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8 EVANGELHOS
E ATOS
LIVRO DIDÁTICO
FACULDADE
CRISTÃ DE CURITIBA
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
1. A PALESTINA DO SÉCULO I a.C.
1.1. Contexto político e social do Novo Testamento
1.1.1. Antecedentes do século I d.C.
1.1.1.1. Período Grego
1.1.1.2. Os Macabeus
1.1.1.3. Período Romano
1.1.2. O século I d.C.
1.1.2.1. A política romana da Judeia
1.1.2.2. Aspectos Econômicos
1.1.2.2.1. A pirâmide social
1.1.2.3. Aspectos do Mundo Religioso
1.1.2.4. Filosofias greco-romanas
1.2. As Instituições religiosas e os partidos político-religiosos
1.2.1. O Templo
1.2.2. A sinagoga
1.2.3. O Sinédrio
1.2.4. Fariseus
1.2.5. Saduceus
1.2.6. Zelotes
1.2.7. Essênios
1.2.8. Samaritanos
1.3. EVANGELHOS: QUESTÕES INTRODUTÓRIAS
1.3.1. Conceito teológico
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SUMÁRIO
1.3.3. A Crítica das Formas
1.3.1. Categorias ou Gêneros
1.4. A QUESTÃO DOS EVANGELHOS SINÓTICOS
1.4.1. A Crítica das Fontes
1.4.2. As semelhanças nos Sinóticos
1.4.3. As diferenças nos Sinóticos
1.4.4. Inventário
1.4.5. A Crítica dos Evangelhos
1.4.5.1. Hipóteses de origem dos Evangelhos canônicos
1.4.5.2. Hipótese baseada na prioridade de Marcos
1.4.5.3. A Crítica da Redação
1.4.5.3.1. Propósitos da Crítica da Redação
1.4.5.3.2. Principais Características
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SUMÁRIO
2.3. Questões Teológicas
2.3.1. Jesus é o Messias, o Cristo
2.3.1.1. Jesus: Messias investido com poder
2.3.1.2. O segredo messiânico
2.3.2. Jesus é o Filho do Homem
2.3.3. Jesus é o Filho de Deus
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SUMÁRIO
3.3.3. Escatologia
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SUMÁRIO
4.4.1.2. Data
4.4.1.3. Lugar de Composição
4.4.1.4. Propósito
4.5. Questões Literárias
4.5.2.1. Crítica Textual
4.5.2.2. Linguagem e Estilo
4.5.2.3. Estrutura Literária
4.5.3. Questões Teológicas
4.5.3.1. A importância da ressurreição de Cristo
4.5.3.2. O Espírito Santo
4.5.3.3. A universalidade da salvação
4.5.3.4. Os marginalizados
4.5.3.5. A Igreja
4.5.3.6. A importância da oração
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SUMÁRIO
5.2.3. Estrutura Literária
5.3. Questões Teológicas
5.3.1. Deus
5.3.2. Jesus
5.3.3. Espírito Santo
5.3.4. Espírito Santo: fonte da vida eterna e princípio de
adoração ao Pai
5.3.5. O universalismo da salvação
5.3.6. A eficácia da oração
5.3.7. Perseverança final e ressurreição futura
5.3.8. O dualismo Joanino
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Lucas é o pesquisador dos fatos. Este Evangelho é o mais longo dos quatro.
Porém, é apenas a metade da grande obra lucana, uma vez que
originalmente estava unido aos Atos como a primeira parte de uma obra
em dois volumes, cuja extensão é maior que um quarto de todo O Novo
Testamento. Uma narrativa magnífica que conjuga a história de Jesus com
a da Igreja dos primórdios. Lucas se distancia de Marcos mais do que
Mateus, e podemos dizer que teologicamente está a meio caminho entre
Marcos-Mateus e João. Certamente, ainda que todos os evangelistas sejam
teólogos, o número de obras sobre a teologia de Lucas é surpreendente
(BROWN, 2002, p. 311).
4.1.1. AUTORIA
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A tradição, desde Marcião e Irineu, no século II, identificou esse Lucas com
o companheiro de Paulo, médico, aquele de quem falam as cartas de Paulo
(Cl 4.14; Fm 14; 2Tm 4.11), e até o século XIX não se duvidou dessa
identificação. Irineu afirma que “Lucas, o companheiro de Paulo, registra
em um livro o Evangelho pregado por ele”. Do mesmo modo, os
testemunhos de Orígenes, Eusébio, Atanásio, Gregório de Nazianzo,
“A ligação de Jerônimo, e outros condizem com isso (BERKHOF, 2014, p. 79).
Lucas com Paulo Ainda hoje prevalece a ideia de que o autor se chamava Lucas, pois este
parece ter sido nome nunca foi discutido na tradição; além disso, não pode ser
pseudoepígrafe, porque, neste caso, seria mais sensato atribuir a obra a
tão forte que o um personagem de maior relevância, como Pedro, Paulo, ou outro nome de
testemunho maior destaque na Igreja Primitiva. De mesma forma, se aceita que o
autor não foi uma testemunha direta de Jesus (Lc 1-4), mas um cristão da
antigo chega a segunda geração cristã; pessoa culta, familiarizada com a cultura helenista
afirmar que “A e veterotestamentária, possivelmente nascida fora da Palestina e de
compilação de origem gentílica, relacionada com as igrejas paulinas, para as quais
escreve (MONASTERIO; CARMONA, 1991, p. 434).
Lucas é
frequentemente Estimado aluno, o único conhecimento que temos sobre Lucas deriva de
algumas passagens nas epístolas paulinas (cf. acima). Das duas primeiras
atribuída à passagens (Cl 4.14; Fm 14) resulta o seguinte: em primeiro lugar podemos
Paulo.” afirmar que Lucas foi um dos colaboradores de Paulo no trabalho
missionário entre os gentios; em segundo lugar, uma vez que em Cl 4.10s
Paulo destaca os colaboradores da circuncisão de forma específica, sem
arrolar Lucas entre eles, podemos ter certeza de que ele era um gentio
cristão; do título de médico (Cl 4.14) podemos inferir que ele era
cientificamente instruído. A partir do texto de 2Tm 4.11 descobrimos que
Lucas esteve com Paulo enquanto ele estava preso em Roma pela segunda
vez (por volta do ano 66) (RIENECKER, F. O, 2005, p. 11). As três vezes em
que Lucas é mencionado, Marcos também aparece, o que nos leva a crer
que os dois evangelistas se conheciam muito bem.
A ligação de Lucas com Paulo parece ter sido tão forte que o testemunho
antigo chega a afirmar que “A compilação de Lucas é frequentemente
atribuída à Paulo. E de fato é comum um discípulo publicar o trabalho de
seu mestre” (Tertuliano); e ainda “Lucas registrou certa quantidade de
coisas em seu Evangelho à medida que teve certeza delas através de seu
conhecimento e familiaridade profundos com Paulo, e sua ligação com
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outros apóstolos” (Eusébio). Por fim, vale mencionar que Atanásio afirmou
que o Evangelho Segundo Lucas foi ditado pelo apóstolo Paulo (BERKHOF,
2014, p. 80).
4.1.2. DATA
Vamos agora conhecer a data em que foi escrito o Evangelho Segundo
Lucas.
Se o Livro de Atos dos Apóstolos foi escrito por volta do final do primeiro
cativeiro de Paulo 62-63, o Evangelho deve ser situado antes disso. Se
Lucas depende de Marcos, deve ser situado depois da redação deste. Desse
modo, a redação do Evangelho Segundo Lucas deve ficar situada depois do
Evangelho Segundo Marcos e antes de Atos dos Apóstolos. É possível que,
durante os anos de prisão de Paulo em Cesareia, Lucas tenha realizado
suas investigações intensivas. Essa prisão pode ser datada para os anos 57-
59. Portanto, a redação deste Evangelho deve ter acontecido ou durante
esse período ou logo depois (BERKHOF, 2014, p. 80).
4.1.4. PROPÓSITO
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Note ainda que Lucas escreve primordialmente para que Teófilo tenha um
conhecimento mais completo e satisfatório a respeito de Jesus Cristo.
Pode ser que o destinatário tivesse recebido informações rudimentares e
Lucas pensava que fossem necessárias mais instruções, ou possivelmente o
próprio Teófilo tenha pedido ao evangelista para lhe fornecer um relato
mais adequado. Contudo, não resta dúvida de que Lucas tinha em mente
uma audiência mais numerosa que um único e “excelentíssimo” indagador.
Pode ser que o evangelista tenha percebido que a Igreja, como um todo,
precisava de um Evangelho mais completo do que aquele que existia na
ocasião (EARLE; SANNER; CHILDERS, 2015, p. 350).
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especialmente pelo î , todos eles do século III. Além
disso, ele também consta nos grandes manuscritos do
século IV, Sinaítico (¥) e Vaticano (B); é um texto que
possivelmente remonta ao século II. O texto ocidental,
contido no Codex Bezae Cantabrigiensis (D), do século V,
e na Vetus Latina, do século II/IV, oferece um texto
caracterizado por adições, omissões e trocas que
explicam o texto, suavizam-no ou harmonizam-no com os
outros sinóticos e às vezes lhe dão um caráter
antijudaico (CARSON; MOO, D. J.; MORRIS, 1997, p. 135).
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Apesar de todas essas considerações não existem motivos para duvidar que
nós possuímos o texto de Lucas substancialmente como foi escrito
(CARSON; MOO, D. J.; MORRIS, 1997, p. 137).
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1.1-4 Prólogo
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I. Prólogo 1.1-4.
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Ao ler o Evangelho Segundo Lucas, você irá perceber que, ele se empenha
em narrar a história de Jesus na perspectiva de uma história da salvação
(Heilsgeschichte), e esta história é vista em três etapas: 1) o período de
Israel (16.16) – preparação; 2) o período do ministério de Jesus (4.16ss: At
10.38) – acontecimento; 3) o período desde a ascensão, ou seja, o período
da igreja – realização (MORRIS, 1983, p. 30, 31.). Há uma única história de
salvação em contínuo, está presente na vida, morte e ressurreição de
Jesus e nas diferentes economias de Deus. Assim, para Lucas, a Igreja
constitui o prolongamento da história da salvação.
“Há uma única
história de 4.3.1. A SALVAÇÃO
salvação em
contínuo, está A obra de Conzelmann resume admiravelmente em seu título a posição do
presente na vida, autor – O Centro do Tempo (Die Mitte der Zeit). Ele sustenta que Lucas vê
Jesus como totalmente central, e que escreve seu Evangelho baseado
morte e nesta convicção (MORRIS, 1983, p. 31).
ressurreição de
Jesus e nas Caro aluno, é por esse motivo que Lucas é chamado de “teólogo da
salvação”. Ele tem muito a dizer sobre a história da salvação
diferentes (Heilsgeschichte) (MORRIS, 1983, p. 33). Relacionando a salvação e os
economias de eventos históricos, Lucas traz à tona uma ideia nova sobre a teologia da
Deus. Assim, para salvação: a salvação divina manifestada na vida, morte, ressurreição e
ascensão de Jesus são perpetuadas na vida diária da Igreja. Deus se faz
Lucas, a Igreja presente na vida humana agindo em tudo o que Jesus disse e fez (cf. 2.1-
constitui o 2; 3.1) (MARCONCINI, 2012, p. 161).
prolongamento da
A libertação de toda a forma de mal, especialmente do pecado e da
história da perdição eterna e uma relação de amizade e comunhão com Deus está
salvação.” presente na forma como Lucas utiliza o termo “salvar” (sozêin) 17 vezes
no Evangelho e 13 vezes nos Atos dos Apóstolos (ZUCK, 2010, p. 130).
Outras variantes da palavra “salvar” aparecem em Lucas-Atos: “salvador”
(sóter), 4 vezes, e “salvação” (sotería ou sotérion), 13 vezes. Estas
citações revelam claramente a intenção do autor (MARCONCINI, 2012, p.
161).
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Se os sistemas humanos de salvação são parciais, uma vez que não cobrem
todas as necessidades do homem, com frequência marginalizam aqueles
que não têm meios salvadores (dinheiro, poder, prestígio), com o que
produzem dor; pelo contrário, a salvação que Jesus nos oferece é total,
pois cobre todas as necessidades do ser humano, e chega a todos, embora
privilegiando os marginalizados e, por isso, é motivo de alegria. É,
portanto, universal por seu conteúdo e por seus destinatários
(MONASTERIO; CARMONA, 1991, p. 422, 423).
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Ao ler o Evangelho Segundo Lucas, note que ele tem mais a dizer acerca
do Espírito Santo no seu Evangelho do que qualquer um dos demais
evangelistas. Isto forma um vínculo de continuidade. Tanto no ministério
de Jesus quanto na vida da Igreja Primitiva, o Espírito de Deus está
operante (MORRIS, 1983, p. 45).
4.3.5. A ORAÇÃO
Se no ensino acerca do Espírito Santo Lucas nos mostra que Deus leva a
efeito o Seu propósito; esta operação exige uma atitude da parte do povo
de Deus (MORRIS, 1983, p. 45). Dessa forma, no Terceiro Evangelho
encontramos o verbo “orar” até 19 vezes (1.10; 3.21; 5.16; 6.12,28;
9.18,28-29; 11.1,1,2; 18.1,10,11; 20.47; 22.40,41,44,46).
Lucas revela Jesus como “um homem de oração”, através da qual cultiva a
intimidade com o Pai. Ora no momento de seu batismo (3.21); durante seu
ministério (5.16); para escolha dos Doze (6.12); para multiplicação dos
pães (9.16); antes da confissão messiânica de Pedro (9.18); durante a
transfiguração (9.28); durante a dolorosa agonia no Getsêmani (22.39-44);
e finalmente durante as horas em que esteve pendurado na cruz (23.34,
46) (ALDAY, 2009, p. 36).
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Nesse Evangelho, você ainda pode observar que os pobres não são
espiritualizados, como em Mateus. São carentes economicamente,
marginalizados e excluídos socialmente. Não têm relevância na sociedade.
O contraste entre “ricos” e “pobres” transcende as dimensões
socioeconômicas.
Desta forma caro aluno, fica evidenciado que Lucas escreveu com um
propósito profundamente teológico. O evangelista consegue enxergar Deus
operando para trazer a salvação e tem prazer em ressaltar uma variedade
dos aspectos desta grande e universal obra salvífica (MORRIS, 1983, p. 45).
Nesse tópico iremos conhecer um pouco mais sobre o Livro de Atos dos
Apóstolos, te convido outra vez, a ler e a estudar atentamente esse livro e
aumentar os seus conhecimentos.
Certo estudioso afirmou que é muito estranho ler um livro que traz em seu
encerramento um advérbio. É o que ocorre com o Livro de Atos que, em
grego, encerra-se com akolytos (avkwlu,twj), um advérbio que pode ser
traduzido por “desimpedido” ou “desimpedidamente”. Segundo este
mesmo estudioso, parece ser essa a ideia central do segundo volume da
obra de Lucas, mostrar que o evangelho alcançou a liberdade, mesmo a
muito custo (STAGG, 1994, p. 15).
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4.4.1.1. AUTORIA
É importante ressaltar que você, estudante, está diante de duas obras com
uma mesma autoria, tanto Lucas quanto Atos são anônimos, no sentido
estrito da palavra. Usando como ponto de partida o prefácio de Lucas, com
o qual o autor provavelmente pretendeu introduzir tanto seu Evangelho
como Atos, você pode concluir que o autor foi uma pessoa de boa cultura.
O grego de Lucas 1.1-4, como visto é grego literário de bom nível. Disso
resulta que não deve ter sido um dos apóstolos ou discípulos originais de
Cristo – o próprio autor escreve das coisas que “nos transmitiram os que
desde o princípio foram deles testemunhas oculares e ministros da
palavra” – mas mesmo assim pode ser alguém que participou de alguns dos
eventos que narra – “fatos que entre nós se realizaram”. Perceba, caro
aluno, que o autor tem conhecimento do Antigo Testamento na versão dos
LXX, além de possuir um ótimo conhecimento das condições políticas e
sociais vigentes em meados do século I e tem o apóstolo Paulo em alta
estima (CARSON; MOO; MORRIS, 1997, pp. 208, 209).
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Outra inferência bastante comum sobre o autor, que você pode observar,
procede dos trechos que empregam o pronome “nós” em Atos. São quatro
trechos em que o autor passa da narrativa na terceira pessoa “eles” para
uma narrativa na primeira pessoa do plural (16.8-10 é a primeira delas).
Ademais, parece que o autor acompanhou Paulo até Roma e
provavelmente esteve com o apóstolo durante os dois anos em que este
esteve sob prisão domiciliar em Roma (CARSON; MOO; MORRIS, 1997, p.
209).
Desde o segundo século afirma-se que Lucas, o médico amado (Cl 1.14)
também foi o autor de Atos. O prólogo antimarcionista de Lucas (160-180
d.C.) identifica o autor do Evangelho como sendo Lucas, uma pessoa de
Antioquia da Síria, e médico de profissão. Além do que, estimado aluno,
adiciona que “o mesmo Lucas posteriormente escreveu os Atos dos
Apóstolos”. Do mesmo modo, o Cânon Muratori (170 d.C.) afirma que
“Lucas compilou para 'o mui excelente Teófilo' aquelas coisas que se deram
em detalhe em sua presença”. Tanto Ireneu quanto Clemente de
Alexandria, de modo explícito, admitem Lucas como o autor de Atos
(STAGG, 1994, p. 33).
Assim sendo, não existe motivo algum para negar que o autor de Atos foi
um companheiro de Paulo; de igual modo o testemunho da Igreja antiga
deveria ser suficiente para continuarmos afirmando a autoria lucana.
4.4.1.2. DATA
4.4.1.4. PROPÓSITO
É preciso admitir que, por vezes, uma obra pode abarcar uma diversidade
de propósitos. Atos talvez seja o melhor exemplo desta afirmação em O
Novo Testamento. Com certeza, caro aluno, isso depende muito das
pressuposições do leitor que, muitas vezes, podem extrapolar a intenção
do autor. Assim é necessário tomar cuidado com isso. Os leitores em geral
enxergam em Atos o livro da história da Igreja Primitiva. Tenha em mente
novamente que se trata da segunda parte de uma obra em dois volumes, e
que, os propósitos de ambas podem estar interligados. Na realidade, os
estudiosos têm enfatizado, em geral, os seguintes propósitos: apologético,
teológico, didático, história dos começos do cristianismo, confirmação do
Evangelho e foco na salvação. Veja cada um desses propósitos ainda que
de forma resumida.
8.9-24 Lidou com Simão, um ilusionista. 13.6-11 Lidou com Bar-Jesus, um feiticeiro.
9.36-41 Trouxe Dorcas de volta à vida. 20.9-12 Trouxe Êutico de volta à vida.
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PRAXEIS ¥ 1175 pc
PRAXEIS APOSTOLWN B Y pc
PRAXIS APOSTOLWN D
ai praxeij twn apostolwn 323 .945 al
s
Estimado estudante, ainda que o título não seja preciso, uma vez que o
livro se concentra nas atividades de apenas dois dentre treze indivíduos
reconhecidos como apóstolos, Pedro e Paulo, e dedica porções
consideráveis a não apóstolos, como Estêvão e Filipe, o título é
perfeitamente aceitável, visto que os apóstolos foram os instrumentos
através dos quais Jesus Cristo deu prosseguimento na difusão da mensagem
do Reino de Deus (PINTO, 2008, p. 179).
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III), î (s. VII) e pelos manuscritos Sinaítico (¥), Vaticano (B), Alexandrino
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Cantabrigiensis (D), além da Vetus Latina (s. II/IV). Possui um texto quase
1/10 mais amplo que o anterior, com aproximadamente 400 adições nas
quais atenua as dificuldades, corrige as inexatidões, oferece detalhes
pitorescos, inclusive textos litúrgicos. A linguagem, por vezes, é vulgar e
“A linguagem, por possui diversos semitismos; as citações bíblicas são tomadas de um texto
vezes, é vulgar e bastante diferente da LXX; teologicamente ressalta as figuras de Pedro e
possui diversos Paulo e, pelo contrário, apresenta de forma negativa o povo judeu. É um
texto bem difundido tanto no oriente quanto no ocidente, remonta a
semitismos; as meados do século II e parece ser tão antigo como o anterior. Hoje em dia,
citações bíblicas as edições críticas dos manuais reproduzem o texto alexandrino e
são tomadas de suprimem como não autênticos 8.37; 15.34; 24.6b-8a; 28.29 (MONASTERIO;
um texto CARMONA, 1991, pp. 283, 284).
bastante
diferente da LXX; 4.4.2.2. LINGUAGEM E ESTILO
teologicamente
ressalta as figuras Ao que já foi dito com relação à linguagem e estilo do Evangelho Segundo
de Pedro e Paulo Lucas, que também se aplica a Atos, ainda se pode acrescentar as
e, pelo contrário, seguintes informações. A obra de Atos emprega 2.036 palavras de um total
apresenta de de 18.374 usos, das quais 942 são hápax legomena; a proporção entre
forma negativa o vocabulário e total dos usos é de 9,01, quase igual à do Evangelho, uma
povo judeu. É um boa proporção numa obra literária (MONASTERIO; CARMONA, 1991, p. 289).
texto bem
difundido tanto Você pode observar que as metáforas são frequentes, o estilo direto, os
no oriente quanto discursos, os sumários e os coros. O texto oferece elementos psicológicos
no ocidente, que evocam com maestria a presença do divino: além da apresentação da
remonta a transfiguração de Jesus (9.28), o rosto de Estêvão parece o de um anjo ao
meados do século ver a glória de Jesus (At 6.15, 56). Quanto à composição mesma, caro
estudante, ele une os materiais estreitamente, formando um todo
II e parece ser coerente, mas evita formar blocos ininterruptos e demasiado grandes, cuja
tão antigo como o leitura cansaria o leitor. Com objetivo de apresentar a sua história como
anterior.” plano salvador de Deus, ele une acontecimentos com as categorias de
promessa (anúncio, pregação, projeto) e cumprimento (cf. citações do
Antigo Testamento) (At 2.17-21) (MONASTERIO; CARMONA, 1991, p. 292).
Você pode notar que, até o final da obra, o texto está muito bem travado
por uma sequência geográfica sem solução de continuidade, na qual os
acontecimentos vão sendo entrelaçados a partir da atividade missionária
do apóstolo Paulo, livre, até a sua chegada em Roma, aprisionado
(MONASTERIO; CARMONA, 1991 p. 298).
Ainda pensando que Lucas serviu a Paulo como seu fiel companheiro, seus
escritos parecem não ser dependentes das epístolas que o apóstolo enviou
para várias igrejas e pessoas. Quando Lucas escreveu Atos, Paulo já havia
escrito muitas de suas cartas. Contudo, em Atos, o propósito de Lucas
parece ser escrever tanto como historiador quanto como teólogo.
Encontramos diversos aspectos da teologia que podemos dizer ser
propriamente lucana (KISTEMAKER, 2001, p. 25).
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Você pode perceber que a vida da Igreja foi dirigida por Deus em
etapas cruciais. Às vezes o Espírito dirigia a Igreja naquilo
que deveria fazer (13.2; 15.28; 16.16). Em outras ocasiões,
anjos falavam a missionários cristãos (5.19-20; 8.26; 27.23),
ou vieram mensagens através dos profetas (11.28; 20.11-12).
Em algumas ocasiões, o próprio Senhor aparecia aos Seus
servos (18.9; 23.11) (MARSHAL, 1991., p. 23).
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O Evangelho pregado trata do que Jesus fez e ensinou até sua morte. Atos
mostra o Cristo ressuscitado, vivo e ativo como o Senhor que salva e doa o
Espírito Santo aos crentes. Note que o conceito que Lucas tem da história
da salvação (Heilsgeschichte) não cessa na ascensão de Cristo. Os judeus
têm um lugar especial da dispensação divina, e até ao fim é “a esperança
de Israel” que os pregadores do evangelho proclamam (At 28.20). Mas a
recusa deles importou em a Igreja ficar predominantemente gentia (At
13.36ss). Tiago especificamente inclui os gentios em “um povo para o seu
nome” (At 15.14). O Evangelho é oferecido gratuitamente a todos os
homens, mas eles têm uma responsabilidade no sentido de se
arrependerem, e serão julgados no devido tempo (At 17.30-31) (MORRIS,
1983, p. 34, 35).
4.4.3.4. OS MARGINALIZADOS
Lucas menciona diversas mulheres nos Atos dos Apóstolos. Elas até lideram
comunidades cheias da força do Espírito. Além de Maria, a mãe de Jesus,
Safira foi a primeira mulher citada como membro efetivo e participante
nas decisões da comunidade. Ela se solidarizou com a comunidade ao
consentir em vender bens e colocá-los a serviço da comunidade. Lucas
ressalta que o pecado de Safira não foi o mesmo do seu marido Ananias.
Ela pecou pelo fato de não ter reagido em público, na assembleia, ao
sistema que regia o casamento patriarcal, segundo o qual era muito difícil
a mulher reagir de modo diferente do modo do marido. Safira acabou
sendo conivente e coautora da traição feita à comunidade e consequente
traição ao Espírito Santo (MORRIS, 1983, p. 39, 40).
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MÓDULO 08
EVANGELHOS CAPÍTULO 4
E ATOS
O EVANGELHO SEGUNDO
LUCAS E ATOS DOS APÓSTOLOS
4.4.3.5. A IGREJA
Segundo os Atos dos Apóstolos, uma das colunas mestras que sustentava a
vida das primeiras comunidades cristãs era a oração. Oravam juntos
(12.12) e cultivavam um novo ambiente na vida em comum. Perseveravam
na oração (1.14; 2.42; 6.4; 10.2) nas casas, no Templo (3.1), às margens do
rio (16.13), na praia (21.5) etc. Pela oração criava-se intimidade com o
Espírito Santo (4.31; 8.15; 10.30; 22.17) e consagravam-se líderes na
comunidade a serviço da Palavra e da assistência social (6.6; 9.11). Os
visitantes também entravam no clima da oração (16.13). Pela oração, os
seguidores de Jesus permaneciam unidos entre si e a Deus (5.12b),
fortaleciam-se nas tribulações (4.23-31) e faziam discernimento crítico e
criativo (1.24; 13.3).
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CRISTÃ DE CURITIBA
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