considerar como os pontos mais
elementares de todo o conjunto de esforços para a manutenção de um projeto de integração
para a diversidade. Ainda que o texto traga,
Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo
prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com
uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas (BRASIL, 2015, p.01).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
questões das sociedades modernas. Fomos avançando nos campos pesquisados, comparando
com publicações anteriores, vemos como a internet transformou a força da palavra de
qualquer um que se inclina a falar de si ou de outro. Podemos citar os artigos que versam
sobre relatos de experiência em centros de formação com pessoas DVs. Por mais que
tenhamos o compromisso com a cientificidade, é impossível não se destacar pela imaginação
e experiência paralela a tantas realidades de um país enorme como o nosso.
A ABEM é a partir de então, uma associação que merece um foco especial, suas
investidas para a melhoria do quadro de ensino musical no Brasil são significativamente ricas,
além dos temas que abordamos aqui, ela colabora com os mais necessários pontos sobre a
problemática educativa musical. Os Grupos de Trabalho (GTs) amplamente distribuídos nos
eventos sazonais, são diagnósticos da saúde sócio/cultural das cinco regiões brasileiras. Sem
desmerecer a ANPPOM e as notórias publicações do Congresso Brasileiro de Educação
Especial (CBEE), o GT 3.3 que trata da inclusão e a música, reflete um parâmetro direto da
ação da arte em envolvimento com a deficiência humana. Com isso, não há julgo sobre quem
tem as melhores publicações ou quantitativo, vemos com isso um avanço importante para
aqueles que esperam por novos procedimentos e tratamento pelas sociedades.
De um todo iluminado pelas horas de esforço dedicadas a esta tese, indico uma futura
problematização, iniciada nesse tocar de fatos. No caso deste estudo que relaciona deficiência
visual e a música, podemos partir ao enfrentamento das questões que se abrigam dentro das
condições simbólicas que a música se apoia para a melhor compreensão. De um modo muito
curioso, pessoas cegas são consideradas aptas à música e não aptas a entrarem na academia de
música. Que valores são efetivados para que esta condição prevaleça? Muito do que podemos
perceber como resposta está diretamente ligado a qualidade do símbolo ou conjunto de sinais
investidos para o registro musical.
Os ajustes na investigação de Fantini (2016) nos foram úteis para indicar como é
crescente e consciente a preocupação com a deficiência visual e o autismo, categorias mais
presentes, tendo na ABEM uma voz solidária e responsável pela alegria de estar associada
com a música. Neste ponto o estudo revela como a arte é implacável para uma neutralização
da condição defeituosa como diz Vigotsky (2011), por ela temos como dar enfrentamento para
as raízes da desigualdade e contornar preconceitos. Nessa esteira, pudemos observar como a
música é veículo encorajador para a criação de locais de convivência urbana para a inclusão.
Considerando toda a parte de formação dentro do estudo das disciplinas do
doutoramento, vemos hoje o quanto se mostra relevante a participação ativa do autor,
mantendo o bom senso, como participante das narrativas contidas no corpo do estudo.
96
Durante a associação das ideias entre orientadora e orientando, vimos como possível
colaborar com humildade em determinados pontos com a escrita em primeira pessoa. Como
antes dissemos, não é fácil ler com pouca visão, mas ainda é mais difícil fazer outra pessoa
entender isso. Contudo, o medo de dar esse tipo de referência foi sendo substituído pela
possibilidade dia a dia de compartilhar verdades e mitos que circundam a música e a baixa
visão.
Quando no segundo capítulo tratamos de tornar clara a metodologia de atuação da vida
com baixa visão, sabíamos que não seria pelo propósito de sensibilizar somente, mas pela
conquista de um espaço adquirido pelos mesmos processos defendidos nos anos de AEE. Em
outras palavras, a sociedade trabalhou para dar voz e qualidade desta, então se a hora se
apresenta, “Nada sobre nós sem nós” é pauta para a emoção que nos trazem aqui. Sendo
assim, nossas conexões como a ciência e a experimentação se afunilam nas palavras que
traduziram os momentos de sobrevivências como músico e PBV para uma sociedade ainda
despreparada.
Os elementos pelos quais nos deram suporte para o teor metodológico deste capítulo
citado, consideramos aqui certos pela percepção das igualdades entre vidas analisadas de
pessoas do universo cego. Sendo aqui a primeira tese defendida por alguém em tais condições
de oportunidade, deflagram uma verdade que destrói as incapacidades para dar assento ao
potencial criativo e eficiente pelo foco que norteia a vida de quem escreve e não de quem a lê.
Para ser mais claro, fazemos referência a uma necessidade de mudança dos paradigmas
postulados, precisamos entender que nem sempre um livro é lido, pode ser ouvido e tocado, e
isso, finalmente considerado, traz conformidades interpretativas imprevistas nos moldes mais
convencionais.
Não podemos deixar de lembrar do próximo surdo, que não lhe permitem apresentar
suas ideias por meio de como está habituado a dizer de si, e com isso, causam confusão
achando que o cego só por não enxergar, é capaz de segurar um lápis e desenhar o mundo.
Nesse momento, tratando todos os que leem este estudo, voltemos para uma infância de
calores, queiramos saber mais pela necessidade e não pela vaidade de cuidar de assuntos da
moda acadêmica. A contribuição para as pessoas em atendimento especializado precede a
formação intelectual, pois nascemos todos, mesmo sendo humanos, como o animal mais
deficiente do planeta e dependemos integralmente dos pais para nossa sobrevivência. Assim,
podemos dizer que nossa infância contabilizando mais de 20 anos, existe assim pela
quantidade de coisas a aprender e por conta de nossa incapacidade natural no processo
evolutivo.
97
Sob as histórias de vida trazidas para dentro deste debate, pudemos reorganizar as
conformidades entre a autoria do estudo e os processos de conciliação da música na vida dos
nomes famosos citados. Conhecer mais de Ray Charles, nos trouxe um desenho de como a
vida se encarrega de anexar dados elementares para dentro de nossa formação biológica,
constituirmos adaptações. Por essa etapa, fica clara que a superação é condição de quem não
entende ou sente de fato o que é viver com a deficiência. Nos relatos e documentos
analisados, não há presença de qualquer conformação direta em relação a cegueira ou baixa
visão, pois quando |Pascoal fala de sua infância, carrega no seu tom de voz a serenidade muito
comum de quem reflete simultaneamente enquanto fala sobre como seria diferente se visse
bem como os outros o mundo.
Enquanto elaborávamos esta tese, na memória vinham as escolas de atendimento
específico para cegos antes conhecidas, pois era forte a recordação sobre o medo de seus
funcionários para o fim da inclusão por parte do fechamento destas frentes de funções. Vimos
com Bocceli como a escola dotada de uma metodologia sedimentada é capaz de acelerar
nossas potencialidades. Considerar isso extravasa para qualquer outro modelo educativo, pois
não somente para deficientes as ações de inclusão servem, no fundo, estudar tem como
essência uma constante inclusão por não saber e passar a saber. Por este, continua a lembrança
de como os alunos com deficiência incluídos em classes regulares, na maioria das vezes,
davam menos ocupações que os demais. Nossa busca demonstra que não se trata de
compensação, mas de uma modificação dos atos para a compensação.
Em Schafer (1992) pudemos constatar como caminhamos no mesmo fio de ligação. O
autor canadense, sendo específico para as necessidades específicas de seus alunos, trouxe para
muitos uma nova verificação sobre o que ele mesmo afirma ser a afinação do mundo. Por
outro lado, contido no viés desta pesquisa, o autor canadense também pode ser considerado
um autor para a diversidade na perspectiva da inclusão. Conhecer a música por seus
elementos fundamentais nos deixa insuficientes ou mesmo deficientes nas primeiras classes
de aula. Para o professor, quando tenta reordenar a música por meios mais acessíveis, dá
noção do que seja a chave que abre uma caixa para inclusão nas sessões de aprendizado
musical. Desse modo, nos sentimos profundamente identificados com a teoria e sensíveis a
mais próxima condição entra a música e a deficiência visual.
Por fim, nos impulsiona para um quarto capítulo um conjunto perante as obras
coletadas para um índice de proposituras para uma concepção dialética entre a música e a
deficiência visual. A base metodológica da pesquisa pelo foco de uma abordagem a partir das
narrativas, autobiografia e leitura dos recentes anais relacionado, compromete alguns setores
98
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NUNES, Sylvia & LOMÔNACO, José Fernando Bitencourt. O aluno cego:
105
APENDICE
109
TABELA 03: Levantamento das publicações relacionadas com EME na Revista da ABEM (2015-2018)
Revista da ABEM
Autor (s) Título e Resumo Ano
Paulyane Educação Musical e transtorno do espectro autista: análise da 2018
Nascimento produção em revistas brasileiras de artes/música qualis a1 e
Zimmer, seus anais de eventos regionais e nacionais (2006-2016)
Jéssika Castro Resumo: Neste estudo, os pesquisadores analisam a produção
Rodrigues, gratuita sobre educação musical e Transtorno do Espectro
Áureo Autista (2006-2016) nas revistas brasileiras Qualis A1
DéoDeFreitas Artes/Música (avaliação 2014): (a) Música HODIE, Per Musi,
110
para pessoas com deficiência precisa ser visto como uma das
várias facetas da educação musical vinculado a novos
parâmetros de diversidade do ensino de música.
Ricardo Soares O ensino e aprendizagem da música para pessoas com 2017
Ribeiro deficiência visual na escola especial de música Juarez Johnson
resumo: Este artigo é resultado de um estudo que envolve a
educação musical para alunos com deficiência visual (DV). O
campo empírico da pesquisa foi a Escola Especial de Música
Juarez Johnson (EEMJJ), no município de João Pessoa. Esse
estudo buscou compreender como o professor aborda os
conteúdos musicais junto aos alunos com DV, a partir dos
seguintes questionamentos: Qual a proposta pedagógica da
escola especial de música? Que metodologias são empregadas
no processo de ensino e aprendizagem musical com crianças
deficientes visuais? E ainda, que recursos específicos,
incluindo materiais didáticos, são empregados no processo de
ensino e aprendizagem musical em crianças com deficiência
visual? A abordagem metodológica, de caráter qualitativo, se
apoiou em informações coletadas em uma instituição que
contempla em seu corpo discente alunos com deficiência visual
(DV), adotando a metodologia estudo de caso, tendo como
participantes dois alunos com DV. Os conceitos centrais da
pesquisa fundamentam-se nos pressupostos teóricos dos
seguintes autores: BONILHA (2006), TOMÉ (2003) e MELO e
ALVES (2010) e relacionados principalmente a musicografia
braille; VANAZZI (2010) e SOUZA (2010), que tratam da
inclusão e LOURO (2003), que trata principalmente de
adaptações pedagógicas para pessoas com deficiência. Palavras
chave: deficiência visual (DV); Escola Especial de Música
Juarez Johnson (EEMJJ); ensino e aprendizagem musical.
Liana Monteiro Música e inclusão: refletindo sobre novas perspectivas da 2017
de Araújo relação música e deficiência.
Resumo: Este artigo apresenta reflexões voltadas para a
temática da atuação do educador musical que está inserido no
processo de ensino e aprendizagem de pessoas com
deficiência. O texto tem como objetivo discutir a educação
musical numa perspectiva inclusiva, levantando questões sobre
a necessidade de quebra de paradigmas e barreiras nos
processos de ensino e aprendizagem musicais. Para tanto, situo
a interseção entre música e educação especial, traço um breve
panorama histórico da educação especial, apresentando três
modelos de deficiência, que servem de referencial para se
compreender os pressupostos que os processos educativos
sofrem ou sofreram frente à diversidade. Finalizo apontando
novas perspectivas da relação música e deficiência, que vão
desde adaptação de acesso ao currículo, de conteúdos e
objetivos, do método de ensino e de materiais, falando de
maneira concreta que há novas oportunidades no campo da
elaboração de materiais adaptados, composições específicas
para grupos de instrumentos adaptados, lutheria e manufatura
de instrumentos adaptados, que viabilizem e façam mediação
do professor e o aluno com deficiência; incluindo a ampliação
dos espaços de atuação dos educadores musicais e das pessoas
com deficiência.
Erickinson A regência e seu ensino técnico basilar para um discente cego 2017
115
TABELA 05: Levantamento das publicações relacionadas com EME publicadas no Anais dos
Encontros da ABEM (2016-2018)
TABELA 08: Resultados de teses e dissertações coletadas por autor, título, ano e país de origem.
Levantamento Internacional
Autor(s) Título Ano País
Glória El impacto social y educativo del programa musical batuta 2015 Espanha
Constanza el sistema nacional de orquestas sinfónicas juveniles e infantiles de
Rincín Colombia
Prat
Nadhir La spécificité du déchiffrage pianistique chez les musiciens aveug les 2015 França
Bouabid et deficientes visuels:
effetsdesreprésentationsmentalesdesnotationsmusicalessurlaconduite
de mémorisation
Luis “La didáctica de lviolínen alumno scon 2017 Espanha
Sánchez discapacidad visual: compendio de buenas prácticas, recursos y
Sánchez estrategias metodológicas para una educación inclusiva em las
enseñanzas elementales y profesionales de música”.
Edyta Influence of musical experience of blind and visually impaired young 2015 Polônia
Bogusz- persons on performance in selected auditory tasks
Witczak
Hanna
Turkowska
experiências com crianças e jovens com deficiência visual, relacionadas com a percepção
psicoacústica do som como arte musical.
No caminho dos estudos citados pelas autoras podemos perceber que além das tarefas
psicoacústicas, outros resultados de melhor adaptação por parte de DVs acontecem em uso da
memória de empenho da pesquisa. Para elas, essa memória que acompanha as inteligências do
ofício é mais solicitada em DVs que em adultos videntes. Nas crianças, dada a condição de
amadurecimento, as relações de eficiência não são tão discrepantes como em outros casos de
etária adulta. Todavia, a interpretação feita pelas autoras tem bases de fundamentação quando
observam os exames de índice ressonante que acusam ao córtex uma diferença significativa
do desenvolvimento das habilidades auditivas prevendo treinamento músico espacial, tanto no
grupo caso e controle.
Como o texto é inspirado em um paper das próprias autoras, é um aprimoramento dos
valores atualizados neste estudo, mensagens mais diretas como por exemplo, pessoas DVs são
mais eficazes a exposição de sons em plataformas 3D, ainda que a fonte seja frontal. Estes e
outros exemplos são percebidos na tabela criada para ilustrar o quantitativo proporcional de
desempenho em relação a diversas tarefas envolvendo vidente e DVs sob exposição acústica.
Por fim, o texto é bem compreensível, apesar de termos muito específicos, colabora de
forma direta, sem rodeios com os resultados alcançados e demonstra como outras áreas,
diferentemente da educação, trabalham sob a influência de compreender mais do universo da
DV para interpretação do mundo e do universo da arte musical.
Faremos nessa etapa os comentários críticos dos dados levantados sob a luz dos
conceitos em diálogo com os autores e participação nas ideias de construção desta tese.
Vamos abordar, sem juízo de valor, os estudos na ordem que se apresentam nas tabelas 01, 02
e 03 (p...Apendice), por perfis elencados nas letras de A a D.
PERFIL A
educativas para que pessoas, como o próprio autor, deficiente visual, pudessem alcançar seus
objetivos através da educação.
Sendo um texto autobiográfico, Brandão, pessoa com baixa visão, diagnóstico de
Síndrome de Stargardt, é professor assistente da Universidade Federal do Amazonas, da
Faculdade de Artes, curso de música e tem na sua rotina de trabalho, “oferecido” aos seus
alunos a oportunidade de atendimento em via contrária, pois os alunos aprendem a receber as
especificidades da conduta cega do professor. Nesse sentido, o autor revela sempre em sentido
contrário, sinais de atendimento especializado dos alunos para o professor.
Com o aumento dos recursos tecnológicos, internet mais rápida, leis apropriadas,
congressos e encontros de compartilhamento de dados e outros, a possibilidade de pessoas
com deficiência alcançarem funções de liderança se amplificam a cada ano. Podemos avaliar
o núcleo da idéia de Brandão como positivo pelo relato ainda incomum, mas como uma
promessa que mais pesquisas apareçam com o mesmo teor.
Como diz Charlton (1998), em uma tradução de “Nothing About Us Withou Us”, ou
seja, “Nada sobre nós, sem nós”. Por conta desta, o autor chama atenção para a necessidade
de mais enfrentamentos pela academia autobiográficos, fundamentados nos diálogos de outros
autores, mas, com condições de traduzir ao mundo, determinadas verdades somente ditas por
quem de fato vive a realidade da deficiência visual.
Na mesma linha do texto de Brandão (2016), temos Silva & Ferreira (2016), sendo
apresentado no Encontro Regional Nordeste, trazendo o depoimento enquanto um dos autores
sendo aluno de graduação em música, expressando como Brandão os desejos por mais acesso
e linguagens unificadoras para a prática musical.
Podemos encontrar em Fantini (2016) um panorama do aumento de investidas
autobiográficas como uma tendência que ilustra, sobretudo, o aumento da entrada de pessoas
com deficiência nos ambientes acadêmicos. Com isso, o texto publicado por Brandão traz
depoimentos de alunos e concepções de estudo em regime de formação das novas condutas de
mercado para profissionais atendidos ao longo de sua vida estudantil, por sistemas
especializados de ensino e boas condições de estudo.
O texto, Mediação Informacional e inclusão para musicistas cegos, imediatamente
contabilizo aqui mais uma crítica ao texto publicado por Seco (2017), trazendo em seu interior
dados relevantes sobre o acesso, principalmente dentro de bibliotecas digitais, a mesma
dissertação é autocontraditória, fechada a seleção dos caracteres e difícil de ser lida pelos
programas descritos por mim.
Se trata de um dissertação duplamente encontrada na BDTD e Banco de dados da
132
Desse total, 2.074 alunos foram considerados como cegos e 11.028, com baixa
visão. A somatória desses dois contingentes totaliza 13.102 alunos com deficiência
visual matriculados em cursos de graduação, nas modalidades presencial e a
distância, em IES públicas e privadas do nosso país no ano de 2016” (FINCK, 2017,
p.01).
Nas palavras entendidas de Seco (2017) é útil no sentido da demanda apresentada por
Finck (2017), reflete incialmente sobre os conceitos de cegueira que nunca estão
ultrapassados pela importância do interesse de novos leitores, ao mesmo tempo que debate um
tema importante, a mediação.
No primeiro momento, a autora considera importante conceituar dois elementos
fundamentais para a compreensão do que venha a ser acessibilidade, o obstáculo/barreira e
sua forma antagônica, a própria acessibilidade. Na Lei nº10.098/2000, uma barreira é prevista
“como qualquer obstáculo que limite ou impeça o acesso à informação e à possibilidade de
comunicação” (p.04), ao qual Seco (p.04) encaminha os esforços da pesquisa para dar novos
horizontes de acesso, principalmente a leitura e escrita de DVs. Como destaque, podemos
considerar a identificação de dois tipos de barreiras na vida: as físicas, sendo definidas como
componentes da arquitetura urbana, transportes e passeios públicos e no outro lado, tem-se os
obstáculos atitudinais, referência direta ao preconceito sofrido pelos sujeitos da pesquisa.
Em seguida, o texto toma um teor de confronto social com base nas relações
estabelecidas ao longo dos anos diante da presença de deficientes na sociedade. Mesmo sendo
uma revisão detalhada da literatura de maioria impressa, este autor defende a manutenção de
duas frentes de enfrentamento, citando o menosprezo e a eliminação como ações ainda
permanentes e a aceitação e tolerância para uma nova condição social. Para ela, toda essa
movimentação histórica resulta em uma legislação “destinada a assegurar e a promover, em
condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa
com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania” (BRASIL, 2015, p.01). Ainda
133
neste capítulo, a autoria do texto faz uma interessante redação sobre a história
especificamente ligada a cegueira na sociedade, mostra como os mais temidos castigos eram
relacionados a perda da visão e cita parte da Bíblia com passagens entre as enfermidades do
mundo antigo.
Em outro momento do texto, Seco, por meio de outros autores, concentra uma curiosa
relação entre a interpretação das imagens com o órgão visual. Ela salienta uma informação
que traduz muito do que o senso comum faz rotina em afirmar, “crianças nascem cegas”. Na
verdade, como comprova a autora, ao nascer, “[...]a criança possui os órgãos da visão
imaturos e não tem capacidade de enxergar como um adulto. Os estímulos visuais são
imprescindíveis para a maturação ocular que ocorre do nascimento até os seis anos de
idade”(p.05). Além desse quadro, o estudo colabora com um dado importante, o entendimento
da condição de baixa visão se dá a partir da década de 1970 em estudo exteriores. Essa ação é
fundamental e relevante para a melhoria de vida da maioria dos DVs no mundo.
Para Seco (2017, p.34), “a baixa visão é definida como a ausência severa de visão ou a
debilidade visual que ocasiona diminuição da capacidade de enxergar”. Com base nesta, o
discurso do texto caminha para a aplicação dos conceitos para associação a prática docente
com pessoas cegas. Neste momento, Layara confere à qualidade da mediação à
responsabilidade do sucesso de muitos procedimentos didáticos. Assegura que se a “mediação
informacional” fosse melhor ou mais vezes mencionada nos cursos de formação profissional,
uma quantidade de barreiras atitudinais seria ultrapassada.
Para concluir a autora disserta sobre o preconceito de modo contrário como eu penso
ser. Ter considerações prévias acerca de qualquer pessoa é comum a nossa humanidade.
Entendo pelo o que escreve o autor, há uma referência a manutenção de conceitos pré-
estabelecidos que impedem uma melhor compreensão dos fatos e condutas de um DV. Por
outro lado, as pessoas com deficiência também criam barreiras na direção contrária, tudo faz
parte de um jogo de aceitação, somo tolerantes até quando temos interesse e curiosidade. Vale
salientar, “a crescente busca informacional percebida inclusive nos círculos sociais dos
musicistas com deficiência visual traz reflexões que precisam ser exploradas para que
ocorram melhores práticas inclusivas e acessíveis” (2017, p.08). O texto conclui com uma
análise bem significativa sobre os depoimentos adquiridos durante a investigação e reflete
sobre como devemos arrumar o mundo para nossos descendentes.
No texto A cor do som: processos de reconhecimento da imagem do som por meio
da semiótica nas relações entre deficientes visuais e a música, os autores, “com base nas
leituras de Sanders Peirce (1839-1914), verificam um encorajamento para uma nova
134
construção a partir dos fenômenos da interpretação dos sinais de uma rotina de vida por meio
da deficiência visual”(p.08). Brandão e Staub conseguem, neste objeto criado, orientar
professores sobre a importância da construção da confiança entre aluno e educador, uma vez
estabelecida esta confiança, tudo flui pela possibilidade de criação de “imagens” não gráficas
que ordenam o aprendizado. Nessa mesma perspectiva, tais atributos pertinentes da
interpretação de sinais, acima de tudo, sensoriais, constroem sensações de confiança contidas
nos canais semióticos revisados nesse estudo.
Sendo um dos autores deficientes visuais, em determinados momentos a experiência
por meio do relato do mesmo é valiosa para uma leitura mais confiante do universo da falta de
visão. Brandão e Staub comentam sobre a capacidade humana de, somente com a fala,
elaborar na cabeça de alunos, imagens a partir do conjunto dos sentidos. É assim a percepção
de um cego. O cheiro de uma lasanha é imagem, a textura de um carpete também é imagem e
outras possibilidades de associação dentro da unidade formada pelos cincos sentidos
humanos.
Publicado no XXII Congresso da ABEM em Belo Horizonte, é um texto inovador pela
abordagem do discurso, precisamente inédito sob a avaliação de Fantini (2016) e abre vias de
expansão para outras formas de desenvolver aprendizado por dimensões ainda desconhecidas
de muitos. Em resumo, o fato observado dos autores diz que os cegos não se veem diferentes,
somos mais iguais que pensamos, pois as mesmas condições administradas por este viés
pedagógico, é vivenciado por todos, só não somos atentos às formações das “imagens”
segundo os autores, se temos todos algum sentido funcionando, temos unidades de imagens
constantemente sendo criadas em consciência.
O estudo BRAILLEÉCRAN: uma abordagem para entrada de texto em braille
para smartphones apreciado de Joyce Siqueira, publicado em Goiânia, 2017, é uma
dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação do Instituto de Informática da
Universidade Federal de Goiás e versa sobre a criação de um aplicativo associado a acessório
para escrita em telefones de tela sensível ao toque. Neste caso, a autora faz um breve e
esclarecido comentário sobre algumas necessidades pertinentes ao universo da cegueira. Com
isso, ela aborda problemas muito comuns que ocorrem quando usamos aparelhos celulares
com tela touth, aquelas lisas, sem botões.
Mesmo sendo um esquema que por teoria esteja distante do ambiente pedagógico,
assume um perfil conceituado da realidade da demanda de uso por pessoas cegas junto a um
celular. Podemos imaginar como deve ser desconfortável uma tentativa de digitação cega em
135
teclado QWERTY, e quando isso ocorre, recursos como leitores de tela 4 tiram a privacidade e
narradores5, quando acionados em ambientes poluídos sonoramente, falham bastante. Diante
disso, Siqueria (2017) apresenta um relato experimental da criação de um conjunto de
dispositivos com aplicativo para escrita com base no código Braille em smartphones.
O BRAILLECRAN é um aplicativo testado por um grupo de 10 colaboradores,
avaliado quanto a sua facilidade de uso, custo e adequação a rotina de cada usuário. Siqueira
(2017, p.18) propõe “desenvolver um método para entrada de texto, utilizando o Sistema
Braille, que proporcione usabilidade apropriada, uma boa experiência de uso e que possa ser
produzido a baixo custo. O método é destinado a smartphones com tela sensível ao toque”.
Além deste, existem no mercado, outras aplicações que interagem com o Braille a partir de
telefones modernos. Em uma rápida busca nas lojas virtuais, neste caso da Apple, a
tag“Braille” apresenta os seguintes resultados: Braille Go, Visual Braille, Braille Study Learn,
WD Braille, entre outros. Siqueira tenta, neste projeto, criar uma possibilidade adequada a
realidade brasileira, ligada principalmente aos custos para o usuário final.
Como pudemos constatar, as stores de aplicativos possuem soluções para o
aprendizado do código, para tradução, para um banco de memória do alfabeto Braille, porém
o sistema se adequa a cada configuração ortográfica do país que incide e isso, quando nos
aplicativos importados, não funciona para o deficiente local.
O trabalho conclui apresentando os pontos fortes e fragilidades do projeto. Foram de
fato desenvolvidos protótipos e colocados em uso pelo grupo mencionado. Dados sobre
distância dos botões, aplicação direta de inserção numérica e letras maiúsculas, são tarefas
futuras para a melhor qualidade do produto. O ponto alto cabe ao “[...]custo da película tátil é
extremamente baixo. No entanto, esbarra na dificuldade do usuário comum em imprimir a
película tátil, visto a impressora 3D ainda não ser um produto popular” (2017, p.74).
A deficiência visual e a música: reflexões sobre dois universos da condição
humana é mais um exemplo deste levantamento. Podemos verificar como os enfrentamentos
da rotina de vida de uma pessoa com deficiência visual ocupam determinadas pesquisas
4
Com a chegada dos computadores pessoais, alguns programas foram criados para dar melhor acesso para
deficientes visuais. Esses aplicativos, hoje também embarcados em aparelhos celulares, ajudam cegos e pessoas
com baixa visão a ler o que está na tela do PC ou smartphone. Fazendo uma leitura em voz alta e sintética,
aplicativos como Voiceover(iOS) e o Talkback(Androide), facilitam a vida no uso de celulares com tela sensível
ao toque. Por outro lado, acabam com a privacidade da pessoa e possuem limitações ainda frequentes.
5
O caminho inverso de uma leitura no PC ou smartphone é o narrador ou ditado. São aplicações, hoje comuns,
principalmente nos celulares de uma tecnologia que escreve o que se narra. Atualmente é um recurso muito
eficaz, restrito a ambientes silenciosos para uma melhor qualidade do resultado final e aumenta a prática de
inserção de texto por pessoas cegas e com baixa visão nas aplicações mais simples como uma conversa no
Whatsapp.
136
Perfil B
visual, muito comum nas regências feitas por normovisuais6. Por outro lado, as mãos, sendo
bem condicionadas, mesmos princípios da condução da assembleia, passam por adaptações.
Quando prestei horas de regência no curso de licenciatura em artes, lembro de dedicar umas
horas a mais para ter nas mãos, outros sinais mais específicos que tomassem conta das minhas
necessidades como regente. Além disso, o tempo com determinado grupo gera comunicações
únicas e a deficiência visual passa a ser somente um detalhe quando há envolvimento maduro
entre os pares.
Para comentar o artigo, O Ensino e aprendizagem da música para pessoas com
deficiência visual na Escola Especial de Música Juarez Johnson, vamos partir das
considerações de Sá et. Al. (2008), em uma publicação encomendada pelo Ministério da
Educação sobre o Atendimento Educacional Especializado. Neste pequeno livro, a autora
consolida praticamente todos os recursos didáticos adaptados para o atendimento de DVs.
Ricardo Soares Ribeiro apresenta um trato de pesquisa de origem basicamente de seu esforço
de observação, porém muitas coisas faltam para compreendermos onde se aplicam os
objetivos do relato. Dessa forma, Ribeiro desconhece o que temos posto há mais de 10 anos
assim como aponta Sá et. Al. (2008). A crítica é apresentada pela oportunidade de reconhecer
que estudos voltados para as deficiências não podem mais partir de algo tão raso.
O autor faz um relato sobre uma experiência com dois alunos cegos em uma escola de
música em João Pessoa. No quadro metodológico do labor acadêmico, Ribeiro não descreve,
como vejo fundamental, o potencial de resíduo visual que os sujeitos respondem, se fazem
uso de algum recurso específico e principalmente, delibera pelo uso do Braille como
ferramenta, sendo que, neste último tópico, devemos valorizar alguns aspectos antes da leitura
em relevo ser aplicada (Giesteira, 2016). Sendo uma pesquisa qualitativa, o autor passa a dar
noção de sua inserção no universo da cegueira e não a tomar processos didáticos adaptados
para ensinar música para DVs.
Dessa forma, o título deste trabalho seria diferente e mais justo com a posição humilde
que Ribeiro toma. Claro que toda colaboração é válida, porém como faço aqui uma crítica,
vejo que estudos que possuem elementos que registrem os “medos” de professores ao lhe
comunicar com DVs, somam bastante para o universo do conhecimento.
A coleção de dados é apresentada como comunicação oral no XI Conferência Regional
Latino-Americana de Educação Musical da ISME, traz, como maior colaboração, o
6
Termo que se faz presente nos mais recentes trabalhos e se determina a definir todas as pessoas que possuem
visão normal. No jargão escolar, “deficientes visuais” são diferentes de “videntes”. Desse modo,
normovisuais são aqueles que não apresentam de capacidade em sua acuidade visual.
139
depoimento do autor quando se refere a sua primeira e impactante entrada no meio vivente de
sala de aula musical com alunos cegos inclusos. Nota-se que quando Ribeiro diz, “[...]os
mínimos detalhes acontecidos naquela imensa sala exigiam atenção[...]” mostra de modo
muito interessante como estamos formando os futuros professores de música. Finck (2016),
representando uma ideia, propõe um olhar mais dedicado aos currículos formativos e
inclinados a diversidade de um país em desenvolvimento.
Sua coletânea apresenta duas tabelas sem padrão estabelecido, dificultando a
interpretação dos dados. Na primeira, apresenta conteúdos observados durante as aulas e
atividades deflagradas para cada item mencionado, enquanto na segunda, temos visto
metodologias diversas para aplicação de conteúdos diversos e pertinentes ao fazer artístico.
Por fim, Ribeiro conclui dizendo que o textual é muito mais um exercício investigativo,
porém, como constato, ele colabora muito para a verificação de parâmetros do egresso de
nossas instituições. Diante disso, mesmo que aqui sejam detectadas essas ausências, é um
texto direto e de leitura bem leve, quase se imagina o perfil físico do professor recém-saído da
universidade.
O ensino de música para alunos cegos e videntes em classe regular de ensino por
meio dos jogos musicais: um relato de experiência éum estudo apresentado no XII
Encontro Regional Nordeste em 2016 e se inicia com bons esclarecimentos que nos fazem
lembrar os números de nossa ação.
A autora é bem feliz ao dedicar ao educador musical a responsabilidade da
democratização da própria música, seja isso em ambientes diversos e acima de tudo, nas
escolas. É um texto preocupado em verificar como os jogos, muitas vezes desenvolvidos em
classes de elaboração de oficinas pedagógicas na universidade, podem auxiliar com êxito uma
educação musical em salas regular com alunos DVs inclusos. Por este, Rocha descreve
procedimentos tomados a partir da intervenção em uma escola de ensino médio com cinco
oficinas estruturadas que aplicariam jogos rítmicos e práticas instrumentais.
Com 04 jogos descritos, Rocha consegue apresentar procedimentos valiosos, ou seja,
um quadro optativo de possibilidades para futuros professores de música como emprego nas
suas práticas docentes. Ao tabular os dados avaliados nas oficinas, a autora colabora com um
importante banco de associação das semelhanças entre alunos videntes e DVs. Mantendo em
sigilo os nomes dos participantes, o número elevado às vezes dispõe certa confusão, porém os
resultados só comprovam como estamos muito mais semelhantes ao contrário de alguns mitos
formados para a associação de música e cegueira (Giesteiria, 2016).
Considerações sobre o ensino de música para alunos com deficiência visual:
140
diálogos para a inclusão, sendo mais um caminho apontado de Ricardo Soares Ribeiro, este
é apresentado no XII Encontro Regional Nordeste ABEM em 2016. Considero um estudo
clássico e útil.
O autor procura desde o início apresentar as leis que conduzem para um atendimento
de qualidade na educação inclusiva. Divide o estudo em 03 partes: Educação musical,
Deficiência visual e Inclusão. Respectivamente Ribeiro mostra, em comparação ao seu outro
texto também levantado neste Estado da Arte, mais maturidade e compromisso com o
universo da percepção visual. Mesmo que ainda aconteçam referências às terminologias
empregadas como: portador, necessidades especiais e outras sendo acrescentadas, o monte
teórico flui com mais leveza e organização.
Agrada quando Ribeiro cita além da cegueira a baixa visão, caso inocorrente nos
textos até aqui catalogados. “A deficiência visual pode ser vista como uma limitação – mas
não como impedimento” (p.06). Até então, este devolve uma literatura mais inicial do que
vimos antes de 2015, porém e refrescante para os novos olhares da EME, isso contabiliza um
ponto positivo dentro dos anais da ABEM.
Por fim, Ricardo conclui trazendo caminhos possíveis como DOS VOX, musicografia
Braille e uma proposta de reformulação das práticas docentes em música para a inclusão, no
meu entender, para todos os quadros possíveis, uma vez que o autor mostra como a música
tem potencial para a criatividade e libertação de certas opressões sociais. É uma soma muito
interessante e infelizmente peca ao referenciar imagens consagradas de forma errada, por
exemplo, o alfabeto Braille inserido é do livro AEE Deficiência Visual e não de um banco de
dados da internet.
Música e inclusão: ações pedagógicas para o trabalho com um aluno cego no
Ensino Superior, o presente artigo contido nos anais do XI Conferência Regional Latino-
Americana de Educação Especial, 2017, versa sobre a experiência tratada dentro de um
núcleo de acessibilidade denominado Esperança Viva que inclui pessoas com deficiência por
meio do ensino musical.
Neste quadro os autores classificam ações elementares do desenvolvimento do núcleo.
Mendes e Oliveira (2017) quando dizem que o projeto “conta com a ajuda de monitores
empenhados e apaixonados pelo afirmativo que é feito e totalmente dispostos a promover um
ensino de qualidade para os alunos que integram o grupo”(p.33), me preocupa pelo fato de
haver um juízo de valor agregado a essa fala. Ao longo de minha vida, quando senti falta de
um apoio mais eficaz, infelizmente a paixão não foi agente suficiente, o voluntariado é bem-
vindo, porém ações profissionais são incomparavelmente profundas.
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Com isso, Finck (2016) ao tratar da chegada dos números que revelam acesso ao
ensino superior por pessoas alvo do AEE, propõe um currículo mais voltado a formação
profissional, longe do voluntariado.
Outro ponto de confronto ideal parte da afirmação dos autores, “Ainda são poucas as
pessoas que realmente conhecem e utilizam a Musicografia Braille” (nosso grifo, p.33). Para
Giesteira (2017), os avanços, sobretudo, da leitura feita por deficientes visuais residem nos
dispositivos digitais. O Braille não morre, mas seu uso é caro e demorado, sem falar no
desgaste do mesmo. “Ainda”, é uma condição a se refletir, pois com a chegada de
smartphones e aplicativos de conversão sonora, a musicografia Braille é cada vez mais difícil
de achar. Por outro lado, justifica-se no fio da cognição a inclinação para dar noção do que
venha a ser a musicografia e os esforços para que esta exista fisicamente.
Concluindo, os autores fazem um levante das ações dedicadas dentro do projeto e
consideram importante a música como ferramenta de inclusão. A partir dos alunos cegos
atendidos, a discursão tomou forma para uma melhoria da qualidade dos processos
metodológicos aplicados pelos condutores das ações. Dessa maneira, mais como um relato
expressivo, Mendes e Oliveira (2017), como estamos verificando, colaboram para o registro
de possibilidades nascidas pela vontade de fazer o melhor, porém ainda reforço o papel do
profissionalismo em qualquer frente, sendo ela inclusiva ou não.
Técnica vocal para alunos com deficiência visual: um olhar sobre o desafio dessa
prática no Grupo Esperança Viva (EMUFRN), nesse levante a autora Matias descreve um
relato de experiência vivenciado dentro do Projeto de Extensão Esperança Viva, ao qual suas
ações eram voltadas à criação e manutenção de um coro para pessoas acima de 60 anos. No
caso em questão, o trabalho se ocupa de ofertar metodologias adaptadas ao contexto do coro,
sendo este uma oportunidade de técnica para dois integrantes cegos. Tal ilustração de esforço
faz uma singela homenagem ao Grupo Esperança Viva, piloto das ações do programa que se
iniciou com um grupinho de flauta doce com alunos cegos na Escola de Música da UFRN.
A autora consegue por meio de uma boa descrição e fácil leitura, apontar os
pressupostos da deficiência visual, recursos estabelecidos e um quadro de separação muito
clara dos processos de aquisição dos sintomas da cegueira, dando ênfase ao que é congênito
ou adquirido. Nesse ponto, entendemos como relevante a contribuição para a condição de
baixa visão, referenciada pela autora com o apoio dos escritos de Viviane Louro e outras
figuras.
Por fim, o texto é parcela do conjunto de artigos aceitos neste ano e associados à
temática. Conclui que os conteúdos de técnica vocal vão além de colaboradores, são
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facilitadores de uma inclusão plena. A deficiência não assume maiores problemas e o conjunto
da unidade de normovisuais e DVs se neutraliza durante as expressões vivenciadas nas
apresentações do grupo. Matias (2016) acrescenta que uma boa observação e abertura para o
diálogo são fatores hiper favoráveis para o sucesso do atendimento nestes casos.
Música e deficiência visual: os processos de aprendizagem musical no Projeto
Esperança Viva, dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Música da
UFRN, 2016, com precisão, Bezerra divide o seu ideal em 04 capítulos, organizados para dar
suporte de leitura a condição da deficiência visual: a música e a deficiência visual, o Projeto
Esperança Viva e processos de aprendizagem pela pessoa deficiente.
A história da pessoa deficiente visual é tratada de forma bem curiosa. O autor divide
em tópicos que nos incentiva a leitura dos períodos personificados da situação de cegueira.
Para ele podemos interpretar as relações sociais do cego por períodos, sendo o primeiro visto
como místico, por conta de todo o envolvimento mágico da antiguidade pela crença, em
alguns casos, de que cegos poderiam ver o futuro ou muito além das paisagens.
Depois, temos o biológico ingênuo, caraterizado pelo momento iluminista da
humanidade, passando a ver a pessoa cega a partir de sua condição biológica, ainda com
resquícios das maldições e castigos creditados no passado pelos mais crentes nas punições
divinas. No próximo período vemos a ciência no indivíduo, ou seja, efetivamente o cego é
capaz e deve se educar. São quando surgem os processos metodológicos educacionais na
Europa do Século XVII.
Nessa obra há uma busca para uma das perguntas mais recorrentes, “um sentido
substitui o outro?”(p.41). Bezerra, após revisão de Vygotsky (2011), faz um confronto de
teorias que defendem ou não a aceitação da transmissão de tarefas sensoriais. Tal parte da
pesquisa dá ao conjunto das análises uma força para as publicações mais atuais. Mesmo que
eu tenha minha posição em relação ao assunto, e que veremos mais a frente, é uma leitura
recomendada, típica da curiosidade comum aos que investigam desse modo e responsável.
No capítulo seguinte, o autor confere às relações entre a deficiência visual e a música,
modelos aplicados e tendências de ação pedagógica são abordadas. Com base nos suportes
teóricos apresentados anteriormente, Bezerra comenta sobre os equívocos naturais que
ocorrem quando há a união da deficiência visual e a prática musical. Faz uma alusão ao
Braille e sua musicografia e discorre sobre as habilidades da pessoa cega. Tudo com base nas
observações de campo e revisões de artigos relacionados. Desse modo, o autor mais uma vez
é cativante nas palavras e contribui para o aumento de conhecimento agregado.
Nos dois últimos capítulos, há uma associação direta entre si, pois o debate rodeia o
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Projeto ao qual o professor autor é fundador e caminha para o elenco das práticas efetuadas no
Esperança Viva e, por consequência, processos sócio criativos da metodologia desempenhada
pelos professores do programa para a inclusão de deficientes. Dessa maneira, o autor conclui
afirmando que muito do desempenho é resultado dos procedimentos desenvolvidos durante as
ações do Projeto Esperança Viva.
PERFIL C
texto em relação ao ensino da música para deficientes. Nesta etapa, são verificadas as
diferenças metodológicas entre as condições de acesso dos três tipos de sujeitos envolvidos na
pesquisa. Ainda com um bom enquadramento dos dados coletados, o autor faz suas próprias
considerações com base nas ações de intervenção experimental. Em determinados pontos do
texto é impossível de ser compreendido pelos leitores de tela que uso, pois as imagens quando
ampliadas e sem legendas descritivas, ficam desfocadas na lupa virtual do computador.
PERFIL D