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UNIVERSIDADE CESUMAR - UNICESUMAR

CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS TECNOLÓGICAS E AGRÁRIAS


CURSO DE GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO

ARQUITETURA E URBANISMO APLICADOS


AO DESENVOLVIMENTO DE JOGOS DIGITAIS

LUIZ FELIPE DOS SANTOS LOUZADA

MARINGÁ – PR

2021
Luiz Felipe dos Santos Louzada

ARQUITETURA E URBANISMO APLICADOS


AO DESENVOLVIMENTO DE JOGOS DIGITAIS

Artigo apresentado ao Curso de Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade


Cesumar – UNICESUMAR como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em
Arquitetura e Urbanismo, sob a orientação do Prof. Paulo Renato de Castro Alves.

MARINGÁ – PR
2021
FOLHA DE APROVAÇÃO
LUIZ FELIPE DOS SANTOS LOUZADA

ARQUITETURA E URBANISMO APLICADOS


AO DESENVOLVIMENTO DE JOGOS DIGITAIS

Artigo apresentado ao Curso de Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade


Cesumar – UNICESUMAR como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em
Arquitetura e Urbanismo, sob a orientação do Prof. Paulo Renato de Castro Alves.

Aprovado em: 18 de novembro de 2021.

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________
Professor Paulo Renato de Castro Alves

__________________________________________
Professora Fernanda Di Benedetto Vieira

__________________________________________
Professora Fabia Rosas Moreira
A todos que me incentivaram a escrever sobre
o que amo.
AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, por todo seu esforço para que eu pudesse fazer aquilo que amo.
Agradeço aos demais familiares pelo incentivo contínuo.
À minha namorada, pelo suporte e incentivo nos dias mais difíceis.
Aos amigos do Discord pela companhia nas madrugadas de estudo.
Aos amigos que demonstraram interesse pelo tema, e me incentivaram a escrever.
A toda comunidade de jogadores e da Twitch que contribuíram para as pesquisas.
ARQUITETURA E URBANISMO APLICADOS
AO DESENVOLVIMENTO DE JOGOS DIGITAIS

Luiz Felipe Dos Santos Louzada

RESUMO

Este trabalho tem como intenção explorar as formas com as quais a Arquitetura e
Urbanismo dialogam com os jogos digitais e os jogadores, além das funções e etapas em que
arquitetos podem trabalhar e contribuir para o desenvolvimento de um jogo bem como o tipo
de experiência que um espaço digital pode oferecer, quando devidamente planejado por um
profissional especializado. Através dos capítulos serão evidenciados por meio de dados e con-
ceitos como o desenvolvimento de jogos é um meio de atuação promissor para arquitetos e
urbanistas, também serão feitas análises de obras em vários segmentos da arte, bem como o
estudo de caso de um jogo em específico (Control) e uma pesquisa realizada com 3 públicos
alvos distingues, para que se possa por fim, estabelecer o tipo de relação que a arquitetura
possui e pode vir a possuir no desenvolvimento de jogos a fim de que mais profissionais pos-
sam se aprofundar nesta área.

Palavras-chave: Level Design. Ambiente virtual. Design de ambientes.


ARCHITECTURE AND URBANISM APPLIED
TO GAME DEVELOPMENT

Luiz Felipe Dos Santos Louzada

ABSTRACT

This paper will explore the ways in which Architecture and Urbanism dialogues with
digital games and players, as well as the functions and stages in which architects can work
and contribute to the development of a game and the kind of experience that a digital space
can offer, when properly designed by a specialized professional. Through the chapters, it will
be shown through data and concepts how game development is a promising way of working
for architects and city planners. We will also analyze works in several art segments, as well as
the case study of a specific game (Control) and a survey conducted with three different target
audiences, so that we can finally establish the kind of relationship that architecture has and
may have in the development of games, in order that more professionals may approach this
field.

Keywords: Level Design. Virtual enviroment. Enviroment Design.


LISTA DE IMAGENS
Imagem 1 - Pinturas Rupestres ................................................................................................... 3
Imagem 2 - Experimento de Brunelleschi .................................................................................. 5
Imagem 3 - A toca de um Hobbit ............................................................................................... 8
Imagem 4 - Sala da casa do filme Parasita ............................................................................... 11
Imagem 5 - Cozinha da casa do filme Parasita ......................................................................... 11
Imagem 6 - Cenário construído para o filme Parasita .............................................................. 12
Imagem 7 - Escadas no filme Parasita ...................................................................................... 12
Imagem 8 - Magnavox Odyssey (1972) ................................................................................... 13
Imagem 9 – Asteroids (1979) ................................................................................................... 14
Imagem 10- Fluxo de Trabalho SCRUM ................................................................................. 15
Imagem 11 - Processo de criação de arte final para uma skin (League of Legends) ............... 17
Imagem 12 - Modelagem de personagem (Death Stranding) ................................................... 17
Imagem 13 - Modelagem de componentes de cenário (Uncharted) ......................................... 18
Imagem 14 - Artes conceituais (Death Stranding) ................................................................... 18
Imagem 15 – Template para criação de níveis no Unreal 5 ..................................................... 20
Imagem 16 - Série de jogos da franquia The Witcher III ......................................................... 21
Imagem 17- Receitas globais de mídia e entretenimento ......................................................... 33
Imagem 18 - Receita global de 2020 por plataformas .............................................................. 34
Imagem 19 - Divisão de público por plataforma ...................................................................... 35
Imagem 20 - Quantidade de horas jogadas ao longo da semana .............................................. 36
Imagem 21 - Divisão de público por classe social ................................................................... 36
Imagem 22 - Frequência com que entrevistados jogam online ................................................ 37
Imagem 23 - Capa promocional de Control ............................................................................. 38
Imagem 24 - Cena de combate dentro do jogo ......................................................................... 39
Imagem 25 - Setores de Control ............................................................................................... 40
Imagem 26 - Ambientes de Control ......................................................................................... 41
Imagem 27 - Semiótica de Pierce aplicada a Control ............................................................... 42
Imagem 28 - Semiótica aplicada aos mapas de Control ........................................................... 43
Imagem 29 - Esquema de concretização da imaginabilidade ................................................... 44
Imagem 30 - Imagem final comum a todos observadores ........................................................ 44
Imagem 31 - Esquema de criação de espaços exteriores positivos .......................................... 45
Imagem 32 - Ferramenta de criação de mapas em Warcraft III ............................................... 47
Imagem 33 - Software gerador de imagens de projetos arquitetônicos (Lumion) ................... 47
Imagem 34 - Engine para criação de jogos (Unreal 5) ............................................................. 48
Imagem 35 - Cena em jogo (DOOM, 1993) ............................................................................. 49
Imagem 36 - Cena em jogo (Red Dead Redemption II) ........................................................... 49
Imagem 37 - Imagem promocional de Assassin´s Creed II...................................................... 50
Imagem 38 - Cena em jogo (Discovery Tour - Assassin´s Creed Odyssey) ............................ 51
Imagem 39 - Mapa de Night City (Cyberpunk 2077) .............................................................. 52
Imagem 40 - Esquema de Layout linear ................................................................................... 53
Imagem 41 - Esquema de Layout em Anel .............................................................................. 54
Imagem 42 - Mapa de Red Dead Redemption II ...................................................................... 54
Imagem 43 - Mapa Mirage de Counter Strike - Global Ofensive ............................................ 55
Imagem 44 - Cena em jogo de The Last of Us 2 ...................................................................... 56
Imagem 45 - Arte Conceitual de The Last of Us 2 ................................................................... 56
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 2
1. ARQUITETURA E ARTE .............................................................................................. 3
1.1. A ARTE CLÁSSICA ............................................................................................... 4
1.2. ARTE CONTEMPORÂNEA ................................................................................... 9
2. JOGOS DIGITAIS ........................................................................................................ 12
2.1. A HISTÓRIA ......................................................................................................... 12
1.1. O DESENVOLVIMENTO .................................................................................... 14
3. PESQUISA .................................................................................................................... 22
3.1. Formulário 1 ........................................................................................................... 22
3.2. Formulário 2 ........................................................................................................... 26
3.3. Formulário 3 ........................................................................................................... 29
4. O MERCADO ............................................................................................................... 32
4.1. NO MUNDO .......................................................................................................... 32
4.1. NO BRASIL ........................................................................................................... 35
5. ESTUDO DE CASO ..................................................................................................... 37
5.1. A EMPRESA.......................................................................................................... 38
5.2. O JOGO .................................................................................................................. 39
5.3. A MECÂNICA ....................................................................................................... 39
5.4. A ARQUITETURA................................................................................................ 40
5.5. A SEMIÓTICA ...................................................................................................... 41
5.6. A IMAGINABILIDADE ....................................................................................... 43
6. AS APLICAÇÕES ........................................................................................................ 45
6.1. OS SOFTWARES .................................................................................................. 45
6.2. A ASSESSORIA .................................................................................................... 48
6.3. O LEVEL DESIGN ................................................................................................ 52
6.4. ENVIROMENT DESIGN ...................................................................................... 55
7. CONCLUSÃO ............................................................................................................... 57
REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 58
APÊNDICES ............................................................................................................................ 60
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INTRODUÇÃO

Ao interpretarmos a Arte como sendo a manifestação da criatividade, somos capazes


de representar o abstrato e até mesmo o inexistente. Entretanto, o profissional de Arquitetura
enfrenta obstáculos mais concretos (se comparados com as demais artes) ao tentar expressar
esse tipo de manifestação, a física por exemplo, cujas leis tornam impossíveis construções que
ousem se comportar de forma irregular e não lógica.
Porém, e se pudéssemos modificar a maneira como a física afeta um objeto? Alterar
as propriedades de um material, suas texturas, sua densidade, seu comportamento, modificar a
gravidade de um ambiente, explorar espaços e pontos de vista nunca experimentados. Essa
possibilidade ainda é considerada improvável com as atuais ferramentas que dispomos, toda-
via, essa limitação se restringe ao mundo como conhecemos hoje, mas com os avanços tecno-
lógicos e desenvolvimento de novas técnicas e formas de arte, esse tipo de abordagem pode
ser aplicado à Arquitetura por meio de outras plataformas, outras artes.
Para que tal experiência possa ser vivenciada, temos de recorrer a meios alternativos
daqueles com o qual a arquitetura concreta e factível é percebida, e ainda que não apresentem
o mesmo nível de imersão, as ferramentas alternativas utilizadas para esse tipo de experiência,
consigam de forma única e individual nos transportar pelo tempo e pelo espaço e nos conce-
der experiências únicas.
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1. ARQUITETURA E ARTE

As primeiras manifestações de arte na história, como a escultura e a pintura sempre es-


tiveram relacionadas com o espaço no qual as pessoas viviam. As pinturas rupestres, por
exemplo, eram realizadas nas superfícies das rochas dos locais onde mesmo que por um curto
período, serviu de abrigo para os homens e mulheres primitivos. Claro que naquele momento
tais gravuras não eram consideradas artes e nem mesmo tinham a mesma intenção que um
artista, ao fazer uma pintura em uma tela, as ferramentas mudaram, as necessidades mudaram
e o contexto mudou. Porém, os locais em que estas pinturas foram eternizadas continuam ten-
do um significado, talvez não sirvam de abrigo para o homem moderno e suas casas ortogo-
nais, mas continuam sendo um lugar de conexão com o passado, em que a presença humana
foi eternizada naquilo que uma vez chamou de “casa”.

Imagem 1 - Pinturas Rupestres

Fonte: História das Artes


Tendo em vista as demais manifestações das artes, ao longo deste capítulo será abor-
dada a relação da arquitetura com a pintura (exemplificado no parágrafo anterior), a literatura,
e o cinema, além disso será estabelecido a forma com que cada uma destas artes, ao longo do
tempo, se desenvolveram e tiveram contato direta ou indiretamente com manifestações arqui-
tetônicas, seja através de obras físicas e visíveis, como também por meio de conceitos teóricos
que envolvem o ser humano e o espaço ao seu redor.
Com o intuito analisar essas relações, serão categorizadas as formas de arte a serem
abordadas de forma temporal, estas serão separadas em Artes Clássicas, aquelas que são resul-
tado direto da interferência “manual” do homem, tendo em vista que ao final de sua concep-
ção são tangíveis e são fruto direto do trabalho manual de seus autores, e as Artes Contempo-
râneas, desenvolvidas somente a partir do século XIX, com o advento da fotografia e seu pos-
terior desenvolvimento para o cinema e demais artes eletrônicas/digitais. Portanto, a classifi-
cação utilizada neste ponto específico do trabalho não diz respeito a uma separação temporal,
mas sim do processo de concepção destas obras.
Para a primeira categoria, Artes Clássicas, serão avaliados os seguintes pontos nas
obras:

• Composição - análise das posições e formas dos elementos arquitetônicos e como es-
tes dialogam com o restante dos ambientes que compõem a obra.
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• Representação - métodos utilizados para transmitir as formas, texturas, cores e demais


aspectos arquitetônicos.
• Relação com o público - de que forma a obra se conecta com o espectador (lei-
tor/observador), e que tipo de experiência esta carrega.

Para a segunda, Artes Contemporâneas, serão avaliados os seguintes pontos:

• Composição - análise de como os elementos se dispõe na visão do público, enquadra-


mento e fotografia das cenas.
• Representação - qualidade da representação visual, levará em conta pontos como a fi-
delidade dá ao representar formas, texturas e cores.
• Relação com o público - de que forma a obra se conecta com o espectador, e que tipo
de experiência esta carrega.
• Relevância - análise da importância de todo o contexto arquitetônico ao desenrolar da
obra, como ela interage com os personagens.

Para realizar a análise, serão escolhidas obras de ambos os períodos que contenham
conteúdo suficiente para se estabelecer uma conexão com o tema abordado. Além disso, serão
aplicados também, conceitos como a Legibilidade e Imaginabilidade, apresentados e discuti-
dos por Kevin Lynch em “A Imagem da Cidade (1960). No caso das artes contemporâneas,
mais especificamente no cinema, serão avaliados filmes como: Parasita (2019, Bong Joon-
ho). Já nas artes clássicas serão abordadas obras como O Hobbit (1937, J. R. R. Tolkien) e
Duna (1965, Frank Herbert).

1.1. A ARTE CLÁSSICA

1.1.1. A PINTURA
A pintura, pode ser interpretada como uma das manifestações mais básicas da criativi-
dade e emoções humanas. Como dito anteriormente, foi a pintura nas cavernas, que nos per-
mitiram compreender com maior precisão, os eventos que antecederam nossa evolução até os
primeiros indícios da formação de uma sociedade. Tendo isto em vista, avançaremos até o
momento com maior número de desenvolvimentos na área da pintura, momento em que pes-
soas dedicavam a maior parte de suas vidas a aprender, entender e melhorar suas habilidades
de representação, o Renascimento.
O período histórico que vai do começo do século XIV ao século XVI é chamado de
Renascimento pois nessa época, os ideais antropológicos existentes na cultura greco-romana
foram retomados e aprimorados em todos os âmbitos da arte, como pintura, arquitetura, escul-
tura, literatura e na ciência.
Após séculos de uma supremacia religiosa que limitava o desenvolvimento das ciên-
cias, estudiosos passaram a questionar e se contrapor aos dogmas estabelecidos pela igreja, e
buscaram na ciência os argumentos que pudessem libertar a sociedade dessa prisão intelectu-
al, isso tudo devido principalmente a substituição do divino e sobrenatural pelo humano e
racional (Proença, 2008). Nesta época várias técnicas foram empregadas na pintura, dentre
elas estão a perspectiva, o estudo de anatomia e o chiaroscuro que tiveram como intenção,
melhorar a representação e a experiência do observador, que agora podia reconhecer aspectos
mais realistas como profundidade, dinâmica e aspectos de iluminação. Em específico, a pers-
pectiva, se mostrou extremamente relevante para todo tipo de representação 2D, uma vez que
é o resultado de estudos matemáticos, sendo utilizada até hoje para a representação de um
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espaço 3D em uma superfície plana. Ao se aprofundar nos estudos da perspectiva, o arquiteto


e escultor renascentista Fillipo Brunelleschi utilizou dessa técnica para realizar representações
das obras das quais era responsável, dando início ao que hoje chamamos de desenhos técni-
cos, foi ele também quem aperfeiçoou e popularizou essa técnica.
Neste período, era mais recorrente se deparar com a utilização da perspectiva de um
ponto, que consiste na visualização de uma cena a partir de seu plano frontal, desde que este
se encontre paralelo ao ponto de fuga, desta forma, todas as linhas que convergem para o pla-
no de fuga podem ser conectadas por linhas verticais criando planos quando não exatos, muito
similares aos planos reais do objeto no mundo real, o que torna a técnica ideal para represen-
tações que requerem maior precisão.
Com o intuito de afirmar que seus estudos funcionavam, Brunelleschi realizou um ex-
perimento no qual utilizou da técnica da perspectiva para pintar um quadro do Baptistério de
S. Giovanni, entretanto a pintura apresentava apenas uma parcela do edifício, em seguida fez
um orifício na tela e posicionou um espelho há uma distância específica da tela. Ao se obser-
var o espelho através do orifício, sempre a partir da mesma posição (afinal a técnica se baseia
na observação a partir de um ponto fixo) o observador podia “encaixar” a imagem da pintura
perfeitamente na imagem real que observava do Baptistério, não só as formas como também
as características de texturas e sombras condiziam perfeitamente com a realidade. Com essa
experiência, o arquiteto provou não somente que se podia representar com exatidão o mundo
ao nosso redor, como também utilizar os desenhos como referência para a construção de edi-
fícios físicos.

Imagem 2 - Experimento de Brunelleschi

Fonte: http://www.webexhibits.org/arrowintheeye/brunelleschi1.html . Acessado em: 03 julho, 2021.

1.1.2. A LITERATURA
Diferente da pintura, que permaneceu sob a ótica classicista até o surgimento das pri-
meiras manifestações impressionistas, em que os artistas romperam com a representação ge-
ométrica difundida até então para fazer uso da representação sensorial, a escrita sempre foi
capaz de expressar o mais variado tipo de conteúdo, indo desde o registro de acontecimentos e
estudos, até a criação de histórias e fábulas. De acordo com Aristóteles no seu livro “A poéti-
ca”, existem 3 tipos de gêneros literários, os quais chamamos hoje de “gêneros clássicos”, são
eles, Lírico, Épico e Dramático, porém com uma breve pesquisa após os mais de 2 (dois) mil
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anos após a morte de Aristóteles, fica evidente que essa classificação já não aborda todos os
gêneros literários desenvolvidos até hoje.
Tendo em vista o contexto deste trabalho, abordaremos os textos literários, em especí-
fico os gêneros de Romance, Conto e Crônica, sendo esses, gêneros que abordam histórias
fictícias ou baseadas em fatos e acontecimentos históricos, desenvolvidas a partir da imagina-
ção e experiências de seus autores.
Para que o leitor possa “visualizar” os ambientes idealizados pelos autores, é necessá-
ria uma combinação entre referências, criatividade e descrição que tornam a experiência de ler
única para cada leitor. No livro Duna (1968) de Frank Helbert, o autor descreve uma cena da
seguinte forma:

Ele se levantou, observando o lugar: uma área larga e profunda


com um teto abobadado e pouco mais alto do que um homem com a mão
levantada...Jessica encontrou-se olhando para fora, através de uma larga
abertura na caverna. Uma abertura situada num ponto alto da parede do
penhasco. Olhava em direção a outra depressão, com aproximadamente
doze quilômetros de largura, protegida por altas paredes rochosas. Tou-
ceiras esparsas de plantas distribuíam-se à sua volta.

Para contextualizar, na passagem destacada, o autor descreve um esconderijo utilizado


pelos nativos de um planeta hostil chamado Arrakis (Duna), no qual mãe (Jéssica) e filho fo-
ram acolhidos. Ao ler esse trecho, criamos uma imagem em nosso cérebro a partir da descri-
ção do autor, esta imagem é elaborada a partir de nossas referências e experiências pessoais,
reunindo tudo aquilo com o qual já tivemos contato, seja direta ou indiretamente e tudo ao
qual essa fonte de informação estava associada. Entretanto, devido a escassez de detalhes for-
necidos pelo autor, até mesmo as palavras chaves como, teto abobadado, abertura na caverna
e altas paredes rochosas compõem uma imagem pouco detalhada que não nos indica fatores
como cores, temperaturas ou nem mesmo locação espacial, a qual em uma comparação livre,
se assemelha á uma tela impressionista, na qual a primeira vista, possa parecer apenas um
conjunto de cores, texturas e pinceladas dispostas de forma aleatória e sem aparente precisão.
Todavia, por mais aleatórias e indiferentes que sejam, se observadas de longe e como um to-
do, compõem uma cena única e uniforme. Neste caso em específico, o leitor que já está con-
textualizado em meio ao livro, pode formar uma imagem virtual mais complexa do que o lei-
tor que teve contato apenas com o trecho destacado, mas ainda sem detalhes precisos para
compor, por exemplo, uma representação realista da cena.
Ainda que os livros de Frank Herbert tenham foco no desenvolvimento de conflitos
sociais, econômicos e religiosos e sejam inspirados em acontecimentos históricos, sua obra
deixa a desejar quando se trata da descrição da arquitetura e seus ambientes, muito contrário
da obra de John R. R. Tolkien, que mesmo tendo criado todo um universo fictício que serviu
de base para a maioria das histórias de fantasias existentes hoje, descreve nos mínimos deta-
lhes a maioria das passagens de suas histórias. No trecho,

Numa toca no chão vivia um hobbit. Não uma toca nojenta,


suja, úmida, cheia de pontas de minhocas e um cheiro de limo, nem
tampouco uma toca seca, vazia, arenosa, sem nenhum lugar onde se sen-
tar ou onde comer: era uma toca de hobbit, e isso significa conforto.
Ela tinha uma porta perfeitamente redonda feito uma escoti-
lha, pintada de verde, com uma maçaneta amarela e brilhante de latão
exatamente no meio. A porta se abria para um corredor em forma de
tubo, feito um túnel: um túnel muito confortável, sem fumaça, de pa-
redes com painéis e assoalhos azulejados e acarpetados, com cadeiras
enceradas e montes e montes de cabideiros para chapéus e casacos - o
hobbit apreciava visitas. O túnel seguia em frente, continuando quase
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(mas não totalmente) em linha reta pela encosta da colina… e muitas


portinhas redondas se abriam a partir dele, primeiro de um lado e de-
pois de outro. Nada de segundo andar para o hobbit: quartos, banhei-
ros, adegas, despensas (muitas dessas), armários (ele tinha cômodos
inteiros dedicados a roupas), cozinhas, salas de jantar, todos ficavam
no mesmo andar e, de fato, na mesma passagem. Os melhores cômo-
dos estavam todos do lado esquerdo (de quem entrava), pois esses
eram os únicos a ter janelas, janelas fundas e redondas que davam pa-
ra o jardim dele e para os prados mais distantes, que desciam até o rio.

O autor descreve (no primeiro parágrafo do livro) a casa do personagem principal de


seu livro O Hobbit, publicado pela primeira vez em 1937. A descrição do autor é minuciosa
em certos aspectos, mas o propósito dessa descrição tão bem-feita se esconde entre suas li-
nhas, pois ao relatar aspectos e acrescentar comentários, Tolkien não somente nos desenha
uma imagem do local como também da personalidade e hábitos de seu morador. Este tipo de
recurso implícito do qual o escritor utiliza está presente em toda a sua obra, e apesar de se
tratar de uma alta fantasia, são muitas as referências à realidade (principalmente a vivida pelo
autor, na primeira metade do século XX), em diversos momentos podemos traçar paralelos
não somente na história, como também na arquitetura inventada por Tolkien, que utiliza de
características similares a estilos arquitetônicos já existentes para que o leitor, ao perceber as
semelhanças, faça de forma inconsciente uma ligação entre as características sociais, econô-
micas e culturais do estilo original.
Como apontado no artigo Lições de J.R.R. Tolkien para arquitetos (“J.R.R. Tolkien’s
Lesson for Architects”, INVOLVED, 2019), apesar de qualquer pessoa com imaginação e
vontade ser capaz de criar um universo totalmente original, Tolkien foi além, pois sua obra
apesar de ser fictícia incorpora elementos reais de nosso mundo, que são especificamente
moldados para se encaixarem na história e universo criado pelo autor. Além disso, diferente
de autores como Frank Herbert, ao detalhar cenas e tudo que as compõem, estas se tornam
senão iguais muito semelhantes para todos os leitores, independentemente de suas referências
pessoais, desta forma, o conjunto de descrições minuciosas, referências reais e universo fan-
tástico tornam os ambientes (bem como personagens, cultura e línguas) criados pelo autor,
altamente imersivos, contribuindo para a criação de ambientes virtuais na imaginação de to-
dos.
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Imagem 3 - A toca de um Hobbit

Fonte: O Hobbit (1934)

1.1.3. O TEATRO
Apesar de ser um ambiente arquitetônico por si só, os teatros abrigam uma terceira
forma de representação dos espaços, enquanto na pintura e literatura temos a possibilidade de
explorar espaços quase infinitos, que se limitam apenas pela vontade de seu autor, o teatro
possui limitações físicas que exigem inovação na hora de representar lugares e momentos
diferentes.
Quando falamos de uma pintura ou uma obra literária, é esperado que pensemos em
uma tela e um livro respectivamente, visto que ao longo dos anos a pintura e a literatura con-
tinuaram ligadas aos seus principais meios de circulação, mesmo que com poucas variações
devido a disseminação de informação ao redor do mundo. Já o teatro, é relativamente livre
neste aspecto, o ato de encenar pode ser realizado independentemente do meio em que o autor
esteja inserido, tendo em vista que seu “meio de circulação” é o indivíduo e não um objeto.
Entretanto, para que possamos assistir a uma apresentação teatral, uma série de fato-
res se repetem ao longo dos mais variados tipos de teatros, por exemplo, é criada uma separa-
ção (não necessariamente física) entre plateia e atores, de forma que quem observa a peça
consiga identificar os limites do ambiente virtual criado naquela obra. Aí está a maior diferen-
ça entre este tipo de manifestação e as demais artes abordadas até agora, a limitação física
imposta pelo palco torna necessária a utilização de objetos (decoração, iluminação, texturas e
música) que colaborem para a criação de um “ambiente físico-virtual”, que é a representação
física de um ambiente que não existe, ou que não pode ser representado de maneira fidedigna,
devido à limitação espacial do palco.
Estes ambientes físico-virtuais são chamados de cenários dentro do meio teatral, sendo
de extrema importância para passar informações sobre o contexto em que um personagem de
uma peça esteja inserido. É comum encontrar cenários construídos a partir de objetos reais,
mas assim como na pintura pré-renascentista, onde o importante era o símbolo e a mensagem
que se desejava transmitir, também é possível encontrar cenários que utilizam de objetos sem
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escala real, que servem apenas para situar os atores em relação à um ambiente. Por exemplo,
se em um determinado momento de uma peça os personagens estejam em uma torre, é inviá-
vel a utilização ou até a construção de uma torre em tamanho real dentro do ambiente limitado
pelo palco, desta forma o cenário utiliza de seu simbolismo para retratar esta torre, seja cons-
truindo uma torre sem proporções reais ou em alguns casos, a utilização de pinturas em gran-
des tecidos dispostos atrás dos personagens (com exceção de anfiteatros).

1.2. ARTE CONTEMPORÂNEA


1.2.1. A FOTOGRAFIA
Não se pode definir ao certo quando a fotografia foi inventada, pois até mesmo a ideia
de se capturar um momento ou imagem através de um dispositivo retoma séculos atrás na
Grécia antiga com Aristóteles e a projeção de imagens nas cavernas, e avança até hoje em dia
em que todos que possuem um celular, são capazes de fazer o registro de um momento com
resoluções cada vez maiores.
O registro da primeira fotografia data no ano de 1826, realizado por Joseph Niépce,
que utilizou da luz solar para gravar, em uma chapa, um composto químico conhecido como
betume da Judeia. Entretanto, Joseph não era o único que tinha interesse em desenvolver essa
técnica, e juntamente a Louis Daguerre conseguiram aprimorar o processo de registro, dimi-
nuindo o tempo necessário para fixação do material na chapa para 30 minutos, que embora
fosse muito menor que o tempo original necessário para a captura, continuava sendo difícil
fazer a captura de pessoas ou acontecimentos.
Enquanto Daguerre aprimorava seu método, o inglês William Henry Fox Talbot de-
senvolvia outro método para a captura de imagens, o Calótipo, que utiliza de um negativo que
quando exposto a uma solução de hipossulfito de sódio e ao secar registrava a imagem no
papel, este processo é muito semelhante ao de revelação que utilizamos atualmente, além de
ter um amplo alcance nos tons de cinza também permitia a criação de cópias.
As máquinas fotográficas continuaram evoluindo, sempre utilizando de novos proces-
sos ou aprimorando os já existentes. Não distante dos dispositivos, a fotografia em si, também
evoluiu, pois passou a chamar a atenção de artistas que viam na fotografia um novo tipo de
manifestação, um novo tipo de arte. Assim, o uso da fotografia passou a ser amplamente ex-
plorado, resultando na profissão de fotógrafo/a e suas especializações, foram desenvolvidas
técnicas e processos que elevaram as fotografias ao patamar de verdadeiras obras de arte, pois
assim como as pinturas (inclusive em maior fidelidade), transmitem emoções, comovem e
transmitem significado, além de servirem como registro visual da nossa história.
Nos dias de hoje, a fotografia e a Arquitetura podem trabalhar em conjunto para captu-
rar o que não pode ser explicado em palavras e levar para pessoas nos mais diversos locais
obras que anteriormente seriam conhecidas apenas por descrições (como na literatura) ou re-
presentativamente (como na pintura). O fotógrafo especializado em arquitetura, urbanismo e
interiores busca capturar os sentimentos que apenas quem já visitou a obra pôde sentir, para
isso, ele procura sempre os ângulos e composições com maior imaginabilidade* já que essas
imagens são as mais passíveis de gerar identificação para com os observadores, além disso,
aspectos como iluminação, espaço, texturas e movimentos também precisam ser transmitidos
para o espectador. Além disso, no atual contexto profissional, a fotografia se torna uma im-
portante ferramenta na divulgação e propaganda dos projetos de arquitetos, no mundo alta-
mente visual em que vivemos, no qual as pessoas possuem o poder do registro fotográfico na
palma das mãos, é de extrema importância a experiência e conhecimento de um profissional
especializado neste tipo de serviço.
10

1.2.2. O CINEMA
A sétima arte, surgiu - assim como a fotografia- a partir de “experimentos científicos”,
sendo antes de qualquer conceito posteriormente agregado, a exibição de imagens (fotos) de
forma sequenciada, a fim de se obter o efeito visual de movimento. Porém, com o passar dos
anos, e aprimoramento de suas ferramentas os produtos gerados a partir desta técnica passa-
ram a ser consideradas obras de arte, e isto se deve não só ao fato de sua popularização - a
ponto de se tornar uma das formas mais essenciais de entretenimento - como também devido
ao fato de que pessoas passam a vida em busca de aprimorar suas habilidades e criar “filmes”
(todas as mídias visuais relacionadas ao cinema) que possam conversar e gerar sensações no
espectador, assim como uma pintura o faz.
O cinema, assim como as demais artes, possuem o poder da criação, mas se na literatu-
ra somos levados a imaginar e desta forma, criar nossas próprias ideias daquilo que é descrito,
no cinema tudo nos é fornecido visualmente. A capacidade que o cinema possui, de simular a
realidade através da captura de imagens, e posteriormente, reproduzi-las em outras circuns-
tâncias, em outros lugares e outros tempos é o que torna única a experiência de se assistir a
um “vídeo”. Muito além da simples filmagem do mundo como é, o cinema nos permite trans-
formar a liberdade do teatro, de seus roteiros, cenários, figurinos e demais aspectos que são
limitados apenas pelo espaço físico de apresentação, em experiências audiovisuais que ficam
sobre a linha que separa imaginação de realidade.
Para os grandes artistas deste meio, filmar algo vai muito além do que a simples captu-
ra daquilo na frente das lentes, fazer um filme - que pode ser considerado o principal produto
desta arte - está ligado a experiência do espectador, quais emoções e sensações este terá ao
contemplar a obra, e para isso, muitos autores recorrem a técnicas e recursos desenvolvidos
especificamente para gerar estas sensações. Alguns filmes são capazes até mesmo de nos
transmitirem informações não explícitas, apenas pelo movimento da câmera, pela iluminação,
pela paleta de cores ou até mesmo, pelo cenário. Este último possui papel muito importante
para a contextualização das cenas e história - assim como no teatro - já que algumas informa-
ções só nos são fornecidas a partir dele, como a localização, temporal e física, que por si só já
nos permitem complementar as demais informações necessárias a partir de dados que guar-
damos ao longo de nossas vidas.
Em um filme, a arquitetura pode assumir diferentes papéis, podendo servir apenas de
cenário, no qual os personagens estão inseridos e a história pode acontecer independentemen-
te do local em que se passe, em outros casos, a arquitetura pode se tornar personagem princi-
pal do filme, estando não apenas ligados diretamente ao foco da história como também do
desenvolvimento dos personagens. Também existem aqueles filmes, em que a arquitetura é
utilizada em segundo plano, mas sem ser figurativa, sendo crucial para a transmissão de in-
formações não explícitas, contribuindo para a história tanto quanto qualquer outro persona-
gem.
Um exemplo do segundo caso, em que a arquitetura por si só é um personagem do
filme, está no filme vencedor do Oscar de melhor filme de 2020, Parasita (2019), dirigido
pelo cineasta sul-coreano Bong Joon-ho. O filme se passa em sua maior parte em uma mansão
num bairro de classe alta fictício, que foi projetada especificamente para a filmagem do filme,
embora tenha sido construída apenas o andar térreo, sendo o segundo pavimento construído
em estúdio.
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Imagem 4 - Sala da casa do filme Parasita

Fonte: https://revistacasaejardim.globo.com/Casa-e-
Jardim/Arquitetura/noticia/2020/01/parasita-casa-do-filme-foi-criada-
especialmente-para-o-set-de-filmagens.html. Acesso: 28 outubro 2021

O diretor explica, que pelo filme se tratar de uma metáfora sobre a luta de classes tra-
vada na Coréia do Sul, este, tentou traduzir nas locações o conceito de que sua posição na
hierarquia de classe definirá a quantidade de iluminação natural que você terá ao longo do dia.
Para representar este conceito, o cenógrafo do filme, Lee Ha Jun escolheu um terreno que
pudesse aproveitar por maior período de tempo a iluminação natural, de modo que é possível
identificar pelas filmagens, que a casa está inserida no topo de um terreno, acima de uma co-
lina e que possui diversas aberturas para o exterior maximizando a quantidade de luz dentro
da casa.
Enquanto isso, a casa da família mais pobre foi construída em estúdio, devido a neces-
sidade de simulação de uma inundação em determinado ponto do filme. O diretor explica que
para esta casa, manteve a proposta de locação utilizada na casa oposta, porém invertendo os
princípios. Se a mansão da família mais afortunada era bem iluminada e situada do topo de
uma colina, a casa destinada a classe inferior se insere em um nível abaixo do nível da rua,
possuindo apenas um acesso de pedestre, e uma ou duas janelas que permitem a entrada de luz
solar por poucas horas do dia.

Imagem 5 - Cozinha da casa do filme Parasita

Fonte: https://revistacasaejardim.globo.com/Casa-e-
Jardim/Arquitetura/noticia/2020/01/parasita-casa-do-filme-foi-criada-especialmente-para-o-
set-de-filmagens.html. Acesso em 28 outubro 2021
12

Imagem 6 - Cenário construído para o filme Parasita

Fonte: 1https://revistacasaejardim.globo.com/Casa-e-
Jardim/Arquitetura/noticia/2020/01/parasita-casa-do-filme-foi-criada-
especialmente-para-o-set-de-filmagens.html. Acesso em 2, outubro de
2021

Além destes fatores, o diretor também utiliza de escadas para elaborar a constante me-
táfora de luta de classes, simbolizando para os personagens sua ascensão e queda em meio ao
cenário caótico.

Imagem 7 - Escadas no filme Parasita

Fonte: Parasita (2019)

2. JOGOS DIGITAIS

2.1. A HISTÓRIA

O mundo dos jogos eletrônicos começou a dar seus primeiros passos ainda na década
de 1940 com o uso de monitores de osciloscópios, porém eram apenas uma replicação de jo-
gos de mesa clássicos como jogo da velha, damas e xadrez. Porém, o desenvolvimento e até
13

mesmo o conhecimento sobre os primeiros experimentos com jogos era restrito aos universi-
tários e professores, que desenvolviam pesquisas dentro das universidades sobre as possíveis
aplicações para todas as inovações tecnológicas da época, além disso, isto passou a se tornar a
diversão dos alunos, que começaram a disseminar as máquinas entre os amigos e acabaram
por criar as primeiras comunidades de gamers (termo em inglês que possui conotação especí-
fica para se referir a pessoas que jogam jogos digitais).
Só na década de 1970 o mundo dos videogames começa a alcançar o público geral, e
os Arcades (máquinas que funcionam com fichas) passam a chamar grande atenção da popu-
lação mais jovem e da indústria tecnológica. Ainda em 1972, o primeiro console doméstico
passa a ser comercializado, o Magnavox Odissey, desenvolvido pelo alemão naturalizado nor-
te americano Ralph Baer, contava com o uso de baterias e não possuía nenhum tipo de emis-
sor sonoro, e fez sucesso suficiente para que novas versões fossem lançadas nos anos seguin-
tes.
Imagem 8 - Magnavox Odyssey (1972)

Fonte: https://www.dci.com.br/tecnologia-e-games/historia-do-
videogame/4270/. Acessado em 5 abril de 2021

Ao final da década de 1970, a marca Atari já havia se estabelecido como absoluta na


indústria de jogos e consoles domésticos com o Atari VCS 2600, e jogos como Space Inva-
ders e Asteroids, já entravam para a história dos videogames sendo os jogos mais populares
da época. Asteroids apresentou o primeiro vislumbre sobre como a competitividade nos jogos
poderia ser explorada, ao incorporar em sua programação um placar com os jogadores de me-
lhor pontuação, que fazia com que os jogadores passassem horas em frente aos arcades ten-
tando aumentar suas pontuações.
Ao analisar a temática e o tipo de jogo que vinha sendo desenvolvido e fazendo enor-
me sucesso, é possível identificarmos algumas coisas sobre o que acontecia na sociedade na-
quela época, principalmente nas grandes potências, como Estados Unidos e Japão, que eram
os maiores fabricantes de videogames por anos, e a Guerra Fria que apesar de todos os pro-
blemas que gerou, foi responsável por imensos avanços tecnológicos, que foram a base para
os hardwares utilizados na criação dos consoles e demais formatos de jogos, além disso as
temáticas espaciais coincide com os ideais presentes no imaginativo que a sociedade nutria
nessa época, com promessas de um futuro altamente tecnológico. Não à toa, a publicidade dos
consoles domésticos tinha foco na inserção de jogos nos lares das famílias de acordo com o
estilo de vida suburbano altamente materialista da época.
14

Nos anos seguintes a temática espacial dos jogos se tornou saturada, e foi então que
surgiu um dos maiores clássicos de todos os tempos, e que continua sendo um símbolo dos
jogos até mesmo para a parte da população que nunca jogou, o Pac-Man. Desenvolvido pela
empresa japonesa Namco, foi feito com a intenção de atrair todas as faixas etárias, e foi o
primeiro jogo a apresentar um protagonista com o qual todos poderiam se identificar, o que
possibilitava o uso deste em propagandas mais abrangentes, que levaram a popularização do
jogo em todos os meios.
Tendo introduzido o começo da longa caminhada dos videogames até o ponto em que
se encontram hoje, esta seção de estudo terá como foco mostrar ao leitor a relevância dos jo-
gos na nossa sociedade e mostrar o potencial que continuam carregando desde seus primeiros
protótipos, e não só comercialmente, eles possuem grande potencial educacional. Para tal,
serão apresentados ao longo deste capítulo diversos estudos, que apontam o impacto que os
jogos possuem, tanto positivos quanto negativos, nos usuários e principalmente na sociedade.

Imagem 9 – Asteroids (1979)

Fonte: Level Skip

1.1. O DESENVOLVIMENTO

Neste capítulo será apresentado de forma sucinta como é o processo que dá origem aos
jogos, mais especificamente os criados a partir de 2000 (2 gerações de consoles atrás) que
fazem uso das mesmas metodologias e tecnologias atualmente usadas para o desenvolvimento
de jogos. Além disso, serão apresentados os cargos e funções existentes dentro de uma desen-
volvedora, além das metodologias de trabalho mais recorrentes e todas as etapas existentes até
a obtenção do produto final.
Para que um jogo possa ser desenvolvido é necessário estabelecer as premissas básicas
do jogo, tais como; para quais plataformas o jogo será lançado, o que na maioria das vezes
depende de quais empresas vão fazer a venda do jogo para seus consoles (é muito comum
dentro da indústria de jogos, que as próprias empresas façam parcerias com as desenvolvedo-
ras para obter exclusividade sobre o lançamento de um jogo, ou como será explicado no capí-
tulo “4. O MERCADO” (pág:40) desenvolver seus próprios jogos); qual será a linguagem ou
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engine (software de programação já “adaptado” para o desenvolvimento de jogos, que remove


do processo a necessidade de se escrever os códigos fontes do software desde o início, eco-
nomizando grande quantidade de tempo); quais serão as publicadoras e distribuidoras (este
ponto não é via de regra para todos os casos, um exemplo são os jogos indies, que são os jo-
gos desenvolvidos de forma independente, sem o intermédio de uma publicadora); o público
alvo do jogo; por último mas talvez o mais importante, o conceito do jogo.
Empresas que trabalham desenvolvendo softwares regulares, utilizam metodologias de
trabalho cíclicas, que utilizam o princípio de etapas (geralmente pré-estabelecidas), como o
método de desenvolvimento “Cascata”, no qual geralmente só se é possível avançar para uma
nova etapa, depois da finalização total da anterior, o que acaba por engessar o processo, sendo
aplicada geralmente para projetos mais previsíveis com datas e marcos programados. Já as
desenvolvedoras de jogos tendem a utilizar métodos de gerenciamento mais ágeis como o
SCRUM, que partem do princípio de feedbacks rápidos, no qual os avanços de uma equipe
são levados a teste pelas demais, de forma que os problemas tenham de ser resolvidos enquan-
to o processo continua, o que garante ao projeto uma alta maleabilidade e renovabilidade,
além de não impor um formato padrão na qual todos os passos devem ser seguidos de acordo
com o descrito, o que possibilita sua aplicação nos mais diversos casos.
No SCRUM, para que um produto possa ser entregue, é necessário que se faça pri-
meiramente, uma lista dos objetivos principais (Product Backlog) a serem realizados pelas
equipes juntamente ao Product Owner que geralmente é quem estabelece uma conexão entre
todas as equipes e o “cliente”, em seguida é realizada uma reunião prévia chamada de Sprint
Planning Meeting no qual serão discutidos os métodos e ferramentas a serem utilizados para a
realização das tarefas, a partir desta reunião é gerada uma versão resumida da primeira lista,
na qual são escolhidas as tarefas com maior urgência e/ou importância a serem realizadas em
primeiro momento no Sprint (fase de trabalho que dura em média de 2 à 4 semanas), ao longo
dessa etapa são realizadas breves reuniões diárias para “inspeção” das atividades realizadas no
dia anterior, com intuito de sanar possíveis dúvidas e problemas encontrados, o responsável
por liderar,analisar e auxiliar uma equipe em específico (Development Team) é o Scrum Mas-
ter. Após a análise final do produto (neste caso, do marco do jogo) é realizada a reunião de
Sprint Review que nada mais é do que o feedback dos testadores/clientes. E por final, antes de
se dar continuidade com a realização das tarefas, é realizada uma reunião de retrospectiva,
onde são analisados os pontos positivos e negativos apontados durante o Sprint anterior.
Imagem 10- Fluxo de Trabalho SCRUM

Fonte: https://pt.slideshare.net/mhoogveld/scrum-overview-by-mark-hoogveld-17157844. Acessado em


03, setembro de 2021
16

Além disso, as metodologias de gerenciamento ágeis priorizam a utilização de escritó-


rios físicos, com intuito de tornar as relações entre os funcionários mais pessoal e imediato, o
que faz delas, ideais para o processos de desenvolvimento de jogos, nos quais as equipes
mencionadas anteriormente, precisam realizar trocas de informações de forma contínua, para
poderem adaptar e melhorar seus trabalhos de acordo com os feedbacks das demais equipes
que impactam ou serão impactadas pelo seu trabalho.
Geralmente os integrantes de uma desenvolvedora de jogos são divididos em equipes
de acordo com suas funções e habilidades, embora não seja uma regra. Entre as divisões mais
comuns, estão as equipes de:

• Programadores - Encarregados pela linguagem de programação e engine do jogo, são


eles quem criam os conjuntos de ação e reação do jogo. Ex: geram os códigos fonte
que farão o efeito de gravidade dentro do jogo.
• Artistas - São encarregados de todo o visual do jogo, dependendo da complexidade e
proposta do jogo, costumam ter o maior número de funcionários entre todas as equi-
pes. Podem ser artistas gráficos, desenhistas, modeladores 3D etc.
• Designers - Geralmente ocupam posições de liderança nas equipes. São os responsá-
veis por gerar a identidade do jogo, desde o conceito às limitações do gameplay. Além
disso, podem ser incluídos nesta equipe, porém com clara diferença de funções, os
produtores, engenheiros de som e diretores.
• Testadores - São encarregados de testar e “irritar” os jogos ao limite, com intuito de
achar possíveis defeitos de softwares (bugs)

Como descrito acima, as equipes funcionam para separar os funcionários de acordo


com suas funções e habilidades. A seguir, será explicado um pouco sobre os cargos mais co-
muns nas desenvolvedoras, sendo importante lembrar que não é via de regra que para se de-
senvolver um jogo, seja necessário que todos estes cargos sequer existam dentro de uma em-
presa, sendo muito mais importante que o conhecimento necessário para cada etapa de traba-
lho esteja diluído entre os envolvidos. Também é válido lembrar que dependendo da plata-
forma para a qual o jogo esteja sendo desenvolvido, as metodologias e processos podem so-
frer alterações, já que as limitações de cada plataforma são diferentes, impactando diretamen-
te no planejamento e ferramentas utilizadas para o desenvolvimento.

• Level Designer (Designer de level): Pode ser tratado como o diretor do jogo, embora
muitas desenvolvedoras possuam pessoas em ambos os cargos. Este costuma ser o lí-
der geral durante todo o processo, é ele quem faz com que as equipes trabalhem em
conjunto mesmo que estejam em etapas diferentes, é também, quem traduz para todos
os integrantes os conceitos abordados pelo jogo, desde a premissa da história ao códi-
go e as equipes de propaganda. Espera-se de um Level Designer amplo conhecimento
em todas as áreas e processos, de forma que não necessariamente precisa saber deta-
lhes específicos dos trabalhos de cada um, mas que possua conhecimento suficiente
para a gestão de cada etapa.
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• Artista 2D - Inicialmente (nos primeiros jogos) este era o responsável por toda a parte
gráfica do jogo, como interface, personagens, fases, animações e etc. Todavia, com o
passar dos anos e o aprimoramento das tecnologias utilizadas durante a criação dos jo-
gos, as artes “dentro” do jogo começaram a ser tridimensionais e este trabalho ficou
para os modeladores 3D. Hoje em dia muitos jogos voltaram a utilizar as artes bidi-
mensionais, principalmente devido a facilidade de utilização destas, por não exigirem
trabalhos muito complexos na parte de programação e seguir um fluxo básico de so-
breposição de frames, o que permite que desenvolvedores independentes possam criar
a arte de seus jogos com equipes muito menores e até mesmo amadoras.

Imagem 11 - Processo de criação de arte final para uma skin (League of Legends)

Fonte: Bo Chen - Ilustrador Senior na Riot Games


• Artista 3D - São principalmente, modeladores, pois utilizam de softwares de modela-
gem tridimensional para criar tudo que é visto em jogo, desde objetos que compõem o
cenário, armas e objetos utilizáveis, o próprio cenário e os personagens do jogo. São
responsáveis por transformar os desenhos conceituais em modelos aplicáveis ao jogo.
Estão sempre alinhados com os demais departamentos de arte como os animadores e
os responsáveis pelos efeitos visuais, pois ambos trabalham com o produto gerado pe-
lo artista 3D.
Imagem 12 - Modelagem de personagem (Death Stranding)

Fonte: http://www.kojimaproductions.jp/en/death_stranding.html. Acessado em 4, setembro de 2021


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Imagem 14 - Modelagem de componentes de cenário (Uncharted)

Fonte: 2https://www.artstation.com/artwork/688B5N. Acessado em 26, setembro de 2021

• Concept Artist - Como toda mídia, os jogos começam com uma ideia (conceito) seja
do level designer ou do próprio “criador”, e para que seja possível dar início ao desen-
volvimento é necessário antes de tudo que toda equipe esteja alinhada sobre o que fa-
zer com o jogo, e é aí que entra o Artista Conceitual, ele é quem passará para o mundo
real aquilo que está somente na ideia dos desenvolvedores. É muito comum que este
trabalhe apenas com imagens 2D devido ao alto número de alterações que as primeiras
ideias tendem a ter, embora sejam essas imagens que serviram de base para os demais
artistas trabalharem, sejam eles 2D ou 3D.
Imagem 13 - Artes conceituais (Death Stranding)

Fonte: 3Death Stranding ArtBook (2020)


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• Programador - Não muito diferente do que o próprio título sugere, este é quem está
por trás da funcionalidade do jogo. É ele quem faz com que os botões apertados pelos
jogadores (ou toques na tela) sejam interpretados e gerem consequências dentro de jo-
go. Atualmente existem diversas ramificações para os programadores somente dentro
de uma desenvolvedora de jogos, sem falar em todos os setores dependentes de tecno-
logia, por isso são também os mais procurados pelo mercado. Até alguns anos atrás o
trabalho realizado por eles era extremamente complexo, e necessitava de longas horas
e linhas de programação para a confecção de um first playable (marco do jogo em que
se possa realizar o primeiro teste com os jogos), entretanto com a disseminação das
engines prontas, o trabalho pode ser feito de forma muito mais simples, sendo possível
que este só implemente ou modifique os códigos fontes de acordo com o almejado.

Além destes cargos, também existem aqueles já conhecidos dentro da indústria de mí-
dia e entretenimento, como os roteiristas, editores de som, editores de vídeo, os produtores
(cargo de extrema importância nas empresas já estabelecidas no mercado), e os designers, que
são responsáveis por grande parte do trabalho visual do jogo seja in game (durante a jogabili-
dade) quanto fora deste, como a interface de usuário, o HUD (Heads-up Display; interface
ativa durante o jogo, como barra de vida, energia, munição e etc). Não obstante dos progra-
madores, existem os demais cargos ligados a tecnologia que os jogos atuais exigem, como os
operadores de servidores, analistas de dados, engenheiros e analistas de sistemas e softwares,
engenheiros de rede e os mais específicos, como as aplicações a determinados modos de jogo,
como Co-op (jogos cooperativos) e on-lines que exigem uma infraestrutura a parte para que
possam rodar de maneira aceitável.
Com os conceitos definidos, uma equipe estabelecida e os trabalhos iniciados é co-
mum que seja decidido juntamente (ou exclusivamente) com os produtores e publicadoras, os
marcos do jogo. Estes marcos servem como entregas da equipe de desenvolvimento, e costu-
mam apresentar as funcionalidades e avanços realizados ao longo do tempo, desde as mais
simples, como movimentação dos personagens, interação com objetos e física, até o ponto
jogável com todas as funcionalidades e interfaces. Os marcos são geralmente utilizados para
se estabelecer um meio de validação por parte da publicadora e produtores do trabalho desen-
volvido, visto que por ser um trabalho que costuma demorar anos para ser finalizado, é neces-
sário que sejam apresentados os resultados dos trabalhos de forma recorrente. É válido lem-
brar que os marcos (milestones) variam de acordo com projeto (jogo) e de acordo com a pu-
blicadora ou produtora, sendo muito comum que fique acordado entre estes e os desenvolve-
dores que a cada marco estes sejam pagos. Como descrito no The Games Production Handbo-
ok (Manual de produção de jogos) no caso de jogos padrões com desenvolvimento previsto de
até dois anos, podem ser estabelecidas metas básicas para as entregas, como:

• First Playabe - serve como amostra do jogo para os produtores, utiliza de elementos
básicos e regularmente mais simples, sem muitos detalhamentos e texturas, além de se
optar por modelos low poly (poucos polígonos, tipo de modelo tridimensional que não
exige muito do hardware). Geralmente apresentam protótipos das mecânicas básicas
que farão parte do jogo bem como os elementos gráficos de cenário.
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Imagem 15 – Template para criação de níveis no Unreal 5

Fonte: Acervo do autor.

• Alpha - estágio do jogo em que todas as funcionalidades já foram implementadas. Ser-


ve como marco para uma prévia do jogo, geralmente utilizada para avaliar o código
fonte e revisar os detalhes, ainda estando sujeito a modificações.
• Code Freeze - é o marco no qual todo desenvolvimento de conteúdo é pausado e as
equipes de teste e programadores (outras equipes também podem vir a participar) são
encarregados de encontrar e resolver possíveis bugs (erros no código). Apesar de tra-
tado como um marco, pode ser utilizado como uma etapa recorrente ao longo da reali-
zação de uma tarefa complexa e demorada.
• Beta - é o momento em que o jogo já não apresenta (ou não deveria) bugs que impe-
çam com que ele seja jogado de maneira completa, além de não serem adicionados
mais conteúdo. Neste momento o jogo está praticamente pronto.
• Code Release - é a versão final que é enviada para produtoras e publicadoras, bem
como testadores finais.
• Gold Master - É o jogo final utilizado para a produção em larga escala deste, por isso
é o jogo final, que chegará aos consumidores.

Assim como nas demais mídias de entretenimento é comum que sejam feitas campa-
nhas de divulgação com artes finais já aprovadas do jogo, bem como a divulgação de crono-
gramas contendo a data de lançamento e assim por diante, podendo ser elencada como um
marco por si só. Entretanto, é comum (embora seja uma má prática) que jogos com grandes
expectativas de lançamento e que possuam muitos investidores sofram pressão para o lança-
mento e finalização do jogo, que acaba resultando no prolongamento da jornada de trabalho
das equipes de desenvolvimento, esse período de trabalho a mais é chamado de “crunch time”
e costuma ser compensado no marco de pós-produção. Não distante, também ocorrem casos
contrários em que a pressão dos investidores e público leva o jogo a ser lançado ainda sem
uma correção apropriada de bugs para que o jogo seja considerado um Gold, como o caso de
Cyberpunk 2077, que teve a primeira data de lançamento definida para 16 de Abril de 2020,
sendo prorrogada mais três vezes até seu lançamento oficial no dia 10 de Dezembro do mes-
mo ano, sendo alvo de severas críticas por parte dos jogadores que compraram o jogo em pré-
21

venda, devido ao fato do jogo conter bugs em excesso para uma versão final, o que acarretou
em processos coletivos milionários contra a desenvolvedora polonesa CD Projekt Red.
Atualmente um último marco passou a fazer parte do processo de desenvolvimento
dos jogos, a manutenção ou atualização. Até os primeiros jogos online surgirem, o consumi-
dor tinha de ir até uma loja física e comprar seu jogo, este que se contivesse algum bug ou
defeito não poderia ser substituído em larga escala devido à toda logística envolvida, e caso a
publicadora decidisse realizar conteúdos adicionais para o jogo, o mesmo processo de compra
deveria ser realizado, ou ocorreria o mais comum, o lançamento de uma continuação como
um jogo a parte. A partir do momento que a tecnologia permitiu que os jogos estivessem co-
nectados à internet, foi possível não somente que bugs pudessem ser corrigidos posteriormen-
te ao lançamento através de “Patchs” (pacotes de correções) como a atualização contínua de
conteúdo, bem como o implemento das DLCs (Downloadable content - conteúdo baixável)
que são conteúdos adicionais para jogos específicos, que servem como continuação e expan-
são do jogo base, podendo ser vendidas por preços mais acessíveis e reduzidos, por não pos-
suírem a mesma quantidade de conteúdo do base. A internet também permitiu que jogos de
multiplayers online pudessem se atualizar constantemente para o balanceamento constante
dos seus conteúdos a fim de oferecer uma disputa mais justa para todos.

Imagem 16 - Série de jogos da franquia The Witcher III

Fonte: https://thewitcher.com/en/witcher3. Acessado em 24, outubro de 2021

Tendo sido apresentado os detalhes de funções e metodologias utilizadas, podemos


avançar para os processos de desenvolvimento propriamente ditos. Como descrito anterior-
mente o primeiro passo é a elaboração do conceito do jogo, onde as informações básicas sobre
este devem ser definidas, isto deve acontecer dentro do processo de pré-produção, onde se-
rão gerados diferentes tipos de documentação, com o intuito de se formalizar a ideia tanto
para a apresentação para possíveis investidores quanto para a equipe de desenvolvimento, o
mesmo tipo de documento é mais tarde revisado e configurado para ser apresentado para to-
dos os setores da empresa que trabalharam direta ou indiretamente no desenvolvimento do
jogo, um exemplo disso é o GDD (Game design document - Documento de design do jogo),
sendo um documento detalhado de tudo que o jogo irá conter e busca alcançar.
Após isso o jogo passa para o processo de Produção, no qual a equipe de desenvolvi-
mento começa a trabalhar efetivamente. Na maioria dos casos todas equipes trabalham de
forma simultânea, já que se considera que o necessário para o trabalho de todos já foi definido
durante a pré-produção, pois como dito anteriormente o método de desenvolvimento cíclico
não se aplica nestes casos.
22

Neste momento todos os envolvidos passam a trabalhar de forma conjunta para reali-
zar as entregas de marcos definidas anteriormente. Os programadores começam a escrever e
editar os códigos, os escritores começam a redigir os diálogos e cenas, bem como criar os
personagens que irão compor a história, os modeladores e artistas começam a traçar seus pri-
meiros esboços para aprovação dos designers e futura aprovação dos produtores, e assim por
diante.

3. PESQUISA

Visando obter uma breve visão sobre o atual relacionamento entre público geral, ar-
quitetos e jogos digitais, foram desenvolvidos 3 formulários de pesquisa.
O primeiro formulário (Apêndice A) é direcionado para os profissionais da área de
Arquitetura e Urbanismo em formação, e terá como objetivo descobrir o quão familiarizado
com essa área de atuação eles estão; se durante o curso eles foram introduzidos ou apresenta-
dos a essa vertente da profissão; de que forma eles avaliam este mercado; se possuem habili-
dades que julgam necessárias para tal.
O segundo formulário (Apêndice A) será voltado para os jogadores, aqueles que tes-
tam o produto final de todo o desenvolvimento. Neste formulário, os entrevistados foram
questionados sobre seus gostos pessoais, ou seja: os gêneros de jogos que preferem; o quanto
o ambiente virtual impacta na experiência; o que mais gostam nos cenários e como avaliam o
relacionamento entre arquitetos e jogos.
O último formulário (Apêndice A) terá como foco pessoas que não estejam diretamen-
te ligadas a nenhum dos espectros anteriores, os quais serão tratados como público geral. As
perguntas serão voltadas para a relação que possuem com os jogos, o quão bem conhece esse
âmbito e como avaliam estes.
Os formulários foram desenvolvidos através da plataforma Google Forms, que possi-
bilita a criação e compartilhamento de formulários voltados para todo tipo de pesquisa a ser
desenvolvida. Todos os questionários foram criados com a intenção de limitar as respostas
dos entrevistados a perguntas de múltipla escolha, objetivas, e curtas, de forma que ao encer-
ramento do prazo de respostas, seja possível a elaboração de gráficos para melhor representa-
ção dos resultados.

3.1. Formulário 1

O primeiro formulário contou com um total de 35 respostas e está dividido em 3 ses-


sões, a primeira serviu como triagem e reconhecimento do público entrevistado, sendo estes
em sua maioria mulheres, entre os 20 e 30 anos. 25% dos entrevistados têm 30 ou mais anos,
e no total, aproximadamente 46% ainda não terminou a faculdade.
23

A sessão seguinte procurou entender a relação entre os participantes e os jogos.


24

94,3% dos entrevistados afirmaram não ter tido nenhum tipo de contato com a área de
jogos digitais durante o curso, todavia 28,6% afirmaram já ter considerado trabalhar nesta
área, mesmo que destes, 80% não tiverem nenhum incentivo por parte da faculdade. Dentre os
entrevistados, 14,3% afirmou ser ou conhecer colegas arquitetos, que trabalham no desenvol-
vimento de jogos.

A terceira sessão tem como foco entender como os entrevistados avaliam o mercado
de jogos, e de que modo podem se inserir nele. A primeira pergunta foi sobre quão familiari-
zado com jogos eles são, sendo que metade (51,4%) joga com certa frequência e os outros
48,6% tiveram pouco ou nenhum contato com jogos.

Os entrevistados acreditam que dentre as fases do desenvolvimento, o Design a produ-


ção de arte e o conceito são as mais propensas para a participação dos arquitetos, seguidos da
assessoria e criação de níveis.
Dentre as habilidades aprendidas ao longo do curso, as mais aplicáveis ao desenvol-
vimento (segundo os entrevistados) são a criação de imagens 3D (renderização), modelagem
3D e elaboração de projetos (ateliê) com 94,3%, 50% e 77,1% respectivamente. Em seguida,
com quase mesma quantidade de votos estão o desenho técnico (60%), história da arquitetura
(57,1%), história da arte e planejamento urbano (54,3% ambos). As menos votadas foram as
artes que mais se relacionam com a engenharia civil, como pré-dimensionamento de estrutu-
ras, técnicas e sistemas construtivos e topografia.
25

O gráfico seguinte apresenta softwares utilizados no desenvolvimento dos jogos, no qual foi
pedido aos participantes que assinalem os que já tiveram contato.

Os softwares mais votados foram SketchUp (100%), V-ray e Photoshop (ambos com
91,4%). Com isso é possível avaliar que os entrevistados possuem mais contato com as ferra-
mentas de manipulação e criação de imagens. Entretanto, uma certa parcela dos entrevistados
conhece softwares de modelagem e animação muito utilizados pelas empresas desenvolvedo-
ras de jogos, como Skratch (25,7%), Unreal Engine (17,2%), Blender (22,9) e 3dsMax
(65,7%).
E por fim, quanto acreditam que um desenvolvedor ganhe em média, dos quais apro-
ximados 50% votaram um valor entre R$ 2.500,00 e R$ 6.000,00 reais, e 45,7% julgam ser
mais de R$ 6.000,00 reais.
26

3.2. Formulário 2

O formulário voltado para os jogadores contou com 145 respostas. A primeira sessão
do formulário diz respeito às informações pessoais dos participantes, como nome, ida-
de e sexo.

Ao analisar os dois gráficos, é possível estabelecer uma certa predominância de jovens


entre os 16 e 25 anos do sexo masculino.
27

A seção seguinte tinha como objetivo identificar o perfil dos jogadores, na qual 59,7%
dos entrevistados afirmaram jogar todos os dias e 30,6% jogar de 3 a 4 dias por semana. Este
dado mostra que a atividade de jogar já não é tratada como uma atividade momentânea ou
dependente de fatores casuais e sim uma atividade recorrente e pontual. Isso é reforçado ainda
mais no gráfico seguinte, onde é apontado o período em que os entrevistados costumam jogar,
onde quase 80% destes jogam mais de 4 horas seguidas.

Em seguida os participantes foram questionados a respeito das características que os fazem


adquirir um jogo e que tipo de jogo mais consomem.
28

Com estes dois gráficos, fica evidente que os jogadores, não só procuram jogos imer-
sivos como o RPG (Role Playing Game) no qual o foco é a construção de um personagem
conforme a vontade do jogador e exploração de um mundo pré-estabelecido assim como os de
Aventura, com temáticas, jogabilidade e experiências comuns à todos, como também jogos
competitivos no qual toda partida é diferente, onde a jogabilidade é o principal fator, pois es-
timula o aprimoramento das habilidades ao se jogar. Além disso, ao juntarmos os dados ante-
riores com o gráfico abaixo, fica evidente que a temática, enredo e cenário são fatores chaves
para os jogadores.
29

Tendo em vista que o cenário é considerado importante ao ponto de ser o foco dos jogadores
em alguns momentos, foi questionado também o que mais chama a atenção dos jogadores nos
cenários, mapas etc.

Conforme visto nas primeiras perguntas, o enredo e trama são os quesitos chaves para
se escolher um jogo, portanto já se esperava que o quesito “Inovação” fosse o mais votado
quando se tratando dos cenários, seguido pela quantidade de detalhes, física (nesse caso não
apenas a física aplicada ao mundo como a resposta do jogo às ações do jogador) e complexi-
dade dos ambientes respectivamente. Assim como no formulário anterior e no próximo, os
entrevistados foram questionados sobre quais etapas um arquiteto poderia participar nos jo-
gos, porém o resultado será apresentado mais à frente, junto de uma análise específica desta
questão.

3.3. Formulário 3

O último formulário tinha como intenção obter um panorama mais geral em relação
aos temas abordados no trabalho, por isso teve como foco a população em geral. Neste formu-
lário foram obtidas 101 respostas, e assim como os outros começou com as informações pes-
soais dos participantes:
30

Esta pesquisa foi relativamente mais abrangente do que as demais, com pouco mais de
25% dos entrevistados estando acima dos 25 anos e com maior participação do público femi-
nino. Em seguida foi questionado sobre a relação destes com o “mundo” dos jogos digitais.

Aproximadamente dois terços dos entrevistados jogam sempre que podem ou até mes-
mo todos os dias, o restante ficou dividido entre quem jogou as vezes (14,9%), quem jogou
poucas vezes (11,9%) e quem nunca jogou (6,9%). Em seguida foram questionados se conhe-
ciam e-sports (competições de jogos eletrônicos), dos quais apenas 8% nunca ouviram falar.
A próxima pergunta se refere a receita gerada pelos jogos, na qual foi solicitado que os entre-
vistados marcassem a opção de mídia de entretenimento que julgavam ter a maior receita, e
em seguida qual a média salarial que acreditam que um profissional que trabalha no desen-
volvimento de jogos tenha.
31

A terceira e última sessão do formulário tinha como intenção tentar identificar o tipo
de perfil que as pessoas possuem dos jogadores em geral. Desta forma as perguntas são mais
genéricas e tendem a não estabelecer nenhum pré-julgamento por parte do entrevistado.
32

Analisando os resultados dessa sessão, é possível identificar que mesmo com pesqui-
sas recentes como a PGB 2021 (Pesquisa Game Brasil 2021) apontando que no Brasil o maior
número de jogadores está na faixa etária de 20 à 24 anos e que o número de jogadores acima
de 40 anos corresponde a aproximados 20% dos brasileiros, o estigma de jogadores como
crianças ou adolescentes se mantém forte, e que mesmo com todas as informações disponibi-
lizadas através da internet, muitos não sabem sequer que jogos possuem classificação etária.

4. O MERCADO

4.1. NO MUNDO

A partir do momento em que a comercialização de vídeo games se tornou financeira-


mente viável (por volta dos anos 1970) este passou a chamar grande atenção do mercado, po-
rém com foco voltado principalmente para o público masculino juvenil, já que até então as
empresas vendiam seus consoles como brinquedos, o que acabou por limitar por muito tempo
a possibilidade de crescimento do setor. Porém, já na primeira década de vida, os Arcades
(fliperamas) movimentaram cerca de U$39 Bilhões de Dólares, mostrando os primeiros sinais
de um mercado em ascensão (Visual Capitalist, 2020).
A década de 1980-90 se mostrou um verdadeiro teste do mercado, nesse período o
mercado enfrentou seu pior momento até hoje devido principalmente à saturação do mercado
e queda drástica na qualidade dos jogos desenvolvidos, todavia foi também nessa época em
que os jogos de computadores (com certa limitação devido à baixa acessibilidade) e os conso-
les portáteis (com o lançamento do Game Boy, pela Nintendo em 1989, que vendeu cerca de
118,69 milhões de unidades até 2003) entraram no mercado, o que permitiu a retomada do
setor ainda na segunda metade da década. O surgimento de novos concorrentes, que possibili-
tavam o uso pessoal e contínuo dos video games, resultou no declínio dos arcades, onde ocu-
pa a última posição em arrecadação no mercado de jogos até hoje.
33

Com a evolução e disseminação dos computadores pessoais, os jogos voltados para es-
sa plataforma começaram a se popularizar (com o lançamento de Doom em 1993) garantindo
ao segmento uma arrecadação maior até mesmo que a dos consoles. Neste caso a tecnologia já
havia evoluído ao ponto de permitir o uso de CDs ao invés de cartuchos, e mais tarde o lan-
çamento de celulares com jogos.
Em 2004 World of Warcraft é lançado para computadores, sendo o primeiro jogo onli-
ne com serviço de assinatura, dando início a era dos jogos online e consolidação do mercado
de jogos para públicos de todas as idades. O lançamento do smartphone da Apple, o iPhone,
possibilitou que pessoas e empresas desenvolvessem aplicativos para que qualquer usuário
pudesse fazer o download (de forma gratuita ou paga), fazendo com que as desenvolvedoras
de jogos passassem a tratar os jogos mobile (celulares) como uma possibilidade altamente
lucrativa, já que até 2010, 67,6% da população mundial possuía acesso a um telefone celular
(BBC, 2010).
Em 2020, ano em que o COVID-19 se alastrou pelo mundo deixando uma série de cri-
ses sanitárias e financeiras por vários países onde passou, o mercado de vídeo games apresen-
tou um crescimento significativo de aproximadamente 12% em relação ao ano anterior, com
um lucro ficando por volta de R$ 160 Bilhões de dólares, mais do que os segmentos de músi-
ca, cinema e streaming de vídeo juntos, e três vezes mais do que este último sozinho (Exa-
me,2021).
Imagem 17- Receitas globais de mídia e entretenimento

Fonte: https://exame.com/revista-exame/o-fantastico-mercado-dos-games/. Acessado em 8, abril de 2021

Dentro do segmento dos jogos, este lucro se divide entre as plataformas de consumo,
no qual o segmento de jogos mobiles apresenta a maior parte da arrecadação, com aproxima-
damente 48,5% do total. Uma explicação para estes números expressivos, estão no fato de que
os jogos Mobiles são os de mais fácil acesso, já que a maior parte da população possui acesso
a smartphones, além de utilizam da estratégia Free-to-play (gratuito para jogar), na qual per-
mite que qualquer pessoa baixe os jogos gratuitamente, e só então dentro do game, o jogador
encontra uma “loja” na qual pode fazer transações em troca de itens do jogo.
Em seguida estão os consoles, que são os video-games que ainda fazem uso de uma
TV/monitor para se jogar. Diferente das demais plataformas, estes ainda são dependentes di-
retos da compra de jogos físicos (CDs) ou digitais (download), mesmo com uma parcela dos
jogos voltados para o free to play. Ao contrário do que este segmento indica, as empresas di-
ficilmente conseguem lucro com as vendas de seus hardwares (os consoles propriamente di-
34

tos), isto acontece devido ao fato de que a fabricação dos componentes e distribuição dos dis-
positivos finais faça com que todo o processo não seja financeiramente rentável, e mesmo
assim, em alguns casos as empresas até mesmo “pagam” (ficam no prejuízo), para que os usu-
ários comprem seus consoles.
Para obter lucro, as empresas utilizam do método da “isca e anzol”, muito conhecido
pelo modelo de negócios da marca de barbeadores Gillete. Este método consiste, primeira-
mente, na venda de um dispositivo único (console), que possui valor de venda próximo (para
mais ou para menos) que o seu custo de produção. Em seguida, para que o usuário faça uso do
produto que adquiriu, é necessário que este faça a compra de um segundo produto (os jogos),
que de preferência será oferecido apenas pela mesma empresa, sendo este, o responsável pelo
verdadeiro lucro da empresa. Não é à toa que as fabricantes de consoles, são também conhe-
cidas pelos seus jogos exclusivos, que são jogos desenvolvidos apenas para o dispositivo da
empresa específica. Além disso, as empresas também obtêm lucro com a venda de jogos mul-
tiplataforma, pois para uma desenvolvedora vender seu jogo, esta precisa pagar parte do seu
lucro bruto (preço que o jogador paga pelo jogo) para a empresa dona da plataforma.
Imagem 18 - Receita global de 2020 por plataformas

Fonte: https://exame.com/revista-exame/o-fantastico-mercado-dos-games/. Acessado em 8, abril de 2021

Um exemplo da rentabilidade do setor de jogos digitais, e talvez o mais conhecido, é o


sucesso da desenvolvedora Rockstar Studios, GTA V (Grand Theft Alto V), um jogo de ação
e aventura para um único jogador com foco no desenvolvimento de 3 personagens principais.
35

Lançado em 2013 para os consoles PlayStation 3 e Xbox 360, arrecadou nas primeiras
24 horas de vendas a quantia de U$ 800 milhões de dólares, se tornando o produto de entrete-
nimento mais rentável em 2018 (5 anos após seu lançamento) com um lucro próximo de U$ 6
bilhões de reais. Hoje em dia, o jogo continua fazendo um sucesso espantoso, lucrando só no
ano de 2020 cerca de U$ 1 bilhão de dólares, aparecendo ano após ano entre os 10 jogos mais
vendidos mundialmente, passando por 2 gerações de consoles, com uma remasterização já
prevista para a terceira geração.
Uma explicação para tamanho sucesso, pode estar na qualidade da produção utilizada
durante o desenvolvimento do jogo. Já na época de seu lançamento, GTA V trouxe grande
inovação para as mecânicas e enredo dos jogos, bem como os gráficos que até hoje continuam
exigindo alta performance dos hardwares, mas apesar de tudo isso, foi o lançamento do “mo-
do” (vendido como um jogo a parte) online, no qual os jogadores poderiam interagir uns com
os outros em um servidor que replica o mapa do jogo base, que fez GTA V se manter entre os
jogos mais vendidos quase 10 anos após seu lançamento. Neste modo os players podem reali-
zar missões e competições entre si, personalizar seus personagens conforme queiram, além de
ter introduzido as micro transações, que somam a maior parte do lucro atual.

4.1. NO BRASIL

A Pesquisa Game Brasil (PGB) foi criada em 2013 e tem como intenção traçar o perfil
dos gamers na América Latina em países como Brasil, Argentina, Chile e Colômbia. Desde
sua criação os resultados das pesquisas têm sido publicados de forma anual, e em 2021 com
todas as problemáticas causadas pelo COVID-19 não foi diferente, as análises realizadas ao
longo deste capítulo foram feitas com base nos dados coletados e divulgados pela 8ª edição
publicada (referente ao ano de 2021). A pesquisa, conforme informado na página 4, utilizou
de duas estratégias metodológica de pesquisa, 4 P´s (Percepção, Posse, Paixão e Plano) e Mé-
todo de Juul; participação de 12.498 entrevistados; aplicada em território nacional conforme
os dados de distribuição da população brasileira feita pelo IBGE; realizada entre os dias 07 à
22 de Fevereiro do mesmo ano.
A pesquisa, assim como a realizada no capítulo anterior, começa pela divisão de pú-
blico-alvo, que neste caso é somente aqueles que possuem o costume de jogar, constatando
que 72% dos brasileiros se encaixam nesse perfil. O segundo dado base diz que 51,5% deste
público alvo é formado por mulheres, o que evidencia que apesar de não se considerarem “jo-
gadoras”, muitas mulheres possuem o hábito de jogar com certa frequência, porém possam
estar mais concentradas em um nicho de jogo específico como os jogos para smartphones, que
por se tratarem de jogos mais casuais acabam não entrando no conceito que se tem de “jogo”,
enquanto as demais plataformas acabam sendo utilizadas em sua maioria pelos homens, como
mostram os dados a seguir.
Imagem 19 - Divisão de público por plataforma

Fonte: PGB 2021


36

Como mencionado anteriormente, a maior parcela destes jogadores, está entre os 20 e


24 anos (22,5%), seguidos por aqueles com 25 a 29 anos (18,6%), deixando 48,6% do restante
dos jogadores com idade acima dos 30 anos, o que indica, assim como os dados sobre as jo-
gadoras, que jogar não está ligado à idade ou sexo. Outro dado base extremamente importante
levantado pela pesquisa, está na etnia dos gamers brasileiros, em que 46% se conside-
ram/identificam como branca, enquanto quase metade, se identifica como parda ou preta
(36,7% e 13,6% respectivamente). Além disso, a pesquisa também separou a quantidade de
jogadores de cada classe social entre as plataformas, em que evidenciou que independente-
mente da plataforma, a maior porcentagem de jogadores se encontra na classe média.

Imagem 20 - Divisão de público por classe social

Fonte: 4PGB 2021

Em seguida, a pesquisa levanta os dados mais pessoais dos entrevistados, visando en-
tender o comportamento destes, e sua relação com os jogos, como por exemplo, se os jogos
digitais são sua principal forma de entretenimento, pergunta a qual 68,0% dos entrevistados
responderam de forma afirmativa. Além disso, a maior parcela (19,2%) de jogadores afirmou
jogar de 8 a 20 horas semanais, 18,3% entre 6 e 8 horas, e 17,8% entre 4 e 6 horas, sendo que
de todos os estes, 97,0% afirmou jogar em sua própria casa.

Imagem 21 - Quantidade de horas jogadas ao longo da semana

Fonte: PGB 2021


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E muito próximo ao apresentado pela pesquisa do capítulo anterior, 45,6% dos entrevistados,
afirmou jogar pelo menos uma vez ao dia, enquanto 20,5% jogam entre 3 e 6 dias na semana.

Imagem 20 - Frequência com que entrevistados jogam online

Fonte: PGB 2021


Em relação ao período de pandemia, em que a população enfrentou o isolamento soci-
al por meses, 46% dos entrevistados afirmaram que passaram a jogar por períodos mais lon-
gos e com maior frequência, enquanto 42,2% concordam com a afirmação “gastei mais di-
nheiro com jogos digitais durante o período de isolamento social”. Este resultado é confirma-
do pelas pesquisas que avaliam o mercado de jogos como a Global Games Market Report
(2020) que apontou um crescimento de 5,1% na receita anual de jogos eletrônicos no Brasil,
movimentando 2,3 Bilhões de dólares, garantindo a posição de maior receita de jogos na
América Latina e 12º no ranking mundial

5. ESTUDO DE CASO

O estudo de caso escolhido para fazer parte deste trabalho, foi o jogo de ação-aventura
Control, lançado em agosto de 2019 pela desenvolvedora Remedy Entertainment. Ao longo
do capítulo será realizada uma breve apresentação da desenvolvedora, do jogo e de suas me-
cânicas, contando com uma análise “arquitetônica” da obra como um todo.
Control foi escolhido devido ao fato de ser um jogo em terceira pessoa que se passa
em um único local. A proposta sci-fi da trama e seu desenvolvimento de forma cinematográfi-
ca contribuem para a experiência altamente imersiva no aspecto espacial do jogo, represen-
tando muito bem o atual cenário de jogos digitais, como um verdadeiro conjunto de elementos
artísticos previamente apresentados (capítulos 1 e 2).
Descrever a experiência de jogar um jogo através de palavras é uma tarefa um tanto
quanto complexa, pois além de uma análise, este capítulo também se trata da aplicação de
recursos técnicos e teóricos a uma mídia completamente visual e sensorial, portanto, como
parte complementar ao estudo de caso, foi elaborado um vídeo, disponibilizado na plataforma
online YouTube (Apêndice B) .O vídeo apresenta uma versão adaptada do texto a seguir, pos-
suindo pequenas variações para que este se adapte ao formato audiovisual.
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5.1. A EMPRESA

A Remedy Entertainment foi fundada em 1995 por um grupo de jovens que trabalha-
vam criando demos de jogos para computadores. A empresa lançou seu primeiro título, Death
Rally no ano seguinte, porém só em 2001 a empresa começou a definir sua marca no mercado
de jogos, lançando o primeiro jogo da franquia Max Payne, um jogo de ação policial com
toque de suspense noir, que após o grande sucesso teve os direitos vendidos para a já gigante
dos jogos Rockstar Studios, garantindo uma continuação em 2003 com Max Payne 2 - The
Fall of Max Payne e em 2012 com Max Payne 3.
Somente em 2010, em parceria com a Microsoft, a empresa lançou um novo título,
Alan Wake, que apesar das críticas relativamente boas, não fizeram do jogo um grande suces-
so de vendas, resultando na abertura da empresa para o segmento de jogos mobile (dispositi-
vos portáteis). Entretanto a empresa continuou desenvolvendo jogos para consoles paralela-
mente aos mobiles, lançando em 2016 o jogo Quantum Break, esse que apesar do pouco su-
cesso que teve foi inovador, trazendo novas mecânicas e um grande foco no storytelling, apre-
sentando ao longo do jogo cenas com atores reais, que mais tarde acabaram sendo compiladas
em uma série televisiva, além de utilizar os mesmos atores para a realização de captura de
movimentos para o jogo.
Em 2019 a empresa lançou Control, que serviu como um compilado de tudo que me-
lhor funcionou nos jogos anteriores, o tema sci-fi, os poderes utilizados pela personagem
principal, a mecânica de combate e exploração de ambientes e o mais evidente, a dramatiza-
ção da história com trechos de vídeos gravados em live action, que mais uma vez contou com
atores reais para as capturas de movimentos.

Imagem 21 - Capa promocional de Control

Fonte: 5https://www.remedygames.com/games/control/. Acessado em 9, junho de 2021


39

5.2. O JOGO

Em Control, o jogador assume o controle de Jesse Faden, que tem como objetivo bus-
car pistas do paradeiro de seu irmão mais novo, que foi levado ainda jovem por um departa-
mento desconhecido do governo americano após terem entrado em contato com um objeto
capaz de transportá-los para lugares e dimensões diferentes.
O jogo começa com Jesse já dentro do Departamento Federal de Controle (DFC) anos
após começar sua busca, no local aparentemente deserto, o jogador deve procurar por missões
que o levem a explorar todo o edifício, este qual, o jogador descobre ser chamado de A Casa
Antiga, sendo não apenas o local onde o jogo todo é desenvolvido, como também parte da
história tal qual os demais personagens.
Jesse logo descobre que a sede do DFC é um vetor sobrenatural por si só, e que dentro
dele está ocorrendo um protocolo de contenção devido a um tipo de vírus identificado como O
Ruído. Além disso, o DFC é capaz de abrigar inúmeros setores, divididos em diversos pavi-
mentos, todos esses com características arquitetônicas únicas e marcantes, que contribuem
com a exploração do cenário.

Imagem 22 - Cena de combate dentro do jogo

Fonte: https://www.remedygames.com/games/control/. Acessado em 3, abril de 2021

5.3. A MECÂNICA

As mecânicas básicas de jogo como, se mover, pular, rotacionar câmera, não possuem
nenhum tipo de tutorial, uma vez que este tipo de mecânica é comum entre a maioria dos jo-
gos. No início, são apresentados os comandos exclusivos do jogo, por exemplo: como o joga-
dor pode interagir com objetos e o cenário, como se orientar em relação ao mapa e como sa-
ber quais são os objetivos.
Após isso, o jogador é apresentado a única arma que usará durante todo o jogo, um ob-
jeto, que assim como a Casa Antiga, apresenta características físicas incomuns. Apesar de não
40

haver mais nenhum tipo de arma física disponível, esta possibilita que o jogador a configure
da forma que preferir, adquirindo diferentes formas, cada uma para um uso específico.
Depois do jogador se familiarizar com o uso da arma, são introduzidas novas mecâni-
cas ao longo do jogo, tais como: a habilidade de levitar; se deslocar rapidamente; formar um
escudo; controlar inimigos; controlar e mover objetos.
A maioria dessas mecânicas são pensadas de forma que o jogador se veja obrigado a
interagir com o ambiente ao redor, seja usando objetos dispostos no cenário para arremessá-
los nos inimigos ou escalar através do cenário para acessar áreas escondidas nos ambientes.

5.4. A ARQUITETURA

Apesar de Control se passar nos dias atuais, ao entrar na sede do Departamento Fede-
ral de Controle, o jogador é levado a acreditar que tudo ali ficou preso no tempo em algum
momento entre os anos de 1960 e 1970. A arquitetura, a decoração, os móveis e até mesmo as
tecnologias, são retratos fiéis de um típico centro empresarial dessa época.
Logo no início, ao percorrer os primeiros corredores do DFC, fica clara a inspiração na
Arquitetura Brutalista, características como as enormes paredes e os blocos monumentais de
concreto armado, remetem às grandes construções públicas deste movimento, conferindo ao
edifício uma sensação de extrema solidez.
Essa ideia de uma fortaleza de concreto, é muito bem representada pelo Brutalismo,
uma vez que este tipo de arquitetura surgiu como um símbolo de força e resistência, muito
presente em países que sofreram com a crise do Petróleo entre os anos 1960 e 1980, período
também, no qual acontecia a corrida espacial e os momentos de maior tensão da Guerra Fria.
Imagem 23 - Setores de Control

Fonte: https://www.remedygames.com/games/control/. Acessado em 3, abril de 2021

Os ambientes do jogo, como escritórios, laboratórios, salas de reuniões e demais cô-


modos, também são compostos por objetos e decorações que remetem a este período históri-
co. Um jogador com o olhar um pouco mais treinado, consegue perceber estilos arquitetônicos
e de design muito recorrentes a edifícios corporativos da época, como o uso de cores quentes
nos escritórios, como laranja e amarelo, o uso de texturas de madeira, e mobiliários com evi-
dente inspiração em designers da época, como Jens Risom e Hans J. Wegner.
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Imagem 24 - Ambientes de Control

Fonte: https://www.remedygames.com/games/control/. Acessado em 3, abril de 2021

Um ponto negativo, mas que surge de uma limitação do contexto do jogo, é a ausência
do contato com o exterior do edifício, a iluminação no jogo se dá, em sua maior parte por
fontes elétricas, apesar de existirem grandes vãos, que servem como shafts que capturam ilu-
minação difusa para os ambientes, enquanto os únicos indícios de ventilação são os gradis
embutidos em todas as salas e ambientes comuns.
Este fato, que embora pareça uma falha de concepção do edifício, acaba sendo permi-
tido, se levado em consideração que apesar de fictício, este é um centro de pesquisa de alta
segurança, portanto qualquer contato não supervisionado com o mundo exterior, pode dar
início a uma catástrofe.

5.5. A SEMIÓTICA

A semiótica pode ser aplicada a todo e qualquer elemento visual que denota conteúdo
implícito, ou explícito, desde que este transmita uma mensagem a um observador.
Uma análise semiótica, tem como intuito entender de que forma o objeto de estudo se
relaciona com o indivíduo, este objeto pode ser tanto literal e factível, como uma caneta, ou
uma ideia, como uma imagem.
No caso de Control, iremos aplicar um exemplo de análise, baseada no estudo de Peir-
ce sobre a semiótica. Como primeiro objeto de estudo, temos o mapa do jogo, o qual o joga-
dor utiliza para se orientar dentro do edifício. Este mapa, como qualquer mapa de jogos digi-
tais, apresenta uma planta do local em que o avatar se encontra.
Este, apresenta elementos básicos como linhas, cores e textos. Mas além disso, possui
também, elementos, os quais chamaremos de cardeais, que só são entendidos pelo jogador,
devido a estas mesmas características estarem em contraste com os demais elementos. Ao se
movimentar com o mapa aberto, o elemento cardeal de uma seta vermelha também se movi-
menta no mapa, e a partir desta simples ação, o espectador entende que aquele ícone, é a re-
presentação de seu avatar dentro do espaço físico em que se encontra. Peirce divide este fe-
nômeno em 3 segmentos:
42

• Primeiridade - sendo aplicado a tudo que possui informação, possibilidade e sentimen-


to, neste caso, o mapa e os elementos que o compõem.
• Secundidade - sendo o efeito que o significado implica, como em um evento de ação e
reação, sendo representado pela interpretação do significado do elemento pelo joga-
dor.
• Terceiridade - que funciona como consequência dos segmentos anteriores, se manifes-
tando finalmente, como a ação que o jogador fará, sempre que quiser se orientar em
relação ao mapa, se tornando parte de um novo conjunto de signos e significados.
Imagem 25 - Semiótica de Pierce aplicada a Control

Fonte: Acervo do autor.

Também no mapa, podemos observar a aplicação da semiótica de forma mais simples, e rela-
cioná-la à elementos utilizados na arquitetura e urbanismo, como a representação de níveis e
profundidade. É comum encontrar em desenhos técnicos, ao representar cortes e elevações,
um método visual que utiliza diferentes espessuras de linhas, chamado de hierarquia de linhas,
nas quais as linhas mais grossas representam os objetos em corte ou mais próximos do ponto
de vista, sendo sucedidas por linhas cada vez mais finas conforme se afastam do ponto de
vista.
No mapa de Control, o conceito é similar, uma vez que ao contrário das linhas, os di-
ferentes níveis do edifício, são representados com uma paleta de cinza, na qual, os pavimentos
superiores estão mais próximos do branco, e os pavimentos inferiores se aproximam do preto.
Além disso os jogos utilizam da semiótica para guiar o jogador ao longo da narrativa, seja
estruturando uma série de símbolos que farão parte de um contexto maior para o jogador con-
forme este avança pelo jogo.
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Imagem 26 - Semiótica aplicada aos mapas de Control

Fonte: Acervo do autor.

5.6. A IMAGINABILIDADE

Em seu livro, A imagem da cidade, Kevin Lynch apresenta dentre vários conceitos a
legibilidade e a imaginabilidade.
Lynch descreve a Legibilidade, como a “Facilidade com que cada uma das partes (da
cidade) pode ser reconhecida e organizada em um padrão coerente.” Ou seja, a capacidade
que um conjunto de elementos visuais dispostos ao longo do espaço físico tem de formar uma
concepção comum, ainda que de maneira totalmente não intencional e ocasional, em uma
quantidade considerável de observadores.
Enquanto a Imaginabilidade, elenca conjuntos que possuem as características observa-
das pela legibilidade, portanto a probabilidade que objetos, cenários e composições possuem
de serem “legíveis”, a partir de suas características físicas, como tamanho, cores, texturas etc.
Estes conceitos, se aplicados em Control, identificam pontos do mapa em que a maio-
ria dos jogadores associa a uma sensação ou lembrança em específico. Em uma rápida pesqui-
sa pelo fórum onde jogadores postam imagens de tela salvas enquanto jogam (print screens),
podemos identificar não apenas elementos que se repetem várias vezes, como também com-
posições com estruturas, objetos, iluminação e cores comuns entre si, este fenômeno está as-
sociado a alta imaginabilidade destes elementos específicos presentes no cenário do jogo, e
servem também como pontos de referência para que os jogadores possam se localizar durante
o jogo.
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Imagem 27 - Esquema de concretização da imaginabilidade

Fonte: 6Acervo do autor

Fonte: Acervo do autor.

Imagem 28 - Imagem final comum a todos observadores

Fonte: Acervo do autor.


Através da combinação destes elementos e da semiótica, os designers de nível são ca-
pazes de orientar o jogador através do mapa da forma que desejam, mas sempre sendo possí-
vel que estes, explorem o mapa conforme procuram pistas de como progredir no jogo. Outro
conceito muito importante discutido pelo urbanista austríaco Christopher Alexander, são os
espaços exteriores positivos. Por se tratarem da representação de espaços reais, alguns jogos
fazem com que o jogador explore ambientes urbanos muito similares ao que encontramos nas
cidades ao redor do mundo, entretanto, ao oferecer ao jogador um espaço urbano teoricamente
aberto para ser explorado, se espera que o jogador possa de fato visitar todas as localidades o
que muitas vezes não acontece devido a necessidade de se limitar o acesso a certas regiões em
45

decorrência das limitações de hardware, que não permitem a criação de mapas infinitos. Dessa
forma, é necessário fazer utilização de métodos de restrição, para Adams, Ernest (2010) um
jogo que limita seu espaço através de artifícios mal elaborados ou de forma arbitrária, não
exerce seu papel de imersão, pois não fornece ao jogador, um motivo para permanecer dentro
do espaço dedicado à jogatina, portanto, um método que pode ser aplicado a estes casos, é o
de espaços exteriores positivos, no qual o posicionamento de edifícios “principais” ao longo
de um espaço aberto, dão origem a ambientes intermediários, que não estão lá apenas por con-
sequência das edificações principais, mas sim como um ambiente individual e válido por si
só, que pode conceber um tipo de experiência que não esteja apenas em segundo plano.

Imagem 29 - Esquema de criação de espaços exteriores positivos

Fonte: Acervo do autor.

6. AS APLICAÇÕES

Esse capítulo servirá como a ponte entre os dois temas explorados, Arquitetura e Jogos
Digitais. A Partir das análises e explicações feitas nos capítulos anteriores serão apresentados
meios pelos quais o profissional de arquitetura pode se inserir no mercado de desenvolvimen-
to de jogos, quais funções e quais contribuições ele pode exercer durante o desenvolvimento.
No capítulo citado acima sobre o processo de desenvolvimento de jogos, foram apre-
sentados alguns dos cargos presentes em uma empresa desse ramo, os quais possuem forte
ligação com as atividades desenvolvidas pelos arquitetos atualmente.

6.1. OS SOFTWARES

É inegável que a relação do arquiteto e "máquina" se estreitou muito nos últimos anos,
principalmente com os avanços dos softwares de desenho e modelagem. A prancheta perdeu
seu lugar para os monitores bem como o lápis e borracha para o mouse e teclado, entretanto a
46

transição não foi fácil, em parte devido ao fato de esses programas terem sido extremamente
difíceis de se usar, além de possuírem uma interface rudimentar na qual as ferramentas eram
muito limitadas sendo necessário que o profissional que quisesse utilizar os softwares fizesse
cursos para aprender não somente a usar o programa como também contornar suas falhas.
Todo esse processo tornava inviável para um arquiteto já formado e estabelecido no mercado
até mesmo porque tudo já funcionava "muito bem como era".
Com o passar dos anos, os softwares passaram a focar no aprimoramento da UX (User
Experiência), e na simplificação das ferramentas, de modo que se tornassem verdadeiras
pranchetas virtuais, onde o arquiteto poderia realizar os desenhos a partir de elementos bási-
cos, como linhas, círculos, hachuras etc. Além disso, os softwares implementaram ferramen-
tas que manualmente seriam impossíveis, como copiar vários segmentos do desenho, rotacio-
nar, espelhar e muitas outras. Porém com a tecnologia avançando a passos largos, esse tipo de
software que replicava a utilização de um papel e caneta se tornou obsoleto e programas que
utilizam de tecnologias de visualização 3D e automação de vistas se tornaram essenciais no
currículo de um profissional de arquitetura.
Além de permitirem a confecção de projetos técnicos com alto nível de detalhamento
em um tempo muito menor do que o padrão até então, os softwares voltados para os arquite-
tos passaram a permitir também a criação de imagens hiper-realistas de seus projetos, melho-
rando a visualização prévia das obras ao ponto de serem (conforme o nível de detalhe do mo-
delo) muito próximos ao resultado real após a finalização da obra. Esse tipo de software em
específico não somente se assemelha com os utilizados por jogos, como descendem direta-
mente destes, desde o conceito de visualização tridimensional ao próprio código fonte no qual
se baseia a construção dos modelos.
Um exemplo muito claro está em softwares especializados na geração de imagens ren-
derizadas, com visualização em tempo real, como o Lumion. Como descrito no site da empre-
sa desenvolvedora (Act-3D), o software foi desenvolvido a para que pudesse oferecer aos
arquitetos um programa que fosse capaz de demonstrar em tempo real como o projeto que
estava desenvolvendo se pareceria na imagem final. Os dois criadores iniciais do programa
eram programadores e se basearam nas mecânicas de Map creators/World Editors (Criador de
mapas/Editor de mundos) muito comuns em jogos até então. Este sistema de edição permite
que os jogadores desenvolvam seus próprios mapas e fases a partir dos modelos e texturas
existentes dentro do jogo base, dessa forma o usuário pode usar ferramentas de clicar e arras-
tar numa série de elementos disponibilizados. Essa liberdade dada aos jogadores para criarem
suas próprias fases fez extremo sucesso nos jogos criados a partir de 1990, como Super Mario
World (Nintendo, 1990) garantindo a existência desse tipo de ferramenta até mesmo nos jogos
desenvolvidos atualmente. É muito comum a criação de comunidades on-line onde os jogado-
res compartilham suas fases e dão feedback uns aos outros, fomentando o aprimoramento e a
exploração à exaustão das possibilidades que os editores oferecem, surpreendendo muitas
vezes até mesmo os desenvolvedores, chegando ao ponto de empresas comprarem e “oficiali-
zarem” esses níveis autorais.
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Imagem 30 - Ferramenta de criação de mapas em Warcraft III

Fonte: http://cbagamez.blogspot.com/2012/12/warcraft-3-world-editor-
introducao.html. Acessado em 7, agosto de 2021

Assim como essas ferramentas de edição e criação de mapas/fases, os softwares de


renderização como Lumion, costumam fornecer para o usuário uma biblioteca com centenas a
milhares de modelos já prontos, de forma que seja possível apenas selecionar e arrastar os
objetos para as “cenas”. Além da biblioteca pronta, é comum na indústria a comercialização
de modelos tridimensionais, existindo sites de comércio especializados nesse tipo de produto,
que abastece não somente a indústria de jogos, como a de cinema, computação e como já
mencionado a arquitetura e design.
Imagem 31 - Software gerador de imagens de projetos arquitetônicos (Lumion)

Fonte: 7https://lumion.com/product.html. Acessado em 15, agosto de 2021


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Imagem 32 - Engine para criação de jogos (Unreal 5)

Fonte: Acervo do autor.

Outro fator, apontado também no capítulo de desenvolvimento, é o trabalho de artista


3D. Como dito no parágrafo acima, a existência de uma nicho de mercado voltado para a co-
mercialização de modelos tridimensionais abriu portas para uma nova aplicação das habilida-
des desenvolvidas pelos estudantes de arquitetura até porque hoje em dia a aplicação da in-
formática já faz parte das Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de Arquitetura e Urba-
nismo () exigida pelo Ministério da Educação, portanto é esperado que ao finalizar o curso o
profissional esteja familiarizado com tais ferramentas digitais. Muitos profissionais que de-
senvolvem afinidade com estas ferramentas acabam por permanecer na área, se dedicando a
criação, modelagem e venda de modelos 3D prontos para serem baixados e utilizados dentro
dos softwares de renderização. Esse tipo de trabalho costuma ser muito desenvolvido também
por profissionais da área de design, desde o designer de produtos até o de interiores.

6.2. A ASSESSORIA

Com o avanço das tecnologias responsáveis por gerar os gráficos dentro de jogo, estes
passaram a apresentar visuais cada vez mais realistas, incorporando efeitos visuais que tornam
os ambientes dos jogos mais imersivos para os jogadores, tais como sombras, reflexos, ilumi-
nações globais e volumétricas, refração da água etc. Um fator muito importante para que essa
qualidade de imagem fosse alcançada, está no ganho de capacidade de processamento dos
hardwares, desenvolvidos especificamente com estes propósitos, permitindo que os modelos
3D utilizados nos jogos passassem de representações “”, cheios de formas agudas devido a
limitação de polígonos, para modelos extremamente detalhados com centenas de milhares de
polígonos e que imagens com maior definição pudessem ser utilizadas como texturas.
49

Imagem 34 - Cena em jogo (DOOM, 1993)

Fonte: https://bethesda.net/pt/store/product/DO1GNGPCBG01. Acessado em 24, outubro de 2021.

Imagem 33 - Cena em jogo (Red Dead Redemption II)

Fonte: 8https://www.rockstargames.com/br/newswire/article/ak19112o9o53k9/the-five-states-
red-dead-redemption-2-nature-documentary-by-8-bit-bast. Acessado em 24, outubro de 2021

Porém, nem sempre os jogos com os gráficos mais realistas e resoluções extravagantes
conseguem alcançar a imersão esperada desse tipo de jogo, uma parte disso se deve muito ao
level designer (por todos os motivos já explicados), mas o principal motivo muitas vezes,
acaba sendo a falta de embasamento e informação para a construção dos ambientes do jogo. É
comum que ao vivenciar novas experiências visuais, o nosso cérebro procure reconhecer e
estabelecer conexões com padrões já conhecidos, como se tentássemos ligar, de maneira in-
consciente, uma imagem/paisagem/ambiente/objeto a alguma coisa semelhante com a qual já
tenhamos tido contato. O que acontece nesses casos, é que analisamos, mesmo sem perceber,
a incoerência de certos lugares ou construções e até mesmo ambientes complexos com deze-
nas de objetos. Essa “rejeição” ocorre com maior intensidade quando se trata de coisas que já
conhecemos e/ou sabemos como funcionam, por exemplo, ao jogar um jogo que retrata algum
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período histórico em específico, em um lugar específico, é comum que já esperemos nos de-
parar com lugares e construções conhecidas daquele local, porém a falta de fidelidade ou até
mesmo erros de referenciamento tiram nossa atenção da gameplay. Para que este tipo de situ-
ação não aconteça, as empresas mais estabelecidas no mercado de jogos, muitas vezes respon-
sáveis pelos jogos Triple-A, possuem na equipe de desenvolvimento ou até mesmo terceiri-
zam, profissionais que sejam responsáveis por garantir a fidelidade daquilo representado em
seus jogos, seja na representação étnica de personagens ou sua cultura, objetos e principal-
mente, sua Arquitetura.
Já é comum encontrar no mercado de jogos digitais, Arquitetos e Urbanistas que traba-
lham em conjunto às equipes de desenvolvimento de jogos, não só as responsáveis pela parte
visual dentro do jogo, como também fornecendo informações para os roteiristas, animadores e
os próprios game designers sobre toda a ambientação relacionada à cultura ou tempo em que o
jogo se passa. Estes profissionais costumam prestar assessorias ou até mesmo trabalharem
como artistas conceituais durante o desenvolvimento, muitas vezes são responsáveis por man-
ter a “coerência histórica” dentro do jogo, seja limitando os conceitos e ideias explorados ou
norteando os game designers.
Um exemplo disto, está na arquiteta María Elisa Navarro, formada pela Faculdade de
Arquitetura e Desenho na Universidade de Los Andes, que foi convidada a participar do de-
senvolvimento do jogo Assassin´s Creed II no começo de 2008, logo no começo da produção.
O jogo conta a história de um jovem que através de certas tecnologias é capaz de se
conectar com seus antepassados e vivenciar suas vidas, neste jogo em específico, o jogador
assume o controle de Ezio Auditore da Firenze, um jovem cuja história se passa entre os anos
de 1476 e 1503, que como mencionado no primeiro capítulo, condiz com o período histórico
da Renascença, além de se passar em Florença - Itália, local em que é considerado o berço do
Renascimento. O jogo se passa em meio a cidade, e apresenta mecânicas de Parkour, das
quais o jogador utiliza para se deslocar e cumprir os objetivos pela cidade, utilizando de todos
os objetos e edifícios disponíveis no cenário. Sendo assim, a empresa desenvolvedora (Ubi-
soft) procurou manter a maior fidelidade possível às construções da época, e para tal, contra-
taram Maria Elísa.
Imagem 35 - Imagem promocional de Assassin´s Creed II

Fonte: 9https://store.ubi.com/ofertas/assassins-creed-
2/56c4947f88a7e300458b4690.html?lang=pt_BR. Acessado em 23, outubro de 2021
51

Inicialmente, conforme relata a arquiteta em entrevista concedida ao ArchDaily (7, ou-


tubro de 2015), ela ministrou aulas para a equipe de desenvolvimento, nas quais apresentava e
explicava todo o contexto histórico e cultural da época, além de preparar arquivos contendo
informações e imagens para servirem de referência para toda a equipe de arte. Um exemplo
deste tipo de documento, era uma lista com todos os edifícios daquela época que podem ser
encontrados ainda hoje na cidade Toscana. Desta forma, sempre que os modeladores finaliza-
vam um modelo de edifício ou monumento, ela os inspecionava minuciosamente a fim de
encontrar possíveis equívocos, como utilização de texturas de materiais ou até mesmo objetos
que não existiam naquele momento e região específica. Para poder dar assistência a jogabili-
dade, era necessária a adição de elementos que possibilitassem que o personagem escalasse as
construções, o que tornava a intervenção de María não apenas “”, mas ativa, de forma que esta
sugerisse e participasse dos processos de soluções necessários para a construção do cenário.
Desde então, houve uma popularização desse tipo de relacionamento entre os profissi-
onais da área de arquitetura/historiadores e desenvolvedores, a fim de aumentar a imersão e
melhorar a fidelidade do que é representado, assim como é feito no cinema, não à toa, a fran-
quia de jogos Assassin´s Creed passou a definir equipes especializadas nesse tipo de “levan-
tamento” histórico, já que cada novo jogo lançado costuma focar em um local ou temática
específica, que acabou por levar a empresa a fazer o lançamento de um modo de jogo no qual
os jogadores são guiados através de um tour pelos locais relevantes da história do jogo base,
chamado de Discovery Tour, o modo já está disponível como uma DLC para os últimos 3
jogos da franquia. Os guias costumam ser personagens históricos e/ou fictícios que viajam
com o jogador através dos cenários explorados pelo jogo, focando em aspectos gerais como,
cultura, artes, ciências, e arquitetura, e além do jogador poder se movimentar de forma livre
pelo mapa, ele também pode interagir com personagens que fornecerão informações sobre o
cotidiano das pessoas que ali viviam e informações precisas sobre os demais aspectos que
compõe o ambiente. Este modo ainda leva o jogador a desbloquear novas ferramentas, como
personagens, armas, montarias e demais itens que fomentam a exploração.

Imagem 36 - Cena em jogo (Discovery Tour - Assassin´s Creed Odyssey)

Fonte:https://store.ubi.com/ofertas/assassins-creed-
2/56c4947f88a7e300458b4690.html?lang=pt_BR. Acessado em 23, outubro de 2021
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6.3. O LEVEL DESIGN

Ao longo do capítulo sobre o desenvolvimento de jogos, o cargo de level designer foi


brevemente mencionado justamente para que pudesse ser melhor analisado neste capítulo, no
qual serão explicadas as várias funções a serem desenvolvidas pelo level designer.
Em Fundamentals of Game Design (2010, p.359), Ernest Adams afirma que “Se você
já se encontrou admirando a paisagem de um jogo, ou apreciando o modo como os desafios
do jogo continuam te intrigando, você está admirando o trabalho do designer de nível”. Esta
afirmação se deve ao fato de que o responsável por elaborar e criar todos os ambientes do
jogo, é o designer de nível (level designer), não que ele seja efetivamente o criador de tudo
que você encontra no cenário (embora muitos level designers o façam), ele na verdade é quem
conduz ou supervisiona estes trabalhos mais específicos. Enquanto o trabalho do game desig-
ner é definir os conceitos e aspectos gerais do jogo, o do level designer é assimilar estes con-
ceitos e conciliá-los em harmonia dentro do ambiente jogável.
Entre os trabalhos realizados pelo level designer, estão a criação dos espaços onde o
jogo se desenvolve, os objetivos e desafios que aquele nível possuirá, o modo como aquele
ambiente contribuirá para a história do jogo, através de suas cores, texturas, composições e até
mesmo gráficos.
Em um paralelo às demais profissões, o level designer seria o arquiteto do jogo, ele
quem fará os primeiros (e definirá o último) esboços de mapa, definirá como o jogador irá se
deslocar por ele, e o que acontecerá em cada ponto deste. É também quem define os objetos,
texturas e construções existentes ao longo dos ambientes, é responsável por criar e setorizar os
espaços, como por exemplo onde o jogador deverá combater o inimigo, onde este deve des-
cansar, onde procurar por pistas ou acessórios etc.
Imagem 37 - Mapa de Night City (Cyberpunk 2077)

Fonte: https://www.cyberpunk.net/br/pt-br/. Acessado em 5, junho de 2021


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Assim como o trabalho de um arquiteto, o designer começa a partir de um programa


de necessidades, as quais geralmente são dadas pelo game designer, responsável pela “idéia”
do jogo. A partir da lista, são elaborados os requisitos chaves para o nível em específico, co-
mo o objetivo final ao se “vencer” e como conectá-lo à história - um level bem feito, criará ao
longo deste uma curva de expectativa, que acumula ao longo do jogo, ou mesmo do nível, seja
pelo contínuo aumento de dificuldade dos inimigos, ou pela dramaticidade daquele momento,
em seguida um esboço do mapa começa a tomar vida - é importante mencionar, que não é
essencial ao level designer, que este possua conhecimentos sobre desenho ou ferramentas para
criação de modelos e/ou programação, embora seja notável o aumento da procura por profis-
sionais que possuam tais características no mercado, devido a facilitação que dão ao trabalho
em equipe - e nele são distribuídos alguns dos itens presentes no programa de necessidades.
Um fator determinante para esse processo é qual o gênero do jogo, pois além de mudar os
conceitos e a jogabilidade explorada, o ambiente também mudará.
Diferentes tipos de gêneros possuem diferentes tipos de layouts de nível. Um jogo de
aventura por exemplo, possui muito de sua essência na história que pretende contar, geral-
mente este tipo de jogo costuma explorar a evolução de seus personagens enquanto melhoram
suas habilidades e conhecem novos lugares, e para que tudo funcione em harmonia, é necessá-
rio que os ambientes deem suporte à história. Por isso os layouts de mapa desse gênero cos-
tumam ser lineares, de forma que acompanhem a evolução do jogador, e apresente a cada ní-
vel alcançado, desafios novos a serem superados pelo personagem e mecânicas mais comple-
xas a serem aprendidas pelo jogador.
Imagem 38 - Esquema de Layout linear

Fonte: Acervo do autor.


Toda via, um mesmo gênero pode explorar diferentes tipos de layouts, até mesmo den-
tro de um único jogo. Outro tipo de layout frequentemente utilizado em jogos de aventura, é o
layout em anel, neste modelo, o jogador avança em diferentes fases, até o ponto em que co-
meça a revistar pontos pelo qual passou, já com mecânicas mais avançadas, oferecendo ao
jogador, uma nova possibilidade de exploração, mesmo que em um nível no qual este já tenha
passado. Este tipo de layout costuma utilizar do conceito de “chave e porta”, no qual para
explorar um novo caminho, o jogador deve antes seguir por um outro, o qual o levará, através
de desafios até a obtenção da “chave”, para que este então retorne e possa seguir pelo cami-
nho antes bloqueado.
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Imagem 40 - Esquema de Layout em Anel

Fonte: 10Acervo do autor


Outro modelo de layout, que costuma contrapor todos os demais, é o conceito de la-
yout aberto, no qual um grande mapa é desenvolvido para que o jogador explore, sem a
necessidade de se ater somente aos objetivos principais. Este tipo de layout costuma estar
presentes em jogos que deem suporte para o Role Play (interpretação de personagens)
onde o jogador pode passar boa parte de seu tempo procurando meios alternativos para
melhorar as habilidades e equipamentos de seu personagem. Este modo apresenta algumas
limitações, como, de que modo limitar os limites da área jogável, que muitas vezes são
resolvidas com uma explicação que parte da temática ou história, como já discutido ante-
riormente. Um exemplo deste tipo de layout é o mapa de Red Dead Redemption II
(RockStar Games, 2018), com temática velho-oeste e que possui um modo online vendido
separadamente do jogo base, que funciona com mecânica de RPG, no qual os jogadores
podem formar bandos e melhorar seus equipamentos e posses.
Imagem 39 - Mapa de Red Dead Redemption II

Fonte: https://reddead.fandom.com/pt-br/wiki/Página_Principal. Acessado em 6, junho de 2021


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Após a determinação do layout, o level designer deve implementar dentro deste, todos
os aspectos necessários para a gameplay conforme acordado com o game designer. Esse pro-
cesso diz respeito principalmente, ao posicionamento de objetos e artifícios que deem suporte
a mecânica de jogo. Um exemplo comum, está nos jogos de FPS competitivos (jogos de first
person shooter multiplayer online), no qual cada partida apresenta um mapa diferente, cada
qual com suas peculiaridades, mas sempre fechados, sem a possibilidade do jogador explorar
ou desbloquear locais novos. Estes jogos são divididos em partidas de rounds ímpares, no
qual duas equipes se enfrentam, sendo vencedora aquela que ganhar o maior número de
rounds, que pode acontecer com a eliminação da equipe adversária, ou, na maioria das vezes,
com o tempo do round se esgotando e uma das equipes tendo concluído seu objetivo (plantar
uma bomba ou algo do tipo). Um FPS mundialmente conhecido e com campeonatos com
prêmios milionários, é Counter Strike - Global Ofensive (CS-GO), o jogo possui um cenário
altamente competitivo, no qual os jogadores exploram ao longo dos treinos, todas (à exaustão)
possibilidades que os mapas têm à oferecer, por isso, o level design desse tipo de jogo, passa
por inúmeros testes, a fim de eliminar possíveis vantagens que um posicionamento possa ofe-
recer à uma equipe. E como um projeto arquitetônico, o mapa também é passível de falhas,
apontadas apenas posteriormente ao seu lançamento.

Imagem 41 - Mapa Mirage de Counter Strike - Global Ofensive

Fonte: 11https://steamcommunity.com/sharedfiles/filedetails/?id=1110438811. Acessado em 28, outubro de 2021

6.4. ENVIROMENT DESIGN

Não distante do artista 3D e do Level Designer está o designer de ambientes (Enviro-


ment Designer), que atua como uma síntese dessas duas já mencionadas, com o diferencial de
que na maioria das vezes se limita a ambientes internos e/ou desenvolvimento de ambientes
específicos do jogo. Enquanto o Level Designer está mais preocupado com a experiência do
jogador, determinando a posição, dimensões e demais fatores físicos de todo o nível/mapa, o
enviroment design se atém a um ambiente por vez, sendo responsável por conceber os demais
detalhes do cenário, sejam interativos ou não.
Este atua muitas vezes como o artista responsável por criar os modelos e/ou texturas
presentes no cenário, porém, diferente do artista 3D, sua visão tende a ser mais voltada para
os conceitos do jogo e menos o manuseio da ferramenta de modelagem por si só, além disso,
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é trabalho do designer de ambientes, fazer com que seja possível “encaixar” tudo feito dentro
do jogo, prevendo soluções para representações, quantidade de polígonos e todos os demais
problemas que possam vir a ocorrer durante a construção do ambiente virtual.
O produto de seu trabalho se reflete nas entrelinhas do ambiente, pois mais do que for-
necer suporte à gameplay, os cenários construídos contam histórias de maneira visual, sem
que nada precise ser explicado dentro de jogo, dando nas mãos do jogador o poder de criar
suas próprias versões da história baseado naquilo que vê ao seu redor.

Imagem 42 - Cena em jogo de The Last of Us 2

Fonte: 12The Art of the Last of Us 2 (2020)

Um caso de um ótimo trabalho de enviroment design está no jogo The Last of Us 2


(Naughty Dog, 2020), que retrata um cenário pós apocalíptico no qual o restante da humani-
dade tenta sobreviver em meio a cidades abandonadas onde a natureza reivindica seu espaço.
Durante o jogo, é comum se deparar com ambientes internos repletos de objetos que se inter-
pretados em conjunto com os demais aspectos do jogo, permitem ao jogador acrescentar deta-
lhes à história contada pelo jogo que variam de um para o outro, pois dependem da sua inter-
pretação e demais aspectos individuais.
Imagem 43 - Arte Conceitual de The Last of Us 2

Fonte: The Art of The Last of Us 2 (2020)


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7. CONCLUSÃO

Tendo explicado ao longo do trabalho, as formas como as artes se relacionam com a


Arquitetura, como os jogos chegaram à posição de mídia de entretenimento mais rentável e
como são desenvolvidos, dados e pesquisas que apontam o contínuo crescimento deste setor,
e a aplicação de uma análise arquitetônica à um jogo, acredito ter elaborado argumentos sufi-
cientes para convencer quem quer esteja lendo este trabalho de que o mercado de jogos é de
fato uma área promissora para os profissionais da Arquitetura e Urbanismo.
No capítulo final, foram elencados alguns dos cargos presentes em uma equipe de de-
senvolvimento de jogos, associando sempre suas atividades, a atividades similares que um
profissional de arquitetura possa desenvolver ao longo de sua formação, ficando evidente, que
não distante de um arquiteto que trabalha para criação de cenários de filmes peças etc., está o
profissional que projeta jogos e níveis. Apesar de não ser necessário um diploma de Arquite-
tura e Urbanismo, estes serviços carecem de profissionais que entendam o processo de se pro-
jetar um ambiente, e que possuam sensibilidade tal qual para se colocar na posição de consu-
midor, que ao comprar um jogo e gastar horas de seu tempo livre dentro de um ambiente vir-
tual, consiga parar por certos momentos para admirar o trabalho por trás do que lhe é mostra-
do na tela de seu monitor. Pois assim como experienciar uma obra física no mundo real, po-
demos (dentro de sua escala) vivenciar e sentir novas experiências dentro dos vários mundos
que os jogos nos apresentam.
Deste modo é possível, levando-se em consideração todos os pontos levantados ante-
riormente, que a carreira de um Arquiteto e Urbanista, por mais ampla que já possa ser, se
estenda para além dos limites convencionais da área da construção civil, a qual somos direci-
onados durante maior parte de nossa formação. Um novo caminho para as aplicações do co-
nhecimento arquitetônico já começou a ser explorado, e está em constante busca por profissi-
onais qualificados, que possam transgredir as barreiras do lápis e papel para criar mundos e
lugares novos, nunca experimentados, em um ambiente virtual composto de polígonos e
pixels.
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ZAMBARDA, Pedro. GTA V gerou cerca de um bilhão de dólares em receitas só em


2020. [S. l.], 30 maio 2021. Disponível em:
https://dropsdejogos.uai.com.br/noticias/industria/gta-v-gerou-cerca-de-um-bilhao-de-
dolares-em-receitas-so-em-2020/. Acesso em: 26 jun. 2021.
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APÊNDICES

APÊNDICE A – FORMULÁRIOS

Formulário 1 – Disponível em: https://forms.gle/pw66HFdBJGD56V867


Formulário 2 – Disponível em: https://forms.gle/Cjwv8cFv2AABFC4d9
Formulário 3 – Disponível em: https://forms.gle/6dNewnfZjfHAoeNt7

APÊNDICE B – ESTUDO DE CASO


Vídeo de estudo de caso – Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=IRDMdPuHsmI

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