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KAVA-KAVA (Piper methysticum):

UMA REVISÃO GERAL

Diomara Resende Barbosa1, Layane Lenardon¹, Anette Kelsei Partata2

A utilização de fitoterápicos vem se expandindo nos últimos anos. Uma das razões desse aumento é a
falsa idéia de que os usuários têm sobre medicamentos a base de plantas medicinais não trazem
nenhum prejuízo. Entre os fitoterápicos existentes destaca-se o Piper methysticum conhecido
popularmente como kava-kava. Durante os anos de 1999 a 2002, a kava-kava esteve na lista dos 10
medicamentos fitoterápicos mais vendidos no Brasil. O uso indiscriminado de plantas vem causando
cada vez mais toxicidade segundo os estudos científicos. A kava-kava foi responsável por dezenas
desses números, envolvendo casos de hepatotoxicidade na Europa. Diante do exposto, o objetivo
desse trabalho é descrever os aspectos gerais de kava-kava e suas atividades farmacoterapêuticas e
apresentar informações técnicas para o desenvolvimento de uma melhor atenção farmacêutica aos
usuários de medicamentos fitoterápicos. O desenvolvimento deste estudo teve como base uma revisão
de literatura em livros, revistas e periódicos científicos e artigos atualizados sobre o tema. A kava-
kava é uma planta medicinal que se destaca pelas suas propriedades farmacológicas, tendo efeitos
ansiolíticos e indutores de relaxamento e sono. Os usuários de medicamentos fitoterápicos devem ser
informados sobre eventos adversos, interações e contra-indicações do fármaco que está sendo
utilizado, pois o prescritor e o dispensador devem orientar o paciente sobre a terapia mais adequada.
Ressalta-se que o farmacêutico possui amplo conhecimento sobre o uso racional de medicamentos e
compreende-se a sua importância para a realização de um tratamento eficaz e seguro.
Palavras-Chave: Ansiolíticos. Fitoterápicos. Kava-kava.

The use of herbal medicine has been expanding in recent years. One reason for this increase is that
users have a false idea that medicinal plants are harmless. Among the herbal existing stands to Piper
methysticum popularly known as kava-kava. During the years 1999 to 2002, the kava-kava was in the
list of 10 best-selling herbal medicines in Brazil. The indiscriminate use of plants has been causing
increasing toxicity according to scientific studies. The kava-kava was responsible for dozens of these
numbers, involving cases of hepatotoxicity in Europe. Given the above, the aim of this paper is to
describe the general aspects of kava-kava and its activities pharmacotherapeutics and present
technical information for developing better pharmaceutical care to users of herbal medicines.
Development of this study was based on a literature review of books, magazines and journals and
updated articles on the topic. Kava-kava is a medicinal plant that stands out for its pharmacological
properties, and anxiolytic effects and induce relaxation and sleep. Users of herbal medicines should be
informed of adverse events, interactions, and contraindications of the drug that is being used because
the prescriber and the dispenser should advise the patient on the most appropriate therapy. It is
noteworthy that the pharmacist has extensive knowledge about the rational use of medicines, and
understands the importance of pharmaceutical operations in achieving an effective and safe treatment.
Keywords: Anxiolytics. Botanicals. Kava-kava.

1Farmacêutica graduada pela FAHESA / ITPAC - Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos. Av. Filadélfia, 568 – Setor
Oeste – Araguaína-TO – Email: diomararesende@hotmail.com.
1Graduanda do Curso de Farmácia Generalista pela FAHESA / ITPAC - Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos. Av.
Filadélfia, 568 – Setor Oeste – Araguaína-TO – Email: layane.farmacia@hotmail.com.
2Orientadora, Doutora. Docente da FAHESA / ITPAC. - Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos. Av. Filadélfia, 568;
Setor Oeste; CEP: 77.816-540; Araguaína-TO. Email: anettepartata@hotmail.com.
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1. INTRODUÇÃO contribuição aos usuários de fitoterápicos, para


Desde a Antiguidade a utilização de que possam ter maior segurança na utilização de
plantas era uma fonte de medicamentos que vem kava-kava, visando prevenir o seu uso
se transformando aos longos dos tempos, a partir inadequado.
das formas mais simples aplicadas pelo homem
pré-histórico até aos medicamentos fitoterápicos 1.1 OBJETIVOS
utilizados atualmente (JUSTO & SILVA, 2008b). 1.1.1 Objetivo geral
As partes e áreas subterrâneas de plantas Descrever os aspectos gerais de kava-kava e
ou de materiais vegetais são definidas como suas atividades farmacoterapêuticas, visando
produtos fitoterápicos, que são plantas medicinais o estabelecimento do seu uso racional no
etiquetados e acabados com componentes ativos tratamento da ansiedade, nervosismo e
ou com combinações em formas de preparações insônia.
vegetais ou em estado bruto (CORDEIRO;
CHUNG & SACRAMENTO, 2005). 1.1.2 Objetivos específicos
Os medicamentos fitoterápicos surgiram a  Estudar os aspectos farmacobotânicos e
partir dos primórdios da humanidade, pois, a farmacoterapêuticos de kava-kava;
busca do homem para tratar enfermidades fez  Identificar os constituintes químicos que
com que ele procurasse recursos através das estão associados às suas atividades
plantas. A variedade e espécies de fitoterápicos farmacológicas;
foram reflexos do conhecimento da população ao  Apresentar informações técnicas para o
uso e manejo das plantas medicinais no desenvolvimento de uma melhor atenção
tratamento de doenças (JUSTO & SILVA, 2008b). farmacêutica aos usuários de medicamen-
Acredita-se que algumas razões para o tos fitoterápicos.
aumento da popularidade de fitoterápicos na
medicina humana é a falsa idéia de que 1.2 METODOLOGIA
medicamentos a base de plantas não fazem mal O desenvolvimento desta revisão de
(PINTO, 2004). literatura realizou-se através de pesquisas de
Entre os fitoterápicos existentes, destaca-se artigos que foram localizados sistematicamente a
a kava-kava (Piper methysticum G. Forst) partir de busca eletrônica em bases de dados, bem
pertencente à família Piperaceae, que é cultivada no como pelo acesso aos livros disponíveis no acervo
Pacífico Sul há mais de 3000 anos pelos nativos bibliográfico da FAHESA / ITPAC.
(PINTO, 2004).
Durante os anos de 1999 a 2002, a kava- 2. REVISÃO DE LITERATURA
kava esteve na lista dos 10 medicamentos
fitoterápicos mais vendidos no Brasil. Esta planta 2.1. HISTÓRIA
é indicada no tratamento de insônia e ansiedade, Ao longo da história da humanidade, a
atuando como calmante (JUSTO & SILVA, 2008b). fitoterapia tem sido amplamente utilizada pelo ser
O uso indiscriminado de plantas vem causando humano desde os primórdios das civilizações
cada vez mais toxicidade segundo os estudos mais antigas e as plantas têm sido aplicadas pela
científicos. A kava-kava foi responsável por medicina popular na cura, prevenção e tratamento
dezenas desses números envolvendo casos de de enfermidades, devido ao fato de possuírem
hepatotoxicidade na Europa (OLIVEIRA & uma relevante fonte de princípios ativos. Diversas
GONÇALVES, 2006). culturas utilizaram produtos naturais com
O aconselhamento de um profissional finalidades terapêuticas e esses registros históricos
farmacêutico aos usuários de kava-kava visa contribuíram para a pesquisa de novas moléculas
contribuir para o uso racional de medicamentos de importante ação farmacológica na obtenção de
fitoterápicos e informar quanto aos benefícios e fármacos (FIRMO, et al., 2011; FOGLIO, 2006).
malefícios que possam ser causados pelo seu uso. Helfand & Cowen (Citado por FIRMO, et
Portanto, as autoras dessa revisão acreditam nessa al., 2011) “citam que existem vários registros sobre

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a utilização das plantas para tratamento de Alemanha, em 1990, o uso de kava-kava foi
doenças desde 4.000 a. C”. aprovado para o tratamento da ansiedade e
Na última década, tem ressurgido o distúrbios nervosos como estresse ou cansaço.
interesse pela fitoterapia e isso fica evidente nas Através de estudos clínicos recentes ficou
publicações científicas da área de farmacologia esclarecido que o kava-kava é relativamente
que buscam descobrir novos fármacos através de seguro, pois, não causa dependência química e é
substâncias extraídas de espécies vegetais que um ansiolítico efetivo. Enquanto os ansiolíticos
produzam maior eficácia terapêutica (FIRMO, et sintéticos causam letargia e confusão mental,
al., 2011). kava-kava é responsável pelo aumento na
Na pesquisa de novos fármacos que concentração, memória e reflexos das pessoas que
proporcionem uma maior adesão ao tratamento, apresentam ansiedade (COLÓ, 2006).
estão sendo estudadas novas substâncias obtidas Entretanto, foram registrados casos de
de plantas. Entre as espécies vegetais, destaca-se a necrose hepática. Na Alemanha, em 1998, houve
Piper methysticum G. Forst, que é popularmente um episódio grave e na Suíça, em 2000, um
conhecida como kava-kava, Kava, cava-cava, paciente precisou de transplante de fígado após
pimenta-intoxicante, raiz-Kava, pimenta-Kava e hepatite aguda provocada por doses diárias de
outras denominações (JUSTO & SILVA, 2008b). 210-280 mg de kavalactonas (COLÓ, 2006).
Tanto o arbusto da espécie Piper Portanto, em 2010, a Diretoria Colegiada
methysticum quanto a bebida psicoativa elaborada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária
com o rizoma desta planta, é denominada de (ANVISA), no uso das atribuições que lhe
kava-kava pelos nativos das ilhas do Pacífico, conferem, estabeleceu que a kava-kava não deverá
sendo que, essa bebida é usada principalmente em ser comercializada livremente, sendo obrigatória a
cerimônias culturais e religiosas, para promover padronização dos textos de bula para os
alterações na consciência, diminuição da fadiga e medicamentos fitoterápicos obtidos a partir do
da ansiedade e consequentemente, o bem-estar extrato de Piper methysticum e controles rigorosos
desses povos (COLÓ, 2006). na fabricação e comercialização desta droga
Foi durante a primeira expedição do vegetal (BRASIL, 2010).
Capitão James Cook ao Pacífico Sul em 1768-1771,
que dois botânicos suecos descreveram a planta 2.2 ORIGEM E DISTRIBUIÇÃO
do kava-kava. Na segunda viagem, datada no ano Nas ilhas do Pacífico (Fig. 1) a distribuição
de 1772-1775, o botânico Johann Georg Foster, fez de kava-kava é limitada, pois é a única planta que
a primeira descrição detalhada dessa planta, é cultivada com importância econômica.
nomeando-a cientificamente de Piper methysticum. Atualmente, a kava-kava não cresce mais
Essa espécie é do gênero “Piper”, pois, pertence à naturalmente, pois, seu cultivo só tem interesse
família “Piperaceae” e “methysticum” é latim que comercial (NETO, 2004).
veio do grego “Methustikos”, que deriva de
“Methu” e significa “bebida intoxicante” (COLÓ,
2006; JUSTO & SILVA, 2008b).
Em 1886, a kava-kava foi pela primeira vez
citado em artigos científicos, devido aos seus
efeitos ansiolíticos e indutores de relaxamento e
sono. Em 1914 estava na lista da Farmacopéia
Britânica e em 1950 surgiu na “USDispensary”
sendo usado no tratamento da gonorréia
(Gonosan) e distúrbios nervosos (Neurocardin)
(COLÓ, 2006).
Na última década, produtos feitos à base
do extrato de kava-kava começaram a surgir nos Figura 1. Ilhas do Pacífico onde o consumo de kava-kava foi
mercados norte-americanos e europeus. Na originado - Fonte: Coló, 2006.

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O cultivo de kava-kava e seleções


produziram muitas variedades ou cultivos
reconhecidos por diferenças nos internodos
(espaço entre juntas de talo), cor de talos,
intensidade de cor de folha e qualidade da raiz.
Essas são classificadas como variedades
diferentes, usadas e nomeadas com um objetivo
diferente pela população nativa (NETO, 2004).

Figura 2. Descrição de Piper methysticum - Fonte: JUSTO &


2.3 NOMENCLATURA CIENTÍFICA SILVA, 2008b.
A kava-kava passou a ser conhecida no
mundo civilizado a partir dos primeiros contatos A parte central do rizoma (Fig. 3) é
entre os nativos do Pacífico e os Europeus. Seus bastante porosa com feixes lenhosos e finos que
usos medicinais eram identificados através de são torcidos de forma irregular e separados por
rituais, onde os nativos faziam uma bebida raios medulares, dando origem a malhas sob a
amarga para os seus visitantes. Esse costume é casca. O caule é subterrâneo do tipo rizoma,
mantido até hoje em algumas regiões (ALONSO, podendo pesar até 10 kg, ramificado, suculento,
1998). com várias raízes, cor negro-acinzentado por fora
James Cook (1768-1771) possivelmente foi e esbranquiçado no interior (JUSTO & SILVA,
o primeiro europeu a ter contato com a kava-kava. 2008b).
A descrição botânica foi realizada pela primeira
vez por Johann G. Forster, que denominou Piper,
por fazer alusão ao seu sabor picante e
Methysticum, seria uma tradução da palavra em
grega methu (bebida embriagante) (ALONSO,
1998).
Nas regiões de origem, o termo kava faz
alusão a seu caráter aromático. Segundo o
historiador De Felice, iniciou-se o uso de kava-
kava pela observação de ratos que costumavam
roer as raízes deste arbusto e caíam quase
fulminados, e após algum tempo voltavam as suas Figura 3. Rizoma de P. methysticum - Fonte: JUSTO &
atividades (ALONSO, 1998). SILVA, 2008b.

A parte utilizada é o rizoma seco, que


2.4 DESCRIÇÃO possui odor fracamente aromático e sabor
O Piper methysticum é um arbusto dióico, levemente amargo. Ao mastigar o rizoma de kava-
ereto, com dois a três metros de altura, com folhas
kava provoca dormência na língua e salivação
grandes e rígidas profundamente cortadas na base
(JUSTO & SILVA, 2008b).
(Fig. 2). Possuem de 9 a 13 nervuras principais,
A partir da trituração é feita a bebida de
sendo menos proeminentes na face interior;
kava-kava através do rizoma seco, maceração do
estípulas presentes e grandes. Contém inúmeras
mesmo em água fria, em seguida de percolação do
flores pequenas, que se arranjam em cachos tipo
líquido. Os extratos são preparados pela extração
espigas, com 3 a 9 centímetros de comprimento
da droga vegetal com uma mistura de etanol e
(JUSTO & SILVA, 2008b). água, quando se deseja extratos com
aproximadamente 30% de princípio ativo. Usa-se
mistura de acetona e água para extratos mais
concentrados, contendo até 70% de princípio ativo
(JUSTO & SILVA, 2008b).

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2.5 COMPOSIÇÃO Tabela 1. Principais cavapironas presentes em


P.methysticum
Segundo Cordeiro et al., (Citado por
JUSTO & SILVA, 2008b), a kava-kava apresenta
em sua composição química várias substâncias,
como taninos, ácido benzóico, ácido cinâmico,
açúcares, bornil-cinamato, estigmasterol,
flavocavaínas, mucilagens, pironas,
tetrahidroiangoninas e alguns sais minerais,
principalmente o potássio.
As α- pironas denominadas cavalactonas
ou cavapironas (Fig. 4) são os principais
constituintes responsáveis pela sua atividade
farmacológicas da kava-kava (JUSTO & SILVA,
2008b).

Fonte: JUSTO & SILVA, 2008b.

Os constituintes podem variar a sua


concentração de 3 a 20% de planta para planta
(Tab. 2), dependendo dos procedimentos de
Figura 4. Estrutura geral das cavalactonas presentes em colheita, secagem, armazenamento e
P.Methysticum - Fonte: JUSTO & SILVA, 2008b. processamento. A maior parte das cavapironas se
encontra na resina, sendo que a planta seca deve
apresentar no mínimo 3,5% de cavalactonas
No rizoma da espécie foram identificados calculadas como cavaína. Essas substâncias são
18 cavalactonas, sendo que destas, as seis que poucos solúveis em água, possuem tempo de
apresentam maior interesse farmacológico são: meia-vida que pode variar de 90 minutos a várias
iangonina, metisticina, cavaína, desmetoxiangoni- horas no plasma e biodisponibilidade bastante
na, dihidrocavaína e dihidrometisticina (Tabela 1) variável (JUSTO & SILVA, 2008b).
(JUSTO & SILVA, 2008b).
Tabela 2. Concentração das cavalactonas presentes no
rizoma de P. methysticum

Fonte: JUSTO & SILVA, 2008b.

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2.6 VARIAÇÕES QUÍMICAS ENTRE O mente. Material de talo foi achado por
CULTIVO conter aproximadamente e respectiva-
mente 36%, 28% e 10% de dihidrocavaína,
dihidrometisticina e iangonina, enquanto
Segundo Cheng et al., (Citado por NETO, 19% cada de cavaína desmetoxiangonina e
2004), um extrato solvente de material recolhido 17% cada de dihidrocavaína e iangonina
em Vanuatu, mostrou que este conteve muito foram achadas nas raízes. Os dois cultivos
iangonina. Também foram encontrados deram cromatogramas semelhantes para
dihidrocavaína e cavaína predominantes nesse as partes correspondentes. Estas tentativas
material recolhido em Vanuatu. foram administradas há três tempos
Material de Vanuatu, a kava-kava diferentes do ano, com essencialmente os
incomum pirona 5-hidroxidihidroxicavaína, a mesmo resultados.
extração da fração aquosa com solvente orgânico é
realizada somente depois do tratamento de Foi observado que no campo a seleção de
umedecer com ácido aquoso. O solvente orgânico kava-kava para propagação é principalmente
não só libertou este material de raízes (NETO, baseado em composição química, e não as
2004). diferenças morfológicas da planta, isso foi
Segundo Cheng et al., (Citado por NETO, determinado pelo efeito fisiológico produzido por
2004), também mostrou que a água remove só 5%- ingestão da planta (NETO, 2004).
10% da resina que poderiam ser diretamente Entretanto, Labot & Levesque (Citado por
removidas com os solventes orgânicos. NETO, 2004) afirmam que, nenhuma investigação
De acordo com Smith (Citado por NETO, fitoquímica sistemática de cultivos de kava-kava
2004), utilizou um método de GC semelhante ao foi empreendida. A origem e distribuição de Piper
descrito por Duve (1981), para quantificar o Piper methysticum foram usadas para estudar essa
methysticum e seus conteúdos de pirona de kava- observação. Foi feita uma análise detalhada de
kava de dois cultivos de Fidjian, distinto em base cavalactona para poder identificar as variações
da cor deste talo, um branco e outro preto. entre os componentes ativos existentes entre os
Não foram vistos resultados que diferentes cultivos. Localizou-se mais de 240
correspondem a metitiscina e o autor notou espécies de Piper methysticum na Oceania, 13 de
dificuldades gerais com sua quantificação por Papua Nova Guiné e 3 de Irian Jaya e 111 espécies
análise de GC, sugerindo que GC pode não ser Piper wichmannii de Papua Nova Guiné, em
uma técnica segura para determinar concentração Solomons e Vanuatu; essa identificação foi
de cavalactona. Com as proporções relativas realizada através de uma pesquisa herbária
informadas para cavalactonas em raiz de kava- mundial.
kava comparada favoravelmente e previamente Mais de 220 amostras de raízes que
com resultados, obtiveram usando TCL e representam quatro áreas geográficas principais
espectrofotometria (NETO, 2004). (Vanuatu, Fidji, Polinésia, Papua Nova Guiné, Ilha
Smith (Citado por NETO, 2004), dois de Salomon e Pohnpei) foram selecionadas pós-
cultivos deram cromatogramas secos, extraídas com clorofórmio e analisadas por
semelhantes para as partes fase normal de HPLC. Para as seis principais
correspondentes, entretanto foram vistas cavalactonas os tempos de retenção eram notáveis,
variações largas entre os níveis de que foram quantificados em porcentagens (NETO,
componentes em folhas, talos e raízes. Os 2004).
resultados seguintes são uma média das Baseado na predominância de cavalactona
concentrações relativas de cavalactonas cada amostra foi codificada baseada nessa ordem.
informada por cada cultivador. Piper
Nove tipos foram identificados, quatro formas de
methysticum foi reconhecido novamente
Piper wichmannii que é exclusivo da Melanésia e
como um componente principal de folhas
da kava aproximadamente 37%, enquanto cinco cultivos de Piper methysticum. Parece ser
dihidrocavaína e dihidrometisticina controlado geneticamente o conteúdo de
responderam por 31% e 19%, respectiva- cavalactona, não ambientalmente regulado. Em

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outras palavras, enquanto nenhuma relação sabe-se, que a presença de etanol (utilizado
poderia ser estabelecida entre morfotipo e poderia para diluir o extrato) pode interferir nas
ser o valor percebido, havia uma relação entre reações de identificação dos taninos.
quimiotipo e uso tradicional na ilha (NETO, 2004). Portanto é compreensível que a
De acordo com os dados dos estudos caracterização da classe de taninos
químicos, Lebot & Levesque (Citado por NETO, presente no extrato seco da kava-kava
2004), perceberam que aqueles tipos de kava-kava tenha ficado comprometida.
com uma porcentagem alta de cavaína e uma 3. As análises físico-químicas apresentaram
baixa porcentagem de dihidrometisticina foram densidade 0,63 g/mL, pH 4,67 e ponto de
especialmente desejados e desfrutados, enquanto fusão indeterminado, pois, o equipamento
as bebidas de kava-kava não estimavam que alcança temperatura máxima de 300ºC
porcentagens altas de dihidrocavaína e não conseguiu encontrar o ponto de fusão
dihidrometisticina. da amostra analisada e na literatura
pesquisada não existe tal informação.
2.7 ANÁLISES FÍSICO-QUÍMICAS 4. A amostra não acusava a presença de
Embora a kava-kava seja utilizada material estranho.
amplamente pela população mundial, essa planta 5. A Farmacopéia Brasileira (2000) estabelece
ainda não possui monografia específica que valores entre 8 a 14% de umidade para
descreva suas características farmacológicas e matérias-primas vegetais. O teor de
farmacognósticas, isso facilita processos de umidade encontrado para a amostra foi de
adulterações e/ou falsificações e impede a 4,3%, portanto, este valor está abaixo do
realização de um controle de qualidade mais mínimo estabelecido.
rigoroso (JUSTO & SILVA, 2008a). 6. A amostra permaneceu na mufla a 450ºC e
Justo & Silva (2008a) fizeram um trabalho foram analisadas duas vezes distinta-
que buscaram dados que fossem um suporte para mente, sendo que, tanto na primeira
a realização do controle de qualidade do extrato análise de 4 horas quanto na segunda
seco da Piper methysticum, tais como análise análise de 6 horas, o extrato seco de kava-
sensorial, prospecção fitoquímica, potencial kava apresentou-se esbranquiçado e não
hidrogeniônico (pH), ponto de fusão, densidade, houve formação de cinzas.
análise da presença de material estranho,
determinação do teor de umidade e de cinzas A análise fitoquímica visa estudar os
totais. Nesse estudo foram obtidos os seguintes constituintes químicos, portanto, esses testes são
resultados para a amostra do extrato seco de kava- imprescindíveis na identificação das principais
kava: classes de compostos provenientes do
1. A análise sensorial: o extrato apresentou-se metabolismo secundário das espécies vegetais
extremamente fino, de cor amarelo- (FOGLIO et al., 2006; JUSTO & SILVA, 2008a).
esverdeado, com odor bastante Os testes fitoquímicos foram realizados
característico e sabor levemente adocicado. através de reações em tubo de ensaio em triplicata
2. Na prospecção fitoquímica, o único e cromatografia em camada delgada (CCD), posto
composto oriundo do metabolismo que, as classes de substâncias testadas foram:
secundário encontrado no extrato seco da compostos fenólicos, compostos antracênicos,
kava-kava, foram os compostos fenólicos, flavonoides e taninos de Piper methysticum (JUSTO
sendo que, na literatura, apenas a presença & SILVA, 2008a).
de taninos é relatada para a espécie. Quando não é possível realizar estudos
Entretanto, sabe-se que os compostos químicos sobre as plantas, os testes fitoquímicos
fenólicos são precursores dos taninos. preliminares podem indicar o grupo de
Posto que, os taninos geralmente são metabólitos secundário. No entanto, para obter
identificados conforme a identidade dos uma melhor compreensão das substâncias
compostos fenólicos nas suas moléculas responsáveis por determinada atividade biológica

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ou classe específica de constituintes, deverá ser área cerebral atingida por danos
feito o isolamento estrutural da espécie analisada provenientes de isquemia em ratos. As
(FOGLIO et al., 2006) demais cavapironas não demonstraram
A pesquisa realizada demonstra que possuir esta ação (JUSTO & SILVA,
2008b).
através das análises e dos dados obtidos foi
possível montar um banco de dados que
auxiliasse na identificação dos constituintes do Gleitz & colaboradores (Citado por JUSTO
Piper methysticum. Portanto, é necessário elaborar & SILVA, 2008b) fizeram teste com os ratos
uma monografia farmacopéica dessa espécie injetando cavaína por 5 minutos antes de
vegetal, pois, há uma carência de informações injetarem ácido araquidônico, com isso
sobre essa planta (JUSTO & SILVA, 2008a). conseguiram notar uma diminuição da dose-
dependente da agregação plaquetária, sugerindo
que a atividade sobre a enzima cicloxigenase-1
2.8 FARMACOLOGIA
(COX-1) seja o alvo principal das cavalactonas. No
O extrato da kava-kava ao agir no sistema
entanto, a kava-kava não age seletivamente, pois é
nervoso central (SNC) proporciona uma sensação
também, capaz de inibir a enzima COX-2, com
de prazer, amenizando as sensações de medo.
potência comparada a de 2,5 μg/mL do fármaco
Perifericamente, age sendo um potente anestésico
naproxeno.
local, exercendo também efeito protetor contra
Contudo, a atividade ansiolítica da kava-
envenenamento por estricnina, sendo superior a
kava é o alvo que vem despertando o interesse de
todos os antagonistas não-narcóticos conhecidos
pesquisadores em estudos científicos. O efeito de
(JUSTO & SILVA, 2008b).
uma dose diária equivalente a 210 mg de
A atividade farmacológica da kava-kava é
cavapirona foi comparado com o efeito de
devido às kavalactonas (também chamada de
15mg/dia de oxazepam ou 9 mg/dia de
kavapironas), kavaína, diidrokavaína,
bromazepam em um estudo duplo-cego que teve
mestisticina, diidromestisticina e outros. Está
seis meses de duração (JUSTO & SILVA, 2008b).
comprovado que a kava-kava possui diversos
A vantagem da ação ansiolítica da kava-
efeitos sobre o SNC, inserindo atividades
kava que não apresenta os efeitos adversos dos
ansiolíticas, sedativas, anticonvulsivantes,
benzodiazepínicos como prejuízo das funções
anestésica local, espasmolítica e analgésica;
cognitivas, sonolência, redução da coordenação
entretanto é desconhecido o mecanismo exato
motora e dependência (JUSTO & SILVA, 2008b).
desses feitos (JUSTO & SILVA, 2008b).
A kava-kava possui atividade
As cavalactonas têm a capacidade de inibir
anticonvulsivante que age no SNC, que essa
diversas isoformas do citocromo P450(CYP450),
atividade pode estar associada à ação antagonista
sendo elas: CYP1A2, CYP2C9; CYP2C19; CYP2D6,
das cavalactonas, em especial da cavaína, sobre
CYP3A4; CYP4A9 e CYP4A9/11. Esta
canais de sódio dependentes de voltagem e de
propriedade causa inúmeras interações,
cálcio tipo L (JUSTO & SILVA, 2008b).
principalmente farmacocinéticas, com outras
Nessa investigação sobre a kava-kava, uma
drogas, pois, diminui a metabolização destas pelas
curiosidade despertou o interesse nos
enzimas inibidas do complexo CYP450, podendo
pesquisadores: a baixa incidência de câncer de
induzir a toxicidade (JUSTO e SILVA, 2008b).
Outra atividade atribuída aos estômago, pulmão e próstata nos habitantes da
componentes da Kava é a analgesia. A ilha de Fijian (pertencente às ilhas do Pacífico),
dihidroxicavaína e a dihidrometisticina comparado aos moradores de outras ilhas como
em concentrações de 120 mg por quilo de Polinésia, Micronésia e Nova Caledônia. Os
peso corporal são equivalente à ingestão pesquisadores notaram que o povo de Fijian
de 200 mg de ácido acetilsalicílico (AAS) possuía o hábito de beber kava-kava na busca de
por quilo de peso corporal. Backhauss e sua atividade analgésica e esse costume não
Krieglstein (1992) também defendem a existia com moradores das outras ilhas. Por isso,
atividade neuroprotetota da metisticina e
passaram a estudar a composição química do
da dihidrometisticina, que diminuíram a

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kava-kava e acabaram por identificar uma nova neurotransmissores dopamina e serotonina


cavapirona, a 7,8 epoxiangonina (Fig. 5), capaz de (JUSTO & SILVA, 2008b).
diminuir significativamente a liberação do fator α A inibição reversível da enzima
de necrose tumoral (FNT-α), um importante monoaminoxidase B(MAO-B) tanto pelo
marcador de tumores (JUSTO & SILVA, 2008b). extrato de kava-kava como pelas
cavalactonas isoladas pode ser um
mecanismo importante para sua ação
psicotrópica, sendo que as diferenças
estruturais da cavalactonas resultaram em
diferentes potenciais de inibição, onde se
obteve: desmetoxiangonina>metisticina>
iangonina>dihidrometisticina>dihidrocav
aína>cavaína (JUSTO & SILVA, 2008b).

Figura 5. Estrutura química da cavalactona 2.9 INDICAÇÕES CLÍNICAS


7,8 epoxiangonina - Fonte: JUSTO & SILVA, 2008. Os fitoterápicos que contém extratos ou
mesmo o pó de raízes e rizomas de Piper
Ainda não está bem esclarecido o methysticum G. Forster (kava-kava) são
mecanismo de ação das cavalactonas, existindo amplamente utilizados no mundo, sendo que, seu
dados contraditórios sobre a interação destas, uso é aplicado principalmente no tratamento de
principalmente da dihidrocavaína, com o receptor ansiedade e insônia (JUSTO & SILVA, 2008b).
do ácido gama-aminobutírico (GABA), sendo que, A kava-kava é uma droga alternativa ao
um trabalho realizado remete ao aumento dos uso dos benzodiazepínicos, devido ao fato de não
sítios de ligação (modulação) nestes receptores, induzir dependência em seus usuários, além de
acontecendo uma redução significativa nas não provocar distúrbios cognitivos e outras
descargas neuronais e outro mostra a ausência de reações adversas inerentes a esta classe
atividade nestes sítios e também nos sítios de medicamentosa (JUSTO & SILVA, 2008b).
ligação dos benzodiazepínicos (JUSTO & SILVA, Segundo Beauge; Aufrere; Dingeon
2008b). (Citado por COLÓ, 2006), após a administração do
Por causa da característica extremamente extrato de kava-kava notou-se o aumento da
lipofílica das cavapironas, é possível que estas ingestão de água e diminuição do consumo de
atuem sobre a fluidez da membrana lipídica álcool em pacientes que utilizaram essa planta no
celular, mudando a conformação de vários tratamento do alcoolismo, sendo que, essa
receptores, atuando de forma não seletiva (JUSTO analogia indica uma possível atividade
& SILVA, 2008b). terapêutica.
Foram realizados estudos farmacológicos Atualmente, a kava-kava tem sido
em animais que demonstraram ações sedativas, utilizada para o tratamento da ansiedade,
relacionadas com a ativação da transmissão estresse, insônia, agitação, epilepsia,
dopaminérgica e serotoninérgica na região psicose e depressão. Não há informação
mesolímbica, o que poderia estar associado com a suficiente disponível sobre a eficácia da
kava-kava para seus outros usos.
redução da excitabilidade emocional e alterações
Entretanto, na medicina popular, ela é
comportamentais (JUSTO & SILVA, 2008b). usada também, para promover
Enquanto isso, outro grupo de autores cicatrização de feridas, no tratamento
confirma que as cavapironas interagem sim enxaquecas, resfriados e infecções do trato
com receptores GABA-A através de um efeito respiratório, tuberculose, reumatismo,
alostérico e que também inibem canais de infecções urogenitais, incluindo cistite
crônica, doenças venéreas, inflamação
sódio dependentes de voltagem e atacam uterina, problemas intestinais, otite e
receptores H3, mas, não alteram os níveis dos abscessos (CORDEIRO; CHUNG; SACRA-
MENTO, 2005).

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Foram descritos outros efeitos terapêuticos haver uma indicação adequada do medicamento
da kava-kava no tratamento da gonorréia, sífilis, para conseguir a eficácia terapêutica.
cistite e obesidade, mas, não há explicações bem Segundo a ANVISA, a kava-kava é
definidas sobre os seus mecanismos de ação indicada para o tratamento dos sintomas de
(COLÓ, 2006). ansiedade, nervosismo e tensão que se apresentam
Há pesquisas sobre a avaliação das nos estágios leves a moderados, sendo utilizada
atividades neuroprotetoras da kava-kava, em um curto prazo de 1-8 semanas de uso
relacionados com N-metil-D-aspartato, entretanto, (BRASIL, 2010).
os resultados sobre a elucidação dos mecanismos
foram muito contraditórios. Além disso, foi 2.10 USO EM ANIMAIS
observada uma menor incidência de câncer em No Brasil, a criação de codornas vem
pessoas que consomem kava-kava frequentemente evoluindo a cada ano no mercado agropecuário.
(COLÓ, 2006). No entanto, as codornas que estão estressadas
Singh & Sweetman (Citado por JUSTO & podem diminuir a produção de ovos, e o
SILVA, 2008b), popularmente a kava-kava comportamento nervoso e agitado faz com que
é usada para tratar gonorréia, dor elas se biquem mais e gastem energia devido a
menstrual, tuberculose e problemas
esses atos agressivos que prejudicam a produção
respiratórios. [...] Também foi referida sua
(SILVA, et al., 2010).
utilização como analgésico, diurético e
relaxante do músculo liso. Alguns Pesquisas e estudos com fitoterápicos de
moradores da região do pacífico a utilizam caráter ansiolítico e sedativo vêm sendo utilizados
como enxaguatório bucal, para tratar como tentativa de diminuir o estresse em
úlceras orais e dor de dente, contra veneno codornas para que possam melhorar o
de cobra e outros animais peçonhentos e, desempenho e bem estar das aves (SILVA et al.,
na homeopatia, é usada nos estados de 2010).
excitação, exaustão e gastrite. Conforme A kava-kava (Piper methysticum), que é um
Mesquita e colaboradores (2005), na fitoterápico que tem como indicação no
Europa, produtos contendo extratos
tratamento de ansiedade, tensão nervosa, estresse,
hidroalcoólicos, o pó ou até mesmo as
agitação e insônia, poderia ser uma opção para
raízes de P. methysticum são muito
comercializados para o tratamento de tentar melhorar o desempenho de codornas na
ansiedade e insônia. produção de ovos e diminuir o estresse que
acomete essas aves (SILVA et al., 2010).
Segundo a metanálise publicada por Pittler Devido a isso, foi feito um experimento
& Ernst (Citado por FAUSTINO; ALMEIDA; que teve como objetivo avaliar o efeito da kava-
ANDREATINI, 2010), através de estudos baseados kava como fitoterápico na alimentação de
em sete trabalhos com pacientes que codornas na fase de postura. Também foi avaliado
apresentavam transtornos de ansiedade indicam a o desempenho (consumo da ração, conversão
redução da ansiedade avaliada pela EAH (Escala alimentar, peso dos ovos e produção), qualidade
de Ansiedade de Hamilton). dos ovos, tempo em imobilidade tônica,
Segundo Toniolo Neto (1999), o uso de 100 intensidade de ferimentos e relação heterófilo:
mg de kava-lactonas, na dose, três vezes ao dia, linfócito (SILVA, et al., 2010).
apresenta resultados positivos no tratamento da Para essa pesquisa utilizou-se noventa
ansiedade, tensão, insônia e dores musculares. codornas com 21 semanas de idade que foram
Este fármaco também atua como coadjuvante no pesadas e alojadas em gaiola. As distribuições das
tratamento de pacientes que apresentam sintomas codornas foram feitas em blocos ao acaso, para
de depressão, distimia, transtorno do pânico e poder ter um controle do peso no início do
outros distúrbios psiquiátricos. De modo geral, as experimento, submetidas a três tratamentos (0 –
pesquisas relacionadas à Piper methysticum G. controle, 300 e 600mg de extrato seco de kava-
Forster apresentam um efeito ansiolítico, sendo kava/ kg de ração), com cinco repetições e seis
que, para obter melhores resultados é necessário codornas em cada parcela (SILVA, et al., 2010).

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De acordo com o estudo realizado por Outra pesquisa que tinha como objetivo
Silva, et al. (2010) a kava-kava utilizada na contribuir para os conhecimentos sobre a
alimentação de codornas de postura causa uma utilização de fitoterápico utilizando como
redução no estresse. Isso evidencia que a kava- ansiolítico e sedativo, foi a avaliação toxicológica
kava é capaz de acalmar as codornas. da preparação fitoterápica contendo Piper
Também foram realizados outros estudos metysticum Forst (kava-kava) sobre o
em ratos onde as resinas de kava-kava e desenvolvimento pré-natal em ratos Wister
cavapironas individuais foram mostrados para (PINTO, 2004).
não interagir com benzodiazepina ou receptores Foi avaliado também nesse estudo
de GABA significativamente. Para explicar estes algumas possíveis alterações hepáticas em ratas
achados experimentais, postularam os autores que Wister tratadas com a kava-kava durante o
as propriedades de lipofílicos fortes de período da gestação, por meio da mensuração das
cavapironas podem causar distorções em enzimas hepáticas alanina-aminotrasferase e
domínios de receptor por uma incorporação não fosfatase alcalina e da histopatologia do fígado
seletiva em membranas de lipídios (NETO, 2004). (PINTO, 2004).
O teor de dihidrocavaína (DHK), cavaína Utilizou-se nesse estudo 96 ratos Wister
(K), desmetoxiangonina (DMY) e iangonina (Y) com idade de 90 dias, onde foi realizado o
em cérebro de rato foi medido por cromatografia. acasalamento dos animais. A confirmação da
DHK e K penetraram rapidamente e eram gestação foi realizada através de teste por citologia
rapidamente afastados. DMY e Y penetraram vaginal (estro) (PINTO, 2004).
menos (NETO, 2004). Para a pesquisa foi utilizado uma
Os componentes de resina de kava-kava formulação de Piper methysticum (kava-kava®)
tinham o teor que era de duas a vinte vezes com rizoma em forma de pó em cápsulas de
maiores, respectivamente, que quando eles eram 400mg (PINTO, 2004).
chamados como materiais isolados. Embora o No estudo obteve que a preparação
mecanismo exato seja desconhecido, há um fitoterápica contendo P. Metysticum (kava-kava®),
aumento marcado na potência oral destas administrada por via oral, do 6° ao 15° dia de
substâncias quando eles são consumidos com gestação, nas dosagens de 5mg/kgˉ¹ o que
outros componentes de kava-kava (NETO, 2004). equivale à dosagem recomendada para humanos,
A mais atual pesquisa de Jussofie et al., 35mg/kgˉ¹ e 50mg/kgˉ¹ em ratas Wister, não se
(Citado por NETO, 2004) demonstrou que um observou alterações nas concentrações da enzima
extrato de cavapirona enriquecido aumenta o alanina-aminotrasferase e fosfatase. Portanto,
número de GABA situados em cérebro de rato por como não foram encontradas alterações
um mecanismo semelhante ao de barbituratos e significativas na análise histopatológico no fígado
esteróides de anestésico. das referidas ratas evidenciando não possuir
O aumento de densidade acontece em toxicidade hepática no período das doses
regiões do cérebro de forma específica, como nas utilizadas (PINTO, 2004).
mesmas áreas do hipocampo e das amídalas, que As variáveis reprodutivas não são afetadas
são consideradas como centros de ação de com as doses testadas, porém as modificações
cavapirona (NETO, 2004). morfológicas as dosagens (50mg/kgˉ¹), foram
A hipótese de que a kava-kava possui uma consideradas. Assim, a preparação fitoterápica
capacidade para relaxar diretamente músculos da kava-kava® é considerada segura ao ser
forma de um anestésico local é apoiada pela administrada na dose até 35mg/kgˉ¹, no período
descoberta de que o sintético da cavaína organogênese em ratas Wister (PINTO, 2004).
(racêmica) causa uma inibição rápida e específica
dos canais de sódio e voltagem dependentes. Este 2.11 EVENTOS ADVERSOS
mecanismo de inibição pode explicar o efeito Os fitoterápicos elaborados com Piper
espasmolítico, analgésico e ações de methysticum G. Forster (kava-kava) geralmente são
anticonvulsivantes de cavapironas (NETO, 2004). utilizados sem a prévia orientação médica,

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causando risco à Saúde Pública, pois há diversos bilirrubina conjugada. Além de diminuir os níveis
casos de hepatotoxicidade relacionados ao seu uso das proteínas plasmáticas, uréia, bilirrubina e
indiscriminado e também devido à falta de causar plaquetopenia, também, pode originar
controle de qualidade, orientação ao paciente e hepatomegalia e início de encefalopatia. (BRASIL,
controle da utilização desses medicamentos 2010; CORDEIRO; CHUNG; SACRAMENTO,
(JUSTO & SILVA, 2008b). 2005).
Fundamentado nas análises das reações A kava-kava apresenta segurança
adversas notificadas, vários países, tais como terapêutica quando usada isoladamente,
Alemanha e suíça foram proibidos pelas administrada por via oral e por um curto período
autoridades regulatórias de comercializar os de tempo. Entretanto, quando aumenta a duração
produtos que contêm extrato de kava-kava, do tratamento por períodos longos e/ou são
devido aos relatos de icterícia, fadiga, urina escura utilizadas altas doses, a segurança é diminuída e
e hepatotoxicidade, que se apresentou de diversas pode produzir eventos adversos de extrema
formas desde elevações transitórias das enzimas significância após o uso de 1-3 meses
hepáticas, hepatite aguda, cirrose até à necrose (CORDEIRO; CHUNG; SACRAMENTO 2005).
hepatocelular severa e morte (CORDEIRO; Segundo Anke & Ramzan (Citado por
CHUNG; SACRAMENTO, 2005). JUSTO & SILVA, 2008b), é notável que a maioria
Segundo a ANVISA, no início do dos relatos de insuficiência hepática e
tratamento, pode surgir um cansaço pela manhã hepatotoxicidade podem não estar associados com
de intensidade moderada. De acordo com os o consumo de kava-kava. Portanto, é preciso
ensaios clínicos realizados, raramente pode haver mais estudos para obter respostas
ocorrer mal estar gastrintestinal, reações alérgicas satisfatórias quanto ao seu uso racional.
cutâneas, inquietação, vertigem, sonolência,
tremor, câimbras, problemas respiratórios, dores 2.12 INTOXICAÇÃO, TERATOGENICIDA-
de cabeça e indisposição, sendo que, em todos os DE, MUTAGENICIDADE E CARCINOGE-
casos analisados, essas reações adversas NICIDADE
desapareceram após a suspensão do medicamento A cada ano cresce o número de estudos
(BRASIL, 2010). científicos que vem comprovando a toxicidade de
Entre os eventos adversos raros, pode-se plantas. A kava-kava é um exemplo de planta que
citar o amarelamento reversível da pele, unhas e vem causando vários casos de toxicidade.
cabelos, distúrbios visuais, tontura, efeitos Segundo Pierce (Citado JUSTO & SILVA,
extrapiramidais, congestão pulmonar e hepatite 2008b), a kava-kava pode exacerbar problemas
que são dificilmente apresentados, mas, podem hepáticos, pois já houve relatos de hepatite aguda
estar associados ao tratamento com fitoterápicos à com necrose hepatocelular severa.
base de P. Methysticum. Portanto, o uso desse tipo Estudos vêm demonstrando em usuários
de medicamento deve ser interrompido intoxicados por uso de extrato de kava-kava
imediatamente (BRASIL, 2010). alguns sintomas como tremor, taxia, sedação,
É comprovado que os constituintes da anormalidades específicas de coordenação motora
kava-kava têm capacidade de estimular a perda e atenção visual (OLIVEIRA & GONÇALVES,
do tônus uterino, incitar complicações na gravidez 2006).
e atravessar as glândulas mamárias chegando até Em exames in vitro, foi demonstrada
ao leite materno (CORDEIRO; CHUNG; positividade mutagênica e negatividade
SACRAMENTO, 2005). teratogênica. Em uma revisão geral na literatura
O tratamento de 1-2 meses com P. não houve estudos que comprovasse a
methysticum pode ocasionar alterações no carcinogenecidade de kava-kava, pois, o uso dessa
resultado dos exames de avaliação da função planta não causa danos a populações nativas que
hepática, tais como o aumento das enzimas ainda utilizam a kava-kava por gerações (JUSTO
hepáticas aspartato e aminotransferase, γ - & SILVA, 2008b; NETO, 2004).
glutamiltransferase, desidrogenase lática e

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2.13 TOLERÂNCIA E DEPENDÊNCIA que a utilização de Piper methysticum com


Os investigadores Duffield e Jamieson em alprazolam, cimetidina e terazosina pode
1991 estudaram sobre o desenvolvimento de provocar estados de letargia e desorientação em
tolerância a kava-kava em ratos. Foi observada pacientes que fazem uso de suplemento alimentar
uma tolerância ao extrato aquoso livre de pyrones, a base dessa espécie vegetal.
que diminui a motilidade espontânea. Assim, a A kava-kava associada com antagonistas
tolerância para a resina de kava-kava, não era logo dopamínicos pode reduzir a eficácia da levodopa
demonstrável, sendo que, apenas em altas doses e causar distonia, discinesia e pseudo-
pode ser notada uma tolerância parcial (NETO, parkinsonismo. Inibidores da monoaminoxidase
2004). (IMAO) utilizados juntamente com a kava-kava
A grande quantidade de kava-kava vem ocasiona uma inibição exacerbada MAO, elevando
sendo vista como sugestiva para essa tolerância e os níveis toxicológicos da kava-kava e
dependência da droga (NETO, 2004). apresentando irritabilidade, hiperatividade,
insônia, ansiedade, hipotensão, cansaço, colapso
cardiovascular, alucinações, flushing, taquipnéia,
2.14 INTERAÇÕES FARMACOLÓGICAS taquicardia e alterações de movimento, etc.
Habitualmente o esquema terapêutico é
(CORDEIRO; CHUNG; SACRAMENTO, 2005).
composto pela administração de diversos
medicamentos, sendo necessário que, os
Segundo Cordeiro; Chung; Sacramento
profissionais de saúde devem obter informação (2005) existem relatos de que a kava-kava
das prováveis alterações no efeito de um fármaco, pode interagir com outros medicamentos à
provocado por outro, administrado em um base de plantas medicinais, como a Nepeta
mesmo intervalo de tempo, pois, através do cataria L. (erva-dos-gatos), Apiumgraveo-
conhecimento sobre as interações farmacológicas é lensL. (aipo), Panicumchloroticum N.
possível orientar os pacientes quanto ao seu uso (grama-de-ponta), InulaheleniumL. (ênula),
adequado. Assim é possível evitar efeitos Pfaffi a paniculataK. (ginseng siberiano),
negativos e proporcionar um tratamento eficaz e MatricariachamomillaL. (camomila alemã),
seguro (NICOLETTI, 2010b). Melissa officinalisL. (erva-cidreira),
SalviaofficinalisL. (sálvia), Hypericumper-
Há interações de produtos contendo
foratumL. (erva de são João),
extratos de rizoma de Piper methysticum utilizados OcoteaodoriferaR. (sassafrás), Urtica urensL.
concomitantente com medicamentos esteróides (urtiga), Valeriana officinalisL. (valeriana).
anabolizantes, amiodarona, metotrexato,
paracetamol e cetoconazol (via oral) podem Na literatura não são encontradas
ocasionar toxicidade hepática, tais como, hepatite, interações de P. methysticum com alimentos. Mas,
cirrose e insuficiência hepática (NICOLETTI, devido ao fato de que os constituintes ativos das
2007a). plantas são lipossolúveis, subentende-se que o
A kava-kava potencializa a ação de drogas consumo de comidas gordurosas juntamente com
que atuam no Sistema Nervoso Central como medicamentos extraídos dessa espécie vegetal
etanol, anti-histamínicos, hipnótico-sedativos, pode ajudar na sua absorção (BRASIL, 2010).
neurolépticos, barbitúricos, benzodiazepínicos e As interações medicamentosas da kava-
agentes psicoativos, pois, aumenta os efeitos kava com alguns fármacos apresentam-se de
depressores sob a forma de sedação, cansaço e maneira simplificada na tabela abaixo.
diminuição dos reflexos. Essa planta facilita a
excreção da urina e por isso pode potencializar os
efeitos dos fármacos diuréticos (CORDEIRO;
CHUNG; SACRAMENTO, 2005; NICOLETTI,
2007a).
Segundo Stockely (Citado por CORDEIRO;
CHUNG; SACRAMENTO, 2005), há relatos de

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Tabela 3. Principais interações farmacológicas glândula mamária do homem, dificuldade de


descritas para P. methysticum amamentação e mastalgia) e hipotensão (BRASIL,
2010).
A kava-kava potencializa reações nocivas
no fígado quando utilizada juntamente com
medicamentos que apresentam elevados níveis de
toxicidade hepática (CORDEIRO; CHUNG;
SACRAMENTO, 2005).
Portanto, a crença erroneamente aplicada
pela população de que produtos de origem
vegetal não causam reações adversas deve ser
elucidada aos pacientes que fazem uso de
fitoterápicos, assim como acontece com os demais
medicamentos, pois, devem ser avaliadas as
possíveis interações medicamentosas e a relação
custo versus benefício de sua utilização
(NICOLETTI, 2010b).

2.15 CONTRAINDICAÇÕES
O P. methysticum é contraindicado a
pacientes com conhecida hipersensibilidade e
Fonte: JUSTO; SILVA, 2008b. alergia aos constituintes químicos dessa espécie
vegetal ou a qualquer outro componente da
A kava-kava aumenta os efeitos maléficos fórmula. Pacientes que apresentam problemas
do álcool. Pois, foram realizados testes hepáticos, que fazem consumo de álcool,
visomotores que demonstraram que o uso portadores de Doença de Parkinson, depressão e
concomitante de kava-kava e álcool potencializam psicose não devem utilizar kava-kava, pois, o seu
os efeitos depressores, mas, não se sabe por quais uso pode aumentar os efeitos destrutivos no
mecanismos ocorre essa interação (BRASIL, 2010; fígado e piorar os sintomas extra-piramidais, de
CORDEIRO; CHUNG; SACRAMENTO, 2005). depressão endógena ou psicótica (BRASIL, 2010;
ANKE (Citado por JUSTO & SILVA,
JUSTO & SILVA, 2008b).
2008b) afirma que interações entre a kava-
Medicamentos e produtos que contenham
kava e o álcool sempre foram
mencionadas. Para elucidar esta incógnita, kava-kava em sua formulação não devem ser
realizaram-se testes para descobrir se a utilizados por gestantes, lactantes e crianças que
kava-kava inibe a enzima álcool tenham idade inferior a 12 anos, pois, não há
desidrogenase, responsável pela estudos que apresentem segurança nestas
conversão do etanol em acetaldeído. Para circunstâncias (BRASIL, 2010; JUSTO & SILVA,
tanto, testaram-se três concentrações 2008b).
diferentes de três cavalactonas (cavaína, O uso de kava-kava por pacientes que tem
metisticinaeiangonina) e não foi percebida asma, psoríase e doença de Parkinson deve ter
diminuição da metabolização do etanol.
rigoroso acompanhamento médico. Sendo que,
Isto implica que pelo menos através deste
pessoas que operam máquinas pesadas e dirigem
mecanismo, é improvável que a Kava
interaja com o álcool. veículos devem ter cuidado, pois, alguns
A associação de fenotiazinas indivíduos podem apresentar sonolência e
(clorpromazina, flufenazina e tioridazina) com tremores. Portanto, o tratamento não pode
kava-kava pode potencializar seus efeitos e ultrapassar o período de dois meses (BRASIL,
provocar disfunções motoras extrapiramidais e 2010).
endócrinas (desenvolvimento excessivo da

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2.16 REGISTROS NA ANVISA publicidade, a RDC 102/2000, a regulamentação


A Agência Nacional de Vigilância Sanitária para a certificação das Boas Práticas de Fabricação
(ANVISA) junto ao Ministério da Saúde é e Controle (CBPFC), a RDC 210/2003, dentre
responsável pela regulamentação de plantas outras.
medicinais e seus derivados no Brasil A ANVISA disponibiliza várias formas
(CARVALHO et al., 2008). para que os usuários de medicamentos
O registro de medicamento foi uma das fitoterápicos tenham acesso ao registro e
ações realizadas pela ANVISA com o objetivo de informações sobre se o que estão usando tem
garantir segurança, eficácia e qualidade dos certificação pela ANVISA (CARVALHO et al.,
medicamentos. (CARVALHO et al., 2008). 2008).
A RDC 48/2004 permite o registro Uma dessas formas é pela internet, onde o
como fitoterápico apenas do derivado de usuário pode ter acesso ao site da ANVISA para
droga vegetal, que é o produto de extração verificar, por exemplo, o registro de determinado
de matéria prima vegetal: extrato, tintura, fitoterápico. Esse é de livre acesso a toda
óleo, cera, exsudato, suco, etc. De acordo
população brasileira. Outra forma importante
com a abrangência, “não é objeto de
para se consultar é a DATAVISA, que é um
registro ou cadastro a planta medicinal ou
suas partes, após processos de coleta, sistema de cadastramento utilizado pela ANVISA
estabilização e secagem, podendo ser desde 2002, onde o usuário pode ter acesso a
íntegra, rasurada, triturada ou dados como composição de sua formulação
pulverizada” (CARVALHO, 2008). registrada, validade do medicamento, cuidados de
conservação entre outras informações
Segundo Brasil (Citado por CARVALHO, (CARVALHO, et al., 2008).
et al., 2008), a Resolução de Diretoria Colegiada Com base na lista de substâncias de origem
(RDC) 48/2004, é a regulamentação em vigor para vegetal cadastradas pela ANVISA, foi realizado
o registro de medicamentos fitoterápicos. Essa um levantamento no ano de 2007, onde os
RDC determina os aspectos necessários ao fitoterápicos foram classificados entre simples e
registro, como a identificação botânica das compostos (CARVALHO, et al., 2008).
espécies vegetais que são utilizadas, os padrões de Na classificação realizada pela ANVISA, o
qualidade e identidade e as provas de eficácia e Piper methysticum mais conhecido como kava-
segurança que validem as indicações terapêuticas kava, obteve a classificação de categoria
propostas. terapêutica comprovada no registro como
Segundo Brasil (Citado por CARVALHO, Ansiolítico Simples (CARVALHO, et al., 2008).
et al., 2008), existe também uma Resolução Com relação ao P. methysticum, a RDC n. 48,
Específica (RE), a RE 88/2004, que considera uma juntamente com a RE n. 89 de 2004 facilitam
lista de referências bibliográficas para garantir a seu registro como medicamento fitoterápico
por incluí-lo na Lista de Registro Simplificado
avaliação de segurança e eficácia desses
de Fitoterápicos, que não exige a validação
fitoterápicos. Segundo Brasil (Citado por
das indicações terapêuticas e a segurança de
CARVALHO, et al., 2008), a RE 90/2004 contém uso, desde que sejam obedecidas condições
uma guia para a realização de testes de toxicidade definidas. Com relação ao kava-kava, devem
pré-clínica dos fitoterápicos e a RE 91/2004 é a ser respeitadas integralmente as seguintes
que corresponde a guia para a realização de especificações: - Parte utilizada: rizoma; -
modificações, inclusões, notificações e até o Marcador: cavapironas; - Formas de uso:
cancelamento pós-registro dos medicamentos extratos ou tinturas; - Indicações: ansiedade,
fitoterápicos. agitação, insônia e tensão nervosa; - Dose
Segundo Brasil (Citado por CARVALHO et diária: 60 a 120 mg de cavapironas; - Via de
administração: oral. - Restrição de uso: venda
al., 2008), no registro dos medicamentos
sob prescrição médica; utilizar no máximo
fitoterápicos se aplica legislações que são
por dois meses (CARVALHO, et al., 2008).
responsáveis por normatizarem o registro desses
medicamentos, tais como as normas de

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Os casos relatados de hepatotoxicidade fez notificados foram graves, cerca de 18,3%, sendo
com que a ANVISA, incluísse a kava-kava como que três levaram a óbito, sendo que duas mortes
medicamento de tarja vermelha, isso é, somente foi por hepatite fulminante causado pelo uso de
será permitida a venda com a prescrição médica, Piper metysticum. Nesses casos relativos à kava-
segundo a Resolução-RE n.356 de 28 de fevereiro kava descartou-se a possibilidade de hepatite viral
de 2002, e incluem, também, os produtos a base de e alcoólica (BALBINO & DIAS, 2010).
kava-kava. No mercado, alguns desses
medicamentos são conhecidos como Ansiopax®, O FDA alertou, em 2002 a existência de 25
Laitan®, Kavasedon®, entre outros (JUSTO & casos de toxicidade hepática na Alemanha
SILVA, 2008b). e Suíça, incluindo casos de cirrose,
hepatite e falência renal. Há também relato
de caso de transplante hepático em uma
2.17 FARMACOVIGILÂNCIA mulher jovem americana que utilizava
O conceito de farmacovigilância, de acordo suplemento contendo kava-kava (Piper
com a OMS, é a ciência relativa à detecção, methysticum G. Forst.). Há também relatos
avaliação, compreensão e prevenção dos efeitos de nefropatias seguidos de rápida falência
adversos ou quaisquer problemas relacionados a renal pela ingestão de plantas chinesas
medicamentos (BALBINO & DIAS, 2010). (BALBINO & DIAS, 2010).
A farmacovigilância tem como objetivo
detectar eventos adversos que são conhecidos ou O uso de plantas medicinais tem que ser
não, e verifica o possível aumento de incidência questionado pelos profissionais de saúde aos
dos mesmos. Também avalia em relação aos pacientes, pois, esses devem ser treinados para
produtos e os riscos e benefícios causados por informar sobre o uso dessas plantas medicinais e
eles, e assegura toda eficácia, qualidade e fitoterápicas e alertar quando ocorrer reações
segurança para o uso racional desses produtos adversas, que essas devem ser notificadas no
(BALBINO & DIAS, 2010). Sistema Nacional de Farmacovigilância
(BALBINO & DIAS, 2010).
Atualmente, a Resolução RDC n°48, de 16
de março de 2004, a Agência Nacional de 2.18 ACONSELHAMENTO FARMACÊU-
Vigilância Sanitária (ANVISA), normatiza TICO AOS USUÁRIOS DE KAVA-KAVA
o registro de medicamentos fitoterápicos
O uso racional de medicamentos abrange:
enquanto que a Resolução RDC n°4, de 10
o prescritor, o paciente e o farmacêutico. O
de fevereiro de 2009, dispõe sobre as
normas de farmacovigilância (BALBINO prescritor tem a função de estabelecer a terapia
& DIAS, 2010). adequada, mas, a eficácia terapêutica também
depende do comportamento do paciente em
Uma pesquisa realizada pelos dados da seguir as orientações sobre a utilização adequada
Gerência de Farmacovigilância da ANVISA dos medicamentos, sendo que, esta é uma prática
realizou uma análise sobre notificações de eventos farmacêutica que deve ser fornecida no instante
adversos que citavam plantas medicinais e da dispensação, pois, é importante que o
fitoterápicas (BALBINO & DIAS, 2010). profissional farmacêutico saiba estabelecer uma
Nessa análise, constatou-se que um terço aproximação, através da qual o paciente sinta-se
das notificações de eventos adversos refere-se a seguro para transmitir suas expectativas e obter
plantas medicinais ou alguns derivados que não instruções sobre o tratamento (NICOLETTI et al.,
possui registro na ANVISA, pois, as aquisições 2010b; RATES, 2001).
dessas plantas podem ser feitas através da internet, Antes de utilizar o medicamento deve-se
feiras livres e outros locais irregulares (BALBINO observar o prazo de validade, as características
& DIAS, 2010). organolépticas e manter fora do alcance das
A ANVISA avalia todas as notificações crianças. A dose diária de extrato de P.
recebidas quanto à gravidade e a causalidade. methysticum deve totalizar um limite
Entre essas notificações, trinta eventos adversos compreendido entre 60 a 210 mg de kavalactonas.

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A forma farmacêutica sólida deve ser bromocriptina; pergolida; pramipexol; levodopa e


administrada via oral, ingerida inteiramente e sem amantadina. Além de potencializar os efeitos de
processo de mastigação com quantidade de água medicamentos hepatotóxicos, tais como,
necessária para que sejam engolidas, após as acetaminofeno, inibidores da HMGCoA redutase,
refeições. Devido ao fato que os constituintes isoniazida, metotrexato, entre outros. Portanto, os
dessa planta são lipossolúveis, subentende-se que, pacientes que fizeram essa interação
alimentos gordurosos facilitam a absorção dos farmacológica devem fazer exames que avaliem as
seus princípios ativos (BRASIL, 2010). funções hepáticas (BRASIL, 2010).

A Organização Mundial da Saúde orienta


para que esta droga não seja administrada 3. CONCLUSÃO
por mais de três meses sem orientação A kava-kava é uma planta medicinal que
médica; até mesmo dentro da posologia se destaca pelas suas propriedades farmacológicas
indicada, os reflexos motores e a tendo efeitos ansiolíticos e indutores de
habilidade na direção ou a operação de relaxamento e sono, sendo utilizada no tratamento
equipamentos pesados poderá ser afetada
da ansiedade e distúrbios nervosos como estresse
de maneira diversa (NICOLETTI, 2010b).
ou cansaço, agitação, epilepsia, depressão, entre
outras doenças.
Se o paciente apresentar hipersensibili-
Seu uso atualmente no mercado como
dade, leve amarelamento da pele, dos cabelos e
medicamento fitoterápico teve um grande
unhas, é aconselhável interromper a utilização de
destaque pelos casos de hepatotoxicidade que
kava-kava. Sendo que, não se devem administrar
foram relatados, fazendo com que entrasse como
doses superiores do que a prescritas (BRASIL,
venda somente sob prescrição médica.
2010).
Os medicamentos que contém extratos do
Em caso de superdosagem, o medicamento
rizoma de kava-kava são constituídos de
deverá ser interrompido o mais rápido possível e
kavalactonas (kavaína, diidrokavaína, yangonina
buscar atendimento médico para que sejam
e desmetoxiangonina), que atuam no Sistema
realizadas as medidas necessárias para manter as
Nervoso Central (SNC). Essa planta possui efeito
funções vitais. Quando as doses excessivas forem
ansiolítico, sedativo, analgésico, anticonvulsivante
administradas em um curso rápido e intenso,
e anestésico local. Porém, no Brasil, a ANVISA
deve-se fazer o tratamento com passagem de
indica este fármaco somente em estágios leves de
sonda nasogástrica, esvaziamento e lavagem
ansiedade, nervosismo e tensão.
gástrica. Se aparecer vermelhidão ou inchaço pelo
As propriedades farmacológicas do kava-
corpo, pode haver necessidade de utilizar
kava são comparáveis às dos benzodiazepínicos,
corticoides (BRASIL, 2010).
mas somente uma fraca ligação entre as
Segundo a ANVISA, os medicamentos que
kavalactonas e os receptores GABAa e
contém extrato de P. methysticum só podem ser
benzodiazepínicos foi detectada. Assim,
administrados após dois a três dias da última dose
receptores de N-metil-D-aspartato (NMDA) e/ou
de alprazolam. Durante o tratamento não devem
canais de voltagem-dependentes devem estar
ser consumidos bebidas alcoólicas, fármacos que
envolvidos no mecanismo de ação das
atuam no SNC (benzodiazepínicos e barbitúricos),
kavalactonas. As propriedades anticonvulsivantes
antidepressivos inibidores da monoaminaoxidase
são similares às observadas para os anestésicos
(MAO) (BRASIL, 2010).
locais, especialmente a procaína. A analgesia
“Contraindica-se o uso de medicamentos
produzida pelo kava-kava ocorre por via diferente
fitoterápicos à base de P. methysticum em pacientes
da via dos opiáceos.
com doença de Parkinson e/ou com história de
A kava-kava é um ansiolítico que
efeitos extrapiramidais induzidos por fármacos”
apresenta eficácia e tolerabilidade, sem provocar
(BRASIL, 2010).
sedação ou sonolência, quando são utilizadas
A ação de P. methysticum pode diminuir a
doses que variam entre 50-70 mg de kavalactonas
eficácia terapêutica de alguns fármacos, como,

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2 a 4 vezes por dia. O consumo de kava-kava em FAUSTINO, T. T; ALMEIDA, R. B; ANDREATINI,


doses recomendadas, geralmente, não provoca R. Plantas medicinais no tratamento do transtorno
efeitos adversos. No entanto, idosos, portadores de ansiedade generalizada: uma revisão dos
de doença de Parkinson e pacientes que tem estudos clínicos controlados. Revista Brasileira de
problemas hepáticos, devem ter um rigoroso Psiquiatria. v.32, n.4, p.429-436, dez./ 2010.
acompanhamento médico/ farmacêutico que FIRMO, W. C. A. et al. Contexto histórico, uso
devem avaliar o custo versus benefício dessa popular e concepção científica sobre plantas
terapia farmacológica. medicinais. Cad. Pesq. São Luís. v. 18, n. especial,
Portanto, os usuários de medicamentos p. 90-95. dez./ 2011.
fitoterápicos devem ser informados sobre eventos FOGLIO, M. A. et al. Plantas medicinais como
adversos, interações e contraindicações do fonte de recursos terapêuticos: um modelo
fármaco que está sendo utilizado, pois, o multidisciplinar. Multiciência. Campinas. V. 7.
prescritor e o dispensador, neste caso, o médico e Out./ 2006.
o farmacêutico devem orientar o paciente sobre a JUSTO, S. C.; SILVA, C. M. Análises Físico-
terapia mais adequada. Ressalta-se que, o Químicas e da pureza do extrato seco de Piper
farmacêutico possui amplo conhecimento sobre o methysticumG. Forster (Kava-Kava). Visão
uso racional de medicamentos, e compreende-se, a acadêmica. Curitiba, v.9, n.1, p.13-22, jan./jun./
importância da atuação farmacêutica na realização 2008a.
de um tratamento eficaz e seguro. JUSTO, S. C.; SILVA, C. M. Piper methysticumG.
Forster (Kava-Kava): uma abordagem geral.
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