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gem de temas em livros didáticos indicados e distribuídos pelo MEC, tipificando crimes relacionados
ao que é entendido como doutrinação, dentre outras restrições. O mesmo blog também identificava,
até setembro de 2016, projetos de teor similar em onze estados.
6 Conforme texto disponível em: <http://www.programaescolasempartido.org/>. Acesso em: 12//7/2016.
7 Esta é a diferenciação feita na própria mensagem inicial de acesso ao site do Escola sem Partido,
originalmente feita em letras maiúsculas: “Aviso importante! Esta é a página do movimento Escola
sem Partido. Para visitar a página do anteprojeto de lei contra a doutrinação nas escolas, ‘clique aqui’”.
[grifos meus]
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COMO AGE?
A partir de seu site e de suas ramificações, o Escola sem Partido vem
realizando, desde sua criação, ações sistematicamente orientadas para coibir a
comandos, seja no que diz respeito aos nexos diretos e indiretos do Escola sem
Partido com partidos políticos, seja no que diz respeito a seus vínculos com
ramos específicos da grande mídia, do parlamento e de segmentos religiosos.
O caráter personalista, centralizado e partidário de sua coordenação
é particularmente perceptível na estrutura singular e na linguagem do site,
ancoradas na veiculação de variadas peças de propaganda vigorosamente
panfletárias (especialmente posts e vídeos de tom jocoso e depreciativo), na
difusão massiva de textos de opinião que reforçam um mesmo e delimitado
núcleo de ideias (e cujo tamanho e forma são típicos de produções destinadas
à propaganda dessas ideias), mas também em estratégias de interatividade que,
dissimulando o caráter restrito da coordenação, alimentam o fornecimento
regular de relatos apresentados como “provas” que corroborariam as convicções
emitidas nos textos editoriais do site e nos artigos de opinião.
Os nexos entre esses dois últimos eixos de comunicação do site – os textos
de opinião e os depoimentos e “denúncias” obtidos por meios de mecanismos
de interatividade – podem ser encontrados tanto em chamadas específicas do
site, quanto no interior de diversos textos de opinião, que convocam e instam
pais, alunos e ex-alunos a enviarem mensagens relatando as supostas tenta-
tivas de doutrinação e solicitando que cada mensagem seja acompanhada de
“elementos que possam comprová-la”.11
Chama a atenção, neste caso, o tom de conclamação à suspeição e ao
denuncismo, bastante evidente, entre outras, na seguinte passagem:
13 Cuja teia de relações, como já indicado anteriormente, encontra-se bem revelada no artigo de
Espinosa e Queiroz (2017) que compõe esta coletânea.
70 ESCOLA “SEM” PARTIDO
de conjunto cada vez mais orgânico que interliga esses âmbitos como braços
de uma ação coordenada, em que as estratégias de mobilização e propaganda
relativamente diversificadas estão, na verdade, ancoradas em propósitos co-
muns nada apartidários.
A relativa variedade de estilos, que torna a discussão aqui ou ali mais
palatável e aparentemente mais ancorada em bases acadêmicas, não chega a
ocultar suficientemente seus vínculos com o tom primordial do site, reiterado
por parte dos associados, em que predominam conclamações conservadoras,
a utilização de uma linguagem deselegante e não raramente grosseira, além
de formas de intimidação, ameaça e desqualificação que não disfarçam as
intenções de “abater o inimigo”.
Essas características impedem que o Escola sem Partido seja entendido
como “movimento”. Ainda que suas ações ancorem-se em agregações vincu-
ladas a propósitos aparentemente comuns, sua coordenação personalizada e
centralizada, bem como a assimetria completa entre os que ocupam posições de
decisão e comando e os demais participantes o definem como uma organização
especializada, que cumpre funções específicas de propaganda, mobilização e
controle no âmbito de uma vertente partidária compromissada com a defesa
de prerrogativas econômicas, políticas e socioculturais ultraconservadoras.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Há algo de particularmente intrigante, quando observamos com relativo
distanciamento o discurso e as formas de atuação do Escola sem Partido.
Em um quadro nacional de realização da escola, ainda tão combalido devido
à história de descasos com a educação do povo, um quadro no qual imensas
assimetrias ainda constituem a oferta escolar pelos mais variados aspectos, das
condições materiais e funcionais das escolas às condições de contratação e remu-
72 ESCOLA “SEM” PARTIDO
O importante, hoje, não é o que a nova lei poderá fazer para acabar
com os vestígios de uma pedagogia às avessas, pervertida. É o que
ela poderá ser para gerar, a partir de nossos dias, uma educação
escolarizada fincada na escola e nucleada na sala de aula. Não basta
remover os “excessos” de centralização, que substituem a relação
pedagógica pela relação de poder. É preciso construir uma escola
autossuficiente e autônoma, capaz de crescer por seus próprios
dinamismos. Conferir à sala de aula a capacidade de operar como
o experimentum crucis da prática escolar humanizada, de liberação
do oprimido, de descolonização das mentes e corações dos pro-
fessores e alunos, de integração de todos nas correntes críticas de
vitalização da comunidade escolar e de transformação do meio
social ambiente. (Fernandes, 1989, p.22)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS