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Resumo: O presente artigo objetiva analisar a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) como
mecanismo de defesa a mulheres transgênero e travestis no âmbito das relações domésticas.
Abordaremos, de forma simplificada, a distinção entre gênero e sexo biológico, a possibilidade
da retificação do nome e do gênero no Registro Civil para que sejam tratados e tenham direitos
e deveres inerentes ao gênero que se identifiquem. Iremos expor o posicionamento dos
Tribunais de primeira instância e dos Tribunais Superiores acerca da aplicabilidade ou não da
supracitada Lei Maria da Penha como mecanismo de proteção a essas minorias. Por meio de
uma pesquisa com objetivo de entender a opinião popular, apresentaremos a opinião individual
de determinado número de pessoas, e buscaremos mostrar como o caso é abordado atualmente
na sociedade. Em seguida, daremos ênfase a decisão do Superior Tribunal de Justiça ao julgar
o Recurso Especial nº 1.977.124. Concluiremos o presente artigo mostrando ser possível que
mulheres transgênero possam ser amparadas pela Lei Maria da Penha, visto que não há qualquer
impedimento trazido por Lei, não cabendo ao interprete fazê-lo interpretação contraria.
Abstract: This article aims to analyze the applicability of the Maria da Penha Law (Law nº
11.340/2006 – domestic violence) as a defense and protection mechanism for transgender
women in the context of domestic relations. It will approach, in a simplified way, the
distinction between gender and biological sex, the possibility of rectifying the name and
gender in the Civil Legislation so that they are treated and have rights and duties inherent to
the gender that they identify. We will expose the position of the Courts of first instance and
the Higher Courts about the applicability or not of the aforementioned Maria da Penha Law as
a mechanism to protect these minorities. Through a popular survey, we will present the
individual opinion of a certain number of people, and we will seek to show how the case is
currently addressed in society. Next, we will emphasize the decision of the Superior Court of
Justice when judging the “Special Appeal” nº 1.977.124. We will conclude this article
showing that it is possible that transgender women can be supported by the Maria da Penha
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Artigo apresentado a Universidade Potiguar, como parte dos requisitos para obtenção do Título de Bacharel em
Direito, em 2021.
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Graduanda em Direito pela Universidade Potiguar – Email: lailasena9@gmail.com
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Graduanda em Direito pela Universidade Potiguar – Email: marinacduarte@hotmail.com
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Curso de Extensão Universitária (UnB/UERN/UnP). Graduado em Direito (UnB/UnP). Especialista em Direito
Civil e Processo Civil (UFRN). Mestrado em Ambiente Tecnologia e Sociedade (Meio Ambiente – UFERSA –
dissertação: Direito e Inclusão). Mestrado em Educação (dissertação: Sistema Prisional Federal – UERN). Cursa
o Doutorado em Arquitetura e Urbanismo (tese: História da Arquitetura e o Poder – UFRN). Autor de livro
(Brasília/DF) e autor de capítulo de livro pelo Doutorado em Educação (UERJ). É citado em 452 artigos
científicos no Brasil e exterior, segundo o site ACADEMIA (trabalhos acadêmicos e pesquisas).
2
Law, since there is no impediment brought by law, and it is not up to the interpreter to make it
contrary interpretation.
1. INTRODUÇÃO.
A lei nº 11.340 de 07 de agosto de 2006, denominada Lei Maria da Penha, foi instituída
objetivando, inicialmente, criar ferramentas capazes de punir os responsáveis por atos
discriminatórios e violentos contra as mulheres, com o intuito final de desestimular e erradicar
os casos de violência doméstica e familiar contra o gênero feminino.
É sabido por todos que a mulher atualmente ainda é tida por uma grande parte da
população como sujeito inferior ao homem em diversos aspectos, o que contribui para a
propagação de crenças machistas – que são reproduzidas, inclusive, em meios unicamente
femininos. Isso se deve, em boa medida, à sociedade estruturalmente criada em favor da figura
masculina em detrimento da feminina, tornando estas uma espécie de apetrecho daquela e
subordinada às suas vontades.
A pluralidade é uma forte realidade no Brasil e é notória a grande diversidade sexual e
de gênero nos núcleos familiares, contudo, mesmo nestas restam enraizadas condutas
preconceituosas e que ferem de várias maneiras – física, psicológica, moral, econômica – a
parte mais frágil que, geralmente, trata-se da parte que se identifica com o sexo feminino.
Os indivíduos que não se enquadram na definição de cisgênero (pessoa que tem
identidade de gênero igual ao que lhe foi atribuído em sua nascença; oposto a transgênero) são
especialmente segregados e desrespeitados perante a sociedade, fato que contribuía para que
estes não pudessem agir espontaneamente e adotar publicamente sua identidade de gênero.
Com o advento da Constituição Federal de 1988, mecanismo garantidor de direitos
básicos inerentes ao ser humano e apoiadora da pluralidade social, as pessoas se viram com
mais liberdade para, de fato, serem quem são, sem medo de represálias – mesmo que estas ainda
ocorram em menor escala – e passaram a trazer à tona pautas voltadas ao público LGBTQIA+ 5.
Dessa maneira, é inegável que na atual conjuntura social brasileira, que se mostra
majoritariamente machista, ser uma mulher cis tem suas desvantagens. No entanto, ser uma
mulher transgênero ou travesti torna-se ainda pior, em razão da discriminação e violência que
lhe é empregada diariamente.
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Sigla utilizada para indicar as diversidades de orientação sexual e gêneros.
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2. SEXO E GÊNERO
2.1 SEXO
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Para o senso comum o sexo biológico é aquele que é designado por uma série de fatores,
na maioria dos casos, antes mesmo do nascimento. Se estabelece em decorrência dos órgãos
genitais, da combinação de cromossomos e dos hormônios que apresentam. É documentado,
em primeiro momento, a partir do registro civil, na certidão de nascimento, onde constará se
aquele ser recém-nascido é pertencente ao sexo feminino ou masculino.
2.2 GÊNERO
O gênero, por sua vez, traz um conceito muito mais abrangente. Aqui se esquece toda a
condição biológica de definição do feminino e masculino, e passa a analisar o campo de
identificação subjetiva de cada indivíduo.
A definição genérica será construída pouco a pouco baseada em contextos sociais, e
vivências pessoais que cada ser passará ao longo de sua existência. O comportamento humano
do dia a dia, as convivências, as experiências pessoais e todo um conjunto de fatores subjetivos
levará o ser a se identificar, ao longo da sua trajetória, com o sexo definido desde a sua
concepção, ou identificar-se, posteriormente, com um gênero diferente do que lhe foi imposto
por condições meramente biológicas.
2.2.1 CISGÊNERO
2.2.2 TRANSGÊNERO
2.2.2.1 TRANSEXUAL
2.2.2.2 TRAVESTI
Constituição Federal de 1988 já era interposta, mas só aos poucos foi sendo de fato reconhecida
pelas legislações infraconstitucionais, modulando a letra da lei e impondo igualdade de fato no
âmbito das relações jurídicas.
Percebe-se que o vigor de uma lei especifica para pontuar o que é, quais as formas, e
como punir, de fato, a violência doméstica contra a mulher, foi só o primeiro passo para o
combate desse crime (violência doméstica) tão repulsivo, mas trouxe à tona a expectativa de
pôr fim a uma vasta era de silenciamento a qual foram submetidas por tanto tempo.
O artigo 5° da Lei Maria da Penha trás o termo “violência” de forma bastante genérica
e abrangente, indo muito além da agressão física. Por este motivo o artigo 7º do mesmo diploma
legal trouxe, de forma minuciosa, os tipos de violência doméstica e familiar contra a mulher,
como passa a analisar:
Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou
saúde corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe
cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o
pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações,
comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento,
humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz,
insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e
limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde
psicológica e à autodeterminação; (Redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018) III -
a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a
manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça,
coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo,
a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force
ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem,
suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais
e reprodutivos; IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que
configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos
de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos,
incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V - a violência moral,
entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
A violência física é aquela trazida pelo inciso I é de fato a mais conhecida por todos, e
entende-se como a violência contra a integridade física ou a saúde da mulher. Segundo o
Instituto de Segurança Pública (ISP), o índice de violência física aumentou de 59,8% em 2019
para 64,1% em 2020, sendo esta correspondente a um quantum de 33% dos casos de violência
doméstica e familiar.
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No âmbito penal, é conceituada legalmente através do artigo 129 do Código Penal como
“ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem”, e terá a punição Estatal de acordo com
a gravidade da lesão, podendo ser de natureza leve, grave ou gravíssima, bem como culposa,
punido de acordo com as respectivas penas.
Entretanto, não será possível no âmbito das relações domésticas e familiares a aplicação
da Lei 9.099/1995 para as lesões de natureza leve ou culposa, visto a incompatibilidade com o
artigo 41 da Lei Maria da Penha, que tem o intuito de atribuir uma punição mais justa, e buscar
uma efetividade maior na responsabilização do agressor.
Em segundo momento tem-se a violência psicológica, abordada no inciso II do artigo
7° que preceitua ser aquela causada por qualquer conduta que cause dano psicológico, como
bem elucida Altamiro de Araujo Lima Filho (2007, p. 46) 13 hipóteses de violência psicológica:
Assim como na violência física, tamanha gravidade também se atribui a esse tipo de
violência, pois os danos causados em sua decorrência podem ser extremamente lesivos a saúde
mental da vítima, ocasionando problemas psicológicos como ansiedade, transtornos e
depressão, podendo, por sua vez, acarretar até mesmo pensamentos suicidas ou levar a suicídio
de fato.
O inciso III é aquele que passa a definir os parâmetros da violência sexual no âmbito
das relações domésticas, e aborda o seguinte:
Sobre o assunto, é relevante mostrar o que Alice Biachini (2016, p. 53) trata sobre os
direitos sexuais:
Os direitos sexuais pressupõem a livre exploração da orientação sexual, podendo a
pessoa promover a escolha do parceiro(s) e exercitar a prática sexual de forma
dissociada do objetivo reprodutivo. Deve ser assegurado o direito à prática sexual
protegida de doenças sexualmente transmissíveis, além do necessário respeito
integridade física e moral. Já os direitos reprodutivos levam em conta a livre escolha
do número de filhos que um casal deseja ter, independentemente de casamento, sendo
assegurado o direito ao matrimonio desde que haja concordância plena de ambos.
Diante da ideia misógina de que a mulher é submissa ao homem, muitos acreditam que
não seja possível ocorrer tal tipo de violência, alegando que é obrigação da mulher manter
relações com o companheiro, em decorrência da relação afetiva que mantém. Entretanto a
mulher deve ser detentora de autonomia suficiente para decidir por si só quais atos deve praticar,
sejam eles sexuais ou não, e para isso deve ter respeitada a sua vontade, não se submetendo a
realizar os desejos do companheiro, principalmente se esse contraria sua própria vontade.
A quarta hipótese de violência, é a violência patrimonial, que é configurada através de
qualquer conduta que subtraia, detenha ou destrua bens pertencentes a mulher, porém, acaba
não sendo frequentemente objeto de denúncia pelo fato de a vítima na maioria das vezes não
considerar algo tão grave, até mesmo normalizando referida atitude.
É utilizada pelos homens principalmente como forma de coação e chantagem para forçar
as mulheres a realizar suas vontades, sendo normalizada de maneira que os levam a acreditar
que a administração financeira é função da figura masculina e que não há problema nisso.
Por último, em consonância com os artigos 138, 139 e 140 do Código Penal, a violência
moral é composta pelos crimes contra a honra, e é diretamente interligada com a violência
psicológica, decorrente do aspecto negativo ao emocional da vítima. A grande diferença será
perceptível através das ofensas proferidas a mulher, como bem explica Valéria Diez (2015, p.
108):
Demonstradas as formas de violência trazidas pela Lei Maria da Penha, fica concluído
a importância dela no combate à violência doméstica e sua efetivação como mecanismo de
proteção à mulher, restando explicado que a violência vai muito além de agressão física, sendo
necessário combater todo e qualquer tipo de violência existente.
O artigo 2° da lei 11.340/2006 é direto quando fala, nas suas duas primeiras palavras,
que a lei se destina a toda mulher em situação de violência doméstica, sem qualquer distinção,
com o objetivo de proporcionar-lhes uma vida sem violência, para que seja preservado a sua
saúde física e mental e o aperfeiçoamento moral, intelectual e social, in verbis:
Portanto, quando a própria legislação fala de ser destinatária da proteção toda mulher, e
não impõe qualquer tipo de distinção ou discriminação, entende-se que o conceito de mulher
trazido pelo legislador é no sentido amplo, não sendo feito nenhuma ressalva quanto a definição
de mulher apenas no quesito biológico, visto que, conforme abordado anteriormente, além do
sexo atribuído a pessoa no nascimento, o gênero somente será definido a partir da identificação
subjetiva de cada um com o passar do tempo e de suas experiencias humanas no decorrer de
sua vida.
Ao contrário do que se pensa, a lei 11.340/2006 não abrange somente o casal, mas sim
quem quer que esteja dentro do ambiente doméstico e familiar.
O sujeito ativo é aquele que por meio de uma ação ou omissão baseada na condição do
gênero feminino é causador de violência no âmbito da unidade doméstica, familiar ou de relação
íntima de afeto independente de coabitação e orientação sexual, conforme traz a redação do
artigo 5° da supramencionada legislação:
Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a
mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: (Vide Lei
complementar nº 150, de 2015)
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A empregada doméstica, que presta serviço a uma família, está sujeita à violência
doméstica. Assim, tanto o patrão como a patroa podem ser agentes ativos da infração.
Igualmente, desimporta o fato de ter sido o neto ou a neta que tenham agredido a avó,
sujeitam-se os agressores de ambos os sexos aos efeitos da Lei. [...] Os conflitos entre
mães e filhas, assim como os desentendimentos entre irmãs está ao abrigo da Lei
Maria da Penha quando flagrado que a agressão tem motivação de ordem familiar.
Seguindo esse mesmo raciocínio tem-se que no sujeito passivo estará a mulher vítima
de agressão no contexto do artigo 5° acima transcrito, podendo ser a mãe, a vó, a tia, a
namorada, esposa, ex-companheira, ou quaisquer daquelas que se encaixe nos ditames do rol
do artigo mencionado.
Partindo desse ponto de vista, é importante que se analise não somente a forma biológica
para que se defina um indivíduo como mulher, necessitando ir mais além, analisando como
essas pessoas se veem, se sentem e, não menos importante, como querem ser vistas, tratadas e
acima de tudo respeitadas.
Uma vez que a Constituição Federal em vigor condena quaisquer forma de
discriminação em relação à orientação sexual dos sujeitos, tem-se aberto cada vez mais espaço
e dado voz para as pessoas não cis, muito embora a discriminação ainda seja escancarada.
Como supracitado, o simples fato de ser mulher já coloca o sujeito em uma situação de
vulnerabilidade, tratando-se de uma mulher transgênero e de travestis, no entanto, a
vulnerabilidade é ampliada.
Não havendo uma regulamentação própria para essa minoria, tem-se utilizado cada vez
mais a Lei Maria da Penha no que lhe cabe, Dias (2008, p.6) reafirma ao asseverar que
Ainda que a Lei tenha por finalidade proteger a mulher, acabou por criar um novo
conceito de família, independente do sexo dos parceiros. Assim, família também
passou a ser não só a união entre homem e mulher, mas também a união entre duas
mulheres e, igualmente, a união entre dois homens. ‘Mesmo que eles não se encontrem
ao abrigo da Lei Maria da Penha, para todos os outros fins, impõe-se esse
reconhecimento. Basta invocar o princípio da igualdade’.
Desta forma é possível compreender que ainda que mesmo na ausência uma legislação
específica para os indivíduos transgêneros e os casais homoafetivos, caminha-se para que se
possa garantir uma igualdade de proteção no que tange às agressões domésticas.
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O direito basilar da Constituição Pátria é, sem dúvida nenhuma, aquele exposto no artigo
5°, no qual preceitua que todos são iguais perante a lei, vejamos:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(BRASIL, 1988)
aplicação da Lei Maria da Penha como mecanismo jurídico de proteção a mulher transexual e
travesti. Ora, sabe-se, pois, que o intuito maior da referida Lei é atuar de forma protetiva aos
direitos a integridade física, moral, patrimonial e psicológico da mulher, visto as condições de
vulnerabilidade a que são submetidas, diante do estereótipo de inferioridade atribuído a figura
feminina pela sociedade, e os costumes patriarcais que ainda as cercam. Outrossim, maior ainda
é a situação de vulnerabilidade em que se encontram mulheres transexuais e travestis, visto o
preconceito e a transfobia que essa minoria enfrenta tanto perante a sociedade quanto no âmbito
familiar.
O texto legislativo trazido não aborda em nenhuma ocasião ou hipótese restrições a
mulheres transexuais e travestis de serem amparadas pela Lei Maria da Penha, visto que não
apresenta definições para o termo mulher, tampouco exige que haja retificação do registo ou
cirurgia de redesignação sexual.
Diante disso, extrai-se teor final da nota técnica que aponta o seguinte:
Um dos marcos históricos na busca por direitos pelas pessoas transgêneros foi, sem
dúvida, a possibilidade da retificação do prenome, para tanto, precisando somente recorrer às
vias judiciais, ou até mesmo de forma administrativa, e requerer a alteração do prenome e do
gênero do registro civil, e, por questões ainda mais dignas, é totalmente vedado a inclusão do
termo “transgênero” no registro. Abordado o tema em Recurso Extraordinário 670422/RS, o
Supremo Tribunal Federal adotou a seguinte tese:
de entendimento de um Órgão Jurisdicional Superior, o que deste modo abrirá portas para que
mulheres transgêneros vítimas de violência doméstica e familiar possam receber amparo
jurídico, haja vista tamanha negligência estatal em protegê-las, mesmo diante dos números
alarmantes de violência (doméstica ou não) contra essa minoria.
Saindo um pouco do âmbito jurídico e partindo para as relações sociais, é válido abordar
a opinião pública no tocante ao tema.
Foi realizada pesquisa através de formulário on-line (google forms), no qual o link que
direcionava para o questionário foi compartilhado nas redes socias tais como instagram e
whatsapp com o objetivo de alcançar o máximo possível de pessoas e após levantados
questionamentos acerca do que deve ser considerado mulher, se mulheres transgênero devem
ser amparadas pelas legislações brasileira inerentes à mulher e se devem ser abrangidas pelo
conceito feminino abordado na Lei Maria da Penha, foram colhidas respostas de 181 pessoas,
onde podemos chegar ao resultado apontado nos gráficos a seguir:
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6. CONCLUSÃO
Por fim, tal interpretação da Lei 11.340/06 deverá ocorrer em indiscutível observância
aos princípios constitucionais mais basilares, tais quais o princípio da dignidade da pessoa
humana e o princípio da liberdade. Considera-se ainda, nesse bojo, que o artigo 2ºda referida
Lei declara expressamente que “Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia,
orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos
fundamentais inerentes à pessoa humana a discriminação”, o que torna clara a possibilidade de
aplicação da Lei Maria da Penha às travestis, mulheres transexuais e transgêneros, no âmbito
do combate à violência doméstica e familiar.
No tocante a pesquisa realizada, não se pode deixar de observar o quanto a população
tem passado a enxergar a fragilidade dessas mulheres e percebido a necessidade delas serem
acolhidas pela legislação brasileira, visto a violência diária que são vítimas, necessitando de
uma resposta estatal para garantir os seus direitos à vida digna e a segurança, entendendo a
sociedade, em sua grande maioria, que essas mulheres devem ser amparadas pela Lei Maria da
Penha, por se reconhecerem em condições do gênero feminino.
REFERÊNCIAS:
DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2008
LIMA FILHO, Altamiro de Araujo. Lei Maria da Penha comentada. Leme/SP: Mundo
Jurídico, 2007. Acesso: em 15 de maio de 2022.
FERNANDES, Valéria Diez Scarance. Lei Maria da Penha o processo penal no caminho
da efetividade. São Paulo Atlas 2015. Acesso: em 15 de maio de 2022.
APÊNDICE
1ª Você acredita que para ser considerada mulher precisa: Nascer como mulher ou se
identificar como mulher?
2ª A mulher transgênero/travesti deve ser amparada pela lei brasileira em todos os aspectos de
direitos e deveres inerentes a pessoa do sexo feminino?
3ª A Lei Maria da Penha serve como uma forma de combate a violência doméstica/familiar,
bem como para dispor de mecanismos de proteção a mulheres vítimas da violência no âmbito das
relações domésticas/familiares. Você concorda que mulheres transgênero/travestis devam ser amparadas
por essa Lei?