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EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E MUNDO DO TRABALHO: perspectivas e limites para a


formação da classe trabalhadora no CEEP – Parnaíba/PI.

1. INTRODUÇÃO

Ao mesmo tempo em que avança a partir da crítica de Hegel, Marx opõe-se


ao materialismo vulgar ou metafísico, principalmente a forma antidialética
de filosofar de Ludwig Feuerbach, que não consegue considerar o mundo
enquanto processo, enquanto matéria engajada num desenvolvimento
incessante. O pensamento de Feuerbach, que Marx em suas teses sobre
Feuerbach considerava vulgar e mecanicista, está ainda presente hoje na
concepção dogmática da dialética que leva ao sectarismo. O dogmatismo se
satisfaz com ideias gerais, slogans mistificados em função dos quais
esquematiza toda a realidade. Toda discussão, todo debate, toda crítica torna-
se impossível. A dialética mistificada torna-se metafisica. Como diz Politzer:
‘o sectário raciocina como se ele próprio houvesse aprendido tudo de uma só
vez. Esquece-se de que ainda tem muito a aprender. Assim sendo, não
deveria encolerizar-se muito mais consigo mesmo do que com os outros? O
verdadeiro revolucionário é aquele que como dialético, cria as condições
favoráveis ao advento do novo. (GADOTTI, 1997, p. 32/33).

Partindo de uma perspectiva marxista de compreensão da realidade, propomo-nos


neste estudo a investigar a temática da Educação Profissional a partir dos sujeitos que a
vivenciam no contexto de uma instituição que oferta ensino técnico/profissionalizante na
cidade de Parnaíba/PI. Consideramos para tanto, a relação com as propostas locais de
Educação Profissional que vêm sendo instituídas em âmbito mundial e nacional e o mundo do
trabalho na sociabilidade do capital.
A Educação Profissional no Brasil – Piauí/Parnaíba tem se constituído como uma
modalidade de ensino bastante favorável ao contexto das propostas de desenvolvimento
social, visando suprir tanto a demanda de mão de obra técnica e especializada, como oferecer
aos jovens maiores oportunidades de acesso ao mercado de trabalho. Essa perspectiva tem
gerado diversos debates a nível mundial no que concerne as políticas públicas para a
consolidação dessa modalidade de ensino. Essas políticas de educação voltadas para a
formação técnica e profissional correspondem ao modo de produção capitalista e a estrutura
social em que vivemos, na qual encontramos evidenciado o valor da educação com caráter
mercadológico.
Diante das dificuldades de emprego encontradas no cenário econômico mundial e as
sucessivas e cíclicas crises do capitalismo, nos preocupamos neste estudo, em analisar a
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juventude enquanto segmento social atingido por esse fenômeno, considerando o impacto da
educação para o trabalho na conquista do emprego e construção dos meios de sociabilidade
desse jovem. Neste âmbito buscamos ainda compreender as contradições que emergem de tal
proposta educativa, vez que, a educação não pode ser compreendida como mero apêndice
econômico, negligenciando a formação humana integral1, assim, por exemplo, como propõe
Gramsci (2010). É necessário um atento olhar ao discurso que vincula educação e
empregabilidade, o âmbito educativo isoladamente não dá conta de gerar emprego e renda,
neste sentido mudanças estruturais no sistema, no sentido de redistribuir renda precisariam
acontecer.
Partindo desses pressupostos, procuramos compreender as práticas de educação
profissional que estão em vigor no nosso país/Estado/cidade e suas relações com a
manutenção da estrutura socioeconômica vigente. Visando a dualidade existente no processo
de formação profissional, indagamos a respeito de como estas práticas têm sido direcionadas à
formação do jovem trabalhador e de que forma elas dialogam com o modelo de
desenvolvimento social e suas reais/diversas intenções. Ressaltamos ainda, como a educação
profissional e técnica tem se constituído como um espaço de mobilidade social para a
juventude.
Posto isto, esta pesquisa será realizada em uma instituição de educação técnica e
profissional, o Centro Estadual de Estudos Profissionalizantes – Ministro Petrônio Portella, na
cidade de Parnaíba – Piauí, que oferta essa modalidade de educação integrada ao ensino
médio, com duração de quatro anos cada curso. Ao realizar essa pesquisa, tomando como foco
uma instituição de ensino profissionalizante a nível estadual, pretendemos analisar o contexto
em que está inserida a temática em pauta, dialogamos com as especificidades e as
contradições que permeiam o processo de formação do jovem para o mercado de trabalho.
Para a discussão/reflexão da temática pesquisada organizamos em três capítulos o
desenvolvimento desse estudo. Na presente introdução dialogamos com os aspectos técnico-
metodológicos e apresentamos a estrutura que nos possibilitou expor as análises e
considerações acerca do fenômeno investigado. Optamos por uma pesquisa engajada e,
portanto, sob a perspectiva metodológica/ideológica do materialismo histórico e dialético, a
estruturação dos capítulos e as discussões que nos remetem a cada segmento do texto
estruturam-se frente à necessidade de confrontar, dialeticamente, teoria, empiria e nossas

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Conforme Manacorda (1996) a formação humana integral deve possibilitar uma plena e total manifestação de si
mesmo, do desenvolvimento de todas as capacidades do sujeito completo, no aspecto intelectual, emocional,
cultural e social.
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interpretações e hipóteses diante do fenômeno estudado. O texto de caráter


argumentativo/analítico aqui apresentado propõe diálogo/reflexão/crítica sobre a realidade
social, política e econômica que impulsiona a modalidade de Educação Profissional em
Parnaíba-PI.
Neste âmbito, sob o viés do materialismo histórico e dialético, mergulhamos em
uma totalidade investigativa, partindo da realidade local da cidade de Parnaíba/PI na
perspectiva de analisar/compreender o contexto da proposta de Educação Profissional e
Técnica e realizamos estudos sobre as experiências e propostas que vêm permeando a
Educação Profissional e Técnica em âmbito nacional/global para confrontar com a realidade
pesquisada localmente. Esta metodologia pauta-se na compreensão da realidade a partir das
contradições encontradas no campo da pesquisa, propondo-se a confrontar os dados de tal
realidade com as propostas que se apresentam em âmbito nacional/internacional, vez que
segundo Gadotti (1997, p. 31) “o método dialético ao estudar uma determinada realidade
objetiva, analisa, metodicamente, os aspectos e os elementos contraditórios desta realidade”.
Ao se apropriar da realidade através das contradições postas, o materialismo histórico e
dialético analisa a partir da síntese dos elementos a totalidade/complexidade que constitui essa
mesma realidade. Assim sendo,

Para a dialética a natureza se apresenta como um todo coerente onde objetos


e fenômenos são ligados entre si, condicionando-se reciprocamente. O
método dialético leva em conta essa ação recíproca e examina os objetos e
fenômenos buscando entendê-los numa totalidade concreta. [...] O
pressuposto básico da dialética é que o sentido das coisas não está na
consideração de sua individualidade, mas na sua totalidade. (GADOTTI,
1997, p. 24/25)

Ao se apropriar do materialismo histórico e dialético para a realização deste estudo


compreendemos que este não se constitui enquanto método estático, ou um manual para a
realização metódica de uma pesquisa, apropriamo-nos dessa metodologia como possibilidade
de apreender das experiências concretas situações que revelam as contradições e opressões do
sistema educacional, social, econômico e político vigente. Situamo-nos historicamente e a
partir da perspectiva dialética, formulado por Marx e Engels na Modernidade, nos desafiamos
à investigação do tema proposto, pois, “a dialética em Marx não é apenas um método para se
chegar a verdade, é uma concepção do homem, da sociedade e da relação homem-mundo
(GADOTTI, 1997, p. 19). Assim os sujeitos e o objeto da pesquisa trazem consigo referências
socioeconômicas e políticas que devem ser analisadas no seu contexto, buscamos assim,
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analisar a Educação Profissional considerando as peculiaridades e a totalidade que a cerca.


Conforme Lefebvre ( 2009),

Marx afirma que a ideia geral, o método, não dispensa de capturar cada
objeto em sua própria essência. O método é apenas um guia, um arcabouço
genérico, uma orientação para a razão no conhecimento de cada realidade.
De cada realidade é preciso capturar a suas contradições particulares, o seu
movimento individual (interno), a sua qualidade e as suas transformações
bruscas. A forma (lógica) do método deve, então subordinar-se ao conteúdo,
ao objeto, à matéria estudada, ela permite abordar de forma eficaz seu
conteúdo, captando os aspectos mais gerais dessa realidade, mas não
substitui jamais a pesquisa cientifica por uma construção abstrata.

Para tanto, nos comprometemos com o campo da pesquisa e os sujeitos para a


realização deste estudo, pois é a partir das situações concretas experienciadas no CEEP –
Centro Estadual de Estudos Profissionalizantes em Parnaíba/PI que apresentamos nossas
análises e reflexões/debates acerca das problemáticas que envolvem a Educação Profissional
em nossa cidade. Procuramos na perspectiva de autores como Gramsci (2010); Oliveira
(2005); Nosella (2005); Mészáros (2008) Antunes (2006); Marx (2008) dentre outros,
compreender o fenômeno estudado e apresentar as possíveis discussões que permeiam a
realidade posta.
O CEEP é uma instituição que oferta ensino técnico integrado ao ensino médio, que
desde 2006 está respaldada pelo Decreto 5.154/2004. Os cursos do CEEP têm uma duração de
quatro anos a nível médio, no entanto há também a oferta do curso técnico desvinculado do
Ensino Médio para o público que já cursou tal modalidade e almeja basicamente um curso
técnico, com duração de dois anos. Outra proposta que encontramos nessa instituição foi o
PROEJA que se constitui numa Educação de Jovens e Adultos na modalidade de Educação
Profissional, destinada a um público que não teve acesso a escola na idade certa, em sua
maioria são trabalhadores do setor informal, donas de casa, domésticas e pessoas
desempregadas em busca de uma qualificação para se inserir no mundo do trabalho e concluir
a Educação Básica.
Durante o processo da pesquisa, nos aproximamos dos sujeitos que vivenciam a
Educação Profissional, e através destes pudemos analisar a realidade e compreender como
esse modelo de educação influenciou a perspectiva de empregabilidade e qualificação para
esse público. Essas pessoas que fizeram parte de nossa investigação são jovens da classe
trabalhadora, que buscam uma oportunidade de melhorar sua condição econômica e social, ou
minimamente, buscam meios de sobrevivência. Nos deparamos com jovens trabalhadores que
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ao concluirem o curso técnico conseguiram um trabalho, com estudantes ainda em processo


de qualificação, com jovens que concluiram o curso e continuam desempregados e com
pessoas na idade adulta que não tiveram acesso a educação no tempo certo.
Na pesquisa também experienciamos entrevistas com a Gestão da escola, e
mantivemos contato com os funcionários que trabalham na instituição, o que contribuiu
significativamente para percebermos as relações que permeiam a realidade da Educação
Profissional e o contexto que impulsiona a execução dessa proposta. Como instrumentos de
investigação utilizamos entrevistas 2 semi-estruturadas com o corpo administrativo e docente
da escola, observações roteirizadas3 da instituição e das aulas e aplicamos questionários 4 com
os discentes, além das entrevistas realizadas com a gestora da instituição, com os estudantes e
com os jovens que estavam no mercado de trabalho. A título de compreensão sobre a
realidade da Educação Profissional em Parnaíba/PI e a situação da juventude em relação ao
mundo do trabalho entrevistamos o Secretário de Trabalho de Parnaíba.
Realizamos ainda uma pesquisa documental5 a partir de fontes primárias6 como os
planos de curso do CEEP e a Proposta político-pedagógica documentos que nos
possibilitaram compreender o currículo e a proposta de educação ofertada. Outra fonte de
pesquisa foram os documentos oficiais do Ministério da Educação, do Ministério do Trabalho
e Emprego e do IBGE. Ressaltamos aqui a dificuldade de acesso a tais fontes de dados sobre a
demanda e oferta de emprego em Parnaíba, principalmente, quando nos referimos à
juventude.
Propomos, sob o viés marxista, o registro dos dados coletadas e das análises
desencadeadas. No primeiro capítulo, portanto, intitulado “Educação, juventude e trabalho”

2De acordo com Severino (2007) a entrevista é um instrumento de coleta de dados sobre a temática em estudo,
diretamente solicitada aos sujeitos pesquisados. No que se refere à entrevista semi-estruturada configura-se como
uma técnica em que as questões são direcionadas, mas o entrevistado pode ficar livre para discorrer sobre a
situação pesquisada, e o entrevistador pode intervir discretamente a fim de instigar e estimular o sujeito da
pesquisa.
3
A observação roteirizada é um procedimento de análise organizado a partir das principais categorias (Trabalho,
Educação Profissional e Juventude) a serem investigadas no campo de pesquisa, planejamos roteiros de
observação frente à realidade em pauta e averiguamos as contradições, traçamos perfis, sociais, educacionais,
políticos e econômicos inerentes ao fenômeno pesquisado. Na observação roteirizada constam os elementos que
devemos observar durante a pesquisa, a partir dos quais elaboramos nossas hipóteses, análises e conclusões sobre
a instituição e os sujeitos pesquisados.
4
Conforme Severino (2007, p. 125) “questionário é um conjunto de questões, sistematicamente articuladas, que
se destinam a levantar informações escritas por parte dos sujeitos pesquisados, com vistas a conhecer a opinião
dos mesmos sobre o assunto em estudo”. Utilizamos questionários com questões abertas, onde os sujeitos
elaboraram as respostas, com suas próprias palavras, a partir de sua elaboração pessoal (SEVERINO, 2007).
5A pesquisa documental é toda forma de registro e sistematização de dados, informações, colocando-os em

condições de análise por parte do pesquisador (SEVERINO, 2007, p. 124). No caso estudado, a pesquisa
documental se constitui como técnica de identificação, levantamento, exploração de fontes do objeto pesquisado.
6
Fontes primárias são documentos originais em forma oral, escrita e impressa que constituem parte da pesquisa
de campo.
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verificamos o perfil da juventude que encontramos no CEEP e a relação desta com o mundo
do trabalho em Parnaíba. Procuramos compreender essa juventude enquanto segmento social
e histórico que constrói sua sociabilidade a partir de um repertório de experiências sociais e
históricas, analisando o perfil socioeconômico dos estudantes da escola investigada através de
um questionário. Considerando a educação como instrumento de formação
integral/omnilateral para o desenvolvimento da juventude analisamos os limites e as
possibilidades dessa perspectiva educacional na instituição de Educação Profissional
pesquisada.
Essa modalidade de ensino tem como objetivo a formação/qualificação técnica para
o mercado de trabalho, contribuindo para uma educação unilateral7 em que os estudantes
deverão desenvolver capacidades para o mundo do trabalho. Nesse sentido, os limites da
Educação Profissional se apresentam na perspectiva da mercantilização da educação, através
dessa modalidade buscamos compreender a expectativa de empregabilidade da juventude
parnaibana e a demanda do mercado de trabalho na relação com as propostas do ensino
profissional em Parnaíba/PI.
No segundo capítulo “Metamorfoses do capitalismo contemporâneo e políticas
públicas de Educação Profissional” analisamos as políticas de Educação Profissional e os
processos de restruturação do capital na tentativa de compreender a articulação desse modelo
de educação às metamorfoses do capitalismo contemporâneo. Direcionamos essa parte da
pesquisa para a discussão das políticas públicas na Educação Profissional pensadas como
possibilidades para promover o desenvolvimento econômico e social que consta em
documentos oficiais, bem como apresentar as formas de precarização e exploração do
trabalhador e do trabalho, através da compreensão da nova morfologia do trabalho que
encontramos nos estudos de Antunes (2005). Buscamos, dessa forma, perceber a relação entre
modo de produção capitalista e as políticas de Educação Profissional.
Analisamos o processo de reestruturação da produção e reificação do capital
(MÉSZÁROS, 2008) diante das suas crises e a relação com a proposta de educação
apresentada nesta pesquisa, vez que a modalidade de Educação Profissional é pensada na
perspectiva de qualificar/formar mão de obra para o mercado de trabalho e inserir a juventude
na sociabilidade do capital, considerada potencial força de trabalho, capaz de impulsionar o

7
O conceito de educação unilateral pauta-se na compreensão de um modelo de educação que visa meramente
uma mercantilização das capacidades humanas, direcionadas para uma formação específica do sujeito, que não
contempla a sua totalidade nem suas potencialidades múltiplas.
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desenvolvimento econômico do país. Intencionamos, assim, identificar a real possibilidade de


inserção dos mesmos no mercado de trabalho.
Em reflexão sobre o conceito marxiano de trabalho, que de acordo com Lefebvre
(2009, p. 65) para Marx “é através do trabalho, pelos instrumentos do trabalho e pela
organização do trabalho que o homem arranca da natureza aquilo que necessita para manter
sua própria vida e supera uma vida simplesmente natural”. Propomos o terceiro capítulo “O
conceito de trabalho em Marx e as formas de apropriação do trabalho pelo capital” na
tentativa de compreender o conceito de trabalho em Marx e a relação com o Ensino
Técnico/Profissional, vez que o trabalho se constitui uma categoria ontológica e, portanto,
determinante para o modelo de educação a ser ofertado à juventude. Nesse sentido, a escola
apresenta uma dicotomia entre conhecimento técnico e propedêutico o que reflete nos
processos de trabalho e inaugura divisão entre trabalho manual versus trabalho intelectual
(GRAMSCI, 2010).
Diante disso, refletimos sobre os processos de formação/qualificação no CEEP e a
relação com o mundo do trabalho e buscamos verificar a dualidade entre formação técnica e
formação intelectual e as contradições do processo de formação dos jovens trabalhadores
parnaibanos. Apresentamos a partir dessa perspectiva o modelo de ensino técnico e a
dualidade educacional presente na formação da juventude sob o enfoque da mercantilização
do conhecimento e da educação. Buscamos através do conceito gramsciano de educação
omnilateral a perspectiva de uma educação que proporcione uma formação do homem integral
e de superação do tecnicismo.
Neste contexto, ressaltamos a importância de compreender a escola como espaço de
construção do conhecimento sistematizado, elaborado para um determinado fim, como um
processo de institucionalização e formalização da educação, dentro das
contradições/desigualdades de um mundo capitalista. Desta feita, algumas indagações
nortearam nossas análises: a proposta da Educação Profissional observada atende,
efetivamente, a demanda do mercado de trabalho parnaibano? Os cursos ofertados atendem as
especificidades do mercado de trabalho local? Ou seja, há possibilidade real de
inserção/emprego? Quais os impactos da reestruturação produtiva nacional/transnacional para
as políticas públicas de Educação Profissional? Quais as influências
ideológicas/sociais/econômicas das relações capitalistas para a Educação Profissional
parnaibana? Como as práticas de Educação Profissional intensificam as desigualdades sociais
e dicotomizam as relações entre trabalho intelectual e trabalho manual? A qual segmento
social pertencem os jovens pesquisados?
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Para concluir apresentamos ao final deste escrito às considerações que nos levam a
discorrer sobre resultados, reflexões/discussões que permearam o estudo. Ressaltamos que
compreender a totalidade que a temática apresenta a partir de suas peculiaridades, tomando
como referencial o materialismo histórico e dialético, é muito mais do que buscar respostas ou
verdades sobre fatos. Procuramos no decorrer deste estudo apresentar as contradições
presentes na sociabilidade do capital a partir do modelo de educação que é oferecido à
juventude na relação com o mundo do trabalho em Parnaíba, fazemos, portanto, de nossa
pesquisa também uma denúncia das condições de exploração e precarização a que estamos
submetidos cotidianamente na lógica da exclusão.
Se por vezes, as condições reais de existência são desumanas e em nosso estudo
enfatizamos o quanto são, também não nos abstemos de apontar para o horizonte da utopia, do
sonho e de uma necessidade efetiva de transformação, pois “nada é impossível de mudar,
desconfia do mais trivial, na aparência singelo, e examinai sobretudo o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito, como coisa natural, pois em
tempos de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de
humanidade desumanizada, nada deve parecer natural, nada deve parecer impossível de
mudar”. (Bertold Brecht, 2013, p. 02).
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2. EDUCAÇÃO, JUVENTUDE E TRABALHO EM PARNAÍBA/PI

A escola profissional não deve se tornar uma incubadora de pequenos


monstros aridamente instruídos para um oficio, sem ideias gerais, sem
cultura geral, sem alma, mas só com o olho certeiro e a mão firme. Mesmo
através da cultura profissional é possível fazer que surja da criança o
homem, contanto que se trate de cultura educativa e não só informativa, ou
não só prática manual. (GRAMSCI, 2010, p.67).

Diante da proposta de estudar a problemática que envolve a Educação Profissional


em Parnaíba-PI, nos compete apresentar as categorias que são intrínsecas a discussão dessa
temática como Educação, Juventude e Trabalho. Assim tomamos a juventude como segmento
social para a realização desse estudo, vez que, é a mais atingida pelas propostas de
profissionalização e considerada potencial força de trabalho a ser formada/condicionada. Ao
longo deste capítulo debateremos com entrevistas de três estudantes do CEEP, que mantemos
na impessoalidade, os quais denominamos de estudantes A, B, C e D.
Para compreender a juventude enquanto segmento social é necessário perceber o
jovem como sujeito social e histórico, que constrói a sua sociabilidade na relação com o outro,
que se reconhece protagonista das relações sociais e capaz de tomar decisões no âmbito
educacional e socioeconômico. Assim explica Cavalcante (2011), “podemos compreender os
jovens como sujeitos sociais, historicamente marcados pela construção de um ‘repertório de
experiências’ assim como o adulto, pela realidade social da qual fazem parte” (p. 06).
Nesse aspecto Lênin (1985) na sua obra intitulada “Sobre a Juventude” incube aos
jovens a tarefa de construir uma nova sociedade, pois compreende esse segmento a partir das
peculiaridades históricas e sociais as quais estão inseridos. Referido autor propõe, entretanto,
que se dê especial atenção à educação destinada a juventude, pois “só transformando
radicalmente o ensino, a organização e a educação da juventude conseguiremos que os
esforços da jovem geração tenham como resultado a criação de uma sociedade que não se
pareça com a antiga”. (p.38).
No entanto, no contexto da sociabilidade pautada na lógica capitalista a juventude
muitas vezes é caracterizada apenas pela faixa etária ou como uma categoria passiva8 em
processo de formação, é compreendida como uma fase de preparação para a vida adulta
dependente das gerações anteriores no aspecto econômico, social e político. Essa visão tende

8Cabe ressaltar que por passividade compreendemos o estado de ânimo social alheio as decisões políticas e não
participativo das relações construídas historicamente.
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a tornar a juventude vulnerável às decisões político-sociais que refletem na sua própria


existência, desconsidera o papel da juventude enquanto sujeitos que constroem a sua
sociabilidade. Nessa perspectiva, são elaboradas políticas de âmbito educacional que
objetivam uma mera formação para o trabalho, negligenciando o caráter omnilateral9 do ser
social ao receberem uma formação linear, em que são considerados apenas como potencial
força de trabalho a ser formada para o mercado excludente e desigual, principalmente, os que
são oriundos das classes mais baixas da sociedade. Isso contribui para que os jovens muitas
vezes procurem se inserir no mercado de trabalho cada vez mais cedo, tanto por aspectos
financeiros quanto por necessidade de autonomia e autoafirmação 10.
As discussões sobre educação e trabalho têm se tornado pertinente na formação da
juventude diante da conjuntura socioeconômica atual. Assim é que a educação proposta para a
juventude parnaibana se configura como possibilidade de formação para o mercado de
trabalho nas instituições de ensino profissionalizante, que oferecem cursos técnicos com o
objetivo de suprir uma demanda de mão de obra do sistema capitalista de produção. Nesse
contexto, as relações entre trabalho e educação se tornam inseparáveis na atual sociabilidade
do capital, em que a educação apresenta caráter mercadológico, o trabalho se torna o
responsável pela manutenção e desenvolvimento dos meios de produção e a juventude
enquanto importante força de trabalho a ser formada.
Embora a formação humana tenha se configurado como um instrumento de
manutenção da estrutura social, econômica e política vigente, em que se (re)produzem as
relações de produção, é necessário compreender que a mesma apresenta-se dialeticamente
como uma possibilidade de superação das desigualdades sociais. A educação é um processo
que perpassa todas as relações/dimensões humanas, assim, para Saviani (2005, p.12) “dizer
que a educação é um fenômeno próprio dos seres humanos significa afirmar que ela é ao
mesmo tempo, uma exigência do e para o processo de trabalho, bem como é, ela própria um
processo de trabalho”. No entanto, devemos entender que trabalho, nesse sentido, tem uma
perspectiva ontológica11, não no âmbito do capital que se apropria do trabalho como valor de
troca e propiciador de mais-valia, o trabalho a qual se refere Saviani (2005) é aquele que

9
O conceito de omnilateralidade surge a partir de Marx, ao considerar que os indivíduos devem desenvolver-se
como indivíduos completos e, portanto, a educação deve possibilitar a formação geral para a construção do ser
social e, concomitantemente, oferecer uma formação para o trabalho. Segundo Manacorda (1996, p.78) a
omnilateralidade compreende um desenvolvimento total, completo, multilateral, em todos os sentidos das
faculdades e das forças produtivas, das necessidades e da capacidade da sua satisfação.
10 Compreendemos autoafirmação como necessidade de reconhecer-se enquanto sujeito social e histórico.
11
A partir da perspectiva ontológica compreendemos o trabalho como categoria fundante do ser social. Nesse
sentido o trabalho é uma especificidade do ser humano, pois é o trabalho que o diferencia de outros animais e,
portanto, é através do trabalho que o homem se torna um ser social (MARX, 2008).
20

distingue o ser humano dos outros animais, é uma ação transformadora sobre a natureza e
realizadora do homem em seus anseios.
Essa concepção de trabalho pode ser encontrada nos escritos de Marx (2008, p. 62)
“enquanto valor de uso, o trabalho é a condição natural da existência humana, a condição
independente de todas as formas sociais, do intercâmbio da matéria entre o homem e a
natureza”, tal conceito está relacionado, especificamente, as necessidades dos homens em
garantir materialmente a produção da sua existência. No entanto, Marx (2008) compreende
que referida atividade humana se torna trabalho social ao criar valor de troca, em que se
constitui enquanto ação intrínseca ao modo de produção, determinante das relações sociais.
Nesta perspectiva, Macário (2003, p. 129) infere que “o homem enquanto indivíduo entra em
relação com a natureza, reproduz sua existência pelo trabalho, sempre e necessariamente
mediado por relações sociais determinadas”. Então, no contexto da sociedade capitalista a
força de trabalho é transformada em mercadoria e apropriada como trabalho assalariado.
Posto isso, verificamos o perfil da juventude em aprendizado laboral que
encontramos no CEEP em Parnaíba/PI, vez que, a proposta de Educação Profissional é
destinada a esse segmento social, pois é nessa categoria que se lançam maiores esforços e
recursos na formação para o trabalho. A juventude parnaibana investigada pertence à faixa
etária de 16 a 20 anos nos cursos diurnos. Esta faixa etária cresce nos cursos noturnos,
principalmente, nos cursos do PROEJA12 com alunos entre 18 e 25 anos. A maioria desses
jovens apresenta um perfil socioeconômico de baixa renda, geralmente moram numa casa
com quatro ou cinco pessoas com uma renda mensal média de dois salários mínimos, por isso,
veem na Educação Profissional a oportunidade de conseguir um emprego mais rápido e
contribuir com a renda da família.
O filho da classe trabalhadora deve direcionar seus objetivos para o labor cotidiano
que lhe é destinado por sua condição social determinada pelas relações de poder na sociedade,
“para Bowles e Gintis a educação escolar é um aspecto da reprodução da divisão capitalista
do trabalho. A organização escolar é uma réplica das relações de dominação e submissão da
esfera econômica” (FRIGOTTO, 1993, p. 48). Nesse sentido, a Educação Profissional é
destinada aos jovens de baixa renda, com menos possibilidade de ascensão social.
Através de um questionário aplicado a 20 estudantes do curso técnico de informática
e técnico em enfermagem, analisamos ainda que de cada 10 estudantes 9 almejam prestar

12
Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio na Modalidade de Educação de Jovens e
adultos. De acordo com Sousa (2011) o PROEJA, objeto do Decreto Nº 5. 840 de julho de 2006, regulamenta a
formação inicial e continuada de jovens e adultos trabalhadores em Educação Profissional técnica de nível
médio, integrada ou concomitante. (p. 79)
21

vestibular e fazer um curso de nível superior. Os que fazem curso técnico na área da saúde
informaram que gostariam de fazer faculdade na mesma área, quanto às áreas de informática
eles tendem a desejar um curso na área de exatas. Outro dado interessante é que de cada 10
estudantes que responderam ao questionário apenas 2 tem alguém na família que tem um
curso superior, o que mostra o quanto o acesso a educação superior é restrito, elitista e
excludente, estando distante do universo de possibilidades dos filhos da classe trabalhadora.
Nos capítulos que se seguem serão apresentados dados da formação desses jovens na relação
com o mercado de trabalho em Parnaíba/PI.

1. LIMITES E POSSIBILIDADES FORMATIVAS DO CEEP – Parnaíba/Piauí

A Educação Profissional vem se constituindo como modalidade de ensino atraente


aos jovens, vez que, o discurso da empregabilidade13 tem permeado a formação nesta
modalidade impulsionado pelas metamoforses no mundo do trabalho contemporâneo. Nesta
pespectiva, o CEEP em Parnaíba/Piauí oferta Educação Profissional na tentativa de atender as
necessidades de formação exigidas no âmbito da relação educação para o trabalho, é portanto,
uma instituição que tem se adequado as reformas empreendidas nas políticas públicas de
Educação Profissional desde a década de 1990 para atender as demandas do mercado de
trabalho14. Verificamos essas mudanças nos documentos da instituição em que consta que até
o ano de 2006 era uma instituição que ofertava apenas o ensino técnico com duração de dois
anos, desvinculado do ensino médio, essa proposta era amparada pelo Decreto 2.208/1997 que
foi instituído durante a Reforma da Educação Profissional em 1997 – Governo de Fernando
Henrique Cardoso.
Entretanto, a partir de 2004 – Governo Lula - esse Decreto foi revogado e foi
aprovado o Decreto 5.154/2004 que readmite que a Educação Profissional Técnica seja

13
O termo empregabilidade gera controvérsias e tem sido usado com diversos sentidos. De acordo com Sales
(2012, p. 88) “a noção de empregabilidade manifestou-se inicialmente em um contexto econômico marcado pela
eliminação de postos de trabalho e pelo aumento da competição entre os trabalhadores, ao mesmo tempo em que
exigiu competência técnica e científica para a força de trabalho se ajustar ao mercado de trabalho. Pode ser
compreendido como a passagem de uma situação de desemprego para a de emprego, ou como capacidade de se
manter em um mercado de trabalho em constante modificação”.
14
Segundo Antunes (2006, p. 18) foi nos anos 1990 que a reestruturação produtiva do capital desenvolveu-se
intensamente em nosso país por meio da implantação de vários receituários oriundos da acumulação flexível e do
ideário japonês com a intensificação dos sistemas just-in-time e kanban, do processo de qualidade total, das
formas de subcontratação e de terceirização da força de trabalho que impulsionaram a entrada da robótica,
telemática, informática e microeletrônica. Consequentemente, ocorreu uma reorganização da produção que
passou a exigir um profissional mais qualificado.
22

ofertada integrada ao ensino médio, todavia segundo Oliveira “esse Decreto permite variadas
formas de organização da educação profissional técnica, desde a separação completa em
relação ao ensino médio até a integração total” (2005, p.93). Nestes termos é que o CEEP,
atualmente, oferta cursos na modalidade integrada com duração de quatro anos e o curso
técnico com duração de dois anos, caso o egresso já tiver cursado o ensino médio regular,
portanto, de acordo com o disposto no Paragráfo Único da LDB 9.394/96 da seção IV-A “A
preparação geral para o trabalho e, facultativamente, a habilitação profissional poderão ser
desenvolvidas nos próprios estabelecimentos de ensino médio ou em cooperação com
instituições especializadas em educação profissional” (BRASIL, 1996).
Com essas reformas da Educação Profissional verificamos que a formação desses
jovens tem acontecido de forma cada vez mais aligeirada, reforçando a dicotomia entre
formação geral/integral e formação técnica, pois no novo currículo, as disciplinas básicas,
como português, tiveram sua carga horária reduzida, vez que, era necessário a diminuição da
carga horária dessas disciplinas para possibilitar a inclusão das mais específicas em um curso
com duração de quatro anos. Tomamos como exemplo o curso técnico de restaurante e bar em
que consta que o objetivo geral é “ promover capacitação profissional do aluno com a oferta
do curso em nível técnico médio na área de eventos, permitindo o conhecimento científico e
técnico, assim desenvolvendo as competências necessárias para o bom desempenho
profissional” ( PLANO DE CURSO, 2012, p. 5).
Percebemos, assim, a negligência de uma formação ominilateral e a ênfase em uma
inserção subalterna no mercado de trabalho, que privilegia a reprodução da técnica para o ato
laborativo, e evidencia a permanente dicotomia entre o trabalho manual e o trabalho
intelectual, para Gramsci (2010) “essa distinção é ideológica, na medida em que desvia a
atenção das funções reais, no interior da vida social e produtiva, para os aspectos técnicos do
trabalho”. A educação profissional é destinada aos filhos da classe trabalhadora, aos quais são
relegadas as atividades técnicas/manuais de pouco prestígio em uma sociedade de classes,
enquanto aos filhos da classe dirigente reserva-se a escola do conhecimento mais elaborado,
da apropriação da ciência e da educação humanista. Isto produz reflexão sobre a tradição
escolar brasileira pré-industrial que segundo Nosella (2002):

A tradição escolar do Brasil pré-industrial era a escola humanista,


socialmente distintiva, destinada as elites. Não havia necessidade de escolas
para formar trabalhadores. Nesse sentido, não vale falar de dualidade de
ensino do Brasil pré-industrial. Porém, com o advento da industrialização
comumente datada dos anos 30 “final do século XX”, organizou-se o ensino
profissional com o objetivo de formar mão de obra para a indústria
23

(técnicos). Dessa forma, estava instituída a dualidade escolar. (grifo nosso,


p.85).

A Educação Brasileira se construiu de forma elitista e excludente desde sua


institucionalização. O surgimento das escolas técnicas direcionadas para formar mão de obra
decorrente do incipiente processo de industrialização tampouco extinguiu esse modelo, ao
contrário, acentuou ainda mais a oposição entre o trabalho manual e o trabalho intelectual, a
escola da técnica para o pobre e a escola da erudição para o rico. A Educação Profissional
brasileira consolidou-se com esse estigma, tendo passado por mudanças consideráveis para se
adaptar as exigências do século XXI, ainda sustenta as heranças dessa dualidade. Para Nosella
(2002), nem mesmo a tentativa de construção de uma escola única15 proposta por
AnísioTeixeira na década de 1950, idealizado a partir de Gramsci, não se efetivou pois se
mostrou inviável no modelo de sociedade capitalista.
A partir desse contexto, a Educação Profissional segundo Nosella (2002) passa por
reformas na tentativa de harmonizar a escola humanista e a escola do trabalho, disso decorre a
atual perspectiva do currículo dos cursos ofertados no CEEP que propõem uma organização
por competências, série e itinerário formativo, em que a cada ano o aluno deverá ter
desenvolvido competências que lhe permitirão a progressão para o ano seguinte até a sua
formação ao final de quatro anos. No entanto, as práticas e os objetivos são contrastantes, na
medida em que, as competências propostas dizem respeito ao perfil de profissional que se
deve formar para suprir a demanda de mão de obra do mercado de trabalho, nesses termos é
que o profissional técnico em serviços de restaurante e bar, por exemplo, “deverá estar
habilitado a recepcionar, encaminhar e atender ao cliente no salão e bar do restaurante, bares e
similares; coordenar a operação nos setores de bar e restaurante, controlar e inventariar
estoques de bebidas e utensílios de salão e bar” (PLANO DE CURSO, 2012, p. 5).
A partir de Guimarães (2006, p.188) compreendemos que “essa proposta curricular
objetiva á educação das novas gerações e sua inserção na lógica da competitividade, da
adaptação individual aos processos sociais e ao desenvolvimento de suas competências para a
empregabilidade ou “laborabilidade”. Essa pespectiva relaciona-se também as novas formas

15
Em 1932, Antonio Gramsci propôs uma reforma escolar centrada na ideia de escola única, a que realiza, num
mesmo currículo a união entre o trabalho intelectual e o trabalho manual. Sua proposta refletia um grande debate
daquele momento quando muitos teóricos da educação viam na ideia de escola única a possibilidade de superar a
tradicional divisão entre escola humanista para as elites e escola profissional para os trabalhadores. (NOSELLA,
2002, p.83)
24

de organização do trabalho, em que é necessário um profissional polivalente e capaz de se


adaptar as constantes mudanças do mundo do trabalho. Para Kuenzer (2003):

Competência deve ser a capacidade de agir, em situações previstas e não


previstas, com rapidez e eficiência, articulando conhecimentos tácitos e
científicos a experiências de vida e laborais vivenciadas ao longo das
histórias de vida .... vinculada à ideia de solucionar problemas, mobilizando
conhecimentos de forma transdisciplinar a comportamentos e habilidades
psicofísicas, e transferindo-os para novas situações; supõe, portanto, a
capacidade de atuar mobilizando conhecimentos. (p. 02)

Nesse contexto, a ideia de competência está relacionada à relação teoria e prática,


deve ser compreendida, portanto, como a práxis no âmbito do trabalho, em que o currículo da
Educação Profissional deve possibilitar uma formação integral para desenvolver as
competências necessárias ao mundo do trabalho. No entanto, o profissional técnico de nível
médio é formado/treinado para executar as atividades que são, geralmente, pensadas por
outros profissionais e os técnicos apenas as executam. A ideia de competência, nesse sentido,
volta-se ao desenvolvimento de atividades meramente técnicas e laborais no âmbito das
atribuições profissionais delineadas pela própria formação, de orientação unilateral e linear.
Nesse âmbito, a formação recebida pelos estudantes do CEEP distancia-se do ideal
de competências proposta por Kuenzer (2003) e da tentativa de harmonizar a Educação
Profissional com a humanista, vez que, percebemos que o modelo investigado se constitui sob
uma abordagem tecnicista e positivista, restringindo a compreensão elementar das disciplinas
de formação geral/integral. Exalta-se uma educação enciclopédica e reprodutivista, que não
possibilita o desenvolvimento de conhecimentos científicos e reflexivos efetivos e elaborados,
além de negligenciar a compreensão política das relações de opressão que permeiam a
realidade histórica e social. Prioriza-se a apreensão da técnica enquanto instrumento de
inserção no mercado de trabalho, nos fazendo relembrar o que Frigotto (1993) revela sobre a
teoria do capital humano:

No âmbito propriamente educacional e pedagógico, a teoria do capital


humano vai ligar-se à toda a perpectiva tecnicista que se encontra em pleno
desenvolvimento na década de 50. Nesse aspecto há um duplo reforço. A
visão do capital humano vai reforçar toda a perspectiva da necessidade de
redimir o sistema educacional de sua “ineficiência” e, por sua vez, a
perspectiva tecnicista oferece a metodologia ou a tecnologia adequada para
constituir o processo educacional como um investimento – a educação
geradora de um novo tipo de capital – o “capital humano”. A educação para
essa visão se reduz a um fator de produção. (FRIGOTTO, 1993, p. 121)
25

Nesse sentido, a Educação Profissional tem se constituído a partir da concepção da


teoria do capital humano na sua dimensão formadora de jovens trabalhadores que devem estar
aptos para a inserção no modelo capitalista de produção. As competências têm sido
organizadas concomitantes as necessidades do mercado de trabalho. Assim é que o CEEP em
Parnaíba/PI oferta cursos que estão relacionados aos setores que exigem maior demanda de
mão de obra e que oferecem maiores possibilidades de emprego no mercado local, como por
exemplo, nas áreas de Informática; manutenção e suporte; edificações; nutrição e dietética;
análises clínicas; enfermagem; saúde bucal; serviço de restaurante e bar; hospedagem. Essa
instituição de ensino mantém convênios com empresas para a realização dos estágios, e
segundo a Gestora (2012) “há estagiários que conseguem emprego na própria empresa em que
realizaram o estágio”, o que evidencia o caráter mercadológico que permeia o processo de
formação desses jovens.
Diante dessa compreensão, em um questionário aplicado a 10 estudantes do curso de
informática, percebemos que eles veem nessa formação a possibilidade de inserção no
mercado de trabalho, têm clareza sobre o objetivo da educação que recebem. A turma
pesquisada estava no primeiro ano do curso e, portanto, a expectativa em relação ao mesmo
para conseguir um emprego é grande, um dos estudantes ao responder sobre a perspectiva de
empregabilidade na sua área de formação e o porquê da escolha por tal área profissional:

O curso técnico em informática é bom, acho interessante a área de


informática, e em Parnaíba há necessidade de profissionais nessa área e será
mais fácil ter um emprego quando concluir o curso de quatro anos, pois as
empresas sempre precisam de um técnico. E conheço pessoas que estudaram
aqui e hoje estão trabalhando na sua área de formação. (estudante A de
informática, agosto 2012).

Neste trecho da entrevista podemos analisar que os ingressos nessa instituição são
capturados pela falácia da educação como possibilidade de inserção no mundo do trabalho,
sua compreensão de formação no âmbito da instituição escolar é pautada pela relação com o
processo de produção capitalista que se apropria ideologicamente da educação como espaço
de reprodução das relações sociais e produtivas vigentes na sociabilidade do capital. Assim
como propunha Gramsci (2010) compreendemos que a escola não se explica por ela mesma,
mas pela sua relação com a sociedade, com a economia e com a política. Em confluência com
a perspectiva da teoria do capital humano verificamos o aspecto unilateral da formação desses
jovens, que restringem a compreensão de educação à possibilidade/oportunidade de inserção
26

no mundo do trabalho, a escola é responsabilizada pela formação de sujeitos aptos a


disputarem uma vaga no competitivo mercado de trabalho, desse modo:

A institucionalização do preparo profissional no âmbito escolar decorre das


necessidades do sistema social capitalista de veicular o conhecimento
utilizado na produção industrial e regulamentar a força de trabalho,
legitimando a estrutura social dessemelhante. A escola cumpre a função
instrumental de transmitir os conhecimentos minimamente necessários a
produção, e, ao mesmo tempo desempenha um mister ideológico
reprodutivo, permitindo justificar as desigualdades sociais em favor da
escolarização com vistas a distribuir as diferentes ocupações com seus
patamares salarias e prestigio social distintos. (OLIVEIRA, 2005, p. 75).

Concluímos que a juventude da classe trabalhadora parnaibana ver na Educação


Profissional a oportunidade de mobilidade social, pois proporciona uma formação para o
mundo do trabalho, e atende as demandas de mão de obra, com uma educação utilitarista. Os
relatos desses jovens relacionam-se ao desejo de um emprego e de melhorar a condição
socioeconômica que estão submetidos, assim é que o estudante B do curso de informática
(agosto, 2012) decidiu fazer esse curso porque “quero algo melhor na minha vida e ajudar nas
despesas da família, mas sei que para conseguir isso preciso me esforçar muito para ser um
ótimo profissional”. Segundo Arrais Neto (2003) essa concepção surge do fato de tornar
responsabilidade individual o que deveria ser garantido por políticas públicas e transfere-se ao
individuo a exclusão direta do mundo produtivo, pois o sujeito deve desenvolver
competências profissionais e se mostrar interessante ao mercado de trabalho para atender as
exigências da “empregabilidade”.
No entanto, nem sempre a instituição oferece uma estrutura adequada para o
aprendizado e a formação, pois há cursos que muitas vezes não propiciam condições à
realização de aulas práticas, que comprometem a qualidade da formação desses jovens, nesse
aspecto durante a aplicação do questionário um estudante ao ser indagado sobre o nível de
qualidade do seu curso relata que considera:

O curso com um nível regular, pois os professores são bons e capacitados,


mas a escola não está com uma estrutura boa, e fica difícil realizar as aulas
práticas de informática sem um bom laboratório, e o que acontece é que não
tem computador para todos os alunos e temos que dividir um computador
com duas ou três pessoas. (estudante C do curso de informática, agosto
2012).

Nesse aspecto, percebemos que embora tenha havido maiores investimentos e


incentivos do governo para ampliar a modalidade de Educação Profissional nos últimos 10
27

anos, ainda encontramos muitas deficiências e problemas no que concerne a estrutura dessa
instituição pública que oferta Educação Profissional, vez que, recebe recursos diretamente da
esfera estadual. Além disso, em uma entrevista realizada com estudantes que já concluíram o
curso percebemos nos relatos dos mesmos que têm se confrontado com as dificuldades de se
inserir no mercado de trabalho em Parnaíba/PI. Para o aluno “D” que concluiu o curso em
2010 relata que:

Não me considero qualificado, pois as disciplinas e professores não


correspondiam com o que era exigido no mercado de trabalho, ou seja
métodos e assuntos ultrapassados, logo que na informática há uma evolução
constante de conceitos, métodos e máquinas. No momento não me encontro
empregado na área, mas já trabalhei na área e era remunerado pela produção
(quantidade de computadores que apareciam para manutenção). Além disso,
é diferenciado conseguir um emprego com essa formação, pois a formação é
aligeirada e de curto prazo para poder dar conta das demandas do mercado
de trabalho. (setembro, 2012)

A partir desse relato analisamos que as exigências do mercado de trabalho, exclui até
mesmo profissionais que tem um diploma de curso técnico que, no entanto, não se consideram
suficientemente preparados e qualificados com competências para se adequar as constantes
mudanças nas relações de produção. Por outro lado, esse fenômeno relaciona-se ao fato de
que a educação sozinha não consegue resolver os problemas de emprego/desemprego, pois a
problemática da empregabilidade está relacionada às politicas públicas de oferta e criação de
postos de trabalho. Para Pochmann (2006) o mercado de trabalho tornou-se mais competitivo,
sobretudo diante de uma oferta de mão-de-obra com mais escolaridade. Mas a permanência
no emprego dos mais qualificados não implicou, necessariamente, a adequação perfeita entre
formação e ocupação (p. 71). A partir disso, refletimos sobre Parnaíba e o quanto o
desemprego tem atingido, principalmente, os jovens com baixo nível de escolaridade e os
mais pobres.

2. EMPREGABILIDADE E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL: (des)compasso entre


teoria e prática

Tomar a educação como perspectiva para a empregabilidade tem apresentado-se


bastante propício à politica neoliberal, principalmente, no que se refere à Educação
28

Profissional no contexto das reformas econômicas empreendidas desde a primeira década do


século XXI, com a possibilidade de formar mão de obra qualificada para o trabalho, com suas
novas formas de reorganização, e ofertar aos filhos da classe trabalhadora conhecimento
técnico que lhes proporcione disputar uma vaga no competitivo mercado de trabalho.
A Educação Profissional em Parnaíba-PI é organizada na perspectiva de
proporcionar aos jovens uma formação que objetiva a inclusão na lógica do capital, em um
mercado de trabalho que é em si excludente, competitivo e desumano. Aos filhos da classe
trabalhadora a falácia16 da empregabilidade se apresenta como possibilidade de mobilidade
social a partir do mundo do trabalho, com as suas formas de captação da subjetividade que
transfere ao indivíduo o seu sucesso ou fracasso profissional. A educação formal nesse
contexto, especificamente a Educação Profissional, está relegada a lógica da mercantilização,
visa uma educação de formação linear/unilateral direcionada a atender as necessidades
impostas pelo mundo do trabalho, em que se forma profissionais para atender as exigências de
crescimento da produtividade dos donos do capital, vez que as empresas necessitam de mão
de obra qualificada para garantir a produção, assim:

Os diversos cursos direcionados á qualificação profissional, por exemplo,


bastante propagandeados pelo mundo do trabalho contemporâneo, vinculam-
se a um ideal de formação para o trabalho e não para a emancipação humana,
restringindo-se ao condicionamento das novas demandas do mercado de
forma estranhada (BEZERRA, 2011, p.166).

O que não significa que os egressos dos cursos técnicos, ao concluir seu curso,
tenham garantia de um emprego, vez que terão ainda que disputar uma vaga com tantos
outros, tendo que se submeter a formas precárias de trabalho para garantir a sobrevivência,
pois o que a escola da técnica não ensinou aos seus aprendizes laborais é que o mercado
excludente e competitivo não absorve a todos que estão qualificados ou não qualificados, e
estes quase sempre se sentirão culpados pela sua “incapacidade” de inserção no mundo do
trabalho. No entanto, o que as condições objetivas das relações de produção apresentam é que
a educação como fator de empregabilidade se constitui numa falácia para a regulamentação
social na oferta e demanda de mão de obra para o mercado de trabalho, vez que é necessário a
concorrência na procura de emprego para manter uma reserva de trabalhadores a espera de um
emprego, pois a desigualdade é a lógica do sistema.

16
Compreendemos que a empregabilidade se apresenta como uma falácia no sentido de não corresponder as
perspectivas de empregos projetadas na educação profissional.
29

Ao levar para o campo educacional a problemática do desemprego, o conceito de


empregabilidade tende a buscar explicações na educação para um antigo problema da ordem
do capital. Para Maciel (2003) essa perspectiva de que a qualificação formal serve como via
de acesso ao mercado de trabalho é decorrente dos anos 1970 que após a II Guerra Mundial
contava com uma conjuntura favorável ao emprego, pois não só havia a geração de postos de
trabalho por conta do crescente processo de industrialização, como o Estado desempenhava
papel interventor na promoção de políticas de pleno emprego. Dessa forma:

A qualificação formal servia assim, menos como via de acesso ao mercado –


até porque a produção em larga escala para um consumidor de massa
operava com um grande contingente de trabalhadores(as)
desqualificados(as). A geração de novos postos de trabalho devia-se, isto
sim, ao próprio modelo de acumulação e jamais ao grau de qualificação
formal dos(as) trabalhadores(as). É obvio, entretanto, que uma boa
certificação fazia diferença na hora do(a) trabalhador(a) assumir seu posto
no mercado de trabalho, na competição como os(as) demais. (MACIEL,
2003, p.292).

Todavia, a partir das transformações ocorridas no mundo do trabalho na década de


1990, com o advento do desemprego estrutural, com a reestruturação produtiva e as novas
formas de reorganização do trabalho, com a entrada da robótica, informática, telemática e
mecatrônica nas indústrias e nos mais diversos setores empregáveis, como por exemplo, a
indústria têxtil, automobilística e os bancos, intensificou-se a substituição do trabalho humano
pela máquina, ocasionou o enxugamento de mão de obra das empresas a fim de aumentar a
produtividade e diminuir os gastos com funcionários, ao mesmo tempo em que causou o
desemprego em massa nesses setores e passou a exigir um profissional polivalente e mais
qualificado.
O mundo do trabalho se tornou ainda mais excludente e competitivo. Para Oliveira
(2003) “o quadro de desemprego aparece como forte agente disciplinador da força de
trabalho, levando o trabalhador a sujeitar-se às formas mais precárias de emprego, aceitar
intenso ritmo de trabalho e comprometer-se com os fins da empresa” (p.82/83). É a partir
desse contexto, que a Educação Profissional é reorganizada para formar um trabalhador
polivalente17 e que desenvolva competências necessárias para o trabalho.
Essas mudanças ocorridas no cenário local, nacional e internacional têm refletido as
condições de trabalho, de empregabilidade e de precariedade, é o que podemos constatar em

17
Esse trabalhador realiza um conjunto de operações parciais simples. O trabalho polivalente baseia-se na
rotação de tarefas, funcionando, em determinados casos, como mecanismo de garantia da qualidade, uma vez
que reduz as situações de stress e de perda de concentração do trabalhador. Baseia-se também na alocação
flexível dos postos de trabalho. (FRANCA, 2007, p. 50)
30

relação ao desemprego de acordo A OIT – Organização Internacional do Trabalho que


registra a existência de 195 milhões de desempregados no mundo, em que 40% das pessoas
que estavam ocupadas (cerca de 1,4 bilhões de pessoas) ganhava menos de 2 dólares por dia
(situando-se, portanto, abaixo da linha da pobreza) e 20% delas ganhava menos de um dólar
ao dia (portanto, abaixo da linha da extrema pobreza). Além disso, oito em cada 10 pessoas
não tinha acesso aos regimes de previdência social (OIT, 2012).
Quando nos referimos à juventude, de acordo com os dados da OIT (2012), a
situação torna-se mais agravante, principalmente a partir de 2008 com a crise financeira
internacional, que entre 2008 e 2009 o número de jovens desempregados no mundo registrou
um aumento sem precedentes de 4,5 milhões, comparado com o aumento médio do período
anterior à crise (1997-2007), que foi de menos de 100.000 pessoas por ano. Analisamos que a
juventude tem sido drasticamente afetada pelas crises econômicas do capitalismo e do
desemprego. Esses dados nos mostram que os órgãos e instituições que estão ligados ao
Estado comprometem-se com a crise e o (des)emprego enfrentados na contemporaneidade. O
Estado na tentativa de salvar esse sistema da falência busca alternativas como, por exemplo,
formar uma consciência de competitividade e consumismo na juventude, criar novos postos
de trabalho e cursos de formação e qualificação para esses jovens. No entanto,

Atingimos uma fase do desenvolvimento histórico do sistema capitalista em


que o desemprego é a sua característica dominante. Nessa nova
configuração, o sistema capitalista é constituído por uma rede fechada de
inter-relações e de interdeterminações por meio da qual agora é impossível
encontrar paliativos e soluções parciais ao desemprego em áreas limitadas,
em agudo contraste com o período desenvolvimentista do pós-guerra, em
que políticos liberais de alguns países privilegiados afirmam a possibilidade
do pleno emprego em uma sociedade livre. (MÉSZÁROS, 2006, p. 31).

Com a derrocada das políticas de pleno emprego que sustentaram durante algum
tempo o auge do liberalismo (início do século XX) europeu e norte americano, tais Estados na
contemporaneidade procuram suplantar a crise ocasionada pela implementação do
neoliberalismo (últimas décadas do século XX e início século XXI) com medidas paliativas,
mesmo diante de uma conjuntura que apresenta a necessidade de soluções mais enérgicas. No
Brasil, mesmo não se tendo vivenciado o auge das benesses liberais (início do século XX),
também tivemos o aprofundamento das teses neoliberais (HARVEY, 2010), experienciando o
dissabor do desemprego e da crise estrutural do capital 18 (últimas décadas do século XX e

18Para Mészàros (2006), este momento de crise se dá por abalar profundamente as estruturas do capitalismo,
apontando para esgotamentos e abismos sociais.
31

início século XXI). Diante disso, os jovens que precisam contribuir na renda familiar ou até
mesmo sobreviver, tem procurado entrar no mercado de trabalho mais cedo, tentando
conciliar estudo e trabalho, ou abandonando a escola para trabalhar e ter uma renda fixa.
Constatamos isso ao analisar os dados do Ministério do Trabalho referentes ao Estado do
Piauí no ano de 2009, observamos que a juventude de 16 a 29 anos faz parte de uma
estatística que nos revela que apenas 16,2% dos jovens dessa faixa etária desfrutam do
privilégio de ser apenas estudante, enquanto a grande maioria 49,4% só trabalham, e os jovens
que trabalham e estudam estão na faixa de 20,8% dos jovens do Estado do Piauí. Veja o
quadro abaixo:

Distribuição da população jovem de 16 a 29 anos, segundo situação de trabalho e estudo


– Piauí/2009. (em %)
Estuda e Só trabalha e/ou Só estuda Outras Total Total
trabalha procura trabalho (em 1.000
e/ou procura pessoas)
trabalho
20,8 49,4 16,2 13,6 100,0 785
Fonte: IBGE. Pnad – Disponível em: http://portal.mte.gov.br/geral/publicacoes/
Elaboração: DIEESE

Neste cenário no Piauí pode-se considerar em linhas gerais que os jovens que só
trabalham e/ou procuram trabalho em 2009 ultrapassa o índice dos jovens que estudam e
trabalham. Em relação ao Município de Parnaíba o Ministério do Trabalho (BRASIL, 2012)
registrou que o número de empregos formais em dezembro de 2011 entre a população jovem
na faixa etária de 15 a 17 anos corresponde a apenas 38 empregos formais, a quantidade de
emprego cresce entre os jovens na faixa etária de 18 a 24 anos, e tem o maior percentual entre
os jovens de 25 a 29 anos, mas ainda assim permanece abaixo dos outros segmentos que se
encontram empregados nesse período. Além disso, a remuneração dos jovens é menor do que
a de outros segmentos, enquanto um jovem de 15 a 17 anos recebe uma remuneração média
de R$ 399,90 outros segmentos na faixa etária de 30 a 39 anos recebem o triplo, assim o
salário aumento de acordo com a faixa etária como disposto no quadro abaixo:

NÚMERO DE EMPREGOS FORMAIS EM 31 DE DEZEMBRO DE 2011


UF: Piauí
Município: Parnaíba
Faixa Etária Masculino Feminino Total Remuneração
média total
32

1 – 10 a 14 anos 1 1 2 473,20
2 – 15 a 17 anos 18 20 38 399,90
3 – 18 a 24 anos 1.416 826 2.242 671,28
4 – 25 a 29 anos 1.686 1.055 2.741 793,25
5 – 30 a 39 anos 2.826 1.864 4.690 907,49
6 – 40 a 49 anos 1.780 1.616 3.396 1.177,40
7 – 50 a 64 anos 1.173 863 2.036 1.425,55
8 – acima de 65 anos 58 28 86 1.819,27
Fonte: RAIS/MTE – Disponível em: http: /bi.mte.gov.br./caged

Infere-se a partir da análise desses dados que aos jovens são destinados os trabalhos
com condições mais precárias, recebem uma remuneração abaixo do salário mínimo, são
expostos a condições de trabalho aviltantes, além de que os postos de trabalho destinado a
essa juventude dificulta a possiblidade de qualificação profissional, pois os setores de
extração mineral, construção civil, comércio, serviços, agropecuária que oferecem
oportunidades de emprego em Parnaíba de acordo com o MTE não proporcionam
oportunidade de qualificação/formação, pois os jovens com a extensa jornada de trabalho que
tem a cumpri, dificilmente conseguirão conciliar com uma jornada de estudo. É no contexto
desse mercado que a juventude parnaibana está inserida, sendo mão de obra mais
acessível/barata para esses postos de trabalho. Além disso, nesse quadro não constam os
jovens que se encontram em situação de emprego informal, sendo que esta é bem mais
precária e será debatida em outro capítulo, no entanto de acordo com a OIT:

Em síntese, pode-se afirmar que a inserção dos jovens em ocupações


precárias e informais, não contribui com sua qualificação profissional nem
com possibilidades futuras de uma melhor inserção profissional. Além disso,
o abandono da escola por parte dos jovens ocupados, em especial por
aqueles de baixa renda, pode decorrer não exclusivamente do trabalho, mas
também de uma educação de baixa qualidade e pouco atrativa. Assim, uma
parte importante da juventude de baixa renda no Brasil vive um dilema: a
busca de trabalho por necessidade traz prejuízos à formação educacional
formal, o que, por sua vez, gera impactos negativos sobre sua inserção futura
no mercado de trabalho, em geral sem qualquer contrapartida significativa,
em termos de aquisição de experiência profissional de boa qualidade, que
contribua para a construção de uma trajetória de trabalho decente. (OIT,
2009, p. 45)
33

Concluímos que os jovens da classe trabalhadora parnaibana acabam se inserindo em


um mercado de trabalho que não lhes oferecem possibilidade de qualificação, de mobilidade
social e muito menos de realização humana. O emprego destinado a esses jovens, que
conseguem concluir com muita dificuldade o Ensino Médio, são muitas vezes subempregos
que não proporcionam inclusão no meio social, e tampouco qualidade de vida. Pois a
qualidade de vida na sociabilidade do capital só é garantida ao trabalhador como forma de
garantir a força de trabalho para aumentar a produtividade “já que em nenhum momento o
foco é o trabalhador como ser humano, mas o trabalhador como força de trabalho que
necessita de melhores condições para produzir”. (CARVALHO, 2006, p. 61).
Contudo, a necessidade de mão de obra qualificada exigida pelo mundo do trabalho
na contemporaneidade tem levado o Estado a desenvolver políticas de qualificação para esses
jovens, exemplo disso, são os cursos técnicos integrados ao ensino médio, ou cursos
profissionalizantes de curta duração para jovens que já estão no mercado de trabalho, ou até
mesmo programas de certificação, como o Programa CERTIFIC que segundo Sousa et al
(2011, p. 125) “visa certificar os saberes adquiridos ao longo da vida. Os trabalhadores terão
seus conhecimentos avaliados e também podem receber cursos para melhorar a sua
formação”.
No entanto, nenhum desses projetos apresenta uma alternativa de superação efetiva
para além das necessidades do desenvolvimento baseado na ordem capitalista, as reformas
empreendidas na educação profissional visam, principalmente, a superação das crises do
capital e a formação de uma mão de obra necessária ao mercado de trabalho. As políticas de
combate ao desemprego são estratégicas para a manutenção do sistema, pois “representam
estratégias de acumulação muito bem orientadas para a expansão do capital, como medidas de
preservação do sistema capitalista, que reduz a significação humana, definindo-a como custos
de produção, força de trabalho necessária e mercadoria comercializável” (CARVALHO,
2006, p.59/60).
Em Parnaíba, por exemplo, o PRONATEC (Programa Nacional de Acesso ao Ensino
Técnico e ao Emprego) tem sido executado pela Secretaria Municipal do Trabalho em
parceria com o Estado e o SENAI, idealizado como um programa para inserir os jovens no
mercado e capaz de combater o desemprego, que habilite o jovem em uma profissão e/ou
atividade rentável e produtiva para o desenvolvimento econômico e social da cidade, sendo
também uma proposta de qualificação de mão de obra necessária ao mundo do trabalho. De
acordo com a SETEC (portal.mec.gov.br, dezembro 2012) esse programa foi criado pelo
Governo Federal em 2011, com o objetivo de ampliar a oferta de cursos de educação
34

profissional e tecnológica. Para o secretário do trabalho da Secretaria Municipal do Trabalho


de Parnaíba:

Os cursos profissionalizantes proporcionam a entrada do jovem no mercado


de trabalho, pois qualifica e prepara para uma profissão garantindo
competências para o exercício dessa profissão. Assim fica mais fácil
conseguir um emprego com um curso técnico. Por isso, a prefeitura de
Parnaíba tem investido nos cursos técnicos e apoiado a execução de
programas como o PRONATEC para que os jovens possam se qualificar e
conseguir um emprego. Em Parnaíba os cursos técnicos tem sido importantes
para a conquista do primeiro emprego entre a juventude. (Dezembro, 2012).

A visão do Secretário de trabalho é bastante otimista diante do cenário local, e das


crises de (des)emprego anunciadas local, nacional e internacionalmente desde o limiar desse
século em decorrência das profundas transformações da economia capitalista mundial e que
persistem na contemporaneidade de forma cada vez mais avassaladora no mundo do trabalho.
Pochmann (2006) nos seus estudos aponta que “o desemprego vem aumentado continuamente
no Brasil desde 1990 e atinge atualmente níveis jamais vistos anteriormente” (p.62), tem-se
assim a necessidade de pensar em programas que servem de “cortina de fumaça” para
abrandar a exclusão no mundo do trabalho. Os investimentos de profissionalização da
juventude culminam na competitividade e seleção desse público no mercado, e quando as
estatísticas apontam os níveis de desemprego, a explicação que se dá de acordo com a lógica
do capital gira em torno do discurso de que “existem muitos postos de trabalho, mas falta
profissional qualificado” (Secretário do trabalho da Secretaria Municipal do Trabalho de
Parnaíba, dezembro, 2012).
Esse tipo de explicação permeia, inclusive, o imaginário do senso comum que
absorve cotidianamente a ideologia dominante. Fato constatado em um relato de um jovem
trabalhador quando se referia aos postos de trabalho na sua área de formação. Em entrevista
com este trabalhador que concluiu o curso de restaurante e bar no CEEP fizemos o seguinte
questionamento: Você considera que a sua área oferece grandes oportunidades de emprego
ou não? Ele prontamente responde que o mercado de trabalho está se expandindo nessa área
sim, mas existem poucas pessoas qualificadas, porque a minha turma foi a primeira a se
formar nessa área. (Janeiro de 2013). No entanto, ele acrescenta que da sua turma de 15
alunos apenas ele conseguiu um emprego logo que concluiu o curso.
Dessa forma, analisamos que o desemprego ainda é uma realidade permanente,
principalmente, entre a juventude, embora as políticas direcionadas a qualificação desse
segmento tenham apresentado eventuais resultados, por si só não conseguiram suplantar a
35

dura realidade de desemprego na cidade. Pois há uns poucos que conseguem êxito quando
concluem um curso profissionalizante, mas há também os muitos que continuam
desempregados ou em condições precárias de trabalho. Conforme Arrais Neto,

O simples fato de que se permaneça interessante ao voraz mercado de


trabalho em que se constituiu o mundo dos parcos empregos inseguros e
temporários é hoje o limite da civilidade apontado pela pregação dos
sacerdotes do capital. Tornado responsabilidade individual, em
contraposição ao enfoque anterior no qual o emprego deveria ser garantido
pelas políticas públicas, se individualiza igualmente a culpa pela exclusão
direta do mundo produtivo. Difunde-se a ideia de “marketing” pessoal e
desenvolvimento das competências profissionais para constituir a, assim,
chamada, “empregabilidade” (2005, p. 20).

Esta citação leva-nos a entrevista do jovem trabalhador citado anteriormente,


vejamos:

O mercado de trabalho aqui em Parnaíba é escasso, principalmente, pra


quem tem só o ensino médio. E com o curso profissionalizante é mais fácil
conseguir um emprego, se eu tivesse feito só o ensino médio eu não teria um
emprego hoje. Porque eu vim fazer um estágio aqui e quando terminou o
estágio pediram o meu currículo, e quando conclui o curso no CEEP a
empresa me contratou. (Janeiro de 2013).

Nesse contexto, a Educação Profissional possibilitou a inserção desse jovem no


mercado de trabalho ao torná-lo atraente pela qualificação que recebeu, ao mesmo tempo, que
não corresponde o ideal de emprego almejado por grande parte da população jovem. Assim, o
emprego destinado aos jovens com um curso técnico são os postos de trabalho com pouca ou
nenhuma possibilidade de ascensão socioeconômica, configurando-se como trabalhos de
baixa remuneração para os filhos da classe trabalhadora. Além de se tornar a alternativa para
os que não conseguem passar no competitivo e excludente exame de vestibular, pois durante a
entrevista o jovem nos fala que deseja fazer um curso superior, mas já fez a prova do ENEM19
e não conseguiu obter a pontuação exigida. Ainda durante a entrevista indagamos sobre as
funções/atividades que o jovem trabalhador exerce no ambiente laboral:

Aqui eu faço um pouco de tudo, de manhã eu ajudo na limpeza, na hora do


almoço que é umas onze horas, eu fico na balança e no caixa e depois do
almoço eu faço a limpeza de novo aqui de fora, e depois ajudo na limpeza da
cozinha. Encerro o meu trabalho umas cinco horas e meu horário de entrar é

19
Exame Nacional do Ensino Médio – é uma seleção feita ao final do ensino médio. Desde 2011 vem sendo
adotado por várias universidades brasileiras como exame que seleciona a entrada nas instituições de ensino
superior.
36

às sete da manhã. Ganho um salário mínimo com carteira assinada. (Janeiro,


2013).

Esses relatos apresentam uma realidade que confronta-se com o discurso oficial que
veicula a Educação Profissional a uma formação omnilateral do educando, posto que tenha
sido apropriada como alternativa de suprir mão de obra com apelo mercantilista e não
possibilita uma formação integral. O trabalho nesse contexto distancia-se do conceito
marxiano de ser “condição natural da existência humana” (Marx, 2008, p. 62), o jovem
trabalhador deve apreender competências que lhe submete a um trabalho meramente
mecânico e troca sua força de trabalho por um sálario. Essa reflexão nos remete ao sentido do
trabalho na sociabilidade do capital, que se apropria do trabalho humano como mercadoria, e
o transforma em trabalho assalariado, Antunes (2005) contribui com essa reflexão ao analisar
que a nova forma de ser do trabalho e da classe trabalhadora de hoje, compreende a totalidade
dos assalariados, homens e mulheres que vivem da sua força de trabalho, incorpora também a
totalidade do trabalho social e a totalidade do trabalho coletivo que vende sua força de
trabalho.
No que se refere à juventude e a sua situação de empregabilidade, de acordo com os
dados do IBGE a população jovem de Parnaíba na faixa etária entre 15 a 29 anos registrada
em 2010 era um total de 41.512, que corresponde a 28,04% da população total da cidade. Ao
compararmos esse total de jovens com a quantidade de empregos formais apresentadas pelo
MTE, verificamos que o nível de empregabilidade entre a juventude ainda está bastante
distante de uma situação favorável, pois há uma parcela desses jovens que se encontram fora
do mercado formal ou em condição de desemprego. Consideramos que embora a Educação
Profissional tenha se constituído como fator importante no discurso oficial na conquista do
emprego, principalmente, na conquista do primeiro emprego entre a juventude, a educação
sozinha não proporciona a inclusão desses jovens no mercado de trabalho, pois é necessária a
intervenção do Estado na promoção de políticas de emprego.
37

3. METAMORFOSES DO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO E POLÍTICAS


PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL

A sociedade do consumo destrutivo e supérfluo, ao mesmo tempo que cria


necessidades múltiplas de consumo fetichizado e estranhado, impede que os
verdadeiros produtores da riqueza social participem até mesmo do universo
(restrito e manipulado) do consumo. (ANTUNES, 2005, p.21).

A organização e as relações de produção no contexto do capitalismo contemporâneo


tem gerado necessidade de mão de obra cada vez mais qualificada para atender as exigências
do mercado de trabalho automatizado. A Educação Profissional surge, assim, como uma
modalidade de ensino direcionada para a formação do traballhador com competências para se
adaptar as constantes metamorfoses do capitalismo e suas políticas de financeirização e
flexibilizaçao do capital que repercute nas relações de produção. Nessa perpectiva, essa
modalidade de ensino se constitui como importante estratégia no cenário da mundialização do
capital20, levando os países considerados emergentes, como por exemplo o Brasil, a traçar
políticas públicas para a efetivação das propostas educacionais direcionadas para atividades
laborais, vez que, a Educação Profissional é ideologicamente embasada pelo discurso da
empregabilidade e do desenvolvimento social.
De acordo com o MEC, no seu documento sobre “Políticas Públicas para a Educação
Profissional e Tecnológica” está disposto que “as concepções e princípios gerais que deverão
nortear a educação profissional e tecnológica deve basear-se no compromisso com a redução
das desigualdades sociais, o desenvolvimento socioeconômico, a vinculação à educação
básica e a uma escola pública de qualidade” (BRASIL, 2004, p. 06). Com isto, a Educação
Profissional se torna basilar na formulação de propostas educacionais vinculadas ao modelo
socioeconômico vigente que impulsione a produtividade e se adeque as mudanças ocorridas
no sistema capitalista, exemplo disso, são as reformas da Educação Profissional empreendidas
no Brasil a partir da década de 1990 e o aumento de instituições que ofertam essa modalidade
de ensino, principalmente, durante o governo petista nesses últimos anos. Esse fenômeno está
associado aos processos metamórficos do mundo do trabalho, as intensas transformações
políticas e econômicas que vem ocorrendo desde 1990. Estas transformações culminaram em

20
O termo mundialização é utilizado por François Chesnais (2003) para designar o processo de financeirização
do capital, substituindo o termo globalização, vez que, para Chesnais o regime de financeirização é uma
produção dos países capitalistas avançados como Estados Unidos e Reino Unido, e é mundializado no sentido
em que seu funcionamento exige a desregulamentação e a liberalização dos investimentos, das finanças e das
trocas comerciais entre todos os lugares. (2003, p. 52)
38

mudanças estruturais no âmbito da produção e das relações de trabalho no espaço da fábrica e


setores de seviços. Segundo Franca (2007):

Nos primeiros anos dessa década, ocorreram fatos marcantes, como o fim do
socialismo real, o avanço geopolítico dos EUA, a incorporação do Brasil à
globalização financeira e o advento da terceira revolução tecnológica. A
conjunção desses acontecimentos abalou a sociedade contemporânea.
Reafirmou o domínio das grandes potências sobre os países periféricos e o
controle do capital sobre o trabalho. (FRANCA, 2007, p. 08).

Os processos de produção se reestruturam na tentativa de se adaptar as metamoforses


do capitalismo em âmbito internacional e nacional, o que reflete nas relações de trabalho e nas
exigências de qualificação do trabalhador. A organização da produção baseada nos
princípios do taylorismo21 e do fordismo22 foi sendo considerada dispendiosa para as
demandas do mercado, isto desencandeou profundas transformações na economia capitalista,
que surgem como alternativas para impulsionar a produtividade, reorganizar as relações de
produção e dinamizar o trabalho no interior da fábrica e as relações entre trabalhador e
capital. Segundo Antunes (2006, p. 20) “as unidades produtoras mais antigas e tradicionais
desenvolveram um forte programa de reestruturação, visando sua adequação aos novos
imperativos do capital no que concerne aos níveis produtivos e tecnológicos e ás formas de
“envolvimento” da força de trabalho”. A política de financeirização do capital baseada na
desregulamentação e flexibilização do mercado desencandeou um processo intenso de
mudanças nas relações de troca e produção no sistema capitalista.
Chesnais (2003, p. 46) denomina essa nova fase do capitalismo de “regime de
acumulação com dominância financeira” baseado na valorização e flexibilização do capital e
sua dominância em âmbito nacional e internacional, que vislumbra um “efeito conjunto de
mudanças nas relações entre os Estados e as frações do capital e nas relações políticas entre o
capital e o trabalho” (CHESNAIS, 2003, p. 46). Há portanto, um deslocamento do eixo das
relações capitalistas centralizada na força de trabalho para a centralização na reprodução e
acumulação do capital financeiro. Esse fenômeno tem ocasionado um estranhamento cada vez
maior da classe trabalhadora em relação a produção e gerenciamento do capital financeiro,

21
O taylorismo designa um conjunto de técnicas científicas desenvolvidas por Taylor que segundo Harvey (1992)
propunha o aumento da produtividade através da decomposição de cada processo de trabalho, ou seja, a divisão
entre execução e planejamento, separação entre gerência, concepção controle e execução.
22
O fordismo compreende que a produção de massa significa consumo em massa, um novo sistema de
reprodução da força de trabalho, uma nova política de controle e gerência do trabalho, uma nova estética e uma
nova psicologia, em suma, um novo tipo de sociedade democrática, racionalizada, modernista e populista
(HARVEY, 1992, p. 121)
39

vez que, a complexidade das relações de exploração da força de trabalho se tornam cada vez
mais aviltantes. Além de envolver o trabalhador e responsabilizá-lo pelo sucesso individual e
coletivo da empresa, fazendo-o acreditar que ele participa da gestão e divisão dos lucros. De
acordo com Antunes (2006):

Os obstáculos reais enfrentados pelo trabalho no presente e no futuro


próximos, podem ser resumidos em duas palavras: “flexibilização” e
“desregulamentação”. Dois dos slogans mais apreciados pelas
personificações do capital nos dias atuais, tanto nos negócios como na
política, soam interessantes e progressistas. E, muito embora sintetizem as
mais agressivas aspirações antitrabalho e políticas do neoliberalismo,
pretendem ser tão recomendavéis, para toda criatura racional, como a
maternidade e a torta de maçã, pois a “flexibilidade” em relação às práticas
de trabalho – a ser facilitada e forçada por meio da “desregulamentação” em
suas variadas formas -, corresponde, na verdade, à desumanizadora
precarização da força de trabalho. (ANTUNES, 2006, p.33/34)

O contexto é, portanto, desfavorável à classe trabalhadora, como sempre foi, já que


foi historicamente desprivilegiada e privada de diversas condições materiais de existência,
tendo que vender sua força de trabalho aos donos dos meios de produção vivenciando
condições de exploração e exclusão social. Assim é que essas mudanças ocorridas no sistema
capitalista ao atingir avassaladoramente a oferta e procura de emprego, faz com que o
trabalhador fique cada vez mais exposto aos ditames do sistema com as transformações
estruturais nas relações de produção, intensificam-se a diminuição dos postos de trabalho,
aumentando o desemprego e criando maiores reservas de mão de obra.
A Educação Profissional surge como modalidade de ensino direcionada para a
formação do trabalhador para esse mercado como alternativa para conter a onda de
desemprego, desigualdades sociais, e ao mesmo tempo, procura qualificar trabalhadores para
ocupar novos postos de trabalho na tentativa de resignificar as práticas escolares formando
profissionais empregáveis. Nesse âmbito, a partir de 2004 no Brasil acontecem as
conferências que traçam as metas para a Educação Profissional através das políticas públicas
(SOUSA et al, 2011), que são resultados de acordos realizados com orgãos internacionais,
como a ONU, e também no cenário nacional entre o governo e as instâncias responsáveis pela
formulação das políticas educacionais, e nesse caso, direcionar as propostas de educação
profissional.

o Ministério da Educação (MEC) por meio da Secretaria de Educação


Profissional e Tecnológica (SETEC) deu início em 2004, as discussões para
40

construção das bases de uma Política Publica para Educação Profissional,


sendo o Pacto pela Educação Profissional, de 2005, o primeiro documento
que expressa as intenções do governo federal. ( SOUSA et al, 2011, p.43)

As políticas de Educação Profissional do Governo Federal tinham como meta


construir escolas profissionalizantes a nível Federal e Estadual em todo o país e fortalecer as
instituições que já existiam. De acordo com os dados da SETEC ( BRASIL, 2012) houve um
aumento no número de estabelecimentos da Rede Federal entre os anos de 2003 a 2010, em
que o Ministério da Educação entregou a poplulação 214 escolas técnicas previstas no plano
de expansão da rede federal de Educação Profissional. Além disso, outras escolas foram
federalizadas. Observe o gráfico abaixo que mostra a expansão das redes federais de
Educação Profisisonal nesse período:

Fonte: MEC; SETEC. Disponível em: http://redefederal.mec.gov.br/


Acesso em 05 de janeiro de 2013

No Piauí foram construídas Instituições de educação profissionalizante que oferta


Educação Profissional de nível superior e a nível médio. Existe, atualmente, o Instituto
Federal com 11 campi, dois na capital e os demais nas outras cidades, além de 03 escolas
técnicas vinculadas a Universidades, que são as chamadas Escolas Agrícolas. Em Parnaíba,
atualmente, tem um campus do Instituto Federal de Educação Profissional e dois Centros de
Educação Profisisonalizante com cursos técnicos de nível médio, que oferta educação
integrada e separada, como por exemplo, o CEEP, e o Liceu Parnaibano, esta última escola de
ensino médio regular transformada em centro profissionalizante desde 2012, que faz parte do
plano do MEC de federalização das escolas. Além disso, ainda de acordo com a SETEC:

O MEC está investindo mais de R$ 1,1 bilhão na expansão da Educação


Profissional. Atualmente são 354 unidades e mais 400 mil vagas em todo
país, com outras 208 novas escolas previstas para serem entregues até o final
de 2014 serão 562 unidades, que em pleno funcinamento, gerarão 600 mil
vagas”. ( BRASIL, 2013)
41

Esses dados são importantes para a compreensão de que as mudanças estruturais no


âmbito das relações político-econômicas influenciam diretamente na oferta e modalidade de
educação vigente, pois na sociabilidade do capital considera-se que “o indivíduo é produtor de
suas próprias capacidades de produção, chamando-se de investimento humano o fluxo de
despesas que ele deve efetuar ou que o Estado efetua por ele em educação (treinamento) para
aumentar a sua produtividade” (FRIGOTTO, 1993, p.44 ). A educação no contexto capitalista
é determinada nos marcos da política financeira e as necessidades de mercado, sustenta-se a
falácia de que a educação traz a possibilidade de mobilidade social e empregabilidade. No
entanto, ao mesmo tempo que a educação se torna meio de inserção mais rápida no mercado
de trabalho, nesse caso a Educação Profissional, também se torna um fator de seleção e
sustentação de reserva de mão de obra, contribuindo para a exclusão.
Além disso, os princípios que norteiam a elaboração das políticas públicas de
Educação Profissional e tecnológica, como a redução das desigualdades sociais; o
desenvolvimento econômico; a educação básica como um direito garantido; escola pública de
qualidade não tem sido alcançados plenamente na prática. E mesmo as políticas de Educação
Profissional estando relacionadas a essas problemáticas econômicas, sociais e políticas,
refletimos que pouco tem conseguido avançar no que se refere aos problemas sociais como a
pobreza, a fome o desemprego dentre outros males que assolam a humanidade. Em Parnaíba
as políticas públicas de qualificação que vem sendo desenvolvidas estão direcionadas para o
PRONATEC, e também as políticas de Educação Profissional das instituições de ensino,
como no CEEP, mas não encontramos políticas de pleno emprego nem programas que visam
a superação das desiguldades sociais e da pobreza, cotidianamente, nos deparamos nas ruas da
cidade com crianças famintas, descalças e maltrapilhas mendigando nas ruas.
Tomamos ainda como exemplo os dados sobre a fome, que de acordo com a ONU
(Organização das Nações Unidas) no seu novo relátorio divulgado sobre a fome em outubro
de 2012 quase 870 milhões de pessoas no mundo sofrem de desnutrição crônica, ou uma de
cada 8 pessoas no mundo. No Brasil cerca de 13 milhões de pessoas passam fome ou sofrem
de desnutrição. Isso mostra a ineficiência do Estado capitalista em resolver problemas sociais
básicos como a fome, que está relacionado a um contexto mais amplo como a distribuição de
renda, a geração de empregos, dentre outros.
No entanto, na perspectiva de desenvolvimento econômico a proposta da Educação
Profissional tem se tornado alternativa, vez que, segundo Sousa et al (2011, p. 35) a
“Educação Profissional contribui para o desenvolvimento à medida que dá suporte à formação
de jovens competitivos, eficientes e produtivos, capazes de inovar os padrões atuais de
42

inovação tecnológica do país”. Dentro do padrão de consumo e produção capitalista o Estado


tem promovido ás políticas públicas para esse modelo de educação, pois tem se mostrado
viável ao desenvolvimento econômico. Nessa compreensão, “a educação profissional e
tecnológica se torna parte do processo integral de formação dos trabalhadores, portanto, deve
ser compreendida como uma política pública e estratégica” (BRASIL, 2004, p.39). Os
objetivos para a promoção dessa política são bem claros no documento do MEC e se referem
às transformações ocorridas no mundo do trabalho, ampliação das instituições para a oferta
dessa modalidade de ensino, aumento do nível de escolaridade dos trabalhadores para
impulsionar o desenvolvimento econômico e social.
No contexto dessas políticas de desenvolvimento social, qualificação e metamorfoses
das relações de trabalho e produção no Estado capitalista deve ser considerado que as
transformações ocorridas na superestrutura e na estrutura desse sistema tem se dado através de
sucessivas crises que desencadeiam a necessidade de repensar e reorganizar os processos de
produção e acumulação de riquezas. Para Cavalcante (2006, p. 48) “duas então foram as
frentes de batalha principais deflagradas neste processo; a) o neoliberalismo e b) a
reestruturação da produção e do trabalho”. Essas duas alternativas que passam a sustentar o
sistema tornam as relações de exploração do trabalhador cada vez mais intensa, há um
crescente aumento da desigualdade social e a acumulação da riqueza nas mãos de poucos. Em
Parnaíba os dados apresentados pelo Secretario de Trabalho parece não corresponder com a
realidade nacional/transnacional estudada, pois este aponta que o mercado de trabalho nessa
cidade está em super expansão, mas falta profissional qualificado. Ele relata que em Parnaíba
os torneiros mecânicos e outros profissionais técnicos estão todos empregados.
Para Franca (2007, p. 136) “o neoliberalismo veio assegurar o domínio do mercado
sobre o Estado, do privado sobre o público e, principalmente, do capital sobre o trabalho”.
Assim o neoliberalismo surge como um novo sistema político, econômico e social na tentativa
de superar a crise e revitalizar o capitalismo e suas estruturas, além de se apresentar como a
solução para os problemas sociais que o chamado Estado do Bem Estar Social23 não
conseguiu resolver. No entanto, o neoliberalismo é apenas o velho liberalismo travestido de
novo. Foca na acumulação do capital e no lucro, suprimindo os direitos sociais e os
transformando em serviços, subjugando as relações de trabalho aos anseios do capital e da

23
Segundo Moreira (2006) O Estado de Bem Estar Social ou Welfare State foi um modelo de intervenção do
Estado na economia capitalista baseado na política econômica keynesiana como forma de garantir direitos
sociais e benefícios a população que sofria com os graves problemas enfrentados pela crise de 1929, esse modelo
de política pública denominado também de Estado Providência ou Estado Social de Direito teve sua vigência
entre as décadas de 1930 a 1970, seu declínio se deu no momento de crise do modelo fordista de produção.
43

lucratividade, persiste cada vez mais a exploração do trabalhador intensificando sua condição
de estranhamento da riqueza produzida pelo seu próprio trabalho.
Segundo Arrais Neto (2005, p.18/19) “mantém-se forte a vertente do neoliberalismo,
que tem como alicerce real de seu projeto de hegemonia social burguesa, as transformações
ocorridas no campo da produção econômica de teor capitalista”. Entretanto, desde 2008 esse
novo capitalismo tem passado por uma forte recessão econômica/financeira, anuncia-se,
constantemente, que o capitalismo está a beira de um colapso, a crise financeira global que
eclodiu em 2008/2009 nos traz questionamentos pertinentes quanto a capacidade do
neoliberalismo de sustentar o capitalismo e resolver as problemáticas sociais prometidas no
seu período hegemônico através do livre mercado, além de por em xeque as benesses desse
sistema. Indagamos então, será o fim do neoliberalismo?
Essas crises do capitalismo tornam as condições materiais de existência da classe
trabalhadora muito mais difícil, e contribui para reorganizar o modo de produção e
gerenciamento do sistema financeiro de forma a torná-lo mais forte e suportável diante dos
momentos de crise, mesmo que a classe trabalhadora viva em constante crise social e
econômica, sendo a mais afetada pelas crises que assolam a economia. De acordo com
Moreira (2006):

O capitalismo é um sistema que dadas as suas contradições irreconciliáveis,


fundamentalmente aquelas que se assentam no movimento de apropriação e
expropriação, se vê frequentemente confrontando-se com suas crises e tendo
de debelar fases de recessão que refletem a proximidade com seu
esgotamento. Isso explica outra característica que lhe é peculiar, que é o seu
caráter cíclico e sua espetacular capacidade de constantemente se
“reinventar”. (MOREIRA, 2006, p. 188)

Disto decorre a capacidade de reestruturação e revitalização do sistema após o


esgotamento do modelo fordista de produção e do declínio da política keynesiana na década
de 1970, baseada no Estado-de-Bem-Estar Social. As políticas públicas de Educação
Profissional que são delineadas a partir dessa conjuntura e planejadas para suprir a
necessidade de mão de obra qualificada que se adequasse a esse contexto configurou-se para a
qualificação de uma mão de obra que servisse aos comandos do mercado, ou seja, um
profissional que além de executar fosse capaz de pensar e gerir o processo de produção para
não desperdiçar tempo e nem força de trabalho.
Além disso, a onda de desemprego ocasionada pelas transformações advindas desse
processo obrigou o Estado e as instâncias governamentais a pensar em políticas de formação,
44

qualificação e emprego para inserir as massas dos desempregados nesse novo modelo e
capacitar, principalmente, a juventude que é vista como potencial força de trabalho para o
desenvolvimento econômico das nações. Assim é que a OIT (2009) no seu relatório sobre o
Trabalho Decente e Juventude no Brasil traça políticas de emprego e qualificação para a
juventude a ser executada no período de 2006 a 2015 e anuncia que:

Reafirmamos o nosso compromisso de elaborar e pôr em prática estratégias


que deem aos jovens de todo o mundo uma oportunidade real e igual de
conseguir o emprego pleno e produtivo, e trabalho decente. Neste sentido,
tendo observado que quase a metade dos desempregados do mundo são
jovens, estamos decididos a integrar o emprego juvenil nas estratégias e
programas nacionais de desenvolvimento; a elaborar políticas e programas
para melhorar a capacidade de emprego dos jovens, em particular, através de
educação, capacitação e formação contínuas, de acordo com as exigências do
mercado de trabalho; e a promover o acesso ao trabalho por meio de
políticas integradas que propiciem a criação de novos empregos e de
qualidade para os jovens, e facilitem o acesso a eles, por meio de iniciativas
de informação e capacitação. (www.oitbrasil.org.br, dezembro 2012)

As metamorfoses do capitalismo implicam na necessidade de assegurar ao


trabalhador as condições de trabalho para a sua sobrevivência, caso contrário o próprio
sistema capitalista entraria em declínio, portanto, essas políticas são necessárias para a própria
sustentação desse modelo socioeconômico e político vigente. Considerando o impacto dessas
mudanças, no tópico seguinte analisamos a reestruturação da produção e do trabalho e as
implicações desse processo para a formação do trabalhador, pois propomos compreender de
que forma essas mudanças trouxeram transformações na formação para o trabalho e na
exigência de qualificação da mão de obra.
Em Parnaíba/PI as possibilidades de emprego para os jovens tem se distanciado do
discurso oficial que veicula um mercado de trabalho em expansão, vez que a esse segmento
social tem sido destinado postos de trabalho com baixa remuneração e em condições precárias
de trabalho. A juventude da classe trabalhadora tem se defrontado com uma realidade que
contraria a apresentada na entrevista realizada com o Secretario de Trabalho da cidade, ao
afirmar que Parnaíba é uma cidade com grandes possibilidades de emprego para a juventude,
principalmente, aqueles que têm uma qualificação técnica.
45

3.1 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E OS IMPACTOS PARA A FORMAÇÃO


DO TRABALHADOR

Nesta etapa do texto debatemos sobre uma perspectiva histórica da reestruturação


produtiva na busca de compreender os impactos que esse processo ocasionou na formação do
trabalhador (Educação Profissional) e nas demandas do mundo do trabalho. Neste âmbito
analisamos o contexto nacional/trasnacional que perpassa as relações capitalistas, refletimos
sobre as condições socioeconômicas que possibilitaram o processo de reestruturação
produtiva e os aspectos que a constituem. Desta feita, é que chegamos ao contexto
parnaibano, vez que é necessário compreender o processo de reestruturação produtiva para
relacionar as demandas de emprego e qualificação destinadas a classe trabalhadora em
Parnaíba, principalmente, no que concerne a oferta e demanda de Educação Profissioanal no
CEEP.
A reestruturação produtiva resulta de processos de transformação da sociabilidade do
capital como alternativa para reestruturar as relações de trabalho e de produção na tentativa de
superar as crises do capital. Investimentos em automação, por exemplo, com a utilização da
tecnologia e substituição do trabalhador pela máquina na tentativa de miminimizar os gastos
com mão de obra e aumentar a produtividade, pois há a necessidade do enxugamento da mão
de obra, e a otimização do mais desenvolvido aparato tecnológico no processo de produção,
como a introdução da microeletrônica, da robótia, da informática dentre outros (HARVEY,
1992). Além disso, esse processo de reestruturação não ocorreu apenas no âmbito da produção
no interior da fábrica, modificou também as formas de gestão das empresas e as relações entre
o patrão e o operário, a relação entre os próprios operários e ocasionou o desemprego
estrutural.
O mais recente processo de reesturturação produtiva surge a partir da década de 1970
em decorrência da crise econômica desse período e do esgotamento do modelo
taylorista/fordista de produção que produzia mercadorias em série, com linhas de produção,
em que cada trabalhador era especializado em uma função/atividade. Segundo Harvey (1992,
p. 135) “o período de 1965 a 1973 tornou cada vez mais evidente a incapacidade do fordismo
e do keynesianismo de conter as contradições inerentes ao capitalismo”, sendo que o principal
entrave desse modelo era a rigidez, para Harvey (ibid;idem) haviam problemas tanto na
rigidez de investimentos de capital fixo, quanto no sistema de produção em massa. Além de
rigidez nos mercados, na alocação e nos contratos de trabalho. Portanto, é nesse período que
46

esse modelo de produção capitalista passa por crises mais intensas, repercutindo em ondas de
greves dos trabalhadores, causando fortes recessões na economia.
Ainda de acordo com Harvey ( 1992) essa crise que solapava o mundo capitalista:

Obrigou as corporações a entrarem num período de racionalização,


reestruturação, e intensificação do controle do trabalho. A mudança
tecnológica, a automação, a busca de novas linhas de produto e nichos de
mercado, a dispersão geográfica para zonas de controle do trabalho mais
fácil, as fusões e medidas para acelerar o tempo de giro do capital passaram
ao primeiro plano das estratégias corporativas de sobrevivência em
condições gerais de deflação. ( HARVEY, 1992, p. 137/140).

Inicia-se a transição do modelo fordista para um novo sistema que se centralizará em


uma acumulação flexível do capital, em que a palavra de ordem que regerá a economia
mundial a partir disso será a “flexibilidade”. Ao contrário da rigidez presente no fordismo,
apresenta-se a economia mundial um processo de flexibilização nas relações de trabalho, na
produção e nos investimentos baseado nas necessidades de consumo. Harvey (1992, p.140)
esclarece que as “décadas de 70 e 80 foram um conturbado período de reestruturação
econômica e de reajuste social e político”, implicando profundas transformações na
organização social do trabalho e nos processos produtivos, pois ao verificar que a produção de
mercadorias em massa do fordismo não correspondia as exigências do mercado consumidor
introduziu-se novas formas de produção e acumulação flexível. Para Harvey (1992):

A acumulação flexível é marcada por um confronto direto com a rigidez do


fordismo. Ela se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos
mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se
pelo surgimento de setores de produção interiamente novos, novas maneiras
de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas
altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e
organizacional. (HARVEY, 1992, p. 140)

O modelo de produção que surgiu durante esse período foi baseado no modelo
japonês conhecido como toyotismo, um sitema produtivo criado por Taiichi Ohno e
desenvolvido pela empresa automobilística japonesa Toyota, e que regulava a produção a
partir da demanda do mercado, adotou um novo sistema de gerenciamento conhecido como
just-in-time24 e novas formas de controle da produção como o kanban25. De acordo com
Franca (2007) esse sistema surge diante da crise do pós-guerra:

24
Esse sistema baseia-se no princípio de que todo circuito produtivo ou todas as fases da produção devem se
desenvolver na mais perfeita sintonia. Através desse sistema de gestão foi possível manter a continuidade e o
47

Quando o Japão tentava se refazer da II Guerra Mundial, a Toyota se deu


conta de que a retomada de sua produção não poderia se basear na produção
fordista em massa. Tinha que considerar o contexto específico do mercado
japonês do pós-guerra, ou desistir de concorrer com grandes montadoras.
Dessa condição nasceu o princípio de adaptar a produção aos pedidos,
pequenos e variados de um mercado e de uma economia em crise.
(FRANCA, 2007, p.42).

A introdução desse novo sistema de produção exigia, portanto, um atento olhar ao


mercado consumidor e a redução do tempo de produção que ocasionou significativas
mudanças na organização do trabalho, sendo fatores determinantes do custo da produção.
Além disso, durante esse período a divisão internacional do trabalho é afetada pelos processos
de reestruturação, sendo que grandes montadoras e indústrias multinacionais começam a
migrar para os países subdesenvolvidos atrás de mão de obra mais barata e com a utilização
ainda de um sistema de produção defasado, como o fordismo, que sobreviveu ainda durante
algumas décadas nesses países. Pois “onde a produção podia ser padronizada, mostrou-se
difícil parar o seu movimento de aproveitar-se da força de trabalho mal remunerada do
Terceiro Mundo, criando ali o que Lipietz chama de “fordismo periférico” (Harvey,1992,
p.146), vez que nesses países de industrialização tardia o fordismo ainda conseguiu se
sobressair e produzir para um mercado local, e mesmo para fins de exportação.
A estratégia utilizada pelas empresas multinacionais ao se instalarem em países
periféricos, em busca de mão de obra mais acessível e com menor custo, impulsionou o
processo de reestruturação produtiva nesses espaços e a divisão internacional do trabalho. A
esses países restava suprir uma demanda de produção regulada pelos países que dominavam a
produção e a economia mundial, portanto, concomitante a esse processo surgiu um mercado
de trabalho que produzia para um mercado externo e condicionava o trabalhador a executar
atividades/funções que exigia maior qualificação/conhecimento para manusear/operar
máquinas. Com tudo, a necessidade de mundialização do capital e as exigências da exportação
fez com que aos poucos essas indústrias, mesmo que tardiamente, em países como o Brasil,
adotassem o modelo toyotista de produção. Navarro apresenta um estudo desse fenômeno, por
exemplo, no setor calçadista no Brasil :

aceleramento do processo de produção, dentro e fora da fábrica. Também permitiu controlar, simultaneamente, o
fluxo dos produtos, os meios de trabalho e o próprio trabalhador. (FRANCA, 2007, p. 38/41).
25 O Kanban é um instrumento operacional de controle da produção utilizado para evitar o desperdício. De

acordo com Bezerra (2006) a utilização dessa ferramenta possibilita ao operador saber exatamente o que é
necessário produzir.
48

A readequação das empresas do setor calçadista francano à nova lógica do


mercado, principalmente a partir dos anos 1990, que passou a exigir maior
qualificação dos produtos, maior variedade de modelos, maior produtividade
e competitividade, implicou extinção de postos de trabalho, exigência de
maior qualificação da força de trabalho, surgimento do trabalhador
polivalente, substituição do trabalho em linha pelo trabalho em grupo ou
células de produção, aumento do trabalho terceirizado, subcontrato por meio
das “bancas” e do trabalho em domicílio, aviltamento salarial e aumento da
exploração do trabalho infantil. (NAVARRO, 2006, p. 414).

Durante esse processo de transição, o mercado de trabalho passou por um fenômeno


bastante peculiar na economia capitalista denominado desemprego estrutural, ocasionado por
essa necessidade de exugamento de mão de obra nas empresas decorrente da automação das
insdústrias e de nova organização do trabalho no interior da fábrica. Algumas máquinas
substituíram postos de trabalho antes ocupados por trabalhadores, além de possibilitar que um
único trabalhador realizasse várias atividades ao mesmo tempo, configurando o trabalho
polivalente. De acordo com Harvey (1992) um outro fator responsável pelo desemprego
estrutural foi a nova forma de acumulação do capital, conhecida como acumulação flexível,
que possibilitou maior controle do capital e do trabalho pelos empregadores:

O trabalho organizado foi solapado pela reconsturção de focos de


acumulação flexível em regiões que careciam de tradições industriais
anteriores e pela reimportação para os centros mais antigos das normas e
práticas regressivas estabelecidas nessas novas áreas. A acumulação flexível
parece implicar níveis relativamente altos de desemprego “estrutural” ( em
oposição a “friccional”), rápida destruição e reconstrução de habilidades,
ganhos modestos (quando há) de salários reais e o retrocesso do poder
sindical – uma das colunas políticas do modelo fordista. (HARVEY, 1992, p.
141)

A flexibilidade do processo de produção e de trabalho tornou a exploração do


trabalhador cada vez mais aviltante, pois a reserva de desempregados durante o período de
transição do modelo taylorista/fordista fez com que os contratos de trabalho se tornassem
flexíveis representando perdas de direitos sociais e econômicos para a classe trabalhadora, vez
que, inicia-se um processo de novas formas de contratos de trabalho através da terceirização e
exigência de um profisisonal que produzisse a demanda do mercado consumidor. O processo
de reestruturação produtiva contribuiu para que a economia capitalista não sucumbisse diante
à crise da década de 1970, no entanto, o trabalhador continuou tendo sua força de trabalho
apropriada pelos donos dos meios de produção, as relações de trabalho se tornaram mais
precárias e desumanas, a rapidez exigida na produção transformou o ser humano em escravo
da sua próprio invenção.
49

No Brasil só demos os primeiros passos para o processo de reestruturação produtiva


na década de 1980 e em Parnaíba esse processo deu-se de forma muito mais lenta,
timidamente na educação parnaibana nas últimas duas décadas, com a chegada de cursos
técnicos em informática e com a inserção da informatização nas escola. O impacto desse
processo foi sentida de forma mais intensa nos bancos e no comércio desta cidade, com a
chegada de empresas nacionais/transnacionais que já se apropriaram da reestruturação para
dinamizar a produção e atender as necessidades de mercado. Segundo Antunes (2006) foi
durante década de 1980 que ocorreram os primeiros impulsos do nosso processo de
reestruturação produtiva que levou as empresas a adotarem, ainda que timidamente, novos
padrões organizacionais e tecnológicos, novas formas de organização social do trabalho.
Iniciou-se a utilização da informatização produtiva e do just-in-time, a produção baseada nos
programas de qualidade total e a ampliação do processo de difusão da microeletrônica.
No entanto, essas mudanças não trouxeram beneficios significativos para os
trabalhadores, ao contrário, contribuíram para a precarização e intensificação da exploração
da força de trabalho, pois nos países subdesenvolvidos o trabalhador “recebia sálarios muito
inferiores àqueles alcançados pelos trabalhadores das economias avançadas, além de regida
por direitos sociais amplamente flexibilizados” ( idem,p. 19). A perca de direitos sociais, antes
existente no modelo fordista, resulta da flexibilização das relações de produção e do trabalho
através da utilização, por exemplo, de serviço terceirizado, da contratação de trabalhadores
temporários e outras formas que o capital financeiro encontrou de driblar as conquistas dos
trabalhadores.
Todas essas mudanças na economia, na produção, nas relações políticas e sociais
implicaram diretamente no perfil de trabalhador que seria exigido a partir desse momento. A
utilização de inovações tecnológicas nas indústrias, no comércio e a criação de novos postos
de trabalho demandou uma maior qualificação da força de trabalho. Enquanto o modelo
fordismo sobrevivia com uma mão de obra especializada/ mecanicista que produzia
mercadoria padronizada, e exigia do trabalhador apenas o “conhecimento” específico da sua
função, o sistema de produção que surgiu com o advento da reestruturação produtiva necessita
de um profissional capaz de se adaptar as relações de trabalho flexíveis, que possa executar
mais de uma atividade, que “pense” e execute uma atividade durante o processo produtivo.
O trabalhador que sabia apenas apertar um parafuso foi substituído por inovações
sociotécnicas mais avançadas, onde um operário começou a manusear uma máquina que
supria a mão de obra de vários outros trabalhadores, isto implica que “para os capitais
produtivos (nacionais e trasnacionais) interessa, portanto, a mescla entre os equipamentos
50

informacionais e a força de trabalho “qualificada”, “polivalente”, “multifuncional”, apta para


operá-las” ( ANTUNES, 2006, p. 19). A exigência de mão de obra “qualificada” impulsionou
as iniciativas de investimento em qualificação e formação para suprir a demanda do mundo do
trabalho e driblar o desemprego estrutural.
No plano das propostas de qualificação do trabalhador insere-se o sistema S
composto pelas redes Senai, Senac, Sebrae que em parceira com o governo desenvolveu
propostas de qualificação profissional no âmbito de cursos técnicos. Essas redes contribuiram
de forma significativa para a implementação das políticas de incentivo a formação do
trabalhador para o mundo do trabalho.

No Brasil, a discussão sobre educação e qualificação profissional inicia-se,


de forma mais consequente, com o período de aceleração da industrialização
nos anos 50, ditado pelo processo de substituição de importações. A
educação pública, então, não tinha capacidade de responder, com a rapidez
requerida, às necessidades do mercado de trabalho emergente e às
específicas de cada novo ramo industrial. É nesse contexto que o governo
promove a expansão do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
(Senai) e do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), para
prover a capacitação da força de trabalho na quantidade e qualidade
requeridas. (BRASIL, www.ipea.gov.br, 1995, p. 10)

Em contrapartida, é na década de 1990 que o poder público brasileiro começa a


construir efetivamente programas de qualificação para o trabalho e pensar em políticas para a
Educação Profissional como estratégias de desenvolvimento econômico e social, vez que, o
mercado de trabalho passou a exigir um sistema mais eficiente para se adequar à necessidade
de formar um público que recebia muito mal a educação regular e, portanto, necessitava de
uma formação que aliasse ensino regular com Educação Profissional para se inserir em um
mercado extremamente competitivo e exigente. Nessa perspectiva, a Educação profissional se
insere no sistema público de ensino e deve ser ofertada pelo Estado ou por instituições
privadas de forma a proporcionar qualificação para o mundo do trabalho, encontra respaldo
legal na LDB 9.394/96.
Em confluência com o Estado brasileiro diversas instituições começam a direcionar
sua atenção para a educação como meio de promover o desenvolvimento social e econômico,
é nesse momento que órgãos como o Banco Mundial e o FMI (Fundo Monetário
Internacional) se propõem a financiar parte da educação brasileira e construir medidas para
superar o atraso socioeconômico por meio do investimento em educação. Essas medidas
foram traçadas pelo Banco Mundial e se referem mais especificamente à educação básica,
51

com ênfase na elaboração de propostas que direcionam os parâmetros dessa modalidade de


ensino para a eficiência e o desenvolvimento. No entanto, conforme Lima:

O ajuste neoliberal, promovido pelos “Novos Senhores do Mundo”,


apresenta-se no campo da educação e da qualificação profissional, de forma
nada original, apesar do intenso discurso inovador. Efetivamente, trata-se de
um retorno à Teoria do Capital Humano, desta feita com uma roupagem de
cunho social, um apelo à novas formas de inserção num mercado mais
exigente. (LIMA, 2006, p. 256).

No que concerne a Educação Profissional o Banco Mundial orientou que fosse gerida
por empregadores e outros financiadores privados interessados, abrindo espaço para a
privatização, Sousa (2005) destaca que essa proposta foi destinada apenas aos países pobres,
enquanto somente para os países ricos seria promissor o poder público investir nesse setor.
Pois para o Banco Mundial o Estado brasileiro deveria investir no ensino fundamental regular
na tentativa de superar o baixo índice de escolaridade dos brasileiros, que se coloca como
condição base para a formação de mão de obra, vez que é mais fácil treinar pessoas com uma
melhor formação básica.
O ensino profissionalizante foi constituindo-se a partir do setor privado, e mais
incisivamente no governo pestita tem experenciado momentos de expansão na esfera pública.
Em decorrência da necesssidade de qualififcação do trabalhador, a escola ganhou o sentido
de formar diretamente para o mundo do trabalho, essa modalidade de ensino atende o público
que almeja um emprego com qualificação técnica e tecnológica, pois a “escolarização
elementar passou a ser uma entre outras precondições para sobreviver na lógica da sociedade
capitalista” (ARROYO, 2002, p. 89). Portanto, o Estado teve que garantir a oferta dessa
modalidade, concomitante ao setor privado, vez que, hoje se encontra no rol das políticas
públicas estratégicas para o desenvolvimento econômico e social da nação.
Esse contexto nos remete a instituição pesquisada em Parnaíba/PI no que concerne a
evolução do número de matrículas no CEEP que apresentou aumento considerável nos
últimos seis anos. A procura por essa modalidade de ensino cresceu e mostra que a instituição
tem avançado quantitativamente de acordo com o número de matrículas. Observe o quadro
abaixo:

Ano Nº de matrículas
2006 600 alunos
2007 258 alunos
52

2008 456 alunos


2009 719 alunos
2010 975 alunos
2011 779 alunos
2012 1.014 alunos
Fonte: CEEP, Fevereiro 2013

Este cenário aponta para a necessidade que a classe trabalhadora tem de qualificar-se
para permanecer no mercado de trabalho e garantir a sobrevivência. Assim depois da reforma
da Educação Profissional proposta pelo Decreto 5.154/2004 o número de matrículas de 2006 a
2007 teve uma queda, no entanto nos anos seguintes o número de matrícula cresceu, chegando
ao maior número em 2012. De acordo com a secretaria da escola que forneceu os dados, o
fato do número de matrículas ter evoluido numa proporção maior em 2012 é devido a
educação á distância que foi implantado em 2011e as primeiras turmas se formaram para o
ano de 2012. O contigente de matrículas do CEEP repercute os impactos que as
transformações no mundo do trabalho ocasionam na formação e exigência de qualificação do
trabalhador.
No decorrer desse processo compreendemos que diversos setores foram afetados
com a reestruturação da produção, em nosso estudo destacamos o impacto dessas
transformações na qualificacação do trabalhador. O que nos remete a sustentação do discurso
oficial que veicula educação como fator determinante para a produtividade e desenvolvimento
social e econômico, ao se fundamentar no regaste da Teoria do Capital Humano como
necessidade do Estado capitalista voltar sua atenção para a educação. Segundo Shultz (apud
OLIVEIRA, 2005, p. 106) “a educação possui um valor econômico que pode ser calculado
com base na diferença de renda dos trabalhadores que concluíram o ensino fundamental e os
que não tiveram essa escolarização”.
Dessa forma, a educação tem sido planejada estrategicamente para
qualificação/treinamento direcionado ao mercado de trabalho. Em Parnaíba/PI, por exemplo,
vivenciamos, paulatinamente, a chegada de empresas multinacionais e nacionais, que se
instalam na cidade e oferecem serviços no modelo de gerenciamento just-in-time, como o
Sabway e o Bob’s. Essas empresas consequentemente procuram uma mão de obra mais
qualificada, concomitante a isso cresce na região a procura por cursos profissionalizantes, e a
oferta destes pelo poder público, apesar dessas empresas já ofertarem os seus próprios cursos
e treinamentos do trabalhador de acordo com a necessidade da empresa.
53

O debate da qualificação do trabalhador perpassa todos esses indicadores de


demanda de empregabilidade relacionadas as transformações socioeconomicas e políticas.
Isso não significa que essa conjuntura torna a Teoria do Capital Humano uma verdade sob a
qual o mercado se sustenta, mas esta teoria tem sido aplicada por empresas e governos, na
tentativa de estabelecer a ideologia dominante. È fato que o nível de escolaridade do
trabalhador influencia na produtividade e na adequação às exigências do mundo do trabalho,
no entanto, isso não significa qualidade de vida para o trabalhador na sociabilidade do capital
e muito menos garantia de emprego, vez que, como vimos anteriormente, as complexas
metamorfoses sofridas pelo capitalismo contemporâneo tem ocasionado uma exploração e
precarização cada vez mais intensa da força de trabalho, além disso o Estado não aponta
possibilidades de superação plena do desemprego e nem políticas publicas eficazes par a
promoção de emprego.

3.2 POLÍTICAS COMPENSATÓRIAS, PRECARIZAÇÃO E EDUCAÇÃO


PROFISSIONAL EM PARNAÍBA

Compreender as condições de inclusão do trabalhador no mercado formal ou


informal perpassa a análise das relações de poder exercidas pelo controle do capital e suas
determinações na estrutura do operariado moderno, resultado do processo de transição de um
capitalismo em crise. A Educação Profissional permeada do ideário neoliberal e constituída
enquanto propulsora do desenvolvimento social e econômico da nação tem cumprido o papel
de política compensatória para a inclusão na informalidade (SALES, 2012), dentre muitas
outras, como programas de incentivo ao empreendedorismo e de financiamento, que oferece
crédito ao pequeno empreendedor, muitas vezes, oriundo do setor informal incentivado a se
tornar um microempreendedor, o que contribui para o endividamento dessa classe.
Refletimos os impactos dessa política para a manutenção da precarização do
trabalhador diante da constituição de uma nova morfologia do trabalho 26, ao tempo que
trazemos uma perspectiva histórica do PLANFOR – (Plano Nacional de Qualificação do
Trabalhador), uma política compensatória desenvolvida no Brasil durante o governo Fernando

26
Compreendemos essa nova morfologia do trabalho a partir de Antunes (2005) ao analisar que a flexibilização
de acumulação capitalista baseada na reengenharia, na empresa enxuta, na redução do proletariado taylorizado e
na ampliação dos novos proletários precarizados e terceirizados implicaram na constituição de uma nova
morfologia do trabalho.
54

Henrique Cardoso – (1994/2002), na intenção de analisar os fatos do passado e compreender o


presente, a fim de perceber as influências desse período para as mudanças no cenário local.
Diante disso, buscamos compreender como a Educação Profissional tem se constituído como
política compensatória, principalmente, na modalidade de PROEJA, que é ofertada no CEEP,
como qualificação para trabalhadores, que em sua maioria, se encontram no setor informal.
As metamorfoses do capitalismo analisadas até esse momento implicaram nessa nova
morfologia do trabalho que surge com o advento da reestruturação produtiva e se configura
com o redirecionamento organizacional, estrutural, de contratação e exigência de qualificação.
No entanto, a condição de precarização do trabalhador ainda é uma realidade que persiste
nesse contexto, nem mesmo as políticas de qualificação conseguiram suplantar essa condição
no turbilhão da lógica capitalista. Ao passo que os trabalhadores se tornaram mais
qualificados em alguns setores, em outros perderam até seus postos de trabalhos que deixaram
de existir e foram substituídos por inovações sociotécnicas. Conforme Antunes,

Criou-se, de um lado, em escala minoritária, o trabalhador “polivalente” e


“multifuncional” da era informacional, capaz de operar máquinas com
controle numérico e de, por vezes, exercitar com mais intensidade sua
dimensão mais “intelectual” (sempre entre aspas). E, de outro lado, há uma
massa de trabalhadores precarizados, sem qualificação, que hoje está
presenciando as formas de part-time, emprego temporário, parcial,
precarizado, ou mesmo vivenciando o desemprego estrutural. (ANTUNES,
2005, p. 32).

Diante desse cenário o trabalho apresenta dimensões mais complexas, e a era da


informatização se contrasta com a informalidade, que surge em meio às adversidades do
cotidiano de trabalhadores que não encontram vaga no mercado de trabalho e buscam no setor
informal uma alternativa de sobrevivência, funcionando como uma forma de envernizar o mal
estar do capitalismo diante da miséria e do desemprego. A situação de informalidade era
característica dos países periféricos durante a hegemonia do modelo taylorista/fordista, no
entanto no processo de transição para o modelo de acumulação flexível essa situação começa
a se expandir também nos países mais desenvolvidos, decorrente do enxugamento da mão de
obra nas indústrias, da fragmentação do operariado e da modificação dos contratos. O trabalho
informal foi sendo apropriado pela lógica produtivista e se constituindo importante para a
manutenção da sociedade capitalista na medida em que se condicionou à acumulação de
riquezas.
Não obstante, o trabalho informal já existia antes do processo de reestruturação e da
acumulação flexível advindo das transformações da década de 1970 (SALES, 2012), a
informalidade é um fenômeno anterior ao processo de reestruturação produtiva, embora em
55

realidades distintas nos países centrais comparados aos países subdesenvolvidos, no entanto
esse meio foi afetado pela reestruturação produtiva com o advento das formas de
subcontratação e terceirização, e passou a se configurar na relação capital-trabalho e nas
formas de precarização do trabalhador:

Observou-se que nos países centrais os resultados da segmentação,


provocada pela imbricação entre desemprego tecnológico e estrutural,
decorrente da transferência de linhas de produção industrial para a periferia,
foram minimizadas em função dos níveis mais elevados de qualificação da
força de trabalho. Porém a redução do número de trabalhadores assalariados
e o crescimento dos socialmente não protegidos fizeram emergir, nos países
centrais, um fenômeno característico dos países subdesenvolvidos, a
informalidade. [...] nos países periféricos os efeitos foram mais extensos à
medida que a exclusão dos setores tradicionalmente incorporados no núcleo
formal ou daqueles que tinham a expectativa de incorporação no mercado de
trabalho padrão resultaram quase sempre na inserção na economia informal,
mais precisamente no rol das “modernas” estratégias de sobrevivência.
(SALES, 2012, p. 46)

As políticas compensatórias estão relacionadas a esse fenômeno de trabalho


informal, vez que, se constitui uma medida para suplantar a condição de ilegalidade do
trabalhador informal e estabelecer vínculos com a lógica produtivista da economia capitalista.
Nesse âmbito a Educação Profissional se torna central para a elaboração dessas políticas. A
possibilidade de inserir o trabalhador no mercado de trabalho formal ou informal necessita da
execução de programas que viabilize a qualificação desse trabalhador. Nos estudos de Sales
(2012) ele considera que ao tempo que se qualifica um trabalhador e não há mercado de
trabalho que o absorva, ele tenderá a se inserir na informalidade, assim as políticas
compensatórias funcionam como uma mediadora da inclusão na informalidade.
No Brasil as políticas compensatórias têm sido promovidas pelo governo como
forma de combater o desemprego, a fome, o baixo nível de escolaridade e impulsionar o
desenvolvimento social e econômico, exemplo disso é o programa bolsa família do governo
federal para famílias de baixa renda que visa combater a pobreza e a fome, e no meio
educacional desenvolveu-se políticas compensatórias para a qualificação do trabalhador com
o discurso de oportunizar um emprego para essa mão de obra e inclui-la no mercado, como o
Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador – PLANFOR na década de 1990, “financiado
majoritariamente com recursos do FAT27 e gerido em parceria com estados, municípios,
associações patronais e centrais sindicais. Entre 1995 e 2001, o Planfor treinou 247 mil
trabalhadores, com a aplicação de R$29 milhões” (BRASIL, 1995, p.17). Posteriormente, esse

27
Fundo de Amparo ao Trabalhador
56

plano norteou outras políticas de qualificação e impulsionou o investimento em educação para


a classe trabalhadora.
O PLANFOR sustenta a vinculação da Educação Profissional com ênfase para a
qualificação vista como essencial para a inserção no mercado de trabalho, vez que o nível de
escolaridade dos trabalhadores era baixo, pois historicamente a essa classe foi destinada as
atividades manuais que exigiam extremo esforço físico e pouca atividade intelectual. Não é
que haja uma ruptura com essa lógica, mas a mudança estrutural nas relações de produção
demandou uma necessidade de escolarizar a classe trabalhadora e oferecer uma educação
elementar e linear direcionada para o desenvolvimento das forças produtivas.

O público-alvo do Planfor é composto, prioritariamente, de trabalhadores


desempregados, especialmente os beneficiários do seguro-desemprego. O
programa atende também micro e pequenos produtores urbanos e rurais,
além de trabalhadores do setor informal (autônomos e cooperados) e pessoas
em risco de desocupação permanente ou conjuntural (BRASIL, 2013, p.17).

Implantado durante o governo Fernando Henrique Cardoso, o Planfor foi uma


política de competência do Ministério do Trabalho, se constituiu a partir de um programa
mais amplo denominado PROGER (Programa de Geração de Emprego e Renda) que segundo
o documento Ações Federais – Piauí traça ações a serem desenvolvidas no período de 1995 a
2002 (BRASIL, 2013). É um projeto de âmbito Federal em parceria com Estados e
Municípios que propõe medidas e ações para a redução das desigualdades sociais, o
desenvolvimento econômico, o combate ao desemprego e à pobreza. Destacamos desse
documento a ênfase na educação e qualificação profissional direcionada a partir do Planfor,
idealizado enquanto “instrumento com reflexos positivos na geração de emprego e renda”
(BRASIL, 2013, p.16), pois ao lado do PROGER que possibilitava à concessão de créditos a
micro, pequenas e médias empresas, apresentou dados quantitativos positivos em relação ao
emprego com o título “Qualificação Profissional e crédito promovem emprego e renda no
Piauí” (idem, ibid).

Voltado a pequenos empresários urbanos e rurais, o Proger atua em parceria


com estados, municípios, associações patronais e centrais sindicais. No
Piauí, o Proger Urbano criou 4,4 mil empregos diretos e 3,3 mil indiretos,
entre 1995 e 2002, com a aplicação de R$ 19,4 milhões do FAT (Fundo de
Amparo ao Trabalhador).

Ao analisar esses dados indagamos quais formas de emprego estão por traz desses
números? Para um observador mais crítico cabe à reflexão de que essas políticas direcionam-
57

se a investimentos e incentivos empresariais, o que se remete a eminente implantação do


neoliberalismo nos governos de FHC durante a década de 1990. Portanto esses programas de
promoção de emprego e renda se configuraram como mais uma conquista para o
empresariado e não para a classe trabalhadora, contribuindo para o avanço da política
neoliberal, e consequentemente o aumento da exploração da mão de obra disponível. Pois o
trabalho “informal” em meio a essas políticas é redirecionado e recebe até investimento
público como incentivo, dado que proporciona retorno de lucros para o capital. Muitos têm
sido os trabalhadores informais que vem se tornando microempreendedores por conta do
microcrédito oferecido pelo governo, esse setor se torna, então, um meio empregável.
A luz da compreensão dos acontecimentos passados, a classe trabalhadora vem
sofrendo as consequências dessa política neoliberal travestida de projetos sociais, e
vivenciando formas semelhantes de políticas compensatórias na contemporaneidade, vez que,
essas políticas continuam centralizando no âmbito educacional a proposta de superação dos
males desse sistema. A educação apropriada como mercadoria objetiva oferecer mobilidade
social, ao mesmo tempo em que apresenta uma dicotomia extrema entre a educação destinada
a classe trabalhadora e a educação para os filhos da classe mais abastada. Em um sistema que
a educação virou mercadoria é privilégio de poucos desfrutar de uma educação de qualidade,
enquanto a maioria realiza cursos técnicos aligeirados, ou cursos noturnos compatível com
seus horários de trabalho.

A valorização da educação vinculou-se tanto ao fato de tentar inserir o


Brasil, de forma mais competitiva, no mercado internacional, quanto a uma
concepção que estabeleceu uma ligação linear entre desenvolvimento
econômico e educação, de modo que a educação passou a ser apresentada
como o mais importante instrumento de promoção social para as camadas
populares. (SALES, 2012, p.82).

Na contemporaneidade, por exemplo, programas como as diversas modalidades de


projovem28 são destinados a jovens em situação de risco social, de baixa renda, funciona
como um programa assistencialista e de qualificação profissional que “destina-se aos jovens
com idade entre 18 e 24 anos, [...] que apresentem marcas de discriminação étnico-racial, de
gênero e de religião, os quais receberão um auxílio de R$ 100,00, enquanto durar o curso”
(SOUSA et al, 2011, p. 85).
Outra modalidade que objetiva qualificar o trabalhador e formar em nível médio é o
PROEJA, que oferta educação profissional integrada ao ensino médio para jovens e adultos

28
De acordo com Sousa et al (2011, p. 87) “O programa divide-se em PROJOVEM urbano, PROJOVEM
trabalhador, PROJOVEM adolescente e PROJOVEM campo-saberes da terra”.
58

que não tiveram a oportunidade de estudar no turno diurno porque trabalham durante o dia,
esse público está na faixa etária entre 18 a maiores de 25 anos, a maior parte desse público é
composto por trabalhadores que não tiveram acesso ao ensino regular na idade certa. No
CEEP, por exemplo, o PROEJA funciona no turno noturno e foi implantado desde 2009.
Segundo a gestora dessa instituição:

O objetivo do PROEJA é qualificar para o mercado de trabalho, pois esse


público já está alfabetizado, e todos são trabalhadores e pais de família, tem
doméstica, artesão e muitos que trabalham no comércio, a maioria exerce
alguma atividade informal e procuram nesse curso uma possibilidade de
melhorar suas condições de renda e de trabalho. (entrevista realizada em 14
de fevereiro de 2013).

Essa modalidade de Educação Profissional apresenta-se como uma política


compensatória, na tentativa de apresentar ao trabalhador uma alternativa de formação e
qualificação para o mundo do trabalho. Esse curso que funciona no turno diurno se apresenta
ainda mais precarizado, pois o público a que é destinado são trabalhadores que se encontram
no setor informal, e que procuram no curso profissionalizante uma possibilidade de sair da
situação de informalidade quando receberem um diploma, ou mesmo aqueles que trabalham
no setor formal e almejam alcançar um cargo melhor na empresa que trabalha e para isso
necessita qualificar-se, outros advém de uma situação de desemprego e buscam no curso
técnico a entrada para o mercado de trabalho.

O Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a


Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos -
PROEJA é um Programa do Governo Federal criado através do Decreto
Federal N° 5.840/2006, tem como fundamento a integração entre trabalho,
ciência, técnica, tecnologia, humanismo e cultura geral com a finalidade de
contribuir para o enriquecimento científico, cultural, político e profissional
como condições necessárias para o efetivo exercício da cidadania. O
PROEJA objetiva o acesso à Educação Básica da população que se encontra
fora da faixa etária adequada aos cursos regulares e à qualificação
profissional necessária. (CEEP, 2011, p. 5)

Diante dessa perspectiva apresentada pelo CEEP no plano de curso da área de


hospedagem, refletimos que os desafios encontrados na formação do trabalhador perpassa o
contexto social e econômico que envolve a realidade deste, assim é que a Educação
Profissional apresenta o dilema de formar mão de obra para o mercado de trabalho e
promover fundamentação cientifica, humanista, cultural e política. No entanto, no decorrer da
nossa pesquisa observamos que essas categorias são negligenciadas, vez que, os cursos
59

técnicos, e principalmente, o PROEJA encontra diversos limites na formação dos


trabalhadores. Desde a estrutura precária em que ainda se encontram os centros de Educação
Profissional até a perspectiva de uma educação mercantilizada que na prática se distancia da
proposta apresentada no plano de curso, em que pouco se promove a formação cientifica e
integral dos educandos, pois o foco da Educação Profissional é o mercado de trabalho e nesse
sentido a promoção de um currículo amplo exigiria maiores recursos e tempo de formação
desse público.
Assim o PROEJA, enquanto política compensatória, é idealizado para a manutenção
de uma estrutura socioeconômica vigente, e que se distancia de uma política pública efetiva
para a promoção da qualificação/formação e do fim da desigualdade social. O trabalhador
continuará precarizado, mesmo “qualificado”, o problema do emprego/desemprego não se
resolve apenas com políticas de qualificação do trabalhador.
60

4. O CONCEITO DE TRABALHO EM MARX E AS FORMAS DE


APROPRIAÇÃO DO TRABALHO PELO CAPITAL

A aranha realiza operações que lembram o tecelão, e as caixas suspensas que


as abelhas constroem envergonham o trabalho de muitos arquitetos. Mas até
mesmo o pior dos arquitetos difere, de início, da mais hábil das abelhas, pelo
fato de que, antes de fazer uma caixa de madeira, ele já a construiu
mentalmente. No final do processo ele obtém um resultado que já existia em
sua mente antes de ele começar a construir. O arquiteto não só modifica a
forma que lhe foi dada pela natureza, dentro das restrições impostas por ela,
como também realiza um plano que lhe é próprio, definindo os meios e o
caráter da atividade aos quais ele deve subordinar sua vontade. (MARX,
2013)

A citação acima apresenta o trabalho como uma condição humana que difere os
homens dos outros animais, vez que, ao contrário da abelha que realiza sua atividade e não
modifica o curso natural do ambiente, o homem tem a capacidade teleológica de antecipar
mentalmente a sua atividade e interferir no ambiente de forma a modificá-lo, no momento em
que o homem projeta as suas atividades e a executa realmente ele modifica o meio em que
vive e modifica a si mesmo, o que faz do trabalho um elemento indissociável da vida humana.
O trabalho se constitui sob as bases da produção material da existência humana. Desta feita,
compreender a Educação Profissional em Parnaíba nos convida à tentativa de
conceituação/compreensão da categoria trabalho e suas implicações para a constituição da
sociabilidade humana, na perspectiva de que o trabalhador deverá adquirir competências e
qualificar-se para o mundo do trabalhado.
Partindo desse pressuposto, abordar o conceito de trabalho em Marx não é tarefa
fácil, principalmente num capítulo de pesquisa monográfica, vez que, nos exigiria muito mais
tempo e leitura aprofundada de suas obras se quiséssemos analisar essa categoria de forma
mais minuciosa e adentrar na complexidade que envolve as obras de Marx para a
compreensão do trabalho na organização social e da vida humana. No entanto, o que
propomos é compreender o conceito de trabalho em Marx para refletir sobre elementos
históricos que constituem as relações sociais e de produção material da existência do ser
humano, bem como, apresentar o significado do trabalho nas relações superpostas 29 na
contemporaneidade. A pesquisa de campo, portanto, nutriu tal debate vez que apresenta as
contradições do processo de trabalho a partir da proposta de qualificação do trabalhador para

29
Por relações superpostas compreendemos a hierarquização das relações de trabalho e a apropriação do trabalho
pelo capital como uma mercadoria. Nesse sentido o trabalhador encontra-se submetido a relações superpostas
pelos donos dos meios de produção, em um processo de negação do trabalho enquanto condição de emancipação
humana.
61

ser inserido em um mercado de trabalho excludente e com relações hierárquicas, pois o


estudante/trabalhador a ser formado na instituição pesquisada é uma mera força de trabalho a
ser explorada pelo mundo capitalista e reproduzir as estrutura socioeconômica vigente.
O trabalho, na perspectiva marxiana, envolve a produção da materialidade da
existência humana a partir da sua relação com a natureza desde seus primórdios, e perpassa o
desenrolar da história da humanidade e sua construção social. Desde condição ontológica, o
conceito de trabalho em Marx, compreende a totalidade das relações sociais como categoria
fundante do ser social e atividade inerente ao ser humano que o distingue de outros animais,

Atividade útil que busca a apropriação dos produtos da natureza sob uma ou
outra forma, o trabalho é a condição natural da existência humana, a
condição, independente de todas as formas sociais, do intercâmbio da
matéria entre o homem e a natureza. Ao contrário, o trabalho que cria valor
de troca é uma forma de trabalho especificamente social. [...] O legislador
Moisés sabia tão bem como Adam Smith, o inspetor aduaneiro, que o
trabalho é uma fonte de riqueza material (MARX, 2008, p. 62/63).

O trabalho deve constituir-se como fonte de realização humana, vez que, é através
do trabalho que os homens constroem a sua própria história e produzem seus meios de vida,
ou seja, as condições materiais de que necessitam para sobreviver. Para Marx (2013), “o
trabalho é, antes de mais, um processo entre homem e Natureza, um processo em que o
homem medeia, regula e controla a sua troca material com a Natureza através da sua própria
acção”. Nessa perspectiva, portanto, o trabalho deve ser expressão da criatividade e
emancipação humana, pois “o que eles [os homens] são coincide com sua produção, tanto
com o que produzem, como com o modo como produzem” (MARX & ENGELS, 1982, p.
27/28), assim, é que o trabalho se apresenta como condição indissociável da construção da
vida humana e social.
Em nossas análises empíricas percebemos ainda que a proposta de Educação
profissional apresenta-se como uma modalidade de ensino para a construção do sujeito social
a partir do processo de trabalho, consta na Proposta pedagógica da instituição que “o CEP
pretende proporcionar aos jovens e adultos trabalhadores a formação profissional e/ou
atualização profissional de modo a favorecer o desenvolvimento das competências no
exercício das ocupações” (CEEP, 2008). Apresenta-se a juventude parnaibana a possiblidade
de desenvolver competências para o trabalho, e através dessas competências construí sua
sociabilidade e condições materiais de existência.
No entanto, o trabalho na contemporaneidade é para muitos um fardo, difícil e
pesado de ser carregado. Nada semelhante ao trabalho pensado por Marx como fonte de
62

realização humana, natural e inerente ao homem, que deveria proporcionar produção material
para ser socialmente compartilhado. Mas assim, também como já havia estudado Marx
cientificamente, o trabalho apresenta-se dialeticamente apropriado pelas relações sociais e de
produção de cada forma de organização social, vez que o trabalho, expressão da condição
humana, foi historicamente constituído sob as bases produtivas de cada sociedade, conforme
Marx (2008):

Na produção social da própria existência, os homens entram em relações


determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; essas relações de
produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento de suas
forças produtivas materiais. A totalidade dessas relações de produção
constitui a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual
correspondem formas sociais determinadas de consciência. O modo de
produção da vida material condiciona o processo de vida social, política e
intelectual (p. 47).

Na sociedade capitalista, por exemplo, as relações de produção se baseiam nas


forças produtivas que são direcionadas para o desenvolvimento do capital 30, que tem em sua
estrutura econômica e ideológica a produção baseada no lucro, na exploração do homem pelo
homem, e na constituição de uma sociedade que transforma o produto do trabalho humano em
mercadoria rentável. Nessa perspectiva o trabalho é apropriado como uma forma de produzir
riqueza material e mercadorias que possuem valor de troca, em que esse valor de troca se
expressa na quantidade de trabalho despendida para produzir determinada mercadoria. Em
Parnaíba o que presenciamos é que os estudantes que terminam um curso técnico no CEEP
tem sua força de trabalho apropriado pelas relações capitalistas e se submetem a condições de
exploração e precarização do seu ofício.
O trabalhador que realiza esse trabalho, o qual produz riqueza, não poderá se
apropriar da riqueza que ele mesmo produziu, pois troca a sua força de trabalho por salário,
ou seja, o trabalho na lógica capitalista deixa de ser uma atividade vital do ser humano, como
condição de garantia da existência, e passa a ser uma mercadoria, vez que, é apropriado como
mecanismo de desenvolvimento do capital.

O trabalhador fica mais pobre à medida que produz mais riqueza e sua
produção cresce em força e extensão. O trabalhador torna-se uma mercadoria
ainda mais barata à medida que cria mais bens. A desvalorização do mundo
humano aumenta na razão direta do aumento de valor do mundo dos objetos.
O trabalho não cria apenas objetos; ele também se produz a si mesmo e ao
trabalhador como uma mercadoria, e, deveras, na mesma proporção em que

30
Para Marx (2008, p. 267) “O capital é a potência econômica da sociedade burguesa, que domina tudo”.
63

produz bens. Esse fato simplesmente subentende que o objeto produzido


pelo trabalho, o seu produto, agora se lhe opõe como um ser estranho, como
uma força independente do produtor. (MARX, 2013,)

Nessa compreensão o trabalho produz objetos estranhos ao próprio trabalhador, pois


o produto do seu trabalho não corresponde as suas necessidades, mas sim a necessidade do
mercado de obter lucro ao suprir uma demanda socialmente determinada e, ainda assim, o
objeto produzido não pertence ao trabalhador, que muitas vezes não pode possuí-lo porque as
suas condições econômicas não lhe permitem que possua o próprio objeto do seu trabalho.
Em Marx (2013) essa forma de trabalho recebe a denominação de trabalho estranhado ou
alienado, em que “o próprio trabalho transforma-se em um objeto que ele só pode adquirir
com tremendo esforço [...]. A apropriação do objeto aparece como alienação a tal ponto que
quanto mais objetos o trabalhador produz tanto menos pode possuir e tanto mais fica
dominado pelo seu produto, o capital”.
A este respeito o CEEP nos revela que a juventude a ser formada para o mundo do
trabalho deve atender as exigências do mercado e qualificar-se para que possa suprir as
demandas de mão de obra, os jovens estudantes/trabalhadores que fazem um curso no CEEP
não o fazem como deleite, ou porque sonham com a profissão que escolheram, mas sim por
necessidade de garantir suas condições de sobrevivência de acordo com a demanda de
qualificação. Dessa forma é que o público dessa instituição quando indagados se gostariam de
fazer um curso superior não titubeiam em afirmar que quando terminar o curso técnico vão se
preparar para o ENEM, porque querem fazer um curso superior, alguns já até tentaram, mas
não conseguiram passar. Parte desses jovens afirmaram que antes de fazer um curso superior
precisam conseguir um emprego para se manter na faculdade, portanto buscam no CEEP uma
porta para o primeiro emprego.
Isso nos remete aos estudos de Antunes (2005, p. 11) sobre a nova morfologia do
trabalho onde ele argumenta que “com o evolver humano, o trabalho se converteu em
tripaliare – originário de tripalium, instrumento de tortura -, momento de punição e
sofrimento” e para o trabalhador só os poucos momentos que não está trabalhando lhe causa
alguma satisfação ou prazer, somente nos momentos de lazer, onde se encontra distante do
ambiente de trabalho o trabalhador se reconhece enquanto ser humano, assim,

A atividade laboral que poderia ser fonte de realização, se apresenta como


um fardo, um sacrifício, algo de caráter obrigatório que tem a única função
de suprir necessidades orgânicas. Transfere-se para o trabalho toda a
insatisfação gerada pelo gênero humano. Pois há a constatação, em
64

consonância com a teoria marxiana, que o trabalhador não trabalha para si,
direcionado a sua realização. Mas, produz em função de outro, um estranho,
que se apropria da atividade alheia para enriquecimento individual.
(BEZERRA, 2006, p. 259)

O trabalhador para sobreviver, no capitalismo, tem suas necessidades limitadas de


forma que desfruta de pouco ou nenhum acesso a espaços de lazer, sua vida é restrita ao labor
cotidiano e a suprir as necessidades de “comer, beber e procriar, quando muito ainda
habitação e adornos e etc.” (MARX, 2013). Nessa perspectiva não disfruta de uma vida
plenamente humana, pois “a gente não quer só comida, a gente quer comida diversão e arte, a
gente quer saída pra qualquer parte...”(TITÃS, 2013). Ainda assim, a condição de exploração
e estranhamento do trabalhador na sociabilidade do capital, torna o trabalho uma atividade
degradante, que não lhe proporciona um desenvolvimento humano e nem construção do seu
ser social. Portanto, submerso em um trabalho estranhado na lógica capitalista, à atividade
vital de sobrevivência humana – o trabalho – deixa de ser um meio de realização humana e
passa a ser uma forma de alienação do trabalhador. Como, por exemplo, podemos perceber no
relato de um jovem trabalhador ao falar da sua situação de emprego em uma empresa logo
após ter concluído o curso de Restaurante e Bar:

Consegui um emprego nesse restaurante depois que conclui meu curso de


restaurante e bar no CEEP, aqui eu faço um pouco de tudo, faço a limpeza,
fico no caixa, ajudo na limpeza da cozinha. Foi difícil encontrar esse
emprego e eu estava precisando muito trabalhar para me sustentar e ajudar
em casa, ganho um salário mínimo e dá para me virar, mas penso em
melhorar minha situação, vou fazer um curso de garçom e me qualificar
mais, porque o mercado de trabalho exige que a gente seja qualificado.
(Janeiro, 2013)

Outra característica do processo de acumulação de riquezas no decorrer da


organização da sociedade é a divisão do trabalho. Segundo Marx (1982, p. 77) “a maior
divisão entre o trabalho manual e o trabalho intelectual é a separação entre a cidade e o
campo”, vez que essa separação culminou com a divisão da sociedade em classes e com os
modos de produção. Historicamente, a cidade manteve uma posição privilegiada em relação
ao campo devido a divisão social do trabalho, a cidade considerada espaço de disputa
ideológica e de poder determinava as relações de produção no campo. Com o advento da
burguesia a divisão do trabalho se tornou cada vez mais profunda e necessária para a
manutenção da propriedade privada e para o desenvolvimento industrial.
65

Os cursos técnicos, por exemplo, são reflexos dessa divisão do trabalho, pois
preparam um profissional com especificidades técnicas, para executar atividade que são
elaboradas por um profissional que domine a “teoria”, enquanto ao técnico é destinada a
atividade manual que ele deve aprender para ser absorvido pelo mercado de trabalho. Embora,
a carga horária dos cursos técnicos contemplem uma parte do conhecimento geral, ainda
assim é somente o necessário para os estudantes compreenderam a sua técnica. O papel social
do técnico não muda só porque mudou a estrutura curricular, a divisão social do trabalho
permanece para a manutenção da ordem vigente. No CEEP o curso técnico de nível médio em
hospedagem apresenta que o profissional dessa área deverá adquiri competências que:

Promovam a capacitação profissional do aluno com a oferta do curso em


nível técnico médio na área de hospedagem, permitindo o conhecimento
cientifico e técnico, assim desenvolvendo as competências necessárias para o
bom desempenho profissional. E ofereça condições de formação a
profissionais para desenvolver habilidades técnicas e conceituais. Como
atuar na recepção e governança em meios de hospedagem; Executar
atividades operacionais de recepção e atendimento a clientes; Coordenar
serviços de andares; comercialização e marketing de produtos turísticos;
Controlar as reservas; Prestar suporte ao hóspede durante sua estada,
valorizando as características culturais, históricas e ambientais do local de
sua atuação. (CEEP, janeiro 2011)

Conforme Marx (1982):

As diversas fases de desenvolvimento da divisão do trabalho representam


outras tantas formas diferentes da propriedade: ou em outras palavras, cada
nova fase da divisão do trabalho determina igualmente as relações dos
indivíduos entre si, no que se refere ao material, ao instrumento e ao produto
do trabalho. (Marx, 1982, p. 29)

A divisão do trabalho reflete na alienação do trabalhador, é perceptível que a


sociedade contemporânea ainda se baseia nesse modelo de produção, com algumas
adaptações históricas. Assim é que nem mesmo a tentativa de qualificação do trabalhador,
por meio de cursos técnicos e profissionalizantes na modalidade integrada ao ensino médio,
não proporciona a formação humana e muito menos transforma o trabalho estranhado em
trabalho humanizado e vital para o ser humano, vez que o trabalho é à força de produção
necessária para o desenvolvimento do capital, e enquanto tal só pode existir como trabalho
alienado e externo ao próprio trabalhador. Verificamos essa perspectiva em entrevista com o
jovem trabalhador citado anteriormente que concluiu o curso de restaurante e bar no CEEP:
66

Fiz o curso de restaurante e bar durante quatro anos. Logo quando terminei o
curso consegui um emprego nesse restaurante, onde havia feito o meu
estágio. Aqui eu faço um pouco de tudo, de manhã eu ajudo na limpeza, na
hora do almoço que é umas onze horas, eu fico na balança e no caixa e
depois do almoço eu faço a limpeza de novo aqui de fora, e depois ajudo na
limpeza da cozinha. Encerro o meu trabalho umas cinco horas e meu horário
de entrar é às sete da manhã. Ganho um salário mínimo com carteira
assinada. (Janeiro, 2013)

Dessa forma, Antunes (2005, p. 18) analisa que “quanto mais as empresas laboram
na implantação das ‘competências’, da chamada ‘qualificação’, da gestão do conhecimento,
mais intensos parece tornar-se os níveis de degradação do trabalho”. Esse fato nos leva a
compreender que o trabalho se tornou um não-trabalho, vez que, o trabalho não possibilita a
emancipação humana, distancia-se do próprio sujeito do trabalho, que desenvolve uma
atividade meramente mecânica. O processo de qualificação desse sujeito não contribuiu para o
seu desenvolvimento integral, o transformou em um instrumento do trabalho apropriado pela
sociabilidade do capital.
Diante das metamorfoses do capitalismo contemporâneo alguns teóricos tem
apresentado a tese do fim da sociedade do trabalho, em que de acordo com Teixeira (2008)
ressalvadas as diferenças entre eles, todos comungam com a ideia de que o trabalho, hoje, não
é mais a “categoria sociológica central”. Teóricos como Offe, André Gorz e Habermas tem
anunciado essa teoria sob o argumento de que “a luta de classes perdeu sua centralidade” e
que a “exploração, antes um enigma a ser decifrado teoricamente, não só foi reconhecida na
prática, como também passou a fazer parte das políticas estatais de correção dos
desequilíbrios entre capital e trabalho” (Teixeira, 2008, p. 50/51).
Os teóricos do fim da sociedade do trabalho postulam que a teoria marxiana está
superada, que as classes sociais vivem momentos de conciliação dos conflitos e que, portanto,
não faz sentido falar em luta de classes, vez que o trabalho foi substituído por outras formas
de produção, baseada na produção do conhecimento e na ciência. Diante dessa compreensão,
a classes trabalhadora se desarticula em meio às condições de exploração e precarização do
trabalho na sociabilidade do capital, e deixa de lutar por direitos básicos, como melhores
condições de trabalho e um salário digno. A difusão de ideias como essas servem para alienar
a classe trabalhadora que chega a naturalizar as desigualdades sociais e acreditar que o
capitalismo é um sistema que possibilita ascensão social, pois os seus filhos se estudarem
muito podem alcançar um posto de trabalho com status e superar a condição de classe a qual
foi historicamente determinado.
67

Mas esse mesmo filho da classe trabalhadora é que vai para o ensino técnico, ocupar
os postos de trabalho com menos prestigio social e pouca mobilidade. Assim é que só é
possível a classe trabalhadora superar essa condição através do reconhecimento da sua própria
classe e da necessidade de exigir seus direitos. Nesse sentido, devido às condições de trabalho
precarizado, com baixos salários vemos constantes greves de trabalhadores que eclodem no
mundo inteiro, o que fez com que muitos estudiosos, principalmente marxistas, retomassem a
teoria de Marx e comprovaram cientificamente que os teóricos do fim da sociedade do
trabalho estavam equivocados em suas análises, vez que a categoria trabalho apresentada por
Marx no século XIX ainda é central na sociabilidade do capital. Além disso, a condição de
exploração do trabalhador é uma constante no modo de produção capitalista e o trabalho
material ou imaterial ainda é elemento que produz riqueza. De acordo com Antunes (2005)

Podemos afirmar que as teses que defendem o fim da centralidade do


trabalho, como traço constitutivo da chamada “crise da sociedade do
trabalho”, sua substituição pela esfera comunicacional ou da
intersubjetividade encontram seu contraponto quando se parte de uma
concepção abrangente e ampliada de trabalho, que contempla tanto sua
dimensão coletiva quanto subjetiva, tanto na esfera do trabalho produtivo
quanto improdutivo, tanto material quanto imaterial, bem como nas formas
assumidas pela divisão sexual do trabalho, pela nova configuração da classe
trabalhadora, entre os vários elementos aqui apresentados (ANTUNES,
2005, p. 38).

Conforme as considerações de Antunes (2005), e de outros estudos como os de


Teixeira (2008), Mészáros (2006) demostram que nunca se trabalhou tanto quanto nos dias de
hoje, pois cada vez mais estamos expostos a uma lógica de produtividade, consumismo,
competitividade e exploração cada vez mais intensa da força de trabalho. Como falar do fim
da sociedade do trabalho, se é o trabalho vivo ou morto que move as bases produtivas do
capital? Se há milhões de desempregados e despossuídos a procura de um emprego para
sobreviver, pois somente através do trabalho, mesmo apropriado pelo capital, poderão garantir
suas condições mínimas de sobrevivência? Como falar que a teoria marxista está superada, se
a lógica capitalista permanece metamorfoseando-se sob as formas de trabalho precarizado,
part-time31, terceirizado, material ou imaterial.
As análises de Marx mostram a dimensão dialética do trabalho, tanto na perspectiva
de compreender o trabalho como mediador da relação homem natureza, quanto um trabalho
fundante do ser social. Marx nem sempre apresenta o trabalho como algo positivo, ao

31
Trabalho parcial que segundo Antunes (2005) o sistema capitalista necessita cada vez menos de trabalho
estável e cada vez mais de trabalho parcial, ou seja, part – time. Trabalho esse precarizado, terceirizado e que se
encontra em expansão em todo o mundo produtivo e de serviços.
68

contrário, do ponto de vista do capital encontramos em Marx explicitadas situações negativas,


que mostram como o capitalismo se apropriou do trabalho humano e o transformou numa
atividade degradante, de acordo com Antunes (2005, p. 25) “Marx não hesitou em dizer que,
se pudesse o trabalhador fugiria do trabalho, como se foge de uma peste. Marx diferentemente
do que se costuma afirmar, tem uma concepção claramente negativa do trabalho sob o
capital”. No entanto, Marx reconhece o trabalho – responsável pela produção material da
existência - como um elemento indissociável da vida humana.

4.1 A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL COMO MEDIADORA DA DICOTOMIA


ENTRE ENSINO TÉCNICO E PROPEDEUTICO EM PARNAÍBA

A dicotomia entre ensino técnico e propedêutico, historicamente, se constituiu como


um modelo de educação sob as bases de uma sociedade de classes, que se apropria da
educação e reconhece o valor desta enquanto espaço de poder e disputa ideológica.
Intencionalmente, essa dicotomia representa a submissa condição de uma maioria da
população em relação a uma minoria privilegiada, esta última dispunha de um poder
socioeconômico e político na sociedade, enquanto a maioria vive a margem dessa sociedade
elitista e aristocrática, e como a educação é pensada no modelo elitista e aristocrático vigente
às classes pobres só resta uma educação pouco significativa e doutrinaria. Para Ponce (2005,
p.171) como a educação é

Ligada estreitamente à estrutura econômica das classes sociais, a educação


em cada momento histórico, não pode ser outra coisa a não ser um reflexo
necessário e fatal dos interesses e aspirações dessas classes[...]. A educação é
o processo mediante o qual as classes dominantes preparam na mentalidade e
na conduta das crianças as condições fundamentais da sua existência. [...] A
classe que domina materialmente é também a que domina com sua moral, a
sua educação e as suas ideias.

No Brasil, por exemplo, de acordo com Nosella (2002, p. 81) “a dualidade escolar
brasileira – escola secundária/superior para as elites e a primária/profissional para os
trabalhadores – persiste até hoje”. Dessa forma a educação técnica e profissional se constituiu
enquanto modalidade de educação destinada aos filhos da classe trabalhadora e aos
trabalhadores, e historicamente foi elaborada para as pessoas que não tinham oportunidade de
estudar em uma escola regular e necessitavam de uma qualificação para garantir um emprego,
69

em sua maioria marginalizada pela sociedade. Constatamos essa perspectiva ao analisar um


plano de curso durante nossa pesquisa no Centro Estadual de Educação Profissional Ministro
Petrônio Portella – CEEP, em Parnaíba/PI, que de forma a trazer uma compreensão histórica
da educação profissional apresenta a seguinte narrativa:

Existe uma carga de preconceito que historicamente circunda a Educação


profissional, até mesmo as leis orgânicas da década de 40 retratam esse
estereotipo e trazem textualmente que educação profissional é destinada para
os filhos de operário e desvalidos da sorte (CEEP, 2008, p. 4).

Esse texto é apresentado na perspectiva de que o atual modelo de Educação


Profissional deve suplantar essa marginalidade a que foi submetido historicamente o ensino
técnico, vez que deve possibilitar que o estudante dessa modalidade de ensino tenha acesso a
um currículo amplo, com uma área geral, onde tenha acesso ao conhecimento científico e
técnico. No entanto, em nossas investigações percebemos que o fosso entre a escola regular,
mesmo pública, e a escola profissional e técnica, pensada para os filhos da classe
trabalhadora, ainda evidencia uma forte dualidade da escola brasileira, que se torna ainda
maior quando comparada a escola privada.

No reino do capital, a educação é, ela mesma uma mercadoria. Daí a crise do


sistema público de ensino, pressionada pelas demandas do capital e pelo
esmagamento dos cortes de recursos dos orçamentos públicos. Talvez nada
exemplifique melhor o universo restaurado pelo neoliberalismo, em que
“tudo se vende, tudo se compra”, “tudo tem preço”, do que a mercantilização
da educação. (MÉSZÁROS, 2008, p. 16)

Assim, a Educação Profissional se encontra nesse contexto de mercantilização e


apropriação pela sociabilidade do capital como instrumento reprodutor das relações
socioeconômicas, direcionada para a formação do trabalhador. Essa modalidade de ensino que
tem se expandido, contribui para reforçar a dicotomia entre ensino técnico para os filhos da
classe trabalhadora, com uma instrução meramente tecnicista, e a educação propedêutica para
os filhos da classe abastada, com conhecimento geral, cientifico e culturalmente elaborado.
Essa dualidade que permeia a educação gira em torno da construção de uma sociedade de
classes, extremamente excludente e opressora.
Dessa forma, o filho do operário dificilmente conseguirá suplantar sua condição de
operário, pois a instrução que recebe é direcionada para que ele também se torne um operário,
que detém o saber fazer, mas um saber que não pertence a ele próprio, mas sim ao capital.
Pois, de acordo com Ponce (2005, p. 172) assim se expressa “o pensamento da burguesia a
70

respeito da ‘nova educação’: não lançar às massas as flores da cultura, e reservar apenas para
o homem das classes superiores o completo desenvolvimento do espírito”. Assim, ao filho do
dono dos meios de produção, lhe é destinado os meios de produção, e toda a riqueza
socialmente produzida. Além disso, a Educação que lhe é destina faz dele um homem de
cultura e conhecimento amplo, com condições para gerir os processos produtivos e a
acumulação de riquezas.
A Educação Profissional é um reflexo dessas relações socialmente determinadas,
apresenta um caráter de classe que repercute na formação para o trabalho e nas relações de
produção. Marcada pela dicotomia entre ensino técnico e propedêutico esse modelo de ensino
apresenta para a juventude parnaibana a falácia da empregabilidade, se torna atraente ao
jovens pois traz a possibilidade de entrar no mercado de trabalho, e ter um emprego para
sobreviver. Diante de um cenário de desemprego, essa é a educação destinada à juventude e a
outros segmentos da classe trabalhadora que não tiveram acesso à educação na idade certa.
Mesmo que o discurso oficial – nos currículos e propostas pedagógicas das escolas
profissionais – anuncie um novo modelo de escola profissional, baseado na proposta de uma
escola técnica integrada ao ensino médio, à estrutura socioeconômica vigente tende a
direcionar essa modalidade para supri uma mão de obra destinada para os postos mais baixos
e precarizados do mundo do trabalho. Não é por acaso que o estudante que concluiu o curso
de restaurante e bar no CEEP, por exemplo, conseguiu um emprego para executar atividades
como limpeza do estabelecimento (restaurante), ficar no caixa, atender as demandas do local
no que for preciso, por um salário mínimo32.
Analisamos, portanto, que a Educação Profissional está a serviço da manutenção da
sociabilidade do capital e de suas formas de apropriação do trabalho, concomitante a isso é
pensada como uma educação para o povo que se diferencia de uma educação para a classe
abastada. A promoção da Educação Profissional cumpre esse papel, que assim como nos
esclarece Mészáros (2008, p. 82) “a sociedade capitalista resguarda com vigor não apenas seu
sistema de educação, mas simultaneamente também de doutrinação permanente”, o que
significa que a ideologia burguesa impregna a sociabilidade do sujeito social, o qual está
submetido cotidianamente, e naturaliza essa relação como algo que não pode ser modificado.
Nesse sentido, a classe trabalhadora fica feliz quando consegue um emprego, mesmo
precarizado, e mais ainda quando tem a possibilidade de qualificar-se para o mercado, pois
assim, tem a falsa sensação de melhoria social.

32
Esse dado é parte da entrevista cedida por um funcionário de um restaurante em janeiro de 2013, que concluiu
o curso de restaurante e bar no CEEP e logo após conseguiu esse emprego.
71

Pensar em uma escola que humanize e que direcione a instrução de um ofício é o


desafio da escola técnica profissional brasileira atual, no entanto a ideologia burguesa ao
impregnar a Educação Profissional com a sua ideologia a torna cada vez mais especializada e
direcionada para fins mercadológicos, o que intensifica a dualidade da educação e da divisão
de classes. Uma proposta de Educação para as classes populares só pode ser pensada como
possibilidade de superar essa dualidade, se for compreendida na perspectiva gramsciana de
que:

O proletariado precisa de uma escola desinteressada. Uma escola na qual


seja dada a criança a possibilidade de ter uma formação, de tornar-se
homem, de adquirir aqueles critérios gerais que servem para o
desenvolvimento do caráter. Em suma uma escola humanista [...]. Uma
escola que não hipoteque o futuro da criança e não constrinja a sua vontade,
sua inteligência, sua consciência em formação a mover-se por um caminho
cuja meta seja prefixada. Uma escola de liberdade e de livre iniciativa, não
uma escola de escravidão e de orientação mecânica. Também os filhos do
proletariado devem ter diante de si todas as possibilidades, todos os terrenos
livres para poder realizar sua própria individualidade do melhor modo
possível, e por isso, do modo mais produtivo para eles mesmos e para a
coletividade. (GRAMSCI, 2010, p. 66)

A educação do proletariado, para Gramsci, deve possibilitar o desenvolvimento


omnilateral do sujeito, para que este tenha acesso a uma cultura geral, a um conhecimento tão
elaborado quanto o filho da classe dirigente. Só assim poderíamos falar em uma escola
humanista e igualitária, onde se extinguiria a dualidade do pensar versus o fazer, pois uma
educação geral deve partir da práxis onde a relação teoria e prática é indissociável, é pensar
um sujeito pleno que possa desenvolver todas as suas capacidades.
As políticas de Educação Profissional pensada no contexto capitalista não
correspondem a um modelo de educação para superar as desigualdades sociais e nem
ultrapassar a dualidade entre ensino técnico e propedêutico. Ao se articular com a necessidade
de formar mão de obra para o mercado ela se constitui enquanto uma educação como diz
Gramsci (2010) “que hipoteca o futuro da criança” e transfere para o âmbito educacional uma
relação direta entre emprego e qualificação profissional. As escolas profissionais, assim
pensadas, para os filhos da classe trabalhadora, é ainda uma educação para os que necessitam
supri necessidades urgentes de sobrevivência.
Para Mészáros (2008) a condição de mercantilização da educação só pode deixar de
existir através de uma mudança estrutural da sociedade, em que a educação vai deixar de ser
um espaço ideológico da perpetuação da sociedade de mercadorias para possibilitar a
transformação do ser social, vez que “o papel da educação é soberano, tanto para a elaboração
72

de estratégias apropriadas e adequadas para as condições objetivas de reprodução, como para


a automudança consciente dos indivíduos chamados a concretizar a criação de uma ordem
social metabólica radicalmente diferente” (MÉSZÁROS, 2008, p.65). Nesse sentido Mészáros
reconhece a educação como possiblidade de transformação social, não só a educação formal,
mas principalmente em outros espaços de educação, onde os jovens recebem influências e um
olhar crítico e questionador mais estimulante do que na escola, onde se encontra a ideologia
burguesa, mas também a possibilidade de subversão desta.
Retomando a perspectiva Gramsciana compreendemos que a Educação Profissional
deveria possibilitar também a formação geral/integral do sujeito, desde que, como bem disse
esse grande intelectual e militante, a escola profissional não se torne “uma incubadora de
pequenos monstros aridamente instruídos para um oficio. Mesmo através da cultura
profissional é possível fazer que surja da criança o homem, contanto que se trate de cultura
educativa e não só informativa, ou não só prática manual” (GRAMSCI, 2010, p.67). Portanto,
superar a dualidade educacional presente nessa modalidade de ensino significa repensar a
práxis social e suplantar a mercantilização da educação, através de uma mudança estrutural da
sociedade.

4.2 TRABALHO MANUAL X TRABALHO INTELECTUAL: herança de uma sociedade


escravocrata

Nessa perspectiva a qualificação para o mundo do trabalho se confronta com a


problemática da divisão intelectual do trabalho que permeia as relações de poder e de
exploração do homem. Assim, a Educação Profissional ao se constituir diante da dualidade
entre ensino técnico e propedêutico reforça essa divisão do trabalho entre trabalho manual
versus trabalho intelectual. Mas é importante analisar que essa relação foi historicamente
construída, e que o trabalho manual muitas vezes foi considerado impróprio e inadequado
para os homens de bem e de bens, enquanto o trabalho braçal era destinado às classes
subalternas, pois em algumas sociedades esse tipo de trabalho era realizado apenas por
escravos, ou homens que não possuíam propriedade. Nessa perspectiva os estudantes do
CEEP são preparados para o mundo do trabalho para exercer trabalhos de ordem subalterna e
que exige pouco esforço intelectual, advindo das classes menos privilegiadas esses jovens vão
adquirir a técnica necessária para desenvolver trabalhos manuais.
A fonte de riqueza material – o trabalho, como já havia apontado Marx (2008), foi
considerada uma atividade indgna para a nobreza, durante o feudalismo, e até mesmo antes,
73

como na Grécia Antiga, na Roma Antiga. Segundo Ponce (2005, p. 37) “desligados do
trabalho manual e do intercâmbio dos produtos, as classes superiores já eram nessa época
socialmente improdutivas”. Disso decorre o fato de que para os filhos da nobreza era
reservado cultivar o espirito e desenvolver habilidades das artes liberais, podiam frequentar a
escola e aprender sobre arte, música, literatura, ciências, retórica e aprender a arte da guerra,
pois estes eram preparados para assumir os postos de comando da sociedade, ou seja,
assumiam a função de comandar o Estado. Enquanto, o restante do povo devia ser submisso a
essa nobreza e realizavam os trabalhos manuais e mais degradantes. Ainda de acordo com
Ponce (2005) durante a Idade Media a Educação destinada as massas tinha como objetivo a
doutrinação cristã, nas escolas da plebe não se ensinava a ler nem escrever, mas apenas a
tornar as massas dóceis e conformadas.
É a partir da Revolução Burguesa que o trabalho passa a ser considerado digno, pois
proporcionava enriquecimento individual e possibilitava a sociedade burguesa ascensão
social. No entanto, a dualidade entre trabalho manual e trabalho intelectual se intensifica a
medida que as relações de exploração aumentam na consolidação da sociedade capitalista.
Embora o trabalho manual a partir do processo de industrialização, não seja visto como uma
atividade indgna, este continua sendo executado pelas classes sociais pobres e que se
submetem a extensas jornadas de trabalho desumanas. Enquanto a burguesia disfruta da
produção de riqueza gerada através da exploração da força de trabalho dos operários.
A Educação do homem burguês não é a mesma do homem antigo. Diante das
transformações no modo de produção e nas relações de trabalho outro modelo de educação
passa a ser direcionado aos filhos da burguesia emergente. Ponce (2005, p.115b) aponta que
“a educação cavalheiresca já não servia para esse nobre, tampouco eram uteis a dialética e a
teologia ao bom burguês que fretava navios para viagens ao novo mundo”, na educação do
homem burguês dava-se atenção a um conhecimento que fosse útil para a vida terrena e dos
negócios. Dessa forma a educação do homem burguês também diferia da educação das
massas, pois às camadas populares a educação ainda se constituía um espaço de doutrinação
religiosa, sendo espaço também de evangelização dos protestantes a partir da reforma
empreendida por Lutero, que para Ponce (2005) não obstante afirmava que a instrução
constituía uma fonte de riqueza e de poder para a burguesia, no entanto nem de longe pensou
em estender esses benefícios às massas populares, deixando os homens das classes inferiores
excluídos da educação.
Assim, A educação se tornou um fator que contribuiu para difundir a dicotomia entre
trabalho manual e trabalho intelectual, que se fundou sob as bases de uma escola de forte
74

dualidade entre o ensino da técnica e o ensino das artes liberais, e sob as bases de uma
sociedade excludente e escravocrata. Embora na contemporaneidade possamos perceber que
as escolas técnicas sofreram modificações no currículo para adaptar disciplinas de
conhecimento geral, analisamos por exemplo, que no CEEP a escola técnica não supri as
necessidades de formação integral, tampouco se constitui uma escola para as classes
abastadas, pois essa modalidade de ensino é destinada aos filhos da classes trabalhadora. Os
cursos que compõem o currículo da escola direcionam para um mercado de trabalho pouco
atraente na perspectiva da ascensão social, ainda assim o quadro na página 51/52 sobre a
evolução do número de matrículas no CEEP, que mostra o quanto a procura por um curso
técnico cresceu nos últimos seis anos nessa instituição de ensino na cidade de Parnaíba.
Isto nos remete a compreensão de que a qualificação para o mundo do trabalho
através dos cursos técnicos, difundidos pelo discurso oficial, passa por um processo de
exclusão das camadas populares que são submetidas a condições de trabalho precarizado, com
baixa remuneração e destinada aos jovens que tem pouca oportunidade de competir por uma
vaga na universidade. Este cenário aponta para a perspectiva de que ainda não superamos a
dualidade entre trabalho manual versus trabalho intelectual, nem mesmo o desenvolvimento
da tecnologia e da utilização desta em setores que usavam antes a mão de obra do trabalhador
pouco contribuiu para o fim dessa ideologia que separa o homem do fazer do homem do
pensar. O desenvolvimento da tecnologia e a sua utilização no mundo do trabalho intensificou
as condições de exploração do trabalhador e o transformou no escravo da máquina, ainda há
os que operam as máquinas de acordo com o ritmo delas, e os que pensam os processos de
produção e gerenciamento para os operários.
No Brasil, por exemplo, o trabalho manual era uma atividade que deveria ser
exercida exclusivamente pelos escravos, enquanto os senhores de engenho desfrutavam do
ócio e do não-trabalho, pois trabalhar era destinado para aqueles que não possuíam liberdade e
nem dignidade humana, o trabalho braçal era destinado aos espíritos inferiores. Assim o
Brasil se constrói sob as bases de uma sociedade escravocrata e produtiva em contraste com a
improdutividade do homem branco, o trabalho era desprezível para a elite brasileira. É dessa
forma também que irá se difundir o trabalho industrial, onde ocupações degradantes serão
destinadas aos miseráveis e despossuídos, é ainda assim que as escolas profissionalizantes no
Brasil se constituem em espaços para a qualificação de uma mão de obra marginalizada e
subalterna, enquanto as escolas propedêuticas se tornam improdutivas, mas são mais
valorizadas porque são destinadas aos filhos das classes mais abastadas. De acordo com
Nosella:
75

A instituição escolar, obviamente, reflete o quadro produtivo nacional. Um


industrialismo tardio e inorgânico, a periferia urbana, a miséria, o arcaísmo
agrícola, o parasitismo produziam o assistencialismo educacional que é a
nossa grande ideologia pedagógica, pois fetichiza miséria fazendo-nos
esquecer a pergunta de Marx: “Quem educa o educador?” ou seja,
acostumados com a miséria, acabamos por legitimá-la, esquecendo que é o
trabalho o principio pedagógico geral, e que o nosso educador em última
instância é a forma produtiva. O assistencialismo nos faz esquecer que é
justamente o trabalho que deve ser educado no Brasil. (2005, p. 138)

A escola da técnica foi implantada no Brasil a partir do processo de industrialização,


pois surge a necessidade de formar uma mão de obra especializada para a indústria, no
entanto, como o Brasil não tinha uma tradição industrial e nem de preparação dos jovens para
o mercado de trabalho, essas escolas vão se tornando espaços inóspitos de preparação de uma
força de trabalho rude, sem formação geral, apenas destinada a desenvolver a técnica, daí a
dualidade e a não atratividade da escola profissionalizante para os filhos da elite brasileira.
Nosella (2005, p.138) infere que “o estigma do trabalho escravo deve ser exorcizado por
intermédio de uma catarse educativa.[...] o trabalho escravo, antigo educador, deve passar a
ser educado na nova escola da liberdade industrial”. Mas partindo das considerações de
Nosella (2005) nos indagamos sobre que tipo de trabalho e de trabalhador essa liberdade
industrial tem produzido na sociedade atual?
Retomamos ao contexto do CEEP que nos traz elementos importantes nesse sentido,
pois o CEEP é uma escola técnica de nível médio que passou por reformas para se adaptar ao
mundo do trabalho, tendo passado pela reforma de 1997 que instituía o Decreto 2.208/1997,
em que as escolas técnicas deveriam ofertar ensino técnico separado do ensino médio, o que
segundo Oliveira (2005) causou diversas polêmicas entre os educadores e pesquisadores da
escola profissional, e culminou com a revogação desse Decreto em 2004 durante o “Fórum
Internacional de Educação Tecnológica”, momento esse que instituiu o Decreto 5.154/2004,
onde fica estabelecido no Art. 4o que “a educação profissional técnica de nível médio, nos
termos dispostos no § 2o do art. 36, art. 40 e parágrafo único do art. 41 da Lei no 9.394, de
1996, será desenvolvida de forma articulada com o ensino médio” (BRASIL, 2013)
Assim o CEEP se torna uma escola técnica integrada ao ensino médio para
possibilitar ao filho da classe trabalhadora que concluísse o ensino médio e concomitante
estivesse preparado para o mundo do trabalho. Conforme Oliveira (2005):

Dessa maneira no novo decreto foram mantidas tanto as bases da educação


produtivista, quanto às bases de uma educação que pretende superar esse
viés, buscando minimante desenvolver ao trabalhador o saber que lhe fora
76

parcelarizado pela organização taylorista/fordista do trabalho. Essa tendência


de acomodar duas perspectivas distintas no mesmo espirito constitui um
passo à frente e dois para trás na história da educação profissional brasileira.
(OLIVEIRA, 2005, p. 94/95)

De acordo com essa reforma o CEEP deve promover como consta, por exemplo, no
plano de curso técnico de nível médio em hospedagem (CEEP, 2011) “a capacitação
profissional do aluno com a oferta do curso em nível técnico médio na área de hospedagem,
permitindo o conhecimento cientifico e técnico”, assim desenvolvendo as competências
necessárias para o bom desempenho profissional, e ao mesmo tempo adquirir o conhecimento
geral do ensino médio para prestar um concurso de vestibular. No entanto, analisamos que os
jovens que concluem um curso técnico no CEEP querem entrar mais cedo no mercado de
trabalho e ficam em postos de trabalho mais precarizados, a maioria desses jovens não
conseguem entrar na universidade, pois o tempo de estudo fica cada vez mais reduzido, tendo
que trabalhar para garantir o próprio sustento fica difícil conciliar a extensa jornada de estudo
e trabalho.
A Educação Profissional se constitui em uma modalidade de ensino que tem em sua
origem a marca de uma sociedade escravocrata, a formação do sujeito necessária ao
desenvolvimento das forças produtivas se confronta com um modelo social excludente e
elitista. A divisão entre trabalho manual X trabalho intelectual é um estigma que ainda
permeia a realidade da educação brasileira/piauiense/parnaibana. Considerar que a educação
deve ser um processo de formação para a emancipação humana é pensar em uma relação do
sujeito com o mundo do trabalho no sentido gramsciano de que “não existe atividade humana
da qual se possa excluir absolutamente alguma participação intelectual. Não é possível separar
o homo faber do homo sapiens” (Gramsci, 2010, p. 21). Partindo desse ponto, a divisão do
trabalho é uma forma de desumanização das ações humanas, portanto, uma educação que
divide o homem entre homens do pensar e homens do fazer é uma forma de deseducação, pois
ainda de acordo com Gramsci (2010) todos os homens são intelectuais, porém nem todos
exercem a função de intelectuais na sociedade.
77

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante o processo que culminou com estas análises e reflexões, dialogamos com
dados empíricos e fundamentação teórica para a compreensão das relações que perpassam o
processo educativo na instituição pesquisada, bem como, o contexto social, econômico e
político que influenciam a perspectiva da Educação Profissional. As considerações aqui
apresentadas se referem às reflexões/discussões ao longo da nossa pesquisa, mas
reconhecemos que nem todas as problemáticas levantadas têm respostas ao longo deste
escrito, pois as questões levantadas se remetem a uma realidade que constantemente nos leva
a outras indagações, que merecem uma investigação mais acurada para outro momento. Desta
feita, registramos de forma humilde e franca as percepções e análises da temática em debate.
Contudo, nos propomos fazer considerações sobre as contradições apresentadas na
proposta da Educação Profissional e responder algumas perguntas levantadas na investigação
da temática. Para tanto, a partir das discussões apresentadas podemos inferir, no que concerne
a primeira parte dessa pesquisa sobre a formação da juventude parnaibana e o mercado de
trabalho, que este segmento social recebe uma qualificação para o mundo do trabalho que
negligencia a perspectiva omnilateral, pois não considera o sujeito a ser formado como um
sujeito integral que deve desenvolver as suas potencialidades como indivíduo completo. Na
proposta da Educação Profissional a formação deve ser direcionada para o mercado de
trabalho e os jovens são considerados potencial força de trabalho a ser formada, portanto, essa
modalidade de educação destina-se a grande parcela da juventude da classe trabalhadora.
Diante disso, as reformas empreendidas na Educação Profissional que tinham como
objetivo repensar as práticas de Educação Profissional, modificando o currículo e a proposta
de ensino que passou a ser apresentada como modalidade de ensino integrada ao Ensino
Médio, não trouxe mudanças efetivas para a consolidação de uma Educação Profissional que
apontasse para uma perspectiva de formação integral. Ainda que a Educação Profissional
tenha sido pensada para a formação do trabalhador a partir de competências, e com uma
proposta de formação geral/integral, no entanto, a partir dos sujeitos investigados pudemos
analisar que essa formação distancia-se da possibilidade de formação integral, vez que, a
Educação Profissional se constitui em uma modalidade de ensino destinada a preparar o
jovem para o mercado de trabalho, tão competitivo e excludente quanto desumano, portanto,
com uma formação unilateral e linear.
78

A juventude que encontramos no CEEP tem suas especificidades, se constitui de


sujeitos históricos e socialmente marcados por um conjunto de representações político,
econômico e social que reflete em suas trajetórias de vida. São jovens da classe trabalhadora
que envolvidos na falácia da empregabilidade veem na Educação Profissional a oportunidade
de entrar no mercado de trabalho e uma possiblidade de mobilidade social. Mas ao
verificarmos os dados de emprego apresentados pela OIT em âmbito mundial e pelo
Ministério do Trabalho em Parnaíba e no Piauí e a relação com a remuneração recebida por
uma parcela da juventude os dados são desanimadores para esse segmento social. Pois os
empregos destinados a essa juventude são precários e com baixa remuneração, os parcos
empregos não oferecem melhoria nas condições de vida dessa juventude que se prepara para o
mercado de trabalho.
Diante dessa crise de (des)emprego na sociabilidade do capital concluímos que a
partir das metamorfoses do capitalismo contemporâneo e das contradições desse sistema
como o modelo socioeconômico vigente influencia ideologicamente as políticas públicas de
Educação Profissional, vez que, essa modalidade de ensino tem como objetivo formar mão de
obra para o mercado de trabalho. Nesse sentido, as políticas de Educação profissional se
baseiam na proposta de promover desenvolvimento social e econômico e contribuir para a
qualificação do trabalhador como uma resposta às transformações do mercado e da produção.
No entanto, enquanto os nossos governantes apostam na Educação Profissional como
uma tática para salvar o país, vivemos em uma sociedade do (des)emprego, com parcela da
população em busca de cursos e treinamentos aligeirados para se inserir no mercado de
trabalho, e outra parcela da população desempregada e sem perspectiva de emprego ou em
condições de emprego informal, precarizado, part-time. Inclui-se nesse meio a juventude que
vive um momento de descoberta de si e do mundo, e a busca incessante por autonomia e
reconhecimento social e econômico. É nesse momento que ainda nos fica como indagação se
a proposta da educação profissional observada atende, efetivamente, a demanda do mercado
de trabalho parnaibano? Ou se, há possibilidade real de inserção/emprego da juventude
parnaibana?
O trabalho trona-se, portanto, uma categoria importante para a análise da temática a
partir das contradições geradas pelo capital, vez que a Educação Profissional propõe qualificar
uma mão de obra para o mundo do trabalho. Foi possível apreender dessa investigação, em
confluência com a teoria marxiana, que o trabalho na sociabilidade do capital constitui ao
mesmo tempo uma forma de construção social e negação do homem enquanto gênero
humano, pois as relações de trabalho apropriadas pelo capital desumaniza a própria atividade
79

humana como havia postulado Marx no século XIX. A realidade apresentada pelos jovens
trabalhadores em Parnaíba nos trouxe compreensões valiosas nesse sentido, e durante
entrevista realizada com jovens que conseguiram entrar no mercado de trabalho observamos
exemplos de apropriação da força de trabalho desses sujeitos e o nível de precarização do
trabalho destinado a esse público.
Considerando as características da Educação profissional e o perfil socioeconômico
da juventude que estuda no CEEP, constatamos que essa modalidade de ensino carrega ainda
o estigma da dualidade entre ensino técnico e propedêutico, baseado nas relações de classe
predominantes na sociabilidade do capital. Desta feita, refletimos que a educação é um espaço
de dominação e reprodução das relações sociais e econômicas, a Educação Profissional nesse
contexto contribui para intensificar essa dualidade quando tenta fazer uma mediação entre
ensino técnico e educação integral. A escola pública, destinada às camadas populares, serve
como espaço de doutrinação das massas enquanto a escola dos filhos da classe dominante
proporciona maior acesso a uma cultura ampla, essa dualidade se intensifica em relação ao
ensino técnico.
Esse modelo de Educação marcado por uma dicotomia entre ensino técnico e
propedêutico repercute, portanto, no modelo de organização do trabalho na sociedade
contemporânea, vez que contribui para a divisão entre trabalho manual x trabalho intelectual.
A partir da compreensão histórica das relações de trabalho e das análises empíricas no campo
da pesquisa, concluímos que a Educação Profissional em Parnaíba é marcada por um caráter
de classes e pensada em uma perspectiva mercadológica, que se apropria da educação
enquanto instrumento de reprodução das desigualdades sociais e das relações de poder na
sociedade. Contudo, apontamos a partir de autores como Mészaros (2008), Gramsci (2010),
Nosella (2005) dentre outros, que há possibilidades de superação dessa proposta de ensino,
mas para isso a educação deve ser um instrumento de formação omnilateral baseada numa
práxis transformadora e de humanização.
Durante a investigação no campo da pesquisa nos deparamos com diversas situações
que nos trazem à reflexão o quanto a Educação brasileira/piauiense/parnaibana experiencia
situações de precarização e, constantemente, sustenta através da ideologia dominante a
exclusão e a desigualdade social. Nos deparamos, com a precarização da própria estrutura
física da instituição, a Educação Profissional, assim como o ensino superior, se tornou uma
modalidade para o discurso da expansão e democratização da educação para o povo, no
entanto, surge nesse processo de investigação indagações pertinentes sobre a que preço temos
essa “democratização” e expansão da educação brasileira? Mesmo que não tenhamos nos
80

debruçado sobre essa questão específica, ao longo das nossas análises é possível perceber as
incoerências entre o discurso oficial que veicula um modelo de Educação Profissional pautada
no desenvolvimento social e o distanciamento desse discurso à prática cotidiana.
Através dessas problemáticas, às que surgiram ao longo desse estudo e as que não
conseguimos responder, é perceptível que a investigação da temática ainda traz grandes
desafios e não se esgota no momento dessas considerações, vez que os sujeitos que fazem
parte da realidade pesquisada e o próprio campo da pesquisa apresentam complexidades e
contradições que merecem atenção para pesquisas posteriores. Ao considerarmos ainda, que
no âmbito de Parnaíba/PI a Educação Profissional tem sido pouco pesquisada na academia
esperamos que este estudo contribua para que surjam outras pesquisas e indagações a respeito
desse campo.
Durante o tempo da pesquisa experenciamos, em diversos momentos, observações e
nos aproximamos dos sujeitos que fazem parte da realidade investigada, nesse meio
encontramos a juventude, segmento social que constitui uma das nossas categorias de análise,
vez que a Educação Profissional vem sendo elaborada para os jovens da classe trabalhadora e
pensada como potencial força de trabalho para o mercado. No entanto, diante dessa juventude
que encontramos no CEEP gostaríamos de registrar o quanto esses sujeitos são constituídos
de humanidade e da capacidade de superar, mesmo que momentaneamente, a condição de
homens máquina, a que são submetidos na sociabilidade do capital. Os estudantes dessa
instituição de ensino são seres humanos, dotados da capacidade de sonhar e de acreditar em
um mundo melhor.
Nos corredores do CEEP os aprendizes do mundo do trabalho transitam e constroem
a sua história, que mesmo em meio às desigualdades sociais e as condições precárias da
instituição são capazes de sonhar com uma vida digna e humanamente desejável. Os sonhos
que pulsam nestes jovens nos trazem a esperança de que é possível suplantar a coisificação
das relações humanas e pensar em outra realidade social. Percebemos através desses sujeitos
que são feitos de sonhos, encontros, desencontros, esperanças e desejos que são acometidos
por uma certa apatia, impelidos a se comportar de acordo com a ordem, mas nos seus olhos
insurge, de quando em quando, a vontade de gritar e assim como o poema de Drummond
(2013) esses jovens querem nos dizer que:

As coisas talvez melhorem. São tão fortes as coisas. Mas eu não sou as
coisas e me revolto, tenho palavras em mim buscando canal, são roucas e
duras, irritadas, enérgicas, comprimidas a tanto tempo, perderam o sentido,
apenas querem explodir. [...] há soluções, há balsámos para cada hora e dor.
81

É em meio a esse contexto, que encontramos a necessidade de compreender as


relações que permeiam a condição material de existência desses sujeitos. Durante os
encontros nesta instituição percebemos que havia uma movimentação dos estudantes para se
organizar em um grêmio estudantil, e mesmo que essa percepção pareça distante das análises
da Educação Profissional, é importante ressaltar que esses jovens estão em busca de
demonstrar que precisam ser ouvidos e que são sujeitos históricos e sociais em busca de
espaço. Essa é então a forma que encontram para dizer que a realidade que o capital projetou
para eles não é de fato o mundo com o qual sonham e querem viver.
No que se refere aos professores que trabalham no CEEP, são graduados,
especialista, mestres. A maioria tem dois ou mais empregos, além do CEEP ministram aulas
em outras escolas, ou trabalham na sua área de atuação, principalmente os professores das
áreas técnicas, como no caso de uma enfermeira que ministra disciplinas no curso técnico de
enfermagem e trabalha no hospital. Os professores têm condições de trabalho precárias, tendo
que se dividir em uma extensa jornada de trabalho de três turnos diários, a maioria dos
professores são substitutos e foi difícil encontrar um professor que tivesse tempo para dar uma
entrevista ou responder um questionário, pois normalmente, os professores estavam correndo
pelos corredores se dividindo entre uma e outra sala de aula para ministrar suas aulas, e não
podiam perder tempo.
O mesmo acontecia com a gestão da escola, que sempre tinha muito trabalho
acumulado, no entanto foi mais fácil o contato com a gestora e sempre que possível ela nos
forneceu informações valiosas sobre a instituição e nos viabilizou o acesso aos documentos
para a pesquisa. Contudo, difícil mesmo foi o contato com a secretaria da escola, estavam
sempre muito ocupados e nunca podiam disponibilizar os dados. Quando muito, prometiam
procurar os dados e tivemos muitas idas e vindas para conseguir números de matrículas e de
professores.
Registramos diante dessa realidade, a dificuldade em encontrar material escrito sobre
a temática da Educação Profissional em Parnaíba e dados sobre emprego e desemprego da
juventude nessa cidade. O pouco material que encontramos foi disponibilizado pelo
Ministério do Trabalho, tivemos muita dificuldade em encontrar dados sobre emprego e
desemprego, até mesmo no IBGE estes dados não são claros quanto a faixa etária e o nível de
empregabilidade nesta cidade.
O CEEP é uma instituição que nos traz uma compreensão de como a Educação
Profissional vem sendo articulada em Parnaíba, pensar em uma modalidade de ensino técnico
muitas vezes nos remete ao mercado de trabalho, mas não podemos deixar de pensar no CEEP
82

como uma instituição de ensino para a formação humana, pensar a educação como um espaço
de humanização e construção de uma práxis transformadora. Se por um lado a
institucionalização da educação serve como forma de reprodução das relações capitalistas e
das desigualdades sociais pautada nessa sociabilidade, por outro devemos pensar na educação
e nos espaços institucionais como uma possibilidade de subverter essa ordem e através desses
espaços, construir elos de subversão das condições de exploração e precarização a que
estamos submetidos na lógica produtora de mercadoria.
Perceber todas essas relações e contradições apresentadas neste estudo, foi possível
através do materialismo histórico e dialético, que possibilitou analisar a realidade e os
elementos que a constitui na sua totalidade. Mas ressaltamos que a partir de uma perspectiva
dialética para a compreensão dos fatos também causou angústias e tivemos que percorrer um
longo caminho, vez que a dialética em Marx nos mostra que devemos aprender “o conjunto
das conexões internas das coisas, de seus aspectos, o desenvolvimento e o movimento das
coisas” (GADOTTI, 1997, p. 33). Considerar a realidade enquanto processo dialético é
compreender que as relações sociais e o mundo que nos cerca é um processo, é um constante
devir.
O materialismo histórico e dialético, formulado por Marx e Engels é mais que um
método, se configura principalmente como um modelo para a construção de uma práxis
transformadora. Com isso o que nos tocou ao longo da pesquisa, ao nos apropriar do
materialismo histórico dialético para a investigação da temática, portanto, foi a complexidade
das relações que envolvem os sujeitos investigados, o quanto se constituem enquanto sujeitos
de sonhos e perspectivas, para além da mera percepção dos fatos e das coisas que os cercam.
Buscamos nos sujeitos o olhar questionador e inquietante do desconforto que as condições
desumanas do capital produzem nessas pessoas, por traz de destroços e escombros foi
possível ainda encontrar sonhos e esperanças. Assim como nos ensina Guevara (2013) “sonha
e serás livre de espírito, luta e será livre na vida”
Por ora concluímos nossas análises, e ao longo da pesquisa procuramos nos apropriar
das relações dos sujeitos históricos que constroem sua sociabilidade pautados na busca por
condições de sobrevivência, nem sempre possíveis, dadas as relações de exploração, exclusão
e desumanização do capitalismo. Assim como nos esclarece Marx (1997, p.21) de que “os
homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem, não a fazem sob
circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas que se defrontam diretamente, legadas e
transmitidas pelo passado”. Desta feita, é que os sujeitos que fazem a sua própria história,
83

contribuíram para a realização desse e estudo e vivenciam, cotidianamente, as formas de


exploração e precarização do mundo do trabalho na sociabilidade do capital.
84

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