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DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE
ADVOCACIA 33
Rua Joaquim Floriano, 72 • 13', 15*e 16* andares • cjs. 133, 155 e 166
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CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO LUIZ RODOVIL ROSSI


CÂNDIDO DA SILVA DINAMARCO PEDRO DA SILVA DINAMARCO
TARCISIO SILVIO BERALDO JOSÉ ROBERTO DOS SANTOS BEDAQUE
MAURICIO GIANNICO HELENA MECHL1N WAJSFELD CICARONI
BRUNO VASCONCELOS CARRILHO LOPES ANDERSON MARTINS DA SILVA
CLAR1SSE FRECHIANI LARA LEITE DANIEL RAICHELIS DEGENSZAJN
CLÁUDIO AMARAL DINAMARCO MARCOS DOS SANTOS LINO
MELINA MARTINS MERLO JOÃO CARLOS DE CARVALHO ARANHA VIEIRA
OSWALDO DAGUANO JUNIOR FRANCISCO ETTORE GIANNICO NETO
MARIANA DE SOUZA ANDRADE MARCELO MARCUCCI PORTUGAL GOUVEA
CAROLINE DAL FOZ EZEQUIEL JULIA PRADO MASCARENHAS
STEFAN1A LUTTI HUMMEL GIOVANNA FILIPPI DEL NERO
JOÃO GUILHERME VERTUAN LAVRADOR JOÃO CÂNOVAS BOTTAZZO GANAC1N
ISABELA PERASSI JÚLIO CÉSAR FERNANDES
DANIEL MENEGASSI ZOTAREL1 RENAN DE LIMA NETTO IERVOLINO BASILE
CAIO VERONESI CUNHA LIGIA FERREIRA NOVAIS DE OLIVEIRA
MARIANA DE MORAES TORGGLER ELON CAROPRESO HERRERA
BIANCA BELLUSCI D'ANDRÉA LA1S MARTINS MORO g
BRUNO HENRIQUE SASSO LEONARDO CAMPOS DOS SANTOS
MARINA CHAMUSCA PASSOS FERNANDO MOLL1CA BEDAQUE
JOSÉ PEDRO VAISER MALFATE VITOR HUGO ANDRADE MACIEL
RAFAEL PAES ARIDA MARCELO GROBA VIEIRA
DANIELLE SOUZA VILARES LARA MARIA MARQUES CACHEADO
PUNI() CÉSAR CAMARGO BACELLAR DE MELLO MARCELO SALVITTI PETITI
GIULIANA ROS1N SANTOS ABREU CAROLINE NARVAEZ LEITE
GABRIELA GONÇALVES MARTINS DE FREITAS GABRIELA YUM1 SUJUKI
CHEL1DA VILELLA

EXCELENTÍSSIMO SR. DR. PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
SÃO PAULO.

100FAL20.01054691- 4110220 174453


—proc. n. 0159521-55.2012.8.26.0100

COSAN S.A. INDÚSTRIA E COMÉRCIO, que contende nestes autos

com JÚLIO FORTI NETO, vem interpor recurso especial contra o V. acórdão que
negou provimento à sua apelação, integrado pelo V. aresto que acolheu seus
embargos de declaração sem efeitos modificativos. O presente recurso tem assento
no art. 105, inc. III, alínea a, da Constituição Federal e demonstra violação aos
arts. 109, § 1°, 141, 369, 492, 505, 507 e 1.022, inc. II do Código de Processo Civil
(CPC-73, arts. 128, 42, § 1 0, 332, 460, 471 e 473), e ao art. 299 do Código Civil.
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ADVOCACIA

Requer-se o regular processamento deste recurso, com sua


admissibilidade por esse E. Tribunal e posterior remessa ao Col. Superior Tribunal
de Justiça, para que ali sejam apreciadas suas razões. Para tanto, demonstra-se o
recolhimento das custas necessárias por meio dos comprovantes anexos.

São Paulo, 11 de fevereiro de 2020.

José Robert ntos Bedaque


OAB-SP n. 91.537 OAB-SP n. 309.099
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O B-SP n. 206.587
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CaroliNal P 4 Z zequiel
OAB-SP n. 329.960


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ADVOCACIA 363 5
SENHORES MINISTROS

CAP. I
INTRODUÇÃO

1-
BREVE RELATO DO CASO
A CONDENAÇÃO IMPOSTA AO SR. JÚLIO FORTI
E OS CONTRATOS CELEBRADOS COM A COSAN

Em 13 de março de 1998, o ora recorrido JÚLIO FORTI NETO ajuizou


demanda condenatória em face de ANTONIO AUGUSTO RODRIGUES GUERRA, USINA
SANTA HELENA, USINA COSTA PINTO, INDÚSTRIA AÇUCAREIRA SÃO FRANCISCO e
COMPANHIA AGRÍCOLA QUELUZ (proc. n. processo n. 0000451-15.1998.8.26.0125).
Naquele feito, foi julgada improcedente a pretensão deduzida pelo sr. JÚLIO, sendo o
recorrido, por consequência, condenado ao pagamento de honorários
de sucumbência. Atualmente, o processo encontra-se em fase de cumprimento
de sentença para a execução dos honorários, cujo valor, em 2012, era
de aproximadamente 5 milhões de reais.

Em junho de 2006, o recorrido firmou com a COSAN "Instrumento


particular de cessão de direito litigioso e outras avenças"(fls. 72-74). De acordo
com o sr. JÚLIO, por força desse instrumento, a ora recorrente estaria obrigada
a ingressar no polo passivo da referida execução de honorários e a quitar o débito
exequendo.

O instrumento, contudo, não foi celebrado isoladamente. À época,


a COSAN objetivava adquirir ações da USINA AÇUCAREIRA Bom RETIRO S.A.,
sociedade da qual participava o sr. JÚLIO. Para consumar o negócio, além de firmar
o "Instrumento particular de contrato de compra e venda de ações e outras
avenças" (fls. 233 ss.), o recorrido exigiu fosse também celebrado o referido
instrumento de cessão — verdadeira conditio sine qua non para a transferência das
ações.
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ADVOCACIA

Além disso, ainda em momento anterior ao início da execução dos


honorários, para que a COSAN se interessasse em assumir o controle da sociedade,
o sr. JÚLIO pintou um quadro inverídico de suas condições financeiras, econômicas,
estruturais e gerenciais. Nesse fantasioso cenário, a submissão da recorrente ao risco
de uma eventual condenação milionária a título de honorários seria contrabalanceada
pelos futuros ganhos que poderiam advir do controle acionário da usina. Entretanto,
iniciada sua gestão, a COSAN descobriu que a saúde financeira e o passivo
da sociedade, na verdade, eram muito piores do que o apresentado pelo sr. JÚLIO
(fls. 270-292). 1 No caso, estava claro que a recorrente havia comprado gato por
lebre.

2—
A DEMANDA AJUIZADA EM FACE DA COSAN
E O JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO

A despeito de ter induzido a COSAN a celebrar contrato baseado em


informações que se revelaram inverídicas, iniciada a execução dos honorários,
o recorrido requereu naqueles autos que a recorrente o sucedesse. Contudo, diante da
oposição de alguns dos credores, o pedido de sucessão foi indeferido pelo
E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em decisão preclusa (proc.
n. 990.10.325264-0 - fls. 294-300).

O recorrido, então, ajuizou a demanda que deu origem a este


recurso. Neste feito, o sr. JÚLIO FORT1 requer seja cumprida obrigação prevista no
mencionado "Instrumento particular de cessão de direito litigioso e outras
avenças". Para tanto, pediu: (i) a execução de obrigação de fazer, a fim de que a
COSAN fosse obrigada a ingressar no polo passivo da execução e a pagar o débito
exequendo; e (II) a condenação da recorrente ao pagamento de indenização por
perdas e danos.

'. Ao adquirir, em abril de 2006, as ações pertencentes ao sr. JÚLIO, a COSAN foi induzida a acreditar
que assumiria um passivo de, à época, R$ 13.190.631,90. Porém, poucos meses após
a celebração do negócio, ao calcular o primeiro balanço patrimonial da sociedade (jul./2006),
a recorrente descobriu a existência de inúmeros débitos ocultas, cuja existência lhe fora
omitida e que perfaziam um total de R$ 23.624.427,89 em dívidas — valor, portanto, superior
ao esperado em mais de dez milhões de reais.
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Como era de se esperar, o MM. Juízo de primeira instância percebeu
a incompatibilidade entre os pedidos de execução e de condenação, e determinou
a emenda da petição inicial:
"em que pese o autor entender que se trata de uma ação de execução,
equivoca-se. [...] No caso, se pretende a execução de título judicial, deve
fazê-la através de incidente no mesmo processo onde ocorreu a fase de
conhecimento. Caso insista neste pedido, será indeferida a inicial por
absoluta inépcia.
Agora, como no presente caso, se além do valor que entende devido,
pleiteia, subsidiariamente, a conversão do objeto da ação em perdas e
danos; além de pedido autônomo de indenização por danos morais [el
materiais (sequer apontados na inicial!), a ação adequada é a ação de
cobrança (sendo discutível o interesse de agir) c.c. indenizatória, que
segue o rito ordinário. [...] Caso recuse o presente tipo de ação, será
considerada desistência da ação"(fls. 156).

Contra essa R. decisão o ora recorrido interpôs agravo


de instrumento, que não foi conhecido (fls. 348-351). Em seguida, o sr. JÚLIO

danos e o prosseguimento da demanda como execução (fls. 344-346).

Por óbvio, com base na escolha do recorrido, a recorrente estruturou


sua estratégia de defesa. A COSAN chamou atenção para o fato de que o processo
teve início como processo de conhecimento e não poderia prosseguir como execução,
razão pela qual impunha-se sua extinção. Ademais, em todas as suas manifestações,
requereu a produção de prova testemunhal, bem como a juntada de novos
documentos (fls. 341-343 e 358-361). Tais provas, em conjunto com os elementos
inicialmente apresentados, não deixariam dúvidas de que as condições financeiras
da usina adquirida eram dissonantes daquelas apresentadas pelo recorrido à época
da celebração do negócio.

Não obstante a expressa escolha do sr. JÚLIO FORTI em perseguir


a tutela executiva e sua desistência do pedido de condenação por perdas e danos,
aquele MM. Juízo, em surpreendente desconsideração à realidade dos autos, proferiu
sentença julgando antecipadamente procedente a demanda, para condenar a COSAN à
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"obrigação de fazer consistente em efetuar a quitação do valor que está sendo
cobrado em face do autor", acrescentando que, "em caso de descumprimento, a
obrigação ficará automaticamente convertida em indenização por perdas e danos,
ora estabelecida no valor da execução" (fls. 379 386).
-

Repare-se que o MM. Juizo de primeiro grau, embora tenha alertado


o recorrido de que sua insistência em obter tutela executiva ensejaria a rejeição da
inicial por inépcia (fls. 156), inovou ao afirmar na sentença que "o vício não
apresenta gravidade que impossibilite a prestação jurisdicional" (fls. 381).
Parece não haver dúvidas de que a COSAN foi surpreendida.
A decisão foi proferida em manifesta desconsideração às expectativas
da parte quanto ao rito adotado para aquele processo e quanto à produção
de provas essenciais para o deslinde da controvérsia (infra, n. 8).

Mas não foi só. A sentença, apesar de ter julgado antecipadamente


o mérito da causa, fundamentou substancialmente o decisório na suposta falta
de provas das alegações deduzidas pela recorrente. A titulo exemplificativo:
A) "também não restou demonstrada a alegada violação aos
princípios da probidade e boa-fé por parte do autor na conclusão do
contrato de cessão" (fls. 383);
B) "a requerida não trouxe aos autos cópia do referido balanço"
(fls. 384);
crnada há nos autos que comprove que tal situação era
desconhecida ou foi omitida pelos vendedores, valendo frisar que, como já
dito acima, não foi trazida aos autos cópia do balanço de 31 de março
de 2006" (fls. 385); e
D) "nenhum documento foi trazido aos autos que indique que o autor
ocupava cargo diretivo na usina, de sorte a poder ser responsabilizado pelo
passivo do período anterior à venda" (fls. 385).

Como se vê, decidiu-se com base na ausência de elementos


probatórios — elementos esses cuja produção foi expressamente requerida pela
COSAN em mais de uma ocasião (fls. 341-343 e 358-361) e sobre os quais o
MM. Juizo de primeiro grau sequer se manifestou.
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3—
A APELAÇÃO INTERPOSTA PELA COSAN
E OS VV. ACÓRDÃOS RECORRIDOS

Diante desse cenário, a COSAN interpôs recurso de apelação


(fls. 392-415), no qual demonstrou a nulidade da R. sentença por: (a) violação à
correlação entre a demanda e a tutela jurisdicional (infra, n. 7); (b) cerceamento de
defesa (infra, n. 8); (c) condenar a recorrente ao cumprimento de obrigação
impossível (infra, n. 9); e (d) impor à recorrente condenação condicional (infra,
n. 10).

Todavia, o E. Tribunal a quo negou provimento ao recurso nos


seguintes termos (fls. 478-483):
"em que pese a peça inicial causar certa confusão quanto à natureza
da ação, intitulada inicialmente de 'ação de execução de obrigação de
fazer', a exposição dos fatos e fundamentos foi descrita de forma clara e
os pedidos efetuados na exordial (fls. 19/21) foram certos.

A conveniência da produção de outras provas deve ser submetida


a critério do Juízo (artigo 130 do Código de Processo Civil).
No caso dos autos, os documentos anexados mostraram-se
suficientes para o deslinde da causa, não se podendo acolher a tese de
cerceamento de defesa.
No mérito, não se sustentam as alegações da apelante.
Não há qualquer referência por parte da recorrente quanto ao
balanço patrimonial apresentado pela empresa e constante do contrato
celebrado entre as partes. Sem a juntada do referido documento aos autos,
a tese de que a real situação financeira da empresa teria sido ardilosamente
ocultada do comprador passou a ser mera afirmação sem embasamento
documental" (fls. 482).

Contra essa R. decisão, a ora recorrente opôs embargos de


declaração (fls. 486-491), os quais foram rejeitados (fls. 493-495). Em seguida,
interpôs recurso especial, em que demonstrou a violação aos arts. 109, §1°, 141, 369,
492, 505, 507 e 1.022, inc. II, do Código de Processo Civil (CPC/73, arts. 128, 42,
§1°, 332, 460, 471, 473 e 535, inc. II) e ao art. 299 do Código Civil (fls. 498-539).
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67-0
Após o recurso ter sido inadmitido pela Presidência do E. Tribunal a
quo (fls. 544-545), a COSAN interpôs agravo (fls. 548-573) e os autos foram
remetidos ao Col. Superior Tribunal de Justiça.

4—
O JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL
. E O NOVO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PELO E. TRIBUNAL Á QUO

Recebidos os autos pelo Col. Superior Tribunal de Justiça, o recurso


especial da COSAN foi parcialmente provido para anular o V. acórdão do E. Tribunal
de Justiça de São Paulo que havia julgado os embargos de declaração (fls. 493-495).
Aquela Co!. Corte entendeu que questões essenciais ao julgamento da demanda não
haviam sido objeto de decisão pelo E. Tribunal a quo. Veja-se:
"as razões recursais que envolvem as supostas omissões do Tribunal
de origem, residem na alegação de que este, apesar de provocado por meio
dos embargos declaratórios opostos pelo recorrente, não se manifestou no
que concerne aos seguintes fatos, essenciais ao deslinde da controvérsia:
1) o autor desistiu expressamente, por meio de emenda à inicial, do pedido
de indenização de perdas e danos; 2) há acórdão, nos autos do Processo n°
125.01.1998.000451-9, indeferindo o pedido de substituição processual,
para que o recorrente assumisse o pagamento da execução, ante a
discordância expressa do exequente.
Da análise do processo, constata-se que, de fato, o Tribunal não
analisou os pontos suscitados pelo recorrente nos embargos de declaração
opostos.
Assim, impõe-se a cassação do acórdão que apreciou os
declaratórios, a fim de que sejam sanadas as omissões suscitadas, tendo-se
como prejudicado o recurso especial quanto às demais questões
suscitadas" (fls. 604-606).

Com o retorno dos autos ao E. Tribunal de Justiça de São Paulo,


os embargos de declaração opostos pela COSAN foram novamente analisados e, dessa
vez, acolhidos para sanar as omissões apontadas, mas sem efeitos modificativos.
Diante disso, mantido o improvimento da apelação e, como consequência, a violação
aos dispositivos de lei indicados no recurso especial de fls. 498-539, a COSAN
interpõe novo recurso especial, o qual reúne todos os requisitos de admissibilidade e,
no mérito, merece ser provido, conforme se passará a demonstrar.
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ADVOCACIA
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CAP. II
ADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL

5—
NÃO SE PROPÕE O REEXAME DE FATOS OU DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS
DISCUSSÃO RESTRITA A QUESTÕES DE DIREITO

Não se pretende que no julgamento do presente recurso especial essa


Col. Corte analise e interprete as cláusulas do contrato celebrado entre as partes, em
especial a que dispõe sobre a suposta obrigação de a COSAN ingressar no polo
passivo da execução de honorários movida contra o recorrido. Tampouco se pretende
que sejam revistas as provas produzidas ao longo deste processo ou se analise se
eram ou não suficientes para embasar as decisões proferidas pelo E. Tribunal a quo.
Tais questões são irrelevantes para as pretensões formuladas, limitadas à análise de
matéria exclusivamente de direito e à apreciação das violações .perpetradas aos
dispositivos legais que fundamentam este recurso.

A discussão fomentada nesta instância especial é puramente jurídica


e pode ser traduzida nos seguintes pontos centrais:
1) primeiro ponto: é nula a decisão judicial que desrespeita a
necessária adstrição entre a pretensão formulada e a tutela concedida
(CPC/73, arts. 128 e 460; CPC/15, arts. 141 e 492);
H) segundo ponto: o julgamento que se fundamenta na ausência
de provas, quando sua produção não foi permitida à parte, enseja
cerceamento de defesa e, como consequência, a nulidade da decisão
(CPC/73, art. 332; CPC/15, art. 369);
terceiro ponto: é nula a decisão que impõe o cumprimento
de obrigação impossível, em razão da dependência da aceitação de
terceiros (CC, art. 299; CPC/73, art. 42, §1°; CPC/15, art. 109, §1°) e
da afronta a decisão preclusa, proferida em outro processo (CPC/79,
arts. 471 e 473; CPC/15, arts. 505 e 507);
iv) quarto ponto: é nula a condenação condicional, ao impor o
dever de reparar prejuízo ainda não experimentado pela parte
(CPC/73, art. 460, par.; CPC/15, art. 492, par.);
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ADVOCACIA

v) quinto ponto: relevantes omissões incorridas durante


o julgamento de recurso devem ser sanadas pelo órgão julgador,
sob pena de violação ao art. 1.022, inc. II do Código de Processo
Civil.

Acerca do segundo ponto, especificamente, esse Co!. Superior


Tribunal de Justiça já assentou entendimento sobre "a inaplicabilidade da Súmula
7/STJ no presente caso, uma vez que a verificação da ocorrência de cerceamento de
defesa quando há julgamento antecipado da lide, concluindo pela ausência de
comprovação do fato constitutivo do direito, constitui questão típica de direito".2 No
mesmo sentido: "a verificação de cerceamento de defesa com o julgamento
antecipado da lide em que se concluiu pela improcedência do pedido por falta de
comprovação do fato constitutivo do direito constitui questão de direito que afasta a
incidência da Súmula 7/STJ"3 .

Está claro, portanto, que a admissibilidade do presente recurso


especial não esbarra nos enunciados das súmulas nn. 5 e 7 desse Co!. Superior
Tribunal de Justiça.

6—
PREQUESTIONAMENTO

A COSAN demonstrou ao E. Tribunal a quo que a R. sentença de


primeiro grau (a) desrespeitou a necessária correlação entre a demanda e a tutela
jurisdicional (infra, n. 7); (b) provocou cerceamento de sua defesa (infra, n. 8);
(c) condenou-a ao cumprimento de obrigação impossível (infra, n. 9); e (d) impôs-
lhe condenação condicional (infra, n. 10). Diante disso, defendeu sua nulidade, por
violação aos arts. 109, § 1 0 , 141, 369 e 492 do Código de Processo Civil (CPC-73,
arts. 128, 42, § 1°, 332 e 460) e ao art. 299 do Código Civil.
As questões pertinentes (1) à inobservância da correlação entre
pretensão deduzida e tutela concedida e (II) ao cerceamento de defesa da recorrente
foram expressamente abordadas no V. acórdão que julgou o recurso de apelação:

2 . STJ, 2 T., AgRg no REsp n. 1.354.814-SP, rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, j. 4.6.2013.
3 STJ, 3' T., AgRg no REsp n. 1.415.970-MT, rel. Min. NANCY ANDRIGHI, j. 7.8.14.
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"em que pese a peça inicial causar certa confusão quanto à natureza
da ação, intitulada inicialmente de 'ação de execução de obrigação de
fazer', a exposição dos fatos e fundamentos foi descrita de forma clara e
os pedidos efetuados na exordial (fls. 19/21) foram certos.
A conveniência da produção de outras provas deve ser submetida a
critério do Juízo (artigo 130 do Código de Processo Civil).
No caso dos autos, os documentos anexados mostraram-se
suficientes para o deslinde da causa, não se podendo acolher a tese de
cerceamento de defesa" (fls. 482).

As mesmas matérias foram também abordadas no V. acórdão que


julgou novamente os embargos de declaração:

• "a) Não houve afronta ao Princípio da Correlação, pois consoante


observado no V. Acórdão, a interpretação do pedido do demandante
deveria observar todo o conjunto da postulação e não reservada apenas a
determinado tópico da inicial. Ademais, a emenda de fls. 344/346
requereu a exclusão apenas da condenação em perdas . e danos,,
s_ubstituhulo_a_ãuig~eia,=r_prevista_ex~mente=ontrato.
b) Também não se vislumbra a ocorrência de cerceamento em
virtude da necessidade de produção de provas testemunhal e documental,
tendo em vista que a obrigação pleiteada pelo embargado encontrava-se
prevista na cláusula 4 do contrato, a qual não poderia ser desconstituída
por outros documentos".

Já as matérias contidas nos demais dispositivos de lei alegados como


• violados (CPC-73, arts. 42, § 1°, 460, par., 471 e 473; CPC-15, arts. 109, § 1°, 492,
par., 505 e 507; CC, art. 209) não haviam sido abordadas no V. acórdão que julgou a
apelação (fls. 478-483) e tampouco no primeiro V. acórdão que julgou os embargos
de declaração (fls. 443-495), posteriormente anulado. No novo julgamento dos
embargos da COSAN, contudo, finalmente foram enfrentadas tais questões, veja-se:
"c) Igualmente não subsiste a tese da impossibilidade
do cumprimento da obrigação, consistindo no dever contratual de efetuar a
quitação de valor que está sendo cobrado no Processo
N° 125.01.1998.000451-9. Em caso de eventual óbice, a r. sentença
determinou a conversão automática em perdas e danos no valor
da execução;
fls. 676
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ADVOCACIA
citi4
d) Por fim, também não prospera a alegação de prematuridade da
condenação, porque ainda que ausentes bens do embargado, a dívida
subsiste, implicando penhora e outros prejuízos ao recorrido, que por força
do contrato não responde mais pelo valor decorrente de condenação em
ação judicial".

Lembre - se que "o prequestionamento consiste na apreciação e na


solução, pelo tribunal de origem, das questões jurídicas que envolvam a norma
positiva tida por violada, inexistindo a exigência de sua expressa referência no
acórdão impugnado.4 Portanto, o fato de o E. Tribunal a quo não ter expressamente
mencionado as normas apontadas como violadas é irrelevante.

Portanto, ventilada a matéria devolvida à instância especial,


0110 cumprido está o requisito do prequestionamento, sendo forçoso o conhecimento
do presente recurso especial.

CAP. III
MÉRITO DO RECURSO ESPECIAL

7—
CORRELAÇÃO ENTRE A DEMANDA E A TUTELA JURISDICIONAL
CPC-73, ARTS. 128 E 460; CPC-15, ARTS. 141 E 492

Após determinação do MM. Juízo de primeira instância para ser


emendada a inicial, o ora recorrido desistiu expressamente do seu pedido
condenatório ao pagamento de indenização, reafirmando sua pretensão de que a
demanda prosseguisse como uma execução de obrigação de fazer. Veja-se:

"em razão do reconhecimento da incompatibilidade entre pedidos


decorrentes (i) do processo de execução com (ii) a condenação por perdas
e danos, requer-se seja excluída esta última, permanecendo a primeira
no tocante à obrigação de fazer, nos termos e para os efeitos da legislação
processual prevista no art. 632 e seguintes do Código de Processo Civil"
(fls. 345).

4. STJ, Corte Especial, EREsp n. 162.608-SP, rel. SALVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, j. 16.6.1999,
DJ 16.9.1999.
fls. 677
DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE 13
A D V OCAC 1 A
ítiS
Foi com base nessa escolha que a COSAN estruturou sua defesa,
de acordo com o procedimento no qual acreditava estar inserida — novamente,
um processo de execução.
Cabe aqui ressaltar que "é estritamente reservada ao demandante
a escolha da espécie de provimento a ser emitido pelo juiz em caso
de acolhimento de sua demanda" e que, quanto ao julgador, "o que jamais
se lhe permite é conceder provimento de ordem diferente do que
o demandante houver pedido". Por consequência, "é absolutamente
excluída a conversão de um processo em outro mediante decisão judicial,
por infração ao disposto nos arts, 128 e 460 do Código de Processo
Civil".5

Contudo, sem oportunizar à recorrente manifestar-se sobre


a intenção de julgar a causa como se processo de conhecimento fosse e a despeito da
inequívoca manifestação de vontade do sr. JÚLIO FORTI, foi prolatada sentença que
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recorrente foi condenada em obrigação de fazer, que não era objeto de pedido
condenatório, e ao pagamento de indenização por perdas e danos, que corresponde ao
pedido do qual expressamente desistiu, caso a obrigação de "quitação do valor que
está sendo cobrado" do sr. JÚLIO não fosse cumprida (fls. 385).

Segundo dispõe o nosso regramento processual civil, "o juiz decidirá


a lide nos limites em que foi proposta", sendo "defeso ao juiz proferir sentença,
a favor do autor, de natureza diversa da pedida" (CPC-73, arts. 128 e 460;
CPC-15, arts. 141 e 492). No mesmo sentido, ensina a doutrina que, "se o juiz
pudesse extravasar tais limites, dispondo sobre algo ou para alguém que não figure
nela ou com fundamento em fato não alegado, com isso estaria comprometendo
a efetividade da garantia constitucional do contraditório, pois poderia surpreender
as partes, ou mesmo terceiro não integrado ao processo, com um resultado do qual
não se defenderam [...] na parte que não corresponde à demanda o juiz estaria
decidindo sem a indispensável iniciativa da parte". 6

5 DINAMARCO, Instituições de Direito Processual Civil, v. 3, 38 ed., São Paulo, Malheiros, 2009,
p. 294.
6• DINAMARCO, Instituições de Direito Processual Civil, v. 3, 38 ed., São Paulo, Malheiros, 2009,
p.2'78.
fls. 678
DINAMARCO, Rossi, BERALDO & BEDAQUE 14
ADVOCACIA
6 f4
Tendo isso em vista, ante a expressa desistência do recorrido,
a pretensão condenatória inicialmente deduzida não poderia ter sido apreciada.
Ao assim proceder, o E. Tribunal a quo proferiu condenação claramente nula, já que
imposta (a) em processo no qual se pede tutela executiva e (b) sem o correspondente
pedido do autor, em flagrante violação à regra de correlação entre a demanda
e a tutela jurisdicional.

A despeito de tais considerações, os VV. acórdãos recorridos


decidiram a questão como se se tratasse de simples má formulação de pedido.
Ora, de fato o recorrido formulou pedidos "certos", mas eles eram incompatíveis
entre si. Por esse motivo, após ter expressamente desistido de um deles, não poderia
ter-lhe sido deferido justamente aquele de que desistiu, pois, como explicado,
"se o autor não pediu, o juiz não pode conceder, e tampouco pode negar". 7

Também não pode ser aceito o argumento expresso no V. acórdão


que rejulgou os embargos de declaração, no sentido de que "a emenda de
fls. 344/346 requereu a exclusão apenas da condenação em perdas e danos,
subsistindo a obrigação de fazer prevista expressamente no contrato". Ora, se
o próprio E. Tribunal a quo admite expressamente que houve a desistência expressa
do pedido condenatório, como pode prevalecer justamente a condenação
em obrigação de fazer que, caso não cumprida, será automaticamente convertida
em indenização por perdas e danos (fls. 385)?! Se o autor optou por propor uma
execução, como concluir com a imposição de uma condenação? A nulidade do
julgamento, repise-se, é evidente!

É pacífico o entendimento desse Col. Tribunal quanto à nulidade


do provimento que desrespeita a necessária adstrição entre a pretensão formulada
e a tutela concedida:
iré o autor quem fixa os limites da lide, ou seja, o princípio
da correlação ou adstrição entre o pedido e a decisão judicial, de que trata
o art. 128 do CPC, bem como os arts. 2° e 460 do CPC, faz referência
ao que foi deduzido pelo autor, em sua petição inicial. [...]

7. BARBOSA MOREIRA, A correlação entre o pedido a sentença, Revista de Processo, v. 83, 1996,
P. 3.
fls. 679
DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE 15
ADVOCACIA
64q-
Na hipótese analisada, o pedido dos autores-recorridos foi
declaratório (i) de nulidade das assembleias condominiais irregularmente
convocadas e realizadas e (ii) de inexistência das obrigações impostas
aos autores por meio das referidas assembleia. [...]
Diante do exposto, verifica-se que o Tribunal de origem,
ao condenar o recorrente à restituição de valores, de fato, decidiu "fora"
dos limites do pedido — decisão extra petita -, ficando caracterizada
a violação do disposto nos arts. 2°, 128 e 460 do CPC"; 8

julgamento extra petita, pois mudou-se


II) "Há, portanto, claramente,
o pedido e a causa de pedir, constantes da inicial. O pedido na ação
possessória era de reintegração de posse, com indenização de danos
matérias, em face de esbulho cometido pelos réus. O julgamento, por
maioria, contrário à sentença e ao voto do relator originário, julgou
procedente a ação possessória, como se fosse ordinária, para reconhecer o
direito de utilização do canal pelos promoventes, em razão da função
social da propriedade, e em vista do escoamento natural das águas, desde
que os autores indenizem os demandados.
Tem-se, data venha, violação aos arts. 459 e 460 do CPC, o que
conduz à nulidade dos v. acórdãos recorridos" 9
HO "consoante noção cediça, é no pedido que se encontra
a delimitação da causa para o julgador, nem mais nem menos. É este
o sentido do principio da correlação, ou seja, o juiz deve julgar o que lhe
foi apresentado, pois é defeso ao Poder Judiciário agir . de oficio,
ainda mais em lides de natureza privada e direito disponível"; 10
iv) "tem razão a recorrente no que concerne aos artigos 128 e 460
do Código de Processo Civil. De fato, os juros moratórios e a comissão
de permanência não foram objeto do pedido, que, de resto, é bem
especifico [...]. Já decidiu a Corte que não pode o Tribunal decidir fora
dos termos postos na inicial (REsp n° 97.670/MG, Relator o Senhor
Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ de 04/9/00; REsp n° 197.602/RJ,
de minha relatoria, DJ de 01/4/02; REsp n° 51.687/RS, Relator o Senhor
Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 24/10/94). Se a inicial não
contemplou o pedido sobre os juros moratórios e sobre a comissão
dejleman^r l r"; 1 I e
e_wLi_nãoj2ade_odulgado_cleks_c_uka_

8• STJ, 3a T., REsp n. 1.394.650-SC, rel. NANCY ANDRIGHI, j. 25.3.2014.


STJ, 4T., REsp n. 1.426.239-RS, rel. p/ acórdão Min. RAUL ARAÚJO, J. 17.11.15.
". STJ, 6 T., REsp n. 595.904-RJ, rel. Min. PAULO MEDINA, j. 10.2.2004.
II . STJ, 3a T., REsp n. 489.966-RS, rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, j. 4.9.2003.
fls. 680
DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE 16
ADVOCACIA
648
Portanto, tendo os VV. acórdãos recorridos julgado a presente
demanda como se de conhecimento fosse e concedido tutela diversa da pretendida,
violaram o disposto nos arts. 141 e 492 do Código de Processo Civil (CPC-73,
arts. 128 e 460). E, por esse motivo, há que se prover o presente recurso especial.

8—
CERCEAMENTO DE DEFESA DA RECORRENTE
JULGAMENTO ANTECIPADO FUNDAMENTADO EM AUSÊNCIA DE PROVAS
CPC-73, ART. 332; CPC-15, ART. 369

Ante o exposto até aqui, não é dificil perceber que, por si só,
(a) os confusos e incompatíveis pedidos apresentados pelo recorrido e
(b) as contraditórias decisões proferidas pelo E. Tribunal a quo impediram a COSAN
de exercer plena e eficazmente o seu direito de defesa. Isso porque, segundo a lição
de BARBOSA MOREIRA, "o exercício amplo do direito de defesa implica
necessariamente para o réu um mínimo de previsibilidade. É preciso que ele saiba,
ao ser convocado a juízo, ou possa verificar com os dados de que dispõe, quais são
as suas chances, tanto para o melhor, quanto para o pior. É preciso que ele possa
avaliar desde logo qual a pior coisa que lhe pode acontecer na hipótese de
derrota".12 Contudo, in casu nada disso foi permitido à recorrente.

Como se não bastasse, em sua contestação a COSAN apresentou os


documentos de que dispunha no momento para provar a má situação financeira
da USINA Bom RETIRO. A recorrente, contudo, requereu na mesma ocasião e em
manifestações posteriores a complementação do conjunto probatório, com a
produção de prova oral e documental (fls. 214, 343 e 360-361). Tais pleitos,
entretanto, nem sequer foram apreciados. Pior: ao julgar antecipadamente a demanda,
o MM. Juízo de primeiro grau, além de não permitir a produção de provas,
fundamentou a condenação justamente na suposta ausência de provas de suas
alegações.

'2. A correlação entre o pedido a sentença, Revista de Processo, v. 83, 1996, p. 3.


fls. 681

DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE 17


ADVOCACIA
61 9
São inúmeras as referências à ausência de provas ao longo da
R. sentença: "não restou demonstrada a alegada violação aos princípios
da probidade e boa-fé por parte do autor na conclusão do contrato
de cessão", "a requerida não trouxe aos autos cópia do referido balanço",
"nada há nos autos que comprove que tal situação era desconhecida ou
foi omitida pelos vendedores", "nenhum documento foi trazido aos autos
que indique que o autor ocupava cargo diretivo na usina" (fls. 383-385).

Apesar de tais referências, o E. Tribunal a quo, ao negar provimento


à apelação da COSAN, afirmou justamente que "os documentos anexados mostraram-
se suficientes para o deslinde da causa, neio se podendo acolher a tese de
cerceamento de defesa" e, depois, ao julgar os embargos de declaração, indicou que
"a embargante em nenhum momento apresentou o balanço patrimonial constante do
contrato celebrado entre as partes". Ora, se os documentos já anexados aos autos
eram suficientes, como explicar a condenação da recorrente fundamentada na
ausência de documentos que ela deveria ter apresentado? Por qual razão não foi dada
à ora recorrente a oportunidade produzir prova — requerida oportunamente - a
respeito das informações que constariam do referido balanço patrimonial?
O cerceamento de defesa é gritante!

Ao se deparar com situações similares, essa Col. Corte consolidou


entendimento em favor da impossibilidade de se julgar com fundamento, na ausência
de provas quando a sua produção não foi permitida pelo órgão julgador, veja-se:
t) "Não se pode perder de vista que o direito de defesa é
efetivamente cerceado na hipótese em que o magistrado julga
antecipadamente a lide, indeferindo a produção de provas previamente
requerida pelas partes, e conclui pela procedência ou improcedência da
demanda, com fundamento na falta de comprovação do direito alegado na
inicial ou na peça defensiva." 13
ii) "Há cerceamento de defesa quando o juiz indefere a realização de
prova oral e pericial, requeridas oportuna e justificadamente pela parte
autora, com o fito de comprovar suas alegações, e o pedido é julgamento
improcedente por falta de provas" 14

13 STJ, 4 T., Aglnt no AREsp n. 1.261.662-BA, rel. Min. LÁZARO GUIMARÃES, j. 2.8.2018.
14 STJ, 3' T., AgRg no REsp n. 1.415.970-MT, rel. Min. NANCY ANDRIGHI, j. 7.8.14.
fls. 682
DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE 18
ADVOCACIA

"o acórdão recorrido julgou em conformidade com a orientação


iurisprudencial desta Corte que se firmou no sentido de que ocorre
cerceamento de defesa quando, proferido julgamento antecipado da lide,
admite-se que não há prova do alegado pela ré";15

lleuma vez reconhecendo que os fatos dependiam de provas -


que não foram produzidas - o Tribunal a quo deveria, como alega
o recorrente, ter considerado irregular o julgamento antecipado da lide,
o que não ocorreu in casu.
Sendo assim, inafastável a ocorrência de cerceamento de defesa,
devendo ser anulada a sentença proferida e oportunizada a produção
das provas, reabrindo-se, assim, a instrução processual"; 16

ivro cerceamento de defesa, no caso dos autos, é manifesto,


devendo ser provido o recurso especial ante a violação dos arts. 330, I
e 333, I, do CPC.
De acordo com a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça,
há cerceamento de defesa no procedimento do magistrado que,
sem_ops~jaar_a_pr~e_proLas,_i_ulaaantecizad
e conclui pela não comprovação do fato constitutivo do direito do
autor. [...]
Com o reconhecimento do cerceamento de defesa, fica declarada
a nulidade dos atos decisórios, devendo os autos retornar ao primeiro grau
de jurisdição a fim de que seja oportunizada a produção de provas
por parte da recorrente, com a designação, se for o caso, de audiência
de instrução e julgamento"; 17 e

v) "com razão a seguradora no que concerne ao cerceamento


de defesa. É que o acórdão teve por correto o julgamento antecipado,
mas afirmou que não há nos autos prova do alegado pela seguradora.
A_Lurisp_m2ncia_da_CoÉ&_e_s_d_redieada_sk_preced
c j_t_e_s_que_hadicam
ocorrer o cerceamento de defesa quando se valida o julgamento antecipado
e se aponta ausência de prova, no caso, de "qualquer documento"
do direito alegado pela ré (REsp n° 427.804/SP, Relator o Ministro Aldir
Passarinho Junior, DJ de 1°/9/03; REsp n° 333.320/MG, Relatora
a Ministra Nancy Andrighi, DJ de 18/2/02; REsp n° 471.322/RS, Relatora
a Ministra Nancy Andrighi, DJ de 18/8/03; REsp n° 512.890/RJ, de minha
relatoria, DJ de 10/5/04)". 18

15.STJ, 3' T., AgRg no AREsp n. 783.082-PE, rel. Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE, j. 8.2.2012.
16.STJ, 4T., REsp n. 898.123-SP, rel. Min. JORGE SCARTEZZINI, j. 13.2.2007.
17.STJ, 3' T., AgRg no REsp n. 1.149.914-MT, rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO,
j. 23.10.2012.
18 • STJ, 3a T., REsp n. 623.479-RJ, rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, j. 4.8.2005.
fls. 683
DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE 19
ADVOCACIA

Portanto, caracterizado o cerceamento de defesa da recorrente,


deve ser provido este recurso especial também por violação ao artigo 369 do Código
de Processo Civil (CPC-73, art. 332).

9—
CONDENAÇÃO DA RECORRENTE AO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO IMPOSSÍVEL
CPC-73, ART. 42, § 1°, 471 E 473; CPC-15, ART. 109, § 1°, 505 E 507; CC, ART. 209

Os VV. acórdãos recorridos condenaram a COSAN à "obrigação


de fazer consistente em efetuar a quitação do valor que está sendo cobrado em face
do autor". Trata-se, contudo, de obrigação im 4' ,rie e, já que
o pagamento de dívida por terceiro depende da aceitação expressa dos credores,
que não são partes neste processo (CC, art. 299; CPC-73, art. 42, §1°; CPC-15,
art. 109, § 1°). A respeito da cessão de dívida, ensina SILVIO RODRIGUES:
"a cessão de dívida é o negócio pelo qual o devedor transfere para
outra pessoa sua posição na relação jurídica, de modo que esta o substitua
na obrigação. (...) É condição de sua eficácia o consentimento do
credor".19

Portanto, no presente caso, o ingresso da recorrente como


cessionária de bem litigioso na relação processual na qual é parte o sr. JÚLIO FORTI
somente seria possível caso os credores dos honorários executados concordassem
com tal pedido — o que já se sabe não ter ocorrido nos autos daquele processo.
Por meio de decisão preclusa, proferida nos autos do agravo de instrumento
n. 990.10.325264-0 (fls. 294-300), o E. Tribunal a quo indeferiu definitivamente o
pedido de sucessão processual, justamente em razão da ausência de concordância dos
credores. Veja-se:
"com efeito, tendo em vista a discordância de um dos exequentes,
impõe-se o indeferimento do pedido de substituição processual, formulado
pelo agravado JÚLIO FORTI NETO, eis que, conforme mencionado
anteriormente, a substituição voluntária do polo passivo da demanda,,
na hipótese de alienação do direito litigioso, apenas será possível quando
a parte adversa, de forma expressa, manifestar sua anuência".

19 . Direito Civil, v. 2, Parte Geral das Obrigações,São Paulo, Saraiva, 2002, p. 104.
fls. 684

DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE 20


ADVOCACIA

Está claro portanto que, ao condenar a recorrente a pagar b5g


os honorários que estão sendo cobrados do recorrido, o E. Tribunal a quo impôs
a substituição processual do sr. JÚLIO FORTI pela COSAN no processo de execução.
Porém, ao fazê-lo, os VV. acórdãos recorridos (a) deliberaram novamente sobre
questões já decididas, (b) relativas a esta mesma lide e (c) em relação às quais
incidiram os efeitos da preclusão. Houve, por consequência, manifesta violação
aos artigos 505 e 507 do Código de Processo Civil (CPC-73, arts. 471 e 473).

Como se não bastasse, ao assim decidirem, os VV. acórdãos


recorridos ainda condenaram a recorrente ao cumprimento de obrigação impossível.
Ao analisar a questão durante o julgamento dos embargos de declaração,
o E. Tribunal a quo afirmou que não se trataria de obrigação impossível, pois
consistiria no "dever contratual de efetuar a quitação de valor que está sendo
cobrado no processo n. 125.01.1998.000451-9". Ora, independentemente da sede em
que prevista a obrigação a que a COSAN foi condenada, indaga-se: como poderá a
recorrente cumpri-la sem infringir decisão proferida pelo mesmo E. Tribunal, não
mais passível de alteração?

Em situações análogas à esta, esse Col. Tribunal vem consolidando


sua jurisprudência para vedar a imposição de obrigação impossível de ser cumprida:
epor 'obrigação impossível' deve se entender também aquela
que se mostrar ilegal e/ou desarrazoada, como na espécie.
Em síntese, mesmo que o resultado prático dos acordos firmados
seja considerado satisfatório pela autora – superando a questão atinente
à sua ineficácia – sobressai a impossibilidade legal da obrigação assumida
pela GOOGLE, cujo efetivo cumprimento 'criaria embaraço ao direito
constitucional à informação.
[...] independentemente dos reais motivos que levaram a autora
ao ajuizamento da presente ação, fato é que a obrigação assumida pela
GOOGLE se mostra impossível de ser cumprida, configurando ameaça
concreta à liberdade de informação"; 20 e
"a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça
II)
(Rcl n. 5.072/AC, relatora para o acórdão Ministra Nancy Andrighi,
DJe de 4/6/2014), procedendo à distinção entre os provedores de internet

". STJ, 3' T., REsp n. 1.407.271-SP, rel. NANCY ANDRIGHI, j. 21.11.2013.


fls. 685
DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE 21
ADVOCACIA

e os provedores de pesquisa, firmou o entendimento de que o provedor


663
de pesquisas na intemet não pode ser obrigado a filtrar expressões
ou termos pesquisados, seja por violação do direito à informação, seja por
ineficácia técnica da medida, ainda que indicada o URL que conduza
o usuário à pagina desabonadora. [...]
O comando judicial que deu origem à multa cominatória e
ao pagamento de indenização por danos morais e impôs ao GOOGLE
a obrigação de excluir de seus registros o URL indicado pelo ora
agravado, constitui, nos termos da nova orientação jurisprudencial
firmada, uma obrigação impossível de ser realizada". 2I

Trata-se, portanto, de mais uma razão que enseja o provimento deste


recurso especial.

10—
CONDENAÇÃO CONDICIONAL
CPC-73, ART. 460, PAR.; CPC-15, ART. 492, PAR.

Mesmo que sejam desconsiderados os argumentos acima expostos,


o que se admite apenas a título de argumentação, este recurso especial ainda assim
deverá ser provido para declarar a nulidade do ato decisório por força do qual
a recorrente foi condenada ao pagamento de indenização por perdas e danos.
Isso porque a sentença condenatória reconheceu o dever de reparar prejuízo ainda
não experimentado pelo recorrente, ou seja, foi imposta condenação condicional,
vedada por nosso ordenamento e repudiada pela jurisprudência.

A mera possibilidade de inadimplemento não basta para legitimar


sentenças com eficácia futura. Nesses casos, faltando a certeza do inadimplemento
ou mesmo a segurança quanto à existência do direito, falece à parte o legítimo
interesse processual ao processo e ao julgamento de pretensões relativas a prestações
futuras, mas inexigíveis.

No presente caso, os VV. acórdãos recorridos impuseram


condenação ao ressarcimento de "perdas e danos" no valor da execução, apesar de o
recorrido não ter desembolsado qualquer quantia até o presente momento para

21 • STJ, 3' T., REsp n. 730.119-RJ, rel. JOÃO OTÁVIO NORONHA, j. 2.6.2016.
fls. 686
DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE 22
ADVOCACIA

realizar o pagamento do valor executado nos autos do proc. n. 0000451-


654
15.1998.8.26.0125. Ressalte-se ainda que, caso não haja bens do recorrido a serem
expropriados, o prejuízo cujo ressarcimento foi determinado pelos VV. acórdãos
recorridos sequer se verificará, o que evidencia a prematuridade da condenação
da COSAN e, como consequência, sua nulidade.

Conforme ensina THEOTONIO NEGRÃO, "inviável é proferir-se


sentença condicional que determine a reparação de danos caso, em liquidação,
se apure que ocorreram. ""

A esse respeito, o V. acórdão que julgou os embargos de declaração


afastou a alegação da recorrente, sob a justificativa de que "ainda que ausentes bens
do embargado, a dívida subsiste, implicando penhora e outros prejuízos ao
recorrido, que por força do contrato não responde mais pelo valor decorrente de
condenação em ação judicial". Contudo, justamente por depender de evento futuro e
incerto, não poderia ter sido imposta tal obrigação à recorrente!

A esse respeito, essa Col. Corte "tem o entendimento de que,


nos termos do disposto no art. 460, parágrafo único, do CPC, a sentença
que sujeita a procedência ou improcedência do pedido a acontecimento
futuro e incerto é nula". 23

Resta evidente, portanto, a violação aos arts. 460, par. do Código de


Processo Civil de 1973 e 492, par. do Código de Processo Civil de 2015, razão pela
qual deve ser dado provimento a este recurso especial.

11—
VIOLAÇÃO AO ART. 1.022, INC. II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Caso esse Co!. Superior Tribunal de Justiça eventualmente entenda


não ter ocorrido o enfrentamento pelo E. Tribunal a quo das questões tratadas nos
itens anteriores, ainda assim o presente recurso deve ser conhecido porque, nessa
hipótese será imperioso ao menos reconhecer que o segundo dos VV. acórdãos lá

22 Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, 49 ed., São Paulo, Saraiva, 2018,
P. 21.
23 • STJ, 6 T., AgRg no REsp n. 1.295.494-BA, rel. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, j.21.10.2014.
fls. 687
DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE 23
ADVOCACIA
655
proferidos e aqui impugnados cometeu nova violação frontal ao disposto no art.
1.022, inc. II do Código de Processo Civil — violação essa que surgiu com o próprio
V. acórdão recorrido, ficando, portanto, dispensada a prévia suscitação desse ponto
(supra, n. 6).

Relembre-se que logo após o julgamento da apelação, a ora


recorrente opôs embargos de declaração para tratar de graves omissões incorridas
pelo E. Tribunal a quo (fls. 6). Ao analisar o recurso, naquela ocasião, a Col. Câmara
julgadora rejeitou os embargos sob a justificativa de "inocorrência de quaisquer das
hipóteses previstas no artigo 535 do CPC/1973 (artigo 1.022 do CPC/2015)".
Posteriormente, reconhecida por esse Co!. Superior Tribunal de Justiça a violação ao
art. 1.022, inc. II do Código de Processo Civil, e a necessidade de que o E. Tribunal
a quo se manifestasse sobre questões essenciais ao julgamento da demanda,
o V. acórdão de fls. 493-495 foi anulado e os embargos de declaração da COSAN
foram novamente julgados. Dessa vez, foram acolhidos, manifestando-se
o E. Tribunal a quo, ainda que sucintamente, sobre as omissões apontadas.

Apesar desse novo julgamento, caso essa Col. Corte entenda que as
questões objeto deste recurso ainda não foram adequadamente debatidas pela
instância a quo, deverá ser reconhecida novamente a violação ao art. 1.022, inc. II,
do Código de Processo Civil, por não ter sido cumprida a função integrativa para
a qual foram criados os embargos de declaração. Conforme o entendimento dessa
Co!. Corte, "há ofensa ao art. 535, II, do CPC [reproduzido no art. 1.022, inc. II,
do Código de Processo Civil vigente] quando o Tribunal a quo, a despeito
da omissão existente no acórdão e da oposição de embargos declaratórios, deixa de
emitir juizo de valor especificamente sobre questão desenvolvida nos autos
e relevante para o deslinde da controvérsia"?'

Assim, para o caso de o presente recurso especial não ser provido


nos termos requeridos nos itens anteriores, pede seja reconhecida a ofensa ao
art. 1.022, inc. II, do Código de Processo Civil e, aplicado o disposto no art. 1.025 do

24 . ST.1, 4T., REsp n. 1.130.311-RJ, rel. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, j. 4.8.2011.


fls. 688
DINAMARCO, ROSSI, BERALDO & BEDAQUE 24
ADVOCACIA
656'
mesmo Código, seja desde logo enfrentada por essa Col. Corte a alegação de
violação aos arts. 109, § 1°, 141, 369, 492, 505 e 507 do Código de Processo Civil
(CPC-73, arts. 128, 42, § 1°, 332, 460, 471 e 473), e ao art. 299 do Código Civil.

Caso se entenda que não é possível na situação concreta aplicar o


disposto no art. 1.025 do Código de Processo Civil, pede-se novamente a anulação
do V. acórdão que julgou os embargos de declaração opostos pela COSAN, por ofensa
ao art. 1.022, inc. II, do Código de Processo Civil.

CAP. IV
CONCLUSÃO

12—
PEDIDOS

Pede-se que o presente recurso especial seja admitido pela alínea a


do permissivo constitucional e provido, por violação aos arts. 128, 42, § 1°, 332, 460,
471 e 473 do Código de Processo Civil de 1973 (CPC-15, arts. 109, § 1°, 141, 369,
492, 505 e 507), e ao art. 299 do Código Civil, para que este processo seja extinto
sem o julgamento do mérito.

Subsidiariamente, pede-se que sejam anulados os VV. acórdãos


recorridos, abrindo-se a oportunidade para a recorrente produzir prova a respeito das
suas alegações.

Em segundo grau de subsidiariedade, pede se o provimento do


-

recurso especial para que se anule o acórdão que julgou os embargos de declaração,
por violação ao art. 1.022, inc. II, do Código de Processo Civil.

São Paulo, 11 de fevereiro de 2020.

ange inam. arco José Roberto dos San-Ns Bedaque


OAB-SP n. 91.537 OAB-SP n. 309.099

/g i htti
celos Ca :il2o Lopes Caro me P i o Ezequiel
O B-SP n. 206.587 OAB-SP n. 329.960

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