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NASCIMENTO, COR E RAÇA – 1996 A 2020

Edmilson Bezerra do Nascimento Júnior


Mestrando no Programa de Pós-Graduação em História pela UFPE
edmilsonbjunior2017@gmail.com
É comum ouvir relatos de pessoas que dizem ter uma determinada cor apontada
na Certidão de Nascimento que não condiz com a sua real cor de pele ou com a cor que
se identificam. Ao pesquisar sobre este tema, verificou-se que a Portaria n°344 de 1° de
fevereiro de 2017 no artigo 2° diz que fica a cargo do pai ou responsável informar na
Declaração de Nascido Vivo (DNV) a cor do seu filho (MINISTÉRIO DA SAÚDE,
2020). A DNV foi criada em 1990 e é com a posse dela que o pai ou responsável consegue
registrar seu bebê no Cartório de Registro Civil (CIDADE DE SÃO PAULO SAÚDE,
2011).
A DNV é um documento padronizado pelo Ministério da Saúde, preenchido
em todo o território nacional, para todas as crianças nascidas em
estabelecimentos de saúde ou domicílio, imprescindível para o registro civil.
Ela é o documento de entrada do SINASC, que organiza e fornece informações
sobre os nascimentos para os gestores da saúde em todos os níveis
(NHONCANSE e MELO, 2012, p. 956).
A partir de 1996, segundo Camisão (2017, p. 19), o quesito raça e cor passou a ser
utilizado no campo da saúde, no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e no
Sistema de Informação de Nascidos Vivos (SINASC). Porém, ao acessar o Manual de
Preenchimento da Declaração de Nascido Vivo disponibilizado pela Prefeitura de São
Paulo do ano de 2011, percebe-se a ausência do campo cor/raça para o bebê. Só contendo
esta informação para a mãe. O que abre margem para equívocos referente a cor de pele
do recém-nascido, principalmente se for feito uma heteroidentificação ao invés de uma
autoidentificação.
Para se ter uma ideia de como a falta do campo cor/raça na DNV pode provocar
constrangimentos e da não autoidentificação do pai referente a cor/raça do seu filho, segue
um exemplo de uma reportagem do Jornal “A Tribuna” de Santos (2006) onde o
delegado-registrador do 1° Subdistrito de Registro Civil de Pessoas Naturais da cidade de
Santos, Nélson Hidalgo Molero diz que antigamente, o documento do hospital que era
apresentado no cartório não informava a cor do bebê. Aos funcionários do local cabia a
tarefa de definir este quesito. Ele fala que deduziam, olhando para os pais e, às vezes, até
perguntavam. Mas, segundo ele, isso trazia muito constrangimento, porque, muitas vezes,
vinha o pai e declarava que o filho tinha cor negra e depois, vinha a mãe e reclamava. E
eles chegavam a brigar no balcão, relata (ARPEN-SP, 2006).
Autoidentificação ou autodeclaração de cor/raça serve, fundamentalmente, como
diz Osório (2003, p. 17): “como um critério favorável e adequado, uma vez que impede
que imposições raciais sejam feitas orientadas por pensamentos baseados em preconceitos
e promove a consciência racial por parte da população negra”. Esta consideração contribui
com a afirmação e autoidentificação daquilo que o indivíduo enquanto ser social e
pertencente a um grupo se veja e se sinta inerente à determinada etnia sem se preocupar
com sua cor ou aspectos econômicos. Contrário da heteroclassificação que é uma
classificação feita por terceiros a partir da identificação que este tem do outro.
Até a década de 1980, conforme Brasileiro (2008, p. 54), o registro de nascimento
em cartório era feito por declaração verbal do pai ou responsável que, acompanhado de
duas testemunhas, obtinha a certidão mediante pagamento. Somente com a Lei 9534 de
dezembro de 1997 é que a certidão de nascimento passou a ser gratuita. A certidão de
nascimento é o meio pelo qual os indivíduos passam a existir legalmente na sociedade
(CASTANHEL, 2003, p. 6). E é através dela que o Estado, por sua vez, pode dispor de
informações importantes para o planejamento na área materno-infantil, possibilitando a
elaboração de indicadores utilizados para descrever uma determinada população, em um
período de tempo, e subsidiando intervenções do ponto de vista socioeconômico e
sanitário (SCOCHI, 2004, p. 172).
O registro de nascimento oficializa-se no Brasil, de acordo com Castanhel (2003,
p. 1), quando o governo regulamenta o Decreto N° 9886 de 07 de março de 1888,
instituindo obrigatoriedade para os registros de nascimentos, casamentos e óbitos. Antes,
no período Imperial, em função das relações entre a Igreja e o Estado, os registros
paroquiais eram revestidos de todo o valor probante, desconhecendo outra forma de
registro que não o religioso (CASTANHEL apud LOPES, 2003, p. 10).
A regulamentação dos registros civil de casamentos, nascimentos e óbitos,
ganharia ainda mais força com a imigração dos fins dos oitocentos, por virem pessoas que
tinham outra religião que não a católica (CASTANHAEL apud LUZ, 2003, p. 10). Ainda,
de acordo com Castanhel (2003, p. 11), em 1870, cria-se a Diretoria Geral de Estatística
(DGE), que tinha por incumbência trabalhar os dados de nascimentos, óbitos e
casamentos - órgão este que depois se tornaria o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE).
Em 1872, já com o nome de IBGE é realizado o primeiro censo demográfico no
país. Segundo os dados obtidos deste censo, a população brasileira beirava os dez milhões
de habitantes (CHRISTILLINO, 2019, p. 238), sendo que metade da população livre de
todo o país era constituída por negros e pardos (FLORENTINO e MANOLO, 1958, p.
116). Outro fator que se evidencia deste censo é a existência de subnotificações, pois de
acordo com Dolhnikoff (2012, p. 210): “apesar de terem entrado cerca de 4 milhões de
africanos até 1850, quando o tráfico foi efetivamente extinto, o censo realizado em 1872
registrava apenas 1,5 milhão de escravos no território brasileiro”.
É a partir deste momento, fins do século XIX, que cor e raça começam a ganhar
importância. Surgem as teorias evolucionistas/racialistas fortemente influenciadas por
Charles Darwin que, segundo Barbosa (apud HOBSBAWN, 2016, p. 4), com a
divulgação de “A Origem das Espécies” em 1859, fez com que um novo e importante
paradigma ganhasse as discussões raciais: o evolucionismo.
Segundo a mesma autora:
A partir daí o conceito de raça ultrapassa os problemas estritamente biológicos,
adentrando questões de cunho político e cultural. Surgindo, assim, o
darwinismo social, o qual, justamente com a antropologia e a etnografia do
século XIX, ajudou a construir a ideia de missão civilizatória das potências
imperialistas. Mas foi com Francis Galton em 1883 que surge a eugenia. Uma
doutrina, uma espécie de prática avançada do darwinismo social que
transmutou o saber sobre as raças em um ideal político, um diagnóstico sobre
a submissão ou mesmo sobre a possível eliminação das raças inferiores
(BARBOSA, 2016, p. 4).
O Brasil que começava a procurar, naquela época, uma identidade própria de nação sofre
influência desta teoria e intelectuais como, Silvio Romero e Nina Rodrigues são uns
destes adeptos. Eles defendiam que a miscigenação iria favorecer positivamente o
embranquecimento da população brasileira.
Uma das formas utilizadas para, de certo modo, embranquecer a população
brasileira foi utilizado no censo de 1872 com o uso do termo “Pardo” no questionário
demográfico. Campos (apud CAMARGO, 2013, p. 4), alega que a categoria parda foi
incluída em 1872 sob a alegação de que ela captaria o número de descendentes de
escravos alforriados ou já nascidos livres. Etimologicamente, pardo não significava raça,
mas sim uma cor que não é branca e nem preta. Segundo Mattos (2013, p. 41), a cor era
a informação sempre presente e todos os nascidos livres eram qualificados como brancos
ou pardos. Ou seja, era dado uma qualidade de cor, a qual o distanciava de um passado
escravizado e lhe garantia um status social.
Vale ressaltar que o termo pardo já aparece naquele que é considerado o primeiro
documento histórico do Brasil, a carta de Pero Vaz de Caminha, que descreve os
ameríndios do Novo Mundo, a Terra de Santa Cruz, da seguinte forma: “[...] Eram pardos,
todos nus... A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados...” (CORTESÃO
apud CAMINHA, 2010, p. 16).
De acordo com Leão e Silva (apud Mattos, 2012, p. 119), pardo provem do latim,
pardus, e do grego, pardos, significando, nessas línguas, leopardo. Para Rafael Bluteau
(autor do vocabulário português e latino publicado em 1720), pardo significa a cor entre
branco e preto, própria do pardal, de onde parece ter vindo o nome. Ainda segundo
Bluteau (vol 6, 1720, p. 265), constam alguns adágios portugueses que mostram pardo
como uma cor escura: “maio pardo, junho claro, de noite todos os gatos são pardos”. O
dicionário da língua brasileira de 1832, de Luiz Maria da Silva Pinto, designa o adjetivo
pardo como de “cor entre branco e preto, mulato” e o substantivo pardo como o “macho
da onça ou leopardo”.
Schwarcz & Starling (2015, p. 94) observam que a cor parda ainda hoje consta no
censo brasileiro, parecendo mais uma opção “nenhuma das anteriores”, ou seja, um
grande etcetera, uma espécie de coringa da classificação, já que, como afirma Campos
(2013, p. 5), a palavra pardo no censo é falada depois das palavras branco e preto,
sugerindo que a escolha por ela deve ser feita somente após a recusa das alternativas
anteriores, mais “polares”.
Percebemos que o uso da palavra pardo ora foi para dá qualidade ao indivíduo o
afastando de um passado escravizado, ora com o intuito de abranger os mestiços da nação,
porém com a finalidade de embranquecer a mesma e a afastar de sua verdadeira etnia, a
negra. As dúvidas referentes a esta cor/raça vem desde que o seu sentido era apenas o de
dá qualidade ao indivíduo e o de garantir um status social. Podemos perceber essa
indecisão no exemplo citado por Santos (2005, p. 122): “É o caso de uma exposta que,
em 07 de abril de 1766, foi classificada, inicialmente, como “branca”, mas no final do
registro o escrivão deixa transparecer a nossa proto-ambiguidade: parece a criança, ser
pardinha”.
Em um outro caso semelhante, o mesmo autor fala:
O mais instigante é a combinação dupla de cores no que se refere à cor de pele.
Algo que sobressai, por exemplo, com a enjeitada Anna, registrada como
“branca morena”, mas que na conferência, realizada em 23 de janeiro de 1818,
“se conheceo ser clara” com olhos grandes e “pouco azuis tirando a pardos”,
apesar de “ser bastante morena” (SANTOS, 2005, p. 127).
Estas incertezas de cor permanecem nos tempos atuais e são muito presentes no nosso
cotidiano. Sobre isso, Panizzi (apud ZAID, 2016, p. 9) considera que: “Muitas vezes, a
pessoa que não tem sua raça claramente definida tende a se autodeclarar como branca
para ter melhores oportunidades”. O que demonstra que as questões sociais continuam
influenciando as raciais. Por sua vez, ainda segundo o mesmo autor (apud RICH, 2016,
p. 8), exemplifica uma outra situação: “(...) uma pessoa fenotipicamente ambígua, ou seja,
que é difícil definir se é negra ou branca, se vestir um terno é classificada como branca,
e se vestir um uniforme de faxineira é classificada como negra”.
Para levantar dados atuais sobre estas questões de cor/raça, especificamente em
investigar os possíveis equívocos de erros gerados nas certidões de nascimento,
propusemos um questionário através da ferramenta Goolgle Forms, porque a pandemia
vigente (Covid-19) nos impediu de fazermos ela pessoalmente (AUTOR, 2020). Por este
motivo, enviamos o questionário por aplicativos de grupos de mensagens de amigos e
conhecidos e, também, por algumas redes sociais. Foram feitas perguntas simples e
abertas com o intuito de confirmar se na certidão de nascimento dos mesmos, existia o
campo cor/raça e, se caso existisse, se coincidia com a cor/raça que a pessoa se identifica.
Nossa pesquisa não tinha o interesse de obter um grande estudo quantitativo, mas, sim,
de procurar demonstrar, através dos dados coletados, o quanto as questões de cor/raça
ainda são tão presentes na atualidade.
Obtivemos 87 respostas, dentre as quais, de pessoas nascidas entre 1962 a 2002.
A importância de sabermos a data de nascimento dos mesmos é pelo motivo de
verificarmos se já estava vigente a Lei de 1° de fevereiro de 2017 que garante ao pai
autodeclarar a cor/raça do seu filho. E, também, nos ajuda a vermos as brechas causadas
pela ausência do campo cor/raça nas DNV de anos anteriores à Lei, principalmente no
tocante a utilização da heteroclassificação dos recém-nascidos.
Destacamos a seguir, as respostas que mais nos chamaram a atenção:
 Ao todo, 19 pessoas disseram que não tinham a informação da cor/raça na
Certidão de Nascimento;
 11 pessoas disseram que tinham a informação da cor/raça parda na Certidão e elas
se autodentificavam com a mesma;
 10 pessoas disseram que tinham informação da cor/raça parda na Certidão, porém
elas se autoidentificam com a cor/raça preta/negra;
 8 pessoas disseram que tinham a informação da cor/raça branca na Certidão, mas
elas se autoidentificam com a cor/raça parda;
 2 pessoas disseram que tinham a informação da cor/raça branca na Certidão, mas
que elas se autoidentificam com a cor/raça preta;
 2 pessoas disseram que tinham a informação da cor/raça caucasiana na Certidão e
elas se autoinditificam com essa cor/raça;
 1 pessoa disse que tinha a informação da cor/raça morena na Certidão, mas ela se
autoidentifica com a cor/raça branca;
 1 pessoa disse que tinha a informação da cor/raça branca na Certidão, porém ela
se autoidentifica com a cor/raça amarela.
Ao analisar estas constatações, verificamos a necessidade de mais estudos referentes a
cor/raça para que se possa desmistificar o que é cor e o que é raça. Em casos,
principalmente das pessoas que se identificam com a cor caucasiana e com a cor amarela,
nos intriga o quanto ainda a nossa sociedade está influenciada pelas teorias
racialistas/eugênicas do século XIX.
Raça, para Turner (2000, p. 121), é um termo usado para denotar aquilo que
percebemos como diferenças biológicas, ou seja, cor da pele e características faciais, por
exemplo. O autor também considera que nunca deveríamos usar o termo “grupo racial”,
pois este não tem base científica. Por outro lado, ele afirma que quando usamos o termo
“raça” queremos realmente dizer “etnia” ou aquelas diferenças comportamentais,
culturais e organizacionais que nos permitem categorizar os membros de uma população
como distinta.
Já o conceito de etnia, de acordo com Santos e Palomares (2011), é polivalente,
que constrói a identidade de um indivíduo resumida em: parentesco, religião, língua,
território compartilhado e nacionalidade. O termo funciona como um referencial para
relacionar o ser ao âmago do que ele é enquanto indivíduo pertencente a um grupo, a uma
tradição.
Para Moore (apud DIOP, 2020, p. 132): “o conceito de ‘raça’, como uma suposta
realidade biológica, corresponde a uma noção relativa e recente; não obstante, ela traduz
a compreensão sobre uma realidade concreta visualmente apreendida: o fenótipo”. Ou
seja, ele defende que a ideia de raça está imbrincada no fenótipo, na aparência física. E
continua:
Nesse mundo, percebemos primeiro o que é diferente de nós. Nas relações
sociais, humanas e históricas só percebemos o fenótipo. [...] Desde o início dos
tempos até o limiar do século XIX, todas as relações históricas e sociais da
Humanidade foram relações étnicas baseadas no fenótipo. Nenhuma outra
explicação faz sentido no movimento geral da história se subtraímos esse fato
(MOORE apud DIOP, 2020, p. 132).
Pensamento este defendido também por Souza (2018), que diz o que define como um
indivíduo será socialmente compreendido aqui no Brasil são os seus traços, sua pele, seu
corpo e seu cabelo.
Segundo Petruccelli (2013, p. 17), a noção de raça ainda permeia o conjunto de
relações sociais, atravessa práticas e crenças e determina o lugar e o status de indivíduos
e grupos na sociedade. O que nos leva a supor que efetivando as devidas
contextualizações, estejamos passando por um processo de “traumatismo coletivo”
descrito por Jacques Le Goff, o qual, mencionado por Souza (2011, p. 7), pontua sobre
as relações entre os conquistadores e os conquistados no Peru, onde a desestruturação dos
referenciais culturais das populações indígenas, daquele país, durante o sistema colonial,
resultou no desmonte cultural e na perda de identidade.
O que pode resultar no seguinte pensamento de Kabengele Munanga sobre o
embranquecimento e perda de identidade da sociedade brasileira:
Apesar do processo de branqueamento físico da sociedade ter fracassado, seu
ideal inculcado através dos mecanismos psicológicos ficou intacto no
inconsciente coletivo brasileiro, rodando sempre nas cabeças dos negros e
mestiços. Esse ideal prejudica qualquer busca de identidade baseada em
‘negritude e na mestiçagem’, já que todos sonham ingressar um dia na
identidade branca, por julgarem superior (MUNANGA, 2019, p. 21).
Ideia também defendida por Lima (2008), onde ele diz que a mestiçagem é apresentada
como embranquecimento e constitui-se e tem sido historicamente usada como mais um
dos mecanismos que vão contra a construção de uma identidade negra brasileira.
Constatar que a maioria da população brasileira se autodeclara parda na
atualidade, de acordo com o último censo divulgado de 2016 (IBGE, 2017) é, no mínimo
intrigante, por todas as construções sociais/raciais que esta cor foi ganhando no decorrer
do tempo. Desde às qualidades que a ela foram dadas e depois as teorias eugênicas que,
no Brasil, se ganhou o nome de miscigenação, embranquecimento. Em 1940, como
relatam Silva e Leão (2012), o Brasil se consolida como uma nação mestiça, por computar
no censo daquele ano, o agrupamento de todos aqueles que foram classificados como:
índio, caboclo, moreno, mulato etc, como pardos. A conclusão que se tira deste fato é a
seguinte: “o pardo é o símbolo da mestiçagem” (WESCHENFELDER e SILVA, 2018, p.
311).
Contudo, percebe-se como o uso do termo pardo favoreceu numa construção de
identidade racial que, como percebemos no decorrer deste trabalho, não condiz com a real
ideia de raça/etnia, ao qual os pardos fazem parte. A história, como diria Petersen e
Lovato (apud MORADIELLOS, 2013), tem um papel fundamental na construção de
identidades sociais, pois:
Qualquer grupo humano precisa, para sua orientação e sobrevivência no
presente, de uma consciência de seu passado coletivo, de sua duração como
grupo, que transcenda ao passado biográfico de cada um. A experiência
histórica de uma sociedade é seu único referente positivo, sua única
advertência tangível para saber ao que se ater e poder conceber planos e
projetos: sem ela, o futuro seria um salto no vazio. Assim, apropriar-se do
passado é, antes de mais nada, um mecanismo de autopreservação social
(PETERSEN e LOVATO, apud MORADIELLOS, 2013, p. 20).
Um grande estudo, “Projeto Humanae”, vem sendo realizado pela Angélica Dass
desde 2012, a qual, propõe captar através das lentes de sua câmera e com a paleta de cores
industrial (Pantone) a nossa verdadeira cor sem está atrelada as classificações raciais que
nos foram impostas. Ela já percorreu mais de 13 países e suas fotos nos faz refletir como,
em alguns casos teremos a mesma cor de pele, segundo a paleta industrial de cores, mas
de acordo com a classificação racial, seremos diferentes (FHOX, 2018). Como na Figura
1, onde a primeira é classificada como negra e, o segundo, como branco. Porém, ambos
tem a mesma cor de pele segundo paleta de cores industrial.

Figura 1

Fonte: Adaptado de https://www.angelicadass.com/humanae-project

Este estudo nos remete a uma ideia recente, o colorismo. O qual foi datado na
década de 1980 pela estadunidense, escritora e ativista, Alice Walker. Ela, segundo Souza
(2018), abriu uma discussão sobre a quantidade de privilégios atribuídos a uma pessoa
negra cuja tonalidade de pele é mais clara em relação às pessoas de pele de preta retinta.
Porém, vale ressaltar que nos Estados Unidos a leitura racial é baseada no genótipo:
possuindo uma gota de sangue de descendência negra, você será considerado um
afrodescendente.
Segundo Silva (2016), o colorismo apresenta-se como mais uma faceta de
discriminação racial e, ainda que não seja possível mensurar e comparar as discriminações
raciais existentes, trata-se de um tipo discriminatório extremamente cruel e violento.
Porque quanto mais pigmentada uma pessoa, mais exclusão ela sofre.
Quiçá, algum dia no mundo, estas questões de cor/raça/social/econômico sejam
vencidas e possamos ter um mundo mais justo e igualitário para todos, sem nenhuma
distinção. Sem mais nenhuma imposição humana frente as construções sociais e conceitos
que possam oprimir uns em valorização de outros, como as questões de cor e raça. E
evitar equívocos no tocante a este campo nas certidões de nascimento.

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