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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS

CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS – BACHARELADO

OS VÁRIOS MUNDOS NUM SÓ:


PAISAGENS URBANAS GOIANIENSES SOB O OLHAR FLÂNEUR NA AVENIDA E
EIXO ANHANGUERA

Aluna: JORDANNA FONSECA SILVA

Goiânia

2017
UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS

CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS – BACHARELADO

OS VÁRIOS MUNDOS NUM SÓ:


PAISAGENS URBANAS GOIANIENSES SOB O OLHAR FLÂNEUR NA AVENIDA E
EIXO ANHANGUERA

Monografia apresentada à
Faculdade de Ciências Sociais
como requisito parcial para a
obtenção do título de bacharel em
Ciências Sociais.

Orientadora: Ivanilda Aparecida de


Andrade Junqueira

Aluna: JORDANNA FONSECA SILVA

Goiânia

2017
JORDANNA FONSECA DA SILVA

OS VÁRIOS MUNDOS NUM SÓ:


PAISAGENS URBANAS GOIÂNIENSES SOB O OLHAR FLANEUR NA AVENIDA E
EIXO ANHANGUERA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Ciências Sociais da


Universidade Federal de Goiás, para obtenção do título de Bacharel em Ciências Sociais,
aprovado em 14 de dezembro de 2017, pela Banca Examinadora constituída pelos/as
seguintes professores/as:

___________________________________________

Profa. Dra. Ivanilda Aparecida de Andrade Junqueira


Orientadora

___________________________________________

Prof. Dr. Jordão Horta Nunes


Examinador

___________________________________________

Profa. Ms. Ana Karina Calmon


Examinadora
AGRADECIMENTOS

A Deus,

Ao meu pai, Walteir, e à minha mãe, Roseany, mãe e pai, sem ordem,

À minha avó, Maria, e ao meu avô, João,

À minha irmã, Jamille, e cunhado, Gabriel,

Ao meu irmão, Eduardo,

Aos meus sobrinhos, Diego e Mateus,

Às minhas amigas e amigos,

À minha turma-família e professores/as do CEPAE/UFG,

Aos colegas e amigas/os da FCS/UFG,

À orientadora deste trabalho, da iniciação científica e das ideias para uma dissertação, profa.
Ivanilda,

Aos professores/as da FCS/UFG,

Aos/Às colegas de estágio e monitoria,

Aos amores e esperanças,

Às resistências e mudanças,

Aos desconhecidos/as e solitários/as,

Às multidões.
A rua se torna moradia para o flâneur, que,
entre as fachadas dos prédios, sente-se em
casa tanto quanto o burguês entre suas quatro
paredes.

W. Benjamin, O Flâneur
Resumo

As discussões sobre paisagem urbana, segregação socioespacial, cidadania e direito à cidade,


levam este trabalho a desenvolver uma reflexão sobre as desigualdades sociais que habitam o
espaço urbano da cidade de Goiânia, tendo como principal objeto de análise a Av.
Anhanguera. Para isso, foram utilizadas fotografias do percurso leste e oeste, abarcando toda
a avenida no interior da capital, para posterior leitura e análise das imagens. Também foi
realizada uma etnografia urbana, com observação participante, simples, deste pedaço da
cidade a partir do Eixo Anhanguera, veículo que trafega exclusivamente por esta avenida. A
partir disso, foram analisadas as condições de mobilidade à disposição dos/as citadinos/as que
utilizam este veículo de massa, BRT. Os resultados apontam para uma estreita relação entre a
desigualdade social e a segregação espacial, mostrando como, à medida que nos afastamos
das regiões centrais e nos aproximamos das regiões periféricas, os lugares da cidade se
alteram, significativamente, no que diz respeito a serviços e estética urbana.

Palavras-chave: Av. Anhanguera; segregação socioespacial; paisagem urbana; mobilidade


urbana.
Abstract

The discussions on urban landscape, socio-spatial segregation, citizenship and right to the
city, lead this work to develop a reflection on the social inequalities that inhabit the urban
space of the city of Goiânia, having as main object of analysis Av. Anhanguera. For this,
photographs of the east and west route were used, covering the entire avenue inside the
capital, for later reading and analysis of the images. An urban ethnography was also carried
out, with a simple participant observation of this part of the city from the Eixo Anhanguera, a
vehicle that travels exclusively through this avenue. From this, the conditions of mobility
available to citizens using this mass vehicle, BRT, were analyzed. The results point to a close
relationship between social inequality and spatial segregation, showing how, as we move
away from the central regions and approach the peripheral regions, the places of the city
change significantly, in terms of services and urban aesthetics.

Keywords: Av. Anhanguera; social-spatial segregation; urban landscape; urban mobility.


Lista de Figuras

Figura 1: Introdução: os vários mundos num só .................................................................... 10


Figura 2: Av. Anhanguera em 1968 ....................................................................................... 18
Figura 3: “Compra-se ouro”: Av. Anhanguera, St. Central ................................................... 21
Figura 4 [Detalhe fig. 3]: “O sono dos justos” ou A informação dos sobreviventes ............. 26
Figura 5: ESTAÇÃO 1: o confinamento ou pêndulo: como ir e vir? O Eixo Anhanguera ... 27
Figura 6: Início da Av. Anhanguera, saída do Terminal Novo Mundo ................................. 31
Figura 7: Mapa do Eixo Anhanguera ..................................................................................... 34
Figura 8: “Americanizando”: Av. Anhanguera, St. Central .................................................. 35
Figura 9: Teatro Goiânia, cruzamento Av. Anhanguera e Av. Tocantins ............................. 35
Figura 10: O império das mercadorias, St. Central ................................................................ 36
Figura 11: Hemocentro de Goiânia, St. Aeroporto ................................................................ 38
Figura 12: Jd. Novo Mundo, saída para Senador Canedo, Av. Anhanguera ......................... 38
Figura 13: Espera, corre-corre e aflição: Terminal Praça A, St. Campinas ........................... 39
Figura 14 [Detalhe fig. 13]: A senhora e a mochila .............................................................. 40
Figura 15: Trocas: Terminal Dergo, St. Aeroviário ............................................................... 40
Figura 16: ÚLTIMA PARADA: a cidade como um lugar de tensões e conflitos [...] .......... 44
Figura 17: Estação Vila Morais, entrada Jd. Novo Mundo ................................................... 45
Figura 18 [Detalhe fig. 17]: Calçada, lixo e barranco ........................................................... 46
Figura 19 [Detalhe fig. 17]: Casas no relevo ........................................................................ 46
Figura 20: Passeio entre árvores e edifícios: Parque Lago das Rosas, St. Oeste ................... 48
Figura 21 [Detalhe fig. 20]: Prédios e sentidos ..................................................................... 49
Figura 22 [Detalhe fig. 20]: Entre trampolim, pedalinhos e obrigações ............................... 49
Figura 23: Homenagem ao fazendeiro abandonado, Av. Anhanguera .................................. 51
Figura 24: Considerações Finais ............................................................................................ 52
Sumário

Introdução: Os vários mundos num só... ............................................................................... 10


MARCO ZERO – Uma moderna capital no cerrado brasileiro ............................................. 18
ESTAÇÃO 1 – O confinamento ou o pêndulo: como ir e vir? O Eixo Anhanguera ............. 27
ÚLTIMA PARADA – A cidade como um lugar de tensões e conflitos: A Av. Anhanguera 44
Considerações Finais ............................................................................................................. 52
Referências Bibliográficas ..................................................................................................... 56
10

Figura 1 - Introdução: Os vários mundos num só..., St. Central / Fonte: Elaboração própria da autora (2017)

Introdução: Os vários mundos num só...


11

Introdução: Os vários mundos num só...

Quando pensamos e nos dispomos a mudar o mundo, transformar a realidade social,


acabar com a injustiça, seja com propostas de nível mundial, extrapolando fronteiras e limites;
seja no nível nacional, regional, local, ou com pequenas ações no limitado universo
individual, a igualdade surge como principal horizonte. A integração absoluta dos seres
humanos entre si, da humanidade, implica a percepção de que há muito mais semelhanças do
que diferenças entre o Outro e o Eu. Isso não quer dizer, por outro lado, que buscamos uma
homogênea composição humana, imune de características distintas, peculiares, particulares.
Tanto no que se refere a culturas e sociedades diferentes, povos e grupos com formas de
organização político-econômica-social nitidamente diferentes entre si, quanto no que diz
respeito a indivíduos de uma mesma comunidade, sociedade, nação, essa diversidade é o que
torna a vida tão vasta e infinita em possibilidades.
A grande dificuldade está em discernir entre o que é diferença e o que é desigualdade,
e até que ponto uma se relaciona a outra. Esse debate vale para muitos aspectos da vida
sociocultural: sexo/gênero, religião, trabalho/profissão, grupos etários, local de moradia,
parentesco etc. O amplo espectro da liberdade possibilita aos indivíduos, dentro de suas
condições, optarem por, por exemplo, utilizar ou não o transporte coletivo, morar ou não em
uma região central, aceitar ou não as humilhações de seus superiores no trabalho, vestir-se de
determinada forma, praticar ou não esportes, alimentar-se seguindo uma dieta balanceada ou
desleixadamente, praticar ou não um culto religioso, ir ou não à escola etc. Percebemos,
então, que a liberdade envolve vários aspectos da vida individual, desde questões psíquicas,
de pensamento, sentimento, imaginação, vontades, desejos etc., a questões sociais mais
amplas, políticas, de associação, de ação coletiva, comportamentos, atitudes, valores,
identidades, pertencimento a grupos etc.
Que os indivíduos são diferentes entre si é fator indiscutível e absolutamente
importante. Que a sociedade se organiza de forma desigual, garantindo a poucos boas
condições de existência e, à maioria, modos de vida degradantes, é algo a ser questionado.
Neste trabalho, busquei analisar as desigualdades sociais observáveis na paisagem
urbana e nas condições de mobilidade urbana da capital de Goiás, Goiânia, tomando como
ponto de partida a Av. Anhanguera e o corredor de transporte público denominado de Eixo
12

Anhanguera1. Tendo utilizado o veículo diariamente para ter acesso à cidade, frequentar aulas,
passear, me interessei por compreender como se dão as relações sociais percebidas dentro do
Eixo, e como são as alterações das paisagens observadas através da janela do coletivo que nos
leva de uma ponta a outra do corredor. Procurei refletir sobre a apropriação do espaço pelos
sujeitos/agentes sociais; como se conformam as múltiplas territorialidades e fronteiras em sua
dimensão política; e, ainda, se é possível pensá-lo como um espaço de troca entre os sujeitos
sociais ou como uma “guerra de lugares”. Acredito que as pessoas reinventam novas formas
de se apropriar dos espaços públicos, transformando sua paisagem de acordo com seus
interesses e cujos simbolismos encontram-se inscritos nos locais onde vivenciam seu
cotidiano. De modo geral, esse é o tema central da pesquisa, que se desmembra em outros
ramos.
Objetivo apresentar uma visão geral da segregação socioespacial existente no decorrer
da Av. Anhanguera, como um recorte da realidade na cidade de Goiânia e em outras
metrópoles, partindo dos estudos sobre paisagem urbana, espaço urbano, cidadania e
desigualdades sociais. Para isso, percorri com o Eixo Anhanguera, o principal transporte de
massa da capital - a qual não conta com metrô ou trem –, durante vários dias, a Av.
Anhanguera. O veículo biarticulado trafega exclusivamente por essa avenida. Nele
encontramos de bebês de colo a idosos que utilizam muletas enfrentando diariamente a
superlotação, a falta de respeito das empresas para com o/a consumidor/a, do Estado para com
a/o cidadã/o, além da insegurança, preços incompatíveis com o serviço, desconforto, tempo de
espera elevado nos horários de pico, péssimas condições de espera etc.
A proposta metodológica consiste em uma “caminhada virtual” (ARANTES, 2000),
por meio da qual atravesso a cidade a partir da Av. Anhanguera, capturando os trechos com
fotografias para, em seguida, descrevê-las e analisá-las. Procurei estabelecer um diálogo entre
a obra de Arantes e de Benjamin, pois, minha intenção foi olhar para cidade considerando-a
um grande laboratório. Entretanto, diferente do flâneur que caminha sem destino e a “passos
de tartaruga”, cultuando as ruas da metrópole moderna, observo a cidade da janela do coletivo
e meu destino foi pré-estabelecido. Apesar desta diferença, para mim, assim como para o
flâneur benjaminiano:

1
O Eixo Anhanguera foi o precursor de toda a rede integrada de transportes coletivos que hoje opera na Região
Metropolitana. Sua história mistura-se com a da Rede Metropolitana de Transportes Coletivos (RMTC). Ele
representa o principal eixo de estruturação, de interconexão de linhas e de distribuição de demanda do transporte
coletivo em operação na capital. Para saber mais, ver: BORGES, Adriane Tavares. Mobillidade urbana: os
corredores de transporte coletivo de passageiros em Goiânia. Dissertação (mestrado) – Pontifícia Universidade
Católica de Goiás, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Desenvolvimento e Planejamento Territorial,
2015.
13

Os letreiros esmaltados e brilhantes das firmas são um adorno de parede tão


bom ou melhor que a pintura a óleo no salão do burguês; muros são a
escrivaninha onde apoia o bloco de apontamentos; bancas de jornais são
suas bibliotecas, e os terraços dos cafés, as sacadas de onde, após o trabalho,
observa o ambiente. Que a vida em toda a sua diversidade, em toda sua
inesgotável riqueza de variações, só se desenvolva entre paralelepípedos
cinzentos (BENJAMIN, 1994, p.35).

Cabe definir a flâneurie, antes de tudo, como um tipo de ação social sobre o espaço
urbano, seguindo o traçado da cidade, o movimento da multidão. Para Benjamin (2007), que
se debruçou em encontrar o tipo literário do flâneur nas obras de escritores do século XIX, em
especial Charles Baudelaire e Edgar Allan Poe, este personagem possui características que lhe
são próprias. Ocioso, vagabundo, observador, caminhante. O flâneur torna-se multidão e
apenas existe em seu meio, sem perder sua individualidade. Benjamin (2007) afirma, todavia,
que a ociosidade resulta de um confronto com a divisão do trabalho social, assim como a
lentidão dos movimentos, a ausência da pressa, são também uma afronta aos modos de vida
urbanos, erguidos na modernidade, com a correria, a velocidade e o controle do tempo pelo
relógio.
O flâneur compõe seus devaneios como legendas para as imagens, parafraseando
Benjamin (2007). Assim, a elaboração das legendas e nomeação das fotografias ocorreu de
maneira livre, seguindo uma linha descritiva ou metafórica, e, por vezes, um tom sarcástico
que se justifica diante das contradições presentes nas imagens. O percurso analisado segue,
necessariamente, um norteamento básico: o coletivo sai de uma região periférica, atravessa
um setor médio-nobre, corta o setor comercial-central, e encontra novamente uma região
periférica.
Ainda sobre a metodologia aplicada adotei a revisão bibliográfica aliada à etnografia
urbana (MAGNANI, 2002) e produção das fotografias. No primeiro caso, o levantamento
bibliográfico, leituras, fichamentos e produção de resumos, fundamentaram o processo de
formação da pesquisadora e o aprofundamento teórico no assunto a ser estudado. Esse
processo inicial contribuiu para a discussão sobre os conceitos indicados nos objetivos
específicos, que foram basilares para o seguimento da pesquisa, tais como “paisagem urbana”,
“lugar”, “mobilidade urbana”, “cidade”, “espaço público”, entre outros.
A metodologia de Leitura e Análise da imagem, proposta por Coutinho (2011), foi
escolhida, considerando a produção de fotografias sob o olhar do flâneur que observa a
paisagem urbana goianiense. Ela será fundamental para a compreensão das mudanças
ocorridas ao longo do tempo, tanto em relação ao “Eixo” como de seu entorno. Segundo a
14

autora, as fotografias poderiam ser tomadas como garantia de que um fato realmente ocorreu,
entretanto, é de suma importância que o/a pesquisador/a tenha sempre em mente que a
fotografia representa um recorte da sociedade ou de um fato, o que leva a conclusão de que
escolhas foram realizadas conforme os diversos interesses que permearam sua produção.
Além disso, ressalta-se a diversidade de interpretações a que estão sujeitas esta tipologia
documental.
Em relação às redes de relações encontradas dentro do “Eixo”, a proposta consistiu na
adoção do método observacional, porque, conforme salienta Gil (2011), este método se
constitui como elemento fundamental para a pesquisa, principalmente, no momento da coleta
de dados. Minha escolha foi pela metodologia da Observação Simples, por meio da qual o
pesquisador, no momento inicial, permanece alheio à comunidade, grupo ou situação que
pretende estudar, participando mais como um espectador. Isso me permitiu captar as
subjetividades inerentes à ação dos sujeitos sociais que se apropriam do espaço estudado
cotidianamente. No entanto, durante os percursos, não me era possível ser invisível,
espectadora. Ao entrar no Terminal, atravessar as Estações, dividir assentos e/ou espaços
apertados entre outros/as transeuntes, situei-me dentro do grupo que buscava estudar.
Justifico minha pesquisa pela necessidade de trazer à discussão problemas reais,
concretos, cotidianos (IANNI, 1976), que a classe trabalhadora, estudantes, grupos de menor
renda, enfrentam diariamente na cidade onde residem e vivem. Além disso, por se tratar de
uma avenida que está presente no desenho da capital desde seus rabiscos iniciais, sua
relevância histórica é significativa e ela tem sido palco para muitas mudanças, tanto no que se
refere às ações do poder público, dos investimentos privados, como do interesse popular,
comunitário, coletivo, auto-organizado.
A pesquisa bibliográfica me possibilitou compreender que os estudos sobre o
fenômeno urbano, sobre as cidades, surgiram com maior fôlego em meados do século XX, no
Brasil. A industrialização, os anseios desenvolvimentistas, o crescimento populacional, o
êxodo rural, as grandes transformações nos modos de vida acompanham o interesse pela
compreensão dos processos de expansão urbana e a consequente adaptabilidade dos diferentes
grupos sociais que passam a compor esses espaços. Camponeses/as se tornam pobres
trabalhadores/as assalariados à procura de cidadania nas avenidas das capitais; seus/suas
filhos/as buscam estudos, profissões liberais, a promessa da ascensão e mobilidade social.
Investidores da agricultura moderna, mecanizada, chefiam poderosas empresas, acordos
multinacionais. A substituição de importação, os investimentos estrangeiros, a expectativa de
formação do capitalismo nacional forte diante da competição do mercado mundial (IANNI,
15

1983), aceleram os contrastes de classes que se traduzem nas visíveis desigualdades das
cidades brasileiras. Em suma, essa é a historicidade do social que moldou nosso presente,
transitório e crítico.
A experiência urbana contemporânea enquadra-se numa complexa arquitetura de
territórios, lugares e não-lugares2 (AUGÉ, 1994), dado o predomínio da formação de
configurações espaço-temporais mais efêmeras e híbridas ao invés de territórios sociais de
identidade, pertencimento, mais fixos e rígidos, estudados pela antropologia clássica. Nesse
sentido, os lugares sociais são construídos a partir de superposições, entrecruzamentos
complexos, formando zonas simbólicas de transição onde atores e cenários em suas mútuas
relações, ordenados em categorias e grupos sociais, erguem coletivamente fronteiras
simbólicas que separam, aproximam, nivelam e hierarquizam os diferentes habitantes da
cidade (ARANTES, 2000). Esta diferença se constitui, fundamentalmente, devido à sua
localização no espaço urbano, ou seja, por sua posição dentro da estrutura social, produzindo
tensões e conflitos que definem a dinâmica da realidade cotidiana nas grandes cidades. As
relações entre centro e periferia, metrópole e cidades satélites; campo e cidade; cidades do
interior e capital etc.; formam uma complexa estrutura que submete uma área a outra numa
situação de aparente dependência mútua e de essencial exploração das zonas marginais.
A partir de pesquisas bibliográficas em revistas e sites especializados, dissertações e
teses, constatou-se que os estudos multidisciplinares sobre Goiânia concentram-se em sua
maioria na Praça Cívica (AZEVEDO, 2016), Avenida Goiás (CARMO, 2014), parques e
praças (OLIVEIRA, 2011), prédios ou construções históricas, com o intuito de investigar
transformações ocorridas nestes espaços após terem sido tombados em patrimônio cultural
local/nacional (LIMA FILHO, 2007) ou após revitalizações, requalificações, de qualquer
natureza. Ou, ainda, tratam dos projetos iniciais da cidade (centro político-administrativo do
estado, modernidade etc.), a arquitetura e os traços de l’Art déco, plano diretor (REZENDE,
2011), entre outros. Além disso, estudos sobre arborização, mobilidade urbana (BORGES,
2015), feiras, comércios, infraestrutura e serviços públicos, percorrem as pesquisas sobre o
fenômeno urbano na cidade tão jovem e de crescimento tão vertiginoso como Goiânia.
O caso da Avenida Anhanguera é pouco estudado. Não foi encontrado nenhum
trabalho específico sobre a avenida que cruza a capital do estado de Goiás de Leste a Oeste.
Isso não significa que não haja nenhuma pesquisa, estudo ou trabalho, mas que as formas de
busca têm seus limites. Alguns estudos encontrados, feitos por órgãos governamentais tinham

2
Não-lugares estão relacionados à aceleração do tempo e à virtualização do espaço, próprios da sociedade
contemporânea e seus processos de globalização (AUGÉ, 1994).
16

objetivo de fundamentar projetos de implantação e/ou melhorias do Eixo Anhanguera, o


transporte coletivo característico desta avenida, responsável pelo trânsito de pessoas tanto da
capital quanto da região metropolitana, conectando terminais e demais linhas de ônibus. Nada
sobre o que pretendi abordar: segregação social e espacial, paisagem urbana, bairros
periféricos e regiões centrais, desigualdades socioeconômicas contrastantes encontradas no
percurso de um extremo a outro; nem sobre o perfil dos usuários do Eixo Anhanguera e suas
condições de travessia pela cidade, bem como suas dinâmicas culturais e formas de
sociabilidades.
A monografia foi estruturada da seguinte forma: no primeiro capítulo, Marco Zero –
Uma moderna capital no cerrado do sertão brasileiro, abordo a questão do Anhanguera em
Goiás, apresentando alguns elementos para pensar a construção de uma importância
simbólica, cultural, política, da figura do Anhanguera para o estado de Goiás, ancorado em
sua jovem capital. Para isso, tomo alguns exemplos de lugares e objetos que carregam essa
nomeação atualmente, como é o caso da própria Avenida e Eixo desta monografia.
No segundo capítulo, que denominei de Estação 1 – O confinamento ou o pêndulo:
como ir e vir? O Eixo Anhanguera, discuto os direitos sociais, em especial, o direito ao
transporte, lazer e segurança; os direitos civis, considerando a liberdade de ir e vir,
principalmente, e as concretas condições existentes para parte da população exercer esses
direitos. Assim, questões sobre acessibilidade, mobilidade urbana, direito à cidade,
segregação socioespacial são tratadas, elucidando alguns elementos da composição social dos
transportes públicos. É neste capítulo que apresento os dados coletados com minha
“caminhada virtual”, que parte do Terminal Novo Mundo até o Terminal Padre Pelágio, com
fotografias da paisagem do percurso produzidas por mim de dentro do Eixo.
Em Última Parada – A cidade como um lugar de tensões e conflitos sociais: Av.
Anhanguera, terceiro e último capítulo, discuto a questão da segregação socioespacial de
modo central, abordando aspectos que relacionam a ocupação territorial com a divisão do
trabalho social. Apresento ainda elementos que nos permitem concordar que a gestão e
governo das cidades são voltados, predominantemente, para classes dominantes e médias,
habitantes das regiões centrais; ao passo que as classes populares, periféricas, ficam à margem
na qualidade dos serviços públicos urbanos, bem como dos espaços públicos de consumo
coletivo. A designação de classes sociais é feita aqui sob um viés estatístico, de renda, poder e
profissão, e não elaborada em termos marxistas da luta de classes (proprietários/as e não-
proprietários/as dos modos de produção), apesar de conjurar para a referida teoria.
17

Pela janela do “Eixo”, enxergamos as paisagens urbanas da cidade de Goiânia


mudando como cenários de um filme latino-americano sobre desigualdade social, violência,
acumulação de capital, trabalho infantil, trabalho informal, trânsito, limites da cidadania,
individualismo, tribos urbanas, capitalismo, subdesenvolvimento, contrastes centro-periferia,
etc. Marcadamente distintas, as regiões e bairros adjacentes à Avenida Anhanguera diferem-se
nas paisagens, comércios e serviços oferecidos; casas, prédios, edifícios, monumentos; fluxos
de pessoas, veículos e mercadorias; limpeza e “beleza” de ruas, muros e avenidas. É como
mundos diferentes num mesmo lugar.
18

MARCO ZERO – Uma moderna capital no cerrado


brasileiro

Figura 2 - Av. Anhanguera em 1968 / Fonte: Hélio de Oliveira - Acervo de fotografias históricas de Goiás (1968)
19

MARCO ZERO – Uma moderna capital no cerrado brasileiro

Toda cidade, assim como todos os elementos da realidade (social ou não), possui uma
origem, um ponto inicial, um começo de sua história. Nas cidades, estados ou regiões e até
mesmo países ou continentes, retomar esse marco zero é fundamental para a composição do
mosaico histórico do lugar, de sua população e grupos locais. Isso não significa dizer que as
cidades se constituem isoladamente, com um processo histórico que lhes é restrito, intangível.
Ao contrário, nos sugere pensar a formação dos espaços a partir das relações (de exploração,
de interdependência, de troca, de cooperação, de competição etc.) que eles estabelecem entre
si, seja por meio dos fluxos de pessoas, objetos, ideias, mercadorias, matéria-prima, modos de
vida etc. Todos esses elementos devem ser pensados, ainda que parcelados, em sua totalidade.
Nas cidades litorâneas, o marco zero é encontrado onde, factualmente testemunhado
por documentos e narrativas históricas, as primeiras embarcações levantaram seus vilarejos.
Trata-se de um lugar central da cidade que serve de referência para distâncias e
posicionamento geográfico, geralmente, localizado no centro histórico. No Recife Antigo está
na Praça Rio Branco; em São Paulo, na Praça da Sé; na Praça XV de novembro, no Rio de
Janeiro, por exemplo. No caso dos estados e cidades não-litorâneas, do sertão, do Brasil-
interior, como é o caso do estado de Goiás e de sua capital, o marco zero pode ser encontrado
nos primeiros edifícios erguidos, nas praças centrais e/ou nas monumentais menções à
memória local.
Inicialmente projetada para abrigar cerca de 50 mil habitantes e servir como novo
centro político-administrativo do governo de Goiás, as dimensões de Goiânia ultrapassam,
atualmente, limites territoriais significativos. Poderíamos destacar, em Goiânia, a Praça
Cívica com seus edifícios art déco, ou o Monumento ao Bandeirante, no cruzamento das
avenidas Anhanguera e Goiás, na praça do bandeirante ou praça Atílio Correia Lima, como
marco zero da capital.
Nesse contexto, é preciso refletir sobre os processos de construção da identidade local
a partir da reelaboração de sua narrativa histórica e das considerações acerca do patrimônio
histórico e cultural, uma vez que:

Os monumentos, com algumas exceções, geralmente representam a memória


das elites de uma determinada sociedade. [...] também nos relevam as
disputas simbólicas e os grupos que disputam esse poder simbólico [...];
revela-nos quais memórias são rememoradas (dos ‘vencedores’) e quais são
esquecidas (dos ‘vencidos’); revela-nos quais grupos integram a ‘história
oficial’ e quais são ‘excluídos da história’. (BATISTELLA, 2014, p. 155,
grifos meus)
20

Para Bourdieu (2001, p. 9, grifos do autor), o poder simbólico é “[...] um poder de


construção da realidade que tende a estabelecer uma ordem gnoseológica: o sentido imediato
do mundo (e, em particular, do mundo social) supõe aquilo a que Durkheim chama o
conformismo social”. Ou seja, ao existir somente através de uma relação determinada de
“cumplicidade” entre os/as que exercem esse “poder invisível” (Ibidem, p. 8) e aqueles/as que
lhe estão sujeitos/as, o poder simbólico atua através dos sistemas simbólicos como
instrumentos de conhecimento e comunicação, mas, principalmente, como imposição,
legitimação da dominação, inculcação, ou seja, com uma função política intrínseca. Ainda
Bourdieu (2001) nos mostra que a integração social depende deste aspecto lógico, de uma
concepção homogênea de tempo e espaço etc., que cria as condições necessárias para uma
integração moral. Sendo poder, o poder simbólico é também violência, violência simbólica,
ao sustentar-se na relação dominantes e dominados/as (WEBER, 2007).
Essas considerações nos indicam que o monumento foi projetado, pensado, idealizado,
pelas elites locais. Atílio Correia Lima, o primeiro projetista da nova capital goiana,
mencionou em seu relatório urbanístico a possibilidade de criação do monumento, indicando
inclusive sua localização:

No cruzamento dos eixos das Pedro Ludovico, Araguaia, Tocantins, 10, 26,
34 e 35, deverá ser erigido futuramente um monumento comemorativo das
bandeiras, descobertas, e das riquezas do Estado, figurando como
homenagem principal a figura de Anhanguera (LIMA, 1979, p. 142, grifos
meus).
Além do monumento como homenagem, louvável lembrança, à figura do
Anhanguera3, do bandeirante ou das bandeiras, para a história de Goiás e Goiânia, tem-se
ainda a avenida e o eixo de transporte público (chaves dessa monografia), um canal de
televisão aberta (filial da rede globo), jornal, revista, faculdade particular, vilas habitacionais,
terminais de integração de ônibus coletivo e inúmeras outras referências em lojas e armazéns
locais: Av. Anhanguera, Eixo Anhanguera, Jornal Anhanguera, TV Anhanguera, Faculdade
Anhanguera, Vila Bandeirantes, Terminal das Bandeiras etc.
No caso do monumento o objetivo seria perpetuar, rememorando, os laços históricos
entre Goiás e São Paulo, ao registrar os feitos dos bandeirantes numa obra de arte exposta no
centro da capital. Foi em São Paulo que aconteceu, então, a campanha pró-monumento,
financiada pelos governos dos dois estados. Contou com publicidade, propagandas a nível
nacional, bem como conferências e palestras que versavam sobre a história dos bandeirantes

3
Nomeação indígena conferida à Bartolomeu Bueno da Silva, bandeirante, em uma de suas expedições pelo
território goiano, que significa “diabo velho”. In: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/dtbs/goias/goias.pdf
21

em território paulista e goiano. Em 1942, ano do batismo cultural de Goiânia, o escultor


Armando Zago é contratado para construir a estátua de Bartolomeu Bueno da Silva,
inaugurada no mesmo ano.
Sabe-se que o centro cultural, intelectual, político-econômico do país era disputado
pela região sudeste (SP, RJ, MG, predominantemente):

A Região da Grande São Paulo é o centro dinâmico do país. A produção


industrial, o sistema financeiro, a renda per capita, enfim, qualquer indicador
de pujança econômica apresenta-se com larga fartura quando comparado às
outras áreas da sociedade brasileira. (KOWARICK, 1980, p. 29).
Os movimentos modernistas, os ícones da literatura, música, pintura, arte nacional, o
reconhecimento internacional, a coesão da nação através das intepretações do Brasil, se
formaram ali. Não se trata de identificar se foi o café, a Política dos Governadores, o governo
Vargas, a transferência da capital federal, a ditadura militar ou o maior polo industrial da
América Latina os responsáveis por esse centralismo nas regiões sudeste e sul. Fato é que
perduram preconceitos e visões discriminatórias sobre nortistas, nordestinos e interioranos
(centro-oeste), como regiões de
espaço e povo “atrasado”,
“inferior”. Nesse sentido, os
bandeirantes foram vistos
como heróis no processo de
colonização do interior do
Brasil, desbravadores do
desconhecido reino das
florestas, animais selvagens e
rios duvidosos, além de Figura 3: “COMPRA-SE OURO”: Av. Anhanguera, St. Central,
Goiânia – GO / Fonte: Produção da autora (2017)
importantes sujeitos históricos
que contribuíram para a formação de regiões produtivas, de exploração econômica, no berço
do ouro. Ainda hoje, se considerarmos a imagem da Figura 3, é possível abordar aspectos
dessa exploração econômica na atualidade, pois o espaço na Av. Anhanguera acabou por ser
apropriado pelos vendedores ambulantes que comercializam, dentre uma gama variada de
produtos, o ouro, que não perdeu seu valor de troca.
No que se refere à figura dos Bandeirantes, à experiência das bandeiras, à marcha para
o Oeste, ao Anhanguera, as contradições presentes na imagem deste “sujeito histórico”,
“produto de seu tempo”, variam de uma construção heroica, mítica, de nobres conquistadores
de terras à tenebrosa captura, comércio, escravização e abuso físico, sexual, de povos
22

indígenas e escravas/os, destruição de quilombos, ambição desmedida por metais preciosos


etc. Alguns grupos sociais mais radicais realizam intervenções, como pichações, nos
monumentos, praças, edifícios históricos, questionando a relevância dos mesmos na
representação da memória das camadas populares.
Dito isso, não cabe aqui uma recapitulação da história de Goiás, perfazendo os trajetos
que o conduziram à sua feição atual, mas cabe destacar alguns elementos centrais, capazes de
serem lembrados por qualquer habitante da região: a busca por minas de ouro e outros metais,
a caça aos e escravização dos índios, a interiorização colonial, a agricultura e a pecuária, o
predomínio do mundo rural, os camponeses e fazendeiros, latifúndios e pequenas
propriedades (PRADO JR, 2000; FURTADO, 2007).
É somente na década de 70 (IBGE, 2006) que o número de pessoas habitando zonas
urbanas ultrapassa o de zonas rurais, consolidando um marco fundamental na história da
sociedade brasileira. Em Goiás, não foi diferente. Isso não significou o fim das comunidades
camponesas, apenas sua redução e migração para as cidades, processo decorrente da
“modernização” do campo, denominado de êxodo rural (ALVES, 2011). Desse modo, no
campo concentra-se um tipo de produção agrário-exportador, caracterizado pela mecanização
da agricultura, das grandes propriedades e da produção em larga escala, ao passo que nas
cidades encontra-se o tipo urbano-industrial, comercial.
Ao tratar do processo de urbanização, industrialização e desenvolvimento nos países
subdesenvolvidos, Gunder Frunk (1976) afirma ser necessário investigar as relações entre o
passado econômico e a história social dessas áreas que foram um dia coloniais e hoje são
subdesenvolvidas. Este termo é caro na literatura das ciências humanas, de modo geral. As
críticas, por um lado, referem-se à consideração de que o desenvolvimento econômico por si
só não traz consigo distribuição de renda e igualdade social, uma vez que o modo de produção
capitalista se sustenta na acumulação de capital, riquezas e miséria. As críticas refutam ainda
a ideia de que os países seguem uma mesma trajetória evolutiva, sendo o processo histórico
um desenrolar de etapas de desenvolvimento, linear e contínuo, e que, portanto, países
subdesenvolvidos repetiriam etapas anteriores de países já desenvolvidos.
Além disso, países subdesenvolvidos eram vistos como sociedades e economias duais
(GUNDER FRUNK, 1976; STAVENHAGEN, 1965). De um lado tinha-se o arcaico,
tradicional, agrário, estagnado, com predomínio de relações de tipo familiar, pessoalidade,
instituições tradicionais (compadrio, clientelismo etc.), rígida estratificação social (ausência
de mobilidade), normas e valores que legitimam o status quo. De outro, o moderno, urbano,
industrializado, dinâmico, progressista, com relações de tipo secundárias (utilitárias, racionais
23

etc.), instituições funcionais, estratificação complexa (renda, educação, profissão etc.),


normas e valores orientados à mudança, progresso, inovações. No entanto, estes mesmos
autores reiteram que diferenças socioeconômicas não implicam numa sociedade dual ou
dualista e que, na verdade, os dois extremos seriam resultados de um único processo histórico,
além de parte integrante de uma só sociedade global.
No interior desses países, ex-colônias, subdesenvolvidos ou “em desenvolvimento”,
encontramos regiões e cidades que, de certa forma, reconfiguram em território nacional a
relação de dependência e dominação expressa no mercado mundial através da divisão
internacional do trabalho (MARINI, 2000). Se antes as colônias forneciam matéria-prima,
mão-de-obra barata e se mantinham numa condição de atraso e isolamento frente à
competição internacional, certas regiões no país condensaram “polos de crescimento”
(STAVENHAGEN, 1965), subordinando o resto do país para garantir a expansão do mercado
nacional e o desenvolvimento econômico, num processo denominado de colonialismo interno
(Ibdem). Um exemplo brasileiro desse “polo de crescimento” seria a Grande São Paulo, como
já mencionado.
Na história colonial brasileira, Goiás e outros estados são incorporados no ciclo da
mineração (PRADO JR, 2000; FURTADO, 2007), predominante nas Minas Gerais. A
economia colonial difere-se da economia de tipo capitalista em muitos aspectos, dentre eles
no modo de trabalho (MARX, 2001): escravidão, no primeiro, e assalariado, no segundo. A
divisão do trabalho é também fator dessa distinção. Marx (2001) considera, primeiramente, a
divisão entre trabalho agrícola, realizado no campo, e trabalho industrial, com foco nas
cidades. Depois, destrincha o trabalho nas cidades entre comercial e industrial. Em seguida,
traça a diferença entre trabalho material (produção, trabalho, atividade) e intelectual
(pensamento, fruição, consumo) ao criticar a elaboração da teoria pura (dos jovens
hegelianos), desconexa da realidade material, das condições de vida e necessidades concretas
dos seres humanos históricos e reais.
A dinâmica urbana das cidades brasileiras, latino-americanas, tem como base a
apropriação privada de formas da renda urbana, concentrando em grupos privilegiados um
maior nível de bem-estar social e riqueza acumulada, ou seja, de um patrimônio imobiliário
de alto valor (LAGO, 2000), ao passo que a maior parte dos habitantes sofre com a espoliação
urbana, definida como “o somatório de extorsões que se opera através da inexistência ou
precariedade de serviços de consumo coletivo que se apresentam como socialmente
necessários em relação aos níveis de subsistência [...]” (KOWARICK, 1980, p. 59).
24

As necessidades da vida tornam-se disponíveis através da indústria, do comércio, da


produção, das trocas, e de uma cadeia de distribuição organizada, que resulta e se fixa numa
estrutura de classes sociais a partir da expropriação da terra e dos instrumentos de produção
(MARX, 2001). A favelização, o crescimento da periferia, surge como alternativa de
sobrevivência ao elevado custo do solo e de vida. O desemprego, a pobreza, o aumento da
criminalidade e da violência (ADORNO, 1994), a exclusão e segregação socioespacial, os
desastres ambientais e evidentes desigualdades sociais, são resultado desse processo de
urbanização gerido não a partir de um planejamento de equidade social, mas segundo a lógica
do capital, do lucro, como foi o caso de Goiânia (OLIVEIRA, 2005):

Goiânia é produto de intenções que, apesar das ideias positivas de seus


urbanistas e idealizadores, perderam-se diante da voracidade do capital. Este
faz avançar a urbanização sobre os espaços disponíveis e não disponíveis e
não escolhe formas para apropriar-se deles, pois sua lógica exige a
transformação do solo urbano em espaço de acumulação (MOYSES, 2001,
p.90)
Nessa tríade de produção, distribuição e consumo, o setor comercial de uma cidade-
capital condensa-se em suas regiões ou bairros centrais. Assim, em Goiânia, a estrada das
mercadorias ficou sendo a Av. Anhanguera. De um extremo a outro, a cidade é cortada por
esta avenida, de leste a oeste. Nos esboços, projetos e planejamentos da capital, ainda na
década de 30, é possível encontrar o traço em linha reta da avenida atravessando as outras três
avenidas fundantes, cujos nomes se referem ao estado, Goiás (antes era Av. Pedro Ludovico
Teixeira), e aos principais rios goianos: Araguaia e Tocantins. A Avenida Goiás foi
recentemente tombada como patrimônio nacional (CARMO, 2014). A Avenida Anhanguera,
todavia, se encontra tombada, como uma árvore sem raízes, esquecida e apodrecendo.
Reconhecida por seu predominante fluxo comercial, nas áreas centrais da capital, é referência
para o comércio local:
O setor comercial distribui-se no cruzamento com a Avenida Anhanguera.
Concebido pelo autor como ‘área central da cidade, onde gravita o comércio,
onde a construção é mais densa’, seu traçado em malha ortogonal privilegia o
tráfego de veículos e as áreas de estacionamento. (UNES, 2010, p. 47)

O autor a quem o texto se refere é Atílio Correia Lima, o principal projetista da capital
goiana. A avenida, hoje, se encontra ancorada não apenas no comércio formal, mas também
no trabalho informal que se estende desde o entroncamento com a Av. Paranaíba até pouco
depois do cruzamento com a Av. Tocantins. Após certo vazio comercial, a forte presença do
comércio é retomada no bairro de Campinas. Ao contrário do que o trecho afirma, o tráfego
25

de veículos é lento em praticamente toda extensão da avenida, devido à sua estreiteza e às


áreas de estacionamento rentes às calçadas.
O Eixo Anhanguera, por outro lado, trafega sem concorrência. Inicialmente projetado,
pelo político e arquiteto curitibano Jaime Lerner (RODRIGUES, 2017), e implantado como
Sistema Integrado de Transporte de Massa, em 1976, percorria um trajeto de 7,8 km que ia do
Terminal Dergo até o Terminal Praça da Bíblia, levando cerca de 40 mil pessoas diariamente.
Foi o segundo corredor BRT (Bus Rapid Transport) do Brasil. O primeiro foi inaugurado em
Curitiba. Atualmente, o trajeto ultrapassa os limites da capital goiana. Há um Eixo específico
para Senador Canedo, que sai do Terminal Novo Mundo (extremo leste), e outro que, saindo
do Terminal Padre Pelágio (extremo oeste), alcança Trindade e Goianira, cidades da região
metropolitana. A extensão dentro da capital chega a quase 14 km. Nos 40 anos de
funcionamento, o Eixo foi gerido por empresas de economias mistas, com subsídios estatais.
Atualmente, a Metrobus desempenha esse papel. Esta parceria público-privada compreende
não apenas a aumento, manutenção e melhoria das frotas de ônibus, mas dos terminais, pontos
de ônibus, criação de novas linhas etc.
Esta breve contextualização nos traz ao presente, à formatação atual da Av., e,
possivelmente, nos permite pensar sobre a cidade em sua totalidade. Desde as ideias de
mudança da capital de Goiás, passando pelos projetos e planejamentos de Goiânia, até sua
configuração que encontramos hoje, tem-se uma longa trajetória histórica, que largamente
esboçou-se neste capítulo. Da busca pelo ouro à ocupação territorial, do caipira e da roça aos
modos de vida urbanos, das bicicletas ao BRT. O marco zero nos trouxe para um ponto
específico da história goianiense, capital e metrópole, traduzido em sua configuração espacial,
social e cultural. Feita esta breve digressão e análise história, para os próximos capítulos, nos
ateremos ao “presente etnográfico”, uma vez que centralizaremos nossas investigações na
observação cotidiana e nas fotografias tiradas neste ano.
26

Figura 4 [Detalhe fig. 3] – “O sono dos justos” ou A informação dos sobreviventes / Fonte: Produção da autora
(2017)

A Figura 4 reporta-nos para as dificuldades enfrentadas pelo trabalhador informal no


seu dia a dia na Av. Anhanguera. Trata-se de um recorte da figura 1. A imagem revela o
cansaço dos ambulantes, que não encontram estruturas mínimas que os apoiem em seus
afazeres cotidianos. Observa-se que, apesar de estarem em frente a uma loja de móveis, com
sofás e colchões, a opção que lhes cabe é a de uma parede e tamborete de plástico. A legenda
foi construída como uma tentativa de ironizar o cochilo do “comprador de ouro” em plena
jornada de trabalho, numa realidade que talvez não seja tão “justa” como pretende ser. Ao
lado, seu colega de trabalho, lê um jornal. Como sobrevivente do caos urbano, ele precisa de
informações, notícias; de inteirar-se no mundo, na cidade. Esse elemento da imagem nos leva
ainda a refletir sobre a contribuição que o acesso à informação pode dar para que ele conheça
seus direitos de cidadania e lute por eles.
27

ESTAÇÃO 1 – O confinamento ou o pêndulo: como


ir e vir? O Eixo Anhanguera.

Figura 5 – Estação 1 – O confinamento ou o pêndulo: como ir e vir? O Eixo Anhanguera / Fonte: Elaboração própria da autora (2017)
28

ESTAÇÃO 1 – O confinamento ou o pêndulo: como ir e vir? O Eixo Anhanguera

A organização do transporte coletivo nas grandes cidades contribui para o controle


social e o confinamento dos habitantes menos favorecidos economicamente, deixando o
espaço público a dispor das elites, classes alta e média, que podem pagar mais por melhores
formas de locomoção e consumo da cidade. Nesse sentido, em uma cidade que é lugar de
consumo e lugar consumido, o combustível do movimento é o dinheiro. Isso faz com que o
indivíduo calcule seus ganhos e despesas a partir das condições possíveis: transporte coletivo,
individual, táxi, bicicleta ou a pé.
Como o modo de produção capitalista é dominante em nossa sociedade, a venda da
força de trabalho é imperioso fator que delimita as formas de satisfação das necessidades
individuais. Todavia, a “economia é concebida como um componente de cultura, em vez de
um tipo de ação humana; o processo da vida material da sociedade em vez de um processo
para satisfazer necessidades individuais” (SAHLINS, 1972, p. 186). Com o crescimento
exponencial e não planejado de cidades como Goiânia, quase sempre os habitantes moram
longe de seus locais de trabalho, o que os impulsiona a um largo trajeto cotidiano. Se o caso é
habitar regiões metropolitanas e trabalhar ou estudar na capital, o fenômeno é caracterizado
de movimento pendular, pois, ao sair de casa para o trabalho no começo do dia e retornar do
trabalho para casa, os indivíduos desenhariam no espaço o movimento de um pêndulo, que
retorna ao mesmo lugar após o deslocamento.
Como se trata de uma trajetória entre municípios, cidades da região metropolitana,
próximas a Goiânia, que são atendidas pelo Eixo Anhanguera, como Senador Canedo,
Trindade e Goianira, ilustram esse fenômeno crescente na dinâmica urbana metropolitana, ou
seja, em áreas de maior concentração populacional (ANTICO, 2003). Como um transporte de
massa, o Eixo atua promovendo a locomoção de grande quantidade de pessoas, forças de
trabalho, estudantes, indivíduos, cidadãos, de forma qualitativamente debilitada. Ademais, as
mediações simbólicas que envolvem o controle do serviço de transporte coletivo urbano,
como é o caso da catraca, reforçam significados expressivos. Na prática, o transporte não é
público. Coletivo é apenas uma condição de habitar a cidade: jamais se está só; é-se sempre
um fragmento de um conjunto, parte de um todo (ROLNIK, 1988). O transporte coletivo, na
verdade, trata-se de um serviço, fornecido e consumido, geridos por empresas, camadas
dirigentes e acordos governamentais. Isso se explica, de certa forma, pois,
[...] um transporte de massa, que deveria servir ao deslocamento da
população operária, devido à alquimia especulativa do setor imobiliário-
29

construtor e à ‘neutralidade’ tecnicista do planejamento público, converte-se


em instrumento dos interesses dos estratos privilegiados. (KOWARICK,
1980, p. 37, grifos meus)

As condições de travessia, dos terminais às estações, traduzem as condições de


mobilidade urbana das classes de menor rendimento. Com o predomínio do transporte
individual, Goiânia lidera o ranking de capitais com maior número de veículos por habitantes
(ABREU, 2015). Não tendo sido projetada para um tráfego tão intenso, com suas ruas
estreitas e avenidas curtas, o congestionamento já tem sido uma realidade de quem opta pelo
automóvel. As bicicletas ajudariam a aliviar a sobrecarga do trânsito, mas as ciclovias, recém-
inauguradas, foram construídas apenas nas regiões centrais, o que permanece restringindo as
opções dos conjuntos marginais. No caso da Av. Anhanguera, mesmo nas zonas centrais, o
tráfego de bicicletas é consideravelmente inviável. De laterais estreitas, cabendo no máximo
dois carros, com estacionamento rente à calçada, e via de fluxo exclusivo do Eixo, a Avenida
não tem espaço para ciclovias.
O acesso à cidade e o consumo de serviços por ela fornecidos variam a partir da
configuração territorial e social, com as elites concentrando-se geralmente no centro e os/as
trabalhadores/as nas regiões periféricas. Vale destacar que, conforme a teoria da expansão em
círculos concêntricos da Sociologia de Chicago, a tendência à deterioração do centro conduz à
expansão urbana para áreas antes periféricas que se tornam valorizadas. Este caso, em
Goiânia, pode ser ilustrado pelos condomínios fechados luxuosos Alpha Ville, Aldeia do
Vale, entre outros. De volta ao Eixo, os nomes das estações remontam aos bairros que as
circundam ou a pontos marcantes. Veremos isso mais de perto.
Apontada como a capital da América Latina com o maior índice de desigualdade
social pela ONU, em 2012 (ASSIS, 2012), Goiânia tem hoje 84 anos. Partindo da Avenida
Anhanguera, buscaremos identificar elementos que permitam refletir sobre essa desigualdade
socioeconômica que envolve a capital de Goiás. Isso será feito, como já foi dito, utilizando
como meio de transporte o veículo BRT (Bus Rapid Transport): Eixo Anhanguera
(RODRIGUES, 2017). A discussão estará centrada no direito à cidade, nas condições e
formas de locomoção que restam às classes populares, bem como na efetiva cidadania ao
alcance destes grupos, para além dos direitos sociais resguardados, com ênfase no transporte e
outros dele decorrentes: segurança, lazer, trabalho, saúde, educação. (CONSTITUIÇÃO
FEDERAL, Art. 6º, 2010). Em outras palavras, faremos uma “caminhada virtual”
(ARANTES, 2000) pela cidade de Goiânia, partindo do extremo leste até o extremo oeste,
sem tomar a região metropolitana como referência. Ou, ainda, uma etnografia urbana
30

(MAGNANI, 2002) da Av. e Eixo Anhanguera. Nesse percurso, serão consideradas


informações, ou dados, relevantes tanto as que estão do lado de fora do Eixo, ou seja, que
versam sobre a paisagem urbana, a estruturação dos espaços públicos, bem como aquelas
encontradas dentro do veículo, como o perfil de usuários(as), as condições de travessia e
eventuais formas de sociabilidades ensaiadas.
Comecemos por caracterizar a cidadania. A ideia comum a ela reservada é a de
direitos e deveres mutuamente respeitados. Enquanto participação integral do indivíduo a uma
comunidade, a cidadania pressupõe segurança de acesso à herança social – ou a todos os bens,
materiais ou não, de determinada sociedade –, além do acesso a um mínimo de bem-estar
econômico. Seu objetivo é tornar todos os indivíduos, de uma mesma comunidade, cidadãos
ou civilizados, equiparando-os a um mesmo nível social, tendo como horizonte um ideal de
igualdade humana. Isto é, no que se refere às diferenças ou desigualdades, vistas nas variações
de níveis econômicos, nas classes sociais, a cidadania teria como objetivo diminuir essas
distâncias e homogeneizar a população de um território nacional ou local. Assim, a cidadania
constituiria um modo de viver, um status (MARSHALL, 1951), sendo interna ao indivíduo e
necessitando da interferência do Estado não apenas para garantia dos direitos formais, mas
também para formação de quadros institucionais específicos que possibilitem sua efetivação.
Em suma, a cidadania se manifesta nos seguintes direitos e suas garantias: os direitos
civis e a vida na sociedade, civitas; os direitos políticos e a participação no governo, nos
negócios públicos, dessa sociedade, polis; os direitos sociais e a participação na riqueza
coletiva dessa sociedade, salariat (CARVALHO, 2002). A liberdade individual, inserida no
escopo dos direitos civis, no Brasil, foi uma das últimas a serem conquistadas. É nela que
encontramos o direito de ir e vir, de transitar, de se deslocar no espaço perfazendo lugares e
fronteiras, identidades e pertencimentos. É claro que a liberdade tangencia outros horizontes
como o da expressividade política (associar-se, reunir-se), religiosa, de pensamento, ou seja, a
liberdade individual de modo geral.
Os limites, no entanto, são evidentes: a liberdade, no capitalismo, configura-se como
uma relação monetária, de consumo, de compra e venda. Ou seja, é preciso ter dinheiro para
vivê-la, afinal, é ele, o dinheiro, que surge como o “denominador comum de todos os valores”
(SIMMEL, 2005 [1903]). Isso significa que um/a morador/a pode deixar de locomover-se,
inclusive de ir ao trabalho, caso não consiga pagar pela tarifa do ônibus ou comprar um
veículo automotor e abastecê-lo com frequência, pois a cidade torna-se um meio de consumo
de bens e serviços coletivos (OLIVEIRA, 2005). Além disso, “a privatização dos serviços
31

urbanos, ao mesmo tempo, aumenta a desigualdade urbana, especialmente no que concerne à


qualidade.” (RIBEIRO, 2005, p. 89).
Com isso em mente, avancemos para as dimensões locais da discussão. Tomaremos os
direitos sociais, com ênfase no transporte, e os direitos civis, priorizando a liberdade de ir e
vir, para seguir com a proposta de discutir as desigualdades socioeconômicas encontradas
nesse recorte espacial da cidade de Goiânia.
A fim de sustentar a utilização das fotografias como método investigativo e forma de
apreensão da realidade, trago uma citação de Simmel feita por Benjamin, sobre o predomínio
da visão, em relação aos outros aparelhos sensoriais humanos, nas grandes cidades e no
mundo moderno, vinculando-o ao surgimento dos transportes coletivos:

As relações recíprocas dos seres humanos nas grandes cidades...


caracterizam-se por um evidente predomínio da actividade do olhar sobre a
do ouvido. As causas principais deste estado de coisas são os meios de
transporte colectivos. Antes do aparecimento dos autocarros, dos comboios,
dos eléctricos no século XIX, as pessoas não conheciam a situação de se
encontrarem durante muitos minutos, ou mesmo horas, a olhar umas para as
outras sem dizerem uma palavra (SIMMEL apud BENJAMIN, 2007, p. 39).

Figura 6: Início da Av. Anhanguera, saída do Terminal Novo Mundo Goiânia – GO / Fonte: Elaboração própria da
autora (2017)
32

A Avenida Anhanguera, dentro de Goiânia, possui cerca de 15 km de extensão, indo


do Terminal Jardim Novo Mundo (leste) ao Terminal Padre Pelágio (oeste). Sua principal
distinção com relação às demais avenidas é o corredor de ônibus separado do trânsito corrente
por uma pequena cerca de ferro azul e um baixo muro amarelo e cinza, por onde trafega o
Eixo Anhanguera. Podendo custar até metade da tarifa usual (R$3,70) do transporte coletivo
da região metropolitana, com cadastro e cartão Metrobus4, ele cruza alguns terminais de
integração de ônibus da cidade. De um terminal a outro, há plataformas azuis com os nomes
de cada estação, referentes aos bairros vizinhos. As paradas, para embarque e desembarque
dos transeuntes, acontecem em todas as estações construídas a cerca de 1m do chão.
O “eixão”, “sanfonão”, “minhocão”, é o veículo utilizado pelas camadas mais pobres
da cidade de Goiânia que, geralmente, partem das regiões periféricas, ou de cidades vizinhas
(Trindade, Goianira e Senador Canedo), em direção às regiões centrais, onde estão seus locais
de trabalho ou instituições escolares, instâncias burocráticas, agências bancárias, correios,
hospitais, parques, teatros, cinemas, bares, lojas, comércios, shoppings, lugares de passeio,
entre outros.
Diferentemente do metrô de São Paulo onde “embora evitem andar de ônibus, as
classes média e alta frequentemente usam o metrô, ao lado de passageiros mais pobres”
(ARANTES, 2000, p. 110), no BRT de Goiânia não se observa essa heterogeneidade de
classes reunidas. De fato, há o predomínio de estudantes, idosos/as, ociosos/as,
trabalhadores/as uniformizados do setor de serviços e industrial, vendedores/as ambulantes,
pedintes, mulheres e homens, rapazes e moças, cujo cálculo econômico viabiliza a travessia
utilizando o Eixo.
Conforme o capítulo se desenrola torna-se mais compreensível por que, apesar de
considerar o espaço no interior do veículo como um espaço de sociabilidades, (re)encontros,
redes de relações mais ou menos estabelecidas, percebemos o Eixo Anhanguera também
como um não-lugar:

Os não-lugares são tanto as instalações necessárias à circulação acelerada


das pessoas e bens (vias expressas, trevos rodoviários, aeroportos) quanto os
próprios meios de transporte ou os grandes centros comerciais, ou ainda os
campos de trânsito prolongado onde são estacionados os refugiados do
planeta (AUGÉ, 1994, p. 36, grifos meus).
Do terminal Novo Mundo, partimos em direção ao centro da cidade. É manhã e os
trajetos individuais estão determinados, apressados, pontuais ou atrasados. A espera pelo

4
Metrobus Transporte Coletivo S/A: Empresa de transporte público urbano, gerida por economia mista, com
subsídios estatais, no estado de Goiás, responsável pelo Eixo Anhanguera que trafega em Goiânia e, desde 2014,
alcança Goianira, Trindade e Senador Canedo.
33

Eixão não se prolonga, cerca de 5 minutos e estamos dentro. O horário de pico já passou. O
burburinho dos ônibus e das pessoas nos terminais, os(as) vendedores(as) ambulantes, os
estreitos corredores de circulação, a pouca e confusa sinalização para pedestres, coincidem
com o empurra-empurra por um lugar no veículo. É preciso se esforçar para ser uma das 240
mil pessoas transportadas por dia. “Porta fechando...”, o moderno desenvolvimento da capital
alerta com a voz de uma mulher atenta que a porta fechará em segundos e que caso você não
entre ou saia depressa pode ter suas pernas decepadas. O fechamento é bruto, barulhento,
preciso. O privilégio é de quem conseguiu se sentar, seja criança ou idoso(a), jovem ou
adulto. Aos que permanecem de pé, cuidem de seus pertences: mochilas entre os braços e a
barriga, bolsas firmes coladas ao corpo, nada nos bolsos, mãos onde se pode ver. Se for
mulher, o cuidado é dobrado. Além de cuidar de seus pertences deve cuidar de seu corpo, para
evitar situações constrangedoras de assédio. Para distrair, há monitores de TVs instalados no
veículo, que não vimos ligados em nenhuma das viagens que fizemos, refletindo em seu
espelho negro apenas aquela realidade momentânea.
Olhar para os lados, certificar-se de quem lhe acerca, é arriscado. A depender da
velocidade do gesto, da precisão do olhar, da forma do movimento, o(a) observador(a) torna-
se observado(a). O medo, a insegurança, a incerteza, a falta de confiança, geram um
silencioso percurso, aflito e ansioso pelo fim do trajeto sem surpresas. “Diz-se que a
confiança é ‘um dispositivo para se lidar com a liberdade dos outros’, mas a condição
principal de requisitos para a confiança não é a falta de poder, mas falta de informação plena”
(GIDDENS, 1991), incluindo a possibilidade de o Outro usar sua liberdade para tomar-lhe de
assalto num susto, num ato imprevisível, não informado. Não é lenda, mas todos(as)
conhecem as histórias de assaltos e arrastões do Eixão. Se perguntar algo a alguém, caso não
se conheçam, é provável que a resposta da interação seja distante, precavida e, em alguns
casos, hostil, sem contato visual. Há exceções, obviamente. Uma senhora, mais velha, com
dificuldades para se locomover, um homem ou mulher com uma criança, jovens com
mochilas e uniformizados certamente despertam maior confiança do que um rapaz, alto, forte,
malvestido, “mal-encarado”, de mãos vazias.
Não é raro encontrar jovens mães com seus bebês no colo trafegando pela cidade
dentro do Eixo. Negras/os, pardos/as e brancos/as etc. Crianças de colo e ainda em
crescimento estão sempre acompanhadas. Quando estão prontas para seguir sozinhas, vestem
o uniforme da escola ou do trabalho e seguem com suas turmas. Afinal, na Estação
Universitária, o Eixo corta o Instituto Estadual Goiano - IEG, um dos maiores colégios
públicos de Goiânia, localizado em frente à Secretaria Cidadã, onde vemos slogans de
34

igualdade racial, sexual, social, econômica etc. Também não é raro ver idosos(as), geralmente
sozinhos(as) ou acompanhados(as) de algum familiar, utilizando o transporte para chegar até
algum hospital, resolver trâmites burocráticos ou fazer compras. É possível inferir tais
informações a partir de curtos diálogos com dúvidas sobre onde descer ou com resultados de
exames, pasta com fotocópias de documentos ou sacolas de lojas, nas mãos.

Figura 7: Mapa do Eixo Anhanguera / Fonte: www.metrobus.gov.go.br

Do Terminal Novo Mundo ao Terminal Praça da Bíblia, a paisagem urbana não se


modifica tanto. Passamos por quatro estações: Anhanguera, Palmito, Vila Morais e Vila
Bandeirantes. As pequenas lojas, raras construções acima do térreo, expõem mercadorias e
estabelecimentos que variam de cosméticos a salões de beleza, de açougues a supermercados,
revistarias a chaveiros, ferro e aço a materiais para construção, celulares a shows eróticos,
parafusos e ferramentas a revisão de veículos, panificadoras, lanchonetes, farmácias, lotéricas.
Restaurantes, escolas, igrejas, praças, postos de gasolina. Ruas estreitas para os carros,
calçadas desfeitas e caminhos inventados para os(as) pedestres. Um viaduto sobre a Avenida
permite a saída da cidade pela BR-153.
Do Terminal da Praça da Bíblia até o próximo Terminal, Praça A, é onde encontramos
os principais contrastes na organização espacial da cidade e, concomitantemente, na
organização social. Ainda não estamos certas do que viria primeiro: a disposição espacial ou a
hierarquia socioeconômica? De todo modo, esse assunto será melhor discutido no próximo
capítulo. Após a Estação Botafogo, referente à marginal botafogo, uma via de trânsito rápido
35

da capital, avistamos o começo do Setor Central. Antigos prédios, tombados como patrimônio
por sua arquitetura em estilo Art déco, cedem lugar para contemporâneos prédios comerciais,
principalmente de grandes lojas nacionais de eletrodomésticos, eletrônicos, instrumentos
musicais, brinquedos, roupas, acessórios etc.
A legenda foi construída inicialmente
como um trocadilho entre o fenômeno social
da “Americanização” da vida social e a
presença das “Lojas Americanas”. Essa
imagem nos possibilitaria ir além disso,
principalmente, se levarmos em
consideração essa “americanização” em
todas as esferas da vida social (TOTA,

1993). Alguns estudos indicam o Brasil Figura 8 – “Americanizando”: Av. Anhanguera, Goiânia /
Fonte: Elaboração própria da autora (2017)
como um exemplo desse fenômeno. Não se
restringindo ao universo do consumo (produtos e serviços estrangeiros, predominantemente
estadunidenses; shoppings centers), a adaptação ao “American way of life” afeta os mais
diversos setores da vida cotidiana, tais como: a política, a economia, a cultura (literatura,
música, filmes, desenhos animados programas de rádio e TV, redes sociais etc.), a língua
(gírias, expressões etc.), os valores, entre outros. Um caso exemplar é a indústria cultural dos
filmes hollywoodianos, sempre reproduzidos com grande público nas salas de cinema
convencionais.
A exemplos dos antigos prédios, vemos o Teatro Goiânia (1942), o Edifício do
Comércio, entre outras casas e sobrados.

Figura 9: Teatro Goiânia,


cruzamento Av. Anhanguera e
Av. Tocantins / Fonte:
Elaboração própria da autora
(2017)
36

Figura 10: O império das mercadorias: St. Central, Av. Anhanguera / Fonte: Elaboração própria da autora (2017)

Nas calçadas, o mercado informal reina. Há muitos imigrantes, negros e homens, em


especial. Entre as mercadorias, nota-se a predominância de óculos escuros e relógios; bolsas e
carteiras; baterias, chips, acessórios para celular; meias e peças íntimas; frutas e doces etc.
Sempre a pequenos preços promocionais que cabem no bolso do(a) trabalhador(a). É nesses
entroncamentos da Tocantins, Goiás e Araguaia com a Anhanguera que o fluxo de pessoas,
mercadorias, coisas e valores aparece mais visível, ininterrupto. Porém, vale lembrar que
estamos caminhando pela manhã, por volta das 9h, durante a semana. Atravessamos as
estações da Rua 20, Rua 7, Rua 8 e do Joquei Clube.
Ao analisar a figura 10, destaco, em relação à apropriação do espaço na área que
compreende o Setor Central, que, apesar de inúmeras tentativas por parte da administração
pública em disciplinar o seu uso, os agentes/sujeitos sociais sempre criam estratégias para
burlar as regras. Ali, os ambulantes disputam os consumidores com os lojistas, o que, algumas
vezes resulta em conflitos devido à diferença existente entre a legislação que normatiza o
comércio formal e o informal.
Junqueira (2011) ressalta que tanto a classe dirigente como parte dos cidadãos têm se
esforçado para encontrar soluções para o caos urbano. Entretanto, que se deve considerar a
formação de uma complexa rede de territórios, lugares e não-lugares que resulta na formação
de configurações espaço-temporais mais efêmeras e híbridas do que os territórios de
identidade fixos. “O espaço comum, principalmente dos bairros centrais, é cotidianamente
trilhado se transformando em suporte físico de significados e lembranças que são
compartilhados pelos agentes sociais que dele se apropriam. As fronteiras simbólicas são
construídas coletivamente pelos usuários conforme delimitam seus territórios”
(JUNQUEIRA, 2011, 134).
Tal como foi destacado pela autora, percebi que o espaço central não se encontra
esvaziado, como querem alguns estudiosos, mas que é palco de tensões e conflitos, os quais
permeiam as relações que são ali encenadas a todo momento. Expõe-se publicamente a falta
37

de direitos de grande parte da população da cidade, que se manifesta na incidência de assaltos,


no comércio e ostensivo consumo de drogas, na construção de moradias “invisíveis”, no
subemprego, na mendicância e na oferta de uma vida melhor por meio das loterias, das poções
milagrosas e das pregações religiosas. Ali se pratica a vigilância ostensiva ao “mesmo tempo
que instituições políticas e assistenciais proclamam suas palavras e teatralizam suas práticas
salvadoras” (ARANTES, 2000, p. 107).
Junqueira (2011) ressalta que as tensões que se estabelecem entre os distintos grupos
dizem respeito à desigualdade de interesses que permeiam suas relações e se acirram quando
o grupo que representa a administração municipal e coloca em prática a expulsão dos camelôs
do Eixo. De certo modo, ao assim agirem, protegem os interesses daqueles para quem a
presença dos camelôs representa inconveniências, ou seja, uma parcela da sociedade que os
encara como um estorvo na sua rotina diária e para quem os camelôs são tidos como
concorrentes desleais devido ao fato de eles não arcarem com as mesmas obrigações em
relação ao pagamento de impostos.
Diante do exposto, surgiram uma série de indagações: De que forma a ocupação do
espaço público se relaciona com o “direito à cidade”? Quem são os responsáveis por elaborar
as propostas de organização do espaço urbano? De que maneira elas afetam o direito dos
camelôs em relação à sua permanecerem do centro da cidade? Sabemos que o país passa por
uma crise econômica atualmente e que, devido a isso, muitos trabalhadores perderam a
segurança de um emprego formal e procuram novas estratégias de sobrevivência, sendo uma
delas, o comércio informal. Ao ser tolhido do seu direito ao trabalho, estes/as trabalhores/as
também perdem o direito à cidade, o que não considero justo na atual nem em nenhuma
conjuntura política. É necessário pensar em soluções que atendam as demandas das/os
cidadãs/os independentemente da sua condição social, e que o/a proteja contra o uso abusivo
da violência, pois, no Setor Central, em Goiânia, também ocorre a luta pela sobrevivência.
Naquele espaço, ocorrem diversas práticas de sociabilidade que, muitas vezes, ultrapassam as
fronteiras simbólicas: “é lá que novas relações são estabelecidas a partir de valores,
sentimentos e interesses variados” (JUNQUEIRA, 2011, p. 134).
Seguimos. Até o Terminal Praça A ainda temos um caminho. Lá está Campinas, que já
era cidade moça quando Goiânia nasceu. Foi depois que se tornou apenas um bairro. Antes de
Campinas, atravessamos o Setor Aeroporto e Oeste. Hospitais, condomínios fechados e
prédios muito altos; melhor sinalização e cuidado das ruas e avenidas; são vistos pela janela.
38

Figura 11 - Hemocentro de Goiânia, St. Aeroporto / Fonte: Elaboração própria da autora (2017)

Não há morros acentuados, as ruas edificam-se em planícies quase retilíneas.


Atravessamos uma região de hospitais. Nela se encontra o Hemocentro, ponto de referência
para cidades vizinhas em atendimentos diversos. A Estação HGG (Hospital Geral de Goiânia)
precede a Estação Lago das
Rosas, referente ao parque
mais antigo da capital,
inaugurado ainda por Pedro
Ludovico Teixeira, em 1941.
Seus pedalinhos, árvores e
plantas, quadra de esportes,
zoológico, destoam das praças
outrora vistas durante o
percurso, onde sequer havia

bancos para se sentar e as Figura 12 - Jd. Novo Mundo, saída para Senador Canedo, Av.
Anhanguera (lado leste) / Fonte: Elaboração própria da autora (2017)
crianças brincavam na poeira
vermelha e enferrujados brinquedos. À medida que seguimos na direção leste, é possível
39

perceber que a paisagem se modifica como ficou registrado na figura 12. Ali já é possível
visualizar o descaso com as regiões periféricas, as quais apresentam construções de baixa
qualidade, terrenos baldios que, muitas vezes, são utilizados como depósitos de lixo, além de
uma infraestrutura que não atende as necessidades dos cidadãos.
Agora falta pouco. Nosso percurso está quase no fim. Em Campinas, no Terminal
“Praça A”, o pulso comercial é fortemente sentido nos camelódromos, feiras, nas grandes e
pequenas lojas. Reconhecida como o lugar onde “se encontra de tudo”, Campinas lidera entre
os locais escolhidos para procurar desde tecidos de costura até móveis, acessórios para festas,
equipamentos para automóveis etc.
Há ainda o Shopping Cerrado,
recém-inaugurado. As grandes lojas
vendem geralmente em atacado, o
que atrai pequenos comerciantes e/ou
vendedores(as) ambulantes.
É interessante notar que
apesar de haver um aviso em todos
os veículos dizendo que “É proibida
a venda no interior do veículo”,
Figura 13 - Espera, corre-corre e aflição: Terminal Praça A, St. os(as) vendedores(as) ambulantes
Campinas / Fonte: Elaboração própria da autora (2017)
são os(as) principais agentes dentro
do Eixo Anhanguera. São os(as) únicos(as) autorizados(as), legitimados(as), a se
movimentarem livremente (ou sempre que houver espaço entre as pessoas), a falar em voz
alta dirigindo-se a todos(as), apresentando seus produtos e preços. Água, chocolates, balas;
fones de ouvido, carregadores; lixas de unha, esmaltes; tampas de tanque, porta-documentos,
cremes para dores musculares, CDs, entre outros, são vendidos por preços que variam de 1 a 5
reais. Além dos(as) vendedores(as) ambulantes, há também os/as pedintes e rapazes de casas
de reabilitação cristãs. Ambos se dirigem às pessoas em tom explicativo, falando ou
entregando pequenos bilhetes, justificando o que estão fazendo ali, suas necessidades e/ou
objetivos. Os rapazes da reabilitação geralmente se apresentam como antigos usuários de
crack, que superaram seus vícios, ou “se libertaram”, graças à clínica e a Deus.
É recorrente em seus discursos que começaram experimentando a droga por influência
de terceiros/as e acabaram dormindo nas ruas ou comendo restos de comida que encontravam
nos lixos. Vários sintomas dos problemas sociais urbanos estão reunidos dentro deste veículo.
Para além da aparente simples desigualdade entre ricos e pobres, as drogas, o mercado
40

informal, o subemprego, a mercadoria e mão-de-obra barata, as precárias condições do


transporte público (superlotação, insegurança, desconforto, sujeiras etc.), a vulnerabilidade
física e a facilidade de assédios, o elevado tempo gasto na espera da condução, a mendicância,
os assaltos, a criminalidade, os apelos religiosos (ARANTES, 2000), são algumas das
características da marginalização, do submundo cotidiano maquiado pelo espetáculo da vida
moderna.
Na Figura 14, podemos observar o que anteriormente foi mencionado sobre as
estratégias de manutenção dos pertences pessoais durante
as viagens de ônibus, especialmente de Eixo. Com a
mochila ou bolsa na frente, entre os braços e visível, é
mais fácil driblar possíveis assaltantes silenciosos, muito
comuns, que abrem as mochilas sem que as pessoas vejam
e lhes roubam carteiras, celulares e o que encontrarem de
imediato. A fotografia captura a imagem de uma senhora
com sua mochila, estudando formas de andar pela cidade
tranquilamente.

Figura 14 [Detalhe fig. 13] – A senhora e a


mochila / Fonte: Elaboração própria da
autora (2017)

Figura 15 - Trocas: Terminal Dergo, St. Aeroviário / Fonte: Elaboração própria da autora (2017)

O Terminal Dergo, representado no imaginário social como um ponto perigoso,


marginal, de prostitutas e travestis, drogas e ladrões; durante o dia, é apenas mais um terminal
de ônibus coletivo, com relativo movimento, policiamento, transeuntes, vendedores/as e
empregados/as da Rede Metropolitana de Transporte Coletivo – RMTC. Fim da linha.
Atravessamos uma pequena ponte sobre uma parte do Rio Meia Ponte e chegamos ao
41

Terminal Padre Pelágio. Nesse fim de percurso, a cidade vai perdendo o fôlego, sofregamente
se arrastando com pouca circulação de pessoas, carros, motos ou bicicletas; fraco comércio e
muitos espaços vazios entre as casas e algumas ruas sem asfalto, deixando para trás a
verticalização e o intenso fluxo comercial. Em compensação, grandes indústrias são vistas, a
exemplo: uma indústria de cortes de aço e outros metais.
Ao passo que o transporte individual permite uma circulação relativamente mais livre
pela cidade – apesar de ainda condicionada pelas vias de tráfego, como todo tipo de
movimento urbano (ônibus, carro, bicicleta, pedestres etc.), o transporte público, coletivo, em
suas condições atuais, dificulta essa circulação. As possibilidades caminham nos limites do
aceitável, do humano. Em horários de pico, pela manhã e fim da tarde, transitar por Goiânia
utilizando o Eixo Anhanguera é um desafio nada divertido. O inevitável contato físico, o
temível assédio, a ilusória privacidade, esmagam uns contra os outros, contra assentos, janelas
e portas. Até mesmo respirar se torna difícil. Mas é preciso ir. Chegar a casa, ao trabalho, à
escola, ou a outro lugar. Atravessar os muros e pontes que cruzam lugares tão diferentes e tão
próximos.
Ribeiro (2005) chama atenção para as formas de associação/filiação a entidades civis
encontradas em algumas metrópoles brasileiras, dentre elas São Paulo, Rio de Janeiro, Recife,
Belo Horizonte e Salvador. Constatou em suas pesquisas que algumas cidades apresentaram
graus de associativismo maior que outras. Um dado que nos interessa em especial é o de que
nas:
áreas centrais, onde verifica-se com maior força o fenômeno urbano da auto-
segregação das camadas superiores, apresentam os mais altos níveis de
adesão às entidades sindicais, profissionais, esportivas e culturais, que são
menores nas áreas periféricas. Em sentido inverso, os níveis de filiação a
entidades religiosas e comunitárias mostram-se significativos em áreas
periféricas. (RIBEIRO, 2005, p. 58)

Isso nos conduz a uma reflexão sobre a participação popular e a cultura cívica, ou seja,
sobre quais grupos mobilizam-se em reivindicações e lutas sociais por melhores condições de
vida e quais meios utilizam para se organizarem, ainda que visando reformas e negociações
com os governos municipais ou estaduais, pensando localmente. Afinal,
numa Metrópole em que a produção do espaço se faz sem a existência de
uma Sociedade Civil vigorosa na defesa dos interesses básicos da maioria
dos seus habitantes, as transformações urbanas só podem se realizar como
um rolo compressor que esmaga todos aqueles que não têm recursos para
conquistar os benefícios injetados na cidade. (KOWARICK, p. 82)

No caso do transporte público, as reclamações são diárias e recorrentes. Os aumentos


nos preços da tarifa, a exaustiva espera nos pontos, terminais inseguros e desconfortáveis, os
42

ônibus sempre muito cheios, são alguns dos principais elementos de eclosão das revoltas
populares. Muitas acontecem de modo espontâneo, num contexto de lutas frequentes, em
terminais de integração. Outras são discutidas e organizadas por usuários/as e estudantes.
Podemos citar o caso das Jornadas de Junho, em 20135, em Goiânia, e no Brasil, que começou
tendo a pauta do transporte público como principal e acabou dissolvendo-se em múltiplas
bandeiras.
De toda forma, o que isso nos mostra é a não-passividade dos/as usuários/as deste
serviço de nome público, mas de ordem privada, diante das arbitrárias condições de
locomoção impostas pelas empresas e governos locais responsáveis por sua gestão e
fornecimento. Poderíamos ainda traçar uma conexão entre a localidade e a esfera global, uma
vez que a mobilidade urbana é um problema não apenas goiano ou brasileiro, mas mundial, já
que, atualmente, a vida urbano-industrial predomina na maior parte do mundo. O que acarreta
uma série de problemas de nível ambiental (desastres “naturais”, mudanças climáticas etc.),
socioeconômico (desigualdades, guerras civis etc.), político (governabilidade deslegitimada
etc.) e cultural.
Outro exemplo de resistência acontece com os/as vendedores/as ambulantes. Durante
todo o ano de 2017, eles/as se confrontaram com a fiscalização municipal que tem promovido
operações para retirá-los/as do espaço que ocupam. A justificativa é que, devido à presença de
suas barracas e carrinhos captados no registro da imagem 10, a segurança dos cidadãos que
usam o transporte coletivo do Eixo, fica prejudicada. Segundo matéria publicada pela TV
Anhanguera, no dia 08 de dezembro de 2017, vendedores ambulantes e seguranças se
envolveram em uma confusão no Terminal Padre Pelágio. Os comerciantes contaram para a
equipe de reportagem da TV, que foram agredidos pelos seguranças do local e afirmaram que
os seguranças chegaram de maneira agressiva, impedindo-os de trabalhar. Sua banca de
goiabas foi derrubada e, ao tentar recuperar o produto do chão, foi agredido.
Já a empresa responsável pelos seguranças, a Pró-Guarda, informou à TV Anhanguera
que os comerciantes, em alguns casos, são violentos com os vigilantes, que precisam se
defender. Conforme aponta a matéria, a companhia informou que os funcionários são
instruídos a orientarem os ambulantes sobre a regra que proíbe o comércio nos terminais.
A Rede Mob informou, por meio de nota, que os ambulantes “impediram a operação dos
veículos do Eixo Anhanguera e agiram de forma violenta atirando frutas e pedaços de madeira

5
“Preço da passagem de ônibus provoca manifestações pelo país”, 07/06/2013, << http://g1.globo.com/bom-dia-
brasil/noticia/2013/06/preco-da-passagem-de-onibus-provoca-manifestacoes-pelo-pais.html >> Acesso em
11/12/2017.
43

nos profissionais do transporte público”. Segundo a empresa, “a Polícia Militar foi acionada e
prestou o apoio necessário, liberando a saída dos Ônibus por volta das 14h” e reforçaram que
“os vigilantes vão continuar coibindo a presença e o comércio de ambulantes no Terminal
Padre Pelágio e nos demais Terminais da RMTC”.
A matéria publicada no dia 08/12, apresenta a situação de insegurança também deve
ser considerada no que diz respeito ao cotidiano dos vendedores ambulantes que podem ser
surpreendidos a qualquer momento por uma operação da empresa de fiscalização. A simples
desconfiança de que os fiscais estão por perto já é motivo para que estratégias sejam adotadas
no sentido de proteger não apenas o produto que comercializam, mas também a si mesmos da
possível violência a que estão sujeitos.
44

ULTIMA PARADA – A cidade como um lugar de


tensões e conflitos sociais: Av. Anhanguera

Figura 16 - Última parada - A cidade como um lugar de tensão [...] / Fonte: Elaboração própria da autora (2017)
45

ULTIMA PARADA – A cidade como um lugar de tensões e conflitos sociais: Av.


Anhanguera

Uma vez que “a fotografia permite, pela primeira vez, fixar os vestígios de uma pessoa
de uma forma inequívoca e definitiva” (BENJAMIN, 1994, p.29), escolho, pois, iniciar essa
parte do texto com a descrição de duas fotografias.

Figura 17: Estação Vila Moraes, entrada do Jd. Novo Mundo / Fonte: Elaboração própria da autora (2017)

A primeira congelou a paisagem de entrada para o Jardim Novo Mundo, na estação


Vila Moraes, a caminho do extremo leste de Goiânia, logo após o viaduto da BR-153 (Figura
17). Nela observamos, à primeira vista, uma propaganda de show musical de uma dupla
sertaneja, à esquerda, uma calçada quebrada, suja de carvão e lixo logo a frente, uma
construção que lembra uma loja abandonada à direita com nome de serralheria e, aos fundos,
algumas casas e árvores, além de fios de energia elétrica “flutuando” pelo ar.
Não é preciso nos atentarmos para os detalhes a fim de constatar que se trata de uma
região periférica. Pode não se tratar de uma favela, no sentido de um aglomerado urbano,
originado de invasões ou ocupações (sem a posse legal) de pedaços do espaço vistos como
46

não lucrativos pelo mercado imobiliário; caracterizada pela vulnerabilidade de infraestrutura e


serviços urbanos (água potável, saneamento básico, energia elétrica, transporte público,
sinalização, asfalto etc.), afastamento do burgo urbano, bem como de situação irregular na
topografia do terreno (KOWARICK, 1980). No entanto, apesar de não ser uma favela, trata-se
com segurança de uma periferia.

Figura 18 [Detalhe fig. 17] – Calçada, lixo e barranco / Fonte: Elaboração própria da autora (2017)

Imagine-se caminhando por esta calçada (Figura 18). Além do desconforto de andar ao
lado da sujeira e das dificuldades de, caso seja um cadeirante, passar por ali, a inclinação é
bastante acentuada e não há cercas ou limites demarcados entre a calçada e o lado
“abandonado”, para segurança dos pedestres. Apesar disso, este é o único caminho possível
para quem trafega a pé do lado direito da Av. Anhanguera na direção do Terminal Novo
Mundo e demais Estações e bairros adjacentes.
Nota-se que no mesmo nível da calçada,
rente à avenida, é possível ver as telhas das casas
e estabelecimentos, o que indica um acentuado
declive e posterior aclive, conforme as moradias
afastam-se da avenida e aproximam-se do
horizonte da imagem (Figura 19). Esta inclinação
do solo fornece ao bairro o desenho de um
morro, influenciando nos diversos tipos de
deslocamentos locais. Adão de Oliveira (2005)
relaciona a ocupação territorial ou socioespacial
Figura 19 [Detalhe fig. 17] – Casas no relevo / Fonte: com a divisão social do trabalho, de forma que a
Elaboração própria da autora (2017)
desigualdade instaurada com a divisão do
trabalho assume a forma de desigualdade na ocupação espacial: “A disposição espacial das
pessoas na cidade obedece à determinação de classes, de maneira que os lugares ordenam-se
47

representando na forma e no conteúdo a situação socioeconômica dos grupos que os ocupam.”


(OLIVEIRA, 2005, p. 131).
É nesse sentido que compreendemos a cidade como um lugar de tensões e conflitos
sociais, inerentes ao modo capitalista de produção da vida material e social. Decorre daí a
estratificação social, estruturada no sistema de classes, que se apropriam do espaço urbano de
maneira diferente e desigual. No caso de Goiânia, cidade projetada com demanda de ordem
político-econômica, seguindo o modelo de produção capitalista nacional, ancorado nas ideias
de modernidade, desenvolvimento e progresso, essa premissa se efetiva.
Nas cidades planejadas e nos planejamentos que seguem cidades “espontâneas”, a
tendência é dividi-las em pedaços, deixando para cada especialista uma parte. Assim, os
projetistas do esgoto estão distantes de arquitetos/as, mestres de obra, donos/as das
construtoras, bem como os especialistas em mobilidade urbana não cuidam da configuração
espacial das ruas e avenidas, calçadas, sinalização, ciclovias, da poluição do ar, do desgaste
ambiental etc. (MOYSÉS, 2005). Resta ao habitante, morador/a, acionar seus veículos de
negociação democráticos (associações de bairro, eleições periódicas, consultas públicas etc.) e
aguardar a deliberação da prefeitura e seu aparelho burocrático institucional. Por outro lado, a
especialização é característica da nossa época, e parece-nos inevitável pensar a gestão
metropolitana sem cogitar a fragmentação institucional (Ibidem).
No entanto, é preciso destacar que essa tendência pode fazer surgir uma cidade
fragmentada, gerida para os vitoriosos da globalização (grandes empresas, monopólios, elites
político-econômicas etc.), que governam para si mesmos, deixando de fora partes
abandonadas, sujeitas a todo tipo de violência, incluindo a violência simbólica (BOURDIEU,
2001). Ou seja, as classes dominantes, dirigentes, buscam ocultar a dominação e exploração
em que estão sustentados os seus privilégios, através de discursos impraticáveis de cidadania
e equidade social, ao mesmo tempo em que há a visível distribuição desigual dos serviços
públicos e equipamentos de consumo coletivo (CASTELLS, 2009).
48

Figura 20 - Passeio entre árvores e edifícios: Parque Lago das Rosas, St. Oeste / Fonte: Elaboração própria da autora
(2017)

A segunda fotografia (Figura 20), mostra uma mulher caminhando, possivelmente


voltando do trabalho, na direção da faixa de pedestres que lhe dará acesso à Estação Lago das
Rosas. O inexpressivo tráfego reflete uma manhã de sábado.
Para Lefebvre (2002), a sociedade urbana nasce da industrialização. É somente a partir
do domínio e absorção da produção agrícola, ou seja, do predomínio da cidade sobre o campo
(ROLNIK, 1988), que começa o universo urbano. Os lugares se alteram, modificando os
cenários onde as relações entre as pessoas, coisas e objetos, adquirem novos sentidos,
significados, configurando um modo de vida tipicamente urbano. Valores, tradições, crenças,
visões de mundo, atitudes, comportamentos, recebem expressivas mudanças que, apesar de
graduais, processuais, são percebidas nas trocas geracionais, caracterizando uma “cultura
urbana” (CASTELLS, 2009). Indústrias, tecnologias, eletricidade, internet, ciência, meios de
transporte mais velozes e individualizados, consumismo, produzem transformações notáveis
entre a cidade e o mundo rural, que aparece estacionado na tranquilidade, no isolamento, no
trabalho da terra, doméstico, nas trocas, na ausência de ambições, na simplicidade. Destaco
que isso trata-se de uma representação hegemônica, um tanto bucólica.
49

Os contrastes centro e periferia visualizados


nessas duas fotografias nos mostram que, de um lado,
há a fruição confortável dos serviços e bens
disponíveis na cidade, com uma razoável segurança e
bem-estar, mas, do outro, há apenas a reprodução da
força de trabalho, em condições muitas vezes
desumanas. Nota-se, portanto, a segregação social
refletida no espaço urbano (KOVARICK, 1980).
Basicamente, a configuração espacial das

Figura 21 [Detalhe fig. 20] – Prédios e sentidos / cidades estrutura-se em: 1) habitação, 2)
Fonte: Elaboração própria da autora (2017)
estabelecimentos (inclui-se aqui de instituições e
edifícios públicos às feiras de rua), 3) vias de tráfego e locomoção (avenidas, ruas, calçadas,
pontes etc.) e 4) espaços vazios. A moradia está intimamente ligada à reprodução da força de
trabalho (CASTELLS, 2009), assim como também estão as condições mínimas para a
sobrevivência: alimentação, água, vestimentas, transporte casa-trabalho etc.
Neste ponto concordam muitos autores/as da sociologia clássica e contemporânea em
assumir os fatores socioeconômicos como predominantes sobre os demais fatores de ordem
sociocultural (BOURDIEU, 2001; MARX, 2001; WEBER, 2006). Uma vez que os
fenômenos
socioeconômicos tratam
de necessidades humanas,
primárias ou não, tanto na
luta com a natureza como
na associação com outros
seres humanos,
praticamente todos os
fenômenos da vida social
são economicamente
condicionados, pois,

dizem respeito à luta Figura 22 [Detalhe fig. 20] - Entre o trampolim, pedalinhos e obrigações / Fonte:
Elaboração própria da autora (2017)
material pela existência
(WEBER, 2006).
50

O cotidiano da cidade esconde por detrás das relações naturalizadas com o mundo e as
pessoas, da rotina programada, a historicidade do mundo social que ali se forma. Por outro
lado, revela tensões, contradições e conflitos latentes no meio da aparente organização. Os
sistemas de produção industrial, citadino, com suas fábricas, indústrias, empresas; os modos
de consumo, seja da saúde, da educação, do transporte etc.; as formas de distribuição dos
produtos: serviços, comércios, trocas; se apresentam nos territórios da vida cotidiana como
subsolo da nação, da cidade. O espetáculo global, estadual, anuncia-se nas altas finanças, nos
grandes acordos comerciais, empresariais, políticos.
Há ainda um ponto a ser mencionado: Lefebvre (2002) atenta para uma relação de
dependência que se cria entre a metrópole e as cidades pequenas que a formam, configurando
um contexto de semicolônias. Isso acontece, pois, ao fornecerem matérias-primas e mão-de-
obra baratas, as cidades vizinhas submetem-se à metrópole que, no jogo regional, nacional,
possui mais condições de ganhar, justamente por essas relações que a fortalecem econômica e
politicamente.
Para finalizar, essa leitura da economia do espaço urbano a partir de autores marxistas,
nos conduz para uma análise de alguns elementos centrais: valor imobiliário (mercado
imobiliário) e infraestrutura urbana (Estado). Para esses autores, já citados anteriormente, a
realidade histórica de um lugar é marcadamente uma realidade construída a partir das relações
sociais de produção. Nesse sentido, Moraes (2003) chama a atenção para a expansão
imobiliária como fator de grandes transformações na lógica urbana. Ao analisar a segregação
urbana em Goiânia, a autora divide a história da cidade em alguns períodos relevantes: 1)
1933-1950: “Fase de criação do lugar”, 2) 1950-1964: “Fase da ampliação do espaço”, 3)
1964-1975: “Fase da concentração de lugares no espaço”, 4) 1975-: “Expansão urbana”. É
neste último período que se encontram os projetos de transporte coletivo, planos de lazer,
meio ambiente etc. A criação do Eixo Anhanguera, inaugurado em 1976, coincide, portanto,
com essa divisão cronológica.
Na Figura 23, vemos um edifício com o nome de Urias Magalhães, com feições
antigas e desgastadas pelo tempo. Sua entrada está na Av. Anhanguera. Aos fundos e ao lado,
um prédio moderno, alto, novo. Um contraste de tempos e construções. Segundo informações
dos arquivos da prefeitura6, Urias Magalhães foi um fazendeiro, proprietário de uma enorme
área de terras, que hoje circundam o bairro que carrega seu nome, localizado na Zona Norte
de Goiânia. Algumas avenidas e ruas, praças e outros bairros, levam ainda os nomes de seus

6
Para mais informações, acessar: http://www.goiania.go.gov.br/shtml/seplam/dados/dados.shtml
51

parentes, em sua maioria homens: filho, pai, avô, sogro. Conta a história que ele teria doado
50 alqueires de terras, antes de falecer, a Pedro Ludovico Teixeira, com fins de fundação da
nova capital do estado. Somente em 1968, as áreas doadas foram liberadas para
comercialização. Até então o poder público buscava frear os anseios da expansão imobiliária.

Figura 23 – Homenagem ao fazendeiro abandonado: Ed. Urias Magalhães, Av. Anhanguera / Fonte: Elaboração
própria da autora (2017)

Nesse sentido, percebemos que o surgimento das construções, edifícios, prédios, ruas,
praças; as modificações nas paisagens; não acontece de modo espontâneo ou aleatório. Na
verdade, estes processos obedecem à lógica específica da propriedade privada e do direito à
posse da terra, em suas diversas manifestações históricas, legitimada pelas autoridades do
poder público, sendo o Estado a figura representativa desta estrutura. O lado de dentro das
cercas está reservado aos investimentos particulares daqueles/as que ali se refugiam, o lado de
fora permanece inerte até que algum tipo de ação coletiva o transforme, seja de moradores/as
auto-organizados/as, seja de funcionários/as das prefeituras e governos estaduais. Incapazes
de se alterarem naturalmente, os espaços, sobretudo os espaços urbanos, carecem de
52

constantes investimentos para sua manutenção e “progresso”. Refiro-me não apenas aos
serviços urbanos (limpeza, energia, saneamento, transporte, sinalização etc.), mas também às
políticas de educação, saúde, planejamento, lazer etc.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
53

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De modo geral, busquei com este trabalho investigar a atual situação material e social
que articula a mobilidade urbana em Goiânia e atinge grande parte de sua população. Sendo o
principal veículo de massa da capital, sua importância para o tráfego e circulação de pessoas é
inegável: mesmo em péssimas condições, de superlotação, sujeira e violência, caso o Eixo
Anhanguera deixe de transitar, uma quebra nos deslocamentos cotidianos de milhares de
habitantes, trabalhadores/as e estudantes, será sentida. A ideia consistiu em mostrar que o
trajeto da Avenida Anhanguera por onde passa o Eixo não se reduz a um espaço de
circulação, tratando-se de um espaço público. Ou seja, não se restringe ao simples
deslocamento, homogêneo e abstrato, de pessoas e bens, mas integra em seu veículo e
percurso diário redes de sociabilidades, convívios, encontros e agência (ARDILA PINTO,
2016).
Isso foi elucidado com a presença dos/as vendedores/as ambulantes, dos/as pedintes,
dos rapazes da reabilitação; dos grupos mais ou menos estruturados de estudantes, idosos/as,
crianças, dos/as que sabem onde estão e dos/as que precisam de informação, de homens e
mulheres, jovens, grupos étnicos (negros/as, pardos/as, mestiços/as, brancos/as etc.). Apesar
de não termos mencionado, uma vez que não presenciamos durante nossa observação, alguns
grupos de artistas marginais e/ou estudantes realizam dentro do Eixo intervenções artísticas,
visando o entretenimento e o lazer dos/as que assistem, além da divulgação de seus projetos e
trabalhos. Tocam instrumentos, cantam; recitam poesias, cordéis; encenam pequenos jograis,
peças, cujos temas podem fazer referência à vida na cidade, ao cotidiano urbano ou
simplesmente terem um caráter lúdico, humorístico, reflexivo.
Nesta parte do trabalho, questões que envolvem a cidadania, os direitos à cidade, à
mobilidade, ao transporte etc., foram levantadas, de modo a mostrar o vácuo entre a ordem
legal e a cidade real, as salvaguardas constitucionais e a realidade das condições sociais
concretas que abrigam a pobreza, a marginalidade e a exclusão urbana. Apesar das melhorias
implementadas no Eixo Anhanguera, incluindo sua ampliação para cidades da região
metropolitana de Goiânia, as condições de travessia disponíveis aos/às usuários/as ainda não
são satisfatórias. Em horários de grande procura, a superlotação é inevitável, aumentando os
riscos temíveis pela maioria dos transeuntes: roubos, furtos, violências, assédios, empurra-
empurra, agressões involuntárias (cotoveladas, pisar no pé, quedas etc.).
A partir da trajetória desenhada pelo Eixo no percurso da Av. Anhanguera, a paisagem
que se modificava do lado de fora do veículo foi também objeto de análise, uma vez que
54

apresentava dissonâncias visuais significativas. Era a desigualdade social refletida no espaço


urbano e em suas apropriações por classes e grupos distintos, isto é, a segregação
socioespacial. Este tema foi discutido tomando como pontos de comparação uma região
periférica, de poucos ou nulos espaços fixos de convivência, calçadas, parques, praças, e uma
região médio-nobre que conta com amplos espaços como estes. Nessa discussão, não se
considerou a região comercial-central como referência para as discussões, pois, ela se
encontra relativamente acessível a ambos os grupos de moradores/as.
Para finalizar, gostaria de mencionar algumas dificuldades e situações encontradas no
desenvolvimento da pesquisa. Quando optei por tirar as fotos de dentro do Eixo, não me
lembrei que estaria num veículo, num “chão em movimento”. Perdi vários instantes, espaços,
que meus olhos viram, mas que o clique capturou apenas como uma imagem embaçada,
tremida. O mesmo aconteceu com a tentativa de levar um bloco de anotações. Queria grafar
alguns pontos ativando a memória para posterior descrição do percurso na avenida, mas
sempre que a caneta encostava no papel, o ônibus pulava e um risco escorregava, muito longe
de remeter a uma palavra. Tive que esforçar-me para lembrar do trajeto, com o auxílio das
fotografias exitosas. A vantagem que tive foi a de ter utilizado bastante o Eixo durante os
últimos dois anos.
Algumas situações que me marcaram e gostaria de compartilhar. Uma mulher, de uns
trinta, quarenta anos, sorria muito sentada no fundo do ônibus, lugar quase sempre evitado
pela maioria dos usuários devido à distância até o motorista (que ilusoriamente é relacionado
à segurança). As pessoas a olhavam, estranhando sua alegria. Ela ria alto e comentava com
alguém ao seu lado: “Isso é muito bom! Eu nunca tinha andado nisso não.”. Eu estava
próxima a ela. As pessoas sorriam, também sorri, achando engraçada, provavelmente, a
inocência daquela mulher, que buscava responder às reações: “É sério, gente. Eu sou do
interior, lá não tem isso não. A porta fecha sozinha e ainda avisa que vai fechar...”. Ela
parecia realmente impressionada.
Outra vez, eu estava voltando para casa, uma mulher, um pouco mais velha, senta-se
ao meu lado, olhando atentamente para a direita e para a esquerda. Eu mexia no celular,
tranquilamente, e alternei meus olhos para ela assim que ela se aproximou para mostrar que a
vi. Pouco depois escuto uma voz incisiva, um tanto perturbada e aflita: “Você não tem medo
de andar com isso aí não?”, apontou para o celular com os olhos, olhando ao redor
imediatamente depois. Respondi perguntando se o Eixo andava muito perigoso. Ela começou
a contar inúmeras situações vistas e vividas: “Outro dia, uma menina tava com um celular
desse tamanho no bolso... chegou um moleque e tomou dela... Nem para esconder. Depois não
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quer ser assaltada.”; “O ônibus tava muito cheio, veio um, só abriu a mochila e pegou a
carteira. Não tinha nem jeito de correr atrás...”. Depois das histórias, guardei meu celular e saí
abraçada com a mochila até atravessar a porta.
Tive medo. Nas outras vezes que saí para tomar notas do percurso e fotografar, nem
levei o celular. Peguei uma câmera antiga e velha, um livro para apoiar as anotações, uma
caneta; pendurei no pescoço o Cartão do Passe Escolar, vesti-me com uma roupa leve e tênis
confortável o suficiente para correr, saltar ou fugir.
As fotografias permitem a visualização de paisagens urbanas contrastantes no percurso
da Av. Anhanguera. Essas paisagens se formam num processo coletivo sustentado
basicamente pelos governos locais, por investimentos privados e pelos grupos diretamente
afetados, ou seja, moradores/as da região. Apesar das fotografias não terem focado as pessoas
e apresentarem, em alguns momentos, as paisagens “vazias”, sem ocupação humana, podemos
concluir que esse vazio é provisório, uma vez que se trata da paisagem urbana de uma avenida
central, com grande fluxo comercial e de pessoas.
Concluímos, pois, que a Av. Anhanguera é uma amostra da desigualdade
socioeconômica e da segregação socioespacial presente na cidade de Goiânia. Além dos
diferentes acessos aos serviços e entretenimentos urbanos, dos desníveis estéticos da
paisagem, no que se refere aos/às moradores/as das regiões centrais e periféricas, comerciais e
habitacionais, é possível mencionar a presença do Eixo Anhanguera como uma das principais
atrações nas regiões periféricas, e como acessório marginal nas regiões centrais, nobres. Ou
seja, apesar de tratar-se de uma única avenida, ao mudar as regiões e bairros, alterações
significativas são percebidas na paisagem urbana e, consequentemente, nos ambientes à
disposição dos habitantes, nos serviços oferecidos às/aos cidadã/os. Isso pode ser percebido e
confirmado nas imagens analisadas nesta monografia. Os serviços públicos, a estética urbana,
se modificam de acordo com a região (central, comercial, nobre, periférica etc.). Desse modo,
o acesso, o direito, à cidade se configura de modo condicionado, com limites precisos,
resultado da segregação social e espacial presente no mundo urbano.
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