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Introdução
O presente trabalho faz a articulação da pesquisa da autora e o sexto
capítulo do livro dos autores Renfrew e Bahn (2020), com foco nas relações entre
o meio ambiente e os abrigos que são temas da referida pesquisa.
A pesquisa aborda o uso pré-colonial e histórico de abrigos rochosos
cristalinos existentes em ambientes costeiros e serranos no litoral do Paraná.
Observando os processos geológicos e formativos associados e os tipos de
ocorrências arqueológicas identificadas até o momento.
Para este estudo, foram levantadas bibliografias arqueológicas,
geomorfológicas e espeleológicas destinada a compreensão da gênese das
cavidades cristalinas e a formação dos depósitos arqueológicos. Também foram
realizados trabalhos de campo visando o levantamento topográfico preliminar e
estudos geoarqueológico dos abrigos e entorno.
O abrigo Gamelas II apresenta vestígios conchíferos, ósseos, líticos e
cerâmicas históricas em superfície. Na superfície do Abrigo do Cubatão foram
registradas cerâmicas pré-coloniais e material lítico.
O Abrigo do Cubatão é formado por dois grandes matacões sobrepostos
que formam a área abrigada com dimensões aproximadas de 12 a 5 metros e 1
a 5 metros de altura. Por sua vez, os abrigos Ilha Gamelas I, II e III localizados
na ilha homônima em Guaraqueçaba, situam-se a leste da ilha, entre 6 e 35 m
da linha de costa, próximos a enseadas e costões de rochas gnáissico-
migmatiticas. Suas áreas internas variam de 3,7 a 3,5m a 13 x 6m, e altura de 1
a 6 metros. As cavidades são formadas por matacões de aspecto tabular
empilhados e próximos a nascentes.
Cronologia
A cronologia não é somente a obtenção de uma data, são as
interpretações e como essas se relacionam com as mudanças e o contexto
arqueológico, que permitem ordenar os acontecimentos que afetaram o sítio.
Os métodos de datação relativas, permitem essa ordenação sem
qualquer medida entre eles, podem ser de ordem geológica como a estratigrafia
ou a bioestratigrafia. Também de ordem arqueológica como a seriação.
A datação absoluta é a que permite obter uma idade numérica ou um
intervalo cronológico. Podem ser de ordem biológica como a dendrocronologia
ou radiométrica, como o radiocarbono entre outros.
A estratigrafia é o estudo das rochas estratificadas, suas relações e
interpretações e tem como princípios fundamentais sendo esses a Leis da
superposição, formulada por Nicholas Steno (Copenhagem,1638 –
Achewerin,1686) e a Lei da Horizontalidade Original. Estuda como foi o processo
de deposição das camadas. A Estratigrafia Clássica não estuda como se deu a
deposição e sim como se depositaram, ou seja, analisa apenas as sequências
deposicionais. Já a Estratigrafia de Sequencias, tem interesse em saber como a
camada foi formada, seja clima, sedimentação, tectônica.... Procura entender a
sequência e o mecanismo que originou a sequência.
Renfrew e Bahn (2020), citam os processos sedimentares que estão
relacionados às mudanças relativas do nível do mar, como a Eustasia que ocorre
em nível global e pode ser analisada através dos Ciclos de Milankovitch, sendo
uma datação absoluta; a Isostasia, que é espacialmente variável, pode ser
determinada através das análises de geodos e é uma datação relativa e o
tectonismo.
Os estudos para compreender e datar a estratigrafia são a
litoestratigrafia- descreve as camadas; cronoestratigrafia- data as camadas e a
bioestratigrafia- estudada pelos paleontólogos e aplicada apenas a rochas
sedimentares.
A dendrocronologia é o método que baseado no crescimento das árvores
e pode ser aplicado a madeiras carbonizadas. Contando os anéis das árvores
podemos saber a sua idade e a partir da análise dos anéis das árvores é possível
obter dados como épocas de estiagem ou de muita chuva, incêndios florestais,
entre outros. Os anéis ficam mais finos à medida que a árvore envelhece. Esse
método pode ser utilizado com segurança para datações de até 13.900 cal B.P
(Before Presente)
Outros métodos citados pelos autores é varvecronologia que se dedica
a análise da linha de sedimentos em lagos e lagoas, é possível usá-lo até 45.000
anos BP. A liqueometria, datação baseada nos líquens, útil em construções
históricas, pode-se datar a quanto tempo está no local e pode datar até 9.000
anos.
Outras datações possíveis são a tefrocronologia, datação baseada m
cinza vulcânica. Cada erupção produz uma determinada cinza que é possível
referenciar na estratigrafia ou pelo método potássio- argônio (40k- Ar40). A
datação por aminoácidos, enquanto o aminoácido está no corpo vivo está virado
para a direita, quando o corpo morre vira para a esquerda, se trata de uma
datação difícil pois depende do PH da pele e entre outros fatores.
O paleomagnetismo, se trata de diferentes escalas de tempo, como os
geológicos e arqueológicos. As variações seculares são as que interessam
particularmente para a arqueologia. Quando uma rocha entra em contato com o
fogo os elementos magnéticos se soltam e se alinham com o N magnético
daquele momento. É aplicado as cerâmicas e sedimentos que foram expostos a
temperatura acima de 600 ° C, sendo às vezes possível utilizar nos sedimentos
que contenham ferro e foram aquecidas acima de 400° C. Nesse contexto não é
possível datar as argilas de são de um lugar e foram levadas para outro, pois
não temos como determinar a relação com o campo magnético. É um método de
análise regional, com as curvas de datação válidas em raios de 1.000 km.
Os métodos radiométricos utilizam a medida da radioatividade. Dentre
eles citarei os métodos radioisotópicos, baseado no decaimento radioativo. O
decaimento radioativo é a mudança na estrutura atômica para alcançar a
estabilidade. Se soubermos o tempo do decaimento podemos medir o tempo que
levou para o elemento se transformar em outro, como o tempo em que o Urano
levou para se transformar em Tório, esse método é conhecido como Urano-Tório.
Existem três tipos de decaimento: o Alpha, facilmente declinável e não oferece
riscos aos seres vivos; o Beta no qual o átomo perde uma carga negativa, o
número atômico aumenta, queima a pele, mas não prejudica os órgãos internos
e o decaimento por captura eletrônica, no qual o próton captura um elétron, a fim
de adquirir estabilidade, o número atômico diminui com isso libera energia e
emite radiação. Como não tem massa e tem muita velocidade penetra em tudo,
sendo muito prejudicial aos seres vivos, só sendo barrado pelo concreto ou pelo
chumbo.
São essas as premissas da datação por Carbono 14, utilizado para
datações de 5.00 até 200 AP. As explosões atômicas ocorridas a partir dos anos
50 do século XX, impossibilitaram a utilização do método em datação
posteriores, pois despejaram muita radioatividade na atmosfera. Além da
radiação por explosões atômicas, o homem ainda interfere no método emitindo
radiação através de produtos manufaturados, raios da televisão, relógio
luminosos que usam Trítrio, camisinha de lampião (Tório), tabaco (Polônio- 210),
cerâmicas, etc.
A datação por Carbono 14, também um método radioativo. Por ser
instável o C14 é absorvido pelas plantas e animais. Quando esses morrem
deixam de absorver e começam gradualmente a perder o C14 que se transforma
em Hidrogênio pela radiação Beta até que em 5.730 anos (+- 40 anos) metade
do C14 é perdido. Se soubermos qual a quantidade de C14 havia na atmosfera
na época da morte do ser vivo e quanto tem atualmente, podemos saber quando
morreu.
Os autores explicam como as modificações no entorno afetam os sítios
e a como é possível utilização de cronologias a partir dessas modificações.
O Ambiente Vegetal
As plantas refletem as mudanças climáticas com rapidez. Reconstruir o
ambiente pretérito no qual estão localizados os abrigos, nos ajuda a
compreender qual era a paisagem que os antigos habitantes encontravam,
consequentemente, qual eram os recursos vegetais e animais e minerais a sua
disposição. As plantas estão na base da cadeia alimentar e os recursos
disponíveis podem atrair ou afastar os animais e consequentemente os humanos
que deles dependem para viver.
Nos Abrigos da Ilha das Gamelas, essas mudanças podem estar
relacionadas com o nível do mar e mudanças climáticas. Já no Abrigo do
Cubatão as mudanças climáticas certamente impactaram seu uso pelos antigos
moradores, como vimos na questão dos paleoníveis da Baía de Guaratuba.
Atualmente a maior perturbação vem das lavouras de bananas.
Através da coleta de amostras de solo para a análise de fitólitos e
palinologia nos abrigos estudados poderemos averiguar as mudanças ocorridas
na vegetação local.
Restos de animais.
O Abrigo Gamelas II, apresenta em seu interior restos conchíferos que
serão analisados para saber qual a sua procedência. A importância dessa
análise está em saber se os ocupantes se deslocavam até o abrigo para
processar as ostras colhidas em frente ao abrigo ou se existe alguma espécie
não endêmica que possa ter sido trazida para o lugar. Com essa análise
poderemos identificar se houve ou não deslocamento e qual o sentido dele.
Existe uma forte correspondência entre o método da ausência ou abundância
das conchas e os isótopos de oxigênio das conchas na identificação de
alterações climáticas.
Os restos de osso achados na superfície poderão indicar se são recentes
ou arqueológicos, quais as espécies e como eram utilizados. Da mesma forma
poderemos aferir se as espécies são endêmicas ou não. A microfauna pode nos
orientar em relação ao clima, aferindo em que camadas eram mais abundantes
e como isso indica as alterações climáticas. Assim como insetos que em geral
são abundantes em abrigos e muito sensíveis as alterações climáticas, podem
nos fornecer dados ambientais.
Os autores chamam atenção que os restos faunísticos em abrigo
próximos ao mar, sofrem alterações à medida que o nível do mar se altera.
Outras causas de alterações a concorrência por comida e por território,
epidemias e flutuações de predadores. (RENFREW E BAHN 2020).
A micromorfologia pode oferecer dados para a reconstrução da
paisagem humanas em determinadas áreas no abrigo, como a área de cozinhar,
fogueiras, de passagens e de descarte de resíduos. Além de ser utilizada na
arqueologia contextual, combinada com abordagens tradicionais do estudo dos
artefatos (RENFREW e BAHN, 2020, P.236).
As análises citadas pelos autores trazem um panorama muito claro da
importância de entender as modificações do entorno.
Incialmente a arqueologia analisava apenas os achados arqueológicos,
não os situando no contexto que estavam localizados. O processualismo procura
nas datações de C14, parâmetros científicos, mas se atém aos conceitos
evolucionistas. O pós-processualismo rejeita as interpretações funcionalistas e
reconhece a necessidade de interpretações mais amplas.
Atualmente o pilar da arqueologia é o contexto. Devemos ainda os
critérios de medição do tempo na arqueologia é diferente do tempo da sociedade
moderna. Sendo é importante observar que a margem de erro da cronologia dos
homíneos é diferente da cronologia ocidental.
Considerações finais
No andamento dos estudos do projeto de mestrado da autora, foram
realizados levantamentos que vêm permitindo compreender os processos
formadores das cavidades cristalinas no litoral paranaense, suas ocorrências e
potencial arqueológico associado. Embora em fase inicial, a pesquisa aponta
para a existência de dois contextos promissores: 1) no sistema de ilhas e morros,
geralmente associados a costões rochosos; 2) nas encostas da Serra do Mar,
junto a depósitos de tálus e leques aluvionares. Por fim, este estudo aponta para
a importância dos abrigos cristalinos na compreensão das dinâmicas
ocupacionais e de mobilidade de grupos humanos na costa, representando
formas de uso diferenciadas daquelas já amplamente reconhecidas no litoral
paranaense.
Já estavam previstos em projeto a análise de sedimentos, de fitólitos, de
palinologia, entre outros. O texto de Renfrew e Bahn (2020) trouxe mais
subsídios para outras análises ambientais que serão úteis para o entendimento
do entorno dos sítios.