Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
POLÍTICA
Mundo bipolar
e Guerra Fria
Gabriel André de Assis Ramos
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
A Guerra Fria, conflito disputado entre os Estados Unidos e a União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS) pela hegemonia mundial, proporcionou a diversas
nações experiências profundas, indo muito além dos impactos internos nos res-
pectivos países. Na busca por expandir suas áreas de influência e diminuir as de
seu rival, ambos os países aplicaram estratégias distintas, apoiando e oprimindo
diferentes países em diferentes situações.
Mesmo com o mundo tentando se recuperar da traumática experiência que foi
a Segunda Guerra Mundial, as perspectivas de paz não duraram e, em poucos anos,
os embates de cunho político, econômico e ideológico tornaram-se novamente
belicosos, afetando países da América Latina até a Ásia. Os eventos ocorridos no
período da Guerra Fria preservam, até hoje, enorme relevância. Notório exemplo
é o regime militar brasileiro (1964–1985) e o golpe militar de Pinochet (1973), no
Chile, ambos apoiados logística, econômica e militarmente pelos Estados Unidos,
buscando minar as inclinações socialistas nos dois países.
Neste capítulo, você vai estudar os eventos que antecederam a Segunda Guerra
Mundial, ponto chave para entender sua sucessora, a Guerra Fria, e o antagonismo
2 Mundo bipolar e Guerra Fria
Por essas razões, logo após a vitória dos comunistas na Rússia, dezenas
de países — destacando-se Estados Unidos, França, Reino Unido e Japão —
apoiaram financeira e logisticamente grupos que ainda tentavam retomar
o poder na Rússia. Todavia, mesmo com toda a pressão externa e conflitos
armados internos, o grupo dirigido por Lenin saiu vitorioso desse segundo
episódio, conhecido como a Guerra Civil Russa (1918–1923).
O terceiro episódio a ser brevemente analisado é a Primeira Guerra Mundial
(1914–1918). O conflito, envolvendo inicialmente potências europeias, contou
também com o envolvimento militar, mas principalmente econômico, dos
Estados Unidos. A potência ocidental fez vários empréstimos para o Reino
Unido e a França, além de ter sido um grande fornecedor de alimento e ar-
mamento para ambos. Ao fim da guerra, a Europa — parcialmente destruída e
Mundo bipolar e Guerra Fria 3
com suas maiores potências (Reino Unido, França e Alemanha) devendo mais
de quatro bilhões de dólares para os Estados Unidos — perdeu sua posição
hegemônica para os Estados Unidos, que se tornou o centro do capitalismo
mundial (REZENDE FILHO, 2008).
O quarto episódio é a crise de 1929. A década de 1920 foi, até a explosão
da crise, um período de grande crescimento econômico para os Estados
Unidos. Com o fim da Primeira Guerra Mundial (1914–1918), enquanto os paí-
ses da Europa lutavam para se estabilizar, os Estados Unidos lucravam com
empréstimos e vendas que haviam feito aos países beligerantes. Entre os
motivos que fizeram da década de 1920 um período de forte crescimento
econômico dos Estados Unidos, destacam-se:
A década de 1920 foi marcada pelo American way of life (Figura 1), um
estilo de vida sustentado na fácil aquisição de crédito e bens de consumo
por parte da população. A produção industrial era tanta que, entre 1926 e
1929, os Estados Unidos foram responsáveis por 42,2% de toda a produção de
industrializados do mundo. No entanto, toda aquela aparente prosperidade
escondia grandes problemas estruturais, como baixas taxas de lucro, um
razoável nível de desemprego e altíssimo grau de concentração de renda e
desigualdade social. Em 1929, 60% das famílias estadunidenses possuíam
uma renda capaz de sanar somente as demandas mais básicas e vitais dos
seres humanos (REZENDE FILHO, 2008).
4 Mundo bipolar e Guerra Fria
Figura 1. No fundo, uma propaganda exaltando o “estilo de vida americano”, na frente uma
fila de desempregados, em 1929.
Fonte: Obvious (2016, documento on-line).
a ascensão nazista. Quando Hitler assumiu o poder (1933) e deu início ao III
Reich, a Alemanha passava por uma profunda crise econômica oriunda ainda
do Tratado de Versalhes (1919) e da Crise de 1929. No campo político, o país
vivia uma situação de conflito aberto entre comunistas e nazistas (grupos
adeptos ao Partido Nacional Socialista Alemão) e uma enorme insatisfação
popular com os partidos tradicionais. Com uma ideologia declaradamente
anticomunista e antissemita — pois grupos comunistas tentavam tomar o
poder, e grupos de capitalistas judeus controlavam parte da economia alemã
—, Hitler conseguiu apoio dos grandes capitalistas nacionais e de parte da
população para avançar na sua empreitada contra a URSS, planejada desde
1933, e os comunistas e judeus na Alemanha (VUILLARD, 2018).
Outros acontecimentos importantes e que demonstram o apoio que o
nazismo (capitalismo) teve para invadir a URSS (socialismo) foram a Anexa-
ção da Áustria (1938) e a Conferência de Munique (1938), quando a Europa,
principalmente o Reino Unido e a França, foram coniventes com os interesses
alemães de anexar territórios em busca de melhor posicionamento estratégico
e insumos para sua indústria bélica. O resultado foi que, no ano seguinte,
Hitler invadiu a Polônia e deu início à Segunda Guerra Mundial.
Vimos até agora que:
A Grande Guerra
Para entendermos a bipolaridade à qual o mundo foi submetido após o fim
da Segunda Guerra Mundial, é necessário nos determos em três pontos: 1) a
demonstração de força e o avanço do socialismo no mundo; 2) a situação dos
Estados Unidos durante e após a guerra e; 3) a divisão regional do planeta.
6 Mundo bipolar e Guerra Fria
vivenciassem uma revolução. Além disso, Magnoli (2008, p. 97) afirma que o
resultado da Doutrina Truman foi:
Figura 2. Cerco feito à URSS pelas organizações criadas pelos Estados Unidos.
Fonte: Vasconcellos e Mansani (2013, documento on-line).
poderia representar mais uma perda no continente asiático. A guerra teve fim
com uma trégua assinada em 1953, mantendo o país dividido em Norte e Sul.
Outro episódio importante foi a Revolução Cubana (1959). Governada pelo
ditador Fulgêncio Batista, Cuba era há séculos uma espécie de bordel dos
Estados Unidos (ALVES, 2016), que mandavam e desmandavam na pequena
ilha. Com o início da luta armada (1953) pelo grupo dirigido por Fidel Castro,
foram necessários aproximadamente seis anos até o triunfo da revolução. Com
tendências nacionalistas, anti-imperialistas, democráticas e comunistas, a
Revolução Cubana desagradou fortemente os Estados Unidos, que passaram
a boicotar o pequeno país. Uma das maiores ações dos Estados Unidos contra
Cuba se deu na chamada Invasão da Baía dos Porcos (1961). Nesse episódio,
agentes financiados pela CIA tentaram invadir o país e sabotar a revolução.
Todavia, a empreitada falhou. Após as diversas ofensivas estadunidenses
contra Cuba, Fidel Castro buscou e conseguiu apoio da URSS. Esta, por sua vez,
não investiu ou apoiou o desenvolvimento industrial de Cuba, mas manteve
o país com sua economia atada principalmente à produção açucareira, o que
fez com que, após o desmanche da URSS (1991), a pequena ilha vivenciasse
uma enorme crise. O triângulo Cuba-Estados Unidos-URSS também foi pro-
tagonista da Crise dos Mísseis (1962).
Para a URSS, era de extremo interesse ter um aliado no secular quintal
dos Estados Unidos, a América Latina. Porém, no contexto da Guerra Fria,
as manobras cubano-soviéticas geraram um dos momentos mais tensos da
história recente, quando URSS e Estados Unidos ameaçavam lançar bombas
atômicas um no outro — ápice histórico da corrida armamentista entre as
duas potências. Contudo, a guerra nuclear não ocorreu e, após diálogos entre
Kennedy (Estados Unidos) e Kruschov (URSS), a crise teve fim.
este se viu obrigado a intervir no país para tentar evitar a vitória das forças
dirigidas por Ho Chi Minh.
No entanto, a pretendida vitória fácil da potência estadunidense sob os
guerrilheiros comunistas não se realizou; pelo contrário, os Estados Unidos
se viram cada vez mais obrigados a aumentar seu investimento de vidas
humanas e dinheiro no conflito (MAGNOLI, 2013). Por fim, com sucessivos
fracassos e uma enorme pressão popular pelo fim da guerra, o presidente
Richard Nixon se viu obrigado a assinar um cessar-fogo. Após a derrota e a
retirada das tropas estadunidenses do Vietnã, o governo do Sul não resistiu
à ofensiva comunista e, em 1976, o país foi unificado sob direção destas.
Os eventos aqui trazidos visam demonstrar com exemplos históricos o
nível ao qual chegou a disputa por áreas de influência entre a URSS e os
Estados Unidos. A URSS incentivava os países a fazerem sua revolução e
romperem com a dominação estadunidense, enquanto os Estados Unidos
intervia em defesa de seus interesses e de seus aliados, buscando conter
a expansão comunista pelo mundo; afinal, os dois modos de produção em
disputa são antagônicos.
É verdade que o poder burguês dita, algumas vezes, leis e decretos de que se
aproveita também a classe operária. Mas, se ele o faz, é no interesse da burguesia.
Tomemos para exemplo a estrada de ferro: — elas são utilizadas pelos operários,
servem também aos operários, mas não são construídas para eles. Comerciantes,
fabricantes, precisam delas para o transporte de suas mercadorias, a circulação
de seus gêneros, a mobilização das tropas e dos operários, etc. O Capital precisa
de estradas de ferro e as constrói para o seu próprio interesse. Elas são úteis,
também, aos operários, mas esta não é a razão que faz com que o Estado capitalista
as construa. Consideremos, também, a limpeza das ruas, o serviço municipal de
assistência e dos hospitais; a burguesia também os assegura nos bairros operá-
rios. É bem verdade que, comparados aos bairros burgueses, os bairros operários
são sujos e constituem focos de infecção, etc. Mas, ainda assim, a burguesia faz
alguma coisa. Por quê? Muito naturalmente porque, a não ser assim, as doenças
e as epidemias se espalhariam por toda à cidade e iriam causar sofrimentos aos
burgueses. O Estado burguês e seus órgãos das cidades são guiados, também,
nesses casos, pelos interesses da própria burguesia.
Referências
ALVES, R. Um lugar de cabarés e gângsteres. Correio Braziliense, 27 nov. 2016. Disponível
em: https://www.correiobraziliense.com.br/impresso/2016/11/2715573-um-lugar-de-
-cabares-e-gangsteres.html. Acesso em: 26 jan. 2021.
BUKHARIN, N.; PREOBRAJENSKI, I. ABC do comunismo. 2. ed. São Paulo: Edipro, 2018.
CANO, W. Notas sobre a crise da URSS. Economia e Sociedade, v. 9, n. 1, p. 203-210,
2016. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/ecos/article/
view/8643126. Acesso em: 26 jan. 2021.
MAGNOLI, D. História das guerras. In: MAGNOLI, D. (org.). Guerras da Indochina. São
Paulo: Contexto, 2013. p. 407.
MAGNOLI, D. O mundo contemporâneo: os grandes acontecimentos mundiais da guerra
fria aos nossos dias. 2. ed. São Paulo: Atual, 2008.
MARTINS, L. C. dos P.; KRILOW, L. S. W. A crise de 1929 e seus reflexos no Brasil: a
repercussão do crack na Bolsa de Nova York na imprensa brasileira. In: ENCONTRO
18 Mundo bipolar e Guerra Fria
NACIONAL DE HISTÓRIA DA MÍDIA, 10., 2015, Porto Alegre. Anais [...]. Porto Alegre: UFRGS,
2015. Disponível em: https://silo.tips/download/a-crise-de-1929-e-seus-reflexos-no-
-brasil-a-repercussao-do-crack-na-bolsa-de-nov. Acesso em: 25 fev. 2021.
MARX, K. As lutas de classes na França. São Paulo: Boitempo, 2012.
MARX, K.; ENGELS, F. Manifesto do partido comunista. 3. ed. São Paulo: Edipro, 2015.
MIGLIOLI, J. Formação do sistema soviético de planejamento. Novos Rumos, v. 26, n. 12,
1997. Disponível em: https://revistas.marilia.unesp.br/index.php/novosrumos/article/
view/1949. Acesso em: 25 fev. 2021.
MORRAY, J. P. Origens da Guerra fria (de Yalta ao desarmamento). Rio de Janeiro: Zahar, 1961.
MUNHOZ, S. J. Imperialismo e anti-imperialismo, comunismo e anticomunismo durante
a Guerra Fria. Revista Esboços, v. 23, n. 36, p. 452-469, 2017. Disponível em: https://
periodicos.ufsc.br/index.php/esbocos/article/view/2175-7976.2016v23n36p452/34094.
Acesso em: 25 fev. 2021.
OBVIOUS. [Beleza americana]. [S. l.]: Obvious, 2016. Disponível em: http://obviousmag.
org/lumiere/2016/beleza-americana-chuck-palahniuk-e-o-american-way-of-life.html.
jpg. Acesso em: 25 fev. 2021.
REZENDE FILHO, C. de B. História econômica geral. 9. ed. São Paulo: Contexto, 2008.
SARAIVA, J. F. S. (org.). História das relações internacionais contemporâneas: da socie-
dade internacional do século XIX à era da globalização. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
VASCONCELLOS, C.-M. E.; MANSANI, R. de S. As conferências internacionais de Yalta
e Potsdam e sua contribuição à construção da hegemonia econômica internacional
norte americana no capitalismo do pós 2ª Guerra Mundial. Relações Internacionais no
Mundo Atual, v. 2, n. 16, p. 41-55, 2013. Disponível em: http://revista.unicuritiba.edu.br/
index.php/RIMA/article/view/731. Acesso em: 25 fev. 2021.
VIZENTINI, P. G. F. O Sistema de Yalta como condicionante da política internacional do
Brasil e dos países do Terceiro Mundo. Rev. Bras. Polít. Int., v. 40, n. 1, p. 5-17, 1997. Dispo-
nível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0034-73291997000100001&script=sci_
abstract. Acesso em: 26 jan. 2021.
VUILLARD, É. A ordem do dia. Alfragide: Dom Quixote, 2018.
Leituras recomendadas
CATANI, A. M. O que é capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 2017.
HOBSBAWM, E. J. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. 2. ed. São Paulo:
Companhia das Letras, 1995.