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Para sua própria reprodução biológica e social, enquanto ser genérico, o ser
humano relaciona-se com outros seres humanos, o que significa que o homem é,
inerentemente, um ser social, e é através dessas relações sociais que estabelecem entre
si os homens é que garante-se o desenvolvimento genérico do ser humano, um
desenvolvimento responsável por cada vez mais tornar o ser humano menos
dependente de sua relação direta com a natureza (ainda que não seja possível uma
superação total da relação humana com ela).
Esse valor de uso, que é produto do processo de trabalho, teve no seu processo
de produção, enquanto meios de produção, outros valores de uso, que são produtos de
processos de trabalho anteriores. “Valor de uso que é produto de um trabalho torna-se,
assim, meio de produção de outro” (MARX, 2019, p. 215). Sendo assim, tais produtos
do trabalho são também condição do processo de trabalho.
Vieira (2018), contudo, afirma que estas determinações gerais, conforme o
próprio Marx evidencia nos Grundrisse (2011), não são a-históricas. Elas formam um
complexo e estão diversamente articuladas, “algumas determinações pertencem a
todas as épocas; outras são comuns apenas a algumas. [Certas] determinações serão
comuns à época mais moderna e à mais antiga” (MARX, 2011, p. 41). Nesse sentido,
a produção em geral é uma abstração, utilizada para facilitar a apreensão das formas
de produção.
As determinações gerais, conforme Marx entende, são resultado de relações
históricas, e estas determinações (ou categorias) são produzidas no interior de relações
sociais determinadas, “frutos de desenvolvimentos específicos ao longo da história
concreta dos homens” (VIEIRA, 2018, p. 27). Estas determinações não estão
descoladas da realidade concreta, elas são “formas de ser”, elas “são abstraídas, pelo
pensamento, de uma determinada realidade social, para que, em seguida, esse mesmo
pensamento possa reproduzir, em conceitos, tal realidade como um todo” (p. 27). É
por isso que Marx diz que “as categorias expressam formas de ser, determinações de
existência” (MARX, 2011, p. 59).
Na concepção ontológica de Marx, afima Lessa (2021), o ser é síntese de
múltiplas determinações, que incluem as determinações da esfera fenomênica e da
essencial. Ambas as esferas são rigorosamente existentes, mas o que as distingue é o
grau de permanência na história, a sua continuidade.
O trabalho é uma eterna necessidade do homem uma vez que cumpre a função
fundante da continuidade humana, a reprodução social. Por ser universal e eterna da
vida humana, é comum a todas as formações sociais. Uma vez que o trabalho é
determinação essencial do mundo dos homens, ele “apenas pode existir através da
sucessão histórica das formações sociais particulares, ou seja, do mundo fenomênico,
[...] mediação decisiva no ser da essência; o desenvolvimento da esfera fenomênica
interfere no desenvolvimento da essência” (LESSA, 2021, p. 97). Tanto a essência
como o fenômeno são históricos, o que significa que os homens é que produzem sua
própria essência historicamente, e não um “ser superior” ou uma “natureza” separada
dos homens, a-histórica e eterna. Os seres humanos podem ser senhores (demiurgos)
de sua própria essência.
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Como identficia Fortes (2022), as categorias alienação/exteriorização (Entäusserung) e objetivação
(Vergegenstanlichung) ainda não são mencionadas por Lukács no capítulo O trabalho, estas são
introduzidas no terceiro capítulo da Ontologia, o ideal e a ideologia, no qual ele trata sobre o momento
ideal, trazendo para sua análise estas duas categorias e identificando que ambas já estão presentes na
forma originária do trabalho. Essas categorias passam a ser incorporadas à exposição justamente pelo
adensamento categorial que vai sendo desenvolvido ao longo dos capítulos da obra. No capítulo
terceiro, Lukács retoma o complexo do trabalho o aprofundando com a identificação, dentro desse
complexo, dessas duas categorias. Já a categoria estranhamento (Entfremdung) é abordada por Lukács
no capítulo final de sua obra.
3) É um ser que vive em sociedade e produz as condições necessárias à sua
existência de maneira inerentemente social;
4) Como ser social produtivo, ele adquire novas necessidades (“necessidades
criadas por intermédio da associação social”) e novos poderes para sua
satisfação;
5) Como ser social produtivo, ele transforma o mundo à sua volta de uma
maneira específica, deixando nele a sua marca; a natureza se torna, assim,
“natureza antropológica” nessa relação entre homem e natureza; tudo passa a
ser, pelo menos potencialmente, parte das relações humanas (a natureza,
nessas relações, surge sob uma grande variedade de formas, desde elementos
materiais de utilidade até objetos de hipótese científica e de prazer estético);
6) Estabelecendo suas próprias condições de vida sobre uma base natural, na
forma de instituições socioeconômicas e seus produtos, o homem “se
desdobra” praticamente, lançando com isso as bases para “contemplar-se num
mundo que ele mesmo criou”;
7) Por meio de seus novos poderes, que são, tal como suas novas
necessidades, “criados por intermédio da associação” e da interação social, e
com base nesse “desdobramento prático”, recém-mencionado, ele também
“desdobra a si mesmo intelectualmente”.