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Nos trechos iniciais das redes de drenagem é corrente verificarem-se altos valores do
potencial redox e elevadas concentrações de oxigénio dissolvido no interior da massa
líquida. No entanto, à medida que aumentam os tempos de percurso decrescem, em
regra, tais concentrações, devido ao facto do consumo de oxigénio não ser compensado
pelo rearejamento natural ocorrido através da interface ar-massa líquida.
Num sistema de drenagem, após ter sido atingida a condição de anaerobiose, e desde
que satisfeitas certas condições favoráveis, podem resultar das reacções de oxidação
bioquímica da matéria orgânica, libertação de dióxido de carbono e de sulfureto de
hidrogénio. Diz-se, então, que o escoamento se processa em condições de septicidade,
circunstância associada a concentrações positivas de sulfuretos e baixos potenciais
redox, representando o potencial redox, em solução aquosa, o balanço entre as substân-
cias oxidantes e as redutoras. O sulfureto de hidrogénio e o dióxido de carbono tendem,
também, a reduzir o pH da massa líquida.
a) odor que provoca, que é, de entre os gerados no interior das águas residuais, dos
mais intensos e desagradáveis;
b) criação de ambientes tóxicos, por vezes mortais, no interior de atmosferas
confinadas ou ventiladas deficientemente;
c) criação de condições para a ocorrência de corrosão em colectores, câmaras de
visita, poços de bombagem, câmaras repartidoras de caudal e órgãos ou
equipamentos de estações de tratamento;
d) contribuição para a ocorrência, em circunstâncias excepcionais, de atmosferas
explosivas;
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e) contribuição para o mau ou irregular funcionamento de estações de tratamento.
230
8.2. Origem, natureza e propriedades do sulfureto de hidrogénio
Os sulfuretos totais inorgânicos podem ser divididos em sulfuretos solúveis (S2-, HS- e
H2S) e não solúveis em água (FeS, ZnS, ..., etc.). A concentração de sulfuretos não
solúveis é função do pH e da concentração de determinados elementos metálicos, como
o ferro, o zinco, o cobre ou o chumbo, usualmente presentes, embora em baixas
concentrações, em águas residuais domésticas. Esses elementos metálicos reagem com
o ião sulfureto, originando partículas em suspensão que podem precipitar.
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hidrogenosulfureto (HS-) ou ião sulfureto (S2-). O sulfureto de hidrogénio dissocia-se
em água, de acordo com as seguintes reacções:
k1 (8.1)
H2S HS- + H+
k2
HS- S2- + H+ (8.2)
sendo as concentrações de H2S, HS- e S= função do pH da solução aquosa, tal como
indicam as seguintes expressões:
Como se pode constatar pela Figura 8.1, no intervalo comum de pH das águas residuais
domésticas, entre 6,5 e 8,5, a concentração de ião sulfato é praticamente nula, sendo
predominantes as concentrações de sulfureto de hidrogénio e ião hidrogenosulfureto.
Para pH igual a 7, as concentrações de sulfureto de hidrogénio e hidrogenosulfureto são
praticamente idênticas, aumentando a predominância daquele composto à medida que se
reduz o pH da massa líquida.
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Figura 8.1 - Distribuição das concentrações de equilíbrio das espécies H2S, HS e S2-, em função do pH da
massa líquida, admitindo pk1 = 7 e pk2 = 14.
O gás sulfídrico é incolor, 1,19 vezes aproximadamente mais denso que o ar e tem um
odor característico a “ovos podres”. A exposição humana a relativamente pequenas
concentrações desse gás tóxico, da ordem de algumas dezenas de p.p.m. (neste trabalho,
é entendido o termo p.p.m. como referente a concentração em partes por milhão em
volume), pode provocar dores de cabeça, náuseas e irritações de garganta e vista.
Concentrações mais elevadas de algumas centenas de p.p.m., podem conduzir a
paralisia do sistema respiratório e à morte. O gás sulfídrico no ar pode tornar-se
explosivo em concentrações entre 4,3 e 45,5%. O sulfureto de hidrogénio é
moderadamente solúvel em água, decrescendo a solubilidade com o aumento da
temperatura. Para temperaturas de 15 e 25°C, as solubilidades são, respectivamente, de
4150 e 3175 mg/l.
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implantados em regiões frias (como em certas áreas dos Estados Unidos da América, da
França, do Reino Unido ou da Dinamarca), onde já foram referenciados efeitos
especialmente graves, provocados pela ocorrência de septicidade em colectores de
águas residuais domésticas, nomeadamente devidos à presença de gás sulfídrico. Nesses
casos, a ocorrência de septicidade deve-se, fundamentalmente, ao facto do escoamento
de águas residuais se processar sob pressão, em condutas elevatórias, trechos de sifões
invertidos ou colectores sub-dimensionados, não havendo pois lugar a rearejamento.
Nas reacções que se apresentam no Quadro 8.1, e que ocorrem, ou podem ocorrer, em
colectores de águas residuais, são identificados possíveis receptores de hidrogénio e os
correspondentes produtos de reacção.
As reacções identificadas com os números de ordem (1), (2) e (5) originam produtos
que não provocam impacte, do ponto de vista dos odores. As reacções (3) e (4) originam
compostos de odor desagradável, respectivamente sulfureto de hidrogénio e,
frequentemente, mercaptanos.
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Em águas residuais, a disponibilidade de enxofre orgânico e ião sulfato encontra-se
naturalmente assegurada. Em estudos experimentais realizados num interceptor da
cidade de Bruxelas, reportam capitações de ião sulfato, por habitante e por dia, de 16 g.
Metcalf & Eddy 1979 referenciam contribuições, de origem doméstica, correspondentes
a concentrações na massa líquida entre 15 e 30 mg/l (valores médios correspondentes a
sistemas de drenagem em exploração nos Estados Unidos da América).
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CBO5 - carência bioquímica de oxigénio aos cinco dias e a 20°C (mg/l);
A expressão (8.8) foi calibrada com base na análise de resultados experimentais obtidos
em quarenta e duas condutas e pressupõe as seguintes condições:
Davy 1950 postula que, para que a concentração de sulfuretos no interior da massa
líquida seja praticamente nula, torna-se necessário que a taxa de oxidação seja pelo
menos igual à taxa de formação. A oxidação dos sulfuretos é assegurada pela
disponibilidade de oxigénio que depende da turbulência do escoamento, ou seja, do
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número de Reynolds. Combinando argumentos lógicos com os resultados experimentais
obtidos em treze colectores da cidade de Melbourne, na Austrália, aquele autor define
uma expressão que relaciona o valor crítico do número de Reynolds, a partir do qual a
formação de sulfuretos se torna improvável, com a CBO5 e a largura e secção do
escoamento. Essa expressão foi posteriormente modificada, por forma a tornar mais
expedita a sua aplicação, e pode ser apresentada sob a seguinte forma:
- para Zp < 5 000 o sulfureto de hidrogénio raramente está presente. Materiais à base
de ligas de prata e de cobre e, possivelmente, tintas contendo chumbo podem ser
escurecidas;
- para 5 000 < Z ≤ 7 500 as concentrações máximas não excedem algumas décimas de
mg/l. É possível a ocorrência de ligeira corrosão em estruturas de betão e alvenaria,
especialmente se o escoamento se processar com turbulência significativa;
- para 7 500 < Zp ≤ 10 000 o sulfureto de hidrogénio pode, por vezes, desenvolver-se
em quantidade suficiente para causar odores desagradáveis e danos substanciais em
estruturas de betão e alvenaria, principalmente se o escoamento se processar com
elevada turbulência. É previsível, mesmo em locais onde a turbulência do
escoamento não seja significativa, ataque ligeiro do betão e do fibrocimento;
- para 10 000 < Zp ≤ 15 000 podem ocorrer períodos em que os odores desagradáveis
se manifestem significativamente, sendo de esperar um rápido ataque das estruturas
de betão. Em colectores de betão de 2,5 cm de espessura, pode dizer-se que são
fortes as probabilidades de ocorrer ruptura nos primeiros 25 anos de vida;
239
- para Zp > 15 000 o sulfureto de hidrogénio está praticamente sempre presente na
massa líquida, variando o período de vida útil de pequenos colectores e betão entre 5
e 10 anos.
A expressão (8.10) teve grande divulgação no mundo científico, e foi, praticamente até
meados da década de oitenta, a única que se aplicou, nesse domínio, em países como
Portugal ou Brasil. Esta expressão tem, no entanto, importantes limitações, havendo
autores que limitam a sua aplicação a colectores com diâmetros iguais ou inferiores a
600 mm. No entanto, a maior limitação dessa expressão, segundo alguns autores, é não
ter em conta o tempo de percurso e os efeitos da septicidade acumulada em trechos a
montante, como os que decorrem, em particular, da presença de condutas sob pressão.
240
Figura 8.5 - Variação do parâmetro Zp, em função da tensão de arrastamento e do diâmetro do colector.
241
- hipótese moderadamente conservadora: M = 0,32 x 10-3 m/h,
m = 0,96.
- hipótese muito conservadora: M = 0,32 x 10-3 m/h,
m = 0,64.
242
O gás sulfídrico é moderadamente solúvel em água bastante mais, por exemplo, que o
dióxido de carbono, o oxigénio ou o azoto, e segue a lei de Henry com razoável
ajustamento. Em 1903, William Henry postulou que, a temperatura constante, a massa
de gás dissolvida num determinado volume é directamente proporcional, em equilíbrio,
à pressão parcial do gás no ar. Essa lei pode ser apresentada sob a seguinte forma:
xg = KHe Pg (8.15)
sendo,
Figura 8.6 - Variação da concentração de equilíbrio do gás sulfídrico no ar, em função da temperatura e
da concentração em solução (adaptada de ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY
1985).
Para aplicar a expressão (8.16) torna-se necessário conhecer o parâmetro “q” e, por isso,
a concentração de equilíbrio, a qual pode ser determinada a partir da lei de Henry. A
taxa de libertação do gás sulfídrico para o ar (g/(m2.s)) pode ser expressa em termos de
taxa de variação de concentração de sulfuretos dissolvidos em solução (mg/(l.h)) tendo
em conta a largura superficial e a secção do escoamento. Na Figura 8.7 é apresentada a
variação da taxa de libertação de gás sulfídrico, expressa em termos de variação da
concentração na massa líquida, em colectores de águas residuais com escoamento a
meia secção. Para os cálculos foi admitida uma concentração de 1 mg/l de sulfureto de
hidrogénio em solução, um coeficiente de Manning igual a 0,013 m-1/3s, e a aplicação
da expressão (8.16).
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Figura 8.7 - Libertação do gás sulfídrico em águas residuais sépticas em função do declive do colector
(h/D = 0,50; N = 0,013 m-1/3s; H2SL = 1 mg/l) (adaptada de Matos 1992).
245
Em determinadas condições, pode ocorrer tendência a uma inversão do sentido do
escoamento do ar, ou seja, pode verificar-se um movimento global ascendente do ar, no
sentido contrário ao do escoamento do líquido. Essa tendência pode tomar proporções
mais significativas, em sistemas de drenagem implantados com grandes desníveis, e em
que, simultaneamente, as alturas e velocidades médias do escoamento sejam reduzidas.
246
Figura 8.8 - Representação esquemática do encadeamento dos processos conducentes à redução do pH da
superfície de betão.
Várias definições têm sido dadas para a concentração ou limite absoluto de percepção
de gases odoríferos (em terminologia anglo-saxónica absolut threshold concentration),
sendo vulgar aquela a que corresponde a concentração mínima do gás odorífero,
detectada por 50% dos indivíduos consultados num painel de odor. O valor limite de
concentração (em terminologia anglo-saxónica threshold limit value - TLV)
corresponde a concentração média máxima à qual trabalhadores podem ser expostos,
sem perigo de consequências gravosas, oito horas por dia, cinco vezes por semana e
cinquenta semanas por ano.
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Quando, no interior dos sistemas de drenagem, a concentração de gás sulfídrico atinge
valores muito altos, podem ocorrer acidentes que, em alguns casos, podem conduzir à
morte.
A longo prazo, o efeito mais relevante do gás sulfídrico é a corrosão. Esse gás ataca
directamente elementos metálicos e, indirectamente, após dar origem à formação de
ácido sulfídrico, diversos materiais, entre os quais se realçam o betão, o fibrocimento e
o ferro fundido.
8.4.2. Odor
O controlo de odores pode levar à necessidade de confinamento das áreas onde são
libertados, nomeadamente obras de entrada, decantadores primários e espessadores de
estações de tratamento, e ao tratamento do ar colectado, antes da rejeição final. Em
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Portugal, podem ser referenciados os casos das instalações elevatórias da Barcarena
(Oeiras) e do Gorgulho (Funchal), em que o ar é tratado por filtros de carvão activado, e
as galerias da estação de tratamento preliminar do sistema de drenagem de águas
residuais da Costa do Estoril, em que o ar “viciado” é diluído e oxidado em torres de
ozono (oxidação húmida).
8.4.3. Toxicidade
O gás sulfídrico é tóxico e tem sido causa de vários acidentes mortais. É mais denso que
o ar, ao contrário do metano, e, por isso, concentra-se muitas vezes nos volumes
inferiores das câmaras de visita dos sistemas de drenagem. Pode, no entanto, devido a
correntes de convexão e a diferenças de temperatura entre o ar e o gás sulfídrico
libertado, suceder precisamente o contrário. Na câmara de parafusos da obra de entrada
da estação de tratamento de águas residuais de Alcanena, foi medido, no Outono de
1989, junto à superfície do líquido, teores de 50 p.p.m., bastante inferiores aos medidos,
na mesma altura, junto à cobertura da câmara (entre 80 e 100 p.p.m.). A toxicidade do
gás sulfídrico tem sido comparada à do ácido cianídrico e têm sido referenciados casos
de acidentes mortais, por exposição humana a concentrações superiores a 300 p.p.m..
Nos Estados Unidos da América, Pomeroy e Bowlus 1946 referenciam dois casos,
ocorridos na mesma altura e no mesmo local, enquanto Keating 1978 referencia que,
apenas no estado do Texas e entre 1974 e 1978, ocorreram vinte e quatro mortes
atribuídas a inalação do gás sulfídrico.
8.4.4. Corrosão
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A corrosão é um fenómeno natural, que consiste na deterioração de um material ou na
alteração das suas propriedades, por acção do meio a que está exposto. A deterioração
pode ocorrer por razões físicas, químicas, electroquímicas e bioquímicas, e pode ser de
vários tipos, incluindo a corrosão selectiva, bimetálica, sob tensão, fadiga, erosão-
cavitação, e devido a acção microbiana. No âmbito destas folhas é analisada a corrosão
provocada pela presença de gás sulfídrico, e que é de origem microbiana.
Processo de corrosão
No caso do betão armado, as características do meio produzido pela hidratação do
cimento, em particular a sua elevada toxicidade (pH > 11), fazem com que o aço se
encontre no estado de passivação. Tal estado, em que a corrosão é pouco provável,
considera-se resultante da formação de uma camada muito fina de óxido, directamente
decorrente de uma reacção electroquímica anódica, camada essa que protege o aço de
corrosão ulterior. O estado de passivação pode ser destruído por abaixamento do pH,
presença de iões agressivos, particularmente de cloretos, e outros factores, como tensões
aplicadas.
250
efeitos são visíveis pelos sulcos irregulares deixados ao longo da superfície não
molhada das paredes dos colectores.
Modelo de cálculo
A aglutinação dos componentes inertes com que se fabrica o betão, brita e areia, deve-se
à presa e endurecimento resultantes da hidratação dos constituintes do cimento, silicatos
e aluminatos anidridos. A hidratação dá-se com formação de hidróxido de cálcio, que é
a matriz do cimento hidráulico, e, nomeadamente, hidróxido de cálcio, a componente
vulnerável do betão.
A taxa média de corrosão em colectores de betão (ou fibrocimento) pode ser deduzida
teoricamente. O seu valor depende, designadamente, da velocidade de formação do
ácido sulfúrico e da reserva alcalina do material (tipo e teor de cimento, e natureza dos
inertes).
Sabe-se que são necessários 32 gramas de enxofre para formar o ácido sulfúrico
suficiente para reagir completamente com 100 gramas de material alcalino, expresso em
251
carbonato de cálcio (CaCO3). De acordo com essa premissa, é possível deduzir a
seguinte expressão de cálculo:
O valor do parâmetro Al pode tomar valores entre 0,18 e 0,23, no caso de betão
construído com inertes graníticos, ou ascender a 0,9, no caso daqueles inertes serem
calcários (visto dispor-se de maior reserva alcalina). No caso do fibrocimento, é comum
serem admitidos, para dimensionamento, valores entre 0,4 e 0,5.
A corrosão das paredes dos colectores não se processa de forma uniforme. Em trechos
rectilíneos, sem quedas e turbulência significativa, a razão entre as corrosões máxima e
média pode ser, aproximadamente, de um e meio. Em trechos especiais, junto de locais
onde a turbulência é significativa (como em quedas, junções de colectores e transições
de secção bem dimensionadas), a corrosão máxima pode ser duas a cinco vezes superior
à corrosão média, estimada em condições de regime uniforme em trecho rectilíneo.
252
A expressão (8.17) permite estimar a corrosão média que se verifica num determinado
intervalo de tempo, e pode ser adaptada, por forma a se tornar mais prática para efeitos
de dimensionamento. Admitindo um factor de segurança de dois e especificando o
intervalo de tempo, t, correspondente à acção da corrosão (que é, em regra, considerado
igual ao horizonte de projecto da obra) é possível deduzir as seguintes expressões:
Nas expressões (8.19) e (8.20), os símbolos Al, Ka, Fi1 e CR têm o significado e são
expressos nas unidades já previamente definidas.
253
ser adequado do ponto de vista de corrosão. Em termos de odores, àquelas
concentrações poderão corresponder, em determinadas condições, impactes ambientais
mais ou menos significativos. Para averiguar quantitativamente os efeitos da corrosão,
deve ser aplicada a expressão (8.17), admitindo as condições do escoamento
correspondentes a concentrações médias anuais de sulfuretos.
Nos sistemas de drenagem de águas residuais podem ocorrer outros compostos, para
além do sulfureto de hidrogénio, tais como alguns mercaptanos, susceptíveis de
provocarem odor desagradável. No entanto, o consenso geral é de que a presença desses
compostos se relaciona com a dos sulfuretos, de tal modo que as medidas preventivas e
correctivas conducentes a controlar a formação e efeitos do sulfureto de hidrogénio
também inibem a produção e efeitos de outros compostos odoríferos.
Tem pois sentido, segundo tal perspectiva, controlar a libertação de odor e a corrosão
em sistemas de drenagem de água residual, limitando a valores admissíveis a
concentração de sulfuretos na água residual.
254
3) alterações estruturais, mais ou menos significativas, na concepção e funcionamento
dos sistemas, incluindo, nomeadamente, redução da extensão das condutas sob
pressão e do número de instalações elevatórias ou sifões invertidos, remodelação de
colectores gravíticos de modo a terem maiores declives, utilização de tubagens
protegidas da corrosão, construção de postos de ventilação, etc..
Nas secções 8.5.2 e 8.5.3 dá-se especial ênfase aos aspectos constantes dos pontos 1) e
2) acabados de referir.
- colectores com atmosfera mal ventilada, como a que se pode desenvolver a montante
de sifões invertidos, instalações elevatórias ou secções das redes de drenagem onde
as obstruções sejam mais frequentes;
- caixas de visita (e colectores vizinhos), onde aflua águas residual transportada sob
pressão;
255
Além de se reduzirem as fontes de formação de sulfuretos, devido ao aumento da
velocidade do escoamento e da turbulência, incrementam-se as trocas de oxigénio na
interface ar-massa líquida, com benefícios óbvios.
A limpeza deve ser regular e preventiva, isto é, deve ser efectuada ciclicamente, de
modo a evitarem-se entupimentos e obstruções totais ou parciais das secções de
escoamento.
Figura 8.10 - Efeito de uma operação de limpeza, num colector de água residual, na concentração total de
sulfuretos (adaptada de Thistlethayte 1972).
256
O controlo da formação e dos efeitos do sulfureto de hidrogénio, em redes de drenagem
de água residual, pode ser conseguido recorrendo a certos procedimentos, entre os quais
se incluem os seguintes:
- injecção ou adição de ar, oxigénio puro e certos agentes químicos (como cloro,
permanganato de potássio e peróxido de hidrogénio) à massa líquida; estes
compostos actuam, por um lado, oxidando os sulfuretos dissolvidos e, por outro,
inibindo a actividade das bactérias anaeróbias redutoras do ião sulfato;
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A injecção de ar na massa líquida, para ser eficiente, deve efectuar-se em condições de
pressão e de turbulência favoráveis. É corrente considerarem-se essas condições
satisfeitas quando a pressão hidráulica é superior a 0,15 Mpa e a velocidade média do
escoamento excede 0,6 m/s.
- maior eficiência dos grupos electrobomba, que se traduz por economia, por vezes
significativa, nos encargos de energia de bombagem;
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Em determinadas circunstâncias, pode justificar-se a utilização de equipamentos
específicos, como bicones (dispositivos com uma forma cónica, concebidos de modo a
promoverem condições de turbulência e de contacto entre o oxigénio gasoso e a água
residual, que possibilitam a sua dissolução), para se garantir adequada eficiência de
“tratamento”. Estas circunstâncias podem estar associadas a condições insuficientes de
velocidade de escoamento, de pressão ou do tempo de contacto oxigénio-massa líquida,
que inviabilizam o método de arejamento por injecção directa.
Adição de cloro
Uma outra técnica alternativa para o controlo sanitário em sistemas de drenagem de
água residual consiste em adicionar hipoclorito ou cloro, sob a forma gasosa, à massa
líquida. Em regra, o hipoclorito é usado em aplicações ocasionais ou quando as ne-
cessidades não são significativas (menores que 2,3 kg/dia).
A água residual inclui, em regra, vários compostos que reagem com o cloro. Devido a
este facto, em aplicações práticas, as taxas de adição de cloro normalmente variam entre
10 e 15 g por grama de sulfuretos dissolvidos a oxidar.
259
A reacção de peróxido de hidrogénio com o ácido sulfídrico processa-se rapidamente.
Em regra, a reacção completa-se totalmente em 30 a 45 minutos.
- as reacções dão origem a subprodutos que não são tóxicos para o homem;
- a decomposição do peróxido de hidrogénio fornecido em excesso dá origem a
oxigénio dissolvido, que pode inibir a posterior formação de sulfuretos no sistema;
em meio ácido
Outros metais, tais como o chumbo e o cobre, podem também ser utilizados com o
mesmo objectivo. No entanto, os elevados encargos que lhe estão associados e os
260
eventuais efeitos negativos, a jusante, nos processos de tratamento biológico da água
residual, podem ser factores que desaconselham a sua utilização.
A adição de bases fortes (como hidróxido de sódio) à água residual séptica eleva o pH
da solução, reduzindo a percentagem de ácido sulfídrico, em relação aos iões HS- e S2-.
Se a dosagem adicionada for tal que o pH da massa líquida ascenda a mais de 12,6,
durante cerca de 30 minutos, pode esperar-se uma redução praticamente total da
actividade dos microrganismos redutores, e da produção de sulfuretos no troço tratado.
Esse efeito inibidor pode persistir durante alguns dias.
EXEMPLO DE CÁLCULO 1
Dados de base
- Diâmetro da conduta sob pressão: D = 150 mm
- Extensão: L = 600 m
261
- Carência bioquímica de oxigénio (5 dias a 20°C): CBO5 = 400 mg/l
Cálculo sanitário
- Velocidade média do escoamento: V = Q/S = (0,02 x 4) / π x 0,152) = 1,13 /s
= 1,7 mg/l
Comentários
Dado que o valor obtido excede 1,5 mg/l, é de temer alguns problemas sanitários (como
manifestação de odor desagradável e ocorrência de corrosão) nas estruturas de
drenagem e tratamento que se desenvolvem a jusante. Na própria conduta elevatória sob
pressão, estes problemas não se manifestam, visto não haver contacto com a atmosfera
e, por isso, condições para a libertação do gás sulfídrico.
EXEMPLO DE CÁLCULO 2
Dados de base
- Diâmetro do colector: D = 400 mm
Cálculos hidráulicos
- Caudal escoado a secção cheia (Qsc):
262
1
Qsc = N S R2/3 J1/2 = π x 0,42 / (4 x 0,013) (0,4/4)2/3 (0,0025)1/2 = 0,104 m3/s
Cálculo sanitário
- Parâmetro “Zp”:
Comentários
Como o valor do parâmetro “Zp” se situa entre 7 500 e 10 000, é de esperar que o
sulfureto de hidrogénio se possa desenvolver em quantidade suficiente para causar odor
desagradável e corrosão nos colectores e nas caixas de visita, principalmente em zonas
de elevada turbulência. Esta expressão, no entanto, apenas permite avaliar, de forma
qualitativa, as condições de formação de sulfuretos no trecho em análise e não tem em
conta o efeito, que é relevante, do tempo de retenção. Em situações de projecto
especialmente críticas ou que requeiram um maior rigor, torna-se recomendável a
aplicação das expressões (8.12) a (8.14), tal como se elucida no exemplo de cálculo 3.
EXEMPLO DE CÁLCULO 3
Dados de base
- Diâmetro do colector: D = 400 mm
- Extensão: 3600 m
- pH: pH = 7
Cálculos hidráulicos
263
- Caudal escoado a secção cheia (Qsc):
Cálculo sanitário
Ct = - L m J0,375 / (3600 dm v0,625)
Slim = M/m CBO5 1,07(T-20) (JV)-0,375 (P/b)
Sj = Slim - (Slim - Sm) exp (Ct)
Admite-se a hipótese moderadamente conservadora para as constantes empíricas M e m,
ou seja,
264
Comentários
Neste exemplo de cálculo são obtidos os seguintes valores: concentração de sulfuretos
totais - 1,1 mg/l, concentração de sulfureto de hidrogénio em solução - 0,5 mg/l,
concentração de gás sulfídrico no ar - 24 p.p.m..
Embora não seja de esperar ataque significativo do colector devido a corrosão (e que
pode ser quantificada aplicando a expressão (8.17)), a concentração prevista de gás
sulfídrico no ar é muito superior ao limite de percepção, podendo produzir efeitos
tóxicos (dores de cabeça, náuseas, irritação da vista, nariz e garganta) quando ocorra
exposição humana prolongada. Nestas circunstâncias, deve ser evitada a entrada no
sistema de pessoal sem protecções especiais, nomeadamente máscaras apropriadas.
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265
266