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Proteção contra Descargas Atmosféricas de

Redes de Distribuição de Baixa Tensão


M. A. Ravaglio, J. C. Schaefer , L. R. A. Gamboa, R. L. Araújo, LACTEC
C.L. Silva Pinto e R.P. de Oliveira, COPEL Distribuição

RESUMO: Este artigo apresenta os principais resultados obtidos O nível de isolamento de linhas de distribuição de tensão
no projeto “Proteção contra Descargas Atmosféricas de Redes de igual ou inferior a 34,5 kV é insuficiente para suportar
Baixa Tensão do Sistema de Distribuição da COPEL”. Foram tensões por descargas diretas ou próximas, ou mesmo de
levantados dados estatísticos de equipamentos da concessionária e
descargas em cabos pára-raios, empregados em alguns
de consumidores, danificados por descargas atmosféricas no
sistema de distribuição. Foi avaliada a conformidade de
casos. Nestas linhas, especialmente as sem essa proteção, as
supressores de surtos comerciais com a norma IEC 61643-1 (1998) descargas atmosféricas aparecem como a principal causa de
e levantada a suportabilidade de equipamentos de informática e problemas em regiões de alta densidade de descargas, como
eletrodomésticos, frente a surtos atmosféricos, com base na norma acontece em redes rurais.
IEC 61000-4-5 (1995). Adicionalmente, foram avaliadas as
sobretensões desenvolvidas em redes de distribuição de tamanho Formas de onda de correntes de descargas atmosféricas
reduzido, tanto por ensaios de laboratório quanto por simulações são de difícil determinação. Existe uma faixa grande de
digitais, em função dos dispositivos de proteção empregados, do amplitudes e formas de onda registradas em locais sujeitos a
modo de aterramento e do valor das resistências de aterramento. descargas (edifícios altos, montanhas e antenas), bem como
Redes urbanas e rurais também foram avaliadas por simulação de descargas provocadas com o auxílio de foguetes, que
digital, para correntes de descarga de 2,5 kA, 15 kA e 100 kA, permitiram adotar padrões para ensaios de laboratório.
incidentes no alimentador de alta tensão, no ramal secundário ou Impulsos de corrente com formas de onda 10/350 µs e 8/20
nas instalações de um dos consumidores.
µs são usados. Em termos estatísticos, a corrente média
Palavras-Chave: Transformadores de Distribuição, Rede de Baixa considerada é de aproximadamente 30 kA, porém, descargas
Tensão, Descarga Atmosférica, Supressor de Surtos
com amplitudes maiores a 200 kA e taxas de crescimento de
até 300 kA/µs já foram registradas.
I. Introdução
No Brasil, o nível ceráunico (Td) varia entre 20 e 140. No II. Índices de Qualidade de Redes de Baixa Tensão
Estado do Paraná se situa entre 30 e 80, implicando em uma Ainda que as descargas atmosféricas sejam responsáveis
densidade de descargas atmosféricas para a terra (Ng), por por aproximadamente 30 % dos danos em instalações
km2, entre 3 e 10. A expressão que relaciona estas grandezas elétricas de consumidores, solicitações de indenização por
é: Ng = 0,04 x Td1,25. este motivo até recentemente não eram aprovadas devido ao
A severidade dos efeitos depende da magnitude e forma caráter fortuito do fenômeno.
de onda das descargas, do grau de exposição do sistema Por outro lado, a COPEL Distribuição possui em torno de
elétrico, do ponto de impacto e da tensão nominal do 300 mil transformadores de distribuição instalados, sendo a
sistema considerado. Assim, quanto menor a tensão nominal maioria monofásica, de potências nominais de 5 a 15 kVA,
do sistema, mais graves são os efeitos. pertencentes à rede rural de distribuição.
Os efeitos decorrentes de descargas atmosféricas indiretas A vida até a primeira falha desses transformadores foi
são usualmente desconsiderados para linhas de classe 69 kV determinada pela ocorrência mais antiga registrada no
ou maiores, que possuem torres com cabos de blindagem e histórico de movimentações do Sistema GEDIS. Em virtude
pára-raios para proteção de equipamentos nas instalações da de existirem registros de falha apenas a partir de 1992, a
subestação. data da primeira avaria dos transformadores mais antigos foi
tomada como sendo a data de instalação registrada, sempre
Cleverson Luiz da Silva Pinto trabalha na Área de Operação de Redes que a diferença entre esta e a data de fabricação fosse
de Serviços da COPEL Distribuição (E-mail: cleverson@copel.com); superior a dois anos.
Rogério Prestes de Oliveira trabalha na Área de Projetos e Obras da
COPEL Distribuição (E-mail: prestes@copel.com). A vida útil dos transformadores foi definida pela
Marcelo Antonio Ravaglio trabalha na Unidade de Tecnologia de Alta diferença entre as datas de fabricação e a identificação da
Tensão do LACTEC (E-mail: marcelo@lactec.org.br); primeira avaria. O histograma da Fig. 1 mostra um número
José Carlos Schaefer trabalha na Unidade de Tecnologia de Alta Tensão
do LACTEC (E-mail: schaefer@lactec.org.br);
elevado de falhas precoces de transformadores, com
Luis Ricardo Alfaro Gamboa trabalha na Unidade de Tecnologia de distribuição de freqüências de aspecto muito diferente de
Alta Tensão do LACTEC (E-mail: gamboa@lactec.org.br). uma distribuição normal. A função de Weibull foi utilizada
Ricardo Luiz Araújo trabalha na Unidade de Tecnologia de Compatib. para o ajuste da distribuição de freqüências, pela aplicação
Eletromagnética do LACTEC (E-mail: rluiz@lactec.org.br).
do método da máxima verossimilhança.
10 III. Características de supressores de surtos comerciais
9
Foram avaliados quatro conjuntos, adquiridos em lojas de
FREQÜÊNCIA PERCENTUAL

8
material elétrico, de fabricantes diferentes, compostos de
7
três supressores de surtos para proteção entre fases e terra de
6
circuitos trifásicos e, quando disponível, de dispositivo
5 específico para a proteção entre o neutro e terra.
4
3
Os supressores de surtos foram submetidos ao ensaio de
2
Ciclo de Operação, segundo norma IEC-61643-1, de 1998.
1
O ensaio avaliou a capacidade de recuperação e estabilidade
0
térmica dos supressores de surtos para impulsos de corrente
0 10 20 30 40 50 de amplitude máxima, estando os supressores de surtos
FIG. 1 – VIDA ATÉ A PRIMEIRA FALHA energizados em sua tensão máxima de operação contínua. A
Fig. 3 mostra o arranjo de ensaios utilizado.
Segundo a Fig. 1, a vida da metade dos transformadores
avariados é de até 9,0 anos. A primeira falha de pouco mais
de 93 % dos transformadores ocorre antes de 20,5 anos, com
expectativa de vida bem inferior àquela prevista nos guias
de carregamento. A taxa de falhas anual de transformadores
avariados, estimada pelo risco de falha do conjunto, é em
torno de 2,8 %, o que é razoável quando se leva em conta a
ocorrência da primeira avaria em 184 mil dos 370 mil
transformadores cadastrados na Companhia.
Adicionando-se os transformadores que ainda não tiveram
falha ao conjunto avaliado, determinou-se a vida útil dos
transformadores da COPEL Distribuição (ver Fig.2). Neste
caso, a vida útil de 50 % dos transformadores cadastrados é FIG. 3 –ENSAIO DE CICLO DE OPERAÇÃO
de até 14,4 anos e a probabilidade de um transformador Ao início e final do ensaio, mediu-se a tensão residual sob
apresentar vida útil inferior a 20,5 anos, de 68,3 %. corrente de descarga nominal, para observar eventuais
8 alterações nas características de proteção. Com o mesmo
propósito, foi medida a tensão de referência dos supressores
1ª AVARIA
de surtos com varistores, determinada pelo valor eficaz da
FREQÜÊNCIA PERCENTUAL

6 NÃO AVARIADOS
componente resistiva da tensão aplicada, em fase com a
corrente, para o valor de pico de 1,0 mA.
4
Dos quatro modelos ensaiados, apenas um apresentou
conformidade com a norma, mesmo assim com degradação
2
acentuada nos contatos de seus terminais. Os demais
apresentaram avarias internas, sinalização inadequada e
0 envelhecimento precoce, indicando que não possuem as
0 10 20 30 40 50
características nominais declaradas pelos fabricantes.
FIG. 2 – VIDA ÚTIL DOS TRANSFORMADORES
Dos 184 mil transformadores já avariados, foi identificada
IV. Suportabilidade de equipamentos eletro-eletrônicos
a causa da falha de pouco mais de 63 mil unidades, com alta
incidência de falhas por descargas atmosféricas (62,5 %). A Equipamentos eletro-eletrônicos de uso geral devem
segunda causa de maior incidência indica a avaria de elos apresentar suportabilidade adequada frente a surtos
fusíveis, pára-raios e centelhadores (6 %). Deste conjunto de atmosféricos para operar adequadamente em instalações de
transformadores, 65 % estava protegido por centelhadores, consumidores residenciais, comerciais e industriais. Até o
30 % por pára-raios e 5 % não tinha proteção. Além disso, momento, não se possui no país legislação que defina os
6,9 % deles apresentou danos simultâneos nos dispositivos níveis admissíveis de imunidade a surtos elétricos desses
de proteção, o que é bem significativo. equipamentos, nem sequer os fabricantes são obrigados a
orientar os consumidores sobre os requisitos mínimos da sua
Falhas simultâneas dos transformadores de distribuição e
instalação para proteger os equipamentos.
instalações de consumidores de baixa tensão são raramente
registradas, correspondendo a 0,3 % das ocorrências. Não se Desde 2003, as concessionárias de energia elétrica são
pode afirmar, entretanto, que as avarias nos transformadores responsáveis pelo ressarcimento de danos em equipamentos
não tenham causado danos na instalação dos consumidores. de seus consumidores, causados por descargas atmosféricas.
Interligações de equipamentos com sistemas operados por
Experiências na Austrália indicaram que 1/3 das avarias
outras concessionárias de serviço público, como televisão
de transformadores por descarga atmosférica tiveram
por assinatura, redes de computadores e telecomunicações,
origem na rede de baixa tensão. Foi demonstrado que o
elevam a suscetibilidade da instalação a defeitos por surtos
emprego simultâneo de pára-raios nos lados de alta e baixa
elétricos. Apesar disso, nenhuma das concessionárias orienta
tensão do transformador, instalados próximos ao tanque,
seus consumidores sobre o modo mais adequado de proteger
possibilita a obtenção de taxa de falha da ordem de 0,3 %.
seus equipamentos eletrônicos mais sensíveis.
Os níveis de suportabilidade a surtos dos equipamentos de Considerando que as instalações típicas de consumidores
informática e eletrodomésticos foram avaliados pelo Ensaio da COPEL Distribuição possam apresentar surtos de tensão
de Imunidade a Surtos Elétricos, de acordo com a norma de até 4 kV (classe 4, segundo a IEC 61000-4-5, de 1995),
IEC 61000-4-5, de 1995. Em vez de verificar apenas a justamente os equipamentos eletrônicos mais caros e mais
conformidade dos equipamentos em relação às prescrições sofisticados não apresentam níveis de imunidade suficientes.
da norma, optou-se por determinar o menor valor de crista É fundamental a proteção local desses equipamentos por
do impulso, suficiente para provocar operação inadequada supressores de surtos bem dimensionados e de qualidade
ou danos nos equipamentos ensaiados. Os impulsos comprovada, tanto quanto sua utilização em instalações
combinados foram aplicados aos terminais de alimentação especialmente projetadas para minimizar os efeitos
do equipamento sob ensaio, sempre que possível nos modos decorrentes de descargas atmosféricas.
comum e diferencial, com amplitude crescente e incremento
de 200 V, até o valor máximo de 4 kV. A Fig.4 mostra o V. Simulação de Redes de Distribuição Típicas
arranjo de ensaio utilizado.
Na 1ª Etapa do projeto foi realizado um extenso trabalho
de medição das sobretensões desenvolvidos nos
equipamentos da concessionária e de consumidores,
decorrentes de descargas atmosféricas incidentes ou
induzidas na rede de distribuição. Limitações do Laboratório
de Alta Tensão do LACTEC, apenas possibilitaram a
avaliação de uma rede de distribuição de tamanho reduzido,
classe 15 kV, com somente um consumidor (ver Fig.5).
Visando a avaliação de configurações mais complexas, os
componentes principais da rede de distribuição foram
modelados e simulados por computador, por meio do
programa Orcad Capture - Pspice.
ENTRADA DO CONSUMIDOR EQUIPAMENTO CONSUMIDOR

30 Ω
C0 C0
kWh C1 C2 L2
C3

RAT

1,2 m 5,5 m

9,2 m

FIG. 4 –AVALIAÇÃO DA SUPORTABILIDADE A SURTOS


RAT RAT RAT

Foram avaliados os seguintes equipamentos:


1,7 m 3,0 m

1 Microcomputador completo e acessórios; POSTE 1 POSTE 2 POSTE 3

3 Televisores novos, coloridos, 14”; 17,9 m 9,3 m

3 Televisores novos e 1 usado, coloridos, 20”; H2

3 Aparelhos de vídeo-cassete novos e 1 usado; H1 H3

2 Aparelhos de DVD novos; X2

2 Aparelhos de som novos e 1 usado, tipo microsystem; X1


X0
X3

2 Aparelhos rádio-relógio digitais novos; TRANSFORMADOR


RAT

2 Fornos a microondas novos e 1 usado;


3 Refrigeradores novos e 1 usado. FIG. 5 – SIMULAÇÃO DE REDE DE DISTRIBUIÇÃO 15 KV
No ensaio do microcomputador, verificou-se por diversas No poste central da rede simulada foi instalado um
vezes o travamento do sistema operacional, para impulsos transformador de distribuição 13200-220/127 V, 30 kVA,
com amplitude acima de 400 V. Para possibilitar a avaliação com seus terminais da alta tensão protegidos por pára-raios
de sua suportabilidade, as fontes de alimentação danificadas, de óxido de zinco, 15 kV - 5 kA, fixados em suporte próprio
com impulsos da ordem de 1.400 V, foram substituídas por no tanque; para a proteção dos terminais da baixa tensão,
fontes similares novas, por sete vezes. Dispositivos de foram usados pára-raios de óxido de zinco, 175 V, 1,5 kA.
proteção muito usados, como “filtro de linha” e protetores
próprios contra surtos, mostraram-se ineficientes. Foi prevista a montagem de uma entrada de serviço típica
de consumidor de baixa tensão, com disjuntor trifásico e um
Os eletrodomésticos com tecnologia mais sofisticada medidor de energia analógico. A carga do consumidor foi
(DVD e vídeo-cassete) e aqueles equipados com fontes de simulada por um resistor de 30 Ω .
alimentação do tipo chaveada apresentaram menor nível de
imunidade a surtos. Dentre 25 eletrodomésticos novos e O neutro da rede da baixa tensão foi ora aterrado junto
usados avaliados, 52 % deles não apresentou suportabilidade com os pára-raios e tanque do transformador, ora nos postes
adequada para instalações de consumidores residenciais. adjacentes. O aterramento do neutro da rede de distribuição
Defeitos em eletrodomésticos novos foram observados com foi avaliado para resistência nula e de 22 Ω. O aterramento
a aplicação de impulsos combinados com tensão de crista de do neutro da entrada de serviço do consumidor foi avaliado
apenas 1.600 V. para resistências de aterramento nula, 65 Ω e 965 Ω.
A validação dos modelos foi realizada pela comparação Para impulsos de corrente de amplitude 5 kA, forma de
entre os sinais medidos e os calculados por simulação de onda 8/20 µs, aplicados aos três condutores do alimentador,
sobretensões transferidas, através do transformador de com a alta tensão do transformador protegida por pára-raios
distribuição, para o ramal secundário da rede de distribuição. de 15 kV, a Fig. 8 mostra as sobretensões medidas e
A avaliação foi realizada pela aplicação de impulsos de calculadas nos terminais de fase do enrolamento de baixa
tensão da ordem de 70 kV, com polaridade negativa e forma tensão.
de onda 1,2/50 µs, sobre os três condutores fase do 15
alimentador de alta tensão. A Fig.6 mostra os sinais medidos
10
e simulados nos terminais de fase da baixa tensão.
5
5
0
0
-5
-5
-10
X2 - Simulado com Sist. Medição
-10 X2 - Simulado sem Sist. Medição
-15
-15 X2 - Medido em Laboratório
-20
-20 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75
X2 - Simulado com Sist. Medição Tempo (µ s)
-25 X2 - Simulado sem Sist. Medição

-30
X2 - Medido em Laboratório FIG. 8 – SURTO TRANSFERIDO - NEUTRO NÃO ATERRADO
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75
Tempo (µ s) Mesmo que o modelo avaliado não reproduza fielmente as
FIG. 6 – SURTO TRANSFERIDO - NEUTRO NÃO ATERRADO sobretensões transferidas para a baixa tensão, os sinais
medidos e simulados, sem a alteração de parâmetros, são
Na condição de neutro não aterrado, observa-se que há similares e da mesma ordem de grandeza. Assim, mesmo
sobreposição aceitável dos sinais medido e simulado apenas simples e incompleto, o modelo adotado é útil para o estudo
quando o sistema de medição está presente no circuito de das sobretensões em redes de distribuição sob efeito de
ensaio. Neste caso, quando se elimina o divisor de tensão descargas atmosféricas.
resistivo da rede de distribuição simulada, verifica-se que a
tensão transferida para o secundário apresenta a mesma Para eliminar os erros causados pelo sistema de medição
forma de onda do impulso aplicado. Além disso, a nos ensaios de laboratório, a rede de distribuição de
sobretensão calculada sem o divisor de tensão é maior que a tamanho reduzido foi novamente avaliada por simulação
correspondente medida, da ordem de 20 %. digital. Foram calculadas as sobretensões na rede de
distribuição decorrentes de descargas atmosféricas
A taxa de transferência de surtos para a baixa tensão do incidentes ou induzidas no alimentador de alta tensão, na
transformador de 30 kVA é dada pela relação: rede de baixa tensão e nas instalações do consumidor. De
C HX 633 pF
modo geral, observou-se que:
Taxa de Transferência = ⋅100 = ⋅100 = 35,9%
C HX + C X 633 pF + 1132 pF Quando o neutro é aterrado junto ao transformador são
maiores as sobretensões nas instalações do consumidor;
onde CHX é a capacitância entre os enrolamentos de alta e
para surtos originados na baixa tensão, são maiores as
baixa tensão e CX a capacitância entre o enrolamento de
sobretensões transferidas para a rede de alta tensão;
baixa tensão e o tanque aterrado do transformador. A taxa de
transferência calculada a partir das medições de laboratório Quando o neutro é aterrado em postes adjacentes, são
é 30,3 %, enquanto para as simulações digitais é 36,1 %, maiores as sobretensões entre o enrolamento de baixa
demonstrando que a transferência de surtos entre os tensão e tanque do transformador;
enrolamentos primário e secundário do transformador se dá Quanto maior a resistência de aterramento do neutro,
predominantemente por acoplamento capacitivo. maior a sobretensão na rede de distribuição;
A Fig.7 mostra as sobretensões transferidas para a baixa Supressores de surtos na entrada de serviço ou nos
tensão, quando o neutro é aterrado junto ao transformador. equipamentos do consumidor limitam as sobretensões em
Ainda que a amplitude do surto transferido simulado seja modo diferencial, mas não garantem proteção adequada
pouco superior à do sinal medido, a forma de onda é similar em modo comum; se instalados apenas na entrada de
e a sobretensão verificada de mesma ordem de grandeza. A serviço, não garantem a proteção dos equipamentos do
eliminação do divisor de tensão do circuito simulado consumidor; têm pouca influência nas sobretensões
novamente causa o aumento da sobretensão no secundário verificadas no enrolamento secundário do transformador;
do transformador. Supressores de surtos apropriados devem ser instalados
10 nas interligações dos equipamentos do consumidor com
circuitos de outras concessionárias de serviços públicos;
5
Pára-raios nos terminais secundários do transformador
protegem o consumidor apenas para surtos transferidos da
0
alta tensão; para surtos originados na baixa tensão limitam
-5 X2 - Simulado com Sist. Medição
as sobretensões nos enrolamentos do transformador;
X2 - Simulado sem Sist. Medição
X2 - Medido em Laboratório
Pára-raios nos terminais primários do transformador são
-10 indispensáveis para protegê-lo de descargas atmosféricas
0 5 10 15 20 25
Tempo (µ s) no alimentador de alta tensão; limitam a transferência de
FIG. 7 – SURTO TRANSFERIDO – NEUTRO ATERRADO sobretensões para a baixa tensão; apenas sua instalação
não protege a rede e os consumidores de baixa tensão;
A instalação de fio terra de segurança nas instalações O neutro da rede de baixa tensão foi aterrado ora junto ao
internas do consumidor é fundamental para reduzir o risco tanque do transformador, ora em postes adjacentes, com
de choque elétrico por contato nos gabinetes metálicos de resistência de 22 Ω. Nos postes terminais da rede de baixa
seus equipamentos. tensão, o neutro também foi aterrado, porém com resistência
de 65 Ω, para simular o emprego de apenas uma haste de
VI. Simulação de Redes Urbanas e Rurais aterramento. Na entrada de serviço dos consumidores, o
neutro foi aterrado com resistência de 65 Ω.
Em complemento às simulações digitais e de laboratório
realizadas em uma rede de distribuição simples, com apenas As descargas atmosféricas foram simuladas para correntes
um consumidor, foram realizadas simulações digitais de de descarga de 2,5 kA, 15 kA e 100 kA. Estes valores foram
redes de distribuição urbanas e rurais, típicas no sistema da escolhidos para simular a incidência de descargas
COPEL Distribuição, sob efeito de descargas atmosféricas. atmosféricas diretas ou induzidas no sistema de distribuição,
para níveis considerados moderados (5 kA), médios (30 kA)
A rede de distribuição urbana foi simulada por um e máximos (200 kA), respectivamente. Foram avaliados os
alimentador de classe 15 kV, para atendimento de cinco efeitos de descargas atmosféricas diretas ou induzidas nos
quadras de 100 x 100 m2, com um transformador de três condutores do alimentador de alta tensão, nos quatro
distribuição trifásico de 75 kVA, 15 postes, 9 consumidores condutores da rede de baixa tensão e nas instalações de um
trifásicos e 18 monofásicos, dispostos conforme a Fig. 9. dos consumidores. Além disso, foi avaliado o desempenho
Estimou-se o consumo médio de cada consumidor em 1,5 de supressores de surtos na proteção da entrada de serviço e
kWh, por fase, ou carga monofásica correspondente a 10 Ω. equipamentos sensíveis do consumidor e, de pára-raios na
proteção do enrolamento secundário do transformador.
P9

Um enorme volume de dados foi gerado pelas simulações


6uH

65
A B C N

digitais. Para uma descarga de 200 kA no alimentador de


alta tensão, com ponto de impacto no Poste 15, nenhuma
C15

P8

220 / 127 V
13,8 kV

proteção na rede de baixa tensão e o neutro aterrado junto ao


LT6

C14

transformador, a Fig.10 mostra a sucessiva atenuação do


A B C N

C12

C13
C11

surto simulado ao longo do alimentador de alta tensão.


N
N

N
F

F
P7

220 / 127 V
13,8 kV

200
LT5

6uH

22

100

0
P6
N

N
F

F
F

A B C N

A B C N

-100
C10
C8

C9

220 / 127 V

C6
13,8 kV
C7

-200
P1 P2
LT4

-300 P3 P4
P5 P6
G
-400 P7 P8
P9
22
6uH

X0
H3
H2
X3
X2 -500
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75
1uH

H1 X1
P5

Tempo (us)
C5

C4

FIG. 10 – SOBRETENSÕES AO LONGO DO ALIMENTADOR


A B C N

A B C N

Sobretensões de quase 400 kV próximas do ponto de


220 / 127 V
13,8 kV

65
6uH

22
6uH

65

impacto e superiores a 200 kV em todo o alimentador


C3
LT3

6uH
C24
A B C N

C27
C20
C18

provocam a transferência do surto para a rede de baixa


F

F
N

N
P4

tensão através do transformador, dos pára-raios e postes de


LT10
LT9

distribuição, em decorrência da disrupção dos isoladores de


220 / 127 V

220 / 127 V

220 / 127 V
220 / 127 V

alta e baixa tensão. A Fig.11 mostra as sobretensões


LT7

LT8

calculadas nos 15 postes simulados da rede de baixa tensão,


P12

P13

P14
P10

P11

P15
P3

220 / 127 V
13,8 kV

N
N

N
N

F
F

F
F

para a mesma situação anterior.


C16

C23
C17

C19

C22

C25

C26
C21

LT2

A B C N

100
P2

C2
220 / 127 V

50
13,8 kV

C1

0
LT1

6uH A B C N

-50 P1 P2
65

P3 P4
-100
P1

P5 P6
FIG. 9 – REDE DE DISTRIBUIÇÃO URBANA SIMULADA -150 P7 P8
P9 P10
-200 P11 P12
Foram adotados modelos para os principais equipamentos -250
P13 P14

da rede de distribuição. O transformador de distribuição de -300


P15

75 kVA foi modelado com base nos resultados de ensaios de 0 5 10 15 20 25 30 35 40


Tempo (us)
45 50 55 60 65 70 75

laboratório para a medição de perdas em vazio, perdas em


carga e das capacitâncias. Nos postes de distribuição foi FIG. 11 – SOBRETENSÕES AO LONGO DA REDE DE BT
simulada a eventual descarga disruptiva dos isoladores para Para cada configuração simulada foi calculada a corrente
sobretensões superiores a 150 kV e 30 kV, respectivamente escoada para a terra nos pontos de aterramento do neutro na
para os ramais de alta e baixa tensão. De modo similar, a rede de distribuição e as sobretensões desenvolvidas nos
suportabilidade das instalações dos consumidores foi equipamentos da concessionária e dos consumidores.
considerada 15 kV.
A rede de distribuição rural foi simulada por um VIII. Conclusões
alimentador de classe 15 kV, bifásico, com 9 vãos de 70 m,
Apesar dos esforços realizados para obter um modelo fiel
totalizando 630 m de comprimento. Um transformador de
da rede de distribuição, simplificações tiveram que ser
distribuição monofásico de 15 kVA foi instalado no vão
adotadas para tornar possível a simulação digital. Não foram
central, alimentando as instalações típicas de apenas um
considerados os efeitos do transitório em 60 Hz provocado
consumidor.
por curtos-circuitos na rede de distribuição e os efeitos
De modo geral, para as duas redes de distribuição secundários da descarga atmosférica, incluindo a indução
simuladas, pode-se afirmar que: nos circuitos internos dos consumidores, as descargas
subseqüentes, as correntes com forma de onda diferente da
Nas redes urbanas, a maior parte da corrente de descarga
padronizada (8/20 µs), o acoplamento magnético entre os
flui para a terra pelos pontos de aterramento do neutro dos
ramais de alta e baixa tensão, etc. Mesmo incompleta, a
consumidores, sendo ainda maior quando o neutro da rede
metodologia de simulação apresentada é uma ferramenta
é aterrado junto ao tanque do transformador. Nas redes
valiosa para a avaliação de sobretensões atmosféricas em
rurais a maior parcela da corrente flui para a terra no ponto
redes de distribuição.
principal de aterramento do neutro (situado apenas no
consumidor ou simultaneamente junto ao transformador). Nas simulações digitais de descargas atmosféricas em
Parcela significativa da corrente de descarga é escoada redes de distribuição urbana e rural, foi avaliada a eficiência
para a terra através dos postes de distribuição. de dispositivos de supressão de surtos na proteção de
equipamentos da concessionária e dos consumidores.
A instalação de pára-raios nos terminais de baixa tensão
Também foram avaliados os métodos de aterramento
do transformador é necessária sempre que o neutro da rede
adotados para o neutro na rede de baixa tensão.
de baixa tensão é aterrado em postes adjacentes em redes
urbanas ou apenas no consumidor de redes rurais, Alguns supressores de surtos comerciais avaliados não
inclusive para níveis moderados de descarga. satisfazem as prescrições das normas técnicas no ensaio de
ciclo de operação, indicando que não possuem a capacidade
Nos consumidores urbanos, o aterramento do neutro em
anunciada para drenar correntes elevadas de surtos para a
postes adjacentes sempre causa menores sobretensões. Nos
terra. Além disso, a suportabilidade de computadores e
consumidores rurais, entretanto, o aterramento do neutro
eletrodomésticos comerciais avaliados, da ordem de 1.500 V
somente na entrada de serviço do consumidor provoca
para alguns equipamentos novos, pode exigir proteção da
menores sobretensões apenas para surtos transferidos da
rede de distribuição ainda mais elaborada.
alta tensão. De qualquer modo, sobretensões elevadas em
modo comum e diferencial requerem o emprego de A proteção de todos os consumidores pela concessionária
supressores de surtos na entrada de serviço e junto às requer investimentos significativos. Mesmo assim, não se
tomadas de alimentação dos equipamentos do consumidor, pode garantir a imunidade contra surtos nos equipamentos
mesmo para correntes de descarga moderadas. do consumidor. A proteção da rede de distribuição depende
de ações do próprio consumidor, tanto na fase de projeto de
suas instalações, quanto no emprego de dispositivos de
VII. Filosofia de Proteção de Redes de Baixa Tensão
proteção para seus equipamentos eletrônicos mais sensíveis
A Tab.1 resume as recomendações mínimas para o e na adoção de práticas de segurança.
emprego de dispositivos de proteção contra surtos em redes
Sugere-se, em uma primeira fase, a identificação de
de distribuição urbanas e rurais, em função do nível de
regiões do Estado do Paraná com maior incidência de
descarga esperado (5 kA, 30 kA ou 200 kA) e o método de
descargas atmosféricas e pedidos de ressarcimento de
aterramento adotado, com base nas simulações realizadas,
consumidores, para implantar redes de distribuição piloto
admitindo-se uma suportabilidade de 4 kV para os
adequadamente protegidas, a fim de avaliar, na prática, a
equipamentos de baixa tensão da concessionária e dos
eficiência das recomendações feitas neste trabalho.
consumidores e, de 30 kV para o enrolamento de baixa
tensão dos transformadores de distribuição.
IX. Referências Bibliográficas
TAB.1 – PROTEÇÃO DE REDES DE BAIXA TENSÃO Darveniza, M., Mercer, D.R. Lightning Protection of Pole Mounted
Nível de Ponto de Aterramento Principal do Neutro da Rede de Baixa Tensão Transformers, IEEE Trans., v.4, n.2, April/89.
Descarga
Descarga Rede de
Atmosférica Distribuição
Atmosférica
Poste do Transformador Postes Adjacentes (*)
Hasse, P., Overvoltage Protection of Low Voltage Systems, IEE Power
Baixa Tensão Consumidor Baixa Tensão Consumidor
(kA)
Incidente
Transf. Cx. Entrada Equipamento Transf. Cx. Entrada Equipamento
Engineering Series, no. 33, IEE, England, 2000.
Alta Tensão SPI PR IEC-61000-4-5/1995, Electromagnetic Compatibility, Part 4-5: Testing and
Urbana Baixa Tensão SPI SPI
Consumidor SPI + FT SPI + FT
Measurement Techniques - Surge Immunity Test, IEC, Genebra, Suíça.
5
Alta Tensão SP SPI PR SP SPI IEC-61643-1/1998, Surge Protective Devices Connected to Low-Voltage
Rural Baixa Tensão SPI PR SP SPI
Consumidor SP SPI + FT PR SP SPI + FT
Power Distribution Systems, IEC, Genebra, Suíça.
Alta Tensão SP SPI PR SP SPI IEC-61643-12/2002 Low-voltage surge protective devices - Part 12: Surge
Urbana Baixa Tensão SP SPI SP SPI
Consumidor SP SP+SPI+FT PR SP SP+SPI+FT
protective devices connected to low-voltage power distribution systems
30
Alta Tensão SP SPI PR SP SPI - Selection and application principles, IEC, Genebra, Suíça
Rural Baixa Tensão SP SPI + FT PR SP SPI + FT
Ravaglio, M.A, Schaefer, J.C., Gamboa.,L.R.A. e outros, Projeto Proteção
Consumidor SP SP+SPI+FT PR SP SP+SPI+FT
Alta Tensão SP SPI + FT PR SP SPI + FT contra Descargas Atmosféricas de Redes de Baixa Tensão do Sistema
Urbana Baixa Tensão SP SPI + FT PR SP SPI + FT de Distribuição da COPEL - Relatório de Conclusão da 1ª Etapa,
Consumidor PR SP SP+SPI+FT PR SP SP+SPI+FT
200
Alta Tensão SP SPI PR SP SPI
UTAT 0194/2003, LACTEC, Curitiba, Novembro de 2003.
Rural Baixa Tensão SP SPI + FT PR SP SPI + FT Ravaglio, M.A, Schaefer, J.C., Gamboa.,L.R.A. e outros, Projeto Proteção
Consumidor PR SP SP+SPI+FT PR + PRN
(*) No caso de Rede Rural, neutro aterrado apenas na entrada de serviço do consumidor
SP SP+SPI+FT
contra Descargas Atmosféricas de Redes de Baixa Tensão do Sistema
(**) Legenda: de Distribuição da COPEL - Relatório Final, UTAT 008 / 2005,
PR = Pára-raios de baixa tensão (fase-terra) PRN = Pára-raios de baixa tensão (neutro-terra)
SP = Supressor de surtos (fase-neutro) SPI = Supressor de surtos para as interligações
LACTEC, Curitiba, Fevereiro de 2005.
FT = Aterramento de segurança (fio terra)

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