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CASPER
ESPECIAL #21
Maio, junho, julho e agosto de 2017

OS 70
ANOS
DA PRIMEIRA
ESCOLA DE
JORNALISMO
DO BRASIL
A maior revista de
carreira e finanças
pessoais do país
• Planejamento de carreira
• Educação executiva
• Vagas
• Liderança
• Remuneração
• Aperfeiçoamento profissional
• Qualidade de vida no trabalho
• Direitos trabalhistas

Tudo dedicado à sua carreira e a você.

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chapéu ´
CASPER
EDIÇÃO
ISSN 2446-4910

FUNDAÇÃO CÁSPER LÍBERO

PRESIDENTE
Paulo Camarda

SUPERINTENDENTE GERAL

HISTÓRICA
Sérgio Felipe dos Santos

FACULDADE CÁSPER LÍBERO


DIRETOR
Carlos Costa

VICE-DIRETOR
Roberto Chiachiri Filho O testamento de Cásper Líbero mudou e ainda muda a vida de
milhares de brasileiros. Jornalista e empresário visionário, ele ex-
REVISTA CÁSPER pressou sua vontade de ter uma fundação e que uma de suas funções
NÚCLEO EDITORIAL DE REVISTAS seria a criação e a manutenção de “uma escola de jornalistas e ensi-
COORDENADORA DE ENSINO DE namentos de humanidade, particularmente português, prosa, estilo,
JORNALISMO literatura, eloquência, história e filosofia, em cursos de grandes pro-
Helena Jacob porções”. Em 16 de maio de 1947, nascia a primeira escola superior
de Jornalismo do Brasil, a Faculdade Cásper Líbero.
EDITOR-CHEFE A edição histórica que tem em mãos é uma homenagem a Cásper
Eduardo Nunomura
Líbero e aos milhares de alunos, professores e funcionários que pas-
EDITORES saram pela instituição. Nas 134 páginas, o dobro das edições habitu-
Carolina Moraes e Guto Martini ais, contamos a história do jornalista e empresário e como a Facul- C

dade se tornou uma referência brasileira do campo comunicacional. M


CONSELHO EDITORIAL Os cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Relações
Dimas Künsch, Helena Jacob, Joubert Brito, Y

Marcelo Rodrigues, Patrícia Salvatori, Públicas e Rádio, TV e Internet atraem a cada ano uma leva de jovens
CM
Roberto Chiachiri Filho, Roberto D’Ugo e que valorizam tanto a tradição quanto a inovação e descobrem como
Sonia Castino faz diferença passar alguns anos de suas vidas na “Paulista 900”, o MY

icônico endereço da Cásper desde 1966. São 70 anos formando pro- CY

REPORTAGEM fissionais, muitos deles renomados e respeitados no mercado de tra-


Beatriz Fialho, Carlos Costa, Carolina CMY

Moraes, Felipe Sakamoto, Giulia Gamba, balho, que carregam consigo o orgulho de ser casperianos. Também
K

Guilherme Guerra, Guto Martini, Mariane apresentamos um cardápio de reportagens atuais, que falam dos
Rossi, Paula Calçade, Paulo Henrique desafios que enfrentam as áreas da comunicação.
Pompermaier, Simone Dantas Esta edição foi pensada com carinho para celebrar os 70 anos ao
lado de parceiros que reconhecem a importância da Faculdade. São
EDITORA DE ARTE E FOTOGRAFIA
Giulia Gamba empresas que valorizam a sólida formação educacional e, por essa ra-
zão, se destacam em suas áreas de atuação. E, como não poderíamos
PROJETO GRÁFICO perder uma oportunidade tão única, apresentamos uma revista repa-
Giulia Gamba ginada a partir deste número. O novo projeto gráfico, mais elegante,
moderno e harmônico, é um convite à boa prosa e ao belo estilo que
DIAGRAMAÇÃO
Beatriz Fialho, Giulia Gamba e Guilherme Cásper Líbero sempre defendeu.
Guerra

COLABORADORES
Roberto D’Ugo e Adalton Diniz

NÚCLEO EDITORIAL DE REVISTAS EDUARDO NUNOMURA


Avenida Paulista, 900 – 5º andar
01310-940 – São Paulo – SP Editor-chefe
(11) 3170-5874/5814
revistacasper@casperlibero.edu.br
revistacasper.casperlibero.edu.br

CAPA
© Acervo Gazeta Press

Se não houver um © explicitado, você pode


CC copiar, adaptar e distribuir os conteúdos
BY
4 CÁSPER | Maio de 2012 desta revista, desde que atribua créditos
SUMÁRIO

SETE DIAS
64 As pequenas histórias da Cásper que
compõem uma grande narrativa

CM

CÁSPER LÍBERO
24 Um FIQUE DE OLHO
88 Nossos
MY

perfil do jornalista, empresário e professores revelam quais CY

patrono da Fundação são as tendëncias da comunicação CMY

08 :: POR ONDE ANDA :: 40 RAIO-X 108 PLANEJAMENTO


A trajetória de quatro casperianos A Faculdade Cásper Líbero é A abordagem Design Thinking
no mercado de trabalho grandiosa também em números para a solução de problemas

16 :: POR CONTA PRÓPRIA :: 48 LUTA ESTUDANTIL 112 FUTURO DO CINEMA


O projeto Draft conta a história de O passado combativo do Centro Um balanço da gestão de Manoel
empreendedores brasileiros Acadêmico Vladimir Herzog Rangel à frente da Ancine

18 :: BITS & BYTES :: 52 ERASMO NUZZI 116 FILME INDÍGENA


O kit de sobrevivência para o A história do ex-diretor mais O antropólogo que ensina os
profissional multimídia longevo da Faculdade índios a filmarem suas vidas

22 :: FEITO À MÃO :: 76 TRIPLO ANIVERSÁRIO 118 GESTÃO DE CRISE


Os brasileiros abusam da emoção RP, Publicidade, Rádio, TV e A assessoria de imprensa da
na hora de usar os emojis Internet também festejam Força Aérea Brasileira

32 PROVAS ESPORTIVAS 94 FACT-CHECKING 122 O OLHAR DA RUA


Cásper Líbero e a história do O papel do jornalismo na era da O consistente trabalho do fotojor-
esporte no Brasil pós-verdade nalista Felipe Larozza, da Vice

6 maio • junho • julho • agosto 2017


POR ONDE ANDA
PUBLICIDADE

ANA CAROLINA DONEGÁ


Do
estágio
para a
vida
A ex-casperiana Gabriela Nassar encontrou seu lugar no
mercado de trabalho antes mesmo de se formar

O
segmento de cosméticos é para Gabriela Nassar, Após passar por um processo interno,
de 26 anos, uma paixão que encontrou ainda foi promovida para o cargo de analista
em seu tempo de faculdade. Ex-casperiana sênior da marca de maquiagens “Quem
formada em 2012 no curso de Publicidade e Propaganda, Disse, Berenice?” No começo da Cásper
juntou-se ao Grupo Boticário como estagiária quando chegou a estagiar na Agência Giz, com
estava cursando o terceiro ano. “Consegui ser efetivada na atendimento, e na Fnac, com trend
época em que estava fazendo o TCC. Foi punk conciliar marketing. Mas sua predileção foi mesmo
tudo, mas valeu muito a pena”, relembra. Na marca Eudora, na área de marketing de produtos. “Não
pertencente ao Grupo Boticário, lançou o produto que me imagino trabalhando com qualquer
considera a menina de seus olhos: o perfume Chic. “Tenho outro segmento. Sou apaixonada pelo
muito orgulho. Foi um projeto trabalhoso para viabilizar que faço e estou muito satisfeita e feliz na
por causa do custo, mas hoje é um sucesso de vendas.” posição que ocupo”, disse.

08 maio • junho • julho • agosto 2017


CHAPÉU | CHAPÉU
POR ONDE ANDA
JORNALISMO

MARIANA PEKIN
Renovar
a profissão
Trajetória do ex-casperiano Leandro Beguoci, de veículos tradicionais
a startups, é marcada pela inventividade e entusiasmo

“H
oje, nós temos um desafio bem concreto. social”, conta. Desde então, o jornalista já
Como a gente transforma o jornalismo num passou por Veja, Editora Abril, iG, liderou
item de primeira necessidade? Como a gente a criação da Fox Sports online no Brasil, e,
convence pessoas, organizações e empresas a dar seu tempo em 2013, trabalhou com startups. É mestre
e seu dinheiro para quem se dedica a produzir jornalismo pela London School of Economics e deu
profissionalmente?” Esse é o questionamento de Leandro aulas na pós-graduação da Faap e para o
Beguoci, de 34 anos, ao longo do texto “A Reinvenção do Instituto Europeu de Design. Desde 2015,
Jornalismo”, escrito enquanto estudava novos modelos de é diretor editorial da revista Nova Escola,
negócio em jornalismo no Tow-Knight Center in Entrepreneurial a maior revista de educação no País. “O
Journalism. Filho de professores e de Caieras, Beguoci veio a meu trabalho na Nova Escola casa com o
São Paulo em 2001 para estudar Jornalismo na Cásper Líbero sonho de moleque. Faço o trabalho com a
“em parte por ativismo, em parte por desejo de mudança disposição de ser transformador”, diz.

10 maio • junho • julho • agosto 2017


POR ONDE ANDA
RELAÇÕES PÚBLICAS

© ROBERTA KASINSKI
UMA
JOVEM
REVISTA
SAÚDA
UMA
RP SENHORA
e Saúde
A ex-casperiana Manoela Cordeiro já passou por várias
FACULDADE!
empresas até chegar na Johnson & Johnson

E
x-casperiana formada em 2007 no curso de e Brilhante. Desde 2015 trabalha como
Relações Públicas, Manoela Cordeiro iniciou a carreira gerente de marketing do produto One
estagiando na área de eventos e depois como Touch, medidor de glicemia da Johnson
ombudsman do Hospital e Maternidade São Luiz. Encorajada & Johnson. “Além de fazer toda a parte
pelo professor e então coordenador do curso de RP, Julio relacionada ao marketing, quando você
Barbosa, ela resolveu se arriscar na área de marketing. Entrou trabalha com saúde também tem a ‘missão’
PA R C E I R A S N A P R O M O Ç Ã O
no programa de estágio da companhia farmacêutica Boehringer de contribuir com informação e educação
Ingelheim. O que poderia parecer alguns passos atrás na para pacientes, consumidores, médicos D A C U LT U R A E D A E D U C A Ç Ã O
carreira representou um cargo efetivo como analista. Depois e familiares”, completa ela, que tem 31
foi para a empresa farmacêutica Nycomed – atualmente anos. Para o futuro, pretende dar vida ao
Takeda – para trabalhar com a marca Neosaldina. Em 2011, projeto sobre planejamento de eventos
aceitou o convite para ser coordenadora de marketing na área em colaboração com sua amiga, Stefania
regional da Unilever, atuando com as marcas Lifebuoy, Omo Souza, também ex-casperiana.
R E V I S TA C U LT. C O M . B R • 11 3 3 8 5 3 3 8 5
12 maio • junho • julho • agosto 2017
POR ONDE ANDA
RÁDIO, TV E INTERNET

Anúncio

ACERVO PESSOAL
Um pé
na TV
Formado pela Cásper, Afonso Cappellaro é
roteirista de programas da TV Globo

A
luno da primeira turma de Rádio e TV da Cásper que se consolidou como um espaço de
Líbero, Afonso Cappellaro coordenava com os reunião de projetos do mundo todo sobre
colegas um programa sobre trilhas sonoras na acessibilidade, proteção à privacidade e
rádio universitária, que seguiu participando mesmo depois inovação na internet. A televisão apareceu
de formado, em 2006. O entretenimento musical e a unida à internet quando Cappellaro
vontade de dar continuidade à formação acadêmica o precisou migrar o programa Esquenta,
levou para Londres, onde trabalhou na Universal Music e da TV Globo, para o digital. Depois de
na MTV, como assistente de marketing digital. De volta ao três anos atuando no ramo digital da
Brasil, a internet começou a se estabelecer como um dos emissora, o ex-casperiano se aproximou da
focos profissionais na carreira de Cappellaro. Ingressou na roteirização para televisão, trabalhando no
Casa da Cultura Digital, onde trabalhou na organização Vídeo Show e, hoje aos 33 anos, escreve os
do “Fórum da Cultura Digital” na Cinemateca, em 2011, roteiros do programa Estrelas.

14 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 15


POR CONTA PRÓPRIA

EMPREENDEDORISMO

Desafie o ::STARTUPS:: Potencial de

status
mudança é o que une as
histórias contadas pela Draft,
uma plataforma online que
estimula novos negócios

quo
Em agosto de 2014, o comunicador Adriano Silva lançou o
Draft, uma plataforma de jornalismo de negócios, ao perceber
Startups ou negócios
o surgimento da chamada nova economia no País. A ideia era
de escala
destacar novos empreendimentos e empreendedores fora do radar
Aos Fatos, a primeira
dos tradicionais veículos de comunicação. Desde então, foram
plataforma de fact-checking
1.850 histórias contadas nos primeiros dois anos e cerca de 500 mil
brasileira, procura novas formas
leitores por mês. E o site já expandiu sua produção com o Draft TV
de sustentar o negócio a partir
e a Academia Draft, seu braço educacional. “Acreditamos que é isso
de parcerias, contribuições de
que inspira as pessoas a também pensar fora da caixa”, conta.
iniciativa privada, organizações
sociais, leitores e crowdfunding.

EXEMPLOS

Economia criativa
O lema aqui é unir a vocação Negócios de impacto Inovação corporativa
ao seu ganha-pão, como os Esses empreendimentos têm A Red Bull criou no centro
sócios Pedro Doria e Vitor como essência um impacto de São Paulo a Red Bull
Conceição, com a startup positivo na comunidade Basement, um espaço
de jornalismo Canal Meio. A onde estão inseridos. A com residência para
newsletter envia as notícias partir da inquietação da desenvolvedores digitais,
essenciais do dia e foi lançada jornalista Emília Rabello, a um makerspace – espaço
em 2016 depois que a dupla, proposta de planejar junto comunitário com ferramentas
com passagens por grandes de agências de publicidade de uso compartilhado – e
empresas de mídia, perceberam campanhas para serem que promove um festival de
a possibilidade de negócio na veiculadas em comunidades palestras sobre tecnologia.
era do excesso da informação. marginalizadas e incluir no
processo agentes desses lugares
como planejadores de mídia,
exibidores e receptores das
mensagens.
16 maio • junho • julho • agosto 2017
BITS & BYTES

PROFISSIONAL MULTIMÍDIA

Manual de
::INOVAÇÃO:: Para quem
quer atuar na nova fronteira
midiática das narrativas,
abaixo, um kit mínimo

sobrevivência
Câmera 360°
Vídeos 360° é uma das mais Canon 5D
novas apostas do jornalismo na Esse modelo é
web. O diretor de fotografia do uma solução
Vice Brasil, Nicholas Zugaib, completa para
conta que os principais desa- foto e vídeo. A
CAROLINA MORAES

fios são transportar a pessoa sugestão para


para o ambiente da narrativa e um profissional
buscar uma reprodução de vídeo é uma câmera
mais acessível. A publicação usa com resolução de
um conjunto de sete câmeras GoPro em 22,3 megapixels que
um suporte de 200 dólares – apesar de também grava vídeos
existirem outras opções no mercado BEATRIZ FIALHO
full HD. Custa cerca de 18
mil reais

GoPro Hero5 Black

DIVULGAÇÃO
Com sua lente grande angular, a câmera é leve, pequena e pode ser
uma boa pedida para gravar vídeos e tirar fotos com praticidade. As
fotos têm até 12 megapixels, a gravação de vídeos de 4.096 x 2.160
pixels. O aparelho com formatos ampliados é à prova d’água, tem GPS
e sistema de estabilização e custa cerca de 1.900 reais
BE
AT
R
IZ
FIA

APLICATIVOS NA FAIXA
LH
O
O
LH
FIA

Cogi Evernote Call recorder


RIZ
AT

O app é ideal para O aplicativo facilita o Grave suas entrevistas


BE

economizar horas de- trabalho de organização nacionais e internacio-


cupando entrevistas: ele do profissional: cria nais diretamente no
grava com a possibilidade listas, escreve no bloco celular. O aplicativo
ACESSÓRIOS de recortar as partes mais de notas, lista as tarefas permite que as grava-
Lapela – pequeno microfone importantes. Basta clicar do dia e salva arquivos ções sejam enviadas
Lentes básicas para câmeras da em “tap”. O Cogi também nos mais diversos forma- para o e-mail ou se-
Canon – 24-70mm, 70-200mm permite tirar fotos e usar tos. De quebra, todo o jam salvas no próprio
Kit Boom – conjunto de microfone, um bloco de notas. Ao conteúdo é sincronizado aparelho. Disponível
vara, para sustentação, e blimp, um fim, a entrevista já estará para o computador, para sistemas iOS e
case de proteção para o microfone quase pronta para ir ao ar tablet ou celular Android

18 maio • junho • julho • agosto 2017


NOVO VISUAL

CHAPÉU | CHAPÉU

Uma larga pulseira de miçangas


azuis e pretas, discreta sob a manga
D O C U M E N TÁ R I O

Apesar de instrutor, Portella pri-


vilegia o trabalho e as escolhas dos
sociação Filmes de Quintal. No ano
seguinte, teve seu primeiro contato
A REVISTA
DE CARA
da camisa branca, é o único elemen- próprios ameríndios. “A gente tem com alguns integrantes do Vídeo nas
to que, à primeira vista, liga aquele que saber o que querem mostrar Aldeias, que fizeram uma retrospec-
homem à cultura indígena. Sentado para eles. Os Baré, por exemplo, tiva de seus filmes no festival.
em um café no Centro Cultural São faziam cortes absurdos, algo muito Essa experiência foi o ponto de
Paulo, está apenas de passagem por sofisticado, sozinhos. Não tinham partida para seu mestrado, que rela-
sua cidade natal. Deixou-a aos 17 background para usar isso como a ta 10 anos de sua pesquisa na antro-
anos para estudar artes visuais em gente, que aprendeu numa escola. pologia visual. O trabalho, intitulado
Belo Horizonte. Cumpre ali uma Fizeram isso executando a mon- “Essa máquina não caiu do céu”, em
função intimamente relacionada à tagem que eles pensaram. Aquilo referência à câmera, metaforiza a re-
sua vida e sua carreira: Pedro Por- que o Lévi-Strauss dizia que tanto lação desigual entre homem branco
tella é um dos curadores da Aldeia o cientista como o xamã chegam ao e os ameríndios e foi defendido em

NOVA
SP, uma mostra de cinema indígena. mesmo ponto através de vias dife- 2014 na UFMG. Aos 41 anos, Por-
Desenterrou a pulseira de seu rentes”, reflete. tella planeja ainda o doutorado na
baú etnográfico apenas para aquela Essa perspectiva é apenas uma Inglaterra, onde passou praticamen-
ocasião. Foi presente de uma tribo das infinitas riquezas que os amerín- te todo o ano de 2016 ministrando
Ikpeng, um dos tantos que Portella dios têm a apresentar. As tradições workshops sobre antropologia visual.
recebeu ao longo de 12 anos em orais, a roçar milenar, a medicina “A máquina é feita com os mi-
que percorreu 30 tribos indígenas tradicional, o conhecimento da ter- nerais que saem do solo, Omama, o
grande deus dos Yanomami. A má-

A IMAGEM DO ÍNDIO
quina não caiu do céu, ela já existia
O antropólogo Pedro na terra, e é como se o homem bran-
Portella ensina os povos co tivesse roubado essa substância
dos indígenas. E os indígenas toma-

O projeto gráfico foi


indígenas a documentarem ram essa máquina de volta, toma-
ram essa voz de volta, porque o não
suas vidas indígena é como um ladrão de vozes,
POR PAULO HENRIQUE POMPERMAIER
trabalhando com cinema etnográ- ra e da floresta são alguns dos ele- um ladrão de olhares”, explica.
fico. Certa vez foi presenteado com mentos. Perpetuados na imagem, Portella já exerceu outras fun-

reformulado e traz novas


uma iguaria exótica para os bran- empoderam os índios e resgatam sua ções mais burocráticas, como con-
cos, mas um gesto sagrado para os tradição em um país que ainda não sultor da Unesco e analista do acer-
caçadores Kaxinawá: “Como chego os reconheceu. Tornam-se “registros vo do Museu do Índio, da Funai.
lá ensinando algo novo, uma nova políticos, nessa pátria ainda genoci- Nessas atividades, ficou menos de
tecnologia, eles precisam retribuir e da”, na observação de Portella. um ano, preferindo sempre suas ex-

propostas editoriais
eu ganho um miolo de anta. Fiquei Entre suas trilhas pelos passos an- periências etnográficas. Ele afirma
emocionado e comecei a perceber cestrais, já percorreu Peru, Colômbia que aprendeu mais com o índio do
como as trocas são importantes en- e Guiana Francesa organizando ofici- que com a sociedade contemporâ-
tre nós e os outros. A gente aprende nas de audiovisual. Chegou a enfren- nea. “Desde o primeiro momento
a trocar”, diz. tar resistência de alguns povos. Foi o aprendi a dormir em rede, a am-
Seu percurso no audiovisual in- caso dos Yanomani, que negaram a pliar nossos gostos, nosso paladar, a
dígena começou em 2004, quando câmera num primeiro momento, mas aprender com as histórias deles, com
integrou o projeto Vídeo nas Aldeias, aos poucos foram aceitando a im- as cosmogonias, com os mitos”, ex-
que organiza oficinas cinematográ- portância do registro imagético para plica, afirmando que foi preciso se

POR GIULIA GAMBA


ficas para os povos originários. Co- educar o olhar do homem branco. desapegar de uma visão asséptica,
ordenou, em seu primeiro projeto, Antes de organizar oficinas com que não queria contato com a terra.
encontros com os Kaxinawá do Rio o Vídeo nas Aldeias, Portella já tinha “Ensinar audiovisual consiste mais
Jordão, no Acre. Com algumas câme- projetos nos quais trabalhava com em aprender do que ensinar, e é um
ras e computadores, ficavam de duas arte e vídeo nas periferias. Em 2003, privilégio. A gente deixa de acreditar
a quatro semanas ensinando os índios foi convidado para integrar a equipe que os outros têm crença e nós temos
a manusearamo equipamento: filmar, do Festival do Filme Documentário o saber. O indígena tem seu próprio
fazer foco, criar noções de continui- e Etnográfico de Belo Horizonte, o saber, sua própria ciência, que preci-
dade, descarregar em HD, editar. Forumdoc.bh, organizado pela as- sa ser respeitada.”

A partir da edição #21 a Revista


30 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 31

Cásper ganha uma cara diferente. Foi


na busca por um visual mais clean e
arrojado que surgiu o desafio de criar
BITS & BYTES
um novo projeto gráfico que unisse
As páginas podem
PROFISSIONAL MULTIMÍDIA modernidade com comunicação e
ser diagramadas
Manual de
::INOVAÇÃO:: Para quem

acompanhasse o ritmo e os temas da


quer atuar na nova fronteira
midiática das narrativas,
abaixo, um kit mínimo com maior
sobrevivência flexibilidade,
valorizando as
publicação. O objetivo foi proporcio-
nar uma sincronia visual entre foto-
Câmera 360°
imagens e os
grafias e textos para agradar os olhos
Vídeos 360° é uma das mais novas
apostas do jornalismo na web. O
diretor de fotografia do Vice Brasil,
Nicholas Zugaib, conta que os grafismos. As colunas
principais desafios são transportar
a pessoa para o ambiente da
narrativa e buscar uma reprodução
Canon 5D
Esse modelo mudam a cada de quem lê, sem perder aquilo que a
de vídeo mais acessível. A publica- é uma solução
ção usa um conjunto de sete câmeras
GoPro em um suporte de 200 dólares - ape-
sar de existirem outras opções no mercado
completa para foto
e vídeo. A sugestão para
um profissional é uma
edição, mantendo- Cásper têm – sua tradição e legado.
câmera com resolução de
22,3 megapixels que tam- se apenas os temas As colunas, que já foram uma no-
bém grava vídeos full HD por
18 mil reais
de cada uma delas.
GoPro Hero5 Black
vidade da edição passada, trazem des-
Com seu formato leve e pequeno, a câmera é discreta e, com sua lente
grande angular pode ser uma boa pedida para gravar vídeos e tirar fotos Nas reportagens
com praticidade. As fotos têm até 12 megapixels, a gravação de vídeos
de 4.096 x 2.160 pixels. O aparelho com formatos ampliados é à prova
d’água, tem GPS e sistema de estabilização e custa cerca de 1.900 reais especiais, o uso de temas atuais ligados à tecnologia,
de fotos amplas é em Bits & Bites, um mapa sobre como
Cogi
APLICATIVOS NA FAIXA
Evernote Call recorder
estimulado. A nova andam alguns ex-alunos casperianos
fonte, Miller, serifada
O app é ideal para O aplicativo facilita o Grave suas entrevistas
economizar horas de- trabalho de organização nacionais e internacio-
cupando entrevistas: ele do profissional: cria listas, nais diretamente no
que estão se destacando no mercado,
grava com a possibilidade escreve no bloco de notas, celular. O aplicativo
e com um traço

Há 21 anos,
de recortar as partes mais lista as tarefas do dia e permite que as grava-

em Por Onde Anda, ideias e cases de


ACESSÓRIOS importantes. Basta clicar salva arquivos nos mais ções sejam enviadas
Lapela
Lentes da Canon 24-70, 70-200
Kit Boom - R$ 3.500 - 5.500
em “tap”. O Cogi também
permite tirar fotos e usar
um bloco de notas. Ao
diversos formatos. De
quebra, todo o conteúdo
é sincronizado para o
para o e-mail ou se-
jam salvas no próprio
aparelho. Disponível
moderno, favorece
fim, a entrevista já estará
quase pronta para ir ao ar
computador, tablet ou
celular
para sistemas iOS e
Android a leitura dos textos comunicadores que apostaram em
8 maio • junho • julho • agosto 2017
mais longos. seus próprios negócios, em Por Conta
Própria, e uma matéria infográfica,

BIOGRAFIA | ESPECIAL
em Feito à Mão. A revista quadri-
mestral não deixa ninguém na mão
o ponto de encontro dos jornalistas
SETE
– expõe temas relevantes das áreas da
comunicação e também tendências e
ferramentas necessárias para os pro-

DIAS
NA CÁSPER
fissionais dessa área.
A edição #21 celebra os 70 anos
da Faculdade com um caderno espe-
Audiência qualificada em todo o Brasil (e até no exterior)
Bastidores, vaivém profissional e lançamentos
cial, repletos de boas histórias e pa-
Sorrateiramente, abrimos as cortinas que envolvem o
universo dos casperianos. Venha conosco, leitor: por seis dias ginados de forma a valorizar a leitura
Tudo que de relevante acontece no jornalismo
caminharemos pelos corredores da Faculdade espiando o que
acontece na rotina dos alunos e funcionários.
POR NÚCLEO EDITORIAL 2017
visual. O novo projeto gráfico valoriza
os grafismos e fotografias. A leitura
está mais leve e não perde a relevância e na comunicação corporativa
com assuntos que abrangem os qua-
tro cursos da faculdade – Jornalismo,
Publicidade e Propaganda, Rádio, TV
30 31
e Internet e Relações Públicas. Contato: Vinicius Ribeiro
Jornalistas Editora
maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER

113861-5280
vinicius@jornalistasecia.com.br

20 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 21


FEITO À MÃO por Beatriz Fialho

LINGUAGEM DIGITAL

70
Emojiworld
::COMUNICAÇÃO POR IMAGEM:: Na ilustração, os quatro
emojis mais usados pelos brasileiros. Pesquisa da Swiftkey mostra
que rimos até chorar e aplaudimos mais que qualquer outro povo

Sorria, meu bem!


É tão triste... 1º Emojis felizes são os preferidos
Quando a questão é expressar em 5 dos 6 países pesquisados.
a tristeza, os brasileiros só não Confira quanto a carinha feliz
deixam para trás a Espanha: lá, representa do uso total de emojis

ANOS
a carinha representa 24% dos no mundo:
emojis usados, ante os 17% do 2º Alemanha 48%
lado de cá Itália e EUA 47%
Brasil 46%
Espanha 42%
França 24%

4º 3º
Mais amor, Cordialidade BR
por favor • PERFIL DO JORNALISTA E EMPRESÁRIO • A
Os brasileiros ganham PAIXÃO PELOS ESPORTES • O ANO DA CRIAÇÃO
Os desenhos românticos
são o 3º mais usado no
quando o assunto é • CÁSPER EM NÚMEROS • PRATA DA CASA • EX-
mandar palmas. O gesto
Brasil e no mundo. A ALUNOS • LUTA ESTUDANTIL • O MAIS LONGEVO
representa 9% dos emojis,
exceção é a França: os
enquanto nos dois países • O PRESIDENTE • INTERCÂMBIO CULTURAL •
franceses enviam tantos
que seguem no ranking, UMA SEMANA NA FACULDADE • AS LIDERANÇAS
corações que o símbolo
representa 55% de todos
Espanha e Estados • OS DESAFIOS GLOBAIS • BIBLIOTECA • QUIZ
Unidos, representa 6%
os emojis usados

FONTE: SWIFTKEY RESEARCH

22 maio • junho • julho • agosto 2017


CHAPÉU | CHAPÉU

PERFIL | ESPECIAL

OS TRÊS
LADOS DE
CÁSPER

O legado do jornalista continua


sob os eixos que mais preservou
© ACERVO GAZETA PRESS

em vida: o patriótico, o jornalístico


e o cultural
POR GUILHERME GUERRA

24 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 25


Em 15 de março de 1943, a voz com quem ficou por 18 anos) e ami- pos e Campos Sales, então em marcha
grave de Cásper Líbero proferiu al- gos para pensar a produção de um pelo Brasil. Na pequena Bragança, o
gumas palavras na recém-inaugurada testamento. Sem filhos e sobrinhos reconhecimento logo veio e o primei-
Rádio Gazeta. Aos 54 anos, o jor- e sem ter se casado no papel, Cásper ro Líbero foi convidado em 1888 para
nalista, empresário e dono da nova preocupava-se em manter um impé- inaugurar a presidência do Clube Re-
emissora de São Paulo discursava tão rio jornalístico e assegurar o cresci- publicano de Bragança, de vida curta
bem quanto uma figura política. Com mento de seu patrimônio. graças ao breve fim do Império.
os erres fortes, os esses sibilantes, as Em 16 de março, o testamento de Foi nessa agitada Bragança da
pausas e a perfeita clareza do que se Cásper Líbero foi redigido, deixando Primeira República que Cásper cres-

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é dito, ele mantinha a dicção comum seus imóveis a Dona Maggy e o res- ceu. Mas o menino teria boas memó-
aos melhores oradores da época. “A tante para a criação de uma fundação, rias da infância, como as partidas de
Rádio Gazeta empreenderá o melhor baseada em uma tríplice finalidade: futebol na rua e seus tempos no colé-
dos seus esforços para se transfor- “patriótica, cultural e jornalística”. gio, onde era elogiado por suas belas
mar em uma emissora digna da nossa Esses objetivos nortearam a vida de descrições de quadros. No quarto ano
cultura, do nosso civismo, das nossas Cásper. Da parte patriótica, o jornalis- do primário, recebe nota máxima e é
tradições e, sobretudo, da nossa res- ta combateu o regime getulista – não escolhido para ser o orador da turma,
ponsabilidade que pesa sobre todo o com armas, mas por oposição com o aos 10 anos. “Como ato de marotice,
Brasil nesta hora grave e triste da hu- jornalismo de trincheira de A Gazeta. eu surpreendi aos mestres e pais de
manidade”, definiu. Da cultural, foi grande entusiasta dos meus amigos presentes à formatura,
O acirramento da Segunda Guer- esportes, incentivando e promovendo quando no momento da colação, em
ra Mundial não impediu que Cásper diversas competições em São Pau- que eu deveria ser o orador, saquei © ACERVO GAZETA PRESS
Cásper Líbero assinando o contrato da Rádio
Líbero expandisse seus negócios. Vi- lo. Da parte jornalística, foi pioneiro de minhas próprias palavras e fiz um Gazeta, em 5 de fevereiro de 1942
sionário, o empresário já possuía uma na cobertura especializada brasileira discurso de improviso”, relembrou em
rede de jornais e de contatos pelo Bra- com A Gazeta Esportiva, modernizou texto de A Gazeta. 2ª PARTE: O JORNALISTA
sil, Estados Unidos e Europa quando jornais e teve participação decisiva na Na virada do século 20, os Líbe- Até 1947, não existia um curso de formação para jornalistas reco-
decidiu comprar uma decadente rádio criação da primeira escola de jornalis- ros se mudam para São Paulo para nhecido oficialmente. Nem no Brasil, nem na América Latina. A
educacional para, anos depois, trans- mo do país, a Cásper. atender a um chamado profissional profissão era exercida livremente. Bastava entrar em uma reda-
formá-la em uma prestigiada emis- de Honório, médico dedicado que ção, pedir um emprego e aprender na marra. Eram necessários
sora de radiodifusão. Foi ainda pre- atendia os pacientes sob sol ou chu- a boa escrita e o interesse pela vida pública, requisitos que ainda
sidente do Clube dos Proprietários de 1ª PARTE:O PATRIOTA va. Escolheram o bairro de Campos hoje são essenciais na profissão. Cásper Líbero possuía os dois,
Jornais, que tinha como associados O Em 2 de março de 1889, Cásper Lí- Elíseos para morar, e lá também es- mas havia algo mais: o espírito empreendedor.
Estado de S. Paulo e A Folha da Ma- bero nascia em Bragança Paulista, e tudaram os garotos. Desde aquele Ao longo da vida, pouco trabalhou para um jornal que não
nhã. Foi também agente da Política em 15 de novembro, a República bra- tempo, Cásper parecia predestinado fosse seu. No Rio de Janeiro, com amigos fundou em 1911 o ves-
da Boa Vizinhança, encabeçada pelo sileira. A relação com a política fez ao jornalismo, pois assim atestava o pertino Última Hora, de vida curta, mas bastante combativo ao
vice-presidente norte-americano Nel- parte da vida dos Líberos. Vindo da vice-diretor do Liceu em que estuda- marechal Hermes da Fonseca, cujo governo foi marcado por re-
son Rockefeller (de quem era amigo) cidade vizinha Itabina, o pai e médi- va: o garoto teria futuro nas letras. O beliões em todo o país, como a Revolta da Chibata (1910), quan-
para estreitar a relação entre EUA e co Honório Líbero envolveu-se com rapaz enveredou-se pela tradicional do marinheiros, a maioria negros ou mulatos, se amotinaram
América Latina naqueles conturbados a política local bragantina em defesa Faculdade do Largo do São Francisco, contra as más condições a que eram submetidos. A experiência
anos. Mas a menina dos seus olhos dos republicanos. Com os monar- a SanFran, cursando ciências jurídi- com o Última Hora foi o primeiro flerte de Cásper com o jor-
continuava a ser A Gazeta, “um jornal quistas às vésperas do novo governo, cas e sociais. Fez parte da Campanha nalismo. Foi também a primeira tentativa de oposição política
considerado por todos os jornalistas envolveu-se em uma troca de raivo- Civilista para o candidato à presidên- feita pelo bragantino.
uma organização modelar”, como re- sos artigos de jornais. A mãe, Zerbina cia Ruy Barbosa, seu ídolo ao lado do O jornalista fundou também a pioneira Agência Americana,
memorou na inauguração da rádio. de Toledo, foi filha do Capitão Tole- chanceler Barão do Rio Branco, hoje que durou de 1913 a 1914, e trouxe notícias do exterior para o Bra-
“Mas jornal é bem diferente de uma do, figura política da cidade acusada patrono da diplomacia brasileira. A sil. Pouco depois, diversas outras agências semelhantes nasceram
estação de rádio”, e a Rádio Gazeta de hospedar um republicano em sua seu contragosto, ganha o candidato ou chegaram ao país. Ainda capital da República, foi diretor da
logo foi conduzida “às suas finalidades casa – o próprio sogro, recém-casado militar Hermes da Fonseca. sucursal carioca de O Estado de S. Paulo, por indicação de Júlio
intelectuais, artísticas e patrióticas”. com Zerbina e sem casa para morar. Formado bacharel em dezembro Mesquita.
Nos anos 1940, a emissora Gaze- De Zerbina e Honório, nasceram os de 1909, Cásper mal exerce a pro- O sucesso, porém, veio com A Gazeta, já de volta a São Pau-
ta era a “rádio de elite”, como frisava futuros médicos Nelson (de 1884) e fissão, passando brevemente pelo lo. Cásper recebeu a proposta de compra do jornal. Tinha ape-
seu slogan, com uma programação José (de 1886), irmãos de Cásper. cargo de Procurador da Fazenda nas 29 anos. Caso a compra fosse mal-sucedida, quem arcaria
inédita de ópera e música erudita O envolvimento de Honório com a do Estado do Mato Grosso. Logo com os custos seriam os irmãos mais velhos, Nelson e José, mé-

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transmitidos em cadeia nacional. causa republicana foi tão grande, que o abandonou a vida de servidor pú- dicos com carreira estabelecida em São Paulo. Em 16 de maio de
Desde janeiro de 1943, o jornalista médico recepcionou sob seu teto os fu- blico para procurar terra firme na 1918, A Gazeta ganhava um novo dono, que lhe modernizaria e
consultava sua mulher (Dona Maggy, turos presidentes Bernardino de Cam- maré incerta do jornalismo. transformaria no mais importante jornal paulista das décadas

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de 1920 e 1930. Até lá, Cásper e sua se levantaram para a luta! Pelo Bra- relacionamento entre jornalismo e
nova equipe tiveram de reformular sil? Por uma Pátria melhor? Por dias cobertura especializada levaram A
o projeto gráfico, as rotativas, os re- mais claros? Não! Foi contra ti, São Gazeta Esportiva a vender 500 mil
pórteres e as coberturas. O que não Paulo!”, dizia o texto. Cásper tinha o exemplares em 1970 após a Copa do
mudou foi a posição política: uma faro para saber o efeito de tal ousadia Mundo no México, marca que só foi
publicação profundamente republi- editorial e não sacrificaria a credibi- ultrapassada pela Folha de S.Paulo
cana, aliada do Partido Republicano lidade de seu jornal diante da opinião nos anos 1990.
Paulista (PRP). pública. A Gazeta reinventada por Outra inovação vinda do jornalis-
Tanto A Gazeta quanto Cásper Cásper Líbero representou a menta- ta foi o Palácio da Imprensa, então o
foram republicanos desde o berço. O lidade do paulistano, que saltava de único prédio do país a ser inteiramen-
jornal nasceu em 1906 sob os cuida- mera província a um dos maiores te dedicado a redações de jornais – to-
dos de Adolfo Araújo, poeta e jorna- centros industriais da América Lati- dos oriundos de A Gazeta. A sirene do
lista pró-republicano. A tradição foi na. No início do século 20, São Paulo meio-dia foi transportada para o novo
mantida e a campanha presidencial possuía 200 mil habitantes e 40 anos edifício, e o auditório do Palácio da
de 1930 teve participação d’A Gazeta depois mais de 1,3 milhão. Imprensa foi onde os primeiros alu-
em favor do candidato do PRP, Júlio nos da Escola de Jornalismo Cásper
Prestes, oponente de Getúlio Vargas. Líbero tiveram aula. Hoje, o prédio
Em fevereiro, o jornal afirma: “Votar 3ª PARTE: O CULTURAL localiza-se na atual Avenida Cásper
em Júlio Prestes é votar pela felicida- Cásper sempre foi um homem do Líbero, em São Paulo.
de do Brasil e da República.” mundo. De 1930 a 1934, o empresário Cásper era conhecido por ser ex-
Em 24 de outubro do mesmo ano, se exilou no exterior, deixando as fun- celente anfitrião. Seu escritório dispu-
às 14h25, sem aviso, uma chuva de pe- ções de diretor d’A Gazeta. Foi quan- nha de cadeiras e café de alta qualida-
dras atinge a redação d’A Gazeta, no do ele processa o governo brasileiro e de. O bragantino nunca redigia seus
Edifício Médici da Rua Líbero Badaró. recebe uma indenização pelos empas- textos. Preferia ditar para sua secretá-
Não há feridos, somente a própria re- telamentos de seu jornal. O dinheiro ria enquanto andava de um lado para
dação, que ficou em inércia por 3 sema- ganho na causa foi reinvestido no ve- o outro da sala. Era no escritório, do
nas sem circular o jornal, e também a ículo. O jornalista sempre reutilizava Rio ou de São Paulo, que trocava car-
rotogravura e a Sereia. Esta foi a perda os lucros da publicação para manter as tas e marcava encontros com diversos
mais simbólica. O relógio, conectado a inovações feitas em sua equipe e jornal. figurões. Walt Disney foi um deles, e
uma sirene vinda da França em 1915, O empresário era, ainda, um Cásper ganhou um boneco de Zé Ca-
anunciava todo meio-dia (tradição homem de ideias criativas. Na final rioca, mais novo personagem do uni-
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mantida até hoje, na Avenida Paulis- da Copa Sul-Americana de Fute- verso animado e dedicado ao público
ta) mais uma nova edição de A Gazeta. bol, que aconteceu em 1922 no Rio brasileiro. O jornalista era um grande
Como lembrança pela perda da Sereia, de Janeiro, não havia rádio e muito admirador dos Estados Unidos, e logo
Cásper Líbero jamais permitiu que o menos televisão que transmitisse a a potência norte-americana viu nele

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relógio fosse consertado – e assim ficou partida para os paulistanos. A solu- uma forma de reaproximar um Brasil
marcado para sempre o horário do ata- ção encontrada foi simples e genial. que tendia para um apoio ao Eixo du-
que. Atribuem-se as pedras à oposição Cásper Líbero mandou instalar um rante a Segunda Guerra.
getulista, insatisfeita com o posiciona- telefone no estádio do Rio de Janei- Em 1942, o Escritório de As-
mento da publicação. Como se destino ro, que esteve conectado aos novíssi- suntos Interamericanos escolheu
não fosse trágico o suficiente, naquela mos auto-falantes instalados no Vale A Gazeta e seu suntuoso Palácio da
mesma rua havia um século, Líbero do Anhangabaú, no centro de São Imprensa para gravar um documen-
Badaró fora assassinado, tornando-se Paulo. Diretamente do Rio, o próprio tário de 10 minutos sobre o cotidiano
o primeiro jornalista morto por seus jornalista narrava a final do campeo- do jornal, intitulado “Brazil Gets the
escritos na história do Brasil. nato entre Brasil e Paraguai para os News”. Com narração em inglês, Cás-
Em 1932, um novo ataque eleva milhares de paulistanos abarrotados per Líbero aparece no início, posan-
A Gazeta a jornal-símbolo da Revo- no local. O jogo terminou com uma do ingenuamente para câmera en-
lução Constitucionalista. Fora os em- goleada de 3 a 0 para o Brasil. quanto se vê ocupado com papéis. Já
pastelamentos atribuídos à base ge- Esse foi o pontapé para iniciati- estava com sua “marca registrada”,
tulista, outro marco foi a publicação vas como A Gazeta Esportiva, que que ficaria para a posterioridade: a
do poema-manifesto de Ibrahim No- saiu de coluna semanal d’A Gazeta careca, o terno e os óculos de aros
bre na capa do jornal no aniversário em 1918 e transformou-se em pu- redondos. Na “Detroit do Brasil”, as
de São Paulo. “No entanto, do Norte, blicação independente em 1947. A imagens apresentam a “casa de um
do Sul, de toda a parte, os homens paixão do Brasil por esportes e o moderno jornal” e, como todo jornal

Cásper era próximo de Nelson Rockfeller, então vice-presidente dos Estados Unidos
28 maio • junho • julho • agosto 2017 e idealizador da política de aproximação entre o país e a a América
CÁSPERLatina
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Encontro entre D. José Gaspar e Cásper. Os dois também estavam juntos no acidente de avião

“em bom estado”, há um editor. O ta perguntou: “Então, dom José, afinal Cásper, em 16 de maio 1947 criou-se,
próprio Cásper. vamos hoje para o céu?” Confabulação após muitos entraves com a burocra-
Logo após o filme, Cásper e uma ou não, a frase antecipa o trágico desti- cia vigente, a Escola de Jornalismo
comissão de jornalistas foram con- no de ambos naquela manhã. Sob uma Cásper Líbero, a primeira do Brasil
vidados a visitar os Estados Unidos densa cerração no Rio de Janeiro, a asa e da América Latina. O início da fa-
durante o período natalino. O bra- do avião da empresa estatal Vasp, com culdade esteve ligado à Faculdade de
gantino recusou a proposta. Não por seus 18 passageiros, chocou-se contra Filosofia de São Bento, da Pontifícia
desinteresse, mas por acreditar que o o prédio da Escola Naval e mergulhou Universidade Católica de São Paulo
Natal devia ser passado com a famí- nas águas da Guanabara, em torno das (PUC-SP), que cedeu o espaço físico
lia. A viagem aconteceu em maio de 9 horas da manhã de uma quarta-feira para as aulas e também emitiu os di-
1943, e os relatos foram todos publi- do dia 27 de agosto de 1943. Cásper e plomas para os formados. A parceria
cados em agosto daquele ano, em que D. José morreram no acidente. durou até 1972, quando a Faculdade
o jornalista enalteceu o aparato béli- Cásper Líbero já estava na Avenida
co e a imprensa norte-americanos. Paulista há seis anos. Se no ano de
Cásper era ainda um grande com- EPÍLOGO estreia eram 42 alunos matriculados,
panheiro, segundo relatos. Sua gene- Pouco menos de um ano após a mor- hoje são 2.500 estudantes que serão
rosidade com funcionários foi mais de te de Cásper Líbero, em 10 de agosto bacharéis em Comunicação Social.
uma vez lembrada. Certa vez, saben- de 1944, a Fundação Cásper Líbero O corpo de Cásper Líbero foi se-
do que um funcionário estava para se foi criada, presidida por seu irmão pultado no Cemitério da Consolação
casar, estacionou em frente à redação mais velho, Nelson. O testamento e depois transferido para o Obelisco
um carro zero quilômetro e, após in- ganha vida. Dizia o texto: “objetivo de São Paulo, monumento em frente
terminável suspense, revelou que o cultural de criar e manter uma esco- ao Parque do Ibirapuera dedicado aos
veículo era um carinhoso presente do la de jornalistas e ensinamentos de combatentes da Revolução Constitu-
chefe para o seu subordinado. humanidades, particularmente por- cionalista de 1932. Tanto por A Gazeta
Em uma das típicas viagens Rio- tuguês, prosa, estilo, literatura, elo- quanto por ser figura central na his-
-São Paulo, Cásper Líbero embarcou quência, história e filosofia, em cursos tória de São Paulo, parece apropriado
em um vôo com o Arcebispo de São de grandes proporções, a começar que Cásper seja lembrado como com-
Paulo, Dom José Gaspar. Quando es- pelo secundário e finalizar pelo su- batente – um ferrenho defensor da li-
tão para sair de Congonhas, o jornalis- perior”. Seguindo as vontades de berdade de expressão.

30 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 31


PERFIL | ESPECIAL

São Silvestre

AMOR AOS
Em 1925, a primeira edição da São Silvestre teve 60 inscritos
e apenas 37 participantes. No ano passado, foram mais de 30 mil
corredores. O sucesso estrondoso da prova esportiva, hoje conhecida
internacionalmente, se deve à coragem do jornalista e empresário Cásper
Líbero. Criador da prova, ele quis desafiar o costume dos paulistanos de

ESPORTES
passar a virada do ano entre familiares para colocá-los na rua para ver os
corredores em marcha pela cidade.
Cásper assistiu a uma corrida noturna, iluminada à base de tochas,
na Paris de 1924. Quis trazer um evento nos mesmos moldes, mas sabia
que São Paulo exigiria algumas adaptações. A capital de 92 anos atrás,
com ruas de pedra, era mais semelhante a uma cidade interiorana do
que à São Paulo pulsante de 2017. Na noite do dia 31 de dezembro de
Cásper Líbero admirava e incentivava a prática esportiva, criando a 1925, o evento foi lançado. Com um percurso de 8 quilômetros, a largada

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saía do Parque Trianon, passando pelo Vale do Anhangabaú, e chegava
Corrida de São Silvestre e a Prova Ciclística 9 de Julho em frente ao clube Atlético São Paulo, única área iluminada da região.
“A prova era programada de forma que quando o primeiro colocado
estivesse passando em frente à Gazeta, o relógio marcasse meia-noite e,
POR PAULA CALÇADE
então, a sirene fosse acionada”, conta Júlio Deodoro, repórter da Gazeta
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Esportiva desde 1978.
Cásper Líbero deu o tiro de largada. Dentre os 37 corredores, o
vencedor foi Alfredo Gomes, atleta do Clube Espéria. Naquela época,
O corredor José de Silva foi o 1º
apenas homens profissionais podiam participar e os clubes eram
brasileiro a ganhar a São Silvestre
responsáveis pelas preliminares. A maioria dos corredores da São da fase internacional, prova que na
Silvestre de 1925 não se dedicava apenas ao atletismo, como relatou José versão feminina teve na portuguesa
Miranda, corredor da época: “Eu trabalhava o dia todo e só depois ia ao Rosa Mata, sua supercampeã. Na
clube Espéria para treinar”. imagem de abertura, a multidão
Em 1945, a prova esportiva São Silvestre se consolidou como um invadia a Paulista no ano de 1988
dos eventos mais importantes do País. Na 20ª edição, a prova se tornou
internacional, com a presença de atletas do Chile e do Uruguai. Nos anos
seguintes, americanos, europeus, africanos e asiáticos passaram a se
inscrever e o percurso mudou diversas vezes desde então.
Júlio Deodoro conta que a São Silvestre se mostrou resistente até
mesmo a períodos políticos agitados. “Ela não parou de acontecer
durante a Revolução Constitucionalista, quando São Paulo lutava
contra o governo federal. Mesmo na Segunda Guerra, a prova ocorreu
sem nenhuma alteração”, afirma. Em 1955, o papa Pio XII abençoou a
São Silvestre como “uma expressão nítida do congraçamento esportivo e
humano internacional”.
As mulheres conseguiram se inscrever em 1975, engajadas em
conquistar mais espaço naquele que foi declarado o Ano Internacional da
Mulher pela ONU. A atleta portuguesa Rosa Mota foi a grande campeã
em números da São Silvestre, com vitórias consecutivas de 1981 a 1986. A
Gazeta Esportiva a apelidou de “imbatível campeã”, e capas estampando
seu rosto eram comuns. A reação brasileira feminina só ocorreu em 1995
com a brasiliense Carmem de Oliveira. Sua vitória, além de trazer o
primeiro título feminino ao país, deixou a imagem de seu choro quando
cruzou a linha de chegada guardada na memória dos espectadores.
A vitória dos atletas brasileiros na fase internacional da
São Silvestre só aconteceu em 1980, um ano depois que os populares
puderam participar da competição. O líder da prova era o português
Fernando Mamede, mas, em plena Avenida Paulista, ele foi ultrapassado
pelo pernambucano José João da Silva, que “levou a torcida ao delírio”,
escreveu a primeira Gazeta Esportiva daquele ano.

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A partir de 1989, a São Silvestre passou a acontecer durante o dia e não
mais na virada do ano. A proximidade dos anos 2000 trouxe inovações
tecnológicas para os grupos de elite da prova, com exames antidoping nos
campeões em 1998 e a entrega de chips descartáveis em 2010.

32 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 33


Travessia de São Prova Ciclística
Paulo a Nado 9 de Julho
“[A Travessia de São Paulo a Nado] era tão impor- Insatisfeitas com as intervenções políticas e econômi-
tante quanto a São Silvestre”, relatou Max Graber ao jor- cas de Getúlio Vargas, as elites paulistanas se revoltaram
nal Folha de S.Paulo, participante de cinco edições. Cria- contra o governo federal e outros estados do país no ano
da em 1924, a prova acontecia no Rio Tietê quando ainda de 1932. No ano seguinte, Cásper quis homenagear os ci-
era serpenteado e limpo. Cásper Líbero assumiu sua re- vis e militares que apoiaram o estado de São Paulo na Re-
alização em 1932 e acompanhou o desenvolvimento das volução Constitucionalista. Criou a Prova Ciclística 9 de
primeiras edições de lancha. Julho, que, passava por importantes monumentos, vias
Henrique Nicolini, jornalista da Gazeta Esportiva da capital e participava da inauguração de rodovias pau-
desde 1947 e autor do livro “Tietê – O Rio do Esporte”, listas, como a Imigrantes. A única competição do gênero
conta que o rio servia de clube ou praia para os paulista- no país buscava valorizar a cidade.
nos. Havia pesca, passeio, remo, salto e natação. A maior A primeira prova tinha o percurso de 38 quilômetros,
movimentação esportiva ou de lazer se dava na altura dos com a largada na Avenida Paulista e chegada na Angélica.
dois clubes rivais nas beiras opostas, o Tietê e o Espéria, Apenas homens participaram, com um total de 332 ciclis-
próximo a atual Ponte das Bandeiras. Quando a Travessia tas. Com a presença de argentinos e uruguaios, a compe-
ganhou estrutura, ficou estabelecido o trajeto de cinco qui- tição ganhou, em 1947, o título de Prova Internacional 9
lômetros e meio, com saída na Ponte Vila Maria e chegada de Julho. Nesse momento, a prova procurava se adequar
em frente ao Espéria. O leito do rio tinha um curso sinu- melhor ao seu crescimento: já eram 482 participantes, o
oso, com vegetação e população ribeirinhas, e a prova en- que fez com que seu circuito diminuísse a 34 quilômetros
volvia correntezas e diferentes larguras ao longo do trajeto. e a escolha das vias fosse mais criteriosa, sem desafio de
A Travessia chegou a ter 2 mil participantes, entre montanhas, com percursos planos.
eles muitos homens e poucas mulheres. Alguns repre- A Federação Internacional do Ciclismo reconheceu a
sentaram o Brasil nas Olimpíadas de Los Angeles, em importância da prova e incluiu a competição no calendá-
1932, e de Berlim, em 1936, como Maria Lenk e sua irmã rio oficial do esporte em 1974. Mesmo assim, 50 anos se
Sieglinda, Harry Forssell e João Havelange, que morreu passaram sem a presença de mulheres na prova. Foi só em
em decorrência de um tifo contraído no Rio Tietê, já 1985 que as primeiras ciclistas percorreram o Autódromo
mostrando os primeiros sinais de poluição em 1944. O de Interlagos. Cibele Santini, vencedora em 1989, comenta
rio deixou de ser próprio para banho e foi contamina- que a 9 de Julho exige um bom preparo físico e que a pro-
do pelo despejo colossal dejetos e esgoto. Nesse cenário va da elite feminina e masculina se diferencia da aspirante
desanimador, a prova parou de existir em 1944, um ano pelo número de voltas. “Tinha que manter velocidade do
depois da morte de seu incentivador, Cásper Líbero. Na inicio ao fim, da largada à chegada. No início, todos então
década de 1970, a travessia chegou a ter reedições na Re- quase no mesmo índice. Vence quem mantém até o fim”.
presa Billings, em São Bernardo do Campo, mas também A prova voltou às ruas de São Paulo em 2015, depois de
foi interrompida por inadequações do percurso para os 15 anos sendo realizada em percursos menores na Cidade
nadadores. Universitária e no Autódromo de Interlagos.

Maria Lenk foi uma das nadadoras na Travessia e competiu nas Olimpíadas de Berlim, em 1936.
Em 1979, a rodovia dos Imigrantes foi percursso da Prova Ciclística 9 de Julho
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34 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 33


ARTIGO | ESPECIAL

César Tralli é jornalista e,


atualmente, é âncora do
telejornal SPTV, da Rede Globo

Cásper,
amor e

TV GLOBO / DIVULGAÇÃO
gratidão
POR CÉSAR TRALLI

ou Casperiano com muito orgulho. Só não gosto muito de ficar fa-


zendo contas. Afinal, entrei na Cásper 30 anos atrás. Pois é...Jesus
amado! Eu tinha 16 quando passei no vestibular e comecei o curso
logo depois de completar 17.
Foi um período punk, confesso. Eu dava aulas particulares de inglês
e português. Atuava em jornais e revistas da Cultura Inglesa, brigava por uma
bolsa de especialização na Inglaterra (consegui!), fazia teatro, e tomava mui-
to busão dia todo para rodar SP e ir até a Paulista estudar. Frequentei
turmas da tarde, da noite, fui mudando conforme as necessidades.
Apesar dos dias apertados, eu fazia de tudo para conciliar tra-
balho com estudo. Detestava faltar. Sempre fui um exímio CDF.
Adoro estudar, ler, aprender, ouvir, explorar a alma alheia. Sou
um eterno curioso pela vida, pela natureza humana. Sociologia.
Antropologia. Filosofia. Notícia. Estou na profissão certa.
Graças a este espírito fominha por conhecimento, consegui
na Cásper acumular mais uma responsa: estágio não remunera-
do no extinto A Gazeta Esportiva. O jornal funcionava no mesmo
prédio da Folha de S.Paulo, na Barão de Limeira.
Não era propriamente um estágio. Era trampo pesado já na
época. Trampo de repórter, que saía para cumprir pautas e voltar com
histórias e notícias. E trampo de arquivista também.
Aí... tem um causo sensacional. Na época, era tudo máquina de escrever, mime-
ógrafo, telex, papel carbono... Ou seja, só faltavam dinossauros no Parque Trianon. O
arquivo da Gazeta Esportiva era todo manual.
Uma sala gigantesca, sem ventilação nem iluminação adequadas, onde centenas
de exemplares do jornal ficavam organizados por dezenas de estantes.
O telefone tocava lá pra mim e alguém da redação me pedia: “Preciso da escalação
de Corinthians e Palmeiras em partida do campeonato paulista de 1945. Preciso pra
ontem!”. E lá ia eu vasculhar os originais da época para dar a resposta correta.
Era tanto pó que saíam das encadernações que eu chegava em casa todo sujo.
Lembro até hoje da minha mãe horrorizada me olhando, quando eu pisava em casa
tarde da noite: “Filho, você trabalha num jornal ou numa oficina mecânica?”
Com meu motor sempre acelerado, ainda durante a Cásper eu consegui empre-
go de repórter na Rádio Jovem Pan AM. Atravessava a Paulista e ia surfar nas ondas
do rádio.
Dos porões da Gazeta Esportiva... para os céus da Paulicéia desvairada. Eu era o
repórter aéreo. Voava 6 horas por dia no helicóptero da Jovem Pan. E assim decolou
minha carreira de jornalista. Ave, Cásper!

36 maio • junho • julho • agosto 2017


L I NCH
HAAP ÉDUO| TC E
HAMP PÉ O
U | ESPECIAL

JULHO AGOSTO

1947
Depois de 347 anos de colonização
Publicação da All-Negro inglesa, a Índia consegue sua
Comics, primeira revista de

SETEMBRO
independência. Mahatma Gandhi

JUNHO
quadrinhos conhecida que foi (1869-1948) destacou-se por liderar
escrita e desenhada unicamente uma resistência por meio da não-
por afroamericanos violência e da desobediência civil

FELIPE MOSTARDA
O ANO DA
No dia 21, nasce o escritor
norte-americano Stephen King,
No dia 27, o edifício-sede do reconhecido como um dos mais
Banespa, projetado pelo arquiteto ilustres escritores de ficção de
Plínio Botelho do Amaral, é sua geração
inaugurado no centro de São Paulo

CÁSPER

OUTUBRO
No dia 16, é inaugurada a então

MAIO
Escola de Jornalismo Cásper

LÍBERO
A França realiza a Operação
Líbero. No mesmo mês, é a vez Léa para destruir a Liga Pela
da rodovia Anchieta, com 72km Independência do Vietña, conhecida
para ligar São Paulo a Santos como Viet Minh, e capturar seus
líderes em Hanoi, capital do país

O que estava acontecendo no mundo no


ano da criação da Faculdade?

DOMÍNIO PÚBLICO
ABRIL
POR FELIPE SAKAMOTO

No dia 7, o Museu de Arte de


São Paulo (MASP) é criado pelo

NOVEMBRO
empresário Assis Chateaubriand. O
primeiro endereço ficava na Rua 7
JANEIRO FEVEREIRO MARÇO de Abril. O Masp, cujo acervo tem A Organização das Nações
Unidas orienta a aplicação do
cerca de 8 mil obras, é o museu
mais importante do Hemisfério Sul Plano de Partição da Palestina,
No dia 8, nasce o cantor, ator O Tratado de Paz de Paris
O general George C. aprovado em Assembleia,
e compositor britânico David foi assinado após a Segunda
Marshall elabora o Plano dividindo o Estado em dois: um
Bowie em Brixton, Londres. Guerra Mundial pelos países
Marshall, uma iniciativa THE palestino e outro judeu
Nove dias depois, morre o vencedores e antigos aliados PHO
TOG
RAP
da Alemanha nazista. O dos Estados Unidos para HER
/W
contrabandista Al Capone IKIM
documento internacional a reconstrução dos países EDIA
CO
MM
pretendia resolver as questões aliados da Europa após a ON
S

fronteiriças e as diferenças entre Segunda Guerra Mundial


as nações

DEZEMBRO
Nasce no dia 14 a economista
e ex-presidente do Brasil, Dilma
Rousseff, em Belo Horizonte,
Minas Gerais
RON FRAZIER

AGÊNCIA BRASIL
WIKIMEDIA COMMONS

38 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 39


RADIOGRAFIA | ESPECIAL

INÚMEROS
NÚMEROS
Um retrato da Faculdade a partir de seus dados
POR GIULIA GAMBA

Trinta e dois degraus separam a faculdade, 693 deles são de Jornalis-


movimentada Avenida Paulista do mo, 713 de Publicidade e Propagan-
prédio de número 900. São 4.528 pés da, 305 de Rádio, TV e Internet e 553
de alunos que se dividem entre piso- de Relações Públicas. A quantidade
tear o íngreme escadão e o corredor de mulheres é quase 2 vezes maior
do térreo baixo diariamente. A Cásper que a de homens: 67%. As futuras
é uma faculdade de verticalidades. O publicitárias formam um pelotão de
acesso mais escolhido para chegar a 428 alunas, ante os 285 homens.
qualquer um dos 15 andares são os A Cásper é uma faculdade de
elevadores. São 9 que funcionam 24 corpo jovem. A faixa etária média
horas por dia, 168 por semana. Os dos alunos é de 21 anos. Falemos de
equipamentos carregam gente de to- extremos: 42 anos separam o aluno
das as áreas – funcionários, professo- mais novo (nascido nos anos 2000)
res e alunos, em sua maioria. Os quase do mais velho (de 59 anos). Oito de
450 degraus de escadas que dão aces- cada dez alunos são brancos. Apenas
so ao prédio inteiro são evitados – e 0,7% dos alunos se declaram pretos,
não é difícil descobrir o por quê. número que só não é menor que
Desde 1970, a sirene no topo aqueles que se declaram indígenas
da torre já tocou pelo menos 17 mil (0,1%). O perfil discente também
vezes para avisar aos pedestres atra- inclui cerca de 28,3% de alunos com
sados, aos trabalhadores em seus renda familiar mensal de 5 a 7 salá-
escritórios ou aos moradores ainda rios mínimos e 22,2% com a renda
por acordar que já é, pontualmente, entre 8 a 10 salários mínimos. Tro-
BEATRIZ FIALHO
12 horas. Nunca falha. cando em miúdos, o poder aquisi-
Dos 2.264 alunos matriculados tivo é alto: 50,5% dos alunos fazem
por ano nos 4 cursos oferecidos pela parte do grupo restrito de 15,9% de

40 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 41


brasileiros que ganham mais de 5 volta quase inteira pela cidade de São
salários mínimos. Paulo. O auge de frequência de pes-
Entre os discentes, 650 alunos são quisas, em 2016, aconteceu em abril
contemplados com bolsa de estudos e – 9.828 usuários. Os meses de férias,
430 contam com bolsa de avaliação naturalmente, são menos movimen-
socioeconômica subsidiada pela man- tados: apenas 2.495 usuários em ja-
tenedora, a Fundação Cásper Líbero. neiro e 2.413 em julho. As consultas e BEATRIZ FIALHO

Outras são oferecidas para quem par- os empréstimos quase sempre são de
ticipa do Centro Interdisciplinar de livros, pelo menos 9.805 por ano. E
Pesquisa, conhecido como CIP. Até os alunos são os que mais retiram – de
hoje, lá foram produzidos mais de 11.029 empréstimos, 9.494 são para
200 projetos docentes e de iniciação estudantes – 86% do total anual.
científica. No último ano, 15 pesqui- Quando o assunto é mercado de
sadores bolsistas e 6 não bolsistas ti- trabalho, a Cásper tem destaque:
veram a oportunidade de fazer suas 47% dos alunos estagiam na área
pesquisas, orientados por 7 docentes. de seus estudos, o que corresponde
Desde 2003, 140 alunos pesquisado- a 1.064 comunicadores casperianos
res passaram pela experiência. Em contratados. Cerca de 88% deles rea-
2016, houve 3 projetos de pesquisa lizaram os estudos de ensino médio e
relacionados a Jornalismo, 3 a Publi- fundamental em escolas particulares,
cidade e Propaganda, 3 a Rádio, TV e ante apenas 5% que frequentaram
Internet e 2 a Relações Públicas. escolas públicas. A maioria dos ca-
Nos 4 andares da Faculdade, há louros está cursando sua primeira fa-
30 salas de aula. Nelas, 92 profes- culdade. Exatamente 85,9% dos 540
sores que compõem o corpo docente ingressantes. São 200 vagas abertas
atual se revezam, muitos ministran- por ano em Jornalismo e em Publici-
do disciplinas em mais de um curso – dade e Propaganda, 150 em Relações
são 36 professores com aulas em Jor- Públicas e 90 em Rádio, TV e Inter-
nalismo, 36 em Publicidade e Propa- net. Na pós-graduação, outra área
ganda, 28 em Rádio, TV e Internet conceituada da Cásper, havia 308
e 27 em Relações Públicas. O tempo alunos matriculados em 2015.
em sala de aula passa de 60 horas em Há três órgãos laboratoriais na
cada um dos períodos, matutino e Faculdade. Para aqueles que estudam
noturno, todos os meses, número que Rádio, TV e Internet, a Clact Zoom é
se multiplicarmos por uma média de um local de experimentação audio-
3 turmas por ano soma mais de 1.440 visual e produz cerca de 15 projetos
horas – tempo suficiente para assistir anuais, que incluem o programa Edi-
a toda franquia de filmes da saga Star ção Extra, vídeos institucionais e ou-
Wars pelo menos 80 vezes. tros projetos. Já o Núcleo Editorial
A biblioteca Professor José Ge- de Revistas, vinculado ao curso de
raldo Vieira intersecciona o 4º e 5º Jornalismo, é responsável pela pu-
andares. O acervo total, de 133.509 blicação de cerca de 7.000 exempla-
exemplares, abriga uma infinida- res impressos, dos quais fazem parte
de de materiais – desde fitas K-7, as revistas CÁSPER e Esquinas.
em uma quantidade pequena de 45 Todo ano casperianos chegam e
unidades, até os 51 mapas, 454 dis- partem. Em 2016, a Cásper Líbero
sertações, 36 disquetes, 8.490 fo- formou 517 novos profissionais para
tografias impressas, 3.216 projetos o mercado de trabalho. Foram 174
experimentais, 3.169 DVDs e 48.185 em Jornalismo, 157 em Publicidade
livros, além dos 30.326 periódicos – e Propaganda, 119 em Relações Pú-
em março de 2017. São ao menos 4 blicas e 67 em Rádio, TV e Internet.
milhões de páginas disponíveis para Setenta anos que passaram, com di-
consulta ou empréstimo – estendi- versos números e histórias – de mui-
das no chão, seria possível dar uma tas que ainda estão por vir.

42 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 43


GALERIA | ESPECIAL

PRATA D A CASA Grandes nomes que fizeram parte do corpo docente


da Faculdade Cásper Líbero

© COMUNICAÇÃO SOCIAL/FFLCH-USP

© COMUNICAÇÃO SOCIAL/FFLCH-USP
© MARCOS SANTOS/USP IMAGENS

LINDOMAR CRUZ / ABR


©ULISSES CAVALCANTI

© CICERO RODRIGUES
© LARISSA PAIVA

ACERVO PESSOAL

ACERVO PESSOAL

© FELIPE GOMES
Aloysio Biondi Ana Maria Antonio Antonio F. Aziz Ab’Saber Eugênio Bucci Francisco Gilberto José Marques de
Augusto Soares Costella José Hamilton
Camargo Gaudêncio Maringoni Mello
Ribeiro

©ULISSES CAVALCANTI
CAROLINA MORAES
BÁRBARA HECKLER

© LAINE ALMEIDA
ACERVO PESSOAL

ACERVO PESSOAL

ACERVO PESSOAL
© ESPAÇO ÉTICA

© FÁBIO SABBA

© TÚLIO VIDAL
Bernardo Issler Bianca Santana Caio Tulio Costa Clovis de Barros Cristina Giacomo Julio Cesar Laan Mendes Liana Gottlieb Luís Alberto de Marcelo Coelho
Filho Barbosa de Barros Farias
© CENTRO DE EVENTOS FCL
© CENTRO DE EVENTOS FCL

© LAURA CAPELHUCHNIK
© ARQUIVO PESSOAL

© ALINE ABE PACINI

ACERVO PESSOAL
© TIANA CHINELLI
ACERVO PESSOAL
ACERVO PESSOAL
© TÚLIO VIDAL

Dulcília Helena Edson Flosi Elisa Marconi Erasmo de Erivam de Marcos Margarida Maria Ivonete Mario Vitor Marlene Fortuna
Buitoni Freitas Nuzzi Oliveira Faerman Kunsch B. Ramadan Santos

44 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 45


ARTIGO | ESPECIAL

Regina Helena de Paiva Ramos é

ACERVO PESSOAL
jornalista, escritora e dramaturga.
Atualmente, mantém o site
Escrevinhações em que compartilha
alguns de seus textos

©DIOGO VIUDES JUNIOR


©ILUSSES CAVALCANTE

© ALINE ABE PACINI


©FÁBIO SABBA
Quase me
estrepei!
Matinas Suzuki Monica Nanami Sato Nancy
Brincalope Ramadan

POR REGINA HELENA DE PAIVA RAMOS

no letivo de 1950, aula inaugu- quatro mãos: Perón-Evita”. Afiançava que a Argentina
ral na Escola de Jornalismo vivia numa ditadura cruel, mandavam matar inimigos, a
© ALINE ABE PACINI

©ALINE ABE PACINI


ACERVO PESSOAL
Cásper Líbero. O palestrante inflação era altíssima, roubavam, a população estava es-
era Vergniaud Gonçalves. magada e todos se queixavam.
© FCL

Estava voltando dos Esta- Assim mesmo, sem provas, só com a opinião da repór-
dos Unidos, onde cursara ter. A matéria foi publicada; o jornal, distribuído.
Paulo Nassar Pedro Serico Péricles Eugênio Roberta Jornalismo na Univer- Resultado? Até o prédio da Fundação Cásper Líbero
Vaz da Silva Ramos Cesarino Ihan sidade de Missouri e tremeu. Mais ainda quando receberam carta do Consulado
aprendera a aplicar Argentino protestando: onde estavam as provas colhidas
o lead, palavra e pela repórter? Aquilo era um despautério e a aluna irres-
técnica então des- ponsável deveria ser punida!
conhecidas no Fui chamada à diretoria. Sem descompostura, mas
Brasil. com advertências. “Cadê minha liberdade de imprensa?”
A caloura aqui, perguntei, assustada.
© ALINE ABE PACINI

© ALINE ABE PACINI


PEDRO CARAMURU
ACERVO PESSOAL

toda ouvidos. A Fundação pediu desculpas ao consulado, mas foi Luiz


Enquanto Silveira, o velho professor de Técnica de Jornalismo e di-
o tema foi retor da Escola, que me deu a primeira lição importante.
técnica, tudo bem. Mas Vergniaud passou a discorrer sobre Aquilo não era uma reportagem séria, não tinha dados, não
Rodney Sérgio Amadeu Sérgio Rizzo Sidney Ferreira liberdade de imprensa e proferiu a frase que me revoltou: entrevistara ninguém, não havia “fontes”. Passou a mão na
Nascimento Leite “Não existe liberdade de imprensa. O que prevalece é a opi- minha cabeça e sorriu: “Mas foi uma matéria corajosa”.
nião do dono. Jornalista não pia”. A matéria corajosa que não era uma reportagem séria
E MAIS: Vontade de levantar e ir embora! acabou recebendo o 1º lugar num concurso da Livraria Sa-
O radicalismo do palestrante era largo e a caloura não raiva para alunos da Cásper.
Alon Feuerwerker; Anton Miguez; Antonio
sabia disso. Queria salvar o Brasil e o mundo – seu jornalis- Daí para cá pesei as palavras de Vergniaud, a lição de
Bandeira; Carlos Rizzini; Ebrahim mo deveria gritar o que achasse justo para todos ouvirem – Luiz Silveira e acrescentei a elas a experiência de mais de
© BRUNO PACHECO

© CENTRO DE EVENTOS

Ramadan; Emir Nogueira; Fernando Góes; e vinha um cara gordo falando baixo (era surdo!) proferin- 60 anos de batente. Sim, o patrão, muitas vezes, decide.
João Alves das Neves; José de Freitas Nobre; do uma coisa dessas? “Liberdade de imprensa não existe?” Mas a gente tenta conversar. Se a fonte é segura, se o as-
Não aceitei. sunto é palpitante, se o repórter é correto e mostra firmeza,
José Geraldo Vieira; Juarez Bahia; Luiz
Mas já nesse ano vi que um pouco de razão o gordo tinha. meio caminho andado. Deve-se concluir que “nem tanto ao
Silveira; Renata Lo Prete; Walter Lima Junior Fui de férias para Buenos Aires, época do Peron. As- mar, nem tanto à terra”. O radicalismo do Vergniaud Gon-
Tereza Cristina Toshio censorista reclamava do governo, garçons resmungavam, çalves não era para ser levado a ferro e fogo. A fogosidade
Vitali Yamazaki taxistas se queixavam e um dia o projeto de jornalista que da repórter na Argentina não deveria ser tolerada. Há que
a caloura era viu nas ruas o enterro de um inimigo do go- seguir fazendo o melhor, captando fontes preciosas, perse-
verno: uma carruagem negra puxada por cavalos negros guindo honestidade e ampliando conhecimentos.
levando o féretro e uma multidão atrás com a boca tampa- Essa, a rota correta. Às vezes encontramos obstáculos
da por faixas negras. O morto teria sido assassinado pelo pela frente. Contorná-los é possível. E, se não der, muda-se
governo. Horror! Era preciso escrever sobre aquilo. a rota, o emprego, a vida e não há motivos para desespero.
Na volta, a caloura publicou no jornal “A Imprensa”, Liberdade é algo que deve estar, em primeiro lugar,
órgão da Cásper, uma reportagem intitulada “Governo a dentro da gente.

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© HOMERO SERGIO
CHAPÉU | CHAPÉU
GRÊMIOS | ESPECIAL

MEMÓRIA
SUBVERSIVA
Surgimento do Centro Acadêmico Vladimir
Herzog é parte da história de resistência à
ditadura militar na década de 1970
POR PAULA CALÇADE
© HOMERO SERGIO

Trinta e nove anos se passaram uma instituição autônoma que os três correntes principais: Espaço Li-
desde a criação do Centro Acadêmi- representasse, sem vínculos burocrá- vre, uma versão casperiana do grupo
co da Cásper Líbero em meio à dita- ticos com a Faculdade. Uma possibi- trotskista Liberdade e Luta; Conver-
dura militar. O período de violações lidade nova àqueles que antes viviam gência Socialista, também trotskista e
aos direitos humanos já começava a na clandestinidade. atual PSTU; e Caminhando, formada
decair em 1978. Mas a luta estudantil “A Cásper, restrita ao quinto an- por simpatizantes de outras tendên-
era necessária para combater o esta- dar, era um espaço físico asfixiante, cias não trotskistas, que se dissolveu
do ainda repressivo, e foi nesse con- quase insuportável nos dias de calor. entre o PCdoB e o PT.
texto histórico e político que os estu- O cheiro de gordura dominava o am- Mauro Lopes, jornalista e calouro
dantes da Cásper Líbero se juntaram. biente no horário do intervalo. Onde do mesmo ano, era membro do gru-
Arte, política e comunicação juntas: hoje está a tesouraria ficava a cantina, po Caminhando, corrente vencedora
essa era a face do Centro Acadêmico que servia como uma única opção de das primeiras eleições para o Centro
Vladimir Herzog. lanche sanduíches de presunto e quei- Acadêmico. Ele recorda que, logo no
No ano de sua criação, o curso jo”, conta Igor Fuser, calouro naquele início da gestão, o espaço para a re-
© HOMERO SERGIO

de Jornalismo da Faculdade Cásper ano e, atualmente, professor da Uni- flexão política já se mostrava muito
Líbero era procurado por profissio- versidade Federal do ABC. Ele des- mais aberto do que antes. “O batiza-
nais que já estavam nas redações: a creve uma faculdade completamente do com nome de Vladimir Herzog foi
obrigatoriedade do diploma de jor- diferente da atual, em que a falta de consenso dentre todas as chapas que
nalista para atuar no mercado os fez espaço físico acabava facilitando a ar- concorreram. Ele havia sido assas-
voltar às salas de aula. O ambiente ticulação entre todos. sinado poucos anos antes (em 1975)
era diverso, mas majoritariamente Era o momento de destituir o e isso causou grande mobilização
consciente da repressão política que Diretório Acadêmico, departamento entre os jornalistas”, lembra. Como
se vivia nas ruas e nos jornais. Muitos institucional responsável pelas de- forma de homenagem, os estudantes
dos novos casperianos constituíam a mandas dos alunos, e disputar um chamaram Clarice Herzog, viúva de
chamada imprensa alternativa. Esses espaço mais democrático. Os grupos Vladimir, para a cerimônia de posse
alunos começavam a aproveitar um políticos atuantes dentro da Facul- do Centro Acadêmico. Foi apenas
primeiro diálogo aberto pelo então dade eram os mesmos da esquerda em 2012 que a Comissão Nacional
diretor Erasmo Nuzzi para firmar clandestina, mas na Cásper atuavam da Verdade conseguiu a emissão de

CÁSPER 49
ARTIGO | ESPECIAL

Heródoto Barbeiro é
jornalista, historiador e,
atualmente, âncora e editor-
chefe do Jornal da Record
News

TV CULTURA / WIKIMEDIA
De volta
à escola
HERÓDOTO BARBEIRO

oi uma alegria voltar para a escola. Depois de 15 anos de aula sair do ta-
blado e sentar no meio dos alunos é uma experiência extraordinária. De
© HOMERO SERGIO
um lado a pressão do sindicato dos jornalistas que era preciso diploma
para exercer a profissão. De outro uma escola tradicional, conceituada
A banda Língua de Trapo surgiu e tocava na Cásper bem no meio do caminho entre o cursinho Objetivo e a Jovem Pan. Não
tive dúvidas, me inscrevi no vestibular. Há uns
um novo atestado de óbito decorren- e calouro de 1979, afirma que foram Possolo, calouro de 1978 e fundador 15 anos não sabia o que era estudar para entrar
te “de lesões e maus-tratos sofridos nessas semanas culturais em que as do grupo Parlapatões, explica que na faculdade. Minha última experiência tinha
em dependência do II Exército–SP, o possibilidades de ação se expandiram. todas as atuações se misturavam. sido o vestibular no curso de japonês da facul-
Doi-Codi”. “Existiam as comissões de música, po- “Reivindicávamos reestruturação da dade de Estudos Orientais da USP. Mas lá estava
A abertura política lenta e gradual lítica e a literária. Essa última criou grade de Jornalismo com conteúdos eu sentado na turma da noite ao lado de alguns
que muitos lembram desses anos, para a revista dos alunos chamada Esqui- mais atuais ao mesmo tempo em que que tinham sido meus alunos ou no cursinho ou
Lopes, ainda não representava o fim na do Grito: eram crônicas e poesias entrávamos nas salas atuando em no curso de História da USP.
das perseguições e da censura. Vladi- muito representativas de quem éra- monólogos e ações teatrais contra a A Cásper para mim foi responsável pela
mir Herzog era o exemplo disso, e os mos e o contexto em que vivíamos”. ditadura”, afirma. abertura de uma ampla avenida para aprender como fazer jornalismo.
estudantes ainda resistiam. “Criamos Mas foi na comissão de música que Hoje, a militância política e social É verdade que na sala de redação ainda existiam “máquinas de escrever“
as semanas culturais, em que artistas ele conheceu seus colegas de banda e na Faculdade vai além do ambiente um objeto arqueológico que os jovens só encontram no museu. Mas o
e figuras públicas muito relevantes começou a desenvolver o que depois proporcionado pelas gestões das cha- elenco de professores era de primeira. Um grupo bem preparado, polêmi-
e oposicionistas à ditadura vinham se tornou a Língua de Trapo. pas. Coexistem também Africásper, co, democrático e que se expunha para uma turma onde vários alunos já
para se apresentar e conversar com os “Tocando violão e trocando Frente Feminista Casperiana Lisandra tinham curso superior. Na minha, por exemplo, tinha médico, advogado,
alunos. O cartunista Henfil foi um de- ideias” era o lema que sintetizava o e Frente LGBT Casperiana. Os coleti- professor... No entanto eles construíram claramente as linhas mestras do
les”, afirma. Lopes lembra ainda que o CAVH à época. Laert conta que es- vos surgiram após 2013, ano em que as jornalismo: compromisso com a verdade, busca da isenção, procura do
CAVH atuava com outros centros aca- creviam suas músicas e promoviam reivindicações políticas se tornam mais interesse público, perseguição da ética e disposição para ganhar pouco e
dêmicos, como os da PUC, USP e FGV, um trote cultural: seus pequenos efervescentes dentro das universidades trabalhar muito.
participando de assembleias e mani- shows eram as recepções dos novos e caminharam para fora, dialogando Com ou sem diploma obrigatório, a Cásper é uma escola obrigató-
festações. Naquele tempo, o Centro calouros que chegavam semestral- com outras frentes. Todos esses grupos ria para quem quer aprender jornalismo. As boas escolas suplantam a
Acadêmico era cada vez mais atuante mente na Cásper Líbero, e depois le- reforçam a luta por questões relaciona- burocracia e os velhos hábitos. São propagadoras de conhecimento e os
dentro e fora da Cásper Líbero. vavam as composições para ações de das aos direitos humanos. Para Hugo alunos as procuram não porque emitem diplomas, mas porque ensinam,
Nesse ambiente acadêmico de outros centros acadêmicos. “O pesso- Possolo, “é uma expressão natural do difundem cultura e desenvolvem conhecimento. Certamente a Cásper Lí-
mobilização política e artística surgiu al das outras faculdades nos conhecia caminhar do tempo, agregar forças bero deu e dá uma contribuição importante para o desenvolvimento do
uma nova banda bastante singular, a como os malucos e os caras engraça- dessas pautas é uma forma autêntica jornalismo em São Paulo e no Brasil. Tenho certeza de que uma quantida-
Língua de Trapo, que se apresentava dos da Cásper”, diverte-se. de representar os alunos e conquistar de enorme de jornalistas aproveitaram os ensinamentos da escola e contri-
pelos corredores e salas de aulas cas- Outra intervenção artística co- espaço dentro da Faculdade, sem se buem diariamente para a pluralidade de versões e visões de mundo, agora
perianas, unindo humor e crítica polí- mum pelos corredores, cantina e desligar dos assuntos mais urgentes da turbinados pelas mídias sociais. Coisa que, no meu tempo, era impensável.
tica e social. Laert Sarrumor, vocalista salas casperianas era o teatro. Hugo Cásper e do País”.

50 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 51


BEATRIZ FIALHO
O M A I S LO N G E V O | E S P E C I A L

TAQUIGRAFIA
DE UMA VIDA
A história de Erasmo Nuzzi: do garoto de
Guaranésia (MG) ao diretor que esteve por mais
tempo à frente da Cásper
POR GUTO MARTINI

O ano é 1933. Erasmo de Freitas Nuzzi é um garoto de 14 anos e está Voltemos no tempo para novem-
dando adeus a Guaranésia, Minas Gerais. Seu destino: São Paulo. Em seu bro de 1946. Américo Bologna, secre-
horizonte, a perspectiva do jornalista que se tornaria anos depois ainda não tário de redação do jornal A Gazeta,
se delineou. Tampouco, a essa altura, consegue imaginar os cinco mandatos procura um novo empregado. Falta uma
que viria a cumprir como diretor de uma das melhores faculdades de comu- semana para a inauguração do Centro de Membros da Diretoria da Fundação e Erasmo Nuzzi na
© JOSÉ REBELO

nicação social do país. Debates de Assuntos Econômicos Cásper posse de seu segundo mandato, em fevereiro de 1985
“Naquela época, quem vinha do interior em busca de trabalho e não ti- Líbero. É preciso um profissional expe-
nha uma profissão definida acabava aceitando o que lhe ofereciam”, lembra- riente para a cobertura das reuniões. Um
ria Nuzzi muito tempo depois. Até completar o ensino secundário, passou nome vem se destacando entre alguns bigode. É Nuzzi.“Foi na época que Getúlio assumiu democraticamente. Seu “A medida que eu lia, ele pedia
por diversos empregos. Foi de ajudante de garçom no Café Guarany a chefe dos principais jornais paulistanos: Eras- último mandato antes do suicídio. O secretário do Jornal de São Paulo me para eu fazer ajustes. Quando termi-
de vendas numa fábrica do Brás, a Cartoteca. mo Nuzzi, que assina trabalhos para o pediu uma entrevista em primeira mão com o presidente”, lembra o profes- nei, falou: ‘Está aí uma entrevista para
Na fábrica, o patrão lhe mostrou um artigo da revista Seleções cujo título Correio Paulistano, algumas edições dos sor enquanto olha para a foto. a sua matéria. Satisfeito?’” Nuzzi esboça
era “Carreira Simples que Leva Longe”. O texto destacava grandes persona- Diários Associados e para a edição pau- um sorriso: “Bom, eu disse que não esta-
lidades que começaram sua jornada profissional pela taquigrafia, a arte de lista do jornal A Noite. Américo Bologna Rio Grande do Sul, 1950. Getúlio Vargas está hospedado na fazenda va satisfeito. Pedi para que fizesse uma
fazer anotações rapidamente. Foi a partir desse pequeno texto que sua vida, vai atrás do repórter e oferece-lhe a vaga de João Batista Luzardo, político de grande força que o apoiava. Com a aju- carta agradecendo a seus eleitores de
em suas próprias palavras, deu uma guinada. “De chefe de vendas, virei pro- para taquigrafar as reuniões do novo da de um amigo pessoal que trabalhava para o presidente, Erasmo Nuzzi São Paulo. E ele fez. Pegou uma caneta
fessor. Quando terminei os estudos, abri com alguns colegas a Associação centro de debates da Gazeta. O convite é conseguiu se juntar a um seleto grupo para uma estadia na propriedade de com Gregório e escreveu na minha fren-
Taquigráfica Paulista para ensinar esse método de escrita”, recorda. aceito imediatamente. Luzardo. Chegando à fazenda, de noite, os convidados se reuniram para jan- te”. Sessenta e sete anos depois, o pro-
tar. Tudo o que Getúlio falava, Nuzzi tomava nota atentamente. Foi assim fessor divide com orgulho essa história.
É fevereiro de 2017 e o professor Nuzzi está com 97 anos. Apesar de Enquanto Nuzzi relembra seu tra- por toda a refeição e em todos os outros momentos. Até no passeio que de- Não é para menos: foi um dos únicos
alguns incômodos físicos que, vez ou outra, o afligem, ele conserva uma balho na Gazeta, sua esposa vai atrás ram pela manhã seguinte: lá estava o repórter, ao lado direito do presidente, que conseguiu uma entrevista exclusiva
lucidez admirável e uma memória quase intacta. Do seu apartamento no de alguns documentos. Retorna segu- anotando as coisas mais importantes que o homem dizia. com Getúlio. O Jornal de São Paulo pu-
Jardins, em São Paulo, o professor narra sua trajetória ao lado da mulher, rando uma fotografia em preto e bran- Após o almoço, que não foi diferente das outras refeições, o famoso chefe blicou uma reportagem histórica.
Neide. Falávamos sobre a época em que começou a ensinar taquigrafia co. Nada tem a ver com o assunto que da guarda pessoal de Getúlio, Gregório Fortunato, aproximou-se de Nuzzi Além de ter entrevistado o presi-
quando interrompeu o que dizia e olhou para a companheira. “À minha falávamos, mas a foto faz o professor e disse: “Ei, você, o chefão quer falar com o senhor”. Sem hesitar, o repórter dente gaúcho, nos anos 1950, Nuzzi
esquerda está uma aluna. Foi ao curso para aprender e acabou arranjando contar uma de suas maiores histórias. seguiu o segurança até o bangalô do presidente. “O que o senhor tanto ano- também começou o curso de Jornalis-
um marido”, diz, sorrindo. Com 20 anos de diferença, professor e aluna “Meu grande desafio jornalístico”, diz. tava durante todas as refeições que fizemos? Quase não comeu para ficar mo da Cásper Líbero. Apesar de já ser
se apaixonaram. O retrato mostra um grupo de pesso- escrevendo”, perguntou Getúlio assim que o viu. “Estava taquigrafando o repórter experiente, queria um diploma.
Anos antes do casamento, que ocorreu em 1959, a taquigrafia já havia tra- as caminhando junto a Getúlio Vargas. que falava para uma matéria”, respondeu Nuzzi. Aventurou-se e, em três anos, formou-
zido para Nuzzi um forte contato com o jornalismo. Trabalhou para os maio- Bem ao lado do presidente, à sua direita, O presidente pediu para que o repórter lesse, vagarosamente, tudo o -se. Suas notas se mantiveram as maio-
res veículos de São Paulo cobrindo entrevistas, pronunciamentos e eventos. avista-se um homem de cabelos negros e que havia anotado. res da turma até o fim, o que lhe rendeu

52 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 53


ARTIGO | ESPECIAL

Neusa Maria Pereira é


jornalista, sócia da editora
Abayomi Comunicação e uma

ACERVO PESSOAL
das fundadoras do Movimento
Negro Unificado em 1978.

Eterna
lembrança
POR NEUSA MARIA PEREIRA

s anos Embalada pela primeira recepção, redobrei os

BEATRIZ FIALHO
vividos na estudos realizando cursinhos populares. Con-
Cásper Lí- segui entrar na Cásper. Foi um momento de sa-
bero foram tisfação indescritível para mim e meu inesque-
Erasmo e Neide folheiam a impressão de História global dos meios de comunicação
os mais im- cível pai, que vivia afastado do trabalho devido
portantes de às frequentes crises de hemoptise, mas que não
minha vida. Du- media esforços para me ver ser alguém na vida,
rante a experiência, por meio dos estudos. Para ele, única maneira de
uma bolsa de estudos da Família Jafet. Foi estudar em Roma e, ao cabo de ganhou projeção internacional. Ele já aprendi a importância combater preconceitos.
um semestre, estava de volta. tinha um know how no meio da educa- das relações humanas Quando passei para o segundo ano, ele ficou
“Quando retornei ao Brasil, em 1955, me ofereceram um cargo de pro- ção, sempre trabalhou com isso. Che- baseadas na solidariedade, gravemente doente. Seu salário mal dava para
fessor na Cásper Líbero. Lecionei taquigrafia e jornalismo europeu”, conta gou a ser assessor técnico de Educação companheirismo, respeito e crença suprir as despesas de casa e comprar remédios e,
Nuzzi. Alguns de seus alunos vieram a se tornar destaques no meio jorna- da Prefeitura”, conta. na igualdade entre as pessoas. Aprendi que ape- por isso, não teve condições de pagar a matrícula.
lístico, como Clóvis Rossi e Heródoto Barbeiro. Após anos trabalhando no sar das vicissitudes da vida é possível construir um Eu teria de abandonar a faculdade. Os alunos fi-
corpo docente, concorreu ao cargo de diretor da faculdade. Em 1972, por Neide nos traz um último docu- mundo mais feliz quando estes princípios nortearem caram sabendo, realizaram um movimento para
um voto, venceu as eleições e deu início ao primeiro dos cinco mandatos que mento. Desta vez, trata-se de material a sociedade. Valores éticos centrados na liberdade de arrecadar dinheiro e pagaram minha matrícula.
o tornaram o mais longevo da Cásper Líbero. novo. É a impressão de História Global expressão, da informação verdadeira, análise crítica Ato único, jamais soube de outro igual entre estu-
dos Meios de Comunicação, próximo criteriosa, vigilância implacável dos que detêm o po- dantes. Nunca ouvi nenhum comentário que pu-
“Pode parecer loucura uma pessoa com cerca de 80 anos estar to- livro do professor a ser lançado. A obra der, defesa dos despossuídos de voz, aprendidos nas desse abalar minha auto-estima, me fizesse sentir
mando posse, pela quinta vez, do cargo de diretor da faculdade. Não é traça um panorama da comunicação, da aulas de grandes mestres jornalistas e professores diminuída. Pelo contrário, passaram a me tratar
loucura, é um ato de amor”. Assim foi parte do discurso de Nuzzi quando fala à internet. Foi escrita a mão, mas já negros Juarez Bahia e Fernando Goés. com mais carinho e admiração pela superação da
assumiu o último mandato, em 2003. Por questões de saúde, teve que se está inteiramente digitalizada. Nuzzi pa- Quando cheguei na Cásper Líbero, há quase 42 dor que, ainda hoje, palpita fundo no coração ao
distanciar da diretoria em 2005. A vice-diretora Tereza Vitalli assumiu rece estar ansioso com a obra. Não é raro anos, não existiam alunos negros. Fui uma das pri- lembrar do fato.
como interina e foi eleita a mais dois mandatos. Nuzzi não quis parar de a secretária da diretoria da Cásper Líbe- meiras afrodescendentes a pisar nesta Casa inesquecí- Graças a este ato de solidariedade e amor ao
trabalhar e pediu para ser realocado num cargo mais adequado à sua situ- ro, Marcia Regina Saro, receber ligações vel. O inusitado do fato fazia os colegas torcerem por próximo, tornei-me a jornalista que sou hoje,
ação. Assim, acabou virando Consultor Educacional do presidente da Fun- do professor querendo saber algum deta- meu sucesso, demonstrarem sinceridade em manifes- preocupada com o bem comum, a verdade do fa-
dação Cásper Líbero, Paulo Camarda. Regina Rodrigues Cabrini, secretá- lhe sobre a publicação do livro, que está tações de simpatia e apreço. Entendiam a importân- tos, sensível com o sofrimento alheio. Tornei-me
ria de Camarda, lembra quando Nuzzi subiu para o 11º andar da Fundação sendo analisado pela Faculdade. cia da presença de uma aluna negra num ambiente uma ativista pelos direitos humanos. Fui uma
Cásper Líbero para assumir sua nova função: “Ele tinha um cabelinho Com uma vida dedicada ao universo estudantil de maioria branca e de classe média alta. das fundadoras do Movimento Negro Unificado
azul anil e usava uma bengalinha. Era bem ativo, na medida que permitia da educação e da comunicação, o nona- Sentiam a necessidade da alteração daquele cenário de 1978, uma das criadoras da seção afro-latino
o problema na coluna que o fez se afastar do cargo”, diz. genário Erasmo de Freitas Nuzzi, agora sem diversidade de raça e classe social. América, do jornal Versus, publicação alternati-
O secretário-geral da Faculdade, Alípio Rodriguez Lineira, testemu- aposentado, mantém seu interesse na No primeiro ano em que prestei vestibular fui va das mais importantes. Atualmente, sou sócia
nhou todos os mandatos de Nuzzi como diretor. “Foi ele quem expandiu pesquisa e no ensino. A idade chegou, recebida com um misto de entusiasmo e surpresa. da editora Abayomi Comunicação, responsá-
a Faculdade. Aumentou o espaço e as vagas dos cursos e implementou mas não foi o suficiente para diminuir Alguns vieram conversar comigo, tentando adivi- vel por publicações voltadas para informação e
o curso de Rádio, TV e Internet. Foi durante sua estadia que a Cásper seu fôlego intelectual. nhar meus pensamentos, desejando-me boa sorte. formação de mulheres das classes C e B da zona
Infelizmente não consegui aprovação. Não desisti. norte da capital paulistana.

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PA L AV R A DA D I R E Ç ÃO | E S P E C I A L

Nossa Fundação, como se sabe, então conhecido como “Uma luz so-
tem sua origem e destino no Jorna- bre São Paulo”.
lismo e na área da comunicação, e a A Faculdade se transladou para
eles está intrinsecamente ligada. Não esse endereço, na Avenida Paulista
poderia ser diferente. Como dito inú- 900, em 1966, funcionando inicial-
meras vezes, Cásper idealizou uma mente no Térreo-Alto. Hoje está ins-

UM
instituição que tivesse na educação talada em parte do 3º, do 4º, 5º e do 6º
um de seus pilares. Assim, não foi por andar, ocupando uma área de 21.575
acaso que sempre defendeu a criação metros quadrados.
de uma escola de jornalismo que pri- Como era o desejo do seu insti-
vilegiasse o ensino de humanidades, tuidor, a Fundação sempre direcio-
a comunicação como teoria e prática, nou os seus veículos de comunicação

BRINDE
educação e transformação. na defesa, manutenção e desenvol-
Primeira Escola Superior de Jor- vimento de uma imprensa livre e
nalismo do Brasil, com total auto- democrática, regida pelos princípios
nomia didática e pedagógica, nossa patrióticos, jornalísticos e culturais,
Faculdade, então denominada Escola Em 1934, Cásper resolveu criar com o objetivo da prestação de ser-
de Jornalismo Cásper Líbero, foi cria- uma versão radiofônica do vespertino, viços à comunidade e ao desenvolvi-

AOS
da em 16 de maio de 1947, no mesmo “O Grande Jornal Falado d’A Gazeta”, mento da cidadania.
mês e ano em que fui admitido como transmitido pela Rádio Cruzeiro do Manter vivo o sonho de Cásper
contador-auxiliar aqui na Fundação Sul. Menos de uma década depois, requer um intenso trabalho de pla-
Cásper Líbero. em 1943 comprou a Rádio Educa- nejamento e gestão. A dedicação e
Inicialmente, a Faculdade fun- dora Paulista, transformando-a na competência de nossos colaborado-
cionou em um imóvel alugado no 8º Gazeta AM, hoje parte da Faculdade. res – jornalistas, radialistas, publici-

PRÓXIMOS
andar da Av. Cásper Líbero, 58, ao Chamada de “a emissora da elite”, a tários, professores, funcionários ad-
lado do Palácio da Imprensa, que fi- rádio marcou época com programas ministrativos – foram fundamentais
cava no número 88 da mesma aveni- de música clássica de auditório, com para que os objetivos traçados pelo
da. Palácio da Imprensa era o nome orquestra e participação de cantores fundador permanecessem firmes na
do edifício da Gazeta, que se instalou líricos de nomeada. longa caminhada.
ali em 1939 – foi o quarto endereço Nesse meio tempo, Cásper Líbero Nosso grande desafio hoje é

70 ANOS
do jornal. Até 1943, três anos antes, criou a Corrida Internacional de São continuar a investir não apenas em
a avenida se chamava Rua da Concei- Silvestre, a Prova Ciclística 9 de Julho, tecnologia, como também no co-
ção. Foi nesse ano de 1943, da morte entre outras competições que deram nhecimento e em recursos humanos,
do jornalista e empresário, que houve impulso a um suplemento que veio a visando não só este, mas também os
a mudança de nome do logradouro ocupar o lugar do vespertino, A Gaze- próximos anos, com o intuito único
para homenagear nosso fundador. ta Esportiva. de oferecer sempre o melhor, fazendo
O Palácio da Imprensa foi o pri- Nos finais dos anos 1950, a Fun- a diferença. Garantir os investimen-
meiro prédio projetado e construído dação decidiu expandir suas instala- tos em tecnologia de ponta, dissemi-

A grande aventura e os desafios das décadas


especificamente para funcionar como ções, centralizando as empresas em nar a cultura e educar para a forma-
sede de um veículo de comunicação um só lugar. A proposta era transfor- ção e aperfeiçoamento profissionais,
no Brasil – contava com instalações mar a sede num marco simbólico, à a fim de cumprir o desejo do patrono

vindouras estão apenas começando agora! adequadas para o funcionamento de


uma redação, dos setores de gravura,
altura do inspirador. Assim, a nova
Casa de Cásper Líbero foi construída
de nossa instituição.
O foco da Faculdade é continuar

Para lá iremos composição, impressão e distribuição


do jornal A Gazeta. A publicação, cria-
em plena Avenida Paulista, endereço
emblemático da capital bandeirante.
sendo uma das maiores do País, não
em número de alunos e área ocupada,
da em 1906, foi comprada por Cásper As obras arrancaram em 1958, da mas em qualidade de ensino, baseada
em 1918. O advogado e jornalista prancheta do engenheiro José Car- na alta qualificação de seus profes-
POR PAULO CAMARDA, PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO CÁSPER LÍBERO empreendedor tinha então 29 anos. los de Figueiredo Ferraz, construtor sores, dos técnicos, assistentes e fun-
Transformou o vespertino num dos de obras históricas da cidade, como cionários, sempre lançando mão das
mais importantes órgãos de imprensa o Planetário do Ibirapuera ou o vão grandes inovações da tecnologia.
da época, com a introdução de mo- livre do Masp (Museu de Arte de São Nos orgulhamos dos profissio-
dernas rotativas, técnicas pioneiras de Paulo), este projetado pela arquiteta nais desta Casa. Nos orgulhamos dos
impressão e uma frota de distribuição Lina Bo Bardi. O projeto do prédio profissionais que formamos. Quem
realizada com automóveis. da Gazeta, em concreto armado, era aproveita o aprendizado do passado

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A PRESIDÊNCIA DA Clóvis de Barros Filho é jornalista e
professor livre docente pela Escola
FUNDAÇÃO de Comunicação e Artes da USP.
Atualmente, atende grandes

© ESPAÇO ÉTICA
POR CARLOS COSTA
empresas pelo Espaço Ética.
e as oportunidades do futuro é o pró-
Ao morrer num acidente aéreo no Rio de Janeiro, no dia
prio ser humano.
Os 70 anos da Faculdade, com-
27 de agosto de 1943, Cásper Líbero deixou, de acordo
com vontade registrada em testamento, um complexo de Para
nunca mais
pletados em 16 de maio com uma comunicações que é administrado pela Fundação Cásper
celebração prévia no dia 9 de maio,
foram magníficos em todos os sen-
Líbero, criada quase um ano depois, em 10 de agosto de
tidos. A Cásper tem orgulho de ser
a primeira escola de Jornalismo do
Brasil. Por seus bancos escolares pas-
1944. Hoje o grupo reúne a TV Gazeta, a Rádio Gazeta
FM e a AM (esta, a emissora da faculdade), a Gazeta esquecer
Esportiva Net, a agência Gazeta Press, a Faculdade
saram mulheres e homens que ocu- POR CLÓVIS DE BARROS FILHO
param e ocupam cargos importantes
Cásper Líbero, o Grupo Cidadania Empresarial e o
não somente na Fundação, mas nos Memória Cásper, entre outras marcas.
mais diversos veículos de nossa mí- A história dessa fundação teve diversos momentos de eu pai insistia com di a dar aula. E quando digo que aprendi a dar aula,
dia. Radialistas, diretores de vídeo, grandes arroubos, alternados com sérios contratempos Engenharia e minha quero que o leitor me entenda bem, aprendi a fazer
publicitários, relações públicas, jor- mãe com Medicina. o que faço até hoje, e se isso significa dar aula ou dar
nalistas – como vocês verão em diver-
e decisões infelizes. Paulo Camarda, 12º presidente Então prestei Fuvest boa aula, aí eu realmente não sei.
sas páginas desta publicação. do conselho diretor (empossado em 27 de março de para Direito e, pra Ao longo de 15 anos vividos em duas etapas dis-
Continuaremos firmes com o foco 1995), está em sua quinta gestão, somando mais de preencher o resto do tintas, separadas por uma ida à Espanha com vistas a
em ser uma das grandes referências 23 anos à frente da instituição. Sua gestão – a mais tempo, um curso no- obtenção de um título em comunicação, tive alunos e
em comunicação. Mas o sucesso de turno viria a calhar. colegas brilhantes.
ontem não é garantia de nosso êxito
longa de todas – marca um período de estabilidade, Jornalismo me pare- Meu mundo virou o mundo das faculdade de co-
amanhã: com atitude humilde, bus- reconstrução, renovação e de consolidação da solidez cia simpático. Ainda mais ali na Paulista, perto de municação, e a Cásper foi o passaporte que me au-
camos manter a tradição, buscar a do grupo. Com saúde financeira estável, a grande nave casa. Eram só três anos, e eu não tinha a menor ideia torizava passear por todos os cantos e instituições.
inovação, fazer a diferença nos cursos do que esperar. Além disso, os anos trabalhados na Cásper Libero me
de Cásper Líbero segue esses tempos de tempestades
que oferecemos, na graduação (Jor- A carreira jurídica parecia atrair todas as minhas permitiriam mais tarde pleitear uma vaga em Direito
nalismo; Publicidade e Propaganda; e crises sem acusar os golpes e problemas que levam atenções. O Jornalismo me daria algo para fazer às na Faculdade de São Paulo, outro sonho a ser vivido.
Relações Públicas; Rádio, TV e Inter- outras instituições a sangrias e cortes profundos. noites. No primeiro ano e meio, por uma distribuição Mas como toda relação de amor, um dia a minha
net), na especialização e no mestrado. Em 1945, Paulo Camarda era funcionário da McAuliffe de salas que nunca compreendi totalmente, acabei trajetória na Cásper alcançou o seu final. Somando
Estamos nos credenciando junto ao cursando junto de alunos de Relações Públicas. Devo “esforções” com colegas professores do departamento
Turquand Young & Co, empresa de auditoria de
MEC para a oferta de pós-graduação assegurar que foram meses felizes, recheados de des- de Jornalismo, pretendíamos um destino para a esco-
lato sensu por EAD (ensino a distân- renome internacional que auditava as contas da cobertas e experiências. la que não coincidia com o entendimento dos outros
cia), com projetos de abrir o leque no Fundação Cásper Líbero. Foi admitido como auxiliar Se o futuro me parecia sempre jurídico, o presen- departamentos, e talvez com as instâncias maiores da
campo comunicação, com nova oferta de contabilidade em nossa empresa em 5 de maio te naquele instante era sem dúvidas casperiano. Ape- fundação. Assim acabamos todos procurando novos
de cursos graduação na área em que sar da segunda metade do curso, voltada mais para a desafios e espaços.
de 1947 – mesmo mês da criação da faculdade.
somos especialistas, com estudos para inserção profissional, me encantar bem menos, ainda Uma espécie de flashback de tudo isso foi reencon-
chegar ao doutorado e a um mestra- Atento e competente, após ter exercido diversas assim passava os dias esperando as noites. trar na Casa do Saber, anos depois, o chefe de depar-
do profissionalizante. A aventura dos funções no Departamento de Contabilidade do grupo, Terminado o curso, já tinha certeza que queria tamento que tanto garantirá minha presença e minha
próximos 70 anos apenas está come- inclusive a de gerente administrativo a partir de 1 de ser professor. Assim, mestrados e doutorados eram a voz, Mario Vitor Santos, novamente como o diretor da
çando. A isso iremos! parada obrigatória. Concluí o Direito, me mudei para casa, o chefe. Novamente estendendo a mão e permi-
julho de l971, em fevereiro de l989 foi promovido a
Paris, e lá fiquei me preparando para ser professor tindo novos voos.
superintendente administrativo e financeiro. Exerceu em alguma faculdade de Direito. Sendo assim, não é exagero dizer que se um dia
ainda, paralelamente, a função de procurador da Com alguns diplomas na mão, o regresso foi com- devi tudo foi à Cásper por uma permanência feliz,
Fundação por 21 anos. Foi membro ativo do Conselho plexo. Menos receptivo do que imaginava, e mais ás- convivência harmoniosa e experiência inigualável.
Curador de 27 de abril de 1984 a 15 de julho de 1992. pero do que jamais supus. De novo quem me abriria Hoje, já no final da minha vida profissional, repito
as portas era a Cásper, onde coube-me implementar que devo tudo a Cásper, pois nada de relevante teria
Foi quando solicitou seu desligamento da Casa. Três um programa de legislação de imprensa. acontecido sem ela. Nada que me fez brilhar os olhos
anos depois, era chamado para assumir a Presidência, O começo da vida profissional via na Cásper uma teria sido possível se um dia, pela primeira vez, não
tomando posse em 27 de março de 1995. parada promissora e segura, ao mesmo tempo. E se tivesse me apresentado no quinto andar da Avenida
foi na Cásper que aprendi a ser feliz, foi lá que apren- Paulista, para nunca mais esquecer.

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INTERCÂMBIO | ESPECIAL ARTIGO | ESPECIAL

Clóvis Rossi é jornalista com mais de

© JACQUELINE MORAES
Abertura do III Encontro Luso-Afro-
40 anos de carreira e é, atualmente,
Brasileiro de Língua Portuguesa, colunista da Folha de S. Paulo
Literatura e Comunicação Social,
em maio de 2000

Devo meu
emprego à
Cásper
CLÓVIS ROSSI

evo à Fa- Cásper tinha instalações modestíssimas, na avenida Ipi-


culdade de ranga, não o “predião” da Fundação na avenida Paulista.
Jornalismo Não havia aulas práticas, não havia jornal-laborató-
ALINE ABE PACINI

Cásper Lí- rio, nada de nada das oportunidades que hoje são roti-
bero o meu neiras nas faculdades de jornalismo. Nunca fiz uma re-
primeiro portagem como prova ou tese nos três anos de curso (era
emprego e, o tempo que durava à época, anos 60 do século passado).
por decor- Além disso, como o “Correio da Manhã” me contra-
rência, toda a tou quando eu estava exatamente no meio do curso, ou

PORTUGUÊS A Faculdade foi pioneira na criação


de um encontro entre países lusófonos
minha carreira
já excessivamen-
te longa de 54 anos.
Foi assim: Erasmo
seja, um ano e meio depois de tê-lo iniciado, era muito
mais emocionante fazer jornalismo na prática do que ou-
vir falar dele nas salas de aula.
Para minha sorte, comecei beneficiado por duas cir-

NO PLURAL POR FELIPE SAKAMOTO


de Freitas Nuzzi, que era en-
tão professor de taquigrafia, me indi-
cou para uma vaga na sucursal de São Paulo do jornal
cunstâncias irrepetíveis: primeiro, trabalhava em uma
sucursal pequena, em que era preciso que cada um dos
seus poucos jornalistas fizesse de tudo (rádio-escuta,
carioca Correio da Manhã. “recortagem”, reportagem, política, boxe, futebol, eco-
Em 1983, o jornalista português e as suas próprias obras. “A curiosidade dade, preservação do idioma e mídia. Fui, fiquei e fui ficando até hoje na profissão (não nomia, café, o diabo).
docente da Faculdade Cásper Líbero, me parece uma qualidade importan- O discurso feito pelo então Côn- passei nem um minuto sequer desempregado nesses 54 Estamos falando de uma época em que não havia
João Alves das Neves, e o presidente do te. O escritor deve ser incontentável.” sul-Geral de Portugal, Domingo Fezas anos). Mas seria hipócrita se dissesse que devo minha um telejornal de verdade nem, muito menos, internet
Conselho Diretor da Escola Superior de Em 1986, houve a segunda edição do Vital, atual Embaixador de Portugal carreira à Cásper. A Faculdade me fez empregado, mas nem mesmo fax. A transmissão de textos era por meio
Jornalismo do Porto, Pinto Garcia, re- encontro, em que os principais pontos nos Estados Unidos, ilustrou a impor- não me fez jornalista. de um aparelho chamado telex (um telégrafo moderni-
solveram cumprir a missão de Cásper e do debate foram educação, mídia, li- tância dessa convergência cultural: “O Aliás, desconfio seriamente que nenhuma faculdade zado), que, hoje, nenhum jornalista nem sabe o que é.
organizaram o I Encontro Afro-Luso- teratura e a atividade jornalística. português é uma língua viva. Ela nas- forma de fato um profissional. É a prática que vai fazer de São Paulo era, para o Rio de Janeiro (sede do meu
-Brasileiro de Jornalismo e Literatura. O docente Welington Andrade, ce, cresce e evolui todos os dias. Nós um formando em Direito um advogado, de um formando jornal), um planeta distante. Com uma equipe pequena
Sediado no Teatro do Museu de que participou da comissão acadêmi- contribuímos todos, como nos é di- em Medicina um médico - e assim por diante. que não podia cobrir tudo, reescrever textos dos jornais
Arte de São Paulo em outubro de ca do III Encontro, em 2000, pontua ferente e particular, para que ela seja A bem da verdade, não sei porque o professor Nuzzi locais era praxe, o que não deixava de ser uma maneira
1984, o encontro teve como princi- a relação entre jornalismo e literatu- todos os dias uma língua mais rica. E me indicou. Eu não era bom aluno, passava mais tem- de apreender. Segundo ponto: comecei cobrindo a cons-
pal convidada Lygia Fagundes Telles, ra: “É possível defender a ideia que é justo desses universalismos e desse po jogando pebolim do que na sala de aula, não aprendi piração para o que viria a ser o golpe de 1964. Esse tipo
que contou aos espectadores como é o jornalismo é uma área de humani- acolhimento do que é particular, que nem mesmo a taquigrafia que ele ensinava. de situação obriga o “foca” a aprender, em seis meses, o
ser escritora em uma sociedade que dades, que também tem relação com se cria e se tece uma rede de cumpli- Mas não recomendo a ninguém que siga meu exem- que levaria seis anos para aprender em circunstâncias
tentou convencê-la de que mulheres as letras. O jornalismo não pode ser cidades”. Mais uma vez, o pioneirismo plo. Eu sei perfeitamente bem o trabalho que deu recupe- institucionais normais.
que pensam e estudam estão destina- considerado literatura, mas utiliza-se da Faculdade Cásper Líbero permitiu rar, já trabalhando em jornalismo, o conhecimento que O que aprendi na Faculdade foi ética. E é um tremendo
das à solidão. Apesar de ser aclamada de recursos ficcionais”. O encontro que um importante encontro interna- a faculdade talvez tivesse me proporcionado, se eu fosse acervo para quem teve que navegar no jornalismo em tem-
intensamente pelo público, Fagundes também fez uma reflexão sobre outras cional entre os países lusófonos tives- um aluno pelo menos medianamente aplicado. pos obscuros e, mais recentemente, em uma polarização
também discutiu a insatisfação com áreas da comunicação, como publici- se acontecido. É bom notar também que estou falando de tempos política que inibe um debate de ideias sadio e civilizado.
pré-históricos do jornalismo e do ensino de jornalismo. A Por isso, sou duplamente grato à Cásper.

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FA M Í L I A | E S P EC I A L ILUSTRAÇÃO | ESPECIAL

O PRIMOGÊNITO
A história do médico que presidiu a
Fundação Cásper Líbero
homem das letras. Pouco arriscou nos versos, mas a prosa
POR GUTO MARTINI de seus pensamentos e vivências sempre vieram ao papel
em momentos que sentia necessidade de se expressar artis-
É no térreo baixo do “prédio da Gazeta”, logo após as catra- ticamente. Como ele mesmo dizia “sou protegido por um
cas e em frente aos elevadores. Uma sala espaçosa de vidro fos- hobby inofensivo, mas laborioso também – as divagações
co. Na entrada, lê-se: Ambulatório Nelson Líbero. Lá funciona literárias!”. Fruto disso foi a biografia Yéyé: Martins Fon-
a medicina ocupacional e os primeiros socorros para os alunos tes na Intimidade, que fez a partir de sua convivência com
e funcionários da Fundação Cásper Líbero (FCL). “Como Nel- o amigo, e seu próprio livro de memórias: Flashs.
son era médico, achei que colocar o nome da sala em sua ho- Em 1915, um ano após a deflagração da Primeira Guer-
menagem fosse importante”, explica a superintendente patri- ra e ainda tomado pelo romantismo e influência que res-
monial da FCL, Angela Esther de Oliveira. Mas, afinal, quem tara da Belle Époque, Nelson pegou um vapor até a França
foi o homem com o mesmo sobrenome de Cásper? para ajudar o país que carecia de médicos. Começou dando
O dono da Gazeta tinha dois irmãos mais velhos: Nel- reforço no Serviço de Saúde, em Lyon, e terminou como
son e José. Diferente do caçula, ambos dedicaram a vida à chefe de equipe cirúrgica. Apesar dos horrores do front,
medicina. Nelson nasceu em 2 de setembro de 1884 e entre anos depois lembraria da época como uma fase feliz de sua
os irmãos foi o que por último faleceu, em 24 de julho de vida. “Foi um período de lutas, onde tudo interessava e era
1976. Ao longo de seus 92 anos, não chegou a ter herdeiros. novidade para mim”, registrou no livro Flashs.
No entanto, passou por momentos marcantes da história e De volta ao Brasil, o primogênito dos Líberos continuou
se relacionou com figuras icônicas de nossa literatura: foi dedicando-se à medicina. Em 1924, fundou a Garantia In-
amigo próximo de Olavo Bilac e Martins Fontes. dustrial Paulista, serviço médico de seguros que atendia a
Mais que amigo dos poetas, Nelson era ele próprio um funcionários de empresas e indústrias. O dinheiro que con-
seguiu com o negócio foi de grande ajuda à Gazeta. Durante
a ditadura de Getúlio Vargas, com Cásper exilado na Eu-
ropa, Nelson conseguiu manter o jornal até o seu retorno,
impedindo uma venda precipitada e arriscada.
Ao notar que a emergente São Paulo dos anos 1930 so-
fria com a falta de hospitais, Nelson construiu a Casa de
Saúde Dom Pedro II. Conforme relata em alguns escritos
que deixou, foi difícil manter a empreitada. Recebeu vá-
rias propostas de venda, mas recusou todas e, mais do que
preservar, conseguiu expandir o espaço transformando-o
num verdadeiro complexo hospitalar. Hoje em dia, quem
for na Rua da Figueira número 831 encontrará o que antes
era a Casa de Saúde de Nelson Líbero transformada em
uma unidade da rede de hospitais Sancta Maggiore.
Nelson nunca precisou de dinheiro. Financeiramente,
sempre teve uma vida saudável. Após a morte de Cásper des-
cobriu que seu nome constava no testamento como detentor
de uma fortuna incalculável: a ele ficava delegada a tarefa de
integrar a diretoria de uma Fundação, ao lado de José Líbe-
ro, João Ferreira Jorge, Pedro Monteleone e Sylvio Marga-
rido, que o irmão havia idealizado. Foi assim que, em 1944,
tornou-se o primeiro presidente da Fundação Cásper Líbero.
Apesar do carinho pela Gazeta, Nelson não perma-
neceu no cargo por muito tempo. Antes de terminar seu
mandato, afastou-se para se dedicar às suas paixões: a me-
dicina e as divagações literárias.
© ACERVO GAZETA PRESS
Eduardo Baptistão, premiado ilustrador e formado em Publicidade e Propaganda pela Cásper
em 1988, começou a fazer suas primeiras ilustrações em A Imprensa, jornal-laboratório da
Faculdade. Publica seu trabalho no blog http://baptistao.zip.net
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R E P O R TA G E M | E S P E C I A L
DANIEL CARVALHO

SETE
DIAS
NA CÁSPER
Sorrateiramente, abrimos as cortinas que envolvem o
universo dos casperianos. Venha conosco, leitor: por uma
semana caminharemos pelos corredores da Faculdade
espiando o que acontece na rotina dos alunos e funcionários.
POR BEATRIZ FIALHO, CAROLINA MORAES, FELIPE SAKAMOTO, GIULIA
GAMBA, GUTO MARTINI, GUILHERME GUERRA E PAULA CALÇADE

BEATRIZ FIALHO

GIOVANA CHRISTOFANO
ANANDA GALVÃO

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Segunda-feira Enquanto Débora resolve as pen- por corredores silenciosos, bater de Terça-feira Com o fim das aulas, é hora do al- em roda no centro do jardim do ter-
O escadão da Paulista 900 está vazio: dências administrativas do curso, no teclas na frente do computador nos Às 7h03, Dalva do Ó, secretária da moço, e Julia Favero, Marcella Cantoni ceiro andar destacam-se das poucas
às 6 horas, apenas um ou outro pe- terceiro andar, os alunos do terceiro laboratórios e conversas em baixo Faculdade e quase uma unanimidade e Paulo Vita, monitores da Clact Zoom, que estão nos bancos lendo. Às 17h30
destre cruza sua frente nessa gélida ano de RTVI têm nas mão o story- tom nos saguões e corredores do ter- entre alunos, funcionários e professo- aproveitam a promoção da pizzaria ainda está claro, mas nuvens carre-
manhã. O cheiro de croissants assando board da série Game of Thrones, en- ceiro ao sexto andares. res, corre para não perder o elevador. Dominos. Logo a produtora laborato- gadas começam a aparecer no céu. O
no forno do Reserva Cultural invade o tregue no início da aula, nas mãos. Às 18h27, um flash da câmera de Todos os dias, o mesmo trajeto: quarto rial dos alunos de RTVI é tomada pela debate da Frente Feminista Casperia-
corredor do térreo baixo por onde che- Sentados em volta à mesa comprida uma aluna irrompe no Centro Aca- andar para pegar um café, no três-e- mistura do cheiro das pizzas de frango na Lisandra sobre o Dia Internacional
ga o primeiro pacote do dia: os jornais que toma o centro da sala, os alunos dêmico Vladimir Herzog: alguns -meio para deixar a marmita na gela- com requeijão, peperoni e quatro quei- da Mulher foi feito de oscilações entre
Valor, Agora, Diário de SP, Diário do acompanham Kleber Carvalho an- participantes da reunião sobre apro- deira e, depois de passar pelo banhei- jos. Os 32 pedaços que chegaram às 13 falas calmas e indignadas.“A Reforma
ABC, Lance!, O Estado de S. Paulo, Fo- dando de um lado ao outro durante a priação cultural do coletivo AfriCás- ro, chega ao quinto andar – que ainda horas duram poucos minutos. da Previdência vai aumentar o número
lha de S.Paulo e O Globo. Rosana Sil- aula de Direção de Arte. Enquanto a per, que se propõe a discutir pautas está silencioso e sem alunos pedindo Três andares acima, onde o cheiro de idosas na extrema pobreza”, aler-
va, a recepcionista, recebe os impressos outra metade da turma está na aula de do movimento negro, se espantam. chaves para abrir as coordenadorias, dos rastros da pizza não chega, Letí- ta Carla Vitória, militante da Marcha
antes que sejam distribuídos pela Fun- Edição para Rádio, na sala 10 os alu- Risos tomam conta da pequena sala documentação de estágio, bilhete úni- cia Sé pega uma folha com diálogos Mundial das Mulheres. Com o dia já
dação Cásper Líbero. Ela ainda recolhe nos começam a pintar a folha conside- no terceiro andar. Enquanto no CA co… Ela é um faz-tudo a quem muitos em francês sentada em frente a um escurecendo, o jardim se preenche com
os crachás do dia anterior, confere o rando os grupos de cores que melhor os alunos se espalham no chão e nos recorrem. “Os alunos até me chamam dos três computadores da tranqui- alunos se reunindo e falando mais alto.
funcionamento das catracas e olha a contribuem para a história violenta de sofás, no hall de entrada do Teatro de tia”, afirma entre risos tímidos. la sala do Centro Interdisciplinar de As primeiras gotas caem do céu e as 15
lista de convidados do dia. guerras entre famílias pelo trono. “Isso Cásper Líbero uma outra aglomera- Mas o sossego dos corredores aca- Pesquisa (CIP). Ela lê as frases que mulheres se despedem.
Os relógios dos elevadores mar- ao som de músicas ao estilo Antena 1”, ção se forma linearmente. A fila para ba quando os alunos chegam rumo serão usadas no documentário produ- Às 18 horas, Leonardo Louria e
cam 7h10, e, no terceiro andar, a for- diz Bruna Antenore, uma das alunas. “bater” a carteirinha é um clássico em às salas de aula. Na segunda aula da zido pelos alunos durante a viagem ao Rafaela Romcom se sentam em uma
nada com 24 pães de queijo acaba de Ao fim das aulas da manhã, no dia de evento. É quando se marca a manhã, às 10h30, silêncio entre as ca- Marrocos para cobrir a COP 22. Qua- das mesas da coordenadoria de Publi-
sair do forno do Rock Café. Os pri- quinto andar 25 alunos de jornalis- presença dos estudantes. Dentro do deiras na sala 13. Os alunos do tercei- tro passos atrás, a monitora Gabriela cidade discutindo sobre drag queens.
meiros clientes, alunos e professores, mo ocupam a sala 01 depois que o espaço, o professor Pedro Noguei- ro ano de jornalismo olham atentos à Glette, aluna do quarto ano de Jorna- O barulho dos ventiladores na sala di-
começam a aparecer atrás de um ex- sinal marca o fim da aula, às 11h30. ra conversa com os alunos e arrisca aula de Welington Andrade. “Escrever lismo, está finalmente em paz: chegou ficulta a boa audição, mas já do corre-
presso para poder despertar. Grupos formam uma fila em frente alguns versos da música que toca, não é somente uma atividade técnica, ao fim o processo de seleção de novos dor é possível ouvir nomes conhecidos
Se os alunos saem dos elevadores à mesa do professor, tomada naque- “Moro num país tropical/ Abençoado mas é também uma prática corporal pesquisadores do CIP. do programa de televisão RuPaul’s
rumo às salas no quinto andar ainda le momento por outros três alunos: por Deus e bonito por natureza”. A de prazer”, recita o trecho escrito por Às 16 horas, a monitora Fer- Drag Race. O professor Rodrigo Mo-
sonolentos, a monitora Débora Santos Felipe Sakamoto, Guilherme Guerra iluminação do teatro se apaga, a voz Roland Barthes. Com três folhas en- nanda Silva afasta os fones de ouvido rais está ao lado dos alunos. “O que
já está na coordenadoria de Rádio, TV e Paula Calçade, editores da Revista de Jorge Benjor é cortada e o vídeo tregues pelo professor no começo da enquanto edita vídeos na ilha de edi- é transaminase?”, pergunta alheio à
e Internet para começar o trabalho. A Esquinas. Três calouras empolga- de avisos sobre a segurança no teatro aula, anotar cada citação não é a preo- ção. Julia Zayas, também monitora do conversa dos dois, enquanto preenche
leitura diária dos e-mail só começa de- das sentam nas carteiras da frente e é reproduzido. Mais uma aula mag- cupação dos estudantes. Na discussão Edição Extra, entra para avisar que vai palavras cruzadas. A resposta, talvez
pois do acionamento do ar condiciona- começam a contar sobre a próxima na de Rádio, TV e Internet começa. sobre escritura e escrita percorreram, reservar o material da próxima grava- um pouco fora do cotidiano dos co-
do. Desta vez, não há bilhetes na mesa: reportagem. Em pé, Guilherme cro- O palestrante é Felipe Braga, um dos levados pela voz do professor, o come- ção. Pelo labirinto que os corredores do municadores, era “enzima de fígado”
é como ela e as outras duas monitoras nometra no celular os cinco minutos sócios da produtora Losbragas junto ço da escrita na Suméria e os diálogos quarto andar formam, chega-se na sala – segundo o próprio jogo.
se comunicam. Isabela Tengelmann, que terão para tirar suas dúvidas. Se da atriz hollywoodiana Alice Braga socráticos de Platão. Na primeira car- de Irineu Gonçalves de Sousa . “Me su- Depois das aulas cheias que
monitora que chega às 13 horas, en- não fizesse isso, não daria conta de – filha do professor Ninho Moraes. teira, Júlia Benini deixa uma lágrima jei de tinta branca”, ele conta. A porta inauguram as atividades noturnas
contrará um, solicitando um Comuni- atender a todos. São 13 horas, e é o Por aproximadamente duas horas, os escorrer e, assim como o resto da tur- da sala acabou de ser pintada. da Faculdade, às 22 horas, Nathália
cado Interno para liberação de entrada começo dos preparativos para a 61ª alunos ouvirão o produtor narrar sua ma, anota apenas o que, de alguma Encerrando as atividades do e Yasmin da Frente Feminista ven-
de produção para trabalhos do curso. edição da revista. A tarde é marcada trajetória pelo mundo audiovisual. forma, a toca. período da tarde, mulheres sentadas dem broches com o logo do coletivo
BEATRIZ FIALHO

MARIANA CAVALCANTI

BEATRIZ VECCHI
PEDRO FASCIONI

66 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 67


LETICIA CINTRA

Os alunos olham

GIULIA GAMBA
atentos à aula:

LARISSA ALBUQUERQUE
‘Escrever não é
GIULIA GAMBA

só uma atividade
técnica, mas é
DANIEL CARVALHO

GIULIA GAMBA
BEATRIZ FIALHO
também prática
corporal de prazer’
DIEGO GARCEZ

DANIELA ARAÚJO
LUIS MAURO SÁ MARTINO

68 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 69


a R$3 no saguão do quinto andar. aos 70 anos da Cásper é amanhã. Al- tas abertas nos textos publicitários. ditadura e cinema marginal, é narra- recém-chegados ao mundo univer- bem como os funcionários da central
Elas se surpreendem com a quanti- gumas das imagens que ilustram esta Gustavo Fernandes se atentou espe- da por Pedro Ernesto, aluno do tercei- sitário. O próximo sábado promete de impressão e o pessoal que cuida dos
dade de alunos e alunas que param reportagem veio desse projeto. No cialmente no slide sobre silogismo: a ro ano de Jornalismo. Para produzir uma festa regada a cerveja, catuaba e laboratórios. No corredor que leva ao
para olhar as opções. Sorridentes, sexto andar, Daniela Araújo e Ana Ca- argumentação da lógica perfeita. o programa, há vários alunos espa- o tradicional chupingole – drink cas- banheiro feminino, o Núcleo Editorial
contam as notas que vão acrescentar rolina, alunas de publicidade, editam Pouco antes da aula da professora lhados pela Faculdade e pela Aveni- periano com vodka, suco tang e soda. é a única sala funcionando. O monitor
R$ 250 ao caixa do coletivo, tiram as fotos já prontas para o mesmo tra- Vilma terminar, ao pé do escadão uma da Paulista. A intenção é simular um Guto Martini conclui um texto desta
fotos dos broches e espalham a nova balho em uma das mesas redondas da roda de pessoas começa a encher a lar- programa ao vivo e todos os partici- Sexta-feira edição especial. Na Sala dos Professo-
empreitada pelos grupos da Cásper sala de criação. Há duas horas estão ga calçada da Avenida Paulista. A roda pantes estão focados em suas tarefas. O ar condicionado da sala 3.05 dei- res, uma barulhenta máquina de café
no Facebook. procurando a cor certa para os cliques de capoeira do grupo Abadá-Capoeira, Durante a tarde, os sete monitores xa as carteiras geladas na manhã de permanece ligada.
feitos do escadão com uma GoPro. Às que não tem ligação com a Faculdade, do Núcleo Editorial fazem uma pausa sexta-feira. Às 8 horas, as alunas vão O professor Luís Mauro chega à sua
Quarta-feira 14h29, acham o tom perfeito. Mas em traz dança em plena noite de quarta- na edição da Revista Cásper para con- entrando para a aula de marketing sala na pós-graduação às 8h30. Está
No quinto andar, a única fonte de poucos segundos recomeçam o traba- -feira. A música atrai os alunos que versar sobre as pendências desta edição em Relações Públicas. Sim, apenas segurando um saco de biscoitos e boli-
iluminação que sai do corredor vem lho: esqueceram de salvá-lo. acabam de sair da aula magna com que têm em mãos. Há muito trabalho alunas: desde o primeiro ano, só mu- nhos. Deixa-os em cima da mesa vazia
da sala da Cásper Digital. Às 6 horas, Os alunos Gabriel Calvino, Gio- Tralli. É o caso de Breno Zonta, Bianca pela frente. Enquanto conversam, um lheres compõem a turma no terceiro do professor Marcelo Santos e, olhando
Claudia e Erika já começaram a limpe- vanna Sutto, Lucas Herrero e João Sandine e Brida Rodrigues, que inicou grupo de alunos do ensino médio che- andar. Pedro Nogueira, enquanto ao redor, brinca: “Bom dia, sala”. Senta
za que se estende por mais oito horas. Pedro Petrini assistiram juntos à deci- a capoeira aos cinco anos de idade. ga para mais uma visita à Faculdade. as alunas se acomodam, decide vol- em frente ao computador para finali-
No escadão, o burburinho toma conta são final entre o Barcelona e PSG, na “Você quer jogar?”, perguntam à Bri- Pela janela de vidro, os sete monitores tar a um dos 4 “pês” do Marketing: zar algumas pendências quando rece-
às 7h50. Em dia de aula magna, ele fica sala 13 do quinto andar. Calvino sai da da. A estudante entra na dança e, ao acenam de dentro do “aquário” não “um produto é tudo aquilo capaz de be uma mensagem de sua sogra pelo
mais cheio que o normal. O aluno Feli- sala rumo a um cochilo na rampa do final dos giros e gingadas, um caloroso mais constrangidos: já é um hábito. Às satisfazer um desejo”. Fazendo uma WhatsApp: é uma foto de seu filhinho
pe Leite, de Jornalismo, conversa com terceiro andar antes da aula magna de aperto de mão encerra a noite. 18 horas, os monitores encerram suas ponte entre o trabalho de marketing Lucas que está com a avó. O menino
quatro colegas. Em 15 minutos, vão to- Jornalismo começar. Lá, o ambiente atividades no Núcleo e, os que são do e de RP, o professor estimula as alu- está bem. Às 10 horas, o professor pega
mar seus lugares no teatro para escutar ecoado é dividido entre casais se bei- Quinta-feira período noturno, vão para as salas de nas ainda pela manhã a perguntar e os biscoitos e bolinhos e vai para a sala
as jornalistas Patrícia Campos Mello e jando, rodinhas de conversa e alu- O dia da Central de Estágios, no aula assumir seus lugares como alunos entender a importância do marketing 16 receber seu grupo de estudos.
Maria Júlia Coutinho. Patrícia desta- nos deitados em suas mochilas. Mas quinto andar, começa às 8 horas, mas até as 22h30 da noite. para a identidade das marcas que as Uma hora depois, Mara Faustino,
ca um episódio que vivenciou em sua quando o convidado chega, o jornalis- a primeira a passar para falar com Às 22 horas, a apertada sala da futuras RPs coordenarão. diretora do grupo de teatro Grapetes,
carreira. Ela conseguiu entrar na festa ta César Tralli, o foco se volta para ele. Bruno Sanches, atendente do setor, Atlética no terceiro andar está cheia À tarde, na quadra do sexto andar, organizado pelos alunos da Faculda-
de posse de Donald Trump. Como não Enquanto a aula magna com o é Natália Fujiki, no intervalo da aula de alunos atleticanos: Aloyzio Lima e um grupo se reúne para uma partida de de, chega para dar a primeira aula do
podia fazer anotações, teve uma saída jornalista da Globo acontece no Te- da manhã. A então monitora do CIP Pedro Gavioli assistem a um jogo de futsal masculino. De um lado, o time ano. A turma deste ano está grande, a
criativa: “Escondi um bloquinho de atro Cásper Líbero, às 21 horas, os carrega um papel: é um dos seis con- futebol no computador, enquanto Lu- possui camisas. Do outro, há o time dos sala quase não é suficiente para com-
notas na bolsa”. alunos de Publicidade escutam à pro- tratos de estágio que saem, em média, ana Maronezi, Lucas Toso e Fernan- descamisados. O jogo, que era apenas portar os quase 40 alunos presentes.
Enquanto os alunos de Jornalis- fessora Vilma Schatzer na sala 03 do todas as semanas, e uma das 60 vagas da Silva conversam entre si. Isabela uma brincadeira e um treino entre ami- Mas tudo se ajeita, como tem sido
mo saem empolgados do Teatro Cás- sexto andar. Os futuros publicitários de estágio disponíveis todo mês. Cuppoloni permanece no sofá com gos, termina em 0 a 0. Alunos do se- durante os oito anos do grupo. En-
per Líbero pela fala das convidadas, discutem os conceitos de textos apolí- Na Rádio Universitária, sobe o os olhos fixos no celular. Todos ali fa- gundo ano de Jornalismo se reúnem, tre os exercícios aplicados, os alunos/
no jardim do terceiro andar, alunos de neos e dionisíacos. Entre passadas de som da vinheta: começa um dos jor- zem parte de uma escala para cobrir riem e discutem sobre música. “Legião atores fazem um aquecimento para
Publicidade sentam-se no chão para uma apresentação de Powerpoint com nais produzidos pelos alunos para a a venda de ingressos da Cervejada Urbana e Los Hermanos são bandas acordar o corpo, um jogo de memori-
bater uma foto. A entrega do traba- arabescos no canto esquerdo, os alu- aula da professora Filomena Salem- dos Bixos, a primeira festa do ano: é polêmicas, não são boas, mas todo zação e apresentação, uma dinâmica
lho de composição em comemoração nos discutem como não deixar pon- me. A primeira matéria, sobre arte na o momento para integrar os calouros mundo gosta”, provoca Thaís Cha- para testar a sensibilidade sensorial e
ves. Todos reagem e citam refrãos de cenas de improvisação. A aula vai até
músicas que consideram exemplares. as 13 horas. Meia hora depois, os cor-

PAULA CALÇADE
No final da noite, esperam os colegas redores voltam a ficar vazios. O pes-
para ir ao Bar do Zóio, onde acontece soal da Bateria, que surgiu em 1997
o recreio da Aguante, a torcida orga- por iniciativa dos alunos, não está na
nizada da Faculdade. Às 21 horas as Faculdade. Nessa hora, em geral, os
últimas aulas de todos os cursos da músicos costumam se organizar para
Faculdade ainda estão acontecendo ensaiar do lado de fora do prédio.
e os alunos se agitam para o final de Neste sábado, contudo, eles se en-
semana. Eles encaram o evento como contram na Avenida Prof. Abraão de
uma preparação para o dia seguinte: o Morais. É lá que eles se apresentarão
sábado da Cervejada. para os calouros e veteranos na Cer-
vejada dos Bixos.
Sábado Para todos os efeitos, depois desta
DANIEL CARVALHO

Os cursos de graduação da Cásper não semana culminando na tão aguarda-


têm aulas, mas a Faculdade está aber- da festa de integração entre os qua-
ta para os da pós. Às 8 horas, Giovanna tro cursos, o ano em que a Faculdade
Lima começa seu expediente na secre- Cásper Líbero completa 70 anos real-
taria de atendimento do quinto andar, mente começou.

70 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 71


LIDERANÇA | ESPECIAL
Joubert Ribeiro, coordenador
O diretor e os coordenadores de cursos da de Publicidade e Propaganda

E
“O corpo docente está
Faculdade apontam o futuro de suas áreas
muito unido para fazer
esse curso crescer ainda
Carlos Roberto da Costa, diretor da mais, e acredito que o

L
Faculdade de Comunicação Cásper Líbero núcleo de EAD [ensino à
“A função da Cásper é olhar para distância] dá um up no
frente e preparar o profissional para nosso núcleo. E trabalhar
ele ser importante, atuante, crítico e

E
com amor: publicidade
transformador da realidade futura.” sem amor, não se faz”

S
Helena Maria Jacob, coordenadora
de Jornalismo
Patrícia Salvatori,
“O jornalismo passa por um
coordenadora de Relações
momento de redefinição, os

F
Públicas
alunos devem estar preparados “Temos passado por
para trabalhar com todos um período de grande
os novos caminhos da mobilização no curso.

A
comunicação. A perspectiva Além de contarmos
é de que o curso continue com uma grade muito
crescendo, mantendo sua mais humanista,
tradição e importância”.

L
nossos alunos de RP
mantêm um nível
altíssimo de aceitação
antonio Roberto Chiachiri filho, vice-
no mundo corporativo”.

A
diretor e coordenador da Pós-Graduação
“A Cásper é um signo de
desenvolvimento cultural
e social. Concentramos

M
nossos esforços no ensino da
Sonia Castino, coordenadora de comunicação e, aqui, nosso
Cultura Geral trabalho sempre tem resultado!”
Roberto D’Ugo, coordenador de Rádio, TV e Internet
“As disciplinas de humanas
“A Cásper mantém um excelente quadro de
trabalhadas são essenciais
recursos técnicos para atender as necessidades
para a formação de um
dos alunos. Procuramos estar sempre
comunicador. Com elas, os
atualizados e bem servidos para acompanhar
alunos ganham o repertório
as exigências do mercado audiovisual”.
cultural necessário para as
profissões que querem seguir”.
72 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 73
CASPERIANOS | ESPECIAL

EU NA Os alunos, professores e funcionários


que formam a Faculdade contam
sobre sua relação com a instituição

CÁSPER Irineu Gonçalves


de Sousa, assistente
Francisco Sucar,
laboratorista fotográfico há 15 anos
“Sou bem sincero e posso dizer: gosto
muito da Cásper Líbero. Embora
eu seja repórter fotográfico, gosto
Luciana Leine Gonçalvez,
funcionária da Fundação há 13 anos
“Comecei na Fundação como
ascensorista, fui transferida
para a recepção e, depois, vim
Mariana Gonzalez,
aluna do 4º ano de jornalismo
“Os coletivos da Cásper formam o espaço
onde eu aprendi o que é militância. Claro
que a luta social vai muito além das
muito de estar aqui no laboratório da para a Faculdade. Eu gosto paredes da Faculdade, mas sem dúvidas
administrativo do desse ambiente, é a minha
Faculdade” foi um pontapé inicial e tanto”
laboratório de RTVI segunda casa”
“Eu me sinto
bem na Cásper,
conhecendo
coisas e pessoas
diferentes. Uma
das melhores
empresas que
já estive. Acordo
com vontade de
trabalhar”

Julya Vendite, aluna do 4º ano de jornalismo e


estagiária Núcleo de Mídias Digitais da Fundação Alípio Rodriguez Lineira, Secretário Geral da faculdade e
“Na Cásper percebi as possibilidades funcionário da Fundação desde 1961
Michelle Prazeres,
de praticar o que a gente via nas aulas. “Entrei na Cásper com 15 anos e posso dizer que
professora da Cásper Líbero há 3 anos
Comecei a estagiar no Núcleo de Mídias trabalhar aqui é minha paixão, gosto e sempre gostei
“Chegar aqui foi uma grande conquista.
daqui, aprendi a pensar em melhores de tudo na faculdade. Mas acho que a melhor parte
A Cásper propicia um ambiente de
estratégias de comunicação nas redes é a troca de ideias que eu tenho com os alunos e
relações humanas muito importante. Criei
sociais para uma instituição” professores”
vínculos para a vida toda”

Tatiana Ferraz,
professora há 12 anos na
Cásper Líbero
“Gosto de trabalhar
Ana Carolina Líbero, na Cásper porque Antonio Carlos
prima de 3º grau de esse lugar se tornou Vianna, Supervisor
minha casa. Aqui técnico há 20 anos Antonio Paixão, técnico
Cásper Líbero e aluna do
dentro há um clima “Boa empresa para do SAV há 20 anos
curso de Publicidade
de conscientização, de se trabalhar. É uma “Em 20 anos de Cásper,
“Ter alguém na família
seriedade e ao mesmo satisfação estar com valorizo o trabalho em
que alcançou tudo o
tempo de alegria, os alunos e passar equipe que é possível
que ele alcançou e ter
descontração. Um conhecimento para aqui. Somos próximos
uma Faculdade em
clima que não existe em eles. Juntei o útil ao dos professores e
homenagem a ele é
nenhuma das redações agradável” alunos, e estendemos o
algo importante e que
nas quais trabalhei” audiovisual para todos os
valorizo muito”
alunos”

74 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 75


R P, R T V I E P P | E S P E C I A L

TODOS
As semanas de Publicidade e Propaganda são conhecidas por
trazer grandes nomes da área, como Washington Olivetto

primeiros anos, o estágio não é como


era hoje”, compara. Uma evidência é o

EM FESTA
alto número de alunos nas empresas:
dos formados no ano passado, 92%
passaram por estágios.
No curso de Publicidade e Propa-
ganda, essa realidade se repete. Se-
gundo o coordenador Joubert Britto,
os alunos chegam muito mais madu-
ros, e, consequentemente, aumentam
a inserção no mercado.
As parcerias externas são tendên-
cias no curso de PP: Meio e Mensagem,
© CENTRO DE EVENTOS FCL / BEATRIZ VECCHI
Clube de Criação e Estado de S. Paulo
RP e PP completam 45 anos e são algumas das empresas parceiras
da Faculdade. A ideia é criar cada vez
RTVI, 15, consolidando juntos a mais pontes entre os alunos e o mundo
Jornalismo um polo de referência publicitário e, para isso, os projetos da
área também se reinventam ao longo
em comunicação dos anos. É o caso da Mostra, projeto
que simula o trabalho de uma agência,
e das Semanas de Publicidade, que já
POR CAROLINA MORAES
trouxeram para as salas da Faculdade

© CENTRO DE EVENTOS FCL / BEATRIZ VECCHI


nomes como Washington Olivetto.
Para a Cásper Líbero, 2017 é o ano das comemora- O coordenador do curso de Rá-
ções. Há 70 anos, começava suas atividades como a pri- dio, TV e Internet, Roberto D’Ugo,
meira escola de Jornalismo do Brasil. Há 45 anos, surgi- conta que, quando era coordenador
ram os cursos de Publicidade e Propaganda e Relações de programação e produção na rádio
Públicas, fazendo com que a Faculdade se tornasse uma Cultura FM teve, entre seus estagiá-
referência no ensino da comunicação. Há 15 anos, o ca- rios, duas alunas da primeira turma
Na Mostra anual de Relações Públicas, os alunos apresentam
um planejamento anual pensado para ONGs çula chegou: Rádio, TV e Internet. Assim como os ou- que o impressionaram pela qualidade
tros, logo primou pela qualidade. do trabalho. “Para mim, foi um sinal
O curso de Relações Públicas é o segundo mais tradi- de que a Cásper estava com um nível
cional do Brasil. Antes dele, só era oferecido pela Escola tão bom quanto os cursos tradicionais
de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. da ECA e da Faap”, lembra. Além dos
As transformações mais significativas vieram a partir da
década de 1990, quando as empresas montavam suas
corpos docente e discente, a estrutura
da Gazeta foi fundamental para essa
transformação exige. Em RTVI, assim
como nos outros dois cursos, “o desa-
Desde os primeiros
estruturas de comunicação. RP, como é mais conhecido,
passou a pensar mais na formação para as corporações,
consolidação. “Dispondo de um com-
plexo televisivo e radiofônico como a
fio é associar a tradição com a inova-
ção”, pontua Marco Vale, professor do
anos, a procura
o que ampliou o leque de inserção no mercado de tra-
balho para os jovens profissionais de comunicação. “A
Gazeta, cedo ou tarde a Cásper Líbero
assumiria um curso que formaria pro-
curso de Rádio, TV e Internet. A for-
mação de todos os cursos é fundada
é grande das
Cásper sempre foi uma formadora de profissionais, e o fissionais de excelência”, diz D’Ugo. em uma visão fortemente humanista. empresas por
curso de RP nunca esteve tão maduro”, diz Sérgio An- A renovação das grades curricu- Tanto nas disciplinas de Cultura Ge-
dreucci, ex-aluno e professor da Faculdade há 23 anos. lares dos três cursos permitiu acom- ral, comuns a todos os cursos, quanto estagiários da
Cásper
Patricia Salvatori, atual coordenadora de RP, traça um panhar as dinâmicas do ensino da nas aulas técnicas, o desenvolvimento
paralelo com os alunos de 1992, turma em que foi aluna. comunicação e atender às compe- de um pensamento crítico acerca da
“Não havia um perfil de aluno que trabalhasse desde os tências que um mundo em constante profissão é prioritário.
Mauro Mendonça Filho, diretor de novelas da TV Globo, foi
um dos palestrantes das aulas magnas de RTVI em 2016

76 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 77


JORNALISMO | ESPECIAL

OS DESAFIOS
pautas específicas, como o feminismo dentro da redação, Ingrid Yurie, repór- com as novas tecnologias, chegamos
ou o combate ao trabalho escravo, e as ter da Carta Capital e formada na Cás- finalmente no que acredita ser o
redes de mídia independente apontam per em 2016, conta que a sua forma- rumo: revalorizar o jornalismo. “Me
rumos diferentes para a profissão. ção foi fundamental em dois aspectos. parece uma tendência saber que o

GLOBAIS
As competências que um jornalis- “Primeiro, na minha formação crítica. fazer jornalístico há uma técnica que
ta necessita extrapolam o que era ne- Aprender a pensar. E na minha forma- não é simples. E uma faculdade de
cessário até então: produção multimí- ção como ser humano para aguentar jornalismo é o lugar para se discutir
dia, veiculação de matérias em mídias uma redação”. O que Ingrid aponta é essas mudanças”, conta.
digitais e gestão de pessoas e de con- uma tendência que também aproxima
teúdo são competências mínimas. “As a Cásper das instituições espanholas: o
escolas têm que estar atentas a isso, e
não significa que seja uma formação
forte fundamento nas Ciências Sociais,
porque, apesar das diferentes técnicas
“Continua sendo
voltada para o mercado. Continua
sendo uma formação crítica, mas li-
e demandas que surgem, um jornalis-
mo que de fato informe a população é
uma formação
A discussão sobre reinventar o jornalismo
gada a esses novos conflitos”, explica
Ratier. Experimentar outros formatos
sempre necessário.
Para o professor de Jornalismo
crítica, mas
é permanente. E mundial. para contar histórias, apostar em pro-
jetos interdisciplinares e investir no
Econômico Marcos Guterman, os de-
bates sobre as mudanças pelas quais
ligada a esses
POR CAROLINA MORAES
digital são estratégias que o mundo, e
a Cásper, tem adotado.
o jornalismo passa estão se impondo
no ambiente acadêmico. Mas acredita
novos conflitos
No fim de março, Helena Jacob foi convidada a visitar a Uni-
Atenta principalmente à interação
entre jornalismo e mídias sociais de
que depois de passarmos por momen-
tos de deslumbramento e atonicidade
Rodrigo Ratier
versidade de Navarra, porque a Cásper foi a faculdade com mais
alunos participantes na Semana Estado e no prêmio Santander
Jovem Jornalista. Apesar dos 8.386 quilômetros que separam São Evento de 2014 “Quem mexeu no meu jornalismo?” trouxe figuras ilustres
do jornalismo para debater financiamento e narrativas no novo contexto
RICARDO NÓBREGA Paulo da Espanha, a coordenadora do
curso de Jornalismo se surpreendeu:
“Os desafios dos professores lá são
os mesmos que os nossos aqui: como
atender as demandas do mundo aca-
dêmico e do mercado de trabalho?”
Os modelos das gigantes estruturas
jornalísticas do século 20 não se sus-
tentam mais. Na verdade, ruíram de-
pois da revolução digital. E a mudança
tecnológica trouxe um grande e contí-
nuo desafio: lidar com a velocidade. “A
dinâmica no mundo acadêmico é dife-
rente. Por isso apostamos na formação
humanística, que é forte e não muda
de uma hora para outra”, explica He-
lena. Em tempos de pré-revolução tec-
nológica, precisava-se de uma grande
estrutura para se fazer ouvir. Com um
celular e uma conexão à internet, em
No dia 7 de abril a Cásper Líbero tese, bilhões de pessoas podem ser conectadas. O cenário mudou
celebrou o dia do jornalista com radicalmente, e não necessariamente para pior. “Há um caráter
o evento “Contar histórias do
democratizante que é muito interessante”, pontua Rodrigo Ratier,
futuro: diálogo sobre o jornalismo
e a técnologia” professor de Teoria e Prática da Reportagem da Cásper Líbero.
Se de um lado, as grandes empresas diminuem o núme-
ro de jornalistas nas redações e perdem audiência, do outro surgem
alternativas promissoras. Agências de fact-checking, veículos com
YURI ANDREOLI

78 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 79


PESQUISA | ESPECIAL O número de alunos
interessados em
fazer pesquisa pelo
CIP aumentou

© CENTRO DE EVENTOS
exponencialmente
desde sua criação. Em
2017, 25 alunos e 8
professores compõe o
grupo de pesquisadores.

A inauguração
do Centro
Interdisciplinar BEATRIZ FIALHO

de Pesquisa em
2000 foi um marco
para a produção
acadêmica da dade de organizar as pesquisas que estavam sendo feitas professores: “É como se estivesse cuidando de um filho.
Faculdade. tanto pelo corpo docente quanto pelo discente. “O CIP é Essa troca de experiência com alunos é muito gostosa”.
fruto de um ambiente de pesquisa que estava nascendo Menezes ressalta a importância da iniciação científica

PAIXÃO POR
na Cásper. Havia muitos professores cursando mestrado na formação do aluno: “O processo de fazer pesquisa é
e doutorado e o diretor Erasmo era entusiasta da pesqui- o de gerar conhecimento. Mesmo que o aluno não siga a
sa”, conta o professor José Eugênio Menezes, orientador carreira acadêmica, terá tido uma imersão em pesquisa e
de iniciação científica. “A partir de sua criação, a Cásper refletido a comunicação”.

PESQUISA
passou a ter o ciclo completo de pesquisa: a iniciação Os resultados não podiam ser melhores. O artigo da
científica, a pesquisa docente e o mestrado”, diz. aluna do quarto ano de jornalismo Laura Uliana, orien-
A mudança no interesse ao longo dos anos foi radical: tada pela professora Simonetta Persichetti, foi finalis-
dos 2 inscritos no primeiro ano, o CIP tem hoje 33 pes- ta na área Ciências Sociais Aplicadas na categoria “Em
quisadores. Neste ano, o processo de seleção teve 58 can- Andamento” do Congresso Nacional de Iniciação Cien-
Com 17 anos de existência, o CIP é a casa dos pesquisadores didatos para 15 selecionados. Cada aluno bolsista ganha tífica (Conic) do ano passado. O texto procura verificar
25% de desconto na mensalidade. as ideias de autoria, verdade e subjetividade e como elas
docentes e discentes na Faculdade Cásper Líbero A produção do saber originado no CIP permitiu a permeiam o fotojornalismo em três diferentes momen-
criação da revista Communicare, um periódico científico tos: na revista Life, na agência Magnum e na Farm Se-
POR RAFAELA ARTERO semestral que recebe colaborações de outras universida- curity Administration.. Laura conta que a experiência da
des e do exterior. Lançada em 2001, a revista é avaliada iniciação científica foi fundamental para escolher qual
Instituições do ensino superior privado são vistas, es- em parceria com a Coordenadoria do Curso de Jornalismo. como Qualis B2 pela Coordenação de Aperfeiçoamento caminho irá seguir profissionalmente. “O mais impor-
sencialmente, como formadoras de mão-de-obra para o O órgão se chamava Núcleo de Pesquisa em Jornalismo. A de Pessoal de Nível Superior (Capes). “Costumo dizer tante foi a vivência acadêmica, que me deu a certeza de
mercado de trabalho. E isso é o que faz do Centro Inter- ideia de fazer pesquisa dentro de uma faculdade particular que tão importante quanto pesquisar é divulgar o resul- que quero ser professora. Amadureci como pesquisadora:
disciplinar de Pesquisa (CIP) uma espécie de oásis para era tão inusitada que só duas pessoas se inscreveram, con- tado”, pontua Cilene Victor, professora que coordenou o agora sei como escolher o recorte de um tema, como fa-
professores e alunos da Cásper Líbero. Durante 10 meses, ta Luís Mauro de Sá Martino, orientador no CIP, professor CIP de 2013 a março de 2017. Professores e bolsistas são zer um projeto e, pesquisar”, diz.
eles podem se dedicar a projetos de pesquisa do campo co- da Faculdade e um dos corajosos desbravadores da primei- estimulados a apresentarem seus artigos em congressos O ex-aluno Tiago Mota fez a iniciação científica no CIP
municacional com apoio e suporte financeiro da Faculda- ra turma. “Não existia na Cásper, ou existia bem pouco, dentro e fora da Cásper. em 2012 e hoje é pesquisador e mestre na área de Comuni-
de. Em 17 anos, o CIP já fomentou mais de 200 trabalhos a vivência de área acadêmica. Então, a iniciação científica Em 2014, o CIP passou por uma grande mudança cação e Semiótica pela PUC-SP. Tiago conta que o conhe-
acadêmicos. “A Cásper Líbero tem um espaço privilegiado era algo bem inédito”, lembra. Foi por meio da iniciação ao procurar estreitar o diálogo com a pós-graduação cimento adquirido durante sua pesquisa na Faculdade o
que dá voz, tempo e incentivo para esses pesquisadores re- que ele descobriu a vocação para a docência. “Um dia o stricto sensu da Cásper Líbero. Os professores desse de- ajudou a elaborar seu projeto de mestrado. Ele pesquisou
alizarem projetos dentro da Comunicação Social”, diz Eric meu orientador me disse ‘você tem que ser professor, o seu partamento também foram convidados a participar da a relação entre jogos eletrônicos e a comunicação mediada
de Carvalho, professor e coordenador do CIP. lugar é na academia’, e então me mostrou na teoria e na orientação dos projetos de iniciação científica de alunos pelo computador. “Cheguei com boa parte da bibliografia
O incentivo à pesquisa surgiu de professores como Cló- prática o que é o mundo acadêmico.” da graduação. De acordo com Antônio Roberto Chiachiri básica do meu atual grupo de pesquisa, o Centro Interdis-
vis de Barros Filho. Em 2000, seu terceiro ano lecionando, Naquele ano e em parceria com alguns professores, Filho, vice-diretor da Faculdade e orientador no centro, a ciplinar de Semiótica da Cultura e da Mídia, já lida e revi-
ele iniciou uma seleção para pesquisadores na graduação o então diretor Erasmo de Freitas Nuzzi viu a necessi- troca é ótima não só para os alunos, mas também para os sada. Isso graças ao meu tempo no CIP”, afirma.

80 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 81


N A S E S TA N T E S | E S P E C I A L

ONDE O VELHO E O A biblioteca Prof. José


Geraldo Vieira conserva

NOVO CONVIVEM
os pilares teóricos da
Faculdade
POR CAROLINA MORAES

Os 28 mil livros distribuídos entre guardam textos de sua própria autoria recebiam senhas para apenas uma
o quarto e quinto andar da Faculdade e dedicatórias de grandes nomes, como hora de consulta à internet, agora têm
começaram a partir de uma doação da o do amigo Martins Fontes. nove computadores disponíveis e le-
família de Cásper Líbero. Na revista A O homem que dá nome à biblioteca vam seus notebooks, tablets e celula-
Imprensa do mesmo ano, 1948, um representa a essência da relação biblio- res para as salas de estudos.
anúncio pedia outras doações para teca-faculdade: José Geraldo Vieira in- O espaço também ganhou títulos
ampliar o acervo que, ano a ano, che- tegrou a Academia Paulista de Letras, atuais de comunicação, área ainda
garia à biblioteca Prof. José Geraldo foi crítico de artes plásticas no jornal com pouca produção acadêmica na
Vieira de hoje: uma coleção de 130 Folha de S. Paulo e professor da Facul- década de 1950. O professor de Teoria
mil itens entre DVDs, CDs, VHS, pe- dade Cásper Líbero por 15 anos. Em da Comunicação José Eugênio Mene-
riódicos, revistas e dissertações. 1977, ano de seu falecimento, a congre- zes comenta que a obra de Christoph
Daniela Bisolato, atual coordena- gação da Faculdade homenageou-o ba- Wulf escrita em italiano é rara em
dora do espaço, começou como estagi- tizando o espaço com seu nome. outros acervos e fundamental para
ária em 1998, período em que a biblio- Desde os anos 2000, quando o o rumo de suas pesquisas atuais. O
teca passava por um dos processos mais espaço onde hoje é a Secretaria de Re- livro The Wealth of Networks, ainda
importantes de ampliação. O acervo gistros acadêmicos deixou de ser sufi- sem tradução para o português, tam-
quase dobrou de tamanho e muitas as- ciente para abrigar os exemplares e o bém compõe o acervo e é a principal
sinaturas de revistas foram feitas. Nes- acervo migrou ao quarto andar, a bi- obra do professor de Harvard Yochai
sa época, descobriram e catalogaram blioteca foi cenário de grandes trans- Benkler, que estuda o surgimento da
os livros pertencentes a Cásper Líbero formações. A chegada da internet foi economia de uma sociedade em rede.
- hoje dispostos nas reservadas estantes uma delas. O primeiro computador As revistas, jornais e periódicos
do mezanino. Entre livros de literatu- instalado na biblioteca causava filas totalizam 133 itens, que são mudados
ra, economia e direito, os exemplares intermináveis. Os alunos, que antes todos os dias. Se os exemplares expos-
tos são importantes para se
Em 2000, foi inaugurado o espaço em dois andares da biblioteca
informar dos acontecimen-
tos atuais, os exemplares
antigos são preciosos itens
de consulta. Na biblioteca,
a coleção da Veja e da Re-
alidade, revista inovadora
da Abril que circulou até
1976, estão quase com-
pletas e disponíveis para
consulta. Os periódicos são
o que há de mais atual no
espaço. A biblioteca conta
com uma base específica
de comunicação, a EBSCO
(Communication & Mass
Media Complete), que
disponibiliza mais de 850
títulos escritos desde 1915
na área da comunicação.
GIULIA GAMBA

82 maio • junho • julho • agosto 2017


TESTE | ESPECIAL

QUIZ
Qual desses profissionais da
4. comunicação não se formou na Cásper?
a) Maria Júlia Coutinho
b) Carla Jimenez
c) Gugu Liberato

CÁSPER
d) Sonia Abrão
e) Evaristo Costa

Teste seus conhecimentos sobre a primeira Em qual bacharelado Cásper


Faculdade de comunicação do País 5. Líbero se formou?
a) Engenharia

1.
b) Jornalismo
Quantos andares tem o prédio da
c) Direito
Fundação Cásper Líbero?
d) Medicina
a) 12 e) Magistério
b) 15
c) 17
d) 19
e) 20 6. Qual o professor mais antigo em
atividade na Faculdade?
a) Welington Andrade

2. Qual congresso de comunicação


foi fundado na Cásper?
b) Liráucio Girardi Júnior
c) Adalton Diniz
a) Compós d) Dirce Escaramai da Silva
b) Abrapcorp e) Sergio Andreucci
c) Comunicon
d) Intercom
e) Congresso Brasileiro de Comunicação

7.
Alternativa Onde eram distribuídas as primeiras
edições da revista Esquinas?
a) Pelos estudantes nos corredores da faculdade

3.
Qual figura política nunca b) Os moradores de rua distribuíam pelas esquinas da cidade
participou de eventos na c) Era comercializada pelos estudantes e a verba revertida para
Faculdade Cásper Libero? o Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua
a) Lula d) Os estudantes compravam diretamente no Núcleo Editorial
b) Gilberto Maringoni e) Nenhuma das alternativas anteriores
c) Paulo Maluf
d) Luciana Genro
e) Ivan Valente Respostas: 1. b; 2. d; 3. d; 4. e; 5. c; 6. b; 7. b.

84 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 85


ORGULHO POR COMUNICADORES
DE SER PARA COMUNICADORES
A Cásper é sinônimo de cultura ,comunicação e atualidades.
Sempre com reportagens de grande profundidade,

CÁSPER
investindo na boa apuração e no debate de ideias.
© FELIPE FRAZAO

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revistacasper@casperlibero.edu.br
4
FIQUE DE OLHO

Em um mundo cada vez mais


midiático e conectado, as maneiras
de se comunicar e atingir o público
tem encontrado novos caminhos
ou renovado meios já tradicionais.
Quais são as tendências mais
discutidas e aplicadas nas quatro
áreas da comunicação? Com a
ajuda dos professores dos quatro
cursos da Cásper, elencamos alguns
dos principais tópicos utilizados
no dia-a-dia dos profissionais e
pesquisadores.

TRENDING
TOPICS
COMUNICACIONAIS
88 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 89
PUBLICIDADE RÁDIO, TV
E PROPAGANDA E INTERNET

1 1
REALIDADE VIRTUAL/VÍDEO 360°
GAMIFICAÇÃO Para o professor Roberto D’Ugo, os vídeos em 360° e de
Tendência mais citada entre os professores da Faculdade Cásper
realidade virtual, dentro das possibilidades digitais, abrem
Líbero como forma de estratégia em comunicação, a gamificação
perspectivas novas para o roteiro e lançam o desafio para o
tem sido utilizada no meio publicitário para o desenvolvimento
desenvolvimento de novas narrativas. Há uma maior sensação de
de projetos e campanhas. O lado lúdico dos games estimula o
realidade nas narrativas audiovisuais.
engajamento de grupos de pessoas que buscam resultados.

2 2
USER EXPERIENCE STORYTELLING
Para vender um conceito ou um produto, é O sucesso estrondoso dos seriados e
preciso levar em conta as percepções e reações narrativas televisivas é um forte indicador
psicológicas dos consumidores. O mundo de que a arte de contar histórias cativa e
publicitário se baseia na chamada experiência do impacta o público de maneira intensa.
usuário para formular suas estratégias.

3
GAMIFICAÇÃO

3
TRANSMÍDIA A indústria de games já ultrapassa a
hollywoodiana evidenciando seu forte impacto
Hoje, o consumidor é atingido por diferentes plataformas na sociedade contemporânea. Frente a essa
de comunicação. Contar cada história de forma realidade, cada vez mais as obras audiovisuais
diferente, tornando-as mais dinâmicas e adaptadas ao estudam e incorporam elementos da
meio, é o que o permite o conceito de transmídia, explica gamificação em suas narrativas.
o professor Marcelo Rosa de Publicidade e Propaganda.

4 4
TRANSMÍDIA
O professor Marco Vale afirma que a transmídia
STORYTELLING aplicada nas áreas de rádio, TV e internet
A arte de contar histórias vem despontando representa “não mais uma tendência, mas uma
como a estratégia publicitária por seu
persistente realidade”. A internet propiciou à
poder de impacto e envolvimento entre os
consumidores. Não é novo, mas é eficiente. convergência das mídias e abriu o campo para
novas e potenciais narrativas.

90 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 91


JORNALISMO RELAÇÕES PÚBLICAS

1
FACT-CHECKING BIG DATA/MINING DATA

1
“A tecnologia possibilitará que os drones e Trabalhar com mineração de dados possibilita, para a
inteligências artificiais façam todo o processo de professora Carla Almeida, um melhor desempenho no
apuração e divulgação de notícias, restando ao planejamento e execução das ações de comunicação.
jornalista a tarefa de checar o conteúdo”, explica Com informações mais filtradas, há uma clareza maior
o professor Jorge Tarquini. As agências de fact- na hora de identificar estratégias assertivas e de se
checking despontam como grande novidade. relacionar com stakeholders.

2 2
JORNALISMO DE DADOS GOVERNANÇA NA COMUNICAÇÃO
O meio digital possibilita um ambiente de circulação Há uma demanda crescente de credibilidade e
de informações quase inesgotável. Segundo o professor legitimidade das organizações por parte da sociedade.
Eduardo Nunomura, o jornalismo de dados representa “um Em momentos de crise, em que a imagem é colocada
nível de aprofundamento do processo de apuração que em risco, a gestão da reputação por meio da
poucos ainda conseguem enxergar”. comunicação se faz altamente necessária.

3 3
TRANSMÍDIA O NOVO INFLUENCIADOR
Com a ampliação dos meios digitais, aumenta o trabalho
As plataformas digitais possibilitam ao público
do profissional de relações públicas na gestão de imagem
diversas maneiras de consumir conteúdo
de figuras públicas e influenciadores, como youtubers e
jornalístico. Como em Publicidade e Rádio, TV
outros formadores de opinião.
e Internet, segue como tendência por permitir a
ubiquidade de informações e conteúdo.
RETORNO SOBRE ENGAJAMENTO

4 4
Para o professor Sérgio Andreucci, a sociedade espera muito mais
STORYTELLING das marcas e das organizações, e muito além de bons produtos
Ao jornalista cabe – e sempre coube – a e serviços. “Os consumidores e os cidadãos desejam uma postura
missão de construir boas narrativas sobre a socialmente responsável das empresas e, por sua vez, as empresas
realidade. A crescente falta de leitores deve desejam ser vistas como engajadoras de causas sociais, culturais,
ser encarada como um desafio para que se ambientais, esportivas, entre outras”, afirma.
melhore a maneira de narrar, evidenciando
a importância do storytelling.

92 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 93


VERACIDADE

de fatos” em notícias de seis pu-


blicações jornalísticas da Améri-
ENTENDENDO O FACT-CHECKING

CHECAGEM
ca Latina, três delas brasileiras:
Cada agência de fact-checking possui uma metodologia própria, com
Agência Lupa, Agência Pública e
Aos Fatos. “O objetivo da checa- selos que verificam as falas de figuras públicas. Veja como funciona o
gem é empoderar quem precisa de Truco da Agência Pública com frases sobre o tema:
informação”, afirma Cristina Tar-
dáguila, jornalista e diretora da

EM XEQUE
Lupa. Desde seu lançamento, no “A checagem é o futuro do jornalismo”
fim de 2015, a agência acompa-
nhou o processo de impeachment Exagerado. Por mais
de Dilma Rousseff, os Jogos Olím-
picos e as eleições municipais. importante que sejam os
O trabalho dos checadores vir- fact-checkers, há ainda
tuais consiste em analisar objeti-
lacunas que outros veículos
vamente falas de figuras públicas,
A reação dos jonalistas em tempos de proliferação de notícias falsas atestando sua veracidade ou não.
Cada agência possui um méto-
preenchem: notícias hard-
news, reportagens de fôlego e
POR GUILHERME GUERRA do de classificação que vai muito
além de “verdadeiro” ou “falso”. entrevistas
Por exemplo, o candidato afirmou
sem contextualizar? “Impreciso”.
Utilizou dados errados para pro-
var um ponto correto? “Exagera- “Notícias falsas são um fenômeno norte-
Os jornalistas das antigas lembram da temível figura do checa- do”. Entrou em contradição com americano”
dor. A reportagem poderia passar por um redator, um editor de texto algo dito anteriormente? “Con-
e um revisor, mas só seria publicada depois do escrutínio daquele traditório”. Para chegar a essas
profissional com olhos de lince. Mas hoje ele está em vias de extin- conclusões, os repórteres buscam
Falso. Embora as eleições
ção. O enxugamento das redações e a caça por cliques que levaram a origem das informações e vão
os veículos de imprensa a acelerarem a produção de notícias fizeram a fundo em relatórios, planilhas, norte-americanos e Donald
com que a checagem deixasse de ser prioridade. Publica-se qualquer leis, especialistas e até mesmo na Trump tenham incitado um
coisa. Se estiver errado, corrige-se o que já estiver no ar. O que im- própria fonte da fala.
porta é publicar antes de todos. Natalia Viana, co-diretora da debate sobre notícias falsas e
Não é preciso ser estudante de jornalismo para perceber que notí- Agência Pública, pontua que a checagens, o Brasil também
cias falsas circulam livre e impunemente nas redes sociais. Em abril de checagem, utilizando-se de técni-
2016, semana do impeachment de Dilma Rousseff, três de cada cinco cas do jornalismo investigativo, foi bastante afetado pelo
reportagens mais compartilhadas no Facebook eram falsas. A cons- consegue resumir e transmitir problema, desde 2014
tatação foi do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas de Acesso à uma informação com segurança e
Informação da Universidade de São Paulo (USP). O nível da mentira muito rapidamente. Essa caracte-
em escala global se tornou tão patente que até empresas como Google rística faz com que o fact-checking
e Facebook tornaram a checagem de fatos como uma de suas pautas esteja perfeitamente formatado “Fact-checkers podem vender seu serviço a
prioritárias para 2017.
O que os pesquisadores da USP detectaram é que a dinâmica viral
aos tempos de mídias sociais, em
que a objetividade é fator essen-
outras empresas”
do Facebook, favorecido pelo fácil compartilhamento de postagens, cial para chegar ao público.
acaba por reforçar as polêmicas em detrimento de outros assuntos. Desde 2011 no ar, a Pública Sim. Cada veículo
Essas polêmicas muitas vezes confirmam uma ideia pré-concebida produziu extensas matérias pau-
decide sua forma de
dos nichos de usuários da rede e, ainda que sejam falsas, acabam vi- tando sobretudo direitos huma-
ralizando. E é o crime que compensa: uma página que propaga uma nos. Em setembro de 2014, foi negócio, inclusive vender
mentira ganha mais seguidores, criando um ciclo de propagadores de lançado o Truco, seção de fact-che- checagens a jornais,
notícias falsas. Onde está o velho e bom checador das redes sociais? cking para acompanhar a eleição
Talvez sejam as agências de fact-checking, que já somam mais de presidencial brasileira daquele revistas e canais de
uma centena de organizações espalhadas pelo mundo. Acompanhan- ano. O Truco permanece até hoje televisão
do essa tendência, o Google passou a mostrar um selo de “verificação como seção fixa do veículo. “As

94 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 95


pessoas questionam indústria em frangalhos, como a críticas dos usuários, o empresário
muito a checagem. A jornalística”, explica. mudou o discurso e anunciou uma
reação do público é Mas isso não significa que o série de medidas (entre elas, par-
maior, e o engajamen- céu é o limite para os fact-che- ceria com fact-checkers) para com-
to é muito grande”, ckers. Uma possibilidade futura é bater notícias falsas que circulam
conclui Natalia. levar as checagens para debates ao no Facebook. “Nós somos um novo
“A checagem é vivo na televisão. Porém, envolve tipo de plataforma para o discurso
sempre muito polê- mudanças no formato por se tra- público, e isso significa que temos
mica, pois desperta os tar de uma linguagem diferente. um novo tipo de responsabilidade
ânimos,” diz Cristina Varredura em tempo real de ban- para construir
Tardáguila, da Lupa. cos de dados é uma possibilidade. um espaço onde
A experiência de Cristina com E mais: “Outro dispositivo pode pessoas podem
fact-checking vem desde 2013, jogar na sua tela o contexto pes- ser informadas”,
quando entrou em contato com o quisado pela inteligência artifi- escreveu em seu
site argentino Chequeado, o pri- cial, de modo que você tenha aces- perfil na rede.
meiro do tipo na América Lati- so a mais conteúdo imediatamen- É pouco
na. Levou a proposta ao jornal O te depois de o político ter falado provável que
Globo, que lançou em agosto de algo errado na TV”, diz Nalon. as agências de
2014 o blogue Preto no Branco. Aliás, é da própria televisão checagem de
O timing era bastante apropria- que veio a checagem de fatos notícias dêem
do: as eleições pre- como um fenômeno à parte do co- conta de frear
sidenciais de 2014 tidiano jornalístico. A equipe Ad o ímpeto dos proliferadores das
abriam espaço para Police foi encarregada pelo canal notícias falsas na rede. Muitas
checagens diversas. de notícias norte-americano CNN vezes, os próprios veículos da im-
A iniciativa se tor- de checar as falas dos candidatos prensa são a origem dos posts que
nou a primeira do à presidência das primárias de acabam sendo compartilhados e
Brasil, precedida em 1991. Em 2003, veio o factcheck. vão crescendo como uma grande
um mês pela Agên- org e, em 2007, o politifact.com, bola de neve, um aumentando um
cia Pública. vencedor em 2009 do Prêmio Pu- conto na mentira. Especialistas da
Em julho de litzer pela cobertura das eleições Tecnologia da Informação acredi-
2015, surge outro presidenciais do ano anterior. tam que os algoritmos sejam mais
projeto brasileiro: Aos Fatos, da Não é de se estranhar a ini- eficazes: uma
jornalista Tai Nalon. Nas eleições ciativa do Google em oficializar vez detectada
de 2010, Nalon trabalhou em ex- a checagem de fatos. Na verdade, uma mentira,
periências de checagens, como o antes de uma atitude nobre em o post deixa
Mentirômetro e Promessôme- favor do bom jornalismo, o ato de ser com-
tro da Folha de S.Paulo. Quatro foi encarado como uma forma de partilhado.
anos depois, começa a idealizar lutar contra as notícias falsas que Mas para fa-
como seria um veículo especiali- assolaram o debate público dos zer esse filtro
zado em conferir falas de políti- Estados Unidos e, principalmen- não bastam
cos. Para ela, a checagem é mais te, de manter intacta importância robôs. No fim
simples de de- do serviço da empresa no consu- das contas,
senvolver, ain- mo de notícias mundial. toda a discus-
da que faltem A empresa de Mark Zuckerberg são apenas
profissionais também entrou na discussão após fortalece o trabalho dos jornalis-
no segmento. duras críticas à indiferença do Fa- tas – em especial, dos checadores.
“Não é uma cebook durante o período eleitoral, De olho em 2018 e com base nas
operação de em que diversos sites de notícias ga- últimas eleições norte-america-
alto custo do nharam relevância no debate com nas, Cristina Tardáguila consi-
ponto de vista o impulsionamento pago da ferra- dera que as eleições brasileiras
tecnológico, menta. Na época, o CEO chegou a farão com que a checagem ganhe
embora seja insistir na imparcialidade de sua ainda mais fôlego. “Será o ano da
caro para uma companhia. No entanto, após mais checagem”, afirma.

96 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 93


P R I VAC I DA D E

Nesse exato instante, dezenas de reza, não há problema. Mas, concen- camento, o app sabe que no meio do
empresas sabem exatamente onde trado, se torna radioativo. Pode ser caminho não há pedras, mas anun-
você está, se é homem ou mulher, uma bomba atômica. É o que está ciantes. Empresas compram espaço
quantos anos tem e algumas prefe- acontecendo com os dados que esta- no Waze para oferecer seus serviços a
rências pessoais que seus amigos nem mos disponibilizando com os diversos partir da proximidade entre seu espa-
desconfiam. Se é de manhã, tarde ou aparelhos eletrônicos. Como estamos ço físico e o carro do usuário. Pode ser
noite, comeu alguma coisa e começou cada vez mais interativos, a quantida- um posto de gasolina, uma padaria ou
a se deslocar para o trabalho ou a fa- de de informação fornecida pelo usu- uma loja de decoração. No primeiro
culdade, elas também estão a par dis- ário não para de crescer, criando um caso, pode ser conveniente. Nos dois
so. E nem é preciso que esteja com o perfil extremamente refinado de cada últimos, não demorará muito para
celular na mão. Se bobear, o aparelho pessoa. Quando falamos de milhões que os aplicativos saibam que você
está largado no bolso da calça, porque ou bilhões de indivíduos conectados, estava louco por um pãozinho ou pre-
o filme que está vendo já começou. essa miríade informativa revela pa- cisava comprar cortinas novas.
Seus pais nem desconfiam que está drões, comportamentos e tendências. O que é compartilhado, curtido
na casa de amigos assistindo Netflix É o chamado big data. (um dado teoricamente privado) e
numa confortável sala com uma smart “Ao permitirmos o acesso, concor- postado nas redes sociais permite tra-
TV. Mas as corporações que pagam damos que entrem no nosso telefo- çar um perfil assustadoramente pre-
caro por informações de potenciais ne e usem esses dados da forma que ciso de cada indivíduo. A reportagem
consumidores sabem de tudo. A vida quiserem”, explica Fernanda Becker, The Data That Turned the World Up-
de qualquer um de nós nunca esteve membra do coletivo Actantes, que side Down, publicada por Grassegger
tão escancarada. E a responsabilidade milita pela comunicação livre nas re- e Krogerus na revista Motherboard,
por essa exposição também é nossa. des digitais no Brasil. Ela conta que mostra como a coleta de dados em re-
Tudo o que fazemos quando es- o jogo Pokemon Go, por exemplo, des sociais foi fundamental para ma-
tamos conectados deixa rastros: os “é uma coleta de dados coletiva, um pear os potenciais eleitores de Donald
cliques que damos, os aplicativos que mapeamento de interiores, algo que Trump e garantir o sucesso publicitá-
acessamos, quanto tempo ficamos em o Google Street View não consegue rio da campanha presidencial.
um determinado site, o preenchimen- fazer”. Basta colocar um Pikachu no A privacidade se tornou uma ilu-
to de formulários online. Se acessa- local em que se quer mapear e o usu- são no mundo digital. E enquanto
mos o site O Globo para ler notícias, ário acaba disponibilizando imagens estivermos liberando acesso a nossos
apenas para citar um exemplo, outros do lugar desejado. Com um simples dados porque os aplicativos parecem
nove sites são notificados de acordo jogo, mania mundial que durou algu- úteis, funcionais ou divertidos perde-

VOCÊ
a engenhosa websérie Do Not Track, mas semanas, a população mundial mos de vista que há riscos em deixar
Não faltam denúncias sobre a vigilância um retrato alarmante de como ope- conectada forneceu pelo celular infor- nossas vidas expostas. Informações
de cidadãos comuns por corporações e ra a privacidade e a economia digital
da rede. Entre eles, Google, Facebook
mações de seus contatos, localização,
câmera e microfone.
relacionadas à saúde, um prontuário
ou a compra de remédios, podem es-
agências governamentais. Apesar delas, e Twitter que, juntos, são capazes de O Waze, aplicativo que facilita a tar sendo usadas no cálculo de uma

ESTÁ
monitorar seu trajeto de navegação na vida dos motoristas, é, também, um apólice de seguro. “As pessoas com
estamos nos preocupando com a nossa rede. Em uma pesquisa sobre o mer- grande coletor de dados. Como cada dados mais expostos podem acabar
privacidade na rede? cado de dados pessoais feitas por Sér-
gio Amadeu, Rodolfo Avelino e Joyce
condutor está em constante deslo- sendo mais taxadas por algum tipo de
problema que se imagina que ela te-

NU
POR CAROLINA MORAES
Souza, pesquisadores da Universida-
de Federal do ABC, os 100 sites mais (Temos que) nha”, explica Francisco Cruz, diretor
do InternetLab, centro que pesquisa
acessados do País enviam microinfor-
mações de navegação (os chamados
pegar o que direito e tecnologia. “E isso não se es-
gota nas corporações. O governo tam-
cookies) de seus visitantes para outros
956 sites. E os usuários raramente
é nefasto e bém pode utilizá-los para reproduzir
tratamentos discriminatórios.”
desconfiam desse compartilhamento.
Um paralelo muito usado pelos
transformar em Cruz também alerta para a falta
de regulamentação dos dados pesso-
que militam pela privacidade ajuda
a entender o tamanho do problema:
algo positivo ais no Brasil, mesmo com a imple-
mentação do Marco Civil da Internet
os dados são como urânio. Se esse Sérgio Amadeu de 2014. “Estamos devendo aos cida-
elemento está espalhado pela natu- dãos brasileiros uma lei geral de pro-

98 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 99


CHAPÉU | CHAPÉU

FREEDOM OF THE PRESS FOUNDATION/WIKICOMMONS


teção de dados pessoais da Internet das Coi-
para o setor privado sas, um movimen-
e para o setor públi- to tecnológico que
co”, diz. O juiz Sergio pretende conectar
Moro, chefe da opera- os objetos usados
ção Lava Jato, ordenou no dia a dia à inter-
a condução coercitiva net, cada vez mais
do blogueiro Eduardo dispositivos captam
Guimarães, em março, dados sobre nossa
a partir de duas ati- vida privada.
vidades, no mínimo, A questão é: es-
invasivas. Moro que- tamos de fato nos
brou o sigilo telefôni- importando com a
co dele e vasculhou as nossa privacidade?
postagens no Facebook Patrícia Cornils,
de Guimarães, um co- também integrante
nhecido defensor dos do Actantes, alerta
governos Lula e Dilma. que a questão não
A alegação era a de que é mais exclusiva-
o blogueiro tinha aler- mente tecnológica.
tado um assessor sobre “A gente vive nesse
uma operação da Polí- mundo em rede. E
cia Federal contra o ex- precisamos saber
-presidente. Esse é um disso para saber-
dos episódios repre- mos então como
sentativos do cenário criar proteções
brasileiro atualmente. – tanto pessoais
Snowden foi um dos que revelou programas de vigilância
Em março de 2017, quanto políticas”,
o Wikileaks divulgou afirma. As notícias
o Vault 7, um pacote SAIBA COMO SE PROTEGER parecem ser boas:
com 8.716 documentos as proteções pes-

1
Senhas Fortes
da CIA com códigos de soais são cada vez
Use senhas longas, com diferentes caracteres e as troque periodicamente. É
programação que per- mais simples. Há
importante não usar a mesma em diferentes plataformas
mitem espionar celu- uma comunidade
lares com sistema An- que desenvolve fer-

2
Buscadores alternativos
droid (do Google), iOS É possível migrar para buscadores como o DuckDuckGo, que não armazena seus ramentas mais fá-
(da Apple), Windows dados e utiliza as informações de origem Crowdsourcing, como o Wikipédia ceis para o usuário
(da Microsoft) e smart final. Não se trata
TVs da Samsung, todos mais de saber pro-

3
Navegação anônima
intensamente presen- Usar o Tor como navegador, uma rede global descentralizada, garante que quem fundamente sobre o
tes no nosso dia-a-dia. recebe os dados enviados não consiga rastrear sua origem. Baixe em torproject.org algoritmo que está
Quatro anos antes, em por trás, mas sobre
maio de 2013, Edward o que está em jogo

4
Snowden revelou à im-
Navegação criptografada quando somos vi-
Para garantir que o navegador acesse sites sem que nossas informações sejam ser
prensa programas do lidas por qualquer um, baixe o HTTPS Everywhere, um adicional de navegador
giados e como agir.
sistema de vigilância “Temos que hackear
global construído pelos a lógica de merca-

5
Estados Unidos. O que Chats criptografados do, no sentido de
os hackers do mundo Assim como a navegação, é importante que as mensagens sejam criptografadas. inverter essa lógica.
inteiro não cansavam O TextSecure (Android) e Signal (iPhone) são exemplos de chats seguros Pegar o que é nefas-
de falar era verdade: to e transformar em
somos monitorados. *Essas dicas foram feitas a partir da conversa com membros do coletivo Actantes e do algo positivo”, diz
Com a potencialização guiaTem Boi Na Linha, disponível em temboinalinha.org
Sérgio Amadeu.

100 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 101


E N G A J A M E N TO

JOGAR
PARA
lidade de controlar jogadores virtuais. modelo em 2008 e, em 2012, ganhou zer da pessoa para transformar a
A pergunta é: por que não usar essas o Prêmio Abril de Jornalismo na cate- comunicação publicitária, ela mes-
características nas profissões? goria Uso de Redes Sociais com o jogo ma, em uma fonte de prazer para o
Mesmo ao aplicar a técnica a Filosofighter. O intuito era criar um consumidor: isso é o advergame ou
diferentes áreas, as características game que demonstrasse as diferenças o ingame ad.”

APRENDER
próprias dos jogos se preservam: no pensamento de nove filósofos por Nas relações públicas, os games
deve haver regras, contexto, objeti- meio de recursos como o perfil dos também abrem novas portas. Além
vo e sistema de pontuação, explica personagens no Twitter e um teaser de motivar e agregar diversos setores
o mestre em comunicação pela Fa- explicativo no Youtube. de uma empresa, são mais uma ferra-
culdade Cásper Líbero Luiz Augus- O professor da Cásper Líbero menta para relacionar e interagir com
to Barna. Assim, as tarefas não es- Marcelo Santos, estudioso do tema, o público, ajudando na formação de
A gamificação chega à área de comunicação Brincar é coisa antiga. No século tabelecem apenas uma meta e uma afirma que a aceitação de modelos imagens e reputação. De acordo com
4 a.C., Platão já apontava a impor- recompensa, mas se tornam um de- gamificados ainda é um problema Barna, uma empresa que investe em
e ressignifica processos desgastados ao tância das atividades lúdicas para o safio e uma atividade mais engaja- para a mídia tradicional: “Pelo gran- uma comunicação gamificada e lú-
transformá-los em atividades lúdicas desenvolvimento da personalidade
e do aprendizado. Jogar bola, pega-
dora e eficiente. “Trabalhar com essa
motivação intrínseca do ser humano
de risco que sempre se viu de apro-
ximar jornalismo do entretenimento,
dica “reforça sua cultura interna de
uma maneira muito mais prazerosa e
-pega, pular corda, rodar peão, brin- permite que as pessoas tenham mais demorou muito para se permitir essa eficiente”. A produção de audiovisual
POR BEATRIZ FIALHO
car de bonecas, as brincadeiras de liberdade para testar novas pers- gamificação do conteúdo noticioso”. também se apropria dos jogos e ex-
rua sempre despertaram a imagina- pectivas e encontrem soluções mais Outra ferramenta de gamificação plora o seu potencial interativo como
ção. Hoje, certo ou errado, os jogos criativas, de uma maneira mais pra- muito aplicada ao jornalismo são uma forma de construir novas narra-
eletrônicos ocupam esse espaço des- zerosa”, diz Barna. os quizzes e as palavras cruzadas. tivas. O próprio modelo de realidade
de os primeiros anos de vida de uma O potencial dos games em atrair a Embora não sejam inovadoras e tão virtual abre um horizonte de novas
criança. Em um mundo que exige atenção e direcioná-la já foi captado pouco narrativas digitais, as opções possibilidades fortemente atreladas
cada vez mais soluções criativas, o lú- por sistemas educacionais e escolas. se mostram efetivas. aos jogos. Certeiras ou não, o impor-
dico está em alta. E os games podem Agora é a vez de empresas em fases As agências de publicidade já in- tante é arriscar e entrar no jogo.
ser a ponte entre a criatividade natu- de treinamento e recrutamento pas- vestem em jogos há pelo menos três
ral dos pequenos e a necessidade de sarem pelo mesmo processo. A Opus- décadas. Ainda em 1983, a Atari,
resolver os problemas da vida adulta. phere, empresa brasileira de gamifica- empresa de jogos, desenvolveu uma
Há um nome para essa tendência: ção, fez uma pesquisa pelo termo em releitura de Space Invaders a pedido
gamificação, do inglês gamification. perfis do Linkedin em 2015 e elencou da Coca-Cola em que os alvos eram
Vendida como a promessa de ser a as dez companhias que mais aparece- substituídos pelo logo da Pepsi como
última Coca-Cola do deserto, a gami- ram nesses perfis. Entre elas, estão as forma de reforçar a cultura da empre-
ficação consiste em usar a lógica de gigantes Totus, Itaú e Samsung. sa entre os funcionários.
jogos, eletrônicos ou analógicos para A área da comunicação também A alocação de conteúdo publi-
resolver problemas. Um jogo de car- está nesse jogo. O newsgame é um citário dentro do contexto do game
tas em duplas demanda cooperação. formato em expansão que consiste em também é uma técnica comum, que
O xadrez exige concentração e pen- transformar grandes reportagens em ganhou repercussão com os banners
samento alargado. Uma partida de jogos nos quais o leitor-jogador dire- da campanha do ex-presidente ame-
futebol, basquete ou vôlei é lazer, mas ciona a própria leitura, e por sua vez ricano Barack Obama, posicionado
também competição. Os games enga- obtém informações em uma ordem no jogo de futebol americano Mad-
jam as pessoas e as motivam. No Fifa personalizada. A Revista Superin- den 13. Segundo Santos, o modelo
17, qualquer um pode fazer um gol de teressante, uma das pioneiras nesse funciona bem. “Para comunicar, a
bicicleta, mas desde que tenha a habi- subgênero, começou a adotar esse marca deixa de interromper o pra-

102 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 103


SEM FRONTEIRAS

TEIRAS

DA DA VI
M FRON

MOMENTOS
MÍLIA SE

SHARE
DIVERSIDADE

ND
/MELHORES
AÇÃO/F

AVEL A
DIVULG

R
AÇÃO/T
LGAÇ ÃO

DIVULG
DIVU

EIRAS
MÍLIA SEM FRONT
DIVULGAÇÃO
/TRAVEL AN
D SHARE

DIVULGAÇÃO/FA
DIVULGAÇÃO/MELHORE
S MOMENTOS DA VIDA

NÔMADES DIGITAIS A independência e autonomia exigem competências na área


Em um mundo conectado, trabalhar e viajar ao mesmo de comunicação e capacidade de lidar com diferentes idiomas
e culturas sem a rigidez de um trabalho fixo
tempo já é uma possibilidade do mercado de trabalho
POR MARIANE ROSSI

Os destinos de uma parisiense e A francesa Allyson Natier, de 25 sal era poder explorar o mundo. Mas hora do parto, foram para Paris, onde um segundo bebê. Noam nasceu em balhando em casa ou em qualquer lu-
de um carioca se cruzaram na inter- anos, e o brasileiro Bruno Pinheiro, de era preciso ter alguma fonte de renda. Ella nasceu. Após algumas semanas, 2016, também em Paris. A família gar do mundo. “Elas têm seu negócio
net. E ganharam a estrada. Em uma 34, se conheceram três anos atrás no Decidiram apostar nos conhecimen- prosseguiram a viagem e seguiram aumentou, mas isso não foi motivo pequeno e não conseguem resultado.
conexão que une amor e trabalho, Couchsurfing, um site de acomodação tos do brasileiro sobre marketing para Espanha, Noruega, Turquia e para abandonar a estrada. Desta vez, Ensino tudo com base em três tipos
eles carregam na bagagem apenas o grátis na casa de moradores locais. digital. Depois de atuar na Europa e Marrocos. Ella completava oito me- o destino foi o Brasil, para tratar de de liberdade, de tempo, financeira e
desejo de conhecer o mundo. Se no Num certo dia, Pinheiro recebe uma percorrer 23 países, Pinheiro decidiu ses de vida, quando o trio iniciou uma negócios. Nascia o projeto ‘Família geográfica”, explica ele, que lançou o
passado, ser mochileiro era a única mensagem inusitada. “Ela tinha vindo trabalhar como consultor, selecionan- viagem pela Ásia. Sem Fronteiras’. livro Empreenda Sem Fronteiras.
opção, hoje, ele é um nômade digital. para o Brasil e queria continuar falan- do poucos clientes. “A limitação está na cabeça dos O mundo online trouxe ao cario- Allyson cuida de Noam e Ella, e
Graças à tecnologia e à rede mundial do português. Namoramos online por Durante os preparativos para a pais. Você consegue aproveitar da ca uma família e uma carreira de su- também escreve para o site deles, o
de computadores, trabalhar, ganhar uns seis meses”, relembra. Primeiro, grande viagem, Allyson engravidou. mesma forma. As crianças se adap- cesso como consultor. Ele abriu uma ‘Família Sem Fronteiras’. O objetivo
dinheiro e ter experiências fantásticas ele foi para França, conhecê-la pesso- Mas os planos não mudaram. Em tam onde elas estiverem”, diz Pi- empresa de treinamento de negócios do blog é pagar os custos de trans-
explorando o planeta virou um novo almente. Depois, ela veio para o Rio. 2014, o casal iniciou uma viagem pela nheiro. Durante essa viagem, Ally- online para ensinar as pessoas a ga- porte e alimentação, já que vivem
modelo de negócio e de vida. Um dos sonhos traçados pelo ca- América do Sul. Quando chegou a son descobriu que estava esperando nharem dinheiro com a internet, tra- de hotel em hotel. “A gente faz uma

104 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 105


viagem com conforto, hoje não tenho nio para um canal do Youtube sobre estímulo para continuar. “Por mais ganhava mais de US$ 100 por dia cada Para “sentirem-se em casa”, eles ticos e ir ao encontro do desconheci-
problema com dinheiro. Ficamos nos a expedição. Sem sucesso, apostaram impressionante que seja um lugar, um vendendo cerveja”, diz Barbara. viajam dois meses e depois vão para do. “Viajar é uma lição de humildade.
melhores hotéis do mundo”, diz ele. na produção de conteúdo para empre- seus olhos já não vêem aquilo. Mas Nos hotéis onde tinham hospe- Chiang Mai, a segunda maior cidade Você tem que aprender várias formas
A próxima aventura será morar em sas. Eles fecharam negócio com mar- quando você tem o seu trabalho rela- dagem de graça, faziam vídeos em na Tailândia. Lá, montam uma espé- de se expressar, entender a cultura, é
um barco por três meses e passear cas como Cachaça 51, Nissan e Rider cionado a isso, te motiva a olhar ângu- forma de agradecimento. Como o cie de base para relaxar e reorganizar preciso ser mais humilde, tolerante
pelo Caribe. Até agora, o casal soma para produzir fotos e vídeos para as los diferentes”, diz ela. trabalho deu resultados, resolveram a rotina. Eles alugam um apartamen- e faz questionar várias coisas que se
35 países percorridos. redes sociais das companhias. A mineira afirma que é preciso cobrar por esse tipo de promoção e to barato, frequentam uma academia acredita”, diz ela.
Muitos consideravam o casal es- No início de 2015, iniciaram a via- tempo para criar e planejar, investir abriram uma empresa de vídeos iti- e têm uma alimentação saudável. Na Eles não querem mais mudar de
quisito, mas outros começaram a per- gem com uma lista de desejos, algumas em cursos, equipamentos, ter de R$ nerante. “Fomos evoluindo, melho- viagem a Nova Zelândia, a jornalista vida, acreditam que não conseguiriam
ceber que é possível trabalhar, viajar e peças de roupas e uma energia de sobra 10 mil a R$ 20 mil para emergências rando a técnica, comprando equipa- ganhou dez quilos morando em ho- voltar a trabalhar em horário comer-
educar os filhos ao mesmo tempo, rela- para desvendar o mundo. Na América, e uma dose de paciência para enfren- mentos. Nosso nicho são hotéis bou- téis. Depois da pausa, seguem para cial. Ser dono do próprio tempo, para
ta Alysson, que levava uma vida boa na dormiram em barracas, no carro deles tar as dificuldades. “As empresas hoje tique”, conta Vagner. outro destino. Aprenderam que não eles, virou uma razão de viver. “Tenho
França. Com apenas 2 anos, a pequena apelidado de ‘Gallega’ e na casa de es- estão apostando em coisas muito mais Uma emissora brasileira se inte- são viajantes, vivem na estrada. um arrependimento muito grande de
Ella fala português e francês. “Eu digo tranhos, que conheciam também por orgânicas, feitas por alguém, mais do ressou pela série reportagens sobre O casal tem um estilo de vida mi- não ter feito isso antes. Comecei a viajar
que é a melhor vida que poderíamos meio do couchsurfing. “Nosso objetivo que algo superproduzido por agên- a Nova Zelândia e a história deles nimalista. Adquiriram medo de avião, depois de 42 anos. Amo demais fazer o
ter. Meus filhos são muito mais aber- era trocar experiências com a pessoa cias. Tem espaço para todo mundo”, foi parar na TV. A segunda tempo- depois de turbulências. Desapegaram que faço. Filmar série, fazer os vídeos.
tos ao mundo do que crianças que só que nos recebia e foi muito legal isso, diz Rômulo. O próximo destino do rada está sendo gravada na Ásia e de vaidades. Cruzaram países, foram a Se você quer fazer isso, pare de tomar
conhecem os amigos da escolinha. Ella muito mais do que ter a hospedagem casal deve ser a África, depois a Ásia contará com 14 países. Depois, o capitais e chegaram em tribos e luga- cerveja, comprar roupa, gastar grana e
já visitou mais de 20 países, não tem grátis. Só tínhamos uma barraca, fica- e a Oceania. Os planos podem mudar destino será a Austrália ou Estados res quase intocados. Conheceram re- fica um ano juntando. Esse é o melhor
problema de socialização, consegue va difícil dormir todos os dias e tomar sempre, a cada dia. Unidos, onde devem rodar mais ligiões, gente e cultura. Aprenderam conselho. Um bom planejamento e cair
compartilhar e está acostumada com banho”, conta Mirella. Depois, parti- A jornalista gaúcha Barbara Ro- uma parte da série. que o incrível é sair dos roteiros turís- no mundo”, aconselhou Alcantelado.
as línguas”, comenta. ram para a Europa. A Gallega ganhou cha, 32 anos, sentia-se presa dentro
Para a psicóloga e consultora um campeer, uma espécie de ‘casinha’ do escritório sem janelas no Rio de
Adriana Gomes, que trabalha há mais acoplada na picape, onde há uma Janeiro. Com o carioca Vagner Al-
de 20 anos com orientação de carrei- cama, uma mini-sala e cozinha. cantelado, de 48, criou o projeto
ras, o nomadismo digital chegou re- Melhores Momentos da Vida e os
centemente no Brasil, mas já acontece Em meio a uma paisagem e ou- dois embarcaram para a Nova Ze-

SHARE
em nível global. Traduz um momento tra, eles entram em contato com as lândia. O casal começou a aventura,

L AND
de transformação no mercado de tra- empresas via Linkedin, mandam pro- encontrando culturas, pessoas e indo
balho com mais autonomia e inde- postas e fazem reuniões por Skype. a lugares desconhecidos da Oceania.

/TRAVE
pendência. Para a profissional, não Nunca precisaram se encontrar pes- Fizeram parcerias com empresas de
é uma solução que sirva para todos. soalmente com um cliente para fechar turismo, albergues, hotéis e pousa-

AÇÃO
“Tem que ter competências não só na um negócio. “O pagamento da viagem das. Eles ofereciam exposição no site, Buscando fugir de escritórios,

DIVULG
área de comunicação, mas de outros desde o dia 1 foi produção de conteúdo, nas redes sociais e em uma websérie Bárbara e Vagner foram para
a Nova Zelândia e os próximos
idiomas e capacidade de lidar com as nunca tiramos das nossas economias”, em troca de algumas noites no lugar.
destinos do casal incluem a
culturas. Tem que ter softskills, que explica a jovem. O canal no Youtube Em um ano e sete meses, não paga- Austrália e os Estados Unidos
são competências de relacionamen- recebe atualizações diárias. O foco é a ram nenhuma acomodação na Nova
to, parte social e psicológica para dar rotina, as dificuldades, as pessoas e as Zelândia. “É um país incrível para
conta de tudo isso”, explica. belezas que encontram no caminho. fazer parcerias. As pessoas gostavam
Funcionários de multinacionais, Com milhares de seguidores, as redes da história que a gente estava con-
Rômulo Wolff e Mirella Rabelo resol- sociais do Travel and Share passaram a tando porque era uma ideia de viver
veram largar a vida em São Paulo para ser um local de desejo das marcas por de uma forma mais livre com menos
explorar os continentes. Eles já acumu- conta da audiência do canal. estresse, menos capitalismo, mais
lavam experiências de terem morado Segundo Rômulo, cerca de 80% saudável”, conta ela.
em outros países. Mas o que os uniu foi do dia é destinado à produção de con- Mas as parcerias não seriam sufi-
o aplicativo de relacionamentos Tinder. teúdo. “A gente chega em uma praia, cientes para cobrir as despesas. O jeito
A mineira de Poços de Caldas instalou tem que saber o que vai gravar, pegar foi trabalhar em outros ramos, o que le-
o programa e encontrou o rosto do as imagens, contar a história, voltar vou o casal a viver momentos surpreen- Rômulo e Mirella já viajam juntos pelo
mundo há mais de dois anos
gaúcho. Ele tinha voltado para o Brasil para o carro para editar o vídeo para dentes. “Ficamos três meses colhendo
após nove anos na Europa. O bate-papo subir no dia seguinte. Não tem aqui- flores em Tauranga, que foi uma expe-
virtual virou namoro, uniu sonhos e de- lo de sentar na praia e ficar três horas riência muito legal. Trabalhos como ge-
pois o projeto Travel and Share. vendo a água”, explica. Mirella não rentes de um albergue e vendemos ce-
O casal mandou e-mails para mais nega que estar o tempo em viagem reja no Natal. Foi maneiríssimo. Uma
de 150 empresas para pedir patrocí- cansa, mas o trabalho acaba sendo o grana forte para seguir viagem. A gente
DIVUL
GAÇÃ
O/MEL
HORES
MOME
NTOS
DA VID
106 A
maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 107
P L A N E J A M E N TO V I S UA L

“Chamá-lo de
PENSAR
momentaneamente, mas essa medida pautar em três valores principais: em-
emergencial não funcionaria no longo patia, colaboração e experimentação.
prazo. Para resolver de maneira mais
humana e visando erradicar de vez a
A empatia é saber se colocar no
lugar do próximo. “Desconstruir cren-
uma ferramenta
subnutrição, implementaram-se aulas ças e valores para conseguir se conec-
é diminuir o

PARA INOVAR
de culinária em uma aldeia para en- tar e ter a sensibilidade para entender
sinar as famílias a aproveitarem me-
lhor os nutrientes em suas refeições.
o que o outro espera”, explica Mario
Rosa, gerente de Negócios da Escola
seu potencial
Os resultados foram significativos: a
subnutrição infantil caiu de 65% para
de Design Thinking Echos. Na cola-
boração, é importante agregar novas
transformador
20%. A essência para a solução foi se mentes no processo e estimular o pen- Mario Rosa
Design thinking chega como uma
abordagem inovadora e focada nas
pessoas para solucionar problemas
POR BEATRIZ FIALHO

A expressão design thinking pode ser en-


ganadora e levar à interpretação equivocada
de que o termo se aproxima de um planeja-
mento visual. O equívoco é justificável: em
português, o termo design é aplicado como um
sinônimo de desenho, quando na verdade o
mais coerente é relacioná-lo ao verbo projetar.
Embora também se utilize de recursos visuais,
o design thinking (DT) busca maneiras criati- entendimento observação ponto de vista ideação prototipagem teste iteração
vas e inovadoras de solucionar problemas.
Um exemplo prático de como o DT pode
ser aplicado a diversas áreas foi publicado em
formato de infográfico na página do Sebrae.
Para solucionar um problema sério no Vietnã,
onde 65% das crianças sofriam de subnutrição, Terminadas
utilizou-se essa abordagem. A primeira etapa as discussões
foi entender as famílias com filhos subnutridos Quando tudo
e buscar casos de exceção em que as crianças e pesquisas, é está definido,
eram saudáveis, num processo de imersão e Dados levantados: A fase final do
necessário debater parte-se para
convivência. Com os resultados, veio a análise. Na primeira fase, a de Na fase da O teste é uma processo pode
é hora de observar. para estabelecer
Foi possível perceber que que as famílias nutri- a ideação, fase prototipação as
entendimento, deve-se Aqui, é importante extensão do não ser a última:
das consumiam camarões e pequenos crustáce- o desafio para da criação e do
os, criados em seus arrozais como um produto buscar a imersão no ideias são levadas protótipo: é o a iteração é a
trocar experiências, já construir um ponto
secundário. E as famílias bem alimentadas fa- brainstorm a um nível mais
problema em questão: que essa abordagem momento de colocar oportunidade de
ziam diversas pequenas refeições ao longo do de vista
levantar hipóteses, prático: cria-se o plano em prática receber o feedback e
dia, em vez de duas grandes refeições. coloca o fator humano
Diagnosticado o problema, foi necessário procurar dados e um modelo e e para observar os aprimorar a solução
em primeiro lugar
pensar em uma solução com foco nas pesso- encenam-se as
desapegar de todos os pontos bem sucedidos criada
as. Se não fosse pautado em DT, uma solução
rápida seria doar comidas nutritivas às famí- pré-conceitos possibilidades e os que precisam ser
lias subnutridas, o que resolveria o problema melhorados

REFERÊNCIA DO GRÁFICO: MINI TOOL KIT DE DESIGN THINKING - ESCOLA ECHOS DE DESIGN THINKING

108 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 109


UM OLHAR DIFERENTE
A CADA REPORTAGEM.
Produzido, editado e apresentado por alunos de
samento coletivo. Cada vez mais o trabalho
colaborativo tem dado certo nas organizações.
Jornalismo e RTVI da Faculdade Cásper Líbero, o programa
Já a experimentação é tentativa (e erro tam- Edição Extra explora as novidades e bastidores do mundo da comunicação.
bém). Priscila Gonsales, diretora-executiva
do Instituto Educadigital e ex-casperiana, co-
menta que resolver um problema leva tempo e
é necessário testar muitas saídas. “Não pode-
mos achar que vai surgir uma fórmula mági-
ca, uma metodologia que acabe com todos os
problemas”, diz. Esse processo de construção
do pensamento é longo e, diferente da abor-
dagem tradicional, entende o erro como uma
possibilidade de aprendizado completamente
necessária.
Mas, então, o DT, é uma metodologia ou
um instrumento? Nenhum dos dois. “Chamá-
-lo de uma ferramenta é diminuir o seu po-
© ECOS / JULIA MORE

tencial transformador”, comenta Rosa. O in-


tuito de qualquer tipo de design, acrescenta
Priscila, é “desenvolver um produto, ou pen-
sar um serviço, projetar algo para o público
de forma que seja, de fato, algo que melhore
Mario Rosa é gerente de Negócios da Escola de Design
Thinking Echos a vida daquelas pessoas”. O DT, então, é uma
abordagem, uma maneira diferente de enxer-
gar um desafio e superá-lo.
Na comunicação, o design thinking já
vem sendo empregado com sucesso. Como
em toda interação humana, é necessário que
exista empatia para que a relação de troca seja
sincera e verdadeira.
Para Rosa, “precisamos começar a usar a
comunicação de uma forma mais inteligente
para criar um espaço de troca e de geração de
conteúdos mais relevantes para o mundo”.
Outro aproveitamento dessa abordagem é
para repensar paradigmas. Se uma profissão
está em crise, o ideal é que se pense a solução
sob uma ótica humana e não mercadológica.
“Os grandes parâmetros das organizações
hoje é o que é tecnicamente possível e finan-
ceiramente viável e isso não está necessaria-
mente de acordo com as pessoas”. Na prática,
Priscila Gonsales explica que “a colaboração,
tão em alta no jornalismo e na comunicação
em geral, é um princípio do design que pode
BEATRIZ FIALHO

abrir portas para novas possibilidades e mo-

EDICAO
delos de profissão”. -

-
Priscila Gonsales é diretora-executiva do
Instituto Educadigital
EXTRA
110
Todo primeiro domingo do mês
maio • junho • julho • agosto 2017
às 23h30, na TV Gazeta
CINEMA

O audiovisual cresce 8% ao ano lado, há também no país uma baixa


desde 2007. Não valeria continuar memória dos processos e isso faz com

O GESTOR DA
já que vivemos um momento tão que as pessoas não percebam o que é
bom para o setor? a longa trajetória de construção das
Tive a possibilidade e a felicida- instituições. Políticas públicas são
de de contribuir à frente da Ancine, resultado de conflito, múltiplas von-
contei com a confiança do presidente tades e interesses que se chocam coti-

7ª ARTE
Lula que me indicou para diretor e dianamente e que também encontram
depois me fez presidente da Ancine. O PNE um caminho de serem equacionadas e
Meu mandato chega ao fim, desem- estabelece processadas. É isso que nos fez cons-
metas que
penhei as minhas tarefas dentro dos truir o Plano de Diretrizes e Metas,
garantam a
limites que foram postos e dentro do continuidade aprovado em 2012 por unanimida-
que foi a minha capacidade. Sou grato do crescimento de no Conselho Superior do Cinema,
Em entrevista exclusiva, o presidente da Agência Nacional do Cinema, aos representantes do setor e a todos os do setor até
2020, como
que tinha representantes de todos os
seus agentes econômicos pela contri- setores da atividade. É um plano para
Manoel Rangel, fala do fim de sua gestão que durou uma década buição que deram. É hora de uma re-
a expansão
do mercado dez anos e que constitui uma espécie
novação que permita que outros dêem exibidor de pacto entre o conjunto dos agen-
POR GUILHERME GUERRA continuidade à frente da Ancine, dando tes econômicos do setor audiovisual
conta dos desafios que se apresentarem. na perspectiva de fazer do Brasil um
Em 2007, Manoel Rangel assumia o cargo de presi- sidente da agência e comemorou os vistosos resultados, grande centro produtor e progra-
dente da Agência Nacional de Cinema (Ancine). Cineasta como a de ter feito o número de salas saltar de 1.635 para Houve uma manifestação, em Ber- mador de conteúdos audiovisuais,
mais conhecido pela sua atuação política do que pela pro- 3.005 nos últimos 10 anos de mandato, que termina em lim, de cineastas preocupados com tornando-se uma das cinco maiores
dução artística, Rangel fora convidado por Gilberto Gil, maio de 2017. o futuro da Ancine, que foi criada A Lei do economias de audiovisual do mundo.
então ministro da Cultura, para revolucionar o setor au- Crente de que a consolidação do setor audiovisual só após uma manifestação dos cineas- Audiovisual,
anterior à
diovisual no País. Àquela altura, a produção, distribuição será possível por meio da criação de políticas públicas, tas nos anos 2000. Como analisa E qual foi a política pública decisi-
criação da
e exibição de filmes injetavam R$ 8,7 bilhões ao Produto Rangel vê a regulamentação do serviço de vídeo por de- essa situação? Ancine e que va para que o setor avançasse nesse
Interno Bruto (PIB). Em 2014, apesar da generalizada manda (ou VOD, do inglês), como Netflix e HBO GO, A Ancine foi criada dentro de um retomou a período?
desaceleração da economia, essa cifra saltou para R$ 24,5 como o mais recente e maior desafio a ser enfrentado. A esforço geral do governo e da socieda- capacidade Um dos momentos de grande sal-
do Brasil de
bilhões. Representou um avanço de mais de 8% ao ano, Ancine deve fomentar ainda a produção de jogos eletrôni- de, que acreditaram na importância to foi a criação do Fundo Setorial do
produzir filmes
muito superior ao crescimento anual de outros setores. Se cos, área em que o Brasil hospeda “milhões de jogadores”, de o Brasil voltar a ter uma política Audiovisual, porque ele recuperou a
em 2002 o Brasil lançou 29 filmes nacionais, no ano pas- mas tem muito poucos realizadores. Afinal, se há tantos nacional do cinema e audiovisual. O capacidade de investimento do Esta-
sado esse número saltou para 143. consumidores, por que não incentivar a produção? pessoal do meio audiovisual liderou do no desenvolvimento da política au-
Não há milagre, naquela época toda uma movimenta- diovisual. Nós fizemos com que esse
mas uma década de ção que ajudou a ampliar a consciên- fundo fosse constituído de tal forma
ELZA FIÚZA/AGÊNCIA BRASIL

trabalho capitaneado cia dessa necessidade. A Lei 8.685, a que desenhássemos uma estratégia
por Manoel Rangel e Lei 11.437 e a Lei 12.485 são fruto de multifocal de todos os segmentos,
sua equipe, reconhe- uma consciência da importância de apostando na parceria entre produ-
cem até alguns de seus que o Brasil ocupe um espaço através ção independente e a televisão brasi-
antigos detratores, Criou o Fundo dos filmes e obras seriadas brasileiras. O Lei da TV leira, entre distribuição e produção.
como Cacá Diegues Setorial do Acredito na existência dessas bases Paga, criou as O segundo grande salto é aprovação
Audiovisual obrigações de
(“é verdade que graças sólidas, aprovadas pelo parlamento da Lei da TV Paga. Ela representou
e ampliou a carregamento
ao sistema criado pela capacidade brasileiro envolvendo todo o arco po- de conteúdo a geração de uma enorme demanda
Ancine, alcançamos regulatória da lítico representado pela sociedade. brasileiro e de filmes e obras seriadas brasileiras.
um número inédito Ancine amplicou a A lei permitiu também que o Fundo
capacidade de
de lançamentos, 143 Existe alguma possibilidade de Setorial do Audiovisual ganhasse a
ação do Fundo
filmes”, afirmou para desmonte dessas bases que hoje Setorial do robustez necessária para fazer política
O Globo). Em entre- sustentam a Ancine? Audiovisual pública em escala de Brasil. Há outros,
vista exclusiva à revis- O Brasil tem uma baixa tradição como o Cinema Perto de Você, um pro-
ta CÁSPER, realizada em construir instituições sólidas. A grama que alavancou a expansão do
em março, ele fez um Ancine vem sendo construída ao lon- parque exibidor ao longo dos últimos
balanço das três ges- go de 15 anos e já se revelou em seu anos. Isso permitiu que as empresas
tões como diretor-pre- pleno potencial. Há um corpo técnico brasileiras seguissem competindo nes-
Com Manoel Rangel, setor audiovisual cresceu mais de 8% ao ano se mercado de fortes nomes nacionais.
muito capaz e profissional. Por outro

112 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 113


Um dos feitos da Ancine foi ter Uma discussão que a própria An- produtor, um distribuidor ou um exi- val de Roterdã, 12 filmes em Berlim
descentralizado a produção entre cine levantou foi a do video on de- bidor de filmes. O Estado regula essa e em Sundance, os três festivais mais
o eixo Rio-São Paulo, e hoje se vê mand (VOD). Essa é uma obriga- atividade e estimula a produção, a dis- importantes do primeiro trimestre
produções de norte a sul no País. O ção da Ancine? tribuição, a exibição, a parceria entre Até abril deste do ano. Minha Mãe é uma Peça 2 fez
quanto isso representa um proje- O grande desafio que está sobre a produção independente e televisão. A ano, Minha Mãe mais de 9 milhões de ingressos e con-
O Video Home É uma Peça 2
to novo de Brasil, em que todos os System (VHS) mesa é a construção do marco regula- maior prova disso é a quantidade de tinua havendo um forte desempenho.
arrecadou mais
rostos aparecem nas telas? revolucionou tório do vídeo por demanda. É a nova produtores, diretores com as mais di- de 73 milhões de Pendular levou prêmio da crítica no
a indústria fronteira da expansão dos serviços versas visões que estão realizando fil- reais durante as Festival de Berlim, Como Nossos Pais
O Brasil é um país continental,
televisiva e 15 semanas em
plural e diversificado. Fazer com que cinematográfica audiovisuais. Representa o que a tele- mes e séries de televisão com o apoio já vendeu para diversos países mun-
que ficou em
essa cultura tenha a possibilidade de ao permitir visão era nos anos 1940 e 1950, o que do Estado brasileiro e tendo suas do afora, No Intenso Agora, de João
cartaz, tornan-
se manifestar em sua plenitude é o que as pessoas o VHS representou no final dos anos obras circulando amplamente. do-se o sucesso Moreira Salles, estava em Berlim e foi
grande desafio do poder público fe- assistissem 1970, o que a TV paga representou do ano considerado pela Variety um dos dez
a materiais
deral, estadual e local. Nosso esforço audiovisuais em no início dos anos 1980. O vídeo por Os próprios cineastas reclamam da melhores filmes exibidos no Festival.
sempre foi nacionalizar a política de suas casas demanda representa este momento. A burocratização exigida pela Anci- Nós tivemos um filme brasileiro com-
cinema e audiovisual. Sim, valorizar o Europa já regulou, há políticas regu- ne. O que pode ser feito para facili- petindo pela primeira vez ao César de
Rio e São Paulo como pólos de produ- latórias no Canadá e em outros países. tar a burocracia? Melhor Filme Estrangeiro, Aquarius.
ção, mas também fazer com que todos O Brasil já tem um setor econômico de Há duas questões. Há uma cultu- É um ano excepcional e fico feliz que o
os outros estados possam desenvolver vídeo por demanda robusto o suficien- ra burocrática no Brasil e nos países resultado se apresente. Esse resultado
seu potencial, produzir e ocupar o te para lidar com um marco regulató- da América Latina em todas as ati- positivo é a expressão de uma política
espaço. As 27 unidades da federação rio, que se torna necessário para asse- vidades econômicas e reguladas pelo robusta que apostou na pluralidade,
têm tido presença na produção do ci- gurar segurança jurídica para os pres- Estado. Há um enfrentamento a isso na diversidade, na nacionalização e
nema e audiovisual. Temos uma linha tadores de serviços, qualidade para os feito sistematicamente pelo governo quebrou qualquer estrutura de privi-
de arranjos regionais em que fazemos usuários e afinamento com a política brasileiro. A Ancine faz esse movi- légios que permitiu que todo aquele
investimentos combinados com os nacional de cinema e audiovisual. mento sistematicamente. Nós fizemos que queira empreender conte com o
O projeto Ancine estímulo para que o Brasil tenha uma
governos de estados e as prefeituras. O segundo grande desafio é cons- 2 anos atrás o Ancine + Simples, que
+ Simples es-
Todos os estados já foram nossos par- truir uma política de desenvolvimento tabelece uma fez um profundo enxugamento das forte economia audiovisual.
ceiros, seja através do governo estadu- do mercado de jogos eletrônicos bra- prestação de normas e das operações da agência.
al ou municipal. sileiros. O Brasil é um grande jogador. contas periódica, Por outro lado, há um impasse. Aqui Pretende continuar na gestão de po-
formulário de líticas públicas depois da Ancine?
Aqui, estão concentrados milhões de se lida com recursos públicos. É pre-
acompanha-
Na Ancine, existe uma preocu- jogadores fazendo do país um dos mento de projeto ciso respeito e cuidado. Há toda uma Manoel Rangel Sou formado em cinema e audio-
pação em esperar algum retorno maiores mercados do mundo. Temos e simplificação legislação da Constituição Brasileira é diretor de visual. A experiência na gestão pú-
Em 2014, o
financeiro de todas as suas produ- muitos talentos no desenvolvimento do acompanha- que rege a aplicação de recursos pú- três curtas- blica me fascinou. Vou completar 14
orçamento do
mento com o metrangens e um anos no governo federal, dois anos e
ções? Fundo Setorial de jogos e poucos jogos eletrônicos blicos em qualquer atividade. Desde
Fundo Setorial documentário,
O Fundo Setorial do Audiovisual do Audiovisual brasileiros ocupando esse mercado. 2015, temos um calendário bianual de meio no Ministério da Cultura e 12 na
do Audiovisual feitos entre 1999 e
(FSA) chegou Precisamos canalizar esforços para financiamento em que informamos as Ancine. É uma experiência gratifican-
investe nos filmes e nas séries. Como 2003. Além disso,
a pouco mais
investidor, ele é sócio na exploração que tenhamos mais jogos e empresas datas de lançamento dos editais, das é membro do te. Acredito no Brasil, acredito nessa
de 1 bilhão de
Comitê Central ao civilização tropical e nova que Darcy
econômica dessas obras e, se elas reais, divididos brasileiras ocupando espaço. entregas de resultado e outros prazos
PCdoB
obtém resultado econômico, o Fun- pelo programa que ali estão citados. Temos uma Carta Ribeiro descreve. Acredito que me de-
Brasil de Todas Uma das críticas feitas é a estatiza- de Serviços que fixa os prazos que de- dicar às políticas públicas é uma bela
do Setorial obtém retorno. Se essas
as Telas
obras não obtêm resultado econômi- ção da produção. Há um aparelha- vem ser observados em cada processo. forma de contribuir para que o País
co, o fundo segue em frente e esses mento da produção da Ancine ou E procuramos cumpri-los com rigor. ocupe seu lugar no mundo e para que
produtores também. É assim porque prefere rebater essas críticas? os brasileiros ocupem seu lugar no
o mercado de cinema e audiovisual Não consigo entender esse concei- 2017 começou como um ótimo ano Brasil. Quando digo isso, refiro-me ao
no mundo disputa espaço com um to de estatização da produção porque para o nosso cinema. Recorde de direito de que 200 milhões de brasi-
produto hegemônico, com empresas quem diz isso não sabe o que é uma bilheteria, com Minha Mãe é uma leiros tenham boa condição de vida,
multinacionais que controlam a es- produção estatal ou não sabe o que é Peça 2 e mais doze filmes em Ber- acesso à educação, à saúde, a condi-
trutura de distribuição mundial de uma produção privada. No Brasil, o lim. É uma boa despedida? ções adequadas de infraestrutura, a
obras e séries audiovisuais. Enfren- Estado não produz filmes e séries. E Começamos o ano de maneira serviços e bens culturais. Sim, pre-
tar esse ambiente oligopolizado exi- não atua economicamente. Muito di- extraordinária e espero que não seja tendo continuar a me dedicar, mes-
ge que os estados nacionais tenham ferente dos anos 1970 e 1980, quando uma despedida, mas que isso se re- mo que seja exclusivamente como um
mecanismos de apoio, sustentação e o Brasil tinha uma empresa que se pita sistematicamente nos festivais e cidadão atento, dedicado e voluntário
estímulo aos seus produtores para a dedicava a produzir e distribuir fil- nas salas de cinema. Foi um janeiro para reflexão e ação no sentido de que
produção do conteúdo. mes. O país não tem no Estado um especial. Tivemos 15 filmes no festi- o Brasil possa seguir sua trajetória.

114 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 115


CHAPÉU | CHAPÉU D O C U M E N TÁ R I O

ALICE FORTES
Uma larga pulseira de miçangas Apesar de instrutor, Portella pri- sociação Filmes de Quintal. No ano
azuis e pretas, discreta sob a manga vilegia o trabalho e as escolhas dos seguinte, teve seu primeiro contato
da camisa branca, é o único elemen- próprios ameríndios. “A gente tem com alguns integrantes do Vídeo nas
to que, à primeira vista, liga aquele que saber o que querem mostrar Aldeias, que fizeram uma retrospec-
homem à cultura indígena. Sentado para eles. Os Baré, por exemplo, tiva de seus filmes no festival.
em um café no Centro Cultural São faziam cortes absurdos, algo muito Essa experiência foi o ponto de
Paulo, está apenas de passagem por sofisticado, sozinhos. Não tinham partida para seu mestrado, que rela-
sua cidade natal. Deixou-a aos 17 background para usar isso como a ta 10 anos de sua pesquisa na antro-
anos para estudar artes visuais em gente, que aprendeu numa escola. pologia visual. O trabalho, intitulado
Belo Horizonte. Cumpre ali uma Fizeram isso executando a mon- “Essa máquina não caiu do céu”, em
função intimamente relacionada à tagem que eles pensaram. Aquilo referência à câmera, metaforiza a re-
sua vida e sua carreira: Pedro Por- que o Lévi-Strauss dizia que tanto lação desigual entre homem branco
tella é um dos curadores da Aldeia o cientista como o xamã chegam ao e os ameríndios e foi defendido em
SP, uma mostra de cinema indígena. mesmo ponto através de vias dife- 2014 na UFMG. Aos 41 anos, Por-
Desenterrou a pulseira de seu rentes”, reflete. tella planeja ainda o doutorado na
baú etnográfico apenas para aquela Essa perspectiva é apenas uma Inglaterra, onde passou praticamen-
ocasião. Foi presente de uma tribo das infinitas riquezas que os amerín- te todo o ano de 2016 ministrando
Ikpeng, um dos tantos que Portella dios têm a apresentar. As tradições workshops sobre antropologia visual.
recebeu ao longo de 12 anos em orais, a roçar milenar, a medicina “A máquina é feita com os mi-
que percorreu 30 tribos indígenas tradicional, o conhecimento da ter- nerais que saem do solo, Omama, o
grande deus dos Yanomami. A má-

A IMAGEM DO ÍNDIO
quina não caiu do céu, ela já existia
O antropólogo Pedro na terra, e é como se o homem bran-
Portella ensina os povos co tivesse roubado essa substância
dos indígenas. E os indígenas toma-
indígenas a documentarem ram essa máquina de volta, toma-
ram essa voz de volta, porque o não
suas vidas indígena é como um ladrão de vozes,
POR PAULO HENRIQUE POMPERMAIER
trabalhando com cinema etnográ- ra e da floresta são alguns dos ele- um ladrão de olhares”, explica.
fico. Certa vez foi presenteado com mentos. Perpetuados na imagem, Portella já exerceu outras fun-

ROBERTO KOTIRIA
uma iguaria exótica para os bran- empoderam os índios e resgatam sua ções mais burocráticas, como con-
cos, mas um gesto sagrado para os tradição em um país que ainda não sultor da Unesco e analista do acer-
caçadores Kaxinawá: “Como chego os reconheceu. Tornam-se “registros vo do Museu do Índio, da Funai.
lá ensinando algo novo, uma nova políticos, nessa pátria ainda genoci- Nessas atividades, ficou menos de
tecnologia, eles precisam retribuir e da”, na observação de Portella. um ano, preferindo sempre suas ex-
eu ganho um miolo de anta. Fiquei Entre suas trilhas pelos passos an- periências etnográficas. Ele afirma
emocionado e comecei a perceber cestrais, já percorreu Peru, Colômbia que aprendeu mais com o índio do
como as trocas são importantes en- e Guiana Francesa organizando ofici- que com a sociedade contemporâ-
tre nós e os outros. A gente aprende nas de audiovisual. Chegou a enfren- nea. “Desde o primeiro momento
a trocar”, diz. tar resistência de alguns povos. Foi o aprendi a dormir em rede, a am-
Seu percurso no audiovisual in- caso dos Yanomani, que negaram a pliar nossos gostos, nosso paladar, a
dígena começou em 2004, quando câmera num primeiro momento, mas aprender com as histórias deles, com
integrou o projeto Vídeo nas Aldeias, aos poucos foram aceitando a im- as cosmogonias, com os mitos”, ex-
que organiza oficinas cinematográ- portância do registro imagético para plica, afirmando que foi preciso se
ficas para os povos originários. Co- educar o olhar do homem branco. desapegar de uma visão asséptica,
ordenou, em seu primeiro projeto, Antes de organizar oficinas com que não queria contato com a terra.
encontros com os Kaxinawá do Rio o Vídeo nas Aldeias, Portella já tinha “Ensinar audiovisual consiste mais
Jordão, no Acre. Com algumas câme- projetos nos quais trabalhava com em aprender do que ensinar, e é um
ras e computadores, ficavam de duas arte e vídeo nas periferias. Em 2003, privilégio. A gente deixa de acreditar
a quatro semanas ensinando os índios foi convidado para integrar a equipe que os outros têm crença e nós temos
a manusearamo equipamento: filmar, do Festival do Filme Documentário o saber. O indígena tem seu próprio
fazer foco, criar noções de continui- e Etnográfico de Belo Horizonte, o saber, sua própria ciência, que preci-
dade, descarregar em HD, editar. Forumdoc.bh, organizado pela as- sa ser respeitada.”

116 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 117


RELAÇÕES PÚBLICAS

Eram duas da madrugada de se- Para chegar à assessoria de im-


gunda-feira quando o telefone tocou. prensa da FAB, o profissional de co-
O celular iluminava o quarto. Era o municação deve ter experiência, mas a
meu chefe. Acordei rápido. Desde que mais importante habilidade é ter inte-
entrara na assessoria de imprensa não ligência emocional. A tragédia de San-
ousava dormir profundamente. Dis- ta Maria em que as aeronaves da FAB
farcei a voz de sono e atendi pronta- fizeram o transporte de feridos para os
mente. “Pois não, chefe?” Eu já sabia hospitais, em 2013, o acidente da aero-
que alguma coisa havia acontecido nave da TAM que não conseguiu pou-
e enquanto respondia ao protocolar sar em Congonhas, seis anos antes, o
“desculpe incomodar neste horário” desastre que matou Eduardo Campos,
me perguntava qual crise seria aque- em plena campanha presidencial de
la que me faria seguir de madrugada 2014, as enchentes no Espírito Santo
para o trabalho. Meu chefe me pediu em 2013, o acidente com a aeronave
rapidez e não quis falar o assunto por da equipe Chapecoense são algumas
telefone. Depois de um banho rápido, das maiores tragédias nacionais que
minha ansiedade não me deixou fazer passam pelas mãos da FAB.
todo o ritual de fardamento. Só peguei Internamente, representam mo-
o uniforme e segui para a Esplanada mentos de tensão e tema de diversas
dos Ministérios, onde fica o Centro demandas, discussões internas e no-
de Comunicação Social da Aeronáuti- tas oficiais. Naquele dia de fevereiro
ca – Cecomsaer. No local, jornalistas, de 2014, felizmente não fomos por-
relações-públicas, sargentos e aviado- ta-vozes de outra tragédia. Orienta-
res da Força Aérea Brasileira (FAB) se do a pousar em Manaus, a aeronave
revezam na prestação de informações sofreu uma abordagem de seguran-
à sociedade. Todos são militares que ça na pista e o piloto informou que
lidam com o ônus e o bônus da carrei- acionou o código de emergência por
ra em que é necessário estar sempre à engano. A aeronave seguiu viagem e
disposição, respeitar a hierarquia e dis- somente a imprensa local soube da
ciplina, concorrer a diversas escalas e ocorrência. Aquele foi um longo dia.
representar a instituição o tempo todo. O trabalho não terminou com a de-
Uma dessas escalas é a do “ce- colagem da aeronave para o destino,
lular-bomba”. O temido telefone de o expediente continuou e outras de-
plantão da assessoria de imprensa da mandas surgiram.
Na sala de situação FAB é o ponto de contato de repórte- Em tempos em que a palavra
para grandes eventos,
decisões são tomadas
res e comandantes, que naquela noi- “crise” insiste em estar presente nos
coletivamente te trouxe a informação de uma emer- noticiários, na FAB é quase uma ro-
gência em voo civil. Havia a suspeita tina. A missão síntese da Força Aé-
MARCELO CAMARGO/© AGÊNCIA BRASIL de bomba ou sequestro de um avião rea Brasileira de “manter a soberania

NA TORRE
com mais de 120 passageiros que ia do espaço aéreo e integrar o territó-
do Rio de Janeiro a Miami. O piloto rio nacional, com vistas à defesa da
acionou o código de interferência ilí- Pátria” significa que a instituição é
cita no transponder por 17 segundos responsável pela defesa aérea brasi-

DE CONTROLE
logo após a decolagem e os controla- leira, gerenciamento do espaço aé-
dores de tráfego e defesa aérea pas- reo, busca e salvamento aeronáutico,
saram a monitorar a aeronave. Ter- desenvolvimento de tecnologia aero-
rorismo no espaço aéreo brasileiro? espacial, prevenção e investigação de
Caças F-5 Tiger da FAB foram acio- acidentes aeronáuticos. Traduzindo:

Os bastidores da assessoria de imprensa da Força nados para escoltar o voo. Nossa fun-
ção naquele momento era reunir as
cuidar da segurança de quem voa.
Aparentemente essa rotina é
Aérea Brasileira em casos de emergência informações cruas, cheias de jargões uma miscelânea de atuações, prato
e sabíamos que uma ocorrência des- cheio para profissionais de comuni-
sa natureza às vésperas da Copa do cação social sedentos por trabalho
POR SIMONE DANTAS* Mundo seria muito ruim para o país. sem hora, local, previsão ou rotina.

118 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 119


AGÊNCIA FORÇA AÉREA/©SGT REZENDE
Pautas que variam do lançamento de colecionador de miniaturas de aerona- todo o país e, para ele, é um desafio
foguete no Nordeste à busca de uma ves e pôsteres, Leite é apaixonado por ser eficiente em contextos culturais
aeronave desaparecida na Floresta histórias e dados da aviação mundial. variados, com inúmeros veículos de
Amazônica, da operação de combate E, segundo ele, nada como o trabalho comunicação para superar a antiga
ao crime na fronteira com o Paraguai de comunicação para vivenciar esse ideia de que uma boa assessoria se
ao intenso tráfego aéreo na ponte aé- fluxo de informações. A experiência baseia em “conhecer os coleguinhas”.
rea Rio-São Paulo. oferecida pela Força Aérea contribuiu Acostumado a lidar com temáti-
para que o jornalista acumulasse hoje cas complexas como acidentes aére-
Na parede da movimentada mais de 100 horas de voo a bordo do os, o tenente Humberto lembra que é
sala da SDAI – a Subdivisão de As- helicóptero Black Hawk, visse inúme- importante manter a consciência de
sessoria de Imprensa da FAB – na ros reabastecimentos em voo e estives- que o assunto não envolve exatamen-
capital federal, um painel com a ima- se a bordo da aeronave de ataque A-29 te aeronaves, mas vidas humanas.
gem de repórteres fotográficos den- Super Tucano em missão na Fronteira “São aqueles dias de voltar para casa
tro de uma aeronave Hércules C-130 Amazônica. “Consegui voar em prati- mais pensativo”. Mas mostrar a fra-
em voo, com a rampa aberta, captu- camente todas as aeronaves, em todos gilidade também pode ser uma boa
rando imagens de aeronaves de caça os tipos de missão”, orgulha-se. estratégia de comunicação.
numa simulação de guerra, inspira os No processo de compra dos caças
assessores. Quem trabalha tem que
se esforçar para equilibrar as possibi-
Em tempos em que durou 20 anos e resultou na aqui-
sição dos caças suecos Gripen NG, a
lidades da instituição e as demandas
da imprensa. É essa a rotina do jor-
que a palavra FAB buscou ressaltar a necessidade
urgente de uma definição de compra, Entre as tragédias aéreas em que a FAB autou está o acidente da aeronave da TAM que não conseguiu pousar em Congonhas
nalista Humberto Leite, tenente da
FAB, há oito anos.
“crise”insiste em e a comunicação foi fundamental para
esclarecer o povo brasileiro sobre como
Acostumado aos serões e plan- estar presente esse processo era uma iniciativa de in-
tões, o tenente Humberto, como é teresse do País. “A estratégia se mos- quanto o Exército conta com 3,2 mi- muito bem a atualidade virtual e essa - saber se declarar incapaz de oferecer
chamado, acredita que a maioria das nos noticiários, trou muito válida, e considerei isso um lhões de fãs e a Marinha possui 1,5 postura deles acaba interferindo em uma opinião embasada sobre algum

na FAB é quase
crises não é diária e enxerga uma momento em que pude servir à Força milhão. Essa diferença, segundo o nossa atuação. Eles tendem a valori- assunto, por motivo pessoal, seja por
fórmula interessante para lidar com de uma maneira exemplar”, lembra o major, se dá pelo fato de a FAB ter zar a cobertura dos meios tradicio- não ter ciência do tema completa-
um cenário turbulento. “São, na ver-
dade, ápices de divulgação de alguns rotina jornalista que atuou como assessor de
imprensa do projeto que custará cerca
ingressado nas mídias sociais um ano
após as outras armas. Para Ribeiro,
nais como o rádio e a televisão, mas
isso está mudando”, afirma Ribeiro.
mente, e por entender que outras pes-
soas estão mais capacitadas.”
assuntos críticos, sempre envoltos de U$$ 5 bilhões ao Brasil e prome- é importante destacar o processo Para ele, a comunicação será melhor O profissional de relações públicas
em um contexto de interesses, desco- A diversidade de atividades é te um retorno de U$$ 9 bilhões em constante de reavaliação, reinvenção à medida que os gestores entenderem deve estar pronto para superar essas
nhecimento e, algumas vezes, erros”, também o espelho do efetivo que transferência de tecnologia e offset – e renovação que os profissionais de o cenário de convergência e permiti- situações, não abalar a relação com o
explica o jornalista. Para ele, estar atua na comunicação social da FAB. compensações de natureza industrial, mídias sociais se obrigam a passar. rem que as ferramentas de comuni- assessorado e tentar descobrir meios
nesta área e vivenciar os momentos São militares e civis de regiões e for- tecnológica ou comercial. Aviador, Ribeiro atua há 14 anos na cação da instituição trabalhem de de ser ouvido em uma oportunidade
de turbulência lhe deu diversas per- mações diferentes, com experiências Num cenário de convergência área de comunicação social. “Ao fazer maneira complementar. adequada. “Um bom assessor não deve
cepções que facilitam seu dia-a-dia. variadas que enriquecem o dia-a-dia de mídias, a FAB mantém perfis em uma comparação superficial das mi- jamais achar que a instituição está
“Com a organização de informações da instituição. “Nas Forças Arma- mídias sociais que atuam também nhas horas de voo e das minhas horas A diversidade de gerações e for- sempre certa, que o problema é da so-
(algo tão pouco comum entre os jor- das vemos um culto significativo aos como ponto de prestação de infor- de comunicação social, chego à con- mações na instituição também pode ciedade, ‘é dos outros’, ‘é a imprensa’,
nalistas), trabalho duro e entendi- símbolos pátrios, mas o verdadeiro mações na gestão de crises. Abarca- clusão de que já sou um RP (profis- ser um obstáculo e, no caso da comu- etc. Se estivermos ali só para concordar
mento profundo da instituição para sentido disso, me parece, é a diversi- da na Subdivisão de Relações Públi- sional de relações públicas)”, afirma. nicação social, uma grande dificulda- com os chefes, não somos necessários.
a qual você trabalha, é possível atuar dade de origens. Essa diversidade me cas, a gestão de mídias sociais ain- Mestre em Jornalismo e Mídia e de. Segundo o jornalista Humberto Sempre há muito o que melhorar, mui-
bem, e ser respeitado”, ressalta. encanta”, destaca Leite, ao citar que da é coadjuvante em momentos de Especialista em Gestão da Comuni- Leite, há momentos em que as ações to mesmo”, conclui Leite.
Natural do Ceará e torcedor faná- se cada um de seus colegas de traba- crise. O major Marco Antônio Aidar cação Institucional, Ribeiro procu- não correspondem ao assessoramen-
tico do Fortaleza, Leite também nutre, lho usassem quimonos com as siglas Ribeiro, chefe da Subdivisão de Re- rou nos livros a resposta para a atu- to, porém isso não é muito diferente
desde a adolescência, a devoção pela de seus estados de origem, como nos lações Públicas e responsável pelas ação da FAB nas mídias sociais. Se- em outras instituições públicas e pri-
aviação. “Ser apaixonado por aviação campeonatos de judô, haveria quimo- mídias sociais da Força Aérea, conta gundo ele, o trabalho de redes sociais vadas. “Com o tempo, aprendi ainda a *Simone Dantas é relações
é a parte fácil, amar é manter essa nos com as expressões do ES, RS, CE, que este ainda é um assunto novo, na instituição inova e supera dificul- ter dois comportamentos: o primeiro públicas da Força Aérea
admiração mesmo com a convivência MG, SP, RJ, DF e PE. E não é dife- embora já tenham vivenciado focos dades. “Depois de estudar um pouco é saber que nem sempre o seu asses- Brasileira desde 2011 e aluna da
diária e o contato com eventuais nar- rente nos contatos com a imprensa. de crises nessas redes. sobre o choque de gerações, entendo soramento será seguido, e não morrer
pós-graduação lato sensu em
rativas não muito idealizadoras. E eu Os profissionais de comunicação da O perfil da FAB no Facebook que as gerações mais antigas, dos por causa disso. O segundo é - isso é
Jornalismo da Cásper
amo aviação”. Apesar de não ser um Aeronáutica lidam com pessoas de possui 1,3 milhão de seguidores, en- nossos comandantes, não aceitaram mais difícil de fazer no setor privado

120 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 121


C E N A S D O COT I D I A N O

O protesto dos Gaviões da Fiel contra Fernando


Capez, Rede Globo, CBF, e FPF em setembro de 2016
Em uma das festas de Carnaval de São
reuniu a torcida da quadra até a Federação Paulista
Paulo, Larozza registrou um casal se
beijando no capô do carro da Polícia Militar

FLAGRAS
O portfólio do
fotojornalista Felipe
Larozza, selecionado

URBANOS
pela agência
Magnum Photos em
sua comemoração de
70 anos
FOTOGRAFIA POR FELIPE LAROZZA
TEXTO POR FELIPE SAKAMOTO

Agora como Editor de Arte da Vice, Larozza fotografa cotidianamente para não perder a
prática. O clique é do verão de 2017, em Salvador (BA)

122 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 123


Do guitarrista de surf rock Dick Dale aos acordes da banda Nirvana, o do
it yourself do movimento punk e anarquista ensinou Felipe Larozza, fotojor-
nalista e editor de fotografia da VICE, a despir seu olhar de preconceitos ao
criar narrativas. “Vou tentar entender os pensamentos e as motivações das pes-
soas para poder contar essas histórias”. Formado em Publicidade e Propagan-
da pela Faculdade Cásper Líbero, em 2008, Larozza ingressou no mundo da
fotografia quatro anos depois, quando percebeu que poderia elevar o hobby a
outro patamar. Aos 30 anos, já publicou em veículos como a Folha de S.Paulo,
UOL, Rede Globo e Folha Metropolitana.
Ele gosta do que vem das ruas, das culturas vistas com olhos tortos. É o caso
dos campeonato de pipeiros, em Osasco, que reúne mais de 10 mil participantes
para empinar e assistir ao duelo no céu; das manifestações políticas, que foram a
sua primeira grande escola de fotojornalismo; ou a história de Aline e Érico que
se beijaram intensamente, durante o carnaval de São Paulo, no capô do carro da
Polícia Militar. As fotos que compõem o portfólio dessa edição da CÁSPER colo-
caram Larozza no concurso Magnum Photos 70th Anniversary Rio & Foto em
Pauta para concorrer a workshops com os grandes fotógrafos Michael Christopher
Brown, Bieke Depoorter e Cristina Garcia Rodero. Ele foi um dos 15 finalistas.
Larozza encontra inspiração no trabalho de outros fotojornalistas, desco-
brindo novas linguagens juntos. O casperiano viu no jornalismo a chance de ser
uma outra pessoa a cada pauta. Manifestante, motoqueiro, pipeiro, admirador
do reggae jamaicano do Maranhão e outros tantos personagens, como os pre-
sentes neste portfólio. “Tenho que absorver quem são essas pessoas para poder
transmitir a parada com veracidade”, afirma. E com sua lente fixa e aberta pro-
cura captar até o cheiro do que está distante dos nossos olhos.

Em Setembro de 2014, o centro de São Paulo foi tomado por bombas, gás lacrimogêneo e pela fumaça preta de um ônibus incendiado
Apesar dos mais de 10 mil pipeiros se reunirem em Osasco para o combate conhecido com “Rio X SP”, Larozza
foi o único fotógrafo da imprensa a cobrir o evento em setembro de 2015

As 200 radiolas, nome dado


aos DJs e aparelhos com
potentes caixas de som,
retratam a tradição do
reggae na cidade de São Luís
do Maranhão, presente desde
a década de 1950

124 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 125


Empinar moto em 90º, conhecido como “chamar no grau”, é esporte para molecada de muitas
regiões da grande São Paulo e da capital e não para de crescer

Depois do incêndio da Favela Portelinha da Penha, Zona Leste de SP, o fotógrafo registrou, em abril
de 2014, as crianças desabrigadas

Nos últimos dois anos, os paulistanos curtem o carnaval em ruas tomadas por blocos e festas
carnavalescas. Larozza registrou em 2017 a euforia que tomou conta da cidade nos quatro dias

126 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 127


© GAZETA PRESS
O grande congresso
Ciclismo A Faculdade abre as portas para o mais prestigioso congresso de comunicação brasileiro

nas ruas Por Guto Martini

Prova Ciclística 9 de Julho de 2017 passará


por parques e volta às ruas de São Paulo

Por Paula Calçade

Uma das mais tradicionais disputas do ciclismo na-


cional, a Prova Ciclística 9 de Julho, voltou às vias de São
Paulo em 2015, depois de ser realizada no Autódromo de
Interlagos. Dois anos depois, em 2017, o feriado estadual
cai em um domingo e o evento esportivo se consolida no
calendário da cidade. A prova vai percorrer algumas das
principais ruas e avenidas da capital paulista, com largada
e chegada na avenida Lineu de Paula Machado, em frente
Em 2016, a Prova Ciclística 9 de Julho bateu
ao Jockey Club. Marcus Gurgel, um dos responsáveis pe-
recorde de inscritos, com 2.129 competidores
los eventos esportivos da Fundação Cásper Líbero, explica
que mais uma vez o evento fará parte das comemorações
da Revolução Constitucionalista de 1932.

CASPERIANAS
A prova deste ano foi programada para passar por três
CASPERIANAS

parques de São Paulo, Ibirapuera, Villa Lobos e Parque do


Povo, “Como se fosse uma intervenção urbana, valorizando
pontos turísticos da cidade”, ressalta Gurgel. Anualmente,
assim que a São Silvestre acaba, a preparação para a Prova
Ciclística 9 de Julho se inicia em parceria com a Federa-
ção Paulista de Ciclismo. O evento será aberto para atletas,
que na última prova teve um número recorde de inscritos
(2.129 competidores), com equipes de todo o país, estran-
geiros, e aspirantes. Para participar, basta ter qualquer tipo
de bicicleta. “A expectativa é mais uma vez alta e seguimos
trabalhando para recuperar todo o prestígio de sua histó- Publicar na Compós é erguer a taça do mundo dos dos pontos altos da comemoração de seus 70 anos”.
ria. O retorno às ruas, depois de muito tempo, e o retorno congressos brasileiros de comunicação. Não que haja mui- A abertura da Compós ficará por conta do sociólogo
dos amadores continuam sendo algumas das ações que tos, mas se existe um evento reconhecido e cobiçado pela francês Dominique Wolton que fará uma palestra no Te-
estamos fazendo para isso”, destacou Gurgel. maioria dos acadêmicos é o organizado pela Associação Na- atro Cásper Líbero. Diretor de pesquisas no CNRS (Cen-
cional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação. tre National de La Recherche Scientifique), autor de mais
Em outubro de 2015, o Conselho da Compós aprovou, por de 30 livros, Wolton estuda como a comunicação media
unanimidade, a candidatura da Cásper Líbero para sediar a conflitos e permite a convivência, com um olhar recente
26ª edição, que ocorrerá entre 6 e 9 de junho. O diretor da e mais detido sobre o impacto das novas tecnologias nas
© GAZETA PRESS
Faculdade, Carlos Costa, afirmou, na apresentação da can- transformações da comunicação humana. Por mais que o
didatura, estar “contando com esse evento para marcar um ser humano esteja cada vez mais dependente dos apare-

128 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 129


RESENHA

Para
lhos móveis para estabelecer conexões, o sociólogo alerta da Cásper Líbero aponta para um engajamento e uma pre-
que em algum momento é preciso se desconectar e ini- ocupação da instituição com a cultura da pesquisa.
ciar um diálogo entre pares. Nos outros dias do evento, Para o professor Luís Mauro, ter os trabalhos aprova-
ocorrerão reuniões dos 17 Grupos de Trabalho (GTs) que dos no evento mostra que a Faculdade está, mais uma
discutirão artigos científicos submetidos à Compós. vez, no mapa das discussões acadêmicas. “É importante

entender
Fundada em 16 de junho de 1991, a Compós nasceu também destacar o incentivo da direção e da coordena-
da inquietação de pesquisadores de programas de pós- ção. Sem um direcionamento institucional voltado para o
-graduação (os PPGCOMs de PUC-SP, UFBA, UFRJ, UnB, estímulo de pesquisas científicas, seria difícil realizarmos
Unicamp e Umesp) em qualificar seus cursos e aumentar essas participações”, conta.
a integração do conhecimento que circula nas pesquisas O programa de pós-graduação da Cásper Líbero in-

o economês
comunicacionais. Em pouco tempo, os maiores pensado- gressou, definitivamente, na Compós em abril de 2001.
res de comunicação do País encontraram na Compós o O professor Bernardo Isler, coordenador do PPGCOM, foi
espaço privilegiado para difundir e trocar experiências de um dos pioneiros da Faculdade a participar dos encon-
seus estudos e reflexões. tros antes mesmo do ingresso na associação, para logo
Com critérios rígidos para seleção de trabalhos que em seguida ser acompanhado de Erasmo Nuzzi, o mais
participam nos congressos, o evento se tornou de difícil longevo diretor da Cásper. A entidade, para além do con-
acesso. Nem todos conseguem ter papers aceitos pelos gresso que realiza, também atua na defesa dos interesses
pareceristas. A Cásper contará, este ano, com a participa- dos programas de pós-graduação de seus associados. Foi
Com uma abordagem simples, novo ma- Manual de introdução à Economia
ção de seis professores para apresentar seus artigos: José o que a Compós fez em meados dos anos 2000, quando a nual de Economia busca se aproximar do Jefferson Mariano
Alta Books Editora
Eugênio de Oliveira Menezes, Dimas Antônio Künch, João pós da Cásper teve de funcionar sub judice por 12 meses. público leigo 160 páginas
Alexandre Peschanski, Else Lemos Inácio Pereira, Liráucio A Cásper Líbero, ao longo da história, consolidou uma
Girardi Júnior e Luís Mauro Sá Martino. tradição em congressos acadêmicos. Na sala 1 do quinto
O professor Liráucio Girardi conta que participou pela andar da Faculdade, foi fundada a Sociedade Brasileira
primeira vez em 2015 com um texto sobre Pierre Bourdieu. de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom), Por Adalton Franciozo Diniz*
No ano seguinte, sua pesquisa incidiu em outra discussão: em 12 de dezembro de 1977. Com quase 40 anos de exis-
a materialidade. Em um intercâmbio de ideias com outros tência, o congresso tem critérios menos rígidos, se com-
participantes de seu grupo de trabalho, Liráucio acabou se parados com os da Compós. Em 2015 e 2016, alunos do Quando Paul Samuelson lançou o seu livro Economics, brasileira e ao perfil de um público pouco familiarizado
interessando ainda mais pelo tema que estava abordando. segundo ano de jornalismo tiveram a oportunidade de em 1948, ele estabeleceu um novo padrão para os com a linguagem econômica, mas interessado em conhe-
Nesta edição, apresentará uma pesquisa que navega por apresentar trabalhos na Intercom a partir de um projeto manuais de introdução à Economia. O seu sucesso foi tão cer mais sobre o assunto. O resultado foi um livro que
seu objeto central. O professor ressalta que a participação da disciplina de metodologia. extraordinário que a obra ficou conhecida como o “livro- obedece a estrutura de exposição lógica consagrada pela
texto canônico” da Ciência Econômica e foi a base da obra de Paul Samuelson e que, com uma linguagem sim-
formação de três gerações de economistas em todo o mundo. ples e direta, também aborda temas da realidade brasilei-
Luis Mauro Sá Martino e Liráucio Girardi, professores da Faculdade, participam da Compós anualmente
O padrão estabelecido pelo livro de Samuelson tornou- ra. Desse modo, o livro atraiu um público leitor que, até
se incontornável e, até os dias atuais, todos que ousaram então, via o seu interesse por Economia frustrado pelo
CASPERIANAS

ignorá-lo ou subvertê-lo falharam miseravelmente. hermetismo, por vezes dispensável, dos manuais de Eco-
E eis que acaba de chegar às livrarias a nova edição do nomia disponíveis no mercado brasileiro.
Manual de introdução à Economia, do professor Jefferson Hoje, a quarta edição do livro é a prova do sucesso da
Mariano. Mariano é um pesquisador voltado para a temá- fórmula adotada por Mariano: respeitar aquilo que foi con-
tica do desenvolvimento econômico, com doutorado pela sagrado, todavia, adequando-o ao público brasileiro não ver-
UNICAMP e possui uma vasta experiência como analista sado, mas, interessado no assunto. Além da simplicidade e
nos mais respeitados institutos de pesquisa socioeconômi- da clareza, os aspectos do livro, que podem ser considerados
ca do Brasil: a Fundação Sistema Estadual de Análise de elementos que o diferenciam dos demais textos introdutórios
Dados (Fundação SEADE) e o Instituto Brasileiro de Ge- da disciplina, são o tratamento dos temas Contas Nacionais
ografia e Estatística (IBGE). A sua experiência profissio- e Mercado de trabalho. No tocante as contas nacionais, o li-
nal está coroada por sua brilhante carreira como docente vro incorpora as alterações mais recentes implementadas no
e conferencista. Atualmente, os estudantes, professores e método de levantamento do Produto Interno Bruto do Brasil.
funcionários da Faculdade Cásper Líbero têm o privilégio E, no caso do mercado de trabalho, há uma atualização dos
de desfrutar de suas aulas e de sua companhia. Diaria- conceitos e classificações que ainda não estão presentes nos
mente, podem constatar o quão generosa e pacientemente principais manuais de economia publicados no Brasil.
ele coloca o seu vasto conhecimento de Economia a dispo-
sição de todos aqueles que o cercam.
Há cerca de quinze anos, Mariano publicou um livro *Adalton Diniz é professor titular de Economia da
texto de Economia adaptado à realidade da economia Faculdade Cásper Líbero
REPRODUÇÃO FACEBOOK REPRODUÇÃO FACEBOOK

130 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 131


RESENHA

O ângulo fenômenos tridimensionais registra- cuperando a noção de comunicação

CULTURA DO OUVIR E ECOLOGIA DA COMUNICAÇÃO


dos e recriados em ambientes digitais. como atividade geradora de ambien-

da escuta
Compartilhados na internet, permi- tes de afetividade, o autor contrapõe
Seu texto não é uma fala cética,
mas também não é uma fala in-
O autor apresenta a relação
entre comunicação e pertenci-

tem ao autor investigar as relações


gênua, é uma voz que se levanta

às conexões vertiginosas, e ao esva-


para argumentar a favor da vida.
E, ainda que com dúvidas, com os
CULTURA mento quando evidencia a na-
tureza capilar e porosa da co-
municação, quando aponta para

DO OUVIR
engasgos adequados a todo o pes- a necessidade de resgatarmos o

entre comunicação presencial e co- ziamento do presente, dinâmicas do


quisador que aprendeu a não crer
nas ideias acabadas, apresenta o
seu caminho em busca do ouvir. A atenção à cultura do ouvir permite perceber que
ouvir como um gesto do corpo,
um corpo que se abre ao outro
e que se deixa sensibilizar pela

municação mediada por equipamen-


Não “o” caminho, não a certeza,
corpo e dos vínculos afetivos, dinâ-
não a definição, apenas seu cami-
nho. E, com sua coragem de tocar
estamos enredados em processos comunicativos,
participamos de uma teia de vínculos também
sonoros. Da mesma forma como as vibrações sonoras
E ECOLOGIA DA alteridade, que se deixa pene-
trar pelos poros da alma. Um
penetrar que abriga a glória do

COMUNICAÇÃO
em um tema tão urgente como o ocupam ambientes, podemos dizer que também pertencimento, mas ao mesmo

tos. Menezes não nega essa tensão micas simbólicas, tecnológicas, cola-
da “corresponsabilidade planetá-
ria”, nos convoca a caminhar.
Certamente será preciso ler
geram ambientes comunicacionais nos quais é
impossível não participarmos.
tempo esconde o medo de ser
possuído, de ser rejeitado, da
amplificação da ferida que é ser

própria da contemporaneidade, mas borativas e acadêmicas. E alerta: para


este livro com a disposição de humano. E propõe o que me pa-
um andarilho da alma, dos senti- José Eugenio de O. Menezes rece ser a única resposta possí-
dos, um cidadão planetário. vel a esse impasse – um ato de

Outras formas de pensar a comunicação


fé, de generosidade para com a

valoriza o trânsito: idas e voltas entre que os comunicadores não se tornem


Malena Segura Contrera
própria vida.
Na “Apresentação”

José Eugenio de O. Menezes


Ao reivindicar a devida aten-
ção ao tempo lento, ao ouvir e

ambientes comunicacionais, ganhos apenas funcionários de máquinas,


à comunicação como gestos do
José Eugenio de O. Menezes
corpo, ao propor que façamos a
atua no Programa de Pós-gradu-
escalada da abstração de volta,
ação em Comunicação da Facul-
no sentido contrário, descendo

por Roberto D’Ugo* e perdas em seus diferentes graus de faz-se necessário um conjunto de
dade Cásper Líbero, instituição
na qual também é professor de
Teoria da Comunicação nos cur-
os degraus em direção ao cor-
po, à vida, à Terra onde toda
nossa aventura se desenrola, o
sos de graduação. Integra o Gru-

densidade e abstração. aprendizados nos campos da media


po de Pesquisa Comunicação e
Cultura do Ouvir e, em parceria
autor está de fato propondo que
possamos retomar o protago-
nismo de nossas vidas, exercer
com pesquisadores da Cásper e
a consciência e as escolhas que
Essa reflexão prossegue em “Co- literacy e das social media literacies
de outras instituições, participa
do projeto de pesquisa Cultura
do Ouvir, Vínculos e Ambientes
nos cabem, resistindo aos apelos
hipnóticos do “programa”. (....)

municação e a escalada da abstração”, – letramentos digitais fundamentais


Comunicacionais.
Cultura do ouvir e ecologia da comunicação (2017), li- lidade, do psicólogo Paul Watzlawick, bem como dos visio-
978‐ 85‐ 92691‐ 08‐ 0

vro de José Eugênio O. de Menezes, é um convite ao reen- nários canadenses Harold Innis e Murray Schafer. em que o diálogo com filósofo tcheco- ou habilidades para sobrevivência no
cantamento da vida por meio do som; suas palavras resso- Cultura do ouvir e ecologia da comunicação, é articu- -brasileiro Vilém Flusser faz emergir universo das redes. Cultura do ouvir e ecologia da
am delicadas e avançam com a languidez própria de quem lado em cinco painéis comunicantes entre si. O primeiro uma imagem esperançosa sobre o ce- “Cultura do ouvir, vínculos e am- Comunicação
José Eugenio de O. Menezes
escolhe cultivar organicamente outras formas de pensar a capítulo apresenta as relações entre “Som, corpo e cultu- nário de intensas transformações que bientes comunicacionais”, último ca- UNI Editora
comunicação. Pesquisador no Programa de Pós-graduação ra do ouvir”. Estabelece as premissas da obra: “as inves- experimentamos. O termo “escalada pítulo, aborda pesquisas recentes que 123 páginas
em Comunicação da FCL, instituição na qual também é tigações a partir do som representam uma das portas de da abstração”, explica Menezes, foi ampliaram os horizontes de estudos
professor de Teoria da Comunicação, o autor percebeu acesso a uma perspectiva processual/sistêmica no estudo utilizado por Flusser para descrever ao redor da cultura do ouvir remeten-
há tempos que um dos caminhos do estudo da comuni- da comunicação”. Jogos de pertencimento e vinculação, as mudanças comunicacionais ocor- do-os a uma perspectiva de sustenta-
cação passa pelo corpo e pelos sons que o envolvem. Em capilaridades e dinâmicas comunicacionais apontam para ridas quando o homem, além de usar bilidade dos processos comunicativos.
companhia de Dietmar Kamper e Norval Baitello Jr., não a quebra de paradigmas e desvelam um horizonte há mui- a comunicação tridimensional, com Destacam-se ainda os objetivos do
considera o tempo como um opositor. Acena que “ouvir to esquecido: a ampliação do leque da sensorialidade para todos os sentidos do corpo, passou a projeto de pesquisa Cultura do Ouvir,
implica a lenta aprendizagem do sentir para acolher, tecer além da visão. Menezes parte do axioma de Harry Pross usar a comunicação bidimensional Vínculos e Ambientes Comunicacio-
conexões ou caminhar em busca das relações, dos sentidos (“toda comunicação começa no corpo e nele termina”) e (imagens), depois a comunicação nais, do Grupo de Pesquisa Comuni-
e do sentir”. Este seu livro é a expressão madura de um acolhe o desafio de Dietmar Kamper quando, no contex- unidimensional (escrita linear), e por cação e Cultura do Ouvir, da Cásper.
compromisso afetivo com a alma humana. to da saturação do olhar, ressalta que é “preciso mudar do fim também a comunicação nulodi- Incontestáveis são os méritos des-
A cultura do ouvir, defendida por Menezes, com seu ângulo de vista para o ângulo de escuta”. Eis aí a oportuni- mensional (expressa em forma de nú- sa obra que, ao permitir ser habitada
modelo ecológico de participação na comunicação, extra- dade da cultura do ouvir. meros), no universo digital. Menezes pelo leitor, com quem divide dúvidas
pola a perspectiva funcionalista de troca de informações Ao frisar a interdependência afetiva dos corpos, Me- considera a possibilidade de transitar- em rara franqueza, o transforma; e
e aponta para uma ciência da comunicação probabilística nezes aventura-se a explorar a hipótese da complemen- mos entre as quatro etapas do percur- que articula perspectivas tão promis-
e complexa, que demanda multidisciplinariedade. O que tariedade entre os meios primários (criados pelo próprio so conforme a necessidade, recordan- soras no estudo da comunicação apre-
está em jogo é um processo de ampliação da percepção corpo), secundários (quando um corpo utiliza um suporte do que afetos podem muito bem ser sentando a solidez, a engenhosidade
do outro, uma proposta de pesquisa que não confunde para se comunicar com outro corpo) e terciários (quando trocados, e efetivamente vivenciados, e a beleza algo enigmática de uma
comunicação com conexão. “A atenção à cultura do ouvir os corpos utilizam aparatos eletrônicos no processo co- por mensagens de smartphone. sinfonia de Sibelius. O som é também
permite perceber que estamos enredados em processos co- municativo). A referência retroativa de todos os meios ao “Dinâmicas que atravessam os um lugar, disse alguém.
municativos, participamos de uma teia de vínculos tam- corpo apresenta-se como chave legítima para a compre- estudos da comunicação” constituem
bém sonoros, cada vez mais admirados e espantados com o ensão dos desafios que a contemporaneidade apresenta à o foco do quarto capítulo. Nele, são
fato de que a perspectiva de participação na comunicação pesquisa da comunicação. destacadas pesquisas a respeito da
seja mais fecunda e adequada ao estudos dos fenômenos No segundo capítulo, a noção de “Ecologia da Comu- formação e atuação dos comunicado-
*Roberto D’Ugo é mestre em
comunicacionais do que a perspectiva de reação dos indi- nicação” é usada como “metáfora sistêmica para observar/ res e comunicólogos no contexto dos
Comunicação pela Universidade
víduos às ações de outros”, revela o autor. Em sua trilha investigar/compreender como, a partir do corpo, os pro- estudos da comunicação. Trata-se de
rumo a uma ecologia da comunicação, colhe contribuições cessos de comunicação transbordam por diferentes capi- um gesto a favor da conscientização
Metodista de São Paulo, bacharel
de diferentes correntes, em diálogo com Vicente Romano, laridades comunicacionais. Uma radioarte documental de que “os processos de comunicação em Comunicação Social –
Baitello Jr, Ivan Bystrina, Vilém Flusser, Ashley Montagu sobre uma pequena comunidade rural no México; obser- não se limitam ao que muitos em- RTV pela FAAP. Atualmente
e Christoph Wulf, entre outros. É possível talvez reconhe- vações empíricas das pinturas rupestres da Serra da Capi- pregadores contemporâneos ainda é Coordenador de Ensino do
cer ainda, nos silêncios e ressonâncias discretas do texto, vara (Piauí); e um podcast sobre cantos dos Pigmeus Baka chamam de ferramentas de comuni- Curso de Rádio, TV e Internet da
ecos distantes de Samuel Beckett, poeta da incomunicabi- (República dos Camarões) são os exemplos destacados de cação, em sentido instrumental”. Re- Faculdade Cásper Líbero.

132 maio • junho • julho • agosto 2017 CÁSPER 133


PARA ENTENDER MAIS

História e ::CAMINHOS::
Aprofunde-se em
temas desta edição

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