Você está na página 1de 44

Relatório Final de Estágio Mestrado Integrado em Medicina

Veterinária

Medicina e cirurgia de animais de companhia – a importância da


citologia na prática clínica com descrição de casos clínicos

Sara Martins Rodrigues

Orientador: Prof. Doutor Ricardo Jorge Pereira Córdova Marcos


Co-orientadores: Prof. Doutora Marta Susana Amaro dos Santos (Laboratório de
Histologia e Embriologia ICBAS-UP) e Dr. Paolo Selleri (Centro Veterinario
Specialistico, Roma)

Porto 2023
Relatório Final de Estágio Mestrado Integrado em Medicina
Veterinária

Medicina e cirurgia de animais de companhia – a importância da


citologia na prática clínica com descrição de casos clínicos

Sara Martins Rodrigues

Orientador: Prof. Doutor Ricardo Jorge Pereira Córdova Marcos


Co-orientadores: Prof. Doutora Marta Susana Amaro dos Santos (Laboratório de
Histologia e Embriologia ICBAS-UP) e Dr. Paolo Selleri (Centro Veterinario
Specialistico, Roma)

Porto 2023
RESUMO
O presente relatório diz respeito ao trabalho desenvolvido ao longo do estágio
curricular de 16 semanas na área de Patologia e Clínica laboratorial e Medicina e Cirurgia
de Animais de Companhia, no âmbito do 6º ano do Mestrado Integrado em Medicina
Veterinária do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto
(ICBAS-UP). O primeiro mês de estágio decorreu nos Serviços de Diagnostico Citológico
e Hematológico, ICBAS-UP e os restantes 3 meses decorreram no Centro Veterinario
Specialistico (CVS) em Roma, Itália. Durante o período do estágio no laboratório participei
no processamento de amostras citológicas desde a receção, coloração e montagem à
observação microscópica e descrição. Durante este período tive também a oportunidade
de observar e analisar casos citológicos selecionados para formação.
No CVS acompanhei várias áreas da clínica de animais de companhia,
nomeadamente medicina interna, cirurgia, anestesiologia, terapia intensiva, oncologia e
diagnóstico citológico.
O tema e a estrutura deste relatório foram definidos no sentido de, através do relato
de 4 casos clínicos, demonstrar a utilidade do diagnóstico citológico na prática clínica.
Optou-se por fazer uma revisão das técnicas de recolha de amostras citológicas, uma vez
que o sucesso e a utilidade da citologia está dependente da existência de amostras
representativas e colhidas segundo o método mais adequado ao tipo de lesão. Por outro
lado, a seleção de 3 casos de oncologia e 1 caso de doença infeciosa resultam, não só da
distribuição da casuística observada no CVS (centro de referência em oncologia), mas
também porque foram os casos que tive a oportunidade de acompanhar desde a
apresentação, colheita da citologia até ao tratamento. Pretende-se também reforçar a
importância da citologia em casos de doença neoplásica e a sua utilidade na identificação
de agentes etiológicos.

PALAVRAS-CHAVE: Animais de companhia; Citologia; Oncologia; Doenças infeciosas.


AGRADECIMENTOS

Um especial agradecimento à minha mãe e à minha irmã por todo o apoio e


incentivo que tornaram possível a realização do meu maior sonho. Se não fosse por vocês
eu não estaria onde estou agora.
Ao professor Ricardo Marcos, o meu orientador, e à professora Marta Santos, a
minha co-orientadora, por todo o conhecimento transmitido não só durante o estágio mas
também durante o meu percurso académico. Obrigada por terem partilhado comigo a vossa
paixão pela citologia.
A toda a equipa do laboratório dos Serviços de Citologia Veterinária do ICBAS, em
especial à Fernanda Malhão e à Célia Lopes, por me terem recebido tão bem e por tudo
aquilo que me ensinaram.
Ao CVS e ao Dr. Paolo Selleri por me terem recebido de braços abertos. À Dra.
Alessandra Citton e à Dra. Cristina Schiano por todo o apoio e ensinamentos transmitidos
ao longo do estágio.
Obrigada a todos os docentes do Mestrado Integrado em Medicina Veterinária.
Por fim, a todos os meus amigos que me acompanharam ao longo do meu percurso
académico pela vossa amizade e por todas as rizadas mesmo nas piores alturas. Sem
vocês não seria a mesma coisa.

Ao meu pai.
ÍNDICE
1. A citologia na prática clínica ........................................................................................ 1

1.1. Importância da citologia....................................................................................... 1

1.2. Métodos de colheita e preparação das amostras................................................ 2

2. Casos Clínicos ............................................................................................................ 3

2.1. Caso clínico nº1: Linfoma multicêntrico canino ................................................... 3

2.2. Caso clínico nº2: Melanoma oral ........................................................................11

2.3. Caso clínico nº3: Mastocitoma na conjuntiva bulbar ......................................... 16

2.4. Caso clínico nº4: Leishmaniose Visceral Canina .............................................. 22

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................. 29

ANEXO A .......................................................................................................................... 31

ANEXO B .......................................................................................................................... 33

ANEXO C .......................................................................................................................... 34

ANEXO D .......................................................................................................................... 35
ABREVIATURAS
< Menor
> Maior
Ac Anticorpos
BID Duas vezes ao dia
CHOP Ciclofosfamida, Doxorrubicina, Vincristina, Prednisolona
CID Coagulação intravascular disseminada
CVS Centro Veterinario Specialistico
DAPP Alergia à picada da pulga
DOX Doxorrubicina
DV Dorso-ventral
EDTA Ethylenediamine tetraacetic acid
ELISA Enzyme-Linked Immunosorbent Assay
GI Gastrointestinal
hpf campo de grande ampliação
IFAT Immunofluorescence antibody test
IgG Imunoglobulina G
IHC Imunohistoquímica
IM Via intramuscular
IRC Insuficiência renal crónica
IV Via intravenosa
Kg Quilograma
L Litro
LDGCB Linfoma difuso de grandes células B
LL Latero-lateral
LMC Linfoma multicêntrico
LNH Linfoma não Hodgkin
LN Linfonodo
m2 Metro quadrado
MDR Multi-drug resistance
mg Miligrama
ml Mililitro
MM Melanoma Maligno
MOMP Mecloretamina, vincristina, melfalan e prednisolona
MOPP Mecloretamina, vincristina, procarbazina e prednisolona)

i
MTC Mastocitoma
OD Olho direito
OMS Organização Mundial de Saúde
PAF Punção por agulha fina
PARR PCR for antigen receptor rearrangement
PCR Polymerase chain reaction
PO Via oral
RC Remissão completa
RM Ressonância magnética
ROSE Rapid on-site evaluation
RT Radioterapia
SC Via subcutânea
SCCED Defeito epitelial corneal espontâneo crónico
SID Uma vez ao dia
TC Tomografia computadorizada
TID Três vezes ao dia
TMS Tempo médio de sobrevida
TRC Tempo de repleção capilar

ii
1. A citologia na prática clínica
1.1. Importância da citologia

A citologia tem-se tornado num importante método auxiliar de diagnóstico na prática


clínica ao longo dos anos. A citologia diagnóstica dedica-se ao estudo das células, sendo
útil na diferenciação de células normais, neoplásicas e inflamatórias. Quando comparada
com a histopatologia, a citologia tem inúmeras vantagens pois, para além de ser um método
rápido, simples, pouco invasivo e de baixo custo, baseia-se na obtenção de amostras sem
recorrer a sedação ou anestesia. Outro motivo que torna a citologia única é o facto de
poder fornecer informação útil enquanto o animal ainda está na clínica [1]. Em muitos casos
um diagnóstico definitivo pode ser feito e quando este não é possível, as informações
fornecidas pela citologia (por exemplo, a distinção entre inflamação versus neoplasia) vão
ser úteis na escolha dos testes adicionais para se chegar a um diagnóstico definitivo (por
exemplo, cultura versus histopatologia) [1, 2]. A crescente disponibilidade de técnicas de
imagem avançadas, tem gerado uma maior procura pela análise citológica para a avaliação
de lesões focais de órgãos internos. Com o aumento do uso desta modalidade de
diagnóstico na veterinária, o espectro de patologias que podem ser identificadas pela
citologia tem vindo a ser ampliado, assim como tem crescido a precisão dos diagnósticos
emitidos [2]. Para além disso, em vez de serem simplesmente arquivadas, as lâminas de
citologia podem ser uma fonte valiosa para a realização de técnicas auxiliares de
diagnóstico como a imunocitoquímica e técnicas moleculares [3]. Apesar de todas estas
vantagens, a citologia não deve ser considerada como um substituto em relação ao exame
histopatológico. A histopatologia tem uma maior probabilidade de fornecer um diagnóstico
definitivo e, dado que a biopsia mantém preservada a arquitetura do tecido, a obtenção do
grau e classificação do tumor é geralmente possível. Estes dois métodos de diagnóstico
complementam-se um ao outro [2] .
O valor diagnóstico das amostras citológicas depende de um binómio, por um lado
a experiência de quem observa as preparações, e por outro a qualidade das amostras é,
também ela, determinante para obter um diagnóstico. Esta qualidade está muito
relacionada com a experiência do operador na obtenção de amostras [2, 4]. Não obstante,
a obtenção e preparação de amostras citológicas é definitivamente uma destreza adquirida
através da experiência e o aperfeiçoamento da técnica resulta de uma aprendizagem de
acordo com os resultados obtidos. Muitos médicos veterinários (e tutores) ficam
compreensivelmente frustrados quando uma amostra enviada para análise é determinada
como não diagnóstica. Felizmente, a compreensão dos princípios básicos da colheita das
amostras e a familiaridade com os erros mais comuns relacionadas à sua preparação

1
podem aumentar as chances de um resultado diagnóstico [2]. O rapid on-site evaluation
(ROSE) é um método que pode ser aplicado na prática clínica antes do envio das amostras
para o laboratório, reduzindo as taxas de resultados inconclusivos. Para isso, o profissional
responsável pela sua execução deve ser capaz de determinar se o material é
representativo da lesão, ou seja, se a lesão foi alcançada e se existe quantidade suficiente
para permitir um diagnóstico [5].

1.2. Métodos de colheita e preparação das amostras

Existem vários métodos para a colheita de amostras citológicas. A punção por


agulha fina (PAF) é um método de recolha de material que pode ser realizada com uma
agulha e seringa padrão, com ou sem aspiração, sendo considerada como o método de
eleição para qualquer massa cutânea ou lesão interna. Este método permite a colheita de
células, tipicamente bem preservadas, dentro da lesão evitando a presença de
contaminantes. É considerada a única técnica prática para a amostragem de órgãos e
massas subcutâneas ou internas. As amostras por PAF são recolhidas com uma agulha de
calibre 22 a 25G e uma seringa de 2 a 5 ml [4]. Raramente se utilizam agulhas com um
calibre superior a 22G, para além de que o seu uso tende a causar uma maior
contaminação com sangue (hemodiluição da amostra). Para lesões mais profundas dentro
da cavidade corporal o uso de agulhas mais longas pode ser necessário. Neste caso, é
comum o aparecimento de células mesoteliais das superfícies serosas, que são aspiradas
devido à passagem por órgãos não-alvo. Isto pode ser evitado através do uso de uma
agulha com estilete onde este só é removido após a agulha penetrar na lesão alvo [2].
Relativamente à capacidade da seringa, esta é apenas tida em conta quando se utiliza a
PAF com aspiração, sendo influenciada pela consistência do tecido. Para tecidos mais
moles [por exemplo, linfonodos (LNs)] utiliza-se uma seringa de 3 ml e para tecidos mais
firmes (por exemplo, fibromas) é necessário manter uma maior pressão negativa, sendo
conseguida através do uso de uma seringa maior. A preparação do local de aspiração
também é um fator importante pois se a amostra for destinada a testes microbiológicos
deve ser realizada uma assepsia do local. Deve-se ter cuidado quando se realiza a recolha
de amostras ecoguiadas substituindo o gel pelo álcool como meio de contato [2]. Na PAF
usando a técnica capilar, ou seja, sem aspiração é possível obter amostras de igual ou
melhor qualidade em comparação com a técnica anterior. Esta técnica funciona bem,
especialmente em lesões muito vascularizadas. O cilindro da seringa deve ser preenchido
com ar antes da colheita do material para permitir a sua rápida expulsão para a lâmina de
vidro. A massa deve ser estabilizada com a mão livre e a agulha é inserida realizando-se
movimentos para a frente e para trás sem sair da lesão. Posteriormente a agulha é retirada

2
do tecido expelindo-se rapidamente o material para uma lâmina limpa para fazer o
esfregaço. Na técnica com aspiração o princípio é semelhante, mas neste caso a agulha é
introduzida com a seringa acoplada aplicando-se pressão negativa tendo o cuidado para
nunca sair da lesão enquanto esta estiver a ser aplicada. Se possível, o ideal é tentar
realizar várias colheitas de material de vários locais dentro da massa, corar e examinar
uma ou duas lâminas para garantir que a amostra é adequada [2, 4]. Em amostras de várias
massas, ou no caso de tentativas adicionais da mesma lesão, deve-se trocar sempre a
agulha e cada lâmina deve ser claramente identificada [2].
Para a preparação de esfregaços a técnica mais utilizada é a slide-over-slide
(“squash”). Neste caso, o material recolhido é colocado perto de uma extremidade de uma
lâmina de vidro (lâmina de esfregaço). Uma segunda lâmina de vidro (lâmina de
espalhamento) é colocada sobre a amostra, perpendicularmente. O espalhamento ocorre
pelo deslizamento de uma lâmina sobre a outra, tendo cuidado para não exercer
demasiada pressão (especialmente em tecidos mais frágeis como os linfonodos). Depois
de espalhado, o material é seco ao ar. Se corretamente realizado, o esfregaço deve ter
uma “forma de chama” sem que este se estenda até a borda da lâmina [1, 2]. Nos casos
onde se obtêm amostras com conteúdo mais fluído, a técnica do esfregaço de sangue pode
ser usada. Neste caso, a lâmina de espalhamento é inclinada num ângulo de 45º em
relação à lâmina de esfregaço, deslizando suavemente e levando o material [1, 2].
As amostras de fluídos podem resultar de lavagens (e.g., lavagem broncoalveolar
ou transtraqueal) ou paracenteses (aspiração de fluido de cavidade corporal). Após a
recolha, a amostra deve ser colocada em tubos com Ethylenediamine tetraacetic acid
(EDTA). Os esfregaços devem ser preparados diretamente a partir de fluido fresco bem
misturado ou do sedimento de uma amostra centrifugada. Podem também ser usados os
esfregaços em linha (para amostras de baixa celularidade), no sentido de concentrar as
células [1, 2]. Deve-se ter especial atenção para não deixar a amostra coagular ou secar
(por exemplo, ao expelir o material demasiado distante da lâmina) e evitar sempre os
esfregaços muito espessos [2].
Depois de secas ao ar, as amostras são coradas. Habitualmente usam-se os
corantes tipo Romanowsky (coloração de Wright, Giemsa ou Diff-Quik). Se o clínico não
for avaliar as lâminas na clínica, deverá garantir que cheguem intactas ao laboratório [2].

2. Casos Clínicos
2.1. Caso clínico nº1: Linfoma multicêntrico canino

Identificação do animal: Rufo, cão de raça Spinone Italiano, macho castrado com
8 anos e 21,4 Kg. Motivo da consulta: Diarreia com 7 dias de evolução, inapetência e

3
perda de peso. Anamnese e história clínica: Há 2 dias os tutores referem que teve uma
espécie de desmaio, que parecia sem folego, mas que passado uns minutos voltou ao seu
estado normal. O Rufo vivia em Roma, numa casa com acesso ao exterior privado e público
sem coabitantes animais. Era alimentado com ração seca (Hill´s) e tinha livre acesso a
água. Estava devidamente vacinado (raiva, esgana, parvovirose, hepatite infeciosa canina,
leptospirose e parainfluenza) e desparasitado interna e externamente. Sem passado
médico e cirúrgico relevante a não ser a orquiectomia que realizou quando tinha cerca de
1 ano. Exame de estado geral e dirigido: Estado mental normal e temperamento nervoso.
As mucosas apresentavam-se ligeiramente pálidas, húmidas e com tempo de repleção
capilar (TRC) <2 segundos. Grau de desidratação <5%, condição corporal de 4/9, pulso
débil e movimentos respiratórios aumentados com frequências de 100 ppm e de 40 rpm,
respetivamente e hipertérmico (39,3°C). Na inspeção dos linfonodos verificou-se uma
linfadenomegalia generalizada nomeadamente nos poplíteos (direito 4cm por 5cm e
esquerdo com 3,5cm por 4cm) que se apresentavam móveis, firmes e indolores à palpação.
À palpação abdominal, o abdómen encontrava-se rígido, distendido e doloroso no
quadrante medio-cranial. Restante exame físico sem alterações. Lista de problemas:
Diarreia, inapetência, linfadenomagalia generalizada, distensão e dor abdominal, mucosas
pálidas, perda de peso e taquipneia. Diagnósticos diferenciais: Neoplasia primária
(linfoma, mieloma múltiplo, mastocitoma, leucemia, histiocitose maligna), hiperplasia
reativa dos linfonodos, linfadenite devido a infeções supurativas, eosinofílicas, histiocíticas
e/ou piogranulomatosas, infeções disseminadas, como por bactérias, vírus, rickettsias
(Ehrlichia sp.), parasitas (Toxoplasma sp., Leishmania sp.), fungos (Blastomyces e
Histoplasma sp.), doenças imunomediadas (pênfigos, lúpus, poliartrite, vasculite,
dermatopatia), metástases (carcinoma, sarcoma, melanoma, mastocitoma). Exames
complementares: 1) Hemograma: anemia normocítica normocrómica (30,5% [37,1 – 57,0

%]), linfopenia (0,54x103/ul [1,3 - 4,1x103/ul]), e trombocitopenia (confirmada em

esfregaço) (33x103/ul [143 – 440x103/ul]); 2) Bioquímica sanguínea: sem alterações no


perfil renal e hepático. 3) Provas de Coagulação: sem alterações; 4) Radiografia torácica e
abdominal: a nível torácico apresentava um padrão brônquico e os linfonodos
traqueobrônquicos aumentados (Anexo A, figura 1 (A)), no abdómen havia perda de
detalhe abdominal e presença de massa (Anexo A, figura 1 (B)). 5) Ecografia abdominal:
Esplenomegalia acentuada, com um padrão heterogéneo observando-se na porção caudal
do órgão, uma protuberância com aparência nodular com 4cm de diâmetro e com eco-
estrutura do tipo complexo causando deformação do perfil do órgão. Hepatomegalia
discreta com presença de 3 três estruturas nodulares hiperecóicas com margens definidas

4
na porção dos segmentos hepáticos esquerdos. Linfadenomegalia (linfonodo portal
esquerdo, mediastinais esternais e craniais); 6) Ecocardio: Sem alterações; 7) Citologia do
linfonodo poplíteo esquerdo: Compatível com linfoma de grandes células. (Anexo A, figura
2). Diagnóstico presuntivo: Linfoma multicêntrico (LMC) em estadio IVb. Tratamento e
evolução: O Rufo esteve internado no hospital durante quatro dias (D1 – D4). No primeiro
dia de internamento (D1) fez fluidoterapia com lactato de Ringer (2 ml/kg/h), analgesia com
metadona (0,1 mg/kg, q5h, IM) e dipirona (10 mg/kg, BID, EM), antibioterapia com
ampicilina (20 mg/kg, TID, EV), antifibrinolítico com ácido tranexâmico (15 mg/kg, TID, EV)
e suplementado com vitamina B12 (1 mg/kg, BID, EV) e vitamina C (1 mg/kg, SID, EV). Ao
final do dia apresentou dois episódios de vómito adicionando-se à terapia anterior
maropitant (1mg/kg, SID, EV). No segundo dia (D2) foi submetido a uma esplenectomia de
urgência. Antes da esplenectomia foi realizada uma transfusão sanguínea. A cirurgia
decorreu sem complicações e o baço foi enviado para histopatologia, com realização de
imunohistoquímica (IHQ) (Anexo A, tabela 1). Também foi realizada intraoperatoriamente
uma PAF das lesões hepáticas para avaliação citológica, que foi compatível com quadro
de proliferação de clone linfoide neoplásico. No período pós-cirúrgico (D3 e D4) foi
adicionado à terapia anterior vitamina K (2,5 mg/kg, EV, BID) e maltodextrina fermentada
(2 comprimidos, PO, BID). Durante o internamento não se verificou nenhuma alteração nos
exames físicos e ao final do terceiro dia (D3) o Rufo começou a ganhar apetite. Nos
hemogramas de controlo do pós-cirúrgico verificou-se uma melhoria da anemia e
trombocitopenia, que no dia da alta clínica já se encontravam dentro do intervalo de
referência. Ao fim do quarto dia (D4) teve alta, tendo sido receitado antibioterapia com
amoxicilina e ácido clavulânico (12,5 mg/kg, PO, BID) durante 6 dias, e florentero ACT (1
comprimido, PO, BID) durante 5 dias, a avaliar com base na evolução clínica. Foi marcada
consulta de reavaliação passado 4 dias e consulta para remoção de sutura passado 12
dias, salvo complicações. Acompanhamento: Na consulta de reavaliação, a zona de
incisão encontrava-se limpa e não havia sinais de deiscência. Na semana seguinte, foram
removidos os pontos dada a boa cicatrização e, uma vez que se tratava de um linfoma B
de células grandes num estadio já avançado, foi agendada uma consulta com a oncologista
nessa mesma semana onde iniciou o primeiro ciclo de quimioterapia. O protocolo
selecionado foi CHOP (Ciclofosfamida, Doxorrubicina, Vincristina, Prednisolona)
modificado da Universidade Wisconsin-Madison para o tratamento de linfoma canino
durante 19 semanas. A cada semana o Rufo era acompanhado através de exames
hematológicos e bioquímicos prévios à administração dos quimioterápicos. Foi possível
acompanhar o tratamento até à 12ª semana. O acompanhamento e o protocolo de
quimioterapia estão esquematizados no Anexo A, tabela 2. Prognóstico: Como o Rufo já

5
se encontrava num estadio bastante avançado o prognóstico foi considerado como muito
reservado. Discussão: O linfoma (linfoma maligno ou linfossarcoma) corresponde a um
grupo diverso de neoplasias que têm origem no sistema linfoide. Pode surgir em quase
todos os tecidos do corpo podendo também afetar o baço, fígado e/ou medula óssea [6].
Representa aproximadamente 7% a 24% de todas as neoplasias caninas e 83% de todas
as neoplasias hematopoiéticas caninas [6]. É considerada a neoplasia mais
frequentemente tratada em cães e a sua incidência anual foi estimada entre 13 a 24 casos
por 100.000 cães. O linfoma não Hodgkin (LNH) em pessoas e o linfoma canino são
doenças similares e podem constituir bons modelos para a comparação das suas
evoluções. Em ambas as espécies, o subtipo mais comum é o Linfoma difuso de grandes
células B (LDGCB) [7]. Apesar de poder afetar animais de qualquer idade, os cães de meia-
idade a idosos, com idades compreendidas entre os 6 e os 9 anos, parecem ser mais
afetados [6, 8, 9]. Embora o sexo não seja considerado um fator de risco importante, as
fêmeas inteiras parecem ter um risco mais reduzido para o linfoma [10]. O Rufo não fazia
parte das raças mais frequentemente afetadas entre as quais se destacam o Labrador
Retriever, Boxer, Pastor Alemão, Golden Retriever, Rottweiler, Pastor de Berna, Doberman,
Cocker Spaniel e Beagle [11]. A etiologia do linfoma canino é multifatorial e em grande parte
desconhecida. Contudo, fatores genéticos e moleculares (anomalias cromossómicas),
infeciosos (podendo estar associado a um retrovírus), ambientais (residência em áreas
industriais, uso de herbicidas, tintas ou solventes e exposição a campos magnéticos fortes),
imunológicos (trombocitopenia imunomediada) e atopias (associadas ao linfoma cutâneo)
podem estar relacionadas com a probabilidade da sua ocorrência [6, 9, 12]. Vários sistemas
histológicos têm sido usados para classificar o LNH em humanos e alguns deles têm sido
aplicados ao linfoma canino. A classificação histológica do linfoma segue atualmente o
sistema da Organização Mundial de Saúde (OMS), que incorpora critérios anatómicos,
morfológicos (citologia e histologia) e imunofenotípicos (células B e T). Este sistema de
classificação, teoricamente, deve ajudar numa melhor adaptação dos protocolos de
tratamento e numa melhor correlação do prognóstico com subtipo [6, 8]. As formas
anatómicas mais comuns do linfoma, por ordem decrescente de ocorrência, são:
multicêntrica, gastrointestinal (GI), mediastinal e cutâneo. Mais de 80% dos animais que
são diagnosticados com linfoma apresentam a forma multicêntrica, caracterizada pela
presença de linfademegalia [6, 8] como se verificou no Rufo quando deu entrada no CVS.
A forma GI é menos comum, representando cerca de 5% a 7% dos casos e pode ocorrer
localmente ou sob a forma generalizada, que representa a forma mais comum do linfoma
GI, afetando múltiplos segmentos da mucosa intestinal. Está descrito que o linfoma GI tem
maioritariamente origem em células T e está frequentemente associado a epiteliotropismo.

6
O Boxer e o Shar-pei estão entre as raças mais predispostas ao desenvolvimento desta
neoplasia [6, 8]. A forma mediastinal representa cerca de 5% e é caraterizada pela
linfadenomegalia (linfonodos mediastinais craniais) e/ou o timo [6, 8]. O linfoma cutâneo,
que está entre as formas menos comuns, sendo tipicamente de células T e pode ser
classificado como epiteliotrópico (micose fungóide) ou não-epiteliotrópico [6, 8]. Dentro das
formas atípicas de linfoma a forma hepatoesplénica é a mais comum [6]. A classificação
citológica e histológica do linfoma baseia-se nas características morfológicas das células
tumorais, podendo ser classificado em baixo grau (composto por células pequenas, com
baixo índice mitótico), grau intermédio ou alto grau (composto por células grandes,
centroblásticas, com alto índice mitótico) [6]. Comparativamente com os de baixo grau, os
de alto grau apresentam uma progressão rápida e uma melhor resposta à quimioterapia.
No entanto, estão associados a tempos médios de sobrevivência (TMS) mais curtos. A PAF
costuma ser suficiente para estabelecer o diagnóstico de linfoma em cães e gatos [12]. Os
linfócitos grandes são células frequentemente maiores que os neutrófilos, com núcleos
aumentados, normalmente com o dobro do diâmetro das hemácias ou mais, com cromatina
dispersa e menos basófila que a dos linfócitos pequenos. O citoplasma é mais abundante,
por vezes visível ao redor de toda a circunferência do núcleo e intensamente basófilo.
Nucléolos proeminentes são frequentes e podem ser observados nucléolos múltiplos.
Quando células com estas caraterísticas representam mais de 50% das células num
esfregaço de tecido linfoide, com elevada celularidade e contendo principalmente células
intactas, pode ser feito um diagnóstico de linfoma com segurança [12]. Para além do
supracitado, é frequente observar-se numerosos pequenos fragmentos basófilos de
citoplasma entre as células, com tamanhos diferentes, que se denominam de corpos
linfoglandulares. Os núcleos nus, são núcleos de células que foram rompidas durante a
preparação do esfregaço, devendo-se ter cuidado na realização do esfregaço pois as
células linfoides (particularmente as grandes), são células frágeis e facilmente rompidas
durante a preparação da lâmina [12]. Já foi descrito que o índice mitótico na análise
citológica pode ajudar na distinção dos cães com prognóstico significativamente pior [13].
Todos estes achados foram encontrados na citologia do linfonodo poplíteo do Rufo (Anexo
A, figura 2), sendo compatível com um linfoma de elevado grau. No entanto, não foi feita
qualquer referência quanto índice mitótico no relatório. Relativamente ao imunofenótipo,
este pode ser de células B ou T. Esta caracterização é feita através de IHQ usando
marcadores específicos como o CD79a, para as células B, e o CD3 para as células T [6].
Os linfomas de células B estão associados a maiores taxas de resposta à quimioterapia,
períodos de remissão completa (RC) e tempo médio de sobrevida (TMS) que os de células
T [6]. Os sinais clínicos associados ao linfoma são inespecíficos e dependem da localização

7
do tumor. Como foi referido anteriormente, no LMC a linfadenomegalia generalizada não
dolorosa é o sintoma mais comum. A maioria dos cães com LMC não apresenta sinais
sistémicos. Os sinais clínicos mais frequentes compreendem a anorexia, perda de peso,
vómito, diarreia, ascite, dispneia, febre, polidipsia e poliúria. De referir que estes dois
últimos estão associados a hipercalcemia, que é frequentemente observada nos linfomas
T [6, 8, 9]. O Rufo, para além da linfadenomegalia generalizada, apresentava alguns dos
sinais de doença sistémica. Pode também surgir edema subcutâneo e tosse, associados a
alterações na drenagem linfática ou compressão das vias respiratórias devido à
linfadenomegalia, alterações oculares (uveíte anterior, hifema, infiltrados), alterações ao
nível da medula óssea, pele, rins e sistema nervoso central [6, 8, 9]. Estas alterações não
foram verificadas no caso do Rufo. No entanto, não se pode excluir o envolvimento da
medula óssea, pois não foram realizados exames citológicos para descartar este
envolvimento. Sendo assim, perante o quadro que o Rufo apresentava, foram considerados
alguns diagnósticos diferenciais. Ainda assim, os exames complementares foram
direcionados para a principal suspeita, que era o linfoma. Para cães com esta suspeita, a
avaliação diagnóstica deve incluir um exame físico completo, hemograma, perfil bioquímico
e urianálise. A realização de biópsia ou citologia (ou ambos) é essencial para um
diagnóstico definitivo. A anemia é a anomalia sanguínea mais comum nos casos de linfoma,
logo seguida pela trombocitopenia [6] e o Rufo apresentava ambas. O perfil bioquímico
pode refletir a localização anatómica envolvida ou síndromes paraneoplásicas (como a
hipercalcémia) e alterações da função renal, que no caso do Rufo estavam normais [6].
Ainda assim, não foi realizada urianálise no caso do Rufo. Após estabelecido o diagnóstico
de linfoma deve-se proceder ao seu estadiamento, realizado com base nas guidelines
estabelecidas para a classificação de doenças neoplásicas dos tecidos linfoides pela WHO
que inclui o estadios de I a V (para incluir a localização anatómica) e os subestadios a) ou
b). No estadio I o envolvimento é limitado a um único linfonodo ou tecido linfoide em um
único órgão/excluindo a medula óssea, no II há um envolvimento de vários linfonodos numa
área regional, no III existe um envolvimento generalizado dos linfonodos, no IV existe
envolvimento do baço ou fígado (+/- estadio III) e no V já se verificam manifestação no
sangue e envolvimento da medula óssea e/ou outros órgãos. Quanto ao subestadio o a) é
atribuído na ausência de sinais sistémicos e o b) quando há presença de sinais sistémicos.
Mais de 80% dos cães diagnosticados com LMC já se apresentam em estadios avançados
(III a V) [6, 8]. Para determinar a extensão do envolvimento interno devem ser realizadas
radiografias torácicas e abdominais, ecografias abdominais (acompanhadas ou não de PAF
ou biópsia de fígado, baço ou linfonodos mesentéricos) e citologia ou biópsia de medula
óssea. Para a caracterização do linfoma, podem ser usadas técnicas de diagnóstico

8
avançadas como a IHQ, a imunocitoquímica, a citometria de fluxo ou o Polymerase chain
reaction (PCR). Existem casos onde, mesmo com biópsia, pode ser difícil a distinção entre
uma inflamação crónica e um linfoma. O PCR for antigen receptor rearrangement (PARR)
é uma técnica de diagnóstico molecular particularmente útil nestas situações pois permite
a distinção entre linfócitos monoclonais de um linfoma de linfócitos policlonais de uma
inflamação crónica [6, 8]. Na radiografia torácica, 60% a 75% dos cães com LMC
apresentam alterações, com cerca de dois terços apresentando linfadenopatia torácica [6],
como também foi verificado no Rufo. As radiografias abdominais revelam muitas vezes
envolvimento dos LNs ilíacos mediais (sublombares) e/ou mesentéricos, baço ou fígado
em aproximadamente 50% dos casos [6]. Na radiografia abdominal do Rufo, como havia
perda de detalhe abdominal, não foi possível detetar o envolvimento de outras estruturas,
a não ser uma massa abdominal, possivelmente de origem esplénica. No entanto, para os
casos típicos de LMC, a imagem pode ser limitada apenas a radiografias torácicas, pois
não há diferença prognóstica entre cães com doença em estágio III e IV (isto é,
envolvimento do fígado/baço). A linfadenopatia mediastinal cranial possui importância
prognóstica [6].
Foi realizada uma ecografia abdominal para determinar com melhor segurança o
envolvimento abdominal e verificou-se que havia um envolvimento hepatoesplénico, depois
confirmado através de citologia do fígado e histopatologia de baço, e dos LNs. A
ecocardiografia foi realizada para descartar a presença de doenças cardíacas, pois a
doxorrubicina (DOX), um dos fármacos usados no protocolo quimioterápico do linfoma,
possui cardiotoxicidade [6]. A realização de uma punção de medula óssea ou biópsia de
medula (do úmero proximal ou da crista ilíaca) é recomendada para o estadiamento e
prognóstico completos e pode ser indicado em cães com anemia, linfocitose, linfócitos
atípicos circulantes ou outras citopenias periféricas [6]. Porém, esta não foi realizada no
caso do Rufo. Relativamente ao tratamento, como o linfoma é caraterizado por ser uma
doença sistémica, os melhores resultados são obtidos através de um tratamento sistémico
como é o caso da quimioterapia. O benefício da remoção cirúrgica do baço em cães com
esplenomegalia acentuada permanece incerto, exceto para linfomas indolentes confinados
ao baço. Posto isto, um estadiamento cuidadoso é necessário para descartar o
envolvimento multicêntrico antes de se tratar uma condição local [6]. Apesar de estar
teoricamente contraindicado, o Rufo foi submetido a uma esplenectomia de urgência no
dia D2 com o intuito de aliviar os sinais associados ao hiperesplenismo. É importante referir
que a realização de esplenectomia em casos de linfoma já foi estudada. Num estudo com
16 cães com linfoma e esplenomegalia marcada, como era o caso do Rufo, nas 6 semanas
seguintes à esplenectomia, 1/3 dos cães morreram devido a coagulação intravascular

9
disseminada (CID) e sepsis. Os 2/3 restantes tiveram RC e 7 tiveram um TMS de 14 meses.
É importante destacar que as alterações hematológicas mas frequentemente associadas a
LMC, anemia e trombocitopenia, foram revertidas em todos os cães que sobreviveram ao
período pós-operatório inicial [14]. O mesmo se verificou no Rufo logo no 1º dia após a
cirurgia. No LMC, o protocolo mais usado atualmente é o que combina os agentes
quimioterápicos múltiplos (protocolo CHOP) tem uma taxa de resposta de 80-90%, com
períodos de RC de 8 meses e TMS de cerca de 12 meses [6]. A duração do protocolo CHOP
pode variar (19 ou 25 semanas) e no caso do Rufo foi selecionado o protocolo de 19
semanas (Anexo A, tabela 2). Nos dois protocolos, os agentes são distribuídos por 4 ciclos
de tratamento semelhantes. O Rufo teve um episódio de neutropenia depois da 1ª
administração de ciclofosfamida e a administração do fármaco seguinte foi realizada
apenas quando o animal apresentou os valores normais. Foi possível acompanhar o Rufo
até à 12ª semana de tratamento e não foi verificada mais nenhuma alteração hematológica.
Passado aproximadamente um mês e meio, a doença entrou em RC. Ao longo do
tratamento, o Rufo manteve o apetite e aumentou o seu peso corporal (até à 12ª semana
aumentou de peso 4,5kg). No final das 19 semanas, a quimioterapia é descontinuada
sempre que o animal estiver em RC e a partir daí deve-se realizar uma reavaliação mensal,
com registos das medições dos LNs. A remissão consiste na resolução dos sinais clínicos,
das alterações laboratoriais e das alterações observadas ao exame físico [6], [8]. Como
protocolos alternativos, quando os tutores não pretendem seguir com quimioterapia
sistémica tão agressiva ou dispendiosa, os protocolos de agente único, DOX (30 mg/m2
IV, a cada 3 semanas, num total de 5 tratamentos, juntamente com o tratamento de 4
semanas com prednisolona), são uma hipótese. No entanto, estão associados a menores
períodos de RC e taxa de resposta. Caso se pretenda apenas o uso de terapia oral, pode
usar-se lomustina (70 mg/m2 PO, cada 3 semanas, 5 tratamentos) e prednisolona. Se os
tutores recusarem a quimioterapia, a única alternativa será a prednisolona (2 mg/Kg PO,
SID), tendo remissões de apenas 1 a 2 meses [6]. A maioria dos animais que atingiram a
RC acabam por ter recaídas. Isto acontece porque surgem clones tumorais mais
resistentes à quimioterapia do que o tumor original, denominados de clones multidrug
resistance (MDR), que já eram inicialmente resistentes ou que se tornaram resistentes
após a exposição a agentes quimioterápicos selecionados [6]. Na primeira recorrência do
linfoma, deve tentar-se uma reindução com o mesmo protocolo utilizado na indução, desde
que a recorrência tenha ocorrido, pelo menos, há mais de 2 meses após o término do
protocolo inicial. Geralmente, a duração da remissão na reindução corresponde a metade
da alcançado com a 1ª terapia, alcançando resultados positivos em 80-90% dos animais
[6]. Nos casos em que a reindução não resulta ou caso o animal não responda ao protocolo

10
usado na indução, pode tentar-se usar os chamados agentes ou protocolos
quimioterápicos de “resgate”. Podem ser usados como agente único ou em combinação,
não sendo encontrados nos protocolos CHOP padrão. Os protocolos de resgate mais
comuns em cães incluem o uso de um agente único ou uma combinação de rabacfosadina,
actinomicina D, mitoxantrona, DOX (se a DOX não fizer parte do protocolo de indução
inicial), dacarbazina, temozolomida, lomustina, l-asparaginase, mecloretamina, vincristina,
vinblastina, procarbazina, prednisona e etoposido. As taxas de resposta variam de 40 a
90%, mas a duração da remissão é de apenas 1,5 a 2,5 meses [6]. Apesar de o linfoma
multicêntrico ter um prognóstico reservado e ser considerado fatal, independentemente do
tratamento, a sua evolução depende de diversos fatores. Embora estejam descritos
diversos fatores de prognóstico, a ausência ou presença de sintomatologia clínica
(subestadio) e o imunofenótipo (linfoma B ou T) parecem ser os que apresentam um valor
de prognóstico mais consistente [6]. No caso do Rufo, quando foi efetuado o seu
diagnóstico, o animal já apresentava sintomatologia sistémica não sendo favorável para o
seu prognóstico. Porém, foi diagnosticado com um linfoma difuso de grandes células B
(LDGCB) que apresenta, comparativamente ao T, uma melhor resposta à quimioterapia e
um maior TMS. É importante enfatizar que o TMS de um animal sem quimioterapia
corresponde a 4 a 6 semanas. Com protocolos de quimioterapia com múltiplos agentes é
possível alcançar taxas de RC em mais de 80% dos casos e o TMS pode aumentar para
os 6 a 12 meses. Em cerca de 10% dos casos pode, inclusivamente, chegar aos 2 anos ou
mais após início da terapia [15].

2.2. Caso clínico nº2: Melanoma oral

Identificação do animal: Tobia, cão de raça Jack Russel, macho castrado, com 11
anos e 6kg. Motivo da consulta: Perda parcial de apetite e episódios de sangramento oral
com 15 dias de evolução. Anamnese e história clínica: O Tobia era seguido numa clínica
da sua área de residência, onde já lhe havia sido prescrito prednisolona 5mg (0,25 mg/kg,
PO, SID). O tutor mencionou perda de peso, halitose e que, por vezes, ao respirar fazia um
“ronco”. Como o Tobia apresentava relutância e desconforto marcado ao exame da
cavidade oral, foi referido para o CVS para uma investigação mais detalhada do quadro
clínico. No dia anterior ao da consulta no CVS foi-lhe administrado carprofeno 25mg (PO,
SID). O Tobia vivia nos arredores de Roma, num apartamento com acesso limitado ao
exterior público. Coabitava com um gato devidamente vacinado e desparasitado. Era
alimentado com ração seca e húmida adequada e tinha livre acesso à água. Estava
devidamente vacinado (raiva, esgana, parvovirose, hepatite infeciosa canina, leptospirose
e parainfluenza) e desparasitado interna e externamente. Sem passado médico e cirúrgico

11
relevante além da orquiectomia. Exame do estado geral: Estado mental normal e
temperamento nervoso. Mucosas rosa, brilhantes e húmidas com TRC <2 segundos. Grau
de desidratação <5%, temperatura corporal de 38,1ºC, condição corporal 5/9. Pulso e
movimentos respiratórios normais com frequências de 115ppm e 23 rpm. Auscultação
cardiorrespiratória sem alterações e LNs normais. Apresentava desconforto à palpação
abdominal. Como o Tobia mostrava grande desconforto à inspeção da cavidade oral, foi
anestesiado para se poder proceder à sua inspeção com maior detalhe. Observou-se uma
neoformação palatofaríngea à esquerda, sólida, multilobada, escura, com cerca de 3 x 2,5
cm (Anexo B, figura 1). Realizou-se uma PAF da massa para avaliação citológica. Lista
de problemas: hiporexia, perda de peso, sangramento da cavidade oral, halitose, estridor
respiratório, desconforto abdominal e neoformação oral. Diagnósticos diferenciais:
Melanoma, outras neoplasias da cavidade oral (malignas: carcinoma de células
escamosas, fibrossarcoma, osteossarcoma; benignas: ameloblastoma acantomatoso,
fibroma odontogénico periférico e papilomatose oral), epúlide, hiperplasia gengival,
abcesso. Exames complementares: 1) hemograma e bioquímica sanguínea: hemograma
e perfil renal e hepático sem alterações; 2) PAF da massa oral: Quadro citológico
compatível com melanoma maligno escassamente pigmentado (amelanótico) (Anexo II,
figura 2); 3) Ecografia abdominal e torácica: Abdómen sem alterações. A nível torácico
observam-se lesões sub-pleurais nodulares múltiplas, bilaterais, com um diâmetro máximo
de 0,5 cm (Anexo B, figura 3A); 4) Radiografia torácica 2 projeções [dorso-ventral (DV) e
latero-lateral direita (LL)]: Padrão broncoalveolar moderado associado à presença de
nódulos multifocais de dimensões variáveis compatíveis com metástases pulmonares
(Anexo B, figura 3B e 3C). Diagnóstico presuntivo: Melanoma maligno (MM)
amelanótico grau IV. Tratamento e evolução: O Tobia ficou internado com fluidoterapia
(lactato de Ringer, 2 ml/kg/h). Teve alta ao final do dia tendo sido receitado antibioterapia
com amoxicilina e ácido clavulânico (12,5mg/kg, SC, BID) durante 10 dias, protetor gástrico
com ranitidina (2 mg/kg, PO, BID) e anti-inflamatório com dexametasona (0,10 mg/kg, SC,
SID). Acompanhamento: Foi agendada uma consulta com a oncologista para dois dias
após a alta hospitalar. Nesse dia os tutores mencionaram que o apetite do Tobia tinha
melhorado (comia apenas comida húmida misturada com água). Neste caso, estipular um
tratamento era algo difícil, pois a sua localização não era favorável e já se encontrava num
estadio bastante avançado. Sendo assim, foi explicada a gravidade da condição, no sentido
de prosseguir para tratamento paliativo. À terapia sintomática prescrita anteriormente foi
receitado, um canabinóide 3% (tópico, 3 gotas, SID) para controlo da dor e para um maior
conforto. Na semana seguinte, o Tobia deu entrada no serviço de urgência do CVS
gravemente dispneico, verificando-se que a massa havia aumentado consideravelmente

12
de volume provocando obstrução das vias respiratórias. Os tutores optaram pela eutanásia,
não tendo sido realizada necropsia. Prognostico: Devido ao facto de o MM ser uma
neoplasia bastante agressiva, estar localizado numa zona inoperável e de já haver
metástases pulmonares, foi explicado aos tutores que o prognóstico do Tobia era muito
reservado. Discussão: Os melanomas são neoplasias malignas com origem nos
melanócitos. Estes são classificados em dois tipos: melanóticos e amelanóticos. Estudos
sugerem que os melanomas orais melanóticos e amelanóticos apresentam diferentes
comportamentos biológicos, estando os primeiros associados a um maior grau de
agressividade [16]. Os locais mais comuns para a localização desta neoplasia são a
cavidade oral (gengivas, língua, palato e faringe) e as junções mucocutâneas (lábios),
podendo também surgir nos dígitos, na pele (tronco, pálpebras, escroto e cabeça) e nos
olhos, menos frequentemente [17]. A maioria dos melanomas cutâneos apresentam um
comportamento benigno contrariamente aos localizados na cavidade oral que, geralmente,
são altamente malignos com elevada probabilidade de invasão local (ossos) verificada em
cerca de 57% das lesões [12]. Os locais metastáticos são numerosos, incluindo LNs,
pulmões, fígado, meninges e glândulas adrenais. Dentro das raças mais frequentemente
diagnosticadas, destacam-se o Scottish Terrier, Golden Retriever, Chow Chow, Poodle e
Dachshund. Animais com a cavidade oral fortemente pigmentada e mais velhos (a partir
dos 9 anos) parecem apresentar uma maior probabilidade para o aparecimento do
melanoma oral. Não parece haver predisposição em relação ao sexo [17]. O Tobia, apesar
de não estar entre as raças mais predispostas, tinha 11 anos e apresentava a mucosa oral
bastante pigmentada, considerados como fatores de risco para o aparecimento desta
neoplasia. Os sinais clínicos mais frequentes são halitose, sangramento oral, sialorreia,
apatia, disfagia (podendo levar a pneumonias por aspiração), perda de peso e dor à
manipulação da cavidade oral. Caso ocorra invasão local pela neoplasia, podem ser
observadas fraturas patológicas, deslocamento ou perda de dentes, deformação da face,
podendo ainda observar-se ulcerações secundárias por traumatismo. Nos casos onde
existam metástase pulmonares, o animal poderá apresentar sinais respiratórios como
dispneia, taquipneia, estertores respiratórios, tosse, rinorreia e epistaxe [18, 19]. O
presente caso corrobora os achados clínicos mais frequentes. No entanto, apesar da
presença de metástases pulmonares, o Tobia ainda não apresentava sintomatologia
respiratória das vias inferiores. Para além disso, o Tobia também apresentava estridor
inspiratório, atribuído à localização da massa que provocava uma obstrução parcial das
vias aéreas superiores. O diagnóstico clínico do MM deve incluir uma história completa e
exame físico, hemograma completo, perfil bioquímico e urianálise [17]. No caso do Tobia,
não foi realizada a urianálise; já o hemograma e perfil bioquímico (renal e hepático) não

13
apresentavam alterações. No exame físico, as características macroscópicas da massa,
como a presença de pigmentação, levantaram a forte suspeita de um MM. Os melanomas
pigmentados podem ser facilmente reconhecidos através da sua análise citológica.
Contudo, para o diagnóstico definitivo deve ser realizado um exame histopatológico. No
caso dos melanomas amelanóticos (representam cerca de um terço da totalidade dos
casos), que se assemelham microscopicamente a outros tipos de neoplasias, a IHQ possui
um papel importante [17, 19]. Na citologia, os melanomas/melanocitomas bem
diferenciados, podem apresentar-se com células discretas e uniformes com elevada
concentração de grânulos de melanina. Os grânulos coram de preto a verde-escuro com
corantes comumente usados (Romanowsky). A morfologia dos melanócitos pode ser
variada, desde redonda a poligonal, a fusiforme ou mesmo estrelada. Os melanomas
indiferenciados, que apresentam pouca ou nenhuma granulação, podem ser difíceis de
distinguir de outros tumores malignos. Porém, tem-se verificado cada vez mais, que a
citologia de rotina pode ser um meio de diagnóstico confiável nos casos de melanoma
amelanótico oral. O tamanho dos melanócitos pode ser variável e os núcleos são,
normalmente, paracentrais com forma redonda a oval. Os padrões da cromatina nas
formas benignas são uniformes e finamente pontilhados, contrariamente às formas
malignas, em que são grosseiros e irregulares [12]. Nos MM, os nucléolos podem ser
múltiplos, proeminentes e com forma irregular podendo ser observado um número
moderado a alto de figuras mitóticas. O citoplasma é granular, levemente basófilo [12]. O
estadiamento clínico consiste na avaliação da extensão local do tumor e na presença de
metástases. As locais de metástase mais comuns dos tumores orais são os LNs regionais
e os pulmões [19]. Para o estadiamento, além da avaliação dos LNs regionais, devem ser
realizadas radiografias torácicas (três projeções) ou uma tomografia computadorizada
(TC)/ressonância magnética (RM) para avaliar a extensão da doença. Aproximadamente
70% dos cães com linfadenomegalia apresentam metástases regionais. No entanto, cerca
de 40% dos animais com LNs normais apresentam metástases. Sendo assim, os
linfonodos regionais, para além da habitual palpação, devem ser também sujeitos a uma
análise citológica e/ou histológica para avaliar a presença de metástases [17, 19]. O Tobia
não apresentava linfadenomegalia. Apesar de ser aconselhada a realização da PAF dos
LNs regionais para o estadiamento, esta não foi realizada no caso do Tobia. Nos
melanomas orais envolvendo a maxila e a mandíbula caudal, a TC ou a RM são críticas
para o planeamento cirúrgico, pois permitem a avaliação da extensão do tumor, invasão de
tecidos moles, osso e cavidade nasal [19]. O esquema de estadiamento da OMS para cães
com MM oral é baseado no tamanho do tumor e metástases regionais e distantes. O
estadio I é um tumor não metastático com menos de 2 cm de diâmetro, o estadio II é um

14
tumor não metastático entre 2 cm a 4 cm de diâmetro, o estadio III é um tumor maior do
que 4 cm de diâmetro e/ou presença metástase para os LNs regionais e o estadio IV é um
melanoma com metástases distantes [17]. O Tobia, como já apresentava metástases
distantes a nível pulmonar, encontrava-se em estadio IV. Quanto ao tratamento, a cirurgia
continua a ser a modalidade de tratamento local mais eficaz. Para tumores cutâneos
benignos, margens de 1 cm com um plano de profundidade, são geralmente suficientes
para a excisão completa. No entanto, dada a natureza invasiva do MM, a sua excisão deve
ser feita com margens amplas (2–3 cm) sempre que possível. Infelizmente, para
melanomas orais, a excisão da massa com margens amplas pode não ser possível devido
à quantidade limitada de tecidos normais adjacentes. Neste caso, pode ser necessária a
combinação da cirurgia com radioterapia (RT) para um controlo local adequado. Não
obstante, a cirurgia deve ser orientada pela localização do tumor, estadio clínico,
preferências do tutor e capacidade do cirurgião em realizar uma resseção ampla em locais
onde a cirurgia é difícil (por exemplo, grandes tumores caudais) [19]. Diversos estudos têm
vindo a demonstrar que o MM oral responde positivamente à RT, a qual permite obter um
bom controlo local da doença quando utilizada para tratar volumes tumorais de dimensões
microscópicas resultantes de uma incompleta exérese cirúrgica, por exemplo. Esta pode
ter como objetivo a cura ou ser apenas paliativa, no sentido de melhorar a qualidade de
vida e minimizar o desconforto do animal. Vários fatores de prognóstico foram identificados
em cães com melanoma oral tratados com RT, sendo que o tamanho do tumor e a presença
de metástases à distância foram associados como causas mais comuns para a falha deste
tratamento [17, 20]. Apesar da RT ser considerada um tratamento seguro e eficaz, esta
possui custos bastantes elevados para os tutores, pois implica a utilização de equipamento
e instalações especializados. Sendo assim, o custo/benefício da RT acaba por ser um
grande entrave para o seu uso na prática clínica [20]. Quanto à quimioterapia, de acordo
com a literatura veterinária, o tratamento do MM oral com quimioterapia sistémica não tem
apresentado resultados promissores. Vários agentes únicos quimioterápicos já foram
testados, nomeadamente a mitoxantrona, doxorrubicina, dacarbazina, carboplatina e
cisplatina. Estima-se que a resposta à mesma não vá além dos 8-28%, não existindo
evidência de que aumente, de facto, o TMS [17, 20]. O melanoma canino é um tumor
altamente imunogénico e, por conseguinte, a imunoterapia sistémica para o tratamento
adjuvante do MM aparenta ser mais promissora do que a quimioterapia [17, 20]. Atualmente
existe uma vacina de DNA xenogénico (Oncept) com membros da família da tirosinase,
que produz respostas imunes capazes de causar a proteção ou rejeição tumoral,
prolongando o TMS [21]. No caso do Tobia, devido ao estado avançado que se encontrava
no momento do diagnóstico, nenhuma destas abordagens terapêuticas foi considerada,

15
acabando por se optar apenas pelo tratamento paliativo. O prognóstico para cães com
melanoma oral é bastante reservado. É considerado um tumor extremamente maligno, com
alto grau de invasão local e alto potencial metastático verificado em cerca de 80% dos
casos [17]. A doença metastática, particularmente para os pulmões, é a causa de morte
mais reportada (14% a 67% dos casos). A cirurgia é, sem dúvida, o tratamento local mais
comum e a combinação da cirurgia e RT podem fornecer um bom controlo da doença a
nível local. As taxas de recorrência local do melanoma variam desde 22% após
mandibulectomia, até 48% após maxilectomia [19]. Contudo, as estratégias para controlar
o alto potencial metastático do melanoma maligno, como a quimioterapia e a imunoterapia,
requerem mais investigação [17, 19]. Existem vários aspetos associados a um pior
prognóstico. O estadio é considerado um aspeto importante, pois, quanto mais avançado
for, maior é a probabilidade de existirem metástases disseminadas e, como consequência,
menor será o TMS [17, 18]. O TMS dos cães após a intervenção cirúrgica é de 17 a 18
meses, 5 a 6 meses e 3 meses para tumores no estadio I, II e III, respetivamente. Estudos
mais recentes sugerem que cães com melanoma oral em estadio I tratados com cirurgia,
RT e/ou quimioterapia têm um TMS de aproximadamente 12 a 14 meses, sendo a causa
de morte atribuída, na maioria das vezes, a doença metastática distante e não a recorrência
local. No geral, a taxa de sobrevivência por mais de um ano situa-se nos 10% e apenas
5% dos animais sobrevivem até cinco anos após o diagnóstico [17, 18]. Além disso, pelo
menos 27% dos melanomas orais recidivam após o tratamento [17, 18]. O tamanho do
tumor primário, no caso do melanoma oral, é também considerado um importante fator de
prognóstico (tumores no estadio I, sem evidência de metástase, com <2 cm possuem um
prognóstico mais favorável [22]). A localização também possui um elevado indicador de
prognóstico, pois animais com tumores inoperáveis têm, consequentemente, um menor
TMS [17]. A localização do tumor no caso do Tobia é um exemplo clássico de tumores em
zonas inoperáveis.

2.3. Caso clínico nº3: Mastocitoma na conjuntiva bulbar

Identificação do animal: Nio, cão de raça Boxer, macho inteiro, com 8 anos e 40kg.
Motivo da consulta: Consulta de oftalmologia pois apresentava exoftalmia (olho direito)
com 1 mês de evolução. Anamnese e história clínica: O Nio vivia em Roma, numa
moradia com acesso a um jardim privado e coabitava com outro cão devidamente vacinado
e desparasitado. O único passado médico do Nio foi um defeito epitelial corneal
espontâneo crónico (SCCED) bilateral diagnosticado há meio ano. Não apresentava
passado cirúrgico relevante. Estava devidamente vacinado (raiva, esgana, parvovirose,
hepatite infeciosa canina, leptospirose e parainfluenza) e desparasitado interna e

16
externamente. Era alimentado com ração seca adequada e tinha livre acesso à água. Os
tutores referiram um aumento do volume do olho direito, mas que por vezes parecia
regredir. Exame do estado geral: Estado mental normal e temperamento nervoso.
Mucosas rosas, brilhantes e húmidas com TRC <2 segundos. Grau de desidratação <5%.
Condição corporal 6/9. Temperatura corporal de 38,3ºC. Pulso e movimentos respiratórios
normais com frequências de 130ppm e 30 rpm. Auscultação cardiorrespiratória sem
alterações. LNs normais. Sem dor à palpação abdominal. Exame oftalmológico: presença
de uma massa rosada na conjuntiva bulbar superior (temporal) do olho direito (OD),
estendendo-se lateralmente e com protusão da terceira pálpebra (Anexo C, figura 1A).
Reflexo de ameaça: presente em ambos os olhos. Reflexo pupilar: direto e consensual
normais em ambos os olhos. Teste de Schirmer: dentro dos valores de referência.
Pálpebras: sem alterações. Conjuntiva: hiperémia na conjuntiva bulbar do OD. Sistema
lacrimal: permeável. Córnea: teste de fluoresceína negativo, a biomicroscopia com a
lâmpada de fenda revelou leve contato superficial da massa à córnea sem alterar a sua
estrutura. Sem alterações desde a câmara anterior ao fundo do olho. Lista de problemas:
massa na conjuntiva bulbar temporal no OD, hiperémia da conjuntiva. Diagnósticos
diferenciais: Neoplasias conjuntivais primárias (mastocitoma, carcinoma de células
escamosas, angioendotelioma, hemangioma, hemangiossarcoma, angioqueratoma,
papiloma, linfoma, histiocitoma e tumor venéreo transmissível). Massas não neoplásicas
[massas inflamatórias (episclerite granulomatosa nodular, histiocitoma fibroso e
queratoconjuntivite proliferativa recorrente), quisto dermoide, prolapso de gordura
subconjuntival e granulomas parasitários]. Exames complementares: 1) Hemograma e
bioquímica sanguínea: hemograma e perfil renal e hepático sem alterações; 2) PAF da
massa bulbar: quadro citológico compatível com mastocitoma (MTC) (Anexo C, figura 2);
3) Ecografia abdominal: sem alterações; 4) Citologia do baço: imagem citológica normal;
5) Citologia do fígado: imagem citológica normal; 6) Citologia de linfonodo submandibular
direito: imagem citológica normal (negativa para metástase ganglionar). 7) Radiografia
torácica: sem alterações. Diagnóstico definitivo: Mastocitoma na conjuntiva bulbar no
OD. Tratamento e evolução: O Nio teve alta nesse dia e a cirurgia foi agendada para a
semana seguinte. Como o MTC algum tempo após ter sido manipulado apresentou um
aumento considerável de volume (Anexo C, figura 1B), foi-lhe receitado um anti-
histamínico com cetirizina (1 mg/kg, PO, SID) durante 5 dias. No dia seguinte os tutores
relataram que a massa tinha diminuído consideravelmente de tamanho após a
administração da primeira dose de anti-histamínicos (Anexo C, figura1C). No dia da
cirurgia o Nio foi pré-medicado com ranitidina (2 mg/kg IV) e maleato de clorfeniramina (0,5
mg/kg). Foi realizada uma cirurgia conservativa da massa na conjuntiva, com preservação

17
do globo ocular (Anexo C, figura 1D e E) e procedeu-se também à remoção do linfonodo
satélite (submandibular). A cirurgia decorreu sem complicações. No período pós-operatório
fez fluidoterapia com lactato de Ringer (2 ml/kg/h) e analgesia com buprenorfina (0,01
mg/kg IV TID). Teve alta ao final do dia tendo-lhe sido receitado antibioterapia sistémica
com cefalexina (30 mg/kg, PO, BID) durante 7 dias, anti-inflamatório com meloxicam (0,1
mg/kg, PO, SID) durante 4 dias e antibioterapia oftálmica com ofloxacina (2 gotas no OD,
TID) durante 7 dias. Recomendou-se o uso de colar isabelino pelo menos durante 10 dias.
Acompanhamento: Na consulta de controlo, passados 10 dias, as zonas de incisão,
conjuntiva bulbar e pescoço, encontravam-se limpas, com boa cicatrização e removeram-
se os pontos. Foi agendada uma consulta de controlo com a oncologista passado 1 mês.
A histopatologia reportou um tumor de baixo grau com margens limpas e o linfonodo não
apresentava metástases. Sendo assim, não foi necessária quimioterapia, tendo-se
agendado consulta de controlo passados 3 meses. Discussão: O MTC é o tumor cutâneo
mais comum no cão, representando entre 16% a 21% de todos os tumores cutâneos [23,
25]. Os MTCs extracutâneos são raramente diagnosticados em cães e as localizações
primárias relatadas destes tumores incluíram a conjuntiva, cavidade oral, glândula salivar,
laringe e canal espinhal. As neoplasias conjuntivais primárias em cães são relativamente
incomuns, mas os tumores podem surgir a partir do tecido epitelial, vascular ou de
elementos de tecido conjuntivo [26]. Os MTCs conjuntivais têm sido descritos na membrana
nictitante, conjuntiva bulbar e conjuntiva palpebral [12, 23, 24, 26]. O presente caso clínico
descreve um MTC numa localização atípica (conjuntiva bulbar). Os cães mais velhos, com
idades a partir dos 8-9 anos, apresentam uma maior probabilidade para a incidência desta
neoplasia. Não parece haver predisposição em relação ao sexo e a maioria dos MTCs
ocorre em cães sem raça definida. No entanto, existem algumas raças que têm um maior
risco nomeadamente cães braquicefálicos, tais como Boxer, Boston Terrier, Bulldog Inglês
e Pug. O Labrador e Golden Retriever, Cocker Spaniel, Schnauzer, Staffordshire Terrier,
Beagle, Leão da Rodésia, Weimaraner e Shar-pei também estão entre as raças mais
afetadas. O aumento da incidência de MTCs em certas raças sugere a possibilidade de
uma causa genética subjacente. Curiosamente, embora os cães braquicefálicos
apresentem um maior risco ao aparecimento de MTCs, nesses cães os MTCs geralmente
são menos agressivos [23 – 25]. O caso do Nio enquadra-se com os fatores de risco
mencionados anteriormente pois, para além de ter 8 anos, era um Boxer que está descrita
como a raça mais predisposta a esta neoplasia. A etiologia do MTC é em grande parte
desconhecida. Porém, tem sido associado à inflamação ou lesão crónica como cicatrizes
de queimaduras [25]. Como referido anteriormente, a grande maioria dos MTCs em cães
ocorre na derme e no tecido subcutâneo sendo a maioria de natureza solitária, embora

18
cerca de 11% a 14% dos cães apresentem lesões múltiplas [23, 24]. Os MTCs
extracutâneos também estão descritos como sendo, maioritariamente, tumores solitários
[26]. É importante ter em atenção que os MTCs cutâneos têm uma grande variabilidade
de aparências clínicas. De um modo geral, existem 2 formas de MTC cutâneo. As formas
bem diferenciadas tendem a ser tumores solitários, pequenos e de crescimento lento, que
podem estar presentes por vários meses. Geralmente não são ulcerados, mas podem-se
se apresentar como massas alopécicas. Já as formas indiferenciadas tendem a ser lesões
ulceradas de crescimento rápido que causam irritação considerável, podendo atingir
grandes dimensões. Pode ocorrer o aparecimento de pequenos nódulos satélites nos
tecidos circundantes [23 – 25]. Uma apresentação clínica com um comportamento biológico
muito distinto é o MTC subcutâneo. Geralmente estes tumores apresentam um
comportamento benigno, mesmo quando excisados com margens incompletas [23 – 25]. A
história e os sinais clínicos de cães com MTCs estão intimamente relacionados com a
liberação de substâncias vasoativas presentes nos grânulos dos mastócitos (histamina,
heparina e outras aminas). Durante a manipulação mecânica no exame do tumor, pode
ocorrer eritema e formação de pápulas nos tecidos circundantes, resultante da
desgranulação dos mastócitos. Este fenómeno denomina-se de Sinal de Darier. Este
fenómeno também pode ocorrer de modo espontâneo, fazendo com que a massa aumente
e diminua de volume [23 – 25]. No caso do Nio, momentos após a manipulação da massa
e realização da PAF, esta aumentou consideravelmente de volume (Anexo C, figura 1B).
Em casos mais graves, a ulceração do trato GI também pode ocorrer devido ao aumento
da secreção de ácido clorídrico provocada pela libertação de histamina. Outros sinais como
a hemorragia profusa intra e pós-operatória e atraso na cicatrização de feridas também
podem ocorrer pelo mesmo motivo [25]. Linfadenopatia regional devido a doença
metastática também é comum em cães com MTCs invasivos ou presentes por um longo
período. Ocasionalmente, esplenomegalia ou hepatomegalia estão presentes em cães
com disseminação sistémica [25]. O Nio não apresentava qualquer sinal de sintomatologia
sistémica paraneoplásica dando indícios de baixa malignidade tumoral. Os MTCs
conjuntivais geralmente apresentam superfícies lisas e uma cor desde o castanho-pálido a
avermelhada [23, 24]. A sintomatologia presente pode incluir epífora, hiperémia da
conjuntiva, secreção ocular mucopurulenta, protrusão da terceira pálpebra, ulceração da
córnea e neovascularização ou pigmentação desta [26]. Algumas características clínicas
no caso do Nio, tais como hiperemia conjuntival, protrusão da terceira pálpebra, incluíram
esses sinais oftalmológicos. Na maioria dos casos, os animais não apresentam alterações
no hemograma e bioquímica séricas. Porém a eosinofilia é uma alteração comum [23 –
25]. A técnica mais simples e rápida, utilizada no diagnóstico de MTC é a realização da

19
PAF da massa. É possível obter um diagnóstico correto em aproximadamente 95% dos
casos. Na citologia, os mastócitos com a coloração Diff-Quik, têm a particularidade de
possuírem grânulos citoplasmáticos que coram de cor púrpura o que facilita a sua distinção.
Os mastócitos possuem abundante citoplasma pálido com numerosos grânulos,
frequentemente vistos no fundo das preparações citológicas [12]. Os núcleos são redondos
a ligeiramente ovais podendo ser difíceis de observar em mastócitos fortemente granulados
(bem diferenciados). Em casos de atipia citológica e menor diferenciação, a quantidade da
granulação vai diminuindo e células multinucleadas podem estar presentes. Eosinófilos e
fibroblastos reativos estão frequentemente presentes. A presença de colagenólise também
é um achado comum [12]. O exame histopatológico deve ser sempre realizado de forma a
obter um grau histológico permitindo orientar o tratamento e o prognóstico [23 , 24]. De
acordo com o sistema de Patnaik et al. (1984) os MTC cutâneos podem ser classificados
em 3 graus. O grau I é bem diferenciado, o grau II apresenta características intermédias e
o grau III é pouco diferenciado. Mais recentemente, Kiupel et al. (2011) propôs um sistema
de classificação de dois níveis para MTCs cutâneos caninos, usando uma designação de
baixo grau e alto grau. Este novo sistema não só melhorou o nível de concordância entre
patologistas, como forneceu fortes correlações com prognóstico no que diz respeito à
mortalidade e ao risco de metástases. Sendo assim, os tumores são classificados como de
alto grau se possuíssem: pelo menos 7 figuras mitóticas/10 hpf; pelo menos 3 células
multinucleadas (3 ou mais núcleos) /10 hpf; pelo menos 3 núcleos bizarros/10 hpf; ou
cariomegalia. Um diagnóstico de MTC de baixo grau baseia-se na ausência de todos estes
critérios [27]. Mais recentemente, um esquema da classificação de Kiupel foi aplicada com
sucesso em amostras citológicas, com uma sensibilidade de 88% e especificidade de 94%
em relação à classificação histológica. Neste sistema os são tumores classificados como
de alto grau se apresentarem células escassamente granuladas ou se tiverem pelo menos
dois dos quatro critérios: figuras mitóticas, células binucleadas ou multinucleadas,
pleomorfismo nuclear ou >50% de anisocariose [23 – 25]. Os MTCs conjuntivais
normalmente não são classificados, pois o sistema de classificação foi desenvolvido para
tumores cutâneos e os critérios não são aplicáveis a localizações atípicas como a
conjuntiva [23, 24, 26]. Em termos comparativos com os MTCs cutâneos, a analise
citológica do MTC do Nio é compatível com uma forma de baixo grau (Anexo C, figura 2).
No estadiamento de um MTC confirmado citologicamente deve-se incluir uma palpação
cuidadosa da área afetada e LNs, palpação abdominal, ecografia abdominal (com PAF de
baço e fígado), hemograma, perfil bioquímico sérico, urianálise, radiografia torácica se a
neoplasia estiver na metade cranial do corpo (para detetar linfadenopatia intratorácica),
citologia da medula óssea e citologia do linfonodo regional mesmo que não esteja

20
aumentado. Nos MTCs solitários que se encontram num local de fácil excisão cirúrgica com
margens amplas e sem indicadores de prognóstico negativo, o estadiamento de rotina (à
exceção da aspiração do LN regional) não é obrigatório e pode ser realizado no pós-
operatório se houver indicação de “agressividade” pela histopatologia (ou seja, alto grau)
[23, 24]. No caso do Nio, mesmo apresentando um prognóstico favorável, foram realizados
todos os exames de estadiamento à exceção da urianálise e citologia da medula óssea,
não tendo sido registadas alterações. Antes de se iniciar qualquer tratamento é necessário
ter em conta os fatores de prognóstico negativo. No caso de um tumor solitário, numa área
onde a excisão completa é possível e o LN regional esteja livre de metástases, a cirurgia
é o tratamento ideal (idealmente com margens de 2 a 3 cm laterais e um plano debaixo do
tumor) [23, 24]. Se for confirmado através da histopatologia que o tumor é de baixo grau e
apresenta margens limpas, não é necessária terapia adicional, considerando-se o animal
“curado”. No entanto, no caso de a excisão ser incompleta pode-se optar por realizar uma
segunda cirurgia na tentativa de obter margens limpas, ou realizar tratamento adjuvante
com RT, ou a realização de quimioterapia por um curto período (3-6 meses). No caso do
Nio, apesar de existirem muito poucos estudos sobre MTC na conjuntiva bulbar, considera-
se que esta localização apresenta morfologicamente um baixo grau a intermédio e um
comportamento benigno [26, 28]. Na maioria dos casos, os MTCs conjuntivais respondem
bem à resseção cirúrgica conservadora e, mesmo que a maioria dos cães apresentassem
margens sujas, não houve relatos de que a causa de morte dos animais tenha estado
relacionada com o tumor [29]. Geralmente, estes tumores têm um baixo risco de
recorrência e uma baixa probabilidade de apresentar metástases. A excisão cirúrgica
nestes casos é geralmente curativa mesmo não apresentando margens limpas [26, 28].
Sendo assim, optou-se pela cirurgia conservadora do MTC conjuntival do Nio e pela
remoção do LN regional, ambos enviados para histopatologia. Devido aos riscos
associados à desgranulação dos mastócitos o Nio foi pré-medicado com ranitidina e um
anti-histamínico. Um MTC solitário onde a excisão cirúrgica é difícil ou impossível pode ser
tratado com sucesso com RT (no caso de grau 1 ou 2). Injeções intralesionais com
corticosteroides (1mg por via intralesional por centímetro de diâmetro do tumor a cada 2-3
semanas) podem reduzir o tamanho do tumor com sucesso, embora geralmente seja
apenas um tratamento paliativo [23 – 25]. Como abordagem alternativa, pode ser realizada
uma quimioterapia neoadjuvante (isto é, quimioterapia antes da cirurgia) onde se usa uma
combinação de vimblastina (com ou sem lomustina) e prednisolona para diminuir o
tamanho do tumor. Quando existem metástases, raramente se consegue a cura. Em MTCs
não cirúrgicos ou disseminados as combinações dos 3 fármacos mencionados
anteriormente têm sido associadas a uma taxa de resposta de 50% a 70% [23 – 25]. A

21
hepatotoxicidade é um efeito secundário relativamente frequente associada à
administração da lomustina. A sua combinação com a vinblastina, aumenta o intervalo de
administração da lomustina diminuindo os seus efeitos adversos [23 – 25]. No presente
caso, devido às caraterísticas do tumor e ao facto de apresentar as margens limpas, não
foi necessária a realização de quimioterapia. O grau histológico é considerado o fator de
prognóstico mais consistente e confiável para cães com MTCs, embora não consiga prever
o comportamento de todos os tumores. A grande maioria dos cães com MTCs cutâneos
bem diferenciados (80% a 90%) e aproximadamente 75% dos cães com grau intermédio,
apresentam um TMS longo após a excisão cirúrgica completa. As taxas de metastização
para MTCs indiferenciados variam de 55% a 96% e a maioria dos cães tem apenas um
TMS de até 1 ano após o diagnóstico [23, 24]. Marcadores de proliferação têm sido usados
em alguns estudos como fatores de prognóstico entre os quais se destacam a quantificação
das regiões argirofílicas organizadoras de nucléolo (AgNOR) e a quantificação da
proliferação através do Ki-67. Nesses estudos, pontuações elevadas de AgNOR e Ki-67
foram associadas a um menor TMS [23 – 25]. O índice mitótico, em diversos estudos,
também tem sido usado para avaliar o comportamento biológico dos MTCs, onde se
demonstrou que cães com tumores que possuíam um índice mitótico <5 tiveram um TMS
de, aproximadamente, 80 meses em comparação àqueles que possuíam um índice mitótico
>5 em que o TMS era de apenas 3 meses [23, 24]. Parece também que os MTCs em certas
localizações anatómicas são mais agressivos do que os tumores noutras áreas. Tumores
na área do membro distal, períneo, prepúcio, zona escrotal e inguinal, zona nasal e
cavidade oral parecem ter um maior potencial metastático do que tumores nas regiões do
tronco e pescoço [23 – 25]. No caso do Nio o seu prognóstico foi dado como favorável, não
só devido ao facto de ser um Boxer (que estão associados a formas mais benignas do
MTC) como também devido ao MTC conjuntival; apesar da escassez de estudos, os dados
existentes apontam para um bom prognóstico [23, 24, 26, 28]. As avaliações de rotina (para
tumores com margens completas, baixo ou intermédio grau e com ausência de fatores de
prognóstico negativos) devem ser realizadas passado 1 mês após a cirurgia, depois de 3
em 3 meses até aos 18 meses e a partir daí apenas de 6 em 6 meses. Deve ser realizado
um exame físico completo com avaliação dos LNs (se possível através de análise
citológica). A citologia de controlo do fígado e baço também é aconselhada [23, 25]. O Nio
no mês subsequente à cirurgia não apresentou quaisquer sinais de recorrência do tumor.

2.4. Caso clínico nº4: Leishmaniose Visceral Canina

Identificação do animal: Boris, cão sem raça definida, macho inteiro, com 2 anos
e 7 meses e 22kg. Motivo da consulta: Perda de peso. Anamnese e história clínica: O

22
Boris vivia em Roma, num apartamento com acesso a um terraço sem coabitantes animais.
Era alimentado com uma ração comercial seca e tinha livre acesso à água. Estava
devidamente vacinado (raiva, esgana, parvovirose, hepatite infeciosa canina, leptospirose
e parainfluenza) e desparasitado interna e externamente. Não apresentava passado
médico e cirúrgico relevante. Os tutores referiram que, desde há algumas semanas, o Boris
tinha perdido peso apesar do apetite ser normal e não denotar alterações de
comportamento. Exame do estado geral: Estado mental normal e temperamento
equilibrado. Mucosas ligeiramente pálidas, brilhantes e húmidas com TRC <2 segundos.
Grau de desidratação <5%. Condição corporal 4/9. Temperatura corporal de 38,7ºC. Pulso
e movimentos respiratórios normais com frequências de 120ppm e 19 rpm. Auscultação
cardiorrespiratória sem alterações. À palpação dos LNs verificou-se que o Boris
apresentava de uma linfadenomegalia generalizada. Não apresentava dor à palpação
abdominal. Apresentava também uma ligeira dermatite com descamação furfurácea. Lista
de problemas: perda de peso, linfadenomegalia, dermatite furfurácea, ligeira palidez das
mucosas. Diagnósticos diferenciais: Linfadenomegalia: Hiperplasia reativa dos
linfonodos, linfadenite devido a infeções supurativas, eosinofílicas, piogranulomatosas,
infeções disseminadas causadas por bactérias, vírus, rickettsias (Ehrlichia sp.), parasitas
(Toxoplasma sp., Leishmania sp.), fungos (Blastomyces e Histoplasma sp.), doenças
imunomediadas (pênfigos, lúpus, poliartrite, vasculite, dermatopatia), neoplasia primária
(linfoma, mieloma múltiplo, mastocitoma, leucemia, histiocitose maligna), metástases
(carcinoma, sarcoma, melanoma, mastocitoma); Dermatite furfurácea: leishmaniose,
infeção bacteriana da pele (piodermite ou foliculite), alergias a picadas de parasitas
externos (alergia à picada da pulga (DAPP), hipersensibilidade alimentar, dermatite
atópica; Exames complementares: 1) hemograma, bioquímica sanguínea (perfil renal e
hepático) e eletroforese: leve anemia normocítica normocrómica (32,5 % [37,1 – 57,0 %]),
aumento da proteína C reativa (0,82 mg/dl [0,01 – 0,27 mg/dl]) e ligeira diminuição do ferro
total (63 ug/dL [94 – 217 ug/dL]), Hipoalbuminemia (19,7 % [56 – 67.2 %]) e
hipergamaglobulinemia (49,6 % [6,1 – 12,7 %]). 2) Urianálise: sem alterações; 3) PAF LN
poplíteos e pré-escapulares: quadro citológico indicativo de hiperplasia ganglionar reativa,
linfadenite granulomatosa e infeção por Leishmania spp. (Anexo D, figura 1) 4) Exame
serológico ELISA: positivo (nível de anticorpos >25) para Leishmania infantum.
Diagnostico definitivo: Leishmaniose canina. Tratamento e evolução: Como o Boris se
encontrava estável, com apetite e não apresentava alterações renais, teve alta nesse
mesmo dia. Foi receitado antimoniato de meglumina (100 mg/kg, SC, SID) durante 8
semanas e alopurinol (10 mg/kg, PO, BID) durante 6 meses consecutivos.
Acompanhamento: Veio à consulta de controlo passado 1 mês onde foram realizadas

23
novas análises sanguíneas de controlo (hemograma, eletroforese e bioquímica
sanguínea). No exame físico verificou-se que ainda apresentava uma ligeira
linfadenomegalia. Verificou-se que os parâmetros anteriormente alterados assim
permaneciam iguais, acrescentando-se uma eosinofilia (2.460 103/ul [0,000 – 1,000
103/ul]). Agendou-se nova consulta e foi realizado uma nova bateria de testes serológicos
porque se suspeitava que poderia haver outros agentes infeciosos concomitantes. O
exame serológico deu positivo para Rickettsia e Borrelia. À terapia anterior foi adicionada
a doxiciclina (10 mg/kg, PO, SID) durante 28 dias. Foi agendada nova consulta de controlo
após 1 mês para novas análises. Nessa altura, o Boris já não apresentava
linfadenomegalia, os valores da anemia tinham melhorado (35 % [37,1 – 57,0 %]) assim
como o rácio albumina/globulina. Para além disso, aumentou 10% do peso corporal e a
dermatite furfurácea era impercetível. À terapia anterior foi prescrita a domperidona (0,5
mg/kg, PO, SID) durante 4 semanas consecutivas. Foi agendada consulta de controlo
passados 3 meses. Prognóstico: Bom a reservado. Discussão: A leishmaniose é uma
doença infeciosa, causada por um protozoário do género Leishmania com ampla
distribuição mundial [30]. Nos humanos, a Leishmania spp., pode causar doença cutânea,
mucocutânea e visceral. O cão pode ser infetado por várias espécies, desenvolvendo as
mesmas formas da doença que no ser humano [31]. No entanto, a Leishmania infantum é
a principal espécie a infetar o cão e é considerada uma importante zoonose a nível global,
potencialmente fatal para o ser humano e para o cão. A espécie canina é o principal
reservatório da infeção para os humanos [30 – 32]. A leishmaniose canina é endémica em
mais de 70 países no mundo, estando presente nas regiões do sul da Europa, África, Ásia,
América do Sul e América Central [30, 33]. Num estudo realizado em Itália durante um
período de 10 anos, as regiões com maiores taxas de prevalência da L. infantum incluíam
o sul seguido pelo centro do país. A zona de Lazio (onde se situa Roma, residência do
Boris) foi a que apresentou a taxa de prevalência mais elevada da L. infantum [34]. Vários
fatores têm contribuído para mudanças na distribuição da L. infantum pela Europa. Entre
eles destacam-se os fatores socioeconómicos e climáticos. O número de cães do norte da
Europa que viaja para o sul ou os cães importados como animais de companhia de áreas
endémicas, fez aumentar o número de casos de leishmaniose relatados em países não
endémicos como o Reino Unido e a Alemanha [30, 33]. Esta zoonose é transmitida a
hospedeiros vertebrados através de vetores primários (mosquitos) pertencentes ao género
Phlebotomus (Europa, África e Ásia). Os flebótomos são insetos noturnos estando mais
ativos desde o entardecer até as primeiras horas da noite, e ao amanhecer. Nos climas
temperados, encontram-se ativos de abril a outubro no Hemisfério Norte, enquanto em
países tropicais podem ser encontrados durante todo o ano. A Leishmania, para completar

24
o seu ciclo de vida, precisa de dois hospedeiros, um flebótomo (vetor) e um mamífero, onde
a forma intracelular amastigota se desenvolve e replica. A transmissão da Leishmania
ocorre quando as fêmeas do flebótomo se alimentam do sangue do hospedeiro inoculando
promastigotas através de saliva. Uma vez inoculados, os promastigotas são fagocitados
pelos macrófagos do hospedeiro, nos quais perdem o seu flagelo e se transformam na
forma amastigota. Os amastigotas replicam-se por fissão binária, levando à rutura do
macrófago e liberação de amastigotas infetando novas células. Os amastigotas também
podem ser ingeridos pelos flebótomos, onde se transformam na forma promastigota
flagelada extracelular que se replica no trato GI do inseto [30, 32, 33]. A infeção por L.
infantum segue, frequentemente, um padrão insidioso e crónico que se pode manifestar de
forma subclínica, autolimitante, severa e por vezes até mesmo fatal. A infeção subclínica
não é necessariamente permanente e fatores como a imunossupressão ou doenças
concomitantes podem levar à progressão para a doença clínica [30 – 33]. No caso do Boris,
põe-se a hipótese de que este já apresentava a infeção pela L. infantum na forma subclínica
e que a coinfecção com Rickettsia e Borrelia tenha levado à manifestação clínica da
doença. Estão descritos vários fatores predisponentes relacionados com a ocorrência da
leishmaniose, incluindo a raça, idade e predisposição genética. O Boxer, Cocker Spaniel,
Rottweiler e Pastor Alemão, parecem estar entre as raças mais suscetíveis ao
desenvolvimento da doença, enquanto outras, como o Ibizian Hound, raramente
desenvolvem sinais clínicos da doença. A idade também parece ser um fator importante,
com uma distribuição bimodal, com picos em cães com menos de 3 anos e mais de 8 anos
[33]. O Boris enquadrava-se na primeira faixa etária (pois tinha menos de 3 anos). O
número e a intensidade dos sinais clínicos vão depender de um conjunto de fatores que
envolvem a espécie do parasita, a genética e o estado imunitário do hospedeiro. Uma vez
que quase 50% da população canina afetada não apresenta sintomatologia, a identificação
dos animais seropositivos pode ser bastante difícil [32]. Para além disso, quando
clinicamente doentes, os sinais clínicos são variáveis e inespecíficos pois a leishmaniose
é caraterizada como uma doença crónica e multicêntrica que pode afetar qualquer órgão.
Na forma mucocutânea e/ou visceral, o sinal clínico mais comum é a linfadenopatia
generalizada [32]. Os sinais dermatológicos geralmente ocorrem mais tarde e são variáveis
tanto na sua caraterização como na sua extensão. Estima-se que cerca de 90% dos
animais apresentam lesões cutâneas e que quando estas se encontram presentes,
presume-se que já exista envolvimento visceral [32, 35]. As lesões cutâneas em cães são
tipicamente caracterizadas por uma dermatite esfoliativa não pruriginosa com escamas
prateadas, que pode ser generalizada ou localizada. A forma localizada geralmente é mais
grave e afeta as orelhas, cabeça e extremidades. A alopécia periocular também é um

25
achado frequente. As manifestações cutâneas adicionais que podem ser encontradas são
a hiperqueratose nasodigital, dermatite ulcerativa, onicogrifose, dermatite postula ou
nodular, dermatite postular estéril e piodermite bacteriana secundária [32, 35]. A única
manifestação dermatológica evidente no caso do Boris foi uma ligeira dermatite furfurácea.
Outros sinais que podem estar presentes incluem a anorexia, enterite crónica e perda de
peso, intolerância ao exercício, prostração, esplenomegalia e hepatomegalia, lesões
oculares, atrofia muscular, poliartrite ou glomerulonefrite (devido à formação de
imunocomplexos desencadeada por uma resposta humoral maciça e a elevada carga
parasitária) e até manifestações neurológicas [32]. O Boris apresentava perda de peso e
linfadenomagalia generalizada. A doença renal pode ser a única manifestação clínica da
doença podendo evoluir de proteinúria leve para síndrome nefrótica ou para doença renal
terminal. A insuficiência renal crónica representa uma forma grave da progressão da
doença sendo a causa mais comum de morte [31 – 33]. Apesar da alta prevalência de
patologia renal em cães infetados, a azotemia renal é um achado laboratorial relativamente
incomum [31]. O baço é um dos órgãos mais afetados durante a infeção, juntamente com
a pele e a medula óssea. A presença de amastigotas no baço leva à esplenomegalia devido
à infiltração de macrófagos e alterações na sua microestrutura. A medula óssea, quando é
atingida, é responsável pela persistência da doença, incluindo recidivas [30]. Os meios
complementares de diagnóstico que devem ser realizados no caso de suspeita de
leishmaniose incluem um hemograma completo com eletroforese, perfil bioquímico e
urianálise. No entanto, o diagnóstico da leishmaniose canina é complexo, pois o espectro
clínico é amplo e a quantidade de alterações clínico-patológicas com base nos exames
anteriormente descritos pode ser ampla e inespecífica. Sendo assim, é preciso adaptar
para cada paciente uma abordagem diagnóstica específica [31]. Apesar disso, os animais
podem estar coinfectados com outras doenças transmitidas por vetores ou sofrer de outras
doenças infeciosas e não infeciosas concomitantes, tornando os diagnósticos diferenciais
mais complicados e diversos [31]. No caso do Boris, teria sido prudente se inicialmente se
tivesse feito também a pesquisa serológica para outros agentes infeciosos. As principais
alterações clinico-patológicas incluem hiperglobulinemia (geralmente policlonal),
hipoalbuminemia, proteinúria, aumento das enzimas hepáticas, anemia, trombocitopenia,
linfopenia e leucocitose com desvio à esquerda [30, 32, 33]. Neste caso, foi observada a
presença de uma anemia ligeira e uma diminuição do rácio albumina/globulina, devido à
hiperglobulinemia policlonal β e γ. No entanto, o diagnóstico parasitológico é sempre um
diagnóstico laboratorial. Os sinais clínicos e/ou alterações clínico-patológicas compatíveis
com a doença levam-nos a suspeitar que o animal seja portador de leishmaniose canina.
A confirmação da etiologia da infeção pode ser obtida por diferentes métodos laboratoriais

26
diretos e indiretos: parasitológico, molecular e serológico. O método parasitológico mais
usado inclui o exame microscópico (a cultura é um procedimento complexo e lento) [30 –
32]. A observação microscópica dos amastigotas de Leishmania spp. pode ser feita em
esfregaços de impressão de lesões ulcerativas, aspirados de nódulos, linfonodos, baço ou
medula óssea, que geralmente apresentam inflamação piogranulomatosa ou
granulomatosa [36]. Neste caso a PAF dos LNs do Boris permitiu detetar a presença de
formas amastigotas de Leishmania spp. no interior dos macrófagos. Na citologia, os
amastigotas são ovoides e contêm um núcleo oval, rosa a roxo e um pequeno cinetoplasto
azul-escuro a roxo em forma de bastonete (Anexo D, figura 1) que distingue este
organismo de outros microrganismos (por exemplo, Toxoplasma spp.) [36]. A realização de
um esfregaço sanguíneo ou de buffy coat também podem ser utilizados para a pesquisa
de hemoparasitas (por exemplo, Babesia ou microfilárias) [36], mas no caso do Boris não
foram realizados. Outros meios de diagnóstico que podem ser utilizados, considerados
sensíveis e específicos da infeção, são a deteção de anticorpos séricos específicos (IgG)
usando técnicas preferencialmente quantitativas, como o teste de immunofluorescence
antibody test (IFAT) e o Enzyme-Linked Immunosorbent Assay (ELISA). O PCR é um
método qualitativo que permite detetar o parasita e a carga infetante nos tecidos, sendo
utilizado não só para o diagnóstico, mas também no seguimento durante o tratamento [30,
32, 33]. A serologia quantitativa é classificada de acordo com o nível de Anticorpos (Ac)
encontrados em resultado negativo (< 9), duvidoso (entre 9 - 11), baixo (entre 11 - 19) e
médio (entre 20 – 24) a elevado (> 25). Um nível elevado de anticorpos (Ac) confirma o
diagnostico de leishmaniose num cão com sinais clínicos e/ou anormalidades clínico-
patológicas compatíveis com a doença. Porém, um baixo nível de Ac não significa,
necessariamente, a presença da doença sendo necessário uma investigação adicional
para confirmar ou excluir a leishmaniose clínica [30]. No caso do Boris o resultado revelou
um número elevado de Ac (>25). O objetivo do tratamento é controlar os sinais e alterações
clínicas, melhorar a imunidade celular, reduzir a carga parasitária, evitar recaídas e diminuir
a taxa de transmissão ao vetor [30]. A escolha da terapia deve ser realizada com base no
estadio clínico em que o animal se encontra. O sistema da LeishVet classifica, de acordo
com a progressão da doença, a leishmaniose canina em quatro estadios que se encontram
descritos no Anexo D, tabela 1 [33]. De acordo com este sistema, o Boris encontrava-se
no estadio II. Os cães em estadio I podem ser deixados sem tratamento ou tratados apenas
com alopurinol, ao contrário dos pertencentes ao estadio II e III que devem ser tratados
com combinações de alopurinol e miltefosina. Animais no estadio IV devem ser tratados
apenas com alopurinol (possui baixa toxicidade) para evitar um maior dano renal [30, 33].
Nenhum fármaco ou combinação de fármacos tem a capacidade de eliminar a Leishmania

27
do sistema com sucesso. Sendo assim, é preciso ter em conta que, embora os sinais
clínicos da doença geralmente melhorem com os fármacos usados no tratamento, o
prognóstico é variável e existem recaídas na maioria dos casos [31]. A combinação de
antimoniato de meglumina (100 mg/kg, SC, SID) e alopurinol (15 mg/kg, PO, BID)
apresenta melhores resultados em comparação ao seu uso isoladamente. Para evitar
recidivas o alopurinol é administrado durante longos períodos [31]. No caso Boris foi
utilizada a combinação de antimoniato de meglumina e alopurinol sendo que, a duração
estipulada para o tratamento com alopurinol foi de 6 meses. Num estudo, cães que eram
tratados com a combinação destes dois fármacos não apresentaram recidivas da doença
até 1 ano de monitoramento e o intervalo livre de doença para alguns cães foi de até 65
meses. A miltefosina e domperidona estão disponíveis em alguns países. A miltefosina
(2mg/kg, SID, durante 28 dias) quando administrada com alopurinol e a domperidona (0,5
mg/kg, PO, SID) administrada como agente único também demonstraram eficácia
terapêutica no tratamento da leishmaniose [31]. A miltefosina é geralmente utilizada em
cães com dano renal (estadio IV), pois pode diminuir a proteinúria. A domperidona
(Leishguard®) é um agonista D2 da dopamina e pode ser usada no tratamento e prevenção
da leishmaniose na medida em potência o aumento da resposta imune dos animais. A
anfotericina B é outro fármaco que pode ser utilizado, mas a sua eficácia ainda não é clara
para além poder causar um maior dano renal [30]. Os cães com insuficiência renal crónica
(IRC) geralmente apresentam um mau prognóstico. Durante o tratamento os parâmetros
clinico-patológicos devem ser monitorizados. A grande maioria dos cães apresenta uma
melhoria clínica no primeiro mês de terapia. A monitorização é recomendada após o
primeiro mês de tratamento e depois a cada 3-4 meses durante o primeiro ano. Mais tarde,
se o animal estiver totalmente recuperado clinicamente com o tratamento, recomenda-se
uma nova reavaliação a cada 6 meses ou uma vez por ano [33]. No caso do Boris, o que
levou à forte suspeita de haver mais do que um agente infecioso envolvido foi a presença
de eosinofilia e o facto de não estar a responder à terapia. Porém, o prognóstico do Boris
apesar de tudo era considerado favorável pois, após o diagnóstico dos outros 2 agentes
infeciosos, começou a responder bem à terapia e não apresentava (até à data) qualquer
indício de dano renal. Mais estudos ainda são necessários para poder avaliar o impacto
clínico, estratégias de tratamento e prognóstico de coinfecções. De acordo com um estudo,
que descreve as oito coinfecções mais comuns ocorridas em cães de áreas endémicas da
L. infantum, a desregulação da resposta imune parece ser mais importante do que a
patologia causada pelo próprio agente coinfecioso [37]. As medidas de prevenção devem-
se se focar no controlo dos vetores. Os repelentes em spot-on geralmente combinados
com colares são os meios de controlo mais utilizados. A estratégia preventiva mais eficaz

28
seria a combinação de repelentes e uma vacina eficaz, porém as vacinas atualmente
disponíveis conferem apenas uma proteção parcial contra a infeção. As vacinas licenciadas
na Europa disponíveis são a CaniLeish® e a LetiFend®. Outras estratégias baseiam-se na
limitação da interação hospedeiro-vetor através da limitação de passeios nos momentos
do dia onde há um pico de atividade do vetor e no uso de inseticidas ou redes mosquiteiras
nas janelas de casa [30 – 32].

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] L. Ayele, C. Mohammed, and L. Yimer, “Review on Diagnostic Cytology: Techniques and Applications in Veterinary
Medicine,” J. Vet. Sci. Technol., vol. 8, no. 1, 2016, doi: 10.4172/2157-7579.1000408.
[2] J. H. Meinkoth, R. L. Cowell, R. D. Tyler, and R. J. Morton, “Sample Collection and Preparation,” in Cowell and Tyler´s
Diagnostic Cytology and Hematology of the Dog and Cat, 5th ed., Elsevier, 2020, pp. 1–17.
[3] G. Avallone et al., “Review of Histological Grading Systems in Veterinary Medicine,” Vet. Pathol., vol. 58, no. 5, pp. 809–828,
2021, doi: 10.1177/0300985821999831.
[4] B. Stone, “Cytology sample collection and preparation for veterinary practitioners,” Pathol. Vetnostics, pp. 1–8, 2010, [Online].
Available: http://www.qml.com.au/Files/Vet_NL_Mar10.pdf.
[5] F. Neiva et al., "ROSE: Alternative for Cancelled and Inconclusive Cytopathologic Examinations, as
Well as Professional Training at the UNESP-Botucatu Veterinary Hospital," Open Journal of Veterinary
Medicine, 9, 2019, pp. 121-135, doi: 10.4236/ojvm.2019.99011.
[6] D. M. Vail, D. H. Thamm, and J. M. Liptak, “Hematopoietic Tumors,” in Withrow & MacEwen´s Small animal clinical oncology,
6th ed., Elsevier, 2020, pp. 688–715.
[7] D. M. Seelig, A. C. Avery, E. J. Ehrhart, and M. A. Linden, “The comparative diagnostic features of canine and human
lymphoma,” Vet. Sci., vol. 3, no. 2, 2016, doi: 10.3390/vetsci3020011.
[8] M. Zandvliet, “Canine lymphoma: a review,” Vet. Q., vol. 36, no. 2, pp. 76–104, 2016, doi: 10.1080/01652176.2016.1152633.
[9] D. M. Vail, “Tumours of the haemopoietic system,” in BSAVA Manual of Canine and Feline Oncology, 3rd ed., 2018, pp.
285–303.
[10] J. M. Belanger, T. P. Bellumori, D. L. Bannasch, T. R. Famula, and A. M. Oberbauer, “Correlation of neuter status and
expression of heritable disorders,” Canine Genet. Epidemiol., vol. 4, no. 1, pp. 1–12, 2017, doi: 10.1186/s40575-017-0044-6.
[11] S. Comazzi et al., “Breed-associated risks for developing canine lymphoma differ among countries: An European canine
lymphoma network study,” BMC Vet. Res., vol. 14, no. 1, pp. 1–7, 2018, doi: 10.1186/s12917-018-1557-2.
[12] K. Jacocks, N. Hoepp, and D. B. DeNicola, “Round Cells,” in Cowell and Tyler´s Diagnostic Cytology and Hematology of the
dog and cat, 5th ed., Elsevier, 2020, pp. 65–73.
[13] K. Kliczkowska-Klarowicz, D. Jagielski, M. Czopowicz, and R. Sapierzyński, “Prognostic role of clinical presentation,
cytological picture and response to treatment in canine centroblastic lymphoma,” Pol. J. Vet. Sci., vol. 24, no. 1, pp. 101–107,
2021, doi: 10.24425/pjvs.2021.136798.
[14] M. B. Brooks, R. E. Matus, C. E. Leifer, and A. K. Patnaik, “Use of splenectomy in the management of lymphoma in dogs: 16
cases (1976-1985),” J Am Vet Med Assoc, vol. 191, no. 8, pp. 1008–1010, 1987.
[15] L. Marconato et al., “Predictors of Long-term Survival in Dogs With High-Grade Multicentric Lymphoma,”
J. Am. Vet. Med. Assoc., vol. 238, no. 4, pp. 2–7, 2011.
[16] T. F. Teixeira et al., “Cell proliferation and expression of connexins differ in melanotic and amelanotic canine oral melanomas,”
Vet. Res. Commun., vol. 38, no. 1, pp. 29–38, 2014, doi: 10.1007/s11259-013-9580-z.
[17] P. J. Bergman, L. E. Selmic, and M. S. Kent, “Melanoma,” in Withrow & McEwen’s Small Animal Clinical

29
Oncology, 6th ed., Elsevier, 2020, pp. 367–381.
[18] K. C. Colombo, D. A. Lima, L. A. Rossi, M. M. Bianchi, and C. Sapin, “Oral cavity melanoma in dogs: epidemiological, clinical
and pathological characteristics,” Res. Soc. Dev., 2022, doi: 10.33448/rsd-v11i13.35332.
[19] S. Ryan, E. G. H. Wouters, S. van Nimwegen, and J. Kirpensteijn, “Skin and Subcutaneous tumors,” in Veterinary Surgical
Oncology, Wiley-Blackwell, 2012, pp. 69–75.
[20] K. A. Carroll, C. A. Kuntz, J. Heller, A. Peters, R. Rotne, and A. Dunn, “Tumor size as a predictor of
lymphatic invasion in oral melanomas of dogs,” J. Am. Vet. Med. Assoc., vol. 256, no. 10, pp. 1123–
1128, 2020, doi: 10.2460/javma.256.10.1123.
[21] M. A. Pellin, “The Use of Oncept Melanoma Vaccine in Veterinary Patients: A Review of the Literature,”
Vet. Sci., vol. 9, no. 11, 2022, doi: 10.3390/vetsci9110597.
[22] C. E. Fonseca-Alves et al., “Current Status of Canine Melanoma Diagnosis and Therapy: Report From a Colloquium on
Canine Melanoma Organized by ABROVET (Brazilian Association of Veterinary Oncology),” Front. Vet. Sci., vol. 8, , pp. 1–
12, 2021, doi: 10.3389/fvets.2021.707025.
[23] C. A. London and D. H. Thamm, “Mast Cell Tumors,” in Withrow & MacEwen´s Small animal clinical
oncology, 6th ed., 2020, pp. 382–403.
[24] P. E. Miller and L. B. C. Teixeira, “Ocular Tumors,” in Withrow & MacEwen´s Small animal clinical
oncology, 6th ed., Elsevier, 2020, pp. 675–687.
[25] R. W. Nelson and C. G. Couto, “Selected Neoplasms in Dogs and Cats,” in Small Animal Internal
Medicine, 6th ed., Elsevier, 2020, pp. 1328–1333.
[26] J. Y. Lee and S. M. Jeong, “Primary Conjunctival mast cell tumor in a Korean native Jindo dog,” J. Vet.
Clin., vol. 30, no. 2, pp. 131–133, 2013.
[27] M. Kiupel et al., “Proposal of a 2-tier histologic grading system for canine cutaneous mast cell tumors
to more accurately predict biological behavior,” Vet. Pathol., vol. 48, no. 1, pp. 147–155, 2011, doi:
10.1177/0300985810386469.
[28] Ursula M. Dietrich, “Ophthalmic Examination and Diagnostics,” in Veterinary Ophthalmology, 5th ed.,
Wiley-Blackwell, 2013, pp. 675–687.
[29] Fife, M., Blocker, T., Fife, T., Dubielzig, R. R., & Dunn, K. "Canine conjunctival mast cell tumors: a
retrospective study,". Veterinary ophthalmology, 14(3), 2011, pp. 153–160.
https://doi.org/10.1111/j.1463-5224.2010.00857.x
[30] M. Morales-Yuste, J. Martín-Sánchez, and V. Corpas-Lopez, “Canine Leishmaniasis: Update on Epidemiology, Diagnosis,
Treatment, and Prevention,” Vet. Sci., vol. 9, no. 8, pp. 1–20, 2022, doi: 10.3390/vetsci9080387.
[31] R. W. Nelson and C. G. Couto, “Polysystemic Protozonal Infections,” in Small Animal Internal Medicine,
6th ed., Elsevier, 2020, pp. 1518–1519.
[32] R. R. Ribeiro, M. S. M. Michalick, M. E. Da Silva, C. C. P. Dos Santos, F. J. G. Frézard, and S. M. Da Silva, “Canine
Leishmaniasis: An Overview of the Current Status and Strategies for Control,” Biomed Res. Int., vol. 2018, no. Cl, 2018, doi:
10.1155/2018/3296893.
[33] L. Solano-Gallego et al., “LVC: LeishVet guidelines for the practical management of canine leishmaniosis,” Parasit. Vectors,
vol. 4, pp. 1–16, 2011, http://www.parasitesandvectors.com/content/4/1/86.
[34] J. Mendoza-Roldan et al., “Leishmania infantum and Dirofilaria immitis infections in Italy, 2009-2019: Changing distribution
patterns,” Parasites and Vectors, vol. 13, no. 1, pp. 1–8, 2020, doi: 10.1186/s13071-020-04063-9.
[35] S. L. Lemarié, “Cutaneous Manifestations of Systemic Infections,” in BSAVA Manual of Small Animal
Dermatology, 2nd ed., BSAVA, 2003, pp. 187–188.
[36] L. V. Pane, P. J. Yang, and R. L. Cowell, “Selected Infectious Agents,” in Cowell and Tyler´s Diagnostic Cytology and
Hematology of the dog and cat, 5th ed., Elsevier, 2020, pp. 44–64.

30
[37] E. Beasley, D. Pess, B. Scorza, and C. Petersen, “Co-Infections during Canine Leishmaniosis,” pp. 1–28, 2021

ANEXO A

A B

Figura 1. Radiografia LL direita toracica e LL esquerda abdominal. A - Padrão bronquico e linfadenomegalia dos
linfonodos traqueobrônquicos (círculo); B - Perda de detalhe abdominal e presença de massa abdominal (circulo).

Figura 2. Preparações hemáticas com boa celularidade. Presença de população única de grandes células linfoides
com moderado citoplasma intensamente basófilo (cabeça seta vermelha), núcleos redondos (cerca de 2,5-3 eritrócitos
de diâmetro) com cromatina granulosa e 1-3 nucléolos dismétricos, angulosos e hipocrómicos (cabeça seta preta). Os
núcleos estão dispostos na periferia. Observam-se ainda núcleos nus (seta vermelha), estrias de material nuclear e
corpos linfoglandulares (seta preta). Seta verde – eritrócito. Comentário: Compatível com linfoma de grandes células.

Tabela 1. Resultado da análise histopatológica e imunohistoquímica após esplenectomia


Infiltração difusa por uma neoplasia densamente celular, mal delimitada, não capsulada e
infiltrativa. Composta por células redondas com uma alta relação N/C, escasso citoplasma
Resultado da eosinofílico com margens bem definidas, núcleo redondo com cerca de 2-2,5 eritrócitos de
histopatologia diâmetro com cromatina granular e nucléolo bem visível. Moderada anisocitose e anisocariose
e a atividade mitótica é de 39 mitose/10 hpf. Neoplasia maligna de células redondas
morfologicamente compatível na primeira hipótese com linfoma de grandes células e alto grau.
Resultado da Marcadores usados: CD3; CD79a. A lesão parece ser caracterizada por cerca de 85% de
imunohistoquímica células CD79a positivas, contra uma população de cerca de 15% de células CD3 positivas,

31
elementos estes que se distribuem de forma disseminada e ocasionalmente em agregados
nodulares.
Tabela 2. Protocolo CHOP, curto de 19 semanas, da Universidade de Wisconsin-Madison (adaptado de Vail,
2020 [6]).

Semana de Prednisolona*., Vincristina., Ciclofosfamida**., Doxorrubicina***., Exame físico e


Administração PO, SID 0.7 mg/m2 250 mg/m2 PO 30 mg/m2 IV hemograma
IV
1ª (08/02/2023) X X Peso: 19,8 kg
2ª (15/02/2023) Hemograma sem
X X
alterações
Saltou-se uma semana pois o Rufo no apresentou neutropenia no hemograma de controlo. Repetiu-se o
hemograma na semana seguinte e como já se encontrava próximo dos valores de referência foi continuado o
tratamento. Peso: 21,4kg
3ª (01/03/2023) Ligeira
linfadenomegália,
hemograma sem
X X
alterações
significativas.
Peso: 22,7 kg
4ª (08/03/2023) X X Peso: 23,0 kg
Sem tratamento
6ª (22/03/2023) Doença em
remissão,
X hemograma sem
alterações. Peso:
23,7 kg
7ª (29/03/2023) Hemograma sem
X
alterações
8ª (05/04/2023) Ambos sem
X alterações. Peso:
24,2 kg
9ª (12/04/2023) Ambos sem
X alterações. Peso:
24,3 kg
Sem tratamento
11ª Episódio de
(26/04/2023) vómito (cerenia,
X 1 mg/kg, SC)
Hemograma sem
alterações
12ª Hemograma sem
X
(03/05/2023) alterações
13ª X ---------------------
14ª X ---------------------
16ª X ---------------------
17ª X ---------------------
18ª X ----------------------
19ª X ----------------------
*2mg/m², diariamente na primeira semana, 1,5 mg/m² na segunda, 1mg/m² na terceira, 0,5mg/m² na última. Foi prescrito
juntamente o omeprazol, 1 mg/kg, PO, SID.
**Dividida em 4 administrações. Furosemida, 1-2 mg/kg, PO, juntamente com a ciclofosfamida para diminuir a incidência de
cistite hemorrágica estéril.

***Em cães com menos de 15kg de peso corporal, substituir a dosagem da doxorrubicina de 30 mg/m2 por 1 mg/kg.

Todos os tratamentos devem ser interrompidos após a 19ª semana se houver remissão completa e deve ser feita uma reavaliação
mensalmente. Deve ser realizado um hemograma de controlo antes de cada ciclo de quimioterapia.

32
ANEXO B

Figura 1. Observação da neoformação na cavidade oral realizada sob sedação.

Figura 2. Preparação hemática com elevada celularidade. Presença de população única de células dispostas
em monocamada com margens citoplasmáticas na sua maioria indefinidas, com perfil ligeiramente fusiforme
ou arredondado. O citoplasma é na sua maioria escasso, fracamente basófilo, podendo-se identificar, com
pouca frequência, granulações enegrecidas finas e raras, a mais abundantes e grosseiras (seta preta). Os
núcleos (cerca de 2-3 eritrócitos) são ovais com cromatina reticular. Observam-se 1-2 nucléolos proeminentes
e irregulares (seta vermelha). Anisocitose discreta e anisocariose. Presença de melanomacrófagos (seta
branca). Comentário: Quadro citológico compatível com melanoma maligno pouco pigmentado (amelanótico).

A B C
Figura 3. Ecografia e Radiografia torácica
A – Imagem ecografia onde se verifica a presença de um nódulo pulmonar com diâmetro máximo de 0,5 cm. B
e C - Projeção DV e LL direita respetivamente, evidenciando um padrão broncoalveolar moderado associado à
presença de nódulos multifocais de dimensões variáveis compatíveis com metástase pulmonar.

33
ANEXO C

A B

C D
Figura 1. A – Neoformação na conjuntiva bulbar no dia da primeira consulta. B – Neoformação momentos
após a realização da CAAF. C - MTC no dia da cirurgia. D – Após a excisão cirúrgica do MTC.

Figura 2. Preparação hemática com boa celularidade. População única de células redondas com quantidade
variável de grânulos citoplasmáticos (seta branca). Os grânulos de cor púrpura estão presentes no citoplasma
assim como no fundo da preparação. Os núcleos são centrais com cromatina reticular. Estão ainda presentes
fibroblastos (setas vermelhas). Comentário: quadro citológico compatível com mastocitoma.

34
Tabela 1. Resultado histopatológico da massa conjuntival e do GL

O exame histológico revela a presença de uma neoplasia densamente


celular, mal definida, não encapsulada, com crescimento infiltrativo que se
desenvolve no córion conjuntival. A neoplasia consiste em elementos
Resultado da histopatologia da arredondados dispostos em folhetos. As células neoplásicas apresentam
massa na conjuntiva bulbar quantidades moderadas de citoplasma eosinofílico com margens
distinguíveis e, às vezes, contendo um fino grânulo basofílico, núcleo
redondo central com cromatina fina e nucléolo ocasionalmente visível. A
anisocitose e a anisocariose são leves a moderadas e a atividade mitótica
é de 1 mitose/10 hpf. Raras células binucleadas são observadas.
Intercalado com a população neoplásica está um infiltrado difuso de
granulócitos eosinofílicos. O tumor não atinge as margens da amostra
examinada. Comentário: Os achados histológicos são indicativos de
mastocitoma conjuntival
Múltiplos cortes preparados a partir do linfonodo também corados com
Resultado da histopatologia do azul de toluidina são examinados, nos quais a arquitetura parece estar
LN preservada e não são observadas populações neoplásicas. Comentário:
O linfonodo mandibular foi negativo para pesquisa de metástases

ANEXO D

Figura 1. Amostras com elevada celularidade. Fundo ligeiramente hemático, caracterizado pela presença de
grânulos grosseiros de pigmento escuro (melanina) (seta verde). Presença de população mista de linfócitos
pequenos e médios (cabeça seta preta e vermelha respetivamente) (cerca de 60% das células nucleadas) e
macrófagos (cerca de 10%) com citoplasma grande e claro, núcleos frequentemente recortados ou reniformes
com cromatina finamente reticular, muitas vezes contendo raros a numerosos amastigotas de Leishmania spp
(seta preta). Há também plasmócitos (seta vermelha) (cerca de 20%) e células imaturas. Comentário: quadro
citológico indicativo de hiperplasia ganglionar reativa, linfadenite granulomatosa e infeção por Leishmania spp.

35
Tabela 1. Estadiamento clínico da Leishmaniose canina com base no status serológico, sinais clínicos,
alterações laboratoriais e tratamento e prognóstico para cada estadio clínico (adaptado de Solano-Gallego,
2011 [33])
Estadio Serologia Sinais clínicos Alterações laboratoriais Tratamento Prognóstico
clínicos
Estadio I Níveis de Sinais clínicos Geralmente sem • Monitorização Bom
(Doença anticorpos leves: alterações. da progressão
leve) negativos ou • linfadenomegalia Perfil renal normal: da doença;
positivo baixo periférica *creatinina (CRE) < 1,4 • Alopurinol
• dermatite mg/dl; não proteinúrico: • Alopurinol +
papular Rácio proteína/creatinina antimoniato de
(RPC) < 0,2 meglumina
• Alopurinol +
miltefosina**
Estadio II Níveis de • Sinais Estadio I • Anemia leve não • Alopurinol + Bom a
(doença anticorpos + regenerativa; antimoniato de reservado
moderada) positivos • Lesões cutâneas • Hipergamaglobulinemia meglumina
baixos a difusas e • Hipoalbuminemia • Miltefosina
elevados simétricas: • Síndrome de
- dermatite hiperviscosidade sérica.
esfoliativa a) Perfil renal normal:
- onicogrifose creatinina < 1,4 mg/dl;
- ulcerações não proteinúrico; RPC <
• Linfadenomegali 0,5
a generalizada b) CRE <1,4 mg/dl; RPC =
• Perda de apetite 0,5-1
• Perda de peso

Estadio III Níveis de • Sinais listados • Alterações do estadio II • Alopurinol + Reservado a


(doença anticorpos em I e II + • Insuficiência renal antimoniato de mau
grave) positivos • Sinais crônica (IRC): meglumina
médios a provenientes de - *Estadio I com RPC = • Miltefosina
elevados lesões de 1-5
imunocomplexos - *Estadio II (CRE 1,4-2 Guidelines IRIS
(e.g., uveíte e mg/dl) *** para IRC
glomerulonefrite)
Estadio IV Níveis de • Sinais listados • Alterações do estadio II • Alopurinol Mau
(doença anticorpos em III + • IRC
muito positivos • Tromboembolismo - *Estadio III (CRE 2,1-5 Guidelines IRIS
grave) médios a altos pulmonar mg/dl) para IRC
• Síndrome - *Estadio IV (CRE >
nefrótica 5mg/dl)***
• Doença renal • Síndrome nefrótica:
terminal proteinúria acentuada
RPC> 5

*International Renal Interest Society (IRIS): http://www.iris-kidney.com/pdf/2_IRIS_Staging_of_CKD_2023.pdf

36

Você também pode gostar