Você está na página 1de 22

INSPEÇÃO PREDIAL DE EDIFÍCIOS TOMBADOS, VIDE A

RELEVÂNCIA HISTÓRICA: CASO DO COPAN1


ERIC MAGALHÃES BUCKUP – ericbuckup@gmail.com

RESUMO

A lei de tombamento brasileira atesta que as características da edificação com valor histórico do
bem tombado têm que ser preservadas. A partir de inspeção predial efetivada no edifício Copan, foi
possível constatar a ausência de um item para análise específica, nos preceitos das Normas de
inspeção da ABNT, no que concerne a edifícios tombados e a análise de suas características
históricas. Portanto, foi necessário inserir no procedimento de inspeção um item que tratasse
especificamente disso em relação ao sistema ou subsistema analisado. Criou-se um quadro
informativo contendo os requisitos da metodologia da Norma de Inspeção Predial, NBR 16.747
(ABNT, 2020) e o requisito da análise da relevância histórica do sistema. Isso visou revelar qual a
ordem de prioridade da manutenção do sistema em termos de urgência e periodicidade. Isso porque
a relevância histórica de determinadas características pode alterar os patamares de urgência das
manutenções no caso de edifícios como o Copan. Foi utilizada a inspeção do sistema de
revestimento da fachada, pastilha cerâmica e substratos. O registro foi feito a partir de uma visão
diferenciada de inspeção e não altera a prioridade do reparo da fachada por anomalia funcional.
Porém, serve de alerta para o plano de manutenção, para a manutenção de sua caracterização
histórica. Fica demonstrado como é possível proceder esta análise também para outros edifícios
tombados e análises de seus sistemas e subsistemas sob a ótica da Norma de inspeção predial,
levando-se em consideração seu valor histórico.
Palavras-chave: inspeção predial; lei de tombamento; Copan.

BUILDING INSPECTION OF LISTED BUILDINGS, ACCORDING


TO HISTORICAL RELEVANCE: COPAN’S CASE
ABSTRACT

The Brazilian law of designated heritage buildings attests that the characteristics of the building
with historical value must be preserved. After a building inspection, that took place at Copan
building, it was possible to verify the absence of an item for specific analysis, in the precepts of the
ABNT Inspection Standards, regarding listed buildings and the analysis of their historical
characteristics. Therefore, it was necessary to insert an item in the inspection procedure that

1
Artigo de Conclusão de Curso, apresentado como requisito parcial à obtenção do título de especialista em Perícias de
Engenharia e Avaliação, EE, UPM em parceria com IBAPE/SP, São Paulo, 2022.
1
specifically addressed this in relation to the analyzed system or subsystem of this building. An
information board was created containing the methodology requirements of the Norma de Inspeção
Predial, NBR 16,747 (ABNT, 2020) and the requirement of analyzing the historical relevance of the
system. It aimed to reveal the order of priority of system’s maintenance in terms of urgency and
periodicity. The reason is because the historical relevance of certain characteristics can change the
levels of urgency of maintenance in the case of buildings such as Copan. Inspection of the facade
coating system was used as an example, ceramic tile and substrates specifically. The record was
made from a differentiated view of inspection and does not change the priority of repairing the
facade due to functional anomalies. However, it serves as a warning for the maintenance plan, for
the preservation of its historical characterization. It is demonstrated how it is possible to carry out
this analysis also for other listed buildings and the analysis of their systems and subsystems from
the perspective of the building inspection standard, considering their historical value.
Keywords: building inspection; listed buildings law; Copan.

1 INTRODUÇÃO

A conservação de edificações é sinônimo de segurança, conforto e economia para seus


usuários. Trabalhos de inspeção predial têm sido cada vez mais implantados no intuito de garantir
essas características. No caso de edifícios históricos tombados a conservação é obrigatória. Isso
ocorre porque o bem imóvel só é tombado por conta de sua relevância histórica e cultural. O
tombamento ocorre no intuito de proteger e preservar suas características.
Para qualquer intervenção neste tipo de edificação, os órgãos públicos responsáveis deverão
ser consultados. Eles são responsáveis pela preservação e divulgação do patrimônio material e
imaterial do país. Estão divididos entre federal, estadual e municipal. São independentes e podem
agir por conta própria independentemente um do outro. O bem pode ser tombado em um dos
âmbitos, dois ou todos. O IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) é uma
autarquia federal vinculada ao Ministério do Turismo. Os órgãos estaduais e municipais geralmente
são ligados às secretarias de cultura locais.
Fica sob responsabilidade do órgão que for tombar o imóvel o processo administrativo de
tombamento. São informadas por estes órgãos as regras que o proprietário do imóvel tombado
deverá seguir e suas atribuições e responsabilidades. Adota-se um regime específico de proteção
para preservar o imóvel e/ou suas características.
Portanto, no que concerne aos edifícios tombados, a manutenção deve ser a principal forma
de preservação das características históricas do bem. Porém, adota-se a substituição do sistema em
casos extremos, como término da vida útil de determinados sistemas construtivos, ou quando não há
a possibilidade de se preservar por conta de danos irreversíveis. Todavia, essa substituição deverá

2
ocorrer de forma a respeitar as características originais do sistema substituído, de modo a não
prejudicar as qualidades originais, relevantes do edifício em questão.
Para que haja a organização dos procedimentos de conservação e manutenção dessas
características é necessária a elaboração de um plano de uso, operação e manutenção durante o uso
e ocupação do edifício tombado. O plano deverá contemplar as especificidades deste tipo de
construção. Ele conterá requisitos similares ao manual existente em qualquer edifício, mas deverá
ter características e itens específicos para garantir manutenção dos atributos que alçaram o edifício
ao status de tombado.
Para tanto deverá ser utilizada a Norma ABNT NBR 16.747 - Inspeção Predial: Diretrizes,
Conceitos, Terminologias e Procedimentos (ABNT, 2020), a fim de determinar requisitos para a
manutenção da boa saúde e segurança da edificação e de seus usuários. A principal função da
inspeção é justamente compreender e indicar ações que garantam o aumento da vida útil e
desempenho da construção. Segundo consta na Introdução da NBR 16.747 (ABNT, 2020):

A atividade de inspeção predial estabelecida nesta norma tem por objetivo constatar o estado de
conservação e funcionamento da edificação, seus sistemas e subsistemas, de forma a permitir
um acompanhamento sistêmico do comportamento em uso ao longo da vida útil, para que sejam
mantidas as condições mínimas necessárias à segurança, habitabilidade e durabilidade da
edificação. Trata-se, portanto, de trabalho com finalidade de instruir a gestão de uso, operação e
manutenção da edificação, sendo certo que não se presta ao objetivo de instruir ações judiciais
para asserção de responsabilidades por eventuais irregularidades construtivas.

Como base para estabelecer parâmetros no sentido de determinar o desempenho dos


sistemas da edificação é usada a ABNT NBR 15.575-1: Edificações habitacionais — Desempenho -
Parte 1: Requisitos gerais (ABNT, 2013). Tal norma é dividida em seis partes e abarca não só os
requisitos gerais, mas em cada parte aprofunda os quesitos para sistemas específicos: estruturais,
pisos, vedações, coberturas e hidrossanitários, respectivamente. Portanto, serve como alicerce para a
inspeção predial. Segundo LARA (2021):

Desempenho em um determinado sistema predial significa o cumprimento da função para a qual


foi inicialmente projetado, assegurando com que valores e condições especificadas em projeto
ou por seus fabricantes sejam atingidos ao longo de sua vida útil, ponderando-se, no entanto,
eventuais impactos ou desvios relacionados a sua obsolescência ou envelhecimento/desgaste.
Importante destacar que a manutenção de seu estado e desempenho é de responsabilidade da
atividade de manutenção.

3
O gráfico apresentado abaixo (Figura 1), traduz visualmente o conceito de recuperação do
desempenho por ações de manutenção. Fica claro conceito de aumento da vida útil através da
manutenção.

Figura 1 – Desempenho ao longo do tempo (Fonte: ABNT NBR 15.575 – 1, 2013)

E como base complementar para compreensão e aplicação das NBR 16.747 (ABNT, 2020) e
NBR15.575 (ABNT, 2013), é utilizada a ABNT NBR 5674, Manutenção de edificações –
Requisitos para o sistema de gestão de manutenção (ABNT, 2012). considerando-se que:

(...) é inviável, sob o ponto de vista econômico, e inaceitável, sob o ponto de vista ambiental,
considerar as edificações como produtos descartáveis, passíveis da simples substituição por
novas construções quando os requisitos de desempenho atingem níveis inferiores àqueles
exigidos pela ABNT NBR 15.575 (Partes 1 à 6). Isto exige que a manutenção das edificações
seja levada em conta tão logo elas sejam colocadas em uso. (ABNT NBR 5674, 2012)

Neste estudo o objetivo é verificar as diferenças ou quesitos adicionais para inspeção predial
no caso de edifícios tombados. Considerando-se a citação acima, entender que este tipo de edifício
geralmente não possui um histórico de manutenção. Tais dados deverão ser levantados no processo
de inspeção predial. Dessa forma podem ser aplicados todos os requisitos das normas para
conservação do bem.
Para verificar as peculiaridades deste tipo de inspeção efetuou-se um estudo de caso sob a
ótica da inspeção com foco na conservação das características históricas de um edifício específico.
O edifício escolhido é o mundialmente conhecido edifício Copan. Ele está localizado no centro da
cidade de São Paulo e é considerado um ícone da arquitetura Modernista, principalmente por sua
fachada curva e dimensões. Foi projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer, na década de 1950,
construído entre as décadas de 1950 e 1970. O condomínio comporta 1.160 apartamentos que estão

4
distribuídos em seis blocos, possui 35 andares, que abrigam cerca de 5.000 moradores, em 120mil
m² construídos. Possui 104 funcionários e 72 lojas na galeria do térreo, além de contar com três
subsolos.
O edifício foi tombado pelo CONPRESP – Conselho Municipal de Preservação do
Patrimônio Histórico de São Paulo – em dezembro de 2012. O reconhecimento do edifício como
patrimônio, traz em suas resoluções, considerações quanto ao valor histórico, arquitetônico,
urbanístico e paisagístico. A principal exigência de tal ato é a preservação de suas características
arquitetônicas externas e dos ambientes internos constituintes de suas áreas comuns condominiais.
As áreas físicas de foco do tombamento são portadoras de vários elementos que devem
passar pela inspeção predial. Os elementos que caracterizam o edifício como bem cultural histórico
devem ser avaliados de forma prioritária. A partir do olhar técnico de profissional de inspeção
capacitado, são definidas as prioridades em termos de manutenção e a sua relação com os demais
sistemas da edificação.
Propõe-se verificar na prática a especificidade da inspeção predial no caso do edifício
Copan. Essa especificidade levou em consideração a hierarquia das prioridades em termos de
conservação do bem tombado. Esta consideração passa a ser fundamental para manter as
características que o qualificam. Dessa forma, preserva-se o bem em termos de desempenho para os
usuários e de patrimônio histórico para a sociedade.
Além disso, este estudo possui o intuito de tornar possível aplicar os mesmos conceitos
abordados nele, em outros estudos de caso de inspeção predial de bens tombados. E, conscientizar o
engenheiro de perícia, da obrigatoriedade de rever o peso das características do edifício tombado
em relação aos edifícios convencionais, na hierarquia das prioridades de manutenção.

2 DIAGNÓSTICO DA SITUAÇÃO-PROBLEMA

Segundo o item 5.1 da NBR 16.747 (ABNT, 2020) para análise do desempenho da
edificação, no que tange o requisito de seus usuários, é necessário verificar:
a) segurança (estrutural, contra incêndio, no uso e na operação);
b) habitabilidade (estanqueidade; saúde, higiene e qualidade do ar; funcionalidade;
acessibilidade);
c) sustentabilidade (durabilidade e manutenibilidade).
Além dos supracitados, devem também ser considerados, sem obrigatoriedade:
a) habitabilidade (conforto térmico, acústico, lumínico e antropodinâmico);
b) sustentabilidade (impacto ambiental).
Um edifício tombado deve considerar todos os requisitos citados anteriormente, como
qualquer outro. Porém, tem que ter como uma de suas prioridades a manutenção de suas

5
características de relevância histórica e cultural, ao contrário dos demais. As irregularidades
relativas a essas características deverão ser identificadas da mesma forma que as demais, porém,
com a devida relevância creditada no resultado da inspeção.
O Decreto-Lei número 25, de 30 de novembro de 1937, organiza a proteção do patrimônio
histórico e artístico nacional. Ele regula o tombamento no país. Após o bem ser tombado, fica sob
reponsabilidade do proprietário sua manutenção. Caso não possa arcar com os custos, poderá
comunicar ao órgão responsável, como é possível verificar no artigo 19 da lei supracitada:

Art. 19. O proprietário de coisa tombada, que não dispuser de recursos para proceder às obras de
conservação e reparação que a mesma requerer, levará ao conhecimento do Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional a necessidade das mencionadas obras, sob pena de
multa correspondente ao dobro da importância em que for avaliado o dano sofrido pela mesma
coisa.
§ 1º Recebida a comunicação, e consideradas necessárias as obras, o diretor do Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional mandará executá-las, a expensas da União, devendo
as mesmas serem iniciadas dentro do prazo de seis meses, ou providenciará para que seja feita a
desapropriação da coisa.
§ 2º À falta de qualquer das providências previstas no parágrafo anterior, poderá o proprietário
requerer que seja cancelado o tombamento da coisa. (Vide Lei nº 6.292, de 1975)
§ 3º Uma vez que verifique haver urgência na realização de obras e conservação ou reparação
em qualquer coisa tombada, poderá o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
tomar a iniciativa de projetá-las e executá-las, a expensas da União, independentemente da
comunicação a que alude este artigo, por parte do proprietário.

Portanto, no intuito de salvaguardar o bem e seus proprietários, deve ser realizada a inspeção
predial de forma diferenciada em edifícios tombados. Na sua realização, leva-se em consideração a
conservação das características que o valorizam. No caso de edifício histórico, parte-se do princípio
de que o próprio edifício é uma fonte primária da pesquisa, “um documento construído” (MELO,
2019). Dessa forma, o olhar de quem inspeciona, tem de estar atento para identificar e registrar
detalhes que não constem na documentação existente relativa ao edifício.
Inicialmente, deverão ser combinadas a análise da documentação da edificação com a sua
vistoria, para identificar irregularidades. Isso ocorre para verificar a conformidade em termos de
uso, manutenção e operação. Na vistoria da inspeção deve o perito identificar sintomas no edifício
que demonstrem anomalias e/ou falhas em relação a essas características.

6
Segundo a NBR 16.747 (ABNT, 2020), para que a avaliação sistêmica da edificação ocorra
é necessário considerar a existência de três pilares a serem adotados, que são as seguintes
avaliações:
a) técnica
- projetos e dados técnicos do sistema implantado,
- especificações originais ou de reformas de sistemas ao longo do tempo de vida útil,
- perda de desempenho precoce – anomalias construtivas;
b) Funcional
- segurança,
- vida útil dos sistemas adotados,
- perda de desempenho natural – anomalias funcionais;
c) Manutenção
- estratégias, planos, programas,
- operação, registros,
- perda de desempenho precoce - falhas.
Em todos os edifícios é necessário levar em consideração essas avaliações propostas pela
norma. Isso ocorre para que seja possível desenvolver uma organização das prioridades de
manutenção em patamares de urgência. Estes patamares serão determinados pela classificação das
recomendações.
Pelo fato de o proprietário ter a obrigação de manter as características da edificação, tais
avaliações devem priorizá-las. Ou seja, deve haver uma análise pontual dos sistemas e seus
subsistemas do ponto de vista histórico e das características de época que compõem e qualificam o
edifício como bem tombado.
Diferentemente de um edifício convencional, o edifício tombado deve ter analisadas e
qualificadas suas características físicas, de sistemas e subsistemas de forma a identificar o que o
caracteriza como tal. Isso pode mudar adequadamente a perspectiva de prioridades de manutenção,
formas de preservação ou substituição de peças de sistemas ou mesmo sistemas como um todo. Essa
análise deve ser feita por profissional tecnicamente habilitado e qualificado. Mas, além disso,
segundo a Carta de Veneza (ICOMOS, 1964):

A conservação e a restauração dos monumentos constituem uma disciplina que reclama a


colaboração de todas as ciências e técnicas que possam contribuir para o estudo e a salvaguarda
do patrimônio monumental.

7
O olhar técnico específico deverá ser parte integrante dos demais olhares de outros
profissionais que possam fazer parte da equipe de inspeção. Isso porque haverá um arquiteto ou
engenheiro responsável pela inspeção como um todo e profissionais com formações específicas para
atender a inspeções que demandem olhares de especialistas. Equipes podem ser compostas por
engenheiros mecânicos e elétricos, por exemplo. No caso dos edifícios tombados pode também
abarcar um profissional técnico em patrimônio, com conhecimento técnico específico. De acordo
com a definição contida no item 3.14, da NBR 16.747 (ABNT, 2020), a inspeção predial
especializada se trata de:

Processo que visa avaliar as condições técnicas, de uso, operação, manutenção e funcionalidade
de um sistema ou subsistema específico, normalmente desencadeado pela inspeção predial, de
forma a complementar ou aprofundar o diagnóstico.

A análise deste profissional e daquele que coordena a inspeção deverá levar em


consideração o passo a passo da inspeção predial, aliado aos conceitos relativos à preservação do
bem. Segundo proposto por ICOMOS (International Council on Monuments and Sites), na Carta de
Burra (ICOMOS, 2013), entende-se que:
a) Conservação: é cuidar de um lugar para manter seu significado cultural;
b) Manutenção: é a proteção contínua de um lugar e sua configuração;
c) Preservação: é a manutenção do estado existente para retardar a deterioração;
d) Restauração: trata-se da retomada para um estado anterior conhecido, com remoção de
acréscimos, sem a introdução de materiais novos.
e) Reconstrução: refere-se a voltar ao estágio anterior conhecido, com acréscimo de novos
materiais.
A inspeção predial deve adotar tais conceitos quando vai analisar um edifício tombado.
Juntamente a esses conceitos, pode-se ainda afirmar que: “(...) a conservação preventiva baseia-se
no conhecimento dos processos de deterioração dos bens culturais, e a sua eficácia depende da
integração entre a atuação prática e a pesquisa científica.” (CARVALHO, 2015). A inspeção predial
deve partir deste preceito para entender a especificidade do bem tombado e deve considerar o que
de fato deve ser preservado e o que pode ser substituído. Dessa forma aquilo que caracteriza e dá
valor ao imóvel tombado será preservado e receberá manutenção de forma correta.
Ou seja, faz parte das atribuições da inspeção predial identificar os materiais utilizados na
construção, sua fragilidade, vulnerabilidade e entender se estes materiais devem ser reproduzidos ou
substituídos. Tal escolha deve levar em consideração os efeitos prejudiciais sobre a autenticidade
das construções. Tanto em relação às restaurações, quanto às substituições.

8
Para os órgãos de preservação, o registro das ações de manutenção e o atendimento das
mesmas deve ser parte integrante do seu gerenciamento, assim como consta na Norma de Inspeção
Predial (ABNT, 2020). Em relação ao olhar atento da inspeção, segundo a Carta de Burra
(ICOMOS, 2013): “a conservação é uma parte integral da boa gestão de lugares com significado
cultural”.
Outro conceito importante em termos de preservação, é que mudanças em um edifício
tombado não devem distorcer sua aparência física ou outras evidências de valor cultural histórico.
Além disso, as técnicas e materiais tradicionais utilizados originalmente têm preferência na sua
conservação. “Porém, em algumas circunstâncias, técnicas e materiais contemporâneos que
oferecerem benefícios substanciais em termos de conservação, podem ser apropriados” (ICOMOS,
2013). Estes são conceitos a serem aplicados na análise de documentos e vistoria de edifícios
tombados, no momento da inspeção.
Portanto, a base para proceder a inspeção predial de edifícios tombados, deve contemplar a
compreensão do significado cultural do monumento, propor um plano de manutenção e propor
como gerenciar este plano.

3 METODOLOGIA

Esse trabalho foi desenvolvido a partir de um estudo de caso de processo de inspeção predial
em edifício tombado. Foi feito o estudo de caso do edifício Copan e levantadas as informações
referentes a: levantamento das ações e regras de preservação para bens tombados, segundo
ICOMOS (International Council on Monuments and Sites), constantes na Carta de Burra
(ICOMOS, 2013):

a) compreender o significado
- compreender o local (definir o local e sua extensão, investiga-lo),
- avaliar significado cultural (a partir de critérios de relevância);
b) desenvolvimento de diretrizes
- identificar todos os fatores e questões (identificar obrigações decorrentes
de significância, necessidades futuras, fontes de sustentação, restrições e
condições),
- desenvolver as diretrizes,
- preparar plano de gerenciamento (definir prioridades, fontes de
sustentação, responsabilidades e cronograma; desenvolver ações de
implementação);
c) gerenciar de acordo com as diretrizes
- implementar o plano de diretrizes,
- monitorar os resultados e revisar o plano.
9
Levantamento das recomendações da NBR 16.747 (ABNT, 2020) quanto à inspeção predial,
de acordo com o item 5.2 Etapas da metodologia da inspeção predial:

a) levantamento de dados e documentação (documentos técnicos, administrativos e de


manutenção);
b) análise dos dados e documentação solicitados e disponibilizados;
c) anamnese para a identificação das características construtivas da edificação como
idade, histórico de manutenção, intervenções, reformas e alterações de uso
ocorridas;
d) vistoria da edificação de forma sistêmica, considerando a complexidade das
instalações existentes;
e) classificação das irregularidades constatadas;
f) recomendações das ações necessárias para restaurar ou preservar o desempenho
dos sistemas, subsistemas e elementos construtivos da edificação afetados por
falhas de uso, operação ou manutenção, anomalias ou manifestações patológicas
constatadas e/ou não conformidade com a documentação analisada (considerando
para tanto o entendimento dos mecanismos de deterioração atuantes e as possíveis
causas das falhas, anomalias e manifestações patológicas);
g) organização das prioridades, em patamares de urgência, tendo em conta as
recomendações apresentadas pelo inspetor predial;
h) avaliação da manutenção, conforme a ABNT NBR 5674;
i) avaliação do uso;
j) redação e emissão do laudo de inspeção predial. 2

Levantamento de similaridades e diferenças no que concerne à inspeção predial proposta na


NBR16.747 e a proposta de inspeção de órgãos de preservação, como ICOMOS. Além de
construção do registro do que foi levantado na inspeção, de modo que a forma de apresentação e
análise fiquem em conformidade com a NBR16.747.
Foi concebido quadro esquemático informativo contendo os conceitos da metodologia
abordados até este ponto. Além dos itens relativos à metodologia da NBR 16.747 (ABNT, 2020), o
Quadro 1 (abaixo) comtempla o item “relevância histórica”.

2 Observação: a intensão deste trabalho não é construir um laudo. Portanto, o ítem “j” das etapas supracitadas será
desconsiderado.
.
10
Quadro 1 – Itens para executar inspeção predial em edifício tombado
Item Descrição

Sistema construtivo

Documentação sim não Validade

Relevância histórica

Sintoma ou irregula-
ridade constatada
Classificação de
origem
Recomendação
técnica
Prioridade 1 2 3

Justificativa

Fonte: Elaborado pelo autor, 2022

Após a elaboração do Quadro 1, foi realizada uma visita de inspeção sob esta ótica no
edifício Copan. Delimitaram-se alguns sistemas dos locais apontados como relevantes
historicamente para esta análise. Além disso, foram priorizados os sistemas mais representativos em
termos de deterioração para análise.
Nestes sistemas, dentre as principais características de alterações, encontram-se as fachadas
revestidas por pastilhas cerâmicas, devido à falta de manutenção. Já há alguns anos cobertas com
tela de náilon azul, no intuito de proteger os transeuntes da calça devido à queda de pastilhas do
revestimento de fachada. Na Figura 2 uma visão geral da tela e a constatação da descaracterização
da fachada e na Figura 3, a vista interna de um dos apartamentos em direção à fachada principal,
com pastilhas que destacaram e permanecem sobre os brises soleils:

11
Figura 2 – Fachada principal coberta com proteção – fonte: arquivo pessoal do autor

Figura 3 – Pastilhas soltas sobre o brise soleil da fachada principal – fonte arquivo pessoal do autor

12
Além disso, constatou-se a falta de revestimento nas empenas laterais (Figura 4), local em
que o substrato e as pastilhas já haviam sido removidos, mas que ainda não recebeu a instalação das
pastilhas de reposição. Inicialmente por conta do embargo à obra e depois por falta de verba para
comprar o material e executá-la:

Figura 4 – Empena lateral sem acabamento – fonte: arquivo pessoal do autor

Alguns pontos em que houve o desplacamento e não há proteção (Figuras 5, 6), fachadas do
mezanino, sobre o térreo:

Figuras 5, 6 – Desplacamentos pontuais fachada do mezanino – fonte: arquivo pessoal do autor


13
Escadas de emergência, localizadas nos fundos do edifício, também se encontram bastante
deterioradas por falta de manutenção e fim da vida útil do substrato da pastilha (Figuras 7, 8):

Figuras 7, 8 – Desplacamentos escada de emergência – fonte: arquivo pessoal do autor

A descaracterização de fachada que teve a recomposição de pastilhas pontualmente (Figura


9). Apresentam tonalidades diferentes e demonstram ação corretiva sem planejamento:

Figuras 9 – pastilhas de épocas diferentes na mesma fachada – fonte: arquivo pessoal do autor

A partir dessas constatações foi possível preencher o Quadros 2, a seguir:


14
Quadro 2 – Itens para executar inspeção predial no Copan
Item Descrição

Sistema construtivo Sistema de revestimento externo

Material Pastilhas cerâmicas Jatobá, cores branca e cinza, 1,9 x 1,9cm e substrato da época

Documentação sim não Validade: verificar individualmente – avaliações já realizadas.

Relevância histórica Elemento muito significativo: a utilização de pastilha como revestimento de


fachada marca historicamente a transição de revestimento que só era utilizado em
piso, para revestimento de fachada. Simboliza a transição de uma época em que a
maioria das construções possuíam características da arquitetura eclética e passam a
ter características de arquitetura Modernista. Até então o convencional era utilizar
“pedra fingida”. Tratava-se de argamassa cimentícia com adição de agregados que
lhe conferia a aparência de revestimento pétreo. No final da década de 1940,
substitui-se um processo artesanal, que requeria mão de obra especializada e altos
custos para aplicação e manutenção; para um sistema mais econômico, durável e
de produção industrial.
Sintoma ou irregula- Desplacamento do revestimento de pastilha da fachada, com perda de aderência do
ridade constatada revestimento, por ruptura na interface da pastilha e da massa argamassa de fixação.
Observa-se que a argamassa apresenta característica pulverulenta e chegou ao fim
da sua vida útil. Possui mais de 50 anos de idade. Também há perda de
desempenho no requisito de segurança, uma vez que o destacamento repentino de
placas põe em risco transeuntes na rua e calçada.
Classificação de Anomalia funcional
origem
Recomendação Avaliação da fachada como um todo para comparar com os levantamentos de
técnica danos já existente, para verificar sua evolução. Seguir recomendações do projeto
de fachada já pronto e parcialmente executado. Manter obrigatoriamente o padrão
de pastilhas originais, porém usar substrato corrente atual, no intuito de aumentar a
vida útil do revestimento. Elaborar plano de manutenção que atenda aos requisitos
técnicos do sistema e à ABNT NBR 5674.
Prioridade 1 2 3

Avaliação da Não atende


manutenção
Fonte: Elaborado pelo autor, 2022

15
4 ANÁLISE DA SITUAÇÃO-PROBLEMA E PROPOSTA DE SOLUÇÃO

Após apresentar a metodologia, procede-se para a análise do que foi levantado na inspeção
do edifício Copan, sob a ótica da preservação das características que motivaram o seu tombamento.
O revestimento de fachada é um dos sistemas que mais o caracteriza em termos de época, e aquele
que tem recebido maior atenção por conta de sua deterioração.
Existem registros que atestam grave deterioração no sistema de revestimento de fachada já
há alguns anos. Tal estado culminou em 2009, quando, devido a um destacamento houve queda de
pastilhas de um andar alto e estas foram responsáveis por matar um cachorro na calçada. Desde
então, o edifício foi coberto por uma tela azul de náilon, no intuito de proteger os transeuntes nas
calçadas e ruas.
Segundo o síndico do edifício no cargo desde 1993, Affonso de Oliveira: inicialmente,
foram repostas algumas das pastilhas dos brises soleis nos anos de 1994 e 1995 (OUTRA CIDADE,
2016). Nesta época foram compradas por volta de 2.000m² de pastilhas brancas e 200m² de
pastilhas cinzas. As pastilhas eram exatamente do mesmo modelo que aquelas que compõem a
fachada do edifício originalmente.
Porém, logo depois dessa reposição, outros locais da fachada começaram a sofrer
desplacamento. Pela falta de consciência de que problema era generalizado, áreas muito maiores
sofreram perdas durante a manutenção pontual. Isso ocorreu por conta movimentação nas fachadas.
A falta de inspeção predial e a inexistência de um plano de uso, operação e manutenção levaram o
condomínio a fazer manutenções bem-intencionadas, porém sem qualquer planejamento e baixo
alcance em termos de resultados globais para manutenção da edificação. Além disso, o condomínio
sempre teve problemas financeiros em relação ao caixa para fundo de obras.
A falta de investimento em um processo preventivo foi responsável pela descaracterização
da fachada. Caso houvesse registros de inspeção e um plano, haveria um registro de todos os pontos
que pudessem estar danificados e em processo de deterioração. Dessa forma, seria possível fazer um
planejamento para recuperação do revestimento da fachada. Inclusive no tocante a planejamento
financeiro, durante estes quase 30 anos de problemas.
Entre 2013 e 2014, o Centro de Controle Falcão Bauer foi contratado para fazer o
levantamento das condições físicas das fachadas por meio de mapeamento delas e ensaios técnicos.
Em 2014 a empresa ARCO foi contratada para desenvolver projeto executivo de revestimento de
fachada. Este foi item requerido na inspeção predial realizada, como forma de preservação das
características históricas da fachada e segurança dos usuários. Foi apresentado no Quadro 2,
constante da metodologia deste trabalho.
As obras de remoção das pastilhas soltas e emboço do revestimento de fachada tiveram
início em 2016, mas foram paralisadas no fim deste mesmo ano pelo CONPRESP. O motivo da
16
paralisação foi uma falta de consenso entre o condomínio e o órgão de conservação do patrimônio
em relação às pastilhas novas destinadas ao revestimento. “[...] a Secretaria Municipal de Cultura,
responsável pelo CONPRESP, diz que a obra não foi autorizada pois as pastilhas de vidro propostas
pelo Copan possuem características visuais completamente diferentes do material cerâmico original,
o que produziria ‘impacto visual’ e mudança da percepção do bem tombado.” (Folha de São Paulo,
2018).
O papel da inspeção predial e suas recomendações é evitar este tipo de situação. O resultado
da falta dela acarretou atraso e prejuízo. Esta inspeção e as considerações de um especialista em
conservação poderiam ter sido submetidas ao órgão de conservação de patrimônio e a discussão
poderia ocorrer antes do embargo da obra ou até mesmo de seu início.
Neste trabalho foi apresentado um modelo de quadro esquemático onde constam de forma
esquemática os itens da Norma de Inspeção Predial somados ao item de “relevância histórica”.
Ambos foram apresentados no item Metodologia deste trabalho. Ambos elaborados pelo autor. O
“Quadro 1” apresenta apenas os itens a serem considerados para preencher no processo de inspeção
predial. O “Quadro 2” apresenta o exemplo de preenchimento a partir do estudo de caso do Copan.
O diferencial deste modelo de quadro é considerar o item “relevância histórica” como algo distinto
dos demais itens.
Porém, mesmo tendo em vista a importância deste elemento construtivo para a conservação
das características do edifício, é de suma importância enquadrá-lo como uma anomalia funcional,
por término do período de vida útil. Com a ressalva de que a substituição do sistema deve respeitar
suas características a partir das recomendações de um especialista em conservação deste tipo de
edifício, com a anuência do órgão de preservação do patrimônio responsável.
Tais informações devem fazer parte do plano de uso, operação e manutenção de edifícios
tombados como o Copan. Isso deve ocorrer de forma que tanto nas inspeções regulares, quanto em
relação ao término da vida útil do revestimento, seja possível analisar a situação, para ter um
diagnóstico mais preciso e indicações de como atuar para sanar o problema. Este registro garante
que as características históricas estão mantidas e preservadas. Ele pode inclusive servir como
material a ser analisado periodicamente pelos órgãos de preservação histórica, no intuito de
fiscalizar a manutenção das características.
Dessa forma, evita-se o mau uso de recursos técnicos e financeiros na gestão de ativos.
Previnem-se os investimentos patrimoniais antecipados e ações corretivas sem planejamento, além
de reparos impróprios. Porém, assim como em qualquer edifício o principal objetivo da inspeção
predial é garantir a segurança dos usuários e evitar acidentes.
Por conta disso, no caso do revestimento de pastilhas, devido ao claro risco de
comprometimento da segurança dos usuários e transeuntes em geral, trata-se de uma questão de

17
urgência de prioridade 1. Conforme já descrito, foram feitos levantamentos das características da
estrutura do edifício, alvenarias e substratos de fixação das pastilhas, baseados no projeto executivo
e memorial descritivo. Foi realizada inspeção visual, como forma de verificar as características
físicas das patologias na edificação. Também foram realizados testes e ensaios em corpos de prova
(BONFIM, 2019).
Conforme apontado no “Quadro 2” da Metodologia, o diagnóstico dado é o de que o
substrato chegou ao término da sua vida útil e teve que ser refeito. Foi refeito com técnicas atuais,
pois isso não interfere nas características da fachada e aumenta a vida útil da mesma. Porém, como
citado anteriormente, a pastilha obrigatoriamente deverá possuir as características das pastilhas
originais, segundo o CONPRESP.
Além da pastilha, existem outros sistemas que compõem as áreas a serem preservadas
através do tombamento. Sistemas de piso das áreas comuns, principalmente corredores da galeria e
halls sociais. Sistema de acabamentos de lambril em madeira nas fachadas do térreo. Sistema de
pintura nas partes inferiores dos brises soleils e sob as lajes das galerias e halls de entrada. Sistemas
de caixilharia em geral. Estes sistemas merecem atenção para a conservação das características do
edifício.
Ao se verificar a hierarquia de prioridades, dividida em 1, 2 e 3, apresentada na NBR16.747
(ABNT, 2020), os itens citados acima, que não são referentes às fachadas, receberiam um nível de
prioridade 3. Isso aconteceria por não oferecerem perigo à segurança dos usuários (prioridade 1) e
não colocarem em risco a funcionalidade da edificação (prioridade 2). Portanto, por se tratarem de
sistemas mais ligados à estética do edifício que à funcionalidade ou segurança, em edifícios
convencionais receberiam prioridade 3.
Mas no caso do Copan, especificamente, tais sistemas precisam receber no mínimo
prioridade 2. Isso ocorre porque a funcionalidade do edifício como bem tombado se dá pela
conservação de suas características. Caso isso não ocorra, segundo a lei de Tombamento (1937),
configura-se crime contra o patrimônio cultural. Destruir ou deixar o bem cultural deteriorar é
crime. Segundo a mesma lei o reparo do dano ao bem patrimonial deverá ser de responsabilidade do
proprietário. Por isso é necessário que a inspeção predial nesses casos possua um olhar diferenciado
e atento a estas especificidades.
No preenchimento do item “significância histórica”, do “Quadro 1”, é necessário explicitar
de forma técnica a importância dessas características, de forma a adequar sua relevância em termos
de prioridade na hierarquia de manutenção. Segundo a Carta de Burra (ICOMOS, 2013), deve-se
proceder uma “[...] abordagem cautelosa às alterações: fazer tão pouco quanto seja necessário para
cuidar do sítio e torná-lo utilizável mas, por outro lado, alterar tão pouco quanto seja possível para

18
que seu significado cultural fique retido.”. A descrição da significância histórica deve ter aderência
a este conceito.
A conservação das características é justamente o que valoriza o bem cultural. No caso do
Copan, essas características das áreas externas e comuns são parte integrante do que atrai os
usuários. A falta de manutenção e a degradação da construção desvalorizam o bem.
Segundo o síndico do Copan, Affonso Prazeres, conforme relatado em entrevista ao site
Síndiconet (2021), “[..] o condomínio não aprova aumento na arrecadação para o fundo de obras e
não havia verba suficiente em caixa para executar a reforma.”. Ele também declara que “[...] o
condomínio possuía 20 milhões de reais em caixa.”, até a data da entrevista. Relatou que este valor
seria insuficiente para executar a reforma.
Mesmo que a responsabilidade legal sobre a preservação do bem tombado seja do
proprietário, existem alternativas para viabilizar a manutenção do mesmo com recursos externos.
Segundo PAIVA (2018), “(...) deve-se sempre pensar na autossustentabilidade do patrimônio
cultural, ou seja, de que modo os seus proprietários poderiam manter e conservar o bem,
explorando-o economicamente, desde que de modo adequado.”. Um exemplo é o extinto Programa
Monumenta, “[...] projeto que propunha financiamento através de parcerias público/privado.”
(GIANNECCHINI, 2021) entre os anos de 1999 e 2010, e poderia ter ajudado financeiramente a
recuperação das fachadas e áreas comuns do condomínio. Além de outras parcerias que não deram
certo ao longo dos anos que a fachada esta coberta.
Utilizando-se de um laudo de inspeção predial, a partir da metodologia proposta por este
trabalho, ficaria mais claro para o condomínio a necessidade de um maior empenho financeiro para
a manutenção de suas características de patrimônio histórico. Ao mesmo tempo estaria garantida a
segurança dos condôminos e usuários. Neste sentido, para que a evolução desta e de outras
necessidades do Copan, como condomínio, iniciem o deslanchar do processo de recuperação é
necessário desenvolver um trabalho de inspeção predial. Principalmente, no que concerne à
manutenção dos problemas mais graves, como o das fachadas.
O resultado da falta desse tipo de cuidado e planejamento acarretou descaracterização e,
consequente, desvalorização do bem histórico. Além disso, prejuízo aos proprietários e à cidade.
Isso por conta das alterações de qualidades de um de seus principais cartões postais, edifício
símbolo da arquitetura Modernista nacional e internacional.
Tal situação teria maiores chances de começar a ser modificada, caso a inspeção predial
fosse aplicada. Com a ressalva de ser aplicada sob a ótica da conservação do bem tombado. A
prioridade, logo após a segurança do usuário é a manutenção das características do edifício e sua
conservação. Este raciocínio pode ser aplicado a qualquer edifício residencial tombado. Levando-se

19
em consideração a NBR 16.747 (ABNT, 2020) somada ao olhar atento do perito sobre a
preservação das características da edificação histórica.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Levando-se em consideração os edifícios residenciais tombados, a necessidade da


conservação dos mesmos e a possibilidade de viabilizar a manutenção deles de forma sistemática,
propôs-se a aplicação da inspeção predial de forma diferenciada. A primeira diferenciação foi
compreender que suas características históricas são uma prioridade para a manutenção. A segunda é
que o edifício deve ser autossustentável por ser um bem tombado e ganhar este status que o
valoriza.
A inspeção predial atua como meio de verificar se as manutenções específicas relativas ao
bem tombado estão sendo aplicadas de forma eficiente. Leva-se em consideração que o bem
tombado tem como prioridade no plano de manutenção, a preservação das características que o
levaram a possuir este valor, além da segurança para o usuário.
Ao proceder inspeção do edifício Copan, verificou-se que a falta da inspeção predial trouxe
prejuízos tanto em termos de conservação e manutenção equivocadas, quanto gastos para soluções
pouco ou nada efetivas. Portanto, gerou-se prejuízo para seus proprietários. Tanto em termos de
valorização do bem imobiliário, quanto do bem como patrimônio histórico.
Por conta do embargo da obra de reconstrução da fachada, imposto pelo CONPRESP, ficou
claro que não foram atendidos nem os princípios de conservação exigidos pela lei de tombamento e
nem os requisitos de segurança para seus usuários. As soluções encontradas e adotadas até agora
foram paliativas e não receberam a atenção necessária em termos de possuir um plano de
continuidade ou até mesmo de visão global.
Na inspeção predial executada a partir deste trabalho, surgiu a necessidade de adicionar à
metodologia proposta pela NBR 16.747 (ABNT,2020) o item “relevância histórica”. Ele foi
adicionado a um quadro utilizado na inspeção no intuito de direcionar a prioridade das
manutenções, levando-se em consideração a significância histórica do sistema ou subsistema
analisado. Foi adicionado juntamente com os outros itens constantes da metodologia já consagrados
pela Norma.
Faz-se necessário levar em consideração a qualificação dos profissionais que farão esta
análise e a concordância dos órgãos responsáveis pela preservação do patrimônio histórico. No caso
do Copan isso teria evitado embargos, caso já houvesse um laudo apontando as intensões de
restauro da fachada, por exemplo.
Portanto, frisa-se que, dentro das possibilidades de um edifício tombado, a inspeção predial
deve ser parte integrante dos planos para a sua conservação. Sem este instrumento não é possível

20
fazer o levantamento das questões existentes e muito menos se elas estão sendo atendidas de forma
adequada, com o passar do tempo.
A diferença da inspeção em edifícios tombados é a preocupação com a manutenção das
características que lhe dão tal valor. E, portanto, devem ser priorizadas estas características estéticas
na hierarquia geral dos itens prioritários em termos de manutenção, sob o olhar da inspeção predial.
Em edifícios convencionais isso não ocorre.
Porém, em qualquer caso, a prioridade 1 de manutenção e conservação é sempre aquilo que
pode colocar a segurança do usuário em risco. No caso do Copan, o principal problema constatado
foi a fachada. Ela acumula duas questões, risco ao usuário e descaracterização do patrimônio
histórico. Respectivamente, prioridades 1 e 2 sob a ótica deste trabalho. Logo, dois problemas que
perduram há quase trinta anos e já poderiam ter tido uma solução planejada através dos dados
levantados pela inspeção predial.
A falta ou inexistência de análises sistêmicas para a preservação de edifícios tombados é
comum. Dessa forma, é necessário atentar para as características específicas de cada edifício
tombado no momento da inspeção. De forma geral, o olhar técnico e diferenciado daquele que
executar a inspeção, deverá ser suficiente para entender as prioridades da manutenção das
características do bem tombado. Inclusive de acordo com o que consta nas especificações do
tombamento.
A escolha do edifício Copan como estudo de caso para este trabalho foi feita por conta de
suas características exclusivas, como um dos maiores representantes da arquitetura brasileira
Modernista. Além disso, por conta de seu tamanho, com muitos usuários e por ser um edifício
tombado em pleno funcionamento. Por outro lado, mesmo representando milhares de metros
quadrados, a questão das fachadas pode ser abordada de forma relativamente simples.
Principalmente, considerando-se todos os estudos técnicos já realizados.
Neste trabalho, optou-se por criar um sistema de análise específico que pode ser aplicado a
outros edifícios e ao próprio Copan em seus outros sistemas e subsistemas. Isso não foi feito mais
vezes para que o trabalho ficasse com o tamanho imposto pelo formato de artigo tecnológico. Mas a
intensão é que os quadros apresentados possam ser aplicados de forma eficaz em qualquer inspeção
predial de edifício tombado.
Além disso, pelo fato de entender a dificuldade financeira para tais operações e a nem
sempre possível presença de especialista para tais análises durante a inspeção, demonstrou-se como
qualquer profissional capacitado pode atuar de forma consciente em termos de preservação.
Considerando-se que ainda seja recomendável um especialista. Portanto, foi apontado um caminho
para a execução da inspeção predial sobre o imóvel tombado.
Outros trabalhos, neste mesmo sentido, poderão apontar outras especificidades em relação as

21
prioridades de inspeção predial sob outros aspectos. Será importante incorporar tais aspectos na
próxima revisão da NBR 16.747 (ABNT,2020).

REFERÊNCIAS

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 15.575-1 Edificações


habitacionais — Desempenho - Parte 1: Requisitos gerais 1. Ed. Rio de Janeiro: ABNT, Set 2021.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 16747: Inspeção Predial:


Diretrizes, Conceitos, Terminologias e Procedimentos. 1. Ed. Rio de Janeiro: ABNT, Mai 2020.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 5674: Manutenção de


Edificações – Requisitos para o sistema de gestão de Manutenção. 1. Ed. Rio de Janeiro: ABNT,
2012.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 16280: Reforma em


edificações – Sistema de gestão de reformas – Requisitos. 1. Ed. Rio de Janeiro: ABNT, 2014.

BONFIM, Valéria A. C. A conservação da arquitetura moderna: as fachadas do edifício Copan.


2019. 71 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Arquitetura, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade de São Paulo – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, São Paulo, 2019.
Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/16/16132/tde-25072019-
144537/publico/MEVALERIAAPARECIDACOSTABONFIM_rev.pdf. Acesso em: 13 mar. 2022.

CARVALHO, Claudia S. Rodrigues. Conservação preventiva de edifícios e sítios históricos:


pesquisa e prática. Revista CPC, São Paulo, n. 18, p. 141-153, abril, 2015. Disponível em
http://dx.doi.org/10.11606/issn.1980-4466.v0i18p141-153. Acesso em: 10 abr. 2022.

ICOMOS. The Burra Charter – The Australia ICOMOS charter for Places of Cultural
Significance. 2013. Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/The-Burra-
Charter-2013-Adopted-31_10_2013.pdf. Acessado em 10 abr. 2022.

LARA, Alexandre M. F. Inspeção Predial e Manutenção. São Paulo: Universidade Mackenzie,


2021 – Apostila.

MELO, C. F. A. Requalificação de um edifício histórico em Fortaleza/CE: uma proposta para


promover a perman^ncia urbana e garantir a memória da cidade. Campina Grande: trabalho de
conclusão de curso e arquitetura e urbanismo. UFCG. Julho de 2018

PAIVA, Carlos Magno de Souza; SOUZA, André Henrique Macieira, org. Manual para quem
vive em casas tombadas. 1a edição – Ouro Preto: Livraria e Editora Graphar, 2018.

SP1. Reforma do Copan, no Centro de SP, é autorizada pela prefeitura após 10 anos de
negociação. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2021/10/06/reforma-do-
copan-no-centro-de-sp-e-autorizada-pela-prefeitura-apos-10-anos-de-negociacao.ghtml.
Acesso em: 13 mar. 2022.

22

Você também pode gostar