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15/01/2024, 07:05 Empre­sas não ates­tam ver­são de mili­ta­res sobre bene­fí­cio da qua­ren­tena

Empre­sas não ates­tam ver­são de mili­ta­res sobre bene­fí­cio da


qua­ren­tena
Ex-che­fes do Exér­cito e da Mari­nha na ges­tão Bol­so­naro rece­be­ram bene­fí­-
cios após con­sulta à Comis­são de Ética da Pre­si­dên­cia, mas ofer­tas de
emprego não foram admi­ti­das ao ‘Esta­dão’

O Estado de S. Paulo. · 15 jan. 2024 · A1 · TÁCIO LORRAN ANDRÉ SHALDERS

Ex-che­fes do Exér­cito e da Mari­nha rece­be­ram salá­rio extra após apre­sen­tar pro­pos­tas de


tra­ba­lho na ini­ci­a­tiva pri­vada. Ao Esta­dão, empre­sas não con­fir­ma­ram ofer­tas.
Ex-inte­gran­tes da cúpula do governo de Jair Bol­so­naro (PL) ganha­ram da Comis­são de
Ética Pública (CEP) da Pre­si­dên­cia da Repú­blica direito de rece­ber salá­rio extra do governo
por seis meses. Um diri­gente civil e dois ex-coman­dan­tes das For­ças Arma­das tive­ram o
bene­fí­cio da “qua­ren­tena” reco­nhe­cido pela CEP após apre­sen­ta­rem pro­pos­tas de tra­ba­lho
na ini­ci­a­tiva pri­vada. Porém, quando pro­cu­ra­das pelo Esta­dão, as enti­da­des não con­fir­ma­-
ram as ofer­tas de emprego aos mili­ta­res e ao ex-dire­tor. Em um caso, os valo­res rece­bi­dos
na qua­ren­tena pas­sam de R$ 100 mil.
As supos­tas pro­pos­tas de emprego foram apre­sen­ta­das à comis­são pelo gene­ral Marco
Antô­nio Freire Gomes, que foi coman­dante do Exér­cito de março a dezem­bro de 2022; e
pelo almi­rante Almir Gar­nier San­tos, chefe da Mari­nha sob Bol­so­naro, de abril de 2021 até
o fim do governo ante­rior. O diri­gente civil é o ex-dire­tor do Fundo Naci­o­nal de Desen­vol­-
vi­mento da Edu­ca­ção (FNDE), Garigham Ama­rante Pinto, atual asses­sor da Lide­rança do PL
na Câmara (mais infor­ma­ções nesta página).
Pro­cu­ra­dos, os ex-coman­dan­tes não se mani­fes­ta­ram. Garigham ale­gou que apre­sen­tou à
CEP uma pro­posta de tra­ba­lho que rece­beu para saber se tinha direito à qua­ren­tena.
Os pro­ces­sos de con­sulta à Comis­são de Ética Pública foram obti­dos por meio da Lei de
Acesso à Infor­ma­ção (LAI). A qua­ren­tena busca evi­tar que ser­vi­do­res do topo da hie­rar­quia
usem infor­ma­ções pri­vi­le­gi­a­das obti­das na fun­ção para bene­fi­ciar empre­sas pri­va­das – a
cha­mada “porta gira­tó­ria”. Minis­tros, secre­tá­rios e outros ser­vi­do­res gra­du­a­dos pre­ci­sam
con­sul­tar a CEP caso pre­ten­dam ir para o setor pri­vado após sair. Se a Comis­são enten­der
que há risco de con­flito de inte­resse, pode sub­me­ter o demis­si­o­ná­rio à qua­ren­tena. Ele ou
ela fica então impe­dido de tra­ba­lhar na empresa pri­vada por seis meses, mas man­tém o
salá­rio de seu antigo cargo.
“A Comis­são julga de acordo com os ele­men­tos que são tra­zi­dos. Se um fun­ci­o­ná­rio apre­-
senta uma pro­posta (de tra­ba­lho) que não existe, houve fraude. Se isso che­gar à comis­são, a
comis­são terá de tomar as pro­vi­dên­cias neces­sá­rias para que essa fraude seja repri­mida”,
disse ao Esta­dão o pre­si­dente da CEP, o advo­gado Manoel Cae­tano Fer­reira. Os ex-ser­vi­do­-
res tam­bém pode­rão res­pon­der por fal­si­fi­ca­ção de docu­mento, fal­si­dade ide­o­ló­gica ou
impro­bi­dade admi­nis­tra­tiva, con­forme espe­ci­a­lis­tas.
CONFLITO. O gene­ral Freire Gomes con­sul­tou a CEP em 20 de março do ano pas­sado, três
meses após dei­xar o comando do Exér­cito. Infor­mou pre­ten­der atuar como con­sul­tor de
empre­sas que ven­dem pro­du­tos estra­té­gi­cos para as For­ças Arma­das, e par­ti­ci­par do Con­-

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15/01/2024, 07:05 Empre­sas não ates­tam ver­são de mili­ta­res sobre bene­fí­cio da qua­ren­tena

se­lho de Admi­nis­tra­ção da Asso­ci­a­ção Bra­si­leira de Blin­da­gem (Abra­blin), de quem diz ter


rece­bido uma pro­posta for­mal. Pro­cu­rada, a Abra­blin negou taxa­ti­va­mente a oferta:
“Marco Antô­nio Freire Gomes não faz parte do qua­dro da asso­ci­a­ção, bem como não houve
qual­quer tipo de con­vite ou son­da­gem para isso.”
À CEP, o gene­ral disse que teve acesso a infor­ma­ções pri­vi­le­gi­a­das na área de Defesa
durante o perí­odo em que ficou no Comando do Exér­cito, bem como acesso a pla­nos rela­ci­-
o­na­dos ao desen­vol­vi­mento do País, indi­cando, por­tanto, que exis­ti­ria um poten­cial con­-
flito de inte­resse caso fosse para a ini­ci­a­tiva pri­vada. Fun­dada há mais de duas déca­das, a
Abra­blin atua com a regu­la­men­ta­ção e pro­mo­ção do mer­cado de veí­cu­los blin­da­dos.
Após a deci­são deter­mi­nando a qua­ren­tena, em maio, Freire Gomes rece­beu um paga­mento
de R$ 58.690,42 bru­tos, como civil, em junho pas­sado. O bene­fí­cio se jun­tou ao salá­rio de
R$ 37.792,02 que ele recebe como gene­ral da reserva.
CONSULTOR. O almi­rante de esqua­dra Almir Gar­nier San­tos disse, por sua vez, ter rece­bido
uma pro­posta for­mal para tra­ba­lhar como con­sul­tor no Sin­di­cato Naci­o­nal das Indús­trias
de Mate­ri­ais de Defesa e Segu­rança (Simde). Segundo o ex-coman­dante da Mari­nha, o sin­-
di­cato lhe enviou uma carta con­sul­tando-o sobre sua dis­po­ni­bi­li­dade para atuar em ati­vi­-
da­des remu­ne­ra­das e não remu­ne­ra­das. No suposto con­vite apre­sen­tado à Comis­são de
Ética, o Simde chega a elo­giar o “notó­rio conhe­ci­mento” de Gar­nier sobre assun­tos afe­tos
à defesa.
Ques­ti­o­nado pelo Esta­dão,o sin­di­cato infor­mou que “não houve con­tra­ta­ção para o qua­dro
de pes­soal nem para pres­ta­ção de ser­viço, espe­ci­fi­ca­mente pelo Simde, desde 2022 até o
momento. A pro­pó­sito, não há pla­nos de con­tra­ta­ção no futuro pró­ximo”. O Simde é um
sin­di­cato patro­nal que reúne entre seus fili­a­dos mais de 170 indús­trias da base indus­trial de
defesa.
De março a junho de 2023, Gar­nier rece­beu R$ 107.084,88 bru­tos, como civil, rela­ti­vos ao
perí­odo de qua­ren­tena. Pro­cu­rada, a Mari­nha con­fir­mou o paga­mento do bene­fí­cio. Ele já
ganha R$ 35.967,57 men­sais como mili­tar da reserva.
Ex-minis­tro-chefe da Secre­ta­ria-Geral da Pre­si­dên­cia da Repú­blica, o gene­ral Luiz Edu­-
ardo Ramos tam­bém rela­tou ter rece­bido pro­posta do Simde para ganhar a qua­ren­tena
remu­ne­rada de seis meses. A carta-con­vite que Ramos teria rece­bido do Simde tem o
mesmo teor da carta de Gar­nier San­tos. No caso do ex-secre­tá­rio-geral da Pre­si­dên­cia, o
sin­di­cato não res­pon­deu ao Esta­dão sobre ter ou não feito o con­vite. Após o perí­odo de qua­-
ren­tena, porém, ele não foi tra­ba­lhar na enti­dade. Pro­cu­rado, não se mani­fes­tou. •
Segundo o pre­si­dente da CEP, se a fraude for com­pro­vada, ser­vi­do­res podem ter de devol­-
ver o dinheiro rece­bido
“Em tese, a lei per­mite, depen­dendo do nível da auto­ri­dade, até uma pro­posta que não seja
for­mal (...) Mas na mai­o­ria dos casos a gente exige uma pro­posta for­mal para evi­tar frau­-
des”
Manoel Cae­tano Fer­reira
Pre­si­dente da CEP

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