Você está na página 1de 25

Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais

Instituto de Relações Internacionais


Universidade de Brasília

Du Bois e Brasil: Reflexões sobre Transnacionalismo Negro e Diáspora


Africana

Juliana Góes
1
2022

Tradução: Bárbara Luiza Macêdo Gonçalves


Revisão: Jhader Cerqueira do Carmo

GÓES, Juliana. Du Bois and Brazil: Reflections on Black Transnationalism and African
Diaspora. Du Bois Review: Social Science Research on Race, v. 19, n. 2, p. 293–308, 2022.
DOI: 10.1017/S1742058X2100045X.

1 INTRODUÇÃO

Desde o começo do colonialismo europeu, pessoas negras têm sido oprimidas


mundialmente. Como resultado, os esforços para se criar uma solidariedade transnacional não foi
algo incomum1. Todavia, nossa opressão compartilhada não criou um projeto comum de
libertação, nem apagou nossas diferenças. Nesse artigo, eu examino esta questão por meio de um
exemplo histórico – o relacionamento de Du Bois com o Brasil. No início do século XX, ele estudou,
escreveu e publicou sobre esse país sul-americano. Os primeiros escritos de Du Bois sobre o Brasil
ilustraram o país como um paraíso racial. Seu objetivo era produzir uma solidariedade e
cooperação internacional entre pessoas negras2. Porém, a ideia de paraíso racial construiu a base
para o mito da democracia racial brasileira – um mito que é historicamente o oposto da realidade
de violência contra afro-brasileiros. Por que um eminente pensador libertário como Du Bois se
prendeu a uma ideia tão errônea e, no fim das contas, perigosa? O que tal armadilha implica para

1
Neste artigo, “Black” é escrito em letra maiúscula quando o termo se refere a um grupo étnico ou racial.
No entanto, “white” não se inicia assim, com letra maiúscula. Isto é um movimento intencional para destacar
e reconhecer as dificuldades de negros nas Américas, assim como o sistema de poder que marginaliza as
pessoas negras.
2
NDT: No texto original deste artigo, a autora usa os verbetes “Negro” e “black”, conforme a lógica linguística
do inglês estadunidense, valendo-se ressaltar o vocábulo “Negro” tem aqui um significado ofensivo e
antiquado. A linguística brasileira segue uma lógica diferente para as palavras negro e preto. Nesta versão,
optou-se por seguir uma lógica já presente no argumento científico da autora, de que o vocábulo preto tem
na língua portuguesa brasileira, um sentido mais pejorativo. De tal forma, no texto traduzido, procurou-se
observar as intenções de significado e narrativa do manuscrito original.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

o diálogo e a libertação afrodiaspórica? Nesse artigo, exploro estas questões por meio da análise
do relacionamento de Du Bois com o Brasil de 1900 até 19403.
Na literatura, as explicações sobre o porquê Du Bois se engajou com o mito da democracia
racial estão relacionadas ao seu desejo de provar que outras políticas raciais eram possíveis
(HELLWIG, 1990; NUNES, 2008)4. Depois da abolição da escravatura no Brasil em 1888, as elites
2
brasileiras tentaram embranquecer o país por meio da miscigenação. Isto é, elas procuraram diluir
o sangue negro no sangue branco até que o primeiro desaparecesse completamente.
Consequentemente, não existiu uma segregação funcional no país. Isto não significa que não
existia racismo no Brasil, mas era realizado de maneira diferente. A população afro-brasileira viveu
na pobreza e encarou o preconceito ao tentar acessar a educação, trabalhos e moradia. Todavia,
foi a ausência de segregação que atraiu a atenção de Du Bois. Negligenciando a violência diária
sofrida pelos afro-brasileiros, ele analisou e representou o Brasil como um possível exemplo para
os Estados Unidos – um paraíso racial que provava que a segregação poderia ser extinguida.
Além disso, existia outra razão pela qual Du Bois se prendeu à uma suposição tão errônea.
Depois de conduzir uma extensa pesquisa em arquivos no W. E. B. Du Bois Papers, na Universidade
de Massachusetts em Amherst (DU BOIS, [s.d.]), analisando mais de 100 documentos arquivados
relacionados ao Brasil, argumento que Du Bois também representou o Brasil como um paraíso
racial porque ele se alinhou a elites brasileiras (representada por acadêmicos brasileiros brancos)5.
Tanto ele quanto essas elites estavam interessados em defender a miscigenação. Naquele tempo,
nos Estados Unidos, cientistas alegavam que indivíduos de raça pura eram superiores a pessoas
mestiças e que a mistura de raças levava à degeneração (HOOKER, 2017; MUNANGA, 1999). As
elites brasileiras lutavam contra essa ideia, declarando que a miscigenação poderia embranquecer
a população por meio da eliminação do sangue negro. Simultaneamente, Du Bois estava lutando

3
Du Bois mudou sua opinião sobre o Brasil depois de 1940. Ao invés de ilustrar o local como um paraíso
racial, ele começou a denunciar o racismo no país. Essa mudança está relacionada ao aumento de conexão
de Du Bois com o marxismo e comunistas brasileiros. Ainda, está vinculada ao crescente número de afro-
americanos que visitaram o Brasil depois de 1940, como Franklin Frazier, Irene Diggs, Lorenzo Turner,
Katherine Durham e George Schuyler. O relacionamento de Du Bois com o Brasil depois de 1940 será
explorado em um artigo futuro.
4
Cf. Sansone (2011), Pereira (2013) e Francisco (2014) para saber de outros afro-americanos se engajando
com o mito da democracia racial e as razões para tal engajamento.
5
Para esse trabalho, procurei fontes primárias no W. E. B. Du Bois Papers na Universidade de Massachusetts
em Amherst (DU BOIS, [s.d.]). Como mencionei, analisei mais de 100 documentos no repositório
relacionados ao Brasil, entre cartas trocadas sobre o país sul-americano (com brasileiros ou outros) e
publicações. Também, analisei artigos no The Crisis (jornal da Associação Nacional para o Progresso de
Pessoas de Cor – NAACP, no qual Du Bois era editor), e como fonte secundária, a imprensa negra dos Estados
Unidos e do Brasil. Para estudos futuros, materiais sobre Du Bois estão disponíveis para consulta em ambos
os arquivos da Universidade de Harvard e da Universidade Fisk.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

contra as leis de anti-miscigenação nos Estados Unidos e buscava provar que raças puras não
existiam. Isto explica a breve aliança entre Du Bois e as elites brasileiras.
Ademais, neste artigo, exploro como as desigualdades globais e o imperialismo
impactaram a agenda pan-africana de Du Bois relativa ao Brasil. Ao se questionar o que podemos
aprender sobre a experiência dele para fortalecer a solidariedade afrodiaspórica, exponho a
3
importância de considerar as diferenças entre pessoas negras e como as desigualdades globais
podem facilitar ou desafiar o engajamento do povo negro nos debates transnacionais.
O artigo é dividido em cinco seções. Primeiro, explico o mito da democracia racial. Depois,
exploro os escritos de Du Bois sobre o Brasil e como ele promoveu o tal mito. Em seguida, explico
o relacionamento de Du Bois com as elites brasileiras. Então, discuto a orientação elitista de Du
Bois, conectando-a ao seu relacionamento com as elites brasileiras. Eu concluo por meio da análise
de como o relacionamento entre Du Bois e o Brasil nos ensinam sobre solidariedade transnacional
negra, unindo essa experiência histórica sob estudo aqui, com a literatura sobre o diálogo e
libertação da diáspora africana.

2 O MITO DA DEMOCRACIA RACIAL

No Brasil, a população é racialmente definida de acordo com seu fenótipo,


independentemente de sua ancestralidade. Por isso, pessoas são classificadas como negras caso
tenham traços africanos, como cor de pele preta/parda e cabelo cacheado/crespo (cf. TELLES,
2014). Vale ressaltar, o Brasil é um país majoritariamente negro. No último censo brasileiro, em
2010, tem-se as seguintes classificações e resultados: branco (47,51%); pardo (cor marrom,
43,42%); preto (cor preta, 7,52%); amarelo (asiáticos, 1,1%); e indígenas (0,42%). A categoria negro6
(Negro/black) é composta por aqueles que se autodeclaram como pardos e pretos. Juntos, eles
representam 50,94% da população e pesquisas mais recentes sugerem que esse número
aumentou para 56,2% em 2019 (IBGE, 2020). Porém, a maioria numérica de afro-brasileiros não se
reflete no poder social, político e econômico. Pelo contrário, a antinegritude permeia a vida
brasileira.
O país teve o maior e mais duradouro sistema de escravidão nas Américas (PASCHEL, 2016)
e, depois da abolição, pessoas negras têm seguido em posições subalternas. Mesmo assim, o Brasil
segue sendo amplamente definido como uma democracia racial por acadêmicos, governos e
agências internacionais como a UNESCO (HANCHARD, 1994; MUNANGA, 1999; SCHWARCZ,
1993). Democracia racial se refere a “um sistema racial desprovido de qualquer barreira legal ou
institucional para a igualdade racial e [...] um sistema racial desprovido de qualquer manifestação
de preconceito ou discriminação” (DOMINGUES, 2005, p. 116). O termo foi usado para descrever

6
NDT: no texto original, a autora utilizou essa palavra em português brasileiro.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

o Brasil durante a década de 1950, mas as raízes da ideia podem ser vistas antes disso, quando o
país era ilustrado como um paraíso racial.
Gilberto Freyre (FREYRE, 1933, 1936) é o acadêmico brasileiro reconhecido por criar a base
para esse mito. Criticando as explicações biológicas para as diferenças raciais, Freyre escreveu dois
livros na década de 1930. Ele argumentou que o racismo era algo que precisava ser superado e
4
que o Brasil estava fazendo isso com sucesso. De acordo com Freyre, no Brasil, as interações entre
indivíduos negros e brancos eram marcadas como zonas de confraternização. Para ele, essa
confraternização era principalmente evidenciada pelo fato de que os colonizadores brancos
faziam sexo com mulheres negras escravizadas, e consequentemente, pela miscigenação7.
Enquanto ele reconhecia que homens brancos agiram de maneiras opressivas para com mulheres
negras, Freyre insistia que havia “casos de pura confraternização do sadismo do conquistador
branco com o masoquismo da mulher indígena ou da negra” (FREYRE, 1933, p. 113).
A miscigenação era sim algo comum durante a escravidão no Brasil. Porém, dado as
dinâmicas de poder da escravidão, relações sexuais entre senhores e escravizadas eram estupros
e não zonas de confraternização (ou relações sadomasoquistas). De fato, muitas feministas afro-
brasileiras argumentam que as raízes do país advêm do estupro de mulheres negras (CARNEIRO,
2011; GONZALEZ, 1984; SOUZA, 1983). No entanto, Freyre ignora essas dinâmicas de poder e
“força sua miscigenação seletiva ainda mais longe, conectando isso [...] ao surgimento da
democracia social no Brasil” (HANCHARD, 1994, p. 53). Na teoria dele, as supostas zonas de
confraternização e miscigenação promoveram a diminuição da distância social entre pessoas
negras e brancas, resultando na harmonia entre as raças e criando um sistema democrático
inclusivo – uma democracia racial8.
Como veremos posteriormente, as elites brasileiras usaram as ideias de Freyre para
representar a nação como uma terra de progresso, que os habitantes avançados teriam eliminado
preconceitos retrógrados. Mais especificamente, as elites brasileiras se retratavam como indivíduos
que não viam cor9e misericordiosos, que estavam até mesmo dispostos a ter relações sexuais com
eles (cf. GONZALEZ, 1984). Contudo, a miscigenação não preveniu a divisão entre pessoas negras
e brancas, nem reduziu o racismo. Recentes dados no Brasil mostram que pessoas negras são o
principal alvo de homicídios: 75% dos assassinados são negros (CERQUEIRA et al., 2017). A
violência aumenta quando focamos na juventude: no Brasil, um jovem homem negro entre 15 e
29 anos de idade é assassinado a cada vinte e três minutos (ESCÓSSIA, 2016). Além disso, a

7
Miscigenação, com sua conotação racista, é exatamente o termo usado por Freyre. Como será explicado
depois, as elites brasileiras nunca tiveram a intenção de construir um país multirracial. Pelo contrário, eles
queriam eliminar as pessoas negras pela miscigenação.
8
O autor não usa o termo “democracia racial” nos dois livros mencionados. Ele usou o termo depois de
1950.
9
NDT: no texto original, a autora usa o termo “colorblind”.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

violência contra mulheres negras no país aumentou 54% de 2003 para 2013 (WAISELFISZ, 2015).
Em outros dados, vemos que aqueles que não são assassinados frequentemente são submetidos
à pobreza. Enquanto as pessoas brancas representam 70% dos brasileiros mais ricos, as pessoas
negras representam 75% dos mais pobres (IBGE, 2019).
Ademais, o mito da democracia racial foi seguido pela ideologia do embranquecimento,
5
que postulava que a única maneira de se tornar uma pessoa, um ser humano, era se tornando
branco. O trabalho seminal de Neusa Santos Souza (1983) demonstrou que dentro da cultura
brasileira, ser negro significava ser irracional, feio, sujo, emocional, exótico, um macaco desprovido
de Civilização e da humanidade – alguém que deveria ser eliminado. Consequentemente, todos
estavam motivados a eliminar qualquer sinal de negritude dos seus corpos, primariamente pela
miscigenação. Ela escreve: "[...] o cidadão era o branco, os serviços respeitáveis eram os ‘serviços-
de-branco’, ser bem tratado era ser tratado como branco. [...] tendo que deixar de ser negro – o
que o negro buscou [...] tornar-se gente" (SOUZA, 1983, p. 21). O resultado dessa ideologia foi o
apagamento da subjetividade dos afro-brasileiros. Mesmo que muitos afro-brasileiros lutassem
contra essa ideologia, outros tentavam de tudo para parecer brancos – desde embranquecer suas
crianças pela miscigenação até a deformação dos seus corpos.
Essa ideologia de embranquecimento resultou em um baixo nível de identificação com o
termo preto entre afro-brasileiros. Como explicado anteriormente, pessoas negras no Brasil se
autodeclaram como pardos (cor parda) e pretos (cor preta). Todavia, o número de pessoas que
usam a palavra preto é muito baixo. Ser preto era considerado algo tão errado que pessoas negras
retintas evitavam esse termo e se autodeclaravam pardos. Afinal, quem deseja afirmar que é o
animal sujo que permeia a imaginação brasileira quando falamos sobre negritude? Embora
atualmente ser amplamente reconhecido que o Brasil nunca foi uma democracia racial e que a
ideologia de embranquecimento é uma forma de violência antinegra, vestígios dessa ideologia
ainda forçam pessoas negras com uma pequena quantidade de ascendência branca (pele mais
clara, cabelo liso, nariz e boca mais finos) a se autodeclarar pardas, buscando negar a sua negritude
(CARNEIRO, 2011). Assim, o mito da democracia racial teve um impacto tremendo na vida de afro-
brasileiros.

3 DU BOIS E O MITO DA DEMOCRACIA RACIAL

Du Bois promoveu a ideia de que o Brasil era um paraíso racial, que ajudou a criar o mito
da democracia racial. Ele estudou o Brasil no começo do século XX e a primeira conexão entre Du
Bois e acadêmicos brasileiros apareceu em 1911 no Primeiro Congresso Universal de Raças. O
evento, realizado em Londres, reuniu acadêmicos de diferentes partes do mundo para discutir
raça. Du Bois foi nesse evento, assim como João Batista de Lacerda, diretor do Museu Nacional do

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

Rio de Janeiro. Lacerda (1911) apresentou o artigo The Metis, or Half-breeds, of Brazil10, no qual
ele argumenta que pessoas negras e brancas eram da mesma espécie humana mas de duas raças
diferentes. Para sustentar seus argumentos, Lacerda declarou que a prova de que os dois sujeitos
eram da mesma espécie era a habilidade de seus descendentes de procriar e que os metis11
(pessoas mestiças) no Brasil eram altamente férteis. Ainda, ele alegava que os metis demonstraram
6
inteligência, boas proporções físicas e outras características superiores às das pessoas negras.
Logo, para ele, a miscigenação melhorava as pessoas negras.
O trabalho de Lacerda atraiu a atenção de Du Bois12. Muitos acadêmicos viam a
miscigenação como perigosa e indesejável – a degeneração da raça superior que conduzia para o
fim da civilização. Lacerda, porém, argumentava em favor da miscigenação (mesmo que ele
mantivesse a ideia racista de que pessoas negras eram inferiores). Consequentemente, o trabalho
de Lacerda influenciou a primeira publicação escrita por Du Bois sobre o Brasil – uma resposta à
opinião de Roosevelt sobre o país.
Em 1914, Theodore Roosevelt visitou o Brasil e publicou seu texto de opinião em uma
revista semanal chamada The Outlook. De acordo com esse ex-presidente, o que separava o Brasil
e os Estados Unidos não era o número de pessoas mestiças. Ele escreveu: “é um erro completo
falar como se a população do Brasil fosse tão miscigenada que é completamente distinta da
Europa ou dos Estados Unidos. É miscigenada apenas do mesmo jeito que as populações da Itália
e da Espanha são mistas [...]” (ROOSEVELT, 1914, p. 409). Ademais, de acordo com Roosevelt,
brasileiros em posições sociais altas eram brancos. Eles aceitavam alguns pretos13 ou mulatos que
demonstraram habilidades, mas a maioria das pessoas negras estavam em posições mais baixas.
Então, a diferença entre ambos os países, de acordo com Roosevelt, eram as suas atitudes para
com o preto. No Brasil, eles buscavam apagar completamente indivíduos negros por meio da sua
absorção na raça branca (miscigenação). Nos Estados Unidos, indivíduos negros e brancos
acreditavam na completa separação de raças. Roosevelt argumentou que, como resultado, as
pessoas do Brasil teriam o sangue branco levemente mais fraco, mas eventualmente eliminaria o
problema negro14. Nos Estados Unidos, em contraste, Roosevelt alegava que se acreditava “em

10 NDT: apesar de o título dessa obra poder ser traduzido literalmente como Os Impuros, ou Mestiços, do
Brasil, merece-se destacar que os verbetes “metis” (provindo do francês) e “half-breeds” possuem sentidos
ofensivo e pejorativo.
11 NDT: a autora se valeu do estrangeirismo e usou o verbete “metis” no texto original.
12 Lacerda também escreveu sobre seu encontro com Du Bois. Ele argumentou que Du Bois era um mulato
inteligente e que ele provou que sua raça poderia ser melhorada com educação acadêmica. Cf. Rocha (2010).
13 NDT: no texto original, a autora utilizou a palavra “Negroes”. Pode-se afirmar o uso seguiu em
conformidade com a ideologia ofensiva de Roosevelt.
14 NDT: “Negro problem” pode ser considerado uma categoria de análise dentro da gramática
estadunidense; e apesar de a versão aqui ter sido a palavra negro, o sentido ainda permanece pejorativo e
ofensivo.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

tratar cada homem de qualquer cor se baseando absolutamente em seu valor como homem,
permitindo-o à oportunidade completa de alcançar o sucesso assegurado por sua habilidade e
integridade, e dando-o toda a mensura de respeito que tal sucesso o intitula" (ROOSEVELT, 1914,
p. 410).
Nesse mesmo ano, Du Bois (1914) respondeu Roosevelt em um artigo publicado no The
7
Crisis. Em tal artigo, ele argumentou que Roosevelt evitou discutir a população negra, mesmo
tendo visitado o Rio de Janeiro (uma cidade com centena de milhares de pretos) e a Bahia (o maior
estado [sic] negro das Américas). Ademais, Du Bois considerou que mesmo Roosevelt indicando
três fatos, ele também disse duas inverdades. Pela perspectiva de Du Bois, os fatos eram: (1) Brasil
estava absorvendo pessoas negras na raça branca; (2) não existia um padrão de cor para a
ascensão social e (3) a maioria das pessoas negras estava na classe social mais baixa. As inverdades
eram: (1) os Estados Unidos acreditavam em tratar cada pessoa, independentemente da sua cor,
como uma pessoa e (2) a miscigenação levava a um leve enfraquecimento da raça branca. Du Bois
pontuou que, nos Estados Unidos, pessoas brancas acreditavam que a civilização só poderia ser
mantida se negros estivessem em um lugar inferior. Não existia igualdade. Além disso, ele usou o
trabalho de Lacerda para argumentar que pessoas mestiças eram inteligentes e capazes e tais
características provavam que o seu sangue negro não os fez pior que brancos puros. Du Bois mais
adiante explicou que ele não argumentava pelo casamento interracial já que ele considerava
normal se casar com a mesma raça. Ao contrário, ele argumentava contra as mentiras científicas
sobre a inferioridade negra.
Em resposta a Roosevelt, Du Bois retratou o Brasil como um lugar sem uma linha de cor15.
Ele repetiu esse argumento em 1915 na publicação The Negro. Esse livro é uma contribuição
importante para o pan-africanismo e desafiou a ideia de que pessoas negras não tinham história,
ao analisar civilizações africanas e a diáspora. Du Bois dedicou um capítulo para a análise das
Índias Ocidentais e da América Latina, dentro da qual ele discutiu o Brasil. Ele analisou o país desde
a escravidão em diante, alegando que a linha de cor não era precisa. Além disso, mesmo que Du
Bois tenha mencionado que houve revoltas contra a escravidão, ele argumentou que "a
emancipação toda foi pacífica, e brancos, pretos e indígenas estão hoje amalgamando uma nova
raça" (DU BOIS, 1915, p. 98). Portanto, de acordo com Du Bois, o Brasil era caracterizado pela
igualdade e solidariedade humanas.
Depois, Du Bois (1916) estendeu essa ideia para toda América do Sul. Os editores do The
Baltimore Afro-American requisitaram vários intelectuais, incluindo Du Bois, para dar suas opiniões
sobre o Congresso Pan-Americano. Afirmando que a linha de cor quase não existia nessa região,

15
NDT: a epistemologia de linhas de cor, desenvolvida pelo próprio Du Bois, diz respeito a um mundo
dividido racialmente, no qual, potências imperiais e econômicas, mesmo com o processo descolonização,
ainda estariam projetando suas sombras em países escuros (sobretudo aqueles localizados na África). Em
síntese, este era o problema do mundo contemporâneo.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

Du Bois argumentou que os Estados Unidos poderiam se beneficiar do exemplo da América do


Sul para mudar suas políticas raciais.
Também, Du Bois acompanhava e influenciava a literatura sobre o Brasil, que ilustrava o
pais como uma lugar sem um padrão de cor. No Brasil, durante a escravidão, as taxas de suicídio
de pessoas escravizadas e o número daqueles que morreram jovens era muito maior do que nos
8
Estados Unidos (PASCHEL, 2016). Ainda, a literatura inglesa sobre a escravidão brasileira, com
frequência, a representou como menos violenta que outros sistemas escravocratas devido a
miscigenação que ocorreu no país. Zita Nunes, que escreveu um dos estudos mais completos
sobre a promoção transnacional do mito da democracia racial, mostrou que livros como “South
America: Observations and Impressions do historiador britânico James Bryce (1914) e The Negro in
the New World (1910) de Harry Johnston, assim como o artigo de Roy Nash, secretário da NAACP,
no The Crisis, The Origin of Negro Slavery in Brazil e seu livro The Conquest of Brazil (1926) [...]"
(NUNES, 2008, p. 89) declararam que a escravidão no Brasil foi baseada em relações cordiais, e
por causa disso, a linha de cor não existia no país.
Esses livros foram lidos e recomendados por Du Bois. De fato, Roy Nash perguntou a Du
Bois informações sobre afro-brasileiros em 1923, antes de escrever seu livro16. Du Bois sugeriu
vários livros sobre o assunto incluindo South America: Observations and Impressions de James
Bryce, The Negro in the New World de Harry Johnston e o artigo apresentado por Lacerda no
Primeiro Congresso Universal de Raças17. Du Bois e Nash trocaram várias cartas sobre o tópico e,
Du Bois leu e comentou o livro de Nash antes da sua publicação, ajudando a construir a ideia de
que o Brasil era um paraíso racial18.
Du Bois recebeu vários relatórios sobre o racismo no Brasil. Em 1927, por exemplo, ele
recebeu uma carta da senhora T. Ross Farmer19. Ela chegou no Brasil "sob a ilusão de que a
discriminação e preconceito racial não existiam". Depois de três anos vivendo ali e estudando a
questão, ela evidenciou o oposto20. No mesmo ano, Du Bois recebeu outra carta de Owen Johnson,

16 Carta de Roy Nash para W. E. B. Du Bois, 8 de janeiro de 1923. W. E. B. Du Bois Papers (MS 312). Special
Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst Libraries.
17 Carta de W. E. B. Du Bois para Roy Nash, 17 de janeiro de 1923. W. E. B. Du Bois Papers (MS 312). Special
Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst Libraries
18 Carta de W. E. B. Du Bois para Roy Nash, 09 de maio de 1923. W. E. B. Du Bois Papers (MS 312). Special
Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst Libraries.
19 Carta da senhora T. Ross Farmer para The Crisis, 22 de janeiro de 1927. W. E. B. Du Bois Papers (MS 312).
Special Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst Libraries. Veja também a
carta de W. E. B. Du Bois para a senhora T. Ross Farmer, 9 de março de 1927. W. E. B. Du Bois Papers (MS
312). Special Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst Libraries.
20
Farmer afirmou que gostaria de escrever um artigo sobre isso para o The Crisis. Infelizmente, o artigo não
foi encontrado. Mesmo assim, a troca de cartas entre ela e Du Bois é um exemplo de que ele tinha acesso
aos relatórios preocupantes sobre o Brasil.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

um pescador contratado por um navio brasileiro21. Ele reportou abusos pelos oficiais e pela
tripulação, assim como o preconceito racial no Brasil. Ainda assim, esses relatos não foram o
suficiente para mudar a definição de Du Bois sobre o Brasil como um paraíso racial.
Por que Du Bois se engajou com o mito da democracia racial? Para explorar essa questão,
primeiro, nós precisamos entender o contexto em que ele estava escrevendo. Entre 1910 e 1930,
9
o país sul-americano era um tópico debatido com frequência na imprensa negra dos Estados
Unidos (FRANCISCO, 2014; HELLWIG, 1990; PEREIRA, 2013). Muitos acadêmicos, ativistas e
jornalistas negros publicaram artigos em jornais como o The Crisis, o Chicago Defender e o
Baltimore Afro-American, nos quais o Brasil foi ilustrado como um lugar sem linha de cor. O
engajamento de tais publicações com o Brasil foi tão intenso que Nunes (2008) argumenta, que
intelectuais e ativistas afro-americanos ajudaram a criar o mito da democracia racial. Ela compara
as datas das publicações sobre o Brasil na imprensa negra dos Estados Unidos e o período em
que Gilberto Freyre publicou seu livro mais importante Casa-Grande e Senzala (1933). Enquanto
nos Estados Unidos desde a década de 1910, o Brasil era definido como um lugar sem linha de
cor, Freyre publicou seu primeiro livro apenas em 1933. Ademais, Gilberto Freyre estava nos
Estados Unidos quando ele estava desenvolvendo suas ideias. Naquela época, ele estudava na
Universidade Columbia, orientado por Franz Boas.
De acordo com Nunes (2008), afro-americanos se engajaram na criação e reprodução da
imagem do Brasil como um paraíso racial, para provar à sociedade estadunidense que outra
solução para o problema negro era possível. Enquanto as Leis de Jim Crow haviam sido
estabelecidas nos Estados Unidos, não existia segregação legal no Brasil. Então, pessoas negras
estadunidenses usaram a imagem do Brasil para confrontar o sistema racial dos EUA. Para
demonstrar seu argumento, Nunes (2008) explorou a viagem de Robert Abbot para o Brasil. Ele
foi o fundador do Chicago Defender e visitou o Brasil em 1923 com sua esposa, Helen Abbott.
Quando ele voltou, publicou uma série de artigos chamados My Trip through South America. Neles,
Robert Abbott descreveu o Brasil como um lugar em que o negro poderia desfrutar da democracia
e que uma população homogênea emergiu devido à forte presença de pessoas mestiças. Além
disso, ele

informou aos seus leitores que como resultado de sua viagem, ele estava ‘mais
determinado que nunca para lutar e fazer o nosso país [os EUA], como o Brasil,
como a Argentina, terras de verdadeira democracia, ao contrário de um país com
uma democracia falsa’. (NUNES, 2008, p. 115)

21
Carta de Owen Johson para W. E. B. Du Bois, 18 de novembro de 1927. W. E. B. Du Bois Papers (MS 312).
Special Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst Libraries.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

No entanto, Nunes (2008) destaca que as experiências da família Abbott no Brasil nem
sempre foram positivas. Eles tiveram alojamento recusado em hotéis e Helen Abbott enfrentou
descriminação devido a diferença entre sua cor e a de seu marido. A cor de pele de Helen Abbott
era mais clara do que a de seu marido e a insistência dela na negritude rompia com a ideologia
do branqueamento. De acordo com Nunes (2008), Helen Abbott confidenciou à sua irmã os gestos
10
de que eles não eram bem-vindos mesmo quando eram aceitos no hotel. Eles eram excluídos dos
restaurantes do hotel e aconselhados a comer em um lugar de gente preta. Ainda, Nunes afirma
que o desejo de Robert Abbott em representar o Brasil como um lugar democrático era tão intenso
que ele deixava de escrever sobre essas situações.
É verdade que afro-americanos, incluindo Du Bois, tinham a genuína necessidade de provar
que outras políticas raciais eram possíveis para a sociedade estadunidense. No entanto, Du Bois
ainda tinha uma motivação adicional para o engajamento com o mito da democracia racial. Existiu
um breve alinhamento de interesses em relação aos benefícios da miscigenação entre Du Bois e
elites brasileiras. De acordo com o discurso hegemônico nos Estados Unidos, raças puras
(especialmente pessoas brancas) eram superiores e a mistura de raças levava à degeneração. O
indivíduo mestiço era considerado uma aberração – uma mistura de raças na qual características
psiquiátricas eram desequilibradas por conta da mescla antinatural e era, consequentemente,
inferior às raças puras (HOOKER, 2017; MUNANGA, 1999). As elites brasileiras estavam lutando
contra essa perspectiva em defesa das suas políticas raciais (embranquecer o país por meio da
miscigenação). Ao mesmo tempo, Du Bois acreditava que era essencial acabar com as leis contra
a miscigenação, para poder acabar com o linchamento nos Estados Unidos. Logo, existia uma
convergência de interesses que levou a um alinhamento filosófico.

4 DU BOIS, ELITES BRASILEIRAS E MISCIGENAÇÃO

Para entender o alinhamento entre Du Bois e as elites brasileiras, primeiramente é


necessário entender o desenvolvimento de duas diferentes gerações de acadêmicos brasileiros,
que eram em sua maioria brancos e conectados a elites brasileiras22. As datas da primeira geração
de acadêmicos são desde a década de 1910 até a de 1930 – o mesmo período em que a imprensa
negra estadunidense estava muito interessada no Brasil. Durante esse período, acadêmicos
brasileiros estavam tentando responder a seguinte questão: como podemos construir uma nação
próspera considerando a presença significante de pessoas negras na população brasileira?
(ALENCASTRO, 1985; CONSORTE, 1999; SCHWARCZ, 1996). Construir uma nação estava

22
Por gerações eu não quero dizer diferença em idade, mas uma diferença na composição e no argumento
científico de grupos acadêmicos. Muitos dos estudiosos da primeira geração também pertenciam à segunda.
Mesmo assim, era claro ali a demarcação em termos de produção acadêmica.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

diretamente relacionado à criação de uma civilização e considerando que a civilização era definida
em termos de grupos raciais, era necessário resolver o problema racial brasileiro. Acadêmicos
brasileiros, então, alegaram que podiam embranquecer o país por meio da miscigenação,
resultando na eliminação de indígenas e, principalmente, a influência negra (CONSORTE, 1999;
COSTA, 2001; SCHWARCZ, 1996). Isto é, pessoas brancas iriam predominar através dessa mistura,
11
limpando a nação do sangre negro.
Logo, o Estado brasileiro começou a incentivar a migração de europeus ao Brasil por meio
do financiamento de seu transporte para a América do Sul. É estimado que milhões de europeus
chegaram ao Brasil durante esse período. Contudo, as elites brasileiras foram acusadas de
contribuir para a degeneração da raça branca por meio da criação de uma população vira-lata23
(MUNANGA, 1999; PASCHEL, 2016). Essa acusação está relacionada à expansão do imperialismo
estadunidense. Os Estados Unidos frequentemente racializavam os países estrangeiros que
exploravam. Por meio do avanço desse imperialismo, as elites brasileiras estavam sendo retiradas
da categoria branca e definidas como mestizos24/não-brancos (cf. NUNES, 2008). Dessa forma, era
indispensável que as elites brasileiras rompessem com as teorias hegemônicas sobre miscigenação
e combatessem o poder imperial estadunidense, mesmo que elas não quisessem romper com o
mito da superioridade branca. Alguns acadêmicos brasileiros brancos, por exemplo, elaboraram
estudos estatísticos nos quais projetavam que, até 2012, o Brasil se tornaria um país branco (SILVA;
PAIXÃO, 2014).
Nos Estados Unidos, Du Bois também estava interessado em criticar discursos
hegemônicos sobre miscigenação, o que promoveu sua aliança com as elites brasileiras. Juliet
Hooker (2017), que estudou as escrituras e o ativismo dele sobre o tópico, argumentou que Du
Bois era um forte opositor às leis de anti-miscigenação. Ele não promoveu o casamento interracial.
Porém, ele entendia a conexão entre essas leis e o linchamento: regras anti-miscigenatórias
ajudavam a perpetuar o estereótipo de homens negros como predadores sexuais e animais
violentos que tentavam estuprar mulheres brancas inocentes. Além disso, Hooker alegava que, no
começo de sua carreira, “Du Bois rejeitou a descrição biológica da ciência racial quanto à raça e
propôs uma definição baseada em fatores culturais e históricos” (HOOKER, 2017, p. 126), usando
a miscigenação para desafiar as definições biológicas de raça.
Isso é exemplificado pelo artigo não publicado de Du Bois chamado Miscegenation, escrito
em 1936. Nesse artigo, Du Bois alegou que a miscigenação existe desde o início da humanidade.
Ele escreveu: “italianos, franceses, britânicos e alemães modernos são compostos de fragmentos

23
NDT: no texto original, a autora utilizou o termo “mongrel”, um termo considerado tabu na língua inglesa.
Nesta versão, por tal vocábulo vir associado sempre a um raciocínio racista, optou-se por traduzi-lo
seguindo a mesma lógica ofensiva e pejorativa.
24
NDT: mestiços foi empregado no texto original em referência à sua morfologia na língua espanhola,
possivelmente pela influência da migração de latino-americanos hispano-falantes aos EUA.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

quebrados de diferentes grupos raciais ou subgrupos. A reprodução cruzada tem fragmentado


raças antigas; a interação e imitação criaram uniformidades em modos, linguagem e
comportamento” (DU BOIS, 1936, p. 3). Sendo assim, não existe uma raça biológica pura. De fato,
Du Bois alegou que raça era um conceito artificial, sem uma definição científica clara. Por exemplo,
enquanto algumas pessoas identificavam três raças (negra, branca e amarela), outros encontravam
12
150 raças. Ele também comentou que pessoas geralmente são divididas em raças de acordo com
suas características morfológicas/fenotípicas e a variação dos tipos raciais ocorria devido ao
ambiente, não pela biologia. Baseado nisso, Du Bois declarou que negros estavam em condições
inferiores aos brancos não pela alegada inferioridade biológica mas pelas circunstâncias do
ambiente, como o desemprego. Logo, Du Bois usou a miscigenação para redefinir raça e advogar
por melhores condições para pessoas negras.
Finalmente, Du Bois criticou a ideia de que a miscigenação levaria à degeneração (e então,
deveria ser proibida) pela alegação de que ao menos um pouco de miscigenação e troca entre
raças eram uma pré-condição para o desenvolvimento e o progresso. Citando Lacerda e seu
estudo sobre o Brasil, Du Bois alegou que o caso brasileiro era um exemplo de pessoas mestiças
sendo músicos, intelectuais, advogados, etc. Também, usando estatísticas sobre a distribuição
racial, Du Bois demonstrou uma porcentagem substancial de mulatos na população estadunidense
e que eles não eram inferiores aos brancos. De acordo com ele, “o número de americanos
excepcionais de sangue mulato é considerável, incluindo Frederick Douglas, Booker T. Washington,
o artista Henry O. Tenner e o escritor Charles W. Chestnut” (DU BOIS, 1936, p. 12).
Em 1930, surge a segunda geração de acadêmicos brasileiros. Eles estavam escrevendo
quando a migração europeia para o Brasil estava decrescendo. Era claro que, nesse tempo, o Brasil
não iria se tornar um país branco, mas um lugar com uma vasta proporção de pessoas negras
(uma categoria que incluía mulatos). Ademais, concepções biológicas de raça estavam sendo
abandonadas internacionalmente. Nesse contexto, acadêmicos brasileiros colocaram a
miscigenação no centro da identidade nacional do Brasil – negros, indígenas e os portugueses
eram exaltados como os três grupos que formaram a população brasileira, cada um contribuindo
com suas culturas (SCHWARCZ, 1993)25. Dois importantes representantes dessa geração foram
Arthur Ramos e Gilberto Freyre. Ramos era considerado a autoridade primária de estudos negros
no Brasil antes de Gilberto Freyre. Em 1934, ele publicou O Negro Brasileiro, um livro sobre a
cultura africana no Brasil com uma atenção particular na prática de religiões afro. Nesse livro,
Ramos alega que o problema negro do Brasil não estava relacionado a inferioridade biológica

25
As raízes do discurso que o Brasil foi formado por brancos, negros e indígenas foram criadas em 1844. Cf.
Schwarcz (1993).

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

racial, mas a problemas psicológicos26. Gilberto Freyre, como mencionado previamente, também
criticou as explicações biológicas para a diferença racial, mas simultaneamente argumentou que
existia uma harmonia racial no Brasil.
Seus trabalhos influenciaram o Estado brasileiro e as políticas raciais de 1930 até 1988.
Durante esse período, houve dois governos autoritários: a Era Vargas (1930-1945) e a ditadura
13
militar (1964-1985). Em ambos momentos, o governo usou o mito da democracia racial para
unificar a nação – isto é, para promover a ideia de um Brasil homogêneo e coeso em que a
população, especialmente a massa de pessoas negras, não precisavam reclamar da desigualdade
racial. Para promover essa suposta união, a miscigenação se tornou a base de uma nação
aparentemente sem raça e o mulato virou um símbolo nacional. Em outras palavras, políticas
raciais no Brasil mudaram do apagamento negro para a celebração mulata. Além disso, alguns
elementos da cultura africana foram incorporados em símbolos nacionais, mesmo que
transformados em folclore, enquanto centros culturais negros eram simultaneamente submetidos
à intensa vigilância do governo (ALENCASTRO, 1985; CARNEIRO, 2011; CONSORTE, 1999;
NASCIMENTO, 1978; PASCHEL, 2016).
Du Bois sabia dessa mudança acadêmica no Brasil. Em 1936, ele contatou acadêmicos na
América Latina para convidá-los a escrever a Encyclopedia of the Negro. Esse trabalho teria quatro
volumes reunindo textos de diferentes estudiosos sobre o negro na África e a sua diáspora,
representando um importante avanço para o pan-africanismo. No Brasil, Du Bois contatou Arthur
Ramos, que aceitou o convite para fazer parte do projeto27. Ramos enviou a Du Bois uma lista com
os maiores eventos relacionados a população negra no Brasil e em Portugal, e uma lista de
brasileiros (de qualquer raça) que tenham influenciado a vida de pessoas negras28.
Infelizmente, Du Bois não conseguiu financiamento suficiente para concluir o projeto.
Ainda assim, em 1940, ele compilou uma lista de temas que poderiam ser incluídos na

26
Arthur Ramos começou seu livro falando sobre pessoas negras dos Estados Unidos e a linha de cor, assim
como mencionado por Du Bois. Ele afirmava que “a linha de cor é tudo que divide duas raças em uma
grande e odiosa maneira” (RAMOS, 1934, p. 8, tradução nossa) e cidadãos estadunidenses negros estavam
reagindo ao aumento do linchamento através da música, dança e organizações como a Associação Nacional
para o Progresso de Pessoas de Cor – NAACP, “que são liderados por grandes autores negros como Du Bois,
Calverton, Brawley, Walter White, etc.” (RAMOS, 1934, p. 11, tradução nossa).
27
O contato foi feito por Rayford W. Logan, um acadêmico e ativista negro, em nome de Du Bois, o qual
estava viajando. Veja em carta de Rayford W. Logan para Richard L. Pattee, 10 de outubro de 1936. W. E. B.
Du Bois Papers (MS 312). Special Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst
Libraries.
28
Ramos, Arthur. Lista de maiores eventos que tem relação ao negro no Brasil e Portugal, 16 de março de
1937. W. E. B. Du Bois Papers (MS 312). Special Collections and University Archives, University of Massachusetts
Amherst Libraries. Ramos, Arthur. Lista de brasileiros de qualquer raça que influenciaram a vida negra, 16 de
março de 1937. W. E. B. Du Bois Papers (MS 312). Special Collections and University Archives, University of
Massachusetts Amherst Libraries.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

enciclopédia, assim como sugestões de nomes para escreverem sobre esses tópicos29. A lista
começou citando os trabalhos de Gilberto Freyre como referência para os estudos no Brasil. Ele
expressou que Freyre poderia ser o brasileiro com o número de artigos mais significante na
enciclopédia.
Portanto, o surgimento da segunda geração de estudos sobre raça no Brasil não alterou
14
negativamente a aliança entre Du Bois e esses estudiosos brasileiros. De fato, no Brasil, as elites
ainda precisavam romper com as teorias que definiam pessoas mestiças como inferiores, em
relação aos indivíduos de raça pura, para justificar a adoção da miscigenação como a formação
da identidade brasileira. Nos Estados Unidos, as Leis de Jim Crow estavam sendo fortemente
baseadas em teorias racistas que defendiam a segregação. Consequentemente, Du Bois ainda
considerava essencial a crítica aos discursos hegemônicos sobre miscigenação para provar que
outras políticas raciais eram possíveis.
Esse alinhamento não significa a ausência de conflitos. Enquanto o governo do Brasil estava
tentando embranquecer o país, especialmente antes da década de 1930, alguns afro-americanos
começaram uma onda de imigração para o país sul-americano buscando por um paraíso racial.
No marco do Brazilian American Colonization Syndicate (BACS), por exemplo, um grupo de afro-
americanos criaram uma companhia de desenvolvimento territorial para desencadear o processo
de povoação no Brasil (cf. MEADE; PIRIO, 1988). A presença de cidadãos estadunidenses negros
no Brasil era considerada indesejável para as elites brasileiras já que eles enegreceriam o país. Por
isso, havia dois grupos opositores em movimento: elites brasileiras que estavam tentando proibir
a entrada de pessoas negras (assim como de judeus e chineses) e afro-americanos que estavam
criando projetos para recolonizar o Brasil. A Constituição brasileira de 1891 proibia a entrada de
africanos e asiáticos no país. A Constituição de 1934 reforçou essas políticas, estabelecendo que
o número de imigrantes permitidos no Brasil deveria ser limitada considerando raça e etnia
(PASCHEL, 2016; PEREIRA, 2013). Nos Estados Unidos, grupos negros reagiram às publicidades
brasileiras de programas de imigração (provavelmente feitas para alcançar cidadãos
estadunidenses brancos). Esses programas ofereciam terra, assistência médica e transporte.
Portanto, eles se organizaram para migrar, publicando em jornais como o The Crisis e o Baltimore
Afro-American, anúncios incentivando afro-americanos a comprar terras no Brasil (ALBERTO, 2011;
NUNES, 2008; SEIGEL, 2009).
Como resultado, o governo brasileiro começou a negar vistos para afro-americanos.
Consequentemente, Du Bois escreveu tanto para o presidente do Brasil e para a Embaixada dos

29
Sugeriu tópicos com referências para o negro no Brasil, [194-]. W. E. B. Du Bois Papers (MS 312). Special
Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst Libraries.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

Estados Unidos no Brasil30. Em ambas as cartas, ele questionou se o governo brasileiro discriminou
cidadãos negros estadunidenses. Du Bois recebeu uma resposta de tal embaixada, a qual alegou
que não existia uma proibição específica para a entrada de afro-americanos no Brasil31. No
entanto, os vistos eram submetidos a uma aprovação administrativa e qualquer estrangeiro
poderia ser recusado baseado em uma ordem pública ou em interesses nacionais. Além disso, de
15
acordo com a carta, alguns afro-americanos tiveram sua entrada negada porque eles criaram uma
propaganda, com a finalidade de enviar pessoas para colonizar estados brasileiros. Du Bois
concluiu que o governo dos Estados Unidos intimidou o governo brasileiro a recusar pessoas
negras32. Em outras palavras, Du Bois acreditava que as práticas racistas no Brasil foram causadas
pela influência dos Estados Unidos ao invés do projeto brasileiro de embranquecimento. Logo,
apesar dos conflitos, a aliança entre Du Bois e as elites brasileiras continuou.

5 MOVIMENTOS AFRO-BRASILEIROS E O ELITISMO DE DU BOIS

Desde antes da abolição da escravatura no Brasil em 1888, grupos e associações afro-


brasileiros estavam lutando por uma cidadania plena. Além disso, a imprensa e a mobilização
política afro-brasileiras floresceram durante o século XX (DOMINGUES, 2007; FRANCISCO, 2014;
PINTO, 2018; SILVA, 2007). Os intelectuais e ativistas negros brasileiros frequentemente
contribuíram para o mito da democracia racial afirmando que o Brasil estava firmado na harmonia
entre grupos raciais (GUIMARÃES, 2004, 2019). No entanto, enquanto estudiosos, como Gilberto
Freyre, reproduziram essa ideia para argumentar que o racismo não existia no Brasil, os afro-
brasileiros relatavam o preconceito racial no país.
Alguns afro-brasileiros até declararam que a experiência de pessoas negras no Brasil era
pior do que nos Estados Unidos. Em 1993, por exemplo, o ativista e jornalista afro-brasileiro José
Correia Leite escreveu que "nós não linchamos negros, mas fazemos mais do que isso e
extinguimos completamente a raça negra, abandonando-a para a sífilis, para as doenças. [...] Os

30
Carta de W. E. B. Du Bois para o presidente da República do Brasil, 16 de novembro de 1926. W. E. B. Du
Bois Papers (MS 312). Special Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst
Libraries. Carta de W. E. B. Du Bois para a Embaixada dos Estados Unidos, Brasil, 21 de janeiro de 1927. W.
E. B. Du Bois Papers (MS 312). Special Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst
Libraries.
31
Carta da Embaixada dos Estados Unidos, Brasil para W. E. B. Du Bois, 10 de fevereiro de 1927. W. E. B. Du
Bois Papers (MS 312). Special Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst
Libraries.
32
Confira a carta de M. Denton Jr. para a NAACP, 29 de outubro de 1928. W. E. B. Du Bois Papers (MS 312).
Special Collections and University Archives, University of Massachusetts Amherst Libraries. Carta de W. E. B.
Du Bois para M. Denton Jr., 7 de novembro de 1928. W. E. B. Du Bois Papers (MS 312). Special Collections
and University Archives, University of Massachusetts Amherst Libraries.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

americanos lincham cinquenta negros por ano. Nós matamos a raça negra brasileira inteira" (LEITE
apud SEIGEL, 2009, p. 202–203). Os afro-brasileiros mobilizaram a ideia de um paraíso racial como
uma estratégia para demandar inclusão – não como uma forma de negar o racismo no Brasil. Em
outras palavras, eles alegavam que o preconceito que encaravam era anti-Brasil e anti-progresso
e, consequentemente, deveria ser eliminado (ALBERTO, 2011; CAMPOS, 2015; REIS, 2017).
16
Também, os afro-brasileiros criticavam afro-americanos que representavam o Brasil como
um paraíso racial. Voltando para a viagem da família Abbott no país sul-americano, Robert Abbott
fez discursos no Brasil afirmando que não existia racismo ali. A imprensa negra brasileira criticou
intensamente os argumentos dele. Abílio Rodrigues, por exemplo, escreveu que a igualdade racial
do Brasil defendida por Abbott era uma fantasia, nas suas palavras:

alguém vê em toda caminhada da vida que os negros precisam fazer, três vezes
mais o esforço para conseguir alcançar uma posição melhor. [...] em cada passo
nós colidimos com o preconceito que [...] esmaga o homem de cor. E nós
continuamos sendo minados pela ilusão de que a democracia real é a brasileira
porque é baseada nos princípios da igualdade humana. (RODRIGUES apud
NUNES, 2008, p. 130)

Além disso, Benedito Florêncio escreveu que "As conferências do Dr. Robert Abbott [...] não
resistem absolutamente a uma análise rigorosa, porque tem (sic) fundo vazio" (FLORÊNCIO apud
REIS, 2017, p. 64). Ele afirmou que o ódio contra pessoas negras não era demonstrado no Brasil
como era nos Estados Unidos, mas “daí a vir afirmar que não existe preconceito de cor no Brasil é
como negar a derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial" (FLORÊNCIO apud REIS, 2017, p.
64).
Mesmo com essa intensa mobilização e produção afro-brasileira, Du Bois não interagiu
com grupos afro-brasileiros. Ao invés disso, ele procurava se engajar com acadêmicos brasileiros
brancos. Por que Du Bois priorizou os relacionamentos com os estudiosos brasileiros brancos e
não com intelectuais e ativistas brasileiros negros? Mesmo a agenda compartilhada entre Du Bois
e as elites brasileiras relacionada a miscigenação sendo um fator, a questão acima ainda precisa
ser respondida.
Duas hipóteses devem ser exploradas. A primeira é de que Du Bois não sabia da
mobilização afro-brasileira. Em relação a esse problema, é importante lembrar que os
compartilhamentos transnacionais entre os sujeitos da diáspora africana não são simétricos. Micol
Seigel (2009), por exemplo, demonstrou que o imperialismo impacta o compartilhamento
internacional de informação e produtos, então as notícias do Norte Global circulam com mais
frequência no Sul Global do que o inverso. Em relação à imprensa negra, ela escreve que

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília
os limites sociais da imprensa negra estadunidense e brasileira não permitiram
que seus representantes tivessem interações niveladas. O poder global era
desbalanceado nas notícias, nas indústrias de entretenimento, nas publicações, na
aquisição de língua estrangeira e na riqueza bruta estruturada, até mesmo na
imprensa... (SEIGEL, 2009, p. 183)

17
Devido a esse relacionamento assimétrico, notícias da mobilização cultural e política nos
Estados Unidos iriam chegar mais facilmente no Brasil do que vice-versa.
No entanto, é improvável que Du Bois não estivesse a par da mobilização afro-brasileira.
Quando Arthur Ramos enviou a Du Bois uma lista com os maiores eventos relacionados às pessoas
negras no Brasil e em Portugal, ele mencionou intelectuais e grupos afro-brasileiros, como a Frente
Negra Brasileira (FNB) – uma organização nacional afro-brasileira criada em 1930. Além disso,
Petrônio Domingues demonstrou que a FNB era vastamente conhecida pelo público negro nos
Estados Unidos e ainda tinha sido ilustrada em alguns jornais negros estadunidenses como "a mais
poderosa organização em toda América do Sul" (DOMINGUES, 2013, p. 156).
Então, a segunda hipótese sobre o porquê Du Bois priorizou o diálogo com acadêmicos
brasileiros brancos deve ser explorada. Essa hipótese aponta as desigualdades que limitavam as
possibilidades de afro-brasileiros se engajarem nas trocas de informação transnacional e o elitismo
de Du Bois. Flávio Thales Ribeiro Francisco (2010), em sua pesquisa sobre o diálogo afrodiaspórico
com o foco no Brasil e nos Estados Unidos durante o começo do século XX, argumenta que houve
duas esferas em que esse diálogo acontecia. Relações acadêmicas caracterizavam a primeira. A
segunda esfera era representada por jornais negros e a atividade jornalística de ativistas negros.
Os afro-brasileiros raramente podiam participar da primeira esfera. No Brasil, pessoas negras, até
mesmo aquelas com melhores condições econômicas, eram excluídas de escolas e universidades
(cf. MACHADO, 2009; NASCIMENTO, 1978). Por isso, os afro-brasileiros encaravam obstáculos para
participar na esfera acadêmica. No entanto, Francisco declara que eles participavam no diálogo
transnacional da imprensa negra, que era mais aberta aos grupos populares e individuais.
Mesmo que Du Bois fosse o editor da The Crisis por muitos anos, ele priorizou a esfera
acadêmica, em detrimento da esfera jornalística/popular, enquanto se engajava com o Brasil. Para
entender o porquê isso ocorreu, nós precisamos considerar a sua perspectiva elitista. É bastante
reconhecido que Du Bois tinha uma forte veia elitista no começo da sua carreira33. Essa veia é
demonstrada em um dos seus textos mais conhecidos The Talented Tenth (1903). Nesse texto, Du
Bois alegou que a elite negra deveria ser desenvolvida por meio da educação superior e essa elite
educada deveria liderar as massas para o progresso. Logo, ele distinguiu as massas negras,

33
Isto muda quando ele se aproximou do Marxismo e de movimentos comunistas. Cf. Du Bois (1952).

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

compostas por pessoas retrógradas e incapazes, e o povo negro, por sua vez, uma classe civilizada
e educada que deveria ser a líder das massas34 (cf. GOODING-WILLIAMS, 2010).
Levando isso em consideração, nós podemos supor que Du Bois preferia se engajar com
homens formalmente educados e estudiosos reconhecidos, priorizando a esfera acadêmica.
Considerando isso, os brasileiros negros eram excluídos de espaços educacionais e os acadêmicos
18
brasileiros eram majoritariamente brancos, ele se aproximou mais de estudiosos brasileiros
brancos do que de intelectuais e ativistas afro-brasileiros. Em outras palavras, Du Bois
provavelmente priorizou o relacionamento com estudiosos brasileiros brancos porque ele se
identificava como um membro da elite acadêmica, um grupo ao qual os afro-brasileiros eram
excluídos.

6 RUMO A UMA CONCLUSÃO

Nesse artigo, eu explorei as contribuições de Du Bois para a promoção do mito da


democracia racial até aproximadamente 1940. Além disso, discorri sobre as razões pelas quais ele
se engajou com uma suposição tão errônea. Durante esse período, Du Bois e outros afro-
americanos defenderam uma imagem do Brasil como um paraíso racial a fim de desafiar as
políticas raciais dos Estados Unidos. Além do mais, Du Bois se alinhou com elites brasileiras em
defesa da miscigenação e o elitismo de Du Bois impossibilitou seu diálogo com os afro-brasileiros.
No entanto, é inegável que as intenções de Du Bois estavam relacionadas à libertação negra. Logo,
em conclusão, exploro o que nós podemos aprender com essa experiência para construir um
projeto de libertação afrodiaspórico.
Como uma das figuras principais do pan-africanismo, Du Bois acreditava que as pessoas
negras compartilhavam uma história e um destino devido a escravidão (DU BOIS, 1915, 1947,
1987). Para ele, a linha de cor era um problema global e pessoas negras (e outras pessoas de cor)
apenas poderiam ser livres quando o mito da superioridade branca fosse derrotado ao redor do
mundo. Du Bois também acreditava que a solidariedade e cooperação internacional negra eram
naturais. Para ele, pessoas negras compartilhavam uma identidade comum baseada na sua
opressão e, consequentemente, uma irmandade entre esses de sangue negro poderia ser
facilmente alcançada (cf. VALDEZ, 2019).
Em décadas passadas, vários estudiosos têm demonstrado que a solidariedade diaspórica
negra não é desenvolvida naturalmente (EDWARDS, 2001; LAO-MONTES, 2007; PATTERSON;
KELLEY, 2000). A expansão colonial e capitalista não foi uniforme em tempo e espaço, criando
sistemas conectados, mas diferentes através de limites nacionais. Consequentemente, experiências

34
NDT: no artigo original, a dualidade é entre os verbetes “masses” e “folk”, traduzidos respectivamente
aqui, para massas e povo.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

negras são diferentes através do tempo e do espaço, e os laços que ligam a diáspora não são
inevitáveis, mas sim historicamente constituídos. Baseado nisso, estudiosos também têm
argumentado que as assimetrias globais entre as populações negras impactam a solidariedade
diaspórica (CAMPT; THOMAS, 2008; KELLEY, 2000). Por exemplo, a posição das pessoas negras no
capitalismo global permite que alguns negros tenham mais acesso a circulação através das
19
fronteiras nacionais que outros, o que cria assimetrias entre populações negras que podem
desafiar o entendimento e a solidariedade diaspórica.
O relacionamento de Du Bois com o Brasil exemplifica a importância da consideração
dessas assimetrias. Como mencionado anteriormente, afro-americanos e afro-brasileiros não
interagem no diálogo transnacional em posições iguais. Países imperialistas usam condições
econômicas (como o controle sobre indústrias de entretenimento e companhias publicitárias) para
impor suas agendas a esses lugares. Devido a essa desigualdade global, afro-americanos têm mais
acesso a plataformas as quais divulgam suas experiências através do mundo do que afro-
brasileiros. Além disso, enquanto afro-americanos como Robert Abbott podiam viajar para o Brasil
e disseminar suas experiências, afro-brasileiros careciam de capital econômico e social para viajar
aos Estados Unidos no começo do século XX. De fato, viajar ao exterior era uma oportunidade
acessível exclusivamente às elites brasileiras. Diferentemente dos afro-brasileiros, acadêmicos
brasileiros brancos como Gilberto Freyre e Arthur Ramos viajaram aos Estados Unidos para
compartilhar seus estudos. Todavia, até mesmo esses estudiosos encararam desafios para viajar
ao exterior devido às desigualdades globais (GUIMARÃES, 2008, 2019; OLIVEIRA, 2019).
Nesse contexto, notícias sobre as experiências de afro-americanos circulavam mais do que
informações sobre a situação dos afro-brasileiros (além disso, essa informação era
frequentemente mediada por acadêmicos brasileiros brancos). Como previamente discutido, isso
não impediu Du Bois de se atentar à mobilização afro-brasileira. Não obstante, provavelmente
influenciado pelas desigualdades na troca de informação global, Du Bois analisou o Brasil baseado
na sua própria experiência e na agenda política. Ele ilustrou o Brasil como um paraíso racial para
promover diferentes políticas raciais nos Estados Unidos. Para fazer isso, Du Bois negligenciou as
variâncias nas experiências afro-americanas e afro-brasileiras, transformando experiências afro-
americanas em um padrão de mensura para definir o racismo antinegro. Para ser mais específico,
a luta contra a segregação marcou a sua experiência. No Brasil, ao contrário, não existia
segregação. Isto não significa que o racismo não existia, apenas era performado de maneira
diferente. Porém, Du Bois interpretou isso como uma superação da linha de cor, e
consequentemente, definiu o Brasil como um paraíso racial que poderia ser usado para se opor
às políticas raciais do governo dos Estados Unidos.
Também, a posição do povo no capitalismo global impacta quem é considerado branco,
afetando o diálogo e a solidariedade afrodiaspórica. Como discutido antes, as elites
estadunidenses racializam a população dos países que eles dominam (NUNES, 2008). Em relação

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

ao Brasil, isto ocorre por meio da competição entre dois projetos raciais. Enquanto as elites
brasileiras procuravam embranquecer a população por meio da miscigenação, as elites dos
Estados Unidos promoviam a segregação e as políticas anti-miscigenação. Ao passo que a atitude
imperial estadunidense se estendeu para o Brasil, o projeto racial brasileiro foi rejeitado pelas
forças estadunidenses. As elites brasileiras foram classificadas como mestizas/não-brancas e
20
acusadas de criar uma população vira-lata por meio da miscigenação.
Isso facilitou a aliança entre Du Bois e as elites brasileiras. O primeiro lutou contra a
violência antinegra nos Estados Unidos, criticando leis segregacionistas, definições biológicas de
raça e discursos anti-miscigenação. As últimas lutavam contra o imperialismo estadunidense e
seus componentes raciais. Porém, as elites brasileiras não tinham intenção de acabar com a
antinegritude, mas assegurar seu status internacional enquanto pessoas brancas. Em outras
palavras, a libertação afro-brasileira não estava na agenda das elites brasileiras. Por isso, Du Bois
e as elites brasileiras tiveram uma convergência devido a sua posição no capitalismo global: ambos
estavam lutando contra a regra imperialista dos EUA e seu discurso anti-miscigenatório. No
entanto, afro-brasileiros lutavam contra essas políticas, o imperialismo estadunidense e também
contra as elites brasileiras.
Logo, a agenda pan-africana de Du Bois relativa ao Brasil foi ofuscada pelas desigualdades
globais e o poder desbalanceado nas Américas. Consequentemente, isto exemplifica a importância
em considerar assimetrias entre as pessoas negras e como elas podem desafiar a solidariedade
afrodiaspórica. Finalmente, o relacionamento de Du Bois com o Brasil nos ensina uma valiosa lição
acerca da solidariedade transnacional. Transnacionalismo negro não é automático. Nós
precisamos construí-lo, e para isso, nós precisamos dedicar tempo, trabalho, esforço, suor –
tratando as diferenças entre comunidades negras seriamente.

AGRADECIMENTOS

Essa pesquisa foi apoiada pelo W. E. B. Du Bois Center na Universidade de Massachusetts em


Amherst. Eu gostaria de agradecer aos professores Lao-Montes, Battle-Baptiste, de Leon e Bracey,
e aos membros da 2020 UMass Sociology Graduate Program Writing Seminar pelos seus
comentários.

INFORMAÇÕES SOBRE A AUTORA

Juliana Góes é doutoranda em Sociologia na Universidade de Massachusetts em Amherst (UMass


Amherst), se graduou em Ciência Política na Universidade de Brasília e é mestre em Ciência Política
pela Universidade Federal de Minas Gerais. Seu foco de pesquisa é raça, teoria decolonial,
movimentos sociais e gênero. Atualmente está trabalhando no livro Du Bois on Latin America and

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

the Caribbean: Trans-American Pan-Africanism and Global Sociology, no qual é co-autora com
Agustin Lao-Montes e Jorge Vasquez. Além disso, é uma das candidatas ao certificado de Africana
Studies pelo W.E.B. Du Bois Center e ao certificado Larin American Studies pelo Center of Latin
American, Caribbean and Latino Studies, ambos fornecidos pela UMass Amherst. Contato:
jgoes@unmass.edu.
21

AVISO

A tradução deste artigo foi realizada no âmbito do projeto Laboratório de Estudos Afrocentrados
em Relações Internacionais – LACRI, vinculado ao Instituto de Relações Internacionais da
Universidade de Brasília, com a finalidade de uso didático em reuniões de estudo e pesquisa. A
referência a esse texto deve ser obrigatoriamente empregada em citação ao artigo original em
inglês. No entanto, qualquer equívoco ou inconsistência, são de responsabilidade da autora; neste
sentido, vale-se também consultar o manuscrito original.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALBERTO, Paulina L. Terms of Inclusion: Black Intellectuals in Twentieth-Century Brazil. Chapel Hill:
University of North Carolina Press, 2011. DOI: 10.5149/9780807877715_alberto.
ALENCASTRO, Luiz Felipe De. Geopolítica da mestiçagem. Novos Estudos CEBRAP, v. 11, p. 49–64, 1985.
CAMPOS, Luiz Augusto. “O negro é povo no Brasil”: afirmação da negritude e democracia racial em alberto 22
guerreiro ramos (1948-1955). Caderno CRH, v. 28, n. 73, p. 91–110, 2015. DOI: 10.1590/S0103-
49792015000100007.
CAMPT, Tina; THOMAS, Deborah A. Gendering Diaspora: Transnational Feminism, Diaspora and its
Hegemonies. Feminist Review, v. 90, n. 1, p. 1–8, 2008. DOI: 10.1057/fr.2008.41.
CARNEIRO, Sueli. Racismo, Sexismo E Desigualdade No Brasil. São Paulo: Selo Negro, 2011.
CERQUEIRA, Daniel et al. Atlas da violência. Brasília: IPEA, 2017.
CONSORTE, Josidelth Gomes. A Mestiçagem no Brasil: Armadilhas e Impasses. Revista Margem, v. 10, p.
107–117, 1999.
COSTA, Sérgio. A mestiçagem e seus contrários: etnicidade e nacionalidade no Brasil contemporâneo.
Tempo Social, v. 13, n. 1, p. 143–158, 2001. DOI: 10.1590/S0103-20702001000100010.
DOMINGUES, Petrônio. O mito da democracia racial e a mestiçagem no Brasil (1889-1930). Diálogos
Latinoamericanos, v. 10, p. 116–131, 2005.
_______. Movimento negro brasileiro: alguns apontamentos históricos. Tempo, v. 12, n. 23, p. 100–122,
2007. DOI: 10.1590/S1413-77042007000200007.
_______. Como se fosse Bumerangue: Frente Negra Brasileira no circuito transatlântico. Revista Brasileira
de Ciências Sociais, v. 28, n. 81, p. 155–170, 2013. DOI: 10.1590/S0102-69092013000100010.
DU BOIS, William Edward Burghardt. Papers Special Collections and University Archives, University of
Massachusetts Amherst Libraries. [s.d.]. Disponível em: http://scua.library.umass.edu/.
_______. The talented tenth. Nova York: James Pott and Company, 1903.
_______. The Crisis, v. 7, p. 286–287, 1914.
_______. The Negro. Nova York: Henry Holt and Company, 1915.
_______. Baltimore Afro-American. In: Special Collections and University Archives, University of
Massachusetts Amherst Libraries., 1916.
_______. Miscegenation. In: Unpublished Manuscript, Special Collections and University Archives,
University of Massachusetts Amherst Libraries., 1936.
_______. The Pan-African Movement. In: PADMORE, George (org.). Colonial and Coloured Unity: A
Programme of Action / History of the Pan-African Congress. Londres: The Hammersmith Bookshop
Ltd, 1947. p. 13–26.
_______. In Battle for Peace: The Story of My 83rd Birthday. Londres: Oxford University Press, 1952.
_______. The Conservation of Races. In: CHANDLER, Nahum Dimitri (org.). The Problem of the Color Line
at the Turn of the Twentieth Century. Nova York: Fordham University Press, 1987. p. 51–66.
EDWARDS, Brent Hayes. The Uses of Diaspora. Social Text, v. 19, n. 1, p. 45–73, 2001. DOI:
10.1215/01642472-19-1_66-45.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília
ESCÓSSIA, Fernanda De. A Cada 23 Minutos, Um Jovem Negro é Assassinado no Brasil, diz CPI. BBC News,
2016. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-36461295. Acesso em: 31 jul. 2021.
FRANCISCO, Flávio Thales Ribeiro. Fronteiras em defnição: Identidade negra e imagens dos Estados
Unidos e da África no jornal “O Clarim d’Alvorada” (1924-1932). 2010. Universidade de São Paulo,
2010.
_______. O novo negro em perspectiva transnacional: Representações afro- americanas sobre o Brasil 23
e a França no jornal Chicago Defender (1916-1940). 2014. Universidade de São Paulo, 2014.
FREYRE, Gilberto. Casa-Grande e Senzala: A Formação da Família Brasileira sob o Regime da
Economia Patriarcal. São Paulo: Editora Global, 1933.
_______. Sobrados e Mucambos: Decadência do Patriarcado Rural e Desenvovlimento do Urbano. São
Paulo: Editora Global, 1936.
GONZALEZ, Lélia. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Revista Ciências Sociais Hoje (Anpocs), p.
223–244, 1984.
GOODING-WILLIAMS, Robert. The Shadow of du Bois: Afro-modern Political Thought in America.
Cambridge: Harvard University Press, 2010. DOI: 10.2307/j.ctvjhzqcr.
GUIMARÃES, Antonio Sérgio Alfredo. Intelectuais negros e formas de integração nacional. Estudos
Avançados, v. 18, n. 50, p. 271–284, 2004. DOI: 10.1590/S0103-40142004000100023.
_______. Africanism and Racial Democracy: The Correspondence Between Herskovits and Arthur Ramos
(1935-1949). EIAL: Estudios Interdisciplinarios de America Latina y el Caribe, v. 19, n. 1, p. 53–79, 2008.
_______. A Democracia Racial Revisitada. Afro-Ásia, v. 60, p. 9–44, 2019.
HANCHARD, Michael. Orpheus and Power: The Movimento Negro of Rio de Janeiro and São Paulo,
Brazil, 1945-1988. Princeton: Princeton University Press, 1994.
HELLWIG, David J. Racial Paradise or Run-Around? Afro-North American Views of Race Relations in Brazil.
American Studies, v. 31, n. 2, p. 43–60, 1990.
HOOKER, Juliet. Theorizing Race in the Americas. Londres: Oxford University Press, 2017. DOI:
10.1093/acprof:oso/9780190633691.001.0001. Disponível em: https://academic.oup.com/book/5866.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Desigualdes Sociais por Cor ou Raça no
Brasil. Estudos e Pesquisas, Informação Demográfica e Socioeconômica, v. 41, p. 1–12, 2019.
_______. Características Gerais Dos Domícilios e Dos Moradores 2019. Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicilios Contínua, 2020. Disponível em:
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101707_informativo.pdf. Acesso em: 31 jul. 2021.
KELLEY, Robin D. G. How the West was One: On the uses and Limitations of Diaspora. The Black Scholar,
v. 30, n. 3–4, p. 31–35, 2000. DOI: 10.1080/00064246.2000.11431106.
LACERDA, João. The métis, or half-breeds, of Brazil. In: SPILLER, Gustav (org.). Papers on Inter-Racial
Problems Communicated to the First Universal Races Congress Held at the University of London,
July 26-29, 1911. Londres: P.S. King and Son, 1911. p. 377–382.
LAO-MONTES, Agustin. DECOLONIAL MOVES. Cultural Studies, v. 21, n. 2–3, p. 309–338, 2007. DOI:
10.1080/09502380601164361.
MACHADO, Carlos Eduardo Dias. População negra e escolarização na cidade de São Paulo nas
décadas de 1920 e 1930. 2009. Universidade de São Paulo, 2009.

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília
MEADE, Teresa; PIRIO, Gregory Alonso. In Search of the Afro-American “Dorado”: Attempts by North
American Blacks to Enter Brazil in the 1920s. Luso-Brazilian Review, v. 25, n. 1, p. 85–110, 1988.
MUNANGA, Kabengele. Rediscutindo a Mestiçagem No Brasil: Identidade Nacional Versus Identidade
Negra. Petrópolis: Editora Vozes, 1999.
NASCIMENTO, Abdias. O Genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado. Rio de
Janeiro: Editora Paz e Terra, 1978. 24
NUNES, Zita. Cannibal Democracy: Race and Representation in the Literature of the Americas.
Minneapolis: University of Minnesota Press, 2008.
OLIVEIRA, Amurabi. Afro-Brazilian Studies in the 1930s: Intellectual Networks between Brazil and the USA.
Brasiliana: Journal for Brazilian Studies, v. 8, n. 1–2, p. 32–49, 2019. DOI: 10.25160/bjbs.v8i1-2.114694.
PASCHEL, Tianna S. Becoming Black Political Subjects. Princeton: Princeton University Press, 2016. DOI:
10.23943/princeton/9780691169385.001.0001.
PATTERSON, Tiffany Ruby; KELLEY, Robin D. G. Unfinished Migrations: Reflections on the African Diaspora
and the Making of the Modern World. African Studies Review, v. 43, n. 1, p. 11, 2000. DOI:
10.2307/524719.
PEREIRA, Amilcar Araújo. O Mundo Negro: Relações Raciais e a Constituição do Movimento Negro
Compoterâneo no Brasil. Rio de Janeiro: Pallas Editora, 2013.
PINTO, Ana Flávia Magalhães. Escritos de Liberdade: Literatos Negros, Racismo e Cidadania no Brasil
Oitocentista. Campinas: Editora Unicamp, 2018.
RAMOS, Arthur. O Negro Brasileiro. São Paulo: Civilização brasileira, 1934.
REIS, Ruan Levy Andrade. Letras De Fogo, Barreiras De Lenha: A Produção Intelectual Negra Paulista
Em Movimento (1915-1931). 2017. Universidade de São Paulo, 2017.
ROCHA, Vera da Silva. Mestiçagem Na Bahia: Um Estudo Sobre A Construção da Identidade Na
Cidade de Salvador. 2010. Universidade Federal da Bahia, 2010.
ROOSEVELT, Theodore. Brazil and the Negro. The Outlook, v. February, n. 21, p. 409–411, 1914.
SANSONE, Livio. USA and Brazil in Gantois: Power and the Transnational Origin of Afro-Brazilian Studies.
Vibrant: Virtual Brazilian Anthropology, v. 8, n. 1, p. 536–567, 2011.
SCHWARCZ, Lilia K. Mortiz. O Espetáculo das Raças: Cientistas, Instituições e a Questão Racial no
Brasil do século XIX. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 1993.
_______. Usos e abusos da mestiçagem e da raça no Brasil: uma história das teorias raciais em finais do
século XIX. Afro-Ásia, v. 18, p. 77–101, 1996.
SEIGEL, Micol. UUneven Encounters: Making Race and Nation in Brazil and the United States. Durham:
Duke University Press, 2009. DOI: 10.1215/9780822392170.
SILVA, Graziella M.; PAIXÃO, Marcelo. Mixed and Unequal: New Perspectives on Brazilian Ethnoracial
Relations. In: TELLES, Edward (org.). Pigmentocracies: Ethnicity, Race and Color in Latin America.
Chapel Hill: UNC Press Books, 2014. p. 172–214.
SILVA, Luiz. E Disse o Velho Militante José Correira Leite. São Paulo: Noovha América, 2007.
SOUZA, Neuza Santos. Tornar-se Negro. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1983.
TELLES, Edward. Pigmentocracies: Ethnicity, Race, and Color in Latin America. Chapel Hill: UNC Press

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb
Laboratório de Estudos Afrocentrados em Relações Internacionais
Instituto de Relações Internacionais
Universidade de Brasília
Books, 2014.
VALDEZ, Inés. Transnational Cosmopolitanism: Kant, Du Bois, and Justice as a Political Craft. Nova
York: Cambridge University Press, 2019. DOI: 10.1017/9781108630047.
WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da violência 2015: Homicídio de mulheres no Brasil. Brasília: FLACSO,
2015.
25

Campus Universitário Darcy Ribeiro – Prédio do IREL, Asa Norte, Brasília/DF – CEP: 70910-900
lacriunb@gmail.com @lacriunb

Você também pode gostar