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Gusmão, Gisela de O .
Resumo
Palavras-Chave
Racismo; Genocídios; Etnocídio e Epistemicídios; Contra-Colonialidade; Decolonialidade.
Introdução
A colonização tem sido um tema de estudo bastante complexo. Neste trabalho, mantive
o foco na escuta não de dois grandes autores, grandes representantes da população
negre, mas especialmente à suas histórias de vida, que se configuram em grandes
ensinamentos e num arsenal de provas do crime de racismo. Pelo ponto de vista de
Nogueira (2020), colonização diz respeito a um processo de produção de inferioridade
e de alienação do colonizado, impondo ‗valores civilizatórios universalistas‘ a fim de
difundir a ideia de superioridade do colonizador, justificando sua intervenção. Desta
forma, a colonização é percebida como um benefício aos colonizados, vistos como
selvagens e primitivos, enquanto ao colonizador é conferido o título de herdeiro legítimo
dos bons valores. A esse respeito, Santos (2015) converge citando em seu livro, muitas
passagens do relatório do descobrimento do Brasil, bem como trechos bíblicos que
demonstram com muita força o sentimento de discriminação e de julgamento raso dos
invasores em relação aos povos originários. Ambos os autores, afirmam que não
somente o processo de colonização do Brasil, mas de outros territórios e populações,
não teria sido possível sem o trabalho da igreja católica. A fim de distanciar-se do
senso comum e da história do racismo escrita por brancos, Santos (2015) usa uma
terminologia própria, como por exemplo, ao referir-se aos brancos, diz ―euro cristãos
monoteístas‖. Este texto se propõe a expressar minhas reflexões a respeito do que
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Psicóloga, mestranda do PPGECCO – UFMT.
pude apreciar nos vídeos do tão relevante projeto ‗Vozes Contra os Genocídios‘ do
qual participei como aluna, e, me convidou a reflexões muito profundas a respeito da
minha vida, como brasileira miscigenada e estigmatizada por ser filha de mãe branca e
pai mestiço. Uma união que contrariou as minhas duas famílias e a sociedade. Eu vivi a
falácia construída por autores bastante relevantes que, desde o século XIX como
descreve Santos (2015) de um Brasil sem racismo, de harmonia entre as raças.
Portanto, escolhi esse tema a fim de compreender um pouco melhor a minha própria
existência. E, foi uma experiência maravilhosa, por meio da qual aprendi muito e tive a
oportunidade de me aproximar mais desses dois mestres que tanto têm contribuído
para a decolonialidade e a contra-colonialidade, expressões que serão melhor
abordadas no decorrer do texto.
Além disso, de acordo com o autor, trata-se de um ritual para o qual as pessoas
se preparam com banhos, tranquilizando seu espírito, sua mente e sintonizando com
toda a atmosfera do ritual, embalado por cânticos e rezas.
‗Babalorixá é a minha camada de negritude enquanto professor é a minha
camada de branqueamento‘. Com essas palavras, Pai Sidney de Xangô, inicia uma
profunda reflexão a respeito do apagamento e da imposição cultural do projeto
colonialista humanista civilizatório e diz que ser Babalorixá foi o que lhe restou por
direito dos valores da África ancestral. Apresenta-se orgulhosamente como uma
pessoa preta e de fala decolonial, da qual garante sua expressividade livre,
considerando que durante muito tempo, como pessoa negra, teve que ouvir o que não
queria. Reconhece que a realidade do racismo no Brasil ainda pretende calar a ele e ao
seu povo, mas tanto ele como alguns outros, falam porque furaram a máscara da negra
Anastácia (PPGECCO UFMT, 2021, aula 4, 05‘56‖-11‘30‖).
Considerando que os idiomas predominantes sempre foram as línguas hindu-
européias, quando Pai Sidnei de Xangô entrou no doutorado e decidiu estudar a língua
Nago Ketu, durante uma apresentação num congresso, foi advertido para deixar o
Babalorixá fora da academia, e, se sentiu profundamente afrontado. Falando do lugar
de vítima de um crime, racismo religioso, reflete o porquê um padre ou um pastor
nunca necessitaram deixar sua religião de fora. Pai Sidnei de Xangô explica que
quando o Brasil foi colonizado já existia aqui uma civilização de 4 mil anos e os
Africanos eram uma civilização de 6 mil anos, sendo inconcebível a negação de sua
epistemologia civilizatória e todo o epistemicídio, e o etnocídio que objetivou o
apagamento das suas ancestralidades bem como o seu genocídio (PPGECCO UFMT,
2021, aula 4, 22‘00‖-22‘28‖). A esse respeito, Munanga (2003) nos recorda de que a
Bíblia ignorava a existência dos índios e os negros eram estigmatizados.
Para aceitar a humanidade dos ―outros‖, era preciso provar que são também
descendentes do Adão, prova parcialmente fornecida pelo mito dos Reis
Magos, cuja imagem exibe personagens representes das três raças, sendo
Baltazar, o mais escuro de todos considerado como representante da raça
negra. Mas o índio permanecia ainda um incógnito, pois não incluído entre os
três personagens representando semitas, brancos e negros, até que os
teólogos encontraram argumentos derivados da própria bíblia para demostrar
que ele também era descendente do Adão. (MUNANGA, 2003, p. 2)
Munanga (2003) nos provoca quando afirma que a etnia não é uma ‗entidade
estática‘, mas trás em si uma história, desde a sua origem evoluindo no tempo e no
espaço, como no caso dos afro-brasileiros, e, um olhar cuidadoso para a história de
todos os povos, revela que as etnias nascem e desaparecem de tempos em tempos. E,
ainda fortemente impregnados pelas visões biológica e genética, mudam-se apenas os
termos. Segundo o autor, Por esse prisma, é possível falar de novas etnias ou etnias
contemporâneas.
Um exemplo impressionante de resistência, que teve início a mais de 200 anos,
é contado pela Sra. Maria Aparecida Mendes - Coordenadora Nacional de Articulação
das Comunidades Rurais Quilombolas/CONAQ, sobre a comunidade Conceição das
Crioulas/PE, cuja fundação se deu pela chegada de N. S. da Conceição, trazida por um
senhor, acompanhado de 6 mulheres negras que fizeram a promessa de que se não
fossem escravizadas construiriam uma igreja em nome da Santa. Com o tempo o
território começou a ser invadido por pessoas comuns e mais tarde por fazendeiros que
iludiram alguns para o trabalho sem pagamento ou como mão-de-obra barata. Mas, um
grupo de resistência, formado em torno de lideranças e da importante luta das
mulheres, conseguiu realizar uma grande transformação nessa comunidade. O esforço
para que as jovens estudassem para desenvolver a educação local para além do
curriculum tradicional, mantendo sua história e seus costumes, e o seu trabalho na
cooperativa de artes manuais produzindo utensílios de cerâmica e bonecas de sisal,
que de acordo com o Sr. Pedro Reis - Vice-presidente do Conselho Municipal de
Promoção de Igualdade Racial – CMPIR, tem uma forte relação com a ancestralidade e
essa comunidade é a única que tem mantido o artesanato em sisal. A forma com que
elas trabalham favorece a conservação da biodiversidade pela visão ancestral que
mantem da relação com a natureza (PPGECCO UFMT, 2021, aula 9, 16‘00‖-31‘55‖).
Essa relação com a terra, a partir da lógica sustentável, é descrita por Santos
(2015) como Biointeração e é englobada pelo seu conceito de Cosmovisão. De uma
forma bastante poética, o autor diz ter aprendido com os mestres e as mestras que o
melhor lugar para guardar a mandioca é na terra. Portanto, o que se tira é para uso e
para repartir. Segundo ele, a relação de biointeração é de comunhão prazerosa com a
terra, ao contrário de Adão e seus descendentes, que foram condenados pelo ‗Deus
Bíblico‘, á fadiga para produzir o alimento. E, continua a seguir.
A história da luta pela identidade contada pela Sra. Maria Aparecida Mendes,
trás claramente a forma de manipulação que ataca os aspectos psicológicos e morais
de um povo subalternizado, como na sua fala de aos olhos dos de fora, o território é
pobre, bem como o seu povo. Mas, ao contrário, ela afirma que quando se uniram a
outros grupos que estavam mais avançados na luta por seus direitos, entenderam que
o território sim é rico e o que lhes faltava era a acessibilidade aos serviços básicos dos
quais foram excluídos. Passando a integrar comissões de discussões a respeito das
políticas públicas, conquistaram não somente o reconhecimento de pelo menos parte
do seu território, como também educação e serviços, para alcançarem o
desenvolvimento que tem hoje. Quando a Sra. Maria Aparecida Mendes fala do que
produzem, reitera que, de fato, é a natureza que produz e o êxito da comunidade é
fruto da relação de respeito entre o seu povo e a natureza. Rompendo essa relação
ancestral com a natureza estariam aceitando o projeto dos Governos que é matar seu
povo, quando os empurram para as grandes cidades para viverem em favelas.
(PPGECCO UFMT, 2021, aula 9, 01‘00‖-‖).
Percebe-se nos depoimentos e reflexões desses líderes e mestres que
participaram do projeto ‗Vozes Contra os Genocídos: Perspectivas Contemporâneas‘,
que de fato parece equivocado o conceito de mestiçagem e harmonia entre as raças,
que predominou até meados do século XX, segundo Ortiz (1986) ignorou o preconceito
à mestiçagem por ignorar a problemática racial. Em busca de uma identidade nacional,
mecanismo sutil de adequação dos colonizados, como numa suposta evolução do
Candomblé para a Umbanda como descreve (ORTIZ, 1986, P. 108) ―A macumba e a
umbanda representariam o momento em que a superestrutura se adaptaria ao
processo de transformação da história brasileira, isto é, as ideias africanas se
adequariam pouco a pouco à totalidade nacional‖.
Considerações
Referências