Você está na página 1de 3

COMEÇANDO PELO COMEÇO

Escrever? Uma carta? Não, prefiro falar!

A comunicação escrita é o calcanhar de Aquiles de muitas pessoas. Afinal, fomos


pouco estimulados e todos recordam, durante o ensino formal, o pânico que
cercava uma redação. No trabalho, a elaboração de cartas, e-mails e relatórios
repetem o drama. Na vida pessoal, o drama persiste: desde uma carta para o
banco até outra para um amigo. Na busca do emprego também é comum a
solicitação de currículo vir acompanhado de “carta do próprio punho”.

E qual é a solução para a dificuldade? Aderimos ao modelo. Pegamos um padrão


de carta e repetimos a fórmula. Há inclusive livros só com modelos de cartas.
Este recurso – a cópia do modelo – é muito antigo. E o que é pior: a maioria das
pessoas não atualiza a cópia do modelo. O mesmo estilo de carta do início do
século continua circulando, principalmente no mercado de trabalho. Veja, por
exemplo, há quantos anos não dizemos “mui respeitosamente”? Nem meu bisavô
falava mais e, no entanto, ainda recebemos cartas com esta expressão arcaica.

Manuela Rodriguez, professora de Comunicação e de Espanhol, autora dos livros


Manual de Modelos de Cartas Comerciais e Manual de Correspondência Del
Mercosur, editados pela Atlas, e que acaba de lançar Comunicação &
Objetividade (Editora STS), é especialista no assunto e afirma que a resistência
na atualização das cartas ainda é grande. “Em muitas empresas a carta continua
andando mal das pernas. Ainda há chefes que não aceitam a nova redação,
simples, direta e objetiva. Eu mesma – através dos meus livros – já comprei muita
briga, principalmente entre chefe e secretária e chefe e redator”, diz.

CONCORRÊNCIA COM CAMINHA


Manuela, que ministra palestras, principalmente para secretárias, conta que o
principal comentário é que elas desejavam que o chefe estivesse presente, ou
então, que Manuela deveria fazer uma palestra especial para os chefes.

O profissional quer se atualizar, escrever dentro de um padrão mais moderno,


porém a chefia ainda está presa nos modelos do passado.

A professora tem uma coleção de frases descabidas, geralmente enviadas pelas


suas alunas. Por incrível que pareça, ainda hoje encontramos cartas que
procuram concorrer com Pero Vaz de Caminha, o autor da primeira carta escrita
em português no Brasil.

Conheça algumas delas: “Sem mais, com estima e consideração receba um


grande amplexo”; “No interesse de granjear sua simpatia, subscrevemo-nos . . .”,
“Em anexo, junto à carta que segue hoje pelo correio, envio 3 notas promissórias .
. .”; “Assim sendo, enviamos a presente proposta para lembrá-los da nossa
existência e colocamo-nos mais uma vez ao seu inteiro dispor, firmando-nos mui,
Atenciosamente”; “Nos desculpem por nossa longa carta, mas ela era necessária
para mencionar todas as nossas propostas. (3 páginas)”. Atenção: todas as frases
acima são verídicas.

COMECE PELO INÍCIO, VÁ ATÉ O MEIO E DEPOIS PARE


“Uma carta comercial tem que ser simples e objetiva, como se você estivesse
falando pessoalmente com o receptor. Ela tem que prender a atenção no primeiro
parágrafo para que o leitor continue lendo”, diz a professora.

Manuela afirma que os formalismos e as palavras rebuscadas podem ser


dispensados do começo ao fim. “O início da carta deve ser rápido e sem
preparação; no meio, você deve expor claramente o motivo da carta, e o
encerramento deve, basicamente, atender aos seguintes objetivos: levar o leitor a
fazer aquilo que se deseja dele ou deixar boa impressão sobre o remetente, caso
não se pretenda a ação do destinatário”, ensina.

E o traço para a assinatura? “Não é preciso, pois quem assina cartas já é bem
grandinho, não precisa de traço para assinar. Apenas mencione: Atenciosamente
ou Cordialmente, para terminar sua carta. Se tiver que agradecer, mencione:
Gratos pela atenção”.

É PROIBIDO
Conheça alguns exemplos que você NÃO deve escrever nunca, em nenhuma
carta, seja qual for o destinatário, de acordo com a professora:

1. “Venho por intermédio desta” ou ”Venho pela presente”.

Será que você pode vir por outra?

2. “Acusamos o recebimento de sua carta e passamos a responder”.

Se você está respondendo a carta é lógico que você a recebeu.

3. “Damos em nosso poder sua carta. . .”.

Não diga!

4. “É com prazer que comunicamos...”.

Tem gente que só sabe iniciar as cartas assim. Não é necessário ter tanto prazer
para escrever uma carta comercial, a não ser que seja um evento especial, uma
boa notícia, uma inauguração, etc.

5. “Limitados ao exposto somos com estima e consideração”.

Não é necessário ter estima nem consideração para fechar uma carta. Outra
coisa: se você está limitado, não avise seu leitor.

6. “Sem mais para o momento...”.

Se você tivesse mais, diria na carta.


7. “Sendo o que se nos oferece para o momento, ‘subscrevemo-nos’, ou,
‘firmamo-nos’”.

Isto não se usa há mais de 20 anos. Não é necessário mencionar que você está
firmando a carta, ela precisa ser assinada.

APROVEITE E VERIFIQUE O QUE PODE E O QUE NÃO PODE SER USADO:

Por intermédio desta informamos;


Servimo-nos da presente para comunicar;
Levamos ao seu conhecimento;

Nem informamos ou comunicamos.


Pode ir direto ao ;assunto.
Ir direto ao assunto.

Seguem em anexo . . .
Conforme segue abaixo relacionado . . .
Encontra-se em nosso poder . .
Tem esta o objetivo de solicitar . .

Anexamos . . .
Relacionado a seguir . . .
Recebemos . . .
Solicitamos . . .

E O E-MAIL?
Manuela, afirma que há pessoas que pensam que o e-mail está tirando o lugar da
carta comercial. “Nada disso! Se a empresa necessitar fechar um negócio,
confirmar uma proposta confidencial, comunicar a nomeação de uma nova
diretoria e vários outros assuntos importantes, o melhor método continua sendo a
carta. Com isto, não quero diminuir a importância e a praticidade do e-mail, mas
nenhum documento ainda conseguiu tirar a excelência e a confiabilidade da
carta”, diz.

Porém, ela chama atenção para a displicência na redação dos e-mails. Ao


receber um e-mail interessante, as pessoas não se preocupam em criar uma nova
mensagem para o próximo destinatário, simplesmente acionam a tecla
ENCAMINHAR, perdendo a chance de personalizá-lo. Manuela afirma que a boa
redação, seja em carta, seja em e-mail, é um diferencial enorme e deve ser
cuidado e aprimorado. “A escrita é a ação mais íntima no sistema de
comunicação com o mundo, que desnuda e invade o referencial interno da
pessoa humana, tornando-a transparente”, finaliza.

Você também pode gostar