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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS

CAMPUS ARAPIRACA
UNIDADE EDUCACIONAL DE PALMEIRA DOS INDIOS
CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

DENISE KELLY SILVA

A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL FACE A CRISE ESTRUTURAL DO


CAPITAL: A ADMINISTRAÇÃO DO ESTADO SOBRE A POBREZA

PALMEIRA DOS INDIOS


2021
Denise Kelly Silva

A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL FACE A CRISE ESTRUTURAL DO


CAPITAL: a administração do Estado sobre a pobreza

Trabalho de Conclusão de Curso - TCC apresentado


a Universidade Federal de Alagoas – UFAL,
Campus de Arapiraca, Unidade Educacional
Palmeira dos Índios, como requisito parcial para a
obtenção do grau de Bacharel em Serviço Social.
Orientadora: Prof.ª Dra. Angélica Luiza Silva
Bezerra.

PALMEIRA DOS ÍNDIOS


2021
Catalogação na fonte
Universidade Federal de Alagoas
Biblioteca Unidade Palmeira dos Índios
Divisão de Tratamento Técnico

Bibliotecária Responsável: Kassandra Kallyna Nunes de Souza (CRB-4: 1844)

S586p Silva, Denise Kelly


A política de assistência social face a crise estrutural do capital: a
administração do estado sobre a pobreza / Denise Kelly Silva, 2021.
80 f.

Orientadora: Angélica Luiza Silva Bezerra.


Monografia (Graduação em Serviço Social) – Universidade Federal de
Alagoas. Campus Arapiraca. Unidade Educacional de Palmeira dos Índios.
Palmeira dos Índios, 2021.

Bibliografia: f. 75 – 80

1. Serviço social. 2. Política social. 3. Estado de pobreza. 4. Assistência


social. I. Bezerra, Angélica Luiza Silva. II. Título.
CDU: 364
DENISE KELLY SILVA

A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL FACE A CRISE ESTRUTURAL DO


CAPITAL: a administração do Estado sobre a pobreza

Trabalho de Conclusão de Curso – TCC apresentado ao Curso de Serviço Social da


Universidade Federal de Alagoas/ Unidade Educacional de Palmeira dos Índios, como requisito
parcial para obtenção do grau de Bacharel em Serviço Social.

___________________________________________________
Profª. Drª. Angélica Luiza Silva Bezerra
(Orientadora– Curso de Serviço Social/Unidade Educacional Palmeira dos Índios/Campus
Arapiraca/ Universidade Federal de Alagoas – UFAL)

_____________________________________________________
Prof. Dr. Fernando de Araújo Bizerra
(Examinador interno – Curso de Serviço Social/Unidade Educacional Palmeira dos
Índios/Campus Arapiraca/ Universidade Federal de Alagoas – UFAL)

_____________________________________________________
Profa. Ma. Érika Flávia Soares da Costa
(Examinadora externa - Curso de Serviço Social/Unidade Educacional Palmeira dos
Índios/Campus Arapiraca/ Universidade Federal de Alagoas – UFAL)

Palmeira dos Índios/AL, 06 de abril de 2021.


Dedico este trabalho a todos que lutam e
resistem as investidas do capital contra as
políticas públicas que mesmo sendo utilizadas
para controlar as crises do capital, favorecem a
população em vulnerabilidade social.
AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente a Deus que me possibilitou a dádiva da vida, aos meus pais
Ivoneide Maria Silva e Domingos José da Silva pelo apoio em vários momentos da minha
jornada, aos meus tios, Ioleide Rocha e Antônio Barnabé por serem suportes na nossa educação,
ao meu noivo Ícaro Rodolfo Soares Coelho da Paz pelo amor, apoio, cumplicidade,
companheirismo e paciência nos momentos de adversidade e por todo incentivo na conclusão
deste curso e aos meus irmãos Karine e Dênisson pela compreensão em etapas deste curso. À
minha sobrinha Luna Sophia, que nasceu em 2016 e esteve presente durante todos os momentos
dessa conquista.
Às minhas amigas em especial Rosa Beatriz, Fernanda Marinho, as primas Mylla e
Nadja Gracielle, pelo incentivo para que eu não desistisse de concluir este trabalho, por todo
auxílio e humildade em me ajudarem quando precisei, por muitas vezes apenas com uma
palavra amiga.
Às minhas colegas, destaco aqui algumas delas porque foram de grande importância
nessa caminhada, meu muito obrigada a Rosa Maria, Rayane Guerra, Daniela Lopes, Satyla,
Janaína, Déborah, Elaine Kívia, Amanda de Araújo, Rose, pelos instantes de conversa e
trabalho que nos possibilitaram o crescimento mútuo durante o curso. Agradeço também as
demais colegas de curso que trocaram conhecimento mesmo nas horas de intervalo, eventos e
momentos de descontração.
Agradeço a assistente social Thaíris Larangeira, minha supervisora de estágio pelos
ensinamentos proporcionados acerca da vida profissional e também aos profissionais que
trabalhavam no Centro de Referência de Assistência Social – CRAS e no Centro de Referência
Especializado de Assistência Social – CREAS em 2018, ambos na cidade de Igaci/AL.
Agradeço também a minha orientadora, Angélica Bezerra, pela paciência, conversas e
contribuição nas reflexões e orientações do melhor caminho para este estudo.
. Não poderia deixar de agradecer também aos integrantes do Projeto de Extensão IUPI
em 2018, principalmente a Paulinha, Samyla e Rirys, que me acolheram tão bem e pude me
tornar uma pessoa melhor com tudo que vivenciei no projeto, em cada visita aos hospitais, pois
a palhaçoterapia mostra que através de um sorriso podemos diminuir o sofrimento das pessoas,
como citava Patch Adams no filme: O Amor é contagioso, “Comprimidos aliviam a dor, mas
só o amor alivia o sofrimento”.
Por fim e não menos importante devo agradecer aos professores que venho trazendo em
minha bagagem e que foram as bases da minha formação. Obrigado aos meus professores do
Ensino Fundamental e Médio, obrigado aos professores da graduação, em especial aos
professores Fernando de Araújo e Angélica Bezerra por todos os ensinamentos partilhados no
decorrer de suas disciplinas, pela dedicação e profissionalismo que sempre contribuíram
positivamente para o alunado. Outrossim obrigada ao Curso de Graduação em Serviço Social e
a UFAL, pela oportunidade de ampliar meus conhecimentos, através de uma Universidade
pública, e de qualidade.
“[...] não há incongruência em relacionar o
marxismo com a política social: [...]
um processo contraditório no interior do
capitalismo que, ao mesmo tempo em
que é capturado pelo capital para atender seu
objetivo de lucro, pode ser uma
estratégia de fortalecimento dos trabalhadores
contra os apetites do capital”

(PEREIRA, 2010, p. 9)
RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso “A política de assistência social face a crise estrutural
do capital: a administração do Estado sobre a pobreza” trata sobre a compreensão da política
de assistência social no contexto da crise estrutural do capital que impulsionara efetivamente
na fragmentação e redução desta política sob a perspectiva do neoliberalismo, como também as
estratégias de enfrentamento do Estado sobre a pobreza, os investimentos e a permanência dos
programas de transferência de renda da atualidade. Deste modo, nossa perspectiva é trazer para
a discussão a política de assistência social como política pública configurando-se, desta forma,
como direito de cidadão e dever do Estado. Este trabalho tem a pretensão de mostrar a política
de assistência social no momento da crise estrutural do capital, ao apresentar a precarização da
política devido ao neoliberalismo. Como fundamentação metodológica deste trabalho, foi
utilizada a pesquisa bibliográfica e documental, que foi fundamental e trouxe grande
esclarecimento sobre a temática e o método materialista histórico dialético de Marx que
apreende o objeto em uma perspectiva de totalidade. A partir do exposto compreende-se as
possibilidades e os limites da efetivação da política de assistência social no contexto da crise
estrutural que põe cada vez mais em evidência a necessidade de controle da pobreza mediante
a intervenção do Estado para manter a ordem do capital em funcionamento. Esta realidade
demonstra a necessidade da luta por um outro tipo de sociedade como alternativa, com
mobilização através da luta de uma sociedade organizada, construindo uma sociedade
humanamente emancipada.

PALAVRAS-CHAVE: Crise estrutural. Assistência Social. Neoliberalismo. Programa de


Transferência de Renda.
ABSTRACT

The present work of conclusion of the course “The policy of social assistance in the face of the
structural crisis of capital: the State administration on poverty” deals with the understanding of
the policy of social assistance in the context of the structural crisis of capital that had effectively
driven in the fragmentation and reduction of this policy from the perspective of neoliberalism,
as well as the State's coping strategies on poverty, investments and the continuity of current
income transfer programs. In this way, our perspective is to bring the social assistance policy
as a public policy to the discussion, thus configuring itself as a citizen's right and duty of the
State. This work intends to show the social assistance policy at the moment of the structural
crisis of capital, by presenting the precariousness of the policy due to neoliberalism. As a
methodological basis of this work, bibliographic and documentary research was used, which
was fundamental and brought great clarification on the thematic and the dialectical historical
materialist method of Marx that apprehends the object in a perspective of totality. From the
above, it is possible to understand the possibilities and limits of implementing the social
assistance policy in the context of the structural crisis that increasingly highlights the need to
control poverty through State intervention to keep the order of capital in operation. . This reality
demonstrates the need to fight for another type of society as an alternative, with mobilization
through the struggle of an organized society, building a humanly emancipated society.

KEYWORDS: Structural crisis. Social assistance. Neoliberalism. Income Transfer Program.


LISTA DE SIGLAS

AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida


BPC Benefício de Prestação Continuada
CBIA Centro Brasileiro para Infância e Adolescência
CF Constituição Federal
CNAS Conselho Nacional de Assistência Social
CRAS Centro de Referência de Assistência Social
CREAS Centro de Referência Especializado de Assistência Social
DELP Documento Estratégia de Lutas contra a Pobreza
EUA Estados Unidos da América
FHC Fernando Henrique Cardoso
FMI Fundo Monetário Internacional
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INSS Instituto Nacional de Seguro Social
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
LBA Legião Brasileira de Assistência
LDO Lei de Diretrizes Orçamentárias
LOAS Lei Orgânica de Assistência Social
MAS Ministério de Assistência Social
MBES Ministério do Bem Estar Social
MDS Ministério do Desenvolvimento Social
MP Medida Provisória
MPAS Ministério de Previdência e Assistência Social
MPC Modo de Produção Capitalista
NOB Norma Operacional Básica
NOB/SUAS Norma Operacional Básica/ Sistema Único de Assistência Social
OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômica
ONU Organização das Nações Unidas
PAC Programa de Aceleração do Crescimento
PBF Programa Bolsa Família
PBSM Programa Brasil sem Miséria
PETI Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
PEC Proposta de Emenda Constitucional
PGRM Programa de Garantia de Renda Mínima
PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PNAS Política Nacional de Assistência Social
PT Partido dos Trabalhadores
PTCR Programa de Transferência Condicionada de Renda
SUAS Sistema Único de Assistência Social
SUS Sistema Único de Saúde
SNAS Secretaria Nacional de Assistência Social
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 12
2 A INTERVENÇÃO DO ESTADO SOBRE A POBREZA NO
CAPITALISMO E A CRISE ESTRUTURAL DO CAPITAL 16

2.1 O sistema do capital e a intervenção do Estado sobre a pobreza 17


2.2 Os fundamentos da crise do capital e suas formas de enfrentamento: as
necessidades de controle do sistema do capital mediante o Estado 27

3 A CONDIÇÃO DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO


SÉCULO XXI 39
3.1 A Política de Assistência Social: um pouco de história 41

3.2 O direcionamento da Política de Assistência Social e o controle da pobreza:


A persistência dos programas de transferência de renda 53
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 71

REFERÊNCIAS 75

.
12

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho de conclusão de curso tem como objeto de estudo a política de


assistência social face a crise estrutural do capital. A política de assistência historicamente se
deu a partir da constituição cidadã de 1988, firmando assim como política pública que deve
atender a todos que dela necessitar, configurando-se, desta forma, como direito de cidadão e
dever do Estado. Tal direito é ratificado pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) pela
Lei nº 8.742 de 1993 e pelo Sistema Único de Assistência Social (SUAS) em 2005, que por
meio de um sistema descentralizado e participativo contribuem na criação de medidas que
assistem e defendem os cidadãos que se encontram em situação de vulnerabilidade social.
Amparada nos estatutos legais, é instituída a Política Nacional de Assistência Social
(PNAS) em 2004 que como política pública de direito social é assegurada pela Constituição,
sistematizada e aprovada a partir do SUAS, e normatizada pela LOAS. A PNAS então visa
junto com as políticas setoriais prover condições para atender à sociedade de forma a garantir
a universalidade dos direitos sociais e o acesso aos serviços socioassistenciais, que serão a
posteriori, melhor elucidados (SANTANA; SILVA; SILVA; 2003).
Importante frisar que, com a consolidação da política de assistência em 1988, veremos
ao longo do trabalho que até a atualidade tal política vem tendo redução dos investimentos nos
serviços sociais e por sua vez influenciou na dinâmica da efetivação desta política,
principalmente, nos programas de transferência de rendas e nos benefícios socioassistenciais.
Ademais, a política de assistência social advém para ressaltar as contradições existentes
entre as particularidades que fundamentam as estratégias utilizadas pelo capital para manter o
controle da pobreza expressando-se nos programas de transferência de renda no Brasil, como o
Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o Programa Bolsa Família (PBF), esta pesquisa
permite assimilar em uma perspectiva da totalidade sócio histórica, a complexa conjuntura
política, econômica e social da sociabilidade e o percurso da consolidação da política de
assistência social em meio aos ditames neoliberais.
O referido tema despertou-me interesse desde os estudos e pesquisas realizados durante
o curso de graduação em Serviço Social, e também do estágio supervisionado no Centro de
Referência de Assistência Social (CRAS) e Centro de Referência Especializado de Assistência
Social (CREAS), o qual possibilitou uma maior aproximação com a política e resultou em
questionamentos acerca de sua efetivação no contexto do neoliberalismo.
13

O propósito deste trabalho é explicitar brevemente o percurso de expansão da política


de assistência social, citar os determinantes históricos que levará para as formas de
enfrentamento pelo Estado na intervenção da pobreza e consolidação das políticas sociais, para
isto faz-se necessário resgatar os fundamentos e a gênese do sistema do capital para desta forma
avaliar as formas de administração dos conflitos sociais nesta sociedade. Como também salienta
sobre os investimentos e a permanência dos programas de transferência de renda diante do
contexto atual no Brasil, para assim buscar as respostas as indagações dividimos este estudo em
duas seções.
Assim, tornar-se relevante este trabalho pela importância que representa esse
conhecimento para os profissionais que estudam e trabalham no cotidiano da política de
assistência social. Dessa forma, contribuir e continuar a acrescentar a novas discussões e outros
conhecimentos mais atuais.
Ademais, a pesquisa foi orientada pelo método materialista histórico dialético de Marx
que apreende o objeto em uma perspectiva de totalidade. Para entender o movimento real do
objeto, com o intuito de compreender e desvendar sua essência, partindo da aparência. Tal
método envolve uma totalidade social, um complexo de complexos que exigem para sua
instituição a interação social, onde é indispensável para entender o contexto do objeto, conhecer
desde as suas raízes. Assim, o método nos possibilitou o conhecimento dos fundamentos das
crises instituídas no sistema capitalista com todas as contradições que são capazes ao mesmo
tempo que o Estado utiliza das políticas sociais para controlar as mobilizações, administrar as
contradições sociais e amortecer o choque dos conflitos sociais, também auxilia os usuários da
política de assistência social em suas condicionalidades de vulnerabilidade social.
A metodologia utilizada foi a bibliográfica e a documental. A partir da leitura de obras
clássicas dos autores: Karl Marx e Friedrich Engels podemos entender os fundamentos das
contradições da sociedade capitalista e o surgimento da pobreza e das leis que puniam os pobres.
Nas obras contemporâneas de autores como: José Paulo Netto; Elaine Behring e Ivanete
Boschetti; Maria Lúcia Martinelli; Maria Luiza Mestriner; Berenice Couto; Mandel; Mészáros;
Maria Carmelita Yasbeck, entre outros, podemos atualizar os efeitos destrutivos do capitalismo
na pobreza e a necessidade de mantar sempre sob controle os problemas sociais com o advento
da assistência social enquanto política. Além disso, buscamos trazer para a discussão os
fundamentos da crise estrutural de Mészáros para fazer relação com a situação de como foi
gerada a política de assistência social, pois ao passo que se torna política, na realidade brasileira,
é reduzida e fragmentada com a ideologia neoliberal como uma das respostas à crise. Como
forma de endossar nossos argumentos sobre a construção da política de assistência social, a
14

partir da pesquisa documental, tivemos acesso a Constituição Federal de 1988 e a leis que
regulamentam a política de assistência social.
Na construção da pesquisa levantaram-se os seguintes questionamentos que nortearam
a discussão: Quais os fundamentos da crise estrutural que impulsionaram efetivamente na
fragmentação e redução da política de assistência social no neoliberalismo? Quais as estratégias
de enfrentamento do Estado sobre a pobreza no contexto da crise estrutural do capital? Qual o
direcionamento dado a política de assistência social diante do contexto de expansão do
neoliberalismo? Por que há um investimento na política de assistência social quanto à
permanência nos programas de transferência de renda?
A primeira analisa os elementos determinantes da crise estrutural do capital e suas
interferências sobre a classe trabalhadora, desta forma faz-se necessário a realização da
recuperação histórica da gênese do capitalismo, com o objetivo de compreender o Estado
Moderno, e como este irá administrar os embates sociais existentes dentro da sociabilidade
capitalista. Isto feito, será traçado o percurso da intervenção do Estado desde a acumulação
primitiva do capital percorrendo toda a formação das políticas sociais no Welfare State até o
governo Temer, onde devido aos limites impostos pelo sistema, há o redimensionamento do
Estado no tocante as políticas sociais.
No segundo item desta seção elucidada acima será tratado sobre os fundamentos das
crises e de que maneira serão as formas de enfrentamento a estas, pois segundo Mészáros
(2011), tal crise estrutural diferencia-se de toda e qualquer crise cíclica vivenciada em toda
história do capitalismo. Desta maneira a crise não é usada apenas à área econômica, se prolonga
às instituições políticas que exigem novas “garantias políticas”, muito condicionada à “política
de consenso”. Assim as políticas sociais se alastram no capitalismo monopolista em alguns
países apenas, aumentando o poder do capital, instituindo um “bem-estar” aos necessitados,
não deixam de ser funcional a ordem do sistema.
Na segunda seção desta pesquisa será abordado sobre a centralidade da assistência social
na conjuntura atual diante a crise estrutural vivenciada e sobre a necessidade da continuidade e
persistência dos programas de transferência de renda no século XXI, assim como sintetizamos
no segundo item desta seção fazendo uma linha histórica até o ano de 2018 com o governo de
Temer. Dessa forma, é feita uma reflexão sobre a pobreza onde destaca-se uma das formas de
enfrentamento utilizadas no Brasil que será as políticas de transferência de renda, que são
consideradas como pontos estratégicos da política social fundamentais no sistema brasileiro de
proteção social.
15

Neste sentindo será observado as peculiaridades e concepções das políticas de


transferência de renda no Brasil que compõem a assistência social, como o Benefício de
Prestação Continuada e o Programa Bolsa Família, que como já foi falado acima, são tidos
como programas essenciais para o enfrentamento à pobreza, pois devido ao aumento dos índices
da pobreza e todas as transformações econômicas e sociais, principalmente com o rearranjo do
mercado capitalista, a regionalização dos mercados e a crescente concentração do capital
financeiro, acaba crescendo as demandas por ações do Estado voltadas à proteção social dos
que se encontram fora do mercado de trabalho ou vivendo em precarização, desta forma
percebe-se uma abrangência dessas políticas que atingem números nunca vistos na assistência
social, por exemplo, no atendimento maior dos usuários em vulnerabilidade social, tornando os
programas de transferência de renda como eixo central das políticas sociais no país.
Assim, observaremos que o presente trabalho terá uma grande importância para os
demais estudos que surgirá e virá a contribuir com novas demandas e críticas ao sistema vigente,
desvelando alguns limites nestas políticas, ou seja, compreenderemos que possibilitará uma
alternativa à de uma nova sociabilidade, com mobilização através da luta da sociedade civil
construindo uma sociedade humanamente emancipada.
16

2 A INTERVENÇÃO DO ESTADO SOBRE A POBREZA NO CAPITALISMO E A


CRISE ESTRUTURAL DO CAPITAL

Essa seção aborda sobre o Estado na administração da pobreza e os elementos


determinantes da crise estrutural do capital ativada na década de 1970 e seus influxos sobre a
classe trabalhadora. Para isso, se faz necessário inicialmente realizar um resgate histórico dos
fundamentos e da gênese do sistema capitalista. Assim, buscamos demonstrar a intervenção do
Estado desde a acumulação primitiva do capital, perpassando a expansão das políticas sociais
no Welfare State até a contemporaneidade, em que diante dos limites absolutos do sistema
provocados pela crise, resultou em um redimensionamento do Estado, impactando nas políticas
sociais.
Também é de nosso interesse discutir os fundamentos da lógica destrutiva do capital
que é fortalecida no capitalismo maduro com o aumento da competitividade e da concorrência,
da subordinação do valor de uso ao valor de troca e da obrigação de atestar a autorreprodução
do sistema. O divisor de águas para tais características destrutivas do sistema do capital
encontra-se num momento histórico em que foi evidenciada a crise estrutural do capital
especificamente nos anos de 1970 que gerou modificações no histórico das crises do
capitalismo. Para Mészáros (2011), a crise estrutural diferencia-se de toda e qualquer crise
cíclica experimentada em toda história do capitalismo. Trata-se de uma crise endêmica,
cumulativa e permanente atingindo toda a vida social em todas as relações, levando a uma
destruição global1.
Desta maneira a crise faz parte do capitalismo, pois trata-se de uma expressão
concentrada das contradições pertencentes ao Modo de Produção Capitalista, ou seja, essas
contradições são necessárias para garantir a reprodução do capital, assim o mesmo não resolve
suas contradições, pois sua natureza prospera-se sobre elas. Assim, que a história do capitalismo
é a história de suas crises. Essas crises são de superprodução de alta ou baixa intensidade
dependendo do contexto social. Nas palavras de Paulo Netto e Braz (2012, p. 157), “a crise é
constitutiva do capitalismo: não existiu, não existe e não existirá capitalismo sem crise”, ficando
evidente que no decorrer de seu desenvolvimento, há uma alternância entre prosperidade e
depressão, gerando o ciclo econômico entre uma crise e outra.
Também podemos dizer que outra característica deste tipo de crise é que não atinge
apenas a área econômica, pois ela se estende das instalações políticas à cultura dos homens.

1
O desemprego (conjuntural e estrutural), a destruição do meio ambiente e as guerras constituem manifestações
inequívocas do caráter sociometabólico do capital que é autodestrutivo e absolutamente incapaz de se controlar.
17

Uma expressão dos efeitos regressivos da crise é como o Estado reduziu significativamente o
investimento em serviços sociais para responder as consequências da crise estrutural. Esta
realidade pôs sérios agravamentos no investimento em políticas sociais, como a política de
assistência social.
Importa esclarecer que antes da ativação da crise estrutural as políticas sociais foram
generalizadas nos países nórdicos da Europa, no período dos chamados anos gloriosos, sob a
função de possibilitar a reorganização e expansão do desenvolvimento capitalista depois da
Segunda Guerra Mundial. Neste período, também conhecido como Estado de “bem-estar social
ou Welfare State”2, as políticas sociais foram redirecionadas qualificando e mantendo a força
de trabalho para o desenvolvimento econômico com o discurso de bem estar para o trabalhador.
A partir disso, entendemos como foi um longo processo de lutas e conflitos para que as
políticas sociais fossem generalizadas, mas com a crise estrutural estas políticas são redefinidas
com a sua fragmentação e focalização mantendo apenas a sobrevivência do trabalhador.
Assim, começaremos nesta seção sobre as contradições do sistema do capital e a
necessidade da função do Estado sobre os problemas sociais e como os efeitos da crise podem
influenciar a dinâmica do Estado sobre as políticas sociais em nome da reestruturação produtiva
sob a ótica do neoliberalismo.
Posto isto, esboçaremos os fundamentos das crises existentes no capitalismo, sejam
essas periódicas/cíclicas ou sistêmica/estrutural, e as formas interventivas que o capital
encontra com a funcionalização do Estado para controlá-las, de modo que não coloque em risco
a dinâmica do modo de produção capitalista.
A partir destes fundamentos podemos encontrar as bases materiais para entender o lugar
da política social na atualidade especialmente o investimento da política de Assistência Social
mediante a necessidade de administrar a pobreza historicamente determinada.

2.1 O sistema do capital e a intervenção do Estado sobre a pobreza.

O sistema capitalista possui como objetivo principal o lucro e para isso torna-se
necessário manter a força de trabalho explorada e controlada, conforme as necessidades de
expansão do capital. Essa exploração do trabalho humano no capitalismo, evidenciou algo
inédito na história: o desenvolvimento das forças produtivas do trabalho que forneceram as
bases para que o sistema do capital concentrasse e centralizasse ainda mais riqueza. Essa nova

2
Welfare State – Estado de Bem-Estar Social, trataremos sobre este no próximo item.
18

sociabilidade em seu estágio mais avançado, é alicerçada na extração do trabalho excedente


cada vez mais em larga escala, se utilizando do Estado como o comitê executivo da burguesia,
para intervir nos processos econômicos e sociais visando garantir a propriedade privada, o
domínio do capital sobre o trabalho, e as condições necessárias para a acumulação e a
valorização do capital.
Contudo, antes de adentrarmos nesse tema, se faz necessário haver um resgate histórico
buscando compreender sobre a gênese dessa nova sociedade, o processo foi designado por Marx
(1988) como “Acumulação primitiva do capital”. Segundo o autor, o período da pré-história
do capital ocorreu a partir da crise do sistema feudal3, quando houve a expulsão dos camponeses
e servos de suas terras, resultando na separação do produtor rural de seus meios de produção.
O referido processo impôs a esses camponeses que se tornassem vendedores de sua força de
trabalho sendo a única forma para a manutenção da sobrevivência, e o trabalho nessa nova
sociedade passa a ser uma atividade criadora de valor.
Marx (1988) explicita que um novo valor somente é gerado a partir do uso da força de
trabalho, em razão que é a única mercadoria que propicia a valorização do capital. No processo
de acumulação do capital, a mercadoria, que é a força de trabalho, se distingue das outras porque
cria um valor superior ao seu custo, dessa maneira, o trabalhador transforma-se em um meio
para a produção da mais-valia4.
Assim, essas mudanças que possibilitaram em uma ruptura dos vestígios feudais,
aconteceu no último terço do século XV, em direção as primeiras décadas do século XVI
quando as terras passam a serem apropriadas para a agricultura capitalista, e se convertem em
propriedade privada. Houve a expulsão dos camponeses e servos de suas terras, surgindo com
isso, uma massa de proletariados que trabalhariam nas grandes indústrias. A derrocada do
sistema feudal resultou no aparecimento das duas classes sociais, a burguesia designada como
os proprietários dos meios de produção e de subsistência, e a classe trabalhadora designada
como as pessoas possuidoras somente de sua força de trabalho.
Diante dessa nova realidade, Marx (1988) expõe que coube ao Estado controlar a classe
trabalhadora que surgia, em vista que o mesmo age de forma fundamentada na manutenção da

3
A Idade Média, por se tratar de um período historicamente longo, foi dividido em duas fases: Alta Idade Média
(V ao XI), período em que ocorre a formação e consolidação do feudalismo, e Baixa Idade Média (XII ao XV),
quando ocorre o apogeu, a decadência e a crise do feudalismo. Já no final da Alta Idade Média ocorreram profundas
mudanças na estrutura feudal, que introduziram parte da sociedade a uma dinâmica urbana e comercial. Sobre
estas mudanças estruturavam-se as principais causas da crise do sistema feudal, que pouco a pouco, tomava
formado capitalismo mercantil dominante durante a Idade Moderna (FERLA; ANDRADE, 2007).
4
Mais-valia absoluta (trata-se do prolongamento da jornada do trabalho), e a mais-valia relativa (trata-se da
intensificação do trabalho, com base na inserção de novas tecnologias e relações de trabalho).
19

ordem, tencionando garantir as condições adequadas para a acumulação e valorização do


capital, a partir da preservação da força de trabalho. Compreendendo isso, o autor prossegue
afirmando que para conter os camponeses expulsos, foram desenvolvidas as leis contra a
vagabundagem, chamada naquele período de legislações sanguinárias, que eram medidas
coercitivas que tratavam os pobres como criminosos. As leis determinavam que:

[...] Esmoleiros velhos e incapacitados para o trabalho recebem uma licença para
mendigar. Em contraposição, açoitamento e encarceramento para vagabundos válidos.
Eles devem ser amarrados atrás de um carro e açoitados até que o sangue corra de seu
corpo, em seguida devem prestar juramento de retornarem a sua terra natal ou ao lugar
onde moraram nos últimos 3 anos e “se porem ao trabalho” (to put himself to labour).
Que cruel ironia! Henrique VIII, o estatuto anterior é repetido, mas agravado por
novos adendos. Aquele que for apanhado pela segunda vez por vagabundagem deverá
ser novamente açoitado e ter a metade da orelha cortada; na terceira reincidência,
porém, o atingido, como criminoso grave e inimigo da comunidade, deverá ser
executado (MARX, 1988, p. 265).

Desse modo, podemos perceber que as leis possuíam um viés repressivo ao invés de
protetivo, mas a vagabundagem e a mendicância continuavam a ocorrer com frequência. Como
afirma o autor, aqueles aptos a vender sua força de trabalho eram obrigados a fazê-la, já aqueles
considerados inválidos, recebiam serviços assistenciais e eram encaminhados para as Casas dos
Pobres, onde os indivíduos eram subjugados ao trabalho forçado como uma maneira de
sobreviver.
Essas legislações promulgadas na Inglaterra, ficaram conhecidas como a Lei dos Pobres,
que com base em Marx (2010), tais legislações inglesas implicavam em uma ação política do
Estado visando controlar a população pauperizada. De acordo com Engels (2010), a Lei dos
pobres que foi promulgada por Elizabeth I em 1601, era estabelecida sob quatro aspectos:
necessidade e obrigação para com os que precisassem; assistência pelo trabalho; imposto
cobrado para socorro aos pobres, o auxílio da igreja tanto com o socorro como para o trabalho
e imposição para aqueles considerados válidos. Essas ações demandadas pelo Estado, foi uma
forma do capital de manter a ordem e preparar uma enorme força de trabalho para as indústrias
que surgiam já que enquadrava a população ao sistema de trabalho assalariado, sendo a primeira
medida de enfrentamento da pobreza.
Outra medida que se destaca é a Lei da Residência em 1662, proibindo com que os
trabalhadores se deslocassem para outras cidades, sendo então punidos aqueles que
infringissem a lei.
Essas legislações estabeleciam distinção entre pobres “merecedores” (aqueles
comprovadamente incapazes de trabalhar e alguns adultos capazes considerados pela
moral da época como pobres merecedores, em geral nobres empobrecidos) e pobres
“não merecedores” (todos que possuíam capacidade, ainda que mínima, para
desenvolver qualquer tipo de atividade laborativa). Aos primeiros, merecedores de
20

“auxílio, era assegurado algum tipo de assistência, minimalista e restritiva, sustentada


em um pretenso dever moral e cristão de ajuda, ou seja, se sustentavam na perspectiva
do direito [...] a principal função dessas legislações era impedir a mobilidade do
trabalhador e assim manter a organização tradicional do trabalho (BEHRING;
BOSCHETTI, 2011, p.49).

Destarte, as transformações econômicas, políticas e sociais que vinham ocorrendo na


sociedade e o constante desenvolvimento das forças produtivas 5, acarretou uma nova fase do
capitalismo, conhecida como concorrencial, é nesse período entre 1776 a 1830 que desencadeou
a Revolução Industrial, onde consolidou o modo de produção capitalista. As mudanças que já
ocorriam na classe trabalhadora, se intensificam ainda mais nesse período, Engels (2010) afirma
que os trabalhadores foram postos a um alto nível de exploração da força de trabalho através
do aumento da jornada de trabalho; houve a apropriação do trabalho feminino e infantil, haja
vista que eram caracterizados como mão de obra barata; e todos os trabalhadores foram
submetidos a condições de miséria, com ambiente insalubre tanto nas fábricas como em suas
moradias.
O processo de industrialização no século XVIII, conforme exposto por Marx (1988) em
sua obra, trouxe outras consequências na vida dos operários, quando o capitalista passa a
investir mais em meios de produção do que na força de trabalho, tencionando a extração de
mais lucros, isso fez com que muitos trabalhadores não fossem absorvidos pelo mercado,
transformando-os em um exército industrial de reserva6. O autor ainda explicita que o exército
industrial de reserva é funcional ao capital, pois o mesmo pressiona o exército ativo de
trabalhadores, e sendo o Estado quem regula os salários, se utiliza da pressão desses
trabalhadores não inseridos no processo de produção, para que os empregados aceitem salários
inferiores.
Assim, no transcorrer do capitalismo concorrencial evidenciou-se que todo o processo
da acumulação do capital gerou um aumento da miséria dos trabalhadores, já que essa
contradição é típica da dinâmica capitalista. Podemos perceber que a pobreza se manifesta com

5
“O conjunto dos elementos, meios de trabalho (tudo aquilo de que se vale o homem para trabalhar, como
instrumentos, ferramentas, instalações, a terra etc.), objetos de trabalho (tudo aquilo sobre que incide o trabalho
humano, como as matérias primas naturais brutas ou já modificadas pela ação do trabalho) e força de trabalho
(trata- se da energia humana que no processo de trabalho; é utilizada para, valendo-se dos meios de produção,
transformar os objetos de trabalho em bens úteis à satisfação de necessidades) designa-se forças produtivas”.
(PAULO NETTO; BRAZ, 2012, p. 70).
6
Como elucidou Marx, ao suceder-se a produção do sistema de metabolismos de segunda ordem, cria-se uma
massa de trabalhadores desocupados, sobrantes, sob a ótica dos detentores dos meios de produção. Em suas
palavras: “[...] a acumulação capitalista sempre produz, e na proporção de sua energia e de sua extensão, uma
população trabalhadora supérflua relativamente, isto é, que ultrapassa as necessidades médias da expansão do
capital, tornando-se, desse modo, excedente” (Marx, 1988, p. 731). Tal população constitui o chamado exército
industrial de reserva (TRINDADE, 2017, p.226).
21

base na exploração a qual os trabalhadores foram submetidos, e esse pauperismo se apresenta


pela distribuição desigual da riqueza socialmente produzida, ao contrário do que ocorreu nas
sociedades anteriores ao capitalismo em que a pobreza era gerada pela escassez da produção7.
O período também vai ser marcado pela expansão de ideais liberais que agudizou ainda
mais o pauperismo entre os trabalhadores, dentre as mudanças, uma Comissão Real em 1932 é
instaurada para apurar a administração dos fundos alocados na Lei dos Pobres citada
anteriormente. Mediante essa Comissão, a burguesia concluiu que instituir a referida lei era um
gasto inviável para o país, e que resultava problemas para indústria. Com base na averiguação
da Comissão, aprova-se em 1834 a Nova Lei dos Pobres, que passa a ser uma nova forma de
pensar a política social. Berhing e Boschetti (2011, p. 61-62, grifos das autoras), especificam
bem os elementos característicos do liberalismo:

Predomínio do individualismo. Os liberais consideram o indivíduo (e não a


coletividade) como sujeito de direito, de modo que os direitos civis foram os primeiros
a ser reconhecidos pelo Estado liberal no século XVIII, pois a liberdade de ir e vir, de
adquirir e comercializar propriedade era um requisito fundamental para instituir a
sociedade de classe.
O bem-estar individual maximiza o bem-estar coletivo. Para os liberais, cada
indivíduo deve buscar o bem-estar para si e sua família por meio da venda de sua força
de trabalho no mercado. Assim, não cabe ao Estado garantir bens e serviços públicos
para todos. Nessa perspectiva, cada um, individualmente, deve garantir seu bem-estar,
o que levaria todos os indivíduos a atingir uma situação de bem-estar. Tal princípio
se funda em outro – a liberdade em detrimento da igualdade.
Predomínio da liberdade e competitividade. A liberdade e a competitividade são
entendidas como formas de autonomia do indivíduo para decidir o que é melhor para
si e lutar por isso. Os liberais não reconhecem que a liberdade e a competitividade não
asseguram igualdade de condições nem de oportunidades para todos.
Naturalização da miséria. Os liberais vêem a miséria como natural e insolúvel, pois
decorre da imperfectibilidade humana, ou seja, a miséria é compreendida como
resultado da moral humana e não como resultado do acesso desigual à riqueza
socialmente produzida.
Predomínio da lei da necessidade. Baseados nas teses malthusianas, os liberais
entendem que as necessidades humanas básicas não devem ser totalmente satisfeitas,
pois sua manutenção é um instrumento eficaz de controle do crescimento populacional
e do consequente controle da miséria.
Manutenção de um Estado mínimo. Para os liberais, o Estado deve assumir o papel
“neutro” de legislador e árbitro, e desenvolver apenas ações complementares ao
mercado [...]
As políticas sociais estimulam o ócio e o desperdício. Para os liberais, o Estado não
deve garantir políticas sociais, pois os auxílios sociais contribuem para reproduzir a
miséria, desestimulam o interesse pelo trabalho e geram acomodação, o que poderia
ser um risco para a sociedade de mercado.
A política social deve ser um paliativo. Como, na perspectiva liberal, a miséria é
insolúvel e alguns indivíduos (crianças, idosos e deficientes) não têm condições de
competir no mercado de trabalho, ao Estado cabe apenas assegurar assistência mínima
a esses segmentos, como um paliativo. A pobreza, para os liberais, deve ser minorada
pela caridade privada.

7
PAULO NETTO, José; BRAZ, Marcelo. Economia Política: uma introdução crítica. São Paulo: Cortez, 2011.
22

Dessa maneira, a Nova Lei dos Pobres determinava que todos os subsídios a exemplo
da Lei Speenhamland8 fossem então excluídos, e a única forma de assistência seria nas
workhouses, que eram casas de trabalho marcadas pela forte repressão. São nessas casas de
trabalho que vão ser mantidos tanto aqueles aptos como os não aptos para o trabalho, constata-
se assim, que a política da Inglaterra no curso do desenvolvimento capitalista fez do
pauperismo, um objeto de administração intensa, onde essa administração e controle da pobreza
era por via da repressão, pois desta forma era funcional ao capital. A partir dessa compreensão,
nota-se que nesse período que coincide com o desenvolvimento industrial, ocorre uma
intensificação da miséria, sobretudo na população que não estava inserida no mercado de
trabalho, o exército industrial de reserva, como já mencionado anteriormente.
Para compreendermos melhor acerca da situação que a classe trabalhadora foi
submetida, é necessário apreender conforme Marx (1988), que uma grande massa de
trabalhadores passa em algum momento a não estarem inseridos dentro do processo produtivo,
e isso foi manifestado principalmente com o desenvolvimento industrial e em períodos de crise,
essa superpopulação veio a ser categorizada como fluente, latente e estagnada. A
superpopulação fluente, segundo Marx (1988), são os trabalhadores dispensados nesse processo
de produção diante dos avanços tecnológicos, que alteraram a composição orgânica do capital9,
ou seja:

Tanto nas fábricas propriamente ditas como em todas as grandes oficinas, em que a
maquinaria entra como fator ou em que ao menos a moderna divisão do trabalho é
aplicada, precisa-se de trabalhadores masculinos até ultrapassarem a juventude. Uma
vez atingido esse termo, só um número muito reduzido continua sendo empregado no
mesmo ramo de atividade, enquanto a maioria é regularmente demitida. Esta constitui
um elemento da superpopulação fluente, que cresce com o tamanho da indústria. Parte
emigra e, de fato, apenas segue atrás o capital emigrante (MARX, 1988, p. 207).

Marx (1988) prossegue que a superpopulação latente são os trabalhadores rurais que não
foram absorvidos pelas indústrias e passam a ter trabalhos inferiores, sendo submetidos as
condições degradantes e com salários baixos. A outra superpopulação que é a estagnada são
aqueles que estão em situação irregular e que nas palavras do autor “sua condição de vida cai

8
Behring e Boschetti (2011) afirmam que em 1795, diferentemente da lei dos pobres, é criada a Lei Speenhamland
que foi a primeira a garantir uma assistência para empregados e desempregados, essa lei “[...] estabelecia o
pagamento de um abono financeiro, em complementação aos salários, cujo o valor se baseava no preço do pão”
(BEHRING; BOSCHETTI, 2011, p.49).
9
A composição orgânica do capital é formada por capital constante (meios de produção) e capital variável (força
de trabalho). Com a industrialização ocorre uma alteração na proporção do capital constante e da variável. Assim,
o investimento no capital constante passa a ser superior ao capital variável, já que tem a introdução cada vez mais
de novas tecnologias e uma redução do número de trabalhadores no processo produtivo.
23

abaixo do nível normal médio da classe trabalhadora [...]” (MARX, 1988, p. 208). Sendo uma
grande reserva de força de trabalho disponível para os capitalistas.
Marx (1988) ainda vai ressaltar o sedimento mais profundo que é o lupemproletarido,
isto é, a população descrita como os vagabundos, criminosos, as prostitutas, e incapazes que
estão no pauperismo. O autor ainda relata que o lupemproletariado é dividido em três categorias,
a primeira categoria é:

[...] os aptos para o trabalho. Basta apenas observar superficialmente a estatística do


pauperismo inglês e se constata que sua massa se expande a cada crise e decresce a
toda retomada dos negócios. Segundo, órfãos e crianças indigentes. Eles são
candidatos ao exército industrial de reserva e, em tempos de grande prosperidade,
como, por exemplo, em 1860, são rápida e maciçamente incorporados ao exército
ativo de trabalhadores. Terceiro, degredados, maltrapilhos, incapacitados para o
trabalho. São notadamente indivíduos que sucumbem devido a sua imobilidade,
causada pela divisão do trabalho, aqueles que ultrapassam a idade normal de um
trabalhador e finalmente as vítimas da indústria, cujo número cresce com a maquinaria
perigosa, minas, fábricas químicas etc., isto é, aleijados, doentes, viúvas etc (MARX,
1988, p. 208-209).

É o lupemproletariado que o Estado cria medidas para o seu controle, já que a


intervenção sobre a pobreza é realizada com o objetivo de manutenção da ordem, agindo em
defesa dos interesses da classe dominante. Constatamos que a intervenção do Estado na
pobreza, no processo da acumulação primitiva, que era resultante da reprodução simples do
capital, e perpassando até a consolidação do modo de produção capitalista, através da
intervenção no pauperismo que se dá por meio da reprodução ampliada do capital, acabam
ambos decorrendo para uma forma de intervenção repressiva, com medidas assistenciais que
não se estabeleciam como direito e sim através do trabalho forçado.
Cabe frisar que a classe trabalhadora não se manteve inerte durante esse período, já que
como Engels (2010) explicita que desde os primórdios do capitalismo, foram registradas
revoltas por sua condição social, econômica e política. Um dos principais movimentos ainda
no período de desenvolvimento industrial foi o ludismo que se caracterizou pela revolta dos
operários sobre as máquinas, no pensamento dos trabalhadores, a máquina era a causadora da
situação de exploração que os trabalhadores foram subjugados no modo de produção capitalista.
Contudo, esse tipo de revolta aconteceu de forma isolada e recebeu forte repressão do Estado,
não havendo conquistas em suas reivindicações.
Outro movimento que se destaca, foi o cartismo que se caracterizou como o primeiro
movimento político da classe trabalhadora. Engels (2010) expõe que o movimento objetivava
a aprovação de uma série de exigências por melhores condições de vida e de trabalho, dentre
essas, se destaca:
24

1) Sufrágio universal para todos os homens maiores, mentalmente sadios e não


condenados por crime; 2) renovação anual do parlamento; 3) remuneração para os
parlamentares, para que indivíduos sem recursos possam exercer mandatos; 4)
eleições por voto secreto, para evitar a corrupção e a intimidação pela burguesia; 5)
colégios eleitorais iguais, para garantir representações equitativas e 6) supressão da
exigência (já agora apenas formal) da posse de propriedades fundiárias no valor de
trezentas libras como condição para a elegibilidade – isto é, qualquer eleitor pode
torna-se elegível (ENGELS, 2010, p. 262).

A principal conquista do movimento foi a redução da jornada de trabalho para dez horas,
mas as lutas operárias se intensificam ainda mais no século XIX, propiciando um novo ambiente
político em que tais manifestações sociais levavam o Estado a reconfigurar sua intervenção
fundamentada na ideologia liberal. Diante disso, em um cenário de extrema pobreza resultante
da grande exploração dos trabalhadores e a ascensão da luta que exigiam mecanismos de
respostas para condições dignas de trabalho e de vida, o Estado passou a buscar novas
estratégias de intervenção no pauperismo.
Behring e Boschetti (2011) explicitam que é no final do século XIX, que se inicia de
forma embrionária as primeiras discussões referentes a proteção social na Europa, sendo o
modelo bismarckiano o primeiro que concebe a ideia de um sistema de seguros sociais – como
aposentadorias e seguro-saúde – para os trabalhadores e suas famílias. Cabe ressaltar que o
seguro tinha como característica ser contributivo. Esse foi o ponto de partida para o começo do
desenvolvimento de medidas de proteção social para a classe trabalhadora, entretanto, a
instituição da seguridade social surge como núcleo central do Estado Social após a Segunda
Guerra Mundial gerando uma nova forma de regulação social e econômica conhecida como
padrão keynesiano-fordista. Para Behring e Boschetti (2006) tal modelo caracterizou-se como
um dos pilares do processo de acumulação de capital fundado no pleno emprego, com produção
em massa, para consumo de massa, e maior igualdade social por meio de políticas sociais. Esse
padrão de Seguridade Social vai representar a superação do primeiro modelo de seguro social
fundado na Alemanha e este conceito de seguridade social será influenciado pelo modelo
beveridgiano inglês que se consolida de fato no Welfare State quando se tem a expansão dos
direitos sociais de cidadania.
Conforme Paulo Neto (2006) para a compreensão da conjuntura descrita e dos
fundamentos das medidas da proteção social que mais adiante se tornariam as políticas sociais,
é necessário compreender o contexto histórico no qual houve sua consolidação, o período
monopolista do capitalismo. Partindo do ponto de que com o desenvolvimento do capitalismo
monopolista ocorreu alterações significantes na dinâmica da sociedade burguesa, tais alterações
acirraram os ânimos das contradições de classes, gerando o crescimento do pauperismo, do
25

desemprego, da miséria, que passa a ser tratada diferentemente com a intervenção direta do
Estado, por meio das políticas sociais.
Para Paulo Netto (2006), a ordem monopólica alterou nos níveis econômico-social e
histórico-político significativamente a dinâmica da sociedade burguesa, colocando em
evidência as contradições já expostas no capitalismo concorrencial, e as combinou com novas
contradições e antagonismos, é nesse momento que a sociedade burguesa atingiu seu
amadurecimento, outrossim, desde a revolução industrial que desenvolveu-se no capitalismo
concorrencial que o modo de produção capitalista já se tornava dominante, modo esse que se
apropria da força de trabalho extraindo a mais valia, o lucro, como fonte de riqueza, realizando
as possibilidades de desenvolvimento que tornam mais extensos e complicados os sistemas de
mediação que garantiriam sua dinâmica. Paulo Netto e Braz (2006, p. 203) sintetizam que o
período monopolista do capital “requer um Estado diverso daquele que serviu ao capitalismo
concorrencial: a natureza da ordem monopólica exige um Estado que [...] vá além da garantia
das condições externas da produção e da acumulação capitalistas – exige sim, um Estado
interventor, que garanta suas condições gerais”. Isto significa que no capitalismo monopolista
preservar-se não só as condições externas da produção capitalista, a sua intervenção passa a ser
na organização e desde dentro da dinâmica econômica, de forma contínua nas funções do
Estado, políticas e econômicas.
Como explicita Paulo Netto (2006), o Estado então é capturado pela lógica do capital
monopolista, operando para propiciar um conjunto de condições necessárias à acumulação e à
valorização do capital. Para garantir essas condições, nessa nova fase, o Estado passa a priorizar
a conservação da força física de trabalho, ameaçada pela intensificação da exploração. Dessa
maneira, tornou-se visível a constituição e implementação das políticas sociais na garantia das
condições adequadas para o desenvolvimento do capitalismo monopolista, e ao nível político,
reafirma a criação do Estado como um mediador desses conflitos.
Destarte, no período posterior a Segunda Guerra Mundial, quando se adentra na fase
madura do capitalismo – capitalismo monopolista, desenvolve-se um fenômeno histórico
denominado como Welfare State10, pois vê-se a necessidade do capitalismo se reinventar para
intervir no Estado, tanto após uma guerra, quanto devido às transformações intensas e profundas
que já tinha sofrido no período pós-crise 1929-1931, dessa maneira irá ser demonstrado os
fundamentos de expansão e consolidação das políticas sociais, que ampliaram as medidas de

10
No próximo item observaremos melhor sobre este período.
26

proteção social nos países da Europa Ocidental e que também serão aprofundados no item
seguinte.
Conforme expõem Behring e Boschetti (2011), a experiência do Welfare State ocorreu
durante trinta anos, conhecida como anos “gloriosos” ou de “ouro”, quando foi marcada por
uma forte expansão, com taxas de lucros altas e ganhos de produtividade para as empresas, e
políticas sociais para os trabalhadores, ou seja, um amplo desenvolvimento no âmbito
econômico e social, em que o Estado passou a demarcar regras para o funcionamento
econômico e a promover uma política de bem-estar para a classe trabalhadora por intermédio
do acesso a serviços sociais, visando como já mencionado a manutenção da força de trabalho,
tal período perdurou até meados da década de 1960, quando eclode uma crise jamais vista
anteriormente, derivada do esgotamento da expansão do capital, que resultou na queda
acelerada das taxas de lucros.
Como uma potência mundial, o sistema do capital na sua forma capitalista de ser, é
também comandado por crises que alguns autores chamam de crise periódica/cíclicas ou
sistêmica/estrutural11. Não podemos deixar de mencionar que o capitalismo é desenvolvido a
cada ciclo de crise, sobre as crises e este ciclo falaremos adiante. Assim sendo, a tecnologia e
o desenvolvimento estão respaldados também pelo movimento de crise do capitalismo,
portanto, qualquer obstáculo para o desenvolvimento do capitalismo pode ocorrer crises que
logo adiante são respondidas pela própria dinâmica do desenvolvimento do trabalho.
Ademais, Mészáros (2000), também esclarece sobre os efeitos deste tipo de crise ao
trazer para a discussão como o capitalismo garante as respostas para seus obstáculos garantindo
a intervenção direta do Estado para os efeitos da crise.

O capital, no século XX, foi forçado a responder às crises cada vez mais extensas (que
trouxeram consigo duas guerras mundiais, antes impensáveis) aceitando a
“hibridização” — sob a forma de uma sempre crescente intromissão do Estado no
processo sócio-econômico de reprodução – como um modo de superar suas
dificuldades, ignorando os perigos que a adoção deste remédio traz, a longo prazo,
para a viabilidade do sistema (MÉSZÁROS, 2000, p.8).

As longas crises existentes no século XX, que será tratada no próximo item, se
colocaram como objeto da intervenção do Estado, esta não abalou somente o sistema do capital
e seus elementos, como também as suas bases. O processo que demarca o século XX
compreende uma desumanização da sociedade visto que os capitalistas se preocuparam com a
expansão do capital, provocando desta forma uma intensa destruição na relação metabólica

11
Sobre estas crises, analisaremos no item a seguir.
27

entre o homem e a natureza, pois sabemos que a lógica do capitalismo é voltada para a expansão
da produção de mercadorias, resultando em um meio ambiente degradado.
Por tanto, segundo Mészáros (2011), a intensidade da oposição entre o valor de uso e o
valor de troca e a subordinação do primeiro ao segundo, multiplicam-se para manter o
desenvolvimento econômico e o poder de domínio do capital. Uma estratégia amplamente
utilizada para garantir o alcance destes aspectos é o investimento na aplicação da tendência de
redução da taxa de utilização real das mercadorias.
Desta maneira que será detalhada no próximo item, a tendência de redução da taxa de
utilização é vantajosa para a expansão do capital, porque, além de limitar o tempo útil das
mercadorias para que possam ser rapidamente trocadas, acaba por movimentar o mercado e os
lucros, desta forma traz consigo impactos para o trabalho vivo, mediante o uso progressivo da
maquinaria tecnológica, acarretando em uma destruição da força de trabalho da população, uma
vez que utiliza-se de tecnologias ou de várias outras formas que existam para tal eliminação,
deste modo fica evidente que a expansão incontrolável do capital leva a uma crise de forma
estrutural diferentemente das já existentes conhecidas como cíclicas. Sobre os fundamentos
das crises e em especial sobre a crise estrutural e sua forma de enfrentamento, trataremos no
próximo item.

2.2 Os fundamentos da crise do capital e suas formas de enfrentamento: as necessidades de


controle do sistema do capital mediante o Estado.

As crises no interior do sistema capitalista são funcionais a ordem por renovar as forças
do desenvolvimento capitalista, permitindo contradições jamais vistas no campo social,
econômico, político e cultural dos homens. Mediante a crise, os serviços sociais, bem como as
políticas administradas pelo Estado são reduzidas e redimensionadas somente para manter a
força de trabalho viva e mantendo assim o subdesenvolvimento para as camadas pauperizadas,
intensificando a desigualdade social.
Conforme Paulo Netto e Braz (2011), as crises estão intrínsecas no processo histórico
do capitalismo, todo este processo de desenvolvimento desde a consolidação do comando da
produção pelo capital resulta em uma sucessão de crises, já que a dinâmica do capitalismo é
instável, pois de início as crises eram mais localizadas. A primeira crise ocorreu em 1825 na
Inglaterra, de 1847 a 1848 estas passam a ganhar dimensão mundial, em 1873 eclodiu a crise
28

mais grave do século XIX. No século XX, a crise que surge em 1929 foi a principal do
capitalismo monopolista, com consequências catastróficas atingindo todo o mundo, era uma
crise nunca vista, provocando além da queda da bolsa de valores de Nova York, o desemprego
sem precedentes, a decadência de empresas e dívidas até na legitimação da política do
capitalismo vigente, tornando-se claro o equívoco liberal de que o mercado era autorregulável.
Dessa forma, compreende-se que o capitalismo, ou a forma de ser histórica sob o
domínio do capital, se estabeleceu nesta forma de sociabilidade como um modo de produção
de dominação e que este, pela contradição histórica imposta da relação capital/trabalho sob a
qual se assentou, foi apenas reformando os efeitos aparentes das crises até que chegou um
momento em que não foi possível mais se afastar delas, desenvolvendo a partir dos anos 1970
um tipo de crise que fez ampliar ainda mais as evidentes contradições do desenvolvimento
capitalista, principalmente no que se refere ao acirramento da pobreza. Exigindo mais uma vez
do Estado a manutenção de seu controle, mesmo que de forma fragmentada e parcial pelos
imperativos do neoliberalismo12.
Na tentativa de alimentar os lucros, o capitalista está sempre à procura de meios e formas
de expandir sua produtividade, tanto por meio da aplicação na sua base de produção do capital
constante com as inovações tecnológicas, como alterando a forma de organização da produção
do chão da fábrica. Com o emprego de máquinas potentes, que substituirão alguns
trabalhadores, haverá uma maior produtividade, gerando um excedente maior, assim a produção
aumentará e circulará, depois será distribuída e consumida no mercado em que o capitalismo
está em expansão, no entanto, em períodos de recessão, ocorre a superprodução e com ela irá
desenvolver a crise do capital.
A superprodução significa sempre que o capitalismo produziu tantas mercadorias que
não havia poder de compra disponível para adquiri-las ao preço de produção, isto é, a
um preço que fornecesse aos seus proprietários o lucro médio esperado (MANDEL,
1990, p. 211- 212).

Desse modo, como expõe Paulo Netto e Braz (2012), a crise capitalista com a
superprodução e a diminuição da força de trabalho devido a substituição dos homens pelas
máquinas, gera o desemprego. Isso quer dizer que não há insuficiência no âmbito da produção
de bens, e sim dos consumidores, que não possuem dinheiro para comprar os bens produzidos,
ou seja, existe uma crise de superprodução (oferta maior que a demanda), e como consequência,

12
Será abordado mais adiante, no entanto, conforme Paniago (2008) o neoliberalismo apresentam-se como um
conjunto de políticas, econômicas e sociais que visam tirar o capitalismo da crise e criar as condições necessárias
para a recuperação da lucratividade da ordem global do capital em queda. Essas mesmas medidas intentam realizar
objetivos diversos, a depender de quais interesses de classe procuram proteger.
29

o capitalista reduz a produção resultando no aumento do desemprego, assim, é possível


compreender que a insuficiência na demanda é que reduz o potencial para consumo.
Entre uma crise e outra se evidencia a existência de um ciclo econômico com quatro
fases: a crise, a depressão, a retomada e o auge, vejamos como os autores Paulo Netto e Braz
(2011, p.160) explicam esse processo:
Na crise, as operações comerciais se reduzem e as mercadorias não são vendidas,
consequentemente a produção é reduzida até ser paralisada. Preços e salários caem,
empresas declaram falência, o desemprego se generaliza e o caos acontece. A
depressão é o período que sucede a crise, a produção continua estagnada, as
mercadorias são estocadas ou destruídas ou vendidas a baixo do preço. A Retomada
é quando as empresas que sobreviveram reagem. Absorvem algumas que quebraram,
incorporam os seus equipamentos e instalações e voltam a produzir. O comércio se
reanima, as mercadorias escoam, os preços se elevam e aos poucos o desemprego
diminui. O Auge (boom), a concorrência leva os capitalistas a investirem nas suas
empresas, ocorre o crescimento da produção, e com isso, a prosperidade. Até que...
um detonador qualquer evidencia de repente que o mercado está abarrotado de
mercadorias que não se vendem, os preços caem e sobrevém nova crise – e todo o
ciclo recomeça.

Diante disto, podemos perceber que os autores destacam que no capitalismo, o


capitalista investe dinheiro para produzir mercadoria e com isso gerar mais dinheiro do que
investiu inicialmente, a mercadoria só se concretiza quando é convertida em mais dinheiro,
vimos então acima, que a crise provoca a interrupção deste movimento, pois impossibilita que
haja o crescimento do processo de acumulação do capital. Mandel (1990) explica que esse
fenômeno acarreta no “movimento cumulativo da crise”, que gera redução de emprego, renda,
investimentos, produção, gerando sempre um novo espiral, atingindo tanto o trabalhador quanto
o empregador. Assim, o referido ciclo econômico evidencia a razão pela qual, apesar das crises
serem funcionais, o sistema capitalista sempre se restaura e suas consequências não o levam ao
colapso ou destruição.
A partir dos anos 1970, o capitalismo encontra grande dificuldade para sustentar o seu
movimento de expansão, um novo período se abre com o aparecimento de bloqueios cada vez
maiores para a manutenção das taxas de lucratividade do capital global, até então alcançadas.
Explanar sobre as crises capitalistas já não é novidade visto que desde sua fase madura o
capitalismo vem passando por várias crises de acumulação e expansão, quase sempre
solucionadas temporariamente por medidas de intervenção saneadoras das crises que irão
resultar na expansão, não importando as estratégias utilizadas. Contudo, a crise estabelecida na
década supracitada até os dias atuais apresenta características e efeitos de maiores gravidades
para o sistema global, desenvolvendo-se num contexto histórico e econômico diferente do que
gerou as crises anteriores, atentemos a seguir.
30

Conforme salienta Silva, Sant´Ana e Silva (2015), a atual crise do capital tem se
mostrado incapaz de lidar com suas tensões internas, ou seja, criando e recriando componentes
inerentes ao metabolismo do capitalismo mundial maduro. Esta crise põe em questão a própria
ordem econômica e social que a criou, o que não quer dizer que tenha o poder de extinguir com
o modo de produção capitalista – a não ser que ponha em risco a própria humanidade, pois a
mesma é parte constitutiva deste, isso significa que, a partir da crise estrutural, é possível notar
os limites mais claros deste sistema e de suas próprias contradições, que são fortalecidas com a
citada crise, pois sua própria essência é antagônica, e não se incomoda com as reais
necessidades humanas, mas sim em aumentar seu poder no controle do sistema
sociometabólico, resultando no sistema global permanente, atingindo todos os países.
Sendo o sistema do capital uma relação social baseada na exploração do trabalho pelos
capitalistas, donos do meio de produção, onde tem por elemento alavancador do crescimento a
busca pelo total controle sob a extração do trabalho excedente, e como mero objeto de
realização do valor as necessidades humanas que não são pontos importantes ou prioridade para
produzir e acumular riqueza. Assim, todas as contradições geradas desse sistema desumano e
alienado é sempre superada por uma nova expansão, eliminando frequentemente os obstáculos
para o processo de gerar valor. O capital baseado em toda sua história irá sempre procurar
estratégias para que aumente o excedente da produção, mesmo que seja preciso eliminar a mão
de obra do trabalhador, como por exemplo na substituição da força de trabalho humana pelo
uso das máquinas, sem levar em consideração danos à natureza, ou qualquer outra necessidade,
como ressaltamos anteriormente.
Tal tendência de expansão produtiva do capital proporcionou uma absorção da classe
trabalhadora através do consumo, resultando em ganhos materiais que foi impulsionado pelo
mecanismo de sustentação da política de negociação de classe conhecida como Welfare State,
como já citado sucintamente no item anterior, esta tinha por objetivo salvar o capital da crise
das décadas de 1920 e 1930, debruçaremos de maneira sintetizada sobre este mais adiante. Com
isso, os trabalhadores foram estimulados para obtenção de melhores condições de vida e de
trabalho através das lutas de classe, mas por outro lado o capital buscava incessantemente
formas para ressarcir estes direitos conquistados pelos trabalhadores, fortalecendo
evidentemente o sistema do capital, e situando uma aparente vitória do trabalho diante o
domínio do capital.
Em decorrência das crises ocorrem mudanças maiores na intervenção do Estado na
economia capitalista, naquela época estava em disputa três projetos de um ponto de vista
econômico, ideológico e político, desses projetos, cada um deles via-se como solução para tal
31

crise. Assim, no início do século XX surgem dois projetos (fascismo e socialismo) que
colocavam em risco a ordem burguesa, no entanto, com o fascismo derrotado na segunda guerra
mundial, o projeto social-democrata comandado por Keynes, torna-se dominante em 1945. O
Keynesianismo como assim ficou conhecido, segundo Behring e Boschetti (2011, p.71),
Estava sintonizado com a experiência do New Deal americano, e inspiravam
especialmente as saídas europeias da crise, sendo que ambas têm um ponto em
comum: a sustentação pública de um conjunto de medidas anticrises, tendo em vista
amortecer as crises cíclicas de superprodução, superacumulação e subconsumo
lançado a partir da lógica do capital.

Com o Keynesianismo houve uma maior intervenção do Estado na economia, nesse


contexto elevou-se a demanda global, e antes que ocorresse a crise amortecia-se a mesma com
alguns mecanismos de contenção, a exemplo: a programação indicativa da economia,
intervenção na relação capital/trabalho com a política de salário e controle de preços, a
distribuição de subsídios, política fiscal, oferta de créditos atrelada a de política de juros e as
políticas sociais.
É então nesse momento de controle dos ciclos econômicos que as políticas sociais se
generalizaram, compondo segundo Berhing e Boschetti (2011, p. 71) “o rol de medidas
anticíclicas do período que também foi o resultado de um pacto social estabelecido nos anos
subsequentes com a classe operária”, o chamado Welfare State, ou seja, o Estado de Bem-Estar
Social que,
Institucionalizou a possibilidade de estabelecimento de políticas abrangentes e mais
universalizadas, baseadas na cidadania, de compromisso governamental com aumento
de recursos para expansão de benefícios sociais, [...] de um amplo sistema de bem-
estar e de comprometimento estatal com crescimento econômico e pleno emprego
(BERHING; BOSCHETTI, 2011, p. 92).

Dessa maneira, o “Estado de Bem-Estar Social” foi uma junção de políticas sociais que
se generalizaram apenas nos países centrais. Conforme ia modificando as necessidades do
capital abria-se espaço para a maior intervenção do Estado na economia e na área social. Assim
as políticas sociais se desenvolviam no decorrer do capitalismo monopolista, tais medidas
aumentaram o poder do capital, não modificando a função social, e sendo funcional a ordem da
reprodução do mesmo. Berhing e Boschetti (2011), expõem que a política Keynesiana obteve
um grande destaque no Plano Beveridge de 1942 na Inglaterra, pois fez uma crítica aos seguros
sociais bismarckianos, adequando a uma nova lógica de organização das políticas sociais, com
a implantação da seguridade social.
Foi então a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, que implementaram e expandiram
políticas sociais vinculadas à economia com o objetivo de reduzir o impacto das crises, mesmo
assim continuou alternando o processo de prosperidade e depressão ou repressão, o que nos
32

direciona ao caráter ineliminável das crises, contraditório ao MPC, sendo estas crises
naturalizadas pela burguesia, como se é algo que escapa do controle da sociedade, mas evidente,
que são constitutivas do capitalismo. Em países europeus e nos EUA as políticas sociais se
expandiram, e teve pontos de diferenciação entre ambas como a seguridade social, outro fator
principal deste período foi como já falado a maior intervenção do Estado na regulamentação
das relações sociais e economias, e também foi uma das soluções para uma das maiores crises
econômicas capitalistas da contemporaneidade, além de reformas econômicas e políticas13 que
aconteceram.
O sistema capitalista se caracteriza por operar em meio a sucessivas recessões e
retomadas de crescimento e sabe-se que é natural do sistema do capital tratar das consequências
e efeitos, e não da base causal da crise, tal afirmação fica claro quando Mészáros (2002)
exemplifica, que o período com características de produção de massa, de consumo e de
crescimento do capital que levou ao aumento das taxas de consumo antes inexistentes para a
classe trabalhadora e da classe média, tornando-os beneficiários de políticas sociais de caráter
universal e de direitos trabalhistas ampliados, não foi algo mantido sem uma finalidade, pois
fica evidente que o capitalismo se utiliza destas para legitimar-se como o “modo de produção
mais adequado”, cooptando a classe trabalhadora e se beneficiando do crescimento econômico
para gerar novas formas de controle da ordem social, aumentando com isso sua lucratividade,
sem colocar em xeque suas contrariedades. Portanto, as medidas adotadas para facilitar o
processo de acumulação e expansão do capital visto o impedimento que se provocava com a
contradição entre produção e realização que caracteriza a crise da superprodução de valores de
troca do sistema, adiaram apenas os efeitos das contradições, o qual não é atingido em sua base.
Deste modo, resultava-se em um período de recuperação e crescimento o qual irá se esgotar
junto ao efeito das medidas interventivas utilizadas, este esgotamento dos mercados e territórios
no último período de expansão do capital agrava-se pelos limites humanos reais de consumo,
que serão elevados até vir uma nova contradição.

13
As condições políticas e econômicas que proporcionaram a formação e implementação do Estado de Bem-Estar
Social nos países avançados foram a associação entre o fordismo e o keynesianismo que se completou após 1945,
com a superação da firme resistência dos trabalhadores à implantação das rotinas de trabalho repetitivo e
parcializado implantadas pelo fordismo-taylorismo (por meio da cooptação dos sindicatos e do ataque político ao
movimento operário mais radical) e a adequação dos mecanismos de intervenção estatal (políticas fiscais e
monetárias, políticas de investimento, políticas de controle de trabalho e de complementação dos salários através
dos gastos sociais) aos objetivos de demanda crescente. A integração desse conjunto de medidas na esfera da
produção e da reprodução social proporcionou o surgimento de um período de expansão econômica, de
crescimento imperturbado, que vai de 1945 a 1973.
33

O Welfare State ou Estado de Bem Estar Social, teve uma duração de trinta anos, em
que o ganho de produtividade do sistema auxiliou o capital a expandir mais em espaços
desocupados, com a incorporação de novos consumidores ao mercado global e realização
contínua do capital, que estavam em sintonia com a expansão do sistema como um todo. As
conquistas sociais e os direitos dos trabalhadores adequaram-se à lógica do capital junto às altas
taxas de crescimento.
No entanto, o esgotamento das medidas remediadoras keynesianas e fordista14 se impôs
com o tempo, e reinicia uma nova crise que irá se desenrolar a partir dos anos 1970. Mészáros
(2011) vem afirmar que esta crise que o capital vivencia neste período é estrutural, entretanto,
apesar de se diferenciar das crises cíclicas, a mesma não elimina a existência dessas crises
sucessivas anteriores. Assim, desde 1970, a crise estrutural se estende não somente no modo
socioeconômico, e sim em todas as instituições políticas, que dependem de garantias maiores
que apenas as proporcionadas pelo Estado. A crise estrutural se delineia nas bases do modo de
produção capitalista, demonstrando os limites estruturais perpétuos do capital, a mesma afeta a
totalidade de um complexo social em todas as relações com as suas partes constituintes e em
outros complexos a estes articulados, por outro lado a crise cíclica afeta apenas parte do
complexo citado, mesmo sendo grave, ela não pode pôr em xeque a sobrevivência de todo o
sistema do capital.
A crise estrutural se intensifica e surge devido à dificuldade do capital em continuar
seus mecanismos de deslocamentos de contradições, pois os problemas que faziam parte do
desenvolvimento do capitalismo ficam visíveis nos países periféricos e centrais. Dessa maneira,
Mészáros (2011) vem identificar quatro características principais da crise em questão: o
primeiro é o caráter universal, pois a mesma não se limita a uma particularidade da produção,
ela atinge um ramo da produção e se expande aos demais ramos da atividade capitalista; o
segundo é o alcance global, pois diferente das crises anteriores que atingia apenas alguns países,
esta percorre todo o planeta; em terceiro a sua escala de tempo é extensa, contínua e permanente,
diferentemente das passadas que eram limitadas – crises cíclicas; em quarto, seu modo de

14
O Fordismo consiste em um sistema de produção industrial idealizado e difundido pelo empresário Henry Ford.
Como fundador da Ford Motor Company, em 1914, Henry tinha o objetivo de atingir um nível produtivo em que
a eficiência industrial atingisse seu ápice. Para isso, criou o método e pode comprovar que a produção massificada,
e padronizada, atingia uma capacidade de produção ímpar. Ford implementou uma linha de montagem que visava
a padronização de todos os processos operacionais, isso foi possível através da implementação de uma série de
melhorias e planejamento estratégico. No fim, a proposta de Ford atingiu seu objetivo, a produção era eficiente,
acelerada, barata e padronizada, tornando-se o sistema de produção adotado em todo o mundo no século 20, com
uma alta aderência entre as décadas de 20 e 70 (MENDES, 2021).
34

ampliação é chamado de rastejante porque a crise se estende lentamente, atingindo todas as


esferas do sistema do capital, não possuindo erupções e colapsos que se destacam nas anteriores.
As manifestações da crise estrutural são destacadas em suas dimensões internas.
Conforme expressa Mészáros (2000), a crise estrutural resume-se em três dimensões internas
do capital, a produção, consumo e circulação/distribuição e realização, cada dimensão
fortalecem-se entre si e se ampliam por um determinado tempo, gestando também uma
motivação interna para a reprodução cada vez mais extensa. A crise estrutural afeta todas as
estruturas do sistema sociometabólico, e abre uma possibilidade de transição para outra forma
de sociabilidade, a mesma está relacionada aos limites últimos de uma estrutura global e não
aos limites imediatos visto nas crises cíclicas, onde atingia-se apenas uma parte das dimensões,
enquanto a estrutural atinge as três citadas anteriormente.
Contudo, no capitalismo contemporâneo fincado na crise estrutural, universal, global,
extensa, permanente e rastejante, é possível observar uma conjuntura diversificada e crítica
quanto ao desenvolvimento e continuidade do modo capitalista, não se identifica que medidas
adotadas pelo capital e Estado com o objetivo de superar a crise tenha obtido algum resultado
com altas taxas dos lucros de períodos anteriores. Dessa forma, há em curso um crescimento
do domínio dos setores monopolistas na economia e reação burguesa à crise onde Paulo Netto
(2006) descreve como uma “ofensiva do capital”, partindo de três pilares: o primeiro a
reestruturação produtiva que traz consigo grandes mudanças na produção, resultando assim, em
uma flexibilização das formas de trabalho, que proporcionaram o surgimento da polivalência
mediante ao aprofundamento da extração da mais valia; o segundo pilar é a financeirização do
capital que prolonga a especulação financeira gerando o capital fictício, aumentando o poder
dos bancos; e o terceiro pilar é a política neoliberal ou mesmo, o neoliberalismo que age
diretamente na forma econômica e política do Estado, e que auxilia o capital cada vez mais na
contenção de gastos sociais e incentivos maiores em empresas privadas com fundo público,
autorizando privatizações de empresas de poder público, mediações e acordos políticos e
econômicos financiados pelo FMI – Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial, em
especial nos países periféricos.
O neoliberalismo como um dos pilares da ofensiva se impõe sobre a sociedade com toda
força de restrição e austeridade que a crise do sistema capitalista propõe e exige. Tratando-se
de resposta aos efeitos da crise, é um sistema de exploração do trabalho, o peso da crise recai
principalmente sobre o trabalho, os ganhos materiais anteriormente obtidos no keynesianismo
são agora retirados, e as políticas sociais assumem um caráter focalista e seletivo, comutando a
concepção de proteção universal social e gratuita. Somente a reação das forças trabalhadoras
35

contra essas perdas foi insuficiente, devido às formas de resistência que foram derrotadas
quanto à força na organização de classe no período da política de negociação entre as classes,
em que era ponto principal do período de “paz” reformista entre o capital e o trabalho15 , tendo
vigorado nos países centrais e mais tarde nos países periféricos.
Dessa maneira, o leitor/a pode compreender a partir do que foi exposto por Berhing e
Boschetti (2011) que as reformas conduzidas pelo capital atrelado ao Estado nesta tentativa de
superar a crise estrutural que vigora, caracteriza-se como contrarreformas, pois ocorrem
mediante aos retrocessos que ocasionaram em uma diminuição dos direitos sociais conquistados
com tanta luta, em períodos anteriores. Conforme Paniago (2007, p. 5) “o neoliberalismo
motivou uma substantiva reorientação das políticas sociais, numa clara inflexão do
compromisso da esfera pública do Welfare State para uma política privativa dos serviços sociais
e da transferência da responsabilidade social para a sociedade como o todo”, surgindo como
uma reação teórica e política ao que era executado pelo modelo intervencionista do Estado em
períodos anteriores. Assim sendo, no contexto neoliberal, o Estado, no processo de continuação
de cumprimento do seu papel de garantir as condições de produção e reprodução do capital, irá
facilitar o fluxo global de mercadorias e dinheiro através da desregulamentação de direitos
sociais, de garantias fiscais ao capital, da privatização e das possibilidades de promover a
realização dos superlucros e da acumulação, apreende-se então que a política neoliberal
incentiva os governos a utilizarem essas medidas com reformas estruturais, controlando o
Estado com ajustes fiscais e diminuindo os gastos na área social.
Destarte, o surgimento das políticas sociais como já sintetizado deu-se de forma gradual
e diferenciado entre os países, um destes países por exemplo, é o Brasil. O Brasil no século XIX
por ser um país escravocrata não havia então manifestações e nem lutas operárias. Sendo assim,
as primeiras lutas da classe trabalhadora e as leis que se direcionavam ao trabalho empregavam
o pauperismo e suas múltiplas faces em primeiro plano como questão política. Dessa forma,
conforme Draibe, citado por Behring e Boschetti (2011), a expansão das políticas sociais no
Brasil se deu entre os anos de 1930 e 1943 com as primeiras medidas reguladoras do mundo do
trabalho na Era Vargas.
Nesse sentido, se o governo Vargas enfrentou também com a polícia os componentes
mais radicalizados do movimento operário nascente, em especial após 1935, ele soube
combinar essa atitude com uma forte iniciativa poética: a regulamentação das relações
do trabalho no país, buscando transformar a luta de classes em colaboração de classes,
e o impulso à construção do Estado Social, em sintonia com os processos

15
Não se pode ignorar os efeitos desnorteadores que o colapso da União Soviética e a queda do muro de Berlim
provocaram na desmobilização das organizações da classe dos trabalhadores.
36

internacionais com nossas mediações internas particulares (BERHING;


BOSCHETTI, 2011, p. 106).

A intervenção do Estado sobre a pobreza expressa-se em um caráter focalizado,


fragmentado, desorganizado, diversificado e instável em suas configurações. Contudo em 1942
há uma certa centralização no campo federal com a criação da Legião Brasileira de Assistência
(LBA).
A LBA foi criada para atender as famílias dos pracinhas envolvidos na segunda
guerra e era coordenada pela primeira-dama, Sra. Darci Vargas, o que denota
aquelas características de tutela, favor e clientelismo na relação entre Estado e
sociedade no Brasil, atravessando a constituição da Política Social. Posteriormente,
a LBA vai se configurando como instituição articuladora da assistência social no
Brasil, com uma forte rede de instituições privadas conveniadas, mas sem perder
essa marca assistencialista, fortemente seletiva e de primeiro-damismo, o que só
começara a se alterar muito tempo depois, com a CF de 1988 (BEHRING;
BOSCHETTI, 2011, p.107-108).

Conforme Sposatti (2004), essas ações da LBA trazem para a assistência social o vínculo
emergencial e assistencial, marco que predomina a trajetória da Assistência Social. Desta
forma, com suas raízes fincadas na caridade, filantropia e na solidariedade religiosa, a
assistência social teve o reconhecimento como direito social, com a instituição das políticas
sociais no Brasil também de forma retardatária, pois o poder público agia com ações de caráter
paternalista e ou clientelista, ou como favores concedidos.
Para o desenvolvimento das funções da LBA buscou-se auxílio junto às escolas de
Serviço Social, pois necessitava-se de uma equipe técnica para a realização de trabalhos da área
social e o Serviço Social precisava se legitimar. Em 1969 a LBA se modifica para fundação
vinculada ao Ministério da Previdência Social, expandindo sua estrutura e tendo novos projetos
e programas (LONARDONI et al. 2020).
No entanto, após o Seminário de Petrópolis em 1974, o qual fora mobilizado por
profissionais, especialistas e organizadores da área, acaba resultando em um documento que
destacará a importância da assistência social pelo Ministério da Previdência e Assistência Social
e salienta um tratamento inovador para a área, deixando o caráter assistencialista um pouco de
lado, claro, não de forma contínua. Neste fim de período ditatorial se acirra ainda mais o
pauperismo requerendo do Estado uma maior atenção em todos os níveis.
A Política Social então é direcionada ao exército de reserva de força de trabalho usando
essa demanda como finalidade para o crescimento do Estado, dessa maneira ocorre uma
expansão de Programas Sociais, onde podemos citar: a Alfabetização pelo Mobral, casas
37

populares, complementação alimentar16, entre outros. Assim, a Assistência Social deixa de ser
apenas filantrópica e irá fazer parte da relação social de produção, porém o surgimento de novos
organismos irá se debruçar na lógica da fragmentação social que constituem uma prática
setorizada fragmentada e descontínua, criando-se serviços, projetos e programas para cada
necessidade, problema ou faixa etária, conforme Mestriner (2001, p. 170) ressalta até os dias
atuais.
O pauperismo ganha uma notoriedade com o fim do regime ditatorial, proporcionando
o desenvolvimento dos movimentos sociais, que com forte pressão legitimará as demandas da
assistência social ao lado das demais políticas como enfrentamento da pobreza e suas múltiplas
faces como: desemprego, miséria, fome, tendo como objetivo a diminuição das desigualdades
sociais.
Em um contexto de mobilização democrática e pressão popular com exigências de novas
práticas na área social, inicia-se discussões para se tornar a política de assistência social como
direito social constitucionalmente assegurada pelo Estado, então em 1988 a Constituição
Federal traz a mesma como política pública, não-contributiva e integrada ao tripé da seguridade
social, saúde, previdência e assistência social, passando a ser normalizada pelas legislações: Lei
Orgânica da Assistência Social – LOAS, Política de Assistência Social – PNAS, e Norma
Operacional Básica – NOB.
Apesar dos avanços que a assistência social alcançou com o reconhecimento como
política pública no Brasil, muitos retrocessos continuavam, a lógica da incapacidade para o
trabalho continuava, assim como cita Boschetti (1999, p. 69), “[...] este princípio vem com
toda força e limita as prestações assistenciais apenas a segmentos considerados absolutamente
incapazes ao trabalho, como idosos e deficientes [...]”, ou seja, nem as crianças foram
reconhecidas como cidadãos portadores de direito às prestações assistenciais para garantia de

16
O Programa Alfabetização pelo Mobral, trata-se de uma educação funcional e continuada. Assim, com a
interpelação dos movimentos de cultura popular dos anos 1960, cria-se através do MOBRAL, uma nova política
educacional que interpreta e desenvolve a educação de adultos baseada na funcionalidade. O Programa de Casas
Populares – BNH (Banco Nacional de Habitação), segundo os seus mentores, tinha como objetivo o desempenho
marcante na produção de casas populares onde permitiria ao regime militar emergente obter a simpatia de largos
setores das massas que constituíram o principal apoio social do governo populista derrubado em 1964, assim nesse
projeto, encontrava-se implícita a ideia de que a casa própria poderia desempenhar um papel ideológico importante,
transformando o trabalhador de contestador em "aliado da ordem”. Outrossim, o Programa de Complementação
Alimentar – PRONAN, definiu como alvo as gestantes, nutrizes e crianças até sete anos na população de baixa
renda e os escolares de sete a 14 anos. O primeiro Pronan (1973-1974) teve sua execução prejudicada por
dificuldades administrativas. O Pronan II (1976-1979) ofereceu o primeiro modelo de uma política nacional
incluindo suplementação alimentar, amparo ao pequeno produtor rural, combate às carências específicas,
alimentação do trabalhador e apoio à realização de pesquisas e capacitação de recursos humanos.
38

renda. Dessa forma, as pessoas em condições físicas de trabalhar, o direito à assistência não era
nem cogitado, como podemos notar na Constituição Federal de 1988 no artigo 199, inciso III,
que para estes, o objetivo é a promoção ao mercado de trabalho, as demais legislações citadas
no parágrafo anterior que foram desenvolvidas posteriormente e são regulamentadoras da
assistência social reforçam mais ainda este princípio.
Sabemos que no Brasil o grande problema desta lógica está no direito ao trabalho e ao
recebimento pelo menos de um salário mínimo, pois estes não são garantidos a todos e nem à
maioria dos trabalhadores, fazendo com que estes fiquem totalmente desprotegidos, sem
direitos ao seguro/previdência pois estão fora do mercado de trabalho e sem direito à
assistência, pois são capazes de trabalhar, demonstrando uma lógica seletiva, focalizada, que
será explícita nos ditames neoliberais. Mesmo que a assistência social tenha sido incorporada
na seguridade social, e a saúde universalizada, com seus serviços desvinculados da assistência,
como veremos na próxima seção, a lógica continua sendo mantida, os beneficiários
previdenciários permanecem dependentes e proporcionais às contribuições realizadas, o auxílio
doença mantém-se na lógica do seguro e os beneficiários de prestação continuada sendo idosos
e deficientes. É dessa forma que todos os direitos sociais que se materializam na garantia de
prestações monetárias de substituição e/ou complementação de renda são aprisionados pelo
critério de capacidade/incapacidade ao trabalho como fonte de definir o direito.
Com as medidas neoliberais trazidas para o Brasil a partir de 1990 com a eleição do
Presidente Fernando Henrique Cardoso – FHC e com a implantação do Plano Real, ocorrem
consequências econômicas e sociais, devido aos resultados das gestões do período ditatorial
que irão ativar a crise do capital na realidade brasileira, resultante do endividamento externo,
ou seja, uma inflação elevada que impactava diretamente no aumento do custo de vida para os
trabalhadores. Assim, sob a proposta de diminuição de gastos governamentais que refletiria na
redução do déficit público que FHC apoiado nas ideias neoliberais defendia a privatização e a
diminuição da regulamentação do Estado na Economia, como cita Melo (2015), o que implica
na redução das aplicações nas políticas sociais públicas, vivenciando um total retrocesso. Desta
maneira, com a lógica da focalização e seletividade nas políticas sociais, ao invés de beneficiar
no mínimo aos usuários que dela necessitam como assim descreve a Constituição de 1988,
acaba por restringir o acesso dos usuários aos serviços sociais, devido às condicionalidades
limitadas que as leis preconizam aos programas, como a Lei nº 10.836, de 09 de janeiro de 2004
que rege o Programa do Bolsa Família quanto a Lei nº 8.742, de 07 de dezembro de 1993, que
diz respeito ao Benefício de Prestação Continuada, como detalharemos na seção seguinte.
39

3 A CONDIÇÃO DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO SÉCULO XXI

Esta seção abordará sobre a política de assistência social especificamente fazendo uma
abordagem histórica até o ano de 2018, com o governo de Temer, esta política será tratada no
contexto da crise capitalista, pois ao passo que se construiu uma política pública para a
assistência social foi também o momento em que o Brasil passou pelos efeitos da crise
estrutural do capital que como alternativa foi implementado o neoliberalismo que tem como
principal objetivo reduzir os custos no campo social para minorar os efeitos negativos na
economia.
Apesar da redução no investimento dos serviços sociais mediante a magnitude da
pobreza brasileira, houve a necessidade da implementação dos programas sociais como os de
transferência de renda.
Sabemos que nos últimos anos do século 20 e o início do século 21 foram marcados
por profundas alterações no campo das políticas sociais, tanto nos países centrais quanto nos
países periféricos. As grandes transformações econômicas e sociais, principalmente com o
rearranjo do mercado capitalista, a regionalização dos mercados e a crescente concentração
do capital financeiro, acabaram resultando no aumento da pobreza e na exclusão de um
extenso grupo populacional em vulnerabilidade social.
Desta forma, será feito uma breve reflexão sobre a temática da pobreza no primeiro
item desta seção, com o intuito de demonstrar as formas de enfrentamento no Brasil utilizadas
para tal problemática, obtendo destaque os Programas de Transferência de Renda,
considerados a estratégia de Política Social mais importante no contexto do Sistema
Brasileiro de Proteção Social na atualidade. Com o aumento dos índices da pobreza e todas
as transformações ocorridas abordadas acima, crescem as demandas por ações do Estado
voltadas à proteção social dos que se encontram fora do mercado de trabalho ou vivendo em
precarização.
Assim, os programas de transferência de renda são tratados como parte integrante do
sistema de proteção social brasileiro. Para demonstrar os sistemas de proteção social nos
recorremos a Silva e Silva, Yazbek e Giovanni (2004, p. 15) ao analisarem que: “São formas,
às vezes mais, às vezes menos institucionalizadas que todas as sociedades humanas
desenvolvem para enfrentar vicissitudes de ordem biológica ou social que coloquem em risco
parte ou a totalidade de seus membros”.
Em suma, Silva e Silva, Yazbek e Giovanni (2004) relatam que a proteção social no
Brasil tem se remodelado a partir do momento em que se processa a democratização e o
40

modelo de pacto federativo consagrado pela Constituição Federal de 1988, na qual instituiu
a descentralização político-administrativa e a participação da comunidade na elaboração e
controle das políticas sociais.
Em vista disso, será analisado as concepções e peculiaridades dos programas de
transferência de renda no Brasil que integram a assistência social. A estratégia utilizada no
Brasil nesta política para tentar controlar os índices de pobreza até ser instituído a CF de 1988
era sob o caráter assistencialista, caritativo e o voluntariado. Após a aprovação da
Constituição, nota-se que as ações fragmentadas foram substituídas por uma assistência social
fundamentada no campo do direito social, mesmo que possuísse algumas limitações para
acesso à ela como por exemplo: não ter vínculo empregatício, sem levar em consideração, um
usuário que possui apenas a renda para sua subsistência.
Todavia, mesmo diante aos limites para universalização da política social no sistema
do capital, percebe-se avanços na mesma. Outrossim, para o atendimento aos interesses
capitalistas como um todo, será observado nos itens a seguir deste capítulo, que a política de
assistência social sofrerá ataques neoliberais, com recursos desviados, cortes bruscos nos
orçamentos, mas haverá uma continuidade na expansão para o acesso aos benefícios
assistenciais, mesmo sob o controle orçamentário, isto se dará devido ao ideário neoliberal
que se sustenta na focalização e no direito condicionado para desvinculamento do assistente
social dos objetivos reais da seguridade social explícita na CF de 1988.
Desta forma na atualidade, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o Programa
Bolsa Família (PBF) são vistos como programas imprescindíveis para o enfrentamento à
pobreza, pois a cobertura dessas políticas atinge números nunca visto na assistência social, e
sua expansão leva a confirmação de que as transferências de renda assumem o privilégio da
centralidade nas políticas sociais no Brasil.
Por conseguinte, os programas de transferência de renda ganharam centralidade no
Brasil a partir dos anos 1990, com a introdução do neoliberalismo, que reorientou o sistema
de proteção social, e seus objetivos, tornando seu caráter universalista e configurando-o sob
a ótica da descentralização, da privatização e da focalização, como iremos analisar
detalhadamente no segundo item desta seção.
Contudo, existem distinções nas concepções e peculiaridades dos programas de
transferência de renda em evidência nessa seção, limitando-se à satisfação de necessidades
básicas que veremos adiante, não promovendo mais que apenas a amenização e o controle da
pobreza, e também priorizando as decisões políticas em valorizar políticas seletivas e não as
universais, como forma limitada para reduzir à pobreza e desigualdade social, evidente que o
41

acesso aos programas de transferência de renda trazem muitos benefícios para a pobreza, mas
há muito o que mudar, uma das soluções é a alteração da instituição das relações sociais que
deve ser contrária ao capital para então existir o fim da desigualdade social, o que exigiria
uma organização e luta da sociedade civil a favor de um modo de produção não capitalista.

3.1 A Política de Assistência Social: um pouco de história

A pobreza integra a sociedade desde as primeiras civilizações, onde surgiram


discursões a respeito das razões que levavam algumas pessoas a serem possuidoras da riqueza
e outras que experimentavam situações de vulnerabilidade atrelada à insuficiência de renda.
Segundo Behring e Boschetti (2011) os primeiros indícios evidentes da pobreza no
17
Brasil são da primeira década do século XX, devido ao elevado número de população
desempregada percebeu-se a dificuldade em inseri-los no mercado de trabalho, motivo pelo
qual, se acirrou a luta de classes, além da intensificação da luta por direitos civis, políticos e
a ampliação das políticas sociais, esta última ocorre pelo motivo da impossibilidade do
governo de garantir o direito ao trabalho e, com isso, os direitos sociais oriundos dessa esfera.
Assim, uma grande parte dos indivíduos que não se enquadraram no trabalho formalizado
detém um lugar marginalizado dentro de uma sociedade que não garantia a cidadania através
da concretização de direitos, desta forma os desempregados também passam a compor a
clientela dos que precisam da assistência social.
Dessa maneira, foi a partir das primeiras décadas do século XX que se desenhou o
grupo de população pobre e ocorreu o aumento de suas dimensões dentro da sociedade
brasileira, modificando os espaços territoriais urbanos, com o aparecimento dos bairros
periféricos, cortiços, onde se encontram os trabalhadores desempregados e os que escapavam
da pobreza rural. Juntamente aos trabalhadores desempregados, iniciaram as formas primárias
da resistência por intermédio das lutas sociais. Durante os anos de 1950 e 1960, o país passou
por um processo de desenvolvimento econômico e industrial, no entanto, houve o acirramento
da pobreza, derivada da exploração da classe trabalhadora e da desigualdade social entre as
pessoas, resultante da enorme diferença no processo de apropriação das riquezas socialmente
produzidas.

17
Segundo “Estatísticas do Século XX”, publicação feita pelo IBGE (2003), de 1977 a 1999, o número absoluto
de pobres aumentou de 40,7 milhões para 53,11 milhões. Houve queda, porém, da parcela que eles representam
(de 39,6% para 34,09%).
42

No decorrer da década de 1970 onde o Brasil viveu o “milagre brasileiro” 18, houve a
diminuição da pobreza entre a população, por outro lado, como já citado ocorreu o acirramento
da desigualdade social no país, tal contradição foi notória devido ao crescimento econômico,
ocorrido apenas em algumas partes da população, situação que permaneceu até os anos de
1980, gerando instabilidade na economia, acarretando perdas para a população até os anos de
1990.
Com o fim da ditadura militar na entrada dos anos de 1980 no Brasil, com grande
expressão da pobreza, do desemprego e das desigualdades sociais, resultando na luta dos
trabalhadores que marcaram a expansão das mobilizações sociais que pressionaram o Estado
para o atendimento de suas necessidades, acaba por culminar na instauração da Constituição
Federal de 1988, na qual prevê a garantia dos direitos e proteção social aos cidadãos, onde o
grande destaque desta foi o conceito de seguridade social para a construção da política social.
É evidente que historicamente a assistência social foi vista como uma forma de intervir
na pobreza, diminuindo seus efeitos, se tornando comum em nossa sociedade identificá-la
como prática clientelista do poder público, com enfoques na filantropia e benemerência e não
como uma política de direitos. Dessa forma é com a Constituição de 1988, que a assistência
passa legalmente a ser considerada como um direito social e dever do Estado, como podemos
ver no art. 6º que elenca a assistência entre os direitos sociais (BRASIL, 2002, p. 144), e em
seu artigo 203, como podemos analisar a seguir,

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar,


independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: I - a
proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II - o
amparo às crianças e adolescentes carentes; III - a promoção da integração ao
mercado de trabalho; IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de
deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; V - a garantia de um
salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que
comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.

A Construção da Constituição Federal - CF nos anos 80 trouxe consigo a conquista da


seguridade social brasileira com o progresso dos movimentos sociais na luta pela
redemocratização do país e do reconhecimento dos direitos sociais por parte do Estado, diante
dos vários embates entre a classe oprimida e a opressora. Pode-se afirmar então que a CF de
1988 trouxe ganhos significativos para a população brasileira, como vemos no artigo 104,

[...] é que apenas a partir da Constituição Federal de 1988, resultado de um processo


de mobilização sem paralelo na história brasileira, passa a ter em perspectiva a

18
Caracteriza-se por “milagre brasileiro” o período em que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro apresentou
crescimento de 8,6% ao ano, aumentando a renda de toda a população (ROCHA, 2006, p. 90).
43

construção de um padrão público universal de proteção social, coloca-se um quadro


de grande complexidade, aridez e hostilidade, para a implementação da seguridade
social (BEHRING, 2008, p. 249).

Desta maneira relata que, a seguridade social é “[...] um conjunto de princípios, normas
e instituições, integrado por ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, visando
assegurar os direitos relativos à saúde, previdência social e a assistência social” (BRASIL,
2008). Portanto, a Seguridade Social Brasileira é instituída na CF como mecanismo regulador
dos direitos sociais na previdência, saúde e assistência.

Art. 194. a seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de


iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos
relativos à saúde, à previdência e à assistência social. (EC nº20/98)
Parágrafo único. compete ao poder público, nos termos da lei, organizar a
seguridade social, com base nos seguintes objetivos:
I - universalidade da cobertura e do atendimento;
II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e
rurais;
III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;
IV - diversidade da base de financiamento;
V -caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão
quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos
aposentados e do governo nos órgãos colegiados (BRASIL, 2015, p. 117, grifo dos
autores).

Considerando que na Constituição, a política de saúde é orientada por princípios como


universalidade, gratuidade, descentralização, redistribuição, sendo direito de todos e dever do
Estado. A Política de Assistência Social é regulamentada pela fiscalização, gratuidade,
distributividade, descentralização e centralização na execução dos benefícios, onde só terão
acesso aqueles que dela necessitarem. Já a previdência social que exige a contribuição direta
dos trabalhadores e empregadores, onde o governo federal que complementa, só terão acesso
a esta última quem trabalha, quem realiza suas contribuições.
Com isso, a Constituição Federal determina o tripé da Seguridade Social, e sua
institucionalização se caracterizou como um grande marco para a expansão das políticas
sociais no Brasil, tendo em vista que até o momento se era conservado ações fragmentadas e
seletivas, com um caráter assistencialista. Contudo, houveram grandes impasses na
implementação dessa rede da proteção social no país, mesmo sendo garantida pela carta
constituinte, seus princípios não foram concretizados em sua totalidade, em vista que a década
de 1990 teve em seu ápice o domínio do pensamento neoliberal.
Diante disso, a conjuntura brasileira submersa em uma crise estrutural que atingiu todo
o mundo, passou a discutir com os partidos conservadores e as elites empresariais acerca da
impossibilidade de seguir os princípios constitucionais, dando início a uma agenda política,
social e econômica pautadas no neoliberalismo. Assim, houve uma série de impasses na
44

Constituição de 1988 nos governos seguintes, e o desmonte é evidenciado principalmente na


luta pela regulamentação em lei do tripé da seguridade social, a saúde com a Lei Orgânica da
Saúde (Lei nº 8.080 de 1990), a Previdência com o Custeio e Plano de Benefício da
Previdência (Leis nº 8.212 e nº 8.213 de 1991) e a Lei Orgânica da Assistência Social (lei nº
8.742 de 1993).
No que se refere a política de assistência social – que é o objeto de análise desse
trabalho, até 1988 a mesma não era vista como direito da população e nem era dever do
Estado, já que nas décadas anteriores, a assistência se caracterizava por ações clientelistas,
assistencialistas e populistas. Com a CF/88 ocorre a recognição da assistência social como
política pública, se constituindo em dois fundamentos, posto isto, o primeiro fundamento se
designa pela ação que se relaciona com à previdência, e visa garantir benefícios mensais de
transferência de renda para idosos e deficientes, um exemplo disso é a regulamentação do
Benefício de Prestação Continuada (BPC); e o segundo fundamento tem como finalidade
proporcionar o bem-estar a população que se encontra em situação de pobreza extrema e
vulnerabilidade social.
Tal configuração e ampliação colocaram a política de assistência em um novo patamar
dos direitos sociais, como pode ser visto posteriormente na LOAS que em seu Art.1º
determina que a assistência social é um “[...] direito do cidadão e dever do Estado, é Política
de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um
conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento
às necessidades básicas” (BRASIL, 1993).
Todavia, a década de 1990 não trouxe somente fragmentações e sim também
contrariedades advindas do projeto neoliberal para seguridade social, como os
direcionamentos que desvaloriza os ganhos alcançados pela classe trabalhadora tendo como
finalidade a satisfação de interesse do capital, menosprezando os direitos instituídos na CF de
1988 e modificando a função do Estado, como vemos na,

[…] retirada do Estado como agente econômico, dissolução do coletivo e do público


em nome da liberdade econômica e do individualismo, corte dos benefícios sociais,
degradação dos serviços públicos, desregulamentação do mercado de trabalho,
desaparição de direitos públicos históricos dos trabalhadores; estes são os
componentes regressivos das posições neoliberais no campo social, que alguns se
atrevem a propugnar como traços da pós-modernidade (MONTES, 1996 apud
BEHRING, 2008, p.58).

Nesse contexto, o interesse da busca de lucros no investimento no setor privado


propicia cada vez mais o desenvolvimento da mercantilização, principalmente com a
privatização das políticas da previdência e da saúde, onde os direitos se transformaram em
45

“mercadorias” visando alcançar a supercapitalização, já que gera um nicho lucrativo para o


capital. Essas transformações vão ser denominadas, conforme Behring e Boschetti (2011, p.
152-153), como trinômio do neoliberalismo que é composto pela descentralização,
focalização e privatização, acerca da última, podemos observar que buscava [...] atrair
capitais, reduzindo a dívida externa; reduzir a dívida interna; obter preços mais baixos para
os consumidores; melhorar a qualidade dos serviços; e atingir a eficiência econômica das
empresas, que estariam sendo ineficientes nas mãos do Estado.
As autoras ainda expõem acerca do trinômio, que a descentralização, se caracterizou
pelo repasse na execução das políticas públicas para entidades não governamentais, que são
designadas como terceiro setor. Essas transferiam parte da responsabilidade do Estado para
as ONGs, Organizações Sociais (OS), as Organizações Sem Fins Lucrativos (OSFL) e entre
outras. Por último temos a focalização, em que os gastos públicos passaram a ser direcionados
para programas sociais específicos, isto é, os recursos advindos do Estado destinaram-se para
aqueles em situação abaixo da linha da pobreza, e esse processo veio a intensificar ainda mais
o desmonte das políticas sociais, em especial a política de assistência social.
Essas transformações culminaram em um retrocesso nos direitos sociais, quando o
Estado redirecionou parte das funções que antes eram suas, ao mercado e à sociedade civil,
sob a justificativa da impossibilidade de se realizar as reformas propostas na Constituição. As
consequências do neoliberalismo impactaram diretamente a classe trabalhadora, pois estando
inserida em uma conjuntura de desemprego, alta inflação, e com os desmontes que atingiram
as políticas sociais, a década de 1990 demarca a ampliação da desigualdade social no Brasil.
Deste modo, podemos observar que a crise econômica tratada na primeira seção, a
reestruturação do trabalho, juntamente com desmonte na seguridade social, foram as respostas
para as novas orientações econômicas pautadas no neoliberalismo. Assim, a efetivação da
política de assistência social foi abalada, tendo em vista que houve a recusa em aprovar o
projeto de lei em que regulamentava a política e a mesma continuava a ser executada como
uma caridade do Estado, ao invés de um direito legitimado pela Constituição.
Conforme esclarece Couto (2010), a política de assistência social ganhou notoriedade
jurídica de maneira diferenciada das demais, retardando reconhecimento com direito, pois
mesmo que a CF/88 não tenha alcançado seu objetivo com novas mudanças políticas
imediatas, é incontestável a luta da classe trabalhadora na garantia de seus direitos. Com isto,
a Política de Assistência foi regulada em 1993, mesmo diante dos impasses para a sua
efetivação, com as falhas em debates conceituais políticos, uma parte da população
conservadora do governo Collor acreditava que a administração da assistência social fora
46

destacada com irresponsabilidade, considerando a crise fiscal que o Brasil passava naquele
momento no contexto da inflação.
Toda esta rearticulação junto ao movimento que ganhava força política no Brasil, cujo
objetivo era o impeachment de Collor, contribuíram para a população pressionar o governo
de Itamar Franco, para que fosse encaminhado a bancada do Congresso novas
complementações através de projeto de lei para a área da seguridade social. Desta forma,
aprova-se a Lei Orgânica da Assistência Social, conhecida como LOAS, Lei nº 8742 de 07 de
dezembro de 1993 que trata da organização da Assistência Social e dá outras providências,
demonstrando que seria a última política a ter a lei aprovada, seguindo o dilema já visto na
realidade brasileira quanto à sua estruturação, como descreve Brasil (1993) em sua definição
para a Assistência Social, a qual é um direito do cidadão e dever do Estado, sendo uma política
de seguridade não contributiva que oferta os mínimos sociais aos usuários que dela
necessitarem, por meio de um conjunto integrado de ações públicas e da sociedade, garantindo
as necessidades básicas.
A LOAS segundo seus princípios e diretrizes é revolucionária e se organiza na
conservação como direito social, um grande avanço para esta política ressaltada, conforme o
art.4º e 5º a seguir:

Art. 4º A assistência social rege-se pelos seguintes princípios:


I - supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as exigências de
rentabilidade econômica;
II - universalização dos direitos sociais, a fim de tornar o destinatário da ação
assistencial alcançável pelas demais políticas públicas;
III - respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu direito a benefícios e
serviços de qualidade, bem como à convivência familiar e comunitária, vedando-se
qualquer comprovação vexatória de necessidade;
IV - igualdade de direitos no acesso ao atendimento, sem discriminação de qualquer
natureza, garantindo-se equivalência às populações urbanas e rurais;
V - divulgação ampla dos benefícios, serviços, programas e projetos assistenciais,
bem como dos recursos oferecidos pelo Poder Público e dos critérios para sua
concessão.
Art. 5º A organização da assistência social tem como base as seguintes diretrizes:
I - descentralização político-administrativa para os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, e comando único das ações em cada esfera de governo (BRASIL, 2020,
p. 11, grifo dos autores).

Os princípios e diretrizes citados acima possuem uma grande importância para o


sistema de Proteção Social no Brasil, pois tem como objetivo alterar o antigo significado da
assistência social, de ajuda e assistencialismo para o direito social. A separação da
contribuição e prestação de serviços sob a forma de supremacia das necessidades sociais sobre
o lucro do capital é bastante desafiador, e não encontram formas anteriores, nem leis sociais
que tratam disto no Brasil.
47

A grande novidade da Política de Assistência está no cofinanciamento e sistema


compartilhado entre governo federal, os Estados e municípios, sendo que o Estado é o grande
responsável e condutor das Políticas Sociais diferentemente do antigo papel do Estado, e que
anteriormente tal função destinava-se às entidades filantrópicas e privadas.
A partir destes argumentos, os autores Couto (2010) e Boschetti (2003) destacam a
ruptura do clientelismo, da fragmentação, pulverização, da descontinuidade dos serviços, da
participação dos conselhos democráticos na assistência social. Com isto, a assistência social
avança como política de seguridade ampliando os direitos, com o Estado sendo responsável
pelas necessidades sociais, desta forma a LOAS,

não apenas introduziu novo significado para a assistência social, diferenciando-a do


assistencialismo e situando-a como política de seguridade voltada à extensão da
cidadania social dos setores mais vulnerabilizados da população brasileira, mas
também aponta a centralidade do Estado na universalização e garantia de direitos e
acesso a serviços sociais qualificados, ao mesmo tempo em que propõe o sistema
descentralizado e participativo na gestão da assistência social no país, sob a égide
da democracia e da cidadania (YAZBEK, 1997, p. 9).

De acordo com a LOAS identifica-se também um novo sentido na definição dos


programas e benefícios com um caráter restritivo. O Benefício de Prestação Continuada-
BPC, benefício garantido na LOAS, que objetiva o critério de menor elegibilidade juntamente
com à defesa de transferência de recursos financeiros aos deficientes pobres e idosos.
Sabemos que a LOAS apesar de ter sido um grande desafio para a organização da
Assistência Social como espaço da esfera pública de política social, mantém também
condutas restringidas e únicas da Assistência Social. Com isto, acontece o critério de
elegibilidade baseado sempre na linha de pobreza, limitando esta renda familiar per capita,
onde pois a pobreza absoluta é o centro de atenção da política de assistência social. No Brasil
a partir da aprovação da CF/88 e a da LOAS escolheu-se então uma linha de pobreza bem
abaixo do esperado, no Benefício de Prestação Continuada – BPC por exemplo, os usuários
beneficiários tem que comprovar renda familiar abaixo de 25% do salário mínimo, os demais
acima desta linha continuam em situação crítica de pobreza.
A organização da Assistência Social com a estruturação da LOAS fundamentado na
política social tem como base os princípios democráticos listados em critérios como assim
descreve Raichellis (1998) e Couto (2010): visibilidade, é quando há clareza das ações e
discussões para a população, por parte de quem toma as atitudes; cultura pública: fim dos
princípios de cuidados e restrito da assistência social; representação dos interesses coletivos,
onde se tem uma participação de sujeitos sociais; controle democrático: participação da
48

sociedade civil na tomada de decisões; democratização das decisões para além dos fóruns
tradicionais e instituídos em lei.
Consoante a LOAS, a assistência social estabelecida no governo Itamar Franco
organizou-se como política pública, atrelada a outras políticas sociais instituídas a partir da
Constituição Federal, realizando com isso a concessão de direitos antes negados aqueles que
se encontram em situação de extrema pobreza e em vulnerabilidade social.
Desta forma, a política de assistência social como cita Pereira (2007, p.66),

Passou a ter complexidade que requer conhecimento próprio, gestão qualificada e


ação competente. Por isso, não deve ser encarada como mera distribuição de
benefícios e serviços, mas como uma unidade de caminhos diversos interligados
entre si, que vão desde a compreensão e o estudo da realidade, o planejamento, a
definição coletiva (geralmente conflituosa), até a implementação, o
acompanhamento e a avaliação das ações. E isso exige aparato legal e institucional,
recursos materiais e financeiros, além do pessoal qualificado a serviço do interesse
público.

Nesta direção e considerando as leis regulamentadoras, a assistência social não


poderia: (1) funcionar isoladamente das outras políticas; e nem focalizar na pobreza absoluta,
onde estas mantêm os pobres em condição de privação e de rótulos dos usuários. Assim, a
assistência social como define Pereira (2007) baseado na LOAS é uma política de natureza
gratuita e desmercadorizada, que deve ser escusa de contrapartidas de instituições. Esta
política pública vem então requerer o seu próprio espaço institucional comandado pela
Secretaria Nacional de Assistência Social vinculada ao Ministério do Desenvolvimento
Social
Dessa maneira, a assistência social foi alvo de várias disputas para o seu
reconhecimento como um direito, a aprovação da LOAS em 1993, trata-se de uma conquista
da luta da classe trabalhadora, no entanto, com o governo de Fernando Henrique Cardoso
(FHC) que possuía um caráter neoliberal, a política se consolidou pelo viés da solidariedade
e programas sociais de caráter conservador, contrariando ao que é posto na seguridade social
e na LOAS. Um exemplo disso, foi a criação do Programa de Comunidade Solidária,
estabelecido pela MP 813/95, que objetivava coordenar ações governamentais, atendendo
uma parte da população que não tinha meios para sobreviver, contudo, o programa se resumiu
a entrega de cestas básicas de forma emergencial e seletiva.
Conforme Pereira (2002) o Programa Comunidade Solidária do governo de FHC na
Área da Assistência Social colaborou para rejeitar o princípio da equidade e da justiça social,
alargando os níveis de pobreza de um lado, e de outro fazendo com que os usuários da
assistência social passem por testes constrangedores e que cria estigmas, rótulos.
49

Com esse governo de natureza neoliberal, houve alterações na organização do Estado e


também ocorreu demissão de servidores. Desta forma extinguiu-se a LBA, O Centro Brasileiro
para a Infância e Adolescência (CBIA), o Ministério do Bem Estar Social (MBES), a assistência
social então passa para a administração do Ministério da Previdência Social, com vinculação
da Secretaria de Assistência Social, controlada pelos órgãos do Conselho Nacional de
Assistência Social.
Couto (2006) evidencia que as reformas realizadas na década de 1990 ocasionaram,
como já mencionado, na ampliação da concentração de renda para “alguns”, agravamento das
desigualdades sociais no país, aumento do desemprego e do trabalho informal, intenso processo
de privatização, e o desmonte dos direitos sociais e trabalhistas, anulando os princípios da
Constituição de 1988.
A entrada dos anos 2000, deu continuidade a esse projeto que perdurou durante o
governo de Luiz Inácio Lula da Silva, mas é importante ressaltar que mesmo com a ofensiva
neoliberal, houveram significativos avanços legais na política de Assistência Social, esses
avanços foram direcionados pela IV Conferência Nacional de Assistência Social em 2003, que
propiciou a construção para a implementação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)
em 2011. O SUAS propõe-se a organizar os princípios, deliberações, ações e pontos dispostos
na LOAS e na PNAS (2004), esta última, por sua vez, respeita os determinantes estabelecidos
na LOAS e na CF de 1988, acrescentando outra diretriz, bem como complemento, a
descentralização na política administrativa, designando as coordenações e normas gerais ao
governo federal e coordenação e gestão dos programas aos governos municipais e estaduais
evitando a justaposição de ações. Como podemos ver nas diretrizes estabelecidas pela PNAS
(2004, p. 32-33),

A organização da Assistência Social tem as seguintes diretrizes, baseadas na


Constituição Federal de 1988 e na LOAS:
I - Descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas
gerais à esfera federal e a coordenação e execução dos respectivos programas às
esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência
social, garantindo o comando único das ações em cada esfera de governo, respeitando-
se as diferenças e as características socioterritoriais locais;
II – Participação da população, por meio de organizações representativas, na
formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis;
III – Primazia da responsabilidade do Estado na condução da Política de Assistência
Social em cada esfera de governo;
IV – Centralidade na família para concepção e implementação dos benefícios,
serviços, programas e projetos.
50

Algumas modificações ocorreram nesta nova PNAS 2004 19 que substituiu a PNAS de
1998, assim como descreve Pereira (2007), uma delas foi a definição da assistência social como
política de proteção social, a delimitação do público-alvo desta política e das proteções que ela
deve assegurar, a territorialização da ação, a instituição do Sistema Único da Assistência Social
(SUAS) e as novas bases de financiamento, sobre a PNAS (2004) retornaremos adiante.
A consolidação do SUAS vem se dando na medida em que definiu as atribuições,
responsabilidades e competências, estabeleceu padrões de atendimento, tipificou os serviços,
organizou o cofinanciamento e estabeleceu mecanismos para provisão dos recursos necessários
ao funcionamento das ofertas e proteções da política.

Com base no art.6º da LOAS se conclui, nos termos da lei, que o SUAS é um
mecanismo organizador dos preceitos, disposições, ações e procedimentos previstos
na LOAS e na PNAS. Seu objetivo é o de garantir, do ponto de vista operacional e em
caráter sistêmico (funcionalmente interligados), a implementação e gestão da Política
(PEREIRA, 1998, p. 69).

No artigo 204 da CF/88 expõe-se que o orçamento da assistência vem da seguridade


social, pois as ações governamentais são organizadas pela descentralização político-
administrativa, a coordenação e os trâmites gerais cabem ao governo federal, a execução dos
programas e coordenação, aos municípios e Estados, às associações beneficentes e setores de
assistência social (Cadastro Único, CRAS, CREAS), e também por meio de controle social com
a participação da população na construção das políticas.
Com a atualização da LOAS pela Lei nº 12.435 de 2011, há uma reorganização nos
objetivos da assistência social estruturados em três partes distintas:

I- Proteção Social, que visa à garantia da vida, à redução de danos e à prevenção da


incidência de riscos, especialmente:
a) à proteção à família, à maternidade, à infância, /à adolescência e à velhice;
b) o amparo às crianças e aos adolescentes carentes;
c) a promoção da integração ao mercado de trabalho;
d) a habilitação e reabilitação das pessoas com deficiência e a promoção de sua
integração à vida comunitária, e;
e) a garantia de 1 (um) salário-mínimo de benefício mensal à pessoa com deficiência
e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família;
II – A vigilância socioassistencial, que visa a analisar territorialmente a capacidade
protetiva das famílias e nela a ocorrência de vulnerabilidades, de ameaças, de
vitimizações e danos;

19
O ano de 2004 foi marcado, na área de Assistência Social, pela aprovação da Política Nacional de Assistência
Social (PNAS). O debate em torno da nova política teve início ainda no primeiro semestre do ano, mas ganhou
densidade após o mês de junho, quando a Secretaria Nacional da Assistência Social apresentou ao Conselho
Nacional de Assistência Social (CNAS) uma versão preliminar dessa política. Tal documento foi também
divulgado nos estados e debatido em vários eventos que passaram a ser organizados para esse fim. A versão final
da PNAS foi aprovada pelo CNAS em setembro. Segundo a nova PNAS, a Assistência Social é uma política de
proteção social e deve garantir três tipos de segurança: i) segurança de sobrevivência; ii) segurança de acolhida; e
iii) segurança de convívio.
51

III- A defesa de direitos, que visa a garantir o pleno acesso aos direitos no conjunto
das provisões socioassistenciais (BRASIL, 2011, p.8).

Caracterizando tal definição fica evidente que a política de assistência social é não
contributiva, pois ela não se adequa à lógica irrisória do mercado, não podendo ser tratada
como mercadoria, que visa o lucro, por isso por vezes não há preocupação com quem dela
necessita por parte dos governantes, não esquecendo de mencionar alguns programas que
serão explorados adiante, que por vários motivos ocorre um olhar diferenciado para eles, o
que não justifica o esquecimento da importância que a política pública de assistência social
preconiza, conforme indaga Couto (2010) sua definição e objetivos que demonstra a
necessidade para ser considerada como direito social, responsabilidade estatal, apontando
para uma solidariedade social, que define a política social pública.
A Política Nacional de Assistência Social – PNAS/2004 como já observamos, elucida
a CF/88 e a LOAS, conferindo ao campo da assistência social a característica de uma
ampliação do objetivo da proteção social dos brasileiros, ocasionando um alcance maior do
direito de cidadania, superando a leitura da proteção social unida tão somente ao campo da
legislação do trabalho. Considera ainda, que essa ampliação é definida a algumas seguranças
sociais no âmbito da política de assistência social, e em ações que promovem a prevenção, a
proteção, a promoção e a inserção social, a PNAS é construída com o objetivo de integrar as
demais políticas sociais, levando em conta as peculiaridades sociais e territoriais, efetivando
dessa maneira, a garantia dos mínimos sociais, bem como a universalização dos direitos
sociais. E analisa também que a política se organiza em unidade nacional na forma de sistema
que assegura direitos através de proteção social básica e especial, como detalharemos adiante.
Os princípios democráticos que norteiam a PNAS (2004, p. 33) estão em,

[...] consonância com o disposto na LOAS, capítulo II, seção I, artigo 4º, assim são
nomeados:
I – Supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as exigências de
rentabilidade econômica;
II – Universalização dos direitos sociais, a fim de tornar o destinatário da ação
assistencial alcançável pelas demais políticas públicas;
III – Respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu direito a benefícios
e serviços de qualidade, bem como à convivência familiar e comunitária, vedando-
se qualquer comprovação vexatória de necessidade;
IV – Igualdade de direitos no acesso ao atendimento, sem discriminação de
qualquer natureza, garantindo-se equivalência às populações urbanas e rurais;
V – Divulgação ampla dos benefícios, serviços, programas e projetos assistenciais,
bem como dos recursos oferecidos pelo Poder Público e dos critérios para sua
concessão.

Desta maneira a PNAS (2004), assim como a LOAS, define a Assistência Social
vinculada como política de proteção. Então, como proteção, ela se organiza em ações que
garantem as seguranças de sobrevivência, de acolhida e convívio. Cada segurança por sua vez
52

orienta para o desenvolvimento humano, e se prende nos princípios da centralidade da família,


na territorialização, na proteção pró-ativa, integralidade da seguridade social e de todas as
políticas sociais e econômicas.
As seguranças de sobrevivência, acolhida e convívio serão usadas de acordo com a
necessidade de proteção social do usuário: a proteção básica têm por objetivo a prevenção de
situações de riscos, destina-se a população que vive em situação de vulnerabilidade social,
resultante da pobreza, privação, ausência de renda e todas as outras formas de fragilidade de
vínculos, têm suas ações organizadas pelo Centro de Referência de Assistência Social
(CRAS); A Proteção Social Especial têm um caráter reparador onde reúne um conjunto de
serviços e programas especializados de médio e alta complexidade que através do Centro de
Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) atua com os profissionais técnicos
em situações de riscos já instalados na família, indivíduos, incluindo idosos e pessoas com
deficiência em atuação de risco ou com direitos violados.
Desta forma Pereira (2007) faz uma análise entre a assistência social e a saúde, e
demonstra ser uma cópia dos sistemas, ou seja, do SUS no SUAS. O SUAS convive com
interferências no campo da assistência social, as quais algumas ações possuem ainda formas
que lembram o assistencialismo, escapando assim do controle do sistema, que para a autora
acaba por perder a identidade do SUAS, que deveria ser cuidadoso nas particularidades da
assistência social. Assim, o mesmo depara-se em conceitos do SUS, que contraria a lógica da
política de assistência social, sendo adverso ao modelo que criou a assistência social na CF
de 88 e da LOAS.
Contudo, observa-se que é a partir da entrada do século XXI que vemos uma forte
tendência a centralidade desta política de assistência social, sobretudo pelo aumento da
desigualdade social no Brasil, como já citamos nesse item.
Assim, os recursos desta política20 revertem-se grande parte para as políticas de
transferência de renda, que são oferecidas aos usuários e famílias em pobreza absoluta em sua

20
De acordo com dados do Caderno SUAS (2008, pág. 17), gráfico III, que relata a evolução dos recursos dos
Programas de Transferência de Renda, especificamente no ano de 2004 quando inicia-se a implantação do PBF,
dois programas se destacam pela maior concentração de crescimento em todos os anos como mostra no caderno
citado, desde 2004 a 2016, que são o BPC e o PBF, o recurso destinado ao BPC no ano de 2004 foi de R$ 5,73
bilhões e reais, para o PBF foi destinado neste mesmo ano um valor estimado em R$ 5,31 bilhões de reais. No
BPC, há uma forte influência da política de aumento do salário mínimo. O salário mínimo teve um acréscimo de
cerca de 46% neste período. Outro aspecto que impactou no incremento dos recursos desse programa foi a
aprovação do Estatuto do Idoso no mesmo período, que modificou os critérios de concessão do benefício ao reduzir
a idade de 67 para 65 anos e não contabilizou na renda per capita familiar o benefício já concedido a outro idoso
da família. Consequentemente, houve ampliação da cobertura do BPC. No que tange ao Programa Bolsa Família,
o crescimento da execução é resultante do processo de expansão do programa, que seria finalizado em julho de
53

totalidade, desde a soma da renda que é uma renda mínima até a proximidade ao acesso das
políticas sociais. Destarte, as transformações na estrutura econômica e social no Brasil
impactaram diretamente no sistema de proteção social, o Brasil vivia uma fase de crescimento
econômico, onde houve um investimento maior nos programas contributivos ou não
contributivos de renda, essas intervenções feitas pelos programas sociais com base na
transferência de renda, a exemplo do Programa Bolsa Família (PBF) e o Benefício de
Prestação Continuada (BPC), estão mudando a realidade de muitas famílias tanto nos índices
de extrema pobreza ou pobreza de acordo com as informações detalhadas acima onde
especifica-se os recursos destinados a estes programas, que por sua vez, os programas de
transferência de renda tem como objetivo atender aos mínimos sociais da população que se
encontra em situação de maior vulnerabilidade social, acarretando em uma expansão da
política de transferência de renda, no entanto ainda de forma focalizada, seletiva, devido ao
ideário neoliberal, de acordo com cada programa e suas condicionalidades, como iremos tratar
no próximo item.
Cabe frisar, que a Seguridade Social, conforme a Constituição, é compreendida pelo
amplo e articulado mecanismo de proteção social, e ao focalizar a política a uma transferência
de renda, o que observamos é que a mesma é reduzida em termos relativos, impedindo parte
da população de ser beneficiária dos referidos programas, já que não se encontram dentro dos
critérios mínimos de elegibilidade. Tal fato acarreta uma limitação dos serviços públicos e na
redução dos direitos da classe trabalhadora.
As políticas de transferência de renda serão abordadas a seguir, onde terá
direcionamentos necessários considerando a importância das políticas de transferência de
renda em um contexto orçamentário e político que gera entendimentos e polêmicas quanto a
sua estrutura e desenvolvimento para o controle da pobreza, e também como uma busca de
notoriedade pública.

2.3 O direcionamento da Política de Assistência Social e o controle da pobreza: A persistência


dos programas de transferência de renda.

A partir da análise do item anterior, faz-se necessário uma reflexão sobre a pobreza e
suas formas de enfrentamento no Brasil, partindo para um destaque aos programas de

2006 quando atingiu a meta de atendimento de 100% das famílias pobres, ou seja, famílias com renda per capita
mensal de até R$ 120,00, com base na estimativa da PNAD/IBGE de 2004.
54

transferência de renda, os quais baseados em Silva, Yazbek, Giovanni (2008) são


considerados estratégias de Política Social dominante no contexto do Sistema Brasileiro de
Proteção Social, perpassando nos governos de Lula, Dilma e Temer. Os programas de
transferência de renda são importantes no contexto das políticas sociais, pois utiliza-se dos
investimentos em capital humano como base para evitar a reprodução da pobreza entre
gerações, melhorando tanto a situação das famílias beneficiárias que se encontram em
vulnerabilidade social, pois as mesmas terão acesso à renda para prover suas necessidades
básicas, quanto contribuir com o acesso aos serviços sociais, como meio para colaborar no
alívio da pobreza (SILVA; YAZBEK; GIOVANNI, 2008).
A pobreza é um objeto de preocupação no campo teórico-conceitual e da intervenção
social buscando aprofundar sobre sua emergência, perseverança e ampliação global, sendo
visto sua regulação ou redução, que é fundamental para manter o sistema do capital. Assim,
para contribuir com a temática dos programas de transferência de renda, a pobreza tem sua
concepção como fenômeno multidimensional, não se tratando de uma simples insuficiência
de renda, e sim também de uma desigualdade na distribuição de riqueza socialmente
produzida, de não participação nos serviços básicos, no acesso limitado às informações, aos
trabalhos e renda digna, e também a não participação social e política como usuário na
sociedade civil.
A pobreza por sua vez, possui um amplo debate com padrão liberal que atribui várias
correntes ortodoxas neoclássicas, as informações economicistas, contratualistas, liberalistas,
não obstante, no campo liberal a pobreza é vista no indivíduo que visualiza o mercado como
local de aprazamento para as necessidades, sejam elas econômicas e sociais, acarretando em
políticas orientadas à intervenção marginal e numa vertente compensatória, corrigindo os
casos de pobreza extrema.
Em síntese, sabe-se que para explicar o fenômeno da pobreza pressupõe analisar suas
determinações estruturais, pois é no campo do marxismo que se encontram os princípios para
tal explicação, conforme Silva (2002, p.79) esboça que, a pobreza, é essencial ao sistema de
produção capitalista, mediante exploração decorrente do processo que gera o lucro e da
repartição desigual da renda nacional entre todos.
A percepção então da pobreza como fenômeno estrutural que é resultante do processo
capitalista e como fenômeno multidimensional, complexo e relativo, desconsidera o
entendimento apenas como insuficiência de renda e onde via-se os usuários pobres como um
grupo separado. Desta forma, desvenda os valores e conceitos das políticas de intervenção
nas situações de pobreza, estratégias para redução, superação ou apenas controle.
55

Preliminarmente a inclusão dos programas de transferência de renda na temática da


política social não é recente, pois segundo Suplicy (2006) a primeira forma de viabilização
desta na prática foi a renda mínima realizada na cidade de Burgues na Bélgica, influenciados
pelas ideias de Vives que possuía um livro em 1525, onde orientavam formas de como lidar
com a problemática da pobreza, insinuava o acesso ao benefício monetário as famílias sem
nenhum trabalho ou que não garantissem sua renda para sobrevivência da mesma, no entanto
esta experiência da Bélgica é meio que deixado de lado pela literatura que coloca a Inglaterra
como pioneira do acesso à renda complementar ao trabalho por meio da lei Speenhamland de
1795, como já especificada no item anterior.
Considerando a fome europeia e a pressuposição do Estado quanto às inquietudes dos
pobres, pensou-se em complementar a renda dos trabalhadores, indexando esta ao preço do
pão, que não alcançavam sua renda mensal por meio de abono monetário, equilibrando o
poder de compra. Foi então na passagem do feudalismo para o capitalismo 21, conforme
Boschetti (2006) ressaltou que a Lei Speenhamland realizou mudanças políticas-sociais,
construindo assim um novo paradigma, regulamentado no capitalismo industrial e em suas
inferências econômicas e sociais que desencadearam na transformação na relação entre
sociedade e Estado.
Assim com as alterações econômicas, políticas e sociais, o Estado Capitalista se torna
o personagem principal no contentamento às necessidades humanas, se renovando na
esperança de recuperação do lucro e de um crescimento logo depois da crise de 1929,
utilizando-se dos programas de transferência de renda, que foram introduzidas no século XX
nos países centrais e periferias das capitais. Entretanto, foi com o segundo pós-guerra que as
transferências de renda são generalizadas, tidas como instituição do Estado social, onde a
mesma garantiria o bem-estar dos cidadãos.
Para isso, Esping Andersen (1991) analisa entre alguns dos seus critérios para o Estado
que a desmercadorização assume centralidade, alterando as relações sociais que antes eram
vistas como mercadoria para uma mudança na construção de políticas sociais universais como
direito para providenciar um status de cidadão, garantindo melhores condições de vida e

21
A transição do feudalismo para o capitalismo ocorreu sob o esfacelamento das instituições medievais que
entravam em uma profunda crise com as mudanças ocorridas a partir do século XI. A crise na estrutura da
sociedade feudal ocorreu quando as relações de produção servis se tornaram um obstáculo para o desenvolvimento
das forças produtivas materiais, contraindo, ao longo de um processo transitivo, novas relações ajustadas ao modo
de produção em ascensão, o capitalismo. Estas relações de produção eram as assalariadas. Com as mudanças
econômicas surge também um novo homem, o burguês, que não serviu apenas para concretizar a exploração do
homem pelo homem, mas também para simplificar esta exploração ao longo da evolução do modo de produção
capitalista (FERLA; ANDRADE, 2007).
56

dignidade aos homens e mulheres, fazendo com que haja uma autonomia dos cidadãos, onde
eles escolham a forma de vida que desejam adquirir e não dependam da escolha dos outros.
Deste modo o debate entre autonomia e transferência de renda é bastante fundamental.
Plant (2002) em seu discurso diverge de liberdade negativa, considerando a importância de
intervenção do Estado, propondo uma concepção de liberdade humana e vista como positiva.
O autor supracitado defende então que a renda é um direito social e contribui para o exercício
da liberdade.
Por outro lado, na conjuntura latino-americana, o acesso às políticas de transferência
de renda circulou por longe de ser um debate de liberdade e construção de uma vida melhor,
como o europeu preconizava.
A década de 1970 que houve a estruturação dos princípios do neoliberalismo nestes
países, introduziram como estratégias, as políticas de transferência de renda para atingir os
objetivos do Milênio22, seriam eles: reduzir a pobreza extrema e a fome à metade, alcançar a
educação primária universal; promover igualdade de gênero e; reduzir a mortalidade infantil
para dois terços e mortalidade maternal em três quartos; parar com a disseminação de doenças
pandêmicas (AIDS, Malária, Tuberculose); garantir a sustentabilidade ambiental;
desenvolver uma parceria global para o desenvolvimento.
Em vista disso, na virada do século XX, recorrente da condição de pobreza mundial,
a Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou a Declaração do Milênio, o qual foi um
documento assinado por 189 países para desta forma agir contra as condições de pobreza
extrema. Fica evidente que houve críticas quanto aos objetivos, especialmente na soberania
da tríade EUA, Europa e Japão, onde não houve na formulação desses objetivos participação
dos países pobres, deste modo a tríade indicou a necessidade de financiamento a partir de
empréstimo aos países pobres que os mesmos deveriam solicitar ao Banco Mundial, ao FMI
(Fundo Monetário Internacional) e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) em troca de “salvar” os países pobres da América Latina, financiando as
políticas de transparência de renda, a tríade estaria utilizando uma estratégia para recuperarem

22
O ano de 2015 foi o último em que vigorou os Objetivos do Milênio – ODM - estabelecidos pelas Nações Unidas
para lidar com graves problemas de carências humanas. Os ODM foram substituídos pelos ODS – Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável, chegou-se a um acordo que contempla 17 Objetivos e 169 metas, envolvendo
temáticas diversificadas, como erradicação da pobreza, segurança alimentar e agricultura, saúde, educação,
igualdade de gênero, água e saneamento, energia, crescimento econômico sustentável, infraestrutura, redução das
desigualdades, cidades sustentáveis, padrões sustentáveis de consumo e de produção, mudança do clima, proteção
e uso sustentável dos oceanos e dos ecossistemas terrestres, sociedades pacíficas, justas e inclusivas e meios de
implementação.
57

suas economias, que vinham em queda progressiva a partir de 1960, seria como um disfarce
para o avanço do neoliberalismo, e expansão do capital.
Assim, as políticas de transferência de renda passam a ser importante forma de
combate à pobreza absoluta na América latina, pois os Organismos Internacionais
organizavam o financiamento das políticas de transparência de renda conforme Stein (2005)
a partir da elaboração dos países pobres do Documento Estratégia de Lutas Contra a Pobreza
(DELP) que exigiam os seguintes elementos: (1) diagnóstico que expresse a compreensão
integral da situação da pobreza, desigualdade, seus determinantes e obstáculos para sua
superação; (2) concepção de processo participativo; (3) a definição de um plano de ações
prioritários e; (4) o estabelecimento de metas.
Por conseguinte, para alcançar alguns dos objetivos do documento em questão, outra
categoria de transferência de renda fundamentada em condicionalidades foi alavancada, a
qual é defendida por diversos organismos e encontra-se em implementação em vários países.
Tais transferências monetárias em modo geral, destinam-se a famílias pobres ou
extremamente pobres, com filhos em idade escolar, que serão abonados de forma a contribuir
para melhoria no capital humano de cada indivíduo, evitando uma progressão futura da
pobreza.
Deste modo, os programas de transferência de renda no caso brasileiro entraram na
agenda político-social diante a obrigatoriedade de prover ações para o combate à pobreza no
país. Além disso, os autores Silva, Yazbek e Giovanni (2008) constataram que no texto
encontrado do Professor Antônio Maria da Silveira, o qual foi publicado na Revista Brasileira
de Economia, tornou-se uma pesquisa precursora no Brasil quanto a defesa das necessidades
para os mais pobres. Então, de acordo com Silveira (1975) sua defesa tratava-se de uma
transferência de renda correspondente a diferença entre renda tida pelo pobre e um nível
mínimo de isenção, tendo como referência para o nível de isenção, um valor para a
subsistência do indivíduo, um programa que direcionasse o mesmo para implementação por
faixas progressivas começando pelos idosos, até chegar aos mais jovens.
Seguindo a linha de raciocínio de Silveira (1975), os autores Bacha e Unger (1978)
apoiaram a forma de complementação de renda cooperando o dito projeto de democracia no
Brasil, enaltecendo a necessidade da redistribuição de renda para uma sobrevivência da
democracia política, a qual exige um controle no nível de desigualdade e pobreza.
A respeito dos autores apresentados acima, verificou-se a contribuição destes para a
construção em 1991 do Projeto de Lei, criado por Eduardo Suplicy que garantiria renda
mínima para o Brasil, pois desde 1930 o país passava por uma crise recessiva e a atenção do
58

governo e do povo estava para o combate à inflação sem controle e para os impasses
resultantes da dívida externa.
Tal conjuntura começou a ser modificada de 1992 em diante, com a consolidação do
Movimento Ética na Política que mobilizou o impeachment de Collor, e vindo à tona a fome
e a pobreza. Analogamente neste período surge a Campanha Nacional da Ação da Cidadania
Contra a Fome, a Miséria e pela Vida, que tinha como líder o sociólogo Herbert de Sousa,
mais conhecido como Betinho, logo esta campanha fora introduzida por Itamar Franco em
1993, estabelecendo o novo Plano de Combate à Fome e a Miséria.
Deste modo, os programas de transferência de renda fazem parte do atual Sistema
Brasileiro de Proteção Social, seguindo as transformações da economia e da sociedade que
marca a reorganização do capitalismo mundial recentemente. A expansão dos programas de
transferência de renda ocorrida no Brasil nos 1990, como podemos citar, leva à: garantia de
renda mínima, bolsa escola que adiante sofrerá modificações, a renda básica que vem
substituir o modelo Keynesiano/Beveridgiano visto no pós-guerra, sendo um pluralismo de
bem-estar com atuação do mercado, do terceiro setor, voluntariado, sobretudo com a
orientação do projeto neoliberal, privilegiando o mercado.
Conforme Silva (2012) o programa que determina o início da renda mínima no Brasil
é o Programa de Garantia de Renda Mínima (PGRM), o mesmo foi desenvolvido em abril de
2001 por Fernando Henrique Cardoso, que se tratava de uma ajuda financeira para
beneficiários nos municípios que fizessem parte das famílias com renda mensal per capita
menor que meio salário mínimo, as quais possuíssem também crianças de 0 a 14 anos, claro
se obtivesse frequência na escola, de acordo com o percentual exigido nas condicionalidades,
neste programa o valor recebido por família era de R$ 45,00 (Quarenta e cinco reais).
Assim o governo federal com o auxílio das agências internacionais, desenvolveu
vários programas sociais com intuito de oferecerem a renda mínima às famílias em
vulnerabilidade social. Desta forma o Bolsa Escola substituiu o PGRM, sendo então o
Programa Nacional de Renda Mínima atrelado à educação. O Bolsa escola por sua vez
pretendia diminuir a evasão escolar e repetência dos alunos contemplados que possuíam baixa
renda, tal benefício era atribuído a famílias que possuíam crianças de 6 a 15 anos, que
estivessem matriculados no ensino fundamental e não fossem inscritos no PETI 23, a família

23
PETI – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, de acordo com a Lei Orgânica de Assistência Social
(LOAS), é um programa de caráter intersetorial, integrante da Política Nacional de Assistência Social, que
compreende: transferência de renda; trabalho social com famílias; oferta de serviços socioeducativos para crianças
e adolescentes que se encontram em situação de trabalho.
59

beneficiada recebia então 15 reais por filho inscrito, tendo um limite para três filhos por
família que pudesse receber o auxílio.
Nesta mesma linha de raciocínio está o Bolsa Alimentação, criado também em 2001
com o objetivo de instituir uma boa alimentação para gestantes, nutrizes e crianças de seis
meses a seis anos, para isto havia uma complementação de renda de 15 reais, este não era
contabilizado em critério de renda per capita, como os demais. O Programa Auxílio Gás foi
criado em 2002 para auxiliar as famílias cadastradas nos programas federais, uma
contribuição de R$ 7,50, que seria uma estratégia para reduzir os efeitos da liberação do
aumento do petróleo comercializado.
Com o fim do governo de Fernando Henrique Cardoso e passados nove anos da
existência da LOAS esperava-se um desenvolvimento democrático a mais da Política de
Assistência Social, que tivesse garantia de aprofundamento dos princípios universais,
participativo e da constituição, onde vinculasse um sistema de gestão com a capacidade de
certificar direito efetivo à Política de Assistência Social, evidente com a institucionalização
pública, no entanto, o que avaliamos foi um processo neoliberalista que difundiu as ideias e
Estado mínimo, focalização e reprodução do paralelismo. Este é prática na assistência social,
e se estabelece com programas focalizados, seletivos, fragmentados e “combate à pobreza”,
culminando fortemente em uma forma específica nesta área.
No primeiro mandato de Lula, dez anos após a consolidação da LOAS, aprovou-se a
Política Nacional de Assistência Social (PNAS) pela CNAS conforme já explicitado no item
anterior, a mesma teve como objetivo adotar a deliberação da IV Conferência Nacional de
Assistência Social de 2003 que iria estabelecer a criação do Sistema Único de Assistência
Social (SUAS), que foi aprovado somente em 2005 com a resolução nº 130 de 15 de junho
de 2005.
Desta maneira e sob forte indignação que foi realizada a IV conferência, com toda
revolta dos profissionais da área, conselheiros, movimentos sociais, ou seja, de uma
porcentagem de pessoas políticas que desde o governo FHC já denunciavam o descaso
público em razão do que preconizava na LOAS, que exigia o Sistema Único de Assistência
Social, mas que não era posto em prática, foi graças aos impulsos da PNAS e das mobilizações
políticas no aparato do Estado que aprovou-se a NOB/SUAS, materializando a LOAS,
culminando então na implementação do SUAS a partir de 2005 com norteamento da
NOB/SUAS.
Assim a temática de combate ou mesmo o controle da pobreza ganhou holofotes,
tornou-se lema do governo Lula em suas campanhas eleitorais, o que era evidente notar que
60

a pobreza extrema nos anos advindos seria o grande eixo que articularia as políticas sociais,
em específico a política de assistência social.
O Programa Fome Zero conforme o governo descrevia, iria buscar estratégias para o
combate ou controle da fome, ganhando destaque entre essas formas de enfrentamento: os
programas de transferência de renda, destinados às famílias pobres, que possuíam como
algumas das suas características: a utilização de políticas mais densas como geração de
trabalho e emprego, distribuição de alimentos entre outros e estímulo a agricultura familiar e
alfabetização.
Sabemos que apesar da instituição do SUAS e da Política de Assistência Social, ainda
acontecia a centralidade do paralelismo no Programa Fome Zero, quando se nota que a gestão
do mesmo é vinculada ao gabinete do prefeito. Desta maneira o paralelismo se fixa na
dificuldade de alicerçar a Política de Assistência Social na seguridade social do Brasil.
Segundo Mendonsa (2020) que cita sobre a presença do paralelismo na Conferência
Nacional de Assistência Social, as discussões que aprovaram a PNAS nesta, obtiveram muitas
moções de repúdio contra a vinculação do Programa Fome Zero ao gabinete, além de que o
governo teria total controle social sobre o programa supracitado. Assim, Mendonsa (2020,
p.150) salienta que, “Destacavam-se as exigências de que o Fome Zero e o Programa Bolsa
Família fossem coordenados pelo, MAS, negando a cultura de programas de assistência
vinculados ao gabinete do Presidente”.
A aprovação da PNAS e da NOB/SUAS que implementariam o SUAS em todo Brasil
é atravessada por limitações que as práticas e direção política das políticas sociais colocavam,
que irão reproduzir na história da Política de Assistência Social, juntamente ao paralelismo
das ações que descentraliza o SUAS e suas atribuições.
Mediante o exposto anteriormente, a instituição dos programas de transferência de
renda no Brasil foi alçada por algumas propostas e desenvolvimento de suas experiências sob
alguns traços: (1) o aumento dos números de desempregados e precariedade nas relações de
trabalho, fruto das políticas liberais de ajuste estrutural, resposta da economia brasileira à
competitividade da economia mundial; (2) A grande elevação de índices de violência nas
capitais; (3) Associado ao desemprego traz com isso a falta de qualificações dos
trabalhadores, sob as transformações que o trabalho apresentava; (4) Aumento nos casos de
trabalho infantil, ocorrendo a exploração de crianças e jovens; (5) Aumento da pobreza
atingindo principalmente jovens e crianças.
Atualmente no Brasil estão articulados dois programas de transferência de renda, o
Benefício de Prestação Continuada – BPC e o Programa do Bolsa Família – PBF, ambos em
61

diversos critérios de elegibilidade, concepções, benefícios e objetivos que alcançam um


grande número de usuários e famílias beneficiadas atingindo um grau de importância no
contexto da Assistência Social.
O Programa Bolsa Família (PBF) foi criado no campo do programa Fome Zero, sob a
lei nº 10.836 de 09 de janeiro de 2004, com o objetivo de ser uma transferência de renda
direta, punindo a estratégia que era central do “combate a fome”. Desta forma foram
unificadas todas as experiências locais com Programas de Transferência Condicionada de
Renda (PTCR). O PBF instituído no governo Lula em 2003, passa a fazer parte do Plano
Brasil sem Miséria a partir de 2011. Este não exige qualquer contribuição anterior para o
acesso aos benefícios, pois diante a classificação da pobreza, se embasa no critério de
composição familiar e critério de renda, tornando-se a centralidade na política social
brasileira.
O Benefício de Prestação Continuada (BPC) da Assistência Social apesar de ter sido
instituído pela CF/1988 e regulamentado pela LOAS em 1993, só foi implantado em 1996.
Sendo o mesmo operacionalizado pelo Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) através do
Decreto nº 1.744 de 8 de dezembro de 1995, sua gestão ficou por conta da Secretaria Nacional
de Assistente Social (SNAS), órgão do senado federal atrelado ao Ministério da Previdência
e Assistente Social (MPAS) e Ministério do desenvolvimento social (MDS).
O BPC é então um benefício não contributivo garantido na CF de 88, trata-se de uma
transferência de renda para idosos com 65 anos ou mais ou pessoas com deficiência que
possuem impedimentos a um longo prazo de natureza física, mental, intelectual e sensorial,
as quais prejudiquem a participação na sociedade. Este benefício conforme a Lei nº 8.742, de
07 de dezembro de 1993 (BRASIL, 1993) é integrado as políticas setoriais, que objetiva
redução da pobreza, garantia da proteção social, das estratégias para conter contingências
sociais e a universalização dos direitos sociais.
Por conseguinte, alguns autores que condicionam as transferências de renda
consideram o PBF e o BPC como estratégias em reduzir pobreza e a desigualdade social. Em
um comunicado do IPEA nº 55 publicado por Neri (2012) e intitulado “A Década Inclusiva
(2001-2011): Desigualdade, Pobreza e Políticas de renda”, que se utilizava um método de
coeficiente de Gini24, apontava-se uma diminuição na desigualdade brasileira a partir dos anos

24
Este coeficiente se define como uma medida de desigualdade em 1912, utilizada para calcular a desigualdade
na distribuição de renda, mas que também pode ser usada para qualquer distribuição. Consiste em um número
entre zero e um, em que o zero corresponde à completa igualdade de renda e o número um corresponde à
completa desigualdade.
62

de 2000. Neste mesmo comunicado Neri (2012) aponta algumas causas da queda da
desigualdade social nesta década, constatada pela Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílio (PNAD): trabalho (58%), previdência (19%), PBF (13%), BPC (4%) e demais
rendas (6%) como juros e aluguéis, isto implica que 17% da diminuição da desigualdade são
colocadas às políticas de transferência de renda.
No entanto, no tocante a diminuição da pobreza no Brasil estabelecido por Neri, cita-
se apenas o critério de acesso a renda e diante a tal análise, Rocha (2003) descreve como
limitadas as alternativas de intervenção para esta definição, desta forma traçam uma linha de
pobreza extremamente baixa, seja no Brasil ou de maneira internacional, que se tornam como
forma utilitária a estes países a execução de programas focalizados, dados como respostas à
população para minimizar a pobreza.
Pode-se citar também como um dos programas focalizados da pobreza que veio sete
anos depois da aprovação da PNAS em 2011, o Plano Brasil Sem Miséria (PBSM) que surge
após uma melhor gerência do SUAS, onde muitos municípios brasileiros já tinham
implantado serviços socioassistenciais na mesma trilha do Programa Bolsa Família, o PBSM
une o esforço total necessário como programa estratégico-operacional do governo Dilma
Rousseff, focalizando a pobreza como citado anteriormente, assim se torna um programa
central para área social e protegido pelo presidente, onde notamos a vinculação ao gabinete,
igualmente o que via-se no governo do presidente Lula.
Ademais, mesmo diante aos avanços que ocorreram nas políticas sociais
compensatórias do governo de Luís Inácio Lula da Silva, uma parcela da população mantinha-
se na linha da pobreza, inclusive os que se encaixava nos critérios de vulnerabilidade social.
Dessa maneira surge mais um programa que segue o contexto do Bolsa Família, propagando-
se o paralelismo de programas, sobrepondo e fragmentando os serviços.
O PBSM conforme De Maria (2020) ressalta, ao unir no mesmo programa várias
vertentes de ação, políticas sociais e ministérios, atua de modo a atingir os propósitos dos três
eixos que se estabelecem em: garantia de renda, que irá reduzir a situação de extrema pobreza
centralizada no PBF; Acesso a serviços públicos de forma a facilitar melhoria na educação,
saúde e cidadania das famílias; Inclusão produtiva que amplifica a oportunidade para geração
de renda para as famílias mais vulneráveis.
A Política de Assistência Social neste ambiente passa por uma transformação nos
sistemas, com recursos advindos da gestão da política e da ampliação de equipamentos
sociais, sendo acumuladas para o PBSM. No entanto, Silva (2020) ressalta que o SUAS ganha
um “viés gerencialista” com o governo petista, intensificando as medidas tecnicistas para
63

minorar os efeitos quanto aos problemas devido a divisão do trabalho na reprodução das
relações sociais.
Numa análise das ações ampliadas pela Assistência Social foi verificado na relação
do PBSM com o SUAS que não se tornou somente um desenvolvimento na seguridade social,
mas evidencia-se que a política social em um campo de execução de programas, benefícios e
serviços, estimulou a diminuição dos níveis de pobreza, porém sobre o viés de focalização e
de seletividade, acaba por acarretar limitações ao avanço da política de assistência social na
área do efetivo direito, pois houve um aumento de tecnificação dos sistemas no controle
desses programas a partir da vigilância socioassistencial, aproveitamento dos serviços que já
existiam sobre um público de usuários no plano, que pôde como citado anteriormente, ter
ocorrido uma certa modernização da política, no entanto houve a renovação do
conservadorismo que é estratégia principal do capitalismo.
Nos anos de 2011 a setembro de 2014, o orçamento empregado pelo governo federal
para as ações do PBSM foi segundo Costa e Falcão (2014) de R$ 107,9 bilhões, tal demanda
foi vista como uma das grandes estratégias do governo Dilma juntamente com o PAC que se
tornou indispensável na área das políticas sociais, de fato houve um elevado número em metas
quantitativas.
Assim tendências contrarreformistas foram aplicadas no governo Dilma, junto ao seu
vice Temer, entre os anos de 2015 e 2016, este último possuía uma linha liberal conservadora
atraente para o mercado financeiro em um pressuposto caos político que viria a acontecer.
Diante aos escândalos de corrupção que se alastravam no governo de Dilma e a
ofensiva da direita e extrema direita contra o partido do PT que ocasionou um cenário
favorável a expansão do conservadorismo no Brasil, conduzido pela ala política que mais
desejava a queda de Dilma, juntamente com o seu vice Michel Temer, que antes era seu
aliado, o PMDB impulsionou o processo de impeachment.
Com Temer no poder inicia-se uma ascensão de uma ofensiva liberal com grandes
proporções, unido a um Congresso corrupto em sua maioria e um parlamento impaciente por
emendas. Sob a promessa falsa de combater a corrupção e enfrentar à crise política e
econômica, Michel Temer, que possuía a reprovação de boa parte dos brasileiros, construiu
medidas que atingia a sociedade na área social e política.
Segundo referência em Brasil de Fato (2017), as reformas propostas pelo governo de
Michel Temer (PMDB) foram lembradas com preocupação. Uma delas é a trabalhista, que
entrou em vigor no mês de novembro e retirou uma série de direitos consagrados pela CLT.
Outra ação do governo foi a aprovação da PEC do Teto dos Gastos, que congela os
64

investimentos para as chamadas despesas primárias, como saúde, educação e assistência pelos
próximos 20 anos.
No campo da assistência social os cortes foram preocupantes e assustadores tanto no
SUAS como diante a redução dos recursos para a assistência social, conforme salienta o
Instituto de Estudos Socioeconômicos (2017) que, outra importante Função Orçamentária
para a promoção de direitos é a de “Assistência Social” que sofreu corte de 5%. Em termos
de valores, essa função saiu de R$ 87 bilhões em 2016 para R$ 83 bilhões em 2017. Esta
redução de orçamento irá colocar mais adiante em risco o Sistema Único de Assistência Social
- SUAS, o que acaba por comprometer a manutenção e continuidade dos serviços, benefícios
e a oferta dos direitos socioassistenciais.
No entanto mesmo diante aos cortes e redução dos gastos, ainda percebe-se alguns
avanços concretos graças aos trabalhadores da área, movimentos sociais que garantiram a
continuidade dos serviços, vista a centralidade que existe no financiamento dos programas de
transferência de renda.
Em suma, pode-se destacar algumas medidas neoliberais nas bases do SUAS:
aprovação da LDO baseado no exercício de 2016, fazendo com que reduza os recursos para
2017 e assim sucessivamente; o congelamento dos recursos nos próximos vinte anos com a
aprovação da PEC nº 55; Instituição e implantação do Programa Criança Feliz conhecido pelo
Conselho Nacional de Assistência Social como Primeira Infância no SUAS, sobre este
programa, o mesmo foi aprovado em decreto, sem a ocorrência de nenhum tipo de debate, ou
até mesmo conferências, que contariam com a participação das categorias de profissionais
primordiais inseridos no SUAS, os quais compreendem toda a estrutura de organização do
Sistema Único de Assistência Social.
Neste cenário notou-se descaminhos dos objetivos da política de assistência social
partindo para um conservadorismo no contexto brasileiro, um exemplo é a volta do primeiro-
damismo, e clientelismo, com a criação do Programa Criança Feliz através do decreto nº
8.869/2016 em 05 de outubro de 201625, este programa vem sobrepor ações que já são
executadas nos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), padronizados em
âmbito nacional. Além disso, a maior preocupação dos profissionais de assistência social é o
fato de que o trabalho deste programa seja feito pelo voluntariado, numa perspectiva

25
Segundo a publicação mais atualizada do Ministério da Cidadania – Secretaria Especial do Desenvolvimento
Social (2019), este decreto nº 8.869/2016 que instituiu o Programa Criança Feliz no dia 05 de outubro de 2016 foi
alterado pelo Decreto nº 9.579, de 22 de novembro de 2018, o mesmo possui um caráter intersetorial e tem como
finalidade a promoção o desenvolvimento integral das crianças na primeira infância, considerando sua família e
seu contexto de vida.
65

assistencialista, e não por trabalhadores formados e remunerados, que integrem o Sistema


Único da Assistência Social (SUAS).
Numa breve análise, o Programa Criança Feliz provoca um descaminho na Política de
Assistência Social no retorno aos elementos arcaicos, e conservadores, reacendendo o
primeiro-damismo, com a indicação da primeira-dama do país para ser embaixadora do
programa, este objetiva a focalização e possui sobretudo centralidade nos programas de
transferência de renda. Desta forma o Programa Criança Feliz sintetiza ações minimalistas
que direcionam de que maneira deve ser a forma de cuidado que as famílias devem ter com
seus filhos através de um tipo de “treinamento”, como podemos observar nos objetivos em
conformidade com o art. 99, título V do Decreto nº 9.579 de 2018,

I- promover o desenvolvimento humano a partir do apoio e do acompanhamento do


desenvolvimento infantil integral na primeira infância; II - apoiar a gestante e a
família na preparação para o nascimento e nos cuidados perinatais; III - colaborar
no exercício da parentalidade, de modo a fortalecer os vínculos e o papel das
famílias para o desempenho da função de cuidado, proteção e educação de crianças
na faixa etária de até seis anos de idade; IV - mediar o acesso da gestante, das
crianças na primeira infância e das suas famílias a políticas e serviços públicos de
que necessitem; e V - integrar, ampliar e fortalecer ações de políticas públicas
destinadas às gestantes, às crianças na primeira infância e às suas famílias
(BRASIL, 2020, p.1) .

Ademais, o programa traz à tona o focalismo extremo e a ausência da segurança de


renda, as estratégias que anunciam um controle maior indicando possíveis fraudes nos
benefícios socioassistenciais anteriormente, acaba por demonstrar uma tendência a redução
de acesso tanto ao Programa Bolsa Família, quanto ao Benefício de Prestação Continuada,
baseada na ofensiva neoliberal de restringir políticas distributivas quanto à abrangência,
permanência e escala. Segundo Silveira (2017, p.5) uma maior focalização nos 5% mais
pobres em menção ao Programa Bolsa Família ou nova forma de critérios como maior grau
de dependência, no caso de pessoa idosa e pessoa com deficiência é capaz de indicar no
mínimo barreiras maiores no acesso a um direito que é constitucional. A dependência da
política social à política econômica, acaba por desconsiderar a função do desenvolvimento
das economias locais, como também coloca em risco a manutenção do vínculo do BPC ao
valor do salário mínimo, e até mesmo coloca em xeque a universalização das políticas
redistributivas, que trazem efeitos essenciais na diminuição desigualdade de renda.
Assim podemos observar segundo Stopa (2019) que, em 2016, o BPC foi incluído na
Proposta de Emenda Constitucional n. 287 (PEC), que propõe a contrarreforma da
Previdência Social. O argumento principal é que é preciso revisar os critérios do BPC para
não gerar incentivos inadequados. Para não “desincentivar” a contribuição direta, a proposta
66

inicial era aumentar a idade para setenta anos de idade e desvincular o valor do BPC do salário
mínimo.
Outrossim o formato do Programa Criança Feliz fortalece aos mecanismos de
endurecimento do ajuste fiscal, que provoca a redução ainda mais dos recursos para o SUAS,
enquanto pede-se atenção a proposta da “proteção à infância” para focalizar o gasto em um
único programa específico sem ocorrer ampliação dos recursos para os serviços
socioassistenciais e programas da política de assistência social.
Complementando e retornando aos argumentos de Neri (2012) e Rocha (2003) sobre
o contexto dos programas de transferência de renda como estratégia para combate à pobreza,
Yazbek (2012) analisa que tais políticas possuem problemas em suas estruturas que tornam
inviáveis a retirada dos usuários da condição de pobreza, contrária aos dados dos órgãos de
pesquisas governamentais e até as realizadas pelos governantes quanto à redução dos números
de pobreza e desigualdade no país. O critério exclusivo da renda que define o pobre e o
extremamente pobre é um dos problemas estruturais segundo a autora, pois, além de não
considerar a dimensão multidimensional da pobreza, com todas as suas expressões, acaba
desconsiderando o acesso aos serviços sociais básicos, como por exemplo: saúde, educação,
transporte, habitação, e também suprimindo os processos que garantem participação,
autonomia, autoestima, ou seja, há uma apreciação na pobreza absoluta, firmando em uma
renda per capita familiar rebaixada, favorável a exclusão de muitas famílias que são privadas
socioeconomicamente.
Cabe notar que o valor dos benefícios repassados às famílias que estão nos critérios
de cada programa seja ele PBF ou BPC são baixos26, evidente que ajudam, mas não são

26
Os valores atualizados do PBF segundo o site do Ministério da Cidadania (2020), se baseiam na soma de vários
tipos de benefícios previstos no Programa Bolsa Família. Os tipos e as quantidades de benefícios do PBF que cada
família recebe dependem da composição (número de pessoas, idades, presença de gestantes etc.) e da renda da
família beneficiária. Por exemplo, “o Benefício Básico, no valor de R$ 89,00 é pago apenas a famílias
extremamente pobres (renda mensal por pessoa de até R$ 89,00); O Benefício Variável Vinculado à Criança ou
ao Adolescente de 0 a 15 anos é equivalente a 41,00, pago às famílias com renda mensal de até R$ 178,00 por
pessoa e que tenham crianças ou adolescentes de 0 a 15 anos de idade em sua composição; O Benefício Variável
Vinculado à Gestante de R$ 41,00, pago às famílias com renda mensal de até R$ 178,00 por pessoa e que tenham
grávidas em sua composição; Benefício Variável Vinculado à Nutriz de R$ 41,00, pago as famílias com renda
mensal de até R$ 178,00, para reforçar a alimentação do bebê, mesmo nos casos em que o bebê não more com a
mãe; Benefício Variável Vinculado ao Adolescente, no valor de R$ 48,00 (até dois por família) pago às famílias
com renda mensal de até R$ 178,00 por pessoa e que tenham adolescentes entre 16 e 17 anos em sua composição;
e por fim, o Benefício para Superação da Extrema Pobreza, em valor calculado individualmente para cada família.
pago às famílias que continuem com renda mensal por pessoa inferior a R$ 89,00, mesmo após receberem os
outros tipos de benefícios do Programa. Quanto ao Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social (BPC)
conforme o site do Ministério da Cidadania (2020) “garante a transferência mensal de 1 (um) salário mínimo à
67

suficientes para promover a redução da pobreza, mesmo com alterações em valores a cada
ano, somente eles não produzem a ultrapassagem de classe ou nível de pobreza da família
beneficiária, sobretudo, ao relacionar o recebimento do Programa Bolsa Família a
possibilidade de emancipação dos seus beneficiários, pois sabemos que a criação deste
programa deu-se em um novo cenário, denominado de Neodesenvolvimentismo27, mesmo
diante o objetivo central de equilíbrio econômico e justiça social, alguns autores, por exemplo,
Mota (2012), Alves (2014), Gonçalves (2013), contestam que este novo cenário não propiciou
o desprendimento total das ideias neoliberais, até porque o Neodesenvolvimentismo é uma
forma velada dos preceitos do Neoliberalismo, onde neste último analisamos várias perdas de
direitos trabalhistas. Ademais, as relações de trabalho estão bastante conflitosas, os trabalhos
cada vez mais precários devido o desmonte dos direitos trabalhistas, atrelado a isto está um
elevado número de desempregados, inseridos em trabalhos informais e sem proteção
nenhuma quanto aos seus direitos, com baixos salários, o que caracteriza como público
elegível do PBF. No entanto, excluídas as possibilidades de emprego para estas famílias, as
mesmas tem direito ao benefício, que em alguns momentos são necessários, em outros
insuficientes, com o intuito de falar que é uma oportunidade dos usuários saírem do perfil de
miséria, acaba por transferir para eles mesmo a responsabilidade de uma provável redução da
pobreza, que evidentemente sabemos que só aumentou com a validação cada vez mais intensa
do capital, o programa então em questão, torna-se auxílio imediato para a redução da pobreza,
mas pouco efetivo para a emancipação de seus beneficiários, diante a todo cenário descrito,
juntamente aos programas de transferências de renda faz-se necessário a efetivação
continuada de acompanhamento aos programas, benefícios e serviços socioassistenciais
oferecidos pela política de assistência social.
Em meio as instabilidades que o Estado capitalista se encontra, pois não possui a
capacidade de oferecer emprego em um nível universal, é evidente que para que o capital se
reproduza e obtenha o lucro, é necessário o consumo, nisto o mercado precisa se reinventar,

pessoa idosa com 65 anos ou mais e à pessoa com deficiência de qualquer idade. Nos dois casos, o cidadão que
pleiteia o benefício deve comprovar não possuir meios de se sustentar ou de ser sustentado pela família”.
27
De acordo com Bresser-Pereira (2006), o fracasso das políticas neoliberais em promover o desenvolvimento na
América latina, conduziu a uma rejeição do que ele denomina por política econômica ortodoxa no subcontinente.
Diante deste desafio, alguns países latino-americanos, por meio de governos de centro-esquerda, teriam voltado a
explorar aspectos do desenvolvimentismo que vigorou durante o século XX, no entanto, com modificações que
representariam uma terceira via entre o populismo de esquerda e o neoliberalismo. Um novo modelo de
desenvolvimento denominado de neodesenvolvimentismo, Este tipo de política baseia-se na junção dos
desenvolvimentos sendo eles, econômicos e sociais, assim trazem consigo fundamentos de redistribuição de
recursos e transferência de renda com intuito de melhorar o enfretamento das desigualdades existentes, no entanto,
existem dimensões ocultas da precarização do trabalho oriundas da nova precariedade salarial que expõem as
misérias sociais do novo padrão de desenvolvimento capitalista no Brasil.
68

vender suas mercadorias, acarretando na possibilidade dos programas de transferência de


renda, que objetivam a manutenção do consumo dos trabalhadores desempregados, acessando
por um lado estes benefícios, desvendando como fala Sposati (2011), a face monetarizada da
política social, mantendo-se o poder de consumo e também a economia controlada.
O PBF e o BPC são os programas de transferência de renda que simbolizam esta
monetarização das políticas sociais brasileiras, que ocasionam a circulação dessas
mercadorias pelo consumo das famílias beneficiadas e como observamos boa parte do
benefício volta aos cofres públicos, já porque esses programas de transferência de renda se
organizam por tributos regressivos, retornando principalmente como impostos sob as
mercadorias. Desta forma, como retrata Sposati (2011, p. 111) “[...] a monetarização da
política social é mais uma política econômica com efeito social, justamente pelo alastramento
do consumo”.
A principal consequência da política social monetarizada é a mercadorização da
atenção, buscando com isso a dinamização da economia pela exploração das famílias que são
beneficiadas. Acerca disto, Sposati (2001, p.111) expõe que “[...] com certeza estamos diante
do fenômeno da financeirização do social que toma o mercado como o grande agente
regulador”. Sendo assim, a referida autora sintetiza que estamos diante a uma acumulação
capitalista, onde os benefícios e programas sociais com enfoques na pobreza extrema nutrem
o sistema capitalista. Considerando o contexto latino-americano, o combate à pobreza tem
sido executado por a monetarização da política social, especialmente por meio dos Programas
de Transferência Condicionada de Renda (PTCR), um exemplo no Brasil é o PBF.
O desenvolvimento do Programa Bolsa Família e do Benefício de Prestação
Continuada corrobora para a valorização pelo governo das políticas focalizadas ao invés das
políticas universais, como saúde e educação, como forma de minimizar os gastos e atingir
ganhos políticos com a população em vulnerabilidade social, diante dos critérios de
assistência e segurança.
Apesar de sua importância para a economia brasileira e por se tratar de programas
focalizados, fragmentados que não garantem a redução da desigualdade social, não podemos
negar a importância dos programas de transparência de renda para a sobrevivência dos milhões
de usuários brasileiros que estão em extrema pobreza, mesmo assim ambos programas não
passam sem críticas como já visto anteriormente, devido a contribuição mínima à
sobrevivência dos indivíduos, limitando-os à uma manutenção biológica, expressa no valor
recebido a cada mês pelas famílias em condições de vulnerabilidade social, dessa forma acaba
remetendo a um pensamento de governabilidade biopolítica, possuindo segundo Castro (2009,
69

p.57) “[...] na população seu objeto, na economia seu saber mais importante e nos dispositivos
de segurança, seus mecanismos básicos”, que acarreta na presença de “uma estatização da
vida biologicamente considerada”.
Atentando-se para a importância do sistema capitalista em manter altos níveis de
desemprego e a exclusão dos pobres ao acesso dos direitos sociais, ainda tem o porém dos
beneficiários dos programas de transferência de renda serem conhecidos e rotulados como os
incapazes de arrumar um emprego assalariado e se adequarem às leis impostas pelo mercado
de trabalho, cabendo aos usuários a responsabilidade e criatividade por manter suas
necessidades.
Historicamente, conforme Silva (2012) os indivíduos em condições de vulnerabilidade
social foram associados pela sociedade como perigosos à manutenção da ordem pública, estes
são, atualmente os beneficiários do BPC e do PBF, e continuam sendo rotulados como
ameaçadores a coesão social e a segurança pública, são classificados desta forma, porque estão
bem afastados dos que tem acesso à educação, saúde, higiene e consumo, considerados
valorizados pela sociedade que preconiza a ordem do capital. Por esse motivo, é essencial a
disponibilização da renda mínima a estes cidadãos para garantir o desenvolvimento e
recuperação do baixo capital humano dos mesmos, mas este benefício é tão reduzido que se
torna incapaz de suprir sequer a alimentação das famílias quanto mais outras necessidades.
Destarte ainda se tem o controle da alimentação para os beneficiários do PBF, por meio da
educação e saúde, utilizando-se dos direitos como elementos de análise para verificação da
responsabilidade da família, como se ela tem algo a pagar, dar em troca de tal benefício.
Conforme Mota (2010) o BPC e o PBF que são associados a lógica capitalista e
deliberados pelos ataques neoliberais, tem por objetivo estabelecer um cidadão-consumidor,
com a posse restrita de certas mercadorias. Em suma e seguindo as propostas dos estados na
oferta de transferência de renda, como estratégia de superação da pobreza, verifica-se limites
para o desenvolvimento de um cidadão crítico e autônomo, quando é preciso seguir o ideário
do capitalismo, dividido em três estágios, segundo Lopes (2009, p. 155): ser educado em
direção a entrar no jogo, permanecer nele e incluído e desejar a permanência no jogo.
Os programas de transferência de renda brasileiros, PBF e BPC estão distantes de ser
modelo de satisfação aos usuários que deles necessitam, porém cabe salientar que cada um
possuem peculiaridades diferenciadas ocasionando em atendimentos particulares, mesmo que
ambos benefícios se limitem a alimentação e nível biológico de reprodução social. Foi por
meio da comparação dos dois benefícios que evidencia-se diferença no alívio da pobreza,
70

sobretudo quando verificam-se as várias linhas de pobreza, que objetivam o programa e


benefício em questão.
Mesmo com algumas divergências apontadas, o BPC e o PBF possuem muitas
semelhanças, onde ambos têm acesso a uma renda mínima, e os critérios e condicionalidades
explícitas de cada um interfere na tentativa de instruir uma renda básica de cidadania. As
famílias e usuários beneficiários restringem-se apenas aqueles que estão em condições
precárias de privação socioeconômica, ou seja, tratam-se de rendas emergenciais, com caráter
focalista, organizadas pelo ideário neoliberal que orientam os princípios instruídos nas
políticas sociais.
Logo, a continuidade das políticas de transferência de renda no século XXI é a
concretização da substituição das políticas e programas universais pelos programas
conduzidos pela lógica neoliberal, resultando em programas focalizados na extrema pobreza,
tornando-se o acesso a estas políticas como conformação da pobreza, naturalizando-as, pois
são condicionadas às políticas econômicas, dominadas pelos ideais capitalistas. Evidente que
isto decorre devido as determinações estruturais que são desconsideradas, naturalizando a
pobreza e a desigualdade social, pois tudo pode acontecer no sistema do capital, o que não
pode ser alterado ou tocado é a propriedade privada dos meios de produção.
Contudo, haja vista o enfoque do governo no sistema atual vigente em programas
emergenciais e pontuais com o ideário neoliberal, que funcionam sobretudo para controlar os
pobres e manter o poder político dos grupos existentes em cada município, acaba por tal
motivo não ocorrendo um avanço maior ainda na melhoria de vida das famílias beneficiadas
pelo PBF e BPC, entretanto não devemos deixar de exaltar o lado positivo dos mesmos que é
indiscutível, tendo em vista que o BPC e o PBF são programas que estão se expandindo em
números consideráveis e geram efeitos relevantes sobre os índices de desigualdade social e os
índices de pobreza. No entanto, na sociedade capitalista que vivemos não existirá o fim da
pobreza nem a relativa e nem a absoluta e consequentemente da desigualdade social, terá que
acontecer uma mudança completa iniciando pela instituição das relações sociais do capital e
para isto, compete à sociedade à organização e luta por um modo de produção diferente do
capitalista, na expectativa da promoção de uma nova relação social, que será baseada em
fundamentos contrários à lógica imposta pelo capital.
71

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse estudo realizou-se um resgate histórico do surgimento e dos fundamentos do


sistema capitalista, em que a origem dessa nova sociabilidade se tem como ponto de partida a
expropriação dos camponeses de suas terras, vindo a estimular o aparecimento de novas
relações de trabalho, que são alicerçadas com base na formação de duas classes sociais e
fundamentais: a burguesia e o proletariado.
Observamos ao longo do trabalho as transformações políticas, econômicas e sociais,
acarretadas pelos elementos que proporcionaram a construção do Estado Moderno, que em
meio a uma grande massa de trabalhadores foram condicionados a vender sua força de trabalho
como única forma de garantir a sua sobrevivência, trouxe como consequência conflitos sociais
que ao longo da história, no qual coube ao Estado o papel de intervir visando a manutenção da
ordem capitalista e a extração da mais-valia.
Traçamos no decorrer das duas seções a intervenção do Estado desde o processo da
acumulação primitiva do capital, perpassando a expansão das políticas sociais no Welfare State
até o século XXI, onde frente aos limites absolutos resultantes de uma crise estrutural,
ocasionou em uma reconfiguração do Estado que impactou diretamente as políticas sociais em
especial a política de assistência social.
Como vimos, a ação do Estado na sociedade pré-capitalista esteve norteada no viés
punitivo e repressor em que obrigava a população ao trabalho e para aqueles considerados não-
aptos, seu destino era as workhouses onde usufruíam de uma assistência mínima pautada na
ajuda e na benesse, sem a perspectiva do direito social.
Já com a consolidação da Sociedade Moderna, que trouxe a expansão do pensamento
liberal, houve uma rejeição do intervencionismo estatal priorizando o mercado, no entanto,
diante do crescimento industrial que acarretou numa intensa exploração e o aumento da miséria,
a classe trabalhadora passou a reivindicar por novas regulações sociais e de trabalho. Assim, é
no século XX, logo após a crise de 1929 e a Segunda Guerra Mundial que o Welfare State se
estrutura nos países desenvolvidos, e o Estado se torna o responsável na administração do
campo econômico e social.
O Welfare State esteve em vigor por trinta anos até o seu esgotamento no final dos anos
1960, quando uma crise, considerada inédita, de características estruturais, trouxe grandes
impactos no capitalismo que modificou as esferas política, econômica, social e cultural dos
homens. Como foi explicitado ainda na primeira seção, a crise é em sua essência endêmica,
cumulativa e definitiva, sendo intrínseca ao capitalismo já que se delineia nas bases do modo
72

de produção capitalista. Este tipo de crise se consolida na década de 1970 e se difere das
anteriores, por seu caráter global que alcançou todos países, impactando diretamente as três
dimensões internas do capital: a produção, consumo e circulação/distribuição, afetando todas
as estruturas do sistema sociometabólico (MÉSZÁROS, 2002).
Para conter essa crise, o capital teve como estratégia a reestruturação produtiva: a partir
da privatização, flexibilização, terceirização e precarização do trabalho; houve uma diminuição
dos gastos públicos que resultou em um desmonte do Estado e principalmente nas políticas
sociais; e o mercado passou a se autorregular. Essas transformações que estiveram pautadas no
ideário neoliberal expandiram na segunda metade do século XX em todo o mundo.
O cenário em destaque diz respeito a política social e as formas do sistema de proteção
social no Brasil. Diferente do que ocorreu na Europa com o Welfare State, o país não atingiu
um desenvolvimento econômico, social e político que pudesse garantir um tipo de proteção
generalizada como foi no Estado de Bem-estar da Europa.
Apesar de toda dificuldade, mediante a particularidade brasileira, a política de
assistência social após a Constituição Federal de 1988 finalmente tornou-se um direito social,
mas sua efetivação em meio aos ditames neoliberais, se viabilizou com ações focalizadas aos
mais pobres através dos programas de transferência de renda, especificamente o Programa
Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Com base nas análises dos autores
estudados, observamos uma verdadeira expansão desses programas, principalmente durante os
governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
Sabendo que trata-se de uma agenda político-social pautada nos organismos
internacionais, o PBF e o BPC visam a redução da extrema pobreza dos indivíduos que
encontram-se em situação de vulnerabilidade e risco social, mas esta proposta acerca da pobreza
instaurada no contexto neoliberal acaba por inserir nos programas sociais, a focalização e
seletividade, que resultará em limitações no avanço da política de assistência social. Desse
modo, a ausência de uma efetivação dos princípios universais propostos na Constituição, que
foram decorrentes da ofensiva neoliberal difundiu as ideias de Estado mínimo no país,
dimensionando a referida política para a execução de programas focalizados, seletivos,
fragmentados de “combate à pobreza”, não havendo a expansão de outros serviços
socioassistenciais e a articulação com as demais políticas públicas.
Assim, conclui-se que os avanços que ocorreram na assistência social foram limitados,
devido ao Estado priorizar as políticas do âmbito econômico em detrimento do social, frente a
crise estrutural que assolou o país e sua estratégia mediante a implementação dos princípios
neoliberais, resultando em um desmonte do sistema de Seguridade Social. O que observamos
73

nas últimas décadas são cortes bruscos nos programas e a continuidade do acesso aos benefícios
assistenciais cada vez mais atendendo a critérios mínimos de elegibilidade, isto é, restringindo
o atendimento para apenas a população que se insere dentro das condicionalidades dos
programas.
A partir da manifestação da política de forma focalizada, se tem um distanciamento do
caráter de universalidade previsto na Constituição, que propõe-se ampliar a acessibilidade dos
direitos sem demarcar critérios de elegibilidade, viabilizando e articulando o acesso as outras
políticas sociais. O século XXI demonstra que a política de assistência social se efetiva
enquanto um mero instrumento do capital na intervenção sobre a extrema pobreza, as medidas
paliativas, a focalização e a seletividade tratam-se de uma estratégia de manutenção da ordem
sob os ditames neoliberais, já que a intervenção no cerne dos problemas sociais colocaria em
risco a sociedade capitalista.
Desta maneira, destacamos a importância do estudo desenvolvido, mas esperamos que
esse estudo possa contribuir, juntamente com outros tantos, para a crítica ao modo de produção
capitalista e para desvelar a grande fragilidade dos programas de transferência de renda, como
mínimos sociais, no alívio da pobreza de milhões de brasileiros de que delas necessitam.
Contudo, enfatizamos que no momento evidenciado na pesquisa deste trabalho com a
crise estrutural vigente, nos resta como uma das alternativas, o confronto direto ao capital. Para
isto, faz-se necessário resgatar a centralidade prática e teórica do trabalho, rompendo com as
reformas neoliberais que até então estão sendo expostas como garantidora da ordem social de
dominação do capital sobre o trabalho, trazendo à tona a crítica ao Estado burguês, que é
colocado como ponto essencial na luta dos trabalhadores para a transformação da sociabilidade
capitalista, construindo um novo sistema que será determinado por uma nova sociabilidade
humanamente emancipada.
Enquanto isso o que temos são formas de enfrentamento que servem para controlar e
mediar os conflitos de classes, em que a política de assistência social acaba sendo meio de
controle da população e provocando cada vez mais uma sociedade com um maior índice de
pauperização no qual fica mais visível as expressões dos problemas sociais na sociedade
brasileira.
Portanto, é importante frisar que com a crise estrutural a desigualdade social ganha
novos contornos, observamos que o Estado ao longo das últimas décadas criou mecanismos
para contribuir positivamente na renda da população brasileira possibilitando o benefício de
prestação continuada e o programa de transferência e renda – bolsa família, ambos programas
que estão se expandindo em números consideráveis e geram efeitos relevantes sobre os índices
74

de desigualdade social e os índices de pobreza. Ademais, a tendência das políticas públicas é


de focalização nos problemas peculiares da população, contudo acaba reafirmando sua função
conservadora no conjunto da totalidade social.
Assim, na atual conjuntura percebe-se que como em outros casos de cunho social, a luta
pelos direitos ainda é intensa, continua e necessária para que exista de fato a efetivação de
qualquer política pública e para que o sistema único da assistência social possa ser efetivo e
suas ações possam chegar para quem dele de fato precise.
75

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