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(Vem a Mãe e diz:)

MÃE: Pêro Marques foi-se já?

INÊS: E pera que era ele aqui?

MÃE: E não t'agrada ele a ti?

INÊS: Vá-se muitieramá!

que sempre disse e direi:

mãe, eu me não casarei

senão com homem discreto,

E assi vo-lo prometo

ou antes o leixarei.

Que seja homem mal feito,

feo, pobre, sem feição

como tiver descrição,

nam lhe quero mais proveito.

E saiba tanger viola,

e coma eu pão e cebola.

siquer uma cantiguinha

discreto feito em farinha

porque isto me degola.

MÃE: Sempre tu hás de bailar

e sempre ele há de tanger?

Se nam tiveres que comer

o tanger te há de fartar?

INÊS: Cada louco com sua teima.

com uma borda de boleima

E uma vez d'água fria,

nam quero mais cada dia.

MÃE: Como às vezes isso queima.

E que é desses escudeiros?

INÊS: Eu falei ontem ali

que passaram por aqui


os judeus casamenteiros

e hão de vir logo aqui.

Aqui entram os Judeus casamenteiros, um, Latão, e outro, Vidal e diz Vidal:

VIDAL: Ou de cá.

INÊS Quem está lá?

VIDAL Nome del Deu, aqui somos.

LATÃO Nam sabeis quão longe fomos.

VIDAL: Corremos a ira má.

Este e eu.

LATÃO: Eu, e este...

pola lama e polo pó

que era pera haver dó

com chuiva, sol e Nordeste.

Foi a coisa de maneira,

tal friúra e tal canseira,

que trago as tripas maçadas

assi me fadem boas fadas

que me saltou caganeira

Pera vossa mercê ver

o que nos encomendou.

O que nos encomendou

será se hoiver de ser

Todo este mundo é fadiga

Vós dissestes fiha amiga

que vos buscássemos logo

VIDAL: E logo pusemos fogo.

LATÃO: Cal-te!
VIDAL: Nam queres que diga

nam sou eu também do jogo?

LATÃO:Não fui eu também contigo

tu e eu nam somos eu?

Tu judeu e eu judeu,

nam somos massa dum trigo?

VIDAL: Si somos juro al Deu.

LATÃO: Deixa-me falar.

VIDAL: Já calo.

Senhora há já três dias.

LATÃO: Falas-lhe tu ou eu falo?

Ora dize o que dizias

que foste que fomos que ias

buscá-lo esgaravatá-lo.

VIDAL: Vós amor quereis marido

discreto e de viola.

LATÃO: Esta moça nam é tola

que quer casar por sentido

VIDAL: Judeu queres-me leixar?

LATÃO: Deixo, não quero falar.

VIDAL: Buscámo-lo.

LATÃO: Demo foi logo.

Crede que o vosso rogo

vencera o tejo e o mar.

Eu cuido que falo e calo

calo eu agora ou não?

Ou falo se vem à mão?

Nam digas que nam te falo.

INÊS: Jesu guarde-me ora Deos

nam falará um de vós?

Já queria saber isso.


MÃE: Que siso Inês que siso

Tens debaixo desses véus.

INÊS Diz o exemplo da velha

o que nam haveis de comer

deixai-o a outrem mexer.

MÃE: Eu nam sei quem t'aconselha...

INÊS Enfim, que novas trazeis?

VIDAL: O marido que quereis

de viola e dessa sorte,

nam no há senão na corte

que cá não no achareis.

Falámos a Badajoz,

músico discreto solteiro.

este fora o verdadeiro,

mas soltou-se-nos da noz.

Fomos a Vilhacastim

e falou-nos em latim:

vinde cá daqui a uma hora

e trazei-me essa senhora.

INÊS: Tudo é nada enfim.

VIDAL: Esperai, aguardai ora.

Soubemos dum escudeiro

de feição de atafoneiro

que virá logo essora,

Que fala e com' ora fala

estrogirá esta sala.

e tange e com' ora tange

alcança quanto abrange

E se preza bem da gala.


JUDEUS CASAMENTEIROS:

 Interesseiros ·
 Desonestos · Mentirosos · Aldrabões · Mercenários · Indiferentes pelo futuro de Inês e do
Escudeiro ·

Latão e Vidal – alcoviteiros casamenteiros;

▪ têm a missão de encontrar um marido para Inês;

▪ operam como uma única personagem, visível no seu discurso que confere comicidade à obra: «Tu e
eu não somos eu?»;

▪ procuram o marido ideal para Inês Pereira;

▪ sem escrúpulos e oportunistas, visando apenas uma recompensa material, exageram as qualidades
do Escudeiro e de Inês para atingirem o seu objetivo;

▪ são desonestos, falsos, materialistas e astutos

RESUMO:

Aparece um escudeiro e é solteiro…

Pero marques vai-se embora e a mãe questiona Inês sobre ele. Inês elucida a mãe sobre o seu
homem ideal (pode ser feio e pobre, mas tem de ser bem-falante e tocar viola), a mãe chama-a à
razão, dizendo que não se pode viver apenas de folia. Inês informa que já contratou judeus
casamenteiros para a ajudar a encontrar um marido compatível com os seus ideais e que a sua
esperança agora está neles. Entra em cena Latão e Vidal que somente se interessam no dinheiro que
que o casamento arranjado lhes pode render, não querendo saber do bem-estar de Inês. Os judeus
contam que percorreram muitos lugares para encontrar um homem com as características
requeridas por Inês. Assim apresentam-lhe Brás da Mata, um escudeiro, que se mostra exatamente
como Inês pretendia, apesar das desconfianças da sua mãe.

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