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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DO NOROESTE FLUMINENSE DE EDUCAÇÃO SUPERIOR


CURSO DE PEDAGOGIA

JÉSSICA DE SOUZA BORGES

ENTRE O OUTRO E EU: PRÁTICAS INSTITUINTES DO


ORIENTADOR EDUCACIONAL NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Santo Antônio de Pádua


Maio/2017
II

JÉSSICA DE SOUZA BORGES

ENTRE OUTRO E EU: PRÁTICAS INSTITUINTES DO


ORIENTADOR EDUCACIONAL NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Trabalho de Conclusão de Curso elaborado por


Jéssica de Souza Borges, acadêmica de Pedagogia,
do Instituto do Noroeste Fluminense de Educação
Superior (INFES), da Universidade Federal
Fluminense (UFF), sob a orientação da Profa. Dra.
Mitsi Pinheiro de Lacerda Leite Benedito, como
pré-requisito de habilitação.

Santo Antônio de Pádua


Maio/2017
III

CATALOGAÇÃO NA FONTE UFF/SDC/BINF

B732 Borges, Jéssica de Souza.

Entre o outro e eu: práticas instituintes do orientador educacional na educação infantil / Jéssica de Souza Borges. -
Santo Antônio de Pádua, 2017.
64 f. ; 30 cm.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Licenciatura em Pedagogia). - Universidade Federal Fluminense,


Instituto do Noroeste Fluminense de Educação Superior, 2017.
Bibliografia: f. 57-59.
Orientadora Mitsi Pinheiro de Lacerda Leite Benedito.

1. Orientação educacional. 2. Práticas instituintes. 3. Escola. I. Benedito, Mitsi Pinheiro de Lacerda Leite. II.
Título.

CDD 371.4
IV

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE – UFF


INSTITUTO DO NORESTE FLUMINENSE DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – INFES
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – PCH
COORDENAÇÃO DO CURSO DE PEDAGOGIA – SGO

ATA DE APRESENTAÇÃO DO
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

Às treze horas e trinta minutos do dia 30 do mês de maio do ano de 2017, na sala 07, do Campus
do INFES/UFF, compareceu para apresentação pública de Trabalho de Conclusão de Curso,
requisito obrigatório para a obtenção do título de Licenciada em Pedagogia, a aluna Jéssica de
Souza Borges, tendo como título do “ENTRE O OUTRO E EU: PRÁTICAS INSTITUINTES
DO ORIENTADOR EDUCACIONAL NA EDUCAÇÃO INFANTIL”. Constituíram a banca
examinadora os professores Profa. Dra. Maristela Barenco Corrêa de Mello e Prof. Josias Teodoro
Guedes. Após a apresentação e as observações dos membros da banca avaliadora, ficou definido
que o trabalho foi considerado _____(aprovado/reprovado/aprovado com restrições)______. Eu, MITSI
PINHEIRO DE LACERDA LEITE BENEDITO lavrei a presente ata que segue assinada por mim
e pelos demais membros da Banca Examinadora.
Observações: (para aprovação com restrições)

Santo Antônio de Pádua, 30 de Maio de 2017

______________________________________________________________
Profa. Dra. Mitsi Pinheiro de Lacerda Leite Benedito – INFES/UFF
Orientadora

_______________________________________________________________
Profa. Dra. Maristela Barenco Corrêa de Mello – INFES/UFF
Examinadora

_______________________________________________________________
Prof. Josias Teodoro Guedes – PPGEn/INFES/UFF
Examinador
V

À minha mãe, que tanto contribuiu


para que eu concluísse essa etapa tão
importante em minha vida.
VI

AGRADECIMENTOS

Sentar e escrever meus agradecimentos é uma tarefa difícil. Ou o papel será pouco ou as
palavras se atrapalharão com o meu pensamento. Em contrapartida, gostaria de iniciar esse
momento prazeroso dedicando um abraço.
Abraço, à todos que me incentivaram quando eu julguei não conseguir.
Abraço, ao colega de curso que sempre via em mim mais do que eu acreditava ser.
Abraço, aos que construíram em mim, um sentimento bom, ascendente e perpetuável.
Um abraço apertado à Ana Luiza Cunha, que de maneira singela e meiga, oferecia
créditos a mim que me transportavam a figura de irmã mais velha.
Um abraço apertado ao Profº. MSc Francis de Souza Borges que é, e sempre será um ser
humano capaz de demonstrar amor e sabedoria nos momentos mais adversos que a vida lhe
propuser.
Um abraço apertado ao meu irmão Flavio de Souza Borges, que sempre delegou prestígio
e honra à minha formação.
Um beijo cotado de carinho à minha irmã mais nova, Jhennifer Feitosa Lima, por viver,
conviver e vivenciar as experiências mais marcantes da minha vida.
Um beijo cotado de amor ao homem que faz meus olhos se encherem de risos, meus lábios
de palavras afetuosas e meu coração de certezas, por escolher viver ao seu lado. Eu não seria mais
eu, se não existisse você, João Jazbik.
Meu muito obrigada, à banca. Que fez deste trabalho um espelho de mim, cheio de
acertos, erros e novos recomeços.
Meu muito obrigada ao “Grupo de Pesquisas e Estudos CotidianoS” por tantos momentos
de partilha. Partilha de indagações, medos, sorrisos, diálogos e muito conhecimento.
Meu muito obrigada à minha orientadora Mitsi Pinheiro Lacerda pela paciência,
compreensão e sabedoria em lidar com uma pessoa como eu.
E por fim, minha eterna gratidão a mulher que me gerou, educou, instruiu e possibilitou
estar aqui para escrever essas palavras. Obrigada mãe. Você é o exemplo de persistência, de
segurança, de firmeza, de professora, de mãe e mulher que tento ser.
Papai do céu você foi muito generoso comigo, obrigada.
VII

[...] o importante é perceber que devemos estudar as escolas em


sua realidade, como elas são, sem julgamentos a priori de valor
e, principalmente, buscando a compreensão de que o que nela faz
e se cria precisa ser visto como uma saída possível, naquele
contexto, encontrada pelos sujeitos que nela trabalham, estudam
e vão levar seus filhos.
Rockwell e Ezpeleta, 1986
VIII

RESUMO

BORGES, Jéssica de Souza. Entre Outro e Eu: Práticas Instituintes do Orientador


Educacional na Educação Infantil. 2017. 63 p. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso
de Licenciatura em Pedagogia) – Instituto do Noroeste Fluminense de Educação Superior,
Santo Antônio de Pádua. 2017.

O presente trabalho visa articular reflexões acerca do papel do orientador educacional na


instituição pública municipal de uma determinada cidade localizada no Noroeste
Fluminense do estado do Rio de Janeiro. Tenho como caminho as trilhas do cotidiano
para compreender acerca do seguinte tema de pesquisa: Quais são as práticas instituintes
do orientador educacional dentro da escola que contribuem para o desenvolvimento
educativo? Neste sentido, o movimento de pesquisa é caracterizado pelo processo de
associação entre teoria e prática na atuação de pedagogos, interesse e necessidade da
pesquisadora de abarcar a formação institucional deste profissional e a compreensão da
ação dinâmica educacional que recaem no cotidiano da escola. Assim como, repensar o
papel da escola como protagonista na formação de sujeitos atuantes e participativos,
capazes de respeitar o processo de humanização um dos outros. A abordagem teórico-
metodológica de pesquisa é a etnometodologia, que visa investigar o método que o outro
sujeito faz cotidianamente em sua prática, pensando assim como o indivíduo se organiza
e pensa suas atividades. Essa metodologia de pesquisa aguça a compreender como a
construção deste mundo social se organiza; e a partir de então, conhecendo como esses
membros constroem suas atividades, investigando empiricamente os métodos que os
orientadores educacionais produzem e utilizam para realizar ações cotidianas, buscando
compreender os sentidos a partir dos quais estes métodos são criados.

Palavras-chave: Orientação educacional; práticas instituintes e escola.


IX

ABSTRACT

BORGES, Jéssica de Souza. Entre o Outro e Eu: Práticas Instituintes do Orientador


Educacional na Educação Infantil. 2017. 63 p. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso
de Licenciatura em Pedagogia) – Instituto do Noroeste Fluminense de Educação Superior,
Santo Antônio de Pádua. 2017.

This paper aims to articulate reflections about the role of the educational orientation in
the municipal public institution of a certain city located in the Northwest Fluminense of
the state of Rio de Janeiro. Having as a way the daily perspective, I try to understand
about the following research topic: What are the instituting practices of the educational
supervisor within the school that contribute to the educational development? In this sense,
the research movement is characterized by the association between theory and practice in
the pedagogues' performance, interest and necessity of the researcher to include the
institutional formation of this professional and the understanding of the dynamic
educational action that falls on the daily life of the school, as well as , To rethink the role
of the school as a protagonist in the formation of active and participatory subjects capable
of respecting the humanization process of one another. The theoretical-methodological
approach of research is the ETNOMETODOLOGIA, which aims to investigate the
method that the other subject does daily in their practice, thinking as well as the individual
organizes and thinks their activities. This research methodology sharpens understanding
of how the construction of this social world is organized; And from then on, knowing
how these members construct their activities, investigating empirically the methods that
the educational advisors produce and use to carry out daily actions, seeking to understand
the senses from which these methods are created.

Keywords: Educational orientation, practices institutes and school


X

SUMÁRIO

TRILHANDO O CAMINHO ................................................................................................... 11

SEÇÃO II – METODOLOGIA DE PESQUISA E EPISTEMOLOGIA ................................. 15

SEÇÃO III – A ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL: HISTÓRICO, NORMATIZAÇÃO E


REVISÃO DE LITERATURA ................................................................................................ 21

3.1 Alguns poucos dados históricos sobre a Orientação Educacional ...................................... 21

SEÇÃO IV – A ATUAÇÃO DO ORIENTADOR EDUCACIONAL NO COTIDIANO


ESCOLAR ................................................................................................................................ 37

4.1 Centralidade do processo pedagógico na figura do orientador........................................... 43

4.2 A artificialidade da proposta............................................................................................... 45

4.3 A necessidade de autoafirmação para a classe ................................................................... 47

SEÇÃO V – CONCLUSÃO ..................................................................................................... 56

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................... 58

ANEXOS ................................................................................................................................. 60
11

TRILHANDO O CAMINHO

O presente trabalho visa articular reflexões acerca do papel do orientador


educacional na instituição pública municipal de uma determinada cidade localizada no
Noroeste Fluminense do estado do Rio de Janeiro. A busca por discutir este tema foi
provocada a partir da entrada na escola intermediada pela observação de Estágio pelo
PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência) pela UFF
(Universidade Federal Fluminense) realizado no decorrer do ano de 2015 em uma
instituição de Ensino de Educação Infantil. Dentro deste universo, obtive entrada legal no
cotidiano desses atores que constroem a escola, dos quais desenvolvi olhares aguçados
que me perturbavam profundamente, tais como a maneira com a qual os docentes se
organizavam didaticamente, as relações destes docentes com os gestores, interação
família e escola, entre tantos outros. Em contrapartida, a ótica que escavou em minha
pessoa enquanto sujeito pesquisador de um cotidiano escolar múltiplo e interminável
foram as atitudes expressadas na função da orientação educacional.
A forma como me lanço nesta temática não aflorou de repente, como algo
premeditado a pensar ou a escrever. Julgo que essa imersão foi além de um acontecimento
que sobrevém da rotina, mas sim, uma questão de movimento intrínseco que provocou o
pensar e o ruminar desse assunto. É a conquista epistêmica do meu ser enquanto atuante
em um processo de desenvolvimento intelectual, e como pano de fundo desse horizonte
que se desvendava a mim, estava a escola como palco de práticas instituintes realizadas
por todos nós que perpassamos e vivemos este espaçotempo.
A inserção e atenção pelo cotidiano escolar me perturbava há muitos anos, desde
que a minha existência familiar se constituía dela. Foram muitos anos dedicados às
relações escolares que interferiam diretamente nas relações do meu lar na figura
representativa de minha mãe. Os sujeitos da escola e suas táticas me habitavam antes
mesmo de eu nascer. Assim, como outros filhos de mães professoras sabem e vivem a
extensão da escola até seus lares, almoços de família e passeios de domingo, isso se torna
comum, e ao mesmo tempo admirável, quando o profissional faz com diligencia e afeto.
Esse é um dos principais pilares que me levam a observar o cotidiano povoado em mim.
Ferraço, (apud Oliveira; Alves, 2008, p. 111) me acalenta quando expressa motivos pelos
quais nos envolvemos pelo cotidiano:
12

[...] Investimos no cotidiano porque é lá que está a essência de


nossa metodologia de estudo. Uma essência pulverizada em
artimanhas e táticas. Disseminada em movimentos caóticos.
Semeada em ações e relações fatuais. Uma essência produzida
pelos tempos subjetivos. Que pulsa com fios invisíveis nas redes
efêmeras. Que corrói de modo sorrateiro. Que subverte
localmente e produz novas formas de apropriação do tempo e do
espaço.

Tendo como orientações e influência, os estudos desenvolvidos em cotidianos,


busco diálogo para a seguinte questão que delimita o objeto a ser estudado: Quais são as
práticas instituintes do orientador1 educacional dentro do campo escola que contribuem
para o desenvolvimento educativo naquele lugar? Refiro-me as práticas primeiro, porque
é a atividade humana em sua essência, e quão grandioso é se deleitar no novo,
surpreendente e inesperado ato do viver instituinte. Em segundo, referenciando esses atos
instituintes, gostaria de caracterizá-lo como sendo um saber empregando vivencia a
aquele conhecimento produzido sob uma função pré-determinada. A autora Chauí elucida
de forma esplendorosa os conceitos de instituído e instituinte e, trago das palavras da
autora um achado de vida. Percebi que somos incitados a sermos seres instituídos por
toda a nossa existência. Nascemos com um nome determinado, onde não nos
possibilitaram a sua escolha e convivemos com este, até o dia de nosso fim. Somos
instituídos em nossa maneira de vestir, falar, comer, se relacionar em sociedade, se
reproduzir, e assim por diante. É provável que em muitos aspectos sejamos participantes
destes movimentos instituídos, no entanto é necessário pensar até que ponto essa
‘determinação’ acontece ou se é dada, como a autora explica

[...] O saber [..] torna-se aceitável e passível de incorporação quando já


foram acionados dispositivos econômicos, sociais e políticos que
permitam acolher o saber novo não porque seja inovador, nem porque
seja verdadeiro, mas porque perdeu a força instituinte [...] (2003, p. 7).

Por isso, encontro saberes e conhecimentos instituídos o tempo todo, “[...] o


discurso instituído. [...]É aquele no qual a linguagem sofre uma restrição [...] não é
qualquer um que pode dizer a qualquer outro qualquer coisa em qualquer lugar e em
qualquer circunstância (2003, p. 7).” Então, me vi na ilusão de encontrar as práticas
instituintes, sendo ingênua e leiga na arte de investigar. Aprendi com Chauí que o discurso

1
Usarei a palavra no masculino do mesmo modo como aparece na Lei 9.394/96.
13

instituído só se valida quando temos indivíduos sendo objetos sociais, quando os que
deveriam ser sujeitos sociais e políticos se veem na figura reduzida da incompetência.
Procuro pelas práticas instituintes que os sujeitos sociais e políticos produzem
como pano de fundo em um cenário dominador. A excelência nas ações intituintes está
na autonomia de valor, na equidade da diversidade, na validação histórica, na
permanência de um ser, na abundancia dos saberes e nas diversas razões em que
construímos saberes. Tento vislumbrar os saberes instituintes presentes na escola através
da orientação educacional, com seus desafios, possibilidades e enfrentamentos que
compõem essa figura educacional.
E neste movimento que apresento este Trabalho de Conclusão de Curso. Julgo o
tema relevante, pois envolve um assunto de interesse dos que se formam academicamente
e dos que se preocupam em fazer uma educação voltada para a integração de todos os
atores do ambiente escolar através de uma visão participativa e democrática.
Neste sentido, o movimento de pesquisa é caracterizado pelo processo de
associação entre teoria e prática na atuação de pedagogos, interesse e necessidade da
pesquisadora de abarcar a formação institucional deste profissional2 e a compreensão da
ação dinâmica educacional que recaem no cotidiano da escola, assim como, repensar o
papel da escola como protagonista na formação de sujeitos atuantes e participativos,
capazes de respeitar o processo de humanização um dos outros. E também com o intuito
de manifestar a importância do trabalho articulador do orientador educacional nas
instituições de Ensino Fundamental das séries iniciais.

[...]o pesquisador do cotidiano escolar enfrenta o desafio de reinventar


o próprio ato de pesquisar, incorporando a ele a noção da tessitura do
conhecimento em redes de múltiplos saberes, valores e crenças, as
múltiplas interações sociais entre sujeitos dessas redes com suas
diferentes experiências, bem como as emoções e os valores que eles
mobilizam e outras dimensões das suas existências. Tudo isso, para
alguns, em busca da desinvisibilização das práticas cotidianas
emancipatórias presentes em diferentes espaçostempos
escolares.OLIVEIRA; SGARBI, (2008, p. 92).

Nesse contexto, o trabalho configura-se em quatro seções. Na primeira seção


intitulada Metodologia de Pesquisa e Epistemologia, faz-se uma apresentação dos meios
pelos quais se pensou e foi organizada a pesquisa, como o movimento da experiência me

2
Visto que no currículo do Curso de Pedagogia – UFF/INFES não foi oferecido disciplina voltada para a
Orientação Educacional durante o período de minha formação e a certificação do Curso em Pedagogia
habilita para tal.
14

tocou a escrever e refletir sobre o cotidiano da orientação educacional. Compondo a


segunda seção A orientação educacional: histórico, normatização e revisão de literatura
exponho uma breve retrospectiva histórica do serviço de orientação educacional no
contexto brasileiro delimitando o lugar na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
5692/71 e 9394/96. Na terceira seção A atuação do Orientador Educacional no Cotidiano
Escolar trago o meu encontro com esse orientador, suas funções, vivencias e experiências.
Na última, conclusão evidencio o tratamento dos dados coletados e o que se pensou sobre
os resultados. É com este olhar que procuro compreender a participação do Orientador
Educacional no processo de humanização dos sujeitos perpassados no âmbito
educacional.
15

SEÇÃO II
METODOLOGIA DE PESQUISA E EPISTEMOLOGIA

Ninguém caminha sem aprender a


caminhar, sem aprender a fazer o
caminho caminhando, refazendo e
retocando o sonho pelo qual se pôs a
caminhar.
Paulo Freire

Procurei trilhar um caminho de pesquisa metodológica que permitisse andar pelos


diferentes espaços dos quais encontrei para a compreensão deste trabalho. Por isso, penso
com Larrosa sobre a “experiência” enquanto provocação ao pensamento que atravessa
esta pesquisa, visto que foi a partir desta percepção que me evocou a pensar a orientação
educacional. Dialogando com a concepção de Larrosa (2000, p. 21) sobre a experiência,
evidencio como não sendo aquela vivenciada proveniente de um determinado
acontecimento; ou por ter visto, aprendido; muito menos a experiência que lhe tornou
mais forte, autodeterminado e/ou empoderado pelo “saber” desta experiência, não. A
experiência que busco resgatar no cotidiano escolar destes profissionais é aquela que nos
toca, nos alcança, nos permeia, invade e gera em nós transformação. Porque nos passando,
nos forma e principalmente nos transforma. Por isso, trago uma definição sobre essa
experiência que tanto me provoca nas palavras de Heidegger (1987, p. 143 apud Larrosa
2006, p.98)

[...] fazer uma experiência com algo significa que algo nos acontece,
nos alcança; que se apodera de nós, que nos tomba e nos transforma.
Quando falamos em “fazer” uma experiência, isso não significa
precisamente que nós a façamos acontecer, “fazer” significa aqui:
sofrer, padecer, tomar o que nos alcança receptivamente, aceitar, à
medida que nos submetemos a algo. Fazer uma experiência quer dizer,
portanto, deixar-nos abordar em nós próprios pelo que nos interpela,
entrando e submetendo-nos a isso. Podemos ser assim transformados
por tais experiências, de um dia para o outro ou no transcurso do tempo.

Assim, “Fazer uma experiência quer dizer, portanto, deixar-nos abordar em nós
próprios pelo que nos interpela, entrando e submetendo-nos a isso”, portanto permitir-se
a algo do qual não controlamos não nos pertence e não nos completa. Todavia, apenas o
sujeito desta experiência está aberto à própria transformação. Por essa inquietação do não
ser, não poder controlar, não pré-ver e não pré-dizer que proponho esta reflexão.
16

Cunha, (2016) traz em sua fala uma percepção intrínseca sobre o que significa
vivenciar uma experiência que conturba o ser humano. “Essa experiência move o meu
afeto. Nós não delimitamos a experiência, ela permanece em aberto”. Esse pensamento
expressado nas palavras da autora acima, me remete a uma concepção de atravessamento,
quando o indivíduo se vê inserido em um contexto do qual não se premeditou e as relações
e desdobramentos são pulverizadas para as demais compreensões humanas deste sujeito.
Quando nos deparamos, ou percebemos que estamos imersos em um movimento
centrípeto, força resultante que puxa o corpo para o centro da trajetória em um movimento
curvilíneo ou circular, onde nossas conjecturas, sendo-as de cunho social, intelectual,
profissional e familiar, configurando-se em campos teoricamente externos ao fator em
experiência, ainda assim, são aproximados para essa força centrípeta da experiência do
qual eu conceituo.
A experiência é para mim um umbral aberto a vários horizontes. Tomo
emprestadas, também, as palavras extremamente tocantes de MERLEAU-PONTY, (apud
Oliveira, 1999, p. 14) onde pincela “o mundo é não aquilo que eu penso, mas aquilo que
eu vivo; eu estou aberto ao mundo, comunico-me indubitavelmente com ele, mas não o
possuo, ele é inesgotável”. Assim, devaneio nas palavras do autor Leal (2015, p. 402) ao
delegar liberdade ao sujeito em se perceber como um ser inteiro absorvido em sua
experiência. A parte que nos compete a sentir a experiência já não se mantém enquanto
parte, em contrapartida, se torna um todo para que esse mesmo sujeito aprenda a
importância de sentir a pulsação da experiência pelo campo tátil, visual, sensitivo e
mental. Pois assim se percebe a experiência em nós, de forma integral e exponencial.
Essa noção de experiência é tamanha, que não estou somente buscando na
legislação as normatizações do que venha ser o trabalho do orientador educacional. Não
me parece suficiente acreditar na atuação do orientador educacional somente pela sua
disposição legal. Os documentos oficiais são para mim insuficientes para contemplar a
atividade e o afeto com que essa função afeta as pessoas ao seu redor, mesmo ainda
quando proponho a refletir sobre tal registro profissional. Eu busco entender como
acontece dentro da instituição, junto às relações entre os atores que constroem a escola,
suas vivências e táticas presentes nas fugas do dia a dia.
Ao refletir sobre as possíveis táticas que o orientador pode ter e produzir em seu
cotidiano, objetivo primário desta pesquisa, sugiro as palavras de Certeau para esclarecer
minhas proposições acerca desta proposta. O autor nos aponta três ideias que devem ser
consideradas para a compreensão das estratégias e táticas sociais cotidianas.
17

Em um primeiro momento ele nos fala do próprio, um indivíduo (que aqui pode
ter a representatividade de um grupo, organizações, empresas, cidades entre outros)
favorecido de querer e poder, proveniente de um lugar privilegiado que mobiliza e
manipula estratégias. Esse campo é denominado de próprio, sendo o sujeito do querer e
do poder algo. Certeau nos diz “O ‘próprio’ é uma vitória do lugar sobre o tempo. Permite
capitalizar vantagens conquistadas, preparar expansões futuras e obter para si uma
independência em relação à variabilidade das circunstancias” (1994, p. 99). No segundo
momento também é possível compreender a dominação dos lugares pela visibilidade que
a posição do próprio possibilita e consequentemente prever qualquer força estranha que
curse no seu lugar de domínio. “A divisão do espaço permite uma prática panóptica a
partir de um lugar de onde a vista transforma as forças estranhas em objetos que se podem
observar e medir, controlar portanto e ‘incluir’ na sua visão” (1994, p. 100). E no terceiro
momento seria legitimar o poder de um saber por ser determinado a partir do lugar de um
“próprio”, sendo perceptível reconhecer nestas “estratégias” a manutenção e a conquista
deste mesmo poder. “[...] um poder é a preliminar deste saber, e não apenas o seu efeito
ou seu atributo. Permite e comanda as suas características. Ele se produz aí” (1994, p.
100).
Assentadas as ideias, emanam as correlações a respeito das práticas cotidianas
do orientador educacional em razão das táticas que estes desenvolvem. Quando penso, ou
pesquiso as práticas de alguma função ou órgão tenho que compreender as atribuições
pré-determinadas para aquele ofício. E mais ainda, de onde (campo, ordem, setor, regime,
repartição) partiram tais instruções para a execução das atividades pertinente ao cargo.
Quando me reporto as palavras do Certeau são justamente para compreender o universo
administrativo que envolve a minha pesquisa. O autor fala sobre o poder do “próprio” que
administra e influencia nas competências dos que estão subordinados a este campo de
poder. Pensado isso, são as táticas que este profissional usa em seu cotidiano inundado
nesta concepção, que quero conhecer.
Certeau caracteriza tática como “a ação calculada que é determinada pela
ausência de um próprio” (1994, p. 100). A estes é necessário usar da ausência do próprio
para articular suas intervenções, façanhas, obras e práticas. Desta maneira, é através das
táticas que os sujeitos não detentores daquele mesmo lugar se movimentam, chegando até
a subverter, de modo silencioso e astuto os ambientes do poder e querer determinados em
uma esfera social. A tática é a arte do fraco, é a maneira como o outro que não se torna
próprio, se faz para articular, subverter e viver frente as determinações do forte/próprio.
18

Ele trabalha com o tempo, usando dos momentos e ocasiões para armazenar proveitos,
ampliar a posse e pressagiar saídas, válvulas de escape em meio a sujeição do forte.
Enquanto a estratégia é, por manifestação, atitudes desenhadas pelo titular do lugar de um
próprio para se conservar dominante.

A tática não tem por lugar senão o do outro. E por isso deve jogar com
o terreno que lhe é imposto tal como o organiza a lei de uma força
estranha. Não tem meios para se manter em si mesma, à distância, numa
posição recuada, de previsão e de convocação própria: a tática é o
movimento “dentro do campo de visão do inimigo” [...] e no espaço por
ele controlado. Ela não tem portanto a possibilidade de dar a si mesma
um projeto global nem totalizar o adversário num espaço distinto,
visível e objetivável. Ela opera golpe por golpe, lance por lance.
Aproveita as “ocasiões” e delas depende, sem base para estocar
benefícios, aumentar a propriedade e prever saídas. O que ela ganha não
se conserva. [...] Aí vai caçar. Cria ali surpresas. Consegue estar onde
ninguém espera. É astúcia (CERTEAU, 1994, p. 101).

Em suma, a pesquisa sobre as práticas instituintes do orientador educacional


dentro do campo escola, que contribuem para o desenvolvimento educativo, oportuniza
evidenciar as estratégias e táticas cotidianas. Destacando as formas pelas quais práticas
sociais abarcam relações com interesses de cunho convergente e divergente em relação
as inserções contextuais dos diferentes sujeitos envolvidos no espaço de disputa entre
forte e fracos.
Este trabalho reuniu ideias a partir de pesquisas tanto de caráter documental, assim
como, de pesquisas de campo com observação direta. Além de percorrer os caminhos
documentais, adentrei o cotidiano escolar de forma a alimentar reflexões sobre a
orientação educacional junto à pesquisa etnometodológica.
A partir da pesquisa documental busquei na legislação as transformações
ocorridas na função de orientador educacional apoiadas na comparação da Lei 5692/71
em referência a Lei 9394/96 – ambas são Leis de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, e as alterações e discussões que se apresentam para o campo da educação e a
formação de pedagogos a partir das mesmas. Esses documentos se encontram disponíveis
na internet, no site do Planalto, Câmara dos Deputados/RJ dentre outros sites que também
disponibilizam o arquivo, inclusive comentado.
Busquei também artigos de teóricos que se debruçam sobre a temática para
elucidar e enriquecer esta pesquisa, visto que são produções importantes e de pessoas que
pensam sobre o trabalho da Orientação Educacional há mais tempo e com mais
19

experiência. Cito neste trabalho contribuições de Carvalho. Maria, T., (1994); Grinspun.
Libâneo. José, C.,(2011);MírianPaura. Z., (2008); Pimenta. Selma, G.,(2011);Santos.
Marcos, Pereira., (2011) entre outros autores que também pesquisam a orientação
educacional. Procurei em cada autor um perfil para cada profissional, seja em âmbito
educacional ou acadêmico e tentei vincular com os dados que colhi na pesquisa
etnometodológica realizada em campo, ou seja, ambiente escolar onde eu me encontro
com este orientador.
Venho de alguma forma elucidá-los sobre o termo, que para mim é tão novo e
inesperado, quanto suponho que seja para você também, leitor. O termo etnometodologia
enquanto abordagem de pesquisa empírica surgiu nos anos 1960 nos Estados Unidos,
tendo como principal marco fundador a publicação do livro de Harold Garfinkel (Estudos
sobre Etnometodologia em 1967).
A etnometodologia estuda fenômenos sociais, aqueles que estão disponíveis em
atividades humanas incorporadas, sensíveis, de fala e ação. Recebeu influência de teorias
que constituem outros elementos filosóficos, métodos e tipos de pesquisas. Pode-se
afirmar que a etnometodologia não trata de um método, mas de uma abordagem teórico-
metodológica de pesquisa, a qual situa, no cerne da sua proposta, o estudo dos métodos
que os membros da sociedade empregam, de maneira conjunta, para organizar as
definições das atividades práticas diárias (Mehan e Wood;Zimmerman, 1976 apud
Oliveira; Montenegro, 2012, p. 134).A etnometodologia é assim compreendida, porque
ela pretende investigar os métodos; logo, não faz sentido entendê-la como um método em
si, isolado.
A Etnometodologia faz a contemplação de outros conceitos nucleares desta
teórica-metodológica, bem como: a noção das Práticas e Realizações – como as coisas
acontecem, como se dá o entendimento sobre esses eventos, qual a relação destas práticas
e a estrutura em que estas se reúnem; a Indicialidade – que se codificam nas linguagens
que vinculam a palavra a uma situação, sentido distinto nas situações em que é usada; a
Reflexividade - se configura pela maneira de pensar, e planejar as ações a seguir,
propiciando uma segurança ontológica para a ação dos indivíduos; a Relatabilidade –
apoia-se na lógica da reflexividade, pois parte do princípio de uma reflexividade
consciente, o indivíduo pode ainda que minimamente, descrever por meio da linguagem,
de forma inteligível e descritível um determinado evento, tornando-o assim, relatável ; e
por último a noção de Membro - onde os indivíduos tem capacidade suficiente
de“dominar naturalmente um conjunto de modos de agir, de métodos, de atividades, de
20

uso da linguagem para dar sentido ao mundo que os cercam” Coulon, (1995, p. 48 apud
Oliveira; Montenegro, 2012 p. 136).
Em síntese, a abordagem teórico-metodológica de pesquisa,
ETNOMETODOLOGIA, visa investigar o método que o outro sujeito faz cotidianamente
em sua prática, pensando assim como o indivíduo se organiza e pensa suas atividades.
Essa metodologia de pesquisa me aguça a compreender como a construção deste mundo
social se organiza; e a partir de então, conhecendo como esses membros constroem suas
atividades, investigando empiricamente os métodos que os mesmos produzem e utilizam
para realizar ações cotidianas, buscando compreender os sentidos a partir dos quais estes
métodos são criados.
A intenção de produzir esse material mina da responsabilidade inerente de se
refletir sobre esse orientador educacional que pretendo ser. E a função que esse
profissional exerce na escola e como ele está sendo constituído no cotidiano. Por isso,
pondero minhas questões analisando as transformações da nomenclatura do Orientador
Educacional que as Leis 5692/71 e Lei 9394/96 – ambas Leis de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional. E também como esse processo ocorre na realidade de uma escola do
interior do Rio de Janeiro, no Noroeste Fluminense no ano de 2015. É importante
delimitar o espaçotempo de onde reflito e pesquiso para não corremos o risco de
generalizar as informações encontradas.
Pretendo apresentar de forma clara e sucinta as modificações na definição de
função deste profissional que encontro nas respectivas leis e pensar sobre essas alterações
contrapondo o cotidiano deste orientador educacional de educação infantil. Bem como,
as atribuições oficiais que regem a ação do Orientador educacional no cotidiano da escola
e a efetiva participação deste indivíduo como coadjutor social presente no ambiente
educacional.
21

SEÇÃO III
A ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL: HISTÓRICO, NORMATIZAÇÃO E
REVISÃO DE LITERATURA

Não há saber mais ou saber menos: Há


saberes diferentes.
Paulo Freire

3.1 Alguns poucos dados históricos sobre a Orientação Educacional

A discussão sobre o histórico da orientação Educacional no Brasil baseia-se na


orientação profissional que se dava nos EUA por volta de 1930, indo posteriormente de
encontro com a história de formação do curso de Pedagogia em nosso país (Pimenta,
2011, p.11) “instituído no Brasil em 1939, o curso de Pedagogia formava bacharéis
denominados ‘técnicos em educação’”. Para propósito deste assunto, tomemos por
referência Pimenta, 2002 apenas para vislumbrarmos de forma mais acurada a gênese do
nascimento da orientação educacional. A autora aborda, que a necessidade de instituir a
orientação educacional parte da insuficiência da orientação profissional. Com a divisão
do trabalho intelectual para os denominados sujeitos dominantes e, o trabalho manual
para os leigos e dominados, a orientação profissional, se desenvolveu aprimorando suas
estratégias e procedimentos laborais.

O desenvolvimento da industrialização e do processo produtivo, em


meados da década de 1930, passa a exigir do trabalhador hábitos,
atitudes e conhecimentos, o que pode ser entendido como uma
“capacitação profissional”, adquirida previamente a entrada no
emprego. Entendida como um conjunto de habilidades básicas para o
necessário ajustamento às funções produtivas, esta “capacitação
profissional” era adquirida na escola. (PIMENTA, 2002, p. 20-21)

A escola como manjedoura dos desejos da sociedade capitalista, tratou de


corresponder as necessidades que se inauguravam no momento de grande
desenvolvimento econômico no pais, atuando coadjuvantemente à medida que reproduz
essa força de trabalho voltada para os interesses burgueses. A orientação profissional
passa a ser realizada no interior da escola como maneira de orientar os alunos a
escolherem planos de estudo e carreira se preparando adequadamente conforme as
aptidões de cada um. Esta orientação está intitulada de escolar.
Contudo, todos os sistemas de adequação não estavam abarcando as necessidades
que chegavam até as empresas. A triagem profissional, o orientador profissional e a
22

orientação escolar era insuficientes para respaldar o ser humano. Os contingente de


funcionários infrutíferos só aumentava, fazendo com que seus empregadores se
preocupassem com o seu aproveitamento. Então surge a necessidade do ajustamento do
homem no trabalho, o que provoca um grande impulso nas pesquisas a respeito de qual
profissional estaria apto a dissolver este problema. Assim está posta a substituição da
orientação profissional para a orientação educacional.

[...] pode-se afirmar que a orientação no Brasil tem seus pressupostos


técnicos iniciais na concepção liberal tradicional da educação, à medida
que afirma o desenvolvimento humano baseado nas diferenças
individuais que devem ser ajustadas no todo social orgânico.
(PIMENTA, 2002, p. 27)

Avistava-se na orientação educacional uma forma de obter amplos resultados com


os jovens estudantes, onde a missão escolar também apregoava a doutrinação do corpo,
da mente e do psicológico humano. Com o intuito de regular sua vida para atender a
demanda do meio social iminente da época: o trabalho, e a incumbência desta artimanha
recaia sobre o mérito dos orientadores educacionais.

A especificidade da orientação educacional será, pois, de ajudar o


adolescente escolar a obter um desenvolvimento integral e harmonioso
com sua personalidade. Por personalidade desenvolvida integral e
harmoniosamente entende-se a personalidade ajustada a si mesma, às
características individuais em consonância com o meio ambiente
(escola, família e trabalho). (PIMENTA, 2002, p. 27)

Agora que conseguimos compreender, ainda que de modo simplistas, as origens


da orientação educacional, transportemos nossos olhares e reflexões para o Brasil. E se
organizando por períodos, gostaria de destacar alguns referenciando a formação de
docentes através do curso de licenciatura em pedagogia. O período que vai de 1939 a
1972, traz consigo alguns documentos que regulamentam o curso de pedagogia durante
seus anos de existência: o Decreto-Lei nº 1.190, de 4 Abril de 1939, o Parecer CFE nº
251/62 e o Parecer CFE nº 252/69, sendo regulamentações que fundamentam legalmente
o curso por mais de três décadas, e ainda não se tem documento que substitua os
regimentos considerados tão importantes para a classe.

Decreto-Lei nº 1.190, de 4 Abril de 1939


23

Art. 2º A Faculdade Nacional de Filosofia compreenderá quatro secções


fundamentais, a saber:
a) secção de filosofia;
b) secção de ciências;
c) secção de letras;
d) secção de pedagogia.
Art. 7º A secção de pedagogia constituir-se-á de um curso ordinário:
curso de pedagogia.
Art. 19. O curso de pedagogia será de três anos e terá a seguinte seriação
de disciplinas:
Primeira série
1. Complementos de matemática.
2. História da filosofia.
3. Sociologia.
4. Fundamentos biológicos da educação.
5. Psicologia educacional.
Segunda série
1. Estatística educacional.
2. História da educação.
3. Fundamentos sociológicos da educação.
4. Psicologia educacional.
5. Administração escolar.
Terceira série
1. História da educação.
2. Psicologia educacional.
3. Administração escolar.
4. Educação comparada.
5. Filosofia da educação.
Art. 48. Aos alunos que concluírem seriadamente os cursos ordinários,
de que tratam os arts. 9 a 19 desta lei, serão conferidos,
respectivamente, os seguintes diplomas de bacharel: [...]
11) bacharel em pedagogia.
Art. 51. A partir de 1 de janeiro de 1943 será exigido:
b) para o preenchimento dos cargos ou funções de assistentes de
qualquer cadeira, em estabelecimentos destinados ao ensino superior da
filosofia, das ciências, das letras ou da pedagogia, o diploma de
licenciado correspondente ao curso que ministre o ensino da disciplina
a ser lecionada;
c) para o preenchimento dos cargos de técnicos de educação do
Ministério da Educação, o diploma de bacharel em pedagogia.
Parágrafo único. Caberá à lei federal determinar a data a partir da qual
será exigido o diploma de licenciado, obtido nos termos da presente lei,
para o preenchimento dos lugares de professores catedráticos dos
estabelecimentos destinados ao ensino superior da filosofia, das
ciências, das letras e da pedagogia.
Art. 58. Os bacharéis em pedagogia, que se matricularem no curso de
didática não serão obrigados à frequência nem aos exames das
disciplinas, que hajam estudo no curso de pedagogia.

Desde o início de seu nascimento, a regulamentação do curso de Pedagogia


apresentava deficiências quanto a formação da sua identificação. Manchope, (2004, p.
24

3865) discute que ainda permanecia limitado o campo de atuação deste profissional, visto
que, as opções presentes no texto era apenas que o licenciado atuaria em sala de aula e ao
bacharel cabiam as funções técnicas, coordenação pedagógica, organização burocrática
do sistema de ensino, entre outras funções.
Já o Parecer CFE nº 251/62 tentou entender a questão existente, se a formação do
professor (a) primário (a) deveria acontecer em âmbito superior, e a dos técnicos da
educação em nível de pós-graduação, pensando ser questões possíveis para o futuro. Em
relação ao curso de Pedagogia sua intenção não era que fosse extinto, mas que fosse
remodelado para que sua definição pudesse ser compreendida com clareza. O parecer
descarta a hipótese de extinção do curso e parte para uma redefinição, principalmente no
que se referia ao cargo de técnico em educação, ou o bacharel, já que este profissional era
modelado a todas as atividades não-docentes dentro do nível educacional. Em razão disso
começa a se desenhar uma nova função ou um novo campo de trabalho que começa a
surgir na década de 50. Assim abrindo novos caminhos ao bacharel em Pedagogia, na
forma conseguir de esclarecer sua identidade Manchope, (2004, p. 3865-3866).
O curso de Pedagogia nos anos 1960 passa a formar bacharéis e licenciados. O
Parecer CFE nº 252/69 acarretou um estufamento do curso por causa das diversas
especialidades que a formação em pedagogia agora habilitava. O indivíduo que cursava
pedagogia estaria habilitado para lecionar o ensino normal (licenciado), e também apto
para exercer a função de especialista nas atividades de orientação, administração,
supervisão e inspeção dentro das escolas e do sistema escolar. “Mexeu-se também no
currículo, este agora estava estruturado para uma base comum de estudos, e ao
especialista oferecia a habilitação específica para os conjuntos de tarefas” Manchope,
(2004, p. 3866). O pedagogo então passa a ser um professor (a) para diferentes disciplinas
dos então cursos ginasial e normal.
Santos, (2012, p. 142) relata que durante a gestão governamental no final da
década de 1960, a classe dominante propagava uma imagem de um país harmonioso e
sem problemas, no entanto, o país convivia com a repressão e a violência, assim como,
com discussões acerca da implantação de uma legislação educacional. Sendo assim, a
proposta educacional pensada para aquele momento deveria atender aos interesses de uma
classe para atingir objetivos alheios. Tanto se faz essa afirmativa que o projeto de reforma
do Ensino de 1º e 2º Graus foi planejada pela “cúpula” do sistema, sem qualquer consulta
aos professores e demais agentes educacionais.
25

Já no final dos anos 1970, emerge o movimento de redefinição dos cursos de


Pedagogia voltando os olhares à regulamentação da formação dos profissionais desta área
no contexto social pelo qual o Brasil enfrentava no momento da construção da Lei5.692
de 11 de Agosto de 1971. Temos as funções do curso de pedagogia aprovadas e
homologadas pelo Ministro da Educação e Cultura. Foi a partir da implementação desta
Lei que regularizou a função de professor (a) e da figura dos especialistas para atuarem
no sistema de ensino brasileiro.
O capítulo V da Lei 5.692/71 faz menção à formação e ingresso de professores e
“especialistas” no ensino brasileiro.

Art. 29. A formação de professores e especialistas para o ensino de 1º e


2º graus será feita em níveis que se elevem progressivamente,
ajustando-se às diferenças culturais de cada região do País, e com
orientação que atenda aos objetivos específicos de cada grau, às
características das disciplinas, áreas de estudo ou atividades e às fases
de desenvolvimento dos educandos. [...]
Art. 33. A formação de administradores, planejadores, orientadores,
inspetores, supervisores e demais especialistas de educação será feita
em curso superior de graduação, com duração plena ou curta, ou de pós-
graduação.
Art. 34. A admissão de professores e especialistas no ensino oficial de
1º e 2º graus far-se-á por concurso público de provas e títulos,
obedecidas para inscrição as exigências de formação constantes desta
Lei.
Art. 35. Não haverá qualquer distinção, para efeitos didáticos e
técnicos, entre os professores e especialistas subordinados ao regime
das leis do trabalho e os admitidos no regime do serviço público. [...]
Art. 38. Os sistemas de ensino estimularão, mediante planejamento
apropriado, o aperfeiçoamento e atualização constantes dos seus
professores e especialistas de Educação.
Art. 39. Os sistemas de ensino devem fixar a remuneração dos
professores e especialistas de ensino de 1º e 2º graus, tendo em vista a
maior qualificação em cursos e estágios de formação, aperfeiçoamento
ou especialização, sem distinção de graus escolares em que atuem.
Art. 40. Será condição para exercício de magistério ou especialidade
pedagógica o registro profissional, em órgão do Ministério da Educação
e Cultura, dos titulares sujeitos à formação de grau superior.

As medidas contidas no texto da Lei 5.692/71 trazem reformulações norteadas


pela concepção tecnicista de ensino atendendo a ideologia do governo militar.
Principalmente ao sistema educacional quando no Artigo 33 a lei faz menção “A
formação de administradores, planejadores, orientadores, inspetores, supervisores e
demais especialistas de educação será feita em curso superior de graduação, com duração
26

plena ou curta, ou de pós-graduação”, fazendo com que as atribuições de cada cargo


fiquem a mérito dos Estatutos. Em contrapartida, é satisfatório pensar que cada jurisdição
encontre o melhor caminho para compor as atividades de seus colaboradores conhecendo
a realidade da sua comunidade social.
A análise que forço a fazer é a uniformização de administradores, planejadores,
inspetores e supervisores na mesma assimilação que os orientadores. Administradores,
planejadores, inspetores e supervisores se enquadram em um nível de distanciamento dos
professores, pois o objetivo destas funções era de cunho normatizador e para inspecionar
o trabalho do docente no contexto histórico de 1970, quando a lei foi decretada.
Por isso, indago o Art. 33 capítulo V da Lei 5.692/71 quando classifica
administradores, planejadores, orientadores, inspetores, supervisores e demais
especialistas de educação no mesmo grau de execução. Não entro no mérito de formação
pois é imprescindível para qualquer indivíduo que almejar esse tipo de responsabilidade.
Defendo que para cada função deveríamos ter uma formação especifica correspondente
as suas atribuições, porém temos como contra resposta as especializações e/ou formações
continuadas que cada estatuto municipal se encarrega de oferecer visando a realidade
social de seus municípios. Entendo que os orientadores são perfis que necessitam
trabalhar em proximidade ao docente dentro do desenvolvimento do trabalho na escola.
Na apreciação da lei também se percebe a mensagem implícita de organizar a o
sistema educacional a fim de garantir a propagação de ideias progressistas favorecendo o
desenvolvimento que se pretendia implantar no período vigente.

O modelo que a Lei nº 5692/71 trazia implícito era da escola a serviço


do desenvolvimento econômico do pais, escola esta descentralizada e
voltada para os interesses da comunidade na qual se inserisse. Essa
“idealização” via na escola um sistema social formado por grupos e
subgrupos (alunos, professores, técnicos e comunidade) interagindo
entre si e constituindo um todo orgânico e harmonioso. (ROSERLEY,
1991, p. 24)

A característica marcante desta lei está vinculada ao momento sócio-político em


qual o nosso país se encontrava. O início da década de 1970 foi turbulento em vista dos
anos decorrido anteriormente. Tínhamos um país envolvido em um crescimento
econômico “milagroso”, a educação posta como instrumento de forças para a perpetuação
do modelo da sociedade e os opositores desta forma de organização, sendo oprimidos
pelo governo militar operante.
27

Com o fim do “Milagre econômico” em meados dos anos 1970 e fortes


pressões sobre o regime militar, planos e programas foram
implementados junto às populações das áreas mais pobres. Ainda no
final dessa década, a profissionalização universal e compulsória
empreendida pela lei n. 5.692/71 é flexibilizada pelo Parecer do CFE n.
75/76 e consolidada pela lei n. 7.044/82 com as seguintes alterações: a)
substituição de “qualificação para o trabalho” por “preparação para o
trabalho”; b) absorção de “preparação para o trabalho” como elemento
da “formação integral do aluno” em caráter obrigatório no ensino de 1o
e 2o graus; e c) conversão da habilitação profissional em opção dos
estabelecimentos de ensino. (CIAVATTA; RAMOS, 2012, p. 16)

Percebemos que a trajetória de normatização da formação dos profissionais de


educação foi caminho árduo e repleto de percalços. Sempre envolto por políticas de
educação voltadas aos interessas da sociedade, e com o intuito de harmonizar ânimos e
movimentos que pudessem se opor e incomodar o governo. Foi um período com intensa
participação e governabilidade militar. Com ações e políticas de cunho coercitivo,
punitivo e controlador.
Se pensarmos em outras palavras próximas, parecidas, sinônimas do termo
“vigiar”, encontraremos tais conceitos: verificar, fiscalizar, supervisionar, inspecionar,
monitorar, controlar, superintender, entre outros. Quando me remeto a algum destes
termos, a reminiscência que vem à tona são de órgãos de controle, fiscalização e
cobranças presentes em nossa sociedade. E esses conceitos foram e estão transportados
intencionalmente para a organização das instituições educativas, e com o intuito de
fiscalizar, cobrar, vigiar e punir seus submissos.

[...] é um tipo de colocação dos corpos no espaço, cuja distribuição dos


indivíduos se efetua em relação mútua, i.e., numa organização
hierárquica, com disposição dos centros de canais de poder, definindo
os instrumentos e os modos de intervenção que se podem utilizar em
locais como os hospitais, as escolas ou as prisões (idem). Podemos,
pois, dizer que o poder disciplinar depende da criação de arranjos
físicos nos quais as pessoas são monitorizadas nos mais diversos e
minuciosos detalhes das suas atividades. Funciona pela divisão,
isolamento e codificação do espaço, permitindo a gestão detalhada e
treino da conduta, organizando os movimentos dos corpos no espaço
através do tempo. (BARNETT, 1999 apud PEREIRA, 2006, p. 119)

Trago essa junção de ideia justamente para nos fazer pensar. Desconheço órgãos
de fiscalização com a nomenclatura de orientação ou sinônimos que vinculem outras
formas de observação a este conceito. Visto que orientar não tem a ver com verificar,
28

fiscalizar, supervisionar, inspecionar, monitorar, controlar, superintender alguém ou


alguma coisa. Orientar vai além. Além das circunstâncias, além das necessidades, além
das possibilidades, além de capacidades, vai além das pessoas. Orientar é encaminhar
para vida. Fazendo o contraponto, e pensando em palavras próximas, sinônimas ao
conceito de “orientar”, encontro: guiar, encaminhar, dirigir, direcionar, conduzir, nortear,
aconselhar, instruir, estimular, ensinar, influenciar, encarrilhar, e ainda no sentido
autônomo da palavra, orientar pode ser: regular-se ou governa-se. Por isso, o orientador
educacional tem que pensar e agir além do presente, tem que estar próxima do professor
(a) e de suas mazelas durante o processo de aprendizagem ocorrido em sala de aula.
Findando a década dos anos de 1980, as mudanças de reorganização das relações
de sociais, e acrescentando as novas formas de vínculo com o trabalho, e a implementação
de uma nova LDB, começaram a surgir na sociedade questionamentos sobre uma
formação de um novo tipo que abrangesse os campos políticos que se comprometesse
com a cidadania. Surgindo assim, “uma mobilização em torno da reformulação curricular
no interior das instituições federais pela implantação de um currículo comum da educação
tecnológica baseada na conexão entre ensino e trabalho, excluindo a oposição entre
cultura e profissão” (Ciavatta; Ramos, 2012, p. 16).
O papel do profissional especialista na área da educação sempre esteve ligado as
políticas educacionais através do controle e manutenção da ordem estabelecida. Visto que
a legislação das reformas de ensino iam de encontro com as propostas de instituições
financeiras de grande porte e influencia sócio-política (Santos, 2011, p. 168). Assim
como, a função do especialista na figura do Orientador Educacional, foi se reorganizando
para atender as necessidades educacionais que fermentavam no país. É neste sentido, que
buscarei refletir sobre os aspectos da Lei Federal nº 9.394 de 20 de Dezembro de 1996, e
também conhecida como a Lei Darcy Ribeiro.
Trago para refletirmos o Título VI do capítulo que diz respeito aos profissionais
de educação. Suas funções, ordens, e organizações, bem como, a formação específica
necessária para os respectivos cargos de cunho educacional. Analisemos tão somente, o
Art. 64, dos quais demonstram progresso em relação a normatização da formação dos
especialistas de ensino.

Art. 61. Consideram-se profissionais da educação escolar básica os


que, nela estando em efetivo exercício e tendo sido formados em cursos
reconhecidos, são:
29

I – professores habilitados em nível médio ou superior para a


docência na educação infantil e nos ensinos fundamental e médio;
II – trabalhadores em educação portadores de diploma de
pedagogia, com habilitação em administração, planejamento,
supervisão, inspeção e orientação educacional, bem como com títulos
de mestrado ou doutorado nas mesmas áreas;
III – trabalhadores em educação, portadores de diploma de curso
técnico ou superior em área pedagógica ou afim.
IV - profissionais com notório saber reconhecido pelos
respectivos sistemas de ensino, para ministrar conteúdos de áreas afins
à sua formação ou experiência profissional, atestados por titulação
específica ou prática de ensino em unidades educacionais da rede
pública ou privada ou das corporações privadas em que tenham atuado,
exclusivamente para atender ao inciso V do caput do art. 36;
V - profissionais graduados que tenham feito complementação
pedagógica, conforme disposto pelo Conselho Nacional de
Educação.
Parágrafo único. A formação dos profissionais da educação, de
modo a atender às especificidades do exercício de suas atividades, bem
como aos objetivos das diferentes etapas e modalidades da educação
básica, terá como fundamentos:
I – a presença de sólida formação básica, que propicie o
conhecimento dos fundamentos científicos e sociais de suas
competências de trabalho;
II – a associação entre teorias e práticas, mediante estágios
supervisionados e capacitação em serviço;
III – o aproveitamento da formação e experiências anteriores, em
instituições de ensino e em outras atividades.
Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica
far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura plena, admitida,
como formação mínima para o exercício do magistério na educação
infantil e nos cinco primeiros anos do ensino fundamental, a oferecida
em nível médio, na modalidade normal.
§ 1º A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios, em
regime de colaboração, deverão promover a formação inicial, a
continuada e a capacitação dos profissionais de magistério.
§ 2º A formação continuada e a capacitação dos profissionais de
magistério poderão utilizar recursos e tecnologias de educação a
distância.
§ 3º A formação inicial de profissionais de magistério dará
preferência ao ensino presencial, subsidiariamente fazendo uso de
recursos e tecnologias de educação a distância.
§ 4o A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios
adotarão mecanismos facilitadores de acesso e permanência em cursos
de formação de docentes em nível superior para atuar na educação
básica pública.
§ 5o A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios
incentivarão a formação de profissionais do magistério para atuar na
educação básica pública mediante programa institucional de bolsa de
iniciação à docência a estudantes matriculados em cursos de
licenciatura, de graduação plena, nas instituições de educação superior
§ 6o O Ministério da Educação poderá estabelecer nota mínima
em exame nacional aplicado aos concluintes do ensino médio como pré-
requisito para o ingresso em cursos de graduação para formação de
docentes, ouvido o Conselho Nacional de Educação - CNE.
30

§ 7o (VETADO).
§ 8o Os currículos dos cursos de formação de docentes terão por
referência a Base Nacional Comum Curricular.
Art. 62-A. A formação dos profissionais a que se refere o inciso
III do art. 61 far-se-á por meio de cursos de conteúdo técnico-
pedagógico, em nível médio ou superior, incluindo habilitações
tecnológicas.
Parágrafo único. Garantir-se-á formação continuada para os
profissionais a que se refere o caput, no local de trabalho ou em
instituições de educação básica e superior, incluindo cursos de
educação profissional, cursos superiores de graduação plena ou
tecnológicos e de pós-graduação.
Art. 63. Os institutos superiores de educação manterão:
I - cursos formadores de profissionais para a educação básica,
inclusive o curso normal superior, destinado à formação de docentes
para a educação infantil e para as primeiras séries do ensino
fundamental;
II - programas de formação pedagógica para portadores de
diplomas de educação superior que queiram se dedicar à educação
básica;
III - programas de educação continuada para os profissionais de
educação dos diversos níveis.
Art. 64. A formação de profissionais de educação para
administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação
educacional para a educação básica, será feita em cursos de
graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da
instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum
nacional.
Art. 65. A formação docente, exceto para a educação superior,
incluirá prática de ensino de, no mínimo, trezentas horas.
Art. 66. A preparação para o exercício do magistério superior far-
se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de
mestrado e doutorado.
Parágrafo único. O notório saber, reconhecido por universidade
com curso de doutorado em área afim, poderá suprir a exigência de
título acadêmico.
Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos
profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos
estatutos e dos planos de carreira do magistério público:
I - ingresso exclusivamente por concurso público de provas e
títulos;
II - aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com
licenciamento periódico remunerado para esse fim;
III - piso salarial profissional;
IV - progressão funcional baseada na titulação ou habilitação, e
na avaliação do desempenho;
V - período reservado a estudos, planejamento e avaliação,
incluído na carga de trabalho;
VI - condições adequadas de trabalho.
§ 1o A experiência docente é pré-requisito para o exercício
profissional de quaisquer outras funções de magistério, nos termos das
normas de cada sistema de ensino.
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 5º do art. 40 e no § 8o do
art. 201 da Constituição Federal, são consideradas funções de
magistério as exercidas por professores e especialistas em educação no
31

desempenho de atividades educativas, quando exercidas em


estabelecimento de educação básica em seus diversos níveis e
modalidades, incluídas, além do exercício da docência, as de direção de
unidade escolar e as de coordenação e assessoramento pedagógico.
§ 3oA União prestará assistência técnica aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios na elaboração de concursos públicos para
provimento de cargos dos profissionais da educação.

A mensagem da nova legislação presente na Lei 9.394/96 não apresentou


novidades aos sujeitos do meio educacional. Pois, encontramos implicitamente os
caminhos correspondendo aos objetivos de política econômica, com o intuito de organizar
a base educacional para atender as demandas da classe dominante. Segundo Falcão Filho
(1998), “todas as legislações educacionais que antecederam a Lei 9.394/96 sempre
tiveram comprometidas com o autoritarismo, a centralização, a rigidez, a desconfiança da
maioria dos educadores e os interesses das minorias socioeconômicas privilegiadas”.
Libâneo e Pimenta, (1999, p. 240) ressalta que através desta legislação a posição
atualmente assumida é que a presença do pedagogo se tornou uma necessidade nas escolas
de modo geral, pois ultrapassando as salas de aula, configura-se como primordial na busca
por uma escola que se organize e se faça democrática. O esforço em que se tem debruçado,
é de transpor a barreira do corporativismo em que o ‘especialista’ se fez e refletir sob uma
nova perspectiva deste profissional no processo de democratização da escolaridade.
Santos, (2012, p. 171) “[...] mais uma vez, esse papel não aparece claramente definido
nos documentos oficiais do Governo brasileiro para a Educação. Ao contrário, encontra-
se “desenhado” implicitamente nas entrelinhas das propostas do Banco Mundial [...]”.
O Art. 64 conforme destaque, vem sendo alvo para muito debate no campo da
educação. Pois, além de normatizar a formação dos profissionais que irão atuar na escola
dos diversos níveis hierárquicos e instancias pedagógicas, deixa a cargo das instituições
de ensino a grade curricular, respeitando apenas a base comum nacional. Mesmo sendo
reconhecido como um avanço na legislação educacional, a unidade de ensino compor a
imagem que deseja para o pedagogo de seu curso, ainda assim, não é tudo.
Em contrapartida, um aspecto ponderante na lei é justamente o da flexibilidade
dos sistemas de ensino estruturarem seus currículos de acordo com a regionalidade
brasileira. Temos avanços nesta área. Entretanto, precisamos de pedagogos com
conhecimento acerca de tais assuntos para abarcar essa necessidade, mesmo que essa
32

atividade venha requerer dos professor-pedagogo3 fundamentos filosóficos, psicológicos,


políticos, econômicos entre outros.
Todavia, ainda é por meio de ranços e avanços que a legislação da Lei 9.394/96
tem atendido as necessidades da educação brasileira e também a maioria das expectativas
dos educadores. Mesmo tendo muito caminho ainda a percorrer, já é um grande passo ao
processo de democratização da educação no Brasil.
A experiência que o especialista carrega consigo é importante para a realização
do seu papel frente aos demais profissionais da instituição educacional. Pinto,(2011, p.
188) diz respeito da hierarquia funcional. Que uma vez estabelecida na escola, só resulta
em reconhecimento, quando o trabalho executado pelo especialista de ensino refere-se a
realidade de sala de aula vivenciada pelo professor (a). E isso acontece em grande parte,
quando o especialista tem experiência docente. Pois a fala é sentida com mais propriedade
e conhecimento do mesmo chão que o docente pisa. Pinto, (2011, p. 189)relata ainda,
uma crítica onde os docentes ocasionavam dúvida em relação ao trabalho do especialista
quando, “sem experiência docente mandavam os professores ‘fazerem’ de determinado
modo, algo que eles próprios não sabiam direito ‘como fazer’”.
Existe algumas questões que ainda circundam os pesquisadores em relação à
docência como base de formação do profissional da educação conforme o autor Pinto
expressa “uma das brechas a serem preenchidas é investigar o princípio de que a
‘docência deva se se constituir na base de formação e/ou identidade de todo profissional
do ensino’, [...] e ponto de discórdia ainda hoje, entre os pesquisadores” (2011, p. 162).
A experiência em habilitar o especialista da educação a partir do professor (a) do ensino
fundamental, faz com que o movimento entre a teoria e prática pedagógica aconteça de
forma facilitada visando essa experiência docente. Acreditamos que essa articulação e a
presença de resultados, evidenciem a defesa da docência como pré-requisito e base para
a formação do especialista de ensino, Pinto (2011, p. 162). Todavia, grande se mostrou o
desafio em conciliar tais funções no interior da formação do especialista de educação.

Esta proposta de formação dos especialistas de ensino foi homologada


na época pelo MEC e logo em seguida sustada no próprio ministério.
Ainda no final da década de 1970, ela foi reativada e posteriormente
arquivada de vez, em decorrência da movimentação de educadores, [...]
professores e alunos universitários se mobilizam num movimento de

3
Segundo as pesquisas de Santos, (2012, p. 169), neste contexto, o professor-pedagogo pode ser entendido
como aquele profissional encarregado de prestar assessoria técnica, didática, pedagógica e metodológica
aos professores em suas atividades educativas no interior da instituição-escola.
33

resistência às proposições do CFE (Conselho Federal de Educação). [...]


as propostas de reformulação dos cursos do magistério [...] foram
norteadas pela concepção tecnicista de ensino, de acordo com a
ideologia tecnocrática do governo militar. [...] a proposta de sua
formação reforçava os pressupostos da racionalidade e eficiência, à
medica que mantinha a rigidez na compartimentalização das funções
dos diferentes especialista (PINTO, 2011, p. 163-168).

Ainda sobre a discussão de formar ou não o especialista a partir do docente, temos


as colocações da Comissão Nacional dos Cursos de Formação do Educador
argumentando que o curso deverá ter uma base comum, junto com as demais
licenciaturas, de modo que todos os formandos se identifiquem como professores, ou seja,
“a docência constitui a base de identidade profissional de todo educador” (1983, p. 5).
Saviani, (1985, p. 62) contrapõe a ideia anterior defendendo que o profissional
seja formado “com habilitação polivalente capaz de enfrentar os desafios da nossa
realidade educacional.” A formação continuaria a mesma em si, tanto para professores
quanto para os especialistas de ensino, a intenção do autor com a sua afirmação acima
não é caracterizar todo educador como sendo um professor (a). Mas, ao mesmo tempo,
propor uma formação capaz de aprimorar o especialista em educador,
independentemente, deste ser ou não ser um professor (a).
A dicotomia gerada em torno de questões como estas precisam ser debatidas pelos
que se organizam no amago deste terreno. A Associação Nacional de Educação (1981,
n.p.) trata do assunto com o seguinte posicionamento “[...]nossa concepção implica [...]
uma alteração no slogan proposto [...]: em lugar de formar o especialista no professor (a),
diríamos que trata de formar, seja o especialista, seja o professor (a), no educador (a)”.
Contudo, para alguns pesquisadores da área como Libâneo (1999), acreditam que

[...] a identificação dos estudos sistemáticos de Pedagogia com o curso


de licenciatura para a formação de professores para as series iniciais, a
supressão em alguns lugares da formação de especialistas[..] a redução
da formação do pedagogo à docência, o esvaziamento da teoria
pedagógica, acabaram por descaracterizar o campo teórico-
investigativo da Pedagogia e das ciências da educação, retirando da
universidade4 os estudos sistemáticos do campo cientifico da educação
e a possibilidade de formar o pedagogo para as pesquisas especificas na
área e exercício profissional (p. 5).

4
A pesquisa realizada em 1994 (Brzezinski, 1996, p. 207) constatou que em um universo de quarenta cursos
investigados, as vinte e duas universidades públicas apenas três ainda permaneciam formando o
especialista, sem exigência inicial da docência. Todavia, o número de cursos de pedagogia é relativamente
pequeno quando comparamos com a totalidade dos cursos oferecidos também no setor privado do nosso
país. (PINTO, 2011, p. 173)
34

Libâneo (2011, p. 191) vai assumir que a formação para os especialistas de ensino
deveria ter uma nomenclatura diferenciada, a partir do momento que ele identifica os
pedagogos que, mesmo sem restringir suas atividades profissionais ao ensino, lançam-se
aos movimentos de pesquisa, ações documentais, formação profissional, gestão de
sistemas escolares e escolas, coordenação pedagógica, animação sociocultural, formação
continuada em empresas e escola e ainda em outras instituições em pedagogos formados
como“stricto sensu” diferente dos professores que como “latu sensu” seriam todos
pedagogos.
Avançando no debate, compreendemos que a busca por uma qualidade na
formação do docente e/ou especialista na representação do pedagogo, se justifica a
medida que os objetivos visem a contribuição na pratica social e educacional exercida
nos ambiente escolares e também não-escolares dos quais este profissional perpassa. Por
outro lado, o autor Pinto, reforça que os profissionais que exercem funções de
especialistas dentro da escola, devem nortear o seu trabalho enfatizando a “qualidade do
processo de ensino aprendizagem que ocorre em sala de aula” (2011, p. 188).
Deste modo, é necessário repensar o argumento sobre a questão levantada “a
docência como base de formação do profissional de educação”, e tão somente
metamorfosear em “a docência constitui a base de formação do especialista de ensino”.
Entendendo que o termo pedagogo, também inclui o profissional que não atua na área da
educação, orquestramos o termo pedagogo escolar, assim adjetivado, identifica e
especifica o profissional de educação habilitado na área educacional com experiência
docente. Reformulando mais uma vez, a expressão “a docência constitui a base de
formação do pedagogo escolar” (Pinto, 2011, p. 191)
Os especialistas precisam trabalhar como semelhantes em um mesmo objetivo
unificado. Preocupando-se em proporcionar qualidade de ensino para os educandos. Se o
especialista, e aqui friso o papel do orientador educacional, exercer seu cargo sem se
preocupar com a qualidade do processo de ensino e aprendizagem que ocorrem em sala
de aula, tão pouco os docentes validarão a proposta do mesmo. Agregando valor ao
debate sobre a questão da docência como requisito para o especialista de ensino, trago a
narrativa do autor Pinto, como especialista com experiência docente

Uma das experiências de trabalho que tive como coordenador


pedagógico foi em uma escola particular fora do estado de São Paulo.
Os demais profissionais da Equipe Técnica (diretores, orientadores
35

educacionais e demais coordenadores pedagógicos) eram pedagogos


sem experiência em sala de aula. Eles faziam oposição aos professores,
de modo que as relações de trabalho na escola viviam o tempo todo sob
tensão. Em uma determinada situação de embate profissional eu
defendia o ponto de vista dos professores e fui duramente criticado
pelos demais especialistas. Argumentaram que eu sempre ficava do
lado dos professores e não me identificava com a Equipe Técnica
porque antes de eu ser pedagogo eu tinha sido professor! (2011, p. 189,
grifo nosso).

Refletindo ainda sem concluir, temos muito o que pensar sobre a prática do
profissional especialista. Libâneo e Pimenta destacam que existem outros pressupostos
epistemológicos que se incorporam na Pedagogia. Reforçando que as demandas na
atuação do pedagogo vão além da sala de aula, por isso, discordam da exigência docente
como condição para a formação do pedagogo. “Ser pedagogo é mais abrangente que ser
especialista de ensino. Quando o pedagogo direciona sua ação para qualquer situação
pedagógica que não seja a escolar, a docência não se faz necessária”. (Pinto, 2011, p. 190)
Havemos de concordar que o pedagogo que atuar em áreas externas as salas de aula, não
haveria a necessidade da docência como pré-requisito para o exercício da função, visto
que, seu âmbito de trabalho não está vinculado as necessidades pedagógicas da sala de
aula. Entretanto, o pedagogo docente, traz contribuições significantes nas atividades
exercidas no interior da escola, colaborando para um trabalho mais qualitativo de forma
geral. “[...] é a formação docente para o caso de o pedagogo assumir as funções dos
especialistas de ensino, ou seja, quando ele exerce as ações pedagógicas de suporte ao
trabalho docente em escolas ou em outras instâncias do sistema escolar” (Pinto, 2011, p.
190).
Contudo, debater sobre a formação do pedagogo ainda que seja tarefa obrigatória
na definição deste profissional dentro do ambiente educacional, ainda se faz
imprescindível pensar que nem todo território brasileiro dispõe tal profissional para estar
atuando nas redes de ensino de nosso país. Prova disso, está na pesquisa realizada por
Pascoal (2010, p. 115) onde apenas “dos 26 estados mais o Distrito Federal, 13 possuem
o orientador educacional na sua rede escolar estadual”. Os estados que possuem a
orientação educacional são: Amazonas, Roraima, Rondônia, Amapá, Tocantins, Piauí,
Paraíba, Distrito Federal, Minas Gerais, Espirito Santo, Rio de Janeiro, Paraná e Rio
Grande do Sul. Posto isso, ainda que a lei de regulamentação da profissão seja destinada
a nível nacional, não temos um amparo legal que reafirme a exigência desta função
36

cooperando nas práticas escolares do nosso Brasil. Ainda ficam de fora metade de uma
nação que não abrange o exercício da orientação educacional.
37

SEÇÃO IV
A ATUAÇÃO DO ORIENTADOR EDUCACIONAL NO COTIDIANO
ESCOLAR

Os educadores, antes de serem


especialistas em ferramentas do
saber, deveriam ser especialistas em
amor: Intérpretes de sonhos.
Rubem Alves

Segundo Santos, (2012, p. 169) na Grécia antiga, o pedagogo era aquele escravo
que tomava conta das crianças e as conduzia ao local de aprendizagem, isto é, até o mestre
para receber ensinamentos. Mais tarde, passou a significar o próprio educador, visto que
era ele quem se encarregava da educação das crianças. Atualmente, considera-se
pedagogo todo e qualquer profissional da educação graduado em Pedagogia, cuja função
é a de articular o trabalho didático-pedagógico na escola e em outras instituições públicas
e privadas que necessitem de seu serviço (empresas, hospitais, universidades,
organizações não governamentais etc.).
Orientador educacional. O que é esta função? Essa pergunta me consome todos os
dias quando penso em que eu estou me formando academicamente. Acredito que todo
profissional que se dedica verdadeiramente a sua função, que aqui, já não permito chamar
de função ou cargo, mas, sim de parte integrante da construção de seu ser, rumina-se
constantemente sobre sua prática. Cito a construção do ser, pois ao nascer eu era um bebê
desconhecendo a vida. Cresci, me tornei uma criança onde minhas únicas necessidades
eram se alimentar, brincar e ser amada. Ingressei na escola e já incorporei papéis sociais,
o de filha e o de estudante. Ao optar por um ensino médio profissionalizante recebi o
certificado de habilitação para lecionar da educação infantil ao 5ºano do Ensino
Fundamental, me tornando filha, estudante e então professora. E hoje ao optar por fazer
um 3ºgrau em uma universidade pública eu escolhi ser pedagoga.

Na interação social, são múltiplos os papeis que assumimos e deixamos


quase que instantaneamente: em casa, somos filhos, pais, irmãos,
cônjuges, patrões ou empregados; ao sairmos de casa, somos vizinhos,
pedestres, motoristas, cobradores, passageiros; no trabalho somos
colegas, empregadores, assalariados; e assim, sucessivamente, somos
pessoas/personas nas relações que estabelecemos e somos
indivíduos/indivisíveis apenas em relação a nós mesmos, na nossa mais
profunda intimidade (CARVALHO, 1994, p. 121).
38

É bem verdade que as consequências da vida nos encaminham para lugares que
não almejávamos, que encontramos pessoas que nos surpreenderam e obstáculos quase
intransponíveis. O que quero dizer e tentar deixar o mais claro possível, é que as decisões
que nós tomamos formam nosso ser. Neste exato momento, eu sou Jéssica de Souza
Borges: filha, professora e pedagoga. Ainda não sou mãe e muito menos esposa, todavia,
em algum momento eu me tornarei essa mulher. Quando ouvimos a pergunta: “Quem é
você?” imediatamente iremos responder nome, profissão, onde residimos, se temos
filhos(as) ou se temos cônjuge ou não. Geralmente respondemos qualificando nossas
funções e papéis para dizermos quem somos. Penso que hoje a palavra que define sua
pessoa em primeira instância é a sua profissão, ou algo relacionada a sua família. Sendo
algo que lhe define e isso acontece com muita frequência, ao menos, no meu cotidiano.
Na área das ciências sociais, e principalmente na educação, campo de onde falo, as
relações entre indivíduo e função se atravessam. Por isso, questiono tanto a função do
Orientador Educacional porque é quem realmente a minha alma deseja um dia ser.
Todavia, esse enfrentamento criado por mim não será compreendido de maneira
objetivada, imparcial ou neutra, muito pelo contrário, eu sou e estou apaixonada pelos
devaneios do cotidiano escolar, pelos seres humanos que os compõem, por tudo que os
constrói.
Agora, trago uma reflexão bem contundente no universo acadêmico para nós
graduandos que precisamos “executar” (desculpe a força da palavra, mas é preciso de
rigor neste momento) nosso trabalho de pesquisa para concluirmos um curso a nível de
3º grau. Como pensar e elaborar uma pesquisa que aos olhos de outrem venha agregar
valor e conhecimento de maneira equânime, reta ou apartidária? Sendo justo e dissecando
melindrosamente cada parte do objeto a ser estudado, ou então elencando todos os
manuais e documentos que regeriam e regulamentasse o meu objeto de pesquisa? Não.
Isso aos meus olhares é raso, desapaixonado e a mim, não agrega valor. Pois eu estou
refletindo sobre pessoas, seus sentimentos, seus gestos, sua prática. Seres humanos que
como eu e você, caro leitor, estamos irrigados de tantas outras pessoas, sentimentos e
realidades. E para com pensamentos, atividades e sensações tão tênues preciso me
acomodar investigativamente para esta prática, que me afeta grandiosamente.
Certa vez li a respeito desse rigor científico que tanto nos estarrece. Digo que a
leitura conversa com o leitor, pois a obra se intitula Conversas com quem gosta de ensinar

Tomemos a educação como exemplo. Não se pode entender o processo


educacional, na sua totalidade, se não se levar em conta fatores de
39

ordem biológica (criança com fome não pode aprender bem, nem
criança doente, nem criança marcada por fatores hereditários adversos),
psicológica, social, econômica política. Que cientista está em condições
de pesquisar este fenômeno, na sua globalidade? Nenhum. Não é
possível dominar todas as áreas do saber. Qualquer análise
interdisciplinar, empreendida por um pesquisador, tem,
necessariamente, de ser frouxa do ponto de vista metodológico. Mas é
isso que a comunidade científica não perdoa! Rigor acima de tudo!
Reprimidos pelo fantasma do rigor os pesquisadores se põem a campo
não em busca de problemas interessantes e relevantes, mas de
problemas que podem ser tratados com os magros recursos
metodológicos de que dispõem. [..] A obsessão com o rigor,
especialmente quando se leva em consideração que este será o critério
básico a ser invocado pelas bancas de tese de mestrado e doutoramento,
força o pesquisador a abandonar os problemas importantes (são muito
complexos) e a eleger problemas triviais que são passíveis de
tratamento metodológico fechado (ALVES, 1993, p. 76).

O autor não quer dizer que devemos abandonar os métodos e “boicotar” a


comunidade científica, mas sim, sugerir que o pondo de partida de uma pesquisa seja a
relevância do objeto e não a metodologia aplicável ao mesmo. Pensando por este viés
estive flexível em relação aos métodos e anseios metodológicos que busquei para realizar
minha pesquisa. Meu raciocínio se organizava de forma que a minha inquietação não
fosse correspondida em métodos de análise, mas sim, nas suas várias formas livres de se
admirar. Embebecida nesta conversa, ratifiquei meu desejo fugaz em observar a relação
do Orientador educacional com o cotidiano escolar estipulado tipicamente por meio de
um único modo e rigor, mas com todas as maneiras que o cotidiano me permitir
compreender observar.
Nesta seção relato as atividades desempenhadas pelo orientador educacional
observadas na perspectiva da pesquisadora, no período de observação na instituição de
ensino municipal. Estes relatos tratam das funções pré-determinadas para o orientador
educacional pela secretaria municipal de educação do mesmo município, e de que modo
este trabalho inferiu na minha formação acadêmica, assim como na formação de
pesquisador.
Gostaria de partilhar com você, meu leitor, a narrativa de uma experiência que me
imergiu nesta incessante busca pelo cotidiano e como fez-me questionar o porquê da
minha ótica por essa temática.

E
ra um dia comum de estágio de observação pelo PIBID na
escola municipal da qual eu conhecia e já fazia parte de
sua rotina há alguns meses. Quando em uma das diversas
datas efemérides, ou seja, datas comemorativas que a
instituição comemorava, a escola se organizou para realizar uma
40

atividade coletiva, sendo assim entenda-se aqui, todos os alunos,


professores e funcionários reunidos. Voltando a escrita, na frase:
‘a escola se organizou’, leia-se ‘o orientador educacional pediu’.
Construo a escrita desta forma, pois foi essa impressão que senti
na face de cada professor (a), sussurros dos funcionários e
também percebi em seus semblantes. Como não sabia que iria se
comemorar essa data dias antes de seu acontecimento e meu
estágio não era diariamente, fiquei surpresa com o alvoroço todo.
Murais na escola toda, portas enfeitadas, a criançada toda com
suas carinhas pintadas, máscaras, Datashow montado no pátio,
enfim, era uma festa para se comemorar. Entrei na sala,
cumprimentei as crianças e a professora respectivamente, que no
mesmo instante já pediu para eu ir amarrando as máscaras nas
crianças. Naquela mesma semana havia sido trabalhado dentro de
sala de aula e pelo planejamento da docente uma perspectiva
sobre a data comemorativa que se aproximava. As crianças
fizeram atividades, ouviram histórias, trabalharam em grupos,
assistiram a vídeo e que por sinal eu julguei serem atividades
bastante enriquecedoras para aquele momento. Todavia, existia a
pedido do orientador educacional uma solicitação de culminância
de projeto relativo a semana trabalhada com aquela data
comemorativa. Chegado o horário marcado para todas as turmas
se acomodarem no pátio, saímos todos da sala e sentamos no
chão. As crianças estavam lindas! O orientador educacional
cumprimentou os presentes e informou que seria passado um
vídeo ou filme, talvez com mais de 30 minutos de duração, para
os ali presentes. Neste momento, sou surpreendida por outra
professora, de uma outra turma com idades superior a minha do
maternal III, que me solicita ajuda. Esbaforida e muito agitada,
aconchega as crianças ao chão, visto que o vídeo/filme já havia
começado e me pediu que a ajudasse a retirar as máscaras que ela
havia comprado para as crianças e que amarrasse e colocasse nos
alunos dela. Imediatamente me prontifiquei. E foi aí, neste exato
momento que o atravessamento da experiência me ocorreu. Eu
estava ouvindo as lamúrias da professora enquanto colocávamos
os adereços nos pequenos, e a mesma, muito entristecida me
questionava porquê o orientador se preocupava tanto em realizar
esses tipos de eventos, quando a real necessidade da sala de aula
dela não era atendida. Visto que, tinha alunos com dificuldades
no processo de alfabetização, alunos com problemas familiares
que estavam interferindo na sua rotina escolar, contingente de
educandos excessivo em classe pelo grau de importância para a
turma de alfabetização. Enfim, vários dilemas que a professora
estava enfrentando, me relatando e não encontrava apoio, muito
menos instrução para com o seu orientador, ou melhor orientador
educacional responsável pela escola. Ao ouvir tudo isso, fiquei
imóvel depois de ter auxiliado a professora e sentado em meu
lugar novamente. Fiquei apenas observando, observando e
observando. E comecei a me questionar para que fazer tanta coisa,
se o objetivo com a atividade não era as crianças e muito menos
valorizar o trabalho dos docentes. Vi rostos desanimados, outros
insatisfeitos e crianças apáticas e outras tanto inquietas porque o
vídeo era longo demais, e as crianças maiores já haviam assistido
no ano anterior. É bem verdade que toda atividade fora de sala de
aula com as crianças na educação infantil é válida, porém retirá-
las da sala de aula possibilitaria que tipo de interação naquele
momento? Realmente não sei responder e não pretendo tentar.
Minha angustia ficou fixada na função do orientador. Ele teria de
41

ver aquilo que eu estava vendo, e era só isso que me perturbava.


Como ele não percebia rostos desanimados e desacreditados
daquilo que estava sendo feito. Encontrei meu objeto de pesquisa.
Comecei a observar atentamente os passos e atitudes deste
profissional na escola. Não me cabia entender ou me aproximar
do ser humano que se materializava naquele papel, mas sim quem
era o orientador educacional no cotidiano da escola e sua
relevância. Observava, mas não entendia muita coisa. Vigiava
seus passos. O via entrando nas salas e perguntando aos
professores se estava tudo bem, via cobrando diários e relatórios
com vocabulários adequados, via as professoras “ameaçando”
suas crianças indisciplinadas com o castigo de ter que ficar na sala
dos professores com o orientador, via o orientador retirando
alunos da sala quando não paravam de chorar, via, via de novo e
mais uma vez. Mas não conseguia discernir as funções deste
indivíduo na rotina da escola, não era translucido para mim como
era quando via um professor (a), um aluno, o diretor (a), a
merendeira, o porteiro. Consigo ver as pessoas e suas atividades
nestes cargos, mas não enxergava a pessoa e muito menos as
atividades da orientação educacional. Era confuso para mim.
Observei também que a orientadora educacional sempre “dava
um jeito” quando as coisas na escola precisavam de um suporte
administrativo. A direção por vezes se ausentava e o especialista
se encarregava de tal exercício. Foi quando decidir chegar mais
perto. Sim, burlei as regras, e fui ao encontro do meu desejo. Quis
me aproximar, me colocar à disposição, deixar claro para o
orientador que ele poderia incluir minha participação, assim como
de outros estagiários presentes na escola, nas atividades que ele
organizaria na escola. O fato de termos chegado mais perto,
apartou no mínimo a apatia que o orientador poderia sentir por
nós. Começamos a se aproximar através de diálogos, curtos onde
eu perguntava a ela onde conseguiria material escolar para
atender a um pedido da professora da sala. E ao me conduzir aos
locais de acesso, geralmente indagava o porquê e o como fazer a
atividade que estava a mim designada. Eu achava isso bom, pois
via interesse por parte dela, ainda que as professoras não
compartilhassem suas atividades diárias com o especialista. Foi
então que em um curto espaço de tempo já estávamos envolvidos
em outra atividade referente a datas comemorativas. Elaboramos
um teatrinho para as crianças. Com caracterização e falas
decoradas. E mais uma vez eu questionei o que eu estava fazendo
ali. Não pela possibilidade de propor atividades diversas as
crianças, mas qual a finalidade de se estar realizando isso.
Chegado a data comemorativa referente ao aniversário da cidade
onde reside a escola e as famílias das crianças, realizamos mais
uma atividade de comemoração. Realizamos uma exposição com
estandes sobre as diversas belezas que a cidade apresentava. Foi
uma atividade trabalhosa, mas realmente muito significativa. Pois
os realizadores, no caso um grupo de estagiários dos quais eu
participava, não se preocuparam com as definições estabelecidas
pelo orientador educacional. Apenas nos organizamos para
pensar o que trazer de real e significante para aquelas crianças que
iriam vivenciar mais uma data comemorativa. Optamos por uma
mini exposição com algumas “belezas” que a cidade possuía. O
orientador não aprovou muito o projeto inicial, porém como a
data se aproximava e ele precisava de movimento na escola,
decidiu pôr assim fazer, não nos contrariar. Mas sempre
oferecendo palpites condimentados em nossos trabalhos. A
42

exposição se organizou no pátio da escola com vários cantinhos


de mostras sobre as belezas que a cidade oferecia. Bem como,
alimentos cultivados na região, pontos históricos, principais
empresas, valorização da existência de povos indígenas naquela
região, brincadeiras para a conscientização do meio ambiente,
montagem de brinquedos com materiais reciclados, ou seja,
atividades diversas enaltecendo a importância da cidade e de se
preservar o local onde vivemos. A exposição se deu durante o dia
inteiro e nos dois turnos (manhã e tarde) atendendo a todas as
turmas e alunos da escola. A montagem de toda essa exposição
demorou dias, e dias. Os estagiários realizavam produções em
casa e na própria escola, estávamos muito motivados com o
resultado e a vivencias que estas crianças poderiam ter. Durante
este processo o orientador se mostrou bastante solicita em
fornecer materiais que ajudassem na nossa exposição. Ela se
mostrou interessada pela grandiosidade que o projeto estava
tomando e quão grande estava o nosso empenho. No dia do
acontecimento, chegamos bem cedo e começamos nossa
arrumação. O orientador não estava presente, mas quando
chegou, opinou sobre o local da montagem, pois o espaço
oferecido pela escola realmente não era dos maiores. Achei
importante da parte dela em se preocupar com a posição do sol,
momento de entrada e saída das crianças, assim como a
locomoção dentro da escola. Decidido isso, montamos tudo. E
logo em seguida começaram as exposições para as crianças. Foi
um maior frisson! As crianças queriam pegar, cheirar, colocar na
boca. E grande parte delas reconheceram as empresas da cidade
pela pronuncia do nome e pelas imagens, pois seus responsáveis
ou algum familiar trabalhava lá. Eram empresas de papel,
produtos de limpeza e até pedreiras. Os pequenos quando
chegavam no cantinho dos alimentos podiam degustar dos
alimentos provindos da sua região e geralmente se surpreendiam
com o saber do alimento em si. Fomos agraciados por esse
momento tão bom, leve e transformador. Vi no semblante dos
meus amigos de curso a certeza de que estávamos caminhando na
direção certa de nossa profissão. Conseguia ver meus colegas
exaustos, porém com satisfação enorme em estar doando o
melhor de si e recebendo a gratificação nos sorrisos e olhos
atentos do alunos. Durante as apresentações percebi pessoas
diferentes das quais eu já conhecia dentro da escola. Encontrei o
orientador educacional registrando os momentos com fotografias
e filmagens. Fiquei lisonjeada com a atitude dela em registrar
aquele momento tão bacana para todos nós, e me choquei ao
descobrir através de alguns funcionários de apoio da escola, que
o objetivo principal era para postar nas redes sociais da escola
para que a secretaria municipal tivesse acesso. E as “pessoas
diferentes” das quais havia citado anteriormente, eram um
supervisora e uma funcionária da secretaria de educação que
estavam lá a pedido do orientador. E mais uma vez senti a mesma
indignação da comemoração anterior. Poxa, um trabalho tão
interessante sendo realizado para as crianças que se mostravam
tão concentradas. As professoras radiantes pela vivencia dos
pequenos e por não terem sido elencadas para mais atividades
trabalhosas e exaustivas sobre as datas comemorativas, e o
orientador exibindo para a supervisora um trabalho do qual ela
não havia colocado os dedos. Novamente me vi angustiada e
obstinada em conhecer mais deste profissional.
43

Ao compartilhar esta narrativa, gostaria de dialogar e destacar algumas ideias


presentes, mostrando outras possibilidades de compreensão. Pensar nos processos de
formação faz o indivíduo pensar nas experiências vividas, permitindo um movimento
circular de investigação sobre seus processos pessoais. Investigação esta, que pode
produzir saberes e as ações que constituem-nos enquanto pessoas, ajudando a vislumbrar
as histórias que se entrelaçam no decorrem do nosso cotidiano. Tudo isso permite um
exercício da memória, revisitando o passado nas marcas que o presente apresenta, para
compreender algo do percurso que o sujeito elabora de si mesmo (Ostetto, 2015, p. 164-
165).

Na apresentação de si mesmo por meio do relato, o indivíduo se faz


intérprete dele mesmo: ele explicita as etapas e os campos temáticos de
sua própria construção biográfica. Ele também é intérprete do mundo
histórico e social que é o dele: ele constrói figuras, representações,
valores ... considerando que é no relato que ele faz suas experiências de
que o sujeito produz categorizações que lhe permitem apropriar-se do
mundo social e nele definir seu lugar (Delory-Momberger, 2006, p.
369).

Assim, destaco algumas ideias das quais me tocam profundamente, permitindo a


possibilidades de contrapontos e outras interpretações. É importante ressaltar que não se
tratam de categorias prévias que foram aplicadas na análise e interpretação do relato, mas
que são ideias que surgiram após a reflexão acerca desta práxis. Estas ideias são
apresentadas abaixo, sendo: (i) Centralidade do processo pedagógico na figura do
orientador; (ii) A artificialidade da proposta e (iii) A necessidade de autoafirmação para
a classes. A seguir dialogo sobre cada aspecto observado sempre resgatando a narrativa
de experiência e refletindo sobre tais ações.

4.1 Centralidade do processo pedagógico na figura do orientador

A narrativa a partir do ponto de vista da observadora nos traz relatos bastante


relevantes a respeito da atuação do especialista de ensino na função de orientador
educacional da escola adentrada. Através de Carvalho (1994, p. 115) entendemos que o
orientador educacional pode, através de suas técnicas e habilidades, oferecer apoio ao
grupo com quem trabalha e potencializar o processo de aprendizagem mediado pelo
44

docente em sala de aula. Contudo, o profissional só se posiciona deste modo quando


encontra-se envolvido em sua própria capacidade de sentir/sentir-se a si e ao outro.
Quando percebo o movimento que o orientador educacional organiza para as propostas
em comemoração as datas efemérides, consigo inferir centralidade nas atividades
realizadas. De fato, a hierarquia presente na escola, assim como em outra instituição
precisa de um membro, ou setor ou ainda, um órgão que se responsabilize pelo
desenvolvimento de tais atribuições. Necessita-se de responsáveis para conduzir as
propostas dentro de uma hierarquia, por isso, compreendo as atitudes delegadas pelo
orientador educacional quando pensou as atividades das datas comemorativas, quando
pensou a organização das turmas, quando pensou na forma de execução por parte dos
professores, quando pensou em proporcionar experiências diferenciadas para as crianças
da educação infantil da escola e quando se preocupou em fazer algo para que todos
pudessem estar envolvidos. Todavia, essa interação não acontece de forma solitária. A
participação de funcionários, alunos, docentes e até mesmo a comunidade, deve ocorrer
de modo integral. Durante o processo de planejamento de qualquer ação na escola
direcionada pela direção, coordenação e até mesmo a orientação, precisa ser pensada em
concordância com a população funcional da escola. Pois, quando um sujeito não se vê
participante de um projeto, ou atividade a ser desempenhada, tão pouco o mesmo acredita
na aplicabilidade da ação. “Quanto mais consigo me sentir, mais aprendo sobre mim
mesmo, e quanto mais observo os padrões externos de estímulo, mais aprendo a sentir o
meio e a controlar a energia que me é endereçada: isto é consciência em ação” Carvalho
(1994, p. 115).
É esta consciência de si, nas ações realizadas pelo orientador educacional em
minha narrativa, que me provocam a reflexão. O profissional com essa consciência de si,
que observa ao seu redor, que olha pelo outro, conforme aponta a autora Carvalho, é um
caminho a se seguir. As atividades desempenhadas no âmbito escolar precisam ser de
conhecimento de todos os que possam estar envolvidos, seja a partir da atividade mais
simplória até a atividade mais crucial da ação. A consciência em ação requer isso de quem
lidera um determinado grupo ou comunidade. Apreendo versões efetivas da ação
observada assim como, modelo a não ser idealizado.
45

4.2 A artificialidade da proposta

Segundo Garcia (2012, p. 21) “os povos que não conhecem a sua história estão
condenados a repeti-la”. Pensando nisso, relembrar momentos marcantes de conquista
social é um movimento importante para a memória coletiva. Assim como, reavivar as
lembranças das grandes vitórias faz de nós sujeitos mais participativos e cientes dos
processos pelos quais já se batalharam para a apreensão daquele determinado triunfo. E
esses ensinamentos podem ocorrerem primeira instância, no grupo familiar e em segunda
instância, no ambiente escolar com mais frequência. Sendo assim, uma das maneiras que
a escola encontrou de produzir conhecimento histórico, para com as crianças que ainda
estando na tenra idade não se apropriaram de tais memórias, introduzem de forma lúdica
as datas comemorativas no cronograma escolar. As datas comemorativas ou efemérides
são datas importantes e que merecem ser relembradas e celebradas principalmente pelo
seu valor histórico, político e econômico.

[...] Para este Brasil, que nas últimas décadas foi capaz de consolidar a
democracia e de promover o desenvolvimento econômico com inclusão
social, as Efemérides (...) surgem como uma recordação poderosa do
esforço que puseram os fundadores de nossa nacionalidade na
construção deste imenso patrimônio, o qual as gerações atuais têm a
responsabilidade de preservar. Para que possamos enfrentar os desafios
do presente e perseverar no caminho da solução dos problemas que
ainda nos angustiam, é sempre inspirador o exemplo dos personagens e
dos eventos do passado. (GARCIA, 2012, p. 21)

A relevância da disciplina em celebrar ou não as datas comemorativas nas escolas


de educação infantil não será quesito de discussão neste texto, apenas uma ilustração do
como essa atividade perpassam a minha escrita. Sendo assim, voltemos a ação de se
celebrar datas comemorativas nas escolas. Na narrativa exposta também destaco como
uma das ideias que me inquietaram bastante, o fato de se comemorar muitas datas
comemorativas no cotidiano escolar. Já destaquei nas palavras de Garcia a sua
importância, e concordo com o autor quando em sua fala ao não conhecermos nossa
história corremos o risco de repeti-la.
A questão a ser repensada é o tipo de ação em que se propõe o pensamento
reflexivo sobre o ato de comemorar. É bem verdade que, ao elaborarmos atividades
diversificadas para os discentes de educação infantil devemos considerar muitos aspectos.
Dentre eles, destaco a faixa etária da criança, o tempo de concentração durante a
46

atividade, a complexidade da ação desenvolvida, a elaboração dos materiais e


principalmente, se pensar reflexivamente sobre um pano de fundo lúdico. A ludicidade é
importante, pois a forma alegre, recreativa, brincante precisa adentrar todos os espaços
na educação infantil. Com isso, cabem aos educadores, a ação reflexiva sobre a proposta
a ser apresentada para os pequenos em celebração as datas comemorativas com cenários
lúdicos. Reforço a ideia da ação reflexiva porque os educadores precisam se atentar para
a magnitude em que se torna uma celebração de data comemorativa na mente de uma
criança. Em grande parte, as referências morais, cívicas, éticas e até mesmo as afetivas,
das quais as crianças de hoje vivenciam são realizadas ambiente escolar.
A ação reflexiva da qual falo é o ato de pensar. Pensar sobre o que pensar. Pensar
sobre o que fazer. Pensar sobre como fazer. Pensar sobre para quem fazer. Pensar sobre
com quem fazer. Quando destaquei a artificialidade na proposta do orientador
educacional em celebrar uma data comemorativa da qual eu não conseguia ver sentido
para a comunidade escolar, julgo porque não foi vivenciada a ação reflexiva. Isto é, o ato
de se pensar, antes da elaboração da proposta. Pode ser que em um primeiro momento
tenha se pensado em algo significativo para os pequenos, porém essa proposta
apresentada no momento da minha observação, enquanto pesquisadora do cotidiano
naquele local, já se repetia pela segunda vez. Desta maneira, para um primeiro momento,
assistir aquela atividade tenha sido proveniente de uma ação reflexiva e quem sabe até
mesmo em coparticipação com os docentes. Mas, no período da celebração realizada, não
foi isso que meu corpo percebeu naquele espaçotempo. Foi realizada a mesma atividade
do ano anterior, com a mesma apresentação em vídeo e sem a participação do professor
(a). Talvez essa participação docente não ocorreu por falta de convite ou espaço, mas
quem sabe por falta de interesse e diálogo. Estava visível a organização por parte somente
do orientador quando da escolha do vídeo, na posição do televisor, na disposição dos
assentos, no tapete ao chão e na distribuição das crianças.
O orientador educacional precisa se especializar no pensar. Ser um jogador do
pensar, ou melhor da arte de pensar bem conforme esclarece Carvalho (1994, p. 117).

De modo geral, a educação formal, escolar, só se preocupa com o pensar


pra fora, para pensar sobre estímulos e não sobre a produção mental de
alto gabarito. Parece que os que fazem a escola ignoram ou esquecem
que o ser deve aprender a pensar-se, descobrir-se pensando, pensar o
que pensa, a fim de evitar o fazer irrefletido e prejudicial a si e aos
outros (CARVALHO, 1994, p. 118).
47

A certeza dos acertos na vida não se dá especificamente pelo ato de se pensar


sozinho e para si, mas pensar em coletivo para o coletivo. Porque não vivemos
isoladamente, não se conquista sozinho, não se vive só e também não se pensa sozinho.
Na comunidade escolar todos são próprios na obra do pensar, as crianças, os docentes, a
gestão, a coordenação, os funcionários e os especialistas de ensino são sujeitos pensantes
que precisam pensar juntos para construir suas existências, senão para que haveria a
escola?
Um recorte exemplificado do pensar vivido no meu relato de experiência foi a
proposta da exposição sobre as belezas da cidade para os alunos. Ainda que com todo
monopólio de informações e autoridade sobre nossa forma de execução por parte do
orientador, foi uma ação reflexiva do qual gostamos de realizar. Foi preciso diálogo com
os professores sobre o que apresentar, foi pensado no como fazer, foi preciso pesquisas
para conhecer o que poderíamos apresentar como informações relevantes para o
aprendizado das crianças, foi preciso pensar de que forma transmitir, foi preciso pensar
em como pensar, escolher, classificar, separar, elaborar, refazer, calcular. Foi preciso ação
reflexiva sobre nossa forma de pensar. Foi um movimento renovador.

4.3 A necessidade de autoafirmação para a classe

Quando percebo a ideia de autoafirmação presente em meu relato de experiência,


fico desapontada. Não pelo sujeito do qual narro em minhas palavras, mas pelo desejo
incessante do ser humano de se auto justificar para o outro. Durante a observação direta
vi um profissional obstinado em realizar suas tarefas, muito empenhado a realizar
atividades que propusessem movimento na escola e também bastante dedicado ao registro
das ações coordenadas por ele.
De fato, nos dias atuais o registro é algo inevitável, principalmente com a
facilidade com que isso se dá no século XXI. Mas o que intriga são as primícias da
objetividade do ato de registrar, e no caso da observação direta, o registro através da
fotografia. Durante o período em que estive presente nos espaços da escola, observava
atentamente o especialista de ensino e questionava internamente o motivo de tantos
registros naquele lugar. Não me atentarei a juízos sobrepostos as observações registradas
na narrativa de minha pesquisa, tão somente repensar-me ei-las refazendo seus caminhos.
48

Em conversas com alguns funcionários de apoio, eu consegui compreender que o


motivo de tais ações era a divulgação dos eventos da escola em uma rede social na qual
a secretaria de educação do município tinha visibilidade sobre todos os ocorridos nas
escolas. Foi então esclarecido para mim o fato. As ações sendo realizadas no interior da
escola e também sendo observadas e avaliadas pelos de fora. Como se o que ali se fazia,
importasse mais aos ausentes do que aos viventes da ação. Quando penso por esse
caminho, me perco na capacidade que o ser humano tem de se apequenar. E nos
apequenamos constantemente. Eu e você. Simplesmente pelo fato de não pensarmos
enquanto agimos ou trabalhamos. Por isso é tão significativo se mover sobre ação
reflexiva, se orientar pelo pensar-se. Só se projetando assim conseguiremos fazer-se antes
mesmo de agir ou mexer-se.
Carvalho (1994, p. 119) afirma tais palavras quando diz que “o fazer implica uma
ação”, ou seja, fazer alguma coisa requer um deslocamento, não físico porém mental.
Quando automatizamos o fazer físico, a ação continuada, o movimento repetitivo
deixamo-nos dissociar-se do fazer mental.

Com a rotina dos nossos hábitos perdemos o prazer das pequeninas


jogadas do dia-a-dia, porque nos ausentamos em termos de consciência
corporal. Não pensamos no que estamos fazendo ou nem pensamos em
nada quando estamos trabalhando e, sem pensamento e sem sentimento,
esvaziamos de objetivo e de significado o nosso fazer cotidiano
(CARVALHO, 1994, p. 119).

Não seria a rotina do dia que lhe imputa esvaziamento. O que lhe paralisa é o
apartamento do pensar, do fazer-se sem ação reflexiva. As ações maquinais estão em
grande parte envolvidas responsavelmente pela escassez do fazer mental. Repenso a ação
do orientador educacional em registrar somente para efetivar seu modelo de trabalho para
um outro sujeito onde, no momento de produção da ação, não lhe disseminou valor,
atenção e tampouco, afeto. Quando na realidade, os que exalavam apego e admiração pelo
movimento da ação estavam sendo registrados todavia, não sentidos.

A conscientização dos afetos que acompanham os outros fazeres dá ao


jogador a oportunidade de mover-se no continuumdas emoções com
maior controle, não se deixando arrebatar sem pensar nas
consequências de sua jogada. Convém não esquecer que todos os afetos
ou emoções ou sentimentos tem um polo positivo e um polo negativo e
que a nossa localização entre um e outro nem sempre é muito clara. É
o trabalho da consciência desperta e vigilante que nos situa e nos mostra
49

evidencias de nossa real posição (CARVALHO, 1994, p. 120) grifo do


autor.

Estamos nos movendo em um terreno onde somos e estamos inundados de afetos


por parte dos pequenos. E reconhecer e replicar tais sentimentos dos pequenos é alçada
dos que deles se responsabilizam dentro do ambiente educativo. Á vista disso, o
orientador educacional precisa fazer-se continuamente respeitando e percebendo os afetos
de seus próximos. O afeto compreende olhar o outro com acatamento, perceber o lugar
do outro, valorizá-lo para posteriormente culminar atitudes comuns, como o registro, por
exemplo.
A seguir, apresento a reprodução de um OE. Esse documento foi coletado junto à
Secretaria Municipal de Educação e se constitui enquanto instrumento normativo de
natureza pública. Esse documento nos ajuda a compreender documento coletado na
escola, referente ao ano de 2015, o qual define as atribuições do o que se passou na
narrativa acima.

ATRIBUIÇÕES BÁSICAS DO ORIENTADOR PEDAGÓGICO


1. Amparar os professores metodologicamente.
2. Apresentar recursos e inovações didáticas.
3. Acompanhar e avaliar o processo de ensino-aprendizagem.
4. Traçar metas objetivando um percentual elevado de aprovação.
5. Fazer acompanhamento entre ensino/aprovação.
6. Realizar acompanhamento de Plano de Curso, observando se está em
consonância com o currículo mínimo.
7. Verificar caderno de plano do professor e, eventualmente, observar caderno
dos alunos para estabelecer paralelo.
8. Vistoriar avaliações e provas.
9. Participar ativamente nos conselhos de classe e reuniões diversas.
10. Conceder suporte ao professor, no caso de indisciplina discente, em conjunto
com a equipe gestora.
11. Propor, quando necessário, encaminhamento de alunos à equipe de
Atendimento Educacional Especializado da Secretaria Municipal de
Educação.
12. Notificar ao Conselho Tutelar no caso de infrequência escolar.
50

13. Cumprir as tarefas propostas pelo Departamento Pedagógico, respeitando os


prazos pré-definidos e divulgando com rapidez informações e diretrizes
recebidas.
14. Atualizar o PPP (Projeto Político Pedagógico) observando as bases legais e o
cumprimento da democracia.
15. Agir em parceria com o diretor objetivando maior eficácia no trabalho
desenvolvido pela escola.

Antes de começar a elencar os pontos dos quais tenho a intenção de dialogar com
a minha narrativa, gostaria de chamar a atenção para a denominação da função deste
especialista de ensino “Orientador Pedagógico”. Nas pesquisas realizadas até aqui, pouco
se tem usado tal nomenclatura para definir a profissão do pedagogo. Segundo Libâneo,
“não se faz distinção relevante entre supervisor pedagógico e orientador educacional:
quanto mais cresce a convicção da unidade do ato pedagógico na sua diversidade, menos
sentido faz a fragmentação do atendimento ao professor e ao aluno” (1983, n.p). O termo
pedagógico aparece geralmente fazendo referência as ações, práticas, tendências, ao
ensino, as atividades, mas poucas vezes na função de orientação.

O orientador educacional diferencia-se do coordenador pedagógico, do


professor e do diretor. O diretor ou gestor administra a escola como um
todo; o professor cuida da especificidade de sua área do conhecimento;
o coordenador fornece condições para que o docente realize a sua
função da maneira mais satisfatória possível; e o orientador educacional
cuida da formação de seu aluno, para a escola e para a vida.
(PASCOAL, 2010, p. 109)

Percebe-se que quanto mais se ramifica as atividades do especialista, mais se


instigue seu potencial em se consolidar enquanto profissional coadjuvante no processo de
ensino-aprendizagem. As ideias da ramificação e da especialização são marcas da
modernidade pós-industrial, demarcando um novo tipo de trabalhador e novas relações
fragmentadas e hierárquicas.
Observando a lista de “atribuições”, de forma geral, é possível notar a aderência
à prática examinadora, fiscalizadora e prescritiva posta ao Orientador Pedagógico. Nesta
lista, há quinze atribuições e, dentre elas, acentuo que, de acordo com as conjecturas das
quais desejo chegar, são registradas apenas duas atribuições pertencentes ao orientador
educacional da qual realizei a observação. São elas:
51

Item 10. Conceder suporte ao professor, no caso de indisciplina discente, em


conjunto com a equipe gestora.

Depois de tomada ciência de tal atribuição, consigo enxergar o motivo pelo qual
o orientador educacional realizava suas “rondas” na escola caminhando de sala em sala,
perguntando os professores (as) se estava ocorrendo tudo bem naquele dia de aula. Ou
quando os alunos eram induzidos a ficar na sala dos professores junto com a orientadora,
se permanecessem fazendo bagunça. É preciso lembrar que era uma instituição que era
uma instituição de educação infantil com crianças de 4 a 6 anos de idade. Não pretendo
relembrar tais memórias presentes em minha narrativa com o objetivo de julgar os
atuantes desta prática obsoleta e invasiva para com os alunos. Mas sim, indagar como as
ações mecanizadas e por vezes, incorporadas a nossa rotina nos fazem tão rasos e
empobrecidos de nós mesmos. Necessitamos pensar. Pensar para agir, pensar para falar,
pensar para fazer, pensar para ser, repensar nosso pensar. A autora Carvalho (1994, p.
119) reforça “Pensar-se, portanto, facilita o entendimento com os outros, a compreensão
das circunstancias e evita a auto projeção”. Ainda contraponho esta atribuição, aponto as
palavras de outra autora na área orientação educacional

a orientação, hoje, está mobilizada com outros fatores que não apenas e
unicamente cuidar e ajudar os ‘alunos com problemas’. Há, portanto,
necessidade de nos inserirmos em uma nova abordagem de Orientação,
voltada para a ‘construção’ de um cidadão que esteja mais
comprometido com seu tempo e sua gente. Desloca-se,
significativamente, o ‘onde chegar’, neste momento da Orientação
Educacional, em termos do trabalho com os alunos. Pretende-se
trabalhar com o aluno no desenvolvimento do seu processo de
cidadania, trabalhando a subjetividade e a intersubjetividade, obtidas
através do diálogo nas relações estabelecidas (GRINSPUN, 1994, p.
13).

A orientação educacional não se põe a padronizar os alunos com critérios de


desajustados, ou disciplinados ou ainda os responsáveis e os alunos bonzinhos. O
importante é valorizar a singularidade de cada um dentro da pluralidade que um grupo
apresenta. O papel deste especialista é respeitando a realidade deste aluno, o conhecendo
e o inserindo dentro do contexto escolar. Com o propósito, do mesmo se reconhecer
52

enquanto participante do seu processo de formação e também propiciar a melhora


ampliada de seu desenvolvimento cognitivo e emocional.
Em contrapartida, já vivenciei momentos de tensão em sala de aula onde foi
necessária a intervenção da orientadora educacional com o intuito de acalmar os ânimos
do discente que estivesse mais alterado. E esse resultado sempre era visto com bons olhos
pelos professores, pois aliviava o clima da sala, caso os demais alunos também estivessem
prejudicados com o comportamento do colega de classe. Portanto, foi perceptível a
intervenção do orientador educacional ainda que alguns professores não se dessem conta
de tal ação.

Item 15. Agir em parceria com o diretor objetivando maior eficácia no


trabalho desenvolvido pela escola.

Neste item, percebo muitos pontos inconclusos. O trabalho do orientador


educacional é voltado para o atendimento aos discentes, mas para que este trabalho seja
desenvolvido de forma pedagógica e democrática, respeitando as potencialidades do
aluno, precisa ser articulado com os docentes, que por sua vez, são o elo de ligação com
a família. Da qual o especialista de ensino também pode recorrer, quando por vezes, a
orientar respectivamente. Como o orientador educacional desenvolve sua prática quando,
baseado neste item, se põe distante de seus semelhantes

O orientador educacional é o profissional encarregado da articulação


entre escola e família. Assim, cabe a ele a tarefa de contribuir para a
aproximação entre as duas, planejando momentos culturais em que a
família possa estar presente, junto com seus filhos, na escola. Cabe
também ao orientador educacional a tarefa de servir de elo entre a
situação escolar do aluno e a família, sempre visando a contribuir para
que o aluno possa aprender significativamente. A perspectiva de
orientação educacional que consideramos válida não se equipara ao
trabalho do psicólogo escolar, que tem dimensão terapêutica. O papel
do orientador com relação à família não é apontar desajustes ou
procurar os pais apenas para tecer longas reclamações sobre o
comportamento do filho e, sim, procurar caminhos, junto com a família,
para que o espaço escolar seja favorável ao aluno. Não cabe ao
orientador a tarefa de diagnosticar problemas e/ou dificuldades
emocionais ou psicológicas e, sim, que volte seu trabalho para os
aspectos saudáveis dos alunos (PASCOAL, 2010, p. 109).
53

O orientador educacional precisa ser acessível a toda comunidade escolar,


incluindo desde a gestão administrativa até os responsáveis pelos discentes, sejam eles
próximos à escola ou não. Com o tempo instaurou-se uma cultura de que o contato da
escola com a família seria em grande parte por razões negativas e/ou de retificação. Isso
fez com que a família não participasse mais do mesmo olhar que a escola ao ser convocada
para uma conversa, reunião, um evento, entre outros.
Concerne ao orientador educacional assim como a todos os profissionais que
vinculam sua proposta de trabalho em contato com a família dos alunos, reaproximar e
traze-los ao cenário da escola. Atualmente a orientação educacional se encarrega de
mediar as relações pertinentes ao aluno com o meio social e escolar em que está inserido.
O aluno se torna o centro da ação pedagógica deste especialista de ensino, e
concomitantemente, compreendendo todo o universo que esse discente perpassa. Tanto
nas ações educativas como também sociais, das quais, a escola também recebe e
administra tantas outras ações que a sociedade lhe incumbiu.

A visão contemporânea de orientação educacional aponta para o aluno


como centro da ação pedagógica, cabendo ao orientador atender a todos
os alunos em suas solicitações e expectativas, não restringindo a sua
atenção apenas aos alunos que apresentam problemas disciplinares ou
dificuldades de aprendizagem. Mediador entre o aluno e o meio social,
o orientador discute problemas atuais, que fazem parte do contexto
sociopolítico, econômico e cultural em que vivemos. Assim, por meio
da problematização, pode levar o aluno ao estabelecimento de relações
e ao desenvolvimento da consciência crítica. Para poder exercer a
contento a sua função, o orientador precisa compreender o
desenvolvimento cognitivo do aluno, sua afetividade, emoções,
sentimentos, valores, atitudes. Além disso, cabe a ele promover, entre
os alunos, atividades de discussão e informação sobre o mundo do
trabalho, assessorando-os no que se refere a assuntos que dizem respeito
a escolhas (PASCOAL, 2010, p. 110)

Tendo como centro da ação pedagógica, o aluno, cabe ao orientador educacional


mediar as relações que os discentes estabelecem com os seus outros semelhantes,
docentes, família, escola, sobre o seu entorno. A responsabilidade da formação
educacional destes pequenos fica a cargo do docente regente da turma, todavia, o
orientador educacional precisa pensar junto com o professor (a) outras formas de se
pensar o fazer dentro da sala de aula, de maneira que contribua e potencialize as atividades
pedagógicas da classe.
As práticas instituintes da qual observei durante o período de observação direta
foram suficientes para eu compreender que a ação deste profissional é afetada por diversas
54

demandas. Entre elas destaco a docência como base na identidade do especialista de


ensino de educação; a ação pedagógica sobre os alunos de modo geral, e não somente, os
desajustados, a centralidade da proposta na figura do aluno, o consentimento por parte
dos docentes, e principalmente, o fazer pedagógico de forma reflexiva. Sentir-se enquanto
parte integrante na formação do outro ser, pensar-se sobre o processo de construção de si,
assim como, respeitar o do outro e fazer-se no sentido de realizar a ação refletida, o fazer-
se continuamente por meio do pensar em como estou fazendo.
Para que o orientador produza suas práticas instituintes, ele precisa de “ocasiões”
como diz Certeau (1994, p. 100) e dar o “golpe certo”. Aproveitar os momentos de espaço
e ausência de poder para através de suas táticas produzir conhecimento próprio e realizar
ações pedagógicas que visem melhorias na construção do sujeito amparado. Assimilo
também, que construir suas próprias práticas instituintes não é tarefa fácil, tampouco se
apresentara para todos e em qualquer momento. Requer conhecimento. Conhecimento de
que existe um forte, um próprio que oprime e detém as estratégias para se manter
enquanto forte. Se o orientador educacional não se vê enquanto sujeito, que precisa
produzir outras formas de organizar o pensar e o seu fazer, sequer terá forças para auxiliar
na formação de outros, quando na verdade não dá conta da formação de si. E pensar em
práticas instituintes na atuação do orientador educacional requer movimento e bastante
reflexão crítica sobre o seu trabalho e o meio em que interage.
Por isso, indaguei o artigo 64 da Lei 9.394/96 quando define “A formação de
profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e
orientação educacional para a educação básica, [...]”. Avançamos quando
normatizamos a formação dos profissionais que irão atuar na escola dos diversos níveis
hierárquicos e instancias pedagógicas. Porém, ao fazer, distanciamos a função do
orientador educacional dos docentes e discentes e os aproximamos aos cargos de gestão
e controle. Como pensamos em orientadores educacionais imbuídos de suas táticas,
quando temos sujeitos que não se veem como semelhantes de seu próximo? As táticas
são validas em sua essência, somente quando temos fracos conscientes de que suas
práticas instituintes são relevantes para o processo de humanização de todos. Enquanto o
orientador educacional estiver longe dos que ele precisa se aproximar, suas ações
pedagógicas estarão à mercê do acaso. Enquanto o orientador educacional estiver na
secretaria, com sua mesa ao lado da mesa da direção, suas propostas didáticas continuarão
no projeto impresso em cima da mesa dos professores, sem ao menos folheá-los.
Enquanto realizar “rondas” pela escola, tampouco, saberá o que é o encontro. Enquanto
55

o orientador educacional se fizer um cargo, desperdiçará a experiência de descobrir-se


potente, simplesmente pelo fato de agora saber enxergar a si.
56

SEÇÃO V
CONCLUSÃO

Tenho uma convicção muito forte dentro de mim ao refletir sobre todas as
interrogações abordadas neste trabalho, é a de que somos seres inacabados e em
incessante transformação. Permaneço assim como em um movimento de experiência por
se fazer constantemente. “Fazer uma experiência quer dizer, portanto, deixar-nos abordar
em nós próprios pelo que nos interpela, entrando e submetendo-nos a isso” Heidegger
(1987, p. 143 apud Larrosa 2006, p.98). Tentamos aprender para melhorar para nós, para
o outro, por nós e pelo outro. É vivenciar a polivalência das ações em constante mutação
comigo mesmo, indo e voltando ao encontro do outro, me refazendo o tempo todo.
A nossa escola é, com certeza, um dos âmbitos mais importantes da sociedade.
Tendo por função primordial o ato de ensinar, que por si só não podemos reduzi-la a
missão empobrecida de transferir conhecimento, ela ganha palco para voos mais amplos.
Essa instituição se organiza para atender as reformulações do ser humano do nosso tempo,
onde o raciocínio lógico e a velocidade com que as informações transitam de forma
rápida, e bem como a criatividade são necessários para adentrar o mundo dos que a
habitam todos os dias. Assim sendo, trago a definição do papel da escola nas palavras de
Assis quando

[...] promover o desenvolvimento do indivíduo, tornando-o capaz de


enfrentar múltiplas situações porque conta com uma bagagem valiosa
de experiências e apresenta um raciocínio sempre aberto ao
estabelecimento de novas relações com o mundo que o cerca (1994, p.
130).

Os profissionais que fazem da escola este local de enriquecimento intelectual e


afetivo são responsáveis por ensinar aquilo que os alunos precisam saber para que
dominando tais saberes possam se tornarem sujeitos plenos em sociedade e agindo e
transformando seu meio ambiente. Grinspun (1994, p. 143) relata que a orientação
educacional precisa atuar se aproximando do projeto político da escola, pretendendo
contribuir para alcançarmos soluções possíveis, juntos dos alunos, aos problemas que se
apresentam rotineiramente na escola. O ambiente em que a escola se torna para os
pequenos é de grande importância na formação de suas habilidades sociais, pois é a partir
desse desenvolvimento social nutrido na escola que as crianças darão significado as suas
ações a medida que o próprio grupo as representa.
57

A escola tem um papel muito importante no desenvolvimento social das


crianças. Visto que, é na escola que os educandos se relacionam e interagem entre si com
seus semelhantes. Segundo Grinspun (19914, p. 152), “a partir da interação social,
segundo Vigostky, o indivíduo internalizara os elementos de sua cultura, construindo seu
universo intrapsicologico a partir do mundo externo”. A escola educa, prepara para a
vida, forma caráter, media conflitos, constrói sujeitos, e a orientação vai atuar
insistentemente na interpretação desta realidade vivenciada pelo aluno, compreendendo
seus significados para que se faça significativo para a formação de cada ser.

A prática de orientador, hoje, deve estar em procurar ajudar o aluno a


construir o conhecimento, a facilitar as condições de aquisição desse
conhecimento, promovendo as interações e toda a teia de relações que
envolva o sujeito e o meio (...) ajudar ao aluno, orientá-lo no sentido de
permitir viver seus desejos, sonhos, paixões, que se inter-relacionam
com os saberes, com os fazeres, com o próprio conhecimento
(GRINSPUN, 1994, p. 150)

É nesse movimento sobre a prática do orientador educacional que dialogo


durante a dinâmica em que se desenvolveu este trabalho. Observei atentamente meu
campo de pesquisa em busca de ações que satisfizessem a vontade em conhecer mais
sobre este profissional da educação. Analisei a trajetória, ainda que de forma sucinta,
observando alguns caminhos pelos quais essa função se fez e se desfez diversas vezes
para chegar até o presente momento. Estive atenta a este sujeito necessário na construção
de indivíduos plenos, e também, as práticas instituintes deste orientador. Ao encontrar
práticas instituintes, encontrei também esses profissionais que se valem para exercer um
trabalho de forma pedagógica, respeitando as possibilidades do outro, e de modo
participativo, conhecendo a realidade e desejos dos pequenos.
A orientação educacional está além dos alunos rotulados com problemas, além
dos discentes desajustados, além das atividades meramente administrativas, além das
comemorações mensais, além de uma função ou cargo. A orientação educacional
constituí o sujeito que se permite adentrar caminhos dos quais ele encontrará
enfrentamentos e obstáculos. Mas, ainda assim, atuando e possibilitando rotas de fuga
para a construção de seres humanos, produzindo conhecimento de si e regendo o seu
entorno. Não é a orientação que se faz uma experiência, mas o próprio movimento de si
dá sentido à sua existência.
58

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61

ANEXOS
62

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO


Autorização para desenvolvimento de Pesquisa*

AUTORIZO a estudante Jéssica de Souza Borges, do curso de Pedagogia da


Universidade Federal Fluminense (UFF), a desenvolver observações junto ao
cotidiano escolar da Creche Escola “Judith Machado de Bustamante”. As
observações irão subsidiar o desenvolvimento do Trabalho de Conclusão do Curso
intitulado: “Entre o Outro e Eu: Práticas Instituintes do Orientador Educacional na
Educação Infantil”. Estou ciente de que: a) as observações receberão tratamento
pautado pelo respeito e pela ética; b) o emprego das observações será a contribuição
para com o desenvolvimento desta pesquisa; c) diretora, orientação pedagógica e
professores da escola poderão participar do estudo, caso desejarem; d) a estudante
estará à disposição para quaisquer esclarecimentos.

_________________________________________________________________________

Diretor da Creche Escola “Judith Machado de Bustamante”.

Santo Antônio de Pádua (RJ), ________ de ___________________________ de 2017.

Nome da Estudante: Jéssica de Souza Borges


Email: jbborgesjs@gmail.com
Celular: 22 981194739

*TCLE em duas vias: estudante e escola.


63

Contato: Jéssica Borges


Endereço Institucional: Rua Vinte e Oito de Setembro, 104 - Vila Laroca – Além
Paraíba MG CEP: 36.660-000
Telefone Institucional: 32 3462.1542
Email: jbborgesjs@gmail.com
Celular:22 98119.4739
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