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POESIAS COMPLETAS DE
BERNARDO GUIMARES
Organização, introdução, cronologia e notas por
ALPHONSUS DE GUIMARAENS FILHO
DE DE CODA
XIV BERNARDO GUIMARES POESIAS COMPLETAS XV
rista, com a facécia habitual, como no poema meus magistratura, em Goiás, abandoná-la para exercer o magisté
ros cabelos brancos"; nêle, as lamentações do"Apoeta se primei rio e o jornalismo, voltar novamente a ela para novamente
inter
Iompem com esta quadra em que, para aliviar talvez a pressão abandoná-la pelo magistério. E tudo isso nas suas andanças
interior, se descreve êle assim pitorescamente: pelo sertão, em Goiás ou em Minas, na sua permanência na
Côrte e finaimente na sua fixação mais ou menos definitiva
Agora apenas, de óculos nas ventas, (mais ou menos, pois teve de ser ainda professor em Queluz,
Em tôsco rabecão, Minas), em Ouro Prêto, depois do casamento. E tudo isso
Poderei desferir algumas notas aproveitado para observar os costumes e admirar as paisa
Em tomn de cantochão. gens que descreveria nos seus romances e poemas de sertanis
ta legítimo, em cujas páginas, como viu João Alphonsus na
Em tom de cantochão: aí está, nessa quadra, a
essência região do sudoeste mineiro, onde se desenrola um dos romances
da poesia joco-séria que Bernardo Guimarães tanto afeiçoava. de Bernardo Guimares, A filha do fazendeiro (vide o ensaio
Sucede porém que, não raro, se dava o contrário,
isto é, o "Bernardo Guimares, romancista regionalista", em C ro
Poeta se preparava para fazer um poema joco-sério e de re mance brasileiro), tem-se a presença de um escritor que fixou
pente percebia que a sua ingênita melancolia acabava por sem falsear certos hábitos e costumes ainda hoje existentes
dominar os versos e se impor. 0 queÉ
anota êle, por exemplo, e a quem são palavras de João Alphonsus ainda que
no poema em que, como neste citado acima, outros méritos não tivesse", restaria "a glória de iniciador do
também se detém
a analisar a devastação e estragos causados pelo nosso sertanismo literário, iniciação espontânea ou quando me
meu aniversário". Fôra a sua intenção tempo: *Ao nos livre da paternidade européia ou americana, como o india
inicial debicar, num
tom muito seu. Mas eis que se surpreende êle a constatar nismo ou o antiescravismo". E mais: "Espontânea tanto
que: mais quanto o escritor era por si mesmo um narrador verbal
de histórias à beira do fogo, nas fazendas ou humildes
E esta ?! comecei sôbre êste assunto habi
tações da roça, sabendo tocar viola para entremear as narra
Um canto joco-sério:
tivas de canções".
Eis senão quando vejo-me envolvido
No pó do cemitério!...
Procuramos, na citada cronologia, mencionar o principal
de uma biografia abundante em casos de vivo pitoresco. Para
completar, ainda referimos nas notas finais, fatOs e anedotas.
Foi Bernardo Guimarães um poeta em cuja personalidade Estáclaro porém que, nos limites dêste trabalho, não pudemos
coexistiram habitualmente o lírico e o humorista, mas que dar ao leitor a impressão exata do que foi essa vida, tão curiOsa
tem como a sua principal nota a visão pessimista, e dolorida, que Antônio de Alcântara Machado, na primeira
hora do mo
da existência. dernismo, em crônica posteriormente inserida no seu livro
póstumo Cavaguinho e sacofone, intitulada "0 fabuloso Ber
II – A VIDA DE BERNARD0 GUIMARAES
nardo Guimarães", exaltou o homem para amesquinhar, e
mesmo negar, o escritor. Exagêro próprio de um movimento
Damos ao leitor, nesta edição, uma cronologia de Bernar que, visando promover a renovação de
valores, começou por
do Guimarães. Estamos longe de supor que, nessas breves destruir e negar. (Vide, a êste respeito, o ensaio, já mencio
indicações, se ache devidamente esboçada a vida movimentada nado acima, "A posiço moderna de Bernardo Guimarães,
e interessante dêsse inquieto de João Alphonsus.)
vagamundo e andejo.
Poucos escritores nossos oferecerão biografia tão rica em
fatos que põem em relêvo a singularidade do seu espirito, a
sua bomomia, a sua necessidade de evasão.
Já antes de ir III NORMAS E BASES DESTA EDIÇÃO
para São Paulo, teria Bernardo Guimarães participado, ainda
adolescente, da revolução de 1842; depois de diplomar-se em
Direito em São Paulo, o que se viu foi o Poeta ingressar na
tanto quanto possível completas, -
A presente edição das poesias de Bernardo Guimarães,
como já declarei inclui
todos s trabalhos reunidos pelo Poeta nos três livros que -
BERNARDO GUIMARÄES COMPLETAS
POESIAS
publicou: Poesias, Novas poesias e Fôlhas do outono. Acres Fique consignado também o meu agradecimento especial
centamos uma quarta parte, Dispersos", na qual inserimos ao Sr. José Renato Santos Pereira, diretor do I.N.L., a cujo
os poemas que não figuram naqueles livros, alguns dos quais,
como explicamos em notas finais sôbre cada caso, foram por estímulo e entusiasmo se deve, em grande parte, a realização
dêste trabalho; à professôra Maria Filgueiras, competente cola
nós recolhidos nos estudos biográficos do Poeta feitos pelos seus boradora, cujo carinho pela árida tarefa se demonstrou na
coestaduanos Dilermando Cruz e Basílio de Magalhães. Aliás,
no estudo de Basilio de Magalhães, merecedor de todos os meticulosidade e segurança com que a executou; ao escritor
José Guimarães Alves, neto de Bernardo Guimarães, que nos
elogios, foi que encontramos as melhores fontes para pesauj forneceu subsídios valiosos sôbre a vida e a obra de seu avô,
sas que tivemos de encetar e que possibilitaram a inclusão de
poemas que não constam dos três volumes organizados pelo além de excelente documentação iconográfica, acudindo com
Poeta. Bernardo Guimarães chegou mesmo a juntar um poe solicitude sempre que a êle nos dirigimos; a Alexandre Eulálio
ma a um dos seus romances: trata-se do canto elegíaco "À Pimenta da Cunha, que nos auxiliou com esclarecidas pesqui
morte de Gonçalves Dias", publicado em apêndice ao romance sas; e ao professor Celso Cunha, que, com o seu cavalheirismo
e boa vontade, pôs à nossa disposição os arquivos da Biblio
0 indio Afons0. Lá o fomos buscar para esta edição, que só teca Nacional, de que é diretor.
não apresenta, como é óbvio, os poemas eróticos de Bernardo
Guimarães. Tomamos como base para organização das Poesias com
Atualizamos a ortografia de acôrdo com as normas vigen pletas as seguintes edições de Bernardo Guimaräes, feitas em
tes. Mantivemos quase integralmente a pontuação do Poeta. vida do autor: Poesias, de 1865, Livraria Garnier, contendo:
Apenas nos permitimos alterá-la raras vêzes, movidos pelo "Cantos da solidão", "Inspirações da tarde", "Poesias diver
propósito de melhor esclarecer o texto. Atendendo ao valor sas", "Evocações'", "Abaía de Botafogo"; Novas poesias, 1876,
psicológico da pontuação, agimos com a maior prudência. As Livraria Garnier, e Fôlhas do outono, 1883, Livraria Garnier.
poucas modificações intoduzidas estão devidamente apontadas Das Poesias e Novas poesias há uma outra edição e de Cuntos da
nas notas finais, onde reproduzimos, inclusive, o texto original. solidão uma primeira feita em São Paulo, mas revista e corri
Indicamos também os erros tipográficos por nós emendados, gida pelo Poeta numa segunda ediço feita no Rio de Janeiro,
mais freqüentes em Novas poesias e Fólhas do outono. Tudo texto posteriormente inserto entre os livros que compuseram
a edição de 1865 das Poesias. Não nos foi possível obter
isso nos obrigou a minúcias que de certo modo sobrecarregaram
um pouco as aludidas notas; mas estou que o leitor ficará, a 1.# edição dos Cantos du solidão, o que, de resto, não oferecia
assim, melhor informado sôbre o trabalho que executamos. maior interêsse, por ser definitivo não o seu texto mas aquêle
Nem serápreciso assinalar que tais notas não têm maiores revisto pelo Poeta, como explicamos acima (revisão sôbre a
pretensões. Guiamo-n0s, quase sempre, pela lição de mestres qual o próprio Poeta informa em prefácio às Poesias incluído
e eruditos, entre os quais o professor Sousa da Silveira e o na presente edição). Pudemos compulsar o exemplar de Novas
poeta Manuel Bandeira, aos quais se devem excelentes traba poesias de propriedade do escritor Múcio Leão, volume enca
lhos sôbre alguns dos nossos principais poetas românticos. dernado sem a capa. Traz a data de 1900, mas não se informa,
Valemo-n0s ainda da inestimável colaboração de outro ilustre no frontispício ou em qualquer outra parte do volume, se se
filólogo, a quem sou grato: o professor Jesus Belo Galvão, que trata de uma reedição. Pensamos que é a 2.", embora
inclusive redigiu algumas notas especialmente para esta edição. sem afastar a hipótese de haver outras edições das Novas poe
Mas seria injusto se não citasse, ainda uma vez, o escritor Basí sias por nós desconhecidas, até mesmo anteriores a ela, tal o
lio de Magalhães, cujo estudo biográfico e crítico sôbre Ber espaço que medeia entre essa reedição, de 1900, e a princeps,
nardo Guimares constitui o melhor roteiro para quem queira de 1876. Com a 2.4 edição das Poesias, que consultamos no
entrar na intimidade da obra do poeta e romancista de Ouro exemplar pertencente à biblioteca da Academia Brasileira de
Prêto, * Letras, ocorreu algo mais grave: foi ela errôneamente designa
da como sendo a 3.2 e para tal engano chamou José Verissimo a
() Basílio de Magalhães faleceu em Lambari, Minas Gerais, em atenção no ensaio a que aludimos no início desta introduço.
14.XII.1957, aos 83 anos. Póstumas que são, essas edições não possuem evidentemente o
XVIII BERNARDO GUIMARES
1851 No 5,0 ano do curso jurídico, foi o poeta reprovado pelo pro
fessor Prudêncio Giraldes Tavares da Veiga Cabral,quecatedrá
tico de direito civil pátrio. "Reprovação acintosa", muito
o magoou.
2
XX BERNARDO GUINM ARÄES POFSIAS COM PLETAS XXI
1852 Publicou Cantos da solidão, pocsia, Tipografin Liberal, São o professor Pedro
lecidos em Belo Horizonte, já setuagenários;
Paulo. depois dos
1852 1854 - 15 de março de 1852: fêz ato na scgunda época, ba
charclando-se pcla Faculdade de Direito de São Paulo. Excr
Bernardo Guimarães, deputado, historiador,
rizonte aos 37 anos, e Joao, vitimado p0r
falecido
sessenta anos ern Uberlandia; José, que morreu em Belo Ho
envenenamento aci
e duas meninas, Isabel
ceu o cargo de juiz municipal e de órfãos do têrmo de Catalão. dental, aos nove anos, em Ouro Prêto;
em Goiás, de 1852 a 1854. e Constança, sendo a primeira, já falecida, mãe do poeta João
.. perguntará o
Pois deveras !. leitor com tôda a razão, Ora é
esbôço de un drama, que lá fica nas gavetas sem
o
em perto de 20 anos de trabalhos poéticos apenas nos apresen
chave do estudante de S. Paulo.
Ora são fôlhas sôltas de um ensaio de romance, que
tais êsse mísero punhado de poesias mal ataviadas, incompletas o
e incorretas?.. . Sois muito tardo em produzir!.. e as
vento, entrando pelas janelas abertas, entorna pelo pátio,
Para responder-vos, amigo leitor, me é preciso estender faz rebolcar-se na lama.
me mais algum pouco, bem a meu pesar.
Ora é uma ode esquecida entre as páginas de um livro.
Deveis saber primeiramente que a minha vida não tem Ora um madrigal, que foi para a fonte ensaboar-se com
a
sido, nem podia ser inteiramente consagrada ao culto das mu roupa.
sas. Prouvera a Deus que o fôsse!. Ora são artigos de periódicos, literários, que se imprimem
A cultura das letras e da poesia não estando por ora assaz depois de muitas fadigas e despesas, e depois se distribuem
vulgarizada entre nós, não pode constituir uma profissão, um alguns raros exemplares, indo o resto para as tavernas servir
meio de viver ao abrigo das mecessidades, segundo as exigên de embrulho.
cias da época e do país em que vivemos. Ora são folhetins neste ou naquele gênero; e todos sabem
Portanto... a conclusão é clara. que o folhetim é por sua natureza efêmero.
Demais, amigo leitor, minha vida, pôsto que não ociosa, Ora é um folheto, que se imprime com muita dificuldade,
tem sido inquieta e errante, meu destino incerto, e vagas mi e do qual se tiram apenas algumas centenas de exemplares, e
nhas aspirações. se esvaecem como um vapor por êsse espaço imenso.
Ora tudo isto não é muito consentâneo com a índole do Ora é uma composição ligeira, que se confia a um amigo,
poeta, do verdadeiro adorador das musas, se bem que eu, e que êste, tão descuidoso como o autor, vai passando de mão
ainda que indigno delas, não consinto que ninguém me lance em mão, até que se lhe perde o rasto.
a barra adiante no ardor do culto e veneração que Ihes con Ora é um drama, que se confia a um teatro com tôda a
sagro. fé e esperança, e que fica enterrado na poeira dos arquivOs,
Mas Camões, mas Byron, mas Chateaubriand, Tasso, sem que se Ihe tenha lido uma s palavra, fóssil que algum
não têm tido a vida triste, errante, inquieta?!... E entre dia talvez os geólogos desenterrarão.
tanto que de obras esplêndidas não nos legaram!... E por êstes e vários outros modos o autor tem perdido
Por piedade; não me acabrunheis com o pêso de tão não pequena porção de seus manuscritos.
gloriosos nomes! Já se vque se não salvei a nado as minhas poesias, não
sou menos herói do que Camões, fazendo-as escapar de todos
A isso, amigo leitor, para não desculpar-me com a minha
êsses naufrágios e perdições de tôda sorte. Se o público e
insuficiência, pois que a modéstia não é hoje de bom-tom, e mesmo a posteridade me não ler, não seráportanto por minha
seria parvoíce de minha parte não me inculcar por um gênio, culpa.
a isso sòmente responderei: -0utros tempos, outros costumes,
outros países, outras condições, e mil cousas outras, que seria Felizmente a publicação da presente coleção está agora
enumerar. confiada à casa do Sr. Garnier, que tantos serviços tem pres
longo
tado à literatura brasileira, editando nìtidamente em Paris os
Espero que o leitor não me fará mais perguntas embara escritos de nossos autores mais notáveis, quer poetas, quer pro
çosas, e portanto tratemos de concluir quanto antes êste pr
sadores. uma garantia de que estas produções, que agora o
É
logo, que já vai longe. autor entrega à publicidade, ficarão para sempre a salvo de
Vou pois explicar a razão por que não tenh0 amontoado tantos naufrágios e perdições.
volumes sôbre volumes, pôsto que tenha rabiscado muito papel. O autor agradecendo ao público e à imprensa da Côrte e
Em primeiro lugar entendo que nem tudo quanto se escreve das províncias as palavras lisonjeiras com que até aqui tem
merece as honras de ser editado em livro. acolhido as fôlhas esparsas de suas poesias, compromete-se a
Em segundo lugar o pouco que temho escrito existe dis ir fazendo esforços para salvar mais algumas e compor novas.
perso e sôlto, como as escrituras da sibila, ao capricho dos Ven
tos revoando. B. GUIMARAES
CANTOS DA OLIDO
AO LEITOR*
ou fada,
Eu amo essas lembranças; são grinaldas
ó
tu, quem quer que sejas, anjo
Que o prazer desfolhou, murchas relíquias Mulher, sonho ou visão,
De esplêndido festim; Inefável beleza, sbem-vinda
Em minha solidão!
Tristes flores sem viço! mas um restO
Vem, qual raio de luz dourando as trevas
Inda conservam do suave aroma
De um cárcere sombrio,
Que outrora enfeitiçou-nos.
Verter doce esperança neste peito
Quando o presente corre árido e triste, Em minha solidão!
E no céu do porvir pairam sinistras Nosso amor é tão puro!antes parece
As nuvens da incerteza, A nota aérea e vaga
De ignota melodia, êxtase doce,
Só no passado doce abrigo achamos Perfume que embriaga!...
E nos apraz fitar saudosos olhos
Na senda decorrida; Amo-te como se ama o albor da aurora,
O claro azul do céu,
Assim de novo um pouc0 se respira O perfume da flor, a luz da estrêla,
Uma aura das venturas já fruídas, Da noite o escuro véu.
Assim revive ainda
que Com desvêlo alimento a minha chama
0 coração angústias já murcharam, Do peito no sacrário,
Bem como a flor ceifada em vasos d'água-b
Como sagrada lâmpada, que brilha
Revive alguns instantes. Dentro de um santuário.
Sim; a tua existência é um mistério
AMOR IDEAL A mim só revelado;
H uma estrêla no céu Um segrêdo de amor, que trarei sempre
Que ninguém v, senão eu. Em meu seio guardado !
(GARRETT.)
Ninguém te vê; dos homens te separa
Quem és?- d'onde vens tu? Um véu misterioso,
Sonho do céu, visão misteriosa, Em que modesta e tímida te escondes
Tu, que assim me rodeias de perfumes Do mundo curioso.
De amor e d'harmonia?
Mas eu, no meu cismar, eu vejo sempre
Não és raio d'esp'rança A tua bela imagem;
Enviado por Deus, ditamno puroa Ouço-te a voz trazida entre perfumes
Por mãos ocultas de benigno gênio Por suspirosa aragem.
No peito meu vertido?
Sinto a fronte incendida bafejar-me
Não és anjo celeste, Teu hlito amoroso,
Que junto a mim, no adejo harmonioso E do cândido seio que me abrasa
Passa, deixando-me a alma adormecida O arfar voluptuoso.
Num êxtase de amor?
18 BERNARDO GUIMARES POESLAS COMPLETAS 19
Porém silêncio, ó gênio, –não mais vibres Queime-se todo o incenso de minh'alma,
E em ondas aromáticas se expanda
As brônzeas cordas, em que bramam raiOs,
Aos pés do Onipotente!...
Pregoeiros da cólera celeste:
28 BERNARDO GUIMARES
COMIPLETAs 29
POESIAS
Desfeita no outro dia, eram bastantes Esta trêmula abóbada, que ruge
Para abrigar o filho do deserto; Por seculares troncos sustentada,
No carcás bem provido repousavam Bste silêncio místico, estas sombras,
De todo o seu porvir as esperanças, Que agora me derramam sôbre a fronte
Que suas eram da floresta as aves, Suave inspiração, cismar saudoso,
E nem lhes nega o córrego do vale, Vão em breve morrer; lá vem o escravo,
Límpido jôrro que lhe estanque a sêde. Brandindo o ferro, que dá morte às selvas,
No sol, fonte de luz e de beleza, E afanosO põe peito à ímpia obra:
Viam seu Deus, prostrados o adoravam, o tronco, que os séculos criaram,
Já
Na terra a mãe, que os nutre com seus frutos, Ao som dos cantos do africano adusto
Sua única lei na liberdade. Geme aos sonoros, compassados golpes,
Que vão nas brenhas ressoando ao longe;
Oh! floresta, que é feito de teus filhos? Soa o último golpe, range o tronco,
Esta mudez profunda dos desertos
0
tope excelso trêmulo vacila,
Um crime bem atroz! nos denuncia. E desabando com gemido horrendo
0 extermínio, o cativeiro, a morte Restruge qual trovão de monte em monte
Para sempre varreu de sôbre a terra Nas solidões profundas reboando.
E'ssa mísera raça, nem ficou-lhes Assim vão baqueando uma após outra
Um canto ao menos, onde em paz morressem! Da floresta as colunas venerandas;
Como cinza, que os euros arrebatam, E tôdas essas cúpulas imensas,
Se esvaeceram, e do tempo a destra Que inda há pouco no céu balanceando,
Seus nomes mergulhou no esquecimento. A sanha dos tufões desafiavam,
Aí jazem, como ossadas de gigantes,
Mas tu, ó musa, que piedosa choras, Que num dia de cólera prostrara
Curvada sôbre a urna do passado, 0 raio do Senh01.
Tu, que jamais negaste ao infortúnio
Um canto expiatório, eia, consola Oh! mais terrível
Do pobre Indiano os erradios manes, Que o raio, que o dilúvio, o rubro incêndio
E sôbre a inglória cinza dos proscritos Vem consumar essa obra deplorável.
Com teus cantos ao menos uma lágrima Qual hidra formidável, no ar exalça
Faze correr de compaixão tardia. A crista sanguinosa, sacudindo
Com medonho rugido as igneaS asas,
E negros turbilhões de fumo ardente
III Das abrasadas fauces vomitando,
Ei-lo, que vem, de ferro e fogo armado, Em hórrido negrume os céus sepulta.
Da destruição o gênio formidável, Estala, ruge, silva, devorando
Em sua fatal marcha devastando Da floresta os cadáveres gigantes;
0 que de mais esplêndido e formoso Voam sem tino as aves assustadas
Alardeia no êrm0 a natureza ;
No ar soltando pios lamentosos,
Que nem sòmente o íncola das selvas E as feras, em tropel tímidas correm,
De seu furor foi vítima; após êle A se embrenhar no fundo dos desertos,
Rui também a cúpula virente, Onde vão demandar nova guarida.
Único abrigo seu, sua riqueza. Tudo é cinza e ruína: adeus, ó sombra,
38 BERNARDO GUIMARES POESIAS COMPLETASs 89
Adeus, murmúrio, que embalou meus sonhos, Como um bando de garças na planície;
Adeus, sonoro frêmito das auras, E em lugar dêsse brando rumorejo
Sussurros, queixas, suspirosos ecos, Aí murmurará a vZ de um povo;
Da solidão misterioso encanto! Essas encostas broncas e sombrias
Adeus!-umEm vão a pomba esvoaçando Serão risonhos parques suntuosos ;
Procura ramo em que fabrique o ninho: E êsses rios, gue vão por entre sombras
o viajor cansado
Em vão suspira Ondas caudais serenos resvalando,
Por uma sombra, onde repouse a
os membros
Em vez do tope escuro das florestas,
Repassados do ardor do sol pino! Refletirão no límpido regaço
Tudo é cinza e ruína, tudo é morto!! Tôrres, palácios, coruchéus brilhantes,
Zimbórios majestosos, e castelos
E tu, musa, que amas o deserto
ó
De bastiões sombrios coroados,
E das caladas sonmbras o mistério, Ésses bulcões da guerra, que do seio
Que folgas de embalar-te aos sons aéreos Com horrendo fragor raios despejam.
D'almas canções, que a solidão murmura, Rasgar-se-ão os serros altaneiros,
Que amas a criação, qual Deus formou-a, Encher-se-ão dos vales os abismos:
Sublime e bela vem sentar-te, 6 musa, Mil estradas, qual vasto labirinto,
Sôbre estas ruínas, vem chorar sôbre elas. Cruzar-se-ão por montes e planura;
Chora com a avezinha, a quem roubaram Curvar-se-ão os rios sob arcadas
0 ninho seu querido, e com teus cantos De pontes colossais; canais imensos
Procura adormecer o férreo braço Virão surcar face das campinas,
Do impróvido colono, que semeia E êstes montes verão talvez um dia,
Sòmente estragos neste chão fecundo ! Cheios de assombro, junto às abas suas
Velejarem os lenhos do oceano !
Nua e singela
filha da floresta,
Mas, não te queixes, musa; são decretos10-e Um dia, em vez da simples arazóia, 10-g
Da eterna providência irrevogáveis! Que mal te encobre o gracioso talhe,
Deixa passar destruição e morte Te envolverás em flutuantes sêdas,
Nessas risonhas e fecundas plagas,
E
abandonando o canitar de plumas, 10-4
Como charrua, que revolve a terra, Que te sombreia o rosto côr de jambo,
Onde germinam do porvir os frutos. Apanharás em tranças perfumadas
0 homenm fraco ainda, e que hoje a custo, A coma escura, e dos donosos ombros
Da criação a obra mutilando, Finos véus penderão. Em vez da rêde,
Sem nada produzir destrui apenas,10 Em que te embalas da palmeira à sombra,
Amanh criará; sua mão potente, Repousarás sôbre coxins de púrpura,
Que doma e sobrepuja a natureza, Sob dosséis esplêndidos. Ó virgem,
Háde imprimir um dia forma nova Serás então princesa, forte e grande,
Na face dêste solo imenso e belo: Temida pelos príncipes da terra;
Tempo viráem que nessa E de brilhante auréola cingida
Onde flutua a coma da valada Sôbre o mundo alçarás a fronte altiva !
floresta,
Linda cidade surja, branguejando Mas, quando em tua mente revolveres
As memórias das eras que já foram,
BERNARDO GUIMARÁES POESIAS COMPLETAS 41
despertares
Láquando dentro d'almaquase extintas, Por transpor essa meta ainexorável:
Do passado lembranças
infância Os teus domínios entre terra e os astros,
Dos bosques teus, de tua rude Entre o túmulo e o berço estão prescritos:
Talvez terás saudade. Além, que enxergas tu? 0 vácu0 e o nada!...
Longe do sólio teu, cá neste valeo Que nos franqueias as regiões sublimes
De eterna escuridão? Acaso homem,
essência tua, Onde a luz da verdade eterna brilha?
Que é pura emanação da Ou és do nada a fauce tenebrosa,
à tua imagem,
E que se diz criado mesmo não é digno, Onde a morte pra sempre nos arroja
De adorar-te em t Em um sono sem fim adormecidos!
gozar tua presença,
De contemplar, Oh! quem pudera levantar afouto
De tua glória no esplendor perene?o teu trono Um canto ao menos dêsse véu tremendo
Oh! meu Deus, por que cinges Que encobre a eternidade.
Da impenetrável sombra do mistério?
Quando da esfera os eixos abalando
nuvens Mas debalde
Passa no céu entre abrasadas Interrogo o sepulcro, e debruçado
tenmpestade o carro fragoroso,
Da Sôbre a voragem tétrica e profunda,
Senhor, é tua cólera tremenda Onde as extintas gerações baqueiam,
Que brada no trovão, e chove em raios? Inclino o ouvido, a ver se um eco ao menos
Eo íris, essa faixa cambiante, Das margens do infinito me responde!
Que cinge o manto azul do firmamento, Mas o silêncio que nas campas reina,
Como um laço que prende aos céus a terra, É Como o nada, fúnebre e profundo.
É
de tua clemência anúncio meigo?
É tua
imensa glória que resplende
No disco flamejante, que derrama Se ao menos eu soubesse que co'a vida
Luz e calor por tôda a natureza? Terminariam tantas incertezas,
Dize, ó Senhor, por que a mão ocultas, Embora os olhos meus além da campa,
Que a flux esparge tantas maravilhas? Em vez de abrir-se para a luz perene,
Dize, ó Senhor, que para mim são mudas Fôssem na eterna escuridão do nada
As páginas do livro do universo!. Para sempre apagar-Se. mas quem sabe?
Mas, ai! que o invoco em vão! êle se esconde Quem sabe se depois desta existência
Nos abismos de sua eternidade. Renascerei pra duvidar ainda?!... 11-d
Onde irá
Soçobrar
-
Das vagas contra o penedo
o
talvez bem cedo
meu batel.
NO MEU ANIVERSÁRIO
Ao meu amigo o Sr. F. J. de Cerqueira
No horizonte não lobrigo
Hélus! hélas! mes années
Nem praia, nem lenho amigo,
Que me salve do perigo,
Sur ma tête tombent fanées,
Et ne refleuriront jamais.
Nem fanal que me esclareça; (LAMARTINE.)
Só vejo as vagas rolando,
Pelas rochas soluçando, Não vês, amigo? Lá desponta a aurora
E mil coriscos sulcando Seus róseos véus nos montes desdobrando;
A medonha treva espêssa.
Traz ao mundo beleza, luz e vida,
Traz sorrisos e amor ;
Voga, baixel sem ventura, Foi esta qu'outro tempo
Pela túrbida planura, Meu berço bafejou, e as tenras pâlpebras
Me abriu à luz da vida,
Através da sombra escura,
Voga sem leme e sem norte; E vem hoje no círculo dos tempos
Sem velas, fendido o mastro, Marcar sorrindo o giro de meus anos.
Nas vagas lançado o lastro, Já vai bem longe a quadra da inocência,
E sem ver nos céus um astro, Dos brincos e dos risos descuidosos;
Ai! que só te resta a mnorte! Lá s'embrenham nas sombras do passado
Os da infância dourados horizontes.
Oh! feliz quadra! então eu não sentia
Nada mais ambiciono, Roçar-me pela fronte
ÂS vagas eu te abandono, A asa do ternpo estragadora e rápida;
Como cavalo sem dono E êste dia de envolta comn os outros
Pelos campos a vagar; Lá s'escoava desapercebido;
Voga messe pego insano,
Que n0s ronCOS do Oceano la-me a vida em sonhos prazenteiros,
Ouço a voz do desengano Como ligeira brisa
Pavorosa a ribombar ! Entre perfumes lêda esVoaçando.
Mas hoje que caiu-me a venda amável
Que as misérias da vida me ocultava,
Voga, baixel foragido,
Voga sem rumo
Eu vejo com tristeza
perdido, O tempo sem piedade ir desfolhando
Pelas tormentas batido,
A flor dos anos meus;
Sôbre o elemento infiel;
Para ti não hábonança; Vai-se esgotando a urna do futuro
À toa, sem leme avança Sem do seio sair-lhe os dons sonhados
Neste mar sem esperança, Na quadra em que a esperança nos embala
Voga, voga, meu baixel! Com seu falaz sorriso.
BERNARDO GUIMARAES
POESIAS COMPLETAS 49
Adeus! -
Pedir pousada na mansão dos mortos,
fôste feliz, que a senda é rude,
0 céu é tormentoso, e o pouso incerto.
Derrama o doce bálsamo das lágrimas;
do órfão infeliz, do ancião pesado,
É
Em tôrno te desdobra
Entretanto não me alveja a fronte, Sorrindo o seu painel cheio de encantos:
nem minha cabeça pende ainda para a Eis umn vasto horizonte, um céu sereno,
terra, e contudo sinto que hei pouco de Serras, cascatas, ondeantes selvas,
vida. Rios, colinas, campos de esmeralda,
(DUTRA E MELO.)
Aqui vales de amor, vergéis floridos,
Em manso adejo o cisne peregrino De frescas sombras perfumado asilo,
Passou roçando as asas pela terra, Além erguendo a voz ameaçadora
E sonorosos quebros gorjeando 0 mar, como um leão rugindo ao longe,
Despareceu nas nuvens. Ali dos montes as gigantes
Não quis mesclar do mundo aos vãos rumores formas
Com as nuvens do céu a confundir-se,
A celeste harmonia de seus carmes; Desenhando-se em longes vaporosos.
Passou foi demandar em outros climas Donoso quadro, que mne arrouba os
Pra suas asas mais trangüilo pouso, olhos,
N'alma acordando inspirações saudosas!
Onde foi êle
o
-
Ares mais puros, onde espalhe o canto ;
em meio assim deixando
Quebrado acento da canção sublime,
Tudo é beleza, amor, tudo harmonia,
Tudo a viver convida,
Vive, ó poeta, e canta a natureza.
Que apenas encetara?
Onde foi êle? em que felizes margens Nas sendas da existência
Desprende agora a voz harmoniosa? As flores do prazer lêdas vicejam;
Estranh0 ao mundo, nêle definhava À
mesa do festim vem pois
Qual flor, qu'entre fraguedos sentar-te,
Sob uma coroa de virentes rosas
Em solo ingrato langue esmorecida: Vem esconder os prematuros
Uma nuvem perene de sulcos,
tristeza Vestígios tristes de vigílias longas,
De austero meditar, que te ficaram
56 BERNARDO GUIMARES
POESIAS COMPLETAS 57
Na larga fronte impressos.
Dissipe-se aos sorrisos da beleza 0 formoso clarão da aurora eterna.
Essa tristeza, que te abafa a mente. Quando vem pois sua hora derradeira,
Ama, poeta, e o mundo que a teus olhos
6
Saúda sem pavor a muda campa,
Um deserto parece árido e feio, E sôbre o leito do eternal repouso
Sorrir-se-á, qual hôrto de delícias: Tranqüilo se reclina.
Vive e canta os amôres. Oh! não turbeis os seus celestes sonhos;
Deixai correr nas sombras do mistério
Mas se a dor é partilha de tua alma, Seus tristes dias: triste é seu destino,
Se concebeste tédio de teus dias o
Como luzir de moribunda estrêla
Volvidos no infortúnio: Em céu caliginoso.
Que importa, 6 vate; vê pura e donosa Tal éseu fado; –0 anjo d'harmonia
Sorrir-se a tua estrêla 14-a C'uma das mãos lhe entrega a lira d'ouro,
No encantado horizonte do futuro.
Vive e sofre, que a dor co'a vida passa, Noutra lhe estende o cálix da amargura.
Enquanto a glória em seu fulgor perene Bem como o incenso, que só verte aromas,
No limiar do porvir teu nome aguarda
Para enviá-lo às gerações vindouras. Quando se queima, e ardendo se evapora,
E então mais belos brilharão teus louros Assim do vate a mente
Entrançados co'a palma do martírio; Aquecida nas fráguas do infortúnio,
Vive, ó poeta, e canta para a glória. Na dor bebendo audácia e fôrça nova
Mais pura ao céu se arrouba, e acentos vibra
Porém respeito a essa dor sublime De insólita harmonia.
Sêlo gravado pela mão divina Sim não turbeis os seus celestes sonhos,
Sôbre a fronte do gênio, Deixai, deixai sua alma isenta alar-se
Não foram para os risos destinados Sôbre as asas do êxtase divino,
Ésses lábios severos, donde emana Deixai-a, que adejando pelo empíreo
A linguagemdos céus em ígneos versos; Vá aquecer-se ao seio do infinito,
Longe dêle a vã turba os prazeres, E ao céu roubar segredos de harmonia,
Longe os do mundo passageiros gozos, Que sonorosos troem
Breves flores de um dia, que fenecem D'harpa sublime nas melífluas cordas.
Da sorte ao menor sôpro.
Não, não foi das paixões o bafo ardente Mas ei-la já quebrada,
Que os ledos risos lhe crestou nos lábios; Ei-la sem voz suspensa sôbre um túmulo,
A tornmenta da vida ao longe passa, 14-b Essa harpa misteriosa, qu'inda há pouco
E não ousa turbar com seus rugidos Nos embalava ao som de endeixas tristes 27-b
A paz dessa alma angélica e serena, Repassadas de amor e de saudade.
Cujos tão castos ideais afetos Ninguém lhe ouvirá mais um s arpejo,
Só pelos céus adejam. Que a férrea mão da morte
Alentado sòmente da esperança Pousou sôbre ela, e lhe abafou pra sempre
Contempla resignado A voz das áureas cordas.
As sombras melancólicas, qu'enlutam Porém, ó Dutra, enquanto lá no elísio
O horizonte da vida; mas vê nelas Saciando tua alma nas enchentes
Um crepúsculo breve, que antecede Do amor e da beleza, entre os eflúvios
De perenais delícias,
58 BERNARDO GUIMARÁES POESIAS COMPLETAS 59
E unido ao côro dos celestes bardos, Eis do nosso passar por sôbre a terra
O fogo teu derramas Em breve quadro uma fiel pintura;
Aos pés de Jeová em gratos hinos, a vida oceano de desejos
É
se alentava.
e
Como um beijo de adeus longo saudoso Com o aroma das flores gemer da
Com o som das brisas,
com o
fonte:
Que a tarde he enviava.
Com os olhos puros fitos no horizonte Ela, só ela eu via no universo,
Tão sòzinha a cismar, E tudo dentro d'alma retraçava
Me parecia um anjo do céu vindo De minha amada as graças peregrinas.
Que vai pra o céu voar. No respirar da viração serena
Vinde, vinde, lembranças saüdosas, Eu sentia seu hálito; nos ecos
Perfume do passado, Do vale solitário ouvir cuidava
com as imagens
Vinde embalar minha alma Do seu falar o acento mavioso,
afortunado! o seu sorriso,
De um tempo A aurora me lembrava
A tarde o seu olhar.
Oh! era doce aquêle puro afeto
III Que então eu te sagrava,
Lírio do vale, cândido e singelo,
E com0 quem receia nume, Que os seios de minh'alma embalsamavas
Mistérios violar de ignoto Com teu aroma estreme!
Em tímido silêncio eu contemplava Num pego de emoções nunca sentidas
Aquela imagem plácida e sublime, 0 coração batia alvoroçado;
Medroso de quebrar o fio místico De meu amor no enlêvo parecia
De seu sonhar celeste; Que ante mim se ia abrindo um mundo novo
Té que da tarde os arrebóis extremos Cheio de luz, de aromnas, de harmonia,
Nas orlas do ocidente se extinguiram. Onde neiga sorria-me a esperança
Então a vi ligeira deslizar-se, Em meu caminho rosas desfolhando!
Nas sendas da devesa, Vinde, vinde, lembranças saüdosas,
E com0 aparição de um vago sonho Perfume do passado;
Nas sombras do crepúsculo perder-se. Vinde embalar minh'alma com as imagens
Partiu, porém agui no fundo d'alma De umn tempo afortunado!
Sempre encontro brilhando a imagem dela,
Bem como astro amoroso
Refletindo no azul de manso lago
Clarão misterioso!
Vinde, vinde, lembranças saüdosas, Triste ilusão!. o leve matiz d'ouro
Perfume do passado, Que a vida embelecia,
Vinde embalar minh'alma com as imagens A um sôpro só da sorte esvaeceu-se,
De um tempo afortunado! Sumiu-se num só dia!
É tudo assim; nos céus brilha um momento
Risonha alva manhã,
IV E não v deslizar mais que uma aurora
Do vale a flor louçã.
DebaixO do trangüilo céu dos ermos Apenas do festim da natureza
Medrava o meu amor de dia em dia; Libamos as primícias,
Lá, pelos arvoredos sussurrantes, Que logo a nossos pés cai em pedaços
Nas recatadas sombras, A taça das delícias.
70 BERNARDO GUIMARAES POESLAs cOMPLETAS 71
Em vão a tarde neste sítio expande Que por longes sem fim se vão perdendo!
Seus raios amorosos; Todo enlevado na ilusão donosa
Em vão murmura viração fagueira
a
Longo tempo meus olhos espaireço.
Nesses vergéis saudosos. Porém do céu as côres já desbotam,
E êrm0 o vale, e a senda da colina Os fulgores se extinguem, se esvaecem
De relva se cobriu; As fantásticas formas. vem de manso
E cismando sòzinha a virgem bela A noite desdobrando o véu das sombras
Ninguém, ninguém mais viu. Sôbre o aéreo painel maravilhoso;
Um tufão arrancou do prado ameno Apenas pelas orlas do horizonte
A flor dos sonhos meus; Bruxuleia através da escuridade
E levando-a nas asas transplantou-a O crêspo dorso dos opacos montes,
Para os jardins de Deus. E sôbre êles fulgindo merencória,
Cessai, cessai, lembranças saüdosas Suspensa, como pálida lucerna,
De um tempo já volvido ! A solitária estrêla do crepúsculo.
Ah! não mais me embaleis co'as vsimagens
De um sonho esvaecido! Assim vos apagais em sombra escura,
Lêdas visões da quadra dos amôres!...
ILUSÃO Lá vem na vida um tempo
Em que a um sôpro gélido se extingue
V, que painel formos0 a tarde borda A fantasia ardente,
Na brilhante alcatifa do ocidente! Ésse sol puro da manhã dos anos,
Que doura-nos as nuvens da existência,
As nuvens em fantásticos relevos E mostra além, pelo porvir brilhando,
Aos olhos fingem, que inda além da terra Um cu formoso e rico de esperança;
Novo horizonte infindo se prolonga, E êsses puros bens, que a mente ilusa
Onde lindas paisagens se desenham Cismara em tanto amor, tanto mistério,
Descomunais, perdendo-se no vago Lávo sumir-se um dia
De vaporosos longes. Nas tristes sombras da realidade;
Lagos banhados de reflexos d'ouro, E de tudo que foi, conosco fica,
Onde se espelham gigantescas fábricas; No fim dos tempos, a saudade apenas,
Solitárias encostas, onde avultam Triste fanal, brilhando entre ruínas!
Aqui e além ruínas pitorescas,
Agrestes brenhas, serranias broncas,
Pendentes alcantis, agudos píncaros, 0 SABIÂ
Fendendo um lindo céu de azul e rosas;
Fontes, cascatas, deleitosos parques, L'oiseau semble le véritable emblème
Encantadas cidades quais só pode du chrétien ici-bas; il préfère, comme le
Criar condão de fadas, fidèle, la solitude au monde, le ciel à la
Surdem do vale, entre vapor brilhante, terre, et sa voic bénit sans cesse les mer
veilles du Créateur.
Com a fronte coroada de mil
tôrres, (CHATEAUBRIAND.)
De esguios coruchéus, de vastas
E além ainda mil aéreas formas,
cúpulas;
Tu nunca ouviste, quando o sol é pôsto,
Mil vagas perspectivas se debuxam, E que do dia apenas aparece,
Por sôbre os ermos píncaros do ocaso,
BERNARDO GUIMARAES
POESIAS COMPLETAS 73
A orla extrema do purpúreo manto;
Quando lá do sagrado campanário Canta, que oteu doce canto
Já reboa do bronze o som piedoso,; Nestas horas tão serenas,
Abençoando as horas do silêncio Nos seios d'alma adormece
Nesse instante de místico remanso, O
pungir de acerbas penas.
De maga soidão, em que parece
Pairar bêncão divina sôbre a terra, Cisma o vate ao brando acento
No momento em que a noite vem sôbre ela
Desdobrar o seu manto sonolento; De tua voz harmoniosa,
Tu nunca ouviste, em solitária encosta, Cisma, e deslemnbra tristuras
De anoso tronco na isolada grimpa, De sua vida afanosa.
A voz saudosa do cantor da tarde
Erguer-se melancólica e suave E ora 'alma se lhe acorda
Como uma prece extrema, que a natura Do passado uma visão,
Envia a0 cu, –suspiro derradeiro Que em perfumes de saudade
Vem banhar-lhe o coração;
Do dia, que entre sombras se esvaece?
O
viandante para ouvir-lhe os quebros
Pára, e se assenta à margem do caminho: Ora um sonho lhe vislumbra
Encostado aos umbrais do pobre alvergue, Pelas trevas do porvir,
Cisma o colono aos sons do etéreo canto E uma estrêla d'esperança
Já das rudes fadigas deslembrado; Em seu céu lhe vem sorrir:
E sob as asas úmidas da noite
Aos meigos sons em êxtase suave E por mundos encantados
Adormece embalada a natureza. Lhe desliza o pensamento.
Qual nuvem que o vento embala
Quem te inspira o doce acento, Pelo azul do firmamento.
Sabiámelodioso ?
Que mágoas triste lamentas Canta, avezinha amorosa,
Nesse canto suspiroso? Em teu asilo soidoso;
Saúda as horas sombrias
Quem te ensinou a canção, Do silêncio e do repouso;
Que cantas ao pôr do dia?
Quem revelou-te os segredos Adormenta a natureza
De tão mágica harmonia? Aos sons de tua canção;
Canta, até que o dia morra
Acaso a ausência tu choras De todo na escuridão.
Do sol, que além se sumira;
E teu canto ao dia extinto Assim o bardo inspirado,
Mavioso adeus suspira? Quando a eterna noite escura
Lhe anuncia a fatal hora
Ou nessas notas De baixar à sepultura,
sentidas,
Exalando o terno ardor,
Tu contas à meiga tarde Um adeus supremo à vida
Segredos do teu amor? Sôbre as cordas modulando,
Em seu leito sempiterno
Vai adormecer cantando.
RERNARDNO GUIMARES
É
doce assim viver!
Descuidado e a
-
sorrir, a
ir desfolhando,
flor dos anos,
Sem lhe contar as pétalas, que fogem
HINO DO PRAZER Nas torrentes do tempo arrebatadas:
se a vida é sonho,
É doce assim viver:
Seja um sonho de rosas.
Et ccs voic qui passaient, disaicnt joyeu Quero deixar de minha vida as sendas
[sement: Juncadas das relíquias do banquete;
Bonheurl gaité! délicesl Frascos vazios, machucadas flores,
A nous les coupes d'or, remplies d'un vin Grinaldas pelo chão, cristais quebrados,
A d'autres les calices!.
.[charmant, E entre murchos festões rto alaúde,
Que reboando balanceia ao vento,
(V. HuGO.) Lembrando amôres que cantei na vida,
Sejam de meu passar por sôbre a terra
Os únicos vestigios.
Com cantos alentai-me, e com aromas, Quanto eu te amava então, tarde formosa!
Que em tamanha ventura desfaleço. Qual pastôra gentil, que se reclina
Eu sou feliz... demais!. cessai delícias, Rósea e loucã, sôbre a macia relva,
a tanto gôzo o coração sucumbe! Das diurnas fadigas descansando;
Que
A face, em que o afã lhe acende as côres,
Na mão repousa, os seios lhe estremecem
Assim cantava o filho dos prazeres. No mole arfar, e o lume de seus olhos,
Mas no outro dia um golpe inopinado Em suave langor vai desmaiando;
Da sorte lhe quebrou o tênue fio
Da risonha ilusão que o fascinava : Assim me aparecias, meiga tarde,
A noite o viu cantando hino de amôres, Sôbre os montes do ocaso debruçada;
A aurora o achou curvado a verter pranto Tu eras o anjo da melancolia,
Sôbre uma lousa fria. Que à paz da solidão me convidavas.
Então no tronco, que o tufão prostrara,
No viso da colina, ou êrma rocha
HINO À TARDE Sôbre a margem do abismo pendurada,
Me assentava a cismar, nutrindo a mente
A tarde estátão bela e tão serena, De arroubadas visões, de aéreos sonhos.
Que convida a cismar. Contigo a sós, sentindo o teu bafejo
Ei-la saudosa e meiga, reclinada De aromas e frescor banhar-mne a fronte,
Em seu etéreo leito, E afagar brandamente os meus cabelos,
Da muda noite a amável precursora; Minha alma então boiava docemente
Do róseo seio aromas transpirando,
Com vagos cantos, com gentil sorriso Por um mar de ilusões, e parecia
Que un côro aéreo, pelo azul do espaço
Ao repouso convida a natureza.
Me ia embalando com sonoras dúlias;
Montão de nuvens, como vasto incêndio,
Resplende no horizonte, e o clarão rúbido De um puro sonho sôbre as asas d'ouro
Céus e montes ao longe purpureia. Me voava enlevado o pensamento
Pelas odoras veigas Encantadas paragens devassando,
Ou nas vagas de luz, que o ocaso inundam,
As auras brandamente se espreguiçam,
E o sabiána encosta solitária Afouto me embebia, e o espaço infindo
SaudosO cadenceia Transpondo, ia entrever no estranho arroubo
Os radiantes pórticos do Elísio.
Pausado arpejo, que entristece os ermos. Ó
sonhos meus, ó ilusões amenas
Oh! que grato remanso ! que hora amena, De meus primeiros anos,
Propícia aos sonhos d'alma! Poesia, amor, saudades, esperanças,
Quem me dera voltar à feliz quadra, Onde fôstes? por que me abandonastes?
Em que êste coração me transbordava Inda do tempo me não pesa a destra,
De emoções virginais, de afetos puros! E não me alveja a fronte; inda não sinto
Em que esta alma em seu seio refletia Cercar-me o coração da idade os gelos,
Como o cristal da fonte, pura ainda, E já vós me fugis, 6 lêdas flores
Todo o fulgor do céu, tôda a beleza De minha primavera?
E magia da terra!... oh! doce quadra! E assim vós me deixais, tronco sem seiva,
Quão veloz te sumiste Como um sonho Só, definhando na aridez do mundo?
Nas sombras do passado! Oh! sonhos meus, por que me abandonastes?
GUIMARES POESIAS COMPLETAS 85
84 BERNARDO
A tarde está tão bela e tão serena, Para saudar teus mágicos fulgores.
Que convida a cismar: vai pouco e pouco Silenciosa e triste está minha alma,
Desmaiando o rubor dos horizontes, Bem como lira de estaladas cordas,
E pela amena solidão dos vales Que o trovador esquece pendurada
Caladas sombras pousam; breve a noite No ramo do arvoredo,
Abrigará co'a sombra de seu manto Em ócio triste balançando ao vento.
A terra adormecida.
Vinde, ainda uma vez, meus sonhos d'ouro,
Nesta hora, em que tudo sôbre a terra
Suspira, cisma, ou canta,
Como êsse afagador, extremo raio,
Que à tarde pousa sôbre as grimpas êrmas,
Vinde pairar ainda sôbre a fronte
Do bardo pensativo; iluminai-a
Com um raio inspirador.
Antes que os ecos todos adormeçam
Da noite no silêncio,
Quero um hino vibrar nas cordas d'harpa,
Para saudar a filha do crepúsculo.
Ai de mim! êsses tempos já caíram
Na sombria voragem do passado,
E os meus sonhos queridos se esvaíram,
Como após o festim murchas se espalham
As flores da grinalda:
Perdeu a fantasia as asas d'ouro,
Com que se alava às regiões sublimes
De mágica poesia,
E despojada de seus doces sonhos
Minha alma vela a sós co sofrimento,
Qual vela o condenado
Em sombria masmorra, à luz sinistra
De amortecida lâmpada.
Adeus, formosa filha do ocidente,
Virgem de olhar sereno, que meus sonhos
Em doces harmonias transformavas,
Adeus, ó tarde! -já nas frouxas cordas
Rouqueja o canto, e a vOz me desfalece.
Mil e mil vêzes raiarás ainda
Nestes sítios saudosos, que escutaram
De minha lira o deleixado acento;
Mas, ai de mim!.. nas solitárias veigas
Não mais escutarás a voz do bardo,
Hinos casando ao suSsurrar da brisa
POESAS DIVERSAS
19
O
NARIZ PERANTE OS POETAS
Beija-se os cabelos,
E os olhos belos. 19-a
E a bca mimosa,
E a face de rosa
De fresco matiz;
E nem um só beijo
Fica de sobejo
Pro pobre nariz;
Ai! pobre nariz,
És bem infeliz!
Entretanto, notai a sem-razão
Do
mundo, injusto e vão:
Entretanto o nariz é do
0 ponto culminante;semblante
No meio das demais
feições do rosto
Erguido é o seu pôsto,
90 BERNARDO GUIMARES POESIAS COMPLETAS 91
Bem como um trono, e acima dessa gente Onde, pois, ingratos vates,
Eleva-se eminente. Acharíeis as fragrâncias,
Os balsâmicos odores,
Trabalham sempre os olhos; mais ainda De que encheis vossas estâncias,
A bôca, o queixo, os dentes; Os eflúvios, os aromas
míseros plebeus vão exercendo Que nos versos espargis;
Ofícios diferentes. Onde acharíeis perfume,
Se não houvesse nariz?
Mas o nariz, fidalgo de bom gôsto, Ó
vós, que ao nariz negais
Desliza brandamente Os foros de fidalguia,
Vida voluptuosa entre as delícias Sabei, que se por um êrro
De um doce far-niente. Não há nariz na poesia,
seu fado infeliz,
É por
Sultão feliz, em seu divã sentado Mas não é porque não haja
A respirar perfumes, Poesia no nariz.
De bem-aventurado ócio gozando,
Não tem inveja aos numes. Atenção pois aos sons de minha lira,
Vós todos, que me ouvis,
o De minha bem-amada em versos d'ouro
Para êle produz rico Oriente
Cantar quero o nariz.
O cedro, a mirra, o incenso;
Para êle meiga Flora de seus cofres 0 nariz de meu bem é com0.
..
oh! céus!.
Verte o tesouro imenso. É como o
quê? por mais que lide e sue,
Nem uma só asneira !.
Amante fiel sua, a mansa aragenm Que esta musa estáhoje uma toupeira.
As asas meneando
Anda pra êle nos vergéis vizinhos Nem uma idéia
Aromas apanhando. Me sai do casco!..
Ó
miserando,
E tu, pobre nariz, sofres o injusto Triste fiasco!!
Silêncio dos poetas?
Sofres calado? não tocaste ainda Se bem me lembra, a Bíblia em qualquer parte
Da paciência as metas? Certo nariz ao Líbano compara;
Se tal era o nariz,
Nariz, nariz, já é tempo De que tamanho não seria a cara?!...
De ecoar o teu queixume;
Pois, se não há poesia E ai de mim! desgraçado,
Que não tenha o seu perfume, Se o meu doce bem-amado
Em que o poeta às mãos cheias V seu nariz comparado
Os aromas não arrume, A uma erguida montanha:
Por que razão os poetas, Com razão e sem tardança,
Por que do nariz não falam, Com rigores e esquivança,
Do nariz, pra quem sòmente Tomará cruel vingança
Ésses perfumes se exalam? Por essa injúria tamanha.
92 BERNARDO GUIMAR ES
POESIAS COMPLETAS 93
Pois bem!. Vou arrojar-me pelo vago
Dessas comparações que a trouxe-mouxe
0
teu nariz, doce amada,
Do romantismo o gênio cá nos trouxe, É um castelo de amnor,
Que pra tôdas as cousas vão servindo;
Pelas mãos das próprias graças
Fabricado com primor.
E à fantasia as rédeas sacudindo,
Irei, bem como um cego, As suas ventas estreitas
Nas ondas me atirar do vasto pego, São como duas seteiras,
Que as românticas musas desenvoltas Donde êle oculto dispara
Costumam navegar a velas sôltas. Agudas flechas certeiras.
E assim como 0 coração, Em que sítios te pus, amor, coitado!
Sem ter corda, nem cravelha, Meu Deus, em que perigo?
Na linguagem dos poetas Se a ninfa espirra, pelos ares saltas,
A uma harpa se assemelha; E em terra dás contigo.
Como as mãos de alva donzela Estou já cansado, desisto da emprêsa,
Parecem cêstos de rosas, Em versos mimosos cantar-te bem quis;
E as roupas as mais espêssas Mas não o consente destino perverso,
São em vers0 vaporosas; Que fêz-te infeliz;
Estádecidido, não cabes emn verso,
E o corpo de esbelta virgem Rebelde nariz.
Tem feitio de coqueiro,
E sócom um beijo se quebra E hoje tu deves
De tão franzino e ligeiro; Te dar por feliz
Se êstes versinhos
E como os olhos são flechas, Brincando te fiz.
Que os corações vão varando; Rio de Janeiro, 1858.
E outras vêzes são flautas
Que de noite vão cantando;
À SAIA BALÃO
Pra rematar tanta pta
O
nariz será trombeta. Balão, balão, balão! cúpula errante,
Atrevido cometa de ampla roda,
Trombeta o meu nariz?!! (ouço-a bradando) Que invades triunfante
Pois meu nariz é trombeta?. Os horizontes frívolos da moda;
Oh! não mais, Sr. poeta, Tenho afinado já para cantar-te
Com neu nariz s'intrometa. Meu rude rabecão;
Vou teu nome espalhar por tôda parte,
Perdão por esta vez, perdão, senhora ! Balão, baläo, balão!
Eis nova inspiração mne assalta agora,
E em honra ao teu E para que não vá tua memória
Dos lábios me arrebentanariz
em chafariz: Do esquecimento ao pélago sinistro,
Teu nome hoje registro
:8
94 BERNARDO GUIMARES POESIAS COMPLETAS 95
Quantas vêzes rendido e fulminado Mas ah! por que o meneio gracioso
Um pobre coração, De teu airoso porte
Não vaipor esSsas ruas arrastado Sepultas por tal sorte
Na cauda de um balão. Nesse mundo de saias portentoso?
poupas
Mal despontas, a turba numerosa Por que razão cuidados mil não
À direita e à esquerda, Pra ver tua beleza tão prezada
De tempo sem mais perda Sumir-se-te afogada
Amplo caminho te abre respeitOsa; Nesse pesado pélago de roupas? 20-a
E com êsses regquebros sedutores
Com que saracoteias, Sim, de que serve ver as crêspas Ondas
A chama dos amôres De túrgido balão
Em mais de um coração a furto ateias. A rugirem bojudas e redondas
Movendo-se em contínua oscilação;
Sexo lindo e gentil, foco de enigmas! Vasto sepulcro, onde a beleza cega
Quanto és ambicioso, Seus encantos sepulta sem piedade,
Que o círculo espaçoso Empavezada nau, em que navega
De teus domínios inda em pouco estimas; A todo pano a feminil vaidade?
Queres mostrar a fôrça onipotente
De teu mimos0 braço; De que serve enfeitar da vasta roda
De render corações já não contente, Os estufados flancos ilusórios
Inda pretendes conquistar o espaço!... Com êsses infinitos acessórios,
Que vai criando a inesgotável moda,
Outrora já cos atrevidos pentes De babados, de gregas, fitas, rendas,
E as toucas alterosas, De franjas, de vidrilhos,
As regiões buscavas eminentes, E outros mil badulaques e fazendas,
Onde giram as nuvens tormentosas; Que os olhos enchem de importunos brilhos,
Como para vingar-te da natura, Se no seio de tão tofuda mouta
Que assim te fz pequena de estatura. Mal se pode saber que ente se acouta?!
96 POESIAS COMPLETAS 97
DERNARDO GU1MAREs
Mas não o quer o mundo, onde hoje impera Como ao te ver atropelados! corremn
A moda soberana; Cuidados enfadonhos
Esquivar-se pra sempre, oh! quem pudera
Sua lei tirana!. Quantas penas não vão por êsses ares
Com uma só fumaça !.
Balão, balão, balão! fatal presente, Quanto negro pesar, quantos ciúmes,
Com que brindou das belas a inconstância E quanta dor não passa!
A caprichosa moda impertinente,
Sepulcro da elegância, Tu és, charuto, o pai dos bons conselhos,
Tirano do bom gôsto, horror das graças!. símbolo da paz;
O
Render-te os cultos meus não poss0, não; Para em santa pachorra adormecer-nos
Roam-te sem cessar ratos e traças, Nada hámis eficaz.
Balão, balão, balão. Quando Anarda com seus caprichos loucos
Me causa dissabores,
Rio de Janeiro, 18 de julho de 1859. Em duas baforadas mando embora
O anjo e seus rigores.
AO CHARUTO
Quanto lastimno os nossos bons maiores,
ODE Os Gregos e os Romanos,
Vem, ó meu bomn charuto, amigo velho, Por não te conhecerem, nem gozarem
Que tanto me regalas; Teus dotes soberanos!
Que em cheirosa fumaça me envolvendo Quantos males talvez não pouparias 21-a
Entre ilusões me embalas. À triste humanidade,
ó
bom charuto, se te possuísse
Oh! que nem todos sabem quanto vale A velha antiguidade!
Uma fumaça tua!
Nela vai passear do bardo a mente Um charuto na bca de Tarquínio
Ås regiões da lua. Talvez lhe dissipara
Ésse ardor, que matou Lucrécia linda,
E por lá embalado em rósea nuvem Dos mimos seus avara.
Vagueia pelo espaço,
Onde amorosa fada entre sorrisos Se o peralta do Páris já soubesse
0 toma em seu regaço; Puxar duas fumaças,
Talvez com elas entregara aos ventoS
E com beijos de requintado afeto Helena e suas graçaS,
A fronte lhe desruga,
Ou com as tranças d'ouro mansamente Ea régia espôsa em paz com seu marido
As lágrimas lhe enxuga. Dormindo ficaria;
E a Tróia antiga com seus altos muros
ó
bom charuto, que ilusões não Inda hoje existiria.
geras!
Que tão suaves sonhos!
COMPLETAS 101
100 BERNARDO GUIMARES
POESIAS
Quem dera ao velho Mário um bom cachimbo Por que razão tão cedo cá vieste
Que lhe abrandasse as sanhas, De noVO aparecer-me?
Para Roma salvar, das que sofrera, Não sabes que o teu rosto já tão visto
Só pode aborrecer-me ?
Catástrofes tamanhas!
Que me trazes de mimo? mais um ano,
Mesmo Catão, herói trombudo e fero,
Mais uma ruga à fronte,
Talvez se não matasse, surge mais distinta
Se raiva que aos tiranos consagrava,
a E campa, que lá
a
Nas brumas do horizonte!
Fumando evaporasse.
Que tens de me contar de interessante?
Que um ano mais de idade mne
Ambrósio, traze fogo... Conto além de outros muitos que deste?!
Fumemos pois !
Oh! grande novidade!
Puff!. oh! que fumaça!
Como me envolve todo entre perfumes, Já lá vão lustros seis,mais dous anos,
e 22-a
Qual vu de nívea cassa! Que emcontras-me na vida,
Cada vez mais moído e atrapalhado
Vai-te, alma minha, embarca-te nas ondas Nesta enfadonha lida!
Dêsse cheiroso fumo,
Vai-te a peregrinar por essas nuvens, Até quando pretendes oprimir-me
Sem bússola, nem rum0. Com o tremendo fardo
De anos e anos, com que os ombros vergas
Vai despir no país dos devaneios Do teu infeliz bardo?
£sse ar pesado e triste;
Depois, virás mais lépida e contente, Anos, e nada mais eis o que trazes
Contar-me o que lá viste. A quem viste nascer:
E queres que com brindes te festeje,
Ouro Prêto, 1857. Com hinos de prazer?
Passarás, -
e teus ledos esplendores
Virão pousar risonhos
"Andava só;
Como
–
nuvem
espêssa cabeleira
sombria,
No leito em que eu estiver dormindo o eterno "Negra, em desordem flutuando ao vento,
Sono que não tem sonhos. fronte Ihe cobria.
A
e
E nem palpitará aos teus sorrisos "E no vago do olhar turvado triste
Mirrado o coração, Uma alma ressumbrava,
E nem se aquecerão meus frios ossoS Que um pego de amargura e desalento
Na gélida mansão. No seio concentrava.
Estou certo que quando sôbre a terra "Cansado de vagar por êste mundo
Achares-me de menOs,
e nem teus raios
Sonhando um paraíso,
De atroz sarcasmo às vzes pelos lábios
Luto não trajarás,
Serão menos serenos. Lhe doudejava um riso.
Nem pretendo que ao veres meu sepulcro *Longo tempo, em vãos sonhos embalado
De horror voltes a cara;
Antes desejo que o inundes sempre
Viveu só de esperanças
.. o
;
Em leito de Procusto.
106 BERNARDO GUIMARÃES POESIAS COMPLETAs 107
.
o desalento
Como homem que entende dos estilos, Mas, ah!... dovo eu dizer-te?..
Impávido me ergui, apagou-me a inspiraço celeste,
N'alma
Passei a mão na fronte, e sobranceiro E fêz cair das mãos esmorecidas
Assim lhe respondi: A lira que me deste!...
serve
Percgrina gentil, de que te
Andar vagando aqui nestes retiros,
Musa da Grécia, amável companheira Na solidão dos bosques exalando
.
Melódicos suspiros?.
De Hesíodo, de Homero e de Virgilio,
E que de Ovídio as mágoas consolaste Não vês que o tempo assim perdes
embalde,
Em seu mísero exílio; Que tuas imortais nobres cançõcs
morrem,
Entre os rugidos, abafadus
Tu, que inspiraste a Pindaro os arrojos Dos rápidos vagõcs?
De altiloqüentes, inortais canções,
E nos jogos olímpicos lhe deste Neste país de ouro c pedrarias
Brilhantes ovações; 0 arvorcdo de Dáfnis não medra;
E sóvalo o café, a cana, o fumo
Tu, que a Tibulo os hinos ensinaste D o carvão do pedra.
De inefável volúpia repassados,
E do patusco Horácio bafejaste Volta aos teus montcs; vai volver teus dias
Os dias regalados; Lú nos teus bosques, ao rumor perene,
De quc puvon as sombras encantadas
Que com Anacreonte conviveste A limpida Hipocrene.
Em galhofeiro, amável desalinho,
Mas so descjas hoje alcançar palmas,
Entre mirtos e rosas celebrando Deixa o deserto ; exibe-te na cena;
Amor, poesia e vinho; Ao teatro!... lá tens 0s teus triunfos;
Lú tems a tua arena.
Que tens a voz mais doce que a da fonte
Que entre cascalhos trépida borbulha, Tu és formosa, e cantas como um anjo!
Mais meiga que a da pomba que amoTOsa Que furor não farias, que de enchentes,
Junto do par arrulha; Quanto ouro, que jóias não terias,
E que reais presentes!
E também, se te apraz, tens da tormenta
A voz troante, o brado das torrentes, Serias excelente prima-dona
0 zunir dos tufões, do raio o estouro, Lm cavatinas, solos e duetos:
O silvo das serpentes; E ajustarias de cantar em cena
Sòmente os meus libretos.
Tu bem sabes, que desde minha infância
Rendi-te sempre o culto de minh'alma; Se soubesses dançar, oh! que fortuna!
Ouvi-te as vozes e aspirei constante Com essas bem moldadas, lindas pernas,
A tua nobre palma. Teríamos enchentes caudalosas
Entre ovações eternas.
POESIAS COMPLETAS 115
BERNARDO GUIMARÁES
CANGÃO
Mas não por esta sorte;
Morrerei; mas também tu morrerás, Minha rêde preguiçosa
ó
ninfa desalmada, Amorosa,
Porém um outro gênero de morte
Comigo sofrerás: Fm teu seio me embalança;
Quero ler nos céus risonhos
A mim e a ti verás,
Doces sonhos
Ea tôda tua infanda papelada De vemtura e de esperança.
Reduzidos a pó, a cinza, a nada!"
Neste lânguido deleixo
Enquanto isto eu dizia, da algibeira Correr deixo
Uma caixa de fósforos tirava, Minha vida descuidosa,
Que por felicidade então trazia; Contemplando ali defronte
E já chama ligeira No horizonte
Aqui e além lançava Uma nuvem côr-de-rosa.
Com o pequeno archote que acendia; 24*
Eis já o voraz fogo se propaga, Pelo vão dessa janela,
Como em madura, tórrida macega,
E co'as rúbidas línguas lambe e traga Pura e bela,
Eu a vejo deslizar;
A sêca papelada que fumega. Pelo campo etéreo voga
Como Hércules em cima da fogueira
Qual piroga
Por suas próprias mãos alevantada, Cortando o cerúleo mar.
Eu com serena face prazenteira
Vejo lavrar a chama abençoada.
Espêsso fumo em túrbidos novelos
Linda nuvem, quem me dera
Pela esfera
Os ares escurece. Em teus ombros ir boiando,
10
126 BERNARDO GUIMARES
POESIAS COMPLETAS 127
E pairando sôbre os montes, Que adormece
Horizontes Nas asas equilibrado.
Infinitos devassando!
E adejando em céus de anil,
Veria da minha terra ÉSse vil
A alta serra, Ri talvez de compaixão
Que hátanto tempo deixei; De mim, pobre animalejo,
E veria na janela Que rastejo
A donzela Neste ingrato e duro chão.
Por quem tanto suspirei.
Que me importa, se em descanso
E os lares de minha infância, Me embalanço
Em distância Cantando uma barcarola;
Pelo menos eu veria, E agitando-me nos ares,
E as campinas, os ribeiros, Dos pesares
E os coqueiros, Minha rêde me consola.
A cuja sombra dormia.
Tudo prazeres exprime,
Veria coisas infindas, E sorri-me
E tão lindas, Em puro céu de bonança,
Que eu nem posso descrever, Quando esta rêde amorosa,
nuvem, se em teu regaço
Ó
Preguiçosa,
Pelo espaço Em seu seio me embalança.
Eu pudesse espairecer.
Minha rêde é meu tesouro,
Mas se tão puro recreio Nuvemn d'ouro
Em teu seio Que me embala pelo espaço;
Não quer dar-me a Sorte escassa, Dm seu lânguido vaivém
Ao menos esvoaçando Eu também
Lá te mando Sôbre os ares esvoaço.
De meu charuto a fumaça.
Se penso nos meus amres,
Nela vai meu pensamento Entre flores
Me sorri doce esperança :
Pachorrento E entre sonhos côr-de-rosa,
Pelo ar vogando a êsm0;
Para mim isto é tão doce, Amorosa,
Minha rêde me embalança.
Qual se fôsse
Para ti voando eu mesmo.
Os pesares, os queixumes,
Entanto daquele corvo Os ciúmes
Com horror dela se arredam;
Negro e tôrvo Só prazeres sorridores,
Quanto invejo o feliz fado! Só amôres
Sôbre as nuvens me parece
Cm suas malhas se enredam.
POESIAS COMPLETAS 129
128 BERNARDO GUIMARKs
;
Meus amigos, em mimn crede: Vagueiam na selva noturnos duendes
Esta rêde Fosfóricos lumes nas trevas ondulam,
D vagos espectros com voz agoureira
Foi um presente divimo;
Esta rêde é encantada; Nas brenhas ululam.
Uma fada A noite vai negra, tremenda. que importa;
Me a deu em trco de um hino. Mais negra a
é noite do meu coraçã0,
Minha rêde sonolenta,
E as fibras lhe açouta de atrOzes ciúmes
O rijo tufão.
Vai mais lenta,
Vai-me agora embalançando; Corramos ! voemos! que o solo, em que piso,
Enguanto o suave sono Requeima-me as plantas; êste ar me envenena;
De teu dono Oh! sim, que estas plagas tornaram-se inferno
Sôbre os olhos vem baixando. Desta alma, que pena.
Rio, abril de 1864. Nem mnais um suspiro, nem mais um olhar
À
terra odiosa volvamos atrás.
Ó terra maldita, nem vivo nem morto
GALOPE INFERNAL Jamais me verás.
BALATA E tu, que eu amava, mulher impudente,
Que com teus sorrisos, com teu olhar terno,
Com lábios de um anjo sopraste-me n'alma
I As chamas do inferno;
Avante! corramos; por montes e brenhas Que todo um passado de amor e ventura
Galopa ligeiro, meu bravo corcel; No charco da infâmia sem pejo arrojaste,
Corramos, voemos; ah ! leva-me longe Eo meu porvir todo co'as mãos impudicas
Num dia esmagaste;
Daquela infiel.
Corramos! ligeiro! quem dera pudesse Oh! fica-te embora, de mim bem distante,
Nas asas levar-me veloz furacão; De teus desvarios carpindo a vergonha,
E longe arrojar-me dos sítios que viram Ou dêsses teus lábios em peitos incautos
Tamanha traição. Cuspindo a peçonha.
A noite vai negra, rebrama a tormenta; Sim, fica-te embora: quem sabe no mundo
E nem um sóastro na esfera reluz; Quão mísera sorte te espera por fim;
Só rubros lampejos abismos aclaram Talvez que algum dia no abismo do opróbrio
Com lôbrega luz. Suspires por mim.
Suspires embalde; nemn nunca tu saibas
A chuva em torrentes tombando ruidosa
Nas grotas profundas atroa a montanha; Aonde me arrojam meus tristes destinos;
Dos ventos, que uivamn da selva nas brenhas, E possam ralar-te remorsos eternos
De teus desatinos.
A fúria se assanha.
POESIAS COMPLETAS 131
130 BERNARDO GUIMARES
E jamais suas trevas se aclarem, A vida, o amor sorri por tôda parte
Se um momento sequer procurarem Na criação.
Só o fumo entrever de seu lar.
132 BERNARDO GUIMARAES
POESIAS COMPLETAS 133
em tudo,
E só eu gemo, só de dor suspira Renasce a vida: amor respira
Das meigas pombas no lascivo arrulho,
Meu coração.
do regato, que veloz deriva,
E
Nem luz, nem vida.. reina dentro dle No trépido marulho.
Perpétua noite; A flor que se abre, as asas embalsama
Sofrendo sem cessar do atroz ciúme Da aura fagueira, que he beija 0 seio,
eterno açoute,
O
E as avezinhas nocantam seus amres
Dos arvoredos folhudo enleio.
Meu pobre coração não acha abrigo
Em que se acoute.
Tudo é feliz, e de prazer exulta
A noite de tormentas e de horrores No seio desta amena solidão;
Mais o enfurece. E que faço eu aqui, odioso espectro
A manhã com seus risos, suas flores No meio do festim da criação?
Dle escarnece.
Nem no céu, nem na terra ninguém dle
Se compadece. é que aquela infida
possível, 6 céus!
E
Com as mãos sem pudor num só momento
Tão formoso destino transformasse
No mais atroz tormento?
Eis-nos já bem distantes; já bemn longe,
Lá por detrás dos derradeiros montes É quem sabe!.
possível?. tantas vêzes
Sumiram-se a meus olhos Fantasmas vãos a mente nos desvairam.
Daquela infame os turvOs horizontes.
E tantas vêzes nos delírios da almna
Agora sim; aqui por estas veigas Estranhos sonhos pairam...
Podemos repousar,
Mais livre o coração aqui respira, Louco que eu sou!– ligeiras aparências
Vão tlvez me fazer cego e sem tino
É mais puro êste céu; mais leve o ar, Romper por minhas mãos a áurea cadeia
Que nestes camnpos gira.
Do mais feliz destino !
Meu valente corcel, resfolga livre
Pelo viçoso esmalte da campina, E ela! quem sabe, na passada noite
Enquanto exalar busco o voraz fogo, Em quanta angústia Ihe arquejara o peito,
Que esta fronte me queima e desatina. E que de pranto ardente não vertera
Possam as ânsias, que me fervem n'alma No solitário leito!
Em deliroso afä,
Um momento acalmar-se nestas sombras Talvez agora ao pêso dos cuidados
Ao benfazejo sôpro da manhã. Pende-lhe a fronte em mísero quebranto,
E embalde estende pelas sendas êrmas
Como flocos de alvíssimo algodão Olhos cansados de vigília e pranto.
Névoas sutis dos vales se despegam,
Doces aromas os vergéis espiram;
Jáde esperar embalde fatigada
Se debruça sòzinha na janela,
Pelo dorso dos montes, que fumegam, E em desespêro com as mãos convulsas
Róseos vapôres lúcidos se estiram. As tranças arrepela.
1S4 RERNAKDO GUINMARÅN POFSIAS COMPLETAS 135
Oh! que êste céu tão puro, &stes
perfunes,
Esta amorosa sombra, esta frescura, A ti já corro,
Tudo isto me diz que ela me am! Vo n teus braços,
Esta ura, que tão meiga aqui mrmura, Atar os laços
É ela que me De amor sem fim.
chama!
Aquela nuvem branca, que lá surge
Pairamdo nos espaçoS
Sôbre os saudosos montes que hei deixado,
É
ela ainda, que me estende os braços. De novo corramos, por montes e brenhas,
Meu bravo ginete, galopa ligeiro,
doce amada
ó ó
tu, que me hás sido, na dor, nos prazeres,
A ti j corro; Fiel companheiro,
Que por ti morro
Já de saudade. Resvala qual sombra, que rápida foge,
Sibilem-te os ventos nas crinas de prata;
Mais do que munca Devora o caminho, veloz como a fôlha
Hoje te adoro, Que o vento arrebata.
E por t choro
Na soledade. Eu quero já v-la, fazer em seus braços
De meus desvarios fiel confissão,
Maldito instante Depois, entre beijos, dos lábios divinos
De atrOz loucura, Ouvir-lhe o perdão.
Em que a fé pura
Te suspeitei. O sol no zenith seus fogos dardeja 25-a
E os ares abrasa com ímpio furor!.
Qual fsse a causa Que importa! mais vivo me ateia no peito
De tal desdita, 0 fogo de amor.
Oh! acredita
Nem mesmo eu sei. Oh! não esmoreças; tu bem sabes como
o delíirio Teus nobres esforços por ela são pagos;
Foi De tuas fadigas por prêmio te esperam
De um pesadelo,
Que num vo zêlo
Carinhos e afagos.
Me atormentou.
Na testa alisando-te as crinas ebúrneas
Porém findou-se A mão tão sabida por fim sentirás;
Como a tormenta, E sob seus dedos a fronte briosa
Que violenta Feliz curvarás.
No céu passou.
Tu és meu amigo; muito ela te estima;
Quais vão fugindo No pátio ela mesma pensar-te virá;
Densos negrumes,
Os meus ciúmes
Eo braço mimoso lançando-te ao colo
Ração te dará.
Foram-se assim.
136 BERNARDO GUIMARES POESLAS COMPLETAS 187
Oh! possam sempre tão gentis imagens Nem consintas jamais que insulsos vates,
Embalar-te na vida a alma serena, Dispensadores de tardia glória,
Como bafejam tépidas aragens
O cálix da açucena. Em minha campa venham dar rebates
De póstuma memória.
Seja todo de luz teu horizonte;
Eu, que na vida de ovações ruidosas,
Jamais nem leve sombra de tristeza De glórias vs não procurei o incens0,
Lance uma nuvem nessa linda fronte, Goivos, perpétuas, nênias lagrimosas,
Que tem do lírio a virginal pureza. Morto também dispenso.
Mas ah ! painel tão lindo Eu cantei só por disfarçar o enfado
Não tenho n'alma, que me andava agora Do longo caminhar de peregrino;
Longe dos quadros, que te estão sorrindo, Como cantando o mísero forçado
Como longe do 0caso fulge a aurora. Busca esquecer o horror do seu destino.
Se a glória não sorriu-me aquém da tumba,
Isolados em meio dos vargedos, Pouco me importa essa que além retumba.
Aquela fonte, as sombras e o remanso
Daqueles arvoredos Bastam-me as flores, que ao passar da aragem,
Estão oferecendo almo descanso Deixem cair da árvore as madeixas
Eo suspirado asilo, que deseja Por sôbre a tôsca lajem;
O viajor, que de cansaço arqueja.
Nem quero nênia alguma,
Que não sejam as símplices endeixas 27-b
Eu também sou cansado caminheiro, Que à hora do sol pôsto
Já bem extenuado; Ali o sabiá cantar costuma
Estádio não mui longo, mas fragueiro Nas tardes saudosíssimas de agôsto.
Da vida hei palmeado.
Nem permitas, que lúgubres emblemas
Após tantos suores e fadigas Cerquem de horror o leito em que repousa
Devo pensar no poUso; Teu fido amante; nen sombrios lemas
Devo pensá-lo, sim! embora digas 27-a Deixes gravar em sua pobre lousa.
Que inda vem longe a hora do repouso.
Porém que importa! ao pé daquele outeiro, Das galas mais gentis ataviada,
Debaixo do arvoredo, que na vargem Em meu sepulcro brinque a natureza;
As sombras deita do caminho à margem, E possas semn receio ali sentada
Quero dormir meu sono derradeiro, Cismar sòzinha em horas de tristeza.
Quer soe mesmo agora,
Quer lá mais tarde, minha extrema hora.. Se acaso ali vier o passageiro
Matar a sêde e procurar repouso,
Não quero aí nem mármores polidos, Ao volver para a lousa olhar piedoso
Nem goivos, nem ciprestes; Depare êste letreiro:
Bastam-me aguelas árvores agrestes
Com seus ramos floridos,
Cansado viajor, neste retiro
Vem descansar em paz.
Ea relva humilde, e a que murmura
Ao péde minha pobre fonte Que eu não te peço mesmo um só suspiro
sepultura. Pelo pobre poeta que aqui jaz, 27-o
11
142 BERNARDO GUIMARAES
POESIAS COMPLETAS 148
Por umn
bispo eu morria de amôres, Do meu reino e de minhas cidades
Que afinal meus extremos pagou; 0 talento e a virtude enxotei;
Meu marido, fervendo em furores De michelas, carrascos e frades,
De ciúmes, o bispo matou. De meu trono os degraus rodeei.
Deixemos lá o grão-turco
No tapête acocorado
Com seu cachimbo danado
Encher as barbas de sarro.
Quanto a nós, ó meus amigos,
Fumemos nosso cigarro.
És do bronco sertanejo
Infalível companheiro; 33-a
E ao cansado caminheiro
Tu és no pous0 o regalo;
Em sua rêde deitado
Tu sabes adormentá-lo.
E agora, enquanto vão seus dias pálidos Eia! ao chamado meu acudi prontas,
Para o ocaso da vida descambando. E do olvido por entre a névoa espêssa,
Erocando lembranças de outros tempos Belas, donosas, quais vos vi outrora,
Vai amôres passados ruminando; Erguei vossa cabeça.
Bem como quem, a0 coracão cingindo,
Um ramalhete de mirradas flores, Contam vates que Orfeu, cantor divin0,
Co pranto da saudade avivar tenta A morta espôsa à luz restituíra,
0 aroma e o
viço das perdidas côres. As infernais potências encantando
Não penseis que . sou eu ;- há muito tempo,
Lábem longe.. das brenhas na espessura,
Aos sons de ebúrnea lira.
Entretanto nas sendas da existência Se aos braços meus a campa não roubou-vos
Apenas sete lustros hei transposto,
Nem da velhice ainda a mão pesada Vejo entre nós barreira inda mais forte;
Curvou-me a fronte, nem sulcou-me o rosto.
O
fado, a ausência, as ilusões perdidas
Têm muitas vêzes mais poder que a morte.
E nesses anos, que lá vão saudosos,
Quantas vidas de amor tenho vivido; Não sois mais para mim que puros sonhos,
Que vários fados me hão enchido o tempo, Suaves, que inspirais amor sem zelos;
Quanto hei gozado, e quanto mais sofrido?!. Como o porvir, nosso passado é sonho,
Porém sem pesadelos.
Pelas devesas tristes do passado
Como vão meus caminhos alastrados
Aos sons da lira agora vos conjuro,
Dos destroços de minhas esperanças,
De mil laços de amor despedaçados. Vinde um momento conversar comigo;
Vinde num beijo as mal extintas chamas
Dizem que a vida é breve! é para
aquêles Reavivar de nosso amor antigo.
Que vão singrando em mares de bonança,
Ou resvalando em flóridas veredas Meu coração viúvo e solitário
Embalados nos braços da esperança. Já tendo dito adeus às esperanças,
Evocando as imagens do passado
Não para quem por sendas escabrosas Só vive de lembranças,
Deixa em sangue o vestígio de seus passos,
E aqui e além, em seus tristes errores
Como que o coração larga aos pedaços. Qual em deserto vale albergue em ruínas,
Onde nos rotos tetos adejando
Da noite as auras ululando vagam
Saudades acordando.
13
174
BERNARDO GUIMARES
POESIAS COMPLETAS 175
PRIMEIRA EVOCAÇÃO
Oh! quem me dera ver essas campinas,
Das sombras do sepulero De que me afasta tão fatal distância,
Ei-la que surge plácida e formosa E ver os céus, onde sorriu-me a estrêla
Essa visão primeira, De minha lêda infância!...
Que me sorriu na quadra venturosa
Da infância prazenteira... E a fonte, e o musgo, aonde te sentavas
À Sombra do florido limoeiro,
Sêmui bem-vinda, 6
flor sempre lembrada Ouvindo o trepidar harmonioso
De minha lêda aurora! Do próximo ribeiro;
Graças te rendo, pois a consolar-me
Surges primeira agora. E os vargedos sem fim, onde alvejava,
Em meio dos vergéis quase encoberto,
Inda h0je mesmo, após tão largos anos, Teu lar ditoso, ninho de alva pomba
Que repousas no leito funerário, Em meio do deserto;
À minha voz acodes, e abandonas
Para escutar-me o gélido sudário. E do bosque a avenida solitária,
Tão grato asilo ao tímido recato,
Não; não morreste; ou bela como outrora E essa agreste alpondra, em que brincando
VOZ do meu amor hoje
renasces!.. Saltavás o regato.
Tombam-te ao colo as nítidas madeixas,
E adorável pudor te adorna as faces. Lá, nas tardes serenas, eu te via
Por entre os perfumados laranjais,
Não vens da campa, não, que nos teus lábios Ou qual errante Náiade, vagando
Vejo o frescor e a púrpura da rosa ; Nos campos teus natais.
Palpita o seio, e brincam-te os sorrisos 35-a
Na bca graciosa. E ao teu passar, as árvores do bosque
Os ranmosbrandamente meneavam;
Vejo-te os olhos límpidos, serenos, em que pisavas,
Tais como costumava outrora vê-los; Eo chão, à porfia
De flores alastravam.
Nem dos sepulcros o hálito mefítico
Exalam teus cabelos. Brisa amorosa bafejava aromas
Em trno a ti com plácidos rumores;
Tu vens direito da mansão celeste E murmurando a fonte te mandava
A mim descendo, ó anjo meu Um cântico de amres.
formoso,
Com asas de ouro desferindo o vo
No espaço luminoso. E eu te amava; mas do meu afeto
Dentro em meu coração continha as lavas;
E o fogo, que nesta alma ento
Nem sei se adivinhavas. fervia,
Lembras-te ainda dos felizes dias,
Que deslizamos, antes
Eu era tão feliz,
Pela pátria dos anjos, que trocares
de
nome a tão suaves nem sabia
O
e
A sombra de teus hoje habitas, emoções;
lares?... Nem pensei que jamais se esvaecessem
Tão puras ilusões.
1N6 BERNARDO GUIMARAES
POESIAS COMPLETAS 177
E nosSOs corações eram quais flores,
Lá vá de tarde sabiá sòzinho
o
Que o casto seio mal abrindo ao lumne 27-b
De nascente manh, dentro do cálix Saudoso modular tristes endeixas;35-b
a
Guardavam seu perfume. E nos buritirais gemendo brisa
Sussurre eternas queixas.
É
lá que minha aurora para sempre Vai-te, que há muito os querubins saudosos
Sumiu-se em negra treva. Te aguardam lá nos céus.
Foi breve o nosso amor, mas devoraNte Como se lança um manto funerário
Como o incêndio, que um vento impetuoso Sôbre o lívido rosto de um finado
Assopra na floresta, Para ocultar-lhe oa feia hediondez,
Que laVra furioso, e num instante Assim do olvido gélido sudário
Tudo aniquila: e do vergel fromdoso Sôbre as desgraças e erros do passado
Sòmente a cinza resta. Lancemos de uma vez.
Eis-te tão bela, qual eu vi-te outrora Tal a gaivota descuidosa pousa
Pousada à sombra do jambeiro em flor; E se embalança na cerúlea
vaga
Teus lindos seios de cansaço arfavam, De feio golfão, que mil monstros nutre,
E a calma intensa te avivava a côr. E naus possantes n0 seu bôjo traga.
Dos bosques vinhas, onde volitando Tímida corça, que eu amava tanto,
Flores e frutos a colhêr andavas; Por que comigo teo tornaste fera?.
Flores e frutos, que do teu regaço E em devorar-me coração sangrento
Na relva em trno trêfega entornavas. Tu te aprazias, qual feroz pantera?.
Es sempre assim! – de tua primavera Por que. mas ah! de que me serve agora
Tu vais à toa despencando as flores; De tal passado renovar as penas?.
E os imaturos frutos que colheste, Não é melhor de nossas desventuras
Os lábios teus encheram de amargores. Um véu lançar sôbre as pungentes cenas?
Bosques e montes lépida corrias, Hoje contigo só desejo, amada,
Qual das cidades a elegante filha De meu passado respirar as flores;
De seu jardim as alinhadas ruas Que no futuro inguietações não faltam,
Cismando amôres descuidada trilha. E no presente me sobejam dores.
Quão luzidia te tombava a coma Com vãos queixumes perturbar não devo
Por sôbre o colo e face côr de jambo; Desta entrevista a bem-fadada hora, 36-b
Tal ser devia, porém não tão bela, Que tu, lembrando nossa antiga chama,
A linda espôsa do infeliz Cacambo. 36-a Branda quiseste conceder-me agora.
eTímida corça, que incessante vagas dos passados erros,
Do vale ao monte, da floresta ao prado, Já deslembrado
Só sinto agora quanto és meiga e linda:
Deixa, eu te peço, essa fragueira lida, Oh! nessas faces, que já foram minhas,
E nesta sombra vem pousar-me ao lado." Deixa que um beijo deposite ainda.
Assim te eu disse, e me escutando as v0zes
A linda fronte reclinar vieste Mas já procuras de teu bosque as sombras,
Em meus joelhos, e com meigo riso Em leve giro retalhando os ares;
As róseas faces a beijar me deste. Se num momento a meu chamado acodes,
Noutro me foges, sem sentir pesares.
Ah! que essas horas de fugaz ventura
De agros martírios eram precursoras; Adeus! se a sorte ou desvarios nossos
Eram quais flores nas lúbricas margens A tanto amor deram funesto fim,
De fundo abismo a vicejar traidoras. Fiel saudade dêle guarda ao menos
Láno teu êrmo, e lembra-te de mim.
Da vida enquanto te reluz a aurora
Por entre abismos a cantar vagueias; Rio, agôsto de 1864.
Ah! e quem sabe, que colheita amarga
De angústia e mágoas a sorrir semeias?!
182 BERNARDO GUIMARES
POESIAS COMPLETAs 183
A
águia, que com vôos alterosos Meu nome encontrarei quase esquecido
tempo e da distância,
Perlustra tda a esfera, Pela fôrça do
em que hei nascido:
Volta constante aos pín caros rugosos, E quase estranho à terra
Onde entre os filhos o repousO a espera; Os amigos fiéis de minha infância
E nem mesmo a feroZ suçuapara Mortos uns acharei, outros dispersos
e
De seu covil os antros desampara. Por países longínquos diversos.
14
190
BERNARDO GUIMARES
POESIAS COMPLETAS 191
as passadas.
Ao longe estende nas planícies vastas. Que suspeitoso espreita-lhe
Em mil combates já vitorioso Já na beleza e no vigor crescendo
Para longe espancou rivais temíreis, 0 galhardo novilho se arriscava,
Que em campo aberto disputar-Ihe ousaram Se bem que a mêdo, a acompahar nos bosques,
De sua nédia grei a posse e o mando. Amorosos mugidos exalando,
Do rebanho as novilhas mais formOsas.
Porém um dia, como o velho chefe Bem o pressente o ciumento velho,consente
Os flancos molemente reclinando Que emn partilhar de modo algum
Com mais ninguém delícias de
um serralho,
Em mimoso capìm junto da fonte, seus cornos.
Trangüilamente ruminando as ervas Que conquistou co'a ponta de
Ao sol de manhã pura se aquecia Ardendo em zelos, de furor raivando,
A contemplar a numerosa tribo, Corre a punir o temerário amante,
Que em tôrno vaga, Que ousa a seus olhos requestar-Ihe as
vacas.
súbito uns bramidos
Longínquos aos ouridos descuidosos Quer êste resistir; mas inda noVo,
Vêm ressoar-Ihe. Por alguns instantes Inda não traquejado nas pelejas,
Atento escuta ; aps lesto se erguendo, Dos campos seus natais afugentado,
E sacudindo Os retorcidos cornos, Espancado e ferido, foi ao longe
Ergue a cabeça, e com torvados olhos Chorar no seio das profundas brenhas
Percorre ao largo os chapadões imensos. Seu infortúnio e meditar vingamça.
Longo tempo vagou pelas florestas
hora de combate.
É
Muito ao longe Errante, sem rebanho e sem amôres,
Todo envolvido em turbilhões de terra, Com bramidos de dor e desespêro
Que com as unhas, com as rijas pontas Das solidões amedrontando os ecos.
Cava no chão, e arroja pelos ares, Nos rijos troncos, nos cupins anosos
Campeia o inimigo, e denodado Exerce e aguça as formidáveis pontas,
Avançando e rugindo, pouco e pouco E nos alheios campos penetrando
Do rival temeroso se avizinha. Os cornos cruza em luta encarniçada
De seu acampamento o velho chefe Dos arredores com os mais fortes chefes ;
Não se arreda ; porém calado e quêdo A uns soterra, e para longe exila
Por um momento o seu rival escuta, Dos campos seus vencidos e humilhados ; 39-a
E quase acreditar inda não pode, A outros rasga as tépidas entranhas;
Que haja em tôrno atrevido aventureiro Outros nos tremedais deixa atolados,
Que se abalance a disputar-Ihe a posse Ou precipita em boqueirões profundos,
Dos campos seus, de seu gentil rebanho. Aonde encontram morte e sepultura.
Ei-lo já lidador robusto e fero,
ÉSse inimigo audaz, que o procurava, De troféus e vitórias carregado,
E a combate o chamava em campo aberto, Terror e assombro em tôrno derramando,
Era um touro novel, guapo novilho, Para vingar não esquecida afronta
Que nascera e cresceu no
mesm0 camp0,
Nas campinas natais ufano surge.
E inda há pouco do chefe entre a manada
Pascia os mesmos prados, e bebia Assim César, a quem de Roma arreda
Da mesma fonte. Mas sua presença De ambiciosos êmulos a inveja,
Já inquietava ao carrancudo déspota, Depois que longo tempo confinado
Nas Gálias, entre aspérrimos trabalhos
POESIAS COMPLETAS 201
200 BERNARDO GUIMARES
Cem batalhas venceu, domou cem povos, Medonha orquestra formam, que de susto
À Itália volta, o Rubicon transpõe, Mesmo as panteras recuar fariam.
O orgulhoso Pompeu enxota e vence, Consternado o rebanho em tôrno corre,
E toma posse da cidade eterma. Lastimosos bramidos exalando,
E como que Com rogos vãoS procura
O novel lidador avança intrépido, Dos combatentes acalmar a sanha.
Rasgando a terra, os troncos escarchando
Co'as pontas furibundas, e de estragos O dia inteiro, com bem curtas tréguas
Só para retomar um pouco
o alento
Ao largo alastra os sítios em que passa. se
Sem do campo arredar-se o chefe o aguarda Na renhida peleja sustentam
Junto a um velho cupim, que impaciente Sem as buídas aspas descruzarem.
Qual se fôsse o inimigo ataca e rompe, Para esgotar de seu contrário as fôrças,
E em mil pedaços pelos ares lança, O novel campeão manhoso e arteiro
Ou com as unhas cara fundo a terra, Deixa impelir-se, e cede cauteloso
Como quem ao rival, que dá por morto, De seu rival aos empurrões tremendos,
De antemão vai abrindo a sepultura. Que o leva de rondão pelas campinas,
A terra treme aos urTOs furbundos Num brejo o atola, o esbarra pelos troncos,
Dos ferozes, cornígeros atletas, E da vitória já quase seguro
Que com solene lentidão sinistra De um golpe extremo decidir intenta
Pouco a pouco bramindo se aproximam. A porfiosa, tétrica peleja;
Chegados frente a frente quedos param Recua um pouco destravando os cornos,
Quase sem respirar, e fito a fito, E as pontas abaixando se arremessa
Mudos, torvados, de revés se encaram. Ao ventre do inimigo; mas debalde
De horTOr transida a grei muda contempla No desigual terreno em que lutavam
ÉSse solene e pavoroso instante, Por barranceiras ambos se despenham,
Em que os dous ferozes contendores E a travar-se de novo se levantam.
Parece que um ao outro se devoram
Com tôrvo olhar sanguíneo. Já desce a noite, e as sombras, que descaem,
Estão pedindo ou tréguas ou vitória.
Mas de chôfre O novel lidador reúne as fôrças,
Cruzanm-se os cornos com fracasso horrendo, Que até então de indústria sopeara,
Que pelas brenhas muito ao longe troa. E com vigor insólito esbarrando
Está travada a luta; o chão retreme 0 estafado rival de encontro o leva
Ao tropear das truculentas patas; A um rijo tronco, e enovelado o tomba.
As gramas das campinas arrancadas caído porém presto levanta-se
O
(1876)
PRÓLOGO
ao
0 nome do pocta, cujas novas produções hoje damos
que dão culto às
público, é tão conhccido por todos aquêles,
sua reputação se acha tão bem firmada, seus
letras pátrias, e festejados, que publicando
cscritos são sempre to aplaudidos
esta nova coleçio de poesias suas, nos julgamos dispensados
de recomendá-las ao público.
Todavia nos é grato reproduzir aqui algumas das aprecia
ções, com que a imprensa tem acolhido as diversas produções
do insigne poeta e romancista mineiro.
Dando notícia do aparecimento do fndio Afonso, que foi
editado juntamente com uma peça de versos a
intitulada
Canto elegiaco à morte de Gonçalves Dias, "Reforma" expri
me-se nos seguintes têrmos:
"Se há um romancista e poeta que seja apreciado é sem
pelos
seus contemporâneos com a mais justa razão, dúvida
alguma o autor do Seminarista e de Jupira; o público
disputa ansioso os volumes que de vez em quando nos dá o
poeta mineiro.
"Bernardo Guimarães é uma das individualidades mais
poderosas que possui presentemente a literatura nacional:
quase todos os seus romances passam-se nas nossas províncias
interiores; são as belezas das matas, a grandeza dos rios, o
esplendor e a magnificência da natureza, as virtudes das se
nhoras brasileiras, os hábitos simples e honestos dos nossos
a
roceiros, vida silvestre no Brasil, que escolhe sempre para
assunto de seus romances.
Não há o menor artifício no que nos conta Bernardo
Guimarães, tudo neste belo talento é original; até o estilo é
especial. Não se prende sempre às regras da gramática e des
preza muitas vêzes os preceitos de Quintiliano; cuida mais do
fundo que da forma, mas apesar disso tem realce o vulto lite
rário, que acaba de mimosear as letras pátrias com um ro
mance que não é desconhecido dos leitores da "Reforma".
"As poesias de Bernardo Guimarães respiram um tal per
fume, têm tanta beleza, tanta imagem pomposa, um tal entu
siasmo por tudo quanto fala ao coração, e o bom gôsto
tico, a harmonia a mais perfeita dominando constantemente artísa
rima, suavidade e melodia as mais agradáveis,
soando sempre
220 BERNARDO GUIMARES COMPLE'TAS
221
POESIAS
16
222 BERNARDO GUIMARES
Flor sem perfume, pálida de morte, Mas em dia sinistro o raio ardente
Mirrada pelo sôpro da saudade,
Que te ofereço, apenas orvalhada
Cai sôbre êle:
E deixa apenas
-
queima-Ihe a ramagem,
do despido tronco
Do pranto da amizade. A merencória imagem.
Entre luzentes núvens perfumadas Sim, ela foi para os jardins eternos
A ela vêm baixando anjos do empíre0, Sôbre as asas dos anjos adejando;
Que em tôrno 1he adejando, da agonia anjos da orfandade,
Adoçam-lhe o martírio. E os tenros filhos,
Cá ficam soluçando.
Sua alma de crist formosa e pura eternamente
Voar não teme ao seio de seu Deus; E tu, mísero espôso,a eterna ausência:
Da espôsa chorarás
Mas o materno coração confrange-se Roubou-te o céu do coração metade
No doloroso adeus! Metade da existência.
Adeus eterno aos cândidos filhinhos, Essa grinalda, que te perfumava
Ao espôso, aos pais, a tão queridos entes! 41-o
0 lar ditoso, tão viçosa e bela
Ah! ninguém pode conceber a angústia que tão cedo se mudou na campa
Por
De mágoas tão pungentes. Em fúnebre capela ?!.
Da morte, que lhe estende os braços gélidos Doces laços de amor, que só devíeis
No tôrvo aspecto nada v, que assuste-a: De prazeres nos dar suave fruto,
Mas da saudade maternal não pode Ah! por que vos tornais fonte perene
Dissimular a angústia. 41-† De lágrimas e luto?!...
Que importa, que entre cânticos os anjos Viuvez! orfandade! ai tristes crepes,
Para guiá-la ao céu sua alma esperem, Com que de luto o coração cobrimos,
Se junto a si gemidos e soluços Vós sois bem como lúgubre mortalha,
O coração lhe ferem? Que em vida já vestimnos.
Se em tôrno espairecendo os olhos turvos 13 de feveveiro de 1869.
Cruel tormento Ihe lacera o peito, 41-g
Vendo os tenros filhinhos, que soluçam
Junto do infausto leito? 41-% 0 MEU VALE 42
Ah! são anjos também êsses, que deixa A meu amigo Ovidio João Paulo de Andrade
Sôbre a terra chorando em orfandade;
E a triste ao vê-los duas mortes sofre, Inveni portum; sors, et fortuna, valete!...
E morre de saudade.
Ei-lo?. é
aqui o vale sossegado,
Quantos laços de amor e de ventura Em que para meus dias foragidos
Despedaçados no fatal momento! Achei sereno asilo,
Nos tristes lares que porvir sombrio E nos erradios passos achei pouso
De dor e sofrimento! Humilde, mas tranqüilo.
Sua alma pura foi gozar no empíreo Tu não verás aqui vastas campinas
A luz da aurora que não tem ocaso 414 Se estenderem té onde a
vista alcança,
E o frágil corpo quebra-se na campa Nem largos horizontes,
Bem como inútil vaso. 41-j Que vão perder-se nos remotos
píncaros
Dos azulados montes.
inspiração. Celeste tenda, minha a Pousar
baixando vir fronte minha a sôbre E
montanhas das seio no vim, eu Assim
coração, ao Falar-me fenda, oculta mais Na
anjo um a de voz
ouvir cuido eu Então derrocada tôrre da muros Os Entre
docemente; cisma alma minha Então esconde ninho seu que andorinha, a Como
espessura; na sombras
Das adejam. não votos Meus
vale do córrego murmura mal o E cercam, me que outeiros, dêstes alémn E
outeiros dos aberta essa por Além, fontes frescas de borbotar o entre Por
Me pareces
Viveste sempre, encaneceste, e morres A estrêla crepuscular,
Nos braços da vitória. Entre nuvens escoando
Clarão brando,
Que de amor nos faz cismar.
Paz aos manes do inclito guerreiro!
Honra à sua memória!
Junto ao seu monumento funerário Quando cismas à tardinha
Está velando a glória. Tão sòzinha,
0 que vês lá no horizonte?
O que assim teus olhos prende,
Dorme, velho guerreiro, o sono eterno E te pende
A donosa e pura fronte?
À sombra de teus louros;
E do bardo a canção teu nome envie
Aos séculos vindouros. Acaso na flor da idade
Da saudade
Sentes já o agro pungir?
A CISMADORA Ou nos sonhos de criança
Da esperança
Sedutora moreninha, Vês a estrêla reluzir?
Que à tardinha
Vens pousar nessa janela, Que sôpro te verga o colo
Em que cismas tão calada, Para o solo,
Debruçada, 44-a Flor apenas entreaberta,
Com a mão na face bela ?.
.. E faz pelos horizontes,
Sôbre os montes,
Vaguear-te a vista incerta?
Os raios do sol poente
Docemente De algum anjo, teu irmão,
Beijam-te a fronte mimosa :
A canção
E em teus sonhos engolfada Estás ouvindo nos céus?
Ou do éden as campinas
Descuidada
Descortinas
Nem sabes quanto és formosa. Da tarde por entre os véus?
Já não existe o
lidador valente,
E êle era do povo filho amado,
o
Que largo tempo as santas liberdades E pelo povo a sanha dos tiranos
Da pátria defendeu, Intrépido afrontava,
Dos ilustres soldados do progresso Profeta ardente, que da liberdade
0 egrégio corifeu. As sendas preparava.
Caiu enfim êsse, que vimos sempre Como a Isaías nas remotas eras,
Dos livres o estandarte desfraldando
Ante o povo oprimido;
0 anjo do Senhor com brasa viva
Os lábios lhe tocou,
Perdeu da liberdade a santa causa E da pátria no amor nobre e sublime
O apóstolo querido. O peito lhe abrasou.
Ai! era cedo aimda; a pátria aflita, De Washington aluno, nunca humilde
Entre cachopos e perigos grandes Foi mendigar nem honras, nem favores
Vacila e luta incerta; Aos pés do régio sólio;
Do laurel popular cingida a fronte
Contra os filhos do êrro e do regresso 45-b
A liça ainda estáaberta. Alçou no capitólio,
Ai! era cedo aida;e a pátria aflita, De Washington aluno, nunca humilde
Entre cachopos perigos grandes Foi mendigar nem honras, nem favores
Vacila e luta incerta; Aos pés do régio sólio;
Contra os filhos o êrro e do regresso 45-b
A liça ainda está aberta.
Do laurel popular cingida a
Alçou no capitólio,
fronte
Viúva e moça! que painel sombrio! Detê-lo em vão procura entre carinhos,
És qual pálido goivo debruçado Em seus mimosos braços;
Sôbre uma sepultura; aos beijos furta a face,
Linda estátua da dor pousada à margem Vai batalhar,
De uma vereda escura. Arranca-se aos abraços.
Roncan trincando os dentes navalhad0s. Olha, que nobre ardor, quanto heroísmo
Solta o jaguar um pávido bramido, Da denodada turba o peito inflama
garras lança:
Eà relta caterva as
Com êles entra em áspera refega,
Tendo aos pés o voraz, undoso abismo,
e
Sôbre a fronte um dossel de fumo chama,
E tudo, quanto o irado bote alcança, Já dos domínios teus rompe a baliza,
Mutila, rasga, e rábido estrafega. E o solo do inimigo afoita pisa.
Ei-los em fuga á se vão rosnando
Nora guarida ao longe procurando. m
Nos teus rotos merlões viste plantada Ondulando lá vejo nas ameias
A gloriosa, nacional bandeira; Vitorioso o nacional pendão,
Tu, que a fronte humilhada
Ante o herói brasileiro inclinas muda, Avante! avante! heróicos lidadores!
Itapiru, a musa te saúda!. Longa a lide será, dura e fragueira;
Ainda longe está dos vencedores
Diante de teus muros
Que esplêndido painel se desenrola !
V como alegre aos troféus futuros
Avante! avante!
Éle aos
-
A palma derradeira.
campos
Osório é quemn vos brada.
da glória
S1-b
ondas espumantes
Lá vem cortando asproa Salve, 6 nomes tão dignos de memória!
Do "Amazonas" a gloriosa, 52-e Vós sós sois um poema!
as asas sussurrantes E entre os troféus da brasileira glória
E sacudindo a !
Vomita fogo mole poderosa 0 mais formoso emblema!
Qual monstruoso, rábido espadarte
Tudo, que encontra, fere, esmaga
e parte.
Que em teu seio se abrigue a horda impura Onde a peleja hórrida rebrama.
Do bárbaro insolente, Vamos além; mas antes de deixares
Que da pátria as campinas tala e assola, Éstes sítios famosos,
E o que hámais santo sem pudor viola! Desperta ainda os ecos, e saúda
De Canavarro os manes gloriosos!
monstro carniceiro, que surgira
O Não, não podes, não deves ficar muda
Das selvas paraguaias, Ante a sombra do velho lidador,
E com ousada planta conseguira Guerreiro ilustre das antigas lides,
Do pátrio solo violar as raias; Cavalheiro sem mancha, e sem pavor!
Que rugia famélico e sedento Suas cinzas venera, e não trepides
De sangue e de carniça,
E vinha ansioso em teu solo opulento Em comsagrar-lhe a glória
Fartar de roubos a feroz cobiça ; Entre os heróis mais dignos de memória.
Ei-lo que arqueja hidrófobo, espumante
Colhido em fatal rêde, Quem por essas intérmìnas campanhas
Ei-lo dobra o joelho suplicante Dêste solo de heróis não sabe o nome
Morrendo à fome e à sede, E as ímclitas façanhas
E à terra em vão, em vo aos céus implora Do valente, que a terra hoje consome
LenitivO ao tormento, que o devora! No túmulo singelo, em que descansa?
Mas passemos por alto a cena inglória Podem mil gerações se suceder,
Esse nome do povo na lembrança
ERNANIO GUIMANES
POESIAS COMPLETAS 273
54-e
E nas sombras do báratro hediondo Glória ainda uma vez ao nome teu,
Um gênio se afigura, Ilustre lidador!.
Que rege, ateia e apaga a seu talante
Todo aquêle oceano flamejante. Nova coroa a fronte te envolveu
De eterno resplandor,
Avante! avante! fogo! Osório brada Honra a ti, e a teus bravos companheiros
As filas perlustrando; Glória aos hericos, imortais guerreiros!...
Retine a lança, a baioneta, a espada,
No prélio fuzilando,
E nas últimas ânsias a peleja 54-d VII
Em mar de fogo furiosa arqueja!
PÔRTO-ÁLEGRE
Avante !. porém já desbaratado
Volta a face o inimigo, Já não sòmente a bala, a lança, o
sabre
E de Rojas no campo entrincheirado Em contínuas batalhas carniceiras
De dia em dia imensos claros abre
Vai procurar abrigo.
Qual de javardos horda perseguida, Das aliadas hostes nas fileiras.
Que se recolhe à toca conhecida, 54-e Novo inimigo surde lá do fundo
Dos mangues lodacentos:
Quais voam pelo céu despedaçadas, Da peste se levanta o monstro imundo,
No fim do temporal, E das fauces infectas exalando
As nuvens pelo sôpro dispersadas Miasmas peçonhentos
De rijo vendaval, Vai pelo campo estragos derramando.
Tais de tropel buscando os seus merlões
Lávão fugindo os rotos batalhões. No leito inglório exânimes expiram
Aos centos os heróicos lidadores,
Foi êste um dia de sangrenta glória, Que já em cem combates vencedores
Também de luto e pranto ; De glória se cobriram,
Já pelo campo da feliz vitória Des lá de Uruguaiana e Iataí
Restruge altivo o canto, Té os tredos pauis de Tuiuti.
E a clangorosa, bélica harmonia
Abafa mil gemidos de agonia! Calam-se os bronzes ante o mal horrível,
Pende o arcabuz, a espada se embainha,
E dizimado o exército invencível
Em forçada inação jaz e definha,
És tu ainda, Osório, que na história E fraco mal responde
Da brilhante epopéia grandiosa Aos tiros do inimigo, que se esconde!
Burilas com a espada valorosa
A mais brilhante página de glória.
Mas já no campo surge radiante
Sim -é o teu montante formidável, De Pôrto-Alegre a homérica figura;
Que inda uma vez esnmaga o Dos heróis entre a plêiade brilhante
paraguaio,
E eterniza esta data memorável Mais um nome fulgura!
Das campinas do Sul é mais um filho, 55-a
Vinte e quatro de maio! Que às pátrias armas vem dar novo brilho.
BERNARDO GUIMARES PODSIAS COMPLETAS
280 281
Sim, talvez lhe sorriem nesse instante Pelos grotões do bosque emaranhado
Imagens bem-queridas
:
Pavoroso sussurro se propaga,
o lar, a espôsa, a doce amante Como ao longe ocean0 encapelado
A pátria,
No troar dos combates esquecidas Arrebentando vaga sôbre vaga;
Vêm a furto afagá-lo Tremenda ventania
embalá-lo. A melena dos bosques arripia!
E com meigas lembranças
Mas dura pouco a paz, que 0 céu envia Pelos selvosos antros, que restrugem,
Sôbre a face da terra. Um mar de fogo em turbilhão rebrama;
peito humano estua noite e dia As chamas em furor crepitam, rugem,
Entre sonhos de guerra. Nos ares se derrama
De espêsso fumo tolda abraseada
Avança fogo! mata! avança! avança !
! 56 Como de bronze abóbada inflamada.
Mesmo dormindo o lábio remurmura,
Sêde fatal de sangue e de matança Já da floresta as árvores copadas
Lhes anuvia a tôrva catadura. De rubras labaredas se coroam;
Mil chispas abrasadas
Mas que sinistro estrondo desusado Turbilhonando pelo espaço voam;
Lá vem roncando pela escura brenha? Línguas de fogo pelo ar se estiram,
Que horrendo temporal desatinado E em fúria espadanando ao céu se atiram.
Pela bravia encosta se despenha,
Eaquem
faz bramir qual fero leopardo,
cravaram venenoso dardo? Mas do inimigo a ardil imprevidente
A
Contra si mesmo açula os elementos;
Não é dos bronzes o trovão, que brame
Contra êles soprando de repente
De ocultos bastiões,
Em nosso auxílio vêm propícios ventos, 56-b
Por quem o eco destas serranias dias "E tu, 6 clara fonte, que golfavas 62-c
Lembrando as glórias dos antigos Sonora entre os penedos,
Inda hoje em vão suspira. E meiga a meus ouvidos murmuravas
Melódicos segredos.
Da bronca serra na empinada crista,62-a
Vizinha à região das tennpestades, "Hoje turva, rolando lôdo imundo,
Tendo a seus pés quase a perder de vista Na voragem sombria
Montanhas, rios, selvas e cidades, 62-a Não refletes o céu no azul regaço,
Sôbre a grimpa altaneira Não tens mais harmonia.
Alçou-se a ninfa ao mundo sobranceira:
E em trno do vastíssimo horizonte "A garça não vem mais as níveas plumas
Pairando um triste e derradeiro olhar Banhar em teu licor,
Trava da lira, e assim lá do Itamonte Nem se ouve o sabiáaos teus murmúrios
Começa de cantar: 62-b Casar hinos de amor.
"Adeus, montanha minha, adeus, 6 fonte, Nãotem asas a musa; -a lira e o louro 62-d
Que eu tanto tenho amado; Jazem de pó cobertos,
Vou deixar-vos;. mas levo de saudades Väos emblemas de um túmulo esquecido
O peito repassado. Em meio dos desertos. 62-e
"Fui rainha dos montes da Harmonia; "0 canto emn
do inspiradovão soara
Brindei com liras de ouro Entre as turbas descridas; 62-f
Poetas imortais, e em nobres frontes Em vão; no sono vil da indiferença
Cingi sagrado louro. As acha adormecidas.
"Mas já se foram tão formOsos dias, Passara, como a brisa, que nas selvas
E hoje de saudade Sem rumores Soprou
Suspiro em vão pelas brilhantes glórias Entre despidos troncos, cuja coma
De tão feliz idade. 0
incêndio devorou.
Meus viçosos vergéis emurcheceram, Respiram por aí corrutas auras
Não têm fôlhas, nem flores; De ambição e avareza,
Ai de mim! não me resta um os
só abrigo E mnonótonos dias conta o vulgo
Do sol contra os rigores! em
Imerso vil tristeza.
"Éstes ecos, que outrora repetiam Silêncio pois,ó musa; não profanes 62-7
Meus cantos maviosos, Da lira o dom sagrado ;
Não me ouvem mais, e nas sombrias grutas Deixa êste monte, que empestado sôpro
Dormem silenciosos. 0 tem contaminado.
"Crescem espinhos e bravios matos "Adeus, montanha minha, adeus, 6 fonte,
Na gruta deleitOsa, Que eu tanto tenho amado;
Onde outrora morei; dentro se aninha Eu vo deixo, mas levo de saudades
Serpente venenosa. 0 peito repassado.
21.
DERNARDO GUIMAREs
302 POESIAS COMPLETAS B03
penedo
"Eu parto, mas enquanto êste Cm manso adejo os páramos varando
a
Aquie'guer fronte. Da solidão dos ares,
Há de soar nas cordas desta lira Batem asas os cisnes gorjeando
O nome do Itamonte". Dulcíssonos cantares,
E longe, longe, no horizonte infindo
Engolfados no azul se vão sumindo.
Com a fronte austera desdobrada ao riso, Que eu afinava ao som de eólias notas
Vem conosco assentar-te
enm
tôrno à mesa Da mata entre os rumores, e ao marulho
Do vinho e dos amôres. Da fonte soluçosa, que borbota
Enquanto andamos nos desertos páramos, Dentre penedos em musgosa gruta,
Bem como o viandante extraviado, No doce enlêvo de um cismar infindo.
Suavizemos as dores do destêro
Abrindo o seio aos cânticos e às flor'es.
Fulge-me ao longe essa formosa quadra
Do passado nas brumas quase oculta,
PEDRO FERNANDES. 64 Bem como ilha encantada, onde algum tempo
Entre cantos e aromas embalei-me
(1868.) Em mole berço de verdura e flores.
Mas ei-la, que entre as vagas azuladas
No doirado horizonte vai sumindo,
A POESIA Como a dizer-mne o derradeiro adeus,
Enquanto o meu batel, mísero esquife
Resposta a Pedro Fernandes 64 Já de longos errores fatigado,
Aos tufões do destino abandonando
Ce n'est plus la main du barde même, As estragadas velas triste singra
qu'on entend sur la harpe; c'est ce Para as praias do ocaso, onde só vejo
missement des cordes produit par le fré
tou Bruxuleando lívidos fulgores
cher d'une ombre. De agoureiro presságio entre as geleiras
(CHATEAUBRIAND.)
De merencório inverno.
Ah! guem me dera
I Agora reviver-te, ó quadra amena!..
Quem me dera poder neste momento
Contam, que o albatroz, ave peregrina, Revocar-vos das sombras do passado,
Equilibrada nas possantes asas, Éxtases puros, inefáveis sonhos,
Em sidéreos adejos desparece Que a mente outrora ao céu me arrebatáveis,
Na profundez dos páramos etére0s, De ideais emoções tôda ofegante,
E dias passa, e noites em repouso Pelas do espaço solidões infindas!
Solitária dormindo sbre as nuvens. Então sim, eu pudera acompanhar-te
Em teus valentes, arrojados vôOs,
Assim pairando andava em outros E varando de movo a imensidade
Por outros mundos minha mente tempos Ir devassar harmônicos segredos,
Qual abelha entre flores errante, Fulgurantes visões de ignotos mundos.
De orbe em orbe vagueandovolteando, Então da lira as cordas afinando
Colhendo pelo espaço as incerta, Da solidão aos místicOs rumores
vagas notas
Do hino imenso, que o De novO a vozZ dos ecos acordara
E dêles lepetindo sôbre universo
a lira
entoa Na bronca penedia adormecidos,
Em débeis ecos pálido transunto. E um canto ainda, embora fôsse apenas
Poeta, OS sonhos meus se Descorada lembrança de outras eras,
Co'as róseas névoas esvaeceram
me da manh da vida; Unira aos hinos teus, cantor suave,
Lá ficou entre os Que ao som cadente de gentis endeixas 27-b
Da fresca juventude avergéis floridos
lira de oiro, Encantas hoje as margens deleitosas
Do opulento, caudal Jequitinhonha,
GUINIARES POESIAS COMPLETAS
310
BERNARDO 311
De Deus a glória sem cessar proclamam. Por lá dos irmãos nossos indefesos
0 sangue corre em jôrro;
Eia!. cumpre-nos já em ia acesoS
III Voar em seu socorro;
De tamanha traição, tanta matança,
Canta, poeta, enquanto a sacra chama
ó
Tomar inteira, aspérrima vingança.
Te aquece o coração, te alenta os vôos.
de manhã, que os passarinhos cantam
É A pátria aflita vosso esfôrço implora,
Seus mais frescos, harmônicos gorjeios. Valentes lidadores;
À tarde geme o sabiá saudoso Eia, corramos!. vamos sem demora
No tope excelso de virente cedro; Livrála dos horrores,
noite só ulula em sons carpidos
À
Com que o assassinato, o roubo, o crime
Entre ruínas agoureiro môcho. Nas fronteiras do Sul o império oprime,
Canta, antes que o inverno congelado
Na urna de teu peito extinga a chama, E não é só a pátria; a humanidade,
Que faz subir aos céus o incenso d'alma, A terra, o céu reclama
E da vida nos álgidos caminhos Vingança contra tanta iniqüidade,
Venha murchar da fantasia as flores. E em grito se derrama
Canta; bem-vindo seja êsse teu canto, Por tôda parte Guerra aos vis piratas!
Guerra às coortes bárbaras, e ingratas! 65-c
Que em minha alma acordando ecos de outrora
Abre meu seio aos cânticos e às flores. Ide, heróicas, intrépidas falanges,
Colhêr da glória os louros,
Queluz, 1873.
E ao lampejo dos rábidos alfanjes,
Ao silvo dos pelouros
ESTROFES As sanguinosas garras arrancai
Ao tredo canguçu do Paraguai.
Dedicadas briguda mineira que partiu de Ouro Prêto em
à
Sejam muitos embora; são cativos
1864 sob o comnando do brigadeiro
Galvño 05 De um déspota sanhudo ;
Pra vós, de um livre império heris altivos
Mineiros, um feroz aventureiro, A liberdade é tudo.
Que o inferno vomitou, De entre vós um punhado só de bravos
Do belo território Pode vencer coortes mil de escravos.
brasileiro,
BERNARDO GUIMARAES
316 POESIAS COMPLETAS 317
Sôbre o leão dormido tigre astuto
o
o
0 bote preparava, Ei-lo!.. garboso pavilhão querido
De nossa independência,
E no nobre animal o altivo bruto
Sanguentas unhas crava. Contra o qual mil afrontas tem cuspido
A estúpida insolência
Mas o leão acorda, e ao seu rugido
Do mísero caudilho desalmado
O vil recua de pavor transido.
Que humanidade e a Deus tem ultrajado.
O
Brasil acordou, que à guerra o chama Ide, correi!... em seu negro covil
0 tigre paraguaio, Os tigres rechassai,
E brado seu ao longe se derrama
o
a
E flâmula auriverde do Brasil
Troando como o raio. Nos muros Ihe hasteai,
Um eco só desd'o Oiapoque ao Prata Ide, correi!.. caí bem como o raio
Responde Guerra !. guerra ao vil pirata! Sbre o vil, e insolente paraguaio.
Que exemplos de heroísmo não vais dando, Depois voltai trazendo em vossa fronte 65-f
Terra de Santa Cruz! Os louros da vitória,
Ali a mãe o filho abençoando E contareis às filhas do Itamonte
Entrega-lhe o arcabuz, A gloriosa história
Dos renhidos combates, que tivestes,
E diz-lhe: Vai, onde o dever te chama, Das heróicas proezas, que fizestes.
Que braço teu a mãe comum reclama.
o
22
BERNAIDO GUIMARES
3IS POESIAS COMPLETAS 819
Aos antigos e variadíssimos metros tão vantajosamemte falada, em cuja execução só se observa o compasso, 71-dmúsica
usa
dos na poesia portuguêsa, vai-se substituindo o predomínio a me
dida do tempo.
quase exclusivo do verso alexandrino, que bem se pode chamar Em confirmação do que levo dito, indicarei alguns exem
o balão da
moderna poesia; o metro das palavras balofas e plos.
retumbantes; dos plurais enfáticos como eternidades
Leia-se os primeiros versos da Henriade, que são rápidos
imensidades; das sinonímias intermináveis, metro, que re e calorosos:
clama, não por necessidade ou elegância, mnas para encher me
dida, o emprêgo da conjunção e a cada passo; metro enfim Je chante ce heros, qui regna sur la France
de incontestável monotonia. Et par droit de congute et par droit de naissance.
Perdoem-me os adoradores do alexandrino, não me exco
munguem. Se a tolerância religiosa é um dogma da moderna Leia-se depois êstes da Passagem do Reno de Boileau:
civilização, não o deve ser menos a tolerância em doutrinas
literárias. Demais eu não sou propagandista; apenas enuncio Au pied du mont Adule entre mille roseauc
e procuro justificar simplesmente e sem pretensão alguma a Le Rhin tranquille et fier du progres de ses eaue,
minha opinião individual. Appuié d'une main sur son urne penchante
Entendo que o metro alexandrino é o mais monótono, pe Dormait au bruit flateur de son onde naissante,
sado e inflexível, de que pode dispor a língua portuguêsa, e Lorsquun ci tout à coup, suivi de mille
que não é sem razão, que os antigos cris...
gavam. Não devemos de todo bem raras vêzes o empre
abandoná-lo;
que tem êle todo o cabimento; mas parece-me, há ocasiões, em Note-se o contraste, que há entre os quatro primeiros ver
que só emprega Sos, repassados de pausada e majestosa melodia, e o último,
do com muita parcimônia, ou intercalado com que brusco e rápido indica
e manejado por mãos outros ritmOs, belamente a transição para nova
habilíssimas pode produzir bom efeito. ordem de idéias.
0 alexandrino não dispensa a rima. Sem ela e às vêzes Confronte-se ainda êste verso de Mellevoie:
mesm0 com ela quase se confunde com a prosa. Poderia aqui
citar numerosíssimos exemplos; mas não devo estender muito Je meurs et sur ma tombe, ou lentement j'arrive
DERNANDO GUIMANAES
332 POESIAS COMPLETAS 283
com êste outro, não me lembro de que pocta:
Vou ainda citar um exemplo, e êste é de um gênio, O
trace. visconde de Castilho, que além de possuir uma imaginação brí
Apprcntis cavallier chevanchait à ta lhante fecunda como bern poucO8, era um adestrado metrifi
Que diferença de movimento, de entonação, c podc-se dizcr Cador, deixou-nos, ao par de magníficos exemplos, preciosas
mesmo de colorido! teorias. Mas infelizrnente, foi êle que nos últimog quartéis da
Passemos agora ano metro latino, e exemplifiquemos ainda,
vida introduziu em Portugal a mania do moroso e arrastado
que é @ste o melhor meio de fazer sentir a minha opinião. alexandrino, que os poctas brasileiro8 adotaram, abraçaram
com um fervor, um fanatismo tal, que... parcce, que ainda
Arma, rirumque cano, Troje qui primus ab orie Cstamos nos temp08 coloniais, durante os quais Bó era boz
o que nos vinha do Reino.
Italiam fato profugus, lavinaque venit, ctc. É dêle mesmo, dêsse bardoimortal,
que vou tirar 0 exemplo, do quanto é superior o nosso verso
Háagui o tom altivo e entusiástico de quem vai entrar na de onze sílabas ao de treze para todos 09 agsuntos, e principal
exposição de grandiosos acontecimentos. mente para assuntos elevados. Quem não tem lido ¢ não sabe
Confronte-se com êstes versos o princípio do canto IV do até de cor os Ciumeg do bardlo? EsSes magníficos versos hen
mesmo poema : decassílabos, 71-/ apesar de não rimados, gravam-se por si mes
mos na memória do leitor. Há entretanto uma produção
At regina gravi jamdudum Baucia cura... mesmo poeta, recheada dos mais engenhosos conceitOs, do
rica
Vemos nestes exemplos, como a mesma metrificação, na
de imageng e dessa brilhante e variada linguagem, que soía
língua francesa e latina, se acomoda admiràvelmente a todos os
empregar o grande bardo lusitano, mas que, em meu entender,
assuntos, a todos os tons,1-e Esses exemplos poderia eu mul perde grande parte do seu valor, não tanto por ser longa, mas
por ser escrita em versos alexandrinos rimados dous a doug.
tiplicá-ios a ponto de fatigar, mas a preguiça de Cscrevê-los, e
o receio de enjoar o Jeitor, me aconselham, que
não cite senão É custoso lê-la de fio a pavio sem fadiga e mesmo sem algum
mais um exemplo, e êste o mais frisante de entre os versog enfado.
do grande poeta e grande metrificador latino. São os s0 Refiro-me a umna poesia, que li na "Revista contemporâ
guintes: nea" de Portugal, notável e preciosa revista, em que colabora
Ile latus niveum molli fultus yacyntho vam, além do mesmo Castilho, as outras
sumidades da litera
tura portuguêsa, como A. Herculano, E. Castelo Branco, Latino
Coelho, J. Machado, etc., etc. Foi
Quadrupedante putrem 80nitu guatit ungula campum uma célebre atriz portuguêsa feita expressamente para
Emilia
por ela recitada em uma representação, das Neves, e devia ser
que não se realizou,
Agora peço licença aos idólatras do alexandrino para per infelizmente para o fim humanitário, a que era destinada, mas
guntar-hes, se o seu metro felizmente para a poesia, que mesmo lida não deixa de ser
favorito é susceptível de tamanha monótona e fatigante em razão do em que é escrita, e
variação de tom, colorido e movimento?. que recitada ainda mesmo por essaritmo,
Por mais que Jeia essa infinidade de hábil artista, com custo,
anda por aí a granel em livros e alexandrinOs, que creio cu, poderia ser ouvida e entendida.
vêzes muita inspiração, estilo jornais, encontro nêles por Basta sbre êste assunto, a respeito do qual bem desejara
brilhante e elevado, ou estender-me mais um pouco a fim de provocar alguma dig
conceitos, mas quase nunca essa belíssimos
a verdadeira poesia, e sem a túnica prestigiosa, que reveste cussão entre meus colegas, e nomeadamente o meu amigo Ma
qual a musa é uma chado de Assis, 71-y poeta de forma pura e
imóvel, incolora ; quase nunca esga estátua fria, e primo
tiva, que coloca a arte de Homero e cadência musical e imita roso romancista, o qual sei que é também elegante,
apaixonado do ale
tenes e Cícero e a de Virgílio entre a de Demós xandrino, pôsto que dêle não faça uso exclusivo.
Rossini e Verdi, fuzendo-a
vantagens de uma e de parlicipar das Outro motivo, que me induziu a fazer um prólogo a esta
pensamento e OS ouvidos.outra, encantando ao mesmo tempo 0 pequena coleço de poesias 71-h foi o ter
lido tempos em um
jornal da Côrte um artigo do Sr, Valentim há Magalhães, em que
23
BERNARDO GUIMARES
334
novo Minas, o Sr. Augusto de
tratando de um outro poeta que deparece aludir à minha pes
Lima, l-se o seguinte trecho,
S0a: a província de
"Deve orgulhar-se nêle (Augusto Lima)e ODE
Minas, cujo maior poeta, outrora tão ardido
fecundo, hoje se
esteriliza numa apatia mórbida, donde só rebentam
monótonas
Ao meu amigo Dr. Franciseo de Paula Pereira Lagoa, por
cantilenas em honra de César". ocasião do falecimento de seu pai 72
Não me tenho em conta do maior poeta da província de
Minas, nem mesmo do cantão, em que resido;
mas é bem certo,
que só eu, ao que me consta, fiz algumas poesias em homena Durum, sed levius fit pacientia
gem a SS. MM. II., quando visitaram a capital desta província, Quid, quid corrigere est nefas.
e portanto creio que não vou errado tomando para mim a alu (HORÁCIo, Odes.)
sãodo Sr. Valentim. Como nenhum outro se apresentara para
solenizar com os produtos de sua musa tão auspicioso aconteci
mento, se não era de minha rigorosa obrigação, julguei ser ao Em frente de um sarcófago funéreo
menos um dever de civilidade da minha parte, render aos ilus Vejo-te, amigo; atroz melancolia
tres hspedes as devidas homenagens pelos meios ao meu al Te paira sôbre a mente conturbada,
Cance. Como nuvem sombria.
Mas essa alusão, em parte tão honrosa para mim, e tão
acima do meu mérito real, é de todo o ponto injusta, quando É
grave a tua dor; austera e funda
me supõe engolfado em mórbida apatia, donde só rebentam Como da campa-o seio tenebroso;
mOnótoNas cantilenas em honra de César. Com a publicação E o peito aflito como que se fende
desta coleção o Sr. Valentim se convencerá, que não é tanto No arquejo doloroso.
assim.
Que essas cantilenas, apenas duas, são monótonas, Üma nuvem de lúgubres idéias
eu o reconheço, e até mesmo mal feitas, porque foram quase Eu vejo em tua mente esvoaçando,
improvisadas no meio do tumulto e ruído das festas. Mas Como abutres sinistros de teu peito
agora ao editá-las de novo na presente coleção, tomei o cuidado As fibras lacerando.
de corrigi-las e melhorá-las, não sei se o consegui, a fim
de torná-las mais dignas dos altos personagens, a quem são Nem um suspiro, nem uma só lágrima
dirigidas, e mais merecedoras da indulgência do Sr. Valentim Pelas imóveis pálpebras transuda;
Magalhães, cujo alto eritério e ilustração muito respeito. A dor, que é forte e grande, não tem prantOS
E como a campa é muda.
Ouro Prêto, 10 de agôsto de 1882.
Debalde invocas de tua alma a fôrça
B. GuIMARES Nesse transe de acerbo sofrimento;
Corre-te em bagas pela fronte pálida
Suor de desalento.
Fatal destino, que te enluta os dias, Ergue tua fronte, e impávido te apresta
Te abre no coração cruel ferida; A prosseguir tua missão no mundo;
Ei-lo deitado sôbre o chão da morte Ah! não fraqueies na afanosa luta
ÊSSe, que deu-te a vida. De teu pesar profundo.
Em dia infausto o pálido fantasma Na poeira das campas não mais deixes
Co'as fuscas asas te roçou n0s lares, Rebolcar-se abatido o pensanmento,
E os transformou em lúgubre morada E da esperança nas esferas puras
De angústias e pesares. Respira novo alento.
Ao Paraguai
A pátria clama
Meu brado
Pra defendê-la
ouvi! -
Eia marchemos, Eis-nos aqui.
E ao vil tirano
Morte levemos. Ouro Prto, 1867.
BERNARDO GUIMARES
344
POESLAS COIPLETAS 345
Celebrando a memória
me conforta; Dos feitos de um heróico e nobre povo?
Não,eu não vou m0rrer. Deus escura, Eu, bardo obscuro dêste mundo novo ?!
campa a sombra
Não me aterra da porta;
Bem moça vou bater dos céus à Devo eu, do seio destastristes brenhas
a sepultura.
E essa porta qual é?... Soltar nota perdida,
Que irá por certo em vibrações rouquenhas
Não, eu não vou morrer. Flor melindrosa Perder-se esvaecida
Preciso de aura mais serena e pura; Na orquestra universal, que hoje proclama
Não resiste ao tufão a frágil rosa; Do lusitano bardo o nome e a fama?...
meu abrigo o véu da sepultura.,
É
que devo eu viver na terra ainda?... Da glória de seus feitos, de seus hinos,
Porespero Dos tristes devaneios
Só no céu paz e ventura; De seu amor, seus ásperos destinos
e
Irei lá renascer mais forte linda, Três séculos vão cheios.
meu novo berço a sepultura.
Será Três séculos há que surge essa figura,
Aquela estrêla, De ano em ano mais brilhante e pura.
'Não, eu não ou morrer.
A mais formosa, que no céu fulgura,
Me guia ao meu destin0; ao brilho dela
Porém que importa?. A tímida homenagem
Vou descer sem pavor à sepultura."
De meu fervente culto
Nada amesquinha à gigantesca imagem
Do nobre, heróico vulto;
Tôsca pedra que encosto ao pedestal
Assim, não os teus lábios, mas tua almna De uma estátua soberba e colossal.
Murmurar parecia. Não falavas,
Mas do triste sorrir na expressão calma Quando da aurora no horizonte assoma
Do teu peito os mistérios revelavas. Do sol o disco ardente,
A verde selva meneando a coma,
O zéfiro fremente,
Eram êles, quais fôlhas desbotadas
Que a flor deixa cair uma por uma; 0 arroio, a fonte alegres rumorejam,
Larga no chão as pétalas mirradas Eo céu e a terra e as águas o cortejam.
Mas de eflúvio suave o ar perfuma.
Ante o foco da luz e da beleza,
Assim, alma gentil, no extremo arquejo Em êxtase suspenso
Do corp0 o frágil cárcere 0 mundo inteiro canta; a natureza
quebraste, Desprende um hino imenso
Nos espaços azuis soltaste o adejo,
De multiforme, esplêndida harmonia,
E para os céus voaste.
Em que exalta e saúda o rei do dia.
Mas no meio da orquestra retumbante,
A CAMÕES 79 Que entoa a criação,
Ouve-se lá na encosta verdejamte
Bem árduo empenho tomo A tímida canção,
sbre os
Posso eu cantar a glória ombros!... Que entre moitas de murta e rosmaninho
Do vate, que causou ao
mundo Gorjeia a mêdo ignoto passarimho.
assombros
BERNARDO GUIMARES POESIAS COMPLETAS
S53 858
Tríplice louro te circunda a fronte 79-a Dos sofrimentos teus a triste história,
Majestosa e sublime; Teus ásperos labôres,
Poesia, amor, patriotismo ardente Tanto infortúnio junto a tanta glória,
Eis o que êle exprime. Teus trágicos amôres,
São três fanais, em que tu te inspiraste, Diga-os a fndia e a gruta de Macau,
Na epopéia, que aos séculos legaste. Diga Lisboa, diga o fiel Jau.
Oh! que vasto horizonte de harmonias Desdobremos, porém, sôbre tais cenas
Do olvido o espêsso véu,
Já lêdas e risonhas,
Já tristes, já terríveis e sonmbrias, Esqueçam-se hoje cousas tão pequenas.
Já rudes e medonhas, Esqueça-se o labéu
Abres nesse imortal, divo poema, Dessa mesquinha geração ingrata,
Que há de tocar do tempo à meta Que um tão nobre filho assim maltrata.
extrema!...
Aí do luso nauta está gravada Mas basta!... eisjá cumprido o santo voto!...
A imagem sobranceira Oh, imortal Camões,
Em pedestal eterno sublimada; Aceita os hinos do cantor ignoto;
Aíresplende inteira São fracas oblações
A glória de uma altiva
geração; De quem arrasta míseros andrajos
De um povo herico Aos pés de quem vestiu sublimes trajos.
aí bate o coração.
Quão tristemente E que importa ao fulgor de tua glória
Inês aí suspira A pálida lucerna,
Seu lastimoso
Que terríveis amor!... Que apenas bruxuleia merencória
vinganças não respira
O tôrvo Adamastor, Em lôbrega caverna?!.
Ao nauta afouto
anunciando os duros,
Apague-se uma vez; quebre-se a lira,
Cruéis desastres, que Que a celebrr teu nome em
contou futuros. vão aspira.
BERNARDO GUIMARES
354
POESIAS COMPLETAS
355
Sono de glória à sombra de seus louros
CAMÖES Hátrês séculos, que dorme no jazigo
Aquêle, que entre o silvo dos pelouros,
Poesia recitada no Teatro do Ouro Prêto por ocasião de Longe da Pátria, errante e sem abrigo
celebrur-se o terceiro centenário do grande épico português Soube enviar aos séculos vindouros
Nobre epopéia, em que o mundo antigo
Aquêle, cuja lira sonorosu Reconta aos filhos dêste mundo novo
Será mais afamada que ditosa. Altas façanhas de um heróico povo.
Que sombra ilustre vê se hoje pairando Ao vivo sol das plagas indianas
Nos horizontes fúlgidos da história! Suas pálidas faces se crestaram;
É nobre o porte, o aspecto venerando; Cruéis vexames, dores sôbre-humanas
Traz impresso na fronte merencória Nos lábios os sorrisos lhe murcharam:
Sêlo fatal, que bem estárevelando, Em rija pugna as balas mauritanas
Que foi homem fadado para a glória, 0 lume em um dos olhos lhe apagaram,
Poeta herói de uma nação possante,80-a Mas nada disso o alento lhe esmorece,
Como na Itália fôra outrora o Dante. E nem do engenho as chamas lhe amortece.
Foi poeta e herói êsse, que vejo Deus, a Pátria, o amor tendo por norte
Pelo clarim da fama apregoado. Emboca a tuba épica e derrama
Des dos mares da fndia à foz do Tejo 80
Em sonoroso verso, altivo e forte
Oferece à pátria o peito denodado,
Por tôda a parte a gloriosa fama
E cisne altivo de valente adejo Daqueles, que afrontando o mar e a morte,
Soltando aos ares canto sublimado, Guiados pelo audaz, ínclito Gama
No limiar do templo da memória Foram fundar entre remota gente
Está cantando de seu povo a história. Novo império na extrema do oriente.
Uma das mãos repousa sôbre a
espada, Escuta, com que sons harmoniosos
A outra brandamente empunha a pena,
Que des da infância às musas
As suas gentis Tágides invoca;
foi sagrada; Castro, Albuquerque e outros
Uma combate em sanguinosa arena Dos gloriosos túmulos evoca; heróis famosos
Pelo esplendor da pátria sua
amada; Depois vibrando acentos vigorosos
A outra em uma esfera serena Nos faz tremer quando nas
mais
Em versos de ouro aos séculos mágoas toca
proclama Do Adamastor feroz,
Do Portugal antigo o nome tôrvo gigante,
e a fama. Que em vo defende OS mares
do levante,
No largo peito a rígida
Dando realce ao rosto seuarmadura
Da triste Inês o caso lamentoso
Com que sentidas vozes
A vida do soldado sever0
e dura, rememora!. .,
De mil tribulações áspera
o pêso austero,
Já não é mais 0 eco clangoroso
Pátria, amor, poesia e De épica tuba, que se ouve agora,
Eis o troféu do lusitanodesventura, Mas uns sons de alaúde lamentoso,
A quem ao par do Homero, Que em piedoso carpir a sorte
engenho peregrino Dessa infeliz tão bela, quão chora
Coube em partilha mísero destino. Que só depois de morta foi mesquinha,
rainha.
BERNARDO GUIMAREs
356 POESIAS COMPLETA8
357
Ainda hoje as filhas do Mondego
Choranm da mãe e amante a sorte escura;
Onde ela foi buscar vida e soss@go, ; ESTROFES 81
Tenra e mimosa
flor da primavera
Acorda de teu sono;
Se tão triste lembrança Do ardente estio vem chegando a era;
Ao vate perdoai, que vOs magoa, Depois virá o outono,
também Em que tu colherás por entre flores
0 prant0, que chorais, chora Frutos gentis de teus castos amres.
E a lágrima, que aqui
Levai a vossos deponho agora,
Ouro Prêto, julho
pais. "Frutos gentis de teus castos amres
1881. A vida te engrinaldem,
Os claros dias teus emn mar
de flores
362 BERNARDO GUIMARES
POESIAS COMPLETAS
263
Serenos se desfraldem;
E num porvir de amor e de bonança Sem serem por mãos lascivas
Se convertam teus sonhos de esperança." Desfolhadas pelo chão;
E em qualquer estação
Assim falou-te o anjo; em doce enleio De tua vida ditosa,
Despertas a sorrir, As filhas da arte engenhosa
E com olhar tranqüilo e sem receio Viçosas te sorrirão.
Encaras o
porvir,
Vendo o espôso, que a fida mão te oferta Qual passarinho entre flores,
E para sempre ao seio0 seu te aperta. Do teu talento a cintila
Do lar na sombra tranqüila
Lança vívidos fulgores.
Por mares encantadores
DÉCIMAS Voga tua fantasia,
Ao aniversário natalicio de minha sobrinha Qual condão de alta magia,
habilissima e
pianista
Maria Cunuta,
cantora, filha de meu irmão desembar. Que através da vida ingrata
gador Joaquim Descuidosa te arrebata
Caetano da Silva Guimares 93-a Sôbre as asas da harmonia.
Entre nuvens côr-de-rOsa 10 de maio de 1882.
Desponta o festivo dia,
Que mais um elo anuncia
Na cadeia venturosa
De teus anos, oh formosa. FAGUNDES VARELA 84
Ah! sejam êles, senhora,
Sejam sempre como agora, Olha, 6 poeta! lá pelo ocidente
Guirlanda de eternas flores, Que oceano luminoso!. .
De sorrisos e fulgores Que painel sedutor o sol poente
Perpétua, florente aurora. Esboça pelo espaço vaporoso .
!..
Como cantando a avezinha E o sol é já
sumido além dos montes
Por horizontes sem véu Buscando outro hemisfério,
Vai rompendo o azul do E ainda nos dourados horizontes
E do céu mais se avizinha,céu, De seus fulgores alardeia o império.
Assim tu, minha sobrinha
Sôbre as campinas amenas
De primaveras serenas Em suntuosa campa ei-lo deitado
Docemente resvalando, Sôbre imenso coxim!. ..
Os jardins vais Vasto sudário o cobre, recamado
procurando
Das eternas açucenas. De ouro e de carmim;
E um anjo do Senhor com mão oculta
Essas flores, que Entre luzes e flores o sepulta.
Com tanto engenho cultivas
Derramando o puro e primor, A selva, o rio, a viração sonora
odor,
Vicejaro sempre vivas Lhe manda um triste adeus;
O
passarinho, que o saudou na aurora,
BERNARDO GUIMARAES
-364 POESIAS COMPLETAS
365
Sagra-Ihe agora os ternos cantos seus,
E tôda a terra, cheia de saudade, Pairou-te então por certo sôbre a fronte
o hino da imortalidade. A chama do Sinai,
Lhe entoa E te mostrando a sacrossanta fonte
Dos hinos de Adonai
Na mente te acendeu santo delírio, s4-b
Para cantar do Gólgota o martírio.
Mas no zenith que nuvem tormentosa 25-a Foi assim, que na verde Galiléia,
Seu brilho escureceu!?...
Pela vOZ de Jesus
E odespenhou por senda tenebrosa .. Se propagou a generosa idéia,
Na campa, que o escondeu!?. Que êle selou com sangue em umna cruz;
Quanto bulcão sinistro e temeroso Ea vOz, que ouviram nazarenas relvas,
0 precedeu no ocaso glorioso !?... Ecoa agora nas brasílias selvas.
Foi a tua mamhãserena e pura,
De vil poeira e sórdidos vapôres Foi teu zenith brilhante: 25-a
Espessos turbilhões ao céu remontam; Porém ao declinar, tormenta escura
E querendo apagar-he os esplendores Pairou-te sôbre a mente, como ao Dante,
Ao astro, que descamba, a face afrontam; E te inspirou, sublime anacoreta,
Mas não consegue tétrico negrume ÉSse imortal poema, o Anchieta, 84-a
Extinguir o farol de eterno lume.
e luminoso
0 sol sumiu-se, ardenteem resplendores; Maria, pede a Deus, que das alturas,
Entre canções, envolto
a campa S4-d Pra onde tu voaste,
E ela sòzinha vem velar-Ihe Envie refrigério às amarguras
Com seus meigos fulgores.
Daqueles, que tão cedo abandonaste.
assim a glória, traz sempre na vida
É
Junho 1880.
Um travo de amargura ;
E só sôbre o silêncio dos jazigos
Resplende calma e pura.
A SEREIA E 0 PESCADOR S5
BALATA
rocha,
Onde em vão esbarra o mar.
Manceb0, vai noutra parte VI
Teus amres suspirar.
Longos dias se passaram;
Do que existe sôbre a terra Ninguém mais ouviu cantar
Nada mne pode agradar; A linda filha das águas
Sóamo a Deus nas alturas, Nem na praia, nem no mar.
E a liberdade no mar. E vivia o pescador
Mancebo, vai noutra
"Teus amôres parte Triste e só a definhar.
suspirar.
BERNARDO GUIMARAES
372 POESIAS COMPLETAS g73
praias
Se ousava nas êrmas E vivo aqui sòzinha
Seu queixoso canto alçar, No seio de esplendores;
Só ouvia longe, longe Ninguém quer meus amôres,
Uma vOz a lhe bradar: Ninguém me vem buScar.
Mancebo, vai noutra parte
Teus amôres suspirar." E eu sou a mais formosa
Das filhas dêste mar.
XII
NO ÁLBUM DE B. HORTA
Na base da penedia
0 vulto branco surdiu Estrofes dedicadas a meus jovens amigos os Srs. Bernardo
De uma donzela formosa Horta de Araújo e Pedro de Moura Estévão
Como igual nunca se viu.
Para láo pescador Oh! é já tempo de depor a lira
0 barco seu impeliu. A um canto pendurada,
Como esfriada cinza de uma pira
Que jaz quase apagada,
Saltando na branca areia Ou como flor sem viço e sem perfume,
Aos pés da bela caiu;
Que cai no pó, e murcha e se consume. 86-a
Mas ela com brando riso
Meigas frases proferiu,
Sim, é já tempo – Do zenith brilhante 25-a
De ardente inspiração
Beijou-lhe a fronte incendida Vai declinando o astro fecundante
E os alvos braços lhe abriu. Que em mágica ilusão
Me inundava de luz e de harmonia
A juvenil, ardente fantasia.
O batel abandonado
No pego se submergiu, Assim pensei, e a voz do desalento
Eo ditoso par amante Em minha alma ecoava,
Entre rochas se sumiu, E ao pêso de tão triste pensamento
E por aquelas paragens A fronte me vergava ;
Nunca mais ninguém os viu. Em vil marasmo . eu ia adormecer,
E assim viver.. viver até morrer.
ÀS vêzes por horas mortas, 85-o Viver?!- Oh! não, iss0 não era vida, 8G-b
Pelas noites de luar era
Só vegetar;
Ao largo vê-se um Isso era ver minha alma apodrecida
barquinho Sem crer e sem amar.
Solitário a velejar.
Melhor é dar o corpo à sepultura
Quem vai dentro não se Do que deixar a mente em treva escura.
sabe
Nem se v ninguém remar.
E entretanto ao mórbido marasmo
Apenas ouve-se um 0 coração cedia;
canto, A esperança, a crença, o entusiasmo, 86-c
Tão triste, que De mim longe fugia;
faz chorar;
E Os pescadores, que
0 Ouvem, E eu me julgava como estéril tronco,
Começam logo Que o vendaval prostou em sítio bronco. 86-d
a rezar,
Dizendo
consigo:-éela, Mais eis que uma briosa mocidade
É ela, a filha do mar! Em generoso empenh0
Vem despertar da triste ociosidade
BERNARDO GUIMARÁES
378
POESIAS COMPLETAS
279
O meu inerte engenho,
Que em taciturna, lânguida apatia Lá onde freme a viração sonora
se esquecia.
Do mundo e de si mesmo Na trêmula folhagem,
Onde ao clarão de resplendente aurora
Vós, meus amigos, despertar viestes Inflama-se a paisagem,
A chama quase morta Onde à tardinha o sabiá suspira
Da inspiração, e entre clarões celestes Saudoso adeus ao sol, que se retira;
Me franqueais a porta,
Por onde entra arrojada a fantasia Onde por baixo de vergel sombrio
Nos alcáceres da mágica poesia. Sereno serpenteia,
E mal murmura cristalino rio
Já não são para mim da juventude Lambendo a branca areia,
Os risos e os folguedos, E entre os ramos ledos passarinhos
Pelas cordas de erótico alaúde Tecem cantando seus mimosos ninhos;
Não mais brincam meus dedos;
Ao declinar do sol cantos mais graves Láestá minha alma; lá ouço tranqüilo
Ensina o céu até às próprias aves. Da natureza hino;
o
Mas se as meigas visões, os ledos sonhos E no suave, perfumoso asilo
Da quadra juvemil Da lira os sons afin0
Jánão me enfeitam de clarões risonhos Para cantar os céus e a imensidade,
Um céu de puro anil, E os enlevos do amor, ou da amizade.
Se as cordas de minha harpa emudeceram
Para as rosas de amor, que ennurcheceram, Vêde Castilho, o lusitano bardo, 86-j
Do Tejo cisne ingente;
Acima disso eu vejo no horizonte Nem a cegueira, nem da idade o fardo
O
mundo, a humanidade; Lhe apaga o engenho ardente,
Acima disso sôbre a minha fronte
E a musa que o embalou na meninice
HáDeus e a imensidade; Só à margem da campa
Do universo o espetáculo solene adeus lhe disse.
de
É
alta inspiração fonte perene.
Milton, que deixa na posteridade
Inda em meu peito não rompeu-se a Um nome enobrecido,
Do amor e fibra S6-e
Milton já cego, ao declinar da idade
da amizade,
E em minha lira ao menos inda Decanta o Éden perdido,
A corda da saudade; vibra
Deplorando na lira harmnoniosa
Do passado me resta uma
lembrança
E ainda fulge além uma esperança. Do par primeiro a queda lamentosa.
VI
um recessSO ameno,
Foi lá no seio de natureza,
Em face da festiva
ao carancudo aceno,
E não da guerra em luta acesa,
Ao troar dos canhões
Que um herói com altivO olhar sereno
Afrontando dos fados a incerteza, ALGUMAS POESIAS DE MIU PAI
Aos ecos do Brasil de sul a norte
Soltou o brado Independência ou morte! JOÃO JOAQUIM DA SILVA GUIMARES 5
E DE MEU IRMÃO
VII
PADRE MANOEL J. DA SILVA GUIMARES 5
Eo eco entre clamores de alegria
Vai retumbando do Oiapoque ao Prata,
Des dos topes da erguida serrania
Té às profundas solidões da mata;
E como por si mesma, em um só dia
Da escravidão a algema se desata,
E sem luta, sem dor, sem comoção
Quebra-se um jugo, e surge uma nação.
Ouro Prêto, setembro de 1882.
ao pro essas musas, e e
como carreira olvido
não parti Meneses nome uma Brasil, Janeiro estado teve papéis, amigo
indife de o
mar
incumbia
descuidosamente
s é bancos ao
tempo conse tam mir
saudade carOs, deixar
amigo, inexprimível, se ligam
seguida
algumas
se cujo
é
qual
fumeral,
meu
flores à mais,
vida,
bem
público
no que perdido, e letras no em poucos olhos piedosa
dos
LEITOR das distinto de
tão sua me
envoltos
de distintíssimo,
contemporânea
do Rio e O
podiam
excelente sobretudo
estreitar
de produções, São publicidade.
percurso
de das alguns
ausência,
remeter.
publicidade
já luminosos
todo
no a
mão
poetas é que
um do valor. Cardoso
ambos
oferecer república
lugar papéis, não e quem
AO dous me nomes
meu encarregar-se
com amizade,
prestimoso veio
essas
de de João arrecadar
ligariam,
agora dos
PALAVRAS que no ter-se-iam cuidado
poeta teve
mos subido
colheu
outros da da
irmão,
daqueles
uma vestígios seus
Conselheiro
poesia
de poucos
àquele, luz João
circunstância
apesar
que amigo,
que à e
desejo e
tributar não dous
a
deixando
conhecido
de o sentimento,
reflorir
conm gratidão
meu
obsequioso
da falecimento,falecido
êsses
importância
inestimável
leva
poesias,
talento
dous
mesmas
glórias de lembrança
êle, oferecer
Paulo,
si, pósteros,
bem onde para
generoso além
o
de tanto Sr. falecimento
que
me para de que essa
ALGUMAS fazê-las
e de deixar finaram-se são gratidão de S.
o vantajosamentebrilhantes o
que de pai do essas
e estando
pobreza, compreendeu,
sepulcrais, jazigo, veio
amostras ainda
cinzas obscuridade.
Infelizmente
meu,
feliz nenhuma de do que
laços
de
volume é
dos delicado e amigo, de poeta e
motivo, mel bom
e
mim e Academia
poeta.
não podendo e
largaram,
dizer,
memória amigo e deixou, um guardá-las, Minha os
nmais
às salvar,
do gramde delicada
para
pequen0
de falecidOS,
respeito
literária,
Sousa. Éste mais
sabendo era 1870, e
mavioso
de
possível,
poucas
o rentes posso
ilustre
0 duçoes
radas gem
como fôsse cular
na bém
em que bem ser
que
na gui tão das as
e e de a da
BERNARDO GUIMARAES
POESIAS COMPLETAS 407
06
Os papéis, que
o meu amigo arrecadou, constavam de ras. maneira que se verá no comêço da elegia, procurando
para
agora e quase
cunhos de poesias, entre as quais sóposso dar publicidade cenário de suas inspirações um sítio bronco, alpestre
um número mais conside mundo
inacessível, o Itacolomi, onde, longe dos olhos do
e a
a duas poesias 96-a de meu irmão,
meu pai, das quais meu irmão estava de sua e render homenagem à memória do
rável de poesias de foi exalar mágoa,
se bem que não desco
posse. eram có varão, cujos hericos feitos admirava, o caráter, os ines
Os autógrafos, tanto de um como de ; outro, não nhecesse os graves senões, que lhe mareavam
eram simplesmente em resultado
pias, a que a
tivessem dado ûtima demão
e cusáveis erros dessa política nefasta, que trouxe
rascunhos, cheios de emendas, de palavras riscadas, substituí o memorável 7 de abril.
das por outras, etc., etc. Ainda hoje as opiniões se dividem, e ao lado dos
que glo
Mas como a letra de ambos era bastante clara e legível, a
rificam, não falta quem estigmatize memria do duque
não me foi difícil decifrá-las, fazendo algumas correções ou de Bragança. Seja como fôr, ninguém pode contestar a
gran
alterações, que não vale a pena mencionar. diosa e providencial missão, que D. Pedro I foi chamado a
Seja-me lícito agora dizer algumas palavras a respeito do desempenhar, e a poderosa influência, que exerceu sôbre os
mérito dessas poesias. Se fôsse desfavorável o juízo que delas destinos de duas nações, erguendo uma do berço, levantando
faço, é escusado dizer, que as não publicaria. Mas entendo, outra do abismo de sofrimentos, em que jazia quase agonizante,
que elas têm mérito real, e que não é só o estreito laço de e deixando assin sua figura estampada na tela da história em
parentesco, que me liga a seus autores, que me leva a fazer brilhante e prestigioso relêvo. eDous vultos culminantes da
delas elevado conceito e julgá-las dignas da luz da publicidade. literatura portuguêsa, Castilho Alexandre Herculano, que
Meu pai, que faleceu a 24 de junho de 1858, na idade de ninguém poderá acoimar de poetas cesarianos, renderam culto
80 anos, era unn poeta educado na pura escola clássica, e como de admiração, e consagraram eloqüentes e sentidas homenagens
tal deve ser julgado. Entretanto parece-me, que tem um cunho às cinzas do heróico duque de Bragança. Não é pois para
original, que o torna benm diferente dos clássicos da época, que estranhar, que um poeta brasileiro extraísse de sua lira trenos
0 viu nascer. Não faz abuso das alusões mitológicas, em que doridos em honra do homem, que tanto contribuiu para acele
tanto se apraziam seus contemporâneos, quer do Brasil, quer rar o movimento emancipador e fundar a nacionalidade bra
de Portugal; inspira-se sempre nos princípios de uma filosofia sileira. É
porém certo, que a musa de meu pai tornou-se pro
eminentemente crist, que revelam os nobres sentimentos de fética, quando assim se exprime nos seguintes tercetos:
um coração bem formado, e as qualidades de um
e honrado. caráter puro
Se curvados comigo ao fado injusto
Sua linguagem, a meu ver, tem a severa correção dos qui Muitos não unem hoje aos meus lamentos
nhentistas unida ao apurado gôsto e elegância dos últimos Preces, que votam ao varão mais justo,
poetas da escola clássica em Portugal. Em seus versos o lei
tor, que os ler com alguma atenção, descobrirá às vêzes o Eu sei, que um dia puros sentimentos
aticismo e a sã filosofia de Sá de Miranda, a galhofa ingênua Saudosos lhe darão; eu sei, que gratos
de Nicolau Tolentino, e quase sempre essa grave, melancólica Lhe hão de erguer honrosos monumentos.
e singela elevação de linguagem, que nos
faz lembrar Camões.
Para que a elegia feita à morte de D. Pedro I seja bem Alguma cousa também poderia aqui dizer sôbre a índole
compreendida, torna-se mister advertir ao leitor, que
ela foi
e qualidades do talento poético de meu irmão; mas creio, que
escrita logo depois da morte do herói, época su seria inteiramente descabido estender-me sôbre êste assunto,
de grande
perexcitação política, em que os ânimos não podendo infelizmente oferecer agora ao leitor senão duas
população brasileira, exacerbados pelas de grande parte da de suas produções, e essas mesmas não sendo das mais primo
últimas e fatais
dências do Imperador, andavam revoltos e impru rosas de entre tantas, que escreveu. Inspirava-o principa
todos aquêles, que ainda ousavam por ameaçadores contra mente a musa do idílio. Os enlevos da solidão, o espetáculo
qualquer
nifestar simpatia e admiração pelo fundador maneira ma
do Império. da natureza risonha e grandiosa de nossos sertões, as cenas
pai era um dêsses, e é por essa razão, que Meu singelas as puras emoções da vida campestre namoravam-he
êle se exprime pela
BERNARDO GUIMARES
408
suave
de
a fantasia, e lhe extraíam da lira canções cheias
harmonia e da mais encantadora
simplicidade. Não reinava
nelas o cansado tom bucólico das églogas
antigas, e nem tão
se pretendeu en
pouco êsse indianismo, que por algum tempo
xertar na literatura como uma espécie de poesia nacional.
ver, um ensaio do que se poderia cha
Eram, a meu brilhante
mar o idílio brasileiro.
Infelizmente, a não ser uma ou outra dessas produções,
que porventura tenham sido divulgadas nos jornais do Rio POESIAS DE MEU PAI
Grande do Sul, onde meu irmão residiu ùltimamente por algum
tempo, tôdas elas sumiram-se para sempre nas trevas do se JOÃO JOAQUIM DA SILVA GUIMARES
pulcro com seu infeliz autor.
Não devo terminar sem fazer aqui pública restituição de
umas lindas estrofes, que roubei a meu finado irmão. Elas figu
ram neste volume no comêço de uma poesia minha, que tem
por título Não queiras morrer. Entre os poucos papéis
aproveitáreis, que deixou, deparei o rascunho das oito ou nove
estrofes, de que me apropriei, e a que o autor parecia querer
dar seguimento. A chando-as lindíssimas e perfeitamente apli
cáveis ao assunto, de que eu tinha de tratar, servi-me delas
como de uma epígrafe, a que dei mais amplo desenvolvimento.
POESLAS COMPLETAS 15
Quem não vale no mundo, não
se conte ;
Embora gema, morrerá sòzinho, a cena
Pois hoje já não é o que foi onte. 99-b Porém, se vejo ao vivo sôbre
o
0 fero amante, emforte Afonso triste.
pranto o que a condena,
Inês já morta!!
À
SEPULTURA DE... ..
Em fúria Pedro, que em vingança insiste.
De susto, de pesar, de amor, de pena,
SONÉTO ÀS lágrimas minha alma não resiste.
À
Morte de D. Pedro I Talvez um fido amigo não achasse
Outra consolação, que a lastimosa
De acabar com aquêle, que acabasse.
Deus, a quem sagra o Tempo êste Penedo,
Que às nuvens tocar vejo solitário,
Imagem da Grandeza e do Segrêdo, Porém a mão suprema, assaz piedosa,
Com sábia precaução envia o meio,
Mitigador da mágoa venenosa.
Aqui me tens sòzinho e temerário,
Buscando neste espaço sinuoso Deixar o ignóbil mundo, o humano enleio,
Verter oculto um pranto necessário. E pela das virtudes esperança
Ir do empíreo habitar o claro seio,
Tenho êste voto, que cumprir piedoso;
Dá-me, que o faça nesta estância escura, Abandonar do barro a intemperança
Propícia à mágoa, e ao tempo perigoso. Os fados, os trabalhos, e entre os santos,
Santo gozar da bem-aventurança,
Se em Roma já se viu à morte dura
Ser condenada a mãe, por que chorara Deixar de ouvir enternecidos prantos,
Do extinto filho a infausta desventura, Intrigas, 6dios, lástimas, gemidos,
Para dos anjos escutar os cantos,
Não se renove em mim a cena ignara,
Por lastimar um pov0, a quem o susto Obter na glória eternamente unidos,
Faz hoje atassalhar, o que onte honrara, 104-a Sem o favor de humanas criaturas,
Os prêmios cá no mundo merecidos,
Se curvados comigo ao fado injusto
Muitos não unem hoje aos meus lamentos, Pedro, 6 grande herói! são estas puras
Preces, que votam ao varão mais justo. Imagens, que do cu me estão chegando,
Para alívio de tantas amarguras!...
Eu sei, que um dia, puros sentimentos
Saudosos lhe darão. Eu sei, que gratos Porém... que nova dor me
vai passando
Da idéiaao peito!... vendo em triste apêrto
Hão de Ihe erguer honrosos monumentos.
Lísia, a Espôsa, os filhos soluçando?!...
Vós, da tristeza lúgubres retratos,
Os lusos lá descubro em desconcêrto,
Negras sombras, letal melancolia,
Sem que na acerba dor atingir possam,
Turvos painéis de dor, de angústia ornatos,
Se acaso um tal herói morreu decerto!. ..
BERNARDO GUIMARAES
420 COMPLETAS
POESIAS
a 104-5
Vejo uns, que co'a incerteza mágoa adoçam,
Outros, que ao todo já desenganados Em vez de estéril, v melancolia
Do Tejo as águas com seu pranto engrossam; Os feitos me ressurjam à lembrança
Do justo, que viveu como devia.
E lá vejo os do herói sócios honrados
Trajando dó, em tôrno ao monumento Assim futuro gênio se abalança
Co'as mãos no rosto, de pesar cortados. Co'exemplo a praticar ações, que dobrem
Do mundo as honras, e dos céus a herança.
Ah!. rei, amigos, filhos, cara espôsa,
Tudo acaba no mundo!... a morte dura Se em pouca terra os restos teus se encobrem,
Os teus heróicos feitos, teus talentos
Impune perenal triunfo goza.
Nos hemisférios ambos se descobrem.
Ou tôrva guerra, ou febre lenta, impura Não carecem heróis de monumentos;
Faz que um palmo de terra se não pise, Duram mais que as estátuas, que as colunas,
Onde não haja humana sepultura, Exemplos nobres, sábios documentos.
Que uma só obra a vista não divise, Nem são os feitos seus, pra que os reúnas,
Sem que de seu autor memória triste ó
fama, co'êsses dos heróis antigos,
Nossa alma não confranja e penalize. Roubadores de estados e fortunas.
Mas, se à série fatal não se resiste, Pompeus, Césares são do céu castigos,
Se o curso inevitável não se muda Como são prêmios, quando à terra envia, 104-«d
Para que tanta mágoa em nós existe?!... Franklins amáveis, da igualdade amigos.
Fôra por certo menos carrancuda Se livre um Deus no mnundo o homem cria,
Qualquer perda, buscando no transporte Aquêle, que o reverte à liberdade,
Do amigo idéia, que a saudade iluda. Faz o que um Deus já fêz, e ainda faria.
ALDEIA
brandamente
enviam
ermos. deserto.
longe ruge arroios, resplende
saudade.
longe horizonte
perfumado
montes oriente
remurmura
desolada nauta lira aurora,
vale, que cintilando,
vale, noite,
MINHA tão solitária
desponta
ao repete dos arroios, lhe
meus
com serenos,
minha do
deixei perdido risonho rosado
onde
negreja que
risonho
tempestuoso.
de nesses e amplidão
no daflores
natureza!
!
mundo ouro,
a
alma
linda,
hino manto
tormentas,
que canta resplende cheirosas,
que a anil, montanha virações,
lágrimas
que estrelinha
DE deleitoso, noite
tão pode
do que as
meu minha
de meu um formosa
inefáveis,
verdejante, de tudo
campinas, do olhos
tão puros,
seu portas de nuvens
à na tributo,
SAUDADE
aldeia,
oceano
da mar aldeia,
vargem
só gemendo
céus Sorrindo
floresta,
ecos
para com que nuvens das
das escuridão
vós
insetos, palpita,
CANTO ELEGÍACO
mares,
E vinhas ver, atravessando oS
Pela última vez teus pátrios lares.
Cruel doença as fontes te secava
Da débil existência,
E já quase do vaso se entornava
Essa imortal essência
sôpro, que dos lábios de Deus sai,
O
apraz, a si retrai.
E que, quando lhe
Ah! que saudade, que palpite ansioso
No peito Ihe ofegava,
Quando pelo horizonte nebuloso
As praias lobrigava
Da doce pátria, e os coqueirais viçosos,
Que de longe acenavam-lhe saudosOs.
que esvai-se, o extremo alento
Já da vida,
No peito lhe lateja ;
Mas à luz da esperança ainda um momento
Sua alma se espaneja,
Que já 1he trazem virações fagueiras
Os aromas da terra das palmeiras.
GUIMARES
135
BERNARDO COMPLETAS
434 POESIAS
Mais êste exemplo novo! Pernambucano", Recife, 1869, págs. 188-140, dados qu0 confirmamos
Falsos depositários desleais ao consultar a citada cdição de Corimb08. Verificamos, inclusive, que
e aquêle atribuído a Ber
Da vontade do povo há ligciras variantes cntre o texto do livro
nardo Guimarãcs.
nos
Nestes nefastos, miserandos dias, Pique registrado o engano, de quo não queremos absolutamente
Um simples preito ao gênio recusaram, exeulpar, pois nêlo temos tambóm a nossa parte. Talvez, se desculpa
Ao monumento de Gonçalves Dias houvesse, cstaria não 8ó no fato, que já frisamos, do não têrmos motivo
para pôr em dúvida a informação de Basílio de Magalhãcs como na
Uma pedra negaram.
complexidade da tarofa do preparar uma obra poética do vulto da de
Bernardo, que exigiu tivéssemos a atenção voltada para numerosos e
diferentes detalhes. E também porque o poema 'A uns quinze anos"
ENDERÊÇO AO EDITOR não suscitou em nós maior interêsse. S6 podemos lamentar quc
apenas tardiamente tenhamos descoberto tal equívoco. Ao registrá-lo,
Eis os cantos que d'alma me fugiram reafirmamos nossa admiração pelo livro. de Basilio de Magalhães,
No seio de meu êrmo, tanto mais que. sabemos as dificuldades com que @le se defrontou para
Quando um dia à idéia me acudiram elaborá-lo. Certo que umn engano como -êsse pode correr à conta de
0 triste fado, o desastros0 têrmo tais dificuldades. Com esta nota, devolvemos o poema "A uns quinze
Do sabiá das terras brasileiras, anos" ao seu verdadeiro autor: Luís Guimarães Júnior.
Do cantor mavioso das palmeiras.
2 Aproveitamos para informar ao leitor que o prefácio às Poesias
a que nos referimos à pág. XVII, linha 29, 6 "Advertência da Segunda
Aceita agora êstes singelos cantos,
Filhos do coração : Ediçã" dos Cantos da solidão e pode ser lido à pág. 11 dste volume;
Foram d'alma exalados entre prantos ainda que, quando mencionamos, nas notas finais, P ou NP (Poesias
e Novas poesias) sem indicar a edição, estamos aludindo à 1.4 edição
Em minha solidão. dêsses livros. Aliás, como se esclarece na Introdução, pág. XVII,
pelas primeiras edições das obras poéticas de Bernardo foi que prepa
Mas dá-lhe asas; faze com que corram ramos-estas Poesias completus. A alusão, em várias das referidas
ÀS mais remotas plagas, notas, ao texto das edições póstumas (2. ed. de P e ed. de 1900 de
E não permitas que afogados morram NP), visou apenas a recolher elementos subsidiários,
Pelas do olvido sonolentas vagas.
441
COMPLETAS
POESIAS
broncas serras,
Cá destas voem presUrosOs
Onde lasceram,
morrer dolentes, suspirosos,
E vão formosas terras,
Do Maranhão pelas
Berço do bardo ilustre,tamanho lustre.
deu
Que às pátrias letras
109
A UNS QUINZE ANOS
ÉS doce e pura
saudosa, e
Como um perfume de rosa,
Que pouco a pouco se esvai.
como o frouxel de um ninho,
És
Os trinos de um passarinho,
Uma pétala que cai.
Ao sôpro do ventoum
sul,
Vem surgindo de paul
0 gentil Dalailama, PARECER DA COMISSÃO DE ESTATÍSTICA A
Atraído pela fama RESPEITO DA FREGUESIA DA MADRE-DE
Irminsul.
De uma filha de DEUS-D0-ANGU 114
Diga-me cá, meu compadre,
Corre também a notícia Se na sagrada escritura
Que o Rei Mouro, desta
feita,
colheita
Já encontrou, porventura,
Vai fazer grande Um Deus que tivesse madre?
De matéria vitalícia. Não pode ser o Deus-Padre,
Seja-lhe a sorte propícia, Nem tão pouco o Filho-Deus;
ÉO que mais Ihe desejo.
Só se é o Espírito-Santo,
De quenm falam tais judeus.
Portanto, sem grande pejo,
Mas êsse mesmo, entretanto,
Pelo tope das montanhas, De que agora assim se zomba,
Andam de noite as aranhas Deve ser pombo, e não pomba,
Comendo cascas de queijo. Segundo os cálculos meus.
Para haver um Deus com madre,
O queijo, dizem os sábios, Era preciso um Deus fêmea;
um Mas isto é forte blasfêmia,
É grande epifonema, Que horroriza mesmo a um padre.
Que veio servir de tema Por mais que a heresia ladre,
De fam0s0s alfarrábios. ÊSse dogma tão cru,
Dátrês pontos nos teus lábios, De um Deus de madre de angu,
Se vires, lá no horizonte, Não é obra de cristão,
E não passa de invenão
Carrancudo mastodonte, Dos filhos de Belzebu.
Na ponta de uma navalha,
Vender cigarros de palha, E, se há um Deus do Angu,
Molhados na água da fonte. . Pergunto: Por que razão
Não há um Deus do Feijão,
Seja êle cozido ou cru?
Háopiniões diversas De feijão se faz tutu,
Que não é mau bocadinho;
Sôbre dores de Mas não se seja mesquinho :
barriga:
Dizem uns que são
lombrigas; Como o feijão sem gordura
Outros, que vm de conversas. É coisa que não se atura,
Porém as línguas perversas Deve haver Deus do Toicinho.
Nelas vêm grande Desta tríplice aliança
De um bisneto de
sintoma
Mafoma, Nascerá uma trindade,
Que, sem meias, nem Com que tda humanidade
chinelas,
Sem saltar pelas
janelas, Háde sempre encher a pança ;
Num só dia foi a
Roma. Porém, para segurança,
BERNARDO GUIMARES
448 POESIAS COMPLETAS
P
NP
-- Poesias
Novas poesias
FO - Fôlhas do out0no
De P houve duas edições, a 2.2 designada, por equívoco,
como sendo a 3.2; a ela nos referimos porém, nestas Notas,
como 2. ed." De NP houve igualmente duas edições, mas na
2.*, 0u que se presume ser a 2., não se informa se se trata,
ou não, de uma reedição; a ela nos referimos, nestas Notas,
como *ed. de 1900", de acôrdo com o ano de que está datada.
Maiores esclarecimentos sôbre as edições das obras poéticas
de Bernardo Guimarães podem ser encontrados, na Introducão
a êste volume, em Normas e bases desta edicão.
INTR0DUCÃ0
NOTA 1
NOTA 2
31
DERNARDO GUIMARES
462
POESIAS COMPLETS J63
referc-se o Dr. Lnércio Prazeres pcla mancira seguinto.
previsão, "Noite", de 15 de ngôsto do
nos curiosos apontamcntos quc enviou àuma
'Estava D, Teresa à sncnda de jancla, à Rua de S. Jos6. E era o seu olhar a seta luminosa . .
1925: c fortc, traiandó Quc irrandiava a luz dos grandes corações.,
com uma amiga, quando passou um homem alto
fraquc. A scta que cortava o azul, impetuosa,
É
Cxclamou a moça.
um mocctño! Formada, como o sol, de 1ímpidos clarõcs.
Qual! Parcce um caipira.. volveu D. Tercsa.
Não diga isso! Pois você não sabe quem é aquêle? Tal cra o seu olhar -0 ninho da utopia,
Não. 0 mar das ilusõcs e o cu da fantasia...
É o Dr. Bernardo Guimarãcs.
0 pocta ? Tal era o meigo olhar do divinal pocta
"
tle mesmo. A gruta dos leõcs, a cstrêla só de brilhos,
"0 coração de D. Teresn bateu agitado. Pouco depois, numa tarde Tocando do idcal a fantasiosa meta!
perfumada a flor de laranjcira, um belo e forte rapaz levava pelo Inda o vejo brilhar na fronte de seus filhos
braço à igreja uma linda mocinha de cabelos pretos e olhos claros, D. Numa radiação de docc amor repleta!
Teresa realizava o sonho íntimo de seu coração.
c) Alphonsus de Guimaraens
-A propósito do noivado entre Al d) A visita de D. Pedro II a Ouro Prêto Ainda Basílio do Ma
phonsus de Guimaraens e Constança, filha de Bernardo Guimarãcs, me galhães é qucm informa, em nota ao pé da pág. 52 de seu livro sôbre
lancòlicamente encerrado com a morte da moça, ocorrida em Ouro Prêto Bernardo Guimarãcs: "É tradição que D. Pcdro II quis então galar
em 28 de dezembro de 1888, doar o talento c os serviços de Bernardo Guimarãcs com o título de
quando tinha ela apenas dezessete anos c
o primo dezoito, leia-se a Notícia biográfica", da barão, recusamdo, porém, o escritor a honraria e justificando-se com
Alphonsus, em Pocsias, de Alphonsus de Guimaracnsautoria
de João as seguintes palavras: "Qual! Ondo já se viu barão sem
Sôbre tudo quc ocorreu cem Ouro Prêto entre o último baronato?"
(1.4 edição do
Ministério da Educação, 1938, sob os cuidados de Manuel e imperador
João Alphonsus, e 2.4 edição da Organização Simõcs, 1955, Bandeira do Brasil o o escritor minciro, cumpro as
e revista por Alphonsus de organizada publicadas no "Jornal do Comércio" de 7lere 25 "correspondências"
de abril de 1881
Guimaraens Pilho). Torneceu-nos o es (reproduzidas por J. M. Vaz Pinto Coelho, op. cit., págs.
critor José Guimarães Alves, neto de Bernardo Guimarães, 163-167),
uma poesia de Alphonsus, cópia de assim como um longo e curioso artigo do
até agora inédita, ma qual o cantor de Dona (editado em Paraíso, Minas), de 12 de junho dosemanário "O Oriente"
mesmo ano (transcrito
Mistica evoca, em 1888, a figura do poeta de por Dilermando Cruz, op. cit., págs. 165-173) ".
tio-avô, falecido quatro anos antes. A poesia Fôlhas do 0utono, seu (0s livros citados são
foi escrita em Ouro Prêto, Poesias e romunces do Dr. Bernardo Guimarães, por José Maria Vaz
do próprio punho, por Alphonsus, num
Guimarães organizava para seus filhos e que
tança Guimares Alves Santiago, neta
álbum
de
de
hoje
cromos que Bernardo
pertence a D. Cons
e espôsa do enge
Pinto Coelho, Rio de Janciro, 1885; e Bernurdo Guimarães
bio-biblio-literário, por Dilermando Cruz, 1,0 ed. de 1911, S. -
Comp. Editôres, Juiz de Fora, 2. ed. de 1914, contendo na Costa o
Perfil
&
nheiro Alfredo Carneiro Santiago, Bernardo íntegra
residente em Belo Horizonte. drama inédito "A voz do pajé", Belo Horizonte, 1914.)
de 18 de agôsto de 1888, poucos meses Data
Constança, e é a seguinte: antes, portanto, da morte de Ainda sôbre a visita do imperador há a registrar o acontecimento
que representou a solenidade de entrega, pelo Poeta, a D. Pedro II.
de suas obras completas. A cerimônia se realizou na ASsembléia Pro
vincial, tendo conduzido os livros, que o Poeta entregou pessoalmente
0 OLHAR a D. Pedro II, as suas filhinhas Isabel e Constança (vide, na presente
D0 POETA nota, a letra e). Sôbre êste episódio, existem curiosos detalhes no
a de pro.
brava a cabeça nem perdia sono, cismando.. ". sôbre colocaço
o
Ignoramos se esse aspecto da pontuação romântica Homero Pires, à pág. 315 do 1,0 tomo da aludida edição crítica,
qualquer explicação. Não lhe conhecemos outra constituiu objeto de cita, a propósito da seguinte rima impura de Alvares de Azevedo:
a declamação, visando a finalidade a não ser eu8surranle doliruntes, estoutra de Bernardo Guimarãcs: ternos
maior ou menor pausa reticente". inferno (pág. 106 de Fôlhas do outono). Outras idênticas podem ser
cncontradas no pocta minciro, entre as quais estas em Poesias: "A
orgia dos ducndes": arrancoa tranco. "Nostalgia": parugens la
NOTA 7 jem. Em Novua poesias: "Melodia": céu -– véus; perfume queizu
me8. Em Fôlhas do outono: "Fagundcs Varela": pensamento Lcen
Tnvocução tos.
a) Como um túmulo
onde não havia qualquer juzera;
sinal de
- Pug ponto c vírgula em juzera,
No pocma "A uma cstrêla" vem uma rima toante: cabate 08
NOTA 10
NOTA 8
0 trmo
Primciro 80nho de umor
«) O8 profético8 cuntos do piaga; "Piagé, Pugé, ou Piagá
Com 80nhos dourados, que
Sacordotes, profotas o médicos entre as tribos solvagens. A
metros preferidos do
freqüência, como neste Pocta
(vide a nota 86-f).
o8 unjos te
inspiram,
Cstá o hendecuggílabo,
pocma. Jamais se
Dntre O8
qug ôle usa com
valeu, porém, do aloxandrino
parcco quo significa sábio ou udivinho. Viviam em cavernas
rins o oram tidos cm grando veneraçio,
o tinham grando Influôncia
Dit
gio do hendecassílabo No prefácio a FO, faz Bernardo
(nota 71-f). GuimarCs 0 clo nos negócios do paz e da guerra". (Nota do Autor.)
BERNARDO GUIMARES
468 POESIAs COMPLETAS
ta do Autor.)
e) Mas, não te queixes, musa; são decretos Observe-se o NOTA 12
novo rumo que, a partir desta IV parte, Bernardo Guimarães imprime
ao poema e a visão, que tem o Poeta, das cidades nascendo e se mul. neu irmão
Visita à sepultura de
tiplicando, da civilização despontando nas regies desérticas do Brasil.
Sílvio Romero se refere a êste fato. 0 poeta, depois de prantear "o
desaparecimento dos primitivos íncolas, a destruição das matas, a mu As biografias de Bernardo Guimarães mencionam apenas que o
dança operada pelos colonos", em suma "a morte de tantas cenas na poeta teve dois irmãos: o desembargador Joaquim Caetano da Silva
turais", " de repente muda de linguagem". E depois de citar novos ver Guimarães, autor do romance João e Francisco e o padre Manoel Joa
sos de "0 êrmo ": "Neste gôsto prossegue o Poeta", diz Silvio Romero, quim da Silva Guimarães (vide, nesta edição, a "Cronologia de Ber
concluindo que "assim se expressava em 1849 ou 50 nesta peça, uma nardo Guimarães", 1825). Chamou a nossa atenção, por iss0 mesmo,
de sua lavra" (História da brasileira, 3.a essa elegia que o Poeta consagrou à memória de um irmão e que foi
das mS
ed., Livraria
%
Olvmnio Editôra, 1943, 3,0 literatura
tomo, pág. 301). inserida por êle na edição das Poesias, de 1865, ano em que os dois
irmãos citados ainda eram vivos. Propusemos o caso ao neto do Poeta,
) Sem nada produzir, destrui apenas, Na 1. ed. de P está
escritor José Guimarães Alves. Este, consultando o único filho do
destrue, forma hoje menos usada de destri. Na 2. edição está destroe. Poeta ainda vivo, Oprimogenito, também escritor, Horácio Bernardo
g) Um dia, em vez da sinples arazóia, "Aruzóia Cinto ou Guimarães, veio a por êste que o terceiro irmão do poeta ouro
saiote ornado de plumas". (Nota do Autor.) pretano, morto ainda muito jovem, chamava-se Jaques da Silva Gui
h
E abandonando o canitar de plumas, "Canitar Cocar de marães. Lembrou ainda o escritor José Guimarães Alves que o nome
plumas". (Nota do Autor.) ganha, assim, tradição na família, "pois temos o Jaques Guimarães,
filho do Dr. Luís Guimarães e neto do desembargador e ministro Joa
quim Caetano d Silva Guimares, irmão de Bernardo".
NOTA 11
0 devanear do céptico
NOTA 13
cdiãodo
Rumalhcto do flores às jovene flumi
Paris". E ainda: "Publicou:
Desd'o berço respirando nON8e8, Noilon de São Joüo o artigos o pocsins cstampadag na rovista
Osares da cscravidão, "Minervn brasilionse". Cntro os sous manuscritos achou-s0 uma C0
Como semente lançada leçio de pocsias, nté hojo não publicndas".
En terra de maldição, c) Sorrir-se a tua estrêla –Falta em P, por defaito do impres
A vida passo chorando
são, o S da palavra inicial, que aparcce assim: orrir-so, lapso corri
gido na 2,0 cdição.
Minha triste condição. b) A tormenta du vidu ao longe passa, Como no caso referido
no item acima, o verso não apresenta, na 1. cd. do P, por defoito do
Os meus braços estão presos, imprcssão, o artigo inicial, lapso corrigido na 2,0 cdição.
A ninguém posso abraçar,
Nem meus lábios, nenn meus olhos
Não podem de amor falar; NOTA 15
Deu-me Deus um coração
Sòmente para penaI. Esperança
a) Omde a esp'rança 80 extinguiu, Esp'rança: remeto o leitor
Ao ar livre das campinas à nota de Manuel Bandeira à pág. 370 da 3. ed. de sua
Antologia, a
respeito da ocorrência das formas " csp'rança", "croa", entre
Seu perfume exala a flor; os ro
Canta a aura em liberdade mânticos. São clas comuns em Bernardo Guimarãcs.
Do bosque o alado cantor; b) Esperança, que és tu? Ahl que minha harpa
gula. Pus a vír.
Só para a pobre cativa
Não há canções, nem amor.
Em FO, o Poeta virá a dedicar um poema a) Agora, que o africano a encada pondo, É ainda o anties
prole das escravas: "Hino à lei de 28 à lei que emancipou a cravista que se faz presente nestes versos, na alusão aos "duros ferros
de setembro de 1871". da escravidão" (vide a nota 13).
NOTA 14
NOTA 17
0 destino o vate
Recordução
0 poema é dedicado à memória de
morto aos 23 anos Dutra e Melo, poeta
vastas inteligências (1823-1846), "e que deixou fama de uma romântico ,) Na v0z dos ecos m0rre suspiroso. Pus o ponto. Não havia
ra à pág. 33 da 3.já aparecidas no Brasil", segundo Manueldas mals qualquer sinal de pontuação.
edição de sua Antologia
românticos, onde fornece os consagrada aos Bandei
p0etase b) Vimde, vinde, lembranças saüdosas, Este verso se repete vá
Melo: Antônio Frangicnsntes dados biográficos de Dutra Tlas vezes no curso do poema, como um
e Melo nasceu e refrao. Poeta, que con
faleceu no Ri0. ta al quatro sílabas em saüdosas, contará três, mais adiante, nesta
BERNARDO GUIMÁRES
POESIAS COMPLETAS 473
o guo fa
do cuntor da tarde,
Verso do poema "0 sabiá": A v0z savdosa vocábu
em muitos outros versos. A propósitoo da pronncia
de
aliáscomo saudoso e outros, remeto leitor à nota sôbre Be.
los saudade, poetag
nardo Vieira à pág. 324 do vol. I da Antologia dog com re NOTA 21
avalo2ial, por Sérgio Buarque de Hollanda,
brasileiros da fase edicão do Ao charuto
visão crítica por Aurélio Buarque de Hollanda Ferreira,
Instituto Nacional do Livro, 1952.
a) Quantos males talvez não pouparias Dstú, nas duas edições
de P, Quantos mal.
NOTA 18
NOTA 22
Hino do prazer
que o Poeta estâve Ao meu aniversário
As palavras que precedem êste poema revelam
sèriamente enfêrmo e foi salvo pelos três médicos a quem dedica êsses a) Já lá vão lustros seis, e mais dous anos, Basílio de Maga
lhães, no seu estudo biográfico, pág. 17, comenta êste verso para dizer
versos. o ninho, do engano que houve a respeito do ano exato do nascimento do Poeta
a) Qual feroz caim, guardundo Em P: caiman. (com efeito, as antologias ora registram 1825, ora 1827): "Parece-me'
b) Longe, tristes visões, fúncbres larvas Por defeito de im diz êle "que a culpa do engano cabe tôda ao próprio Bernardo
pressão, falta na 1. ed. de P o L da palavra inicial, lapso corrigido Guimarãcs, que, certamente, a fim de passar por mais moço, assim
na 2,ª edição. contou a era em que soltou o primeiro vagido, nos versos intitulados
"Ao meu aniversário" (15 de agôsto) ", (estampados na "Atualidade",
n.° de 20 de agôsto de 1859, e reproduzidos no volume das Poesias,
ed. de 1865, págs. 184-191).
POESIAS DIVERSAS
Já lá vão lustros seis e mais dois anos
NOTA 19 Que encontras-me na vida,
Cada vez mais moído e atrapalhado
0 nariz perante 0s poetas Nesta enfadonha lida.
José Veríssimo, nos Estudos brasileiros (edição Garnier, 1901, pág.
206), escreve sôbre Bernardo Guimarães: "Éle é, porventura, o mais Não podia êle ignorar que nascera en 1825, porque com tal decla
ração se matriculou na Faculdade de Direito de S.
espirituoso, o mais engraçado, e não sei se diga o único humorístico, Paulo e consta
dos poetas brasileiros, sem exclusão talvez do nosso Gregório de Matos. ela da sua carta de bacharel, que vi por
há poucos dias em Belo Horizonte,
Tem três ou quatro poesias, "0 nariz perante os poctas", "À saia ba onde está carinhosamente guardada sua ex.ma viúva. E, se ainda
pairasse qualguer dúvida sôbre a verdadeira data em que lhe devesse
lão", "Dilúvio de papel", que qualquer delas tem mais chiste que comemorar o centenário, cessaria ela de vez, ante a seguinte cópia
quantas reuniu Camilo Castelo Branco no seu Cancioneiro alegre, onde de assentamento do batism0 de Bernardo Guimares, existente no ar
aliás não figura Bernardo Guimares. E essa graça não é só dos quivo da Matriz de Ouro Prêto, livro 6.0, fls. 167 v.
seus poemas facetos, senão, com a intensidade relativa aos assuntos,
"Aos cinco (5) do mez de setembro de 1825 (mil oitocentos
de tôda a sua obra poética". e vinte e cinco), nesta ias
egreja-matriz de Nossa Senhora do Pilar desta
os
a) olhos belos,- Sôbre êste verso escreveu Basílio de Ma imperial cidade de Ouro-Prêto, o reverendo coadjutor João Moreira
galhães à pág. 79 de seu livr0: "Bernardo, em alguns versos, muitas Duarte baptizou e poz os santos 6leos a Bernardo, inocente, filho le
vêzes se descuidava da contração vocálica e os deixava fracos, qual gítimo do capitão João Joaquim da Silva Guimarães e sua mulher
êste". A verdade é que Bernardo Guimarães usou com freqüencia Constança de Oliveira. Foram padrinhos o Dr. Bernardo Antônio
o hiato, como
fizeram todos os românticos, sendo numerosoS como no
Monteiro e D. Maria Fausta de Oliveira. Do que mandei fazer êste
verso acima OS exemplos que se assento. -0 vigário (a) José Pereira de Carvalho".
poderiam recolher em sua obra.
NOTA 23
NOTA 20
A
Sirius
saia balão que
O Poeta se refere neste poema ao verão carioca, à canícula
Nesse pesado pélago de roupas? o de Janeiro num período que vai aproximadamen
b) Falta, em P, a interrogação. atinge anualmente Rio
res do
Hoe podem chamar-se e de dezembro a março
e em janeiro, data do poema, está atingindo o
gameleiras,
Brasil, de copa chata e diâmetro Gumeleiras: árvo máximo.
vastíssimo" (Nota do AutOT)
474 BERNARDO GUIMARÄES
ou da tendência
na fixação prosódica dêsses vocá
pico alteroso das montanhas
de Ouro Prêto." (Nota o
pela escola "O celebrado lazarento de
bulos e semelhantes. ter-se presente a ponderável advertência de Cha o decantado luzarento que o
"Convém, pois, d) Que teve quem não conheça o célebre sonêto
nosso conheci mestre Tolentino. Não há a um cavalo lançadlo à margem.
les Bally: "... tôdas ascomo associações sôbre que repousa
o de todos os fenômenos lingüísticos facêto Nicolau Tolentino fêz encontrá-lo aqui repro
mento das palavras
estão para nós em um mesiotio
e são coetâneas.
(EL lenguajc
A história não
y la vida, págs. Todavia julgo que os leitores estimarão
consciência lingüística duzido. Ei-lo:
eXiste para a
104/105, trad. cast. de Amado Alonso).
Vai, mísero cavalo lazarento,
NOTA 26 Pastar longes campinas livremente;
Não percas tempo, enquanto te consente
De magros cães faminto ajuntamento.
Adeus a meu cavalo branco clhanado Cisne
corm
NOTA 28
ambas : "Mutuca. Grande môsca do
mato, que incomoda o gado
no texto, o qual corrigi
as suas mordeduras". Houve êrro tipográfico
A orgia dos duendes mos. 0 Pequeno icionário brasileiro da lingua portuguêsa registra "mu
tuca", com o significado de "nome popular das Tabânidas", quee vêm
a ser uma "família de dípteros hematófagos, de antenas curtas asas
Sôbre "A orgia dos duendes", escreve Basílio de Magalhães à páo.
e crítico: "Em tudo e por tudo, é esta manchadas, conhecidos vulgarmente por mutueas".
83 do seu estudo biográfico
a mais brasileira das produções poéticas do autor dos Cantos da
so
h) No cupim o macuco piou. "Macuco. Grande ave das flo
idão". Isto depois de ter dito, na página anterior do mesmo volume, restas, que pia de noite." (Notu do Autor.)
que o poema Ihe parece uma espécie de paródia ao "Canto do piaga" i) Vinde, vinde tocar marimbau, Está merimbau, êrro tipo
de Gonçalyes Dias, e que "há neste curioso poemeto, afora a exploração gráfico em ambas as edições de P; neste mesmo poema o Poeta virá a
de superstições indígenas ou alienígenas, ainda sobrevivas no Brasil, escrever marimbau, grafando também assim a palavra na nota que
grande número de vocábulos genuinamente nossos, que Bernardo Gui deu sôbre ela no final de P.
marães aproveitou e dos quais dá o significado e a9 explicação em notas, j) Ide já procurar-me a bandurra "Bandurra. Viola pequena."
que se encontram nas ültimas páginas do yolume. (Nota do Autor.)
É uma
a) Se asscntou sôre o grande jirau. Jirau. palavVra k) Três diabos vestidos de rozo Está, em P, 1,a ed., da
brasileira, que significa um leito grosseiro de pau, armado entre os roto, êrro tipográfico corrigido na 2.4 edição.
ramos das árvores." (Nota do Autor.) l) Capetinhas trepados nos galhos "Capetinha. Sinônimo de
b) Lobisome apanhava os gravetos Está lobishome, tôda vez diabretes ou demônios." (Nota do Autor.)
que a palavra aparece no poema, em P. m) Outros põem-se a tocar marimbau. "Marimbau. Pequeno ins
c) No borralho torrava pipocas.
trumento de ferro, que colocado entre os dentes produz certas vibrações
"Pipocas. Grãos de milho um
torrados ao borralho. " (Nota do Autor.) monótonas; é mais brinquedo de crianças do que verdadeiro instru
mento musical,." (Nota do Autor.) Vide, nesta mesma nota, a letra i.
d) Taturana, unma bruza amarela, Taturana. Espécie de la n) Ferve a dança do catereté; "Cateretê, batugue. Danças po
garta felpuda; há de diversas côres e figuras; se nos passa pelo corpo pulares do interior do Brasil." (Nota do Autor.)
deixa na pele uma irritação cáustica assás incomôda, mas que se des
vanece em pouco tempo. É um verme vulgarmente conhecido pelo nome o) Mas na vida beata de ascético Está assético, em ambas as
edições de P.
de bicho cabeludo." (Nota do Autor.)
p) Té nas hóstias botava veneno. Está Ténas, em P, 1,a ed.,
e) Getirana com todo o sosségo "Getirana, ou Getiranabóia. lapso corrigido na 2, edição.
Inseto raríssinmo, que se encontra nos sertões do Brasil. Sua for g) Um rebengue estalando se ouviu,
ma é singularíssima, e só um desenho poderia dar dela uma ca, látego." (ota
"Rebenque. Chicote, guas
idéia do Autor.)
precisa. É uma grande môsca de uma
até duas polegadas
mento. Tem asas como as de cigarra, porém excedendo muito ao de compri
manho do corpo, que é oblongo como o da borboleta. Sua cabeça, que
ta
é quase um têrço do total do uma NOTA 29
serpente. Tem um ferrãn cOpo, tem a forma da cabeça de
como um canivete no cabo. que se dobra por baixo do ventre,
Dizem que é cego, e quando desprende o Olhos verdes
vôo, parte direito como uma scta com o
como uma baioneta terrível aguilhão estendido
calada, e desgraçado do ente em que Cai
imediatamente fulminado. toca!.. Éste poema talvez lenmbre sob certos aspectos o de igual título de
Gonçalves Dias. Na primeira estrofe de ambos
lindo e quase fabuloso inseto existe portanto. há a rima b0nança o
esperança, sendo que o terceiro verso em Gonçalves
ra-se"Éste
se é mesmo destruidor e venenoso como dizem os Smente igno tempo vai bonança. Gonçalves Dias se lamenta de ter Dias é: Quando
apenas uma bela e inocente sertanejos, Ou e
verdes : visto uns olhos
borboleta, sendo aquela tromba, que
destinada a sugar o alimento necessário, tanto
pavor espalha, apenas
pretendem outros. Não sei se algum como
exame acurado sôbre entomologista já terá feito um Dizei vós: “Triste do bardo!
algum indivíduo dessa curiosíssima Deixou-se de amor finar!
(Nota do Autor.) espécie.
f) Vento sul sobiou ma cumbuca, E Bernardo Guimarães:
(Nota do Autor.) Cumbucd. Cabaça ôca."
g) Por três vêzes zumbiu
a mutuca, Antes nunca eu visse os olhos,
edições de P, mas não na
seguinte nota do PoetaEstá matruca nas duas Que fazem morrer de amor.
incluída no final de
BERNARDO GUIMARLS 181
480 POESIAS COMPLETAS
de um fato em si
NOTA 30 por ela provocado que a desloca da fria exposiço repercussão interior, a
para a expressão total de sua "vivência", da
emotiva dêsse drama.
Utinan sublinhar singularmente a significação um desajuste entre as categorias
"Houve, a exprimir tudo isso, e afetivas, com a vantagem,
escreve sôbre ste pocma à pág. 84 de seu gramaticais e as categorias psicológicas
Basílio de Magalhães e mais exDres porém, de que só êsse desajuste Ihe permitiu, implícita e sintètica
estudo biográfico crítico: "A mais curta, a mais linda
e
a "Idéia leve, que, perfume
annor, que conheço em rimas, saíram do maravilhosO mente, que a "Palavra pesada" captasse
siva declaracão de aliás. e clarão, refulgia e voava". Karl Vossler em boas razões assentava
plectro de Victor Hugo. Imitou-a Bernardo Guimarães (gue,
fêz isto pela primeira e última vez, com relação a todo
e qualauer esta oportuníssima advertência: "o que idiomàticamente é um saltar
de trilhos pode conduzir a valores artísticos, sempre que seja um ras
poeta estrangeiro), emn "Utinam". go original, porque, na arte, valem os direitos de cada espírito, enquan
to na gramática só prevalecem os da comunidade" (Filosofia del len
NOTA 31 guaje, págs. 163/164, Buenos Aires).
"0 puro eritério gramatical, em coerência com a sua análise l6
gica e restrito conceito de correção, impugnará a construção da estro
Foge de mim fe por ter fugido aos recursos comuns de expressão, consagrados pela
camada culta e liderante da classe literária, pela impostura tradicional
a Sorris?. .. oh quanto
belo o teu sorriso!
é da sociabilidade lingüústica já constituída. Só a análise estilística pe
netra a dentro do indivíduo, extrai-lhe a representação do mundo, no
Mas em minha alma derramar não podem âmbito de sua visão pessoal e de sua participação até nos fatos que
Nem sombra de ventura; expõe. Assim, exprime, a um tempo, a realiade objetiva e a reali
dade subjetiva, evidenciada mesmo no descompasso entre o recurso for
São como os raios da manhã fulgindo mal e a repercussão emotiva daquela realidade.
Em feia sepultura. Que o Poeta dispunha dos recursos formais, necessários à harmno
nia estrutural da gramática, mostra-nos a estância seguinte em que
Sôbre a estrofe acima, fêz o professo0T Jesus Belo Galvão, a nosso o primeiro verso reproduz paralelamente a desenvoltura rítmica da
pedido, a seguinte nota: criação expressiva que,. não perturbada no seu encadeamento lógico,
logra a explicitaçáão formal que lhe assegura a correspondência grama
"Há realmente uma discordância fornal entre as flexões verbais tical do verbo de referência:
em "podern" e "são" e "teu sorriso ", sob cuja dependncia lógica e
sintática, no âmbito gramatical, se esperaria aparecessem tais flexões, Ah tu choras! -eas lágrimas que vertes,
na categoria singular, portanto. O critério, exclusivamente l6gico -for
mal, de recompor êsse desajuste determina, pois, como já o fêz um
Na aridez de meu peito vêm secar-se,
dos comentadores do Poeta se estabeleça a concordância flexional: Bem como almo rocio,
Que o cu derrama em vão na ardente areia
Sorris?... oh quanto é belo o teu sorriso!; De páramo bravio.
Mas em minha alma derramar não pode
Nem sombra de ventura; b) Delas lavando, um pouc0 dor acalma, Nota de Manuel
Bandeira à pág. 115 da 2.0 ed. de sua Antologiu: "Só nesta estrofe
É como o rao da manhã fulgindo
está rimado o 2.0 verso com o 4.0",
Em feia sepultura.
bém se chama pau de óleo." (Nota do Autor.) A meus primeiros cabelos brancos
NOTA 37
NOVAS POESIAS
Nostalgia
Éste po ema, composto no Rio de Janeiro, é com efeito, de acôrdo NOTA 41
com o comentário de Basílio de Magalhães em nota ao
pé da pág. 48
de seu livro, "uma das mais lindas e sinceras trovas de Bernardo Elegia
Guimarães". Nêle, como em alguns outros, deixa o
Poeta entrever
invencível nostalgia que o dominava quando ausente de Minas Gerais.
Augusto de Lima, na conferência citada na nota 2-e, refere o
a
bj
Triste resignação,
Consolação
- Pus a vírgula.
para tamanha angústia Em NP, 1.a ed., está
não ter podido o poeta permanecer na Côrte: "Cercado de amigosfato dee ugústia, êrro tipográfico corrigido na ed. de 1900.
85
BERNARDO GUIMARÃES POESIAS COMPLETAS
484
Está em NI, ambas as edições, por êrro céu azul, nem nadam niveas
garças, Pus a segunda vír
c) Dulciss0nos arpcjos a) O
0 poema é dedicado ao grande amigo do Poeta, Dr. Ovídio João b) Que, à frente de teus bravos, Pus a segunda vírgula.
Paulo de Andrade, ilustre mineiro de quem existe uma crítica sôbre c) De Itapiru às Lomas Valentinas, Está: as Lomas na 1. ed..
Bernardo Guimarães, inserida no número do "Minas Gerais" de 10 de NP, e ás Lomas, na ed. de 1900.
de outubro de 1861 e reproduzido no livro Poesias e romamces do Dr. d) Ea gue a Grécia erguera monumentos. Em NP, 1,4 ed., está
Bernardo Guimarães, de autoria de J. M. Vaz Pinto Coelho, Tipografia E á que. Na ed. de 1900: E a que.
Universal de Laemmert & C., Rio de Janeiro, 1885, espécie de In Me
moriam organizado com grande carinho e incluindo valiosas opiniões
sôbre o Poeta e importantes trabalhos dêste, alguns inéditos. Trata-se NOTA 44
de uma apreciação do volume de Poesias, de Bernardo Guimarães, na
qual existem interessantes comentários sôbre poemas como "Invocação", A cismadora
"O êrmo " e sobretudo "0 devanear do céptico " e "A orgia dos duen
des". É curioso observar que o Dr. Ovídio João Paulo de Andrade,
transerevendo estrofes do poema "Foge de mim", corrige numa delas
a)
6)
Debruçada, - Substituí o ponto por vírgula.
São du inocêneia u fragância, Fragûncia é como está no
0 que certamente tinha como êrro, e o faz não sabemos baseado
em texto e como aparece também (frugante) no sonto "A um cravo acha
que fonte. É aquela a que nos referimos na nota 31-a e da qual, a nosso do no chão do pai do Poeta, João Joaquim da Silva Guimarães, em
pedido, fêz o professor Jesus Belo Galvão detida e precisa análise. Assim FO. Já em P, no poema "O nariz perante os poetas", no verso Acharieis
a transcreve o Dr. Ovídio João Paulo de Andrade: as fragrâncias, está fragrâncias. O professor Sousa da Silveira, nos
seus Trechos seletos, 8.8 edição aumentada, pág. 262, a propósito do
Oh! quanto é belo o teu sorriso; emprêgo de fragância no P. Manuel Bernardes, dá a seguinte nota:
Sorris?. "19. fragûncia. Dissimilação, r r>r 0, de fragrância.
Mas em minha alma derramar não pode Tambm em oJ. de Alencar, Til, vol. IV, 1872, p. 181, linha 15".
Nem sombra de ventura; Lembra-nos prof. Jesus Belo Galvão a
expressividade fonética.
da dissimilação, pois fragância traduz a ingenuidade, a delicadeza e ino
É como o
raio da manhã fulgindo
Em feia sepultura. cência até da moça a que o poeta dedica o poema.
NOTA 46
Leite,
Nênia
E como frutas maduras
a) 0 sol da pátria, a pas do lar saudoso, Em NP, ambas as
edições, está á paz.
ö) Selras de lanças, chuvas de metralha, –
Pus a vírgula em
Duras.
metralha.
c) Ei-lo valente repousando ao ado, Traga, já, qualqucr quitanda!
Em NP, 1,0 ed., está re
poussando, lapso corrigido na ed. de 1900.
Anda!
NOTA 47
Que a gente lambisqucira
Gentil Sofia
Queira
£ste é, no gênero, o único poema publicado por Bernardo Guimarães,
sem dúvida original tanto na forma como nas rimas. "A balada "Gen
til Sofia" escreve Basíilio de Magalhães à pág. 95 de seu livro Semelhante gulodice...
"é antes um conto em heptassílabos, seguidos todos do eco em versos
monossílabos. curiosa, porque manteve nela o Poeta uma en Disse."
trosagem vocabular, mau grado a extensão e as dificuldades feliz
e rima." de
Dissemos que é o único poema publicado por Bernardo Guimarães,
no gênero. Existe um outro, não
metro
a) A isto a velha casmurra
Na ed. de 1900: A isto.
-
Está na 1.0 ed. de P: Á isto.
aproveitado pelo poeta. Dêle nos b) "Disseste em palavras poucas Está dissestes em ambas as
-dá notícias Basílio de Magalhães à pág. 129 de sua edições de NP.
Quem lhe forneceu êsses versos foi o Dr.
obra sôbre o Poeta.
.ceder da seguinte nota: Aurélio Pires, fazendo-0S pre c) "A passar nesta janela: Em NP, 1.0 ed., está: Á passar.
Na ed., de
1900: A passar.
"Em 1881, achando-se, como habitualmente acontecia,
república de estudantes da velha capital
guntasse, em presença do Poeta, se podiamineira, o
servir
em uma
como o criado per
almôco, Bernardo
d) "E esta alma, que não sossega,
e vírgula que
havia depois de sossega.
me
-
Substituí por vírgula o ponto
Guimarães incumbiu-se de responder-lhe, Que canta nil divinos Emn NP, 1,4 ed., está devinos,
êrro
o que fêz do seguinte modo: tipográfico corrigido na ed. de 1900.
Traga já êsse almôço, f) Nada. –Pus o ponto. Não havia qualquer sinal de pontuação.
g) "Se eu o pilho à vontade Em ambas as edições de NP
Moço! está: a vontade.
BERNARDO GUIMARES POESIAS COMPLETAS 89
488
A campanha do Paraguai
II - Lopez e Humaitá
NOTA 54
a) Estende-se disforme,
mão trêmula confias – Pus a vírgula. No verso Dos velhos à
suprimi a vírgula que havia em confias.
b) Na êrma granja, na indefesa aldeia,
-
Pus a segunda vir
A campanhu do Paraguai - - VI Tuiuti e 24 de Maio
No
pontuação.
que mos deu;
verso
-
Serei
Em NP, 1.a ed.: a patria. Na
teu, sòmente teu. pus a vír
b) A luz se esbate de
formoso ia. Pus o ponto. Não havia gula; não havia qualquer sinal de pontuação.
aualgner sinal de
poutlhöcg se espargeM.
c) Os denodados
Pus o ponto. Não ha e) -
Me levará à vitória.
1900: á vitoria.
Em NP, ed.: a vitoria. Na ed. de
1.
Barcarola
NOTA 60
a) Que à
tardinha Em NP, 1.2 ed., está a tardinha. Na ed.
de 1900: é tardinha. Se eu de ti me esquecer
b) Vem à minha barca linda, Pus a vírgula e suprimi a que
havia em ainda, no verso seguinte.
Bste poema, sem úvida dos mais característicos do movimento
NOTA
romântico em nosso país e da poesia pròpriamente romântica de Ber
58
nardo Guimares, alcançou grande popularidade em seu tempo, sendo,
a0 que nos consta, musicado e cantado por nossa gente, sobretudo em
0 adeus do voluntário Minas Gerais.
a) Tristes dias vou passar;
Ml perigos afrontar. o ponto e vírgula. No verso
pus o ponto.PusNão havia em
sinal de pontuação. ambos qualquer
BERNARDO GUIMARES POESIAS COMPLETAS 498
492
NOTA 61
tem asag
a
musa: a lira e o louro Suprimi o ponto
d)Não
Farnese final que havia em louro. vem es
A morte de Flávio Em NP, ao pé da pág. 158,
e) Em meio dos desertos. que o autor julgava perdida, é muito
do jornal "A ta Notu do Autor: "Esta poesia,
Fundador, no Rio de Janeiro, em 1859 e 1860. (Ver. ao em que se acha reproduzida esta
Flávio Farnese Guimarães colaborou anterior "Dilúvio de Papel "
Atualidade". onde Bernardo de Magalhães à pág. 38 e seguintes do mesma estrofe, que o autor conservava de memória ".
a respeito, o que diz Basilio
e crítico.) Sacramento Blake assim informa f) Entre as turbas descridas; Em NP, por êrro tipográfico,
seu estudo biográfico Farncsc da Paixo Filho de Flávioe des eridas, No verso Siléncio, pois, 6 musa; não profanes em
"Flávio está
sôbre Flávio Farnese:nasceu na cidade do Sêrro, en Minas Gerais. NP está o musa, na 1,a ed.; corrigiu-se lapso na ed. de 1900.
o
Farnese da Paixão, com cêrca do 9E Em NP, 1.2 ed., por
a 6 de setembro de 1871, g) Aos pés da ninfa vem pousar de leve.
faleceu no Rio deemJaneiro fornmado em
direito pela Faculdade de S. Paulo, êrro tipográfic0, está pousas; o lapso foi corrigido na ed. de 1900.
anos. Bacharel tesouraria
mesmo ano, nomeado procurador fiscal daque o h) Pelos cerúleos topes alterosos Em NP, 1.ª ed., por êrro tipo
1856, foi, neste sua provincia, elegeu topez, na
e em 1858, promotor público da capital de gráfico, está lapso corrigido ed. de 1900.
1867 a 1870. Exerceu a advocacia ao
seu deputado na legislatura de
e liberal estreme, pugnou nor
mesmo tempo que, republicano sincero
suas idéias, já colaborando para diversos periódicos,
já redigindo. NOTA 63
e noticioso.
:
"A Atualida de" jornal político, literário Redatores:
Farnese, Lafaiete Rodrigues Pereira, Bernardo Joaquim da Sil Adeus da musa do Itamonte
Flávio 1858 a
va Guimarães e Pedro Luís Pereira de Sousa. Rio de Janeiro,
1864, in fol. Foi êle o e
fundador principal redator desta
Antônio e
fôlha,
Luís Bar
aue
a A Deus e
à criação – Em NP: oÁ Deus e á criação.
neste último ano passou a ser redigida pelos Drs. b) De altivos sentimnentos. Pus ponto.
bosa da Silva".
a) À sombra de pacificos troféus, Em NP, 1. ed.: A sombra.
Na ed., de 1900: sonbra.
Á NOTA 64
em glória Pus o ponto. Não
b) Seu nome recomenda envolto
havia qualquer sinal de pontuação. A poesia Resposta a Pedro Fernandes
c) Nossantos arraiais da liberdade Em NP, por êrro tipográ
fico, está arraies. O poeta Pedro Fernandes Pereira Correia, nascido na cidade minei
d) Do validisno à mesa embriagados
-
Em NP: a mesa. ra de Montes Claros em 29 de junho de 1837, era filho de José Fernan
e) Entre as grades de lúgubre masmorra, Em está mas P
33
GUIMARÁES
494
BERNARDO
POESIAS COMPLETAS 495
suas foram
livro publicado. Composições
lomé Queiroga. Não deixou de poesia brasileira, de Varnharen acentuemos o fato de o Poeta, não obstan
incluídas no 3.0 volume do Florilégio
Em NP em vez de Há professor Jesus Belo Galvão empregar às vêzes a sinérese, como neste
no horizonte se sumiam, te ser grande amigo do hiato,
b) Há muito Conta igualmente duas síla
as edições.
está A, em ambas amor, de êxtase. Contempla Parecc-1n0s interes verso, ao contar duas sílabas em ruínas. de ruínas e cadáveres, do
vovee
bas em ruins
no verso Sôbre nontões
c) De luz, de o trccho iniciado por êste são raros os casos em que
a atenção do leitor para poema "A Baía de Botafogo", de P. Não
sante chamar o amoroso das paisaens por exemplo, no verso E nos erradios pass08
no gual se reafima em Bernardo Guimares que @le se refere abole o hiato: é o que faz, meu ao contar três sílabas em
de seu país ou "da virgemo
natureza amer1cana", ea descritor eleoant achei pouso, do poema "0 vale", de NP,
sobretudo, colorista agradável erradios.
mais adiante; de Carvalho.
que havia nêle, de acôrdo com a opinião de Ronald
b) E por divisa tem Carnificina. Em NP está devisa em
uns frouTos ecos
d) Mal posso recordar as edições.
Está, em NP, por êrro as
em ambas edições.
tipográfico, pass0, ambas
Em NP, ambas as c) Guerra às coortes bárbaras, e ingratas! Na 1,a ed. de NP:
e) Dos cisnes
seus n0s perenais gorjeios;
por êrro tipográfico, Do cisncs. Guerra as; na ed. de 1900: Guerra ás.
edições, está,
novas cordas ajuntando à lira Em NP: a lira. d) Ser homem já deseja impaciente. Deu-nos êste verso, à
) ESim, tu és imortal, virgem celeste, onvém salientar o Jon
primeira vista, a impressão de conter êrro tipográfico, por causa de sua
g) tece à poesia, o qual poderia rima com o anterior: impaciente-impaciente. A impresso se confirmou
vor que o Poeta a partir dêste vers0 a morte dess ao descobrirmos o poema transcrito no livro Poesias e romances do Dr.
s0nduzir ao velho debate, já tantas vêzes ensaiado, sôbre
mesma poesia em virtude das conquistas da ciência
e do progresso e Bernardo Guimarães, de J. M. Vaz Pinto Coelho. Lá êle aparece o assim:
reconhe. Ser homem já deseja de-repente. Deve prevalecer, contudo, texto
da materialização da vida. 0 Poeta, considerando-a imortal,
ce os malefícios que trazem às musas a ciência e o progresso, bem
como de NP, de vez que a transcrição do poema por J. M. Vaz Pinto Coelho
vozes" que declaram já "estar findo" o foi feita segundo o n,o 494 do Minas Gerais", de 1865, e apresenta
alude às "tristes, agoureiras que, a numerosas variantes com relação ao texto adotado pelo Poeta para
reinado delas. Passa então a enumerar os motivos Seu ver, inclusão, em 1876, em NP. Parece-nos ter preferido o Poeta a rima
asseguram a perenidade da poesia. da mesma palavra àquele "de-repente" que lá está no texto primitivo
h) Da fresca riba murmura" queirumes; Em NP, por êrro tipo do poema, depois submetido a revisão por Bernardo Guimarães para
gráfico, está presca,
enm
ambas as edições. inclusão em livro. Um só exemplo mostra como o Poeta alterou o
i) E a caçoula, a que a mão do artis ta santo Está em NP, poema. No liVro de J. M. Vaz Pinto Coelho a quarta estrofe traz
ambas as edições, por êrro tipográfico, artiste. êste verso
:
E cumpre, que corrais já sem demora, que em NP figura
i) De universal, tremendo cataclismo Em NP, está cateclismo. assim modificado: Eia, corramos!... vamos sem demora.
Mantido o texto de NP, temos que a rima que o verso apresenta é
única em Bernardo Guimarães. Há nêle um exemplo de rimas de parô
NOTA 65 nimos: casa (substantivo) e casa (verbo), no poema "Gentil Sofia" de
NP. Mas a rima impaciente-impaciente não seria de estranhar. Jun
queira Freire rimou misericórdias e Misericórdias no poema "Jesus das
Estrofes Misericórdias" e deu a seguinte nota: "Luís de Camões, no canto oitavo
dos Lusiadas, estância noventa e quatro, rimou val do quarto verso com
No subtítulo, está em NP: Dedicadas à brigada mineira que partiu
val do sexto verso. E no canto décimo primeiro, estância cento e qua
de Ouro Prêto em 1864 sob o comano do brigadeiro Galvão., A briga renta, tereis do primeiro verso com tereis do quinto; e a não ser enfa
da partiu não em 1864, mas a 10 de maio de 1865, conforme se lê donho citaria sonetos com rimas iguais. (Poesias completas de Junqueira
nas Efemérides mineiras de Xavier da Veiga, vol. II, págs. 246-247: Freire, edição rigorosamente revista, com um estudo de Roberto Alvim
"Parte de Ouro Prêto, em direção a Mato Grosso, a primeira brigada Correia, 2.0 vol., Zélio Valverde, Rio, 1944.) Homero Pires, em Obras
mineira, ao comando do coronel José Antônio da Fonseca Galvo. Com completas de Álvares de Azevedo, 1.o vol., dá ao pé da pág. 14 a se
punha-se de três corpos: o de guardas nacionais, o policial e o 17. guinte nota sôbre a rima mar-mar no poema "Sonhando", do vate paulis
voluntários da Pátria, com um total de 1 298 praças. Esta förça, ta: "Rima da mesma palavra: mar-mar. Cfr. Gonçalves Dias, Primeiros
destinada a operar contra os paraguaios invasores do Mato Grosso,
chegou a Uberaba a 20 de junho e ali estacionou à espera do coronel
cantos, Rio de Janeiro, 1846, p. 147: mar-mar; Garrett, Flores sem
fructo, 2,a ed, Lisboa, 1858, p. 179: flor-flor; Domingos de Magalhães,
Drago, nomeado presidente e comandante das armas de Mato Grosso, Cantos fnebres, Rio de Janeiro, 1864, p. 150: amor-amor; Laurindo Ra
que vinha à frente de outras tropas organizadas em S. Paulo. A 20 belo, Poesias, Rio de Janeiro, 1867, págs.148-149: lembrado-lembrado;
de julho houve junção das fôrças mineiras e paulistas, mas só a 5 Fagundes Varela, Cantos do êrmo e da cidade, Rio de Janeiro, s.d., p. 9:
de setembro seguiram elas para o ponto do seu destino, onde copartici luz-luz: Machado de Assis, Poesias completas, Rio de Janeiro, 1901, p.
param das horríveis provações que em Mato Grosso aguardavam as 330: amiga-amiga; Vicente de Carvalho, Poemas e canções,
2,
ed., Pôr
tropas brasileiras, lá simultâneamente em luta contra os paraguaios, to, 1909, p. 166: caminho-caminho".
fome e o cholera-morbus",
e) Em frente das coortes inimigas. Em NP, 1.a ed., está, por
a) Tingindo em sangue, e sepultando em runas Por êrro ti êrro tipográfico, dos coortes, lapso corrigido na ed. de 1900.
pográfico, está em ambas as edições de NP: Fingindo. Sugere-nos
GUIMARES POESIAS COMPLETAS 497
BERNARDO
496
que havia depois
Em NP, 1. cd., estí recordar o passado Suprimi a vírgula
D Depois voltai trazendo em vossa fronte de 1900.
e) Vem
uma existência querida, pus a
corrigido na ed. de passado. No verso seguinte, De
travendo, por êrro tipográfico, vírgula.
f) "Quando gozei outra pusvida. Pus o ponto. No verso seguinte
vírgula em Saudade e suprimi a que
NOTA 66 "Saudade, doce perfume a
havia em perfume; no verso
De uma
flor que já mnurchol, pus
Melodia - I vírgula.
g) gue fui e o que hoje sou."
"0 Pus aspas em sou.
a) Às solidões
serenas -
Em NP: As solidões
pencdia
serenas.
Em NP: pregado a pe NOTA 69
b) Qual Prometeu pregado à
nedia.
Melodia IV
FÔLHAS DO OUTONO
NOTA 71
NOTA 68
Prólogo
Melodia
a) Misterio8o asilo, -
III
Suprimi o ponto que havia depois de asilo. b)
a) ...a
.
clusse alguma de Aristarcos; -
Em F0: á classe.
arrastados pela locomotiva. Por defeito de impressão, falta,
E nem da terra o místico remanso, Substituí o ponto por em FO, o l em locomotiva.
vírgula. .de preferência a o outro qualquer metro. Em FO: 6 qual
quer.c) de atonção comentário desfavorável do Poeta sôbre
c) Entre as malhas da rêde que a tortura Suprimi a vírgula é digno
o alexandrino, verso de que não há um único exemplo em sua obra.
que havia em rêde e no verso seguinte, em vão as agas bate, pus ... em cuja execução só se observa o compasso, Está em
a vírgula. E d)
d) Vem, saudade, doce amiga
havia depois de amiga.
-
Pus as vírgulas c suprimi a quo
FO, por êrro tipográfico, só se observa-se.
BERNARDO GUIMARES
COMPLETAS 499
498 POESIAS
NOTA 72
NOTA 76
Ode O vôo angélico
0 Dr. Francisco de Paula Pereira Lagoa, a quem é dedicada esta a) Dos lares teus o anjo
tutelar. Em FO: 6 anjo tutelar.
"Ode", nasceu em Ouro Prêto em 1828, sendo seus pais
o major Silvério
Diplo
Pereira da Silva Lagoa e D. Balbina Carlota dos Reis Lagoa. NOTA 77
mou-se em medicina no Rio de Janeiro em 1853, adquirindo desde logo
fama como clínico. Faleceu antes dos 40 anos, a 24 de janeiro de Dous anjos
1868. Sua morte prematura causou grande consternação entre os seus
conterrâneos. Xavier da Veiga dedica-lhe duas páginas nas Efemé a) A meu amigo Francisco Lana. Em FO: Á
meu amigo.
rides mineiras, vol. II.
a) Do perenal repuso? Falta a interrogação em FO. NOTA
eleva a a
idéia regiões mais altas Em FO: é regiões.
c) Um cântico de dor? Em FO não há a interrogação. Não queiras morrer
Em "Algumas palavras ao leitor", advertência que pode ser en
contrada nesta edição precedendo os poemas do pai e do irmão de
Bernardo Guimarães, êste confessa ter-se aproveitado de oito ou nove
NOTA 73 estrofes do irmão, padre Manoel da Silva Guimarães, servindo-se delas
neste poema, "Não queiras morrer": "Achando-as lindíssimas e per
Estrofes feitamente aplicáveis ao assunto, de que eu tinha de tratar, servi-me
delas como. de uma epígrafe, a que dei amplo desenvolvimento".
a) Onde Cláudio e Dirceu -Além da alusão a Cláudio Manuel
da Costa e Tomás Antônio Gonzaga, os grandes poetas envolvidos no
a
Resista aos vendavais a frágil rosa,
por êrro tipográfico.
"Não, não chames a morte. Àquela estrêla,
Em FO está Resisto,
NOTA 81
"Arraial do Ouro Branco, 21 de abril. –
Na carta que escrevi
de Ouro Prêto não disse, por ser tarde, quc tendo S. M. o Imperador
declarado ao Dr. Bernardo Guimarães que descjnva possuir uma co
Estrofes leção completa de suas obras, ontem à noite em palácio nquêle cstimado
escritor e poeta levou-lhas, mas sendo intérprete perante Sua Majesta
Este poema foi dedicado ao correspondente do "Jornal do Comércio" de a nenina Constança da Silva Guimarães,
filha do referido poeta
em Ouro Prêto por ocasião
da visita de D. Pedro II à antiga capit1 (vide a nota 2-d), a qual pronunciou as seguintes palavras:
G03
ERNARDO GUIMARES POSIAA COMIPLETAS
502
proscncn do V. M. Imperinl temos n meu
n honrn do anro
poema, Anchictu,
o 0
grifo em Anchieta
"Senhor. A
que nqui se nchn Indo, n fim o) Caae imorll n
Anchictu ou o Bvnjyeiho nug nclvas, lonyo
o minhn irnnã Isabel, o Dr. Bornurdo noBso., Alude o Pocta
sentar-nos cu do Fagundes Varela. campu,
6
cm nome de nosso pni, pooma cm decasaílabos, versos branco%,
de ofortar V. M. Imperial,
suns produçõcs literárins, clu gàzinha vcm velar-lhe u campuPmn PO cstá a
Guimarãcs, ôstes volumes ade V. M. Imperinl pela insignificíâncin dn d)
"Cle pcde deseulpa apresentada por nossAs mäo8, a fim de signi
oferta, o quis que fôsse
n purcza c sinceridade da frncn
homennren da NOTA 85
ficar por êssc modoquc hoje dcpomos nns augustas mãos de V. M.
amor e respcito
Imperial". a csta rovínciu. Em FO está: a esta. A Bereia e o peecudor
Cm sua visita
a)
"A sercia c o pescador", csclarcce Basílio de Magalhãcs à pág, 107
NOTA 82 o aprovcitara Bernardo Gui
do seu estudo biográfico c crítico, "já em 1879, Esta novela é
marãcs no romance A ilha maldita, publicada
Uma lágrima um simnples desdobramento do enrêdo daqucla É um conto di
se ver
vidido cm dozc pequenos capítulos, onde harmonizam crigtalino8
Em FO cstí Anênones:
unémone8. à seis c quatro sílabas, formando uma pequena orquestração.
AnêmonCs c rosas.
a) orga 8Os dg
a ser posta em música pelos que patriotica
pág. 68 do 1.0 vol. das Pocsias completas de Raimundo Correia, vem a A linda balada bememnpudera
Nacional, 1948), mente se inspiram nossa Castália c em boa hora desejam criar a
nizado por Múcio Leão (Companhin Editôra
scguinte nota: "Faça-te a linda anêmona lcmbrar... Encontro cm arte nacional."
um artigo de João Ribciro, respondendo a uma consulta pelo "Estado A meus pés vinde geme, Em FO: Á meus pés.
–
de São Paulo", a seguinte observação sôbre
a palavra anêmona: "Todos
os nossos poctas cscrevem e pronunciam anémona ou anèmone,
vocábulo esdrúxulo. Assim está
como
o nmome dessa "flor do vento" (como falta
b)
o
Sem médo, a êsmo
c Não me deiaes 8oçobrur.
em Não.
-
Em FO: 4 esmo.
Em FO, por defeito de impressão,
No álbum de B. Horta
NOTA 83
a) Que cai no pó, c murcha e 8e coneume. Consumne: forma
Décima8 hoje menos usada de consome. Bernardo Guimarães escreveu também
destrui no poema "0 êrmo", de P (vide a nota 10-f).
Viver?! Ohl não, isso mão era vida, Pus a vírgula em
a) Ao aniversário natalício de minha sobrinha Maria Canuta,... não.
No índice do FO vem: Maria Caneto, êrro tipográfico.
c) A esperançu, a crença, o entusiasmo, Substituí por vírgula
o ponto que havia em entusiasmo.
84
d) Que o venduval prostou em sitio bronco. Está, em FO,
NOTA Prostou. (Vide, a propósito da dissimilação, a nota 44-u)
e) Inda em meu peito não rompeu-8e a fibra –
Cf. Álvares de
Fagundes Varela Azevedo no poema "Lembrança de morrer": Quundo em meu peito re
bentar-8e a fibra.
f) Vêde Castilho, o lusituno burdo, Mais uma vez se afirma
Dos seus companheiros de romantismo, a Aureliano Lessa, Dutra aqui a grande admiração de Bernardo Guimarães pelo poeta português
e Melo, Fagundes Varela e Gonçalves Dias consagrou Bernardo
marães poemas póstumOs. Varela viveu de 1841 a 1875; o poemaGui
Antônio Feliciano de Castilho (1800-1875), autor de Cartu8 de eco e
Bernardo foi escrito, portanto, três anos depois de ua morte. de Nurciso, Primavera, Amor e meluncolia, Ciúmes do bardo, etc. No
prefácio a FO, Bernardo Guimarães considera-o gênio: "Vou citar
a) Que os sagrados mistérios mos revela.
há um asterisc0 e, ao pé da pág. 106, a seguinte Em FO, neste verso ainda um exemplo, e êste é de um gênio". Sôbre a admiração de Ber
flor do
nota do Poeta:A
maracujá (está maricujá) é o título de uma mimosa nardo Guimares pelo visconde de Castilho, eserevem Waltensir Dutra
poesia e Fausto Cunha no livro Biografia eritica das letras mineiras, edição
ligeira do falecido poeta". do Instituto Nacional do Livro, 1956, pág. 58: "Invoca permanente
b) Na mente te acendeu santo delirio,
o ponto final que havia em FO. Substituí por vírgula mente a lição e a obra de Castilho, seu mestre incorruptível. Esta ve
BERNARDO GUIMARAES
504 POESIAS COMPLETAS 505
em boa parte,poa
Feliciano de Castilho explica,
neração por Antônio de Bernardo, assinalada mano, quando prevê que se lhe aproxima a hora tétrica do mirvand,
tendência neoclássica da poesia romântica gongorisno c marinismo
nos Estudos. Quando farcja filo-árcade, que não busca rever tudo quanto
o encantou na terra, desde os dias aurorais
José Veríssimo e Maccdo, cstamos em face prova o belo poemeto "Saudades do sertão do
em Gonçalves Dias uma reação contra o culteranismo. Si
da infância. Disso é
ern
ter sido o arcadismo rigor, na primeira; a anterior oeste de Minas", no qual Bernardo Guimares rccorda e descreve,
ignorava geração romântica (a Guimarcs
tuado na segunda o poeta Bernardo
6, muitas vêzos. rimas sinceras e cantantes, molhadas nas tintas
sem
multicores da saudade
se olvidar de Araxá,
foi pré-1omntica), Pertence àqucle grupo de liristas bra vivaz, a quadrae que passou em Uberaba, por onde ali divagou
seu turno, um
pré-romântico. Magalhãcs. C do Patrocínio dos outros pinturescos lugares,
um meio-tom clássico-romântico: Gon. Substituí a vírgula que
sileiros cuja poesia é (das Inspiraçöes do claustro), Tenho inveja dle ti, meu caro amigo;
Gomes de Sousa, JunquciranoFreire o que em Portugal represcentarome havin em amigo por ponto e vírgula.
Brasil
çalves Dias. Representamo da Lirica de João Minimo, pré-romântica b) Correndo quase sem tocar o 8olo; Substituí por ponto e
Garrett (principalmente e Castilho. Bernardo nunca cvoluiria na3o vírgula a vírgula que havia em solo.
quase arcádica), Herculano de Casimiro de Abrou
Azevedo,
um romantismo total, à mancira de a Guima
Até que ponto se projetou sôbre obra poëtica de Bernardo ve NOTA 89
ou o exemplo, de Castilho, não nos será possível
rães a 1ntluencuimitos dêste trabalho. O que nos interessa Saudação e homenagem a SS. MM. o
Imperador e a Imperatriz do
rificar, pelos a Castilho no aludido prefácio: investindo por sua
destacar é a restrição feita se valeu, Bernardo Guimarães Brasil, ocusião de visita a Ouro Préto em i881
o alexandrino, de que jamais
contra
observa "0 visconde de Castilho, que além de possuir urna imaginacão Éstes poemas deram motivo censura de Valentim Magalhães, a
que o Poeta respondeu no prefácio à a FO,
:
brilhante e fecunda como bem poucos, era um adestrado metrificador. transcrito na presente edição
deixou-nos, a par de magníficos exemplos, preciosas teorias. Mas (vide, sôbre a viagem do Imperador, as notas 2-d, 2-e e 81).
infelizmente foi êle que nos últimos quartéis da vida introduziu em
Portugal a mania do moroso
e
arrastado alexandrino. (...) É dâle
mesmo, dêsse bardo imortal, que vou tirar o exemplo do quanto NOTA 90
ao de treze para todos os assun
superior o nosso vers0 de onze silabas
tos, e principalmente para assuntos elevados". sse prefácio revela,
umas poucas
Saudação a Sua Majestade o Sr. D. Pedro II
de resto, 0 estudioso e o crítico (êste lembrado ainda por
em 1859 e 1860) que havia a) Não de servil, ignóbil vassalagem, poeta afirma nesse
críticas que fêz para o jornal "Atualidade" verso e nos três que se seguem a sua posição, 0como
em Bernardo Guimarãäes, não raro acusado, como cm geral todos os virá a fazer no
pocma seguinte (nota 91-b), ressaltando que a
românticos, de pressa ou negligência na factura dos seus versos. No tava aos homenagem que se pres
que talvez tenha êle um pouco de culpa, ao dizer, p0r exenmplo, no Imperadores era "sincera e jubilosa" e não mera vassalagem.
"Hino do prazer": Da minha lira o deleixado acento..., ou em "Sau
dades do sertão do oeste de Minas": Vos leve de meu canto desleixado.
Até parece que o Poeta pensou em tais censores ao advertir
no prefá NOTA 91
cio a P, que os versos reunidos nesse volume eram “frutos de quadras
mui diferentes de mais de quinze anos de vida errante, inquieta e agi Saudação a Sua Majestade a Imperatriz do Brasil
. e em ambiente pouco propício ao culto
tada.. das letras. A tão augusta, umável Personagem
b) Não de lisonja, mas sincero preito,
Em F0: Á tão.
ou mesmo necessário chamar a atenção do leitOr Torna-se interessante,
para esta advertência
NOTA 87 do Poeta, de que não saudava a Imperatriz por mera
se sabe da censura que viria a lisonja, quando
sofrer da parte de Valentim Magalhães
Hino a Tiradentes (vide a nota 2-e).
c) Há muito tem, erguido em nosso peito. Em F0: muito.
(Vide, a respeito de Tiradentes, a nota 73-a.)
a) Maldição a teus algozes Em F0: á teus.
NOTA 92
NOTA 88 Å moda
Saudades do sertão do oeste de Dste poema recorda outro, "À saia-balão", incluído em P.
Minus a) T'e amnarrou a essa cauda, que carrega8, Em FO: 4 essa
A propósito deste poema, escreve Basílio cauda.
de seu estudo biográfic0 e crítico: de Magalhães à pág. l10 b) De que pródiga ornou-te a natureza,
"É crenca geral gue o Substituí por vírgula
espírito nu 0 ponto final.
BERNARDO GUIMARES POESIAS COMPLETAS 507
506
o Dr. Bernardo
NOTA 93 morte, porém, do mais empenhado talvez na emprêsa,
Guimarães, parece-me que não se tratou mnais disso. Este entretanto,
no seu livro F6lhas do outono publicou várias dessas poesias".
Hino à preguiga No volume VI, 1900,
Padre Manocl Joaquim da Silva Guimarães
pocmas humorísticog pág. 199, Sacramento Blake registra o nome do padre Manoel da Silva
ver, um dos mais deliciosos anota à pág. 112 de Guimarães Araxá, nascido em Ouro Prêto em 1821, referindo-se assim
£ste é. a nosso de Magalhães ao sobrenome Aruaá: "Chamava-se Manoel Joaquim da Silva Guima
Guimarães. Basílio ". em que êle
de Bernardo e crítico: "No "Hino à preguiça rães e sendo nomeado cônego da Capela Imperial, quando se achava
seu estudo biográfico sua “psique" i6 no Rio de Janeiro um capelão do exército com igual nome, êste apres
um dos aspcctos particulares da
mais uma vez retraça charuto", "Minha rêde"o sOu-se a tirar o respectivo título, fato que levou o agraciado a assi
revelado em anteriores
produçes (A0 e ironia". nar-se como acima se acha ". Basílio de Magalhaes, à pág. 14 de
tangível mescla de humorismo
cigarro"), há
a) De rechonchudo abadc.
o nundo o
-
Em FO está rochonchudo.
mant0 do repouso Suprimi a vírgula
seu estudo biográfico e erítico, depois de falar do primeiro irmão de
Bernardo, Joaquim Caetano da Silva Guimarães, que chegou a ministro
do Supremo Tribunal Federal, assim alude ao padre Manoel: se
d) Por todo gundo, Manoel Joaquim da Silva Guimares, nascido em 1821 e"0 fale
que havia em repous0. cido enm 1870,
recebeu ordens sacras e paroquiou por algum tempo as
freguesias mineiras de Araxá e Uberaba, donde foi transferido para
NOTA 94 a sul-riograndense de Santo ngelo. Como houvesse prestado bons ser
viços às nossas tropas durante a guerra do Paraguai, escolheu-o
Pedro II para cônego da Capela Imperial. Estava êle longe da côrte,
D.
e o 7 de Setembro ao passo que se achava aqui um esperto capelão
0 Ipiranga do exército, portador
do mesmo nome, que se apressou a empossar-se no cargo.
à
pág. 104 de seu dadeiro agraciado entendeu de não abrir litígio com o seu homônimo. 0 ver
Escreve Basílio de Magalhães, propósito de FO,
a
pe
esta coletânea, à semelhança da anterior, distingue-se gue
Limitou-se a Suprimir o Sobrenome e a acrescentar ao cognonme o
estudo: umas e outras denunciando topônimo A
1858. Era pai do Dr. Bernardo Joaquim da Silva Guimarães, de quem NOTA 96
já fiz menção; oficial superior da guarda nacional, em sua província,
onde exerceu vários cargos de eleição popular, e por onde foi deputado
na primeira legislatura geral. Escreveu: Algumas palavras ao leitor
Vúrias poesias e trabalhos em prosa em yários jornais da provinel
De
entre essas poesias e outras inéditas, seus filhos trata ve
de colecionar as melhores, em 1882, a fim de dá-las ao prelo; com
a)
duas.
... dar publicidade agora a duas poesias... - Em FO: á
BERNARDO GUIMARES 509
POESIAS COMPLETAS
508
NOTA 97
NOTA 100
A João Cardoso Å
sepultura de...
e barän
João Cardoso de Meneses Sousa,"Harna
João Cardoso:
o conselheiro poeta, autor de
.. ) mundo a orige, Orige: por neces
nascido em 1827, também
no
ao qual Bernardo Guimaraes
ue pura conserVOU
de Paranapiacaba,
e "Camoniana brasileira", chamando-lhe "distinto de rima.
gemedora' palavras ao leitor" rascunboe
.se refere em "Algumas terem sido salvos os no
amigo". Deve-se-lhe o fato de encontrados espóiio NOTA 101
particular Joaquim e do padre Manoel,este poema, que repete
das poesias de JoãoFicou-nos uma dúvida: em talvez ao lei.
dêste último. que se encontram AlgumaS palavras FO, abra
Sonêto
inclusive expressões Bernardo Guimarães. Na edição de
de autoria de e não traz.c0me
tor", seja Joaquim da Silva Guimarães Informa João Joaquim da Silva Guimarães, em subtítulo, que êste
êle as poesias de João a êle alnde
Bernardo Guimarães sonêto foi improvisado por êle depois de assistir à representação da
os demais, qualquer assinatura. Nem Cardoso colheu tais flores
que João tragédia "Inês de Castro", de Ferreira. Ferreira: o poeta português
na sua introdução, mas nesta mão piedosa à margem de um jazigo,
diz
e sepulcrais", 'com Antônio Ferreira (1528-1569), de quem escreveu, a propósito da tragé
mirradas descuidosamente as largaram em 0 irmão de dia Castro, Fidelino de Figueiredo: "Antônio Ferreira é que nos legou
onde dous outros entes seu pai morreu 1858. Como a única tragédia quinhentista portuguêsa, completa e original" (Fide
Bernardo morreu em 1870, quando
oferecesse a João Cardoso aquelas lino de Figueiredo, História iterária de Portugal (sécs. XII-XX), Edi
.explicar pois que João Joaquim piedosa à margem de como um ja torial Nobel, pág. 120).
"flores desbotadas", colhidas “com mão considerado de
o poema tem sido até hoje
zigo?" No entanto, e é que Mário de Lima o inclui na sua
.autoria de João Joaquim assimVol. I, 1922, pág. 353. NOTA 102
Coletânea de Autores Mineiros,
A buena-dicha
NOTA 98
a) o meu que vejo nessas mãos traçado.
É
Em FO falta a pri
0 empregado público meira palavra, por defeito de impressão. 0 verso está assim: o meu
que vejo nessas mãos traçado.
É de notar
a existência, João Joaquim da Silva Guimares,
em me
.como atesta êste sonêto, das qualidades de humorista que depois
sua Biografia crítica
lhor se afirmariam em Bernardo Guimarães. Na NOTA 103
das letras mineiras, pág. 58, WaltensirDutra e Fausto Cunha anotam
o humorista Bernardo teve a
esta particularidade, para dizer "que Apólogo
quem sair". Já observara aliás Agripino Grieco na sua Evolução da
poesia brasileira (2.a ed., Livraria H. Antunes, Rio de Janeiro, pág.
35)
xado
:
"0 pai
rimas
Bernardo Guimarães era poeta e prosador,
de
avulsas, que
tendo dei
o filho incluiu piedosamente em suas Fôlhas
a)
b)
Qual seria o remédio a tantos males,
À 80mbra dos Milords.
-
Em FO: tanto males.
Está A sombra em FO. 0 grifo é
nosso.
do outono, rimas impregnadas de um misto de lirismo
e sarcasmo, dons
.antagônicos que também coabitariam no rebento do vate malogrado".
c) O
burro alegre diz: "Descer podemos; – Faltam as aspas em
FO.
34
BERNARDO GUIMARES
510 POESIAS COMPLETAS 511
ram escritos em Ouro Prêto em 1865". em 1883 acalorado debate na assembléia provincial de Minas, a propó
sito da mudança de denominação da freguesia de Madre-de-Deus-Angu.
Não se conteve Bernardo Guimarães ante a esquisitice de tal topô
NOTA 112 nimo e o pinturesco da discussão, e a sua irreverente musa imediata
mente Ihe fêz fluir dos bicos da pena uma das suas melhores com
posições, senão a melhor, do gênero jogralesco. Ao "Colombo", da
Lembranças do n0sso amor Campanha, que a obtivera de um amigo do poeta ouropretano, coube
o publicá-la em sua edição de 30 de setembro de 1883. Ei-la tal qual
poema vem reproduzido à pág. 121 do estudo de Basílio de se nos deparou no precioso livro do Dr. J. M. Vaz Pinto Coelho (págs.
Éste 198-200)."
Magalhães e à pág. 195 do livro de J. M. Vaz Pinto Coelho.em Basílio
de Magalhães informa: “Por êsse tempo, cantava-se muito Minas, No seu livro, além de reproduzir o poema, J. M. Vaz Pinto Coelho
nas serenatas, ao som do violão, a conhecida modinha" de Aureliano dá a seguinte nota sobre êstes versos: Possuo-os pela pena do nosso
Lessa, "Lembranças do nosso amor". Dela fêz Bernardo Guimarães Poeta. Foram escritos em Ouro Prêto em 1865".
a seguinte chocarreira paródia, inserta no Constitucional" de Ouro Transereve a seguir, ainda do livro de J. M. Vaz Pinto Coelho,
Prêto (ed. de 20 de julho de 1867)". No livro de J. M. Vaz Pinto Coelho as palavras com que o Colombo" os publicou na secção "Museu do
vem êste esclarecimento ao pé da pág. 195: "Foi publicada no "Consti Colombo":
tucional" de Ouro Prêto n,° 47 de 20 de julho de 1867. É paródia da "0 colaborador do nosso Museu de hoje é ninguém menos do que o
modinha Qual quebra a vaga do mar. grande poeta mineiro Bernardo Guimarães. Colaborador involuntário,
é certo, mas não contra a
a) Lá na estalagem do Meira, No livro de J. M. Vaz Pinto vontade, pois nutrimos a pretensão, talvez
Coelho, ao pé da pág. 196, lê-se, a propósito dêste verso: "José Rodri vaidosa, de que o ilustre poeta não levará a mal a indiscrição de assi
gues Meira, então proprietário de um hotel na freguesia de Antônio narmos esta sua recente produção, que temos sem assinatura e de
Dias, de Ouro Prêto. Nêle hospedaram-se em 1869 os deputados pro abrilhantarmos com ela esta secção da nossa fôlha, para que não era
vinciais Drs. Teodomiro Alves Pereira, Francisco F. Correia Rebêlo, destinada. À obsequiosidade de um amigo devemos a graciosa compo
Manuel Basílio Furtado e o autor desta "Grinalda" que tem o prazer sição, inspirada ao autor pela discussão havida na assembléia mineira
a propósito de mudar-se o nome à freguesia de Madre-de-Deus-do-Angu.
de recordar aqui os seus nomes de amigos e distintos comprovincianos Como bons amigos dos nossos leitores, julgamo-nos obrigados a trans
mitir-lhes o risonho mimo. Aí está."
NOTA 113
NOTA 115
Disparates rimados
Dedicatórias
A respeito dêste poema, escreve Basílio de Magalhães à pág. 122
de seu estudo: "0 Ipiranga", periódico Reunimos num só, dando-lhes êste título, dois pequenos poemas
literário surto no Rio de
-neiro em 1865, recebeu do poeta ouropretano que serviram de dedicatórias a retratos ofereeidos por Bernardo Gui
deu à luz no n.° 74, de marães a amigos seus.
27 de outubro de 1867, uma curiosa produção, do
gênero En
0
primeiro, a Peregrino Werneck. Informa
escurril.
GUIMARAES
POESIAS COMPLETAS 515
DERNARDO
514
e que afirmna ale
o pocta minciro: Co
nolos o gigante alado, (de que falamos na nota 110) um
de seu livro sôbre Lcopoldina, Minas) um de álbum e gue
Dilermando Cruz à pág, 177 (a cidade de ter sido compôsto "por solicitação da possuidora
nhecemos em nossa terra natal Weneck, uo e
deseiava um sonêto de sabor moderno", mais o dois outros, "escritos por
Guimaråes : o Sr. Porcgrino consi. Liceu de Artes e Off
íntimo amigo de Bernardo retrato que o Sr. Werneck ocasião de se inaugurar, na velha Ouro Prêto,
um retrato do grande pocta, m
XI
XIX
Introdução Guimarães
Cronologia de Bernardo
POESIAS 1865
3
Prólogo
CANTOS DA SOLIDÃO 9
Ao leitor 11
Advertência da segunda edição
Sr. Coronel Antônio Felisberto Nogueira, endere 13
Ao Ilmo. solidão"
çando-lhe éstes "Cantos da 15
Prelúdio 16
Amor ideal 19
Hino à aurora 21
Invocação 28
Primeiro sonho de amor oferecida a meu amigo o Sr. A, C. C.
A uma estrêla, poesia 30
V. C. 33
0 êrmo 40
0 devanear do céptic0 45
47
Desalento ao meu amigo o Sr. F. J. de Cergeira
No meu aniversário, meu irmão
49
Visita à sepultura de 53
sepultura de um escravo de F. Dutra e
Melo 54
0
destino do vate, à memória 58
Esperança
INSPIRAÇÕES DA TARDE
65
Inyocação à saudade 66
Recordação 70
Ilusão 71
O sabiá 76
Hino do prazer 82.
Hino à tarde
BERNARDO GUIMARAES
524 ÍNDICE 525
POESIAS DIVERSAS
89
O
brigadeiro Andrade Neves, barão do Triunfo
A cismadora
- Ode 231
234
0 nariz perante
os poetas
93 À morte de Teófilo B, Otôni 237
À saia balão 98 Nênia, oferecida à Ex.ma Sr. D. Maria da Conceição Soares
Ao charuto Ode i00 Ferreira, espôsa do capitão Soares Ferreira, mmorto em Lomas
(15 dc agôsto
)
Ao meu aniversário 104 Valentinas 240
Gentil Sofia Balada 243
Sirius sonho de um jornalista pocta
Dilúvio de papel,
107
A campanha do Paraguai Heróides brasileiras
125
Minha rêde
Galope infernal - Canção
Balata
Adeus, a meu cavalo branco
chamado Cisne
128
136
Invocaço
Lopez e Humaitá
25)
254
139 III Osório e a passagem do Passo da Pátria 259
Idílio 144 Riachuelo e Barroso 263
A orgia dos duendes
IV
152 Uruguaiana e Canavarro 269
Olhos verdes
Uma filha do campo 152 VI Tuiuti e 24 de Maio 273
Ilusão desfeita 154 VII Pôrto-Alegre 279
Utinam, imitado de V. Hugo 155 VIII Assalto a Curuzu 283
Foge de mim
Que te darei
A fugitiva
- Canção
156
157
158
Barcarola
0 adeus do voluntário
Cantiga
289
291
293
0 bandoleiro Canção 160 Se eu de ti me esquecer 294
Ao cigarro Canção 162 A morte de Flávio Farnese 295
Aureliano Lessa, versos escritos no álbum de meu amigo João
EVOCAÇõES Raimundo Duarte junto a uma paisagem da Diamantina 299
Adeus da musa do Itamonte 303
Advertência 169 A Bernardo Guimarães (Pedro Fernandes) 305
Sunt acrimae rerun 170 A poesia, resposta a Pedro Fernandes 308
Prelúdio 171 Estrofes dedicadas à o brigada mineira gue partiu de Ouro
Primeira evocação 174 Prêto em 1864 sob comando do brigudeiro Galvão 314
Segunda evocaço 177 Melodia, à Ex.m Sr. D. Joana Perpétua de Oliveira Santos 317
Terceira evocação 179
Lembrança, a M. L.
-
182
Nostalgia 184
Saudade 188 FÔLHAS DO OUTONO 1883
Lembrar-me-ei de ti 188
A meus primeiros cabelos brancos 190
Cenas do sertão, fragmentos de uma epístola Prólogo 327
dirigida a wm
amigo da provincia de Goiás 194 Ode, ao meu amigo Dr. Francisco de Paula Pereira Lugoa,
por ocasião do fale cimento de se pai 335
A BAÍA DE B0TAFOGO Estrofes, ao Dr. F. L. Bittencourt Sampaio, por ocasião de
sua vinda a Ouro Prêto, em 1875 338
A baía de botafogo Canto épico 205 Poesia feita por ocasião do 14.0 aniversário da Ex,m Sr." D.
Luisa Augusta Amaral da Veiga 340
Hino dedicado ao 8.0 Batalhão de Voluntários, que em abril
de 1866 partiu de Ouro Prêto a tomar parte na camnpanha
BERNARDO GUIMARAES
GUIMARAES
B. J. DA SILVA
B. L. G.
RIO DE JANEIRO
B.-L. GARNIER
LIVREIRO-EDITOR DO INSTITUTO HISTORICO
65, Rua do Owidor, 65
PARIS PORTO
E, BELHATTE ERNESTo OHARDRON
1865
Folha de rosto da primeira ediço de Poesias, de Bernardo Guimares
FOLHAS D0 0UTONO
rOR
BERNARDO GUIMARES
RIo DE JANEIRO
B. L. GARNIER- Livreiro-Cditor
71 RUA DO OUVIDOR 71
1883