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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos

Príncipe dos Desejos


(Patricia Grasso)
Título Original: Pleasuring the Prince
Saga dos Kazanov - 04
Copyright © 2006 by Patrícia Grasso
Originalmente publicado em 2006 pela Kensington Publishing Corp.
© 2007 Editora Nova Cultural Ltda.
Digitalização: Polyana
Revisão: Irany

RESUMO: Londres, 1821


Perigosa entrega
Fancy Flambeau se recusa a ceder ao assédio dos admiradores, pois sabe bem o que é
a dor de um coração partido. Mas é dificil resistir às promessas doces e sensuais
sussuradas a seu ouvido pelo principe Stepan Kazanov! O jogo de sedução de Stepan,
no entanto, toma um rumo diferente quando Londres é varrida por uma onda de
apreensão e medo.
Desesperado para tirar Fancy da mira de um homem perigoso, obcecado por mulheres
artistas e bonitas, ele a leva para fora da cidade à força. Sozinha com Stepan numa
ilha distante, Fancy é incapaz de continuar resistindo a seu charme. Porém, a
intensidade da paixão e do desejo que eles encontram nos braços um do outro, poderá
não ser suficiente, para que Fancy esqueça o passado!
Capítulo I
1
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Londres, 1821
Bem me quer, mal me quer...
Um cavalheiro bastante alto, vestido com traje de noite, formal, estava
parado no alto da colina Primrose sob o céu acinzentado de uma manhã bastante fria.
Trazido pelo vento, chegava até ele o cheiro inconfundível do rio Tâmisa.
O homem olhou quase amorosamente para a mulher deitada no chão. O rosto
delicado mostrava agora a placidez da morte. Ele tirou do bolso uma rosa e começou a
despetalá-la sobre o corpo ,da morta.
- Um desperdício de beleza, ele murmurou com voz rouca. O cavalheiro olhou
para a mulher que se encontrava ao seu lado.
- Volte para a carruagem, ordenou. Sabendo que ela lhe obedeceria sem
reclamar, pegou outra rosa do bolso.
- Bem me quer, mal me quer...

Teatro Real de Ópera


- Juro que nunca vou me tornar uma mulher como mamãe, Fancy Flambeau
murmurou baixinho para si mesma enquanto se preparava diante do espelho para a sua
estréia no palco. Potes de cremes cobriam a mesinha da penteadeira.
Notando a rachadura diagonal no espelho, Fancy ficou se perguntando se esse
seria um sinal de azar.
- Juro que nunca vou me tornar uma mulher como mamãe, ela repetiu olhando
para a sua imagem retorcida no espelho quebrado.
Estrear no palco não a deixava nervosa. Por outro lado, a possibilidade de ser
assediada por algum aristocrata, daqueles que vivem em torno de cantoras, dançarinas
e atrizes, ah, isso a irritava. Fazia um bom tempo que jurara para si mesma que jamais
se apaixonaria por um nobre nem se transformaria em uma vítima do amor. Como
acontecera com sua mãe.
Manter essa promessa tinha sido fácil até aquela noite. Uma vez que ela
pisasse no palco, aumentavam as chances de um nobre assediá-la. Mas Fancy nunca se
tornaria um objeto de prazer de um aristocrata.
Ela havia se vestido para o papel de querubim na ópera O Casamento de
Fígaro. O traje consistia em calções pretos, uma camisa branca e um colete vermelho.
Secando as mãos úmidas com uma toalha de linho, Fancy observou pelo espelho
suas seis irmãs, que se amontoavam no camarim.
Variando em idade dos dezenove aos dezesseis anos, com dois pares de
gêmeas, suas irmãs riam, satisfeitas, com a estréia de Fancy. Os únicos membros da
família ausentes eram Gabrielle Flambeau, a mãe das sete jovens e a babá, Smudge.

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- É melhor irmos para os nossos lugares. Belle abriu a porta e se surpreendeu
quando algo pequeno e peludo entrou correndo no camarim.
Era um macaquinho, que pulou imediatamente no ombro de Fancy. Com as mãos,
o animalzinho cobriu os próprios ouvidos, depois os olhos e finalmente a boca.
Blaze pegou-o no colo como se fosse um nenem.
- Oh, srta. Giggles, finalmente a encontrei. Com um sorriso de desculpas, um
homem baixote entrou no camarim e levou o macaquinho embora.
- Quem era esse homem? - perguntou Raven, a irmã mais nova.
- Sebastian Tanner é o marido da cantora principal, a prima-dona - Fancy
respondeu. E a srta. Giggles, a macaquinha, é seu bicho de estimação.
- Giggles odeia seus donos - Blaze disse. Vi isso nos seus olhinhos.
- Agora é melhor vocês todas procurarem os seus lugares no teatro, Fancy
recomendou.
As jovens deixaram o camarim e apenas Belíe e Raven ficaram para trás.
- Ele está na platéia? - Fancy perguntou a Raven.
- Sinto a sua presença.
- Ver que uma de suas filhas bastardas está no palco deve surpreendê-lo.
Fancy mordeu o lábio com raiva. Espero que sua consciência lhe pese.
- Por que sempre se coloca tão agressiva contra o homem que nos sustentou
até hoje? - Belle indagou. Sua amargura faz mais mal a você do que a ele.
- Ele foi o culpado por mamãe ter morrido tão cedo.
- Mamãe foi responsável por seu próprio destino - Raven retrucou.
- Mas nosso pai nunca nos amou, Fancy insistiu.
- Ninguém sabe o que se passa no coração de uma pessoa.
- Não fique arranjando desculpas para um pai que não a reconhece quando você
passa por ele na rua - Fancy rebateu, sabendo que havia alguma coisa de verdade nas
palavras de Belle. Ele magoou mamãe, e agora Smudge foi se reunir à pobrezinha.
- Nossa babá não foi a parte alguma. Raven tocou no braço de Fancy. Ela ainda
continua a nos proteger.
Ouviram-se os primeiros acordes da orquestra anunciando o início do
espetáculo.
- Nos encontraremos mais tarde! - Fancy exclamou, voltando a se arrumar.
Depois que as irmãs saíram do camarim, ela olhou-se no espelho mais uma vez.
- Deseje-me sorte, Smudge - Fancy pediu baixinho à babá já falecida.
O cheiro de canela que havia no ar deu-lhe uma nova confiança. Era como se a

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babá estivesse ali ao seu lado.
Fancy colocou o chapéu que fazia parte do traje e saiu apressada do camarim.
O palco estava à sua espera. Assumindo o papel de querubim, ela sorriu como um
garoto para Genevieve Stover, a mulher que interpretaria Barbarina, um papel
secundário. As duas haviam feito amizade durante os ensaios.
- Soube o que .aconteceu com a bailarina que estava desaparecida? -
Genevieve perguntou baixinho.
Fancy meneou a cabeça.
- Foi vítima do assassino que desfolha pétalas de rosa sobre os cadáveres.
Fancy tentou não pensar nos crimes bárbaros que estavam acontecendo em
Londres. Precisava se concentrar em seu papel de garoto adolescente. Charmoso.
Divertido.
Ao entrar no palco, deixou-se envolver pela música e pelo canto, e sua voz soou
emocionada.
O papel exigia que cantasse para a Condessa, interpretada por Patrice Tanner.
Fancy aproximou-se da beirada do palco e, inesperadamente, a prima-dona a empurrou
para o fosso da orquestra. Ouviu-se um zunzunzum entre os espectadores, mas Fancy
foi erguida pelos músicos de uma maneira tal que parecia que o ato havia sido ensaiado
exatamente assim. Logo se ouviram aplausos e risos animados. Ela voltou-se para o
público e fez uma reverência bastante exagerada, provocando mais risos.
Quando Fancy regressava aos bastidores, o diretor da peça, o sr. Bishop, a
deteve.
- O Príncipe Stepan Kazanov quer conversar com a senhorita.
Ela fingiu não ter escutado o diretor e tomou um copo de água.
- E quanto ao Príncipe?
- Não quero falar com ele.
- Não posso dizer a Sua Alteza que a senhorita não deseja vê-lo, o diretor
exclamou. O Príncipe Stepan é um patrono bastante generoso e tem ajudado muito
nas produções de óperas.
- Não estou à venda.
- Mas se encontrar com os patronos das artes faz parte do emprego. Quer
conservar o emprego, não é?
- Muito bem, pode me apresentar o Príncipe depois do espetáculo, Fancy
concordou, relutante. Diga-lhe que me recuso a me tornar sua amante.
- A senhorita se encarrega de lhe dizer isso. Com estas palavras, o diretor se
afastou, deixando-a apreensiva.
- Lá está ela.
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Sentado com seus três irmãos no camarote, o Príncipe Stepan Kazanov
estendeu suas longas pernas e relaxou na cadeira. Fixou seu olhar na mulher que se
encontrava no palco, seguindo cada um de seus movimentos.
A srta. Fancy Flambeau estava a poucos metros de seu camarote. Sua voz
maravilhosa prendia a atenção de toda a assistência. Bastara vê-la e ouvi-la para que
Stepan soubesse imediatamente que queria aquela mulher para si.
- Aquela é a jovem por quem está interessado? - o Príncipe Viktor perguntou.
- Ela se veste como um menino. O Príncipe Mikhail sorriu para o irmão mais
novo.
- Será que nosso irmãozinho está nos escondendo um segredo? Diga logo,
Stepan, gosta mais de meninos do que de meninas?
- A srta. Flambeau faz o papel de querubim. E não gosto de meninos.
- Silêncio!
Os quatro Príncipes russos voltaram os olhos para o camarote ao lado. Lady
Althorpe estava sentada com o Duque e a Duquesa de Inverary. A mulher, já idosa,
olhava com reprovação para os rapazes.
- Desculpe-nos pelo barulho, lady Althorpe. Rudolf dirigiu a mulher seu sorriso
mais cativante.
Stepan voltou sua atenção para o palco. No meio dele, o querubim cantava ao
lado da prima-dona e havia uma nítida animosidade entre as duas.
- Vossa Alteza? - o diretor da peça chamou. Stepan voltou-se para o
homenzinho atarracado.
- A srta. Flambeau pede por sua indulgência, mas prefere encontrar-se com o
senhor depois do espetáculo.
- Obrigado. Stepan esfregou as mãos. Quanto tempo levaria para torná-la sua
amante?
O intervalo começou. Normalmente, Stepan deixava o camarote da família e
circulava entre seus muitos amigos, falando com os homens e flertando com as
mulheres.
Naquela noite, ele apenas estendeu as pernas e continuou sentado,
surpreendendo os irmãos.
- Não pode deixar de cumprimentar lady Cynthia e sua mãe, Viktor foi
dizendo.
- Mãe e filha estão preparando uma armadilha para que eu me case. Só de
pensar que teria de passar a vida inteira ao lado de Cynthia Clarke, já me dá calafrios.
- E quanto à viúva alegre? - Mikhail perguntou.
- Lady Veronica ficaria muito mais feliz ao seu lado, Mikhail. Sem contar que
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você precisa de uma madrasta para sua filha.
- Veronica Winthrop não tem talento para cuidar de crianças, rebateu o irmão.
Mas você pode ir conversar com lady Drummond, Stepan. Ela está lhe enviando olhares
melosos.
- Não quero me envolver com mulheres casadas.
- Então, vai ficar aí sentado durante todo o intervalo? - perguntou Rudolf.
- Vou me encontrar com a srta. Flambeau depois do espetáculo.
- Ela parece muito jovem o Príncipe Viktor observou, chamando a atenção de
Stepan.
- Uma vez tirada a sua inocência, esta não voltará mais, Mikhail lembrou ao
irmão mais novo,
- Você presume que pretendo fazê-la minha amante. Bem, pode estar
enganado. Posso propor casamento à bela jovem.
-Deixe disso, irmãozinho, Rudolf caiu em uma gargalhada. O Príncipe e a
cantora de ópera?
- Não vou seduzir ninguém. Stepan piscou para o irmão mais velho. A não ser
que ela queira ser seduzida.
Fancy se sentia inebriada com o entusiasmo do público. Parou no meio do palco
e agradeceu a todos. Os aplausos eram ensurdecedores. Ela continuou em seu papel de
adolescente e tirou o chapéu em sinal de cumprimento. Ao fazer isso, seus cabelos se
soltaram. A imagem da jovem com cabelos chegando quase à cintura fez com que o
público emudecesse por um instante, para em seguida voltar a aplaudir com mais
entusiasmo.
Alguém da platéia lhe jogou uma rosa. Logo o palco foi coberto de flores.
- Cante alguma coisa! - um rapaz gritou, e foi seguido por outros
imediatamente.
- Cante! Cante!
Fancy olhou em volta, confusa. Notou que a prima-dona estava irritada,
enquanto o diretor apertava as mãos e lhe dirigia um olhar encorajador.
Ela nunca se sentira tão sozinha. Ficou em silêncio por um longo momento,
pensando no que poderia cantar e os espectadores emudeceram.
Finalmente, ergueu o rosto em um gesto de desafio.
- Quando criança, sempre implorava ao meu pai para que me levasse a passear
em sua carruagem, Fancy disse. Papai pedia-me que esperássemos um dia de sol.
Quando fiquei mais velha, percebi que papai só nos visrtava em dias chuvosos. Nunca
consegui andar em sua carruagem, e assim, compus uma balada sobre uma terra mágica
situada além do horizonte, onde as gotas de chuva eram proibidas do amanhecer ao

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anoitecer.
Sem acompanhamento musical, Fancy começou a cantar sobre a terra além do
horizonte. Sua voz perfeita e a amargura das palavras da canção transportaram os
espectadores através do tempo e espaço até suas próprias infâncias. A letra falava de
sonhos esquecidos e desapontamentos que magoavam o coração.
Após cantar a última palavra, Fancy saiu correndo do palco, ignorando os
delirantes aplausos. Lágrimas corriam por seu rosto, manchando-lhe a maquiagem.
- Que tocante! - A voz ácida pertencia a Patrice Tanner. Acredita mesmo que
um aristocrata passearia com sua bastarda diante de seus conhecidos?
Fancy ignorou a prima-dona. Fechou a porta de seu camarim e apoiou-se contra
ela, precisando de alguns poucos minutos de privacidade para se recompor.
Seu pai estaria na platéia? E o que teria pensado da canção? Ela desejava
que...
O que desejava? Que seu pai implorasse por seu perdão por tê-la
negligenciado? O remorso traria sua mãe de volta à vida? Um homem a quem não via há
quinze anos não devia sentir nada por ela nem por suas outras filhas.
E o tal Príncipe queria encontrá-la. Ou melhor, queria levá-la para a cama.
Fancy voltou a sentir o cheiro de canela, um sinal de que a babá estava por
perto. Sabia o conselho que ela lhe daria. “Escute a sua cabeça, criança, mas siga o
seu coração”.
Fancy suspirou. Sua mãe havia seguido seu coração e pagado um alto preço.
Sete filhas. Nenhum marido. Nenhum amor. Nenhum futuro.
De todas as sete irmãs Flambeau, Fancy era a única capaz de ver e sentir os
mortos.
Não comentava esse dom com ninguém fora da família. Não queria que a
chamassem de louca e a internassem em um hospício.
Suas irmãs possuíam outros poderes especiais. Alguns mais interessantes do
que o dela.
Fancy deixou de lado esses pensamentos e começou a se despir. Precisava
tirar a fantasia de querubim e vestir suas próprias roupas. Nem bem acabara de
colocar o vestido e calçar os sapatos, ouviu uma batida na porta.
- Fancy? - Era a voz do diretor.
- Pode entrar.
A porta se abriu e o diretor Bishop entrou no camarim acompanhado de um
estranho.
O Príncipe Stepan Kazanov olhou para Fancy do alto de seus quase dois
metros. Era uma presença magnífica. Moreno, ombros largos, corpo elegante, músculos

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sólidos.
A beleza do Príncipe pegou Fancy de surpresa, provocando-lhe um arrepio na
espinha. Os cabelos e os olhos profundamente negros, o nariz longo e perfeito e os
lábios finos e bem delineados de Stepan Kazanov a deixaram por um momento sem
fala.
Havia um sorriso em seu olhar, como se o Príncipe soubesse o efeito que
provocava em todas as mulheres.
Fancy soube imediatamente que precisava se afastar desse aristocrata. Mas
como? Desejou que o Príncipe fosse feio e gordo, assim seria mais fácil mandá-lo
embora.
Stepan deu um passo à frente e ela recuou.
- Eu não mordo, srta. Flambeau.
- Alteza, quero lhe apresentar Fancy Flambeau, Bishop disse.
- Bonsoir, Fancy. Enchanté-ele falou em francês, querendo deixar claro que
estava encantado com a bela cantora.
- Fale em inglês e me chame de srta. Flambeau.
O Príncipe ergueu uma das sobrancelhas em surpresa. Bishop tossiu. Fancy
olhou de um homem para o outro.
- Pode sair Bishop, Stepan disse finalmente. A srta. Flambeau e eu nos
entenderemos bem.
- Deixe a porta aberta ao sair - Fancy ordenou, fazendo o Príncipe sorrir. Não
quero insultá-lo, Alteza; mas tenho uma reputação a zelar.
- Prefiro que me chame pelo nome.
- Como desejar, Stepan.
- Sua voz me emocionou. O Príncipe se aproximou e a olhou bem de perto. Seus
olhos são de um tom violeta, e sua beleza me tira a respiração.
- Verdade? Pois então é melhor sair daqui bem depressa, respirar novamente e
viver.
Stepan voltou a sorrir.
- Tem a língua afiada, srta. Flambeau. Mesmo assim, é bela como uma rosa.
- Em vez de ficar fazendo elogios o tempo todo, Stepan, por que não se distrai
procurando um emprego?
O Príncipe não conseguiu reter uma gargalhada.
- Pensa que está me insultando, não é? Pois eu cresci com meus irmãos-
caçoando de mim o tempo todo. Desenvolvi uma pele dura e resisto a qualquer
provocação.

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Fancy acabou sorrindo.
- Devia sorrir mais vezes. Seus olhos me lembram violetas da Pérsia.
Dessa vez ela resolveu não responder ao elogio com um insulto.
- Obrigada, disse simplesmente.
- Gostaria de celebrar o seu sucesso com um jantar.
- Lamento, mas minhas irmãs estão me esperando na porta do teatro.
- Possui sua própria carruagem?
- Não, mas tenho minhas próprias pernas e posso andar. O olhar de Stepan era
de surpresa.
- A senhorita e suas irmãs não podem ir a pé para casa tão tarde da noite. Eu
acompanharei suas irmãs até sua casa e depois jantaremos. O que acha?
- Não janto com pessoas que mal conheço.
O Príncipe pareceu perplexo. Nenhuma mulher jamais recusara um convite seu.
- Aceitei conversar com Vossa Alteza para não perder o meu emprego, Fancy
revelou sem hesrtação.
- Não gosta de estrangeiros?
- Minha mãe era francesa.
- Então detesta os russos.
- Não.
- Mas me detesta?
- Não pessoalmente. Ela tentou dar uma explicação razoável. O senhor é
simplesmente um aristocrata.
- Seus lábios pronunciaram a palavra "aristocrata" como se estivesse dizendo
"lepra". Stepan suspirou. Antes desta noite, nunca me havia sentido inferior por causa
da minha riqueza e do meu título.
- Estou honrada em lhe acrescentar algo à sua experiência de vida. Fancy
desejou que o Príncipe saísse antes que ela mudasse de idéia.
Stepan, porém, não tinha intenção alguma de deixar o camarim.
- Sei de modos mais agradáveis de acrescentar algo à minha experiência de
vida, sua voz soou rouca e sedutora.
A observação do Príncipe deixou Fancy chocada. Endireitou o corpo como se
tivesse sido ofendida. Ele jamais diria uma coisa dessas a uma dama da sociedade.
- Eu não devia ter esperado por nenhum respeito por parte de um aristocrata.
- Aristocrata não é o nome de uma doença fatal, srta. Flambeau.

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Ela ergueu o queixo, e seu olhar era frio como gelo.
- Meu relacionamento com nobres não é nada animador.
- Ah, sim, está se referindo ao seu pai. Stepan fez um gesto de que entendia
o comportamento de Fancy. Como as pessoas do povo, nem todos os aristocratas são
iguais. Por favor, considere o meu convite para jantar amanhã à noite. Podemos ter
mais em comum do que pensa, srta. Flambeau.
- Duvido muito.
- Ora, vamos. O Príncipe estendeu sua mão como se a estivesse convidando
para dançar.
Por um momento, Fancy sentiu vontade de colocar sua mão entre as dele, mas
sua desconfiança levou a melhor. Não podia permitir que nenhum homem fizesse a ela
o que seu pai fizera à sua mãe.
- Eu acompanharei a senhorita e suas irmãs até sua casa. Stepan pegou a mão
de Fancy. Preocupo-me com sua segurança, apesar de a senhorita não gostar de mim.
Essa observação fez com que Fancy se sentisse diminuída. O Príncipe parecia
uma pessoa decente e ela não devia ferir seus sentimentos.
- Jantarei com o senhor amanhã à noite, Fancy concedeu, porém não espere
que me torne sua amante.
- Mas eu não lhe pedi que se tornasse minha amante.
Fancy enrubesceu, embaraçada com sua presunção. Ela era o resultado de uma
união ilícita entre um Duque e uma cantora de ópera. Que outra razão poderia ter o
Príncipe para querer sua companhia?
- Confie em mim. Stepan beijou-lhe de leve a mão. Não costumo seduzir jovens
inocentes e relutantes. Ele fez um gesto em direção à porta. - Podemos ir?
Com sua mão na do Príncipe, Fancy caminhou em silêncio pelo teatro deserto
até a porta de saída. Em sua mente, apenas um pensamento: por que aceitara jantar
com Stepan Kazanov?
Ao sair do teatro, surpreendeu-se com o número de carruagens estacionadas
nos dois lados da rua.
- O que está acontecendo? - ela perguntou, confusa.

Capítulo II
Seus admiradores estão se oferecendo para levá-la para casa.
Stepan sorriu quando notou a surpresa no rosto de Fancy. Ela o encantava com
sua inocência.
- Por que fariam isso?

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- Homens têm seus motivos quando cortejam uma bela dama, mas a principal
razão, eu suponho, será roubar a sua virtude. Sabe que é atraente, não sabe?
- Obrigada. - Fancy ruborizou.
- Eu a protegerei de todos esses lobos que querem devorar a sua inocência.
- E quem me protegerá do senhor, Alteza?
Antes que o Príncipe pudesse responder, seis mocinhas o rodearam.
- Apresente-me às suas irmãs.
- Isso não é necessário. O olhar de Fancy era desafiador. O senhor não vai
voltar a vê-las.
Stepan não se importou com a agressividade dela.
- Sou o Príncipe Stepan Kazanov, ele se apresentou, sorrindo.
- Eu sou Belle - a moça foi dizendo.
- E o seu nome faz justiça à sua beleza!-p Príncipe exclamou e beijou-lhe a
mão.
- Esta é Blaze - Belle disse.
- Que cabelos maravilhosos! - Stepan dirigiu-se à única das irmãs de cabelos
vermelhos. Os cavalheiros a rodearão como moscas em torno da luz.
Blaze, sorriu, encantada. Ela apontou para uma mocinha de cabelos escuros que
estava ao seu lado.
- Bliss é minha irmã gêmea, apesar de termos cabelos de cor diferente.
- Que sorte terá o cavalheiro que a conquistar. Stepan virou-se então para
uma outra irmã. E você, quem é?
- Sou Serena, Alteza.
- Serenidade e beleza formam uma rara combinação.
- E o senhor é um Príncipe de verdade? - a jovem perguntou ruborizando.
- O senhor não parece ser um Príncipe - Blaze comentou.
- Como deve ser um verdadeiro Príncipe? Stepan perguntou divertindo-se com
a ingenuidade das mocinhas.
- Deveria usar uma coroa.
- Nem todos os Príncipes usam coroa.
Bliss tocou no braço de Stepan e virou-se, confiante, para as irmãs.
- Ele é um verdadeiro Príncipe.
Stepan voltou-se para Bliss com um olhar cheio de curiosidade.
- Como pode ter certeza de que não sou um impostor?

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Porque sei das coisas sem que ninguém precise contá-las para mim. Ela
apontou para a jovem que estava ao lado de Serena. Também Sophia e Serena são
gêmeas.
- O nome Sophia significa "sábia", Stepan disse. A senhorita é tão sábia
quanto bonita?
- Meu bom Deus! Que enjoo! - Fancy murmurou.
Stepan não se perturbou. Ao contrário, apenas riu. Concentrou sua atenção em
Raven, aquela que parecia a mais nova das irmãs.
- Aposto que é a caçula da família. Acertei?
- Um caçula reconhece o outro, não é? Meu nome é Raven e tenho dezesseis
anos.
- Como soube que sou o caçula da minha família?
- Prática. Sou a sétima filha de uma família de sete filhas. Stepan ficou
pensando se poderia se aproveitar do fato de que as irmãs de Fancy pareciam ter
simpatizado com ele. Contaria com elas para amaciar a agressividade da irmã mais
velha?
- Srta. Fancy Flambeau? - A voz pertencia a um cocheiro.
- Sim, sou eu.
- A Duquesa de Inverary gostaria de falar com a senhorita. O cocheiro
apontou para uma carruagem.
Stepan escondeu um sorriso. Para uma mulher que não gostava de
aristocratas, ela escolhera uma profissão que a deixaria rodeada de nobres. A
pobreza não promove as artes. Com as seis irmãs o seguindo, ele acompanhou Fancy
até a carruagem da Duquesa e fez as devidas apresentações.
- Vossas Graças, eu lhes apresento a srta. Fancy Flambeau.
- A senhorita canta como um anjo, a Duquesa elogiou.
- Obrigada, Vossa Graça. Fancy cumprimentou os dois nobres com uma mesura.
Minha mãe era cantora de ópera.
- Apesar de a carreira dela ter sido tão curta, eu me lembro de Gabrielle
Flambeau, a Duquesa disse. Stepan, espero que não esteja perturbando a srta.
Flambeau.
- Absolutamente, Duquesa. A dama e suas irmãs estão em segurança comigo.
- Não tenho tanta certeza assim, Fancy comentou.
- Oh, uma bela rosa com pétalas e espinhos. Stepan declarou, impassível.
- Não parece feliz, apesar do sucesso desta noite, comentou a Duquesa,
olhando para Fancy.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
-A srta. Flambeau não gosta de aristocratas, Stepan se adiantou antes que
Fancy pudesse dizer algo que ofendesse a Duquesa.
- Talvez uma opinião provocada por homens como você, meu jovem. E agora me
apresente essas mocinhas bonitas.
- São irmãs da srta. Flambeau. Belle, Blaze, Bliss, Serena, Sophia e Raven.
- Se quiser, poderemos nós mesmos acompanhar a senhorita e suas irmãs até a
casa delas, a Duquesa se ofereceu.
-Já me comprometi a fazê-Io, Duquesa. Stepan não deixaria escapar a chance
de ter um contato maior com Fancy.
- Vai levá-las diretamente para casa? - o Duque perguntou.
- Naturalmente.
As meninas subiram na carruagem e Fancy ficou para trás.
- Decidi que caminharei até a minha casa, ela disse para Stepan.
- Então, eu a acompanharei a pé e seguiremos a carruagem.
- Ora, quem diria! Um Príncipe que gosta de caminhar.
- Comecei a andar bastante cedo, Stepan ironizou. E mesmo os Príncipes
sabem que exercícios físicos fazem bem à saúde. Bem, onde mora, milady?
- Está me insultando?
- Eu jamais faria isso.
- Mas me chamou de milady.
- Para mim, a senhorita é uma lady.
Fancy não sabia o que pensar. Era a filha bastarda de uma imigrante francesa,
no entanto o Príncipe a tratava como se fosse nobre. Seria um plano para tentar levá-
la para a cama?
Aquele homem era bonito e charmoso demais, e ela precisava ficar alerta o
tempo todo. Sentiu vontade de se afastar correndo do Príncipe, em uma tola atitude
de autodefesa. Controlou-se, porém. Afinal, o que havia de mal em um passeio à noite,
caminhando atrás de uma carruagem onde estavam suas seis irmãs? Não seria isso que
modificaria sua vida.
- Fale-me sobre a sua família. A senhorita mora com sua mãe?
- Não.
- Simplesmente não?
Fancy suspirou, considerando que não era obrigada a contar ao Príncipe a
história de sua vida.
- Minha mãe morreu há cinco anos e a sra. Smudge faleceu no último inverno.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Quem era a sra. Smudge?
- Nossa babá. Meu pai a enviou para ajudar minha mãe a cuidar das crianças. A
família de minha mãe morreu durante a Revolução Francesa.
- E a senhorita e suas irmãs vivem sozinhas?
- Temos um cão-de-guarda.
O Príncipe colocou o braço em torno dos ombros de Fancy e continuaram
caminhando.
- Conhece a identidade de seu pai?
- Pretende desafiá-fo para um duelo?
- Se isso a fizer feliz...
- Prefiro não dizer o nome dele. Fancy hesitou um momento. Acredita que
nosso pai nos teria reconhecido se fossemos homens?
- Em geral, os aristocratas preferem ter filhos homens. Já eu prefiro uma
casa cheia de mulheres. Adoro tomar chá com minhas sobrinhas, filhas de meus irmãos
Mikhail e Viktor. Ouvir a conversa de meninas menores de dez anos me diverte.
Fancy não conseguiu esconder sua surpresa.
- Toma chá com suas sobrinhas?
- Todas as semanas. Gostaria de conhecer mais alguma coisa sobre mim?
- Não. Percebeu que estava sendo grosseira e se corrigiu. Desculpe-me. Não
quis ser indelicada. Claro que quero saber mais sobre a sua pessoa.
Stepan acariciou de leve o rosto de Fancy. Inclinou-se e a beijou com
delicadeza nos lábios. Inexplicavelmente, ela não se afastou.
- Ficarei muito feliz em lhe revelar todas as minhas qualidades e defeitos no
jantar de amanhã à noite. Ele fez um gesto apontando para uma direção. Ah, estamos
chegando à Soho Square.
A moradia de Fancy e de suas irmãs era um prédio de três andares de tijolos
vermelhos.
- Sophia pintou as portas - ela revelou. - De azul a que dá para o norte. É para
trazer boa sorte à casa. Pelo menos foi isso o que nos disse nossa babá.
- E as que dão para o sul?
- São vermelhas.
- Fancy! - Um homem surgiu do meio da noite.
- Alex. - Ela sorriu feliz com a chegada do jovem que devia ter uns vinte e
poucos anos e era quase tão alto quanto Stepan.
O Príncipe não conseguiu evitar de sentir ciúmes do desconhecido. Como isso

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
era possível? Ele praticamente acabara de conhecer Fancy.
- Alteza, quero lhe apresentar Alexander Blake. Alex, este é o Príncipe
Stepan Kazanov.
Os dois homens se entreolharam e nenhum deles estendeu a mão para
cumprimentar o outro.
Alexander Blake não parecia satisfeito. Virou-se para Fancy com o semblante
carregado.
- Esqueceu-se da sua promessa depois de apenas uma noite? Quer acabar
como sua mãe?
- Não me esqueci de nada.
- Estou pensando no que é melhor para você.
- E eu lhe agradeço por isso, Alex. Stepan olhou com curiosidade para Fancy.
- Que promessa fez, srta. Flambeau?
- Jurou que nunca se envolveria com homens como o senhor, Alexander
respondeu em lugar dela.
- Mas nenhum de vocês dois sabe qualquer coisa ao meu respeito.
- Conhecemos o seu tipo.
- Não quero discussões na minha casa. Fancy fez um gesto em direção à porta.
Por favor, entrem e tomem um cálice de vinho.
No hall de entrada, Stepan parou, surpreso, quando um enorme cão surgiu à
sua frente. O animal pulou em seu peito e começou a lamber-lhe o rosto, fazendo-o rir.
- Sente-se! - Fancy ordenou.
O cão imediatamente obedeceu, mas ficou observando Stepan com um ar de
admiração.
- Este é o seu cão-de-guarda? O Príncipe não segurou a risada. O que ele
faz? Mata os estranhos com lambidas de carinho?
- Ele nos protege quando precisamos. Fancy dirigiu-lhe um sorriso doce,
porém falso.
Stepan a seguiu por um corredor na direção de onde vinham vozes femininas.
- Qual a sua relação com Alexander Blake?
- Isso não é da sua conta, Alteza.
- A senhorita o considera um amigo, mas ele não vai se contentar apenas com a
amizade. Se não percebeu isso antes, fique atenta.
Entraram em uma cozinha espaçosa e aconchegante. A mesa era enorme e
tinha pernas de ferro e pés em formato de leão.

15
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Que móvel interessante! - o Príncipe exclamou.
- Foi meu pai que presenteou minha mãe com esta mesa. Mas venha até nossa
sala de estar.
Passaram pela sala de jantar e Stepan notou a mobília cara. Uma toalha de
linho cobria a mesa onde se encontravam peças de porcelana e copos de cristal. Um
candelabro francês ornamentava o centro da mesa. Em uma parede, havia um espelho
enorme e uma lareira com aparador de pedra.
O salão de estar era decorado em estilo francês. Pelo visto, a família não
sofrera pela ausência do pai, Stepan concluiu. O aristocrata, cujo nome ele
desconhecia, vinha sendo generoso, suprindo as filhas de bens materiais.
- Posso ajudá-lo a descobrir o assassino, Raven estava dizendo a Alexander em
uma conversa animada.
Fancy encarregou-se de servir o vinho.
- Alexander trabalha com o inspetor de polícia Amadeus Black. Já ouviu falar
do trabalho dele?
- Londres inteira conhece o inspetor de polícia. Stepan olhou diretamente
para Alexander. Os senhores já estão perto
de prender o assassino que desfolha pétalas de rosa sobre as suas vítimas?
Alexander fez um gesto de negativa. Parecia descontente.
- O assassino escolhe suas vítimas entre cantoras, dançarinas e atrizes.
Apenas as bonitas, naturalmente.
- Quem lhe disse que o assassino é um homem? - Raven perguntou. Pode ser
uma assassina com inveja da beleza dessas mulheres.
- Mulheres não costumam matar a sangue-frio, Alexander rebateu. Um bom
investigador elimina o provável antes de voltar sua atenção ao possível.
- E como ele mata suas vítimas? - Fancy estava curiosa.
- Ainda não sabemos exatamente, mas ele dilacera o rosto das moças depois
de mortas.
- Como sabe que eías já estavam mortas quando foram desfiguradas, sr.
Blake? - o Príncipe quis saber.
- O sangue não jorra se a pessoa está morta. Os ferimentos nas vítimas
estavam sem sangue.
- Senhoritas, peço que tomem cuidado até que esse monstro seja preso.
Stepan colocou seu cálice sobre a mesa e voltou-se para Fancy: - Preciso me despedir
agora. E o senhor também deve sair, disse dirigindo-se a Alexander.
O policial concordou sem reagir e logo os dois homens saíam pela porta da
frente.
16
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Quem o nomeou guardião das irmãs Flambeau? - Alexander perguntou quase
se descontrolando. Fancy não vai lhe dar o que está querendo.
- Não sabe o que eu quero, sr. Blake.
- Está planejando se casar com Fancy?
- Meus planos interessam apenas a mim.
- Se a magoar, eu o farei em pedaços.
- Pretendo viver até uma idade bastante avançada. Stepan caminhou em
direção à sua carruagem. Antes de entrar, olhou para Aíexander. Quer uma carona?
- Não preciso, mas obrigado, Alteza. Eu moro na casa ao lado.
Stepan praguejou em russo e subiu em sua carruagem.
Fancy e Belle estavam em um pequeno jardim atrás da casa.
- Quero que me dê alguma idéia de como posso dispensar o Príncipe sem
insultá-lo, Fancy pediu à irmã.
- Por que não dá uma chance a ele?
- Chance do quê? Não acredito que as intenções do belo Príncipe sejam
honradas e incluam um pedido de casamento.
Belle sorriu, enigmática.
- Nunca se sabe o que o destino nos reserva.
- A vida real não é como um conto de fadas em que um Rei se casa com uma de
suas criadas.
- Charles vai me levar para conhecer sua mãe no domingo. Se eu posso ser
aceita na sociedade, por que você não pode?
- Sei que você ama o Barão Wingate, mas... - Fancy não podia esconder sua
preocupação. Não confio totalmente no seu namorado. Lembre-se do que aconteceu
com mamãe, Belle.
- Charles me ama, a irmã insistiu. Apresentar-me à sua mãe é o primeiro passo
em direção ao casamento.
- Se acredita nisso...
- Acredito. Mamãe amava um homem que não podia se casar com ela.
Fancy se recusava a abordar essa questão. Tinha quase certeza de que Charles
Wingate não estava sendo totalmente honesto com Belle. Temia ver sua irmã
sofrendo. Da mesma forma que sua mãe sofrera.
Mesmo agora, havia ocasiões em que Fancy acordava à noite ouvindo a mãe
chorar. Por diversas vezes se levantara e se dirigira ao quarto onde sua mãe dormira.
Quando abria a porta, o choro cessava, e o aposento estava vazio.

17
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Gabrielle Flambeau não descansava em paz. Fancy não queria o mesmo destino
para a irmã.
- Irmãs, olhem isto.
Fancy e Belle se voltaram e viram Blaze entrar correndo no jardim. Segurava
um jornal.
- O Times mencionou você. Blaze passou o jornal para Fancy.
A srta. Fancy Flambeau roubou a cena no espetáculô de ópera na noite
passada, em sua estréia no Teatro Real de Ópera, obscurecendo a atual príma-dona.
Abençoada com uma voz maravilhosa, a jovem cantora demonstrou um incrível talento
e versatilidade e recebeu aplausos delirantes dos espectadores.
Filha de uma imigrante francesa e, segundo rumores, de um conhecido nobre
inglês, a srta. Flambeau conquistou o coração da elite de Londres, como ficou
evidenciado logo após o espetáculô. Cavalheiros alinharam suas carruagens em ambos
os lados da Bow Street, na esperança de conseguir - levar a bela cantora para casa.
Um certo Príncipe russo, um dos solteirões mais admirados pelas jovens solteiras,
venceu a competição e saiu do teatro com a cantora pendurada em seu braço.
Este repórter espera com ansiedade mais notícias sobre esse romance.
Fancy leu a matéria, irritada com a arrogância do repórter. Esperara
ansiosamente por algum comentário sobre sua estréia, mas nada a respeito de sua vida
pessoal. Será que também houvera no passado mexericos acerca do romance de seus
pais?
Nem todas as cantoras de ópera se tornavam amantes de nobres. Patrice
Tanner era um bom exemplo. A mulher se casara quatro vezes e enterrara três
maridos.
- Você não parece satisfeita - Belle observou surpresa.
- Ser alvo de mexericos não me parece nada animador.
- Fancy!
O que seria agora? Ela viu sua irmã mais nova lhe acenando.
- Chegou um mensageiro do Príncipe.
Trajando um uniforme, um senhor de meia-idade esperava por Fancy no hall de
entrada. Entregou-lhe um pacote.
- Um presente de Sua Alteza, Príncipe Stepan Kazanov.
- Não vai abrir o presente? - Belle perguntou tão logo o homem deixou a casa.
Fancy desamarrou o laço de fita e abriu o pacote. Dentro, havia violetas e um
bilhete.
“Minhas violetas persas se sentirão envergonhadas diante de seus lindos
olhos.”
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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Todas as irmãs suspiraram exclamando comentários como: Que romântico!
Parece um conto de fadas!
- Contos de fadas não se tornam realidade, meninas. Apesar das palavras
céticas, Fancy aspirou o perfume sensual das flores.
O russo era um romântico. Ou talvez fosse assim para conseguir persuadir as
mulheres a irem para a cama com ele. Somente um aristocrata podia comprar violetas
naquela época do ano.
Um leve sorriso surgiu em seus lábios. O Príncipe seria romântico ou um
canalha?
Fancy voltou-se para as irmãs, que sorriam. Ouviu-se uma batida na porta. Era
o Príncipe. A luz do dia não diminuía seus atrativos e até o deixava ainda mais
atraente. Fancy disfarçou um suspiro. Definitivamente, estava em apuros.
- Parece surpresa em me ver, srta. Flambeau - Stepan sorriu.
- Pensei que fôssemos nos encontrar apenas à noite.
- Vim convidar a senhorita e suas irmãs para um piquenique no próximo
domingo.
- Não poderemos ir.
- Um piquenique no domingo parece maravilhoso! - Bliss exclamou.
Fancy ignorou o olhar das irmãs e tentou manter sua negativa.
- Podemos levar Puddles, o nosso cão?
- Puddles também está convidado. - O Príncipe acariciou a cabeça do enorme
cão. - Eu me encarregarei da comida e do transporte.
- Duvido que caibamos todos em uma carruagem, Raven comentou.
- Um bom argumento para não aceitarmos... - Fancy agarrou-se a essa
desculpa.
- Eu tenho mais de uma carruagem - Stepan interrompeu a recusa. Se
quiserem, cada uma das senhoritas pode ir sozinha em uma carruagem. Até Puddles
pode ter a sua.
- Acredito que duas carruagens sejam suficientes, Alteza. Fancy sentiu que
caíra em uma armadilha. Acontecera assim com sua mãe? Pelo menos, ela não estaria
sozinha com o Príncipe, mas rodeada das seis irmãs mais um cachorro.
Já que não havia escapatória, Fancy acabou aceitando o convite para o
piquenique. Fez um gesto para o Príncipe, indicando que podia entrar, e o levou para a
sala de visrtas.
- Sente-se, por favor.
- Já leram o Times! - Stepan perguntou.

19
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Fancy fez sinal que sim.
- E o seu sucesso não a faz feliz?
- Ficaria satisfeita com os elogios se o repórter não tivesse incluído na
matéria aqueles comentários a respeito da minha vida privada.
O Príncipe sentou-se em um sofáe estendeu suas longas pernas.
- Ah, esse é o preço da fama.
- Está caçoando de mim?
- Nunca faria isso.
Fancy ficou pensativa por alguns instantes.
- Não pode ter aceitado com naturalidade os comentários do jornalista. Ela
encarou Stepan de frente.
- Aprendi a ignorar as invasões da minha privacidade. Além disso, o repórter
me fez um favor deixando claro que a senhorita é minha, e assim nenhum outro
cavalheiro a aborrecerá.
- Pertenço apenas a mim mesma, Alteza. Fancy irritou-se. Era uma pessoa, não
um objeto. Deve se ter em alta conta, já que acredita que nenhum outro cavalheiro
possa vir a me interessar.
- Não me preocupo com a competição. O sorriso de Stepan era quase infantil.
Por que devo beber água quando posso saborear o mais delicioso champanhe?
Fancy resolveu não discutir e simplesmente deixou de lado a ousada
observação do Príncipe.
- Obrigada pelas flores, Alteza.
- A perfeição das violetas me fez lembrar da sua beleza, Fancy.
- E onde arranjou violetas nesta época do ano?
-Gosto de jardinagem - Stepan respondeu, assim me distraio na minha estufa.
- Foi Vossa Alteza quem cultivou aquelas flores?
- Precisamente. Gosto de presentear com flores.
Ela acabou rindo. O Príncipe falava abertamente de suas conquistas. E Fancy
não podia negar que se sentia atraída por aquele belo homem.
Não demorou e Stepan se levantou, despedindo-se.
- Ah, quase me esquecia de lhe entregar. O Príncipe enfiou a mão no bolso e
tirou um pequeno pacote. Estendeu-o a Fancy. É para a senhorita.
Ela abriu o pacote.
- Canela?

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Sei que adora canela. O seu camarim tinha esse aroma.
Fancy o olhou, cheia de surpresa. Stepan sentira o cheiro que indicava a
presença da babá Smudge? Nem mesmo suas irmãs conseguiam senti-lo. Sem dúvida,
sua querida babá estava lhe enviando uma mensagem. “Escutar o que a razão mandava
ou seguir seu coração”?

Capítulo III
Fancy estava atrás do palco ouvindo o canto final da peça. Ao seu lado, sua
colega Genevieve parecia inquieta.
- Você está agitada. Aconteceu alguma coisa? - Fancy perguntou.
- Meu irmão tem vindo me buscar todas as noites para que eu não volte
sozinha para casa. Sabe, tenho medo do assassino que desfolha as pétalas de rosa em
cima de suas vítimas. Genevieve respirou profundamente. Hoje à noite ele tem um
compromisso e não virá me buscar. Estou assustada só de pensar no risco que posso
correr.
- Isso é tudo? - Fancy sorriu para a amiga. O Príncipe Stepan vai me levar para
jantar e com certeza terá prazer em levá-la para casa, Genevieve.
- Acha que ele não se importará de mudar de caminho?
- O Príncipe é uma pessoa muito gentil.
- Então, eu os encontrarei na porta do teatro.
Fancy continuou a escutar a música e o canto. Sentiu ao seu redor o cheiro de
canela e se lembrou de sua babá. “Escute a sua cabeça, criança, mas siga o seu
coração”.
Finalmente o espetáculo acabou e ela foi tirar a maquiagem e trocar de roupa
em seu camarim.
Uma batida na porta chamou sua atenção.
- Pode entrar.
O Príncipe permaneceu junto à porta. Mais uma vez, sua beleza masculina fez
com que Fancy sentisse estranhos arrepios pelo corpo. O sorriso dele, mostrando
dentes brancos e perfeitos, era mais uma amostra de sua perfeição.
Ele seria capaz de seduzir uma freira, Fancy pensou. Que chances ela teria de
recusar os seus avanços?
Em minutos estavam prontos e saindo do camarim. Alexander Blake se
encontrava nas proximidades da saída do teatro.
Fancy sorriu para o seu vizinho.
- Que bom que conseguiu arranjar um tempo para assistir ao espetáculo, Alex.

21
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Vendo Genevieve, ela fez as apresentações.
- Eu lhe apresento Alexander Blake, meu velho amigo. Alex trabalha com o
inspetor de polícia Amadeus Black e está tentando capturar o assassino que joga
flores nas vítimas.
Fancy notou imediatamente o interesse de Alex por sua amiga. Também
Genevieve parecia ter gostado do policial.
- Esse assassino me deixa apavorada - Genevieve murmurou. Meu irmão não
virá me buscar esta noite, como usualmente faz. Mas o Príncipe...
- Terei prazer em levá-la para casa, ofereceu-se Alexander.
- Eu a protegerei com a minha vida, ele disse galantemente. Genevieve olhou
para Fancy, que fez um gesto de incentivo.
Então, aceitou o braço que Alexander lhe oferecia e saíram juntos do teatro.
Fancy sorriu com satisfação. Gostava de Alex e gostava de sua amiga. E os
dois pareciam interessados um pelo outro.
- Muito bem, mademoiselle. Stepan estava aliviado por terem se livrado do
amigo de Fancy. Podemos ir?
- Onde vamos jantar? - ela perguntou, decidida a pular da carruagem caso ele
dissesse que jantariam na mansão dos Kazanov.
-No Belle Sau vage. Pensei que gostaria de comer algum prato francês.
- E o que os russos gostam de comer?
- Cantoras de ópera.
Fancy caiu em uma gargalhada. O Príncipe tinha seu charme.
O restaurante ficava perto do rio Tâmisa. Em seu interior, bastante
aconchegante, os clientes falavam em voz baixa e velas tremulavam sobre suas mesas
colocadas em pequenas alcovas.
O Príncipe Stepan pediu moules marinieres, mexilhões cozidos no vinho e
servidos em suas conchas. Então, voltou-se para Fancy dando-lhe toda a atenção.
- Fale-me sobre a sua família.
- Gabrielle Flambeau era a filha mais nova de um aristocrata francês. Ela e
sua babá fugiram da França perseguidas pelos revolucionários. Todos os seus parentes
morreram.
- E veio com a babá Smudge?
- Não, sua babá era outra. A sra. Smudge veio bem mais tarde, quando a babá
de mamãe havia morrido. Mamãe, então, conheceu meu pai, qúe insistiu para que ela
deixasse o teatro. Foi quando engravidou.
Stepan tomou um gole de seu vinho.

22
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- E foi então que a babá Smudge chegou e ajudou sua mãe a criar você e suas
irmãs?
- Não foi exatamente assim. Mamãe é quem ajudou a nova babá a nos criar -
Fancy o corrigiu rindo.
- Nesse caso, a babá Smudge se tornou uma espécie de mãe para você.
- Exatamente. - Fancy tomou um gole do vinho e o achou delicioso. Naquele
minuto, ficou imaginando o que seria sentir a pressão dos lábios de Stepan sobre os
dela.
- Fancy, onde você está? Parece ter se transportado para um outro mundo.
Ela forçou um sorriso e procurou afastar os pensamentos sensuais que haviam
entrado em sua mente.
- A babá Smudge adorava canela. Fancy revirou os olhos fazendo o Príncipe
rir. Comíamos biscoitos de canela, pão de canela, bolos de canela, cookies de canela...
A sra. Smudge acreditava que canela dava sorte na vida.
Stepan ficou observando-a falar de seu passado. Era ingênua, inteligente,
sensual e bonita.
Fancy merecia mais do que o lugar de amante. Suas qualidades exigiam um
casamento honrado.
O Príncipe e a cantora de ópera? Os mexericos durariam uma década. Por
outro lado, dois de seus irmãos haviam escolhido suas esposas sem a aprovação da
sociedade. Rudolf se casara com a filha de um Conde endividado, e Viktor se
apaixonara pela filha de um mercador.
Fancy também observava o Príncipe. Ele não era mais um aristocrata sem
nome, sem rosto, sem caráter. Stepan era simplesmente um homem charmoso e
atraente. Muito atraente.
- Agora fale sobre suas irmãs - Stepan pediu.
Ela ficou indecisa. Se contasse sobre os talentos especiais de suas irmãs,
poderia desencorajar o Príncipe. Ou ele a classificaria de mentirosa, ou a veria como
louca. De qualquer forma, seria uma maneira de colocar uma distância entre ambos.
Exatamente o que Fancy pretendia. Ou não?
Stepan lhe dirigiu um olhar indagador.
- Pensei que a minha fosse uma pergunta simples.
- Quer saber realmente a verdade?
- Nada mais do que ela.
- E promete não contar a ninguém o que vou lhe revelar?
- Eu respeitarei a sua confidência.

23
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Então que seja, Alteza. - Fancy colocou o garfo sobre o prato e limpou os
lábios com o guardanapo. A verdade é que minhas irmãs possuem talentos especiais,
poderes estranhos vindos do além.
- Explique isso melhor, por favor.
- Belle possui uma alma gentil tão grande quanto a sua beleza. Fancy observou
o olhar do Príncipe antes de continuar: - Suas mãos têm o poder de curar.
Não apareceu nenhum sinal de dúvida na expressão de Stepan.
- Blaze pode se comunicar com os animais. O Príncipe não estava reagindo
como ela esperava. Bliss ama os números e algumas vezes sabe o que as pessoas estão
pensando, sobretudo quando pode tocá-las.
Stepan continuou em silêncio, o que deixou Fancy inquieta. Ele estaria se
decidindo se tinha uma mentirosa ou uma louca à sua frente? Mesmo assim, continuou
a revelar os segredos das irmãs.
- Deus abençoou Serena com uma voz perfeita, um talento para tocar flauta e
uma afinidade com o vento. Sophia, a pintora, pode julgar as pessoas pelas cores de
suas auras. Ela parou de falar, tentando descobrir o que Stepan pensava. Sendo a
sétima das irmãs, Raven possui muitos talentos. O sorriso de Fancy era
particularmente doce. Ela consegue mover os objetos com o poder da mente.
- E quanto a você, Fancy? Que talento esconde?
- Vejo, escuto e sinto a presença de pessoas mortas ao meu lado. Vopê
também parece ter esse dom.
- Eu? Como assim?
Fancy apenas sorriu, mas não disse nada. Somente um homem especial poderia
estar ainda sentado ali à sua frente depois de ter ouvido todas aquelas revelações
bizarras. Esse era um sinal enviado pelo além? Ou pela babá Smudge?
- Já falei demais. Agora é sua vez, Alteza.
- Pois eu tenho leyado uma vida comum. Nasci o mais novo de cinco irmãos,
sendo que um continua em Moscou.
- Como era a vida na Rússia?
- Nasci, estudei e fiquei adulto, então me mudei para a Inglaterra. Meus
irmãos e eu temos muitos negócios por aqui, o que nos permite viver com luxo. Sendo o
mais novo, sofro caçoadas de todos os meus irmãos.
Stepan tomou mais um gole de vinho, antes de continuar com seu relato.
- Meu pai nunca dedicou o seu tempo para nós, mas um de seus primos nos
levava com frequência para caçar. Vladimir, meu irmão que está em Moscou, sempre
ficava em casa ao lado de meu pai, mas quatro de nós aproveitávamos para acampar
junto a uma fogueira e dormir sob as estrelas.

24
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Fancy riu, satisfeita por estarem trocando confidências. E estava mudando
sua opinião a respeito do Príncipe. Nunca percebera que aristocratas eram pessoas que
também tinham medos e famílias. Nunca considerara os nobres, humanos.
- Quem é seu pai? Stepan perguntou sem preâmbulos.
Fancy perdeu o bom humor.
- Um aristocrata de sangue frio.
Ele cobriu a mão de Fancy com a sua em um gesto de carinho.
- Seu pai se preocupou com o bem-estar de sua mãe e de suas filhas, querida.
- Mamãe o amava e mesmo assim, ele a magoou.
- E quanto a você?
Fancy o olhou sem entender bem a pergunta.
- Você o amava?
- Suponho que sim. Até que um dia ele deixou de nos visitar.
- E você se deixou levar pela raiva.
- Não senti falta de meu pai, ela declarou com rancor. Ele tem sido generoso
com o seu dinheiro, mas não com o seu amor.
Stepan deu de ombros, decidido a mudar de assunto.
- Se pensa assim...
- Penso.
- Então, deixemos as lembranças de lado e falemos do futuro. Amanhã à noite
irei a um baile na casa do Conde e da Condessa de Winchester, parentes de uma de
minhas cunhadas.
- Se estiver pensando em me convidar para acompanhá-lo, pode desistir. Não
conte com a minha presença.
- Você vai comigo.
- Não vou aonde não sou desejada.
- Eu quero você comigo.
- Já pensou no que dirão seus parentes e amigos se o virem entrando na festa
com uma cantora de ópera?
- Tudo isso é bobagem.
Fancy não sabia que decisão tomar. Precisava arranjar rapidamente uma
desculpa.
- Não tenho uma roupa adequada para usar.
- Trata-se disso? Pois está resolvido.

25
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Não vou permitir que me compre um vestido.
- Comprarei um que combine com a cor de seus olhos.
- Vossa Alteza sempre consegue o que quer?
- Os filhos caçulas levam vantagem sobre os outros. Pena que tenha nascido a
mais velha, Fancy.
- Muito bem, Stepan. Irei ao baile com você.
- Nunca duvidei disso. Bem, vou levá-la para casa.
Pouco tempo depois, a carruagem real parou em frente à casa da família
Flambeau, na Soho Square. O Príncipe saltou e ajudou Fancy a descer.
Ela hesitou, pensando em como se despediriam.
- Obrigada pela noite surpreendentemente agradável, murmurou com voz um
pouco trêmula.
- Vou levá-la até a porta. Dê-me a chave, por favor.
- Isso não é necessário.
Stepan ficou parado com a mão estendida e Fancy lhe entregou a chave. Uma
vez aberta a porta, ele colocou-se de lado para deixar Fancy entrar e depois a seguiu.
Como tinha acontecido na noite anterior, o cão subiu em cima de Stepan e o
Príncipe acariciou suas orelhas enquanto devolvia a chave para Fancy.
-Boa noite, mademoiselle. Que seus sonhos sejam agradáveis.
Sem nenhuma outra palavra, ele virou-se e logo entrava em sua carruagem.
O Príncipe não tinha lhe dado um beijo de boa-noite.
Fancy estava sentada em seu camarim, olhando a própria imagem refletida no
espelho quebrado. Por que nem tentara beijá-la? O que havia de errado com ela?
Esperara que Stepan a beijasse ao deixá-la em casa. Um beijo respeitoso,
claro. No entanto beijara-lhe apenas a mão.
Nesse momento, Genevieve Stover entrou no camarim com ar sonhador.
- Obrigada por ter me apresentado o seu amigo Alexander, ela disse dirigindo
a Fancy o maior dos sorrisos. Ele me levará para casa hoje à noite. E quanto ao seu
Príncipe?
- Convidou-me para um baile que acontecerá na residência de uns parentes
dele.
- Que maravilha!
- Será? - Fancy sorriu para a amiga, temerosa quanto ao que o futuro lhe
reservava.
Fancy olhou para o vestido cor de violeta, e a insegurança roubou-lhe a

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
confiança. Depois de sua última ária, tinha voltado ao seu camarim para esperar o fim
da ópera e comparecer a uma recepção em que ninguém a aceitaria ou pelo menos a
família do Príncipe não a veria com bons olhos.
Sentiu-se presa em uma armadilha.
Sentiu-se comprada.
Sentiu uma urgência em escapar.
O mundo fechou-se ao redor de Fancy. O pânico chegou a tais proporções que
ela passou a respirar mal. Suas mãos tremiam e sentiu-se enjoada.
Sinto muito, Strudge, mas hoje à noite preciso seguir a minha cabeça, pensou.
Vestiu sua própria roupa, deixando sobre uma cadeira o vestido que ganhara
de presente. Abriu apenas uma fresta da porta para ver se havia alguém a esperando.
Como não percebeu a presença do Príncipe, escapou pela porta dos fundos do teatro.
Controlou-se para não começar a correr, já que isso apenas chamaria a
atenção das pessoas na rua. Distanciou-se do teatro e rezou para que Stepan não
estivesse pelos arredores.
De repente, notou que a rua estava estranhamente silenciosa. O assassino das
pétalas de rosa veio à sua mente. Sua pulsação disparou e Fancy quase gritou de medo
quando uma carruagem apareceu inesperadamente e parou bem ao seu lado.
- Ei, moça - um homem chamou. - Não quer ganhar um bom dinheiro?
Fancy o ignorou e voltou a andar. Foi quando sentiu a mão agarrar seu braço.
Vestido como um cavalheiro, o homem que a segurava era alto e forte e
razoavelmente bonito. Cheirava à bebida.
- Por que a pressa, mocinha?
- Largue-me imediatamente! - Fancy gritou. O homem apenas riu e a segurou
com mais força.
- Você não é aquela cantora...
Fancy se pôs a chutá-lo, mas o desconhecido foi mais rápido e começou a
arrastá-la em direção à carruagem.
- É melhor vir comigo, ele murmurou com um perverso sorriso nos lábios.
- Largue a moça!
Fancy percebeu que dois homens se aproximavam. Seu atacante a soltou,
entrou rapidamente na carruagem e sumiu de cena, deixando-a sozinha com seus dois
salvadores.
- A senhorita está bem? Sou Douglas Gordon, o Marquês de Huntly, e este é
meu primo, Ross MacArthur, o Marquês de Awe - o primeiro homem se apresentou.
Fancy olhou, agradecida, para os dois cavalheiros.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Não podemos deixá-la voltar para casa sozinha. Douglas Gordon apontou
para a sua carruagem. Nós a levaremos.
- Obrigada, milordes. Fancy meneou a cabeça. Posso continuar sozinha. Estou
bem próxima da minha casa.
-Não ficaremos tranquilos deixando-a aqui na rua. Douglas Gordon olhou em
volta. Veja, está tudo silencioso demais.
- É perigoso. Não precisa ter medo de nós, senhorita. - O Marquês de Awe
abriu um sorriso cativante, procurando convencer Fancy a segui-los.
- A srta. Flambeau me pertence.
Fancy voltou-se ao ouvir a voz do Príncipe e jogou-se em seus braços.
Felizmente, ele a estava procurando. Por pouco não lhe acontecera uma coisa
pior do que ser mal recebida pela sociedade.
- Você está bem? - Stepan perguntou a Fancy, olhando-a com preocupação.
Está machucada?
Ela negou com a cabeça.
- Ross e eu a salvamos de Eddie, o Louco, Douglas Gordon disse ao Príncipe. -
Anda descuidando de suas posses, Kazanov?
- E eu lhes agradeço por terem salvado a srta. Flambeau.
- Uma bela jovem. Por acaso tem irmãs? Douglas perguntou a Fancy.
- Seis.
Os dois escoceses olharam um para o outro e riram. Despediram-se e partiram
em sua carruagem.
Stepan ficou olhando para o rosto pálido de Fancy.
- O que devo fazer com mademoiselle?
- Beije-me, ela pediu.
O Príncipe não esperou por um segundo pedido. Fancy fechou os olhos,
sentindo o calor do corpo de Stepan, a batida de seu coração, a sua força.
- Tenho esperado por isso há muito, ele sussurrou.
E então seus lábios se tocaram em um primeiro beijo gentil. Os lábios do
Príncipe eram quentes e firmes, fazendo com que todo o pensamento racional fugisse
da mente de Fancy.
Stepan acariciou-lhe a nuca. Mudou o jeito do beijo, movendo sua boca em um
convite para que ela também participasse.
Envolvida naqueles braços fortes, Fancy estava sem forças para recusar esse
convite.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
O beijo foi longo e o mundo pareceu parar. Para ela, todo o universo se
resumia no corpo e nos lábios do Príncipe. Stepan acariciou-lhe os lábios com a língua,
testando sua doçura.
E então o beijo terminou.
O primeiro beijo de Fancy.
- Eu... eu estava com medo.
- Está segura agora. Não confia em mim? Ela sorriu.
- Minhas pernas estão trêmulas.
- Você passou por uma experiência assustadora. Felizmente o maluco que a
abordou não era o assassino que anda matando moças por aí.
- Meus nervos estão assim por causa do seu beijo, Stepan.
- Fancy, você não deve fazer esse tipo de observação a um homem - ele disse,
ajudando-a a subir na carruagem.
- Por que não devo?
- Ora, isso dá ao homem uma vantagem muito grande.
- Você já está com essa vantagem, Alteza. Mas a mínha casa fica em outra
direção. Para onde está me levando?
- Para a minha casa.
- Recuso-me a ir.
- Vou apenas lhe oferecer um jantar e discutiremos o que lhe aconteceu esta
noite. Nada mais, eu lhe prometo.
Dez minutos depois, a carruagem real parava em frente a uma mansão na
Grosvenor Square. Stepan desceu primeiro e ajudou Fancy a descer.
A porta da frente se abriu e um mordomo de meia-idade observou Fancy com
curiosidade.
- Boa noite, Alteza.
- Bonés, peça a Feliks para nos servir zakooska e vodca na sala de estar.
- Sim, Vossa Alteza. O mordomo desapareceu pelo corredor.
Fancy não se sentia muito à vontade. Era a primeira vez que se encontrava na
casa de um homem. Se alguém descobrisse que entrara na mansão do Príncipe, sua
reputação estaria arruinada. Não importava se ali acontecesse apenas um jantar. Os
mexericos se espalhariam.
- Relaxe. Veja, nossa comida está chegando.
Bonés e dois homens enormes entraram na sala. Todos os três carregavam
bandejas e as colocaram na mesa perto do sofá. Em uma bandeja, havia uma garrafa

29
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
com um líquido claro, dois cálices e pequenos pratos. As outras duas travessas
continham variedades de comida, nenhuma familiar a Fancy, com exceção de pão,
queijo e salsichas.
- Obrigado, Bonés. Pode deixar que nos servimos sozinhos. Um dos homens
ficou parado tossindo.
- Ah, sim. Fancy, deixe-me lhe apresentar Feliks, meu chef de cuisine, que
veio comigo da Rússia. E este é Boris, o irmão de Feliks, que trabalha como meu
guarda-costas.
- Estou encantada em conhecê-los. - Ela sorriu para eles. Os dois homens
saíram da sala falando em russo.
- Tome, isto é vodca - Stepan disse, entendendo-lhe um cálice. Beba de um só
gole. E depois coma este queijo.
Fancy seguiu suas instruções, engasgou e começou a tossir furiosamente.
- Coma o queijo.
Comer o queijo?
Ela olhou para o Príncipe, que se divertia ao vê-la secar as lágrimas que
escorriam em seu rosto. A tosse não parava e Fancy sentia a garganta queimar.
- Vodca e você não combinam. Mas, diga-me, está com fome?
- Mulheres mortas não comem.
- Desculpe-me por não a ter alertado em relação à vodca. É uma bebida muito
apreciada na Rússia exatamente porque é assim forte. Stepan dirigiu-lhe o mais
charmoso de seus sorrisos. Peço-lhe perdão.
Fancy acabou rindo e aceitou um pãozinho que ele lhe estendeu. Deu uma
pequena mordida naquela comida desconhecida chamada zakooska.
- Gostou?
- É uma delícia. O que é?
- Caviar.
- Nunca comi antes. Mas o que é de fato?
- Ovas de peixe.
Fancy colocou a rnão sobre a garganta, como se estivesse enjoada.
- Caviar é uma fina iguaria. Mas, se não quiser comer, tudo bem.
Stepan pegou a mão de Fancy e esperou que ela o encarasse.
- Por que fugiu esta noite? Senti-me presa em uma armadilha. E comprada.
E temi acabar como minha mãe. Não podia dizer essas coisas ao Príncipe.
Prefiro andar sem roupa pela rua a usar um vestido comprado por um homem que não é

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
meu marido.
- Pensando bem, eu também a prefiro nua.
Fancy não se deixou levar pela brincadeira.
- Fui apressado demais, Stepan desculpou-se. Refiro-me a introduzi-la na
sociedade. Quando estiver pronta, você me diz e eu a acompanharei.
Fancy se emocionou com essa inesperada gentileza. Estava difícil não se
apaixonar por Stepan. Mas ela não podia, não podia...
- Por que está agindo assim? - Fancy perguntou.
- Estou cortejando a minha doce cantora. Ele beijou-lhe a mão. Ea proíbo de
voltar para casa sozinha ao sair do teatro. Boris, o meu guarda-costas, a acompanhará
nos dias em que eu não puder estar lá. E isso não é negociável.
- Muito bem. Permitirei que Boris me acompanhe até a minha casa, quando isso
for necessário.
- Ótimo. Agora, vou levá-la para casa. E não se esqueça do nosso piquenique
amanhã.
- Duvido que minhas irmãs comam caviar.
- Prometo que não lhes servirei.
Quinze minutos mais tarde, Stepan ajudou Fancy a descer da carruagem em
frente à moradia da família Flambeau e a acompanhou até a porta.
- Veja. O Príncipe apontou para um buque de flores que alguém havia colocado
na soleira da porta. Eram beladonas. Ele franziu a testa, um pouco preocupado. Na
linguagem das flores, beíadona significa um alerta de morte.
Alexander Blake sentia-se muito bem ao lado de Genevieve Stover. A jovem
cantora tinha o rosto angelical e seus cabelos lembravam os das Princesas dos contos
de fadas. Estava encantado e se sentindo feliz por haver tido a sorte de conhecê-la.
- Realmente não se magoou quando Fancy ficou com o papel que você desejava?
- Fiquei um pouco decepcionada, mas Fancy tem uma voz poderosa. Eu lhe
garanto que a carreira dela será um sucesso.
O garçom se aproximou e lhes serviu suas refeições.
- Trabalhar com o inspetor de polícia deve ser excitante, Genevieve comentou
enquanto começava a comer.
- Ao contrário do que todos acreditam, um inspetor de polícia leva uma vida
muito monótona. - Alexander sorriu. São poucos os momentos excitantes.
- Você acredita que conseguirão prender o assassino das pétalas de rosa?
- Creio que sim. Não será fácil, mas ele acabará deixando alguma pista.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Como ele mata as suas vítimas?
- Não discutirei esse assunto aqui. Posso lhe dizer que as mulheres não
parecem ter sofrido em suas mãos.
- Então vamos mudar de assunto. Desde quando conhece Fancy?
Alexander sabia que Genevieve queria obter informações que atestassem o
interesse dele pela amiga.
- Fancy e eu somos como irmãos. - Ele notou a expressão de alívio de
Genevieve. - Sempre fomos vizinhos. Agora, fale sobre você.
- Quando meus pais morreram, meu irmão e eu herdamos uma casa na rua
Compton. Ele deixou a casa quando se casou, e eu alugo quartos para dançarinas e
atrizes. Genevieve parou de falar e franziu a testa. Há um homem olhando
insistentemente para a nossa mesa, murmurou.
Alexander virou-se para a direção que ela indicara. O homem bem vestido que
os observava era um dos empregados de seu avô, e saber que estava sendo vigiado
deixou o policial irritado.
- Você o conhece?
Alexander negou. Dizer de suas suspeitas a Genevieve não levaria a nada,
- Quem sabe a viu cantar na ópera e a seguiu, ele inventou.
- Agora, me diga se tem um tempo livre para mim amanhã. Genevieve não
conseguiu esconder o sorriso.
- Pois irei até a sua casa e cozinharei para você - ela se ofereceu.
- Ficarei muito feliz com isso. - Alexander estava exultante. Uma mulher se
oferecendo para cozinhar para ele era por demais interessante. Nem podia acreditar
em sua sorte. Pouco depois, o casal se encontrava na frente da casa de Genevieve.
Delicadamente, Alexander a beijou nos lábios.
- Boa noite, Genevieve - uma voz feminina soou bem perto. Os dois se separam
imediatamente.
Vestida de vermelho, uma das dançarinas de bale passou por eles e subiu em
uma carruagem.
- Aquela é Phoebe - Genevieve explicou. Perdeu o seu protetor, lorde
Parkhurst, e está atrás de outro.
Alexander inclinou-se e beijou-a mais uma vez.
- Até amanhã.
Feliz com as perspectivas positivas do dia seguinte, Alexander logo estava em
sua casa. Raven o esperava.
- Preciso falar com você, Alexander. É urgente,

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Raven estivera sentada perto da janela de sua casa por horas esperando o
amigo aparecer. Sabia que podia ajudá-lo a identificar o assassino das pétalas de rosa.
E se trabalhassem juntos, Alexander repararia que ela havia se tornado uma mulher.
Então, se apaixonaria. Isso era tudo o que Raven mais desejava na vida.
Alexander acendeu uma vela, serviu-se de uísque e o tomou. Virou-se então
para Raven.
- O que tem para falar comigo de tão urgente, menina? O tratamento "menina"
desanimou Raven.
- Posso ajudá-lo no caso do assassino das pétalas de rosa. Tive uma visão esta
noite.
- Uma visão?
- Vi alguém costurando o que não devia ser costurado e... Alexander colocou
um dedo nos lábios de Raven impedindo-a de continuar a falar.
- Agradeço esse seu interesse, mocinha, mas não posso chegar até meu chefe
e lhe dizer que o caso foi solucionado porque minha vizinha maluca teve uma visão.
- Não sou maluca! Raven se sentia frustrada. Quero ajudá-lo. Eu amo você.
Alexander ficou parado por uns momentos, surpreso com a declaração de
amor. Como lidaria com Raven sem ofendê-la? Todas as irmãs Flambeau eram como
irmãs para ele.
- Não deve me amar, não como uma mulher ama um homem. Alexander passou
as mãos nos cabelos. Querida, você só tem dezesseis anos e...
- Não me diga o que devo sentir, seu arrogante!
E com essas palavras, Raven saiu da casa batendo a porta.
- Bem me quer, mal me quer...
Um elegante cavalheiro, vestido em traje de noite, estava junto ao rio Tâmisa.
Olhou para a mulher, bela ainda em seu repouso de morte, e continuou
despetaíando a rosa.
- Vai demorar?
O cavalheiro voltou-se para o lado, onde uma mulher o esperava dentro da
carruagem.
- Não muito.
E ele continuou, impassível.
- Bem me quer, mal me quer...

Capítulo IV

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
O dia amanheceu claro e razoavelmente quente. Especial para animar as
pessoas. No entanto, também marcava uma coisa que estragava sua perfeição: o corpo
de uma mulher coberta por pétalas de rosa.
Alexander Blake foi ao encontro de dois homens absorvidos numa conversação.
Ele esperara encontrar Amadeus Black, mas o promotor Lowing era uma desagradável
surpresa. Bamey, o ajudante do inspetor de polícia, estava examinando a área onde a
mulher tinha sido colocada.
- Perdemos uma dançarina, e logo outra aparece em Londres - Lowing dizia. -
Somente mulheres de virtude duvidosa é que devem temer pelo assassino das pétalas
de rosa. Infelizmente a população inteira está assustada.
Ao ouvir o promotor, Alexander lembrou-se de seu avô. Desagradava-lhe ouvir
uma autoridade falar com leviandade de uma pobre vítima. O promotor julgava aquele
crime menos grave por ser a morta uma dançarina. Se fosse uma dama da sociedade,
Lowing estaria arrancando os cabelos de desespero.
A mulher morta, vestida de vermelho, era exatamente a mesma que ele vira na
noite anterior saindo da casa de Genevieve.
- Conheço esta mulher! - Alexander exclamou dirigindo-se ao seu chefe. Eu a
vi à noite passada.
- Voto pela sua inocência. O promotor esperou que os dois homens rissem de
sua piada, mas tanto Alexander como Amadeus Black permaneceram em silêncio. Isso
irritou Lowing. Estou surpreso que seu avô lhe permita associar-se com mulheres
desse tipo.
Alexander preferiu ignorar a desagradável observação. Voltou-se para
Amadeus:
- Phoebe aluga um quarto na casa de uma amiga minha.
- Alugava, o promotor o corrigiu.
- Quem é essa sua amiga? - Amadeus Black perguntou.
- Genevieve Stover canta na ópera.
- Hum... Cantoras de ópera se equivalem a dançarinas, Lowing comentou
maldosamente.
Dessa vez não só Alexander ignorou o promotor. Amadeus Black preferiu
fingir não ter ouvido o comentário.
- Agora eu sei por que nunca há testemunhas dos crimes desse assassino. Vi
quando a vítima subiu em uma carruagem. Infelizmente não reconheci a quem
pertencia e nem mesmo a identificaria se a visse de novo.
Amadeus Black colocou uma mão em seu ombro. Gostava de Alexander.
- Ninguém espera testemunhar um crime, e mesmo o melhor de nós não fica

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
alerta para detalhes a qualquer momento do dia.
Barney aproximou-se e entregou um anel ao inspetor de polícia.
- Achei isto perto da vítima. Pode não pertencer a ela, mas... O anel era
pesado e de ouro, um estilo apropriado tanto para homens como para mulheres. Um
nítido "P" estava gravado no topo.
- O que você acha? - o promotor perguntou. Amadeus Black voltou-se para
Alexander:
- Você perguntaria à sua amiga se Phoebe possuía um anel de ouro com a letra
"P" gravada?
- Genevieve me contou que o ex-protetor de Phoebe era lorde Parkhurst.
-Interessante. Um casal cujos nomes começam com "P". Um é vítima. O outro
seria o do assassino?
- Perguntarei a lorde Parkhurst- o promotor anunciou. Claramente irritado,
Amadeus Black virou-se para Lowing:
- Não o interrogará sem que eu esteja presente. E, antes disso, Alexander
perguntara à sua amiga sobre o anel. Ele olhou para Alexander. Ninguém tocou o corpo.
Pode examiná-lo.
Alexander aproximou-se do cadáver mais uma vez. Não havia ferimentos ou
sangrameníos. Um corte no queixo, sem sangue. A expressão serena indicava que a
mulher morrera sem perceber. Rosas inteiras estavam colocadas em suas orelhas.
Abaixando-se para ver melhor, Alexander notou que as pálpebras e os lábios
haviam sido costurados, o mesmo que acontecera com as outras vítimas.
Vi alguém costurando o que não devia costurar. As palavras de Raven Flambeau
ditas na noite anterior lhe voltaram à mente, alertando-o.
A menina tivera uma visão? Não que visões fossem aceitas em um tribunal.
Precisava conversar com Raven para saber exatamen-te o que ela vira, mas não tinha
certeza de que a jovem estaria disposta a tanto depois da forma como haviam se
separado.
- O que está vendo? - o inspetor de polícia perguntou.
- O assassino repetiu o seu ritual como das outras vezes.
- E como acha que ela morreu?
- Provavelmente envenenada. Nada que lhe provocasse dores, porque sua
expressão é serena.
Momentos depois os três homens se separavam. Alexander preferiu caminhar
um pouco,'ainda abalado com a experiência de ver a jovem morta, com os lábios e olhos
costurados. Precisava falar com Genevieve e lhe dar a má notícia.
Não demorou e estava diante da casa de Genevieve, que o recepcionou com
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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
surpresa.
- Bom dia, Alexander. Todos ainda estão dormindo.
- Posso entrar? O que preciso falar com você é confidencial.
Ela deu um passo para o lado, permitindo que ele entrasse, e o levou até uma
pequena sala.
- Você parece misterioso.
- Sente-se, por favor.
- Por quê? - Agora havia medo na voz de Genevieve.
- Faça o que estou lhe pedindo. Quando ela se sentou, Alexander se ajoelhou à
sua frente e tomou-lbe as mãos.
- Na noite passada, Phoebe foi vítima do assassino das pétalas de rosa.
- O quê? Surpresa invadiu os olhos de Genevieve, e depois lágrimas
escorreram por seu rosto. Suas mãos começaram a tremer.
- Preciso lhe fazer algumas perguntas, querida. Sabe de quem era a carruagem
em que ela subiu à noite passada?
- Não sei.
- Foi lorde Parkhurst quem terminou o romance com Phoebe ou o contrário?
- Suponho que tenha sido lorde Parkhurst, já que Phoebe começou a procurar
um novo protetor.
- E ela lhe fez confidências? Contou-lhe a razão de o romance terminar?
- Sinto muito, mas não sei de nada. A voz de Genevieve soou chorosa.
- Não fique assim. Não pode me dizer o que não sabe. Alexander lhe acariciou
as mãos. - Sabe me dizer se Phoebe tinha um anel de ouro com a letra "P" gravada?
- Nunca a vi usando um anel assim.
- Bem, vai me prometer que jamais sairá sozinha do teatro. Prometa-me.
- Eu prometo.
Ele beijou-lhe a palma de cada uma das mãos e então se levantou.
- Não quer ir para a minha casa? Prometeu cozinhar para mim, lembra-se?
- Mas eu me sinto culpada de estar me divertindo enquanto...
- Não tem de se sentir culpada porque a sua vida continua e a de Phoebe
acabou, querida.
- Mas podemos passar por uma capela? Gostaria de fazer uma oração.
- Naturalmente.
Genevieve procurou controlar sua emoção e sorriu docemente para Alexander.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- O que. vai querer de almoço?
- Quero você.
Stepan fez uma cara engraçada ao olhar para o cachorro, que encostara a
cabeça em seu ombro enquanto a carruagem seguia para o lugar escolhido para o
piquenique.
- Nós, homens, fomos deixados de lado, meu amigo - ele abraçou o cão.
Fancy e Raven caíram em uma gargalhada. O Príncipe olhou para as duas e riu
também.
- Por que me foi destinado o lugar ao lado de Puddles?
- Para que eu pudesse ficar olhando para o seu lindo rosto - Fancy murmurou,
dirigindo-lhe um sorriso que era puro flerte.
- Está brincando comigo, minha pequena. Poderíamos ter colocado Puddles com
as gêmeas.
- Nesse caso, as pobrezinhas viajariam sem conforto.
- Lamento que Belle não tenha vindo conosco, Stepan observou.
- O Barão Wingate a levou para conhecer a mãe dele.
- Tenho um mau pressentimento a respeito disso, Raven murmurou baixinho.
- Também não gosta do Barão, não é, Raven? Fancy comentou, virando-se para
a irmã.
- O Barão Wingate nunca se casará com Belle.
- Tem certeza?
Raven confirmou com um gesto de cabeça. O Príncipe entrou na conversa:
- Nunca gostei do Barão.
Fancy observou-o com curiosidade.
- Diga-me a razão, Stepan.
- Nas poucas vezes em que o vi, o Barão Wingate me pareceu uma pessoa
afetada, dessas que se preocupam demais com as aparências. Deixou claro que
desprezava as pessoas com menos dinheiro. Sua mãe é uma mulher amarga. E vou lhe
dizer uma coisa com franqueza. O Barão Wingate estava não só acompanhado de sua
mãe, mas da amiga da Baronesa, lady Clarke, e sua filha solteira, Cynthia.
- Isso não significa nada. Fancy deu de ombros. Belle é a mulher mais bonita
de Londres. Por que o Barão se interessaria por outra mulher?
Stepan arqueou uma das sobrancelhas.
- Depois que dancei com lady Cynthia, a mãe de Charles conversou comigo,
dizendo que esperava unir o filho a Cynthia. Lady Clarke escutou a conversa e mais

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
tarde disse que não estava de todo satisfeita com um possível casamento entre os
dois jovens. Acredito que ela preferia ter um Príncipe na família a um Barão.
- E o que você prefere? A expressão dos olhos de Fancy era indecifrável, e
sua voz soou fria.
- Prefiro a morte a me casar com Cynthia Clarke.
Essa resposta trouxe de volta o sorriso ao rosto de Fancy.
Ao chegarem ao lugar escolhido para o piquenique, todos desceram, inclusive
Puddles, que correu em direção ao rio. Fancy caminhou ao lado de Stepan enquanto os
criados do Príncipe carregavam as cestas com comida.
Depois de estender diversas cobertas onde as jovens podiam se sentar,
Stepan começou a pegar a comida. Havia sanduíches de ovos e pepino, frango frio e
bolinhos de limão.
- Ah, estou vendo uma iguaria. Stepan olhou para Fancy ao pegar um pedaço de
pão preto e colocar caviar sobre ele.
- Nem tente me beijar antes de lavar a boca - ela disse rindo.
- É um convite?
- Nada disso.
- O que está comendo, Príncipe? - Blaze perguntou. Fancy respondeu antes de
Stepan:
- Sua Alteza está comendo caviar, isto é, ovas de peixe.
- Credo! - Blaze parecia enjoada.
Stepan comeu o pão e pegou outra fatia, na qual passou caviar. Fancy me disse
que você se comunica com os animais, Blaze. Pode me dizer o que Puddles está
pensando agora?
- Puddles pensa que ele adoraria experimentar o caviar. Nesse preciso
momento, o cão roubou o pão da mão do Príncipe.
Todos riram, inclusive Stepan e seus criados.
- Um de seus cavalos está com uma pedra na ferradura, Blaze disse com
naturalidade.
Stepan fez um gesto para que um de seus homens examinasse o cavalo. Boris
examinou o animal e encontrou a pedra; dirigiu ao Príncipe um olhar de surpresa.
Agora, pensou Fancy, ela e sua família pareciam pessoas nada normais para
aqueles homens.
- Somos pessoas normais, não malucas, Stepan.
- Ah, contou-me sobre os talentos de suas irmãs pensando em me
desencorajar?

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Não foi por isso.
- Espero que não esteja mentindo. Fancy não disse nada. O que poderia dizer?
- Adoro as cores da natureza, Sophia disse, quebrando o silêncio.
- Ah, você é a pintora. Na Rússia, acreditamos que quando a cor de uma flor
capta a sua atenção, é que a sua fada está cumprimentando você.
- Que pensamento adorável. Sophia sorriu.
Fancy também se encantou com o Príncipe. Na verdade, ele tinha se tornado
uma fonte de surpresas nos últimos dias. Não parecia uma pessoa sem caráter. A não
ser que estivesse fingindo.
Inesperadamente, Raven levantou-se de onde estava.
- Belle precisa de nós! - ela exclamou. Temos de voltar imediatamente para
casa.
- O Barão Wingate deve ter aprontado alguma, Fancy disse com raiva.
Nenhuma das irmãs nem sequer cogitou se a visão de Raven poderia ser uma
fantasia.
Menos de uma hora mais tarde, as carruagens do Príncipe chegavam à casa de
Fancy. Esta não esperou pela ajuda de Stepan e desceu rapidamente, entrando na casa
como um furacão. Suas irmãs a seguiam.
Fancy foi a primeira a chegar onde Belle estava e parou, horrorizada.
Caída no chão, com o rosto sangrando, Beíle não se mexia. Havia um enorme
corte em uma de suas faces.
Stepan observou Fancy e soube imediatamente que ela seria de pouca ajuda.
Assim, fez um gesto para as meninas darem espaço e ajoelhou-se ao lado de Belle.
- Relaxe, Beíle, estamos aqui e agora tudo vai ficar bem.
O Príncipe começou a dar ordens como se fosse um general falando com sua
tropa.
- Sophia, pegue as cobertas que estão na carruagem. Serena, traga aqui
toalhas limpas. Bliss, coloque uma agulha bem fina em água fervente. Raven,
precisamos de ufsque. Blaze, corra até o vizinho e conte a ele o que aconteceu aqui.
- Como vocês souberam que eu precisava de ajuda, Belle perguntou com um fio
de voz.
- Raven teve uma visão.
- Forre o sofá com uma das cobertas, Stepan pediu para Sophia. Abaixou-se
então e falou carinhosamente com Belle: - Vou levá-la para o sofá e alguma de suas
irmãs vai costurar o seu corte.
Raven voltava com uma garrafa de uísque.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Quando eu levantar os seus ombros e a cabeça - o Príncipe instruiu Belle,
tome um grande gole de uísque.
Ela obedeceu e começou a tossir.
- Muito bem. Tome outro. E outro.
Fancy observava o Príncipe em ação. Mal podia acreditar que um dia pensara
que ele fosse um canalha. Mais parecia um médico do que um conquistador.
Belle conseguiu tomar dez goles de uísque e pareceu relaxar.
Stepan se abaixou para falar com a jovem ferida:
- Quer que Fancy costure o seu corte?
-Não! Fancy é a piorcostureira de Londres, Belle conseguiu dizer e inclusive
sorriu. Raven é quem dá os menores pontos.
Fancy virou-se para Raven, e a menina estava pálida como uma cera.
- Raven, lave as mãos - Stepan ordenou. Belle, você confia em mim? Sei como
fazer com que não sinta dor.
- Sim, Vossa Alteza, eu confio.
- Fancy, fique atrás da poltrona e...
- Por quê?
- Não discuta. Apenas me obedeça.
Quando Fancy estava posicionada atrás da cabeça da irmã, o Príncipe começou
a instruí-la:
- Coloque as palmas em ambos os lados da cabeça de Belle para mantê-la
firme.
- Não seria melhor se fosse você a fazer isso? É muito mais forte.
- Faça o que eu digo.
Procurando não se enervar, Fancy fez exatamente o que Stepan lhe
determinara.
- Raven, coloque a linha na agulha - o Príncipe disse. Eu lhe direi quando
começar.
Sua voz foi se tornando mais baixa e macia. Logo estava sussurrando no ouvido
de Belle.
- Feche os olhos e deixe os músculos relaxarem. Respire fundo e solte o ar.
Mais uma vez. E outra mais. Isso, muito bem. Agora, visualize uma escada com dez
degraus que levam a uma porta fechada. Está vendo a escada e a porta?
- Sim.
- Suba o primeiro degrau, Belle, e sinta os seus músculos relaxando. Dez,

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
nove, oito, sete, seis, cinco, quatro, três, dois, um. Suas pernas estão pesadas, mas
você pode subir o segundo degrau.
Stepan guiou Belle a subir uma escada imaginária.
- Agora, abra a porta e caminhe. O que vê?
- Um prado verde com muitas flores. E há um riacho.
- Vá até onde a água corre e diga-me o que está vendo.
- É uma cachoeira, Belle murmurou. Há flores sobre a água, e eu estou
pisando em uma grama macia. O sol aquece o meu rosto.
- Deite-se na relva e fique ouvindo o barulho da cachoeira.
- Stepan olhou para Raven e fez sinal para que começasse. Pálida, Raven
começou a costurar o rosto da irmã.
Fancy fechou os olhos, mas continuou segurando Belle. Stepan prosseguia
murmurando palavras suaves no ouvido da jovem, incitando-a a relaxar mais e mais.
Fancy sentiu quando os pontos haviam acabado e abriu os olhos. A expressão
de Belle era surpreendentemente plácida.
- Ah, até que enfim você chegou. Bliss abria a porta para Alexander. E trouxe
alguém junto.
Fancy viu Alexander e Genevieve parados na soleira da porta. Seu olhar se
fixou em Raven. Não precisava ver a expressão do rosto da irmã para saber que ela
estava magoada.
- Genevieve é uma amiga, Alexander disse apresentando-a.
- Ela canta com Fancy na ópera.
- Tragam-me um espelho - Belle pediu.
- Não acredito que seja uma boa idéia - Fancy disse, vetando o pedido. O
tempo vai fazer com que o ferimento deixe apenas uma cicatriz muito pequena.
- E Belle pode responder a algumas perguntas? - Alexander quis saber.
Fancy dirigiu um olhar indagador para Stepan. Era ele quem decidia se Belle
estava ou não em condições de falar. O Príncipe fez sinal que sim.
- Diga-me o que aconteceu, Belle, Alexander pediu.
- Alguém que estava escondido dentro da casa me pegou por trás e cortou o
meu rosto. Cobriu a minha boca com a mão para que eu não gritasse.
- E ele a tocou... em suas partes íntimas?
- Não.
Alexander virou-se para as irmãs:
- Sentiram falta de algum objeto de valor? Elas menearam a cabeça.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Esse era um sinal de que o intruso estava querendo ferir Belle, Fancy pensou.
- Como a mãe do Barão Wingate a recebeu? - perguntou ela a Belle.
- Foi delicada comigo. Assim como o irmão de Charles.
- Você nunca mencionou que Charles tinha um irmão.
- É que George não aparece muito. Ele usa uma bengala. É apenas meio-irmão
de Charles.
Alexander pegou a mão de Belle e a segurou com carinho.
- Quando puder escrever, coloque tudo do que se lembrar em um papel. Mesmo
os menores detalhes.
- Gostaria de me deitar agora, Belle murmurou.
Ela levantou-se do sofá bem devagar, com a ajuda do Príncipe. Depois saiu da
sala, sustentada por duas de suas irmãs. Raven preparou-se para segui-las.
- Genevieve, você poderia voltar para a minha casa? - disse Alexander.
Gostaria de conversar com Raven. É sobre o meu trabalho.
- No que está pensando? - Fancy perguntou ao amigo.
- Se o assassino das pétalas de rosa tivesse atacado Belle, ela agora estaria
morta, Alexander respondeu. O monstro segue o mesmo ritual com cada vítima.
- Belle não foi estuprada, roubada ou morta, Stepan disse.
- Quem a atacou queria que ela ficasse com uma cicatriz. Alexander concordou
com o Príncipe e depois olhou para Raven.
- Fale-me sobre a sua visão.
- Que visão? - Fancy perguntou, surpresa.
- Raven me procurou ontem à noite, Alexander respondeu. Ela havia tido uma
visão sobre o assassino das pétalas de rosa.
- Acha que minha visão pode ajudar em alguma coisa? A voz de Raven soou
mais fria do que as águas do Tâmisa no inverno.
- Acredito que qualquer coisa pode ajudar neste caso.
Raven fechou os olhos e compenetrou-se.
- Vi o corpo de uma mulher vestida de vermelho.
- Você viu um vestido vermelho? Raven abriu os olhos e encarou Alexander.
- Foi o que eu disse.
- O que isso significa? - Fancy perguntou.
- Ontem à noite, o assassino matou mais uma mulher. E ela usava um vestido
vermelho.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Vi mãos, acrescentou Raven.
- De homem ou de mulher?
- Vi apenas dedos longos.
- Tente mais.
- Vi um anel de ouro. Alexander empalideceu.
- Se tiver outra visão, quero que me procure imediatamente, Raven, ele pediu.
- Por que está bravo com Raven? Ela não matou ninguém, Fancy reclamou.
Alexander ficou um minuto em silêncio, perturbado com os próprios
pensamentos.
- Achamos um anel na cena do crime esta manhã. E o monstro costurou as
pálpebras e os lábios da vítima, exatamente como Raven previu.
- Meu Deus! Fancy apoiou-se no Príncipe.
Stepan colocou os braços em torno dos ombros dela e a puxou para junto de
si.
- Acreditamos que ele costura as vítimas depois que elas estão mortas,
Alexander comentou.
Alexander despediu-se e saiu. Fancy olhou para Stepan com uma idéia na
cabeça.
- Você acha interessante falar com o Barão Wingate sobre o que aconteceu
com Belle?
- Quer que eu o traga aqui para visitá-la?
- Só se ele sugerir isso.
- Uma sábia decisão.
- Onde aprendeu a arte de tirar a dor como fez hoje com minha irmã? - Fancy
perguntou, curiosa.
- Eu não tiro a dor, mas a redireciono. Uma vez quebrei o braço e, enquanto o
médico me examinava, meu irmão Rudolf fez exatamente o que fiz para Belle. Bem...
hoje o dia foi longo e perturbador. Vou embora, mademoiselle.
Fancy sorriu para o Príncipe.
- Boa viagem, monsieur. Ela jogou-se nos braços de Stepan. Obrigado por ter
sido tão maravilhoso com Belle. Não sei o que teríamos feito sem você.
- Um elogio? Estou surpreso. Stepan inclinou-se e beijou Fancy nos lábios. Um
beijo muito suave.
Depois disso, virou-se e deixou a casa.
- Quero falar com o Barão Wingate.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
O mordomo fez um ar de poucos amigos.
- A família está tomando seu café da manhã. É muito cedo para visrtas. Se o
senhor me der o seu cartão...
- Não vou lhe dar cartão nenhum. Quero falar imediatamente com o Barão.
- Muito bem, espere aqui enquanto...
- Não espero em soleira de porta.
- Então me siga, senhor...
- Sua Alteza, Príncipe Stepan Kazanov.
O sangue sumiu do rosto do mordomo.
- Vossa Alteza, queria aceitar as minhas...
- Poupe-me. Já perdi muito do meu precioso tempo.
- Sim, Vossa Alteza.
Stepan caminhou por um corredor que levava à sala de jantar. Estava irritado
com a atitude do mordomo, que discriminava as pessoas. Agora que o sabia Príncipe,
bajulava-o.
- Alteza, que surpresa! - a Baronesa exclamou ao ver Stepan entrar na sala.
O Príncipe fez um gesto para que os dois homens permanecessem sentados e
sorriu para a Baronesa.
- Surpresa agradável, espero. Diga-me como consegue parecer tão linda assim
cedo.
A Baronesa riu como se fosse uma garotinha.
- Nunca havia notado o quanto Vossa Alteza é galanteador.
- Madame, juro que falo somente a verdade.
A Baronesa colocou sobre a mesa uma xícara da mais fina porcelana.
- Nigel, traga café para Sua Alteza. E um prato com ovos e salsichas, ela
instruiu o mordomo.
- Sim, madame.
- Aceito apenas café, por favor.
- Não tinha a menor idéia de que sabia onde eu morava. Charles Wingate
sorriu para o Príncipe. A que devo esta honra?
- Como deve saber, estou cortejando a srta. Fancy Flambeau, Stepan começou.
- Cortejando uma cantora de ópera com intenção de se casar com ela? A
Baronesa pareceu horrorizada. Não pode estar falando sério.
- Nunca falei tão sério na minha vida. Não sabia que as irmãs Flambeau são de

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
origem nobre?
- Ouvi rumores. Quem é o pai das jovens?
- Logo saberá, Baronesa, Stepan mentiu. Virou-se em seguida para Charles: -
Belle foi atacada depois que você a levou para casa ontem.
- O quê? - Surpreso, Charles Wingate levantou-se de sua cadeira. Eu deixei
Belle na porta de casa.
- Sente-se, a Baronesa ordenou.
Charles sentou-se imediatamente, isso deixou claro a Stepan o domínio que ela
exercia sobre o filho.
- O que aconteceu com a doce criatura? - a Baronesa perguntou.
- Alguém entrou em sua casa e a esfaqueou no rosto.
- Oh, pobrezinha!
- Em seu lindo rosto? - Charles lamentou, claramente aborrecido.
Em seguida, dirigiu um olhar para a mãe, como pedindo para dizer o que ele
deveria fazer.
- Devo visitá-la?
- Duvido que a pobrezinha se sinta bem a ponto de receber visrtas.,
- Discordo. - Stepan levantou-se. Uma visrta de Charles vai animá-la.
- Certo, Vossa Alteza. Então iremos juntos.
- Em minha carruagem, Stepan propôs.
O Barão parecia preocupado com alguma coisa. Finalmente, fez a Stepan a
pergunta que o atormentava:
- Belle foi violada?
- Felizmente, não!
- Isso me alivia. Eu jamais a perdoaria se tivesse sido estuprada.
O Príncipe quase tropeçou nos degraus ao ouvir essas palavras. Charles
Wingate era um idiota que merecia ser chicoteado. Levá-lo para visrtar Belle tinha
sido uma péssima idéia.
Alexander Blake e o inspeíor de polícia Amadeus Black esperavam para falar
com lorde e lady Parkhurst.
-Eles formam um estranho casal-Amadeus murmurou para o seu auxiliar. - A
esposa é mais velha que o marido.
- É ela quem tem o dinheiro?
- Ah, sim.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Lady Parkhurst apareceu para recepcionar os policiais. Devia ter uns quarenta
anos, era baixa, gordinha e apenas simpática.
- Viemos devolver o anel de seu marido, lady Parkhurst. - Alexander se
adiantou estendendo o anel.
Lady Parkhurst examinou a jóia.
- Este anel não pertence a meu marido.
- Tem certeza?
- Naturalmente.
Lorde Parkhurst entrou na sala naquele exato momento. Era alto, devia ter uns
trinta e poucos anos e bem-apessoado.
- Senhores, em que posso ajudá-los?
- Gostaríamos de lhe fazer algumas perguntas - Amadeus disse.
- A presença de minha esposa é necessária?
- Não, milorde.
- Então, pode sair, querida. Não se esqueça de fechar a porta. Ela hesitou,
com a esperança de que o marido a deixaria ficar.
- Não vão precisar de mim?
- Dificilmente.
Tão logo a mulher saiu da sala, Amadeus estendeu o anel para Parkhurst.
- Milorde, reconhece este anel?
- Não.
- Ele não lhe pertence?
- Tenho gosto mais refinado.
- Este anel pertencia a Phoebe. Lorde Parkhurst assumiu um ar inocente.
- Não conheço nenhuma Phoebe.
Alexander gostaria de arrancar a verdade daquele homem.
- Não manteve um romance com uma bailarina chamada Phoebe? - Amadeus
Black perguntou.
- Senhores, sou um homem casado.
Amadeus inclinou a cabeça, pensativo.
- Desculpe-nos por termos tomado o seu tempo, milorde. Venha, Alexander.
Tão logo os dois saíram da casa, Alexander virou-se para o chefe:
- Esse homem está mentindo, Amadeus.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Sei disso, Aíex. A partir de hoje, quero que Barney siga todos os passos
dele. E, naturalmente, temos de ser discretos e não deixar que perceba qualquer coisa.
No hall de entrada, Fancy viu quando Stepan chegou acompanhado de Charles
Wingate. Não tinha muita certeza de que tivesse sido uma boa idéia trazer o Barão
para visrtar Belle. Sua irmã era uma jovem de constituição fraca. Se Charles a
magoasse...
- Vou perguntar a Belle se ela quer receber visrtas, Fancy disse friamente ao
Barão quando ele entrou na casa.
Belle hesitou por um momento ao saber que Charles viera visitá-la. Colocou a
mão em cima do corte.
- Você não é obrigada a vê-lo.
- Mande-o entrar. Belle sabia que era bobagem esperar mais tempo para saber
a reação de Charles diante de sua cicatriz.
Fancy abriu a porta e fez um gesto para que o Barão subisse até o quarto de
sua irmã. Depois que ele entrou e fechou a porta, ela ficou ali perto. Stepan logo
estava ao seu lado.
- Vai escutar atrás da porta? - ele lhe sussurrou.
- Preciso proteger minha irmã.
O Príncipe colocou um braço em volta de seus ombros.
- Também a protegerei.
- Oh, minha pobre querida! Charles exclamou. Sinto-me tão culpado...
- Não deveria estar se culpando, Belle disse.
- Deixe-me ver o seu lindo rosto.
- Não é mais um lindo rosto, Charles. Vou ficar com uma cicatriz.
- Bobagem, querida. Deixe-me ver.
Silêncio.
Fancy olhou para o Príncipe e ficou imaginando se o Barão não teria se
horrorizado ao ver o corte. Stepan parecia se sentir culpado, temendo ter feito uma
bobagem ao trazer Charles até ali.
- Você vai se recuperar, querida.
O tom hesrtante da voz do Barão não inspirou confiança em Fancy. Ela olhou
para o Príncipe mais uma vez. Sua reação era a mesma.
- Eu deveria tê-la acompanhado até dentro de casa, disse o Barão.
- Minhas irmãs estavam fora,- Belle o lembrou. Não poderíamos ficar
sozinhos. Seria tentação demais. Quero continuar virgem até o dia do nosso

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
casamento.
Silêncio novamente. Um prolongado silêncio.
Agora Fancy estava alarmada. O Barão não podia ser cruel a ponto de terminar
seu namoro com Belle um dia depois de ela ter sido atacada.
-Pensa que o Barão a esteja beijando? perguntou o Príncipe, esperançoso.
- Não. Todo o ódio contra os aristocratas que Fancy cultivara nos últimos anos
retornou.
- Bem, querida, o fato é... o Barão Wingate hesitou. - Minha mãe acredita que
não devemos nos casar.
- Mas sua mãe foi tão delicada comigo.
- Ela nunca se comporta de outra forma. Sua nobreza sempre está presente,
não importa a sua opinião.
-Nobreza? Belle parecia confusa. Mas o pai da Baronesa não era um vigário, e
seu primeiro marido, um escudeiro?
Fancy sentiu o sarcasmo na voz da irmã. Belle podia estar magoada, mas era
orgulhosa.
- Esse assunto não está em questão agora.
- Minha mãe era uma Condessa, Belle disse, e meu pai é um Duque, o que me
faz mais nobre do que sua mãe.
- Mas seus pais nunca se casaram. O Barão estava claramente irritado e havia
hostilidade em sua voz. Você nasceu uma bastarda.
- Ele é um porco miserável, Stepan quis abrir a porta, mas Fancy o impediu. -
Dê .um passo atrás, que vou matá-lo!
- Vingança não serve para nada, Alteza.
- Gostaria que saísse agora. - A voz de Belle soou emocionada.
- O que eu quis dizer é que... preciso de tempo para convencer minha mãe de
que uma união entre nós é interessante.
- Leve o tempo que precisar, Charles. Eu, naturalmente, vou examinar os meus
sentimentos por você.
Fancy e Stepan se afastaram da porta do quarto de Belle e tentaram
aparentar que não haviam escutado nada da conversa de havia pouco.
O Barão Wingate caminhou para a porta da saída.
- Gostaria de sair agora.
Stepan abriu a porta e indicou a saída para o Barão. Confuso, Wingate olhou
para o Príncipe.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Alteza, estou aborrecido e gostaria de voltar para casa.
- Não levo pessoas de classe inferior em minha carruagem. Arranje-se
sozinho. Com essas palavras, Stepan bateu a porta na cara do Barão.
Fancy o abraçou, agradecida.
- Você foi maravilhoso!
- Obrigado, mademoiselle.
Então, ouviram o choro vindo do quarto de Belle. Fancy fez um movimento para
ir confortá-la, mas Stepan a impediu.
- Deixe Beíle aliviar a sua dor em paz. Nada que você possa fazer irá ajudá-la
neste momento. E eu vou embora agora. Meus irmãos estão me esperando. - Stepan
beijou-a e caminhou para aporta.
Fancy ouviu o choro novamente, mas se controlou. O Príncipe estava certo.
Belle tinha o direito de chorar em privacidade.
Logo depois, Stepan subia as escadas dirigindo-se ao escritório do Duque de
Inverary. Bateu na porta e entrou sem esperar pela permissão. Quando os quatro
homens que se encontravam lá dentro o olharam com surpresa, ele sorriu para o Duque
e para seus três irmãos mais velhos.
- O que está fazendo aqui? - o Príncipe Rudolf perguntou.
- Vim assistir a uma reunião de negócios.
- Por quê? O Príncipe Viktor parecia desconfiado.
- Está com problemas? O Príncipe Mikhail indagou.
- Nada disso. - Stepan serviu-se de uísque. Um homem sem trabalho é um
homem sem direção.
Os três Príncipes e o Duque caíram em uma gargalhada.
- A srta. Flambeau acredita que eu preciso de um emprego, Stepan esclareceu.
Isso fez os homens rirem ainda mais.
- Se está querendo trabalhar, o Duque disse, é porque sua ligação com a srta.
Flambeau deve ser séria.
- Fancy e eu não mantemos uma relação íntima, Stepan admitiu, mas estou
envolvido com os problemas da sua família.
O Príncipe Mikhail sorriu diante das palavras do irmão.
- Que problemas podem ter as mocinhas? Problemas de roupas?
- Jóias? - indagou Rudolf.
- Peles? - acrescentou Viktor.
Stepan tomou um gole de seu uísque antes de responder:

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Belle Flambeau foi atacada em sua casa ontem à tarde. O assaltante a
esfaqueou no rosto.
Isso acabou com o bom humor e as provocações dos quatro homens.
- E ela está muito ferida? - perguntou o Duque com ar de preocupação.
- Um dos lados de seu rosto precisou ser costurado.
- E a pobre moça carregará para sempre uma cicatriz? Stepan fez um sinal
que sim.
- Talvez eu possa lhe enviar o meu médico para examiná-la, propôs o Duque.
- Isso não será necessário. Nós a tratamos com o melhor dos médicos.
- Você estava lá? - Rudolf perguntou.
- Eu havia levado seis das irmãs mais um cachorro para um piquenique, Stepan
explicou, e seus irmãos riram de novo.
- Suponho que um homem que toma chá com garotinhas goste de levar
mocinhas a piqueniques.
- Encontramos Belle caída no chão da entrada, e uma das irmãs mais novas a
costurou, Stepan disse, ignorando o comentário do irmão.
- Por que ela não foi ao piquenique? - perguntou o Duque com curiosidade.
- Belle foi conhecer a mãe de Charles Wingate. O Barão havia lhe prometido
casamento, mas bastou ver o seu rosto costurado para dizer que não se casaria com
ela.
O silêncio reinou na sala, cada homem pensando na jovem ferida e agora
magoada pelo namorado.
- Wingate não disse que estava terminando o relacionamento por causa da
cicatriz. Afirmou que sua mãe jamais aceitaria uma nora bastarda. Felizmente a
mocinha não tinha lhe entregado sua virgindade.
Rudolf olhou surpreso para Stepan.
- Como sabe disso?
- Fancy e eu estávamos atrás da porta escutando Belle e o Barão conversando.
Quando o Barão saiu do quarto e me pediu para levá-lo para casa, eu lhe disse que
ninguém de classe inferior entrava na minha carruagem. E fechei a porta na cara do
homem.
Agora o bom humor voltava ao ambiente e os quatro homens riam mais uma
vez. Logo discutiam negócios. Stepan prestou atenção e ouviu que seus irmãos e o
Duque comentavam que uma empresa estava prejudicando a deles ao abaixar demais os
preços.
Era uma empresa cujo dono tinha o nome começado por "P", aparentemente

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Puddles. Esse nome deixou Stepan em alerta.
- Vocês conhecem o dono da empresa? - ele perguntou.
- Apenas um de seus representantes.
- E o nome dele é Alexander?
- Como sabe? Conhece o homem?
Stepan não fez nenhum outro comentário, perdido em seus pensamentos. A
empresa que estava prejudicando a de seus parentes chamava-se As Sete Pombas,
tinha um agente chamado Puddles e um representante chamado Alexander. Se
dissesse aos irmãos e ao Duque o que sabia, jamais o levariam a sério.

Capítulo V
Naquela noite, Stepan estava como sempre à espera que o espetáculo
terminasse para levar Fancy para casa. Quando entrou no camarim, encontrou-a
conversando com Bishop, o diretor.
- Genevieve cantará a parte do querubim amanhã à noite, ele estava dizendo.
Fancy lançou um olhar de preocupação para o Príncipe..
- Está me demitindo, sr. Bishop?
- Genevieve assumirá o seu papel apenas uma noite. Isso porque você estará
cantando no baile promovido pelo Duque de Inverary.
- Não canto em festas particulares. - Fancy enfrentou o olhar de seu chefe.
- Vai ter de se apresentar nesse baile, isso se quiser continuar cantando na
minha ópera.
- Muito bem. Ela suspirou, resignada. Mas esta será uma exceção.
- Discutiremos isso em outra hora. O diretor fez um gesto de despedida para
o Príncipe e saiu do camarim.
- Odeio ser forçada a fazer uma coisa que eu não quero. Fancy suspirou e
olhou para Stepan. Não vou me sentir bem na residência do Duque. Foi você quem me
arranjou essa apresentação?
- Juro que não tive nada com isso. A Duquesa adora ver gente famosa em suas
festas, e Londres inteira quer ouvir você cantar.
- Peio que vejo, o sucesso tem seu preço.
- Muitas mulheres trocariam de lugar com você, Fancy.
- Você quer dizer que milhões de mulheres mudariam de lugar comigo para
estar ao seu lado, Príncipe Kazanov?
- Isso também, ele brincou.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- E você me levará diretamente para casa hoje à noite? Estou preocupada com
Belle.
- Só se me prometer que usará o vestido violeta amanhã à noite.
- Prometo.
Quando Fancy entrava na carruagem do Príncipe, este ousou lhe fazer um
pedido.
- Posso lhe pedir um favor?
- Claro.
- Peça a Bliss que pare de prejudicar a empresa dos Príncipes Kazanov.
- O quê?
- Não se faça de inocente comigo, Fancy. Sei que a empresa As Sete Pombas
está arruinando as concorrentes. E sei muito bem quem são as sete pombas...
Fancy lhe dirigiu um sorriso enigmático e nada disse.
- Muito bem, minha pequena cantora, guarde os seus segredos.
Fancy olhou-se no espelho. Trajava o vestido de seda cor de violeta que o
Príncipe lhe dera. Para combinar, ela escolhera um xale de cashemere, sapatos de
cetim e longas luvas brancas.
- Você sabe quem estará lá - ela dirigiu-se a Raven. O que farei se ele vier
falar comigo?
- Papai nem vai reconhecê-la. Você está muito diferente da menina que ele viu
anos atrás.
- Tem razão. Bem, você avisa o Príncipe de que não vou me demorar?
- Você parece uma Princesa de um conto de fadas – Raven murmurou,
encantada. Então se dirigiu à porta para atender ao pedido da irmã,
Fancy respirou profundamente. Não havia dúvida de que seu pai estaria no
baile. Se ousasse abordá-la, ela fingiria não saber dos laços que os uniam.
Nesse momento, um cheiro de canela invadiu o quarto. A babá Smudge estava
enviando seu conselho.
“Escute a sua cabeça, criança, mas siga o seu coração.”
Stepan encontrava-se no hall de entrada quando Fancy desceu as escadas.
- Você está maravilhosa. Tão perfeita que nem parece real.
- Oh, mais um de seus elogios.
- Não consigo me decidir o que admiro mais, a sua infinita beleza ou a sua
língua afiada.
Os dois entraram rindo na carruagem e logo chegavam a Park Lane. Ao

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
caminhar para a entrada da residência do Duque, Fancy começou a ficar nervosa mais
uma vez. Suas mãos tremiam, e surgiu uma dor inesperada em seu estômago.
- Relaxe, minha pequena. Imagine-se no palco. Stepan lhe estendeu a mão. Ela
parecia uma mulher se dirigindo à forca.
- Às vezes me sinto enjoada antes de entrar no palco. Quer que isso me
aconteça agora?
- Pois erga o queixo e encare as pessoas. Lembre-se, sua mãe era uma
Condessa, e seu pai é um Duque. A falta de um certificado de casamento não diminuiu
a sua origem nobre. Ficarei ao seu lado o tempo todo. Stepan apertou-lhe a mão. E
como pode ter certeza de que seu pai estará no baile? Talvez ele nem tenha sido
convidado.
Fancy dirigiu-lhe um olhar desanimado.
- Príncipe Stepan Kazanov e a srta. Fancy Flambeau, anunciou o mordomo.
Fancy hesitou quando viu os convidados virando as cabeças para olharem a
entrada do Príncipe e da cantora de ópera. E então ela viu seu pai observando cada um
de seus passos.
Stepan a guiou em direção a um grupo de senhoras e cavalheiros.
- Quero que conheça a minha família.
- E se eles me desaprovarem?
- Por que fariam isso?
Fancy percebeu que ele estava sendo sincero. Isso lhe deu forças para seguir
em frente.
O salão era imenso e iluminado por enormes candelabros de cristal. A
orquestra estava posicionada perto da pista de dança. A maioria das pessoas
conversava enquanto alguns casais dançavam uma valsa.
- Pessoal, eu lhes apresento a srta. Fancy Flambeau - Stepan anunciou quando
se aproximou de sua família. Com orgulho em sua voz, ele indicou cada parente e amigo.
- Fancy, eu lhe apresento meu irmão mais velho, Rudolf, e sua esposa, Samantha. Co-
nheça Viktor e sua esposa, Regina, e Mikhaih Robert Campbell é filho do Duque de
Inverary, e esta é sua esposa, Angélica. Aqui está minha prima Amber e seu marido,
Miles Montgomery.
Fancy cumprimentou cada um deles com um sorriso e um aceno de cabeça.
Recusou-se a fazer uma reverência, como mandava a etiqueta.
- Oh, meu querido Stepan. A Duquesa de Inverary aproximou-se cheia de
animação. Vejo que conseguiu persuadir a srta. Flambeau a nos honrar com sua
presença.
- O Príncipe Kazanov não me persuadiu a nada, Fancy disse à Duquesa. Foi o

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
diretor Bishop que deixou bem claro que se eu não viesse aqui, ele me demitiria. Um
sorriso acompanhou essas palavras reveladoras. Ela ouviu risos dos três Príncipes, de
um Marquês, de um Conde e de um Duque.
- Eles não estão caçoando de você, Stepan lhe assegurou. Acredito que ouvir a
verdade os divertiu. Não estão acostumados com pessoas francas como você.
- Ninguém está aqui para insultá-la, minha doce jovem, a Duquesa acrescentou.
- É muito gentil, Duquesa.
- Sou uma soberba estrategista ao lidar com o sexo oposto. Quando estiver
para se casar, poderei lhe ensinar algumas táticas.
- Nunca estarei pronta, porque não pretendo me casar. Só me casarei quando
Deus criar uma alternativa para os homens.
- Fancy! - o Príncipe murmurou.
- Talvez eu tenha de ensinar as minhas estratégias a você, meu querido
Stepan.
- Aguardarei com ansiedade as suas aulas - Stepan disse beijando a mão da
Duquesa. Voltou-se para Fancy: - Vamos dançar?
Ela hesitou por uma fração de segundo.
- Aceito, Alteza.
Stepan a levou para a pista de dança. Era uma valsa, e Fancy esqueceu-se de
sua insegurança, deixando-se levar pelo homem e pela música.
- Você dança bem, Stepan disse. O seu anônimo pai contratou-lhe um
professor?
-.Nada disso. Minhas irmãs e eu praticávamos todas as noites. Queríamos
estar prontas para quando o Príncipe encantado aparecesse.
- E aqui estou eu.
O Príncipe Rudolf solicitou a segunda dança e dançava tão bem quanto o irmão.
O Príncipe Viktor e Mikhail dançaram com ela depois. Mikhail a devolveu a Stepan.
- Espero que guarde outra dança para mim mais tarde - ele pediu.
Nesse momento, o Barão Wingate se aproximou de Fancy.
- Gostaria de saber como Belle está passando, ele disse, meio sem jeito.
Ela olhou-o com desprezo e depois lhe deu as costas. Stepan e Rudolf, que
assistiam à cena, sorriram.
- Srta. Flambeau, o Barão merece o seu desdém, observou o Príncipe Rudolf
tão logo Charles sumiu entre os convidados.
- Sabe em que negócios o Barão investe, Alteza?

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Quer arruinar o homem? - Rudolf perguntou.
- Foi um pensamento que me passou pela cabeça - Fancy respondeu.
- Mas para arruinar uma pessoa é preciso ter capital.
- Sei disso, Alteza. Ela virou-se para Stepan: - Posso deixá-los por um
instante? Gostaria de me preparar para o meu número de canto.
- Senhoras e senhores, a Duquesa de Inverary anunciou logo depois, eu lhes
apresento minha convidada especial, a srta. Fancy Flambeau.
Fancy escolheu uma ária de ópera para cantar. Sua voz poderosa capturou a
audiência, enchendo-a de emoção. Quando terminou, alguém fez um pedido, e ela
cantou mais uma vez. Aplausos entusiastas se seguiram ao fim da apresentação.
Fancy havia conseguido. Sobrevivera ao momento que sempre temera.
Apresentara-se à alta sociedade. Agora podia se retirar para o seu refúgio em sua
casa e na companhia de suas irmãs.
- Leve-me para casa, Stepan, ela sussurrou para o Príncipe.
- O jantar está para ser servido. Não quer comer alguma coisa?
- Prefiro ir embora.
- Então iremos.
O Príncipe Rudolf os alcançou quando chegavam às escadarias.
- O Duque e a Duquesa de Inverary querem falar com a srta. Flambeau no
escritório.
Os três seguiram para o escritório do Duque. Este tomava uísque com a
Duquesa por perto.
- Sua apresentação foi maravilhosa, a Duquesa elogiou.
- Roxie. A voz do Duque alertava a esposa de que não estavam ali para falar
banalidades.
Fancy desejou estar em qualquer outro lugar, menos naquele.
- Eu não mordo, menina.
- Mas eu, sim, Vossa Graça.
Stepan olhou com curiosidade para o Duque e depois para Fancy. Havia algo de
estranho entre os dois. Ninguém falou por alguns instantes.
- Que tal um uísque? Rudolf perguntou ao irmão, aliviando a tensão.
- Há vodca?
- Não.
- Então aceito uísque.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Srta. Flambeau, deseja beberalguma coisa? - Rudolf ofereceu.
Fancy o ignorou, os olhos presos no Duque.
- Sabe quem eu sou? - o Duque perguntou.
- Vossa Graça é o Duque de Inverary.
- Sou seu pai.
- Eu não tenho pai.
- O que é isso? - Stepan virou-se para o irmão.
Rudolf deu de ombros, observando Fancy enfrentar o poderoso Duque.
- Aparentemente, a srta. Flambeau e suas irmãs são filhas do Duque.
Fancy voltou-se para Rudolf:
- Não, tenho pai.
- Você tem, e este sou eu. O Duque indicou uma cadeira.
- Sente-se e escute-me.
Ela se recusava a permanecer naquela sala. Quando o Duque se afastara,
quinze anos antes, perdera seu direito de exigir obediência de uma filha.
Pálida e trêmula, Fancy dirigiu-se a Stepan:
- Quero sair daqui imediatamente.
- Quanto antes se sentar e ouvir, mais cedo poderemos sair, ele respondeu.
Você não vai conseguir se livrar desta conversa.
Fancy soube imediatamente que o Príncipe ficaria ao seu lado e a apoiaria. E se
deu conta de que não conseguiria sair daquela casa sem antes conversar com o pai.
O pai que a abandonara.
- Fancy, não está prestando atenção ao que estou dizendo.
- Chame-me de srta. Flambeau, por favor.
- Sei que tem razões para estar aborrecida, mas...
- Não estou aborrecida, eu o odeio.
- Isso não é verdade. E, agora, vou lhe fazer algumas revelações. O Príncipe
Rudolf Kazanov é seu meio-irmão.
Surpresa, Fancy olhou para o Príncipe Rudolf.
Ele ergueu seu copo de uísque fazendo-lhe um brinde.
- Estou feliz em conhecê-la, irmã. Fancy voltou-se, horrorizada, para Stepan.
- Rudolf e eu temos pais diferentes, ele lhe assegurou. Confie em mim. Não
temos ligações de sangue.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
O Duque de Inverary limpou a garganta.
- Quero que saiba que, ao meu modo, eu amei sua mãe.
- Tanto que a levou mais cedo para o túmulo.
- Eu não podia me casar com Gabrielle. Já tinha uma esposa.
- Então, deveria ter ficado em casa fazendo companhia para a sua esposa e
deixado mamãe em paz.
- Lamento o meu comportamento de rapaz irresponsável. Sei que errei.
- Pelo que eu sei, o senhor tinha trinta anos. Não era mais um rapaz.
- Porém mantive vocês em uma boa casa e com conforto.
- Eu nunca quis o seu dinheiro. Fancy sentiu a voz lhe faltar. Só precisava
de...
Ninguém falou, e o silêncio se tornou quase intolerável. Ela tentou se
controlar.
- Gostaria de ir embora agora. Sua voz um mero murmúrio.
- Do que você precisava, Fancy? o Duque perguntou.
Ela lutou para controlar suas emoções. Fitou o Príncipe com olhos que
revelavam toda a sua agonia.
- Diga-me do que precisava, Fancy - insistiu o Duque na pergunta.
- Precisava de um pai. A voz soou emocionada, e ela estava a ponto de chorar.
- Oh, Deus! - murmurou a Duquesa.
Stepan abraçou Fancy, que se apoiou em seu peito, olhando para o pai e
percebendo que a expressão do Duque revelava culpa e arrependimento.
- O senhor foi embora um dia e nunca mais voltou. A babá me disse que havia
morrido.
O Duque de Inverary estava visivelmente abalado. Tomou seu uísque em um
único gole, procurando se fortalecer.
- Chorei pela sua morte - Fancy continuou. Quando a primavera chegou,
convenci o menino que morava na casa ao lado a me levar ao cemitério porque queria
colocar flores no seu túmulo, Alex sabia da verdade e me trouxe até aqui em frente
da sua casa e me contou tudo. Eu o vi, sadio, rindo para uma moça muito bonita.
Fancy respirou fundo antes de prosseguir:
- O senhor me viu e virou-se para o outro lado. Eu era a sua filha bastarda.
- Mereço ouvir essas palavras de revolta, murmurou o Duque.
Merece mais do que isso, Fancy pensou.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Pode não acreditar em mim. Tive pesadelos nestes últimos quinze anos. O
remorso me atormentava.
- Também tive os meus pesadelos. Fancy voltou-se mais uma vez para o
Príncipe: - Por favor, leve-me para casa.
Stepan olhou para o Duque e depois para Fancy. Estava indeciso sobre o que
fazer.
- Quero corrigir o meu erro! - o Duque exclamou.
- Não sou mais uma criança e não preciso de um pai. E saiba que nunca o
perdoarei.
- Estou disposto a assumir as minhas responsabilidades. Pretendo dar o meu
nome às minhas filhas e apresentá-las à sociedade.
- Quer que suas filhas vivam com o senhor? Mesmo que não o perdoem?
- Perdoando-me ou não, minhas filhas viverão aqui comigo.
- Não espere que eu viva aqui para lhe aliviar sua culpa. Fancy levantou-se e se
dirigiu aporta. O Príncipe Rudolf bloqueou-lhe a saída.
-Tenho o poder de arruinar a sua carreira-o Duque ameaçou.
- Magnus! - a Duquesa exclamou com ar de censura.
- O que quer de mim?-Fancy perguntou. Nunca o amarei nem o perdoarei. Nem
mesmo o respeitarei. Detesto todos os aristocratas. Ela olhou para o Príncipe. Quase
todos. Amaldiçoo o chão que o senhor pisa e o ar que respira.
- Tal ódio é um fardo pesado para ser carregado pôr uma mulher tão frágil -
Rudolf observou.
Fancy ignorou seu meio-irmão.
- O que Vossa Graça espera de mim? Que anuncie o seu nome ao final da minha
próxima apresentação no teatro, ou que chame um repórter e lhe conceda uma
entrevista reveladora?
- Admito que cometi um erro terrível, mas estou arrependido e agora quero
minhas filhas junto de mim.
- Mas nós vivemos muito bem sem a sua presença.
- Fala também por suas irmãs?
- Minhas irmãs podem não reconhecê-lo se passarem ao seu lado na rua. Se
quiser arruinar a minha carreira, faça-o. Fancy deu-lhe as costas.
- Belle não teria sido ferida se estivesse sob a minha proteção.
Essa observação calou fundo no coração de Fancy. Seu pai dissera a verdade.
Ele poderia proteger suas irmãs.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Então, pode chamar minhas irmãs para perto de si, mas nunca a mim.
- Elas se mudarão para cá se você não vier junto?
- Elas farão o que eu lhes pedir. Fancy virou-se novamente para a porta de
saída. Blaze não virá sem seu cachorro. Ela tem cabelos vermelhos, caso não saiba.
Fancy sentiu satisfação ao ver que o pai ruborizava.
- O cachorro pode vir também, o Duque afirmou.
- Belle vai querer um jardim, pois adora flores e ervas. Serena toca flauta,
canta e ama as árvores, especialmente os salgueiros. Sophia vai querer telas e tintas.
Bliss apreciaria livros de matemática.
- E quanto à mais nova?
- Raven aspira pelo talento dos outros em vez de valorizar o seu.
- E qual é o talento dela?
- Descobrirá em seu devido tempo, Vossa Graça. Quando as quer aqui?
- Pode ser amanhã?
- Eu as trarei à tarde. Fancy queria sair imediatamente porque não desejava
chorar diante do Duque.
- Espero que nunca seus filhos venham a rejeitá-la, Fancy. Eía desejou lhe
gritar que nunca abandonaria um filho, mas apenas abriu a porta e saiu.
Síepan a alcançou no corredor.
- Juro que não sabia nada do que foi dito aqui.
Lágrimas agora escorriam pelo belo rosto de Fancy.
- Por favor, leve-me para casa.
O Príncipe lhe estendeu um lenço.
- Vá até o toalete e lave o rosto primeiro. Não vai querer que os convidados
vejam que andou chorando.
Fancy lhe obedeceu e encontrou o toalete vazio. Refugiou-se em um canto e
deixou as lágrimas verterem livremente.
Logo entraram duas jovens conversando exatamente sobre a cantora de ópera
que viera ao baile com o Príncipe. Não podiam ver Fancy porque ela estava fora de sua
área de visão.
- O Príncipe fará da cantora a sua amante, uma jovem de cabelos vermelhos
disse rindo. O que achou da moça?
- Não tão bonita como comentam por aí, respondeu maldosamente a outra.
Quando elas saíram, Fancy decidiu que já era hora de parar de chorar.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Posso ajudá-la, srta. Flambeau?
Era a Princesa Amber, prima de Stepan, que lhe sorria amigavelmente,
- Tive uma conversa difícil com meu pai.
- Não estou entendendo.
- Apesar de que minha mãe era uma Condessa francesa, e meu pai, um Duque
inglês, eles nunca se casaram. Minha mãe morreu alguns anos atrás, e agora meu pai...
que ignorou as filhas por quinze anos... nos quer morando com ele.
- E seu pai é...
- O Duque de Inverary. Eu lhe trarei minhas seis irmãs amanhã, mas morarei
sozinha. Nem sei como viverei sem elas.
- Conheço a solidão porque vivi sozinha a minha vida toda - a Princesa
murmurou. A vida de uma Princesa não é tão interessante como parece. Venha, meu
primo está preocupado com a senhorita.
A Princesa Amber voltou ao salão para se encontrar com seu marido. Stepan e
Rudolf aguardavam por Fancy no corredor.
- Está se sentindo melhor? - Stepan perguntou.
- Estou. Gostaria que ajudasse a trazer minhas irmãs amanhã.
- Planejava fazer isso. Vou levá-la para casa agora. - Stepan ajudou-a a descer
as escadas.
- Não quero que minhas irmãs saibam que não morarei com elas. Se eu lhes
disser antes de estarem aqui, vão recusar vir também.
O Príncipe pégou-a pelo braço e lhe dirigiu um olhar encorajador.
- Superaremos tudo isso juntos, eu lhe prometo.

Capítulo VI
Fancy sentou-se à cabeceira da mesa, de frente para as janelas, e observou as
irmãs tomando o café da manhã. Nunca mais estariam todas juntas como naquele
momento. A vida mudaria totalmente depois que ela as levasse para viverem em Park
Lane.
Uma brisa flertava com as cortinas de renda francesa, dando-lhe uma rápida
visão de um pássaro em vôo. Trazido pelo vento, o perfume das flores do jardim tão
bem cuidado por Belle chegava até o aposento.
Fancy olhou para cada irmã e soube que tomara a decisão certa. Seu pai tinha
razão. Elas estariam protegidas em Park Lane. Belle nunca mais seria ferida caso
estivesse sob a proteção do pai. Como irmã mais velha, já deveria ter procurado o
advogado de seu pai e o informado de que a partir da morte da babá estavam morando

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
sozinhas. Sete mulheres e um cachorro manso.
Agora sua responsabilidade era conseguir que as irmãs se mudassem para a
mansão do pai sem oferecer resistência. Assim, fingiria ir junto, mesmo que isso
exigisse que empacotasse suas coisas e as desempacotasse mais tarde.
- Irmãs, Fancy disse em voz alta e forçando um sorriso, tenho uma grande
novidade para lhes contar.
Todas as seis olharam para ela.
- Falei com nosso pai na noite passada, Fancy anunciou, e ele nos quer morando
em sua casa.
Houve um instante de silêncio.
- Por isso, vamos fazer as malas com as coisas mais urgentes e depois viremos
buscar o resto. O Príncipe Stepan nos levará até Park Lane esta tarde.
- Park Lane? Belle parecia impressionada.
- Nosso pai mora em uma mansão em Park Lane. Ele vai nos reconhecer
oficialmente como filhas e nos apresentar à sociedade.
- Quem é nosso pai? - Raven perguntou.
Fancy voltou-se para a irmã mais nova. Que triste gerar sete filhas, seis das
quais desconhecendo sua identidade.
- Magnus Campbell, o Duque de Inverary é nosso pai.
- Mas será estranho passarmos a morar com um homem a quem nem
conhecemos.
- Sua Graça se arrependeu por nos ter negligenciado, Fancy explicou. E se
sente culpado pelo ferimento de Belle.
- Sua Graça? - Raven murmurou.
- Eu o chamarei de Grace, e sua esposa, de Grade, Blaze anunciou, levando as
irmãs ao riso.
Belle aproveitou que Blaze falara de uma possível esposa do Duque.
- A Duquesa está disposta a nos receber? Seremos bem-vindas?
- A Duquesa é a segunda esposa do Duque. A união aconteceu depois que nossa
mãe morreu. - Fancy forçou o melhor de seus sorrisos. A Duquesa está animada com a
idéia de que terá enteadas. Acredito que não tenha um filho próprio,
- E quanto a Puddles? - Blaze perguntou. -Puddles se mudará conosco.
-E o que vai acontecer com a nossa empresa, As Sete Pombas? - Bliss indagou.
-Nosso plano de vingança continua. Fancy olhou para cada irmã, desafiando-as
a discordarem. Alex vai ao teatro todas as noites para buscar Genevieve. Eu lhe darei

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
as instruções devidas.
- Se vamos morar na casa do Duque, poderemos roubar os seus segredos de
negócios! - Serena exclamou, animada.
- Essa seria uma estratégia financeiramente vantajosa. - Bliss franziu a
testa, já fazendo algumas contas.
- Vou pedir a papai que me compre um cavalo. E também um macaco. Blaze
parecia estar aceitando a nova vida com naturalidade.
Raven observou Fancy por algum tempo. Depois chamou a atenção da irmã mais
velha.
- Fancy, ainda não sei bem a razão, mas acho interessante que você treine
bastante o seu lançamento de dardos.
- Por que está preocupada? - Sophia perguntou a Fancy.
- Não estou preocupada com nada. Ela se esquecera dos poderes especiais das
irmãs, capazes de descobrir até seus pensamentos.
- Está triste e nos deixará tristes também - Serena observou. O Duque é um
estranho para nós, Belle explicou, mas Fancy não consegue esquecer que ele é o pai que
nos abandonou. Fancy percebeu que a conversa caminhava para um terreno perigoso.
- Esqueci de lhes contar que temos dois meios-irmãos.
- Irmãos? - seis vozes ecoaram.
- Robert Campbell, o Marquês de Argyll, é filho do Duque com sua primeira
esposa e seu herdeiro oficial. O Príncipe Rudolf Kazanov é um filho que ele teve fora
do casamento.
- Meu Deus! - Serena murmurou. - Pelo visto, o Duque gostava de ter suas
aventuras quando mais jovem. Sete filhas e mais um filho de uma Princesa russa. Mas
Rudolf não é irmão de Stepan?
- Stepan e Rudolf não são filhos do mesmo pai.
- Felizmente. Serena deu uma piscada para a irmã mais velha. Se Stepan
também fosse nosso irmão, vocês não poderiam namorar.
- E quem disse que o Duque não tem outros filhos por aí? - Raven perguntou.
As irmãs ficaram em silêncio, inclusive Fancy. Quantos filhos o pai delas
gerara?
- Vou sentir falta desta casa, Raven reclamou quebrando o silêncio.
- Vamos entrar em um mundo novo esta tarde.
- Mas eu gosto do velho. E se não gostar da mudança? Raven foi direta ao
problema.
- Voltaremos para esta casa.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Casa cujo dono é nosso pai - Bliss lembrou às irmãs.
- E se ele não nos deixar voltar? - Raven perguntou.
- Estamos criando problemas antecipadamente, meninas. - Fancy queria que a
mudança não fosse traumática. Se suas irmãs cismassem em não ir a Park Lane, seu pai
jogaria a culpa nela.
- Pois acredito que, antes de nos mudarmos, devemos pensar no que poderá
acontecer - Blaze disse às irmãs.
- Isso nos poupará o trabalho de empacotar e desempacotar as nossas coisas.
- Nosso pai não pretende nos manter prisioneiras, Fancy lhes assegurou.
- E se o fizer? - Blaze queria examinar todas as possibilidades.
- E se o céu cair? E se a terra abrir um buraco sob os nossos pés? E se as
águas do rio Tâmisa subirem e inundarem a cidade?
As meninas ficaram em silêncio.
- Irmã, tudo ficará bem, Belle disse tocando com carinho no braço de Fancy.
- Lamento a minha explosão. Como está se sentindo hoje, Belle?
- Meu rosto dói, mas viverei. Obrigada por terem feito pontos tão pequenos.
Meu corte não ficou feio.
- Eu é que lhe agradeço por ser minha irmã. A voz de Raven soou cheia de
emoção.
Fancy sentiu que estava a ponto de chorar. Levantou-se imediatamente, e as
irmãs correram para abraçá-la.
- Vamos guardar este momento nos nossos corações, Raven pediu.
- É o que faremos - todas as jovens prometeram, Fancy secou uma lágrima e
suspirou.
- Meninas, vamos fazer as nossas malas.
- Boa tarde, Tinker, o Príncipe Stepan cumprimentou o mordomo-chefe à
porta da entrada da mansão do Duque de Inverary.
- Boa tarde, Alteza. - Tinker voltou-se, respeitoso, para Fancy. - Boa tarde,
srta. Flambeau.
Stepan apresentou as irmãs uma a uma.
- Meninas, conheçam o mordomo-chefe de seu pai. Tinker, estas são Belle,
Bliss, Blaze, Serena, Sophia e Raven. Este é Puddles. O que acha, meu bom homem?
- Que minha vida mudou para sempre.
- A diversão começa agora.
- É o senhor quem sempre abre a porta? - Blaze perguntou.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Sim, senhorita.
- Estamos proibidas de abrir a porta?
- As senhoritas podem abrir a porta quando quiserem. Agora, venham comigo,
por favor.
Tinker caminhou à frente e as mocinhas seguiram-no em fila. De mãos dadas,
Stepan e Fancy vinham um pouco atrás. A opulência da mansão deixava Fancy
embaraçada.
- Como está se sentindo?
- Não sobreviveria se você não estive ao meu lado. Essa observação deixou o
Príncipe feliz e ele sorriu.
- Suas filhas chegaram, Vossa Graça - Tinker anunciou.
O Duque e a Duquesa de Inverary se levantaram do sofá. Perto deles estavam
Robert Campbell e Rudolf Kazanov.
- Oh, queridinhas! - exclamou a Duquesa, indo ao encontro das meninas. Parou
diante de Belle e lhe dirigiu um olhar de pena. Minha pobrezinha. Que susto você deve
ter passado.
Fancy viu que Belle enrubescera de vergonha. Desejou ter tido a idéia de
pedir à Duquesa que não fizesse menção ao ferimento da irmã, pelo menos por uns
dias.
Com um sorriso de boas-vindas, o Duque se dirigiu às filhas. Era um homem
charmoso, pouco acostumado a aceitar ordens das pessoas.
- Este é Grace - Bliss sussurrou para sua irmã gêmea.
O Duque ouviu e virou-se para Biiss, que deu um passo para trás.
- Quem é Grace? - ele perguntou.
- Decidimos chamar o senhor e sua esposa de Grace e Gracie. O senhor sabe...
Suas Graças...
Fancy olhou para o Príncipe e viu que Stepan fazia força para não rir. Já o
Marquês e o Príncipe Rudolf riam abertamente.
- Vocês podem me chamar de papai quando estiverem prontas para isso. Até
lá, me chamem de senhor ou Vossa Graça. Minha esposa é Roxie, madame ou Sua
Graça.
- Preferia Grace e Gracie - Serena sussurrou para uma das irmãs.
- Também eu - respondeu Sophia.
Os filhos do Duque estavam rindo mais uma vez, assim como Stepan. Até a
Duquesa sorria.
Fancy lutou para ficar séria. Se a situação não fosse delicada, ela estaria se

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
divertindo também.
O Duque decidiu deixar esse assunto para depois e mandou as filhas se
sentarem. Pegou a mão de Belle e lhe dirigiu um olhar de simpatia.
- Lamento não a ter protegido.
- Agradeço-lhe pelas palavras gentis, mas a culpa não foi sua.
- Fancy me disse que você ama cuidar de jardins. Considere todos os meus
como sendo seus, os daqui e os que tenho na nossa casa de campo.
- Obrigada, senhor... papai.
O Duque olhou para Fancy e depois para Belle.
- O seu perdão me emociona. Lamento ter negligenciado você.
- Lamento que tenha negligenciado minha mãe, Belle disse.
- Lamento isso também.
Fancy sabia que aquelas palavras eram dirigidas para ela. Desejou poder
perdoar tão facilmente como suas irmãs estavam fazendo. Isso tinha uma explicação,
naturalmente. As meninas não possuíam lembranças do pai como ela.
- Você é Sophia, a artista? - o Duque perguntou. A jovem acenou que sim.
- Do que gosta mais?
- Das cores. Eu consigo ver a...
- Sophia! - O tom de voz de Fancy alertava a irmã para não revelar seu talento
em ver auras.
- Vou providenciar tintas e telas para você. - Sorriu o Duque para a filha.
- Obrigado... papai.
- E esta é Serena?
- Sou a irmã gêmea de Sophia.
A expressão do olhar do Duque mudou, como se ele estivesse se lembrando de
fatos passados.
- Lembro-me de como me surpreendi em saber que Gabrielle tinha dado à luz
gêmeas mais uma vez. Na primeira oportunidade, quero ouvi-la tocar a sua flauta e
cantando.
Fancy notou e apreciou a habilidade do Duque em se referir a cada talento de
suas fíihas. Pena que tivesse levado quinze anos para fazer isso. E ela ainda não
acreditava na sinceridade dele.
- Tenho centenas de livros de matemática - o Duque falava agora com Bfiss.
No que você utiliza os seus conhecimentos de matemática?
- Bem, papai, nós possuímos uma...

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Possuímos uma série de atividades que exigem habilidades matemáticas -
Fancy se apressou em dizer, antes que Bliss revelasse que possuíam uma empresa que,
por sinal, estava prejudicando a do Duque.
- Depois você me falará mais sobre as suas habilidades com as contas - o
Duque declarou. Vou esperar por isso.
Bliss apontou para uma das irmãs.
- Esta é Blaze, minha irmã gêmea.
- E que gosta de animais - o Duque se adiantou.
-Eu o chamo de papai se me comprar um cavalo e um macaco.
- Blaze! - Fancy gostaria de dar um puxão de cabelos em sua irmã.
Os filhos do Duque e Stepan caíram em uma gargalhada. O Duque apenas
sorriu e olhou para Blaze.
- Então, acredita que eu possa ser chantageado em troca de ser chamado de
papai?
- Chantageado? - Blaze assumiu um ar inocente. - Seria um presente, não é?
O riso dos rapazes aumentou.
- Irmã, isso não foi gentil de sua parte! - Bliss exclamou.
- Não vi você reclamando de ganhar os livros de matemática - Blaze contra-
atacou.
- Papai me ofereceu os livros. Eu não os pedi.
- Mas conseguiu o que queria.
- Isso é diferente.
- As coisas são sempre diferentes para você.
- Agora chega. - O tom sério da voz do Duque silenciou as gêmeas.
- Bem-vindo à paternidade, Vossa Graça. Havia sarcasmo na voz de Fancy.
- Não sei por que vocês estão discutindo em relação a esses presentes, a
Duquesa falou. Deve-se querer jóias como presente, não livros ou animais.
- Não quero forçá-la a me chamar de papai antes que esteja pronta, Blaze. E
vou lhe dar um cavalo, mas pensarei melhor quanto ao macaco. Discutiremos isso
depois.
- Obrigada, papai.
Todos na sala riram, inclusive Fancy e o próprio Duque.
- E qual é o nome do cachorro de vocês?
- Puddles. Blaze olhou em volta. Onde ele está? Oh, não!

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
O cachorro estava dando uma volta, parou junto à porta, levantou uma perna e
urinou.
A Duquesa olhou, estarrecida, e pareceu prestes a desmaiar.
- Não se preocupem, Blaze explicou. Puddles está marcando o seu território.
Robert, Rudolf e Stepan estavam se engasgando de tanto rir. O Duque deu de
ombros.
Fancy cobriu o rosto com a mão. Ela havia imaginado um cenário diferente e
mais gentil do que esse humilhante fiasco.
- Puddles vai ficar fora da casa, a Duquesa anunciou.
- Se Puddles ficar fora, eu também fico, Blaze disse com naturalidade.
A Duquesa virou os olhos e fitou o marido em busca de apoio. Ele passava a
mão pela cabeça, como se estivesse sentindo alguma dor.
- Estou velho demais para essas coisas - o Duque murmurou. Bem, Puddíes
ficará em observação. Nós consideraremos isso... - Ele apontou para a poça de urina -
um acidente.
Então, se aproximou da filha mais nova.
- E você é a caçula.
- Sim, senhor.
- E o qual é o seu desejo?
- Queria que o tempo parasse e minhas irmãs e eu ficássemos unidas para
sempre como estivemos hoje de manhã.
Sua observação fez com que todos silenciassem. Fancy sentiu que lágrimas
invadiam seus olhos e o Príncipe lhe dirigiu um olhar de compreensão.
- Um desejo importante - o Duque falou e olhou para a filha mais velha.
Gostaria de fazer o tempo voltar atrás e corrigir os meus erros. E agora, meninas,
quero lhes apresentar seus meios-irmãos, Robert Campbell, o Marquês de Argyll, e o
Príncipe Rudolf Kazanov.
- E como devemos chamá-los? - Blaze perguntou.
- Chame-me de Robert - disse o Marquês e o chame de Rudolf.
- Se você é um Príncipe, isso significa que sou uma Princesa? - Blaze perguntou
a Rudolf.
- Lamento dizer que não - Rudolf lhe respondeu.
- Bem, papai, o senhor me leva às corridas de cavalos? - Bliss indagou
inesperadamente.
- Agora chega - Fancy murmurou, sem esconder sua irritação.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Raven se aproximou da irmã mais velha e lhe cochichou:
- Não se esqueça de treinar o seu lançamento de dardos.
- Você sabe, não é?
- Sim.
- O que ela sabe e nós não sabemos? - Blaze perguntou.
Fancy respirou fundo e olhou para as irmãs.
- Eu não vou morar com vocês.
- Por quê? - Blaze arregalou os olhos.
- Preferi continuar morando em Soho Square.
- Mas nós precisamos de você! A jovem fez ar de choro. Dessa vez foi o
Duque quem veio em socorro a Fancy.
- Fancy precisa de mais tempo para fazer essa mudança. E ela sabe que é bem-
vinda aqui.
As irmãs correram a abraçar Fancy. Até Puddles aproximou-se e lambeu-lhe a
mão.
- Prometo vir aqui visitá-las. E quero que me visitem.
- Ou Puddles dorme comigo na minha cama, ou eu vou junto com Fancy, Blaze
ameaçou.
- Oh, meu Senhor! A Duquesa parecia horrorizada. Como vamos conseguir lhe
arranjar um marido?
- Prefiro um macaco.
Mais uma vez os rapazes caíram em uma gargalhada.
- Gostaria que todos saíssem porque quero falar com minha filha mais velha,
pediu o Duque.
- Escute o que ele tem a dizer, Stepan murmurou para Fancy. - Eu a esperarei
no hall de entrada.
O Duque se aproximou de Fancy e tomou-lhe as mãos.
- Não quer mudar de idéia?
- Neste momento não consigo.
- Quero que venha ver uma coisa. - Ele levou a filha até um pequeno canto da
sala. Na parede, havia um retrato de Gabrielle Flambeau. - Mandei fazer este retrato
seis meses depois que começamos o nosso relacionamento. - Um sorriso surgiu nos
lábios do Duque. - Depois que minha primeira esposa morreu, pensei em trazer
Gabrielle para cá. Já lamentava tê-la abandonado e às filhas. Ela seria uma Condessa
na França se não tivesse acontecido a revolução. Se não fosse casado, eu a teria

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
tornado minha esposa.
- Obrigada por me mostrar o retrato e por me falar essas coisas. Fancy
estava emocionada.
- Pense sobre o meu convite e venha se unir às suas irmãs nesta casa.
- Vou pensar a respeito. Isso é o melhor que posso fazer neste momento.
- Venha quando estiver pronta.
- E se eu nunca estiver pronta?
- Mesmo assim, eu a amarei. O Duque a abraçou e a levou para a porta. Posso
lhe perguntar sobre o seu relacionamento com o Príncipe Stepan?
- Não tenho um relacionamento com o Príncipe.
- Mas ele parece acreditar que sim.
- Não posso controlar os pensamentos do Príncipe.
- Mas você nutre sentimentos por ele?
- Stepan tem sido muito bom para mim, Fancy admitiu, mas Príncipes não se
casam com cantoras de ópera.
O Duque sorriu.
- Príncipes se casam com filhas de Duques.
Stepan caminhava pelo hall de entrada, preocupado com o que estaria
acontecendo lá em cima. Se pelo menos Fancy fizesse as pazes com o pai, mas sabia
que isso seria muito difícil.
Magnus Campbell carregava o peso de muitos pecados.
- Meu irmãozinho está se portando como um homem apaixonado, o Príncipe
Rudolf caçoou.
- Falei com o representante da empresa As Sete Pombas, Stepan disse para
escapar das brincadeiras dos irmãos.
- Quando foi isso?
- Encontrei-o na ópera e aproveitei a oportunidade.
- E resolveu as coisas a nosso favor?
- Lamento dizer que não. A empresa parece querer arruinar alguns nomes
poderosos.
Fancy e o Duque se aproximaram e ouviram a conversa.
- Estão querendo me arruinar? - o Duque perguntou.
- Lamento dizer que sim, Vossa Graça.
Fancy interrompeu a conversa dos homens:

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Gostaria de ir direto paia o teatro. Já estou atrasada. Stepan concordou e
acompanhou Fancy para fora da mansão dos Campbell.
- Obrigada pelo seu silêncio.
- Acredito que As Sete Pombas irão revisar a sua política de negócios. O
Príncipe colocou o braço em torno dos ombros de Fancy. Até que isso aconteça, os
Kazanov podem perder alguns lucros.
Ela permaneceu em silêncio, perdida em pensamentos. Por fim, virou-se para
Stepan:
- O retrato de minha mãe está pendurado naquela casa. Talvez ele a tenha
amado.
- E pode perdoá-lo?
- Não consigo.
- Está sendo muito teimosa, minha pequena.
- Eu sou assim. Fancy olhou pela janela da carruagem e estranhou o trajeto.
Seu cocheiro pegou o caminho errado. Eu vou para o teatro, e não para a minha casa.
- Falei com Bishop e pedi que lhe desse outra noite de folga.
- Não é você quem dirige a minha vida. Não tinha o direito de falar em meu
nome com o meu diretor.
- Já mencionei como fica bonita quando fica brava?
- Quero cantar esta noite, Stepan. Cantar me faz bem e vai me aliviar a
tensão.
- E se a emoção falar mais alto e vocS cantar mal? Não se esqueça que o
público é implacável. Quem a aplaude hoje pode vaiá-la amanhã. Melhor descansar e
retornar apenas amanhã à noite.
Fancy ficou em silêncio. O Príncipe falava como um homem apaixonado, alguém
que se preocupava realmente com eía. Mas Príncipes não se casam com cantoras de
ópera. Se ela se entregasse a uma aventura, provavelmente terminaria seus dias como
sua mãe.
A carruagem aproximou-se da Soho Square e parou bem em frente à casa de
Fancy. Stepan, como sempre, ajudou-a a descer. Caminhou para a porta e a abriu.
- Onde arranjou essa chave?
- Belle a passou para mim. Não achou que tivesse mais utilidade.
- Então, ab sair, deixe a chave no aparador - Fancy disse, sem nenhum sorriso.
- Não vou devolver a chave.
- Você vai voltar para a sua casa a pé? Notei que dispensou o cocheiro.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Mandei que fosse providenciar uma refeição para nós. Não está com fome?
- Eu posso preparar o nosso jantar! - Fancy exclamou.
- Escolhi muito bem a minha mulher. Ela não é somente linda, como ainda
cozinha.
- Não sou sua mulher.
- Eu a considero minha.
Fancy preferiu não retrucar e deu as costas ao Príncipe. Seu olhar vagou pela
casa, agora vazia. Sentia falta das irmãs e até do cachorro. A solidão seria uma
realidade a partir de agora.
- O silêncio está me deixando doente, Stepan disse, suas palavras se
assemelhando aos pensamentos de Fancy. Ele sentou-se em um sofá e esticou as
pernas, acomodando-se bem.
- Venha sentar-se aqui comigo, pediu.
Cedendo ao inevitável, Fancy sentou-se no sofá. Será que já teria entregado
seu coração ao Príncipe?
- Não quero que passe a noite sozinha, Fancy. Vou dormir aqui esta noite.
- Não pode fazer isso. Quer arruinar a minha reputação? Se insistir, chamo as
autoridades para obrigá-lo a sair.
- Não estou planejando seduzi-la. Quero apenas ter certeza de que passará a
noite em segurança. A não ser que você esteja querendo me seduzir.
Fancy ruborizou, mas se recompôs rapidamente.
- Não estou pretendendo seduzir Príncipe algum neste momento. Se eu mudar
de idéia, poderei escolher você.
Fancy sentiu um desejo enorme de se atirar nos braços dele. Sua mãe
entregara-se ao homem que ela amava e trilhara um caminho triste. Nem mesmo suas
sete filhas conseguiam alegrá-la. Continuava precisando do amor de Magnus Campbell.
- Pode escolher um dos quartos que eram de minhas irmãs. E trancarei a porta
do meu, e você precisa prometer que sairá ao amanhecer. Não quero que ninguém
perceba que dormiu aqui.
- Devo fazer um juramento formal?
- Isso não será necessário.
Nesse momento, ouviu-se a carruagem de Stepan parando em frente à casa.
- Nosso jantar está chegando - ele anunciou.
Sorrindo, dirigiu-se à porta de entrada. Sabia que Fancy o desejava, mas
temia se entregar a um relacionamento.

71
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Abriu a porta para seus criados. Bonés, Feliks e Bons entraram carregando
bandejas.
- Sigam este corredor que dá para a cozinha. - Voltou-se para Fancy: - Vamos
jantar?
Ela levantou-se do sofá e o seguiu até a cozinha. Ao entrar, não conseguiu
deixar de imaginar suas seis irmãs sentadas à mesa, tagarelando alegremente como
sempre faziam.
Procurou afastar esse pensamento. As meninas estavam agora em segurança.
Nenhuma delas correria o risco de ser esfaqueada em sua própria casa.
Os criados russos haviam trazido um jantar digno de um Príncipe e regado a
champanhe. Quando deixaram a casa, Stepan ergueu um brinde.
- À mais bela cantora da Inglaterra.
Fancy tocou sua taça na de Stepan, tomou um gole de champanhe e sorriu.
- Obrigada, murmurou.
- Quero que afaste esse olhar triste de seu semblante, o Príncipe pediu.
- Não consigo deixar de pensar no que minhas irmãs estão fazendo em Park
Lane. Será que sentem falta de mim?
- Tenho certeza de que estão pensando em você neste exato momento. Fico
com pena da Duquesa, que não vai sobreviver às suas irmãs.
-Blaze já está se rebelando contra a autoridade. Um sorriso surgiu nos lábios
de'Fancy. Acha que há alguma chance de a Duquesa devolver minhas irmãs?
- Acredito que não. Ela nunca conseguiu ter filhos e deve desejar ter pelo
menos enteadas.
Fancy cortou um pedaço de carne e o mastigou lentamente. Tomou um gole de
champanhe e olhou para o Príncipe.
- Sabe que posso me acostumar a ser servida por criados?
- Basta dizer uma palavra e eu lhe providencio um batalhão de criados. Ah, não
quero me esquecer de avisá-la. Rudolf espera por nós no baile que oferecerá amanhã à
noite.
- Não tenho nenhum traje apropriado. Não posso repetir o vestido que você
me presenteou, já que fui ao baile da Duquesa com ele.
- Isso não é problema. Mando madame Janette entregar outro traje com
acessórios ao seu camarim.
- Não sou bem-vinda nos círculos sociais. Fancy não gostava de ser forçada a
ir aonde não queria. Também não gostava de ganhar as roupas que deveria usar.
- Eu lhe dou as boas-vindas no meu círculo social. Stepan estendeu o braço

72
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
querendo dizer que esse círculo era grande. Meus irmãos e suas esposas gostam de
você. O Duque e a Duquesa de Inverary também querem a sua presença. As sobrinhas
da Duquesa e seus maridos, idem. Minha prima...
- Entendi aonde quer chegar. Fancy via lógica nos argumentos do Príncipe.
Compre-me um vestido cor-de-rosa, se possível, sem babados ou enfeites.
- Você dá ordens como uma Princesa. - Stepan levantou-se e indicou a sala de
estar. - Vamos?
Ela se acomodou no sofá & começou a pensar em como faria para as horas
passarem mais depressa e chegar logo a hora de dormir. Era perturbador ficar ao lado
de Stepan.
O Príncipe exalava masculinidade. O aroma de sândalo de sua colónia, a força
de seus músculos, a beleza de suas feições, tudo isso deixava Fancy trémula. Ele se
parecia com o Príncipe encantado com quem ela sonhara até agora.
- Relaxe, minha passarinha.
Fancy voltou-se para aqueles olhos escuros, antecipando o calor do corpo de
Stepan e o sabor de seus lábios.
Desejou poder se esquecer do sofrimento que sua mãe passara. Desejou poder
se entregar ao Príncipe sem hesrtações.
- Não pense - Stepan murmurou.
Fancy ergueu o rosto, e seus lábios se encontraram. Stepan a puxou de modo
que seus corpos ficaram unidos.
O beijo foi ficando cada vez mais intenso. Com a ponta da língua, ele obrigou
os lábios de Fancy a se abrirem, vencendo a resistência e testando a sua doçura.
Os lábios do Príncipe eram quentes e firmes, o calor de seu corpo passava
para o dela, e Fancy sentiu que começava a ruir sua determinação de manter-se firme
e controlada.
Beijou Stepan com ardor. Entreabriu os botões da camisa do Príncipe, ansiosa
por tocar em seu peito e sentir sua força. Perdeu-se em sensações excitantes quando
ele imitou seu gesto e lhe abriu o vestido. O prazer que sentia apagava a razão e o
bom seno. Estava totalmente entregue aos sentidos.
A lembrança da mãe cruzou-lhe inesperadamente a mente e ela gemeu.
- Não. Por favor... - implorou, não porque duvidasse que o Príncipe a atenderia,
mas porque temia não se controlar e deixar-se tomar pela tentação.
Stepan afastou-se respirando fundo e passando as mãos pelos cabelos.
-"Creio que serei eu a trancar a porta do meu quarto esta noite
- ele murmurou. - Você está faltando com a sua promessa. Não jurou que não
me seduziria?

73
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Fancy duvidou que tivesse todos esses poderes de sedução alardeados pelo
Príncipe. Justo ela, que nunca havia beijado um homem antes,
- Desculpe-me por haver me deixado levar. Nunca pretendi... Stepan tentou
um sorriso.
Os dois tinham culpa, não apenas o Príncipe, Fancy reconheceu.
- Eu o perdoo, mas me considero tão culpada quanto você.
- É muito generosa, meu amor, porque cabe ao homem controlar-se. Stepan a
observou por um longo tempo. Certamente pôde concluir pelo beijo que nós dois
pertencemos um ao outro. O que acha de irmos dormir?
- Juntos?
Ele sorriu ao perceber o pânico de Fancy.
- Dormirei no quarto de uma de suas irmãs.
Ela respirou aliviada e levantou-se para mostrar um quarto e arrumar-lhe a
cama. Logo depois, trancava-se em seu próprio aposento. Vestiu sua camisola e deitou-
se. Estranhos pensamentos insistiam em lhe perturbar a mente.
Quase sucumbira ao prazer, pensou. E tinha de reconhecer que agora era
tarde para tentar não se apaixonar pelo Príncipe. Havia se apaixonado por um
aristocrata, ela que jurara que isso nunca aconteceria.
Fechou os olhos e teve dificuldade em adormecer. Era difícil relaxar sabendo
que Stepan estava ali tão perto, no quarto ao lado.
Acabou adormecendo, mas acordou ouvindo o som de choro. Com o coração
pesado, Fancy levantou-se e caminhou em direçao ao quarto da mãe. O som de choro
aumentava à medida que ela se aproximava.
Passou pelo cómodo onde Stepan dormia e chegou ao quarto em que sua mãe
dormira no passado. Abriu a porta e a viu.
Gabrielle Flambeau estava deitada na cama e chorava a perda de seu amor. O
som desse lamento partiu o coração de Fancy. Era possível que seu pai tivesse amado
sua mãe, mesmo assim a abandonara.
Sentiu que alguém a tocava e assustou-se. Era Stepan.
- O que está fazendo aqui? - Fancy perguntou, a voz um mero sussurro.
- Ouvi você chorando e fiquei preocupado.
Primeiro o Príncipe sentira o cheiro de canela no camarim. Agora ouvira o
choro de sua mãe. Ele merecia saber a verdade.
- Este quarto pertenceu à minha mãe. Você acaba de ouvi-la chorar. Não era
eu quem estava chorando, mas ela.
- Bem me quer, mal me quer...

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Vestido com seu traje de noite, o cavalheiro alto encontrava-se parado nos
arredores da Feira de São Bartholorneu. Olhava para uma mulher que estava deitada
aos seus pés, muito tranquila em seu sono de morte. O homem continuou a despetalar a
rosa, deixando que cada pétala caísse ao longo do corpo, da cabeça aos pés.
- Estou com frio - uma voz rouca reclamou.
Como uma cobra, o cavalheiro virou-se para olhar a mulher ao seu lado.
- Volte para a carruagem. Preciso fazer mais uma parada. - Ele pegou outra
rosa e começou sua ladainha.
- Bem me quer, mal me quer...

Capítulo VII
Apenas amanhecia quando Fancy tomou seu primeiro gole de café. Havia
acordado bem cedo e preparado o café para o Príncipe.
Stepan estava sentado à mesa devorando os ovos com salsichas e os biscoitos.
Usava calções justos, botas e uma camisa desabotoada. Ver parte de seu peito nu
provocava estranhos arrepios em Fancy.
- Vou procurar madame Janette esta manhã, disse ele. Mais tarde,
comparecerei a um chá de bonecas.
Isso trouxe um sorriso aos lábios de Fancy. O Príncipe seria um excelente pai
e jamais abandonaria seus filhos.
- E o que você vai fazer hoje? - Stepan perguntou.
- Talvez tire um cochilo e treine o meu lançamento de dardos.
- Está planejando se vingar da prima-dona que anda perseguindo você?
- Estou seguindo o conselho de minha irmã caçula.
- Siga também o meu conselho, meu amor. Não mencione a ninguém que sua
mãe assombra esta casa.
- Claro que não. Não quero que me internem em um hospício.
- Muito bem. Stepan tomou o último gole de café e então abotoou a camisa e
vestiu a jaqueta. O cocheiro deve estar me esperando. Acompanhe-me até a saída, ele
pediu, e tranque a porta imediatamente.
Fancy o seguiu pelo corredor. Ao abrir a porta, o Príncipe praguejou:
- Desgraçado!
- O que foi?
- Alguém lhe deixou um buque de rosas. Decapitadas. Fancy colocou a mão na
garganta em um gesto de defesa.

75
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Não está pensando que o assassino das pétalas de rosa fez isso, está?
- Não gosto que você fique sozinha nesta casa. Stepan passou a ela o buque.
Ou se mude para Park Lane, ou venha para a minha casa.
- Não farei nem uma coisa nem outra.
- Não vou sossegar minuto algum sabendo que está aqui sozinha, ele
argumentou.
- Você precisa de proteção.
- Vou procurar Alex e lhe mostrarei as rosas. Talvez o chefe dele investigue o
caso.
Stepan não se deixou convencer.
- Fique sabendo que não hesrtarei em colocá-la sob a minha custódia.
- Não sou uma criminosa.
- Não vou permitir que continue a agir de forma irresponsável. Agora feche
essa maldita porta.
Ele estava atrasado. O sol já cruzara meio céu quando Alexander Blake abriu
a porta de sua casa. Havia passado a noite com Genevieve. Exausto pelas horas de
prazeres, serviu-se de um uísque e jogou-se em um sofá.
Amava Genevieve? Ela era bela e sensual. Ele quase lhe propusera casamento
na noite anterior, mas algo o detivera.
Alexander tomou um gole de uísque, fechou os olhos, e então se arrependeu
de tê-lo feito. Uma imagem entrara em sua mente.
Cabelos negros. Olhos cor de violeta. Corpo desabrochando e se
transformando no de uma mulher. Não deveria pensar em Raven Flambeau como uma
mulher, considerou. Ela era como uma irmãzinha. Mas se ele amasse verdadeiramente
Genevieve, jamais Raven estaria entrando em sua mente.
Alexander proporia casamento a Genevieve tão logo prendesse o assassino das
pétalas de rosa. Se ela engravidasse antes disso, o casamento seria realizado
imediatamente.
Ouviu baterem na porta da frente e apressou-se em atender. Arrependeu-se
dessa presteza quando viu que era seu avô, Bartholomeu Blake, o Duque de Essex,
quem viera visitá-lo.
- O que o senhor deseja?
- Quero entrar e conversar com você.
Apoiado em sua bengala, o Duque de Essex entrou mancando na sala, sentou-se
em uma das poltronas e ficou observando o neto.
- Você está com a aparência de um bandido.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Obrigado. Alexander não se deu ao trabalho de contar por que ainda não
fizera a barba. Quer uma bebida? - ele ofereceu.
- Nenhum de nós dois vai beber a esta hora.
Alexander ficou sentado e seu olhar não era nada simpático.
- Essa é a bengala com a qual expulsou meu pai da sua casa? O Duque de Essex
não respondeu a essa pergunta.
- Soho Square não é um lugar adequado para a residência do Marquês de
Basildon.
- Não reconheço esse título.
- Seus pais eram legalmente casados, e assim você herdará o título de
Marquês.
- O senhor deserdou meu pai quando eie se casou com minha mãe.
O arrependimento apareceu nos olhos do velho.
- Você é meu único parente e em data próxima herdará tudo o que eu possuo.
Não vou viver muito tempo mais.
- Não aceito o título e nem herança alguma. Que tudo vá para o governo.
Lembre-se destas minhas palavras quando estiver em seu leito de morte.
O Duque de Essex bateu a bengala na mesinha de café.
- Você é meu neto e aceitará o título, a terra e a riqueza nem que eu tenha de
enfiá-los na sua garganta.
- Há alguma razão em particular para ter vindo me visrtar hoje? - Alexander
perguntou, levantando-se da poltrona.
- Você não precisa trabalhar para o inspetor de polícia.
- Eu gosto de investigar crimes.
- E qual a sua relação com a cantora de ópera?
- Isso não é da sua conta.
- A moça não serve para você. Uma das irmãs Flambeau agora serve.
Alexander arregalou os olhos.
- Explique-se.
- O Duque de Inverary reconheceu oficialmente as filhas, que agora estão
morando com ele. Vão ser apresentadas à sociedade. Podem ter nascido fora do
casamento, mas a mãe era uma Condessa. Sangue aristocrata corre nas veias delas.
- Como sabe disso tudo?
O Duque de Essex olhou longamente para o neto.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Sei de tudo que me interessa. Levantou-se e caminhou para a saída. Você
deve ocupar o seu lugar de direito, casar-se e produzir um herdeiro. Não vou viver
para sempre.
Sem fazer promessas, Alexander abriu a porta para o avô sair. O inspetor de
polícia, Arnadeus Black, acabara de chegar e ia chamar seu auxiliar.
- Bom dia, Vossa Graça - Amadeus disse, cumprimentando o Duque.
O Duque de Essex respondeu com um gesto de cabeça e olhou para o neto.
- Quando tiver mudado de idéia...
- Não vou mudar.
Alexander viu o avô subir na carruagem. O Duque estava velho e sozinho e ele
não conseguia deixar de sentir pena do homem. Amadeus Black seguiu Alexander para
dentro da casa.
- O que foi isso?
- Meu avô quer que eu assuma o meu verdadeiro lugar dentro da sociedade.
- Devia fazer isso. Talvez nos fosse útil. Como Marquês de Basildon, você seria
aceito pelos aristocratas e poderia expandir a nossa investigação.
- Acredita então que Pankhurst é culpado?
- Barney perdeu Pankhurst de vista na noite passada e hoje cedo encontramos
outra vítima. Mas o assassino cometeu um erro ao jogar o corpo perto do mercado
Smithfield. Aparentemente, o cavalheiro ignora que o pessoal lá começa a trabalhar
muito cedo.
Alexander olhou animado para o chefe.
- Temos uma testemunha?
- Alguém notou uma carruagem perto do mercado. Um cavalheiro alto
acompanhado de uma senhora eram seus ocupantes. Quando a carruagem deixou a
área, o cadáver de uma mulher foi descoberto.
- E essa testemunha pôde identificar o cavalheiro?
- Infelizmente não. Amadeus observou seu auxiliar com atenção. Por que está
com essa cara? Está doente?
- Passei a noite com Genevieve.
- Ah, entendo o seu cansaço. O inspetor de polícia sorriu.
Fancy entrou na casa de Alexander sem bater na porta.
- Oh, desculpem-me. A porta não estava trancada e eu tomei a liberdade de
não chamá-lo, Alexander.
- Fancy Flambeau, apresento-lhe o inspetor de polícia Amadeus Black.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Depois dos devidos cumprimentos, Fancy estendeu o buque das rosas
decapitadas para os dois homens.
- Vejam, colocaram estas flores à minha porta ontem à noite. Poderia ser o
assassino das pétalas de rosa?
- Ou um imitador dele. Amadeus pegou as flores e as examinou.
- Por que não se mudou para a casa de seu pai? - Alexander perguntou.
- Eu não o perdoei e não quero morar na casa dele.
Alexander passou as mãos nervosamente pelos cabelos. A vingança contra o
Duque estava colocando Fancy em perigo.
- Mas se seu pai pediu perdão...
- Recuso-me a deixar de lado a memória de minha mãe e não o reconheço como
pai.
- Mas eu não recomendo que a senhorita viva sozinha, Amadeus a alertou. Tem
um cachorro?
- O cão foi morar com minhas irmãs.
- Gentileza do Duque em aceitar o animal, o inspetor de policia comentou com
um sorriso.
- Fancy, raciocine, por favor. Você não pode ficar sozinha em casa. Alguém
pode entrar e atacá-la.
- O Príncipe Stepan passou a noite na minha casa. Fancy enrubesceu. Não na
minha cama, naturalmente.
Alexander não sabia o que dizer para convencer Fancy a mudar de idéia.
- More com suas irmãs em Park Lane ou eu vou morrer de preocupação.
- Está parecendo Stepan. Ela voltou-se para Amadeus. Alexander lhe disse
que rainha irmã pode ajudar nas suas investigações?
- Explique-se por favor.
- A moça tem visões, Alexander explicou e sabe de certos fatos não
revelados a ninguém sobre o estado das vítimas do assassino das pétalas de rosa. Ela
soube que eram costuradas e também da existência do anel.
- Raven toca em objetos e tem visões, Fancy acrescentou.
- E move objetos com o poder da mente. Alexander acrescentou,
desconhecendo a reação de seu chefe.
- Pois marque uma reunião com a moça, preferencialmente aqui na sua casa,
Amadeus instruiu Alexander. Não quero que ela se iniba em um lugar estranho.
- Está falando sério? - Alexander estava surpreso.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Um investigador deve ter uma mente aberta e assim poder solucionar todos
os casos. Amadeus Black se virou para Fancy:
- Vá para a casa de seu pai ou contrate um guarda-costas. Morar sozinha é
flertar com o perigo.
Ele estava atrasado. Stepan bateu na porta da-casa de seu irmão.
- Boa tarde, Bottoms.
- As Princesas estavam preocupadas, acreditando que Vossa Alteza faltaria ao
chá de hoje. Elas o esperam na sala de estar.
Stepan sorriu e apressou-se em se reunir às meninas.
- Está atrasado! - Roxanne reclamou.
- Peço perdão a todas vocês por isso.
Bottoms entrou na sala nesse momento trazendo uma bandeja com bules,
sanduíches e doces. Serviu a cada Princesa um copo de limonada, encheu a xícara do
Príncipe com chá e saiu.
Stepan comeu um sanduíche e começou a tomar seu chá.
A conversa entre ele e as crianças girou em torno de assuntos cheios de
fantasia. Finalmente uma das sobrinhas lhe pediu para contar alguma novidade.
- Cheguei tarde hoje porque precisei passar pela modista e encomendar um
vestido para uma amiga, Fancy Flambeau.
- Ela é uma Princesa?
- Não.
- Uma Duquesa? - Elizabeth perguntou.
- Não.
-- Então deve ser uma Condessa - Sally disse.
- Não.
- Uma Baronesa? - perguntou Natásia.
- Não.
- Quer dizer que não é nobre? - Roxane ergueu o queixo e encarou o tio.
- Também não.
- Explique-se melhor, tio - Lily exigiu.
- Fancy Flambeau é uma cantora de ópera.
- E você a ama?
- Suponho que sim.
- E já se declarou? - Elizabeth perguntou.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Não.
- Por que não? - quis saber Natásia.
Stepan sorriu.
-E ela o ama, tio? Sally não imaginava que existisse alguém que não estivesse
apaixonada por Stepan.
- Não sei, ele confessou.
- Pergunte a ela, Lily o incentivou.
- Assim saberá, Elizabeth concordou com a prima.
- E o que farei se ela não me amar?
- Confie em mim. Lily apontou um dedo para Stepan. Ela o ama.
Stepan sorriu para a sobrinha de quatro anos, em seguida se levantou ao ver a
Princesa Samantha entrar na sala.
- A srta. Flambeau comparecerá ao baile desta noite? - ela perguntou.
- Eu garanto a sua presença. Stepan olhou para as sobrinhas e depois para a
sua cunhada. O que acha que devo fazer?
- Definitivamente, deve confessar o seu amor à jovem cantora. Nenhuma
mulher resiste a um Príncipe apaixonado.
- Traga a Princesa para tomar chá na semana que vem, tio, Lily pediu.
- Fancy não é uma Princesa, querida.
- Todas as meninas são Princesas. Lily apontou para sua mãe, suas irmãs e
primas. Nós somos Princesas.
- Fancy se tornará também uma Princesa quando eu me casar com ela... -
Stepan sorria ao sair.
Ele estava atrasado. Fancy esperava no camarim do teatro, agitada e
impaciente. Onde estaria o Príncipe? Começou a andar de um lado para outro. Não
ficara assim nervosa nem quando da sua estréia no palco. A verdade era que preferia
enfrentar uma platéia aos nobres que encontraria no baile de logo mais.
Madame Janette havia trazido até o camarim um vestido de seda com mangas
curtas e bufantes. Trouxera ainda sapatos de seda rosa, meias bordadas e luvas
brancas. A modista incluíra um xale e um leque de pérolas.
Fancy prendera seus cabelos para cima, mas alguns cachos escapavam, o que a
deixava ainda mais graciosa. Não usava jóia alguma.
Examinar a própria imagem no espelho quebrado que havia no camarim era
impossível. Talvez ela pudesse observar por partes.
Assim, inspecionou o decote e as mangas.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Tentou olhar as costas do vestido e torceu o corpo exatamente quando o
Príncipe entrou.
- O que está fazendo?
- Tentava ver minha aparência no espelho.
- Está linda.
- Obrigada pelo traje.
- Eu lhe comprarei um espelho amanhã.
- Por favor, não faça isso. Fancy suspirou, desejando poder aceitar o presente.
Estou tentando manter as pazes com Patrice. Se ela descobrir que tenho um espelho
novo, vai ficar com raiva mais uma vez. Mas, diga-me: por que se atrasou?
- Sentiu a minha falta?
- Eu estava segurando as lágrimas, ela ironizou. Mas você não respondeu à
minha pergunta.
- Encontrei a macaquinha no corredor e decidi agradar à prima-dona.
- Muito diplomático. Fancy estendeu-lhe a mão, e ambos saíram do camarim e
logo subiam na carruagem.
Não demoraram em chegar à mansão do Príncipe Rudolf, onde aconteceria o
baile.
- Não vai sair do meu lado, vai? Ela dirigiu um olhar suplicante a Stepan.
- Ficarei grudado em você. A não ser que saia para dançar com outros
cavalheiros.
- Dançarmos a três ficaria estranho.
Um criado lhes abriu aporta, e o mordomo-chefe anunciou suas presenças:
- Príncipe Stepan Kazanov e srta. Fancy Flambeau.
- Preferiria que ele não tivesse feito isso, Fancy sussurrou, fazendo o Príncipe
sorrir.
Ela viu um mar de rostos se voltarem em sua direção. Alguns não apenas
olhavam, mas comentavam alguma coisa com os outros. Poucos foram os que os
ignoraram.
O salão era parecido com o da casa do Duque de Inverary.
- Está pronta?
Fancy sentiu a mão de Stepan pegar a sua. Olhou para ele e assentiu.
- Boa noite, o Príncipe Rudolf os cumprimentou.
- Estamos felizes que tenham vindo. A Princesa Samantha dirigiu-lhes um
sorriso acolhedor. Depois se dirigiu a Stepan: As meninas estão esperando ansiosas

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
pelo chá da semana que vem. Não se esqueça do que prometeu a elas.
- Otjue você prometeu às meninas? - Fancy perguntou, com curiosidade.
- Eu lhe contarei mais tarde. Agora vamos cumprimentar meus irmãos.
Fancy sentiu os olhares de reprovação à sua passagem. Stepan parecia não se
importar com nada.
- Lembra-se de Viktor, de sua esposa, Regina e de Mikhail? - ele disse quando
chegaram junto de seus parentes.
- Sally não queria parar de falar sobre o chá de hoje à tarde, a Princesa
Regina comentou e piscou para Stepan.
- Minha Elizabeth fez o mesmo, acrescentou o Príncipe Mikhail.
Fancy e Stepan dirigiram-se à pista de dança. Ele a envolveu em seus braços e
começaram a valsar.
- O que aconteceu de tão interessante nessa reunião que você teve com as
suas sobrinhas?
- Eu lhes falei sobre a ópera. As meninas querem que você esteja presente na
próxima reunião.
- Adorarei participar. Garantir o meu comparecimento foi a promessa que você
fez a elas?
A música acabou antes que o Príncipe pudesse responder. Ele a levou de volta
ao grupo, agora contando com a presença do Duque e da Duquesa de Inverary.
- Querida Fancy! - a Duquesa exclamou e a beijou. Estou feliz que esteja
entre nós. Tenho de lhe contar que a doce Belle se recusa a sair de seu quarto.
- Minha irmã precisa de tempo para se recuperar. As suas cicatrizes vão mais
fundo do que sua pele.
- Ela se recusou a sair para fazer compras. A Duquesa parecia horrorizada
com isso.
Fancy escondeu um sorriso e virou-se para Stepan, que fazia o mesmo.
- O problema é facilmente contornável, o Duque disse à esposa. Convide os
lojistas a irem até a nossa casa. Quando Belle se recuperar, terá um guarda-roupa
completo,
A Duquesa dirigiu ao marido um olhar felino.
- Magnus, somente a sua inteligência rivaliza com a sua boa aparência.
Agora era o Duque quem revirava os olhos.
- Vou ver o que está acontecendo na sala de jogos, ele disse afastando-se do
grupo.

83
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Fancy observava o pai, quando ouviu uma voz feminina:
- Boa noite, Stepan.
Fancy olhou em direção de onde viera a voz. Uma mulher de cabelos vermelhos
e de ousado vestido mais curto do que o habitual sorria para o Príncipe.
- Apresento-lhe lady Verônica Winthrop, Stepan disse. - Lady Verônica, eu lhe
apresento...
- Sei quem ela é, Verônica interrompeu-o, ignorando Fancy. Seu irmão me
surpreendeu ao querer que socializemos com uma cantora de ópera.
Fancy percebeu a raiva de Stepan e lamentou ter vindo.
- A srta. Flambeau é filha do Duque de Inverary - Stepan disse.
Verônica olhou para Fancy, a acusação de bastarda estampada em sua
expressão. Voltou sua atenção ao Príncipe.
- Eu o verei mais tarde.
Fancy observou a moça se afastar. No caminho, Verônica encontrou-se com a
Duquesa.
- Querida Verônica, adorei o seu vestido. A Duquesa de Inverary meneou a
cabeça. Apesar de esse tom de azul não combinar com o seu cabelo vermelho.
Fancy escondeu um sorriso. Verônica Winthrop lançou-lhe um olhar furioso e
se afastou de vez. A Duquesa tocou no braço de Fancy.
- Mulheres inteligentes permanecem calmas e frias, não importa a provocação,
e sempre a devolvem. Precisa aprender a insultar com classe, minha querida.
O Príncipe Rudolf interrompeu a conversa das duas mulheres:
- Srta. Flambeau, posso ter a honra desta dança?
- Sim, Vossa Alteza. - Fancy deu a mão ao Príncipe e logo estavam dançando.
- Como está passando esta noite a minha irmã secreta? - Seu sorriso lembrava
o de Stepan.
- Seu irmão me prometeu não arredar pé do meu lado, a não ser quando algum
cavalheiro me convidasse para dançar. Creio que dançar a três chamaria muita
atenção.
O Príncipe Rudolf riu, chamando a atenção dos convidados.
- Relaxe e aproveite a noite. Você está entre amigos.
- Duvido que lady Verônica me considere uma amiga.
- Meu irmão é jovem, solteiro, e muitas damas da sociedade o querem para
marido.
- Isso explica a aversão que Stepan tem em relação à palavra não.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Os caçulas acreditam-se irresistíveis. Mas quero lhe revelar que desde que a
conheceu, Stepan tem participado mais da nossa empresa, a Kazanov Brothers.
Fancy sorriu, satisfeita consigo mesma por haver influenciado positivamente o
Príncipe.
Quando a música terminou, Rudolf a acompanhou de volta ao grupo. Agora
havia uma senhora gorda e uma jovem loira conversando com Stepan e com a Duquesa.
- Fancy, quero que conheça lady Clarice e sua filha, Cynthia. A Duquesa fez as
apresentações.
- Estou feliz em conhecê-las, Fancy disse.
Tanto a mãe como a filha dirigiram-lhe um sorriso frio. Seus olhos azuis
pareciam cristais de gelo.
- Vossa Alteza ainda não dançou com Cynthia, lady Clarice disse ao Príncipe.
- Pois estava eu pensando nisso neste exato momento. Stepan estendeu a mão
para a jovem. - Lady Cynthia?
Em vez de se sentir embaraçada com a interferência da mãe, Cynthia aceitou
o convite. Stepan sorriu para Fancy e dirigiu-se à pista de dança.
Uma onda de ciúmes invadiu Fancy. No entanto ela logo percebeu que o
Príncipe não tivera alternativa. Recusar-se a dançar com a moça seria uma afronta à
velha senhora.
- Srta. Flambeau?
O Príncipe Mikhail Kazanov se aproximara.
- Pode me conceder esta dança?
Fancy suspirou, aliviada. Os irmãos do Príncipe estavam verdadeiramente
satisfeitos com a sua presença entre eles.
Fancy e Mikhail deram um passo, quando ouviram perfeitamente lady Clarke
destilar seu veneno:
- Estou surpresa que o Príncipe tenha trazido a sua amante ao baile. Sinto-me
desconfortável com isso.
- Pobrezinha! a Duquesa exclamou. Mas se você se sente assim desconfortável,
talvez seja melhor deixar o baile, não é?
Fancy nunca se sentira tão humilhada. Desejou ir embora imediatamente em
vez de dançar.
- Não se deixe perturbar pela observação de lady Clarke - Mikhail observou.
Ela está tentando fisgar meu irmão e torná-lo seu genro.
- Muitas mulheres parecem ter a mesma expectativa.
- Meu irmão não corre perigo de ser pego por nenhuma delas. Já foi fisgado.

85
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- O que quer dizer com isso?
- Pela primeira vez na vida, Stepan se apaixonou. Todos já sabem disso.
Fancy pareceu confusa.
- Faça-o sofrer um pouco e depois o aceite como marido.
- Você não pode estar falando sério.
- Nunca brinco com assuntos do coração.
Mikhail a levou de volta para junto da Duquesa.
- Cynthia, querida, por que usa sempre vestidos brancos? a Duquesa
perguntava nesse momento.
Lady Clarke respondeu pela filha:
- O vestido branco de Cynthia simboliza a sua virtude.
- Mas assim não vai arranjar marido. A Duquesa sacudiu a cabeça. Seu cabelo
loiro, sua pele branca e o vestido branco a deixam apagada.
Lady Clarke e sua filha se afastaram imediatamente da Duquesa, sem retrucar
nada.
- Sua língua destila sangue, Stepan observou olhando para a Duquesa.
- Obrigada, querido.
- A senhora está considerando minhas irmãs e a mim um desafio? - Fancy lhe
perguntou.
- Ao contrário. Estou encantada com a chance de procurar marido para as
minhas enteadas.
Antes que Fancy pudesse fazer qualquer comentário, o Príncipe Viktor
Kazanov a convidou para dançar e ela aceitou.
- Tive de esperar um bom tempo para ver meu irmão apaixonado, ele disse
sorrindo.
- Mikhail aconselhou-me a provocá-lo um pouco antes de aceitá-lo como
marido.
Conforme valsavam, Fancy notou que Stepan dançava com uma mulher morena
e vestida de vermelho.
- Aquela é lady Elizabeth Drummond. Quer Stepan para seu amante. Casou-se
com um homem com idade suficiente para ser seu pai.
Fancy arregalou os olhos e voltou a olhar para a mulher.
- Stepan jamais se envolveria com uma mulher casada. Sei que meu irmão não é
um santo, mas...
Quando a dança acabou, Viktor e Fancy retornaram ao grupo. Stepan fizera o

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
mesmo, sem Elizabeth Drummond. O Duque de Inverary também deixara o salão de
jogos e se encontrava ao lado da esposa.
- Fancy? Quer dançar comigo? - pediu o Duque.
Ela hesitou por um instante.
- Entendo se não quiser.
Agindo por instinto, Fancy lhe estendeu a mão. Finalmente realizava um sonho
que tivera quando menina: dançar com seu pai em um enorme salão. Valsaram em
silêncio, mantendo seus olhares fixos um no outro.
- Sonhei com este momento por um longo tempo, o Duque disse a Fancy. Rezo
para que minhas filhas me permitam levá-las ao altar quando estiverem se casando. Sei
que não mereço essa honra.
- Antes disso, será necessário encontrar os noivos.
- Não vejo problema algum quanto a isso.
Quando a dança terminou, o Duque beijou a mão da filha.
- Obrigado, Fancy. Ele caminhou até Stepan. Minha filha é sua, Alteza.

Capítulo VIII
Agradeço a confiança, Vossa Graça. Stepan sabia que o Duque o estava
encarregando de cuidar de sua filha e aprovava uma união entre os dois.
Nesse momento, três meninas de camisola entraram no salão. Havia felicidade
em seus rostinhos angelicais.
- Quero que conheça três das minhas sobrinhas, murmurou o Príncipe no
ouvido de Fancy, parando a dança e levando-a para onde estavam as meninas.
O Príncipe Rudolf e a Princesa Samantha já tinham ido ao encontro das filhas.
- Tio, Lily chamou.
- Srta. Flambeau, eu lhe apresento as Princesas Roxanne, Natásia e Lily.
Fancy sorriu para as três garotinhas.
- E eu estou feíiz em conhecê-las. O tio de vocês fala de suas sobrinhas o
tempo todo.
- Você parece uma Princesa. Natásia parecia encantada olhando para Fancy.
- O tio disse que ela não é uma Princesa, Roxanne corrigiu a irmã.
- Ela é a Cinderela! - Lily exclamou.
- Digam boa-noite - Rudolf disse às filhas.
- Como vamos falar boa-noite se nem dissemos alô? - Lily observou.

87
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Esta é a sua filha, Rudolf indicou para a esposa. E onde está a babá?
- Nós a amarramos, Roxanne falou calmamente.
- E fugimos, Natásia acrescentou.
- Estas são as suas filhas. A Princesa Samantha olhou para o marido.
- Tio, você já disse para ela? - Natásia perguntou a Stepan.
- Ainda não.
Fancy viu, fascinada, o Príncipe ruborizar. Ela ficou imaginando o que o teria
embaraçado.
Roxanne, que era a mais velha das meninas, olhou para as irmãs.
- Eu não disse a vocês que os meninos são bobos?
Uma certa mão tocou no braço de Fancy. Ela voltou-se e sorriu para Natásia.
- O tio vai fazer de você uma Princesa.
- Ele vai me dar uma coroa?
- O tio vai se casar com você.
- O tio está apaixonado, Lily falou.
- Meninas, eu não tenho certeza disso.
- Ele nos disse que ama você, Natásia insistiu.
- E o tio nunca mente, Lily adorava Stepan. - Você ama nosso tio?
Fancy olhou para o Príncipe e hesitou.
- Ela o ama, querida. Roxanne exibia um ar de mais velha. Quase nem pode
falar.
- Agora vamos, meninas, a Princesa Samantha disse às filhas quando conseguiu
reunir as três. Vamos desamarrar a babá.
- Boa noite, Cinderela. Lily acenou um adeusinho a Fancy.
Dois rapazes se aproximaram do grupo. Eram Ross MacArthur e Douglas
Gordon, os que haviam salvado Fancy de Eddie, o Louco. Fancy os cumprimentou
querendo lhes expressar novamente seus agradecimentos.
- Você tem um rosto que nos é familiar - Douglas Gordon disse encarando
Fancy.
- Estou contente em revê-la. Ross MacArthur abriu um sorriso. E como vão
suas irmãs?
- Se elas forem adoráveis como você, Gordon acrescentou, estou disposto a
fazer uma loucura.
- Fancy e suas irmãs são minhas enteadas, disse a Duquesa de Inverary aos

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
dois escoceses. Eu lhes garanto que cada uma é uma beldade.
- Verdade?
-Tenho certeza de que vocês dois gostariam de conhecer Bliss e Blaze, a
Duquesa foi dizendo. Venham jantar em nossa casa em uma das noites da próxima
semana, meus rapazes.
- Vamos adorar! - MacArthur exclamou, animado.
- Não consigo pensar em nada melhor - Era Gordon quem fazia tal comentário.
- Mandarei a vocês dois um bilhete confirmando o jantar e informando a data.
A Duquesa dirigiu-lhes um sorriso felino. Então se voltou para o marido: Querido,
você deveria ter pensado nesses dois rapazes como possíveis candidatos a maridos de
suas filhas.
- Desejo passar mais tempo com elas para conhecê-las melhor, o Duque
murmurou. Não gostaria que se casassem logo.
Fancy sorriu e olhou para o Príncipe, que lhe deu uma piscadela.
- Estou com vontade de festejar. Que tal uma taça de champanhe? - Stepan
propôs a Fancy. - Ou prefere água?
- Champanhe será perfeito.
Os dois tomaram o champanhe e depois se retiraram antes do jantar ser
servido.
Ao chegarem à casa de Fancy, Stepan dispensou o cocheiro.
- O que está fazendo?
- Vou passar a noite aqui. Quando ela abriu a boca para protestar, o Príncipe
acrescentou: Alguém lhe enviou rosas decapitadas, e eu me recuso a deixá-la sozinha.
Stepan destrancou a porta e seguiu Fancy escada acima. À porta do quarto
onde dormira na noite anterior, ele lhe atirou um beijo.
Evidente que queria mais do que isso. Desejava sentir aquele corpo macio sob
o seu, passar a noite fazendo amor. Não queria assustá-la, porém.
- Você me ama? - Fancy perguntou inesperadamente.
- Você quer que eu a ame?
- Não sei.
Stepan despediu-se mais uma vez e entrou no quarto. Tirou suas roupas,
deitou-se na cama e colocou os braços sob a cabeça.
A sua cantora era temperamental, mas ele a amava. E o relacionamento entre
ambos estava progredindo.
Stepan acordou sentindo cheiro de café. Pareceu-lhe como se estivesse

89
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
casado. E gostou da idéia.
Vestiu-se rapidamente e desceu as escadas. Abriu a porta para verificar se
alguém não deixara outro buque sinistro.
Na soleira, encontrou um jornal aberto na página em que havia a coluna social.
“Um dos nobres mais cobiçados pelas jovens casadoiras foi visto ontem de
manhã deixando a residência de uma certa cantora de ópera.”
Stepan entrou na cozinha com o jornal.
- Bom dia - ele cumprimentou Fancy com um sorriso.
- O que está planejando fazer hoje? - ela lhe perguntou.
- Planejo comparecer a uma reunião de negócios com seu pai. Depois disso
estarei à sua disposição.
- Sou uma prisioneira ou arranjei um protetor?
- Você merece o melhor.
- Esse jornal é o Times!
- Harry deve tê-lo deixado na soleira da porta. Não há nada de importante.
Fancy pegou o jornal e seus olhos deram com a coluna social.
- Maldito repórter! - ela exclamou depois de ler o comentário maldoso.
- Não se preocupe com os mexericos. Eu me casarei com você e salvarei a sua
reputação.
- Se o repórter viu você deixando a minha casa, talvez tenha visto o homem
que colocou o buque de rosas.
Um sorriso surgiu nos lábios de Stepan.
- Eu investigarei essa possibilidade.
Raven encontrava-se no jardim da mansão de seu pai e observava Puddles
brincando.
O jardim era um oásis de tranquilidade com árvores enormes, arbustos e
flores.
Ela chamou o cachorro para entrarem na casa. Puddles passou em disparada
pelo mordomo-chefe e subiu as escadas. Tinker sorriu. A mansão não era a mesma
depois da chegada das meninas.
Bateram na porta e ele foi atender. Alexander Blake, acompanhado de
Amadeus Black e Barney, pediu para falar com Raven Flambeau.
- O que posso fazer pelos senhores? - Raven perguntou ao receber os três
homens.
- Raven, quero lhe apresentar Amadeus Black e o policial Barney. Alexander

90
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
procurou descobrir se a jovem dama ainda sentia mágoas dele. Estamos aqui porque o
sr. Black quer conversar com você sobre a sua visão. Ele acredita que a sua ajuda seria
preciosa.
Raven sentiu uma satisfação interior, mas não demonstrou. Ora, ora... a polícia
de Londres acreditando em suas visões!
- Pode nos ajudar? - Alexander perguntou.
- O que querem que eu faça? O que têm em mente?
- Gostaríamos de nos reunir na casa de Alexander, onde a senhorita poderá se
concentrar com mais facilidade.
- A que horas?
- Pode ser às duas horas da tarde?
- Tudo bem. Estarei lá às duas.
Quando os três cavalheiros se retiraram, Raven foi se reunir com as irmãs.
- Pode me fazer um favor? - Bliss pediu-lhe.
- Do que se trata?
- Esconda-se dentro do escritório do Duque e tome nota durante a reunião de
negócios que acontecerá lã esta manhã.
- E por que você não faz isso pessoalmente?
- A Duquesa insiste em irmos às compras. Está organizando um jantar onde
comparecerão dois cavalheiros, Blaze disse virando os olhos. Bliss e eu estaremos
presentes a esse jantar.
- E por quê?
- A Duquesa acredita que possam ser dois pretendentes à nossa mão. E são
irlandeses.
Raven aceitou a missão de espionagem e desceu ao segundo andar. Entrou no
escritório do Duque, que estava no mais absoluto silêncio. Escondeu-se no fundo da
sala, atrás de uma poltrona.
Enquanto esperava, deixou seus pensamentos vagarem. Mal acreditava que
Alex precisava de sua ajuda. Não se sentiu muito animada porque sempre que se
recordava de sua visão, sentia arrepios de pavor.
O Duque de Inverary não estava satisfeito com os mexericos a respeito de
Fancy. Apesar de o jornalista não ter mencionado nem sua filha nem Stepan, estava
claro que toda a sociedade associaria os dois à notícia.
- Bom dia, o Príncipe cumprimentou o mordomo-chefe. - Estou atrasado?
- Seus irmãos acabaram de chegar, Alteza.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Stepan subiu as escadas de dois em dois degraus e logo chegava ao escritório
do Duque.
O Duque de Inverary, seu filho e mais os três Príncipes Kazanov estavam
sentados à mesa. Todos eles olharam para a porta quando Stepan chegou.
- Desculpem-me o atraso.
- Irmãozinho, o Duque quer ter uma palavrinha com você. Rudolf piscou para
Stepan.
O Príncipe intuiu o assunto e passou a mão pelos cabelos.
- No que posso ajudar, Vossa Graça?
- Explique-me isto. O Duque apontou para a coluna do jornal.
- Fancy e eu não trocamos intimidades. Stepan ignorou as risadinhas dos
irmãos. Desde que ela está morando sozinha, quis apenas protegê-la.
- Mas está arruinando a reputação de minha filha.
- Eu quero me casar com ela, mas convencê-la a isso poderá levar meses. O
senhor sabe que Fancy detesta os aristocratas.
O Duque de Inverary suspirou. Conhecia bem a filha mais velha.
- Ouvi dizer que nenhuma mulher resiste a um Príncipe apaixonado, Rudolf
comentou.
Todos os homens riram, menos Stepan.
- Alguém deixou um buque com rosas decapitadas junto à soleira da porta.
Fiquei com medo e insisti em passar a noite na casa. Naturalmente, dormi em um dos
quartos vazios.
- Alguém está planejando atacar Fancy?
- Pode ser. Andei pensando que talvez o repórter que vigiou a casa tenha visto
o estranho colocando o buque. Vou conversar com ele e ver se descubro alguma coisa.
Em seguida, a discussão passou a girar em torno do estado de espírito de
Belle.
- Minha filha anda enclausurada desde que ficou com aquela cicatriz no rosto.
Não quer sair nem comprar roupas nem receber ninguém.
- Belle continua linda! - Stepan exclamou.
- Eu a vi cuidando do jardim e a achei muito bonita, Mikhail disse ao Duque. -
Minha filha precisa de uma mãe, e nenhuma mulher que eu conheço parece indicada,
assim gostaria de pedir Belle em casamento. Ela, porém, ainda nem me conhece.
- Falarei com minha filha sobre a sua proposta, meu rapaz.
- Não faça isso! Raven esqueceu-se que deveria manter-se escondida e levan-

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
tou-se encarando os homens.
- O que está fazendo aqui, minha filha? - O Duque caminhou na direção dela,
um sorriso confuso no rosto.
- Estou espionando a sua reunião.
- Com que propósito?
- Temos uma empresa que está tentando prejudicar a sua, Raven confessou.
- As Sete Pombas pertence às minhas filhas? Não consigo acreditar!
O Duque colocou o braço em torno dos ombros da filha e a levou até uma
poltrona.
- Conte-me como tudo isso começou.
- Fancy estava brava com o senhor, e seu método de vingança foi tentar
arruiná-lo.
- Sei que Fancy estava brava, mas não entendo como conseguiram abrir uma
empresa. Para isso é preciso muito dinheiro.
- Nós arranjamos o dinheiro.
- Como?
- Nas corridas de cavalos. Bliss é um gênio em matemática. Sabe tudo sobre
ações e decide onde devemos investir nosso dinheiro.
- Mas como conseguem ganhar nas corridas? - perguntou o Duque.
- Blaze conversa com os animais. Raven ignorou os sorrisos dos homens. Ela
sabe o que eles sentem e pensam. Bliss e Blaze se vestem como homens, e Alex...
- Alex?
- Alexander Blake.
- O Marquês de Basildon?
- Ele mesmo.
- O que está dizendo? Stepan perguntou. -Blake é seu vizinho e trabalha para
o inspetor de polícia.
- Isso é verdade. Alexander é também neto do Duque de Essex, mas se recusa
a aceitar o seu título.
- Continue - o Duque pediu.
- Alex, Bliss e Blaze comparecem às corridas. Blaze dá uma volta nos estábulos
e se comunica com os cavalos. Então diz a Alex quem vai ganhar a corrida e Bliss
decide o quanto quer investir.
- E há mais do que isso?

93
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Alex faz as apostas, os cavalos correm e nós pegamos nosso lucro. Então
Fancy convoca uma reunião e Bliss explica quais são os melhores investimentos. Depois
disso Fancy nos dá algum dinheiro para comprarmos bobagens.
Os homens caíram na risada. Até mesmo o Duque riu.
- E alguma vez Blaze escolheu um cavalo perdedor? - o Duque perguntou
procurando ficar sério.
- Ela sempre descobre o vencedor.
O Duque olhou para seu filho e para os Príncipes.
- Acredito que Blaze comparecerá comigo às corridas deste ano.
- Gostaria de ir junto - Rudolf declarou.
- Naturalmente, todos vocês podem ir. Mas, Raven, por que está contra a
proposta de casamento de Mikhail?
- Belle vai recusar o pedido porque terá certeza de que o Príncipe só está
fazendo isso por pena.
- Posso encontrar-me com ela acidentalmente, Mikhail propôs. Como disse, ela
não me conhece e nem sabe que sou um Príncipe amigo da família.
- Minha esposa possui uma casa de campo do outro lado de Primrose! o Duque
exclamou. Roxie pode persuadir Belle a passar lá alguns dias.
- Mas, mesmo lá, Belle não aceitará a proposta do Príncipe, Raven observou.
- Fingirei que sou um homem do povo; direi que fui assaltado por bandidos que
me deixaram com cegueira temporária. Ela pensará que não estou vendo a sua cicatriz
e terá, inclusive, pena de mim. Afinal, ser cego é pior do que ter uma pequena cicatriz
no rosto.
- Talvez funcione. Mas minha irmã pode desconfiar que você está mentindo.
- Arranjarei algumas marcas e treinarei o andar de um cego.
- Conte conosco. - Rudolf riu. Nós lhe daremos uma boa surra.
- Mesmo assim, teremos um problema pela frente! - Raven exclamou. - Fancy.
- Tirarei Fancy de Londres. Visitaremos a casa de campo de Rudolf em Sark
Island, Stepan propôs.
- Minha irmã não aceitará viajar com você, Stepan. Mas eu sei de algumas
ervas que podem fazê-la adormecer.
- E quando voltarem a Londres, você precisa se casar com ela - o Duque exigiu.
Stepan sorriu para seu futuro sogro.
- Pode anunciar o nosso noivado tão logo partamos de Londres. Vossa Graça
sabia que Raven consegue mover objetos com o poder de sua mente? Por que não dá

94
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
uma demonstração ao seu pai, ele pediu à jovem.
- Não gosto de exibições, em todo caso...
Raven mirou um copo de uísque que estava muito perto de Stepan. Quando ele
percebeu que o copo se movia, procurou se afastar. Tarde demais. O uísque molhou-lhe
as calças.
Stepan chegou ao teatro durante o segundo ato. Sentou-se para esperar o fim
do espetáculo.
Havia trazido Fancy ao teatro e depois voltado à residência das Flambeau.
Usando sua própria chave, entrara e empacotara algumas roupas, sapatos e artigos de
higiene pessoal. Não se esquecera nem do jogo de dardos.
Apesar de conhecê-la havia tão pouco tempo, o Príncipe sabia quais seriam as
reações de Fancy.
Primeiro, ele a convidaria a passar uns dias em sua casa de campo.
Naturalmente, ela recusaria. Então, a convidaria a jantar em sua casa. Dessa vez
Fancy aceitaria, já que recusara o primeiro convite.
Quando a cortina desceu encerrando o espetáculo, Stepan levantou-se
devagar, dando tempo para que Fancy chegasse ao seu camarim, retirasse a maquiagem
e se vestisse. Aproveitou para conversar com Bishop.
- Alguém está ameaçando a vida de Fancy diretor, Stepan explicou. Estou
afastando-a da cidade para sua própria segurança.
- Entendo, mas fará falta aqui. Ninguém consegue atrair o público tanto
quanto ela, lamentou-se Bishop.
- E na volta da viagem, pretendo pedi-la em casamento.
- Isso significa que Fancy não voltará a trabalhar? - Agora o diretor estava
verdadeiramente preocupado.
- Discutiremos isso mais tarde. Mas ela tem uma irmã que também canta muito
bem.
- Vou tentar contratá-la.
- Terá de pedir autorização ao Duque de Inverary. Ele assumiu a paternidade
das moças, que agora moram em sua mansão.
Stepan despediu-se do diretor e estava quase no camarim de Fancy, quando
encontrou a prima-dona e sua macaquinha. Cortês, fez elogios ao desempenho da
cantora e agrados ao animal.
Finalmente, entrou no camarim e encontrou Fancy já à sua espera. O Príncipe a
olhou com carinho. Ele a amava. Disso, não tinha dúvidas.
O difícil seria convencê-la a aceitar sua proposta de casamento.
- Está pronta?
95
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Para quê?
- Pensei que poderíamos viajar até a minha casa de campo para passarmos lá o
fim de semana.
- Não creio que seja uma boa idéia.
- Pelo menos aceita jantar comigo na minha casa?
- Isso parece maravilhoso.
Stepan sorriu, satisfeito consigo mesmo. Aparentemente, o modo de lidar com
a sua querida cantora era lhe oferecer duas opções: primeiro, uma, que ela recusaria,
para depois aceitar aquela que interessava de fato.
Meia hora mais tarde, o casal entrava na residência do Príncipe. Bonés abriu a
porta antes que batessem.
- Boa noite, Alteza. Boa noite, srta. Flambeau.
- Boa noite, Bonés.
- Feliks está preparando uma refeição deliciosa. Ela será servida em seguida.
Fancy olhou para o Príncipe com surpresa.
- Como Feliks sabia que jantaríamos aqui hoje à noite. Ele tentou encontrar
uma desculpa razoável.
- Bem, pensei que você não aceitaria viajar comigo, assim pedi a Feliks que nos
preparasse um jantar.
- Espero que não nos sirva caviar, Fancy disse piscando para o Príncipe.
Nesse momento, o jantar foi servido e era realmente soberbo. Nada de caviar
nem de comidas exóticas.
Ao fim da refeição, Stepan propôs tomarem um cálice de vinho.
- Prefiro não beber, Fancy recusou.
- Não vai cantar até a próxima terça-feira. Então, pode tomar um pouco de
vinho.
- Muito bem. Agora me diga como foi a sua reunião de negócios.
- Seu pai estava preocupado com a empresa As Sete Pombas.
- Bem, ele pode suportar algum prejuízo, sobretudo quando isso me dá prazer.
Stepan foi servir o vinho e discretamente colocou um pozinho no cálice de
Fancy.
Tomaram vinho conversando sobre trivialidades.
- Este vinho está delicioso. Talvez tome mais um cálice.
- Um é suficiente, Princesa.

96
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Estou me sentindo cansada esta noite, Fancy murmurou.
- É porque a sua semana foi exaustiva. Venha aqui e encoste-se no meu ombro.
Fancy sentou-se no sofá ao lado de Stepan e. acomodou-se. Logo, estava
adormecida. Sucesso. Ele carregou-a em seus braços e encontrou Bonés no corredor.
- Harry trouxe a carruagem para a entrada?
- Sim, Alteza.
Bonés foi abrindo as portas e ajudou o Príncipe a acomodar Fancy no banco da
carruagem.
- Por que está preocupado? - Stepan perguntou ao notar o semblante fechado
de seu mordomo-chefe.
- Que Deus tenha misericórdia do senhor quando a jovem acordar - Bonés
murmurou.
Raven convidou Sophia para as duas irem ao encontro que ela marcara com o
inspetor de polícia.
Como combinara, Raven bateu na porta de Alexander e teve uma desagradável
surpresa. Quem abriu foi Genevieve.
- Lembra-se de minha irmã Sophia? Raven olhou para a irmã e ficou surpresa.
Sophia estava olhando para a cantora e sua expressão era estranha.
Logo Sophia se recuperou e cumprimentou Genevieve.
- Belle melhorou? - a cantora perguntou.
- Está passando uma temporada na casa de campo de meu pai.
Raven notou que Genevieye se comportava como se fosse dona da casa. Sentiu-
se deprimida. Conquistar Alexander agora seria mais difícil ainda.
- Posso lhes servir café ou chá? - Genevieve ofereceu.
- Obrigada, mas viemos apenas para conversar com os policiais.
Genevieve as levou então para uma sala onde se encontravam Alexander e o
inspetor de polícia. Os homens se levantaram e cumprimentaram as duas jovens.
- Espero que não se importe por haver pedido a Sophia para me acompanhar,
sr. Black.
- Sua irmã é bem-vinda. Ela também possui os mesmos talentos que a
senhorita?
- Meus talentos são outros, Sophia respondeu.
As duas jovens se sentaram e Raven ficou à espera do que Amadeus Black lhe
pediria.
- Alexander me falou sobre as suas visões. Trouxe-lhe alguns objetos de uma

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
das vítimas para que a senhorita as examine e me diga se elas lhe revelam alguma
coisa.
Amadeus começou estendendo-lhe um pequeno copo cheio de pétalas de rosa.
- Estavam sobre o corpo da jovem morta. Na ocasião, as pétalas ainda eram
frescas.
Raven examinou as pétalas, fechou os olhos, relaxou e tentou visualizar alguma
coisa.
Esperou e esperou, mas nada lhe veio à mente.
- Relaxe e convide a visão a entrar em sua mente, sugeriu Sophia.
Raven tentou mais algum tempo, depois devolveu as pétalas ao policial.
- Lamento, mas nada me vem à mente. As pétalas foram colocadas antes ou
depois que a jovem foi morta?
- Acredito que o assassino as coloque depois de matar suas vítimas.
- Então a alma da vítima já havia partido deste mundo, Raven explicou. Isto
explica a razão de eu não conseguir visualizar nada.
Amadeus Black estendeu-lhe um par de luvas brancas. Raven fechou os olhos e
se concentrou.
- Cabelos escuros e olhos azuis... vestido rosa... uma atriz, otimista quanto ao
futuro, procurando aconselhamento de alguém importante... tonta, os olhos pesados...
partiu desta vida calmamente.
Raven abriu os olhos. Todos na sala olhavam para ela e os dois homens estavam
surpresos.
- Sua identificação da vítima está correta! - Amadeus Black exclamou.
- Não consegue identificar o assassino? - Alexander perguntou.
- A senhorita mencionou que a jovem estava tonta, o inspetor de polícia disse.
- Ela não soube que estava morrendo porque tomou um veneno que não lhe
provocou dor alguma. Apenas sono e a morte.
- Será que sabe que veneno foi esse? - Amadeus olhou ansioso para Raven.
- Cinco gotas de água-tofana misturadas em vinho e água. Morreu em poucas
horas.
- Como sabe disso? - Alexander perguntou.
- Sei porque sei.
O inspetor de polícia sorriu.
- E a senhorita mencionou um conselho.
- A jovem confiava no assassino. Esperava que ele a ajudasse na sua carreira.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Amadeus e Alexander trocaram olhares. Somente um homem rico poderia
ajudar a carreira de uma jovem atriz.
- E este é o último objeto. O inspetor de polícia entregou o anel de ouro a
Raven.
Ela sentiu um frio no corpo.
- O anel não pertence à vítima, mas ao assassino.
- Diga-me tudo o que conseguir visualizar - Amadeus Black pediu.
- Bem me quer... mal me quer... um cavalheiro alto, magro, vestido com roupas
de noite... uma mulher baixa e gorda... ele se parece com ela e ela, com ele...
Raven abriu os olhos e devolveu o anel.
- A alma dele é corrupta, decadente como as pétalas de rosa.
- O que significa que os dois se parecem um com o outro?
- Pareceram-me partes de uma mesma pessoa.
- E pode identificar o rosto? - Alexander perguntou.
- Não. Minhas visões são mais simbólicas.
Alexander virou-se para seu chefe:
- O que acha que isso significa?
- Nossa testemunha viu um homem e uma mulher. Assim não pode ser apenas
uma pessoa. Amadeus dirigiu-se a Raven: - Concordaria em nos ajudar no futuro?
- Quando precisar de mim, pode me chamar, sr. Black.
Raven e Sophia se levantaram para sair. Alexander e Amadeus Black também
se levantaram, como mandava a etiqueta.
- A senhorita está pálida. Quer que a levemos de volta a Park Lane?
- Prefiro caminhar, senhor.
Raven e Sophia deixaram a casa de Alexander e caminharam em silêncio por
um tempo.
- Sophia, você pareceu perturbada ao cumprimentar a cantora. O que estava
pensando naquele momento?
Sophia voltou-se para a irmã, uma expressão de preocupação em seu rosto.
- Genevieve Stover não possui aura.
Fancy acordou e se viu em um ambiente totalmente estranho.
Sentou-se na cama e notou três coisas. O quarto não era seu, ela usava o
mesmo vestido com que saíra do teatro, e Stepan estava sentado em uma cadeira ao
lado da cama.

99
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
A memória lhe falhava, porém. O que havia acontecido? Ela se encontrava em
um dos quartos da mansão do Príncipe?
Seus olhos visualizaram uma paisagem verde através da janela.
Ela não estava em Londres.
- Gosta da paisagem? - Stepan perguntou calmamente.
- Onde estou?
- Na propriedade de Rudolf, em Sark Island. Ele se levantou. Chegamos em um
de nossos navios na noite passada.
- Por que não me lembro de nada?
- Eu coloquei um narcótico no seu vinho.
- Você me drogou e me sequestrou?
- Eu a sedei e a afastei de perigos - Stepan se defendeu.
- Quero ir imediatamente para casa!
- Atenderei a todos os seus pedidos, menos esse. Acalme-se e aproveite uns
poucos dias de descanso.
- Quantos dias?
- Duas ou três semanas, talvez.
- Isso não é aceitável. Eu preciso voltar para a ópera.
- Bishop entendeu o seu problema e dará um jeito de substituí-la enquanto
estiver fora.
- Como ousou falar com Bishop?
- Já mencionei que fica adorável quando está com raiva?
- Mais de uma vez. Diga-me, sou sua prisioneira?
- Uma convidada de honra. Agora sente-se, que eu lhe explicarei tudo.
Fancy sentou-se a contragosto. Não haveria nada que o Príncipe pudesse falar
que a levasse a perdoá-lo.
- Você sabe que meus irmãos e eu nos reunimos no escritório de seu pai ontem.
Durante a reunião, descobrimos que sua irmã mais nova estava escondida atrás de uma
cadeira, tomando nota da nossa reunião.
Isso fez Fancy sorrir.
- Raven admitiu que você está tentando empobrecer seu pai.
Fancy não podia acreditar que Raven tivesse dito isso.
- Meu pai pediu a sua ajuda para se livrar de mim?
- Nem tudo gira em torno da sua pessoa, querida. Meu irmão Mikhail viu sua

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
irmã Belle no jardim e sentiu-se atraído por ela. Expôs ao seu pai que queria pedi-la em
casamento.
- Ainda não entendo a razão de você ter me trazido até aqui.
- Você tem governado a vida de suas irmãs como se fosse uma rainha. Stepan
sorriu, suavizando suas palavras. Raven ficou preocupada que você pudesse arruinar os
nossos planos para Belle. Foi ela quem me deu a mistura para adormecê-la.
Fancy arregalou os olhos. Raven acreditara que ela seria capaz de querer
arruinar a chance de Belle ser feliz? Suas irmãs nunca haviam reclamado por ela ser
mandona. Sempre se julgara uma líder.
- Eu não quis magoá-la, Fancy.
- Não estou magoada. Qual o plano de vocês?
- Seu pai enviou Belle à casa de campo da Duquesa. Mikhail vai se apresentar a
ela como se fosse um homem do povo, atacado há pouco por ladrões e
temporariamente cego e sem memória.
- E como ele ficou desse modo?
- Os ladrões o espancaram. Rudolf e Viktor vão lhe dar uma boa surra.
Fancy ficou pensativa. Se Mikhail aceitava ser espancado pelos irmãos, é
porque queria de fato se casar com Belle.
- E por sua culpa estou perdendo tudo isso, Stepan brincou.
- E meu pai participou dos planos de me afastar de cena?
- Sim. Stepan não revelaria que naquele momento Londres inteira deveria
estar comentando sobre o casamento do Príncipe com a cantora de ópera.
- Meu pai confia em você?
- Minha mãe será sua acompanhante.
- Sua mãe?
- Mamãe mora aqui. Refresque-se e se reúna a nós para o almoço.
Fancy encarou o Príncipe. Não sabia o que pensar de suas atitudes. No entanto
a idéia de conhecer a mãe de Stepan despertava sua curiosidade.
- Querida?
Seus olhares se encontraram.
- Minha mãe não está passando muito bem. Por favor, não diga nada que a
aborreça.
- Prometo que não farei isso.

Capítulo IX

101
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
-Aqui está ela, mamãe, a muíher que eu amo.
Fancy olhou, surpresa, para o Príncipe. As sobrinhas de Stepan haviam falado
a verdade? Ele a amava?
A mãe do Príncipe era uma mulher ainda atraente, apesar dos fios brancos que
começavam a aparecer.
- Mamãe, eu lhe apresento Fancy Flambeau. Fancy conheça a Princesa
Elizabeth.
- Estou honrada em conhecê-la, Alteza.
- Que jovem encantadora, meu filho. Você foi sábio em sua escolha. Estou
aliviada em saber que vai conhecer o verdadeiro amor. A senhora olhou para Fancy.
Conhecer o verdadeiro amor vale a pena, apesar de que faz sofrer.
Stepan acompanhou as duas mulheres até a sala de jantar. Ajudou-as a se
acomodarem e sentou-se entre elas.
- Sou um espinho no meio de duas rosas.
A Princesa Elizabeth sorriu para o filho.
- Não sou mais uma rosa desabrochando.
- Para mim, é a mais bela das rosas.
O carinho entre mãe e filho fascinou Fancy. A gentileza do Príncipe com sua
mãe trouxe-lhe lágrimas aos olhos. Ele amava a mãe do mesmo modo como ela amara a
sua. Piscou rapidamente para que não percebessem sua emoção.
- Fancy canta na ópera-Stepan disse. O Times considerou sua voz a mais bela
que se ouviu em anos.
- Que excitante. A Princesa virou-se para Fancy: Eu sempre adorei óperas,
mas faz muito tempo que não assisto a nenhuma.
- Mais tarde, cantarei para a senhora, se quiser.
- Eu adoraria. Você não, meu filho?
- Com certeza, mamãe.
Fancy ficou pensativa. Havia se enganado quanto aos aristocratas. Sempre os
julgara mal, no entanto o Príncipe era rico, bonito e carinhoso com seus parentes. E
amava a mãe, isso estava bem claro.
- Sua esposa cantará para os seus filhos. Em seguida, a Princesa Elizabeth
voltou-se para Fancy: Stepan sempre queria que eu cantasse para ele dormir. Ela
olhou um pouco apreensiva para o filho. Quem cantava para você dormir quando eu...
quando eu...
- Rudolf cantava para mim, mamãe.
- E por que Rudolf não está aqui conosco?

102
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Ele ficou em Londres, Stepan explicou com infinita paciência. Todos virão a
Sark em agosto e passarão um bom tempo com a senhora.
- Espero que Vladimir não venha. A Princesa pareceu preocupada. Não gosto
de Vladimir.
- Vladimir mora em Moscou e não virá para a Inglaterra. Mas a prima Amber
fará uma visrta este ano. No próximo ano, estará ocupada com seu primeiro filho.
- A doce Amber se casou com um inglês?
- Você se lembra, mamãe, Amber casou-se com o Conde de Strafford.
Fancy não conseguia afastar os olhos do Príncipe. Sua sensibilidade a
surpreendia. Ficou imaginando o que causaria a confusão mental da Princesa.
- Fancy vem de uma família grande. Stepan procurou desviar a atenção da mãe
para outro assunto.
- Fale-me sobre a sua família, querida.
- Mamãe morreu há poucos anos. A babá Smudge faleceu no ano passado.
Minhas seis irmãs e eu moramos a nossa vida inteira na Soho Square com nosso
cachorro, Puddles.
A Princesa riu ao ouvir o nome do cachorro.
- E onde está seu pai?
Fancy hesitou, embaraçada em contar a história do pai. Olhou para o Príncipe,
que notou seu desconforto.
- Magnus Campbell é o pai de Fancy e de suas seis irmãs, ele contou para a
mãe.
- Oh, Magnus? Então você é irmã de Rudolf? Ela olhou para o filho. Ela é irmã
de Rudolf?
- Sim, mamãe. Rudolf é seu meio-irmão.
Não acostumada a receber visrtas, logo a Princesa mostrou cansaço e retirou-
se para seu quarto.
Stepan acompanhou a mãe e voltou rapidamente para a sala.
- Vamos dar uma volta pelos jardins?
O gramado era um tapete verde aqui e ali interrompido por um canteiro de
rosas. Havia as mais variadas flores espalhadas pelos outros canteiros. Fancy exalou o
perfume sensual das rosas e sentiu-se no paraíso.
Caminharam pelos jardins até encontrar uma estufa.
- Sempre que venho aqui, passo as manhãs cuidando de plantas.
- Oh, temos aqui um jardineiro.

103
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Jardinagem relaxa a pessoa. Você deveria experimentar.
- Pois assassinei cada planta que tentei cultivar.
Saíram da estufa e logo Fancy notou um enorme carvalho sobre o qual havia
uma casinha.
- Uma casa na árvore! - ela exclamou, excitada.
- Venha conhecê-la.
Subiram no carvalho por uma pequena escada e a casa surpreendeu Fancy. Era
espaçosa e mobiliada.
- Dormíamos aqui nas noites quentes. Stepan sentou-se em uma pequena cama
e Fancy o acompanhou.
- A sua gentileza com sua mãe me impressionou.
- Isso significa que gosta de mim?
- Isso significa que eu o tolero um pouco mais.
Stepan mirou aqueles maravilhosos olhos cor de violeta e beijou-a na testa.
- Penso que quer saber mais sobre minha mãe.
- Só se você quiser me contar.
-Mamãe estava grávida de Rudolf quando se casou com Fedor Kazanov, Stepan
começou. Não escondeu de meu pai a sua gravidez e ele sempre soube que ela
carregava o filho de outro homem. Nunca a perdoou por não ter se casado virgem e
sempre desprezou Rudolf.
Stepan parou por um momento, como se buscando forças para continuar com
aquelas recordações.
- Apesar de continuar a amar Magnus Campbell, minha mãe foi uma esposa fiel
e teve quatro filhos com meu pai. Vladimir é o irmão gêmeo de Viktor.
Fancy ficou pensando como as aventuras do Duque de Inverary tinham
complicado a vida de muitas mulheres.
- Por que sua mãe não gosta de Vladimir?
- Fedor conseguiu com que Vladimir ficasse contra minha mãe. Nomeou-o seu
único herdeiro e ignorou o resto de nós.
- Quando mamãe deixou de poder ter filhos, ele a internou em um asilo de
loucos. Ela ficou por lá quinze anos, até que Rudolf a resgatou e a trouxe para a
Inglaterra. Meus irmãos e eu os seguimos.
Chocada, Fancy ficou apenas olhando para o Príncipe. Havia horror em sua
expressão.
- Mamãe melhorou aqui em Sark Island. Os estranhos a assustam, mas ela

104
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
adora a visita dos filhos e das netas.
Fancy ficou confusa. Como poderia confortar o Príncipe, um homem que
testemunhara a crueldade do pai para com sua mãe? Pelo menos o Duque de Inverary
protegera sua mãe e enviara a babá para ajudá-la.
Stepan notou lágrimas nos olhos de Fancy e a puxou para junto de si.
- Chorar não muda o passado.
- Há coisas piores na vida do que ser uma filha abandonada, Fancy murmurou.
Alexander caminhou em direção ao grupo de homens que conversavam perto da
margem do Tâmisa. Sentia o calor do sol em seu rosto, mas uma brisa fria expressava
bem seu estado de espírito. Reparou que Barney examinava os arredores do corpo
havia pouco encontrado.
Mais uma vítima do assassino das pétalas de rosa?
Talvez devesse ter ido buscar Raven Flambeau. Decidira, porém, falar antes
com Amadeus Black.
Raven. Por que ele vivia pensando na jovem? Já não lhe bastava ter o amor de
Genevieve?
- Devo buscar Raven? - Alexander perguntou ao chegar ao lado de seu chefe.
- Inspecione a vítima e me diga se precisamos dela. Alexander tirou um par de
luvas de seu bolso e as calçou. Não queria prejudicar em nada a cena do crime. Puxou o
pano que cobria o corpo da vítima e arregalou os olhos.
Havia pétalas de rosa, contudo o instinto lhe dizia que alguma coisa estava
diferente.
A vítima não tivera os lábios e as pálpebras costurados. Sua expressão nãd
era serena, mas de horror.
A jovem que estava ali coberta por pétalas de rosa não fora envenenada, e sim
estrangulada.
- Este crime está diferente, ele comentou com Amadeus.
O inspetor de polícia apontou para um homem que chorava rodeado de amigos.
- O marido achou a esposa, que havia desaparecido de casa, Amadeus contou a
Alexander. Algo me diz que alguém quis jogar a culpa no assassino das pétalas de rosa.
- E se foi o marido a estrangular a esposa?
- Veremos, veremos. Serei eu a interrogá-lo. Temos de encontrar logo o
assassino das pétalas de rosa, antes que apareçam por aí mais imitadores. Alexander
concordou.
- Precisamos investigar Parkhurst, Amadeus disse. Quero que você faça as
pazes com seu avô e assuma o seu lugar na sociedade.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Alexander abriu a boca para argumentar, mas Amadeus não lhe deu tempo de
falar.
- Não seja orgulhoso. Precisamos mudar de ação ou encontraremos novas
vítimas. E depois, por mais sofrimento que seus pais e você tenham tido, nada se
compara ao que o velho tem passado nesses anos todos. Você precisava de um motivo
para perdoá-lo, e agora eu lhe estou dando um.
Aíexander ficou parado algum tempo em frente à casa de seu avô, procurando
se convencer de que estava fazendo aquele sacrifício para poder pegar um assassino.
E o mais importante, o velho havia magoado o filho e a nora, mas acabara ele próprio
se magoando.
O Duque de Essex era um homem idoso e solitário.
Alexander respirou profundamente e subiu as escadas. Bateu na porta e
esperou.
A porta foi aberta por um homem também velho, o mordomo-chefe de seu avô.
- Boa tarde, milorde. Queira entrar.
- Sabe quem eu sou?
- Naturalmente. Venha comigo, senhor. Sua Graça está tomando chá no
pequeno salão.
Alexander seguiu o mordomo e logo entravam no salão. Pelo caminho, ele notou
que a decoração era elegante.
Alexander cruzou o salão e, sem esperar por convite, sentou-se na cadeira
oposta à de seu avô.
- Mudei de idéia quanto à herança.
- Foi o que deduzi.
- Preferia que eu não tivesse tomado essa decisão?
- Falei isso, por acaso?
O mordomo entrou no salão naquele momento trazendo chá e sanduíches. Após
servir o Duque e seu neto, saiu do aposento.
Alexander tomou um gole de chá e começou a comer um sanduíche.
- Já vou lhe avisando que planejo me casar com Genevieve Stover e não
escutarei os seus argumentos contra ela.
O Duque de Essex suspirou e não disse nada. Parecia resignado.
- Agora, me conte sobre a sua investigação, o Duque pediu.
- Está interessado?
- Não perguntaria se não estivesse.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Acabo de voltar da margem do Tâmisa. Descobrimos um corpo coberto com
pétalas de rosa. O marido tentou se livrar da esposa e jogar a culpa no assassino das
pétalas de rosa.
- O homem confessou?
- Não, mas Amadeus Black vai interrogá-lo. Certamente o fará confessar.
- O Conde e a Condessa de Winchester estão oferecendo uma festa esta
semana. Gostaria que você fosse comigo.
- Muito bem. Alexander levantou-se para sair.
- Posso lhe perguntar o que o fez mudar de idéia quanto à sua herança?
-Amadeus Black me aconselhou a fazer as pazes com o senhor.
O velho inclinou a cabeça.
- Estou grato pela interferência do inspetor.
À meia-noite, a casa inteira estava mergulhada no silêncio e Fancy andava pelo
quarto.
Ela julgara mal o Príncipe. Na verdade, ele não era um canalha como seu pai
tinha sido. Brincava com as sobrinhas e era gentil e paciente com a mãe.
Parou junto à janela e olhou a escuridão. Ajudada pelo luar, Fancy conseguiu
ver a casa em cima da árvore.
O aroma de canela encheu o quarto. Ela sabia que sua babá se encontrava por
perto.
“Escute a sua cabeça, criança, mas siga o seu coração”.
Fancy sabia que seu coração mandava-a se atirar nos braços do Príncipe.
Deveria dizer isso a ele? Talvez devesse dar-lhe um lugar em sua cama?
Então ela o viu. Usando apenas calções, Stepan caminhava em direçao à casa
da árvore. Fancy o viu subir as escadas e desaparecer dentro da casinha.
Vestida só com a camisola, Fancy caminhou, decidida, em díreção à porta e
rumou para a casa da árvore. Nem calçara os sapatos.
Chegou ao carvalho e subiu as escadas.
- Stepan?
Entrou e viu o Príncipe.
- O que está fazendo aqui a esta hora?
- Eu... - Fancy hesitou.
- E você? Por que veio até aqui?
- Fugi da tentação, mas você me seguiu. Ela criou coragem e se aproximou

107
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
dele.
- Você me ama? - Fancy perguntou, embora já soubesse a resposta.
A pergunta de Fancy surpreendeu o Príncipe.
- Você quer que eu ame você?
- Quero.
Stepan sentiu uma excitação invadi-lo por inteiro.
- Por quê?
- Porque eu estou apaixonada por você.
Ela o amava. Ele a possuiria finalmente. Stepan acariciou com muito carinho os
braços despidos de Fancy.
- Eu o amo mais que a minha própria vida.
Em silêncio, Fancy realizou um desejo secreto. Suas mãos deslizaram pelo
peito de Stepan.
- Beije-me, ela pediu.
Stepan inclinou a cabeça, seus lábios clamando pelos dela. O corpo de Fancy
exalava o aroma das flores e sua promessa de amor seduzia o Príncipe.
O beijo foi longo. Com a ponta da língua, Stepan invadiu e desfrutou a doçura
da boca daquela mulher fascinante.
Fancy tremeu e sua língua travou uma dança sensual com a de Stepan. Ela
pressionou-se contra ele, totalmente tomada pela crescente excitação.
O Príncipe nunca conhecera uma mulher tão doce. Fancy era inocente, e ele
não queria assustá-la. Assim, primeiro acariciou de leve um dos seios por cima do
tecido fino da camisola.
- Você fará amor comigo? - Stepan perguntou.
- Pensei que já estivéssemos fazendo amor, meu Príncipe.
- Tudo o que eu quero é o seu amor. Se não estiver pronta para qualquer
intimidade, esperarei - ele forçou-se a dizer, apesar de que todo o seu corpo
desmentia essa promessa.
- Quero conhecer o amor agora, Stepan. Um novo beijo selou aquele início de
entrega.
- Tem certeza? - ele insistiu.
- Tenho.
- Pertencer a um Príncipe significa uma entrega eterna.
- Pare de falar. Eu quero fazer amor.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Isso o fez sorrir. Quando sua linda cantora tomava uma decisão, ninguém a
fazia mudar de idéia.
Lentamente, Stepan começou a lhe tirar a camisola, ao mesmo tempo em que
lhe acariciava o corpo. Primeiro os ombros, depois os seios e os quadris, estes
perfeitos para carregarem os nenems que eles teriam. A pele de Fancy era pura seda.
Fascinado, o Príncipe tocou nos mamilos, que cresceram ao contato com seus dedos.
- Dispa-me, Stepan pediu.
- Quer que eu...
- Tire-me a roupa e toque no meu corpo.
- Onde devo tocar?
- Onde desejar, minha flor.
Fancy seguiu suas instruções e logo estava conhecendo prazeres até então
nem sequer imaginados.
O Príncipe estendeu-lhe a mão e a levou até uma pequena cama que havia na
casa da árvore. Deitaram-se e seus corpos procuraram um contato mais íntimo. Ela
colocou os braços em torno do pesr coço de Stepan, e ele iniciou um beijo provocante
que terminou deixando os dois tontos de prazer.
- Você é tão bela! O Príncipe começou a lhe beijar o rosto, e seus lábios
foram procurando novos pontos ainda não tocados. Finalmente, encontrou um dos
mamilos e Fancy gemeu, desconhecendo a si mesma.
Novas sensações excitantes a levaram a agarrar-se em Stepan quando ele
abriu-lhe delicadamente as pernas e tocou em suas partes mais íntimas.
- Quero que me possua, por favor... - ela pediu.
Stepan obedeceu imediatamente ao pedido de sua amada e amou-a, tirando-
lhe a virgindade. Parou por um instante, para que Fancy se acostumasse ao que estava
acontecendo. Ela se surpreendeu a princípio, depois relaxou e posicionou o corpo em
um silencioso convite.
E o ato do amor foi se intensificando até ambos gemerem de prazer. Quando
tudo terminou, Fancy soluçou de encontro ao peito do Príncipe.
- Oh, querida. Sinto muito. Não queria machucá-ia, mas uma mulher sente dor
quando perde a virgindade.
- Você não me machucou, Stepan.
Ele a olhou, sem entender a razão de suas lágrimas.
- Por que está chorando, meu amor?
- Eu me tornei como minha mãe - ela murmurou.
O Príncipe sentiu vontade de rir.

109
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Você não é sua mãe. E ouça-rne bem. Eu te amo, minha Princesa.
- Meu pai também fez juras de amor à minha mãe. E agora Fancy chorava
ainda mais alto.
- Você não é nem sua mãe nem a minha. E eu quero me casar com você.
- Você quer? - Ela parou imediatamente de chorar.
Stepan a beijou no rosto e depois se colocou de joelhos.
- Srta. Flambeau, quer me dar a honra de se tornar minha esposa?
Fancy não disse nada, apenas ficou olhando para ele. Por um momento horrível,
Stepan pensou que ela recusaria seu pedido.
- Prometo amá-la e honrá-la em cada dia da minha vida, ele acrescentou.
Fancy abriu um enorme sorriso.
- Sim, Alteza, eu me casarei com você.
Stepan gritou de alegria e a puxou de volta para a cama. Beijaram-se
apaixonadamente. Ele não queria correr nenhum risco de Fancy mudar de idéia. Fariam
amor tantas vezes enquanto estivessem ali na ilha que ela voltaria grávida para
Londres. Só assim Stepan teria certeza de que o casamento estaria assegurado.
- Algum dia no futuro, ele disse, você contará aos nossos netos que seu avô
pediu sua avó em casamento completamente nu.
- Isso não me parece apropriado, Fancy fingiu-se escandalizada.
- E eu quero uma dúzia de filhas e um filho.
- Treze é o número de azar.
- Então, apenas as doze filhas, o Príncipe corrigiu.
Fancy acariciou os lábios dele.
- Você enganou toda a sociedade londrina, Alteza. Pensam que é um
aventureiro, e isso não é verdade.
- Adoro cultivar uma reputação má. Os canalhas são mais interessantes do
que os borizinhos.
Stepan vestiu seus calções rapidamente e ajudou Fancy a colocar a camisola.
- Venha, querida. Quero fazeramor novamente com você, só que ern lençóis de
seda, e não nesta cama de criança. Juro que a devolverei ao seu quarto antes que
todos acordem na casa.
Raven encontrou Serena e Sophia jogando cartas em vez de se vestirem para
o baile daquela noite. Puddles estava deitado sobre a cama e abanou o rabo quando a
viu entrando.
- Não vão se vestir? A Duquesa vai ter um ataque.

110
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Nossa madrasta nos deu permissão para ficarmos em casa, Serena contou.
- Isso não é justo. Por que sou obrigada a ir? - reclamou Raven.
- Não fique aborrecida. A Duquesa convidou vários cavalheiros, que virão
jantar aqui na próxima semana. Teremos de nos socializar nessa ocasião.
- Se a Duquesa conseguir fazer as coisas à sua moda, todas nós estaremos
casadas por ocasião do Natal.
- Você está linda esta noite, Serena comentou.
- Obrigada. Raven atravessou o quarto para inspecionar a sua aparência em um
espelho. Usava um vestido rosa de seda, com um decote recatado e mangas bufantes.
A criada da Duquesa havia penteado seu cabelo para cima, permitindo que apenas
alguns poucos fios caíssem graciosamente nos lados do rosto.
- Vocês duas acham que pareço muito jovem vestida assim de rosa?
- Querida! - Serena exclamou, imitando a Duquesa. Você é muito jovem.
Raven suspirou procurando se conformar. Olhou então para Sophia.
- Já descobriu a razão pela qual Genevieve Stover não tem aura?
- Talvez existam pessoas que não as possuem.
- E já viu alguém que não tivesse uma?
- Nunca.
Raven deixou as irmãs e desceu para o andar inferior. Bliss, vestida com um
traje violeta e Blaze, usando um vestido amarelo, encontravam-se ao lado da Duquesa.
- Não acha que sou muito jovem para participar de um baile? Raven perguntou
à Duquesa.
- A Condessa de Winchester é minha sobrinha, assim é perfeitamente
aceitável que você compareça. E, meninas, lembrem-se do que lhes disse. Nem todos os
homens são chatos. Afinal, sabemos que muitos estão mortos.
- Não ensine essas coisas às minhas filhas, Roxie. Vestido em seu traje
formal, o Duque de Inverary estava descendo as escadas.
- Oh, Magnus querido, eu não estava me referindo a você.
- Então, não coloque as meninas contra todos os homens. O mundo pertence a
nós, homens, e quero que minhas filhas sejam felizes em seus casamentos.
- Estou apenas pedindo que sejam cautelosas.
O Duque de Inverary franziu a testa e chamou as filhas para perto de si.
- Nunca acreditem em nada que um cavalheiro diga até que a peçam em
casamento. Confiem neles apenas quando se tornarem seus maridos.
Logo depois, todos entravam no salão da sobrinha da Duquesa. Havia centenas

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
de convidados, muitos deles dançando ao som de uma pequena orquestra.
- O Duque de Essex, o mordomo-chefe anunciou. E o Marquês de Basildon.
Raven arregalou os olhos, mal acreditando quem ela via descer as escadas ao
lado do avô. Alexander Blake nunca parecera tão bonito. Sua presença ao lado do avô a
surpreendia, porém. Então, ele acabara aceitando o título de sua família e se tornado o
herdeiro do avô, a quem dizia detestar. E o velho aceitaria Genevieve Stover como
membro da família? Ou Alexander terminara seu romance com a cantora de ópera?
Rodeado por aristocratas, o Duque de Essex apresentou o neto à sociedade.
Debutantes e suas ansiosas mães pareciam interessadíssimas em Alexander, um jovem
rico, bonito e futuro Duque.
Em seguida, o Duque de Essex aproximou-se do grupo onde estavam o Duque
de Inverary, sua esposa e filhos, e apresentou o neto. Logo se uniram a eles o Príncipe
Rudolf e Viktor e suas respectivas esposas.
A Duquesa de Inverary não demorou a agir. Segurou a mão de Raven e a levou
até junto de Alexander.
- Acredito que conheça Raven, milorde.
- Boa noite, Raven, Alexander cumprimentou-a.
- Nunca pensei em encontrá-lo aqui, Alexander.
- Nem eu mesmo pensei em estar aqui - ele disse rindo. - Gostaria de dançar?
- Não, obrigada.
- Imagine, claro que ela vai dançar com o senhor, milorde. A Duquesa riu.
Raven, querida, não seja assim tão tímida.
- Dance comigo, por favor - Alexander pediu, oferecendo-lhe a mão.
Todos do grupo os observavam. O que ela podia fazer?, perguntou-se Raven.
Terminou por aceitar o convite e colocou sua mão sobre a dele e deixou-se
levar para a pista de dança. Logo estava valsando nos braços de Alexander, o homem
por quem ela sempre fora apaixonada.
- Isso me faz lembrar os velhos tempos, ele comentou. Lembra-se de que
dançávamos na sua cozinha?
Raven ficou em silêncio e Alexander começou a se preocupar.
- Não gosta mais de mim, Raven?
- Não gosto nem desgosto. Apenas não penso mais em você.
- E eu, no entanto, desejo conversar com você em particular. Que tal darmos
uma volta pelos jardins?
- Está parecendo misterioso, ela observou, sem recusar o convite.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Ao penetrar no jardim, Raven sentiu um alívio enorme por não ter de se
comportar como uma dama diante de todas aquelas pessoas que enchiam o salão. Havia
luzes espalhadas pela área iluminando as plantas, e o ar estava deliciosamente
perfumado.
- Foi Amadeus Black quem me recomendou que fizesse as pazes com meu avô.
- Não precisa se justificar.
- Não estou me justificando, apenas lhe contando o fato. Alexander a levou
até um banco que havia sob uma enorme árvore.
- Precisamos investigar lorde e lady Parkhurst. Você me ajudaria?
- Por que precisa da minha ajuda?
Alexander sentiu dificuldade em responder. Se amava Genevieve, por que
existia aquela atração tão grande por essa mocinha de cabelos negros e olhos cor de
violeta?
- Você está linda com este vestido rosa Raven, ele disse inesperadamente.
Raven ficou sem fala. Pareceu-lhe que Alexander pretendia beijá-la. E o beijo
aconteceu e foi leve e doce.
- Lorde Basildon?
Alexander voltou-se em direção à voz. Um criado encontrava-se
discretamente por perto.
- O sr. Barney está no hall de entrada e pede para falar com o senhor.
- Obrigado. Você vem comigo, Raven? Ela o acompanhou trêmula e meio
assustada.
Com o chapéu na mão, Barney esperava por Alexander. - O chefe está
precisando de você. Encontramos outro corpo.
- Irei junto. Talvez o seu chefe precise de mim, Raven declarou.
Alexander concordou e voltou-se para o criado:
- Por favor, informe o Duque de Essex e o Duque de Inverary que Raven
Flambeau está com uma forte dor de cabeça e eu a estou levando de volta à sua casa.
- Sim, milorde.
Vinte minutos mais tarde, Barney parava a carruagem em Battersea Fields,
perto do rio. Alexander ajudou Raven a descer.
- Barney, vá até o teatro e leve Genevieve Stover para casa.
- Para a sua ou para a dela?
- Para a dela.
Vários homens seguravam tochas para iluminar a área. O ins-petõr de polícia

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
ficou satisfeito com a presença de Raven.
- Estou contente que tenha vindo, Raven, apesar de que não sei se ficará
chocada com o que presenciará. A vítima não morreu há pouco e seu corpo já está em
decomposição. Melhor permanecer ao meu lado enquanto Alexander dá uma olhada.
Alexander aproximou-se segurando uma tocha. Rodeou a vítima, inspecionou o
rosto e depois acenou para seu chefe.
- Raven, não penso que deva ver a morta, Alexander disse aproximando-se
dela. É melhor esperar pela próxima vítima.
Esperar pela próxima? Se agora Raven pudesse descobrir alguma coisa que
levasse ao assassino, valeria a pena o sacrifício de passar por um momento de horror.
- Insisto em vê-la. Ela caminhou, resoluta, até o corpo em decomposição sobre
o qual voavam moscas. Sentiu uma pontada no coração ao ver aquela pobre mulher
abandonada ali para apodrecer, sem nem ter o direito de ser enterrada. Pétalas de
rosa cobriam o cadáver.
Um demônio cometera aquele crime, um monstro mascarado de humano.
- Preciso me ajoelhar, Raven murmurou, incapaz de afastar o olhar da infeliz.
Alexander tirou o casaco e colocou-o no chão. Ela ajoelhou-se, mas quando ia
tocar o corpo, Alexander lhe puxou a mão e sacudiu a cabeça.
- Deixe-me tocar uma pétala de rosa, Raven pediu. Alexander calçou luvas,
pegou uma pétala e a colocou na palma da mão dela.
Raven fechou os olhos.
- O mal tem dois rostos.
- Sabemos que há duas pessoas, um homem e uma mulher, envolvidas nesses
crimes.
- Qual é o homem? - Raven deixou cair a pétala de rosa. E qual é a mulher?
Isso está me confundindo.
- Você quer dizer que eles não conhecem o próprio sexo?
- Os monstros sabem o que são, mas suas faces se misturam. Ela suspirou.
Não estou sendo de muita ajuda, não é?
- Ninguém comete um crime perfeito, Alexander murmurou. Nós
descobriremos quem são.
- A vítima está usando alguma jóia que eu possa tocar?
O inspetor inspecionou a morta e encontrou um bracelete. Colocou-o na palma
de Raven.
Ela fechou os dedos sobre a jóia e sentiu algo. Abriu a mão e examinou o
bracelete com cuidado.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- O que foi? - o inspetor de polícia perguntou.
- Sinto que existem fios de cabelo nas ligações dos enfeites. Raven olhou para
o inspetor e depois para Alexander. E os cabelos não vieram de nenhum ser humano.

Capítulo X
As quatro semanas em Sark Island passaram mais depressa do que um dia de
sol em Londres.
Pela janela do camarote do navio, Fancy podia ver a chuva cair. Ela e Stepan
voltavam para Londres em um dos navios da família Kazanov.
Suspirou lembrando-se dos dias de sol na ilha, de como era maravilhoso fazer
amor, cuidar do jardim e cantar para a mãe de Stepan. Agora, uma neblina parecia
tomar conta do ar, deixando seu humor nebuloso.
Mas os dias de chuva lhe traziam outras lembranças. Eram em dias assim que
seu pai visrtava sua mãe. Agora, porém, a chuva somente parecia piorar ainda mais seu
mal-estar. Sentia-se enjoada, naturalmente pelo balançar do navio naquelas águas
agitadas. Gostaria de estar em terra firme, retomando seu trabalho no palco.
Stepan entrou no camarote segurando uma bandeja e fechou a porta com o pé.
Como sempre acontecia ao ver o Príncipe, Fancy sentiu uma emoção toda especial.
- Como está se sentindo? - ele perguntou. Colocou a bandeja na mesa e olhou
ansioso para Fancy.
- Este balanço do navio me tirou a energia.
- Pois eu lhe preparei um chã com torradas. Estaremos chegando ao porto em
menos de duas horas. Pode cochilar um pouco antes de desembarcarmos, Stepan
sugeriu, notando a palidez do rosto de Fancy.
- Talvez eu faça isso.
- Está feliz em voltar a Londres?
- Preferia estar voltando para Sark Island, ela respondeu com sinceridade,
mas estou ansiosa para recomeçar a trabalhar.
Stepan continuava adiando o momento em que teria de dizer a Fancy que ela
não poderia conciliar a vida de cantora de ópera com a de esposa de um Príncipe. Além
do mais, mesmo que Fancy não tivesse percebido ainda, estava esperando um filho.
Aquele enjoo não começara ali na travessia de volta para Londres. Começara em Sark
Island e já durava alguns dias.
Stepan observou que Fancy não tocara nem no chá nem nas torradas.
- Tostei demais as torradas, querida? Ou passei muita manteiga?
- O seu barco me deixa enjoada.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Este não é um barco, mas um navio.
- Pois o seu navio me deixa enjoada. Fancy se esforçou em tomar um gole de
chá.
- Você podia esperar até a próxima semana para voltar ao teatro, Stepan
sugeriu. Hoje é sexta-feira e Genevieve Stover pode terminar a semana
interpretando o seu papel.
- Parece uma boa idéia, Fancy reconheceu.
- Então venha aqui, ele pediu.
Ela se levantou e sentou-se no colo do Príncipe.
- O que está pensando? Fancy perguntou ao ver Stepan olhar desanimado para
a janela.
- Odeio dias chuvosos.
- Por quê?
- Nada de bom acontece em dias assim.
- Pois meu pai visrtava minha mãe em dias chuvosos e ela sempre sorria.
Sem perceber, Fancy encostou a cabeça no ombro de Stepan e adormeceu. Ele
a levou carinhosamente para a cama e a cobriu com uma colcha.
Duas horas mais tarde, o navio chegou ao porto. Fancy ouviu os ruídos de
desembarque e apressou-se a subir ao convés. Nem bem chegara e o enjoo se tornou
forte demais e ela pensou que vomitaria ali mesmo. A certa distância, Stepan a
observava e sorria. Ele tinha certeza de que Fancy estava grávida.
Não muito depois, já em terra firme, Fancy e Stepan entravam na carruagem.
- Leve-nos para Park Lane, ele instruiu o cocheiro.
Ela voltou-se pare o Príncipe, surpresa:
- Quero ir para casa. Não me sinto bem para fazer visrtas.
- Suas irmãs devem estar ansiosas em ver você.
- Posso vê-las amanhã.
- Mas não quer saber se Mikhail conseguiu conquistar o coração de Belle?
- Está bem, daremos uma passada pela casa de meu pai. Fancy encostou de
novo a cabeça no ombro de Stepan e imediatamente adormeceu.
Trinta minutos depois, a carruagem parava em frente à mansão do Duque de
Inverary. Stepan acordou Fancy e ajudou-a a descer.
- Não sei explicar por que estou tão cansada. Não faço outra coisa a não ser
dormir, ela se lamentou.
- Tem estado assim a semana toda. Ele a guiou rumo às escadas.

116
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Tinker, o mordomo-chefe, foi quem abriu a porta. Puddles apareceu do nada e
latiu alegremente para o casal.
- Vamos anunciar à sua família o nosso casamento? - Stepan perguntou.
- Tem preferência por alguma data?
- Quero que seja logo.
- Teremos de planejar a cerimonia conforme o programa da ópera.
- Bishop será compreensivo.
- Mas eu...
Stepan apressou o passo e entrou no salão onde estavam o Duque e a Duquesa
de Inverary e dois de seus irmãos, Rudolf e Mikhail. Conseguira assim adiar a
discussão.
- Oh, minha querida, nem imagina como estou excitada! - a Duquesa exclamou
ao ver Fancy.
- Roxie, vá com calma, o Duque aconselhou.
Confusa, Fancy olhou para o Príncipe.
Stepan sentou-se em um dos sofás e puxou-a para o seu lado.
- Mamãe está bem, ele disse aos irmãos. Fancy a distraiu com o seu canto.
- Gostei muito de visrtar as suas terras, Rudolf. Fancy dirigiu-se ao seu meio-
irmão.
Stepan sorriu e colocou um braço em torno dos ombros dela.
- Ela adorou sobretudo a casa da árvore.
Fancy ruborizou imediatamente e tentou mudar de assunto.
- Onde está Belle?
O Príncipe Mikhail não parecia feliz.
- Deve estar lá em cima, eu suponho.
- Não disse que queria se casar com ela? Fancy perguntou em tom de acusação.
- Pois ela não aceitou o meu pedido de casamento. Acredita que ter uma
esposa com o rosto marcado arruinará a minha vida.
- Falarei com minha irmã.
- Resolveremos o problema de Belle depois de segunda-feira, a Duquesa disse.
Preparei um quarto bem aconchegante para você passar a noite. Ela olhou para o
marido. Está feliz, Magnus, agora que todas as suas filhas se encontram sob o seu
teto?
- Vou voltar para a minha casa, Fancy protestou.

117
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Não pode fazer isso, querida. Precisa ficar aqui até o dia do seu casamento.
O que a sociedade vai pensar?
- Como sabe que Stepan me pediu em casamento, Duquesa?
Tinker entrou naquele momento e colocou um prato de sopa de ostras na
frente de Fancy. Ela imediatamente sentiu o enjoo voltar.
- Respire fundo, Stepan lhe sussurrou.
-Está doente? - a Duquesa perguntou, alarmada. Magnus, mande chamar um
médico.
- Fancy não precisa de médico. Ela tem estado assim já há alguns dias. Stepan
sorriu para o Duque. Não é nada sério.
- Como sabe que Stepan me pediu em casamento? - Fancy voltou a perguntar à
Duquesa.
-- Você não lhe contou nada? - Rudolf sacudiu a cabeça em um gesto de
desaprovação.
- Stepan não me contou o quê? - Fancy olhou para seu meio-irmão, depois para
Mikhail e, por fim, para o pai.
Os três se continham para não cair na risada.
- Quando saímos de Londres, Stepan confessou, seu pai anunciou o nosso
noivado.
- Não entendo. Como ele pôde...
- Nosso casamento está marcado para segunda-feira. Você ficará aqui até a
hora da cerimónia.
Fancy levantou-se do sofá como um raio e encarou o Príncipe.
- Não posso me casar na segunda-feira e voltar a cantar na terça.
- Sente-se aqui, Stepan pediu.
- Não vou me sentar ao seu lado.
- Irmãozinho, viu no que deu não lhe contar a verdade? - Rudolf riu e Mikhail o
acompanhou.
- Vocês dois parem de rir! - Fancy exclamou apontando o dedo para Rudolf e
Mikhail. - Não vai haver casamento algum na segunda-feira.
- O casamento foi planejado, os convites, enviados, e o vestido está pronto - a
Duquesa disse em um gemido. Precisa apenas prová-lo.
Ignorando a Duquesa, Fancy virou-se para o pai:
- Não pode me forçar a ficar aqui e me casar com este mentiroso.
- Sou um homem apaixonado, não um mentiroso. Agora, sente-se aqui, Fancy.

118
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Como ela não parecesse disposta a lhe obedecer, ele levantou a voz: - Já disse para se
sentar.
Surpreendentemente, Fancy sentou-se.
- Você não tem escolha a não ser casar-se comigo.
- Tenho uma escolha - ela retrucou, levantando-se.
- Fique sentada.
Fancy sentou-se.
- Olhe para mim. Você está esperando um filho meu.
- Oh, que maravilha! - a Duquesa exclamou enquanto o Duque franzia a testa.
Fancy riu do absurdo da situação.
- Não estou grávida.
- Querida, temos vivido como marido e mulher por um mês, e você vem se
sentindo enjoada já há uma semana.
- Isso não prova nada.
- Escute, querida...
- Não vou escutar essa bobagem. Enjoei hoje no seu navio, isso é tudo.
A Duquesa de Inverary assumiu o controle da situação.
- Rudolf e Mikhail, por favor, deixe-nos um momento a sós.
- Precisamos sair? - Rudolf perguntou.
- Agora que chegamos à parte mais interessante? - Mikhail reclamou.
Quando os dois despareceram pela porta, a Duquesa voltou-se carinhosa para
Fancy:
- Querida, quando teve a sua menstruação pela última vez?
Fancy engasgou ao ouvir a pergunta. E então empalideceu, compreendendo suas
implicações. A última vez que viera sua menstruação havia sido bem antes de ir para a
ilha. E desde então, nada.
Escondeu o rosto nas mãos e começou a chorar. Stepan não disse nada, apenas
a abraçou e a deixou verter as lágrimas.
- Roxie, essas não são lágrimas de alegria-o Duque grunhiu, - Se Fancy não
quiser se casar com o Príncipe, ela e o nenem viverão na minha casa de campo.
Fancy chorou mais alto ainda. Tinha de fato se tornado sua mãe.
- Minha criança não vai nascer uma bastarda. Stepan levantou o queixo de
Fancy e a fitou nos olhos. Você não me ama?
- Amo.

119
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Então, qual é o problema?
- Sinto que fui enganada.
- Perdoe-me, querida. Eu jamais tentaria forçá-la a nada.
Fancy suspirou e aconchegou-se nos braços dele.
- A culpa em parte é minha.
- Não diga isso. Eu queria tanto me casar com você. Quando a pedi em
casamento e você aceitou, fiquei extasiado. Depois temi que mudasse de idéia. Desejei
então que você engravidasse.
- Mas como vou cantar na ópera?
Stepan queria falar que agora as prioridades eram outras. Talvez fosse
melhor deixar que ela própria concluísse isso quando o enjoo a impedisse de cantar ou
quando engordasse muito e não pudesse mais aparecer no palco.
- Muito bem. Ficarei aqui até segunda-feira - Fancy disse, resignada.
- Você parece exausta. A Duquesa levantou-se de sua cadeira. Venha comigo,
querida, e durma um pouco.
Stepan beijou-a de leve nos lábios.
- Durma bem, e eu a verei amanhã.
- A Princesa Samantha levou suas irmãs para fazerem compras, a Duquesa
disse, acompanhando Fancy para o quarto que lhe fora reservado. Exceto Belle e
Raven, que se recusaram a ir.
Fancy deixou-se levar sem falar nada. Amava Stepan, mas não era uma tola.
Sabia que ele insistiria para que ela abandonasse a ópera. E o que poderia fazer para
impedir que isso acontecesse?
Precisava cantar e manter sua independência.
Entrou no quarto seguindo a Duquesa.
- Quer que suas irmãs lhe façam uma rápida visrta antes de dormir?
- Gostaria disso.
Belle e Raven foram as primeiras a entrar no quarto. Ambas riram e
abraçaram a irmã mais velha.
- Stepan e eu nos casaremos na segunda-feira, Fancy lhes contou. Estou
grávida. Ela olhou para Belle. E o Príncipe Mikhail quer se casar com você.
- Não vou lhe arruinar a vida. Ele precisa de uma mulher perfeita para
acompanhá-lo na sua vida social.
- Por que não deixa o Príncipe tomar suas decisões sobre o que ele quer?
- Eu falei a mesma coisa para Belle! - Raven exclamou. Se Mikhail não se

120
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
importa com a cicatriz, por que ela não pode simplesmente aceitar essa realidade e
ser feliz?
- Mandarei vir a minha maquiagem do teatro e conseguirei esconder a cicatriz
do seu rosto, Belle. Assim você poderá dançar com o seu Príncipe na noite do meu
casamento.
-.Não sei se...
- Vamos ver como fica depois de maquiada, Fancy declarou, dando a conversa
por encerrada.
- Vou esperar para ver o resultado. Se a maquiagem não esconder a cicatriz,
não dançarei com Mikhail. Mas agora me diga, quais são as sensações de uma mulher
grávida?
- Sinto-me cansada e enjoada o tempo todo. Raven voltou-se para Belle:
- Você tem enjoado todas as manhãs, ela observou. E parece sempre cansada.
Fancy olhou, surpresa, para Belle.
- Mas, então, precisa falar com Mikhail. Tenho de admitir que eu não disse
nada para Stepan, contudo não tinha imaginado a possibilidade de estar esperando um
filho. Foi preciso Stepan contar-me o que estava acontecendo.
- Não quero que comentem nada com ele. Nem tenho certeza se também estou
grávida, Belle disse.
- Prometemos não falar nada, - Fancy e Raven declararam ao mesmo tempo.
As irmãs despediram-se de Fancy quando o Duque entrou no quarto
carregando uma bandeja.
- Posso entrar? - ele perguntou.
- Não precisava ter se preocupado em me trazer comida.
-Eu vim porque gostaria de conversar em particular com você.
- Pode falar.
- Stepan e eu estávamos preocupados com a sua segurança. Foi esta a razão
que nos levou a planejar as suas férias.
- E eu adorei a minha estada na ilha. Fancy ruborizou ao lembrar-se de como
se entregara a Stepan na casa da árvore.
- Eu lhe darei tudo do que precisar, Fancy. Se não quiser se casar com o
Príncipe, não o faça.
- Eu estou realmente apaixonada por Stepan.
- E por que hesrta em se casar com ele?
- Porque gostaria de continuar independente.

121
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Teme se tornar uma mulher dependente como sua mãe foi?
Fancy mordeu o lábio, sabendo que o Duque a compreendia muito bem.
- Apenas quero ser feliz. O senhor mé abraça, papai?
O Duque a abraçou e a ninou como se fosse uma criança. Logo depois, ajudou
Fancy a deítar-se. Ao sair, parou junto à porta.
- Stepan é um bom homem e entenderá as suas necessidades, minha filha.
Sua mãe teria sacrificado sua realização profissional pelo amor de um homem?
Fancy viu, pela janelinha da carruagem, surgir à sua frente o Teatro Real de
Ópera.
Talvez seu pai estivesse certo. Perder a família na Revolução Francesa tinha
marcado a vida de sua mãe. Ela passara a desejar amor e segurança, mas Fancy sabia
que queria mais do que isso.
O Príncipe não lhe dissera que deveria desistir do trabalho. Ainda não. Quando
o momento chegasse, ela atenderia ao pedido dele? Poderia desistir de se apresentar
diante do público e cantar apenas para a família e os amigos?

Desceu da carruagem, entrou no teatro e dirigiu-se diretamente ao escritório


do diretor. Ele sorriu ao vê-la entrar.
- Vim buscar os meus produtos de maquiagem, Fancy foi logo dizendo.
- Permita-me parabenizá-la pelo seu casamento.
- Quem lhe falou sobre ele?
- O Príncipe mandou-me um bilhete esta manhã.
Fancy sentiu sua ansiedade aumentar. Será que Stepan também enviara ao
diretor o pedido de demissão de sua futura esposa?
- Meu casamento se realizará na segunda-feira. Ela forçou um sorriso. Mas
posso cantar no final da semana. Ainda tenho um emprego?
- Naturalmente. Mas o Príncipe lhe deu permissão?
- Não preciso de permissão de ninguém para fazer as coisas que eu quero.
O diretor deu de ombros e Fancy foi direto ao seu camarim. Encontrou
Genevieve Stover sentada diante do espelho quebrado. Surpresa, ciúmes e raiva quase
a fizeram perder o controle. Dominou-se, porém.
Genevieve levantou-se alegremente e a abraçou.
- Estou feliz em saber que vai se casar.
- Oh, sim. E vejo que está mantendo a minha cadeira aquecida.
Genevieve enrubesceu.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Espero que não se aborreça com isso.
- Claro que não, Fancy mentiu. Vim apenas buscar meus produtos de
maquiagem.
- Coloquei-os em uma caixa aqui no armário.
- Você assistirá ao meu casamento, Genevieve?
- Adoraria, mas não sei se me sentirei bem ao lado de gente tão importante.
- Gostaria que você fosse. Se mudar de idéia...
- Não vou lhe prometer nada. Ah, sabia que Alex aceitou o título de Marquês?
Nada poderia deixar Fancy mais chocada.
- Mas ele disse que nunca perdoaria o velho.
- Eles se reconciliaram. Genevieve não parecia nada satisfeita.
- Se não a vir no meu casamento, eu a encontrarei no próximo fim de semana.
- Onde?
- Vou voltar a cantar.
- O Príncipe lhe deu permissão?
A irritação de Fancy aumentou.
- Não preciso da permissão dele.
- Se pensa assim...
- Penso.
Fancy saiu do camarim e viu a macaquinha vindo em sua direção.
- Como vai, srta. Giggles? - ela pegou o animal e brincou com ele. Vendo Patrice
Tanner se aproximar, tentou um sorriso. Irei me casar com o Príncipe Stepan Kazanov
na próxima segunda-feira, Patrice.
- Sentiremos a sua falta.
- Cantarei aqui em poucos dias.
- O Príncipe lhe deu permissão?
- Não preciso da permissão dele, Fancy repetiu pela terceira vez.
Patrice também deu de ombros e chamou o marido: - Venha, Sebastian.
Fancy ficou olhando o estranho casal. Patrice era dominadora. Não devia ser
fácil viver com ela.
Não conseguiu deixar de dar uma passadinha pelo palco. De repente, começou
a cantar. Será que aquela seria sua despedida?
Ouviram-se aplausos quando Fancy terminou a canção. Surpresa, olhou e viu os

123
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
seus colegas e os empregados do teatro batendo palmas, como se fosse de fato sua
última apresentação.
Com lágrimas escorrendo pelo rosto, ela se retirou às pressas do teatro,
carregando consigo sua caixinha de maquiagem. À porta, encontrou Stepan.
- Como soube que eu estava aqui?
- Tinker me contou.
-Vim buscar minha maquiagem para tentar esconder a cicatriz no rosto de
Belle.
- Então a levarei para casa. Ele percebera as lágrimas nos olhos de Fancy e
sabia que ela estava passando por um momento difícil.
- Posso ir sozinha. Já tenho uma carruagem ao meu dispor.
- Eu a dispensei.
Stepan virou-se para o diretor Bishop, que lhe sorria abertamente.
Conversaremos sobre aquele assunto na próxima semana.
Quando já estavam dentro da carruagem e a caminho de casa, Fancy voltou-se
para Stepan:
- Que assunto tem para conversar com Bishop?
- A próxima peça que ele vai encenar será A Jovem de Milão.
- Não a conheço.
- É uma obra nova composta pelo próprio Bishop.
- E o que ele espera de você?
- Que financie o espetáculo.
- E você o fará?
- Provavelmente.
- Oh, isso me deixa muito excitada. Patrice Tanner está velha demais para
desempenhar o papel de uma jovem.
Stepan procurou ignorar o comentário e colocou a mão sobre a barriga de
Fancy,
- Como está o nenem Kazanov hoje?
- Ele não gosta das manhãs.
- Você quer dizer que ela não gosta das manhãs?
- Bem me quer, mal me quer...
Um cavalheiro alto estava parado perto da colina Primrose na hora mais escura
e silenciosa da noite. Olhou para a mulher morta no chão. Serena, coberta por pétalas

124
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
de rosa.
- Quando isso vai acabar? - a mulher que se encontrava ali perto perguntou.
Ele não se deu ao trabalho de se voltar para ela.
- Acabará quando eu conseguir pegar aquela cantora de ópera.
- Qual delas?
- Você sabe a quem me refiro. E o homem pegou outra rosa e começou a
arrancar-lhe as pétalas. Bem me quer, mal me quer...

Capítulo XI
O monstro agira novamente. Oh, Deus, como ele gostaria de colocar suas mãos
no pescoço do homem e apertá-las. Alexander Blake fechou os olhos, agoniado.
Hesitou por um momento, porque era muito cedo para acordar alguém. Mesmo assim,
acabou batendo na porta. Tínker o atendeu prontamente.
- A srta. Raven está à sua espera-ele disse com naturalidade, como se
Alexander tivesse marcado um encontro com a jovem.
Ele olhou, surpreso, ao ver Raven sentada em uma cadeira.
- Estava esperando por você. Por que demorou?
- Mas... como soube que eu viria buscá-la?
- Sonhei a noite passada.
Não demorem e chegaram à colina. Amadeus Black aguardava os dois.
- Raven já estava vestida e esperando por mim, Alexander sussurrou para o
inspetor.
Raven olhou para o corpo coberto por um pano.
- Já sabem quem ela é?
- Trata-se de uma jovem que canta no coro da ópera, Amadeus informou.
Raven aproximou-se da vítima e pediu que Alexander descobrisse o corpo. Era
o de uma jovem bonita e com cabelos vermelhos.
- Quer chegar mais perto?
Raven acenou que sim. Ele tirou o próprio casaco e colocou-o no chão. Raven
ajoelhou-se ao lado do corpo.
- Quer que eu encontre algo que tenha pertencido à moça? Abaixando-se,
Alexander pegou uma echarpe e passou-a a Raven.
- Vejo dois rostos olhando a vítima. Por favor, levante o vestido da moça.
- O quê? - Aquela ordem surpreendeu Alexander.

125
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Ela foi mordida na perna, na altura do joelho. Aíexander e Amadeus
abaixaram-se e descobriram a perna da jovem morta. Havia uma marca vermelha ali.
- O sangue está seco - Alexander observou.
- Alguma coisa a mordeu antes que ela fosse morta, Amadeus olhou para
Raven. Foi isso que a matou?
- Não. Ela foi envenenada.
- Como sabe? - Alexander perguntou,
- Sei porque sei.
- Mas você acabou de dizer...
- O veneno não entrou em seu corpo através da mordida. A pobrezinha o
tomou.
- Vejo um milagre.
Fancy suspirou, satisfeita ao ver o sorriso de Belle. Os cosméticos tinham
feito a cicatriz desaparecer quase por completo. Belle não se cansava de olhar para o
espelho e começou a chorar.
- Se chorar, vou ter de começar toda a maquiagem de novo, minha irmã.
- Não sei como lhe agradecer, Fancy.
- Comece contando ao Príncipe sobre o nenem.
- Eu lhe contarei na hora certa. Não quero viver do modo como mamãe o fez.
- O Príncipe precisa de uma esposa e de uma mãe para a filha dele. Não espere
muito, pois pode acontecer de Mikhail acabar se resignando a escolher outra esposa.
- Prometo que vou lhe contar. Belle olhou, emocionada, para Fancy. Como você
está linda! Uma verdadeira Princesa!
Fancy olhou-se no espelho. Ela se parecia mesmo com uma Princesa.
O vestido era de seda branca, e o véu, tão longo que mal se via seu fim. Nos
cabelos, Fancy usava uma coroa, o que lhe dava um ar nobre.
Preciso usar alguma coisa nova. Alguma coisa velha. Alguma coisa emprestada.
Alguma coisa azul.
Era superstição, ela sabia disso. Mesmo assim, por que não se deixar levar
pelo costume?
Bem, o vestido era novo. Pegara emprestado da esposa de Rudoif um par de
ligas azuis. Estava usando um lenço que sua mãe trouxera da França havia muitos anos.
- Fique com os produtos de maquiagem, Belle - ela disse ao entregar a caixa à
irmã. Arranjo novos quando voltar a trabalhar.
- Conseguiu a permissão do Príncipe?

126
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Fancy procurou não se irritar. Parecia mesmo que todos se surpreendiam que
alguém rico quisesse trabalhar. Mas ela queria ser a Jovem de Milão, a personagem da
nova peça de Bishop. Patrícia Tanner podia não saber, mas seus dias de cantora
principal estavam quase terminados.
- Oh, minha querida, precisa afastar essa expressão do seu rosto ou o Príncipe
fugirá pela porta dos fundos! - a Duquesa exclamou ao entrar no quarto.
Belle riu e Fancy forçou um sorriso para a Duquesa, mas a incerteza de sua
carreira, o casamento com um nobre e sua gravidez mexiam com seus nervos.
- Pense só em coisas maravilhosas, querida. A Duquesa girou em torno da
noiva. Pense em felicidade, felicidade, felicidade...
Trinta minutos depois, Fancy se encontrava ao lado do pai na entrada da
capela de Grosvenor. Centenas de parentes e amigos enchiam seus bancos. Velas
iluminavam a capela, e dois violinistas tocavam uma música nupcial.
- Gostaria que Gabrielle pudesse assistir ao seu casamento, minha filha.
Fancy olhou para o pai. Ele havia amado sua mãe, agora sabia disso muito bem.
- Eu amo o senhor, papai - ela murmurou, emocionada.
- E eu sempre a amei e sempre a amarei, Fancy. Não importa o que aconteça
em nossas vidas, sempre quero você por perto.
- Obrigada, papai.
- Levá-la ao encontro do Príncipe é a maior honra da minha vida.
- Mas não passamos muito tempo juntos, papai.
- E eu lamento isso.
A Marcha Nupcial começou a ser tocada anunciando que chegara o momento da
a noiva entrar na capela.
- Está pronta?
Fancy olhou para o pai e lhe acenou que sim. Ignorando os rostos
desconhecidos que a olhavam entrar na passarela, ela caminhou como uma verdadeira
Princesa, irradiando beleza e felicidade.
Fancy e seu pai chegaram ao altar e o Duque a entregou ao Príncipe.
Stepan beijou-lhe a mão, fazendo Fancy suspirar.
- Obrigado por aceitar compartilhar a sua vida comigo, meu amor - ele
murmurou. - Este é o dia mais maravilhoso da minha vida.
Juntos se voltaram para o bispo. A cerimónia não durou mais que trinta
minutos, o que agradou a Fancy. Afinal, era a noiva, mas uma noiva grávida e tudo a
cansava.
Ao final da cerimónia, Stepan abeijou de leve nos lábios. Havia amor nos olhos

127
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
de Fancy e muito mais nos olhos do Príncipe.
Ela sentiu-se feliz. Era esposa de Stepan e esperava um filho dele.
Um futuro esplendoroso se descortinava à sua frente.
- Está disposta a começar uma nova vida, Princesa?
- Você é meu Príncipe encantado que fez com que todos os meus sonhos de
menina se realizassem.
- Pensei que detestasse os aristocratas - Stepan sussurrou-lhe, guiando-a na
passarela a caminho da porta de saída.
- Você me fez mudar de idéia. Tudo se deve ao seu talento e à sua persuasão.
Pouco tempo depois, o casal ouvia música de harpa sendo tocada no salão da
mansão do Duque e da Duquesa de Inverary. Ali, havia Príncipes, Duques, Condes,
marqueses, enfim, apenas pessoas importantes.
E Fancy sorriu, feliz, em ver que seu amigo de sempre, Alexander Blake,
estava em sua festa.
- Pensei que não estivesse interessado em títulos, ela o provocou.
- E eu jurava que você odiava os aristocratas, Alexander respondeu abrindo
um enorme sorriso.
- Estou feliz que tenha feito as pazes com o seu avô. Eu o vi recentemente, e
está muito velhinho. Deve ter se arrependido das bobagens que fez com seu pai,
Alexander.
- E eu estou feliz que você tenha perdoado seu pai e se tornado sua amiga. Sua
vida vai ser um sonho de fadas, minha querida Fancy.
Stepan acabou com a conversa dos dois amigos e resgatou a noiva para o seu
lado.
- Está ansiosa em começar a sua vida de casada?
- Estou ansiosa em dar prazer ao meu Príncipe. E quando me tiver tornado a
cantora mais famosa de Londres, saiba que cantarei apenas para você.
Stepan pensou em como conseguiria convencer Fancy que cantar na ópera não
era adequado para uma Princesa. Não falaria nada naquele momento, já que poderia
arruinar a noite de núpcias.
-Nós dois nascemos um para o outro - o Príncipe murmurou, com os olhos
cheios de desejo. O que acha de irmos embora da festa? Acredita que alguém vai
reparar?
- Se acha que podemos...
Desejar sair e passar pelaporta eram duas coisas completamente diferentes.
O costume ditava que a noiva e o noivo ficassem na festa de seu casamento

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
até que o jantar terminasse. Depois, o casal deveria dançar abrindo o baile. O costume
mandava, por fim, que os noivos agradecessem aos seus convidados.
Isso tudo a Duquesa de Inverary explicara aos recém-casados. Stepan, porém,
tinha um trunfo no bolso. Cochichou no ouvido da boa senhora que a noiva estava
sentindo enjoo e tontura e que precisava repousar imediatamente. A Duquesa deixou-
se levar pela conversa do belo Príncipe.
Assim, Stepan e Fancy foram recebidos com surpresa por Bonés na casa do
Príncipe na Grosvenor Square.
- Eu desejo felicidades aos meus Príncipes! - Bonés exclamou ao vê-los. Mas
Vossas Altezas não deveriam estar na recepção?
- Minha esposa precisa descansar. Demos uma escapada,
- Deseja alguma coisa, Alteza?
- Mande preparar-nos uma refeição leve e a coloque na sala conjugada ao meu
quarto. E queremos privacidade.
- Perfeitamente, Alteza.
Fancy entrou no quarto de Stepan e achou-o masculino demais. Teria de fazer
algumas mudanças ali, colocar um toque feminino no ambiente.
Isso, porém, ficaria para depois. Ela estava nos braços do marido desfrutando
sua noite de núpcias.
- Farei o papel de sua criada pessoal - o Príncipe murmurou, piscando para a
esposa. Permita-me despi-la, minha Princesa.
Ele desabotoou o longo vestido de noiva e acariciou-lhe as costas, fazendo-a
arrepiar.
Stepan aspirou o perfume que Fancy usava. Levantou-lhe os cabelos e a beijou
na nuca.
Encontrou o lenço que pertencera à mãe de Fancy,
- Dizem que traz sorte para a noiva usar alguma coisa antiga - ela explicou.
Mais adiante, ele encontrou as ligas azuis e olhou, curioso, para Fancy.
- A esposa de Rudolf as emprestou para mim. Deviam ser emprestadas e azuis.
Ela suspirou e encostou-se no Príncipe. Ele tirou-lhe o vestido e deslumbrou-se
com a beleza do corpo de Fancy. Tomou os seios em suas mãos e percebeu que estavam
maiores.
- Nosso nenem está modificando o seu corpo! - Stepan exclamou, feliz com a
idéia de ter uma esposa e, não demoraria muito, um filho.
Nua, Fancy sentou-se na cama e esperou pelo marido.
- Está demorando, Stepan. Estou ficando impaciente, ela brincou. Amava o

129
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
marido e não se envergonhava de sua nudez.
O Príncipe apressou-se em se despir. Tirou a gravata.
- Nova, ele informou.
Env seguida, tirou a jaqueta e o colete.
- Velhos como manda o costume - Stepan esclareceu.
Seguiu se despindo diante da esposa. Ela o observava, encantada. O Príncipe
era o modelo de beleza masculina. Másculo, um corpo perfeito, feições bonitas, e
aqueles olhos e cabelos negros...
- E algo emprestado. Stepan exibiu um relógio de ouro. Peguei-o emprestado
de Rudolf. - Ele colocou o relógio em cima de uma mesinha.
- E, para completar, alguma coisa azul. Stepan fez uma reverência e exibiu
sua cueca azul.
Fancy caiu na gargalhada e deitou-se na cama. Um momento mais tarde, o
Príncipe estava com seu corpo nu sobre o dela.
- Seremos felizes, minha pequena. Eu te amo, minha esposa.
- E eu te amo, meu marido.
O ato de amor começou devagar e foi se intensificando. Logo o casal gemia de
prazer, um satisfazendo o outro, já que sabiam cada ponto do corpo do parceiro que
lhe dava maior prazer.
- Acredita que não machucaremos o neném? - Stepan perguntou, hesrtando
quando da posse total.
- Você não o machucará, Fancy murmurou.
E então o ato se completou, cada um deles alcançando o clímax. E quando tudo
terminou, abraçaram-se, saciados e felizes.
E adormeceram.
Batidas na porta acordaram Fancy. Ela abriu os olhos e, olhando pela janela,
percebeu que já era noite.
Stepan acordou resmungando, vestiu o roupão e atendeu à porta.
O mordomo-chefe mandara servir uma refeição na sala ao lado, como o
Príncipe pedira.
- Estou faminta - Fancy reconheceu, sentando-se na cama. - E preciso de
alguma roupa para me cobrir.
Stepan lhe estendeu sua camisa e ela a vestiu. De mãos dadas, foram para a
outra sala.
Havia lagosta na manteiga e outros pratos refinados.

130
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- O que nossa filha quer comer? - Stepan perguntou, rindo para Fancy.
- Um pouco de tudo.
- Vinho ou água?
- Limonada. Não quero que o nenem se torne um viciado em álcool.
- Estou feliz que você ame a nossa filha tanto quanto eu. E saiba que sempre
amarei a mãe deste nenem.
- Não mais do que eu amarei o pai da futura princesinha.
Uma forte chuva escurecia o quarto nupcial, mas os noivos não se importaram
em ficar enclausurados ali. Amaram-se vezes emais vezes, cada ato de amor sendo
melhor que o anterior. E isso era normal, já que momento a momento aprendiam mais
um sobre o outro e se dedicavam a dar o máximo de prazer ao companheiro.
E os dias continuaram a se suceder, sempre chuvosos. Na sex-ta-feira, o sol
apareceu.
- Que pena - lamentou-se Fancy. - Estou começando a odiar os dias de sol.
Estavam casados havia quatro dias, ela pensou. E não haviam discutido nada
sobre a sua carreira.
- Vou jogar golfe com os meus irmãos, Stepan anunciou. Espere-me na casa de
seu pai, que eu a pegarei na volta.
- Penso que prefiro ir ao teatro. Fancy procurou falar com naturalidade.
Quem sabe você me pega ao final do espetãculo.
Stepan largou a navalha com a qual fazia a barba.
- Você agora é minha Princesa e mãe de meu filho e não vai voltar a cantar na
ópera.
Então, era essa a opinião do Príncipe a respeito de sua carreira, Fancy pensou.
Se ele não estivesse dando uma ordem, ela poderia negociar suas diferenças, deixar-
se convencer a desistir de sua carreira.
Amava seu marido e seu nenem, mas se recusava a ser dependente como sua
mãe tinha sido a vida toda.
Sim, Stepan a amava. O Duque também amara sua mãe.
Levantou-se e o enfrentou.
- Por que não me disse o que pensava antes de nos casarmos?
- Você teria recusado o meu pedido. Eu não podia correr esse risco.
- Ah, está certo quanto a isso. Desistir da minha carreira está fora de
questão.
- Preferiria ter um filho bastardo?

131
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Fancy arregalou os olhos, magoada pelo fato de o Príncipe fazê-la se lembrar
que ela própria nascera bastarda e sofrera com isso.
- Você me enganou e decidiu me engravidar.
- Querida, sua memória está falha. Esqueceu-se de que foi você quem me
seguiu até a casa da árvore?
- Não o segui, Fancy mentiu. Apenas o encontrei por lá.
- E se ofereceu a mim, Stepan não hesitou em dizer. Não se lembrou da sua
profissão naquele momento. Ou considera os seus gritos de prazer um treino de
soprano?
Fancy ficou vermelha de vergonha ao ouvir a crueza das palavras do marido.
Sentiu vontade de chorar. Nunca venceria uma discussão com o Príncipe. Por que se
dava ao trabalho de tentar?
- Fancy, por favor.
- Não precisa ir me buscar no teatro. Até um cachorro sabe encontrar o
caminho de volta para a sua casa.
- Então, passarei a noite toda com meus irmãos.
- Não me importo.
Stepan vestiu-se e saiu batendo a porta.
O silêncio reinou no quarto, interrompido apenas quando Fancy jogou-se na
cama e começou a chorar. Aos poucos foi se acalmando. Decidiu fazer o que queria sem
se importar com o que pensava o marido.
Tarde da noite, Stepan voltou para casa. O mordomo-chefe abriu-lhe a porta.
- Bem-vindo, Alteza.
Stepan grunhiu um cumprimento e começou a subir as escadas.
- A Princesa ainda não retornou - o mordomo informou.
- Harry a levou à casa do Duque?
- Acredito que sim, Vossa Alteza.
- Mande Harry preparar a carruagem. Vou buscar minha esposa.
- Sim, Alteza.
Minutos depois, Stepan subia na carruagem. Fancy talvez tivesse adormecido
na casa do pai, o que justificava não ter voltado para a Grosvenor Square.
Tinker lhe abriu a porta.
- Boa noite, Alteza.
- Avise minha esposa de que cheguei.

132
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Não creio que a Princesa esteja nesta casa.
Stepan subiu as escadas e entrou no saião onde o Duque e a Duquesa de
Inverary conversavam.
- Onde está minha esposa?
- Ela não veio almoçar conosco - a Duquesa disse levantando-se. Pensei que não
tivesse passado bem por causa do nené.
O Duque levantou-se com ar de preocupação.
- Aonde Fancy poderá ter ido?
- Penso que ao teatro.
Stepan largou o Duque e a Duquesa estupefatos e dirigiu-se, às pressas ao
teatro. Lá, o diretor Bishop lhe dirigiu um olhar sem graça.
- Ela apenas entrou no palco e começou a desempenhar seu papel, ele
justificou ao Príncipe.
Fancy cantava como um anjo naquele momento. Observando-a, Stepan sentiu
uma dor no coração. Ela precisava tanto de sua carreira como precisava do amor dele.
A crua realidade era que não poderia ter as duas coisas.
Fancy sabia que havia escolhido ser esposa e mãe quando entrara na casa da
árvore. Agora, apenas tentava lutar contra o destino que mudaria sua vida.
Stepan não permitiria que ela se esquecesse de seu dever para com seu filho.
Fancy estava sentada diante da penteadeira, olhando-se no espelho quebrado.
Nunca se sentira tão cansada. Gostaria de poder abaixar a cabeça e adormecer ali
mesmo. Desejou estar em sua cama. E, mais do que isso, desejou ter escutado seu
marido. A porta se abriu, assustando-a. Virou-se e viu Stepan entrar.
- Você é uma Princesa grávida e não tem nada a fazer em cima de um palco, ele
murmurou com voz dura. E se a prima-dona a jogar novamente no fosso da orquestra?
Quer ferir o nosso nenem?
O comportamento agressivo de Stepan irritou Fancy, mesmo que havia pouco
ela tivesse reconhecido que não deveria ter vindo ao teatro.
- Vá embora e me deixe em paz - ela ordenou.
- Não virá comigo?
- Não posso fazer isso. O espetáculo não terminou,
- Então que seja.
Fancy viu o marido sair batendo a porta. Quando esta se abriu novamente, ela
olhou, esperançosa. O Príncipe teria se arrependido e voltara. Não era Stepan, mas
Genevieve Stover.
- Eu ouvi você e o Príncipe discutindo. Você está bem?

133
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Naturalmente.
Fancy voltou ao palco-e desempenhou seu papel até o fim. Quando os
espectadores a aplaudiram, ela tomou consciência da realidade. Agora, era aplaudida.
O público muda de preferências, porém. Não haviam aplaudido Patrice Tanner por
tanto tempo e agora a esqueceram?
“Escute a sua cabeça, criança, mas siga o seu coração”.
Sim, teria de encerrar sua carreira. Seu coração insistia que encontraria a
felicidade ao lado de Stepan. Olhou em volta de seu camarim pela última vez e saiu.
Patrice Tanner estava no corredor seguida de seu marido. Se-bastian Tanner
segurava a macaquinha.
- Ouvimos a discussão. Lamentamos que tenha brigado com o Príncipe - Patrice
falou.
- Eu ando nervosa por causa do nenem.
- Ah, está grávida? A prima-dona pareceu surpresa. Volte para casa e faça as
pazes com seu marido. Seja feliz.
- Obrigada pelo conselho.
- Quer uma carona?
- Não preciso, obrigada.
Fancy observou o casal afastar-se. Talvez a prima-dona fosse uma mulher
triste porque nunca tivera filhos e enterrara três maridos. Sua vida era a ópera, mas
estava envelhecendo e logo não conseguiria mais os papéis principais.
Fancy precisava pensar, decidir o que fazer. Por fim, resolveu voltar para
casa.
- Bem-vinda, Alteza - o mordomo-chefe a cumprimentou. - O Príncipe estava à
sua procura.
- Ele já me encontrou.
- Alteza?
- Sim?
- O Príncipe lhe deixou uma mensagem.
- E qual é?
- "Não espere pela minha volta."
Quero que ela fique preocupada por não saber onde estou.
Stepan abriu a porta da antiga casa de Fancy e entrou. Trouxera consigo uma
garrafa de uísque em uma das mãos e uma de vodca na outra.
Voltou-se para o cocheiro:

134
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Harry, não conte a ninguém que me deixou aqui. E volte amanhã para buscar-
me.
- Sim, Alteza.
A casa estava às escuras e ele acendeu uma vela. Sentou-se junto a uma
mesinha e encheu um copo de uísque e outro de vodca.
De repente, sentiu a presença de mais alguém na casa.
Alexander Blake segurava uma vela e olhava para o Príncipe com ar de
surpresa.
- Como conseguiu entrar? - Stepan perguntou.
- Posso lhe perguntar a mesma coisa. - Alexander deu uma olhada nas
garrafas. - As meninas me deram uma chave para um caso de emergência. Notei uma
luz na casa e decidi investigar.
- Pois eu também tenho uma chave e estou punindo minha esposa. Por isso
estou aqui escondido. Sente-se e tome uma bebida comigo.
Alexander colocou a vela sobre uma mesa e aceitou o convite. Não demorou e
os dois homens estavam bêbados.
Fancy acordou quase na hora do almoço. Rolou na cama vazia e suspirou. O
marido não voltara para casa. Ele a estava punindo mantendo-se afastado e dormindo
em outra casa. Bem, ela precisava pensar no que fazer.
Quando entrou na sala de refeições, encontrou o mordomo-chefe.
- Bom dia, Alteza.
- Traga-me chá, Bonés.
Enquanto o mordomo lhe servia o chá, Fancy decidiu descobrir o paradeiro de
Stepan.
- Sabe se meu marido ainda está fora?
- Está, Alteza.
- Não voltou ontem para casa?
- Não, Alteza.
Ela sentiu vontade de chorar. Em vez disso, porém, forçou um sorriso e
dispensou o criado.
Antes de sair, Bonés a olhou com preocupação.
- Não está se sentindo bem? Não comeu nada.
- Apenas não estou com fome.
Mais tarde, Fancy sentiu que não estava conseguindo ficai" na casa sem nada
para fazer. Pensou em voltai- para o teatro.

135
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
E foi o que fez.
Sentado à sua escrivaninha, Bishop examinava alguns papéis quando ela entrou.
- Estou desistindo da ópera, Fancy o informou. Não vou voltar ao palco.
- Lamento ouvir isso, mas sei que a sua atitude é correta. Lamento ficar sem
uma cantora do seu calibre.
- Minha irmã Serena canta e poderá desempenhar muito bem o papel principal
na sua nova peça.
- Serena canta tão bem quanto você?
- Melhor ainda. E Serena toca flauta também. Mas agora vive com meu pai, e
se quiser que ela venha trabalhar na sua peça, terá de convencer primeiro o Duque.
- É o que farei. E lhe desejo felicidades, Fancy.
Ela deixou o escritório de Bishop e deu uma última olhada no palco. Nunca mais
cantaria. Nem daria seu coração a outro homem. E, ao contrário de sua mãe, recusava-
se a deixar que a dor a derrubasse.
Viveria com seu filho, e o Príncipe teria de aceitar essa realidade.
Voltou para a sua antiga casa e teve a surpresa de encontrar Rudolf
esperando-a à porta. Entraram e se acomodaram em um sofá.
- Stepan pediu que viesse falar comigo?
- Vim conversar com minha irmã. Quero respostas.
- Meu casamento não lhe diz respeito, Rudolf.
- Pois a felicidade de meu irmão, sim. Por que está revoltada contra ele?
- Stepan me enganou. Tirou-me de Londres, seduziu-me e me engravidou.
Infelizmente, deixou de me informar que o casamento encerraria a minha carreira. Ele
roubou as minhas escolhas.
Rudolf ficou em silêncio por um momento.
- E se ele tivesse informado, o que você teria feito?
- O que quer dizer?
- Largaria meu irmão para continuar na ópera?
- Provavelmente não.
- Então, está se rebelando contra o fato de que Stepan sabia o que você
queria na vida?
Fancy franziu a testa, procurando analisar as palavras de Rudolf. Ele'a estava
deixando confusa.
- Vai continuar cantando depois de ter seu filho?

136
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Desisti do teatro esta manhã. Rudolf respirou, aliviado.
- E Stepan ainda não sabe?
- Deixei também seu irmão.
- Se vocês se separarem - Rudolf observou, as leis inglesas darão a criança ao
pai..
Fancy arregalou os olhos. Nunca soubera nada sobre a lei da custódia. Por que
deveria? Nenhum de seus conhecidos era separado.
- Meu pai é influente e não deixará que tirem a criança de mim.
- Ele é um Duque, e não um mágico. E tudo o que seu pai quer é que a filha seja
feliz no casamento.
- Meu pai me deve esse favor - ela murmurou.
- Ninguém deve nada a ninguém nesta vida, querida. Aprenda esta verdade ou
sofra as consequências.
- Meu marido não voltou para casa ontem à noite. Posso acusá-lo de cometer
adultério.
- Stepan a ama, Fancy. Nunca a trairia. Vou procurar descobrir onde ele está.
Fancy não disse nada. Seu marido a abandonara e dormira em outro lugar. Ela
o amava, mas Stepan queria vê-la pedindo perdão de joelhos. E isso Fancy nunca faria.
- Vou lhe revelar algo sobre a vida de Stepan, Fancy. Ele por acaso lhe contou
sobre como o pai o espancava todos os dias? Contou-lhe como o pai o arrancou dos
braços de nossa mãe e a internou em um manicômio? E como chorava tanto que nem
mais se importava com as surras que levava simplesmente porque não aguentava mais a
falta da mãe?
Fancy sentiu uma dor profunda no coração. Imaginar seu marido como um
menininho sendo cruelmente espancado a desesperava.
- Stepan chorava dia e noite - Rudolf disse. - E cresceu sendo espancado. Mas
um dia, achamos que aquilo tinha de acabar. Tirei minha mãe do manicômio, mudei-me
para Londres e meus irmãos me seguiram. Trouxeram Stepan junto.
Fancy já não conseguia deter as lágrimas. Rudolf levantou-se e se despediu.
- Vai pensar no que lhe contei, Fancy? –
- Prometo que vou.
Ao ficar sozinha, ela deitou-se no sofá. Apagou as velas e ficou no escuro. De
repente, percebeu que havia mais alguém ali dentro e sentou-se, apavorada.
Felizmente era Alexander Blake.
- Mais uma vez vi luz aqui na casa e vim ver quem era - ele explicou.

137
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Há comida na sua casa, Alexander? Estou faminta. O amigo saiu e logo voltou
com uma sopa.
- Tome, minha amiga.
- Quer falar sobre isso? - Alexander perguntou.
- Sobre a sopa?
Ele sorriu.
- Não, apenas no que a está aborrecendo.
- Larguei o teatro hoje.
- Seu marido ficará feliz.
- Também o larguei.
- Precisamos conversar, e você sabe que sou seu amigo. Diabos, estou
atrasado! Preciso ir buscar Genevieve no teatro. Volto mais tarde. Tranque a porta,
por favor.
Fancy o acompanhou até a saída. E, de repente, ela viu uma pessoa na sala.
Era Genevieve Stover.
Genevieve lhe dirigiu um olhar triste. Ergueu as mãos, cobriu os ouvidos, os
olhos, a boca. Então colocou uma invisível coroa sobre a cabeça, tocou o coração e
apontou para a porta.
Fancy estava confusa.
- O que você está fazendo aqui? - ela perguntou. Foi quando Genevieve
desapareceu.
- Meu Deus, Genevieve!
Fancy caiu de joelhos. Precisava de seu pai. Ele mandaria seus homens
procurarem Alex.
Pegou suas coisas, apagou a vela e trancou a casa. Caminharia até a casa do
Duque. Afinal, a distância não era assim tão grande.
Ao sair, deu com Boris nos arredores da casa.
- O que está fazendo aqui?
- O Príncipe mandou que tomasse conta de Vossa Graça.
- Preciso de meu pai. Preciso ir a Park Lane. Boris apontou para a sua
carruagem,
- Venha, Princesa. Eu a levarei até lá.
Fancy desejou que suas suspeitas fossem infundadas. No entanto sabia que
era tarde demais.

138
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Ao chegarem à mansão do Duque, ela desceu da carruagem e chamou Boris.
- Volte e diga ao Príncipe que estou na casa de meu pai. Entrou correndo e
chamando o Duque aos gritos.
- Fancy! - O Duque de Inverary apareceu.
- Papai, mande os seus criados encontrarem Alexander Blake, ela pediu em
prantos. Aconteceu uma coisa horrível. E mande chamar o inspetor Black.
O Duque olhou para a esposa, confuso.
- Eu farei isso, mas me diga a razão desse seu estado. Fancy ergueu os seus
olhos molhados, uma tristeza imensa em sua expressão.
- Fiquei conversando com Alexander e o atrasei... E agora ela está morta.
A Duquesa de Inverary ficou assustada.
- Quem está morta?
- Genevieve Stove morreu... assassinada!

Capítulo XII
Raven acordou cedo no domingo de manhã. Tivera outro sonho horrível e sabia
que o inspetor mandaria buscá-la. Olhou pela janela o céu coberto por nuvens escuras.
Tinker aproximou-se dela.
- Bom dia, srta. Raven. Quer que eu lhe traga café enquanto espera?
- Não há tempo para o café.
Bateram na porta, surpreendendo o mordomo.
- Vieram me buscar. Raven atravessou a sala e abriu a porta. Barney estava lá
em vez de Alexander.
- Há outra vítima, não é? - ela perguntou. O homem ficou de boca aberta de
surpresa.
- Como soube?
Raven não disse nada, tomou a dianteira e dirigiu-se à carruagem. Ficou
pensando no que poderia ter impedido Alexander de estar ali.
- Onde está Alex? - ela perguntou, entrando na carruagem.
- Ah, Alex foi diretamente para a cena do crime.
Raven percebeu que Barney hesrtara ao lhe responder. Fitou-o, mas ele
disfarçou e olhou para o outro lado.
Ao chegarem ao local do crime, Raven viu o inspetor Black vindo ao seu
encontro. Estranhamente, Alexander estava a uma certa distância, com os olhos fixos
no rio.

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Obrigado por ter vindo, Amadeus disse. E prepare-se. Raven ficou alarmada.
O que essa vítima teria de diferente das outras?
- Oh, Deus! - ela murmurou ao ver o cadáver. Genevieve Stover encontrava-se
deitada sobre a relva, como se estivesse dormindo. Pétalas de rosa cobriam a loira da
cabeça aos pés.
- Ela estava grávida. Amadeus olhou para o lado de Alexander.
Raven fechou os olhos, horrorizada. Pobre Alex, perdera a namorada e o filho!
Ajoelhou-se ao lado do corpo. Genevieve estava exatamente como as outras
vítimas. Seus olhos e lábios tinham sido costurados. Havia um corte sangrento em seu
rosto.
Então, Raven notou uma diferença. Havia um bilhete preso no seu vestido.
Abaixou-se mais e leu.
“Foi negligente e perdeu a sua amada”.
Raven fez o que nunca fizera antes. Tocou no braço da morta. Fechou os olhos
e foi dizendo ao inspetor o que sentia.
- Vejo dois rostos indistintos. Ela não sentiu dor. Nunca soube o que estava
lhe acontecendo até que sua alma deixou o corpo. Genevieve conhecia o seu assassino.
Raven abriu os olhos.
- É isso.
- Obrigado. Amadeus Black ajudou-a a se levantar.
- Vamos falar com a família dela, amigos e colegas.
Raven olhou para Alexander e caminhou até ele.
- Alexander...
Ele voltou-se, seu olhar revelando toda a sua tristeza.
- Lamento muito a sua perda.
- Genevieve estaria viva se eu não tivesse chegado tarde ao teatro. Ela
estava...
- Há alguma coisa que eu possa fazer?
- Pode me dizer quem fez isso?
Raven meneou a cabeça lentamente.
- Ela conhecia o assassino.
Isso o surpreendeu.
- Estou me referindo apenas a Genevieve. Ela conhecia o assassino; as outras
vítimas, não.

140
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
Sentado no escritório de sua casa, na Grosvenor Square, Stepan olhava
tristemente para a aliança que Fancy deixara sobre o travesseiro. Estava tudo
acabado.
Se tivessem discutido antes do casamento a respeito do que ele pensava da
carreira de Fancy, ela teria tomado outra decisão?
Bateram na porta e Bonés entrou trazendo um envelope.
- Obrigado. Stepan abriu o envelope e retirou um bilhete.
Precisamos discutir o nosso casamento em um terreno neutro. Encontre-me na
casa de Patrice Tanner, na Portman Square, às duas horas.
Fancy queria discutir suas diferenças. Isso era um bom ou um mau sinal? E por
que nà casa da prima-dona? Teriam feito as pazes? E isso significava que sua esposa
desistira da ópera?
Stepan consultou o relógio. Levantou-se com um sorriso nos lábios e deixou o
escritório. Quando voltasse, estaria com Fancy. Disso tinha certeza.
- Então, Stepan não voltou para casa naquela noite. Fancy estava na sala de
jantar com duas de suas irmãs, naquela tarde de domingo.
- Passar a noite fora não significa que dormiu com outra mulher - disse Raven.
- Concordo com você! - exclamou Blaze. O Príncipe teve um trabalhão para
conseguir se casar com você. Duvido que se interesse por outra mulher.
Tinker entrou na sala trazendo uma caixa para Fancy.
- O correio lhe trouxe isto, Alteza.
- Estranho. Não há nenhum cartão.
Ela abriu a caixa e encontrou flores azuis.
- É evidente que seu marido quer fazer as pazes, se está lhe mandando flores,
Raven declarou.
- Como posso ter certeza de que foi Stepan quem as enviou?
- Você possui alguma coisa pessoal de seu marido, Fancy? Posso me concentrar
e descobrir se foi ele.
Fancy abriu a bolsa e tirou a cueca azul que o Príncipe usara no casamento.
- O que é isso? - Raven perguntou, rindo.
- A cueca de meu marido. Guardei de recordação, como se fosse uma piada.
Raven pegou a peça e fechou os olhos. Quando os abriu, sua expressão era de
enorme preocupação.
- Stepan corre perigo! - ela murmurou.
- Onde ele está? - Fancy levantou-se, assustada. Precisamos encontrá-lo.

141
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Sente-se, Raven ordenou.
Fancy se sentou, surpreendendo as irmãs por estar obedecendo a uma ordem
pela primeira vez na vida.
- Diga-me o que Genevieve Stover fez quando apareceu na sua visão, Raven
pediu.
- Está achando que Stepan caiu nas mãos do assassino das pétalas de rosa? -
Blaze perguntou.
- Estou. Raven olhou para Fancy. - E então?
- Genevieve cobriu as orelhas, os olhos e a boca. Então, colocou uma invisível
coroa em sua cabeça, tocou seu coração e apontou para a porta.
- A coroa, o coração e a porta se referem a Stepan, Raven concluiu. Ela estava
ihe pedindo para voltar para seu marido. - Não sei o que a outra parte quer dizer.
-Oh, Meu Deus!-Blaze gritou. Eu sei quem é o assassino. A srta. Giggles cobre
as orelhas, os olhos e a boca.
- Está sugerindo que a macaquinha anda envenenando as pessoas?
- Não o animal, mas Patrice e Sebastian Tanner podem ter envenenado aquelas
mulheres, Blaze continuou. A macaquinha revelava o segredo deles, mas ninguém
entendia.
- Mas isso não parece se encaixar com a minha visão. O homem devia ser alto,
e a mulher, baixa. Patrice é alta e o marido é baixo. Como podem ser eles?
- Pois eu lhe digo que Patrice costuma se vestir de homem e o marido se veste
de mulher, Blaze disse.
Satisfeita em exibir seus talentos, Blaze se levantou e sorriu.
- Não vamos fazer nada? - ela perguntou.
- Está com o seu atirador de dardos? - Raven perguntou à irmã.
Fancy fez sinal que sim e o mostrou. As três irmãs correram para a porta.
- Onde estão o Duque e a Duquesa? - Raven indagou ao mordomo.
- Eles saíram a passeio.
- Pois então mande algum criado encontrar Alexander Blake, o inspetor Black q
os Príncipes Kazanov, Fancy foi dizendo. Diga-lhes para nos encontrarem na casa de
Patrice Tanner, na Portman Square, se eles quiserem prender o assassino das pétalas
de rosa.
Tinker pareceu alarmado.
- Talvez pudessem esperar que...
As irmãs não ligaram para as palavras do mordomo e saíram correndo,

142
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
desceram o Park Lane e atravessaram a rua Oxford. A Portman Square ficava a uma
quadra dali.
Ao chegarem à praça, Fancy apontou para uma casa.
- É a última à direita.
- Não podemos bater na porta - Raven disse.
- Podemos entrar pela porta dos fundos. Silenciosamente, claro.
- Patrice e Sebastian não têm criados?
- Se tivessem, como poderiam matar suas vítimas dentro de casa? - Raven
observou.
- Tem razão, Blaze concordou.
Fancy caminhava à frente das irmãs. Conseguiu abrir a porta, que estava
destrancada. Tirou os sapatos e fez um gesto para Blaze e Raven fazerem o mesmo.
As irmãs entraram na casa e, na ponta dos pés, chegaram ao primeiro andar.
Atravessaram um corredor e pararam, assustadas. Havia pétalas de rosa cobrindo o
chão inteiro.
As três ouviram então vozes vindas da sala de jantar.
Ao reconhecer a voz do marido, Fancy sentiu um frio na espinha. Aproximou-
se da sala e, finalmente, pôde ver quem conversava lá dentro.
Vestida de homem e sentada à cabeceira da mesa, Patrice Tanner apontava
uma pistola para Stepan. Ele estava sentado à direita da prima-dona, suas mãos
amarradas para trás. Vestido com um traje feminino, Sebastian Tanner sentava-se à
esquerda da esposa e cortava pedaços de maçã com uma faca. A srta. Giggles, sentada
em uma cadeira ao lado de Stepan, olhava para ele.
- Prefiro levar uma bala a ser envenenado, o Príncipe disse.
- Por quê? - Sebastian perguntou.
- São as mulheres que morrem envenenadas. Posso entender por que você
prefere o veneno.
- Morrer é morrer, Alteza, Patrice declarou.
Stepan a ignorou e continuou provocando Sebastian:
- Naturalmente, quem se veste de mulher deve preferir usar veneno.
- Olhe aqui! - Sebastian protestou.
Fancy preparou o lançador de dardos. Procurou manter as mãos firmes. A vida
de seu marido dependia disso. Se ela falhasse, Stepan morreria.
Fancy mirou e lançou seu dardo, que atingiu o olho direito de Patrice, que
deixou cair a pistola no chão.

143
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Pegue a pistola! - Patrice gritou para o marido.
A macaquinha foi mais rápida e agarrou a arma.
- Aqui, Giggles - Blaze chamou aparecendo na sala e atraindo o animal. Traga a
pistola para mim.
A macaquinha atravessou a sala e entregou a arma a Blaze, que a passou para
Fancy. Em seguida, pegou o animal no colo e o acariciou.
- Vou levá-la para a minha casa, Giggles. Lá, você conhecerá um cachorro, o sr.
Puddles. Vai gostar da sua nova vida.
Fancy apontou a pistola para Sebastian.
- Coloque a faca sobre a mesa ou eu atiro! - ela ameaçou.
- Sua vadiazinha! - Patrice gritou, cobrindo o olho ferido com uma das mãos.
Eu sabia que me criaria problemas.
Fancy a ignorou.
- Solte meu marido, Raven.
Stepan sorria. Levantou-se depois que Raven cortou as amarras e caminhou em
direção à esposa.
- Fique onde está. Fancy apontou a arma para ele, fazendo as irmãs gemerem.
E levante as mãos.
Stepan olhou, surpreso, para a esposa, mas obedeceu.
- Querida, apontar pistolas é perigoso.
- Onde você passou a noite em que não dormiu em casa?
- Ele estava comigo.
Alexander Blake entrou na sala acompanhado do inspetor Black. Atrás dos
dois, vinham os três Príncipes Kazanov.
- Você dormiu com Alex?
Todos os homens riram com a pergunta de Fancy.
Stepan aproximou-se da esposa e lhe tirou a pistola das mãos.
- Blake e eu nos embebedamos na sua casa em Soho. Ele entregou a pistola ao
inspetor. - Cuidado, nenhum de vocês tome o vinho. Ele está envenenado.
- Preferia que vocês não tivessem vindo por conta própria, Black disse às
irmãs Flambeau.
- Não precisa se preocupar com elas, inspetor. Stepan abraçou Fancy. Minha
esposa é letal com o seu atirador de dardos.
Alexander se aproximou da prima-dona.

144
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- Minha mágoa é que vão enforcá-la apenas uma vez.
- Bobagem, meu rapaz. Ninguém vai me condenar à morte. Eu sou louca! Não
enforcam pessoas loucas.
Sebastian Tanner confirmou:
- Ela é totalmente louca.
Fancy ouviu Raven gemer e virou-se para a irmã. Raven estava olhando firme
para a faca que estivera nas mãos de Sebastian.
A faca balançou e logo estava no ar. Atingiu a garganta de Patrice, que
arregalou os olhos e caiu de rosto no chão.
O assassino das pétalas de rosa estava morto.
- Ops - Raven murmurou.
Todos os olhares se voltaram para ela. Ninguém falou, apenas estavam
surpresos.
- Venha, srta. Giggles. Sem se afetar pela execução, Blaze saiu da sala com a
macaquinha em seus braços. Mamãe Blaze vai levá-la para brincar com a Duquesa. Será
divertido.
- Eu vou com ela, Raven disse.
- Não se mova, Alexander ordenou. Quero falar com você.
- Vai me prender?
- Preciso lhe fazer um pedido.
- Quer minha ajuda para resolver um crime?
- Pretendo mantê-la ao meu lado a partir de agora. Digamos que será uma
espécie de prisioneira, ele brincou, sorrindo para Raven. Finalmente encontrara a
mulher de sua vida, e nem seu enjoado avô acharia qualquer defeito na filha mais nova
do Duque de Inverary.
Raven sorriu e jogou-se nos braços de Alexander. Sua irmã encontrara a
felicidade, pensou Fancy, apoiando-se em seu marido.
- Por que veio até aqui? - ela perguntou.
- Recebi um bilhete supostamente assinado por você. Veja.
- Mas esta não é a rainha letra.
- Pensei que fosse.
- Nunca teria sido enganado se a conhecesse. Estes são uns garranchos.
O casal foi saindo e o Príncipe notou que Fancy estava descalça. Ele a pegou
nos braços e a levou para a carruagem.
- Vamos para a minha casa - Stepan ordenou ao cocheiro.

145
Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos
- E seus irmãos?
- Eles que andem. Ele abraçou a esposa. Eu te amo, meu amor.
- E eu muito mais, muito mais. E já provei o meu amor, não foi?
Oito meses depois
As meninas nasceram na mesma noite em que Serena estreou no teafro em A
Jovem de Milão. As recém-nascidas foram chamadas de Gabrielle e Genevieve.
O Times publicou uma matéria elogiando Serena e dizendo que a jovem era tão
talentosa quanto sua irmã mais velha, que havia se retirado do palco depois de se
casar.
Fancy lia o jornal e franziu a testa.
- Irmã mais velha? - ela comentou com o marido. O repórter nem citou o meu
nome.
Stepan riu e a acariciou no rosto.
- O sucesso de Serena a aborrece? Bishop adoraria ver você voltar a cantar.
- E você aprovaria a minha volta?
- Concordaria apenas, não aprovaria.
- Obrigado, meu amor. Fancy beijou o marido no rosto.
- Isso a faria feliz? Voltar ao palco, quero dizer.
- Não posso imaginar-me mais feliz do que estou, querido. Ter as minhas
meninas nos braços é melhor do que qualquer crítica cheia de elogios. Claro que eu não
passaria noites, acordada, ninando crianças... - Fancy disse rindo.
Stepan a beijou carinhosamente.
- Acredite em mim, meu amor. Você canta como um anjo, muito melhor do que
sua irmã.
- E você ainda não arranjou um emprego.
- Meu tempo é todo ocupado pelo meu amor por você. O que pretende fazer
para retribuir esse amor? Fancy lhe dirigiu um olhar malicioso.
- Vou dar prazer ao meu Príncipe. Hoje e sempre. E sou melhor nessa arte do
que cantando na ópera.
O choro de duas crianças interrompeu o longo beijo que se seguira às
promessas de Fancy.

FIM

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Patrícia Grasso Príncipe dos Desejos

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