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9 ESTRUTURAS NEURÓTICAS

J . R CHARTIER
-

NOÇÃ O DE NEUROSE
A neurose apareceu relativa mente tarde nas descrições clínicas e somente no lí m do século
passado. Essa entidade clínica apresentou bastantes dificuldades para ser isolada;
- das doen ças nervosas propriamente ditas (epilepsia, doença de Parkinson);
- da própria loucura, que em termos científicos chamamos de psicose,
A neurose adquiriu, em definitivo, sua carta de cidadania com a psicanálise.
.
Atualmente essa entidade ainda tem bastante dificuldade de recuperar uma definição,
tanto do pomo de vista teórico como do clínico; ela se viu mesmo descartada da nomenclatura
das doenças mentais do DSM ML
É verdade que toda definição da neurose é hipotecada por uma ambiguidade essencial;
-
fala se de uma neurose individual ou de uma neurose familiar ? Mossa opçã o se situa em uma
visão unitária da neurose. Os caminhos que nos permitir ão chegar a isso requerem, em um
primeiro momento, peto menos distingui-los .
Tudo se passaria, em suma. como se a neurose fosse antes de tudo individual, mas eia
poderia també m, por extensão, tomar uma forma familiar. Enfim, é evidente que unta neurose
individual assume uma conotação particular no quadro de urna neurose familiar.

Neurose individual
Ace/ía ção clássica da neurose ou
a neurose segundo a primeira tópica freudiana
Ela é fundada por inteiro no princípio do recalcamento hist érico. Assim, Freud, no caso
Elizabeth von Ritter, conta a história cie uma mulher que se surpreende em pensar que seu
cunhado estaria " livre" , após a morte de sua irmã. Esse pensamento insuport ável é recalcado
e não deixar á aparecer derivados sintomáticos a não ser depois da morte de sua irm ã. Freud os
decifrar á e permitir á a Elizabeth voltar at é a moção recalcada.
Disso decorre essa idéia simples, refer ência implícita maior da neurose; pelo fato da to -
mada de consciência permitir curar os sintomas , a neurose é o produto do recalcamento, uru
recalcamento que concerne essencialmente à sexualidade.
Na realidade , a situação jã não é t ão simples, pois essa concepção histérica utiliza, sem
prestar atenção e sem tirar consequências, o pano de Fundo edípiano e o desejo incestuoso.
Elizabeth n ão percebe somente um desejo sexual inconfessá vel, ela põe em ação nova
mente um cenário edipiano triangular que comporta um desejo incestuoso totalmente essen -
PSICUPATOIOçIA . 137

dal e que se arrisca a passar despercebido, “D incestuoso" representa um além do sexual que
apenas a segunda tópica freudiana pode apreender em toda a sua dimensão, de onde decorrem
as ilusões teóricas e terapêuticas da concepção hist é rica simplificada da primeira tópica.

Concepção contempor ânea da neurose ou a


neurose segundo a segunda tópica freudiana
Sua sintomatologia é bastante mais imprecisa, razão de uma dificuldade diagnóstica mui -
to grande. Estamos, em geral, em lace de um mal -estar em que se contundem avidez e frustra -
.
ção, at é o ponto em que em um primeiro momento, pelo menos, poder- se- ia considerar que a
neurose se caracieriza por uma vontade de recuperar a iodo preço as referências faltantes de
uma evolução libidinal bem conduzida.
Os a vaiares patológicos não seriam, nessa perspectiva, senão as vicissitudes inerentes ã
constituição dos destinos vitais.
Um primeiro ponto de refer ê ncia se esboça, entretanto, de maneira mais ou menos eviden -
te. mas sempre pcrceptivel: o caráter insaciá vel da demanda de uma avidez tal que nenhuma
.
" compensação" é jamais capaz de fazer tace a ela Essa busca insaciável pode assumir formas
.
extremamente variadas, tanto hist éricas comocaracteriais e at é mesmo paranoicas, pelo me -
nos. Ao contr ário, a depressão neurótica pode estar, em primeiro plano, escondendo mal uma
queixa raivosa, encerrada no "ou tudo ou nada ", ou ainda ocultada em uma onipoíência pas-
siva mais ou menos obsessiva c difícil de desalojar. Esse balizamento fundamental não deve
-
fazer esquecer a extensão da legitimidade reivindicativa, A renúncia peto "rtão ser" não é um
programa aceit ável no destino neur ótico. Pelo contrário, o levar em conta essa dupla polari -
dade permite considerar as car ências , e at é os traumas infantis, de maneira mais aberta, e re-
considerar, de outro ponto de vista , as causas infantis que supOStamente podem explicar tudo.
Assim, as consequências das frustrações infantis aparecem mais como faltas a elaborar, difi-
culdades em encaminhar um trabalho de luto, do que como fontes impenitentes e recalcadas.

Inconsciente da neurose
Ele obriga a reconsiderar sua lace existencial, frustração e avidez, mesmo se, à primeira
vista, sua base esiá em perda de refer ê ncia .
O Ego se torna parcial mente inconsciente, a erosização de um Superego sádico faz dele
um comparsa inoportuno e as for ças neuróticas não são mais somente o produto secundário
do recalcamento, mas est ã o simplesmente em contato direto com o id. em sua onipoíência
desordenada .
O balizamento da on!potência pulsional poderá ser descrito sob a forma de violência fun -
damental (Bergeret).
O balizamento da dependê ncia, ao mesmo tempo rejeitada e forçosa , mostra uma espécie
de atitude regressiva que alguns descreverão corno uma libido em busca de objeto íFairbairn,
1978) ,
Esses dois pontos de vista, que nos pareceram referenciar os movimentos essenciais da
avidez aparente, assumem uma forma particular no inconsciente .
.
Eles constituem inicialnientedois tipos de relação de objeto bem diferentes que como i- reud
parece antecipar, em seu artigo de 1914, "Sobre o narcisismo: uma introdução* * prefiguram uma
espécie de marca prévia á constituição triangular do Édipo. Mais , ainda , sua condensação con-
corre naturalmente para o desejo incestuoso: como, de fato, a criança, privada de argumentos
biol ógicos convincentes, teria a arrogâ ncia de se imiscuir na problemática dos desejos parentais?
138 JEAN BERBERE!

Seria necessária que ela tivesse razões sólidas, tais como a conjugação de uma onipot ência
pulsí onai sem limites e uma vontade excessiva de retomo a unia dependência de tipo fetal. 1
Assim, o desejo incestuoso fundador do Édipo ê o protótipo da neurose típica.

Forma çõ es incestuosas simbólicas


lá bastante complexa, a situação sc complica com frequência, na medida em que os deri -
vados incestuosos não são mais apenas elementos mai..s ou menos regressivos de um conflito
.
edipiano mal -engajado, pouco conRitmado apenas ou nada elaborado, mas fenômenos ativos
oriundos do inconsciente dos pais e que produzem o que poderemos chamar de “ formações in-
cestuosas simbólicas", que lixam os processos de identilicaçáo em sistemas de repetição niais
ou menos inextricáveis.
Vê-se como já estamos, por inteiro, em uma situação de neurose familiar que, definitiva -
munte, n ão é senão um caso particular de neurose, mas um caso particular que conduz ornais
das vexes aos estados neur ó ticos mais patol ógicos, e at é mesmo al ém. em direção aos estados -
limítrofes e mesmo à psicose.

Neurose familiar
Poder - se- ia dizer que, por definição, há neurose familiar quando o desejo incestuoso da
crianç a é retomado em espelho pelos pais, que se tornam participantes nesse desejo.
Na medida em que todos os pais do mundo t êm a ver com esse desejo e que não existem
provavelmente situações "puras ", nas quais o desejo incestuoso da criança não se encontre,
de unia maneira ou de uma outra, em estado de cumplicidade com o adulto, n ão estaríamos
.
obrigados a concluir que ioda neurose c de saída, uma neurose familiar?
Aliás, não seria nesse clima de sedução recíproca (Laplanche, 1970) que pode se consti-
tuir um sistema pulsional do tipo amor - ódio? A margem entre uma cumplicidade adaptada à
criança e a carga de um investimento parental depressivo abatidõnico ou devorador, com mais
.
frequência os dois ri ão é sempre evidente.
Há, entretanto, situações em que o laç o incestuoso simbólico ocupa todo o lugar e se torna
o elemento maior da história de um destino (por exemplo, a história que Romain Gary relata,
a propósito de sua infâ ncia, em Lapromesse de Faube) .

Diversas considerações podem ser feita? a esse respeito;


- -
a . Sabe se que existe um ti ebate entre os que sustentam um Édipo genético e os que consideram, ao contrário ,

que o Kdipo se reconstitui a cada geração, posição peto menos unais viva. A hipó tese forniu toda dc urna espécie
de impressão prévia do Édipo poderia constituir uma via dc exploração.
b - Diante da ausê ncia de determinação insiintua! na criança, parece não haver senão dois caminhos possí
veis;
-
y do invesllmemo pulsional: urna espécie de " todo pulsional onipotente**;
- o do retorno á dependência absoluta .
.
c . I.* bem isso que é notado na criança que passe do capricho onipotente à submissão mais total Como se
ela estivesse jogada aos extremos de tal modo que não pôde íntrofetar identificações mais est áveis. Rodemos
mesmo nos perguntar se essas idas e vindas da onipotência á dependência mais absoluta não caracterizani o
tempo da Infâ ncia, ao mcsino tempo t ão dramá tica e t ã o longa.
d. Enfim, iio debate que opõe os sustemadores do " todo objetar desde o nascimento ( fclemianos) e os outros,
.
mais freudianos, que sustentam o narcisismo anobjeiaí (" Mas se ele existisse, como seria possível sair disso
.
uin día...? “, contestam com razão Laplanchc e Pontalis no VócabttMm át p$kmúi£si% a solução de duas po -
.
sições anobjei a is objetais com oscilaçã o de uma a outra , poderia surgir como uma saída muito considerável,
pois ela contém ao mesmo tenipu uma dinâmica interna e sua própria barrei,a. Assim, a onipot ência sc torna
o limite da dependência, c vice-vcrsa
PSKPFATOUKM 139

També m é possível dizer que, se existe um n úcleo neuró tico t í pico, há també m situações
incestuosas simbólicas t í picas, ligadas Freq úentemente ãs depressões parentais.
A pane visível e sintomá tica n ão é freq ú entemente muito reveladora , pois eia se caracteri -
za por rela ções de objeto em que predominam o dom í nio sistemá tico e. de maneira ainda ruais
.
oculta, a dependê ncia recíproca Esses dois elementos condicionam funciona mentos mentais
-
rígidos com revelações - de tempos em tempos explosivas , caracteriais , elásticas, e até mais
graves ainda ,
A pane invisível com frequ ê ncia n ão ê revelada senão a posteriori ou no curso de uma
psican á lise . Trata -se essencial mente de proibi ções impl ícitas maiores , cuja primeira conse -
qu ê ncia é a esterilizaçã o das trocas verbais , Assim , as crian ças se dedicam com deleite , face às
proibi ções explicitas , enquanto que as proibições impl ícitas são menos contorn á veis. Não só
é implicitamente proibido falar de tudo o que é sexual , mas, igual mente, de tudo aquilo que
tem a ver com uma vida imagin á ria qualquer. Por vezes , essas proibições referem -se a tabus
familiares ligados a segredos de fam ília antigos ou recentes (adoçã o , íratria bastarda , incesto ,
doença , soroposítivídade ao v í rus da AIDS) , ou. muito simplesmente, iodo evento exterior que
,

se arriscaria a perturbar o modo adaptaiivo familiar e o cerimonial habitual que dele decorre.
Assim, muitas crian ças n ã o podem falar a seus pais dos eventos que constituem o usual das
trocas familiares [dificuldades escolares ou relacionais, machucados e dores diversas , peripé-
cias do entorno, e até mesmo aparição das regras) .
As formas mais estritas dessas neuroses familiares conduzem a uma sistematização que
tomaremos emprestada da descriçã o feita pela escola de Paio Alto , a propósito do doubk hiad
e que. de nosso ponto de vista, concerne essencial mente às neuroses patológicas. Reteremos
desse "duplo v í nculo n ão o aspecto paradoxal, que nos parece depender do jogo das aparê n
"

cias. mas antes a oposiçã o entre as injun ções expl ícitas e impl ícitas cujo papel nos parece
-
radical mente diferente. Essa contradiçã o aparente n ão constitui problema, pois as Inj un ções
expl ícitas f grande menino, o que esperas para correr atrás das meninas") são feitas para mos -
trar de modo permanente que a linguagem n ão serve para nada .
Apenas as in jun ções impl ícitas {" tu já sabes que não ficas bem a nã o ser com ma m ã e " )
sã o ouvidas e constituem a trama das proibições impl ícitas em que se d ã o os laços incestuosos
simbólicos essenciais. Ralazolli, desse modo , chegou a descrever funcionamentos familiares de
"descon íirmaçã cf , à medida que a empresa neur ó tica familiar leva a reduzir ao má ximo toda

representa çã o pessoal dos afetos e do mundo.


Para constituir uma psicose , é preciso uma ru puí ra mais profunda dos la ços afetivos ,
que deixa livre curso a excita ções aterrorizantes. Assim , a maioria desses comportamentos
pertencem à neurose.
.
Como se vê igual mente , por essa descriçã o simbiótica dos la ços m ã e-crian ça , estamos
próximos do conceito lacanlano de forclusão incidindo sobre o Nome-do - pai. Essa exclusivida -
de materna compreende efetiva mente uma exclusão - e não somente do nome. mas da imagem
do pai na criança , em proveito de seu. pai , e , portanto , de seu pr óprio narcisismo.
Nesse sentido, o valor do pai simbólico da criança nos parece efetivam ente primordial ,
mas caracteriza, por sua ausê ncia , essencialmente as neuroses mais patológicas e n ã o as
psicoses. Durante anos , o mito da forclusão dó Nome - do - pai corno etiologia essencial das psi
coses não sofreu contestação. Urge, hoje , devolver ã neurose o que lhe pertence.
Asstm , a realização incestuosa sistematizada , seja simbólica, inicial ou reparadora , consti -
tui a base essencial das neuroses patológicas, como o pró prio Serge Ledaire o ilustrou , a partir
de uma observa çã o de neurose obsessiva sob a expressão de " prisã o bem -amada".


ver "O .
universo psicótico* (Capítulo 10), concernente á hipótese da etiologia das psicoses ( t/1 p 180)
140 JEAN BÉRJGERET

Resta considerar a natureza do vínculo que liga essas formações incestuosas simbólicas
(at é mesmo incestuosas, simplesmente) com a depressão parental. Não há dúvida de que sua
significação profunda é da ordem de uma adição necessária, espécie de reparação patológica
. .
do mesmo tipo que o delírio, na psicose Tudo se passa, em suma, como se nesses casos "in
,
-
cestuosos *, o domínio sobre outrem não tivesse podido se exercer de outra maneira, ou seja .
de um modo mais edipiano- Nesse sentido, pode- se considerar o conflito edipiano como a
expressão de uni incesto "aberto", que se desloca essencialmente por identificações complexas,
por oposição ao incesto “fechado" das formações que acabamos de descrever, cujo sistema de
identificação surge como bem. mais fixado, passando das identificações mais idealizadas ã s
mais mort í feras, sem muitos intermediá rios.

NÚCLEO EDIPIANO TÍPICO


.
O conflito sexual da neurose se situa, pois, no ní vel genital do Édipo mesmo se as ap -
-
tidões defensivas conduzam a tomar as vias de regressões pré genitais (anais, e até mesmo
orais) , 0 conflito no menino decorre da rivalidade cdípíana com o pai , do projeto dt: conquista
.
da mãe Esse projeto é abandonado, em função ao mesmo tempo dos sentimentos temos exis-
tentes pelo pai e do medo de uma medida de retaliação por este dl timo (castração). Enfim, e
sobretudo, desempenha o lugar do pai na mente da mãe.
A proibição do pai é interiorizada, e també m se diz que o Superego é “o herdeiro do comple -
xo de Édipo", Ao mesmo tempo, a identificação com o pai projeta no porvir a posse da mulher. A
masturbação infantil, espécie de participação alucinatória na cena primitiva, cessa na maioria
das vezes com a instalação do Superego. Sua reviviscê ncta, na adolescê ncia, se acha assim
sob o golpe de uma culpabilidade considerável: o medo da destruição ou de doença dos órgãos
genitais, relacionado à masturbação, é a expressão mais evidente da angústia de castração. Ma
menina, a posição não ê cxaiamente simé trica, em função da mudança de objeto (dos cuidados
maternos ao amor do pai ) e da castração anatômica ( cf. 0 Édipo feminino na histeria, p. 335 -

Identificaçõ es edipianas
A identificação do menino com o pai e da menina com a mãe são os herdeiros mais evi
dentes do complexo de Édipo. Na realidade, essas não sã o as únicas saídas e a instala çã o
dessa herança permanece altamente problemá tica .
Inicialmente, esse modo de resolução do complexo de Édipo permanece parcial o desejo
incestuoso subsiste, mesmo que deslocado [ ver " Le bíé en herbe" ou "O último tango em Pa -
.
ris " ) e é ele que cai. sob o golpe do Superego. Vistas sob esse ângulo, as identificações com
os pais do mesmo sexo não constituem sen ão um destino particular do investimento Íibidí nal.
insuftdeme cm relação ao retorno infatigável da pulsão em seu destino incestuoso. Unia das
razões disso c que essas identificações “homossexuais " não são evidentes e são mesmo radi-
calmente questionadas, em ambos os sexos, e por razões diferentes.
.
No menino, inieialmcnte, a identificação com o pai põe em questão o Édipo invertido Isto
.
é a posi ção feminina do menino frente ao pai. Ora. essa posição c dificilmente tolerada, na
medida em que da denuncia a castração.
Na menina , a identificação com a mãe edipiana també m n ão é simples, pois, em sua
sombra, se perfila a imagem da mãe fálica pr é- edipiana. Em particular, a identificação homos
sexual tem bastante dificuldade em encontrar espaço pelos arcanos do domínio e da depen -
-
dê ncia que cnraaertzam essa imago.
PSICOPATOUPCIA 141

Mas há uma terceira sa ída , espécie de via de contorno, que assume um lugar considerá vel:
é a identificação com o genitor do sexo oposto .
Que eia seja a herdeira natural do Édlpo invertido, isso não basta para dela dar conta. Seu
lugar e tal na sa ída do Édipo que se deve a seu respeito falar mesmo de ideiuilkação edipiana
. .
direta, ainda que heterossexual De fato mesmo que haja ren ú ncia à realização incestuosa ,
a identificação heterossexual n ã o deixa de permitir conservar lagos privilegiados com o pai
edi piano ou peio menos com sua imagem .
Nã o est á em quest ã o considerar esse tipo de identifica çã o como patológica. Hm particu -
lar muito necessá ria ao cumprimento da vida libídinal heterossexual: o coito , em ambos os
, é
sexos, necessita de fato de dois tipos de identifica çã o, feminino e masculino. Ele também n ão
prejulga a partir da identificação homossexual que o acompanha .
,

Assim, algumas mulheres, viris em sua vida social , n ão deixam de conservar, ao mesmo
tempo, uma posição feminina em sua vida privada . Ao contrá rio, quando a identificação ho -
mossexual não é sen ão esboçada , a feminilidade é reivindicada no plano social para absorver
o fracasso , a virilidade no plano privado para assegurá-la.
Se certos homens temem perder sua virilidade, ao vestir um avental de cozinha , outros
reivindicam e realizam “sua maternidade " junto a seus filhos. Essas atitudes, tanto em um
sentido como no outro, n ã o condicionam em nada as que eles podem ter em posiçã o viril .
Mas ainda a í, é preciso fazer uma distin ção entre os homens e as mulheres. Com efeito, a
identifica çã o viril da mulher é essencial mente edi plana, isto é , próxima de sua saída genital ,
razã o da. preponderâ ncia dos fenômenos hist é ricos na mulher. No homem , a identifica çã o ma -
-
terna comporta tantos tra ços da fa.se pré edi piana que a identifica ção heterossexual é saturada
de i magos bem ma is arcaicas. A anal idade defensiva e ao mesmo tempo identifica t ó r ia do
dom ínio da m ã e fá lica assume um. lugar preponderante, o que explica a sa ída preferencial para
a neurose obsessiva e seu abandono , que representam as perversões.
A bissexual idade, enfim , explica qtie se podem inverter todas as situações descritas e que
a histeria e a neurose obsessiva , se sã o estat ística mente preponderantes , a primeira na mulher
c a segunda no homem , n ão deixam de coexistir, tanto em um sexo corno no outro.

Castração edipiana
A castra çã o edipiana se incrusta bem , evideniemente , no destino biológico da diferença
dos sexos , e o Superego masculino conservará por isso um rigor que set ] homólogo feminino
nã o atinge. Na realidade* o medo concernente à integridade corporal de seu aparelho genital
existe també m na mulher, e de é multiplicado em rela ção à sua progenitura .
Esse medo da medida de retalia çã o n ã o deve fazer esquecer o contexto da matura çã o
edipiana , nem as resson â ncias implicadas pela castraçã o na organizaçã o psíquica e no uni -
verso que disso decorre. Pode-se reconstituir essa maturaçã o, utilizando os arcanos do recal -
camento. como uma ren ú ncia à onipotê ncia infantil de posse incestuosa , ao menos em parte,
em proveito da aquisição de um Superego ma is ou menos r ígido e de identificações ma is ou
menos problemá ticas. Isso tem por corolá rio , no homem , eu n ã o tenho o “Falo" , e , na mulher,
. -
"eu n ã o sou o faio" ( ver a economia histé rica ) Na realidade , trata se ai de uma primeira
aproximaçã o , pois seria n ão levarem conta a formidá vel inversã o que comporta essa troca de
“ bom procedimento'.
Por um lado, o psiquismo n ã o se resolve jamais a abdicar compleramente de um de seus
meios de a ção e ainda assim o faz dolorosa mente. Desse modo, a megalomania c um perso-
nagem , que, para ficar na sombra , nã o cessa de se proporcionar um novo emprego { por exem -
plo , no n ível do ideal do Ego).
142 )EAN BtKC jPKhT

Por outro lado, a entrada no Édipo - diga-se de passagem que. uma vez: entrado no Édi-
po, não se sai ma is dele, a neurose se arranja, e o Édipo n ão se resolve * é o começo de uma
história singular, à medida que as pessoas que nele est ão implicadas são elas mesmas indivi -
dualizadas. Os esquemas de organizações psíquicas não são senão marcos em torno dos quais
se entremeiam os destinos humanos, e é nesse sentido que a neurose constitui um destino
especí fico e uma porta de entrada na finitude. A aceitação da perten ç a a um único sexo e da
irredutível saída mortal são por acréscimo, os marcos principais disso.
Mas a finitude é também o testemunho do processo ã revelia do psiquismo humano, que
n ão pode se comunicar com o mundo a não ser depois de ser previamente enraizado cm um
universo que lhe é próprio, dando lugar, mesmo por meio de vest ígios esparsos, a uma verda-
deira mitologia individual
É nesse sentido que, apesar das aparências, a psicanálise n ão é uma aventura em torno
do umbigo, no sentido de que, em si, a singularidade autentica de uma obra de arte desemboca
no universal .
Assim, o condito entre o Superego e as pulsões sexuais não e senã o a trama mais evi -
dente, sobre a qual se constrói a neurose. O recalcamento, que é sua primeira consequência,
frequentemente ultrapassado pelos acontecimentos, d á lugar ao sintoma, que não é somente
uma formação de compromisso entre a pulsão e a defesa, tanto que ele exprime os traços de
identificações Inconscientes oriundas do cenário edipiano imaginário.

FORMAS PSEUDONEURÓTICAS
EM PATOLOGIA MENTAL
O sucesso da neurose de algum modo lhe prejudicou. Tudo o que não era da ordem da psico -
se foi etiquetado como neurose, de maneira abusiva. Iremos, assim, eliminar sucessiva mente:
- A “neurose" de angústia.
A depressão dita “neur
ótica ".
- As "neuroses" fóbicas.
- As "neuroses" de caráter.

Neurose de angústia
.
Ela foi descrita por Freud ( 1895) em um trabalho intitulado “sobre a justificativa de iso -
lar da neurastenia um complexo sintomático particular sob o nome de neurose de angústia *
{ Angstneumsél ,

Clínica da angústia
A angústia aguda tem de particular ser ela uma angústia sem causa, súbita e muitas vezes
.
parúxística que é preciso, pois, distinguin
-
- Da a ngú siia, ou meIhor, da a nsíedadc refotim d uma dificuldade real da vida. par t iculiir
mente intensa no período que precede uma prova, qualquer que seja (entrada nos exames).
- Mas també m da angústia que surge no contato com anos objetos ou em algumas si-
inações (enclausuramento) cujo valor simbó lico basta para produzir seu desencadeamento,,
mesmo quando não há causa real evidente, e fala-se então, de angústia fóbica , bem diferente
*
da angústia flutuante ou do acesso de angústia que permanece sem objeto.
PaCGPÂTOLGGIA 143

- Enfim, da angústia ligada a uma dor orgânica t preciso citar, a esse respeito, a angústia
,

da angina do peito, verdadeira sensação de morte iminente que poder á criar alguns problemas
,

de diagnóstico para o médico, tanto mais que a angústia dita neur ó tica é acompanhada com
.
frequê ncia de suores , dispnéia palpitações, e até mesmo dores. Esses sintomas, por si sós .
podem aliás constituir crises larvadas ou equivalentes menores.
A esse respeito, é importante distinguir o sintoma som á tico do sintoma psíquico: quanto
mais o sintoma pode ser especificado e preciso em seu desencadeamento , sua intensidade e sua
localização, mais se deve suspeitar de sua organicidade; porem, ao contrá rio, se o sintoma é difu -
so. sndisccrní vei no terreno corporal e com mais forte razão no terreno psíquico, a probabilidade
.
de uma manifestação psíquica é grande Se essa distinçã o nem sempre permite uma diferenciação
hicct rume, lima das vertentes não excluindo jamais a outra, deve, em todo caso, permitir com -
preender que não é possível tratar um sintoma psíquico como um sintoma orgânico. Este último
especifica uma doença particular, enquanto que o primeiro não indica senão um tipo (te rekiçâo.

Significação da angústia
Esta digressão permite tomara medida exata da "neurose " de angústia. Com efeito, a an-
gústia é, falando propriamente, um tipo de relação totalmente insustentável; ela n ão permite
se organizar sem arranjos importantes que lhe fazem, perder seu car á ter de crise aguda.
.
Ou seja o quanto " a neurose de angú stia" se reduz " a uma poria de entrada " na patologia
mental.
Essadescompcnsação brutal n ão condiciona em nada a natureza da estrutura subjacente.
VúT certo, o cará ter "reativo” do acesso de angústia, face a um evento, levaria a minimiza - la.
É um erro grave, pois o evento nã o é senão um pretexto para a desconipensaçáo. Assim, uma
crise de angústia pode muito bem ser a porta de entrada de uma esquizofrenia , enquanto que
a família evoca um fracasso sentimental ou assim considerado.
O pr óprio Freud considerou a “neurose de angústia ’ como uma "neurose atual ", ou seja ,
'

uma neurose que depende de um conflito imediato agudo em rela ção com. a abstinência sexual:
o acúmulo de tensão sexual que não pode se realizar nem no plano físico, nem em elaboração
psíquica, é diretamente passado ao plano somá tico sob a forma de angústia. Hoje em dia, essa
visão reativa , face ao comportamento sexual, foi abandonada . O acesso de angústia é consi
.
derado como um fracasso do recalcamento e da instalação de sintomas O acesso de angústia
-
assinala, pois, antes de tudo, a ausência de uma estrutura neurótica suíicientemente elabora -
da, ou mesmo inexistente .
Com efeito, a angústia neur ótica propriamente dita. como se viu, é a angústia de cas -
tração. Seu arranjo, por meio dos diferentes mecanismos de defesas neuró ticos ., mesmo que
inconsistentes ou prec á rios , rara mente deixam a angústia em estado puro.
Pelo contr ário, a angústia esquizofr énica ê feita de sentimentos de transformação interior
e exterior, com perda dos limites do Ego. de onde a denomina ção de angústia de fragmentação.
D acesso de angústia nesse caso é m á ximo, e, no mais alto grau, comunicativo ao entorno,
Em posi ção intermediária, há um terceiro tipo de angústia. Com desencadeamento às
vezes bruf âl, pode dar lugar a uma doença orgânica - fala - se, então, de ataque de pânico ou
de saída instalada em um contexto depressivo, trata - se essencialmente de uma angú stia de
"falta a ser ", em que a menor perda de objeto afetivo é vivida como catastró fica. É a angústia
depressiva dos " estadosdimí trofes”.
Desse modo, o grande acesso de angústia é a porta de entrada maior da psicose e da de -
pressão, a um grau bem menor da neurose. Ela pode também introduzir uma evolução psicos-
somá tica verdadeira ( ver Capítulo 11).
144 JEAN BEIíCEMET

Depressão "essencial'^
Ela se opõe. por definição, à depressão melancólica, caracterizada por um delírio de indig -
nidade. mas igualmente à depressão neurótica verdadeira .
Ideias depressivas
Elas não lem aqui um car á ter delirante, elas levam o sujeito a considerar subitamente as
dificuldades da vida como insuperáveis. Ele subestima tp ta [mente suas capacidades e supe-
restima o esfor ço. Essa desvalorização lhe permite, em certa medida, escapar da luta e, por
conseguinte, da angústia. Mas essa perda da estima de si abre a porta para a eventualidade
suicida que. sem ter a mesma regularidade da depressão melanc ólica, não deixa de ser um
risco maior.
Com frequência, o quadro é menos evidente na medida em que os transtornos remontam
à infância. Trata - se maís de um estado de desamparo permanente do que de kf éias depressivas
propriamente ditas. Esse desamparo se manifesta regular mente por tensões corporais entre -
cortadas por mal-estares difusos, uma instabilidade, e mesmo uma incoercí vel necessidade de
resolver os conflitos pela passagem ao ato.
Enfim , se um fator áesencadeante “traumático" dá 0 aspecto de um processo reativo, aqui,
ao contrário, o que ê ví vido como o fim das infelicidades é que produz a descompensação.

Fadiga
A fadiga e o cortejo neurastênico que a acompanha , feito de anorexia, impot ência ou
.
frigidez, hipotensão arterial, rnquialgias .. se associam em propor ção variada com as ideias
depressivas. Essa astenia tem de particular ser matinal e ceder diante tio esforço: poré m, ioda
atividade se Lorna difícil e dá lugar à ruminação interior. As vezes, ;t astenia assume todo
o lugar, escondendo mesmo as Idólas depressivas subjacentes, das quais o sujeito não tem
consciência , Falou - se. então, depsicastenici . Essa entidade, descrita na França por lanet , foi
retomada por Freud, que fez dela a segunda "neurose atual": o esgotamento psíquico devido ao
excesso de prática masturbatória, Essa visão foi igualmente abandonada.

Insânia
É o terceiro elemento da depressão dita “neurótica ". Sintoma mestre, ele raramente vem
a faltar. Tudo se passa , com efeito, como se a angustia, anulada de dia pelo investimento psí-
quico da depressão e físico da astenia, despertasse à noite, provocando pesadelos e insónia,
aumentando assim a fadiga matinal e criando um verdadeiro círculo vicioso do qual é difícil
fazer sair o doente.
Na realidade, é abusivo que toda depressão não - melancólica seja considerada , em maior
ou menor grau, como uma depressão neur ó tica, mesmo que a linha divisória entre esta última
e a depressão dos estadosdimítrofes seja muitas vezes imprecisa.
-
Poder-se la, com efeito, perder se, ao querer diferenciar a qualquer preço , em um forma-
lismo redutor, a depressão neur ótica daquela dos estados -limítrofes (depressão essencial). A

. .
A depressão ' essencial " descrita por R Marty iem um sentido mais esiriío em relação à "doença psicossomá ti-
.
ca” Aqui, a utilizamos em um sentido bem mate amplo, que recobre o conjunto das depressões não- psicóiicas
e não -neur óticas .
PSKTOPATOLOGW. 145

hemorragia narcísiea faz parte integrante das vicissitudes da neurose, do mesmo modo que
.
nas estruturas (em estado de hiância) nareisieas , o Êdipo se toma um pomo de mira afastado,
por certo, mas potencialmente presente no imaginário.
No primeiro caso, as confidências precedem rapidamente os sintomas. A pr ó pria depressão
parece coincidir com a recuperação de uma parte importante da vida interior, seja por ocasião
de um luto ou de um fracasso da vida sentimental ou profissional.
No segundo, há, ao contr ário, um abatimento da vida psíquica, vivida, aliás, como uma
perda da energia vital. Todo o pensamento está centrado no corpo e ê muito difícil fazê-lo sair
daí. A pobreza dos objetos interiores é tal que apenas objetos exteriores reais podem servir de
apoio. A perda de objeto afetivo não faz sen ão descobrir a fragilidade narcisista subjacente o,

engajamento precário em uma situação genital se revela e os mecanismos de defesa contra a


depressão, que teriam podido entrar em cena, não desempenham mais seu papel (ver as neu-
roses de cará ter ).

" Neuroses" fóbicas


Elas surgem, na realidade, em qualquer compartimento da patologia mental . Com efeito,
se a existência de manifestações fóbicas - medos imotivados em relação ã presença de objetos
ou de situações das quais apenas o car á ter simbólico pode explicar papel - não é discutível,
em compensação, não é possível ligá -las a uma estrutura própria.

História da noção de fobia antes de Freud


Ela é reveladora, em ma is de um sentido.
No começo, as fobias eram muito mal isoladas das ideias obsessivas. Se Finei falava de
“ mania sem delírio", Esquí rol dispunha as fobias nas “ monomanias" , fazendo delas obsessões

particulares, as "obsessões - medo", Essa assimilação ã neurose obsessiva aliá s fez carreira,
pois Kraepelin e mesmo lanei prosseguiram sua tradição .
Na realidade, foi preciso esperar Westphal. em 1871, para que o termo fobia aparecesse na
descrição da agorafobia (literalmente, medo da praça pública). De falo, no fim do século XIX ,
.
antes de Freud foi realizada uma descrição minuciosa de iodas as fobias possí veis e imagi-
ná veis, edificando - se um verdadeiro cat álogo ( 202 fobias teriam sido enumeradas). Citemos,
alem da agorafobia, a claustrofobia, a acroíobia (medo do vazio) , a ereutofobia ( medo de en -
rubescer em público) , a fobia de impulsão (medo de fazer mal a outrem), a siderodromofobía
( fobia das viagens em estrada de ferro) , zoo fobias ( medo dos animais), etc. A disparidade
evidente dessas manifestações, por embaraçosa que seja, não bastou para tã zer desaparecer o
mito da neurose fóbica.

Freud e a histeria de angústia


A situação se esclareceu com Freud. à medida que, entre essas descrições, ele não reteve senão
um só tipo de Fobia verdadeiramente neuró tica: "a histeria de angústia”. De fato, o trabalho de
Freud procedeu em diversos tempos. Em um artigo de 1895 (Obsessões e fobias: seu mecanismo
psíquico e sua etiologia), Freud ao mesmo tempo separa as obsessões e fobias da neurastenia e as
distingue entre si (a obsessão permanece independente da presença do objeto), mas ele integra, de
.
lato as fobias à s manifestações da “neurose de angústia”, no quadro das "neuroses atuais".
Ser á preciso esperar 1909, com a publicação de "A análise de um caso de fobia em um
.
menino de 5 anos " (o pequeno Hans) para que Freud revise sua posi ção, n ão fale rnais de
146 |£AN BEHCí EKET

neurose amai e distinga a angústia fõ bica propriamente dita. sempre em rela ção com a proxi -
midade de um objeto ou de uma situaçã o bem precisa. Eis o que se pode ler, no final da hist ó ria
do pequeno Hans:
O lugar a atribuir ás ybbias " na classificação das neuroses nãofoL até o momento, satis-
fatoriamente determinado. Parece certo que não se pode ver nelas senão síndromes que talvez
-
pertençam a neuroses diversas e também que não se deve dispô las no número das entidades
independentes. Para as fobias da ordem das de nosso pequeno paciente, a designação de "his -
teria de angústia" náo me parece inadequada.
Ele justificar á esse termo, mostrando a similitude dos mecanismos psíquicos entre algu -
mas fobias e a histeria de conversão, isso na medida em que justamenic a evi ração lo bica é ,
,

-
como na histeria , " uma evitaçã o sobretudo sexual "' [ver p. 106 107).

Outras fobias
Com elas, trata -se de outras coisas que n ão da evid ê ncia sexual da histeria de ang ú stia:
Seja de sintomas aparentados , na realidade, aos da neurose obsessiva , conto o medo dos
abjetos sujos , dos excrementos , dos micróbios, e mesmo do câ ncer, ou â histeria , como a cren -
te fobia ou a Ibbia de impulsões..
Seja de medos que se integram em um quadro ma Is complexo, compreendendo ou acessos
.
de ang ú stia, ou um estado depressivo Esses medos dos estados- lim ítrofes comportam , aliás,
um pâ nico considerá vel , em face ao mesmo tempo de urna situaçã o de solidão e de encontro
com um outro estranho, lembrando muito, em definitivo , os terrores infantis.
.
Seja , enfim , dos processos que se situam francamente na linhagem psicó tica Assim é a
rancerolbhta , quando se reveste de um aspecto hipocondr íaco acentuado, aproximando -se de
urna somatiza çã o quase delirante. A pró pria agorafobia , em sua forma maior, beira à impos-
sibilidade total de sair à rua sem ser acompanhado e pode ser ent ã o considerada como um
verdadeiro sintoma de cobertura , espécie de ú ltima defesa contra a psicose subjacente .
Isso demonstra o quanto as fobias não são sen ã o sintomas que devem ser referidos a seu
contexto. Fora da " histeria de ang ú stia " , cuja natureza sexual é , em princ í pio , evidente, das
n ã o podem ser consideradas como estrmuras neuróticas.

** Neurose" hipocondr íaca


Essa denominaçã o , ou a de hipocondria “ neur ó tica ", é total mente injustificada. A hipo -
condria corresponde, de lato , à cren ça em uma afecção doentia orgâ nica em relação a um
simples aumento das sensa ções cenesiésicas normais , que são ent ão sentidas penosamente .
Os exames cl í nicos , biol ógicos e radiológicos, são na maioria das vezes negativos ou , pelo
menos, as pequenas anomalias que eles podem por eni evid ê ncia est ã o fora de proporção com
os males invocados ,

Hipocondria psicó tica


Freud tinha o propósito de situar a hipocondria entre "as neuroses atuais". Ele precisava
que n ã o se tratava de uma espécie de precursor das neuroses de transferê ncia [ histeria e neu -
rose obsessiva) , como a "neurose de angústia " e a psicastenia , mas que a hipocondria era "a
neurose atual " remetendo às “neuroses narcisistas", termo utilizado então por Freud para falar
do que chamamos, no momento atual , de " psicoses". Essa referê ncia a Freud , por caduca que
seja no n ível da nosografia , n ã o deixa de trazer elementos de veracidade incontest á veis. Desse
PSfCQPATOLOaA 147

.
modo uma grande parte das hipocondrias pode ser situada no nível de estruturas psicóticas
francas, ou pelo menos pr é-psicóticas.
Trata-se de sujeitos com dores, queixosos, para os quais todos os cuidados e iodas as me -
lhores vontades do mundo são ineficazes. A crença em seu transtorno é arraigada e quase deli -
rante. Sua tenacidade consegue reunir um dossiê considerável, mas uma nova. série de exames
nã o os satisfaz jamais. Eles continuar ão a ir de médico em médico, at é que um diagnóstico
de organicidade termine, por cansaço, por ser proposto. Mas mesmo assim o hipocondríaco
não estar á satisfeito, mas bastante firme em suas ideias, e todos os tratamentos fracassar ão.
A agressividade contida na dor monótona que ele apresenta incansavelmente é o motivo da
.
rejei ção da qual ele é na maioria das vezes, o objeto. Pode - se dizer com efeito, que nenhum
doente desencadeia uma agressividade maior em seu terapeuta. Chegado a essa fase, o ciclo
persecutório pode se fechar, pela passagem a psicose paranoica. Tudo se passa, aliás, como se
a agressividade que se ostenta à luz do dia, no delírio paranoico, não fosse outra coisa senão
aquela contida, mascarada pela dor no hipocondríaco, mas sentida claramente como tal, em
todo caso, por aqueles que o cuidam.

Hipocondria depressiva
De fato, nem todos os hipocondríacos apresentam um tal quadro clarameme situado na
órbita da psicose, isso não basta entretanto, para fazer dessas hipocondrias neuroses.
,

Trata - se. com efeito, de pacientes que apresentam acessos de angustia, um estado psicas -
t ónico com o cortejo mais ou menos variado de transtornos "neurastênieos" diversos ( crans *

tornos digestivos, raquialgias, cela leias, vertigens, etc .) , tudo isso sobre um fundo depressivo
mais ou menos intenso. A cren ça na realidade somática dos transtornos não é integral, a
agressividade e mesmo a simples demanda de ajuda é vivida de uma maneira extrema mente
culpável- O retorno masoquista é satisfeito pela intervenção cirúrgica abusiva.
.
Trata-se portanto, de manifestações depressivas cujos elementos somá ticos são alegados,
.
sem que haja, por isso a instalação de unta doença orgânica real, mesmo “psicossomática”.

"Neuroses" de car á ter


Elas teriam, de particular, o fato de se tratarem de “neuroses sem sintomas", latentes ,
mudas, de tal modo confundidas com as exigências da sociedade moderna ( atividade e retidão
moral) que, quando a deseompensação aparece, ela sc produz em uma situação de espanto
gerah é o grande carvalho que. de uma hora para outra, se quebra.

Personalidade "de car áter"


Trata- se de personalidades hiper normais, ativas, sólidas, protetoras de seu entorno, cuja
única desarmonia consistiria em uma tend ê ncia invasiva que pais e amigos toleram, com
.
Frequência, mais ou menos bem A fragilidade de uma tal posiçã o só sc manifesta, de fato .
na incapacidade evidente para um questionamento de si e de sua concepção da vida Tudo se .
.
passa como se o menor movimento nesse sentido devesse levar ao irrepar ável Essa certeza
de si implica que toda dúvida seja suprimida. Em particular, o mundo dos “psi " (psic ó logos,
,
psiquiatras, psicanalistas) é execrado: É muito melhor esquecer do que pensar, pois. se nos
!

deixarmos levar por pensamentos interiores, para onde se vai? É preciso agir, eis a única
,

.
maneira de não deixar estagnar sua vontade e de não se deixar levar pela preguiça Deixar- se
,
levar e morrer . O resultado de uma tal atitude é de três ordens:
r
148 )EAM BEBGéRíT

- Hiperatlv idade. com dispêndio considerá vel de energia que impressiona , é considerada
como penhor de sucedo social.
- Severidade com rela çã o ao entorno , tanto mais constrangedora quando acompanhada
de uma severidade dirigida ao pró prio indivíduo.
- Esterilização total de tudo o que pode surgir da vida inconsciente, com . em particular,
uma sexualidade pobre, até mesmo inexistente, sem que isso constitua problema.
Um quarto elemento deve ser notado, cie é sem d ú vida o mais sutil , mas em definitivo o
ma is importante: por tr ás da carapaça de autoritarismo e de certeza de si se perfila uma depen -
d ê ncia considerá vel em rela ção ao entorno inconfessável , de onde a escalada autoritá ria, da
,

n ã o será atestada senã o em face de uma amea ça de peida de objeto.


Em certos casos, entretanto, a marca tibidinal persiste pelo pró prio conformismo morai ,
sem que a menor suspeita de cumplicidade possa jamais ser emitida : controle da sexualidade
de outrem , sob o pretexto de moralidade ou de pedagogia , condena çã o perempt ó ria e fora de
propósito do erotismo e da pornografia , etc. A sexualidade desses sujeitos é mais presente,
ainda que igual mente pobre, quando considerada como normal.

A economia
A personalidade de "cará ter" é inteiramente definida por uma atividade e uma vontade
que se dizem conscientes. Essa consciê ncia , segura de si mesma , constitui um muro sólido
,

edificado no n ível do Ego, espécie de linha Maginot cuja rigidez evita a emergê ncia dos afetos
e de tudo aquilo que concerne de perto ou de longe à vida fan [asmá tica , A vida libldinal não se
manifesta mais que pelo modo da formação reativa ( ver Capitulo 4). ou seja. o hipermoralismo.
Mas. à diferen ça da neurose obsessiva , em que o controle se exerce no n ível dos objetos , aqui
ele se exerce no n ível do Ego , deixando filtrar o m ínimo de elementos pulsSonais poss íveis.
Isso eqivale a dizer que , de fato. a personalidade de " cará ter" pode recobrir toda urna
gama de estrutura ;
- Com as neuroses autê nticas, ela aparece como uma defesa de cobertura (dupla defesa )
dos mecanismos propriamente neuró ticos. Ela fax duvidar, muitas vexes com razã o, da eficácia
,

destes ú ltimos.
- Poré m , os pr óprios sintomas neuróticos podem ter perdido toda a fonte tibidinal e não
serem mais que uma espécie de vest ígios sintom á ticos erguidos defensiva mente contra a de -
pressã o dos estados- limítrofes, e at é mesmo uma estrutura psicótica , e se pode falar, então, de
psicose branca (Green ) .
- Enfim , a ausê ncia de estrutura neurótica subjacente n á o é rara. fazendo dessas persona -
lidades de cará ter arranjos de estados-!im í trofes.

Os diferentes tipos de descompensação


.
A descompensação com frequ ê ncia , é a tempestade em um céu sereno. É de fato impres -
sionante ver o quanto a descompensação se produz nesse tipo de personalidades, na maioria
das vezes quando o sujeito n ão CSLú enfrentando dificuldades maiores. Ou ent ã o um fator
deseneadeante pode ser posto em causa , e é a ú ltima dificuldade que faz vacilar o edif ício at é
ent ã o considerado de uma solidez à ioda prova .
Um primeiro modo de descompensação é o surgimento de unta neurose obsessiva subja -
cente ou mesmo, eventual mente , de uma neurose histé rica,
Mas o modo principal de descompensa çã o é a depressão, cujo elemento psicastê nico é fre *

qtien temente importante. Essa fraqueza ê considerada uma ferida narcísica inqu íetante. Tudo
PSICOPATOI CKjlA 149

se passa como se algo se tivesse quebrado irremediavelmente. A retomada da atividade não


é tolerada sen ão ã condiçã o de reencontrar o ritmo de antes ". A fantasmal ização permanece

pobre e gira em torno dessa recuperação das forças.


H á , entretanto, um terceiro Lipo de descompensa ção , ú a saída " psicossom á tica . Trata -se
"

de verdadeiras doenças orgâ nicas que balizam muitas vezes toda a vida desses doentes , cujo

montante de lá ruasmatizaçáo é dessa vez quase nulo; de doen ças psicossomá ticas clássicas
. .
de longo curso; asma , psoríase , hipertensão arterial Basedow at é a repeti çã o incessante de
urna multiplicidade dos mais diversos acidentes orgâ nicos. Ou então e o acidente brutal da
meia - idade . O perfil psicol ógico dos infartos do miocá rdio, descrito pelos cardiologistas , por
exemplo , corresponde bastante bem à nossa descriçã o.
Enfim , h á uma ú ltima sa ída , dessa vez na pessoa idosa: a demência senil melancólica
ou delirante , fora das demências arter íopá ticas verdadeiras , comporta na imensa maioria dos
casos antecedentes psíquicos caracter ísticos: autoritarismo, hiperat í vidade , rigidez . Ou seja,
estamos ent ão nos confins cie todas as saídas poss íveis, neuró tica , psicó tica, e sem esquecer a
- .
terceira via psicossom á tica, dando pleno sem ido ao termo estado lim ítrofe mesmo que com -
pensado.

NEUROSES AUT ÊNTICAS


A intrica ção dos diferentes tipos de organizações neuró ticas é tal que poderia evidenciar o
caráter totalmeme artificial das distin ções nosográ ficas. Isso n ão é nada , entretanto, i á que as
organizações histé ricas e obsessivas , em particular, continuam a se opor, n ã o somente no pla -
no did á tico , mas iguatmente no plano clínico. Ainda seria preciso referir a defâsagem essencial
que diferencia a histeria, no sentido amplo, dos comportamentos obsessivos.
Sem d ú vida, a histeria aparece como a expressão de uma pulsà o habitada pelo corpo, ao
contrá rio dos comportamentos obsessivos, como o fruto de uma mentalização. Mas essa dis -
tin ção n ão é suficiente.
De maneira mais precisa , a histeria leva plenamente cm conta a onipoté neia da pulsã o e
assume suas consequ ê ncias: da percepçã o vertiginosa de seu limite extremo, o desejo de desejo
insatisfeito , a sua incorpora ção maior, a saber, a fantasia incestuosa. Ê nesse sentido que . com
a histeria , toda pulsã o irá se tornar incestuosa.
Ao contr á rio, no segundo caso, o isolamento obsessivo desempenha um papel de referê n -
cia essencial , pela transformaçã o da onipoténeia pulsíona! em pulsão de onipoté neia . menta -
lizada sob a forma de onipoténeia do pensamento e secundariamente incorporada em dom ínio
onipotente?
O universo obsessivo é extremameme complexo, uma vez que faz intervir, nesse desliga
-

mento um mecanismo muito primitivo, anterior às elaborações eró ticas da puls o


. ã e que .
seria
da ordem de uma viol ê ncia fundamental onipotente que se encontra na psicose em estado
puro. Aqui eia é imediatamente infiltrada de elementos pulsionais eró ticos mascarando o mo -
.
vimento fundamental do isolamento: essa transformaçã o da onipoté neia pulsional em pulsã o
de onipoté neia , ou seja , da onipot é neia pela onipoté neia .
Assim , quando os desenvolvimentos do imaginá rio obsessivo se confrontam com a d ú vi -
.
da ou seja , com as falhas da onipot é neia eles temam obliterá -la pela instauraçã o do pensa -
.
mento m ágico, tais as superstições confessadas ou inconfessá veis que nos habitam , a todos,
em graus diversos.
Se os funcionamentos histéricos e obsessivos coexistem no seio de uma mesma persona -
lidade , suas articulações sã o igualmente balizá veis: assim , pode -se perceber o momento em
150 JhAfr lí lKí-iEKtT

que o sujeito escapa de um comportamento onipotente de domínio intelectual irrespirável,


para recuperar seu núcleo hist érico , por meio de uma realidade pulsional mais espontâ nea e
mais expressiva . Ao contr á rio, o controle memal pode surgir como salvador, em rela ção a uma
invasão generalizada petos afetos.
Cada personalidade representa, assim, um curioso equilíbrio em que os elementos hist éri -
cos c obsessivos, mesmo que nã o sejam evidentes, não deixam de existir na complexidade dos
.
conflitos internos, tais os motores essenciais de nossa vida pulsional e que ao mesmo tempo,
colorem o cará ter de cada um.
.
São. aliás, os transtornos caracteriais, isto ê as impaciências onipotentes, que representam
o essencial das manifestações sejam hist éricas, sejam obsessivas. De modo atenuado em relação
aos sintomas propriamente ditos, eles não deixam de representar um pólode atração e sujeição
.
consider ável Pode - se, além disso, referir facilmente qual desses dois pólosse torna dominante .
As formas patológicas com evidenciação dos sintomas histéricos ou obsessivos típicos
aparecem, a partir de ent ão, como os fracassos flagrantes dos esforços de adaptação do sujeito.
.
As escapadas caracteriais persistem, mas são de algum modo, ultrapassadas pelos aconteci -
mentos.
Isso corresponde, evidentemente, a situações em que os conflitos inirapsíquicosedipianos
ou/e pr ê -edipianos são importantes e não podem esperar se resolver a não ser pela aparição de
sintomas custosos para a vida psíquica e a vida, simplesmente, dos sujeitos.
Pontos assíiuótiços das emergências histé ricas e obsessivas, as estruturas subjacentes se
situam, ent ão, com frequência, aquém da neurose. Paradoxalmente, a descrição clássica da
neurose obsessiva corresponde com frequência à cobertura de uma psicose, isso n ão significa
que a neurose obsessiva "neurótica" n ão exista , mas que há sempre lugar para verificar a na -
tureza edipiana da economia subjacente, face a toda sintomatologia de aparência neur ótica.

Histeria de conversão
Histórico
.
Desde a mais alta Antiguidade e, em particular, com Hipócrates a histeria designava
transtornos nervosos observados nas mulheres que não haviam tido gravidezes e que abusa -
vam dos prazeres venéreos,
Na Idade Média , uma nota particular foi a isso acrescentada: ê a possessão pelo demónio;
e, sob esse ponto de vista , narram - se as famosas histórias dos sabás das feiticeiras.
De fato, foi Charcot que teve o mé rito de ter sabido distinguir, no curso do século XIX a .
histeria da epilepsia. Ele continua, entretanto, a classific ã - la nos transtornos fisiopá ticos do
sistema nervoso.
Depois Babinsky, sublinhando a sugestibilidade (ou pelo menos o que ele considerava
.
como tal e que é, na realidade, a labilidade dos sintomas) e cunhado o termo "pUiaiismo" ,
.
permitiu separar o que pertence à psiquiatria do que concerne à neurologia. De fato as confu -
sões persistir ão e as mais diversas direções ser ão tomadas, confirmando as divergências at é
nossos dias.
Para lanet , que jamais abandonou as teorias organfastas de lackson , trata - se essencial
menie de uma diminuição da tensão psíquica que pode ser provocada por choques emocionais
c recordações traumáticas. Ksse estado explicaria a ação sugestiva e a cura desses doentes pela
hipnose .
Para outros, " essa incógnita m casa " , essa “erva daninha da medicina ", de acordo com
Lasegue, ser á considerada uma simples aiitudedetfwt í ftr
çm
PâCUPATOUXa* 151

Ao mesmo tempo, ela fecundará o gê nio de Freud . Por um momento aluno de Charcot ele .
retomará a Viena , para escrever, com Breuer, alguns anos mais tarde , os famosos “ Estudos
sobre a histeria" ( 18*55). Poder-se - á ter neles, retomando de algum modo a definição antiga :
.
“Apenas sa ído da escola de Charcot ficava embara çado com a conexão entre a histeria e a
.
sexualidade , quase como as pró prias pacientes o fazem , em geral " Em um primeiro momento,
.
ele falará de trauma sexual durante a infâ ncia para depois, abandonar a explica çã o trauma *

oca direta e integrara histeria no quadro dos avatares da evolu çã o libklinal .

Clinica
J Sintomas médicos ou ditos "somá ticos"
Os sintomas histéricos de conversão foram descritos , inicial mente , no plano m é dico. Por
clássicas que sejam , n ão sã o as manifestações mais frequentes da histeria , e as descreveremos
rapidamente.

* Acidentes parox ísficos


A grande crise , descrita por Charcot: trata -se dc uma crise de agitação espetacular cuja sim -
bologia sexual est á muitas vezes presente e que pode assumir todo tipo de formas, desde o acesso
de sonambulismo em pleno dia até a imitação da crise de epilepsia . Em geral, a penda de urina e a
mordida da l í ngua faltam na crise hist é rica , enquanto que estão presentes na. epilepsia . O eletroen -
cefalograma e sobretudo o contexto (extravagâ ncia , teatralismo. labvl ídade) farã o o diagnóstico.
Os equivalentes menores \ vã o desde a crise " nervosa " dc agita ção ao desmaio s ú bito , pas-
sando pelas teianias sem substrato biológico (hipocalcemia) ou espasmofilias cujos la ços com a
histeria sã o certos, quando se faz o giro das condutas psicológicas que est ã o associadas, Enfim ,
as narcolepsias (estados de adormecimento diurnos) se prestarã o a muitas discussões com os
neurologistas, mas parecem , de fato , na maioria das vezes , se situar no quadro da histeria.

• Transtornos de aspecto neurológico


As paralisias sã o os transtornos mais Frequentes; clinicamente é pouco comum serem bem
.
constitu ídas, o mais das vezes bizarras desde a primeira abordagem : nã o h á evidente me me ,
transtornos dos reflexos. Elas podem atingir os dois membros Inferiores (asiasia - abasia ) , um
.
membro ( monoplegia ) , as cordas vocais (afonia) Pode -se acrescentar a isso a. ceguei ra hist é ri-
ca, com estreitamento concê ntrico do campo visual. O diagnóstico diferencial com a esclerose
em placas ( paralisias focais) colocará , ãs vezes , alguns problemas, em fun çã o do cará ter dispa -
ratado dos sintomas, de uma parte e de outra .
As anestesias e sobretudo os edemas localizados constitu íam o que se chamava de "estig -
mas hist é ricos". A topografia aberrante das primeiras e o car á ter provocado das segundas há
tempo n ão enganam ,
As manifestações álgicas n ão est ã o ausentes e criarã o sé rios problemas , particularmente
.
com as dores hipocondr íacas, sem se contarem as dores orgâ nicas reais Alé m da ausê ncia de si -
nais de organicidade ao exame m édico, é cada vez o contexto que dará o diagn óstico, ou seja:

Sintomas ps íquicos e cará ter histérico


As manifesta ções de ordem psíquica , se coexistem com os “sintomas somáticos íreqiien
temente bastam a si pró prias , sã o aliás bem mais freqiientes que os clássicos acidentes de
conversã o; chegou -se , também , a querer opor, ã conversã o somá tica. os sintomas psíquicas
,

da histeria. Não hà, m realidade, solução de continuidade, pois esses sintomas psíquicos se
152 J ê AN G ÉRCèfiírT

mantém essenclalmente Cúmo movimentos do corpo que escapam a seus autores ç devem, pois .
eles também , ser considerados como verdadeiras conversões somáticas.

* Sedu çã o e avidez afetiva


Eles são seu sí morna inicial , primeiro na apresentaçã o e sobretudo no que eia tem de
essencial mente subjetivo. Essa maneira de Ser da histé rica foi descrita de muitas formas: ne -
cessidades de chamara atenção sobre si . egocentrismo , dependê ncia afetiva , falta de controle
emocionai , coquete ria , provocação, erotiza ção da rela ção, etc. De fato. trata - se de um ú nico e
mesmo fenómeno, espécie de precipita ção afetiva que tem a tend ê ncia de encurtar espontanen -
mente as dist â ncias com o outro, Essa oferta afetiva imediata , mesmo que comida - ã diferen ça
do psicótico, que fará sita declara çã o de amor e de ódio sem transição - está na origem do ter-
mo histeria . Mas isso é de fato uma mistificação, pois esse contato n ã o pode sobreviver multo
tempo, a menor resposta a essa "oferta e demanda " ira /, consigo ao mesmo tempo a rupiura
imediata e a fuga desvairada.

* Fuga ou amnésia
Eia caracteriza , com efeito, o segundo movimento, se a atitude de retirada da hist é rica
pode à s vezes assumir o aspecto de fligas verdadeiras, na maioria das vezes ela se manifesta
de maneira bem mais sutil : é a amn ésia hist é rica . Sem ir até as cl ássicas hist ó rias do 'Viajante
.
sem bagagens'' trata se simplesmente do esquecimento de um evento em que o paciente est á
por demais engajado em seus afetos e em tudo o que se relacione a eles. Às vezes, trata -se de
uma verdadeira amn ésia das palavras que a histérica quer pronunciar e logo esquece. Mas a
fantasia essencial , às vezes realizada, continua sendo a fuga por síncope, ou melhor, por ina -
ni çà o. Em grau menor, a fuga no sono é com frequ ê ncia o equivalente disso.
As rela ções sexuais sã o bem mais freqiientes do que se diz classicamente, e a frigidez bem
mais rara do que se crê . Poré m , o comportamento sexual n ã o pode se realizar a n ã o ser em
.
uma espécie de halo amnésico , é preciso n ã o t ê- lo previsto e „ em todo caso é preciso esquece
lo de imediato.
Enfim , com mais frequ ê ncia a histé rica tem a necessidade de anteparos que a separem de
.
seus objetos de amor o que lhe permite esquecer o que está em quest ã o (cF. a história de Dora ,
nas Cinco lições de psican á lise). Resulta disso uma multiplicidade de objetos abandonados uns
depois dos outros, a partir do momento em que a duplicidade n ão pode mais ser sustentada .

* Cará ter histé rico


.
Essas atitudes , em conjunto, correspondem , pois a um duplo movimento sedução- retinu
da , marcando a verdadeira ambivalência no ní vel do corpo , que é o sinal distintivo da histeria.
A neurose obsessiva , por sua vez, é caracterizade por uma atitude de ambival ê ncia no n ível
do pensamento. Esse movimento de provocação e de engodo é encontrado , ali ás, no n ível
do sintoma de conversã o de apar ê ncia m édica , o duplo movimento est á a í de algum modo
,

-
condensado e ao mesmo tempo n ão interpretável Ocorre o mesmo nas. fabulaççtes e nos com -
portamentos mitoman íacos , e até mesmo na tentativo de suicídio, ela própria urna maneira de
fuga , e cujo car á ter n ã o preparado , precipitado, nã o deixa de conter elementos de provoca çã o.
A histérica leva , assim , uma dupla vida (de onde decorre o sentimento de clivagem da
personalidade):
- Uma , a de seus sintomas, quer des sejam f ísicos ou psíquicos, parece lhe dar urna de
senvoltura , uma indiferen ça invejá veis, ê a bela indiferença da hist érica . A conversão escamo -
-
teou totaIntente a ang ústia . A desenvoltura do corpo dotado de uma verdadeira ublqii,Idade dá
o aspecto teatral que sublinha , ao mesmo tempo , a necessidade de ter espectadores.
PS4COPATULGGIA 153

- A outra , em segundo plano, que paga a automisqfkação da precedente , pois a vítima da


histé rica nã o é tanto o objeto abandonado mas ela mesma, de onde o sentimento de abando-
no , de impot ê ncia e de fracasso que pode despertar a angústia adormecida . Mas esta última ,
quando aparece, é sempre lá bil , pronta para desaparecer de novo ou então de tal modo despro -
.
porcionada que é preciso considerá - la como um verdadeiro sintoma entre os outros i ; m geral ,
ocorre o mesmo com estados depressivos em que predominam os elementos ps íquicos , ou seja.
a riqueza da fantasmaiização.
F. nfim , a histeria é frequentem ente invisível . Nem por isso ela deixa de ser dolorosa e ,

isso por uma razã o essencial , a saber a invasão constante dos afetos. “A hist é rica vive da de-
vo raçã o de seus afetos '", escreve Andr é Greem mas pode-se inverter a proposição: a histérica
é ao mesmo tempo devorada por seus afetos, mesmo quando o sistema de representa çã o seja
aparentemenie faltamc. Trata - se , talvez, ai, do sintoma maisc& racter ísticoda histeria , embora
o ma is escondido.
A convers ã o e a inibiçã o intelectual , por um lado. a agressividade e a voracidade indo at é
a toxico mania , por outro, surgem ent ã o como sa ídas que permitem escapar da oni potê ncia dos
afetos.
As palavras se tornam atributos bem particulares, tabus porque demasiado explosivas,
ou , ao contr á rio, exibidas em sua violência nua , para pelo menos tentar disseminar e compar -
tilhar o incomrolá vel .
A histeria oscila , assim , entre uma rememora çã o escondida e a exibi çã o, ela pró pria subs -
titu ída e aliviada pelos processos de conversão.

A economia
Paradoxo da histé rica
.
Com efeito, paradoxal mente , pode -se dizer que se a hist é rica esquece todo o tempo ( am -
n ésia . furos de mem ó ria ) , é para se defender de uma rememora ção constante relativa à s fan -
tasias com objetos sexuais incestuosos, rememoração contra a qual ela luta. Dito isso afetos e.
representações n ão t ê m destinos tão diferenciados , como se poderia crer :
- Por um lado , as representações sofrem o efeito do recalcamento, um recalcamento com
ê xito, pois a amnésia é total , é a " beta indiferença " da hist érica , pelo menos nos acessos exi -
bidos ou n ão da conversã o. Enfim , o que subsiste das representações é transformado em seu
contr á rio: o desejo sexual é transformado em desgosto sexual .
- For outro lado. os qf ètos são destacados da representa çã o psíquica incó moda , para
se converterem , no dom í nio corporal , em sintoma som á tico ou em seus equivalentes psí-
quicos, Apesar do recalcamento das representações, essas descargas de afetos conservam
uma espécie de tra ço de suas origens, razã o de ser do cará ter simbó lico das conversões
som á ticas, do cará ter erotizado das condutas ps íquicas. Tudo se passa como se as repre -
senta ções sexuais recalcadas do sistema consciente encontrassem uma certa ressurgencia
na manifesta çã o dos afetos e continuassem a falar no n ível dos sintomas; mas esse cará ter
escapa total mente â histé rica , porque os sí mbolos s ã o ira vestidos pelo deslocamento [ verga
= caixa torácica , na histó ria de Dora), Km suma, a linguagem muda de instrumento, mas
.
ela continua a sustentar seu discurso ( La çam 1966). Ora , apesar de tudo pode ocorrer que
o instrumento fale forte demais e que a hist é rica j á não possa ser c ú mplice do afeto que a
faz submergir. A solu çã o de urgê ncia é a inversão do afeto; o desgosto sexual no lugar da
atra ção sexual .
Enfim , quando todas essas solu ções estiverem esgotadas , n ã o resta senã o uma : desapare-
cer pela amnésia , pelo sono ou pela inaniçã o ^ Green ) ,
154 Í FAM BFRCfRFT

J O desejo na histérica
.
Por ém, não basta dizer que com a histeria, a sexualidade ronda por ali. nem que a am -
bivalência do sintoma , seu cará ter de provocação e de engodo é a express ão do compromisso
entre a pulsác e a defesa,
A dram ática da histérica se inscreve, de fato, em um contexto bem mais amplo, O desejo
não est á apenas proibido porque culpá vel, mas por ser desejo de desejo insatisfeito. Nesse
.
sentido que o incesto é ao mesmo tempo, desejado e temido como imagem do impossí vel, no
sem ido de que a castração é sempre antecipada pela fuga desvairada e a medida de represália
é assim evitada, daí a bela indiferença .
A identificação histérica prim á ria com. o coito parental ( Braunschveige Kain) é, sem dúvi -
da, um elemento importante da constituição do núcleo histérico: tanto pelo recalcamento que
implica como pelo derivado essencial do retorno do recalcado, a saber, o investimento atito -
em tico e a fantasrnatização que disso decorre .
Entretanto, seria ingénuo fundar a génese dos destinos patol ógicos ila neurose em uma
causalidade linear. A ausê ncia de balizamento dessa identifica ção e a precariedade do acom
panhamento anadúico (Cosnier, \ 987 } são elementos que se devem levar em coma, mas que
não eonsiiLuem a trama da neurose, e seria redutor descreve - la por uma sucessã o de etapas
obrigat órias e bem precisas.
Seu núcleo central cominua sendo o desejo de desejo insatisfeito, em relação direta com o
.
desejo incestuoso que é sua manifestação Tudo depende da maneira pela qual esse desejo se
enraizou em uma história, er a esse titulo, todos os tipos de fatores intervê m sucessiva mente,
Assim, n oralIdade revelada pela maioria dos autores é ostentada por uma voracidade afe
tiva cujo contraponto pode tomara forma de uma verdadeira incontinê ncia psí quica, pontuada
-
às vezes de vómitos, e mesmo de gravidezes Imaginárias.
A histé rica é, em particular, uma grande devoradora de identificações , de onde decorre a
plasticidade e a Iabilidade dos sintomas. Mas a devo ração essencial concerne mais fundamen -
talmente ainda ao /ah imaginário, do qual a histérica est á "gr á vida ", a fim de evitara castra -
ção. A expressão maior disso é. evidente mente, a conversão; a histérica é> ent ão, o Falo.

Ubiquidade e condensação
O que impressiona nessa regressão oral ( regressão tópica; da vagina à boca) é a conserva -
ção da dimensão sexual, a ponto de ser talvez preferí vel falar de nbiq ti idade - oralidade? geni -
tatídade? - que de verdadeira regressão do Ego. Essa ubiqtiidade é, aliás, fortemente marcada
pela supremacia dos mecanismos de condensação (Grcen).
Alguns pomos de referê ncia do desenrolar do Édipo na menina mostram , com efeito, as
relações da mudança de objeto - da mã e para o pai - na formação dos mecanismos de condem
sação; a menina , decepetonada pelo faio de sua mãe não lhe ter dado um pé nis, volta - se para o
pai, processo que o menino n ão ter á que operar, pois ele encontra no primeiro objeto de amor,
a m ãe, igualmente o objeto edipiano. Assim, a castração já est á na origem da organização
edipiana na menina .
Ela vai, então, viver a aventura da conquista do pai, que dá à adolescente uma maturidade
mais importante do que a seu homólogo rapaz. Não se deve esquecer, entretanto, o caráter pro -
.
blemá tico dessa mudança de objeto, pois o objeto materno não pode na realidade, ser abando -
nado. Para sair disso, não resta mais que a estrat égia da ubiquidade e da condensação, de onde
a imporia neta da bissexualidade na histeria; o corpo do pai edipiano é assim investido como
morada materna e o corpo da mãe, croiizado secundariamente, a ponto de a homossexualidade
latente ser banalizada - tais as mudanças de roupas femininas.
PswDOfvvroLoesA 15.5

A condensação máxima é atingida segundo o exemplo dado pelo pró prio Kreud da teia .
da vaca ao mesmo tempo seio e pénis, imagem encontrada no desejo de felação reprimido ou
não.
No homem, a mudança de objeto se propõe igualmente, mas em posi ção terceira somente.
É a razão pela qual a histeria cantes o devir feminino .
Núcleo anal
.
à rápida passagem pela analidade, operada pela condensação histérica mascara as re -
lações com a mãe pré -edipiana, Essas relações e toda a problem á tica que delas decorre ( ver a
economia da neurose obsessiva) sào igualmente fundamentais para a. organização do “núcleo
artar, ponto de ancoragem do Ego.
m existência e da solidez desse núcleo anal depende, na realidade, uma grande parte do
.
destino da histeria. Sem esse recurso ao pensamento, procedido pela regressão anal a histeria
não é senão fup no comportamento, na inibiçã o intelectual, na depressão, e ate mesmo na
loxicomania.

Histeria e psicose
í: pelas razões precedentes, aliás, que a noção de " psicose hist érica " deve ser considerada
.
como um verdadeiro barbarismo Trata - se, de lã to, seja de sintomas hist éricos de conversão
.
maiores (sintomas médicos) , que no adulto, fora de toda situação coercitiva (prisão, seminá -
.
rio caserna, asilo, até mesmo família vivendo sob o modo de clã), é eminente mente suspeita
de não ser senão uma fachada defensiva inaUcamuflando uma estrutura psicó tica: seja de
sintomas particulares iterativos, rígidos e lábeis ao mesmo tempo, espécies de vestígios inope-
.
rantes que se situam, de fato. no ní vel do registro da esquizofrenia Também a passagem da
histeria à psicose permanece muito hipot é tica e deve ser considerada antes como a queda dos
sintomas de cobertura, mesmo que hist éricos.

Histeria de angústia
Ê a fobia situada sob o signo da sexualidade e, por conseguime, a única fobia neurótica.

Clínica
A histeria de angústia corresponde muito exatamente ao caso da fobia das lojas, descrita
por Freud, nessa jovem chamada Em ma e da qual já falamos, a propósito da estrutura neu -
.
ró tica O riso dos jovens vendedores, que desencadeia sua fuga desatinada, quando ela entra
numa loja. representa a projeção de seu esc á rnio interior (culpabilidade) frente acena de sedu -
çã o do velho merceeiro, enquanto que os jovens representam os objetos sexuais que poderiam
excitar a moça.
O medo de sair na rua procede do mesmo chamado da sexualidade . Do ponto de vista do
inconsciente, a rua significa o mmvre, por conseguinte, sair na rua é fazer o trottoir .
Para o pequeno Hans, enfim, a fobia dos cavalos nos restitui a trama edí piana da histeria
de angústia. Tomado entre sentimentos ternos por seu pai e a agressividade em relação a este.
que vem complicar suas relações com a m ãe. o deslocamento da agressividade - desejo de que
o cavalo caia - lhe permite conservar iiuacto o primeiro sentimento de amor. isso não explica -
ria, em absoluto, a fobia dos cavalos , se as medidas de represália que a criança teme, por parte
156 IFAN BURGíRET

do pai . não fossem elas também simbolicamente expressas: o pequeno Hans se recusa a sair
.
na rua por causa dos cavalos que vã o morde-lo. A ambival ê ncia em relação ao pai é assim
resolvida , ao preço do medo dos cavalos.
Enfim , a sintomatologia da histeria de angústia é completada pelo papel do objeto conira -
fóbico. Se Emma n ão pode entrar sozinha em uma loja , a presen ça de um terceiro familiar lhe
permite fazê- lo. com um desaparecimento quase total da angústia . O fó bico perde, igualmente,
o medo na rua. se ele est á acompanhado. O próprio pequeno Hans. na rua , se seme bem ma is
seguro com a m ã e do que com a babá . A histé rica se protege da mesma maneira dos assaltos
de assédio masculino, mas , na histeria de angústia, n ã o é mais a pró pria relaçã o que é evitada ,
mas um objeto simbólico.

A economia
Preud precisa, no final do relato do pequeno Hans, que a similitude entre a histeria de
angústia e a histeria de conversão ú completa , à exceção de um só ponto . " É verdade que esse
ponto é de importâ ncia decisiva e feito para motivar uma distin ção: na histeria de ang ú stia , a
libido destacada do material patogênieo pelo recalcamento n ã o é convertida , quer dizer, n ã o é
desviada do psiquismo para uma inervaçã o corporal , mas liberada sob a forma de ang ústia ".
Ma is tarde, em 1920. em Inibições, sintomas e ang ú stia , ele retomará a essa concepçã o. A
ang ú stia n ã o nasce ruais da libido n ão utilizada , ou seja. n ã o é ruais uni produto do recalca -
mento , como ele havia acreditado: ao contrá rio, a angústia doravante situada no n ível do Ego
suscita o recalcamento, e é o fracasso deste ú ltimo que deixa filtrar a ang ústia.
Ora , na fobia n ão se assiste nem ao sucesso da histé rica que. pela conversão, verdadei
ro sucedâ neo da passagem ao ato sexual , engana o Superego , realizando, apesar de Ludo ,
uni tipo de destino tibidinal , nem às “ast ú cias" e âs ‘ acrobacias do deslocamento obsessivo
"

( Green ) . O deslocamento fó bico é . de algum modo. um mecanismo simples , mas inacabado ,


intermedi á rio , como diz Green , entre duas outras neuroses, o recalcamento é incompleto e a
ang ústia não é senão deslocada. A consequ ê ncia disso é que a angústia neurótica é a í encon -
trada quase que em estado puro. Freud , ali ás, a partir da história do pequeno Hans e de seu
medo da mordida dos cavalos, introduz o conceito de ameaça de castração , que doravante ir á
esclarecer sua concepção das neuroses.
Nas outras fobias, o erotismo , se se manifesta , é apenas de cobertura , a ang ú stia n ã o se
situa mais no n ível da perda de um ierr é uma angústia de dificuldade de ser que se situa , con -
-
forme os casos, no n ível da depressã o (estados lim ít roles) ou da psicose .

Neurose obsessiva
Histórico
A neurose obsessiva era considerada , no começo do século XX , como parte da loucura , isto
é, de saída ela tinha sido colocada na categoria das doenças mentais. Pinei falava de loucura
raciocinaiue , Esquirol a tinha classificado nas monomanias, ou seja , considerava -a um del í rio
-
pardal: Falava se de loucura da d ú vida, de loucura do tocar. A primeira boa descri çã o é devida a
Morei ( 1866) , que falava ainda de del í rio emotivo , mas é com Luys ( 1883) que se vé aparecer o
termo obsessã o , a partir de um artigo intitulado “ Das obsessões patológicas".
A partir de ent ã o , nos aproximamos das neuroses , mas a origem intelectual ou emocional
dos transtornos vai dividir os esp í ritos . A neurose obsessiva introduz, de íato, o problema dos
vínculos entre a vida emocional e a vida intelectual de uma maneira aguda . |anet ir á propor
PSICÍ PATOLOGIA 157

sua teoria da diminuição da energia ps íquica e tentará ligar a psicastenia e as obsessões , que
n ã o sã o , para ele. sen ã o um produto de degrada ção, uma espécie de res íduo do n ível da ativi -
dade psíquica mais elevada ,
Se a origem emocional foi f i nal mente admitida, em particular gra ças a Fitres e a Régis,
foi somente com Freud que se começou a entrever um princí pio de solu ção, a partir de sua
distin çã o entre os destinos res peai vos da representa çã o e do afeto , que assume na neurose
obsessiva uma import â ncia capital .

CLINICA
Isolamento
É o primeiro sintoma , ou seja , no curso de uma rela çã o, a primeira coisa que impressiona
é a esteriliza çã o da afetividade, pois, no obsessivo, o pensamento substitui os aios. at é o ponto
de haver o desaparecimento quase total da espontaneidade. Esse pensamento irá lhe servir de
perpé tuo anteparo entre ele e os outros, se bem que o primeiro movimento do obsessivo, contra
i ia mente à histé rica, é de se retirar, de tomar distâ ncia . Ele pensa e observa . Essa atitude coi res -
ponde, em geral , ao que é descrito , em psicologia , pelo termo de caráter esquizóide. Minkowski ,
.
em seu livro A esquizofrenia , descreveu muito bem esse cará ter que de nosso ponto de vista ,
concerne essencial mente ao obsessivo , em particular a incapacidade de se adaptar à atmosfera
afetiva e a perseguição , indefinida e fora de propósito, da realizaçã o de suas ideias.
.
Esse " isolamento" permite, de fato um distanciamento de toda proximidade afetiva , daí a
frieza de seus gestos e a ausê ncia de emotividade, o que , aliás, n ã o se limita forçosa mente ao
isolamento. Sua sexualidade é pobre e n ã o pode se manifestar, na maioria das vezes , a n ã o ser
em um contexto sadomasoquista. Em compensa çã o, no n ível da fala , ocorre o contrá rio, o ob -
sessivo dá mostra de uma prolixidade a toda prova. Seu esp í rito é de uma lógica inesgotá vel ,
mesmo que ela nem sempre esteja muito adaptada . A licenciosidade verbal n ão o incomoda »
mas trata -se a í ainda mais de uma aventura intelectual do que de uma proposi ção lasciva. O
que ele poderá dizer da sexualidade é desprovido de a Feto e sem nenhuma correspondê ncia
com sua vida sexual real
Mais profundei mente , o isolamento é uma verdadeira inibi çã o dos alé tos , sobre o qual
podemos nos perguntar se se trata de um sistema defensivo ou de um verdadeiro empobreci'
mento da vida psíquica. Km todo caso. consiste em um desligamento em rela çã o a si mesmo
que o obsessivo exerce, em proveito de uma ordem aparente do mundo. Nesse sentido , apenas,
-
pode se considerar o obsessivo como algu é m que é cortado da vida . Com efeito, o afeto latente
esta a postos; quando ele reaparece, é com mais frequ ê ncia no contexto da passagem ao ato e
da violê ncia.

Controle obsessivo
E a segunda vertente da sintomatologia do obsessivo. Tudo se passa , com efeito, como
se o obsessivo, depois de terse retirado a uma boa dist â ncia , armasse sua tenda , verificando
todas as sa ídas , codas as fugas poss íveis , de onde o car á ter obsessivo de suas preocupa ções, os
temas de ordem , de precisã o, de completude , a mania das coleções, que encontramos em desor -
dem , com todos os tipos de compulsões de verificações. K necessá rio, a esse respeito, eliminar
duas acepções correntes desse controle obsessivo: a obsessão sexual e <t ideiaJí xã .
Se passar o tempo a falar do que n ão se faz é um meio seguro "tlc isolar" a sexualidade as »

obsessões n ão são de fato sexuais, bem ao contrá rio, elas caracterizam sempre temas de ordem
que . como se ver á , são meios de lutar justa mente contra as pulsões libidinais.
158 |EAN BFHGFRFT

.
Quanto à idé ia fixa, por repetitiva e obsessiva que sei a cia não é também uma obsessão.
Assim, um marido, permanememerne temeroso, com ou sem razão, de que a mulher o enga -
ne, não apresenta uma obsessã o, no sentido em que a entendemos, mas um sentimento de
ciúme.
0 obsessivo enamorado, não ousando se aproximar do objeto de seus pensamentos, pode .
em compensação, criar todo um sistema de controle dos fatos e gestos de sua bem -amada ,
-
detendo se em detalhes irrisó rios, a partir dos quais ele tem a impressão de se comunicar com
,

ela. Os sentimentos de ciúme não est ão forçosa mente presentes: no extremo, ele pode se sa -
tisfazer com o sucesso de um rival que lhe permitir á isolar definiEiva mente seus sentimentos
e eventualmente prosseguir seus controles obsessivos com toda a tranquilidade: com o casa -
.
mento de “sua bem- amada ", tudo de algum modo, voltou à ordeml

Cará ter obsessivo


Tudo se passa ao contrário do que se viu na hist érica: depois do primeiro tempo de reti -
.
rada, o segundo é de investimento e de controle incessante Se a histérica não est á jamais no
lugar onde se cré que esteja, o obsessivo, ao contrário, surpreende por sua presença inesperada
.
no momento e no lugar em que não se esperava mais ou ainda por sua prodigiosa memó ria.
O controle incessante desempenha assim um papel consider á vel, desde as aquisições escolares
da criança, durante a fase de Iatenda at é o domínio de um sistema econó mico ou industrial,
,

passando por todas as manias de coleções, quer se trate de livros, selos, móveis antigos, qua -
dros c outros objetos de arte, e mais ainda a manipulação do dinheiro. A meticulosidade, a.
limpeza, a parcimónia e a obstinação são, como tela de fundo, os elementos de car á ter mais
freqiien temente encontrados .
Em um sistema desses, o que é mais temido é o imprevisto. O arranjo de sua dist â ncia face
a seus objetos afetivos , nem perto demais , nem demasiado longe, é posto em causa, rnesmo
quando a onipotê ncia do pensamento é colocada em dúvida.
Na superfície, a resposta imediata á interrupção do controle obsessivo é uma reação bru -
tal. até mesmo destrutiva para seus próprios objetos de amor. Se ela se reduz ás vezes a si m -
ples transbordamentos grosseiros em ní vel verbal, ela pode, ao contrário, conduzir a agressões
tanto earacterizadas como imprevisíveis, das quais o sadlsmo n ão est á jamais totalmente au -
sente .
Fm maior profundidade, a angústia latente, nunca totalmenie recalcada como na histeria,
ressurge em massa. A depressão, se ela se instala, e por latente que seja na maioria das vezes,
.
n ão deixa de ser grave O obsessivo se suicida de uma maneira met ódica, discrelamente, db
ferem em ente da hist érica. Esse suicidas são também os que tem mais sucesso. Se ele escapar
disso, a ferida narcísicá ser á intolerável, e a recidiva é a regra.

Ritual obsessivo
t um outro destino da ambivalência do obsessivo. Rir clássico e demonstrativo que seja,
não é o simorna mais frequentemente encontrado, a exemplo da grande conversão na hist éri -
ca. Fie pode, aliás, ser considerado como um elemento de gravidade.
Fie se apresenta , primeiro, sob a forma de obsessão - impulsão, descrita classicamente
como a irrupção da dúvida no pensamento, e de uma ordem interior considerada pelo sujeito
como um fenômeno mórbido e em desacordo com seu Fgo consciente: ela persiste, apesar do
todos os seus esfor ços para se desembaraç ar dela , e n ão desaparece a nã o ser com sua realiza-
ção. Esta última, com frequência não é muito diference da mania da ordem e das verificações
,

descritas anteriormente. De fato, seu sentido é completam ente transformado, pois elas assu
niêrn doravante um caráter corpumtârío.
P $êCi )t txiiA PATOL õí ,i( :A 159

Quer se ira te de apagar e acender três vezes a lâ mpada , antes de dormir, de repetir ta ]
palavra ou n ú mero , antes de atravessar a rua , de não andar sen ã o sobre as lajotas ímpares, ou
ainda de tocar uma certa categoria de objeto em sua passagem: á rvores , painéis de cirai] ação ,
temos a í toda uma série de atos que possuem um valor quase m ágico e cuja repetição constitui
um verdadeiro rito , Se olharmos de perto, n ão se traia , de tato , sen ão da condensação dos
dois sintomas precedentes: isolamento, pelo cará ter aritm é tico e artificial dessas impulsões ,
controle obsessivo, pela necessidade de repetição quedas comportam . Acrescenta -se a isso um
terceiro fator: a onipotência do pensamento ou pensamento m ágico.
Mas essa pró pria condensação se mostra muitas vezes inoperante, a ang ústia reinfiltra
continuam ente o processo, de onde decorrem as repetições até o infinito, as lavagens inces -
santes, as bizarrices no vestir cuja incompletude ir á requerer novos ritos, É o que se chama
.
de anulação pdo ritmi que , pouco a pouco, por contaminação, chega a uma rede compulsiva
total mente estranha à obsessão inicial , t ão considerá vel é o deslocamento f: assim que a Com -
,

plexidade de certos rituais conjurat ó rios {tocar todas as á rvores de um bosque ) pode levar o
paciente a verdadeiros estados de despersonal í za ção.

A economia
Representação
Ela é "isolada ". Essa redu çã o do ato ao pensamento é um mecanismo particular do recai
ca mento, A representa çã o amputada do desejo é assim modificada , de maneira que possa ser
considerada aceitá vel pelo Superego: os pensamentos podem , dai em diante, comportar uma te-
m á tica sexual , eles sofreram o mecanismo do isolamento, o desejo n ã o os segue. Vê- se o quanto
esse recalcamento é incompleto , e o isolamento uma espécie de arranjo relativa mente precá rio,
Afetos
Eles sofrem uma regressão (dinâ mica e temporal) para as representações anais , isto é, h á
uma verdadeira regressão do l£go, o interesse genital sendo "deslocado" para o interesse anal .
Mão se trata a í de uma fixaçã o das atitudes afetivas da crian ça em sua m ãe, no momento da
fase anal , mas de uma fixa çã o secund á ria , que reutiliza o material anal em fun ção das neces-
sidades da organiza çã o libidinal lace ao problema edipianc -
0 que diferencia , essencial mente, a fase anal da fase oral é o papel ativo da criança , que
decide ou n ão dar seu bolo fecal e toma posse assim de uma pot ê ncia autónoma . É esse contro -
le que ú retomado na regressã o anal. Com eleito, a satisfação da crian ça diante de suas fezes ,
no momento da fase anal, parece , em um primeiro momento , pelo menos, completa mente
esquecida ; a regressão não teria conservado, de algum modo, sen ão as manifestações de con -
serva çã o e de controle: por exemplo , uma crian ça sobre seu vaso, que se recusaria a dar seus
excrementos , mas construiria, ao lado , e com min ú cia , um imenso castelo de areia , verdadeiro
" coco limpo". Essa transformaçã o da pulsã o anal inicial em seu contr á rio é o tipo de defesa
chamada de Jbrmaçã o reativa.
A pulsã o anal assim dominada reaparece às vezes , mas de maneira brutal , e mesmo ca *

Lasiróllca , como se ela tivesse tido que forçar uma passagem , da í o forte componente agressivo
que comporta. Assim , um senhor parcimonioso e econ ó mico, que sc recusa habituai mente a
dar a sua mulher o dinheiro de que ela teria necessidade, mas vai . em compensa çã o, aceitar
emprestar urna grande soma de dinheiro a um amigo que ele n ã o via há uma eternidade . Isso
se parece muito , por certo , com a crian ça que se recusa a defecar, quando está com a m ã e. mas
o faz muito bem quando est á na casa da vizinha . Na realidade, poder-se- ia fazer igual mente
uma comparaçã o alimentar. De fato , a pulsã o anal real . satisfação e manipulação das fezes.
160 JEAM BERGEHFT

foi oompletamenbe rearranjada com a regressão. A brutalidade dessa pulsão anal consagrou
a denominação " sádico - anal" Assim, o controle obsessivo n ão está jamais ao abrigo de uma
tempestade pulsional e das medidas de represália que se seguem a castração é a espada de
,

Dâmocles do obsessivo.
O conjunto dessas manifestações de retenção e de expulsão corresponde ao que se chama
de erotismo anal , que se encontra em todos os comportamentos, quer sejam sexuais, afetivos
ou sociais. A infiltração desses mecanismos é . com efeito, mais sutil (e ao mesmo tempo mais
econó mica, aliá s) do que parece . Com efeito, toda compulsão de ordem comporta uma certa
manipulação da sujeira e da desordem ; assim, o controle obsessivo satisfaz ao mesmo tempo
as pulsões anais autê nticas, literal me me escondidas por meio de urna rede cerrada de forma-
ções reativas, e de seu Implacável Superego.
Não se deve esquecer que essa analidade não é senão a regressão de um conflito, que a
príori ê bem genital. Como diz Bouvei, "O obsessivo exprime um conlliioedípiano em linguagem
pr é- genital" . Serge Ledaire, por sua vezr insistiu particularmente 11 a import ância da relação do
obsessivo com sua mãe. O obsessivo seria o filho preferido de uma mãe insatisfeita, que parece
voltar sua expectativa dccepcionada para sua progenitura masculina . Desde ent ão, eles vivem
ambos em um mundo imaginário, corno que cm uma " prisão bem amada " , dirá Leda ire . Sem
chegar at é isso. é necessá rio sublinhar, entretanto, a Importância das primeiras relações com
a máe e a impressão duradoura que elas deixam: a de uma manipulação onipotente , em que o
lactente é inteiramente deixado aos cuidados maternos . Essa impressão pode ser reutilizada em
função das necessidades da crise edipiana. £ o caso, sobretudo, do menino que não tem que efe-
tuar mudança de objeto pelo menos no Édlpo direto. A imagem da mãe edipiana é , assim, infil-
,

trada de imagos bem mais arcaicas. A identificação com a " mãe sádico -anal permite se defender
contra o domínio dessa imago. mas igualmente satisfazer a conservação do objeto edipiano,
A identificação com o agressor pode , assim , tomar aspectos exircmamente variados. O
isolamento, a exemplo da função intelectual, pode preencher um duplo papel: " perpetuar, at é a
periferia do psiquismo, uma mãe ativista " e . ao mesmo tempo, “dominar pelas ideias a disper-
são. em todas as direções, de suas estimulações " [ Didier Anxicu),
Nesse caso, a identificação lica na orbitado Édipo, tal como o concebemos habitualmente.
|ã bem menos , quando o dom ínio tem por alvo essencial defender- se da invasão da depressão
materna , abrindo caminho, assim, para todos os mecanismos de reparação das imagens pa -
rentais . O que dizer, quando a imagem incestuosa está próxima do que Andr é Grccn descreveu
pelo conceito de “mãe morta” (identificação mortífera com a mãe depressiva)? Nessa perspecti-
var o isolamento não c sen ã o mais uma defesa em relação a uma sedução prim ária , mas uma
inibi ção dos afetos que sc encontram como “congelados " por uma espécie de cadáver interior.
O domínio consiste cm restabelecer essa incorporação incestuosa, sem deixar escapar a me -
nor parcela disso.. . A conservação fetichista n ão está longe. A organização obsessiva torna- se
assim um ponto de ancoragem dos avatares das perversões. Nesse ponto, a neurose obsessiva
se afasta do conflito cdlpiano clá ssico e deixa os louros da autenticidade neur ótica ã histeria ...
£ a essa última, aliá s, que se refere André Grcen , quando fala de um núcleo hist érico sobre o
qual seriam construídas as neuroses obsessivas de tipo genital: "O í ndice de histerização ( . ..)
[sendo] tanto mais importante quanto essa neurose conserva mais vínculos com a genitalida
de ”. As outras neuroses obsessivas remetem aos estados- lim í troíes, e mesmo à psicose.

Neuroses obsessivas, estados- limí trofes e psicoses


Nos casos em que o í ndice de histerização é fraco, ou inexistente, a imensidade dos ele-
mentos depressivos é constante . As neuroses obsessivas cujos elementos psicastênicos ou de
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caráter são frequentes aparecem, desde então, como estados- limí trofes cujo arranjo neurótico
permanece precário.
Ocorre o mesmo na maioria dos casos em que os rituais dominam a sintomatologia. Ver -
dadeiras passagens ao aio, eles marcam o fracasso da onipotência do pensamento, ao mesmo
tempo que ficam sob sua depende ncia; o ritual obsessivo, diferente mente da conversão hist éri -
. .
ca permanece mediado pelo pensamento Essa situação desconfort ável constitui um equilíbrio
inst á vel, cujo esgotamento conduz ã depressão grave, ruais, aliás , do que à psicose ,
Quando , enfim, os sintomas de rimais obsessivos invadem a cena, com mecanização do
comportamento e apragmatismo, ou se as convic ções conjuratortas se tornam quase deliran -
.
tes n ão parece ma is se tratar sen ão de estigmas neuróticos, defensivos lace a uma estrutura
psicótica subjacente.

Depressão neur ótica


Descri ção
A. depressão neur ótica é difícil de descrever clinicamente, tantas são as máscaras que eia
pode assumir.
.
- Ela represenm, antes de tudo um elemento maior da descompensação neurótica . O so -
frimento ligado à desvalorização da imagem narcisista, qualquer que seja o fator conjuntural,
modifica os processos de pensamento. Tudo se passa como se a vida psíquica se coagulasse
em um procedimento único que tem tendência a querer tomar todo o lugar: a ruminação.
Trata - se de uma máquina infernal, que r ói o sujeito ínteriormente, ao escolher os recô nditos
mais dolorosos e ao paralisar o funcionamento mental a ponto de provocar uma verdadeira
retirada da maior parte de seus investimentos. Apesar das aparências, trata - se de um processo
muito ativo, cr pois, bastante custoso: toda a energia psíquica disponível é posta a serviço da
ruminação.
Nas neuroses frágeis, uras ainda n ão descomperisadas, a depressão se mant ém roais
discreta e muitas vezes ma&carada. As vezes, ira ta se de uma aflição latente e familiar,
mas os derivados ma is frequentes se manifestam por reações ao tipo de agressividade
que se chama, na linguagem corrente , de "' transtornos caraaeriais " [ n ão confundir com a
.
neurose de car á ter) Que a depressão se manifesta por uma agressividade injustificada, um
movimento de impaciência, essa é uma experiê ncia corrente. Nela reconhecemos também
.
um. sintoma importante da neurose em estado de lat ência ou em via de descompensação,
revelador das falhas narcisistas não - aparentes.
Há, enfim, todos os tipos de posições intermediárias, ligadas a um mal - estar geral mal
precisado, e mesmo a transtornos de natureza funcional que enchem os consult órios médicos.
Esses estados, que podem assumir o aspecto de neurose de destino: neuroses de fracasso,
neuroses de abandono, não devem ser considerados todos con o dependentes das depressões
essenciais.
*

Natureza neurótica da depressão


Eia se revela pela capacidade de utilizar a dor depressiva para fins de elaboração psíquica,
apesar dos sintomas, da ruminação, e at é mesmo da recusa.
A. introdução de um terceiro ( real ou imaginário, na fantasia) pode, peto menos momen-
taneamente, romper o c írculo vicioso da ruminação, por meio de produções mentais mais
associativas.

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