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1. Introdução
ROTEIRO DE ESTUDOS
5. Inovações legislativas
SUMÁRIO
Arbitragem, conciliação e mediação – opções valiosas para a solução de controvérsias; ou, como
usualmente se denominava: meios alternativos de solução de conflitos.1
Pesquisas recentes promovidas pelo Conselho Nacional de Justiça demonstram, por exemplo,
uma “Taxa de Congestionamento” de 71%;2 ainda, registram a estimativa do valor médio de cada
processo na Justiça Comum é de R$ 1.848,00 por processo julgado, mas pode chegar a R$ 6.839,00
(no Amapá e em São Paulo o custo médio é R$ 1.126,00).3 E tudo sem falar no extraordinário
número de processos em andamento. Por exemplo, na Justiça Estadual de São Paulo, supera-se 20
milhões de feitos,4 e no Brasil, entre todas as esferas (Federal, Estadual, Distrital), estima-se
aproximadamente 100 milhões de ações em curso.5
Certo é que, especialmente no âmbito Federal, o maior número de processos envolve o próprio
Poder Público (Governo Federal, Autarquias etc.), porém, o impacto deste congestionamento é
sentido por toda sociedade.
Neste ambiente, e exatamente nesta linha de perspectiva, voltamos agora a nossa atenção ao
que há muito já existe – alternativas adequadas de solução de conflitos –, mas ainda encontra um
campo fértil a ser explorado. E dentre os meios apropriados disponíveis, o maior foco deste
“Curso” será para a mediação e a arbitragem.
Aliás, tamanha a evidência destes dois instrumentos privados de resolução de disputas que
recentemente houve a revisão e reforma da Lei de Arbitragem (Lei 13.129 de 26.05.2015), após
ampliado debate na comunidade jurídica, e o Marco Legal da Mediação (Lei 13.140, de 26.06.2015),
acima referido.
Diante de todas estas recentes leis, já se promove o desenvolvimento deste “Curso” a sua mais
detalhada análise. Ainda, com o objetivo de facilitar o conhecimento e verificação das inovações,
apresenta-se como “Anexo” um Capítulo específico no qual, além da Lei de Arbitragem já
consolidada, da Lei de Mediação, e de outras leis pertinentes ao tema, também se oferece
comentários pontuais sobre a reforma da Lei de Arbitragem, e a transcrição dos artigos do Código
de Processo Civil de 2015 relacionados direta ou indiretamente à arbitragem, à mediação e à
conciliação.
A seu turno, não apenas no espaço acadêmico, mas também na prática, estes dois institutos
estão em destaque, sendo, como se verá, expressivo o aumento de sua utilização.
Mediação, como um instrumento eficaz para alcançar a solução dos conflitos, e não apenas do
processo, através da busca pelo reequilíbrio e harmonia entre as partes envolvidas, não pela
imposição de uma vitória de um em desfavor do outro. Na feliz expressão da Min. Fátima Nancy: é
a “justiça doce”.7
Na verdade, quer nos parecer que as pessoas, de um modo geral, perderam a capacidade de
superar as suas adversidades, acomodando-se na entrega de seus litígios para serem resolvidos
por um terceiro: a cultura do litígio, bem presente na sociedade contemporânea.
Mas pela mediação pretende-se resgatar exatamente a aptidão pessoal dos protagonistas de
uma divergência, para, através da adequada comunicação, com esforços comuns, se encontrar a
melhor forma de restabelecimento do equilíbrio na relação.
Sua intimidade com a conciliação e negociação, sua utilização nas diversas áreas do Direito,8
inclusive Penal – Justiça restaurativa,9 técnicas de aplicação, interdisciplinaridade, e experiências
em órgãos privados e públicos, além do Judiciário, são temas sempre à procura do novo; onde se
aproveita o amplo conhecimento já existente, sem se deixar saciar, vislumbrados sempre novos
horizontes desta ciência.
E lembra Fernanda Levy: “A mediação sugere uma mudança de paradigma, uma nova maneira
de interação nos conflitos interpessoais. Traz à tona o desejo das pessoas em resolver seus
próprios conflitos e realizar suas próprias escolhas. Propõe a autodeterminação e autonomia dos
mediados. Incentiva o olhar para um planejamento do futuro, que se pretende tranquilo e
promissor, deixando as mágoas e os rancores no passado”.10
Apontando a relevância e sua perspectiva promissora, e das diversas iniciativas de prestígio aos
meios autocompositivos, anote-se a concentração de esforços no desenvolvimento e fortalecimento
da cultura da pacificação através do movimento intitulado Pacto de Mediação, lançado em 11 de
novembro de 2014 pelo Centro e Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP/FIESP)
para consolidação das soluções consensuais de conflito especialmente no mundo empresarial.
Como referido na apresentação deste “Curso”, este Pacto de Mediação, firmado entre algumas
Instituições de Ensino,11 e diversas Entidades representativas de categorias econômicas da
indústria, comércio, prestação de serviços etc., cria o compromisso de os signatários incentivarem
a prática destes mecanismos amistosos de gestão de disputas, de maneira colaborativa e
integrativa.
Arbitragem: tão antiga quanto a própria humanidade. Nomear-se terceiro para solucionar
conflitos.12
Aliás, tem-se notícia de arbitragem até na Mitologia grega, quando Zeus nomeou um árbitro
para decidir qual das Deusas mereceria o “pomo de ouro da mais bela”; veja-se a passagem da
Ilíada:
(...) e deixou à mesa um pomo de ouro com a inscrição ‘à mais bela’. As deusas Hera, Atena e
Afrodite disputaram o pomo e o título de mais bela. Para não arranjar confusão entre os deuses,
Zeus então ordenou que o príncipe troiano Páris, na época sendo criado como um pastor ali perto,
resolvesse a disputa. Para ganhar o título de ‘mais bela’, Atena ofereceu a Páris poder na batalha e
sabedoria, Hera riqueza e poder e Afrodite o amor da mulher mais bela do mundo. Páris deu o
pomo a Afrodite, ganhando assim sua proteção, porém atraindo o ódio das outras duas deusas
contra si e contra Troia.
Com origem remota, o instituto ficou adormecido durante tempos, e mesmo agora, no Mundo
Moderno encontra-se em amadurecimento, desfrutando no Brasil de sua sadia e prospectiva
adolescência.
Sadia a experiência internacional, com frutíferos resultados, aliados aos dissabores pela
vagarosa máquina do Judiciário, esta técnica de solução de conflitos passou a ser atraente para
grandes questões jurídicas de natureza privada. Além disso, a arbitragem apresenta-se como um
foro neutro para disputas internacionais.
Pela só previsão na Legislação Civil a arbitragem já se permitia (art. 851, CC/2002;13 arts. 1.037 a
1.048, CC/1916), mas veio em boa hora a Lei 9.307/1996 com proveitosa regulamentação da
matéria.
A partir de então, a arbitragem nacional passou a ser difundida em nossa realidade jurídica.
Mesmo que por questões culturais ainda se mostre reservada a sociedade com relação a este
Instituto, o Brasil ocupou a liderança na utilização da arbitragem entre os países latino-
americanos, situando-se em quarto lugar no ranking mundial, segundo dados da Câmara de
Comércio Internacional.14
Advirta-se, porém, que esse desenvolvimento interno, para questões de menor impacto
econômico, exige atenção redobrada, de maneira a se evitar desvios na utilização do instituto e,
por conseguinte, sua desvalorização.
Saltam aos olhos os proveitosos avanços em tempos recentes: crescente número de instituições
arbitrais independentes ou vinculadas a respeitadas entidades empresariais, lançamento pela
Ordem dos Advogados do Brasil, através das seccionais do Distrito Federal e de Goiânia de
campanha de divulgação (Arbitragem: a escolha é sua),15 e publicação também pela Ordem dos
Advogados do Brasil, através do Coprema (Colégio de Presidentes das Comissões de Mediação e
Arbitragem das Seccionais e Entidades Nacionais) e da Comissão Especial de Mediação, Conciliação
e Arbitragem do Conselho Federal, em parceria com a CACB (Confederação das Associações
Comerciais e Empresariais do Brasil) do “Manual de Arbitragem Para Advogados”, além de vários
eventos, cursos, palestras, congressos etc., fomentando o debate e disseminação do Instituto.
Célere, pois há previsão na Lei para julgamento em seis meses, se outro prazo não for
convencionado pelos interessados (art. 23, Lei 9.307/1996),16 embora em litígios mais complexos,
por iniciativa das partes, seja usual uma arbitragem mais prolongada para se adequar às
exigências do caso concreto. Mas estancando de vez o risco de se eternizar o procedimento,
sempre haverá necessidade de se estabelecer o prazo para seu término. E mais, no sistema
arbitral, como regra, não há previsão de recursos; a decisão é final em uma única instância (por
árbitro singular ou por colegiado). Só por este detalhe, evidentemente, já se tem por reduzido
substancialmente o prazo final de solução da controvérsia. Eficaz, pois rotineiramente as
sentenças arbitrais são espontaneamente cumpridas.
Por fim, facultado às partes a escolha de instituições arbitrais, e até mesmo, conforme as
circunstâncias, a indicação de árbitros, naturalmente podem ser buscados aqueles que melhor
conhecimento têm em determinadas matérias.
Assim, por exemplo, para conflitos entre advogados sócios de uma banca de advocacia, nada
melhor, por certo, que a solução seja através de uma Câmara Arbitral existente junto à Ordem dos
Advogados, oferecida nas Seccionais de São Paulo e do Rio de Janeiro, na qual, inclusive, a
privacidade das relações internas do escritório bem como da relação com os próprios clientes é
preservada.
Enfim, a arbitragem representa, sem dúvida, um excelente instrumento à disposição das partes
para resolverem seus conflitos.
Deixada de lado a imposição da vontade pela força (autotutela ou autodefesa – a “lei do mais
forte”),20 e afastado o entendimento (autocomposição), a solução do conflito é entregue ao terceiro
por provocação do interessado, para harmonização das relações sociais intersubjetivas
(heterocomposição).21
E assim aparece a figura de um julgador que poderá integrar a estrutura estatal (Poder
Judiciário), ou ser independente do Estado – o árbitro indicado pelas partes, direta ou
indiretamente.
Já insinuada a sua utilização entre os Deuses do Olimpo,22 na antiguidade, cerca de 3.000 anos
antes de Cristo, a arbitragem é citada no direito grego tanto para a solução de controvérsias entre
cidades-Estado (ligas enfitônicas),23 como para conflitos privados.24
Os gregos tinham à sua disposição, então, os diaitetai, que eram os árbitros públicos para
litígios privados.25 E como registra Guido Soares, “os ‘juízes arbitrais’ eram escolhidos pelas partes
e poderiam ser tanto um rei, um magistrado, um homem público qualquer; por vezes aparecem
instituições religiosas como o Conselho Anfictiônico ou o Oráculo de Delfos”. Em seguida, adianta
que a “sentença arbitral, gravada em muros de templos, em estelas ou no sopé de estátuas, razões
por que há abundantes informações sobre a prática da arbitragem intermunicipal na Grécia
antiga”.26 O “cidadão idôneo” dos Gregos, ou uma autoridade religiosa (estes especialmente para
pessoas próximas) era preferencialmente investido de poderes para solucionar controvérsias.
A esse respeito, acrescenta Carmona: “Cada parte pagava uma taxa ao árbitro, e este, se não
conseguisse conciliá-las, pronunciava a sua sentença, solenizada por um juramento”.27
Já na Idade Média, “em várias partes da Europa Medieval, decretos locais atribuíam aos bispos
o conhecimento de causas que versassem sobre conflitos entre parentes em matéria de partilha ou
de tutela, alargando o âmbito do decreto justinianeu que lhes atribuía competência arbitral
obrigatória em questões entre clérigos e leigos”.31
Com a estrutura jurisdicional oferecida pelo Estado em descrédito, inclusive pelo precário e
inadequado sistema normativo de então, a arbitragem teve espaço como útil instrumento à
solução de diversos conflitos.32
Dentre inúmeros casos, mas para ficar próximo de nossa realidade, basta lembrar de que a
arbitragem foi utilizada para definir nossas fronteiras com a Argentina, Bolívia, Peru. Nesse
sentido, Pedro A. Batista Martins aduz que “as questões de fronteiras com a Argentina e a Guiana
Britânica foram solucionadas, respectivamente, por laudos datados de 1900 e 1904”. Prossegue
informando que “a questão do território do Acre com a Bolívia foi satisfatoriamente resolvida no
ano de 1909”, bem como “as reclamações mútuas com o Peru, em virtude de problemas surgidos
nas localidades do Alto Juruá e Alto Purus, foram encerradas por arbitragem em 1910”.34
E, no caminho traçado pela globalização da economia, a maneira eficaz para tornar seguras as
relações comerciais internacionais foi depositar confiança na arbitragem, como já há muito faziam
países europeus nas suas relações continentais. Basta notar a edição, pela Comissão das Nações
Unidas para o Direito do Comércio Internacional, em 1985, de uma lei modelo para oferecer uma
referência aos Estados na reforma e modernização de suas normas sobre arbitragem comercial,
cujas regras representam consenso mundial sobre os mais importantes pontos da disciplina
arbitral. Esta proposta é conhecida como Lei Modelo Uncitral e tem sido utilizada como padrão
para a elaboração de diversas legislações nacionais sobre arbitragem.35
No Brasil, embora antiga a sua previsão, como nos traz notícia Marco Maciel ao invocar a
Constituição do Império,38 e as Ordenações do Reino,39 também o Código Comercial de 1850 faz
referência ao instituto,40 mas se encontrava uma desestimulante legislação que exigia a
homologação judicial dos laudos arbitrais (art. 1.045, CC/1916),41 e, assim, previsível, e mesmo
natural à época afastar-se de nossa cultura jurídica a arbitragem.
Mas aos poucos a mentalidade foi sendo alterada, tanto que se encontrava na Lei 7.244/1984,42
que foi substituída pela Lei 9.099/1995,43 previsão de juízo arbitral no âmbito dos juizados
especiais. E motivada a iniciativa (aliás, da própria Lei como um todo) pela já evidenciada
sobrecarga de processos existentes no Poder Judiciário.
Também pelo Decreto Legislativo 90/1995, foi aprovada a convenção do Panamá (1975) sobre
arbitragem, aplicável às relações comerciais internacionais, em modelo totalmente diverso do
previsto pela nossa legislação interna.
Neste ambiente, veio, então, a Lei 9.307, de 23.09.1996, conferindo ao instituto nova
formatação, atual, dinâmica, segura e eficiente, como é de se esperar desta forma de solução de
conflitos.
Com fidelidade histórica, e agradável narrativa de Petrônio Muniz, qualificado como o arauto
da arbitragem brasileira, o livro “Operação Arbiter” traz a detalhada trajetória dos esforços para
se alcançar este marco normativo, e se reconhecer a sua constitucionalidade, por quem esteve à
frente da iniciativa e intensos trabalhos dedicados a esta transformação jurídica e cultural.44
O Código Civil de 2002, por sua vez, dedicou singelos três artigos ao tema (arts. 851 a 853), que
em rasa análise em nada interferem no sistema atual sob um enfoque global, reportando-se no
último deles à lei especial.45
DINAMARCO, Cândido Rangel. A arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros,
2013.
MUNIZ, Petrônio R.G. Operação Arbiter – A história da Lei nº 9.307/96 sobre a arbitragem
comercial no Brasil. 2.ª ed. Salvador: Assembleia Legislativa do Estado da Bahia, 2016.
VALENÇA FILHO, Clávio de Mello; Lee, João Bosco. Estudo de arbitragem. Curitiba: Juruá, 2008.
NOTAS DE RODAPÉ
1
A nomenclatura usada pela doutrina de língua inglesa é Alternative dispute resolution – ADR. Atualmente
já se fala em meios adequados para solução de conflitos, tendo em vista que se deve pensar no método
mais correto para a solução do conflito trazido pela parte(s). Também rotineiramente se apresenta o tema
como Mesc – Meios extrajudiciais de solução de conflitos.
2
De cada grupo de 100 processos em tramitação, 71 terminaram o ano de 2009 sem solução, conforme
demonstrado no relatório “Justiça em Números” de setembro de 2010, o que reforça a importância do
compromisso com metas de desempenho, firmado pelos tribunais e pelo Conselho Nacional de Justiça
(CNJ). A avaliação é de José Guilherme Vasi Werner, secretário-geral adjunto do CNJ. Disponível em:
[http://cnj.jus.br/portal/noticias/9842-congestionamento-de-processos-reforca-compromisso-com-metas].
Acesso em: 10.03.2011.
Anote-se, porém, que mais da metade são execuções fiscais. Veja-se, ainda, que em março de 2015 houve
distribuição de 385.000 novos processos, sendo perto de 200.000 Cíveis e 43.000 nos Juizados Especiais
Cíveis; perto de 175.000 sentenças registradas para aqueles, e 54.000 para estes. Disponível em:
[http://www.tjsp.jus.br/Shared/Handlers/FileFetch.ashx?id_arquivo="66645]." Acesso em: 14.07.2015.
Cf. Relatório Justiça em Números, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ (ed. 2013), excluídos
os processos em curso no Supremo Tribunal Federal. Disponível em: [ftp://ftp.cnj.j
us.br/Justica_em_Numeros/relatorio_jn2014.pdf], p. 34. Acesso em: 14.07.2015.
“Não visualizo outra maneira de incutir na mente humana os benefícios da mediação, a qual me atrevo
denominar Justiça doce, senão sua institucionalização nas escolas e universidades, abrindo, dessa forma,
uma nova estrada que todos devemos ajudar a construir e afastando, definitivamente o misoneísmo,
sempre na busca do abrandamento dos conflitos existenciais e sociais por meio do verdadeiro
instrumento e agente de transformação – o diálogo conduzido pelo mediador –, no lugar da sentença que
corta a carne viva.” Trecho da palestra proferida pela Min. Fátima Nancy no I Encontro Nacional de
Arbitragem e Mediação, no dia 31.03.2008. Disponível em:
[www.mediarsaopaulo.com.br/1094/74401.html]. Acesso em: 10.03.2011.
8
Atualmente de expressivo relevo a mediação corporativa, entre sócios, diretores e nas relações
empresariais como um todo, e mediação nas questões de família.
Com recente prestígio do CNJ a respeito, pela Resolução 225/16, cf. Cap. 3, item 3.4, adiante.
10
LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Guarda de filhos: os conflitos no exercício do poder familiar. São Paulo:
Atlas, 2008. p. 123.
11
Na oportunidade, fomos honrados com a indicação pelo Diretor Prof. Pedro Paulo Manus para assinar o
Pacto de Mediação em nome da Faculdade de Direito da PUC/SP.
12
HOMERO. Ilíada. Trad. Odorico Mendes. Prefácio de Augusto Magne. Rio de Janeiro/São Paulo/Porto
Alegre: W. M. Jackson, 1950. Clássicos Jackson, vol. XXI.
13
“Art. 851. É admitido compromisso, judicial ou extrajudicial, para resolver litígios entre pessoas que
podem contratar.”
14
Brasil lidera uso de arbitragem na América Latina. Retrospectiva 2007 por Arnoldo Wald. Revista
Consultor Jurídico. 28.12.2007. Disponível em: [www.conjur.com.br/2007-dez-
28/brasil_lidera_uso_arbitragem_america_latina]. Acesso em: 13.07.2015.
15
Campanha lançada em evento realizado em 24.09.2009, com o apoio do Governo Federal, através do
Ministério da Justiça e Secretaria de Reforma do Judiciário, do Ministério Público do Distrito Federal, da
Secretaria de Segurança Pública, do Tribunal de Justiça e da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos,
consistente na distribuição de cartilhas sobre arbitragem, e cartazes que foram afixados em locais de
grande circulação do Distrito Federal e de Goiânia, além da divulgados por internet e outros meios de
comunicação.
16
“Art. 23. A sentença arbitral será proferida no prazo estipulado pelas partes. Nada tendo sido
convencionado, o prazo para a apresentação da sentença é de seis meses, contado da instituição da
arbitragem ou da substituição do árbitro. § 1.º Os árbitros poderão proferir sentenças parciais. § 2.º As
partes e os árbitros, de comum acordo, poderão prorrogar o prazo para proferir a sentença final.” (já em
sua nova redação introduzida pela Lei 13.129/2015 – cf. texto consolidado e comentários em Anexo 1 e
Anexo 2 adiante).
17
Leia-se a esse respeito: Argollo, Oscar. Anotações históricas sobre arbitragem, desde os primórdios até a
atualidade. In: Pantoja, Teresa Cristina G. (coord.). Prática em arbitragem. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2008; Delgado, José Augusto. Arbitragem no Brasil – Evolução histórica e conceitual. In:
Machado, Rafael Bicca (coord.). Arbitragem no Brasil: aspectos jurídicos relevantes. São Paulo: Quartier
Latin, 2008; e Dolinger, Jacob; Tiburcio, Carmen. Direito internacional privado: arbitragem comercial
internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.
18
LACAN, Jacques. Livro 10 – A angústia (1962-1963). O seminário. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005,
dentre outras oportunidades em diversos escritos que o autor se refere ao tema.
19
Ou, nas palavras de Rodrigo da Cunha Pereira: “Pode-se dizer que o ‘sujeito de direito’ é também um
‘sujeito de desejo’ e, portanto, um sujeito-desejante. É este sujeito-desejante que pratica atos jurídicos, faz
e desfaz negócios. Se somos sujeitos de desejo, é importante indagar o que é o desejo. A fisiologia do desejo
é estar sempre desejando um algo mais. Desejo é falta. É assim nossa estrutura psíquica. Somos sujeitos da
falta. Está sempre faltando algo para nos completar, embora, às vezes nos iludimos com o nosso ideal de
completude. Somos mesmo de falta e algo em nós sempre faltará. Daí a definição de Lacan: ‘Desejo é
desejo de desejo’” (Pereira, Rodrigo da Cunha. Família, direitos humanos, psicanálise e inclusão digital.
Disponível em: [www.rodrigodacunha.com.br/artigos_pub05.html]. Acesso em: 10.03.2011).
20
Ou, como escreve Aureliano: “Se no início a solução passava obrigatoriamente pela imposição da força
bruta na correta execução da ‘lei do mais forte’, na atualidade este tipo de solução de controvérsia é
considerado exemplo de atraso, deficiência de caráter e até crime” (Amorim, Aureliano Albuquerque.
Arbitragem e Poder Judiciário – O sistema arbitral e o Judiciário brasileiro. Goiânia: UCG, 2009. p. 19).
21
A respeito, transcreve-se a lição de Ada Pellegrini Grinover, Antônio Carlos de Araujo Cintra e Cândido
Rangel Dinamarco: “‘Autotutela’ significa a imposição de determinada resolução ao conflito por uma das
partes, à outra, independente da anuência desta à solução escolhida. As formas pertencentes a essa
categoria valem-se da força física para a sua realização, com no caso da vendetta (aplicação de uma
sanção a um infrator por parte do ofendido ou de seus familiares). A ‘autocomposição’, por seu turno, diz
respeito às formas de solução de conflitos obtidas a partir do consenso entre as partes. Pertencem a esse
grupo a desistência, a submissão e a transação (respectivamente, a renúncia à pretensão, a conformação
com a resistência oposta, e a realização de concessões mútuas). Por fim, a ‘heterocomposição’ abrange os
mecanismos de solução de conflitos de que participam terceiros, como a defesa de terceiro, a conciliação,
a mediação, o processo estatal (judicial) e a arbitragem” (CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER,
Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 23. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.
p. 25).
22
Cf. acima a passagem transcrita sobre “o pomo da discórdia”, e ainda, Homero. Op. cit. e as obras citadas
na nota 13, supra.
23
A esse respeito, vale a transcrição da seguinte passagem: “No direito grego, os contendores podiam
submeter suas controvérsias a árbitros privados, e se tem notícia de que a alguns tribunais (ligas
enfitônicas) era reservada competência para dirimir conflitos entre cidades gregas, como verdadeiros
juízes arbitrais, distintos dos então chamados árbitros públicos” (Furtado, Paulo; Bulos, Uadi Lammêgo.
Lei da Arbitragem comentada. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1998).
24
25
Antonio Sodré traz a seguinte informação histórica: “Como exemplo da utilização da arbitragem em
conflitos de natureza pública, podemos citar o tratado firmado entre as cidades-Estado gregas Atenas e
Esparta, no ano de 445 a.C., o qual continha uma espécie de cláusula, denominada atualmente de cláusula
compromissória expressa”. “Acerca da aplicação da arbitragem sobre conflitos privados, vale lembrar,
como exemplo, que na Atenas de Péricles existiam as cortes populares – heliaea – compostas de milhares
de cidadãos atenienses, que se subdividiam em 10 tribunais, com 600 cidadãos em cada. A partir de
determinado momento, as cortes passaram a julgar casos de menor valor pecuniário, somente se antes
houvesse uma tentativa de conciliação entre as partes por um árbitro, escolhido por sorteio, dentre os
cidadãos maiores de 60 anos” (SODRÉ, Antonio. Curso de direito arbitral. Leme: J. H. Mizuno, 2008. p. 106-
107).
26
Soares, Guido Fernando Silva. Arbitragem internacional (introdução histórica). In: FRANÇA, Rubens
Limongi (coord.). Enciclopédia saraiva de direito: verbete. São Paulo: Saraiva, 1978. vol. 7, p. 377.
27
Diz Joel Dias Figueira Júnior: “É no Direito Romano que se encontram as raízes mais profícuas do instituto
da arbitragem e ou do compromisso arbitral” (Figueira Júnior, Joel Dias. A arbitragem, jurisdição e
execução. São Paulo: Ed. RT, 1999. p. 25).
29
30
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1959. t. 26,
p. 344.
31
32
A respeito, cf. Sodré: “Para Carlos Alberto Carmona, cinco foram as principais causas que justificaram a
ampla utilização da arbitragem: i) ausência de leis, ou sua excessiva dureza e incivilidade; ii) falta de
garantias jurisdicionais; iii) variedade de ordenamentos; iv) fraqueza dos Estados; e v) conflitos entre
Estado e Igreja”. “Guido Fernando Silva Soares, por sua vez, indica três razões primordiais para o sucesso
do juízo arbitral: i) a reiterada prática arbitral no seio da Igreja; ii) as arbitragens intermunicipais, como
uma forma de escapar à jurisdição do Sacro Império Romano-germânico; e iii) a estrutura social estanque
e hierarquizada.” “A Idade Média conheceu uma pluralidade de regulamentações jurídicas válidas em um
mesmo espaço territorial, da mesma forma como conviveu com diversos centros de emanação normativa”
(SODRÉ, Antonio. Op. cit., p. 111).
33
Veja-se, por exemplo, o “Tratado de Tordesilhas” que, segundo historiadores, teve a linha traçada por
arbitragem, embora utilizada a mediação como instrumento de pacificação entre Portugal e Espanha, para
se chegar à assinatura da convenção.
34
MARTINS, Pedro Antonio Batista. Anotações sobre a arbitragem no Brasil e o projeto de lei do Senado
78/92. RePro 77/25, São Paulo: Ed. RT, jan.-mar.,1995.
35
O texto da Lei Modelo, atualizado com a emenda de 2006, pode ser encontrado no seguinte endereço
eletrônico: [http://uncitral.org].
36
Com leis específicas na Espanha (Real Decreto 636, de 03.05.1993), na Argentina (art. 59 da Lei 24.240/1993
e Decreto 276) e outros países que adotam um sistema próprio de arbitragem de consumo.
37
Cf. Lei de Arbitragem espanhola 60/2003, de 23.12.2003: “Art. 10. Arbitraje testamentario. También será
válido el arbitraje instituido por disposición testamentaria para solucionar diferencias entre herederos no
forzosos o legatarios por cuestiones relativas a la distribución o administración de la herencia”. Tradução
livre: “Arbitragem testamentária. Também será válida a arbitragem instituída por disposição
testamentária para solucionar litígios entre os herdeiros necessários ou legatários para questões relativas
à distribuição ou administração da herança”.
38
39
40
Promulgado pela Lei 556 de 26.06.1850: arts. 245 (arbitragem mercantil), 294 (relativo a conflitos entre
sócios ou destes com a companhia, inclusive liquidação ou partilha), além de regras relativas a seguro
marítimo (art. 667, caput e alínea 11 do CCom). Também assim, a Lei 108/1837 que regulamentou o juízo
arbitral para controvérsias relativas aos contratos de locação de serviços. Dentre outras, nas quais, em
determinadas situações, a arbitragem era inclusive obrigatória, derrogada pela Lei 1.350/1866. Confira-se
também o Dec. 3.084/1898 que regulamentou a Lei 221/1894 em seus arts. 767 a 838; o CC/1916, nos arts
1.037 a 1.048; o Dec.-lei 1.608/1939, que instituiu o Código de Processo Civil, no seu Livro IX, arts. 1.031 a
1.036; e a Lei 9.307/1996 com que a arbitragem volta a ganhar relevância.
41
Assim: Art. 1.045 do CC/1916: “A sentença arbitral só se executará, depois de homologada, salvo se for
proferida por juiz de primeira ou segunda instância, com arbitro nomeado pelas partes”. A respeito da
ineficiência da sistemática revogada, escreve Everaldo Augusto Cambler: “O juízo arbitral, referido nos
artigos do Código Civil revogados, não atendia às necessidades das atividades econômicas, contendo
exigências e formalidades secundárias para a homologação do laudo, o que dificultava sua aplicação
prática, pecava pela falta de disciplina legal para a cláusula compromissória, além de não garantir ao
árbitro poderes suficientes para a produção de efeitos práticos resultantes de sua atividade” (Curso
avançado de direito civil: direito das obrigações. CAMBLER, Everaldo Augusto (coord.). São Paulo: Ed. RT,
2001. vol. 2, p. 193). Acompanhando o direito material, também assim a legislação processual tanto de
1939 (arts. 1031 a 1.046) como de 1973 (arts. 1.072 a 1.102), hoje revogados pela Lei de Arbitragem de 1996.
42
43
Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais. A Seção VIII, arts. 21 a 26, trata da “Conciliação e do
Juízo Arbitral”, assim prevendo no que pertinente: “Art. 24. Não obtida a conciliação, as partes poderão
optar, de comum acordo, pelo juízo arbitral, na forma prevista nesta Lei. § 1.º O Juízo arbitral considerar-
se-á instaurado, independentemente de termo de compromisso, com a escolha do arbitro pelas partes. Se
este não estiver presente, o juiz convocá-lo-á designará, de imediato, a data para a audiência de instrução.
§ 2.º O árbitro será escolhido dentre os juízes leigos. Art. 25. O árbitro conduzirá o processo com os
mesmos critérios do juiz, na forma dos arts. 5.º e 6.º desta Lei, podendo decidir por equidade”.
44
O livro de leitura obrigatória, e prazerosa, para se conhecer o momento histórico, traz em seu “Prólogo”,
dentre outras passagens: “Ao relatar-se o aventuroso mutirão nacional, estar-se-á, na verdade
demonstrando aos incréus e às novas gerações de brasileiros, a possibilidade concreta da cidadania ativa e
responsável tomar nas mãos o próprio destino de forma exitosa. Em outras palavras deixarmos a posição
de súditos para nos afirmarmos como cidadãos.... a Operação Arbiter desde o seu início visou tão somente
a efetivação da arbitragem – uma opção para as partes em litígio, sob forma legalmente prescrita.... ‘In
ultima ratio’ a Operação Arbiter ao ultrapassar o cientificismo jurídico, transmudou-se em uma ação de
substrato político, entendido este conceito no que ele de mais nobre expressa – a possibilidade do
aperfeiçoamento da Democracia Brasileira pela participação direta do cidadão no processo de elaboração
de Diploma Legal legitimado por amplo e prévio debate a nível nacional entre os interessados.... A
Operação Arbiter constitui destarte uma lição de comportamento cívico, de otimismo e de esperança, e seu
relato, um documento fidedigno de que ‘o futuro constrói-se’ quando alicerçado na coragem, na
organização e na limpidez de propósitos”. MUNIZ, Petrônio R.G.. Operação Arbiter – A história da Lei nº
9.307/96 sobre a arbitragem comercial no Brasil. 2.ª ed. Salvador: Assembleia Legislativa do Estado da
Bahia, 2016.
45
Assim: “Art. 853. Admite-se nos contratos a cláusula compromissória, para resolver divergências mediante
juízo arbitral, na forma estabelecida em lei especial”.
46
Em pesquisa realizada pela parceria acadêmico-institucional entre a Fundação Getulio Vargas e o Comitê
Brasileiro de Arbitragem, cujos relatórios podem ser acessado no site deste último [www.cbar.org.br],
constatou-se que, das 678 decisões judiciais analisadas no período entre 1996 e 2008, em apenas 14 delas
houve invalidação da sentença arbitral.
47
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
4. O Tribunal Multiportas
• Objetivo
• Conteúdo
• Núcleos em Tribunais
• Centros Judiciários
• Capacitação
• Cadastro
• Código de Ética
SUMÁRIO
2.1. • INTRODUÇÃO
2.1. Introdução
No que diz respeito a essa terceira onda renovatória, os autores lecionam que, além de
abranger a reforma dos procedimentos judiciais, a criação de determinados procedimentos
especiais, a mudança dos métodos para a prestação dos serviços judiciais e a simplificação do
direito, também se inclui “a utilização de mecanismos privados ou informais de solução dos
litígios”. 2
Dessa maneira, a oferta de alternativas para a resolução de contendas está incluída no objetivo
maior de garantir o acesso à Justiça, o que nunca foi exclusividade do Poder Judiciário, mas sim
finalidade do Estado, que, assim, pode incentivar que os conflitos sejam resolvidos no âmbito
estatal ou fora dele, como, de fato, ocorre em muitos desses métodos privados.
Com resultados proveitosos, não só pelas estatísticas, mas pela positiva influência cultural no
sentido de se estimular a pacificação, esta iniciativa lançada pela Res. CNJ 125 gerou os melhores
frutos, a ponto de, definitivamente, conscientizar juristas e o legislador envolvidos com a reforma
do Código de Processo Civil, fazendo com que no Diploma de 2015 a mediação e conciliação
tenham especial destaque, introduzida sistemática pela qual, como regra, estes meios amistosos de
solução do conflito passam a representar uma etapa inicial do processo, como igualmente se verá
ao final deste Capítulo.
E também neste sentido, agora até com exagero normativo a respeito do tema, a recente Lei
13.140, de 26 de junho de 2015, 3 que ao lado de representar o Marco Legal da Mediação no Brasil,
confirma a importante presença da mediação judicial, também dispondo a seu respeito.
Enfim, o conflito existe, e sempre existirá, como inerente ao ser humano. Cabe, então, a análise
contemporânea de como superar as divergências da maneira mais apropriada. Neste contexto,
além da tutela jurisdicional através da sentença judicial, muitas outras possibilidades são
oferecidas, devendo, assim, ser buscado o meio mais adequado à situação, para se obter os
melhores resultados na pacificação social.
Dentre os meios extrajudiciais de solução de conflitos (Mesc), os mais usuais e conhecidos são:
arbitragem, conciliação, negociação e mediação. Vejamos as principais diferenças entre estes
institutos.
A participação dos interessados no resultado é direta, com poderes para a tomada de decisões,
após passar pela conscientização do conflito e das opções para pacificação.
Pela negociação, as partes tentam resolver suas divergências diretamente. Negociam com
trocas de vantagens, diminuição de perdas, aproveitam oportunidades e situações de conforto,
exercitam a dialética, mas, em última análise, querem uma composição, e para tanto, o resultado
deve propiciar ganhos recíprocos, em condições mutuamente aceitáveis e, em certa medida,
equitativas, caso contrário, será rejeitado por uma das partes.
Embora comumente se refira à negociação como método exercido pelos próprios interessados,
nada impede que seja promovida por terceiros – os negociadores. Porém, neste caso, o terceiro não
será um facilitador em benefício das partes, mas um representante de uma delas, e em nome desta
defenderá os seus interesses. Ou seja, o terceiro comparece para negociar a melhor solução em
favor daquele por quem atua. Aliás, no mundo dos negócios, principalmente em grandes
corporações, a figura do negociador “profissional” cada vez mais ganha destaque.
Embora com passagem obrigatória pela análise do conflito, o foco principal na conciliação é a
solução do problema. A meta é alcançar um acordo confortável para as partes.
Como diz Aldemir Buitoni: 5 “O conciliador, seja Juiz ou não, fica na superfície do conflito, sem
adentrar nas relações intersubjetivas, nos fatores que desencadearam o litígio, focando mais as
vantagens de um acordo onde cada um cede um pouco, para sair do problema. Não há
preocupação de ir com maior profundidade nas questões subjetivas, emocionais, nos fatores que
desencadearam o conflito, pois isso demandaria sair da esfera da dogmática jurídica, dos limites
objetivos da controvérsia”.
Este método é mais adequado à solução de conflitos objetivos, nos quais as partes não tiveram
convivência ou vínculo pessoal anterior, cujo encerramento se pretende. O conflito é
circunstancial, sem perspectiva de gerar ou restabelecer uma relação continuada envolvendo as
partes.
Aliás, a criatividade deve ser um dos principais atributos do conciliador; dele espera-se talento
na condução das tratativas e na oferta de diversas opções de composição equilibrada, para as
partes escolherem, dentre aquelas propostas, a mais atraente à solução do conflito. Destaque-se,
portanto, que o conciliador efetivamente faz propostas de composição, objetivando a aceitação
pelas partes e a celebração do acordo. A apresentação de propostas e a finalidade de obter o
acordo são, pois, duas características fundamentais da conciliação.
Pela sua natureza, e principalmente por não se investigar, posto que inexistente, a inter-relação
subjetiva das partes, o desenvolvimento da conciliação mostra-se mais rápido e de menor
complexidade em relação à mediação. Outras duas características fundamentais da conciliação são
a celeridade do procedimento – que, muitas das vezes, se resume a uma única sessão – e a
desnecessidade de conhecimento profundo da relação das partes pelo conciliador.
A indicação da mediação, por sua vez, pressupõe terem as partes em conflito uma relação mais
intensa e prolongada, verificando o relacionamento tanto por vínculos pessoais como jurídicos.
Ainda, tem pertinência em situações em que será gerada para as partes, na solução do conflito,
uma nova relação com direitos e obrigações recíprocas, e, pois, com uma perspectiva de futura
convivência que se espera que seja harmônica.
Utiliza-se da mediação para conflitos com marcantes elementos subjetivos, como nas relações
familiares e na dissolução de empresas, sugerindo-se igualmente em outras relações continuadas,
como relações de vizinhança, contratos de franquia etc.
Uma das principais funções do mediador (de acordo com a escola a ser seguida) é conduzir as
partes ao seu apoderamento, ou seja, à conscientização de seus atos, ações, condutas e de soluções,
induzindo-as, também, ao reconhecimento da posição do outro, para que seja ele respeitado em
suas posições e proposições. Evidentemente também aqui a criação de um ambiente propício, para
superar a animosidade, é uma tarefa relevante. Aliás, pela origem dos conflitos, muito maior o
desafio de minimizar os efeitos do rancor, da mágoa, do ressentimento perversos ao pretendido
diálogo (fala e escuta), pois aqueles sentimentos podem gerar a má vontade na comunicação e na
busca de solução consensual.
O mediador não julga, não intervém nas decisões, tampouco se intromete nas propostas,
oferecendo opções. O que faz é a “terapia do vínculo conflitivo”, 7 sem apresentar propostas ou
sugestões de resolução, pois estas deverão vir dos próprios mediados, com amadurecimento
quanto à relação conflituosa. Como se vê, uma diferença fundamental da mediação em relação à
conciliação é que naquela o mediador não faz propostas de acordo, mas apenas tenta reaproximar
as partes para que elas próprias consigam alcançar uma situação consensual de vantagem.
Aliás, o Código de Processo Civil de 2015, adiante analisado, em seu art. 165 anota: “§ 1.º O
conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as
partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de
constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem. § 2.º O mediador, que atuará
preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos
interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo
restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem
benefícios mútuos”.
Mas no cotidiano, diante de um conflito, pela sua origem (objetivo ou subjetivo), ou mesmo
pelas características pessoais dos envolvidos, detalhes, abrangência ou reflexos posteriores, há
uma zona cinzenta, e extensa, entre as situações em que se recomenda um ou outro método de
solução. Desta forma, o intermediário, o juiz, o advogado ou aquele que orienta as partes a buscar
a solução pacífica deverá saber identificar as peculiaridades do conflito para encaminhá-las ao
meio de solução alternativa mais eficiente. E há espaço para, no desenvolvimento de um modelo,
ao se perceber que outro será mais adequado, promover-se a mudança ou utilização conjunta das
técnicas de ambos os procedimentos, ou mesmo o encaminhamento a outro intermediário com as
qualificações apropriadas ao melhor atendimento dos interessados.
Daí porque se diz que uma solução consensual geralmente é respeitada e atendida
voluntariamente; já uma solução adjudicada pela sua imposição contrária à vontade de uma das
partes provoca inúmeros recursos e, ainda, quando estes não mais forem possíveis, leva ao
descumprimento do decidido, a exigir execução com seus incidentes, tendo como consequência a
“eternização” do litígio.
Ainda quanto aos meios não adversariais de solução de conflitos, veremos a seguir a proposta
de política pública para tratamento adequado das demandas no Judiciário, estabelecida pela Res.
125, de 29.11.2010, do Conselho Nacional de Justiça (Res. CNJ 125/2010). E como já se encontra na
iniciativa de diversos Tribunais, cria-se um modelo de mediação e conciliação em juízo.
Neste momento, então, cabe confrontar estes modelos propostos com a conciliação e a
mediação enquanto institutos próprios e independentes da estrutura do Poder Judiciário.
Parece não se ter vislumbrado a sua relevância em diversas questões, como no amplo ambiente
das relações de consumo, diversas questões trabalhistas e até em algumas relações comerciais.
Daí porque se questionar (apenas para reflexão), se, definitivamente, não seria melhor
incorporar definitivamente a conciliação como uma das técnicas de mediação, como fazem alguns
países, deixando de ter regras próprias para uma e outra (como se faz na conciliação/mediação
judicial).
Retomando a mediação, a recente Lei 13.140 de 26 de junho de 2015, considerada o marco legal
da matéria, contém a mediação judicial, extrajudicial, além da autocomposição de conflitos no
âmbito da administração pública.
Embora com o mesmo signo, é totalmente distinta a forma como se instaura uma e outra
mediação, indicadas na nova Lei também algumas peculiaridades distintas entre estas
modalidades.
Já na mediação judicial, incidente nos processos em curso, na forma apresentada na Res. CNJ
125/2010, esta via é instigada pelo juiz, e no Código de Processo Civil de 2015, ela será “automática”
no início de praticamente todos os processos, pois o primeiro ato do magistrado, após o
recebimento da petição inicial, será a designação da audiência de composição conforme previsto
no art. 334, que poderá, todavia, não ocorrer por conta do previsto no § 4.º do referido artigo (“A
audiência não será realizada: I – se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na
composição consensual; II – quando não se admitir a autocomposição”). 13 Ou seja, em uma e outra
previsões, a instauração não se faz por iniciativa acordada entre as partes, que apenas são agentes
passivos na submissão ou procedimento.
Também nesta modalidade submetida à Res. CNJ 125/2010, a escolha do profissional que
conduzirá os trabalhos fica em parte prejudicada, pois ela é restrita à indicação (em comum ou
não, conforme o caso) daqueles nomes disponíveis no cadastro dos Tribunais; e na própria
disciplina do Código de Processo Civil, se ausente consenso na indicação de terceiros, haverá
“distribuição entre aqueles cadastrados no registro do tribunal, observada a respectiva formação”
(art. 168, § 2.º, parte final, CPC/2015). Ainda, a Lei 13.140/2015 é enfática em estabelecer que “Art.
25. Na mediação judicial, os mediadores não estarão sujeitos à prévia aceitação das partes,
observado o disposto no art. 5.º 14 desta Lei”.
Por fim, pela sua dinâmica na mediação e conciliação em juízo, a disponibilidade de tempo aos
procedimentos acaba sendo extremamente restrita. Enquanto a prática extrajudicial sugere a
realização de várias sessões, perante o Judiciário a perspectiva é de se tentar resolver o conflito em
uma única sessão, ou em poucas oportunidades.
Poder-se-á, então, falar que a mediação passa a ser um gênero, do qual são espécies a mediação
extrajudicial, privada, ou clássica, e a mediação judicial.
Sem dúvida, a iniciativa do Poder Judiciário em oferecer este produto, mesmo com
características próprias, só prestigia os institutos, e inclusive pode servir de estímulo às partes
para, após conhecerem a opção por provocação do magistrado ou por acesso à previsão normativa
(CPC/2015 e Lei 13.140/2015), buscar os meios alternativos desenvolvidos extrajudicialmente.
Muito menos usuais que os meios acima indicados, merecem referência, ainda que superficiais,
outras formas de solução de conflitos. Rara a sua ocorrência, principalmente entre nós, mas com
boas perspectivas de serem adequadas para determinadas circunstâncias podemos apresentar,
também para se pretender superar controvérsias os seguintes instrumentos: mini-trial, avaliação
de terceiro neutro, dispute board, adjudicação e design de sistema de disputas. Ainda, merece
registro o meio específico desenvolvido para disputas de nome de domínio através do Sistema
Administrativo de Conflitos de Internet – SACI.
A adoção destas ferramentas, independe de previsão na lei, e, como tal, acomodam-se ao nosso
sistema jurídico. Também dispensam em geral maior regulamentação, pois pressupõe a
convergência de vontade para se buscar a solução mais adequada ao conflito; 16 vejamos suas
peculiaridades:
Mini-trial representa um sistema pelo qual as partes elegem cada qual seu representante, e
estes indicam, em conjunto, o terceiro neutro para a análise de posições, após o que se buscam
soluções consensuais para as questões propostas. Os representantes defendem os interesses das
partes que a indicaram, mas com ponderação para se obter a resolução do conflito com a
interferência do terceiro neutro que se manifesta a respeito da conclusão que entende adequada.
Nesta dinâmica, especialmente com a “decisão” do terceiro neutro, respeitado por todos, tanto
assim que convidado para participar do procedimento, espera-se a aproximação das partes com o
objetivo final de se alcançar o acordo. A “decisão” do terceiro neutro não tem efeito vinculante,
mas se faz na expectativa de ser ao menos persuasiva aos envolvidos. 17
Pela avaliação de terceiro neutro (Early Neutral Evaluation – ENE ou Neutral Evaluation), as
partes, de comum acordo, indicam um terceiro imparcial, com conhecimento específico na
matéria objeto da controvérsia (geralmente de natureza técnica), para avaliação das posições em
rápido procedimento, apresentando um prognóstico a respeito das chances de êxito de cada qual.
Também não é vinculante, e tem por objetivo a revisão pelos interessados de suas posições,
servindo as conclusões do expert nomeado (geralmente manifestadas apenas oralmente) como
base para a solução consensual do conflito. 18 O terceiro, no caso, de um modo geral, tem atuação
mais avaliativa, no sentido de indicar provável resultado de uma ou outra argumentação, mas sem
apresentar a sua “decisão” ou conclusão a respeito de qual seria a solução adequada para o
conflito.
A perspectiva é que a pessoa escolhida seja especialista na matéria, porém falta-lhe habilidade
ou capacitação para ser um facilitador, daí porque a sua avaliação é adequada para se ter, a partir
daí, elementos úteis aos outros meios de composição (negociação, conciliação e mediação), não
sendo, pois, considerada uma ferramenta isolada para a solução do conflito. 19
Há muito já utilizada em países do Reino Unido e incipiente em nossa academia e prática, com
origem também para solução de conflitos decorrentes de contratos na construção civil, há a
chamada adjudicação. Reconhecida a expressiva intimidade estrutural com os disputes boards, ou
seja, voltado o método a encontrar uma solução imediata à “crise de posições” por terceiro
especialista escolhido pelas partes, em caráter provisório, tem com particularidades: é promovida
por um único escolhido, não por comitê ou painel, impactando diretamente na redução expressiva
do custo e na celeridade acentuada, e geralmente é convocado apenas para enfrentar o problema
cristalizado, sem acompanhamento periódico da obra, embora dela tenha, por vezes, prévio
conhecimento das peculiaridades. Porém enfrenta as mesmas barreiras quanto à eficácia da
cláusula e da respectiva decisão tomada pelo adjudicador. Aliás, embora o nome seja sugestivo de
decisão imposta (obrigatória // adjudicada), a solução apresentada pelo adjudicador sempre é
possível de revisão em procedimento arbitral ou processo judicial, respeitados os prazos
específicos para oposição à decisão e iniciativa da ação. 27
Em sua dinâmica, trabalha-se com a mudança de cultura dos protagonistas da relação para
melhor lidarem com o conflito; promove-se a administração interna das diferenças, com avaliação
da forma mais adequada de encaminhamento das questões, utilizando-se da negociação direita,
conciliação e outras técnicas, inclusive mediação, valendo-se também da organização de grupos
para avaliação questões pontuais, diante da variedade de situações circunstanciais etc., tudo com o
objetivo comum de acomodar os interesses de todos.
Neste contexto, através do diálogo, pretende-se a construção de uma resolução conjunta a ser
adotada com a presença das diversas pessoas envolvidas. O “consenso não significa unanimidade,
mas um acordo, baseado em interesses e realizado com boa-fé, com o qual todos possam
conviver”. 28
Pelas suas características, pode inclusive envolver interesses públicos, 29 e despertou maior
destaque após a sua exitosa experiência através da “Câmara de Indenização 3054”, utilizada para
ressarcir de forma justa e rápida os familiares das vítimas do trágico acidente com o voo TAM 3054
ocorrido em 17 de julho de 2007 em que 199 pessoas vieram a falecer. 30
As soluções podem ser buscadas através de instituições parceiras credenciadas, com estrutura e
regulamento próprio para esta finalidade. 33
Aquele que se diz titular do nome de domínio, ou a pessoa que se sinta prejudicada com a
utilização indevida do nome por outro, tem legitimidade para instaurar o procedimento. Feito o
contraditório, cumpridas as etapas concentradas, pragmáticas e céleres, haverá a análise do
conflito. Uma vez pronunciada a decisão, a parte que se sentir prejudicada poderá ingressar com
ação para discutir a questão; porém, se não o fizer em 15 (quinze) dias úteis contados da ciência da
decisão, o NIC.br implementará a alteração decidida administrativamente, transferindo o nome de
domínio ao reclamante ou simplesmente cancelando o existente se o caso. 34
E seu maior destaque é a agilidade na obtenção e implantação de decisões, sendo certo que, por
partir de instituições credenciadas junto ao Comitê Gestor de Internet, com solução proferida por
conhecedores da matéria, certamente as conclusões serão respeitadas, ou ao menos persuasivas na
hipótese de eventual questionamento em sede judicial ou arbitral, inibindo, em certa medida, a
propositura de ações despidas de sólidos fundamentos contrários à decisão administrativa. 35
Por fim, quanto a alternativas para resolver controvérsia, embora não seja solução “privada”,
mas “perante Autoridade Pública”, porém externa ao Poder Judiciário (e por esta razão aqui
trazida), anote-se o avanço contido no Código de Processo Civil de 2015 ao estabelecer que “Art.
174. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios criarão câmaras de mediação e
conciliação, com atribuições relacionadas à solução consensual de conflitos no âmbito
administrativo, tais como: I – dirimir conflitos envolvendo órgãos e entidades da administração
pública; II – avaliar a admissibilidade dos pedidos de resolução de conflitos, por meio de
conciliação, no âmbito da administração pública; III – promover, quando couber, a celebração de
termo de ajustamento de conduta”.
Mais detalhado e abrangente que o Código de Processo Civil, a nova Lei de Mediação, também
traz regramento específico de solução autocompositiva para os Conflitos em que for parte Pessoa
Jurídica de Direito Público. Dedica-se o Capítulo II para esta matéria, com a Seção I – Disposições
Comuns, e Seção II – Dos Conflitos Envolvendo a Administração Pública Federal Direta, suas
Autarquias e Fundações, entre os arts. 32 e 40. E em disposições finais contidas no Capítulo III,
também faz referências pertinentes ao tema.
A Lei trata da criação de câmaras de prevenção e resolução de conflitos pela União, Estados,
Distrito Federal e Municípios, estabelecendo critérios e regras gerais de atuação, procedimento e
matéria a ser submetida a este sistema. Traz interessantíssima e ousada inovação ao admitir de
ofício ou mediante provocação, procedimento de mediação coletiva de conflitos relacionados à
prestação de serviços públicos. Prevê a suspensão da prescrição pela instauração de procedimento
administrativo para a resolução consensual de conflitos. Apresenta também regras gerais da
transação por adesão mesmo se pendente processo judicial sobre o conflito. Ainda, recomenda e
traz as diretrizes para a resolução administrativa de controvérsias entre órgãos ou entidades de
direito público que integram a Administração Pública Federal através da Advocacia-Geral da
União. Também merece anotar que a Lei, embora com restrições, trata inclusive de composição
extrajudicial relativa a tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal. 36
Diante das novas Leis (CPC/2015 ou Marco Legal da Mediação) a solução consensual de conflitos
perante a Administração Pública foi valorizada na I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de
Litígios, com diversas proposições acolhidas para estimular esta prática, até mesmo em matéria
tributária, como, por exemplo, Enunciados 18, 19, 25, 31, 32, 36, 37, 53, 54, 60, 62, 69, 71, 74, 82, 85 e
87, merecendo destaque o “84. O Poder Público – inclusive o Poder Judiciário – e a sociedade civil
deverão estimular a criação, no âmbito das procuradorias municipais e estaduais, de centros de
solução de conflitos, voltados à solução de litígios entre a Administração Pública e os cidadãos,
como, por exemplo, a Central de Negociação da Procuradoria-Geral da União”. 37
Embora tenha se falado neste sistema em arbitragem na nomenclatura adotada, cabe o registro
de que não se trata de arbitragem propriamente dita, tal qual apresentada neste “Curso” com base
na Lei 9.307/1996. Aliás, a Cartilha da Câmara, referida na nota acima, faz expressamente esta
ressalva. Representa, na verdade, uma forma alternativa de resolver conflitos fora do Judiciário, e
da arbitragem (institucional ou “ad hoc”), com características próprias, promovida “interna
corporis” em controvérsias envolvendo interesse apenas de entes Públicos específicos, com
solução proposta por meio de parecer da Consultoria-Geral da União. 39
Como se vê, caminha-se muito além de mediação e conciliação para a solução amistosa de
conflitos, existindo uma variedade de instrumentos, sem limites, disponíveis com um objetivo
comum: pacificação das relações jurídicas.
Estamos, sem dúvida, em um novo momento do Direito na qual ele também se ocupa em
estimular a acomodação consensual dos interesses das pessoas, independentemente da previsão
dos mecanismos de repressão à lesão, reservados à jurisdição com soluções impostas às partes.
Cabe agora aos operadores do Direito a imersão nesta realidade, e também pensando nas novas
gerações, “é fundamental a atualização das matrizes curriculares dos cursos de direito, bem como
a criação de programas de formação continuada aos docentes do ensino superior jurídico, com
ênfase na temática da prevenção e solução extrajudicial de litígios e na busca pelo consenso”
(Enunciado 66); e mais: “Recomenda-se o desenvolvimento de programas de fomento de
habilidades para o diálogo e para a gestão de conflitos nas escolas, como elemento formativo-
educativo, objetivando estimular a formação de pessoas com maior competência para o diálogo, a
negociação de diferenças e a gestão de controvérsias” (Enunciado 27). 40
Por iniciativa transformadora do professor Kazuo Watanabe, acolhida pelo Conselho Consultivo
do Departamento de Pesquisa Judiciária, do qual honrosamente integramos, 41 o Conselho
Nacional de Justiça aprovou a Res. 125, de 29.11.2010, 42 sobre a “Política Judiciária Nacional de
tratamento adequado dos conflitos de interesse no âmbito do Poder Judiciário”, elaborada com a
participação cuidadosa da Dra. Valéria Lagrasta, 43 profunda conhecedora da teoria e da prática
destes meios amistosos de resolução de controvérsias. Esta Resolução mereceu ajustes, já
incorporados nos comentários abaixo, através das Emendas n. 1, de 31.01.2013, e n. 2, de
08.03.2016. 44
Assim, nas pertinentes palavras do Prof. Kazuo Watanabe: “O objetivo primordial que se busca
com a instituição de semelhante política pública é a solução mais adequada dos conflitos de
interesses, pela participação decisiva de ambas as partes na busca do resultado que satisfaça seus
interesses, o que preservará o relacionamento delas, propiciando a justiça coexistencial. A redução
do volume de serviços do Judiciário é mera consequência desse importante resultado social”. 45
A perspectiva sob a qual foi traçada a Resolução leva em conta o fato de ser atribuída ao Poder
Judiciário a função de garantir o acesso à justiça, como prestador de serviço público essencial à
sociedade, indispensável à cidadania, necessário à solidificação da democracia e imprescindível ao
Estado de Direito.
Neste contexto, cabe ao próprio Judiciário a tarefa de implantar, e aos seus cuidados gerenciar,
os meios alternativos de solução de conflitos, chamando para si a responsabilidade de garantir o
acesso de todos à ordem jurídica, de formas diversas do contencioso propriamente dito, para assim
cumprir com o seu propósito: distribuir a justiça.
Em outras palavras: “O princípio do acesso à justiça, inscrito no inciso XXXV do art. 5.º da CF,
não assegura apenas o acesso formal aos órgãos judiciários, e sim um acesso qualificado que
propicie aos indivíduos o acesso à ordem jurídica justa, no sentido de que cabe a todos que tenham
qualquer problema jurídico, não necessariamente um conflito de interesses, uma atenção por
parte do Poder Público, em especial do Poder Judiciário. Assim, cabe ao Judiciário não somente
organizar os serviços que são prestados por meio de processos judiciais, como também aqueles
que socorram os cidadãos de modo mais abrangente, de solução por vezes de simples problemas
jurídicos, como a obtenção de documentos essenciais para o exercício da cidadania, e até mesmo
de simples palavras de orientação jurídica. Mas é, certamente, na solução dos conflitos de
interesses que reside a sua função primordial, e para desempenhá-la cabe-lhe organizar não
apenas os serviços processuais como também, e com grande ênfase, os serviços de solução dos
conflitos pelos mecanismos alternativos à solução adjudicada por meio de sentença, em especial
dos meios consensuais, isto é, da mediação e da conciliação”. 47
Ou, como registrou o ministro Cezar Peluso em seu discurso de posse como Presidente do STF:
“O mecanismo judicial, hoje disponível para dar-lhes resposta, é a velha solução adjudicada, que se
dá mediante produção de sentenças e, em cujo seio, sob influxo de uma arraigada cultura de
dilação, proliferam os recursos inúteis e as execuções extremamente morosas e, não raro,
ineficazes. É tempo, pois, de, sem prejuízo doutras medidas, incorporar ao sistema os chamados
meios alternativos de resolução de conflitos, que, como instrumental próprio, sob rigorosa
disciplina, direção e controle do Poder Judiciário, sejam oferecidos aos cidadãos como mecanismos
facultativos de exercício da função constitucional de resolver conflitos. Noutras palavras, é preciso
institucionalizar, no plano nacional, esses meios como remédios jurisdicionais facultativos, postos
alternativamente à disposição dos jurisdicionados, e de cuja adoção o desafogo dos órgãos
judicantes e a maior celeridade dos processos, que já serão avanços muito por festejar,
representarão mero subproduto de uma transformação social ainda mais importante, a qual está
na mudança de mentalidade em decorrência da participação decisiva das próprias partes na
construção de resultado que, pacificando, satisfaça seus interesses”. 48
Cabe notar que não se desprezou o quanto já se tinha, e era muito, de conciliação e/ou
mediação extrajudicial, buscadas diretamente pelos interessados. 50 Diversas e qualificadas
instituições e profissionais independentes oferecem e continuarão a oferecer estes serviços com
excelência. Mas agora, como política pública, impõe-se ao Poder Judiciário disponibilizar ao
jurisdicionado o que se chamou de “tratamento adequado da demanda” por meio da conciliação e
da mediação judiciais.
Aliás, incentivada a mediação e a conciliação judiciais por meio desta iniciativa, cujos
resultados certamente são exitosos, provoca-se também o desenvolvimento destes meios
adequados de solução de conflitos no âmbito privado, pois, em última análise, estar-se-á
valorizando a cultura da composição, a cultura da pacificação.
Ao longo dos tempos, por inúmeros fatores, implementou-se a chamada “cultura do litígio”,
pela qual recorrer ao Judiciário foi considerada a principal maneira de acomodação dos conflitos
de interesse. E assim, as pessoas, de um modo geral, perderam a capacidade de, por si sós, ou com
o auxílio de terceiros, superar suas adversidades para resolver seus problemas de forma amigável
ou negociada. Passou a existir a terceirização do conflito, entregando-se ao Judiciário o poder da
solução, que poderia ser alcançada por meios alternativos e diretos.
A mudança desta cultura, provocada pela política pública proposta, aliada aos inúmeros
estudos a respeito e sua prática cada vez mais difundida, nos âmbitos público e, principalmente,
privado, exerce influência direta na própria sociedade.
Aqueles envolvidos com o tratamento adequado do conflito são formadores de opinião, e, como
tal, interferem positivamente na mudança de conduta das pessoas. Igualmente os beneficiados
com a solução amistosa da controvérsia dividem sua experiência positiva, e assim tornam mais
frequente a utilização, por opção, destes instrumentos. Ainda, o ensino jurídico focado nesta
realidade decisivamente contribui para formar profissionais alinhados (ou comprometidos) com
esta nova cultura.
Resgatar o diálogo, desenvolver a escuta, facilitar a comunicação e todo o mais que se explora
na ciência dos meios alternativos de solução de conflitos são extremamente proveitosos para
preservar ou restabelecer o equilíbrio dos vínculos pessoais e jurídicos.
O caminho foi bem traçado, e a prática contribuiu para o desenvolvimento destes institutos –
conciliação, mediação, com a adequada orientação e utilização destes instrumentos. E esta
preocupação também era visível na política pública proposta.
E embora com certo ceticismo de alguns, inclusive com posições críticas radicais de que a
mediação não poderia em hipótese alguma ser oferecida dentro do Judiciário, a experiência foi
reconhecidamente exitosa, alcançando-se plenamente os objetivos propostos.
Neste novo ambiente, bem germinada, crescida e com os melhores frutos a semente do
Tribunal Multiportas plantada pela Res. CNJ 125, em campo fértil pois bem cuidado por todos os
envolvidos (CNJ, Tribunais, mediadores, conciliadores judiciais, e de um modo geral os gestores do
sistema e pessoas que o integram) veio o passo seguinte em homenagem aos meios consensuais de
solução de conflitos: o Código de Processo Civil de 2015.
Assim, confirmada a utilidade do sistema criado pela Res. CNJ 125, e das diversas iniciativas de
promoção da autocomposição, o novo Diploma Processual, reconhecendo os expressivos benefícios
trazidos à estrutura do Judiciário e à própria sociedade, prestigia na essência, a ideia do Tribunal
Multiportas.
Na sequência, veio a Lei 13.140/2015 – Marco Legal da Mediação, que da mesma forma traz
previsão expressa a respeito da Mediação judicial, 52 e reconhece os centros judiciários de solução
consensual de conflitos criados pela Resolução, inclusive para atuação pré-processual.
A bem da verdade, a duplicidade normativa de 2015 foi demasiada, não se podendo poupar
críticas ao legislador por deixar de, sabendo dos projetos então em andamento, desenvolver textos
comuns, harmônicos e interligados quando necessário.
Conhecemos as dificuldades em se ter uma boa lei (no aspecto técnico jurídico), diante de um
complexo processo legislativo influenciado pela política e vaidade, principalmente dos pais e
daqueles participantes ativos da gestação dos projetos; mas sem dúvida a pouca técnica ao se
lançar duas leis com conteúdo próximo, que até mesmo traz problemas de interpretação e
harmonização, se supera facilmente pelo muito de positivo encontrado na essência de ambas as
normas: a confirmação e prestígio do Tribunal Multiportas.
Por questões didáticas, optamos neste “Curso” em manter o quanto se apresentou até a 4ª
edição sobre o conteúdo e Res. CNJ 125/2010. E não por apego ou merecida referência histórica,
mas porque foi renovada a sua eficácia após a vigência das novas Leis referidas, com as
necessárias adequações contidas na Emenda n. 2, de 08.03.2016, pois houve referência expressa à
organização estratégica do modelo (entre proposta de estrutura e diversos outros detalhes) por
normas do Conselho Nacional de Justiça (arts. 165 e 167, CPC/2015 e arts. 11 e 24, Lei 13.140/15).
Em seguida, falaremos das principais inovações do Código de Processo Civil de 2015 e do Marco
Legal da Mediação (no quanto relativo à Mediação judicial), apontando alguns eventuais pontos de
atrito, e as adequações promovidas na Res. CNJ 125/2010 pelo Conselho Nacional de Justiça, na
amplitude de sua atribuição a respeito, até mesmo indicada nas leis, e com a competência que tem
demonstrado ser portador a respeito deste tema.
Enfim, pelos seus benefícios para a sociedade e para o próprio Poder Judiciário, o Tribunal
Multiportas representa uma incontestável evolução, com sua confirmação pelas leis de 2015,
cabendo também ao Conselho Nacional de Justiça, diante das inovações legislativas, no quanto a
ele atribuído, atualizar sempre o planejamento estratégico sobre a conciliação e mediação
judiciais.
2.5. Do conteúdo da Res. CNJ 125/2010 e Estrutura Proposta
Neste quadro, para a efetivação da política pública de tratamento adequado dos conflitos no
âmbito do Judiciário, nos termos da Resolução, criou-se uma rede institucional entre os seus
órgãos e parceiros, sob o planejamento estratégico do Conselho Nacional de Justiça, e com regras
bem definidas para implantação e funcionamento dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e
Cidadania, especialmente quanto aos protagonistas deste cenário: os conciliadores e os
mediadores.
Vejamos mais detalhadamente a estrutura proposta, com indicação, quando pertinente, dos
artigos da Resolução em análise.
Cria-se uma rede integrada por todos os órgãos do Poder Judiciário, por entidades públicas e
privadas parceiras, por universidades e por instituições de ensino, comprometida com a
implementação da política pública (art. 5.º).
Ainda, manterá Comitê Gestor de Conciliação (art. 17) para controle da implantação deste
projeto, centralizando no Departamento de Pesquisa Judiciária – DPJ os dados estatísticos das
atividades dos Tribunais (arts. 13 e 14), já criado o Portal da conciliação, com as informações
pertinentes ao desenvolvimento do projeto, inclusive compartilhando “boas práticas”, ações,
artigos, pesquisas e outros estudos (art. 15).
Por fim, agora como órgão operacional, deverão ser criados os Centros Judiciários de Solução
de Conflitos e Cidadania, unidades destacadas da atual estrutura dos Tribunais, responsáveis pela
administração dos procedimentos de conciliação e mediação, viabilizando as respectivas sessões
que neles, preferencialmente, deverão se realizar, 55 com os detalhes de sua organização previstos
na Resolução (arts. 8.º e 9.º). 56 É facultativa a atuação nos Centros de membros do Ministério
Público, defensores públicos, procuradores e/ou advogados (art. 11), certamente condicionada à
demanda, objeto e outras características dos conflitos.
Lembre-se, neste momento, que estas unidades devem atender não apenas a demanda de
conciliação e de mediação em processos pendentes, mas também lhes compete dar atendimento
pré-processual aos conflitos (art. 10).
E a amplitude sugerida no § 1.º do art. 1.º da Resolução para este Setor de Cidadania contempla
a prestação de “atendimento e orientação ao cidadão”. 58
Por fim, na recente adequação da Resolução pela Emenda 2/2016, anote-se a introdução de
detalhamento dos “Fóruns de Coordenadores de Núcleos”, com projeção de reuniões próprias de
acordo com o segmento da justiça, para propostas de enunciados, encaminhamento de diretrizes
etc. (arts. 12-A e 12-B), e de parâmetro para as “Câmaras Privadas de Conciliação e Mediação”,
atuarem nos processos judiciais, na forma prevista no art. 164 do CPC/2015 (arts. 12-C, 12-D, 12-E e
12-F).
Espera-se que bons ventos soprem a favor de uma total acolhida pela comunidade jurídica em
geral, e em especial pelos próprios Tribunais, para que sejam alcançados os visionários objetivos
idealizados por todos aqueles que, por inspiração e transpiração, criaram um modelo de
pacificação a ser oferecido pelo Judiciário. 59
Quanto aos conciliadores e mediadores, a Resolução é incisiva ao exigir capacitação por meio
de cursos específicos com conteúdo programático detalhadamente por ela estabelecido (art. 12 e
Anexo I), sujeitando-os, tal como os demais facilitadores do entendimento entre as partes, ao
Código de Ética estabelecido pelo Conselho (Anexo III).
Além do programa pontual, foi estabelecida a capacitação através de cursos nos moldes dos
conteúdos programáticos aprovados pelo Comitê Gestor do Movimento pela Conciliação; e assim o
treinamento deve seguir as diretrizes indicadas além de estágio supervisionado obrigatório. Ainda,
exige-se que o treinamento seja conduzido por instrutor certificado e autorizado pelos Núcleos, na
forma por estes estabelecidas (Anexo I).
Também a reciclagem periódica é prevista, tudo para a excelência do tratamento adequado dos
conflitos por meio destes meios alternativos de solução de controvérsias.
Aos conciliadores e mediadores, sujeitos aos mesmos motivos de impedimento e suspeição dos
juízes (art. 7.º, § 6.º e Anexo III, art. 5.º), serão fornecidos os padrões de comportamento ético e
posturas exigidas no desempenho de suas funções, submetendo estes facilitadores ao “Código de
Ética” contido no Anexo III, do qual se destacam alguns aspectos relevantes, além da obrigação de
agirem com lisura e respeito:
• São princípios fundamentais da atuação dos conciliadores e mediadores (Cf. ainda, Capítulo 3,
item 3.2 – Princípios norteadores da mediação, adiante: confidencialidade 60 , decisão informada,
competência, imparcialidade, independência, autonomia e respeito à ordem pública e às leis
vigentes, empoderamento 61 e validação. 62
• São apresentadas regras de procedimento para que haja o envolvimento das partes com a
iniciativa, buscando não só melhores resultados na pacificação, como o comprometimento ao
eventual acordo. Assim, o procedimento deve ser desenvolvido com informações sobre os métodos
de trabalho, preservada a autonomia da vontade, sem indução a acordo ou tomadas de decisões.
Ainda, quando alcançado o acordo, deve ser feito o chamado “teste de realidade” 63 , certificando-
se o pacificador que os envolvidos tenham perfeita compreensão do resultado, objetivando o
comprometimento com o seu cumprimento (Anexo III, art. 2.º, caput e seus incisos).
Ao encerrar, anote-se que tanto o Código de Processo Civil de 2015 como a Lei da mediação 64
apresentam também regramento da atuação destes facilitadores, com princípios, características,
capacitação e impedimentos similares aos apresentados acima, mas com peculiaridades a serem
referidas adiante.
Realmente, o Código já em seu início, ao cuidar das normas fundamentais do processo civil,
destaca a importância das soluções consensuais de conflito, ao estabelecer ao Estado a sua
promoção, cabendo aos juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público
estimular a conciliação e a Mediação, inclusive no curso do processo (art. 3.º, §§ 2.º e 3.º). De outra
parte, acolhendo a cultura da pacificação, anota o dever de todos os sujeitos do processo em
cooperar entre si para a melhor e mais rápida solução do conflito (art. 6.º).
Mas não foi só com palavras iniciais isoladas, de recomendação, mas também se observa a
transformação da mentalidade do Código na mudança da estrutura do processo, e na valorização
da mediação e conciliação, por diversos aspectos perceptíveis pela análise sistemática da Lei,
inclusive com regime jurídico próprio aos institutos de favorecimento à autocomposição.
Para facilitar, em “Anexo 5” deste “Curso” são transcritos todos os artigos que, direta ou
indiretamente, estão relacionados à mediação e à conciliação judicial. E deles se extrai o que
segue:
Além dos artigos referidos acima, o prestígio à autocomposição se encontra em diversas regras
e aspectos do Código.
Confirma-se a criação de uma estrutura própria dentro do Poder Judiciário para o oferecimento
às partes da mediação e da conciliação. Ainda inova em relação ao que hoje se tem, ao
expressamente admitir o cadastro não só de mediadores como conciliadores, mas também de
câmaras privadas 65 (art. 167). Especificamente sobre o convênio com as Câmaras Privadas, a
Emenda 2/2016 introduziu na Resolução Res. CNJ 125/2010 Seção própria tratando do tema (arts.
12-C, 12-D, 12-E e 12-F),
Coloca-se, como se verá, a mediação ou a conciliação como etapa inicial do processo. E mesmo
na audiência de instrução, deverá o juiz novamente tentar conciliar as partes, independentemente
de terem sido antes empregados outros métodos de solução consensual do conflito (art. 359). Tudo
porque dentre os poderes e responsabilidades do juiz, previstos no art. 139, vem expresso o dever
de “V – promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de
conciliadores e mediadores judiciais”.
Em especial nas ações de família se repete (certamente com a ideia de enfatizar a utilização
destes instrumentos) a necessidade de se empreender esforços para a solução consensual da
controvérsia, “devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de conhecimento
para a mediação e conciliação”, permitida a “suspensão do processo enquanto os litigantes se
submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento multidisciplinar” (art. 694 caput e parágrafo
único). A propósito, o Enunciado 78 da I Jornada referida, recomenda “aos juízes das varas de
família dos tribunais onde já tenham sido implantadas as oficinas de parentalidade que as partes
sejam convidadas a participar das referidas oficinas, antes da citação nos processos de guarda,
visitação e alienação parental, como forma de fomentar o diálogo e prevenir litígios”. 66
Da mesma forma incentivadora da pacificação, se direciona o Código nos litígios coletivos pela
posse de imóvel, quando prevê que se a turbação ou esbulho afirmado tiver ocorrido há mais de
ano e dia, previamente à apreciação do pedido de concessão de liminar, deverá ser realizada
audiência de mediação (art. 565). 67
De outra parte, é concedido ao oficial de justiça a atribuição de, por ocasião da realização de
diligência, certificar, em mandado, proposta de autocomposição apresentada por qualquer das
partes, oportunidade em que será dada vista para a outra parte se manifestar em 5 (cinco) dias,
entendendo-se o silêncio como recusa (art. 154, VI e parágrafo único).
Tem impacto esta previsão, pois assumem bônus e ônus, estes, por exemplo, também
representados pelo impedimento e suspeição dos facilitadores, pelos mesmos motivos atribuídos
aos juízes (art. 148, II; e no mesmo sentido, art. 5.º da Lei 13.140/2015).
O Código mantém próxima a organização prevista na Res. CNJ 125, quanto, inclusive ao
cadastro (inclusão e exclusão, acrescentando que poderá ser precedido de concurso público),
capacitação, com a inovação já referida no que se refere à aceitação de câmaras privadas. Admite-
se ainda a criação de quadro próprio de conciliadores e mediadores, a ser preenchido por
concurso público de provas e títulos (art. 167, § 6.º), como já se faz isoladamente em alguns
Tribunais.
Especificamente sobre a capacitação, o Código remete aos parâmetros definidos pelo Conselho
Nacional de Justiça (§1.º do art. 167 – atualmente contidos na Res. CNJ 125, e seus ajustes). Já a Lei
13.140/2015 é mais rigorosa, ao exigir também a graduação há pelo menos dois anos. 69
Prevista a remuneração (art. 169 caput), também se permite expressamente que “A Mediação e
a conciliação podem ser realizadas como trabalho voluntário, observada a legislação pertinente e
a regulamentação do tribunal” (§ 1.º; também assim o § 5.º do art. 7.º da Res. CNJ 125/2010); e
aceita a inscrição de câmaras privadas, a elas também é imposta a responsabilidade social de
atendimento a processos em que foi deferida a gratuidade da justiça, como contrapartida ao seu
credenciamento, fixado o percentual de audiências não remuneradas pelo Tribunal (§ 2.º).
Também a respeito, a Lei 13.140/15 estabelece: “Art. 13. A remuneração devida aos mediadores
judiciais será fixada pelos tribunais e custeada pelas partes, (...)” observado o direito à gratuidade
aos necessitados, prevista no § 2.º do art. 4.º desta Lei. 70 E a Res. CNJ 125/2010, no inciso VIII do
art. 7.º outorga aos Núcleos dos tribunais a regulamentação da remuneração de mediadores e
conciliadores.
Como já antes referido, feita a distinção entre a atuação do conciliador e do mediador (art. 165,
§§ 2.º e 3.º – embora possível de críticas já decantadas entre comentaristas e profissionais
envolvidos com o tema) os métodos são flexibilizados, na medida em que “§ 3.º Admite-se a
aplicação de técnicas negociais, com o objetivo de proporcionar ambiente favorável à
autocomposição” (art. 166, § 3.º). Neste mesmo sentido, pode-se extrair o contido na Lei
13.140/2015, aliás na qual sequer foi feita referência à conciliação, no §1.º do art. 4.º: “O mediador
conduzirá o procedimento de comunicação entre as partes, buscando o entendimento e o consenso
e facilitando a resolução do conflito”. Há referência também em ambas as normas a princípios,
confidencialidade e livre escolha dos interessados (CPC/2015, art. 166, caput, e seus parágrafos; Lei
13.140/2015, art. 2.º), a serem melhor abordados no próximo capítulo, pois idênticos à mediação
extrajudicial.
Por primeiro, e até aqui é tranquilo, anote-se a impossibilidade do facilitador depor como
testemunha em processo onde se discute o litígio por ele acompanhado. Esta restrição já se extrai
da sua obrigação de sigilo ou confidencialidade, podendo-se avocar o impedimento do inc. III do §
2.º do art. 447 (por ter assistido as partes), facultada a recusa ao depoimento pelo inc. II do art. 448
(fatos que deva guardar sigilo). E o §2.º do art. 166 é expresso no sentido de que “Em razão do
dever de sigilo, inerente às suas funções, o conciliador e o mediador, assim como os membros de
suas equipes, não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos oriundos da conciliação
ou da mediação”.
Neste aspecto, também enfática e direta a nova Lei 13.140/2015: “Art. 7.º O mediador não
poderá atuar como árbitro nem funcionar como testemunha em processos judiciais ou arbitrais
pertinentes a conflito em que tenha atuado como mediador” 71 .
O segundo aspecto a ser analisado é a restrição prevista no § 5º do art. 167: “Os conciliadores e
mediadores judiciais cadastrados na forma do caput, se advogados, estarão impedidos de exercer a
advocacia nos juízos em que desempenhem suas funções”.
Esta previsão, desde a inclusão da ideia nos projetos iniciais e emendas, gerou calorosos
debates 72 , e a redação ao final aprovada foi mais acanhada, e não tão abrangente como se chegou
a sugerir (extensivo o impedimento aos limites da competência territorial do tribunal, vedado
inclusive integrar escritório de advocacia na área).
Resta porém identificar o que seja o “juízo” previsto na norma, pois assim pode ser considerado
o juízo da tal vara cível/família, ou de forma ampliada, juízo estadual, juízo federal, juízo cível,
juízo de tal ou qual comarca etc., pela polissemia do termo.
Temos para nós que, tratando-se de regra restritiva de direitos, a interpretação deve ser contida
ao máximo, e assim, limitado o impedimento à menor extensão que se puder conferir. E para esta
análise, será necessária a verificação de como será a organização dos trabalhos de mediação e
conciliação. Se alocados facilitadores para atendimento de uns ou alguns juízos específicos, só em
relação a estes haverá a restrição. Depende, repita-se, de como será a estrutura a ser criada, mas
sempre com a ideia de impor o impedimento da maneira menos extensiva possível.
Ainda neste aspecto, ressalte-se que não se desconhece o eventual abuso do profissional, como
por exemplo, na utilização deste expediente para captação de clientes, porém não se libera esta
inadequada conduta, pois interpretação restritiva acima convive com os demais meios de punição
ao advogado inescrupuloso, como previstos no Estatuto da Ordem.
Mas agora a discussão tem outro viés, não mais pelo debate da adequação de seu conteúdo, pois
positivado, mas direciona-se a análise da subsistência ou não desta restrição diante da Lei
13.140/15 – Marco Legal da Mediação.
Isto porque a Lei de Mediação não mais faz referência a esta restrição, já despertando entre os
envolvidos com o tema o debate se esta Lei, mais nova e específica, (embora com vigência
programada para antes do Código de Processo Civil), teria revogado a nova legislação processual
agora já em vigor.
Realmente, esta revogação de regras quando ainda em vacância a Lei poderia ocorrer, até para
correções ou ajustes em diplomas da magnitude de um Código.
Porém, para nós, ao menos neste aspecto aqui avaliado, não houve a revogação.
A omissão da Lei de Mediação não deve ser considerada como incompatível com a previsão do
Código. E ainda, mais especial é o Código neste particular, pois a ele cabe organizar ou idealizar a
estrutura da mediação/conciliação endoprocessual.
Assim, não vislumbramos pelas regras contidas no art. 2.º da LINDB fundamento para
revogação da restrição, permitindo-se a convivência em harmonia das normas para esta questão.
Por fim, outro impedimento ao facilitador judicial é a restrição pelo prazo de 1 (um) ano,
contado do término da última audiência em que atuaram, para assessorar, representar ou
patrocinar qualquer das partes (art. 172, com idêntica previsão no art. 6.º da Lei 13.140/2015).
Para nós, este impedimento se refere exclusivamente à atuação em outras questões que não
aquelas que tenham relação com os fatos ou elementos contidos na conciliação ou mediação
acompanhada pelo facilitador, pois para estas, o impedimento deve ser absoluto e definitivo (para
sempre), considerando que o facilitador teve acesso a informações, fragilidades e vários outros
elementos da intimidade daquele conflito específico.
Anote-se que na Res. CNJ 125/2010 acima analisada, já revista pela entrada em vigor das novas
leis, há o impedimento nesta linha, vedada a prestação de serviços profissionais, de qualquer
natureza, aos envolvidos em processos de conciliação/mediação sob condução do facilitador (art.
7.º do Anexo III – Código de Ética).
Rompendo com o sistema adversarial 73 do Diploma de 1973, o Código de Processo Civil de 2015,
com modelo já introduzido em outros países, abraça calorosamente a ideia de se conduzir as
partes à pacificação, ao estabelecer audiência de conciliação ou de mediação como etapa inicial no
procedimento comum, iniciando-se o prazo para contestação apenas depois de superada esta fase;
vejamos a indicação do art. 334 com alguns outros detalhes que são autoexplicativos:
“Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de
improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de Mediação com
antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias
de antecedência.
§ 2.º Poderá haver mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação, não podendo
exceder a 2 (dois) meses da data de realização da primeira sessão, desde que necessárias à
composição das partes.
§ 3.º A intimação do autor para a audiência será feita na pessoa de seu advogado.
§ 5.º O autor deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição, e o réu
deverá fazê-lo, por petição, apresentada com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da
audiência.
§ 7.º A audiência de conciliação ou de mediação pode realizar-se por meio eletrônico, nos
termos da lei.
§ 8.º O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é
considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por
cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do
Estado.
§ 9.º As partes devem estar acompanhadas por seus advogados ou defensores públicos.
§ 10. A parte poderá constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes
para negociar e transigir.
Anote-se a reiteração desta etapa pela Lei 13.140/15: “art. 27. Se a petição inicial preencher os
requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará
audiência de mediação”.
Em harmonia, com a regra, o art. 250 estabelece a citação do réu também para comparecimento
à audiência, se for o caso, e não para contestação de pronto, e nesta deverá estar, tal qual o autor,
acompanhado de advogado ou de defensor público. 74
A audiência não se realiza quando não se admitir autocomposição, mas lembre-se que mesmo
em ações relativas a direito indisponível, como a investigação de paternidade, pode haver
reconhecimento do pedido pelo réu ou acordo parcial, relativo a realização espontânea de exame
de DNA etc.; daí a redobrada atenção para se conferir a maior abrangência possível à expectativa
de composição, inclusive se parcial. E com mais valia, assim, a previsão contida no art. 3.º da Lei
13.140/2015: “Art. 3º Pode ser objeto de mediação o conflito que verse sobre direitos disponíveis ou
sobre direitos indisponíveis que admitam transação. § 1º A Mediação pode versar sobre todo o
conflito ou parte dele. § 2º O consenso das partes envolvendo direitos indisponíveis, mas
transigíveis, deve ser homologado em juízo, exigida a oitiva do Ministério Público.”
A iniciativa de se determinar a audiência como etapa inicial do processo não teria valia se
inexistente punição ao ausente: e assim, correto considerar a falta da parte como ato atentatório a
dignidade da justiça, inclusive com imposição de multa de até 2% sobre a vantagem econômica
pretendida, ou sobre o valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado (§ 8º).
Como questão para reflexão, fica a seguinte indagação: as partes, já no negócio processual a
que se refere o art. 190 do CPC/2015 80 podem de comum acordo afastar esta etapa do
procedimento neste instrumento próprio anterior? Em uma primeira análise, pela abrangência
desejada e vinculação esperada deste negócio jurídico, há de se lhe dar esta prevalência ao
procedimento previsto no Código, pois fruto da vontade manifestada pelas partes (evidentemente
se preenchidos seus requisitos). Neste contexto, uma vez comprovada a existência de cláusula
prévia estabelecendo a não realização desta audiência, o procedimento deverá seguir diretamente
para a contestação.
As sessões de conciliação ou mediação podem ser repetidas, mas com prazo limite para se
realizar (§ 2.º). Anote-se, porém, que nas questões de família, não há restrição temporal para as
sessões, com suspensão do processo, “sem prejuízo de providências jurisdicionais para evitar o
perecimento do direito” (art. 696). Ainda, a Lei 13.140/2015 flexibiliza este prazo ao permitir seja
ele prorrogado por requerimento conjunto das partes (art. 28) 81 que, na amplitude do art. 313, I do
CPC/2015 também pode ser solicitado. 82
Em tese, a ser certamente organizado em cada Tribunal, e de acordo com a estrutura local do
juízo, deverá haver uma triagem prévia para se encaminhar o processo logo no início a um
conciliador ou a um mediador, de acordo com as características da causa, mediante sorteio do
facilitador dentre aqueles cadastrados. Acordando previamente as partes sobre a escolha de um
nome comum, este prevalecerá, independentemente de estar cadastrado no tribunal (art. 168, 83
prevista em seu §3.º também a designação, quando recomendável, de mais de um mediador ou
conciliador). 84
Temos convicção de que a iniciativa do Código com este novo modelo de processo é alvissareira,
e aproveitando os bons resultados do que já muito se tem a respeito das experiências judiciais
voltadas ao incentivo da composição, certamente se fortalece a cultura da pacificação,
extremamente saudável e proveitosa para as relações sociais.
Aos céticos com a inovação, recomenda-se a leitura do mito das cavernas, e a reflexão sobre
abandonar a cultura do litígio, e as relações sociais advsersariais, para se conhecer um sistema de
cooperação em benefício de todos, no qual cada um é considerado parte importante e ativa para a
solução positiva de um problema, ainda que não lhe tenha dado causa.
Como já referido em outras oportunidades, a Lei 12.140/2015 é “lei nova” em relação ao Código
de 2015, embora entre em vigor antes do regramento processual. Ainda, quanto à mediação
privada é especial, mas no quanto estabelecido a respeito da mediação judicial, o ambiente
próprio para tanto é realmente a legislação codificada que traz uma sistematização completa a
respeito.
Passa a ter previsão expressa para o dever de revelação, antes da aceitação da função, de
“qualquer fato ou circunstância que possa suscitar dúvida justificada em relação à sua
imparcialidade para mediar o conflito, oportunidade em que poderá ser recusado por qualquer
delas” (parágrafo único do art. 5.º), tal como se exige do árbitro (LArb, art. 14, §1.º).
A seu turno, estabelece a Lei em seu art. 16: “Ainda que haja processo arbitral ou judicial em
curso, as partes poderão submeter-se à mediação, hipótese em que requererão 86 ao juiz ou árbitro
a suspensão do processo por prazo suficiente para a solução consensual do litígio. § 1.º É
irrecorrível a decisão que suspende o processo nos termos requeridos de comum acordo pelas
partes. 2.º A suspensão do processo não obsta a concessão de medidas de urgência pelo juiz ou
pelo árbitro”. Este dispositivo tem rendimento principalmente para os processos em curso, quando
de sua vigência, pelo modelo anterior à mediação como etapa inicial da ação, e confere ao juiz
uma causa específica de suspensão do processo. O que se estabelece, evidentemente, já pode ser
alcançado independente da previsão, mas não deixa de ser um prestígio à mediação.
De um modo geral, como já se disse, entendemos inexistir incompatibilidade entre as Leis, não
obstante a certa crítica à duplicidade normativa se deve direcionar. Pelo bom-senso e critérios de
ponderação se encontram meios saudáveis para sustentar a convivência harmônica entre as
inovações, pois o objetivo de ambas é comum: prestigiar os meios consensuais de solução de
conflitos.
SALLES, Carlos Alberto; LORENCINI, Marco Antonio Lopes; SILVA, Paulo Eduardo Alves da.
Negociação, Mediação e Arbitragem – Curso Básico para programas de graduação em Direito. São
Paulo: Ed. Gen-Método, 2013.
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dos conflitos de interesses. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; PELUSO, Antonio Cezar; RICHA, Morgana
de Almeida (coords.). Conciliação e Mediação: estruturação da política judiciária nacional. Rio de
Janeiro: Forense, 2011.
NOTAS DE RODAPÉ
1
Nas soluções autocompositivas, embora possa participar um terceiro como facilitador da comunicação
(inclusive com propostas de solução, conforme o caso), o resultado final depende exclusivamente da
vontade das partes; a aceitação ou recusa à composição, está no arbítrio do interessado. Já nos métodos
heterocompositivos, a resolução do conflito é imposta por um terceiro, com poderes para tanto
(magistrado, árbitro etc.), daí porque falar-se em solução adjudicada; as partes estarão submetidas à
decisão preferida pelo terceiro, mesmo se contrária aos seus interesses.
CAPPELLETTI, Mauro; Garth, Bryant. Acesso à Justiça . Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Fabris,
2002. p. 71.
FISHER, Roger; URY, William; PATTON, Bruce. Como chegar ao sim : negociação de acordos sem concessões.
Tradução de Vera Ribeiro e Ana Luiza Borges. 2. ed. Rio de Janeiro: Imago, 2005. p. 22.
BUITONI, Aldemir. Mediar e conciliar: as diferenças básicas. Jus Navigandi , n. 2.707, ano XV, Teresina,
nov. 2010, p. 13. Disponível em: [http://jus.uol.com.br/revista/texto/17963]. Acesso em: 09.03.2011.
Cf. Braga Neto, Adolfo; Sampaio, Lia Regina Castaldi. O que é Mediação de conflitos . São Paulo: Brasiliense,
2007. p. 17-22.
10
11
Chega-se a questionar em corredores de eventos, inclusive, se a conciliação privada não teria sido extinta,
ou incorporada apenas à mediação, como um de seus “modelos” ou “escolas”.
12
Inclusive com a utilização cada vez maior de “cláusula escalonada”, analisada no Capítulo 6, item 6.2.4.
13
Adiante se oferecem mais detalhes a respeito, como a forma de cada parte manifestar o desinteresse na
audiência, e a obrigatoriedade desta etapa se uma delas não oferecer objeção à audiência.
14
Relativo a causas de impedimento e suspeição do mediador; assim: “Art. 5.º Aplicam-se ao mediador as
mesmas hipóteses legais de impedimento e suspeição do juiz”.
15
Além dos mecanismos apresentados neste item, recomenda-se a Leitura de Fernanda Rocha Lourenço
Levy, fonte inclusive de muitas das informações abaixo, em obra na qual se apresentam outros meios
privados para resolução de controvérsias, como o rent-a-judge (também denominado de private judging ),
o baseball arbitration (também conhecido por last offer ou pendulum arbitration ), o high-low arbitration
(ou bracketed arbitration ). ( Cláusulas escalonadas – A Mediação comercial no contexto da arbitragem .
Saraiva: 2013, p. 118-120). Aliás, até mesmo o já conhecido entre nós “ Ombudsman (do sueco,
representante do povo), instituto criado com o objetivo de oferecer um canal de comunicação imparcial e
independente para o recebimento de reclamações sobre os serviços públicos mal prestados, estendido ao
setor privado”, é trazido como ferramenta acomodação de interesses, na medida em que “diante da
reclamação realizada, toma as providências cabíveis para esclarecê-la e investigá-la com a finalidade de
propor acordos ou de encaminhá-la às providências cabíveis, pois em geral, não possui poderes de
punição.” (p. 128).
16
17
Esta referência indica o executive mini-trial , mais utilizado, sendo também conhecido o judicial mini-trial ,
“procedimento híbrido que ocorre dentro do juízo estatal. Nessa hipótese, estando o litígio em curso, o juiz
sugere um mini-trial e se as partes o aceitam, segue-se o procedimento de apresentação sumária das
alegações e o juiz sugere uma decisão não vinculante e que permanecerá confidencial. Caso as partes a
aceitem ou cheguem a outro acordo, o caso está resolvido, caso contrário, o processo retoma seu curso
perante o poder judiciário, sendo que o juiz que atuou no mini-trial não será o mesmo que dará
continuidade ao processo”, como esclarece Fernanda Rocha Lourenço Levy; acrescentando: “O mini-trial é
um meio mais rápido e menos custoso que o processo judicial e a arbitragem. Possibilita ainda a
manutenção das relações e, caso as negociações não avancem rumo ao acordo, serve ainda como
oportunidade para a obtenção de dados que auxiliarão na avaliação mais realística do caso. Embora seja
um meio apto à negociação, o mini-trial ainda mantém a lógica adversarial e nesse quesito, pode ficar em
desvantagem em relação à mediação” (Cláusulas escalonadas – A mediação comercial no contexto da
arbitragem. Saraiva: 2013, p. 121).
18
Este mecanismo, inclusive, pode vir previsto em Regulamentos de Instituições de Mediação e Arbitragem,
oferecido como expediente prévio ao respectivo procedimento, a exemplo do contido nas regras da
American Arbitration Association (AAA) (cf.
[http://www.adr.org/aaa/faces/services/disputeavoidanceservices/earlyneutralevaluation]. Acesso
em:13.07.2015).
19
Cf. a respeito, Marco Antônio Garcia Lopes Lorencini, “‘Sistema Multiportas’: Opções para tratamento de
conflitos de forma adequada”, In: Negociação, Mediação e Arbitragem – Curso Básico para programas de
graduação em Direito . Coordenadores Carlos Alberto Salles, Marco Antônio Lopes Lorencini e Paulo
Eduardo Alves da Silva. Editora Gen – Método: São Paulo, 2013, p. 65, para quem: “Esse método é indicado
principalmente nos casos em que grassa forte polêmica em torno de um elemento de prova, ou, ainda,
quando uma das partes tem uma expectativa exagerada de sua posição na disputa”.
20
Acolhido na prática doméstica, como adiante se verá, o dispute board recebeu prestígio na I Jornada
Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios, promovida entre 22 e 23 de agosto de 2016 pelo Centro de
Estudos Judiciário do Conselho da Justiça Federal, com 3 enunciados aprovados a seu respeito na Comissão
de “Outras formas de solução de conflitos”, sendo o primeiro deles, embora sem qualquer repercussão
diante do quanto já se tem na teoria e experiência sobre o proveitoso modelo, assim redigido “Enunciado
49: Os Comitês de Resolução de Disputas ( Dispute Boards ) são método de solução consensual de conflito,
na forma prevista no § 3° do art. 3º do Código de Processo Civil Brasileiro” e os outros reproduzidos em
oportunidade própria abaixo.
21
Ou, como diz Claudia Elisabete Schwerz Cahali: “Os disputes resolution boards são comitês ou conselhos
técnicos instituídos, em geral, por ocasião da celebração do contrato para acompanhar a sua execução
com a finalidade de resolver conflitos e evitar que se transformem em litígios e prejudiquem o
cumprimento das obrigações contratuais. Trata-se de meio alternativo de solução de conflito muito
utilizado na construção civil e nos contratos de longo prazo ou de execução diferida” (O Gerenciamento de
Processos Judiciais em busca da efetividade da prestação jurisdicional. Editora Gazeta Jurídica. Brasília:
2013. p. 82).
22
Neste sentido, o Enunciado 76 da I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios acima referida;
assim: “As decisões proferidas por um Comitê de Resolução de Disputas ( Dispute Board ), quando os
contratantes tiverem acordado pela sua adoção obrigatória, vinculam as partes ao seu cumprimento até
que o Poder Judiciário ou o juízo arbitral competente emitam nova decisão ou a confirmem, caso venham
a ser provocados pela parte inconformada.”.
23
Gilberto José Vaz. “Breves considerações sobre os dispute boards no Direito brasileiro” Re vista de
Arbitragem e Mediação , RT, São Paulo, v. 10, jul. 2006. p. 165.
24
E assim reconhecido pela I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios acima referida:
“Enunciado 80: A utilização dos Comitês de Resolução de Disputas (Dispute Boards), com a inserção da
respectiva cláusula contratual, é recomendável para os contratos de construção ou de obras de
infraestrutura, como mecanismo voltado para a prevenção de litígios e redução dos custos correlatos,
permitindo a imediata resolução de conflitos surgidos no curso da execução dos contratos”.
25
Como nos dá notícia Rui de Arruda Camargo. Comitê de solução de controvérsias : nova modalidade de
solução para conflitos em obras. Publicado em 4 de setembro de 2012.
[http://www.ie.org.br/site/noticias/exibe/id_sessao/70/id_colunista/3/id_noticia/6988/Comit%C3%AA-de-
solu%C3%A7%C3%A3o-de-controv%C3%A9rsias---Nova-modalidade-de-solu%C3%A7%C3%A3o-para-
conflitos-em-obras] (acesso em13.07.2015), para quem: “ao lado do Contrato, a documentação técnica que
define a obra tais como o Projeto, as Normas Técnicas, as Especificações de Produtos e de Serviços e o
Método Construtivo e tantos outros, assumem a mesma posição do Contrato quanto a sua importância.
Geralmente, problemas causados por essa complexa documentação acabam gerando conflitos que
certamente deságuam em gastos algumas vezes elevados e não previstos a serem cobertos pelas partes em
conjunto ou individualmente, conforme o caso. Não é raro ocorrer questionamentos entre os contratantes
durante o desenrolar de uma obra. Esses litígios poderão surgir motivados por vários fatores, como:
conflitos de projeto, divergência entre documentos técnicos, surgimento de situações não previstas em
contrato, mudanças de projeto durante a obra e muitas outras situações que não puderam ser previstas.
Atualmente, para minimizar os problemas de custo com longos processos judiciais, atraso no cronograma,
desgaste entre parceiros, está sendo praticada uma nova forma de mitigação dessas divergências pela
nomeação de um Comitê de Solução de Controvérsias, também conhecido por Dispute Review Board –
DRB.”.
26
27
Para se conhecer mais deste modelo, indica-se a leitura do artigo específico desenvolvido com cuidadosa
pesquisa, apresentando origem, características e particularidades do instituto no direito estrangeiro,
muito bem elaborado por Marcelo Alencar Botelho de Mesquita, que inicia seu texto destacando: “quando
falamos em adjudicação no setor da construção referimo-nos à solução de certo conflito por um terceiro
imparcial, de forma rápida e provisória, tendo as partes de obedecer a sua decisão até que, pela via
arbitral ou em um processo judicial, chegue-se a outra conclusão”. Mesquita, Marcelo Alencar Botelho de.
Adjudicação de conflitos na construção. In: Marcondes, Fernando (org.). Temas de Direito da Construção .
São Paulo: Pini, 2015.
28
Fernanda Rocha Lourenço Levy ( Cláusulas escalonadas – A Mediação comercial no contexto da arbitragem
. Saraiva: 2013, p. 126).
29
Cf. Série Pensando o Direito n. 38/2011, do Projeto desenvolvido pela Secretaria de Assuntos Legislativos
do Ministério de Justiça – SAL, em parceria com a Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio
Vargas. Disponível em [http://participacao.mj.gov.br/pensandoodireito/wp-
content/uploads/2012/11/38Pensando_Direito.pdf], acessado em 26.06.2013, onde foram analisados, dentre
outros, casos de vítimas de choque de trens da CPTM e de loteamento irregular.
30
A respeito, recomenda-se a leitura de Diego Faleck, Introdução ao “ Design de Sistema de Disputa: Câmara
de Indenização 3054”, RBA – Revista Brasileira de Arbitragem n. 23, Jul-Set/2009, Publicação conjunta IOB
e CBAr. São Paulo: 2009, p. 7. E pelos ótimos resultados, a pedido do Governador do Estado, este
procedimento foi utilizado como parâmetro para as negociações desenvolvidas pela Defensoria Pública de
São Paulo no caso do acidente de metrô ocorrido no mesmo ano, obtendo-se, igualmente, índice elevado
de acordo com as vítimas. “A Defensoria Pública atuou em cerca de 60% das pessoas atingidas pelo
acidente nas obras do metrô. 61 casos resultaram em acordos (32 com inquilinos, 28 com proprietários e
um com familiares de vítima fatal), beneficiando, ao todo, 145 pessoas (127 adultos e 18 crianças). Os
acordos extrajudiciais foram fechados entre 24 de janeiro e 23 de agosto de 2007 em sessões de conciliação
na Secretaria de Justiça. As indenizações abrangeram danos materiais e danos morais” (cf.
[http://www.premioinnovare.com.br/praticas/indenizacoes-extrajudiciais-relacionadas-ao-acidente-do-
metro-em-sao-paulo-2546/], acessado em 26.06.2013).
31
Desenvolvidos pela Internet Corporation For Assigned Name and Numbers – ICANN, com a
implementação em 1999 da denominada Uniform Dispute Resolution Policy – UDRP acolhidas as
recomendações da Organização Mundial da Propriedade Intelectual – ONPI (WIPO – World Intellectual
Property Organization). Cf., a respeito, Carlos Eduardo Neves de Carvalho, “Análise comparativa de
resolução de conflitos de nomes de domínio: Sistema brasileiro e UDRP”, Revista ABPI – Associação
Brasileira da Propriedade Intelectual, n. 123, mar./abr. 2013, p. 3, e na mesma revista, Karen Cristina
Moron Betti Mendes e Kelli Angelini Neves, “Solução de conflitos de Internet para domínios no ‘.br’”, p. 63.
32
33
34
Regulamento do SACI, Art. 22: “Se a decisão proferida no procedimento do SACI-Adm determinar que o
nome de domínio objeto do conflito seja transferido ao Reclamante ou seja cancelado, o NIC.br aguardará
o decurso do prazo de 15 (quinze) dias úteis contados da data em que foi comunicado pela instituição
credenciada da decisão, implementando-a em seguida. Parágrafo único: Se qualquer das Partes
comprovar que ingressou com ação judicial ou processo arbitral no período mencionado no caput deste
artigo, o NIC.br não implementará a decisão proferida no procedimento e aguardará determinação
judicial ou do processo arbitral.”
35
Para se saber mais a respeito, recomenda-se a consulta ao primoroso livro “Nomes de domínio na Internet
– Aplicação do sistema administrativo de conflitos” (São Paulo: Ed. Novatec, 2015), fruto da dissertação de
Mestrado apresentada na PUC/SP por sua Autora Kelli Angelini Neves, no qual, através de densa pesquisa,
experiência profissional e substancial bagagem acadêmica, apresenta-se análise completa desta matéria.
36
Cf. adiante, em “Anexo 3”, o texto integral da Lei 13.140, de 26 de junho de 2015. O tema é, sem dúvida,
riquíssimo, apresentando campo fértil para profícua reflexão e prática. Mas nos restritos limites deste
“Curso”, deixa-se de aprofundar os seus estudos, limitando-se a chamar a atenção sobre esta peculiar
forma de se solucionar conflitos em ambiente externo ao Poder Judiciário, envolvendo a administração
pública, com seus diversos personagens que, como se sabe, é a campeã em processos judiciais pendentes.
37
Promovida entre 22 e 23 de agosto de 2016 pelo Centro de Estudos Judiciário do Conselho da Justiça
Federal. Cf. em “Anexo 7” o texto integral dos enunciados aprovados.
38
Confira-se a respeito a “cartilha” elaborada para esclarecimentos sobre esse tipo de arbitragem em
[www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/217576]. Acesso em: 03.01.2016. E há notícia de que nos
últimos anos a CCAF realizou mais de 170 conciliações em pendências patrimoniais, tributárias,
orçamentárias, embientais e agrárias, com homologação dos acordos após 800 reuniões realizadas em
todo o território nacional ([www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/309575]. Acesso em
02.06.2015)
39
40
Também próximo ao tema: “Propõe-se a implementação da cultura de resolução de conflitos por meio da
mediação, como política pública, nos diversos segmentos do sistema educacional, visando auxiliar na
resolução extrajudicial de conflitos de qualquer natureza, utilizando mediadores externos ou capacitando
alunos e professores para atuarem como facilitadores de diálogo na resolução e prevenção dos conflitos
surgidos nesses ambientes” (Enunciado 28).
41
À época, também integravam o Conselho Consultivo os seguintes professores: Armando Manuel da Rocha
Castelar Pinheiro, Carlos Augusto Lopes da Costa, Elizabeth Sussekind, Everardo Maciel, Kazuo Watanabe,
Luiz Jorge Werneck Vianna, Maria Tereza Aina Sadek e Vladimir Passos de Freitas.
42
Veja a íntegra da Res. CNJ 125/2010 nos sites : [www.cahali.adv.br ( espaço acadêmico )] ou
[www.cnj.jus.br], ambos acessados em: 04.06.2013.
43
Cf. Luchiari, Valéria Ferioli Lagrasta. Comentários da Resolução n. 125, do Conselho Nacional de Justiça, de
29 de novembro de 2010. In: Grosman, Claudia Frankel; Mandelbaum, Helena Gurfinkel (orgs.). Mediação
no Judiciário: teoria na prática e prática na teoria . São Paulo: Primavera, 2011: “Assim, seguindo essa
diretriz e tendo por base proposta encaminhada pelo professor Kazuo Watanabe, o ministro Cezar Peluso
nomeou um grupo de trabalho no Conselho Nacional de Justiça, do qual fiz parte, que ficou responsável
por elaborar minuta de resolução para instituir a política pública de tratamento adequado de conflitos no
Brasil. E, em 29 de novembro de 2010, foi baixada a Res. 125, do Conselho Nacional de Justiça, publicada
em 1.º de dezembro de 2010, que instituiu a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado de
conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário. A política pública acima mencionada tem por
objetivo a utilização dos meios alternativos de solução de conflitos, principalmente da conciliação no
âmbito do Poder Judiciário e sob a fiscalização deste, e, em última análise, a mudança de mentalidade dos
operadores do direito e das próprias partes, com a obtenção do escopo magno da jurisdição que é a
pacificação social, sendo apenas consequências indiretas desta, mas de suma relevância, a diminuição do
número de processos e o afastamento da morosidade do Judiciário” (p. 304).
44
Veja a íntegra da Res. CNJ 125/2010 em sua versão original,, e a íntegra da Emenda 1/2013 nos sites :
[www.cahali.adv.br ( espaço acadêmico )] ou [www.cnj.jus.br], ambos acessados em: 04.06.2013; e veja-se o
texto da Emenda 2/2016 em
[http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/03/d1f1dc59093024aba0e71c04c1fc4dbe.pdf] e a versão
consolidada da Res. CNJ 125/2010 com a incorporação das emendas em
[http://cnj.jus.br/images/atos_normativos/resolucao/resolucao_125_29112010_11032016150808.pdf] ambos
acessados em: 12.01.2017.
45
Watanabe, Kazuo. Cultura da sentença e cultura da pacificação. In: Moraes, Maurício Zanoide; Yarshell,
Flávio Luiz (coords.). Estudos em homenagem à professora Ada Pellegrini Grinover . São Paulo: DPJ, 2005. p.
684-690.
46
47
48
Documento de Posse na Presidência do STF, Min. Antonio Cezar Peluso, cerimônia realizada em
23.04.2010, p. 9-10. Disponível em:
[www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/discursoPeluso.pdf]. Acesso em:13.07.2015. Cf.
também neste sentido, Valéria Lagrasta, assim escrevendo: “E não se quer, com isso, diminuir a
importância do Poder Judiciário, dos magistrados e de suas sentenças. Pelo contrário, o que se deseja é
contribuir para a melhora da prestação jurisdicional, reservando-se aos juízes e à solução adjudicada as
causas mais complexas, as que versam sobre direitos indisponíveis, ou aquelas nas quais as partes, apesar
de poder, não querem se submeter a outro tipo de solução que não a sentença. Em outras palavras, os
métodos alternativos de solução de conflitos não podem ser vistos apenas como meios ou métodos
praticados fora do Poder Judiciário, como sugere o adjetivo ‘alternativo’, utilizado para qualificá-los, mas
devem ser vistos também como importantes instrumentos, à disposição do próprio Poder Judiciário, para
a realização do princípio constitucional do acesso à Justiça, havendo uma complementaridade entre a
solução adjudicada, típica do Poder Judiciário, e as soluções não adjudicadas” (Luchiari, Valéria Ferioli
Lagrasta, op. cit., p. 315-316), e acrescenta em outra passagem: “Desta forma, a Res. 125 do CNJ estabelece
uma nova imagem do Poder Judiciário: de prestador de serviços, que atende aos anseios da comunidade”
(idem, p. 305).
49
O Sistema Multiportas oferecido pelo Estado tem origem no modelo norte-americano “ multidoor
courtroom ”, pelo qual o Judiciário, em última análise, deve ser o gestor do conflito, indicando o meio mais
adequado para a sua solução, mesmo que não seja através da sentença judicial. Cf. a respeito, Marco
Antônio Garcia Lopes Lorencini, “Sistema Multiportas”: Opções para tratamento de conflitos de forma
adequada”, In: Negociação, Mediação e Arbitragem – Curso Básico para programas de graduação em
Direito. Coordenadores Carlos Alberto Salles, Marco Antônio Lopes Lorencini e Paulo Eduardo Alves da
Silva. Editora Gen – Método: São Paulo, 2013, p. 73.
50
Neste particular, no Projeto de Novo Código de Processo Civil, adiante analisado, consta expressamente:
“As disposições desta Seção não excluem outras formas de conciliação e Mediação extrajudiciais
vinculadas a órgãos institucionais ou realizadas por profissionais independentes” (art. 153 da versão
aprovada pelo Senado Federal e 176 da versão mais recente da Câmara dos Deputados até a revisão deste
texto), reforçando, pois, o quanto aqui se afirma.
51
Cf. em “Anexo 5” a transcrição dos diversos artigos do Código de Processo Civil de 2015 relativos direta ou
indiretamente à Mediação e conciliação.
52
53
Devendo atuar perante os entes públicos e até mesmo junto a grandes litigantes de modo a estimular a
autocomposição nas demandas que envolvam matérias sedimentadas pela jurisprudência (art. 6.º, VIII), e
criar Sistema de Mediação e Conciliação Digital ou a distância para atuação pré-processual (art. 6.º, X).
54
55
56
A Resolução impõe a instalação dos Centros nos locais 2 (dois) Juízos, Juizados ou Varas com competência
para realizar audiência, prevê a utilização de Centro itinerante, e outros detalhes de organização e
funcionamento.
57
Cf. artigo 16, valendo esta regra tanto para os Núcleos como para os Centros.
58
Com previsão também no art. 8.º, já considerada a nova redação trazida pela Emenda 2/2016.
59
No Estado de São Paulo, já se encontram instalados mais de 180 CEJUSCs – Centros Judiciários de Solução
de Conflitos e Cidadania em Primeira Instância, sendo 9 deles na capital, e os demais em cidades do
interior. A lista completa dos CEJUSCs, com os com seus respectivos endereços, pode ser consultada no
seguinte link: [http://www.tjsp.jus.br/Download/Conciliacao/Nucleo/Enderecos_Cejusc.pdf].
60
Cf. Lei 13.140/2015 que, em seus arts. 30 e 31 passa a regrar com mais detalhes a confidencialidade,
inclusive as exceções (Capítulo 03, item 3.2, adiante).
61
“Dever de estimular os interessados a aprenderem a melhor resolver seus conflitos futuros em função da
experiência de justiça vivenciada na autocomposição” (Anexo III, art. 1.º, VII da Res.CNJ 125).
62
63
Nomenclatura conhecida e utilizada na versão original da Resolução 125, mas que pela Emenda 1/2013 foi
substituída por “Compreensão quanto à conciliação e à Mediação” (Anexo III, art. 2.º, V da Res.125/CNJ).
64
Lei 13.140 de 26 de junho de 2015, analisada com mais vagar no Capítulo 03 adiante. Cf. o texto na íntegra
da Lei em “Anexo 3”.
65
Quanto a estas câmaras privadas credenciadas, há previsão, inclusive, de fixação pelos tribunais de
percentual de audiências a serem por elas realizadas sem remuneração (art. 169, §2.º).
66
67
Com detalhes, como a participação do Ministério Público e eventualmente até de órgãos responsáveis por
política agrária ou política urbana. Também determina-se a audiência de Mediação se, deferida a liminar,
não tiver sido executada no prazo de um ano a contar da distribuição da ação.
68
Cf. em “Anexo 5” a transcrição dos diversos artigos do Código de Processo Civil de 2015 relativos direta ou
indiretamente à mediação e conciliação.
69
Assim: “Art. 11. Poderá atuar como mediador judicial a pessoa capaz, graduada há pelo menos dois anos
em curso de ensino superior de instituição reconhecida pelo Ministério da Educação e que tenha obtido
capacitação em escola ou instituição de formação de mediadores, reconhecida pela Escola Nacional de
Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – Enfam ou pelos tribunais, observados os requisitos
mínimos estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça em conjunto com o Ministério da Justiça”.
70
Diz o § 2.º do art. 4.º da Lei 13.140/2015: “§ 2º Aos necessitados será assegurada a gratuidade da
mediação”. De outra parte, não há definição, a respeito da remuneração das câmaras privadas
cadastradas, mas vem expresso no §2.º do art. 169 que, em benefício dos necessitados, “§ 2º Os tribunais
determinarão o percentual de audiências não remuneradas que deverão ser suportadas pelas câmaras
privadas de conciliação e mediação, com o fim de atender aos processos em que deferida gratuidade da
justiça, como contrapartida de seu credenciamento”.
71
Cf. mais a respeito, ao tratarmos da confidencialidade, no Capítulo 3, item 3.2 Princípios norteadores da
mediação, adiante.
72
Ou, como escrevemos na 4ª edição desta obra: “Tema complexo, a merecer redobrada atenção, pois se, de
um lado, a proposta é eficaz para inibir a indevida captação de clientes que é praticada por alguns de
reprovável conduta, de outro acaba por afastar excelentes e dedicados profissionais que sabem muito
bem agir com postura escorreita, exercendo advocacia independente, ao mesmo tempo em que reservam
parte de seu tempo à mediação e conciliação (comum inclusive em áreas diversas da atuação do
escritório), muitas vezes até como voluntários, por acreditar nestes instrumentos como forma de
pacificação social” (Capítulo 3, item 3.5). E na oportunidade também se fez o registro e a merecida crítica à
versão inicial do anteprojeto aprovado pela Comissão, no qual se previsa a “reserva de mercado” para
advogados, pois necessária na proposta a inscrição na OAB para atuação como mediador judicial.
73
No sentido de pressupor a conduta beligerante das partes, polarizadas em suas rígidas posições
apresentadas, contraposto ao sistema de cooperação. Anote-se que a palavra tem significado diverso no
campo das provas e sua organização no novo processo civil, onde representa certo benefício às partes em
oposição ao sistema inquisitorial.
74
E neste sentido, também a Lei 13.140/15: “Art. 26. As partes deverão ser assistidas por advogados ou
defensores públicos, ressalvadas as hipóteses previstas nas Leis nos 9.099, de 26 de setembro de 1995, e
10.259, de 12 de julho de 2001. Parágrafo único. Aos que comprovarem insuficiência de recursos será
assegurada assistência pela Defensoria Pública”.
75
Promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal entre os dias 24 e 25 de
agosto de 2017 em Brasília/DF.
76
77
78
A Mediação na Argentina é resultado da Lei 24.573/1995, que instituiu a mediação prévia obrigatória na
Província de Buenos Aires. Advêm dela a condição da ação. Sem mediação prévia, não se pode ajuizar
ação judicial, salvo em casos de ações penais, trabalhistas e relativas a família. Já na ação de execução e
despejo ela é optativa. O procedimento se instaura a partir do preenchimento de um formulário, com o
pedido do caso e o sorteio do mediador. Como forma de incentivar a mediação, a parte citada e ausente
pagará as custas da mediação. O não pagamento da multa faz a inscrição do valor na dívida ativa. O
acordo será título executivo equiparado ao judicial. Se for necessária a execução da transação, a parte
inadimplente pagará multa no valor de duas vezes o valor dos honorários do mediador. Óbvio que, caso
não haja acordo, as partes podem ajuizar ação judicial. Algumas questões interessantes: (a) o mediador
não pode assessorar parte alguma durante um ano após seu desligamento do quadro de mediadores do
tribunal; (b) o prazo de realização do processo de mediação é de 60 dias; e (c) os prazos estão suspensos.
Para aprofundar o tema: Basílio, Ana Tereza Palhares; Muniz, Joaquim de Paiva. Projeto de Lei de
Mediação obrigatória e a busca da pacificação social. RArb 13/38.
79
Promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal entre os dias 24 e 25 de
agosto de 2017 em Brasília/DF.
80
Assim: “Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes
plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e
convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.
Parágrafo único. De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste
artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de
adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade”.
81
“Art. 28. O procedimento de mediação judicial deverá ser concluído em até sessenta dias, contados da
primeira sessão, salvo quando as partes, de comum acordo, requererem sua prorrogação”.
82
E com idêntica previsão o art. 4.º da Lei 13.140/2015: “O mediador será designado pelo tribunal ou
escolhido pelas partes”, acrescentando o art. 25: “Na mediação judicial, os mediadores não estarão sujeitos
à prévia aceitação das partes, observado o disposto no art. 5.º desta Lei”.
84
Neste sentido também o art. 15 da Lei 13.140/2015: “Art. 15. A requerimento das partes ou do mediador, e
com anuência daquelas, poderão ser admitidos outros mediadores para funcionarem no mesmo
procedimento, quando isso for recomendável em razão da natureza e da complexidade do conflito”.
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Promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal entre os dias 24 e 25 de
agosto de 2017 em Brasília/DF.
86
A respeito, cf. Enunciado 44 da I Jornada acima referida; assim: “Havendo processo judicial em curso, a
escolha de mediador ou câmara privada ou pública de conciliação e mediação deve observar o
peticionamento individual ou conjunto das partes, em qualquer tempo ou grau de jurisdição, respeitado o
contraditório”. Cf. em “Anexo 7” o texto integral dos enunciados aprovados.
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
3. MEDIAÇÃO
2019 - 04 - 23
Curso de Arbitragem - Ed. 2018
3. MEDIAÇÃO
3. Mediação
ROTEIRO DE ESTUDOS
1. Introdução
• Imparcialidade
• Independência
• Credibilidade
• Competência
• Confidencialidade
• Diligência
3. Técnicas de mediação
• Modelo de Harvard
• Modelo transformativo
• Modelo circular-narrativo
4. A dimensão da mediação
• Mediação familiar
• Justiça restaurativa
• Mediação escolar
SUMÁRIO
3.1. • INTRODUÇÃO
3.1. INTRODUÇÃO
Ou, como se apresenta na recente Lei 13.140, de 26 de junho de 2015, “considera-se mediação a
atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito
pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a
controvérsia” (art. 1.º, parágrafo único).3
Como visto anteriormente, a mediação é indicada para as situações em que existe um vínculo
jurídico ou pessoal continuado entre os envolvidos no conflito,4 ensejando, assim, a necessidade de
se investigar os elementos subjetivos que levaram ao estado de divergências. Ela visa, assim, a
prevenção ou correção dos pontos de divergência decorrentes da interação e organização humana.
Daí porque deve o mediador dedicar mais tempo aos mediados, para melhor auxiliá-los nas
questões controvertidas.
E diante deste contexto, ao mediador cabe criar um ambiente propício à comunicação entre os
mediados, de forma que, aos poucos, emoções, mágoas, ressentimentos, frustrações ou outros
sentimentos sejam superados para facilitar a escuta e respeito à posição do outro.5
Porém, como bem lembram Adolfo Braga Neto e Lia Regina Castaldi Sampaio, a mediação “não
visa pura e simplesmente ao acordo, mas a atingir a satisfação dos interesses e das necessidades do
envolvidos nos conflitos (...). E um de seus objetivos é estimular o diálogo cooperativo entre elas
para que alcancem a solução das controvérsias em que estão envolvidas. Com esse método pacífico
tenta-se propiciar momentos de criatividade para que as partes possam analisar qual seria a
melhor opção em face da relação existente, geradora da controvérsia. Nesse sentido, como salienta
Christopher W. Moore, o acordo passa a ser a consequência lógica, resultante de um bom trabalho
de cooperação realizado ao longo de todo o procedimento, e não sua premissa básica”.7
Pode soar estranho, até mesmo às partes, em um primeiro momento, submeter-se à mediação
para, no final, consumido tempo e recursos, ainda ser necessário a solução adjudicada (por
arbitragem ou processo judicial). Mas para os profissionais da área, e para aqueles que se
submeteram ao procedimento, há o reconhecimento do efeito positivo da mediação, na inter-
relação e na forma como o conflito será a partir de então conduzido. O “tratamento” gera no
mínimo a conscientização das posições, a redução do desgaste emocional, o arrefecimento da
animosidade, e o respeito às divergências. Este resultado, mesmo sem impacto imediato à decisão
do litígio, cria até a expectativa de cumprimento espontâneo da solução que, voluntariamente, não
foi exitosa, mas resultou da intervenção do terceiro/mediador. Ademais, pela mudança de postura
frente ao conflito, as portas da autocomposição estarão sempre mais abertas, talvez aguardando
apenas o amadurecimento dos envolvidos que, por vezes, só o tempo traz.
Em países de cultura menos contenciosa, como China e Japão, o simples ajuizamento de ação
judicial pode ser considerado uma vergonha, caso não se tenha tentado um acordo antes. Na
China, em especial, se tem notícia da mediação há 4.000 anos, com 10 milhões de mediadores,
número muito maior do que os 110.000 advogados.9
Neste processo, o mediador deve ter sensibilidade para identificar a origem real do conflito e
capacidade para levar as partes a esta percepção, para que o novo olhar facilite a compreensão da
controvérsia, e assim contribua para a escolha de soluções, ou, ao menos, para mudança de
comportamento.
Tarefa difícil, na medida em que cada pessoa, pela sua personalidade, reage de forma diversa a
situações indesejadas, incômodos, frustrações e a lesões a seus direitos. Daí porque, às vezes, o
perfil psicológico dos envolvidos deve ser investigado, e repercute na maneira como será
conduzida a mediação.
A mediação ganhou respeito e espaço nos últimos tempos, e seus proveitosos resultados
passaram a ser reconhecidos não só pela acomodação de interesses alcançada como potencial
resultado de seu desenvolvimento, como também, e especialmente, pelo benefício de melhorar a
conduta das partes, inspirando o sentimento de pacificação das relações sociais, até mesmo se
frustrada a composição.
Neste aspecto, acreditamos que, embora se refira à mediação judicial, a Res. CNJ 125/2010, já
antes comentada, foi decisiva para impulsionar a mediação privada.
E como ápice desta valorização, chegou-se ao quanto há algum tempo alguns profissionais da
área buscavam: o Marco Legal da Mediação, através da recente Lei 13.140, de 26 de junho de 2015.
Adotamos aqui a sistematização oferecida com peculiar clareza e objetividade por Adolfo Braga
Neto e Lia Regina Castaldi Sampaio, na obra O que é mediação de conflitos,15 ao indicarem os
seguintes princípios norteadores da mediação que, sem maior rigor técnico, e salvo pequenos
ajustes para adaptação às suas peculiaridades, também se aplicam à conciliação como antes
referido.
Há coincidência, também, desta indicação com o que veio a ser agora positivado, tanto pela Lei
13.140/2015 (art. 2.º),16 como pelo Código de Processo Civil de 2015 (art. 166),17 e assim, a propósito
destas inovações legislativas, se farão as observações pertinentes.
Autonomia da vontade das partes: o processo de mediação tem caráter voluntário na sua mais
completa dimensão: parte da opção dos mediados a se submeterem a este método, passa pela
escolha comum do(s) mediador(es), pela decisão sobre os assuntos a serem abordados, pela
administração do procedimento, conferindo-lhe maior ou menor intensidade, e se encerra no
momento desejado pelos mediados. Os interessados são, pois, senhores da sorte (do destino) da
mediação, e assim, passam a ser os gestores de seu próprio futuro.
A escolha voluntária das partes em se submeter à mediação foi positivada como princípio na
Lei 13.140/2015, em seu art. 2.º, V; porém, como se verá no “procedimento de mediação” adiante
tratado (nas “particularidades da lei”), a liberdade não afasta a responsabilidade, e a escolha traz
compromissos.18
Imparcialidade: este princípio, agora contido na Lei 13.140/2015 (art. 2.º, I), e também no
Código de Processo Civil (art. 166), se impõe ao mediador que, como terceiro facilitador, deve
cuidar para que seus valores pessoais não venham a interferir na condução do procedimento, em
especial quanto à avaliação do comportamento das partes. Também a ele é defeso dar qualquer
sinal de preferência a uma das partes, e assim, deve ter uma conduta isenta, preservando o
equilíbrio de poder entre os mediados.
Independência: o mediador não deve ter qualquer vínculo anterior com uma das partes, e/ou
com os valores/ideias ligadas àquela mediação. Para tanto, obriga-se a revelar as circunstâncias
que eventualmente colocariam em dúvida esta independência. E assim fará durante todo o
procedimento, prestando informações que possam, aos olhos das partes, gerar desconfiança.
Entendemos, porém, que, cientes as partes das circunstâncias envolvendo o mediador e as
possíveis repercussões, nada impede que o escolham ou aceitem. Neste campo vige o princípio da
autonomia da vontade, possibilitando a aceitação da situação em caráter excepcional. E como
facilitador, pela sua habilidade, apenas favorecerá o diálogo, sendo que a solução dependerá
exclusivamente da evolução dos mediados. Desta forma, a atuação do mediador não compromete
(nem deve interferir, como já salientado) o elemento volitivo da decisão adotada pelas partes
quando da composição.19
Especificamente sobre este aspecto, tanto o Código de Processo Civil como a Lei 13.140/2015
fazem expressa referência a situações de impedimento do mediador (cf. Capítulo 2, item 2.6.2,
acima) e, em especial, destaca-se a inovação da Lei 13.140/2015 na previsão do dever de revelação;
assim: “qualquer fato ou circunstância que possa suscitar dúvida justificada em relação à sua
imparcialidade para mediar o conflito, oportunidade em que poderá ser recusado por qualquer
delas” (art. 5.º, parágrafo único), tal como se exige do árbitro (LArb., art. 14, §1.º). E a legislação
processual também indica a independência como princípio (art. 166).
Art. 30. Toda e qualquer informação relativa ao procedimento de mediação será confidencial
em relação a terceiros, não podendo ser revelada sequer em processo arbitral ou judicial salvo se
as partes expressamente decidirem de forma diversa ou quando sua divulgação for exigida por lei
ou necessária para cumprimento de acordo obtido pela mediação.
I – declaração, opinião, sugestão, promessa ou proposta formulada por uma parte à outra na
busca de entendimento para o conflito;
§ 2º. A prova apresentada em desacordo com o disposto neste artigo não será admitida em
processo arbitral ou judicial.
§ 3º. Não está abrigada pela regra de confidencialidade a informação relativa à ocorrência de
crime de ação pública.
Art. 31. Será confidencial a informação prestada por uma parte em sessão privada, não
podendo o mediador revelá-la às demais, exceto se expressamente autorizado.
Um pouco mais contida foi a previsão no Código de Processo Civil, mas igualmente firme,
quanto à confidencialidade (cf. art. 166 caput e §§ 1.º e 2.º).23
Acolhimento das emoções dos mediados: no pressuposto de que o mediador irá mergulhar nas
profundezas de um conflito, investigando as relações subjetivas que ensejaram as divergências,
importante elemento a ser reconhecido é a emoção dos mediados. As emoções motivam as ações,
interferem na razão, transformam sensações, provocam atenção seletiva, e, dentre outros
impactos no pensamento, na linguagem, na expressão e na conduta, também influenciam as
percepções.
A Isonomia entre as partes, em uma análise no quanto se pretende neste “Curso”, representa o
tratamento por igual das partes, decorrente da imparcialidade, e sua violação compromete o
desenvolvimento dos trabalhos de mediação.
A boa-fé é indicativo de conduta a orientar qualquer relação humana, e como tal seria
desnecessária a referência; porém, a redundância, por certo, tem sua função pedagógica.
O Código de Processo Civil, por sua vez, ainda acrescenta a decisão informada como princípio
(art. 166), consistente no direito que as partes têm de receber todas as informações necessárias a
respeito do conteúdo da composição que se estiver construindo.28
Por fim, valem alguns comentários sobre os princípios estudados, levando-se em consideração a
conciliação e mediação em juízo, na forma prevista na Res. CNJ 125/2010 com a adequação ao
estabelecido no Código de Processo Civil. Estes princípios, por vezes, não serão observados, ao
menos na extensão esperada.
Os litigantes, nestes casos judiciais, poderão ser conduzidos à mediação ou conciliação sem ser
por sua iniciativa, embora motivadamente possam recusar a utilização destes instrumentos. A
autonomia da vontade acaba limitada à aceitação do procedimento, com um dos facilitadores
cadastrados. A credibilidade é irrelevante, pois não se elegeram voluntariamente o procedimento
e, principalmente, conforme o caso, o próprio mediador.
Ainda, temos preocupação em relação ao tempo dos facilitadores (assim entendido o
conciliador ou o mediador) que será disponibilizado às partes pelo programa judicial, podendo
não ser adequado às necessidades do conflito, pois, ao que tudo indica, tal como hoje ocorre com a
maioria das propostas de conciliação judicial, observam-se restrições na duração e na quantidade
de sessões: ora, sabe-se da conveniência, por vezes, de vários encontros, em longo período de
acompanhamento, para o amadurecimento dos envolvidos, e esta tranquilidade, útil ao
desenvolvimento dos trabalhos, está comprometida na proposta apresentada.
Sob outra perspectiva, mas também como princípio de conduta, deve o mediador abster-se de
emitir juízo de valor em relação ao conflito ou soluções em discussão. Mesmo sendo advogado,
psicólogo, assistente social, ou profissional da área em que o conflito ocorreu, na qualidade de
mediador lhe é vedado orientar sobre questões de seu conhecimento profissional específico
diverso da mediação.
E boa parte das previsões acima encontra-se no Código de Ética proposto pelo Conima –
Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem, em salutar iniciativa, embora sem
caráter normativo, de criar parâmetros de conduta a serem observados pelos mediadores.29
A mediação não deve ser feita sem a capacitação do facilitador. Por mais que uma pessoa tenha
habilidade e talento como negociador ou gestor de conflitos, a mediação exige estudo específico,
técnicas, experiência, e constante aprendizado para aprimoramento do conhecimento. Repita-se, a
capacitação é indispensável à correta utilização deste valioso instrumento.
De sua parte, a Lei 13.140/2015 reforça esta ideia; assim: “Art. 9º. Poderá funcionar como
mediador extrajudicial qualquer pessoa capaz que tenha a confiança das partes e seja capacitada
para fazer mediação, independentemente de integrar qualquer tipo de conselho, entidade de
classe ou associação, ou nele inscrever-se”, referindo-se a exigências mínimas de qualificação e
curso apenas para o mediador judicial (art. 11; cf. a respeito, capítulo 2, item 2.6.2, acima).
Aliás, sugere-se 120 horas mínimas de aulas teóricas, seguida de 50 horas de estágio
supervisionado,30 pouco diferente, pois, da proposta contida na Res. CNJ 125/2010 (na versão
atualizada). 31
Nas linhas deste curso, pretende-se apenas apontar superficialmente as técnicas disponíveis
para o desenvolvimento da mediação, propiciando um primeiro contato com o tema, a ser
desenvolvido durante o curso de capacitação com a carga horária sugerida acima.
Modelo de Harvard: este modelo decorre do método utilizado para negociação cooperativa. O
mediador, enquanto facilitador do diálogo, procura separar as pessoas do problema. Distingue a
posição, do interesse das partes, centrando o foco neste último. Estimula-se a avaliação objetiva da
situação, buscando soluções criativas em benefício mútuo. Todavia, como não se diferencia
conciliação e mediação no sistema norte-americano, e considerando ainda que este modelo
aproxima-se da conciliação em nosso sistema jurídico, para alguns doutrinadores, esta técnica não
seria aplicável à mediação desenvolvida em nosso sistema.32
Modelo Transformativo: Neste modelo, a meta será a transformação das pessoas no sentido de
conscientização e respeito da posição do outro. E, assim, haverá uma alteração natural da
qualidade das relações interpessoais. O mediador estimula a participação ativa das partes,
reconstruindo interpretações que contemplem seus valores, pontos de vista e condutas. Neste
contexto, a composição passa a ser apenas uma possibilidade, e não o objetivo principal do
processo, verificado o modelo no mínimo com proveitosa finalidade pedagógica.33
Bem esclarecendo o exercício desta técnica, Juliana Demarchi escreve: “Para além das
perguntas abertas, e a fim de aproximar as partes e conduzi-las a um ambiente cooperativo,
devem ser formuladas perguntas circulares e reflexivas. As perguntas circulares, dirigidas a uma
das partes, na verdade envolvem a ambas e fazem com que um dos participantes fale de si
enquanto pensa estar se referindo ao outro. Convém exemplificar: ‘O que o senhor pensa que seu
sócio fez e nunca lhe contou?’, ‘O que a senhora pensa que seu marido esperava do casamento e
nunca lhe disse?’ Estas perguntas, na verdade, fazem com que as partes revelem suas fantasias,
suas ilusões, o que imaginaram ser o pensamento ou anseio da outra, e acabam por facilitar o
diálogo na medida em que são afastadas estas interferências, concentrando-se as partes no conflito
real, e não no que elas imaginavam que fosse. As perguntas reflexivas, por sua vez, estimulam as
partes a se colocarem no lugar da outra, avaliando melhor as circunstâncias e condições que as
levaram a agir da forma como agiram: ‘O que o senhor faria se estivesse no lugar de seu sócio?’,
‘Que reação o senhor teria se sua mulher o tratasse dessa maneira?’, ‘Se o senhor estivesse no
lugar de seu vizinho, como agiria?’”35
Por fim, segue uma síntese da atuação do mediador no processo de mediação: (a) contato com
os interessados, explicando o instituto, suas vantagens e desvantagens; (b) identificação das
questões, baseando-se na técnica do looping, ou seja, questões circulares reflexivas; (c) reflexão
sobre o exposto entre as partes; (d) identificação e sugestão, sem vinculação, pelas partes de
possíveis soluções para o conflito (brainstorming); e (e) lavratura do termo final.
Lembrando que o proveito da mediação projeta-se muito além da solução de um litígio para
encerrar uma demanda (judicial ou arbitral), o instituto tem aplicação para tratamento de diversos
conflitos, mesmo que deles não decorra, por questões variadas, um processo (judicial ou arbitral).
Em outras palavras, aproveita-se da mediação para pacificação de conflitos mesmo que eles não
tenham a perspectiva de chegar às portas do Judiciário, como, por exemplo, quando se fala em
justiça restaurativa, ou mesmo mediação escolar.
Tema amplo, que foge aos contidos limites deste “Curso”, apenas se apresenta para instigar no
estudante questões variadas em que a mediação pode e deve ser utilizada:
• Mediação familiar: sem dúvida, para estes litígios, a melhor indicação é a mediação, pois na
maioria dos casos falta a escuta, a comunicação, e sentimentos negativos (como rancor, mágoa e
frustrações), podem comprometer o diálogo.36 Ainda, além da enorme carga de subjetividade na
relação pretérita, mesmo com o rompimento do vínculo jurídico entre as partes, quando o debate
envolve filhos comuns, a relação deverá ser continuada, a exigir um restabelecimento do
equilíbrio e respeito às posições. Nestas situações, inclusive, recomenda-se a comediação,37 e/ou
equipe multidisciplinar com o objetivo de atender as diversas questões satélites do conflito. Nesta
mediação, busca-se com maior atenção romper com a ideia de culpa, com a análise do certo e
errado, procurando programar novo padrão de conduta, com a conscientização das
responsabilidades de cada um, não só pelo passado, mas principalmente pelo futuro.38
Veja-se situação em que bem se destaca a utilidade da mediação em confronto com o mero
acordo quanto ao litígio aparente e superficial. Na composição em uma ação de investigação de
paternidade, não se quer apenas a submissão do investigado ao exame de DNA, com o
reconhecimento do vínculo se positivo o resultado (litígio aparente, objetivo e pontual). Em todo o
contexto quer-se mais: o estabelecimento, dentro do possível, de uma relação paterno-filial
completa, ou seja, no aspecto afetivo e de responsabilidades recíprocas; é preciso que as partes
compreendam e se conscientizem da nova realidade, com a extensa e complexa relação jurídica
que se cria. Para sugestionar o réu à realização espontânea à prova pericial, basta a conciliação.
Agora, para projetar uma relação saudável entre as partes, recomenda-se a mediação caso os
envolvidos não tenham esta consciência no momento da instauração do desentendimento, ou
estejam bloqueados emocionalmente pelo nocivo impacto do conflito.
Ainda sobre o tema, em excelente trabalho a respeito, Ulf Christian Eiras Nordenstahl traz
estatísticas de resultados verificados na Argentina, modelos e procedimentos, além de profundo
estudo sobre a matéria, destacando a mediação penal e conflitos comunitários, casos de família e
“la mediación penal juvenil”, escrevendo sobre esta: “No existe ninguna duda de que la mediación,
en un marco de justicia restaurativa, resulta una posibilidad más que interesante, por no decir
imprescindible, a tener en cuenta al momento de construir un sistema de administración de
justicia para los jóvenes e adolescentes a quienes se les atribuya la comisión de actos que
encuadren en infracciones a la norma penal. Es que teniendo en cuenta la finalidad
socioeducativa de la pena (una de las características fundamentales del sistema penal juvenil), los
llamados Métodos Alternativos de Resolución de Conflitos (RAC) aportan precisamente las
herramientas apropiadas para que esa función se desarrolle con mayor plenitud, propendiendo
así a una solución que facilite la auto-composición de las partes, la responsabilización del joven
por sus actos, la revinculación social y la reparación del daño, a la vez que permita evitar la
estigmatización u la revictimización”.41
• Mediação escolar: o objetivo aqui é de preservar a integridade física, moral e psicológica dos
alunos, diante de conflitos corriqueiros, porém por vezes complexos e extremamente nocivos, que
rotineiramente ocorrem em escolas. Ainda, a mediação pode detectar graves problemas entre os
estudantes, envolvendo o uso de drogas, bullying, assédio, abuso sexual (inclusive domésticos ou
envolvendo terceiros).42 Aliás, na semana em que escrevemos estas linhas, soube-se de exemplar
resultado da mediação escolar em Franca, interior de São Paulo, em que se evitam, em média, dois
casos por semana de envolvimento de jovens com drogas.
Por outro lado, também com a mediação pretende-se melhorar a qualidade da convivência
entre todos os envolvidos neste contexto: alunos, pais, professores, gestores e funcionários. Sendo
a escola um espaço de diferenças, com potenciais conflitos em diversos setores, a integração e o
comprometimento com o projeto educacional são de extrema importância.
Por fim, como já vem sendo mais intensamente debatido, pode-se falar também em mediação
trabalhista,45 mediação ambiental,46 mediação comunitária,47 mediação na recuperação judicial,
extrajudicial, falência e superendividamento48 e mediação no terceiro setor.49
Tanto na parte destinada aos mediadores, como na voltada ao procedimento, traz algumas
disposições comuns, e outras direcionadas, separadamente, à mediação extrajudicial e judicial.
Ainda, nas disposições finais, voltam as considerações sobre mediação.
Quanto às disposições gerais, a inovação foi a identificação (positivada) do que pode ser objeto
da mediação: direitos disponíveis ou indisponíveis que admitam transação; e, ampliando o
conteúdo da composição, confere a possibilidade de consenso envolvendo direitos indisponíveis,
mas transigíveis, condicionado à homologação em juízo, com participação do Ministério Público.
Nada de novo em relação à prática, apenas positivação do quanto já se faz.
Quanto aos demais aspectos, em especial no que se refere à figura dos mediadores e ao
procedimento da mediação, efetivamente há novidades; vejamos:
Por seu turno, e também aplicável à mediação extrajudicial, há expressa previsão impedindo o
mediador de atuar como árbitro, ou depor como testemunha (Lei 12.140/2015, art. 7.º), com
restrição por um ano, a partir da última reunião, de assessorar, representar ou patrocinar
qualquer das partes (art. 6.º). Repita-se, quanto a esta última questão, nossa posição antes referida
no sentido de que, para o litígio por ele administrado, haverá impedimento definitivo, valendo a
regra para outras questões envolvendo as partes (Cf. Capítulo 2, item 2.6.2, acima).
E com impacto relevante, anote-se a equiparação do mediador, para efeitos da legislação penal,
a servidor público quando no exercício de suas funções ou em razão delas (art. 8.º).
Por fim, exclusivamente aos mediadores extrajudiciais, temos a seguinte regra: qualquer
pessoa, independentemente de sua formação de origem, e de participação em alguma entidade de
classe, conselho ou associação, pode ser mediador,51 desde que tenha a confiança das partes,
determinando a Lei, ainda, a sua capacitação (art. 9.º), mas sem que se imponha padrão para tanto
(horas mínimas etc., como se faz na mediação judicial para a qual, inclusive, se exige graduação há
mais de dois anos em ensino superior, como visto).
Só a previsão destas regras, sem dúvida, representa uma das mais expressivas inovações
introduzidas pela Lei 13.140/2015.
E deixe-se de início anotado que não se quer, com esta novidade, dizer que estará engessado o
instituto (ou processualizada a matéria), pela definição de procedimento, quando, como se sabe, a
atuação do profissional, ou das entidades com oferta de mediação, são marcadas em toda a sua
história, exatamente pela liberdade no procedimento.
Neste particular, a análise sistemática do Código de Processo Civil com a Lei 13.140/2015
permite, em nosso entender, esta conclusão, pois “§ 4.º A mediação e a conciliação serão regidas
conforme a livre autonomia dos interessados, inclusive no que diz respeito à definição das regras
procedimentais” (art. 166, § 4.º, do CPC/2015), sendo que “as disposições desta Seção não excluem
outras formas de conciliação e mediação extrajudiciais vinculadas a órgãos institucionais ou
realizadas por intermédio de profissionais independentes, que poderão ser regulamentadas por lei
específica” (art. 175, do CPC/2015), sendo esta Lei 13.140/2015 específica, pelo que “os dispositivos
desta Seção aplicam-se, no que couber, às câmaras privadas de conciliação e mediação” (art. 175,
parágrafo único, do CPC/2015).
E, assim, com ponderação entre as normas, bom-senso, e atenta à realidade de um instituto que
há anos cresce com liberdade, de um modo geral (salvo previsões específicas, como a relativa à
prescrição adiante indicada, dentre outras), a mediação privada deverá se desenvolver com
parâmetros no quanto previsto na Lei em exame, mas sem que detalhes procedimentais venham a
contaminar a sua eficácia e eficiência.
Inclusive, em nosso sentir, a previsão legal de que “nos litígios decorrentes de contratos
comerciais ou societários que não contenham cláusula de mediação, o mediador extrajudicial
somente cobrará por seus serviços caso as partes decidam assinar o termo inicial de mediação e
permanecer, voluntariamente, no procedimento de mediação” (Lei 13.140/2015, art. 22, § 3.º) foi
além do quanto lhe competia. Ora, se alguém pretende investir na tentativa de mediação sem
convenção prévia com a outra parte, poderá sim fazê-lo, assumindo os custos daí decorrentes,
tratados diretamente com o profissional. A este, por certo, não se pode impor trabalhar
graciosamente. O máximo que se pode vislumbrar, evidentemente, é afastar qualquer
responsabilidade ao convidado (outra parte) pelos custos, mas àquele que teve a iniciativa, cabe,
sim, o pagamento dos honorários acertados.
Ou seja, em hipótese alguma, em uma e outra situação acima tratada, pode-se impor ao
profissional eleito para atuar em mediação privada, o trabalho sem a justa remuneração.
A mediação pode ter origem em contrato ou em iniciativa direta de qualquer das partes,
independentemente de prévia composição a respeito.
§ 1º. A previsão contratual pode substituir a especificação dos itens acima enumerados pela
indicação de regulamento, publicado por instituição idônea prestadora de serviços de mediação,
no qual constem critérios claros para a escolha do mediador e realização da primeira reunião de
mediação. (...).
Mas na flexibilidade antes referida, para omissão da cláusula a respeito do quanto previsto no
art. 22 e seu § 1.º, o § 2.º, na sequência, oferece a solução:
§ 2º. Não havendo previsão contratual completa, deverão ser observados os seguintes critérios
para a realização da primeira reunião de mediação:
I – prazo mínimo de dez dias úteis e prazo máximo de três meses, contados a partir do
recebimento do convite;
Ainda, reforçando a responsabilidade das partes ao firmarem cláusula de mediação (ou mesmo
cláusula escalonada),52 estabelece a lei que: “Art. 23. Se, em previsão contratual de cláusula de
mediação, as partes se comprometerem a não iniciar procedimento arbitral ou processo judicial
durante certo prazo ou até o implemento de determinada condição, o árbitro ou o juiz suspenderá
o curso da arbitragem ou da ação pelo prazo previamente acordado ou até o implemento dessa
condição. Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica às medidas de urgência em que o
acesso ao Poder Judiciário seja necessário para evitar o perecimento de direito”.
Diante desta regra, a cláusula deixa de ser meramente de cortesia, e passa a ter, em certa
medida, efeito vinculante às partes. Pela lei, há necessidade de se constar na cláusula o óbice à
iniciativa da ação por prazo nela estipulado ou sob determinada condição.
Não se chega ao ponto de extinguir a ação, como se faz na arbitragem quando existente
convenção (art. 485, VII, do CPC/2015),53 mas já é uma boa solução impor a sua suspensão do
processo.
Com ou sem convenção: “Art. 21. O convite para iniciar o procedimento de mediação
extrajudicial poderá ser feito por qualquer meio de comunicação e deverá estipular o escopo
proposto para a negociação, a data e o local da primeira reunião. Parágrafo único. O convite
formulado por uma parte à outra considerar-se-á rejeitado se não for respondido em até trinta
dias da data de seu recebimento”.
Veja-se que há flexibilidade legal para, mesmo inexistente prévia convenção entre as partes a
respeito de como instaurar a mediação, ela poderá ser provocada pelo convite previsto neste
art. 21.
A seu turno, prevendo a cláusula, ou regulamento de entidade eleita pela partes, prazos e
detalhes diversos do acima indicado, estes é que deverão prevalecer, sendo assim, a previsão do
artigo em exame é supletiva à eventual convenção.
O art. 22 leva a uma ideia de que a parte estaria vinculada a um dos nomes indicados,
acolhendo tacitamente o primeiro da lista diante do silêncio.
Porém, considerando que o mediador deve ser pessoa de confiança da parte, e por ela escolhido
(art. 4.º), se inexistente prévia contratação a respeito da definição do facilitador, o convidado não
ficará adstrito à lista oferecida, podendo interagir com a outra parte para buscar outros nomes, até
encontrar uma pessoa em comum. E no máximo, o que do convidado se pode “exigir” é o
comparecimento à primeira reunião, mas não aceitação de seus termos, dos nomes ou do primeiro
deles, pois, conciliando a liberdade de escolha com a autonomia de permanecer ou afastar-se da
mediação, a ele não se pode impor, contra a sua vontade, o desenvolvimento da mediação.
Por fim, anote-se que a mediação pode ser provocada independentemente da existência de
processo judicial ou procedimento arbitral em curso, reclamando, evidentemente, a vontade
comum das partes a respeito; e nesta hipótese caberá aos interessados requerer ao juiz ou árbitro
a suspensão da ação por prazo suficiente para a solução consensual do litígio (art. 16).
Pelo art. 17, “considera-se instituída a mediação na data para a qual for marcada a primeira
reunião de mediação”. Já na primeira reunião, e toda vez que julgar necessário, “o mediador
deverá alertar as partes acerca das regras de confidencialidade aplicáveis ao procedimento”
(art. 14).
Uma vez iniciada a mediação, “as reuniões posteriores com a presença das partes somente
poderão ser marcadas com a sua anuência” (art. 18). E, “no desempenho da sua função, o
mediador poderá reunir-se com as partes, em conjunto ou separadamente,55 bem como solicitar
das partes as informações que entender necessárias para facilitar o entendimento entre aquelas”
(art. 19).
Ainda, “A requerimento das partes ou do mediador, com anuência daquelas, poderão ser
admitidos outros mediadores para funcionarem no mesmo procedimento, quando isso for
recomendável em razão da natureza e da complexidade do conflito” (art. 15).56
Faculta-se às partes serem assistidas por advogados ou defensores públicos; mas para se
manter o equilíbrio e isonomia, comparecendo à reunião uma das partes com advogado ou
defensor, o mediador deverá suspender o procedimento até que todas estejam devidamente
assistidas (art. 10 e seu parágrafo único).57
Além dos detalhes procedimentais acima, que devem ser sempre flexibilizados, e representam
em boa parte, a prática já desenvolvida na mediação privada nos últimos tempos, temos uma
inovação de extraordinária relevância: a instauração da mediação suspende a prescrição.
Neste sentido, estabelece o parágrafo único do art. 17: “Enquanto transcorrer o procedimento
de mediação, ficará suspenso o prazo prescricional”. Note-se, pela análise sistemática desta regra,
que a prescrição estará suspensa desde a primeira reunião, tida como o momento da instituição da
mediação (art. 17, caput). Sem dúvida, um relevante avanço, pois em muitas situações, exatamente
em razão do prazo prescricional, instaurava-se a ação, provocando-se, em razão do quanto nela
contido, a inflamação do conflito, extremamente nociva à composição.58
Art. 46. A mediação poderá ser feita pela internet ou por outro meio de comunicação que
permita a transação à distância, desde que as partes estejam de acordo.
Estabelece a Lei que “o procedimento de mediação será encerrado com a lavratura do seu
termo final, quando for celebrado acordo ou quando não se justificarem novos esforços para a
obtenção de consenso, seja por declaração do mediador nesse sentido ou por manifestação de
qualquer das partes” (art. 20).
Finalizado por acordo, o termo “constitui título executivo extrajudicial”; mas se homologado
judicialmente por iniciativa das partes, transforma-se em título executivo judicial (parágrafo único
do art. 20, e, também, quanto ao efeito da homologação, art. 515, II e III, do CPC/2015).
E sob este aspecto, importante resgatar a previsão contida no § 2º do art. 3.º da Lei: “O consenso
das partes envolvendo direitos indisponíveis, mas transigíveis, deve ser homologado em juízo,
exigida a oitiva do Ministério Público”.
Vale dizer, na conjugação destas regras, observado o objeto da mediação (art. 3.º), o acordo
envolvendo direito indisponível, se não levado à homologação quando transigível, é excluído do
rol dos títulos executivos, embora, evidentemente, dele se possa extrair, para alguma finalidade, a
manifestação de consenso em determinado sentido.
Até a entrada em vigor das Leis de 2015, já se considerava o acordo instrumentalizado entre as
partes, com a natureza de transação, prevista no art. 840 do CC/2002.59 E sendo particular o
instrumento, poderia ser considerado título executivo extrajudicial se pelas particularidades
preenchesse os requisitos legais para tanto previstos na época (art. 585, II, do CPC/1973).60
O Código de Processo Civil de 2015 é um pouco mais abrangente que a legislação processual de
1973, pois acrescenta a força executiva ao instrumento de transação referendado não só pelo
Ministério Público, Defensoria Pública, Advocacia Pública ou advogados dos transatores, como
também “por conciliador ou mediador credenciado por tribunal” (art. 784, IV), além da escritura
pública assinada pelo devedor. Nestes casos, com a ampliação anotada em relação ao referendo do
facilitador cadastrado, há dispensa de duas testemunhas. E esta situação tem valia principalmente
naqueles casos de mediação ou conciliação pré-processual, mas no ambiente do Tribunal
Multiportas, previsto na Res.125/CNJ.61
Já a Lei 13.140/15, com vigência anterior ao Código de Processo Civil estabelece, como visto, que
“O termo final de mediação, na hipótese de celebração de acordo, constitui título executivo
extrajudicial”; vale dizer, não há, pelo nela contido, necessidade do credenciamento por tribunal
para que o conciliador ou mediador, referendando o acordo, lhe emprestem força executiva.
Ou seja, em três momentos: antes da entrada em vigor das leis de 2015, o acordo extrajudicial
por instrumento particular necessita duas testemunhas ou assinatura de advogado para ter força
executiva (título extrajudicial). Com a Lei de Mediação, se formalizado o procedimento com
celebração de termo final no qual se contém o acordo, confere-se ao instrumento particular
(“termo final”) a força executiva (título extrajudicial). E por fim, nas situações previstas no novo
Código, para conciliação ou mediação judicial, o instrumento particular referendado por
facilitador cadastrado no tribunal também será considerado título executivo extrajudicial.
Não se pode dizer que o Código de Processo Civil está revogado, pois as hipóteses que nele se
contém permanecerão íntegras; mas a Lei de Mediação amplia o rol dos títulos considerados
executivos extrajudiciais, para também se contemplar nesta categoria o “termo final” da mediação
nela especificado.
Em qualquer caso, antes ou depois das novas leis, anote-se que a depender de seu conteúdo,
será necessária escritura pública para formalização da transação, como, por exemplo, para
transferência de imóveis.
Por fim, se por iniciativa das partes a transação for levada à homologação no judiciário, a
respectiva sentença representa título executivo judicial (art. 515, II, do CPC/2015).
SALLES, Carlos Alberto; LORENCINI, Marco Antonio Lopes; SILVA, Paulo Eduardo Alves da.
Negociação, Mediação e Arbitragem – Curso Básico para programas de graduação em Direito. São
Paulo: Ed. Gen-Método, 2013.
BRAGA NETO, Adolfo. Aspectos relevantes sobre mediação de conflitos. Revista de Arbitragem e
Mediação. n. 15. ano IV. São Paulo, out.-dez. 2007.
BRAGA NETO, Adolfo. Mediação: uma experiência brasileira. São Paulo: Editora CLA, 2017.
FISCHER, Roger; PATTON, Bruce; URY, William. Como chegar ao sim. Rio de Janeiro: Imago,
1994.
GRECCO, Aimée; e outros. Justiça restaurativa em ação – prática e reflexões. São Paulo: Dash
Editora, 2014.
NOTAS DE RODAPÉ
1
Ou, como diz Fernanda Tartuce: “A mediação consiste na atividade de facilitar a comunicação entre as
partes para propiciar que estas próprias possam, visualizando melhor os meandros da situação
controvertida, protagonizar uma solução consensual. A proposta da técnica é proporcionar um outro
ângulo de análise aos envolvidos: em vez de continuarem as partes enfocando suas posições, a mediação
propicia que elas voltem sua atenção para os verdadeiros interesses envolvidos” (Tartuce, Fernanda.
Mediação nos conflitos civis. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2008. p. 208).
Vale anotar, o que dispõe o Código de Ética para Mediadores, do Conima a respeito da mediação: “A
mediação transcende à solução da controvérsia, dispondo-se a transformar um contexto adversarial em
colaborativo. É um processo confidencial e voluntário, onde a responsabilidade das decisões cabe às
partes envolvidas. Difere da negociação, da conciliação e da arbitragem, constituindo-se em uma
alternativa ao litígio e também um meio para resolvê-lo”. Disponível em: [www.conima.org.br]; acesso em
08/07/2015.
Cf. em “Anexo 3” o texto integral da Lei 13.140/2015. E, quanto à definição de mediação, adotou-se em
parte a proposta de antigo PL 4.827/1998, da Deputada Zulaiê Cobra.
Deve-se ter à mente que a mediação também serve no momento anterior ao conflito estar instaurado.
A respeito, bem escreve Fernanda Levy: “A mediação é conduzida por um terceiro, denominado
‘mediador’ que tem por objetivo auxiliar as partes em conflito a chegarem, por si só, ao entendimento e à
transformação do conflito. Assim, o mediador não julga nem tão pouco concilia as partes, tarefas do
árbitro e do conciliador respectivamente” (Levy, Fernanda Rocha Lourenço. Guarda de filhos: os conflitos
no exercício do poder familiar. São Paulo: Atlas, 2008. p. 122); e como salienta Aldemir Buitoni: “A
mediação atua em todos os níveis, é um procedimento ligado a uma visão sensorial da vida e não a lógica
da razão” (Buitoni, Aldemir. Mediar e conciliar: as diferenças básicas. Jus Navigandi, n. 2707, p. 15, ano XV,
Teresina, 29.11.2010. Disponível em: [http://jus.uol.com.br/revista/texto/17963]. Acesso em: 04.06.2011);
Lembramos, ainda, as palavras de Maria Nazareth Serpa sobre a função do facilitador: “O papel do
interventor é ajudar na comunicação através da neutralização de emoções, formação de opções e
negociação de acordos” (Serpa, Maria de Nazareth. Teoria e prática de mediação de conflitos. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 1999. p. 90).
No sentido de pressupor a conduta beligerante das partes, polarizadas em suas rígidas posições
apresentadas, contraposto ao sistema de cooperação. Anote-se que a palavra tem significado diverso no
campo das provas e sua organização no novo processo civil, onde representa certo benefício às partes em
oposição ao sistema inquisitorial.
7
Braga Neto, Adolfo; SAMPAIO, Lia Regina Castaldi. O que é mediação de conflitos. São Paulo: Brasiliense,
2007. p. 19-20.
Neste sentido, cf. Fernanda Tartuce: “Um primeiro objetivo importante na mediação é permitir que as
partes possam voltar a entabular uma comunicação eficiente, com intuito de discutir os pontos relevantes
da controvérsia e encontrar uma saída consensual para o impasse. Sendo a finalidade da mediação a
responsabilização dos protagonistas, é fundamental fazer deles sujeitos capazes de elaborar, por si
mesmos acordos duráveis. Dessa forma, o grande trunfo da mediação é restaurar o diálogo e a
comunicação, propiciando o alcance da pacificação duradoura. (Vilela, Sandra Regina. Meios alternativos
de resolução de conflitos – arbitragem, mediação. Disponível em: [www.pailegal.net/mediation.asp?
rvTextoId=""109399610962k]."" Acesso em: 14.01.2007). Percebe-se, assim, que, antes de cogitar a extinção
do conflito como objetivo primordial, deve o mediador procurar suprir as deficiências de comunicação
entre os sujeitos. Afinal, a ideia é permitir que eles próprios possam superar o impasse, transformando o
conflito em uma oportunidade de crescimento e em uma mudança de atitude”. Tartuce, Fernanda. Op cit.,
p. 222.
Kovach, Kimberlee K. Mediation in a nut shell. St. Paul: Thomson West, 2003. p. 16.
10
Na oportunidade, fomos honrados com a indicação pelo Diretor Prof. Pedro Paulo Manus para assinar o
Pacto de Mediação em nome da Faculdade de Direito da PUC/SP.
15
Braga Neto, Adolfo; SAMPAIO, Lia Regina Castaldi. Op. cit., p. 34-43.
16
“Art. 2º. A mediação será orientada pelos seguintes princípios: I – imparcialidade do mediador; II –
isonomia entre as partes; III – oralidade; IV – informalidade; V – autonomia da vontade das partes; VI –
busca do consenso; VII – confidencialidade; VIII – boa-fé.”
17
Como previsto no art. 2.º, § 1.º: “Na hipótese de existir previsão contratual de cláusula de mediação, as
partes deverão comparecer à primeira reunião de mediação”, mas acrescenta a lei no § 2.º que: “§ 2º.
Ninguém será obrigado a permanecer em procedimento de mediação.”
19
Questão interessante seria saber se quem atua de forma livre consegue ser imparcial. Consideramos que
justamente a independência é que traz a imparcialidade, ou seja, quem atua de forma desvinculada à
parte ou às ideias trazidas na mediação, certamente será imparcial. Nesse sentido, Humberto Dalla
Bernardina de Pinho, em obra conjunta, escreve: “Entendemos que o conceito de imparcialidade, utilizado
pelo legislador pátrio no Projeto de Lei em comento (PL 4.827/1998), deve abarcar o de neutralidade, por
serem conceitos intimamente relacionados e que, não raro, se encontram previstos conjuntamente em
legislações alienígenas ao tratar da conduta dos mediadores (...). A neutralidade consiste no dever de o
mediador não influenciar as partes a adotar uma solução, ainda que esta lhe pareça mais razoável ou
equânime, conforme prevê o item 6.16.2, do referido Code d’Étique, e se coaduna especialmente com a
figura do mediador passivo, à qual se filiou o legislador pátrio no art. 2.º do Projeto de Lei em Comento”
(Do registro de mediadores e da fiscalização e controle da atividade de mediação. In: ______ (coord.). Op.
cit. p. 122-145.
20
O mediador deve ter aptidão para o conflito a ser mediado. Ora, se estivermos à frente de um conflito
societário, será válido, por exemplo, o mediador entender da matéria e seus princípios, por exemplo.
21
“Art. 229. Ninguém pode ser obrigado a depor sobre fato: I – a cujo respeito, por estado ou profissão, deva
guardar segredo; (...).”
22
“Art. 154. Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério,
ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem: Pena – detenção, de três meses a um
ano, ou multa.”
23
Cf. o quanto a respeito falamos e indicação dos artigos pertinentes, no Capítulo 2, item 2.6.2, acima.
25
Cf. também, neste sentido, Enunciado 46 da I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios,
promovida entre 22 e 23 de agosto de 2016 pelo Centro de Estudos Judiciário do Conselho da Justiça
Federal; assim: “Os mediadores e conciliadores devem respeitar os padrões éticos de confidencialidade na
mediação e conciliação, não levando aos magistrados dos seus respectivos feitos o conteúdo das sessões,
com exceção dos termos de acordo, adesão, desistência e solicitação de encaminhamentos, para fins de
ofícios”. Cf. em “Anexo 7” o texto integral dos enunciados aprovados.
26
Nesse sentido vale observar as regras sobre mediação do Conima, que entende por diligência “cuidado e
prudência para a observância da regularidade, assegurando a qualidade do processo e cuidando
ativamente de todos os seus princípios fundamentais”. Disponível em: [www.conima.org.br]. Acesso
em:13.07.2015.
27
Neste sentido, pertinente trazer as ponderações de Adolfo Braga Neto e Lia Regina Castaldi Sampaio: “O
mediador deve trabalhar para que, no transcorrer do processo de mediação, os mediados evoluam a fim
de reconhecer a legitimidade das emoções do outro. Isso não significa concordar ou apreciar, mas trata-se
de reconhecer o direito de cada um de ter sentimentos específicos”. E, adiante: “(...) a estratégia do
mediador deverá estar permanentemente centrada no acolhimento das emoções exteriorizadas ou
naquelas que não o foram e estão sendo sentidas internamente pelos mediados. Neste último aspecto é
dever do mediador promover a sua externalização, mediante um ambiente acolhedor e cooperativo, para
que sejam objetivadas, propiciando com isso que a outra parte escute e posteriormente reflita sobre os
sentimentos manifestados”. (Braga Neto, Adolfo; SAMPAIO, Lia Regina Castaldi. Op. cit., p. 40-41).
28
29
A íntegra do Código de Ética sugerido pode ser consultada no site: [www.conima.org.br]. Acesso em:
14.07.2015.
30
Proposta de carga horária apresentada por Lia Regina Castaldi Sampaio e Adolfo Braga Neto, “com base na
experiência prática adquirida em mais de onze anos de atividade na capacitação de mediadores no Brasil,
na Argentina, em Portugal, em Angola, na Alemanha e em Cabo Verde”, recomendando também durante o
estágio supervisionado, a elaboração de “relatórios específicos para uma reflexão acerca do que foi objeto
de análise e estudo na reunião de mediação e o estabelecimento de estratégias para as reuniões futuras”.
(Braga Neto, Adolfo; SAMPAIO, Lia Regina Castaldi. Op. cit., p. 91-92).
31
32
Cf. a respeito FISHER, Roger; URY, Willian; PATTON, Bruce. Como chegar ao sim? Ricardo Vasques Vieira
(trad.). Rio de Janeiro: Solomon Editores, 2014, responsáveis pelo desenvolvimento deste modelo.
33
Veja o que Rafael Mendonça diz a respeito: “Nesse caminho, de administração do conflito, a mediação
apresenta um escopo psicopedagógico (ou educacional, pois pedagógico remete à infância), pois, leva o ser
humano a aprender a ser parte da humanidade, ou seja, aprender a lidar diretamente consigo e com o
outro. A complexidade humana não poderia ser compreendida dissociada dos elementos que a
constituem: ‘todo desenvolvimento verdadeiramente humano, significa o desenvolvimento do conjunto
das autonomias individuais, das participações comunitárias e do sentimento de pertencer à espécie
humana’ (Morin, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. p. 55). Daí, a mediação, em
certo sentido, é o próprio trabalho de aprendizagem da administração (reconstrutiva) dos desejos. ‘O
trabalho simbólico sobre a administração (reconstrutiva) de nossos conflitos é, em si mesmo,
transformador’ (Warat, Luís Alberto. Ecologia, psicanálise e mediação. In: ______ (org). Em nome do
acordo: a mediação no direito. p. 36.)”. Mendonça, Rafael. (Trans)Modernidade e Mediação de Conflitos:
pensando paradigmas, deveres e seus laços com um método de resolução de conflitos. Florianópolis:
Habitus, 2006. Cf. ainda seus principais idealizadores: BUSH, Robert A. Baruch; FOLGER, Joseph P. The
promise of mediation: the transformative approach to conflict. Ed. rev. São Francisco, CA, EUA: Jossey-
Bass, 2005.
34
Cf. a respeito COOB, Sara. Una perspectiva narrativa en mediación. In: Nuevas direcciones em mediación.
FOLGER, Joseph e JONES, Tricia S. (coord). Paidós. Mediación n. 7. Buenos Aires, 1997.
35
Ainda, esclarece a autora: “As perguntas iniciais devem ser formuladas de forma aberta, ou seja,
solicitando-se às partes que falem sobre determinado tema (‘Como é seu filho’, ‘Como funciona sua
empresa?’, ‘Fale sobre o senhor, como é o seu dia a dia?’). Desse modo, as partes possibilitam ao mediador,
e a elas próprias, uma maior percepção da relação discutida.” (...) “Perguntas fechadas, por fim, devem ser
utilizadas para esclarecer questões pontuais, pois ensejam respostas breves (‘O senhor foi à reunião da
última semana?’), ou ainda, para dar significado a expressões vagas utilizadas pelas partes (‘O que
significa comportamento ruim para o senhor?’) (Grinover, Ada Pellegrini et al. Mediação e gerenciamento
do processo: revolução na prestação jurisdicional. Guia prático para a instalação do setor de conciliação e
Mediação. São Paulo: Atlas, 2008. p. 60.)
36
Nas precisas palavras de Eduardo Oliveira Leite: “Os vínculos afetivos – para citar o mais visível nos
litígios familiares – são muito fortes e tendem a direcionar a disputa a posturas radicais, conduzindo as
partes a agirem sem o equilíbrio suficiente, de modo a construir uma solução duradoura para o futuro e
não tendente a soluções momentâneas ou passageiras. O pós-ruptura é longo e sempre de difícil
elaboração” (p. 117); e ainda: “A mediação familiar, conforme já exuberantemente comprovado pela
experiência mundial mais moderna, contribui para melhorar e agilizar a justiça familiar, possibilitando
uma maior celeridade, eficácia das decisões judiciais e sua permanência pós-ruptura” (p. 140) (Leite,
Eduardo Vieira et al. A mediação nos processos de família ou um meio de reduzir o litígio em favor do
consenso. In: Leite, E. Grandes temas da atualidade: arbitragem, mediação e conciliação. Rio de Janeiro:
Forense, 2007. p. 105).
37
Fala-se em comediação quando mais de um mediador atua no processo. A vantagem, fora a proveitosa
interdisciplinaridade, é que o comediador tem a missão de não deixar o processo fragmentado e
unidimensional, ampliando a visão das partes. Recomenda-se que o comediador tenha especialidade
diferente daquela do mediador. A desvantagem é o aumento do custo e um possível conflito de ego entre
os mediadores se não competentes. A Lei de Mediação Familiar da Comunidade Autônoma de Castilla y
Leon disciplina a comediação, deixando-a obrigatória no caso de menores, inclusive determina a
participação de psiquiatra, psicólogo ou assistente social como comediador, se o mediador não tiver esta
formação. Vale, ainda, citar Humberto Dalla (op. cit.), sobre o conceito de comediação: “Entende-se por
comediação o fato de o processo de mediação vir a ser conduzido por ao menos dois mediadores, cujas
formações profissionais sejam distintas. Por seu turno, saliente-se que a expressão ‘formação profissional’
aqui adotada é ampla, a fim de abranger não só aqueles indivíduos que, de fato, possuam formação
distinta, como também aqueles indivíduos que, muito embora provenham da mesma área do saber
humano, tenham especialidades diversas. Ex: neurologista e psiquiatra. Esse conceito, a nosso juízo,
atende à ratio essendi do instituto da comediação, que é permitir uma visão mais abrangente e não
fragmentária do conflito que se está a mediar.
38
Neste sentido, coloca Fabíola Luciana Teixeira Orlando Souza, em artigo que bem apresenta a relevância
de um procedimento interdisciplinar nas questões de família: “Através da mediação, vê-se uma postura de
responsabilidade pelo projeto de futuro que vai nortear a vida daquelas pessoas vinculadas por relações
de afeto e familiares. (...) A utilização deste paradigma, especialmente, no direito de família, provoca o
fortalecimento e uma maior possibilidade das partes transformarem positivamente as situações de crise,
mediante a priorização de uma filosofia interomunicativa que preconiza a coparticipação responsável.
Assim, os envolvidos se tornam protagonistas das decisões assumidas, adquirindo habilidades para gerir
suas próprias diferenças” (Souza, Fabíola Luciana Teixeira Orlando. Mediação interdisciplinar: direito de
família e psicanálise. In: Guerra, Luiz (coord.). Temas contemporâneos do direito – Homenagem ao
bicentenário do Supremo Tribunal Federal. Brasília: Guerra Ed., 2011. p. 163-170).
39
Cf. a respeito: Melo, Eduardo Rezende. A experiência em justiça restaurativa no Brasil: um novo
paradigma que avança na infância e na juventude. Revista do Advogado, n. 87, p. 125-128, ano XXVI, São
Paulo: AASP, set. 2006. Cf., ainda: Melo, Eduardo Rezende. et al Justiça restaurativa e seus desafios
histórico-culturais: Um ensaio crítico sobre os fundamentos ético-filosóficos da justiça restaurativa em
contraposição à justiça retributiva. In: Slakmon, C.; De Vitto, R.; Pinto, R. Gomes. Justiça restaurativa.
Brasília: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, 2005. p. 53-78.
40
Cf. também estudos sobre a mediação penal para crimes de menor gravidade, como furto, estelionato,
apropriação indébita e crimes de trânsito cujo objetivo é restaurar as relações entre as pessoas, e das
pessoas com as instituições e com a comunidade: Sica, Leonardo. Justiça restaurativa e mediação penal – O
novo modelo de justiça criminal e de gestão do Crime. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. E noticiando
experiência entre nós, cf. Issler, Daniel e Penido, Egberto de Almeida, A Justiça restaurativa nas Comarcas
de São Paulo e Guarulhos, In: Braga Neto, Adolfo; Sales, Lilia Maia de Morais (organizadores). Aspectos
atuais sobre a mediação e outros métodos extra e judiciais de resolução de conflitos. São Paulo: Editora
GZ, 2012. p. 229.
41
Nordenstahl, Ulf Christian Eiras. Mediación penal – De la práctica a la teoría. 2. ed. Buenos Aires: Librería
Histórica, 2010 (Colección Visión Compartida). p. 139. Também merece recomendação o primoroso estudo
a respeito desenvolvido por Carlos Eduardo de Vasconcelos (Mediação de Conflitos e Práticas
Restaurativas. 5. ed. São Paulo: Método, 2016).
42
A respeito confira-se enunciado da I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios; assim: “52. O
Poder Público e a sociedade civil incentivarão a facilitação de diálogo dentro do âmbito escolar, por meio
de políticas públicas ou parcerias público-privadas que fomentem o diálogo sobre questões recorrentes,
tais como: bullying, agressividade, mensalidade escolar e até atos infracionais. Tal incentivo pode ser feito
por oferecimento da prática de círculos restaurativos ou outra prática restaurativa similar, como
prevenção e solução dos conflitos escolares.”, promovida entre 22 e 23 de agosto de 2016 pelo Centro de
Estudos Judiciário do Conselho da Justiça Federal. Cf. em “Anexo 7” o texto integral dos enunciados
aprovados.
43
A respeito confira-se Enunciado 40 da I Jornada referida acima; assim: “40 Nas mediações de conflitos
coletivos envolvendo políticas públicas, judicializados ou não, deverá ser permitida a participação de
todos os potencialmente interessados, dentre eles: (i) entes públicos (Poder Executivo ou Legislativo) com
competências relativas à matéria envolvida no conflito; (ii) entes privados e grupos sociais diretamente
afetados; (iii)Ministério Público; (iv) Defensoria Pública, quando houver interesse de vulneráveis; e (v)
entidades do terceiro setor representativas que atuem na matéria afeta ao conflito”. Cf. em “Anexo 7” o
texto integral dos enunciados aprovados.
44
Cf. Capítulo 2, item 2.3 no qual se faz referência a enunciados da I Jornada Prevenção e Solução
Extrajudicial de Litígios, relativos a solução consensual de conflitos perante a Administração Pública para
estímulo desta prática.
45
Inclusive, referida na Lei 13.140/1915. Porém, para recomendar norma específica; assim: “A mediação nas
relações de trabalho será regulada por lei própria” (art. 42, parágrafo único).
46
47
Cf. enunciados da I Jornada referida; assim: “57. As comunidades têm autonomia para escolher o modelo
próprio de mediação comunitária, não devendo se submeter a padronizações ou modelos únicos”; e “86.O
Poder Público promoverá a capacitação massiva em técnicas de gestão de conflitos comunitários para
policiais militares e guardas municipais.”; e em “Anexo 7” o texto integral dos enunciados aprovados.
48
Cf. a respeito, enunciado 45 da I Jornada referida; assim: “A mediação e conciliação são compatíveis com a
recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, bem como em
casos de superendividamento, observadas as restrições legais”; e em “Anexo 7” o texto integral dos
enunciados aprovados.
49
E a respeito, já nos davam notícia Braga Neto, Adolfo; SAMPAIO, Lia Regina Castaldi. Op. cit., p. 95. Em
recente estudo, aliás, ressalta o Autor que a mediação comunitária “contribui para a criação de espaços de
diálogo em que as pessoas apresentam suas diferenças e redesenham de maneira participativa, dinâmica
e pacífica seus respectivos papéis na sociedade. Permite também estabelecer canais facilitadores da
articulação política, institucional e social” (Braga Neto, Adolfo. A mediação de conflitos no contexto
comunitário. In: Braga Neto, Adolfo; SALES, Lilia Maia de Morais (org.). Aspectos atuais sobre a mediação e
outros métodos extra e judiciais de resolução de conflitos cit., p. 24).
50
Em confirmação a esta orientação, veio o Enunciado 83 da I Jornada referida, transcrito no “Anexo 7”.
52
53
54
55
Sendo confidenciais as informações prestadas em sessão privada, conforme o art. 31 da Lei; assim: “Art.
31. Será confidencial a informação prestada por uma parte em sessão privada, não podendo o mediador
revelá-la às demais, exceto se expressamente autorizado”.
56
57
Embora esta regra não esteja na seção “procedimento”, por falha técnica-legislativa, a este está
relacionada, e assim aqui é tratada.
58
Mesmo admitido o protesto judicial interruptivo da prescrição, na praxe este não é um expediente
comum, sendo mais usual a propositura da ação quando o prazo se aproxima. E daí os méritos da
previsão.
59
“Art. 840. É lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas.”
60
“Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais: (...) II – a escritura pública ou outro documento público
assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o
instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos
advogados dos transatores” (grifos nossos).
61
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
1. A Arbitragem no Brasil
• A Lei 9.307/1996
• Constitucionalidade da Lei
2. Características
• Celeridade
• Cumprimento espontâneo
3. Natureza jurídica
• Teoria autônoma
SUMÁRIO
Assim, fala-se hoje da arbitragem (e também da mediação privada) como meio adequado de
resolução de disputa.
A decisão dada pelo árbitro impõe-se às partes, e por esta razão a solução é adjudicada, e não
consensual, como se pretende na conciliação e na mediação, e delas pode ser exigido o
cumprimento, porém a execução forçada se fará perante o Poder Judiciário, sendo a sentença
arbitral considerada um título executivo judicial (art. 31 da Lei 9.307/19963 e art. 515, VII, do
CPC/20154).
E um dos motivos consiste no fato de que o julgamento arbitral se faz em instância única, ou
seja, sem a possibilidade de recursos. Querendo, as partes podem estabelecer um julgamento
colegiado, mas este acompanha o procedimento desde seu início, e não em instância recursal.
Ademais, no pressuposto de que as partes escolheram as pessoas mais habilitadas para o exame
daquela questão, como lhe é facultado, e na perspectiva de terem os eleitos se dedicado
intensamente ao estudo e solução do conflito, não se justifica pensar em instância recursal.7
E muito se perceberá do que superficialmente aqui se faz referência quando, adiante, for
analisado o procedimento arbitral.8
Contudo, nem todos os litígios podem ser resolvidos pela arbitragem. A Lei 9.307/1996, como se
espera de todos os ordenamentos, estabelece limites ao objeto da arbitragem, de acordo com a
qualidade das partes envolvidas ou pela matéria em questão, como detalhadamente se verá em
momento oportuno.
Como qualquer norma, a Lei 9.307/1996 pode conter algumas imperfeições,12 mas, sem dúvida
alguma, seu mérito merece ser enaltecido, destacando-se a iniciativa transformadora de Petrônio
R.G. Muniz, como articulador e estrategista líder da “Operação Arbiter”13 e que encontrou no
Senador Marco Maciel o incansável defensor parlamentar do anteprojeto encomendado aos
Professores Selma Maria Ferreira Lemes, Carlos Alberto Carmona e Pedro Antonio Batista Martins.
14
Comparada com legislações avançadas, como a da Espanha e a de outros países da Europa, para
a nossa realidade, a Lei não deixa a desejar, principalmente porque naquele continente a cultura
da arbitragem já estava incorporada ao Direito.15
A principal inovação, com relação ao regramento anterior, foi conferir à jurisdição arbitral a
independência que merece, dispensando a homologação pelo Poder Judiciário da sentença arbitral
(exigida à época pelo art. 1.045 do CC/1916). E para as sentenças estrangeiras, bastará homologação
do próprio laudo pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 35 da Lei 9.307/1996, conforme se verá no
Capítulo 15 adiante), dispensando para o reconhecimento a homologação no Judiciário de origem,
como até então se exigia.16
Também a Lei de Arbitragem superou outro grande obstáculo, até então existente, ao conceder
força vinculante à cláusula compromissória.
Como se verá, as partes podem, já no contrato, prever a utilização da arbitragem para futuros,
embora incertos e eventuais, conflitos. No passado, para que se instaurasse arbitragem, fazia-se
necessária a composição das partes a respeito quando já instaurado o litígio, mesmo firmada
previamente a cláusula. Caso contrário, diante da recusa por qualquer das partes ao meio
extrajudicial, este restaria prejudicado, prosseguindo-se o litígio na jurisdição estatal, reservado
apenas ao que se sentisse lesado pela quebra do acordo neste particular pleitear perdas e danos.17
Daí porque, como marco em nossa história, definitivamente a arbitragem pela Lei 9.307/1996
prestigia a liberdade das partes em buscar a tutela para seus conflitos fora da jurisdição estatal,
rompendo com o monopólio do Estado para dirimir controvérsias ao admitir “jurisdição privada”
com total independência e eficácia, na linha traçada pelas legislações mais avançadas.
Felizmente, na linha do quanto advertimos em edição anterior deste “Curso”, o Projeto manteve
a essência e estrutura da Lei atual, corrigindo algumas falhas e aperfeiçoando alguns dos pontos
mais sensíveis, sem mudança substancial que, se tivesse ocorrido, certamente causaria uma
indesejável insegurança e incertezas, tudo que não se queria no estágio atual do sistema arbitral
brasileiro.
Assim, a reforma trouxe proveito à norma de regência (Lei 9.307/1996), reforçando a sua
utilidade e profícuos resultados. Sem dúvida, um ou outro detalhe ainda poderia ser adequado,
mas nada que comprometa a eficiência do instituto.
Desta forma, mantem-se a trilha de consolidação do Brasil como um país em que a arbitragem
está muito bem desenvolvida e amparada pelo sistema jurídico e pelos Tribunais. Solidifica-se
nossa reputação internacional como país arbitration friendly.
4.2.1. A constitucionalidade da Lei 9.307/1996
Isto porque, em última análise, a lei não impõe a utilização da arbitragem, mantendo íntegro
aos interessados o acesso à jurisdição estatal, porém, como expressão da vontade e liberdade de
contratar, nas questões relativas a direitos patrimoniais disponíveis, permite que seja eleito o
palco arbitral para a solução de conflito (potencial, latente ou já manifestado).
Por outro lado, não se exclui do Poder Judiciário a lesão a direito das partes, pois se a
convenção arbitral, ou mesmo a sentença proferida na arbitragem, contiver vícios indicados na
Lei, caberá ação própria de invalidação, ou mesmo em defesa da execução, como em momento
oportuno se tratará. Ou seja, verificada a violação ao direito, cabe o exame da questão pelo
Judiciário, porém, se instaurada e desenvolvida a arbitragem de acordo com os requisitos legais, a
mera irresignação do vencido não é causa para se vulnerar a decisão, cujos efeitos são os mesmos
de uma sentença judicial, pois por livre opção escolheram as partes o método extrajudicial de
solução do conflito, e a ele, pelo sistema normativo, devem se submeter.
Por fim, cabe refletir se na sociedade contemporânea, diante de sua dinâmica, convém aos seus
próprios membros o fortalecimento do dogma da exclusividade do Estado no exercício da função
jurisdicional e da indelegabilidade da jurisdição. Questionando esses paradigmas seculares,
Arruda Alvim, na mais nova edição de seu Manual de direito processual civil, afirma: “O que se
preconiza atualmente é que o Estado não é o único – e, algumas vezes, sequer é o mais adequado –
ente vocacionado para esta função, que pode muito bem ser exercida por particulares, algumas
vezes com resultados mais proveitosos do que aqueles obtidos no âmbito do Judiciário”.23 E
prossegue, com base em boa doutrina: “A propósito do ‘mito’ da indelegabilidade da jurisdição,
Joel Dias Figueira Jr. assinala a importância de se refletir este princípio, que não pode ser erigido à
condição de dogma, em detrimento dos objetivos da jurisdição e da interação entre os Estados”.24
Mas esmiuçar e destrinchar a arbitragem ainda são desafios, na busca do rendimento que dela
se pode extrair em sua plenitude.
Mas ainda hoje sustentam que a autonomia da vontade envolve toda a arbitragem, na fase
antecedente pelo contrato, e na fase consequente, no limite do que foi contratado, por meio da
solução de eventual conflito emergente do negócio pelo árbitro eleito pelos contratantes. A causa é
o contrato, e a arbitragem é o efeito. E o laudo arbitral se impõe às partes em virtude da
obrigatoriedade característica dos contratos.
Por fim, pela teoria autônoma identifica-se na arbitragem um sistema de solução de conflitos
totalmente desvinculado de qualquer sistema jurídico existente. E pelas suas características, esta
teoria tem importância nos procedimentos de arbitragem internacional, nos quais há certa
independência à ordem local de uma ou outra parte. Verifica-se aqui o extremo do princípio da
autonomia privada, na medida em que, diante da liberdade de contratar, as partes subtraem a
arbitragem de outros ordenamentos, tratando-a como soberana. Cria-se, por esta teoria, uma
jurisdição própria, independente e diversa da jurisdição que integra um sistema jurídico.37
A adoção de uma ou outra teoria deve passar, necessariamente, pela identificação do que seja
jurisdição.38 Retomada a ideia de jurisdição na concepção sugerida por Montesquieu ao propor a
separação dos três poderes do Estado Liberal – Executivo, Legislativo e Judiciário –, independentes
e harmônicos entre si, ter-se-á por vinculado o instituto ao Estado, como expressão do seu poder-
dever de reconhecer e aplicar a lei no caso concreto, exigindo coercitivamente a obediência a suas
decisões.39 É o dogma do monopólio estatal da jurisdição. A jurisdição será poder, atribuição e
atividade do Estado, para, por intermédio do Judiciário, aplicar o ordenamento ao caso concreto.40
E assim, seria afastada a natureza jurisdicional da arbitragem, pois sua organização não integra
o Estado, ao contrário, pertence ao sistema privado de solução de conflitos.
A Lei 9.307/1996, como antes referido, outorga poderes ao árbitro para, em certos casos,
solucionar o conflito através de sentença com eficácia e força de título executivo judicial,
conferindo-lhe a qualidade de “juiz de fato e de direito” em sua larga dimensão, inclusive quanto a
atribuições e responsabilidades, retirando-lhe apenas alguns poderes (coertio e executio).42
A jurisdição, então, impõe-se, quer seja ela exercida pelo Estado, quer na arbitragem. Assim, o
árbitro estará investido de jurisdição ao caso que lhe for apresentado pelos interessados. E sua
decisão obriga as partes mesmo diante de solução contrária aos interesses ou expectativas. O
árbitro exerce, sem dúvida, ação cognitiva na atividade julgadora, no sentido de reconhecer e
aplicar o direito ao caso concreto. Os argumentos trazidos pelas partes são avaliados de acordo
com todo o contexto probatório, e, com base nestes elementos, analisadas as questões de fato e de
direito, obedecidas as regras de direito material e processual, promove-se o julgamento do litígio,
tal qual se faz no Judiciário, ensejando em uma e outra hipótese a coisa julgada.
A jurisdição, em tese, enquanto autoridade abstrata de dizer o direito (jurisdictio, jus dicere), é
conferida ao Estado (a ser manifestada pelos magistrados) e também excepcionalmente aos
particulares (pelo modelo arbitral na forma estabelecida em nosso sistema jurídico); a Lei prevê (e
assim cria o poder), estabelece regras, requisitos e condições para a jurisdição privada ser
exercida, ou seja, a jurisdição, em tese, é atribuída pelo ordenamento.
O que fazem as partes é eleger uma ou mais pessoas, direta ou indiretamente,43 como previsto
na Lei de Arbitragem, para esta atribuição – decidir a controvérsia, no pressuposto de que a
jurisdição arbitral já terá sido previamente outorgada. É da Lei, também, que deriva o poder de
julgar; as partes desafiam a jurisdição quando instauram o procedimento.
E o Código de Processo Civil prestigia esta posição, pois em seu art. 3.º refere-se à
inafastabilidade da “apreciação jurisdicional” para ameaça ou lesão ao direito, trazendo em seu §
1.º a expressa referência de que “é permitida a arbitragem, na forma da lei”; ou seja, a utilização
do caminho construído pela arbitragem garante a apreciação jurisdicional do conflito previsto no
caput. E mais, no art. 42 introduzido na nova legislação em Livro II dedicado à “Função
Jurisdicional”, no “Título III – Da Competência Interna”, “Capítulo I – Da Competência”, “Seção I –
Disposições Gerais”, também se confirma esta orientação, ao estabelecer que “As causas cíveis
serão processadas e decididas pelo juiz nos limites de sua competência, ressalvado às partes o
direito de instituir juízo arbitral, na forma da lei”“. Desta feita, nos parece definitivamente
superada qualquer dúvida a respeito da natureza jurisdicional da arbitragem.
No exato instante em que as partes, na convenção arbitral,45 cuja origem é contratual, indicam
a forma pretendida para a solução do conflito, já se desperta a jurisdição, inerente ao instituto da
arbitragem por força da Lei 9.307/1996, a ser provocada quando da instauração do procedimento.
Note-se que só considerando a arbitragem como jurisdição é que se poderá explicar a regra
contida no parágrafo único do art. 8.º da Lei 9.307/1996, consagrando o princípio kompetenz-
kompetenz, como adiante se verá,46 pois, se prevalecesse a natureza contratual, seria inviável ao
árbitro examinar e afastar ou não a sua competência para o litígio a ele submetido.
CARMONA, Carlos Alberto. A arbitragem como meio adequado de resolução de litígios. In:
GRINOVER, Ada Pellegrini; PELUSO, Antonio Cezar; RICHA, Morgana de Almeida (coords.).
Conciliação e mediação: estruturação da política judiciária nacional. Rio de Janeiro: Forense, 2011.
DINAMARCO, Cândido Rangel. A arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros,
2013.
MUNIZ, Petrônio R.G. Operação Arbiter – A história da Lei nº 9.307/96 sobre a arbitragem
comercial no Brasil. 2. ed. Salvador: Assembleia Legislativa do Estado da Bahia, 2016.
FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Da constitucionalidade dos arts. 6.º, 7.º, 41 e 42 da Lei de
Arbitragem (9.307/96). A questão da inafastabilidade do controle jurisdicional. Revista de processo.
n. 91. ano XXIII. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 1998.
NOTAS DE RODAPÉ
1
Refere-se a alternativo tendo como parâmetro a jurisdição estatal, mas não como substituto de um sistema
jurídico capaz de desvencilhar-se do ordenamento, pois na arbitragem aplica-se o direito material e
processual, além dos princípios gerais e a Constituição Federal, ou seja, é uma alternativa à justiça estatal,
mas seguindo regras jurídicas para o julgamento.
A origem da expressão, como visto, é da língua inglesa: Alternative Dispute Resolution – ADR.
3
“Art. 31. A sentença arbitral produz, entre as partes, e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença
proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo.”
“Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos
neste Título: (...) VII – a sentença arbitral; (...).”
No momento oportuno, quando tratarmos da sentença arbitral, será analisado o grave efeito do não
cumprimento do prazo estabelecido para a finalização do procedimento.
Uma eventual instância recursal (possível em tese de ser pactuada, como se verá), pode acabar sendo
muito custosa às partes (em tempo e valores), sem qualquer necessidade aparente, na medida em que se
admite, como visto, desde o início do procedimento a escolha de colegiado arbitral.
Cf. Capítulos 8 e 9.
Neste sentido, dentre outros a serem oportunamente apresentados, o art. 17.4 do Regulamento da Câmara
da Ciesp: “O procedimento arbitral é rigorosamente sigiloso, sendo vedado aos membros da Câmara, aos
árbitros e às próprias partes divulgar quaisquer informações com ele relacionadas, a que tenham acesso
em decorrência de ofício ou de participação no referido procedimento”.
10
LArb., art. 2.º, § 3.º com a redação dada pela Lei 13.129/2015.
11
Já ajustada a referência à reforma da Lei 9.307/96 trazida pela recente Lei 13.129/2015.
12
Algumas imprecisões, mas não todas, adequadas na recente reforma trazida pela Lei 13.129/2015, como se
verá no transcorrer dos próximos Capítulos. Remete-se também à leitura para as breves considerações a
respeito das modificações introduzidas por esta nova Lei em “Anexo 2” deste “Curso”.
13
Cf. MUNIZ, Petrônio R.G., em seu livro Operação Arbiter – A história da Lei nº 9.307/96 sobre a arbitragem
comercial no Brasil (2.ª ed. Salvador: Assembleia Legislativa do Estado da Bahia, 2016), na qual se faz com
galhardia a apresentação do tormentoso caminho percorrido para a aprovação da Lei de Arbitragem, por
narrativa de agradável leitura.
14
15
Aliás, a comissão de redação do projeto foi buscar subsídios, dentre outros, na Lei Modelo sobre a
Arbitragem Comercial da Uncitral, e na legislação espanhola de então, cf. Lemes, Selma Maria Ferreira.
Princípios e origens da lei de arbitragem. Revista do Advogado 51/32-35.
16
Como esclarece Carmona: “Por fim, a disciplina do reconhecimento e execução do laudo estrangeiro fazia-
se absolutamente imprescindível para que o Brasil pudesse integrar-se tão completamente quanto possível
ao concerto das nações, já que àquela altura (início dos anos 90) não havíamos ainda ratificado a
Convenção de Nova Iorque de 1958 e só havíamos ratificado a Convenção do Panamá de 1975 poucos
meses antes da edição da Lei de Arbitragem. Colocou-se um basta no ‘sistema da dupla homologação’ até
então vigente no Brasil, segundo o qual poderia ser reconhecido o laudo arbitral estrangeiro se tivesse
sido previamente homologado pelo órgão judicial do lugar em que tivesse sido proferido” (Carmona,
Carlos Alberto. Arbitragem e processo. São Paulo: Atlas, 2009. p. 12).
17
Neste sentido, Carmona: “(...) o Código de Processo Civil não permitia a instauração do juízo arbitral a não
ser na presença do compromisso arbitral, único instrumento a autorizar a exceção de que tratava o art.
301, IX, do Estatuto de Processo, em sua versão original (cf. RT 615/67-70). Nesta esteira, entendiam os
tribunais pátrios que o desrespeito à cláusula arbitral não permitia a execução específica da obrigação,
resolvendo-se o inadimplemento em perdas e danos, reconhecidamente de difícil liquidação. Em outras
palavras, a doutrina e a jurisprudência praticamente transformaram o pacto de contrahendo (cláusula
compromissória) em verdadeiro pactum nudum, contribuindo para que os agentes do comércio
(especialmente os agentes do comércio internacional) abandonassem a escolha da solução arbitral de
controvérsias no Brasil” (Carmona, Carlos Alberto. Op. cit., p. 4-5).
18
Com esta modificação, naturalmente veio à tona a questão de direito intertemporal, consistente em saber
a respeito da incidência da nova norma aos contratos em curso. Proveitoso notar o prestígio dado à Lei de
Arbitragem, encontrando-se diversos acórdãos vinculando as partes à arbitragem, mesmo firmada a
cláusula anteriormente à sua vigência. Nesta linha, por nós também adotada, confira-se o seguinte
acórdão da Corte Especial do STJ: “A Lei de Arbitragem brasileira tem incidência imediata aos contratos
que contenham cláusula arbitral, ainda que firmados anteriormente à sua edição” (STJ, SEC 894/UY, Corte
Especial, j. 20.08.2008, Min. Nancy Andrighi, DJ 09.10.2008). E, firme a jurisprudência, foi recém editada a
Súmula 485 do STJ, assim: “A Lei de Arbitragem aplica-se aos contratos que contenham cláusula arbitral,
ainda que celebrados antes da sua edição”.
19
Nas quais inclusive tivemos participação apresentando sugestões à Comissão, algumas delas acolhidas
pelo anteprojeto; cf. a respeito [www12.senado.gov.br/noticias/materias/2013/08/26/lei-de-arbitragem-
especialistas-querem-clareza-sobre-temas], e [www.cahali.adv.br], em “Notícias”, de 03.09.2013.
20
Cf., também, breves considerações a respeito das modificações trazidas pela Lei 13.129/2015 em “Anexo 2”
deste “Curso”.
21
Art. 5.º, XXXV, CF/1988: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
22
Com a seguinte ementa, no que pertinente: “1. Sentença estrangeira: laudo arbitral que dirimiu conflito
entre duas sociedades comerciais sobre direitos inquestionavelmente disponíveis – a existência e o
montante de créditos a título de comissão por representação comercial de empresa brasileira no exterior:
compromisso firmado pela requerida que, neste processo, presta anuência ao pedido de homologação:
ausência de chancela, na origem, de autoridade judiciária ou órgão público equivalente: homologação
negada pelo Presidente do STF, nos termos da jurisprudência da Corte, então dominante: agravo
regimental a que se dá provimento, por unanimidade, tendo em vista a edição posterior da Lei 9.307, de
23.09.1996, que dispõe sobre a arbitragem, para que, homologado o laudo, valha no Brasil como título
executivo judicial. 2. Laudo arbitral: homologação: Lei da Arbitragem: controle incidental de
constitucionalidade e o papel do STF. A constitucionalidade da primeira das inovações da Lei da
Arbitragem – a possibilidade de execução específica de compromisso arbitral – não constitui, na espécie,
questão prejudicial da homologação do laudo estrangeiro; a essa interessa apenas, como premissa, a
extinção, no direito interno, da homologação judicial do laudo (arts. 18 e 31), e sua consequente dispensa,
na origem, como requisito de reconhecimento, no Brasil, de sentença arbitral estrangeira (art. 35). A
completa assimilação, no direito interno, da decisão arbitral à decisão judicial, pela nova Lei de
Arbitragem, já bastaria, a rigor, para autorizar a homologação, no Brasil, do laudo arbitral estrangeiro,
independentemente de sua prévia homologação pela Justiça do país de origem. Ainda que não seja
essencial à solução do caso concreto, não pode o Tribunal – dado o seu papel de ‘guarda da Constituição’ –
se furtar a enfrentar o problema de constitucionalidade suscitado incidentemente (v.g., MS 20.505, Néri).
3. Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996): constitucionalidade, em tese, do juízo arbitral; discussão incidental
da constitucionalidade de vários dos tópicos da nova lei, especialmente acerca da compatibilidade, ou não,
entre a execução judicial específica para a solução de futuros conflitos da cláusula compromissória e a
garantia constitucional da universalidade da jurisdição do Poder Judiciário (CF, art. 5.º, XXXV).
Constitucionalidade declarada pelo plenário, considerando o Tribunal, por maioria de votos, que a
manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória, quando da celebração do contrato, e a
permissão legal dada ao juiz para que substitua a vontade da parte recalcitrante em firmar o
compromisso não ofendem o art. 5.º, XXXV, da CF. (...)” (SE 5206 AgR, Pleno, j. 12.12.2001, rel. Min.
Sepúlveda Pertence, DJ 30.04.2004).
23
Arruda Alvim Netto, José Manoel de. Manual de direito processual civil. 14. ed. São Paulo: Ed. RT, 2011. p.
197.
24
Idem, p. 198.
25
Anote-se, porém, posição no sentido da inconstitucionalidade da lei, manifestada por João Roberto Egydio
Piza Fontes e Fábio da Costa Azevedo, assim: “Sendo a jurisdição manifestação da soberania, portanto,
monopólio do Estado por excelência, é lógico que o reconhecimento da arbitragem como atividade
jurisdicional está em contradição com esse monopólio; afinal, com a nova Lei de Arbitragem pretende-se
nada mais, nada menos do que a privatização da justiça, trazendo à tona uma inconcebível e atentatória
forma de exercício da jurisdição por agentes privados, resultando daí a sua flagrante
inconstitucionalidade, por violação do princípio do Estado democrático de direito, consagrado no art. 1.º
de nossa Constituição e regra mestra de nosso sistema jurídico: ‘A República Federativa do Brasil, formada
pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático
de Direito e tem como fundamentos: (...)’ (art. 1.º, CF/1988). (...) Destarte, ressaltamos ainda que a Lei de
Arbitragem implica a instituição de uma instância jurisdicional fora das previstas na Constituição, o que
faz exsurgir mais uma inconstitucionalidade em face da flagrante violação do princípio da proibição do
juízo ou tribunal de exceção, previsto no art. 5.º, XXXVII, da CF, o qual prevê que ‘não haverá juízo ou
tribunal de exceção’” (Fontes, João Roberto Egydio Piza; Azevedo, Fábio da Costa. A Lei de Arbitragem
analisada à luz dos princípios gerais do Direito. Revista do Instituto de Advocacia do Estado de São Paulo
4/87).
26
Cf. em “Anexos” deste “Curso”, além de breves considerações pontuais a respeito das modificações trazidas
pela Lei 13.129/2015, os artigos do CPC/15 relacionados, direta ou indiretamente à arbitragem.
27
Explicando a teoria contratualista, José Cretella Neto: “A primeira vertente [contratualista] vislumbra no
instituto natureza jurídica de obrigação criada por contrato, tendo por consequências todas as derivadas
do pacto em geral. Fundamentam esse ponto de vista, em resumo, com os seguintes argumentos: a)
inexistirá arbitragem sem convenção de arbitragem; b) a base da arbitragem é o consenso entre as partes,
enquanto que a jurisdição estatal se insere no ius imperium estatal, imposto a todos; c) o árbitro não está
vinculado ao Poder Judiciário; e d) o juízo arbitral não confere obrigatoriedade de cumprimento ao laudo
arbitral, que deve ser voluntariamente obedecido pela parte vencida; em caso de recalcitrância,
necessária se fará a intervenção do Poder Judiciário” (Cretella Neto, José. Curso de arbitragem. Rio de
Janeiro: Forense, 2004. p. 14). E complementando, a coautora da Lei de Arbitragem, Selma Lemes, explica
essa teoria como: “Contratual, no sentido de que nasce de uma convenção firmada pelas partes e os
poderes dos árbitros derivam dessa autorização” (Lemes, Selma Maria Ferreira. Arbitragem na
administração pública. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 60).
28
Mas mesmo antes da Lei de Arbitragem, vozes como a de Carmona já sustentavam com sólidos
argumentos a natureza jurisdicional da arbitragem (Carmona, Carlos Alberto. Arbitragem e jurisdição).
RePro 58/33-40.
29
“Art. 31. A sentença arbitral produz, entre as partes, e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença
proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo.”
30
Previsão esta mantida no CPC/2015; assim: “Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento
dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: (...) VII – a sentença arbitral; (...).”
31
“Art. 18. O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a
homologação pelo Poder Judiciário.”
32
“Art. 13. Pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes. (...) § 6.º No
desempenho de sua função, o árbitro deverá proceder com imparcialidade, independência, competência,
diligência e discrição.”
33
Sobre a teoria jurisdicional, vejam-se comentários de Haroldo Verçosa: “A teoria jurisdicional entende a
arbitragem como forma de exercício da função jurisdicional, uma vez que os árbitros recebem das partes
o poder de decidir o litígio a eles apresentado, aplicando a norma ao caso concreto e, assim, emitindo
decisão obrigatória e vinculativa (atribuição dos efeitos da sentença judicial ao laudo arbitral). Além disso,
o procedimento arbitral substitui a jurisdição estatal no que tange ao mérito da discussão travada da
arbitragem” (Verçosa, Haroldo Malheiros Duclerc. Aspectos da arbitragem institucional – 12 anos da Lei
9.307/1996. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 242).
34
Basílio, Ana Tereza Palhares; Fontes, André R. C. Notas introdutórias sobre a natureza jurídica da
arbitragem. RArb 14/51.
35
José Cretella Neto explica o conceito da teoria mista, acrescentando que dois famosos arbitralistas
franceses a defendem: “A doutrina moderna vê na arbitragem instituto misto, sui generis, pois abriga
aspecto contratual e também jurisdicional, que coexistem, posição defendida por Pierre Lalive e Philippe
Fouchard” (Cretella Neto, José. Op. cit., p. 15).
36
Cf. Guerreiro, Luiz Fernando. Arbitragem e jurisdição: premissa à homologação de sentença arbitral
estrangeira. RePro 159/9, trazendo Carnelutti, Francesco. Instituzioni del processo civile italiano. 5. ed.
Roma: Foro Italiano, 1956. p. 120. Cf. Carnelutti, Francesco. Sistema del diritto processuale civile. Padova:
Cedam, 1939. vol. 1, 2 e 3, p. 527-528; Rubino-Sammartano, Mauro. Il diritto dell’arbitrato (interno). 2. ed.
Padova: Cedam, 1994. p. 28.
37
Cf. Guerreiro, Luiz Fernando. Op. cit., p. 9, trazendo Dolinger, Jacob; Tiburcio, Carmen. Direito
internacional privado – Arbitragem comercial internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 96-97; e cf.
também, David, René. L’arbitrage dans le commerce international. Paris: Económica, 1981. p. 20-23.
38
Cf., a respeito, Calmon de Passos, para quem a jurisdição é “a entrega, pelo Estado-juiz, da prestação
jurisdicional reclamada, vale dizer, a aplicação autoritativa do direito que na espécie incidiu” (Calmon de
Passos, José Joaquim. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1988. vol. III – Arts.
270 a 331, p. 2); e ainda, Celso Agrícola Barbi: “O Código [de Processo Civil] admite a existência de uma
jurisdição contenciosa e uma voluntária (...). A jurisdição contenciosa, ou simplesmente jurisdição (...) tem
por finalidade aplicar as aludidas normas gerais aos casos concretos que são levados à sua apreciação e
julgamento (...) todavia, não compreende apenas a função de decidir qual o direito em um determinado
caso, mas abrange também a atividade de tornar efetivo o direito reconhecido” (Barbi, Celso Agrícola.
Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de janeiro: Forense, 1983. vol. I – Arts. 1.º a 153, p. 15-16).
39
Carneiro, Athos Gusmão. Jurisdição e competência. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 3-6, 11.
40
Cintra, Grinover e Dinamarco. Teoria geral do processo. São Paulo: Ed. RT, 1986. p. 83; Grinover, Ada
Pellegrini. Os princípios constitucionais e o Código de Processo Civil. São Paulo: José Bushatsky Ed., 1975. p.
77 e ss.
41
Cf., a respeito, Selma Lemes: “Uma quarta natureza jurídica vem sendo propugnada por Cândido Rangel
Dinamarco para defini-la em atenção à função do árbitro, de parajurisdicional, partindo do pressuposto
que ‘embora ele não a exerça com o escopo “jurídico” de atuar a vontade da lei, na convergência em torno do
escopo “social” pacificador reside algo muito mais forte a aproximar a arbitragem da jurisdição estatal’
[Nova era do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 28-29]. Observa Dinamarco que a expressiva
aproximação entre o processo arbitral e o estatal justifica a sua análise à luz do Direito Processual
Constitucional” (Lemes, Selma Maria Ferreira. Arbitragem na... cit., p. 61).
42
Coertio representa o poder do Estado de sujeitar o objeto do litígio e as partes às determinações de acordo
com as normas legais; executio representa o poder de executar ou fazer executar a decisão, promovendo,
se for o caso, transformações no mundo empírico para efetivar o comando contido na decisão, como, por
exemplo, expropriando bens para pagamento de dívida.
43
No caso de indicação de instituição arbitral, a quem, pelo regulamento, conforme o caso, competirá a
escolha do(s) árbitro(s); cf. Capítulo 7, item 7.3, adiante.
44
Neste sentido, José Cretella Neto: “Parece-nos evidente que o árbitro exerce verdadeira jurisdição, e o faz
por indicação das partes – com respaldo na lei, que valida a convenção –, de forma que, ao permitir a
legislação que se instaure o juízo arbitral, consagra a maior participação do povo na administração da
Justiça, sem dúvida princípio democrático, claramente caracterizador do Estado de Direito” (Cretella Neto,
José. Op. cit., p. 15). Em sentido divergente, Jonathan Barros Vita entende que “a justificativa do caráter
jurisdicional da arbitragem por ela ter sido colocada no rol dos títulos executivos judiciais (art. 475-N, IV,
do CPC [1973], combinado com o seu inc. VI quando se tratar de sentença arbitral estrangeira) não é um
argumento concludente, pois o fato de possuir regime jurídico executório de sentença judicial não
significa que possua a mesma natureza jurídica. (...) esta ideia de arbitragem como estrutura de resolução
de conflitos não jurisdicional faz com que, ao menos, três elementos aflorem e potencializem seu uso.
Neste sentido, o uso da arbitragem como forma autorizada/delegada de jurisdição integral acaba
limitando-a em seu objeto, adaptabilidade e produção de resultado mais facilmente aceitável pelas
partes”. O autor aponta para os seguintes elementos que surgem da não jurisdição da arbitragem: (i) a alta
capacidade de estabilização das expectativas normativas em função das expectativas cognitivas, visto que
não há o isolamento que existe no centro do sistema normativo; (ii) a capacidade da arbitragem de não se
vincular diretamente a uma ordem jurídica, isolando-se das pressões do sistema político nacional; e (iii) a
capacidade de a decisão arbitral fazer parte, ao mesmo tempo, de vários sistemas jurídicos distintos.
Concluindo que “a união do segundo e do terceiro elementos citados, a arbitragem pode selecionar um
conjunto de regras desvinculado de ordens jurídicas, especialmente nos casos das arbitragens
internacionais, em que a estrutura arbitral é replicada em vários sistemas jurídicos (nacionais ou
internacionais), aos quais cada uma das partes envolvidas neste procedimento se vincula” (Filkelstein,
Cláudio; Vita, Jonathan; Casado Filho, Napoleão (coords.). Arbitragem internacional: Unidroit, CISG e
Direito brasileiro. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p. 54-55).
45
Cf. Capítulo 6 adiante, no qual serão detalhadas as espécies de convenção arbitral, a saber: cláusula
compromissória e compromisso arbitral.
46
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
1. Arbitrabilidade
• Subjetiva
• Objetiva
• Kompetenz-kompetenz
3. Espécies de arbitragem
• Avulsa ou ad hoc
• Institucional
SUMÁRIO
5.1. • ARBITRABILIDADE
5.1. Arbitrabilidade
Existe, pois, um filtro dos litígios que poderão ser encaminhados ao juízo arbitral.
A capacidade das partes ao firmarem a convenção é conditio sine qua non para a utilização da
arbitragem – arbitrabilidade subjetiva. Capacidade, como se sabe, é a aptidão da pessoa para ser
titular de um direito, e vem genericamente estabelecida pelo art. 1.º do CC/2002.1
Mas a titularidade do direito difere de seu exercício. Para o exercício dos direitos, a lei
estabelece restrições, em razão da idade, da inaptidão para exprimir vontade, de vícios, e ainda da
prodigalidade, conforme previsão nos arts. 3.º e 4.º do CC/2002.2 Nestas hipóteses de incapacidade
relativa ou absoluta, o exercício do direito estará condicionado à assistência ou representação,
conforme o caso, dos pais, tutores e curadores.
Sob outra ótica, mesmo sendo entes despersonalizados, massa falida, espólio e condomínios (de
edifícios), podem ser partes em procedimentos arbitrais, pois têm capacidade de contratar, e
assim, de ser parte e de estar em juízo.
Assim, a convenção arbitral envolvendo menor relativamente incapaz, mesmo assistido pelos
pais, tem restrição, pois os direitos em questão são indisponíveis. E mesmo no caso de contratos
que envolvam a mera administração, embora permitidos sem autorização judicial aos incapazes
assistidos ou representados, o óbice à utilização da arbitragem surge em razão da necessária
participação do Ministério Público no processo (art. 178, II, do CPC/20153).4
Por sua vez, os entes despersonalizados, para dispor de direitos, necessitam de permissão.
Assim, o espólio, com autorização judicial ao inventariante, pode celebrar convenção arbitral, tal
qual o condomínio, pelo síndico com a autorização da assembleia de condôminos. A permissão,
nestes casos, é um requisito essencial, ensejando sua falta à invalidade da convenção arbitral.5
Para atender à arbitrabilidade objetiva, exige-se que o objeto do litígio diga respeito a um
direito patrimonial disponível, como diz a literalidade da norma.
Direitos não patrimoniais, pois, de plano são excluídos do juízo arbitral. E assim, os direitos da
personalidade6 (direito à vida, a honra, a imagem, ao nome), o estado da pessoa (modificação da
capacidade, como interdição, dissolução do casamento, reconhecimento ou desconstituição da
filiação, atributos do poder familiar, como guarda e regulamentação de visitas), ficam excluídos da
arbitragem. Mas eventuais impactos patrimoniais destes direitos, como também do direito penal,
conforme o caso, são arbitráveis (por exemplo, apuração do dano ex delicto, e partilha de bens na
separação ou no divórcio – a respeito deste, inclusive, confira-se Capítulo 14, item 14.6 adiante).
Quanto aos direitos patrimoniais, exige-se também que sejam disponíveis. A disponibilidade do
direito se refere à possibilidade de seu titular ceder, de forma gratuita ou onerosa, estes direitos
sem qualquer restrição. Logo, necessário terem as partes o poder de autorregulamentação dos
interesses submetidos à arbitragem, podendo dispor sobre eles pelas mais diversas formas dos
negócios jurídicos; são, pois, interesses individuais, passíveis de negociação, ou seja, podem ser
livremente exercidos pela parte.
Já se viu acima que direitos patrimoniais de incapazes são indisponíveis, como também aqueles
envolvendo bens fora do comércio e a grande maioria dos direitos públicos, quando a
Administração trata de direitos fundamentais da sociedade. Igualmente, direitos sobre os quais
não se pode transacionar (como se referia no passado o Código de Processo Civil ao tratar da
arbitragem, no art. 1.072 – revogado) são indisponíveis.
Em um primeiro momento, estas referências bastam para demonstrar que nem todos os litígios
podem ser levados à arbitragem.
Como todos os institutos, a arbitragem submete-se a princípios próprios, além daqueles gerais
do direito. Vejamos:
Até mesmo as regras de direito que serão aplicadas podem ser definidas pelas partes, podendo
convencionar que a arbitragem se dará por equidade, ou “se realize com base nos princípios gerais
de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais do comércio” (art. 2.º, §§ 1.º e 2.º, da Lei
9.307/1996), com limites a serem oportunamente tratados.10
E na intensidade desta liberdade de opções, as partes, desde que de comum acordo, podem
modificar o quanto antes estabelecido. Assim, por exemplo, se inicialmente previu-se um colegiado
arbitral, verificado o conflito apenas em uma pequena parte do contrato, os interessados podem
rever a posição inicial, e encaminhar, de comum acordo, este conflito restrito a árbitro único, ou
mesmo indicar instituição arbitral diversa daquela inicialmente prevista.
Assim, a autonomia aqui confirma o poder das partes de modelar, em conjunto, toda a
arbitragem, desde sua eleição e seu início, até a sua conclusão, passando pelo seu conteúdo. E
assim, este princípio é da essência deste instituto.
Apesar disto, merece registro a existência, em sistemas jurídicos estrangeiros, de matérias que
devem ser obrigatoriamente submetidas ao juízo arbitral. Em Portugal, por exemplo, há previsão
na Constituição (art. 211), de “tribunais arbitrais”, levando os doutrinadores a sustentar que estes
órgãos integram o sistema judicial. E assim, estão em funcionamento quatro destes tribunais para
julgamento de causas específicas, como ligadas aos achados no fundo do mar.
Também em Costa Rica existe a “arbitragem obrigatória para questões ligadas à previdência
social (demandas entre o Instituto Nacional de Seguros e o segurado a respeito do contrato de
seguro) e para certas questões oriundas de admissão ou recusa de herdeiro em uma sociedade de
responsabilidade limitada, entre outras”.11
Anote-se, porém, para quem for dedicar-se ao estudo da questão que, embora se refira a
“arbitragem”, mais próximos estes sistemas a um juizado especializado, e talvez assim devam ser
tratados. De qualquer forma, representam exceção cada vez mais remota nos países que
desenvolvem a arbitragem.
E mesmo no Brasil já tivemos arbitragem obrigatória, em matéria comercial, abolida pelo Dec.
3.900, de 26.07.1867.12
Na amplitude esperada da norma, o exame da arbitrabilidade exigida pelo art. 1.º da Lei
igualmente se oferece primeiro ao árbitro, na exata medida em que será inválida a convenção
contrária aos requisitos deste artigo (arbitrabilidade subjetiva e objetiva, vistas no Capítulo 5, item
5.1 supra).14
Neste sentido, o § 2.º do art. 20 da Lei de Arbitragem, cujo caput17 estabelece o momento para
os vícios da convenção serem arguidos pela parte: “Não sendo acolhida a arguição, terá normal
prosseguimento a arbitragem, sem prejuízo de vir a ser examinada a decisão pelo órgão do Poder
Judiciário competente, quando da eventual propositura da demanda de que trata o art. 33 desta
Lei”.
A hipótese possível para a incidência da regra é de ingresso em Juízo Estatal de pedido de tutela
provisória antecedente à arbitragem. Neste caso, no momento inicial, não caberia a alegação de
existência de convenção arbitral (CPC/2015, art. 337, X), pois há jurisdição estatal para o
processamento da medida (LArb. art. 22-A; Cf. Capítulo 10, item 10.2). Importante notar que se a
parte deixou de alegar, quando e como lhe competia, no curso do processo judicial a exceção de
existência de convenção arbitral, haverá “aceitação da jurisdição estatal e renúncia ao juízo
arbitral” (CPC/2015, art. 337, § 6º).
Com histórico favorável à definição da Jurisdição Arbitral em confronto com o Juízo Estatal, em
razão do Princípio Competência-Competência, contido em julgamentos do STJ em outros Conflitos
de Competência que se seguiram ao anteriormente referido19, nos parece que a inovação do
Código foi exatamente no sentido de criar, como regra, um instrumento próprio para se decidir a
questão sem necessidade de provocação do Superior Tribunal de Justiça.
Assim, pelo artigo 485, VII, do CPC/2015, afirmada a competência do Juízo Arbitral, levada a
decisão ao Juízo Estatal (quando idêntico o objeto do conflito, sem que se tenha considerada
renunciada a arbitragem – CPC/2015, art. 337, § 6º), a este cabe, unicamente, extinguir o processo,
independentemente de sua convicção a respeito do tema. Este é o sentido da norma, exatamente
para se evitar a instauração do Conflito de Competência. Caso contrário, a previsão legal, agora
introduzida, não teria qualquer significado.
E reitere-se que os primorosos votos proferidos nos acórdãos, aqui referidos, são extremamente
positivos para se demonstrar a valorização ao Princípio Competência-Competência, a tornar
segura e confortável a inovação do art. 485, VII, de modo a reservar a provocação direta ao STJ por
conflito de competência somente em casos excepcionais de confronto entre a jurisdição Estatal e
Arbitral, diversos daqueles em que já se afirmou a competência no procedimento arbitral.
Em situações especiais, como nos casos em que a instauração do procedimento arbitral se fará
por indicação do juízo estatal em cumprimento da cláusula compromissória vazia (art. 7º da Lei
9.307/1996),21 a convenção será previamente analisada pelo Judiciário, de forma superficial, tal
como também acontece quando uma das partes ingressa com a ação no juízo estatal e a outra
parte invoca a existência de convenção de arbitragem com o objetivo de se extinguir o processo,
sem resolver o de mérito (art. 485, VII c/c art. 337, X, do CPC/2015). Verificada, prima facie, gritante
vício na cláusula ou no próprio contrato, objetivamente apurado, tem sido admitido o seu
reconhecimento judicial nesta oportunidade.
Como bem coloca Cândido Rangel Dinamarco, “o poder de apreciação pelos árbitros não chega
ao ponto de subtrair radicalmente aos juízes togados a competência para avaliar os casos em que
não se possa sequer haver dúvida séria e razoável sobre a cláusula (dupla interpretação), suas
dimensões, suas ressalvas, sob pena de abrir escâncaras à indiscriminada subtração dos litígios à
apreciação pelo juiz natural.”22
Como já escrevemos em parecer sobre a matéria, reclama-se algum esforço para se saber qual o
limite e a extensão dessa reserva em que se constitui o art. 8.º, parágrafo único, da Lei 9.307/1996,
mas o discrimen parece ser o bom senso. Se, por um lado, a arbitragem não pode ser
desprestigiada com a utilização do Judiciário como instrumento para contaminar a sua dinâmica,
de outro lado não se pode ficar refém do Juízo Arbitral em casos cuja solução neste ambiente está,
sem dúvida, totalmente comprometida por vícios insuperáveis.
Saber se está ou não configurada a situação teratológica neste caso apontado é matéria
reservada ao livre convencimento motivado dos Julgadores, que, aliás, muito bem fundamentaram
suas conclusões no precedente referido. Nesta oportunidade, o importante é destacar a relevância
da matéria, e firmar a tese de que, em caráter excepcional, quando assim qualificada a hipótese
pelas circunstâncias apresentadas, admite-se a quebra da primazia do Juízo Arbitral para conhecer
da existência, validade e eficácia da convenção.
E neste sentido, recente acórdão do Superior Tribunal de Justiça, relatado pelo Ministro Luis
Felipe Salomão, no qual se consignou: “2. A cláusula compromissória ‘cheia’, ou seja, aquela que
contém, como elemento mínimo a eleição do órgão convencional de solução de conflitos, tem o
condão de afastar a competência estatal para apreciar a questão relativa à validade da cláusula
arbitral na fase inicial do procedimento (parágrafo único do art. 8.º, c/c o art. 20 da LArb). 3. De
fato, é certa a coexistência das competências dos juízos arbitral e togado relativamente às questões
inerentes à existência, validade, extensão e eficácia da convenção de arbitragem. Em verdade –
excluindo-se a hipótese de cláusula compromissória patológica (“em branco”) –, o que se nota é
uma alternância de competência entre os referidos órgãos, porquanto a ostentam em momentos
procedimentais distintos, ou seja, a possibilidade de atuação do Poder Judiciário é possível tão
somente após a prolação da sentença arbitral, nos termos dos arts. 32, I e 33 da Lei de
Arbitragem.”23 confirmando orientação já antes manifestada, dentre outros, em precedente
relatado pelo Ministro Sidnei Beneti, segundo a qual: “Nos termos do artigo 8.º, parágrafo único, da
Lei de Arbitragem a alegação de nulidade da cláusula arbitral instituída em Acordo Judicial
homologado e, bem assim, do contrato que a contém, deve ser submetida, em primeiro lugar, à
decisão do próprio árbitro, inadmissível a judicialização prematura pela via oblíqua do retorno ao
Juízo.”,24 encontrando-se inclusive decisões monocráticas com idêntica posição, conhecendo e
dando provimento ao Recurso Especial, proferidas pelo Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, para
quem “a jurisprudência desta Corte encontra-se consolidada no mesmo rumo da tese defendida
nas razões do especial, no sentido de que a alegação de nulidade da cláusula arbitral instituída em
acordo judicial homologado deve ser submetida, em primeiro lugar, à decisão do próprio juízo
arbitral.”25
Pode parecer estranho, e sem sentido, dar ao juízo arbitral a competência para apreciar a sua
competência. Veja-se que, nesta tarefa, pode o árbitro, ao reconhecer a existência de vício na
convenção, extinguir o procedimento registrando a inviabilidade da instauração da arbitragem.
Ora, se não é possível a arbitragem, como o árbitro tem poderes para julgar esta questão e assim
decidir?
Neste caminho a doutrina, à qual nos filiamos, diz que o princípio da competência-competência
deveria ser da “jurisdição-jurisdição”. O árbitro tem competência para avaliar a possibilidade de o
litígio ser submetido à sua jurisdição ou não,26 haja vista a natureza jurisdicional da arbitragem,
conforme completa Daniel Bushatsky: “Aqui um parênteses: detém o árbitro competência para
decidir sobre sua jurisdição e não, como vulgarmente tratado, competência para dirimir sobre sua
competência. O rigor técnico assim impõe, pois a arbitragem afasta a jurisdição estatal e não a
competência de um órgão do próprio poder Judiciário. Trata-se de analisar qual das duas
jurisdições – estatal ou arbitral – está legitimada a apreciar e julgar a controvérsia. Nesse
particular, merece aplauso a Lei de Arbitragem inglesa, de 1996, cuja redação dos arts. 30 a 32
emprega o termo com esse rigor técnico”.27
Devido processo legal: enquanto jurisdição, a arbitragem deve obedecer ao princípio do devido
processo legal, em decorrência do qual, vários outros princípios se seguem, como os inseridos no
próprio corpo da Lei de Arbitragem, que são o do contraditório, igualdade das partes,
imparcialidade do árbitro e livre convencimento (art. 21, § 2.º, da Lei 9.307/1996).
Porém, apenas por razões didáticas, deixamos para apresentar estes princípios no capítulo
destinado ao procedimento arbitral, pois naquele momento é que deverão ser observadas estas
regras.
Os árbitros não se confundem com a Instituição, embora na maioria das vezes sejam eleitos por
ela ou pelos interessados dentre aqueles relacionados em sua lista de árbitros. Não são delas
“funcionários”, e, na independência característica de sua atividade, exercerão a atribuição que lhe
for conferida para cada caso específico. Assim, a jurisdição é exclusiva do árbitro, cabendo à
instituição as funções de “secretaria”.
Embora possa parecer estranho, para determinadas questões, pelo objeto (exclusivamente de
direito) ou partes envolvidas (maior proximidade), vai bem a arbitragem avulsa. Seria como um
parecer jurídico, encomendado a um expert indicado por ambas as partes, ou um “parecer
técnico”, como avaliação ou identificação de um problema específico (origem de vazamento,
apuração de falha em um serviço e até o evaluation de uma empresa etc.), entregue em conjunto
pelos interessados a um especialista, porém, com efeito vinculante aos envolvidos (ao constituir o
resultado um título executivo judicial), quando respeitados os requisitos e características da
arbitragem.
Mas, sem dúvida, poucas, poucas mesmo são as arbitragens avulsas, e o seu sucesso depende
muito da adequada assessoria jurídica dos advogados das partes, inclusive com relação à análise
de sua viabilidade e formalização.
Esta instituição cuidará dos trâmites procedimentais para se realizar a arbitragem. Como antes
referido, trata-se, basicamente, de atribuição cartorária, a ser desempenhada com a finalidade de
dar ao(s) árbitro(s) e às partes as condições para o desenvolvimento e conclusão da arbitragem.
Cada instituição, com total independência, terá suas regras previstas em seu regulamento, e
nele serão estabelecidas as formalidades, etapas, providências, trâmites, e demais previsões
procedimentais para a instauração, organização e desenvolvimento da arbitragem.29
O que não se pode é elaborar convenção arbitral contraditória com o regulamento da câmara
escolhida. Daí a importância de se conhecer e estudar o regulamento da instituição para verificar
aquela que mais se adapta às perspectivas dos interessados. A parte pode se sentir perfeitamente
confortável em acolher a regra de escolha do número de árbitros pela instituição, ou pode preferir
ter a prerrogativa de optar por árbitro único, quando, então, determinadas instituições não
poderão ser eleitas na convenção. Esta questão certamente passa pela escolha da instituição.
Por fim, registre-se a existência no Brasil, desde 1997, do Conima – Conselho Nacional das
Instituições de Mediação e Arbitragem, entidade cujo objetivo é congregar e representar entidades
de mediação e arbitragem, visando o aprimoramento de sua atuação, bem como o
desenvolvimento dos métodos extrajudiciais de solução de controvérsias, valorizando a qualidade
e ética das atividades desempenhadas pelas instituições.
Dentre outras atribuições e atividades, o Conima promove a orientação aos seus filiados nas
mais diversas áreas, propondo Código de Ética para árbitros, mediadores e instituições, além de
promover e patrocinar eventos, relacionar filiados, manter “Ouvidoria Geral”, divulgar a “Cartilha
Arbitragem” desenvolvida pelo Ministério da Justiça, a “Cartilha OAB/SC”, a “Cartilha Boas
Práticas” e gerenciar o projeto “Selo Amizade”.35
Nada impede seja pelo árbitro criada uma equipe ou estrutura para a prática de atos
instrumentais à realização da arbitragem, mas tudo será sob a sua responsabilidade direta.
Nada impede que a arbitragem ad hoc se desenvolva, também, perante um colegiado. Nesta
hipótese, tudo o quanto se disse com relação às atribuições do árbitro, estende-se ao painel
arbitral. Porém, é indispensável que se tenham regras próprias e bem delineadas para a formação
do colegiado, pois só a partir de então, com a aceitação dos árbitros ao encargo, se terá instaurada
a arbitragem, e delegadas as atribuições a eles inerentes.
A opção por este modelo pode trazer uma redução de custos, porém, como referido, haverá
necessidade de uma escolha do árbitro muito bem feita, recaindo em profissional de extrema
confiança das partes, com aptidão e experiência para tão específica atuação, além de uma
adequada delimitação pelas partes de critérios e parâmetros na convenção arbitral, tudo para se
preservar a eficiência, validade e eficácia da solução arbitral.
NOTAS DE RODAPÉ
1
2
“Art. 3.º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16
(dezesseis) anos. Art. 4.º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer: I – os
maiores de 16 (dezesseis) e menores de 18 (dezoito) anos; II – os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
III – aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; IV – os
pródigos. Parágrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial.”
“Art. 178. O Ministério Público será intimado para, no prazo de 30 (trinta) dias, intervir como fiscal da
ordem jurídica nas hipóteses previstas em lei ou na Constituição Federal e nos processos que envolvam:
(...) II –interesse de incapaz (...)”.
Em sentido aparentemente diverso, Luiz Antonio Scavone Junior escreve: “O que se quer afirmar,
diferentemente do que pensam alguns autores, é que as pessoas podem ser representadas ou assistidas na
convenção de arbitragem, desde que respeitados os limites decorrentes da matéria, que deve versas sobre
direitos patrimoniais disponíveis. Assim, com respeito às posições em sentido contrário, nada obsta que,
circunscritos aos limites de mera administração impostos à representação, tutela e curatela, os pais,
tutores ou curadores possam representar ou assistir os incapazes, firmando cláusulas ou compromissos
arbitrais, que versem sobre direitos patrimoniais disponíveis desses mesmos incapazes” (Scavone Junior,
Luiz Antonio. Manual de arbitragem. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Ed. RT, 2010. p. 20-21).
No Capítulo 14, sobre “Arbitragem Temática” faremos a intersecção entre o instituto da arbitragem e
alguns temas de grande importância no cenário nacional e internacional, tais como arbitragem e falência,
arbitragem testamentária; arbitragem no direito de família etc.
A respeito dos direitos da personalidade, veja-se o que diz Flávio Tartuce: “Conforme consta no próprio
art. 11 do CC, os direitos da personalidade são intransmissíveis, não cabendo, por regra, cessão de tais
direitos, seja de forma gratuita ou onerosa. Daí porque não podem ser objeto de alienação (direitos
inalienáveis), de cessão de crédito ou débito (direitos incessíveis), de transação (intransacionáveis) ou de
compromisso de arbitragem. No último caso, consta previsão expressa no art. 852 do CC em vigor, que
veda o compromisso para a solução de questões que não tenham caráter estritamente patrimonial. Porém,
tanto doutrina quanto jurisprudência, pelo teor do que consta do Enunciado n. 4 do CJF/STJ da I Jornada de
Direito Civil, aqui transcrito, reconhecem a disponibilidade relativa dos direitos da personalidade. A título
de exemplo, podem ser citados os casos que envolvem a cessão onerosa dos direitos patrimoniais
decorrentes da imagem, que não pode ser permanente. Também ilustrando, cite-se a cessão patrimonial
dos direitos do autor, segundo o art. 28 da Lei 9.610/1998, pelo qual ‘cabe ao autor o direito exclusivo de
utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou cientifica’. A cessão gratuita também é possível, como
no caso de cessão de partes do corpo, desde que para fins científicos ou altruísticos (art. 14 do CC)”
(Tartuce, Flávio. Direito civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2011. vol. 1. p. 177).
7
Cf. breves considerações a respeito das modificações trazidas pela Lei 13.129/2015 em “Anexo 2” deste
“Curso”.
A respeito da distinção entre autonomia da vontade de autonomia privada, Vicente Ráo escreve: “Através
dos atos jurídicos, os agentes disciplinam os seus interesses (morais ou materiais), atuando sua vontade
autônoma. A autonomia da vontade, por assim se exercer e desenvolver, na ordem privada, autonomia
privada também se denomina. Há, porém, quem entenda que as expressões autonomia da vontade e
autonomia privada são sinônimas apenas aparentemente, traduzindo, na realidade, conceitos diversos: os
que as confundem, diz Luigi Ferri (Nozioni giuridica di autonomia privata, Studi in onore di Francesco
Massineo, 1959, vol. IV/119 e ss.) são partidários do ‘dogma da vontade’, são, isto é, os que julgam ser a
vontade real ou psicológica a causa ou raiz dos efeitos jurídicos, em contraste com os que apontam como
fatos geradores destes efeitos a lei, ou a declaração de vontade considerada como fato objetivo. Mas,
segundo nosso modo de entender, quando vemos na vontade autônoma, que na ordem privada se exerce,
um elemento essencial dos atos produtores de efeitos jurídicos, não excluímos o valor, nem a necessidade
da declaração, nem deixamos de considerar que, em princípio, a força produtora de tais efeitos se
encontra na vontade eficaz e atuante, de conformidade com ordenamento jurídico. O problema do
predomínio ou não predomínio da vontade real ou subjetiva sobre a vontade objetivamente declarada é
problema distinto, que ao caráter autônomo da vontade só por via reflexa diz respeito. Nem se destruiria
o suposto ‘dogma da vontade’ substituindo-o pelo ‘dogma da declaração’, ou pela força atuante da lei: este
problema é por demais complexo e excede os limites de quaisquer afirmações categóricas e simplistas,
num sentido ou noutro. Observe-se, ainda, que a autonomia da vontade não exerce, apenas, dentro do
campo delimitado pela lei, nem se aplica tão só aos contratos inominados, pois melhor se qualifica como
expressão de um poder criador que atua de conformidade com o ordenamento jurídico, ou sob as sanções
por este ordenamento estabelecidas, padecendo maiores ou menores limitações, mais graves ou menos
graves cominações, segundo a relação de que se trate” (Ráo, Vicente. Ato jurídico: noção, pressupostos,
elementos essenciais e acidentais: o problema do conflito entre os elementos volitivos e a declaração. 4. ed.
São Paulo: Ed. RT, 1997. p. 48-49).
Idem, p. 49-50.
10
Por exemplo, tratando-se de procedimento que envolva a administração pública, a arbitragem será
sempre de direito, e respeitará o princípio da publicidade (LArb., art. 2.º, § 3.º, introduzido pela Lei
13.129/2015).
11
Carmona, Carlos Alberto. Arbitragem e processo. São Paulo: Atlas, 2009. p. 54.
12
Cf., a respeito, Arnoldo Wald: “O Código Comercial, de 1850, estabeleceu a arbitragem como meio de
solução obrigatório para diversos conflitos de caráter comercial, entre eles o conflito entre sócio de uma
sociedade comercial. No entanto, em 1866 a arbitragem obrigatória foi abolida pela Lei 1.350,
permanecendo em vigor somente a arbitragem voluntária. O Dec.3.900/1867, por sua vez, estabeleceu que
a cláusula compromissória teria natureza de promessa de contratar, não sendo permitida a execução
específica desta” (Wald, Arnoldo. Maturidade e originalidade da arbitragem no direito brasileiro. In:
Verçosa, Haroldo Malheiros Duclerc. Aspectos da arbitragem institucional – 12 anos da Lei 9.307/1996. São
Paulo: Malheiros, 2008. p. 242)
13
Neste sentido, Selma Lemes: “Princípio da Autonomia da Vontade é a mola propulsora da arbitragem em
todos os seus quadrantes, desde a faculdade de as partes em um negócio envolvendo direitos patrimoniais
disponíveis disporem quanto a esta via opcional de conflitos (art. 1.º), até como será desenvolvido o
procedimento arbitral, no que pertine à forma de indicação dos árbitros (art. 13), seja material ou formal,
desde que não viole os bons costumes e a ordem pública (art. 2.º, §§ 1º e 2º); se a decisão será de direito ou
por equidade (art. 2.º); eleger a arbitragem institucional (art. 5.º); prazo para o árbitro proferir a sentença
arbitral (arts. 11, III, e 23) (...)” (apud Benedetti Junior, Lidio Francisco. Da convenção de arbitragem e seus
efeitos. Disponível em: [http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=""3951]." Acesso em: 13.06.2011.
14
15
Cf. a respeito, com detalhada análise da matéria, pertinente acórdão relatado pelo Des. Roberto Mac
Cracken em que se confirma, pela exata exegese do princípio em análise, a atribuição ao árbitro de decidir
inclusive sobre os efeitos subjetivos da cláusula compromissória, estabelecendo quem devem ser as partes
no procedimento, com as seguintes passagens em sua ementa: “Exceção ao princípio do livre acesso à
justiça ou da inafastabilidade da jurisdição. Questões relativas à existência, validade e eficácia da
convenção da arbitragem e do contrato que possui a cláusula compromissória, bem como daqueles que
serão atingidos ela sentença arbitral que se encontram sob a apreciação discricionária do árbitro. Regra
do Kompetenz– Kompetenz. Fundo internacional que firma termo que previa expressamente ser aditivo
de contrato que avançou a solução de conflito por arbitragem. (...) Cláusula compromissória avençada
regularmente. Arbitragem que produziu seus efeitos nos limites próprios e perante aqueles que se
encontram envolvidos com o direito disponível controvertido.” debatida (TJSP, Apelação Cível
0214068.16.2010.8.26.0100, 2a. Câmara de Direito Privado, v.u., j. 16.10.2012 – Fundos MatlinPatterson vs.
VRG Linhas Aéreas S/A).
16
Cf. STJ, REsp. 1.278.852-MG. Rel. Min. Luis Felipe Salomão. 4.ª Turma, j. 21.05.2013.
17
“Art. 20. A parte que pretender arguir questões relativas à competência, suspeição ou impedimento do
árbitro ou dos árbitros, bem como nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, deverá
fazê-lo na primeira oportunidade que tiver de se manifestar, após a instituição da arbitragem.”
18
Embora este julgado mais se refira ao conflito entre liminares contidas em medidas de urgência
requeridas, tem a mesma essência do quanto aqui tratado: a definição de qual juízo terá jurisdição para
prosseguir no conhecimento e julgamento da matéria, prevalecendo o arbitral se afirmar a sua
“competência”.
19
Cf. recente julgado proferido em conhecido caso envolvendo a Petrobras, a ANP, e o Estado do Espirito
Santo como interessado, comparecendo o Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis como
“amicus curiae” (STJ, CC 139.519/RJ, Rel. para o Acórdão Min. Regina Helena Costa, 1ª Seção, m.v., j.
11.10.2017). Diversas questões foram discutidas neste expediente, deste a arbitrabilidade da matéria
(Resolução da Diretoria da ANP) e o direito de participação do Estado do Espírito Santo no processo para a
defesa de seus interesses (o que estaria, por alguns dos votos, inviabilizado no Juízo Arbitral por não ter
sido signatário da Cláusula). A matéria de fundo realmente é alargada, e bem complexa, mas, no quanto
pertinente, anote-se o prestígio à Arbitragem ao se concluir pelo prosseguimento do litígio exclusivamente
no Juízo Arbitral. Ainda, outro precedente pouco anterior já trazia o mesmo entendimento (CC 146.939/PA,
Rel. Min. Marco Aurélio Belizze, 2ª Seção, j. 23.11.2016), ambos referindo-se ao precedente já citado (CC
111.230/DF) proferido antes da entrada em vigor do CPC/2015.
20
A decisão proferida em primeiro grau que desacolher o pedido desafia Agravo de Instrumento, na exata
exegese do art. 1.015, III, do CPC/2015, na medida em que representa decisão que, no fundo, rejeita a
eficácia da convenção arbitral, já afirmada a competência pelo Árbitro ou Tribunal Arbitral. Vale dizer, a
decisão em exame, em sua essência, tem o mesmo conteúdo daquela que rejeita a arguição de existência
de convenção de arbitragem. A seu turno, extinto o processo caberá eventual apelação, hipótese em que o
procedimento arbitral terá seu curso regular, pois não afetado pela pendência do recurso, tal como ocorre
com a sentença que acolhe a alegação de existência de convenção arbitral.
21
Recomenda-se a leitura do quanto desenvolvido pelo Professor a respeito do tema no item 28 (p. 93-97) de
seu livro A arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2013.
23
STJ, REsp 1.278.852/MG, 4.ª T., j. 21.05.2013, v.u., constando da ementa: “Análise da validade de cláusula
compromissória ‘cheia’. Competência exclusiva do Juízo convencional na fase inicial do procedimento
arbitral. Possibilidade de exame pelo Judiciário somente após a sentença arbitral (...) Precedentes da
Terceira Turma do STJ. 5. Recurso especial provido”.
24
STJ, REsp 1.302.900/MG, 3.ª T., v.u., j. 09.10.2012; cf. ainda, do mesmo Relator: REsp 1.279.194⁄MG,
1.288.251⁄MG, REsp 1.311.597/MG e REsp 1.327.820/MG.
25
STJ, REsp 1.283.388/MG e REsp 1.283.388/MG, 3.ª T., ambos decididos em j. 22.10.2012.
26
Ou como diz Cândido Rangel Dinamarco: “é a competência do próprio árbitro para em primeiro lugar
decidir sobre a concreta existência da jurisdição arbitral, sempre que a arbitragem já esteja instaurada” (A
arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 94).
27
Bushatsky, Daniel. Relação entre falência e arbitragem: jurisprudência estadual comentada. Jus Navigandi.
n. 2843. ano XVI. Teresina, abr. 2011. Disponível em: [http://jus.uol.com.br/revista/texto/18900]. Acesso em:
14.06.2011.
28
29
Podem as partes no prestígio à autonomia da vontade, adaptar, segundo seus interesses, as regras
propostas pela instituição. A respeito da arbitragem institucional, veja-se o art. 5.º da Lei 9.307/1996:
“Reportando-se as partes, na cláusula compromissória, às regras de algum órgão arbitral ou entidade
especializada, a arbitragem será instituída e processada com tais regras, podendo, igualmente, as partes
estabelecer na própria cláusula, ou em outro documento, a forma convencionada para a instituição da
arbitragem”.
30
Como a Camarcom (Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem de Belo Horizonte), a Camarb (Câmara
de Arbitragem Empresarial – Brasil), o Caesp (Conselho Arbitral do Estado de São Paulo), e o Cebramar
dentre outras instituições.
31
32
Anote-se a inovação legislativa na reforma da Lei trazendo polêmico dispositivo pelo qual “As partes, de
comum acordo, poderão afastar a aplicação de dispositivo do regulamento do órgão arbitral institucional
ou entidade especializada que limite a escolha do árbitro único, coárbitro ou presidente do tribunal à
respectiva lista de árbitros, autorizado o controle da escolha pelos órgãos competentes da instituição”
(LArb., art. 13, § 4.º, introduzido pela Lei 13.129/2015), tema este a ser oportunamente tratado (Capítulo 7,
item 7.3, e em “Anexo 2” adiante).
33
Ainda, para ilustrar, cf. regulamento da CCI – pelo qual há previsão expressa de instituição pela Câmara de
árbitro para apreciação de medidas urgentes, como se verá ao serem analisadas, em capítulo próprio, as
medidas cautelares no juízo arbitral.
35
O Selo Amigo da Mediação e Arbitragem é uma iniciativa que visa à divulgação e o desenvolvimento da
Mediação e Arbitragem no Brasil de forma ética e responsável. A empresa que adota o Selo Amigo da
Mediação e Arbitragem atesta e apoia a utilização dos métodos alternativos para a solução de conflitos por
acreditar na necessidade e eficácia desses instrumentos. Cf. [www.conima.org.br]. Acesso em: 05.01.2017.
A Espanha também possui seu selo de arbitragem, sendo importante método de divulgação do instituto e
um diferencial para as empresas que o adotam.
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6. CONVENÇÃO ARBITRAL
6. Convenção arbitral
ROTEIRO DE ESTUDOS
2. Da cláusula compromissória
• Cláusula patológica
• Efeitos positivos
• Efeitos negativos – art. 337, X e §§ 5.º e 6.º c/c art. 485, VII, do CPC/2015
SUMÁRIO
Em nossa legislação, há expressa referência à convenção, como o gênero do qual são espécies a
cláusula compromissória e o compromisso arbitral (art. 3.º da Lei 9.307/1996).1
Já o compromisso arbitral é o instrumento firmado pelas partes por meio do qual, diante de um
conflito manifesto, já deflagrado entre os envolvidos, faz-se a opção por direcionar ao juízo
arbitral a jurisdição para solucionar a questão.
Nesse caminho, a Corte Especial do STJ já assim decidiu: a diferença entre as duas formas de
ajuste consiste no fato de que, enquanto o compromisso arbitral se destina a submeter ao juízo
arbitral uma controvérsia concreta já surgida entre as partes, a cláusula compromissória objetiva
submeter a processo arbitral apenas questões indeterminadas e futuras, que possam surgir no
decorrer da execução do contrato (STJ, Corte Especial, SEC 1.210/GB, j. 20.06.2007, Min. Fernando
Gonçalves, DJ 06.08.2007).
São, pois, dois momentos distintos, com circunstâncias e características próprias. Enquanto a
previsão da cláusula compromissória se faz em contrato, ou em documento próprio a ele
reportado, cujo cumprimento se espera das partes, no compromisso o litígio já está presente, e
diante dele as partes resolvem buscar a solução arbitral para preservar os direitos que entendem
lesados. A cláusula pressupõe o vínculo contratual. Já o compromisso pode referir-se a relação
conflituosa com origem em negócio ou em fato jurídico, sem ter sido necessariamente cogitada a
arbitragem previamente ao nascimento do conflito. Fora isto, o compromisso arbitral exige
requisitos próprios e a Lei de Arbitragem sugere também elementos facultativos, como se vê,
respectivamente, nos arts. 10 e 11 adiante analisados.
Sob outra perspectiva, o compromisso pode ou não ser precedido de cláusula compromissória,
conforme o caso, e, ainda, poderá ser judicial ou extrajudicial, como se verá.
Ainda, na convenção arbitral (por compromisso ou cláusula), pode se eleger tanto a arbitragem
institucional como a arbitragem ad hoc, tudo de acordo com a vontade das partes.
Salvo a previsão expressa para a cláusula inserta em contrato de adesão, com requisitos
próprios a serem analisados em separado,3 a formalidade exigida restringe-se à celebração por
escrito. Permitida a sua previsão em documentos distintos, não necessariamente no próprio
contrato, verifica-se a possibilidade da chamada “compromissória pluridocumental, fruto da
ruptura da unidade do ato”.4
Uma vez escrita a cláusula, sua aceitação pode ser verbal, tácita ou presumida, em situações
peculiares,5 pois, mantendo as características contratuais, sua confirmação, em regra, será
igualmente expressa, e rotineiramente no próprio instrumento representativo do negócio jurídico
realizado.
Se o negócio jurídico, pela sua natureza, reclamar formalidade própria, nada impede que seja
válida a cláusula se observado o seu requisito legal – forma escrita –, ficando vulnerável o contrato
quanto ao seu conteúdo principal. Daí a aplicação da autonomia da cláusula arbitral prevista no
art. 8.º da Lei de Arbitragem (adiante tratada), ou seja, a disposição arbitral pode ser válida, pois
expressa a convenção, a ensejar a renúncia à jurisdição estatal. Mas pode ocorrer de no próprio
juízo arbitral se reconhecer a invalidade do contrato, por inobservância da forma prescrita em lei
(por exemplo, quando se exigir escritura pública imprescindível para a disposição de direitos reais
imobiliários); presente a cláusula compromissória, será o árbitro, pela jurisdição a ele outorgada, o
competente para julgar a nulidade do contrato.
Classifica-se a cláusula arbitral, pelo seu conteúdo, como “cheia” ou “vazia”, com idênticos
efeitos – ensejar a solução do conflito pela arbitragem, porém seguindo caminhos distintos.
Indicando as partes a instituição para administrar a arbitragem, nada mais será necessário
prever, pois o regulamento da entidade certamente contém todas as regras e providências a serem
adotadas pelas partes ao pretenderem instaurar a arbitragem diante do conflito decantado. Aliás, é
comum a sugestão pelas próprias instituições de modelos de cláusula a serem incluídas nos
contratos, inclusive disponibilizando a redação nos respectivos sites ou material de divulgação.9
Mas podem as partes ir além, ou seja, aproveitar a liberdade de contratar para estabelecer
diversas outras regras relativas à organização e ao desenvolvimento da arbitragem.
Neste contexto, desde então, podem estabelecer a quantidade de árbitros, sempre em número
ímpar, e requisitos para a sua indicação (por exemplo, experiência mínima na matéria,
qualificação acadêmica, participação em determinada associação ou entidade etc.), regras
específicas para a forma como determinados atos serão praticados no curso do procedimento,
restrições à autoridade do árbitro (por exemplo, limitação ou exclusão das tutelas de urgência da
jurisdição arbitral), e outros detalhes pertinentes ao desenvolvimento da arbitragem.
Ainda, podem os contratantes estabelecer (a) a sede e o local de desenvolvimento dos atos
procedimentais, (b) a escolha da lei aplicável, permitida a opção pelo julgamento com base na
equidade, (c) o prazo para a apresentação da sentença arbitral, (d) a língua a ser utilizada no
procedimento, e se for em duas línguas, qual prevalecerá em caso de dúvida, (e) se todos os
conflitos decorrentes daquele contrato serão resolvidos pela arbitragem, dividindo, por exemplo,
por matéria e valor, (f) a responsabilidade pelo pagamento das despesas com o procedimento,
inclusive estipulando honorários dos árbitros, tudo estabelecido na Lei (art. 11), como de
facultativa previsão também para o compromisso arbitral, como adiante se verá, mas não apenas a
ele restrito.
Enfim, este é o espaço da liberdade, e os contratantes devem estar atentos às inclusões de tudo
quanto for pertinente à adequada fluidez do procedimento e à apropriada valorização da
qualidade do julgamento, para bem preparar o solo no qual se cultivará a arbitragem, objetivado
os seus melhores frutos. E como a convenção arbitral é feita no momento da contratação, ou seja,
de convergência de interesses para a realização do negócio, espera-se a colaboração mútua das
partes para se ter o mais adequado modelo ao objeto do contrato.
Melhor, sem dúvida, a indicação de uma instituição arbitral, com previsão, se necessário,
apenas de poucos detalhes pela peculiaridade do caso.11
Por fim, embora complexa a questão, pertinente nesta oportunidade apresentar breve
referência à possibilidade de extensão da cláusula compromissória a partes não signatárias, como,
por exemplo, nos seguintes casos: (i) em grupo de empresas, (ii) contratos principal e acessório,
(iii) interveniência no contrato de fiança, (iv) estipulação em favor de terceiro, (v) sub-rogação no
contrato de seguro, (vi) novação, (vii) cessão da posição contratual, (viii) desconsideração da
personalidade jurídica etc.14
A legislação civil não faz ressalvas (quanto à vinculação à arbitragem no quanto aqui interessa)
ao estabelecer que o segurador se sub-roga nos direitos e ações que competirem ao segurado. E a
arbitragem nada mais é que uma forma de ação contra o causador do dano, previamente
estipulada contratualmente. As contratantes podem, se quiserem solução diversa, fazer ressalvas
ou limitações à sub-rogação, mas se nada falarem a respeito, opera-se a sub-rogação.
Veja-se que não se trata de simples extensão aleatória de cláusula compromissória a terceiro
não signatário. Na sub-rogação prevista no artigo 786 do Código Civil, o segurador age como
verdadeiro substituto do credor original (o segurado). Se este optou por celebrar convenção
arbitral, fica aquele igualmente vinculado à arbitragem, arcando com o ônus e os benefícios dessa
escolha. E, pelo modelo do Código, a sub-rogação se faz tanto em relação ao direito material do
sub-rogado, como também quanto à forma de seu exercício (direito de ação); e, assim, fica o
substituto vinculado à jurisdição eleita pelas partes originais.16
Em outras situações de ampliação dos efeitos da cláusula, acrescenta Arnoldo Wald: “Há de ser
atendido um dos seguintes requisitos: a) a sociedade tem que ter desempenhado um papel ativo
nas negociações das quais decorreu o acordo no qual consta a cláusula compromissória; b) a
sociedade deve estar envolvida, ativa ou passivamente, na execução do contrato no qual consta a
cláusula compromissória; e c) a sociedade tem que ter sido representada, efetiva ou
implicitamente, no negócio jurídico”.17
Desta forma, em alguns casos, mesmo a sociedade não tendo sido signatária da cláusula de
arbitragem, ela estará vinculada à arbitragem pelo envolvimento no conflito gerado por
determinado negócio/empreendimento.
Importante repetir que mesmo diante de uma cláusula compromissória vazia já há pelas partes
a renúncia à jurisdição estatal quanto à matéria objeto do contrato, e esta iniciativa vincula os
contratantes.
E a Lei traz a solução: para estes casos, necessária se fará a celebração pelas partes de um
compromisso arbitral.
Art. 6.º Não havendo acordo prévio sobre a forma de instituir a arbitragem, a parte interessada
manifestará à outra parte sua intenção de dar início à arbitragem, por via postal ou por outro meio
qualquer de comunicação, mediante comprovação de recebimento, convocando-a para, em dia,
hora e local certos, firmar o compromisso arbitral.
Parágrafo único. Não comparecendo a parte convocada ou, comparecendo, recusar-se a firmar
o compromisso arbitral, poderá a outra parte propor a demanda de que trata o art. 7.º desta Lei,
perante o órgão do Poder Judiciário a que, originariamente, tocaria o julgamento da causa.
A forma da notificação à outra parte, como indicado no texto, é livre, ou seja, pode ser
promovida por qualquer meio, exigindo-se, porém, a comprovação do recebimento. Admite-se,
assim, a utilização de meio eletrônico, embora com este não se tenha a segurança quanto ao
recebimento.
Ao convocado, por sua vez, cabem as seguintes opções: comparecer e firmar o compromisso
proposto, com os detalhes que ajustarem; comparecer, porém recusar a assinatura do
compromisso, ou simplesmente não comparecer.
Na primeira situação, tudo se resolve, e projeta-se a instauração do juízo arbitral nos limites do
ajustado no compromisso firmado entre as partes, com base nos arts. 10 e 11 da Lei de Arbitragem
(por exemplo, com nomeação de árbitro e aceitação deste no próprio instrumento, ou indicação de
instituição para administrar o procedimento sob suas regras, ou, quem sabe, com detalhadas e
pensadas regras para o desenvolvimento da arbitragem).
“O Poder Judiciário somente poderá ser acionado, no caso do artigo em tela, quando uma das
partes provar que convocou a outra e esta não atendeu à convocação ou se recusou a firmar o
compromisso, extrajudicialmente. Se o interessado o fizer, desatenderá um dos requisitos da ação
(interesse de agir), e o juiz extinguirá o processo sem apreciar o mérito, nos termos do art. 267, VI,
do CPC/1973.18 A ação de que trata o art. 7.º (...) serve meramente para trazer a outra parte para
comparecer em juízo, e não para julgar o mérito”.19
Firmar compromisso, por certo, não é imprescindível à instituição da arbitragem, porém este
foi o meio pelo qual encontrou a lei para, diante da cláusula vazia, sistematizar as providências
tendentes à efetiva submissão do conflito ao juízo arbitral.
Daí, então, existindo consenso entre as partes, mesmo diante de uma cláusula vazia, nada
impede que sejam, de comum acordo, contemporaneamente ao conflito, estabelecidos os critérios
para a instalação do juízo arbitral. Assim, bastará consenso nos critérios de escolha do árbitro,
seguido da aceitação destes, ou a indicação conjunta de instituição arbitral para se viabilizar o
acesso à plataforma de julgamento desejada na cláusula. Lembre-se, ainda, a previsão legal para,
em momento oportuno, já sob a autoridade do árbitro, ser complementada a cláusula no quanto
necessário (arts. 19, § 1.º,20 e 21 da Lei 9.307/1996).
Neste contexto, só mesmo se não encontrarem as partes outros meios de ultrapassar esta fase
inicial de arbitragem vinculante, porém ainda com acesso inviável, é que se faz necessário buscar
o compromisso através da convocação extrajudicial.
Quanto à ação para se obter o compromisso, estabelece o art. 7.º da Lei de Arbitragem, com
riqueza de detalhes, dispensando, assim, maiores esclarecimentos quanto ao procedimento:
§ 1.º O autor indicará, com precisão, o objeto da arbitragem, instruindo o pedido com o
documento que contiver a cláusula compromissória.
§ 3.º Não concordando as partes sobre os termos do compromisso, decidirá o juiz, após ouvir o
réu, sobre seu conteúdo, na própria audiência ou no prazo de dez dias, respeitadas as disposições
da cláusula compromissória e atendendo ao disposto nos arts. 10 e 21, § 2.º, desta Lei.
§ 4.º Se a cláusula compromissória nada dispuser sobre a nomeação de árbitros, caberá ao juiz,
ouvidas as partes, estatuir a respeito, podendo nomear árbitro único para a solução do litígio.
§ 5.º A ausência do autor, sem justo motivo, à audiência designada para a lavratura do
compromisso arbitral, importará a extinção do processo sem julgamento de mérito.
§ 6.º Não comparecendo o réu à audiência, caberá ao juiz, ouvido o autor, estatuir a respeito do
conteúdo do compromisso, nomeando árbitro único.
§ 7.º A sentença que julgar procedente o pedido valerá como compromisso arbitral.
Ainda estabelece o § 1.º, IV do art. 1.012 do CPC/2015 que o recurso de apelação interposto em
face da sentença não terá efeito suspensivo,21 de tal sorte que a instauração do procedimento
arbitral tal qual previsto na decisão pode desde já ser promovida,22 ou seja, a sentença tem eficácia
imediata.
A ação do art. 7.º da Lei de regência, transcrito acima, busca a execução específica da cláusula
compromissória vazia, para se viabilizar a utilização da arbitragem na solução do conflito
instaurado, em atendimento ao que foi pactuado entre os contratantes, diante de resistência ou
impasses surgidos na instauração do juízo arbitral.
Nesta ação, diante da omissão do réu ou divergências entre as partes quanto aos contornos da
arbitragem, ao juiz é dado o poder de preencher as lacunas da cláusula no quanto baste para se
instituir a arbitragem.
A tutela jurisdicional reclamada neste caso é necessária, mas restrita tão somente à obtenção
do compromisso arbitral, excluída a apreciação, nesta sede judicial, do conflito instaurado entre as
partes quanto à matéria de fundo, porém nada impede, nem poderia existir óbice para tanto, a
conciliação quanto ao objeto de todo o litígio (cf. § 2.º acima).
Daí por que se pode falar em jurisdição estatal integrativa, e diz-se integrativa, pois a sentença
completa o quanto falta na cláusula para aperfeiçoar a instalação do juízo arbitral.23 A sentença,
assim, integra-se à cláusula, suprindo a manifestação de vontade ou superando o impasse,
formando a composição de um todo que irá viabilizar a arbitragem.
O desacordo, ainda, pode ser total ou parcial, por exemplo, restrito ao número de árbitros,
responsabilidade pelas despesas do procedimento, escolha da sede ou local de seu
desenvolvimento, prazos, idioma a ser adotado, indicação de instituição arbitral etc. A defesa é,
portanto, ampla.
E pela natureza da tutela neste caso – constitutiva –, os elementos trazidos pela defesa quanto à
organização da arbitragem podem ser acolhidos no julgamento, sem necessidade de apresentação
de pedido contraposto ou reconvenção, no pressuposto de que o réu tenha concordado com a
instituição da arbitragem, mas rejeita os termos propostos.
Aliás, note-se, neste particular, que o artigo acima transcrito fala em citação do réu para
comparecer à audiência a fim de lavrar-se o compromisso, e não citação para apresentar
contestação. Daí a perspectiva de se ter uma participação contributiva do réu para a adequada
elaboração do compromisso. Ou seja, pretende a lei contar com a colaboração do demandado para
viabilizar, da melhor maneira possível, a instauração do procedimento arbitral. Mas o direito de
defesa, enquanto apresentação de contestação ao pedido em toda e qualquer extensão, não pode
ser mutilado.
Embora com severa crítica da autorizada doutrina de Carmona27 diante dos aborrecimentos e
dissabores da cláusula vazia, por vezes, e repita-se é circunstancial, em razão da complexidade
maior ou menor do contrato, multiplicidade de questões envolvidas, expectativa de cumprimento
em sua maior ou menor extensão, ou por diversos outros motivos (inclusive de avaliação de risco e
custos, enorme ou mínimo tempo de execução das obrigações assumidas etc.), para não se
prejudicar o próprio contrato pelas divergências negociais entre as partes quanto a esta cláusula, a
disposição incompleta atinge a sua utilidade e finalidade de ao menos subtrair do Judiciário o
julgamento do contrato.
Ainda, as partes terão quando do conflito a oportunidade de resolver este impasse, e apenas se
frustrada esta iniciativa, mostrar-se-á necessária a propositura da ação. Ademais, mesmo
indesejado o processo, pelas suas características procedimentais e restrito objeto, a tendência é de
se ter um rápido pronunciamento.
Enfim, o melhor, por certo, é firmar contrato com cláusula compromissória cheia, mas sendo
esta inviável ou inconveniente naquele momento diante das peculiaridades do negócio, a cláusula
vazia pode atender muito bem às perspectivas das partes.
Espera-se do conteúdo de uma cláusula arbitral o modelo ideal para a perfeita instauração,
organização e desenvolvimento da arbitragem, com todos os elementos e peculiaridades
pertinentes ao objeto do contrato. Deverá ser clara, precisa e ajustada às perspectivas das partes,
para atender adequadamente ao eventual conflito. Bem redigida, a cláusula agrega valores à
arbitragem, somando vantagens ao procedimento. Mas nem sempre é assim.
Existem cláusulas com redação contraditória, incongruente, confusa, ambígua ou de difícil
interpretação. A imprecisão pode comprometer a certeza quanto à vontade das partes, e enseja
dificuldade na sua efetivação.
Ainda, a disposição pode conter erros, impropriedades ou falhas capazes de afetar a sua
própria eficácia, e até impedir a realização do projetado inicialmente pelos contratantes.
São as chamadas cláusulas patológicas,28 doentes, defeituosas, e como tal representam, sem
dúvida, pedras no caminho, criando imprevistas dificuldades a serem ultrapassadas. Desta forma,
contaminam a regularidade da arbitragem pelos entraves surgidos, e podem até impedir a efetiva
implementação do juízo arbitral.
Como exemplo temos as seguintes situações: indicação de instituição arbitral inexistente (v.g.,
Câmara de Arbitragem Institucional, ou Centro de Arbitragem da USP); indefinição na indicação da
instituição (v.g., Tribunal Arbitral Estadual no Paraná); dúvida quanto ao número de árbitros (v.g.,
será resolvida por arbitragem, através da nomeação de árbitro ou árbitros pelas partes); indicação
do regulamento de uma instituição, porém para ser administrada por entidade diversa, com regras
contrárias àquelas previstas, ou até mesmo para ser desenvolvida por árbitro único,
impossibilitando a utilização de algumas previsões,29 cláusula compromissória que preveja
procedimento diverso e contraditório ao da instituição escolhida etc., tudo sem contar com
cláusulas que ponham em dúvida a própria opção das partes a este método de solução de conflito
(v.g., as partes elegem o foro de São Paulo para as questões decorrentes do contrato a serem
dirimidas por arbitragem judicial, ou, ainda, os conflitos serão resolvidos por arbitragem dos
juizados especiais de pequenas causas).
Diante de situações como estas, os esforços devem ser concentrados para salvar a arbitragem,
quando assim seja possível, e desde que a dúvida não recaia sobre a vontade das partes em afastar
a jurisdição estatal.30 Fala-se princípio da salvação da convenção arbitral, da preservação da
arbitragem, do favor arbitral.
Assim, cláusulas cuja patologia não permita extrair a certeza de terem os contratantes eleito a
arbitragem para solucionar a controvérsia, em nosso sentir, devem ser invalidadas, ou
interpretadas como preservado o acesso ao Judiciário por iniciativa de qualquer das partes (pelo
juiz estatal, ao ter como não existente a cláusula, ou pelo árbitro na autoridade que lhe confere a
Lei – parágrafo único do art. 8.º). Em outras palavras, pela sua relevância, a renúncia à jurisdição
estatal deve ser interpretada estritamente (art. 114 do CC/2002), e com extremo rigor. Até porque o
desenvolvimento da arbitragem nestas situações pode ser totalmente inútil, na medida em que a
sentença estará exposta à invalidação, podendo-se invocar inclusive a Constituição Federal com
questão de ordem pública, estabelecido no inciso XXXV do art. 5.º da CF/1988.31 Nesta linha de
raciocínio, para se subtrair do Judiciário o litígio, há necessidade de segurança quanto à vontade
das partes.
Agora, extraída da cláusula a convicção dos contratantes pela arbitragem, embora com
anomalia, deve ser buscado o rendimento máximo da escolha feita, interpretando-se a cláusula de
tal forma a acomodar a vontade das partes, e as respectivas diferenças, à luz dos princípios da
arbitragem, tanto no juízo arbitral como no Judiciário.
Por outro lado, comprometida a própria instauração do juízo arbitral (p. ex., indicação de
instituição inexistente), deve-se preservar a intenção das partes quanto à utilização deste método
de solução de conflito, e buscar a sua efetivação através da celebração de compromisso, pelo
procedimento previsto na Lei de Arbitragem para as cláusulas vazias (arts. 6.º e 7.º).
Aparecendo cada vez com maior frequência, inclusive com modelos oferecidos por diversos
órgãos arbitrais, encontra-se a chamada cláusula escalonada, consistente na previsão pela
convenção de dois (ou até mais) métodos de solução de conflitos a serem exercidos na forma
convencionada.
O mais usual atualmente é a previsão expressa de busca pela solução da controvérsia por meio
de mediação ou conciliação previamente à arbitragem (cláusula med-arb), ou em fase própria
durante o procedimento, com suspensão deste (cláusula arb-med).34
Considerada a mediação, neste particular, como mecanismo que pode integrar procedimentos
multi-etapas, Fernanda Levy assim identifica a cláusula escalonada: “estipulações contratuais que
preveem fases sucessivas que contemplam os mecanismos mediação e arbitragem para a solução
de controvérsias”.35
Esta cláusula mostra-se pertinente em especial nos contratos de execução continuada (conflitos
em contrato de franquia, representação comercial), de longa duração e significativa complexidade
(grandes obras na construção civil e infraestrutura, inclusive promovidas com parceria público-
privada).
E tem seu atrativo exatamente porque as partes, mesmo diante de alguma controvérsia surgida
no curso da execução do contrato, ainda terão um período prolongado de convivência, sendo de
todo recomendável, assim, buscar soluções consensuais para as diferenças havidas. Ainda, muitas
vezes o contrato envolve parcerias e subcontratações que podem ser abaladas pelas desavenças
levadas a julgamento, com o risco de comprometer até mesmo todo o empreendimento, não só
pela demora na solução (pequena em se tratando de arbitragem), mas também pelos naturais
desconfortos na relação trazidos pelo conflito.
Uma vez indicada como necessária a mediação prévia por vontade das partes expressa na
convenção, surge a questão: poderá a parte provocar diretamente a instauração da arbitragem, ou
esta iniciativa estará vedada pela cláusula? Polêmica a questão, inclusive além de nossas
fronteiras,36 parece que no cenário atual onde se busca prestigiar cada vez mais os meios
amistosos de solução de conflitos (v.g., a previsão contida na Res. CNJ 125/2010, e o Código de
Processo Civil, analisados, no Capítulo 2), a tendência seria considerar impedido o acesso à
arbitragem enquanto não cumprida a etapa voluntariamente eleita pelas partes.
Esta conclusão foi alcançada em primoroso estudo sobre a mediação comercial no contexto da
arbitragem feito por Fernanda Levy em sua tese de Doutorado na PUC/SP, no qual se contém
completa pesquisa desenvolvida, escrevendo, após análise inclusive do debate estrangeiro a
respeito: “Acreditamos que a convenção de mediação prévia possui efeito vinculativo positivo,
dirigido às partes que devem levar a controvérsia à mediação, honrando o previamente pactuado,
e negativo, dirigido ao Estado, incluindo-se a esfera arbitral, impedindo o árbitro de instaurar a
arbitragem, quando da existência de uma cláusula de mediação prévia à arbitragem...”, quando
antes já afirmava: “Realmente, parece ser essa a tendência nacional e estrangeira, e nesse sentido
ousamos afirmar que já é possível atribuir esses efeitos à cláusula de mediação
independentemente de legislação que lhe confira esses atributos e justificamos nossa
afirmação...”.37
Atenta a esta questão, a recente Lei de Mediação (Lei 13.140/2015), analisada no Capítulo 03
acima, ressalta já em seu art. 2.º § 1.º: “Na hipótese de existir previsão contratual de cláusula de
mediação, as partes deverão comparecer à primeira reunião de mediação”.
Mas não é só: também estabelece a nova Lei que: “Art. 23. Se, em previsão contratual de
cláusula de mediação, as partes se comprometerem a não iniciar procedimento arbitral ou
processo judicial durante certo prazo ou até o implemento de determinada condição, o árbitro ou o
juiz suspenderá o curso da arbitragem ou da ação pelo prazo previamente acordado ou até o
implemento dessa condição”.
Optou-se, porém, não pela extinção do processo, tal qual se tem em relação à convenção de
arbitragem (até porque nesta há a exclusão da jurisdição estatal), mas por se impor uma
penalidade pecuniária específica, se outra não tiver sido convencionada pelas partes, e ainda,
além desta sanção, havendo previsão contratual própria, o árbitro ou o juiz suspenderá o curso do
procedimento na forma acordada (art. 23 da Lei 13.140/2015).
Ainda, registre-se que mesmo neste contexto de valorização do compromisso com a cláusula de
mediação, para eventuais tutelas provisórias de urgência, certamente estarão abertas as portas do
Judiciário para garantir eventual direito da parte, com jurisdição nos limites da medida
pretendida, como se admite previamente a instauração da arbitragem em qualquer situação; ou
ainda, se pertinente e com tempo para tanto, também se poderá requerer a preservação do direito
no juízo arbitral (cf. Capítulo 10, adiante). Neste sentido, quando prevista a suspensão do processo
judicial e arbitral pelo art. 23, também se faz a ressalva: “Parágrafo único. O disposto no caput não
se aplica às medidas de urgência em que o acesso ao Poder Judiciário40 seja necessário para evitar
o perecimento de direito”.
Advirta-se que há distinção entre esta previsão de mediação ou conciliação prévia e aquela
tentativa de composição promovida pelo árbitro por conta do previsto no § 4.º do art. 21 da Lei de
Arbitragem (cf., a respeito, Capítulo 9, adiante).
E assim, escalonada será a cláusula em que se estabeleçam dois ou mais meios de solução de
conflitos dentre os diversos disponíveis43 a serem exercidos na forma e etapas ajustadas pelas
partes.
Desta forma, quem irá avaliar e decidir sobre a validade do contrato (quanto ao seu objeto
principal) é o árbitro, tal qual preconizado no parágrafo único deste art. 8.º em exame.45
Pode acontecer, por exemplo, de exigir a lei forma própria ao objeto principal do contrato,
como escritura pública (para a transferência de direitos reais imobiliários), porém contratam as
partes por instrumento particular, com cláusula compromissória. Neste contexto, o vício de forma
quanto à compra e venda não vulnera a disposição arbitral, e caberá ao árbitro o julgamento
quanto à invalidade do contrato.
Trata-se de saber se, resilido o contrato em que se insere a cláusula compromissória, sem
qualquer menção especial àquela convenção, subsistiria a competência do árbitro para solucionar
litígio que envolva as partes e que verse sobre o contrato desfeito. A autonomia anunciada leva à
conclusão de que a vontade das partes no sentido de dissolver por mútuo acordo a relação jurídica
principal não as desliga da relação objeto da cláusula compromissória (independente daquela
outra). Em consequência, surgida controvérsia decorrente do contrato resilido (ou questão que
diga respeito à validade, eficácia e extensão da resilição), tocará ao árbitro – e não ao juiz togado –
dirimir o litígio (vide, no mesmo sentido, as observações de Matthieu de Boisséson, Le droit
français de l’arbitrage interne et international. Paris: GLN Jolv Éditions, 1990, p. 77).47
Pode ser judicial, celebrado por termo nos autos, perante o juízo ou tribunal onde tem curso a
demanda, ou extrajudicial, promovido através de instrumento público ou particular, sendo, nesta
última forma, necessariamente por documento escrito, e com duas testemunhas (art. 9.º, caput e
§§ 1.º e 2.º, da Lei 9.307/1996).48
Quando realizado no curso do processo judicial, segue a forma do termo previsto no art. 209 do
CPC/2015, sendo necessária a assinatura das partes e dos respectivos patronos. Advirta-se que o
advogado só poderá firmar o compromisso em nome das partes se lhe tiverem sido outorgados
poderes especiais e específicos para tanto.
Com o compromisso, extingue-se o processo sem resolução de mérito (art. 485, VII, do
CPC/2015). Subtrai-se do Judiciário a análise do mérito, outorgando às partes a jurisdição privada e
poder decisório ao árbitro.
Conforme o estado do processo, por exemplo, se após a instrução ou mesmo no tribunal, surge
a questão: os atos praticados, especialmente as provas produzidas, podem ser aproveitados? A
resposta é afirmativa: podem, mas a critério exclusivo do árbitro. Vale dizer, o árbitro terá
autoridade para receber e aproveitar, com o valor que julgar pertinente, tudo o quanto passou no
processo judicial e a ele foi encaminhado, porém lhe é facultado abrir totalmente a fase
instrutória, inclusive renovando oitiva de testemunhas, depoimentos, prova pericial etc. Isto
porque, como veremos no capítulo destinado ao árbitro, ele deverá ter independência (dos fatos)
para julgar a controvérsia.
II – o nome, profissão e domicílio do árbitro, ou dos árbitros, ou, se for o caso, a identificação da
entidade à qual as partes delegaram a indicação de árbitros;
IV – o lugar em que será proferida a sentença arbitral51 – que não corresponde necessariamente
ao local de desenvolvimento da arbitragem, como adiante se verá.
Especificamente com relação a indicação dos árbitros, pode ser feito no compromisso, desde
logo, mesmo se encomendada a arbitragem a uma instituição. Porém, neste caso, é recomendado
que a instituição eleita aceite o procedimento com árbitros estranhos ao seu quadro. O comum,
nestas situações, é a instauração de colegiado arbitral, sendo que os árbitros escolhidos pelas
partes, no compromisso, definem qual será o terceiro, e presidente do painel, dentre aqueles
integrantes da instituição indicada. E, na divergência quanto à escolha, esta caberá à instituição.
Fala-se em “recomendado” quando se refere à aceitação pela instituição eleita do árbitro estranho
a seus quadros, pois como se verá, a reforma da Lei de Arbitragem (Lei 13.129/2015), traz polêmico
dispositivo pelo qual “as partes, de comum acordo, poderão afastar a aplicação de dispositivo do
regulamento do órgão arbitral institucional ou entidade especializada que limite a escolha do
árbitro único, coárbitro ou presidente do tribunal à respectiva lista de árbitros, autorizado o
controle da escolha pelos órgãos competentes da instituição (...)” (nova redação do § 4.º do art. 13
da LArb.), cuja análise será apresentada em momento oportuno.52
Por outro lado, quando há indicação direta do árbitro, prudente a enumeração de outros em
substituição ao primeiro escolhido, para a hipótese de impedimento, recusa ou qualquer outro
fator que impeça a participação do eleito,53 evitando, assim, que seja vulnerado por esta
circunstância o compromisso arbitral. Aliás, tanto quanto possível, recomenda-se, nestas situações,
que seja o compromisso também assinado pelos árbitros indicados, manifestando estes já nesta
oportunidade a aceitação do encargo, e, assim, considera-se desde então instituída a arbitragem
(art. 19 da Lei 9.307/1996).
Ainda quanto ao objeto da arbitragem, sua indicação pode ser feita de forma genérica e
abrangente (por exemplo, todos os conflitos decorrentes do contrato firmado entre as partes, ou do
fato ocorrido em tal data envolvendo as partes). Vale dizer que diversamente do quanto se extraia
do sistema anterior à Lei de Arbitragem, fica dispensada a especificação detalhada, precisa,
completa e exauriente do litígio no compromisso. Necessário apenas que sejam fornecidos os
elementos do conflito suficientes para a identificação pelo árbitro do objeto da sua jurisdição, para
respeitar os seus limites.
Estes são requisitos essenciais, e a falta de qualquer deles, nos termos dos arts. 104, III, e 166, IV,
do CC/2002, enseja a nulidade do compromisso.
Advirta-se sobre o necessário cuidado para não se confundir o requisito na sua essência com os
seus detalhes. Assim, de um modo geral, considera-se obrigatória a identificação das partes, do
árbitro ou instituição arbitral e elementos para respectiva localização, e não se tenha por
essenciais todas aquelas minúcias previstas na lei.
Por óbvio, a profissão da parte ou o domicílio do árbitro devem ser tratados como simples
irregularidades, sem macular a validade do compromisso.
Já a identificação do estado civil dependerá das circunstâncias do caso. Se a matéria for relativa
a direito real imobiliário, por exemplo, indispensável a participação do cônjuge (art. 73 do
CPC/2015; cf., ainda, art. 1.647 do CC/2002), e, assim, a omissão pode comprometer a validade do
compromisso. Porém, se para a matéria em discussão for totalmente irrelevante o estado civil das
partes, esta omissão pode ser considerada falha sem maiores consequências.
Enfim, o bom-senso e a atenção à essência dos requisitos recomendam que seja afastada a
interpretação literal do dispositivo, para se valorizar a finalidade do elemento obrigatório na
análise da validade do compromisso. Em suma, sendo possível apurar-se a vontade das partes,
deve-se prestigiar o pacto mesmo diante de eventual irregularidade em seu conteúdo. Lembre-se,
ademais, a oportunidade dada pelo art. 19 da Lei de Arbitragem para serem explicitadas questões
da convenção, quando, então, falhas poderão ser supridas, dando o rumo ao procedimento.
Além dos requisitos obrigatórios, traz a Lei o conteúdo facultativo do compromisso; e pelo que
nele se contém, podem as partes organizar, com maior ou menor amplitude, a maneira como se
desenvolverá a arbitragem. Aliás, como referido, tais elementos podem igualmente constar da
cláusula compromissória e, desta forma, melhor teria sido a lei se referir à convenção arbitral, e
não apenas ao compromisso. Mas nada que prejudique a sua interpretação extensiva. Vejamos o
que diz a norma:
Trata-se aqui da especificação, pelas partes, do local onde os atos relativos à arbitragem serão
praticados, principalmente se diversos de onde será proferida a sentença.
Exemplo que bem identifica esta facilidade oferecida às partes é a possibilidade de se colher a
prova oral, ou acompanhar a prova pericial, no local dos fatos quando diverso da instituição
arbitral onde se processa a arbitragem. Assim, deslocam-se o árbitro (ou árbitros) e o pessoal de
apoio àquela localidade (inclusive, se for o caso, fora do território nacional), facilitando, desta
forma, a produção da prova, a ser acompanhada diretamente pelo julgador.
II – a autorização para que o árbitro ou os árbitros julguem por equidade, se assim for
convencionado pelas partes;
Estas faculdades – julgamento por equidade e opção pela lei aplicável – serão tratadas em
separado, ao ser estudada a arbitragem internacional, pois nelas são mais pertinentes estas
previsões.
No silêncio das partes a respeito deste ponto, a sentença arbitral deverá ser proferida no prazo
de seis meses contados da instituição da arbitragem (ou substituição do árbitro – art. 23 da Lei
9.307/1996).
Ocorre que, se, de um lado, para conflitos mais simples o prazo legal é adequado, para aquelas
questões com maior complexidade, a demandar mais detalhada instrução, ou diante da própria
dificuldade da matéria (envolvendo vários pormenores ou multiplicidade de detalhes técnicos ou,
ainda, demandando a análise de legislação específica de utilização pouco usual, conhecimentos
científicos próprios incomuns etc.), certamente será adequada a prorrogação do prazo previsto em
lei.
Aliás, esta flexibilidade não contraria a celeridade esperada do procedimento arbitral, pois ao
lado desta preocupação há, também, e com igual valor, a atenção à mais profunda e exauriente
análise do conflito posto em julgamento, a consumir, conforme o caso, tempo diverso do previsto
na Lei.
As partes devem estar atentas sobre este ponto, e, como melhores conhecedoras da extensão do
conflito e suas complexidades, devem cuidar para estabelecer o prazo adequado.
Assim, incidentes não previstos, dificuldade na produção de provas, como realização de perícia
com longa duração, acabam por prejudicar o cumprimento do prazo. E neste contexto, caberá às
partes, no curso do procedimento, alterar o anteriormente ajustado, desde que de comum acordo.
O importante é ter a certeza de um termo final para a sentença, com o cuidado para não
prejudicar a qualidade da arbitragem, diferente, pois, do quanto se vê em processo judicial. E o
desrespeito deste prazo, como se verá, leva à extinção do compromisso arbitral, após certas
providências (art. 12, III, da Lei 9.307/1996), com o objetivo de afastar o risco de eternização do
procedimento arbitral.
Uma vez mais aparece a liberdade contratual das partes ao elegerem a arbitragem, agora para
permitir até mesmo a negociação a respeito das conhecidas “verbas de sucumbência”.
Esta flexibilidade, em certas situações, pode ser determinante para que as partes venham a
escolher esta ou aquela instituição arbitral, ou mesmo aceitar este método de solução de conflitos.
Veja-se, por exemplo, se um dos contratantes, pelos custos, preferir a solução judicial, o outro pode
assumir este ônus com exclusividade, e sem direito a reembolso no caso de êxito, pois para ele,
quem sabe, mais vale a celeridade e o conhecimento específico da matéria pelos árbitros de
determinada instituição do que o valor assumido para tanto. E certamente, na avaliação do
negócio, em especial na apuração do preço contratado, todos estes elementos são relevantes.
Três exemplos destacam-se, na prática, pela possibilidade de pagamento dos honorários e das
despesas com a arbitragem que possam ficar exclusivamente com uma das partes e que serão
aprofundados no capítulo denominado “Arbitragens Temáticas”: (i) a arbitragem no direito
societário, em que o sócio minoritário pode não concordar com o procedimento arbitral, mas
concorda na derrogação da justiça privada; (ii) a arbitragem, quando possível, no direito do
consumidor, que, pela possível hipossuficiência do consumidor, a empresa pode se responsabilizar
pelo pagamento dos honorários e despesas; e (iii) na arbitragem no direito do trabalho, não
admitida por diversos precedentes do TST no momento de elaboração desta obra, mas que já foi
muito utilizada, devendo o pagamento ser feito pelo empregador.
Ao se poder o mais, nada impede que apenas parte das despesas, como, por exemplo, com
perícias ou diligências específicas, seja exclusiva de uma das partes, facultada, ainda, a
participação equitativa ou diferenciada entre as partes de todo o custo da arbitragem,
independentemente de seu resultado, e tudo como estímulo à utilização deste método.
Neste sentido, diz Carlos Alberto Carmona: “Seja como for, em sede de arbitragem, não havendo
preocupações políticas de acesso à justiça, mas sim preocupação prática de tornar razoáveis, para
todos os litigantes, os custos da demanda, têm as partes mais este mecanismo interessante, que
traz mais uma vantagem em comparação com o processo estatal”.54
Sobre outra perspectiva, é importante ressaltar que muitas das instituições arbitrais trazem em
seu regulamento previsão expressa para esta responsabilidade pelas despesas do procedimento, e
assim, optando as partes pela instituição, automaticamente estarão acolhendo o que por ela for
estabelecido, salvo se expressamente estabelecerem o contrário.
Ainda neste tema de despesas da arbitragem, surge o problema da omissão, pelas partes e pela
instituição, quando for o caso, a respeito da responsabilidade por estas verbas. Diante desta
situação, caberá ao árbitro decidir a questão, podendo valer-se como parâmetro, mas não como
regra a ser necessariamente observada, do quanto previsto no § 2.º do art. 82 c/c 85 do CPC/2015.
Mas as circunstâncias do conflito e do procedimento podem influenciar na decisão.
Por outro lado, pode acontecer de, na arbitragem administrada, não se ter ônus com os
honorários dos árbitros às partes, porque a instituição, como um órgão de classe, ou entidade
profissional, pode oferecer este serviço gratuitamente aos seus membros, assumindo, porém, os
respectivos custos.
Prestigiada a sua natureza contratual, por vontade das partes, pode-se extinguir o compromisso
antes mesmo de instaurada a arbitragem, tanto em razão de transação quanto ao objeto do
conflito, como para devolver ao juízo estatal o conhecimento da matéria. Sendo, porém, judicial o
compromisso, uma vez que sua existência ensejou a extinção do processo sem julgamento do
mérito, outro deverá ser proposto, caso as partes resolvam romper conjuntamente o pacto.
De outra parte, o encerramento, por sentença, do procedimento arbitral com ou sem análise da
matéria de fundo igualmente extingue o compromisso.
I – escusando-se qualquer dos árbitros, antes de aceitar a nomeação, desde que as partes
tenham declarado, expressamente, não aceitar substituto;
II – falecendo ou ficando impossibilitado de dar seu voto algum dos árbitros, desde que as
partes declarem, expressamente, não aceitar substituto; e
III – tendo expirado o prazo a que se refere o art. 11, inciso III, desde que a parte interessada
tenha notificado o árbitro, ou o presidente do tribunal arbitral, concedendo-lhe o prazo de dez dias
para a prolação e apresentação da sentença arbitral.
Isto porque a indicação do árbitro, em determinadas situações, pode ter sido o motivo
determinante para a escolha da arbitragem. A confiança, valorização do conhecimento específico e
qualidades do eleito, por vezes, são atributos personalíssimos, e, assim, a falta do escolhido retira a
razão de ser utilizado este método de julgamento.
E a extinção depois de instaurado o procedimento arbitral pode ensejar uma situação ímpar, de
perecimento do compromisso sem que se tenha um pronunciamento arbitral a respeito, diante da
falta (por exemplo, por morte) exatamente daquele que teria a autoridade para tanto. De forma
inusitada, o processo deixaria de ter decisão, sequer a respeito de sua extinção, mas tal fato não
obsta a extinção do compromisso por força da lei, autorizando, assim, o ingresso no Judiciário pelo
interessado, sem necessidade de adotar qualquer outra providência relativa ao procedimento
arbitral.
Embora a redação do inciso II possa gerar interpretação diversa, como regra, a recusa ao
substituto deve constar obrigatoriamente da convenção arbitral, e não ser manifestada em
momento posterior, quando da falta superveniente, como a literalidade do texto sugere. Isto
porque se a escolha inicial não teve previamente a pessoalidade como fator intransponível, tal
qual sugere a redação do inciso I (“desde que as partes tenham declarado...”), a substituição segue
a regra geral, no sentido de ser possível para preservar o julgamento pelo juízo arbitral. Isto
porque se afere da cláusula arbitral o efeito positivo, ou seja, as partes concordaram com a
derrogação da jurisdição estatal, assentindo em um julgamento por um árbitro, na jurisdição
privada.
Outra causa específica de extinção do compromisso (da convenção) é o termino do prazo (legal
ou convencional) para ser proferida a sentença arbitral. Esta é uma garantia legal de celeridade da
arbitragem, afastando o risco de prolongamento indefinido do procedimento.
É tão relevante à nossa Lei esta questão que até mesmo se prevê a invalidação da sentença
arbitral quando proferida fora do prazo, se atendido o disposto neste art. 12, III (art. 32, VII, da Lei
9.307/1996).
O interesse no desenvolvimento da arbitragem, porém, é das partes, que por vezes estão mais
atentas à qualidade do julgamento do que à celeridade do procedimento. Desta forma, caberá às
partes a provocação ao árbitro para respeitar o prazo, e, se nada fizerem, nenhum efeito ao
procedimento terá a ampliação, mesmo demasiada, do prazo.
O critério adotado pelo legislador é generoso, pois a notificação do árbitro se fará apenas
quando já vencido o período inicialmente previsto, e no momento que qualquer das partes assim
desejar. Desta forma, além do prazo decorrente da inércia dos envolvidos em instar o árbitro, este
ainda terá mais 10 dias para a prolação da sentença. Sua desídia, porém, pode gerar
responsabilidade civil pela demora.
São os efeitos positivo e negativo da convenção arbitral, como dois lados da mesma moeda.
O efeito positivo é dirigido às partes, que deverão submeter seus conflitos à jurisdição privada,
conforme explica Pedro Batista Martins: “Ao firmarem a cláusula compromissória, os contratantes
concordam com a submissão de eventual conflito à justiça privada, não mais podendo arrepender-
se ou reverter a questão, unilateralmente, à jurisdição ordinária”.56 E a legitimidade desta escolha
vem referendada expressamente pelo Código de Processo Civil de 2015 ao estabelecer que é
preservado às partes o direito de instituir juízo arbitral, na forma da lei (art. 42), quando antes
(art. 3.º, § 1.º) já fez referência à admissibilidade da arbitragem para “apreciação jurisdicional” da
ameaça ou lesão a direito.
Por sua vez, o efeito negativo é dirigido ao Estado, pois impede o juiz estatal de analisar o
mérito da controvérsia submetida à arbitragem; refere-se, pois, ao afastamento da jurisdição do
Estado para apreciar a matéria objeto da convenção.
Porém, pela prestigiada autonomia privada, nada impede que as partes, de comum acordo,
modifiquem ou até mesmo revoguem pura e simplesmente a convenção, restabelecendo, assim, o
status quo ante, ou seja, de livre acesso ao juízo estatal.
Quanto ao efeito positivo, então, ficam as partes sujeitas à arbitragem para a solução do conflito
quando firmarem a convenção. E a maneira de se instaurar a arbitragem dependerá da sua
espécie (ad hoc ou institucional), e tudo se verá ao se apresentar o procedimento arbitral.
Também a origem da opção tem relevância neste momento, pois haverá encaminhamento
diverso se eleita a arbitragem por compromisso ou por cláusula compromissória, embora ambas
se contenham no gênero convenção arbitral e sejam igualmente vinculantes, como já antes
sinalizado.
Pela sua imperatividade, a recusa de uma das partes em se submeter à arbitragem tem
consequência diversa, dependendo das circunstâncias.
(a) Tratando-se de cláusula vazia, segue-se o procedimento dos arts. 6.º e 7.º acima analisados,
para a obtenção do compromisso, seguindo-se, a partir de então, o quanto previsto a este.
As providências específicas (de ordem prática para se provocar o início do processo) serão
analisadas, adiante, quando do estudo do Procedimento Arbitral.
Nesta oportunidade, merece ênfase o fato de que, diante de cláusula cheia, ou compromisso
independente (não aquele do art. 7.º da Lei, que já é resultado de provocação judicial), é
dispensada a passagem pelo Judiciário, ainda que restrita a uma determinada providência (como
celebração de compromisso no caso de cláusula vazia), autorizando as partes, nos termos do
contido na disposição, o acesso direto ao juízo arbitral.
E em especial assim se ressalta quanto à cláusula cheia, pois esta foi uma das mais
significativas e brilhantes alterações da Lei em confronto com o sistema anterior.
Em face desta mudança, anota-se aqui uma questão transitória como são todas aquelas
atingidas pelo direito intertemporal: aplica-se a Lei de 1996 às cláusulas firmadas anteriormente à
sua vigência? Após adequado debate, através de diversos precedentes firmou-se o entendimento
pela incidência imediata da lei mesmo aos contratos em curso, restando hoje superada
praticamente a questão pela idade da lei.
Confira-se, neste sentido, decisão do STJ, proferida pela Corte especial, que pacificou57 a
questão: “A Lei de Arbitragem brasileira tem incidência imediata aos contratos que contenham
cláusula arbitral, ainda que firmados anteriormente à sua edição. Precedentes da Corte Especial”
(STJ, SEC 894/UY, Corte Especial, j. 20.08.2008, Min. Nancy Andrighi). E, firme a jurisprudência, foi
editada em 2012 a Súmula 485 do STJ, assim: “A Lei de Arbitragem aplica-se aos contratos que
contenham cláusula arbitral, ainda que celebrados antes da sua edição”.
Pelo efeito negativo da convenção arbitral, temos a renúncia das partes à jurisdição estatal para
os conflitos decorrentes da matéria objeto da convenção.
E assim, o Código de Processo Civil estabelece a extinção do processo sem a resolução de mérito,
pela convenção de arbitragem (art. 485, VII, do CPC/2015).
Esta “petitio simplex”, como tal, sem forma e previsão legal, não pode ensejar a preclusão
(consumativa) quanto ao direito de defesa na extensão do art. 337 do CPC/2015 (inclusive quanto à
própria preliminar de existência de convenção arbitral), mas convém seja feita a ressalva neste
sentido. De igual maneira, não se terá a suspensão do processo (e dos prazos de audiência/defesa),
salvo se deferido pedido expresso neste sentido, e naturalmente comporta contraditório a respeito.
A arguição assim oferecida representa adequada estratégia processual não só para preservar a
parte dos custos mais elevados inerentes à preparação da contestação completa, como também
para poupar o réu de expor suas teses de defesa em processo judicial fadado à extinção,
permitindo que o autor delas tenha conhecimento antes da apresentação das alegações inicias na
arbitragem (sede própria para a análise do conflito).
Advirta-se, porém que embora a conclusão acima também tenha sido adotada como Enunciado
5 da I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios,59 já se teve notícia de decisão judicial
não conhecendo da arguição prematura, a pretexto de inexistência de previsão legal, exigindo a
alegação em preliminar de contestação que, ao final, foi acolhida... sem dúvida, onerosa às partes
e ao Judiciário além de ineficiente a solução adotada.
A seu turno, confira-se o quanto se diz a respeito do deslocamento da jurisdição do Juízo Estatal
ao Juízo Arbitral quando promovida no Judiciário tutela provisória antecedente à arbitragem
(LArb. art. 22-A; Cf. Capítulo 10, item 10.2), e naquelas situações em que se discute a aplicação do
Princípio Competência-Competência, verificada no caso a indevida coexistência do processo e de
procedimento (Capítulo 5, item 5.2), situações sem que aplica-se a parte final do art. 485, VII, do
CPC/2015.61
Por fim, como registro histórico, anote-se que, na interpretação do Código de Processo Civil de
1973, encontrava-se agitada polêmica quanto à possibilidade de o juiz conhecer de ofício da
existência de cláusula arbitral.62 Já sustentávamos à época, com detalhada fundamentação até a 5.ª
edição deste “Curso”, a imprecisão do texto legal, mas que não afastava, na sua exata exegese, o
impedimento à extinção do processo sem provocação da parte.
E confirmando o acerto desta posição por nós adotada, o Código de Processo Civil de 2015, como
visto, corrigiu a falha na redação contida na legislação revogada, sendo ainda incisivo ao
considerar renunciada a convenção se não invocada pelo réu (art. 337, X, §§ 5.º e 6.º).
Embora pareça conflitante a escolha da solução arbitral, ao mesmo tempo em que se define o
foro competente para processar eventual demanda decorrente do contrato, em um mesmo
contrato podem conviver em harmonia a cláusula compromissória e cláusula de eleição de foro.
Isto porque a convenção arbitral pode ser restrita a uma ou algumas questões do contrato, e
assim, para as demais, não abrangidas pela arbitragem eleita, prevalecerá a escolha do foro.
Assim, como tratado em oportunidades próprias, para a ação prevista nos arts. 6.º e 7.º da Lei
de Arbitragem, relativa à efetivação da cláusula vazia, para a execução da sentença arbitral, para
eventuais ações de invalidação da cláusula ou mesmo da sentença arbitral, e para medidas de
urgência anteriores à instauração do procedimento arbitral, competente será o foro eleito pelas
partes.
ARRUDA ALVIM, José Manoel de. Cláusula compromissória e compromisso arbitral – Efeitos.
Revista de Processo. n. 101. ano XXVI. São Paulo: Ed. RT, jan.-mar. 2001.
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intervenções do Judiciário na arbitragem privada. Revista dos Tribunais. n. 749. ano LXXXVII. São
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FICHTNER, José Antonio; MONTEIRO, André Luís. A convenção de arbitragem como exceção
processual: impossibilidade de conhecimento ex officio. Temas de arbitragem: primeira série. Rio
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2009.
MARTINS, Pedro Batista. Cláusula compromissória. In: MARTINS, Pedro Batista; LEMES, Selma
Ferreira; CARMONA, Carlos Alberto (coord.). Aspectos fundamentais da lei de arbitragem. Rio de
Janeiro: Forense, 1999.
______. A convenção de arbitragem. In: MARTINS, Pedro Batista; LEMES, Selma Ferreira;
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PINTO, José Emilio Nunes. As vantagens da cláusula compromissória clara e precisa para a
condução da arbitragem. Disponível em: [http://www.mundojuridico.adv.br]. Acesso em:
12.06.2011.
NOTAS DE RODAPÉ
1
Difere, pois, de outros ordenamentos, como o espanhol, em que não se faz a distinção, na norma, da
cláusula ou compromisso, tendo em vista a histórica familiaridade com o instituto e as características de
uma ou outra forma de se eleger a arbitragem – neste país as partes se comprometem a resolver seus
conflitos através do convênio arbitral. Por outro lado, França e Itália adotam a divisão entre cláusula e
compromisso, como o Brasil.
2
Para o qual há previsão de que “a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a
iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por
escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula”;
e, a respeito, houve frustrada iniciativa de aprimoramento da regra, com inovações aprovadas pelo
Congresso, mas vetadas por descuido na sanção (Cf. Capítulo 14, adiante e “Anexo 2”).
Nanni, Giovanni Ettore. Cláusula compromissória como negócio jurídico: análise de sua existência,
validade e eficácia. In: Lotufo, Renan; Nanni, Giovanni Ettore; Martins, Fernando Rodrigues (coord.).
Temas relevantes do direito civil contemporâneo: reflexões sobre os 10 anos do Código Civil. São Paulo:
Atlas, no prelo, ao colacionar Antonio María Lorca Navarrete, Comentarios a la nueva Ley de Arbitraje
60/2003, de 23 de diciembre, p. 107.
Cf., a respeito, Giovanni Ettore Nanni, referindo-se a diversas formas de celebração e aceitação da cláusula
compromissória, dentre elas o comportamento concludente (Nanni, Giovanni Ettore. Cláusula
compromissória... cit.). Aliás, recomenda-se a leitura deste artigo, pois traz o Professor minudente estudo
sobre a existência, validade e eficácia da cláusula compromissória, com a seriedade que caracteriza seus
escritos.
Ley 60/2003: Artículo 9. Forma y contenido del convenio arbitral. 1. El convenio arbitral, que podrá
adoptar la forma de cláusula incorporada a un contrato o de acuerdo independiente, deberá expresar la
voluntad de las partes de someter a arbitraje todas o algunas de las controversias que hayan surgido o
puedan surgir respecto de una determinada relación jurídica, contractual o no contractual. 2. Si el
convenio arbitral está contenido en un contrato de adhesión, la validez de dicho convenio y su
interpretación se regirán por lo dispuesto en las normas aplicables a ese tipo de contrato. 3. El convenio
arbitral deberá constar por escrito, en un documento firmado por las partes o en un intercambio de
cartas, telegramas, télex, fax u otros medios de telecomunicación que dejen constancia del acuerdo. Se
considerará cumplido este requisito cuando el convenio arbitral conste y sea accesible para su ulterior
consulta en soporte electrónico, óptico o de otro tipo. 4. Se considerará incorporado al acuerdo entre las
partes el convenio arbitral que conste en un documento al que éstas se hayan remitido en cualquiera de
las formas establecidas en el apartado anterior. 5. Se considerará que hay convenio arbitral cuando en un
intercambio de escritos de demanda y contestación su existencia sea afirmada por una parte y no negada
por la otra. 6. Cuando el arbitraje fuere internacional, el convenio arbitral será válido y la controversia
será susceptible de arbitraje si cumplen los requisitos establecidos por las normas jurídicas elegidas por
las partes para regir el convenio arbitral, o por las normas jurídicas aplicables al fondo de la controversia,
o por el derecho español.
Em relevante pronunciamento do TJPR, ao acolher embargos infringentes, esta matéria foi largamente
debatida, com citação de diversos precedentes, firmando-se a tese de que a existência no contrato de
cláusula compromissória “cheia” é suficiente para se levar o conflito à arbitragem, sem necessidade de
prévio compromisso arbitral; e especificidades da convenção de arbitragem podem ser definidas por meio
de “ata de missão”, ou termo de arbitragem (EI 428.067-1/10, 17.ª Câm. Civ., j. 07.12.2011 (Itiquira vs.
Inepar), recomendando-se a leitura dos comentários ao acórdão feitos por Arnoldo Wald e Ana Gerdau de
Borja (RArb 32, ano IX, jan.-mar. 2012, p. 343 – Jurisprudência Comentada Nacional).
Art. 5.º Reportando-se as partes, na cláusula compromissória, às regras de algum órgão arbitral
institucional ou entidade especializada, a arbitragem será instituída e processada de acordo com tais
regras, podendo, igualmente, as partes estabelecer na própria cláusula, ou em outro documento, a forma
convencionada para a instituição da arbitragem.
10
A boa prática sugere ao advogado – em geral, é ele quem fará este trabalho – elaborar a cláusula de
arbitragem após estudo detalhado do regulamento da Câmara de Arbitragem escolhida, pois eventual
contradição entre o redigido na cláusula e o regulamento pode gerar uma cláusula patológica e potencial
questionamento pela parte sobre “qual disposição vale? A minha, fundamentada na autonomia da
vontade, ou a do regulamento da câmara?”.
11
Neste sentido, preciso comentário de Eleonora Coelho Pitombo: “Assim, no caso de opção pela arbitragem
institucional, é recomendável que o advogado adote cláusula modelo de câmaras arbitrais (checando
sempre a existência, a idoneidade e a adequação da câmara escolhida) e, ainda, que faça constar o número
de árbitros, a sede e a língua da arbitragem, assim como as disposições acerca de medidas cautelares”
(Pitombo, Eleonora M. Bagueira Leal Coelho. Relevância do advogado para a arbitragem. Revista do
Advogado. n. 87. ano XXVI. São Paulo, set. 2006, p. 46).
12
Neste sentido, cf. TJSP, Ap. 2630094/5-00, j. 14.12.2006, com a seguinte ementa: “Arbitragem – Cláusula
compromissória estabelecida em contrato de seguro empresarial para resolução de conflitos decorrentes
da interpretação dos termos e condições da apólice, bem como evolução, ajuste e liquidação de qualquer
sinistro, o que inclui a discussão quanto à subsunção do fato concreto aos danos cobertos – Necessidade de
instituição da arbitragem, valendo a sentença como compromisso arbitral, nos termos do art. 7.º, § 7.º, da
Lei 9.307/1996 – Não provimento”; extraindo-se a seguinte passagem do voto do rel. Des. Ênio Zuliani: “(...)
Assim, não resta dúvida de que as partes optaram pela arbitragem [cláusula vazia ou em branco] para a
solução dos litígios decorrentes do contrato de seguro em questão”. A cláusula arbitral em análise estava
assim redigida: “Fica expressamente convencionado que, caso surja qualquer controvérsia ou divergência
quanto à interpretação dos termos e condições da presente apólice, assim como na evolução, ajuste e/ou
liquidação de qualquer sinistro, estas deverão ser submetidas à decisão de um ‘árbitro comum’ que o
segurado e a seguradora nomearão conjuntamente”, ou seja, faltou a previsão para a nomeação de árbitro
no caso de conflito entre as partes a respeito da indicação de árbitro único, inviabilizando o início
imediato da arbitragem, mas preservando este método de solução, a ser precedido da ação própria do art.
7.º, com as providências do art. 6.º, ambos da Lei de Arbitragem.
13
Cf. neste sentido recente e substancioso acórdão, no qual se colaciona doutrina e diversos precedentes da
Corte, relatado pelo Min. Moura Ribeiro, consignado na ementa: “6. Cuidando-se de cláusula
compromissória cheia, na qual foi eleito o órgão convencional de solução de conflito, deve haver a
instauração do Juízo arbitral diretamente, sem passagem necessária pelo Judiciário” (STJ, REsp. 1.602.696
– PI (2015/0238596-1), 3.ª T., v.u., j. 09.08.2016, no qual fomos honrados com a colação de passagens
contidas neste item da 2.ª edição deste “Curso”.
14
Cf. a respeito, pertinente acórdão relatado pelo Des. Roberto Mac Cracken em que a matéria foi
amplamente debatida (TJSP, Apelação Cível 0214068.16.2010.8.26.0100, 2.ª Câmara de Direito Privado, v.u.,
j. 16.10.2012 – Fundos Matlinpatterson vs. VRG Linhas Aéreas S/A), com as seguintes passagens em sua
ementa: “Fundo internacional que firma termo que previa expressamente ser aditivo de contrato que
avançou a solução de conflito por arbitragem. Tentativa de utilizar-se do Poder Judiciário para se afastar
da arbitragem e de seus efeitos. Impossibilidade. Conduta que configura ofensa ao princípio do venire
contra factum proprium.... Cláusula compromissória avençada regularmente. Arbitragem que produziu
seus efeitos nos limites próprios e perante aqueles que se encontram envolvidos com o direito disponível
controvertido.”.
15
Assim: “Art. 786. Paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites do valor respectivo, nos direitos
e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano.”
16
Nestes sentido: TJSP, Apelação Cível 7.307.457-0, Des. Relator José Tarciso Beraldo, 14ª Câmara de Direito
Privado, j. 04.02.2009. Também neste sentido, um juiz norte-americano do Tribunal Distrital do Sul de
Nova Iorque decidiu em um caso da Zurich Seguradora contra a empresa Crowley Latin America Services
LLC que: “A limitation of third-party enforcement of legal rights arising under the contract does not reach
Zurich’s right of equitable subrogation. Zurich’s equitable subrogation right does not arise from the
contract’s language or provisions, but instead allows Zurich to stand in Adidas’s shoes to enforce the
contract as a party to it. See Farrell Lines, Inc. v. Columbus Cello-Poly Corp., 32 F. Supp. 2d 118, 126
(S.D.N.Y. 1997), aff’d sub nom., Farrell Lines, Inc. v. Ceres Terminals, Inc., 161 F.3d 115 (2d Cir. 1998). For
this reason, § 12.4 of the Service Agreement does not bar Zurich’s claims” (Decisão disponível em
[http://assets.law360news.com/0875000/875012/https-ecf-nysd-uscourts-gov-doc1-127119420714.pdf], pela
qual se nota que a sub-rogação foi reconhecida mesmo diante de previsão contratual restritiva, em sentido
contrário). Ainda, a respeito, confira-se BREKOULAKIS, Stavros. L. Third parties in international comercial
arbitration. Oxford University Press, 2010. p. 43; e STEINGRUBER, Andrea Marco. Consent in international
arbitration. Oxford University Press, 2012. p. 150.
17
18
19
Cretella Neto, José. Comentários à Lei de Arbitragem brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 65. Cf.,
ainda, observações de Carlos Alberto Carmona: “Quanto ao meio de comunicação, não estão descartados o
fac-símile (que comporta demonstração – embora ainda não completamente segura – de envio e recepção)
e o telegrama com aviso de recebimento. Não determinando a Lei que a comunicação seja escrita, pode-se
cogitar da utilização de via eletrônica (e-mail), preocupando-se, porém o interessado de munir-se de prova
do recebimento da mensagem pelo destinatário, já que, na hipótese de fracassar a tentativa e ser
necessário o recurso à via judicial, caberá ao interessado (no caso, o autor da demanda de que trata o art.
7.º) demonstrar que procurou validamente instaurar a arbitragem através do mecanismo previsto no
artigo em questão, sob pena de ver decretada a carência da ação por falta de interesse de agir. A
demonstração pelo autor de que tentou efetivamente fazer instaurar o juízo arbitral antes de procurar o
auxilio do Poder Judiciário é efetivamente da maior importância, pois o exercício da atividade
jurisdicional – ensina Cândido Rangel Dinamarco – não ocorre sem um ‘ponderável custo social’. Desta
forma, espera-se que antes de recorrer à tutela estatal, o interessado procure obter a prestação do
contratante inadimplente través da atuação regular e natural dos mecanismos legais colocados à sua
disposição. Na hipótese estudada, não tendo o autor demonstrado que concitou o réu, sem resultado, a
estabelecer os parâmetros para a arbitragem, não estará caracterizada a necessidade de invocar-se tutela
jurisdicional estatal. Resumindo a questão à sua expressão mais simples, Vicente Greco Filho pondera que
para aferir-se a existência de interesse processual deve-se responder afirmativamente a esta questão: para
obter o que pretende, necessita o autor da providência jurisdicional pleiteada?” E conclui: “Faltará o
interesse processual se a via jurisdicional não for indispensável, como, por exemplo, se o mesmo resultado
puder ser alcançado por meio de um negócio jurídico sem a participação do Judiciário” (Carmona, Carlos
Alberto. Arbitragem e processo. São Paulo: Atlas, 2009. p. 143-144).
20
Já com a nova redação introduzida pela Lei 13.129/2015 – cf. texto consolidado e comentários em Anexo 1
e Anexo 2 adiante.
21
“Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1.º Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a
produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: (...) IV – julga procedente o pedido
de instituição de arbitragem; (...).”
22
A lei espanhola vai além, estabelecendo, neste caso, a irrecorribilidade da sentença arbitral, conforme o
art. 15 da Lei 60/2003, especialmente seu inciso 7.
23
Integrar, segundo o dicionário Houaiss, significa “incluir(-se) um elemento num conjunto, formando um
todo coerente; incorporar(-se), integralizar(-se) ‘uma empresa que integra diferentes ramos de atividades>
<a arquitetura integrava-se perfeitamente à paisagem’”.
24
Embora omissa a lei a respeito, conforme as circunstâncias, diante de novos elementos trazidos pelo réu,
muito além da mera defesa aos argumentos apresentados na ação, em prestígio ao princípio do
contraditório, faz-se necessário, e até útil, ao julgamento, ouvir o autor a respeito.
25
Confira-se, porém, o quanto se disse no Capítulo 5, item 5.2, a propósito de situações excepcionais.
26
Art. 16. § 2.º Nada dispondo a convenção de arbitragem e não chegando as partes a um acordo sobre a
nomeação do árbitro a ser substituído, procederá a parte interessada da forma prevista no art. 7.º desta
Lei, a menos que as partes tenham declarado, expressamente, na convenção de arbitragem, não aceitar
substituto.
27
“Tal situação – em tudo e por tudo desastrosa – somente ocorrerá em caso de inabilidade dos contratantes
ao redigirem a cláusula compromissória. Prevendo as vicissitudes pelas quais poderão passar, as partes
devem desde logo escolher a melhor forma de constituir o tribunal arbitral para a eventualidade de surgir
litígio, discutindo os respectivos detalhes antes de instaurar-se a contenda. Se não tomarem esta
providência, redigindo cláusula completa e bem estruturada, espera-se pelo menos que os contratantes
tenham o cuidado de estabelecer o mecanismo de nomeação do árbitro (ou dos árbitros), o que pode fazer
com que se supere a intervenção judiciária de que trata o art. 7.º” (Carmona, Carlos Alberto. Arbitragem e
processo, cit., p. 156). E ainda esclarece o autor que o legislador francês, antevendo os problemas que a
cláusula vazia pode criar, optou por solução radical, qual seja considerar nula a cláusula que deixe de
nomear o árbitro (ou os árbitros) ou deixe de estipular a forma de nomeação deste(s) (citando o art. 1.443,
§ 1.º do Código de Processo Civil francês). Com idêntica crítica, embora trazendo argumentos comuns e
diversos, Scavone Junior, Luiz Antonio. Manual de arbitragem. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 2009. p. 75.
28
29
Exemplo mais clássico retratado por José Emílio Nunes Pinto: “Cláusula que prevê a escolha das regras de
arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, sediada em Paris, a CCI, mas para serem aplicadas por
instituição brasileira. A patologia, nesse caso, está no fato de essas regras de grande prestígio
internacional e bastante consolidadas terem sido desenvolvidas para uma estrutura única da CCI e que
não encontra similar no Brasil. A inadequação das regras CCI à estrutura das câmaras brasileiras é a causa
da patologia. E muitas podem ser as consequências adversas dessa patologia” (Cláusulas arbitrais
patológicas – Esse mal tem cura. Jus Vigilantibus. nov. 2004. Disponível em: [http://jusvi.com/artigos/2521].
Acesso em: 05.06.2011).
30
Com algumas conclusões em parte diversas do quanto a seguir se diz, em razão de peculiaridades de cada
situação que não comportam análise pelo restrito ambiente deste “Curso”, indica-se para leitura o artigo
de Selma Maria Lemes “A interpretação da cláusula compromissória à luz do princípio do efeito útil”,
merecendo trazer a seguinte passagem: “Nessa tarefa efetuará análise acurada para perquirir a real
vontade e intenção das partes quando elegeram a arbitragem, pois, como é sabido, a arbitragem só existe
em decorrência da vontade das partes (princípio da autonomia da vontade). Neste mister interpretativo
aflora o denominado princípio do efeito útil da cláusula compromissória, que consiste em dar a
interpretação mais consentânea possível à cláusula, a fim de que possa prosperar e instituir a arbitragem.
Este princípio decorre do art. 112 do Código Civil em vigor, ‘nas declarações de vontade se atenderá mais a
intenção nela consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem’” (jul. 2006. Disponível em:
[www.mundojuridico.adv.br]. Acesso em: jun. 2011). Na doutrina e jurisprudência internacionais, tal
como reiteradamente firmado no âmbito da Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio
Internacional – CCI, o mesmo entendimento é perfilhado invocando-se, muitas vezes, o art. 1.157 do
Código Civil francês, que guarda semelhança com o art. 131 do CCo brasileiro e que, indubitavelmente,
homenageia o bom-senso: “Quando uma cláusula é suscetível de dois sentidos, devemos dar preferência
àquele que possa produzir um efeito útil, em lugar daquele que não possa produzir nenhum”. “O princípio
do efeito útil vem sendo adotado pela jurisprudência brasileira ao exarar decisões que convalidam e
reiteraram os efeitos de cláusulas compromissórias omissas, lacônicas ou contraditórias, determinando
que as matérias sejam resolvidas na sede arbitral. Enfim, invocar o princípio do efeito útil para
interpretar cláusula compromissória com anomalia, que na doutrina jurídica denomina-se genericamente
de cláusula patológica ou doente, revela-se terapêutica sadia e eficaz, seja no processo arbitral como no
judiciário. Assim, dependendo da situação, não se justifica recomendar tratamento cirúrgico para negar-
lhe validade e efeito”. Cf., ainda, José Emílio Nunes Pinto. A escolha pela arbitragem e a garantia de sua
instituição. Revista do Advogado. n. 87. ano XXVI. São Paulo, set. 2006, p. 87.
31
Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito; (...).
32
Já com a nova redação introduzida pela Lei 13.129/2015 – cf. texto consolidado e comentários em Anexo 1
e Anexo 2 adiante.
33
Nesse caminho, José Emilio Nunes Pinto: “Busca-se resgatar, na cláusula vazia ou na cláusula patológica, a
verdadeira intenção das partes ao celebrar a cláusula compromissória, ainda que isso seja difícil e a tarefa
por demais complexa”, razão pela qual, “sendo a cláusula compromissória de natureza contratual, o art.
422 do Código Civil se aplica integralmente” (Pinto, José Emilio Nunes. A cláusula compromissória à luz do
Código Civil. Jus Navigandi. n. 518, ano IX. Teresina, dez. 2004. Disponível em:
[http://jus.uol.com.br/revista/texto/6025]. Acesso em: 04.06.2011).
34
Como escreve Fernanda Tartuce, após trazer à colação lições do Prof. Kazuo Watanabe: “A inclusão de
cláusula contratual de mediação prévia e necessária revela a busca de uma saída conjunta como fase
precedente à instauração do litígio, o que enseja interesse crescente sobre o panorama das técnicas
compositivas não contenciosas” (Tartuce, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. Rio de Janeiro: Forense;
São Paulo: Método, 2008. p. 270).
35
36
Cf., a respeito, Selma Maria Ferreira Lemes, assim escrevendo: “Saliente-se que esta questão já foi objeto
de demandas judiciais no exterior, registrando-se que a jurisprudência se inclina no sentido de entender
que a cláusula escalonada tem efeitos contratuais, vale dizer, se não for observada a mediação prévia,
nenhuma consequência além do simples inadimplemento contratual que se resolve por perdas e danos
advirá. Mas também há jurisprudência que considera que esta cláusula tem efeitos processuais e impede o
árbitro ou o Judiciário de conhecer a questão litigiosa, remetendo as partes à mediação ou conciliação
prévias. Na jurisprudência francesa registra-se precedente em que esta questão levou 10 anos,
percorrendo várias instâncias judiciais, até que, exausta, a parte submeteu-se à conciliação prévia que
estipulara como condição à demanda judicial, para em seguida, finalmente, ver o mérito da questão poder
ser julgado” (Lemes, Selma Maria Ferreira. Cláusula escalonada, mediação e arbitragem. Revista
Resultado. vol. 10, jan. 2005, p. 42).
37
38
39
“Art. 17. Considera-se instituída a mediação na data para a qual for marcada a primeira reunião de
mediação. Parágrafo único. Enquanto transcorrer o procedimento de mediação, ficará suspenso o prazo
prescricional.”
40
Fala-se Judiciário, mas, se já se estiver instituído procedimento arbitral, mesmo suspenso, e inclusive
consideradas outras casuísticas a serem analisadas no Capítulo 10, adiante, deve-se entender a regra no
sentido de que, se com jurisdição no momento, ao árbitro poderá ser requerida a tutela provisória de
urgência.
41
42
O Regulamento do CAESP, por exemplo, considera fundada a suspeição de parcialidade do árbitro que
tiver participado como mediador ou conciliador das partes, salvo se expressamente os litigantes
estabelecerem o contrário, conforme o item 46, e, também assim estabelece o Centro de Arbitragem da
Câmara Americana de Comércio de São Paulo – AMCHAM e o Centro de Arbitragem e Mediação da CCBC.
43
44
Neste sentido, José Cretella Neto: “Estipulação semelhante é encontrada na Ley espanhola, que reza que a
nulidade de um contrato não implicará, necessariamente, na nulidade da cláusula compromissória nele
inserta (art. 5.º, § 8.º). Também a lei italiana dispõe que a validade da cláusula compromissória deve ser
avaliada de modo autônomo em relação ao contrato ao qual se refere (art. 808 do Códice). E a lei belga
estipula que ‘la constatation de la nullité du contrat n’entraîne pas de plein droit la nullité de la
convention d’arbitrage qu’il contient’ (art. 1.697, § 2.º, do Code). Por fim, a lei alemã dispõe que o juízo
arbitral pode decidir quanto à sua própria competência, bem como quanto à existência ou validade da
convenção de arbitragem; no contexto, ‘a cláusula arbitral deve ser considerada autônoma em relação às
outras estipulações do contrato’ (art. 1.040. (1) do ZPO)” (Cretella Neto, José. Comentários à Lei de
Arbitragem Brasileira. Rio de Janeiro: Forense, p. 71).
45
Art. 8.º, parágrafo único: Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões
acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a
cláusula compromissória.
46
Cf., a respeito, Rodrigo Almeida Magalhães. Arbitragem e convenção arbitral. Belo Horizonte:
Mandamentos, 2006. p. 238.
47
48
Art. 9.º O compromisso arbitral é a convenção através da qual as partes submetem um litígio à arbitragem
de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial. § 1.º O compromisso arbitral judicial
celebrar-se-á por termo nos autos, perante o juízo ou tribunal, onde tem curso a demanda. § 2.º O
compromisso arbitral extrajudicial será celebrado por escrito particular, assinado por duas testemunhas,
ou por instrumento público.
49
Carlos Alberto Carmona, após apresentar as divergências a respeito da natureza jurídica do compromisso
(contrato de direito privado, contrato processual, contrato complexo e composto), e sua semelhança com a
transação, colacionando posições de civilistas e processualistas, conclui: “O compromisso é o negócio
jurídico processual através do qual os interessados em resolver um litígio, que verse sobre direitos
disponíveis, deferem a sua solução a terceiros, com caráter vinculativo, afastando a jurisdição estatal,
organizando o modo através do qual deverá se processar o juízo arbitral” (Carmona, Carlos Alberto.
Arbitragem e processo, cit., p. 189- -190). Nesta linha também Luis Fernando Guerrero, referindo-se à
impossibilidade de se negar a natureza de negócio jurídico processual da convenção, pois é nítido que o
fim do acordo celebrado entre as partes é a solução de litígio, do modo nela estabelecido (Guerrero, Luis
Fernando. Convenção de arbitragem e processo arbitral. São Paulo: Atlas, 2009. p. 12.). Mas bem pontua
Giovanni Ettore Nanni (Nanni, Giovanni Ettore. Cláusula compromissória... cit.). “Porém, entende-se que é
despiciendo o designativo processual na gênese da cláusula compromissória. Ela é um pacto de direito
material, em que a sua vertente processual surge em momento posterior, no âmbito de sua eficácia, fora,
portanto, de sua natureza jurídica. Aliás, dependendo do caso concreto, se não é deflagrada nenhuma
controvérsia, ela nem sequer se implementa”. Temos para nós que a convenção arbitral caracteriza-se, em
um primeiro momento, como negócio jurídico de direito material, mas se houver previsão também de
organização processual, e no quanto contido a este respeito (v.g., prazos, forma para a prática dos atos e
intimações etc.), pode-se estender à convenção a natureza processual; ou seja, a previsão limitada a
prever, com efeito vinculante, a submissão do litígio (atual ou potencial), qualifica a convenção como
negócio jurídico de direito material; porém, prevendo as partes, como lhes é facultado, disposições
processuais (ou procedimentais), se terá uma ampliação do conteúdo da convenção, e assim bem se lhe
atribui também a qualificação processual. Nesta última hipótese, e apenas nela, somam-se elementos
heterogêneos no mesmo negócio jurídico, justificando adjetivá-lo como processual.
50
José Cretella Neto faz interessante observação a respeito dos requisitos do compromisso no direito
estrangeiro: “A lei argentina apresenta exigências semelhantes às da lei brasileira, mas exige que o
compromisso deverá, também, incluir a estipulação de uma multa, a qual deverá ser paga pela parte que
deixar de praticar os atos necessários para cumprir com o estabelecido (art. 740, 4, do CPN). Já a lei
francesa apresenta menos exigências do que a brasileira: o compromisso deverá conter apenas o objeto do
litígio e a designação do árbitro (ou dos árbitros), ou prever forma para sua designação (art. 1.448 do
Code)” – Cretella Neto, José. Comentários à Lei de Arbitragem brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p.
78.
51
No Capítulo 15, adiante, falar-se-á especificamente do local onde foi proferida a sentença arbitral, pelos
impactos que se tem desta questão especialmente para efeito de identificação do pronunciamento, como
nacional ou estrangeiro.
52
Cf. Capítulo 7, item 7.3, adiante, e breves considerações a respeito das modificações trazidas pela Lei
13.129/2015 em “Anexo 2” deste “Curso”.
53
Mais a respeito se falará no Capítulo 7, adiante. Porém, desde já se aponta a opção da Lei de Arbitragem
por dispensar a necessidade da indicação de substituto, como fazia o art. 1.074 do CPC/1973 por ela
revogado.
54
55
Cf. acima, no Capítulo 4, item 4.2.1, discussão havia no passado a respeito da constitucionalidade da Lei de
Arbitragem, em função exatamente da tese da inafastabilidade da jurisdição estatal. Por certo, se defeitos
existirem na convenção, conforme a sua gravidade, igualmente a questão poderá ser apreciada e decidida
pelo Judiciário em momento próprio, e a este respeito confira-se o Capítulo 13 adiante, sobre a invalidação
da sentença arbitral. Cf., ainda, STJ, REsp 606.345/RS, j. 07.05.2007, rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ
08.06.2007, assim consignando: “A partir do instante em que, no contexto de um instrumento contratual,
as partes envolvidas estipulem a cláusula compromissória, estará definitivamente imposta como
obrigatória a via extrajudicial para solução dos litígios envolvendo o ajuste”.
56
Martins, Pedro Antonio Batista. Convenção de arbitragem. Aspectos fundamentais da Lei de Arbitragem.
Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 207.
57
O STJ estava indeciso quanto à incidência imediata da Lei de Arbitragem para as cláusulas arbitrais
celebradas antes da promulgação da lei – cf., em sentido contrário, uma das decisões proferidas no REsp
238.174/SP, Min. Antonio de Pádua Ribeiro, e no REsp 712.566/RJ, Min. Nancy Andrighi.
58
Particularmente, temos certa reserva a esta “renúncia tácita”: para nós, o correto seria só admitir a
revogação prévia, expressa, e de comum acordo naturalmente, para se permitir o ingresso da ação em
juízo estatal, e assim, verificada qualquer modalidade de convenção, o juiz poderia de ofício extinguir o
processo. Porém, não foi esta a opção do legislador.
59
Promovida entre 22 e 23 de agosto de 2016 pelo Centro de Estudos Judiciário do Conselho da Justiça
Federal. Cf. em “Anexo 7” o texto integral dos enunciados aprovados.
60
61
“Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: [...] VII – acolher a alegação de existência de convenção de
arbitragem ou quando o juízo arbitral reconhecer sua competência. [...]”. E, em face da decisão que
desacolher o pedido de extinção quando comunicado o reconhecimento da jurisdição arbitral, igualmente
caberá Agravo de Instrumento, na adequada interpretação do art. 1015, III, do CPC/2015, conforme
referido na nota de rodapé 20 do Capítulo 5 infra.
62
Dizia o texto, no pertinente: “Art. 301. Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar: (...) IX –
convenção de arbitragem; (...) § 4.º Com exceção do compromisso arbitral, o juiz conhecerá de ofício da
matéria enumerada neste artigo.”. Alguns autores, referidos até a 5.ª edição deste “Curso”, entendiam que
teria havido uma imprecisão no Código de Processo Civil de 1973 ao ser alterado apenas o inciso IX pela
Lei de Arbitragem. E assim, tanto a cláusula como o compromisso – espécies da convenção – ficariam
excluídos da apreciação espontânea do juiz, comportando análise apenas se provocada pelo réu; seria a
renúncia tácita, porém de ambas as partes, ao juízo arbitral; outros sustentavam inexistir equívoco ou
lapso na lei, justificando que como resultado do fortalecimento da cláusula compromissória, elevada à
categoria das objeções processuais, apenas ela poderia ensejar a extinção do processo de ofício pelo juiz, e
assim, apenas ao compromisso se dava oportunidade às partes para, no silêncio, concordarem tacitamente
com sua revogação. Na jurisprudência, embora por vezes não se perceba do acórdão claro conhecimento
sobre a distinção que há entre compromisso e cláusula, também se notava a divergência.
63
Neste sentido, TJPR, AgIn 892851-8 – 7.ª Câmara Cível, v.u., j. 14.08.2012, rel. Des. Denise Krüger Pereira, in
RT 927/983 com a seguinte ementa: “Arbitragem – Contrato – Cláusula de eleição de foro que não é
incompatível com a convenção de arbitragem, também prevista na avença – Interpretação sistemática do
acordado que direciona para a solução precípua da lide o Juízo arbitral, possibilitando, apenas
posteriormente, insatisfeita as partes, a sua verificação pelo Judiciário”, destacando-se a seguinte
passagem: “o STJ sufraga o entendimento de que a cláusula de eleição de foro não é incompatível com o
juízo arbitral, pois o âmbito de abrangência pode ser distinto, havendo necessidade de atuação do Poder
Judiciário, por exemplo, para a concessão de medidas de urgência; execução da sentença arbitral; a
instauração da arbitragem quando uma das partes não a aceita de forma amigável (REsp 904813/PR, 3.ª T.,
j. 20.10.2011, rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 28.02.2012)”.
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
7. DOS ÁRBITROS
2019 - 04 - 23
Curso de Arbitragem - Ed. 2018
7. DOS ÁRBITROS
7. Dos árbitros
ROTEIRO DE ESTUDOS
3. A escolha do árbitro
• Fases e procedimentos
• Arbitragem Multipartes
• Imparcialidades
• Independência
• Competência
• Diligência
• Discrição
• Código de ética
5. Do impedimento e suspeição do árbitro (arts. 144 e 145 do CPC/2015 e art. 14 e § 1.º, da Lei
9.307/1996)
SUMÁRIO
E, por polêmica inovação introduzida na Lei de Arbitragem pela Lei 13.129 de 26.05.2015, como
se verá (item 7.3, adiante), até mesmo nas instituições que possuíam “listas fechadas” de árbitros,
para prestigiar a necessidade de confiança das partes no árbitro, será facultado, de comum acordo,
afastar a restrição, para indicação de profissional estranho à relação, mediante avaliação da
escolha pela instituição (art. 13, § 4.º, na novel redação).
Ainda, necessário advertir que árbitro não é profissão, mas situação. O nomeado estará
investido da qualidade de árbitro, ou seja, ocupará esta posição, apenas no decorrer do
procedimento; ou, como insistentemente se afirma: ninguém é árbitro; e sim está árbitro.3
Diversamente de um juiz togado, a jurisdição do árbitro, tal qual a do colegiado arbitral (painel
ou tribunal) é temporária, não permanente. A jurisdição do árbitro é restrita ao procedimento no
qual foi investido. Nasce e desaparece com o procedimento, não transcende a este. Novo
procedimento, entre as mesmas partes, e quiçá relativamente ao mesmo contrato, reclama nova
investidura, com as formalidades daí decorrentes.
A instituição, quando a ela encomendada a arbitragem, atua, quando o caso, como órgão
delegado pelas partes para a indicação do julgador, mas não como órgão jurisdicional, ainda que
através de seu representante. Haverá, direta ou indiretamente, a escolha de uma pessoa física, a
quem será atribuída a qualidade de árbitro, com as atribuições e responsabilidades inerentes à
jurisdição a ser exercida, e independentes da instituição que prestará serviços meramente
cartoriais.
A especialidade do árbitro, por sua vez, pode ser em qualquer área do conhecimento,
inexistindo “reserva de mercado” aos advogados ou bacharéis em direito.5 Por certo, a maestria
em ciências jurídicas é a rotina da arbitragem, direcionando a verificação da habilidade do árbitro
na matéria objeto da demanda.
Painéis híbridos, compostos, então, com pessoas de diversas áreas do conhecimento, têm se
mostrado extremamente úteis em diversas situações, com proveitosos resultados na análise de
conflitos específicos, mas de toda a conveniência que a presidência fique aos cuidados de quem
tem intimidade com as questões jurídicas da arbitragem, pelas tarefas atribuídas ao presidente do
colegiado, a ser adiante indicadas.
A respeito de a conveniência da indicação do árbitro ser feita a quem tenha formação jurídica,
em razão das decisões jurídicas a serem tomadas na arbitragem, Paulo Hoffman escreve: “Se a lei
não exclui, tampouco obriga que o árbitro tenha formação jurídica, resulta que para ser árbitro
basta ter capacidade e confiança das partes, para ser resguardada a equidistância, a
imparcialidade e a justiça na decisão. Esquece-se, quando se afirma que o árbitro pode não ter
conhecimento jurídico, que durante o procedimento decisões com conteúdo jurídico precisam ser
tomadas. Interessante, sem dúvida, que o árbitro tenha sua especialidade na matéria que será
objeto de discussão, porém o conhecimento jurídico, quase na totalidade dos casos práticos, ainda
que se permita a decisão por equidade, é indispensável. Por tudo isso, independentemente da boa
intenção da lei, entendemos ser de todo conveniente que, se o árbitro for único, deverá ter
conhecimento jurídico, somente se pensando em divisão de especialidades quando três ou mais
forem os árbitros. Porém, se único for e não tiver conhecimento jurídico, poderá aconselhar-se ou
pedir parecer técnico de algum profissional jurídico de sua confiança, sem que haja necessidade
de as partes nomearem assistentes técnicos, porquanto já têm a prerrogativa de se fazerem
acompanhar por advogados, assim como desnecessária será a apresentação de quesitos, uma vez
que as manifestações das partes dispensam esse tipo de formalidade específica e própria”.7
Aliás, a Lei Modelo da Uncitral assim sugere em seu art. 11.1: “Ninguém poderá, em razão da
sua nacionalidade, ser impedido de exercer funções de árbitro, salvo convenção em contrário das
partes”.
Poderá apenas, conforme o caso, se desconhecer o idioma nacional, ser necessário apoio para
leitura ou tradução de documentos, para oitiva de testemunhas, para acompanhamento de
reuniões e audiências e até mesmo para produção de deliberações e decisões, mas nada impeditivo
da sua atuação. Aliás, nossa Lei permite seja a sentença proferida em idioma estrangeiro, ou em
mais de uma língua (comum na análise de contratos internacionais), além da escolha do território
onde será proferida (art. 10, IV) e desenvolvida (art. 11, I), e o direito aplicável (arts. 2.º e 11, IV). 9
Por expressa restrição Constitucional, o juiz togado está proibido de atuar como árbitro (art. 95,
parágrafo único, I, CF/1988),10 sob pena de perder o cargo (art. 26, II, a, Loman),11 salvo se
aposentado,12 pois haveria o desvio de sua finalidade precípua: exercer a judicatura.
O analfabeto é capaz,14 mas sua indicação mostra-se apenas hipotética, pois dificilmente
atenderá a expectativa de ser um expert em determinado assunto. Se em tese assim for eleito,
necessário será o apoio na leitura e escrita pertinentes ao desenvolvimento da arbitragem, tal qual
se faz quando o árbitro é estrangeiro.15
Como já sinalizado em outras oportunidades, a escolha dos árbitros dependerá da forma como
as partes estabeleceram a origem da arbitragem (cláusula ou compromisso), e qual espécie foi
adotada (institucional ou avulsa). Veremos separadamente as situações, mas são, em geral,
percorridas três fases: a indicação, a nomeação e a aceitação. Conforme o caso promove-se a
nomeação diretamente (pela instituição ou pelas partes se assim restou convencionado). Ficará
pendente nesta hipótese apenas a aceitação pelo escolhido.
Lembre-se, por exemplo, que a convergência de vontades quanto ao(s) eleito(s) de plano resolve
a questão da indicação; assim, se já constar(em) o(s) escolhido(s) no próprio compromisso ou
cláusula, não haverá expediente de indicação, mas nomeação direta já realizada (no pressuposto
de ter sido debatida e acordada previamente à convenção).
Raríssimas instituições (no Brasil ou no exterior) restringem a atuação sob sua gestão apenas
àqueles que constam de sua relação de árbitros. A chamada “lista fechada” permite à Entidade o
controle, em certa medida, da qualidade das decisões, pois nela integram aqueles profissionais que
previamente foram reconhecidos por um órgão (geralmente Conselho) da instituição pelos seus
méritos, sendo periódica também a revisão para manutenção ou alteração de nomes; e
acompanha-se a dinâmica dos árbitros no procedimento arbitral, uma vez que estes ficam sob os
cuidados da Entidade. Desta forma, esta opção de “lista fechada” teria algum sentido e razão de
existir.
Com mais frequência, e mostrando-se como a melhor opção entre os usuários da arbitragem,
encontram-se Câmaras em que o presidente do painel ou árbitro único deve ser um dos
integrantes da lista (sendo comum mesmo a estas, abrir exceções se justificada e/ou analisada a
indicação por presidente/conselho/diretoria ou outro órgão da Instituição). E assim, a indicação de
coárbitros, geralmente, é livre às partes (embora algumas também façam certas exigências, como
apresentação de currículo e sua verificação).
Embora menos comum, também existem instituições sem lista de árbitros, podendo-se referir
no ambiente internacional a 2 (duas) Câmaras das mais conceituadas: ICC (International Chamber
of Commerce) e LCIA (London Court of International Arbitration).
Este tema (lista fechada/aberta de árbitros) foi um dos que mais despertou polêmica durante os
trabalhos da Comissão do Senado formada para a elaboração do anteprojeto de Reforma da Lei de
Arbitragem, polarizadas as posições entre aqueles defensores da total autonomia das Câmaras
para preverem o que lhes aprouver nos respectivos regulamentos, e outros, em sentido contrário,
sustentando a necessidade de certa interferência nas Instituições, para obrigá-las a aceitar árbitros
outros que não aqueles constantes de sua lista.
Ao final, assim passou a ser a redação do § 4.º do art. 13 da LArb., com a alteração introduzida
pela Lei 13.129 de 26.05.2015: “Art. 13 [...]. § 4.º As partes, de comum acordo, poderão afastar a
aplicação de dispositivo do regulamento do órgão arbitral institucional ou entidade especializada
que limite a escolha do árbitro único, coárbitro ou presidente do tribunal à respectiva lista de
árbitros, autorizado o controle da escolha pelos órgãos competentes da instituição...”.
Certamente muito ainda se debaterá a respeito, não só quanto à essência da previsão, como
também a propósito de como seria o “controle da escolha” pela câmara, especialmente quanto ao
efeito da respectiva decisão. Por exemplo, recusada a escolha no controle exercido pelo órgão
competente da instituição, promove-se nova indicação, indefinidamente, até que algum árbitro
seja aceito, ou manter-se-á o(s) escolhido(s), transformando-se o procedimento em arbitragem “ad
hoc” (cf. Capítulo 5, item 5.3.2. Arbitragem ad hoc ou avulsa), substituindo o quanto previsto na
convenção a respeito. Sob este aspecto, entendemos que não se poderá impor à Instituição, contra
suas regras e em oposição à decisão do “órgão competente”, por mais imprópria que
eventualmente seja a conclusão, a obrigação de administrar o procedimento; não teria propósito a
intervenção na intimidade da entidade e deliberações com fundamentação ligada à estratégia e
valores interna corporis.
Desta feita, no embate final entre a vontade das partes e a decisão contrária da Instituição,
deve-se ter por afastada a administração do procedimento pela entidade escolhida, seguindo-se a
arbitragem ad hoc, ou administrada por outra instituição a ser escolhida pelas partes.16
Caso permaneça o conflito, agora unicamente entre as partes, limitando a opção entre seguir-se
a arbitragem ad hoc ou sob a forma institucional, uma vez que os árbitros, pelo contexto, já foram
eleitos, em nosso sentir, caberá ao judiciário resolver a questão, exclusivamente neste limite, como
se cláusula vazia houvesse, ou seja, na forma do art. 7.º da Lei. Assim, se terá o pior: a questão será
judicializada.
Sob outra ótica, indicado o “controle da escolha” pela instituição, pode parecer pouca a
alteração, mas não é, na medida em que a vontade das partes afasta a regra restrita (objetiva) do
regulamento, e a lei abre caminho para se provocar um órgão da instituição (conselho, por
exemplo) pontuando a escolha das partes. Este órgão, assim, terá a obrigação de se manifestar
sobre a indicação, para apresentar aceitação ou restrição justificada, mediante avaliação do caso
específico.
Considerando que a maioria das principais Câmaras já acolhia a indicação de coárbitros pelas
partes, mesmo não sendo da lista, mediante uma verificação na forma prevista no Regulamento,17
bem como a postura geralmente colaborativa dos “players” da arbitragem (especialmente os
advogados e profissionais potencialmente lembrados para atuar como árbitros) temos convicção
de que o debate será mais acadêmico do que prático. Ademais, as instituições que adotam listas,
atualmente possuem na relação um razoável número de nomes, extremamente qualificados, em
condições de atender a expectativa das partes (e demais coárbitros indicados por elas), sem vir a
ter a necessidade, por qualquer circunstância, de se aproveitar de outras indicações das partes.
Por outro lado, podemos afirmar que para as partes, ao invés de contrariar os raríssimos
regulamentos eventualmente rígidos e criar impasse com a Instituição já no início do
procedimento (inclusive com polêmica cuja conclusão é incerta no que se refere ao embate final
entre a posição da parte e do “órgão competente”), certamente será melhor prever a arbitragem
em instituição que em seu regulamento já permita a escolha independentemente do nome constar
de sua eventual lista (e tantas boas existem com esta característica; aliás, a maioria delas), ou até
mesmo prever a arbitragem “ad hoc” (diretamente ou diante da recusa do “órgão competente”),
pois tanto em uma como em outra situação não se enfrentará o embaraço a respeito da questão,
nocivo à esperada dinâmica de um procedimento arbitral.
Tenha-se presente, inclusive, que se inicia no Brasil o que já há em outros países: escritórios e
em São Paulo até mesmo um Tabelionato de Notas, aparelhados exatamente para prestar serviços
de apoio a arbitragens “ad hoc” (secretaria, salas, estrutura e administração de procedimento).
De qualquer forma, a alteração proposta, com todas as críticas que a propósito existem,
prestigia a vontade das partes na escolha do nome que tenha a maior confiança, fato este essencial
na arbitragem, como expressamente previsto no caput do art. 13 da Lei. A opção da comissão
elaboradora do anteprojeto, mantida no Congresso, foi neste sentido, e lembremos dos debates
intensos a respeito, inclusive nas audiências públicas, uma delas da qual participamos.18
Inexistente violação à Constituição, ou aos Princípios gerais da arbitragem, mas ao contrário, feita
a preservação da autonomia privada da parte no procedimento na ponderação entre os Princípios,
a opção agora é Lei, e espera-se que inovação não altere ou abale o quanto hoje se pratica na boa
arbitragem.
Com ou sem modificação legislativa, mesmo delegada à entidade à escolha do árbitro, fica
preservado o direito das partes de estabelecer critérios para a sua indicação, como acima referido.
Diante de uma cláusula vazia, ou nas situações em que este tratamento é adotado para
cláusulas patológicas, será necessária, como visto, a instauração do procedimento prevista nos
arts. 6.º e 7.º da Lei de Arbitragem para se obter o compromisso arbitral, no qual, então, é
obrigatória a indicação do árbitro, ou árbitros, (espontaneamente ou por decisão judicial,
conforme o caso) ou a delegação desta escolha a uma instituição arbitral (art. 10, I).
À exceção da nomeação pelo juiz no procedimento previsto no art. 7.º da Lei, nas várias
situações retratadas há envolvimento das partes na escolha do árbitro, de forma menos acentuada,
quando delegada a nomeação à instituição, e com total intensidade quando se faz a nomeação
direta, nestes casos não só prestigiando a autonomia da vontade, como enaltecendo a importância
desta figura no quadro arbitral.
Interessante19 questão que pode surgir é a relativa à indicação do árbitro nos procedimentos
multipartes (aqueles em que em um dos polos da relação jurídica ou em ambos há mais de uma
parte) com solução acanhada (ou até inócua como se verá), prevista na nova redação ao § 4.º do
art. 13 da LArb.20
Ao se ter acordo entre as partes, tudo se resolve, mas, verificado o conflito, surge o problema de
como se dará a indicação para aquele polo na demanda, formado por mais de uma parte. E a
preocupação também se volta à igualdade de tratamento entre as partes, pois se um dos polos
exerce o direito de indicar seu árbitro, seria inadequado que o outro, pela discordância entre as
partes, ficasse privado desta prerrogativa, impondo-lhe a aceitação da escolha da instituição ou
mesmo do juízo.
O ideal é que esta questão seja prevista na convenção, ou no regulamento da instituição eleita;
caso contrário, sem dúvida ensejará um conflito pré-arbitral cuja solução pode reclamar até a
intervenção do Poder Judiciário.
Como é de se notar na pesquisa realizada pelo GPA-PUC-SP, das 27 (vinte e sete) Instituições
Nacionais consultadas, 14 (catorze) possuem em seu regulamento previsão específica para
indicação de árbitro nos casos de arbitragem multipartes, ou seja, praticamente metade delas.
Destas 14 (catorze) com previsão a respeito, a quase totalidade (13 delas) traz a regra de
indicação pela Instituição para ambas as partes, e nenhuma respondeu que a Instituição indicará o
árbitro apenas para a que não entrou em consenso.
Desta feita, note-se a maior preocupação das instituições internacionais a respeito do tema,
embora se constate nas instituições nacionais mais renomadas a igual atenção.
A seu turno, a solução usual adotada pela quase totalidade das instituições, quando previsto o
impasse na arbitragem multipartes, é indicação pela Instituição de todos os árbitros das partes, e
não apenas daquele polo em que se instaurou a divergência.
Leonardo de Faria Beraldo, aponta precedente estrangeiro a respeito, citando o caso Dutco,
envolvendo as sociedades BKMI e Siemens, em uma arbitragem ocorrida em Dubai, anotando que
o Judiciário francês anulou a sentença arbitral por entender que houve violação ao princípio da
igualdade das partes em indicar árbitros, considerada a matéria de ordem pública. Também indica
precedente do Judiciário paulista neste sentido, relativo à arbitragem envolvendo o Banco
Santander de um lado, e Paranapanema e BTG de outro (Proc. n. 0002163-90.2013.8.26.0100 – 18.ª
Vara Cível23).24
Mesmo com estes precedentes, mantemos nossa posição pelos fundamentos acima
apresentados, ao menos enquanto inexistente previsão a respeito, como se verifica na legislação
espanhola.25 A igualdade das partes significa conceder a elas as mesmas oportunidades e direitos,
mas se por qualquer motivo alheio à iniciativa de uma, a outra não exercer a faculdade que lhe é
concedida, aquela primeira não pode ser prejudicada.
A opção eleita pelo CAM/CCBC, certamente, é adequada, mas repita-se que, na ausência de
previsão das partes ou do regulamento, a privação da escolha deve ser apenas àqueles que não
chegaram ao consenso na nomeação do árbitro.
A propósito da questão, a Lei 13.129/2015 introduz ao § 4.º do art. 13 da LArb. a previsão de que
a respeito: “deverá ser observado o que dispuser o regulamento aplicável”.
Com a devida vênia, como já falamos em edição anterior a respeito do então projeto, totalmente
inútil a proposta27, pois se não houver impasse, ou se prevista a solução no regulamento aplicável,
é evidente que estará superada a questão, independentemente de previsão na lei a respeito.
Parece ter passado despercebido nos trabalhos que o problema, como acima referido, ocorre
exatamente diante da falta de previsão no regulamento. E, assim, perdeu-se a oportunidade de se
trazer uma boa solução à questão, dentre as possíveis antes indicadas.
Por fim, anote-se que mais a respeito da indicação dos árbitros, inclusive com alguns detalhes
procedimentais a respeito, se verá no Capítulo 8, item 8.4 – Da instauração da arbitragem.
Limitando em certa medida a autonomia da vontade, estabelece a lei que a nomeação dos
árbitros será sempre em número ímpar (art. 13, § 1.º). E assim faz acertadamente, pois o colegiado
em número par poderia ensejar empate, inviabilizando, objetivamente, a solução do conflito – o
propósito do juízo arbitral.
Reforçando esta restrição, logo no § 2.º do referido artigo, fica estabelecida a presunção
absoluta de que delegaram aos nomeados, quando em número par, a indicação de mais um
árbitro. E inexistente acordo entre os nomeados, “requererão as partes ao órgão do Poder
Judiciário a que tocaria, originariamente, o julgamento da causa, a nomeação do árbitro, aplicável,
no que couber, o procedimento previsto no art. 7.º desta Lei”. E enquanto incompleto o colegiado,
não se terá por instituída a arbitragem.
Quando feita a opção por painel arbitral, superada a fase de impugnação dos árbitros eleitos
pelas partes, estes coárbitros, de comum acordo, escolhem o presidente. Se houver impasse, deve-
se observar o quanto a respeito estabelece o regulamento da instituição escolhida, de acordo com a
modificação introduzida pela Lei 13.129/2015 ao § 4.º da LArb.28
Anote-se que a previsão legal de aplicação do regulamento para solução da questão é supletiva
a eventuais critérios de escolha do presidente pelas partes na convenção, observado, ainda, o
quanto acima se disse a respeito da inovação legislativa a respeito da restrição à escolha do
presidente à lista da instituição (item 7.3).
Também não representará maior dificuldade real a solução indicada na reforma apenas para
arbitragem institucional, e não para arbitragem “ad hoc” (cf. Capítulo 5, item 5.3.2), na medida em
que inexistente “regulamento aplicável”, pois nos mais raros modelos de arbitragens avulsas,
geralmente para sua viabilidade já são definidas as regras de instauração do procedimento, nas
quais, se bem orientada a redação da convenção, esta questão estará contida. E se nada a respeito
se falar, aplica-se o previsto no § 2.º deste mesmo art. 13, segundo o qual, inexistindo acordo,
“requererão as partes ao órgão do Poder Judiciário a que tocaria, originariamente, o julgamento da
causa a nomeação do árbitro, aplicável, no que couber, o procedimento previsto no art. 7.º desta
Lei”.
A escolha do presidente do painel tem relevância, pois sendo vários os árbitros, “a decisão será
tomada por maioria. Se não houver acordo majoritário, prevalecerá o voto do presidente do
tribunal arbitral (art. 24, § 1.º, Lei 9.307/1996)”. Embora contida no capítulo da lei destinado à
sentença arbitral, esta regra vale para todas as decisões proferidas durante o procedimento; por
exemplo, se no colegiado cada qual sugerir um perito, diante do impasse prevalecerá a indicação
do presidente.
Ainda ao presidente são atribuídos, geralmente, pelas partes ou regulamento, poderes para
organização e desenvolvimento da arbitragem, com definição de etapas, prazos, providências,
datas de audiência, elaboração de relatório das decisões, nomeação, se o caso, de secretário,
encaminhamento da sentença às partes (art. 29 da Lei 9.307/1996) etc. Também ao presidente cabe
certificar a eventual falta de assinatura dos outros árbitros na sentença (art. 26, parágrafo único,
da Lei 9.307/1996).
Tal figura tem pertinência na arbitragem ad hoc, pois naquelas encomendadas a uma
instituição, estes serviços são oferecidos diretamente pelo órgão, embora nada impeça tenha o
procedimento administrado um secretário específico nomeado.
Permite a lei sua indicação pelo árbitro, ou presidente do painel, se este assim julgar necessário
(art. 13, § 5.º), ou seja, independente de previsão anterior comum entre as partes. Seu custo será de
responsabilidade das partes, e se não houver consenso, nem anterior previsão, deverá ser
estabelecido pelo árbitro (ou tribunal),29 integrando as despesas da arbitragem, tal qual honorários
periciais, diligências etc.
A mesma regra permite recair a nomeação em um dos árbitros, quando instaurado o painel,
porém, certamente inadequada centralizar numa só pessoa a dupla função, para não confundir
atribuições, poderes e competência. Agora, na diversidade de situações possíveis principalmente
na arbitragem ad hoc, pode ocorrer do próprio árbitro único ou até mesmo o presidente, avocar
estas atribuições e conduzir integralmente sob os seus cuidados com o regular desenvolvimento da
arbitragem, quando pouco complexas e de reduzido número de providências, sem sequer fazer
referência à figura do secretário.
Os predicados que se espera dos árbitros vêm previstos na própria Lei: “No desempenho de sua
função, o árbitro deverá proceder com imparcialidade, independência, competência, diligência e
discrição” (art. 13, § 6.º).
Antes de simples referência, estas qualidades do árbitro, com maior ou menor relevo,
representam princípios informadores da base de sustentação do sistema arbitral enquanto
instrumento adequado à solução de conflitos, através de um terceiro apto a exercer a jurisdição.
São inerentes a qualquer julgador, mas pertinente a sua indicação expressa na lei enquanto
conduta desejada.
E alguns destes atributos não têm mero caráter pedagógico, e seu desrespeito pode gerar sérias
consequências. Mais grave é a parcialidade, pois se considera causa para invalidação da sentença
arbitral (art. 32, VIII, c/c art. 21, § 2.º). A falta de independência enseja a recusa do árbitro (arts. 14
e 15). E a quebra da discrição pode ensejar responsabilidade civil do indiscreto.
Mesmo sem previsão pontual, mas contido na amplitude da diligência indicada na lei, deve o
árbitro ter disponibilidade de tempo. Faz-se esta anotação pois atualmente, na atuação nesta área,
temos deparado com indesejáveis situações em que árbitros extremamente conceituados e
talentosos acabam por assumir inúmeros procedimentos e, assim, comprometem o desempenho,
especialmente quanto à celeridade na condução dos processos.
Aliás, tão preocupante é esta questão que algumas instituições solicitam seja declarada pelo
árbitro indicado a sua disponibilidade de tempo para assumir a arbitragem,30 prestando esta
informação às partes.
Mesmo ausente previsão no regulamento, é dever do advogado das partes, ou delas por si
mesmas, questionarem o árbitro sobre sua disponibilidade de tempo, especialidade e eventuais
impedimentos profissionais para assumir o procedimento arbitral para o qual será convidado.
Já tratamos antes das qualidades indicadas na Lei, pois idênticas àquelas exigidas do mediador
e do conciliador; assim, remete-se o leitor ao quanto lá se disse a respeito.
Imparcialidade
Também deve o nomeado estar despido de diferenças ou preconceitos em relação a uma das
partes que possam influenciar suas decisões, pois tais sentimentos podem igualmente
comprometer sua imparcialidade, e aqui seria a parcialidade inversa, ou seja, capaz de prejudicar
uma das partes.
A imparcialidade se impõe independentemente de ter sido o árbitro nomeado por uma das
partes. Árbitro não é um assistente técnico ou defensor dos interesses daquele que lhe indicou. É
um terceiro isento (não neutro, como adiante se verá), convocado para julgar a causa de acordo
com seu livre convencimento. A confiança depositada no árbitro não atribui ao litigante o
domínio, controle ou qualquer interferência na convicção do indicado. Este deve ser livre para
decidir com entender correto, independentemente de quem venha a ser contrariado.
Neste sentido, cabe aos advogados da arbitragem a correta orientação aos clientes para não
confundirem a posição do árbitro indicado, e dele esperarem o quanto ele não pode oferecer.
Aliás, muitos sustentam até a impropriedade do árbitro “da parte”, entendendo ser mais
adequada, para prestigiar a imparcialidade, a indicação apenas em conjunto ou por delegação à
instituição reconhecida como idônea pela sua lista de experts.
Mas o bom senso, sem dúvida, tem grande valia neste momento.
Por fim, diferencia-se da imparcialidade a neutralidade. O árbitro, como todos, possui valores,
posições ideológicas, convicções sobre determinadas matérias por vezes inclusive tornadas
públicas.32 E estes elementos, por certo, naturalmente influenciam a tomada de decisões. E
impossível exigir-se a neutralidade.33
Ou, como bem destaca Selma Lemes: “Uma questão importante que se coloca quando se analisa
a figura do árbitro é saber se existe árbitro neutro, se o conceito de imparcialidade e neutralidade
são sinônimos. Efetivamente não são, pois não existe árbitro neutro, assim como também não
existe juiz neutro. Neutralidade não se confunde com imparcialidade. Não existe ser humano
neutro; não somos robôs, autômatos. O ser humano é fruto do meio em que vive, de suas
convicções religiosas, sociais, políticas etc., e é por elas influenciado. Portanto, não existe pessoa
neutra; obviamente, não existe árbitro neutro. A neutralidade pressupõe a indiferença, o que é
algo difícil de ser concebido. Ser imparcial é resolver a controvérsia de acordo com o seu livre
convencimento (art. 21, § 2.º, da Lei 9.307/1996), de acordo com o seu modo de entender e fixar
suas convicções sobre o assunto”.34
Independência
Muito próxima à imparcialidade, pois o resultado de sua falta compromete a isenção do árbitro
no julgamento, a independência é aferida sob critérios objetivos: inexistência de qualquer relação
de sujeição ou vínculo de natureza econômica, profissional, moral, social, afetiva com as partes.35
O objetivo também é preservar o livre convencimento do árbitro, esperando seja ele apto a
exercer a tarefa sem influência de elementos externos potencialmente comprometedores de sua
autonomia. As relações interpessoais dos envolvidos na arbitragem não podem perturbar a
liberdade de decidir segundo a convicção. E igualmente a avaliação desta qualidade se faz em face
de ambas as partes, independentemente de quem promoveu a indicação do árbitro.
Competência
Daí porque, como visto, podem as partes, na convenção, até mesmo estabelecer critérios para a
escolha do árbitro com base em elementos identificadores de sua competência (p. ex., titulação
acadêmica, tempo de atuação na área, publicação de livros) na busca da excelência na avaliação
do conflito.
Convém esclarecer que no juízo arbitral, tal qual no processo estatal, tem pertinência,
conforme o caso, a realização de perícia técnica. Quer se dizer, pois, que a capacidade e
conhecimento do árbitro não supre esta prova. São parâmetros diversos. Um julga, o outro faz a
constatação técnica de um fato. Espera-se, porém, do escolhido, pela sua intimidade com a matéria,
a maior percepção dos fatos, privilegiada compreensão dos acontecimentos, conferindo-lhe
melhores condições de avaliar o resultado da prova pericial produzida, inclusive pela potencial
dialética entre perito e assistentes técnicos das partes.
Diligência
O árbitro, neste contexto, afasta-se da inércia das partes, cabendo-lhe a busca da verdade,
ampliando, a seu critério, o espaço da prova, intervindo diretamente neste sentido, explorando e
esmiuçando os elementos apresentados pelas partes, e buscando outros, se e quando pertinentes,
com o objetivo de melhor resultado na instrução.
Daí, por certo, a necessidade de dedicação mais intensa (em tempo e qualidade) ao estudo do
litígio, inclusive com prévia preparação para o acompanhamento das provas (oral, documental,
pericial etc.).
Bem informado de tudo o quanto nos autos se contém, a participação ativa aparece também no
planejamento na condução e desenvolvimento do processo, cabendo ao árbitro refletir sobre as
etapas e oportunidade para os atos, estabelecendo o seu ritmo, na expectativa de aumentar o
proveito e rendimento das providências determinadas e praticadas, sempre respeitando o
procedimento descrito no regulamento da câmara escolhida.
Aliás, o verdadeiro significado da “identidade física do juiz” aqui se mostra presente, pois a
substituição do árbitro é remota, diversamente da rotina na troca de juízes togados, por promoção
ou remoção, não sendo raras as hipóteses em que em um mesmo processo, diversos magistrados
acompanham a instrução, vindo a decisão a ser proferida ainda por outro, com base no conteúdo
dos autos, sem colheita da prova aos seus cuidados.
Por fim, atenta-se que a desenvoltura do árbitro na condução do processo, ao lado de sua
expertise na matéria de fundo, são fatores de prestígio, e valorizam seu nome quando oferecido
para escolha das partes.
Discrição
A confidencialidade, embora seja um dos atrativos deste método de solução de conflito, pois
oferece às partes um local reservado para disputa de seus interesses preservando sua imagem ou
informações preciosas de seus negócios, não é determinada em lei, e, para ser obtida, depende da
vontade das partes expressa na convenção ou na indicação de entidade arbitral com indicação de
sigilo em seu regulamento (e a maioria assim estabelece). E assim previsto, muito mais se obriga o
árbitro do que à discrição.
Porém, mesmo sem confidencialidade, o árbitro deve ser discreto quanto a tudo que soube pela
sua atuação no procedimento, impondo-lhe abster-se de propagar ou mesmo comentar os fatos,
provas, detalhes, particularidades e intimidades do procedimento.
Ou seja, confidencialidade não se confunde com discrição. A primeira impõe o total silêncio
sobre o procedimento, inclusive nome dos envolvidos. Já por discreto, entende-se o
comportamento reservado do árbitro de evitar comentários sobre os conflitos a ele submetidos,
mantendo-se comedido, com reserva ou prudência quanto a informações obtidas.
Por outra ótica, é dever do árbitro a discrição até mesmo pelo dever de sigilo profissional, pelas
informações confidenciais a que tem acesso durante o procedimento.40
Iguala-se o efeito, entretanto, da violação destes deveres: impor ao faltoso indenização por
perdas e danos.
Inexiste em nosso sistema, norma jurídica estabelecendo um Código de Ética aos árbitros.
Porém, atentos à necessária identificação de condutas esperadas dos árbitros, o Conima – Conselho
Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem,41 e diversas instituições arbitrais seguindo os
parâmetros propostos por aquele, estabeleceram seus respectivos Códigos de Ética, com orientação
de comportamento, e, conforme o caso, regras para verificação do grau de envolvimento entre os
protagonistas da arbitragem (partes, advogados e árbitros). 42
Sendo universal a preocupação, a International Bar Association – IBA, em 2004 elaborou, com a
ajuda de 19 especialistas de 14 países diferentes, um IBA – Guia sobre Conflitos de Interesses na
Arbitragem Internacional com proveitosas orientações sobre questões envolvendo a conduta do
árbitro. E mesmo voltado o guia àquela arbitragem, tem grande valia para os procedimentos
domésticos, especialmente pela didática apresentação de suas diretrizes, veja-se:
Sugere a classificação de rol de circunstâncias, não taxativo, em três categorias, de acordo com
a respectiva gravidade: vermelha, laranja e verde, com impacto no afastamento do árbitro ou no
dever de revelar para avaliação dos interessados.43
Na red list, são elencadas situações que impediriam a aceitação ou manutenção do encargo
(non-waivable), como ser o indicado conselheiro, diretor, gerente ou membro do conselho de
administração de uma das partes diretamente ou por meio de suas coligadas. Mesmo neste grupo,
existem restrições sujeitas à renúncia da parte interessada, desde que delas tenham plena ciência;
são as waivable red list, apontando a situação de o árbitro ter prestado consultoria à parte ou sua
coligada, com eventual envolvimento prévio no caso, ou pertencer ao escritório de advocacia
responsável pela assessoria dos envolvidos. Vale dizer, presente a circunstância contida nesta
relação, caberá ao interessado, a seu critério, renunciar ao afastamento do árbitro.
Na orange list, são apresentadas situações específicas que, aos olhos das partes, podem suscitar
dúvidas justificáveis quanto à imparcialidade ou independência do árbitro, impondo assim ao
árbitro o dever de divulgar a existência destes fatos. E nas hipóteses retratadas, ficará implícita a
aceitação do indicado se, após tal divulgação, não for apresentada objeção em tempo hábil.
Extensa a lista, pode-se exemplificar com a atuação do indicado, ou seu escritório, em favor de
uma das partes ou suas coligadas nos três anos anteriores; atuação atual inexpressiva do escritório
do indicado em favor ou contra uma das partes, sem, contudo, envolvimento direto do árbitro.
Participação societária direta ou indireta em uma das partes.
Por fim, a green list apresenta situações nas quais, objetivamente, inexiste conflito de interesses
aparente ou efetivo, dispensando o dever de revelação, recorrendo-se para tanto ao princípio da
razoabilidade. Estão relacionados, como exemplo, contatos anteriores do indicado com a parte ou
seu advogado, atuação do árbitro com o advogado da parte em outro painel arbitral; filiação do
indicado à mesma entidade de classe ou organização social de uma das partes, e divulgação
anterior, pelo árbitro, de sua opinião geral sobre questão relacionada à matéria de fundo da
arbitragem, publicada em revista jurídica ou palestra pública.
Desta forma, pela proximidade com as partes, advogados, ou envolvimento com o conflito, o
árbitro, tal qual o juiz, espontaneamente, ou provocado pelos interessados, não poderá atuar no
procedimento.
Vale dizer, então, que não apenas as causas de limitação de atuação previstas do código
processual, como também outras próprias do sistema arbitral, mais abrangente, estabelecem
reservas à nomeação do árbitro.
Assim, a recusa, ou espontânea desvinculação, se verifica por ser o árbitro impedido (art. 14,
caput, retratando causas de impedimento e suspeição do juiz), ou suspeito (art. 14, § 1.º,
reportando-se à quebra de imparcialidade ou de independência), distinção esta, porém, que
nenhuma consequência prática traz, apenas serve para identificação das hipóteses, pois em
qualquer situação o resultado é o mesmo: vulnerar a indicação do árbitro.
Com solução diferente da adotada pelo Código de Processo Civil, no juízo arbitral pode haver
aceitação do árbitro com restrições, até mesmo no caso de impedimento absoluto previsto no art.
134 do diploma processual. Porém, para tanto, necessário o conhecimento da parte sobre as causas
de recusa e a sua anuência com a nomeação do indicado, tudo em sintonia com o princípio da
autonomia da vontade.
Importante, neste contexto, o conhecimento pelas partes dos eventuais pontos vulneráveis do
árbitro, daí o chamado dever de revelação.
Dever de revelação
A transparência do árbitro indicado não é apenas figurativa. Vem previsto na lei o dever de
revelar “qualquer fato que denote dúvida justificada quanto à sua imparcialidade e
independência” (art. 14, § 1.º, da Lei 9.307/1996), conhecido na doutrina americana como a
obrigação de Full Disclosure (revelação total).
Muito mais do que as causas de impedimento e suspeição previstas no Código de Processo Civil,
cabe ao indicado expor abertamente acontecimentos pessoais e profissionais envolvendo as partes
e o conflito, que aos olhos dos interessados possam gerar alguma dúvida quanto à imparcialidade
e independência.
Já se fez acima, a referência a códigos de conduta dos árbitros, então apontando situações onde,
pela maior ou menor gravidade dos fatos, a confiança da parte no indicado ficará comprometida. E
exatamente para o interessado aquilatar estas circunstâncias se mostra necessário o dever de
revelação.
Ainda, a obrigação de transparência se prolonga por todo o procedimento, e assim, se por fato
superveniente à indicação, nomeação e aceitação da investidura o árbitro vier a se envolver em
circunstância apta a gerar desconfiança, deve prontamente comunicar às partes. Da mesma forma
deve-se proceder com relação a fatos antigos, mas cujo conhecimento ou lembrança só agora
depois veio ao árbitro. E tudo, se não revelado, e se vier a ser decantado, pode comprometer o
procedimento.
Da recusa
Nesta oportunidade apenas se faz o alerta de que o árbitro indicado pela própria parte, ou em
conjunto, deve ser por ela direta e previamente investigado e avaliado, e assim, descabida a recusa
deste após a sua nomeação. Evidentemente, conduta posterior ou fatos anteriores só depois
descobertos autorizam a impugnação. De outro lado, o(s) árbitro(s) nomeado(s) pela Instituição e
pela outra parte, cumprido o dever de revelação, sujeitam-se à recusa por quem não participou da
indicação (art. 14, § 2.º, da Lei 9.307/1996),47 desde que manifestada na oportunidade correta, caso
contrário, pode-se considerar aceita a escolha.
Indicado e/ou nomeado poderá o árbitro escusar-se e assim negar a aceitação. Aliás, o eleito é
totalmente livre para assumir ou não o encargo, independentemente de qualquer razão,
dispensada inclusive a apresentação de justificativa. Até então, inexistente qualquer vínculo entre
os envolvidos.
Aceito o encargo, é possível ter o acolhimento da recusa oposta por uma ou ambas as partes,
afastando o escolhido. Ainda, espontaneamente ao eleito é facultado deixar a investidura. Nesta
hipótese, pertinente justificar a conduta, pois conforme o estágio do procedimento, este ato pode
ensejar indenização por perdas e danos.
Por fim, advirta-se, como é inerente à liberdade de opção: nas hipóteses em que a fidúcia no
árbitro é absoluta, e também base única para a escolha deste método de solução de conflito, as
partes podem, desde a convenção, ou no termo inicial de arbitragem, declarar, expressamente, não
aceitar substituto, extinguindo-se então o juízo arbitral na falta do eleito, como, aliás, já antes
mencionado (arts. 12, I e II, e 16, § 2.º, da Lei 9.307/1996).
Conferindo expressiva seriedade à tarefa exercida, e em certa medida até maior garantia às
partes, o art. 17 da Lei de Arbitragem equipara o árbitro, no exercício de suas funções ou em razão
delas, aos funcionários públicos para os efeitos da legislação penal.
Ainda, correta a interpretação feita por Alexandre Câmara, no sentido de que também o
árbitro, como tal, pode ser vítima de delitos praticados contra funcionários públicos, como, por
exemplo, corrupção ativa e desobediência, respectivamente tipificadas nos arts. 333 e 330 do CP.51
Por fim, o árbitro também terá as garantias legais a favor do funcionário público no exercício de
sua função, que vedam, por exemplo, o desacato, conforme tipifica o art. 331 do CP.52
Omite a lei quanto à responsabilidade civil do árbitro, embora faça uma superficial referência
em seu art. 14, do qual extraem alguns autores a sua previsão.
O tema é interessantíssimo, e foi muito bem tratado por Fernanda Rocha Lourenço Levy.53 Em
linhas gerais, há responsabilidade do árbitro sob duas perspectivas: uma enquanto “juiz de fato de
direito” (art. 18 da Lei 9.307/1996); outra, enquanto prestador de serviço vinculado aos
compromissos assumidos perante as partes.
E, “levando em conta os deveres atribuídos aos árbitros e que seu eventual descumprimento
pode gerar danos às partes envolvidas, não resta dúvida de que além do âmbito da
responsabilidade criminal, ao qual os árbitros estão legalmente sujeitos (art. 17 da Lei 9.307/1996),
também respondem civilmente pelos danos que causarem em razão de sua má atuação”.54
Enquanto julgador, responde pelos errores in procedendo, ou seja, por vícios de procedimento
capazes de acarretar a invalidação da sentença. Mas mesmo aqui, há necessidade de apuração de
dolo ou culpa grave, tal qual se pode apurar em face de um juiz togado.55
E assim deve ser, conforme escreve Joel Dias Figueira Júnior, “porque o árbitro exerce
verdadeira jurisdição privada que lhe é conferida no microssistema da Lei 9.307/1996, agindo
como juiz de fato e de direito (art. 18), tratando-se de garantia que confere ao jurisdicionado maior
segurança e confiabilidade no tocante à prática dos atos jurisdicionados”.56
Por sua vez, “ancorada na seara da responsabilidade civil contratual dos árbitros, temos que
sua responsabilidade é subjetiva, em razão do inadimplemento, por culpa ou dolo, das obrigações
assumidas com as partes que lhes ocasionara danos. Não há presunção de culpa ou uma conduta
de risco que inclua sua atividade no âmbito da responsabilidade objetiva”.57
Cabe registro, quanto a uma situação específica dentre eventuais outras distanciando as duas
perspectivas inicialmente apontadas: se extinto o juízo arbitral por inércia do árbitro em proferir
a sentença no prazo (legal ou convencional), após ser provocado para tanto, evidencia-se a
responsabilidade civil pelos danos causados.
Mas muito bem coloca a Professora em conclusão: “A experiência demonstra que o mundo da
arbitragem abarca, como regra, árbitros que possuem as qualidades acima apontadas (referindo-
se aos atributos do árbitro acima tratados) e ainda de grande experiência e notório saber. Raros
são os casos de responsabilização de árbitros por má conduta na gestão do conflito”.
Enquanto prestadora de serviço, responde pelas práticas adotadas tal qual qualquer outra
pessoa jurídica desta natureza. Assim, as irregularidades em suas atividades trazem
responsabilidade independente da atuação do árbitro, por exemplo, se o próprio órgão arbitral
quebrar a confidencialidade expressamente contratada (por previsão em seu regulamento em
razão do qual foi procurada).
Neste particular, a tendência cada vez mais presente é no sentido de fazer-se constar, nos
regulamentos, a total isenção de responsabilidade das instituições,59 inclusive ressaltando ser o
vínculo das partes estabelecido exclusivamente com os árbitros.
Mas, em nosso sentir, embora eficazes para a maioria das situações, estas exclusões previstas
no regulamento não bastam para eximir, em qualquer hipótese, a responsabilidade das entidades
que deverá ser apurada, com extrema atenção, de acordo com cada caso. Veja-se, por exemplo,
situação peculiar em que a instituição só permite a atuação de sua restrita lista de árbitros, em
confronto com outra na qual o julgador faltoso foi escolhido pelas partes. Enfim, muitos aspectos
merecem atenção, e a análise extrapola os limites deste “Curso”, apenas se fazendo o registro para
despertar a atenção do leitor.
Por fim, anote-se a expressa previsão da legislação espanhola (Ley 60/2003) a este respeito:
7.9. O árbitro como juiz de fato e de direito, sua autoridade e efeitos da sentença
Diz o art. 18 da Lei de Arbitragem: “O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que
proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário”.
Porém, ao se lembrar do sistema anterior, em que a lei exigia a homologação judicial também
do laudo nacional, e dúvidas existiam quanto à extensão das atribuições do árbitro, até diante do
impasse em se reconhecer sua jurisdição, compreende-se melhor o dispositivo.
O árbitro reconhece os fatos que lhe são apresentados, e aplica o direito. Exerce jurisdição
plena quanto à cognição do conflito. E assim, desempenha suas atribuições tal qual um juiz togado.
Muitos comentaristas da lei, por conta deste artigo referem-se ao poder do árbitro, à
semelhança do magistrado, mas o juiz, e apenas ele entre os dois, integra um Poder do Estado –
Poder Judiciário.
Limitada, assim, a atribuição conferida pela lei ao árbitro. O imperium para interferir
diretamente no mundo empírico, através de constrição ou outros atos coercitivos é restrito ao
juízo estatal.
Por outro lado, considerada a liberdade outorgada às partes quanto à definição do objeto da
arbitragem, de comum acordo pode-se restringir ainda mais a autoridade do árbitro, por exemplo,
e como se verá, para dele excluir a possibilidade de apreciação de pedidos cautelares ou de tutela
antecipada.62 Ao aceitar a investidura, o árbitro adere, e assim, se submete, ao quanto
convencionado pelos interessados.
O julgamento do árbitro, por sua vez, não se sujeita, em regra, a recurso: decide-se em instância
única. Querendo as partes um pronunciamento colegiado, devem assim estabelecer na convenção,
sendo, porém, por algumas instituições arbitrais, considerada como regra a formação do painel
arbitral para solução dos conflitos a ela encaminhados.
E a sentença, proferida por árbitro único ou colegiado, é considerada título executivo judicial,
independentemente de homologação (art. 515, VII, do CPC/2015; cf. também, art. 18 da Lei
9.307/1996 e Capítulo 12 adiante), diversamente do quanto previa o revogado (pela LArb.) art.
1.097 do CPC/1973.
CARMONA, Carlos Alberto. Árbitros e juízes: guerra ou paz? In: MARTINS, Pedro Batista;
LEMES, Selma Ferreira; CARMONA, Carlos Alberto (coord.). Aspectos fundamentais da lei de
arbitragem. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
COSTA, Nilton César Antunes da. Poderes do árbitro. São Paulo: Ed. RT, 2002.
NANNI, Giovanni Ettore. A responsabilidade civil do juiz. São Paulo: Max Limonad, 1999.
PINTO, José Emílio Nunes. Recusa e impugnação de árbitro. Revista de Arbitragem e Mediação.
n. 15. ano IV. São Paulo, out.-dez. 2007.
NOTAS DE RODAPÉ
1
“L’afirmatinon est connue: La qualité de l’arbitrage dépend d’arbord de la qualité des arbitres (‘Tant vaut
l’arbitre, tant vaut l’arbitrage’)”, cf. Tercier, Pierre. Roles et défis de l’arbitrage institutionnel. Revista de
Arbitragem e Mediação, número especial em comemoração aos 10 anos da Lei 9.307/96. vol. 9. p. 23. São
Paulo. abr.-jun. 2006.
2
Vale apontar que Selma Lemes atenta para a possibilidade da figura do árbitro arbitrador: “O ‘árbitro
arbitrador’ ou amigável compositor é aquele que deve decidir a controvérsia e ditar a sentença arbitral
obedecendo à prudência e à equidade e não estará obrigado a guardar em seus procedimentos e na sua
sentença outras regras além daquelas que as partes expressaram no ato constitutivo de compromisso
(arts. 223 do COT e 636 do CPC) e, se estas nada tiveram expressado, deverão atinar às regras estabelecidas
no Código de Processo Civil (art. 637 e segs.). Neste sentido, devem ouvir os interessados, agregar ao
processo os instrumentos que apresentem e praticar as diligências necessárias para conhecimento do
feito; enfim, dar guarida ao devido processo legal. O ‘árbitro arbitrador’ pode julgar sem atentar para os
procedimentos e prazos e formas previstas na legislação processual e não está obrigado a aplicar as regras
de Direito Material ao decidir” (Lemes, Selma. Arbitragem na administração pública – Fundamentos
jurídicos e eficiência econômica. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 246-247).
Aliás, chegou-se ao abuso de ser oferecida por instituições inidôneas “Carteira de Juiz Arbitral”, e o CNJ,
quando provocado pelo Conselho Federal da OAB, em 23.03.2010 registrou serem ilegais as carteiras
funcionais de árbitros, determinando o encaminhamento da questão ao Ministério Público Federal para
apuração e punição dos envolvidos. Cf., a respeito, o Conima, pelo site [www.conima.org.br].
Esse é o entendimento majoritário, cf. Câmara, Alexandre Freitas. Arbitragem. 3. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2002.p. 44; Guilherme, Luiz Fernando do Vale de Almeida. Arbitragem. São Paulo: Quartier
Latin, 2003. p. 101; Carmona, Carlos Alberto. Arbitragem e processo. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2009.p. 229.
Em sentido contrário, Pedro Batista Martins, reconhecendo, porém, que a função será, em última análise,
desempenhada por pessoa física (Martins, Pedro A. Batista. Normas e princípios aplicáveis aos árbitros.
Aspectos fundamentais da lei de arbitragem. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 291), e também ressaltando
que o representante legal da empresa, enquanto tal, praticará os atos na arbitragem, confira-se o que diz
Scavone, com as seguintes passagens ao se referir à exigência legal apenas de “pessoa capaz”: “Ora, é
cediço que as pessoas podem ser naturais ou jurídicas. Assim, é evidente que pessoa jurídica também é
pessoa, dotada, igualmente, de personalidade jurídica que, aliás, é distinta daquela atribuída aos seus
membros. (...) Nessa medida a pessoa jurídica produzirá a sentença arbitral devidamente representada,
posto que ‘obrigam a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos nos limites de seus poderes
definidos no ato constitutivo’ (art. 47 do CC). (...) Pode ser da confiança das partes uma pessoa jurídica
especializada em determinada matéria. (...) Não nos convence, portanto, a afirmação segundo a qual, em
razão de a atividade jurisdicional ser personalíssima, o julgamento somente poderia ser feito por pessoa
natural. Não se pode olvidar que a qualidade de personalíssima da atividade arbitral, como se costuma
sustentar para impedir o desempenho da função por pessoa jurídica, decorre do superlativo de ‘pessoal’,
que encontra sua origem no latim personale, ou seja, relativo ou pertencente à pessoa ou relativo a uma só
pessoa e, até, o significado de individual ou particular, que são características que não se divorciam da
existência ou da personalidade jurídica da pessoa jurídica. Ora, se esta pode ser titular, inclusive, de
direitos da personalidade (art. 52 do CC), inalienáveis, imprescindíveis e irrenunciáveis, pode,
evidentemente, desempenhar atividades reputadas como personalíssimas” (Scavone Junior, Luiz Antonio.
Manual de arbitragem, cit., p. 85-86).
5
Discordando desta orientação, cf. Paulo Fernandes Silveira: “Como consequência inevitável da limitação
imposta ao árbitro leigo para atuar na arbitragem, isto é, com competência restrita ao julgamento
excepcional por equidade, o procedimento da arbitragem, de modo geral, será conduzido por advogados,
já que o julgamento, com observância das regras de direito, constitui a forma usual e natural adotada na
legislação arbitral brasileira. Nesse passo, pode-se dizer que a lei que instituiu os juizados especiais (Lei
9.099/1995) andou mais de acordo com o paradigma americano, no que toca à arbitragem judicial, ao
consignar que “o árbitro será escolhido dentre os juízes leigos” (art. 24, § 2.º), sendo que os juízes leigos, de
acordo com essa lei, são, obrigatoriamente, advogados com mais de cinco anos de experiência (art. 7.º,
caput)” (Silveira, Paulo Fernandes. Tribunal arbitral – Nova porta de acesso à justiça. Curitiba: Juruá, 2006.
p. 95).
A prática demonstra que somente será nomeado árbitro quem possui expertise em alguma área do
conhecimento, isto é inclusive uma das vantagens da arbitragem, porém nada obsta a indicação de pessoa
“sem expertise”, mas de confiança das partes.
Hoffman, Paulo. Arbitragem: algumas dúvidas processuais práticas quando o juízo estatal é chamado a
intervir. In: Jobim, Eduardo; Machado, Rafael Bicca. Arbitragem no Brasil – aspectos jurídicos e relevantes.
São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 315.
Em sua clássica obra sobre o Estatuto do Estrangeiro, acrescentando que este entendimento não é
contrariado pelo art. 17 da lei relativo à equiparação do árbitro ao funcionário público, pois se trata de
“equiparação para efeitos da legislação penal”, verificadas as restrições aos estrangeiros para a ocupação
efetiva de cargos e funções públicas (indicadas pelo Autor às fls. 384); ou seja, para a apuração da
responsabilidade do árbitro há a equiparação, mas não se tem restrição para o exercício da atividade, pois
definitivamente não é cargo ou função pública (Cahali, Yussef Said. Estatuto do Estrangeiro. 2. ed. São
Paulo: Ed. RT, 2010. p. 369-384). A propósito, anote-se que o CAM-CCBC indica, em sua lista,
aproximadamente 35% de árbitros estrangeiros, sendo este percentual superior a 20% na CMA/CIESP.
Neste sentido, Carmona, op. cit., p. 202. Scavone, op. cit., p. 87; em posição contrária, Alexandre Feitas
Câmara (Arbitragem – Lei n. 9.307/96. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1997. p. 37), Paulo Furtado (Juízo
arbitral. Salvador: Nova Alvorada, 1995. p. 66) e José Carlos Barbosa Moreira (La nuova legge brasiliana
sull’arbitrato. Rivista dell’Arbitrato. fasc. 1, 1997, p. 1-18, esp. p. 7), todos sob o argumento de que o árbitro
que não se expresse em nosso idioma será incapaz de apresentar sua decisão por escrito. Hamilton de
Moraes e Barros, sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, defendeu a necessidade de o árbitro
estrangeiro conhecer a língua nacional (Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense,
1977. vol. IX, p. 493).
10
Art. 95, parágrafo único, da CF/1988: Aos juízes é vedado: I – exercer, ainda que em disponibilidade, outro
cargo ou função, salvo uma de magistério; (...).
11
Art. 26, I, a, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional – Loman: O magistrado vitalício somente perderá o
cargo: (...) II – em procedimento administrativo para a perda do cargo nas hipóteses seguintes: a)
exercício, ainda que em disponibilidade, de qualquer outra função, salvo um cargo de magistério superior,
público ou particular; (...).
12
Aliás, Carmona faz alusão a esta questão na prática norte-americana, destacando que lá “alguns juízes
aposentados (certamente os mais capacitados, que terão obtido destaque ao tempo em que faziam parte
do Poder Judiciário) poderão converter-se em excelentes árbitros, especialmente porque, livres da
burocracia estatal, estarão aptos a decidir com presteza e desembaraço” (Carmona, Carlos Alberto.
Arbitragem e processo, cit., p. 231).
13
Confira-se, especificamente sobe o tema, Parecer Administrativo 10/2017 da Dra. Juliana de Oliveira
Duarte Ferreira, confirmado pela Subprocuradora Geral do Estado, Dra. Cristina M. Wagner Mastrobuono,
com manifestação detalhada a respeito, aprovado pelo Procurador Geral do Estado, Dr. Elival da Silva
Ramos, em 28 de abril de 2017, no qual se concluiu: “(i) em tese, não há óbice constitucional ou legal à
atuação de Procurador do Estado de São Paulo como árbitro; (ii) da Lei Orgânica da Procuradoria Geral do
Estado de São Paulo decorrem, entretanto, limitações de ordem temporal (regime de 40 horas semanais de
trabalho) e material (conflito de interesses) ao exercício de tal função (iii) diante disso, recomenda-se que
a Corregedoria da Procuradoria Geral do Estado acompanhe o exercício da arbitragem pelos integrantes
da Carreira e avalie a conveniência de editar norma destinada a disciplinar o tema”.
14
A respeito da capacidade do analfabeto, Valéria Maria Sant’Anna observa que “a lei expressamente não
restringe a arbitragem aos analfabetos, como fazia a lei anterior (art. 1.079 do CPC [1973]); tendo em vista
que ficaria sem condições de cumprir a finalidade principal do compromisso que é a elaboração da
sentença, poderíamos entender que a lei tacitamente os reconhece como incapacitados, todavia o
parágrafo único do art. 26 é expresso: A sentença arbitral será assinada pelo árbitro ou por todos os
árbitros. Caberá ao presidente do tribunal arbitral, na hipótese de um ou alguns dos árbitros não poder ou
não querer assinar a sentença, certificar tal fato. Entendemos, por conseguinte, que o termo não poder
também pode acolher o analfabeto. Contudo, mesmo sendo um expert no assunto, infelizmente o
analfabeto terá dificuldades de se inteirar de todo o procedimento tendo em vista ser o mesmo todo
escrito, inclusive a decisão final” (Sant’anna, Valéria Maria. Arbitragem – Comentários à Lei n. 9.307 de 23-
9-96. São Paulo: Edipro. p. 43).
15
Ernane Fidélis dos Santos e Alexandre Câmara(Arbitragem. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 46)
não admitem, entendendo que o analfabeto não está apto a produzir a sentença arbitral por lhe faltar o
manejo do vernáculo. Já Antonio Corrêa(Arbitragem no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p.
80)e Welber Barral(A arbitragem e seus mitos. Florianópolis: OAB/SC, 2000. p. 23-24) admitem a nomeação
de árbitro analfabeto, sustentando que em algumas situações essas pessoas podem possuir conhecimentos
técnicos importantes, como é o caso de uma arbitragem envolvendo a disputa acerca de crias de animais
por camponeses. Carlos Alberto Carmona (Arbitragem e processo, cit., p. 202), mudando de opinião,
passou a tolerar a nomeação de árbitro analfabeto já que o Código de Processo Civil não mais o proíbe.
Reforça tal entendimento a circunstância de que o Código Civil também não taxa o analfabeto de incapaz
(arts. 3.º e 4.º do CC/2002).
16
E este resultado se terá tão só pela comunicação da recusa à administração do procedimento, por
deliberação da Instituição; vale dizer que, em nosso sentir, não cabe ação (no sentido de que deva ser
rejeitada a recusa à indicação, evidentemente) ou qualquer iniciativa que envolva a Instituição em
procedimento judicial buscando rever sua decisão ou pretendendo-lhe impor a gestão do procedimento.
17
Em recente pesquisa desenvolvida no Projeto III do Grupo de Pesquisa em Arbitragem – GPA da PUC/SP,
detectou-se na consulta a 25 Câmaras Nacionais, que 4 delas não tem lista de árbitros, 10 possuem lista
totalmente aberta, ou seja, sugestiva, e apenas 6 delas exigem que o presidente do painel (ou árbitro
único) seja integrante da relação, e ainda assim a maioria admite exceções. Ou seja, o problema decantado
na Comissão e trazido à norma é acadêmico, e não prático. O Grupo de Pesquisa em Arbitragem – GPA
criado no programa de pós-graduação da PUC/SP é liderado por este Autor, e o Projeto III, desenvolvido no
2º semestre de 2016, foi acompanhado pelos seguintes pesquisadores: André F. Albuquerque, Ciro Rangel
Azevedo, Gustavo Perez Tavares, Helena Bimonti, Isadora Urel, Letícia Ferreira Couto, Marcos Serra Netto
Fioravanti, Vivian Gerstler Zalcman, Viviane Rosolia Teodoro.
18
Com participação, inclusive, apresentando sugestões à Comissão, algumas delas acolhidas pelo
anteprojeto; cf. a respeito [www12.senado.gov.br/noticias/materias/2013/08/26/lei-de-arbitragem-
especialistas-querem-clareza-sobre-temas], e [www.cahali.adv.br], em “Notícias”, de 03.09.2013.
19
Anote-se a correta distinção lembrada por Leonardo de Faria Beraldo: “Pode-se definir arbitragem
complexa como gênero do qual são espécies a arbitragem multiparte e a arbitragem multicontratual.
Quando se tem mais de um contrato entre as mesmas partes ou não, e sem que a convenção de arbitragem
seja a mesma para todos eles (ou, pelo menos, compatível), fala-se em arbitragem multicontratual; já
quando houver um contrato com várias partes, então estaremos diante de arbitragem multiparte.”
BERALDO, Leonardo de Faria, Curso de Arbitragem: nos termos da Lei 9.307/96. São Paulo: Atlas, 2014, p.
115.
20
Assim: “nos casos de impasse e arbitragem multiparte, deverá ser observado o que dispuser o
regulamento aplicável”.
21
O Grupo de Pesquisa em Arbitragem – GPA criado no programa de pós-graduação da PUC/SP é liderado por
este Autor, e o Projeto II foi acompanhado pelos seguintes pesquisadores: Helena Bimonti, Isadora Urel,
Marcos Serra Netto Fioravanti, Najla Lopes Cintra, Pedro Guilhardi, Vivian Gerstler Zalcman, Viviane
Rosolia Teodoro. Cf. a respeito: Cahali, Francisco José. Árbitro de emergência e arbitragem multipartes –
Considerações gerais e resultado da pesquisa do grupo de pesquisa em arbitragem da PUC-SP – Projeto II –
2º Semestre de 2015. Revista de Mediação e Arbitragem, ano XIII, n. 51, São Paulo, out.-dez. 2016, onde o
resultado da pesquisa também foi publicado.
22
Esta solução pode ser adotada pela própria instituição, pois ao que se tem conhecimento, em todos os
regulamentos há previsão genérica de como serão resolvidos os casos omissos. Assim, esta solução pode
ser adotada pela Instituição na abrangência de sua possibilidade de resolver impasse diante da omissão do
regulamento.
23
Previamente à procedência parcial do pedido de anulação, foi deferida liminar de suspensão da eficácia
da sentença que, em sede agravo de instrumento, foi confirmada pelo TJSP (AI 0036343-44.2013.8.26.0000,
11.ª Câm., rel. Des. Gilberto dos Santos, j. 02.05.2013). O Tribunal, pela natureza do recurso, não se
aprofundou na tese, mas manteve a decisão de primeiro grau.
24
25
Cf. art. 15, 2, b, parte final: “En caso de pluralidad de demandantes o de demandados, éstos nombrarán un
árbitro y aquéllos otro. Si los demandantes o los demandados no se pusieran de acuerdo sobre el árbitro
que les corresponde nombrar, todos los árbitros serán designados por el tribunal competente a petición de
cualquiera de las partes”.
26
A respeito, escreve Frederico José Straube: “Notadamente, a regra geral cria desigualdades nos casos em
que há mais de dois polos contrapostos na relação processual, pois permite que o Requerente faça a
indicação de seu árbitro, enquanto compele todas as partes requeridas a entrar em acordo quanto à sua
escolha. Na tentativa de manter a igualdade em uma arbitragem multiparte, a solução adotada delega à
instituição, na pessoa de seu Presidente, todas as indicações, inclusive a nomeação do Presidente do
tribunal arbitral” (Straube, Frederico José. Uma primeira análise do novo Regulamento do CAM/CCBC.
Revista de Arbitragem e Mediação, n. 32, ano IX, São Paulo, jan.-mar. 2012, p. 236).
27
Endossando esta conclusão e as ponderações a seguir apresentadas, confira-se a detalhada análise feita
por Giovanni Bonato a respeito da reforma da Lei de Arbitragem. In: BONATO, Giovanni. La Riforma
Brasiliana Dell´arbitrato. Rivista Dell´Arbitrato, Anno XXVII Fasc. 1-2017, Milano: Diuffrè Editore, 2017. p.
34-86.
28
Cf. redação na nota 17 acima. A redação original deste § 4.º dizia que “4.º Sendo nomeados vários árbitros,
estes, por maioria, elegerão o presidente do tribunal arbitral. Não havendo consenso, será designado
presidente o mais idoso”. A previsão tinha como pressuposto que o colegiado era eleito integralmente
pelas partes, e sem maioria quanto a escolha do presidente; porém, o que ocorre é a indicação por cada
parte, de um coárbitro, e estes escolhem o terceiro presidente, e desta forma, esvazia-se a hipótese
prevista na norma revogada.
29
Registre-se posição diversa de Carlos Alberto Carmona, para quem, na falta de consenso entre as partes,
“deverá o secretário dirigir-se ao juiz togado para que seja fixado por sentença o valor de sua
remuneração” (Carmona, Carlos Alberto. Op. cit., p. 238). Parece-nos que a orientação de Carmona
somente dever ser utilizada se esgotada pelo secretário os meios para obter a fixação de seus honorários
no próprio procedimento arbitral, daí sim, restará apenas a via judicial, para a qual, inclusive, deve ser
demonstrada a iniciativa frustrada na sede arbitral própria.
30
Cf., a respeito, arts. 4.6 e 4.7 do Regulamento do CAM-CCBC, onde se prevê o preenchimento pelos árbitros
indicados de “Questionário de Conflitos de Interesse e Disponibilidade”.
31
Cf. José Cretella Neto, a respeito da imparcialidade do árbitro: “Isto significa que não deverá ter qualquer
interesse no resultado do litígio, exceto o de solucioná-lo segundo o estipulado pelas partes” (Cretella Neto,
José. Comentários..., cit., p. 90).
32
Quanto ao assunto vale pequena reflexão: pode o árbitro decidir contrário a tese doutrinária de sua
autoria pública e notória? Sim! Não obstante ser de extrema importância o estudo pelo advogado da
posição doutrinária do possível árbitro para a indicação, o árbitro deve ser imparcial (estado de espírito) e
independente (liberdade e autonomia para julgar) não se vinculando a posições anteriormente adotadas.
33
Em arbitragens internacionais, por ser mais difícil o controle, deve-se atentar a circunstâncias que
poderiam abalar a neutralidade do árbitro, levando-o, infelizmente a parcialidade, tais como: (a) políticas
sociais e/ou econômicas; (b) pressões da mídia; e (c) pressões da autoridade pública.
34
Lemes, Selma Maria Ferreira. Árbitro. Princípios da independência e da imparcialidade. São Paulo: LTr,
2001. p. 63.
35
Nas palavras de José Cretella Neto, a independência que dizer que o árbitro “não deve estar subordinado a
nenhuma das partes, seja por relação empregatícia, societária, política ou de qualquer outra ordem”
(Cretella Neto, José. Comentários..., cit., p. 90).
36
Vale lembrar que a Lei de Arbitragem somente determina árbitro capaz e de confiança das partes (art. 13).
Assim, recomenda-se que o árbitro tenha a competência técnica para julgar aquele conflito, mas nada
impede a indicação de árbitro sem tais atributos, mas de plena confiança das partes.
37
Neste caminho, o art. VII, item 2, do Código de Ética do Conima: “VII – O árbitro frente ao processo: 2.
Conduzir o procedimento com justiça e diligência”.
38
Lemes, Selma Ferreira. O papel do árbitro. Disponível em: [www.selmalemes.com.br]. Acesso em:
13.07.2015.
39
Confira-se José Cretella Neto, para quem diligência “significa que o árbitro deve zelar para que os
procedimentos sejam rigorosamente seguidos, inclusive quanto aos prazos; além disso, compromete-se a
estudar com afinco a causa, para entender melhor as nuances. Note-se que, pelo fato de a arbitragem não
admitir recurso, aceita-se com muito menor tolerância o erro do árbitro, ao contrário do processo judicial,
no qual, quando o juiz comete o erro, pode a parte inconformada reenviar a questão para que seja
novamente apreciada pela instância superior. Tanto a fundamentação da sentença judicial quanto o teor
do decisum servem como excelente fonte de fundamentos para alicerçar o recurso” (Cretella Neto, José.
Comentários... cit., p. 91).
40
Neste sentido o art. 448, II, do CPC/2015 (tb. assim o art. 229, I, do CC/2002) e o art. 154 do CP.
41
42
Cf., além do Código de Ética proposto pelo Conima [www.conima.org.br], o oferecido pelo CAESP
[www.caesp.org.br] e o mais detalhado apresentado pelo CAM-CCBC [www.ccbc.org.br].
43
Cf. a íntegra das “Diretrizes da IBA relativas a Conflitos de Interesses em Arbitragem Internacional”,
aprovadas em 22.05.2004 pelo Conselho da International Bar Association – IBA. Disponível em:
[www.ibanet.org].
44
“Art. 144. Há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo: I – em que
interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como membro do Ministério Público
ou prestou depoimento como testemunha; II – de que conheceu em outro grau de jurisdição, tendo
proferido decisão; III – quando nele estiver postulando, como defensor público, advogado ou membro do
Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou afim, em linha
reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive; IV – quando for parte no processo ele próprio, seu cônjuge
ou companheiro, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau,
inclusive; V – quando for sócio ou membro de direção ou de administração de pessoa jurídica parte no
processo; VI – quando for herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de qualquer das partes; VII – em
que figure como parte instituição de ensino com a qual tenha relação de emprego ou decorrente de
contrato de prestação de serviços; VIII – em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de
seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro
grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório; IX – quando promover ação
contra a parte ou seu advogado. § 1.º Na hipótese do inciso III, o impedimento só se verifica quando o
defensor público, o advogado ou o membro do Ministério Público já integrava o processo antes do início
da atividade judicante do juiz. § 2.º É vedada a criação de fato superveniente a fim de caracterizar
impedimento do juiz. § 3.º O impedimento previsto no inciso III também se verifica no caso de mandato
conferido a membro de escritório de advocacia que tenha em seus quadros advogado que
individualmente ostente a condição nele prevista, mesmo que não intervenha diretamente no processo.
Art. 145. Há suspeição do juiz: I – amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados; II
– que receber presentes de pessoas que tiverem interesse na causa antes ou depois de iniciado o processo,
que aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa ou que subministrar meios para atender às
despesas do litígio; III – quando qualquer das partes for sua credora ou devedora, de seu cônjuge ou
companheiro ou de parentes destes, em linha reta até o terceiro grau, inclusive; IV – interessado no
julgamento do processo em favor de qualquer das partes. § 1.º Poderá o juiz declarar-se suspeito por
motivo de foro íntimo, sem necessidade de declarar suas razões. § 2.º Será ilegítima a alegação de
suspeição quando: I – houver sido provocada por quem a alega; II – a parte que a alega houver praticado
ato que signifique manifesta aceitação do arguido.”
45
O Regulamento do CAESP, por exemplo, considera fundada a suspeição de parcialidade do árbitro que
tiver participado como mediador ou conciliador das partes, salvo se expressamente os litigantes
estabelecerem o contrário, conforme item 46, e, como assim também estabelece o Centro de Arbitragem da
Câmara Americana de Comércio de São Paulo – AMCHAM, conforme item 6.1 do seu Estatuto, e, com
idêntica restrição, o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá, nos termos
do item 5.2.(k) de seu regulamento.
46
Cf., a respeito, arts. 4.6 e 4.7 do Regulamento do CAM-CCBC, já citados, onde se prevê o preenchimento
pelos árbitros indicados de “Questionário de Conflitos de Interesse e Disponibilidade”.
47
“§ 2.º O árbitro somente poderá ser recusado por motivo ocorrido após sua nomeação. Poderá, entretanto,
ser recusado por motivo anterior à sua nomeação, quando: a) não for nomeado, diretamente, pela parte;
ou b) o motivo para a recusa do árbitro for conhecido posteriormente à sua nomeação.”
48
“Art. 16. Se o árbitro escusar-se antes da aceitação da nomeação, ou, após a aceitação, vier a falecer,
tornar-se impossibilitado para o exercício da função, ou for recusado, assumirá seu lugar o substituto
indicado no compromisso, se houver.”
49
Melhor seria a regra deste artigo, acima transcrita, referir-se apenas ao substituto “indicado pelas partes”,
pois não só no compromisso, como também na cláusula compromissória e até mesmo no termo inicial de
arbitragem (art. 19) as partes podem nomear substitutos.
50
Cf. §§ 1.º e 2.º do acima referido art. 16: “§ 1.º Não havendo substituto indicado para o árbitro, aplicar-se-
ão as regras do órgão arbitral institucional ou entidade especializada, se as partes as tiverem invocado na
convenção de arbitragem. § 2.º Nada dispondo a convenção de arbitragem e não chegando as partes a um
acordo sobre a nomeação do árbitro a ser substituído, procederá a parte interessada da forma prevista no
art. 7.º desta Lei, a menos que as partes tenham declarado, expressamente, na convenção de arbitragem,
não aceitar substituto”.
51
Câmara, Alexandre Freitas. Arbitragem, Lei 9.307/96. São Paulo: Lumen Juris, 1997. p. 49.
52
“Art. 331. Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela: Pena de detenção, de
seis meses a dois anos, ou multa.”
53
Levy, Fernanda. Da responsabilidade civil dos árbitros e das instituições arbitrais. In: Nery, Rosa Maria de
Andrade; Donninni, Rogério (org.). Responsabilidade civil – Estudos em homenagem ao Prof. Rui Geraldo
Camargo Viana. São Paulo: Ed. RT, 2009. p. 172-183.
54
Figueira Júnior, Joel Dias. A arbitragem, jurisdição e execução. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1999. p. 178.
55
Cf. a respeito, completo estudo feito por Nanni, Giovanni Ettore. A responsabilidade civil do juiz. São
Paulo: Max Limonad, 1999.
56
57
Levy, Fernanda. Da responsabilidade civil dos árbitros e das instituições arbitrais, cit.
58
Idem, p. 180.
59
Cf. o art. 10.7 do Regulamento do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá;
o art. 7.1 das Regras do Centro de Arbitragem da Câmara Americana de Comércio de São Paulo; e o art. 88
do Regulamento do Conselho Arbitral do Estado de São Paulo.
60
Além do cumprimento de sentença, por exemplo, para pagamento de quantia certa etc., também atos
como condução coercitiva de testemunhas, e constrições decorrentes de tutelas de urgência deferidas,
devem ser efetivados pelo Judiciário, não pelo juízo arbitral.
61
Martins, Pedro A. Batista. Apontamentos sobre a lei de arbitragem. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 307.
62
Cf., a respeito, Nanni, Giovanni Ettore. Recurso arbitral: reflexões. In: Guilherme, Luiz Fernando do Vale
de Almeida (org.). Aspectos práticos da arbitragem. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 161-188.
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
8. PROCEDIMENTO ARBITRAL
2019 - 04 - 23
Curso de Arbitragem - Ed. 2018
8. PROCEDIMENTO ARBITRAL
8. Procedimento arbitral
ROTEIRO DE ESTUDOS
• Etapa preliminar
SUMÁRIO
A meta é a sentença, com qualidade e rapidez.1 Daí os esforços para reduzir a burocracia, evitar
trâmites ineficientes, expedientes protelatórios ou inúteis, buscando um procedimento
pragmático, no sentido de obter o melhor resultado dos atos praticados.
Mas esta liberdade é vigiada, pois está presente na arbitragem o respeito ao princípio geral do
devido processo legal, pelo qual, como se verá, impõem-se regras de preservação do direito ao
contraditório, igualdade, imparcialidade do árbitro e seu livre convencimento.
Disciplinar o procedimento, como referido, pode ser feito diretamente pelas partes, em diversas
situações (compromisso, cláusula ou, mesmo já durante a arbitragem, através de termos
conjuntos), ou pela indicação da entidade arbitral, cujo regulamento conterá as regras a serem
observadas (arts. 212 e 5.º da Lei 9.307/1996).
As entidades arbitrais possuem regras básicas do procedimento, mas mesmo nas arbitragens
institucionais há margem para alguma interferência das partes quanto ao modo de proceder sobre
diversos aspectos, dependendo, evidentemente, de cada regulamento.
Embora constatada a diversidade de situações, cada qual com características próprias quanto à
disciplina do procedimento (pelas partes, pelo árbitro, pela instituição arbitral, pelas partes e
árbitros, ou ainda pelas partes e instituição), e apesar da ausência de regras legais, há certa
uniformidade, na prática, quanto ao desenvolvimento da arbitragem.4
E, com pequena interferência da norma, a moldura na qual devem se conter as iniciativas das
partes, árbitros e instituições consiste no respeito ao devido processo legal, com princípios
informativos contidos no art. 21, § 2.º, da Lei de Arbitragem.
Contidos na amplitude que se espera do devido processo legal (art. 5.º, LV, CF/1988),5 exercida a
jurisdição na arbitragem para a solução justa de um conflito, nem mesmo seria necessário ter a Lei
chamado os princípios do contraditório e igualdade das partes para aplicação no procedimento
arbitral. Mas mal não faz seu destaque na norma específica, pelo contrário, reforça a sua presença
no processo arbitral.
E a incidência destes princípios se faz em toda a arbitragem, não apenas nesta fase mais
voltada ao desenvolvimento dos atos. Vale dizer, então, que mesmo antes de instituída a
arbitragem com a aceitação do árbitro, mas ainda naquela fase preliminar para efetivação do juízo
arbitral (notificações, provocação da entidade etc.),6 mesmo omissa a Lei de Regência neste
aspecto, aplicam-se igualmente estes princípios.
A seu turno, na forma estabelecida pela lei, o contraditório, igualdade, imparcialidade e livre
convencimento, têm sua incidência cogente, e, como tal, não podem ser afastados pelas partes,
mesmo diante da marcante autonomia da vontade existente na arbitragem. Desta forma, se por
desconhecimento, descuido ou mesmo submissão de um à imposição do outro estas garantias de
um devido processo legal vierem a ser vulneradas, até mesmo na convenção arbitral, ou
posteriormente, cabe a qualquer momento a correção do rumo da arbitragem, pelo próprio
árbitro, tornando sem efeito o quanto estabelecido em contrário à lei.
E tão relevante é esta garantia de um procedimento adequado que sua análise comporta dupla
verificação: no próprio juízo arbitral, e, uma vez proferida a sentença, perante o Judiciário através
de ação de invalidação, prevista expressamente como causa, dentre outras, o desrespeito “aos
princípios de que trata o art. 21, § 2.º, desta Lei” (art. 32, VIII, da Lei 9.307/1996).
Especificamente com relação à imparcialidade do árbitro e seu livre convencimento, por ser a
confiança no julgador o alicerce do juízo arbitral, a falta destes atributos pode levar ao seu
impedimento na arbitragem (arts. 13, 14 e 15 da Lei 9.307/1996), que, se mesmo assim com ele se
desenvolver, conduz a sentença a vício específico: proferida por “quem não poderia ser árbitro”
(art. 32, II, da Lei 9.307/1996); ou seja, com base em dois dispositivos, pode ser buscada a
invalidação da decisão proferida sem isenção.
Também na amplitude deste princípio está o direito à ampla defesa, no sentido de se permitir
às partes a produção das provas pertinentes à demonstração de suas razões.
A igualdade das partes, por sua vez, manifesta-se pelo tratamento idêntico a ser propiciado pelo
árbitro aos envolvidos, em especial quanto às faculdades para a prática de atos, quer sejam eles
relacionados a manifestações em geral, inclusive relativos à indicação e impugnação de árbitros,
ou à produção de provas.
Note-se, nesta oportunidade, que a imparcialidade se impõe ao árbitro não apenas quanto à
análise da matéria de fundo (o conflito propriamente dito) a ser promovida na sentença, mas
igualmente quanto à condução do procedimento. E assim, também para o recebimento das
alegações e para o deferimento da prática dos atos, especialmente durante a instrução do feito,
deve o árbitro agir com isenção, até para não direcionar o julgamento. Assim, a garantia da
imparcialidade se exige a todo instante em que o árbitro atua.
Por derradeiro, traz a lei como princípio informativo do procedimento arbitral o livre
convencimento. Também aqui se reporta ao quanto se disse a respeito da independência do
árbitro,12 pois deve o julgador ter condições plenas de conduzir o procedimento e julgar sem
influência de elementos externos potencialmente comprometedores de sua autonomia e
imparcialidade.
Assim, tal qual todos os princípios acima, o livre convencimento é dinâmico, e se faz presente
em toda a gestão do procedimento, e não apenas quando da sentença final.
Mesmo não previsto no artigo em exame, o livre convencimento deverá ser motivado, pois a
fundamentação representa requisito obrigatório da sentença arbitral (art. 26, II, da Lei
9.307/1996). E é natural tal assertiva, pois no ambiente do devido processo legal não tem espaço o
livre arbítrio. Os atos jurisdicionais, por maior liberdade que se outorgue ao julgador, são
vinculados a atender à justa expectativa das partes na aplicação do direito. E, assim, a
fundamentação possibilita o controle da legalidade das decisões.
Do que se libera o árbitro, diferentemente do quanto ocorre no processo civil, é a sua restrição
aos critérios menos flexíveis da oportunidade para requerimento de provas, de distribuição do
respectivo ônus e etapas de sua produção, pois aqui não se tem aplicação direta das regras
processuais; merece anotação, porém, neste momento, o prestigioso avanço do quanto previsto no
Código de Processo Civil de 2015 a respeito do tema, conferindo maior versatilidade à instrução do
processo, inclusive como decorrência da possível realização de negócio processual (art. 190 e ss.,
do CPC/2015), e do chamado saneamento compartilhado (art. 357, do CPC/2015).
Por seu turno, a liberdade de avaliação da prova convive em harmonia com a autonomia das
partes em estabelecer regras próprias, na convenção arbitral, relativamente ao ônus da prova,
tema cuja análise será mais detida adiante.
Superada a primeira fase, com a instituição da arbitragem, exatamente pela ausência de regras
legais preestabelecidas ao progresso da arbitragem, e prestigiada a autonomia da vontade das
partes, respeitada a autoridade do árbitro ou atendido o regulamento da entidade, há o importante
momento de organização do procedimento, no qual se estabelecem quais, como e quando os atos
serão praticados, fixa-se o objeto do conflito, e assim se faz a “estabilização da demanda”.
Com esta rápida introdução, vamos analisar cada uma das fases, com seus incidentes e
particularidades, mas lembrando que todas elas já se referem à arbitragem, e assim, mesmo se
algum ato for realizado fora do juízo arbitral, se fazem com o império do sistema normativo deste
método de solução de controvérsia.
Como já se disse, a variedade das formas como se faz a opção pela arbitragem para solucionar
um conflito gera uma diversidade de maneiras pelas quais se promove o início do procedimento
em sentido amplo, ou seja, enquanto atos praticados com o objetivo de se levar o conflito ao palco
arbitral.
Mas, de um modo geral, teremos a etapa preliminar, de notícia do conflito à outra parte com o
requerimento de arbitragem a seu respeito. Em seguida, vem a etapa de indicação, nomeação e
aceitação do árbitro. Neste último momento, aceita a investidura pelo nomeado, ocorrerá a
instituição da arbitragem (art. 19 da Lei 9.307/1996), conferindo-se jurisdição ao árbitro, mas ainda
provisória, pois submetida à exceção de recusa do nomeado e impugnações quanto a vícios da
convenção, incidentes que na sequência são apreciados como derradeira etapa, para, então,
quando superados, e segundo o que a respeito se decidiu, seguir-se à fase subsequente de
organização da arbitragem.
Sendo avulsa, indispensável a indicação do(s) árbitro(s) (art. 10, II, da Lei 9.307/1996). E assim, a
ele(s) deve ser dirigido o pedido de início da arbitragem, para então, aceito o encargo, e assim
considerada instituída a arbitragem (art. 19 da Lei 9.307/1996), seguirem-se as regras
preestabelecidas, ou pelo próprio árbitro (ou painel) determinadas (art. 21, § 1.º, da Lei
9.307/1996), para a convocação do adversário para assinatura de termo de arbitragem, a ele
facultando a defesa, ainda restrita nesta oportunidade, na maioria das vezes, aos incidentes de
nomeação do árbitro e arguição de vícios da convenção.
A instituição arbitral fará a nomeação do árbitro (eleito pela parte ou pela instituição escolhido,
conforme o caso), dele colhendo a aceitação, conferindo-lhe a jurisdição, e, assim, instituindo a
arbitragem (art. 19 da Lei 9.307/1996).
Sendo prevista a formação de painel arbitral, a parte solicitada (requerida) será chamada para
a indicação do árbitro de sua escolha, para que este, em conjunto com aquele indicado pelo
solicitante (requerente), faça a escolha do presidente do colegiado.15
Sob outra perspectiva, se a arbitragem for eleita pelas partes em cláusula compromissória,
primeiro deve-se identificar seu conteúdo. Por sua vez, tratando-se de cláusula cheia, nela se
contendo a forma de instituir a arbitragem, esta deverá ser seguida.
Nesta situação, o interessado deverá promover sua iniciativa, primeiro extrajudicialmente, tal
qual previsto no art. 6.º da Lei de Arbitragem, já analisado, ou seja, “manifestará à outra parte sua
intenção de dar início à arbitragem, por via postal ou por outro meio qualquer de comunicação,
mediante comprovação de recebimento, convocando-a para, em dia, hora e local certos, firmar o
compromisso arbitral”, e diante da recusa ou omissão do convocado, deverá ser proposta “a
demanda de que trata o art. 7.º desta Lei, perante o órgão do Poder Judiciário a que,
originariamente, tocaria o julgamento da causa” (parágrafo único do art. 6.º referido), para se
obter o compromisso arbitral.
Pode-se notar que, curiosamente, os atos preparatórios ao juízo arbitral realizados nesta etapa
preliminar para provocar a sua instauração são, por vezes, providenciados de forma particular
(por via postal ou por outro meio qualquer de comunicação – art. 6.º da Lei 9.307/1996), e judicial
(através da citação da ação prevista no art. 7.º da Lei em estudo). Ainda, conforme a situação, sem
formalidade específica (solicitação dirigida ao árbitro potencial), ou com a forma prevista em um
regulamento de entidade arbitral. E tudo sem ainda se inaugurar a jurisdição arbitral.
De qualquer forma, sendo o caminho percorrido para se materializar o juízo, desde então, já
nesta etapa preliminar, aplicam-se as regras e princípios do sistema arbitral, e assim, tudo é
tratado como procedimento arbitral em sentido amplo.
Sob outro enfoque, mas no mesmo sentido do acima exposto quanto às providências
preliminares peculiares da arbitragem, com o objetivo de bem fixar as diversas possibilidades de
partida para o juízo arbitral, temos: arbitragem institucional, arbitragem com origem em cláusula
vazia e arbitragem ad hoc:
Por vezes a escolha é direta pela parte, mas pode ser também pela instituição eleita, ou ainda
pelo juiz, na hipótese de lá se terem as providências para a instauração da arbitragem.
Como visto com mais vagar no Capítulo 7, item 7.3 – A escolha dos árbitros, as partes podem
estabelecer o critério de indicação nestas situações, ou acolher o previsto no regulamento a
respeito. Mas omisso o regulamento parece que a melhor solução é considerar como não escolhido
o coárbitro por aquela parte composta por grupo de pessoas (multiparte). E como lá referido,
perdeu legislador uma ótima oportunidade de resolver a questão nestas hipóteses de impasse e
omissão a respeito no regramento das partes ou da instituição 17.
A etapa preliminar de instauração da arbitragem, como referido, tem seu êxito na aceitação do
árbitro indicado ou nomeado. Com esta aceitação, tem-se a investidura do eleito na jurisdição
relativa àquele conflito. E assim se considera instituída a arbitragem, nos termos do art. 19 da Lei
de Arbitragem, in verbis: “Considera-se instituída a arbitragem quando aceita a nomeação pelo
árbitro, se for único, ou por todos, se forem vários”.
Importante este momento, pois a partir dele se conta o prazo para ser proferida a sentença
arbitral (art. 23 da Lei 9.307/1996). Também relevante esta data, pois com a aceitação, passa o
árbitro a ter jurisdição sobre medidas de urgência pretendidas pelas partes (quando não lhe for
excluída esta atribuição, cf. Capítulo 10 adiante), e inclusive afastando, desde então, a jurisdição
estatal para processamento de cautelares antecedentes.18
Enquanto não aceita a investidura, pelo árbitro único ou por todos os nomeados, não se
considera instituído o juízo arbitral, ou seja, não se terá “jurisdição” arbitral propriamente dita.
A cláusula cheia, o compromisso ou mesmo a sentença judicial na ação própria para instituição
de arbitragem (art. 7.º da Lei 9.307/1996) não são suficientes para instaurar, por si sós, o juízo
arbitral, até então considerado apenas potencial, sendo necessárias as providências preliminares
acima referidas para o início do procedimento.
A seu turno, ausente previsão legal para a formalização da aceitação (inexiste exigência de
assinatura de termo de posse do árbitro), sua verificação é circunstancial. Encomendada a
arbitragem a uma instituição, esta certamente conterá procedimentos próprios para a
instrumentalização da aceitação, com a expressa aceitação pelo nomeado da investidura a ele
outorgada.19 Omisso o regramento da entidade arbitral, nada se referindo à convenção, ou se
promovida a arbitragem ad hoc, devem as partes cuidar para que seja documentada a aceitação do
árbitro e o início da arbitragem, para então poderem exigir seus efeitos (responsabilidade do
árbitro pela condução do processo e prazo para ser proferida a sentença).
Mesmo sem documento próprio, “a aceitação do encargo prova-se por todos os meios admitidos
em direito, e pode ser inclusive tácita: o árbitro que dá início aos procedimentos, mesmo sem ter
declarado aceitar a nomeação, acaba por atestar implicitamente sua concordância”.20
Indicado pela instituição, ou mesmo pela outra parte, o árbitro deve ser isento e
descomprometido, e, assim, deve inspirar confiança de todos os envolvidos, e não apenas daquele
que o elegeu.
O árbitro, previamente à aceitação da investidura, como já visto, tem o dever de revelar tudo o
quanto possa gerar dúvida justificada a respeito de sua imparcialidade e independência (art. 14, §
1.º, da Lei 9.307/1996). Como visto, é mais abrangente a apuração de isenção do julgador, pois não
limitada, embora aqui contida, às causas de impedimento e suspeição previstas no Código de
Processo Civil (art. 14 da Lei 9.307/1996; arts. 144 e 145 do CPC/2015).
A parte – ciente da aceitação do árbitro, não importa se com ou sem revelações, mas
entendendo existir, pelos fatos que tem conhecimento, causa de recusa – apresentará, então, a
exceção, com suas razões e provas pertinentes (art. 15 da Lei 9.307/1996). E “deverá fazê-lo na
primeira oportunidade que tiver de se manifestar, após a instituição da arbitragem” (art. 20 da Lei
9.307/1996).
A exceção de recusa de um árbitro cabe a qualquer das partes, mas por certo não àquela que
fez a sua indicação, pois, neste caso, evidentemente, se houver dúvida quanto à sua atuação,
bastará não indicá-lo, escolhendo outro.
Mas mesmo o eleito pela parte pode por ela ser impugnado, quando os motivos da recusa forem
posteriores à sua nomeação, ou só após tiver conhecimento destes fatos.
Diz a Lei de Arbitragem que a exceção deve ser apresentada na “primeira oportunidade que
tiver de se manifestar” (art. 20).
Assim, tratando-se de painel arbitral, em que um árbitro é eleito pelo solicitante, outro pelo
solicitado, a impugnação a este, excepcionalmente, pode ocorrer antes mesmo da instituição da
arbitragem (pois esta só se daria após a escolha e aceitação do presidente). Já a recusa ao
presidente, por qualquer das partes, será depois de instituído o juízo arbitral, pois então completa
a formação do painel arbitral (tribunal) com a aceitação deste.
Pode ocorrer, então, certa desordem no momento de apresentação da recusa, admitindo-se, por
vezes, a impugnação do árbitro antes mesmo de instituída a arbitragem, diversamente, pois, do
previsto na norma, mas tudo de acordo com regulamento ou regras previstas pelas partes, onde,
também, serão identificados prazos, pois ausente previsão legal a respeito.
Ainda de se notar que a causa para recusa pode vir a ocorrer posteriormente, ou só após a
instauração da arbitragem chegar ao conhecimento das partes. Nestas situações, a qualquer
momento poderá ser apresentada a exceção de recusa do árbitro. Ou seja, por motivo
superveniente, a todo instante cabe impugnação ao julgador para preservar a sua independência e
imparcialidade até o final do procedimento.
De outra parte, também a qualquer momento cabe ao árbitro declinar de sua investidura,
verificadas as causas de impedimento e suspeição. Faculta-se a renúncia, inclusive, por questões
de foro íntimo, dispensando, assim, a apresentação de detalhes sobre as razões de sua decisão.
Pela previsão legal, a exceção se dirige ao próprio árbitro, ou ao presidente do tribunal arbitral,
com as razões e provas pertinentes (art. 15 da Lei 9.307/1996).
Neste sentido, para decidir a questão o árbitro, ou o colegiado,26 já deve estar investido da
jurisdição, com a sua aceitação da nomeação e completa instituição da arbitragem (art. 19 da Lei
9.307/1996), daí porque a partir deste momento – instituído o juízo arbitral – é que se apresenta a
exceção de recusa (ou incidente de remoção).
Acolhida a impugnação, o árbitro será substituído por seu suplente, se houver (art. 15,
parágrafo único, c/c arts. 16 e 20, § 1.º, da Lei 9.307/1996). Na ausência de substituto, segue-se a sua
indicação ou nomeação como se fez para o árbitro originário, agora afastado, como antes já se
analisou (art. 16, §§ 1.º e 2.º, da Lei 9.307/1996).31 E tudo se repete, ou seja, abre-se nova
oportunidade para indicação, nomeação, aceitação e incidente de recusa ao novo convocado.
Permitido o incidente a qualquer momento, por fato superveniente, como visto, ao substituto é
facultado determinar a repetição de atos processuais ou de provas, para formar o seu livre
convencimento.
Rejeitada a arguição, “terá normal prosseguimento a arbitragem, sem prejuízo de vir a ser
examinada a decisão pelo órgão do Poder Judiciário competente, quando da eventual propositura
da demanda de que trata o art. 33 desta Lei” (art. 20, § 2.º, da Lei 9.307/1996).
Daí o extremo rigor com que deve proceder o julgador do incidente, merecendo a rejeição do
pedido detalhada motivação, para se preservar o quanto possível o juízo arbitral de futuro e
eventual ataque por esta questão perante o Judiciário.
Note-se, ainda, que a ação se propõe apenas quando do término da arbitragem, pois
direcionada à invalidação da sentença, sendo inapropriada, como regra, a iniciativa da parte em
provocar o Judiciário no curso da arbitragem, mesmo através de tutela cautelar ou antecipatória
de resultado futuro.32
O art. 20 da Lei também estabelece que na, primeira oportunidade, deverá a parte arguir
“questões relativas à competência” e “nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de
arbitragem”.
De pouca precisão técnica o art. 20 em exame, pois refere-se a “competência”, sem especificar a
lei o que nesta se contém;33 ainda, confunde o vício da convenção com seu efeito,34 e, por fim, faz-
se omisso quanto à amplitude com que se podem verificar os defeitos da convenção.
Por outro lado, também neste momento deve ser trazida eventual questão relacionada à
formação do juízo arbitral. Por exemplo, se dúvida houver quanto à instalação de painel ou
fixação de árbitro único, diante de eventual imprecisão da convenção, nesta oportunidade deve
ser solucionada, pois, instruída a arbitragem sem esta arguição, ter-se-á por aceita a forma
instaurada.36
Quanto aos efeitos da decisão, nesta situação de alegada falta de competência ou vício na
convenção, cabem, ainda, algumas ponderações.
Pelo sistema legal criado, como já estudado, o árbitro por primeiro tem a jurisdição para
avaliar a sua própria competência sobre a matéria que lhe é apresentada. Referindo-se a questões
de ordem pública, seu juízo positivo, ou seja, reconhecendo a jurisdição sobre o conflito, pode ser
revisto pelo Poder Judiciário apenas após ser proferida a sentença37 (sem prejuízo, evidentemente,
de eventual revisão no próprio juízo arbitral), e, nesta oportunidade, pode-se concluir pela
invalidação de todo o procedimento, excluindo, então, do palco arbitral a autoridade sobre a
matéria, reservando-a ao conhecimento exclusivo do juízo estatal. E assim, ao Judiciário caberá a
última palavra quanto ao juízo positivo da competência do árbitro.
Contém a regra elementos heterogêneos, cada qual com características próprias, e assim, deve-
se promover a análise separada de uma ou outra situações previstas em conjunto na norma.
Considerando, como já visto, que às partes é dado o direito de aceitar a investidura de árbitro
mesmo diante de eventuais elementos objetivos a ensejar seu impedimento e suspeição, pois mais
valerá a confiança na honestidade e honradez do escolhido, a falta de impugnação, no momento
apropriado, leva à presunção de que foi acolhida pela parte a nomeação, renunciando ao direito
de invocar este incidente.
E assim, restará vedada a arguição posterior no juízo arbitral ou estatal,39 sob pena de se criar
verdadeira insegurança jurídica: a parte somente arguirá recusa do árbitro se a decisão não lhe
for favorável.40
Não significa, porém, e esta assertiva é de extrema importância, que o árbitro estará livre para
julgar com parcialidade.
Desta forma, pode-se reconhecer a preclusão do direito de arguir a recusa, porém a omissão
quanto à instauração do incidente no momento apropriado não contamina o direito de a parte de
buscar um julgamento isento e imparcial.
Ainda, uma última observação quanto ao silêncio das partes, no momento inicial próprio para
incidentes de nomeação do árbitro: se não arguida a recusa também quanto ao desatendimento de
requisitos convencionados para a investidura do julgador (p. ex., como citado acima, exigência de
titulação acadêmica), considera-se superada a irregularidade. Assim, ter-se-á por tacitamente
aceita em definitivo a nomeação, em detrimento do quanto antes ajustado, impedindo que venha a
ser alegada a irregularidade no futuro, quer no juízo arbitral, quer em sede de ação anulatória de
sentença arbitral.42
(b) Quanto aos vícios da convenção
Assim, enquanto nulo, o ato não se convalida, e mesmo omissa a parte, o vício contamina todo o
procedimento, e compromete, inclusive, a sentença arbitral que estará exposta à invalidação nos
termos dos arts. 32 e 33 da Lei de Arbitragem.
Vale observar, porém, que o ataque à sentença arbitral tem prazo, aliás bem reduzido, de 90
dias, após o qual, pela decadência,43 não se poderá mais impugnar o decidido com fundamento
nestes arts. 32 e 33 referidos, muito embora, como se verá adiante (no Capítulo 13 adiante,
destinado à invalidação da sentença arbitral), encontra-se remédio excepcional para impugnar o
procedimento arbitral quando reconhecida a “inexistência” da jurisdição.
Mas, aqui nesta apresentação da cronologia, mais importante do que as datas é identificar e
conhecer o conteúdo da fase em que se está: instauração ou organização da arbitragem.
Pois bem, embora não previsto na Lei, muitos regulamentos estabelecem uma primeira
audiência, ou reunião, entre os interessados e o árbitro para a assinatura de um termo de
arbitragem, ou ata de missão. A inspiração desta providência, pelo que se noticia, vem das regras
de arbitragem da CCI, nas quais se prevê a realização do terms of reference44 muito mais
detalhado e abrangente do quanto se tem por aqui.
(a) No que se refere à convenção, o termo de arbitragem é importante para esclarecer dúvidas
ou sanar irregularidades e falhas que naquela eventualmente se contenha. E, para tanto, há
previsão legal: “Instituída a arbitragem e entendendo o árbitro ou o tribunal arbitral que há
necessidade de explicitar questão disposta na convenção de arbitragem, será elaborado,
juntamente com as partes, adendo firmado por todos, que passará a fazer parte integrante da
convenção de arbitragem” (art. 19, § 1.º,47 da Lei 9.307/1996).
Este adendo, então, complementa a convenção, inclusive, se for o caso, quanto aos poderes
conferidos ao árbitro, quanto à abrangência e extensão da arbitragem, além de dispor sobre
eventuais pontos relevantes àquele procedimento, conforme as circunstâncias (p. ex., sede, lei
aplicável, local de desenvolvimento da arbitragem etc.).
(b) quanto ao objeto da arbitragem, neste instrumento se faz a identificação das partes, seus
representantes e advogados, árbitros, local onde será proferida a sentença, local onde os atos serão
praticados (se distinto do anterior), lei aplicável, ou autorização para julgamento por equidade,
idioma em que será conduzida a arbitragem, identificação precisa do objeto do litígio (as questões
controvertidas), com detalhes de sua extensão, valor, responsabilidade pelo pagamento das custas,
honorários dos peritos e dos árbitros, dentre outros pontos relevantes que se entender
pertinentes.48 Também aqui devem ser especificadas peculiaridades procedimentais próprias do
respectivo litígio, como poderes do árbitro, a impossibilidade de ser proferida sentença parcial, a
maneira como serão praticados os atos processuais (v.g., protocolo eletrônico), e forma de
comunicação das decisões às partes (v.g., correio eletrônico), se diverso do previsto no
regulamento (mas por este permitidas estas adequações a critério das partes).
(c) por fim, pode e deve constar do termo de arbitragem o cronograma provisório que se
pretende seguir na condução da arbitragem. Por meio dele fixam-se prazos e etapas a serem
observados por todos os envolvidos na arbitragem (partes, árbitros, peritos etc.). Especificamente
quanto a prazos, temos adotado como regra, seguindo o exemplo de muitos, a indicação específica
do termo inicial e final para a prática do ato, e não do prazo propriamente dito para sua
realização.49
E seus resultados positivos foram tão reconhecidos pelos Processualistas que fizeram incluir no
Código de Processo Civil instrumentos de gestão do processo, como a previsão para celebração
pelas partes de saneamento compartilhado (art. 357 do CPC/2015), e de negócio processual (art. 190
e ss., do CPC/2015), inclusive, neste último, prevista a possibilidade de o juiz e as partes fixarem
“calendário para a prática dos atos processuais, quando for o caso” (art. 191 e seus §§, do
CPC/2015).O cronograma, como referido, é provisório, de tal forma que contingências podem
afetar a sua subsistência, possuindo o árbitro, naturalmente, autoridade para promover as
adaptações pertinentes.
Conveniente, em nosso sentir, que a ata de missão ou termo de arbitragem mais se aproxime do
modelo sugerido pela CCI, ou seja, contemple o maior conteúdo possível relativamente aos
aspectos próprios da arbitragem a que se refere e sua organização (cronograma).
Embora com significativa liberdade às partes para negociarem o quanto pertinente no termo de
arbitragem, é evidente que não se poderá nele violar normas cogentes e princípios estruturantes
da arbitragem como, por exemplo, do contraditório, ampla defesa e igualdade das partes.
Aliás, como referido, por vezes é tratado como ata de missão, adaptando-se nomenclatura
estrangeira, mas sem importar a seus requisitos e extensão.
Fato é que, no início do procedimento, neste momento aqui identificado como de organização
da arbitragem, costuma-se promover um instrumento com o objetivo de preparar o processo para
a fase de seu desenvolvimento, na qual serão concentrados os esforços no debate, instrução e
solução da matéria de fundo, superando questões periféricas que podem causar turbulências no
andamento do feito.
De outra parte, diante da pluralidade de seu conteúdo, como acima referido, cada qual deve ser
analisado separadamente quanto à ausência de assinatura de uma ou ambas as partes.
Nesta fase, como se viu, o árbitro já possui jurisdição plena51 sobre todas as questões
envolvendo o conflito. Ao árbitro cabe apreciar a sua própria competência, e assim, a extensão dos
poderes que lhe foram outorgados pela cláusula, decidindo sobre sua abrangência. Tem, ainda,
autoridade para disciplinar o procedimento, na falta de estipulação ou consenso entre os
envolvidos. E tudo o quanto decidir, então, impõe-se às partes.
Diante desta situação, recusando-se uma das partes, ou ambas, à assinatura do termo, tudo o
que nele se contém pode ser objeto de decisão do árbitro, como ordem processual. Assim, não
importa o nome, mas o fato é que as deliberações, enquanto tais, consensuais ou por determinação
do árbitro, passam a ser imperativas.
Apenas se faz uma observação quanto ao “adendo” previsto no § 1.º do art. 19 da Lei de
Arbitragem. 52 Enquanto tal, ou seja, “adendo”, e com expressa previsão, necessário será observar
os seus requisitos, dentre eles a elaboração conjunta com as partes.
Neste sentido, o adendo do artigo em exame exige, obrigatoriamente, o consenso retratado pela
assinatura conjunta, até porque “passará a fazer parte integrante da convenção de arbitragem”,
pressupondo a voluntária aceitação. A recusa à sua assinatura torna inválido o ato.53
Mas, repita-se, o árbitro tem autoridade e competência para decidir sobre as dúvidas, lacunas
ou falhas da convenção, emprestando-lhe a interpretação que entender mais adequada,
respeitados, evidentemente, seus limites.
O “adendo” da lei pode ser incluído no instrumento, mas este não se limita, necessariamente,
àquele. Constado no termo o “adendo”, na amplitude referida na norma, indispensável o consenso.
Se, porém, ausente a assinatura de uma das partes, não terá como “adendo”, mas como decisão do
árbitro, no exercício da jurisdição, o que no termo se contém a respeito, e tudo o mais relativo às
outras questões (regras de procedimento e organização geral da arbitragem).54
Sob outra perspectiva, ainda, deve ser considerado o quanto previsto em regulamentos de
entidades arbitrais a respeito. Isto porque, encomendando a partes a arbitragem a uma instituição,
aderem às suas regras, submetendo-se ao quanto nelas previsto.
Desta forma, em conclusão, o adendo da lei pode integrar o termo, e assim, se pela identificação
do regulamento ou do árbitro este termo é mais abrangente e representa a deliberação, consensual
das partes, ou decidida pelo julgador com a autoridade que lhe é própria, sobre questões
relacionadas à competência e procedimento, presente estará o seu caráter impositivo
independente da assinatura das partes.56
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de Mauro Cappelletti e Bryant Garth. In: CAHALI, Francisco, José; RODOVALHO, Thiago e FREIRE,
Thiago (coords.). Arbitragem – Estudos sobre a Lei 13.129, de 26-5-2015. São Paulo: Saraiva, 2016.
NOTAS DE RODAPÉ
1
A respeito da celeridade da arbitragem, Beat Walter Rechsteiner acertadamente aponta para o fato de que
“não se pode esquecer, no entanto, que o árbitro é juiz de fato e de direito e que a seriedade do
procedimento arbitral deve predominar em relação ao princípio da celeridade. Somente assim a
arbitragem constituirá uma verdadeira alternativa para a justiça estatal” (Rechsteiner, Beat Walter.
Arbitragem privada internacional no Brasil depois da nova Lei 9.307, de 23.09.1996 – Teoria e prática. São
Paulo: Ed. RT, 2001).
“Art. 21. A arbitragem obedecerá ao procedimento estabelecido pelas partes na convenção de arbitragem,
que poderá reportar-se às regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada, facultando-
se, ainda, às partes delegar ao próprio árbitro, ou a Câmara Arbitral, regular o procedimento.”
Esclarece Irineu Strenger: “Este artigo traduz de maneira adequada o tratamento a respeito das opções
possíveis no estabelecimento das convenções de arbitragem. Realmente, a maioria dos sistemas arbitrais
vigentes reconhece uma grande liberdade na determinação das regras de procedimento. Admite-se
mesmo recurso a regras transacionais resultantes de análises do direito comparado ou da observação de
jurisprudência arbitral. Tem-se, inclusive, acatado combinar as disposições de diversas leis ou mesmo
abster-se de determinar com antecipação regras ou dificuldades procedimentais que encontrarem à
medida que as mesmas surgirem. Vale dizer que a colocação da presente disposição leva à conclusão de
que se reconhece, às partes e subsidiariamente aos árbitros, uma grande liberdade nesse domínio”
(Strenger, Irineu. Comentários à lei brasileira de arbitragem. São Paulo: Ed. LTr, 1998. p. 123).
Devem as partes, entretanto, cuidar para não redigirem tantos detalhes que levem a ser vulnerada a
convenção, ou mesmo considerada patológica a cláusula compromissória, por incoerências, ou mesmo
total inviabilidade de efetivação do quanto estabelecido.
Neste tema, recomenda-se a leitura de Luiz Olavo Baptista, que, aproveitando de sua sabedoria e larga
experiência em arbitragem, com clareza e objetividade apresenta “Notas Práticas” bem criadas e
desenvolvidas para a orientação de quem pretende exercer a arbitragem (Baptista, Luiz Olavo.
Arbitragem comercial e internacional. São Paulo: Lex Magister, 2011).
Cf. interessante decisão sobre o procedimento escolhido entre as partes e o devido processo legal, em que
o Tribunal de Justiça de São Paulo deixa claro que não há ofensa ao princípio constitucional a submissão
às regras da instituição, proferida no TJSP, ApCiv 1048762-0/2, 31.ª Câm. Civ., j. 29.04.2008, rel. Des.
Francisco Casconi.
Daí por que o registro, ao se estudar o procedimento do art. 6.º e a ação do art. 7.º da Lei de Arbitragem, de
que no processo assim instaurado indispensável garantir ao réu o direito ao contraditório; cf., a respeito,
Capítulo 6, item 6.2.2.
Importante preservar este direito; porém, se a parte se utiliza da faculdade ou permanece inerte, é
irrelevante.
10
Neste sentido, Carlos Alberto Carmona bem elucida a questão, lembrando que no processo estatal, “o
equilíbrio das partes não é a regra, e a participação no processo não é voluntária, mas sim obrigatória. Se
no processo judicial a intervenção estatal é necessária para equilibrar partes ontologicamente desiguais,
no processo arbitral esta intervenção pode ser confortavelmente dispensada. Assim, enquanto a paridade
de armas é uma inquietação para o juiz togado – a ponto de a Lei 9.099/1995 ter determinado que,
comparecendo uma das partes acompanhada de seu advogado, caberá ao Estado proporcionar
representação técnica para o adversário –, o árbitro não deverá preocupar-se com o tema, estando na
esfera de disponibilidade das partes nomear ou não advogados, pois pressupõe-se que os litigantes, ao
escolherem a via arbitral, estejam bem informados sobre suas possibilidades e dificuldades, até porque
elegeram livremente o procedimento que pretendiam ver aplicado à solução da controvérsia. Da mesma
forma, não haverá preocupação com ampliação de prazo para um dos litigantes (como técnica de
nivelamento entre partes desiguais), dispensa de cauções, redução de verba honorária para este ou aquele
litigante, o que revela desde logo que, figurando o Estado (em sua forma autárquica ou nas vestes de
empresa pública, para ficar nos exemplos mais factíveis) como parte em juízo arbitral, não poderá invocar
qualquer das prerrogativas de que goza no processo estatal” (Carmona, Carlos Alberto. Arbitragem e
processo. São Paulo: Atlas, 2009. p. 296).
11
12
Cf. Capítulo 7.
13
Quanto ao procedimento, também merece registro o entendimento de Pedro A. Batista Martins, para
quem a arbitragem se divide em três fases: (i) fase pré-arbitral, (ii) fase arbitral e (iii) fase pós-arbitral.
Assim, o autor nos explica que “a fase pré-arbitral se inicia com a assinatura da convenção de arbitragem,
mas se mantém dormente até o surgimento do conflito. Ela se prolonga até a aceitação da nomeação dos
árbitros. Deve-se entender que a aceitação pelos árbitros da função não põe termo à fase pré-arbitral, pois
esta somente se completa com a efetiva confirmação dos árbitros, após submetido o Termo de
Independência às demandantes. Antes dessa confirmação, dos árbitros podem até ter aceito, mas ainda
não foram confirmados. E pode, mesmo, nem vir a ser confirmados, caso haja algum fato que denote
dúvida justificada quanto à sua imparcialidade e independência”. Na fase arbitral: “Instituída a
arbitragem, é dos árbitros, e somente deles, a jurisdição pra resolver a disputa definida no Termo de
Arbitragem. O procedimento estabelecido pelas partes deverá ser seguido e a sentença pronunciada no
prazo pré-fixado”. Por fim, a fase pós-arbitral se verifica quando, “esgotada a jurisdição arbitral, com a
prolação da sentença final e eventual decisão em sede de embargos arbitrais, cabe à parte não vitoriosa
cumprir o julgado, exceto se a sentença for passível de ação de nulidade (anulabilidade) por infração a
uma das hipóteses contempladas no art. 32 da Lei 9.307/1996” (Martins, Pedro A. Batista. As três fases da
arbitragem. Revista do Advogado. ano XXVI, set. 2006, p. 88). Ainda a respeito das fases do procedimento
arbitral, recomenda-se a leitura de Dinamarco, Cândido Rangel. A arbitragem na teoria geral do processo.
São Paulo: Malheiros, 2013. Item 34, p. 110-112.
14
Importante observar, a modificação do § 4.º do art. 13 da LArb., introduzida pela Lei 13.129/2015 no
sentido de permitir, mediante certo controle da instituição, a prevalência da vontade das partes em
detrimento do regulamento a respeito da limitação da escolha de árbitro, coárbitro ou presidente do
tribunal à respectiva lista, conforme anotado no Capítulo 7, item 7.3.
15
Sobre a maneira de solucionar os conflitos decorrentes da eleição do presidente do tribunal arbitral, cf. o
quanto se disse no Capítulo 7, item 7.3.2, supra.
16
Liliana Bertoni explica o modo como se dá a arbitragem ad hoc no Mercosul: “Al ser el arbitrage un
método ágil aplicable a las controversias em asuntos comerciales, en muchos de estos esquemas se lo ha
elegido como método para superar las disputas. En este caso es importante recordar que el arbitrage – al
que comúnmente se lo denomina como un método alternativo se solución de las controvérsias – pasa a ser
en estos esquemas uno de los métodos posibles para lograr superar un litígio dentro de esto espacio
integrado, que por lo general es acompañado por algún outro método que lo complementa. En los espacios
integrados, los particulares sólo se encontrarán legitimados para actuar dentro de esse espacio jurídico
ampliado si los Estados han decidido otorgale tal legitimación. En el caso del Mercosur, el procedimiento
establecido para el reclamo de particulares (Capítulo XI del Protocolo de Olivos) continúa com la
legitimación indirecta que otorgaba el Protocolo de Brasilia, al expresar que los particulares deberán
presentar sus reclamos ante la Sección Nacional del Grupo de Mercado Común del Estado Parte donde
tengan su residencia habitual o la sede de sus negocios” (Bertoni, Liliana. Laudos arbitrales en el
Mercosur. Buenos Aires-Madrid: Ciudad Argentina, 2006. p. 101).
17
Cf. ainda, Cahali, Francisco José. Árbitro de emergência e arbitragem multipartes – Considerações gerais e
resultado da pesquisa do grupo de pesquisa em arbitragem da PUC-SP – Projeto II – 2º Semestre de 2015.
Revista de Mediação e Arbitragem, ano XIII, n. 51, São Paulo, out.-dez. 2016.
18
STJ, EDCL no REsp n. 1.297.974, 3.ª T., j. 28.12.2012, v.u., rel. Min. Nancy Andrighi.
19
No Centro de Arbitragem e Mediação da CCBC, por exemplo, firma o árbitro “termo de independência” no
qual se contém a aceitação da nomeação e se terá por instituído e iniciado o procedimento arbitral (cf.
arts. 7.1. c/c 4.14 do Regulamento); já segundo o art. 22 do Regulamento do CAESP, o termo de
independência é formalizado na Audiência Preliminar para Assinatura do Termo de Arbitragem (APATer)
e tem a função secundária de formalizar a aceitação dos árbitros.
20
Cf. Carmona, Carlos Alberto. Arbitragem e processo,cit., p. 279, trazendo a posição de Patrício Aylwin
Azocar, El juicio arbitral. Santiago: Fallos de Mes, 1982. p. 395-396.
21
Cf. art. 50 do Regulamento do CAESP; art. 11.2 do Regulamento da CCI; e arts. 14 e 15 do órgão de
arbitragem da OAB/SP.
22
23
24
25
26
Embora diga a lei que a exceção será encaminhada ao presidente do tribunal, a decisão a respeito será
colegiada, e tomada por unanimidade ou maioria de votos, como são todas as decisões interlocutórias
proferidas pelo Tribunal, salvo convenção diversa das partes ou previsão contrária em regulamento.
27
Regulamento do CAM-CCBC, item 5.4; item 11.3 do Regulamento da Corte Internacional de Arbitragem –
CCI.
28
29
Regulamento do Centro de Arbitragem Câmara Americana de Comércio de São Paulo – AMCHAM 7.3 e 7.4;
itens 11.2 e 11.3 do regulamento da Corte Internacional de Arbitragem – CCI; item 4.8 do regulamento da
SP Arbitral – Câmara de Arbitragem Empresarial de São Paulo.
30
Em recente pesquisa desenvolvida no Projeto III do Grupo de Pesquisa em Arbitragem – GPA da PUC/SP,
exatamente sobre a previsão em instituições para julgamento da impugnação de árbitro, detectou-se na
consulta a 22 Câmaras Nacionais que a maioria delas direciona ao Presidente da Instituição (3), ou Diretor
ou Conselho Diretor (6), a Comitê (4) ou a outros órgãos (v.g. Conselho Consultivo) a decisão de
impugnação. Também no ambiente internacional, embora reduzido o número de Câmaras consultadas,
quase a totalidade também delega a outro órgão (a própria instituição, etc.), diverso do próprio árbitro ou
colegiado impugnado, a decisão a respeito. E mais a respeito deste Projeto III do GPA-PUC/SP, e seus
pesquisadores, cf. Cap. 7, item 7.3, nota de rodapé n. 16.
31
32
Por curiosidade, mas sem juízo de avaliação quanto à adequação da solução, anota-se o previsto na Lei de
Arbitragem Voluntária de Portugal, no sentido de que: “Se a destituição do árbitro recusado não puder ser
obtida segundo o processo convencionado pelas partes ou nos termos do disposto no n.º 2 do presente
artigo, a parte que recusa o árbitro pode, no prazo de 15 dias após lhe ter sido comunicada a decisão que
rejeita a recusa, pedir ao tribunal estadual competente que tome uma decisão sobre a recusa, sendo
aquela insusceptível de recurso. Na pendência desse pedido, o tribunal arbitral, incluindo o árbitro
recusado, pode prosseguir o processo arbitral e proferir sentença” (Lei 63/2011, art. 14º, 3.).
33
34
Ora, a invalidade ou ineficácia são efeitos decorrentes de vícios diversos, por sua vez, invalidade, é o
gênero da qual a nulidade e a anulabilidade são as espécies. Em verdade, deverá ser alegado o vício da
convenção, e então indicado o efeito jurídico que em razão do vício se pretende, como na sequência se
verá.
35
Melhor teria sido, então, dizer a lei que a parte deve arguir nesta oportunidade a matéria contida no
parágrafo único do art. 8.º.
36
Nesta oportunidade já se terá, em regra, instituído a arbitragem como acima visto, e caberá ao árbitro (ou
colegiado arbitral) a decisão. Anote-se, porém, diferenciada previsão contida no novo Regulamento do
CAM-CCBC, pelo qual, “antes de constituído o Tribunal Arbitral, o Presidente do CAM/CCBC examinará
objeções sobre a existência, validade ou eficácia da convenção de arbitragem que possam ser resolvidas
de pronto, independentemente da produção de provas” (art. 4.5), com a precisa observação de Frederico
José Straube ao comentar este dispositivo: “A referida possibilidade tem abrangência muito reduzida, e de
nenhuma forma busca suprimir os poderes concedidos ao árbitro para avaliar sua própria jurisdição,
como bem dita o princípio da kompetenz-kompetenz. Contudo, sua inclusão se demonstrava cada vez mais
necessária, concedendo legitimidade à análise prima facie realizada pelo Presidente do CAM/CCBC sempre
que solicitada pelas partes” (Uma primeira análise do novo Regulamento do CAM/CCBC, Revista de
Arbitragem e Mediação. ano IX, n. 32, São Paulo, jan.-mar. 2012, p. 239).
37
Anote-se o quanto já se disse a respeito dos “Efeitos da convenção arbitral” (Capítulo 6, item 6.5, acima), e
também sobre a abrangência do Princípio competência-competência, inclusive quanto à nova previsão
contida no Código de Processo Civil no sentido de impor a extinção do processo judicial sem resolução do
mérito “quando o juízo arbitral reconhecer sua competência” (art. 485, VII, do CPC/2015; Capítulo 5,
item5.2, acima).
38
Recomendam-se, para reflexão, recentes decisões relativas a conflito de competência entre câmaras
arbitrais, ou entre juízo arbitral e estatal, que provocaram debate entre os estudiosos sobre arbitragem:
STJ, CC 113.260-SP, rel. Min. Nancy Andrighi, com a seguinte ementa: “Processual civil. Conflito positivo de
competência. Câmaras de arbitragem. Compromisso arbitral. Interpretação de cláusula de contrato de
compra e venda. Incidente a ser dirimido no juízo de primeiro grau. Incompetência do STJ. Art. 105, III,
alínea d, da CF. Conflito não conhecido. 1. Em se tratando da interpretação de cláusula de compromisso
arbitral constante de contrato de compra e venda, o conflito de competência supostamente ocorrido entre
câmaras de arbitragem deve ser dirimido no Juízo de primeiro grau, por envolver incidente que não se
insere na competência do Superior Tribunal de Justiça, conforme os pressupostos e alcance do art. 105, I,
alínea d, da Constituição Federal. 2. Conflito de competência não conhecido”; e STJ, CC 111.230, no qual se
encontram as seguintes passagens da decisão monocrática do Min. Aldir Passarinho Junior: “De acordo
com o art. 105, I, d, da Constituição Federal, cabe ao STJ processar e julgar originariamente: ‘os conflitos de
competência entre quaisquer tribunais, ressalvado o disposto no art. 102, I, o, bem como entre tribunal e
juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a tribunais diversos’. Não se pode pretender que tal
redação pressuponha que os órgãos judicantes referidos no Texto Magno pertençam necessariamente ao
Poder Judiciário, seja porque lides como a exposta permaneceriam no vácuo ou sujeitas à jurisdição dupla
e eventualmente conflitante, como supostamente aqui ocorre, seja porque o escopo da Lei de Arbitragem
restaria esvaziado se os contratantes que aderissem a tal modalidade na solução das controvérsias
resolvessem se utilizar do processo judicial. Também não pode estender o conceito de conflito de
atribuições inserido na letra g do mencionado dispositivo constitucional para considerar que a expressão
‘autoridades administrativas’ compreenda entes não Judiciários. Acresça-se que eventual declaração de
incompetência por este Tribunal negaria às partes a definição do órgão responsável pelo julgamento, sem
oferecer o instrumento para a pacificação do embate de interesses. De fato, o Juízo suscitado proferiu
decisão liminar determinando o inventário de bens da suscitante e outra (e-STJ, fls. 148-151), objeto de
irresignação via agravo de instrumento ao Tribunal, cuja decisão, proferida pelo relator a quem
distribuído o recurso, declarou a incompetência da Corte Arbitral, senão reafirmada a possibilidade,
estabelecida na cláusula 23.8 do ajuste, de o Poder Judiciário prestar a jurisdição quanto ‘a medida
cautelar ou qualquer outro remédio jurídico que não possa ser obtido segundo a lei de arbitragem
brasileira’ (e-STJ, fl. 242). Isso porque são complementares as funções de ambos os entes julgadores,
atuando no limite de suas competências, conforme previsto pelas partes no contrato. Como é cediço, ao
Juízo Arbitral falta a coerção estatal para o cumprimento de seus julgados, tanto que formam título
executivo exatamente para que à parte refratária, que concordou em se submeter ao julgamento, seja
imposta, perante a justiça comum, a prestação a que foi condenada. Portanto, não está entre suas funções
promover a execução de suas decisões. Todavia, o arrolamento previsto no artigo 855, do Código de
Processo Civil, não constitui medida preparatória de caráter coercitivo a exigir seja necessariamente
prestada perante o Poder Judiciário, comportando, na hipótese de existência de cláusula arbitral, o seu
deferimento, eventualmente, pelo próprio Tribunal Arbitral, bem como o seu processamento. Ante o
exposto, defiro o pedido liminar exclusivamente, por ora, para sobrestar o andamento da cautelar de
arrolamento de bens até final julgamento deste conflito”.
39
Lembre-se que para fatos posteriores, ou cujo conhecimento se deu após instituída a arbitragem, o
momento para a impugnação fica automaticamente prorrogado.
40
Não se pretende, aqui, convalidar nulidade, mas considerar ausente o vício, na medida em que às partes é
dado o direito de confiar no árbitro mesmo se objetivamente existir impedimento. E assim, o árbitro
tacitamente aceito poderá, sim, ser árbitro. Quem não pode ser árbitro, para efeito de nulidade, é aquele
cuja condição foi devidamente impugnada, rejeitada por ele próprio, mas, não convencida a parte,
permite-se levar ao Judiciário o reexame da questão, ou seja, rever se realmente o nomeado pode ou não
ser árbitro contrariando a vontade da parte.
41
O Código de Processo Civil italiano, em seu art. 829, estipula como motivo de nulidade da sentença arbitral
o não seguimento da Lei ou da Convenção Arbitral, porém a nulidade deve ser arguida no procedimento
arbitral.
42
Neste sentido, Carmona elucida: “O direito italiano é mais preciso sobre o ponto, arrolando o art. 829 do
Codice di Procedura Civile, como motivo de nulidade do laudo, o fato de não terem sido nomeados os
árbitros de acordo com o previsto na Lei (ou de acordo com o disposto pelas partes na convenção arbitral),
desde que a nulidade tenha sido deduzida no juízo arbitral. A falta de alegação preliminar, portanto, sana
o eventual vício, impedindo sua posterior alegação. A mesma conclusão – apesar da falta do texto expresso
– serve para a Lei brasileira” (Carmona, Carlos Alberto. Arbitragem e processo, cit., p. 284).
43
44
Expressão inglesa traduzida para o português como “ata de missão”, como informa Carlos Alberto
Carmona (Arbitragem e processo,cit., p. 280). O art. 18 do Regulamento da Corte Internacional de
Arbitragem da CCI estabelece o procedimento e o conteúdo da ata de missão, documento pelo qual se fixa
a missão do Tribunal Arbitral e se estabelece o cronograma provisório para o desenvolvimento da
arbitragem. Para a elaboração deste documento, as partes são convidadas a participar com sua presença
pessoal ou por meio de troca de documentos. Característica própria da arbitragem administrada pela CCI é
a submissão pelo Tribunal desta ata de missão à Corte, para a respectiva aprovação, tal como também se
faz com a sentença arbitral. Cf., a respeito,
[www.iccwbo.org/uploadedFiles/Court/Arbitration/other/rules_arb_brazilian.pdf], acesso, pela última vez,
em 09.05.2011.
45
Ou como diz Leonardo de Faria Beraldo: “Trata-se de instrumento, sem previsão legal, que possui
relevante função ordenadora no procedimento arbitral, uma vez que é nele que as partes poderão, por
exemplo, adaptar, alterar ou prever as regras do regulamento aplicáveis ao caso concreto, observando-se
as particularidades necessárias, tais como forma de indicação de árbitro e o prazo para a prática de atos
processuais.” BERALDO, Leonardo de Faria, Curso de Arbitragem..., cit., p. 285.
46
Selma Lemes observa: “O TDA (Termo de Arbitragem), como mencionado, é instrumento processual
organizador da arbitragem, que fornece às partes e aos árbitros a oportunidade de acordarem a respeito
do procedimento, dos prazos, dos documentos e, principalmente, para identificar e delimitar a matéria
objeto da arbitragem, que repercute no mister dos árbitros, garantindo que a sentença arbitral decida nos
limites do pedido” (LEMES, Selma Maria Ferreira. Convenção de arbitragem e termo de arbitragem.
Características, efeitos e funções. Revista do Advogado. n. 87. ano XXVI. set. 2006. p. 94-99).
47
Já em sua nova redação introduzida pela Lei 13.129/2015 – cf. texto consolidado e comentários em Anexo 1
e Anexo 2 adiante.
48
Adotou-se aqui, como parâmetro, a previsão contida no Regulamento do CAM-CCBC, art. 4.18. Também
detalhada a ata de missão sugerida pela Corte Internacional de Arbitragem da CCI, no art. 18, item 1: “...
Este documento deverá conter, entre outros, os seguintes pormenores: a) o nome ou denominação
completo e as qualificações das partes; b) os endereços das partes para os quais poderão ser validamente
enviadas as notificações e comunicações necessárias no decurso da arbitragem; c) um resumo das
pretensões das partes e dos seus pedidos, e, na medida do possível, uma indicação das quantias
reclamadas ou reconvencionadas; d) a menos que o Tribunal Arbitral considere inadequado, uma relação
dos pontos litigiosos a serem resolvidos; e) o nome completo, as qualificações e os endereços dos árbitros;
f) o local da arbitragem; e g) os pormenores das regras processuais aplicáveis e, se for o caso, a referência
aos poderes conferidos ao Tribunal Arbitral para atuar como amiable compositeur ou para decidir ex
aequo et bono”. Cf. site acima indicado na nota 34.
49
Pelo Regulamento da CCI, acima citado, este cronograma provisório deverá sempre ser feito durante ou
logo após a ata de missão (item 18.4); também na CMA da CIESP/FIESP, a calendarização se faz em “Ata de
Reunião” separada do “Termo de Arbitragem”. Já no CAM/CCBC o calendário é um dos itens do “Termo de
Arbitragem”.
50
Embora voltada a análise ao processo judicial, recomenda-se a leitura de primoroso estudo a respeito do
gerenciamento do processo, feito por Claudia Elisabete Schwerz Cahali no qual se contém substancial
pesquisa a respeito do tema, inclusive após análise do cenário jurídico estrangeiro, resultado de sua tese
com a qual obteve do título de Doutora pela PUC/SP. A autora explora com maestria as vantagens,
requisitos, princípios, técnicas, limites, parâmetros e situações específicas, para se praticar de forma útil o
gerenciamento do processo, instituto que assim identifica: “Entende-se por gerenciamento de processos o
conjunto de medidas e de práticas aplicáveis à condução do processo pelo juiz, voltado para a
concretização de um processo célere e efetivo, observado o devido processo legal. A gestão do processo
busca conferir racionalização à atividade jurisdicional. O gerenciamento de processos judiciais contempla
três vetores principais: 1) a possibilidade de o juiz adaptar o procedimento às peculiaridades do direito
material; 2) a adoção de boas técnicas na prestação jurisdicional que compreende o planejamento, a
organização, a condução da marcha processual e o conhecimento pelo juiz da causa das questões
relevantes do processo e da identificação da demanda conforme a sua complexidade; 3) a utilização
intensa dos meios alternativos de resolução de conflitos. É um instituto complexo que busca desenvolver
maior cooperação entre todos os sujeitos do processo, entre juiz e as partes e os advogados, e as partes e
seus procuradores entre si, na medida em que todos os envolvidos tem (ou deveriam ter) pelo menos um
propósito em comum: a rápida e adequada solução da disputa judicial.” Lendo esta passagem, verifica-se
tudo o que se quer na arbitragem, e se pode exercer com partida no termo de arbitragem, momento
especial para se promover a organização do procedimento arbitral.” (O Gerenciamento de Processos
Judiciais em busca da efetividade da prestação jurisdicional. Brasília. Editora Gazeta Jurídica: 2013. p. 28).
51
A respeito da jurisdição total do árbitro a partir desta fase do procedimento arbitral, Pedro A. Batista
Martins nos ensina: “Segundo a sistemática da ‘Lei Marco Maciel’, a intervenção do Judiciário se acomoda
em momento que antecede a confirmação dos árbitros ou após a prolação da decisão pelos árbitros. Com
efeito, a longa manus estatal não deve alcançar a fase arbitral, em que o árbitro é senhor da função que
exerce, exceto se solicitada pelo julgador privado. A atuação do juízo ordinário deve se fazer presente,
durante o transcurso da arbitragem, por força de solicitação do painel arbitral e para com ele cooperar na
imposição das medidas de direito” (Martins, Pedro A. Batista. As três fases da arbitragem. Revista do
Advogado, ano XXVI, p. 90, set. 2006).
52
Já em sua nova redação introduzida pela Lei 13.129/2015 – cf. texto consolidado e comentários em Anexo 1
e Anexo 2 adiante.
53
Ou, como diz Carlos Alberto Carmona: “Para que haja qualquer acerto válido (que passará a fazer parte
integrante da convenção de arbitragem, como explicitamente menciona o parágrafo único do artigo em
foco) torna-se necessária a participação das partes e dos árbitros” (Carmona, Carlos Alberto. Arbitragem e
processo,cit., p. 281).
54
Discordamos, pois, em certa medida de Carmona, pois o autor considera o adendo como instrumento “que
os brasileiros soem denominar termo de arbitragem” (Carmona, Carlos Alberto. Arbitragem e processo,
cit., p. 282); e com esse raciocínio, “conclui-se, portanto, que se uma das partes não comparecer à
audiência designada exclusivamente para firmar o termo, não há motivo para redigir a peça; da mesma
forma, se uma das partes permanecer alheia ao processo arbitral (revelia), não será lavrado termo de
arbitragem” (idem, p. 281). Como, para nós, o termo acima detalhado é muito mais abrangente que o
adendo legal eventualmente nele contido, a assinatura da parte não retira deste instrumento a sua
utilidade e pertinência, tampouco sua natureza impositiva, na medida em que nele contém decisões do
árbitro a serem respeitadas e relativamente à organização da arbitragem (quanto a objeto e
procedimento).
55
TJSP, ApCiv 296.036-4/4, 7.ª Câm. Dir. Priv., j. 13.11.2003, rel. Des. Sousa Lima.
56
Seu conteúdo não será, porém, repita-se, do adendo consensual previsto na lei, mas, sim, de decisão a
respeito das questões nele contidas.
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9. PROCEDIMENTO ARBITRAL – II
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9. PROCEDIMENTO ARBITRAL – II
9. Procedimento arbitral – II
ROTEIRO DE ESTUDOS
1. Do desenvolvimento da arbitragem
• Atos processuais
• Considerações gerais
• Oitiva de testemunhas
• Memoriais
• A confidencialidade na arbitragem
• Interrupção da prescrição
SUMÁRIO
9.1. • INTRODUÇÃO
Como visto, com ou sem o termo de arbitragem ou ata de missão, a arbitragem prossegue
regularmente para seu desígnio: solução do conflito, com a prática dos atos, pelo árbitro (ou
tribunal), e pelas partes.
E para disciplinar o procedimento (como também se faz para a escolha da entidade arbitral),
devem ser consideradas as características de cada controvérsia, a qualidade das partes, valor
envolvido, grau de especificidade da matéria, necessidade ou dispensa de mais alargada instrução
etc.
Mas, mesmo diante da multiplicidade de opções, pode-se apresentar um modelo usual para o
procedimento. Vejamos:
Para o sadio desenvolvimento da arbitragem, devem ser observadas a fase postulatória, a fase
instrutória e a fase decisória,2 excluindo-se do juízo arbitral, em regra, a etapa para se exigir o
cumprimento da sentença, por faltar ao árbitro a coertio e executio.
Até agora, ressalvado sempre a convenção, regulamento ou decisão em contrário, apenas foi
identificado o conflito, com a delimitação do objeto da arbitragem e apresentação de pedido ainda
abrangente, com o respectivo valor estimado, e tudo de forma concisa e objetiva.
Sabendo o solicitado do conflito e sua extensão, também ele deverá apresentar as suas
“alegações iniciais”, já em defesa de seus interesses. E mais, admite-se nesta oportunidade seja
oferecido por ele também pedido contraposto (com conteúdo da conhecida reconvenção do
processo civil). Ou seja, marque-se com destaque: o solicitado pode fazer pedido no procedimento
arbitral já em seu início,4 o que resulta em clara celeridade para a solução daquele conflito.
Na maioria das vezes esta perspectiva de o solicitado apresentar pedido se faz constar do
próprio termo de arbitragem ou ata de missão, e desde então, pois, já se terá ampliado o objeto da
arbitragem; terá sido, assim, feita a fixação dos pontos controvertidos na fase preliminar, para
melhor direcionar o procedimento. Pode, porém, pelo regulamento ou convenção, ser restrita a
oportunidade de pedido pelo solicitado, exigindo-se, por exemplo, que tenha constado
expressamente no termo inicial, sob pena de não mais se admitir a ampliação da lide.
Mesmo propondo a instituição arbitral prazo certo em seu regulamento,5 pode ser estabelecido
lapso temporal diverso, de acordo com as circunstâncias. E nestas alegações iniciais, devem as
partes desde logo produzir a prova documental.
Após a instrução, a ser adiante analisada, as partes apresentam seus memoriais, orais, no
encerramento da audiência (o que é raríssimo), ou por escrito, simultaneamente, no prazo
assinalado, sendo este último procedimento mais comum.
Pelas partes, suas manifestações são escritas, acompanhadas de documentos, sem maiores
exigências formais ou burocráticas,6 admite-se, quando assim convencionado ou regulamentado
pela entidade, o peticionamento eletrônico, mantendo virtual todo o procedimento (como já se faz
no processo judicial).7
Em meio físico, costuma-se exigir que sejam apresentadas tantas cópias quantos forem os
envolvidos no procedimento – assim, por exemplo, com solicitante e solicitado, painel de três
árbitros, serão protocoladas cinco cópias integrais das petições (alegações e documentos), além do
respectivo protocolo.8
A revelia, no processo civil, representa a situação objetiva em que o réu deixa de apresentar
defesa. O fato em si, ausência de contestação, é isolado. Porém, faz a lei processual sua ligação ao
campo das provas, estabelecendo o Código os efeitos da revelia: presumem-se verdadeiros os fatos
alegados pelo autor (art. 344 do CPC/2015).
Grave mesmo, então, não é a revelia, mas seus efeitos impostos na lei processual.
Na falta de semelhante punição à revelia prevista na Lei de Arbitragem, pode-se afirmar que no
juízo arbitral, mesmo diante da ausência de defesa no momento oportuno – revelia, a parte poderá
acompanhar o procedimento, produzir provas, apresentar manifestações e buscar a preservação
de seu alegado direito, com base em sua versão dos fatos.
Aliás, mesmo no sistema do Código de Processo Civil, há previsão de situações nas quais a
revelia não induz os efeitos mencionados no art. 344, impondo a especificação de provas pelo
autor (art. 348 do CPC/2015),11 e desta forma, caberá ao juiz avaliar a pertinência da ampliação da
instrução probatória.
Assim, a revelia, tal qual se conhece no processo civil, no procedimento arbitral, por si só não
impede seja preservado o livre convencimento racional, ou seja, subsistirá o julgamento com base
na valoração das provas a serem produzidas.
Por outro lado, também, por revelia na linguagem coloquial, entende-se simplesmente a inércia
ou ausência da parte.
E parece ter sido este o sentido do termo utilizado no § 3.º do art. 22 da Lei de Arbitragem: “A
revelia da parte não impedirá que seja proferida a sentença arbitral”.
Daí, por certo, mal colocada a previsão, pois em artigo destinado às provas. Sem dúvida estaria
mais bem localizada a regra como parágrafo do dispositivo atinente ao procedimento arbitral (art.
21).
A preservação do juízo arbitral, mesmo diante da revelia, tem sua razão de ser. Por diversas
oportunidades até agora ressaltou-se a importância de tudo na arbitragem ser feito de comum
acordo, e espontaneamente.
Cabe, ainda, esclarecer que a revelia neste aspecto poderá ser de qualquer das partes, não só
em razão da possibilidade do pedido contraposto a ser formulado pelo solicitado (e assim reclamar
defesa do solicitante), como também porque a ausência do autor pode se verificar no momento
seguinte à instauração do procedimento arbitral, até mesmo faltando ao termo de arbitragem. Tal
conduta, entretanto, não impede o prosseguimento da arbitragem provocada por ele.
Enfim, distingue-se revelia na arbitragem e no processo judicial; neste último, o termo refere-se
à falta de contestação pelo réu, com efeitos próprios, se o caso; na arbitragem, a revelia representa
deixar-se de praticar atos durante o procedimento (não indica árbitro, ausência de defesa, falta na
audiência, omissão na produção de provas etc.) e para qualquer das partes (solicitante/solicitado);
na arbitragem, então, terá mais relevância a contumácia, não a revelia propriamente dita.
Mas a omissão da parte, mesmo contumaz, não abala a validade e eficácia plena do
procedimento e da sentença arbitral a ser proferida, sendo, pois, inclusive à luz do princípio do
contraditório, como já se disse, imperativa a convocação do interessado, mas facultativa a
participação.
9.2.4. Da conciliação
Nada impede, entretanto, que em cláusula escalonada (cada vez mais usual), por regra da
própria entidade arbitral, por sugestão das partes ou do próprio árbitro,12 promova-se a mediação
através de procedimento específico, e daí acompanhada de mediador, não do árbitro.
Mais acertada, porém, em nosso sentir, é a conclusão de Carmona, no sentido de que deve ser
interpretada a norma “como mera sugestão ao árbitro, que pode segui-la ou não, de acordo com o
que julgar conveniente”.17
Pela nossa experiência do contencioso, acabamos por considerar que a iniciativa na produção
de prova compete a quem pretende ser vitorioso na ação, com menor significado, para proveitosa
atuação no processo, as discussões acadêmicas sobre a distribuição do ônus da prova (art. 373 do
CPC/2015).
Esta ideia se apresenta em sua plenitude na arbitragem, pois ausente na lei critérios para
imperativos a um ou a outro, sobre a obrigação de demonstrar os fatos relevantes, aptos a
influenciar o destino da controvérsia. Em poucas palavras, mas com relevante resultado: não há
distribuição legal do ônus da prova no procedimento arbitral.
Neste sentido, a contribuição da parte para instruir a causa é de seu total interesse, cabendo-lhe
a mais completa participação possível na indicação de provas, com o foco na revelação da
ocorrência dos fatos, não só como pelo interessado alegado, mas também na versão que lhe
convém (ou na demonstração de sua inocorrência), mesmo se alegado pelo adversário.
E mais, o próprio árbitro tem alargada, de direito e de fato, a sua autoridade na condução do
procedimento, cabendo-lhe interferir ativamente na instrução da causa, para consolidar o seu
livre convencimento sobre os fatos, necessário à adequada solução do conflito. Por sua iniciativa,
podem ser investigados fatos para descoberta da verdade.
Não se esqueça, porém, que, por praesumptio hominis, na persuasão racional que permeia a
atuação do árbitro na descoberta da verdade, a conduta das partes quanto à iniciativa da
produção da prova é valorizada, pois, ausentes elementos de convicção, é natural que se
desconsidere o fato, em desfavor de quem o alegou, mas não o demonstrou.
Ainda, a atividade do árbitro neste particular acaba sendo complementar à iniciativa das
partes, e voltada a investigar o quanto lhe parecer útil e relevante para influenciar o seu
julgamento. Assim, não atua o árbitro em favor da parte, na defesa dos interesses de quem argui
um fato, mas impulsiona o quanto necessário para a construção de um cenário fático necessário,
segundo o seu critério, a estruturar o convencimento racional.20
Como regra lógica, cabe a quem solicita a diligência, antecipar as despesas necessárias à sua
realização, como veremos adiante.
A seu turno, quanto à ordem, também permeado pelo bom senso, ao julgador será permitido,
então, avaliar e estabelecer a cronologia da instrução, buscando aproveitar o máximo do
rendimento nas etapas a serem cumpridas, de forma a não ser necessária a repetição de um ato
após a realização de outra diligência, ou, ao contrário, para evitar que seja inútil uma providência,
em razão de prova posterior realizada.
Assim, por exemplo, nada impede seja determinada a produção de prova oral partilhada, ou
seja, primeiramente sobre determinados fatos, e de quanto deles resultar, promove-se, então, a
prova pericial, para, após, novamente retomar-se a oitiva de testemunhas e depoimentos.
Ainda, e esta providência muitas vezes é de grande valia, permite-se convocar as partes para
novos depoimentos após a oitiva das testemunhas ou realização de outras provas, pois fatos
relevantes, a merecer outros esclarecimentos além dos prestados anteriormente, podem ter
surgidos no caminhar da instrução.
Nesta flexibilidade, admite-se, por fim das exemplificações, seja apreciada a pertinência da
prova de forma diluída no procedimento, e não concentrada em um único despacho, como
acontece no processo estatal – art. 357 do CPC/2015.
E sempre, em qualquer das situações acima retratadas, devem ser respeitados os princípios do
procedimento arbitral (contraditório, igualdade das partes, ampla defesa etc.).
Enfim, na “batuta” do árbitro (ou tribunal), com a competência e diligência esperada de sua
atuação (art. 13, § 6.º, da Lei 9.307/1996), está a fixação da estratégia na construção do quadro
probatório. O julgador é o maestro da fase instrutória.21 E assim preferimos falar em autoridade
para a condução da instrução, e não poder, como na doutrina se faz referência, para ressaltar o
sentido de atribuição como responsabilidade, não de força como o termo poder pode ser
indevidamente interpretado.
Como já referido, a prova documental deve acompanhar as alegações iniciais e defesa, sendo
que a comprovação da existência da cláusula ou compromisso, obviamente, faz-se antes mesmo do
início da arbitragem, no momento das providências preliminares para a sua instauração, pois esta
depende do que naqueles instrumentos estiver previsto.
Nas situações em que se discutem fatos, e não apenas teses jurídicas, e principalmente se as
partes tiverem participado, direta ou indiretamente, dos acontecimentos, o depoimento pessoal
será de extrema relevância no campo das provas.
Quando o litígio se trava entre pessoas jurídicas, para ser útil, o depoimento deve ser feito por
aquele envolvido ou conhecedor dos fatos. Assim, a própria lei faculta à parte “designar quem as
represente” no procedimento arbitral (art. 21, § 3.º, da Lei 9.307/1996), mesmo sendo pessoa
diversa do “representante legal” previsto no contrato social ou estatutos.
Melhor será o depoimento presencial, “tomado em local, dia e hora previamente comunicados”
(art. 22, § 1.º, da Lei 9.307/1996); mas nada impede, diante da impossibilidade de assim se
proceder, seja colhido o depoimento a distância, pelas outras diversas formas de comunicação
existentes na atualidade, como videoconferência, teleconferência, inclusive utilizando-se dos
avanços da informática nesta seara.22
O depoimento, na forma prevista no § 1.º acima citado será “reduzido a termo, assinado pelo
depoente, ou a seu rogo, e pelos árbitros”. Porém tem sido comum a colheita da prova oral por
gravação de toda a audiência, acompanhada ou não de estenotipia, com posterior transcrição,
expediente este que torna mais dinâmica e completa a colheita da prova, ao se captar tudo quanto
neste momento realmente foi dito ou debatido. Nestas situações, as assinaturas pertinentes se
farão em termo próprio, com a informação do procedimento adotado.
E qual será a consequência da recusa ao depoimento? A Lei de Arbitragem traz solução diversa
da confissão ficta prevista no processo civil (art. 385, § 1.º, do CPC/2015, art. 343, §§ 1.º): “Em caso
de desatendimento, sem justa causa, da convocação para prestar depoimento pessoal, o árbitro ou
o tribunal arbitral levará em consideração o comportamento da parte faltosa, ao proferir sua
sentença (...)” (art. 22, § 2.º, da Lei 9.307/1996).
Com este cenário, a convocação da parte para depoimento pessoal se faz pela decisão (Ordem
Processual) a respeito comunicada ao advogado, sem maiores formalidades,23 sendo comum
constar da decisão que o advogado fica responsável por trazer seu cliente ao depoimento. Se
necessário, e se expressamente requerido, pode-se promover a convocação mediante carta (com
aviso de recebimento), ou forma similar, prevista no regulamento da Instituição ou no termo de
arbitragem para esta finalidade.
Há, pois, obrigatoriedade da participação da testemunha indicada pelas partes, sob pena de
condução coercitiva, a ser promovida através da cooperação do Poder Judiciário.
Evidente que esta drástica medida, inclusive consumindo tempo da arbitragem, deve ser ao
máximo evitada, competindo, por exemplo, à parte que arrolou a testemunha concentrar esforços
para seu comparecimento,26 cuidando diretamente, quando necessário, de seu deslocamento etc.
Ao árbitro (ou tribunal), caberá avaliar em que medida este depoimento tem significativa ou
até fundamental relevância ao destino da causa.
O procedimento para condução coercitiva será visto adiante (Capítulo 10, item 10.4), mas
advirta-se que só é viável para encaminhar a testemunha à audiência realizada na mesma
comarca onde se encontra. A recusa da testemunha em deslocar-se de sua cidade é considerada
legítima.
A seu turno, não há, desta forma “carta precatória” para a produção da prova oral, ou seja, não
se transfere a oitiva para outro juízo (arbitral ou estatal).
O que pode ser feito (e muitas vezes acontece) é a instauração da audiência no local onde as
partes e testemunhas se encontram, diverso daquele onde se situa a instituição arbitral ou onde
será proferida a sentença. Deslocam-se para lá os árbitros e toda a estrutura de apoio. Aliás, já se
viu que podem as partes, na convenção, estabelecer o “local, ou locais, onde se desenvolverá a
arbitragem” (art. 11, I, da Lei 9.307/1996). Esta é a dinâmica do juízo arbitral. Mas tudo tem um
custo (financeiro, pessoal, e de tempo para a providência), e a utilidade de todo este esforço para a
oitiva da testemunha deve ser avaliado pelo árbitro.
Também não se exclui a possibilidade de sua oitiva pelos outros meios de comunicação já antes
referidos.
Assim, todo este contexto será analisado, e até debatido, para se encontrar a melhor solução a
respeito a ser adotada pelo condutor da instrução.
Embora neste caso, então, não se tenha utilizado do depoimento técnico, fácil é perceber o quão
útil é a discussão direta e verbal com quem tem expertise em determinado assunto, prestando o
especialista, informações necessárias à perfeita compreensão da matéria.
Basicamente, são investimentos de três ordens se que faz na arbitragem institucional: (a) custas
da entidade (taxa de administração do procedimento), tabelada, com pagamento mensal ou
único,27 em quantia fixa ou variável, de acordo com o valor dado ao conflito, ou em percentual
sobre este, para se fazer frente às despesas administrativas ordinárias de expediente da câmara;
(b) despesas, dentre outras, com diligências, reuniões, audiências, deslocamento, entregas de
documentos, traduções, reproduções especiais de documentos, gravações, equipamentos
específicos de teleconferência, além de gastos específicos com perícia, avaliações, vistorias etc.,
apuradas segundo a documentação pertinente; e (c) honorários do(s) árbitro(s).
Algumas Câmaras estabelecem em seu regulamento valores de acordo com tabela própria, ou a
serem arbitrados no início do procedimento, geralmente com previsão de adiantamento pelas
partes de custas e despesas.
Porém, pode acontecer, e é comum, que a outra parte (não a “devedora”), tenha a iniciativa de
adiantar estas despesas com o objetivo de levar adiante o procedimento. Neste caso, serão estes
valores ajustados e compensados no final, quando da definição da responsabilidade definitiva
sobre estes encargos.30
Mais delicada a situação de ser a verba cuja antecipação se pretende, de interesse exclusivo de
uma das partes, para a realização de uma diligência ou produção de uma prova. Neste caso o
adversário certamente não se prontificará a pagar. Diante deste quadro, pode o árbitro: (a)
dispensar a providência, prejudicando o resultado que se pretenderia, em desfavor do negligente;
(b) renunciar à investidura, ao considerar indispensável a providência para formação de sua
convicção.31
Ainda quanto às despesas da arbitragem, convém deixar claro inexistir previsão para este juízo
de gratuidade da justiça pela incapacidade financeira da parte, nos moldes previstos no Código de
Processo Civil de 2015 (arts. 98 e ss., com revogação parcial da Lei 1.060/1950 a respeito). O
benefício previsto na norma processual se exerce exclusivamente perante o juízo estatal. Nada
impede, porém, que a convenção, a entidade arbitral, ou árbitro (no procedimento ad hoc), por
pietatis causa ou por interesse comercial (estratégico) em atender ao potencial adversário ou
mesmo à demanda, tenha a iniciativa de reduzir as custas, parcelar o débito ou mesmo isentar o
seu pagamento.32
Podem ser estabelecidos por etapas (fase inicial, audiência, sentença), porém comuns são os
honorários fixados por horas trabalhadas. A falta de quitação no momento acordado autoriza a
renúncia pelo árbitro.
Para evitar dúvida a este respeito, convém se faça a inclusão desta questão na ata de missão, ou
termo de arbitragem, se em outro local (regulamento ou convenção), a matéria não tiver sido
especificada. Também, se nada constar até então, temos apresentado pedido próprio na fase
postulatória neste sentido (pelo solicitante ou como pretensão contraposta), com natureza
indenizatória dos prejuízos experimentados. Mas tudo apenas para evitar contratempos de
percurso, pois temos a convicção da autoridade do árbitro para estabelecer a condenação também
à verba honorária.
De um modo geral, mais correto é sinalizar o procedimento arbitral como um pouco mais
custoso que o processo judicial, principalmente em relação a parte requerida que, por vários
regulamentos, deve honrar com 50% das despesas no curso do procedimento. Mas é casuístico,
pois ao se considerar as custas pagas em diversas etapas do processo judicial (recursos, incidentes,
reconvenção, cumprimento de sentença etc.), pode vir a ser mais econômica a arbitragem na só
comparação objetiva dos números.
De outra parte, pelo mais expressivo valor da demanda, a estimativa das despesas, em algumas
Instituições, e com necessidade de antecipação, chega a ser realmente elevada. Mas a eficiência da
arbitragem, e em especial a celeridade e especialidade dos árbitros, confere benefício que justifica
o custo. Daí porque, em aprofundados estudos relativos à análise econômica da cláusula
compromissória, a arbitragem é vencedora como a melhor opção.
Quanto à litigância de má-fé, pode haver a sua condenação de ofício ou a pedido das partes.
Cautelosa a previsão, porém mais se tem a respeito um debate acadêmico. Na prática, pelas
características da arbitragem e dos personagens que dela participam, remotíssima será,
certamente, a fixação de verba desta natureza (ao vencido ou vencedor, pois se impõe pela
conduta, não pelo resultado da demanda).
Porém, convém deixar claro que o sigilo no procedimento não está previsto em lei.
Assim, querendo as partes sigilo no procedimento, devem eleger instituição cujo regulamento
contenha esta previsão, ou estabelecer a restrição à publicidade na convenção arbitral (cláusula
ou compromisso).
Por outro lado, cresce no Brasil a utilização do juízo arbitral envolvendo entidades públicas,
nos quais, ao contrário das relações privadas, a confidencialidade já era, no mínimo, indesejada37
pela esperada transparência dos atos para controle natural da gestão dos interesses públicos.
Neste sentido, mais saudável sempre foi afastar-se do sigilo, mantendo apenas a obrigatoriedade
da discrição do árbitro.
Art. 189. Os atos processuais são públicos, todavia tramitam em segredo de justiça os processos:
I – em que o exija o interesse público ou social; II – que versem sobre casamento, separação de
corpos, divórcio, separação, união estável, filiação, alimentos e guarda de crianças e adolescentes;
III – em que constem dados protegidos pelo direito constitucional à intimidade; IV – que versem
sobre arbitragem, inclusive sobre cumprimento de carta arbitral, desde que a confidencialidade
estipulada na arbitragem seja comprovada perante o juízo (destaque nosso).
Note-se, pela combinação das duas normas agora introduzidas (reforma da Lei de Arbitragem e
Código de Processo Civil de 2015), que está preservada a publicidade do processo envolvendo o
poder público quando tiver sido parte no juízo arbitral, pois nestes casos a confidencialidade já foi
afastada na própria arbitragem e, assim, faltará requisito necessário para se requerer o segredo de
justiça no processo judicial.
Refere-se a lei a expedientes inexistentes no juízo arbitral. Mas só por isso seria inviável a
interrupção da prescrição pela instauração do juízo arbitral? Não, certamente não. Pela sua
natureza jurisdicional, tal qual o processo estatal, a perseguição de direitos por este método, sem
dúvida, também interrompe a prescrição.
E assim, a reforma da Lei de Arbitragem trazida pela Lei 13.129 de 26 de maio de 2015,
introduziu a seguinte regra no § 2.º ao art. 19: “A instituição da arbitragem interrompe a
prescrição, retroagindo à data do requerimento de sua instauração, ainda que extinta a
arbitragem por ausência de jurisdição”.
A dificuldade sobre o tema reside, porém, na identificação de qual será o ato ou instante em
que se terá por interrompido o prazo prescricional.
Para nós, deverá ser considerada como ato interruptivo da prescrição a inequívoca iniciativa
em provocar o início da arbitragem. Ou seja, no exato instante em que a parte, comprovadamente,
demonstra seu propósito de materializar o juízo arbitral,41 deve-se atribuir ao fato a força
interruptiva da prescrição.
Neste sentido, apontando alguns dos momentos de interrupção da prescrição, escreve Yussef
Cahali: “No compromisso arbitral judicial prevalece a interrupção da prescrição ocorrida na
demanda em curso onde aquele foi convencionado. Na cláusula compromissória, interrompe-se a
prescrição com a manifestação da outra parte interessada, por via postal ou por outro meio
qualquer de comunicação, de sua intenção de dar início à arbitragem (art. 6.º, citado). Assinado
pelas partes o compromisso arbitral, tem o autor como interrompido o prazo da prescrição da sua
ação contra o réu, porque a assinatura desse compromisso, pelo autor e pelo réu, equivale à
propositura de uma demanda em juízo”.44
Com menor atenção a todo este contexto, veio a nova previsão introduzida pela reforma da Lei
de Arbitragem, conforme inicialmente indicado.
Positiva, sem dúvida, a iniciativa, porém dela se deverá extrair, na melhor exegese, que por
“requerimento de instauração da arbitragem”, se entende toda e qualquer iniciativa de se levar o
conflito ao juízo arbitral, ainda que através de notificação para se firmar compromisso, prevista
no art. 6.º da Lei, ou até, em dadas circunstâncias, a só assinatura do compromisso arbitral, pois,
conforme o caso, estes atos serão considerados como o ponto de partida necessário para a
instauração da arbitragem (cf. Capítulo 6, item 6.2.2. Procedimento para instauração da
arbitragem – arts. 6.º e 7.º, e Capítulo 8, item 8.4. Fase I – Da instauração da arbitragem).
Ainda, anote-se a adequada referência à interrupção “ainda que extinta a arbitragem por
ausência de jurisdição”.45 Como já analisado, pelo princípio competência-competência (Capítulo 5,
item 5.2, acima), poderá no Juízo Arbitral vir a ser reconhecido vício na convenção (inexistência,
ineficácia, ou invalidade, como dentre vários outros exemplos, não se tratar de matéria possível de
se submeter à arbitragem, pelo objeto ou pelas partes – LArb., parágrafo único do art. 8.º), que
impede o julgamento do conflito; e assim, caberá ao interessado buscar a tutela jurisdicional no
Judiciário. Nesta situação, confere-se eficácia àquela interrupção da prescrição operada no juízo
arbitral.
Pode-se afirmar, porém, ser remota a arbitragem sem advogado, pois já, desde a convenção,
certamente se contou com a participação deste profissional, afinal dificilmente alguém irá
conhecer e escolher este método de solução de conflito sem prévia orientação de um advogado.
Importante salientar a importância do advogado para contribuir com o bom desenvolvimento da
arbitragem, sem deixar, evidentemente, de defender os interesses de seu constituinte.
Como já dissemos, por vezes sequer o árbitro tem formação jurídica, podendo, por exemplo, ser
um engenheiro, em razão do objeto da demanda. Daí, obviamente, de grande valia que a parte
também tenha em seu apoio um técnico da área de conhecimento específica da matéria em
discussão. Não se reduz a participação deste a de um assistente técnico indicado para acompanhar
uma perícia. O indicado para assistir a parte, neste caso, acompanhando todo o procedimento,
pode, inclusive, formular perguntas para as testemunhas ou às partes quando de seus
depoimentos, e debater sobre a pertinência de provas etc. – enfim, atua nas condições similares às
da parte.
Bem utilizado este expediente, certamente só trará benefícios ao procedimento.
ARMELIN, Donaldo. Prescrição e arbitragem. Revista de Arbitragem e Mediação. n. 15. ano IV.
São Paulo, out.-dez. 2007.
BAPTISTA, Luiz Olavo. Arbitragem comercial e internacional. São Paulo: Lex Magister, 2011.
BERALDO, Leonardo de Faria. Curso De Arbitragem Nos Termos Da Lei n. 9.307/1996. 1. Ed. São
Paulo: Atlas, 2014.
CRETELLA NETO, José. Quão sigilosa é a arbitragem? Revista de Arbitragem e Mediação. n. 25.
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DINAMARCO, Cândido Rangel. A arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros,
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GUERRERO, Luis Fernando. Convenção de arbitragem e processo arbitral. São Paulo: Atlas,
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MAIA NETO, Francisco; FIGUEIREDO, Flavio Fernando de (coord.). Perícias em arbitragem. São
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In: MAIA NETO, Francisco; FIGUEIREDO, Flavio Fernando de (coord.). Perícias em arbitragem. São
Paulo: Leud, 2012.
SILVA, Eduardo Silva da. Regras arbitrais brasileiras: a fase dos regulamentos. In: CAHALI,
Francisco, José; RODOVALHO, Thiago e FREIRE, Thiago. Arbitragem – Estudos sobre a Lei 13.129, de
26.05.2015. São Paulo: Saraiva, 2016.
NOTAS DE RODAPÉ
1
Neste sentido, Carlos Alberto Carmona (CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo. São Paulo:
Atlas, 2009. p. 292-294), trazendo posição divergente de Humberto Theodoro Júnior (THEODORO JÚNIOR,
Humberto. A arbitragem como meio de solução de controvérsias. Revista Síntese de Direito Civil e
Processual Civil, n. 2, nov.-dez. 1999), para quem, por força do art. 272, parágrafo único, do CPC, deveriam
ser aplicadas, supletivamente, as regras gerais do procedimento ordinário na arbitragem conforme notícia
o autor.
Há, também, oportunidade para apreciação de medidas de urgência, cautelares ou como tutela
antecipada, a ser comentado em separado, pelas suas peculiaridades.
E na maioria das vezes esta perspectiva já se faz constar do próprio termo de arbitragem ou ata de missão,
desde então, pois, já se ampliando o objeto da arbitragem. Pode, porém, pelo regulamento, ser restrita a
apresentação de pedido pelo solicitado, deixando, inclusive, para outro momento processual.
Por exemplo, margens, nomes específicos para as petições, documentos originais ou autenticados etc.
7
No feito judicial, a Lei 11.280/2006 tratou da questão, ao alterar o art. 154 do CPC/1973 para permitir o
processo e peticionamento eletrônicos. No CPC/2015, a matéria vem bem mais detalhada, inclusive com
previsão de oferta gratuita pelo Poder Judiciário de equipamentos necessários à prática dos atos
processuais, e de acessibilidade a ser garantida à pessoa com deficiência, tudo nos arts. 193 a 199 contidos
na Seção destinada à “Prática Eletrônica de Atos Processuais”, no Capítulo “Da Forma dos Atos
Processuais”.
Cf. Regulamento do CAM/CCBC, art. 6.3; já o CAESP solicita duas vias exclusivas para a secretaria (art. 12),
assim como no Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem, no art. 1.5; Regulamento da SP-Arbitral (art.
6.6); Regulamento da AMCHAM (art. 14.2).
Aliás, sobre a validade da utilização deste meio, já se pronunciou o TJSP, na Ap. 1.048.762-0-2, 31.ª Câm.
Cív., j. 29.04.2008, v.u., rel. Des. Francisco Casconi, com a seguinte ementa: “Contrato. Cláusula
compromissória cheia. Indicação do Tribunal Arbitral e incidência de seu regulamento. Comunicação dos
atos por meio de fac-símile. Previsão. Nulidade. Não caracterização. Prévio conhecimento. Regularidade
formal do procedimento arbitral. Os contratantes se obrigaram aceitar as normas procedimentais
previstas no regulamento da entidade arbitral eleita. Inteligência dos arts. 5.º e 21 da Lei 9.307/1996. Não
configurada qualquer ofensa ao contraditório e à ampla defesa. Recurso desprovido”.
10
11
“Art. 348. Se o réu não contestar a ação, o juiz, verificando a inocorrência do efeito da revelia previsto no
art. 344, ordenará que o autor especifique as provas que pretenda produzir, se ainda não as tiver
indicado.”
12
Cf. Regulamento do CAESP, art. 33, destacando que tal sugestão pode ser dada “a qualquer momento”.
13
Anote-se que em procedimento por nós conduzido como Presidente do Painel, por nossa provocação,
inclusive convocando as partes para tanto, chegou-se a uma composição entre após já transcorrida longa
etapa do procedimento, até mesmo com detalhada instrução. E assim, podemos confirmar que, na prática,
é saudável a iniciativa de aproximação das partes pelo árbitro não apenas no início do procedimento. Cf.
neste sentido, Leonardo de Faria Beraldo: “não está o árbitro limitado à tentativa de conciliação apenas na
fase inicial do proceso arbitral, podendo, a qualquer instante, de ofício ou por requerimento, intimar as
partes a comparecerem em audiencia ou reunião com esta finalidade.” BERALDO, Leonardo de Faria,
Curso de Arbitragem..., cit., p. 293.
14
“Art. 28. Se, no decurso da arbitragem, as partes chegarem a acordo quanto ao litígio, o árbitro ou o
tribunal arbitral poderá, a pedido das partes, declarar tal fato mediante sentença arbitral, que conterá os
requisitos do art. 26 desta Lei.”
15
Pela peculiaridade da situação, e havendo consenso das partes, evidentemente desconsidera-se a restrição
à “sentença parcial” (art. 32, V, da Lei 9.307/1996), que, aliás, como se verá, já vem sendo moderada, e a
regra segundo a qual, proferida a sentença, “dá-se por finda a arbitragem” (art. 29 da Lei 9.307/1996), pois
ainda pendente de solução parte do conflito.
16
Acrescentando: “... desde que a parte que pretenda alegar o vício tenha se insurgido na primeira
oportunidade que tiver para falar, nos termos do art. 20 da Lei de Arbitragem” (SCAVONE JUNIOR, Luiz
Antonio. Manual de arbitragem. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Ed. RT, 2010. p. 112).
17
Melhor seria, diz o autor acertadamente, se a Lei “declarasse ser recomendável” a tentativa de conciliação,
de qualquer forma considera inaceitável considerar nulo o procedimento diante da omissão do árbitro,
pois “até mesmo no âmbito judicial a doutrina e jurisprudência encaminharam-se no sentido de anotar
que a falta de tentativa de conciliação a que se refere o art. 488 do CPC não pode levar à anulação do
processo” (CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem..., cit., p. 303).
18
Embora assim também se tenha previsto no Código de Processo Civil, atual ou em vacância (art. 370 do
CPC/2015), em razão da distribuição do ônus da prova (art. 373 do CPC/2015), o que se vê, na praxis, é o
magistrado passivo, acomodado à iniciativa da parte para requerer tal ou qual providência,
principalmente nos conflitos relativos a direito patrimonial disponível. Aliás, determina-se às partes a
“especificação de provas”, antes até de se fixar os pontos controvertidos, e em muitas situações,
impropriamente, o julgador espera um lapso ou descuido da parte para, sem maiores dificuldades
inerentes à persuasão racional, desacolher tal ou qual alegação por falta de prova. Definitivamente, não é
esta a conduta que se espera do árbitro, cuja diligência representa um de seus principais atributos.
19
20
Merecem referência os esclarecimentos oferecidos por Pedro A. Batista Martins sobre a admissibilidade
da prova: “Registre-se que é do árbitro o poder de admitir ou não as provas requeridas pelas partes. E não
serão admitidas, necessariamente, todas as provas solicitadas. Tal não acarreta, como pensam e sugerem
alguns advogados em arbitragem, violação ao devido processo legal e, consequentemente, a anulação da
futura decisão arbitral”. E completa o coautor da Lei de Arbitragem: “Aliás, o hábito de se peticionar neste
sentido, como meio de intimidação, não há de produzir qualquer efeito na pessoa do árbitro experiente.
Ao contrário, soará como certa imaturidade e deselegância do advogado, visto que este sempre tem, e terá,
à sua disposição, o caminho da ação de nulidade em sede arbitral. E, para tal, não precisa se valer de
técnicas de ‘guerrilha processual’ na busca, não raro infantil, de atemorizar o árbitro” (MARTINS, Pedro
Antonio Batista. Panorâmica sobre as provas na arbitragem. In: JOBIM, Eduardo; MACHADO, Rafel Bicca
(coord.). Arbitragem no Brasil – Aspectos jurídicos relevantes. São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 339).
21
Para maior aprofundamento sobre o tema, recomenda-se a leitura de BERALDO, Leonardo de Faria, Curso
de Arbitragem..., cit., Capítulo IV – Procedimento Arbitral, item 21, p. 313 e seguintes, por tratar bem, e
com pertinentes detalhes os “Poderes instrutórios do árbitro e a teoria geral das provas na arbitragem” e
diversas provas em espécie na arbitragem.
22
Meios estes já usuais na arbitragem, e que passaram a ser também previstos no Código de Processo Civil
de 2015 (art. 385, § 3.º).
23
Como não há a pena de confissão, não se justifica a previsão contida no CPC de intimação pessoal para
tanto.
24
Acrescentando os parágrafos do artigo referido outros detalhes, como a forma de comunicação (carta
registrada com aviso de recebimento), procedimento para informação ao juízo do quanto promovido, e
situações em que a intimação será feita pela via judicial.
25
Por qualquer meio idôneo de comunicação, porém, com elementos para se confirmar de maneira
inequívoca, o seu recebimento pelo destinatário, como acima visto.
26
27
Por exemplo: a SP Arbitral exige pagamento único da Taxa de Administração, no ato da celebração do
Termo de Arbitragem; a Camarb exige que cada uma das partes deposite 50% da Taxa de Administração
no ato de celebração do compromisso arbitral; a CCI exige o pagamento de um adiantamento, não
reembolsável, por cada Requerimento apresentado nos termos do Regulamento.
28
Personagem da arbitragem sobre o qual já falamos anteriormente, cf. Capítulo 7, item 7.3.3.
29
30
31
32
Esta questão merece especial atenção quando estamos à frente de arbitragem no direito do consumidor,
ou mesmo no direito societário, como veremos no capítulo destinado à arbitragem temática.
33
Apenas quando a parte se fizer acompanhar de advogado, pois a presença deste não é obrigatória no
procedimento arbitral, como já se disse.
34
Já nos deparamos, e se mostrou bem adequada tendo em vista o expressivo conteúdo econômico do
contrato, com cláusula arbitral limitando a condenação a eventual imposição de verba honorária,
evitando, assim, despropositada fixação com base no valor em discussão. Mais comuns são as cláusulas
nas quais cada parte arcará com os honorários de seu advogado.
35
Confirma-se, a respeito mais aprofundado, estudo feito por Napoleão Casado Filho, em Tese de Doutorado
defendida na Faculdade de Direito da PUC/SP em 2014, com o título “Arbitragem Comercial Internacional e
Acesso à Justiça: o novo paradigma do Third Party Funding”.
36
Para não se falar até em necessária publicidade dos atos envolvendo o poder público, conforme as
circunstâncias.
38
39
A respeito da qual escreveu à época Donaldo Armelin: “Essa sugestão é pertinente e adimple uma das
características básicas da arbitragem, que é a de manter o sigilo a respeito da matéria objeto de sua
atuação, o que seria esgarçado se escancarado na carta arbitral o objeto da arbitragem” (ARMELIN,
Donaldo. Arbitragem e o novo Código de Processo Civil. RArb 28/131).
40
Embora se conheça a larga discussão a respeito da interrupção da prescrição pela iniciativa da demanda
(por exemplo, sua antecipação à distribuição da ação e o confronto da lei processual com a lei civil,
verificados detalhes diversos em uma e outra norma, aparentemente mais harmônico o modelo adotado
pelo Código de Processo Civil de 2015), deixa-se de trazer este debate nesta sede, limitando-se a remeter o
leitor ao completo estudo da matéria feito por Yussef Said Cahali, na atualização de sua clássica obra sobre
o tema: CAHALI, Yussef Said. Prescrição e decadência. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. RT, 2012.
41
Cf. a respeito, as diversas possibilidades no Capítulo 8 supra, item 8.4 – A instauração da arbitragem.
42
Com posição em parte diferente, mas na essência admitindo a interrupção da prescrição pela iniciativa da
parte em instaurar a arbitragem, escreve Scavone Junior: “Assim, a interrupção da prescrição na
arbitragem, no nosso entendimento, se dará com a aceitação do árbitro que terá efeito retroativo à data da
provocação da parte para que aceite o mister, aplicando-se, também, por analogia, a teoria da expedição,
de resto tradicional entre nós nos contratos” (SCAVONE JUNIOR, Luis Antonio. Op. cit., p. 116).
43
Também na amplitude por nós considerada quanto ao momento da interrupção da prescrição, e um dos
mais recentes livros de qualidade sobre arbitragem escreve Cândido Rangel Dinamarco: “Propõe-se diante
disso, que uma boa adaptação daquelas regras do Código de Processo Civil à arbitragem consista em fixar
na comunicação feita por uma das partes à outra, nos termos do art. 6º da Lei de Arbitragem, o momento
ao qual retroagirão os efeitos da notificação feita ao réu no processo arbitral (aplicação adaptada do art.
219, § 1.º, do CPC [1973 – correspondente ao art. 240, § 1.º, do CPC/2015]. Aquela primeira iniciativa é uma
indiscutível manifestação de irresignação em face de uma situação jurídica não desejada, equivalendo
para esse efeito, mutatis mutandis, à iniciativa de um processo perante o Poder Judiciário mediante o
ajuizamento da petição inicial. É naquele momento inicial que o sujeito rompe a inércia e já não se
considera um dormiens descuidado do resguardo de seu direito. A partir daí vários atos deverão ser
realizados, e tanto tempo poderá decorrer até quando realmente a demanda venha a ser proposta perante
os árbitros, sendo ilegítimo sujeitar aquele que já saiu da inércia às incertezas de fatos e situações
completamente fora de seu controle” (A arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros,
2013. p. 142-143).
44
CAHALI, Yussef Said. Prescrição e decadência cit., p. 139-140, trazendo à colação CARPENTER, L. Da
prescrição. In: LACERDA, Paulo de. Manual de direito civil brasileiro. Rio de Janeiro: Ed. Jacintho R.
Santos, 1919. vol. IV, p. 369. Cf. ainda, TJRS, Apelação Cível 70045060670, 17.ª Câmara Cível, j. 20.10.2011,
v.u., rel. Des. Elaine Harzheim Macedo, na qual consigna-se a “interrupção da contagem do lapso
prescricional quando do ingresso do pleito perante a Corte Arbitral”, aplicando ao caso a previsão contida
no art. 202, VI do Código Civil; in RJTJRGS 283/343.
45
46
Neste sentido CARMONA (Arbitragem..., cit., p. 299); e SCAVONE JUNIOR (op. cit., p. 113), em sentido
contrário.
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
SUMÁRIO
Pelo Código de Processo Civil revogado (CPC/1973), não obstante os ajustes que se fizeram ao
longo do tempo, havia certa falha na sistematização das chamadas “medidas cautelares”, e “tutelas
antecipadas”, em certa medida coincidindo ou aproximando requisitos, fundamentos e efeitos. E
sabida a existência de uma zona cinzenta entre os dois instrumentos, tanto em relação à
providência em si requerida e/ou deferida, como também relativamente aos seus requisitos,
admitia-se a fungibilidade entre eles (regressiva ou progressiva)1; vale dizer, mesmo tendo sido
requerido um provimento, por falha, engano, pouca técnica ou diverso entendimento do
requerente, permitia-se o deferimento de outro que se mostrasse mais adequado à tutela do direito
questionado. E na prática, embora vedada a antecipação de tutela através de ação cautelar, esta
por vezes vinha deferida.
E classifica as tutelas de acordo com a causa da pretensão provisória: quando o direito da parte
encontra-se a reclamar urgência ou mostra evidência, apontados requisitos e características
próprias para as respectivas providências.
Pelo novo regime, como visto, o gênero destas medidas passa a chamar tutelas provisórias
(Livro V – Da Tutela Provisória, Título I – Das Disposições Gerais – arts. 294 a 311), do qual são
espécies a tutela de urgência e a tutela de evidência. Sob outra perspectiva, tutela provisória, é o
nome da ação (do processo), cujo objeto em um primeiro momento será o pedido de medida
(tutela) específica, com fundamento na urgência ou na evidência. Com cognição sumária, sempre
há a verificação da probabilidade do direito.
Tal qual no sistema de 1973, mas com peculiaridades novas a serem adiante apontadas, a tutela
provisória de urgência, poderá ser antecedente ou incidente ao processo considerado principal, na
qual a tutela definitiva (mérito do litígio) estará sendo discutida. Por sua vez, a tutela de evidência
será sempre incidente.
Na tutela provisória de urgência, ainda, poderá ser requerida medida cautelar, ou antecipada,
cada qual com características próprias, mas sempre no pressuposto de estarem presentes o fumus
boni iuris e o periculum in mora; estes são essenciais ao cabimento da tutela de urgência (art. 300
do CPC/2015). 2
Na tutela provisória de evidência, a medida a ser buscada será de natureza antecipatória do
resultado futuro, e independente da demonstração do perigo na demora do processo; indicadas (e
ampliadas em relação ao previsto no CPC/1973) as hipóteses de seu cabimento (art. 311 do
CPC/2015).3
Grosso modo, agrupam-se as medidas em razão do ponto comum entre elas, consistente na
provisoriedade (art. 296 do CPC/2015), classificando-as pela causa do pedido (urgência ou
evidência), e não pela natureza da tutela pretendida (meramente cautelar ou antecipatória de
resultado futuro).
Anote-se ainda que a inovação legislativa sugere restrição ao deferimento da medida pela
irreversibilidade da decisão apenas quando tratar-se de tutela de urgência de natureza
antecipada.6
Por fim, merece registro ter sido abandonada a tipificação de cautelares contida na legislação
de 73, então com ritos, pressupostos e características próprias, adotada a referência genérica a
algumas delas (art. 301), fortalecendo o poder geral de cautela ao autorizar o juiz a “determinar as
medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória” (art. 297 do CPC/2015).
O estudo das cautelares e da tutela antecipada já desafiava a doutrina processual, com diversos
e proveitosos trabalhos a respeito, e se mostrava de grande utilidade pela variável jurisprudência
diante da enorme casuística. Com a inovação, certamente mais se provocará o rico debate sobre
este fascinante tema.
Mas, nesta oportunidade, apresenta-se esta rápida passagem apenas para se situar o leitor no
novo sistema, direcionadas as considerações seguintes à análise destas tutelas provisórias no
cenário arbitral.
Como já visto, pode ocorrer certa demora na instituição do juízo arbitral, na forma do art. 19 da
Lei de Arbitragem brasileira, e talvez aqui, então, maior pertinência terá a tutela provisória de
urgência antecedente.
Ora, enquanto não instituído o juízo arbitral a quem possa a parte requerer as providências
urgentes, para preservação de seus direitos e exercício pleno do acesso à ordem jurídica, será feito
o pedido de tutela perante o Poder Judiciário, “assegurado como garantia constitucional em favor
de todos, em caso de violação ou ameaça de violação de direito”.7
Mas lembre-se que o Judiciário terá sua atuação, neste caso, limitada à apreciação da tutela de
urgência, impedida a análise do mérito da causa.8
Se antes a matéria foi merecedora de certa dúvida, embora sempre firme a nossa posição a
respeito desde a edição inaugural deste “Curso”, a orientação tomou bom rumo com precedente do
Superior Tribunal de Justiça no qual a relatora, Min. Nancy Andrighi, reconhece o acesso ao
judiciário nesta situação peculiar, mesmo existente a convenção de arbitragem, sem afronta ao seu
efeito vinculante.9 Esta decisão foi seguida por outros julgados no mesmo sentido.
Art. 22-A. Antes de instituída a arbitragem, as partes poderão recorrer ao Poder Judiciário para
a concessão de medida cautelar ou de urgência.
Parágrafo único. Cessa a eficácia da medida cautelar ou de urgência se a parte interessada não
requerer a instituição da arbitragem no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data de efetivação da
respectiva decisão.
Art. 22-B. Instituída a arbitragem, caberá aos árbitros manter, modificar ou revogar a medida
cautelar ou de urgência concedida pelo Poder Judiciário.
A bem da verdade, era desnecessária a reforma neste particular, mas não deixa de ter alguma
utilidade, não só pelo caráter pedagógico, mas para impedir que a dúvida viesse a ser levantada
por algum desconhecedor da doutrina e jurisprudência.
E assim, a reforma da Lei de Arbitragem entrou em vigor “velha” quanto à novel disciplina das
medidas de urgência.
Mas, no quanto cabe de superficialidade neste “Curso”, com restrito ambiente para mais
complexas teses jurídicas, a conciliação das regras (CPC/2015 e LArb. reformada) é simples: basta
substituir a referência a “medida cautelar ou de urgência”, por “tutela provisória de urgência”.10
Definida a jurisdição estatal neste momento pré-arbitral, surgem os seguintes aspectos a serem
observados:
Por fidelidade à convenção de arbitragem, devem ser indicados para atendimento deste
requisito, a existência da cláusula ou compromisso, e o quanto será apresentado na arbitragem.
O Código de Processo Civil de 2015, como suscintamente já referido, traz como inovação a
apresentação do pedido principal de tutela definitiva nos próprios autos da tutela de urgência
provisória, quer seja antecipada (art. 303), quer seja cautelar (art. 305), inexistindo agora a então
chamada “ação principal” que deveria ser proposta em 30 dias (art. 806 do CPC/1973). Ou seja, não
mais se terão dois “processos” (ainda que apensados), mas apenas um, concentrados todos atos nos
mesmos autos (agora ainda em ambiente eletrônico). Em outras palavras, o que se tinha de ação
autônoma (“ação cautelar”), independente, com começo, meio e fim próprios, antecedente ao
“processo principal”, deixa de existir.
O avançado modelo fala em aditamento das razões para contemplar o pedido de tutela final, ou
apresentação de pedido principal, com outros documentos se o caso, tudo nos mesmos autos,
inclusive sem novo recolhimento de custas (arts. 303, § 1.º, I e 308 do CPC/2015). Há, pode-se dizer,
um processo de continência da tutela definitiva em relação à provisória, em que este passa a ser
integralmente contido naquele.
Ainda, estabelece prazo diverso para esta providência, a depender da tutela provisória
pretendida: se antecedente antecipada, o prazo é de 15 dias (art. 303, § 1.º, I, do CPC/2015);11 se
antecedente cautelar, o prazo é de 30 dias (art. 308 do CPC/2015). Tenha-se presente, por oportuno,
que a contagem do prazo se fará por dias úteis, e não corridos (art. 219 do CPC/2015).
Ainda, se prevista cláusula escalonada (Cf. Capítulo 6, item 6.2.4.), pela qual a mediação prévia
é considerada vinculante e impeditiva do procedimento arbitral, a iniciativa desta etapa
(mediação), na forma especificada na convenção, é igualmente suficiente para se considerar
cumprido o prazo, desde que, frustrada a composição, siga-se a arbitragem. Ora, não se tem como
exigir a instauração da arbitragem, para atendimento do parágrafo único do art. 22-A referido, se à
parte for vedada esta iniciativa, enquanto não promovida a mediação. Daí ser correto esperar do
interessado que, no prazo legal, adote a providência cabível, tal como pactuado, para se buscar a
solução do conflito, seja ela a instauração da arbitragem (em qualquer de suas variáveis), seja ela a
provocação da mediação, conforme o caso.
A propósito, confira-se correta decisão proferida no TJDFT, pelo qual se manteve a liminar
deferida no recurso, como tutela provisória cautelar antecedente, durante a instituição da
mediação, por requerimento da parte, considerado que a outra parte manifestou interesse no
procedimento autocompositivo. E assim se concluiu: “DETERMINO que a produção de efeitos da
liminar anteriormente deferida se estenda pelo prazo de 3 (três) meses ou até que seja concluída a
mediação, o que ocorrer primeiro. Após o encerramento da mediação, se infrutífera, deverá a
agravante instaurar o procedimento de arbitragem no prazo máximo de 30 (trinta) dias, conforme
determina o artigo 22-A, da Lei 9.307/96, sob pena de revogação da medida de urgência. Caso
ultrapassado o prazo de 3 meses sem a conclusão da mediação, devem os autos retornar conclusos
para nova apreciação”.13
Pela decisão, não se tem elementos para saber se a cláusula era escalonada, cuja solução em
nosso sentir se alcança pelo quanto acima referido. Ao que parece, a instituição da mediação foi
espontânea, e não decorrente de prévia convenção. Mesmo assim, e de forma acertada em nosso
entender, foi considerada atendida, provisoriamente, a exigência legal quanto ao prazo, diante da
concordância da outra parte com a mediação. Pertinente a solução final adotada, pela qual se
impôs o prazo de 30 dias para a instauração da arbitragem após o encerramento infrutífero da
mediação, e ainda, fixou o prazo de 3 (três) meses para revisão da decisão, se não encerrada a
mediação neste período.
Os autos da tutela de urgência preparatória, terão rumo diverso daquele usual previsto nas
suas regras de regência; não se fará unificação; inexistirá o aditamento ou complementação para
neles se abranger o pedido final de mérito (com o mais a ele pertinente), pois a tutela definitiva é
direcionada, com procedimento próprio, ao juízo arbitral. Desta forma, ao invés de serem
incorporados pela lide principal, os autos (do processo eletrônico) permanecem independentes.
E assim se faz sem mácula ao sistema, mas como situação inerente à duplicidade de jurisdição,
a ser exercida cada qual em momento próprio, com a subsistência da tutela provisória de urgência
antecedente no juízo estatal, sem qualquer acréscimo relativo à tutela definitiva, até o
deslocamento da matéria ao juízo arbitral.
Instaurado o juízo arbitral (LArb., art. 19), a jurisdição sobre o conflito passa a ser do árbitro, e,
assim, a ele deve ser encaminhada, também, a questão objeto do pedido de tutela provisória
envolvendo o litígio. O juiz estatal perde, neste instante, a jurisdição, e as decisões a respeito
passam a ser de exclusiva responsabilidade do árbitro.14
A tutela de urgência, se deferida, prevalece. Porém, ao árbitro (ou tribunal arbitral) é facultada,
até mesmo de ofício, a reapreciação da medida, mantendo, revogando ou alterando a decisão.
Neste sentido, o art. 22-B da LArb. anteriormente transcrito.15 Também se já revista a tutela em
sede de tribunal estatal (no julgamento de agravo de instrumento ou liminar deste recurso),
mantendo ou reformando decisão original de primeiro grau, tem o juízo arbitral a autoridade para
novo exame da medida, pois a ele, agora, é outorgada a jurisdição plena sobre a matéria.
Tudo quanto se expôs também vale para as situações em que, por algum motivo, venha a ser
desfeito provisoriamente o juízo privado (falecimento do árbitro, renúncia ou acolhimento de
recusa apresentada pelas partes), enquanto não instituída ou recomposta nova instância arbitral
com a investidura da jurisdição em outro(s) árbitro(s). Ao se restabelecer o curso da arbitragem, a
esta se devolve a análise da medida eventualmente deferida no Judiciário.
Na prática doméstica, em nosso Curso de Arbitragem, observamos que este procedimento não
conta com a simpatia dos arbitralistas em geral, tampouco das partes, até porque a decisão liminar
proferida pelo “árbitro provisório” em caso de descumprimento reclama como regra a cooperação
do Poder Judiciário, a provocar demora talvez comprometedora do direito. Em casos de urgência,
então, tem sido considerada a melhor opção, dirigir-se diretamente ao Poder Judiciário.19
E a pesquisa realizada pelo GPA-PUC/SP confirmou a pouca adesão à iniciativa ao apurar que
das 22 (vinte e duas) instituições consultadas, apenas 5 (cinco) delas (19%) oferecem alguma forma
de solução emergencial de conflito.
Como principais características deste expediente, temos Câmaras com corpo permanente de
árbitros de emergência, ou com possibilidade, em uma delas, de apreciação do pedido cautelar
pelo Presidente da Instituição. Também é mais comum a vedação ao árbitro de urgência para
atuar na arbitragem futura entre as partes sobre a matéria de fundo.
Quanto à casuística da tutela de urgência preparatória à arbitragem, temos que anotar uma
questão capaz de gerar debate mais tenso e acalorado: até a 4ª edição deste “Curso”, foi com
segurança afirmado que, no modelo de então, não se admitia ao juízo estatal a análise e
deferimento de tutela antecipada, sendo esta reservada ao juízo arbitral20, facultada apenas a
análise de medidas cautelares.
Desta forma, se antes separadas a tutela antecipada (incidente) e a tutela cautelar (antecedente
e incidente), agora as duas medidas (não ação, mas o conteúdo da decisão) integram a categoria de
tutelas provisórias de urgência, como duas formas de assegurar o resultado útil da sentença
futura. São ambos provimentos de concretização da segurança que se quer para a eficácia do
processo.
Por fim, ainda outra questão certamente mais tensa refere-se à previsão no Código de
estabilização da tutela antecipada concedida na tutela provisória de urgência antecedente,
prevista no art. 304.22 Em síntese, se não interposto Agravo de Instrumento em face da decisão
concessiva da tutela provisória de urgência antecedente antecipada, a medida torna-se estável,
dispensado o aditamento, promovendo-se a extinção do processo. Anote-se que o prazo próprio
para defesa, seria apenas após a audiência, posterior ao aditamento relativo à tutela final. Mas
nada disso ocorrerá (aditamento, defesa etc.), pela não interposição do recurso, com a consequente
“estabilização” da medida. Resolve-se a crise no direito desta forma inovadora. Se as partes
estiverem satisfeitas com a estabilização, basta permanecerem inertes. Caso contrário qualquer
das partes terá o prazo de 2 (dois) anos para rever, reformar ou invalidar a decisão (tutela
antecipada estabilizada) através de ação própria para este fim (§ 2.º).
A sentença arbitral, desta maneira, reforma, mantém ou modifica em parte aquela tutela, e o
quanto mais vier a ser apresentado, e agora sim em caráter definitivo, com eficácia de “coisa
julgada”.
O juízo arbitral tem total autoridade para apreciar e deferir medidas de urgência no curso da
arbitragem. A jurisdição do árbitro (ou painel) é completa para o conhecimento de todas as
questões relativas ao conflito. Lembre-se apenas da ausência de poder coercitivo ou de poderes de
execução das medidas, estes privativos do Judiciário. Se não atendida espontaneamente a
determinação arbitral, ou sendo impossível o cumprimento espontâneo, deverá ser solicitada a
cooperação do juízo estatal para a efetivação forçada das medidas determinadas pelo árbitro.
Enfim, possui o árbitro o ius cognitio, mas falta-lhe o ius imperium para realizar na prática suas
decisões.
Em polêmico dispositivo, estabelecia a Lei de Arbitragem em sua versão original que, “havendo
necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão solicitá-las ao órgão do
Poder Judiciário que seria, originariamente, competente para julgar a causa” (art. 22, § 4.º
atualmente revogado).
Inúmeras críticas couberam a esta regra, não só pela sua imprópria localização (em artigo
destinado às provas orais da arbitragem), como também pela ambígua redação. Mas doutrina e
jurisprudência superaram a falha do legislador de então, conferindo à regra a extensão
esperada.23
Neste ambiente de evolução também da prática arbitral, veio a reforma de 2015, acima
indicada, e introduziu, como visto, disposição expressa na Lei de Arbitragem autorizando o
requerimento de “medida cautelar ou de urgência” diretamente aos árbitros (parágrafo único do
art. 22-B).
Mas poupamos o legislador de renovadas censuras por, como visto, ter se pautado no
ultrapassado regime jurídico (CPC/1973), e neste momento, apresentarmos o quanto de útil se tem
na Lei reformada.
Instaurado o juízo arbitral, a requerimento das partes, podem ser avaliadas medidas de
urgência (cautelares ou antecipadas) para se garantir o resultado útil da arbitragem. Cabe ao
árbitro a autoridade sobre a questão, independentemente da omissão a respeito na convenção de
arbitragem, pois contida esta atribuição na jurisdição que lhe é outorgada pelas partes,24 além de
vir prevista agora, expressamente, esta possibilidade. Também o árbitro avalia a providência mais
adequada e extensão da medida.
Deferida a medida, se necessário para seu cumprimento a interferência do Judiciário, com
providências coercitivas, estas devem ser solicitadas ao juízo estatal competente, em ambiente de
cooperação jurisdicional, através de carta arbitral (art. 237, IV, do CPC/2015 e LArb. reformada, art.
22-C, dentre outros dispositivos abaixo analisados).25
E o próprio árbitro se dirige ao Judiciário, com solicitação para serem adotadas as providências
pertinentes (por exemplo, busca e apreensão de mercadoria, arrolamento de bens com indicação
de depositário etc.).
A atuação do juízo estatal, nesta hipótese, é restrita à efetivação da tutela determinada. Não lhe
cabe, assim, avaliar a sua pertinência ou adequação, ou seja, não reexamina a questão, apenas
promove a realização da medida.
No curso da arbitragem, instituída a jurisdição do árbitro (ou painel), ao Judiciário será vedado
o conhecimento de ação cautelar a respeito do litígio. Nesta situação, já aparelhada a jurisdição
arbitral, cabe a alegação de existência da convenção de arbitragem para provocar a extinção do
processo sem resolução do mérito (arts. 337, X c/c 485, VII, do CPC/2015). Até mesmo se já proposta
a medida, mas ainda não apreciada, ficará prejudicado o pedido se instituída a arbitragem,
devendo o requerimento ser promovido agora perante o juízo arbitral, como incidente, não mais
antecedente.
Esta restrição pode ser total ou condicional, por exemplo, a prévia (e indispensável)
manifestação da parte contrária (evitando, nesta hipótese, apenas a liminar inaudita altera parte).
Aliás, como regra, e prestigiando o contraditório previsto no art. 21, § 2.º da Lei de Arbitragem, não
deve ser deferida qualquer medida sem oportunidade de defesa, ainda que assim se permita no
regulamento. E em nosso sentir só excepcionalmente, em situações extraordinariamente
peculiares pela casuística é que a medida poderá ser determinada sem contraditório.
Mas estará aberto, nesta hipótese, o acesso ao Poder Judiciário? Entendemos que sim. A
convenção, como qualquer disposição contratual, não tem força para retirar do lesado o acesso à
jurisdição, e assim, diante de convenção impedindo a análise de tutela de urgência no juízo
arbitral, devolve-se ao juízo estatal a jurisdição para a matéria, restrita, evidentemente, a este
pronunciamento, eventualmente necessário à efetividade da sentença arbitral. E também assim se
diz se a restrição vier consignada no termo de arbitragem.
Neste sentido, a conclusão de Fichner e Monteiro: “Diante disso, a solução aventada, e ora
proposta, é que os limites da convenção de arbitragem sejam, evidentemente, obedecidos pelo
juízo arbitral, abstendo-se este de decretar medidas urgentes no âmbito no processo arbitral, caso
haja expressa proibição na convenção de arbitragem. Isto não impede, por óbvio, que as partes,
mesmo em curso a arbitragem, requeiram então as medidas urgentes diretamente ao Poder
Judiciário, como forma de assegurar, assim, a efetiva e célere tutela dos interesses dos
jurisdicionados. Os árbitros e as partes deverão observar a tutela de urgência deferida, de
natureza provisória, até que possa ela ser substituída pelo provimento definitivo consistente na
sentença arbitral”.28
Contudo, autores sustentam ser “absolutamente nula” a convenção restritiva deste poder do
árbitro, por violar direito ao livre acesso à jurisdição, autorizando assim o árbitro a decidir sobre a
tutela de urgência ignorando o estabelecido pelas partes;29 outros entendem que, diante da
exclusão da possibilidade de tutela acautelatória, restaria ao interessado apenas conformar-se com
a futura sentença, em prestígio ao princípio da autonomia da vontade.30
Diversamente das medidas de urgência, cujo intento é, em regra, preservar o resultado útil do
processo diante necessariamente do risco da demora, a tutela de evidência, (qualificada como
antecipada no revogado CPC/1973) tem por objetivo precipitar, no todo ou em parte, o provimento
futuro. Embora provisória, pois definitiva só a sentença (após os recursos cabíveis, quando
judicial), a eficácia da tutela de evidência é idêntica ao provimento definitivo. Distinguem-se, pois,
uma e outro quanto ao momento e transitoriedade.
Com relação aos requisitos, como inicialmente referido, são indiferentes ao risco da demora no
julgamento definitivo (tutela de urgência); tem igual pertinência a antecipação de tutela, por
exemplo, diante do abuso de direito, manifesto propósito protelatório, fragilidade da resposta
diante de prova documental contida na inicial, ou incontrovérsia no pedido, e daí sua nomeação
no Código de Processo Civil de 2015 como tutela de evidência.
Ainda traçando sua distinção com as medidas de urgência, no aqui pertinente, a tutela de
evidência será sempre incidente, jamais antecedente (arts. 294 c/c 311 do CPC/2015). Ora,
representa exatamente trazer ao presente a tutela no futuro desejada, e assim se requer nos autos
onde o provimento definitivo é buscado, não em separado deste.
No exato instante em que as partes optaram por encaminhar o conflito ao juízo arbitral, a
solução, em definitivo ou antecipada, a este pertence, inadmitindo-se, aqui, fracionamento da
jurisdição, pois o provimento é o mesmo (distingue-se, como referido, quanto ao momento e
transitoriedade, mas no mesmo processo/procedimento), e inexiste urgência a se autorizar a
provocação do juízo estatal; assim, será reservada a análise desta tutela, por opção das partes, à
arbitragem.
Mas sem previsão legal, e afastada a incidência supletiva do Código de Processo Civil, mesmo
assim admite-se o pedido de tutela de evidência (antecipada) incidentalmente na arbitragem?
Assim, este instituto – tutela de evidência – é sem dúvida um útil incremento à tutela
jurisdicional na arbitragem.33
E mais, deferido ao juízo arbitral a jurisdição plena sobre o litígio, não há como negar-lhe o
pronunciamento incidente e provisório sobre todo o quanto se mostrar pertinente no curso do
procedimento, inclusive antecipando o resultado útil buscado. Aliás, permite-se até mesmo a
sentença parcial de mérito (LArb., art. 23, § 1.º),34 mais adequada nestas hipóteses, como logo mais
se verá.
Volta-se, neste momento, à questão da previsão desta tutela na convenção. Omissos a cláusula
compromissória, o compromisso arbitral, o termo de arbitragem (ou ata de missão) e o
regulamento da câmara arbitral escolhida, mesmo assim nada impede que seja solicitada e
deferida a tutela antecipada na arbitragem pelo quanto acima exposto.
Se, porém, houver restrição total ou parcial na convenção (impedindo a medida) os limites
estabelecidos devem ser respeitados.35 Neste particular, anote-se ademais que, diversamente do
quanto afirmado com relação às medidas de urgência, aqui não caberá o acesso ao Judiciário para
reclamar a tutela de evidência, pois despido de jurisdição sobre o mérito da causa, e inexistente a
medida desvinculada da ação principal. No juízo estatal, poderá, sim, exatamente diante de
eventual periculum in mora (com aquele mesmo fundamento fático que se levaria à arbitragem,
mas contida pela convenção a sua análise), ser apresentado pedido de tutela provisória de
urgência para garantir o resultado útil da sentença arbitral.
Por fim, anote-se que a polêmica a respeito da tutela de evidência quando já existente prova
exauriente a respeito do direito invocado perde espaço diante da possibilidade, cada vez mais
difundida, e agora prevista na Lei (art. 23, § 1.º), de se proferir sentença parcial.36
Ora, superado, aos poucos, o preconceito que às vezes existia em relação à sentença parcial pela
então ausência de previsão legal específica a respeito, sem dúvida alguma o julgamento definitivo
da parcela do conflito sobre o qual mostra-se impertinente a ampliação da instrução (necessária
esta, porém, para outras questões contidas na arbitragem), permitindo a sua imediata, total e
definitiva eficácia, é muito melhor e mais adequado do que um julgamento provisório através de
tutela de transitória evidência (antecipada).
E assim, pode-se afirmar que o debate a respeito da tutela de evidência na arbitragem, é mais
acadêmico do que prático, em especial pela sua nova roupagem introduzida na legislação
processual de 2015, em razão da qual se ampliam as hipóteses de cabimento, porém afastado o
periculum in mora como causa.
A convivência entre a jurisdição estatal e a arbitral sempre foi e continuará sendo fundamental
ao desenvolvimento da arbitragem. Esse regime de cooperação ou apoio aparece sob diversas
formas, desde a ação para instituição da arbitragem através de compromisso arbitral (em razão de
cláusula compromissória vazia – art. 7.º da Lei 9.307/1996), até o processo de invalidação de
sentença arbitral (interferência de controle e supervisão, não de apoio à arbitragem), passando
pela indicação de árbitro substituto, homologação de sentença arbitral estrangeira, execução da
sentença arbitral, e pela cooperação do Poder Judiciário ao desenvolvimento da arbitragem.
Assim, juízo estatal pode atuar antes, no curso ou depois do juízo arbitral. É desta cooperação
durante o procedimento que agora se ocupa:
Ainda, com a reforma de 2015, ficou em parte expressa na Lei (art. 22-B e seu parágrafo único),
a possibilidade de se ter tutelas provisórias de urgência cautelares proferidas pelo árbitro ou
tribunal.
Como já se sabe, por repetidas vezes referido, se necessária a efetivação da medida coercitiva,
esta necessariamente se dará pelo judiciário, escapando esta providência aos limites de atuação do
juízo arbitral (Cf. Cap. 7, item 7.9 supra).
Mesmo omissa a lei, advirta-se que outras providências, embora raras, podem ser solicitadas
por um ao outro, como aquelas meramente informativas ou de expediente para prática de atos
com determinado fim, a um certo e identificado magistrado. E considerando o paralelo de
jurisdições, deve-se aproveitar, no que couber, o quanto se tem a respeito de comunicação entre
juízos integrantes do Poder Judiciário, pois, da mesma forma, quando diversa a competência
territorial ou funcional (inclusive em relação à matéria federal ou estadual, cível ou penal etc.), há
intercâmbio entre magistrados para atender aos jurisdicionados na plena realização da tutela
pretendida.
Ocorre que, mesmo entre estes órgãos do Poder Judiciário, há certa indefinição, inclusive na
exegese da sistematização proposta pelo Código de Processo Civil de 2015 (arts. 67 e ss. – relativos
à cooperação nacional). Vejam-se as variáveis contidas no pedido de cooperação, para as quais não
se exige forma específica; mas ao mesmo tempo se faz remissão às cartas de ordem, precatória e
arbitral, com requisitos e formalidades próprias; assim:
Art. 68. Os juízos poderão formular entre si pedido de cooperação para prática de qualquer ato
processual.
Art. 69. O pedido de cooperação jurisdicional deve ser prontamente atendido, prescinde de
forma específica e pode ser executado como:
I – auxílio direto;
§ 1.º As cartas de ordem, precatória e arbitral seguirão o regime previsto neste Código.
§ 2.° Os atos concertados entre os juízes cooperantes poderão consistir, além de outros, no
estabelecimento de procedimento para:
§ 3.º O pedido de cooperação judiciária pode ser realizado entre órgãos jurisdicionais de
diferentes ramos do Poder Judiciário.
Embora não se possa dizer que a matéria veio a ser totalmente definida e solucionada, sem
dúvida alguma o capítulo criado, destinado à Cooperação Nacional, merece aplausos e créditos,
especialmente por ressaltar o “dever de recíproca cooperação” entre todos os órgãos do Poder
Judiciário, seus magistrados e servidores (art. 67 do CPC/2015).
E maior reverência se faz ao Código por ter acolhido a carta arbitral, adiante analisada, neste
ambiente de cooperação, integrando o juízo arbitral no espaço ocupado pelos órgãos do Poder
Judiciário.
Em geral, e no quanto pertinente neste estudo, são expedidos ofícios, quando se espera uma
providência do próprio magistrado destinatário, em si bastante, sem envolver qualquer outro
além de seu respectivo cartório (informativa ou de expediente; ou como referido na lei, para
“auxílio direto” ou “prestação de informação” – art. 69, I e III, do CPC/2015), e carta, quando se
solicitam providências a serem adotadas sob a jurisdição do destinatário (incerto), consistente em
atos mais complexos a serem promovidos, como citação, colheita de provas, e efetivação de tutela
provisória. Na primeira situação, o juízo destinatário certo e identificado no pedido, pratica o ato
(diretamente ou por seu próprio expediente administrativo), na segunda situação, o juízo a quem
for distribuído o pedido, de acordo com regras de organização interna, conduz a prática de atos
para a efetivação das providências solicitadas. 38
A forma como se faz a cooperação entre o juízo arbitral e o juízo estatal dependerá também do
conteúdo da solicitação: informações, providências diretas a serem promovidas pelo juízo
destinatário, ou prática de atos processuais sob a jurisdição do magistrado.
Também para a prática de determinado ato pelo próprio magistrado (ou seu respectivo
cartório), pode-se utilizar de ofício simples. Assim, para solicitar a liberação (expedição de guia de
levantamento ou alvará) relativamente a depósito no próprio juízo feito como garantia exigida
para liminar antes deferida em cautelar antecedente (já solucionado, por exemplo, o conflito por
sentença arbitral cumprida espontaneamente) ou mesmo para levantamento da constrição
determinada (quando necessária a intervenção judicial de quem estabeleceu a medida).
Em qualquer destas situações, há um destinatário certo: o juízo desta ou daquela vara ou
tribunal. E raras são as hipóteses de necessidade de providências, como antes referido, pois em
geral a parte interessada tem condições de promover diretamente a diligência; mas se faz a
observação para anotar que a cooperação entre os juízos vai além do contido nos § 2.º do art. 22 da
Lei de Arbitragem.
Para outras providências a serem solicitadas ao juízo estatal, cujo atendimento, porém,
dependerá de livre distribuição do pedido de cooperação para identificação de quem será o
magistrado com autoridade para supervisionar a prática do ato, é adequada a utilização de “carta
arbitral”, abaixo apresentada, a exemplo do que se faz com “carta precatória”.
E neste modelo se incluem as providências previstas no referido art. 22: medida coercitiva
probatória (§ 2.º), e outras medidas cautelares ou coercitivas decorrentes de tutela de urgência
deferidas no juízo arbitral (art. 22-B e seu parágrafo).
Por sua vez, a solicitação de apoio para as outras medidas, de natureza acautelatória ou
coercitiva, também por meio de “carta”, deve especificar qual a providência a ser adotada. E
assim, aos cuidados do juiz estatal, será determinado o seu cumprimento para, por exemplo,
arrolamento, bloqueio, constrição, busca e apreensão, entrega ou transferência de bens (e
mercadorias).
A seu turno, cabe ao Judiciário, no exercício de seu poder de império, promover, direta ou sob
sua autoridade, o cumprimento das providências solicitadas. Sua posição, neste momento, é de
cooperação com o juízo arbitral.
Significa dizer que o juízo estatal, em tese, não reexamina, aprecia ou avalia o conteúdo da
decisão arbitral, mas apenas concede-lhe efetividade. Assim, por exemplo, a pertinência da oitiva
da testemunha ou as razões de sua recusa ao comparecimento em juízo arbitral são questões
estranhas ao conhecimento do magistrado. Da mesma forma, se mais adequada esta ou aquela
medida de urgência, e mesmo o mérito da tutela em questão (como preenchimento de seus
requisitos etc.), são igualmente alheios ao objeto de apreciação pelo juiz togado.
10.5. Da carta arbitral – O Código de Processo Civil de 2015 e a Reforma da Lei de Arbitragem
E assim se disse por diversos motivos: uniformidade do procedimento em juízo estatal, e, como
as providências são processuais no Judiciário, esta razão tem relevância tal qual toda norma
relativa a processo civil em geral; segurança na prática dos atos em favor das partes na efetivação
da tutela jurisdicional, evitando-se que venham a ser exigidas dos atores da arbitragem (partes e
árbitros) formas, protocolos, providências ou documentos diversos, a critério pessoal do
magistrado, congestionando ou mesmo inviabilizando a realização, oportuno tempore, da medida;
ainda, confere-se segurança ao próprio juízo estatal, para se preservar de medidas cuja
autenticidade ou legitimidade sejam duvidosas, sem afrontar a autoridade arbitral.
Daí por que nosso apoio à iniciativa do Grupo de Pesquisa em Arbitragem – GPA, criado no
programa de pós-graduação da PUC-SP,43 em apresentar proposta de aperfeiçoamento ao então
Projeto de novo Código de Processo Civil em conjunto com a Comissão de Arbitragem e a
Procuradoria-Geral da OAB-RJ,44 para a criação do que nomeamos de carta arbitral.
E foi enorme a satisfação em ver acolhida a proposta, com a importante inclusão da carta
arbitral no ambiente de cooperação entre os órgãos do Poder Judiciário, para constar no Livro II –
Da função Jurisdicional, Título III – Da Competência Interna, Capítulo II – Da Cooperação Nacional,
conforme acima transcrito (arts. 68 e 69).45
II – rogatória, para que órgão jurisdicional estrangeiro pratique ato de cooperação jurídica
internacional, relativo a processo em curso perante órgão da jurisdição brasileiro;
III – precatória, para que órgão jurisdicional brasileiro pratique ou determine o cumprimento,
na área de sua competência territorial, de ato relativo a pedido de cooperação judiciária
formulado por órgão jurisdicional de competência territorial diversa;
(...)
§ 3.º A carta arbitral atenderá, no que couber, aos requisitos a que se refere o caput e será
instruída com a convenção de arbitragem e com as provas da nomeação do árbitro e de sua
aceitação da função.
Enquanto projeto de lei, mas já merecendo prestígio de especialistas, a sugestão foi assim
analisada pelo Prof. Donaldo Armelin: “Novidade que vem ao encontro dos legítimos interesses
dos arbitraristas. Institui-se, com ela, um veículo de comunicação entre os órgãos da jurisdição
estatal e da arbitral, implementando uma lacuna existente a respeito”.46
Ainda em andamento o Projeto de novo Código de Processo Civil, mas reconhecendo a total
pertinência e oportunidade da “Carta Arbitral”, o que muito nos orgulha por termos participado
diretamente de sua criação, conforme inicialmente referido, a proposta de reforma da Lei de
Arbitragem acolheu integralmente a ideia e fez constar a criação de “Capítulo IV-B Da Carta
Arbitral”, introduzido com o seguinte artigo: “Art. 22-C. O árbitro ou o tribunal arbitral poderá
expedir carta arbitral, para que o órgão jurisdicional nacional pratique ou determine o
cumprimento, na área de sua competência territorial, de ato solicitado pelo árbitro. Parágrafo
único. No cumprimento da carta arbitral será observado o segredo de justiça, desde que
comprovada a confidencialidade estipulada na arbitragem”.47
Por falta até então de uma, vieram duas leis a disciplinar o procedimento específico para o
cumprimento de providências de apoio do Poder Judiciário decorrentes de decisões possíveis de
serem proferidas no juízo arbitral, inclusive no que se refere às tutelas provisórias. Mas não se
afastam as demais formas de cooperação e convivência entre os juízos antes referidas, como
expedição de ofício ou pedido de informação, dependendo do quanto será objeto ou conteúdo
solicitado.
O Código é mais detalhado, estabelecendo os requisitos da carta arbitral (art. 260) e sendo a
legislação processual adequada para prever a forma e conteúdo dos atos a serem praticados no
Poder Judiciário, a previsão subsiste integralmente.
De outra parte, a respeito do conteúdo carta arbitral, a regra processual é mais ilustrativa na
referência à solicitação de “ato objeto de pedido de cooperação”, coerente aqui com o modelo
desenhado para esta cooperação, acima visto, esclarecendo a extensão inclusive a providências
“que importem efetivação de tutela provisória”. Mas sem dúvida, a abrangência referida se
contém na genérica indicação na Lei de Arbitragem reformada a “ato solicitado pelo árbitro”.
Quanto ao segredo de justiça contido no parágrafo único do art. 22-C da Lei de Arbitragem
reformada, também não há incompatibilidade, mas conformidade com a previsão contida no art.
189, IV, do CPC/2015, sendo este mais abrangente para todos os processos que versem sobre
arbitragem.48
Enfim, duas normas, com previsões gêmeas, que, embora reconhecidas particularidades,
convivem em harmonia.
A única, porém real e significativa vantagem desta duplicidade de normas é o efeito pedagógico
que nela se contém, de forma a permitir tanto àqueles que concentrem seus estudos apenas na Lei
de Arbitragem, como àqueles mais envolvidos com o processo civil (e por vezes desconhecedores
da Lei especial), a ciência deste novo e útil expediente.
Cria-se, como visto, uma estrutura formal para a comunicação através da carta arbitral quando
pertinente este expediente, e desta forma é facilitado o entrosamento entre ambas as jurisdições,
na medida em que uma saberá como solicitar e outra como receber as solicitações, evitando
desencontro de posições a respeito, nocivas, certamente, à efetividade pretendida na tutela dos
interesses da parte.
AMARAL, Paulo Osternack. O regime das medidas de urgência no processo arbitral. In: CAHALI,
Francisco José; RODOVALHO, Thiago e FREIRE, Alexandre (COORDS). Arbitragem – Estudos sobre a
Lei 13.129, de 26-5-2015. São Paulo: Saraiva, 2016.
BONATO, Giovanni. La Riforma Brasiliana Dell´arbitrato. In: Rivista Dell´Arbitrato, Anno XXVII
Fasc. 1-2017, Milano: Diuffrè Editore, 2017.
BONATO, Giovanni. Tutela anticipatoria di urgenza e sua stabilizzazione nel nuovo c.p.c.
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comparado, 2016, n. 4, 65 ss. e in [www.judicium.it], spec.
COSTA, Marina Mendes. Os poderes do tribunal arbitral para decretar medidas cautelares.
Revista de Arbitragem e Mediação. n. 28. ano VIII. São Paulo, jan.-mar. 2011.
FICHTNER, José Antonio; MONTEIRO, André Luís. Medidas urgentes no processo arbitral
brasileiro. Revista Trimestral de Direito Civil. n. 35. v. 9. Rio de Janeiro: Renovar, jul.-set. 2008.
MAGALHÃES, José Carlos de. A tutela antecipada no processo arbitral. Revista de Arbitragem e
Mediação. n. 4. ano II. São Paulo, jan.-mar. 2005.
RIBEIRO, Sérgio Luiz de Almeida. Breve reflexão sobre o tratamento das tutelas de urgência na
arbitragem de acordo com o Anteprojeto n. 406/2013 e os vetores que dele se extraem para
flexibilizar o monopólio do ius imperium do Estado In: Cahali, Francisco José; Rodovalho, Thiago e
Freire, Alexandre (coords). Arbitragem – Estudos sobre a Lei 13.129, de 26-5-2015. São Paulo:
Saraiva, 2016.
NOTAS DE RODAPÉ
1
Por previsão expressa havia a possibilidade de deferimento de medida cautelar quando requerida tutela
antecipada (art. 273, § 7.º, do CPC/1973), qualificada como fungibilidade regressiva, tendo a Doutrina e
Jurisprudência caminhado para admitir a possibilidade de deferimento de tutela antecipada, em situações
excepcionais, mesmo quando requerida a medida cautelar, identificada esta situação como fungibilidade
progressiva.
Assim: “Art. 300 – A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a
probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. § 1º Para a concessão
da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para
ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte
economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. § 2º A tutela de urgência pode ser concedida
liminarmente ou após justificação prévia. § 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será
concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.”
Assim: “Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de
dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando: I – ficar caracterizado o abuso do direito de defesa
ou o manifesto propósito protelatório da parte; II – as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas
documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; III
– se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito,
caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa; IV – a
petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a
que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II
e III, o juiz poderá decidir liminarmente.”
Ressalvada, como se verá, a estabilização da medida em situação específica possível de ocorrer na tutela
provisória de urgência antecedente antecipada.
Dispensado o pagamento de custas também quando a tutela provisória for requerida em caráter
incidental (art. 295 do CPC/2015).
Quando tal restrição no regime do CPC/1973 estendia-se também à tutela antecipada (art. 273, § 2.º, do
CPC/1973). E ainda pertinente a observação feita na 4.ª edição deste “Curso” quando apontada a restrição à
irreversibilidade da decisão: “Isso se justifica em razão da natureza provisória dessas medidas, mas
excepcionalmente, diante de conflito de valores fundamentais, em que tanto a decisão concessiva quanto
a decisão denegatória podem se tornar irreversíveis, a doutrina admite a superação dessa regra em prol
do princípio da efetividade do processo”.
7
Neste sentido, recente acórdão relatado pela Min. Nancy Andrighi, no Ag.Re na MC 19.226-MS, j.
21.06.2012, 3.ª T., m.v.,.
REsp 1.297.974/RJ, 3ª Turma, v.u., j. 12.06.2012; destacando-se da ementa: “Arbitragem. Medida Cautelar.
Competência. Juízo Arbitral não constituído. 2. Na pendência da constituição do Tribunal Arbitral, admite-
se que a parte se socorra do Poder Judiciário, or intermédio de medida de natureza cautelar, para
assegurar o resultado útil da arbitragem”. Cf. também, STJ, Conflito de Competência 111.230/DF, 2.ª Seção,
Rel. Min. Nancy Andrighi, m.v., j. 08.05.13.
10
Cf. adiante, em “Anexos”, especificamente em “Anexo 2”, o texto consolidado da Lei de Arbitragem,
apontadas as revogações, inclusões e alterações trazidas pela Lei 13.129 de 26.05.2015 com destaques
próprios, indicada também a versão original para confrontação.
11
12
13
14
Neste sentido, recente acórdão do STJ, no qual a relatora, Min. Nancy Andrighi, com a perspicácia que lhe
é peculiar, apresenta solução prática à questão, determinando o envio do próprio processo ao cenário
arbitral, destacando-se do voto: “Nessa situação, superadas as circunstâncias temporárias que justificavam
a intervenção contingencial do Poder Judiciário, e considerando que a celebração do compromisso arbitral
implica, como regra, a derrogação da jurisdição estatal, é razoável que os autos sejam prontamente
encaminhados ao juízo arbitral, para que este assuma o processamento da ação e, se for o caso, reaprecie
a tutela conferida, mantendo, alterando ou revogando a respectiva decisão” (REsp 1.297.974/RJ, j.
12.06.2012).
15
A respeito, cf. FICHTNER, José Antonio; MONTEIRO, André Luis. Medidas urgentes no processo arbitral
brasileiro, cit., p. 43-73, colacionando trabalho específico sobre o tema, escrito por Carlos Augusto da
Silveira Lobo e Rafael de Moura Rangel Ney, que, com base em Fouchard, Gaillard e Goldman, escrevem:
“A natureza precária das medidas acautelatórias permite aos árbitros rever decisões judiciais, sendo certo
que, na hipótese de se instaurar um conflito entre as medidas decretadas pelo Judiciário e as que o
tribunal arbitral entender cabíveis, prevalecerá o entendimento dos árbitros, pois somente eles detêm
jurisdição para deliberar sobre o mérito da causa” (LOBO, Carlos Augusto da Silveira; NEY, Rafael de
Moura Rangel.Revogação da medida liminar judicial pelo juízo arbitral. In: Almeida, Ricardo Ramalho
(coord.). Arbitragem interna e internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 256); em sentido contrário,
os primeiros nomeados indicam Luiz Roberto Ayoub, que diz: “Pode haver a possibilidade de o
compromisso não ter estipulado o Tribunal ou árbitro competente para dirimir o conflito; neste caso, há
uma exceção à regra, onde, uma vez concedida a liminar pelo órgão-juiz, esta prevalecerá, mesmo que a
posteriori haja a instituição do procedimento, este não tem o poder de desconstituir uma medida que fora
concedida antes mesmo da nomeação do árbitro ou Tribunal, fruto do que a doutrina chama de
compromisso em branco, só podendo mudar esta decisão se a sentença arbitral estipular o contrário”
(AYOUB, Luiz Roberto. Arbitragem: o acesso à justiça e a efetividade do processo. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2005. p. 80-84). Na jurisprudência, encontra-se acórdão do TJMG determinando a “remessa dos autos
ao árbitro para manutenção ou não da tutela concedida” (Ag 1.0480.06.083392-2/001/Patos de Minas, 12.ª
Câm. Civ., j. 14.02.2007, rel. Des. Domingos Coelho, DJMG 03.03.2007).
16
Cf. CAHALI, Francisco José. Medidas de urgência na arbitragem e o novo Regulamento do CAM/CCBC.
Revista de Arbitragem e Mediação. n. 33, 2012.
17
18
Cf. a respeito: CAHALI, Francisco José. Árbitro de emergência e arbitragem multipartes – Considerações
gerais e resultado da pesquisa do grupo de pesquisa em arbitragem da PUC-SP – Projeto II – 2º Semestre de
2015. Revista de Mediação e Arbitragem, ano XIII, n. 51, São Paulo, out.-dez. 2016, item 2. A oferta pelas
Instituições arbitrais de “Árbitro de Emergência”, onde o resultado da pesquisa também foi publicado.
Mais a respeito deste Projeto II do GPA-PUC/SP, inclusive com o nome dos pesquisadores, cf. Cap. 7, item
7.3, e em especial a nota de rodapé n. 18.
19
Acrescente-se: não só por descumprimento, mas por vezes, até porque a decisão liminar proferida pelo
“árbitro provisório”, diante do comando nela contido, reclama a cooperação do Poder Judiciário, os
advogados militantes na área têm preferido deixar esta tutela aos cuidados do Juízo Estatal.
20
Assim: “E assim, especificamente nesta situação, não caberá ao juiz togado deferir tutela antecipada, a
pretexto da proclamada “fungibilidade das medidas”, pois antecipar a tutela só cabe a quem tem
jurisdição para apreciar a matéria de fundo. Ou seja, não se permite nesta situação a “fungibilidade
progressiva”; e em nota de rodapé a respeito: “Admitindo apenas a fungibilidade regressiva (deferir-se
medida cautelar em pedido de antecipação de tutela pelo juízo arbitral), mas não a fungibilidade
progressiva (análise de tutela antecipada em sede cautelar pelo juiz estatal), cf. AMORIM, Aureliano
Albuquerque. Arbitragem e Poder Judiciário – O sistema arbitral e o Judiciário brasileiro. Goiânia: UCG,
2009. p. 107, para quem será ‘impossível, sob pena de violar-se a norma procedimental, reconhecer
poderes ao juiz togado para concessão da tutela antecipada em sede de pedido simplesmente cautelas. A
intervenção judicial no sistema arbitral é mínima, ou seja, apenas quando a lei o permitir de forma
expressa, o que não é o caso em comento’”.
21
O restrito ambiente deste “Curso” impede a maior reflexão e desenvolvimento do raciocínio para uma
posição segura a respeito, mas sem dúvida o quanto colocado abre inclusive a oportunidade para o maior
debate a respeito.
22
Assim: “Art. 304. A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que
a conceder não for interposto o respectivo recurso. § 1.º No caso previsto no caput, o processo será extinto.
§ 2.º Qualquer das partes poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela
antecipada estabilizada nos termos do caput. § 3.º A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto
não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2.º. § 4.º
Qualquer das partes poderá requerer o desarquivamento dos autos em que foi concedida a medida, para
instruir a petição inicial da ação a que se refere o § 2o, prevento o juízo em que a tutela antecipada foi
concedida. § 5.º O direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no § 2.º deste
artigo, extingue-se após 2 (dois) anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, nos termos
do § 1.º. § 6.º A decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos
efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por
uma das partes, nos termos do § 2.º deste artigo.”
23
Cf., a respeito, mais aprofundado estudo feito por Fichtner e Monteiro (Medidas urgentes no processo
arbitral brasileiro, cit., p. 43-73), trazendo a referência aos autores favoráveis à posição aqui assumida
(dentre outros, Pedro Batista Martins, Carlos Alberto Carmona, Nilton César Antunes da Costa) e anotando
a posição contrária de Paulo Furtado e Uadi Bulos (FURTADO, Paulo; BULOS, Uadi. Lei da Arbitragem
comentada. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 93), escrevendo: “Destaca-se, desde já, que o Brasil está entre os
países que permitem aos árbitros a decretação de medidas urgentes no processo arbitral, o que não
ocorre, por exemplo, na Itália e na Argentina, em que há em suas legislações internas regras expressas
proibindo os árbitros de concederem essas medidas provisórias (vide, nesse sentido, o art. 818 do Código
de Processo Civil italiano e o art. 753 do Código de Processo Civil e Comercial da Argentina)” (FICHTNER e
Monteiro, Medidas urgentes no processo arbitral brasileiro, cit., p. 52). E ainda: “Na medida em que cabe
ao árbitro decidir todo o mérito do litígio, não há razão lógica para negar-lhe o poder para conhecer e
decretar medidas urgentes no curso do processo arbitral. Em outras palavras, se as partes conferem ao
árbitro o poder de processar e julgar o conflito de interesses em sua inteireza, não há razão legal ou lógica
para proibi-lo de conhecer de medidas urgentes, cujo objeto, dada sua natureza instrumental ou de
continência, nunca será mais abrangente do que a lide principal, a ser resolvida na sentença arbitral.
Trata-se de mera aplicação da regra de que pode o mais pode o menos (cuit licet quod est plus, licet utique
quod est minus)” (FICHTNER e Monteiro, Medidas urgentes no processo arbitral brasileiro, cit., p. 53). Cf.,
ainda, YARSHELL, Flávio Luiz. Brevíssimas notas a respeito da produção antecipada de prova na
arbitragem. Revista de Arbitragem e Mediação. n. 14, 2007. p. 52.
24
Neste sentido, Flávio Luiz Yarshell (op. cit., p. 53). Também assim o PLS 406/2013 ao sugerir parágrafo
único ao Art. 22-B acima citado com a seguinte redação: “Estando já instituída a arbitragem, as medidas
cautelares ou de urgência serão requeridas diretamente aos árbitros”. Situação diversa, porém, será a
vedação na convenção de deferimento de tutela cautelar pelo árbitro, conforme será adiante analisado.
25
Com diz Pedro Batista Martins: “É neste particular que se fraciona a jurisdição arbitral sem, contudo,
anulá-la, por lhe faltar o componente da coertio privativo do Estado” (MARTINS, Pedro Batista. Da
ausência de poderes coercitivos e cautelares do árbitro.In: CARMONA, Carlos Alberto; MARTINS, Pedro
Batista; LEMES, Selma Maria Ferreira (coord.). Aspectos fundamentais da Lei de Arbitragem. Rio de
Janeiro: Forense, 1999, p. 361).
26
Ou, como bem coloca Sérgio Bermudes: “Muitas vezes, basta ao juízo decretar uma providência para que,
dócil, a parte a cumpra” (BERMUDES, Sergio. Medidas coercitivas e cautelares no processo arbitral. In:
MARTINS, Pedro A. Batista; GARCEZ, José Maria Rossani (coord.). Reflexões sobre arbitragem. São Paulo:
LTr. 2002, p. 281).
27
Cf. o quanto escrevemos a respeito do novo Regulamento do CAM/CCBC: “A liberdade de escolha, nos
limites da lei, é sem dúvida um dos principais atrativos da arbitragem. Podem as partes, segundo sua
conveniência e/ou estratégia comercial, disciplinar questões relevantes quanto a eventual conflito, dentre
elas as relativas às medidas de urgência na arbitragem, provimentos estes cujo impacto na seara fática,
pelas suas características, é incontestável. (...) Desta forma, por convenção das partes, pode ser retirada da
jurisdição arbitral a autoridade para apreciar e decretar medidas cautelares, coercitivas e antecipatórias.
Caso assim se tenha pactuado, as medidas de urgência, evidenciados seus requisitos mesmo no curso da
arbitragem, deverão ser direcionadas ao Poder Judiciário, em situação em que haverá a convivência dos
juízos arbitral e estatal, cada qual com parcela limitada de jurisdição para a tutela do direito das partes”
(CAHALI, Francisco José. Medidas de urgência na arbitragem e o novo Regulamento do CAM/CCBC cit.
Revista de Arbitragem e Mediação. n. 33, 2012).
28
FICHTNER e MONTEIRO, Medidas urgentes no processo arbitral brasileiro, cit., p. 67. Também neste
sentido, Yarshell, Flávio Luiz. Op. cit., p. 53.
29
FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias. Arbitragem, jurisdição e execução. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1999. p. 224-225;
COSTA, Nilton César Antunes da. Poderes do árbitro. São Paulo: Ed. RT, 2002. p. 111; ROSA, José Carlos.
Medidas cautelares e arbitragem. São Paulo: Opera Nostra, 2006. p. 104; CARMONA, Carlos Alberto.
Arbitragem e processo. São Paulo: Atlas, 2009. p. 203).
30
AYOUB, Luiz Roberto. Op. cit., p. 80-84; LEMES, Selma Maria Ferreira. Convenção de arbitragem e termo de
arbitragem. Características, efeitos e funções. Revista do Advogado. n. 87. ano XXVI. set. 2006.
31
Neste sentido, SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Manual de arbitragem. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo:
Ed. RT, 2010. p. 134.
32
Ao Poder Judiciário estará vedado o deferimento desta medida, ainda que em aplicação da teoria da
fungibilidade em ação cautelar preparatória na vigência residual do Código de Processo Civil de 1973; ou
seja, afasta-se neste regime, como escrevemos na 4.ª edição deste “Curso”, a fungibilidade progressiva.
Anote-se, porém, o questionamento que se pode ter a respeito com o Código de 2015 em razão da nova
disciplina da tutela provisória, como acima visto (item 10.2.1).
33
Admitindo a tutela antecipada então prevista no CPC/1973, escrevem FICHTNER e MONTEIRO. Medidas
urgentes no processo arbitral brasileiro, cit., p. 60, trazendo Alexandre Freitas Câmara e Joel Dias Figueira
Júnior; ainda, neste sentido, SCAVONE. Op. cit., p. 134; COSTA, Nilton César Antunes da. Poderes do árbitro.
São Paulo: Ed. RT, 2002. p. 110. Em sentido contrário, MAGALHÃES, José Carlos de. A tutela antecipada no
processo arbitral. Revista de Arbitragem e Mediação. n. 4, p. 13, para quem, se não autorizado na
convenção, será vedado ao árbitro apreciar tutela antecipada, “por falta de jurisdição, como ocorria com o
juiz, antes da alteração da lei processual”. Aliás, enquanto vigente o § 4.º do art. 22, sustentava Donaldo
Armelin até mesmo a previsão implícita de cabimento da tutela antecipada contida neste dispositivo, hoje
revogado pela reforma de 2015, escrevendo o professor que, embora o texto “contemple apenas medidas
coercitivas ou cautelares, evidencia-se que o legislador, in casu, cuidou do todo ao se reportar apenas às
espécies” (ARMELIN, Donaldo. Jurisprudência comentada. Revista de Arbitragem e Mediação. n. 6, jul.-set.
2005, p. 225).
34
35
Aliás, não raras as convenções arbitrais que, para evitar surpresas no curso do procedimento, impõem
restrição à antecipação de tutela.
36
Cf., a respeito, Capítulo 11, item 11.7, adiante; cf., ainda, WALD, Arnoldo. A validade da sentença arbitral
parcial nas arbitragens submetidas ao regime da CCI. RDB 17.
37
Cf., inclusive, exemplo referido no Capítulo 8, item 8.5, quanto à antecipada rescisão de contrato.
38
A indefinição já vinha do Código de 1973, pela acanhada previsão de comunicação de atos contida nos
arts. 200 e ss. do CPC/1973, e a rotina direcionava a orientação na forma apresentada. Anote-se o mais
abrangente tratamento da matéria, através da introdução criativa e adequada de capítulo no Código
destinado à cooperação nacional, sendo alguns dos artigos acima reproduzidos.
39
Assim definido no Dicionário Houaiss: “Comunicação adotada no serviço público entre autoridades da
mesma categoria, ou de autoridades a particulares, ou de inferiores a superiores hierárquicos,
caracterizada por obedecer a certa fórmula epistolar e pelo formato do papel (formato ofício)”.
40
MARTINS, Pedro Batista. Da ausência de poderes coercitivos e cautelares do árbitro, cit., p. 370.
41
Idem, p. 361.
42
“Art. 267. O juiz recusará cumprimento à carta precatória ou arbitral, devolvendo-a com decisão motivada
quando: I – a carta não estiver revestida dos requisitos legais; II – faltar ao juiz competência em razão da
matéria ou da hierarquia; III –o juiz tiver dúvida acerca de sua autenticidade.”
43
O Grupo de Pesquisa em Arbitragem – GPA é liderado por este Autor e coordenado pelos mestrandos
Valeria Galíndez e André Luís Monteiro. Além do líder e dos dois coordenadores, participaram desse
primeiro projeto de pesquisa os acadêmicos Daniel Bushatsky (secretário), Antonio Carlos Nachif Correia
Filho, Flávia Gomes, Gledson Marques de Campos, Júlia Schledorn de Camargo, Juliana Cristina Gardenal,
Maithe Lopez, Priscila Caneparo, Renata Paccola Mesquita, Shirley Graff, Thais Matallo Cordeiro e Welder
Queiroz dos Santos.
44
Cuja representação e participação couberam ao Dr. Joaquim de Paiva Muniz, ao Dr. Leonardo Corrêa e ao
Dr. Ronaldo Cramer.
45
A proposta encaminhada originalmente teve a seguinte redação: “Art. 54. Os pedidos de cooperação
jurisdicional devem ser prontamente atendidos, prescindem de forma específica e podem ser executados
como: I – auxílio direto; II – reunião ou apensamento de processo; III – prestação de informações; IV – atos
concertados entre os juízes cooperantes. § 1.º As cartas de ordem e precatórias seguirão o regime previsto
neste Código. § 2.º A carta arbitral seguirá o regime previsto neste Código, atenderá no que couber, aos
requisitos do art. 216 e será instruída com a convenção de arbitragem, com a prova da nomeação do
árbitro e com a prova da aceitação da função pelo árbitro”.
46
47
Cf. adiante, em “Anexos”, especificamente em “Anexo 2”, o texto consolidado da Lei de Arbitragem,
apontadas as revogações, inclusões e alterações trazidas pela Lei 13.129 de 26.05.2015 com destaques
próprios, indicada também a versão original para confrontação.
48
49
Promovida entre 22 e 23 de agosto de 2016 pelo Centro de Estudos Judiciário do Conselho da Justiça
Federal. Cf. em “Anexo 7” o texto integral dos enunciados aprovados.
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
• Prazo – art. 23 (tb. arts. 11, III; 12, III; e 32, VI)
• Documento escrito – art. 24, com relatório/fundamentação/dispositivo – art. 26, I, II, III (tb.
arts. 27 e 28)
• Data, local – art. 26, IV, e assinatura – art. 26, parágrafo único
• Comunicação – art. 29
3. Sentença proferida por tribunal arbitral (arts. 24, §§ 1.º e 2.º; e 26, parágrafo único)
6. Efeitos da sentença
SUMÁRIO
11.1. • INTRODUÇÃO
11.1. Introdução
Tal qual a sentença judicial, pode decidir o litígio quanto à matéria de fundo, ou apenas
concluir pelo não cabimento da arbitragem, ao menos naquele instante, inclusive, dentre outros
motivos, até mesmo por faltar ao caso arbitrabilidade objetiva ou subjetiva. Nestes casos, aos
interessados restará o acesso ao Judiciário para análise do mérito da controvérsia.
Ou seja, a sentença arbitral poderá ser definitiva, decidindo o conflito1 (por exemplo,
condenando ao pagamento da multa pelo descumprimento contratual), ou meramente
terminativa, pela qual o procedimento se encerra, mas a controvérsia persiste, e pode ser levada
ao juízo estatal2 (por exemplo, reconhecida na arbitragem a nulidade da convenção, e, assim, o
interessado deve apresentar sua pretensão perante o Poder Judiciário; e anote-se nesta hipótese
que a instauração da arbitragem interrompe a prescrição, conforme art. 19, § 2.º, da Lei
9.307/1996,3 de acordo com a inovação introduzida pela Lei 13.129/2015).
Em qualquer das situações, a sentença arbitral decidirá, como já visto, sobre a responsabilidade
pelas custas e despesas com arbitragem, podendo estabelecer, inclusive, verba decorrente de
litigância de má-fé (art. 27 da Lei 9.307/1996).4
Também a sentença poderá ser meramente homologatória de acordo alcançado pelas partes e
levado a conhecimento do árbitro (art. 28 da Lei 9.307/1996), mas mesmo nesta situação o
pronunciamento deve preencher os requisitos obrigatórios (art. 26 da Lei 9.307/1996).5
No sistema anterior à Lei 9.307/1996, falava-se em laudo arbitral, como ainda hoje algumas
legislações estrangeiras se referem a este pronunciamento.6 Mais adequada, porém, a terminologia
atual, para marcar a nova sistemática introduzida pela lei, conferindo a força de título executivo
judicial à sentença arbitral,7 independente de homologação ou exame pelo Judiciário, como antes
se fazia. E mais: deixa-se clara a jurisdição exercida na arbitragem, inclusive confirmada pelo
Código de Processo Civil de 2015 (art. 3.º, § 1.º).
A finalização do procedimento arbitral tem data conhecida, por definição das partes (na
convenção arbitral, no termo de arbitragem ou ainda no regulamento da câmara eleita), ou por
disposição legal fixando o prazo de seis meses para ser proferida a sentença arbitral (art. 23 da Lei
9.307/1996).9 Significa dizer que a solução do litígio na arbitragem tem prazo máximo (e curto)
para ser alcançada.
A substituição do árbitro, por sua vez, faz restaurar o prazo primitivo, passando a ser a sua
aceitação o marco inicial da contagem, se com termo na instituição da arbitragem.
Importante notar o impacto deste prazo na arbitragem, pois se fosse “impróprio”, como é para
a sentença judicial (e há previsão, em certos casos, para ser proferida), e desprovido de qualquer
repercussão prática, de nada adiantaria ocupar-se com a questão.
A lei, neste aspecto, é severa: a sentença arbitral proferida fora do prazo será nula (art. 32, VII,
da Lei 9.307/1996), porém, para tanto, deve ser “respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta
Lei”, ou seja, cabe à parte interessada notificar o árbitro, ou presidente do tribunal arbitral,
“concedendo-lhe o prazo de 10 (dez) dias para prolação e apresentação da sentença arbitral”.
Gravíssimo o efeito do julgamento extemporâneo, porém este rigor se ameniza pela inércia das
partes em provocar o julgamento mediante comunicação ao juízo arbitral específica para este
fim.14
No entanto, em nosso sentir, a lei disse menos do quanto queria. Em uma análise sistemática da
norma, vale o princípio da provocação pelo interessado para obter o cumprimento do prazo, sem o
qual não se pode vulnerar a sentença arbitral tardia. Primeiro, porque se prestigia a vontade das
partes, como é comum na arbitragem, de tal sorte que, se satisfeitos os interessados com o
caminhar do procedimento, não seria adequado uma decisão precipitada, às vezes por poucos
dias, apenas para cumprir o prazo, deixado, assim, adequadamente nas mãos destes o poder para
provocar o encerramento da arbitragem. A seu turno, como em relação a diversas outras questões,
o quanto se tem para o compromisso também se terá para a cláusula arbitral, guardadas as suas
particularidades, tanto é que também esta se extinguirá, tal qual o compromisso, pela inércia do
árbitro após devidamente provocado. Ainda, seria no mínimo inadequado deixar a critério da
parte passar o prazo para, segundo o resultado da sentença, se em seu desfavor (e sempre haverá
um “vencido” ao menos em parte), invocar o vício; melhor seria, neste caso, sequer ser, então,
proferida a sentença.
Nas mãos dos interessados a iniciativa de provocar a solução da arbitragem, após o prazo legal
ou convencional, sem dúvida se terá uma utilidade enorme para impedir a eternização imotivada
do procedimento.
Com estas observações quanto ao prazo final da arbitragem, com pouca importância a forma de
contagem do período mensal (diverso que é da fluência do prazo em dias), e, ainda, igualmente de
menor significado discutir quando se considera prolatada a decisão, pois para cumprimento do
prazo legal de tolerância de 10 dias, diz a lei que deve nele ocorrer a “apresentação da sentença
arbitral”.
III – o dispositivo, em que os árbitros resolverão as questões que lhes forem submetidas e
estabelecerão o prazo para o cumprimento da decisão, se for o caso; e
Parágrafo único. A sentença arbitral será assinada pelo árbitro ou por todos os árbitros. Caberá
ao presidente do tribunal arbitral, na hipótese de um ou alguns dos árbitros não poder ou não
querer assinar a sentença, certificar tal fato.
Por expressa previsão, “a decisão do árbitro ou dos árbitros será expressa em documento
escrito” (art. 24 da Lei 9.307/1996). Admite-se todo o procedimento oral, mas a sentença deve ser
escrita e documentada, rejeitando-se outros meios (p. ex., gravação em áudio e vídeo), ainda que
comprovem a conclusão do árbitro.
Tratando-se de requisito de forma, seu desrespeito gera a nulidade da sentença. Embora o art.
32 da Lei de Arbitragem refira-se apenas à invalidação quando ausentes os requisitos de seu art.
26, a seguir analisados, neste último está implícito, pela maneira apresentada, o expresso no art. 24
– documento escrito –, pois se refere à indicação da data, local e, principalmente, assinatura dos
árbitros na sentença.
A seu turno, como já antes referido, cumpre-se o requisito mesmo diante de sentença proferida
em língua estrangeira, se assim convencionarem as partes, dispensada a utilização do vernáculo,
reclamando, porém, a sua tradução caso seja necessário exigir judicialmente o seu cumprimento
em território nacional.
O modelo adotado pelo legislador para a sentença arbitral é o mesmo da sentença judicial (cf.
art. 489 do CPC/201516), fortalecendo esta equiparação a identidade de ambas quanto à eficácia
jurídica deste pronunciamento jurisdicional. E ainda, reforça a necessidade de se oferecer ao
jurisdicionado uma satisfação do quanto avaliado e decidido.
Neste quadro, tudo o quanto se tem na doutrina e jurisprudência a respeito da sentença judicial
aqui se aplica, com poucas particularidades.
E não só para cumprir a determinação legal, mas também de grande valia uma bem delineada
fundamentação até mesmo para, perante as partes e seus respectivos advogados, mostrar a
importância e acerto na escolha do árbitro, valorizando a confiança que lhe foi depositada.
Ademais, é a partir de uma decisão fundamentada que as partes podem conferir eventual vício
na sentença, que possa ensejar pedido de esclarecimentos. É, portanto, uma garantia às partes.
Ainda, anote-se que na arbitragem por equidade, quando assim autorizado pelas partes, maior
atenção deverá ter o árbitro ao informar seus elementos de convicção para, no caso em exame,
encontrar a solução que lhe pareceu mais justa, devendo ser expressamente indicada na
convenção arbitral ou no termo de arbitragem a utilização desta forma de resolução do conflito.
Por fim, chega-se à conclusão quanto à solução adotada pelo árbitro para resolver o litígio, e
assim se fixa a decisão acolhendo ou rejeitando, no todo ou em parte, os pedidos formulados pelas
partes (lembrando a possibilidade, já estudada, de pedido contraposto).
Frise-se: o dispositivo é a congruência entre os pedidos das partes e o decido pelo árbitro ou
painel arbitral, mas não há obrigatoriedade dos julgadores de esmiuçarem cada ponto decidido.
E o acolhimento dos pedidos passa não só pela aplicação do direito ao caso concreto, como
também pela sua pertinência em relação à própria convenção. Ou seja, mesmo com razão uma das
partes quanto a seu pleito, se excluído da abrangência da arbitragem, o pedido não poderá ser
acolhido, sob pena de invalidação da sentença (art. 32, IV, da Lei 9.307/1996).
A seu turno, sobressaem aqui potenciais vícios já conhecidos da sentença judicial verificáveis
igualmente no laudo arbitral: decisão ultra, citra ou extra petita. Cabe ao árbitro decidir os
pedidos, tais quais formulados pelas partes. Nem mais, nem menos, tampouco concedendo tutela
diversa do que foi pleiteada, e tudo, ainda, com parâmetro delineado na convenção arbitral.
Enfim, a decisão deve correspondência ao pedido, limitada ainda ao convencionado pelas partes.19
E tudo sob pena de invalidação da sentença, como se verá com detalhes ao ser tratado o tema
(Capítulo 13).
O dia lançado na decisão põe termo à contagem do prazo (legal ou convencional) para ser
proferida a sentença arbitral, mas de pouco impacto, pois só se terá por comprometida a decisão
mediante a provocação da parte, depois de vencido o lapso temporal.
Deve ser apontada a data em que se conclui a decisão (individual ou colegiada). Ora, sendo
documento escrito (art. 24 da Lei 9.307/1996), indica-se o dia em que foi concluída a sua redação,
ou seja, estabelecida, definitivamente, a solução dada ao conflito. Mas nada impede que seja
indicada a data da assinatura.
Maior atenção se deve ter, porém, quanto ao local indicado na decisão, pois este identifica se a
sentença é nacional ou estrangeira (art. 34, parágrafo único, da Lei 9.307/1996), evitando-se, ou
não, a homologação da sentença arbitral no STJ, como estudaremos no próximo capítulo. Neste
contexto, deverá ser apontado o lugar previsto na convenção (e, em regra, a sede da arbitragem e
onde se promoveu direta ou indiretamente a reunião do colegiado para deliberação final),
independentemente de o instrumento vir a ser posteriormente assinado onde quer que no
momento se encontrem os árbitros (quando de nacionalidades distintas). Aliás, tratando-se de
arbitragem envolvendo julgadores residentes em países diversos, proveitosa a fixação, na
convenção, de que será considerado tal ou qual local para a sentença, independentemente de os
árbitros lá se reunirem fisicamente para tanto.
Por primeiro, note-se referir a lei à comunicação da sentença às partes, e não aos seus
procuradores, porém, a praxis informa como rotina a convenção das partes (ao menos na ata de
missão ou termo de arbitragem, se antes na cláusula ou compromisso nada se falar a respeito),
quanto à entrega da decisão aos advogados constituídos, com poderes para tanto.
De outra parte, fala-se no envio de cópia, porém, mais comum tem sido a entrega de originais
da sentença, promovida em tantas vias quanto as partes, além daquela destinada aos arquivos do
procedimento.
Ainda, nas arbitragens institucionais, também pode ocorrer o encaminhamento da decisão pela
secretaria do órgão (não pelo árbitro ou presidente do tribunal), que por vezes “convoca” as
partes, ou seus advogados, para retirar a sentença em sua sede.
Tratando-se de tribunal arbitral, a Lei de Arbitragem estabelece que “a decisão será tomada por
maioria. Se não houver acordo majoritário, prevalecerá o voto do presidente do tribunal arbitral”
(art. 24, § 1.º). O resultado será também uma sentença arbitral, porém decorrente de decisão
colegiada.
O painel pode ser composto por três, cinco ou mais árbitros, sempre em número ímpar por
expressa previsão legal (art. 13, §§ 1.º e 2.º, da Lei 9.307/1996). Enquanto não completo o número
ímpar, não se instaura a arbitragem. Neste contexto, impossível ocorrer empate na votação, e
prevalecerá, sempre, a posição majoritária.
Assim, por exemplo, se dois árbitros acolhem o pedido do solicitante, e o outro não, prevalece
aquela decisão, ou, se a maioria condena ao pagamento de multa contratual, este será o resultado
do julgamento.
Problema maior, contudo, a ser enfrentado refere-se à divergência quantitativa, com posições
distintas sem que qualquer delas se identifique com a outra, ou seja, cada julgador estabelece um
valor diverso para a mesma condenação (fixação em R$ 40.000,00, R$ 50.000,00 e R$ 1.000.000,00
pelos árbitros respectivos).
Carmona, em sua prestigiada obra, ampara-se nas lições de Barbosa Moreira e de Paulo Cesar
Pinheiro Carneiro para refletir sobre a questão; e, após identificar os dois critérios de solução da
divergência quantitativa, conclui pela prevalência do critério da continência. Por meio deste será
verificado qual o valor contido no número de pronunciamentos suficientes para compor a
maioria, rejeitando o critério da média aritmética (apurado pela soma dos valores apontados
dividido pelo número de julgadores).21
Este problema pode ocorrer em qualquer julgamento colegiado, inclusive nos tribunais
estatuais, sendo que cada qual encontra uma solução, como noticiado pelo referido professor,
indicando a divergência entre os Tribunais de Justiça do Rio de Janeiro e de São Paulo.22
Temos para nós, porém, que no juízo arbitral, por expressa previsão legal, diferentemente do
quanto se vê no Código de Processo Civil, nos casos de impasse onde inexista acordo majoritário,
deve prevalecer o voto do presidente do tribunal. Assim, condenando o primeiro árbitro ao valor
“X”, o segundo, ao valor “Y”, prevalecerá a quantia “Z” determinada pelo voto do presidente.23
Cabe, entretanto, ao presidente, no exercício desta posição, utilizar de extrema sabedoria para
encontrar o equilíbrio na condenação, mais do que pura e simplesmente impor com prepotência e
arrogância a sua posição, apenas pelo sabor da prerrogativa que lhe é conferida. Ou seja, espera-se
do presidente, nesta função, a condução do julgamento com temperança, prudência e moderação,
para, no desempenho da sua autoridade, encontrar o justo e mais adequado em favor dos
jurisdicionados. Antes de sentir-se soberano, com poder maior em relação aos demais, deve
investir-se de modéstia intelectual, para conscientizar-se do pesado fardo que carrega, pois lhe foi
atribuída uma responsabilidade, não um privilégio, de encontrar a decisão mais condizente com a
situação.
O presidente foi escolhido por seus pares, consideradas, em especial, suas qualidades. E em
diversos aspectos é a figura de grande relevância no desenvolvimento do procedimento arbitral;
este é mais um múnus de sua posição. E assim, a ele cabe a sensibilidade e responsabilidade pela
escolha da melhor solução ao caso em exame, devendo despir-se da tentadora imposição de sua
convicção pessoal pela pretensa superioridade.
Muitos falam aqui em “voto de minerva”,24 expressão utilizada para representar um voto de
desempate.25 Porém, como visto, não haverá empate propriamente dito, no sentido ilustrado pela
mitologia grega, em que aparece número idêntico em uma e outra posições, pois esta situação se
resolve pelo voto simples do terceiro árbitro (ou quinto etc.), neste ou naquele sentido. O impasse
decorre da constatação de posições diversas em número ímpar (três ou cinco soluções, sem que
qualquer delas encontre maioria mesmo com o voto simples do presidente). Não se elege uma ou
outra conclusão entre as duas oferecidas pelos demais julgadores por considerá-la a melhor, como
fez Minerva, mas na situação retratada na lei aparece uma terceira opinião, prevalecendo sobre as
demais, que não alcançaram a maioria.
Melhor, assim, identificar o voto como de qualidade, não de desempate. É a qualidade do voto
pelo status de presidente.
Neste contexto, para afastar o non liquet, estabelece a Lei de Arbitragem, por sua opção, o voto
de qualidade, que representa tecnicamente o voto com maior valor, ou prevalência sobre os
demais, atribuído ao presidente, por esta sua qualidade, exatamente para resolver a questão. Desta
forma, como referido, seu julgamento prevalece sobre os demais se por estes não alcançada a
maioria; aliás, como literalmente consta na lei.
Para esta conclusão, somos também influenciados pelo direito espanhol, que, aliás, possui regra
semelhante (art. 35, 1);26 e a respeito, inclusive, há na doutrina referência a esta situação, uma
verdadeira atribuição de faculdade decisória, ou seja, tem o presidente esta prerrogativa, e deve
exercê-la, pela investidura desta qualidade que lhe foi outorgada consensualmente.27
Advirta-se apenas que este critério é supletivo, ou seja, utilizado apenas no silêncio da
convenção (ou do Regulamento na arbitragem encomendada a uma instituição), pois cabe às
partes escolher a forma de solucionar impasse desta ordem, utilizando um dos critérios referidos
ou outros,28 ou, ainda, estabelecendo que, no caso, será ampliado o painel com a expectativa de se
obter maioria.
Por outro lado, diante de um tribunal arbitral, todas as decisões são tomadas por este critério,
inclusive aquelas relativas à instrução e à análise de tutelas cautelares, antecipadas etc.,
consignadas pelas também chamadas ordens processuais. Assim, por exemplo, acolhida prova
pericial por unanimidade, mas divergindo o colegiado quanto ao perito a ser indicado, cada qual
apresentando um profissional diferente, prevalecerá o escolhido pelo presidente, diante da
ausência de maioria quanto a outro nome.
Anote-se, por fim, que todos os árbitros devem assinar a sentença, e, “na hipótese de um ou
alguns dos árbitros não poder ou não querer assinar a sentença”, caberá ao presidente do tribunal
arbitral certificar o fato (art. 26, parágrafo único, da Lei 9.307/1996), e assim levar adiante a
conclusão do procedimento, com a comunicação das partes quanto à decisão considerada
colegiada, sob pena de, se não o fizer, eternizar o procedimento.
É facultado, e não obrigatório, ao árbitro vencido declarar as razões de sua divergência (art. 24,
§ 2.º). Tratando-se de julgamento em instância única, nenhum reflexo à arbitragem terá a
consignação do voto. Aliás, nem mesmo se faz necessária a identificação de qual dos árbitros terá
sido o voto isolado.
Para ressalvar sua posição, por qualquer motivo, ainda que simplesmente para tornar
conhecidos os elementos de sua convicção, pode o árbitro declarar em separado o seu voto.
Admite-se, ainda, fazer a ressalva de seu entendimento no próprio corpo da sentença, no texto
corrido, em capítulo separado, ou até mesmo em observação acrescentada por simples nota de
rodapé. Inexiste rigor na maneira como o dissidente poderá, querendo, apontar a divergência.
Por outro lado, pode existir, excepcionalmente, por vontade das partes, previsão para recurso
arbitral próprio diante da divergência, com as características dos conhecidos “embargos
infringentes”, para que o colegiado seja ampliado, convocando-se dois novos integrantes para
confirmarem a maioria ou prestigiarem a divergência.29 Necessária será, então, nesta situação, a
declaração do voto divergente, para confrontação das posições pelo novo painel.
Como já se disse, inexiste previsão legal para recurso na arbitragem. Contudo, prevê a lei o
chamado de “pedido de esclarecimento”, expediente próximo aos conhecidos Embargos de
Declaração, para correção de erro material e ainda para sanar “obscuridade, dúvida ou
contradição da sentença arbitral”, ou se pronunciar o juízo “sobre ponto omitido a respeito do qual
devia manifestar-se a decisão” (art. 30, I e II, da Lei 9.307/1996).
São, pois, duas situações distintas, tratadas no mesmo artigo, com prazo de 5 (cinco) dias, salvo
se outro prazo for acordado entre as partes,30 para a apresentação do pedido, e “mediante a
comunicação à outra parte”; vejamos suas particularidades sucintamente, pois pela proximidade
com os Embargos de Declaração, o quanto já se tem a respeito deste recurso na doutrina é
proveitoso para estes expedientes da arbitragem.
O prazo para o pedido de ratificação é de cinco dias, porém, o defeito não contamina a decisão,
e pode ser, a qualquer momento, corrigido, até mesmo de ofício. Enquanto ainda pendente o juízo
arbitral, p. ex., para resposta a pedido de esclarecimento de uma das partes, ou promovendo-se
providências relativas à concretização do decidido, por petitio simplex, pode ser requerida a
adequação.
Com características dos embargos de declaração, cabe o pedido de esclarecimento para sanar
omissão, dúvida,31 obscuridade ou contradição da sentença arbitral.
Por fim, por meio deste expediente contido no art. 30 em exame, pode-se provocar o árbitro (ou
tribunal) para complementação da decisão quando eventualmente ausente na sentença algum dos
requisitos previstos no art. 26 da Lei de Arbitragem (relatório, fundamentação, dispositivo,
assinatura, data e local em que foi proferida), sanando, assim, eventual vício que pode, em tese,
gerar a invalidação da sentença arbitral (art. 32, III, da Lei 9.307/1996).
Mantida a preocupação com a celeridade da arbitragem, tal como se faz em relação à sentença,
para a qual há prazo para ser proferida, conforme acima analisado (item 11.2), também para o
aditamento decorrente do pedido de esclarecimento a lei estabelece o prazo de 10 (dez) dias, salvo
se outro tiver sido acordado entre as partes (art. 30, parágrafo único, da Lei de Arbitragem).34
Pela literalidade da Lei de Arbitragem em sua versão original, existia um dogma de que a
sentença não poderia ser parcial, ou fracionada, pois se incluía como causa de invalidação o
pronunciamento que não decidisse “todo o litígio submetido à arbitragem” (art. 32, V, revogado
pela Lei 13.129/2015).
Ocorre, porém, que a modificação da cultura e da própria legislação processual quanto a esta
questão – sentença parcial – influenciou, também, positivamente o procedimento arbitral, pois
tudo de bom e útil que naquela se introduz, neste pode ser aproveitado.
Exemplificando: por intuição, sabe-se que é melhor apreciar a responsabilidade (culpa) por um
descumprimento do contrato previamente à apuração dos prejuízos dele decorrentes. Igualmente
mais lógico será previamente reconhecer a culpa por um evento danoso para, na sequência,
verificar a extensão do prejuízo; ou ainda, melhor identificar, entre diversas parcelas variáveis (e
ilíquidas em razão de vários elementos, como base de cálculo etc.), as que serão devidas, na análise
do mérito da questão, para só então se mensurar o valor daquelas que são objeto da condenação.
Enfim, nestes casos, parece razoável a produção de provas para decisão do quantum debeatur
apenas após pronunciamento e identificação do an debeatur, pois aquele decorre do contorno que
a este for dado pela decisão. Daí, também, por desenvolvimento lógico do procedimento, indica-se
como mais razoável o reconhecimento desde logo da prescrição/decadência de parcelas, ou de
alguns dos pedidos, prosseguindo o procedimento para o quanto mais dependente de outros
elementos para julgamento.
A solução encontrada, então, conduz, realmente, a se admitir o julgamento do litígio por etapas.
E cada vez mais já se via na prática a utilização desta técnica, cujos proveitosos resultados são por
todos reconhecidos, pela economia financeira e de tempo.
Ora, promover-se complexa prova (pericial ou de outra ordem) para dela nada se aproveitar,
pois no final se concluiu pela inexistência de violação ao contrato, é, sem dúvida, um desperdício,
como assim também será a longa instrução para arbitramento de valor e, quem sabe, auditoria e
análise contábil, para, no final, reconhecer-se a prescrição de várias diferenças pretendidas ou de
inexistência de responsabilidade pelo solicitado valor.
Enfim, assim já se fazia na rotina dos julgamentos arbitrais, não obstante a literalidade da Lei
em sua versão original inicialmente referida.
A seu turno, um pensar mais generoso autorizava extrair tranquilamente da reserva legal
contida no então art. 32, V,37 referido (decisão de todo o litígio submetido à arbitragem) que a
jurisdição arbitral, antes de seu encerramento, deve solucionar todo o conflito, mas não
necessariamente em um único pronunciamento, admitidas etapas se entender mais eficiente,
econômico, lógico e adequado; e, principalmente, se as partes assim concordassem.38 Aliás, já se
encontrava em praticamente todos os regulamentos de arbitragem das instituições mais utilizadas
a previsão expressa de autorização para se proferir sentença parcial.
E veja-se mais: a sanção à época imposta na lei era a invalidação da sentença proferida sem
solução de todo o litígio submetido à arbitragem (art. 32, V, da Lei 9.307/1996 em sua redação
original); porém, neste caso, determinava-se o retorno ao juízo arbitral para que fosse proferido
novo pronunciamento completo (art. 33, § 1.º, incs. I c/c II, da Lei 9.307/1996 em sua versão
original),39 ou seja, em última análise, o que sempre se quis foi preservar o direito da parte à tutela
jurisdicional completa no ambiente arbitral. Se esta, por sentença parcial, tiver sido ao final
alcançada, por tantas etapas quanto necessárias, nada haveria a se reprovar.
Resta ultrapassada, assim, qualquer resistência que ainda existe à sentença parcial.43
O julgamento em etapas pode realmente trazer inúmeros benefícios ao procedimento, e até por
vezes pode facilitar a composição. E pela previsão legal inovada, até mesmo se mostrará
desnecessária a usual anuência prévia das partes para o julgamento fracionado, em convenção,
ata de missão ou termo de arbitragem.
Enfim, o litígio será por inteiro apreciado, mas cada questão de fundo a seu tempo e hora (por
chamadas sentenças parciais), inclusive com decisão posterior integrativa da anterior, até o
completo pronunciamento sobre todo o conflito, encerrando a atividade do juízo arbitral. E tudo
com respeito ao prazo legal ou convencional para término da jurisdição. Sem dúvida, a esperada
dinâmica do procedimento arbitral valoriza esta orientação.
A situação é diversa daquela em que o juiz, com a sentença, cumpre e acaba o ofício
jurisdicional (art. 494 do CPC/2015), pois o juízo estatal é permanente, e sempre estará lá à
disposição da parte, por intermédio deste ou daquele juiz. O que se quis com a regra processual foi
retirar do juiz a possibilidade de qualquer intervenção na decisão. Mas a jurisdição estará lá,
inclusive para eventual cumprimento ou execução da sentença.
Já na arbitragem, a sentença encerra, como visto, a própria jurisdição arbitral, e assim, não se
terá a quem encaminhar qualquer solicitação ou expediente posterior, ressalvadas as providências
de praxe relacionadas à garantia de eficácia da decisão (comunicação às partes, ou a terceiros
quando pertinente).44
E daí estabelecem as leis especial e processual que a sentença arbitral condenatória constitui
título executivo judicial (art. 31 da Lei 9.307/1996 e art. 515, VII, do CPC/2015), possibilitando ao
interessado inclusive a constituição de hipoteca judiciária (art. 495 do CPC/2015); e mesmo não
sendo condenatória, “produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença
proferida pelos órgãos do Poder Judiciário” (art. 31 da Lei 9.307/1996).
Também, como eficácia natural da sentença arbitral que contenha condenação líquida,
qualificada como título executivo judicial, por também integrar a categoria ampla de “documentos
de dívida”, permite-se o seu protesto no tabelionato competente.45
A sentença arbitral condenatória, para ser levada ao cumprimento, deve ser líquida, admitindo-
se na instauração do processo judicial respectivo apenas a apresentação de atualização ou
apuração de juros e taxas antes estabelecidos, por simples cálculo aritmético, providências
totalmente diversas da conhecida liquidação do título.
Na arbitragem, porém, a questão é um pouco mais delicada. Isto porque a sentença encerra a
jurisdição, inexistindo previsão legal desta nova fase. Daí a adequada solução introduzida pela
reforma de 2015, ao admitir expressamente a possibilidade de sentença arbitral, acolhendo não só
a prática já então comum, como o modelo de outros países. Assim, o que se terá no procedimento é
o julgamento por etapas, acima visto (item 11.7), sendo a antecedente estabelecendo condenação
ilíquida, e a posterior promovendo a liquidação, quando necessária.
A sentença, como referido acima, será necessariamente proferida por meio de documento
escrito, e, por rotina, encaminham-se vias originais às partes (diretamente ou por intermédio de
seus respectivos advogados).
Não deveria, mas pode acontecer de ter sido apresentada apenas uma via da sentença, e
naturalmente esta permanecerá arquivada na instituição arbitral.47 Neste caso, a cópia
encaminhada à parte terá o mesmo valor que o original. Pode, inclusive, ser certificada a sua
autenticidade, como das demais cópias do procedimento, pelo órgão arbitral. Desnecessária, assim,
a autenticação notarial.
Diante do silêncio normativo quanto à exigência do original, então, pode ser instruído o pedido
judicial com cópia simples. E se dúvida houver com relação à sua autenticidade, deve ser
provocada (e demonstrada!) pela parte interessada, e não pelo Juiz ao receber o instrumento.
Contudo, para evitar transtornos decorrentes de exigências dos originais, ainda que
infundadas, mas aptas a congestionar o processo, o ideal é a apresentação das vias originais, e,
para tanto, também, será excelente se, na falta de previsão no regulamento, as partes
estabelecerem em convenção ou ata de missão (ou termo de arbitragem) esta obrigação do árbitro
em fornecer tantas vias da sentença quantas forem as partes, embora tal providência, mesmo sem
prévia previsão, possa ser solicitada, e deva até ser adotada espontaneamente pelo julgador.
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NOTAS DE RODAPÉ
1
Conteúdo material.
“Art. 33. A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a decretação da
nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos nesta Lei. (...) § 2.º A sentença que julgar procedente o
pedido: (...) II – determinará que o árbitro ou o tribunal arbitral profira novo laudo, nas demais hipóteses”
(grifo nosso), alterada a redação de todo o art. 33, pela Lei 13.129/2015, como se verá no Capítulo 13, item
13.3, abaixo.
“Art. 23. A sentença arbitral será proferida no prazo estipulado pelas partes. Nada tendo sido
convencionado, o prazo para a apresentação da sentença é de seis meses, contado da instituição da
arbitragem ou da substituição do árbitro. (...) § 2. As partes e os árbitros, de comum acordo, poderão
prorrogar o prazo para proferir a sentença final.”
10
Centro de Arbitragem e Mediação da CCBC, art. 10.1; Regulamento da CCI, art. 24.1; Regulamento da CMA
(Câmara de Mediação e Arbitragem de São Paulo), art. 13.1; Regulamento da SP-Arbitral, art. 9.1.
11
Embora não seja propriamente uma arbitragem, com estrutura e regulamento próprios para solução de
controvérsias sobre registro do domínio “.br”, de acordo com o Sistema Administrativo de Conflitos de
Internet Relativos a Nomes de Domínios de Primeiro Nível “.br” (SACI-Adm e confira-se mais a respeito no
Capítulo 2, item 2.3, acima), o CAM-CCBC estima, o encerramento do procedimento no prazo de 90
(noventa) dias. Cf. [www.ccbc.org.br/ccrd.asp]. Acesso em: maio 2011.
12
Art. 23, § 2.º, da Lei de Arbitragem, com ajustes cosméticos de redação introduzidos pela Lei 13.129/2015,
transcrito na nota 9 acima, sem alteração da essência da previsão, sendo a alteração, em realidade,
decorrente da necessidade de renumeração de parágrafos, pois promovida a inclusão do § 1º (verdadeira
inovação por incluir a possibilidade expressa de sentença parcial), levando-se ao § 2.º o então contido em
parágrafo único.
13
Por exemplo, do Centro de Arbitragem e Mediação da CCBC outorgando ao presidente do tribunal arbitral
a prerrogativa de dilatar por até 30 dias o prazo para ser proferida a sentença (art. 10.1.1.), e da CCI,
permitindo a prorrogação por iniciativa da própria corte ou a pedido dos árbitros (art. 24, 2). Neste
particular, interessante a solução dada pela Lei espanhola: salvo convenção em contrário, o prazo de seis
meses (contados da contestação) poderá ser prorrogado pelos árbitros por um período não superior a dois
meses, mediante decisão fundamentada (art. 37, 2).
14
Como se verá, esta comunicação representa conditio sine qua non para se pretender a invalidação da
sentença arbitral, e só pode ser invocado o vício por quem provocou a comunicação, não pela outra parte
(cf. Capítulo 13, adiante).
15
Anote-se a nova apresentação da matéria pelo novo Código de Processo Civil ao se referir, mais
corretamente, a “elementos essenciais da sentença” judicial (art. 489).
16
Como visto acima, anote-se a nova apresentação da matéria pelo Código de Processo Civil ao se referir,
mais corretamente, a “elementos essenciais da sentença” judicial.
17
Aliás, o Código de Processo Civil inovando neste particular a legislação processual anterior, inclui a
apresentação do caso no quanto deve conter o relatório (art. 489, I).
18
Anote-se a possibilidade, na Lei espanhola, de dispensa de fundamentação no laudo arbitral desde que
assim convencionado entre as partes (art. 37, 4), sendo que este mesmo dispositivo libera a motivação,
também, da sentença homologatória de acordo.
19
A Lei Modelo Uncitral trata da decisão ultra, citra ou extra petita, em seu art. 34 (2) (a) (iii), bem como a
Convenção de Nova Iorque refere-se a estes pronunciamentos no art. V, (1) (c). Ambos os regramentos são
claros no sentido de que o árbitro não pode decidir fora dos parâmetros traçados na Convenção Arbitral.
Por sua vez, José Emilio Nunes Pinto, em excelente artigo intitulado “Sentença arbitral infra petita, extra
petita ou ultra petita”, explica que é muito importante que se constate que os textos mencionados, cada
um deles com uma destinação específica, convergem no ponto de preservar o que de são contenha a
sentença arbitral. Portanto, a regra é resgatar o que haja de bom em cada sentença arbitral, segregando-o
da parte contaminada pelo vício de consentimento (In: JOBIM, Eduardo; Machado, Rafel Bicca (coord.).
Arbitragem no Brasil – Aspectos jurídicos relevantes. São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 260).
20
Anote-se posição em sentido contrário de Carlos Alberto Carmona (Arbitragem e processo, cit., p. 372),
entendendo que a data deve ser aquela em que a decisão foi tomada, e não escrita, considerando, então,
por exemplo, o dia em que os árbitros falaram sobre suas posições e a decisão foi acordada verbalmente, o
que gera, em nosso sentir, um subjetivismo enorme quanto à data em que a decisão foi tomada.
21
Assim: “Muitas vezes, porém, a maioria prevista na lei não é tão facilmente identificável, o que ocorrerá
quando houver divergência quantitativa entre os julgadores: todos entendem que o primeiro litigante foi
o causador do acidente e deve indenizar o segundo litigante, mas cada um dos árbitros estima valor
diverso para a indenização. Nesse caso, qual será a decisão final? A resposta deve ser dada depois de
analisar as maneiras mais simples de proceder para resolver as diferenças decorrentes de divergência
quantitativa. Valho-me aqui da lição de Barbosa Moreira [MOREIRA, 2007/58], que aponta dois critérios
para solucionar o impasse: o primeiro, denominado sistema da continência, ‘consiste em verificar qual
das quantidades fixadas nos diferentes votos se acha contida no menor número de pronunciamentos
suficientes para compor a maioria’; o segundo, denominado sistema de média aritmética, ‘consiste em
somar as várias quantidades e dividir o total pelo número de votantes’. Adotado o primeiro critério, segue-
se este sistema: os votos seriam dispostos em ordem de grandeza decrescente, de acordo com os valores
indicados, partindo-se daquele que indicou a maior quantidade, até que se reúna um número de votos
superior à metade do total, prevalecendo então o montante fixado no último dos votos necessários para
atingir-se esse número. O exemplo fornecido por Paulo Cesar Pinheiro Carneiro [CARNEIRO, 1996/149] é
elucidativo: o primeiro árbitro fixa a indenização em R$ 1.000.000,00; o segundo, em R$ 50.000,00 e o
terceiro, em R$ 40.000,00; a indenização será fixada em R$ 50.000,00, pois o primeiro árbitro, ao estipular
a indenização no valor de R$ 1.000.000,00, está implicitamente reconhecendo que o quantum não poderá
ser inferior a R$ 50.000,00, restando isolado o terceiro árbitro, que preconizava valor inferior àquele. Se
no mesmo exemplo fosse adotado o sistema da média aritmética, o resultado do julgamento seria
diferente: somados os votos e dividido o montante obtido pelo número de julgadores (no exemplo, três),
fixar-se-ia o quantum da indenização em R$ 363.333,33” (CARNEIRO, Paulo Cesar Pinheiro. Aspectos
processuais da nova Lei de Arbitragem. In: CASELLA, Paulo Borba (coord.). Arbitragem: a nova lei
brasileira (9.307/96) e a praxe internacional. São Paulo: LTr, 1996. p. 359).
22
“Pelo sistema da continência optou o Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (art. 84);
pelo sistema da média aritmética optou o Regimento Interno do Tribunal de Justiça de São Paulo (art. 262,
§ 1.º, I). A meu aviso, deve prevalecer o critério da continência, que parece propiciar uma solução mais
razoável para o dilema gerado pela situação apreciada” (CARNEIRO, Paulo Cesar Pinheiro. Op. cit., p. 360).
Anote-se que a previsão do Regimento Interno de TJSP de2013, está nos arts. 138 e 139; assim: “Art. 138.
Quando, na votação de questão indecomponível ou de questões distintas, se formarem correntes
divergentes, sem que se alcance a maioria exigida, prevalecerá a média dos votos ou o voto intermediário.
“Art. 139. Se os votos de todos os julgadores forem divergentes quanto aconclusão, o presidente, cindindo
o julgamento, submeterá a matéria por inteiro à nova votação. § 1.º Tratando-se de determinação do valor
ou quantidade, o resultado do julgamento será expresso pelo quociente da divisão dos diversos valores ou
quantidades homogêneas, pelo número de juízes votantes”; e veja-se no TJRJ: “Art.84. Se a impossibilidade
de apurar-se a maioria for devida a divergência qualitativa, o Presidente porá em votação, primeiro, 02
(duas) quaisquer dentre as soluções sufragadas, sobre as quais terão de manifestar-se obrigatoriamente
todos os votantes, eliminando-se a que obtiver menor número de votos; em seguida, serão submetidos a
nova votação a solução remanescente e outra das primitivamente sufragadas, procedendo-se de igual
modo; e assim sucessivamente até que todas se hajam submetido a votação. Será vencedora a solução que
obtiver a preferência na última votação”.
23
Neste sentido, Scavone Junior, Luiz Antonio. Manual de arbitragem. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo:
Ed. RT, 2010. p. 156.
24
“O termo se refere ao episódio da mitologia grega em que a deusa Palas Atená (Atena) (que corresponde à
deusa romana Minerva) preside o julgamento de Orestes. Este, vingando a morte do pai, Agamemnon,
havia matado sua mãe, Clitem nestra e o amante, Egisto, responsáveis pelo assassinato de Agamemnon,
logo após este haver retornado da guerra de Troia. Segundo a tradição, aquele que cometesse um crime
contra o próprio genos era punido com a morte pelas Erínias, seres demoníacos para as quais o matricídio
era o mais grave e imperdoável de todos os crimes. Sabendo do castigo que o esperava, Orestes apelou
para o deus Apolo, e este decidiu advogar em favor daquele, levando o julgamento para o Areópago. As
Erínias foram as acusadoras e Atena presidiu o julgamento. A votação, num júri formada por 12 (doze)
cidadãos atenienses, terminou empatada. Atena, então, proferiu sua sentença decisiva, declarando Orestes
inocente. Como mencionado por Engels, considera-se, a partir de Bachofen, que este episódio tenha
representado, na mitologia, a transição histórica do matriarcado primitivo para o patriarcado”, segundo a
enciclopédia livre Wikipédia, consultada em maio de 2011 (cf.
[http://pt.wikipedia.org/wiki/Voto_de_Minerva]).
25
Há previsão similar de um “voto de qualidade” em favor do Presidente do Supremo Tribunal Federal para
definir o julgamento quando o empate surge exatamente de seu voto simples (no pressuposto excepcional
de número par de Ministros votantes no caso, cf. RISTF, art. 13: “São atribuições do Presidente: (...) IX –
proferir voto de qualidade nas decisões do Plenário, para as quais o Regimento Interno não preveja
solução diversa, quando o empate na votação decorra de ausência de Ministro em virtude de: a)
impedimento ou suspeição; b) vaga ou licença médica superior a 30 (trinta) dias, quando seja urgente a
matéria e não se possa convocar o Ministro licenciado”. Embora seja referido como “voto de qualidade”,
trata-se mesmo de um “voto de minerva”, pois escolhe uma ou outra posição das declinadas por seus
pares, com o objetivo de desempate neste caso, com a diferença (e talvez daí ter-se qualificado o voto de
outra forma) de já ter se manifestado anteriormente. Na verdade não é propriamente voto de qualidade,
mas direito a dupla votação, e assim, um status de qualidade em relação aos seus pares. Aliás,
curiosamente, já se viu nesta Corte o “voto de qualidade” do Presidente, contrário ao voto simples antes
declinado, para prevalecer a posição contrária, então, àquela que o próprio Presidente, votando sem este
status, adotou.
26
“1. Cuando haya más de un árbitro, toda decisión se adoptará por mayoría, salvo que las partes hubieren
dispuesto otra cosa. Si no hubiere mayoría, la decisión será tomada por el presidente”.
27
Cf., a respeito, Silvia Barona Vilar (Comentarios a la Ley de Arbitraje: Ley 60/2003, de 23 de deciembre.
Madri: Civitas, 2004. p. 1152), trazendo o seguinte exemplo: em um painel de cinco membros em que
existem três posições, duas delas com dois votos, e a terceira do presidente com apenas o seu voto. A
atribuição da faculdade decisória ao presidente é a que modela a resolução arbitral.
28
Carlos Alberto Carmona ainda apresenta outros expedientes trazidos por Barbosa Moreira para resolver o
impasse: “O primeiro deles obrigaria os juízes adeptos das soluções menos sufragadas a aderir a uma das
duas correntes mais numerosas, a fim de que alguma destas se torne majoritária (tal critério, é fácil
perceber, não será útil para painéis compostos por três árbitros, composição mais usual dos tribunais
arbitrais); o segundo determinaria a convocação de outros juízes para participar do julgamento, ‘em
número bastante para propiciar o desenlace’; e o terceiro mandaria ‘proceder a nova votação entre duas
das soluções conflitantes, excluindo-se a que for vencida, e depois a uma terceira votação, entre a solução
vencedora e qualquer das outras, repetindo-se o procedimento sucessivamente, até que só restem duas
soluções, das quais será adotada, como pronunciamento do órgão, a que reunir maior número de
sufrágios’” (CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo, cit., p. 360-361).
29
Temos simpatia a este recurso, seguindo aqui a orientação de Fábio Nusdeo (Embargos infringentes na
arbitragem? In: VERÇOSA, Haroldo (org.). Aspectos da arbitragem institucional. São Paulo: Malheiros,
2008. p. 45-52). Em sentido contrário, CARMONA. Arbitragem e processo, cit., p. 361; cf., ainda, NANNI,
Giovanni Ettore. Recurso arbitral: reflexões. In: GUILHERME, Luiz Fernando do Vale de Almeida (org.).
Aspectos práticos da arbitragem. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 161-188.
30
Art. 30, caput, da Lei de Arbitragem em sua nova redação trazida pela Lei 13.129/2015, que introduziu a
expressa possibilidade das partes convencionarem prazo diverso. Válida a inovação, para não se ter
dúvida quanto à flexibilidade deste prazo de iniciativa de manifestação da parte frente à sentença. Mas
assim já se permitia, tanto que alguns regulamentos de Câmaras trazem previsão diversa deste prazo (por
exemplo, o Regulamento do CAM/CCBC, art. 10.6 prevendo o prazo de 15 dias para apresentação de pedido
de esclarecimento).
31
Note-se ter mantido a Lei de Arbitragem de 1996 a referência à dúvida, como fundamento deste
expediente, mesmo já excluída esta hipótese dos embargos de declaração na legislação processual pela
reforma de 1994 (Lei 8.950/1994). Este contexto decorreu, porém, do fato de estar em tramitação o projeto
da Lei de Arbitragem quando verificada a alteração processual, comprometendo a fidelidade que se quis,
inicialmente, à legislação processual vigente à época. De forma alguma, porém, pretende-se sustentar a
pertinência da dúvida como fundamento do pedido de esclarecimento, pela sua inconsistente
identificação isolada. Prestigia-se, neste aspecto, a crítica feita pela doutrina a respeito desta questão, que
ensejou a revisão de 1984.
32
Com mais aprofundada análise sobre a contradição e obscuridade e, especialmente, omissão do julgado,
cf. MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recursos e ações autônomas de
impugnação. São Paulo: Ed. RT, 2008. Coleção Processo Civil Moderno, n. 2.
33
Com a redação dada pela Lei 13.129/2015 para, acolhendo o quanto já usualmente se previa em diversos
regulamentos de arbitragem, permitir o ajuste do prazo para a nova sentença por acordo entre as partes.
34
Com a redação dada pela reforma de 2015, pois até então não se fazia a ressalva à vontade das partes; cf.
adiante, em “Anexo 2”, as alterações introduzidas pela Lei 13.129/2015. Válida a atualização, mas na
interpretação sistemática da Lei, se para a sentença pioneira há faculdade das partes na alteração do
prazo, ou até possibilidade, conforme o regulamento, de o próprio árbitro, em certas situações, alterar o
prazo, como acima visto, e prestigiando a autonomia da vontade, já não havia espaço para se entender de
forma diversa, mesmo antes ausente previsão a respeito.
35
Carmona traz outro interessante exemplo de julgamento por etapas: “Outra situação em que a sentença
parcial poderá ser cogitada pelos julgadores diz respeito a demandas envolvendo franqueador e
franqueado, em que é muito comum o pleito de rescisão do contrato de franquia, cumulado com o pedido
de pagamento de royalties e devolução de produtos. O cálculo de tais valores (percentuais sobre produtos
vendidos) e a identificação das mercadorias não vendidas que deverão ser restituídas ao franqueador
(quando houver consignação) ou que deverão ser recompradas (se isso tiver sido convencionado),
depende, porém, do término do contrato de franquia. Como se vê, se não houver a possibilidade de
proferir sentença parcial que resolva a questão da rescisão (ou não) do contrato de franquia, não poderão
os árbitros proferir sentença líquida. Não é incomum, portanto, na espécie que descrevo, que os árbitros
julguem a causa decidindo apenas sobre a rescisão contratual, limitando-se a fixar as bases para a futura
liquidação da sentença (se as partes não se acordarem sobre valores), tudo a preceder eventual execução
judicial (rectius, cumprimento) da sentença arbitral. Em resumo, os árbitros não poderão – se não usarem
a técnica da sentença parcial – proferir sentença líquida na espécie, eis que eventual apuração de valores
dependerá do encerramento do negócio, após o que poderão ser quantificados os débitos e identificados
bens a restituir ou a recomprar” (CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo, cit., p. 395-396).
36
Para aprofundamento sobre o tema, recomenda-se a leitura de Arnoldo Wald, no artigo A validade da
sentença arbitral parcial nas arbitragens submetidas ao regime da CCI, publicado na RDB 17. Mais recente,
confira-se Cândido Rangel Dinamarco ao escrever: “Não sendo a sentença arbitral qualificada como ato
que põe termo ao processo (como era no sistema do Código de Processo Civil anterior à Reforma – supra.
N.65), não há qualquer impropriedade conceitual ou terminológica em admitir-se no processo por
arbitragem a prolação de duas sentenças, uma parcial e outra final – o que não seria possível naquele
antigo sistema do processo civil comum, porque não se concebe que em um só processo convivam dois
atos que lhe pusessem fim” (A arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 176).
37
38
Registre-se que fatiamento do mérito possui íntima relação com o princípio basilar da arbitragem:
“autonomia da vontade”.
39
Cf. adiante, em “Anexos”, especificamente no “Anexo 1”, o texto consolidado da Lei de Arbitragem,
apontadas as revogações, inclusões e alterações trazidas pela Lei 13.129 de 26.05.2015 com destaques
próprios, indicada também no “Anexo 2” a versão original para confrontação com rápidas considerações.
Cf. ainda, Capítulo 13 adiante a respeito.
40
Merece anotar que a Lei espanhola expressamente prevê o julgamento fracionado, permitido ao árbitro
decidir a controvérsia em um só laudo ou em tantos laudos parciais quanto considere necessários, salvo
acordo em contrário das partes (Lei 60/2003, art. 37, 1; tradução livre).
41
Nova redação ao § 1.º do art. 33. Cf. a respeito do prazo para invalidação o Capítulo 13, item 13.3.
42
Inserção de § 4.º ao art. 33. Cf. a respeito desta inovação o Capítulo 13, item 13.3.
43
Ou, como bem coloca Giovanni Bonato: “La previsione della possibilità di emanare lodi parziali è
un’innovazione legislativa opportuna, in quanto, nel codificare uma prassi già presente nella pratica
brasiliana dell’arbitrato, chiarisce ogni dubbio sul potere degli arbitri di organizzare in maniera più
flessibile la decisione della controversia, frazionandola in più decisioni” (BONATO, Giovanni. La Riforma
Brasiliana Dell´arbitrato. In: Rivista Dell´Arbitrato. Anno XXVII Fasc. 1-2017. Milano: Diuffrè Editore,
2017, p. 34-86). E acrescenta o Autor peculiaridade própria da legislação italiana consistente na indicação
do conteúdo da sentença parcial, inexistente previsão brasileira neste sentido; veja-se: “Al contrario di
quanto avviene nel sistema italiano, in cui l’art. 827 c.p.c. fornisce un’indicazione rispetto al contenuto del
lodo parziale e di quello non definitivo, il legislatore brasiliano non prevede nessun criterio in relazione al
contenuto del lodo parziale, limitandosi a contrapporlo al lodo finale (144). Anche basandoci su quanto
scritto dalla dottrina brasiliana, possiamo, senza dubbio, affermare che è un lodo parziale quello con cui
gli arbitri decidono una o alcuna delle domande cumulate, rinviando la decisione delle altre domande ad
un successivo lodo”.
44
45
Neste sentido, cf. SOUZA, Eduardo Pacheco Ribeiro de. Noções fundamentais de direito registral e notarial.
São Paulo: Saraiva, 2011. p. 261.
46
Tal qual se estabelece para a instrução da “carta arbitral” prevista no Código de Processo Civil de 2015, em
seu art. 260, § 3.º, referida no Capítulo 10, item 10.4, supra.
47
Vale aqui a observação de Carmona: “As dificuldades que poderão surgir na arbitragem ad hoc são
maiores, já que, dissolvido o tribunal arbitral, não haverá mais traço do procedimento, a não ser que os
autos, documentando os atos praticados (e o original do laudo), fiquem depositados em mãos de um dos
árbitros, não havendo, porém, previsão legal a respeito. Por cautela, devem as partes, ao prever
arbitragem não administrada por órgão arbitral, dispor a respeito, estabelecendo quem manterá a guarda
de todo o material produzido durante o procedimento arbitral” (CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e
processo, cit., p. 365).
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
1. Cumprimento espontâneo
• Declaratório
• Constitutivo e desconstitutivo
• Defesa do executado – prazo e conteúdo; LArb., art. 33, §§ 1.º e 3.º – decadência
• Defesa do executado
• Defesa do executado
• Outras medidas
SUMÁRIO
12.1. • INTRODUÇÃO
12.1. Introdução
Por todo o seu histórico, e em especial pela proximidade que há entre os protagonistas da
arbitragem – os árbitros são escolhidos pelas partes –, a tendência natural é o cumprimento
espontâneo das decisões arbitrais. Ora, é intuitivo que se submeta o vencido à posição de quem foi
por ele próprio eleito para resolver uma questão exatamente pela confiança e credibilidade na sua
capacidade de encontrar a melhor solução para o conflito.
A arbitragem, assim, sem dúvida, oferece muitas vantagens, dentre elas agilidade no
procedimento e qualidade das decisões (normalmente proferidas por reconhecidos especialistas
na matéria, que puderam se dedicar intensamente ao caso a eles submetido), mas cobra seu preço:
exige lealdade, boa-fé e respeito, cujo reflexo se dará, no final, pela obediência à autoridade desta
jurisdição.
Dito de outra forma, a rebeldia do vencido traz nocivo impacto à sua própria imagem, capaz de
comprometer sua honradez entre seus pares e, por consequência, vulnerar a credibilidade para
novos negócios. Como não se quer contaminar a arbitragem com as perversas sequelas da
desobediência às sentenças, busca-se excluir deste espaço aqueles cuja insubordinação decorre da
má índole ou espírito emulatório. Além das partes, por certo, também a postura do advogado,
orientando o cliente, sem descuidar da defesa de seus direitos, terá virtuosa influência para
preservar a autoridade da sentença arbitral.
Paralelamente ao efeito moral negativo à insubordinação do vencido que por capricho se faz
inadimplente, também existem outros elementos, como sanções corporativas, para induzir ao
cumprimento da sentença. Tome-se, por exemplo, restrição imposta pela BMF-Bovespa à atuação
no mercado de valores mobiliários de quem desobedecer a decisões de sua Câmara de Arbitragem
do Mercado.
Mesmo assim, talvez se façam necessárias medidas para se impor ou exigir o cumprimento da
sentença, e ausente a coertio ou executio no juízo arbitral, estas tutelas serão buscadas no Poder
Judiciário. Mas não se poderá no juízo estatal, “a título de balizar alegado excesso de execução,
modificar o teor da sentença arbitral. Incumbe-lhe apenas fazer cumprir a decisão, sem exceder os
limites do compromisso”.1
A sentença arbitral “tem os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder
Judiciário” (art. 31 da Lei 9.307/1996) e, como tal, na mesma medida, terá eficácia natural erga
omnes. Apenas se condenatória, qualifica-se como título executivo judicial apto a ensejar o
cumprimento (ou execução forçada) perante o juízo estatal (art. 31 da Lei 9.307/1996; art. 515, VII,
do CPC/2015).
Significa dizer que nem sempre se instaura na justiça estatal o pedido de cumprimento de
sentença, com título originado do juízo arbitral. Mas também, por vezes, conforme o conteúdo da
tutela jurisdicional deferida (definitiva ou provisória), para sua efetivação apenas se pede a
cooperação do Judiciário, através de carta arbitral ou outros meios antes referidos,2 sem aparelhar
o processo judicial necessário ao implemento de sentença condenatória.
Guardada a devida conexão com o pedido, o comando contido na sentença pode impor ao
vencido a obrigação de pagar quantia certa, a obrigação de entregar coisa certa ou incerta e ainda
as obrigações de fazer ou de não fazer; também, a tutela pode ser de natureza declaratória,
constitutiva, executiva lato sensu ou mandamental (com maior ou menor abrangência nestas
categorias, segundo a escolha da posição doutrinária a respeito).
Não se pretende aqui, neste espaço restrito, agitar teses ou atiçar a celeuma a respeito das
diversas classificações (e respectiva repercussão) a propósito do provimento contido na sentença3
(e também em outras decisões judiciais, como nas tutelas provisórias). Se nem mesmo os
processualistas se entendem completamente a respeito, seria muito querer enfrentar nestas
poucas linhas qualquer embate sobre este palpitante assunto.4
E mais, o Código de 2015 também trouxe alterações a serem lapidadas para adequada
aplicação. Com aparente simplificação da disciplina, a exegese do regramento certamente trará
bons debates. Várias devem ser as casuísticas e detalhe no procedimento introduzido. Neste
momento, porém, é feita apenas a referência à nova Lei no quanto pertinente à compreensão geral
desta etapa do litígio, quando solucionado na arbitragem.
O importante, assim, nesta oportunidade, é saber como a sentença arbitral se realiza no mundo
empírico, ou seja, de que maneira a tutela jurisdicional derivada do juízo arbitral se materializa. E
tudo dependerá do quanto nela se contém.
Na prática, vale pensar como seria dada a eficácia concreta em favor das partes à sentença
judicial: por intermédio do procedimento previsto para cumprimento de sentença, ou de forma
diversa, como a adjudicação compulsória, desconstituição de uma relação jurídica, ordem de
desocupação de imóvel etc.
Advirta-se, neste momento, e uma vez mais, ser excluída da arbitragem parcela importante da
jurisdição: a coertio e a executio, e assim, se necessária a imposição destes atos coercitivos ou
executórios para a satisfação material do provimento deferido, indispensável a participação do
Poder Judiciário.
A participação do Estado-Juiz, quando necessária, se fará de diversas formas, tal qual se verifica
na efetivação de uma sentença judicial, podendo ser por meio de cumprimento, execução ou
diretamente por ordem do juízo. São, porém, técnicas de transformação da tutela do plano teórico
para o plano real. Vejamos estas diversas situações.
12.2.1. Da materialização da sentença arbitral – considerações gerais necessárias à
compreensão da posição adotada abaixo quanto aos diversos conteúdos possíveis do
provimento e forma de sua efetivação
Neste sentido, com respeito às teses defendidas pelos processualistas quanto à classificação das
sentenças, cada qual com sólidos fundamentos a autorizar a opção por uma ou outra posição ao
sabor da escolha, para se buscar o cumprimento de uma sentença arbitral, pouco importa se a
obrigação de fazer e não fazer é mandamental ou condenatória.5 Também irrelevante tratar como
cumprimento, ou execução.
Em qualquer situação – imposição de obrigação de pagar, dar, fazer e não fazer, há sentença
arbitral condenatória, considerada título executivo judicial, apto a permitir o acesso ao Poder
Judiciário diante da resistência do vencido em cumprir o que lhe foi imposto pelo juízo arbitral.
Aliás, no pressuposto de que estamos diante de um título executivo judicial, representado por
sentença arbitral condenatória (no sentido amplo aqui considerado) a inauguração do processo
judicial respectivo reclama a citação também por força da expressa previsão legal contida no
parágrafo único do art. art. 515, §1.º, do CPC/2015.6
Dito de outra forma, a ação de execução de sentença arbitral inaugura o processo judicial
necessário para transformação no mundo real do estado das coisas, no caso das sentenças arbitrais
impondo a obrigação de: pagar determinado valor, fazer, não fazer ou dar, consideradas
condenatórias no sentido amplo e para o efeito estabelecido nas leis (art. 31 da Lei 9.307/1996; art.
515, VII, do CPC/2015 – título executivo judicial).
Instaurada a relação processual na ação de execução de sentença arbitral, será iniciada uma
sequência de atos processuais previstos no Código Processual, dependendo da forma aí prevista
para se impor o cumprimento da obrigação estabelecida no juízo arbitral (pagar, fazer, não fazer e
dar).
Ocorre, porém, que existem provimentos qualificados pela doutrina como executivos lato
sensu, para os quais o cumprimento forçado do comando contido na sentença se faz, em razão do
Direito Positivo, de uma forma específica e direta, como adiante se verá.
Nestes casos, também irrelevante discutir se a sentença executiva lato sensu representa
categoria autônoma ou se esta se contém na condenatória. Este debate tem pertinência para
discutir classificação da sentença, mas não para direcionar o cumprimento do provimento
arbitral.
Isto porque a materialização da sentença cuja tutela seja executiva lato sensu, considerada
categoria autônoma ou contida como espécie do gênero condenatório, se faz da forma específica
prevista na lei, como se verá, e não por meio de um “processo” ou fase própria, em que se
desenvolvem diversos atos processuais.
E pela sua característica, contendo em si uma força executiva, em nosso sentir, não se mostra
necessária a instauração de uma ação de execução de sentença arbitral, mas a realização do seu
comando se faz por meio de pedido de cooperação ao Poder Judiciário instrumentalizado pela
carta arbitral,9 como adiante se falará.
Enfim, e objetivamente:
Com estes esclarecimentos preliminares, vejamos agora mais detalhes do quanto acima se quis
dizer.
A sentença arbitral, neste contexto, será em si bastante para vincular as partes. O comando
declaratório nela contido se realiza automaticamente, nem necessidade de qualquer nova
providência, ou de outra “atividade jurisdicional complementar”.12
Às partes, então, impõe-se a solução do conflito dada pelo árbitro (ou Tribunal Arbitral) e
passam elas a agir com base no status jurídico declarado na sentença. Considerado nulo o contrato
pelo julgamento arbitral, o instrumento não mais se opõe aos contratantes e, assim, deles não se
poderá exigir o cumprimento; ele é retirado do mundo jurídico. De igual maneira se faz em relação
à cláusula compromissória, por exemplo, invalidada nesta sede arbitral: será tida como não
escrita, desnecessário qualquer outro ato para tanto.
Situação idêntica a esta quanto à eficácia da sentença teremos com relação ao provimento
arbitral constitutivo. Por intermédio dele, inaugura-se uma nova situação jurídica entre as partes,
na forma determinada (criação, extinção ou modificação da relação jurídica preexistente). A
sentença estabelece o status jurídico que passa a reger a relação entre as partes.
Assim, se passar a ser inadimplente o inquilino, a execução do aluguel se fará com base no
contrato inovado pela sentença arbitral, ou seja, com o valor novo arbitrado em ação revisional ou
renovatória processada no juízo arbitral. Igualmente, prorrogado o contrato por arbitragem,
descabe a denúncia vazia enquanto não vencido o novo termo estabelecido. Desfeito pela
arbitragem o acordo de quotista, ou declarado nulo, o exercício dos direitos de voto dos sócios será
realizado nos termos da situação jurídica anterior ao ajuste questionado. Ainda, considerada
inválida uma cláusula de não concorrência, a parte vencedora está livre para exercer a atividade
desejada; declarado nulo ou rescindido o contrato particular de venda e compra, o titular do
domínio, se já na posse do bem, está prontamente liberado para ceder a plenitude de seus direitos
a terceiros. Enfim, nestas situações retratadas, nada mais precisará ser feito fora do plano teórico
para garantir na prática a eficácia do provimento arbitral.
Importante observar, neste particular, o procedimento arbitral cujo objeto (pedido) seja suprir
a manifestação de vontade não emitida pela parte, por exemplo, para outorga de escritura de
venda e compra. Embora possa parecer que a sentença contenha a imposição de obrigação de
fazer, em verdade, conforme seu conteúdo (e dependerá de como for decidida a questão) a
sentença pode produzir os efeitos da declaração não emitida (art. 501 do CPC/2015), ou do contrato
que seria firmado e assim será constitutiva,13 dispensando ação de execução de sentença arbitral.
Da mesma forma se fará com a adjudicação do imóvel, quando assim decidido, buscadas como
resultado a efetivação e a publicidade necessária da transferência imobiliária contida na sentença.
Significa dizer que, perante o registro de imóveis, a sentença arbitral tem eficácia idêntica à
sentença judicial, inclusive quando transfere domínio, e o expediente a ser utilizado será similar
àquele disponível ao juízo estatal.14
Neste sentido, veja-se correta decisão da 1.ª Vara de Registros Públicos de São Paulo, com a
seguinte ementa: “Juízo arbitral. Divisão amigável de condomínio pro indiviso. Extinção. Carta de
sentença. Qualificação registrária. Possibilidade. ITBI. Título. Instrumento público x privado”.15
Colhe-se desta decisão: “Assim, da mesma forma que um formal de partilha; a carta de
adjudicação expedida em processo expropriatório; a carta de arrematação; a carta de sentença
expedida em processo de separação judicial ou uma carta de sentença em processo de divisão, a
‘carta de sentença’ expedida pelo juízo arbitral, tem força para acessar o fólio real, conquistando a
devida qualificação registrária”.
Com o mesmo raciocínio, poderá ser expedido ofício pelo árbitro a qualquer órgão público de
registro de propriedade de bens móveis, como por exemplo, Detran, quando não bastar a
apresentação de sentença pela parte interessada.16
Nestes casos, repita-se, não há coerção ou execução forçada, mas apenas comunicação, ou
formalização para se alterar o estado de uma relação jurídica, não possível de obtenção pela
iniciativa direta das partes.17
Daí porque ter sido acolhido enunciado na I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de
Litígios, segundo o qual “9. A sentença arbitral é hábil para inscrição, arquivamento, anotação,
averbação ou registro em órgãos de registros públicos, independentemente de manifestação do
Poder Judiciário”. 18
Por sua vez, a sentença classificada como executiva lato sensu contém em potencial a
determinação de ato sub-rogatório da vontade da parte hesitante no seu cumprimento espontâneo.
Porém, não por meio de processo ou fase própria, como se faz para as sentenças condenatórias
e/ou mandamentais19 em geral (art. 513 c/c arts. 497 e 498 e art. a 538, § 3º, do CPC/2015 –
respectivamente fazer e não fazer, entrega de coisa, e pagamento de dinheiro), mas diretamente; e
daí sua qualificação já como executiva por si só, prescindindo de novas e diversas atividades
jurisdicionais complementares, daquelas próprias das condenações referidas nas quais vários atos
são praticados. Será uma providência específica, prevista na lei, a ser determinada pelo juiz para a
materialização do provimento.
Descumprida a sentença, por ordem própria do juiz com força para tanto, se realiza a
determinação nela contida. Há implícita autorização para executar (autoexecutividade), ou
melhor, para impor a transformação no mundo dos fatos para se obter o resultado prático objeto
do provimento contido na decisão, pois a lei assim determina, ou seja, a lei própria de regência da
matéria de fundo, expressamente estabelece esta consequência diante da resistência do vencido.
E, nesta categoria, encontram-se as ações cujo pedido seja a reintegração de posse e despejo.
Percebe-se destes provimentos, sem dúvida, uma condenação em sentido amplo, na medida em
que se impõe pela sentença uma determinada conduta ao vencido (entregar o imóvel).20 Porém, e
muito importante: a forma de se exigir o cumprimento forçado pela resistência do vencido se faz
de acordo com a lei específica – ou seja, de forma direta: mandado de desocupação ou de
reintegração, inclusive com o apoio policial, se necessário, e não pelas providências previstas nos
artigos da legislação processual antes referida (cumprimento de sentença).
E o pedido de cooperação do juízo estatal, neste caso já se poderia fazer com base na amplitude
do § 4.º do art. 22 (revogado pela Lei 13.129/2015) da Lei de Arbitragem e não por meio de processo
próprio de execução ou cumprimento para se alcançar o resultado, até porque não se terá um
“título executivo”. Com a reforma da Lei de Arbitragem, e pelo Código de Processo Civil, como
visto, há a introdução da carta arbitral para se efetivar o provimento em questão.
Dito de outra forma, como o juízo arbitral não tem poder de efetivar na prática, por exemplo, a
desocupação ou reintegração de um imóvel, para realizar a sua sentença com este conteúdo (para
a qual também não cabem as técnicas previstas nos artigos relativos ao cumprimento ou execução
de sentença com base em título executivo judicial), o árbitro solicita ao juiz togado que promova os
atos materiais de efetivação da ordem, tal qual se faz no cumprimento de tutelas de urgência ou
cautelares (intervenção judicial com atos de apoio à arbitragem).
Nestes casos, haverá, sim, uma atividade jurisdicional complementar, provocada pelo árbitro,
no âmbito de suas atribuições, mas realizada pelo juízo estatal no regime de cooperação (carta
arbitral). As providências materiais para o resultado útil, na prática, do comando contido na
sentença se farão por solicitação arbitral, mas sob a autoridade judicial.
Dito de outra forma, não se leva ao judiciário uma sentença enquanto título executivo judicial,
para instauração de uma relação jurídica processual na qual uma série de atos processuais será
desencadeada de acordo com a necessidade e conteúdo da obrigação descumprida.
Porém, decidido o conflito no juízo arbitral, o pedido de cumprimento da sentença deve ser
manejado por intermédio da instauração de um novo processo, e não apenas em fase processual,
perante o juízo estatal; ou seja, de posse da sentença arbitral condenatória de obrigação de pagar
quantia certa, necessária a iniciativa do exequente para inaugurar uma nova relação processual
(exequente, executado e juiz togado), diversa daquela havida na arbitragem (requerente,
requerido e árbitro), bem como exige a citação – não se trata de mera intimação – do executado
para integrar o processo.
Como processo novo perante o Poder Judiciário, a “petição inicial” deverá conter os requisitos
que lhes são próprios, bem como deverá estar acompanhada do título executivo e dos documentos
comprobatórios de sua legalidade,21 além do demonstrativo do débito atualizado. E deverá ser
promovida esta execução perante o juízo que seria competente para a ação de conhecimento
originária (art. 516, III, do CPC/2015, com a opção prevista em seu parágrafo único22).
Nesse sentido, veja-se recente precedente da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça em
julgamento de recurso repetitivo, noticiado em 15.07.2015, no qual se fixou a seguinte tese: “No
âmbito do cumprimento de sentença arbitral condenatória de prestação pecuniária, a multa de
10% (dez por cento) do artigo 475-J do CPC deverá incidir se o executado não proceder ao
pagamento espontâneo no prazo de 15 (quinze) dias contados da juntada do mandado de citação
devidamente cumprido aos autos (em caso de título executivo contendo quantia líquida) ou da
intimação do devedor, na pessoa de seu advogado, mediante publicação na imprensa oficial (em
havendo prévia liquidação da obrigação certificada pelo juízo arbitral)”.23
Dessa forma, em resumo, a fase inicial do cumprimento da sentença arbitral que condena em
obrigação de pagar quantia certa requer (a) a iniciativa do credor (“exequente”) para inaugurar a
relação processual executiva, perante o Poder Judiciário; e (b) a citação do devedor (“executado”)
para, no prazo de quinze dias, cumprir voluntariamente a sentença arbitral, sob pena de
incidência da multa de dez por cento sobre o valor exequendo (e também honorários de advogado
de 10% pelo art. 523, § 1.º, do CPC/2015). Em caso de não atendimento do comando sentencial a
que foi citado, será expedido mandado de penhora e avaliação (art. 523, § 3.º, do CPC/2015).
Para quaisquer destas questões, deve-se ter presente que a Lei de Arbitragem é anterior à
reforma processual que introduziu estas novidades na fase de cumprimento da sentença (inclusive
as contidas no CPC/1973 por modificações mais recentes, introduzidas pela Lei 11.232/2005) e,
assim, o que na lei se continha guardava perfeita simetria com o processo de execução de então.
Daí porque agora se buscar a interpretação mais harmônica entre a inovações processuais e a Lei
de Arbitragem, tanto nas observações acima e como naquelas adiante tratadas, todas resultantes
exatamente da modificação legislativa de 2005.
Pela Lei de Arbitragem (art. 26, III), o árbitro poderá fixar prazo para o cumprimento da
decisão; a seu turno, a legislação processual concede o prazo de 15 dias para cumprimento da
condenação sem encargos (art. 523 do CPC/2015). Pois bem, para o cumprimento da decisão, sem
as sanções processuais previstas para a fase de execução, considera-se o prazo estabelecido na
sentença arbitral ou no Código de Processo Civil?
Entendemos que são prazos distintos, e ambos devem ser observados, convivendo em
harmonia. Pelas características do procedimento arbitral, dentre elas celeridade e expectativa de
cumprimento espontâneo, ao lado de então, em 1996, ser norma com proveitosas previsões
seguindo modelos internacionais, previu-se a possibilidade do árbitro estabelecer o prazo para
cumprimento da condenação, até porque, por vezes, pela sua complexidade ou vulto, a pronta
exigência poderá ser totalmente despropositada. Assim, o prazo de tolerância, por lei deixado ao
criterioso bom-senso do árbitro, representa um benefício destinado ao vencido,24 quiçá até para
viabilizar o cumprimento espontâneo.
Sem o decurso deste prazo, a sentença é, ainda, inexequível. O título, embora “judicial”, não
poderá ser exigido até o dies termini para atendimento espontâneo da condenação. E assim,
prematura a sua execução, se promovida durante o período estabelecido, pois por direito
reconhecido na sentença, o devedor poderá aproveitar de todo o tempo previsto para promover o
cumprimento da obrigação. Proposta a execução antes do dies ad quem, esta haverá de ser
rejeitada de ofício, imediatamente ou por provocação do executado até mesmo por simples
petição, sem qualquer outra formalidade. Dito de outra forma, o título ainda é inexigível e, como
tal, ficará comprometida a iniciativa de se requerer judicialmente o seu cumprimento,
justificando-se a imediata extinção do processo.
Transcorrido o prazo para se honrar a obrigação prevista na sentença arbitral, nasce ao credor
a prerrogativa de provocar a jurisdição estatal para satisfação de seu direito (novamente se antes
já assim fez e à época restou frustrado o pedido pela inexigibilidade do título). Seguindo o art. 515,
§ 1.º, do CPC/2015, o devedor será citado para a execução. E agora, formada a relação processual,
terá o executado 15 dias para o cumprimento da obrigação, sob pena de lhe ser imposta a sanção
processual prevista no art. art. 523 e seu § 1.º, do CPC/2015.
Haverá, pois, um novo prazo. Este benefício, agora, é processual, independente do quanto se
decidiu na sentença. E ultrapassado o período, a lei impõe a sanção, certa e única, sem margem ao
julgador para qualquer modificação.
São prazos distintos, para diferentes situações, com consequências diversas. E desta forma,
ambas as previsões convivem. O vencido terá o prazo estabelecido na sentença arbitral para
cumprimento espontâneo da condenação, sob pena de, não o fazendo, autorizar a execução
forçada. Provocada a jurisdição estatal, o devedor, citado, terá 15 dias para pagar a dívida (e não
mais espontaneamente, pois na verdade já se está em fase de jurisdição coercitiva). Permanecendo
inerte, ou criando embaraços, além de se expor ao ius imperium e aos atos coercitivos para
satisfação do débito, ainda responde pela multa legal.25
Por fim, advirta-se que a multa só incide após o prazo de quinze dias da citação do executado
no processo de cumprimento de sentença. Lembre-se que o prazo, pela nova legislação, conta-se
em dias úteis (art. 219 do CPC/2015). A comunicação da sentença não deve ser considerada como
termo inicial do período para atendimento da condenação sem sanção pecuniária.26
Já a multa prevista para o não cumprimento da sentença no prazo legal não faz parte da
condenação, como obrigação acessória (e a termo), nem tampouco integra o título executivo. É
imposta por lei e, assim, deve ser exigida de ofício pelo Juiz, independentemente do que no título
executivo se contém. A sua imposição a posteriori, nesta fase judicial instaurada, é obrigatória ao
juiz da execução.27
Uma sanção resulta da condenação pelo árbitro, nos limites de sua jurisdição que lhe foi
outorgada para a fase de conhecimento. A outra é cogente ao juiz estatal, no exercício de sua
jurisdição com força coercitiva nesta situação.
Embora o fato gerador de uma e de outra multa, em última análise, seja comum: a inércia do
vencido em cumprir a sentença arbitral, para a primeira causa de sanção, sua incidência, e
exigibilidade, se deve à falta de cumprimento espontâneo no prazo estabelecido pelo árbitro. Já a
segunda pena (processual), se impõe por ter o vencido, além de deixar de cumprir em tempo a
obrigação, ensejar a execução forçada, na qual, mesmo com nova oportunidade, opta por se
submeter às providências judiciais inclusive com intervenção em seu patrimônio.28
Na verdade, o debate de maior complexidade sobre a multa é outro, qual seja: no âmbito de sua
atividade jurisdicional (limitada à convenção de arbitragem), existe a possibilidade de o árbitro
impor multa para o caso de descumprimento da obrigação? E assim se questiona, pois ao juízo
arbitral, despido dos poderes de execução forçada (privativa do juízo estatal), certamente não cabe
impor punição processual decorrente do prosseguimento do cumprimento da sentença, atribuição
esta exclusiva do juiz estatal, e, assim, só lhe competirá tratar da sanção autônoma a constar da
sentença arbitral se as partes convencionaram desta forma.29 Registre-se, porém, que uma vez
prevista a multa na execução forçada e no limite que entendeu o legislador razoável (10%), caberá
ao árbitro atuar com extrema prudência, ponderação e razoabilidade na fixação de outra multa,
quando assim possível (v.g., previsão na convenção), pois esta sanção deve ser instrumento útil
para se estimular o cumprimento espontâneo da obrigação, e não um perverso e injusto meio de
onerar excessivamente o devedor.
Sob outra perspectiva, se a sentença arbitral simplesmente fixar a “multa de 10% sobre o valor
da condenação caso não cumprida a obrigação no prazo de 15 dias”, parece haver, sim, por
equívoco do árbitro, identidade de sanção (no pressuposto de que inexistiu autorização na
convenção para tal condenação), e apenas uma vez deverá incidir o percentual, pois,
aparentemente, na sentença arbitral se quis unicamente confirmar a incidência da sanção
processual (quem sabe para evitar a isenção decorrente da interpretação de alguns quanto à
inaplicabilidade da multa no caso de execução de sentença arbitral), embora, como dito acima,
entendemos que ao árbitro é vedado dispor sobre a sanção processual decorrente da execução
forçada, por faltar-se jurisdição para tanto.30
Não se pode, na execução da sentença arbitral, intimar-se o devedor para honrar a obrigação
estabelecida na sentença condenatória na pessoa de seu advogado, como se faz no cumprimento
de sentença judicial. A citação deve ser pessoal do executado.
Primeiramente, o patrono que representou o executado na arbitragem não possui, só por esta
qualidade, poderes de representação na execução perante o Poder Judiciário, pois se trata de nova
relação processual, a exigir nova outorga de mandato.
Além disso, como se trata de relação processual originada perante o juízo estatal – e não,
simplesmente, de continuidade do mesmo processo, em nova fase como é para o cumprimento da
sentença judicial –, faz-se necessária, pela própria lei instrumental (art. 515, § 1.º, do CPC/2015), a
citação pessoal do executado, como forma de integrá-lo à relação processual executiva.32 A
ausência de citação pessoal ou a sua substituição por intimação na pessoa do advogado inquina o
processo de execução da sentença arbitral de manifesta invalidade e, quiçá, inexistência.
Caso o executado, uma vez regularmente citado, cumpra espontaneamente o julgado, seja por
meio particular, seja nos autos judiciais, o juiz julgará extinto o processo e declarará a satisfação
do direito de crédito. Caso contrário, segue-se para penhora e avaliação, no valor exequendo
acrescido da multa de 10%, mais eventuais consectários legais. Na forma do diploma processual,
com detalhes de procedimento diversos entre o atual e o novo Código, o executado poderá oferecer
impugnação ao cumprimento de sentença (cf. especialmente o art. 525 do CPC/2015, estabelecendo
o prazo de 15 dias a transcorrer automaticamente após o prazo do art. 523).
Com exceção de algumas considerações a respeito da defesa, o que será objeto de exame no
próximo item, daqui em diante não há diferença significativa entre a execução da sentença
judicial que condena em obrigação de pagar quantia certa e a execução da sentença arbitral de
mesma natureza.
12.4.4. Defesa
Lembrando que existem algumas diferenças entre o previsto na legislação atual e futura,
importante é que, evidentemente, em ambas confirma-se o natural direito de defesa do executado
(“devedor”), através de impugnação ao cumprimento da sentença.
A impugnação somente poderá versar sobre: “I – falta ou nulidade da citação se, na fase de
conhecimento, o processo correu à revelia; II – ilegitimidade de parte; III – inexequibilidade do
título ou inexigibilidade da obrigação; IV – penhora incorreta ou avaliação errônea; V – excesso de
execução ou cumulação indevida de execuções; VI – incompetência absoluta ou relativa do juízo da
execução; VII – qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação,
compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença”. (art. 525, § 1.º, do
CPC/2015); e sua apresentação não impede o prosseguimento dos atos pertinentes ao cumprimento
da sentença, sendo excepcional o deferimento pelo juiz de efeito suspensivo (art. 525, § 6.º, do
CPC/2015).
A principal questão no que diz respeito à defesa na execução da sentença arbitral é a sua
relação com a ação de invalidação (ação esta a ser analisada no próximo Capítulo). Isso porque o §
3.º do art. 33 da Lei de Arbitragem (com a reforma de 2015) dispõe que “A declaração de nulidade
da sentença arbitral também poderá ser arguida mediante impugnação, conforme o art. 475-L e
seguintes da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil), se houver execução
judicial”.
A seu turno, com o Código de Processo Civil de 2015, expressamente, em seu art. 1.061, confere
outra redação ao art. 33 da Lei de Arbitragem, para assim constar: “3.º A decretação da nulidade
da sentença arbitral também poderá ser requerida na impugnação ao cumprimento da sentença,
nos termos dos arts. 525 e seguintes do Código de Processo Civil, se houver execução judicial”.
O CPC foi sancionado antes, mas entrou em vigor após a reforma da Lei de Arbitragem, a qual
foi sancionada depois e teve plena vigência a partir do final de julho de 2015. No caso específico,
diferentemente do que acontece em relação ao Marco Legal da Mediação (Cf. Capítulo 03),
qualquer debate a respeito de qual redação deva prevalecer é infértil, pois o conteúdo de qualquer
uma delas é o mesmo, não obstante a impropriedade da redação de ambas. A Lei de Arbitragem
reformada traz, erroneamente, a referência ao CPC/1973; já o CPC/2015 tem de errado a referência
à “decretação da nulidade”, quando a sistemática proposta pela nova Lei 13.129/2015 refere-se a
“declaração de nulidade”, conforme previsto na nova redação do caput do art. 33.
Em nosso entender, a lei posterior, e especial, é a 13.129/2015, devendo ser considerada para
efeito de verificação a data da publicação, após ter sido sancionada, e não a data de entrada em
vigor. Desta forma, o art. 33 deve ter a redação desta lei, não aquela proposta (e agora revogada)
pelo Código de Processo Civil de 2015.
Porém, evidentemente, com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, o § 3.º do art.
33 da Lei de Arbitragem deve ser lido da seguinte forma: a declaração da nulidade da sentença
arbitral também poderá ser arguida mediante impugnação ao cumprimento da sentença, se
houver execução judicial. Mas repita-se, pela exegese lógica de qualquer das regras o resultado é o
mesmo.
São hipóteses de invalidação da sentença arbitral, como será visto detalhadamente no próximo
Capítulo, as previstas no art. 32 da Lei Especial (já com as modificações introduzidas pela
13.129/2015), assim: “É nula a sentença arbitral se: I – for nula a convenção de arbitragem; II –
emanou de quem não podia ser árbitro; III – não contiver os requisitos do art. 26 desta Lei; IV – for
proferida fora dos limites da convenção de arbitragem; V – (revogado); VI – comprovado que foi
proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva; VII – proferida fora do prazo,
respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e VIII – forem desrespeitados os princípios de
que trata o art. 21, § 2.º, desta Lei”. A partir desses fundamentos, cumpre ao interessado ajuizar a
ação de invalidação da sentença arbitral, que, na forma do § 1.º do art. 33 da Lei 9.307/1996,
“deverá ser proposta no prazo de até noventa dias após o recebimento da notificação da respectiva
sentença, parcial ou final, ou da decisão do pedido de esclarecimento”.
Considerando, pois, essas possibilidades no que tange ao ataque à sentença arbitral, as dúvidas,
basicamente, são as seguintes: (a) é possível utilizar as duas vias para investida contra a sentença
arbitral (ação de invalidação e impugnação ao cumprimento)? (b) Há cumulação de fundamentos
entre a ação de invalidação (art. 32 da Lei 9.307/1996) e a impugnação ao cumprimento da
sentença (art. 525, § 1.º, do CPC/2015)? (c) A fluência in albis do prazo decadencial de noventa dias
para anular a sentença arbitral (art. 33, § 1.º da Lei 9.307/1996) interfere nos fundamentos a serem
utilizados na defesa na sua execução?
Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart defendem que “na impugnação, além das
matérias previstas no art. 475-L do CPC/1973 [art. 525, § 1.º, do CPC/2015], o executado poderá
alegar a nulidade da sentença arbitral”,33 utilizando-se de quaisquer das hipóteses do art. 32 da Lei
de Arbitragem.34
Acompanhando esta posição, a maioria da doutrina admite que o vencido na arbitragem utilize
as duas vias para questionar a nulidade da sentença arbitral: ação de invalidação ou impugnação
ao cumprimento da sentença arbitral, cumulando nesta os fundamentos daquela. Esse parece ser,
realmente, o melhor entendimento. Ou seja, a matéria passível de ser invocada na “impugnação”
ao cumprimento da sentença não se limita à contida no art. art. 525, § 1.º, do CPC/2015, podendo
ser trazido, por este instrumento processual no caso de execução de sentença arbitral, também o
quanto previsto no art. 32 da Lei de Arbitragem.35
E mais, sem previsão legal, mas também por interpretação sistemática, naturalmente vícios
processuais desta fase, como defeito na representação processual, ausência de assinatura na
petição etc., e todas as demais questões que podem ser conhecidas de ofício pelo juiz, também
podem ser invocados nesta oportunidade.36
Pela sua seriedade com o trato do Direito Processual Civil, por todos, vale citar as lições da
Profa. Teresa Arruda Alvim Wambier:37 “Tem-se decidido pela desnecessidade de o devedor opor
embargos à execução, quando já em curso ação de conhecimento anterior, em que se discute o
débito”, e, após indicar precedentes do STJ, prossegue: “O STJ confirma que o fato de existir
qualquer ação anterior sobre o crédito, proposta pelo devedor, não impede o ajuizamento da ação
de execução daquele mesmo crédito, pelo credor. No entanto, o STJ admite que, na medida em que
se estenda a ação declaratória anterior como substitutiva dos embargos à execução, porque
idênticas, poder-se-á atribuir a tal ação o efeito de suspender a execução, após ter sido realizada a
penhora”, bem como que “o STJ tem entendido que, naqueles casos em que já existia ação anterior
proposta pelo devedor, não é necessário que o devedor, uma vez citado na ação de execução
proposta pelo credor, oponha embargos à execução. Aliás, rigorosamente, não só não é necessário,
como seria vedado pelo sistema, por se tratar, quase que invariavelmente, de litispendência”.38
Assim, todo o quanto debatido para as demais situações em que se discute, por diversas vias, o
mesmo título executivo, vale aqui para o confronto da ação de invalidação da sentença arbitral
com a impugnação ao cumprimento de sentença ou os embargos com idêntico conteúdo. Em nosso
entender, apenas para registro, e sem maiores digressões e compromissos com a referência,
haverá tecnicamente litispendência39 ou continência (se o objeto de uma medida for mais amplo
que o da outra, por exemplo, quando na impugnação também se levantem outras questões
relativas a esta fase).
Porém, os caminhos são indicados na lei e não excludentes um do outro, aliás, cada qual com
procedimentos e características próprias. Enquanto não se definir em norma futura como
proceder nestas situações (p. ex., estabelecer que um dos meios irá excluir o outro), ao interessado
aconselhamos a utilização dos dois expedientes, deixando ao Judiciário resolver se ambos seguirão
ou qual deles prevalecerá, impedindo, assim, que por uma eventual divergência do julgador com a
tese de defesa, o direito à análise da matéria de fundo (vício do título) venha a ser prejudicado ou
se torne inútil pela sua efetivação irreversível no mundo fático.40
Entendemos que os fundamentos previstos no art. 32 da Lei 9.307/1996 somente poderão ser
utilizados na impugnação ao cumprimento de sentença se esta for apresentada dentro do referido
prazo decadencial de noventa dias.41 Ultrapassado este prazo, não poderá o executado alegar
quaisquer desses fundamentos na impugnação ao cumprimento de sentença.42
Sem dúvida, o prazo é decadencial e, como tal, a inércia de seu titular leva ao perecimento
deste direito. Não apenas o seu exercício, mas o próprio direito resta comprometido,
inviabilizando a sua alegação em qualquer outra circunstância, se operada a decadência na forma
da Lei.
Para a prescrição, lembra Yussef Cahali que se aplicava o brocardo quae temporalia sunt, ad
agendum, perpetua sunt ad excipiendum (o que é temporário, em se tratando de ações, é perpétuo
no tocante às exceções),43 e traz o autor a ressalva feita por Serpa Lopes, dividindo as exceções em
duas: “as existentes por si mesmas e as fundadas num determinado direito. Na primeira categoria,
não se trata de fazer valer um direito efetivo, mas tão só de garantir uma dada posição jurídica
contra o ataque injusto de outrem; nas exceções da segunda categoria, ao contrário, não se cuida
da manutenção de uma situação jurídica, senão de fazer valer um determinado direito”.44 Mas
tudo restou superado, pois, pelo Código Civil de 2002, “prescrita a pretensão de direito material
que poderia ser exercida por meio de ação, toda a defesa que se poderia deduzir contra essa
pretensão também estará prescrita, como decorre do art. 190: ‘A exceção prescreve no mesmo
prazo em que a pretensão’.”45
Sem maiores divagações sobre ser ou não a impugnação ao cumprimento da sentença (como
era a ação de Embargos) uma “exceção” de direito material, o fato é que, agora por Lei, prescrita a
ação, a matéria prescrita não mais poderá ser ventilada em outra oportunidade, ainda que por
meio de outros instrumentos, como defesa ou exceção. Este mesmo raciocínio, embora o referido
art. 190 esteja nas “disposições gerais” sobre prescrição, com maior razão se aplica à decadência,
pela qual perece o próprio direito, e não apenas o seu exercício.
Aliás, como também traz Yussef Cahali, “quanto à decadência, Tedeschi considera que não lhe
seria aplicável a regra quae temporis agendum, perpetua ad excipiendum, pois, tendo a
decadência um termo fixo, nela não comportaria, in genere, aplicação”.46 Por outro lado, mesmo
exercitável como “defesa”, na medida em que contra ataca a execução forçada, a impugnação, tal
qual são os embargos, repita-se tem natureza jurídica de ação e como tal deve ser tratada.
Tal qual se faz em relação à condenação por quantia certa, inaugura-se um processo judicial
próprio, consistente em ação de execução de sentença arbitral, cujo objetivo será a imposição ao
cumprimento das obrigações estabelecidas ao vencido, com petição inicial, citação etc.
Ou seja, tal qual na condenação por quantia certa, aquela comunicação da sentença arbitral
não é em si bastante para consumar o prazo de cumprimento do preceito com imposição das
sanções previstas na lei (multa ou outras). Deve ser citado o executado (seria intimado se a
sentença fosse judicial), para honrar a obrigação e, diante de sua inércia, intervém o Estado com
medidas coercitivas para alcançar o resultado.
O prazo tem significado não apenas para se autorizar, uma vez descumprido, as demais
medidas coercitivas previstas no art. 536, § 1.º, do CPC/2015 em exame, como também para, diante
da inércia do vencido, exigir-se a multa coercitiva.
A Lei de Arbitragem não estabelece, como faz com relação ao prazo no art. 26, III, acima
reproduzido, a fixação de multa na sentença para cumprimento da obrigação pelo vencido.
Porém, a multa pode constar do próprio contrato objeto da arbitragem e, como tal, ser objeto do
pedido, e também pode ser fixada de ofício, em razão da previsão contida no art. 537 do CPC/2015;
assim: “A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de
conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja
suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do
preceito”.
Pelo contido nestas regras, a jurisdição para a fixação da multa cabe ao árbitro, pois se refere a
decisões proferidas na fase de conhecimento (especificamente na sentença); assim, leia-se,
também, “O árbitro poderá (...)”.
Observe-se, aqui, que não se trata propriamente de modificação da sentença arbitral pelo
Estado na fase de seu cumprimento – algo de todo inadmissível –, mas sim de adaptação do valor
da multa às circunstâncias verificadas após a prolação da sentença arbitral. Isso significa, em
termos práticos, que o juízo estatal não poderá, por exemplo, excluir a multa fixada na sentença
arbitral por discordar de sua aplicação, como se a sua atuação correspondesse a um juízo de
rejulgamento, o que não é e nem poderia ser.
O Poder Judiciário, na hipótese em questão, apenas pode aumentar ou reduzir o valor da multa
com base em fatos posteriores à prolação da sentença arbitral, conjugando para tanto o princípio
da efetividade da execução com o princípio do menor sacrifício do executado, razão pela qual essa
explicação deverá constar da fundamentação da decisão judicial, sob pena de nulidade da decisão
tomada pelo juízo togado. Essa possibilidade é fundamental para que, por exemplo, o juiz
responsável pela efetivação da decisão aumente o valor da multa coercitiva, caso a medida não
tenha se mostrado suficiente a compelir o devedor a cumprir o julgado. Afaste-se a hipótese de
caber aos árbitros essa majoração, pois nesse momento de execução da sentença a arbitragem já
terá findado e, com ela, encerrada estará a jurisdição dos árbitros.
E nem se diga, ademais, que essa modificação pelo Poder Judiciário seria impossível, pois essa
conclusão significaria um decréscimo da força persuasiva e executiva da sentença arbitral se
comparada à da sentença judicial, o que não encontra respaldo na lei. Explica-se: na hipótese de
uma multa estabelecida na sentença judicial não apresentar a devida força coercitiva, o juiz da
“execução” poderá aumentar-lhe o valor e, desta forma, perseguir o cumprimento da forma mais
efetiva possível. Caso se entendesse pela impossibilidade de o juiz da execução alterar o valor da
multa fixada pelos árbitros na sentença arbitral, isso significaria uma diminuição da força da
sentença arbitral, pois se a multa estabelecida em sede arbitral fosse insuficiente para coagir o
executado, essa insuficiência perduraria eternamente, o que afronta o princípio da efetividade do
processo.
Enfim, esta regra processual de revisão de ofício da multa fixada para forçar o devedor a
cumprir a obrigação é direcionada à “fase coercitiva” em que se pretende a efetivação da sentença
que condena a fazer ou não fazer, “fase” esta privativa do Poder Judiciário. A atuação do árbitro
vai até a sentença; a partir de então, cabe ao Estado as providências para se alcançar no mundo
fático o resultado desejado; ou seja, cabe privativamente ao juiz estatal forçar a transformação do
comando sentencial em realidade.
O parágrafo único do mencionado art. 498 do CPC/2015, por sua vez, dispõe que, “Tratando-se
de entrega de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o autor individualizá-la-á na
petição inicial, se lhe couber a escolha, ou, se a escolha couber ao réu, este a entregará
individualizada, no prazo fixado pelo juiz”, prazo este a ser estabelecido, então, na sentença,
judicial ou arbitral.
Tal como se faz em relação às demais sentenças condenatórias (no sentido amplo, acima
analisado, ou seja, impositivas de qualquer obrigação ao vencido), também aqui se mostra
indispensável a instauração de processo próprio, com base em título executivo judicial com origem
no laudo arbitral.
Por fim, por expressa previsão legal, aplica-se à obrigação para entrega de coisa o previsto para
o cumprimento de obrigação de fazer e não fazer (art. 538, § 3.º, do CPC/2015), e, assim, tudo o
quanto acima se disse aproveita-se para este procedimento. Igualmente, embora sem previsão,
também aqui valem as observações feitas a respeito da defesa do executado.
Com prazo estendido (30 dias), a Fazenda tem o direito de impugnar o pedido de cumprimento
(não mais se fala em embargos), em situação parelha à do particular, oportunidade em que poderá
alegar as causas de invalidação de sentença arbitral, desde que observado o prazo e fundamentos
(arts. 32 e 33 da Lei de Arbitragem), aproveitando-se aqui tudo o quanto acima dito a respeito
(item 12.4.4).
Em sendo a sentença condenatória a obrigação de fazer, de não fazer, ou de entregar coisa, não
há diferença no tratamento da Fazenda Pública em relação aos particulares, seguindo-se o quanto
disposto nos arts. 536 e ss.
VALENÇA FILHO, Clávio de Melo. Sentença arbitral e juízo de execuções. Revista do Advogado.
n. 87. p. 36-45. São Paulo, set. 2006.
NOTAS DE RODAPÉ
1
TJSP, AI 0200047-10.2011.8.26.0000, 6.ª Câmara de Direito Privado, j. 22.03.2012, v.u., rel. Des. Percival
Nogueira.
Veja-se, por exemplo, encontrar na doutrina autores indicando a sentença que impõe obrigação de fazer e
não fazer como mandamental, que não mais seria restrita à ordem do judiciário a um ente público, e
ainda, definindo como condenatórias todas as que impõem alguma obrigação ao vencido, inclusive aquela
então classificada como executiva lato sensu.
Cf., a respeito, amplo e proveitoso estudo feito pelo Prof. Cássio Scarpinella Bueno (BUENO, Cássio
Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 292-322), no
qual, além de questionar as classificações “trinária” e “quinária”, apresentadas pela doutrina tradicional,
muito bem expõe o Professor tratar-se de categorias mais propriamente ligadas aos efeitos da prestação
da tutela jurisdicional do que às ações ou sentenças, e então apresenta, na sua “8.5.6. Apreciação crítica:
proposta de uma nova classificação da tutela jurisdicional por seus efeitos”, distinguindo apenas duas
classes: tutelas intransitivas, e tutelas transitivas, sendo as primeiras assim chamadas “porque não
precisam de atividade jurisdicional complementar, bastando por si só, isto é, outorgando, por si só, o bem
da vida que se veio pedir do Estado-Juiz, correspondem às tutelas declaratórias e constitutivas; já as
tutelas transitivas, “ao contrário das que compõem a classe anterior, reclamam atividade jurisdicional
complementar, não bastam por si sós”, e correspondem às tutelas condenatórias, executiva e
mandamental, e assim, criam o chamado “título executivo judicial”, “autorizando sejam praticados
determinados atos jurisdicionais com vistas à satisfação material daquele direito tal qual reconhecido”
(idem, p. 312-313).
A tutela mandamental, para parte da doutrina, representa uma ordem judicial “cujo descumprimento por
quem a receba pode caracterizar desobediência à autoridade estatal, possível de sanções, inclusive de
caráter penal (o art. 330 do CP tipifica o crime de desobediência)” (WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA,
Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo, Curso avançado de processo civil. 8. ed. São Paulo: Ed. RT,
2006. vol. 1, p. 142); identifica-se nesta categoria, então, a sentença proferida em mandado de segurança, e,
pois, totalmente estranha ao cenário arbitral (ademais, mostra-se como exercício do típico poder de
império do Estado-Juiz). Porém, para outros doutrinadores, a tutela mandamental é o resultado de
qualquer ação na qual se obtém pela sentença uma ordem direta para alguém ter determinada conduta,
sob pena de multa ou outras sanções; se, com esta feição, ter-se-á integrando a categoria de tutela
mandamental, na essência, a condenação à obrigação de fazer ou não fazer, que, de acordo com a nova
sistemática processual vigente a partir de 2006, autoriza o manejo de cumprimento da sentença pelo
procedimento previsto nos arts. 475-I c/c 461 e 461-A. Entende ser mandamental a sentença que impõe
uma obrigação específica de fazer e não fazer Dinamarco (DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil.
4. ed. ampl. São Paulo: Malheiros, 1994); cf., ainda, Marinoni (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART,
Sérgio Cruz. Execução. São Paulo: Ed. RT, 2008) e José Manoel Arruda Alvim Netto, para quem “a
mandamentalidade veio a comportar grande desenvolvimento no direito brasileiro, inclusive legislativo,
do que são exemplos, entre outros, o disposto no art. 461” (ARRUDA ALVIM NETTO, José Manoel. Manual
de direito processual civil. 12. ed. São Paulo: Ed. RT., 2008. vol. 2, p. 653).
Assim: “Art. 515, §1.º: Nos casos dos incisos VI a IX, o devedor será citado no juízo cível para o
cumprimento da sentença ou para a liquidação no prazo de 15 (quinze) dias”, sendo que o inc. VII refere-
se à sentença arbitral.
Cf. a respeito de arbitragem nos contratos com a administração pública o Capítulo 14, item 14.5 adiante.
Na estrutura do CPC/2015, v. as normas previstas nos arts. 523, 524, VIII, 525, 497, 499, 500, 536, caput e §
1.º, 537, caput e § 1.º, 538, § 3.º, 498, 536, § 2.º, 538, caput e § 3.º, 534, 535 e 910.
9
10
Na estrutura do CPC/2015, v. as normas previstas nos arts. 523, 524, VIII, 525, 497, 499, 500, 536, caput e §
1.º, 537, caput e § 1.º, 538, § 3.º, 498, 536, § 2.º, 538, caput e § 3.º.
11
12
Adotando-se a feliz expressão utilizada pelo Prof. Cássio Scarpinella Bueno na obra citada.
13
Cf. Luiz Rodrigues Wambier, Flávio Renato Correia de Almeida e Eduardo Talamini, assim escrevendo:
“Parece mais adequado reconhecer, como faz grande parte da doutrina, sua natureza de sentença
constitutiva. É provimento que cria um novo estado jurídico, idealmente, independentemente de
providências práticas. Não se impõe uma prestação para o réu – que é o que caracteriza as sentenças
condenatórias e executivas lato sensu –, mas, sim uma sujeição. O réu simplesmente suportará os efeitos
jurídicos advindos da sentença, nem tendo como oferecer-lhes resistência física ou material (ver distinção
entre execução e sentença constitutiva, no capítulo 1). Não se nega, com isso, que o conteúdo originário do
dever do réu era uma prestação (praticar a conduta consistente na emissão da declaração de vontade).
Mas, com o inadimplemento, surgiu-lhe dever derivado de cunho potestativo (submeter-se a um novo
estado jurídico). Passam a existir dois direitos concorrentes, fenômeno amplamente conhecido, pelo qual,
cumprido um deles, o outro se extingue. Assim, se o réu, espontaneamente, antes do trânsito em julgado
da sentença, emitir a declaração de vontade, fica prejudicada a produção de efeitos que se teria com a
sentença pela mera razão de estes já terem sido atingidos. Deixe-se de lado a polêmica doutrinária e
ressalte-se o que há de essencial e é por quase todos reconhecido: não se trata de processo de execução, de
modo que lhe é estranha toda a disciplina que vem sendo até aqui examinada” (WAMBIER, Luiz
Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil. 9.
ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Ed. RT, 2006/2007. vol. 2, p. 308-309).
14
Cf., a respeito, Eduardo Pacheco Souza: “Com efeito, não há como negar o ingresso no fólio real das
sentenças arbitrais que decidam questões referentes a direitos patrimoniais relativos a imóveis. Tendo e
produzindo os mesmos efeitos da sentença judicial, não pode ser vedado o acesso ao registro das
sentenças arbitrais” (...) “Equiparada à carta de sentença judicial, está a carta de sentença arbitral, assim
como aquela e todo e qualquer título apresentado a registro (em sentido lato), sujeita à qualificação
registral. Vale a advertência de Álvaro Pinto de Arruda, ao se referir à qualificação dos títulos: ‘Todos eles
estão sujeitos à obediência aos mesmos princípios e ao cumprimento de idênticas cautelas” (...)
“Merecendo o título (carta de sentença arbitral) qualificação positiva, o ato será praticado, cabendo
ressaltar que ao registrados não se permite ingressar no mérito da decisão arbitral quando do exame”.
Ainda, diz o autor: “O título a ser apresentado ao serviço de registro de imóveis deve ser a carta de
sentença, pois os demais títulos judiciais (formais de partilha, certidões e mandados) não podem ser
expedidos pelos árbitros. Não têm os árbitros poder para: extrair mandados, que são ordens judiciais;
certidões, que são atos administrativos, ou seja, emanam do serviço público; ou formais de partilha, que
decorrem de inventário judicial” (SOUZA, Eduardo Pacheco Ribeiro de. Noções fundamentais de direito
registral e notarial. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 263-265).
15
16
Veja-se, por exemplo, que perante a Junta Comercial, em tese, deve ser considerada suficiente a entrega,
pelo interessado da sentença arbitral (e documentos pertinentes ao procedimento) na qual se decidiu
alguma questão relativa ao contrato social (modificação/invalidação de cláusula, de alteração etc.). Mas
não se vê óbice para o próprio árbitro (ou Tribunal), oficiar a Junta com a finalidade de ser observado o
quanto decidido a respeito do contrato social.
17
Como diversas questões em arbitragem, o cumprimento de uma sentença arbitral, nesta situação “não
condenatória”, é matéria muito nova, e aqui se apresenta a primeira impressão do autor. Mas na prática,
diante de eventual resistência do destinatário da “ordem” arbitral, deixa o juízo arbitral inerte, pois lhe
falta a coercitividade. Assim, se houver, definitivamente, a recusa ao cumprimento, poderá ser buscada a
cooperação do Poder Judiciário, antes, na amplitude da exegese do art. 22, § 4.º (revogado pela Lei
13.129/2015), agora através de carta arbitral, na forma a seguir apresentada para as outras categorias
diversas do cumprimento de sentença. Ainda, e será circunstancial, dependendo da situação, a resistência
de um órgão público ao decidido pelo juízo arbitral pode até ensejar a impetração de Mandado de
Segurança. Confiram-se, a respeito, inúmeras decisões sobre liberação de FGTS no Juízo Arbitral, quando
se realizava com frequência a arbitragem trabalhista, hoje obstada por decisões do TST (veja-se adiante
Capítulo 14 – Arbitragem Temática); confiram-se, dentre outros no STJ, os seguintes precedentes: REsp
777.906/BA, REsp 778.154/BA, REsp 756.501/BA, REsp 707.765/BA, REsp 707043/BA, REsp 635156/BA, REsp
676436/BA, REsp 637055/BA, REsp 635156/BA, REsp 706942/BA e REsp 676346/BA.
18
Promovida entre 22 e 23 de agosto de 2016 pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça
Federal. Cf em “Anexo 7” o texto integral dos enunciados aprovados.
19
20
Daí por que, como referido, alguns autores rejeitam o reconhecimento desta categoria da sentença como
autônoma, tratando-a simplesmente como condenatória, porém com forma diferenciada para se
promover o seu cumprimento forçado.
21
22
Assim: “Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o exequente poderá optar pelo juízo do atual
domicílio do executado, pelo juízo do local onde se encontrem os bens sujeitos à execução ou pelo juízo do
local onde deva ser executada a obrigação de fazer ou de não fazer, casos em que a remessa dos autos do
processo será solicitada ao juízo de origem”. Embora à luz da legislação processual revogada, e em
matéria trabalhista, vale a referência para reflexão ao seguinte precedente: “Conciliação firmada perante
Câmara Arbitral. Natureza de título executivo. Execução na Justiça do Trabalho. A Emenda Constitucional
45/2004, ao alterar o art. 114 da CF, ampliou a competência material da Justiça obreira, possibilitando o
ajuizamento de ação executiva de títulos extrajudiciais além daqueles expressamente previstos no art. 876
da CLT. Não há mais que se falar que o art. 876 celetista apresenta rol taxativo (numerus clausus). Quanto
a este tema, prevalece a aplicação subsidiária do CPC, que dispõe que a sentença arbitral constitui título
executivo (arts. 475-N, IV, e 585, VIII [do CPC/1973, correspondentes aos arts. 515, VII e 784, XII, do
CPC/2015]). Se o exequente não questiona a validade da avença realizada perante a Câmara Arbitral nem
suscita qualquer vício de consentimento, tem direito legítimo de pretender a execução deste título
executivo na Justiça do Trabalho, seara competente para processar e julgar matéria pertinente à relação
de emprego (art. 877-A da CLT)” (TRT-2.ª Reg., RO 00116200931902003/SP, 4.ª T., j. 17.11.2009, v.u., rel. Des.
Sergio Winnik).
23
REsp. 1.102.460/RJ, Corte Especial, Rel. Min. Marco Buzzi, j.17.06.2015, v.u.; cf.
[www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/noticias/noticias/Multa-por-n%C3%A3o-pagamento-de-
condena%C3%A7%C3%A3o-em-15-dias-tamb%C3%A9m-se-aplica-em-senten%C3%A7a-arbitral]: Acesso
em: 17.07.2015. E assim também já se manifestava Rodrigo Garcia da Fonseca, para quem “Ainda que
iniciada mediante citação, a partir da integração do réu no feito, será esta execução em tudo e por tudo
assemelhada à execução (ou cumprimento) de sentença judicial, não havendo motivo para se pretender
aplicar qualquer outra modificação de procedimento. Assim, conforme o art. 475-J do CPC [de 1973],
introduzido pela mencionada pela Lei 11.232/2005, correrá prazo de quinze dias para pagamento, sob
pena de multa de 10%, a penhora de bens poderá ser feita mediante indicação pelo credor, e assim por
diante” (FONSECA, Rodrigo Garcia. Da arbitragem e reforma processual da execução. Revista de
Arbitragem e Mediação. n. 14. ano IV. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2007. p. 43).
24
25
Em sentido contrário, Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart defendem que “o prazo de quinze
dias para o cumprimento voluntário da sentença, estipulado no art. 475-J, não se aplica à sentença
arbitral”, pois “conforme estabelece o art. 26, III, da Lei de Arbitragem, cabe aos árbitros estabelecer o
prazo em que a sentença arbitral deve ser cumprida, não prevalecendo, assim, o prazo legal de quinze
dias” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Execução. São Paulo: Ed. RT, 2008. p. 417).
26
Ainda, na vigência do Código de 1973, confira-se a polêmica a respeito do termo inicial de incidência da
multa decorrente do incumprimento de sentença judicial, sustentando alguns considerá-lo automático.
Nossa posição é no sentido de ser indispensável a intimação do devedor, na pessoa do advogado, para a
incidência da sanção processual, adotando a tese no momento predominante no STJ (REsp 940.274/MS,
Corte Especial, j. 07.04.2010, Min. João Otávio de Noronha, DJ 31.05.2010). E nesta linha, pela redação do
art. 523 do Código de 2015, parece estar clara a incidência da multa apenas quando decorrido o prazo da
intimação. Se assim é para o cumprimento da sentença judicial, por iguais razões, lá expostas, também
será para o cumprimento da sentença arbitral.
27
Como diz Rodrigo Garcia da Fonseca, se referindo à multa do art. 475-J em questão: “A multa, por sinal, foi
estabelecida por lei, e independe de pedido da parte ou disposição na sentença exequenda” (FONSECA,
Rodrigo Garcia. Op. cit., p. 43).
28
Neste sentido, cf. Luiz Antonio Scavone Junior: “Conclui-se que, além da cláusula penal de natureza
material e independentemente dela, surge a vertente cláusula penal processual, com exclusivo caráter
inibitório, de reforço da sentença. Posta assim a questão, em resumo, a multa de dez por cento pela
inexecução das sentenças líquidas é instituto análogo às astreintes, cumprindo função de reforço
sentencial que cumula com a cláusula penal porventura existente na obrigação sem que se trate de bis in
idem” (SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Op. cit., p. 150).
29
Por exemplo, na convenção arbitral, ou no termo de arbitragem, pode constar a faculdade ao árbitro de,
pelas circunstâncias, estabelecer multa ao vencido se não cumprir espontaneamente a condenação, o
mesmo ocorrendo com acordo homologado pelo árbitro elevado à qualidade de título executivo judicial.
Esta sanção, assim, incide independente da multa processual prevista para o cumprimento da sentença
(previstas no art. 475-J do CPC/1973, ou no art. 523, § 1.º, do CPC/2015. A seu turno, mesmo que outorgados
poderes pelas partes ao árbitro para tratar desta punição exclusiva da fase de execução, a disposição
contratual não se presta ao fim desejado, por faltar ao árbitro a jurisdição para tanto (ausente
arbitrabilidade objetiva quanto à matéria).
30
Nesta linha, para se evitar dúvidas de interpretação nocivas a ambas as partes, e como temos feito em
diversas situações, convém se tenha clareza na sentença arbitral a respeito desta questão e, assim, nesta
fazer constar, expressamente, por exemplo, que, diante do não cumprimento, “a multa devida será aquela
prevista para a execução forçada e nas condições estabelecidas na norma processual (art. 523, § 1.º, do
CPC/2015)”, ou, “para o caso de ser necessária a execução forçada, incide exclusivamente a multa prevista
na legislação processual”. E, se e quando possível outra multa, caberá ao árbitro a devida distinção entre
ambas. Em outras palavras, permitidas em situações específicas a dupla incidência da sanção (uma
prevista na convenção arbitral ou termo de arbitragem, para ser fixada na sentença, e outra a ser
estabelecida na execução, por força da lei processual), cabe ao árbitro especificar, em sua decisão, se a
multa por ele imposta na condenação é diversa daquela própria do cumprimento da sentença ou se
apenas esta última incidirá (apenas confirmando, nesta hipótese, a oportuna aplicação da sanção
processual em exame pelo juízo estatal).
31
32
Cf., a respeito, o seguinte precedente, pela interessante e correta solução dada: “Agravo de Instrumento.
Ensino Particular. Sentença Arbitral. Ausência de Citação. Intimação. Rito. I. Por se estar a tratar de título
executivo judicial, a execução de sentença arbitral se faz nos termos do cumprimento de sentença por
exegese do art. 475-N, IV, do CPC [1973]. Deve haver, no entanto, a prévia citação do executado para
compor o polo passivo da demanda. II. Ausente a citação formal, mas havendo a intimação pessoal do
executado para participar da lide, pagando ou depositando o valor do débito, não há falar em nulidade do
feito por exegese do art. 214 do CPC [1973], máxime se o oficial de justiça, em cumprimento da diligência,
esteve na residência do devedor logrando êxito em penhorar bens e depositando-os em mãos do próprio
agravado. Agravo de instrumento provido” (TJRS, AgIn 70030072425, 6.ª Câm. Civ., j. 10.09.2009, rel. Des.
Liege Puricelli Pires).
33
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Execução. São Paulo: Ed. RT, 2008. p. 416-417.
34
Cf., também assim, Fredie Didier Jr. considera que, “a despeito da omissão legislativa, porém, na execução
de sentença arbitral é cabível a alegação das matérias constantes do art. 32 da Lei Federal 9.307/1996, o
que torna peculiarmente mais ampla a cognição judicial na execução deste título judicial” (DIDIER JR.,
Fredie; Cunha, Leonardo José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito
processual civil. Salvador: JusPodivm, 2009. p. 165).
35
Também neste sentido: “Sentença arbitral. Execução por título judicial. Impugnação. Abrangência. As
disposições do § 3.º, do art. 33 da Lei 9.307/1996 não foram revogadas pela Lei 11.232/2005, que deu nova
redação ao art. 741 do CPC [1973] e reacomodou a execução por título judicial como uma ‘fase’ no Livro I –
Processo de Conhecimento do mesmo estatuto. Compatibilizadas as regras anterior e atual, tem-se que
eventual nulidade da sentença arbitral que antes podia ser oposta “mediante ação de embargos do
devedor”, agora pode ser discutida por meio de “impugnação” na forma do art. 475-L do CPC [1973], sob
pena de retirar-se do executado a arguição de nulidade do titulo executivo, faculdade que não foi
suprimida ou limitada pelas recentes modificações legislativas” (TJSP, AgIn 1117010400, 34.ª Câm., 7.º
Grupo (Ext. 2.º TAC), j. 01.08.2007, rel. Des. Irineu Pedrotti). E na doutrina, Felipe Scripes Wladeck escreve:
“Seria anti-isonômico, absolutamente despropositado, reputar que, em razão das alterações recentemente
introduzidas no ordenamento pela Lei 11.232/2005, o Poder Público teria se tornado o exclusivo detentor
da faculdade de deduzir o pleito anulatório de sentenças arbitrais em sede de execução. Com efeito, a
impugnação disciplinada no art. 475-L do CPC [1973] exerce exatamente a mesma função dos embargos de
que trata o art. 741 do CPC [1973] – o simples cotejo dos dispositivos permite tal ilação. Portanto, conclui-se
que a anulação da sentença arbitral também pode ser pleiteada por meio da impugnação (na forma dos
arts. 475-M do CPC [1973] e seguintes), na pendência ou não do prazo do § 1.º do art. 33” (WLADECK,
Felipe Scripes. O pleito de anulação da sentença arbitral nacional em sede de execução. Revista de
Arbitragem e Mediação. n. 16, jan.-mar. 2008, p. 98); cf., ainda, VALENÇA FILHO, Clávio de Melo. Sentença
arbitral e juízo de execuções. Revista do Advogado. n. 87. ano XXVI. São Paulo, set. 2006. p. 40; ZAVASCKI,
Teori Albino. Defesas do executado. In: RENAULT, Sérgio; BOTTINI, Pierpaolo (coord.). A nova execução de
títulos judiciais. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 147. Em sentido contrário, Paulo Salvador Frontini escreve:
“Assim, a remissão constante da Lei de Arbitragem, que remete o devedor ao art. 741, não faz mais
sentido, pois este preceito é de interesse exclusivo da Fazenda Pública, quando executada. (...) O teor da
impugnação está restrito às seis hipóteses previstas nos respectivos incisos (I a VI) do art. 475-L do CPC
[1973]. (...) Mas, na brevidade destas linhas, parece-nos que a ampliação do objeto da impugnação é
contrária aos objetivos da reforma processual, que visou, dentre outras preocupações, valorizar o título
executivo judicial, inclusive a sentença arbitral. Afinal, se o devedor se considera ao abrigo das hipóteses
que autorizam o ajuizamento de ação de nulidade de sentença arbitral, deve fazê-lo; deve tomar a
iniciativa de postular em juízo, como autor, a invalidade da sentença arbitral, ao invés de se quedar na
espera do ingresso do credor em juízo, com a ação de cumprimento de sentença arbitral” (FRONTINI,
Paulo Salvador. Arbitragem e execução da sentença arbitral: Apontamentos sobre os reflexos da Lei n.
11.232/2005 no âmbito do cumprimento forçado da sentença arbitral. Revista do Advogado. n. 87. ano
XXVI, set. 2006, p. 8).
36
Neste sentido, dentre vários autores, Araken de Assis: “Sem nenhuma ofensa ao seu caráter sumário a
impugnação do art. 475-L compreenderá quaisquer questões passíveis de conhecimento ex officio pelo
juiz” (ASSIS, Araken. Cumprimento da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 319), trazido por Valença
Filho, que acrescenta: “Qualquer questão possível de ser conhecida, de ofício, pelo juiz estatal não
invocada nos próprios autos da execução ou, se invocada, que não tenha sido examinada e decidida por
necessidade de dilação probatória, pode e deve ser reapresentada ao juiz estatal de primeira instância no
momento dos embargos ou da impugnação, agora com a possibilidade de ampla produção probatória.
Logo se vê a perfeita compatibilidade entre a natureza sumária horizontal da cognição em sede de
embargos e a amplitude da produção probatória permitida” (VALENÇA FILHO, Clávio de Melo. Sentença
arbitral e juízo de execuções. Revista do Advogado. n. 87. ano XXVI. set. 2006. p. 40).
37
Citada por Oscavo Cordeiro Corrêa Netto e Ada Pellegrini Grinover, A relação entre a execução da
sentença arbitral, os embargos ou impugnação e a ação de anulação de sentença arbitral. Revista do
Instituto de Advogados de São Paulo. n. 23. ano XII. jan.-jun. 2009. p. 264.
38
Cf. também, a respeito, Ada Pellegrini Grinover e Oscavo Cordeiro Corrêa Netto, que enfrentam a questão
especificamente no que se refere à execução da sentença arbitral (A relação entre a execução da sentença
arbitral..., cit., p. 264).
39
Neste sentido, Ada Pellegrini Grinover: “A esse respeito e como visto, ambas as vias processuais têm
natureza de ação de conhecimento e, portanto, desencadeiam processo tendente à prolação de sentença
de mérito. Mais ainda, ambas têm por escopo, em última análise, o reconhecimento de óbice à efetivação
da sentença arbitral. Nessa medida, portanto, parece lícito afirmar que o objeto de ambas é o mesmo,
quando menos sob a ótica do bem da vida que se pretende tutelar”, bem como: “Essa correspondência é
exata quanto aos fundamentos e quanto ao objeto, pois pelas duas medidas o que se busca é
rigorosamente o mesmo resultado, isto é, a tutela do mesmo bem jurídico. Portanto, nessa medida, não há
apenas conexão entre as duas referidas demandas. O que há rigorosamente é situação de litispendência,
que impede que tais matérias, porque já resolvidas na ação anulatória, sejam reapreciadas em embargos.
Os ensinamentos anteriormente colacionados confirmam, com largueza, essa conclusão: o que se quer por
ambas as vias é o mesmo resultado, exatamente pelos mesmos fundamentos” (GRINOVER, Ada Pellegrini.
Arbitragem, execução, ação para reconhecer a invalidade da arbitragem, embargos à execução,
identidade. Revista de Processo. vol. 146. São Paulo: Ed. RT, abr. 2007. p. 271).
40
E, como escrevemos no ensaio já citado: “No plano acadêmico, sugerimos transformar a ação própria em
embargos/impugnação, quando possível, por mera comunicação na execução aparelhada, obedecendo as
regras da prevenção para direcionar o processo a um único juízo (adaptando-se a partir de então ao
respectivo procedimento). Assim se procedendo, certamente, se prestigia o princípio da economia
processual. E mesmo se já no Tribunal a ação, aqui sem pensar em reunião, deve ser emprestada à ação o
efeito de embargos/impugnação, como se tal fosse, ou seja, como se a impugnação ou embargos estivesse
em segundo grau, submetendo o juízo à sentença, como se por ele tivesse sido proferida. E,
evidentemente, tudo o quanto conhecido de liminar, medidas antecipatórias ou de urgência para
suspender a execução seria possível no juízo da ação”.
41
Neste sentido, Arnoldo Wald, escrevendo anteriormente à vigência da Lei 11.232/2005, entendeu que “a
aplicação do art. 741 do CPC [1973] (leia-se, hoje, art. 475-L do diploma processual) deveria ser mitigada,
adaptando-o de maneira adequada para a arbitragem”, isto é, “a interpretação da lei não deveria permitir
à parte executada, que não pleiteou a anulação da sentença arbitral no momento oportuno, suscitar em
sua defesa que permitiriam a anulação da sentença”. O autor sugeriu, de lege ferenda, que “os embargos
do devedor (leia-se, atualmente, impugnação ao cumprimento da sentença) não deveriam poder ser
utilizados nos mesmos casos previstos para a anulação da sentença”, razão pela qual a impugnação ao
cumprimento da sentença deveria ser unicamente cabível “nos casos de incompetência do juiz da
execução, de ilegitimidade das partes na execução, ou quando ela é excessiva ou de fato posterior à
sentença arbitral que poderia afetar a execução” (WALD, Arnoldo. Os meios judiciais..., cit., p. 55-56).
Comungando dessa posição, e renovando seu entendimento anterior, Carlos Alberto Carmona entende
hoje que “o legislador reservou ao embargante a possibilidade de alegar todas as matérias relativas ao
ataque dos títulos executivos judiciais, nada mais: terá o embargante, em tal hipótese, perdido, por
inércia, o direito de levar ao conhecimento do juiz togado qualquer uma das matérias enumeradas no art.
32 da Lei”, o que significa que, depois de escoado o prazo de noventa dias para requerer a invalidação da
sentença arbitral, “enfrentará o impugnante as mesmas limitações impostas ao executado que ataca a
sentença judicial condenatória” (CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem..., cit., p. 430-431).
42
Em sentido contrário à nossa posição, cf. Joel Dias Figueira Jr., que, escrevendo antes da promulgação da
Lei 11.232/2005, sustentava que “mesmo se decorrido em branco o prazo de noventa dias para o
ajuizamento da ação declaratória de nulidade, o mesmo resultado (tutela jurisdicional) poderá ser obtido
através da interposição dos embargos do devedor [leia-se, hoje, impugnação ao cumprimento de
sentença]” (FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Arbitragem, jurisdição e execução. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1999.
p. 271). Também assim, Fernando Gajardoni defende “a natureza também rescisória da presente ação
incidental desconstitutiva [impugnação ao cumprimento], sem, contudo, necessidade de obediência ao
prazo decadencial de 90 dias” (GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Aspectos fundamentais de processo
arbitral. RePro 106/212.); Duval Vianna: “A Lei 9.307/1996 criou um dispositivo que amplia a margem do
controle judicial, conferindo à parte interessada a oportunidade de arguir a nulidade da sentença arbitral,
ainda que tenha deixado decorrer o prazo de noventa dias para propor a respectiva ação, o que fará
através de embargos do devedor” (VIANNA, Duval. Lei de Arbitragem. Rio de Janeiro: Adcoas, 1998. p.
222); e Felipe Scripes Wladeck: “É que, relativamente aos provimentos arbitrais condenatórios, o decurso
do prazo previsto no § 1.º do art. 33 não inviabiliza o juízo rescidens, mas apenas impede que se o
pretenda pela via principal (da ação anulatória), restando ao contendente interessado o mecanismo de
defesa em execução, em que se pode alegar qualquer dos errores in procedendo arrolados no art. 32”
(WLADECK, Felipe Scripes. O pleito de anulação da sentença arbitral nacional em sede de execução.
Revista de Arbitragem e Mediação. vol. 16. jan.-mar. 2008. p. 99-105).
43
Idem, p. 41.
45
Idem, ibidem.
46
Idem, p. 42.
47
48
Anote-se, porém, que ao se admitir, na análise sobre as causas da invalidação previstas no art. 32 da Lei de
Arbitragem, a possibilidade de se estar diante de uma verdadeira nulidade absoluta ou mesmo
inexistência, ao autorizar a ação declaratória imprescritível (querela nullitatis insanabilis), como se verá
adiante, igualmente haverá de se permitir o ataque à sentença por meio da impugnação, independente,
nestes casos, do transcurso in albis do prazo de 90 dias. Cf. a respeito Capítulo 13 infra.
49
50
Especificamente quanto ao prazo de cumprimento pelo vencido, entendemos que, como visto, cabe ao
árbitro a sua fixação, mas se omisso, e não solicitado esclarecimento (art. 30 da Lei 9.307/1996), parece-se
correto pressupor-se ter sido a condenação para atendimento “imediato”. Neste sentido, cf. SCAVONE
JUNIOR, Luiz Antonio, Manual de arbitragem. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. RT, 2009. p. 153,
especialmente nota 20.
51
Assim: “Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de
não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção
de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.
§ 1.º Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de
multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de
atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial.”; e merece anotação
também os seguintes parágrafos deste artigo: “§ 2.º O mandado de busca e apreensão de pessoas e coisas
será cumprido por 2 (dois) oficiais de justiça, observando-se o disposto no art. 846, §§ 1.º a 4.º, se houver
necessidade de arrombamento. § 3.º O executado incidirá nas penas de litigância de má-fé quando
injustificadamente descumprir a ordem judicial, sem prejuízo de sua responsabilização por crime de
desobediência.”
52
Assim: “§ 1.º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa
vincenda ou excluí-la, caso verifique que: I – se tornou insuficiente ou excessiva; II – o obrigado
demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento. §
2.º O valor da multa será devido ao exequente. § 3.º A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento
provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em
julgado da sentença favorável à parte ou na pendência do agravo fundado nos incisos II ou III do art.
1.042. § 4.º A multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e incidirá
enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado. § 5.º O disposto neste artigo aplica-se, no que
couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não
obrigacional.”
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
• VII – proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e
• VIII – ofensa aos princípios de que trata o art. 21, § 2.º, desta Lei.
• Ação ordinária no órgão competente do Poder Judiciário (art. 33, § 1.º, da Lei 9.307/1996)
• Impugnação de sentença que não decide todo o litígio submetido à arbitragem (art. 33, § 4.º,
da Lei 9.307/1996)
SUMÁRIO
Em nosso ver, encontra-se em alguns dos estudos sobre arbitragem quanto ao tema “nulidade”
da sentença arbitral uma análise equivocada, em razão da qual se apresenta inadequadamente o
tratamento jurídico da patologia do laudo final.
Isto se diz, pois se costuma confundir a invalidação da sentença com a invalidação dos negócios
jurídicos em geral, e ainda, por vezes, quer se assemelhar a classificação e os efeitos dos vícios do
ato jurídico reconhecidos no direito civil com aqueles identificados no processo civil. Este cenário
é histórico e induzido pela própria literalidade dos artigos da Lei de Arbitragem (arts. 32 e 33).
Com efeito, definitivamente, a técnica não é o melhor atributo destes artigos; aliás, veja-se: a
sentença é nula; a parte pode requerer a declaração da nulidade que, se procedente o pedido,
declarará a nulidade? Daí porque se faz uma proposta de “leitura” destes artigos, e assim, buscar-
se-á a melhor exegese diante da deficiência de sua redação. E reconhecidos os adequados avanços
trazidos na reforma apresentada pela Lei 13.129/2015, anote-se ter perdido o legislador a
oportunidade de melhor adequar a sistemática vigente.
Não se podem baralhar nulidades civis com nulidades processuais; tampouco assimilar os
efeitos de uma pela outra.1
As nulidades pensadas pelos civilistas, e contidas nos arts. 166, 167 e 171 da Lei civil, são
absolutas ou relativas, sendo que as primeiras são insanáveis, inclusive diante da vontade das
partes, e também são imunes à decadência e à prescrição (art. 169 do CC/2002). As nulidades
processuais, embora também se apresentem como absolutas e relativas, têm critérios próprios
para identificação do vício em uma ou outra categoria (esqueçam neste momento a referência ao
Código Civil!), e, como regra, são sanáveis, por vontade das partes ou outro motivo legal, inclusive
pela preclusão e pela decadência. Mesmos nomes, mas institutos distintos, com muitas
semelhanças, na essência, mas também diferenças na origem e nos efeitos.
Quando a Lei de Arbitragem diz, em seu art. 32, que “é nula a sentença arbitral”, será
equivocado tratar desta nulidade pelo regime jurídico do direito material, impondo-se aplicar o
sistema processual a respeito do vício e seus efeitos.
Ou seja, a invalidade de sentença é matéria que deve ser analisada com as lentes do direito
processual civil; por sua vez, a nulidade da convenção (causa legal para aquela) se apura com base
nos elementos do direito civil (direito material).
A invalidade da sentença arbitral submete-se ao prazo decadencial previsto em lei (90 dias –
art. 33, § 1.º, da Lei 9.307/1996). E só mesmo a parte interessada tem legitimidade para propor a
ação.
Ainda, marcado o regime jurídico processual para a matéria, outras observações devem ser
feitas:
O árbitro é juiz de fato e de direito (art. 18 da Lei 9.307/1996), exerce jurisdição e, assim, profere
sentença arbitral com natureza definitiva, sujeita à imutabilidade decorrente da coisa julgada
material, tal como ocorre no caso da sentença judicial.2 Com os mesmos efeitos da sentença
judicial (art. 31 da Lei 9.307/1996), a sentença arbitral é considerada pela lei processual, inclusive,
como título executivo judicial (art. 515, VII, do CPC/2015). Ambos os pronunciamentos são, sem
dúvida, parelhos e com idêntica eficácia no plano do direito.
Se assim é, o regime jurídico para desconstituição de uma e outra é o mesmo, cada qual, porém,
com seus próprios (às vezes comuns) fundamentos (causas) para tanto.
Sob este olhar, diverso do de vários comentaristas da Lei, temos uma identidade da ação do art.
33 em exame (invalidação da sentença arbitral) com a ação rescisória, e não com ação declaratória
de nulidade para correção de vício do ato jurídico.
Dito de outra forma: a tutela jurisdicional para atacar sentença arbitral, quando qualificada
como nula pela lei, considerados os vícios tipificados na norma, tem natureza desconstitutiva.
Sentença arbitral viciada, nula ou anulável (na linguagem processual), desconstitui-se, não se
declara a nulidade (ou decreta a nulidade como dizia a lei na versão original).3 E em momento
oportuno adiante, falar-se-á sobre a ação declaratória de inexistência, cuja causa é diversa daquela
enunciada no art. 32 agora em exame.
Os vícios legais (art. 32 da Lei 9.307/1996) são de ordem material e processual; conforme o caso,
relativos à sentença (enquanto instrumento jurídico), ao procedimento e até mesmo anterior a este
(no caso da convenção). Existem, pois, elementos internos e externos à arbitragem que podem
ensejar o rompimento do laudo.
Desta forma, à exceção do inciso I, impróprio procurar encaixar os demais incisos do art. 32 em
exame – causas de desconstituição da sentença arbitral – nas categorias dos defeitos dos atos
jurídicos (arts. 166, 167 e 171 do CC/2002). Da mesma forma, afigura-se inadequado falar-se em
vício relativo ou absoluto na forma que vem sendo em geral apresentada. A regra contém
hipóteses legais para se atacar o julgamento. Por qualquer delas, cabe a ação. Pouco importa se
algumas dessas causas estão contidas e outras não em categorias do direito civil.4
Nesta linha, confirma-se a conclusão acima: a ação para desconstituir a sentença arbitral tem
prazo decadencial de 90 dias para ser proposta, exclusivamente pela parte interessada. Após este
prazo, torna-se definitivamente imutável, tal qual a coisa julgada da sentença judicial após o prazo
para a propositura da ação rescisória.
Advirta-se, porém, como se verá, situações teratológicas e excepcionais, em que, por via
indireta, pode-se retirar a eficácia da sentença arbitral em razão de nulidade absoluta da
convenção que a originou, como igualmente, já se sabe, pode ocorrer a ação declaratória de
inexistência até mesmo de sentença judicial, mesmo já consumado o prazo para a ação rescisória.
E ainda, também se aplica à sentença arbitral de aprovação da transação entre as partes (art. 28
da Lei 9.307/1996), em nosso sentir, a tutela prevista no art. 966, § 4.º, do CPC/2015,5 pois o acordo
pode ser rescindido6 “como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil”, e sua quebra
compromete naturalmente o ato homologatório daí decorrente.
Aliás, talvez tenha havido apenas preconceito do legislador (de 1996 e de 2015) em emparelhar
a ação à rescisória (embora esta mais restrita, pois apenas para sentença de mérito, e o
rompimento da sentença arbitral nas hipóteses legais pode atingir, conforme o caso, também
sentenças terminativas), mas a ideia deve ser esta: a desconstituição da sentença arbitral tem seu
cabimento nas hipóteses previstas no art. 32 em comento, e só neles (extremamente abrangentes
como se verá). A tutela não é declaratória de nulidade (como trazido pela reforma de 2015 em
substituição à decretação de nulidade então prevista), mas desconstitutiva pelo vício de nulidade
(processual) que na sentença se contém.
Em recente escrito sobre a matéria, confortou-nos ver que Cândido Rangel Dinamarco também
reconhece como desconstitutiva esta ação; assim: “A demanda de sua anulação tem natureza
claramente constitutiva negativa, porque a pronúncia de sua procedência tem por efeito a
implantação de uma situação jurídica nova mediante a eliminação da sentença impugnada do
mundo jurídico”.7
Por esta razão, neste particular, em nosso entender, a reforma da Lei de Arbitragem, data
vênia, deu passos para trás. Aqueles que dela participaram não se aperceberam da confusão que
hoje se tem a respeito, e quanto ao instituto em si, apenas trocaram “decretação” por
“declaração”,8 confirmando uma vez mais a confusão entre as nulidades do sistema jurídico. Mas
repita-se: encerrado o procedimento por sentença, a eventual exclusão de seus efeitos se faz por
desconstituição, não por declaração ou decretação.
Ainda, a nulidade convalesce pelo decurso do prazo, em homenagem à segurança das relações
jurídicas. Quer-se, por Lei, a estabilização da decisão arbitral em curto espaço. Os vícios em si que
fundamentam a ação podem, conforme o caso, encontrar ambiente na legislação civil para sua
identificação, mas a sentença será nula, sempre na dicção exclusivamente processual, se qualquer
das hipóteses se verificarem, condicionada à propositura oportuno tempore da ação, sob pena de,
com a exaustão do prazo, imunizar-se o julgado.
A reconhecida semelhança entre sentença arbitral e judicial não permite, porém, admitir
àquela submeter-se à ação rescisória, privativa desta. O legislador identifica a patologia de cada
qual e a ação própria para sua desconstituição.10
Por fim, de forma alguma se pode utilizar deste expediente para se rediscutir a matéria de
fundo decidida. O inconformismo do vencido com a solução jurídica dada ao conflito pelo árbitro
(ou tribunal arbitral) não é causa de ação de invalidação de sentença arbitral, ou seja, error in
judicando é matéria estranha à desconstituição do julgado pela forma prevista na Lei de
Arbitragem e o Poder Judiciário não é instância revisora ou recursal da sentença arbitral.
13.2. Das causas de invalidação da sentença arbitral
V – (revogado);11
VII – proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e
VIII – forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 21, § 2.º, desta Lei.
Quer-se aqui dizer que esta causa de desconstituição da sentença arbitral deve ser analisada
sob as luzes do direito material. A patologia, então, é buscada de acordo com os defeitos do ato
jurídico previstos no Código Civil.
E assim, será nula a convenção quando: I – celebrada por pessoa absolutamente incapaz; II – for
ilícito, impossível ou indeterminado o seu objeto; III – o motivo determinante, comum a ambas as
partes, for ilícito; IV – não revestir a forma prescrita em lei; V – for preterida alguma solenidade
que a lei considera essencial para a sua validade; VI – tiver por objetivo fraudar lei imperativa; VII
– a lei taxativamente a declarar nula, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção (art. 166 do
CC/2002); e também se verificada a simulação (art. 167 do CC/2002).
Também, por certo, vícios do negócio jurídico previstos em legislação material específica
igualmente serão considerados para verificação da ocorrência desta causa de desconstituição da
sentença; mas tudo se encampa no próprio Código Civil, pela abrangência dos incisos acima
referidos, ao se reportarem a todo ordenamento jurídico material. A seu turno, deve ser
verificado, ainda, se as partes, na convenção, fizeram a escolha de outra lei aplicável na
arbitragem, hipótese em que igualmente os requisitos eventualmente nesta previstos serão
observados.
Pela previsão contida nos incisos V e VII do art. 166 do CC/2002 acima transcritos, devem ser
obedecidos os requisitos exigidos na Lei de Arbitragem tanto para a celebração do compromisso
arbitral, como para a contratação da cláusula compromissória.
Assim, os elementos necessários à convenção arbitral devem estar presentes.14 Da mesma
forma, considera-se comprometida a convenção se verificada a incapacidade das partes, ou
quando o objeto da arbitragem versar sobre matéria de direito indisponível, pois nestes casos
faltará o requisito da arbitrabilidade subjetiva e objetiva (art. 1.º da Lei 9.307/1996),15 embora
nestas situações se possa reconhecer, excepcionalmente, a inexistência do juízo arbitral, como
adiante se verá.
Em qualquer dos casos, verificado o vício na convenção, apurado de acordo com o direito
material (em especial a Lei de Arbitragem e o Código Civil), há fundamento para desconstituição
da sentença arbitral.
Observe-se ainda que, quando o vício da convenção (negócio jurídico) for considerado pelo
direito material como sendo de nulidade absoluta, será desnecessária a sua prévia arguição
durante a arbitragem, pois, sendo de ordem pública, escapa da disponibilidade das partes,
impedindo o seu saneamento durante o procedimento. Assim, enquanto nulo, o ato não se
convalida, e mesmo omissa a parte até a sentença, o vício contamina toda a arbitragem, e
compromete, inclusive, a decisão que estará exposta à invalidação nos termos dos arts. 32 e 33 da
Lei Especial.
Por outro lado, se o vício da convenção for considerado pelo direto material como sendo
relativo, sua arguição deve ser feita no momento oportuno (p. ex., art. 20 da Lei 9.307/1996), sob
pena de impedir que venha a ser invocado como causa de invalidação da sentença.
No entanto, repita-se, mesmo sendo o caso de nulidade absoluta, o rompimento do julgado com
base nesta causa específica por meio do ajuizamento da ação de desconstituição da sentença
deverá obedecer ao prazo certo e decadencial de 90 dias.
Ultrapassado o prazo, não mais caberá a ação de desconstituição da sentença arbitral com
fundamento nos arts. 32, I, e 33 da Lei de Arbitragem (mesmo se verificado vício de nulidade
absoluta no compromisso), pois a nulidade da sentença – patologia processual – sucumbe à inércia.
Porém, como adiante se verá, reconhecemos a possibilidade de ação própria para declarar a
inexistência da decisão ou da própria jurisdição arbitral.
Na adequada exegese do inciso I em exame estão contidos, como visto, os defeitos da convenção
elencados no art. 20 da Lei de Arbitragem (nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção), e a
este deve ser agregado o parágrafo único do art. 8.º, conferindo ao árbitro a jurisdição para decidir
“as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção”.
Advirta-se, porém, que, conforme a patologia, se assim for admitido no ordenamento para o
respectivo defeito, nada impede seja sanado o vício pelas partes no Juízo arbitral, a qualquer
momento, em especial quando instituída a arbitragem, para se preservar o procedimento, e
respectiva sentença.
Já se analisou o necessário para a atuação do árbitro. E permite a Lei que seja desconstituída a
sentença proferida por quem não poderia assumir a investidura.
Para relembrar esse ponto, cumpre dizer que a incapacidade civil obsta a atividade
jurisdicional. Da mesma forma, também não pode ser nomeado árbitro pessoa jurídica, no
pressuposto de que a atribuição jurisdicional é personalíssima.16
Por sua vez, o art. 14 da Lei de Arbitragem prevê serem impedidas de funcionar como árbitros
as pessoas que tenham com as partes ou com o litígio alguma das relações que caracterizam
impedimento ou suspeição de juízes (arts. 144 e 145 do CPC/2015). Além dessas causas, também
não podem funcionar como árbitros aqueles que tenham com as partes alguma relação que cause
a elas alguma desconfiança em relação à sua independência e à sua imparcialidade e que não
tenha sido revelada no tempo oportuno e aceita pelas partes (dever de revelação dos árbitros).
Ainda, a convenção arbitral pode estabelecer certos requisitos para a nomeação do árbitro,
como, por exemplo, integrar determinada classe profissional, possuir certos títulos acadêmicos ou
qualificações específicas. Nestes casos, aqueles cujo perfil não se enquadra nos elementos
identificados pelas partes não podem ser árbitros, na acepção sugerida neste inciso II.
Mas, como já se disse (Capítulo 8), se não apresentada a recusa, e, pois, superado o vício, mesmo
assim subsiste ao árbitro o dever de conduzir a arbitragem com total imparcialidade, sob pena de
incorrer em outra causa específica de desconstituição da sentença arbitral, prevista no inciso VIII
do art. 32 da Lei de Regência, adiante analisado.
Ausente algum destes elementos, a sentença poderá ser desconstituída por vício de forma.
Por exemplo, se houver dúvida quanto à nacionalidade da sentença pela omissão do local em
que foi proferida e esta não puder se extrair de outros elementos contidos no próprio laudo
(relatório, fundamentação etc.), ainda assim, apenas se apontado na ação o interesse na
identificação do local, por este ou aquele motivo, referindo-se às consequências de uma ou outra
situação, é que se terá pertinência a invalidação da sentença. Ou, dito de outra forma, não se
desconstitui a sentença se do alegado vício não houver prejuízo à parte.
Por fim, quanto ao vício no dispositivo, se faltar na sentença a decisão sobre o conflito, possível
será sua invalidação. Especificamente quanto à parte decisória, também se faz necessária, além de
sua existência, a correspondência à convenção arbitral e ao próprio litígio submetido à
arbitragem, como adiante se verá (inciso IV do artigo em exame).
Apesar de não ser requisito para a propositura da ação de invalidação da sentença arbitral a
prévia apresentação de pedido de esclarecimentos (art. 30 da Lei 9.307/1996), parece-nos que esses
“embargos arbitrais” representam a melhor forma de sanar estes vícios da sentença,
especialmente quanto à omissão a respeito da fundamentação e do próprio acolhimento ou
rejeição de pedidos.
As hipóteses, aqui, são mais acadêmicas, pois na prática tudo flui bem, e assim se espera, na
arbitragem. Mas figure-se a hipótese das partes terem admitido definição do an debeatur na
arbitragem, reservando a apuração do quantum debeatur ao juízo estatal, ou ainda, tenham
limitado a incidência de encargos e multas, ou mesmo a responsabilidade pelas custas e despesas
da arbitragem. Caso a condenação venha a impor estas obrigações, há causa para a ação de
desconstituição.
O vício consiste em se proferir uma decisão ultra petita, e tal qual se faz em relação à sentença
judicial, apenas a parcela contaminada pelo vício deve ser comprometida, preservando-se a parte
sadia do julgamento.18 Haverá, então, invalidação apenas parcial da sentença.
Também se inclui na patologia prevista neste inciso a sentença extra petita, ou seja, impondo
condenação cujo objeto é diverso daquele contido na convenção. Nestes casos, a desconstituição da
sentença atinge todo o seu conteúdo decisório.
Sob outra perspectiva, estabelece a convenção, além do objeto do conflito, o procedimento a ser
adotado para a sua solução. E igualmente, este deverá ser seguido sob pena de comprometer a
arbitragem.
Igualmente, vedado na convenção o julgamento por equidade, mesmo nas hipóteses em que a
lei material eventualmente autoriza tal método, o árbitro estará adstrito à vontade das partes, e
assim, caso a sentença venha a decidir o conflito fundamentando-se na equidade, será nula, na
forma prevista no inciso em exame.
Por outro lado, pode acontecer de, na sentença, não se decidir todo o litígio submetido à
arbitragem. Neste caso, não se estará propriamente fora dos limites, mas aquém da convenção e
pedidos. Para esta patologia, antes indicada como causa própria de invalidação (no revogado inc. V
deste artigo), a reforma de 2015 trouxe outra sistemática, a ser analisada adiante (item 13.4.1).
VI – comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva;
Identifica a Lei de Arbitragem, neste inciso, três delitos passíveis de serem praticados pelos
árbitros, nesta qualidade, equiparados a funcionários públicos, inclusive para efeitos da legislação
penal (art. 17 da Lei 9.307/1996): prevaricação, concussão e corrupção, tipificados,
respectivamente, nos arts. 319, 316 e 317 do CP.20 Em quaisquer das hipóteses, por interesse
pessoal ou por alguma vantagem para si ou para outrem, o julgador atrasa a sentença ou direciona
seu julgamento a uma das partes. E tal qual o pronunciamento assim proferido por um Juiz togado
(art. 485, I, do CPC/1973 – art. 966, I, do CPC/2015), a sentença estará comprometida pela objetiva e
macroscópica parcialidade detectada a posteriori.21
VII – proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei;
A finalização do procedimento arbitral tem tempo certo, por definição das partes (na
convenção arbitral, no termo de arbitragem ou no regulamento da câmara arbitral escolhida), ou
por disposição legal fixando o prazo de 6 (seis) meses para ser proferida a sentença (art. 23 da Lei
9.307/1996).23
O art. 12, III, indicado no inciso em exame, refere-se à necessária notificação prévia para
extinção do compromisso arbitral pela intempestividade da sentença, e, ainda, reporta-se ao prazo
definido pelas partes no compromisso.
No entanto, disse a lei menos do que queria (ou deveria), e a interpretação sistemática da Lei
sugere que a invalidação da sentença, nesta hipótese, seja necessariamente precedida da
notificação, quer tenha sido fixado o prazo da arbitragem em convenção (cláusula, compromisso,
termo ou regulamento), quer incida, no silêncio das partes, o prazo legal (art. 23 da Lei
9.307/1996).
A seu turno, correto o entendimento de que somente o notificante poderá, querendo, propor a
ação desconstitutiva da sentença proferida fora do prazo (e certamente só irá pretender se a
decisão lhe foi desfavorável). A outra parte, inerte até então, estará impedida de, por este
fundamento, pretender a invalidação da sentença.24 Com efeito, confere a lei à parte interessada
na extinção do compromisso a necessária iniciativa da notificação (art. 12, III, da Lei 9.307/1996). E
assim, a parte inerte estará despida de legitimidade para a ação anulatória, pois não manifestou
seu interesse na forma exigida em lei, ou seja, não cumpriu o requisito essencial para a ação:
prévia notificação; e tudo condicionado à fluência in albis do prazo legal de tolerância – 10 dias.
VIII – forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 21, § 2.º, desta Lei.
Como último vício tipificado no artigo em estudo a impor a nulidade da sentença arbitral,
estabelece a Lei a violação “aos princípios do contraditório, da igualdade das partes, da
imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento” (art. 21, § 2.º, da Lei 9.307/1996), tudo,
como visto, contido na regra maior do devido processo legal, a ser observado na arbitragem.
Nos expressos termos do § 1.º do art. 33 da Lei de Arbitragem, a ação para rompimento da
sentença arbitral considerada inválida pelos motivos contidos no art. 32 acima analisado “deverá
ser proposta no prazo de até noventa dias após o recebimento da notificação da respectiva
sentença, parcial ou final, ou da decisão do pedido de esclarecimentos”.
O prazo é curto, sem dúvida, mas se justifica pela celeridade esperada da jurisdição arbitral,
inclusive para se alcançar a estabilização da sentença, em prestígio à segurança das relações
sociais.
E sua fluência se faz em separado para cada parte, na medida em que o termo inicial é a
respectiva notificação da sentença, possível, então, de se realizar em datas distintas aos
interessados.
Ainda, em havendo sentença parcial no curso do procedimento (Cf. Capítulo 11, item 11.7), de
sua notificação inicia-se o prazo para a respectiva ação de invalidação pelo vício que nela
eventualmente se contenha, independentemente de seguir-se o procedimento para sentença
“final”.26
Pode acontecer, porém, de o vício debatido em face da sentença parcial contaminar também a
sentença final (p. ex., nulidade da convenção), e certamente o julgamento arbitral se dará antes do
estatal, reclamando até, em tese, a iniciativa de nova ação de invalidação, quando da sentença
“final”, pela mesma causa.
Embora possível de maior debate a questão, anotamos que, mesmo diante de uma aparente
duplicidade de impugnação, evidentemente indesejada no sistema jurídico, entendemos que a
falta de irresignação tempestiva em face da sentença parcial tornará a decisão definitivamente
imutável, não mais passível de revisão.
Por oportuno, lembre-se de que, em nosso sentir, até mesmo a impugnação da sentença
condenatória quando em fase de cumprimento judicial, com o conteúdo do art. 32 em análise,
submete-se ao reduzido prazo de 90 dias, como já antes analisado.27
Art. 33. A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a
declaração de nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos nesta Lei.
§ 1.º A demanda para a declaração de nulidade da sentença arbitral, parcial ou final, seguirá as
regras do procedimento comum, previstas na Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de
Processo Civil),28 e deverá ser proposta no prazo de até 90 (noventa) dias após o recebimento da
notificação da respectiva sentença, parcial ou final, ou da decisão do pedido de esclarecimentos.
§ 2.º A sentença que julgar procedente o pedido declarará a nulidade da sentença arbitral, nos
casos do art. 32, e determinará, se for o caso, que o árbitro ou o tribunal profira nova sentença
arbitral.
§ 3.º A declaração de nulidade da sentença arbitral também poderá ser arguida mediante
impugnação, conforme o art. 475-L e seguintes da Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de
Processo Civil), se houver execução judicial. (Ou, como introduzido pelo Código de Processo Civil:
“§ 3.º A decretação da nulidade da sentença arbitral também poderá ser requerida na impugnação
ao cumprimento da sentença, nos termos dos arts. 525 e seguintes do Código de Processo Civil, se
houver execução judicial”). 29
Todo este art. 33 (caput e parágrafos) foi modificado pela reforma de 2015; porém, manteve-se a
essência do instituto, com relação à forma e prazos de impugnação da sentença por vício
especificado no art. 32.30
Diante de sentença arbitral estrangeira, deverá ser observada a legislação processual aplicável
por convenção das partes. O objeto de nosso estudo aqui é apenas a ação de desconstituição de
sentença arbitral local.
Assim, por expressa previsão da lei, para cumprimento dos requisitos da sentença (art. 26 da
Lei 9.307/1996), ou para adequação, em alguns casos, aos limites da convenção de arbitragem,
determina-se ao árbitro, ou ao tribunal arbitral, que seja proferida nova sentença (art. 33, § 2.º c/c
art. 32, III, IV, da Lei 9.307/1996). Nesta situação, excepcionalmente, até mesmo poderão ser
retomadas etapas anteriores ao julgamento, como instrução, realização de perícia etc., quando
necessário para a conformação da sentença.
Em outros casos indicados na lei (art. 33, § 2.º c/c art. 32, I, II, VI, VII, VIII, da Lei 9.307/1996), o
resultado é variado, mas, em linhas gerais, será restabelecida a situação jurídica anterior ao
momento em que foi detectado o vício, seguindo-se a partir de então na tutela do direito da parte;
assim:
Desconstituída a sentença por nulidade total da convenção, ou por sua extinção (incisos I e VII),
ficará afastada, definitivamente, a jurisdição arbitral, embora nada impeça que venham as partes
firmar nova convenção para levar o conflito à arbitragem, se assim desejarem e cumpridas as
exigências legais (salvo, evidentemente, se verificada a ausência de arbitrabilidade objetiva ou
subjetiva ao caso).
Por sua vez, se a causa da desconstituição atingir apenas uma etapa do procedimento, este
poderá ser resgatado desde então. Assim, afastado o árbitro impedido, viável será o reinício do
procedimento, com o cumprimento das exigências pertinentes para nomeação de seu substituto.
Desrespeitado o contraditório, impõe-se a sua observância, invalidando os atos posteriores, mas
preservado o quanto até então se caminhou.
Importante notar que nas hipóteses acima de exclusão do juízo arbitral, até mesmo quando
afastada por inteiro a jurisdição arbitral sobre a matéria, haverá julgamento pelo Judiciário do
conflito propriamente dito submetido à arbitragem (matéria de fundo). Na oportunidade da
apreciação da ação desconstitutiva da sentença arbitral, diversamente do quanto pode ocorrer no
resultado de uma ação rescisória (onde se permite, além do juízo rescindente, o juízo rescisório ou
revisório), não haverá julgamento pelo Judiciário em substituição à decisão rompida.32
E assim, em regra, acolhida a ação, no caso de exclusão do juízo arbitral, deverá ser do
interessado a iniciativa de provocar a nova jurisdição estatal, se o caso (quando não retomada a
arbitragem), para tutela de seus direitos. E fala-se em regra, pois por conveniência, pertinência ou
estratégia, de acordo com o contexto fático, poderá, em tese, haver cumulação de pedidos ou por
hipótese até reconvenção (se preenchidos, evidentemente, os requisitos tanto para um como para
outra ampliação do objeto do litígio).
Por fim, é de se observar que a propositura da ação de desconstituição da sentença arbitral, tal
qual a apresentação de impugnação com este conteúdo (já antes analisada), por si só não obsta o
prosseguimento do cumprimento judicial da condenação nela prevista, tampouco impede efeitos
declaratórios ou constitutivos estabelecidos. Porém, como ocorre em qualquer litígio, nada impede
que seja requerida tutela provisória (de urgência ou de evidência) para suspender os efeitos da
decisão atacada, se preenchidos os pressupostos legais para tanto.33
A sentença proferida com este vício é tida como citra petita, e possuindo as partes o direito à
tutela exauriente sobre o conflito levado à arbitragem, o julgamento incompleto evidentemente
representa patologia a ser sanada.
Pela Lei 9.307/1996, em sua versão original, o vício vinha tratado no inc. V do art. 3234 como
causa própria, tipificada, de invalidação da sentença. E realmente, parecia exagerada punição, na
medida em que se pode, sem qualquer dificuldade, não deixar contaminar a parte boa do
julgamento pela parte defeituosa (o quanto omisso). Desta forma, já se mostrava possível manter
íntegros os pedidos apreciados, retornando-se à arbitragem apenas para a complementação. E
assim, a “invalidação”, seria propriamente apenas relativa ao encerramento da arbitragem.
Com esta correta perspectiva a Lei 13.129/2015 traz sistemática própria para resolver a falta de
julgamento de pedidos formulados na arbitragem, como se tratará adiante, mas antes, é
importante a identificação do vício; vejamos:
A delimitação do litígio é feita no momento inicial da arbitragem por ambas as partes, ou seja,
tal qual se faz na petição inicial apresentada em juízo Estatal, o solicitante formula suas pretensões
no prazo previsto no regulamento ou no termo de arbitragem (ata de missão). Também o solicitado
(réu) pode ampliar o objeto da arbitragem para contemplar seus pedidos (no prazo que,
igualmente, estiver previsto no regulamento, ou no termo de arbitragem). E assim, a sentença deve
necessariamente decidir toda a matéria apresentada pelas partes. Mas é evidente que se o
acolhimento ou rejeição de um pedido prejudica a análise de outro, estará implícito o julgamento
deste, dispensada a referência expressa a cada um dos requerimentos.
Nesta verificação, se omissa a sentença a respeito de algum pedido das partes, o ideal é a
apresentação de pedido de esclarecimento (Capítulo 11, item 11.6). Se ainda permanecer omisso o
pronunciamento a respeito de pretensões, ou se não for apresentado pedido de esclarecimento, o
vício expõe a sentença à impugnação.
A solução vem prevista no § 4.º ao art. 33 da LArb., introduzido na reforma de 2015, assim: “A
parte interessada poderá ingressar em juízo para requerer a prolação de sentença arbitral
complementar, se o árbitro não decidir todos os pedidos submetidos à arbitragem”.
Criativa a inovação, pois não se invalida a sentença (não se declara a nulidade, como diz a lei),
mas se adota a providência judicial com a questão efetiva a ser tutelada: a complementação do
julgado para apreciação de pedido não contido na sentença.
Em nosso entender, nesta primeira e açodada análise da regra, deverá ser mantido o árbitro
(colegiado), sem qualquer outra formalidade (além evidentemente das questões administrativas da
Instituição se o caso), com o restabelecimento do procedimento, antes encerrado, para
prosseguimento direcionado à apreciação dos pedidos pendentes (devidamente identificados na
esfera judicial).
É uma situação nova criada na reforma de 2015, e certamente muito ainda se terá para
construir a respeito, mas em geral é confortável a posição adotada, pois raríssima é a ocorrência
do vício previsto neste dispositivo, até em razão do cabimento de pedido de esclarecimento para
sanar esta irregularidade.
Como visto, a “nulidade” referida no art. 32 da Lei Especial tem natureza processual, e, como
tal, sucumbe à exaustão do prazo para a propositura da ação de desconstituição, ensejando a
estabilização da sentença arbitral.
De qualquer forma, encontram-se subsídios para retirar do cenário a sentença arbitral quando
totalmente comprometida, mesmo ultrapassado o prazo decadencial de 90 dias, através da ação
declaratória.
Em nosso sentir, a ação declaratória, neste caso, tem como expectativa reconhecer, sempre, a
ineficácia do procedimento arbitral, ou, mais propriamente, a ineficácia da jurisdição arbitral.
Seu fundamento, este sim, poderá ser nulidade absoluta, ineficácia ou inexistência da
convenção (cláusula ou compromisso), ou da própria instauração do procedimento arbitral (p. ex.,
imposto contra a vontade e sem a participação da parte).
Dito de outra forma, a ação declaratória não será de nulidade da sentença, mas sim, com
fundamento na nulidade ou inexistência preexistente, a iniciativa terá como objetivo o
reconhecimento de inexistência do procedimento, ou da própria jurisdição arbitral.
Advirta-se que a “inexistência” aqui no plano jurídico difere da repercussão prática do ato que
contém o vício, e daí a necessidade de sua declaração por ação específica para este fim, ou através
de impugnação própria em defesa. Significa dizer que, para o Direito, um ato inexistente
visivelmente existe, e até pode impactar o ordenamento jurídico com aparente produção de
efeitos. Assim, a “inexistência” é o rótulo que se confere ao instituto, não é a “ausência”, “vazio” ou
“não existência” da situação, ou do instrumento ou mesmo dos reflexos e impactos do negócio
jurídico. Em outras palavras, trata-se de inexistência jurídica e não de inexistência fática. E daí
melhor qualificar o fato como “ineficácia”, como se faz modernamente.
Isto porque a “sentença declarada inexistente” materialmente existirá, mas pelo vício, retira-se
a sua eficácia jurídica, tal como os atos praticados pelo advogado sem procuração nos autos,
igualmente serão vistos e até palpáveis quando instrumentalizados, mas a lei, neste caso, os
considera “ineficazes” (art. 104, § 2.º, do CPC/2015).36 E até um casamento qualificado como
inexistente, como o celebrado por quem não é autoridade, pode, eventualmente, ser representado
por uma certidão cuja retirada do mundo jurídico reclama ação ou tutela jurisdicional própria.
Sobre outra perspectiva, diz a lei, com norma evidentemente de ordem pública, que a
arbitragem só tem lugar nos litígios envolvendo pessoas capazes e relativas a direito patrimonial
disponível.
A convenção – matriz da arbitragem –, sem aptidão para produzir efeitos jurídicos, contamina a
jurisdição arbitral dela então emergente, pois até mesmo este efeito –instauração do procedimento
– será tido como inexistente no plano jurídico.
O árbitro (ou tribunal), desprovido de jurisdição pelo ordenamento – pressuposto para a sua
atuação como juiz de fato e de direito –, terá feito apenas instrumentos sem impacto no plano
jurídico. E, assim, caberá a ação declaratória de ineficácia (ou inexistência) da sentença arbitral e
do próprio procedimento. Enfim, romper a convenção pela inarbitrabilidade implica
desconsiderar seus aparentes reflexos, dentre eles a própria jurisdição arbitral de lá decorrente.39
Como se sabe, esta ação declaratória não está condicionada ao prazo decadencial de 90 dias da
Lei de Arbitragem, razão pela qual poderá ser proposta a qualquer tempo. Ainda, pode ser
invocada por meios diversos, inclusive através de impugnação ao cumprimento da sentença
arbitral eventualmente instaurado,41 admitindo-se ainda a sua decretação de ofício pelo juízo que
eventualmente venha a ter acesso à decisão (por exemplo, em pedido de cooperação, mas
certamente assim se vislumbra apenas em situações de macroscópica inexistência).
Desta forma, no curso do prazo de 90 dias, a melhor opção será a apresentação da ação de
desconstituição na forma prevista na lei, mesmo que fundamentada em motivos capazes de
ensejar a ação declaratória. Para tanto, pode-se afastar o “rigor técnico” na análise da natureza do
vício para se autorizar o conhecimento e acolhimento do pedido de desconstituição, mesmo diante
de uma situação de ineficácia ou inexistência, pois o resultado útil será o mesmo: retirar do
cenário jurídico a sentença contaminada. De outra parte, exaurido o prazo decadencial, daí sim a
ação de invalidação (agora inviável), definitivamente, sede espaço à ação declaratória.
Por fim, em conclusão deste item, bem pontua a matéria o Prof. Donaldo Armelin: “A ação
declaratória com a sua imunidade a prescrições, decadência ou preclusões, que a caracteriza é o
instrumento adequado para o reconhecimento da inexistência das sentenças arbitrais, a ela
equiparada a impugnação, com carga declaratória relativamente à inexistência do título executivo
judicial correspondente à sentença arbitral. Contudo o seu manejo deve ser reservado àquelas
situações que, efetivamente, comportam o reconhecimento da inexistência da sentença arbitral,
reduzindo-se ao mínimo as hipóteses em que sua nulidade seja convolada em figuras de
inexistência. Com isso manter-se-á o necessário tônus de segurança jurídica, que deve emergir da
tutela arbitral”.42
CAMARGO, Júlia Schledorn de. A ação anulatória com base na violação à ordem pública. In:
CAHALI, Francisco José; RODOVALHO, Thiago e FREIRE, Alexandre (coords). Arbitragem – Estudos
sobre a Lei 13.129, de 26-5-2015. São Paulo: Saraiva, 2016.
FONSECA, Rodrigo Garcia da; WALD, Arnoldo. O mandado de segurança e a arbitragem. Revista
de Arbitragem e Mediação. ano IV. n. 13. São Paulo: Ed. RT, abr.-jun. 2007.
GUERRERO, Luis Fernando. Ensaio sobre a lógica do art. 33 da Lei de Arbitragem. A ação
anulatória e a efetivação das sentenças arbitrais. In: CAHALI, Francisco, José; RODOVALHO, Thiago
e FREIRE, Thiago. Arbitragem – Estudos sobre a Lei 13.129, de 26-5-2015. São Paulo: Saraiva, 2016.
MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recursos e ações autônomas de
impugnação. São Paulo: Ed. RT, 2008. Coleção Processo Civil Moderno, n. 2.
VALENÇA FILHO, Clávio. Sentença arbitral inexistente, reflexões sobre a arbitragem. São Paulo:
Ed. LTr, 2002.
YARSHELL, Flávio Luiz. Ação anulatória de julgamento arbitral e ação rescisória. Revista de
Arbitragem e Mediação. ano II. n. 5. São Paulo: Ed. RT, abr.-jun. 2005.
NOTAS DE RODAPÉ
1
Em primoroso estudo sobre Nulidades do processo e da sentença, a Profa. Teresa Arruda Alvim Wambier,
com a maestria que lhe é característica, esgota o assunto, e dela retiramos algumas passagens pertinentes
à reflexão do quanto aqui referido: “Efetivamente, ‘por séculos o direito de forma foi confundido com o
direito de fundo’, e o processo era classificado, no direito privado, como ‘mero capítulo do direito civil’.
Assim, cada ramo do direito, aos poucos, historicamente, se foi desgarrando do mais ancião dos direitos.
De fato, embora, com efeito, haja comunhão de origens, a teoria das nulidades elaborada no plano do
direito civil não pode ser transplantada para o campo do direito público, pura e simplesmente, sem
profundas adaptações. Deve, portanto, necessariamente haver adaptações das regras do direito civil,
quando se as aplicam a outros ramos do direito, que atendem aos peculiares fenômenos jurídicos de cada
área. Angel Fermin Garrote [Los actos jurídicos procesales. Estúdios de nulidades procesales. Buenos
Aires: Hammurabi, 1980. p. 49] alude à opinião de Palácio no sentido de que todos os vícios do ato
processual são convalidáveis, e recusa integralmente que se recorra ao Código Civil. Concordamos
inteiramente com a forma como vê, citado professor, as nulidades do processo. Discordamos, todavia,
quando, no mesmo texto citado por Garrote, assevera Palácio que, por serem sanáveis (= emendáveis)
todos os vícios do processo, seriam todos eles anulabilidades (ou nulidades relativas). A nosso ver, o
caráter de sanabilidade, no direito público, não se liga à circunstância de se tratar, necessariamente, de
nulidade relativa. Ao contrário, no processo, sana-se até mesmo a inexistência jurídica (v., por exemplo,
art. 37, parágrafo único, do CPC). A vinculação entre a sanabilidade e a nulidade relativa só ocorre no
direito privado, segundo a visão que propomos, como adiante se verá, com mais vagar. Mas, como já se
disse, não se pode assimilar o sistema das nulidades processuais ao das nulidades civis [Procurar subsídios
no direito civil, que é o mais antigo dos ramos do direito, é uma espécie de vício dos pressupostos (Alvim
Netto, 2007/109).]” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 6. ed. São
Paulo: Ed. RT, 2007. p. 142-146 e 153).
Ou, como escreve Donaldo Armelin: “O trânsito em julgado de qualquer decisão, seja ela judicial ou
arbitral, dá-se quando ocorre a sua irrecorribilidade, implicando a imutabilidade panprocessual do
decidido. As situações assemelham-se na jurisdição estatal e na privada. Realmente, tanto em uma como
em outra, à estabilidade das decisões serve o valor segurança jurídica e, como tal, deve ser prestigiada
pelos respectivos sistemas jurídicos” (ARMELIN, Donaldo. Notas sobre a ação rescisória em matéria
arbitral. Revista de Arbitragem e Mediação. n. 1. ano I. jan.-abr. 2004. p. 12).
Ou, como escreve Teresa Arruda Alvim Wambier: “Para que se atinja uma sentença nula, como é a
sentença de mérito proferida por juízo incompetente, ou seja, em face da ausência de um pressuposto
processual de validade (= competência absoluta), é necessária uma ação desconstitutiva. Isto porque os
atos do Poder Público ficam acobertados por uma espécie de ‘manto protetor’, que, no caso dos atos do
juiz, é a coisa julgada, que deve, para que se atinja a sentença nula (que terá, todavia, transitado em
julgado), necessariamente ser desconstituída, para que, indireta e mediatamente, o vício seja atingido (o
vício de nulidade absoluta). Vê-se, pois, nessa circunstância, mais uma diferença nitidamente perceptível
entre o regime de nulidades no direito processual civil e no direito civil, pois, neste ramo do direito,
nulidades são declaradas como tal e anulabilidades são desconstituídas” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim,
op. cit., p. 157).
Como o Código de Processo Civil contém hipóteses legais para a ação rescisória.
Assim: “Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e
homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos
à anulação, nos termos da lei”.
Também imprópria a referência, pois, ao contrário de como se fez na Lei de Arbitragem, aqui
tecnicamente temos a ação de invalidação, e não rescisória.
7
A arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 236. recomenda-se também a
leitura dos itens 92 e seguintes a respeito da invalidação de sentença arbitral.
A nova redação proposta ao art. 33 e seu § 1.º, reproduziu-se nestes dispositivos, no aspecto em questão, o
texto original substituindo-se a palavra “decretação” por “declaração”. Cf. adiante, em “Anexos”,
especificamente no “Anexo 2”, o texto consolidado da Lei de Arbitragem, apontadas as revogações,
inclusões e alterações trazidas pela Lei 13.129 de 26.05.2015 com destaques próprios, indicada também a
versão original para confrontação.
Como, aliás, muito bem diz Donaldo Armelin: “Tal como sucede com a ação rescisória, a anulatória está
vinculada a certas hipóteses de cabimento, especificadas em numerus clausus no art. 32 da Lei 9.307/1996.
Ou seja, é uma ação de âmbito restrito de cabimento, cuja admissibilidade exige um prévio exame de sua
subsunção à hipótese legal autorizadora de seu ajuizamento” (ARMELIN, Donaldo. Notas sobre a ação
rescisória em matéria arbitral, cit., item 11). Neste sentido, também Carlos Alberto Carmona (CARMONA,
Carlos Alberto. Arbitragem e processo, cit., p. 399) e Luiz Antonio Scavone Junior (SCAVONE JUNIOR, Luiz
Antonio. Manual de arbitragem, cit., p. 162). Em sentido contrário, José Cretella Neto (CRETELLA NETO,
José. Curso de arbitragem. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 121), porém traz o autor leitura diversa da aqui
apresentada, no sentido de que “a sentença arbitral é espécie, de que o negócio jurídico é gênero” e assim,
poderia padecer dos mesmos vícios dos atos jurídicos em geral tipificados no Código Civil. Registre-se, por
oportuno, que também se encontra na doutrina a inclusão de mais uma hipótese de invalidação,
consistente na violação pela sentença de ordem pública, sob o argumento de que, se o pronunciamento
assim proferido impede a homologação (art. 39, II, Lei 9.307/1996), por igual deve autorizar a invalidação
da sentença; porém, o enfrentamento desta questão escapa dos limites pretendidos neste curso, pelo que
apenas se faz o registro da questão.
10
Neste sentido, Donaldo Armelin: “Portanto, não parece aceitável a admissibilidade de ação rescisória para
complementar o quadro de ações judiciais estabelecido para o ataque da sentença arbitral já imutável.
Este é suficiente para propiciar o reexame da matéria decidida pela via arbitral e, como sucede com a ação
rescisória, não objetiva o julgamento de decisões injustas, mas sim daquelas que se encartem nas
hipóteses do art. 32 da Lei 9.307/1996” (ARMELIN, Donaldo. Notas sobre a ação rescisória em matéria
arbitral, cit., p. 13). Também assim o Enunciado 1 da I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de
Litígios, promovida entre 22 e 23 de agosto de 2016 pelo Centro de Estudos Judiciário do Conselho da
Justiça Federal: “A sentença arbitral não está sujeita à ação rescisória”. Cf. em “Anexo 7” o texto integral
dos enunciados aprovados.
11
Revogada a previsão pela Lei 13.129/2015, pois introduzida sistemática própria para a solução deste vício
quanto contido na sentença arbitral, conforme item 13.4.1 abaixo.
12
Cf. adiante, em “Anexos”, especificamente em “Anexo 2”, o texto consolidado da Lei de Arbitragem,
apontadas as revogações, inclusões e alterações trazidas pela Lei 13.129 de 26.05.2015 com destaques
próprios, indicada também a versão original para confrontação.
13
14
15
16
17
18
Cf., neste sentido, STJ, REsp 84.847/SP, 3.ª T., rel. Min. Ari Pargendler, DJ 20.09.1999, no qual se consignou:
“O reconhecimento do julgamento ultra petita não implica a anulação da sentença; seu efeito é o de
eliminar o excesso da condenação”; e, mais recente, STJ, EDcl no AgRg no AgIn 262.329-S, 6.ª T., j.
17.11.2005, v.u., rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, assim ementado: “Configura-se ultra petita a decisão que
ultrapassa os limites traçados pelas partes e concede objeto diverso do discutido nos autos, decidindo além
do pedido expresso na inicial. A decisão ultra petita, ao contrário da extra petita, não é nula. Ao invés de
ser anulada, deve ser reduzida aos limites do pedido” (RT 849/220); e, ainda, STJ, AgRg no REsp 753.397/SP,
2.ª T., j. 28.08.2007, rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ 14.09.2007.
19
Neste sentido, Carmona: “Por fim, o dispositivo enfocado também abrange a hipótese de nomeação de
árbitros de modo diverso daquele determinado na convenção de arbitragem. O segundo inciso do art. 32
garante que não poderá ser nomeado árbitro aquele que não tenha a qualificação determinada pelas
partes, o quarto inciso garante que a forma de escolha do julgador deverá seguir o método escolhido pelos
contendentes. Assim, se ficar consignado na convenção que serão três os árbitros, não poderá o órgão
arbitral (em caso de arbitragem administrada) alterar a regra; se ficar consignado que o presidente do
painel será escolhido pelo presidente do órgão arbitral institucional, não pode a entidade delegar a
escolha aos árbitros nomeados pelas partes; se estiver consignado que os árbitros indicados pelas partes
escolherão o presidente do painel entre os profissionais constantes de uma determinada lista de árbitros
da entidade, não poderá a escolha recair sobre alguém que não integre tal lista” (CARMONA, Carlos
Alberto. Arbitragem e processo, cit., p. 406-407).
20
Os crimes referidos estão assim tipificados no Código Penal: Prevaricação – Art. 319. Retardar ou deixar de
praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer
interesse ou sentimento pessoal: Pena – detenção, de três meses a um ano e multa. Concussão – Art. 316.
Exigir para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função, ou antes de assumi-la,
mas em razão dela, vantagem indevida: Pena – reclusão, de dois a oito anos e multa. § 1.º Se o funcionário
exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na
cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza: Pena – reclusão, de três a oito anos, e multa. §
2.º Se o funcionário desvia, em proveito próprio ou de outrem, o que recebeu indevidamente para
recolher aos cofres públicos: Pena – reclusão, de dois a doze anos, e multa. Corrupção passiva – Art. 317.
Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função, ou antes,
de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena –
reclusão, de dois a doze anos e multa. § 1.º A pena é aumentada de 1/3, se, em consequência da vantagem
ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo
dever funcional. § 2.º Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda o ato de oficio, com infração
de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem: Pena – detenção, três meses a um ano, ou
multa.
21
Neste sentido, cf. ARMELIN, Donaldo. A ação declaratória em matéria arbitral. Revista de Arbitragem e
Mediação. n. 9. ano IX, abr.-jun. 2006, p. 116-117.
22
Cf. a respeito da repercussão destes vícios no que se refere à ação rescisória, o casal Nery, em seu Código
de Processo Civil comentado, na análise do art. 585, I, do diploma processual (NERY JUNIOR, Nelson; NERY,
Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 10. ed. São Paulo:
Ed. RT, 2008).
23
Art. 23. A sentença arbitral será proferida no prazo estipulado pelas partes. Nada tendo sido
convencionado, o prazo para a apresentação da sentença é de seis meses, contado da instituição da
arbitragem ou da substituição do árbitro.
24
Cf. neste sentido, CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo, cit., p. 409.
25
26
Se dúvida ou controvérsia acadêmica existissem no passado, com a modificação introduzida pela reforma
de 2015 esta questão mereceu a devida atenção e ajuste, optando o legislador por fazer constar,
expressamente, o termo inicial da contagem do prazo para impugnação da sentença parcial, conforme
previsto na parte final da nova redação dada ao art. 33, § 1.º. Cf. adiante, em “Anexos”, especificamente no
“Anexo 2”, o texto consolidado da Lei de Arbitragem, apontadas as revogações, inclusões e alterações
trazidas pela Lei 13.129 de 26.05.2015 com destaques próprios, indicada também a versão original para
confrontação.
27
28
Leia-se procedimento comum previsto nos arts. 318 e seguintes da Lei 13.105/15 (CPC/2015).
29
30
Cf. adiante, em “Anexos”, especificamente no “Anexo 2”, o texto consolidado da Lei de Arbitragem,
apontadas as revogações, inclusões e alterações trazidas pela Lei 13.129 de 26.05.2015 com destaques
próprios, indicada também a versão original para confrontação.
31
32
Cf. Carlos Alberto Carmona (Arbitragem e processo, cit., p. 424), com notícia de que solução diversa é
adotada pela legislação italiana, na qual o julgamento da ação impugnando a sentença arbitral se faz em
duas fases, uma de anulação, outra de reexame, se for o caso, da controvérsia.
33
Aliás, a apuração do vício e em especial dos requisitos para a tutela provisória (de urgência ou de
evidência) merece extremo rigor, como se tem verificado na prática, no pressuposto, certamente, de que a
sentença arbitral, tal qual a judicial, se prevalece da presunção e expectativa de ter sido perfeita. A
respeito da antecipação de tutela, confira-se acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, com a seguinte
ementa: “Medida cautelar antecipatória da ação de nulidade de sentença arbitral. Pretensão de suspensão
de seus efeitos sob o fundamento de suspeição do árbitro, parcialidade, desrespeito ao contraditório, além
de outras irregularidades. Descabimento por ser impossível a separação, de antemão, de um juízo de
probabilidade de que o comportamento do árbitro ultrapassou as fronteiras da legislação” (TJSP, AgIn
474.700-4/2-00, 10.ª Câm. Dir. Priv., j. 30.01.2007, v.u., rel. Des. Testa Marchi).
34
Cf. adiante, em “Anexos”, especificamente no “Anexo 2”, o texto consolidado da Lei de Arbitragem,
apontadas as revogações, inclusões e alterações trazidas pela Lei 13.129 de 26.05.2015 com destaques
próprios, indicada também a versão original para confrontação.
35
36
Anote-se que o art. 37, parágrafo único, do CPC/1973 falava em serem havidos como “inexistentes” os atos
não ratificados no prazo pelo advogado, melhor adequada a situação pelo Código de 2015 à ineficácia
relativamente àquele em cujo nome o ato foi praticado.
37
Cf., a respeito, o completo estudo feito por Teresa Arruda Alvim Wambier, Nulidades do processo e da
sentença, antes citado.
38
E como bem observa Donaldo Armelin: “Realmente, observado relativo paralelismo com o conceito de
sentença inexistente na doutrina e na jurisprudência do processo civil, a nulidade do compromisso,
implicando a ausência de jurisdição arbitral, faz desaparecer o poder de dizer o direito no caso concreto,
assemelhando-se à figura da sentença inexistente à míngua de jurisdição de seu prolator, juiz de direito”
(ARMELIN, Donaldo. A ação declaratória em matéria arbitral, cit., p. 116-117).
39
Neste sentido, Carmona refere-se à jurisprudência italiana, colacionando Carmine Punzi (Arbitrato,
Enciclopédia giuridica, Roma: Istituto della Enciclopédia Italiana Fondata da Giovanni Treccani, 1988, vol.
II, p. 1-46, esp. p. 29), para quem “este problema deve-se colocar em geral para todos os casos de
inexistência do compromisso ou da cláusula compromissória, que dão vida a uma hipótese de verdadeira
e própria usurpação de poder por parte dos árbitros da potestas decidendi reservada ao juiz togado pela
qual se afirma, exatamente, a inaplicabilidade do princípio da absorção dos motivos de nulidade em
motivos de gravame e com a ulterior consequência da possibilidade de ser arguido o defeito dos
pressupostos fundamentais do juízo arbitral” (CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo, cit., p.
399).
40
Donaldo Armelin: “Não cuida a Lei 9.307/1996 de uma figura patológica do processo civil, que pode
ocorrer com maior facilidade no processo arbitral. É o que ocorre no caso de utilização do processo para
fins ilícitos, no plano de jurisdição estatal. Neste o juiz proferirá sentença obstando os propósitos
subalternos das partes. Na tela arbitral, na qual inexiste a publicidade inerente ao processo judicial, bem
como, salvo casos específicos, os prazos legais para a prática de atos processuais, nada impede que se
simule uma arbitragem, na qual exista um compromisso arbitral a respeito de litígio meramente aparente
e uma sentença arbitral, resultante da cumplicidade de árbitro escolhido pelas partes coniventes. Tudo
obviamente com escopo de obter uma decisão com a imutabilidade inerente à coisa julgada, habilitando
as partes a obter vantagens ilícitas em detrimento de terceiros. A estes obviamente o sistema jurídico
assegura instrumentos adequados para afastar os prejuízos jurídicos que lhes advenham em razão de uma
sentença arbitral simulada. É de se outorgar legitimidade para o terceiro juridicamente prejudicado
investir contra a decisão arbitral que lhe for lesiva. Todavia, se ficar esse terceiro adstrito a uma ação
declaratória de nulidade, no prazo exíguo outorgado à parte para obter a decretação de nulidade da
sentença arbitral, não terá ele como exercitar o seu direito. Deveras, a arbitragem não enseja a
publicidade da sua realização, de modo que o seu resultado poderá restar inacessível ao terceiro,
enquanto não vier a ser acionada pelos simuladores em seu prejuízo. Impende, portanto, o
reconhecimento de ser a arbitragem simulada inexistente, ensejando a sua declaração a qualquer tempo.
Considerando-se que a convenção de arbitragem, nesse caso, é simulada e, consequentemente nula,
evidencia-se que a sentença arbitral será inexistente e, portanto, essa inexistência poderá ser declarada a
qualquer momento, sem restrições de prazos, mediante a ação declaratória para esse fim ajuizada”
(ARMELIN, Donaldo. A ação declaratória em matéria arbitral, cit., p. 118-119).
41
Cf., item 12.4.4 do Capítulo 12, supra e também, neste sentido, Felipe Scripes Wladeck, sobre o pleito de
anulação da sentença arbitral nacional em sede de execução (WLADECK, Felipe Scripes. O pleito de
anulação da sentença arbitral nacional em sede de execução. Revista de Arbitragem e Mediação. vol. 16,
jan.-mar. 2008, p. 98).
42
ARMELIN, Donaldo. A ação declaratória em matéria arbitral, cit., p. 119. Também merece registro e
recomendação de leitura, a posição neste sentido de Leonardo de Faria Beraldo, com mais detalhada
distinção entre inexistência e ineficácia da sentença arbitral em seus escritos; assim escrevendo como
síntese de suas ideias: “A forma pela qual a parte prejudicada deve buscar a tutela jurisdicional, em caso
de se deparar com sentença arbitral inexistente ou ineficaz, é por meio da ação declaratória de
inexistência ou de ineficácia de sentença arbitral, denominada de querela nullitatis insanabilis por uns
[Donaldo Armelin] e de actio nullitatis por outros [Eduardo Talamini]. Assim, se o vício estiver no plano da
existência, ajuizar-se-á ação declaratória de inexistência de sentença arbitral; por outro lado, se o defeito
for no plano da eficácia, ingresar-se-á com ação declaratória de ineficácia de sentença arbitral.” BERALDO,
Leonardo de Faria, Curso de Arbitragem..., cit., p. 477.
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
• Dissídios coletivos
• Dissídios individuais
• Sucessão legítima
• Sucessão testamentária
SUMÁRIO
14.1. • INTRODUÇÃO
14.1. Introdução
Vale recordar, para o bom entendimento deste capítulo, o quanto comentado sobre os arts. 1.º e
2.º da Lei de Arbitragem. O primeiro porque é nele que encontramos a resposta de quem
(arbitrabilidade subjetiva) e qual conflito (arbitrabilidade objetiva) pode ser submetido à
arbitragem, principalmente após a inserção dos §§ 1.º e 2.º no referido art. 1.º da LArb. pela Lei
13.129/2015, a serem analisados em momento oportuno (item 14.5).
Feita esta breve introdução, analisaremos agora a possibilidade ou não de arbitragem nas
seguintes áreas de concentração do direito, lembrando-se sempre do objeto do conflito
(disponibilidade do objeto), capacidade das partes, autonomia da vontade e livre acesso à justiça:
arbitragem no direito do trabalho, arbitragem no direito falimentar, arbitragem do direito
societário, arbitragem no direito público, e arbitragem no direito de família e sucessões.
A segunda, nos dissídios individuais, sobre os quais houve recente inovação normativa no
ambiente de reforma da legislação trabalhista, após período de debates acadêmicos e divergências
entre julgados. E superada a jurisprudência restritiva então dominante, passa a ser admitida a
arbitragem para solucionar conflitos individuais trabalhistas, observados os critérios objetivos
trazidos na Lei.
É neste caminho a redação dada pela EC 45/2004, alterando o art. 114, em especial o § 2.º: “Art.
114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: (...) § 1.º Frustrada a negociação coletiva, as
partes poderão eleger árbitros. § 2.º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à
arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza
econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas
legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente”.
Neste caminho, questões entre sindicatos e empresas poderão ser solucionadas por arbitragem,
inclusive com árbitro decidindo pela redução salarial ou a redução da jornada de trabalho.
A própria Lei 7.783/1989, que dispõe sobre o exercício do direito de greve, observa em seus arts.
3.º4 e 7.º,5 que as relações obrigacionais durante a greve poderão ser regidas por laudo arbitral.
Marcio Yoshida,6 a respeito, escreve: “A previsão constitucional está voltada para a solução de
conflitos coletivos de trabalho, vale dizer, dos dissídios coletivos entre sindicatos patronais e de
empregados, ou entre estes e empresas, que habitualmente são julgados pelos Tribunais Regionais
do Trabalho. Os dissídios coletivos visam à criação de normas complementares sobre as condições
de trabalho e à fixação de reajustes salariais quer por ocasião das datas bases das categorias
profissionais, quer por motivo de greve, proferindo decisões de natureza constitutiva”.
Vale lembrar que, por diferentes óticas, a arbitragem nos conflitos coletivos é positiva:8 (a) para
os patrões, pois viabiliza um instrumento de paz industrial que os faz produzir mais; (b) para os
empregados, uma vez que agiliza, com tecnicidade, a solução dos conflitos de trabalho, permitindo
um sentimento de justiça na sentença arbitral, possibilitando o retorno produtivo aos postos de
trabalho; e, por fim (c) aos sindicatos, porque cria abertura para o incremento da negociação
coletiva, lembrando que seu principal objetivo é a defesa dos empregados ou empregadores.
Dúvida não deve existir, pois, sobre a possibilidade de arbitragem nos dissídios coletivos; e vale
reforçar que nestes conflitos não se pode alegar eventual hipossuficiência do trabalhador ou
indisponibilidade dos direitos, pois nítido a previsão constitucional da possibilidade de uso deste
instituto.
Entre nós, embora com calorosos debates na Doutrina por uma ou outra corrente9, prevalecia a
restrição da arbitragem em pronunciamentos do Tribunal Superior do Trabalho10, o que
favoreceu, inclusive, a ação do Ministério Público para impedir a atuação de Instituições Arbitrais
nesta área.
Art. 507-A. Nos contratos individuais de trabalho cuja remuneração seja superior a duas vezes o
limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, poderá ser
pactuada cláusula compromissória de arbitragem, desde que por iniciativa do empregado ou
mediante a sua concordância expressa, nos termos previstos na Lei 9.307, de 23 de setembro de
1996.
O tema, até então polêmico e recheado de posições extremadas, encontra agora a diretriz legal
a ser observada.
Pela opção do Legislador, a solução arbitral poderá ser prevista no contrato mediante os
seguintes requisitos: (a) remuneração superior, atualmente, a R$11.291,6011; e (b) a iniciativa da
cláusula deve ser do empregado, ou ele deve manifestar concordância expressa.
Sem dúvida, um avanço enorme em favor da arbitragem, e certamente muito ainda será
construído pelos estudiosos da matéria12. Vejamos algumas considerações iniciais sobre este
palpitante tema.
A opção foi um pouco diversa daquela antes proposta na reforma da Lei de Arbitragem, cujo
texto, neste particular, restou vetado pela Presidência. Falava-se em permissão à escolha da
arbitragem considerado o cargo ou função do empregado (administrador ou diretor estatutário13).
O critério neste aspecto agora adotado foi a remuneração.
Certo é que parcela inferior a 2% (dois por cento) da população tem salário nesta grandeza, o
que deixa acanhada a inovação. Mas, além do aspecto cultural, a reforma, sem dúvida, traz
significativo avanço, pois do reconhecimento da licitude da arbitragem em contrato de trabalho,
pode-se extrair, como se verá adiante, o reconhecimento da inexistência de óbice para esta solução
de conflitos também por compromisso arbitral e, para este, independentemente da remuneração
do trabalhador.
Sabe-se que, historicamente, um dos óbices declarados à arbitragem trabalhista é relativo aos
custos do procedimento. Mas direcionada a solução a trabalhadores com favorecida faixa salarial,
o tema passa a ser um daqueles que deve ser debatido e avaliado na contratação (tanto para
indicação da Instituição como para definição de responsabilidade pelas custas). De qualquer
forma, lembre-se da extraordinária vantagem ao trabalhador ao lhe ser oferecida uma solução
rápida para sua demanda, a justificar um certo esforço inicial na escolha deste caminho.
Enfim, já era tempo de a legislação acompanhar a dinâmica das relações sociais no mundo
contemporâneo, e recepcionar expressamente este eficiente e adequado instrumento de solução de
conflitos. E, em estudos mais aprofundados, muito mais poderá vir a ser debatido, como a
pertinência da confidencialidade, a escolha pela equidade para julgamento do litígio, a sede da
arbitragem, a abrangência das questões a serem apreciadas no Juízo Arbitral, a possibilidade e
eficácia do adiantamento do custeio das despesas pelo empregador e até a criação de seguro
específico ou financiamento de terceiros para se fazer frente aos gastos com o procedimento etc.
Sob outa perspectiva, para as relações de trabalho em curso sem previsão a respeito, caberá às
partes, se assim desejarem, firmarem a cláusula compromissória em aditamento ao contrato, no
mesmo ou em outro instrumento ou documento que àquele ele se refira, desde que respeitada a
remuneração mínima prevista na norma.
O art. 507-A em questão legitima a arbitragem trabalhista nascida de cláusula contratual com
os requisitos nele previstos. Nada se disse, nesta prestigiosa alteração, a respeito da escolha da
arbitragem pelo compromisso arbitral.
Temos para nós que, embora omissa a reforma legal, inexiste óbice para o ingresso na
arbitragem pelo compromisso arbitral, após a rescisão do contrato de trabalho. E, neste caso, para
trabalhadores com qualquer remuneração.
As decisões que negavam, até agora, a possibilidade de arbitragem nos conflitos individuais
trabalhistas sustentavam, basicamente, que estes conflitos possuem uma verdadeira gama de
direitos indisponíveis, pois são de caráter social (de ordem pública), acima, portanto, dos
interesses meramente subjetivos das partes, como referido no início deste item.
E vale aqui a observação de Ana Lúcia Pereira: “Os operadores do direito na área trabalhista
(advogados, magistrados, Ministério Público, sindicatos, empregados e empresas) muitas vezes
resistem aos novos paradigmas, no caso específico, a utilização da arbitragem. Demonstramos que
não existe proibição legal para a sua aplicação; existe, sim, a resistência pelo novo, pelo diferente,
pelo desconhecido, e a arbitragem ainda é desconhecida de grande parcela da sociedade
brasileira”.15
Com efeito, uma vez constitucionalmente permitida a arbitragem em dissídio coletivo (art. 114,
§ 2º, da CF), e reconhecida pela Reforma Trabalhista a possibilidade, nas condições nela previstas,
até de cláusula compromissória, o silêncio da lei não deve ser interpretado como proibição ao
compromisso arbitral, especialmente ao se considerar que, após a rescisão do contrato de trabalho,
as pretensões do trabalhador resumem-se em indenizações por afirmada lesão a direitos durante a
relação, e, como tais, devem ser consideradas na amplitude de direito patrimonial disponível
previsto na Lei de Arbitragem.
Nesta situação, por iniciativa do trabalhador, ou por sugestão do empregador com aceitação
pelo empregado, independentemente da remuneração deste, é de se admitir a validade e eficácia
do compromisso arbitral, preenchidos os requisitos legais para este instrumento (Cf. Capítulo 6,
item 6.4).
Assim, criam-se duas situações: início do procedimento arbitral após a decretação da quebra, e
procedimentos arbitrais com início anterior à decretação de falência.
Revendo parcialmente o quanto foi escrito até a 5.ª edição deste “Curso”,18 cada vez mais
consolidada a arbitragem como meio adequado de resolução de conflitos, a tendência no
momento, com posição que entendemos agora correta diante do atual contexto, é no sentido de
admitir-se o início ou prosseguimento do procedimento independentemente da decretação da
falência, quando existente prévia convenção arbitral.
Ademais, o art. 6.º, § 1.º, da Lei de Falência21 é cristalino no sentido de que terão continuidade,
no juízo que tiverem sido ajuizadas, as ações que versem sobre quantia ilíquida. Assim, terminada
a arbitragem, com sentença arbitral líquida, nada obsta a habilitação de crédito no processo
falimentar, como já havíamos comentado.
Acrescente-se, como exposto pela doutrina, que por força do art. 76, parágrafo único, da Lei de
Falência, o administrador deverá representar a massa falida.
Por sua vez, a recuperação judicial também não retira a eficácia da convenção, podendo
inclusive, ser firmada após o início do processo. Em respeito à convenção, o procedimento arbitral
pode ser instaurado e terá seu curso. Ao contrário do que ocorre em um processo de falência, no
qual os atos de administração são conduzidos pelo juiz com auxílio do administrador judicial, na
recuperação judicial o devedor e seus administradores são mantidos à frente da atividade
empresarial, nos termos do art. 64 da Lei de Falência.25 Tendo em vista que a celebração de uma
convenção arbitral decorre de uma deliberação empresarial, torna-se desnecessária a participação
do administrador judicial, que terá tão-somente atividade fiscalizadora.26
E nesta mesma trilha, a liquidação extrajudicial (como ocorre com as operadoras de planos e
seguros de saúde, por exemplo), não impede o prosseguimento ou a instauração de procedimento
arbitral, conforme, ainda que de maneira indireta, já se decidiu no STJ, como se observa nas
seguintes passagens de ementa de decisão monocrática proferida pela Ministra Nancy Andrighi,
em Medida Cautelar para se conceder efeito suspensivo a Recurso Especial: “Operadora de Plano
de Saúde em liquidação extrajudicial. Procedimento arbitral. Participação. Possibilidade.... – A
participação de operadoras de planos de assistência à saúde em liquidação extrajudicial no
procedimento arbitral, a rigor, não exige a prática de nenhum ato inclinado a concluir negócios
jurídicos pendentes, tampouco não significa que haverá, necessariamente, no curso do
procedimento arbitral, atos do liquidante que impliquem na disponibilização de tais direitos.... – A
suspensão das ações e execuções envolvendo direitos e interesses do acervo da entidade em
regime de liquidação extrajudicial, prevista no art. 18, ‘a’, da Lei nº 6.024/74, é de ser aplicada com
temperamento, mormente quando se tratar de ação de conhecimento, na qual se busca tão
somente o reconhecimento do autor. Precedentes.” (MC 14.295/SP (2008/0122928-4), decisão
monocrática, j. 09.06.2008).
Há que se pensar, ainda, se as conclusões acima seriam as mesmas para sociedade limitada, e
sociedades anônimas (com as suas respectivas variáveis), e ainda, se o tratamento àquele ausente
se equipara àquela expressa manifestação discordante com a inclusão da cláusula de arbitragem.36
Nesse sentido, embora a Lei 13.129/2015 não tenha aproveitado o momento oportuno para
também regulamentar a sociedade limitada, apresentou evolução legislativa no que diz respeito à
Lei 6.404/1976 (Lei da S/A) com a inclusão do seguinte artigo nesta:
§ 1.º A convenção somente terá eficácia após o decurso do prazo de 30 (trinta) dias, contado da
publicação da ata da assembleia geral que a aprovou.
I – caso a inclusão da convenção de arbitragem no estatuto social represente condição para que
os valores mobiliários de emissão da companhia sejam admitidos à negociação em segmento de
listagem de bolsa de valores ou de mercado de balcão organizado que exija dispersão acionária
mínima de 25% (vinte e cinco por cento) das ações de cada espécie ou classe;
Com a introdução do art. 136-A, afasta-se qualquer questionamento sobre o quórum para a
inclusão da arbitragem no estatuto social.
Com a reforma, positivada a matéria, prevalece a vontade da maioria prevista no art. 136
(metade das ações com direito a voto).38
Pode parecer prejudicial aos minoritários, principalmente àqueles com participação expressiva
na sociedade; porém, a própria norma traz solução para certo equilíbrio: o direito de retirada pelo
acionista dissidente.
O acionista dissidente terá o prazo de trinta (30) dias para pedir seu desligamento, contados da
publicação da ata da assembleia geral que aprovou a inserção de convenção arbitral. Transcorrido
o prazo, se o acionista permanecer silente, o mesmo se vinculará, por definitivo, à cláusula
compromissória.
Ainda, a norma traz situações específicas em razão das quais, por circunstâncias próprias, não
se confere ao dissidente o direito de retirada (situações específicas de ações negociadas em Bolsa
de Valores ou no mercado de balcão, balcão).39
Também o prazo de trinta (30) dias é o estabelecido para início da eficácia da convenção, de tal
forma que para as ações propostas antes deste período, permanece a jurisdição estatal.
Temos para nós que o novo acionista adere por total aos termos do Contrato/Estatuto Social,
não sendo necessária a assinatura em uma ou outra cláusula expressamente, inclusive a relativa
ao modo de solução de conflito.40 Haverá, neste caso, anuência tácita do adquirente com a
previsão de arbitragem.
E neste sentido, na I Jornada de Direito Comercial promovida pelo Centro de Estudos Judiciários
do Conselho da Justiça Federal, apresentamos proposta de Enunciado, aceita pela Comissão de
Direito Societário, da qual fizemos parte, para assim se concluir a respeito da questão: “Enunciado
16: O adquirente de cotas ou ações adere ao contrato social ou estatuto no que se refere à cláusula
compromissória (cláusula de arbitragem) nele existente; assim, estará vinculado à previsão da
opção da jurisdição arbitral, independentemente de assinatura e/ou manifestação específica a esse
respeito.”41
Por fim, vale ressaltar que: (a) a arbitragem é incentivada pela BMF/Bovespa, inclusive sendo
necessária a disposição de arbitragem no Estatuto Social para a sociedade entrar no novo
mercado; (b) o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa também defende a arbitragem como
uma boa prática de governança corporativa; e (c) a própria Lei das Sociedades Anônimas, o
art.109, § 3.º, da Lei 6.404/1976,42 observou como direito essencial ao acionista a possibilidade de
solucionar controvérsias por arbitragem.
Selma Lemes,43 uma das autoras da Lei de Arbitragem, explicava: “No denominado
microssistema arbitral, no direito da arbitragem, dois importantes conceitos decorrem do disposto
no art. 1.º da Lei 9.307/1996: As pessoas capazes de contratar (arbitrabilidade subjetiva) poderão
valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis
(arbitrabilidade objetiva). A arbitrabilidade subjetiva que está prevista na primeira parte do art.
1.º, da Lei de Arbitragem acima reproduzida, ‘pessoas capazes de contratar’, refere-se a todas as
pessoas capazes da acepção civil, pessoas no gozo de seus direitos e obrigações, sejam físicas ou
jurídicas, de direito privado ou público. A arbitrabilidade subjetiva refere-se aos aspectos da
capacidade para poder submeter-se à arbitragem, que no âmbito do direito público administrativo,
seja como pessoa jurídica de direito público (União, Estados, Municípios, Territórios e Autarquias)
ou de direito privado (sociedade de economia mista e empresa pública), qualificada como entidade
da Administração Pública direta ou indireta, todas possuem capacidade para firmar convenções de
arbitragem”.
Advirta-se que os atos de império da administração não são arbitráveis, pois refletem o
interesse público primário, da coletividade.45 Por outro lado, discussões sobre o reequilíbrio
econômico do contrato administrativo, desregulado por um ato de império, por exemplo, poderão
ser levados à arbitragem, pois refletem o interesse público secundário.46
Nesse passo, vale citar um dos primeiros casos de reconhecimento de arbitragem no direito
público, envolvendo Companhia Estadual de Energia Elétrica, no qual o STJ decidiu que “são
válidos e eficazes os contratos firmados pelas sociedades de economia mista exploradoras de
atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços (art.
173, § 1.º, CF/1988)”.47
Devido a inicial lacuna apresentada pela lei sobre arbitragem no direito público, os tribunais48
passaram a aceita-la paulatinamente, como deveria ser. Isto porque, realmente, o instituto não
desrespeita os princípios constitucionais e traz segurança jurídica para investidores estrangeiros,
bem como celeridade e tecnicidade para as decisões arbitrais de que o Estado participa.
Neste sentido, oportuna a referência feita por Cássio Telles Ferreira Netto, após aprofundado
estudo sobre o tema: “Como se vê, a utilização da arbitragem para dirimir conflitos de Direito
Patrimonial disponível, oriundos das relações entre o particular e o Estado, constitui hoje a etapa
mais avançada da tendência de modernização da Administração Pública, pelo que deve ser
creditada e incentivada, por se constituir em um eficiente instrumento de desenvolvimento para o
País”.49
Com o objetivo de afastar por inteiro qualquer questionamento a respeito, e mais, pretendendo
estimular a utilização desta forma proveitosa forma de solução de conflitos, a Lei 13.129/2015
acrescentou dois importantes parágrafos ao atual art. 1.º da LArb. e demonstrou que a posição
doutrinária e jurisprudencial não estava equivocada ao aceitar a arbitragem na Administração
Pública. Vejamos:
Art. 1.º As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios
relativos a direitos patrimoniais disponíveis.
§ 1.º A administração pública direta e indireta poderá utilizar-se da arbitragem para dirimir
conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis.
De outra parte, houve proposta de emenda acolhida na Câmara dos Deputados para se
acrescentar o seguinte ao texto deste parágrafo: “desde que previsto no edital ou nos contratos da
administração, nos termos do regulamento”. No entanto, acertadamente a proposta da Câmara não
foi aprovada, pois representaria um entrave ou restrição exagerada para o uso da arbitragem,
pois, dentre outros aspectos, há de se admitir, como referido, e até estimular também o
compromisso arbitral. Anote-se também que em recente julgado do STJ entendeu-se que a previsão
de arbitragem não integra o conjunto de regras essenciais ao edital de licitação.52
Desse modo, não resta dúvida quanto ao cabimento de arbitragem em casos que envolvam a
Administração Pública53, com a possibilidade de previsão anterior em contrato (cláusula
compromissória) ou através de compromisso arbitral, com identificação ainda de autoridade
competente para a celebração da convenção.
Por mais razão agora, pois expressa a Lei a respeito, há de se conferir eficácia vinculante às
partes à cláusulas compromissórias firmadas anteriormente à Reforma, tanto por já se sustentar a
sua possibilidade, mesmo antes da inovação, como também, especialmente, por seguir a linha de
raciocínio já direcionada pelo STJ em situação parelha, consolidada na Súmula 485: “A Lei de
Arbitragem aplica-se aos contratos que contenham cláusula arbitral, ainda que celebrados antes
da sua edição” (Cf. Capítulo 6, item 6.5 supra).
Temos para nós, como referido, que a publicidade deve ser ampla, tal qual se tem no Judiciário,
com total transparência, e acesso de qualquer pessoa ao conteúdo do procedimento. E assim,
caberá também à Instituição, disponibilizar estas informações aos interessados. É evidente que,
como em qualquer processo público, pode haver controle do acesso, e informações (ou
documentos) sigilosas pela sua natureza, mas a reserva seria exceção, justificada, não a regra. Até
mesmo as audiências em nosso sentir, devem ser públicas, e neste sentido, com empresa
especializada na área, temos sugestões de como viabilizar esta publicidade sem qualquer
interferência no andamento do procedimento.
Porém, por boa parte da comunidade arbitral, vem sendo distorcida, a nosso ver
equivocadamente, a necessária publicidade dos procedimentos arbitrais envolvendo a
Administração Pública, a ponto de se verificar até mesmo impróprio (a nosso ver) enunciado na I
Jornada acima referida, assim: “4. Na arbitragem, cabe à Administração Pública promover a
publicidade prevista no art. 2.º, § 3.º, da Lei n. 9.307/1996, observado o disposto na Lei n.
12.527/2011, podendo ser mitigada nos casos de sigilo previstos em lei, a juízo do árbitro”.
Enfim, esta e outras palpitantes questões para debate devem surgir, pois com a reforma de
2015, a arbitragem envolvendo a Administração Pública rompe as barreiras do preconceito até
então em parte existente, e certamente ganhará maior espaço e mais destaque como importante
instrumento de resolução de conflitos, com expectativa de impactar positivamente nos contratos
celebrados com os Entes Públicos, tanto em relação ao preço como em relação ao seu mais estável
cumprimento, tendo em vista inclusive, a celeridade nos julgamentos.
A visibilidade atual do tema é tamanha que, na I Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial
de Litígios, já diversas vezes referida, de treze Enunciados aprovados na Comissão de Arbitragem,
quatro deles referem-se à Administração Pública, sendo os outros dois, além dos citados acima, os
seguintes: “11 – Nas arbitragens envolvendo a Administração Pública, é permitida a adoção das
regras internacionais de comércio e/ou usos e costumes aplicáveis às respectivas áreas técnicas”; e,
falando sobre a abrangência dos temas possíveis de serem tratados, “13 – Podem ser objeto de
arbitragem relacionada à Administração Pública, dentre outros, litígios relativos: I – ao
inadimplemento de obrigações contratuais por qualquer das partes; II – à recomposição do
equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, cláusulas financeiras e econômicas”.
De outra parte, vários acadêmicos se debruçam para estudo do tema em sua maior amplitude,
destacando-se, entre vários, a Dissertação de Andre Rodrigues Junqueira, defendida na Faculdade
de Direito da USP, sob a orientação do Prof. Gustavo Henrique Justino de Oliveira e, em cuja Banca
honrosamente participamos54, sobre “Arbitragem na AdministraçãoPública: estudo de caso sobre a
eficiência do instituto nas PPP do Estado de São Paulo”, na qual se apresenta pesquisa séria e
detalhada, aprimorada pela experiência prática do autor, com destacado rigor técnico, além do
exame crítico de arbitragens realizadas.
Como nas demais arbitragens temáticas acima referidas, a questão primeira a ser enfrentada
ao se pensar em arbitragem para a solução dos conflitos de Direito de Família refere-se à
arbitrabilidade da matéria.
Vedada a arbitragem para solução de questão de estado (filiação, poder familiar, estado civil
etc.), e para direitos não patrimoniais e indisponíveis, para se colocar os protagonistas de um
conflito envolvendo o direito de família no palco arbitral, então, indispensável que a matéria
pontual respectiva, dentro da amplitude do instituto, seja exclusivamente de natureza patrimonial
disponível.
Por sua vez, restrito o litígio a efeitos meramente patrimoniais, ainda que decorrente de
relações familiares, inexiste óbice legal, tanto no direito de família, como na legislação sobre
arbitragem para a utilização deste expediente na solução dos conflitos (arbitrabilidade objetiva),
sempre no pressuposto de se verificar a capacidade das partes (arbitrabilidade subjetiva).
Situação clara a se sustentar a viabilidade do juízo arbitral é aquela relativa à partilha de bens
decorrentes da dissolução do casamento,58 da união estável ou mesmo da relação homossexual
(homoafetiva). Podem, então, os cônjuges, companheiros ou parceiros, no exercício da autonomia
da vontade, de comum acordo, reservar à arbitragem a solução de conflito relativo à partilha de
bens.
A praxis de aproximadamente 25 anos no contencioso nos mostra que uma partilha litigiosa
tem previsão, na cidade de São Paulo, para se prolongar por 10 anos, entre perícias,
levantamentos, julgamentos e recursos.
Aliás, diria que a demora é tamanha a ponto de os envolvidos, na maioria das vezes, desistirem
de buscar seus direitos, conformando-se com soluções negociadas, ainda que extremamente
desvantajosas.59
Porém, na rotina forense, a partilha de bens vem à discussão geralmente como adjacente a
outras questões: alimentos, guarda de filhos, discussão a respeito da concordância ou não com o
rompimento do casamento, preservação ou renúncia ao patronímico conjugal, e, especificamente
na união estável, geralmente discute-se com vigor o próprio reconhecimento da relação e de seu
período.
Outra dúvida que surge, diz respeito à indicação de arbitragem no contrato de convivência (na
união estável ou união homoafetiva) ou no pacto antenupcial.63 Tanto em um como em outro, em
nosso sentir, pode ser feita a inclusão de cláusula compromissória. Porém, sem dúvida, o que
certamente será mais comum é a opção pela arbitragem através de compromisso arbitral, firmado
pelas partes quando do rompimento do vínculo.
Certo é que a obrigação alimentar decorrente do poder familiar (em favor de filhos menores)
indiscutivelmente é irrenunciável e, como tal, indisponível, apta, portanto a excluir a matéria do
cenário arbitral.
Tanto assim é que o casal pode dispor dos alimentos livremente na separação ou divórcio pelo
procedimento judicial e também por escritura pública (prevista na Lei 11.441/2007).65
Possível a livre disposição quanto aos alimentos (e até mesmo a sua renúncia – grau máximo de
disponibilidade de um direito), mais fácil sustentar a arbitrabilidade desta matéria entre os
cônjuges ou companheiros.
Advirta-se ainda que, mesmo reconhecido o direito a alimentos como sendo indisponível, seu
valor tem nítido caráter patrimonial. E, assim, tem-se que os efeitos patrimoniais derivados da
obrigação alimentar, ou seja, o valor da pensão propriamente dito, e não o reconhecimento do
direito de percebê-la ou a obrigação de honrá-la é matéria que pode ser objeto de arbitragem.
Neste sentido, o casal Nery escreve: “O direito de alimentos é indisponível, mas o quantum pode
ser objeto de transação. Sem essa ressalva, diz ser inadmissível a arbitragem quanto a alimentos:
Sérgio La China, L’arbitrato: il sistema e l’esperienza, 1995, p. 27”.66
Neste contexto, ou se terá um processo necessário, perante o Poder Judiciário, ou uma escritura
pública específica para este fim, quando preenchidos os requisitos para tanto. Assim, o inventário
propriamente dito não encontra espaço no juízo arbitral para sua instauração de acordo com a
previsão legal específica a respeito.
A sucessão pode ser com ou sem testamento. Quando ab intestato, seguirá a ordem de vocação
hereditária, estabelecendo o Direito Positivo os herdeiros e seus respectivos quinhões. Existindo
testamento, a sucessão seguirá o quanto nele estabelecido, porém respeitada a parcela legítima dos
herdeiros necessários.
Admite-se a partilha arbitral, pois o próprio Código aceita a partilha amigável por escrito
particular homologado pelo juiz (art. 2.015 do CC/2002). Ora, por esta regra, evidencia-se a
possibilidade dos herdeiros de dispor entre eles, como bem lhes aprouver a respeito dos seus
direitos sucessórios. Se assim é, há de se aceitar também a escolha pelos herdeiros, para solucionar
eventual impasse, do juízo arbitral.
A seu turno, também a prestação de contas do inventariante aos herdeiros pode ser levada ao
juízo arbitral; e, aliás, conforme as circunstâncias, este ambiente estará mais bem aparelhado para
solucionar esta controvérsia, ressaltando a vantagem de julgamento em instância única. Lembre-
se, com atenção, a necessidade de concordância de todos os herdeiros maiores e interessados
(viúvo/viúva se o caso).
Mesmo assim, em nosso sentir, é possível ser feita a partilha no juízo arbitral, desde que a
sentença retorne ao Poder Judiciário, para verificação do cumprimento das disposições
testamentárias.
Se assim passa a ser para o inventário extrajudicial, mesmo com testamento, pelos mesmos
motivos e com iguais razões é de se admitir que os herdeiros, maiores e capazes, caso não tenham
chegado ao consenso quanto à partilha, possam de comum acordo firmar compromisso arbitral
para a divisão do acervo no juízo arbitral, desde que requerido e autorizado pelo juízo sucessório
competente.
E nestes casos, autorizada previamente a arbitragem, a sentença constituirá título hábil para os
registros pertinentes, independentemente de qualquer retorno para verificação pelo juízo estatal.
AMARAL, Guilherme Rizzo. Arbitragem nos conflitos trabalhistas individuais. Revista Consultor
Jurídico [conjur.com.br]. Acesso em: 23.01.2018.
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Mediação. ano VI. n. 20. São Paulo: Ed. RT, jan.-mar. 2009.
NOTAS DE RODAPÉ
1
Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito; (...).
2
Segundo Pedro A. Batista Martins, “foi na Nova Zelândia, no ano de 1894, onde surgiu a primeira
legislação admitindo a utilização da arbitragem para fins de solução das controvérsias oriundas das
relações laborais”. Explica o autor que também não se trata de um mecanismo tão recente no Brasil:
“Informa Luiz Roberto de Rezende Puech que o Dec. 1.037, de 05.01.1907, criou mecanismos para resolver
disputas trabalhistas mediante a conciliação e arbitragem, esta exercida pelos sindicatos. Em 1932, o Dec.
22.132 instituiu a arbitragem facultativa e, em certos casos, até mesmo de caráter compulsório. Segundo
assinalado por H. H. Barbagelata, à época, ‘a Justiça do Trabalho levou bastante longe o sistema e, segundo
o que tem sido frequentemente acentuado, esse sistema conseguiu melhorar as condições de trabalho’”
(MARTINS, Pedro A. Batista. O Poder Judiciário e a arbitragem – Quatro anos da Lei 9.307/1996 (1.ª parte).
Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem. n. 9. ano III. jul.-set. 2000. p. 236-
237).
Não se pode falar em arbitragem no direito do trabalho sem lembrar a experiência norte-americana. No
direito trabalhista norte-americano a arbitragem possui grande expressão, uma vez que é um sistema no
qual não há incidência de qualquer esfera judicial ou administrativa para a solução de conflitos coletivos
de trabalho, e inexiste, inclusive, qualquer óbice para sua utilização nos conflitos individuais. No direito
coletivo, primeiramente, tenta-se uma negociação entre os empregadores e os sindicatos (grievance
procedure) que, restando infrutífera, ocasionará na utilização da arbitragem. Esta é, portanto, a última
esfera de resolução da lide, sendo utilizada tanto para a solução de conflitos individuais quanto coletivos,
mas sempre pautada em direitos e condições de trabalho já proclamados nas convenções coletivas, nunca
se esquecendo da força dos sindicatos naquele país.
“Art. 3.º Frustrada a negociação ou verificada a impossibilidade de recursos via arbitral, é facultada a
cessação coletiva do trabalho.”
“Art. 7.º Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o contrato de
trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo
arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.”
YOSHIDA, Marcio. In: GARCEZ, José Maria Rossani; PUCCI, Adriana Noemi (coord.). A arbitragem na era da
globalização. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 90.
TRT-2.ª Reg., ROMS, Proc. 02731.2009.065.02.00-0, 4.ª T., j. 18.11.2004, rel. Juiz Paulo Sérgio Jakutis.
Georgenor de Sousa Franco Filho, convencido das vantagens do instituto da arbitragem, consignou:
“Através da solução arbitral dos conflitos trabalhistas poderá se ter condições de encontrar a almejada
convivência realmente pacífica entre os fatores da produção, a partir de que capital e trabalho, em
comum acordo, atribuam a um terceiro, privado, independente e isento, a busca dos remédios para sarar
seus desentendimentos. É forma válida para se obter a composição das divergências entre as categorias
econômica e profissional e a aperfeiçoar a distribuição da riqueza. Não é mecanismo utópico. Ao
contrário, com sua boa implementação e o conhecimento acurado de suas técnicas, poderá ser a fórmula
que se busca para o perfeito entendimento entre os parceiros sociais” (FRANCO FILHO, Georgenor de
Sousa. A arbitragem e os conflitos coletivos de trabalho no Brasil. São Paulo: LTr, 1990. p. 74).
Para mais a respeito, recomenda-se a leitura da edição anterior deste Curso, no qual, entre outros pontos,
colacionamento: Contrários à arbitragem se posicionam no sentido de que a omissão legislativa quanto à
possibilidade de arbitragem no direito individual do trabalho foi proposital, restritiva de sua utilização
apenas para conflitos coletivos. Os que defendem que a lei não contém palavras inúteis acreditam que não
é possível arbitragem nesta matéria, pois inexiste previsão expressa a respeito. Vale complementar com as
palavras de Antonio Umberto de Souza Júnior: “[...] se teve o constituinte o zelo de mencionar a
possibilidade de instituição de arbitragem (mesmo assim, repita-se, facultativa) apenas para os conflitos
coletivos, não parece lógico que a omissão referente aos dissídios individuais tenha sido proposital,
excluindo-os de tal hipótese alternativa? Como a lei não contém palavras inúteis [...]” (SOUZA JÚNIOR,
Antonio Umberto de. Arbitragem operária. Nova alternativa para a Justiça do Trabalho? Tese apresentada
no Congresso Nacional de Magistrados do Trabalho – Conamat/1997, Fortaleza, p. 9). E favoráveis à
arbitragem, neste aspecto, frisam que a Constituição Federal não autorizou expressamente arbitragem no
direito civil ou comercial, por exemplo, e não é por isto que, naqueles ramos, não é possível arbitragem.
Vale, neste ponto, conferir entrevista do ministro do TST, Pedro Paulo Manus, no site Consultor Jurídico,
aos 24.04.2011, sobre a possibilidade de arbitragem no direito do trabalho individual: “Sim. A Lei de
Arbitragem não proíbe aplicação a conflitos trabalhistas. Se não é proibido e nem obrigatório, é permitido.
E o que é permitido não é proibido. Isso é lógica jurídica. Agora, se o conselho arbitral obriga, não é
arbitral. A maioria dos ministros daqui acha que arbitragem só é possível para conflitos coletivos. Mas se
vier às minhas mãos uma arbitragem, e não ficar provado qualquer vício contra a manifestação de
vontade, na minha opinião, é válida” (Disponível em: [www.conjur.com.br/2011-abr-24/entrevista-pedro-
paulo-manus-ministro-tribunal-superior-trabalho?utm_source=""twitterfeed&utm_medium=twitter]."
Acesso em: 13.07.2015). Ainda, observou-se que a própria Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é clara
no sentido de que, nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito
processual do trabalho, conforme estabelece o art. 769 da CLT. Nesse caminho, ao qual nos filiamos, não
haveria motivo para a não inserção da arbitragem nos litígios individuais. A um, pois a arbitragem
poderia ser considerada regra processual, possibilitando a derrogação da jurisdição estatal; a dois, pois
empregado e empregador são capazes e os direitos são disponíveis (após a rescisão do contrato de
trabalho como adiante se verá), salvo algumas verbas trabalhistas; e, a três, poderia ser benéfico ao
trabalhador, haja vista a celeridade para a solução do conflito.
10
Entre diversos outros, confira-se: “Recurso ordinário. Arbitragem. Direitos Indisponíveis. Inaplicabilidade.
Pacto de sujeição do litígio à arbitragem não pode ser, validamente, utilizado em relação a direitos
trabalhistas indisponíveis ou irrenunciáveis. Tal ajuste não pode ser tomado como óbice à apreciação de
reclamatória em que se discutem, entre outros temas, verbas salariais e, portanto, indisponíveis (TRT-2ª
Reg., Ac. 20040655053, 1ª T., j. 18.11.2004, rel. Juiz Plínio Bolívar de Almeida). E: Recurso de revista da
reclamante. Arbitragem. Transação. Alcance no direito individual do trabalho. Esta Corte vem firmando
posicionamento no sentido de que a solução de conflitos oriundos da relação de trabalho efetivada
perante o juízo arbitral não é compatível com o direito individual do trabalho, considerando-se a
significativa gama de direitos indisponíveis e irrenunciáveis e o desequilíbrio entre as partes decorrente
da hipossuficiência típica da relação de emprego. Recurso de revista conhecido e provido” (TST, RR
171400-67.2008.5.03.0075, 8ª T., j. 07.12.2010, rel. Min. Dora Maria da Costa, DEJT 10.12.2010). Para
registro, favorável à arbitragem trabalhista, cite-se: TST, RR 144300-80.2005.5.02.0040, j. 15.12.2010, rel.
Min. Barros Levenhagen; e TST, AIRR 147500-16.2000.5.05.0193, j. 15.10.2008, rel. Min. Pedro Paulo Manus.
11
O teto previdenciário passou a ser de R$5.645,80 a partir de 1º de janeiro de 2018, conforme portaria do
Ministério da Fazenda publicada no DOU em 17.01.2018 (cf. [www.previdencia.gov.br/2018/01/beneficios-
indice-de-reajuste-para-segurados-que-recebem-acima-do-minimo-e-de-207-em-2018/]).
12
A respeito do tema, já após a reforma, cf.: Amaral, Guilherme Rizzo. Arbitragem nos conflitos trabalhistas
individuais. Revista Consultor Jurídico – [conjur.com.br]. Acesso em: 23.01 . 2018.
13
Cf. em “cf. adiante, em “Anexos”, especificamente em “Anexo 2”, o texto integral da Lei e observações
quanto as alterações aprovadas pela Câmara dos Deputados.
14
Reforçam o argumento as secções de conciliação prévia, que incentivam os acordos (transação). É sabido
que a primeira pergunta feita pelo juiz trabalhista na audiência é relativa à possibilidade de acordo entre
as partes. Ora, se há possibilidade de acordo, é porque o empregado pode transacionar sobre o objeto
discutido e, principalmente, sobre os valores pleiteados, o que nos permite afirmar sobre a
disponibilidade do discutido. Vale lembrar, ainda, que, não obstante a maioria dos conflitos versarem com
uma das partes economicamente mais fraca, existem litígios envolvendo altos funcionários com suas
antigas empregadoras, quando é interessante para as duas partes a utilização da arbitragem, para uma
solução célere do conflito.
15
PEREIRA, Ana Lúcia. Considerações sobre a utilização da arbitragem nos contratos individuais do
trabalho. Revista de Mediação e Arbitragem, v. 23, out. 2009. p. 89; e, ainda, da mesma Autora, cf. As
modificações propostas para a utilização da arbitragem nos contratos individuais de trabalho. In: CAHALI,
Francisco José; RODOVALHO, Thiago; e FREIRE, Alexandre (coord.). Arbitragem: Estudos sobre a Lei
13.129, de 26-5-2015. São Paulo: Saraiva, 2016.
16
Ou como anotado no relatório do Deputado Rogério Marinho sobre o então Projeto de Lei 6.787/2016: “A
arbitragem, como um método alternativo ao Poder Judiciário, permite a solução de controvérsias de uma
maneira mais ágil, sem abrir mão da tecnicidade”.
17
Art. 103. Desde a decretação da falência ou do sequestro, o devedor perde o direito de administrar os seus
bens ou deles dispor.
18
Pois até então era trazida posição resistente ao início da arbitragem após a decretação da falência, de
acordo com a orientação que então prevalecia quando da 1.ª Edição deste “Curso”.
19
Realizada em fevereiro de 2015, pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal.
20
Neste sentido, o acórdão do TJSP, no AgIn 531.020.4/3-00, rel. Des. Pereira Calças: “Agravo de instrumento.
Falência. Impugnação judicial objetivando habilitação de crédito fundamentado em sentença arbitral.
Cláusula com promissória pactuada em contrato de construção de edifício firmado entre as partes.
Inadimplemento contratual gerador de resolução do contrato e formulação de demanda perante a Câmara
de Arbitragem. Posterior decretação da falência da demandada. Intervenção do Administrador Judicial da
Massa Falida no procedimento arbitral, com alegação de incompetência do Juízo Arbitral, em face da falta
de capacidade processual da falida e indisponibilidade dos bens da devedora, com base no art. 25 da Lei
9.307/1996, sustentando dever a demanda ser atraída para o Juízo Universal da Falência. Prosseguimento
da devedora na indenização fixada pela Câmara de Arbitragem. Aplicabilidade do art. 6.º, § 1.º, da Lei
11.101/2005, eis que, versando a demanda sobre quantia ilíquida, o processo não é suspenso em virtude da
falência da devedora, inexistindo a vis attractiva do art. 76, caput, devendo o procedimento arbitral
prosseguir com o administrador judicial que representará a massa falida, sob pena de nulidade.
Inaplicabilidade do art. 117 à convenção de arbitragem. Inexistência de previsão legal de intervenção do
Ministério Público nas demandas arbitrais em que a massa falida seja parte, especialmente sob a óptica do
veto ao art. 4.º da Lei 11.101/2005, que não manteve norma similar ao art. 210 do Dec.-lei 7.661/1945.
Legitimidade da inclusão do crédito reconhecido no Tribunal Arbitrai no Quadro Geral de Credores da
falida, pelo valor determinado no juízo arbitral, limitada a atualização monetária e os juros até a data do
decreto da quebra, a teor dos arts. 9.º, II, e 124, ambos da Lei 11.101/2005. Agravo parcialmente provido
para ser deferida a impugnação e a habilitação do crédito da agravante, observados os limites acima
estabelecidos”.
21
“Art. 4.º O representante do Ministério Público intervirá nos processos de recuperação judicial e de
falência. Parágrafo único. Além das disposições previstas nesta Lei, o representante do Ministério Público
intervirá em toda ação proposta pela massa falida ou contra esta”. Razões do veto: “O dispositivo reproduz
a atual Lei de Falências – Dec.-lei 7.661, de 21.06.1945, que obriga a intervenção do parquet não apenas no
processo falimentar, mas também em todas as ações que envolvam a massa falida, ainda que irrelevantes,
e.g., execuções fiscais, ações de cobrança, mesmo as de pequeno valor, reclamatórias trabalhistas etc.,
sobrecarregando a instituição e reduzindo sua importância institucional. Importante ressaltar que no
autógrafo da nova Lei de Falências enviado ao Presidente da República são previstas hipóteses,
absolutamente razoáveis, de intervenção obrigatória do Ministério Público, além daquelas de natureza
penal”.
23
BUSHATSKY, Daniel. Relação entre falência e arbitragem: jurisprudência estadual comentada. Revista Jus
Navigandi. n. 2843. ano XVI. Teresina. 14.04.2011. Disponível em:
[http://jus.uol.com.br/revista/texto/18900]. Acesso em: 14.06.2011.
24
25
“Art. 64. Durante o procedimento de recuperação judicial, o devedor ou seus administradores serão
mantidos na condução da atividade empresarial, sob fiscalização do Comitê, se houver, e do
administrador judicia (...).”
26
A respeito, veja-se BEZERRA FILHO, Manoel Justino, Nova Lei de Recuperação e Falências Comentada, São
Paulo, Ed. RT, 2005, p. 86: “Os atos de administração da falência são dirigidos pelo juiz, que tem diversos
colaboradores, o principal deles o administrador, que assume função específica, pois lhe cabe a
administração efetiva propriamente dita, a partir do momento em que é decretada a falência (art. 103).
Seu trabalho na recuperação judicial é diferente, pois, em princípio, o devedor e os seus administradores
serão mantidos na condução da atividade empresarial (art. 64).”
27
Promovida entre 22 e 23 de agosto de 2016, pelo Centro de Estudos Judiciário do Conselho da Justiça
Federal. Cf. em “Anexo 7” o texto integral dos enunciados aprovados.
28
Pode-se estudar arbitragem no direito societário para solucionar conflitos entre a holding e suas
subsidiárias. Acerca do tema, Donaldo Armelin afirma: “Em vista das características da arbitragem acima
expostas [confidencialidade, neutralidade ou imparcialidade, decisão por especialista, maior flexibilidade
da administração do processo e no exame das provas, obtenção de uma decisão final irrecorrível, e
procedimento menos conflituoso] e da relação existente entre a holding e as controladas, concluímos que
a opção pela arbitragem, através da celebração de um compromisso arbitral, para a resolução do conflito
entre elas, resulta ser a melhor solução não só para o resguardo das atuais posições de cada parte, mas
também para a obtenção de uma decisão rápida, neutra e sigilosa, emanada de especialistas, sem que se
coloque em risco a imagem ou os negócios das partes envolvidas”. E completa, a respeito da competência
para firmar o compromisso arbitral, que, “com base nos estatutos sociais, contrato social e acordos de
acionistas celebrados, a competência para a assinatura de compromisso arbitral pelas Controladas na
hipótese supra [adoção de arbitragem no instrumento de constituição] é da Diretoria, independentemente
de autorização da Assembleia Geral de Acionistas ou do Conselho de Administração” (ARMELIN, Donaldo.
A arbitragem como melhor forma de solução da controvérsia entre a holding e as empresas subsidiárias.
Revista de Arbitragem e Mediação. n. 16. ano V. jan.-mar. 2008, p. 208-210).
29
Daniel de Andrade Lévy defende a extensão da cláusula compromissória aos administradores e partes do
conselho fiscal: “Sob essa ótica, acreditamos que a cláusula compromissória estatutária deve vincular
todos os acionistas, assim como administradores e fiscais, independentemente de anuência expressa, sob
pena de se criarem procedimentos judiciais e arbitrais paralelos, situação que anula qualquer benefício de
arbitragem. A solução adotada pela CAM nos parece um meio termo necessário nessa linha evolutiva, que
também deve passar um processo de divulgação de informações das companhias cada vez mais sério e
consistente, inclusive quanto à opção pelo juízo arbitral” (LÉVY, Daniel de Andrade. Estudo comparado da
arbitragem no mercado de capitais. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. n.
155-156. ano XLIX. ago.-dez. 2010, p. 275-298).
31
Neste sentido, Modesto Carvalhosa, já antecipando a discussão sobre a entrada de novos acionistas na
sociedade após a constituição: “São partes: para os efeitos de celebração da cláusula compromissória
estatuária, a própria sociedade e os acionistas que expressamente concordaram com essa substituição do
foro judicial pelo arbitral. Assim, no momento da constituição da sociedade (art. 80 e ss. da Lei 6.404/1976)
estarão vinculados à cláusula compromissória todos os fundadores que subscreveram o capital social. São
eles que fundam a sociedade e aprovam o seu estatuto. Pode-se dizer, portanto, que os fundadores-
subscritores da sociedade não aderem ao estatuto, mas efetivamente o aprovam. Fique bem clara aqui a
distinção. No caso, os atos constitutivos e, dentre eles, a aprovação do estatuto são tractatus entre os
fundadores e não dictatus. O caráter de dictatus do estatuto social somente se dá no caso de aquisição de
ações posteriormente aos atos constitutivos. Ressalte-se esse ponto. No momento da constituição da
sociedade a relação contratual é direta entre a sociedade constituída e seus fundadores-subscritores de
capital. Por outro lado, nas aquisições sucessivas de ações, a cláusula compromissória estatuária tem a
natureza de dictatus e não de tractatus. Em consequência, impõe-se a adesão expressa desses acionistas
derivados à clausula compromissória estatuária, por força do que dispõe o referido § 2.º do art. 4.º da Lei
9.307/1996” (CARVALHOSA, Modesto. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas. 4. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2008. vol. 2. arts. 75-137, p. 314).
32
Daniel Bushatsky defende o uso de arbitragem em conflitos societários, dando o exemplo da questão da
apuração de haveres em uma dissolução de sociedade limitada, asseverando que: “Observa-se, portanto,
que a apuração de haveres, bem como outros conflitos que podem surgir em uma sociedade, teriam sua
resolução não só mais rápida, mas também mais precisa e segura caso fosse submetida à arbitragem, com
sua respectiva cláusula inserida no Contrato Social, evitando, assim, que a função social da empresa fosse
abalado em penosas e complicadas batalhas judiciais” (Apuração de haveres e arbitragem. Jus
Vigilantibus. Disponível em: [http://jusvi.com/artigos/26295]. Acesso em: 14.06.2011).
33
Neste sentido: ARMELIN, Donaldo. Revista de Arbitragem e Mediação, v.20 – 2009. Mandado de Segurança
contra ato do Presidente da Junta Comercial do Estado de São Paulo – Jucesp. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2009, p. 339, GUERRERO, Luis Fernando. Convenção de Arbitragem e Processo Arbitral. São
Paulo: Editora Atlas, 2009, p. 63 e 64, VILELA, Marcelo Dias Gonçalves, Arbitragem no Direito Societário.
Belo Horizonte: Editora Mandamentos, 2004. p. 205, 191, 193, 199, LOBO, Carlos Augusto da Silveira In A
cláusula compromissória estatutária. Editora Revista dos Tribunais online vol. 22, p. 11, Jul/2009 –
DTR\2009\841. p. 02, Câmara, Alexandre de Freitas In Os Efeitos Processuais da Inclusão de Cláusula
Compromissória nos Estatutos Sociais das Companhias. Editora Revista dos Tribunais: Revista Brasileira e
Arbitragem nº 28 – Out-Dez/2010, p. 35, e VERÇOSA, Haroldo Malheiros. Curso de Direito Comercial, vol. 2,
Editora Melhoramentos, p. 303; na jurisprudência: 7.ª Vara de Fazenda Pública do Foro Central da
Comarca da Capital/SP. Mandado de Segurança n. 054.08.607775-1, e TJRJ. Apelação n. 2009.001.04638. 8ª
Câmara Cível. Des. Rel. Mônica Maria Costa. DJ: 30.06.2009.
34
Claudio Finkelstein observa que: “alternativa ao sócio recalcitrante, neste caso, seria uma retirada da
companhia, muito embora a Lei das Sociedades Anônimas não apresente essa hipótese. A justificativa
seria a ‘alteração essencial na mecânica operacional e supressão de direito adquirido, direito este
elencado entre aqueles do art. 5.º da CF, ao qual a parte não deseja renunciar, mas cuja alteração e
validade resta autorizada pela lei e pela vontade soberana da maioria do capital social’” (FINKELSTEIN,
Claudio. Arbitragem no direito societário. In: FINKELSTEIN, Maria Eugênia; Proença, José Marcelo Martins
(coord.). Direito societário: sociedades anônimas. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 326).
35
36
Nelson Eizirik, que em recente escrito reconhece a submissão à maioria por aqueles que se abstiveram ou
restaram ausentes na assembleia, impedida a submissão à maioria, porém, para aqueles que
manifestaram expressa discordância com a inclusão da cláusula de arbitragem (EIZIRIK, Nelson. A Lei das
S/A Comentada. São Paulo: Quartier Latin, 2011. p. 617).
37
A Lei italiana estabelece um quorum qualificado de 2/3 para a inserção de cláusula compromissória,
garantindo, também, o direito de recesso ao acionista dissidente. Cf. a respeito, Giovanni Bonato: “La
descritta soluzione adottata dalla riforma brasiliana del 2015 in materia di convenzione arbitrale
statutaria (che—chiaramente—si ispira alla disciplina dell’arbitrato societario italiano, di cui all’art. 34,
comma 6°, del decreto legislativo n. 5 del 2003 (63)) è quella più conforme con i principi costituzionali in
tema di tutela giurisdizionale dei diritti che vietano la previsione di forme di arbitrato obbligatorio”
(BONATO, Giovanni. La Riforma Brasiliana Dell´arbitrato. Rivista Dell´Arbitrato, Anno XXVII Fasc. 1-2017,
Milano: Diuffrè Editore, 2017. p. 34-86).
38
Assim: “Art. 136. É necessária a aprovação de acionistas que representem metade, no mínimo, das ações
com direito a voto, se maior quorum não for exigido pelo estatuto da companhia cujas ações não estejam
admitidas à negociação em bolsa ou no mercado de balcão, para deliberação sobre: (...)”.
39
Como, p. ex., a inclusão da convenção de arbitragem no estatuto social represente condição para que os
valores mobiliários de emissão da companhia sejam admitidos à negociação em segmento de listagem de
bolsa de valores [“Novo Mercado”] ou quando a inclusão da convenção de arbitragem seja efetuada no
estatuto social de companhia aberta cujas ações sejam dotadas de liquidez e dispersão no mercado.
40
Porém, polêmica é a matéria, como se disse, indicando-se decisões nos dois sentidos proferidas pelo TJMG:
no AgIn 1694527-18.2009.8.13.0035, 10.ª Câm. Civ., j. 13.04.2010; e na Ap. 0710759-92.2008.8.13.0024, 13.ª
Câm. Civ., j. 09.07.2009.
41
Neste sentido, e já antes do Enunciado, como boa doutrina, confira-se MARTINS, Pedro A. Batista. A
Arbitragem no Direito Societário. São Paulo: Quartier Latin, 2012. Também respeito, inclusive com citação
de diversos Autores sobre o tema, cf., ainda, Cahali, Francisco José. A vinculação dos adquirentes de cotas
ou ações à cláusula compromissória estabelecida em Contrato Social ou Estatuto – Enunciado 16 da
Jornada de Direito Comercial. Revista de Mediação e Arbitragem. n. 36. ano X. jan.mar. 2013, p. 159, com
as seguintes passagens: “Quem adquire participação societária, recebe o quanto se continha nos direitos
do cedente em relação à sociedade. Transmite-se ao adquirente a posição jurídica pertencente ao cedente
em toda sua dimensão, salvo previsão expressa em contrário. E assim, restrições, vantagens, termos,
condições e cláusulas, como o convênio arbitral, são transferidas ao novo sócio. (...) O momento em que o
adquirente ingressa na sociedade é o exato instante em que se considera aceito o convênio arbitral. Ainda
que nada fale a respeito no ato de transmissão da posição acionária, sub-roga-se o cessionário na
titularidade da participação tal qual antes exercida pelo cedente. Pressupõe-se que a decisão a respeito de
ingressar na sociedade, revela o consentimento com a sua estrutura jurídica, inclusive no que se refere ao
convênio arbitral. Assim, a manifestação de vontade pela solução arbitral é indireta, mas existe. Ao se
adquirir a relação jurídica oferecida, no caso titularidade de quotas ou ações, estar-se-á aceitando também
a previsão de arbitragem que no contrato ou estatuto se contém. O requisito volitivo indispensável para se
submeter ao convênio arbitral decorre, assim, da prévia aceitação e consequente submissão às regras
contidas no estatuto ou contrato social, conferindo eficácia à cláusula compromissória nele contida. Neste
contexto, o adquirente estará vinculado à cláusula em toda a sua extensão. Adere ao pactuado na
convenção. Necessário, porém, que se tenha a previsão no contrato/estatuto, ou, se em instrumento
separado, que deste se faça ter conhecimento o adquirente, para garantir o inequívoco consentimento com
a cláusula compromissória.”
42
Art. 109. Nem o estatuto social nem a assembleia geral poderão privar o acionista dos direitos de: (...). § 3.º
O estatuto da sociedade pode estabelecer que as divergências entre os acionistas e a companhia, ou entre
os acionistas controladores e os acionistas minoritários, poderão ser solucionadas mediante arbitragem,
nos termos em que especificar (incluído pela Lei 10.303/2001).
43
44
Observe-se que esses diplomas legais não criavam a possibilidade do Poder Público solucionar seus
conflitos por arbitragem, apenas vieram reiterar essa opção, uma vez que a Lei de Arbitragem já
autorizava a sua utilização há mais de quinze anos.
45
Ou como escreve Cândido Rangel Dinamarco, também simpático à arbitragem envolvendo o Poder
Público: “prevalece sempre, porém a ressalva de certos direitos ou relações nas quais o Estado aparece no
exercício do imperium que lhe é próprio, figurando os indivíduos em uma situação de sujeição aos atos da
autoridade. Nestes casos, sendo indisponível o direito do Estado, exclui-se a arbitragem, não em direta
contemplação da presença do ente estatal, mas em razão do objeto do litígio (inarbitrabilidade objetiva –
CC, art. 104, inc. II)” A arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 88-89.
46
Boa doutrina tem demonstrado que os princípios de direito público devem ser revistos, inseridos no
contexto de um Estado atuante na economia. Veja-se, por exemplo, a moderna definição trazida por Lauro
Gama Jr. do princípio da legalidade, sob esse novo enfoque da doutrina administrativa: “II.2 A redefinição
do princípio da legalidade administrativa como vinculação à juridicidade do agir administrativo: Se antes
a legalidade administrativa traduzia-se como vinculação positiva à lei, atualmente o princípio da
legalidade administrativa (art. 37, caput, CF) manifesta a ideia de vinculação da conduta do administrador
público à juridicidade constitucional, expressão que reitera a centralidade da Constituição no moderno
direito brasileiro. Essa nova visão reconhece que o administrador se acha jungido à prática de atos
constitucionalmente justificados, à luz das regras e princípios postos na Lei Maior, e não apenas aos atos
determinados ou autorizados por normas legisladas. A ideia de legalidade, ademais, desdobra-se e
relaciona-se com outros princípios constitucionais, como os da impessoalidade, moralidade, publicidade e,
mais recentemente, da razoabilidade-proporcionalidade” (SOUZA JUNIOR, Lauro da Gama. Sinal verde
para a arbitragem nas parcerias público-privadas. A construção de um novo paradigma para os contratos
entre o Estado e o investidor privado. Revista Brasileira de Arbitragem. n. 8. out.-dez. 2005. p. 7).
47
STJ, EDcl no REsp 612.439/RS, j. 17.05.2007, rel. Min. João Otávio de Noronha.
48
Sobre o tema: STJ, REsp 904.813, 3.ª T., j. 20.10.2011, v.u., rel. Min. Nancy Andrighi, no qual se consignou,
inclusive que “o fato de noção haver previsão da arbitragem no edital de licitação ou no contrato
celebrado entre as partes não invalida o compromisso arbitral firmado posteriormente”; e ainda, embora
mais antigo em precedentes de Tribunal Estadual para se mostrar que a matéria já há muito vem sendo
debatida: TAPR, Ac 247.646-0, 7.ª Câm. Civ., j. 11.02.2004, rel. Des. Lauro Laertes de Oliveira: “recurso
improvido”.
49
FERREIRA NETTO, Cássio Telles. Contratos administrativos e arbitragem. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008. p.
78.
50
Lei 9.307/1996 consolidada pela Lei 13.129/2015; cf. adiante, em “Anexos”, especificamente em “Anexo 2”, o
texto integral da lei e observações quanto as alterações aprovadas pela Câmara dos Deputados.
51
Promovida entre 22 e 23 de agosto de 2016, pelo Centro de Estudos Judiciário do Conselho da Justiça
Federal. Cf. em “Anexo 7” o texto integral dos enunciados aprovados.
52
“Todavia, o fato de não haver previsão da arbitragem no edital de licitação ou no contrato celebrado entre
as partes, não invalida o compromisso arbitral firmado posteriormente. O princípio da vinculação das
partes ao edital de licitação (arts. 3.º e 41 da Lei 8.666/1993) tem por finalidade precípua estabelecer as
regras do certame, assegurando a todos os participantes o prévio conhecimento acerca do objeto em
disputa com precisão e clareza, possibilitando-lhes iguais condições no oferecimento e análise de suas
propostas. (...) A previsão do juízo arbitral, em vez do foro da sede da administração (jurisdição estatal),
para a solução de determinada controvérsia, não vulnera o conteúdo ou as regras do certame. Com efeito,
não se pode dizer que a licitação teria outro resultado ou dela participariam mais ou menos concorrentes
unicamente pelo fato de estar ou não previsto determinado foro para solução de controvérsias. Embora
seja cláusula obrigatória do contrato administrativo, nos termos do art. 55, XIII, § 2.º, da Lei 8.666/1993, a
cláusula de foro não pode ser considerada essencial aos contratos administrativos.” (REsp 904.813/PR, rel.
Min. Nancy Andrighi, 3.ª T., DJ 18-10-2012).
53
Ou como diz Giovanni Bonato: “In ragione dell’innovazione della riforma in commento, risulta –
chiaramente – superata quella posizione dottrinaria più estrema che sosteneva l’esistenza di un assoluto
divieto per la pubblica amministrazione brasiliana di deferire la soluzione delle controversie al giudizio
degli arbitri” (BONATO, Giovanni, ob. cit. p. cits.).
54
Com a participação também como examinadores do Prof. Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer e do Prof.
Andre Castro Carvalho.
55
STJ, CC 139.519/RJ, Rel. para o Acórdão Min. Regina Helena Costa, 1ª Seção, m.v., j. 11.10.2017. A matéria de
fundo é alargada, e bem complexa, revolvidas questões como a arbitrabilidade de Resolução da Diretoria
da ANP, e a participação do Estado do Espírito Santo no processo ou procedimento para a defesa de seus
interesses (inclusive se estaria ou não inviabilizada a participação no Juízo Arbitral por não ter sido
signatário da Cláusula). No quanto pertinente ao aqui tratado, merece ainda referência à seguinte
passagem: “[...] não se vislumbra a indisponibilidade do direito discutido no presente Processo Arbitral. As
alterações definidas na RD/ANP 69/2014, analisadas pela Nota Técnica 131/2013/SDP, têm caráter
eminentemente patrimonial, não se revelando inalienável ou impossível de se proceder e ajustar de
maneira diversa. Tanto é que foi fruto de deliberação da Diretoria da ANP, no uso do poder discricionário.
Embora envolva interesse público, que se confundiria com um conceito mais vago de ordem pública, essa
questão não deve ser tida como um óbice à aplicação da cláusula compromissória firmada entre a
PETROBRAS e a ANP”.
56
Sobre este assunto, aproveitamos neste curso parte de nosso artigo específico a respeito. Cf., CAHALI,
Francisco José. Arbitragem para conflitos decorrentes da dissolução da União Estável. In: LEITE, Eduardo
de Oliveira (coord.). Grandes temas da atualidade – União estável, aspectos polêmicos e controvertidos.
Rio de Janeiro: Forense, 2009, vol. 8. p. 77 e ss.
57
58
Perspicaz, a propósito, a referência feita por Christiano Cassettari quanto à possibilidade de, na separação
pelo procedimento extrajudicial, prever-se que “a partilha de bens será efetuada posteriormente, ou por
escritura pública, ou por ação judicial, ou até mesmo por arbitragem” (CASSETTARI, Christiano.
Separação, divórcio e inventário por escritura pública: teoria e prática. 3. ed. São Paulo: Método, 2008. p.
33). Interessante, também, precedente do Tribunal Paulista: “Arbitragem. Determinação pelo árbitro de
realização de perícia contábil na empresa do recorrente. Possibilidade. Partes que elegeram o Tribunal
Arbitral de São Paulo para solução do litígio que versa sobre a revisão de partilha de bens em separação
judicial. A instituição da arbitragem deve ser respeitada pela jurisdição estatal como qualquer convenção
privada. Evidente que não se afasta do controle do Poder Judiciário a apreciação da regularidade do
processo de arbitragem, que como todo ato jurídico está sujeito a ser invalidado. Providência requerida
que deverá ser postulada no órgão perante o qual se processa a arbitragem. Decisão mantida. Agravo não
provido” (TJSP, AgIn 501.512-4/4-00, j. 30.05.2007, rel. Des. Élcio Trujillo).
59
Neste sentido, tivemos a oportunidade de escrever: “Embora possa soar estranho, sendo, por certo,
extremamente incomum, encontramos na arbitragem proveitosa sistemática para a solução de conflitos
também relacionados à dissolução da união estável”. Com efeito, através dela, permite-se aos interessados
obter, com maior presteza, e por vezes com custos reduzidos, a definição de litígios sem percorrer os
sinuosos caminhos do Poder Judiciário. Principalmente nas questões familiares, a morosidade da
prestação jurisdicional representa fator de extremo desgaste, comprometendo, como se sabe, por longo
período, a estabilidade emocional dos envolvidos, sua produtividade profissional e, o que é pior,
transferindo aos filhos pesada carga de frustrações e sofrimentos com efeitos nocivos para a formação
psíquica do menor ou adolescente. Exclusivamente no aspecto econômico, também é grande a lesão. Veja-
se, por exemplo, que a indisponibilidade de ativos financeiros, veículos e mesmo imóveis, no prolongado
curso da ação, em decorrência de propositura de medida cautelar ou tutela antecipada visando a
resguardar futura partilha, prejudica, e muito, a ambos os interessados, pela corrosão do valor no tempo.
Por outro lado, em decorrência do expressivo número de processos, sabe-se da reduzida disponibilidade
de tempo dos magistrados a ser destinada às exigentes questões de família, impedidos nossos julgadores,
também nessas circunstâncias, de dedicar a maior atenção reclamada pelos feitos dessa natureza, pela
casuística e diversidade de valores, interesses e direitos em discussão. Assim, considerando o perfil da
arbitragem, em que o árbitro mais se envolve com o conflito em exame, podendo se aproximar
intensamente das partes objetivando alcançar a solução amigável, encontramos nesse procedimento uma
ótima opção, em diversas situações, para superar litígios decorrentes da união estável. Figure-se a
submissão expressa dos companheiros presunção de condomínio sobre todo patrimônio adquirido a título
oneroso durante a união, pela cumplicidade e participação conjunta nos projetos familiares. Na
adversidade da relação, porém, deixam a critério do árbitro a definição da partilha, com aptidão para
promover, inclusive, direta ou indiretamente, a avaliação do patrimônio para esta finalidade, podendo
privilegiar a equidade e o equilíbrio das partes, em detrimento da exatidão aritmética das parcelas
destinadas a cada um” (CAHALI, Francisco José. Contrato..., cit., p. 250-251).
60
Neste sentido, também Marcos Alberto Rocha Gonçalves, “Arbitragem no Direito de Família: Uma
apreciação dos limites e possibilidades”, in Cadernos da Escola de Direito e Relações Internacionais da
UNIBRASIL, Curitiba: 2011, n. 14, p. 251, disponível em
[http://apps.unibrasil.com.br/revista/index.php/direito/article/viewFile/454/375], acessado em 26.06.2013.
61
Por exemplo, não adianta confirmar de comum acordo a separação de fato. O estado civil continua sendo
o de casado, e, como tal, inviabiliza a partilha.
62
Cf. mais a respeito em nosso artigo acima referido, fundamentando com mais vagar a posição adotada.
63
Especificamente sobre a cláusula arbitral em contrato de convivência, cf. CAHALI, Francisco José.
Contrato..., cit., p. 257-262.
64
Sobre a renúncia prematura de alimentos, vide: CAHALI, Francisco José. Contrato de convivência..., cit., p.
257-262; e Renúncia aos alimentos decorrentes do casamento e da união estável. In: PEREIRA, Rodrigo da
Cunha; CAHALI, Francisco José (coord.). Alimentos no Código Civil: aspectos civil, constitucional,
processual e penal. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 263-276.
65
Ora, uma vez retirado por lei do Poder Judiciário o monopólio para a questão (renúncia e quantificação da
pensão), mais fácil ainda justificar a opção das partes em, se de comum acordo, deixar o quantum dos
alimentos para definição por um árbitro, juiz de fato e de direito, que é por escolha dos litigantes (art. 18
da Lei 9.307/1996).
66
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado. 8. ed. São
Paulo: Ed. RT, 2007. p. 1393. Ainda neste sentido, Sandra Regina Vilela: “Como podem as partes transigir a
respeito do quantum dos alimentos prestados, através de acordo formulado entre as partes, há de se
entender que o quantum dos alimentos prestados não está na esfera de direito patrimonial indisponível, e,
portanto, é arbitrável” (VILELA, Sandra Regina. Op. cit., p. 4); e, ainda, Alexandre Freitas Câmara: “Certo
que o direito a alimentos é indisponível. Tal direito, porém, admite transação no que se refere ao quantum
dos alimentos. Assim, se a controvérsia gira apenas em torno de valores (não quanto à própria existência
da obrigação de alimentar, eis que aí a causa versará matéria indisponível), nada impede que as partes
elejam um árbitro para decidir o conflito” (CÂMARA, Alexandre Freitas. Arbitragem, Lei 9.307/1996. 3. ed.
São Paulo: Lumen Juris, 2005. p. 17), citado por Ilza Andrade Campos Silva, com a correta advertência: “O
que se defende aqui é a aplicabilidade da arbitragem à fixação do quantum da obrigação alimentar, do
modo de pagamento, e ao estabelecimento do direito a alimentos, excepcionalmente, a credores maiores e
capazes, sem estendê-las indiscriminadamente, até por vedação legal expressa, ao tema do direito
fundamental a alimentos” (SILVA, Ilza Andrade Campos. Arbitragem e alimentos: uma conexão possível.
Revista Brasileira de Direito de Família. n. 35. abr.-maio 2006, p. 170).
67
E mais a respeito escrevemos no artigo referido.
68
CAHALI, Francisco José. Ensaio sobre arbitragem testamentária no Brasil com paradigma no direito
espanhol. Revista de Mediação e Arbitragem. n. 17. ano V. abr.-jun. 2008, p. 54, com as seguintes
passagens: “A matéria submetida a exame ao judiciário é única e exclusivamente relacionada à análise do
cumprimento das disposições testamentária. Assim, não há sobreposição de jurisdição. Ao juízo arbitral
atribui-se a função de decidir conflitos relativos à divisão dos bens, podendo até mesmo decidir a partilha
exclusivamente em relação aos herdeiros; ao ambiente judicial, atribui-se, com exclusividade, avaliar o
exato atendimento às disposições testamentárias. Daí a convivência entre os dois juízos, arbitral e judicial,
sem que um invada a esfera do outro. Os dois pronunciamentos jurisdicionais se completam
harmoniosamente. Para mais detalhar: ao judiciário caberá verificar se as condições estabelecidas pelo
testador foram cumpridas, e se na partilha foram atendidas as restrições impostas no testamento, como
encargos, cláusulas de incomunicabilidade, impenhorabilidade, inalienabilidade, porém, é defeso ao juiz
avaliar ou questionar a partilha propriamente dita, como, por exemplo, até mesmo eventuais diferenças
no valor de quinhões, pois é matéria patrimonial disponível, sobre a qual a atribuição para decidir é do
árbitro”.
69
Acrescentando o Provimento, no quanto pertinente, ao dar nova redação ao item 129 do Capítulo XIV das
Normas de Serviço da CGJ: “129.1 Poderão ser feitos o inventário e a partilha por escritura pública,
também, nos casos de testamento revogado ou caduco, ou quando houver decisão judicial, com trânsito
em julgado, declarando a invalidade do testamento, observadas a capacidade e a concordância dos
herdeiros. 129.2. Nas hipóteses do subitem 129.1, o Tabelião de Notas solicitará, previamente, a certidão
do testamento e, constatada a existência de disposição reconhecendo filho ou qualquer outra declaração
irrevogável, a lavratura de escritura pública de inventário e partilha ficará vedada, e o inventário far-se-á
judicialmente.”.
70
Promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal entre os dias 24 e 25 de
agosto de 2017 em Brasília/DF.
71
Lei 60/2003: “Artículo 10. Arbitraje testamentario. También será válido el arbitraje instituido por
disposición testamentaria para solucionar diferencias entre herederos no forzosos o legatarios por
cuestiones relativas a la distribución o administración de la herencia”.
72
E para saber mais a respeito recomendamos a leitura de nosso artigo específico sobre o tema acima
referido: Ensaio sobre arbitragem testamentária no Brasil com paradigma no direito espanhol, cit.
© desta edição [2018]
2019 - 04 - 23
Curso de
Arbitragem - Ed.
2018
REVISTA DOS TRIBUNAIS
• Critérios: Código de Processo Civil francês, Código de Processo Civil italiano, Lei Modelo
Uncitral;
• Competência para ação de homologação: STJ (art. 105, I, i, CF/1988, após EC 45/2004);
• Documentos essenciais à ação de homologação de sentença arbitral estrangeira (art. IV, CNI e
art. 37 da Lei 9.307/1996);
• Competência da Justiça Federal (art. 109, X, da CF/1988, RISTJ, art. 216-N, e art. 965 do
CPC/2015).
SUMÁRIO
A Lei Modelo Uncitral, seguida por muitos países ao elaborar sua legislação interna, estabelece
em seu art. I, item 3, que “un arbitraje es internacional si: a) las partes en un acuerdo de arbitraje
tienen, al momento de la celebración de ese acuerdo, sus establecimientos en Estados diferentes, o
b) uno de los lugares siguientes está situado fuera del Estado en el que las partes tienen sus
establecimientos: i) el lugar del arbitraje, si éste se ha determinado en el acuerdo de arbitraje o con
arreglo al acuerdo de arbitraje; ii) el lugar del cumplimiento de una parte sustancial de las
obligaciones de la relación comercial o el lugar con el cual el objeto del litigio tenga una relación
más estrecha; o c) las partes han convenido expresamente en que la cuestión objeto del acuerdo de
arbitraje está relacionada con más de un Estado”.
A Lei de Arbitragem espanhola, por sua vez, estipula no art. 3, item 1, que “el arbitraje tendrá
carácter internacional cuando en él concurra alguna de las siguientes circunstancias: a) que, en el
momento de celebración del convenio arbitral, las partes tengan sus domicilios en Estados
diferentes; b) que el lugar del arbitraje, determinado en el convenio arbitral o con arreglo a éste, el
lugar de cumplimiento de una parte sustancial de las obligaciones de la relación jurídica de la que
dimane la controversia o el lugar con el que ésta tenga una relación más estrecha, esté situado
fuera del Estado en que las partes tengan sus domicilios; c) que la relación jurídica de la que
dimane la controversia afecte a intereses del comercio internacional”.
E o Código de Processo Civil francês dispõe, em seu art. 1.504, que “est international l’arbitrage
qui met en cause des intérêts du commerce international”.
Sob a perspectiva nacional, José Maria Rossani Garcez ensina que “para diferençar a
arbitragem nacional da internacional pode-se, basicamente, utilizar o mesmo critério
diferenciador entre os contratos nacionais e internacionais: nos primeiros acham-se presentes, em
geral, elementos conectados a um mesmo sistema legal, as partes têm residência no mesmo Estado
e este, em geral, não difere daquele em que o contrato será executado”, enquanto “nos contratos e
nas arbitragens internacionais, em geral intervêm legislações em conexão com mais de um sistema
legal nacional, as partes têm domicílio em países diferentes, o local da constituição da obrigação
contratual ou da convenção arbitral em geral ocorre em país estranho ao domicílio de uma das
partes, o local de execução do contrato, ou da realização da arbitragem, pode ser um dos países de
domicílio de uma das partes ou, ainda, um terceiro país”.1
Como se pode observar, as legislações mencionadas utilizam critérios diversos para classificar
uma arbitragem como internacional, deixando a definição da arbitragem doméstica para o critério
residual. Ou seja, o que não for arbitragem internacional de acordo com os parâmetros legais será
arbitragem doméstica.
Existem diversas opções para a classificação de uma arbitragem como internacional, por
exemplo: a utilização do critério econômico, do misto, ou considerando a sede da arbitragem, mas
este tema envolve complexidade incompatível com os objetivos deste trabalho.2
A Lei de Arbitragem brasileira não estabelece critérios para identificação da arbitragem como
internacional ou doméstica, podendo buscá-los na doutrina e no direito, comparando os elementos
necessários para esta diferenciação. Ocupou-se nossa legislação com a identificação da sentença
nacional e estrangeira. E esta distinção tem extrema relevância, pois, em se tratando de sentença
estrangeira, para produção de efeitos no Brasil, será necessária a sua homologação perante o STJ,
na forma adiante estudada. Já a sentença doméstica tem imediata eficácia em nosso ordenamento
jurídico, e automaticamente é considerada título executivo judicial, quando condenatória.
O art. 1.º da Convenção de Nova Iorque de 1958, promulgada no Brasil pelo Dec. 4.311/2002,
deixa a identificação da nacionalidade da sentença arbitral ao alvedrio da legislação nacional,
assim: “Artigo I: 1 – A presente Convenção aplicar-se-á ao reconhecimento e à execução de
sentenças arbitrais estrangeiras proferidas no território de um Estado que não o Estado em que se
tencione o reconhecimento e a execução de tais sentenças, oriundas de divergências entre pessoas,
sejam elas físicas ou jurídicas. A Convenção aplicar-se-á igualmente a sentenças arbitrais não
consideradas como sentenças domésticas no Estado onde se tencione o seu reconhecimento e a sua
execução”.
E assim diz a Lei de Arbitragem no parágrafo único do art. 34: “Considera-se sentença arbitral
estrangeira a que tenha sido proferida fora do território nacional”. Ou seja, adota-se como
elemento de conexão para a identificação da nacionalidade da sentença o “lugar onde foi
proferida”, sendo a sua menção requisito essencial do pronunciamento (art. 26, IV, da Lei
9.307/1996).
Em recente decisão da Ministra Nancy Andrighi, datada de 24.05.2011, a matéria foi muito bem
elucidada, constando do voto:
Em virtude de a fixação da nacionalidade das sentenças arbitrais ser uma questão de Estado,
vislumbra-se no cenário internacional diferentes regulamentações jurídicas acerca do conceito de
sentença arbitral estrangeira ou, como ensina-nos Renata Alvares Gaspar [ob. cit., p. 76],
‘divergência nos critérios de localização do laudo, já que cada sistema acaba escolhendo os pontos
de conexão mais acordes com seu Direito (e com suas políticas legislativas) interno’, constatando
ainda que ‘cada Estado, quando elege um ponto de conexão para outorgar ao laudo sua
nacionalidade, está afirmando que outros, que não recebam o mesmo tratamento ‘nacional’, têm
que passar por um processo de recepção interna, para que possam produzir efeitos jurídicos
vinculantes’ (...).
1. (...)
2. A execução, para ser regular, deve estar amparada em título executivo idôneo, dentre os
quais, prevê o art. 475-N a sentença arbitral (inciso IV) e a sentença estrangeira homologada pelo
STJ (inciso VI).
4. No ordenamento jurídico pátrio, elegeu-se o critério geográfico (ius solis) para determinação
da nacionalidade das sentenças arbitrais, baseando-se exclusivamente no local onde a decisão for
proferida (art. 34, parágrafo único, da Lei 9.307/1996).
6. Sendo a sentença arbitral em comento de nacionalidade brasileira, constitui, nos termos dos
arts. 475-N, IV, do CPC [1973 – correspondente ao art. 515, VII, do CPC/2015] e 31 da Lei da
Arbitragem, título executivo idôneo para embasar a ação de execução da qual o presente recurso
especial se origina, razão pela qual é desnecessária a homologação por esta Corte.
7. Recurso especial provido para restabelecer a decisão proferida à e-STJ fl. 60 (STJ, REsp
1.231.554/RJ, 3.ª T., v.u.).3
A princípio, a Lei não abre qualquer exceção a permitir que as partes escolham outro direito
aplicável. A doutrina internacionalista debateu muito esse aspecto e, hoje, predominantemente,
considera que nosso ordenamento não consagrou o critério da autonomia da vontade das partes
para escolha da norma de incidência às obrigações assumidas, razão pela qual o direito aplicável
aos contratos atende exclusivamente ao critério do local da sua celebração.
Nesse sentido, João Grandino Rodas explica que, “perante o caput taxativo do art. 9.º da Lei de
Introdução vigente, não se pode afirmar a existência da autonomia da vontade para a indicação da
norma aplicável, no Direito Internacional Privado brasileiro”, razão pela qual “fica às partes
unicamente o exercício da liberdade contratual na esfera das disposições supletivas da lei
aplicável, por determinação da lex loci contractus”.4
E no mesmo sentido escreve Nadia de Araujo: “Não se pode hoje afirmar a existência da
autonomia da vontade para escolher a lei aplicável aos contratos internacionais no direito
brasileiro, ante o caput taxativo do art. 9.º da LICC [LINDB], expresso ao determinar como
elemento de conexão a lex loci contractus”.5
A doutrina majoritária, portanto, considera que o direito internacional privado brasileiro não
permite a escolha do direito aplicável aos contratos, sejam eles internacionais ou nacionais;
prevalecendo sempre a ordem jurídica do local em que as obrigações forem constituídas.
No âmbito da arbitragem, porém, a Lei de Arbitragem trouxe uma regra sobre direito aplicável
a princípio bastante diversa daquela constante do art. 9.º em exame. Isso porque o § 1.º do art. 2.º
da Lei 9.307/1996 dispõe que “poderão as partes escolher, livremente, as regras de direito que
serão aplicadas na arbitragem, desde que não haja violação aos bons costumes e à ordem pública”.
Como se vê, a princípio, desde que não haja violação à ordem pública e aos bons costumes, as
partes estão livres para escolher o direito aplicável na arbitragem. Como se não bastasse tamanha
liberdade, o § 2.º do mesmo dispositivo ainda estabelece: “Poderão, também, as partes
convencionar que a arbitragem se realize com base nos princípios gerais de direito, nos usos e
costumes e nas regras internacionais de comércio”.6
A previsão do § 1.º do art. 2.º da Lei 9.307/1996 dá ensejo a enorme divergência na doutrina
brasileira. Isso porque o mencionado dispositivo de lei afirma que as partes poderão “escolher,
livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem”. Essa previsão permite a
escolha do direito aplicável apenas à arbitragem ou também ao mérito do conflito? Essa previsão
de escolha do direito aplicável incide apenas em arbitragens internacionais ou também em
arbitragens domésticas? Seria correto entender-se que é possível a escolha do direito aplicável ao
mérito da controvérsia quando se estiver diante de arbitragem, mas essa escolha não seria
possível quando se estivesse diante de processo judicial, em que incidiria o limitador do art. 9.º da
Lei de Introdução?
Em sentido assemelhado, Fabiane Verçosa: “Parece mais consentâneo com a realidade de nosso
direito que a autonomia da vontade conferida pela Lei 9.307/1996 limite-se apenas às arbitragens
de cunho internacional”.9 E, nesta linha, a escolha do direito aplicável na arbitragem doméstica
não seria lícita.
Manifestando opinião diversa, Luiz Olavo Baptista e Sílvia Julio Bueno de Miranda entendem
que “a autonomia da vontade das partes concedida pela lei de arbitragem não sofre nenhuma
limitação nos contratos domésticos”, razão pela qual “autoriza as partes em um contrato
doméstico a escolherem uma lei estrangeira para governá-lo, o que tem sido considerado uma real
revolução no direito brasileiro”.10
Em outra passagem, os autores reafirmam sua ideia: “Se as partes assim escolherem, uma
arbitragem envolvendo partes brasileiras e um contrato executado no Brasil poderá ser submetida
a uma lei estrangeira”.11 Os autores também admitem a escolha do direito aplicável ao mérito do
conflito, mas consideram, ao contrário daqueles citados nos parágrafos anteriores, que essa
possibilidade existe tanto em arbitragens internacionais quanto em arbitragens internas.
E em sua mais recente publicação, Luiz Olavo Baptista escreve: “A Lei de Arbitragem garante
expressamente às partes um alto grau de autonomia. Como é mais recente e específica do que a
LICC [LINDB], suas previsões relacionadas à autonomia das partes substituem e afastam a
aplicação da LICC [LINDB] sempre que um contrato contém uma cláusula compromissória ou
cláusula arbitral”.12
A Lei de Arbitragem brasileira traz regra tradicional, de um lado, e inovadora, de outro, no art.
34, segundo a qual “a sentença arbitral estrangeira será reconhecida ou executada no Brasil de
conformidade com os tratados internacionais com eficácia no ordenamento interno e, na sua
ausência, estritamente de acordo com os termos desta Lei”. Tradicional, porque condiciona a
eficácia da sentença estrangeira no Brasil ao processo homologatório;13 e inovadora, porque
estabelece uma prevalência dos tratados internacionais sobre a legislação interna na matéria.
Após vacilação inicial do projeto original e emendas apresentadas no novo Código de Processo
Civil, a estrutura final sancionada confirma esta orientação de incidência preferencial dos tratados
e lei especial no que se refere à homologação de sentença arbitral estrangeira, sendo a codificação
de aplicação apenas subsidiária (arts. 960 e ss., do CPC/2015).14
Lembre-se apenas o critério geográfico adotado em nossa Lei de Arbitragem, como acima visto,
de sorte que a sentença proferida em território nacional dispensa homologação (art. 34 da Lei
9.307/1996), mesmo se administrada a arbitragem por instituição estrangeira, e apreciando
arbitragem internacional.
Por fim, como demonstra interessante levantamento feito por Nadia de Araújo, reproduzido em
“Quadro Geral das Decisões em Homologação de Laudos Arbitrais Estrangeiros” proferidas nos
últimos anos, pela nova sistemática adotada no Superior Tribunal de Justiça, houve uma
significativa redução do tempo de duração do processo, considerada a data da autuação e do
trânsito em julgado, chegando-se a obter homologações, recentemente, em aproximadamente dois
anos, quando, há alguns anos, a média era superior a 5 anos.
Com efeito, o art. IV.1 da Convenção de Nova Iorque estabelece que, “a fim de obter o
reconhecimento e a execução mencionados no artigo precedente, a parte que solicitar o
reconhecimento e a execução fornecerá, quando da solicitação: a) a sentença original devidamente
autenticada ou uma cópia da mesma devidamente certificada; b) o acordo original a que se refere
o Artigo II ou uma cópia do mesmo devidamente autenticada”. Em seguida, art. IV.2 do texto
convencional dispõe: “Caso tal sentença ou tal acordo não for feito em um idioma oficial do país no
qual a sentença é invocada, a parte que solicitar o reconhecimento e a execução da sentença
produzirá uma tradução desses documentos para tal idioma”, e ainda estabelece: “A tradução será
certificada por um tradutor oficial ou juramentado ou por um agente diplomático ou consular”.
Dessa forma, cumpre ao autor da ação, além de atender aos requisitos da petição inicial
dispostos no art. 319 do CPC/2015, instruir o requerimento com a sentença arbitral estrangeira
autenticada pelo consulado brasileiro e acompanhada de tradução oficial, bem como com a
convenção de arbitragem traduzida oficialmente. O original da sentença poderá ser substituído
por uma cópia certificada e, da mesma forma que a original, deve ser autenticada pelo consulado e
traduzida ao português por órgão oficial. O original da convenção de arbitragem poderá ser
substituído por uma cópia certificada e, da mesma forma que o documento original, precisa ser
oficialmente traduzida.
A avaliação desses requisitos cabe, segundo o Regimento Interno do STJ (arts. 216 e ss., de
acordo com a ER 18/2014 em “Anexo 4”), ao Presidente do STJ. Presentes todos os requisitos, o
Presidente determinará a citação do réu para oferecer contestação. Caso não haja contestação, o
próprio Presidente decidirá o pedido. Ao contrário, se houver apresentação de defesa, o processo
será encaminhado à livre distribuição dentre um dos Ministros componentes da Corte Especial do
STJ.
E, como diz Nadia de Araújo “No julgamento do pedido de homologação de sentenças e laudos
arbitrais estrangeiros, não se avalia o mérito do que foi decidido, pois se cuida de verificar tão
somente o cumprimento dos requisitos formais de homologabilidade exigidos pela legislação
brasileira e, apenas tangencialmente, o mérito da questão ao avaliar se esta não ofende a ordem
pública e a soberania nacional. É o chamado sistema de contenciosidade limitada imposto pelas
regras atinentes ao reconhecimento, determinadas na legislação local”.18
O art. V.1, a, da Convenção de Nova Iorque dispõe que “o reconhecimento e a execução de uma
sentença poderão ser indeferidos, a pedido da parte contra a qual ela é invocada, unicamente se
esta parte fornecer à autoridade competente onde se tenciona o reconhecimento e a execução,
prova de que: a) as partes do acordo a que se refere o Artigo II estavam, em conformidade com a
lei a elas aplicável, de algum modo incapacitadas, ou que tal acordo não é válido nos termos da lei
à qual as partes o submeteram, ou, na ausência de indicação sobre a matéria, nos termos da lei do
país onde a sentença foi proferida”. Semelhantemente, o art. 38, I e II, da Lei de Arbitragem:
“Somente poderá ser negada a homologação para o reconhecimento ou execução de sentença
arbitral estrangeira, quando o réu demonstrar que: I – as partes na convenção de arbitragem eram
incapazes; II – a convenção de arbitragem não era válida segundo a lei à qual as partes a
submeteram, ou, na falta de indicação, em virtude da lei do país onde a sentença arbitral foi
proferida”.
Mais técnica, em nosso sentir, a Lei brasileira ao tratar em dois incisos ao que a Convenção fez
referência em apenas um, e acabou levando a certo impasse entre os que a respeito estudaram.
Isto se diz pois é debatida na doutrina eventual incompatibilidade entre estas regras a ensejar
uma exegese a respeito de qual delas prevaleceria sobre a matéria.19 Porém, entendemos que as
duas normas convivem em harmonia, sendo apenas, como referido, com melhor técnica a nossa
Lei de Arbitragem.
Assim: exige-se a capacidade das partes quando celebrada a convenção para o reconhecimento
da sentença estrangeira. Esta capacidade é aferida de acordo com as regras de direito
internacional privado20 e, assim, incide a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Dec.-
lei 4.657/1942). Neste contexto, a capacidade é aferida de acordo com a lei do local em que for
domiciliada a pessoa (art. 7.º, Dec.-lei 4.657/1942). Tratando-se de pessoa jurídica, aplica-se a regra
contida no art. 11 da referida Lei de Introdução (local de sua constituição).
Advirta-se, ainda, que a questão da capacidade das partes comporta dupla verificação, uma
direta e outra indireta. A primeira, por esta previsão, mediante provocação das partes, e outra
constatação se faz de forma indireta, e até mesmo de ofício, ao se impedir a homologação de
sentença arbitral estrangeira diante da falta de arbitrabilidade, como adiante se verá. Ora, a
arbitrabilidade, como se sabe, é subjetiva e objetiva. Na primeira situação, apura-se exatamente a
capacidade da parte para se submeter à arbitragem; e, assim, o vício da incapacidade retira do
litígio a possibilidade de ser resolvido por arbitragem e, desta forma, impede o reconhecimento da
sentença estrangeira.
Por sua vez, também mediante provocação da parte, no mesmo dispositivo, refere-se a
Convenção ao óbice da homologação, diante da invalidade da convenção. E para este traz dois
elementos de conexão: a lei a que se submeteram ou, na falta de indicação, a lei de onde a
sentença arbitral foi proferida. Em perfeita sintonia com a Convenção, a Lei de Arbitragem
confirma esta regra em inciso separado do anterior (relativo à capacidade).
O art. V.1, b, da Convenção de Nova Iorque, por sua vez, dispõe que a homologação será
denegada caso o réu demonstre que “a parte contra a qual a sentença é invocada não recebeu
notificação apropriada acerca da designação do árbitro ou do processo de arbitragem, ou lhe foi
impossível, por outras razões, apresentar seus argumentos”. Da mesma forma, o art. 38, III, da Lei
de Arbitragem permite a rejeição do pedido quando o demandante provar que “não foi notificado
da designação do árbitro ou do procedimento de arbitragem, ou tenha sido violado o princípio do
contraditório, impossibilitando a ampla defesa”.
Em relação a essa hipótese, Ana Cristina Azevedo Pontes de Carvalho escreve: “Trata-se de
verificar, portanto, se os atos processuais foram regularmente informados às partes (de
conformidade com as regras adotadas pelos litigantes) e se lhes foi permitido exercer o direito de
fazer valer as suas próprias razões”. A autora, com razão, atenta para o fato de que “não se
autoriza à autoridade judiciária homologante, com isso, tentar impor as regras do fórum ao
processo arbitral”.21 Desde que observado o procedimento estabelecido pelas partes ou
determinado pelo árbitro com a autorização das partes, não se pode entender que houve violação
ao contraditório ou à ampla defesa. Aliás, o parágrafo único do art. 39 da Lei de Arbitragem,
adiante analisado, confirma inexistir ofensa à ordem pública a realização de citação na forma
convencionada pelas partes.
Sentença estrangeira. Juízo arbitral. Contrato internacional firmado com cláusula arbitral.
Contrato inadimplido. Lei 9.307/96 (Lei de Arbitragem), arts. 38, III, e 39, parágrafo único. Sentença
homologada.
2. Nos termos do art. 39, parágrafo único, da Lei de Arbitragem, é descabida a alegação, in casu,
de necessidade de citação por meio de carta rogatória ou de ausência de citação, ante a
comprovação de que o requerido foi comunicado acerca do início do procedimento de arbitragem,
bem como dos atos ali realizados, tanto por meio das empresas de serviços de courier, como
também via correio eletrônico e fax.
3. O requerido não se desincumbiu do ônus constante no art. 38, III, da mesma lei, qual seja a
comprovação de que não fora notificado do procedimento de arbitragem ou que tenha sido
violado o princípio do contraditório, impossibilitando sua ampla defesa.
5. Sentença arbitral homologada (STJ, SEC 3.660, v.u., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j.
28.05.2009).22
No art. V.1, c, a Convenção de Nova Iorque estabelece como fundamento para a denegação da
homologação o fato de que “a sentença se refere a uma divergência que não está prevista ou que
não se enquadra nos termos da cláusula de submissão à arbitragem, ou contém decisões acerca de
matérias que transcendem o alcance da cláusula de submissão, contanto que, se as decisões sobre
as matérias suscetíveis de arbitragem puderem ser separadas daquelas não suscetíveis, a parte da
sentença que contém decisões sobre matérias suscetíveis de arbitragem possa ser reconhecida e
executada”. De forma semelhante, a Lei 9.307/1996 estabelece que será denegada a homologação
caso o réu demonstre que “a sentença arbitral foi proferida fora dos limites da convenção de
arbitragem, e não foi possível separar a parte excedente daquela submetida à arbitragem”.
Cuida-se aqui dos vícios de sentença ultra e extra petita. A esse respeito, Renata Alvares Gaspar
considera que “os referidos dispositivos legais não determinam a completa ineficácia do laudo
arbitral estrangeiro, cujo pronunciamento se revele dissonante com o pacto arbitral, já que se
admite um dépeçage do mesmo, viabilizando a homologação parcial, sempre e quando seja
possível separar da decisão arbitral a parte que foi decidida em conformidade com a vontade das
partes, da outra parte que ultrapassou ou extrapolou o acordo mencionado”.23 No caso de sentença
extra petita, a única solução é a denegação da homologação. Já no caso da sentença ultra petita,
parece possível a homologação parcial, extirpando-se a parte excedente. Aliás, tanto o Código de
Processo Civil de 2015 (art. 961, § 2.º), como o Regimento interno do Superior Tribunal de Justiça
(art. 216-A, § 2.º) fazem referência expressa à homologação parcial.
Em relação à sentença infra petita, não há referência no cenário normativo (Lei de Arbitragem,
Convenção etc.) de sua qualificação como óbice à homologação. A seu turno, há a tendência de se
aproveitar o quanto nela contido, e, sem comprometer a parte adequada, apenas reclamar-se a
complementação, como, inclusive, passou a ser o regime jurídico brasileiro com a reforma de 2015
que, expressamente, revogou como causa de invalidação da sentença o inc. V do art. 32.24 Neste
contexto, é de se admitir a homologação de sentença estrangeira infra petita.25
A Convenção de Nova Iorque, no art. V.1, d, também prevê como causa para denegação da
homologação, desde que demonstrada pelo réu, o fato de que “a composição da autoridade arbitral
ou o procedimento arbitral não se deu em conformidade com o acordado pelas partes, ou, na
ausência de tal acordo, não se deu em conformidade com a lei do país em que a arbitragem
ocorreu”. De maneira semelhante, o art. 38, V, da Lei de Arbitragem brasileira dispõe que o réu,
para o fim de obter a denegação da homologação, poderá provar que “a instituição da arbitragem
não está de acordo com o compromisso arbitral ou cláusula compromissória”.
A Convenção de Nova Iorque ainda prevê outras duas hipóteses em que o pedido de
homologação da sentença arbitral estrangeira será negado, desta vez não mais como exceção
processual, mas sim como objeção processual. Assim, o art. V.2 prevê: “O reconhecimento e a
execução de uma sentença arbitral também poderão ser recusados caso a autoridade competente
do país em que se tenciona o reconhecimento e a execução constatar que: a) segundo a lei daquele
país, o objeto da divergência não é passível de solução mediante arbitragem; ou b) o
reconhecimento ou a execução da sentença seria contrário à ordem pública daquele país”.
Da mesma forma, a Lei de Arbitragem brasileira, com o ajuste introduzido pela Lei 13.129/2015
estatui, no art. 39: “A homologação para o reconhecimento ou a execução da sentença arbitral
estrangeira também será denegada se o Superior Tribunal de Justiça constatar que: 27 I – segundo a
lei brasileira, o objeto do litígio não é suscetível de ser resolvido por arbitragem; II – a decisão
ofende a ordem pública nacional”. No que tange à primeira hipótese, não existem maiores
dúvidas: a sentença arbitral estrangeira não será homologada quando, de acordo com a lei do país
receptor, no caso o Brasil, o caso não pudesse ser submetido à arbitragem, o que engloba os
conceitos de inarbitrabilidade subjetiva e objetiva.
O último inciso representa a única hipótese em que o STJ poderá efetivamente analisar o mérito
da sentença arbitral estrangeira para fins de decidir pela procedência ou improcedência do pedido
homologatório. Trata-se de verificar se a decisão estrangeira viola “a ordem pública nacional”.
Jacob Dolinger, notável estudioso do assunto, a respeito escreve: “A ordem pública é o princípio
que rejeita a aplicação de lei atentatória à sensibilidade jurídica, à ordem moral e aos interesses
econômicos de um país”.28 Arnoldo Wald, a seu turno, explica que “a ordem pública é o conjunto
de normas essenciais à convivência nacional”.29 Como se vê, a definição de ordem pública é
bastante complexa e não permite um conceito abstrato, devendo o órgão competente para
homologação analisar em concreto essa circunstância.
Anote-se que o Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, após a recente modificação
introduzida pela Emenda Regimental 18, de 17 de dezembro de 2014,30 em seu art. 216-F
estabelece a restrição à homologação se a sentença estrangeira “ofender a soberania nacional, a
dignidade da pessoa humana e/ou a ordem pública”; Chama-se a atenção à inclusão da ofensa à
dignidade da pessoa humana como óbice à homologação, ausente da Resolução 9 até então em
vigor; porém, em nosso sentir, a dignidade da pessoa humana representa cláusula pétrea de nossa
Constituição Federal, (CF, art. 1.º, III),31 e como valor base da Nação, integra a ordem pública. Desta
forma, independentemente do debate a respeito da aplicação ou não desta regra em caráter
subsidiário à lei de regência da arbitragem ou a convenções, o fato é que o quanto nela previsto se
contém na abrangência de “ordem pública”, de tal forma que a violação representa óbice à
homologação.
Para evitar dúvidas e contornar jurisprudência do STF até então formada para homologação de
sentenças judiciais estrangeiras, o parágrafo único do mesmo dispositivo (art. 39 da Lei 9.307/1996)
deixa claro que “não será considerada ofensa à ordem pública nacional a efetivação da citação da
parte residente ou domiciliada no Brasil, nos moldes da convenção de arbitragem ou da lei
processual do país onde se realizou a arbitragem, admitindo-se, inclusive, a citação postal com
prova inequívoca de recebimento, desde que assegure à parte brasileira tempo hábil para o
exercício do direito de defesa”.
Uma vez homologada a sentença estrangeira, sua execução, quando necessário, far-se-á perante
a Justiça Federal (art. 109, X, da CF/1988;32 RISTJ, art. 216-N, e art. 965 do CPC/2015).
BAPTISTA, Luiz Olavo; MAGALHÃES, José Carlos de. Homologação de laudos arbitrais
estrangeiros no direito brasileiro. Arbitragem comercial. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1986.
BARROS, Vera Cecília Monteiro de. Exceção de Ordem Pública na Homologação de Sentença
Arbitral Estrangeira no Brasil. São Paulo: Quartier Latin, 2017.
Caderno especial dedicado à Convenção de Nova Iorque, com artigos de diversos autores, como
Arnoldo Wald, José Carlos de Magalhães, Nadia de Araujo, José Emílio Nunes Pinto e Rodrigo
Garcia da Fonseca, além de Doutrina Internacional e Histórico da Convenção de Nova Iorque e sua
Ratificação. Revista de Arbitragem e Mediação. ano V. n. 18. São Paulo: Ed. RT, jul-set. 2008.
FUX, Luiz. Homologação de sentença estrangeira. In: TIBURCIO, Carmen; BARROSO, Luís
Roberto (org.). O direito internacional contemporâneo: estudos em homenagem ao professor Jacob
Dolinger. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
GARCEZ, José Maria Rossani. Arbitragem internacional. In: GARCEZ, José Maria Rossani
(coord.). A arbitragem na era da globalização. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
NUNES, Thiago Marinho. A convenção de Nova Iorque de 10 de junho de 1958: alguns pontos
polêmicos. Revista Brasileira de Arbitragem. ano V. n. 23. Porto Alegre: Síntese; Curitiba: Comitê
Brasileiro de Arbitragem. jul.-set. 2009.
PUCCI, Adriana Noemi. Homologação de sentenças arbitrais estrangeiras. In: LEMES, Selma
Ferreira; CARMONA, Carlos Alberto; MARTINS, Pedro Batista (coord.). Arbitragem: estudos em
homenagem ao Prof. Guido Fernando da Silva Soares. São Paulo: Atlas, 2007.
TIBURCIO, Carmen. A ordem pública na homologação de sentenças estrangeiras. In: FUX, Luiz;
NERY JR., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coord.). Processo e constituição: estudos em
homenagem ao Professor José Carlos Barbosa Moreira. São Paulo: Ed. RT, 2006.
GARCEZ, José Maria Rossani. Arbitragem internacional. In: GARCEZ, José Maria Rossani (coord.). A
arbitragem na era da globalização. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 164.
A respeito dos diversos critérios, recomenda-se a leitura do texto de VERÇOSA, Fabiane. Arbitragem
interna v. arbitragem internacional: breves contornos da distinção e sua repercussão no ordenamento
jurídico brasileiro face ao princípio da autonomia da vontade. In: TIBURCIO, Carmen; BARROSO, Luís
Roberto (org.). O direito internacional contemporâneo: estudos em homenagem ao professor Jacob Dolinger.
Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 428.
RODAS, João Grandino. Elementos de conexão no direito internacional privado brasileiro relativamente às
obrigações contratuais. In: RODAS, João Grandino (coord.). Contratos internacionais. 3. ed. São Paulo: Ed.
RT, 2002. p. 59.
ARAUJO, Nadia de. Contratos internacionais e a jurisprudência brasileira: lei aplicável, ordem pública e
cláusula de eleição de foro. In: RODAS, João Grandino (coord.). Contratos internacionais. 3. ed. São Paulo:
Ed. RT, 2002. p. 212.
Possível, por exemplo, a escolha de julgamento do conflito de acordo com a lex mercatoria, ou com base
nos princípios do Unidroit ou as regras do Gafta.
LEE, João Bosco. A Lei 9.307/96 e o direito aplicável ao mérito do litígio na arbitragem comercial
internacional. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. jan. 2001. vol. 11, p. 347.
8
Idem, ibidem.
10
BAPTISTA, Luiz Olavo; MIRANDA, Sílvia Julio Bueno de. Op. cit., p. 11.
11
Idem, ibidem.
12
BAPTISTA, Luiz Olavo. Arbitragem comercial e internacional. São Paulo: Lex Magister, 2011. p. 249. E a
propósito também desta matéria – escolha da lei aplicável –, além desta Quinta Parte – O direito aplicável
ao litígio, da qual a transcrição acima foi retirada –, indica-se a leitura do Capítulo III da obra citada, no
qual apresenta o Autor As fontes jurídicas da arbitragem comercial e internacional (p. 67 e ss.).
13
Anote-se a peculiar analogia feita por Luiz Olavo Baptista, com a perspicácia que lhe é peculiar: “O
processo de recepção do direito estrangeiro por um sistema jurídico pode ser comparado ao da reação de
um organismo ao implante cirúrgico de um órgão proveniente de outro corpo. Problemas de
compatibilidade, de qualidade e imunológicos operam com base numa mecânica similar à da admissão de
uma decisão proferida fora da esfera de soberania do Estado, ou seja, são elementos estranhos que
precisam ser compatíveis com o sistema que os acolhe, equivalentes à ideia da utilização da sentença
estrangeira, tais sentenças sendo fruto da ação soberana de outro Estado, ou produzida sob a égide de suas
leis” (BAPTISTA, Luiz Olavo. Arbitragem comercial e internacional cit., p. 281).
14
Cf, em Anexo 5, o texto do Código de Processo Civil no quanto pertinente. E neste aspecto, ficamos
honrados ao observar o acolhimento de nossa sugestão apresentada em conjunto com Fabiane Verçosa e
André Luís Monteiro na versão sancionada. Especialmente, dentre outras propostas contidas no texto, não
necessariamente na literalidade, mas totalmente no conteúdo, anote-se o § 3.º do art. 960; assim: “A
homologação de decisão arbitral estrangeira obedecerá ao disposto em tratado e em lei, aplicando-se,
subsidiariamente, as disposições deste Capítulo”. Anote-se também, pela pertinência, o § 2.º: “A
homologação obedecerá ao que dispuserem os tratados em vigor no Brasil e o Regimento Interno do
Superior Tribunal de Justiça”. Para quem tiver interesse no desenvolvimento dos textos, com as propostas
de então e justificativas oferecidas, confira a 4.ª edição deste “Curso” na qual, inclusive, apresenta-se
quadro comparativo entre os artigos originais e propostos, considerada a primeira redação concluída no
Senado Federal.
15
Confira-se o Guia do ICCA (International Council for Commercial Arbitration) sobre a Interpretação da
Convenção de Nova Iorque de 1958 – Um texto de referência para juízes. Disponível em: [www.arbitration-
icca.org/media/1/13320134139400/portuguese_guide_composite_for_website_final.pdf]. Acesso em: jul.
2015; ou em [www.cahali.adv.br], espaço acadêmico.
16
17
GASPAR, Renata Alvares. Reconhecimento de sentenças arbitrais estrangeiras no Brasil. São Paulo: Altas,
2009. p. 96.
18
ARAÚJO, Nadia de. O STJ e a homologação de sentenças arbitrais estrangeiras: dez anos de atuação. In:
TIBÚRCIO, Carmen; MENEZES, Wagner; VASCONCELOS, Raquel (orgs.). Panorama do direito internacional
provado atual e outros temas contemporâneos. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2015, p. 155-180, com
proveitosa citação doutrinária e jurisprudencial a respeito de questões envolvendo a homologação de
sentença estrangeira.
19
20
Aliás, a convenção diz conforme a lei que às partes é aplicável, e, desta forma, a identificação da
capacidade é de acordo com a Ordem do local do reconhecimento, que, entre nós, é a Lei de Introdução.
21
CARVALHO, Ana Cristina Azevedo Pontes de. As inovações da Convenção de Nova Iorque de arbitragem
em face da Lei de Arbitragem brasileira. In: JOBIM, Eduardo; MACHADO, Rafael Bicca (coord.). Arbitragem
no Brasil: aspectos jurídicos relevantes. São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 54.
22
23
24
Cf. a respeito, Capítulo 13, item 13.2. A solução proposta é de manter-se íntegra a sentença pelo que nessa
se contém, e, para sanar o vício, provoca-se novo pronunciamento arbitral complementar (art. 33, § 4.º).
25
Neste sentido, José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, com pertinente observação final; vejamos:
“(...), o fato de a sentença arbitral estrangeira não ter decidido todo o litígio submetido à arbitragem não
impede a sua homologação, não obstante possa a parte prejudicada pleitear a sua anulação perante o
Poder Judiciário do Estado da sede da arbitragem, caso a lei de regência daquele local assim permita”.
FICHTNER, José Antonio; MONTEIRO, André Luís. As causas de denegação da homologação de sentença
arbitral estrangeira no Brasil. Temas de arbitragem: primeira série. Rio de Janeiro: Renovar, 2010. p. 315.
26
LEE, João Bosco. A homologação de sentença arbitral estrangeira: a Convenção de Nova Iorque de 1958 e o
direito brasileiro de arbitragem. In: LEMES, Selma Ferreira; CARMONA, Carlos Alberto; MARTINS, Pedro
Batista (coord.). Arbitragem: estudos em homenagem ao prof. Guido Fernando da Silva Soares. São Paulo:
Altas, 2007. p. 188.
27
Como já antes referido, à luz da EC 45/2004 (Reforma do Poder Judiciário), houve a transferência da
competência para concessão de exequatur e homologação de decisões estrangeiras do STF para o STJ, na
forma do art. 105, I, i, da CF/1988, e assim automaticamente já se interpretava a Lei com a nova
competência, em qualquer referência que faça ao Supremo Tribunal Federal a respeito do tema. E com a
reforma de 2015, como deveria, foi adequada a referência.
28
DOLINGER, Jacob. A autonomia da vontade para escolha da lei aplicável no direito internacional privado
brasileiro. In: LEMES, Selma Ferreira; CARMONA, Carlos Alberto; MARTINS, Pedro Batista (coord.).
Arbitragem: estudos em homenagem ao prof. Guido Fernando da Silva Soares. São Paulo: Altas, 2007. p. 102.
29
WALD, Arnoldo. Jurisprudência comentada: STJ, Corte Especial, SEC 802, Min. José Delgado. Revista de
Arbitragem e Mediação. n. 7, ano II, out.-dez. 2005, p. 201.
30
31
“Art. 1.º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II
– a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V – o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”
32
“Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: (...) X – os crimes de ingresso ou permanência
irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o exequatur, e de sentença estrangeira, após a
homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização.”