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Salvador
2023
RENATA SOUZA COSTA
Salvador
2023
2
A CONCESSÃO DAS MEDIDAS PROTETIVAS COMO UMA FERRAMENTA
DE PROTEÇÃO A VÍTIMA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA FAMILIAR:
UMA ANÁLISE À LUZ DA LEI Nº 11.340/06 (MARIA DA PENHA).
Nome: _______________________________________________________________
Titulação e instituição: __________________________________________________
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3
DEDICATÓRIA
A Ele toda honra e toda
glória, para sempre.
4
AGRADECIMENTOS
Quão tremendo és tu nas tuas obras, eu te louvarei, eu te exaltarei, ó Deus, rei meu, e
bendirei o teu nome pelos séculos dos séculos e para sempre.
Mãe, obrigada por ter abdicado de tanta coisa por mim. Eu sou você.
Lay, obrigada por acreditar mais em mim do que eu mesma. Eu sou sua fã, você é minha
inspiração.
Tudo que faço é por vocês. Amo vocês duas mais que minha própria vida.
Jeane, você é meu anjo da guarda.
Zinho (bebê), por que me mima como se eu fosse sua filha.
Obrigada às minhas amigas Mariana e Alecsandra por terem feito parte desta jornada
louca. Sem vocês eu teria trancado a matrícula.
Obrigada ao professor Roberto Gomes a quem admiro como profissional, como pessoa
e como professor. Ter o senhor acreditando no meu potencial me fez mais forte.
Obrigada a Fabiana, minha terapeuta, que não me deixou enlouquecer.
Por fim, mas, não menos importante, eu gostaria de agradecer a mim. Renata, obrigada
por não desistir. Você venceu!
5
“A loba, a velha, aquela que sabe está
dentro de nós. Floresce na mais profunda
psique da alma das mulheres, a antiga e
vital Mulher Selvagem. Ela descreve seu lar
como um lugar no tempo em que o espírito
das mulheres e o espírito dos lobos entram
em contato. É o ponto em que o Eu e o
Você se beijam, o lugar em que as mulheres
correm com os lobos (…)”
Clarissa Pinkola
6
RESUMO
Palavras-chaves:
7
ABSTRACT
8
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ART - Artigo
CP - Código Penal
DEAM - Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher
LMP - Lei Maria da Penha
MPU - Medida Protetiva de Urgência
NEVID - Núcleo de Enfrentamento às Violências de Gênero em Defesa dos Direitos
das Mulheres
ONGs - Organizações não-governamentais
PL - Projeto de Lei
STF - Supremo Tribunal Federal
TJBA - Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
9
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO
2.1 Conceito
3.1 Histórico
5 CONCLUSÃO
6 REFERÊNCIAS
10
11
1 INTRODUÇÃO
A Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) foi criada diante da necessidade de uma
legislação penal que protegesse direitos básicos de mulheres, dentro de um
contexto de violência doméstica, haja vista uma construção cultural que as
colocou em posição hipossuficiente.
O objetivo geral deste trabalho é concluir pela necessidade das Medidas Protetivas
relacionadas na lei em referência, sem deixar de analisar as dificuldades
enfrentadas na coleta de dados acerca da sua aplicação, bem como, os desafios das
autoridades que enfrentam obstáculos na garantia dos direitos das mulheres. Além disso,
faz-se necessário a verificação de como garantir que o contexto de violência
doméstica não se repita mediante a aplicação dessas medidas.
Para a sociedade, o estudo visa desmistificar a mulher como responsável pela situação
de violência que ela é vítima, de modo a modificar o pensamento cultural em relação à
violência doméstica.
12
aspectos da criação da Lei Maria da Penha, bem como as Medidas Protetivas de
Urgência e quais são as dificuldades das autoridades.
Quanto ao tema ensina Minayo que, “o termo violência resulta da palavra latina vis,
significando “força” e se refere às noções de constrangimento e uso da superioridade
física sobre o outro para adquirir autoridade, poder, domínio, posse, aniquilamento do
outro ou de seus bens.” 1
Paviani no que lhe concerne, define violência como “consequência, declamando que a
violência produz danos físicos, ao produzir ferimentos, tortura e morte ou danos
psíquicos, como a humilhação, ameaças e ofensas.” 2
De mesmo modo, no direito, de acordo com Nucci a violência pode ser definida como
“qualquer forma de constrangimento ou força, seja ela física ou moral.” 3 No entanto, no
âmbito penal, o termo é comumente utilizado para se referir apenas à violência física. É
importante destacar que o conceito de família abrange indivíduos que se consideram ou
são aparentados, unidos por laços naturais, afinidades ou vontade expressa.
Já a Convenção de Belém do Pará, que teve como foco a violência contra a mulher,
definiu a violência doméstica como “qualquer ato ou conduta baseada no gênero que
cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico, tanto na esfera pública
como na privada”. Essa definição foi praticamente repetida no artigo 5º da Lei Maria da
Penha, que estabelece que qualquer ação ou omissão baseada no gênero que cause
morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial
configura violência doméstica contra a mulher.
1
MINAYO. Violência e saúde, 2006.
2
Conceitos e formas de violência. Organização: Maura Regina Modena, 2016.
3
NUCCI. Manual de Direito Penal: parte geral e especial, p. 45, 2016.
13
Os incisos desse artigo deixam claro que esse tipo de violência pode ocorrer no âmbito
da unidade doméstica, que inclui o espaço de convívio permanente das pessoas, com ou
sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; no âmbito da família, que
compreende a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram
aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; e em
qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a
vítima, independentemente de coabitação.
Por fim, o parágrafo único da Lei Maria da Penha estende a proteção da lei às pessoas
homoafetivas.
4
BRITO. Ainda sobre a Lei Maria da Penha: uma tentativa de pacificação dos conflitos hermenêuticos à
luz da jurisprudência dos Tribunais Superiores. Revista Bahia Forense, p. 19.
14
A violência contra a mulher não é um fato novo, pelo contrário, é tão antigo quanto a
humanidade. Durante mais de cinco séculos no Brasil, desde as Ordenações Filipinas
até o Código Penal de 1940, os únicos crimes destinados a proteger as mulheres eram os
crimes sexuais, embora não fossem voltados para a proteção completa da mulher, mas
apenas para a proteção de sua honra e da honra de sua família. Mesmo sendo um
atributo personalíssimo, a honra da mulher era o foco principal.
A chegada da redemocratização nos anos 1980 marcou o início de uma fase altamente
produtiva para o movimento feminista no Brasil, impulsionando significativos avanços
na luta pelos direitos das mulheres. Um marco importante nesse processo foi a criação
do Conselho Nacional da Condição da Mulher (CNDM) em 1984. Esses avanços
culminaram com a promulgação da Constituição de 1988, que representou uma
mudança significativa em direção à igualdade de gênero. Embora não tenha ocorrido
uma modificação direta no Código Civil, a Constituição Federal deixou claro que
dispositivos que violavam o princípio da igualdade entre homens e mulheres no
casamento e no companheirismo não eram mais aceitáveis. Isso representou um
rompimento com o sistema patriarcal que conferia ao homem uma posição de
superioridade em relação à mulher.
15
Organizações Não-Governamentais (ONGs). Essas organizações tinham como objetivo
promover a participação das mulheres nos espaços públicos de poder, ao mesmo tempo
em que buscavam aprovar medidas de proteção, especialmente para aquelas que sofrem
violência, a exemplo disto, temos a criação da primeira Delegacia de Atendimento à
Mulher foi instalada em São Paulo, no ano de 1985.
Em 2004, a Lei nº 10.886 criou o tipo de violência doméstica no Código Penal, com
uma causa especial de aumento de pena. A Lei nº 11.106/2005 alterou vários artigos do
Código Penal, retirando expressões que remetiam à "honestidade" da mulher e
aumentando a pena em razão do vínculo familiar ou afetivo com o agressor. A lei
também eliminou a possibilidade de extinção da punibilidade por força do casamento da
vítima com o agressor.
5
ALBUQUERQUE. Convenção Europeia dos direitos humanos, pg. 34, 2019
16
Penha - considerada a terceira melhor do mundo pela ONU - as mudanças na lei nem
sempre se traduzem em mudanças socioculturais automáticas.
Maria da Penha assevera que “apesar das conquistas femininas, mesmo não tendo as
mesmas oportunidades, ainda se costuma referir-se às mulheres como inferiores. Esse
comportamento transparece em comentários públicos, piadas, letras de músicas, filmes
ou peças de publicidade.” 6
Tanto os homens quanto as mulheres sofrem com a violência, mas, a maneira como os
tipos de violência se manifestam, são bem diferentes. Vejamos.
17
verdade, temos, ainda, a sexual, a moral, a patrimonial e a psicológica e, não raro esta
última resvala para danos físicos porque deflagradoras da depressão que pode levar ao
suicídio, vários tipos de cânceres, dentre outras patologias psicossomáticas.” 8
2.3.1 Física
A violência física contra a mulher, definida pela Lei Maria da Penha como “qualquer
conduta que ofenda a sua integridade ou saúde corporal” (art. 7º, I), configura qualquer
lesão física, aparente ou não, que provoque danos à saúde ou integridade física dessa.
Não obstante essas agressões são praticadas pelo companheiro, atual ou ex, filho, tio,
irmão, cunhado, alguém que mantém ou manteve convivência com a vítima, por ligação
amorosa, de parentesco, ou de trabalho doméstico. Eluf sinaliza que “muitas vezes, a
justificativa dada pelos agressores para essas lesões é o ciúme, que nasce de uma
necessidade ilimitada de dominar e uma preocupação exagerada com sua reputação.” 9
8
BRITO. Conhecendo a violência doméstica: do passado ao presente. Como enfrentá-la no futuro?
Revista Bahia forense, pg 24.
9
ELUF. A paixão no banco dos réus, pg 51, 2011.
10
Termo criado em 1979, pela psicóloga norte-americana Lenore Walker para identificar padrões
abusivos em uma relação afetiva.
18
arrependimento e pede perdão à mulher. Contudo, geralmente, a situação tende a se
repetir em ciclos subsequentes, aumentando o perigo e o risco enfrentados pela vítima.
Diante de uma situação de dependência, seja ela de natureza econômica e/ou emocional,
a vítima acaba por permanecer presa no ciclo da violência, deixando de buscar auxílio e
não reconhecendo o momento em que deve romper o relacionamento abusivo. Esse
padrão de comportamento persiste até que, infelizmente, a vítima se torne uma
estatística trágica de feminicídio no país, infelizmente, tornando a promessa
matrimonial “até que a morte nos separe” fidedigna.
Maria Berenice Dias13 acredita que a causa para essa realidade é uma só, a existência de
uma ideologia patriarcal.
11
https://www.correiodopovo.com.br/arteagenda/ana-hickmann-o-que-se-sabe-sobre-a-den%C3%BAncia-
da-apresentadora-contra-o-marido-de-agress%C3%A3o-1.1418067
12
https://www.metropoles.com/colunas/fabia-oliveira/patricia-ramos-abre-queixa-crime-contra-o-ex-mari
do
13
Maria Berenice Dias, Quando a vítima é mulher. 03/09/2021 Acesso em:
https://berenicedias.com.br/quando-a-vitima-e-mulher/
19
“Uma cultura machista que reina em uma sociedade ainda conservadora,
em que o homem acredita ser superior à mulher; que ela lhe deve
obediência. O homem se tem como proprietário do corpo e da vontade da
mulher. Tem poder sobre ela, o que a transforma em um objeto de sua
propriedade. Sendo dono da mulher, não aceita perdê-la. Não admite ser
abandonado. Essa errônea concepção de poder é que assegura o suposto
direito de o macho fazer uso de sua superioridade corporal e força física
sobre a fêmea.”
2.3.2 Psicológica
No contexto da violência doméstica ou familiar contra a mulher, é frequente a
ocorrência de violência psicológica, conceituada pela Lei Maria da Penha como
"qualquer conduta que cause dano emocional, diminuição da autoestima, prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento, degrade ou controle suas ações, comportamentos,
crenças e decisões, por meio de ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação,
isolamento, vigilância constante, perseguição persistente, insulto, chantagem,
ridicularização, exploração e restrição do direito de ir e vir, ou qualquer outro meio que
prejudique sua saúde mental e sua autonomia" (art. 7, II). Essa forma de violência
também é abordada pelo artigo 129 do Código Penal, que a considera como lesão
psicológica.
Essa forma de violência contra a mulher representa uma forma extremamente perigosa
pois destrói a vítima de diversas formas causando a deterioração da saúde mental,
causando cicatrizes não no corpo, mas, na alma. Para o doutrinador Nelson Hungria, “a
deterioração da saúde mental é considerada uma forma de lesão corporal, uma vez que a
inteligência, a vontade ou a memória estão intrinsecamente ligadas à atividade funcional
do cérebro, que é um dos órgãos mais importantes do corpo.” 14
14
HUNGRIA. Código Penal Comentado, p. 426, 2008.
20
Na prática, esse tipo de violência se manifesta através de ações que incluem insultar e
denegrir uma mulher, chamando-a de estúpida, incapaz, burra, louca, prostituta, gorda,
feia, apontando constantemente seus erros e declarando que ela nunca é boa mãe, que
nunca foi desejada e não merece coisas boas. Também envolve ofensas e difamações
dirigidas aos familiares da mulher, além de vigiá-la ou segui-la em seu local de trabalho,
momentos de lazer e em todos os lugares que frequenta. O agressor pode negar qualquer
demonstração de afeto, apenas para puni-la, ameaçá-la, agredi-la física ou verbalmente e
até mesmo ameaçar a vida dela e/ou de seus filhos, chegando ao extremo de ameaçar
suicídio. Outras formas de controle incluem impedir que a mulher trabalhe, tenha
amizades, dirija, saia de casa, revelar aventuras amorosas e acusá-la de infidelidade.
Além disso, vêm sendo desveladas outras práticas machistas que afetam as mulheres, de
muitas formas, limitando as suas possibilidades e minando suas forças, a exemplo do
manterrupting, bropriating, mansplaining e gaslighting.
Por outro lado, o mansplaining ocorre quando um homem explica algo que é óbvio para
aquela mulher quando um homem tenta explicar os sentimentos, pensamentos,
comportamentos e o próprio funcionamento do corpo da mulher para ela mesma.
15
Na trama, o marido tenta convencer a mulher de que ela é louca, manipulando pequenos elementos
de seu ambiente e insistindo que ela está errada ou que se lembra de coisas de maneira incorreta. O
nome faz referência às lâmpadas que alimentadas a gás, e em certo momento piscam. Ela nota, mas o
marido a faz acreditar que está imaginando, fazendo com que a mulher duvide da própria sanidade.
21
no ambiente de trabalho ou acadêmico, o bropriating também é extremamente comum
nesses ambientes. O bropriating consiste na prática de um homem se apropriar dos
feitos estudos, pesquisas, realizações, serviços ou produtos que uma mulher produziu
causando o silenciamento e apagamento histórico das mulheres diante de suas próprias
realizações.
Nesse contexto, segundo a juíza Elaine Cavalcante, “os operadores da Justiça precisam
dar credibilidade à palavra da ofendida, desde que coerente com o conjunto probatório,
e considerá-la como suficiente para a condenação, pois, a violência psicológica, por sua
16
vez, tem natureza invisível.” A consequência disto é “a completa anulação da
autonomia da mulher e a maneira como ela é tratada impede-a de cuidar de sua própria
vida.” 17
Ainda, ao estabelecer que a lesão corporal é toda ação que ofenda “a integridade
corporal ou a saúde de outrem”, se a vivência de agressões psicológicas recorrentes
resulta em danos à saúde da mulher, o dispositivo penal deve ser aplicado de forma
combinada às disposições da Lei 11.340/2006. Nesse sentido, a promotora de justiça no
Estado da Bahia, Márcia Teixeira explica, que “não necessariamente você precisa ter um
diagnóstico de transtorno psíquico ou mental, mas que a situação tenha levado a mulher
a desenvolver uma síndrome do pânico, fobia social, ou a tenha levado a fazer
tratamento pós-trauma.”18
2.3.3 Sexual
A violência sexual é um fenômeno universal, em que não existem restrições de sexo,
idade, etnia ou classe social, encontra-se definida na Lei Maria da Penha, inciso III do
art. 7º, in verbis:
16
Titular da Vara Central de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do TJ/SP em entrevista para
o Informativo Compromisso e Atitude em 2014.
17
BRITO. Dizer não ao machismo: Dever de todos! Bahia Forense, p. 22, 2019.
18
Coordenadora da Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher
(Copevid) em entrevista para o Informativo Compromisso e Atitude em 2014.
22
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a
constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual
não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da
força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer
modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método
contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto
ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou
manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos
sexuais e reprodutivos;
A violência sexual pode ser definida ainda como qualquer ato sexual, tentativa de obter
um ato sexual ou outro ato direcionado à sexualidade de uma pessoa por meio de
coerção, realizado por qualquer pessoa, independentemente do seu relacionamento com
a vítima, em qualquer ambiente. Isso inclui estupro, definido como a penetração forçada
fisicamente ou coercedida de forma alguma da vulva ou ânus com um pênis, outra parte
do corpo ou objeto, tentativa de estupro, toques sexuais indesejados e outras formas não
físicas19.
Mas não será, porém, todo e qualquer crime contra a liberdade sexual que se inserirá
neste conceito. Segundo Cunha, “um delito no qual o agente jamais teve contato com a
vítima, decerto que escapará aos rigores da Lei Maria da Penha. E mesmo quando ele
for mais próximo (um parente, por exemplo, como é tão comum), esse fato, de per si,
não atrai a competência da lei em exame, exigindo-se que o delito tenha sido perpetrado
19
New York: UN, 1993
20
Autora do capítulo do livro Lei Maria da Penha Comentada em uma Perspectiva Jurídico-Feminista, em
entrevista para o Dossiê Violência contra as Mulheres do Instituto Patrícia Galvão.
23
no âmbito da unidade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto.”21
É o que também disciplina a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, in verbis.
21
CUNHA. Violência doméstica: Lei Maria da Penha: Comentado artigo por artigo, p. 08, 2015.
22
Secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres da Secretaria de Políticas para as
Mulheres da Presidência da República em entrevista para o Dossiê Violência contra as Mulheres do
Instituto Patrícia Galvão.
24
A violência por parceiro íntimo (física, sexual e psicológica) e a violência sexual
causam sérios problemas de saúde física, mental, sexual e reprodutiva de curto e longo
prazo para as mulheres, como por exemplo: Suicídio, ferimentos, gravidezes não
planejadas, abortos induzidos, problemas ginecológicos e infecções sexualmente
transmissíveis (incluindo o HIV), depressão, estresse pós-traumático, ansiedade,
insônia, transtornos alimentares, dores de cabeça, fibromialgia, mobilidade alterada, uso
de substâncias ilícitas, isolamento, dificuldade de trabalhar, alteração de peso,
habilidade limitada de cuidar de si ou de seus filhos. A antropóloga Débora Diniz, em
artigo publicado em 2013 no jornal O Estado de S. Paulo, assevera que “uma mulher
vitimada pelo estupro não é só alguém manchada na honra, mas alguém
temporariamente alienada da existência”. Para a entrevistada, o estupro é um ato
violento de demarcação do patriarcado nas entranhas das mulheres.
2.3.4 Patrimonial
A violência patrimonial, conforme estabelecido na Lei Maria da Penha, inciso IV do
artigo 7º, refere-se a “qualquer ação que envolva a retenção, subtração, destruição
parcial ou total de objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens,
valores, direitos ou recursos econômicos de uma pessoa, incluindo aqueles destinados a
suprir suas necessidades”.
Na prática, essa forma específica de violência pode ser identificada por meio de
comportamentos como a utilização indevida do cartão de crédito da vítima, contraindo
dívidas sem sua devida quitação, o emprego de coação para que assine procurações com
o intuito de alienar seus bens, bem como a imposição de medidas de interdição com o
objetivo de retirá-la da administração de seus próprios recursos e propriedades, entre
outros exemplos correlatos. Isso é feito por esposos e companheiros em relação às suas
esposas e companheiras.
23
DIAS. A Lei Maria da Penha na Justiça – A efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência
doméstica e familiar contra a mulher, 2013.
25
exemplo, fazer com que a esposa ou companheira se sinta incapaz de ser produtiva e de
contribuir para o orçamento doméstico. Não se trata, assim, de simplesmente impedir a
vítima de trabalhar, mas sim de fazê-la se sentir incapaz de realizar qualquer atividade
remunerada.
Embora seja possível que muitos acreditem que esse tipo de violência tenha se tornado
inexistente na sociedade moderna atual devido ao aumento da participação das mulheres
no mercado de trabalho, ocupando cargos de alto desempenho e obtendo independência
financeira, é importante ressaltar que a dependência emocional, a persistência da cultura
patriarcal e o sentimento de culpa ainda podem fazer com que mesmo essas mulheres
profissionalmente bem-sucedidas, que não dependem financeiramente de seus parceiros,
encontrem-se em situações de violência doméstica.
Vale ressaltar que com o avanço da sociedade, advento da internet e o mundo digital
surgiram novas formas de vitimizar mulheres de maneira patrimonial, um exemplo
disto, são as violências virtuais, como falaremos no tópico mais adiante. Nesse
momento, é importante conhecer que dentro dessas violências, podemos falar sobre a
violência patrimonial-virtual, onde as mulheres são vítimas dos chamados Scammers ou
Golpistas da Nigéria que criam falsos perfis para seduzir corações e confundir as
mentes. É o tipo de homem que muitas mulheres idealizam, estão disponíveis e são
24
REsp 1416580/RJ, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 01/04/2014, DJe
15/04/2014.
26
carentes, querem recomeçar a vida, mas, na verdade, nem a foto, nem a história são
verdadeiras, a finalidade é sempre tirar dinheiro da vítima.
2.3.5 Moral
Conforme já abordado anteriormente, a violência é a manifestação e prática de
autoridade, de um sujeito sobre outro. Em específico a violência moral está diretamente
integrada na esfera psicológica, comportamentos que possam violar, abalar ou ferir a
essência da vítima, sua representação, sua honra etc.
Ao contrário da violência física, que deixa marcas visíveis, a violência moral atinge a
autoestima, a dignidade e a integridade emocional das mulheres. Essa forma de
violência pode ocorrer em diversos contextos, desde relacionamentos íntimos até
ambientes profissionais e virtuais, perpetuando estereótipos de gênero e prejudicando o
progresso e a igualdade de oportunidades para as mulheres.
No Brasil, um dos mais evidentes casos foi direcionado à ex-presidente Dilma Rousseff:
O que aconteceu com Dilma Rousseff nos faz saber que o poder violento
do patriarcado não se volta apenas contra as mulheres, mas contra a
democracia como um todo, sobretudo na sua versão cada vez mais
radical intimamente relacionada com as propostas do feminismo como
luta por direitos ao longo do tempo. O que aconteceu com Dilma
Rousseff nos ensina a compreender o funcionamento de uma verdadeira
máquina misógina, máquina do poder patriarcal, ora opressor, ora
sedutor, a máquina composta por todas as instituições, do Estado à
família, da Igreja à escola, máquina cuja função é impedir que as
mulheres cheguem ao poder e nele permaneçam.25
25
TIBURI, Marcia. A máquina misógina e o fator Dilma Rousseff na política brasileira. Revista Cult - UOL,
2016. Disponível em:
27
O caso deixa evidente que não importa a posição que a mulher ocupa na sociedade,
neste caso, o mais alto cargo político no país, muito menos se promulgou a Lei do
Feminicídio (Lei 8.305/2014) e a Lei das Domésticas, ainda sim, uma mulher pode ser
alvo de violência moral.
Vale ressaltar que com o avanço das tecnologias de informação e das redes sociais na
internet, a violência moral tem se disseminado de forma mais rápida e abrangente,
muitas vezes sem deixar rastros evidentes. Essa forma de violência envolve a
ridicularização, a desqualificação e a inferiorização da vítima no ambiente cibernético.
Para Ferreira, é evidente que a mulher é uma das principais vítimas da violência moral
na internet.
Érica Lene da Silva, com razão, denomina a violência moral como um dos tipos do que
chama de “violências invisibilizadas” pois perturbam o psiquismo da mulher, não
deixando marcas visíveis.
De fato, seja em ambiente virtual ou dentro do lar, a violência moral dentre seus tipos é
a mais difícil de obter elementos para a denúncia e posterior indiciamento de um
agressor. No entanto, caso a vítima consiga reunir provas necessárias, ela pode buscar
reparação por danos materiais e morais por meio de uma ação indenizatória na esfera
https://revistacult.uol.com.br/home/maquina-misogina-e-o-fator-dilma-rousseff-na-politica-brasileira/
Acesso em: 16 nov. 2023.
26
Ferreira, Tarsis Paim. A violência moral contra a mulher praticada pelo ex-companheiro no âmbito
virtual. 2023. https://lume.ufrgs.br/handle/10183/262756
27
https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede/tede/3751
28
cível, recentemente houve decisão nesse sentido do STJ que pacificou o entendimento
que “toda mulher vítima de violência doméstica sofre automaticamente dano moral a ser
indenizado”28
Na esfera penal, com o advento da LMP a violência moral ganhou uma proteção maior
e mais abrangente, que a mera tipificação penal, uma vez que, virão acompanhadas de
outras medidas de proteção, punição e especialização.
2.3.6 Virtual
A violência contra as mulheres é muito mais abrangente do que se pensa. Além de
serem vítimas no mundo físico, as mulheres também são as principais vítimas de várias
formas de violência no ambiente virtual. Com o avanço da tecnologia ocorrido nas
últimas décadas e a massificação do uso dessas novas tecnologias, como internet, redes
sociais e smartphones, a violência contra as mulheres ganhou uma implacável
ferramenta. Todos os dias, milhões de mulheres país afora são vítimas de várias formas
de violência, praticadas, em sua maioria, por homens motivados por questões de ódio,
vingança ou de vantagem financeira. No que se refere a violência virtual existem vários
tipos como, sextorsão, estupro virtual e stalking.
28
STJ, REsp 1643051
29
A "pornografia de vingança", representa uma forma de violência que envolve o
vazamento de imagens íntimas pela internet, expondo as mulheres a situações
extremamente humilhantes e dolorosas. Essa forma de violência pode ter impactos
somáticos, desencadeando estresse, depressão e, em casos mais graves, até mesmo
levando ao suicídio.
Já o crime de “sextorsão” “se refere à junção das palavras “sexo” e “extorsão” – que diz
respeito à exigência do envio de material erótico ou à prestação de favores sexuais
frente ameaças de divulgação de informações confidenciais da vítima ou até mesmo de
imagens e/ou vídeos de conteúdo íntimo.” 29
No contexto legal brasileiro, em 2021, foi promulgada a Lei n° 14.132, conhecida como
Lei do Stalking, a qual acrescentou o artigo 147-A ao Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 (Código Penal). Essa legislação tem como objetivo especificar e
penalizar o crime de perseguição, fornecendo um arcabouço jurídico para coibir e punir
o comportamento de stalking.
Rose Leonel, jornalista e fundadora da ONG Marias da Internet denuncia que “quando
uma mulher sofre um crime de internet, sofre três dores: a da traição da pessoa que você
29
ALMEIDA; ALMEIDA. A violência virtual contra a mulher: Um relato da exposição de imagens íntimas
na internet. Revista Online Fadivale, pg 49-63, 2021.
30
30
amava, a vergonha da exposição e a dor da punição social.” As vítimas deste tipo de
crime são responsabilizadas pela maioria das pessoas, enquanto o agressor ainda é
poupado pela sociedade machista.
Essas mulheres são moralmente condenadas devido à crença de que não conseguiram
evitar situações indesejadas, que foram descuidadas ou que não mantiveram sua
sexualidade restrita à esfera privada e oculta. Além disso, há uma persistência de uma
sexualidade recatada por parte de todos, pois o machismo não está presente apenas nos
homens, mas é uma estrutura fundamental em nossa sociedade.
Como concluir que aquele ato na internet se trata de uma violência virtual contra a
mulher? É preciso ver como isso repercute na pessoa que foi vítima. A mulher pode
ficar tão mal com aquela exposição que acaba ficando doente e, aí sim, há uma
violência.
Um exemplo atual da violência virtual contra a mulher foi o caso da atriz Carolina
Diekmann31, que deu origem a “Lei Carolina Dieckmann” (Lei nº 12.737/2012) que
incluiu no Código Penal uma série de infrações praticadas no meio digital e prevê a
reclusão de 8 meses a 3 anos e 4 meses para quem divulgar conteúdo roubado de
dispositivo informático. Contudo, ela não prevê especificamente a conduta “pornô de
vingança” quando não houver a subtração das imagens, mas sim a veiculação sem
consentimento.
30
Depoimento no Fórum Fale sem Medo de 2014.
31
Fotos íntimas da atriz foram copiadas de seu computador pessoal e divulgadas na rede.
31
campos das ciências jurídicas, a fim de garantir novos direitos fundamentais, bem como
a efetivação dos já existentes de conduta.” 32
É fundamental compreender que a violência virtual contra a mulher não pode ser tratada
como algo inofensivo ou menos grave do que a violência física ou sexual. Ela afeta
diretamente a autonomia e a liberdade das mulheres, limitando seu acesso ao espaço
público, restringindo sua participação social. Além disso, a violência virtual também
perpetua estereótipos de gênero e reforça desigualdades estruturais presentes na
sociedade.
Nesse contexto, as medidas protetivas concedidas pela Lei Maria da Penha (Lei nº
11.340/2006) desempenham um papel crucial. Essa lei representa um marco no
enfrentamento à violência doméstica e familiar, estabelecendo um conjunto de direitos e
mecanismos de proteção para as mulheres em situação de violência.
As medidas protetivas visam não apenas assegurar a integridade das vítimas, mas
também promover a ruptura do ciclo de violência e garantir sua autonomia e liberdade.
3.1 Histórico
Maria da Penha Maia Fernandes nascida em Fortaleza no Ceará no ano de 1945 é
farmacêutica bioquímica e se formou na Faculdade de Farmácia e Bioquímica da
Universidade Federal do Ceará em 1966, concluindo o seu mestrado em Parasitologia
em Análises Clínicas na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São
Paulo em 1977.
32
FIORILLO; CONTE. Crimes no ambiente digital. p. 22, 2016.
32
Maria da Penha cruzou o caminho de Marco Antônio Heredia Viveros, um colombiano,
enquanto cursava o mestrado na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade
de São Paulo em 1974. Naquela época, Marco Antônio estava envolvido em seus
estudos de pós-graduação em Economia na mesma instituição.
Maria da Penha Maia Fernandes, foi agredida pelo marido durante seis anos. Em 1983,
Maria da Penha foi vítima de dupla tentativa de feminicídio por parte de Marco Antônio
Heredia Viveros.
Por duas vezes ele tentou assassiná-la. Inicialmente, ele disparou um tiro em suas costas
enquanto a mesma repousava. Como consequência desse ato violento, Maria da Penha
ficou paraplégica devido a lesões irreversíveis nas terceira e quarta vértebras torácicas,
juntamente com laceração na dura-máter e a destruição de um terço da medula esquerda.
Quatro meses depois, quando Maria da Penha voltou para casa ele a manteve em cárcere
privado durante 15 dias e tentou eletrocutá-la durante o banho.
O ano de 1998 marcou um momento de extrema relevância para o caso, à medida que
ele adquiriu dimensão internacional. Maria da Penha, juntamente com o Centro para a
Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino-americano e do Caribe para
a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM), levaram a denúncia do caso perante a
33
Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados
Americanos (CIDH/OEA).
Diante da falta de medidas legais e ações efetivas, como acesso à justiça, proteção e
garantia de direitos humanos a essas vítimas, em 2002 foi formado um Consórcio de
ONGs Feministas para a elaboração de uma lei de combate à violência doméstica e
familiar contra a mulher: Assim, em 7 de agosto de 2006 foi sancionada a Lei nº
11.340/06 batizada como Maria da Penha.
A denominação da Lei Maria da Penha à Lei Federal nº 11.340/06 foi uma espécie de
retratação simbólica do Estado brasileiro após essa condenação.
Desde sua implementação, inúmeras tentativas de enfraquecer a Lei Maria da Penha por
meio de projetos de lei foram feitas, porém, graças à colaboração entre Maria da Penha,
movimentos feministas e instituições governamentais, a lei nunca experimentou
retrocessos.
34
potencial ofensivo”, desse modo, eram julgados pelos Juizados Especiais Criminais.
Com a instauração da norma esta competência foi atribuída aos Juizados de Violência
Doméstica e Familiar contra a mulher.
Outro passo importante, foram as alterações nos Códigos Penal e de Processo Penal, que
possibilitam a decretação de prisão preventiva de ofício quando houver risco à
integridade física ou psicológica da mulher.
Desde a promulgação da Lei 11.340 em 2006, tem ocorrido várias alterações em seu
texto, além de diversas outras leis que fizeram menção a ela. Além disso, na Câmara
dos Deputados, vários projetos de lei relacionados estão em tramitação. Em 2018, a Lei
13.641/2018 introduziu uma alteração à Lei Maria da Penha ao incluir o Artigo 24-A,
que impõe uma pena de 03 meses a 02 anos de detenção para o agressor que
desrespeitar as medidas protetivas de urgência. Isso proporcionou maior segurança
jurídica nas decisões judiciais.
No ano de 2022 o STF promoveu uma mudança substancial na LMP sendo considerada
talvez a mais controversa entre os juristas. O Supremo Tribunal Federal (STF)
considerou válida a alteração promovida na Lei Maria da Penha introduzida pela Lei
13.827/2019 para permitir que, em casos excepcionais, a autoridade policial afaste o
35
suposto agressor do domicílio ou do lugar de convivência quando for verificado risco à
vida ou à integridade da mulher, mesmo sem autorização judicial prévia, desta forma, a
medida poderá ser implementada pelo delegado de polícia, quando o município não for
sede de comarca(quando o juiz responsável não mora na localidade), ou pelo policial,
quando não houver delegado disponível no município no momento da denúncia. Nesses
casos, um juiz deve ser comunicado, em no máximo 24h, para decidir sobre a
manutenção ou revogação da cautelar.
Por outro lado, os defensores da mudança acreditam que a medida é excepcional e visa
dar celeridade à proteção da mulher em situações de violência doméstica nas quais não é
possível, com a devida urgência, conseguir autorização judicial prévia. Nesse passo foi
o voto do Relator Min. Alexandre de Moraes quando afirmou que a autorização legal
para que policiais e delegados de polícia atuem de forma supletiva para interromper o
ciclo de violência doméstica não viola a prerrogativa constitucional do Judiciário de
decretar medidas cautelares.33
33
ADI 6138 / DF - DISTRITO FEDERAL AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Relator(a): Min.
ALEXANDRE DE MORAES - Julgamento: 23/03/2022 - Publicação: 09/06/2022 - Órgão julgador: Tribunal
Pleno (https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur465627/false )
36
independentemente da tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou
cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência.”.
Tal alteração trouxe significativas críticas no mundo jurídico, pois, para os críticos
haveria um afastamento da igualdade prevista em lei, um estímulo à má-fé, bem como, a
banalização da medida protetiva. Por outro lado, há quem defenda que a alteração
apenas formalizou um procedimento que já ocorria na prática.
Por fim, é possível ainda citar brevemente, a Lei 14.550/2023 que teve como origem em
proposta no PL 1.604/2022, da então senadora e atual ministra do Planejamento,
Simone Tebet, sancionada pelo presidente Lula, prevendo que basta o depoimento da
mulher perante autoridade policial ou apresentação de suas alegações escritas para a
concessão de medidas protetivas. Prevendo ainda que estas fiquem em vigor enquanto
persistir o risco a integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da
ofendida e seus dependentes.
34
https://www12.senado.leg.br/radio/1/noticia/2023/04/24/concessao-imediata-de-medida-protetiva-a-
mulher-que-denuncia-violencia-ja-e-lei Acesso em 19/10/2023
37
serviços, visando à efetivação da Lei Maria da Penha e à promoção de
programas e políticas educacionais que disseminem o respeito à
dignidade da pessoa humana com a perspectiva de equidade de gênero,
raça e etnia.”35
Nesse sentido, quando falamos a nível Municipal é fundamental o papel das guardas
municipais que atuam no transporte de mulheres entre as instituições dos sistemas de
saúde, justiça e segurança, bem como, na fiscalização do cumprimento das medidas
protetivas de urgência.
35
https://dossies.agenciapatriciagalvao.org.br/violencia/violencias/acoes-direitos-e-servicos-para-enfrenta
r-a-violencia/ < Acesso em: 22/10/2023
36
Constituição Federal. Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão
atenderão aos seguintes princípios:
I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;
II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua
divulgação;
III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em
lei;
IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.
37
https://comunicacao.salvador.ba.gov.br/spmj-treina-guarda-municipal-sobre-acolhimento-as-mulheres-v
itimas-de-violencia/
38
Dados da Secretaria de Políticas para Mulheres do Estado da Bahia.
http://www.mulheres.ba.gov.br/2023/04/3701/Mulheres-vitimas-de-violencia-veja-lista-com-servicos-d
e-apoio-juridico-e-psicologico-gratuitos-oferecidos-na-Bahia.html < Acesso em 22/10/2023>
38
possível realizar boletins de ocorrência e conduzir inquéritos nas delegacias comuns,
sendo responsabilidade dos Estados, por meio das Secretarias de Segurança Pública.
Luís Ricardo Santos em seu artigo “O papel da Polícia Militar na garantia da Lei Maria
da Penha: Tecendo reflexões” destaca que “além de fazer o registro e direcionar para os
órgãos do poder judiciário, proceder os trâmites legais da investigação e prisão dos
malfeitores, ainda compete ao órgão atribuições típicas de serviço de rede de proteção,
redesenhando o processo instrumental da própria instituição que agrega, também,
relações e estratégias de acolhimento, articulação em rede com os serviços de
assistência social e outras demandas de saberes e conhecimentos para além do que
habitualmente compete a ação policial”40
39
https://www.compromissoeatitude.org.br/norma-tecnica-de-padronizacao-das-delegacias-especializada
s-de-atendimento-as-mulheres/ <Acesso em 23/10/2023 >
40
Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação (REASE) pág 626
39
11.340/2006, da presença obrigatória de um advogado, seja ele público ou privado, em
todas as etapas do processo, podendo sua ausência causar a nulidade de referida
solenidade judicial41. No caso da necessidade de ser instituído advogado público, nesse
momento entra a assessoria da defensoria pública.
As defensorias também oferecem orientação às mulheres sobre os direitos que lhes são
garantidos, abrangendo aspectos como integridade, guarda de filhos, pensão alimentícia,
acesso a programas sociais, e muito mais. Além disso, fornecem informações sobre as
41
CAMPOS, Carmen Hein de. Lei Maria da Penha comentada em uma perspectiva jurídico-feminista. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 339.
42
https://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/50699/EBOOK_DIREITOS_MULHERES.pdf
43
Cartilha da Anadep-Condege, página 8 < disponível em
https://www.anadep.org.br/wtksite/CARTILHA_ANADEP_CONDEGE_ONLINE.pdf >
40
circunstâncias que podem resultar na prisão do agressor e auxiliam no encaminhamento
para atendimento psicossocial, dentre outras responsabilidades importantes.
Apesar de este possuir uma inclinação apenas para as questões de natureza criminal,
cabe a ele representar a sociedade na denúncia e buscar a responsabilização cível
(aquelas em que se discutem guarda de filhos e alimentos para os filhos – por força do
Código de Processo Civil) e criminal do agressor, sendo a sua intervenção obrigatória
nas ações penais públicas e nas privadas – conforme disciplina o Código de Processo
Penal.
44
https://www.cnmp.mp.br/portal/images/FEMINICIDIO_WEB_1_1.pdf Violência Contra a Mulher: Um
olhar do Ministério Público Brasileiro, CNMP (2018) Acesso em 28/10/2023
41
Além disto, deve requisitar força policial e serviços públicos de saúde, de educação, de
assistência social, entre outros; bem como, fiscalizar os estabelecimentos públicos e
particulares de atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar,
adotando as medidas cabíveis para sanar as irregularidades constatadas, tudo
disciplinado no capítulo III, artigos 25 e 26 da Lei 11.340 (Lei Maria da Penha).
Desta forma, se conclui que cada uma dessas instituições possui papel relevante para
assegurar a efetividade da Lei Maria da Penha, no entanto, apesar dos esforços persiste
um déficit quanto ao estrito cumprimento daquilo detalhado na referida norma.
https://www.mpmg.mp.br/data/files/F9/F7/9C/E3/DA44A7109CEB34A7760849A8/Artigo%20-%20A%20
Lei%20Maria%20da%20Penha%20e%20o%20Ministerio%20Publico.pdf
42
baseando-se nos princípios de proteção à vítima e à família, urgência, acessibilidade e
utilidade processual.
Na mesma linha, Fredie Didier Jr. e Rafael Oliveira sustentam que as medidas protetivas
previstas na Lei 11.340/2006 são espécies das medidas provisionais previstas no artigo
888, do Código de Processo Civil.
47
Disponível em:
https://www.compromissoeatitude.org.br/enunciados-da-copevid-comissao-nacional-de-enfrentamento
-a-violencia-domestica-e-familiar-contra-a-mulher/ Acesso em: 13 de outubro de 2023
48
DIDIER, Fredie Jr. et. al., R. Aspectos processuais civis da Lei Maria da Penha (violência doméstica e
familiar contra a mulher), família e responsabilidade, teoria e prática do direito de família. Porto Alegre:
Instituto Brasileiro de Direito de
Família, 2010.
49
LIEBMAN, Enrico Tullio, Manuale di Diritto Processuale Civile, ed. 1968, vol I, nº 36, pág. 92 e VILLAR,
Willard de Castro, Medidas Cautelares, 1971, pág. 59, apud THEODORO JR., Humberto. Processo
cautelar. 15. ed., São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 1994.
43
“para a obtenção da tutela cautelar a parte deverá demonstrar fundado
temor de que, enquanto aguarda a tutela definitiva, venham a faltar as
circunstâncias de fato favoráveis à própria tutela. E isto pode ocorrer
quando haja o risco de perecimento, destruição, desvio, deterioração, ou
de qualquer mutação das pessoas, bens ou provas necessários para a
perfeita e eficaz atuação do provimento final do processo principal.”50
Considerando que as medidas protetivas de urgência têm como objetivo prevenir novos
ilícitos e impedir sua continuidade, é facultado ao juiz, no caso concreto, adotar outras
medidas não contempladas em lei, para garantir a proteção integral à vítima e seus
familiares.
Dito isto, passaremos a análise das medidas protetivas discriminadas na LMP nos
artigos 22, 23 e 24 que utilizou o critério de diferenciação entre as medidas protetivas
que obrigam o agressor e as medidas protetivas à ofendida.
50
4 LIEBMAN Enrico Tullio, Op. cit. vol. I, nº 36, pág. 92 e CALVOSA, Carlo, Sequestro Giudiziario, in
Novíssimo Digesto Italiano, vol. XVII, pág. 66 apud THEODORO JR., Humberto. Processo cautelar. 15. ed.,
São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 1994.
51
Cadernos Jurídicos, São Paulo, ano 15, nº 38, p. 113-132, Janeiro-Abril/2014 Apontamentos sobre as
medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha
44
Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto bem ressaltam que “o conceito de
“arma de fogo” deve ser alargado para incluir, também, “acessório” ou “munição” e
“artefato explosivo ou incendiário”, cuja posse irregular também configura crime
(respectivamente, arts. 12 e 16, III, da Lei 10.826/2003); e mesmo “brinquedos, réplicas
e simulacros de armas de fogo”, cuja fabricação, venda, comercialização e importação
são vedadas pelo art. 26 do Estatuto.52
Frisa-se que para Fredie Didier e Rafael Oliveira, citando Carlos Alberto Álvaro de
Oliveira “ a separação de corpos ou o afastamento de que ora se trata não substituem a
dissolução de união estável, a separação ou o divórcio judicial ou extrajudicial”53.
No penúltimo inciso deste artigo, que trata acerca da restrição ou suspensão de visitas
aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço
similar.
É comum que nessa medida, o magistrado aguarde o laudo psicossocial para decidir
pela concessão dessa medida, haja vista que, a suspensão do poder familiar de qualquer
52
CUNHA, Rogério Sanches et. al. Violência doméstica: Lei Maria da Penha (Lei 11340/2006) comentada
artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007
53
DIDIER, Fredie Jr. Aspectos processuais civis da Lei Maria da Penha (violência doméstica e familiar
contra a mulher), família e responsabilidade, teoria e prática do direito de família. Porto Alegre: Instituto
Brasileiro de Direito de Família, 2010
45
dos genitores é medida extrema e deve ser adotada com cautela pela autoridade,
perdurando apenas enquanto houver situação de risco.
Elaine Cristina Monteiro Cavalcante citando Rogério Sanches da Cunha defende que o
artigo da legislação, apesar de fazer referência ao fato de que a medida deve ser
concedida aos dependentes menores, deve ser ampliado em seu entendimento para
abranger qualquer membro da relação familiar que tenha contato no âmbito doméstico
com o agressor como no caso do enteado, guardião, tutor, etc.54
Por fim, no quinto e último inciso deste artigo, o legislador cria a concessão da medida
protetiva que obriga o agressor à prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
Uma vez fixados os alimentos como medida protetiva de urgência prevista na Lei Maria
da Penha, são eles devidos desde a data da fixação tanto à mulher quanto aos filhos.
Vale ressaltar que enquanto as medidas previstas no artigo 22, I, II e III têm natureza
penal, as medidas previstas nos incisos IV e V têm natureza civil, próprias do direito de
família.
Além das medidas que obrigam o agressor, a lei também prevê medidas que protegem a
vítima nos seus artigos 23 e 24, respectivamente.
54
CUNHA, Rogério Sanches et al. Violência doméstica: Lei Maria da Penha (Lei 11340/2006) comentada
artigo por artigo. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012
55
Art. 1695. São devidos alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode
prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem
desfalque do necessário ao seu sustento.
46
ofendida e seus dependentes, tudo em um âmbito civil. O referido artigo tem objetivo de
evitar novos atos de violência, bem como, resguardar a vítima e seus filhos de maiores
prejuízos/aborrecimentos. Inclusive, determinando em seu último inciso a separação de
corpos.
56
Cadernos Jurídicos, São Paulo, ano 15, nº 38, p. 113-132, Janeiro-Abril/2014 Apontamentos sobre as
medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha
47
casal ou particular da mulher. Assim, qualquer ato praticado em
desobediência à decisão judicial é passível de invalidação.”57
Desta forma, resta evidente a importância do referido inciso, ressaltando-se ainda, que
caso deferida a medida protetiva , o juiz deve providenciar a comunicação ao Cartório
de Notas e ao Cartório de Registro de Títulos e Documentos.
O terceiro inciso trata acerca do instrumento de mandato, que por vezes a vítima confere
ao agressor dando plenos poderes a este para praticar um ou mais atos em nome da
ofendida como se a própria tivesse praticado. O referido determina a suspensão das
procurações conferidas pela ofendida ao agressor.
Uma vez revogado o mandato pela mulher, o juiz deve cientificar o mandatário da
decisão, sobretudo porque a validade dos atos praticados após a revogação irão
depender da ratificação da mulher, no caso em apreço. E assim como no inciso anterior
o magistrado deve providenciar a comunicação ao Cartório de Notas e ao Cartório de
Registro de Títulos e Documentos.
Por fim, o inciso IV trata sobre a prestação de caução provisória, mediante depósito
judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e
familiar contra a ofendida, servindo para garantir o pagamento de indenização posterior
à vítima em decorrência do ato ilícito cometido.
Trata-se de medida cautelar que pode ser requerida pela vítima perante a autoridade
policial, mas que, existem grandes dificuldades práticas em sua aplicação em virtude da
dificuldade das autoridades em encontrar elementos informativos necessários sobre a
situação fática. Desta forma, por vezes, o magistrado acredita ser mais conveniente o
ajuizamento direto da ação no juízo cível.
Vale ressaltar que além das medidas descritas nos artigos 23 e 24, a Lei Maria da Penha
contempla outras medidas no Capítulo II, que trata da Assistência à Mulher em Situação
de Violência Doméstica e Familiar. Essas medidas se concretizam através da criação de
57
5 Fredie Didier Jr e Rafael Oliveira, Aspectos processuais civis da Lei Maria da Penha, 326 apud DIAS,
Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça: a efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à
violência doméstica e familiar contra a mulher. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
48
programas assistenciais e sociais específicos para mulheres em situação de violência
doméstica. Assim, o art. 9º, assim dispõe:
Arrematar aqui
5 AS MEDIDAS PROTETIVAS COMO UMA FERRAMENTA DE PROTEÇÃO
A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) é uma importante ferramenta de proteção às
mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, que tem o intuito de corrigir uma
perversa realidade que vem de uma cultura machista que visam garantir a integridade
física, psicológica, sexual, patrimonial e moral das mulheres que sofrem violência por
parte de seus parceiros ou familiares.
Tal processo protetivo, por sua vez, composto pelas medidas protetivas destinadas à
vítima e ao agressor, aspectos procedimentais e consequências do descumprimento,
trata-se de instrumento inovador de intervenção social, dotado de grande aptidão para
modificar a realidade e a vivência de mulheres inseridas nos ciclos de violência.58
58
FERNANDES, V. D. S. Lei Maria da Penha: O Processo Penal no caminho da efetividade.
São Paulo: Atlas, 2015.
49
Muito se fala na doutrina brasileira sobre ineficácia das medidas protetivas. Daniele
Lopes Tobar afirma em seu artigo que “ as medidas protetivas, inclusive aquelas
emitidas durante a vigência da Lei Maria da Penha (antes das modificações, do artigo
12-C e artigo 38), não impediram os agressores de desenvolverem seus atos bárbaros”,
no entanto, meras ponderações de que essas medidas não impedem os agressores, estão
extremamente longe da realidade fática.
A existência desses dados revelou a confiança das mulheres vítimas nos meios de
proteção criados pela Lei Maria da Penha à medida que se percebe que as vítimas vão à
procura de ajuda, situação antes inimaginável por muitas delas. Se hoje o fazem é pelo
fato de confiarem mais na lei, no sistema jurídico.
50
boletins de ocorrências, em 595 deles houve a requisição da vítima de medida protetiva
contra o agressor.
51
Estes números refletem claramente que a ação do legislador coíbe a violência contra a
mulher, e, as medidas protetivas, são uma ferramenta que impede os agressores de
desenvolverem seus atos bárbaros.
A Lei Maria da Penha é um triunfo de todas as mulheres, que visa equilibrar a justiça
entre homens e mulheres, mas, apenas a imposição das medidas protetivas previstas
na Lei n. 11.340/2006 não é o suficiente para acabar com a violência doméstica contra a
mulher.
5.1 Os obstáculos
Maria Berenice Dias defende que apesar da LMP ser uma das mais avançadas no
mundo, sendo submetida a sucessivas reformas, o que a autora chamou de “cirurgias
reparadoras”, estas nem sempre a tornam melhor, ou melhor dizendo, mais eficazes. A
autora ainda se questiona se essas reformas bastam para a efetividade da legislação.59
Ocorre que apesar da referida legislação ter tido uma melhor aplicabilidade em
relação ao momento de sua criação, as autoridades judiciais e policiais ainda
59
Há o que comemorar no aniversário de 15 anos da Lei mais popular do Brasil? Maria Berenice Dias
Disponível em: Há o que comemorar no aniversário de 15 anos da Lei mais popular do Brasil? Acesso em
16/11/2023
52
encontram obstáculos na fiscalização do cumprimento das medidas impostas. É o que
comenta a delegada titular da DEAM Periperi quando questionada em entrevista sobre o
acompanhamento da concessão e cumprimento das medidas protetivas:
“(...) Nós não temos nem tempo de ter curiosidade sobre o desenrolar de determinado
caso…Temos uma demanda muito grande aqui. Saí uma vítima, entra outra. É muito
difícil realizar esse acompanhamento.”
Ao coletar dados para esta monografia encontramos diversas dificuldades que também
são enfrentadas pelas autoridades. Na DEAM Periperi, por exemplo, a delegada titular
informou que não há um sistema que realize um compilado de dados acerca das
medidas protetivas, sua concessão e cumprimento ou descumprimento, de forma que foi
53
preciso para a coleta consultar manualmente no sistema mês a mês cada boletim de
ocorrência para constatar a existência de medida protetiva. Ainda, pouco se encontrava
no sistema informação de concessão ou não da medida protetiva após o registro na
delegacia, exemplo disto foi no mês de janeiro de 2023, em que foram realizadas 270
denúncias de violência e 70 com pedido de medida protetiva, porém, dentre elas apenas
11 possuíam informações sobre a concessão (ou não) da MPU.
Há de se destacar ainda, que não há ainda dados que evidenciem a reincidência dos
casos, que em análise social, demonstram que agressores que voltam a cometer as
violências com intervalo de um ano, ou as cometem repetidamente.
As autoridades judiciais e policiais fazem o que podem, mas as soluções não são
simples.
Há que destacar que a Lei Maria da Penha ainda é muito recente, assim como,
obviamente, todas as medidas protetivas nela previstas, e, portanto, ainda há muito a ser
realizado de forma a dar concretude ao que já se tem conquistado.
6 CONCLUSÃO
Inovou a Lei 11.340/2006 – Lei Maria da Penha – ao criar um leque abrangente de
medidas protetivas que obrigam o agressor e protegem a ofendida, visando impedir ou
remover atos ilícitos.
É inegável o impacto positivo dos avanços alcançados graças à Lei Maria da Penha. Nos
últimos anos, observou-se um notável aumento no volume de denúncias.
Maria da Penha, em seu livro Sobrevivi e posso contar, relata que “com a criação da Lei
Maria da Penha senti-me recompensada por todos os momentos nos quais, mesmo
morrendo de vergonha, expunha minha indignação e pedia justiça, para que meu caso, e
tantos outros, não fossem esquecidos”60
Afinal, como afirmou Simone Beauvoir: “não se nasce mulher, torna-se”.
60
FERNANDES, Maria da Penha Maia. Sobrevivi posso contar. 2º ed. Fortaleza: Armazém da Cultura,
2012, p. 89.
54
7 ENTREVISTAS
1. Dra. Iola
2. Dra. Sara Gama
3. Dra.
8 REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de (seleção de opiniões). Convenção Europeia dos
Direitos Humanos. 1ª ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019. Formato: ePub.
Tamanho: 6 Mb.
ALMEIDA, Beatriz; ALMEIDA, Maria. A violência virtual contra a mulher: Um
relato da exposição de imagens íntimas na internet. Revista Online Fadivale,
Governador Valadares, Ano XVII, nº 22, 2021.
BRITO, Nágila Maria Sales. Ainda sobre a Lei Maria da Penha: uma tentativa de
pacificação dos conflitos hermenêuticos à luz da jurisprudência dos Tribunais
Superiores. Revista Bahia Forense: Doutrina, jurisprudência e súmulas / Tribunal de
Justiça do Estado da Bahia. Catalogação nº 47.
BRASIL. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a
violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da
55
Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir
e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o
Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm.
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